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Quinta-feira, 21 de Outubro de 1993

I Série - Número 1

DIÁRIO
Da Assembleia da República

VI LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1993-1994)

SESSÃO SOLENE DE ABERTURA DA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA

REUNIÃO PLENÁRIA DE 20 DE OUTUBRO DE 1993

Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo

Secretários: Exmos. Srs. José Mário de Lemos Damião
Vítor Manuel Caio Roque
José de Almeida Cesário Alberto Monteiro de Araújo

SUMÁRIO

Às 15 horas e 10 minutos, deu entrada na Sala das Sessões o cortejo em que se integravam o Sr. Presidente da Assembleia da República (Barbosa de Melo), o Sr. Primeiro-Ministro (Cavaco Silva), o Sr. Presidente do Tribunal Constitucional, os Srs. Secretários da Mesa, o Sr. Secretário-Geral da Assembleia da República e o Sr. Director dos Serviços de Relações Públicas e Internacionais.
No hemiciclo, encontravam-se já, além de Ministros e Secretários de Estado, os Ministros da República para os Açores e para a Madeira, o Procurador-Geral da República, os Presidentes do Supremo Tribunal Administrativo, do Tribunal de Contas e do Supremo Tribunal Militar, o Chefe do Estado-Maior da Armada, o Vice-Chefe do Estado-Maior do Exército e o Chefe do Estado-Maior da Força Aérea, o Presidente do Conselho Económico e Social, o Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Juízes do Tribunal Constitucional, o Governador Civil de Lisboa, o Presidente da Alta Autoridade para a Comunicação Social, o Presidente da Comissão Nacional de Eleições, o Secretário-Geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros, o Comandante do Comando Operacional da Força Aérea, o Governador Militar de Lisboa, o Comandante-Geral da Guarda Nacional Republicana e o 2º Comandante-Geral da Polida de Segurança Pública.
Em sessão solene de abertura dos trabalhos parlamentares, usaram da palavra os Srs. Deputados Isabel Castro (Os Verdes), Nogueira de Brito (CDS-PP), João Amaral (PCP), Ferraz de Abreu (PS) e Duarte Lima (PSD) e, por último, o Sr. Presidente da Assembleia da República (Barbosa de Melo).
Após suspensão dos trabalhos, em período da ordem do dia, foi aprovada, na generalidade, na especialidade e em votação final global a proposta de lei n.º de lei n. º 59/VI - Autoriza o Governo a transpor para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 92/111/CEE do Conselho, de 14 de Dezembro, e a alteração à legislação sobre o IVA. Intervieram, a diverso título, além do Sr. Subsecretário de Estado' Adjunto da Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento (Vasco Matias), os Srs. Deputados Domingues Azevedo (PS), Lino de Carvalho (PCP), António Lobo Xavier (CDS-PP) e Alberto Araújo (PSD).
A proposta de resolução n.º 36/VI - Aprova, para ratificação, as emendas aos artigos 24º e 25º da Constituição da Organização Mundial de Saúde foi também aprovada, em votação global, tendo produzido intervenções os Srs. Deputados João Rui de Almeida (PS), Luís Peixoto (PCP) e Manuela Aguiar (PSD).
A Câmara aprovou, ainda, três pareceres, dois sobre substituição de Deputados do PSD, do PCP e do CDS-PP e um terceiro não autorizando a suspensão de mandato de um Deputado para ser presente em tribunal.
Eram 18 horas e 15 minutos quando o Sr. Presidente encerrou a sessão.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 10 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Abílio Sousa e Silva.
Adão José Fonseca Silva.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Álvaro José Martins Viegas.
Ana Paula Matos Barros.
Anabela Honório Matias.
António Costa de Albuquerque de Sousa Lara.
António da Silva Bacelar.
António de Carvalho Martins.
António do Carmo Branco Malveiro.
António Esteves Morgado.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas! Leitão.
António José Caeiro da Motta Veiga.
António Manuel Fernandes Alves.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Arlindo da Silva André Moreira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Alberto Lopes Pereira.
Carlos de Almeida Figueiredo.
Carlos Filipe Pereira de Oliveira.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel de Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel de Vallére Pinheiro de Oliveira.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Cipriano Rodrígues Martins.
Delmar Ramiro Palas.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva.
Ema Mana Pereira Leite Lóia Paulista.
Fernando Carlos Branco Marques de Andrade.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando ,José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando Santos Pereira.
Filipe Manuel da Silva Abreu.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco João Bernardino da Silva.
Guilherme Henrique.
Valente Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Isilda Maria Renda Periquito Pires Martins.
Jaime Gomes Milhomens.
João Alberto Granja dos Santos Silva.
João Álvaro Poças Santos.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Dias Madeira Gouveia.
João José da Silva Maçãs.
João José Pedreira de Matos.
Joaquim Cardoso Martins.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Manuel Pereira de Almeida e Silva.
Joaquim Maria Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Angelo Ferreira Correia.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José de Almeida Cesário.
José Fortunato Freitas Costa Leite.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leite Machado.
José Manuel Borregana Meireles.
José Manuel da Silva Costa.
José Manuel Nunes Liberato.
José Mário de Lemos Damião.
José Pereira Lopes.
Luís António Carrilho da Cunha.
Luís António Martins.
Luís Carlos David Nobre.
Luis Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel Antero da Cunha Pinto.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel da Silva Azevedo.
Manuel de Lima Amorim.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Simões Rodrígues Marques.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues.
Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira.
Maria de Lurdes Borges Póvoa Pombo Costa.
Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia.
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa.
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Melchior Ribeiro Pereira Moreira.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos.
Nuno Manuel Franco Ribeiro da Silva.
Olinto Henrique da Cruz Ravara.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Simão José Ricon Peres.
Telmo José Moreno.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Pereira Crespo.

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Partido Socialista (PS):

Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Bernardes Costa.
Alberto da Silva Cardoso.
Alberto de Sousa Martins.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Ana Maria Dias Bettencourt.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Domingues de Azevedo.
António José Martins Seguro.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando António Martins Vara.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Manuel Luís.
Edite de Fátima Santos Marreiros Estrela.
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa.
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins.
Gustavo Rodrigues Pimenta.
João António Gomes Proença.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Maria de Lemos de Menezes Ferreira.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Américo Fialho Anastácio.
Joaquim Dias da Silva Pinto.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho.
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego.
José Barbosa Mota.
José Eduardo dos Reis.
José Eduardo Vera Cruz Jardim.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
José Paulo Martins Casaca.
José Rodrigues Pereira dos Penedos.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Filipe Marques Amado.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Manuel Capoulas Santos.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio.
Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes.
Raúl D'Assunção Pimenta Rêgo.
Raúl Fernando Sousela da Costa Brito.
Rogério da Conceição Serafim Martins.
Rui António Ferreira da Cunha.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António Manuel dos Santos Murteira.
João António Gonçalves do Amaral.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Carlos Martins Peixoto.
Maria Odete dos Santos.
Paulo Manuel da Silva Gonçalves Rodrigues.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Adriano José Alves Moreira.
António Bernardo Aranha da Gama Lobo Xavier.
José Luís Nogueira de Brito.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Isabel Maria de Almeida e Castro.

Partido da Solidariedade Nacional (PSN):

Manuel Sérgio Vieira e Cunha.

Deputados independentes:

Diogo Pinto de Freitas do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Mário António Baptista Tomé.

O Sr. Presidente: - Como sabem, foi deliberado pela Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares que usassem da palavra dentro dos tempos fixados no quadro electrónico os representantes dos grupos parlamentares, seguindo-se a ordem inversa da sua representatividade na Câmara.
Por isso, o primeiro grupo parlamentar a usar da palavra, pela voz da Sr.ª Deputada Isabel Castro, é o Partido Ecologista Os Verdes.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Convidados, Sr.ªs e Srs. Deputados: Tal como a Natureza, de modo intempestuoso, assinala de quando em quando o nosso quotidiano, antecipando ao Inverno os seus efeitos mais devastadores, também a sociedade o faz, traduzindo nas suas mais visíveis marcas o enraizamento e a globalização de uma crise sem paralelo.
É neste contexto que, na abertura dos trabalhos da 3.ª sessão legislativa, importa para nós, Os Verdes, dois anos volvidos sobre a eleição deste Parlamento, questionar o seu papel.
Questionar o seu papel, dois anos passados do tempo das afirmações peremptórias (vendidas em campanhas de marketing, pagas «a peso de ouro»...), do tempo dos números, que, com confiança, se dominavam, e das verdades que se absolutizavam, eternas, prometendo, em tom categórico, que não admitia espaço para a dúvida nem margem para o risco, a estabilidade, a qualidade e a segurança. Verdades que ao exame dos sentidos não resistem e que a realidade desmente inequívoca.
O equilíbrio ecológico, se bem que ainda não rompido, está ameaçado: os nossos rios e o ar estão poluídos como nunca; a água que bebemos está contaminada; os resíduos tóxico-perigosos jazem nos nossos solos; o litoral vai sendo destruído; as áreas protegidas alienadas; o património cultural mutilado.

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Nos nossos mares, cruzam-se, sinistros, materiais perigosos; para os seus fundos projectam-se cemitérios nucleares.
De além fronteiras, chega-nos o alerta do perigo radioactivo.
Nos campos, paga-se para o desperdício; a desertificação não cessa, bem como o êxodo para as cidades, que continuam a constituir a fuga! ao isolamento que as grandes vias não conseguiram quebrar... Cidades, elas próprias incapazes de dar resposta aos sonhos dos que as procuram, crescendo imparáveis em dormitórios desumanizados, descaracterizados, marginalizados e marginalizantes, autênticos armazéns do descontentamento, onde se acolhem os novos excluídos, aqueles a quem o desemprego rouba não só a segurança e o pão mas sobretudo, a própria esperança e o desejo de viver.
Um País onde a degradação ecológica se alia, brutal, à própria degradação dos seres humanos e dos seus códigos de conduta, como resultado do liberalismo mais puro e dos valores que lhe estão associados.
A violência banaliza-se e perde significado. A pobreza aumenta e com ela os idosos e meninos que da rua fazem casa. Ao seu lado, a indiferença campeia, numa sociedade onde a solidão alastra e os sentimentos de generosidade e de solidariedade deram lugar ao egoísmo e à competitividade mais ferozes, que na escola bem cedo se aprendem.
Uma sociedade que engendrou novos fenómenos de exclusão, que, de modo perverso, se estimulam, gerando autoritarismo, intolerância, racismo e xenofobia.
Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Convidados, Srs. Deputados: A sociedade portuguesa está doente e este Parlamento não pode continuar a ignorá-lo, fechado sobre si próprio, estático, divorciado da realidade, preso às suas próprias normas, enclausurado nas suas paredes e mergulhado em liturgias que não o conseguiram aproximar dos cidadãos, antes acentuaram o fosso entre a ficção aqui construída e a realidade vivida lá fora.
Por isso, para nós, Os Verdes, importa no reinício dos trabalhos parlamentares reflectir sobre esta realidade e questionar o próprio sentido do Parlamento.
Nele se reflectem e cruzam expressões múltiplas de vontades, de que a sociedade portuguesa na sua rede plural é feita; vontades a que importa dar corpo num Parlamento que não pode furtar-se a ser a consciência crítica do poder instalado, ainda que maioritário, num Parlamento que não pode condicionar Já liberdade das minorias, fechando-se dogmático a todas as suas iniciativas, anulando-as e desvirtuando assim o próprio sentido de espaço que representa.
Um espaço que tem de ser de Provedoria dos Direitos dos Cidadãos, qualquer que seja a sua raça, sexo, credo ou condição, e que se faça eco das suas vozes, mesmo quando de protesto.
Um Parlamento que respeite o sentido do voto daqueles de quem recebeu o mandato, mas um Parlamento que tem, simultaneamente, ao olhar sobre si próprio, de interpretar o significado do silêncio daqueles (e já são muitos) que, através do voto, já se não manifestam; aqueles que, através da sua abstenção! exprimem a sua desconfiança, o seu cepticismo e o seu desencanto na instituição parlamentar, tal como ela é concebida.
É tempo de criar alternativas, de preservar sonhos e utopias. Pela nossa parte, tudo faremos para que assim seja; para que Portugal se torne um país onde apeteça viver, devolvendo-se a esperança e a confiança que façam de cada um dos portugueses participantes activos no nosso viver colectivo, e para que também deste modo a democracia se cumpra.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o representante do Grupo Parlamentar do CDS-PP, Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS-PP): - Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, Exmas. Autoridades Convidadas: Começamos, como nos parece adequado numa sessão de abertura, por saudar V. Ex.ª, Sr. Presidente da Assembleia da República, sendo-nos grato, ao fazê-lo, poder exprimir, a par da afirmação de respeito, o reconhecimento das qualidades de inteligência, de objectividade e de inclinação permanente para o diálogo, que pessoalmente me habituei a admirar como contemporâneo e depois já como aluno de Coimbra e que V. Ex.ª continua, apesar de todos os condicionalismos do cargo e do seu exercício, a patentear aqui como primeiro entre nós todos que o escolhemos para dirigir os nossos trabalhos e gerir a Casa em que os exercemos. Bem haja, pois, Dr. Barbosa de Melo.
E as saudações vão depois para os que vêm de fora, Srs. Convidados, e para os que vêm de fora, embora frequentando a Casa por direito próprio, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Membros do Governo, saudações que acompanho de um voto: o de que venham cá muito, para responder, esclarecer, propor e debater, com mais ou menos vivacidade, mas sempre com abertura de espírito e não esquecendo a ideia fundamental de que a justificação para o labor de todos é a realização de um bem que a todos é comum.
E finalmente, numa hora que é sempre de reencontro, saúdo ou, melhor, os Deputados do CDS-PP saúdam todos os colegas que aqui têm assento, nas bancadas dos demais partidos, ou mesmo na sua própria bancada individual, e também todos quantos, nos quadros desta Casa, com os Deputados colaboram para tornar possível e mais eficaz o seu trabalho, bem como os Srs. Jornalistas de todos os meios da comunicação social, que acompanham o nosso quotidiano parlamentar e que contribuem de modo decisivo para levar a acção da Assembleia ao exterior, abrindo as paredes desta Casa.
Bem hajam, pois, todos e que todos, com os Deputados em primeiro lugar, possamos trabalhar na próxima sessão com os olhos postos nos interesses do povo português para que este possa finalmente rever-se na representação parlamentar.
Não faço este voto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, sem a consciência de que a imagem pública da instituição parlamentar é, hoje, uma imagem degradada e de que a sessão que se aproxima será naturalmente uma sessão com dificuldades acrescidas.
E afigura-se-me adequado, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que, depois das saudações, nos detenhamos sobre dois aspectos principais, respeitantes à estrutura e à conjuntura do nosso Parlamento.
Começando pela estrutura, pela degradação da nossa imagem, evidenciada, sem margem para dúvidas, nas sondagens feitas periodicamente por diversos especialistas, nós sabemos que a importância dos parlamentos não é, hoje, a que já foi. Sabemos que a transformação dos partidos de quadros em partidos de massas, o sufrágio proporcional, nos países em que já foi consagrado, e o desenvolvimento

