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Sexta-feira, 11 de Novembro de 1994 I Série - Número 11

DIÁRIO
da Assembleia da República

VI LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1994-1995)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 10 DE NOVEMBRO DE 1994

Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo

Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
Vítor Manuel Caio Roque.
José Mário Lemos Damião.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues

SUMÁRIO

O Sr Presidente declarou aberra a reunião às 15 horas e 35 minutos Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de lei n º 457/VI Após o Sr Deputado Guilherme Silva (PSD) ter feito a síntese do relatório (Ia Comissão de Assuntos Constitucionais. Direitos, Liberdades e Garantias sobre o debate do sistema de informação em democracia, nos termos do nº 2 do artigo 76 º do Regimento da Assembleia da República, usaram da palavra, a diverso título, além dos Srs. Ministros da Defesa Nacional (Fernando Nogueira) e da Administração Interna (Dias Loureiro) os Srs Deputados Manuel Sérgio (Indep), João Corregedor da Fonseca (Indep). Isabel Castro (Os Verdes), Alberto Costa (PS), João Amaral (PCP), Jorge Lacão (PS), Nuno Delerue (PSD), Jaime Gama (PS), Guilherme Silva e Angelo Correia (PSD), Eduardo Pereira e José Lello (PS). Adriano Moreira (CDS-PP) e José Magalhães (PS)
Depois de a Câmara ter sido informada da eleição do Embaixador José Cutileiro para Secretário-Geral da UEO. produziram intervenções da congratulação e saudação, além do Sr Presidente, os Srs Deputados Jaime Gama (PS). António Mana Pereira (PSD). Adriano Moreira (CDS-PP), Miguel Urbano Rodrigues (PCP) e Isabel Castro (Os Verdes!
Entretanto, foi aprovado o voto nº 119/VI- De pesar pelo - falecimento do jornalista e escritor Orlando Gonçalves (Presidente da AR, PSD, PS. PCP. CDS-PP, Os Verdes e Deputados independentes Luís Fazenda e João Corregedor da Fonseca)
A Câmara deu assentimento à viagem de carácter oficial do Sr Presidente da República à República Checa, entre os dias 15 e 17, e a Genebra, no dia 18
Mereceram aprovação cinco pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos. Liberdades e Garantias autorizando quatro Deputados e denegando um outro a deporem em tribunal
Foram rejeitados os projectos de resolução n.º 127/VI - Recusa de ratificação do Decreto-Lei n º 122/94, de 14 de Maio. que regula a fusão das empresas Telecom de Portugal, SA , Telefones de Lisboa e Porto, AS, e Teledifusora Portuguesa, SÁ (PCP) [ratificação nº 121/VI (PCP)] e 128/VI - Recusa de ratificação do Decreto-Lei nº 168/94, de 15 de Junho, que aprova as bases de concessão da concepção, do projecto, da construção, do financiamento, da exploração e da manutenção da nova travessia sobre o Tejo em Lisboa, bem como da exploração e manutenção da actual travessia, e atribui ao consórcio Lusoponte a respectiva concessão (PCP) (ratificação n º 122/VI (PCP)
O Relatório e a Conta da Assembleia da República respeitantes ao exercício de 1993 e o l º Orçamento Suplementar para 1994 foram aprovados, bem como, na generalidade, na especialidade e em votação final global, a proposta de lei n º 109/VI - Alteração à Lei n º 75/93, de 20 de Dezembro (Orçamento do Estado para 1994)
O Sr Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 35 minutos

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O Sr Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 35 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Adão José Fonseca Silva.
Adérito Manuel Soares Campos.
Adriano da Silva Pinto.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Alípio Barrosa Pereira Dias.
Álvaro José Martins Viegas.
Américo de Sequeira.
Anabela Honório Matias.
António Augusto Fidalgo.
António Costa de Albuquerque de Sousa Lara.
António da Silva Bacelar.
António de Carvalho Martins.
António Esteves Morgado.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Caeiro da Moita Veiga.
António Manuel Fernandes Alves.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Alberto Lopes Pereira.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Filipe Pereira de Oliveira.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel de Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel de Valleré Pinheiro de Oliveira.
Cecília Pita Catarino.
Cipriano Rodrigues Martins.
Delmar Ramiro Palas.
Domingos Duarte Lima.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva.
Ema Maria Pereira Leite Lóia Paulista.
Fernando Carlos Branco Marques de Andrade.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando Santos Pereira.
Filipe Manuel da Silva Abreu.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco João Bernardino da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Jaime Gomes Milhomens.
João Álvaro Poças Santos.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João José da Silva Maçãs.
João José Pedreira de Matos.
Joaquim Cardoso Martins.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Maria Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Avelino Braga de Macedo.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Angelo Ferreira Correia.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José de Almeida Cesário.
José de Oliveira Costa.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leite Machado.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Borregana Meireles.
José Manuel da Silva Costa.
José Manuel Nunes Liberato.
José Mário de Lemos Damião.
José Mendes Bota.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Albino Casimira de Almeida.
Manuel Antero da Cunha Pinto.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel da Silva Azevedo.
Manuel de Lima Amorim.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Simões Rodrigues Marques.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues.
Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira.
Maria Helena Falcão Ramos Ferreira.
Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia.
Maria Luísa Lourenço Ferreira
Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa.
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Melchior Ribeiro Pereira Moreira.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Alberto Bernardes Costa.
Alberto da Silva Cardoso.
Alberto de Sousa Martins.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Ana Maria Dias Bettencourt.
Aníbal Coelho da Costa.
António Alves Marques Júnior.

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António de Almeida Santos.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes da Silva Braga.
António José Borram Crisóstomo Teixeira.
António José Martins Seguro.
António Luís Santos da Costa.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Armando António Martins Vara.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Manuel Luís.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa.
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins.
Gustavo Rodrigues Pimenta.
Jaime José Matos da Gama.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Maria de Lemos de Menezes Ferreira.
João Paulo de Abreu Correia Alves.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Dias da Silva Pinto.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa.
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho.
José António Martins Goulart.
José Eduardo Vera Cruz Jardim.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
José Manuel Santos de Magalhães.

osé Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Leonor Coutinho Pereira dos Santos.
Luís Filipe Marques Amado.
Luís Manuel Capoulas Santos.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio.
Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes.
Nuno Augusto Dias Filipe.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rosa Mana da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui António Ferreira da Cunha.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP).

António Manuel dos Santos Murteira.
João António Gonçalves do Amaral.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Luís Carlos Martins Peixoto.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Octávio Augusto Teixeira.
Paulo Jorge de Agostinho Trindade
Paulo Manuel da Silva Gonçalves Rodrigues.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Adriano José Alves Moreira.
Manuel Tomas Cortez Rodrigues Queiró.
Maria da Conceição Seixas de Almeida.
Narana Sinai Coissoró.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

André Valente Martins
Isabel Maria de Almeida e Castro.

Deputados independentes:

Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Manuel Sérgio Vieira e Cunha.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (João Salgado)- Sr Presidente e Srs. Deputados, deu entrada na Mesa e foi admitido o projecto de lei n.º 457/VI - Amplia o conceito de união de facto e regulamenta o acesso às prestações da segurança social por parte de casais em união de facto (PCP), que baixou às 1.ª e 9.ª Comissões.
Gostaria ainda de informar a Câmara de que, neste momento, está reunida a Comissão de Agricultura e Mar, e de que a Comissão de Petições reúne às 16 horas e 30 minutos, a Comissão de Economia, Finanças e Plano, às 17 horas e 30 minutos, e a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, às 18 horas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de entrarmos no período da ordem do dia, quero informar a Câmara de que se encontram a assistir à sessão numerosos autarcas do concelho de Águeda, que cumprimento efusivamente e para os quais peço a vossa saudação.

Aplausos gerais, de pé.

Srs. Deputados, o tema da ordem do dia de hoje é, como sabem, um debate convocado pelo Presidente da Assembleia da República, ao abrigo do n.º 2 do artigo 76.º do Regimento, sobre o sistema de informação em democracia.
Nos termos regimentais, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva, que dispõe de 10 minutos para apresentar a síntese do relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs Deputados Iniciamos nesta sessão legislativa um conjunto de debates sobre questões de relevância nacional. De harmonia com o Regimento, cabe à Comissão Parlamentar competente elaborar um relatório prévio sobre a temática trazida a debate ao Plenário da Assembleia da República.
Infelizmente, houve um curto espaço de tempo entre o agendamento e o conhecimento da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, no sentido de ter de elaborar este relatório Como tem acontecido em várias ocasiões semelhantes, chamei a mim a sua elaboração, mas quero deixar aqui claro que me parece de toda a conveniência que estes relatórios sejam elaborados de uma forma alargada, designadamente pelas subcomissões respectivas. Assim, tanto mais que estão previstos debates próximos sobre matérias que têm a ver com a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, gostaria que se procurasse acertar entre a conferência dos

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representantes dos grupos parlamentares e a Comissão a possibilidade de se fazer essa elaboração alargada.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - De qualquer forma, o relatório refere as causas próximas deste agendamento e da sugestão deste debate, que foi aqui trazido pelo Sr. Deputado Jaime Gama e que foi aceite pelo Governo, na pessoa do Sr. Ministro Adjunto e da Presidência, tendo sido, depois, confirmada em conferencia dos representantes dos grupos parlamentares esta vontade alargada e consensualizada de se fazer no Plenário da Assembleia um debate sobre o sistema de informação em democracia
Parece que ninguém de bom senso põe em causa a necessidade de, para defesa da própria democracia, existirem serviços de informações e a questão que se coloca - e que tem suscitado alguma polémica - tem a ver com a garantia de se conseguirem manter estruturados os serviços de informações com um mínimo de eficiência. Essa eficiência, pela natureza desses serviços, impõe alguma reserva no seu funcionamento, ou seja, tratando-se embora de um serviço integrado na Administração, por razões da sua própria finalidade, este não pode estar sujeito à fiscalização comum parlamentar plena a que a Administração Pública em geral é sujeita.

Vozes do PSD : - Muito bem!

O Orador: - Consequentemente, é necessário encontrar formas que procurem conciliar uma fiscalização parlamentar mínima - ou outra -, que garanta que os serviços prosseguem a sua finalidade maior, a de garantirem a segurança e a independência nacionais, sem utilizarem perversamente as informações e o estatuto que, em última análise, têm em termos de poderem pôr em causa os direitos fundamentais dos cidadãos, designadamente o direito à sua privacidade e intimidade, seja em que circunstância ou em que momento for.
Depois de, na sequência do 25 de Abril, terem deixado de haver serviços de informações, salvo no âmbito militar, a própria Assembleia da República deu conta da necessidade de os estruturar e garantir a sua fiscalização democrática no quadro que atrás referi. E, assim, com largo consenso, foi aprovada uma lei que criou um Conselho de Fiscalização dos serviços de informações, que funcionou durante cerca de oito anos No relatório dou conta de que este Conselho, durante os oito anos da sua existência, apresentou relatórios à Assembleia da República, que foram apreciados na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e debatidos em Plenário. Recebíamos, na Comissão, os membros desse Conselho, que, como se sabe, são designados por uma maioria de dois terços dos Deputados da Assembleia da República, e os seus relatórios foram sempre aprovados por unanimidade.
Não obstante ter-nos sido sempre facultado o acesso a todos os dossiers e elementos de que necessitámos, devo dizer que por parte dos próprios serviços e dos membros do Governo por estes responsáveis nunca foram detectadas situações atentatórias de direitos fundamentais dos cidadãos o mesmo se diga de um outro órgão fiscalizador, também criado pela mesma lei - a Comissão de Fiscalização dos Dados Informáticos -, que integra três magistrados do Ministério Público, isentamente designados pela Procuradoria-Geral da República. Este órgão tem também referido que nada se tem registado no funcionamento dos serviços de informações que atente contra os direitos dos cidadãos e, designadamente, que, por parte dos cidadãos, não têm sido presentes quaisquer queixas que possam levantar dúvidas quanto a esse aspecto. Mas a verdade e que também está registado neste relatório que se levantaram alguns problemas relativamente aos serviços de informações na Região Autónoma da Madeira, o que foi objecto de uma intervenção particular do Conselho de Fiscalização, que deu conta de uma actuação um pouco exorbitante das competências legais desses serviços, fornecendo e enviando para os serviços centrais informações que exorbitavam das competências dos serviços de informação, mas também dando conta de que essas informações não eram tratadas, nem canalizadas para o Governo para qualquer efeito.
No relatório e dada também a informação das iniciativas parlamentares que têm havido nesta matéria e do seu destino, designadamente algumas iniciativas legislativas- a mais arrojada, a da UDP, que propõe a extinção, pura e simples, dos serviços de informações -, bem como das pendências que, neste momento, temos na Assembleia, designadamente os inquéritos, pedidos pelo PCP e pelo PS. e o veto do Sr. Presidente da República à proposta de lei do Governo, que altera - do meu ponto de vista, reforça ou, pelo menos, clarifica - as competências do Conselho de Fiscalização.
É feito também neste relatório - não o vou aqui adiantar pormenorizadamente - um quadro comparativo, em termos de Direito Comparado, de uma questão, que, no fundo, é a que mais preocupa esta Assembleia e que estará eventualmente na base deste debate, ou seja, a das várias formas de fiscalização, que são sempre colocadas no âmbito que há pouco referi de reconhecer, à partida, que esse serviço não pode estar sujeito à fiscalização comum, como o está qualquer outro serviço da Administração Pública, o que, nalguns casos, em países com tradições democráticas como é o caso do Reino Unido, vai ao ponto de não haver sequer fiscalização parlamentar.
De qualquer forma, este é um debate que a todos nós interessa, de uma matéria que tem melindres, mas que tem também a importância de Estado que tem e pensamos que a reflexão que a Assembleia hoje vai fazer permitirá esse aprofundamento.
É também referido no relatório um parecer da Procuradoria-Geral da República, emitido a requerimento apresentado pelo Sr. Deputado José Magalhães, para apurar das competências dos serviços de informações no tocante a actuações de entidades ou associações civis - penso que motivado por algumas notícias de que o SIS estaria presente, designadamente, em manifestações estudantis ou outras Do meu ponto de vista, essa situação ficou clarificada num parecer extremamente bem fundamentado e muito bem produzido pela Procuradoria-Geral da República. Isto significa que as instituições não têm estado alheias a esta questão, que os órgãos competentes têm assumido as suas responsabilidades e, designadamente, o facto de a Assembleia, através de um Deputado seu, ter suscitado esta questão à Procuradoria-Geral da República e de esta ter emitido esse parecer enriquecedor desta matéria é clarificador e , com certeza, nesta linha de preocupações que a todos nos anima que a Assembleia vai fazer - estou certo de que com a elevação que o tema merece e exige- este debate hoje aqui agendado

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr Presidente: - Srs Deputados, nos termos acertados na conferência dos representantes dos grupos parla-

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mentares, usará da palavra o Governo, por intermédio do Sr. Ministro da Defesa.
Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr Ministro da Defesa (Fernando Nogueira): - Sr Presidente, Srs Deputados: A grande superioridade moral e política da democracia reside no tacto de ela permitir que o confronto de interesses, convicções e ideologias se opere construtivamente, através de mecanismos preestabelecidos, de regras previamente aceites e de instrumentos de legitimação do processo decisório que a todos responsabiliza e vincula
Uma dessas regras, que integra o núcleo essencial do processo democrático, é a de que, em caso de ausência de consenso unânime, a vontade que deve prevalecer ë a da maioria, desde que esta esteja legitimada pelo voto e possa ser questionada livremente no prazo previamente fixado, de novo e sempre através do voto

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Obviamente que o processo decisório da maioria não dispensa a livre expressão de opinião da minoria, como não dispensa ainda a lógica argumentativa e o esforço de diálogo e de persuasão junto daqueles que dele eventualmente discordem. Porém, em caso de subsistência do diferendo de opinião ou de convicções, o apelo ao consenso há-de ser entendido como um instrumento de discurso e não de acção, como uma obrigação de meios e não de resultados, porque a ausência de consenso não pode significar inacção ou paralisia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A democracia, pela razão da sua própria existência, não pode ser sinónimo de inoperacionalidade, e inactividade e, ainda menos, pode ser acção imposta ou ditada pela minoria contra a convicção da maioria.

Aplausos do PSD.

Há, por isso mesmo, em democracia, princípios e regras balizadoras da discussão, que não podem e não devem ser violados, sob pena de a «polifonia» da verdade - de que fala Edgar Morin - dar lugar à cacofonia da confusão, da mistificação e da retórica inconsequente e imobilizadora.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O debate que hoje vai ter lugar deve ser, por isso mesmo, um exercício conseguido de prática comunicacional democrática e, resulte dele o que resultar, em termos de manutenção, alterações ou modificações das posições de partida de cada um e de todos os intervenientes, este debate só tem sentido se conduzir, no momento próprio, a uma decisão tomada no escrupuloso respeito da regra democrática, que a regra da maioria constitui.
Os inimigos dos regimes democráticos sabem bem que a desagregação política que fomentam, a instabilidade que acicatam e a subversão que subtilmente preparam só são eficazes se conduzirem à inibição de decidir, à anomia do Estado e ao desgaste da sua autoridade.
A matéria que hoje aqui nos traz é justamente uma das mais relevantes do Estado e tanto assim é que o artigo 9º da Constituição ao definir as tarefas fundamentais do Estado apresenta na sua alínea a), como primeira dessas tarefas «garantir a independência nacional e criar condições políticas, económicas, sociais e culturais que a promovam»
Ora, Srs Deputados, os serviços de informações mais não são do que instrumentos de defesa e de prevenção dessa tarefa fundamental do Estado de garante da independência nacional Não são, pois, entidades reaccionárias e retrógradas, agarradas ao passado, antes são organismos legítimos e necessários à vida saudável da colectividade nacional. Tão legítimos como quaisquer outros previstos na Constituição ou nas leis - como os tribunais, as forças de segurança ou os órgãos que os fiscalizam.
Por isso, e muito embora tenhamos de mostrar compreensão para com aqueles que não superaram ainda traumas de um passado distante que nada tem a ver com o presente, somos compelidos a não desproteger todos os outros. Os receios daqueles não fazem hoje sentido; o perigo que os amedronta é, pura e simplesmente, inexistente.
Os direitos e liberdades individuais, antes de serem valores políticos, são valores civilizacionais, valores de uma civilização que se preocupa com cada um de nós e a todos dá lugar na organização da sociedade. Por isso não admira que os direitos e liberdades de uns tenham de ser, à luz desta cultura civilizacional, permanentemente conciliados com os direitos e liberdades dos outros.
Vejamos o que a tal respeito diz a Convenção Europeia dos Direitos do Homem, aprovada por ratificação, entre nós, pela Lei n.º 65/78, de 13 de Outubro. No seu artigo 1.º, n.º 1, diz-se expressamente «qualquer pessoa tem direito ao respeito da sua vida privada e familiar, do seu domicílio e da sua correspondência». Só que o n.º 2 do mesmo artigo acrescenta «não pode haver ingerência de autoridade pública no exercício deste direito senão quando esta ingerência estiver prevista na lei e constituir uma providência que numa sociedade democrática seja necessária para segurança nacional, para a segurança pública, para o bem-estar económico do País, a defesa da ordem e a prevenção das infracções penais, a protecção da saúde ou da moral, ou a protecção dos direitos e das liberdades de terceiros»

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Isto é, os Estados têm o dever de respeitar os direitos e liberdades individuais, mas têm ao mesmo tempo o dever, de igual valia e responsabilidade, de garantir a segurança nacional, a segurança pública ou a defesa da ordem democrática.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A única postura correcta nesta matéria não pode ser a de sacrificar um dever ao outro, mas antes a de procurar em cada ponto e momento a maior harmonia possível entre ambos os deveres.
Como eu próprio afirmei nesta Assembleia durante o debate da proposta de lei n º 105/VI, a Lei n.º 30/84, que se pretendia rever, e uma boa lei, que justamente soube encontrar um sistema de informações da República onde a ponderação de equilíbrios e a salvaguarda dos interesses do Estado e dos cidadãos foi realizada com conta, peso e medida.

Aplausos do PSD.

A iniciativa do Governo, esclareça-se, não visava senão, por razões então profusamente apresentadas, fundir num só dois dos três serviços existentes, justamente os dois

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serviços relativos à segurança externa, mantendo-se assim uma correcta separação entre a componente de segurança interna e externa. Tal proposta, como se recordarão, não contemplava pois, ab initio, qualquer alteração ao sistema de fiscalização. Pelo contrário, considerava-se então e continua a considerar-se hoje, o modelo inicialmente definido como adequado para tutelar do melhor modo todos os interesses em jogo
Sr. Presidente, Srs. Deputados: As «auto-estradas da comunicação» planetária e, confluindo para elas, os «itinerários principais» da comunicação das grandes alianças militares e de defesa, económicas e políticas tornam inevitável a integração e partilha da informação. Não há em matéria de informação e de segurança, nos dias de hoje, compartimentos estanques ou «portas blindadas» entre os Estados que partilham os mesmos valores e que têm as mesmas preocupações. Integração e partilha de informação, que são tanto mais indispensáveis quanto são essenciais os valores que visam acautelar. Ora, no caso português e europeu trata-se de acautelar e preservar um património histórico e civilizacional, onde os valores da paz, da soberania, da vivência democrática e da tolerância pontificam.
Portugal, porque comunga de tais valores contribui com informação relevante para tais «sistemas de comunicação» e recebe deles, em regime de reciprocidade, informação que por eles nos é disponibilizada. O prestígio e a respeitabilidade que condignamente adquirimos não podem ser dissipados em actos de pueril irresponsabilidade política quanto às questões do Estado e dos Estados.

Aplausos do PSD.

Essa não é - decididamente o afirmo - a postura do Estado e do Governo português Essa não pode ser, em verdade, a postura de uma oposição responsável. Infelizmente, Srs Deputados, não estou seguro de poder afirmar em todas as circunstâncias ser essa a postura de alguma oposição, agora como no passado.
Só que mais grave e inconsequente do que a atitude que atrás denunciei é a atitude daqueles outros que, em matéria de segurança e defesa do Estado, têm dois pesos e duas medidas" uma, calibrada, responsável, susceptível de aferição internacional quando estão no Governo; outra, com o ferrete da contrafacção, desnorteadamente ligeira e para consumo eleitoralista doméstico quando são oposição.

Aplausos do PSD

São leviandades políticas de - muito mau gosto - aqui e além produtoras de efeitos imediatos- que a sageza e a prudência secular dos povos costumam castigar severamente. Os que hoje afirmam que o Sistema de Informações da República tem entorses de diversa índole são alguns dos mesmos que em 1984 - eles, sim, os principais obreiros do sistema que agora verberam - se manifestaram firmes, muito firmes - e a meu ver bem - face aos apelos levianos da oposição, sobretudo o Partido Comunista, que na altura reclamava, como agora, contra a concepção e os fundamentos do sistema
Srs. Deputados, aqueles que hoje se autoproclamam «notários da democracia», afinal parecem ter dois pesos e duas medidas para a aferição da democracia consoante estão no poder ou na oposição.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Como pode alguém confiar em quem diz hoje, despudoradamente, ser perverso aquilo que ontem foi por si erigido e apontado como solução fidedigna? Como pode alguém, sem perda de credibilidade e em matéria de raro alcance estratégico, desdizer hoje o que então afirmou, recriminar hoje o que ontem intransigentemente defendeu? Que garantias, Srs. Deputados, pode ter o povo português em atitudes destas, em procedimentos destes, em políticos destes?

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente e Srs. Deputados, para combater as ameaças dos dias de hoje. quer externas quer internas, é cada vez mais necessária a cooperação interestadual em matéria de informações. Por isso a garantia de sigilo e a confidencialidade dos diferentes serviços interessam não apenas a cada Estado de per si mas a todos os Estados. Um serviço que não saiba preservar a informação e que não tenha condições de funcionamento que a assegurem é naturalmente marginalizado por todos os outros, já que a excessiva abertura de uns pode prejudicar a eficácia de todos.
É preciso que ganhemos de uma vez por todas consciência de que um serviço de informações, nos tempos que correm, não produz trabalho útil para o País que serve se não merecer o crédito dos serviços congéneres de países amigos e aliados. Por isso, os padrões do seu funcionamento hão-de ser de tal natureza que nos inspirem confiança a nós, mas também aos outros, porque desses padrões também resultará a maior ou menor vulnerabilidade de muita da informação produzida por esses outros.
Esquecer ou menosprezar esta realidade pode constituir um exercício e uma tentação de retórica fácil, mas não é, seguramente, um bom serviço prestado ao País. E, quer se queira quer não é do País que estamos a falar; é do prestígio das suas instituições que estamos a tratar; é da credibilidade e da eficácia da sua acção que estamos a cuidar e zelar.
Srs. Deputados, quando em 1984 foi institucionalizado, com a Lei n.º 30/84, o Serviço de Informações da República Portuguesa tinha-se acabado de dar um passo decisivo, corajoso - podemos até dizer histórico - no sentido de dotar o País de uma arquitectura normativa que lhe permitisse e permita fazer face às ameaças externas e internas à soberania e segurança nacionais Volvida uma década sobre o fervor da Revolução dava-se um passo firme em torno da institucionalização e sedimentação do regime democrático, afastando complexos, exorcizando fantasmas
A Lei n.º 30/84 constitui - dizemo-lo frontalmente e com total sentido de responsabilidade - um precioso contributo para a prossecução das tarefas mais indeclináveis que ao Estado cumpre prosseguir' manter a ordem e a segurança públicas; garantir a tranquilidade dos cidadãos; não permitir a subversão das instituições democraticamente legitimadas; dar consistência prática ao conceito da soberania nacional. Só que na prossecução de tais desideratos nenhuma prova concludente se fez de que o número «mágico» de três serviços tivesse virtualidades superiores a um sistema baseado em dois serviços, um vocacionado para a garantia da segurança interna e o outro com preocupações precípuas em questões de segurança externa.
O Direito Comparado, Srs Deputados, demonstra mesmo que os países europeus com dimensões e preocupações próximas das nossas não têm mais do que dois serviços. E países tão responsáveis e respeitáveis como o Canadá, a Espanha, o Luxemburgo ou a Suíça possuem um único serviço Questões de operacionalidade e de racionalidade tornam sensato aos olhos de quem se proponha analisar o

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assunto de modo sério e descomprometido que não se diversifique onde é possível e útil concentrar, que não se esbanje onde é possível racionalizar, que não se particularize onde só o global faz sentido.
Srs. Deputados, como já noutra altura tivemos oportunidade de afirmar, a filosofia política que perfilhamos e a praxis política que procuramos prosseguir com todas as nossas forças aconselham a que também aqui tenha lugar a divisa «Menos Estado, melhor Estado».

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Foi, no fim de contas, uma razão de coerência no pensamento e na acção aquela que, em convicção ética e política, nos impeliu a propor a esta Assembleia a redução de três para dois serviços. Ao fazê-lo, tínhamos e continuamos a ter bem presente uma distinção fundamental, norteadora do nosso rumo, a distinção entre «ética política» e «técnica política». Nós acreditamos que mesmo em política há realidades que só podem ser fins (questão de ética política) e que nunca podem, não podem em nenhuma circunstância ser instrumentalizadas ao serviço de tácticas ou estratégias do momento (questão de técnica política).

Sr. Presidente, Srs Deputados: Os estafados argumentos da «governamentalização» também não convencem ninguém - julgo que nem sequer os que os utilizam. Eles sabem que tais «argumentos» não são sequer dignos de tal nome; são, isso sim, puro terrorismo conceituai; assentam, isso sim, numa despudorada tentativa de confundir tudo e todos, de fazer apelo à irracionalidade quando e porque as pseudo-razões a ninguém convencem.
Na verdade, de quem derivam e de quem dependem os serviços de informações senão do Governo? Não devem eles depender do Governo? E dentro do Governo de quem, senão do Chefe do Governo, haveriam tais serviços de depender, em última instância? E acaso não é assim já hoje? O que significa a actual Lei n.º 30/84 dizer, no seu artigo 14.º, que os serviços de informações têm a natureza de serviços públicos? Qual o alcance pretendido pelo legislador ao estabelecer, na alínea c) do artigo 17.º da Lei que está em vigor, que compete ao
Primeiro-Ministro «coordenar e orientar a acção dos ministros directamente responsáveis pelos vários serviços de informações»?
Ou será, Srs. Deputados, que para uma certa oposição isso só deve ser assim se for da sua confiança ou da sua cor política o Primeiro-Ministro?

