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Quinta-feira, 20 de Abril de 1995 I Série - Número 64
DIÁRIO da Assembleia da República
VI LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1994-1995)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 19 DE ABRIL DE 1995
Presidente: Exmo. Sr. João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu
Secretários: Exmos. Srs.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
José Mário Lemos Damião José de Almeida
Cesário José Ernesto Figueira dos Reis
SUMÁRIO
O Sr Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 25 minutos
Antes da ordem do dia.- Deu-se conta da entrada na Mesa dos projectos de deliberação n.ºs 104 a 106/VI e dos votos n.ºs 143 e 144/VI, bem como de requerimentos e da resposta a alguns outros.
O Sr Presidente informou a Câmara do pedido de renúncia ao mandato do Sr. Deputado do PSD Alípio Dias.
Em declaração política, o Sr Deputado Manuel Queiró (CDS-PP) teceu críticas à política do Governo no sector das pescas e respondeu, depois, a um pedido de esclarecimento do Sr Deputado Olinto Ravara (PSD).
O Sr Deputado José Vera Jardim (PS) condenou a situação económica e social do País, tendo respondido, no fim, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Carlos Pinto e Pacheco Pereira (PSD).
O Sr Deputado Carlos Marta Gonçalves (PSD) teceu considerações sobre o desporto
O Sr Deputado Alexandrino Saldanha (PCP) chamou a atenção para a situação dos trabalhadores da banca, tendo criticado a actuação do Governo
Foram aprovados os votos n.ºs 143 e 144/VI, apresentados pelo CDSPP, de pesar pelo falecimento do Professor Doutor Almerindo Lessa e do cineasta António Lopes Ribeiro. No final, a Câmara guardou, de pé, um minuto de silêncio
Ordem do dia. - Mereceu aprovação um parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo à substituição de Deputados do PSD, do PCP e do CDS-PP
A proposta de lei n.º 125/VI - Altera o regime da direito de antena nas eleições presidenciais e legislativas foi apreciada na generalidade, tendo usado da palavra, a diverso título, além dos Srs Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna (Carlos Encarnação), Subsecretário de Estado Adjunto do Ministro Adjunto (Amândio Oliveira) e Deputado Alberto Martins (PS), que fez a síntese do relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, os Srs Deputados Raúl Castro (Indep. ), Manuel Queiró (CDS-PP), António Filipe (PCP), Miguel Macedo (PSD), José Magalhães (PS), Manuel Queiró (CDS-PP) e Mário Tomé (Indep. )
O Sr Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 10 minutos
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O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 35 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva.
Adérito Manuel Soares Campos.
Adriano da Silva Pinto.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Álvaro José Martins Viegas.
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
Américo de Sequeira
Anabela Honório Matias.
António Augusto Fidalgo.
António da Silva Bacelar.
António Esteves Morgado.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Caeiro da Motta Veiga.
António Manuel Fernandes Alves.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Alberto Lopes Pereira.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos de Almeida Figueiredo.
Carlos Filipe Pereira de Oliveira.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel de Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Delmar Ramiro Palas.
Domingos Duarte Lima.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva.
Ema Maria Pereira Leite Lóia Paulista.
Fernando Carlos Branco Marques de Andrade.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Santos Pereira.
Francisco Antunes da Silva.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
João Álvaro Poças Santos.
João Carlos Barreiras Duarte.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João José da Silva Maçãs.
João José Pedreira de Matos.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Maria Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Avelino Braga de Macedo.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José de Almeida Cesário.
José de Oliveira Costa.
José Fortunato Freitas Costa Leite.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leite Machado.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Alvares da Costa e Oliveira.
José Manuel Borregana Meireles.
José Manuel da Silva Costa.
José Manuel Nunes Liberato.
José Mário de Lemos Damião.
José Mendes Bota.
José Pereira Lopes.
Luís António Carrilho da Cunha.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel Antero da Cunha Pinto.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel da Silva Azevedo.
Manuel de Lima Amorim.
Manuel Estácio Marques Florido.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Simões Rodrigues Marques.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues.
Maria Helena Falcão Ramos Ferreira.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos.
Olinto Henrique da Cruz Ravara.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Vasco Francisco Aguiar Miguel
Virgílio de Oliveira Carneiro
Vítor Manuel da Igreja Raposo.
Vítor Pereira Crespo.
Partido Socialista (PS).
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto da Silva Cardoso
Alberto de Sousa Martins
Alberto Manuel Avelino
Alberto Marques de Oliveira e Silva
Ana Maria Dias Bettencourt.
Aníbal Coelho da Costa.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António de Almeida Santos.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes da Silva Braga.
António José Martins Seguro.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Armando António Martins Vara
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Manuel Luís.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
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Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa.
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins.
Gustavo Rodrigues Pimenta.
Jaime José Matos da Gama.
João António Gomes Proença.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Américo Fialho Anastácio.
Joaquim Dias da Silva Pinto.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho.
José António Martins Goulart.
José Carlos Sena Belo Megre.
José Eduardo dos Reis.
José Eduardo Vera Cruz Jardim.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Marques da Silva Lemos.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Filipe Marques Amado.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio.
Nuno Augusto Dias Filipe.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Raúl Fernando Sousela da Costa Brito.
Rogério da Conceição Serafim Martins.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.
Partido Comunista Português (PCP):
Alexandrino Augusto Saldanha.
António Filipe Gaião Rodrigues.
João António Gonçalves do Amaral.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Luís Carlos Martins Peixoto.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Mana Odete dos Santos.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.
Octávio Augusto Teixeira.
Paulo Manuel da Silva Gonçalves Rodrigues.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.
Manuel Tomas Cortez Rodrigues Queiró.
Deputados independentes:
Mário António Baptista Tomé.
Raúl Fernandes de Morais e Castro.
Manuel Sérgio Vieira e Cunha.
ANTES DA ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai anunciar os diplomas, os requerimentos e as respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa.
O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os projectos de deliberação n.ºs 104/VI - Financiamento de um projecto intermunicipal de metropolitano de superfície na margem sul do Tejo (PS), 105/VI - Criação de nós de acesso na Auto-Estrada n.º 2, entre Fogueteiro e Pragal (PS) e 106/VI - Criação de novos terminais e ligações fluviais entre as duas margens do Tejo (PS) e os votos n.ºs 143/VI- De pesar pelo falecimento do Professor Almerindo Lessa (CDS-PP) e 144/VI - De pesar pelo falecimento do cineasta António Lopes Ribeiro (CDS-PP).
Nas reuniões plenárias de 30 e 31 de Março, foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos: ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Octávio Teixeira e Caio Roque; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado António Filipe; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulado pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; à Secretaria de Estado dos Assuntos Fiscais, formulado pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira; a diversos Ministérios e às Secretarias de Estado do Orçamento e da Segurança Social, formulados pelo Sr. Deputado João Proença; ao Ministério do Mar, formulado pelo Sr. Deputado João Rui de Almeida; à Secretaría de Estado da Cultura, formulado pelo Sr Deputado João Carlos Duarte; à Câmara Municipal de Oeiras, formulado pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia: aos Ministérios da Saúde, do Emprego e Segurança Social e à Secretaría de Estado da Formação Profissional, formulados pelo Sr. Deputado Miranda Calha; ao Ministério da Agricultura, formulado pelo Sr. Deputado Pacheco Pereira, à Secretaria de Estado da Cultura e à Câmara Municipal de Vila Nova de Foz Côa, formulados pelo Sr. Deputado António Morgado.
Nas reuniões plenárias de 5 e 6 de Abril, foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos: ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados António Braga, José Reis Leite e António Filipe; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado José Lello; ao Ministério das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Nuno Filipe; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulados pelos Srs. Deputados Fialho Anastácio, José Reis Leite e João Amaral; ao Ministério da Agricultura, formulado pelo Sr Deputado João Carlos Duarte; ao Ministério da Justiça e ao Governo, formulados pelo Sr. Deputado Luís Sá; aos Ministérios do Emprego e Segurança Social e do Ambiente e Recursos Naturais, formulados pelo Sr. Deputado Vítor Raposo; ao Ministério da Educação, formulado pela Sr.ª Deputada Ana Maria Bettencourt; a diversos Ministérios e à Secretaría de Estado da Formação Profissional, formulados pelo Sr. Deputado Miranda Calha, ao Ministério do Comércio e Turismo, formulado pelo Sr. Deputado Alexandrino Saldanha; ao Ministério da Administração Interna, formulados pelos Srs. Deputados João Amaral e Raúl Castro
Entretanto, o Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Macário Correia, nas sessões de 7 de Janeiro e 12 de Fevereiro; Ana Maria Bettencourt, na sessão de 27 de Abril; Isabel Castro, nas sessões de 6 de Maio, 2 e 22 de Fevereiro e 22 e 29 de Março; Paulo Trindade, nas sessões de 11 de Maio, 6 e 19 de Janeiro; João Carlos Duarte, na sessão de 25 de Maio; Guilherme d'Oliveira Martins, nas sessões de 21 de Setembro e 4 e 19 de Janeiro; José da Silva Costa, no dia 14 de Outubro; Nuno Filipe, na sessão de 9 de Novembro; Maria Julieta Sampaio, na sessão de 16 de Dezembro; Luís Sá e Fialho Anastácio, nas sessões de 5 de Janeiro, l e 15 de Fevereiro e 9 de Março; António
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Alves, na sessão de 11 de Janeiro; Paulo Rodrigues, nas sessões de 11 e 18 de Janeiro; Luís Filipe Madeira, na sessão de 12 de Janeiro; Lino de Carvalho, nas sessões de 12 de Janeiro e 1 e 16 de Fevereiro; Mário Tomé, na sessão de 18 de Janeiro; Luís Peixoto, na sessão de 20 de Janeiro; João Amaral e Miranda Calha, na sessão de 22 de Fevereiro; António Filipe, na sessão de 23 de Fevereiro e no dia 13 de Março; Alexandrino Saldanha, na sessão de 24 de Fevereiro; Jaime Gama, na sessão de 22 de Março.
Devo ainda anunciar que, hoje à tarde, irão reunir as Comissões de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e de Trabalho, Segurança Social e Família
Sr. Presidente e Srs. Deputados, deu ainda entrada na Mesa uma declaração de renúncia ao mandato do Sr. Deputado Alípio Dias, do PSD, eleito pelo círculo eleitoral do Porto, ao abrigo do n.º 2 do artigo 163.º da Constituição e do n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 7/93, de l de Março.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, encontra-se presente nas galerias um grupo de estudantes do Instituto Superior de Entre Douro e Vouga, que é a Tuna Académica do ISVOUGA, para os quais peço a vossa habitual saudação.
Aplausos gerais, de pé.
Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.
O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nos primeiros três anos da nossa adesão à Comunidade Económica Europeia, a nossa indústria da pesca modernizou-se extraordinariamente, renovando e actualizando tecnologicamente as embarcações através de um esforço de investimento privado e do aproveitamento dos investimentos financeiros comunitários.
Foram investidos 20 milhões de contos na frota e 9 milhões de contos na indústria transformadora. Era o tempo do optimismo no futuro deste sector, em face do aumento dos mercados na Europa e da possibilidade de Portugal assumir, neste sector, o lugar a que as tradições, as suas vantagens comparativas e os seus recursos lhe davam direito.
Passados esses anos, chegámos, desde há bastante tempo, à altura de fazer contas, e a verdade é que a realidade é muito diferente.
No período de 1986 a 1993, a produção caiu 30 %, de 400 000 t para 280 000; a frota, no seu conjunto, diminuiu cerca de 20 %; a cobertura das importações de pescado pelas nossas exportações desapareceu e as importações aumentaram 225 %, isto é, de 40 para 90 milhões de contos.
O panorama actual é o de subutilização das unidades existentes por falta de quotas de pesca e o principal problema a que, hoje, o sector tem de atender é o de garantir a sua sobrevivência e o de aguentar os postos de trabalho que a ele directa e indirectamente estão ligados.
No sector das pescas, a cada emprego directo no mar estão ligados seis empregos em terra nas actividades a montante e a jusante. O agravamento da situação económica das empresas do sector e das indústrias a ele associadas pode conduzir ao aparecimento rápido de bolsas de pobreza nas áreas do nosso país mais dependentes da pesca.
As causas desta situação, temos de as procurar no funcionamento da Comunidade e nas suas consequências para as pescas portuguesas.
Em primeiro lugar, os acordos de pesca com países terceiros. Antes do Tratado da União Europeia, não existia política comum para as pescas. Actualmente, as quotas são negociadas para a Europa no seu conjunto e redistribuídas entre os países membros.
Países industrializados como a Alemanha e a Inglaterra não prescindem da sua quota nessa distribuição, mas, por norma, não a utilizam. É enorme a concorrência que temos de suportar com a Espanha para a atribuição da quota remanescente.
O resultado líquido desta situação consiste, muito mais do que na ampliação dos mercados, na brutal diminuição da nossa possibilidade de acesso à matéria-prima.
No mercado comunitário, sofremos, além do mais, a concorrência desleal de países subdesenvolvidos, que têm salários miseráveis, não têm controlo sanitário e de qualidade e concedem apoios oficiais à sua indústria. Quer dizer: após Maastricht, restringiu-se a nossa capacidade de captura e não se encontram as esperadas compensações no mercado europeu na venda do produto da pesca.
Some-se a isto a regulamentação excessiva e a política dos abates e já não se estranhará que um sector que reunia vantagens comparativas muito importantes, como a situação geográfica e a extensão da nossa costa, o facto de possuirmos a maior zona económica exclusiva da União Europeia, uma boa indústria de construção e reparação naval, infra-estruturas portuárias naturais e artificiais importantes, seja, hoje, encarado pelo Plano de Desenvolvimento Regional para as Pescas, aprovado por este Governo, como uma actividade em que se prevê uma ainda maior redução da nossa frota a pontos de, a cumprir-se esse plano, Portugal ter em 1999 metade da frota que tinha quando entrou para a Comunidade. Numa Europa deficitária em 2 milhões de toneladas e para um sector em que este Governo incentivou os empresários a investir, a contradição é flagrante.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É urgente restituir perspectivas para o sector das pescas em Portugal. Como em todos os sectores, foi dito aos portugueses que a Europa significa crescimento e mais desenvolvimento. O que se passou com o Acordo de Pescas entre a União Europeia e o Canadá, que colocou os empresários e os trabalhadores do sector perante um negro horizonte para o seu futuro, é o corolário das dificuldades que a política comum de pescas tem criado para Portugal.
É necessário inverter o actual estado de coisas. É do interesse da União Europeia pôr a sua capacidade negocial rapidamente ao serviço das necessidades de pesca da capacidade instalada que Portugal possui. A intensa desilusão que se desenvolve no nosso país a propósito da política comum de pescas tem de ser compensada imediatamente no mesmo quadro institucional, sob pena de a defesa dos interesses nacionais muito em breve exigir o nosso abandono desta política específica da União Europeia.
O que não pode continuar a acontecer é o que ocorreu no último mês: confiarmos a defesa dos nossos interesses na ordem externa a uma entidade supranacional e sermos, em consequência, vítimas de um confronto de interesses que, à partida, não nos dizia directamente respeito; sermos, à partida, dos que menos pescamos e suportarmos as sanções pelos abusos de quem mais pesca.
A União Europeia tem perante Portugal o dever de utilizar o seu poder negocial na obtenção de soluções alternativas e compensatórias. O Governo português deve colocar esta exigência de forma clara perante os nossos parceiros. Pela nossa parte, estamos na disposição de apoiar todas as medidas e posições nesse sentido.
O debate parlamentar, com a presença do Governo, sobre esta matéria é particularmente urgente. Apresentámos ontem mesmo o nosso requerimento nesse sentido e
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é de esperar que seja possível agendá-lo para a próxima semana. Esperamos a presença do Governo, o confronto de posições nesse debate e, em consequência, a mudança da política portuguesa neste domínio.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Olinto Ravara.
O Sr. Olinto Ravara (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Queiró, foi pena que V. Ex.ª não tenha estado, hoje de manhã, numa reunião conjunta de várias comissões com o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, porque, de facto, muitas das questões que colocou tiveram aí uma resposta clara da parte do Sr. Secretário de Estado.
Vou procurar suprir essa sua lacuna, dizendo-lhe o seguinte: parece-me que a posição de Portugal neste conflito foi correcta, e não poderia ter sido de outro modo, porque, na verdade, perante um conflito de interesses, em que estão presentes direitos históricos, reclamados nomeadamente por Portugal, o nosso país não poderia fazer outra coisa a não ser votar contra o acordo que foi estabelecido. Marcou a sua posição de princípio, dizendo claramente que não estava de acordo com tudo aquilo que se estava a passar nem sobre a forma altamente coerciva ou coactiva como o Canadá pretendia desenvolver estas negociações.
O nosso país foi criticado por votar contra. Não sei o que teria acontecido se o nosso país tivesse votado a favor como a Espanha! Seria, com certeza, o descalabro! E não sei o que é que, nesta altura, o Sr. Deputado Manuel Queiró estaria a pedir! Já não seria apenas a saída da política comum de pescas, seria, com certeza, a saída da União Europeia! Gostava que o Sr. Deputado Manuel Queiró esclarecesse este aspecto, que é muito importante.
Por outro lado, a questão da política comum de pescas não pode ser entendida de forma fragmentada, nem se pode nacionalizar um problema que é, obviamente, internacional. O Sr. Deputado Manuel Queiró acha que a voz do nosso país seria mais ouvida, seria mais credível se tivéssemos fora da União Europeia?
