O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 531

Sexta-feira, 22 de Dezembro de 1995 I Série - Número 19

DIÁRIO da Assembleia da República

VII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1995-1996)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 21 DE DEZEMBRO DE 1995

Presidente: Ex. mo Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex.mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
João Cerveira Corregedor da Fonseca
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa de diversos requerimentos, da resposta a alguns outros e do projecto de lei n.º 52/VII.
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Alda Vieira (CDS-PP) tratou de questões relativas aos fogos florestais, tendo, no final, respondido a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Francisco Valente (PS), Gilberto Madaíl (PSD), António Martinho (PS) e Nuno Abecasis -(CDS-PP).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Jorge Lacão (PS) criticou o comportamento que o PSD tem assumido como oposição. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Luís Filipe Menezes (PSD), Jorge Ferreira (CDS-PP), Octávio Teixeira (PCP), Carlos Encarnação, Ferreira do Amaral e Pacheco Pereira (PSD) e Silva Carvalho (CDS-PP), usando de novo da palavra, em defesa da honra, os Srs. Deputados Jorge Ferreira (CDS-PP) e Carlos Encarnação (PSD) e tendo sido dadas explicações ao primeiro pelo Sr. Deputado António Martinho (PS).

Ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 1 a 12 do Diário.
O 1.º Orçamento Suplementar da Assembleia da República para 1995 foi aprovado. tendo feito intervenções os Srs. Deputados Rui Vieira e Nuno Baltazar Mendes (PS).
O Sr. Deputado Mário Videira Lopes (PS), em nome da Comissão Parlamentar de Ética, fez uma comunicação à Câmara sobre o desenvolvimento dos trabalhos da Comissão.
Procedeu-se à discussão conjunta na generalidade dos projectos de lei n. os 28/VII - Sobre o regime de competência e meios financeiros das freguesias com vista à sua dignificação e fortalecimento (PCP) e 42/VII - Atribuições e competências das freguesias (PS). Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados Luís Sá (PCP), Barbosa de Oliveira. Jorge Rato e José Junqueiro (PS), Álvaro Amaro e Manuel Moreira (PSD), António Pedras e Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP). Macário Correia (PSD) - que também fez a síntese do relatório da Comissão de Administração do Território, Poder Local. Equipamento Social e Ambiente - e Isabel Castro (Os Verdes).
A Câmara aprovou o projecto de deliberação n.º 7/VII Veda o uso de telefones celulares no espaço do Plenário e das comissões da Assembleia da República, no decurso das respectivas reuniões (Presidente da AR) e, na generalidade, na especialidade e em votação final global, a proposta de lei n.º ll5/VI - Manutenção na ilha de Santa Maria do Centro de Controlo Oceânico (ALRA).
Foi também aprovada, em votação final global, a alteração, apresentada pelo PS, e aprovada pela Confissão de Economia. Finanças e Plano, ao Decreto-Lei n.º 231/95, de 12 de Setembro, que altera o Decreto-Lei n.º 337/90, de 30 de Outubro (Aprova a Lei Orgânica do Banco de Portugal) [ratificação n.º 2/VII (PS)].
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 25 minutos.

Página 532

532 I SÉRIE - NÚMERO 19

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 15 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Adérito Joaquim Ferro Pires.
Agostinho Marques Moleiro.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Borrani Crisóstomo Teixeira.
António José Gavino Paixão.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus:
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Rui Gaspar de Almeida.
João Soares Palmeiro Novo.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Joel Maria da Silva Ferro.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Oliveira de Sousa Peixoto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maximiano de Albuquerque Almeida Leitão.
José Pinto Simões.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Leonor Coutinho Pereira dos Santos.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Afonso da Silva Strecht Monteiro.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Góes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amado Sequeira.
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Mário Manuel Videira Lopes.
Marfim Afonso Pacheco Gracias.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sérgio Humberto Rocha de Ávila.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Victor Brito de Moura.

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Álvaro José Brilhante Laborinho Lúcio.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Jorge de Figueiredo Lopes.
António Moreira Barbosa de Melo.

Página 533

22 DE DEZEMBRO DE 1995 533

António Roleira Marinho.
António Soares Gomes.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo. Francisco Antunes da Silva.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Gilberto Parca Madail.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Fernando Nogueira.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Manuel Lopes Moreira da Silva.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José de Almeida Cesário.
José Fortunato Freitas Costa Leite.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Durão Barroso.
José Manuel Nunes Liberato.
José Maria Lopes Silvano.
José Mário de Lemos Damião.
José Mendes Bota.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Fernando de Mira Amaral.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Alda Maria Antunes Vieira.
António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
António Bernardo Aranha da Gama Lobo Xavier.
António Carlos Brochado de Sousa Pedras.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel Maria Mendonça da Silva Carvalho.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Maria Manuela Guedes Outeiro Pereira Moniz.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Kruz Abecasis.
Paulo Sacadura Cabral Portas.
Silvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Octávio Augusto Teixeira.
Ruben Luís Tristão Carvalho e Silva.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Isabel Maria de Almeida e Castro.

Antes da Ordem do Dia

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta do expediente.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos: no dia 12 de Dezembro, aos Ministérios do Equipamento Social e do Planeamento e da Administração do Território, formulados pelo Sr. Deputado José Cabeças; ao Ministério do Equipamento Social, formulado pelo Sr. Deputado Victor Moura. Na reunião plenária de 13 de Dezembro: à Secretaria de Estado da Juventude, formulado pelo Sr. Deputado António Galamba; ao Ministério do Ambiente, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro; aos Ministérios do Equipamento Social e das Finanças, formulados pelo Sr. Deputado Luís Sá; ao Sr. Primeiro-Ministro, formulados pelos Srs. Deputados Jaime Ramos e Pacheco Pereira; ao Ministério do Planeamento e da Administração do Território, pelo Sr. Deputado Jorge Roque da Cunha; a diversos Ministérios, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho. Na reunião plenária de 14 de Dezembro: ao Ministério do Equipamento Social e à Câmara Municipal de Sintra, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro; ao Ministério da Educação, formulados pelos Srs. Deputados Ricardo Castanheira e Sílvio Rui Cervan; ao Ministério do Equipamento Social e à Secretaria de Estado da Juventude, formulados pelo Sr. Deputado José Cesário; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Bernardino Vasconcelos; ao Ministério para a Qualificação e o Emprego e à Secretaria de Estado do Tesouro e dás Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Rodeia Machado. Na reunião plenária de 15 de Dezembro: ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Marta Gonçalves; ao Ministério da Cultura, formulado pelo Sr. Deputa-

Página 534

534 I SÉRIE - NÚMERO 19

do Fernando Pereira Marques; à Secretaria de Estado dos Transportes e Comunicações, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Beja; às Secretarias de Estado das Obras Públicas e dos Transportes e Comunicações, formulados pelo Sr. Deputado António Pedras; a diversos Ministérios, formulado pelo Sr. Deputado João Amaral; ao Ministério do Ambiente, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Isabel Castro, no dia 6 de Novembro; Lino de Carvalho, na sessão de 9 de Novembro, Fernando Pereira, no dia 23 de Novembro.
Também se informa a Câmara que deu entrada na Mesa e foi admitido o projecto de lei n.º 52/VII - Sobre a composição de comitivas oficiais em deslocações ao estrangeiro de titulares de órgãos de soberania (CDS-PP), que baixou à 1.ª Comissão.
É tudo, Sr. Presidente, em matéria de expediente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, inscreveram-se, para declarações políticas, os Srs. Deputados Alda Vieira, Jorge Lacão, Lino de Carvalho e Jorge Moreira da Silva.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Vieira.