Aplausos do PSD.

Srs. Deputados, quem desconfia, gratuita e sistematicamente, dos outros, raramente ou nunca é digno de confiança!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Acaso pretende uma certa oposição transferir o poder executivo para o Parlamento, apeando o Governo das competências que constitucionalmente lhe estão cometidas nos artigos 200.º a 204.º da Constituição e que a própria Convenção Europeia dos Direitos do Homem consigna?
Ou, mais grave do que isso, pretende alguma oposição semear os germens da anomia do Estado a que atrás aludimos, abrindo assim as portas à violência e à insegurança que minam os alicerces do próprio Estado e tornam intolerável a vida em sociedade? Se não é assim, Srs. Deputados, às vezes parece que é!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também quanto ao argumento da deficiente fiscalização, a consistência das razões de quem, reiteradamente e de modo premeditado, semeia o boato, a insídia e a intriga é de nulo valor probatório e reveladora ou de uma falta de verticalidade e de ética política deploráveis, ou de uma posição estaticamente fossilizada que nem os novos ventos de Leste, que entretanto percorrem o globo, são capazes de suavizar.
O sistema de fiscalização consagrado pela Lei n.º 30/84 - que a proposta de lei apresentada pelo Governo à Assembleia da República preservava intangível - é, Srs Deputados, no contexto europeu, dos mais rigorosos e completos para não dizer o mais rigoroso e completo que a análise dos textos legais de Direito Comparado revela.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É uma fiscalização que começa, desde logo, na Assembleia da República, quer enquanto órgão de soberania, no exercício das suas competências - o que é certo é que estamos a discutir aqui o Sistema de Informações da República Portuguesa -, quer através do Conselho de Fiscalização eleito por esta mesma Assembleia da República; e uma fiscalização que é exercida depois pelo Governo, detentor legítimo do poder executivo, enquanto órgão de soberania
que é.
Com efeito, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Governo é também um órgão de soberania, aquele a cuja actuação e competências se fica a dever a garantia e salvaguarda daquilo que o povo português considera essencial - a paz, a liberdade e a tranquilidade - e que alguns outros pretendem destruir
Ora, ao Governo cabe, através do Conselho de Ministros, nos termos da Constituição da República Portuguesa, definir as linhas gerais da política governamental, bem como as da sua execução. Cumpre igualmente ao Governo, no exercício das suas funções administrativas- ouçam bem, Srs. Deputados -, «a defesa da legalidade democrática» [artigo 202.º, alínea f) da Constituição]
Ora, os portugueses sabem que o Governo não abdica das suas responsabilidades. nem enjeita a assunção dos ónus que tais responsabilidades implicam O Governo sabe bem que a defesa da segurança nacional e a ordem são, aqui como em qualquer parle do Mundo democrático, valores que alguns tendem levianamente a subestimar e, por vezes, demagogicamente a ridicularizar Só que em matéria de defesa do Estado, em assuntos de segurança e de soberania, a tibieza ou os compromissos do momento tem um nome (irresponsabilidade) e os seus fautores um atributo que nunca ninguém poderá aplicar-nos (irresponsáveis).

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Nós exigimos dos nossos serviços escrupulosa observância da legalidade estabelecida e não lemos hesitações nem contemplações com comportamentos ou actuações que se situem fora deste âmbito Exercemos, neste sentido, uma rigorosa fiscalização e responsabilização dos serviços, na pessoa das chefias e dos agentes Mas tal fiscalização aos serviços de informações faz-se ainda, no âmbito governamental, através do Conselho Superior de Informações- órgão interministerial de consulta e coordenação em matéria de informações e de composição alargada.
Acresce que, a par da Assembleia da República e do Governo, a fiscalização dos serviços de informações é uma fiscalização em que intervém as próprias magistraturas ju-

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dicia! e do Ministério Público. Com efeito, a Comissão de Dados é integrada em exclusivo por magistrados do Ministério Público e, facto singular na Europa e julgo que no Mundo, o dirigente do terrível papão a que a oposição se refere (o Serviço de Informações de Segurança) é hoje, ele próprio, magistrado do Ministério Público.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É a prova provada de que o Governo quer transparência máxima de procedimentos, exige rigor de actuação e não condescende com atitudes de menor escrúpulo perante a lei. E tudo isto, Srs. Deputados, para já não mencionar que ao Ministério Público, enquanto defensor da legalidade e promotor da acção penal, caberá sempre - como na verdade cabe - indagar acerca de quaisquer comportamentos menos claros, recolher indícios da prática de actos criminosos e denunciar, pelos meios e na sede própria, os seus fautores.
Sendo tantos, Srs Deputados, e tão influentes os órgãos (legislativo, executivo e judicial) a quem cabe a fiscalização dos serviços de segurança é urgente perguntar: que «conspiração do silêncio» é essa em que se afirma irresponsavelmente que os serviços estão sem controlo e sem qualquer fiscalização? Que mais garantias de fiscalização dos serviços de informações pode o Estado colocar à disposição das suas populações?
Ou será que o problema - o alegado problema - da fiscalização não é um problema jurídico-político, isto é, atinente à estrutura jurídico-política do Estado, mas antes um problema de intenções ou um simples processo de intenções políticas?
A este propósito direi que à quota-parte de fiscalização, parcelar como se viu, que de momento está por realizar, se pode assacar o velho brocardo latino sibi imputat. Não irei adjectivar ou lamentar as atitudes de quem entendeu demitir-se, apenas adiantarei que mal iríamos todos se a Assembleia da República aceitasse alterar, contra a sua convicção, leis estruturantes de órgãos vitais para o Estado, quando confrontada com a prática de factos consumados por parte de quem não tem autoridade nem legitimidade democráticas para elaborar, votar e aprovar tais leis.

Aplausos do PSD.

Porque, Srs. Deputados, a legitimidade democrática para fazer leis, como aquela a que nos estamos a referir, é um direito irrenunciável de quem tem a autoridade soberana para o fazer: justamente esta Assembleia, a Assembleia da República. Estou certo de que os Srs. Deputados e esta Câmara não abdicarão de exercer essa autoridade, porque assim, e só assim, se estará a cumprir a democracia.

Aplausos do PSD, de pé

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro da Defesa Nacional, os Srs. Deputados Manuel Sérgio, João Corregedor da Fonseca, Isabel Castro, João Amaral e Jorge Lacão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Sérgio.

O Sr. Manoel Sérgio (Indep.): - Sr. Presidente, Sr. Ministro As minhas respeitosas saudações a V. Ex.ª e aos Srs. Ministros que o acompanham.
Levanto agora, com a rapidez que me é exigida, quatro questões. Primeira: que garantias há de que as fichas individuais dos cidadãos não são gratuitamente devassadas e, pior, utilizadas?

O Sr Narana Coissoró (CDS-PP) - Não há nenhuma!

O Orador: - Não me refiro à Comissão de Fiscalização mas às garantias intrínsecas ao próprio sistema.
Segunda questão multiplicam-se os indícios técnicos, pelo menos aparentes, de escutas telefónicas Que garantias pode o Governo dar de que se não está a tentacularizar, de forma ubíqua e obsidiante, um Estado policial que é a manifestação técnica de um Estado virtualmente totalitário?
Terceira questão, gostava de obter do Governo informação nítida acerca dos processos de recrutamento dos elementos do SIS, o perfil dos candidatos, os métodos de inserção, mentalização e as técnicas de formação.
Quarta questão qual o padrão do procedimento diário do elemento pertencente ao SIS? Parece-me importante esta informação pois dela poderá inferir-se muito dos métodos normalmente- sublinho, normalmente - utilizados.
Era isto que, com a rapidez que me e exigida, desejava perguntar-lhe

O Sr. Presidente: - Sr Ministro, havendo mais oradores inscritos para pedidos de esclarecimento, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: - No fim de dois ou três Srs Deputados, Sr. Presidente.

O Sr Presidente: - Então, tem a palavra o Sr Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Sr. Presidente, Sr. Ministro: Realmente este é um debate importante sobre um tema que, como V. Ex.ª disse, é claramente polémico.
Como V Ex.ª sabe, e declarou na sua intervenção, este Serviço é um dos instrumentos de defesa e garante da independência nacional - ate citou o artigo 9.º da Constituição -, mas é evidente, Sr. Ministro, que mal seria que um serviço qualquer, como os serviços de informações, pusesse em risco o normal funcionamento da democracia ou outra norma democrática do País. Acontece, porém, Sr. Ministro, que foram noticiados - e não desmentidas até agora cabalmente e por isso estão pendentes nesta Assembleia uma série de iniciativas legislativas - casos em que, ao que parece, os serviços de informações têm ultrapassado as suas funções, o seu estatuto, procedendo, nomeadamente, a fiscalizações sobre trabalhadores, partidos políticos- como aconteceu na Madeira-, sobre estudantes, jornalistas, delegados sindicais, etc.
E nós recordamos o que se passou nos acontecimentos da Ponte 25 de Abril, onde esses Serviços não ficaram imunes a grandes críticas - aliás, há um parecer do Sr. Procurador-Geral da República sobre o papel que o SIS deve desenvolver no país.
De facto, há suspeições diversas sobre o funcionamento dos serviços de informações. Parece haver irregularidades e temos o problema grave de não haver uma fiscalização democrática da Assembleia da República por força de uma lei que, em vez de conceder uma fiscalização democrática parlamentar sobre os serviços de informações, põe entre a fiscalização e os Serviços o Governo, o que lhes retira autonomia.
Um Serviço destes não pode estar, Sr Ministro, ao serviço de um qualquer partido, não pode estar ao serviço de um qualquer governo, não pode estar ao serviço de

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uma qualquer opção de carácter político-partidário; até tem de, sobretudo, fiscalizar e informar sobre problemas ligados ao terrorismo, à sabotagem e à alta criminalidade.

Portanto, Sr Ministro, não há uma fiscalização! Os chefes e agentes fazem a fiscalização dos serviços, o Governo faz a fiscalização dos serviços e nós teríamos de fiscalizar melhor e com mais autonomia e não fiscalizamos.
Em relação às críticas e suspeições que inicialmente citei, nomeadamente às fiscalizações existentes sobre jornalistas, estudantes, trabalhadores, partidos políticos, o que é que V. Ex.ª tem a dizer? O Governo preocupou-se em saber, realmente, a veracidade destas situações?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, penso que a questão do sistema de informações não pode ser exclusivamente vista na óptica da defesa e da segurança mas também na da dos direitos fundamentais dos cidadãos.
Assim, a questão que lhe coloco é a seguinte: não lhe parece excessivo que o Governo se tenha feito representar por dois ministros que, no fundo, veiculam a óptica da segurança e por nenhum ministro que era suposto veicular a óptica da garantia dos direitos fundamentais do cidadãos?

Vozes do PSD: - Essa e boa!...

O Sr Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Ministro da Defesa Nacional.

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: - Sr. Presidente, Srs. Deputados" Procurarei responder rapidamente às questões que me foram colocadas, até porque o Governo pretende fazer mais uma intervenção e não gostaríamos de esgotar o tempo disponível
Relativamente ao Sr Deputado Manuel Sérgio o que posso dizer-lhe é que não há fichas individuais de quem quer que seja, o que há é um suporte magnético de dados que é completamente aberto à Comissão de Dados que é composta por três magistrados do Ministério Público. A fiscalização feita por essa Comissão é aberta, os seus membros têm acesso a todos os dados e até agora não tem havido qualquer problema
O Sr. Deputado disse que temos um Estado policial... Não vejo porquê? Temos de ter forças de segurança, serviços de informações. Se o senhor conhece algum Estado que não tenha forças de segurança e serviço de informações agradeço que enriqueça a minha cultura dizendo-me quais são, porque não conheço nenhum.
Perguntou-me também o Sr. Deputado qual era o procedimento diário de um agente do SIS. O Sr. Deputado, ele desenvolve as missões que o respectivo chefe de serviço lhe diz para desenvolver Eu não ando atrás dos agentes do SIS a ver o que e que eles fazem em cada dia!
Sr Deputado João Corregedor da Fonseca, vejo que tem lido o que vem em muitos órgãos de comunicação social e, normalmente, as afirmações que o Sr Deputado imputa aos serviços de informações resultam de comunicados de partidos ou de organizações com posições políticas que dizem que há isto e há aquilo, mas factos concretos não apresentam.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.). - E o que se passou sobre a fiscalização dos partidos políticos na Madeira?

O Orador: - Sobre essa matéria houve um inquérito que concluiu que não houve qualquer ilegalidade.

Sr. Deputado, vou ler-lhe parte de um dos relatórios do Conselho de Fiscalização que diz o seguinte «Como atrás foi referido, o Conselho teve acesso a dezenas de relatórios pedidos aleatoriamente aos serviços. De entre alguns desses relatórios alguns houve que detectaram problemas semelhantes àqueles que têm feito eco na comunicação social referimo-nos ao relatório sobre a PGA e sobre a acção dos sindicatos.
Da análise a que procedeu em relação a todos cies concluiu não haver, quanto às finalidades e aos meios usados, violação de quaisquer direitos ou liberdades constitucional ou legalmente consagradas, tendo-se os serviços, naquilo que nos foi dado observar, mantido dentro dos poderes que lhe são conferidos.»
Portanto, Sr. Deputado, esta é a resposta!

O Sr João Corregedor da Fonseca (Indep.) - Qual é a data?

O Orador: - Que importa a data, Sr. Deputado? São dados irrefutáveis e objectivos que o Sr Deputado não contestou quando esteve em discussão na Assembleia da República o relatório do Conselho de Fiscalização.
Quanto à Sr.ª Deputada Isabel Castro, devo dizer que eu, como Ministro, entendo que estou sempre municiado e tenho sempre o dever estrito de defender as garantias, os direitos e liberdades dos cidadãos, independentemente da pasta em que estiver, pois não interpreto a minha função de ministro de outra forma.

Aplausos do PSD

O Sr. Alberto Costa (PS)- Sr Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado

O Sr. Alberto Costa (PS). - Sr Presidente, na resposta que o Sr. Ministro da Defesa Nacional acabou de dar a pedidos de esclarecimento referiu que não havia fichas individuais. Ora, eu tenho conhecimento de que num processo judicial, cujas referencias tenho comigo, foram juntas 40 fichas individuais elaboradas pela DINFO.
Gostaria, pois, que este facto ficasse exarado em acta e fosse comentado pelo Sr. Ministro.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr Presidente: - Para comentar a informação dada pelo Sr. Deputado Alberto Costa, tem a palavra o Sr. Ministro da Defesa Nacional.

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: - Sr Deputado, aquilo a que se referiu é, com certeza, o caso GAL que sucedeu numa altura em que o SIS ainda não estava em funcionamento.

O Sr. José Magalhães (PS). - DINFO, DINFO!..

O Orador:- Eu sei! Mas os senhores também sabem que o SIS só começou a funcionar em 1986 e que o único serviço de informações que havia em funcionamento na altura era a DINFO. Não é verdade? Isto antes de existir o Conselho de Fiscalização, por conseguinte os procedimentos que eram utilizados na altura não existem hoje.

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De facto, hoje, os cidadãos não estão fichados nos serviços de informações. Foi isto que eu quis dizer.

O Sr José Magalhães (PS): - Quem é que está?

O Orador: - Os cidadãos comuns não estão fichados nos serviços de informações,..

O Sr. José Magalhães (PS)- - Mas quem é que está?

O Orador: - ... mas quando existe alguma investigação, naturalmente que se recolhem elementos sobre pessoas! É evidente que sim! Então, sobre o que é que se há-de recolher elementos? Sobre objectos? Sobre coisas?...
No entanto, o que interpretei das palavras do Sr. Deputado Manuel Sérgio foi que ele entendia que os 10 milhões de portugueses têm uma ficha nos serviços de informações... Ora, isso não existe, nem nada que se assemelhe; o que há são registos informáticos! Todas as informações recolhidas pelos serviços de informações são registadas magneticamente e a Comissão de Dados tem acesso a esses registos.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP) - Sr. Ministro da Defesa Nacional, o meu grupo parlamentar formulou algumas questões ao Governo, questões essas que entregámos na Mesa e que lhe devem ler sido remetidas. No entanto, relativamente à intervenção que V. Ex.ª aqui produziu, gostaria de colocar algumas questões
O Sr. Ministro referiu, a certa altura da sua intervenção, que era importante que os serviços de informações tivessem crédito junto de organizações congéneres de outros países. Ora, creio que o primeiro dever dos serviços de informações em Portugal é terem crédito junto dos portugueses e a questão central é a de que os Serviços de informações perderam completamente o crédito junto dos portugueses
Hoje, os portugueses desconfiam dos serviços de informações e tom razões de sobra para isso. No entanto, o Sr. Ministro passou ao lado de todas essas questões, isto é, passou ao lado dos casos concretos. Admito que seja importante para o Sr. Ministro estabelecer aqui algumas regras teóricas em torno dos Serviços, mas a verdade é que a grande questão hoje colocada em torno dos serviços de informações refere-se aos casos concretos de ilegalidades, de múltiplas ilegalidades, que têm sido denunciados abundantemente. Sobre esse casos, o Sr. Ministro nada disse, em absoluto.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Em minha opinião, convinha esclarecer algumas coisas, neste âmbito.
Uma das questões que, de alguma forma, estava implícita na parte inicial da intervenção do Sr. Ministro era a discussão sobre se seriam ou não necessários os serviços de informações. Pode ser interessante para o Governo trazer aqui esse ponto, mas, de facto, tal não constitui matéria deste debate. De qualquer modo, se o Sr Ministro o traz aqui, pergunto-lhe, como e possível que o Governo tenha, ao longo de todos estes anos, deixado sem cobertura, sem acção, sem informações, uma área tão importante como a das informações estratégicas de defesa, em relação às quais não criou o serviço especializado que a lei-quadro previa, o serviço de informações estratégicas de defesa? Sc para a defesa dos interesses nacionais esse é um ponto fundamental, como deixou precisamente essa área a descoberto durante longo tempo e só há pouco, e de modo ilegal, a foi entregar aos Serviços de informações Militares?

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Ministro referiu-se depois à questão da governamentalização. Creio que a acusação feita não é a de que os serviços dependem do Governo, porque eles dependem efectivamente do Governo e isso é o que consta da lei, mas, sim, a de que. através dessa dependência, o Governo os tem colocado ao serviço do partido, ao serviço do PSD e dos seus interesses É essa a questão central!

Vozes do PCP: - Exactamente!

Protestos do PSD.

O Orador: - Sr Ministro, no que respeita à questão da fiscalização, o Conselho de Fiscalização pode ter escrito muitas coisas, mas tudo o que escreveu foi por ouvir dizer e por «ouvir dizer» precisamente aos serviços e ao Ministro que o tutela! Isto é. o Conselho de Fiscalização nunca teve acesso directo às informações e ao trabalho dos serviços de informações Nesse quadro, o trabalho de fiscalização feito pelo Conselho não passa de um relatório elaborado sobre o que os próprios Serviços relatam. O Sr. Ministro acha isto suficiente!
Considera que é isto uma fiscalização democrática e eficaz?
Esclareçamos agora a questão da fiscalização pelo Ministério Público. Sr Ministro, existe um Conselho de Fiscalização de Dados que se refere à informática e a nada mais do que isso!

Sr Presidente: - Sr. Deputado, queira terminar.

O Orador: - Termino já, Sr Presidente

Aliás, a invocação da qualidade de delegado do Ministério Público por parte do actual Director do SIS, para justificar as suas condutas, nomeadamente a sua eventual isenção partidária, como fez, é tão ridícula que serviria para dizer, por exemplo, que um ministro do Governo a que pertence e que é, conhecida e consabidamente, de origem, delegado do Ministério Público, só por esse facto não era do PSD Ele é do PSD, Sr Ministro! Ele é do PSD, mas no quadro concreto não está no exercício das funções de delegado do Ministério Público. Ele é, isso sim, um agente da Administração Pública subordinado ao Ministro da Administração Interna

O Sr. Octávio Teixeira (PCP). - Muito bem!

O Orador: - Finalmente, gostaria de abordar a questão da fiscalização pela Assembleia Acha o Sr. Ministro que há fiscalização pela Assembleia? Então, por que foram recusados os inquéritos parlamentares propostos, nomeadamente o proposto pelo PCP há mais de um ano? Isto não é, inviabilizar, na prática, aquilo que era essencial, isto é, a fiscalização pela Assembleia da República? No entanto, se acha que a fiscalização pela Assembleia iria violar os segredos que cabem ao serviço de informações, faço-lhe um desafio: porque não aceita que a Procuradoria-Geral da República faça, extraordinariamente, um inquérito à totalidade dos serviços, a todo o seu tipo de actuações, por forma a esclarecer-se, de vez, quais são as ilegalidades cometidas

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e, outra coisa muito importante e fundamental, quem são os responsáveis por essas ilegalidades?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr Jorge Lacão (PS) - Sr Presidente, o Sr Ministro da Defesa Nacional fez aqui um discurso que eu qualificaria como de pendor burocrático e razoavelmente
empastelado, para, no essencial, apenas pretender dizer que as preocupações de Estado estariam do lado do Governo e que de outros lados, designadamente do lado das oposições e particularmente do Partido Socialista, estaria uma tendência para não levar com o devido alcance e responsabilidade um tão seno problema de Estado como o do serviços de informações
Está profundamente enganado, Sr Ministro! Porque se alguém, nesta matéria, tem gravíssimas responsabilidades de Estado é o seu Governo, do qual V. Ex.ª faz parte e no qual V. Ex.ª também responsabilidades directas.
Como é possível justificar-se que a Lei n.º 30/84, que o Sr. Ministro aqui veio reconhecer que era equilibrada, com conta, peso e medida, ao longo de mais de oito anos tenha sido sistematicamente violada e não cumprida, por parte do seu Governo? É assim que um Governo se adequa à legalidade democrática, designadamente das leis que considera equilibradas e com conta, peso e medida? Então, quem tem e quem não tem responsabilidades de Estado?
Sr. Primeiro-Ministro,..

Vozes do PS: - Ainda não!

O Orador: - Pois, ainda não!.
Sr. Ministro da Defesa Nacional, a questão é a seguinte: está hoje colocado um gravíssimo problema de crise de confiança entre os cidadãos em geral, e não os «cidadãos normais» de que V. Ex.ª falou, e o sistema de informações porque, justamente, foi o incumprimento sistemático, por parte do Governo, que conduziu a essa situação de crise. Por isso, a responsabilidade de Estado e vossa e, nesta matéria, a culpa é também exclusivamente vossa? É essa a razão pela qual lhe quero manifestar a minha apreensão, porque seria esperável que hoje, ao menos hoje, depois do veto do Sr Presidente da República, o Governo aceitasse vir a este debate, na sequência da interpelação que o PS lhe fez, para discutir as questões substantivas.
Por exemplo, por que razão quer agora o Governo vir a superar a dita lei equilibrada de que falou, de modo a ter uma nova estrutura de serviços e alargar o âmbito dos novos serviços, ou dos velhos, sem justificar verdadeiramente as razões pelas quais quer esse alargamento? .
Porque quer agora o Governo uma verdadeira concentração de tutela, de todos os serviços criados ou a criar no Primeiro-Ministro?
Porque quer o Governo confirmar um conceito de segredo de Estado de dimensão muito mais ampla do que a, prevista na lei de segredo de Estado em vigor?
Porque quer o Governo condicionar em absoluto as autorizações para depoimento ou para declarações, mesmo que elas devessem poder ser feitas, junto dos tribunais?
Porque não aceita o Governo a questão de rever as competências da fiscalização dos serviços de informações, que é nuclear para assegurar a adequação de legalidade no seu funcionamento?
O que lhe ouvimos dizer foi esta coisa surpreendente, Sr. Ministro: não tenham problemas pois os Serviços estão em devida ordem porque são fiscalizados e essa fiscalização é, sobretudo, exercida legitimamente por um Governo legítimo da República...!

Vozes do PSD: - Claro!

O Sr. Presidente: - Sr Deputado, queira terminar

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente
Esta noção, que e completamente subversiva em termos de compreensão do papel constitucional do Governo, dá-nos um esclarecimento cabal da insensibilidade que VV. Ex.ªs revelam perante um problema fundamental de direitos, liberdades e garantias, de separação de poderes e, portanto, dos fundamentos do Estado de direito

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E por isso, Sr. Ministro, que o seu discurso é claramente o discurso da oportunidade perdida Porque, designadamente, ainda em matéria de fiscalização, não foi capaz- ou não quis- de responder à seguinte questão, simples de entender' é ou não admissível que o Conselho de Fiscalização possa exercer as suas competências não condicionado por pareceres prévios da tutela sobre os Serviços?
Sr. Ministro, esta questão simples exige, da sua parte, uma resposta clara, porque sabemos que o decreto que V. Ex.ª já tem preparado para constituir o serviço de informações estratégicas e defesa militar contempla, designadamente, o seguinte, na competência do Primeiro-Ministro a de aprovar o relatório anual de actividades dos serviços a submeter ao Conselho de Fiscalização. Ou seja, há claramente o reforço de uma tutela governamental que retira a um Conselho de Fiscalização qualquer possibilidade autónoma de exercer as suas competências.
São estes, Sr. Ministro, os verdadeiros problemas dos serviços de informações e é acerca deles que o senhor não vai ao fundo das questões e. por isso, desculpe que lhe diga, revela no seu discurso que se alguém não está à altura de um problema de Estado é o seu Governo e é, designadamente, V. Ex.ª.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Ministro da Defesa Nacional.

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: - Sr. Presidente, da forma mais sucinta possível, irei responder às questões que me colocaram.
Sr. Deputado João Amaral, realmente, recebi o decálogo das questões do PCP. Parecem os Dez Mandamentos, porque têm um certo teor de religiosidade, tal é a permanência, o dogmatismo, das questões abordadas, as quais constam também de conferências de imprensa e iniciativas que o PCP tem tomado, muito ao seu jeito.
Sr. Deputado João Amaral, sabe como o estimo pessoalmente, mas admiro-me como e que os senhores têm coragem de confrontar o Governo em matéria de direitos, liberdades e garantias, acusando-o, a um Governo com uma ideologia e uma postura que não deixa dúvidas a ninguém, em relação ao apego à democracia e à liberdade.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP) - Essa agora!

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O Orador: - Como é que os senhores sentem ainda uma pretensa autoridade moral para fazerem de nós um perigo para a democracia?! É realmente espantoso!

Aplausos do PSD.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Não é pretensa!

O Orador: - Sabe porquê, Sr, Deputado? O senhor fez aí uma acusação que só não levo a peito porque, por via de regra, tenho alguma generosidade em relação às pessoas que estão, no momento, com uma certa fraqueza. O senhor acusou os serviços de informações de estarem ao serviço do PSD porque, com certeza, não quer que eu «venha à carga» com algo que é evidente e público, com o que aconteceu com o seu partido em relação a interesses nacionais e ao que fez, ou que é acusado de ter feito, segundo notícias públicas e livros publicados, quanto a interesses de Portugal. E não digo mais do que isto!...

Aplausos do PSD.

O Sr Octávio Teixeira (PCP): - Isso é mentira!

O Orador: - Os Srs. Deputados do PCP gostariam muito que vivêssemos num país de inquéritos, em que só houvesse inquéritos Agora, quer que o Procurador-Geral da República faça um inquérito sobre todos os serviços públicos! O Sr. Deputado não quer mais inquéritos mas, sim, que o País paralise, que o Estado fique inibido e desarmado; porém, não vamos consentir isso enquanto tivermos, e havemos de ter por muito tempo, a responsabilidade da direcção do Estado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado João Amaral afirmou que o Conselho de Fiscalização só tinha acesso a um relatório anual. Das duas, uma. ou estava a omitir a verdade de forma deliberada ou não leu - e é grave, para quem fala tanto e toma tantas iniciativas em matéria de serviços de informações - os relatórios do Conselho de Fiscalização da Assembleia.
Nesses relatórios, o Sr. Deputado poderia ter lido que o Conselho de Fiscalização, aleatoriamente, solicitou o envio de várias dezenas de relatórios: relatórios especiais de informações, relatórios semanais, inquéritos referentes a cidadãos candidatos ao ingresso no quadro das Comunidades, enfim, todo o tipo de relatórios preparados pelos Serviços de Informações de Segurança e Informações Militares. E teve todos esses relatórios. O Conselho de Fiscalização visitou, igualmente, os Serviços de Informações de Segurança e Informações Militares No primeiro, depois da visita a todos os serviços, realizou-se uma reunião, com todos os chefes de serviço e do respectivo director. No Serviço de Informações Militares ocorreu uma reunião com os chefes de todos os serviços e respectivo director.
Sr. Deputado, não há um membro do Conselho de Fiscalização, mesmo os que apresentaram a sua demissão por razões conhecidas e que não quero adjectivar, que lhe diga que alguma vez lhe foi recusado algum elemento pelo Governo ou pelos serviços de informações.