O Sr. Deputado está a defender uma Europa a la carte, como que a dizer: nós gostamos muito dos dinheiros do Fundo Social Europeu ou do FEDER, mas não gostamos dos dinheiros do IFOP, porque esse, afinal, vai para abates e não serve os interesses do País?!
Sr. Deputado Manuel Queiró, acha que 4000 t, no máximo, de alabote podem pôr em causa o interesse estratégico de Portugal, quando o alabote é uma espécie que é capturada em by catch, é uma espécie residual? Os portugueses andam a pescar bacalhau e, conjuntamente com ele, vem o alabote, como vem o redfish, como vêm outras espécies. Acha que isso era motivo para que o nosso país, num assomo de grande dignidade, de grande postura, viesse aqui dizer «nós vetamos»?
Sr. Deputado, responda-me a estas questões, porque estou muito confuso, e, com certeza, o povo português também estará, com aquilo que o Partido Popular tem andado a dizer sobre este acordo que foi negociado.
O Sr. Rui Carp (PSD): - Muito bem!
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.
O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Olinto Ravara, face à situação em que o País foi colocado com a assinatura de um acordo de pescas entre a União Europeia e o Canadá, pergunto-me se aquilo que o partido que sustenta o Governo tem a dizer é apenas o que acaba de ser dito por V. Ex.ª Será que o PSD, perante a situação que, neste momento, objectivamente existe e que coloca o nosso sector das pescas numa crise gravíssima, que põe em causa, de entre empregos directos e indirectos, milhares de postos de trabalho, tem apenas a manifestar este tipo de posição, ou seja, auto-satisfação e conformismo?
Aconselhava o Sr. Deputado a informar-se rapidamente junto do presidente do seu partido, porque a posição que hoje aqui defendeu pode ter de ser desdita muito brevemente. O Sr. Deputado não pode ter a certeza de que a posição que hoje está aqui a defender tenha a mínima possibilidade de se manter no seu partido durante muito tempo.
Até lhe digo mais: hoje, eu não pedi o abandono da política comum de pescas,...
O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Está aqui escrito!
O Orador: - ... mas o Sr. Deputado tem de ter a noção de que, muito em breve, se não for dada volta à actual situação, essa questão vai ter de ser posta em cima da mesa, de tal forma que - e esta é uma suspeita nossa - o presidente do seu partido irá ser um dos primeiros a manifestar uma posição nesse sentido.
O Sr. Deputado Olinto Ravara tem de se capacitar de que o povo português de que falou ainda está, neste momento, impressionado com a falta de defesa dos nossos interesses e da capacidade de nos fazermos respeitar, porque o que se passou foi, muito simplesmente, o seguinte: existe um país, que é a Espanha, que agride a possibilidade de sobrevivência das espécies com um registo histórico da sobrepesca de muitas espécies em muitas partes do mundo que origina um conflito entre a União Europeia, de que faz parte, e o Canadá e quem vem a sofrer e a ter de se manifestar publicamente contra a solução encontrada é um país como Portugal, em relação ao qual essa situação nunca foi colocada, nunca se viu confrontado com situações desse género, porque, sendo um dos países que menos pesca, não põe em perigo a sobrevivência das espécies.
O Sr. Deputado sabe, por exemplo, que o Canadá, no decurso desta crise, várias vezes manifestou, sob reserva, é certo, ao Ministério dos Negócios Estrangeiros que o que estava em causa não era um conflito com Portugal, que tivéssemos calma, que não reagíssemos, porque a posição do Canadá não era contra os interesses portugueses?
Como explica o Sr. Deputado que a União Europeia chegue a um acordo sobre as quotas de pesca naquelas paragens, distribuídas pelos países membros, no qual Portugal se sinta prejudicado e a Espanha vote favoravelmente? Como é que o senhor quer que encaremos um resultado da política comum de pescas que - e não sei se o Sr. Deputado sabe - não existia antes do Tratado de Maastricht e já estávamos na Comunidade Económica Europeia?
O Sr. Rui Carp (PSD): - Já existia!
O Orador: - Não, não existia, Sr. Deputado. Vá-se informar. A política comum de pescas não existia antes.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Queira concluir, Sr. Deputado.
O Orador: - Vou já concluir, Sr. Presidente.
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Não existia uma política comum de pescas.
O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Não diga isso!
O Orador: - É por isso que, havendo hoje uma política comum, para a qual não estão definidas regras especiais, o processo de decisão da Comunidade se rege pela regra geral da votação por maioria. Portanto, o Governo português, para inviabilizar uma solução que objectivamente o prejudica, como é reconhecido pelo próprio Sr. Ministro, teria de vetar, e não o fez. Manifestou a sua posição para quê? Para que, no quadro de uma estratégia global, a União Europeia tenha possibilidade de, amanhã, compensar Portugal, utilizando o seu poder negocial, com quotas de pescas noutras paragens. É disso que estamos à espera, foi isso que eu disse na minha intervenção. Disse também que, se isso não for feito, se não for invertida a actual situação rapidamente, se, com as actuais regras, não se der uma esperança, no quadro comunitário, ao sector das pescas em Portugal, não tenha, Sr. Deputado, a mínima dúvida de que não vou ser só eu a exigir aqui o abandono da política comum de pescas, irão ser também os pescadores, os empresários e os diversos partidos. E quem sabe também o Sr. Deputado!?
Portanto, Sr. Deputado, não venha responder-me com uma atitude vigilante do espírito europeu, porque um dia irá, com certeza, receber uma medalha da Comissão Europeia por esse espírito de vigilância do espírito comunitário e europeu. O que o Sr. Deputado não vai fazer, com certeza, é arranjar emprego para os pescadores que vêem o seu posto de trabalho em perigo.
O Sr. Antunes da Silva (PSD): - O que o Sr. Deputado quer é «Sol na eira e chuva no nabal»!
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu)- - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.
O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A situação económica e social do País não pára de se agravar: quase 420 000 desempregados, dos quais mais de 200 000 em situação de desemprego de longa duração. Estamos, segundo os números oficiais, no limiar dos 10% de desempregados.
A indústria acentua as suas dificuldades: a Renault e a Pereira Roldão são a ponta do iceberg da rotura do tecido industrial português.
A agricultura continua a sua lenta agonia, agora acentuada pela tragédia da seca.
As pescas iniciam novo retrocesso e desmantelamento sem que se vejam alternativas fáceis e imediatas aos pesqueiros, agora em boa parte perdidos nos mares da Terra Nova
A ameaça que representa o Plano Hidrológico Espanhol para os recursos hídricos do País; os fogos que ameaçam trazer-nos um Verão quente, que já aí está; e os lixos que as indústrias europeias despejam no nosso território fazem de Portugal um país ambientalmente doente.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Perante esta situação, onde está o Governo? O Ministro do Emprego e da Segurança Social revela, no Parlamento, uma inépcia confrangedora para compreender o fenómeno do desemprego e delinear uma verdadeira política de criação de emprego.
O Ministro da Indústria e Energia remete-se a um prudente silêncio, sem explicar sequer o atraso da aplicação do PEDIP II.
A Ministra do Ambiente e Recursos Naturais, que andou meses a pretender sossegar os portugueses quanto ao Plano Hidrológico Espanhol, acaba por confessar que, afinal, fomos ultrapassados, não fomos ouvidos e estamos perante um facto consumado. A seguir, chama-se o embaixador a consultas...
Na agricultura, o PAMAF começa mal e continuará pior, e a reforma do Ministério, que absorve uma percentagem inimaginável das ajudas, continua em ponto morto. Quanto à seca, «o silêncio é de ouro» e as medidas roçam o ridículo...
Nas pescas, andámos a reboque da Espanha, só que sem ter as alternativas que entretanto o Governo espanhol foi cimentando.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD e o Governo estão cegos, surdos e mudos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Apontar os problemas, discutir as soluções e elaborar as estratégias é tudo o que o PSD e o Governo menos desejam.
A troika finou-se. E, com ela, a estratégia de combate político do ex-Líder do Grupo Parlamentar do PSD, sacrificado aos interesses eleitoralistas do dueto Cavaco/Nogueira.
Se a situação do País se agrava com eleições à vista, há que fugir do debate político e refugiar-se no eleitoralismo mais puro e duro.
Se não se sabe o que fazer nem como fazer, criem-se factos políticos, inventem-se «pacotes», cortem-se fitas, muitas fitas, mesmo repetidas. A seguir, mobilizem-se os «arautos encartados», pretensos analistas neutrais, para dar notas de «Bom» e «Muito Bom» à ignorância, à incapacidade e à inépcia.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Se faltam ideias e criatividade, copiem-se as da oposição, se possível, com «roupagem de Estado». A cambalhota política aí está. como método de colagem às posições do Partido Socialista.
Mas nem ela consegue esconder o pior deste PSD de Nogueira.
Num repente, sem sequer dar tempo de informar o líder da bancada, o Presidente do PSD vem ao Parlamento apresentar o chamado «pacto de regime», defendendo tudo o que até aí o PSD chumbara. O que era inconsciência e falta de sentido de Estado da oposição passa rapidamente a ser cartilha do partido do poder. Poucos dias depois lançam-se uma série de ideias, umas requentadas, outras já anunciadas no projecto, do PS, de revisão constítucional, que se inviabilizou poucos meses atrás.
Indigita-se um presidente de uma suposta comissão. Dias Loureiro vem dizer que não, que não sabia!...
Durante meses o PSD apelidou de irresponsável a posição do PS ao propor a abolição da portagem de Alverca; a seguir, por um passe de mágica, acaba-se com a dita e fecham-se as cabines!...
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já conhecemos vários PSD; sabemos todos da sua capacidade de fazer oposição a si próprio. Trapalhão como o de Cavaco/Nogueira não conhecíamos nem imaginávamos que pudesse existir.
Aplausos do PS.
As eleições tudo justificam. Estamos perante a estratégia do «toca e foge». Lança-se um tiro de pólvora seca, aproveita-se o barulho e parte-se... até à próxima.
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O Governo não governa, promete pacotes. Os portugueses já conhecem os pacotes, que são, aliás, os mesmos com outros nomes. E aí estão também as inaugurações, pré-inaugurações, pós-maugurações. Chegou-se ao cúmulo de, com estradas prontas, não as inaugurar, com prejuízo das populações, para esperar pelo timing eleitoral mais apropriado.
Aplausos do Deputado do PS Joaquim da Silva Pinto.
O silêncio útil de Nogueira articula-se com a actividade corta-fitas de Cavaco Silva.
Debates com o Secretário-Geral do PS? Lá mais para o Verão...
Debate sobre o futuro europeu e as posições de Portugal na Conferência de 1996? Para depois...
Discussão da política agrícola, ambiental e industrial? Não existem! Não se discutem!
O que dá, na versão Nogueira, o que está a dar é propor o voto dos emigrantes nas eleições presidenciais, a mera engenharia eleitoral, sob a capa de aproximação dos Deputados aos seus eleitores, a afirmação bacoca de que «há que afirmar Portugal no mundo».
O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!
O Orador: - Portugal começa por afirmar-se em Portugal e com os portugueses. E não é ocultando os problemas que o País avança.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - No momento em que é visível a derrocada de um dos mais apregoados mitos do cavaquismo - o ter contribuído para o prestígio internacional de Portugal -, um dos maiores responsáveis pela actividade governativa nos últimos 10 anos vem reconhecer expressamente o falhanço desse objectivo.
Perde-se com a Espanha no plano hidrológico; o governo francês não mantém compromissos assumidos a propósito da Renault; somos derrotados na questão das pescas; firmas alemãs e suíças fazem de Portugal uma lixeira tóxica
Melhor seria que Nogueira questionasse Durão Barroso sobre o que anda a fazer o Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A nossa visão do estádio actual da sociedade portuguesa não é derrotista. Mas é para nós claro que se entrou numa derrapagem social a que o Governo e o PSD não sabem fazer frente. Esgotaram-se com o esgotamento da sua estratégia.
O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!
O Orador: - O contributo, nos Estados Gerais, dos muitos independentes dos mais variados sectores da sociedade portuguesa para o diagnóstico das situações com que nos defrontamos e que carecem de solução coerente e corajosa é inequívoco e coincidente com o que nós próprios fazemos.
Gostaríamos que o PSD se dispusesse a discutir o futuro de Portugal e dos portugueses e a confrontar connosco perante o País as soluções que cada um defende.
Não é esse o interesse do PSD de Cavaco/Nogueira, mas o repto está e fica lançado. E fica lançado no dia em que se celebra o 22.º aniversário do Partido Socialista.
Ao longo deste período, já distante e que mergulha as suas origens na luta contra a ditadura salazarista-caetanista, o povo português reconhece no PS um partido fundante da democracia portuguesa, que nela deixou marcas indeléveis e representa o que de mais generoso, solidário e moderno existe na cena política nacional.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Desde a luta pela liberdade contra todos os que a queriam abafar, passando pela consagração de um sistema constítucional de direitos, liberdades e garantias, sem paralelo nas democracias ocidentais, até à adesão à Europa, conduzida sob a égide do Partido Socialista de Mário Soares, a luta do PS para fazer avançar Portugal para e na Europa democrática aí está como testemunho de capacidade de uma força política.
Orgulhamo-nos do nosso passado, mas o PS é um partido que soube adaptar-se às novas condições políticas, económicas e sociais na Europa pós-1989. Temos uma visão moderna para a reforma do sistema político, apostamos nos homens e nas mulheres deste país e somos capazes de enfrentar com êxito os novos desafios da economia e do social.
Por isso os portugueses em nós votaram maioritariamente nas duas últimas eleições, autárquicas e europeias. E por isso irão dar a maioria ao PS para governar nas próximas eleições legislativas e viabilizar uma «nova maioria» que possa resolver os problemas dos portugueses.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Pinto.
O Sr. Carlos Pinto (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Vera Jardim, depois de V. Ex.ª ter recriado todos os temas que o Partido Socialista normalmente aborda na crítica ao Governo, de ter feito a revista da imprensa dos últimos dias, gostava de falar-lhe de coisas concretas, trazê-lo para o campo das realidades do País e confrontá-lo com aquilo que o Partido Socialista pensa ser a solução para algumas questões.
Sei que não é V. Ex.ª quem, no Grupo Parlamentar do Partido Socialista, trata das questões da indústria, mas, como levamos muito a sério o porta-voz do vosso partido para esta área, a primeira questão que quero colocar-lhe é justamente a este propósito.
V. Ex.ª fala da desindustrialização do País, dos problemas que não foram resolvidos, designadamente neste período de ajudas comunitárias. Ora, eu li com avidez, esperando encontrar, finalmente, no PS, a luz ao fundo do túnel, o texto do vosso porta-voz para a indústria, que foi dado a conhecer num período pré-eleitoral, o que suporia encontrarmos justamente as grandes linhas do Partido Socialista. E o que é que encontrámos da parte do vosso porta-voz, quando solicitado a falar, no concreto, das medidas para a indústria? Esta excelente proposta, que é a constituição de um conselho consultivo do futuro ministro da indústria, evidentemente do Partido Socialista, se viessem a ganhar as eleições, composto por cerca de 50 sábios.
Risos do PSD.
Diria mais: juntamente com este grupo de «eminências pardas» da indústria, o vosso porta-voz vem ainda propor, se as empresas não resolverem os seus problemas,
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inspirando-se certamente nas propostas deste grupo, que o Estado tentaria, através desses IPE - e o que são estes IPE? São mais uns quantos organismos, pequeninos, como ele diz -,...
O Sr. Vieira de Castro (PSD): - «Pequenino» é ternurento!
O Orador: - ... com verbas e fundos de capital de risco, substituir-se aos empresários e, portanto, libertá-los da carga negativa que não conseguiram ultrapassar com os mecanismos de mercado.
Pergunto-lhe, Sr. Deputado José Vera Jardim, se são estas as propostas do Partido Socialista, porque, depois de tanta elaboração teórica nos Estados Gerais, era suposto termos aqui o guia que nos permitiria, no futuro, olhar com seriedade para aquilo que o Partido Socialista quer, em termos de política industrial.
Já agora, não resisto a fazer-lhe uma outra pergunta.
Tem-se falado muito sobre o destino dos resíduos tóxicos e industriais e um destes dias ouvi o Presidente da Câmara Municipal de Estarreja, que é do Partido Socialista, dizer, responsavelmente, que alguém, algum município tem de ter essa postura responsável, para, de forma negociada e avaliada, decidir da localização desse aterro sanitário e desses resíduos industriais.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Queira concluir, Sr. Deputado.
O Orador: - Termino de seguida, Sr. Presidente.
Pensei estar perante alguém do Partido Socialista que olha os problemas numa perspectiva responsável e compreendendo que é dialogando com o Governo que estes problemas se podem resolver. Eis senão quando ouvi o nosso colega e Deputado do Partido Socialista, Carlos Candal, mencionar algo completamente diferente, pois chegou mesmo a invectivar o Presidente da Câmara Municipal de Estarreja dizendo-lhe que, se o aterro ficasse situado no município, tal acto seria quase como o de um pai que entrega a sua filha a uma «prostituição pública», permitindo a utilização de um concelho para esse fim.
Em que ficamos, Sr. Deputado? Não pode, da tribuna, invectivar o Partido Social Democrata e o Governo sobre questões diversas como se nessa atitude residisse a ciência e a capacidade que o País deveria esperar na resolução destes problemas.
