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906 I SÉRIE - NÚMERO 22

a subversão dessa cooperação militar, através da sua utilização para encobrir ou para justificar a ajuda militar a um dos lados de uma guerra civil, é particularmente condenável e perigosa para o futuro das nossas relações com Angola. Uma cooperação para a paz cria vínculos duradouros, uma cooperação para a guerra compromete-os e, sobretudo, dá origem a um passivo com o povo angolano dificilmente comportável por quem, como nós, perante ele tem responsabilidades históricas. Não há realpolitica, não há sentido estratégico de Estado, não há convivência futura, em tempos de paz, que resistam ou que sobrevivam, com viabilidade e confiança, quando, ao encerrar longos de guerra, houver que pagar a factura de um excessivo comprometimento no sangue e no sofrimento alheios, como, aliás, já estamos, infelizmente, a constatar.
A responsabilidade política pelos erros próprios não pode o Governo português descarregá-la para os outros, para outros países ou, o que é bem pior, para o nosso Presidente da República e para as forças políticas de oposição que, durante anos a fio, conferiram ao Governo português toda a latitude que ele quis para o desenvolvimento da política do Estado português com Angola Desculpas de mau pagador, neste caso, não resolvem nada e apenas transformam em escusada tensão institucional interna algo que se devia tratar, com verdade e com sentido de Estado, no plano das nossas relações externas com a comunidade internacional e com o povo angolano, no seu conjunto.
É por isso que incitamos o Governo português a praticar, a respeito desta matéria, uma política de responsabilização, de verdade e de unidade entre os diversos órgãos de soberania, a assumir, no plano interno, os erros e as responsabilidades, a fazer autocrítica e a desculpar-se perante o povo angolano, se necessário, para, no plano externo, ser aceite como interlocutor válido e, no plano angolano, como parceiro insubstituível na paz e na recuperação daquele país.
Pela nossa parte, procuramos criar a oportunidade para que todos os partidos possam contribuir para esse objectivo. Fazemo-lo através desta iniciativa, para que, neste inquérito, se apurem factos e responsabilidades, sem espírito de autoflagelação das posições nacionais mas também sem contemplações para com violações daquilo que, em todas as circunstâncias, deveria ter sido o espírito nacional perante a trágica guerra civil angolana. Vamos querer saber se o compromisso contido na cláusula «triplo zero» dos Acordos de Bicesse foi ou não violado pela parte portuguesa e, se o foi, com que gravidade e sob que responsabilidade.
Aliás, outras interrogações se nos põem: por que é que se aceita que apenas militares resultem responsabilizados? Por que é que continuou o Governo a dar garantias de imparcialidade quando, no passado, surgiram acusações semelhantes, embora não documentadas? O que é que se passou verdadeiramente, a propósito da entrega de helicópteros Allouette? O Governo de Angola pagou ou não os serviços prestados pelas OGMA e, se o não fez, a quanto é que monta essa dívida? Qual é o grau de conhecimento e/ou de responsabilidade que as diversas instâncias governamentais tiveram nas referidas e eventuais violações, nomeadamente os ministros da Defesa e dos Negócios Estrangeiros, sem excluir o Primeiro-Ministro, que, em relação a Angola, sempre fez questão de assumir o protagonismo mais evidente?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os portugueses têm tudo a ganhar se a nossa proximidade com Angola não estiver manchada por traumas irreparáveis. Uma relação de confiança entre os dois povos exige que saibamos todos impedir que as simpatias partidárias prostituam o relacionamento entre os dois Estados. A suspeita actual, tanto em Portugal como em Angola, de que o Governo português não soube respeitar este princípio exige, para já, que este pedido de inquérito seja aprovado e seriamente levado a cabo.
Neste momento, isto é o mínimo que devemos fazer, uma vez que, da parte do Governo, só vimos, até agora, embaraço, desvio de responsabilidades e a criação de novos conflitos institucionais.
Se o Grupo Parlamentar do PSD quiser demonstrar que está, acima de tudo, empenhado em que todos os portugueses possam reconhecer-se numa posição verdadeiramente nacional em Angola, se acredita, como deve acreditar, que essa posição não pode nem deve ser delineada e construída por agentes políticos que confundam o interesse nacional com parcialidade e com cumplicidade partidárias, se, nessa base, estiver interessado em construir com os outros partidos e com os restantes órgãos de soberania uma política portuguesa de relacionamento com aquele país que não comprometa a nossa participação e nossa presença no futuro de Angola, vote, então, favoravelmente este pedido de inquérito e participe, sem reservas, na busca da verdade e na responsabilização de quem houver a responsabilizar.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia). - O Sr. Deputado está a pedir a palavra para uma intervenção?

O Sr, João Corregedor da Fonseca (Indep.). - É para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Manuel Queiró, Sr. Presidente.

O Sr. Correia de Jesus (PSD): - Sr. Presidente, também eu quero pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Manuel Queiró.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Srs. Deputados, embora não me importe que assim se proceda, até agora, no se refere a inquéritos, é apenas concedido tempo, para intervenção, ao proponente, a cada um dos grupos parlamentares e a um membro do Governo.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É entendimento do Grupo Parlamentar de Os Verdes que, neste momento, o que está em discussão é um conjunto de questões que vou tentar ordenar.
Em primeiro lugar, parece-nos de todo em todo inadmissível o comportamento que o Governo assumiu no processo das OGMA, ou seja, que, perante os factos que vieram a público, tenha adoptado uma posição de mentira e de escamoteamento dos dados. O Governo nada mais fez, ao longo dos dias, do que ziguezaguear sobre a questão, tomando a sua primeira posição sobre a matéria quase uma semana depois da denúncia pública dos factos, pela voz do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, que, de uma forma clara, pela primeira vez, abordou esta questão, fazendo aquilo que, em nossa opinião, deve estar presente neste processo, que é a responsabilidade e o dever que o Governo tem de não sonegar informações à Assembleia da República, permitindo-lhe o exercício do seu poder fiscalizador sobre todas as matérias.

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