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acelerado dos meios de comunicação social, como factores de actuação permanente, a que, entre nós, se junta a formação conjuntural e inesperada de uma maioria parlamentar mono-partidária de apoio ao Governo, tendem a subalternizar o papel das assembleias representativas e a deslocar para outros palcos partes importantes da acção política.
Mas sabemos também que esse movimento não é uniforme - eu diria graças a Deus - e que, em Portugal, o Parlamento deveria ter naturalmente um papel acrescido, como elemento de consolidação de uma democracia política, que ainda não fez 20 anos de idade.
A pedagogia da democracia passa necessariamente entre nós pela instituição parlamentar, que é em si o elemento mais vivo de contraste com o antigo regime.
Ora, o que na verdade se passa é, como dizia atrás, que o Parlamento português tem hoje, apesar da sua juventude, uma imagem já desgastada e aparece desprestigiado aos olhos dos portugueses.
As origens desta situação não são, com certeza, simples, mas uma delas reside, sem margem para dúvidas, nas relações que o Governo tem vindo a manter com a Assembleia.
De tal modo que esta aparece, para muitos, reduzida ao papel de simples notário do sistema e, menos do que isso, de simples carimbador da actuação do Governo.
Fixo-me em três acontecimentos recentes, que ilustram isto mesmo. O primeiro foi sem dúvida a gaffe que o Primeiro-Ministro não deixou de cometer, apesar de a ter emendado em tempo útil - reconhece-se! -, e que o levou a condicionar a aprovação de uma medida de carácter fiscal (a actualização dos escalões do IRS) aos azares da concertação social, esquecendo completamente o papel da Assembleia.
Dir-se-á que a questão é formal, na medida em que o Governo dispõe de apoio maioritário garantido, e que a matéria fiscal não deverá deixar de constar das negociações sobre rendimentos.
E é verdade que é assim. Mas o certo é que a formalidade é essencial, não podendo o titular de um órgão de soberania ignorar as competências de outro órgão, também de soberania, e expor tão cruamente na praça pública os rigores da disciplina interna do seu partido.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Cabe, aliás, perguntar: tratando-se apenas de uma questão formal, por que razão é que todas as leis antipáticas são sistematicamente imputadas ao Parlamento, como aconteceu durante o ano lectivo passado com a lei das propinas, que o Ministro da Educação tentava sacudir como quem «sacode água do capote»?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Neste particular, estão fundamentalmente em causa, repito, as relações entre a concertação e o processo de discussão e aprovação do Orçamento, que, sob pena de uma promiscuidade desprestigiante para o Parlamento, deverão ser objecto de regulamentação, que, sem asfixiar a flexibilidade essencial a qualquer processo negocial, fixe com algum rigor o objecto, o processo e os prazos a cumprir na concertação.
Disso mesmo nós, CDS-PP, vamos encarregar-nos.
O segundo acontecimento foi a desconsideração para com a oposição, patente no facto de o Governo a ter consultado sobre temas que haviam já sido decididos, como foram, este ano, as consultas sobre as propostas de lei do Orçamento e das Grandes Opções do Plano, precedidas do anúncio público de que tudo havia já sido aprovado.
É claro que a desconsideração foi formal, como então eu próprio tive ocasião de acentuar, mas não deixou de sê-lo e de implicar uma violação do estatuto da oposição e de contribuir com mais uma acha para a fogueira em que se consome a nossa imagem pública.
Finalmente, não podemos deixar de salientar a indisponibilidade do Governo e da maioria, aqui exibida na passada sessão, para ouvir os avisos da oposição, que conduziram à declaração de inconstitucionalidade de normativos incluídos nos diplomas respeitantes ao Estatuto dos Magistrados Judiciais, do combate à corrupção, do segredo de Estado e da Reforma do Tribunal de Contas.
Reafirmou-se, sem dúvida, o poder da maioria, mas não se prestigiou o Parlamento, e desvalorizou-se o papel das oposições, cujas opiniões e contributos, mesmo quando de carácter técnico, são pura e simplesmente rejeitados, talvez precisamente por serem provenientes da oposição.
Que estas lições possam aproveitar a todos, e sobretudo à maioria, de modo a que a sessão legislativa que hoje se inicia possa ser, antes de mais, o início da recuperação da imagem parlamentar.
Especialmente em tempo de crise, ninguém perdoará que se malbarate património institucional do regime e que a política seja sobretudo uma guerra de posições e não um combate leal e a procura sincera das melhores soluções para os problemas reais do País.
O CDS-PP, como até aqui, tudo fará para que assim seja.
E é em tempo de crise, hoje indesmentível, que a Assembleia vai ter entre mãos temas da maior importância, embora, repito, não isentos de dificuldades.
Começaremos, como é usual, com a matéria orçamental, sendo certo que desta vez temos um verdadeiro orçamento suplementar, respeitante a 1993, e não o correctivo dos últimos anos, a par do Orçamento do Estado para 1994 e de um novo programa de convergência nominal, o Quantum H. 2., para além das Grandes Opções do Plano, é claro!
Não quero, como é evidente, antecipar um debate, que para nós vai, aliás, começar mais cedo, mas não posso deixar de lamentar que a Assembleia se veja uma vez mais confrontada - a última foi em 1983, em pleno Bloco Central - com propostas fiscais retroactivas.
Já abalado pelas clamorosas falhas de previsão, o Orçamento de 1993 vai agora sofrer um entorse (recuso-me a falar de correcção), que, ao menos em matéria de IRC, defrauda completamente as expectativas criadas pelos textos que aprovamos em 16 de Dezembro de 1992 - há menos de um ano, portanto!
Quer dizer que o Estado aparece aqui na pessoa do Governo a propor a violação de um princípio fundamental do Estado de direito democrático, a não retroactividade das leis, e a penalizar comportamentos que ele próprio incentivou.
Depois de se ter consagrado como um dos maiores caloteiros do País, falta agora, uma vez mais e de forma solene, à palavra dada.
Não pomos em causa a necessidade de, em certos termos, adaptar a política às circunstâncias da conjuntura, mas o que exigimos é que as adaptações se processem sempre no respeito dos princípios fundamentais que devem nortear a conduta das pessoas e das colectividades.
Não somos, com efeito, dos que aceitam que o interesse do Estado ou o pretenso interesse do Estado (a salus populí) possa justificar todos os atropelos.

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E é claro que, a não ser corrigida, a proposta do Governo arrisca-se a transformar-se em lei da Assembleia, a menos que os Srs. Deputados e consciência pessoal e ponderem, a essa luz, os deveres que a representação política da maioria consultem a sua de que são titulares, apesar de tudo, lhes impõe.
O CDS-PP, pela voz do seu líder parlamentar, Deputado António Lobo Xavier, tudo fará para que a razão acabe por imperar neste domínio.
Mas esta sessão legislativa coincide também com o segundo ano do Mercado Interno e com o primeiro da segunda fase do processo de unificação económica e monetária europeia, tudo a decorrer num clima que não é mais o clima optimista que, tanto sobre o Mercado Interno como sobre a União Económica e Monetária, se vivia ainda há menos de dois anos.
É por isso desejável que se intensifique a discussão no Parlamento nacional, tendo ern conta a decisão recentemente tomada pelo Supremo Tribunal alemão e a necessária preparação da conferência I intergovernamental de 1996, que, como bem diz a SEDES, necessita de ser preparada com a antecedência que evite as surpresas e as confusões que acompanharam a aprovação do Acto Único e, embora em menor grau, do Tratado de Maastricht.
Assim, e desde já, torna-se necessário conhecer a ideia do Governo sobre o futuro do SME, se é que ainda tem futuro, e sobre o processo I de construção da UEM, e saber se o novo programa de convergências afecta a nossa posição, no contexto dos signatários de Maastricht. E não deverá ser apenas a União Económica e Monetária a monopolizar as nossas atenções. É preciso reflectir seriamente sobre as consequências do Mercado Interno e sobre a real preparação do País (Administração Pública e particulares) para o enfrentar.
O CDS-PP vai propor partir da análise do caso que essa reflexão se faça já a concreto que ultimamente tem surgido na informação e que aí aparece designado como «guerra dos porcos».
Será que, volvido o excesso de zelo que acompanhou a presidência portuguesa! nos preparamos para seguir o modelo grego e italiano, ou seja, o modelo da facilidade a negociar e da dificuldade a cumprir, ao invés do modelo britânico da dureza na negociação e escrúpulo no cumprimento, já que o modelo alemão de «faça-se como é de nosso interesse e vontade» não nos é acessível?
Precisamos de sabê-lo é discuti-lo. Por isso fazemos votos para que a Assembleia Ida República seja o verdadeiro forum do debate europeu, nesta sessão que hoje se inicia, sessão que, aliás, antecede aquela em que a Assembleia vai novamente assumir poderes de revisão da Constituição e em que o CDS-PP tudo fará para que o clima de realismo que agora se vive seja aproveitado para regressar às propostas que formulou, nó sentido de, expressamente e de modo mais claro, acautelar a soberania nacional e a capacidade de intervenção da Assembleia da República.
Em suma, espera-nos, com certeza, muito trabalho. Que Deus nos ajude a encontrar as condições e a capacidade para concretizá-lo.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o representante do Grupo Parlamentar do PCP, Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Membros do Governo, Srs. Convidados, Srs. Deputados: Ao promover esta sessão solene com a presença das mais altas individualidades do Estado, o Sr. Presidente da Assembleia da República não só assinala com dignidade acrescida o início desta sessão legislativa como incentiva os grupos parlamentares a exprimirem publicamente, perante um auditório com especiais responsabilidades, quais os seus pontos de vista e perspectivas sobre o ano parlamentar.
Em nossa opinião, a Assembleia da República esteve tempo demais paralisada. Desde 2 de Julho até hoje, 20 de Outubro, vão três meses e meio, e nada pode justificar esta anómala situação de paralisia a que foi remetida a Assembleia. Formalmente, a sessão legislativa inicia-se em 15 de Outubro, mas querer deduzir daqui que ela deve estar encerrada fora do período normal de funcionamento só se compreende vindo de quem quer reduzir o papel político do Parlamento ou, então, de quem quer instrumentalizá-lo - como sucedeu nas insólitas duas reuniões de Agosto, em que o Governo utilizou o Parlamento, a propósito do direito de asilo, para a guerrilha institucional contra outro órgão de soberania - ou, ainda, para obter benefícios em proveito próprio - como sucedeu com a reunião feita para aprovar, com a única oposição clara do PCP, a escandalosa norma que torna não aplicável aos autarcas o regime de incompatibilidades, violando assim o regime de transparência e dedicação exclusiva que deveria ser norma para presidentes de câmara e vereadores em regime de permanência.
Mas para analisar o agravamento da situação social e económica, para debater os problemas com que os portugueses se defrontam, para isso, lamentavelmente, já não houve vontade política de reunir a Assembleia.
Começamos, assim, os nossos trabalhos, a 40 dias de voltar a fechar esta Casa por causa da campanha eleitoral autárquica, como é, aliás, tradição e, por isso, inteiramente previsível.
Os trabalhos vão ser marcados por três condicionantes principais: primeiro, pela crise em que o País se encontra mergulhado. A crise é o pano de fundo da discussão do Orçamento do Estado para 1994 e da alteração do Orçamento do corrente ano de 1993. A crise tem de ser uma preocupação central da Assembleia.
Da nossa parte, tomamos a iniciativa de agendar, logo para o começo dos trabalhos, para amanhã, dia 21, uma interpelação ao Governo, sobre «a degradação da situação e dos direitos sociais, a recessão económica e as políticas do Governo». Queremos colocar no centro do debate político aquilo que é o cerne das preocupações dos portugueses. A Assembleia não pode assistir impavidamente a uma crise social que atinge os trabalhadores e as famílias, que conduz ao desemprego, às falências e aos tectos salariais que se pretende impor com inaceitáveis processos de chantagem. A crise tem responsáveis e não podem ser os trabalhadores a suportar sempre todas as consequências.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A segunda condicionante desta reentrada parlamentar está nas tentativas, cada vez mais acentuadas, de criar mecanismos de controlo governamental sobre instituições independentes, bem como a promoção de alterações ao regime político no sentido governamentalizador e de concentração de poderes.
A lista das apelidadas «forças de bloqueio» aumentou: agora, além das altas figuras e instituições, são já visados os juízes no seu conjunto, e mesmo os jornalistas.
A tentativa de controlar o poder jurisdicional e de condicionar a comunicação social tudo indica que vai aparecer ern força.