Os senhores têm de definir-se: ou estão do lado da seriedade das propostas ou do lado da demagogia. Se V. Ex.ª não for capaz de responder a estas duas questões concretas, serei levado a pensar que VV. Ex.ªs optaram definitivamente pela demagogia mais pura e fácil no sentido de nada resolverem em relação às questões fundamentais com que o País é confrontado.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Vera Jardim, como utilizou circunstâncias que me envolveram há relativamente pouco tempo para atacar o PSD e, como, eventualmente, tal pode vir a repetir-se, gostaria, desde já, de dizer-lhe que a atitude de cada um tem a ver com a sua individualidade e não é de per si política, pelo que pode ser tida por qualquer pessoa independentemente do partido a que pertença ou da posição que tenha em relação à sociedade.
Contudo, no que diz respeito ao conteúdo político dessa decisão, deixe-me dizer-lhe, em primeiro lugar, que não sei o que é o PSD de Nogueira. Sei o que é o Partido Social Democrata cujo presidente, eleito em congresso, é o Dr. Fernando Nogueira e a tentativa de o Partido Socialista tratar o PSD como se fosse uma espécie de PS maior nunca terá grande sucesso porque a nossa cultura política e entendimento da realidade dificilmente se coadunam com a atitude das pessoas do PS em relação aos seus próprios companheiros. Repito: não sei o que é o PSD de Nogueira, nem pretendo vir a sabê-lo!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Em segundo lugar, os senhores não podem, do ponto de vista ético ou político, usar a minha atitude contra o meu partido porque se há situação sobre a qual não tenho qualquer dúvida e deseje é que o PSD ganhe com maioria absoluta as próximas eleições legislativas e que o presidente do meu partido seja primeiro-ministro por razões que não têm a ver com a minha posição partidária mas com o meu entendimento sobre a necessidade que o País tem dessa solução.
Por essa razão, perdem o vosso tempo se tentam utilizar-me contra o meu partido e não será, em nenhuma circunstância, com a minha colaboração que o farão!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.
O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pacheco Pereira, começo por responder ao pedido de esclarecimento que formulou até porque é o único relacionado com a minha intervenção.
Protestos do PSD.
Sr. Deputado Pacheco Pereira, se V. Ex.ª atribui às suas atitudes uma característica meramente pessoal e privada, está no seu direito, mas tem de dar-me a possibilidade de tirar conclusões políticas desse gesto.
O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!
O Orador: - É inadmissível que V. Ex.ª apresente a demissão do cargo de líder do Grupo Parlamentar do PSD e diga que se tratou de um gesto individual do qual não podem tirar-se conclusões políticas. Foi o que percebi, mas V. Ex.ª poder-me-á elucidar se não foi o que quis dizer.
É mais do que inadmissível, Sr. Deputado Pacheco Pereira, porque quem, ao longo de anos, tentou usar, com argumentos, aliás, muitas vezes, falsos, pretensas divisões no nosso partido e na nossa bancada, foram VV. Ex.ªs,...
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - ... quando distinguiam os «sampaistas» dos «guterristas», dos «gamistas», etc., etc.
O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Dos «soaristas»!
O Orador: - Se V. Ex.ª se demitiu pelas razões que ficámos a conhecer, devo aproveitar a ocasião para lhe
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dizer que fez muito bem! Há pessoas na sua bancada que talvez o devessem ter feito, mas vão continuar a liderá-la e vou explicar-lhe por que razão o digo.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - É que muitas dessas pessoas discutiram e criticaram com muito mais veemência do que V. Ex.ª, porventura - embora não dispusessem das mesmas fontes em que veicula as suas opiniões - , as nossas propostas, ,apelidando-as de irresponsáveis para, três semanas depois, aplaudirem o Dr. Nogueira quando regressou à bancada apresentando uma proposta praticamente idêntica à nossa.
Aplausos do PS.
Sr. Deputado Pacheco Pereira, deixe-me cumprimentá-lo pela sua atitude, mas dê-me igualmente o direito de tirar uma conclusão política. V. Ex.ª não é qualquer pessoa no PSD e tenho o direito de tirar conclusões políticas sobre a sua demissão e de dizer que - é a minha, Interpretação - foi sacrificado a uma estratégia eleitoralista em que não tinha lugar neste momento.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Ao Sr. Deputado Carlos Pinto, tenho a dizer que me pareceu ter lido a entrevista à última hora. Não vou acusar ninguém de lha ter passado, contudo, certamente não teve tempo de a ler ou leu-a em tempos e já não se recorda do seu conteúdo.
A referida entrevista contém muitíssimos aspectos e aponta para - o que temos feito - as causas profundas da situação da indústria portuguesa. Ao fazê-lo - V. Ex.ª sabe-o tão bem como eu - , foi sacrificado o aparelho produtivo industrial português, e não só, a uma política cega de escudo alto, de taxas de juro altas. Não vou repetir tudo o que temos dito, mas a verdade é que foi gizada uma política industrial na base de salários competitivos na Europa, ao tempo, em 1989, não se tendo previsto nem havido capacidade de introduzir as mudanças exigidas pelas novas condições económicas e sociais na Europa de Leste.
Por outro lado, tenho a dizer-lhe que ainda conseguimos arranjar 50 sábios em indústria e não estou a dizer que concorde com essa proposta, mas duvido que consigam juntar igual número porque o mais sábio de entre VV. Ex.ªs, nessa matéria, que é o Sr. Ministro Mira Amaral, mantém um silêncio sepulcral sobre as várias situações pontuais e & crise que atravessa a indústria portuguesa V. Ex.ª já imaginou um Ministro da Indústria e Energia que se demite totalmente de fazer um comentário que seja ao caso Renault...
O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!
O Orador: - ... pelo facto de o Ministro do Comércio e Turismo ser o responsável pelo investimento estrangeiro? E não se trata de uma unidade industrial? E não estão em causa centenas de postos de trabalho? Então, o Sr. Ministro da Indústria e Energia diz a órgãos de comunicação social: «Nada tenho a ver com isso, é com o Ministro do Comércio»? O maior sábio que têm em matéria de indústria! Certamente ser-vos-ia muito difícil justificar nem que fossem cinco sábios sobre política industrial à volta de uma mesa, Sr. Deputado Carlos Pinto!
No que diz respeito aos resíduos, digo-lhe, clara e frontalmente, que é necessário dar-lhes um destino e têm que cá ficar. Sabe porquê? É que nós não podemos exportar os resíduos, tal como fazem a Alemanha ou a Suíça que os exportam para Portugal.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Portanto, nós, como temos que ficar com eles, precisamos encarar esta questão com diálogo. Mas, Sr. Deputado, duvido sinceramente da capacidade do Governo que o senhor apoia para iniciar e levar a bom termo esse diálogo!
Aplausos do PS.
O Sr. Caries Pinto (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Carlos Pinto (PSD): - Para, sob a forma de interpelação à Mesa, poder...
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, peço-lhe que interpele a Mesa.
O Sr. Carlos Pinto (PSD): - Sr. Presidente, não posso deixar de assinalar devidamente a forma «habilidosa» como o Sr. Deputado José Vera Jardim, a sua bancada e o PS passam por cima de temas fundamentais quando se inicia um debate sobre os problemas do País.
Quando se trata de trazer algumas polémicas de rua para o Parlamento, o Partido Socialista discute dessa forma a situação política nacional; quando entramos em discussões acerca de aspectos concretos em que, naturalmente, a acção governativa podia ser enriquecida, o Partido Socialista nada diz!
Eu trouxe o Sr. Deputado José Vera Jardim - foi por essa razão que pedi autorização à Mesa para lhe fazer chegar um documento - para o campo das realidades, designadamente das mais importantes, que têm a ver com o emprego e com o desemprego como é o caso da indústria e o Sr. Deputado José Vera Jardim traz-nos uma adaptação discursiva envergonhada daquilo que o porta-voz do Partido Socialista...
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, peço-lhe que conclua, pois está a interpelar o Partido Socialista e não a Mesa. Se, de facto, pretende que se proceda à distribuição do referido documento, faça chegá-lo à Mesa; se quer interpelar o Partido Socialista, deve inscrever-se para uma intervenção.
O Orador: - Como eu estava a dizer, o Sr. Deputado José Vera Jardim traz-nos uma tentativa de adaptação discursiva das asneiras do porta-voz do Partido Socialista para a indústria. Por exemplo, tala no caso da empresa Manuel Pereira Roldão & Filhos, Lda., esquecendo-se de que o porta-voz do PS para a indústria diz hoje num jornal diário que a fábrica não tem futuro. Em que ficamos?
Peço à Mesa que faça chegar ao Sr. Deputado cópia desta notícia para que possa entender-se com o porta-voz do Partido Socialista para a indústria até porque, dessa forma, o País não se entende sobre a política industrial do Partido Socialista.
Aplausos do PSD.
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O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. José Vera Jardim (PS): - Certamente para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, naturalmente que depois da utilização abusiva desta figura regimental pelo Sr. Deputado Carlos Pinto, não posso deixar de dar-lhe a palavra para o mesmo efeito. Porém, por tratar-se de um hábito que já vai sendo prática corrente nesta Assembleia, julgo que devo solicitar aos Deputados que, numa futura revisão do Regimento, aprovem um aditamento segundo o qual qualquer Deputado pode utilizar a figura da interpelação à Mesa para interpelar outro partido ou Deputado, porque a Mesa fica colocada numa situação difícil ao autorizar a sua utilização.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, não utilizarei muito tempo porque faço, desde já, um repto à bancada da maioria para, se quiser, marcarmos um debate sobre a situação da indústria em Portugal, pois não é a propósito da minha intervenção nem nos poucos minutos de que dispomos que o vamos fazer.
Mais uma vez, o Sr. Deputado Carlos Pinto não leu tudo! Como os documentos lhe chegam «fresquinhos», não tem tempo para os ler, mas vou ajudá-lo.
E possível que, neste momento, essa frase esteja correcta, mas segue-se a explicação, que passo a referir para avivar a sua memória, se já leu o artigo, para o informar, se não teve ocasião de o ler: Henrique Neto responsabiliza o Governo por não ter disponibilizado os fundos necessários para proceder à reestruturação do subsector da cristalaria declarada pelo Governo pela Portaria n.º 934/94, de 21 de Outubro. Esta é a questão, Sr. Deputado! Quando não se actuou em tempo oportuno, quando se deixaram chegar as coisas a uma situação de podridão, é fácil e naturalmente corresponde à verdade dizer que a fábrica não tem futuro. Mas temos de ver o que se fez antes: quando é que o Governo, com que meios, como, procedeu à reestruturação da indústria da cristalaria na Marinha Grande? Essa e a questão que lhe coloco, Sr. Deputado!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Marta Gonçalves.
O Sr. Carlos Marta Gonçalves (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O desporto em Portugal, fruto de situações diversas, revelou dificuldades de desenvolvimento, a que, por certo, não é estranho o facto de, ao longo dos tempos, ter como suporte um modelo fortemente dependente do Estado. Essa situação criou enormes dificuldades ao desenvolvimento desportivo, como também contribuiu para a manutenção de um sistema, em que os circuitos burocráticos nem sempre possibilitaram um espírito de criatividade e de organização associativa das comunidades locais e regionais.
Foi um sistema que durou muitos anos - quase 50 - e que terminou em 1990 com a publicação e aprovação, nesta Casa, da Lei de Bases do Sistema Desportivo.
Foi, assim, derrubada a legislação anterior que vigorava desde 1943, encontrando-se, finalmente, o enquadramento jurídico para o sistema desportivo português: a chamada «Carta magna do Desporto Nacional» e considerada por muitos a lei mais importante para o desporto nacional
Esta lei, para além da consagração do desporto no quadro social e económico do País, aponta as linhas-mestras fundamentais para regulamentar, dirigir, operacionalizar e definir claramente o papel do Estado, do movimento associativo e de todas as estruturas, quer elas se situem na escola, no trabalho, nas forças militares ou no quadro mais alargado dos municípios.
Em suma, a Lei de Bases determina claramente o seguinte:
Primeiro, que o desporto português não é um desporto de Estado;
Segundo, que o Estado não se demite, mas intervém nas obrigações normativas, no criar de condições para uma correcta formação, na criação de infra-estruturas, no combate a assimetrias, nas obrigações de fomento, nas obrigações de ordenamento; nas obrigações inerentes ao sistema educativo;
Terceiro, o respeito pela autonomia do movimento associativo.
A Lei de Bases consagra, assim, um modelo de desenvolvimento desportivo aberto e progressivo, assente em três vectores fundamentais: a escola, o movimento associativo e a descentralização das estruturas desportivas.
A Lei de Bases do Sistema Desportivo consagrou, definitivamente, o desporto na escola. A sua institucionalização é fundamental para uma correcta evolução do jovem praticante. O desporto na escola tem de ser assumido por todos e para todos, dando, naturalmente, prioridade ao curricular e tendo sempre em atenção os valores do associativismo, na medida em que estes permitem o desenvolvimento criativo e a inovação cultural dos jovens. Defendemos, por isso, uma grande articulação entre o sistema educativo e o sistema desportivo. Não pode, nem deve, haver separação entre estes dois sistemas.
O jovem é o mesmo, dentro e fora da escola, e tem de ser educado e preparado para a vida em comunidade.
Queremos e desejamos uma nova escola de sucesso, mas só conseguiremos atingir este objectivo através de um modelo participado e associativo, de forma a desenvolver nos jovens a auto-segurança, a auto-confiança, o respeito por si próprio, a capacidade de liderança, a aquisição de conhecimentos, capacidades e atitudes que os tornem aptos a planear e a gerir as suas próprias actividades, a estimular a imaginação, a criatividade, o optimismo e a vontade de vencer. Mas também há que encorajar atitudes solidárias de cooperação, de lealdade, de tolerância e de compreensão.
Em suma, a escola não pode constituir o simples mudar de nome de uma instituição curricular mas também o mudar de mentalidades nos sistemas social, educativo e desportivo.
Por outro lado, entendemos, e a lei assim o determina, que as actividades a desenvolver têm de ser promovidas e dinamizadas tendo por base o livre associativismo, de forma a haver transformação e desenvolvimento de todo o sistema desportivo.
É um conceito aberto, amplo suporte dos princípios democráticos da sociedade civil. Somos livres de nos associarmos em prol de qualquer actividade que, naturalmente, defenda os valores da sociedade portuguesa, em geral, e desportiva, em particular.
O associativismo é um espaço de liberdade e criatividade conquistado pela sociedade civil, à margem do Esta-
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do, sendo um espaço de auto-responsabilidade assumida por quantos dirigem, participam e fomentam o movimento associativo, funcionando como uma escola da democracia. A lei consagra o respeito escrupuloso pela autonomia dos clubes, associações e federações, pelo seu papel Insubstituível no fomento e mobilização da sociedade civil para o desporto.
Finalmente, a descentralização das estruturas através da recusa da concentração da administração desportiva e da irrecusável valorização do papel das comunidades e das autarquias locais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O desporto e a sua função social, cultural e económica têm sido objecto de uma análise cada vez mais aprofundada, cuja evolução; é patente no conjunto de cartas, manifestos e recomendações elaborados ao longo das últimas décadas.
A Carta Europeia do Desporto Para Todos, cujos Princípios e objectivos são, hoje, universalmente conhecidos, é um marco decisivo na evolução dos conceitos que regem o fenómeno desportivo, não tanto como factor correctivo ou de compensação para uma falta de exercício determinada e pela predominância da ocupação sedentária mas, igualmente, como uma actividade cada vez mais enraizada e generalizada numa sociedade em que a ocupação dos tempos livres dos indivíduos assume uma importância sempre crescente e que requer, como direito a todos reconhecido, uma resposta adequada por parte dos poderes públicos.
O desporto é, assim, um acto de liberdade, devendo dar-se todas as condições para que «todos» o possam fazer, de modo a que qualquer recusa signifique apenas a expressão dessa mesma liberdade.
Por isso, só há um desporto: aquele que é praticado de uma forma competitiva ou de uma forma recreativo, quer seja realizado na escola, nas forças armadas, no federado, nas autarquias, na universidade ou nos locais de trabalho.
O desporto mais não pretende do que preencher uma parte da educação total, se considerarmos o trinómio educação, cultura e desporto.
O desporto contribui assim, de uma forma decisiva, para o combate à droga, à prostituição, à delinquência, que hoje cada vez mais preocupam a nossa sociedade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados. São, pois, estas às linhas fundamentais do modelo de desenvolvimento desportivo seguido pelos diversos governos do PSD e do Professor Cavaco Silva. Uma política desportiva em que a formação, as infra-estruturas desportivas, as actividades, o apoio à alta competição e o desporto na escola têm sido os factores desenvolvidos e privilegiados nos últimos 10 anos de governação do Partido Social Democrata.
Política desportiva inscrita nos diversos programas de Governo apresentados pelo PSD nesta Câmara e que têm sido executados em cada momento por acções a realizações concretas.
Podemos, pois, afirmar que o desporto português conheceu, nos últimos 10 anos, uma evolução claramente positiva. Senão vejamos:
Primeiro, no domínio da formação, importa salientar o facto de se ter passado de uma fase de quase inexistência de técnicos habilitados - basta recordar que, em 1985, a grande maioria das escolas preparatórias e secundárias não tinham professores de educação física e desporto - para uma fase, a que hoje vivemos, em que a estrutura técnica regional e nacional começa a dar respostas às necessidades e exigências das escolas e do movimento associativo.
Não podemos esquecer-nos do papel relevante das universidades portuguesas - no passado apenas duas escolas, hoje são já cinco escolas de formação - que estão a desenvolver, pela via académica, um processo qualitativo de agentes especializados nas ciências do desporto, sem esquecer o magnífico trabalho que nesta área é realizado e desenvolvido pelas diferentes federações desportivas.