O Sr. Angelo Correia (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Jorge Lacão, eu talvez prefira ser pastoso a ser histriónico, teatral e demagógico, em matéria de interesses de Estado.

Aplausos do PSD.

Vou apenas lembrar-lhe o que V. Ex.ª disse na declaração de voto da Lei n.º 30/84 Disse o seguinte: «A definição das competências do Conselho de Fiscalização são, ao contrário do que se insinuou ( .)» - e isto parece um
replay, mas com outros autores e outros actores.

O Sr. Jaime Gama (PS) - Menos demagógico!

O Orador: - Citar o que o ele disse é demagogia, Sr. Deputado? São palavras do Sr Deputado Jorge Lacão!

O Sr. Jaime Gama (PS) - É menos demagógico!

O Orador: - Ah, V. Ex.ª estava a fazer-me um elogio?! Sou menos demagógico que o Sr Deputado Jorge Lacão? Muito obrigado, Sr Deputado!

Aplausos do PSD

Sabe, Sr. Deputado, eu podia pensar que era imodéstia minha, mas, depois do seu testemunho, passo a ter a certeza!
Como dizia, o que o Sr. Deputado Jorge Lacão afirmou na declaração de voto relativa à Lei n º 30/84 foi o seguinte: «A definição das competências do Conselho de Fiscalização são, ao contrário do que se insinuou, suficientes para garantir, em qualquer circunstância, um devido controlo sobre o funcionamento dos serviços de informações, nomeadamente através do relatório anual que a Comissão de Fiscalização deve apresentar na Assembleia da República».
Sr. Deputado Jorge Lacão, V Ex.ª nega isto?

O Sr Jorge Lacão (PS): - Posso responder?

O Orador: - Só estou a perguntar: nega isto? É mentira? Se não é mentira, continuo, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lacão (PS)- - Então, faz-me uma pergunta e não me deixa responder"

O Orador: - Disponho de pouco tempo, Sr. Deputado.
Quero ainda dizer-lhe o seguinte: o senhor voltou a trazer para aqui a discussão da Lei n.º 30/84, de 5 de Setembro, mas não é isso o que estamos a discutir, Sr. Deputado

O Sr. António Guterres (PS) - Quem a trouxe primeiro ao debate foi o Sr. Ministro!

O Orador: - Estamos a fazer um debate geral sobre o Serviço de Informações da República No momento da discussão do veto, se quiser e se ainda não tiver aprendido todas as razões que apresentei, voltaremos ao assunto.
Mas deixe-me dizer-lhe também o seguinte: a demissão de dois dos elementos do Conselho de Fiscalização tem o valor que tem, porque houve um outro elemento que, na sua carta de demissão, diz que discorda, não vê razões, e que, ao mesmo tempo, sempre teve todos os elementos, considerando que o Conselho de Fiscalização tem os poderes suficientes para actuar. E não admito que o Sr Deputado ou quem quer que seja taça discriminações entre os três cidadãos idóneos que foram eleitos por dois terços dos Deputados desta Assembleia.

Aplausos do PSD.

Em segundo lugar, Sr. Deputado, quero dizer-lhe que considero uma gravíssima falta de sentido de Estado, o PS

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afirmar publicamente, nomeadamente na Assembleia, que, enquanto não for alterada a competência do Conselho de Fiscalização, não elege os seus elementos

O Sr. António Guterres (PS)- O PS nunca disse isso'

O Orador: - O PS não tem elementos do Conselho de Fiscalização? São cidadãos idóneos e independente» que devem merecer a credibilidade dos dois terços dos Deputados da Assembleia da República

Aplausos do PSD

O Sr. António Guterres (PS): - Seja rigoroso a citar! O que acaba de citar é mentira!

O Sr. João Amaral (PCP). - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito regimental de defesa da honra e consideração.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, de acordo com o n.º 3 do artigo 92.º, dar-lhe-ei a palavra no fim do debate.

O Sr Jorge Lacão (PS)- - Sr Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lacão (PS). - Sr. Presidente, peco-lhe que diligencie no sentido de fazer chegar ao Sr. Ministro, através dos serviços competentes, o conjunto de todas as minhas declarações sobre os serviços de informações, produzidas nos últimos 10 anos...

Risos do PSD

É que, ao longo dos últimos anos, ano após ano, tenho subido a essa tribuna para ir reflectindo sobre o problema do funcionamento desses serviços. Nessa altura, o Sr Ministro da Defesa Nacional terá ocasião de ler nas minhas intervenções qualquer coisa do género «Em função da própria experiência, designadamente vertida nos seus relatórios, do Conselho de Fiscalização dos serviços e face a uma interpretação, que não foi inequívoca, quanto à amplitude das suas atribuições e competências nas relações com o Governo, o problema da necessidade de rever essas competências à luz da própria experiência colocou-se». E como não tenho os olhos fechados, mas abertos à realidade, fui interpretar essa realidade a essa tribuna
Contudo, 10 anos depois, o Sr. Ministro continua com os olhos fechados e apenas quer fazer exegese literária! O problema é dele, mas, acerca da realidade e dos problemas da vida, continua a não dar resposta.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lacão, tomei nota do seu pedido.

O Sr Silva Marques (PSD) - Sr. Presidente, pelo menos só um resumo desses 10 anos!

O Sr. Nuno Delerue (PSD)- - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr Deputado.

O Sr Nuno Delerue (PSD) - Sr. Presidente, no mesmo sentido da interpelação do Sr. Deputado Jorge Lacão e com a permissão de V. Ex.ª, gostaria de dizer, só para que fique registado, que é a primeira vez que assisto nesta Assembleia a alguém fazer uma interpelação à Mesa que prefigura uma situação de defesa da honra em relação a declarações do próprio.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: - Sr Presidente, peco a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: - Sr Presidente, se me chegarem as mãos todas as intervenções do Sr. Deputado Jorge Lacão produzidas nos últimos 10 anos, não sei se vou conseguir ou ter tempo para lê-las.
No entanto, do que o Sr Deputado não é capaz, nem podia sê-lo - nem mesmo fornecendo as suas declarações dos últimos 10 anos -, é de negar que disse isto que citei.

O Sr. Vieira de Castro (PSD) - Essa é que é a verdade!

O Orador: - E naturalmente que o Sr Deputado, durante esses 10 anos, deve ter mudado muitas vezes de opinião. Além do mais, as nossas opiniões, tanto a minha como a sua, têm uma validade relativa, porque, tratando-se de um debate político, são interessadas.
Mas se V. Ex.ª não está satisfeito, posso ler-lhe a opinião expressa num parecer do Procurador-Geral da República, elaborado a pedido de um seu colega de bancada, o Sr. Deputado José Magalhães, de cujas conclusões a primeira é esta, tratando-se de um parecer produzido não há 10 mas há um ano: «A Lei n º 30/84 instituiu mecanismos de fiscalização da actividade dos serviços de informações idóneos à detecção, correcção e sancionamento de eventuais situações de desconformidade entre a actuação dos serviços e as normas legais e constitucionais a que a respectiva acção deve obedecer».
Para mim, isto tem mais valor do que as declarações que V. Ex.ª fez durante 10 anos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Jorge Lacão (PS): - E o veto do Sr Presidente da República também tem?

O Sr. Presidente: - Dou agora a palavra ao Sr Deputado João Amaral, para exercer o direito de defesa da honra e consideração.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr Presidente, reporto-me exclusivamente à parte da intervenção do Sr. Ministro em que ele mencionou o que «se dizia por aí». O Sr. Ministro sabe ao que estou a referir-me.
Sr. Ministro, quero dizer-lhe o seguinte: lamento que tenha resolvido fazer «porcaria» no meio da sua intervenção, atirando lama e sórdidas calúnias para cima do meu partido, e, ainda por cima, socorrendo-se de uma habilidade, que não abona em seu favor, ao afirmar que não é o senhor que o diz mas outros.
Quero deixar aqui claro, como o PCP já o fez, que não temos nada a ver com essa história! O que é dito acerca disso são calúnias feitas contra o meu partido e aqueles que o dizem, dizendo-o directamente ou socorrendo-se do que os outros dizem, são caluniadores!

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Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Ministro da Defesa Nacional.

O Sr Ministro da Defesa Nacional: - Sr. Presidente, Si Deputado João Amaral, em primeiro lugar, não me referi a V Ex.ª,..

O Sr João Amaral (PCP): - Também não me referi a mim, mas ao meu partido!

O Orador: - .. mas a uma situação política em particular, que e do conhecimento público, e não vejo por que é que ela não pode ser invocada aqui.
Agora, V. Ex.ª e que teve a atitude inaceitável de, num debate que gostaria que decorresse com elevação - e julgo que nas minhas intervenções não tratei mal quem quer que fosse-, ler feito uma afirmação que não tem possibilidade de provar, uma afirmação, essa sim, cheia de lama, de maldade e de fel, de que os serviços de informações estão ao serviço do PSD.
Considerei-me pessoalmente ofendido e atingido.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E V. Ex.ª pode estar certo de uma coisa: não é o PSD que tem a concepção de que o Estado é o partido! V. Ex.ª disso sabe mais do que eu!

Aplausos do PSD.

O Sr Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Gama.

O Sr Jaime Gama (PS) - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A realização de um debate na Assembleia da República sobre a problemática das informações em democracia, agendado pelo Presidente do Parlamento, tem duas origens Por um lado, resulta do envio para nova leitura do decreto que alterou o sistema de informações, devolução a que decidiu proceder o Presidente da República em 16 de Agosto, e, por outro, do desafio que o PS lançou ao Governo neste Hemiciclo, em 21 de Outubro, sobre «a temática das informações, da sua filosofia enquadradora, da sua articulação, da sua fiscalização e da sua deontologia em sistema democrático».
O Governo começou por pretender que uma discussão desta natureza só tivesse lugar após a reapreciação do veto presidencial, mas o bom senso acabou por prevalecer e o debate tem lugar antes. Isto significa, obviamente, que está colocada, com a anuência do Governo, a questão principal, de reflectir globalmente sobre o sistema de informações, visando necessariamente o aperfeiçoamento dos mecanismos legislativos que enquadram o sector e não apenas a regulamentação das questões pontuais afloradas pelas modificações que foram objecto da última iniciativa governamental e da consequente discordância presidencial. Ou seja, estão criadas condições para se ir mais longe - e para fazê-lo de fornia mais rigorosa, mesmo que isso exija mais tempo - em matéria de tanta importância como esta.

Vozes do PS: - muito bem!

O Orador: - Aliás, a evolução internacional registada nos últimos anos tem permitido proceder, em vários países, a exames exaustivos sobre as respectivas comunidades de informações, com inegáveis consequências nos planos doutrinal e orgânico. Portugal não deve ser excepção neste campo.
Ao intervir sobre este tema, neste momento e num debate desta natureza, o PS quer fazê-lo com frontalidade, mas, sobretudo, com o rigor e com a seriedade com que sempre o fez Integram o nosso património, neste domínio, duas vertentes de que nos orgulhamos: a de ser favoráveis à existência de serviços de informações que assegurem ao Estado o conhecimento indispensável para poder diagnosticar, defender-se e agir lace a ameaças internas ou externas e a de ser igualmente favoráveis a que tais serviços, em democracia, exerçam as suas actividades num clima de completa legalidade, sejam respeitadoras dos direitos dos cidadãos e estejam enquadrados pela Constituição.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Isto e, o PS encara esta problemática como uma verdadeira questão de Estado Assim procedeu, de resto, quando assumiu a responsabilidade, em 1984, de criar este tipo de serviços; assim tem procedido, em especial nestes últimos meses, quando se tem batido, entre outras coisas, por melhorar o respectivo regime de fiscalização.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Como existe alguma confusão neste campo, é necessário que uma coisa fique, desde já, clara, para nos posicionarmos na discussão, o PS é a favor deste tipo de estruturas, como, aliás, existem em iodas as democracias, mas, tal como acontece nessas mesmas democracias, o PS é igualmente a favor de mecanismos rigorosos de enquadramento e controlo para o sistema de informações.

Aplausos do PS

Distinguimo-nos quer dos que querem serviços, mas não pretendem nenhuns controlos senos, quer dos que só querem controlos, porque, na prática, não querem nenhum tipo de serviços.
Matéria de tão grande importância com esta merece um tratamento com profundo sentido de responsabilidade.
A criação do Sistema de Informações da República Portuguesa, em 1984, mereceu um consenso alargado das principais forças políticas nacionais. Esse capital devia ter sido conservado e deve ser conservado para o futuro, pois, sem ele, não se contribui minimamente para aquele grau sustentado de credibilização que estruturas e funções desta natureza exigem.
O que o Governo fez nesta matéria é, no mínimo, impensado Não sei se o fez motu próprio ou se terá sido induzido a fazê-lo ao longo dos últimos anos. Se o fez por si mesmo, é grave; se o fez por indução de terceiros, é gravíssimo.
Refiro-me, como se pode calcular, à circunstância de, durante 10 anos, o Governo do PSD se ter recusado, neste domínio, a cumprir e a fazer cumprir uma lei do Estado, aprovada pela Assembleia da República, a Lei n.º 30/84, de 5 de Setembro, que criou o sistema de informações. Essa lei enunciava com clareza a criação de três serviços de informações: o Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED), o Serviço de Informações Militares (SIM) e o Serviço de Informações de Segurança (SIS). Pois bem, o Governo não só não deu qualquer andamento à criação do Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED)

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como, ilegalmente, atribuiu, por despacho secreto, as suas competências ao Serviço das Informações Militares (SIM).
Em qualquer outro Estado democrático uma tão clara violação da lei teria as consequências que se conhece e só um grande laxismo institucional e político permitiu que tal acontecesse - e esteja a acontecer ainda hoje - sem o menor reparo ou sanção.
Aliado a algumas intervenções aventureiras ou a algumas intrusões por demais grosseiras e ostensivas, esse abuso de poder por parte do Governo constituiu-se, afinai, no mais grave factor de descredibilização institucional dos serviços de informações.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Numa área em que se obtivera consenso alargado para uma lei do Parlamento, definidora dó um modelo para a orgânica das informações, como é que um Governo ousa, por via de um despacho secreto do Primeiro-Ministro, violá-la logo de seguida e de forma tão flagrante e com que objectivos o lerá feito.
Onde o Governo devia ter sido rigoroso e serio foi abusivamente confuso, violador de um consenso político e sabotador da legalidade Em muitos países, condutas dessa natureza, que conjugam o secretismo e o concerto de vontades para alcançar objectivos contrários aos consagrados na lei, assumem os traços de uma verdadeira conspiração e, entre nós, todo este processo devia ter sido investigado exaustivamente pelo Ministério Público e sancionado pelos tribunais.

Aplausos do PS.

Se é certo que o nosso sistema de informações cresceu mal. apesar de ter nascido bem, a maquilhagem que o Governo lhe pretendeu introduzir, a maioria aprovar e o Presidente da República velou, essa ainda e pior.
Em 1984, com o voto também do PSD, tinham sido criados três serviços, mas, durante 10 anos, o PSD extinguiu o SIED por só querer dois serviços, o SIS e o SIM. Agora, diz continuar a querer dois serviços, não o SIS e o SIM, mas o SIS e o SIED, dispensando o SIM - é precisamente o contrário do que queria antes. Na prática, porem, acaba por manter os três serviços, só que já o fez no ano passado, em outro diploma, o Decreto-Lei n.º 48/93, que aprovou a Lei Orgânica do Estado-Maior General das Forças Armadas (EMGFA).
A reestruturação do EMGFA, empreendida em 1993, prevê a criação de um fortíssimo dispositivo de informações fora do Sistema de Informações da República Portuguesa. Com efeito, quer a Divisão de Comunicações e Sistemas de Informação (DICSI), no âmbito do Estado-Maior Coordenador Conjunto, quer a Divisão de Informações Militares (DIMIL), no âmbito de Centro de Operações das Forças Armadas (COFAR), passam a deter, no âmbito das informações, áreas de responsabilidades muitíssimo mais amplas e sofisticadas do que aquelas que eram atribuídas anteriormente ao Serviço de Informações Militares, na prática aliás, exercidas pela Divisão de Informações do Estado-Maior-General das Forças Armadas, cuja extinção definitiva só agora se prevê.
O argumento governamental de que são «vantagens de simplicidade e de economia de recursos» que levam à fusão dos dois serviços no novo SIEDM não tem o menor fundamento quando, afinal, se continua a manter precisamente os três serviços, que se alega ir concentrar ou reduzir.

O Orador: - O Governo terá de explicar ao País qual o seu verdadeiro modelo de informações, pois o que tem expressão legal no decreto vetado não corresponde ao sistema efectivo. O Governo terá também de dilucidar se está consciente dessa realidade e a assume ou se é apenas o porta-voz formal de opções cujos conteúdos e nexos práticos evidencia tão profundamente ignorar.
Convém dizer, em abono da verdade, que o PS não tem nem pode ter uma posição fixista ou dogmática em relação ao modelo adoptado em 1984. Passaram 10 anos, o ambiente internacional mudou, a doutrina de informações evoluiu e as questões hoje podem e devem ser encaradas de maneira diferente.
Infelizmente, as reformas preconizadas pelo Governo são muito limitadas: se descontarmos a redução de dois para três serviços, que, afinal, em outra sede legislativa, se revela como a manutenção e reforço dos três serviços previstos no esquema inicial, a proposta governamental limita-se a introduzir alterações de aparente pormenor, que visam exclusivamente assegurar a opacidade da gestão financeira dos serviços de informações e consignar um código de deveres de sigilo ao respectivo pessoal, o qual e ainda tornado praticamente imune face a eventuais investigações judiciais, através da consagração de um mecanismo muito discutível de garantia administrativa

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ou seja, é uma lógica meramente burocrática e corporativa aquela que presidiu à sot-disant reforma governamental do sistema de informações, uma vez que esta falha por completo toda a temática de actualidade que, nos anos mais recentes, tem presidido a transformações idênticas em outros países.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A recente modernização dos serviços de informações nas democracias tem obedecido, de resto, a cinco grandes áreas de preocupação, infelizmente não contempladas nas soluções para que apontou o Governo e a maioria, mas que estamos, naturalmente, em posição de ainda poder corrigir, se a vontade do Governo se orientar, como espero, para uma postura mais construtiva e desinibida.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - São elas. primeiro, a qualidade do produto informações.
Uma das revelações a que nos conduziu o fim da guerra fria foi a de que, a par do mento que certos serviços revelaram na obtenção de dados que permitiram conter o expansionismo soviético e neutralizar as suas redes de espionagem e contra-informação durante décadas, em alguns casos, parte dos dados transmitidos aos governos não era inteiramente rigorosa e continha mesmo uma apreciável margem de erro. A revisão, «dos pés à cabeça», a que foram submetidas as mais qualificadas comunidades de informações, revela a necessidade de superar essas lacunas e, sobretudo, a de gerar meios adequados para conhecer mais em detalhe o cenário exacto dos conflitos actuais, menos de natureza bipolar e mais de natureza regional, com componentes não apenas militares mas também históricas, linguísticas, étnicas, religiosas ou culturais evidentes.

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Orador: - Por outro lado, a conjugação comunicações-informática veio, inequivocamente, ampliar uma área de especial interesse para a segurança nacional, a que não pode permanecer alheio, por obsolescência, este tipo de serviços públicos de protecção interna e externa do Estado Qualquer dos novos campos de inserção, que a situação mundial abre ao sector das informações, exige certamente mais qualidade do produto. As informações, hoje, não se compadecem com amadorismo - elas terão de ser cada vez mais profissionais.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Daí a importância essencial de que os diplomas legais definam, com clareza, o âmbito e as finalidades do sistema de informações e as missões de cada serviço, não se ficando por fórmulas vagas, susceptíveis de preenchimento concreto desconhecido.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Daí a importância que há em regular com clareza a que instância compete a definição da estratégia e prioridades dos serviços de informações e a periodicidade a que a mesma deve obedecer Daí a importância de que se reveste evitar a dispersão, pela abrangência indiscriminada, dos programas de pesquisa, anexando, por vezes, temáticas conexas com fenómenos de ordem pública, já do âmbito das meras informações gerais de polícia, infelizmente não organizadas entre nós com a necessária qualificação.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Intervenções pouco felizes do SIS têm, aliás, a ver com esta precisa lacuna estrutural.
Que produto informativo se tem conseguido com os serviços portugueses'? Será que o próprio Governo está satisfeito? A que resultado útil nos tem levado o trabalho das estruturas criadas? Qual o balanço desta fase inicial de actividades!
Se queremos debater a política de informações em toda a sua extensão, não nos podemos alhear desta dimensão «auditoria técnica», que, até ao momento, não foi feita por quem tinha essa responsabilidade.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Segundo, o controlo operacional dos serviços.
Este é um dos aspectos essenciais Se há matéria onde não deve ter lugar a «espontaneidade» ou onde a «roda livre» da burocracia conduz às piores situações, é a que se relaciona com os serviços secretos Conhecemos alguns exemplos de operações descomandadas que acabaram por lazer cair ministros e Governos, mesmo em ditadura. Ninguém quer que exemplos desses frutifiquem entre nós e não há necessidade de que assim seja. No plano operacional, serviços destes não dispensam uma tutela governamental apertada, enquanto esta significa controlo do órgão de soberania democraticamente constituído como máximo responsável pelo conjunto da administração civil e militar do Estado.

O Sr Angelo Correia (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A emissão de ordens de pesquisa ou a autorização de operações encobertas não devem, por isso, dispensar uma constante vigilância governamental e devem mesmo ser sempre objecto de despacho escrito, convenientemente inventariado em registo obrigatório e nunca de ordens verbais de duvidosa comprovação.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O quadro legal que regula o sistema de informações ganharia em ver clarificados alguns destes pontos, por forma a evitar que se introduzam rotinas pouco sãs, posteriormente convalidadas como efectivas leis do Estado, como estamos habituados a ver.

Vozes do PS: - Muito bem!

Q Orador: - Terceiro, a selecção de pessoal A proposta governamental e minuciosa num conjunto de aditamentos ao sistema vigente, visando subtrair o pessoal da área das informações aos mecanismos que regem o conjunto dos funcionários públicos em matéria de admissão, disponibilidade, remuneração, incompatibilidades, disciplina e contagem de tempo de serviço Pode-se compreender a excepção, ao menos em certos destes pontos, mas é necessário que, ao menos a. algum nível e por entidade tipificada, seja definido o sistema substitutivo. Caso contrário, o sigilo nada terá a ver com as necessidades de protecção do serviço mas, antes, com o estabelecimento de uma lei da selva no próprio serviço, perturbadora cia actividade dos respectivos funcionários e lesiva dos seus direitos (que se pressupõe também existirem)

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Igualmente relevante é o conjunto de requisitos a que deve obedecer o recrutamento deste tipo de pessoal, as suas habilitações ou aptidões e a adequação entre esse mesmo recrutamento e as finalidades e prioridades dos serviços, à luz das actuais exigências no campo das informações

Vozes do PS: - Aprendam!

O Orador: - São capacidades de tipo diferente, porventura daquelas a que se habituaram os pais fundadores dos serviços secretos portugueses, oriundos de uma época em que se privilegiava mais a componente acção do que a componente análise A formação hoje exigida para este tipo de serviços assenta num grau muito mais elevado de especialização de conhecimentos, compatibilizável com habilitações de tipo universitário seguidas por cursos de especialização profissional - de preferência feitos no país e não no estrangeiro, por razões óbvias -, e já não com vocações espontâneas ou carreiras administrativas feitas exclusivamente na base da dedicação e da rotina.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Importante me parece igualmente o problema da clarificação legal das situações em que funcionários de outros departamentos do Estado, nomeadamente diplomatas ou militares, possam prestar serviço nestas organizações, com plena salvaguarda das suas instituições de origem, que, de forma alguma, da base ao topo, devem ser confundidas ou misturadas com este tipo de actividade Especial atenção se exige à conduta das embaixadas ou das missões militares, que interessa manter institucionalmente separadas de operações encobertas ou de conexão orgânica com o sistema de informações.

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Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A própria circunstância de um dos serviços agora criados, o SIEDM, se chamar Serviço de Informações Estratégicas de Defesa e Militares (certamente por razões de ordem corporativa que têm a ver com o mix apropriado de funcionários civis e militares que o mesmo deve vir a possuir), coloca o problema do envolvimento da instituição militar, enquanto tal, em missões de serviço secreto no exterior do país, o que é altamente questionável, atendendo, sobretudo, às possibilidades e consequências da captura em país estrangeiro de um dos seus agentes com essa vinculação específica de origem e esse tipo de ligação orgânica às Forças Armadas Portuguesas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Embora admitindo alguma dose de cautela neste domínio, não se me afigura que o pessoal dos serviços de informações deva, por outro lado, estar protegido por um sistema de garantia administrativa, como o que o Governo preconiza, e que o possa excluir sem reserva de qualquer tipo de investigação criminal, designadamente quando estejam em causa crimes de tal gravidade, como, por exemplo, o homicídio.
Quarto, o rigor contabilístico.
Se é certo que serviços desta natureza devem estar protegidos quanto ao sigilo de algumas das suas despesas específicas - cuja divulgação neutralizaria por completo a sua natureza reservada -, não é menos verdade que cies não devem funcionar por inteiro à margem de qualquer controle financeiro Ora, a evidência é que o projecto governamental e célere em retirá-los do controle do Tribunal de Contas, mas nada esclarece sobre outro tipo de controle Sabemos como em Itália e em Espanha a autonomia de fundos confidenciais das polícias secretas levou a desvios de toda a ordem - com punição, aliás, dos responsáveis -, e não gostaríamos de ver seguido esse caminho. A Assembleia da República, através do Orçamento do Estado, não pode ignorar os montantes globais dos gastos destes serviços,..

O Sr Angelo Correia (PSD): - Claro!