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Da nossa parte, colocamo-nos como tarefa prioritária a defesa das regras básicas do Estado de direito democrático, incluindo a separação de poderes, as regras da independência e de pluralismo, as liberdades e os direitos fundamentais dos cidadãos, a regra da proporcionalidade na legislação eleitoral, tudo normas com consagração constitucional.
Exactamente por causa desta consagração constitucional, alguns querem antecipar para agora o debate sobre a revisão constitucional, lançando para a mesa, entre outras, questões como a da regra da proporcionalidade, a da constituição do Tribunal Constitucional, a da transformação dos Conselhos Superiores das Magistraturas numa espécie de Conselho Superior Judiciário controlado pelo Governo.
Da nossa parte, afirmamos com clareza que a matéria da revisão constitucional não está na ordem do dia. Desde logo, por uma razão formal: porque só a partir de 8 de Julho do próximo ano, de 1994, é que será possível qualquer revisão constitucional ordinária. Mas, fundamentalmente, por uma outra razão, substancial: a partir daquela data, a Assembleia, se se mantiver, está no seu último ano. As questões da revisão não foram objecto de debate eleitoral na altura da eleição desta Assembleia, em 1991. Isto é, a Assembleia não reuniria, daqui a um ano, os pressupostos políticos indispensáveis para concretizar uma revisão constitucional. Nem houve debate político sobre a matéria na altura da eleição da Assembleia da República, nem o fechar das portas é o tempo político adequado para uma tarefa desse tipo.
Na sessão solene aqui realizada, há um ano, o único tema comum a todas as intervenções foi a questão do Tratado de Maastricht. Também na altura se invocaram urgências e legitimidades formais para acelerar a revisão extraordinária da Constituição e a aprovação do Tratado para ratificação.
Contudo, 10 meses depois de concluído esse processo acelerado, o Tratado ainda não entrou em vigor. As metas da convergência são já incumpríveis nos prazos fixados no Tratado. E, hoje, quando as reacções dos cidadãos dos países da Comunidade se pautam pelo desencanto, pelo afastamento das teses federalistas e das práticas de centralismo e pela reclamação de que o cidadão seja o principal protagonista de todo este processo, tem de dizer-se que os que rejeitaram o debate aprofundado e a intervenção dos portugueses, em referendo, prestaram um péssimo serviço à democracia e aos interesses nacionais.

Vozes do PCP e do Deputado independente Mário Tomé: - Muito bem!

O Orador: - O terceiro factor condicionante desta reabertura são as próximas eleições autárquicas. O partido no poder não podia, não conseguia, não lhe era possível colocar a fasquia mais baixa do que o fez. Tenta por todos os meios inculcar a ideia de que o que é determinante é o particularismo destas eleições, isto para evitar que dela se tirem conclusões políticas gerais - só que não é possível evitá-lo!
Quando se agudiza a crise e sobe a contestação social, os resultados eleitorais vão ter uma inegável dimensão política. Certamente, vão reforçar a oposição social e política. Não será possível, por muito mais tempo, fazer subsistir esta política e os seus responsáveis sem gravíssimas consequências para o País! Todos o entendem, todos! E por isso a atenção às autárquicas é muito grande, mesmo para os que procuram disfarçá-la.
Neste horizonte indefinido com que recomeçamos, além do que já referi, outras questões terão que ser rapidamente aprovadas. Nas Jornadas Parlamentares do PCP realizadas em Setúbal, requeremos prioridade para algumas: primeiro, para a aprovação legal de novos limites às despesas com as campanhas eleitorais autárquicas, acabando, assim, com o escândalo dos actuais limites, que, de tão irrisórios, são incumpríveis; segundo, para a aprovação da lei sobre o regime de permanência dos presidentes das juntas de freguesia - é um processo que se arrasta aqui, há anos, sendo esta a altura de a Assembleia responder à proposta apresentada pelo PCP, para que os novos eleitos tenham a sua situação clarificada desde o início do mandato - e, terceiro, para a realização do inquérito parlamentar à actuação dos Serviços de Informações e Segurança (SIS), tendo em vista corrigir abusos e ilegalidades e determinar responsabilidades.
Outras coisas que deveriam ser feitas já não poderão sê-lo. Por exemplo, esta interrupção prolongada dos trabalhos conduziu à caducidade de muitos pedidos de ratificação de decretos-leis. Muitos decretos-leis que deveriam ser fiscalizados pela Assembleia já não o serão, face às regras limitadoras deste instituto introduzidas na revisão constitucional de 1989 e face a esta paralização da Assembleia.
Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Membros do Governo, Srs. Convidados, Srs. Deputados: Da nossa parte, contribuiremos, de forma activa, para o debate político na Assembleia e para o exercício pleno e desgovernamentalizado das suas competências.
No centro das nossas preocupações estarão a resolução dos problemas nacionais, a resposta às carências e reclamações dos portugueses, o processo de desenvolvimento e bem-estar e a defesa da democracia, matérias que exigem uma nova política. Trabalharemos para a concretização da alternativa necessária, cada vez mais na ordem do dia.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o representante do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, Sr. Deputado Ferraz de Abreu.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, Exmas. Autoridades Civis e Militares, Srs. Primeiros-Ministros..., Sr. Primeiro-Ministro,...

Risos do PSD.

Não se riam porque, por acaso, até há mais do que um nesta Sala.

... Srs. Ministros, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Porquê uma sessão solene para dar início a uma nova sessão legislativa da Assembleia da República?
Cremos que é obrigação nossa criar oportunidades para dar relevo aos méritos da democracia e do Parlamento e procurar despertar o interesse dos cidadãos e mesmo o seu orgulho por uma instituição que é sua emanação directa.
Saudamos, pois, a iniciativa prestigiante de, pela primeira vez, se inaugurar o ano parlamentar com dignidade e solenidade próprias, a que só falta o brilho da presença de S. Ex.ª o Sr. Presidente da República, por se encontrar ausente do País.
Também cremos que a melhor homenagem que, a propósito desta sessão solene, podemos prestar à Assembleia da República, é reflectir sobre as causas do seu diminuto prestígio popular em confronto com o dos outros órgãos de soberania.

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É um facto que há hoje uma campanha desinformativa e maldizente contra a classe política em geral, com relevo para os Deputados e para o Parlamento, com origem, sobretudo, nos inimigos da democracia, que sabem ser 'o Parlamento e os partidos os seus símbolos mais representativos.
Mas não estaremos nós, pelo nosso comportamento, a favorecer tal campanha? Para responder a esta interrogação, procedamos à nossa própria autocrítica, tendo em conta a opinião da alguns analistas esclarecidos que apontam vícios e erros no funcionamento do sistema.
Para o funcionamento conecto do sistema democrático, nunca é demais marcar a importância do significado político e jurídico-constitucional da separação dos poderes - pelo menos, desde Montesquieu que essa separação é a garantia do controlo duns poderes pelos outros. Numa verdadeira democracia, os órgãos de soberania, não dotados de poderes discricionários, são todos eles autolimitados pela fiscalização recíproca e pela lei. É essa a essência de um Estado de Direito e do Estado vinculado pelo Direito.
Ora, a experiência de um mandato e meio de maioria absoluta é perturbadora e preocupante. Ela introduziu o fenómeno da junção de poderes, assinalado já por intervenções parlamentares e por alguns analistas, ou seja, um fenómeno de atenuação, quando não de apagamento, daquelas garantias de fiscalização.
Já era nossa convicção que a excessiva dependência e submissão dos Deputados aos respectivos partidos e aos governos que apoiam é extremamente negativa para o prestígio da Assembleia da República e da classe política. Mas elas têm consequências gravíssimas para o sistema quando assumidas por um grupo parlamentar com maioria absoluta.
Ora, esta é a postura da actual maioria parlamentar que, no uso da maioria absoluta, se serve dela como um poder discricionário em face das oposições e obediente em face do Governo, com a agravante de que este repete a mesma postura face ao Primeiro-Ministro. Na realidade, vivemos em regime de poder pessoal, embora formalmente continue a não ser assim.
Temos, pois, uma maioria parlamentar submissa, pronta a funcionar como uma muralha contra a qual se vai quebrar tudo o que não provenha ou não agrade ao seu Governo e a dizer ámen a todas as suas propostas. Para isso, serve-se do Regimento do «seu» Regimento, onde introduziu constrangimentos tais que pervertem todo o funcionamento do Parlamento e fizeram da maioria o seu verdadeiro dono.
Senão, é ver: ausência de efectivos debates por redução das possibilidades de intervenção e de contra-argumentação; o apagamento da figura das perguntas ao Governo feitas ao abrigo de normas talhadas para favorecer e proteger o interrogado; a recusa sistemática de quase todos os projectos de lei vindos das oposições, mesmo quando nos corredores é reconhecido o seu mérito ou mais tarde se assenhoreiam do seu conteúdo; o bloqueio das comissões parlamentares pela recusa da audição de certas personalidades; o escândalo dos inquéritos parlamentares, completamente desacreditados dado que, quando não são vetados pela maioria, são por ela tornados inconclusivos pelo boicote a certas averiguações ou encerrados intempestiva e precocemente; a total neutralização do instituto de ratificação dos decretos do Governo e, finalmente, o arbítrio nos agendamentos.
Isto significa a ausência de efectiva fiscalização do Governo e da Administração pelo Parlamento e os resultados estão à vista: impunidade ao nível governativo e administrativo; agravamento da corrupção e empolamento a níveis inimagináveis do clientelismo e do compadrio.

Vozes do PSD: - É falso!

O Orador: - Que Parlamento pode resistir a tanta afronta sem perder o prestígio?
Se os Deputados das oposições se sentem com frequência frustrados com esta situação, os fazedores de opinião pública exploram-na, pondo em relevo a ineficácia de um órgão que devia ser o centro vital da democracia, havendo mesmo os que a aproveitam para promover o seu total descrédito. A contribuir para este descrédito, soma-se o pouco respeito do Governo pelos direitos da oposição e respectivo estatuto.
Um Parlamento sem uma oposição prestigiada e actuante não é ele próprio prestigiado, como todos se apercebem, com excepção da actual maioria. Quanto a esta, vimos já como actua e ouvimo-la, com frequência e arrogância, justificar o seu comportamento com a legitimidade que lhe confere o resultado eleitoral - o que ninguém contesta -, mas não reconhecendo os direitos democráticos das minorias e de uma oposição que representa, pelo menos, 40 % do povo português.
O Governo, esse, finge que cumpre o estatuto da oposição, mas não cumpre. De facto, limita o cumprimento às mais ínfimas formalidades, como se provou recentemente, ao convocar representantes dos grupos parlamentares para os ouvir, a posteriori, sobre as propostas de lei do Orçamento que acabara de aprovar, num transparente desprezo de opiniões que lhe cumpria recolher e ter em conta. O Estado, através do Governo, violou a lei, violou o estatuto da oposição, ofendeu os Deputados.
Mas esta indiferença e desprezo pelas regras do relacionamento institucional levaram o Governo, com a cooperaçâo da maioria, a desrespeitar também a autonomia do Tribunal Constitucional, do Tribunal de Contas, do Procurador da República e do Provedor de Justiça, todos incluídos no que chamou de .«forças de bloqueio», uma espécie de bodes expiatórios para os seus fracassos.
Na realidade, o que pretendeu e pretende é bastante mais grave: bloquear o livre exercício das competências de órgãos de soberania - os tribunais -, cuja autonomia lhe compete acatar e até estimular. Ou seja, foi desferido um novo ataque à separação dos poderes.
Mas, não satisfeitos em perverter as já referidas garantias do normal funcionamento do sistema, o Primeiro-Ministro, o Governo e a maioria que o apoia resolveram incluir também o Presidente da República...