Segundo, no domínio das infra-estruturas desportivas, o esforço e o trabalho desenvolvidos não têm precedentes na história do desporto português A definição dos princípios orientadores da Rede Integrada de Infra-estruturas Desportivas, em 10 de Maio de 1988, consubstanciada na Lei de Bases do Sistema Desportivo, constituíram os «passos» decisivos para uma alteração significativa da rede de infra-estruturas desportivas e do seu desenvolvimento, não apenas em termos quantitativos mas, igualmente, em termos qualitativos, de acordo com as exigências internacionais reconhecidas neste domínio, nomeadamente na Comunidade Europeia. Com a implementação do projecto RIID - Rede Integrada de Infra-estruturas Desportivas, foi possível, através de um diálogo profundo e de uma cooperação com as autarquias locais, escolas, movimento associativo e comunidade em geral, corrigir as enormes assimetrias ainda existentes e construir pavilhões desportivos, piscinas, pistas de atletismo, relvados, campos de ténis e polivalentes por todo o País.
Defeniu-se claramente uma política de infra-estruturas desportivas, integrada, racionalizada e dimensionada para a comunidade num diálogo aberto com ela e tendo em conta as carências existentes, a população, o nível de prática desportiva e as acessibilidades.
É uma política que defende que uma instalação ou equipamento desportivo deve ser devidamente rentabilizado, pois não podemos mais admitir que aquelas são património exclusivo do Estado, da escola, do clube, da autarquia ou de qualquer outra instituição.
O recente lançamento - e já em execução -, por parte do Governo, através da Secretaría de Estado da Educação e Desporto, de um novo programa para a construção de 100 novos pavilhões desportivos até ao início do próximo ano lectivo para servir as escolas e a comunidade é bem o exemplo dos investimentos e da prioridade dada a esta área pelos governos do PSD e do Professor Cavaco Silva.
Saudamos, igualmente, as recentes medidas tornadas públicas pelo Sr. Secretário de Estado da Educação e Desporto no apoio aos clubes ou autarquias que pretendam realizar o arrendamento dos seus estádios de futebol, o que possibilitará que 58 clubes dos campeonatos nacionais da 2.ª Divisão B e 3.ª Divisão possam cumprir o estipulado nos regulamentos federativos
Terceiro, no domínio das actividades, o balanço é extremamente positivo. A autonomia do movimento associativo é uma realidade indiscutível, fruto de uma política de apoios e estímulos por parte do Estado, de uma forma responsável e criteriosa, deixando ao movimento associativo a liberdade de promover e dinamizar as actividades.
Em 1985, quando o Professor Cavaco Silva chegou ao Governo, o total de apoios atribuídos ao movimento associativo, para actividades regulares e para a alta competição, rondava os 290 000 contos, em 1990, esse apoio era já de 1,74 milhões de contos; em 1992, era de 2,226 milhões de contos e, no ano de 1994, de 4 milhões de contos.
Por outro lado, o Governo, tendo em conta a importância do alto rendimento desportivo, assinou recentemente com as federações desportivas contratos-programas de apoios financeiros suplementares ao desporto de alta
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competição, com vista a proporcionar a melhoria das condições de preparação a atletas e técnicos que se prevê desde já, possam estar presentes nos Jogos Olímpicos de Atlanta em 1996, co-responsabilizando-os igualmente em relação aos objectivos desportivos (entenda-se resultados) previamente traçados.
Portugal foi, igualmente, escolhido em 1994 para a realização de grandes eventos desportivos, o que demonstra o reconhecimento das instituições desportivas internacionais da nossa capacidade de organização e a evolução do desporto português, das quais gostaríamos de destacar: o Campeonato da Europa de Andebol; o Campeonato do Mundo de Juniores de Atletismo; o Campeonato da Europa do Fosso Olímpico; o XVIII Campeonato do Mundo de Trampolins; o Campeonato da Europa de Vela; o Campeonato da Europa de Juniores em Judo; o Campeonato da Europa de Hóquei em Patins de Seniores Masculinos; o Campeonato da Europa de Hóquei em Patins de Seniores Femininos; o Campeonato da Europa de Tiro de Caça com Arco.
Também equipas e atletas portugueses conseguiram, em 1994, resultados desportivos de grande valor e significado. Nos vários campeonatos da Europa e do mundo, realizados em 1994, nas modalidades de atletismo, badminton, bilhar, canoagem, judo, hipismo, hóquei em patins, natação, remo, ténis de mesa, tiro com armas de caça, trampolins, vela e voleibol foram conquistadas 23 medalhas de Ouro, 11 de Prata e 10 de Bronze, o que demonstra o trabalho extraordinário que está a ser desenvolvido por dirigentes, técnicos e atletas, em suma, pelo movimento associativo português e que merece da nossa parte um grande respeito e admiração.
Finalmente, o desporto na escola voltou a renascer. O desporto tem de começar na escola. É ali que se interiorizam os hábitos, os valores e as atitudes que vão marcar o futuro de uma sociedade. É, portanto, na escola que devem ser dadas todas as condições para que os jovens possam ter acesso à prática desportiva.
Mais de 400 000 jovens estão a participar este ano lectivo nas actividades desportivas, o que corresponde à participação de 919 escolas, 3 730 grupos desportivos escolares enquadrados por 3 485 professores, salientando-se o facto de 36 grupos participarem já em quadros competitivos organizados pelas associações e federações desportivas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estão, assim, a dar-se passos decisivos para a correcção das assimetrias e carências ainda existentes e para o desenvolvimento harmonioso e global do desporto em Portugal, desde a escola até à alta competição.
Mas o futuro não pode depender em exclusivo da administração desportiva estatal mas também do esforço conjunto desta com as estruturas desportivas não estatais, com as autarquias, com os meios de comunicação social, com o mecenato, com a escola, com as universidades e com o movimento associativo em geral.
O aumento de quase 16% do Orçamento do Estado para 1995 dos apoios financeiros relativos ao desporto, em relação ao ano anterior, são a prova do reconhecimento da parte do Governo de que é necessário continuar a aposta no desporto para se poder ganhar o futuro.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, encontram-se na tribuna de honra, em visita à Assembleia da República, o Sr. Presidente da Assembleia do Atlântico Norte, Deputado Karsten Voigt, e o Secretário-Geral da Assembleia do Atlântico Norte, Peter Corterier, acompanhados de Deputados da nossa Comissão de Defesa Nacional e de autoridades militares.
Para eles, peço à Câmara uma saudação especial.
Aplausos gerais.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alexandrino Saldanha.
O Sr. Alexandrino Saldanha (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os trabalhadores da banca estão a ser confrontados, em cada dia que passa, com uma cada vez mais grave situação sócio-laboral, fruto da política de direita do Governo PSD, com as privatizações e uma acelerada concentração capitalista e consequente entrega dos bancos a dois ou três grandes grupos económicos.
As consequências desta política para os trabalhadores do sector estão bem patentes na degradação das condições de trabalho e na aguda crise social que hoje vivem.
A violação constante de direitos legais e contratuais, com uma geral impunidade dos seus responsáveis (as excepções são poucas), é regra nos locais de trabalho.
O horário de trabalho não é cumprido, aumentando-se a sua duração com total desrespeito pela legalidade, sem remuneração e chegando mesmo a trabalhar-se nestas condições sábados e domingos e no período de intervalo para o almoço.
Os bancos estão a recorrer cada vez mais a empresas de prestação de serviços - que, em muitos casos, eles próprios criaram - para alugar trabalhadores mais baratos e em situação precária, os quais, em violação do contrato colectivo e da legislação, são postos a executar tarefas especificamente bancárias.
O recurso aos contratos a termo (ou a prazo) em admissões para postos de trabalho efectivos é também generalizado.
Paralelamente, há uma clara tendência para contratar trabalhadores que também desempenham actividades especificamente bancárias, mas pagos através de «recibos verdes».
Tudo isto é acompanhado de uma intensificação dos ritmos de trabalho e, contraditoriamente (ou talvez não), da invocação de «excedentes de pessoal», pressionando-se muitos trabalhadores efectivos para se reformarem, suspenderem o contrato de trabalho ou venderem o seu emprego. Contudo, há depois situações em que os bancos substituem alguns dos trabalhadores assim «libertados» por mão-de-obra alugada nas condições atrás referidas.
No âmbito salarial a degradação dos salários reais é notória.
Nos últimos anos, a evolução das tabelas salariais nem sequer tem acompanhado o aumento da taxa de inflação enquanto a produtividade tem aumentado. Em 1994, por exemplo, os trabalhadores bancários tiveram uma actualização salarial anual de 3 %, quando se sabe que a inflação média anual foi de 5,4 %. E na anterior actualização os bancários já haviam perdido cerca de 3 % face aos índices médios da inflação anual.
Apoiadas na política de direita do Governo e cientes da sua impunidade, as administrações dos bancos desrespeitam as normas contratuais, fragilizando a posição dos trabalhadores e perseguindo o objectivo de uma ampla desregulamentação das relações laborais, que lhes permita instaurar o «quero, posso e mando» nas empresas.
As comissões de trabalhadores vêem-se normalmente confrontadas com a recusa das administrações em fornecer as informações a que a Lei n.º 46/79 as obriga, desrespeitando o direito de participação e do exercício do controlo de gestão constitucionalmente consagrados.
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As comissões sindicais são igualmente marginalizadas pela generalidade das administrações, que, na maior parte dos casos, se recusam a recebê-las.
Por outro lado, penalizam-se os activistas sindicais, membros das comissões de trabalhadores e, em geral, todos os bancários que exigem o cumprimento dos seus direitos legais e contratuais.
A política de direita do Governo do PSD tem como corolário lógico esta afrontosa política de gestão de pessoal - baseia-se na desumanização das relações de trabalho; privilegia o arbítrio; sustenta-se no mais completo secretismo e falta de diálogo; e despreza os recursos humanos de cada empresa e a sua experiência adquirida.
Responsabilizamos o PSD, mas também o PS, pela política de privatizações prosseguida no sector, com a consequente concentração do capital financeiro, que é utilizado para uma autêntica «vampirização» dos recursos e dos sectores produtivos do País.
Responsabilizamos também essas forcas pela postura demissionista assumida no plano social, pois, sendo dominantes nos sindicatos dos bancários e na UGT, desenvolvem uma acção de abdicação no domínio das questões sociais, apesar da capacidade de luta demonstrada pelos bancários.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os interesses dos bancários são convergentes com os interesses dos trabalhadores em geral e do País quando defendem um forte sector público financeiro ao serviço do desenvolvimento económico nacional e não um sector financeiro como aspirador dos nossos recursos produtivos e como instrumento de recuperação dos grandes grupos capitalistas, à custa do empobrecimento do povo.
Por isso, o PCP reclama o fim imediato das privatizações, verdadeiro saque do património público, fonte de desemprego, factor de transferência de decisões económicas e políticas para o estrangeiro; por isso, o PCP defende a qualificação da força de trabalho dos bancários e a melhoria das remunerações dos trabalhadores; e, por isso ainda, o PCP defende uma clara política alternativa à deste Governo, uma política de esquerda, que fomente a estabilidade sócio-laboral no Sector e respeite os direitos de participação dos trabalhadores, consagrados na Constituição da República Portuguesa.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, deram entrada na Mesa dois votos de pesar, apresentados pelo CDS-PP, que o Sr. Secretário vai ler.
O Sr. Secretário (José Cesário): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto n.º 143/VI, de pesar pelo falecimento do Professor Almerindo Lessa, é do seguinte teor:
No passado dia 11 de Abril, faleceu em Lisboa o Sr. Prof. Doutor Almerindo Lessa.
Almerindo Lessa esteve presente em quase sete décadas da vida académica, social, política, científica e médica portuguesas.
Os sobreviventes dos movimentos estudantis da década de vinte lembrarão o colega brilhante, ousado e irreverente.
Outros recordarão certamente o líder de firmes princípios democráticos, sempre pronto para acções coerentes com os mesmos princípios.
Os colegas dos hospitais civis e a classe médica lembrarão o especialista de renome e um cientista cuja obra sobreviveu ao passar das décadas.
Os seus alunos não esquecerão o professor universitário brilhante, progressista e sempre virado para ò futuro, se bem que solidamente enraizado no passado.
Os colegas professores universitários terão sempre presentes a sua inteligência, o seu sentido crítico e a sua preparação científica, sem esquecer a sua alegria de viver.
Os cientistas com quem trabalhou não esquecerão o colega brilhante, polifacetado e por vezes genial capaz não só de integrar equipas de investigação mas, também, de as liderar quando necessário.
Grande parte da sua vida foi dedicada ao estudo da problemática tropical e aí, particularmente em Cabo Verde, no Brasil e em Macau será sempre lembrado no meio científico como alguém que não só teve a coragem de inovar mas também teve a humildade de, durante anos, prosseguir pesquisa individual sabendo que só assim será inovador o que aconteceu com a sua obra premiada sobre Macau a cujo lançamento, como temia, não teve a felicidade de assistir
Cientista de mérito, profundo conhecedor do Homem, cidadão do mundo, Almerindo Lessa teve uma vida que mereceu ser vivida e que será recordada.
A Assembleia da República curva-se perante a excepcional figura de Almerindo Lessa e apresenta à família sentidas condolências.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, vamos proceder à sua votação.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes e dos Deputados independentes Manuel Sérgio, Mário Tomé e Raúl Castro.
A Mesa associa-se também a este voto de pesar e solicita à Câmara que guarde um minuto de silêncio.
A Câmara guardou, de pé, um minuto de silêncio.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do segundo voto de pesar.
O Sr. Secretário (José Cesário): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto n.º 144/VI, de pesar pelo falecimento do cineasta António Lopes Ribeiro, é do seguinte teor:
Faleceu, no passado dia 14 de Abril, o cineasta António Lopes Ribeiro.
Referência incontornável do cinema português, Lopes Ribeiro amou a sétima arte como poucos e muito jovem abraçou uma frutuosa carreira de realizador, que deixa a Portugal não só obras inesquecíveis como O Pai Tirano ou O Pátio das Cantigas mas também documentários de indesmentível qualidade cinematográfica, cujo expoente maior será porventura A Exposição do Mundo Português.
Mas não foi só na qualidade de realizador que Lopes Ribeiro deixou a sua marca indelével no cinema português. Com efeito, e para além de na sua multifacetada carreira ter também assumido as qualidades de produtor e argumentista, ele será sobretudo recordado do grande público por uma notável obra de crítica e divulgação do cinema.
E é também nessa qualidade de verdadeiro agente e comunicador de cultura que Lopes Ribeiro contribuiu de forma ímpar para a divulgação do cinema e da sua arte no nosso país.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos da palavra, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes e dos Deputados independentes Manuel Sérgio. Mário Tomé e Raúl Castro.
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Srs. Deputados, peço-lhes que guardem um minuto de silêncio.
A Câmara guardou, de pé, um minuto de silêncio.
Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.
Eram 17 horas e 15 minutos.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, dando início ao período da ordem do dia, o Sr. Secretário vai dar conta de um relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre substituição de Deputados.
O Sr. Secretário (Lemos Damião): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o relatório e parecer refere-se à substituição dos Srs. Deputados Alípio Dias, do PSD, a partir de 19 de Abril corrente, inclusive (nesta data passou a efectivo o Sr. Deputado António Bacelar, que se encontra em funções), Amélia Pardal, do PCP, a partir de 17 de Abril corrente, inclusive (nesta data passou a efectivo o Sr. Deputado António Filipe, que se encontra em funções) e Rui Manuel Marques, do CDS-PP, com início em 17 de Abril corrente, inclusive, respectivamente pelos Srs. Deputados Acácio Roque, Alexandrino Saldanha e Ferreira Ramos.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes e dos Deputados independentes Manuel Sérgio, Mário Tomé e Raúl Castro.
Srs. Deputados, vamos proceder à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 125/VI - Alteração do regime do direito de antena nas eleições presidenciais e legislativas.
Para proceder à síntese do respectivo relatório, elaborado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.
O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias aprovou hoje, por unanimidade, um relatório respeitante à utilização do direito de antena, em período eleitoral, nas eleições presidenciais e legislativas.
A proposta de lei apresentada pelo Governo visa, fundamentalmente, explicitar uma regra que decorre do ordenamento constitucional e que radica na ideia de que o direito de antena, em período eleitoral, é obrigatório para as entidades públicas e privadas, para as emissoras de televisão ou de rádio.
Esta é uma norma constitucional de aplicação directa e imediata, pelo que, como todos sabemos, independentemente da sua mediação legislativa, tem tradução aplicável e um comando impressivo, impositivo e imediato que decorre da Constituição.
A alteração agora proposta, quanto a nós, traz algumas inovações, nomeadamente no que respeita a matéria de organização dos tempos de antena e, nesse sentido, há uma melhor racionalização dos tempos que são atribuídos aos partidos, às coligações e, no caso das eleições presidenciais, aos candidatos concorrentes.
No entanto, como o relato apresentado na 1.ª Comissão sintetiza e chama a atenção, há duas ou três questões fácticas políticas que se nos levantam. Uma é, desde logo, ter acabado com a obrigatoriedade do tempo concedido, em termos de campanha eleitoral, imediatamente a seguir ao serviço informativo. De acordo com a solução agora apresentada, o período da campanha eleitoral pode ser utilizado entre as 19 e as 22 horas, o que pode permitir a possibilidade de esse tempo ser deslocado para um tempo de menor audiência, o que faz do período nobre do pluralismo da informação política um período menos nobre.