A Sr.ª Alda Vieira (CDS-PP): - Os meus cumprimentos à Mesa, na pessoa do Sr. Presidente, aos Srs. Deputados e Sr.15 Deputadas e 8 Imprensa.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O tema da minha intervenção prende-se com a floresta. Em sentido restrito, com a problemática dos fogos florestais. Começarei por afirmar que a problemática florestal é muito mais problemática do que florestal. Espero que no decurso da minha intervenção o sentido desta frase se torne aparente.
Poderá parecer a ouvidos menos avisados que esta questão é inoportuna. É que hoje, dia 21 de Dezembro, é o primeiro dia de Inverno, com chuvas, humidade relativa alta, temperatura que desce, ou seja, risco de fogos florestais nulo. Estamos, portanto, todos na ressaca dos fogos florestais do ano que termina. Se tudo correr «normalmente», voltaremos dentro de alguns meses aos fogos florestais no que resta ainda para arder e haverá então muita gente a debitar mais uma vez conhecimentos, diagnósticos, críticas, soluções nos já habituais. discursos, conferências, seminários e notícias. Começa então o «burburinho» geral! Uma verdadeira parafernália!
As estruturas criadas no papel, aparentemente para dar resposta a este problema, não chegam para. tantas encomendas. O que é que falha então? O que é que falta? Falha a legislação, mas não falta legislação. Há um sistema organizado mas que não funciona com eficácia. Vejamos acerca da legislação.
Decreto Regulamentar n.º 55/81, de 18 de Dezembro: Srs. e Sr. as Deputados, permitam-me que chame a vossa atenção para a anormalidade que começa exactamente com este diploma legal, pois nele se determina que há uma «época normal de fogos florestais». O Decreto Regulamentar n.º 36/88 vem tentar corrigir algo que está, obviamente, muito mal. E o que faz então? Prolonga o período correspondente à, «época normal de fogos» até 31 de Outubro e dá nova redacção a um dos artigos do Decreto Regulamentar n.º 55/81 afirmando que pode ser fixado por despacho conjunto o «período normal de fogos».
Poderia citar muitos mais diplomas legais que se prendem com esta problemática mas vou citar só mais alguns. Lei n.º 19/86, de 19 de Julho, que dá nova estrutura aos artigos 5 º, 6 º e 7.º do Decreto Regulamentar n.º 55/81 e revoga o artigo 25.º Portaria n.º 341/90, de 7 de Maio, que pretende facilitar a actuação e coordenação das diferentes entidades com competência na matéria - Protecção Civil, Instituto Florestal, Serviço Nacional de Bombeiros, Instituto de Conservação da Natureza, câmaras municipais etc., etc.; Decreto-Lei n.º 327/90, que proíbe nos terrenos atingidos por incêndios florestais, por prazo de 10 anos, novas construções, alterações de solo, estabelecimento de quaisquer novas actividades agrícolas, industriais, turísticas ou outras com impacto negativo.
Portanto, este diploma vem tentar constituir, aos planos directores municipais e outros instrumentos de ordenamento do território, uma condicionante, determinando ainda que cabe ao SNB e às câmaras municipais elaborarem o cadastro das áreas percorridas por incêndios. Ora, ele não funciona na prática e quem tem feito o cadastro das áreas percorridas pelos fogos são os técnicos e guardas florestais.
Sr. as e Srs. Deputados: Não poderei deixar, neste momento, de partilhar convosco uma frase autoreferencial: «Para bom entendedor meia palavra basta...»
Neste quadro legal, que não está completo, citarei ainda o Decreto-Lei n.º 334/90, de 20 de Outubro, que começa por ter boas intenções, mas delas, diz o povo, está o inferno cheio.
A exequibilidade deste decreto é prejudicada à partida. O retirar dos produtos não desejáveis após o corte do arvoredo para local afastado, no mínimo, 200 metros da mata, que deverá ser previamente limpo de mato ou, quiçá, de outra vegetação, tem efeitos negativos de ordem técnica e logística, como bem compreenderão. É que estes produtos, designados por sobrantes no diploma (este não é um termo técnico), ao serem retirados para fora da área de corte vai implicar a colocação dos mesmos em propriedade de outrem que certamente os não quer ver lá, nem permitirá que limpem qualquer vegetação aí existente. Por outro lado, vai onerar, por vezes, de tal modo a extracção dos produtos que prejudica gravemente a rentabilidade do corte. Os produtores florestais pagariam essa factura!
Também só constituí contra-ordenação algumas acções de foguear dentro das matas se o agente não tiver tomado «as devidas precauções» - e atenho-me ainda ao mesmo diploma. .Ora, estas medidas dissuasoras enfermam de um grau de subjectividade, deixando ao cidadão a escolha das precauções a tomar e prejudicam, na prática, a eficácia da sua aplicação. Em consequência, o trabalho fiscalizador complica-se, ficando altamente prejudicado.
Citarei ainda o Decreto-Lei n.º 423/93, de 31 de Dezembro, que vem regular a elaboração e a aprovação dos planos municipais de intervenção na floresta, abreviadamente designados por PMIF, mais um diploma que teoricamente vem resolver o problema desta problemática. Virá?
É, de facto, preciso planear, mas o planeamento só tem razão de ser se a sua lógica e critérios se fundamentarem numa dimensão social. Assim, um plano tem necessariamente que englobar estratégias de gestão. Um plano, admitamos que bem elaborado, é somente uma peça inerte, se bem que fundamental no início de um complexo processo de aplicação na prática. Deste modo, ainda este ano foi assinado um protocolo entre várias entidades e serviços públicos e 13 municípios, dotando-os de verbas para a elaboração destes planos.
Sr. as e Srs. Deputados, então o que é que pode falhar agora? Como é que se faz para passar do plano-documento para a sua execução, no campo? As verbas necessárias para o tornar eficaz são vultuosas e pode implicar a absorção de propriedades privadas na sua totalidade - não esqueçamos que estamos em presença de uma estrutura fundiária caracte-

Página 535

22 DE DEZEMBRO DE 1995 535

rizada por minifúndio e de grande dispersão - e pode determinar a substituição de uma espécie florestal de rápido crescimento por espécie florestal de crescimento lento. Pergunto, então: quem irá pagar ao proprietário pela perda de rendimento? Em alguns municípios, quanto será necessário? Estejamos atentos para que o plano tenha uma estratégia de gestão que terá, necessariamente, de ser faseada mas que não se, compadece com anos de «vacas gordas» entremeados com anos de «vacas magras ou loucas».
Passemos, agora, ao sistema organizativo das estruturas competentes ligadas ao problema da problemática dos fogos florestais. O que falha aqui? Como em quase todos os sectores, falta a estratégia, falta a articulação: prevenção de menos, detecção precária, combate a mais e rescaldo a menos. Há comissões especializadas distritais, reuniões e mais reuniões, mas já com uma grande desmotivação, há projectos expeditos, que as câmaras devem preparar, para caminhos, limpezas, pontos de águas, e apresentar, julgo que até 15 de Março, no respectivo governo civil. No entanto, todos sabem que a distribuição de verbas é mitigada e tem de ser complementada com uma fatia incógnita por parte das câmaras.
Sr. as e Srs. Deputados, o que vou dizer já foi dito e redito. Invista-se na prevenção e poupe-se no combate, pois ganha o orçamento e ganha o ambiente. Neste ano de 1995, tão nefasto para a floresta e com alguns efeitos irreversíveis em termos ambientais, foi dispendida uma verba de umas centenas de milhar de contos na prevenção; no combate gastaram-se 15 milhões de contos, se não mais, estou em crer! Os guardas florestais, a Guarda Nacional Republicana e os bombeiros não conseguem, na época estival acudir, a tantas ocorrências. O número de guardas florestais tem vindo a diminuir drasticamente , havendo um défice de mais de 200, e assim não podem cumprir cabalmente as suas funções. Os bombeiros voluntários, os guardas florestais e da natureza correm de um lado para o outro mal começa o burburinho e a espectacularidade de dita época normal de fogos.
Ora, é esta problemática que tem continuado muito problemática e pouco florestal, mitigada aqui e ali, de onde em onde, sem por isso se atingirem resultados consistentes. Nem os produtores florestais estão dispostos a investir numa floresta que transforma o seu dinheiro em cinzas, nem as indústrias a jusante podem olhar o futuro com optimismo quanto à disponibilidade de matéria prima que é a sua razão de existir, de investir, inovando, reformulando e criando mais postos de trabalho. Se não agirmos rapidamente através de mecanismos simples e de fácil aplicação - por exemplo, isenções fiscais - perderemos mais uma vez uma corrida num sector que o Partido Popular defende, e bem, como sendo altamente competitivo, não perdendo o objectivo da sua sustentabilidade.
Termino, utilizando uma expressão de algum. Estamos à beira de um abismo nesta problemática, vamos evitar dar um passo em frente. Faça-se um esforço para inverter este hábito, que já se tomou até uma atitude, que se consubstancia na inevitabilidade assumida desta anormalidade dos fogos florestais.

Aplausos do CDS-PP e dos Deputados do PSD Gilberto Madaíl e Pacheco Pereira.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Nuno Abecasis pede a palavra para que efeito?

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Para pedir esclarecimentos, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Fica inscrito, Sr. Deputado.
O primeiro a inscrever-se para pedir esclarecimentos foi o Sr. Deputado Francisco Valente, seguido dos Srs. Deputados Gilberto Madaíl, Nuno Abecasis e António Martinho.
Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Valente.

O Sr. Francisco Valente (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Alda Vieira: Creio que V. Ex.ª não foi suficientemente esclarecedora quanto à atenção a dar à prevenção dos fogos florestais a nível de medidas concretas, do meu ponto de vista a única forma eficaz de impedir a destruição da floresta
Os meios gastos no combate aos fogos deveriam ser canalizados muito mais para a prevenção. Sabemos todos que os proprietários sofrem de uma inércia natural, não estando sensibilizados para a criação de meios de prevenção da floresta. Assim, o apoio a dar-lhes devia ser muito mais para meios de limpeza das matas, de circulação, de corta-fogos e aceiros e daí perguntar-lhe o que acha da medida apontada pelo PS em relação ao mercado social de emprego utilizando os desempregados num serviço que, por exemplo, seriam os programas de limpeza da floresta?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada Alda Vieira pretende responder já ou no fim?