O Orador: - e o Primeiro-Ministro, em registo específico, com possibilidade de inspecção confidencial por secção especial do Tribunal de Contas, a que deveria ter acesso a Comissão de Fiscalização, deveria estar vinculado ao controle da execução orçamental, por parte do sistema de informações.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Um serviço público, mesmo secreto, não pode viver baseado num orçamento privado Há, por isso, que apurar um modelo - e há-os com várias soluções - que compatibilize a necessidade de protecção da estrutura com o adequado controlo das suas despesas. Não o fazer seria abrir a porta a todas as suspeitas e a todos os desmandos

Aplausos do PS

O Orador: - Quinto, a fiscalização parlamentar.
Ela é absolutamente vital para a credibilidade do sistema e é, aliás, por essa razão que nenhuma democracia a descura O receio em relação a este tipo de controle não deve preocupar os defensores dos modernos serviços de informações das democracias.
O que se passou entre o Governo e o Conselho de Fiscalização que se demitiu é paradigmático: sempre que o Conselho produziu relatórios incipientes, não houve problemas; quando começou a querer fiscalizar, começaram a surgir as dificuldades e a escassear os meios.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Neste particular, devem ser realçados dois preciosíssimos critérios. Por um lado, o Conselho de Fiscalização deve ser um conselho de fiscalização dos serviços, isto é, um conselho de fiscalização que quer fiscalizar porque, aceitando a existência dos serviços, os quer melhorar, nunca um conselho visando o enfraquecimento ou a destruição dos serviços. Isto é, a lógica deve ser cooperativa e não antagónica Mas, por outro lado, o Conselho de Fiscalização não deve ser um departamento emanado dos serviços, constituído por pessoas com grande proximidade em relação ao meio e, portanto, incapaz de exercer uma autêntica função fiscalizadora de interesse público Isto é, a lógica deve ser de independência e não de subordinação.
Dito isto, e realçando a importância da função fiscalizadora, há que reconhecer os parâmetros em que ela se pode exercer com real significado, para ser algo mais do que uma farsa de encobrimento A Comissão de Fiscalização deve poder vistoriar os serviços, todos os serviços e tudo nos serviços, nomeadamente as ordens de pesquisa, as pesquisas e análises e os registos respeitante às operações encobertas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Deve poder proceder a inquéritos. Deve ter competência para apreciar queixas de cidadãos ou de funcionários dos serviços sobre e contra os serviços.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Deve ter acesso às contas e despesas dos serviços. Deve ter acesso ao resultado das inspecções da comissão composta por três magistrados do Ministério Público com a finalidade de exercer a inspecção periódica dos centros de dados. Deve debruçar-se sobre os resultados operacionais dos serviços, abarcando não apenas a componente protecção de direitos mas também a componente qualidade do trabalho produzido Deve elaborar um relatório mais exaustivo, englobando a totalidade das áreas, que, em democracia, interessa reter numa missão fiscalizadora a estruturas desta natureza
Estando os membros da Comissão submetidos ao segredo de Estado, admito que o seu relatório de actividades seja, em primeira versão, entregue confidencialmente ao Presidente da República, ao Primeiro-Ministro e ao Presidente da Assembleia da República, acertando-se posteriormente um texto para debate no Parlamento e para divulgação na opinião pública que, sem pôr em causa as finalidades da função fiscalizadora em si mesma, acautele exigências básicas da segurança do Estado. Naturalmente, o exercício das funções fiscalizadoras com este tipo de mandato pressupõe a concessão de meios de que a Comissão no actual figurino se tem visto privada.
Assim entendida, a Comissão de Fiscalização é útil ao Parlamento, que a elege, e, por via disso, aos cidadãos, cuja protecção de direitos se vê assegurada, mas é igualmente

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benéfica para o Governo, que coordena os serviços, e para os próprios serviços, os primeiros interessados em conciliar confidencialidade com legalidade. Por outro lado, é a Comissão de Fiscalização o garante normal contra um desvirtuamento anticonstitucional do sistema, como o que decorreria de um funcionamento demasiado espontâneo dos serviços ou de uma apropriação partidária, particular ou pessoal, dos seus canais e actividades. Há casos deploráveis onde esse desvio atingiu limites extremos, e e por isso que todos nós, a este propósito, devemos desde já tomar as cautelas que o bom senso exige, se não nos quisermos arrepender mais tarde.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Digo-o em nome da oposição, mas falo pensando igualmente na óptica de preocupações de um Governo democrático.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que as democracias, no actual ambiente internacional, reclamam dos seus sei viços de informações é bem diferente do que há 10 anos, e, por isso, um pouco por toda a parte, tiveram lugar importantes e pensadas reformas destes serviços.
Em 12 de Julho deste ano. o PS apresentou uma proposta - de que também fui subscritor - destinada a clarificar as competências do Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa. Fê-lo no quadro da discussão da iniciativa governamental. Trata-se de uma proposta responsável, e até minimalista, sobre este problema. Precisamente porque é feita por uma força política que sabe compatibilizar a necessidade dos mecanismos de fiscalização em Estado de direito com os desideratos de funcionalidade deste tipo de serviços na moderna vida internacional.
O Governo retraiu-se e ficou muito fechado. Manteve, aqui, uma fidelidade canina ao diploma de 1984.
Matéria desta natureza merece, porém, que a encaremos com uma perspectiva mais vasta do que a que sempre dimana do habitual confronto Governo-Oposição (ou mesmo da tentação simplista veto-reconfirmação automática, em circunstâncias já conhecidas). Se há domínio da vida do Estado em que a procura discutida, é certo, mas ainda assim procura laboriosa, de um consenso se justifica, é esta Por sabermos que ninguém nos pode obrigar a eleger ou a integrar um Conselho de Fiscalização que carece de necessariamente novo recorte jurídico é que desejamos, a bem da democracia portuguesa, Sr Presidente, Srs Membros do Governo e Srs Deputados, que se reabra o diálogo de novo e que se caminhe para um compromisso aceitável por todos.

Aplausos do PS, de pé.

O Sr Presidente: - Informo a Câmara de que se encontram inscritos, para pedir esclarecimentos, os Srs Deputados Guilherme Silva. João Amaral e Angelo Correia.
Tem a palavra o Sr Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD) - Sr Presidente, o Sr Deputado Jaime Gama tentou emprestar ao seu discurso, à sua intervenção, um sentido de Estado que, infelizmente, a parte final e conclusiva desfez por completo. Estava exactamente a pensar em perguntar-lhe, Sr Deputado, se o Partido Socialista e o seu Grupo Parlamentar mantinham a postura, que publicamente assumiram, de inviabilizar a eleição do Conselho de Fiscalização e se pensa que essa postura se compadece com o sentido de Estado com que esta matéria deve ser tratada. Melhor dizendo, V. Ex.ª pensa que e diálogo parlamentar utilizar um instrumento de pressão exterior às regras normais do Parlamento e da sua actividade para dizer «ou aceitam as nossas sugestões, as nossas alterações, ou vetamos a reeleição de um órgão que está previsto e que a Assembleia deve, em normalidade, eleger e escolher»9

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Jaime Gama, estava à espera que V. Ex.ª, nesta intervenção, trouxesse ao Parlamento uma explicação, que não conseguimos encontrar na linha normal de evolução das questões relativas aos serviços de informações e que se coloca da seguinte forma: durante oito anos, o Conselho de Fiscalização, com maioria de representantes situados na área do seu partido, subscreveu o relatório dos serviços de informações, concluindo, sempre por unanimidade, pelo não registo de actuações, por parte destes serviços, que atentassem contra os direitos fundamentais e no sentido de que nunca lhes tinha sido levantado qualquer obstáculo ou impedimento a terem acesso a todos os elementos e informações que, dos serviços e do Governo, pretendiam.
Gostava que V. Ex.ª desse à Câmara uma explicação para a contradição entre este comportamento, reiterado durante anos, e a atitude posteriormente assumida pelos membros do Conselho de Fiscalização da área do Partido Socialista de abandonarem as suas funções e, se eventualmente, residirá no Expresso de 7 de Maio de 1994 a explicação para tal facto, embora V. Ex.ª, nessa altura, não tivesse as mesmas responsabilidades que hoje tem no Grupo Parlamentar do Partido Socialista Nesse artigo, é dito o seguinte: «Deputados mais radicais do Partido Socialista pressionaram, na quinta-feira passada, os representantes socialistas no Conselho de Fiscalização dos Serviços de Informação a demitirem-se»
A segunda questão

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino de seguida, Sr Presidente.
Como estava a dizer, a segunda questão que lhe coloco é a seguinte: quando foi apresentada - aliás, de uma forma brilhante, como sempre -, pelo Deputado Almeida Santos, a proposta de lei de institucionalização dos serviços de informações, o Sr Deputado Almeida Santos perguntava: «É indiscutível que tenham de ser três os serviços programados? Não, certamente, mas foi esse o número que Deus fez e é esse aquele em que o Governo se compraz»
Ora, reparei que V. Ex.ª insistiu na questão dos três serviços de informações. Tem V. Ex.ª a mesma crença em Deus que o Deputado Almeida Santos, de forma a ter uma fé particular neste número, ignorando que há países da Europa onde funcionam apenas dois serviços de informações com perfeita transparência democrática?

O Sr Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Gama.

O Sr Jaime Gama (PS). - Sr Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, também li e conheço os relatórios da

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Comissão de Fiscalização e boa parte da matéria a que fiz referência não só tem neles acolhimento como expressão em termos de preocupação pública.
Quanto à palavra utilizada por V. Ex.ª, «inviabilizar» não existe no vocabulário político do meu partido! Encaramos esta matéria na óptica da viabilização de um diploma correcto e da formação de uma Comissão de Fiscalização autêntica.
Como V. Ex.ª sabe, essa Comissão e eleita, neste Parlamento, por dois terços dos Deputados. Ora, nas democracias, eleger e ser eleito ou não eleger e não ser eleito e um direito, mas estamos a trabalhar, com profundo sentido de Estado, para que, através da introdução de alterações razoáveis, possam criar-se as condições para que essa eleição tenha lugar e a referida Comissão de Fiscalização exerça as suas competências normais num Estado democrático.

Aplausos do PS

O Sr Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jaime Gama, serei breve. Sobre a matéria da fiscalização, gostava que esclarecesse a sua posição acerca da importância da fiscalização no sistema de informações, se a entende como uma função estruturante do sistema ou se considera que, tal como sucede agora, os serviços de informações podem continuar a funcionar sem terem uma fiscalização eficaz.
Considera que a existência do serviço de informações, em regime democrático, sem fiscalização eficaz, corresponde ao regular funcionamento das instituições democráticas?

O Sr Octávio Teixeira (PCP). - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr Deputado Jaime Gama.

O Sr. Jaime Gama (PS). - Sr Presidente, Sr Deputado João Amaral, corresponde a um irregular funcionamento dos serviços e a uma grave deterioração das instituições, pelo que, em todas as democracias representativas que conheço, funcionam serviços de informações e comissões de fiscalização capazes E, até paradoxalmente, os países cujos serviços de informações são os mais capazes -
a Republica Federal da Alemanha, o Remo Unido ou os Estados Unidos da América - são precisamente aqueles que têm as mais profundas e rigorosas comissões de fiscalização.

Aplausos do PS

O Sr Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr Deputado Angelo Correia.

O Sr. Angelo Correia (PSD) - Sr. Presidente, Sr Deputado Jaime Gama, a sua intervenção justifica alguma reflexão e maior ponderação, mas há duas questões que gostava de colocar-lhe.
Primeira, o Sr. Deputado Jaime Gama reconheceu que a área confidencial de despesas no serviço de informações existia e que devia ser preservada mas, ao mesmo tempo, definiu que a fiscalização financeira sobre esse serviço devia ser feita de uma forma aberta, global e transparente. De que fornia concilia as duas realidades? Ou será que só defende a primeira e mantém uma certa reserva e sigilo na fiscalização global financeira?
Segunda citou os Estados Unidos da América, a Alemanha e a Inglaterra Em Inglaterra, não há qualquer comissão parlamentar permanente sobre informações, mas joined commuttees que só se reúnem para analisar relatórios anuais de serviços quando, decorrente de alguma circunstância debatida previamente no Parlamento inglês, se note uma situação irregular que justifique um inquérito parlamentar.
Por outro lado, do meu ponto de vista, nos Estados Unidos da América, vigora o sistema mais aberto e até mais entusiástico relativamente ao controlo parlamentar e não só. De facto, nos Estados Unidos, há quatro tipos de controlos sobre os serviços de informações.
Mas, Sr. Deputado Jaime Gama, a minha pergunta é esta: alguma vez, mesmo no Senado ou na Câmara dos Representantes, se debateu a análise de natureza operacional de um serviço ou será que apenas se definiram o target, o chamado objectivo, a área de acção e o «envelope» financeiro para o mesmo? Qual é o país do mundo - faz favor de mo dizer sem demagogia - onde a natureza operacional e interna de uma acção é escrutinada do exterior por membros que não fazem parte dos serviços? Aponte-me um só e eu ficaria feliz.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr Deputado Jaime Gama

O Sr. Jaime Gama (PS).- Si. Presidente, começo por solicitar a benevolência de V. Ex.ª para dispor de mais algum tempo para responder Sou conciso, não gasto muito tempo com palavras inúteis e irei directamente ao assunto.
Primeiro, quanto à fiscalização financeira, terá V. Ex.ª notado que eu preconizo um modelo. Não se trata de falar em vão ou pela negativa Digo claramente que o Parlamento deve apreciar o montante global dessa despesa, isto é, ela tem de ter uma inserção global no Orçamento do Estado Depois, digo que ao Primeiro-Ministro deve competir um papel essencial na fiscalização dos gastos desses serviços.

O Sr Ângelo Correia (PSD). - Gastos gerais ou confidenciais?

O Orador: - Todos, obviamente!
Depois, digo que pode prever-se um mecanismo de fiscalização confidencial através de uma secção especial do Tribunal de Contas Também digo que a comissão de fiscalização pode ter acesso a esses dados visto que está cia própria submetida ao segredo de Estado e não podemos pressupor que, para funcionários do serviço secreto, designamos patriotas e necessariamente traidores à Pátria para serem membros da comissão de fiscalização!

Aplausos do PS

É o mesmo País, são os mesmos portugueses, é o mesmo sentido de responsabilidade perante o desempenho do exercício de funções públicas.
Segundo ponto, o problema do controlo parlamentar. Terá V. Ex.ª reparado que não preconizo um sistema de controlo parlamentar directo, isto é, através de uma comissão especial do Parlamento, como existe em alguns países. Permaneço fiel ao mecanismo de fiscalização através deste corpo chamado comissão de fiscalização
Para além disso, penso que se, ao mesmo tempo, devem ser dadas mais capacidades para fiscalizar, porque se trata de portugueses igualmente responsáveis e tão patriotas

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como aqueles que são escolhidos por critérios secretos para agentes secretos, esse grau de abertura deve ser compatibilizado com uma cautela enquadrada pelo segredo de Estado que se traduz no seguinte: a comissão de fiscalização deve ler toda a liberdade para investigar e apurar e deve redigir a primeira versão do seu relatório anual em termos de confidencialidade, a distribuir apenas às três mais altas figuras da hierarquia do Estado. Só depois, através de um diálogo que, preferencialmente, terá de ser um diálogo dessa comissão com o Primeiro-Ministro, que é o máximo responsável pela coordenação dos serviços, deve ser elaborado um relatório sério mas que não contenha matéria susceptível de pôr em causa a segurança do Estado. Este relatório é que deve ser distribuído, debatido no Parlamento e divulgado junto da opinião pública, até como pedagogia para as portuguesas e os portugueses, sobre a actividade, as responsabilidades, as funções dos seus serviços de informações.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, V. Ex.ª verá que no meu espírito não existe um ataque demolidor ou denegridor ao sistema de informações; existe um esforço sério para debater estes problemas em toda a profundidade e para contribuir para que, com um sentido de responsabilidade do Estado, estes mecanismos sejam devidamente aperfeiçoados.

O Sr. Angelo Correia (PSD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr Ângelo Correia (PSD). - Sr Deputado Jaime Gama, agradeço muito o que está a dizer-me; ouvi isso tudo, mas não foi essa a minha pergunta nem formulei qualquer dúvida sobre a boa intenção de V. Ex.ª A minha pergunta foi outra, completamente diferente,.

O Orador: - Referida à comparação com outros países?

O Sr. Angelo Correia (PSD): - ... foi de natureza operacional. Só isso! Não perguntei mais nada.
Quanto ao resto, quanto à boa vontade de V. Ex.ª, é óbvia!

O Orador: - Sr. Deputado, devo dizer-lhe que a fiscalização do output operacional é a auditoria técnica e é necessária!

O Sr. Angelo Correia (PSD) - Qual é o país e como?

O Orador: - Temos de saber qual é o produto operacional desses serviços. Ora, o primeiro responsável por essa auditoria técnica tem de ser o Governo.

O Sr Ângelo Correia (PSD)- Claro!

O Orador: - Mas a comissão de fiscalização não pode colocar-se estritamente numa lógica de protecção de direitos dos cidadãos. Ela também tem de ter uma abrangência sobre a realidade que é a própria política de informações e sobre a forma como os serviços estão a cumprir e a executar as estratégias e as prioridades da política de informações, definidas pelo Primeiro-Ministro, pelos ministros responsáveis e pelo Conselho Coordenador de Informações, para que esse relatório abarque também um dado da actividade desses serviços que é igualmente relevante e importante.
Mais, digo a V. Ex.ª que se há país onde o escrutínio parlamentar sobre o output operacional desses serviços...

O Sr Ângelo Correia (PSD)- O output...

O Orador: - O output, claro!

O Sr Ângelo Correia (PSD) - não a metodologia operacional!

O Orador: - Sr. Deputado, nunca, na minha intervenção, utilizei a expressão «metodologia operacional»! A mim, interessa-me o resultado, obviamente!
Como dizia, se há país e sistema democrático onde esse escrutínio seja permanentemente feito e com o máximo dos rigores, é os Estados Unidos da América, no Senado e na Câmara dos Representantes.

O Sr. Angelo Correia (PSD). - Estamos de acordo, mas o seu projecto de lei não diz isso!

O Orador: - Devo dizer a V. Ex.ª que, no meu entendimento, esta comissão de fiscalização não deve ser entendida, nem jamais poderá sê-lo, como uma plataforma para a organização de leaks ou de qualquer espécie de chicana política, antes deve ser uma comissão de fiscalização inserida na lógica daquilo que devem ser modernos serviços de informações numa democracia adulta e num Estado de direito como aquele que somos e que pretendemos continuar a ser

Aplausos do PS e do Deputado do PSD Angelo Correia.

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao próximo orador, tenho uma informação para dar à Câmara, que considero relevante.

Srs. Deputados, o Sr Embaixador José Cutileiro foi eleito Secretário-Geral da União da Europa Ocidental

Aplausos do PSD, do PS e do CDS-PP, de pé.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. Jaime Gama (PS). - Sr. Presidente, peço a palavra O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Jaime Gama (PS) - Sr Presidente, é para, sob a forma de interpelação à Mesa, expressar, em nome do meu grupo parlamentar e do meu partido, todo o regozijo que temos com essa escolha que acabou de anunciar. Honra o nosso país, honra a diplomacia portuguesa e honra a União da Europa Ocidental
O Embaixador José Cutileiro é não só um estimável antropólogo e escritor mas também um distinto diplomata, que, ao longo dos anos, se distinguiu no plano internacional pela precisão, pelo rigor e pela seriedade que põe no tratamento das questões A credibilidade que ele grangeou pela forma concreta como soube desempenhar dificílimos mandatos internacionais está na origem dessa eleição.
Diplomata e Embaixador José Cutileiro, a diplomacia portuguesa, o Estado português e os portugueses estão de

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parabéns com essa eleição. Oxalá - como espero -, ela contribua para projectar mais Portugal no interior da União da Europa Ocidental e, mais ainda, esta organização na União Europeia e no concerto internacional.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr Presidente: - Tem a palavra o Sr Deputado António Maria Pereira

O Sr António Maria Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome da bancada parlamentar do PSD e na qualidade de Presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, quero congratular-me pela grande vitória da diplomacia portuguesa, conseguida através da eleição do Embaixador José Cutileiro para Secretário-Geral da UEO.

Aplausos do PSD

Digo que se trata de uma grande vitória da diplomacia portuguesa, porque é a primeira vez que um português e eleito para um cargo cimeiro numa grande organização internacional. Sei que o Ministério dos Negócios Estrangeiros se esforçou ate ao limite para conseguir esta vitória. Não foi uma vitória fácil; é uma vitória saborosa, mas que não foi fácil.
Por outro lado, representa o prestígio que Portugal tem nas instâncias internacionais, de modo a que um português possa ter sido eleito para uma organização tão prestigiada como é a UEO.

Aplausos do PSD

O Sr Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira

O Sr Adriano Moreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs Deputados: É para nos associarmos ao regozijo da Câmara pela eleição do Sr. Embaixador Cutileiro para Secretário-Geral da União da Europa Ocidental.
Não se trata apenas da consagração de uma actividade diplomática conduzida com eficácia e também do reconhecimento da capacidade profissional do Sr. Embaixador. Penso que é um acontecimento importante, pelo que toca a contrariar uma Europa «a duas velocidades»' é um pequeno país que é chamado à responsabilidade de unia organização fundamental para a defesa e a segurança europeia.
Já tive ocasião de dizer o ano passado, nesta Câmara, que 1994 me parecia vir a ser o ano dos pequenos países, em que seria necessário que desenvolvessem uma estratégia comum para evitar a tentação da hierarquia das potências, dos «directórios» e de outros males de que temos grande experiência a nível europeu. Esta notícia é um bom augúrio no sentido de que essa linha que nós defendemos, que a Câmara em geral sustenta, recebeu uma primeira contribuição importante.
Assim, associamo-nos ao regozijo geral e cumprimentamos o Sr. Embaixador José Cutileiro.

Aplausos do CDS-PP, do PSD e do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr Deputado Miguel Urbano Rodrigues.

O Sr Miguel Urbano Rodrigues (PCP)- - Sr. Presidente, Srs Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português também se regozija com a eleição do Embaixador José Cutileiro, que é um dos nossos mais talentosos diplomatas. No entanto, ele vai certamente enfrentar uma missão extremamente difícil, pois vai substituir um Secretário-Geral, o Sr Van EeeKelen, que tem sido omisso - e tem sido omisso não apenas por insuficiências pessoais- pela dificuldade da tarefa.
É evidente que as tarefas do novo Secretário-Geral da UEO implicam o debate de problemas de uma enorme complexidade e, particularmente, o problema do relacionamento, sempre ambíguo, entre a NATO e a UEO. É que não pode falar-se da futura segurança da Europa nem basta dizer que a UEO será o pilar da NATO na Comunidade Europeia, é preciso definir Ora. é um facto que em nenhuma das reuniões da Assembleia Parlamentar da UEO nem em nenhum dos seminários NATO-UEO há uma clarificação do que sejam essas relações. Nós, no Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, entendemos que um tipo de intervencionismo, como tem sido o da NATO, não deve ser substituído por outro Pensamos que deve ser encontrada uma política de segurança da Europa por outros caminhos, que não aqueles, como os da ex-Jugoslávia, que levam ao bombardeamento do solo europeu.
De qualquer forma, regozijamo-nos muito com a eleição do Sr. Embaixador José Cutileiro.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes) - Sr Presidente, como é sabido, a UEO não é, propriamente, uma estrutura que o Grupo Parlamentar de Os Verdes considere positiva, uma vez que temos divergências relativamente ao conceito de segurança europeia que lhe está subjacente De qualquer modo, pensamos que este facto não pode ser indiferente para o País: Portugal deve estar contente com esta eleição.
Também nós, do ponto de vista pessoal, saudamos o Sr. Embaixador eleito.

O Sr Presidente: - Srs Deputados, se me é permitido, em meu nome pessoal e dos restantes membros da Mesa, também me associo, naturalmente, ao regozijo manifestado, de forma unânime, pela Câmara.
Pessoalmente, aprecio extraordinariamente o talento do Sr. Embaixador José Cutileiro. Aliás, ele tem-no revelado em situações de grande delicadeza e dramatismo, como aconteceu em exemplos recentes
Espero e desejo-lhe êxito nesta missão, que é, no fundo, a de dar à Europa, à União Europeia uma voz e mão própria nas questões de segurança da Europa e do mundo.
Ao Sr. Embaixador, em nome da Mesa e representando todos os votos aqui expressos, desejo o melhor êxito nessa sua nobre tarefa.

Aplausos gerais

Retomando a ordem de trabalhos, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP) - Sr Presidente, Srs. Ministros, Sr/11 e Srs Deputados' Antes de tudo, creio que é necessário clarificar a razão de ser deste debate e para que é que pode servir Para que não restem dúvidas, afirmo, desde já, que o Governo não quis este debate, antes foi forçado a fazê-lo.

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Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O Governo nunca quis debater a situação de ilegalidade em que vivem os Serviços de Informações portugueses: recusou sempre os inquéritos apresentados, recusou as alterações necessárias para dar eficácia ao Conselho de Fiscalização e escudou-se atrás do Conselho para pôr o SIS enfeudado às suas opções político-partidárias, transformando-o numa espécie de aparelho de informações políticas ao serviço do PSD.
Recusou, igualmente, o debate aprofundado sobre a proposta de lei n º 105/VI, preferindo votá-la aqui «a mata cavalos-», no fim da sessão legislativa passada. Com essa proposta, o Governo alterava, de fundo, mais de metade da Lei-Quadro dos Serviços de Informações, eliminava um dos serviços previstos e tornava o seu conjunto mais concentrado, alargava a esfera de intervenção do SIS, fixava a função de fiscalização como função sem poderes, decorativa, chanceladora das actividades de ingerência do Governo.
Tudo isso, em meia tarde de Plenário, mais meia hora de votações na comissão, quando a lei, em 1984, foi objecto de duas dezenas de reuniões de comissão e de detalhados debates que ocuparam dezenas de horas de Plenário e comissões
O que levou o PSD a este debate foi o veto do Presidente da República e a demonstração, aí feita, de que a incapacidade de diálogo do Governo e a sua vontade de fechar os Serviços de Informações a qualquer controlo eficaz tinham conduzido a um perigoso vazio. E um vazio no sistema de fiscalização dos Serviços de Informações corresponde a uma situação de funcionamento não regular das instituições democráticas, com todas as consequências que isso pode acarretar, e que o Governo, obviamente, teme.
Por isso, o Governo está neste debate obrigado a ele e a jogar para se defender, isto é, a jogar à defesa. À defesa por causa do veto, e não só; à defesa porque hoje é evidente que na opinião pública nacional o sentimento dominante é o de que o SIS - e não só! - enveredou pelo caminho da ilegalidade e, em vez de estar ao serviço do interesse público, entrou no jogo político-partidário. do PSD, contra todos os que legitimamente se opõem ao Governo do PSD e sofrem as consequências da sua política.
O Governo tem, portanto, de se defender do mar de acusações e denúncias que foram e continuam a ser feitas à situação da área das informações e às ilegalidades que por aí perpassam.
A primeira ilegalidade está na não criação do Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED) e na atribuição aos Serviços de Informações Militares da função de informações estratégicas.
A segunda ilegalidade está nas actuações do Serviço de Informações Militares (SIM) em áreas completamente fora das suas atribuições, de que é exemplo mais chocante e indigno o caso do envolvimento da DINFO em acções terroristas organizadas pelo comando policial provocatório auto-apelidado GAL. de que resultou o baleamento de várias pessoas, incluindo uma criança
E, a este propósito, vale a pena fazer aqui um desafio: que teme o Governo para não fazer o completo esclarecimento das responsabilidades deste bárbaro acto terrorista em que se envolveram as secretas portuguesas?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Vai essa responsabilidade até ao Primeiro-Ministro, ele que também se envolveu no caso quando quis evitar que altos funcionários da DINFO fossem a tribunal, invocando o segredo de Estado, apesar de não o poder fazer!
A terceira zona de ilegalidades tem a ver com as actuações do SIS contra associações sindicais, de estudantes, de agricultores, partidos, magistrados, associações cívicas de vária natureza, que vão desde os relatórios sobre questões totalmente alheias ao objecto definido na lei para o SIS, até chocantes actividades de infiltração e provocação.
Quarta ilegalidade, a transformação, por esta via, do SIS num aparelho de informações políticas ao serviço do PSD, um escândalo nacional totalmente inaceitável e que ofende as mais elementares regras democráticas

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Quinta ilegalidade a existência, no Serviço de Informações Militares de informatização com capacidade para ter banco de dados em condições e termos que são absolutamente ilegais Pergunto. Sr. Ministro da Defesa Nacional, para que quer o SIM ter fichas?
Sexta ilegalidade a proliferação de serviços clandestinos de informações pelas polícias, actuando sem qualquer controlo e sem qualquer previsão legal.
Sétima ilegalidade o impedir esta Assembleia do exercício das suas competências fiscalizadoras. negando-lhe qualquer informação directa e Recusando, sistematicamente, os inquéritos parlamentares, conservando assim os serviços num estado de ausência de controlo que a lei não admite.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Face a este mal de ilegalidades, é uma completa mistificação pretender que o centro do debate seja saber se deve ou não haver informações em Portugal ou se os serviços devem ser dois ou ti és. O que existe é uma situação de crise, com graves perigos para a vida democrática, para as garantias dos cidadãos e para o regular funcionamento das instituições

O Sr Octávio Teixeira (PCP) - Muito bem!

O Orador: - Crise provocada pelo Governo e pela fornia como encara os serviços de informações. E se quer ver qual é essa forma, basta ver um caso exemplar, o do perfil, do testemunho e das opiniões do homem que constitui a peça-chave do Sistema de Informações. General Pedro Cardoso, que exerce a função na posição charneira de Secretário-Geral da Comissão Técnica, nomeado pelo Primeiro-Ministro, e exprime tão fielmente as posições do Governo que é agora mantido em funções, apesar de ter já passado os 70 anos de idade.

O Sr. Ângelo Correia (PSD) - O Álvaro Cunhal tem 81 anos!

O Orador:- ... e de até o Conselho de Fiscalização, há mais de um ano, ter assinalado a irregularidade da situação.

ejam-se as opiniões do Secretário-Geral do Sistema de Informações, em artigos publicados na revista Nação e Defesa Neles, ele defende a existência de um único super-serviço de informações e considera muito necessárias as informações, com esta argumentação «Falamos, em primeiro lugar, na actividade sindical, que tem de ser esclarecida dos perigos que a ameaçam ( ) e, em segundo lugar, na acção político-partidária que tem que ser especialmente apoiada (..) para evitai a competição violenta e as interferências em actividades públicas (..)».