Esta é uma dúvida que temos, pois estamos em crer que, com a liberdade que, naturalmente, é concedida às empresas de emissão televisiva ou radiofónica - sobretudo à televisiva - para organizar o seu tempo, isso fará com que o tempo utilizável para a emissão dos períodos eleitorais seja muito próximo das 19 horas e muito distanciado da hora que agora é a mais nobre das horas nobres, ou seja, logo a seguir ao noticiário informativo.
A outra questão diz respeito aos custos e ao pagamento dos serviços prestados pelas empresas públicas ou privadas. Aqui, a solução defendida pelo Governo vai no sentido de uma decisão arbitrai que fixe, na base de tabelas, o pagamento do serviço prestado, o que nos parece ser uma solução adequada, que tenta fugir às contingências e à iminência de uma negociação em termos de pura regra de mercado sem quaisquer controlos, o que poderia fazer diferir a decisão final e traduzir-se numa relativa inconsequência.
Por último, temos dúvidas quanto à satisfação plena de um conjunto de reparos, emitido em parecer da Comissão Nacional de Eleições, e que, em grande medida, são efectivamente satisfeitos com esta proposta de lei. Mas, na parte que respeita à matéria sancionatória, temos dúvidas sobre se as dificuldades que a Comissão Nacional de Eleições admitia estarão definitivamente superadas.
Em todo o caso, o relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias conclui considerando que nada obsta a que esta matéria seja discutida em Plenário, chamando no entanto a atenção de que poderia haver vantagem em serem ouvidas, eventualmente noutra fase da discussão desta proposta de lei, entidades directamente implicadas na discussão e decisão sobre esta matéria.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna (Carlos Encarnação): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em comunicação dirigida à Assembleia da República, a Comissão Nacional de Eleições levantou o seguinte conjunto de questões, que passo a expor.
Nos termos do n.º 3 do artigo 63.º da Lei n.º 14/79, de 16 de Maio (Lei Eleitoral para a Assembleia da República), aplicável à eleição para o Parlamento Europeu por força da remissão contida no n.º 1 do artigo 10.º, da Lei n.º 14/87, de 29 de Abril (Lei Eleitoral para o Parlamento Europeu), compete à Comissão Nacional de Eleições proceder à distribuição dos tempos de antena reservados por
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lei, para efeitos eleitorais, aos partidos políticos e coligações concorrentes.
A fim de organizar as grelhas de emissão que servirão de base ao sorteio a efectuar pela Comissão Nacional de Eleições, suscitou-se o problema de saber se devem ou não incluir-se as estações privadas de televisão.
A dúvida coloca-se porquanto, por um lado, a lei ordinária apenas refere a Radiotelevisão Portuguesa «o seu primeiro canal e os tempos de emissão reservados pela Radiotelevisão Portuguesa, o que correspondia à realidade na altura da sua publicação, no ano de 1979, pelo facto de a televisão ser apenas pública, já o mesmo não acontecendo para a rádio, que era simultaneamente pública e privada,
Por outro lado, a revisão constitucional de 19B9 veio dar nova redacção ao n.º 3 do artigo 40 º da Constituição da República Portuguesa, manifestando a consagração do direito de antena dos partidos nos órgãos de comunicação social, fossem eles públicos ou privados, será o que deixaria de haver verdadeira igualdade de acosso das várias correntes aos meios de informação.
Diga-se, aliás, que a discussão deste preceito no seio da Comissão Eventual para Apreciação da Reforma do Sistema Eleitoral mereceu, desde o início, o consenso geral de todos os grupos parlamentares de então, o que se comprova cotejando algumas declarações contidas nas actas da revisão constitucional: «(..) Nos períodos eleitorais deve haver uma garantia clara e inequívoca,, seja nas entidades públicas como nas entidades privadas, dos tempos de antena regulares e equitativos (..)» - palavras do Deputado Constituinte Rui Machete; «(...) O exercício do direito a tempo de antena, em períodos eleitorais, não é circunscrito, como bem se compreenderá, ao serviço público, uma vez que nessa altura se trata de regras, específicas para os períodos de campanha eleitoral (...)» - palavras do Deputado Constituinte Jorge Lacão; «(...) A Constituição Portuguesa é uma Constituição compromissória e não é só na forma de elaboração que isso Se exprime, exprime-se num conjunto vasto de preocupações, espelhadas por todo o texto constitucional, que vão desde o sistema eleitoral de representação proporcional e não maioritária até aos inúmeros princípios de igualdade dos partidos políticos nas candidaturas - por exemplo» na liberdade de expressão em sede eleitoral -, que têm repercussões em matéria de tempo de antena nos meios de comunicação social públicos ou privados (...)» - palavras do Deputado Constituinte António Vitorino.
Apesar da opinião de todos os constitucionalistas, que a nota da Comissão Nacional de Eleições também cita, a verdade é que os grandes princípios constitucionais carecem de modulação por parte do legislador ordinário, tanto que o próprio preceito refere, nos termos da lei, que o caso em apreço se caracterizou ou por uma profunda apatia e inércia ou pela assunção de nada querer alterar. E veja-se que nem a lei que regula o regime de actividade da televisão, que já prevê o regime de licenciamento para novos canais de natureza privada, veio estabelecer de forma clara que o direito de antena nos períodos eleitorais se aplica indistintamente ao serviço público de televisão e aos canais privados.
Não se diga também que as lei eleitorais têm permanecido imutáveis, isto é, sem que lhes tenham sido introduzidas quaisquer alterações. Muito pelo contrário, no que respeita à Lei Eleitoral para a Assembleia dg República, para onde a nossa atenção recai, o seu artigo 62.º já foi objecto de duas medidas legislativas em relação às estações privadas de rádio de âmbito local.
A primeira medida surgiu por altura da última eleição para o Parlamento Europeu, realizada a 18 de Junho de 1989, e consubstanciou-se na Lei n º 10/89, de 18 de Maio. Este diploma veio suspender o direito reconhecido no citado artigo, no tocante às estações de rádio de cobertura local, apontando para a regulamentação do regime de reserva do tempo de emissão nessas rádios em períodos eleitorais durante a sessão legislativa de 1989/1990, o que nunca veio a acontecer
Tendo a Lei n.º 10/89 caducado por falta de regulamentação no prazo para tal estipulado, vem-se o legislador obrigado, pelos mesmos fundamentos que haviam presidido à feitura do anterior diploma, a publicar, em pleno processo eleitoral para a Assembleia da República, a Lei n.º 55/91, de 10 de Agosto, que, sob a epígrafe Tempos de Antena nas Rádios Locais, preceitua, em artigo único, que o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 62.º da Lei n.º 14/79, de 16 de Maio, não é aplicável às estações de rádio de cobertura local.
Mas se houve o cuidado de ultrapassar o problema das rádios locais, parece não ter havido intenção de alterar o estabelecido no campo das emissões para televisão.
E pergunta a Comissão Nacional de Eleições «Se se entendesse alargar às estações privadas de televisão o acesso dos partidos políticos e coligações para propaganda eleitoral, quais os critérios que deveriam presidir ao reconhecimento em concreto desse direito em matéria de tempo de emissão e de horário?»
Por outro lado, acrescenta. «Prosseguindo aquelas uma actividade lucrativa, teriam de ser, naturalmente, compensadas pelo Estado, em termos também por definir, o que acarretaria um aumento substancial das despesas eleitorais. E, na ausência de previsão expressa na Lei Eleitoral, teria a Comissão Nacional de Eleições competência para obrigar as estações de televisão privadas a conceder tempo de antena aos partidos e coligações9»
Em conclusão: perante este quadro fáctico, a Comissão Nacional de Eleições deliberou no sentido de remeter à Assembleia da República esse parecer, donde se inferem as suas dúvidas sobre os inodus faciendi de uma aplicação directa do direito constitucional, consagrado no n.º 3 do artigo 40.º da Constituição da República Portuguesa, tendo entendido, por unanimidade, que cabe indubitavelmente ao órgão de soberania Assembleia da República definir a extensão e as regras de efectivação do direito de antena das estações privadas de televisão.
Esta posição radica-se no fenómeno que coloca a questão de saber se na campanha eleitoral as estações privadas de televisão, recentemente aparecidas, estão ou não obrigadas a transmitir tempo de antena dos partidos políticos e coligações. A este respeito, a Constituição da República Portuguesa prescreve, no seu artigo 40.º, que «nos períodos eleitorais os concorrentes têm direito a tempos de antena, regulares e equitativos, nas estações emissoras de rádio e de televisão de âmbito nacional e regional, nos termos da lei »
Ora, não estando o direito de antena, para efeitos eleitorais, sujeito a qualquer tipo de limitação constitucional, cabe ao legislador consagrar a distribuição ao longo do período da campanha eleitoral e a repartição equitativas do direito de antena eleitoral entre os concorrentes, de acordo com, o princípio geral da igualdade de oportunidade e de tratamento das diversas candidaturas. Os sujeitos passivos do direito de antena e direitos conexos são. em geral, as emissoras de rádio e de televisão públicas.
O direito de antena eleitoral obriga, no entanto, todas as emissoras de âmbito nacional ou regional, sem distin-
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cão entre as públicas e as privadas. A sujeição das emissoras privadas ao direito de antena eleitoral decorre, pois, directamente da função constitucional das eleições.
Sendo inequívoca a obrigação constitucional de transmissão, pelas estações privadas de rádio e televisão de âmbito nacional, de tempo de antena durante o período de campanha eleitoral, vem hoje o Governo apresentar aqui, perante esta Câmara, uma iniciativa legislativa que visa estabelecer as condições para o exercício regular e equitativo do direito de antena eleitoral.
O Sr. José Puig (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Na sequência do que fica afirmado, o Governo apresenta esta iniciativa legislativa que, entre outras, inclui as seguintes propostas: abrange e esclarece as obrigações decorrentes da imperiosidade do reconhecimento do direito de antena nos canais públicos, incluindo a RTP Internacional, e nos privados; formula um regime de emissão similar em relação a cada canal quanto a tempos e espaço horário; define um sistema de compensações e estabelece as consequências do incumprimento.
Trata-se de uma proposta necessariamente aberta cujo resultado final deve repousar no consenso definido por este Parlamento. Ao Governo coube, e cabe, a iniciativa, a VV. Ex.ªs a decisão final.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Raúl Castro.
O Sr. Raúl Castro (Indep.): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, na sua intervenção não referiu as diferenças entre o tempo de antena que é concedido por este diploma e o que vigorava no regime anterior. Ora, estas diferenças não são para mais mas, sim, para menos. Aliás, basta comparar o que consta desta proposta de lei com o estabelecido na legislação anterior para se ver que, de um modo geral, quer no que respeita às eleições presidenciais quer às legislativas, há uma diminuição do tempo de antena, tanto na televisão como na rádio. Por exemplo: de segunda a sexta-feira, estabelecem-se 15 minutos quando, anteriormente, eram 30 minutos; o período televisivo passa a ser de 30 minutos quando era de 45 minutos e no que respeita às emissões de rádio, um período de 30 minutos e não, como anteriormente, de 60 minutos, etc.
Claro que se pode dizer que todos os concorrentes são prejudicados com isto e, em princípio, essa é uma verdade aparente, mas é só aparente, porque o Governo tem um tempo de antena garantido oficialmente pelo próprio que corresponde ao PSD. Naturalmente, todas as aparições do Governo na televisão e na rádio, para além do tempo de antena, são propaganda do PSD e, portanto, o Governo e o PSD são partes interessadas na diminuição do tempo de antena, porque isso, no fundo, só os favorece. O Governo, como Governo emanado do PSD, já tem na mão a garantia de poder aparecer na televisão e na rádio.
Esta é a questão que deixo a V. Ex.ª, ou seja, não se compreende ou compreende-se mal que o Governo aproveite a oportunidade de regulamentar o preceito constitucional do artigo 40.º para diminuir, de uma forma geral, os tempos de antena nas duas eleições, presidenciais e legislativas, pois isso traduz-se num claro prejuízo de todas as forças políticas, excepto do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Igualmente para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.
O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna, para nós, é claro que o direito de antena que até hoje se impunha em períodos eleitorais, por via da lei, apenas às estações públicas tinha de sofrer uma adaptação legislativa, no sentido de dar cumprimento à norma constitucional tal como ficou redigida na revisão de 1989.
De facto, as estações de televisão e de radiodifusão de âmbito nacional, em época de eleições legislativas e presidenciais, estão, todas elas, constitucionalmente obrigadas a serem sujeitos passivos do cumprimento desse direito.
Simplesmente, o nosso acordo em relação a esta estatuição legislativa, que se impunha, não exclui algumas discordâncias de pormenor, a principal das quais nos parece prender-se justamente com o facto de essas obrigações não estarem, desde logo, incluídas nos contratos de concessão celebrados entre o Estado e algumas estações privadas que, entretanto, passaram a existir e têm de cumprir esse dever.
Com certeza, a dúvida em relação às expectativas entretanto geradas nos operadores privados de televisão vai repercutir-se em algumas posições públicas nessas estações e poderá inclusivamente repercutir-se no cumprimento desses deveres. Ora, isso leva-nos justamente ao artigo 123.º, relativo à violação dos deveres das estações de rádio e televisão, onde, mais uma vez, não fica definida a entidade que aplica as sanções. Esta omissão da lei já teve as suas consequências, no que diz respeito à aplicação de sanções, devido ao não cumprimento de legislação atinente à publicação de sondagens em actos eleitorais recentes. Estamos todos recordados de que essa confusão, ao nível da aplicabilidade da lei, redundou na não aplicação prática de sanções e tememos que esse regime sancionatório se venha a tornar inoperativo por via desta omissão legislativa.
Se o Governo não tem uma ideia clara a este respeito, pela nossa parte, em sede de debate na especialidade, apresentaremos propostas que, do nosso ponto de vista, vão no sentido de clarificar a lei, mas, de qualquer forma, gostaria que o Sr. Secretário de Estado esclarecesse a posição do Governo a respeito desta questão específica.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Raúl Castro, julgo que a questão que colocou foi, de facto, singular nesta Assembleia, pois não me parece que tenha tido o apoio de mais nenhum grupo parlamentar ou Deputado e, além disso, o Sr. Deputado descobriu uma coisa que é manifestamente difícil de descobrir, ou mesmo impossível, para ser mais claro.
No entanto, se o Sr. Deputado fizesse uma simples conta, isto é, se multiplicasse 5 minutos por quatro, que representam as duas estações privadas de televisão e os dois canais públicos - e, mais ainda, se multiplicasse por cinco, mas multiplicando por quatro já basta -, veria que, por exemplo, no período normal diário, há 60 minutos de campanha eleitoral, em vez de 30, como sucedia até agora, o que representa o dobro do tempo de campanha eleitoral.
Não tem, portanto, nenhum sentido a dúvida que colocou e, muito menos, a suspeição que levantou em relação ao Governo. E isto, sem contar com a RTP Internacional.
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Portanto, neste momento, decorre uma obrigação para os dois canais públicos - canal 1 e canal 2 - e para os dois canais privados, enquanto que, anteriormente, havia apenas um canal público a emitir tempos de antena.
O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Isso era se uma pessoa visse todos os canais ao mesmo tempo!
O Orador: - Sr. Deputado Manuel Queiró, em relação à sua primeira pergunta parece-me que não tem sazão, fundamentalmente pelo seguinte: esta é uma obrigação geral decorrente da Constituição por aplicação directa e, por isso, tem um regime especial e, por isso também, há um regime especial de compensação que aqui se define, o qual não tem a ver com as obrigações da concessão das privadas mas com a obrigação que impende directamente da Constituição e que tem de ser compensada nos termos que a própria lei ordinária vier a culminar, que são estes e não outros.
No que diz respeito à segunda questão, não tenho dificuldade em conceber que pode ter alguma razão, mas disse, desde o princípio, que esta era uma proposta aberta e que, do trabalho do Parlamento, resultaria, com toda a certeza, a melhoria da proposta de lei. Aqui está um momento e aqui está um assunto em que a proposta pode perfeitamente ser corrigida e melhorada Ou seja,, nesta altura, com franqueza, é-me difícil concluir se deverá ser a Comissão Nacional de Eleições ou a Alta Autoridade para a Comunicação Social a aplicar as coimas em. relação a esta matéria. Trata-se de uma dúvida que lanço, e esta Assembleia, na comissão especializada, encarregar-se-á de a analisar, bem como de propor, certamente, a solução adequada para aquilo que me parece ser, de facto, uma lacuna da lei - e, nisso, o Sr. Deputado tem razão,
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Na exposição de motivos que acompanha esta proposta de lei, q Governo refere que «O direito de antena eleitoral, constitucionalmente estabelecido, obriga todas as estações de rádio e de televisão de âmbito nacional e regional, públicas ou privadas, a transmitir o tempo de antena durante o. período de campanha eleitoral, sem prejuízo do direito de compensação que lhes assiste pelos respectivos custos de utilização».
Neste ponto estamos perfeitamente de acordo. É inquestionável que a emissão de tempos de antena, em período eleitora], é um imperativo constitucional aplicável a todas as estações emissoras de rádio e televisão de âmbito nacional e regional. É também inquestionável a justeza deste imperativo constitucional, tendo em consideraçâo a importância dos tempos de antena no esclarecimento directo dos eleitores sobre as propostas eleitorais em presença e na garantia de algumas condições de igualdade das várias candidaturas no acesso aos grandes meios de comunicação social.