A Sr.ª Alda Vieira (CDS-PP): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Gilberto Madaíl.

O Sr. Gilberto Madaíl (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Alda Vieira, aproveito para a felicitar porque, entre os Deputados aqui presentes, certamente será uma das vozes avalizadas para falar sobre está temática da floresta. Tive oportunidade de seguir a sua acção e de ouvir, algumas vezes, as suas observações sobre esta problemática dos fogos florestais e sobre a necessidade de uma prevenção e coordenação mais eficaz relativamente à forma de actuação nos fogos, pelo que queria apenas sublinhar que foi feito um grande esforço nesta área. Os nossos bombeiros foram dotados, como nunca, de meios que lhes permitiram, nalguns casos - noutros não, infelizmente actuar, por vezes com sucesso, outras com menos sucesso, mas, como disse, foi feito um grande esforço.
A Sr.ª Deputada Alda Vieira referiu aqui que os fogos florestais são uma problemática e estou de acordo que é necessário unificar, urgentemente, a legislação e a coordenação de que V. Ex.ª falou. Queria apenas sugerir-lhe, Sr.ª Deputada, o seguinte: aproveitando o facto de ser uma especialista nesta matéria, certamente com outros Srs. Deputados presentes nesta Câmara, talvez que a Sr.ª Deputada possa tomar alguma iniciativa a partir desta Assembleia que ajude definitivamente à tal melhor coordenação e utilização de meios, pois, na minha perspectiva, essa é a grande questão dos fogos florestais.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecasis.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputada Alda Vieira, queria manifestar-lhe as minhas felicitações e, ao mesmo tempo, a minha admiração. Estamos num dia chuvoso, em Dezembro, em pleno Inverno, e V.

Página 536

536 I SÉRIE - NÚMERO 19

Ex.ª vem falar-nos de incêndios florestais, num país de ficção, em que, todos os anos, quando o calor aperta, parece que 10 milhões de portugueses são surpreendidos por essa coisa estranha que se chama «incêndios».

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - É tão estranha ela é que até .merece a consagração, por decreto, da definição de um período, tal como a caça, como se o incêndio e as grandes desgraças estivessem à espera que se cumprissem os prazos dos decretos regulamentares que os governos emitem! É por isso, Sr.ª Deputada, que todos os anos assistimos a um empobrecimento da comunidade nacional, em valores muito superiores aos necessários para comprar aviões destinados a 10 anos de combate a incêndios.
Mas queria felicitá-la, Sr.ª Deputada, por romper com este hábito que se verifica nesta área e em tantas outras e que justifica os atrasos que nós; aqui, às vezes com « lágrimas de crocodilo», tão frequentemente lamentamos. A verdade é que as medidas para resolver o problema estavam bem nas nossas mãos.
Depois de a felicitar, terminaria fazendo um apelo a todos os Srs. Deputados, meus colegas e, particularmente, aos Srs. Deputados do partido do Governo. Penso que os problemas relativos aos incêndios florestais já foram longe de mais para serem tratados a brincar e, em meu entender, deveríamos aceitar o repto que hoje aqui nos foi lançado pela Sr.ª Deputada Alda Vieira de em Dezembro - o que seria uma inovação neste país! - começarmos a tratar de um problema que se vai verificar em Maio ou em Junho.
Talvez que, se o fizermos, venhamos a descobrir que a limpeza das matas pode servir para o emprego social e que os desperdícios das mesmas são uma matéria-prima preciosa para o fabrico de determinados tipos de carvão, que há um mercado internacional ávido desse tipo de material, que nós não exploramos, porque deixamos que este caso, como muitos outros, seja um motivo de pobreza, quando poderia ser um factor de riqueza deste país.
Ficam aqui, portanto, as minhas felicitações e dirijo ao Sr. Deputado Jorge Lacão, mais do que um desafio, o apelo para que rompamos um pouco com estes hábitos, que são pitorescos, mas que; de facto, começam a não ter graça nenhuma.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Maninho.

O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, Sr.» Deputada Alda Vieira, estava tentado a dar-lhe os parabéns pela crítica que fez ao XII Governo constitucional, ao governo do PSD, e presumo que a direcção da bancada do PSD terá ficado preocupada quando viu dois dos seus Deputados, eleitos por Aveiro, bater palmas. Presumo que tenham ficado preocupados.
Sr.ª Deputada, o seu grupo parlamentar, nesta questão, está a desiludir-nos. Lembro-lho que, no Verão, o Presidente do seu partido tentou incendiar a opinião pública portuguesa com a questão dos incêndios: pôs o País em estado de sítio e apelou às forças armadas para saírem dos quartéis e irem fazer vigilância.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - O líder do seu partido também o fez!

O Orador: - Eu, em Vila Real, tomei uma posição bem diferente, Sr. Deputado!
Hoje, a Sr.ª Deputada Alda Vieira vem aqui fazer uma declaração política em nome do Grupo Parlamentar do CDS-PP e desiludiu-nos. A única afirmação positiva que fez foi dizer que nós somos a favor da prevenção.
Aliás, neste momento, este. apelo do Sr. Deputado Nuno Abecasis - o desafio que fez à minha bancada - é algo de desadequado, porque, se tivesse feito um conjunto de propostas, o líder do meu grupo parlamentar ou o meu grupo parlamentar teria necessidade de responder, dizendo sim ou não a esta ou àquela proposta. Só que não fez nada disso!
O Presidente do CDS-PP, Manuel Monteiro, tenta incendiar o País mas o Grupo Parlamentar do PP nada disse!

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - O que é que pretende, Sr. Deputado?!

O Orador: - O que pretendo é perguntar à Sr.ª Deputada Alda Vieira duas coisas, para que, claramente, saibamos por onde devemos ir. Assim, gostaria de. saber se a proposta da Sr.ª Deputada Alda Vieira vai no sentido de dar prioridade à «caça» aos incendiários ou à prevenção, se dá prioridade ao castigo ou à educação para a prevenção, preservação e manutenção de um equilíbrio ambiental. esta dicotomia que deve colocar-se e gostaria de saber quais são as vossas opções. Nós temos as nossas e, em tempo oportuno, já as tornámos claras.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - O senhor é um Deputado urbano de Vila Real!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Jorge Ferreira pede a palavra para que fim?

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, para defesa da consideração da minha bancada.

O Sr. Presidente: - Fica inscrita, Sr. Deputado.
Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Vieira.

A Sr.ª Alda Vieira (CDS-PP): - Sr. Presidente, ao Sr. Deputado Francisco Valente, que me colocou a questão de o Programa do Governo entrar em linha de conta com a ocupação dos desempregados na limpeza das matas, quero dizer que só quem trabalha com a floresta e para a floresta sabe quão específicos, muitas vezes, são esses trabalhos e conhece a preparação que é necessária, bem como a dificuldade, para tornar eficaz o trabalho dessas pessoas, o que não quer dizer que não sejam dados cursos de preparação para isso. E com isto penso ter-lhe respondido, Sr. Deputado.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora:- Ao Sr. Deputado Gilberto Madaíl os meus agradecimentos pelas palavras que me endereçou. De facto, em Aveiro, temos feito um esforço conjugado para minorar os efeitos perniciosos dos incêndios.
Ao Sr. Deputado Nuno Abecasis agradeço também as palavras que me endereçou. Relativamente ao empobrecimento a que o País tem sido votado, concordo. plenamente com tudo o que disse. Devo dizer que foi de propósito que escolhi este dia para falar nos incêndios florestais, pois já foram longe de mais para brincarmos com isto.

Página 537

22 DE DEZEMBRO DE 1995 537

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Deputado António Martinho, recordo-lhe que o Sr. Engenheiro António Guterres, algures, na campanha eleitoral, terá dito que a culpa dos incêndios era do governo.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Exactamente!

A Oradora: - Disse o Sr. Deputado que eu os desiludi ou que o Partido Popular está a desiludi-los, mas penso que não terá entendido ou ouvido cabalmente a minha intervenção, porquanto afirmei, por diversas vezes, que a prevenção está em primeiro lugar e sempre, bem como a informação e a educação - e isto com carácter de emergência. Frisei bastante este aspecto e não considero nenhuma condicionante, nem dicotomia, escolher a prioridade à prevenção ou a prioridade ao aumento dos castigos. Não considero isso uma dicotomia e entendo que as duas coisas têm de andar a par e passo.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. as e Srs. Deputados: E sabido que, contra a tradicional arrogância e auto-suficiência do poder, preferimos as vias do diálogo, da concertação e da participação. Mas não aceitamos as críticas sem fundamento daqueles que, possuídos ainda dos tiques do autoritarismo, se recusam a reconhecer em quem introduz novos métodos na acção política capacidade de decisão e decisões efectivas.
Não foi preciso esperar pela eleição presidencial para salvar as gravuras de Foz Côa, definir um novo sistema de portagens, cumprir a Lei das Finanças Locais, estabelecer os parâmetros da política de rendimentos na função pública ou do regime de exclusividade dos directores-gerais.

