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634 I SÉRIE - NÚMERO 17

ter de confiar na minha própria perspectiva - a realidade da vida internacional é completamente outra e que as inquietações que vamos ter de enfrentar neste ano não têm a menor coincidência com este apanhado de factos que costumam preencher, muitas vezes, uma das pequenas colunas dos jornais, para tentar enriquecer as sua efemérides.
Em primeiro lugar, na discussão do ano passado, no que toca à Europa, tive ocasião de sustentar que 1994 seria o ano dos pequenos países na Comunidade Europeia, aquele em que esses países precisavam de tomar consciência da sua posição relativa na instituição que se desenvolve, e isto para assegurar uma equitativa participação na gestão e, naturalmente, nas decisões da Comunidade Europeia.
É claro que traz alguma alegria o facto de um pequeno país ter um comissário ao qual é entregue um sector importantíssimo, o das relações com a África, traz também uma satisfação importante o facto de um português ser nomeado para Secretário-Geral da União da Europa Ocidental, com justiça pessoal às suas capacidades, mas a verdade é que já não se pode ignorar, neste fim de ano, que o desafio das duas velocidades está posto em intrínseco naquilo que diz respeito ao desenvolvimento da Comunidade Europeia. As duas velocidades foram anunciadas pelo partido principal da Alemanha, nós respondemos, naturalmente para os discursos públicos, que não vamos estar de acordo com isso. Pois, curiosamente, neste documento, em certa altura, já se reconhece que estão postas, abertamente, as concepções de uma União em geometria variável. Nenhuma passagem deste documento inscreve esta questão como sendo uma questão essencial no que toca às opções fundamentais do Plano para o ano de 1995, nem sequer naquilo que respeita às opções fundamentais da política externa portuguesa. E sobre isto ternos de tomar uma decisão!... Nós estamos resignados à dupla velocidade?!.. Ou temos já uma política para enfrentarmos o desafio da dupla velocidade?
Há outros aspectos que são importantes. O que o papel nos anuncia é que nós vamos consolidar o Tratado de Maastricht e preparar-nos para a revisão de 1996. Não nos explicam o que é que vamos consolidar e não nos trazem qualquer programa de revisão.
Em relação à Comunidade Europeia, suponho que os factos principais que estão a passar-se - e sobre os quais este documento não traz a menor referência - dizem respeito aos seguintes pontos.
Primeiro: que o único país europeu que foi tratado como uma coisa em 1945, do ponto de vista jurídico, a Alemanha, e o único país que está em recuperação permanente da soberania, e esse país e, hoje, um candidato que dificilmente poderá ser rejeitado ao Conselho de Segurança das Nações Unidas. Esse é que é um facto que diz respeito ao equilíbrio dos poderes europeus! O Governo não se deu conta disto?!... O Governo não tem nada a dizer ao País sobre isto?!... Não há uma posição a tomar sobre isto, em relação a esta variação do equilíbrio de forças dentro da Europa?!...
Por outro lado, temos notícias constantes sobre a União da Europa Ocidental. Regozijámo-nos, como já disse, com o facto de termos podido eleger um português de qualidade para seu Secretário-Geral, mas há um assunto que é tratado com a maior confidencialidade e o Governo a ele não faz aqui a menor referência. Eu poderia comunicar ao Governo, então, que existe, na Europa, em organização, uma coisa que se chama o exército europeu e que esse exército europeu está a ser desenvolvido à margem de todos os textos institucionais da Comunidade Europeia, à margem de todos os textos institucionais da União da Europa Ocidental Ele é, obviamente, um instrumento fundamental, pois vai ser o eixo ou o pilar europeu da defesa. No entanto, quando vejo aquilo que o meu Governo acha que vai ser o ano de 1995 do ponto de vista da estrutura mundial, não encontro a menor referência a esse exército europeu. E, curiosamente, devo dizê-lo, com grande prejuízo para o Governo, porque temos feito um esforço financeiro enorme para redefinir um modelo de Forças Armadas portuguesas - é uma matéria onde tem havido bastante unanimidade nesta Câmara - e aquilo que o Governo conseguiu foi mostrar ao País as novas Forças Armadas que tinha, numa famosa parada no Porto, e que toda a imprensa apreciasse isso como uma manifestação destinada a colher votos É que os tais portugueses, que só se apercebem tarde dos benefícios que o Governo lhe traz, não estão informados sobre a importância da remodelação das Forças Armadas para participar nas responsabilidades, que não pode deixar de ler, no exército europeu e na União da Europa Ocidental.
Por outro lado, também me parece de uma candura pouco exemplar a previsão do alargamento da Europa, o pacifismo das reformas internas da União Soviética e, finalmente, certamente, o «reino da paz perpétua», depois destes desenvolvimentos aqui previstos serem conseguidos. E porquê? Porque, em contraposição a essa atitude tão confiante do Governo, verifico que a comunidade internacional, a que se interessa por estes assuntos, anda preocupadíssima com a intervenção de dois pensadores de referência geral, o Sr. Btzezinsky e Dear Henry, o famoso Kissinger, que não estão nada tranquilos com o reequilíbrio de fronteiras de interesses na Europa, sobretudo tendo em vista as famosas reformas que aqui são tão pacificamente enunciadas neste texto em relação à Rússia. Pelo contrário, aquilo que sabemos é que, neste momento, está em definição o conceito de «estrangeiro próximo da União Soviética», que isso põe em causa a definição da própria NATO, que esse é um problema essencial do nosso tempo e que isso mexe com a nossa defesa, com os nossos objectivos nacionais e com o conceito estratégico nacional, mas o documento guardou disso um segredo enorme, certamente para tranquilidade dos portugueses, que nunca se apercebem dos benefícios que estão a receber com a intervenção governamental.
Há ainda outros aspectos, também fundamentais, que esses sim, dizem respeito à estrutura internacional em mudança. Quando pegamos no documento do Governo, encontramos, entre os factos que festeja, o desenvolvimento económico e social - e até político - nalgumas áreas do Pacífico. Sena talvez a primeira vez na História que a situação da área correspondia ao nome do oceano. Vai ser a tranquilidade geral!
Aquilo que algumas pessoas menos confiantes nesses bons prenúncios imaginam e que vai ser preciso redefinir a função de um outro vencido na guerra, que se chama Japão, cuja candidatura ao Conselho de Segurança é imbatível, e vai ser necessário redefinir a intervenção soberana de um país que se chama China E de todos esses países, curiosamente, nenhum tem dúvidas internas sobre o que é a soberania e se ela está em crise, porque, para eles, a soberania não está em crise, mas em recuperação progressiva.
Ora, não há a menor noção destes factos neste documento com que o Governo procura identificar a conjuntura internacional, em função da qual vai definir a sua política externa.

O Sr. Presidente: - Faça o favor de terminar, Sr Deputado.