É, portanto, necessário estabelecer, por lei, as condições concretas em que se irá dar cumprimento ao n.º 3 do artigo 40.º da Constituição, assegurando a extensão da emissão de tempos de antena aos órgãos de comunicação social que, estando por ele abrangidos, ainda não o cumprem por falta de previsão legal.
Até ao momento, os tempos de antena eleitorais têm sido emitidos, como se sabe, pelo canal 1 da RTP e pelas estações de radiodifusão de âmbito nacional, públicas e privadas. Trata-se agora de estender esse dever às estações de rádio de âmbito regional que passaram a existir,...
O Sr. José Magalhães (PS): - Quais?!
O Orador: - ... às estações privadas de televisão, à RTP Internacional entretanto criada e, por justas razões, ao canal 2 da RTP.
Assente o princípio, trata-se, então, de o concretizar. E aqui começam as nossas divergências e as nossas sérias inquietações em relação à proposta de lei apresentada pelo Governo.
Discordamos frontalmente de diversas soluções propostas pelo Governo, as quais, apresentadas sob a aparência valorizadora dos tempos de antena que consistiria na sua extensão a novos órgãos de comunicação social, acabarão por se traduzir, a final, se forem aprovadas tal como estão propostas, em formas capciosas de desvalorização dos tempos de antena, com prejuízo para o esclarecimento dos eleitores e para as condições de igualdade das várias candidaturas no acesso à comunicação social.
Desde logo, discordamos da questão, já aqui referida, do tempo de emissão diário dedicado aos tempos de antena, o qual é reduzido: nas televisões, passa de 30 para 15 minutos, nos dias úteis, e de 45 para 30 minutos, nos fins-de-semana; nas estações privadas de rádio, passa de 90 para 60 minutos diários.
No que à televisão se refere, note-se que esta solução conduziria a uma perda muito considerável do tempo de emissão atribuído a cada candidatura em eleições anteriores. As alterações recentemente introduzidas nas leis eleitorais já reduziram, em uma semana, a duração da campanha eleitoral e a redução dos tempos diários de emissão praticamente a metade tornaria os tempos globais de emissão incomparavelmente mais reduzidos e fragmentados do que os que até à data têm sido assegurados.
É certo que os 15 minutos provavelmente disponíveis para cada candidatura passariam em vários canais, mas também é certo que o aparecimento de novos canais não implicou a multiplicação do número de espectadores, apenas a diversificação das respectivas escolhas.
Acontece ainda que esta desvalorização não ocorreria apenas por efeito da perda global de tempo disponível nem da fragmentação a que os tempos de antena seriam forçados, ocorreria também por força da possibilidade de inclusão dos tempos de antena entre as 19 e as 20 horas, isto é, fora do chamado «horário nobre», o que teria consequências óbvias nos seus níveis de audiência.
Presentemente, a RTP está legalmente vinculada à emissão dos tempos de antena entre as 20 e as 23 horas, imediatamente a seguir ao serviço informativo. Esta vinculação tem precisamente por objectivo assegurar que essa emissão ocorra num período de grande audiência. Ora, se os tempos de antena passarem a ser emitidos, por exemplo, entre as 19 e as 19 horas e 15 minutos, torna-se evidente a sua desvalorização, no contexto da programação, e óbvia a sua perda de audiência.
Discordamos, por isso, frontalmente, da forma como o Governo propõe a concretização da extensão dos tempos de antena às novas estações de rádio e de televisão, particularmente às de televisão. O Governo não se propõe alargar as condições para o esclarecimento dos eleitores e para a divulgação das propostas defendidas pelas diversas candidaturas, como poderia parecer e como seria razoável e desejável, mas fazer precisamente o con-
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trário, isto é, reduzir e desvalorizar os tempos de antena, o que significa acentuar ainda mais a grave desigualdade de oportunidades já existente no acesso à comunicação social entre as diversas candidaturas a actos eleitorais de âmbito nacional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma outra nota que quero deixar refere-se ao regime sancionatório que o Governo propõe para a hipótese de incumprimento da lei, ou seja, o Governo propõe que esse incumprimento constitua contra-ordenação punível com coima. Fica a questão de saber se as coimas propostas não se poderiam traduzir em real benefício de um eventual infractor, dada a sua relativa exiguidade, mas, mais grave do que isso, também o facto de se estabelecer, mais uma vez - e digo mais uma vez, porque a actual maioria impôs aberração semelhante na lei das sondagens -, um regime sancionatório sem se estabelecer quem o aplica.
O Governo propõe a existência de coimas. Pergunta-se: a aplicar por quem? Pela Comissão Nacional de Eleições? Pela Alta Autoridade para a Comunicação Social? Pelo Gabinete de Apoio à Imprensa? É que se o legislador não o disser, repetir-se-á o regime lamentável que ainda está em vigor relativamente às sondagens e que é extraordinariamente simples: ninguém as aplica!
Não é aceitável que situações destas subsistam e ainda menos que se criem novas situações idênticas, as quais só desprestigiam um Estado de direito.
Sintetizando, a nossa posição sobre esta matéria é muito clara: o alargamento da emissão de tempos de antena eleitorais a rádios de âmbito regional e a televisões privadas decorre da Constituição e concordamos plenamente com a concretização legal desse princípio, porém, temos as maiores inquietações quanto às soluções concretas propostas pelo Governo para consagrar esse princípio. No entanto, dada a posição aqui expressa pelo Governo, no sentido de que esta e uma proposta de lei aberta e de que estão disponíveis para discutir melhores soluções, em sede de comissão, mantemos as nossas expectativas e remetemo-las para aí, a fim de que, de facto, possa haver um melhoramento muito substancial dos termos desta proposta de lei.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.
O Sr. Miguel Macedo (PSD). - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A apresentação desta iniciativa legislativa visa adequar o regime estabelecido para o tempo de antena em período eleitoral à disposição constitucional contida no n.º 3 do artigo 40.º, que prevê que «Nos períodos eleitorais os concorrentes têm direito a tempos de antena, regulares e equitativos, nas estações emissoras de rádio e de televisão de âmbito nacional e regional, nos termos da lei».
Esta disposição constitucional pretende, assim, estabelecer um regime legal de aplicação específica para os períodos de campanha eleitoral, onde, como é evidente, sobrelevam valores de equidade que assegurem a todos os concorrentes uma divulgação capaz das suas propostas e mensagens políticas.
Não está em causa, por isso, o regime geral de acesso ao tempo de antena, previsto no n.º 1 do já citado artigo 40.º da Constituição da República Portuguesa e reconhecido aos partidos políticos e organizações sindicais, profissionais e representativas das actividades económicas, cuja emissão se mantém como encargo a suportar exclusivamente no serviço público de rádio e televisão.
Assim, as matérias objecto desta proposta de lei visam não somente dar cumprimento àquelas disposições constitucionais mas também, compreensivelmente, adequar melhor à realidade actual um conjunto de regras já inscritas nas leis que regem as eleições para a Presidência da República e para a Assembleia da República.
Sr. Presidente, Srs Deputados: A Comissão Nacional de Eleições enviou a esta Assembleia, há cerca de um ano, um parecer sobre o direito de antena, onde arrolava um conjunto de questões nas quais avultavam as seguintes em primeiro lugar, os critérios a estabelecer, em matéria de tempo de emissão e horário, no acesso dos partidos políticos às estações privadas de televisão para efeitos de propaganda eleitoral; depois, em segundo lugar, a definição dos critérios de compensação, com os consequentes reflexos nas despesas eleitorais, relativamente às quais a Comissão Nacional de Eleições manifestava alguma preocupação; finalmente, a eficácia executória das deliberações da Comissão Nacional de Eleições sobre esta matéria.
Em resumo, aquilo que a proposta de lei do Governo aqui vem sugerir- e sublinho a disponibilidade do Sr. Secretário de Estado e da bancada da maioria para a discussão da matéria em sede de comissão - é que nós, conjuntamente e em sede de especialidade, possamos articular um conjunto de regras que enquadrem de uma forma actual, de uma forma que reflicta uma realidade diferente da que era subjacente à feitura da lei em vigor, aqueles que devem ser os direitos dos partidos políticos em período de campanha eleitoral.
Portanto, julgo que são apressadas as afirmações de alguns, designadamente do Partido Comunista, quando tentam tirar a conclusão de que se pretende aqui reduzir o tempo de antena dos partidos políticos em campanha eleitoral. É bom não esquecer que, hoje, a realidade, ao nível dos órgãos de comunicação social, é muitíssimo diferente daquela que existia anteriormente, ou seja, o conjunto de meios de comunicação social que está ao dispor dos partidos políticos, para efeitos de propaganda eleitoral, nestes períodos, é substancialmente maior do que aquele que existia anteriormente.
Naturalmente, por isso. e porque se está a tratar de entidades que são entidades privadas, o Estado vai ter de compensar de forma adequada as estações privadas, quer de televisão, quer de rádio, que vão emitir os tempos de antena nos termos da Constituição e da lei que agora se pretende alterar, e vai fazê-lo através de uma comissão arbitrai - julgo que, em relação a esta matéria, em princípio, estamos todos de acordo.
No que diz respeito à questão da natureza das infracções praticadas contra a lei que agora estamos a discutir, concordamos que a sua natureza seja a de contra-ordenações e que sejam puníveis com coimas. E verificamos, tal qual já foi, aliás, aqui afirmado, que, de facto, é importante precisar na lei, de uma forma muito clara, qual a entidade que vai ter a competência para a definição não só do montante da coima como também da responsabilização das entidades. Julgo que se trata de uma matéria que, em sede de especialidade, podemos, naturalmente, acertar melhor e precisar como é desejável.
Assumimos, portanto, esta proposta como uma proposta que tem em conta esta nova realidade, ou seja, existe um conjunto de circunstâncias que nos embala para a feitura de uma lei adequada. E, em relação a esta matéria, quero dizer que o Partido Social Democrata tem toda a abertura
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para definir, em conjunto com os outros grupos parlamentares e dentro dos princípios que já definimos bastantes vezes sobre a questão, aquela que vai ser a nova era de acesso à comunicação social, designadamente às televisões e às rádios de âmbito nacional, designadamente as privadas, por parte dos partidos políticos em período de campanha eleitoral - uma faculdade que, aliás, só foi possível porque o PSD, em matéria de comunicação social, teve sempre princípios muito claros, no sentido de que os órgãos de comunicação social não podiam, nem deviam, ficar confinados à responsabilidade do Estado.
É isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o que queremos dizer, de momento, sobre esta matéria, estando naturalmente ao vosso dispor para, depois, em sede de especialidade, serem melhor articuladas aquelas que forem as propostas apresentadas sobre esta matéria.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não por acaso é tão frequente nos debates que agora estamos a protagonizar a alusão à mudança do quadro dos audiovisuais. Ela é um facto tão frequente e com consequências tão relevantes que estranho é, Sr, Presidente, que esta exposição de motivos da proposta do Governo que hoje discutimos seja das mais esquálidas na motivação e, segundo me informou o Sr. Deputado Alberto Martins, não particularmente engordada pela exposição introdutória feita em nome do Governo neste debate.
É estranho, e bizarro e é perigoso, porque o que se exigiria hoje, ao repensar o regime jurídico dos tampos de antena nestas duas eleições, embora também nas do Parlamento Europeu ao que se supõe por remissão - se bem entendo, é essa a intenção do Governo -, era uma reflexão alargada sobre como deve ser o alargamento do espaço de expressão dos partidos políticos e dos candidatos, num contexto eleitoral em que a Constituição impõe e exige bons níveis de esclarecimento cívico. Como e que isso se consegue, num quadro em que, ao contrário do de 1976, há pluralismo televisivo, hiperpluralismo radiofónico e já não há direito de espaço nos jornais, como existia de jure, que não de facto, no tempo da entrada em vigor do texto constítucional?
Essa reflexão não foi feita pelo Governo, não é aqui trazida, e, no entanto, é a questão essencial a considerar. Pela nossa parte, Sr. Presidente, dizemos «sim» claramente a um aspecto da proposta - e apenas a um aspecto: o do alargamento dos tempos de antena à RTP Internacional, uma vez que essa nova dimensão de expressão deve, pode e tem de ser usada para fazer chegar aos residentes no estrangeiro mais informação e, logo, mais participação e uma capacidade mais genuína de intervenção no sufrágio.
Quanto ao mais, Sr. Presidente, Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, temos reparos a fazer. Reparos, desde logo, ao facto de o Governo não ter tido o cuidado, a cautela, a cortesia e a prudência de entabular sobre esta matéria, com os interlocutores - estações de rádio e de televisão-, o diálogo necessário paca poder dizer aqui o que não disse, ou seja, quais são exactamente as consequências do regime jurídico que propõe e que panorama de esclarecimento cívico teríamos se esta proposta fosse executada nos precisos termos em que aqui nos chegou, ou seja, mal fundamentada, hirsuta C. misteriosa em relação a alguns aspectos.
Essa pergunta é, infelizmente, uma boa pergunta, para a qual o Governo não trouxe nenhuma resposta Qual é o sentido fundamental da Constituição neste domínio? Conseguir bons níveis de esclarecimento cívico? A Constituição não define o conceito de tempo de antena, não define um princípio de igualdade e monofonia nos espaços públicos e privados, não define nada sobre o regime jurídico quanto ao tempo e ao horário. Nos lermos do n.º 3 do artigo 40.º, é incumbência do legislador definir essas variáveis, essas condicionantes, e, obviamente, Srs. Deputados, o exercício legislativo terá uma consequência ou outra consoante o legislador saiba ou não o que está fazer.
Não sei se o Sr. Secretário de Estado Amândio de Oliveira, que sabe mais destas coisas - é suposto saber -, sabe quanto custa um minuto de publicidade, à hora que se situa entre as horas nobres. No entanto, nesse ponto, a Constituição é inequívoca e clara. Mas as contas a fazer não são inequívocas, nem claras. Qual é o critério de cálculo nessa matéria? É o critério de tempo corrido ou é o tempo de break para efeitos de publicidade? Como se fixa a obrigação? Quem define o horário? Como se compaginam os vários horários? E, sobretudo: qual é o conteúdo e quais são as regras aplicáveis para o «modelo TA» no espaço público e no espaço privado? O Governo não o disse. O Governo, aparentemente, não o diz e está disponível para «pescar à bolina» nesta matéria. Como bem lembra o parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, infelizmente não estão aferidas as consequências práticas das soluções propostas pelo Governo e este não ouviu aqueles que devia ter ouvido.
A nossa posição é esta e é simples: a proposta peca por excesso em diversos domínios, e eu bem gostaria que o Governo pudesse explicar por que e que considera fundamental ter tempos de antena no canal 2. Porque é uma novidade!
O Sr. Miguel Macedo (PSD) - E boa!
O Orador: - Em segundo lugar, por que entende o Governo que deve ter tempos de antena na Antena 3 e na RDP 2? Qual é a lógica de programação a que obedece o Governo nesta matéria?
Em terceiro lugar, gostaria de saber se o Governo pretende fazer ou transpor para um novo nível de «guerra de audiências» a situação que actualmente existe entre os emissores privados de rádio e de televisão.
Por último, gostava de saber, do Sr. Secretário de Estado responsável por este pelouro e não da parte do Sr. Secretário de Estado da Administração Interna - que tem basicamente uma posição de segurança «internista» e «STAPE-ista» -, como tenciona aplicar esta norma às rádios regionais e a quais. O que é que tem em vista? A Rádio Comercial? A TSF? A Rádio Press, integrada na TSF? É importante que os senhores falem com clareza para que o legislador possa definir, de frente e não enviezadamente, as soluções que considera adequadas, possa medir o preço dessas soluções e a eficácia do panorama audiovisual que resultará da aplicação das soluções que propõe.
A nossa proposta, Sr. Presidente, resume-se a uma palavra: concertação - que foi o que o Governo não fez -, recusa da desproporção, recusa das imposições infundamentadas, recusa das posições que possam abrir uma guerra de audiências perversa e perigosa e assim distorcer o normal funcionamento do acto eleitoral. E, última lembrança: não nos concentremos exclusivamente nos tempos de
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antena; preocupemo-nos também com aquilo que a CNE nos lembra ser o problema basilar em período eleitoral, qual seja o tratamento igualitário e justo das candidaturas em todos os espaços informativos e noticiosos, questão chave sobre a qual o Governo não apresenta proposta nenhuma, questão chave sobre a qual há omissões legislativas, para as quais a CNE chamou a atenção através de um ofício dirigido à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, que seguramente é do conhecimento do Governo, e em relação às quais paira omissão, dúvida, incerteza e - confessemos - impotência.
Por último, Sr. Presidente, era muito bom que o regime que sair aprovado por lei, e eventualmente promulgado pelo Sr. Presidente da República, não dê origem a um movimento, que seria infinitamente perigoso, mas quiçá em certos casos compreensível, de desobediência civil. Eu tive ocasião de ouvir da boca do Sr. Engenheiro Roberto Carneiro, há uns dias, quando o Governo aprovou esta proposta na generalidade no Conselho de Ministros, algumas declarações que me suscitaram inquietação, porque elas, por um lado, traduziam um protesto em relação à conduta do Governo - protesto que compreendemos -, mas, por outro lado, traduziam uma disposição para, no caso de esse protesto não ser ouvido, adoptar formas de resistência, que, no quadro constitucional, sendo porventura eventualmente lícitas, poderiam criar uma significativa instabilidade, na qual não vemos francamente vantagem.