Aplausos do PS.

Não foi preciso esperar pela eleição presidencial para que o PS tenha já suscitado, na Assembleia da República, o agendamento de uma dezena de projectos de lei e de resolução, enquanto o principal partido da oposição se mostra profundamente adormecido, sem nos dar, até agora, notícia de uma única iniciativa legislativa com valor substantivo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não foi preciso esperar pela eleição presidencial para os portugueses conhecerem, com clareza, as traves mestras da política europeia e a determinação de fazer cumprir os compromissos internacionais de Portugal, como ficou bem patente na decisão do envio de tropas portuguesas para a Bósnia.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ao contrário, é o principal partido da oposição que persiste em navegar em águas totalmente contraditórias, ao sabor dos desacertos estratégicos de uma campanha presidencial e das indefinições de orientação da sua própria direcção política.
Entendamo-nos: se alguma coisa o PS se acha no direito de esperar do PSD é que seja efectivamente oposição e contribua, pela sua parte, para os indispensáveis equilíbrios democráticos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Que o PSD seja oposição, dura ou construtiva, de acordo coma representação que fizer dos interesses nacionais, mas ao menos que o seja de uma forma consistente.

Aplausos do PS.

Se o PSD persistir em apresentar-se um dia como o mais radical dos radicais, estimulando, por exemplo, todas as pretensões de anulação das portagens ou a satisfação retroactiva das leis que ele próprio sistematicamente violou, se não se coíbe de lançar, noutro dia a suspeita de que o Governo não informa o Parlamento e, logo após, é o primeiro a sugerir o adiamento dos calendários do esclarecimento, se vai ao ponto - pasme-se - de querer introduzir na Assembleia da República modelos de debate que anulem o valor do contraditório, se o PSD, na voragem das suas contradições, demonstra não saber razoavelmente o que quer ou o que quer com razoabilidade, não pode esperar que o possamos tomar suficientemente a sério.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Temos de nos entender: não é admissível ao PSD, que, ontem, no governo, se furtava como podia ao confronto democrático com as oposições, querer agora, na oposição, furtar-se ao confronto com o Governo, em condições de igualdade com os demais grupos parlamentares.
Não estamos disponíveis para sustentar, pelo preço do esvaziamento do debate político, aberto e frontal, as insuficiências de liderança até hoje patenteadas pelo principal partido da oposição.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas não estamos igualmente disponíveis para alimentar com falsas querelas a ilusão de um verdadeiro debate político.
Temos, por isso, de nos entender acerca do tipo de oposição descontrolada que o PSD está a levar a cabo. Das duas uma: ou se quer colocar no papel de guardião do Programa do Governo, aliás, na linha do discurso do Dr. Mota Amaral, e tem, então, de mostrar-se criticamente exigente, mas, ao mesmo tempo, cooperante e sem complexos, no processo da concretização desse programa, ou o PSD, de cada vez que o Governo realiza qualquer dos seus compromissos, vem gritar "Aqui d' El Rei contra o facilitismo", ao estilo do Dr. Fernando Nogueira, e, então, manifesta-se em oposição ao Programa e, nesse caso, deve esforçar-se, a bem do País, por apresentar soluções alternativas e bater-se por elas, o que até agora, manifestamente, não fez.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Defender as duas posições ao mesmo tempo, criticar o PS tanto por cumprir como pela suposição de não cumprir o seu Programa, mostra o PSD numa situação confrangedora: a de um partido em rota de colisão consigo próprio, tornando inevitável o risco de estilhaçar-se numa total falta de credibilidade.

Página 538

538 I SÉRIE - NÚMERO 19

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Entre Cila e Caríbdis, entre a oposição incompreensível (pelo menos, até ao momento) do Dr. Fernando Nogueira e a oposição sem compreensão (pelo menos, até ao momento) do Dr. Pacheco Pereira, por quanto tempo será necessário esperar ainda para que o PSD se mostre na verdadeira face de partido de oposição? Um partido de alternativa e com soluções ou um partido esgotado pela usura do poder, reduzido ao contrapoder e meramente obstrucionista?
Até agora, o partido obstrucionista é a imagem que o PSD nos deu a apreciar.

Aplausos do PS.

É caso, pois, para perguntar: quem está, afinal, suspenso e paralisado em função do resultado das eleições presidenciais? Quem é que anda, entre paragens e solavancos, dependente do dia 14 de Janeiro?
Na noite de 1 de Outubro - recordêmo-lo -,vimos o Dr. Durão Barroso apelar, ao Professor Cavaco Silva para que se candidatasse, em nome da desforra. O Professor decidiu candidatar-se, na tentativa de superar a derrota eleitoral do PSD nas legislativas.
No PSD, receitaram-se, então, «caldos de galinha» para ajudar o candidato a dar de si uma imagem de bonomia.
Entretanto, o Natal está à porta mas parece que, entre o candidato e o PSD, as tréguas ameaçam chegar ao fim.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - No PSD - é visível -, há quem esteja à beira de um ataque de nervos, em face de uma campanha descaracterizada de ideias e de convicções, com uma base de apoio cada vez mais à direita e cada vez menos social-democrata.
O líder do partido, atado às dificuldades, não desatou, até hoje, o nó do problema e da contradição. Mas eis que o candidato, subitamente, deixa cair a máscara, retoma o papel de líder partidário e, arrogante como é de sua verdadeira natureza, faz da arrogância arma de arremesso contra o Primeiro-Ministro e as decisões do Governo, como no caso das portagens.
Goste-se ou não, o problema está colocado.
Do candidato presidencial Cavaco Silva, se dúvidas existissem, sabe-se, em definitivo, que não é possível esperar uma atitude de não ingerência nos assuntos da governação.
Ao conhecer as críticas do candidato sobre o envio de tropas para a Bósnia, no quadro dos compromissos internacionais de Portugal, sabe-se também que, justamente nas matérias mais sensíveis e - de indispensável solidariedade institucional, o Governo não poderia contar com o apoio de tal Presidente.
O candidato presidencial Cavaco Silva, como sempre confessou, revela-se muito melhor no perfil de um Primeiro Ministro - agora Primeiro-Ministro sombra, mas obviamente sempre autoritário - do que no de um Presidente da República virado para a promoção dos consensos sociais e da estabilidade política.

Aplausos do PS.

O Dr. Pacheco Pereira pode ter tido razão em mau momento eleitoral - reconheço-o -, mas estava certo quanto ao desígnio da candidatura a apoiar pelo PSD.

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto!

O Orador: - O único desígnio politicamente compreensível da candidatura do Professor Cavaco está inscrito no apelo à desforra lançado pelo Dr. Durão Barroso.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Haveria de consumar-se, em caso de eleição, numa prática presidencial do género: eis aqui, finalmente, a verdadeira «força de bloqueio», agora catedrática e por isso mais qualificada, dirigida à dissolução antecipada da Assembleia da República para cumprir o sonho, por ora inconfessado, de fazer retornar o PSD ao poder.
Só que os portugueses quiseram efectivamente a mudança e dão todos os sinais de continuar a querê-la nas eleições presidenciais. E quererão certamente saber, em matéria de concepção institucional, se o PSD de hoje é, também um PSD de duas faces: ao mesmo tempo, a favor e contra o conflito institucional, centrando no Presidente da República a oposição ao Governo; ao mesmo tempo, a favor e contra a ideia de um Presidente polarizador de maiorias antagónicas às maiorias de governo.
Falta, em boa verdade, saber o que quer e do que anda o PSD à procura: se de um Presidente em Belém, líder de partido, ainda que por interposta figura; se de um líder de partido, efectivo candidato alternativo a Primeiro-Ministro e disposto, por isso, a jogar abertamente o jogo político com a clareza própria das disputas abertas e democráticas.
Convenhamos, Srs. Deputados, que se esta fosse a intenção do Dr. Fernando Nogueira, hoje, como líder da bancada do PSD, estaria sentado na sua primeira fila.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - No entanto, suspeito de que nesta 5 º feira, dia 21 de Dezembro de 1995, o PSD continua sem saber o que quer. Diria que continua em estado de «depressão reactiva», como que à procura de uma nova identidade.
Na sua condição de oposição, o PSD, convertido, cabe inteiramente no exercício de uma nova cultura democrática e a ela será bem-vindo. Porque há-de, então, teimar em excluir-se dessa mesma cultura democrática? Ou conformou-se simplesmente à condição de prisioneiro do espectro político de Cavaco Silva, bebendo a cicuta até ao fim?
O PSD pode e deve reagir enquanto é tempo, sacudir o destino e recusar ir a reboque dos acontecimentos. Assuma, com frontalidade, se tem uma visão de Estado que não verga às conjunturas e antes do risco de uma nova humilhação eleitoral, o direito e o dever de condenar as declarações conflituais do candidato Cavaco Silva. Ao menos, seria o princípio de um caminho promissor, no sentido da autenticidade política e da responsabilidade democrática como critérios fundamentais de comportamento.
Pode parecer tarde, mas, para quem confia nos valores da democracia, nunca é demasiado tarde.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Luís Filipe Menezes, Jorge Ferreira, Carlos Encarnação, Ferreira do Amaral, Pacheco Pereira, Silva Carvalho e Octávio Teixeira.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Filipe Menezes.

