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16 DE JUNHO DE 1994 2565

valecente; não há concepções únicas de serviço público, de educação e de saúde; todos falam de prioridade ao emprego mas cada um tem sobre isso uma ideia diferente, quando não ideia nenhuma.
A soberania do Estado-nação clássico enfrenta penosamente a ciclópica interdependência e internacionalização de tudo: as identidades nacionais fundem-se no cadinho de uma vertiginosa mudialização de comportamentos e valores e tem-se a clara percepção de que buscarão refúgio a nível regional e local. Os mercados nacionais devêm um anacronismo e os mercados regionais uma ponte para a crescente mundialização de um só mercado, pelo que sobreviver é cada vez mais competir, sendo que a competição econ6mica se assume agora como um sucedâneo da guerra.
Tudo isto e muito mais impõe a mudança como condição de sobrevivência e já ninguém resiste a esse imperativo categórico. Mesmo os mais resistentes conservadores incluem a mudança nos seus avatares. É assim que falam em "mudança na continuidade", em "mudança sem risco", em "mudança segura" e até em "mudança na mudança". Querem mudar não querendo e é isso que hoje, uma vez mais, identifica a direita e, por contraposição, a esquerda.
É óbvio que o eleitorado não tem, todo ele, a clara percepção de tudo isto. Mas tem, disto, uma intuição bastante, a caminho de uma compreensão total. Ou nos antecipamos ou corremos o risco de ser ultrapassados.
Assim, a margem de abstenção do último domingo que exprime convicções pode não ter motivações simplistas nem únicas. Pode reflectir o descontentamento dos excluídos da participação política e do minimum justum; pode reflectir decepção perante o envelhecimento do processo político tradicional; pode reflectir a desvalorização das ideologias e, em geral, a monetarização dos valores; pode reflectir a medida em que o espectador tomou o lugar do agente; pode reflectir o facto de o economicismo e o mercantilismo dominantes desestimularem a participação não utilitarista; pode reflectir o triunfo do egoísmo sobre a solidariedade. Pode reflectir tudo isso e algo mais. Pior do que não aproveitar as lições, só mesmo desprezá-las.
0 PS já revelou disponibilidade para mudar, já traduziu - e vai traduzir - esse estado de espírito em propostas concretas e mobilizadoras, fiel à estratégia definida pelos seus órgãos dirigentes.
Srs. Deputados não socialistas: na preparação do século XXI, gostaríamos de ser ultrapassados por vós!

Aplausos do PS.

0 Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Duarte Lima e Octávio Teixeira.
Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Lima.

0 Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Almeida Santos, ouvi com toda a atenção o seu discurso e a interpretação aqui trazida sobre os resultados das eleições europeias, matéria que gostaria de discutir com V. Ex.ª mas não antes de deixar duas notas prévias.
Em primeiro lugar - permita-me que faça esta qualificação -, contrariamente aos discursos importantes, bem escritos e quase sempre muito enérgicos de V. Ex.ª, notei hoje na sua intervenção um tom baço, cinzento, quase triste, refugiando-se, na ponta final, em questões que, embora importantes e relevantes, se constituírem o discurso do PS para a nova maioria, estamos conversados.
Em segundo lugar, anoto um facto que é apenas político e sem qualquer sentido de desprimor para a elevada qualidade e peso institucional de V. Ex.ª, quer no âmbito parlamentar quer a nível do seu partido. É que, desta vez, contrariamente ao que aconteceu a seguir às eleições autárquicas, não foi o Engenheiro António Guterres - que nesta campanha eleitoral apareceu quase ungido, pelo braço do Dr. António Vitorino, como futuro Primeiro-Ministro - a vir aqui fazer uma declaração política. Repito, faço esta afirmação sem qualquer desprimor para a figura emblemática do Dr. Almeida Santos, em termos institucionais, para a Assembleia da República e para o seu partido.
Começando agora por fazer a análise das suas palavras, direi que mais importante do que aquilo que disse foi o que não disse porque, ao fazer uma leitura das eleições, era natural que o seu discurso - e o do seu partido -, durante a campanha eleitoral, tivesse continuidade.
Lembro-lhe algumas frases que constituíram o mote essencial do vosso discurso eleitoral: "É preciso pregar um susto ao Primeiro-Ministro e ao PSD".

0 Sr. José Vera Jardim (PS): - Está pregado!

0 Sr. Nuno Delerue (PSD): - Não está!

0 Orador: - "É preciso ter uma vitória esmagadora e provocar uma derrota humilhante no PSD". "É preciso criar as condições para que o Engenheiro António Guterres seja o Primeiro-Ministro".
0 Sr. Deputado Almeida Santos não veio aqui falar destas questões e, aliás, já reparou que não estamos nada assustados, mas tranquilíssimos. Ocorreu-me o pensamento de Claude Roy: ou o Sr. Deputado não pensou tudo o que disse ou não disse tudo o que pensou ou não pensou tudo o que pensou. Alguma das situações se verificou porque era expectável que hoje aqui estivesse, essencialmente, a fazer a leitura dessa matéria.
Sr. Deputado Almeida Santos, tem de reconhecer, em primeiro lugar, que o povo português não vos deu o que lhe pediram. Muito foi pedido e pouco foi dado e a derrota do PSD, que queriam significativa e humilhante, não aconteceu. Aliás, como sabe, o resultado eleitoral do PSD subiu relativamente a 1989 e não faça comparações com as eleições legislativas porque, caso contrário, dou-lhe o exemplo do que sucedeu no distrito de Bragança: os senhores tiveram aí uma vitória retumbante nas eleições de Dezembro, mas agora, num total de 12, tivemos maioria absoluta em 11 câmaras, e não me atrevo a dizer que os presidentes de câmara socialistas perderam a legitimidade ou foram derrotados. Porém, devemos presumir a inteligência do eleitor e saber que ele distingue a essência de cada uma das votações.
Portanto, aquilo que os senhores pediram não vos foi dado e acho que o Sr. Deputado tem razão para se lastimar porque o mais duro na vida é ter de pedir e, depois de pedir, receber um "não" como resposta.
Por outro lado, Sr. Deputado Almeida Santos, como os senhores não nos pregaram um susto, deveria ter um pouco mais de moderação e fazer mea culpa do discurso triunfalista e arrogante que o seu partido fez em relação a nós e a outras forças políticas - durante a campanha eleitoral. Os senhores confundiram combatividade com bravata e pensaram que a prudência com que o PSD se apresentou nestas eleições era medo, mas não era.
Lembro-lhe uma história passada com El Rei D. Sebastião quando, com uma intenção tão ufana como a de V. Ex.ª nesta campanha, quis conquistar África e se dirigiu ao Duque de Alba pedindo conselhos. 0 Duque de Alba