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2 DE JULHO DE 1994 2813

contradição que há entre o que V. Ex.ª" diz e o que anteontem disse o seu colega, o Ministro da Justiça. Esse é um dos problemas dramáticos que, neste momento, minam a eficácia da política de segurança interna em Portugal. Na verdade, é uma política bicéfala ou tricéfala. V. Ex.ª diz o que diz e tem o seu "código penal", que é o Código da Estrada e o "código" dos estrangeiros e o Ministro Laborinho Lúcio tem as "polícias do Ministro Laborinho Lúcio", tem o "código penal Laborinho Lúcio". Aparentemente, entre estes dois mundos, o de V. Ex.ª e o do Ministro da Justiça não há uma ponte, nem 25 de Abril, nem 24 de Abril, nem qualquer outra! Não existe, pura e simplesmente!
Como é óbvio, esse é um factor grave de descoordenação das forças de segurança e contraria a asserção confiante, optimista, quase diria "superoptimista", com que V. Ex.ª diz que há problemas e desafios, mas que o Governo sabe o que quer! Sr. Ministro, se assim é, é porque o Governo quer as coisas que estão à vista, que são, desgraçadamente, indesejáveis, na óptica do melhor interesse do povo português.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, começo por dizer-lhe que o seu discurso mais parecia o discurso de um intendente do que o de um ministro com preocupações políticas sobre a sociedade e em relação à qual quer interagir. Mas não me admiro com tal facto, porque há sempre uma má consciência, por parte do PSD e não só, infelizmente, em relação à democracia. Dão "vivas" à democracia, mas dizem que ela tem vulnerabilidades, é uma má consciência, é uma chatice haver democracia, por isso, temos de defender-nos das vulnerabilidades da democracia.
De facto, isto atravessa as preocupações do Governo e a forma como age. Isto é, aquilo que são as causas fundamentais da segurança e a forma de lhes responder estão ausentes do discurso do Sr. Ministro.
Sei que veio aqui falar de segurança interna, mas ela está relacionada com a situação da sociedade, com a forma como se gera a marginalidade e o crime e com a sua origem. Ora, isso está totalmente ausente do seu discurso - e é natural, porque Cavaco Silva e, ontem, o Sr. Ministro Eduardo Catroga dizem que está tudo muito bem. Como é evidente, assim, é difícil encontrar as razões para a situação actual.
No entanto, Sr. Ministro, o que me preocupa é a aceitação de que a segurança deve assentar nas forças de segurança, de que deve criar-se uma sociedade com bunkers para os ricos, ficando os pobres a viver afastados e na promiscuidade (que lhes é imposta) com a marginalidade. E, assim, isto vai andando: põe-se a polícia a vigiar os espaços vazios, a fazer umas "sortidas" aos locais onde estão os marginais e, desse modo, apanham também as pessoas que trabalham, que estão a descansar ou que estão a levantar-se. Depois, são essas próprias pessoas que são alvo da insegurança efectiva que lhes é criada pelas forças de segurança.
Esta contradição é muito grande, cria preocupações e deveria criá-las também ao próprio Governo, que deveria preocupar-se em abordar as questões fundamentais. O Sr. Ministro deveria abordar as questões políticas e sociais que determinam isso. Inclusive, o próprio relatório da ONU sobre o desenvolvimento humano diz que, sendo a segurança uma grande preocupação, é preciso alterar o modelo de desenvolvimento, mas esta questão não está presente no seu discurso. Não quero dizer que apenas deve falar sobre isso, mas não se sente a sua preocupação nesse sentido.
Queria ainda dizer-lhe, Sr. Ministro, que faço minhas as palavras dos meus colegas anteriores, sobre a ausência de qualquer referência ao que se passou muito recentemente na ponte 25 de Abril.
Para terminar, quero apenas referir que nos organismos hierarquizados, quando não se sabe quem foi a pessoa que cometeu o acto irregular ou o crime, há, à partida, uma resposta, que é a responsabilização do comando. Ora, neste país, cada vez mais, isso é absolutamente desprezado. Os comandos não assumem a responsabilidade, não a tem quem se segue na cadeia de comando, não há ninguém com responsabilidade, a não ser aquele que terá praticado o acto e que nunca se sabe quem é. Como isto é inaceitável queria que o Sr. Ministro me comentasse este facto.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, V. Ex.ª abriu a sua intervenção com a citação dos índices de criminalidade em Portugal. Efectivamente, já tínhamos ouvido, com maior pormenor até, a citação destes mesmos índices, dessas estatísticas, há dois dias, quando veio a esta Assembleia o Sr. Ministro da Justiça, para apresentar as alterações ao Código Penal.
Por isso, ficamos sem saber se esses índices de criminalidade são da responsabilidade, em termos de tutela, do Sr. Ministro da Justiça, isto é, sob o ponto de vista penal, da sua prevenção e repressão, ou se são da responsabilidade do Sr. Ministro da Administração Interna. Porque, se for assim, se forem dois Ministros a brandir as mesmas estatísticas, ficamos sem saber a quem pedir contas. Então, a oposição, tal como se diz no Alentejo, terá de ter "um olho no burro e outro no cigano", porque ou temos de atribuir a V. Ex.ª as responsabilidades por essas estatísticas, e perguntar o que se faz, por que razão existem, ou então temos de fazer essas perguntas ao Sr. Ministro da Justiça.
O que não se compreende é que o Sr. Ministro da Justiça venha aqui, como responsável por essas estatísticas, fazer um discurso, dizendo que essa criminalidade está diluída, que é benigna, que o País não se deve preocupar com ela, porque, em comparação com países europeus, até temos a sorte de ser um oásis, pois a criminalidade está estabilizada, e V. Ex.ª venha dizer exactamente o contrário, isto é, que a criminalidade é preocupante, que em Lisboa e no Porto a delinquência é muito grande, que a montante está a droga e todos os crimes derivados da droga e que vai tomar estas e aquelas medidas nos transportes, pôr polícia junto das escolas, etc.
Quer dizer, há uma total descoordenação do Governo quanto ao combate à criminalidade, o que é lastimável num Governo de maioria absoluta, num Governo homogéneo, num Governo de uma só "cor" e onde há, digamos assim, dois Ministros políticos e não tecnocratas que fazem discursos completamento diferentes.
Em segundo lugar, quero perguntar ao Sr. Ministro por que vem hoje falar apenas de 1993 - já aqui foi dito que V. Ex.ª fez tábua rasa sobre tudo quanto se está a passar nas últimas semanas. Tenciona esperar mais um ano e, quando, para o ano, debatermos o relatório de 1994, virá então falar sobre o que se passou na Madeira, nos Açores, e na ponte sobre, o Tejo? Porquê? Porque é que não se falou nisso? ...

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