O Sr. Luís Filipe Menezes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, é difícil fazer-lhe perguntas mas é fácil fazer comentários à sua intervenção.

Página 539

22 DE DEZEMBRO DE 1995 539

A sua intervenção foi, para um partido que está a apoiar um Governo em início de funções, extraordinariamente defensiva e procurou dois objectivos fundamentais. O primeiro foi o de branquear o mal-estar interno que já se vislumbra dentro do seu partido e que os órgãos de comunicação social já evidenciam todos os dias. Aliás, esse mal-estar faz com que hoje, escasso mês e meio após início de funções de um Governo que tem quase uma maioria absoluta, já se fale em cenários de remodelação. Isto é extraordinário, Sr. Deputado, depois de uma semana em que tiveram mais uma derrota parlamentar, em que se evidenciou a fragilidade de uma das Ministras que era uma das estrelas potenciais do vosso Governo.

Aplausos do PSD.

Portanto, percebo o esforço, o timing e a tentativa de branqueamento feita por V. Ex.ª.
Mas é uma intervenção defensiva também porque o senhor só falou do PSD. O senhor vem reconhecer que, escassos dois meses após uma derrota eleitoral nossa, aqui estamos a ser o centro do combate político à vossa maioria. Sr. Deputado, lembro-lhe um mau sinal: nós cometemos um pecado no fim da nossa segunda legislatura de maioria absoluta, que foi...

Vozes do PS: - Ah! Só um?! Quantos?!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, façam o favor de deixar o orador continuar.

O Orador: - Sr. Deputado, se calhar até cometemos mais, por isso é perdemos as eleições.

Aplausos do PSD.

Vozes do PS: - Ah!

O Orador: - Ora, os senhores já estão a cometer pecados e vão perdê-las mais depressa do que nós.
Sr. Deputado, dizia eu que nós cometemos um pecado: estávamos circunstancialmente fragilizados, temos de o reconhecer, e começámos a fazer uma coisa que os senhores diziam ser oposição à oposição. Mas demorámos 10 anos a chegar a esse estado, enquanto VV. Ex. as, ao fim de oito semanas, já só sabem fazer oposição à oposição.

Aplausos do PSD.

Já não têm ideias próprias, já não têm projectos, já não têm alma. Só fazem oposição à oposição.
Sr. Deputado Jorge Lacão, eu poderia falar do clientelismo que já se evidencia na gestão do vosso Governo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PS.

O Orador: - Podia falar do autoritarismo subtil e da arrogância de que VV. Ex. as já são portadores. Alguma vez a maioria do PSD se atreveria, por exemplo, a exigir que um inquérito parlamentar fosse votado por 2/3 de Deputados?! Os senhores já tiveram desplantes deste género! VV. Ex. as têm uma arrogância que nem a subtileza das palavras mansas e do pretenso diálogo consegue esconder.
Mas o fundamental, porque estamos no início de funções, é falar de uma questão emblemática nessa circunstância: o cumprimento de promessas. Nesse particular, VV. Ex. as oscilam entre o cumprimento liliputiano e o cumprimento leviano de promessas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira terminar.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
O cumprimento liliputiano de promessas é uma tentativa de enganar os portugueses, cumprindo um bocadinho para não cumprir o resto.
VV. Ex. as prometeram, no Programa do Governo, abolir todas as portagens nas áreas metropolitanas. Aboliram quatro! VV. Ex. as prometeram o rendimento mínimo, universal, geral e imediato. Passaram para quatro concelhos do vale do Ave e já estão em quatro freguesias do concelho do Porto!

O Sr. José Magalhães (PS): - Leia o Programa!

O Orador: - VV. Ex. as prometeram aumentos salariais, no ano passado, quando estávamos a sair daqui, de 6%...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tem de terminar. O Sr. Deputado pediu a palavra para um pedido de esclarecimento, para o que dispõe, regimentalmente, de três minutos, mas já falou durante quatro minutos e meio. Peço-lhe que termine.

O Orador: - Sr. Presidente, conceda-me 30 segundos e terminarei.
VV. Ex. as prometeram aumentos salariais de 6% e já estão nos 4%!
Mas o cumprimento leviano ainda é o mais preocupante. Em 15 dias, sem estudos técnicos que sustentassem decisões, foram 30 milhões para Foz Côa, foram de 7 a 10 milhões para as propinas, foram 33 milhões para as portagens. Então, Sr. Deputado, já agora, passe o cheque, ou mande o seu Governo passar, respeitante aos dois milhões de contos da pegada de dinossauro que V. Ex.ª prometeu comprar, na última semana de campanha eleitoral.

Aplausos do PSD.

Risos do CDS-PP.

Quem gasta 100 milhões numa semana, também gasta mais dois milhões!

O Sr. Presidente: - Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Presidente, os buracos que este Governo disse que o anterior tinha deixado são pequenos buraquinhos onde cabem todas as promessas eleitorais incumpridas do Partido Socialista.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, havendo mais oradores inscritos para pedir esclarecimentos, deseja responder já ou no fim?

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Respondo já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Filie Menezes, comecemos pelas pegadas dos dinossauros. É um tema muito parecido com as gravuras de Foz

Página 540

540 I SÉRIE - NÚMERO 19

Côa e demonstra à saciedade, independentemente da quantificação de uma solução que não estou, sinceramente, em condições de fazer, que aquilo que se revela da sua pergunta é a total indiferença à protecção do património arqueológico português.

Aplausos do PS.

Depois, não hesitou em vir novamente acusar-nos de clientelismo...

O Sr. Fernando Pereira (PSD): - É verdade!

O Orador: - ... na gestão já praticada pelo actual Governo. Será que o Sr. Deputado Luís Filipe Menezes se recorda do tempo em que o seu líder, debatendo com o então candidato António Guterres, lhe tentava explicar que os lugares de confiança política na Administração Pública eram 5000, na vossa consideração?

Vozes do PS: - É verdade!

Protestos do PSD.

O Orador: - Não considerávamos antes nem consideramos agora que são 5000 os lugares de confiança política. Mas digo-lhe o seguinte: enquanto não chegarmos aos 5000, esteja calado, porque não tem a mínima autoridade para falar!

Aplausos do PS.

Risos do CDS-PP.

Sr. Deputado Luís Filipe Menezes, falei voluntariamente do vosso partido, não para fazer oposição ao que os senhores ainda não fizeram, porque os senhores, como demonstrei, ainda não foram capazes de se situar no terreno da oposição,...

Vozes do PS: - É verdade!

O Orador: - ... mas para vos dizer que temos suficiente respeito pela dignidade da actividade parlamentar para querermos levar muito a sério o principal partido da oposição. E o que fui dizer, da tribuna, é que vejam se se levam rapidamente a sério, porque, da nossa parte, merecem essa consideração.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, estamos muito preocupados, pois acabámos de ouvir do Sr. Deputado Jorge Lacão que, mais dia, menos dia, também o Governo do PS vai chegar aos 5000 lugares de nomeação ...

Risos do CDS-PP e do PSD.