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Mais à frente, dá exemplos de actividades dos serviços de informações: «(. ) forma como se processa a participação dos cidadãos, das organizações sindicais, das entidades representativas e das entidades administrativas nas diversas actividades de natureza laborai, social, administrativa ou pública» Mais: «análise da doutrinação e da propaganda política, a Fim de detectar as variações de orientação dos partidos políticos, os seus problemas internos, as suas relações com o eleitorado e com outros partidos e as suas atitudes perante o Governo, a Assembleia da República e o Presidente da República».
Acrescenta ainda: «análise das ingerências ou influencias partidárias em associações sindicais, culturais, desportivas, recreativas e outras», «previsão das consequências das medidas ou atitudes de associações sindicais»; «situação e grau de seriedade dos órgãos de comunicação social», «funcionamento dos tribunais e o modo como e administrada a justiça»; «perturbações ou deficiente funcionamento dos transportes públicos»; um exemplo espantoso: «inflação exagerada»; «observar o respeito pelo princípio da independência nacional pelos partidos políticos», «referenciar os excessos de autonomia político-administrativa»
Como é que, Sr. Presidente e Srs. Deputados, um homem como este pode ser a peça-chave do Sistema cie Informações da República, num país com uma Constituição democrática como é a nossa! Ele que defende e louva a existência de serviços de informações na GNR, na PSP, na PJ e no Serviço de Estrangeiros, e que a única coisa que exige é que seja feita a circulação de toda essa informação no tal super-serviço de informações!
Se o Governo quer mostrar um mínimo de boa-fé neste processo, então, o que se tem de reclamar que faça de imediato é que demita o General reformado Pedro Cardoso das funções de Secretário-Geral da Comissão Técnica do Conselho Superior de Informações!

Aplausos do PCP e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Luís Fazenda.

Sr Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: As questões centrais deste debate resultam, pois, da situação de ilegalidade a que o Governo conduziu a área das informações, e o centro do debate tem de estar na completa clarificação das exigências democráticas que devem rodear a definição das finalidades e do controlo de funcionamento dos serviços de informações
Cabe, neste debate, ao Governo responder se aceita essas exigências democráticas, se é capaz de assumir a responsabilidade pela gravíssima situação a que se chegou.
Apresentei, nesse sentido, dez questões ao Governo - e o Governo já disse ter recebido os «dez mandamentos» -, que não vou repetir aqui. Irei apenas salientar duas questões muito concretas, porque não há resposta para elas
Pergunto, então, aceita o Governo a exigência democrática de dar público conhecimento de qual o teor das informações sobre partidos políticos que existiam na delegação da Madeira do SIS e de que o relatório do Conselho de Fiscalização, referente àquela revelação, dá notícia? Aceita o Governo a exigência democrática de dar uma informação completa ao País acerca das circunstâncias relatadas na imprensa há pouco tempo, através das quais a Polícia Judiciária ofereceu ao SIS linhas para escutas telefónicas, esclarecendo designadamente as responsabilidades políticas do então Ministro da Justiça, no então Director-Geral da Polícia Judiciária e do Primeiro-Ministro, que terá
mandado apagar da acta do Conselho Superior de informações as referências a essa questão! Esclarece o Governo qual e o entendimento existente na Polícia Judiciária acerca das escutas telefónicas?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Por último, aceita o Governo circunscrever as funções dos Serviços de Informações Militares às funções de segurança militar que lhe estão legalmente definidas, designadamente retirando-lhe a ilegal atribuição de competência na área estratégica de defesa, fazendo cessar qualquer fichagem ou outra utilização abusiva do equipamento informático?
Reportando-me a algumas dessas questões, mais em concreto, diria o seguinte em primeiro lugar, consideramos que a situação a que se chegou com os Serviços de Informações é de tal gravidade que u única solução democrática é fazer um inquérito exaustivo, que permita detectar completamente as ilegalidades e os seus responsáveis.
É a única forma de responder às justas inquietações da opinião pública e de defender e garantir os direitos e liberdades dos cidadãos.
O PCP apresentou há mais de um ano, em Junho de 1993, uma proposta de inquérito parlamentar Argumentou então o PSD com o secretismo dos serviços.
Faço - e repito - o mesmo desafio aceita o Governo e o PSD incumbir a Procuradoria Geral da República de realizar extraordinariamente um inquérito completo à actividade do SIS, tal como é proposto no projecto de lei n º 412/VI, apresentado pelo PCP?

O Sr Octávio Teixeira (PCP) - Bem perguntado!

O Orador: - Respeitar-se-ia, nessas condições, o tal secretismo!
A segunda questão tem a ver com as funções do SIS É uma questão essencial, sobre a qual não devemos sair daqui com qualquer ambiguidade O artigo 21 º da Lei n.º 307 84 e claro e não deixa margem para dúvidas de que o SIS se reporta à segurança interna e mais concretamente, à alta criminalidade, sabotagem, espionagem ou terrorismo.
Não há a mais pequena margem para colocar o SIS a ter como função o que no relatório da Segurança Interna é denominado como conflitualidade social, e que não passa duma actuação típica de aparelho de informações políticas, ao serviço do Governo e das suas opções político-partidárias. São tantos os exemplos, que não vou aqui repeti-los.
O SIS tem de ser reconduzido à sua função e têm de ser estabelecidas rigorosas garantias de protecção dos direitos dos cidadãos.
Faço um segundo desafio aceita o Governo aprovar normas que circunscrevam rigorosamente os limites das actividades dos serviços de informações, garantindo que ficam exclusivamente ao serviço do interesse público, que lhes é vedada qualquer actividade de interesse ou serviço partidário, que lhe são vedadas actividades contra partidos, sindicatos e outras associações de natureza social?
A terceira questão tem a ver com a fiscalização que, como já disse, é um elemento estruturante dos serviços e não aleatório ou, tão só, complementar. Em regime democrático não pode haver serviços de informações sem fiscalização eficaz, e se ou enquanto, essa fiscalização não funcionar, também os serviços de informações devem suspender a sua actividade.

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O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Por isso - e este é o terceiro desafio -, aceita o Governo suspender a actividade dos Serviços de Informações enquanto não estiver em funcionamento uma fiscalização eficaz, entendida esta como a atribuição ao Conselho de Fiscalização de poderes efectivos, incluindo de inspecção directa e sem pré-aviso?

O Sr. José Maneei Maia (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Finalmente, quanto à questão dos Serviços de Informações Estratégicas de Defesa, como diz, e bem. o Sr. Presidente da República no veto, as razões técnicas e financeiras invocadas não justificam nem são suficientes para afastar a decisão tomada em 1984, de criar três e não dois serviços, separando as informações estratégicas de defesa e a informações sobre segurança militar.
Há poderosíssimas razões históricas para seguir em Portugal um modelo de maior desconcentração, razões mais acrescentadas quando vemos a proximidade de alguns altos quadros que montaram os Serviços de Informações com estruturas de informações do regime fascista, particularmente dos existentes nos territórios das ex-colónias.
O que e chocante, e imperdoável do ponto de vista do interesse nacional, é que durante todos estes anos o País tenha estado, por culpa do Governo, sem um serviço de informações especializado em informações estratégicas. Para os que enchem a boca com a necessidade de serviços de informações, é escandaloso que tenham privilegiado um serviço cuja filosofia é o inimigo interno, o SIS, e tenham descurado a criação de um serviço que é vital para a defesa dos interesses de Portugal no mundo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Portugal deve ter três serviços. Além do mais, entendamo-nos: para um País com tanto empenho na cooperação em África, em países como Angola, Moçambique, Guiné, Cabo Verde e S. Tomé, evidentemente que a junção das duas informações, a estratégica e da segurança militar, é totalmente inconveniente. Elas têm de ser desligadas, por razões tão óbvias - mas também delicadas - que me escuso de aqui as citar Razões que, certamente, o Sr. General, na reforma, Pedro Cardoso sabe melhor do que ninguém.
Fica por isso aqui, portanto, o último desafio: aceita o Governo o veto do Presidente da República?
Sr. Presidente e Srs Deputados, a verdadeira eficácia deste debate só se verá à medida que forem sendo votados os projectos de diploma e os pedidos de inquérito parlamentar, agora pendentes.
Porque se fala, por aí, de aproximações entre os progenitores, devemos, desde já, deixar claro que combateremos qualquer solução que não responda à necessidade de estabelecer limites democráticos nos serviços, de instituir uma fiscalização eficaz e de apurar as ilegalidades verificadas.
Em suma, queremos uma solução que respeite e defenda o Estado de direito democrático

Aplausos do PCP e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Luís Fazenda.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Angelo Correia.

Aplausos de alguns Deputados do PSD

O Sr. João Amaral (PCP): - Aplausos logo no princípio!?

O Sr. Silva Marques (PSD)- E porque não?

O Sr. Angelo Correia (PSD) - Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: Regozijo-me com as palavras do Sr. Deputado Jaime Gama e regozijo-me com as palavras do Sr. Ministro da Defesa, quando consideraram esta matéria não só essencial para o Estado democrático como, também, onde é desejável o máximo consenso democrático.
Os governos mudam - podem mudar -, mas há entidades que devem continuai e perdurar para além dos próprios governos e cuja credibilidade se deve manter.

O Sr. Silva Marques (PSD) - Muito bem!

O Orador: - Ora, isso significa que todos façamos um esforço de rigor e de lógica. E, neste debate, a primeira palavra que tenho a dizer, com toda a sinceridade, é congratular-me com o discurso do Sr Deputado Jaime Gama. Não foi só um discurso de seriedade e de rigor mas, também, uma moção de censura às intervenções anteriores de Deputados do seu partido.

Aplausos do PSD

A lógica, a seriedade, apesar da divergência que tenho em relação aos domínios, contrasta com o tom chicaneiro, irresponsável e inconsequente de alguns dos seus colegas anteriores.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Felicito o Sr. Deputado Jaime Gama, e óbvio que o seu partido tem problemas nesta área, mas isso são os vossos problemas.
A oposição, de um modo correcto ou incorrecto, tem abordado quatro questões sobre a estrutura das informações. Tentemos responder com a capacidade que temos - que não é muita! -, mas com alguma análise destes problemas de há muitos anos
Fui um partidário, tal como o Partido Socialista- e hoje verifico que até o Partido Comunista é! -, da existência de três serviços. Estávamos numa primeira fase da democracia em Portugal, pelo que tínhamos de combater, fundamentalmente, o fantasma político que era e foi a existência da PIDE, e que obrigou a toda a projecção cautelar e orgânica, de modo a evitar qualquer melindre, qualquer circunstância adicional que limitasse a capacidade operativa desta comunidade de informações
Nesse sentido, em termos globais e teóricos, os três serviços tinham um papel importante, na prática, funcionaram dois.
O Primeiro-Ministro elaborou um despacho secreto em que atribuiu as missões do SIED ao SIM e, hoje, verifica-se uma forte contestação a esta questão
Não desejaria pronunciar-me sobre a questão formal, porque não fui eu que a fiz e não a lana desta forma, entenda-se - e tenho a liberdade e independência, como todos me reconhecem, para dizer aquilo que sinto, independentemente de ser ou não do meu partido -, mas, curiosamente, o Governo, apesar de tudo, tem legitimidade para o fazer.

O Sr Duarte Lima (PSD) - Muito bem!

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O Orador: - E vou já explicar porquê. É que há cinco tipos de informações a informação estratégica externa não militar, a informação estratégica militar, a informação de segurança externa, a informação de segurança interna civil e a informação de segurança militar.
A justaposição teórica entre o sistema que idealizámos em 1984 e esta apologia de informações é a seguinte: acções de segurança externa competiam ao SIED; acções de informação estratégica externa não militar correspondiam ao SIED, acções de informação estratégica militar correspondiam ao SIM - e aqui houve um erro na argumentação do Partido Comunista, quando o Deputado João Amaral disse que não havia cobertura legal para o SIM poder fazer isto, pois cia existe, exactamente através do Decreto-Lei n.º 2267 85, artigo 3 º, alínea a), que dá toda a cobertura lega] e onde está bem explícita a capacidade cie o SIM fazer a informação estratégica militar, as informações de segurança civil correspondiam claramente ao SIS; e as informações de segurança militar correspondiam claramente ao SIM. Esta era a tipologia da lei-quadro
Mas o que e que aconteceu depois da lei-quadro? Surgiram dois diplomas fundamentais, com a assinatura de pessoas ilustres, como o Sr. Dr. Mário Soares e o Sr. Engenheiro Eduardo Pereira, por exemplo, que referiram apenas o seguinte em relação às funções do SIM, leia-se...

O Sr José Lello (PS) - E não havia lá nenhuma do PSD?

O Orador: - Também havia. Apenas quis referir elementos do Partido Socialista para os destacar valorativamente. Se VV. Ex.ª s entendem mal a valoração que quero dar aos elementos do vosso partido, peço desculpa, puis era apenas em sentido contributivo.

Risos do PSD

Como estava a dizer, nesse diploma, no seu artigo 8.º, alínea a), está explícita a capacidade de o SIM fazer todas as acções que respeitem à contra-espionagem, ao contra-terrorismo e à contra-informação Está explícito na lei, que é o diploma orgânico do SIM aprovado pelo Governo liderado pelo Dr. Mário Soares. Ou seja, o Governo, na lei-quadro, refere que a segurança externa corresponde ao SIED e no dia a seguir, na parte que respeita à função militar, atribui-a ao SIM. O Governo do Dr. Mário Soares fez uma lei e no dia a seguir esvaziou-a de metade do seu conteúdo.
Mais, quando o próprio Partido Socialista, então partido maioritário, nessa mesma lei - Decreto-Lei n.º 226/85 -, refere que, nas articulações específicas entre o SIS e o SIM, compete a abordagem das chamadas questões das informações estratégicas globais não militares, o que é que isso quer dizer, Srs. Deputados. Quer dizer o seguinte: não podendo nunca, por ontologia, por ética de serviço de informações e ética democrática, sediar, num serviço de informações de segurança civil, qualquer matéria que respeite a informações estratégicas e dizendo o Governo do Dr. Mário Soares que e preciso articular essa área entre o SIM e o SIS, não podendo ser o SIS, então, quem poderia ser, senão o SIM?! Ou seja, mesmo em relação à segunda área, aquela que era função do SIED, o Governo do Dr. Mário Soares entendeu como possível e desejável que o SIM a abordasse.
Chegámos a uma situação espantosa: o primeiro Governo que derroga a lei-quadro cio sistema de informações é o Governo do Dr. Mano Soares, que esvaziou o SIED e outorgou essas funções ao SIM.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente e Srs Deputados, dir-se-á é rigorosa e totalmente isto ou não! Em nome da verdade, não, pois há uma área que é coberta e que é a única que é coberta pelo despacho do Sr. Primeiro-Ministro: a que respeita à segurança externa exercida sobre alvos não militares. Assim, estando cometida ao SIM a área de segurança externa em alvos militares, resta a segurança externa para alvos não militares.
A propósito, é preciso explicar o que e a segurança externa, porque, há pouco, o Deputado João Amaral, falando disso - na verdade, falando sem saber -, pensava que segurança externa e a acção no exterior do País e não é nada disso. Segurança externa é a protecção que um Estado dá a agentes de génese externa corporizados no seu próprio território, que pode ser de duas naturezas ou incidir sobre alvos civis e militares.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Enquanto o Dr. Mário Soares, no que respeita à área militar, deu essa função ao SIM. no das missões de segurança, a que se refere o artigo 3 º, ponto A, a área civil estava em aberto.
Então, essa, sim - reconheça-se -, é a única razão subsidiária..

O Sr. José Magalhães (PS): - E ilegal!

O Orador: - ... que legitima, a mais, o despacho do Sr. Primeiro-Ministro. Para o resto, o Sr Primeiro-Ministro nem precisava de despacho, pois estava tudo legitimado e tutelado pela acção do Governo do Dr. Mário Soares.

Aplausos do PSD

Quando VV. Ex.ªs falarem desta questão e a atacarem, convirá que leiam, com atenção e rigor, as leis aprovadas pelos vossos próprios governos, onde, e por cima, alguns de VV. Ex.ªs se sentaram. E sentaram-se no sítio exacto onde a lei foi aprovada, assinada e posta em funcionamento, que é o Governo.
É preciso um pouco mais de cautela em relação a alguns comportamentos políticos, sob pena cie a seriedade que apresentamos não se repercutir em todos os actos onde, eventualmente, quereríamos que estivesse
Sr. Presidente, Srs. Deputados A ilegitimidade deste despacho do Primeiro-Ministro e as fusões respeitantes estão esclarecidas. A sua génese e a questão teórica é a de que se trata de um acto que decorre, fundamentalmente, de tudo o que foi organizado, a seguir à promulgação da lei-quadro, por um Governo do Dr. Mário Soares e concretizado pelos Governos seguintes.
Resta-nos a questão da caracterização ou da fusão de áreas. E há duas regras na ética dos serviços de informações em sistemas democráticos: primeira regra, nunca, nenhum serviço de informações de segurança civil actua na área da segurança externa; segunda regra, nenhum serviço que respeite às áreas da segurança militar se confunde com os serviços de segurança interna civil São estas as duas contradições in limine que nenhuma ética de um país de regime democrático aceita.
O que é que este Governo fez e nos propõe? Propõe-nos que as duas áreas que estavam no SIED, ou seja, da segurança externa, sejam assumidas pelo SIM, a quem cabe

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a segurança militar, o que já tinha toda a lógica no tempo do Governo socialista e tem toda a lógica hoje em dia.
Por outro lado, propõe que ali se introduzam ou acrescentem as informações estratégicas não de defesa mas globais, onde também se pode colocar a questão militar. O que são estas informações? Fundamentalmente, Sr Presidente e Srs. Deputados, são informações que habilitam o poder político executivo a tomar decisões, face a uma visão de enquadramento genérico daquilo que pode perturbar - citando o Deputado Jaime Gama, no que referiu há pouco e muito bem - a segurança interna e externa de um país É exactamente isso!
Nessa medida, em ética democrática, não há qualquer colisão entre segurança externa e esta área de informações estratégicas. Haveria, se fosse dada ao SIS, haveria, se a segurança externa fosse dada ao SIS, mas nem uma nem outra aconteceram.
O que digo hoje disse-o há 10 anos e está escrito nas 292 páginas das actas da Comissão que discutiu o assunto. Tomara outros Deputados, não o Sr Deputado Jaime Gama, naturalmente, poderem repelir hoje o que disseram nessa altura!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Tomaram outros Deputados, que, hoje em dia, dizem coisas que nada têm a ver com a coerência política que os animou nessa altura! Dá a impressão de que, hoje em dia, são porta-vozes de outrem ou de que, nessa altura, eram porta-vozes não sei de quê!
Sr Presidente, Srs Deputados. Em política, paga a coerência e a honestidade, não paga, politicamente, o desvario e o oportunismo político.

Aplausos do PSD.

Perdoar-me-ão, Srs. Deputados, mas tenho de dar uma pequena explicação ao Deputado João Amaral. O Sr. Deputado João Amaral referiu a grande preocupação que tinha com a atribuição destas áreas ao SIM, por causa da confusão em África entre segurança externa e informações estratégicas.
Gostaria de lhe explicar, um pouco mais, esta questão, para que possa perceber. A segurança externa do SIM não é exercida em África, é exercida em território nacional. E quando V. Ex.ª diz isso, faz pressupor, face ao conceito de informações, que está preocupado com a perturbação que os Estados de Angola, Moçambique ou Guiné procurem fazer no Estado português. Ou seja, o Sr. Deputado, além de não perceber a questão, legitima a assunção desses países poderem, eventualmente, provocar perturbações no espaço português.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Como democratas e como pessoas que acreditam na cooperação e na irmandade lusófona com esses países, não aceitamos esse ponto de vista, pois ele é perturbador das nossas relações com África!

Aplausos do PSD

O Sr João Amaral (PCP): - Não se lembra das histórias da Frelimo e da DINFO, ou está a fazer de conta que não se lembra?

O Orador:- Não é nada disso! V. Ex.ª nem sequer percebe o que disse!
A segunda questão básica que transpareceu deste debate, bem como de outros anteriores, foi o problema da fiscalização.
Sr Presidente. Srs Deputados: É preciso dizer que quem propôs todo o esquema previsto - e alguns artigos até os votou sozinho - foi o Partido Socialista. Isso está nas actas e posso citar a página, pois trouxe-as todas, para se poderem ler as declarações e o que se fez nessa altura.
O sistema é o sistema do PS que nós apoiámos e a que fomos leais, mas houve pontos de que discordámos. Apesar de tudo, mantivemo-nos rigorosos à lei, porque, independentemente dos governos, a lei e que vale e nós respeitámo-la. Gostaríamos que outros dessem esse exemplo!

Aplausos do PSD.

Há três formas de fiscalização dos serviços. Não temos receio de dizer o que consideramos, como o Deputado Jaime Gama e o PS, e, nisto, também assumo a intervenção do Sr. Deputado Jaime Gama, em nome do PS. Não assumi outras, em nome do PS, mas assumo a sua.
Em relação à sua preocupação e ao facto de o seu discurso dizer que não são fixistas neste domínio, quero dizer que nós também não.
O Sr. Deputado disse que estavam abertos ao diálogo, o PSD também está.

O Sr. José Lello (PS): - Ah! Muito bem!

O Orador: - Sempre estivemos!

O Sr José Lello (PS) - Onde?!

O Orador: - Mas o debate e o diálogo faz-se com regras de respeito e de lógica, não de chicana política. O PSD sempre aplaudiu e respeitou uma oposição honesta, capaz e competente Nós aspiramos a essa oposição capaz e que até venha transmitir incentivo à nossa própria acção.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Prestigiamos a democracia, estamos todos aqui para isso, e é por isso que estamos de acordo com o facto de pensar algumas questões.
Estamos de acordo com o Deputado Jaime Gama, quando diz que há três formas de controlar o serviço de informações. Naturalmente, há a Comissão de Protecção de Dados, o Conselho de Fiscalização e a função parlamentar Nunca excluímos a função parlamentar!
Sr. Presidente, Srs Deputados: Nunca o PSD poderá dizer que não a um inquérito ou a um debate parlamentar, se, porventura, a matéria de facto provada ou quase provada for de tal gravidade que justifique que a Assembleia não a escamoteie. O PSD não escamoteia estas questões, mas trazerem-nos princípios abstractos, de acção genérica, sem qualquer concretização formal, justificativa ou tipificante de uma situação delitual ou criminal... Não podemos pactuar com situações abstractas, mas. sim, com situações concretas! Ai de nós, se fechássemos os olhos! E nunca o faremos, mas procederemos com serenidade, porque se trata de matéria responsável e séria! Também por isso admitimos a intervenção parlamentar!
Em relação ao Conselho de Fiscalização, há uma pista que poderemos dar: a prática do anterior Conselho revelou-se frutífera, porque. Srs. Deputados, é preciso que se saiba - e o Sr Ministro da Defesa teve a coragem política

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de, há pouco, ler algumas passagens que o elucidaram - que o Governo foi mais além do que a lei referia, em termos de fiscalização. Sublinho, mais além!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A lei refere que o Governo habilita-se a discutir com o Conselho e fornece-lhe informações gerais ou complementares. O que o Sr. Ministro da Defesa nos veio dizer foi que houve mais: houve visitas, houve contactos directos com o serviço houve ligações com os serviços, acompanhadas ou não, pelo Conselho. Ou seja, na prática, a fiscalização por parte do Conselho foi mais além do que a lei permitia, e ainda bem, porque e das praxis, reais e positivas, que se extrai virtualidades para a elaboração de uma nova lei.
Mas atenção, Srs Deputados, a forçada demissão de dois elementos do Conselho criou um problema que está para além da fiscalização e que e um problema de natureza político-partidária, porque foi incitado a isso.
Enquanto não for reposta a questão, na base ética.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... do procedimento que o Governo teve com a oposição e com o Conselho em particular, o Governo não tem legitimidade, de espécie alguma, para voltar atrás no seu comportamento.

Vozes do PSD:- Muito bem!

O Orador: - Quem o tem de fazer não é o Governo.

Aplausos do PSD

O Governo nunca procedeu desta maneira, em termos de violar a legalidade, pelo contrário, ultrapassou-a.
Para concluir este ponto, gostaria que a prática futura do Conselho pudesse ser da mesma natureza que foi a anterior, com a excelência das pessoas que lá estiveram e com o seu mento. Nessa altura, se a prática resultar positiva, talvez a própria lei possa, um dia, configurar o que a prática já fez, já deu, e que, nessa altura, tenha aceitação legal aquilo que a prática quotidiana introduziu.
Desejaria que chegasse rapidamente esse momento. É uma área em que apelo ao consenso que o Deputado Jaime Gama nos sugeriu e que devolvemos desta forma: com todo o prazer, estaremos também em consenso com VV. Ex.ªs quando isso acontecer.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quanto à fiscalização financeira, gostaria de abrir uma pista a título pessoal. Já penso nesta questão há 10 anos, na altura não tive oportunidade de fazer a proposta, nem a vou fazer agora, porque não tenho legitimidade política para falar em nome do meu grupo parlamentar, já que não a discuti aí.
Aceito o argumento do Sr Deputado Jaime Gama, porque é, de facto, um argumento verdadeiro, pois assistimos em Itália ao uso indevido de dinheiros por parte dos serviços de informações. E um País não pode, nunca, escamotear a verdade do que se passa ao seu lado. Não somos ilhas. E é exactamente por não sermos ilhas em sistema de informações que não queremos que a actividade operacional do SIS seja devassada, porque não é só a sua actividade operacional com informações, mas é também a informação que vem do SIS mais a informação que lhe é canalizada do exterior. E quando se penetra nessa área não é só na área operacional que diz respeito aos portugueses, mas numa área operacional que tem contributos de cooperação de muitas entidades em muitos sítios do mundo. Se violamos isso, violamos não só a posição do SIS mas toda a credibilidade dessa entidade face ao exterior.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sc assim se procedesse desacreditávamos o Estado português, e o Sr Deputado Jaime Gama é sensível a isso. Foi por isso que lhe fiz a pergunta: será que a actividade operacional é abrangida por esse Conselho? O Sr. Deputado disse, e muito bem, que não. Estou de acordo consigo, mas diga isso a outros Deputados do seu partido. E mais, olhem para o documento que fizeram, em que permitiam até o acompanhamento da relação do SIS com os serviços de estrangeiros, como os senhores propuseram e consta do Diário.
Meus senhores do PS, por amor de Deus, entendam-se de uma vez sobre aquilo que dizem e o que escrevem.
Sr. Deputado Jaime Gama, é claro que V. Ex.ª não assinou aquele papel, e bem! Era dos Srs Deputados José Magalhães e Jorge Lacão. Se o assinou foi a posteriori. Eu percebo, não era ainda presidente do grupo parlamentar, era preciso fazer uma manobra. Tudo bem! De qualquer forma, percebe-se! Percebe-se a diferença fundamental que existe entre a seriedade, a lógica, o conhecimento e a responsabilidade e o devaneio. É evidente!

Aplausos do PSD

Aceito, Sr. Deputado Jaime Gama, por motivos financeiros que haja uma hipótese de juizes do Tribunal de Contas, ajuramentados pela forma de segredo de Estado, poderem ter uma ligação com os Serviços de Informações, dentro dos próprios serviços. O que não aceito é que as contas do SIS sejam sujeitas a uma devassa pública, que venham para o exterior. Primeiro, as contas do SIS são aprovadas na Assembleia, na Comissão respectiva (o envelope financeiro) e, depois, tal e qual como VV. Ex.ª concordam.

O Sr. José Lello (PS): - Ninguém disse isso!

O Orador: - Sr Deputado José Lello, sei que V. Ex.ª está geralmente de acordo comigo. Só o confirmo, muito obrigado! Espero que isso não crie problemas no seu partido.

Risos.