Vozes do PSD: - Um santo!...

Risos do PSD.

O Orador: - ... entre as chamadas «forças de bloqueio». A propósito da forma como exerce as competências que lhe são próprias ou como emite opiniões que tem o direito de perfilhar e emitir, o Governo e a maioria alimentam uma guerrilha institucional, desferindo ataques ao Sr. Presidente da República e defendendo uma redução dos poderes presidenciais.
Ora, a experiência tem demonstrado que o regime semi-presidencialista tem servido a democracia e o País e que os actuais poderes do Presidente da República são necessários e suficientes. Acrescente-se que o povo, aplaudindo

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Mário Soares, mostra que está contente com a forma como ele tem desempenhado o seu alto cargo, que não desejaria ter um Presidente corta-fitas, que não aprecia ataques pessoais e que não compreende que se alterem leis visando pessoas.

Aplausos do PS e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

O Partido Socialista tem, pois, boas razões para não aceitar que, numa qualquer antecipada revisão constitucional, seja posta em causa a natureza do actual regime.
Todas estas acções realçam uma evidência: o Primeiro-Ministro pretende exercer o seu poder, com todos os poderes, sem quaisquer entraves, com os seus actos e os da Administração a serem fiscalizados por si próprio, sem a intromissão de outros poderes que lhe sejam estranhos e fujam ao seu domínio.
Não duvidamos de que o Primeiro-Ministro talvez não se tenha apercebido da sua natural tendência e apetência para a forma autoritária do poder, como não duvidamos de que, até muito recentemente, acreditava cegamente em si próprio e só em si próprio. Aliás, no discurso oficial perpassa o propósito de desvalorização das ideologias, dos partidos, da classe política.
O Primeiro-Ministro coloca-se de fora e acima da lógica partidária! Não raras vezes responsabiliza os partidos- com apelos à sociedade civil - pelas suas próprias dificuldades e tenta - qual novo Pilatos - lavar as mãos de leis da autoria do seu Governo, que se revelaram impopulares, referindo com ar cândido que são leis votadas na Assembleia da República, mas omitindo o facto de só terem ali recebido os votos favoráveis do seu partido.
E quanto às ideologias, se a experiência dos nossos dias comporta algum sentido, ele é o de que se impõe um regresso às ideologias e à sua força aglutinadora e orientadora das comunidades políticas. O que é desejável - isso, sim - é que ninguém vista roupagens que não lhe assentam.
Mas, no PSD, onde sem dúvida há muitos democratas, porque tardaram tanto a aparecer algumas vozes discordantes? O rocambolesco episódio da guerra dos corredores não foi sinal bastante para revelar o alastrar da onda autoritária?
Neste resumido rescaldo do que foi a actividade política e parlamentar durante a última sessão legislativa, naturalmente que foi nosso propósito dar realce aos aspectos que estão a contribuir para a queda do prestígio desta instituição.
Mas manda a verdade dizer que nem tudo foi negativo. Se, no Hemiciclo, onde não faltaram nem o brilho da eloquência e da argumentação sólida nem o calor e a paixão das discussões, tudo ou quase tudo soçobrou perante o voto da maioria, já o mesmo não aconteceu no trabalho das Comissões. Embora com as restrições e entraves referidos, elas continuam a ser os verdadeiros laboratórios onde se produziu todo o trabalho da Assembleia da República e onde, apesar de tudo, foram possíveis alguns consensos - poucos, mas alguns -, floresceram relações amistosas e se cultivou a tolerância e o diálogo entre todos os partidos.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: Damos hoje começo a uma nova sessão legislativa. Iniciada, como vai ser, por um Orçamento que, anunciado de rigor na sua versão de origem, surge agora em versão suplementar com um défice acrescido, não pode dizer-se que comece bem, a não ser que, a partir de tão monumental falência da sua capacidade de previsão, o Governo, no que se refere ao exercício seguinte e respectivo orçamento, seja menos irresponsavelmente optimista, menos surdo aos avisos e premonições da oposição - catastrofismo, lembram-se? Foi como chamou o Sr. Primeiro-Ministro a estas premonições - e também menos fechado às suas propostas de alteração, a pretexto de falta de rigor ou qualquer outro, já que perdeu toda a autoridade para repetir objecções desse género.
Mas a sessão legislativa que hoje começa dificilmente pode ser fácil, dado que ocorrerá com o País a atravessar uma crise económica sem paralelo no passado, apesar dos milhões da CEE, contando já neste momento com situações sociais dramáticas. O Governo negou-a para lá da evidência e, mesmo agora, disfarça-a até limites de irresponsabilidade. Falha, assim, a primeira condição de, para ela, encontrar respostas.
No propósito eleitoralista de a explicar como consequência das crises do exterior, parece continuar a varrer para debaixo do tapete a sua dimensão estrutural e interna. Não admira, pois, que na sua proposta de lei do Orçamento do Estado para 1994 retome uma certa visão idílica do estado do País.

Risos do PSD.

Aplausos do PS e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

É um Governo irrecuperável! E, sendo-o, como fiar dele a recuperação do País?
Por outro lado, com as eleições autárquicas à porta, a que se seguirão os actos eleitorais de 1994, 1995 e 1996, esta sessão corre o risco de não ser pacífica nem construtiva. O debate político tenderá a prevalecer sobre a criação legislativa. Debalde se esperará que tudo se passe em ritmo de baixa tensão.
É que, a ajuizar pela maneira como a maioria tem encarado outros períodos eleitorais, é de esperar da sua parte nova exacerbação de comportamentos geradores de conflitualidade e protesto. Pela nossa parte, procuraremos estar à altura das nossas responsabilidades, mas também à altura da defesa dos nossos direitos e dos princípios que conferem genuidade às consultas eleitorais em democracia aberta e participada.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: Apesar de todos os obstáculos previsíveis, fazemos votos para que a sessão legislativa que hoje começa possa ser mais democrática no sentido de um funcionamento mais harmónico com as garantias constitucionais e legais, embora haja pouca esperança de ver os Deputados com maior independência face ao Governo; mais construtiva, produzindo não mais leis mas melhores leis; menos espartilhada por empecilhos regimentais e de organização de agendas; mais respeitadora dos direitos da oposição, nomeadamente do seu estatuto. Finalmente, que possa ser um instrumento menos ao serviço do Governo e mais ao serviço do País.
Cônscio das suas responsabilidades, o Partido Socialista tudo fará para melhorar a relação dos cidadãos com o Parlamento e o seu funcionamento. Para já e no contexto da batalha de modernidade em que está empenhado, apresentou um conjunto de projectos de lei que visam o Diário da República electrónico e, em geral, o uso de novas tecnologias para facilitar o acesso dos cidadãos à informação sobre as leis que nos regem.
Para terminar, desejo dirigir as minhas saudações ao Sr. Presidente da Assembleia da República, a quem felicito pela iniciativa desta sessão solene, ideia sua, e assegurar-lhe que o PS está disponível para aplaudir e apoiar todas

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as iniciativas que venha a tomar em defesa do prestígio da Assembleia da República.
Quero saudar também todas as Sr.ªs e os Srs. Deputados e desejar-lhes os melhores êxitos pessoais e que a sua permanência e o trabalho que venham a produzir na Assembleia da República lhes tragam satisfação e realização plenas.
Nesta Casa, perdura ainda duma plêiade brilhante de parlamentares que, no passado, se agigantaram, combatendo, com denodo e inteligência, o obscurantismo, os privilégios o eco de vozes eloquentes e as desigualdades sociais, elevando ao mais alto grau o prestígio deste Parlamento.
A memória de tão ilustres tribunos e das suas lutas em prol da liberdade e da construção da democracia fazem-nos sentir a grande honra que nos foi conferida pelos nossos eleitores.
Honremos essa memória, partilhando e defendendo os ideias por que sempre se bateram!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para ima intervenção, tem a palavra o representante do Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata, Sr. Deputado Duarte Lima.

O Sr. Duarte Lima (PSD) - Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro - no singular, pois não quero cometer a duplicidade do Sr. Deputado do Partido Socialista, Ferraz de Abreu, que, à semelhança do seu partido, vê tudo a dobrar e, apesar de considerar o Governo irrecuperável, também já vê Primeiros-Ministros a dobrar-...

Risos do PSD.

... Srs. Membros do Governo, Ilustres Convidados, Sr.ªs e Srs. Deputados: No começo de mais uma sessão legislativa, o meu grupo parlamentar quer, antes de mais, cumprimentar a Mesa da Assembleia da República na pessoa de V. Ex.a, Sr. Presidente, e desejar-lhe o maior sucesso pessoal na relevantíssima função de condução dos trabalhos parlamentares, função que V. Ex.ª tem, até hoje, desempenhado com notável brilho, isenção e competência.

Aplausos do PSD.

Desejo igualmente cumprimentar com respeito todos os meus colegas que se sentam nas bancadas da oposição e garantir-lhes que, da parte da bancada do PSD, poderão contar, agora como no passado, com um diálogo que será franco mas não timorato, frontal mas não rude, determinado mas não arrogante.
Queremos debate, muito debate; queremos controvérsia, muita controvérsia e esperemos que a controvérsia não seja substituída pela canelada, por força da preocupação com a dupla eleição que se registará durante esta Legislatura, como aqui deixou antever o Sr. Deputado Ferraz de Abreu. Mas queremos também decisões, muitas decisões.
O meu partido tem um contrato inequívoco para cumprir perante os portugueses' resultante do programa sufragado nas eleições de Outubro de 1991. Será para cumprir!
Não será a Lei das Doze Tábuas, esculpida em bronze, alheia às circunstâncias sempre mutáveis do tempo incerto e inseguro que é o nosso, mas também não será um papel para lançar ao vento gavetas do esquecimento. Lembramos isto apenas
ou para encerrar nas cómodas para reafirmar que não temos vontade de executá-lo mecanicamente, indiferentes aos erros da análise - que, com certeza, cometeremos -, ao esquecimento dos contributos alheios ou à apresentação de alternativas mais positivas. Mas também queremos deixar claro que não cederemos aos subterfúgios dilatórios ou às tentativas recorrentemente presentes de inverter o sentido da vontade popular, fazendo no Parlamento o que o povo desfez nas umas eleitorais.

Aplausos do PSD.

Não absolutizamos a democracia parlamentar representativa. Por isso, ponderaremos devidamente a vontade e as iniciativas relevantes da sociedade civil e dos cidadãos, mas não cederemos também aos «cantos de sereia» dos que, propugnando a supremacia dos métodos da democracia directa, procuram substituir os mecanismos da democracia representativa, recriando uma espécie de «neopintassilguismo» de cátedra como forma de substituição da vontade eleitoral expressa em eleições.
Quem se lembra da História, sabe bem que as pulsões excessivas da democracia directa conduziram sempre à degenerescência dos regimes democráticos e ao império da demagogia. Por isso reiteramos a importância de centrar no Parlamento os grandes debates políticos em homenagem à supremacia política de que este órgão goza na arquitectura dos poderes constituídos, já que é da Assembleia da República, particularmente da sua função legislativa, que derivam todos os outros poderes. Aliás, o sinal mais evidente desta supremacia radical no facto de ser o Parlamento que constitui todos os outros poderes, podendo alterar o acervo das suas competências e funções, não sendo - como sabem - a inversa verdadeira.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: O meu grupo parlamentar não ignora os desafios com que estará confrontado nesta sessão legislativa. Nela ocorrerão duas eleições, autárquicas e europeias, nela iniciar-se-á - ou deverá iniciar-se - a revisão constitucional. Tudo num tempo de dificuldades e de incertezas, nacionais e internacionais; tudo num quadro de profundas transformações institucionais na Comunidade Europeia; tudo num momento em que se assiste a uma profunda alteração das relações de força nas quais assentavam, até aqui, as vantagens comparativas dos grandes motores da economia mundial; tudo num tempo em que, em Portugal, se iniciará a sua segunda revolução das estruturas de desenvolvimento com a aplicação do Plano de Desenvolvimento Regional, que irá seguramente operar uma transformação decisiva no perfil sócio-económico e cultural do nosso país até ao fim do século.
É o tempo em que, pela segunda vez, as sementes são lançadas à terra. E quem sabe que só no tempo longo, que vai da semente ao fruto, podem esperar-se alterações de substância na natureza das coisas compreenderá que este momento é de paciência para quem semeia e é de pressa para quem não quer a sementeira.
Este é o tempo do leão, mas também é o tempo do chacal. Do leão, que não soçobra à adversidade, que a combate, que lhe resiste e que, por fim, a vence. Mas também do chacal, do predador que não sobrevive sem vítima e que, da infelicidade alheia, assegura a própria sobrevivência.
Começamos esta sessão legislativa com a noção clara das muitas questões, críticas e reparos que vós, distintos colegas da oposição, tereis para colocar-nos. Sabemos que é ténue a fronteira que separa a interrogação do reparo, o reparo da crítica e que será mais frequente a tentação do ataque do que a sugestão da alternativa. Sabei também vós