... e que a partir desse momento reconhece legitimidade ao Dr. Luís Filipe Menezes para recomeçar a criticá-lo.
O problema é este: de facto, em matéria de clientelismo; só o PS e o PSD podem falar entre si, é uma conversa vossa, na qual, com gosto, não participamos.
As eleições presidenciais estão muito mornas, os candidatos não têm tido grandes performances, uma vez que está a chover e andam pouco acompanhados e se não fossem os Srs. Deputados do PS ou do PSD a levantar aqui, artificialmente, o problema das presidenciais, quase ninguém daria por elas. Compreendemos, por isso, algumas intervenções, quer da bancada do PSD, quer a de hoje, do Sr. Deputado Jorge Lacão, sobre as presidenciais.
O Sr. Deputado Jorge Lacão começou por dizer que não foi preciso esperar pelas eleições presidenciais para que o Governo do Partido Socialista tomasse várias medidas. O que se esqueceu de dizer foi que todas essas medidas são para suspender coisas. Não disse, com essas suspensões, quanto já tinha gasto do Orçamento do Estado. Não disse, com essas decisões do Governo, quanto os portugueses vão ter, para o ano, de pagar a mais nos impostos e aqui é que bate o ponto que quero referir a respeito das presidenciais. É que, infelizmente, está a ser preciso esperar pelas eleições presidenciais para se conhecer a proposta de lei do Orçamento do Estado para 1996, o que não devia acontecer.
Existe, neste momento, no País - e é bom que os senhores tenham consciência disso - a suspeita política de que o Governo está a guardar a proposta de lei do Orçamento do Estado para depois das eleições presidenciais, a fim de facilitar a eleição do Dr. Jorge Sampaio. É preciso denunciar isto!
Sr. Deputado, antigamente, tínhamos as forças de bloqueio ao Sr. Professor Cavaco Silva; hoje, parece que é o Governo do PS que constituí uma força de bloqueio em relação ao País. É que, como sabe, isso gera instabilidade nos mercados e desconfiança por pane dos agentes económicos.
Como é que os senhores querem cumprir com rigor os timings, os prazos e os critérios de convergência se vão adiando o anúncio das linhas fundamentais do Orçamento do Estado para 1996?
Sr. Deputado, faço-lhe um desafio: tente convencer o seu Governo a antecipar uma semana só - uma semana só, basta! - o anúncio e a entrega nesta Assembleia da proposta de lei do Orçamento.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Basta antecipar uma semana para eliminar a suspeita! Se o Sr. Deputado não conseguir convencer o seu Governo afazer isto, é legítimo que o País interprete esse atraso como um favor. político à candidatura do Dr. Jorge Sampaio.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado, a política económica do País não pode esperar por isso. Além do mais, penso que o Governo do PS tem de começar a gastar dinheiro em medidas que tragam benefício concreto aos portugueses. Daí fazer-lhe esse desafio, cuja concretização poderia, por um lado, constituir uma boa nova a dar ao País pela sua bancada e, por outro, servir até, em termos do seu regozijo pessoal, para retirar mais um argumento ao PSD, que também acusa o Governo do PS de andar a esconder o Orçamento para favorecer o Dr. Sampaio.
Quero só lembrar-lhe uma coisa: estive a reler o que os senhores disseram, em 1991, quando o governo do PSD também decidiu «atirar» a apresentação do Orçamento do Estado para 1992 para o próprio ano de 1992 - «caiu o Carmo e a Trindade»! Ora, o que não pode haver é dois pesos e duas medidas!
Imagine V. Ex.ª o que o seu partido diria se os papéis fossem invertidos: os senhores tinham tido uma maioria

Página 541

22 DE DEZEMBRO DE 1995 541

absoluta durante 10 anos, tinham perdido as eleições e tinha ganho o PSD e, por outro lado, havia eleições presidenciais e um candidato apoiado por cada partido. Neste cenário, o governo do PSD dizia isto: «Proposta de lei do orçamento só depois das presidenciais». Gostaria de saber o que é que, neste caso, o Sr. Deputado diria e se não levantaria a mesma suspeita política que eu em relação a essa medida.

Aplausos da CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Ferreira, agradeço-lhe a sua pergunta, mas não me levará a mal se lhe disser que, em meu entender, não está hoje nos seus dias parlamentares mais felizes. Se não, repare: na resposta que dei ao Sr. Deputado Luís Filipe Menezes, quando falei dos 5000 lugares de confiança política na Administração, foi para sublinhar o compromisso do PSD e não o do PS. E aquilo que quis extrair- e toda a Câmara obviamente terá percebido - foi que nós não assumimos para nós a nomeação desse número de lugares de confiança política.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O PSD é que não tem autoridade para invocar o argumento do clientelismo enquanto nós, hipoteticamente e apenas hipoteticamente, não chegarmos ao número que era a bitola que eles assumiram para eles próprios.
Quanto à questão das presidenciais, o Sr. Deputado Jorge Ferreira terá compreendido que aquilo que aqui assumi nessa matéria não foi fazer a propaganda de qualquer candidato,...

O Sr. Silva Carvalho (CDS-PP): - Que ideia!

O Orador: - ... foi, sim, confrontar o PSD com esta responsabilidade óbvia: dá, ou não, cobertura às declarações do Professor Cavaco Silva, quando ele se ingeriu manifestamente nos critérios do Governo do PS e do Primeiro-Ministro António Guterres? Esta é que é a questão ...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... e é partindo dela que saberemos se o PSD quer contribuir para a eleição de um presidente que vá promover claramente o conflito institucional em Belém. Nesse caso, mudou completamente de retórica, de discurso e de posição e, como tal, ao assumir um novo discurso ou uma nova atitude, demonstra que, para além de não ter ainda afinado a sua posição como partido da oposição, perdeu completamente o sentido do Estado e das, instituições democráticas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quanto à questão do Orçamento do Estado, Sr. Deputado Jorge Ferreira, o problema é outro. Em 1991, como estará recordado, aconteceu que, na sequência de uma eleição ganha então pelo PSD com maioria absoluta, houve continuidade governamental, o partido apoiante do governo era o mesmo e o Primeiro-Ministro e os ministros, no essencial, não mudaram. E, apesar disso - razão óbvia para o escândalo! -, o Governo atrasou, para além de tudo o que seria admissível, a apresentação do Orçamento do Estado, por razões eventualmente de táctica política!
Não é disso manifestamente que se trata neste momento. Do que neste momento se trata é de um novo Governo, de um novo elenco governativo, de um novo Primeiro-Ministro ter de preparar o Orçamento do Estado para o País, quando o anterior governo nem sequer deixou organizada a Conta do Estado do ano de 1994.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É por esta razão, Sr. Deputado Jorge Ferreira, que este atraso existe.

Aplausos do PS.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - O Engenheiro António Guterres disse que, caso ganhasse as eleições, estava preparado para apresentar aqui o Orçamento do Estado. Não fomos nós que o dissemos, foi ele! Então, por que é que não o apresenta?

O Orador: - Sr. Deputado Jorge Ferreira, aquilo que o Engenheiro António Guterres, na liderança do PS na oposição, fez- e todos o sabem - foi, em determinado momento, chamar a atenção do País para a oportunidade da antecipação da data das eleições legislativas, exactamente para evitar o atraso na aprovação do Orçamento do Estado. Foi isto o que disse o Engenheiro António Guterres!
Quanto ao mais, Sr. Deputado Jorge Ferreira, para ter sentido político, é preciso ter o sentido da natureza das coisas. Um governo que teve de se apresentar aqui, recentemente, a discutir um orçamento suplementar, quando do anterior lhe tinham dito que a necessidade de reforçar a despesa era de 10 milhões de contos e rapidamente descobriu que tinha de ser de 100 milhões de contos, tem obviamente de fazer muitos levantamentos e, na Administração Pública, de determinar tudo partindo do zero. E sabe porquê, Sr. Deputado Jorge Ferreira? Não é devido a inércia deste Governo mas, sim, por os ministros do anterior governo terem andado, durante o ano inteiro, a fazer a campanha eleitoral, não tendo preparado as contas do Estado para o orçamento do ano seguinte.

Aplausos do PS.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Isso também é verdade!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, é para nós evidente e claro que o tempo político actual deverá ser necessariamente marcado pelas eleições presidenciais, salvo se alguém está a pensar que o Presidente da República vai ser novamente um «corta-fitas», à semelhança do que já aconteceu há muito, quando a eleição não tinha interesse algum, passando completamente despercebida, e não havia necessidade de fazer pré-campanhas ou campanhas eleitorais.
Por conseguinte, julgo que é lógico, normal e natural que se pense que este tempo político deve ser marcado

Página 542

542 I SÉRIE - NÚMERO 19

pelas eleições presidenciais. E aqui entronca a tese, que o Sr. Deputado trouxe à colação, do PSD (e, pelos vistos, também do CDS-PP, agora pela voz do Sr. Deputado Jorge Ferreira) de que o necessário e útil era que houvesse - e vai perdoar-me a expressão - uma grande «foçanguice» do Governo para tapar a campanha eleitoral para as presidenciais e para não se falar nela nem nos candidatos presidenciais.

O Sr. José Magalhães (PS): - Era o que faltava!

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sobretudo nos que vão desistir!

O Orador: - A questão que gostaria de colocar-lhe é a seguinte: porquê esta tese? Designadamente em relação ao PSD, não será que ele defende esta tese para que, desaparecendo da ordem do dia as presidenciais, desapareça também o falar-se na existência de um candidato do PSD às presidenciais? Não estará o PSD, previamente, a afirmar e a mostrar que o seu candidato vai ser derrotado nas presidenciais e, por isso, não quer que falem nelas?