Como estava a dizer, admito essa possibilidade. É uma possibilidade que devemos sempre ser capazes de corrigir no tempo, porque onde pode haver riscos para a democracia e para o funcionamento dos serviços, em termos éticos, nunca pode haver uma mentalidade fixista nem rígida. Não é o nosso caso!
Sr Presidente, Srs. Deputados: Uma terceira questão, relativa à segurança interna. Devo dizer que quando a lei fixou, há 10 anos, que o SIS se responsabilizava pela garantia e preservação da segurança interna e, particularmente, de três ou quatro situações graves como o terrorismo, a espionagem, a subversão ou a sabotagem, estávamos num momento em que o quadro institucional externo favorecia possibilidades numa destas áreas e em que o quadro em

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que se vivia internamente era acompanhado de uma grave conflitualidade social em termos de terrorismo.
Relativamente à segurança interna, o quadro internacional mudou, como muito bem lembrou o Sr. Deputado Adriano Moreira, na intervenção que fez aqui há alguns dias atrás. Hoje em dia, não podemos esperar do terrorismo e da sabotagem a mesma caracterização e natureza que há uns anos atrás. Não que esse problema desaparecesse, mas tem outra natureza. Simplesmente, acrescentámos outras valências. A prática histórica da criminalidade mundial de alto risco mostra que, hoje em dia, o terrorismo está associado ao problema da droga, ao problema do tráfico de armas ou, pior ainda, ao problema do branqueamento de capitais.
A segurança interna não é hoje uma questão que se envolva específica, unilateral e unidimensionalmente com a questão do terrorismo, da sabotagem ou, eventualmente, da espionagem. É um amplexo de questões de gravidade multimodal que se articulam entre si e que fazem com que alguns detentores de poderes nestas áreas já controlem até países.
É mister adaptar a mentalidade, a inserção e a postura neste novo amplexo, mas é também essencial não esquecer que a tutela básica onde se movem estas situações é a segurança interna. Dir-me-ão: o SIS pesquisa partidos e sindicatos, porque faz relatórios sobre a inflação, o desemprego, a situação social nos têxteis.

O Sr. José Magalhães (PS): - Cabe-lhe fazer isso?!

O Orador: - Meus senhores, o SIS não investiga entidades, o SIS investiga fenómenos sociais. Todos, não! Investiga só os fenómenos sociais que podem ter uma implicação grave na perturbação de garantia da segurança interna.

O Sr. José Magalhães (PS): - A inflação!...

O Orador: - Com certeza, Sr. Deputado José Magalhães! Inflação como há, por exemplo, na América Latina é evidente que e um problema gravíssimo! Em Portugal já não é.

O Sr. José Magalhães (PS): - Prefiro o Banco de Portugal!

O Orador: - É óbvio que V. Ex.ª, hoje em dia, até é patriota, até se agrada e é feliz por ser português e por não viver nesses cenários. Como o compreendo e como V. Ex.ª, infelizmente, está a dar razão, para si próprio, à acção do nosso Governo em controlar a inflação. E diz muito bem e pensa melhor ainda!
Não pensa o que diz e diz o que não pensa! Mas isso é outra coisa!

Risos gerais.

O Sr. José Magalhães (PS): - Prefiro o Banco de Portugal ao SIS!

O Orador: - A segurança interna é sempre mister de abordagem não como entidades, mas como fenómenos. Extinguir ou extirpar isto é retirar a capacidade pedagógica de dar quadros permanentes de análise ao decisor político.
Sr. Presidente, Srs Deputados: Infelizmente, não quero maçar mais a Câmara, poderia dizer muito mais coisas...

O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Chega!

O Orador: - Realmente, penso que chega, mas se é preciso mais, façam favor. Façam perguntas, estou aqui para isso.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quero ainda dizer o seguinte: o Governo soube, e saberá em qualquer altura, apoiado pelo PSD, ter uma postura de diálogo e tentar a convergência com as forças democráticas que o queiram.
De acordo com princípios, a convergência e o consenso não são obrigatórios, como disse e explicou há pouco o nosso Ministro da Defesa Nacional. Ela é vantajosa se dialogarmos e se nos debatermos pelos princípios.
Os princípios que temos nesta área são: primeiro, a concentração de dois serviços num só, que e possível e estava relativamente bem legitimada já por acções pretéritas que não são deste Governo; segundo, a coordenação e a fiscalização. Mas perdoe-me, Sr. Deputado Jaime Gama, uma expressão de discordância, quem deve avaliar o valor do output da produção de informações nunca pode ser uma comissão que tem como objectivo a ética, a transparência e os direitos humanos, mas sim o utilizador, e esse é, fundamentalmente, o poder executivo.
Nesse aspecto, tenho uma divergência fundamental em relação a si. O meu amigo sabe que, nos Estados Unidos, por exemplo, se faz a separação entre o Comité dos 40 e o dos 11. Os do 40 como orientação genérica e dos 11 como orientação recursiva, para aquilo que se chama a reversão do tipo de pesquisa e o produto final que sai dela.
Por isso, até nos Estados Unidos é feita a separação conceituai. Peço-lhe que não mantenha esse ponto de vista, porque não e bom, não é produtivo.
Por isso, deverei dizer que a nossa postura será, nesta como noutras questões, a da abertura ao diálogo, percebendo que a segurança dos cidadãos e das instituições dos Estados democráticos é fundamental, mas também sabendo, nós, democratas, que não é permitindo que se viola a democracia e que se violam as regras fundamentais do Estado de direito. Podemos marchar! Não são os fins que justificam os meios. Em democracia, os meios valem por si.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Eduardo Pereira, João Amaral, Jorge Lacão, José Lello e Jaime Gama.
Tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Pereira

O Sr. Eduardo Pereira (PS) - Sr Presidente, tenho a palavra e tenho um problema: não tenho tempo! Porém, prometo não gastar mais do que um minuto.
Sr. Deputado Ângelo Correia, lamento que não esteja aqui presente o Sr. Secretário de Estado Luís Filipe Menezes, pois eureka, está encontrado o general! Com um senão: é que o general vem da área dos desertores. Isto deve ser uma coisa horrível. Mas, paciência, está encontrado um grande general!
Portanto, os meus parabéns ao Sr. Deputado Ângelo Coreia, que soube escolher a discussão desta matéria para se impor dentro do seu partido, que bem merece os meus parabéns!
Quero também congratular-me pelo facto de o Sr. Deputado Ângelo Correia ter dito, em nome do seu partido - portanto, já como general -, que estão abertos ao diálogo, que é qualquer coisa que, dentro do seu partido, ainda ninguém disse em relação a esta matéria. De qualquer for-

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ma, pela maneira como o Sr. Deputado Ângelo Coreia soube compreender a posição assumida pelo meu líder parlamentar e trouxe um apport que é sempre interessante nesta matéria, quero também congratular-me por isso. Já não posso congratular-me por uma ou outra coisa que disse e que são menos certas. Por exemplo, quando falou dos debates em comissão, em determinado momento disse «e o PS votou sozinho». E isso pareceu que seria um crime.

O Sr. Ângelo Coreia (PSD): - Não!

O Orador: - Sr. Deputado, só um momento. Tenha calma! Digo-lhe mesmo, os generais não se podem enervar.
Nós não cometemos qualquer crime, quem cometeu um crime foi a sua bancada, porque a lei que estava a ser discutida era uma lei que tinha sido elaborada pelo Sr. Prof. Mota Pinto, então líder do seu partido, com a minha modesta ajuda e a do Sr Deputado Rui Machete. Sendo uma lei do seu partido, tivemos de votar quando vimos que os senhores ficaram sentados. Aliás, os senhores, de vez em quando, têm destas coisas no interior do partido.
Portanto, não aceito o que me disse «entendam-se dentro do partido» e devolvo-lho, dizendo «aproveite Sr. General, para se porem de acordo dentro do seu partido».

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr Deputado Ângelo Correia

O Sr Ângelo Correia (PSD): - Sr. Deputado Eduardo Pereira, fiquei na dúvida se V. Ex.ª também queria ser promovido. Ou, antes, fiquei na dúvida se V. Ex.ª quer ser promovido.

Risos do PSD.

Não sou desertor! Estou, hoje, aqui, na primeira fila, o que significa que, em alguns momentos, o meu partido é excelente porque consegue dar liberdade aos seus militantes, inclusive, aos seus Deputados. Em muitos assuntos temos divergências, mas quando é preciso, em assuntos essenciais, estamos todos unidos.

Aplausos do PSD

Não sei se o vosso partido vos dá essa liberdade; O meu dá, tanto a um como a todos nós, e por isso estamos aqui em comunhão, não no deserto nem para desertar, antes pelo contrário, para travar várias batalhas.
Sr Deputado Eduardo Pereira, a contribuição do seu líder parlamentar, hoje, não foi só oportuna, foi importante e valiosa, e V. Ex.ª está feliz por isso, em particular também.

Risos do PSD.

Ajuda à promoção!

Risos do PSD.

V. Ex.ª, pelo visto, também a quer.

Risos do PSD.

O Sr Deputado tocou uma questão muito curiosa, que me lembrou problemas de lealdade interna como o meu querido e velho amigo Professor Mota Pinto. E vou dizer-lhe qual foi, exactamente, o ponto em que nos abstivemos, em que não quisermos votar a favor.
Fizemo-lo porque a proposta apresentada pelo Governo, quando chegou à Assembleia, vinha de uma determinada maneira e, quando chegou à Comissão, o Partido Socialista mudou-a. Sabe qual foi a alteração? A proposta do Governo apontava para uma comissão parlamentar e quando ela chegou à Comissão, o Deputado Jorge Lacão - e tenho aqui o Diário com as suas intervenções, trouxe-as todas! - disse: «Não, isso é inconstitucional, vamos é pôr um Conselho de Fiscalização». Mas, privadamente, disseram outra coisa: «Comissão, não, porque isso podia obrigar não a três membros, o que seria inconstitucional, mas a mais e a dar assento a outros partidos, o que nós não queremos. Como tal, vamos criar um Conselho de Fiscalização que,...

Vozes do PSD: - Ah! Foi o Lacão!

... com três membros, não dá essa hipótese.»

Aplausos do PSD.

Foi essa, Sr. Deputado Eduardo Pereira, a lógica, porque, por coerência, fomos apoiantes da proposta do Governo, que foi mudada e não quisemos obstaculizar, quisemos manter também a solidariedade governamental, em nome da coerência prévia a um diploma que tinha as assinaturas do Dr. Mário Soares e do Professor Mota Pinto.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr Presidente, vou ser muito breve, para não consumir o tempo que, generosamente, nos cedeu.
Curiosamente, não sei se hei-de dirigir a primeira pergunta que quero fazer ao Deputado Ângelo Correia se a todos os Srs. Deputados. A pergunta é seguinte: não acham que «cheira aqui a namoro»?

Risos gerais.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Não!..

O Orador: - Cheira, cheira!..
Quero assinalar que a substância da questão é pequena, porque o Sr. Deputado Ângelo Correia teve o cuidado de retirar da sua intervenção todas as arestas que pudessem ferir o desenvolvimento do processo, o que, aliás, não fez o Sr. Ministro da Defesa Nacional, aqui presente, que teve uma discurso que o Sr. Deputado Jorge Lacão referiu como uma intervenção quadrada, do tipo «em frente marche».
A minha pergunta é a seguinte. Sr Deputado Ângelo Correia, já que presidiu à Comissão que, em 1984, votou esta Lei dos Serviços de Informações, pode dizer-nos se estava no espírito dos que a votaram que os Serviços de Informações de Segurança tivessem missões do tipo das que estão a Ter! Estava no espírito deles, nomeadamente, que os Serviços de Informações de Segurança pudessem ter intervenção a nível das actividades sindicais, da actividade dos partidos políticos, etc.?

O Sr. Presidente: - Sr Deputado Ângelo Correia, havendo mais oradores inscritos para pedir esclarecimentos, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Respondo já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra, Sr. Deputado.

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O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Sr. Deputado João Amaral, muito obrigado pela pergunta que me fez.
Trouxe comigo alguma documentação e, em primeiro lugar, faço referencia à página 225 do Diário do dia 24 de Julho de 1984, II Série, onde constam as seguintes palavras por mim proferidas: «Não há incompatibilidade entre o Serviço cie informações Estratégicas de Defesa e os Serviços de Informações Militares. Porquê? Porque pode ser que uma parte dos instrumentos dos Serviços de Informações Estratégicas de Defesa seja um vector militar, isto é, que sejam os próprios órgãos militares. Logo, é possível a sua coligação.»
Isto foi defendido perante o silêncio total do Partido Socialista, nessa altura. Está aqui escrito!... Com o silêncio total do Partido Socialista, que ouviu, aceitou e abanou a cabeça ferozmente. Só havia uma pessoa que, nessa altura, não abanava a cabeça ferozmente, o Dr. José Magalhães, que, curiosamente, dizia assim do Dr. Jorge Lacão, conforme está reproduzido na página 182 do mesmo Diário...

Risos do PSD.

«O Sr. Deputado Jorge Lacão lembra-me o condutor que, chegando a uma rua e vendo o sinal de proibição, em vez de arrepiar caminho, abre a porta, sai do carro, derruba o sinal e, calmamente, engrena a primeira, a segunda, a terceira e vai pela rua em sentido proibido.»

Risos do PSD.

O Sr. José Magalhães (PS): - Isso está bem dito, mas foi dito a propósito de que matéria?

O Orador: - Foi a propósito da matéria que respeita à comissão de fiscalização.

Risos do PSD.

Ou seja, nessa altura, o Sr. Deputado José Magalhães dizia isto ao Sr Deputado Jorge Lacão, que defendia poderosamente a sua dama, o Conselho de Fiscalização. Hoje em dia, vemos o que vemos, ou seja, e interpretando, o Sr Deputado Jorge Lacão mudou, o Sr. Deputado José Magalhães mantém-se e, mais do que isso, conseguiu ampliar o seu espaço de acção e de doutrinação, levando o Deputado Jorge Lacão a pensar como ele.

Risos do PSD.

Vitória pretérita para o Partido Comunista!

Aplausos do PSD

O Sr Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr Presidente, Sr Deputado Ângelo Correia: É evidente que, com a particular habilidade que o Sr. Deputado tem para a tirada retórica, alguns dos seus discursos têm o interesse de produzir aquilo a que eu chamaria - e não me leve a mal - o efeito fácil. E o efeito mais fácil é invocar uma certa técnica escolástica e procurar colar certas afirmações fora do contexto para, depois, numa técnica de amálgama, procurar confundir os espíritos. Nisso o Sr Deputado é brilhante, mas não sei se é suficientemente sério do ponto de vista da seriedade intelectual.

Protestos do PSD

O Orador: - Portanto, é a esta matéria que quero reportar-me, começando por dizer-lhe o seguinte: Sr. Deputado Ângelo Correia, a minha posição de 1984, tal como a minha posição de 1994, quanto à natureza do Conselho de Fiscalização é no sentido de que cie não deveria derivar da aplicação da regra do método de Hondt, como uma comissão parlamentar, porque eu não quis então, como não quero agora e como penso não querer amanhã, uma comissão proporcional baseada na lógica partidária.
De facto, aquilo que acho gravíssimo, do ponto de vista da lógica e da natureza da fiscalização dos Serviços de Informações de Segurança, era uma concepção partidária, ou de luta interpartidária, no exercício dessa função. Foi isso o que eu defendi na altura e é isso que eu continuo a defender hoje e não encontra, Sr. Deputado Ângelo Correia, nenhuma afirmação da minha parte que leve a ter de retratar-me deste meu entendimento

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Com certeza que não!

O Orador: - Aquilo que eu hoje digo, Sr. Deputado Ângelo Correia; é que, face à experiência em concreto dos membros eleitos para o Conselho de Fiscalização, face aos alertas continuados dos seus próprios relatórios e, portanto, ao nosso dever de abrirmos os olhos à interpretações que as realidades nos sugerem, é hoje adequado, do ponto de vista institucional, reforçar os poderes e as competências do Conselho de Fiscalização. Considera o Sr. Deputado que isto é um sinal de incoerência grave ou, pelo contrário, é um sinal de atenção às exigências da vida e uma capacidade de adaptar as respostas do Estado democrático a essas mesmas exigências?

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - Agora, Sr. Deputado Ângelo Correia, o que não o vi fazer na sua intervenção foi responder às questões essenciais, para além, digamos assim, da divagação que produziu. E eu gostava de colocar-lhe algumas, relativamente aos temas centrais.
Primeira questão: é o senhor, neste momento, favorável à proposta governamental no que ela contém de alargamento do âmbito de intervenção do Serviço de Informações de Segurança?
Segunda questão, é, neste momento, o Sr Deputado favorável à concentração de uma tutela directa, por parte do Primeiro-Ministro, relativamente ao conjunto dos serviços de informações?

O Sr Presidente: - Sr Deputado Jorge Lacão, peço-lhe que conclua.

O Orador: - Vou concluir, Sr Presidente.

Terceira questão: é o Sr. Deputado Ângelo Correia favorável ao regime da restrição absoluta quanto a depoimentos e declarações dos membros dos serviços, mesmo perante o poder judicial?
Quarta questão é, de facto, o Sr. Deputado Ângelo Correia favorável ou contrário às sugestão do Deputado Jaime Gama em matéria de quadro quanto aos regimes de pessoal e contabilístico?
Ultima questão: ainda sobre a questão da fiscalização e após a experiência que todos pudemos ter, é o Sr. Deputado favorável ou contrário à possibilidade de o Conselho de Fiscalização poder ter uma relação directa com o serviços, não necessariamente mediada ou autorizada pela tutela?

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O Sr Presidente: - Peço-lhe que conclua, Sr Deputado.

O Orador: - Se o Sr. Deputado, sem tergiversação, me responder a estas questões, o nosso debate terá sido útil. Mas peço-lhe um favor não volte a utilizar a técnica da amálgama e não faça mais escolástica, porque os espíritos precisam de ser esclarecidos e não confundidos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Ângelo Correia, havendo mais oradores inscritos para pedir esclarecimentos, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?

O Sr. Ângelo Correia (PSD) - Respondo já, Sr, Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Sr Deputado Jorge Lacão, vejo que V. Ex.ª diaboliza a escolástica. Como não lhe vai a alma!...

O Sr. Jorge Lacão (PS) - Já passou o tempo. Para si, talvez não!

O Orador: - Já?! Óptimo
Sr. Deputado, todos temos os nossos problemas e todos teremos o problema do Jean Barois.

O Sr José Magalhães (PS): - Essa é profunda!

O Orador: - Não é profunda, e vermelha.

Risos do PSD

O Sr. José Magalhães (PS): - Foi quando o Jean Barois, que era ateu, descobriu Deus ou foi antes?

O Orador: - Foi quando ele olhou para V. Ex.ª.

Risos gerais

Sr. Deputado José Magalhães, não estou a chamar-lhe Mefistóteles. Não, não, não! Não é isso, sinceramente! Foi uma blague e peço-lhe desculpa. Fi-lo só pela admiração que tenho por si...

O Sr José Magalhães (PS): - Ri com gosto!

O Orador: - ... pela coerência que tem tido,...

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito obrigado!

O Orador: - ..e pela capacidade de doutrinação que tem, alargada,...

Risos do PSD.

O Sr. José Magalhães (PS): - Venenoso!

O Orador: - Venenoso, não V. Ex.ª é que tem uma capacidade alargada. V. Ex.ª não tem um conceito de defesa alargado, tem um conceito de ataque alargado, o que é diferente.

Risos do PSD.

Mas isso ó o contrário de SIS, é o anti-SIS. Não é o anti-Cristo, é o anti-SIS. É curiosíssimo!

Risos do PSD.

Sou a favor, claramente, ou pelo menos, não tenho objecções, como expressei há 10 anos nas actas das reuniões da subcomissão, da possibilidade de conexão, articulação e fusão entre o SIED e o SIM.
Há pouco, o Sr. Deputado Jaime Gama colocou uma questão muito curiosa sobre isso, que complementa a questão colocada pelo Sr. Deputado Jorge Lacão. Foi ela até que ponto a DIMIL pode ser um terceiro serviço, um sucedâneo ou uma parte, hoje, do SIS.
Aquilo que ouvimos e lemos em relação à DIMIL é que se trata de um órgão de apoio, de informação operacional das Forças Armadas, ou em campo de batalha. Julgo que não terá uma envolvência para além disso. Se assim for, a cautela que o Dr. Jaime Gama quis colocar não tem razão de ser e, a fortiori, a questão que o Dr. Jorge Lacão coloca não tem qualquer espécie de verosimelhança ou de razoabilidade.
Segunda questão, julgo, pela leitura que fiz do diploma, que os funcionários do SIS não estão isentos de acção penal. Não estão nada isentos!

O Sr. José Magalhães (PS) - Então, e o segredo de Estado?

O Orador: - Desculpe, Sr. Dr. José Magalhães, são questões completamente diferentes!

O Sr. José Magalhães (PS): - Eu sei! E a proibição de ir a tribunal?

O Orador: - São questões completamente diferentes.
Um funcionário que se recuse, por motivos de segredo de Estado, desde que um dossier ou uma matéria seja classificada como tal, não pode ir contra essa circunstância.

O Sr José Magalhães (PS) - Logo.

O Orador:- Logo, não! Não é a mesma coisa dizer que um funcionário do SIS não vai a tribunal Vai, vai,.

O Sr. José Magalhães (PS): - Vai?

O Orador: - ... se cometer qualquer tipo de delito ou crime, excepto no que respeita à divulgação dessa matéria. Mais: ele iria, isso sim, a tribunal, se divulgasse aquilo que, por lei, está proibido. Aí sim! Não está a sugerir que o funcionário viole a lei?!.. Portanto, obviamente que estou de acordo com essa circunstância.
Quanto à selecção de pessoal. Sr Deputado Jorge Lacão, pensei muito nesse assunto, até pelas questões que, há pouco, o Sr. Deputado João Amaral e até o Sr. Deputado Jaime Gama, com alguma profundidade, levantaram.
A função pública costuma ter limites temporais de entrada, por exemplo, os 35 anos de idade e determinados tipos de circunstâncias. Para um serviço de informações, onde a particularidade é dispor de capacidades muito específicas, muito selectivas, o problema da idade não deve pôr-se. Mais: também como na política, o peso dos anos e a experiência são fundamentais, assim como o lastro.
Por isso, estou de acordo que, em muitas circunstâncias, eles sejam isentos em relação às regras gerais da função pública e possam ter um estatuto de entrada que não tenha nada a ver com a idade nem com a categoria profissional mas, antes, com a sistemática da sua capacidade pessoal em

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relação a determinados assuntos afectos as áreas da segurança e possam aí ser úteis. Nesse aspecto, as regras gerais da Administração Pública não devem ser utilizadas.
Mas digo mais: o que está mal, não é o que está aqui; o que está mal é a excepção não ser utilizada noutras circunstâncias para outros organismos do Estado, porque noutros também se podem pôr questões análogas à que se põe em relação ao SIS.
Quanto à contabilidade, já respondi. Em relação à tutela do Primeiro-Ministro, recordo, Sr. Deputado Jorge Lacão, como V. Ex.ª defendia claramente que vissem no Primeiro-Ministro o responsável máximo.
E dizia mais! Lembra-se? Quer que eu leia? V. Ex.ª dizia que o Primeiro-Ministro devia ser o responsável último do SIED! Lembra-se disso?

O Sr Jorge Lacão (PS): - Dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Deputado Ângelo Correia, está recordado de quem é que, nos termos da lei actual, da lei vigente, tem essa competência? O Serviço de Informações Estratégicas de Defesa depende do Primeiro-Ministro, que poderá delegar a sua competência noutro membro do Governo Foi exactamente isto que defendi Ligado a um outro princípio, que era o de não haver ligação de tutelas entre este serviço e outros. Compreende, Sr. Deputado Ângelo Correia''

O Orador: - E, nessa altura, o argumento que expendemos foi o de que, desde que houvesse - está escrito em acta - uma delegação de competências no Ministro respectivo, neste caso da Defesa ou da Administração Interna, a questão que se colocava politicamente era de que, quando, na lei, o Primeiro-Ministro diz que é o responsável último, é porque quer assumir a responsabilidade, perante o País, do próprio controlo dos serviços de informações. Donde o próprio Primeiro-Ministro quer dizer ao País, e à Câmara em particular, que é sua a última responsabilidade do próprio controlo democrático e não o delega, naturalmente, o que significa a assumpção máxima de responsabilidade e não de poder.

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: - Com certeza!

O Orador: - Sr Deputado Jorge Lacão, nunca veja a questão das funções na face do poder, veja também na contra-face, que e a responsabilidade. Na questão de informações, o mais importante é a responsabilidade política. O que o Sr Primeiro-Ministro quis dizer foi que, apesar a execução operativa diária poder ser dada a dois Ministros, a responsabilidade política, ou seja, «quem paga as favas», se houver questões, é o próprio Primeiro-Ministro. Isto só o honra, só lhe dá força e só dá força à democracia em Portugal!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Lello.

O Sr. José Lello (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Ângelo Correia, antes de mais, gostaria de dizer quanto me congratulo por V. Ex.ª, em tempos de carência, ter mantido o seu estatuto de generalato! É importante, porque é um general dos autênticos, dos genuínos, não daqueles «generais Tapioca» que, às vezes, vão para as vice-presidências e não falam! O senhor fala!
Sr. Deputado Ângelo Correia, queria pedir-lhe este esclarecimento, muito conciso e concreto. V. Ex.ª afirmou a sua disponibilidade para o diálogo, pelo que adivinho a sua disponibilidade para eventualmente, alterar o diploma. Ora, da intervenção do Sr Ministro Fernando Nogueira, conclui-se exactamente o contrário: uma indisponibilidade manifesta para fazer alterações a esse diploma. Portanto, pergunto ao Sr. Deputado Ângelo Correia se há ou não há contradição entre a bancada da maioria e o Governo e se prevalece a ideia do diálogo ou a do mutismo do Sr. Ministro.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Ângelo Correia.

O Sr Ângelo Correia (PSD). - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Lello, vejo que V. Ex.ª anda preocupado com o problema das contradições! Eu percebo...

Risos do PSD

..., mas o problema não é connosco! Alguma vez o Sr. Ministro da Defesa disse, hoje, que estava insensível, imune, incapaz de dialogar? Alguma vez disse isso hoje? Eu não ouvi! Alguém ouviu nesta Câmara? E mais: quando eu disse que o PSD estava aberto ao diálogo..

O Sr. José Magalhães (PS)1 - Era em geral!

O Orador: - Em geral e em particular.
Com estava dizer, quando eu disse que o PSD estava aberto ao diálogo, lancei um repto ao Dr. Jaime Gama, líder da bancada do Partido Socialista, que é o seguinte houve uma motivação de natureza político-partidária, exterior à questão ontológica, a coisa em si, da informação e do controlo - é exterior a essa, é uma questão meramente político-partidária - é preciso VV. Ex.ªs reporem o problema no âmbito exacto em que cie deve estar, que é o âmbito meramente do Conselho de Informações,...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... e, nessa altura, estaremos disponíveis. Ou seja, eu disse «sim, mas», e o «mas» não é a pedir algo a mais mas a pedir a reposição do status quo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E pedir a reposição do status quo em termos de não ter havido, por parte de nenhum dos membros que lá estavam, um queixume amargo sobre a incapacidade de funcionarem, de dialogarem e de eles próprios terem reconhecido que, na prática, foram mais longe do que a lei permitia, isto só significa, Sr. Eng. º José Lello, que esse desiderato é possível e será o sinal, da vossa parte, quando o fizerem, de que estarão dispostos ao diálogo, como nós já estamos.

Aplausos do PSD

O Sr Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Gama.

O Sr. Jaime Gama (PS) - Sr Presidente, Sr. Deputado Ângelo Correia, queria começar por reforçar uma ideia que

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há pouco transmiti, assim como nós não somos fixistas nem dogmáticos em relação ao modelo de 1984, e óbvio que não consideramos como uma realidade absolutamente intangível todas as linhas que constituem todos os parágrafos das propostas que apresentamos nesta Assembleia. Naturalmente que isto se aplica àquela que apresentámos sobre o Conselho de Fiscalização.
A pergunta que está em aberto, e a que nem V. Ex.ª nem o Governo, até este momento, responderam, é a de saber se o Governo tem também um igual desiderato em relação a esta problemática. É necessário que esse ponto fique esclarecido. E também é necessário que fique esclarecido outro ponto, que é o de saber se essa eventual liberalidade - que V. Ex.ª demonstrou à sodedade porque convalidou a necessária mudança de inúmeros pontos da um regime legal que, hoje, regula os serviços de informações - tem ou não alguma expressão prática na sequência deste debate e tem já domínio de aplicação útil em matéria de reapreciação do decreto que constitui agenda do Parlamento na próxima semana.
Vem aqui V. Ex.ª referir o problema da demissão, dos membros do Conselho de Fiscalização. Não vou pronunciar-me, por várias razões, sobre todo esse procedimento,...