E é por isso, Sr. Presidente, Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, que vemos mais vantagem num acto legislativo concertado do que na abertura de um novo episódio na «guerra de audiências» e na luta do Governo, por um lado, de proselitismo de pseudo-serviço público e de favorecimento objectivo da RTP, por outro lado, de incentivo à concorrência desleal em relação a outros canais e, ainda por outro lado, de «assassinato» de algum canal mais débil, quiçá o da Igreja Católica, no meio deste processo.
Sei que algumas destas coisas surgem como surpreendentes para o Sr. Secretário de Estado Carlos Encarnação, mas, para mim, a surpresa não é surpreendente para quem escreveu um preâmbulo de 6 letras ou de 6 linhas. Esperemos, no entanto, que o Governo tenha ainda tempo de discutir, de ponderar e de fazer levedar soluções. E esse o rumo para que aponta o relatório da 1.ª Comissão, é nosso empenhamento que esse rumo se concretize, com diálogo, com participação e com soluções de bom senso, bem medidas no quadro constitucional, mas com razoabilidade face a um panorama audiovisual em profunda mudança.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.
O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, uma breve intervenção para resumir a nossa posição sobre esta proposta.
Em primeiro lugar, quero reafirmar que o nosso entendimento em relação ao essencial coincide, julgo, com o da totalidade das bancadas: trata-se de dar cumprimento ao n.º 3 do artigo 40.º da Constituição, a um princípio constítucional de aplicação directa, exigindo-se a sua tradução em lei.
No entanto, quero reafirmar também a nossa posição quanto ao que dissemos anteriormente ao Sr. Secretário de Estado: a sua tradução em lei já poderia e deveria ter sido feita, numa perspectiva de funcionamento mais saudável deste sistema, aquando da celebração dos contratos de concessão, nomeadamente com as televisões privadas. Não só teria sido mais saudável, como teria porventura barrado caminho a alguma argumentação que poderá vir a ser utilizada em breve, para o tal clima de desobediência civil a que se referia o Sr. Deputado José Magalhães. Não me espantaria que esse clima se instalasse, pois, em primeiro lugar, neste caso, a desobediência não é crime - a coima é baixa e não se sabe quem a aplica - e todo este dispositivo é quase um convite a que se utilize a tal argumentação motivada pela ausência da clarificação aquando da celebração dos contratos de concessão.
É por isso que vemos com satisfação a disponibilidade manifestada pelo Governo quanto ao facto de esta ser uma iniciativa aberta e susceptível de ser aperfeiçoada em trabalhos de Comissão. Vemos também com satisfação que o facto de termos levantado o problema da não indicação da entidade que aplicará as sanções toca o Governo e a bancada da maioria. A esse respeito vamos com certeza encontrar uma solução e, do nosso ponto de vista, a entidade mais apropriada para aplicar as sanções é mesmo a Comissão Nacional de Eleições. Em alternativa, teremos a Alta Autoridade para a Comunicação Social, que, cumpre dizê-lo, nos últimos tempos, tem vindo a revestir-se de alguma aura de desprestígio, o que não acontece com a CNE, que é um órgão cuja independência até hoje continua a ser reconhecida por todos - a ela caberá, estou convencido de que com proveito para todos, a competência de aplicar as sanções.
Quanto ao canal 2, gostaria de dizer que é estranho que nas últimas eleições, em 1991, não tivesse sido criado o respectivo quadro legal. Poder-se-á dizer que é a mesma estação do canal 1 - o imperativo constitucional fala em estações -, mas a verdade é que, a partir desta proposta, o canal 2 fica também obrigado à apresentação de tempos de antena, o que criará uma contradição com o que anteriormente existia.
A respeito ainda de uma questão que foi aqui levantada, quanto à protecção deste direito, no que diz respeito à manutenção dos tempos de antena, estou de acordo com a argumentação que já foi utilizada e sustenta que, de facto, este direito resulta menos protegido, deste ponto de vista, porque há uma redução do tempo de antena.
Na verdade, não é pelo lacto de haver maior número de estações emissoras que o número de espectadores aumenta; a audição dos tempos de antena foi antes «cortada em várias fatias» quanto ao número de espectadores. Portanto, os tempos de antena vão chegar por várias vias mas ao mesmo número de espectadores e, no somatório total dessas «fatias», de facto, o tempo é menor. Se esta lei se destina, antes de mais nada, a proteger este direito constitucionalmente consagrado, neste particular ela resulta numa desprotecção desse direito.
Finalmente, julgo que a argumentação do PS a respeito dos prejuízos comerciais em tempo de publicidade, no horário nobre que será ocupado pelos tempos de antena, na tal discussão aberta em Comissão, irá levar o PS a propor um aumento das coimas...
O Sr José Magalhães (PS): - Certamente que não! Faça você a proposta!..
O Orador: - ... para tornar mais efectiva a solução que todos, conjuntamente, vamos procurar para obstar a esse eventual clima de desobediência civil que todos queremos que não aconteça. Aliás, estamos certos de que o PS
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também quererá que tal não aconteça. Portanto, essa argumentação vai, com certeza, conduzir o PS a propor o aumento, na prática, das coimas e das sanções para obstar a esse clima.
O Sr. José Magalhães (PS): - Palavras suas, não minhas!
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.
O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, queria começar por dizer que lamento que tenha sido o Governo a vir aqui com esta proposta de lei porque, exactamente há um ano, como tem sido dito, foi enviado a esta Assembleia um parecer da Comissão Nacional de Eleições que manteve a CNE dependurada sem saber como devia de agir perante as eleições para o Parlamento Europeu, que se aproximavam, o que fez com que essas eleições, que podiam já ter sido feitas de acordo com o novo regime, não o fossem, apesar de eu próprio, até admirado por mais ninguém, aqui, nesta Câmara, o fazer, ter apresentado um projecto de lei que pretendia o conhecimento do direito dos partidos a tempo de antena nas estações privadas, depois da revisão constitucional, obrigando-as a conceder também tempos de antena aos partidos.
É pena que só um ano depois isto venha a acontecer e não sei até que ponto (isto, agora, é especulação subjectiva, minha) a pouca participação no acto eleitoral para o Parlamento Europeu não pode ter um pouco a ver com essa falta, nos canais privados, durante a campanha eleitoral, de tempo de antena para os partidos.
Há ainda a questão dos tempos, que já aqui foram abordada. A hora a que é atribuído esse tempo de antena pelas estações e os respectivos tempos é uma questão que está colocada e que merece alterações, porque tem de ser no horário nobre, tem de ser no horário de maior audiência...
O Sr. José Magalhães (PS): - É ao contrário!
O Orador: - É ao contrário, claro que é, e tem de ser de forma a que não reduza, de facto, o tempo efectivo de campanha eleitoral, com vista a um maior esclarecimento!
O método proposto pelo Governo funciona ao contrário: juntam-se as estações todas mas cada cidadão só vê uma estação em determinado momento.
Finalmente, creio que há uma questão a que os grandes partidos fogem - e o Governo também, por maioria de razão - mas que eu gostaria de colocar aqui e, possivelmente, quando for altura disso, apresentarei uma proposta nesse sentido. Trata-se da igualdade de oportunidades das diversas correntes de opinião, dos diversos partidos, normalmente concorrentes às eleições, não apenas durante o tempo de antena mas também a partir do momento em que são convocadas as eleições.
Penso que isso é importante porque há uma permanente reprodução das ideias dominantes, das ideias feitas, e quem não tem essas ideias dominantes e feitas, está sempre marginalizado. Está «feito», e bem! Está sempre de lado e dificilmente consegue levantar a cabeça e mostrar aquilo que pensa.
Existe uma reprodução, por vezes permanente, de ideias feitas. Assim, tem de ser considerado que, para haver igualdade de oportunidades, ela não pode existir apenas durante os tempos de antena regulamentares; a igualdade de oportunidades tem de ser regulamentada a partir do momento em que são convocadas as eleições.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, vou fazer esta última intervenção fundamentalmente porque foram feitas aqui algumas alusões e afirmações pelos Srs. Deputados, foram colocadas algumas interrogações e algumas fórmulas interrogativas, como normalmente acontece, dentro do âmbito da suspeição, do que é bizarro, do que é estranho, do que é perigoso, como são as declarações que, normalmente, o Sr. Deputado José Magalhães faz em relação a qualquer iniciativa do Governo ou a qualquer iniciativa que não seja do seu partido.
Assim, gostaria de esclarecer aqui três ou quatro coisas que penso que são importantes, sendo que a primeira é que a oposição não tem de, obrigatoriamente, classificar todas as iniciativas do Governo ou de outra força política como estranhas, perigosas e bizarras - algumas poderão sê-lo, mas outras não.
V. Ex.ª, Sr. Deputado José Magalhães, cai no erro, do meu ponto de vista sistemático, de colocar sempre no mesmo plano todas as intervenções e todas as iniciativas que não são suas. É um tique! Podia ser de outra maneira, infelizmente não é!
O que eu gostaria de lembrar aos Srs. Deputados, concretamente ao Sr. Deputado José Magalhães, é o seguinte: estamos, de facto, perante um quadro novo, em que há televisões privadas e televisão pública. Um quadro novo, como disse o Sr. Deputado Miguel Macedo, e muito bem, que só é possível graças a uma luta importante que o PSD, historicamente, travou para que houvesse televisão privada ao lado da televisão pública, isto é, para que se multiplicassem as capacidades de informação televisiva ao dispor do povo português. Isso é importantíssimo que VV. Ex.ªs notem. Julgava que VV. Ex.ªs iam sublinhar isso mas, naturalmente, fazem por esquecê-lo, quando convém!
Gostaria também de dizer que, se a Assembleia, entretanto, não legislou sobre esta matéria, podendo tê-lo feito - como é o caso que referiu o Sr. Deputado Mário Tomé, que se passou na altura das eleições para o Parlamento Europeu, em que houve uma iniciativa legislativa do Governo e em que esta matéria foi discutida, podendo ter sido alterada e não foi - a culpa não é nossa, é da Assembleia!
Não nego que o Sr. Deputado Mário Tomé tenha tido, porventura, uma iniciativa relevantíssima; simplesmente, se calhar, por causa da «lei-travão», a sua iniciativa não podia ser considerada neste domínio. Porém, houve uma iniciativa do Governo sobre esta matéria e isto podia ter sido discutido mas não foi, a Assembleia não quis tomar esta posição, e a Comissão Nacional de Eleições levantou, e muito bem, o problema.
Aqui, aproveito para prestar homenagem ao seu ex-presidente, o Sr. Conselheiro Melo Franco, que abandonou recentemente as funções de presidente da CNE. Esta foi, porventura, uma das suas derradeiras iniciativas, iniciativas cheias de significado, porque revelam o interesse pelo bem público que este homem sempre exibiu na presidência da CNE e que, mais uma vez, aqui, neste caso concreto, foi comprovado.
Sr. Deputado José Magalhães, o que é que nós queremos, afinal? Queremos, fundamentalmente, aquilo que V. Ex.ª diz que quer, isto é, queremos que se cumpram os ditames constitucionais em relação à igualdade de oportunidades e aos bons níveis de esclarecimento público.
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V. Ex.ª, quando faz apelo a que os quinze minutos de cada uma, vezes não sei quantos, não são o mesmo que os trinta minutos antigos, esquece-se de uma coisa que é importantíssima: é que julguei que, fundamentalmente por causa das suas habituais e interessantíssimas prestações televisivas e pela sua ligação à máquina da televisão, ...
O Sr. José Magalhães (PS): - A máquina da verdade!
O Orador: - ... já teria compreendido que o share das televisões significa que o tempo não é acumulável, que o tempo é partilhado por todos. Isto é, um momento determinado representa 100 %, mas estes serão divididos pelas várias oportunidades que os vários canais de televisão têm para contribuir para isto, o que significa que, de facto, há uma possibilidade maior de atingir o conjunto do universo dos espectadores possíveis, de acordo com os hábitos de televisão e com as preferências que cada uma das pessoas tenha por cada um dos canais. Porque é que há, neste sentido, a RTP 2 e porque é que há a Antena 3? Não precisarei, eu, de dizer ao Sr. Deputado José Magalhães por que é que é! Isto decorre da interpretação que ainda agora fiz e que lhe repeti e decorre daquilo que V. Ex.ª também sabe.
Aliás, em relação à radiodifusão, lembraria que a lei do referendo tem um preceito aplicável absolutamente idêntico àquele que nós colocamos aqui, não é nenhuma inovação. E V. Ex.ª aprovou a lei do referendo em relação à radiodifusão regional. V. Ex.ª não levantou essa questão, antes pelo contrário, concordou com ela e votou favoravelmente o artigo.
O Sr. José Magalhães (PS): - E o que é que aconteceu, desde então, às rádios regionais? Há alguma rádio regional?
O Orador: - Queria dizer apenas o seguinte, em conclusão, ao Sr. Deputado José Magalhães e em relação às suas dúvidas. Quando V. Ex.ª fez a sua intervenção, esperava que dissesse tudo menos aquilo que referiu, a dois níveis primeiro, V. Ex.ª disse que «o Governo peca por excesso». Pense bem naquilo que disse! Isto é, tendo dito V. Ex.ª que entendia que o Governo não estava a querer atingir os bons níveis de esclarecimento público, logo a seguir, vem dizer que o Governo peca por excesso, ou seja, parece que o Governo quis demais, parece que o Governo quer dar demais, quer conceder oportunidades demais! Isto levou-me quase a compreender que V. Ex.ª estava, não no ponto de vista do Estado, mas do ponto de vista do prestador do serviço e não é verdade! V. Ex.ª nunca se colocaria numa situação dessas!
De outra maneira, V. Ex.ª não diria nunca, como diz, que estamos a promover o assassinato de uma estação privada de televisão.
O Sr. José Magalhães (PS): - Ah, isso estão!
O Orador: - Veja lá a enormidade que V. Ex.ª acabou de dizer, justamente da estação privada de televisão que referiu - e, naturalmente, há duas posições, como é evidente - que este sistema era bom, por contraponto à de outra estação privada de televisão que já se pronunciou sobre isto e disse que o sistema era mau.
Contudo, como quero sempre sossegar o Sr. Deputado José Magalhães e como não quero nunca contribuir para a sua perturbação intelectual nem para o seu nervoso, que, às vezes, parece congénito e constante, queria dizer-lhe que a Assembleia, como não pode deixar de ser, vai ter a última palavra nesta matéria.
O Governo é tão mau, tão pernicioso, tão falho de intenção clara que, quando veio apresentar este diploma, disse, logo na abertura, o seguinte- eis uma proposta aberta. Eis pontos em que a proposta - respondendo, designadamente, ao Sr. Deputado Manuel Queiró - não é conclusiva, em que há, porventura, algumas lacunas, com toda a certeza! Pois, meus caros senhores. Sr. Deputado José Magalhães, use a sua inteligência brilhante, use a sua capacidade legiferante, que todos reconhecemos ser grande, enorme e muito profícua, e contribua nesta Assembleia para o melhoramento desta lei, para que ela, na verdade, consiga atingir os fins que todos nós queremos que ela atinja.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, significativa é a fala, significativo é o silêncio da pessoa cuja fala nós esperaríamos e que, provavelmente, nos poderia revelar muito sobre a manufactura desta proposta de lei, sobre o panorama audiovisual, sobre o contrato de serviço público prestado com a RTP e a sua efectivação, sobre os montantes pagos à RTP a título de tempo de antena, que, segundo informa a revista TV 7 dias, à venda na banca aqui mesmo ao lado (passe este pequeno spot de publicidade), pelo que não é segredo nenhum de Estado embora seja um segredo da RTP, recebeu, em 1994, 579000 contos para este efeito e, em 1995, 327 948 contos, não se sabe com que critério nem porquê, não se sabe com que enquadramento exacto, reinando aqui um arbítrio curiosíssimo na relação entre o Estado e aqueles que prestam um serviço público desta natureza. Será, assim, estranho que um legislador tenha cuidado em não multiplicar por essa incerteza, esse arbítrio ou essa falta de critério objectivo?
Em segundo lugar, Sr Presidente e Srs Deputados, o Sr. Secretário de Estado agarra mal esta questão porque começa por lançar sobre a Assembleia da República uma responsabilidade de legislar que ela não tem.
Sr. Secretário de Estado, sabe por que é que a Assembleia da República não teve a iniciativa de apresentar um projecto de lei a instituir obrigações deste tipo? Ninguém no seu partido lhe explicou a existência de um coisa chamada «lei-travão», a qual impediria a Assembleia da República de consignar normas sobre as implicações financeiras desta proposta?
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna: - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: - Faça favor, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna: - V. Ex.ª estava distraído, Sr. Deputado. Ainda há pouco acabei de referir isso, quando respondi ao Sr. Deputado Mário Tomé!
O Orador: - Desculpe, mas não referiu!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna: - Referi, sim, Sr. Deputado!
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O Orador: - Referiu a «lei-travão» como explicativa da intervenção?
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna: - Exactamente!
O Orador: - Faz muito bem! Mas, nesse caso, é contraditório consigo próprio.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna: - Essa agora!
O Orador: - V. Ex.ª começou por imputar à Assembleia da República uma responsabilidade de iniciativa legislativa que ela não tinha, não tem e não pode ter!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna: - O que eu disse- foi que, perante uma iniciativa legislativa do Governo, que tinha um âmbito vasto em relação às alterações eleitorais, para além do Parlamento Europeu, podia ter sido discutida e alterada na Assembleia essa proposta legislativa com origem no Governo. A Assembleia podia, tendo tomado conhecimento deste facto, tê-la alterado, porque era uma proposta da iniciativa do Governo que se apresentava.