Aplausos do PCP e do PS.

Sr. Deputado Jorge Lacão, permita-me, agora, fazer-lhe um pequeno comentário ou uma sugestão, como entender, e, depois, uma nova pergunta.
A minha sugestão é a seguinte: o, Sr. Deputado Jorge Lacão, ao referir-se ao PSD, falou no principal partido da oposição, expressão que considero incorrecta. Talvez fosse preferível dizer o maior partido da oposição parlamentar. É que o problema da oposição não decorre da localização de um grupo parlamentar nesta Câmara, mas, sim e fundamentalmente, da sua oposição, ou não, a políticas avançadas pelo Governo e aí, na questão das políticas, não me parece que seja possível dizer que o PSD é o principal partido da oposição. Aliás, ainda há pouco tempo, aquando da discussão do Orçamento suplementar, tivemos essa confirmação - mostrou-se claramente que não era um partido da oposição e muito menos o principal.
A minha segunda e última pergunta refere-se ao facto de o Sr. Deputado, na sua intervenção, ter referido, por várias vezes, a questão das portagens e ter afirmado que o Governo já definiu - e agora vamos já para as coisas feitas pelo Governo - um novo sistema das portagens.
Ora, gostaria que tentasse explicar qual é esse novo sistema, porque é isso que nós não conseguimos entender, é isso que os cidadãos não conseguem entender. Qual é o novo sistema de portagens? É aquele que diz que nos primeiros troços das auto-estradas - e, isto, para as - auto-estradas -,junto das áreas urbanas, não há portagens, porque a deslocação efectuada pelas pessoas é de casa para o emprego e do emprego para casa? Se é este, então, pergunto: quando 'é abolida a portagem da ponte 25 de Abril? É que as pessoas deslocam-se de lá para cá e de cá para lá, diariamente, por uma questão de emprego!

Aplausos do PCP.

Não pode fazer-se uma auto-estrada para a outra margem, mas temos a ponte, que, neste caso, substitui claramente uma auto-estrada e deve ser tratada nos mesmos termos.
Por isso, para quando a abolição das portagens na ponte 25 de Abril?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, V. Ex.ª tem razão quando sublinha que estamos em tempo de eleições presidenciais e só por pura hipocrisia é que fingiríamos que não estamos e, neste sentido, para não deixar de colocar a questão central, que é a de saber em nome de que pressuposto político e institucional é que o PSD apoia o candidato Cavaco Silva. Assim, se esta questão, hoje, não ficar clarificada, significa que, de facto, a suprema hipocrisia resultará da atitude silenciosa do PSD na matéria. Vamos ver, até ao fim.

Aplausos do PS.

O Sr. Deputado Octávio Teixeira volta a ter razão na segunda observação que me fez e tenho gosto em reconhecê-lo. Eu quis, eivado de boas intenções, - tratar o PSD como principal partido da oposição, mas V. Ex.ª e chamou-me a atenção - e, nesse ponto, com razão - que quem tem feito, até agora, oposição substantiva ao Governo têm sido os outros partidos e não o PSD. Concedo e estou de acordo!
Quanto ao terceiro ponto, o que tem a ver com o tema do sistema de portagens, o Sr. Deputado Octávio Teixeira sabe que a explicação assumida é a de que, no quadro das áreas metropolitanas, no interior das circulares, devem desaparecer as portagens, designadamente, e para o efeito, no primeiro troço das radiais. E, no caso específico da ponte 25 de Abril, tendo em atenção os compromissos firmados pelo governo anterior, não é possível alterar a portagem. É, todavia, possível que o Governo, através dos meios financeiros adequados, compense, para impedir ou evitar o aumento previsto das portagens, pelo menos até à introdução do comboio na ponte, que criará um novo sistema de transportes públicos que realizarão muito melhor a condição de mobilidade dos cidadãos de uma e de outra margem da área metropolitana.
É esta a posição do PS.
A concluir, neste domínio, tenho todo o gosto em sublinhar que não se pode ser «preso por ter cão e por não ter». Assumimos com gosto que estamos a cumprir os nossos compromissos eleitorais e, sempre que nos quiserem criticar por isso, façam o favor, sintam-se inteiramente à vontade para o efeito.

Aplausos do PS.

a O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, fui ontem surpreendido pelos excertos dos principais aspectos da sua intervenção de hoje, tornados públicos quer por um órgão de informação escrita quer pela rádio.

O Sr. José Magalhães (PS): - Que interessante!

O Orador: - Agora, uma forma especial de fazer declarações políticas na Assembleia e de valorizar o seu papel político é dar a conhecê-las antes aos órgãos de comunicação social e, depois, vir aqui exibi-las!

Aplausos do PSD.

Mas ainda bem que V Ex.ª o fez, porque, na verdade, na sua intervenção política, não deixou de dar largas àqui-

Página 543

22 DE DEZEMBRO DE 1995 543

lo que é essencial em si: V. Ex.ª, em qualquer intervenção política, não deixa de fazer intriga política, e ela é tão inata em si que não basta que se consuma dentro do seu partido em relação ao Presidente da República, o Sr. Dr. Mário Soares, apoiado por VV. Ex.ªs na altura, mas torna-se necessário que se faça agora dentro do próprio PSD.

Aplausos do PSD.

É por isso, Sr. Deputado, que as suas declarações têm o valor que têm e não nos devemos preocupar muito com isso.
Também o PP não deve preocupar-se muito com as suas posições de hoje em relação a ele. O que V. Ex.ª quis dizer foi isto: «Atenção PP, os senhores têm-se portado tão bem, porque é que hoje se portaram mal? Porque é que hoje resolveram fazer oposição ao Partido Socialista? Porque é que hoje resolveram bater-nos?».

O Sr. José Magalhães (PS): - Bata no PP! Só atrapalha o Cavaco!

O Orador: - Eu, se fosse o PP, tomava realmente esta admoestação como um sinal de grande perigo em relação à sua posição, como, por exemplo, na votação do Orçamento do Estado.
Porque VV. Ex.ªs convenceram o País de que ele vive em instabilidade e isso não é verdade. Quando chegarmos à votação do Orçamento do Estado, vamos ver se, perante a votação negativa geral da oposição, há algum partido que deixe passar o Orçamento,...

O Sr. José Hasse Ferreira (PS): - Isso é que é intriga!

O Orador: - ... porque esse partido será a muleta do Governo e estará objectivamente coligado com o Partido Socialista e com o Governo, em relação aos objectivos e aos resultados da governação.

Aplausos do PSD.

O Sr. Deputado Jorge Lacão, na intervenção que fez, focou três pontos que não deixaria de salientar como muito importantes para nós.
V. Ex.ª fez-nos uma alusão, que reputo não completamente clara, em relação à hipótese que teríamos tido de propor uma mudança de figurino em relação a um tipo de debate parlamentar. Gostaria de lhe lembrar que fizemos isto porque o Sr. Primeiro-Ministro de agora, o então Deputado António Guterres, disse na Assembleia que, manter as regras dos debates que então existiam, era viciar o jogo entre a oposição e os governos e dar todas as condições a estes. Ora, se VV. Ex.ªs dizem que fizemos mal, mas agora ainda fazem pior, porque nem sequer aceitam o modelo de um debate com base numa interpelação, então estão a cometer um duplo erro, estão a manter o figurino dos debates e estão a impedir os partidos da oposição de fazerem oposição dentro da Assembleia da República.

O Sr. Presidente: - Peço-lhe que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - Gostaria, Sr. Deputado Jorge Lacão, de lhe dizer, muito rapidamente, mais duas coisas, em jeito de comentário breve.
VV. Ex.ªs dizem que apresentaram a legislação sobre as incompatibilidades dos directores-gerais, mas faltou qualquer coisa: as normas que dizem respeito aos concursos públicos para directores e subdirectores-gerais. Só nessa base é que será lícito nomear os novos directores e subdirectores-gerais, de acordo com as vossa promessas eleitorais, depois de substituídos estes.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tem de terminar.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente,...

O Sr. Presidente: - Mas termine mesmo, Sr. Deputado.

O Orador: - ... mas há aqui uma coisa que não posso deixar em claro,...

O Sr. Presidente: - Pode, se respeitar o Regimento da Assembleia!

O Orador: - ... senão, depois, terei de pedir a palavra para defesa da honra.
V. Ex.ª fez alusões ao Sr. Prof. Cavaco Silva, que acho que são perfeitamente inadmissíveis. Então, V. Ex.ª acha que o Sr. Prof. Cavaco Silva iria mudar de posições, iria ficar calado, perante um Governo «Pai Natal» que exibe a irresponsabilidade que exibe em relação a tudo quanto é acto de pretenso Governo? V. Ex.ª acha que o Sr. Prof. Cavaco Silva que, em relação à sua governação, foi um exemplo de dedicação e de responsabilidade, iria ficar calado perante isto?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já gastou cinco minutos, tem de terminar.

