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28 DE MAIO DE 1993 2443

Aliás, não é por acaso que a evolução da moderna doutrina processual e da regulamentação dos processos caminha, decididamente, no sentido de diferenciar os ritos e as regras consoante a especificidade dos objectos. Trata-se aqui, no fundo, apenas de uma aplicação particular de uma regra geral.
Á acção popular, modernamente, penso que é muito mais uma manifestação da sociedade do que uma forma de organizar melhor o Estado. Daí que se me suscitem algumas dificuldades e uma relativa fungibilidade, que me pareceu transparecer do projecto socialista, no que respeita ao Ministério Público e ao actor popular.
Penso que, se efectivamente devemos considerar que a acção popular, quer procedimental quer no contencioso administrativo, é uma clara manifestação da sociedade por contraposição ao Estado organizado, devemos retirar dela as necessárias consequências e evitar essa fungibilidade ou indiferença perante o Ministério Público.
O Ministério Público, muito embora tenha um papel extremamente relevante na defesa dos interesses do Estado e na observância do ordenamento jurídico, é uma clara manifestação do Estado-organização. Foi assim que ele foi criado quando o imperador Napoleão teve essa ideia verdadeiramente genial e, de algum modo, é assim - muito embora tenha ganho autonomia em relação ao Governo - que se tem mantido ao longo dos séculos e existe no ordenamento jurídico português.
Nestes termos, diria que a nossa posição é claramente favorável ao estudo das fórmulas mais correctas de regulamentar a acção popular e de nos regozijarmos que outros tenham sido mais céleres do que nós. Aliás, aproveitava a oportunidade para referir que a antecipação deste debate impediu que apresentássemos um projecto como era nossa intenção. Mas em sede de discussão na especialidade, certamente, teremos oportunidade de colmatar essa lacuna e de oferecer claramente a nossa contribuição no sentido de se conseguir uma regulamentação que, pelo menos, esteja à altura da complexidade do problema que enfrentamos.
Portanto, é nesse sentido que me parece de felicitar o Sr. Deputado Almeida Santos pela sua iniciativa e pelo arrojo que teve. Penso que, em muitos aspectos, ela suscitou problemas que, sem ter tido essa coragem e essa audácia, provavelmente não estaríamos perante eles e, noutros casos, ela merece mesmo a nossa concordância. No entanto, penso que, em alguns aspectos, a nossa discussão irá eventualmente encontrar outras soluções, pois é assim que se vai aperfeiçoando o ordenamento jurídico.
Trata-se, em suma, de um momento alto em que o Parlamento demonstra a sua atenção às necessidades e carências não apenas do ordenamento jurídico português mas da própria sociedade portuguesa.

Aplausos do PSD e do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - O Sr. Deputado Almeida Santos pede a palavra para formular um pedido de esclarecimento?

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sim, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): -Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Rui Macheie, uso da palavra não tanto para o questionar mas para lhe tributar as minhas homenagens pelo contributo sério e construtivo que acaba de nos trazer.
Relativamente ao que disse, necessariamente reconheço que não fiz mais do que adiantar hipóteses de solução para problemas que são difíceis de contornar mas, relativamente ao problema do Ministério Público, queria perguntar-lhe se não é sensível ao facto de um litigante, que aparece a litigar em nome de uma colectividade, quase de um grupo de outros indivíduos que se deixam representar por ele, vir a fazê-lo mal ou até a cair na tentação de entendimentos com a parte contrária.
A solução da lei brasileira, que, devo dizer-lhe, é uma lei sucinta e má, é, neste pormenor, exactamente e apesar de tudo, aquela que eu propus.
Podemos pôr o Ministério Público como parte assistente. Simplesmente o que acontecerá é que, quando o principal autor cometer um erro que seja irreparável, o Ministério Público pode não ter posição suficiente para poder ou continuar a lide se ele desistir ou tomar outra atitude que corrija o erro do autor inicial. Foi só porque me preocupei em criar uma garantia, não tanto por razões conceituais, até porque hoje o Ministério Público está tão distanciado do Estado que nos dá garantia de alguma autonomia, de alguma independência - diria até de bastante autonomia e de bastante independência - e, portanto, a razão do seu receio não se verifica, em grande medida, relativamente ao Ministério Público português.
Esta era a única questão que lhe colocava. Quanto ao resto, teremos oportunidade de discutir estes e muitos outros problemas, estas e muitas outras dúvidas porque dúvidas é o que não falta, neste domínio.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.

O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Almeida Santos, estou de acordo consigo em que é necessário prever, nas hipóteses em que os litigantes sejam claudicantes, uma intervenção ad adjuvandum do Ministério Público. O que julgo é que teremos de distinguir, claramente, a posição do Ministério Público na acção penal, em que é, obviamente, o titular da acção penal e em que aí, digamos, serão os assistentes privados, mesmo actuando em termos de quibus de populo, como alguém que tem um papel, de algum modo, sempre secundário embora ajudando, da situação do Ministério Público no processo civil e também da situação do Ministério Público no processo administrativo.
Quanto ao processo civil, penso que não há grandes dúvidas no que diz respeito ao ponto de equilíbrio que deve ser conseguido; no que respeita ao processo administrativo, julgo que há várias coisas a corrigir.
Assim, aceito que possa ter uma função de correcção e de ajuda, mas parece-me que, em primeiro lugar, excede largamente as necessidades e os objectivos do processo permitir que o Ministério Público, independentemente da natureza dos interesses, possa sempre impugnar os actos, mesmo quando não há sequer acção popular.
Em segundo lugar, é confuso que o Ministério Público, que, às vezes, acontece ser solicitado no mesmo processo para ter posições diferentes, seja simultaneamente quem impugna o acto e quem, como comissário do Governo e embora em termos limitados, faz uma análise acerca da viabilidade do recurso e da legalidade que está em causa ou quem representa o próprio Estado.