O Sr Silva Marques (PSD) - Mas convinha!

O Orador: - .. mas registo apenas a V. Ex.ª e à Câmara que fosse qual fosse a respectiva motivação, personalidades que se demitem de um cargo não podem ser repristinadas nesse cargo por uma mera declaração de vontade! Seria um caso insólito e desprestigiante para todos os intervenientes num processo dessa natureza.
Aproveito também para perguntar a V. Ex.ª em pormenor se, nas propostas de transformação que defende, inclui a de fazer transferir as responsabilidades da fiscalização do Conselho para uma comissão parlamentar, como se depreendeu um pouco do ligeiro namoro entre V. Ex.ª e outra bancada.
Para finalizar, aproveito para repor a dignidade da nossa bancada no seguinte ponto no entendimento da nossa bancada e no meu entendimento pessoal, se é que posso usar essa expressão, os meus colegas Eduardo Pereira, e Jorge Lacão, quer em 1984 quer em 1994, comportaram-se com um grande sentido das suas responsabilidades políticas e públicas. E VV. Ex.ªs têm de compreender que, na vida democrática, são todos necessários. Até, às vezes, são necessários os mesmos quando, em diferentes momentos, devem defender posições diferentes.
Resumiria esta ideia, sintetizando o que se pode aplicar aos posicionamentos dentro dos mesmos partidos e aos posicionamentos na dialéctica Governo/oposição: parafraseando Jean Paul Sartre, tão do agrado do Sr Deputado Silva Marques,..

O Sr Silva Marques (PSD) - Sem dúvida!

O Orador: - .. pelo menos numa fase idílica da sua juventude,...

O Sr Silva Marques (PSD): - Mesmo actualmente!

O Orador: - ..., diria que há uns que «ils ont tort d'avoir raison», mas é igualmente necessário que haja outros que «ils ont raison d'avoir tort»!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Ângelo Correia.

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Sr. Presidente, Sr Deputado Jaime Gama, é evidente que estou esmagado com a capacidade intelectual e linguística de V. Ex.ª. Atrevo-me a tentar copiá-lo! Compreendo perfeitamente a intervenção última que teve de fazer. É óbvio que, da nossa parte, há disputa política, há debate, até há, às vezes, um pouco de picardia, mas não houve nem há, da minha parte, independentemente da diferença de perfil e de formulação ideológica, qualquer acinte ou qualquer intenção de magoar quem quer que seja. Nunca o fiz nem o farei, mas percebo por que é que o Sr Deputado Jaime Gama teve necessidade de o fazer hoje. É uma questão que não tem a ver comigo nem com o nosso discurso mas com outras questões, que não vou realçar para não colocar um pequeno buraco na dimensão de um buraco maior!

Risos do PSD.

Respeito isso! Até para V. Ex.ª não cair lá dentro! Nunca quererei que V. Ex.ª lá caia!...

Risos do PSD.

A propósito do passado do Dr. José Magalhães, quero dizer que tenho muito respeito e muita admiração por ele. Dele espero sempre - lembra-me os clássicos - mais uma novitas florirat mundi do que uma recherche du temps perdu, parafraseando o francês do Sr. Deputado Jaime Gama.

Risos do PSD.

Nesse aspecto, todos nós temos e teremos sempre o prazer de o ter connosco pela sua vibração, pela sua inteligência, pela mudança, pela sua evolução, porque só não evolui quem não é inteligente e não é capaz!
Sobre a questão política que o Sr. Deputado Jaime Gama coloca hoje, gostaria que percebesse algo. V. Ex.ª está a tratar com um simples Deputado do PSD, que tem alguma particularidade nesta questão porque, ao longo de muitos anos, estudou, tem lido, tem visitado, tem dialogado com muitas entidades acerca destas matérias, mas que não tem autoridade política para poder falar em nome do Governo. Quem sou eu!? Nem sequer me sento na primeira fila da bancada do meu partido, estou na sexta, estou na última, sou o mais humilde dos Deputados que aqui estão! Hoje estou aqui, porventura, porque se trata de uma questão que estudei um pouco mais e da qual sei um pouco mais, mas só isso. Portanto, falei em tom e em nome daquilo que sinto e da disponibilidade genérica que o meu grupo parlamentar, em todas as matérias, tem demonstrado e manifestado.
Quanto a questões concretas e no tocante ao Governo, Sr. Deputado Jaime Gama, é a ele que deve perguntar e não a mim. Mas mais: o debate de hoje é um prelúdio porque hoje não é o debate do diploma respeitante aos serviços de informações mas o debate de quadro geral, é um debate teórico onde se permitem posições teoricamente dialogantes, visto que ambos não somos fixistas.
Quanto a concretizações e pormenorizações, Sr Deputado Jaime Gama, essas virão a seu tempo, naturalmente que com a contribuição de todos, incluindo de V. Ex.ª.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos efectuar um pequeno desvio da nossa ordem de trabalhos para proceder a votações.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, parece-me que não é aceitável que, quatro horas depois do início do debate, tendo tido a Mesa a abertura que quis ter, permitindo que os tempos fossem ultrapassados, se invoque agora uma figura regimental para proceder a votações, quando há partidos que ainda não usaram da palavra.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, os tempos a que faz referencia foram excedidos em cerca de 21 minutos. A ideia era a de fazermos votações às 18 horas e 30 minutos e, dado que terminou agora uma intervenção, penso que o poderíamos fazer agora, sendo dada depois a palavra aos partidos que ainda não usaram dela, ou seja, o Partido Ecologista Os Verdes e o CDS-PP.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, permita-me que eu não esteja de acordo, pois o meu grupo parlamentar inscreveu-se antes do PSD aceitando inverter a ordem das intervenções. Assim, julgo que a decisão da Mesa não e muito correcta.

O Sr. Presidente:- Isso significa que a Sr.ª Deputada entende que tem de cobrar esse direito? Deu a cedência, mas quer falar agora?

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, não será cobrar, mas que a Mesa proceda de uma forma que, do ponto de vista parlamentar, pode ser perfeitamente aceitável. Uma vez que o tempo já ultrapassado e largamente superior àquele a que o nosso grupo parlamentar tem direito como tempo de intervenção, parece-me que o critério de procedermos neste momento a votações e, pelo menos, um pouco discutível.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, temos aqui um problema de funcionamento, dado que as comissões que estavam reunidas interromperam os seus trabalhos para os Srs Deputados poderem votar. Talvez já tivéssemos terminado as votações se as tivéssemos começado logo!
Assim, vou manter a decisão inicial, passando às votações, e peço desculpa se, entretanto, cometi alguma incorrecção.
Começaremos por votar o voto de pesar n.º 119/VI - De pesar pelo falecimento do jornalista e escritor Orlando Gonçalves (Presidente da AR, PSD, PS, PCP, CDS-PP, Os Verdes e Deputados independentes Luís Fazenda e João Corregedor da Fonseca).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se as ausências dos Deputados independentes Luís Fazenda e Manuel Sérgio.

É o seguinte:

Faleceu Orlando Gonçalves, prestigiado jornalista e escritor, director do Jornal Notícias da Amadora e destacado lutador antifascista. Sob a sua direcção, o Jornal Notícias da Amadora desempenhou um importante papel na resistência à ditadura e pode ser apontado como exemplo do papel de significado nacional que um jornal regional pode desempenhar. Pelas suas páginas passaram no último quarto do século figuras destacadas da intelectualidade portuguesa e manteve-se até à data como um dos órgãos mais prestigiados da imprensa regional.
Orlando Gonçalves foi presidente da Comissão Administrativa da Câmara Municipal de Oeiras e foi membro da Assembleia Municipal da Amadora até ao seu falecimento.
Aos seus familiares, ao Notícias da Amadora e à Assembleia Municipal da Amadora, a Assembleia da República apresenta sentidas condolências.

O Sr. Presidente: - Srs Deputados, foi entregue na Mesa uma carta do Sr Presidente da República que me informa da sua deslocação à República Checa, entre os próximos dias 15 e 17 do corrente mês de Novembro, passando por Genebra e com regresso no dia 19, solicitando à Assembleia da República, por meu intermédio, o necessário assentimento.
O Sr. Secretário vai proceder à leitura do parecer e proposta de resolução da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o parecer e proposta de resolução é do seguinte teor:
A Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação da Assembleia da República, tendo apreciado a mensagem de Sua Excelência o Presidente da República em que solicita o assentimento para se deslocar em viagem de carácter oficial à República Checa, entre os dias 15 e 17, e a Genebra, no dia 18, com regresso a Lisboa no dia 19 do corrente mês de Novembro, apresenta ao Plenário a seguinte proposta de resolução.
Nos termos do n º 1 do artigo 132º da Constituição, a Assembleia da República dá o assentimento à viagem de carácter oficial à República Checa, entre os dias 15 e 17, e a Genebra no dia 18, com regresso a Lisboa no dia 19 do corrente mês de Novembro.

O Sr. Presidente: - Srs Deputados, vamos votar o parecer e proposta de resolução.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se as ausências dos Deputados independentes Luís Fazenda e Manuel Sérgio.

Srs. Deputados, o Sr Secretário vai dar conta de cinco pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr Presidente, Srs. Deputados, o primeiro parecer é do seguinte teor:
De acordo com o solicitado no ofício n º 1021, de 26 de Outubro de 1994, do Tribunal Judicial da Comarca de Oliveira de Frades, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr Deputado José Cesário (PSD) a ser inquirido, como testemunha, em audiência de julgamento, nos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação. Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se as ausência dos Deputados independentes Luís Fazenda e Manuel Sérgio.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr Presidente, Srs. Deputados, o segundo parecer é do seguinte teor:
De acordo com o solicitado no ofício n.º 6324/CV, de 21 de Setembro de 1994, do Tribunal Judicial da Comarca de Oeiras, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de não autorizar o Sr. Deputado Rui Gomes Silva (PSD) a ser interrogado no âmbito dos autos em referência.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação. Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se as ausências dos Deputados independentes Luís Fazenda e Manuel Sérgio.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o terceiro parecer e do seguinte teor:
De acordo com o solicitado no ofício n.º 34168, de 3 de Agosto de 1994, da Directoria de Lisboa da Polícia Judiciária, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Armando Vara (PS) a prestar declarações no âmbito do processo de inquérito em referência.

O Sr. Presidente: - Srs Deputados, está em apreciação. Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se as ausências dos Deputados independentes Luís Fazenda e Manuel Sérgio.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o quarto parecer é do seguinte teor:
De acordo com o solicitado no ofício n.º 1325, de 29 de Setembro de 1994, do Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr Deputado Ângelo Correia (PSD) a depor, por escrito, sobre a matéria dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação. Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se as ausências dos Deputados independentes Luís Fazenda e Manuel Sérgio.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o quinto e último parecer é do seguinte teor:
De acordo com o solicitado no ofício nº 32739, de 21 de Julho de 1994, da Directoria de Lisboa da Polícia Judiciária, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Armando Vara (PS) a prestar declarações no âmbito do processo de inquérito em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação. Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se as ausências dos Deputados independentes Luís Fazenda e Manuel Sérgio.

Passamos agora à votação do projecto de resolução n.º 127/VI- Recusa de ratificação do Decreto-Lei n.º 122/94, de 14 de Maio, que regula a fusão das empresas Telecom de Portugal, S A, Telefones de Lisboa e Porto, S A. e Tele- difusora Portuguesa, S.A. (PCP) [ratificação n. 121/VI (PCP)].

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra da PSD, votos a favor do PS, do PCP, de Os Verdes e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca e a abstenção do CDS-PP.

Passamos à votação do projecto de resolução nº 128/VI- Recusa de ratificação do Decreto-Lei n.º 168/94, de 15 de Junho, que aprova as bases de concessão da concepção, do projecto, da construção, do financiamento, da exploração e da manutenção da nova travessia sobre o Tejo em Lisboa, bem como da exploração e manutenção da actual travessia, e atribui ao consórcio Lusoponte a respectiva concessão (PCP) [ratificação n.º 122/VI (PCP)].

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e votos a favor do PS, do PCP, do CDS-PP, de Os Verdes e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

O Sr. Presidente: - Srs Deputados, porque o projecto de resolução n.º 130/VI - Recusa de ratificação do Decreto-Lei n.º 168/94, de 15 de Junho, que aprova as bases de concessão da concepção, do projecto, da construção, do financiamento, da exploração e da manutenção da nova travessia sobre o Tejo em Lisboa, bem como da exploração e manutenção da actual travessia, e atribui ao consórcio Lusoponte a respectiva concessão (PS) [ratificação n.º 123/VI (PS)] tem o mesmo conteúdo do que votámos anteriormente, considera-se prejudicada a sua votação.
Vamos votar o Relatório e a Conta da Assembleia da República respeitantes ao exercício de 1993.

Submetidos à votação, foram aprovados por unanimidade, registando-se as ausências dos Deputados independentes Luís Fazenda e Manuel Sérgio.

Srs. Deputados, passamos à votação de uma proposta de alteração, subscrita pelo PSD, PS, PCP e CDS-PP, ao I.º Orçamento Suplementar da Assembleia da República para 1994.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se as ausências dos Deputados independentes Luís Fazenda e Manuel Sérgio.

É a seguinte:

Rectificativo

Orçamento das despesas (contos)

Projecto de construção de bloco de gabinete para Deputados .......... . 75 000
Conservação e reparação de instalações ................. 236 908
Construção de um parque de estacionamento subterrâneo na Praça de S. Bento 70000

Orçamento das despesas

Classificação: 0202 0109 IB

Subvenção aos partidos políticos concorrentes às eleições autárquicas de 1993. ... .. 123 250 contos

Srs Deputados, vamos votar a restante parte do I º Orçamento Suplementar da Assembleia da República para 1994.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se as ausências dos Deputados independentes Luís Fazenda e Manuel Sérgio.

Srs Deputados, passamos à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 109/VI - Alteração à Lei n.º 75/93, de 20 de Dezembro (Orçamento do Estado para 1994).

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e votos contra do PS, do PCP, do CDS-PP, de

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Os Verdes e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

Srs. Deputados, estão de acordo em que se vote na especialidade e em votação final global esta proposta de lei n.º 109/VI?

Pausa.

Tem a palavra o Sr Deputado Octávio Teixeira.

O Sr Octávio Teixeira (PCP): - Sr Presidente, não nos oporemos a essa votação mas suscita-se-me a dúvida se a votação na especialidade não devia ser feita em Comissão. No entanto, não levantamos qualquer objecção a que se faça como sugeriu.

O Sr. Presidente: - Sr Deputado, pode ser votada em Plenário e no ano passado assim se fez, embora no dia seguinte.

Pausa.

Como ninguém se opõe, vamos fazer a votação da proposta de lei na especialidade e em votação final global.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e votos contra do PS, do PCP, do CDS-PP, de Os Verdes e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

O Sr Correia de Jesus (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para informar que os Deputados do PSD, eleitos pelo círculo eleitoral da Madeira, vão apresentar na Mesa uma declaração de voto escrita.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr Deputado.

O Sr Mário Maciel (PSD): - Sr. Presidente, também peço a palavra para anunciar que os Deputados eleitos pelo círculo eleitoral dos Açores irão entregar na Mesa uma declaração de voto escrita.

O Sr Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado. Retomando o debate do sistema de informação em democracia, vou dar a palavra, para uma intervenção, à Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: São os serviços de informações e estão em todo o lado: nas ruas, nos cafés, nas empresas, nas escolas, nos movimentos sociais, nas autarquias, nos gabinetes dos magistrados, até. Insinuam-se, manipulam, espiam, infiltram-se, escutam, vigiam, ouvem, gravam, filmam, fotografam, registam, ficham, catalogam.
De forma tentacular, penetram no tecido social. Com inquietação crescente, vêm provar como é vulnerável o Estado de direito, em que é suposto vivermos, como é esvaziada de conteúdo esta ideia de sociedade dita democrática e livre em que nos querem fazer crer.
Eles estão em todo o lado, são os serviços de informações e representam os novos e mais sofisticados instrumentos de controlo social e de repressão política, depois do colapso dos instrumentos tradicionais de normalização que, durante anos, foram o exército, a igreja, a família ou a escola.
São instrumentos mais subtis, mais discretos, mais submersos, que, a par e de modo complementar, agem como muitos outros, tais como os media, a publicidade, as sondagens, o marketing, o próprio urbanismo, no sentido de moldar vontades, de padronizar comportamentos e de condicionar a liberdade dos indivíduos.
São os serviços de informações e utilizam a informática, a electrónica, o vídeo e todos os instrumentos de comunicação e de informação do futuro, não de forma libertária para a aproximação e emancipação das pessoas mas de forma perversa para, entre elas, erguer muros e as domesticar.
São os serviços de informações e estão em todo o lado a lembrar-nos, em cada momento, como e ilusória a liberdade que julgamos adquirida, como é tão frágil este bem e como a sua defesa não passou de moda e é, antes, cada vez mais necessária e urgente, perante estes guardiões da nova ordem, que se multiplicam, cruzam, desdobram e, com o silêncio cúmplice do poder que servem, se mantêm imunes ao poder fiscalizador das instituições, de todos e cada um de nós.
Eles estão em todo o lado, devassam a intimidade, atentam contra pessoas e bens, violam direitos fundamentais da pessoa humana, sempre, sempre a bem da Nação, dizem, e de um Estado autoritário e burocrático, dizemos nós, de um Estado que cada vez menos se assume como o administrador da nossa vida colectiva e garante do nosso bem-estar e cada vez mais como o proprietário arrogante das nossas mentes, dos nossos bens e dos nossos espaços ditos públicos.
Eles estão em todo o lado, anónimos, refugiados no hermetismo das suas múltiplas siglas, a justificar, por cada nova suposta liberdade, mais uma nova restrição, um novo ficheiro, um sem-número de dados, de nomes, de moradas, de convicções, de gostos, de hábitos ciosamente registados por cada um de nós.
Eles são os serviços de informações, aqueles que, em nome da defesa da nossa segurança colectiva, foram criados e aquilo que importa hoje saber, na sua opacidade, é se, afinal, tiveram outro propósito que não o de condicionar liberdade, o de reprimir contestação, o de favorecer o amorfismo, o de permitir o arbítrio, o de estimular a intolerância, o racismo e a xenofobia, com as suas inúmeras e escandalosas ingerências, seja na contestação estudantil, nas manifestações de agricultores, nas reuniões de sindicalistas, na vida das autarquias, nos serviços de fronteiras, nos gabinetes de magistrados, nas comunidades de emigrantes, nos protestos da ponte ou nos vergonhosos relatórios racistas sobre criminalidade e delinquência urbana.
Importa saber, pelo contrário, se serviram para garantir a nossa segurança e a nossa defesa perante as organizações fascistas, os crimes de «colarinho branco», os especuladores fundiários, os traficantes de droga, de armas ou de resíduos, os branqueadores de dinheiro sujo, os profissionais de exploração de mão-de-obra barata, os mixordeiros que atentam contra a saúde pública e os poluidores sem escrúpulos que destroem o meio ambiente.
Sr Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs Deputados: Para o Partido Ecologista Os Verdes, discutir o «sistema de informações em democracia» é discutir o próprio conceito tradicional e ultrapassado de segurança e de defesa que o justifica. Um conceito que, para nós, se não confina à lógica linear do confronto helicista, que se modificou profundamente, e que, hoje, se traduz noutras dimensões mais abrangentes, designadamente na segurança ecológica, mas que tem, sempre, sempre, de ser equacionado na óptica dos direitos fundamentais dos cidadãos.
Discutir o «sistema de informações em democracia» é, para nós, discutir a sua utilização não como alibi de atitudes autoritárias contra cidadãos, de marginalização de mi-

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norias étnicas, de amputação do exercício de direitos, de perseguição política e de qualquer forma de tentativa de manutenção ou, mesmo, perpetuação do poder, mas na óptica dos cidadãos, da sua defesa, dos seus interesses concretos Aquela óptica em que a informação, como poder que efectivamente é, se torne, numa perspectiva democrática, num instrumento de saber e de poder partilhados, descentralizado, acessível aos cidadãos, facilitador da sua vida quotidiana, profissional e cívica, que permita conhecer direitos perante o ambiente, a Administração Pública, o abuso fiscal, a justiça, e exercê-los e participar das coisas públicas e da vida pública, dando, desse modo, à cidadania o corpo e sentido que ainda não tem.
No entanto, discutir o «sistema de informações em democracia» é também discutir os próprios limites desses direitos, os mecanismos de controlo que definem a fronteira do lícito e do ilícito, do aceitável e do abuso e é, acima de tudo, definir com clareza a existência ou não de sistemas eficazes de fiscalização e controlo desses serviços, na perspectiva da salvaguarda dos direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos que, sob nenhum pretexto, podem ser trocados ou amputados.
Trata-se, por fim, de uma discussão que nos leva a questionar o tipo de sociedade em que vivemos, aquela que hoje condescende em ter «micros» escondidos, escutas telefónicas, câmaras de vídeo simuladas e cidadãos rigorosamente vigiados. Hoje, importa saber e questionar onde está a liberdade, o novo sentido e tipo de sociedade que se desenha e as novas ameaças que sobre nós pairam.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Estas são, seguramente, demasiadas interrogações para muito escassas respostas que o debate não soube encontrar e que, hoje, cada vez mais, se mantêm em aberto, como em aberto se mantém a ideia, para nós cada vez mais enraizada, de que o Estado vigia para evitar ser vigiado!

Aplausos do PCP e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr Vice-Presidente Ferraz de Abreu.

O Sr Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.

O Sr. Adriano Moreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Vou fazer uma intervenção muito curta, dado que a Câmara já está fatigada, mas suficientemente informada sobre esta matéria. Limitar-me-ei, por isso, a fazer alguns comentários restritos a alguns pontos.
O primeiro serve para sublinhar que o clima em que foi discutido este problema pela primeira vez na Assembleia e aquando da votação da lei já não corresponde, hoje, aos factos.
Nessa data, havia ainda uma grande inquietação, sob uma herança cultural antiga mas também sob uma competição, algumas vezes feroz, entre as forças partidárias Ora, essa foi uma das razões, ainda aqui não mencionada, para aquela cautela, tantas vezes invocada, de impedir a concentração das tutelas em relação aos serviços. Nesse tempo, as coligações é que apareciam como o modelo de governo de esperar sair das eleições e a não concentração das tutelas garantia a oportunidade de distribui-las pelos partidos que viessem a compor o Governo.
Essas circunstâncias mudaram inteiramente, assim como o quadro das preocupações a que os serviços de informações tem de fazer face. Não podemos continuar a encarar esta questão como se se tratasse de uma ordem pública interna que estivesse sempre em causa, não podemos continuar a imaginar que há uma luta constante em relação a um governo que não está limitado pela legalidade - algumas vezes faltará a ela, mas não é essa a questão essencial.
O problema é que estes serviços ligados à segurança, à defesa e à informação militar estão, neste momento, em toda a área ocidental, pelo menos, a sofrer uma variação, que corresponde a uma linha evidentíssima na própria NATO, é que a NATO é cada vez menos militar e mais política, porque as responsabilidades que está a enfrentar já não correspondem ao ambiente militar em que foi criada e a que nós também procurámos corresponder nessa data.
Por isso mesmo, a definição dos serviços, neste momento, do ponto de vista técnico, precisa sobretudo de ter em vista a reavaliação dos objectivos, porque esses objectivos, hoje, dizem muito respeito à vida económica, à vida científica, à vida tecnológica, etc., e nós até temos exemplos entre nós. Escusávamos de ter sido surpreendidos com o caso TOTTA, se tivéssemos um serviço de informações habilitado a enfrentar as circunstâncias novas que o País enfrenta.
Por outro lado, no que toca à discrição dos serviços, é necessário ter em conta que eles, ocupando-se da segurança do País, atendendo a factores externos mas debruçados necessariamente sobre a vida interna do País, precisam de ter credibilidade e confiabilidade em relação ao estrangeiro. E estamos talvez esquecidos que, entre 1974 e 1984, Portugal deixou de ser receptor de informações da NATO, porque não era confiável como membro da Aliança Atlântica. Não foi uma humilhação para o País mas uma lição de humildade que ele leve de sofrer. Portanto, este problema da confiabilidade e da credibilidade em relação ao estrangeiro é uma questão que temos de pôr na primeira linha.
Assim sendo, temos, em primeiro lugar, de fazer uma reavaliação de objectivos e de ultrapassar as questões de pura segurança pública e, em segundo lugar, de preservar inteiramente a credibilidade dos serviços em relação à comunidade internacional a que pertencemos.
Depois, devemos também debruçar-nos seriamente sobre a credibilidade de respeito pela lei da parte do Governo. É que nós não podemos fugir à circunstância de que a responsabilidade principal nesta matéria cabe ao executivo e de que o serviço de informações, pela sua própria natureza, não pode estar facilmente acessível a qualquer força política ou instância que o queira analisar. E os serviços mais sujeitos à experiência de controlo democrático dão-nos constantemente exemplos de abusos extraordinários. De facto, foi publicado, há poucos dias, um livro com as memórias do Rei de Marrocos e até ele se mostra surpreendido com os abusos que os serviços de informações do General De Gaulle praticaram naquela data em relação a opositores, designadamente na Argélia.
Todos nos lembramos de que, num grande país de experiência democrática, como é os Estados Unidos, o Presidente Reagan teve dificuldades em explicar como é que aconteceu a intervenção e utilização dos serviços em relação aos Contras.
Os perigos são realmente grandes de que o poder, seja qual for a sua tradição ou o ambiente cultural em que está mergulhado, venha a abusar. Para isso, a única indicação que encontro nos autores que tratam deste assunto, a única garantia, é a honestidade do Governo. Nesta matéria, exactamente como na matéria conexa do segredo de Estado, não há outra garantia que não a da confiabilidade do Governo.

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Por isso, não me espantei que, no debate de hoje, que se travou principalmente entre o PS e o PSD, o PS se tenha aproximado do PSD, pondo acento tónico na eficácia dos serviços e não exclusivamente na defesa dos direitos dos cidadãos. É que um partido que se apresenta como alternativa de governo tem de pôr o acento tónico na eficácia dos serviços e foi isso o que fez a aproximação das duas perspectivas que aqui vimos desenvolver.
Nesta bancada, temos sustentado que a eficácia dos serviços é fundamental, pelas razões que acabei de referir. E para não roubar mais tempo à Câmara, gostaria somente de lembrar que a causa próxima deste debate, bem lembrado, que hoje não é de soluções mas de doutrina geral, foi o veto do Sr Presidente da República. Este veto trata de dois pontos:
O primeiro diz respeito ao número de serviços. Devo dizer que acho curiosa a inquietação com que estamos no sentido de ter três serviços, quando conseguimos viver nove anos apenas com dois. É contra a lei!
Bom, neste momento, devo dizer que, por simples razão técnica de razoabilidade até, tenho dificuldade em querer mais serviços, porque tenho dificuldade em convencer-me de que somos capazes de produzir os técnicos habilitados, com capacidade profissional e idoneidade, para preencher a hierarquia para estes serviços de informações.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Eu imagino que para dois já deve ser a maior das dificuldades, pela falta de tradição académica que temos nessa área, pela falta de preparação, pela falta de experiência. Essa é uma razão suficiente para poder imaginar que uma vez a ilegalidade do Governo correspondeu à realidade da comunidade, e provavelmente os dois serviços são suficientes. Mas vem o problema da fiscalização.
Somos partidários de que o Conselho de Fiscalização não deve ser parlamentar, que deve ser excluída do Parlamento, pois estes são os homens bons, mas, neste ponto, já manifestámos, na intervenção que aqui tivemos aquando da discussão da lei, esta preocupação O Parlamento também terá de intervir algumas vezes, porque, como disse, a única garantia destes serviços, a verdadeira garantia, é a idoneidade do Governo, e essa é discutida, em primeira instância, no Parlamento. Ora, na altura, até sugerimos que se fizesse um apelo à tradição constitucional portuguesa, que tem na sua tradição sessões secretas para examinar questões de alto melindre, e não vou agora tentar sugerir qual seria a modalidade, mas penso que devo insistir no regresso a essa tradição, que é do nosso Direito Constitucional anterior a 1926. E é nesse Direito Constitucional que está esta tradição.
Em segundo lugar, não deixo de me impressionar com a circunstância de as pessoas que constituíam o Conselho e que foram eleitas pela sua idoneidade, como cidadãos responsáveis, se terem demitido, o que, a meu ver, deve ser ponderado. Não podemos ter um Conselho de homens bons que se demitem e não prestar atenção às razões pelas quais o fazem. Penso que, na revisão da lei, se a fizermos, este ponto deve ser considerado.
Eles precisam de alguma autonomia funcional, que não têm. Eles precisam de ter recursos humanos de apoio, que não têm - e esse Conselho não tem recursos. Eles precisam de ter alguma independência funcional, que não têm. E esse aspecto, julgo, não é difícil tomar em conta, o que, em meu entender, seria prestar um serviço à eficácia deste sistema, que responderia também à necessidade de prestar alguma atenção às razões pelas quais este veto foi pronunciado.
Quanto ao resto, não temos de alterar a posição que tomámos aquando da discussão da lei e reiteramos os princípios que, nessa altura, afirmámos.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr Presidente Barbosa de Melo.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr Deputado José Magalhães, que dispõe, para o efeito, de 1 minuto cedido pela Mesa.