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que não fugiremos à resposta e ao confronto, mas permitir-nos-eis que igualmente vos questionemos e apresentemos as nossas perplexidades, quando as haja. E, para que esta sessão inaugural se não esgote no ritual sem cor da vénia de circunstância, deixai que estimule a polémica por que ansiais e que vos coloque já hoje algumas questões, em particular, ao maior partido da oposição e em particular a ele por que lhe assiste o dever de ser, em princípio, o mais responsável.
Primeira questão: a revisão constitucional, já aqui aflorada. O PSD estará disposto, como partido responsável, a discutir sem dogmatismo, com tolerância e espírito de diálogo este tema. É sabido que, apesar das melhorias parciais introduzidas no nosso texto constitucional nas revisões de 1982 e 1987, há ainda reformas importantes a fazer e que não deveriam ser adiadas, das quais enuncio algumas: alterações do sistema eleitoral para a Assembleia da República e autarquias locais; correcção da iniquidade constitucional que proíbe os emigrantes portugueses de votarem para a eleição do chefe de Estado, símbolo da unidade nacional; melhor articulação do quadro geral de poderes entre os diversos órgãos de soberania; aperfeiçoamento dos critérios de legitimação de todos os órgãos de poder soberanos; correcção das normas constitucionais económicas de carácter anacrónico e dirigista; redefinição das normas constitucionais que enquadram o Estado-Providência, hoje claramente obsoletas.
Que nos diz a isto o maior partido da oposição, o tal partido que se diz em condições de ser poder? Vai encastelar-se como um dinossauro, como fez há dias o seu líder parlamentar, na inadmissível posição de não querer fazer revisão constitucional com base no absurdo argumento de que, e cito, «seria um crime fazê-la, porque há eleições legislativas em 1995»?... Mas, se é assim, só teremos revisão no próximo milénio, porque também há eleições em 1996, em 1997, em 1999 e em 2001.
Que oposição é esta, que partido é este, que tudo pára, porque nesse ano ou no seguinte há eleições? Que responsabilidade e que capacidade de decisão podem dele esperar os portugueses? Que garantias dá um partido assim de ser capaz de enfrentar as adversidades na governação se tudo pára ao cheiro de um simples voto? Quem vive, afinal, a pensar nas eleições e no eleitoralismo?

Aplausos do PSD.

Onde está a garra, o ímpeto, a determinação do jovem, galhardo e voluntarioso líder do PS, hábil prestidigitador que, para todos os problemas, tira com um sorriso traquinas um coelho da cartola? Onde acaba o voluntarismo e começa a insegurança? Onde começa a demagogia a acaba a responsabilidade? São respostas importantes que esperamos de vós nesta Legislatura.
Segunda questão: a situação económica internacional e nacional. Os tempos que a Europa vive não são de bonança. Apesar dos excelentes resultados que Portugal obteve na inflação e no desemprego, onde continua a registar um dos mais baixos níveis europeus, apesar de continuarmos a assegurar um ritmo de crescimento superior à média comunitária, não vale a pena negar que também o nosso país atravessa um momento difícil.
Poderia ser de outro modo? Poderia Portugal alterar a sua especialização produtiva e operar a modernização da sua economia sem dor? Poderia Portugal transformar as suas arcaicas estruturas económicas sem sobressaltos, sem protestos, sem incompreensões? Poderia Portugal reivindicar na Europa os fundos para a sua modernização e depois disso recusar-se a cumprir as regras que constituem um adquirido comunitário?
Um partido de governo ou de oposição credível que quer ser governo dirá responsavelmente que não. Um partido extremista, «tacticista», condenado para sempre a uma modesta oposição dirá alegremente que sim, como faz o Partido Socialista.
De novo, também aqui, o tempo do leão e o tempo do chacal! Por isso, é pertinente perguntar ao maior partido da oposição: num tempo em que, à abertura económica e política corresponde uma intensificação da concorrência empresarial internacional, há alguma alternativa para que um país renove as suas estruturas económicas como condição indispensável para aumentar a sua competitividade, por doloroso que seja num momento inicial? Pensamos que não!
Num tempo em que o aumento da competitividade e da capacidade produtiva deixou de ser acompanhado, sobretudo na indústria, por um aumento da criação de postos de trabalho - pelo contrário, a inovação tecnológica provoca a sua estagnação ou, mesmo, a sua diminuição -, que opção deve tomar um governo que não aliena as preocupações de natureza social: moderação salarial com garantia de emprego ou reivindicação salarial com aumento de desemprego?
Não hesitamos na escolha, a garantia de emprego vem sempre primeiro. Daí a aposta, na melhor tradição reformista e social-democrata, na concertação social. Daí a aposta também do PS, na tradição socialista que não é rigorosamente social-democrata, na ruptura social.

Protestos do PS.

É notável!

Se repararmos no que se passou nos últimos quatro anos, sempre o PS, tal como o PCP, instigou os sindicatos, às vezes com chantagens inadmissíveis como aconteceu este ano, para que não se assinasse o acordo social.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

É importante este ponto, porque ele é estruturante na distinção entre sociais-democratas e socialistas democráticos.

Risos do PS.

Só a ignorância vos faz rir!

Aplausos do PSD.

Senão, saberiam que a inexistência de tradição de concertação em governos liderados por partidos socialistas como o francês, o português ou o italiano levou mesmo alguns tratadistas a qualificarem a vossa «social democracia» como «social democracia» infeliz, não realizada nalguns dos seus pressupostos essenciais.
Mas a irresponsabilidade de um partido como o PS que se proclama de social-democrata no que concerne à política de concertação social só tem paralelo no despautério com que o seu líder avança com receitas miraculosas para os principais problemas económicos do País. Aliás, ele deve ser hoje o único líder de oposição europeu que consegue falar como um autómato durante três horas consecutivas numa entrevista televisiva, encontrando soluções cor-de-rosa para tudo, sem conflito, sem dor, sem problema, sem despedimento, sem enunciar um único sector onde go-

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vernasse e tivesse de suportar a dor da decisão difícil ou impopular.

Aplausos do PSD.

Percebe-se porquê: só fala assim quem sabe de antemão que não governará. Foi um gosto ouvi-lo na televisão para perceber a cartilha da política das facilidades.
Vamos ao que diz: é preciso mais dinheiro para a educação? Tira-se dás estradas, que seja, da rubrica dos transportes. Há problemas de acessibilidade nas grandes áreas metropolitanas? Quer transportes em coroa e diz ele: investe-se na ferrovia, ou seja, aumenta-se nos transportes onde antes se diminuirá. É a chamada soma de resultado zero, ou seja, «tudo como dantes, quartel-general em Abrantes»!

Aplausos do PSD.

Vê o PS, num discurso do Ministro das Finanças, no qual se aludia à necessidade de baixar as taxas de juro, interpretando assim o sentimento da comunidade empresarial, uma alegada pressão sobre e o Banco de Portugal? Cai o Carmo e a Trindade porque o Governo interfere com a autonomia do banco central. Mas quer o líder do PS instituir o rendimento social mínimo (aquilo a que os liberais chamaram o imposto negativo) e não sabe onde vai buscar o dinheiro? Que faz ele então? Diz que baixa num ponto as taxas de juros- interferindo, ele sim, aqui, claramente, na autonomia do banco central, pois só este pode proceder à sua redução, e nunca o Governo por via administrativa.
Fala-se da situação económica do País? O líder do PS diz que é catastrófica. Fala-se do aumento de salários? Ele quer que sejam avultados e luzidios. Mas se a situação do País é catastrófica, os salários não podem aumentar de forma avultada; se o podem, como ele pretende, então é porque a situação do País não é
tão catastrófica como diz!...

Aplausos do PSD.

E por aí adiante, num nunca acabar de exemplos onde a contradição posterior é sempre maior do que a anterior. Com o líder do PS, como dizia S. Agostinho, «quantas são as medicinas, tantos são os tormentos».
Tem uma explicação esta sua atitude, que o leva a falar mais depressa do que pensar numa fúria de vendedor de bacalhau a pataco, prometendo para amanhã o céu a cada português: e essa explicação reside na sua incapacidade de resistir a tentar satisfazer qualquer reivindicação ou exigência que venha expressa na comunicação social. Aliás, a sua política vive de e para a comunicação social, e não para o País que gostaria de governar. Hoje, os reparos, as notícias, os relatos, as entrevistas, os comentários da comunicação social são o «alfa» e o «omega» da política do líder do PS. Ele não respira e não existe sem a comunicação social. Ela o chama, ele se move; ela o guia, ele a segue; ela o critica, ele se confunde; ela o elogia, ele se eleva; ela o ata, ele se deixa prender.

Aplausos do PSD.

E nesse torvelinho arrasta o desorientado partido que comanda, vendo em cada acto eleitoral que espreita na esquina do mandato o porto seguro das suas ambições. E o partido que comanda investe também em turbamulta: solta-se a gula do resultado eleitoral; desfere-se a ira contra o adversário mais próximo; liberta-se a demagogia face ao cidadão indefeso e por fim desbarata-se o próprio siso.
A quem tanto oferece quando tem tão pouco para dar, deve opor-se renitente desconfiança.
À generosidade do líder do PS tem que responder-se com reserva, como no exemplo antigo de Alexandre Magno perante o filósofo Diógenes. A história é conhecida: estava este sentado à porta da sua cuba quando o visitou aquele grande imperador da Antiguidade, oferecendo-lhe que, pedisse tudo o que quisesse, que logo ali o satisfaria com o seu imenso poder e capacidade. Alexandre Magno achava que tinha tudo, mas não tinha a lealdade do sábio, que desconfiava dos excessos de voluntarismo do poder. Â resposta do filósofo foi como se segue: «Peço-te que me não tires o que me não podes dar». E aquilo que Alexandre Magno lhe tirava naquele momento e não podia dar era a luz do sol, que o tapava com a sua sombra numa manhã de Inverno.
Também ao líder do PS, que tudo oferece aos portugueses, se lhe solicita modestamente que lhe não retire, neste momento difícil, o que lhe não pode dar. E o que lhe não pode dar é bom senso, político e realismo para reagir com sucesso à adversidade dos tempos que atravessamos.
E com isto passo à terceira questão, a questão eleitoral, e à qual não vou fugir.
O nosso sistema constitucional institui-e bem! - diversos níveis de poder e responsabilidade políticas, aos quais correspondem igualmente diversos critérios de legitimação democrática.
Do princípio do equilíbrio do poder resulta a existência de um Presidente da República, eleito por sufrágio universal, que não anula nem substitui a legitimidade governativa; do princípio descentralizador resulta a existência de um poder local autónomo, que é eleito e responde perante as comunidades locais pela sua acção, rompendo um longo período de centralização autoritária do poder ern Portugal; do princípio da participação de Portugal nas instituições europeias resulta uma eleição para o Parlamento Europeu; do princípio representativo resulta a existência de um Parlamento pluripartidário, com base na confiança (ou desconfiança), do qual se constituem (ou caem) os governos.
Assim se escreveu na Constituição, e assim está bem! E tudo está bem porque desta forma as legitimidades eleitorais não se confundem, evitando-se com isso a instabilização crónica da vida política.
Toda a legitimidade é legitimidade para um fim e todos também sabemos qual o fim de cada acto eleitoral. Fossem esses fins coincidentes ou sobreponíveis e seguramente que o legislador constitucional não teria pedido quatro eleições, mas apenas uma, da qual decorreria a escolha para todos aqueles órgãos.
Nem sempre foi assim na política portuguesa, mesmo depois da revolução. Nem sempre o critério de legitimação resultou de uma específica eleição democrática, mesmo após o 25 de Abril. Nos tempos do PREC e do verde-gaio fardado, a morte ou a vida dos governos decidia-se quase sempre na rua, nos palácios, nas tertúlias, nos jornais, nos quartéis, nos incidentes do percurso, e quase nunca nas eleições. Assim Portugal se tornou, durante alguns anos, o paraíso dos governos fresquinhos, à la carte, acabados de confeccionar entre dois bocejos e uma intriga.
O tempo passou, o País amadureceu, as instituições ganharam raízes, os costumes políticos civilizaram-se e a vida seguiu o seu rumo.
Mas eis que de novo, aqui e ali, alguma demagogia infrene faz com que aflorem tentativas despudoradas do regresso ao passado. O absurdo e o disparate subiram para níveis assustadores, ao ponto de algumas almas atormenta-

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das - com particular relevância também para aquela bancada que hoje tanto se agita - começarem de novo a procurar o caminho sinuoso da confusão das legitimidades eleitorais.
Como será o resultado das eleições autárquicas?
Poderá ser diferente do resultado das legislativas? Se forem diferentes das legislativas, então é uma grande sondagem nacional, que mostra que o resultado das legislativas está ultrapassado - esta é a conclusão dos mais ousados. Este exercício não é novo, já que todos se recordarão da sua ocorrência em 1989. Os mais eufóricos falaram aí de «cartão amarelo» e até «vermelho» à maioria.
Seria assim? Aceitemos como boa a lógica do argumento e tentemos extrair dele todo o suculento manjar que nos proporciona.
Se uma eleição autárquica, ocorrida depois de uma eleição legislativa, fere a legitimidade de uma maioria ou de um governo, então também uma eleição legislativa, ocorrida depois de uma eleição autárquica, terá que ferir a legitimidade dos mandatos municipais anteriormente obtidos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Risos do PS.