Nesta altura, o que acontece é que há uma proposta de lei que coloca um problema, que a Assembleia irá decidir.
O Orador: - E o Sr. Secretário de Estado entende que se a Assembleia, em sede de alteração, introduzir normas que diminuam as receitas do Estado ou aumentem despesas, isso se coaduna com a «lei-travão»? É que o Tribunal Constitucional tem entendido o contrário, assim como a Câmara, depois de uma jurisprudência flutuante, e acatou, por último, a mais recente jurisprudência em Tribunal Constitucional sobre essa matéria.
Se é isso que V. Ex.ª entende, tomamos boa nota e passaremos, nas discussões em sede de especialidade, a apresentar caudalosas propostas, com implicações financeiras pesadas e adequadas em função das circunstâncias e de um determinado conceito de justiça.
O Sr. Deputado Alberto Martins lembra-me que tem de haver alguma gestão prudente desse carácter caudaloso, mas justas seriam as propostas, e muito bem.
Em todo o caso, Sr. Secretário de Estado, invocaríamos sempre a sua autoridade. Como diz o Sr. Secretário de Estado, Carlos Encarnação: não há «lei-travão». Não é assim, Sr. Secretário de Estado!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna: - Sr. Deputado, dá-me licença que o interrompa?
O Orador: - Faça favor, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna: - Sr. Deputado, abusando da sua permissão e da do Sr. Presidente, quero dizei-lhe que a Assembleia não levantou esta questão, embora o pudesse fazer perante o Governo. Portanto, no momento da apresentação da proposta, podia ter levantado a questão e não o fez!
Nada tenho a ver com a vontade enorme que VV. Ex.ªs têm de provocar despesa, de continuar a pedir mais despesa pública. Nada tenho a ver com isso! Essa é uma questão que V. Ex.ª - e ainda bem! - incorpora dentro do seu pensamento rigorosíssimo. Felizmente que tem ao seu lado o Sr. Deputado Alberto Martins para o travar; se não, seria uma desgraça!
O Orador: - Não, isso é quanto ao montante e não quanto à aspiração de justiça social. O Sr. Deputado Alberto Martins não é o «Deputado-travão»!
Risos.
Todavia, esta não é a questão central nesta matéria. É evidente que a imputação à Assembleia da República de responsabilidades que ela não tem é infundamentada e injusta da parte do Sr. Secretário de Estado.
De resto, devo dizer que o Governo, nesta matéria, exibiu uma considerável flutuação de critérios. Todos conhecemos, há muitos anos, o artigo 40 º, n.º 3, da Constituição e, todavia, o legislador sempre deu provas, ao longo destes anos, de um apreciável cuidado na sua exegese e, sobretudo, na sua aplicação. E foi assim que, nas eleições para o Parlamento Europeu, nem Governo nem oposição tiveram qualquer iniciativa legislativa tendente, nesta matéria, a definir o regime. Vamos, agora, defini-lo. Definamos o regime tendo em atenção o quadro constítucional e as suas implicações.
O quadro constitucional não implica, em primeiro lugar, um modelo único de tempo de antena; em segundo lugar, um horário único de tempo de antena; em terceiro lugar, não implica sequer um esquema idêntico para o espaço público e para o espaço privado. Aliás, tem consequências diferentes no espaço público e no privado.
Sr. Secretário de Estado, toda a gente sabe, é público e notório, que sou daqueles que não escondem o que escrevo, o que falo, nem os sítios onde falo ou como falo. Portanto, quando digo o que digo, aqui ou lá fora, digo uma e a mesma coisa. As suas observações, desse ponto de vista, são-me inteiramente indiferentes: tenho os rendimentos publicados num livro editado pelo PS, que estão à sua disposição. Quanto ao resto, não renuncio ao direito de opinião.
Gostaria de lhe dizer, nessa matéria, Sr. Secretário de Estado, Carlos Encarnação, que V. Ex.ª fazia melhor se fosse um aluno mais atento do panorama audiovisual. Perderia umas horas, queimaria um pouco a pestana coimbrã, mas teria ocasião de aprender alguma coisa e saberia, entre outras coisas, que nada trava o zapping quando a posição do legislador não é sensata. O que os espectadores fazem, face à overdose de qualquer produto, seja a lantejoula ou a cara do político, é «zapar»! «Zapam»! Portanto, o legislador deve ser cuidadoso na calibração e, sobretudo, não deve ser excessivo na escolha dos «veículos». É por isso que a questão da Antena 3 me parece de bom senso meridiano e gostava muito de saber o que é que pensa a RDP sobre essa matéria.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna: - E quanto à RTP 2, acha mal?
O Orador: - Quanto à RTP 2, a mesma coisa. Digo-lhe isto aqui em público e com todas as implicações. Vamos discutir e vamos ouvir!
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, queira concluir.
O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
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Em segundo lugar, Sr. Secretário de Estado, as consequências das soluções legislativas nesta matéria têm de ser ponderadas, tendo em conta que VV. Ex.ªs têm um contencioso arrastado, muito perigoso e instabilizador com os protagonistas principais do panorama audiovisual português. Portanto, é natural que esse contencioso, que é muito injusto e perigoso mas que foi criado por vós e não por nós, alastre e contagie o debate nesta matéria.
Ora, o que queremos dizer é que nós, Grupo Parlamentar do PS, não participamos nessa guerra, não estamos nessa guerra. Estamos na aplicação da Constituição; na conquista de espaços de livre expressão; na imaginação para encontrar para os partidos políticos novas formas de esclarecer os eleitores; estamos no diálogo e na concertação com os protagonistas, que não são os senhores mas as estações. Lamentamos que não o tenham feito, vamos nós fazê-lo, mas não participaremos na vossa cruzada de proselitismo «RTPézico», anti outras estações, nem o contrário! É essa equanimidade que vos falta...
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Admimistração Interna: - Essa agora!
O Orador: - ... e apelo, aliás, a que essa equanimidade passe a dominar os trabalhos da Comissão, em que o Governo não estará presente mas estará o PSD.
São estes os nossos votos e são estas as razões pelas quais nos movemos nesta causa. Estas e só estas!
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - O Sr. Deputado Miguel Macedo pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Acontece que o Sr. Deputado José Magalhães já não tem tempo para poder responder.
O Sr. minuto.
Macedo (PSD): - O PSD cede-lhe um
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem, então, a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Magalhães Macedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Magalhães: Depois desta intervenção, fiquei com a absoluta convicção de que o Sr. Deputado José Magalhães é um habitual consumidor da RDP. Por óbvias razões, não questiona o tempo de antena na RDP, na Antena 1, mas depois tem preocupações quanto ao tempo de antena na Antena 2 ou na Antena 3. E, das duas, uma: ou V. Ex.ª, em relação à Antena 2, está preocupado com a protecção da elite - porque, apesar de tudo, é uma elite! - que faz a audição regular e normal da Antena 2 e quer evitar-lhe o incómodo dos tempos de antena, ou não conhece, por outro lado, aquilo que é a programação normal da Antena 3, o que é lamentável para a dimensão mediática do Deputado José Magalhães, obviamente!
O Sr. José Magalhães (PS): - Não percebo qual é o seu ponto de vista.
O Orador: - O ponto de vista é uma nota. V. Ex.ª manifestou tanta preocupação em relação à questão da RDP que ainda não entendi qual é essa preocupação. Qual é a sua preocupação pelo tempo de antena que há na Antena 2 e na Antena 3 quando, ao mesmo tempo, faz um discurso, que é perfeitamente contraditório com esse tipo de preocupações, ao dizer que estão a amputar aos partidos políticos, designadamente aos da oposição, a capacidade de explicitarem, em período de campanha eleitoral, as suas propostas políticas.
O Sr. José Magalhães (PS): - Eu não disse isso!
O Orador: - Disse, disse! Disse na sua primeira intervenção. Manifestou-o bastas vezes.
Sr. Deputado José Magalhães, afinal, em que é que ficamos? V. Ex.ª quer tempo de antena em todas as estações, privadas e públicas, com as consequências que daí advêem em termos legais e também em termos de pagamento dessa prestação de serviço, ou não quer, afinal, esse tempo de antena em todas as estações de rádio e de televisão, como manda a Constituição?
Esta é que é, aqui, a questão verdadeiramente importante. Tudo o resto, se as coimas vão ser aplicadas - que é uma questão importante! - pela Comissão Nacional de Eleições ou pela Alta Autoridade para a Comunicação Social, se vai haver esta ou aquela regra a mais em relação a esta ou aquela questão em pormenor, são questões de somenos em relação a esta matéria.
Era isto que eu gostava de saber do Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Subsecretário de Estado Adjunto do Ministro Adjunto.
O Sr. Subsecretário de Estado Adjunto do Ministro Adjunto (Amândio Oliveira): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Magalhães, não pretendo pedir esclarecimentos mas, sim, dar uma informação.
O Sr. Deputado referiu algumas coisas embora saiba que não são assim e somente alguma distracção sua, apesar de ser um homem permanentemente atento a estes fenómenos da comunicação social, é que o levou a dizer o que disse.
Referiu que a RTP recebeu no ano passado 579 000 contos e tem previsto receber este ano 371 000 contos para pagar tempos de antena. Desde logo, disse que não sabe como é que estes números foram encontrados, mas, como homem atento que é destes fenómenos da comunicação social, tinha obrigação de saber.
Por outro lado, fez aqui uma confusão, mas vou explicar-lhe.
Tive o gosto de lhe oferecer uma cópia do contrato que liga o Estado à RTP, o contrato de serviço público. Foi há dois anos. Recorda-se?
O Sr. José Magalhães (PS): - Eu não tive o gosto de o ver cumprir!
O Orador: - Está claramente cumprido, conforme já lhe foi provado mais do que uma vez.
Há uma empresa de auditores externos e há a Inspecção-Geral de Finanças, sendo os valores atribuídos em função dos trabalhos que essas duas entidades fazem. Não é o Estado que fixa o valor, nem é a empresa, é o trabalho conjunto dessas duas entidades que o fixa e estes valores foram encontrados dessa forma.
Aquilo que o Sr. Deputado aqui fez foi esquecer outra realidade que conhece. É que, nos termos da Lei Eleito-
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ral, 30 dias antes do início da campanha eleitoral, cessam estas obrigações de transmissão de tempos de antena, os quais passam a ser regulados nos termos da Lei Eleitoral. Isto quer dizer que os valores que estão aqui em causa nada têm a ver com estes mas, sim, com aqueles que o Sr. Deputado, apesar de conhecer, achou por bem não referir.
Sr. Deputado, os valores foram encontrados não de fornia arbitrária mas de forma criteriosa .
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Subsecretário de Estado, dá-me licença que o interrompa?
O Orador: - Com certeza, Sr. Deputada. Se o Sr. Presidente o permitir, tenho muito gosto em ouvi-lo.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Apenas, quero dizer que o Sr. Subsecretário de Estado não pode oferecer aquilo que não tem...
O Orador: - Peço desculpa, Sr. Presidente. Se, efectivamente, houver alguém que tenha a boa vontade de nos oferecer alguns minutos...
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Num minuto, cedido pelo PSD, tem, então, a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Sr. Subsecretário de Estado, gostaria que, aprofundando ainda o processo de esclarecimento, dissesse quais os critérios que entende deverem presidir à fixação destes montantes compensatórios pelas despesas eleitorais, porque os remeteu para uma comissão arbitrai, uma vez que esta proposta é omissa quanto a qualquer critério (Substantivo para se chegar a um determinado resultado. Foi isso que suscitei também numa das «n» interrogações que aqui deixei expressas
O Orador: - Telegraficamente, devo dizer-lhe que está previsto que nela participem a Inspecção-Geral de Finanças, que tem já, como acabei de lhe dizer, uma larga prática na fixação de pagamentos de serviço público,...
O Sr. José Magalhães (PS): - Isso é composição e não critério!
O Orador: - .. depois, os próprios operadores e a Comissão Nacional de Eleições.
Penso que, nesta fase, mais do que isto não podia ser feito.
O Sr. José Magalhães (PS): - E qual é o critério material?
O Orador: - O critério é aquele que essa comissão determinar.
O Sr José Magalhães (PS): - Um qualquer?
O Orador: - Não, não e um qualquer. É aquele que o bom senso das partes, naturalmente, vier a considerar como conveniente, para além do conhecimento que uma das entidades, que é a Inspecção-Geral de Finanças, já tem sobre a matéria
Não querendo abusar do tempo que me concederam, devo apenas dizer-lhe que, voluntariamente, o Sr. Deputado tentou não dizer aqui tudo aquilo que sabe sobre esta matéria.
Quero que fique claro, de uma vez por todas, que a fixação não foi arbitrária, foi feita por processos rigorosos, e que estes valores nada têm a ver com o período de campanha eleitoral
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, num minuto oferecido pelo PSD, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr José Magalhães (PS): - Sr Presidente, um minuto de pura e completa frustração para o Sr. Deputado Miguel Macedo, que foi extraordinariamente generoso mas fez a chamada pergunta impossível.
A pergunta do Sr Deputado será uma pergunta generosa mas a resposta é puramente impossível. E, repare, o Governo acabou de nos dizer, brilhantemente, que, quanto à comissão arbitrai, não há nenhum critério material para ela operar. Ela deve funcionar na base do bom-senso, da ternura, quiçá de algum critério diáfano e chegar a um resultado. Mas não nos diz, sequer, se delibera por maioria ou por unanimidade, coisa que, na bancada, nos deixa consideravelmente perplexos Admitamos que delibera. Como, Sr. Secretário de Estado9
O Sr. Subsecretário de Estado Adjunto do Ministro Adjunto: - Sr. Deputado, uma comissão delibera, em períodos normais, que é aquele em que vivemos, por maioria. Os períodos em que as comissões deliberavam por minoria, felizmente, passaram.
Vozes do PSD:- Muito bem!
O Orador: - Muito obrigado, Sr Secretário de Estado.
Logo, a questão é a composição da comissão. Se a composição da comissão fosse uma. o Sr Secretário de Estado colocaria a fixação dos montantes indemnizatórios definida por uma maioria, eventualmente liderada pelas rádios cristãs, o que seria uma coisa tocante e muito interessante e teria um resultado quiçá bastante relevante no plano europeu e mesmo para estabelecer um precedente, mas demitia-se da definição de um critério
Por outro lado, como técnica legislativa, é uma coisa altamente bizarra, porque quer dizer que a Assembleia da República se demite, como de resto se demitiu por vossa orientação no caso da RTP, de fixar um critério pelo qual responda uma definição de serviço público, um tratamento equânime para todos os operadores, acabando com o clima actual de incerteza, que V Ex.ª pessoalmente fomenta e de que e um dos principais responsáveis - V. Ex.ª e aqueles a que está ligado e em cujo projecto se insere E é isso que é mau e é por isso que nós, aqui, não participamos nessa guerra de guerrilha de VV. Ex.ªs contra operadores nem assumimos o vosso ponto de vista quezilento, que, aliás, se vai reflectir e repetir amanhã em relação ao veto da lei sobre o direito de resposta
É esse o vosso espírito. Não nos associamos a esse espírito de quezília, queremos mais espaços de transparência, queremos não o espírito de quezília mas o espírito de concórdia e de concertação nesta área.
O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, está encerrado o debate.
Desejamos lembrar que está marcada uma reunião dos representantes dos grupos parlamentares.
A próxima sessão terá lugar amanhã, às 15 horas, com período de antes da ordem do dia, do período da ordem
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do dia constará a reapreciação do Decreto da Assembleia da República n.º 177/VI. que altera o Decreto-Lei n.º 85-C/75, de 26 de Fevereiro (Lei de Imprensa), havendo votações no final do debate. Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 10 minutos.
Rectificação ao n.º 59, de 31 de Março
No Sumário, 1.ª cl., última linha, onde se lê «Ministro do Emprego e da Segurança Social (Menezes Falcão)», deve ler-se «Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social (Falcão e Cunha).
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
António Costa de Albuquerque de Sousa Lara.
António de Carvalho Martins.
António Maria Pereira.
Cecília Pita Catarino.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco João Bernardino da Silva
Jaime Gomes Milhomens
João Alberto Granja dos Santos Silva.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
Luís Carlos David Nobre.
Mana Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Pedro Manuel Cruz Roseta
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Simão José Ricon Peres
Partido Socialista (PS)-
António Poppe Lopes Cardoso.
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.
João Maria de Lemos de Menezes Ferreira.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Santos de Magalhães.
Luís Manuel Capoulas Santos.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Social-Democrata (PSD):
Carlos Miguel de Valleré Pinheiro de Oliveira.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Filipe Manuel da Silva Abreu.
Joaquim Cardoso Martins.
Joaquim Fernando Nogueira.
José Angelo Ferreira Correia.
Luís António Martins
Luís Manuel Costa Geraldes.
Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira.
Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia.
Melchior Ribeiro Pereira Moreira.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Nuno Manuel Franco Ribeiro da Silva.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Partido Socialista (PS)-
Alberto Bernardes Costa.
António José Borram Crisóstomo Teixeira.
António Luís Santos da Costa.
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Leonor Coutinho Pereira dos Santos.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Maria Teresa Dona Santa Clara Gomes.
Rui António Ferreira da Cunha.
Partido Comunista Português (PCP)
António Manuel dos Santos Murteira.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Lino António Marques de Carvalho.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
Adriano José Alves Moreira
Maria Helena Sá Oliveira de Miranda Barbosa.
Narana Sinai Coissoró.
Partido Ecologista Os Verdes (PEV):
André Valente Martins.
Isabel Mana de Almeida e Castro
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL
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