O Sr José Magalhães (PS) - Sr. Presidente, o pedido de esclarecimento é brevíssimo e creio que a intervenção do Sr. Deputado Adriano Moreira justifica-o.
O Sr. Deputado Adriano Moreira enfatizou muito - e creio que todos compreendemos porquê - a importância da honestidade dos governantes, designadamente, como elemento de controlo. Mas, como dizia um bom pensador, a que e bom voltar frequentemente, se estivéssemos a discutir um «Governo de anjos e não de homens, nenhuma Constituição e nenhuma lei eram necessárias». Madison disse isto, é um bom duo! E no caso concreto o Sr. Deputado aponta para duas direcções mais autonomia funcional para o Conselho de Fiscalização e meios, que a Comissão não tem. Mas obliterou, suponho que ladeou - e gostaria que se pronunciasse sobre esse aspecto -, um outro aspecto de controlo fundamental, para o qual, aliás, o Sr Deputado Jaime Gama, insistentemente, tentou chamar a atenção, que é o de uma outra metodologia que garanta a qualidade das informações. E essa metodologia, no fundo, passa pela adopção de procedimentos, que são standard em países que têm sistemas e serviços de informações, cuja eficácia é razoavelmente saudada como sendo boa, mas isso passa, designadamente, pela clareza das missões, pela definição, por ordens escritas, que não por comandos verbais, etérios, fluidos, que é sempre possível de desdizer: «eu não disse isso! Ninguém deu essa ordem».

O Sr Presidente: - Sr Deputado José Magalhães, peço-lhe que conclua.

O Orador: - Sr Presidente, a última observação lógica que está no que acabei de dizei é perguntar ao Sr. Prof. Adriano Moreira se não está de acordo em que deveríamos evoluir, em Portugal, para esse sistema formalizador, procedimentalizador, embora não asfixiante, distanciando-nos do modelo anódino que tem causado estes problemas a que assistimos.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr Deputado Adriano Moreira.

O Sr Adriano Moreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Magalhães, gosto da pergunta, mas penso que há aí um pouco de contradição, que é a condenação do regime anódino e pensar que para responsáveis de qualidade não é preciso regra de orientação.

O Sr. José Magalhães (PS): - Eu disse o contrário. É preciso!

O Orador: - Mas eu queria lembrar-lhe que os mandamentos são para as pessoas que se destinam a ser salvas.

Risos do PSD.

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Sábado, 12 de Novembro de 1994 I Série - Número 12

DIÁRIO da Assembleia da República

VI LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1994-1995)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 11 DE NOVEMBRO DE 1994

Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo

Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
José Mário Lemos Damião.
Belarmino Henriques Correia.
José Ernesto Figueira dos Reis.

SUMÁRIO

O Sr Presidente declarou aberra a reunião às 10 horas e 30 minutos.
Em sessão de perguntas ao Governo, usaram da palavra, além do Sr Ministro do Mar (Azevedo Soares), dos Srs Secretários de Estado do Ambiente e do Consumidor (Joaquim Poças Martins), do Emprego e Formação Profissional (José Varatojo Júnior), da Juventude (Maria do Céu Ramos) e das Obras Públicas (Álvaro Magalhães) e do Sr Subsecretário de Estado Adjunto da Ministra da Educação (Carlos Coelho), os Srs Deputados José Sócrates (PS), Isabel Castro e André Martins (Os Verdes), Jorge Paulo Cunha (PSD), Luís Sá e Paulo Rodrigues (PCP), Guilherme d'Oliveira Martins, Joel Hasse Ferreira, Ana Maria Bettencourt e João Cravinho (PS), Narana Coissoró (CDS-PP), Pedro Passos Coelho (PSD), António Filipe (PCP), Luís Nobre (PSD), José Manuel Maia e João Amaral (PCP), António Crisóstomo Teixeira (PS), Manuel Queiró (CDS-PP), Macário Correia (PSD), Isabel Castro e André Martins (Os Verdes), João Salgado e João Matos (PSD).
Entretanto, o Sr Presidente evocou a passagem do 3 º aniversário do massacre no cemitério de Santa Cruz, tendo pronunciado palavras de solidariedade para com o povo de Timor Leste, no que foi secundado pelos Srs. Deputados Mano Maciel (PSD), Guilherme d'Oliveira Martins (PS), Miguel Urbano Rodrigues (PCP), Adriano Moreira (CDS-PP) e Isabel Castro (Os Verdes).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 14 horas e 35 minutos

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a sessão.

Eram 10 horas e 30 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados.

Partido Social-Democrata (PSD):

Adão José Fonseca Silva.
Adérito Manuel Soares Campos.
Adriano da Silva Pinto.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Alípio Barrosa Pereira Dias.
Álvaro José Martins Viegas.
Américo de Sequeira.
António Augusto Fidalgo.
António da Silva Bacelar.
António de Carvalho Martins.
António Esteves Morgado.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Manuel Fernandes Alves.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Alberto Lopes Pereira.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos de Almeida Figueiredo.
Carlos Filipe Pereira de Oliveira.
Carlos Manuel de Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Cecília Pita Catarino.
Cipriano Rodrigues Martins.
Delmar Ramiro Palas.
Domingos Duarte Lima.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva.
Ema Maria Pereira Leite Lóia Paulista.
Fernando Carlos Branco Marques de Andrade.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando Santos Pereira.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco João Bernardino da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Jaime Gomes Milhomems.
João Álvaro Poças Santos.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
Joaquim Cardoso Martins.
Joaquim Maria Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Avelino Braga de Macedo.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José Albino da Silva Peneda.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José de Almeida Cesário.
José Fortunato Freitas Costa Leite.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leite Machado.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira.
José Manuel Borregana Meireles.
José Manuel da Silva Costa.
José Manuel Nunes Liberato.
José Mário de Lemos Damião.
José Mendes Bota.
Luís António Martins.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel da Silva Azevedo.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Maneei Joaquim Baptista Cardoso.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Simões Rodrigues Marques.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues.
Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira.
Maria Helena Falcão Ramos Ferreira.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa.
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Melchior Ribeiro Pereira Moreira.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos.
Olinto Henrique da Cruz Ravara.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Simão José Ricon Peres.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Alberto Bernardes Costa.
Alberto da Silva Cardoso.
Alberto de Sousa Martins.
Alberto Manuel Avelino.
Ana Maria Dias Bettencourt.
Aníbal Coelho da Costa.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes da Silva Braga.
António José Borrani Crisóstomo Teixeira.

ntónio José Martins Seguro.
António Luís Santos da Costa.
Armando António Martins Vara.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Manuel Luís.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa.

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O Orador: - Srs. Deputados, peço desculpa, mas não percebo! Então, quando se constata que o modelo que temos funciona é que os senhores vêm dizer que não querem aquele Conselho de Fiscalização! Perdoar-me-ão, mas isso não tem sentido!

Aplausos do PSD.

Isto significa que, por detrás disto e deste discurso, há outra coisa e outras razões! E também lá irei, muito rapidamente.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Exacto!

O Orador: - Para além deste facto, Sr. Deputado, tudo o mais foi boato, tendo-se chegado ao ponto de o Secretário-Geral do PS ter dito que o SIS estava ao serviço do Partido Social Democrata, coisa em que o Sr. Deputado António Guterres, líder do PS, não acredita! Porque se acreditasse no que estava a dizer, tinha de agir imediatamente e não, apenas, propor a extinção do serviço.
Se isso fosse verdade, o regime português tinha mudado e o Sr. Deputado tinha de exigir a dissolução da Assembleia da República, a demissão do Governo e a realização de eleições, e não o fez!

O Sr Narana Coissoró (CDS-PP): - Por isso apresentámos a moção de censura!

O Orador: - E não o fez porquê? Porque tudo isso não passou de boato e de palavreado. E se compreendo que muita gente, nessa matéria, possa ter a leviandade de acalentar e espalhar boatos, já não compreendo que o Partido Socialista, e muito menos o seu líder político, o faça da maneira que o fez.
Não me parece que isso signifique ter sentido do Estado, o tal sentido de Estado de que, há pouco, falava o Sr. Deputado Jaime Gama.

O Sr Silva Marques (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Pergunto, então: por que razão sucedeu todo este clamor contra o SIS? Porque ocorreram esses factos? Seguramente que não. Existe outra coisa por trás.
É certo que, do lado do Partido Comunista, percebo perfeitamente e não tenho qualquer dúvida em relação à sua posição. É normal e estou a contar com ela: o Partido Comunista não gosta do SIS, nunca gostou e não quer o SIS! E bem podemos agora modernizar ou alterar, de acordo com a época em que estamos a viver, que nunca gostará; podemos alterar a fiscalização, dar mais um ou outro retoque, mas ele não quer que haja SIS. Pura e simplesmente não quer, nunca gostou e nunca gostará!
O drama não é esse. Drama e que o partido que criou o SIS, num debate aceso e polémico contra o Partido Comunista - está no Diário da Assembleia da República -, venha hoje dizer o mesmo que este último, que hoje o Sr. Deputado António Guterres diga a mesma coisa que diz o Sr. Deputado João Amaral. Isso é que me parece grave!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Esse é que e o sinal novo dos tempos!

Aplausos do PSD.

Temos e de nos interrogar por que é que isso acontece. Até lhes digo mais, pode haver casos em que o PS e o PCP digam coisas parecidas, como em questões sociais, por exemplo. Não é muito provável, mas enfim! Agora, em matéria como esta, que o PS tenha um discurso equivalente ao do PCP, que o líder do PS diga o mesmo que o do PCP, meus senhores, alguma coisa de muito errado se passa!
Do meu ponto de vista, a razão e tão comezinha como esta: uns e outros, com esta matéria, querem o mesmo - votos pela maneira mais fácil.
O PS e o PCP querem exactamente o mesmo: ceder à popularidade fácil e, demagogicamente, conquistar eleitores e votos. Não me parece é que este seja o caminho sério para um partido, como o Partido Socialista, trilhar. Podem, outros partidos, caminhar por aí, nesta matéria.
É que, pelo que me pareceu entender da intervenção do Sr. Deputado Jaime Gama, estes caminhos estavam completamente vedados ao Partido Socialista. Mas foi por aí que ele começou a ir.
O que o PS tenta fazer crer, neste momento, e por isso se colou a todo este brouhaha sem sentido e sem fundamento, é que, em Portugal, há um problema de liberdade. É disto que o PS quer convencer os portugueses, de que o Governo do PSD é já quase uma ditadura asfixiante, pois pensa que isto lhe trará votos e pode levá-lo, outra vez, ao poder.
Srs. Deputados, penso que não e por esse caminho que o PS pode lá chegar, mas os portugueses dirão.
Creio que os portugueses - e termino já, porque a minha intervenção já vai longa - não vos levam a sério nestas queixas e denúncias, mas vão levar-vos a sério na vossa falta de sentido de Estado, na facilidade com que trocam princípios por critérios de oportunidade política, tal como o passarem a vida a faltar à vossa própria palavra e a desdizer a vossa própria história.

Aplausos do PSD de pé

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados João Corregedor da Fonseca, João Amaral e Jaime Gama. Como não dispõem de tempo, a Mesa concede-lhes 1 minuto para o efeito.

Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Sr. Presidente, antes de mais. agradeço a V. Ex.ª o tempo que me concede.
Sr. Ministro, V. Ex.ª, inicialmente, disse que tem havido uma campanha jornalística de descrédito contra o Serviço de Informações. Portanto, em última análise, a responsabilidade é dos jornalistas.
Falou também nos boatos, disse que os portugueses não levam a sério as críticas que têm sido formuladas, falou em chicana política, e V. Ex.ª sabe que não faço chicana política, apenas...

Risos do PSD.

Chicana política acabo agora mesmo de ouvir, expressa na gargalhada boçal dos Srs. Deputados do PSD.
Sr. Ministro da Administração Interna, algo paira no ar, e não é por acaso que isso acontece, há um clima intolerável a que convém pôr termo.
Tinha pensado formular uma pergunta mais longa, mas, como não disponho de tempo, a questão que coloco é a seguinte: o SIS ou qualquer outro serviço de informações têm de inspirar uma total confiança à população e, como é evidente, é intolerável que se introduzam factores de desconfiança na população. Mau é quando as coisas acontecem

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dessa forma. Ora, Sr. Ministro, entende que todo este clima, toda esta situação de desconfiança e artificial ou, na realidade, há que travar alguns abusos?
Por último, também era bom que o Sr. Ministro nos dissesse se trava ou não possíveis abusos nestes serviços.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Sr Ministro da Administração Interna, a sua intervenção foi de uma arrogância sem limites.

Risos do PSD.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Que cordeirinho!

O Orador: - Creio que ela merece a seguinte nota política se o Sr. Ministro veio aqui falar das tácticas de outros partidos, deu uma notável exibição das duas tácticas do PSD neste debate, a táctica de «namoro» do Sr. Deputado Ângelo Correia e a táctica de «tractor» de V. Ex.ª, marchando em frente, marchando em frente, até conseguir destruir tudo.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Que cordeirinho!

O Orador: - O Sr. Ministro falou aqui muito de coisas que todos sabem. E todos sabem que o Governo, a certa altura, perante a pressão que havia em torno do caso, na Madeira, deixou, excepcionalmente, que o Conselho de Fiscalização fizesse aquilo que nunca havia deixado anteriormente e, provavelmente, até aproveitou a situação para se desembaraçar de algumas pessoas que já não respondiam aos interesses.

O Sr Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Sr José Lello (PS): - Isso é verdade!

O Orador: - Só houve uma coisa que o Sr. Ministro não fez, que foi abordar as questões que se colocam hoje.

Protestos do PSD.

O que é que o Sr. Ministro entende dos pedidos de inquérito parlamentar que já foram apresentados? Da necessidade de esclarecer o caso da ponte!? Das intervenções do Serviço de Informações no caso da ponte? Da perseguição a partidos políticos? Das informações que surgiram, no sentido de que houve vigilâncias a autarcas, a jornalistas e a partidos políticos?
Faço-lhe uma pergunta final, o Sr. Ministro entende ou não que a questão central que se coloca nestes procedimentos do Serviço de Informações é uma questão de direitos, liberdades e garantias?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Gama.

O Sr Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo fez aqui, por intermédio do Sr Ministro da Presidência e da Defesa Nacional, uma intervenção com a qual se pode estar de acordo ou discordar, mas foi uma intervenção responsável.
A bancada do PSD, a este propósito, fez também um depoimento com princípio, meio e fim.
Lamento que a intervenção do Sr Ministro da Administração Interna...

O Sr. Silva Marques (PSD): - Não faça isso, Sr. Deputado, porque temos de lhe retirar os nossos elogios!

O Orador: - ... tenha enveredado pelo caminho da polémica política.

O Sr. Silva Marques (PSD) - Por que não?!

O Orador: - Isto, porque V. Ex.ª é um Ministro com responsabilidades nesta área e devia ter estado à altura do Governo que representa, para produzir opiniões e pontos de vista do Governo sobre a temática das informações e não para opinar em matéria de chicana política contra um partido que é seu rival.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Por que não?!

O Orador: - Cabe-lhe esse direito, mas cabe-nos também, a todos nós, julgar a forma como V. Ex.ª exerce as suas funções.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Devo dizer-lhe que, para se chegar a este debate, foi necessária uma intervenção cívica, política e institucional seria, em que desempenharam um papel sério colegas meus desta bancada, o Secretário-Geral do meu partido e o Presidente da República.
V. Ex.ª, com a intervenção que produziu, não me vai fazer arrastar para o campo da polémica, porque esta questão é demasiado importante para ser tratada dessa forma.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Há, todavia, uma coisa que lhe quero garantir: aquilo que disse aqui, hoje, foi e será a intervenção e a posição do PS na regulação da questão de Estado que está implicada na temática das informações em Portugal.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - E V. Ex.ª não tem o direito de fazer uma interpretação unilateral daquilo que eu disse, porque o meu texto é explícito. Utilizando a minha linguagem, fui muito claro a criticar, com profundidade, a realidade existente e a propor alternativas exequíveis para o actual modelo.
Não vou alongar-me muito, mas há algo que gostaria de pedir a V. Ex.ª, porque eu próprio, por mim, também conheço essa realidade. Quando V. Ex.ª analisar legislação estrangeira, nunca confie nos resumos que os serviços lhe fazem.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - É a lei. Sr. Deputado!

O Orador: - Peça, pelo menos, as versões integrais em traduções completas, porque os serviços de informações da República Federal da Alemanha são controlados por uma comissão eleita pelo Parlamento que tem, designadamente, as seguintes funções, a de poder obter informação sobre a actividade geral e processos de significado especial executados nesses serviços, o Governo é obrigado a submeter a essa comissão o projecto de orçamento dos serviços...

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O Sr. Rui Carp (PSD): - Foi o que ele disse!

O Orador: - Não disse nada disso, Sr. Deputado! Nada! O Sr. Deputado esteve aí a dormir, agora acordou; não ouviu nada.

Vozes do PSD: - Disse, disse!

O Sr. Rui Carp (PSD) - Está gravado!

O Sr Presidente: - Sr. Deputado Jaime Gama, queira concluir.

O Orador: - ... o Governo é obrigado a submeter à comissão os orçamentos dos serviços de informações e a discuti-los com a comissão; o método de trabalho da comissão em relação aos serviços é regulado pela própria comissão e sempre que o Governo pretenda recusar uma informação em concreto é obrigado, expressamente, a fundamentá-lo. Além disso, esta comissão não colide em nada com os demais direitos do Parlamento, incluindo os de indicar uma outra comissão que tem um absoluto controlo sobre o sistema de escutas telefónicas dos serviços de informações.
Portanto, V. Ex.ª, que é Ministro da Administração Interna, que tem responsabilidades nesta área, tem um primeiro dever: o de não citar legislação truncada ou de citar legislação completa e - perdoe-me - o de conhecer um pouco melhor estas matérias.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr Presidente: - Queira concluir, Sr. Deputado.

O Orador: - Porque também grande parte do que se passa nestes domínios tem a ver com a exigência de melhor responsabilização governamental pela conduta destes sectores Espero que isso aconteça no futuro.
Mas a intervenção do Sr Ministro da Administração Interna contrasta profundamente com as necessidades de colocação desta temática no adequado plano político e institucional da República Portuguesa.

Aplausos do PS.

O Sr Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, não acusei os jornalistas de fazerem uma campanha contra o SIS; o que eles escreveram foi um conjunto de disparates que os políticos disseram nesta área.
Sr. Deputado João Amaral, lembro-lhe apenas que o inquérito à questão do SIS/Madeira não foi feito por pressão nenhuma. Imediatamente a seguir a ter tido conhecimento, tomei a iniciativa, como está, aliás, reconhecido no relatório da Comissão, de pedir que esse inquérito fosse feito. E mais do que isso ainda, o que é mais relevante, é que forneci todos os elementos, todos os meios que eram necessários.
E, mais ainda, em relação à fiscalização e ao seu receio quanto aos direitos, liberdades e garantias - que fará sempre parte do vosso discurso, já fazia desde o início do SIS e vai sempre fazer no futuro, não estou à espera que digam outra coisa nessa matéria - dir-lhe-ia que devia reler o relatório de 1994 do Conselho de Fiscalização do SIS, onde se diz que foi feito com base em relatórios sobre a concessão de vistos de entrada, sobre a avaliação de ameaça à segurança de individualidades estrangeiras, sobre fenómenos de conflitos sociais, sobre informação de segurança... Tudo o que pediram tiveram. Pediram reuniões comigo, concedi! Pediram reuniões com os serviços, concedi! Tudo aquilo que quiseram para elaborar o relatório, nós concedemos. Nada faltou. Portanto, como também se provou no caso do SIS/Madeira, o Conselho funciona, pode funcionar e pode funcionar bem!
Sr. Deputado Jaime Gama, não me vai querer cercear o direito - também sou parlamentar, neste caso um agente parlamentar - de interpretar aquilo que o Sr. Deputado diz, de ouvir o que o Sr. Deputado diz. É um direito que tenho. Se me é cerceado, fico sem qualquer direito.

Protestos do Deputado do PS Eduardo Pereira

Ó Sr. Deputado Eduardo Pereira, gostava muito de ter falado consigo, mas não tenho culpa se o seu partido não lhe pediu para falar.
Sr. Deputado Jaime Gama, não estive em desacordo com o que disse; estive em desacordo - tenho esse direito - com a prática política do seu partido nesta matéria. São coisas bem diferentes. Aliás, sublinhei-o aqui. Uma coisa é o que o senhor aqui afirmou - e eu disse que merecia que, sobre essa matéria, pudéssemos dialogar -, outra coisa é aquilo que, nesta matéria, o seu partido tem feito E também tenho direito a estar indignado, a estar revoltado, em não concordar, em discordar e em interpretar. Tenho todo o direito! Não mo pode negar!
O importante é que possamos conversar sobre o que o Sr. Deputado aqui disse. Mas já não podemos conversar sobre o modo como o seu partido tem tratado estas questões. Se o Secretário-Geral do seu partido vem à praça pública dizer que o SIS está ao serviço do PSD, não podemos dialogar sobre nada. E esta tem sido a prática política do seu partido até aqui. E a mim compete-me fazer esse juízo, é legítimo que venha aqui fazer esse juízo, perfeitamente legítimo!
E, se me permite, nessa matéria não estive de acordo com o que o Sr. Deputado disse, porque não estou de acordo que ainda queiram, sobre esta matéria fazer alguma chicana política, porque o que o que se está a passar em relação ao Conselho de Fiscalização é uma certa chicana política.

Vozes do PSD: - Muito bem'

O Orador: - E vou dizer-lhe porquê, com todo o respeito: o Sr. Deputado disse, há pouco, que está nas mãos do PS alguma coisa, uma vez que é necessário uma maioria de dois terços para serem eleitos. Isso é verdade. Quer dizer, o que a lei confere ao PS, através da maioria de dois terços, é a capacidade de dizer «Aquele senhor queremos, este senhor não queremos, naquele confiamos, neste não confiamos». Mas essa lei não lhe dá o direito de dizerem que não elegem ninguém. O que o PS tem de fazer e obedecer à lei que diz que o Conselho de Fiscalização deve ser eleito e deve estar em vigor, e isso o PS não quer fazer.

Aplausos do PSD.

Isto é que é chicana, Sr Deputado! Porque o PS, nesta matéria, diz: «Nós não elegemos o Conselho de Fiscalização». Mas, depois, clama: «Aqui d'el-rei, ninguém fiscaliza

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o Conselho». Isso é que não é legítimo! Isso é que não me parece sério nesta matéria.
Podem dizer: «Não queremos o Sr. António queremos o Sr. Francisco». Muito bem! Mas devem eleger o Conselho, porque a lei diz que há um Conselho de Fiscalização que deve estar em funções, e se ele não está em funções não é porque o Governo não queira. O Governo quer que ele esteja em funções, e o Ministro da Administração Interna também. Eu quero que aqueles serviços sejam, de facto, fiscalizados.
Portanto, Sr Deputado, se alguém está a fazer chicana sobre esta matéria não é o Governo, seguramente. Mas alguém está a fazê-la ainda.
Relativamente à lei alemã, não a li toda,...

O Sr. Jaime Gama (PS): - Deve fazê-lo!

O Orador: - ... mas li alguns aspectos que creio serem relevantes para perceber como funciona o controlo parlamentar. Do meu ponto de vista, li aquilo - Sr. Deputado, se quiser, tem aqui as versões alemã e portuguesa, tem aqui a tradução, e pode confrontá-las - que é mais significativo.
O nosso modelo de fiscalização não fica a dever nada a ninguém, nem sequer à lei alemã, e está muito além do conjunto do modelo de fiscalização de outros países da Europa democrática ocidental, membros da União Europeia ou não. Isso é rigorosamente verdade e o Sr. Deputado, que é uma pessoa informada nessas matérias, sabe disto tão bem como eu.
Sr. Deputado, em suma e em conclusão: nesta matéria há-de permitir que eu faça os juízos políticos que entender a partir da prática política do seu partido. Não quis, aqui, associar as suas palavras ao que tem sido a prática do seu partido. Pelo contrário, quis dissociá-las.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, esgotados os tempos, congratulo-me com o elevado nível deste debate.

O Plenário reúne amanhã, às 10 horas, com uma sessão de perguntas ao Governo.
Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 35 minutos.

Declarações de voto, enviadas à Mesa para publicação, relativas à votação da
proposta de lei n.º 109/VI

Os Deputados sociais-democratas eleitos pelo círculo da Madeira votaram favoravelmente a proposta de lei n.º 109/VI (Orçamento Rectificativo para 1994) na convicção de que o Governo da República, através dos meios ao seu alcance, não deixará de dar cumprimento ao disposto no artigo 56.º da Lei nº 75/93, de 20 de Dezembro (Orçamento do Estado para 1994), onde se prevê que «o Ministério das Finanças assegurará as transferências necessárias para as rubricas próprias do orçamento do Ministério da Educação, de forma a assegurar que, por seu intermédio, sejam garantidas à Universidade da Madeira as verbas necessárias ao custeamento das suas despesas no ano económico de 1994».
Para além do imperativo legal, o cumprimento daquele preceito tornou-se urgente e imprescindível, já que o Governo Regional da Madeira tem vindo a fazer adiantamentos à Universidade com vista a assegurar o seu funcionamento, na expectativa do correspondente reembolso, sendo certo que, se este não ocorrer imediatamente, a Região ver-se-á confrontada com uma gravíssima situação financeira.
Foi, pois, na certeza de que, no prosseguimento das diligências que têm vindo a ser feitas pelos signatários, o Governo da República não deixará de cumprir atempadamente a Lei do Orçamento de Estado para 1994, que votámos favoravelmente o Orçamento Rectificativo.
Os Deputados do PSD, Correia de Jesus - Guilherme Silva - Carlos Lélis - Cecília Catarino.

Os Deputados do Grupo Parlamentar do PSD eleitos pelo círculo eleitoral dos Açores declaram que o Ministério das Finanças ainda não deu cumprimento ao art.º 57.º da Lei n.º 75/93, de 20 de Dezembro - Orçamento do Estado para 1994 e também não o fez na proposta de lei n.º 109/VI- Alteração à Lei n.º 75/93, de 20 de Dezembro.
Os Deputados signatários, na presunção de que o Ministério das Finanças dará cumprimento ao que preceitua o referido artigo, no ano económico em curso, votam favoravelmente esta proposta de lei.
Os Deputados do PSD, Mário Maciel - José Reis Leite - Manuel Silva Azevedo - Ema Paulista.

Entraram, durante a sessão, os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António José Barradas Leitão.
António Maria Pereira.
Carlos de Almeida Figueiredo
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
João Alberto Granja dos Santos Silva.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Albino da Silva Peneda.
José Fortunato Freitas Costa Leite.
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira.
Luís António Martins.
Nuno Manuel Franco Ribeiro da Silva.
Olinto Henrique da Cruz Ravara.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Simão José Ricon Peres.

Partido Socialista (PS):

Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Manuel Avelino.
António Alves Martinho.
João António Gomes Proença.
Joaquim Américo Fialho Anastácio.
José Eduardo dos Reis.
Luís Filipe Nascimento Madeira.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
Lino António Marques de Carvalho.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

José Luís Nogueira de Brito.

Faltaram à sessão os seguintes Srs Deputados.

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Partido Social-Democrata (PSD):

José Pereira Lopes.
Luís António Carrilho da Cunha.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Pedro Manuel Cruz Roseta.

Partido Socialista (PS):

António Poppe Lopes Cardoso.
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego.
José Manuel Marques da Silva Lemos.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Rogério da Conceição Serafim Martins.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Maria Odete dos Santos.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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