O Orador: - Concretizando - e supondo que a lógica que não é uma batata, e para não ser uma batata basta não ser a lógica do Sr. Deputado José Magalhães...

Aplausos do PSD.

Risos do PS.

Concretizando (repito): se no meio de um mandato legislativo uma subida da oposição minasse a credibilidade do Governo, também uma subida do partido do Governo, a meio dos mandatos municipais, afectaria a legitimidade em que estes se baseiam.
Concretizando ainda mais, para perceberem melhor: se, em 1989, a vitória do PS nas eleições autárquicas tivesse posto em causa- o que não pôs! -, como muitos pretendiam com a teoria do cartão amarelo, a legitimidade para governar, então a vitória do PSD nas eleições legislativas de 1991, que ocorreu - lembro - em todos os concelhos do País, teria posto em causa a legitimidade dos presidente socialistas do Porto, de Lisboa, de Setúbal, de Braga, etc., de continuarem à frente dos seus mandatos.

O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Essa nem o Aristóteles!

O Orador: - Ó Sr. Deputado Mário Tomé, para si, o Aristóteles não serve, só o Clausewitz...

Risos.

Sendo esta a evidência das coisas, também aqui se lembra à oposição, em particular ao PS, que controle a demagogia e o triunfalismo, porque não é esse, seguramente, o caminho.

Em eleições democráticas, não há vencedores antecipados. A bazófia histriónica do líder socialista não é original. Antes dele encheram o peito, em vésperas de actos eleitorais - só para lembrar-, os Drs. Almeida Santos, Vítor Constâncio e Jorge Sampaio.
O povo avisou-os sucessivamente, com fortes reprimendas eleitorais. Mas os socialistas são mesmo assim: sempre avisados, mas nunca prevenidos. E o destino que tiveram culminou sempre nos «idos de Março» dos seus congressos partidários.
Por isso, é adequado lembrar ao líder socialista, que tão entusiasticamente malbarata o seu talento, que quem quer mais do que lhe convém, pode perder o que quer e o que tem. Estimamo-lo o bastante para lhe não desejar o destino dos antecessores: que foram vento e passaram; que eram sombra e sumiram-se; que eram aparências e acabaram por desaparecer do espectro da liderança do seu partido.
Que ele também, com O excesso de entusiasmo e obreirismo que o distinguem, não se deixe conduzir ao campo sem regresso da demagogia fácil, onde irremediavelmente se sumirá, como uma lâmpada acesa, misto de vidro e fogo: vidro, que com um assopro se desfaz; fogo, que com um assopro se apagará.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Em nome do meu grupo parlamentar, quero assegurar que não nos eximiremos a dar o nosso contributo responsável para o reforço do protagonismo do Parlamento e do seu prestígio.
Gostaríamos de não acompanhar a autoflagelação de outros partidos da oposição, que foi o sinal mais evidente da incapacidade que tiveram para ser oposição.
Srs. Deputados, não é por haver uma maioria absoluta num Parlamento que ele deixa de funcionar, a generalidade dos parlamentos, por essa Europa fora, têm uma maioria. O que distingue uma oposição de uma situação de minoria é a oposição conseguir, na medida em que lhe falta o argumento máximo que é o de poder accionar a sanção política que faz culminar na queda do Governo, fazer uma oposição com responsabilidade, que foi isso que os senhores não souberam fazer.

Aplausos do PSD.

Mas aos que querem prestigiar o Parlamento, lembramos que o seu papel é tão relevante como o da maioria. Eles irão decidir se devem privilegiar a critica construtiva ou a demagogia fácil, o debate sério e as controvérsias ou a mera propaganda com fins eleiçoeiros.
É que também isso não é indiferente para o prestígio da instituição parlamentar, ou para a falta dele.
Por nós, já fizémos a escolha!

Aplausos do PSD.

Protestos do PS, batendo com os punhos nas bancadas.

O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, Sr. Presidente do Tribunal Constitucional, Sr. Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, em representação do Sr. Presidente da República, ausente em Macau, Srs. Presidentes do Supremo Tribunal Administrativo e do Supremo Tribunal Militar, Srs. Membros do Governo, Srs. Conselheiros, Altas Autoridades Civis e Militares, Srs. Deputados, Minhas Senhoras e Meus Senhores: Ouvidas as intervenções dos grupos parlamentares, tenho o grato prazer de saudar, em nome da Assembleia da República, e na cerimónia inaugural da 3.ª sessão legislativa da VI Legislatura, os outros órgãos de soberania e as altas autoridades civis e militares (estaduais, regionais e municipais) e de apresentar a VV. Ex.ªs e ao público que quis comparecer o nosso profundo reconhecimento - dos Senhores Deputados e meu - pela presença que muito veio ilustrar esta sessão solene da Assembleia da República.
Sua Excelência, o Sr. Presidente da República, não ocupa o seu lugar nesta tribuna por se encontrar, como é sabido, no Japão, em visita de Estado, a convite do Imperador Akihito. Antes de partir, porém, Sua Excelência

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pediu-me que fosse intérprete junto de VV. Ex.ªs dos seus sentimentos de consideração e da sua profunda convicção do papel essencial que a instituição parlamentar cumpre na democracia.
A Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares foi de parecer que a Assembleia da República iniciasse, mais uma vez, o seu período normal de funcionamento com uma breve sessão solene.
Por mim, muito me congratulo com tal parecer - à uma, por uma sessão solene exprimir simbolicamente a relevância política que nas democracias pluralistas está ligada à abertura do ano parlamentar; à outra, por os principais partidos disporem assim da oportunidade para uma declaração política inaugural na presença dos representantes dos outros órgãos de soberania e das altas autoridades estaduais, regionais e municipais, aumentando-se deste modo a transparência e a relevância institucional da actividade parlamentar.
Para além disso, a cerimónia solene tornará manifesto aos olhos de todos, assim é de crer, que os Deputados querem assumir, com satisfação e orgulho, a honra de representar o povo que livremente os elegeu, dispondo-se a cumprir as suas complexas competências constitucionais, leal e fielmente, sem subserviências nem complexos de culpa.
Gostaria de fazer referência a algumas melhorias introduzidas na organização da Assembleia da República durante a 2.ª sessão legislativa, assim como apontar alguns dos projectos, cuja concretização se esperam efeitos favoráveis à eficácia e à qualidade do nosso trabalho parlamentar. Não sobrecarregarei, porém, a paciência de VV. Ex.ªs - que este não é o tempo nem o lugar para a apresentação detalhada de relatórios ou de planos de acção administrativa...
Quanto aos factos administrativos importantes da 2.ª sessão legislativa. Em primeiro lugar, é de citar o início da ocupação do edifício adquirido na Avenida D. Carlos I, cuja adaptação está praticamente concluída. Para aí, já foram transferidos a Comissão Nacional de Eleições, a Alta Autoridade para a Comunicação Social e os serviços de apoio respectivos, assim como serviços próprios da Assembleia da República que perfazem 1/3 do total dos seus funcionários. Prevê-se que até ao fim do corrente ano civil haja sido transferida para esse espaço metade dos funcionários da Assembleia da República, o que significa que o Palácio de S. Bento e a Casa Amarela estão a ficar disponíveis para a instalação preferencial de Deputados, dos grupos parlamentares, dos funcionários imediatamente adstritos à actividade parlamentar e dos profissionais da comunicação social.
Em segundo lugar, devem ser mencionadas as alterações introduzidas na Lei Orgânica, em vigor desde 1 de Setembro de 1993. O rejuvenescimento dos quadro dirigentes, derivado, desde logo, dos incentivos à aposentação aí estabelecidos, e a reorganização interna dos serviços, subsequente à mudança da estrutura orgânica global, irão, seguramente, produzir aumentos significativos de produtividade no trabalho administrativo da Assembleia da República. Para já, é de notar que a implementação da reforma está a decorrer sem problemas de maior, apesar da delicadeza em regra inerente a este tipo de medidas.
Em terceiro lugar, e por fim, vale a pena salientar o rigoroso método adoptado pelo Conselho de Administração, no controlo das despesas da Assembleia da República, e lembrar que, no parecer sobre a conta de gerência de 1992 - aliás, precedido de uma auditoria-, o Tribunal de Contas pôde dizer, como conclusão global, que «lhe apraz registar que algumas das deficiências detectadas em anteriores pareceres já foram ultrapassadas», havendo «uma melhoria na organização do sistema contabilístico». Eis um juízo especialmente gratificante que confirma um significativo acréscimo de transparência na gestão da Assembleia da República, do qual só resultam benefícios para todos os órgãos, serviços e responsáveis envolvidos.
Quanto ao que se fará na presente sessão legislativa, julgo dever apontar apenas dois projectos mais significativos.
O primeiro, dentro de dias, cada um dos quatro canais de TV disporá de um estúdio para tratamento das imagens obtidas pelas três câmaras fixadas no Hemiciclo, tendo assim acesso ao registo de todas as intervenções dos Deputados e Membros do Governo, em boas condições técnicas e com total respeito pela igualdade de tratamento de todos quantos usem da palavra no Plenário.
O segundo projecto diz respeito à recuperação dos edifícios que a Assembleia da República em tempos adquiriu no Largo de São Bento. Depois do insucesso do concurso que atingiu o seu termo na 2.ª sessão legislativa, é preciso encontrar rapidamente uma forma adequada para o restauro e adaptação às necessidades da Assembleia da República do importante património ali há muito construído.
O arranjo integral do Largo de São Bento, naturalmente, só poderá atingir o nível pretendido mediante entendimentos e acertos com a Câmara Municipal de Lisboa, que, aliás, já está motivada para o efeito - como ficou claro da reunião que tive com o seu presidente.
Srs. Deputados, este ano parlamentar apresenta algumas dificuldades específicas, derivadas das duas grandes eleições que, durante ele, ocorrerão. Decerto vai ser poderoso o intento ou a tentação de se encarar o trabalho parlamentar deste período como instrumento, primeiro, das eleições locais, e, depois, das eleições para o Parlamento Europeu.
Neste contexto, talvez seja justificado por isso o meu voto de que os Deputados e os grupos parlamentares se não esqueçam na 3.ª sessão legislativa, de que a Assembleia da República, além das funções políticas no domínio eleitoral, tem, diutunamente, de fazer leis, de apreciar os actos do Governo e da Administração, de vigiar pelo cumprimento da Constituição e das leis, de aprovar tratados... Que sei eu?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Srs. Convidados, renovo, por fim, os nossos agradecimentos pela presença com que VV. Ex.ªs nos distinguiram neste singelo acto solene, reafirmando assim pelo gesto a necessidade de cooperação e harmonia que deve existir entre os diferentes poderes para a saúde do sistema democrático.

Aplausos gerais.

Antes de declarar a suspensão da sessão, lembro os Srs. Deputados de que retomaremos os trabalhos, para o período da ordem do dia, dentro de 20 minutos.

Está suspensa a sessão.

Eram 16 horas e 35 minutos.

Srs. Deputados, declaro aberta a sessão.

Eram 17 horas e 30 minutos.

Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai anunciar os diplomas, os requerimentos e as respostas aos requerimentos, que deram entrada na Mesa.

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O Sr. Secretário (José Cesário): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada, e foram admitidos, os seguintes diplomas: propostas de lei n.ºs 78/VI - Altera a Lei n.º 30-C/92, de 28 de Dezembro (Orçamento do Estado para 1993), 79/VI - Grandes Opções do Plano para 1994 e 807 VI - Orçamento do Estado para 1994, que baixaram à 6.ª Comissão; propostas de resolução n.05 39/VI - Aprova, para ratificação, o protocolo de alterações à Convenção da Organização Europeia para a Exploração de Satélites Meteorológicos, que baixou à 3.ª Comissão, e 40/VI - Aprova, para ratificação, o Acto que altera o Protocolo relativo aos estatutos do Banco Europeu de Investimento e autoriza o Conselho de Governadores a instituir um Fundo Europeu de Investimento, que baixou à 6.ª e 11.ª Comissões.
Foram ainda apresentados na Mesa da Assembleia da República os seguintes requerimentos: ao Governo e a diversos ministérios, formulado pelo Sr. Deputado António Filipe; ao Ministério do Mar, formulado pelo Sr. Deputado José Paulo Casaca; aos Ministérios da Educação e da Administração Interna, formulados pelo Sr. Deputado Paulo Rodrigues; ao Ministério da Agricultura, formulado pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações e à Secretaria de Estado da Cultura, formulados pelo Sr. Deputado Luís Sá; ao Ministério da Saúde, formulado pelos Srs. Deputados António Martinho e Eurico Figueiredo; à Câmara Municipal de Oeiras, formulado pelo Sr.ª Deputada Leonor Coutinho.
Entretanto, o Governo respondeu a 1278 requerimentos apresentados pelos Srs. Deputados.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à leitura, discussão e aprovação de dois relatórios da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, sobre substituição de Deputados.
O Sr. Secretário Lemos Damião vai proceder à leitura do primeiro relatório.

O Sr. Secretário (Lemos Damião): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o relatório e parecer refere-se à substituição dos Srs. Deputados António Barradas Leitão, do PSD, para o período de 21 de Outubro corrente a 4 de Dezembro próximo, inclusive; Falcão e Cunha, do PSD, com início em 8 de Outubro do corrente, inclusive; Luís Sá, do PCP, por um período não inferior a 45 dias; Girão Pereira, do CDS-PP, com início a 10 de Outubro corrente, respectivamente pelos Srs. Deputados João Carlos Duarte, Joaquim Almeida, José Calçada e Ferreira Ramos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação. Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do PSN, de Os verdes e dos Deputados independentes Freitas do Amaral, Mário Tomé e João Corregedor da Fonseca.

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário Lemos Damião vai proceder à leitura do segundo relatório.

O Sr. Secretário (Lemos Damião): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o relatório e parecer refere-se à substituição dos Srs. Deputados Domingos Abrantes, do PCP, a partir do dia 20 de Outubro corrente, inclusive, e Maria Amélia de Jesus Pardal, do PCP, por um período não inferior a 45 dias, com início em 20 de Outubro corrente, inclusive; respectivamente por Maria Amélia de Jesus Pardal e Paulo Jorge de Agostinho Trindade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação. Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do PSN, de Os verdes e dos Deputados independentes Freitas do Amaral, Mário Tomé e João Corregedor da Fonseca.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora proceder à apreciação da proposta de lei n.º 59/VI - Autoriza o Governo a transpor para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 92/11 1/CEE do Conselho, de 14 de Dezembro, e a alteração à legislação sobre o IVA.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Subsecretário de Estado Adjunto da Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento.

O Sr. Subsecretário de Estado Adjunto da Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento (Vasco Matias): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o Acto Único Europeu, de Fevereiro de 1986, que modificou determinadas disposições do Tratado de Roma, ao inserir no texto do referido tratado um novo artigo 8.º-A, relativo à instauração de um mercado interno, estabelecendo que este «compreende um espaço sem fronteiras internas» a nível do território pertencente aos vários Estados membros, trouxe consequências no que toca a várias políticas quer comunitárias quer nacionais que doravante sofreriam grandes transformações para que tal meta se pudesse, efectivamente, concretizar no timing definido no citado artigo.
No que diz respeito à matéria fiscal e em particular no âmbito do imposto sobre o valor acrescentado, a Comissão das Comunidades Europeias, tendo como base o artigo 99.º do Tratado de Roma, enceta, então, todo um percurso de iniciativas legislativas no sentido de se conseguir uma harmonização fiscal que, por um lado, fosse consentânea com os princípios de um verdadeiro Mercado Único e, por outro, não pusesse em causa os interesses orçamentais dos diversos Estados membros.
Foi esse trabalho dos últimos anos que viria a culminar na aprovação de várias directivas no domínio da tributação indirecta, de entre as quais convém salientar a Directiva n. º 91/680/CEE, de 16 de Dezembro, alterando substancialmente todo o edifício normativo comunitário até então em vigor - a chamada 6.ª Directiva IVA. Era, assim, aprovado a nível comunitário um novo regime transitório do IVA, a aplicar no âmbito das trocas intracomunitárias e tendente à abolição das fronteiras fiscais. E transitório, porquanto, como decorre dos textos comunitários o objectivo último nesta matéria é, como se sabe, a passagem ao chamado princípio da origem restrito, afastando-se no espaço integrado a aplicação do princípio do destino.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Resumidamente, eis as razões e os resultados que se obtiveram ao nível normativo no âmbito dos doze Estados membros, em matéria de abolição das fronteiras fiscais com vista ao pleno funcionamento do Mercado Único iniciado em 1 de Janeiro último. E se, em finais de Dezembro de 1991, estava erigido a nível comunitário o novo edifício normativo regulador de toda esta matéria, Portugal, interveniente e destinatário de todo esse regime, teria que adaptar a sua legislação transpondo a citada Directiva para o direito interno, o que veio a acontecer através do Decreto-Lei n.º 290/92, de 28 de Dezem-

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bro, dando cumprimento às suas obrigações comunitárias como destinatário da Directiva!
O interesse e o empenho que o Governo emprestou à harmonização fiscal comunitária ultrapassou, de longe, as obrigações decorrentes dos te «os comunitários na matéria, antecipando algumas soluções aquando da aprovação da Lei do Orçamento de 1992, ao abolir a taxa zero e ao alterar toda a estrutura de tax; is existente, num esforço de adaptar os agentes económicos ao novo quadro fiscal comunitário que se avizinhava e cujas consequências extravasavam o mero plano fiscal. Seguiu-se, como atrás referi, a este primeiro esforço de harmonização, a transposição da Directiva n.º 91/680/CEE, no sentido de adaptar a estrutura do imposto à abolição das fronteiras fiscais, o que foi feito através do Decreto-Lei n.º 290/92, que alterou o Código do IVA e aprovou, simultaneamente, o novo regime do imposto nas transacções intracomunitárias.
No entanto, ainda antes de início do funcionamento do Mercado Único, à medida que os Estados membros se empenhavam em transpor para as legislações nacionais a Directiva n.º 91/680/CEE, já a Comissão em conjunto com os Estados membros se apercebera de que aquela Directiva necessitava de ser aperfeiçoada, tendo em conta que nem todas as soluções por ela encontradas se afiguravam como as mais realistas e mais acertadas. Assim, novas negociações são encetadas no seio do Conselho e, em finais de 1992, a Directiva n.º 91/680/CEE, que ainda não entrara em vigor, era alterada pela chamada Directiva Simplificação - Directiva n.º 92/111/CEE.
A Proposta de Lei n.º 59/VI visa autorizar o Governo a transpor para a ordem jurídica interna a citada Directiva n.º 92/111/CEE. É que a Directiva n.º 91/680/CEE, que aprovou o regime transitório do IVA a aplicar nas trocas intracomunitárias devido à criação do Mercado Único, mercê de várias vicissitudes, não contemplou todas as situações que a complexidade do regime e tão profundas mudanças implicavam.
As questões fundamentais reguladas na Directiva que ora se pretende transpor, dizem respeito à possibilidade de: primeiro, manter-se a situação de isenção das transacções de bens destinados a ser consumidos a bordo de um navio, avião ou comboio, no decurso de um transporte de passageiros efectuado no território da Comunidade e parcialmente fora deste território - segundo os princípios do Mercado Único tais transmissões deveriam ser tributadas, mas como o decurso do transporte não se situa todo no território comunitário, o que implica que parte de tais bens iriam ser consumidos fora, a aplicação do critério da territorialidade torna quase impossível estabelecer mecanismos operacionais conducentes à tributação.
Em segundo lugar, pretende tratar-se da isenção nas aquisições de bens efectuados por viajantes que os transportem na sua bagagem pessoal para fora da CEE. Três soluções eram possíveis: isenção só para viajantes de terceiros países; isenção para viajantes residentes em países terceiros e noutros Estados membros; e isenção para todos os viajantes, incluindo os nacionais. Dado que a isenção prevista nas duas últimas situações poderia proporcionar ocasiões de fraude, opta-se por só consagrar a isenção para viajantes de terceiros países.
Em terceiro lugar, o caso mais particular solucionado pela chamada Directiva de Simplificação é o das chamadas operações triangulares. Imagine-se um sujeito passivo A, sediado no Estado membro sediado no Estado membro subsequentemente, que vende mercadorias a B, no 2, sendo certo que as mercadorias são vendidas a C, no Estado membro 3, mas em que as mercadorias são directamente expedidas do Estado membro 1 para o Estado membro 3. A Directiva n.º 91/680/CEE, como os bens não chegavam a entrar no Estado membro 2, obrigava a que B se registasse ou no Estado membro 1 ou no Estado membro 3, efectuando este, no primeiro caso, uma transmissão intracomunitária do Estado membro 1 para o Estado membro 3, e, se registado no Estado membro 3, efectuaria uma transmissão interna para C. Para obviar a esta obrigação suplementai de registo, a Directiva de Simplificação soluciona o problema designando como responsável pela liquidação do imposto o destinatário das mercadorias, que é C, e isentando o sujeito passivo B. É, portanto, fundamentalmente, uma matérias de simplificação administrativa e burocrática.
Finalmente, a Directiva de Simplificação consagra medidas de carácter transitório para os meios de transporte que se encontravam em 1 de Janeiro de 1993 em regime de importação temporária, porquanto a partir daquela data cessaram estes regimes. Como numa destas situações se estipula que não é devido imposto quando o seu montante, devido a título da importação, se tenha por insignificante, haveria que fixar qual o montante mínimo de cobrança, optando-se por consagrar 5 000$, que é o montante mais elevado fixado na legislação nacional.
Por último, importa referir que se aproveitou para solicitar, igualmente, autorização no sentido de se proceder a algumas alterações de pormenor na legislação respeitante ao IVA, quer no Código, quer no RITI (Regime Interno das Transacções Intracomunitárias), quer ainda em legislação avulsa aprovada pelo Decreto-Lei n.º 290/92, de 26 de Dezembro, por forma a uma melhor correcção de várias situações e ao seu aperfeiçoamento face ao regime ora em vigor.
Por consequência, a autorização legislativa que ora se pretende transpor para a ordem jurídica interna, tem a ver com medidas de simplificação burocrática e com uma melhor adequação aos mecanismos do Mercado Interno.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Domingues Azevedo.

O Sr. Domingues Azevedo (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, Sr. Subsecretário de Estado, estes são diplomas que não são susceptíveis de gerar discussão, porquanto se trata da transposição para o direito interno de normas já definidas pela Comunidade. No entanto, estando globalmente de acordo com o que aqui é expresso, gostaria de levantar algumas questões porque se aproveitou, e muito bem, para alargar o âmbito de funcionamento e alterar, pelo menos pela leitura do que nos vem escrito nesta proposta de autorização legislativa, questões que eu gostaria de comentar.
Por exemplo, no n.º 1, alínea a), passa a incluir-se, em minha opinião, muito bem, os comboios e as provisões para o seu abastecimento. Isto não estava previsto ainda na actual versão do Código do IVA, omissão esta que, em minha opinião, não se justificava uma vez que se contemplava todos os outros meios de transporte internacional e que o único que, na versão actual do Código, não estava contemplado era o transporte por via férrea.
O Sr. Subsecretário de Estado já mencionou que o Governo optou por isentar exclusivamente as aquisições de bens efectuadas por viajantes residentes fora da Comunidade, com base nas três opções de que o Governo dispunha: isentar todos os nacionais residentes na Comunidade e os residentes em Estados terceiros, não isentar nenhuns,

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ou uma terceira hipótese, de que não me recordo neste momento. Isto pode ser prejudicial, na medida em que possa haver nacionais da Comunidade em relação aos quais, até pela duração da próprias viagens, haja interesse em que consumam bens que beneficiariam da isenção. Penso que a possibilidade de haver aqui uma grande fraude por evasão neste capítulo nunca seria significativa. Penso também que esta demarcação, esta distinção de excluir do direito à isenção os residentes nacionais e nos Estados da Comunidade, é uma opção que careceria de melhor explicitação.
Ainda no domínio desta isenção, é de salientar as alterações ao artigo 14.º do Código do IVA, n.º 1, alínea b), que se refere às transmissões de bens que estávamos a referir. A actual versão põe algumas limitações, como, por exemplo, aos barcos e aviões, bens que, no âmbito da teoria e da filosofia do Código, eram considerados como supérfluos e, por isso, sujeitos a uma taxação. Nesta alínea c) não se refere isto, havendo aqui um sentido global de transmissões sem se ter o cuidado desta clarificação. Gostaria de ouvir o Sr. Subsecretário de Estado sobre esta questão.
Finalmente, no que nos é proposto neste pedido de autorização legislativa, em especial no que concerta às Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, alarga-se o âmbito de funcionamento, e muito bem, de e para - o que não acontecia na actual versão do Código. Gostaria de dizer que estamos de acordo. O importante neste domínio, Sr. Subsecretário de Estado, e penso que o Governo talvez não tenha ainda elementos capazes para poder dar esta informação, é o controlo que o Estado terá de fazer em especial no domínio dos sujeitos passivos integrados no artigo 9.º e, portanto, sem uma relação directa com os serviços centrais do IVA nas suas operações intracomunitárias. Ou seja, se, neste momento, os sujeitos passivos normais já tem um cadastro nos serviços de administração do IVA, o que torna mais fácil aos serviços detectarem quaisquer deficiências, o mesmo não se passa com os sujeitos passivos integrados no artigo 9.º e, por isso, sujeitos à isenção no que concerne, em especial, às transacções intracomunitárias, podendo abrir-se aí um largo portão por onde pode passar muita evasão no domínio deste imposto.
Gostaria de ouvir o Sr. Subsecretário de Estado também quanto a isto e quanto aos efeitos da aplicação desta norma que possam surgir neste domínio.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Estando marcada a ordem do dia de hoje por duas iniciativas que eu diria que estão como «os anjos para os deuses», tudo em harmonia celestial, mal seria que fossemos nós a entrar em qualquer desconcerto. Este pedido de autorização legislativa do Governo limita-se a propor a transposição para a ordem jurídica interna das directivas de harmonização e simplificação do IVA nas trocas intracomunitárias, e não temos qualquer objecção de fundo a colocar.
Contudo, dois sublinhados e uma questão.
Primeiro, em relação ao momento em que se faz a transposição para a ordem jurídica interna destas simplificações e deste maior rigor no controlo do IVA nas trocas intracomunitárias. Talvez tivesse sido bom fazê-la antes, ou tivesse sido bom terem-se criado as condições para que ela tivesse sido feita no momento em que o Mercado Único foi implementado. Poder-se-ia, assim, evitado a enorme perda nas receitas do IVA que, tal como está previsto no orçamento suplementar para 1993, se verificou este ano.
Segundo, fazemos votos para que a experiência deste ano dê alguns frutos para o futuro, para que a implementação de novas normas no âmbito do Mercado Interno não crie condições para uma enorme evasão fiscal, como este ano tem sucedido e que, como ainda há pouco foi sublinhado na Comissão de Economia pelo Sr. Ministro das Finanças, nem toda será recuperada pelo Estado.
Por último, uma questão de dúvida que, aliás, já foi colocada pelo Sr. Deputado Domingues Azevedo. Nas transmissões de bens de viajantes, transportados na sua bagagem pessoal para fora da Comunidade, das três opções que o Governo tinha à sua disposição, propõe-se optar por uma que limita a isenção aos residentes ou domiciliados em países terceiros e não a alarga a todos os viajantes, incluindo os nacionais e dos países membros da Comunidade. A minha dúvida é se isto não pode configurar alguma discriminação em relação aos viajantes nacionais nestas condições. Sobre isto gostaria de ouvir alguma explicação mais detalhada do Sr. Subsecretário de Estado, para além daquela que acompanha o pedido de autorização legislativa.
Dito isto e, como disse no início da intervenção, dado que nada de fundo nos opõe a esta proposta de autorização legislativa, vamos votá-la favoravelmente - aliás, para não desconcertarmos nesta harmonia celestial que é ordem do dia de hoje.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Lobo Xavier.

O Sr. António Lobo Xavier (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Subsecretário de Estado Adjunto da Secretária de Estado-Adjunta e do Orçamento: Quando adoptamos os instrumentos necessários à transposição de directivas relacionadas com a tributação indirecta, raramente temos margem de manobra e quase nunca é oportuno ou útil manifestar alguma discordância ou alguma reserva.
Mas não é este o caso, seguramente. Existem situações em que, de facto, se justificam algumas reflexões, mesmo sobre directivas muito pormenorizadas, como é costume no caso dos impostos indirectos. Mas esse não é o caso, com certeza, de uma directiva como esta, que, ainda por cima, tem por função introduzir medidas de simplificação.
O CDS-PP quer apenas dizer que, de facto, concorda com as opções - aí, onde havia margem de liberdade - tomadas pelo Governo, o que mostra que, por vezes, em matéria de impostos, estamos de acordo.
Portanto, neste ponto do período da ordem do dia, em matéria tributária, estamos de acordo com o Governo, o que não acontecerá, seguramente, nesta matéria, em muitos outros domínios.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Deixem-me que vos diga que sempre que vejo a transposição de directivas relacionadas com o imposto sobre o valor acrescentado, e quando essa transposição ocorre a tempo e horas, lamento que não se tenha ainda tomado a decisão - que já referi várias vezes nesta Câmara - de eliminar a taxa máxima do IVA, justamente em obediência às mesmas regras de harmonização com que o Governo se tem mostrado tão zeloso.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Araújo.

O Sr. Alberto Araújo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Governo apresenta à Assembleia da República, nos termos da alínea

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18 I SÉRIE - NÚMERO 1

d) do n.º 1 do artigo 200.º da! Constituição da República Portuguesa e do artigo 128.º do Regimento da Assembleia da República, a proposta de lei n.º 59/VI - Autoriza o Governo a transpor para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 92/111/CEE do Conselho, de 14 de Dezembro de 1992, e a alteração à legislação sobre o IVA.
A directiva quê aprovou o regime transitório em IVA a aplicar nas trocas intracomunitárias devido à criação do Mercado Único, mercê de várias vicissitudes, não contemplou todas as situações que a complexidade do regime e tão profundas mudanças implicavam.
Com vista a colmatar tais situações, foi aprovada pelo Conselho das Comunidades, à Directiva n.º 92/111/CEE, vulgarmente chamada Directiva Simplificação, que agora se visa transpor.
Havia, assim, necessidade de pedir a competente autorização legislativa tendente à sua transposição, porquanto, são colocadas aos Estados membros opções sobre as quais há que decidir como sendo as mais convenientes a inserir na legislação interna.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A directiva consagra medidas de carácter transitório para os meios de transporte que se encontravam em 1 de Janeiro de 1993 em regime de importação temporária.
Como numa das situações, conforme consta na proposta de lei, não é devido imposto quando o seu montante for insignificante, haveria que fixar qual o mínimo de cobrança. O Governo optou por consagrar 5 000$, que é o montante mais elevado fixado na legislação nacional.
Por fim, importa ainda referir que o Governo aproveitou para solicitar, igualmente, autorização legislativa no sentido de proceder a algumas alterações, quer no Código do IVA, quer ainda em legislação avulsa, por forma a uma melhor correcção de várias situações que não foram transpostas com o necessário rigor técnico.
Por tudo isto e ainda pela fundamentação da proposta de lei n.º 59/VI, o Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata vai votar, com certeza, e como todos os grupos parlamentares, favoravelmente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições para o uso da palavra sobre a proposta de lei n.º 59/VI, dou o debate por concluído. Como estamos dentro da hora regimental, a votação desta proposta de lei será feita após o do debate da proposta de resolução n. º 36/VI.
Antes de passarmos à discussão dessa proposta de resolução, o Sr. Secretário vai dar conta de um parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

O Sr. Secretário (José Cesário): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 1.º Juízo do Tribunal de Polícia de Lisboa, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de não autorizar o Sr. Deputado Correia Afonso (PSD) a suspender o seu mandato, a fim de ser julgado em processo que se encontra pendente naquele tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação. Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes, do PSN e dos Deputados independentes Freitas do Amaral, João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.

Srs. Deputados, vamos entrar, agora, na apreciação da proposta de resolução n.º 36/VI - Aprova, para ratificação, as emendas aos artigos 24.º e 25.º da Constituição da Organização Mundial de Saúde.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Rui de Almeida.

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Apreciamos hoje uma proposta de resolução que aprova, para ratificação, as emendas aos artigos 24.º e 25.º da Constituição da Organização Mundial de Saúde. Peço a atenção do Sr. Presidente e dos Membros do Governo, pois, a meu ver, há um lapso no documento que a acompanha a proposta de resolução quando diz que aprova, para ratificação, as emendas aos artigos 24.º e 25.º da Organização Mundial de Saúde. Não é assim, mas é da Constituição da Organização Mundial de Saúde. É um pequeno lapso, sem grande importância, mas o próprio texto terá de mencionar que as emendas são aos artigos da Constituição da Organização Mundial de Saúde.
Esta é uma proposta pacífica e para o Pacífico.
Em Maio de 1985, na 38.ª Sessão da Assembleia Mundial de Saúde, foram avaliadas duas importantes resoluções, provenientes de estudos anteriores: uma, do Conselho Executivo da OMS; outra, do Comité Regional do Pacífico Ocidental. Ambas apontavam para a necessidade de aumentar em três ou quatro, na altura ainda não estava definido, o número de membros da região do Pacífico Ocidental. Na base desta alteração estavam dois factos, duas ocorrências constatadas ao longo dos anos: o número dos Estados membros desta região tinha aumento e aumentou, também, as populações desta área.
Reconhecida esta evidência- este aumento de três ou quatro elementos nos membros da região do Pacífico Ocidental -, ela só seria possível desde que o Conselho Executivo passasse a ter mais um elemento, ou seja, de 31 passasse para 32. E estes 31 membros estavam previstos na Constituição da OMS, nos artigos 24.º e 25.º.
No decorrer da 39.ª Sessão da Assembleia Mundial de Saúde do ano seguinte - habitualmente reúne de ano a ano -, em 1986, estes dados e estas constatações vieram a ser consideradas e foi analisada esta resolução - a chamada WHA38.14 -, que apontava para a necessidade de aumentar o número de membros do Conselho Executivo, o qual, de 31, passava para 32.
Foram votadas favoravelmente as emendas aos artigos 24.º e 25.º nesta 39.ª Sessão da Assembleia Mundial de Saúde.
Como disse desde o início, esta é uma proposta de resolução pacífica e para o Pacífico, pelo que lhe damos o nosso voto favorável.
Há um pequeno pormenor acerca do qual, certamente, me saberão elucidar. Entendemos que existe um espaço muito grande de tempo entre a aprovação destas alterações pela Assembleia Mundial de Saúde, em 1986, e a sua chegada ao nosso país. Há aqui algo que, penso, não está totalmente bem.
Em conclusão, damos o nosso voto favorável a esta proposta de resolução porque estas emendas vão ao encontro das novas realidades e das novas necessidades sentidas nesta região do Pacífico e, também, porque são apoiadas por duas entidades importantes: o Conselho Executivo da OMS e o Comité Regional do Pacífico Ocidental.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Peixoto.

O Sr. Luís Peixoto (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Realmente,

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como disse o meu camarada Lino de Carvalho, a tarde é de harmonia. Não quereria, por isso, desafinar este coro, pelo que, depois do «solo de violino» que ele fez, iria continuar, talvez quem sabe, com um «solo de piano».
De qualquer forma, a proposta de resolução que o Governo apresenta, que aprova para ratificação as emendas aos artigos 24.º e 25.º da Constituição da Organização Mundial de Saúde, não é talvez um acto meramente administrativo, uma vez que, em meu entender, devemos constatar que, para além deste acto, há um outro facto que se prende exactamente com o significado deste alargamento.
Com efeito, este alargamento significa que mais países estão empenhados em unir os seus esforços, no âmbito da Organização Mundial de Saúde, no duro combate que se trava, neste momento, pela saúde humana.
Aliás, a manutenção da saúde humana é uma guerra que vai sendo feita de pequenas batalhas e penso que todos os momentos são poucos para recordar as muitas batalhas que ainda não foram ganhas, nomeadamente a do cancro e a da sida. Lamentavelmente, há também outras batalhas, que já julgávamos acabadas, e que começam novamente a surgir: é o caso triste da tuberculose, por exemplo, que começa novamente a impor-se.
Portanto, não temos nada a opor a esta proposta de resolução, pelo que termino apenas afirmando que nos congratulamos por verificar que cada vez mais países vão aderindo a esta luta da OMS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Aguiar.

A Sr.ª Manuela Aguiar (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Apenas uma breves palavras para dizer que o PSD dá o seu acordo a esta decisão, de resto, pacífica.
Trata-se, evidentemente, apenas de garantir a proporcionalidade da representação geográfica, com o que estamos inteiramente de acordo. É, em síntese, uma resolução pacífica sobre o aumento da representação no Conselho Executivo, de 31 para 32 membros, e da área do Pacífico Ocidental, de três para quatro membros.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como não há mais oradores inscritos, considero encerrado o debate.
Nos termos regimentais, vamos agora proceder à votação conjunta, na generalidade, na especialidade e final global, da proposta de lei n.º 59/VI.
Srs. Deputados, vamos então votar a proposta de lei n.º 59/VI - Autoriza o Governo a transpor para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 92/111/CEE do Conselho, de 14 de Dezembro, e a alteração à legislação sobre o IVA.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes, do PSN e dos Deputados independentes Freitas do Amaral e Mário Tomé.

Srs. Deputados, vamos agora, em votação global, votar a proposta de resolução n.º 36/VI - Aprova, para ratificação as emendas aos artigos 24.º e 25.º da Constituição da Organização Mundial de Saúde.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes, do PSN e dos Deputados independentes Freitas do Amaral e Mário Tomé.

Srs. Deputados, a próxima reunião plenária realiza-se amanhã, às 15 horas, e terá como ordem do dia a interpelação n.º 14/VI - Sobre a degradação da situação e dos direitos sociais, a recessão económica e as políticas do Governo (PCP).

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 15 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Domingos Duarte Lima.
José Macário Custódio Correia.

Partido Socialista (PS):

António Manuel de Oliveira Guterres.
José Manuel Santos de Magalhães.

Partido Comunista Português (PCP):

Octávio Augusto Teixeira.
Paulo Jorge de Agostinho Trindade.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Adérito Manuel Soares Campos.
Adriano da Silva Pinto.
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
António Maria Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
João Maria Leitão de Oliveira Martins.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rui Alberto Limpo Salvada.

Partido Socialista (PS):

António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António José Borrani Crisóstomo Teixeira.
António Luís Santos da Costa.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Helena de Melo Torres Marques.
Jaime José Matos da Gama.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Leonor Coutinho Pereira dos Santos.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

André Valente Martins.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA.

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