O Orador: - Com certeza, Sr. Presidente.
Não precisa de perguntar ao PSD que candidato é que apoia; bastaria que houvesse um candidato chamado Jorge Sampaio, com o passado que tem e a configuração que tem, para o PSD ter imediatamente outro candidato.

Aplausos do PSD. Vaus do PS: - Ah!...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, desculpe, mas tem de terminar. Temos de nos respeitar uns aos outros. Não há privilégios especiais para qualquer Sr. Deputado.
O Sr. Deputado sabe isso muito bem, portanto, peço-lhe que termine.

O Orador: - Sr. Presidente, terminarei com uma única frase.

O Sr. Presidente: - Tem de terminar mesmo, Sr. Deputado. Porque dizer que vai terminar e não o fazer não é uma maneira séria de respeitar o Regimento, desculpe que lhe diga!

O Orador: - Sr. Presidente, terminarei imediatamente e com uma declaração de concordância em relação a uma coisa que disse o Sr. Deputado Jorge Lacão. V. Ex.ª disse que era preciso mudança nas presidenciais. Tem razão! É preciso que o novo Presidente da República não seja um socialista!

Aplausos do PSD.

Vozes do PS: - Ah!...

Página 544

544 I SÉRIE - NÚMERO 19

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Encarnação, na minha intervenção disse que o PSD corria o risco de estilhaçar-se numa total falta de credibilidade e não estava certo que, nas questões que me iriam colocar a seguir, isso ficaria tão claramente provado, como acaba de acontecer na intervenção que fez.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado Carlos Encarnação, relativamente ao Sr. Prof. Cavaco Silva, veio dizer-nos isto: «Então não havia o Sr. Prof. Cavaco Silva de manter as posições que sempre manteve, perante a atitude de um Governo de «Pai Natal»?». Ou seja, o candidato Cavaco Silva vai manter as suas posições, como faz sentido que não altere, se for eleito, e aquilo que o Sr. Deputado Carlos Encarnação aqui convalida é a interpretação de um presidencialismo contra a legitimação governamental, por via da sua confiança política pelo Parlamento.

Aplausos do PS.

O Sr. Deputado Carlos Encarnação vem agora amarrar o PSD à concepção presidencialista do regime democrático português.
Quanto ao outro ponto - e este, se me é permitido dizer, é ainda mais grave -, o Sr. Deputado Carlos Encarnação disse-nos isto: «Aquele partido que viabilizar o Orçamento do Estado ficará a ser a muleta do Governo». O Sr. Deputado Carlos Encarnação, veio dizer, não conhecendo o Orçamento do Estado, que não quer que o seu partido seja a muleta do Governo.

Aplausos do PS.

O Sr. Deputado Carlos Encarnação, pelo que aqui disse, veio confirmar inteiramente que o PSD está reduzido a um partido meramente obstrucionista.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado Carlos Encarnação «rasgou» hoje completamente a ponderação dos interesses nacionais, face à avaliação crítica de um Orçamento, reduzindo a posição da sua bancada a uma simples atitude de mera lógica partidária, no pior sentido da expressão.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado Carlos Encarnação já não representa o principal partido da oposição; representará, por este caminho, apenas o mais irresponsável partido da oposição.

Aplausos do PS.

O Sr. Macário Correia (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Macário Correia (PSD): - Sr. Presidente, interpelo a Mesa no sentido de ajudar à compreensão dos trabalhos, com a Mesa, certamente, a servir aqui de elemento de colaboração, para ajudar...

Protestos do PS.

Posso falar, Srs. Deputados?!
O Sr. Deputado Jorge Lacão não leu o programa eleitoral do Partido Socialista e, por isso, quero pedir à Mesa que tire fotocópias das duas linhas do capítulo II, página 74, que dizem o seguinte: «Poderão e deverão ser dispensadas as portagens nas áreas metropolitanas, dados os elevados custos sociais que geram para uma mobilidade de características predominantemente pendulares». As áreas metropolitanas, para quem não saiba, têm 27 municípios, desde Palmela até Mafra e de Espinho até Valongo.
Depois há um outro documento, que é o Programa do XIII Governo Constitucional - e peço também à Mesa para tirar fotocópias -,...

O Sr. José Magalhães (PS): - Ponha isso numa disquette!

O Orador: - ... que, na página 175, diz o seguinte: «Poderão e deverão ser dispensadas as portagens nas áreas metropolitanas, dados os elevados custos sociais que geram para uma mobilidade de características dominantemente pendulares».
Ora, como já ouvi vários Deputados do Partido Socialista dizerem coisas diferentes nesta matéria, peço que estas duas páginas sejam distribuídas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a sua leitura dispensa as fotocópias e a distribuição.

Risos.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Carvalho.

O Sr. Silva Carvalho (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, V. Ex.ª veio aqui hoje contrabalançar a intervenção que o Sr. Deputado Pacheco Pereira fez há alguns dias, tentando equilibrar a situação. Aí têm razão!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Isso é na sua óptica! Ele não tem dignidade para contrabalançar o presidente do meu grupo parlamentar!

O Orador: - Sr. Deputado, se me dá licença...
Portanto, se vamos continuar um pouco nisto, confesso que é lamentável, do nosso ponto de vista: o PSD acusando o PS de estar no Governo, como se fosse oposição, e o PS acusando o PSD de fazer oposição, como se fosse Governo. Já ouvimos isto aqui variadíssimas vezes, por isso queria, muito sinceramente, dizer que, pela nossa parte, já chega.

O Sr. José Magalhães (PS): - Em quem é que vota nas presidenciais?

O Orador: -- Eu só voto por convicção! É um problema!
Portanto, pergunto ao Sr. Deputado Jorge Lacão quem está suspenso do resultado das presidenciais. E vou dar-lhe uma resposta, mais do que pedir esclarecimentos: tanto o PS como o PSD estão suspensos do resultado das presidenciais. Esse é que é o vosso problema, tanto de um como de outro.
Dizia o Sr. Deputado Jorge Lacão, a determinada altura, que reconhecia razão ao Sr. Deputado Pacheco Pereira e chamava-lhe a atenção para algumas dúvidas sobre a, can-

Página 545

22 DE DEZEMBRO DE 1995 545

didatura presidencial do PSD. Porventura, a mesma razão reconhecerá, por exemplo, a algumas dúvidas levantadas pelo Dr. Fernando Gomes relativamente à candidatura do Dr. Jorge Sampaio. Portanto, esta discussão teria muito caminho por onde ir!
Mas quero colocar-lhe uma questão muito objectiva, que já coloquei em relação à intervenção do Sr. Deputado Francisco de Assis, mas, sinceramente, fiquei confuso com a resposta. Por isso, como estão os dois juntos, provavelmente poderão responder melhor. É que, por um lado, era urgente sabermos até quando é que isto vai continuar, porque começo a ter receio de que não acabe a 14 de Janeiro e que, a partir dessa data, tanto o PS como o PSD inventem um pretexto qualquer para continuarem um sem fazer oposição séria e outro sem resolver os problemas do País. Penso que esta questão é fundamental.
Em segundo lugar, devo dizer que o PS fez, efectivamente, muitas promessas, mas o problema mais grave é que quem as vai pagar não é o PS, é o País. Falta saber quanto é que elas custam e, nomeadamente, quanto é que vai custar a operação de portagens do PS. Quanto é que isso vai custar, porque são, com toda a certeza, milhões e milhões de contos.
Já agora, Sr. Deputado Carlos Encarnação, se me permite, V. Ex.ª fez uma observação que não posso, de forma alguma, deixar passar em claro. É que o problema do Orçamento...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o pedido de esclarecimento era ao Sr. Deputado Jorge Lacão!

O Orador. - Sr. Presidente, peço-lhe a sua benevolência.

O Sr. Presidente: - Tê-la-á!

O Orador: - É que o problema do Orçamento do Estado, sendo urgente e sendo um problema do Partido Socialista, é essencialmente um problema do País. E esse Orçamento vai ser condicionado pelos critérios de convergência com os quais tanto o PS como o PSD estão de acordo.
Portanto, se alguém tem de ser muleta do Governo nessa matéria é o PSD e não, de, forma alguma, o PP.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, com certeza, não é para responder!

O Sr. Carlos Encarnação (PS): - Não! Não pode ser, Sr. Presidente! Talvez para defesa da consideração!

O Sr. Presidente: - Se é assim, dar-lhe-ei a palavra no final.
Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, creio que, há pouco, o Sr. Deputado Macário Correia tinha requerido qualquer coisa, mas, entretanto, varreu-se-me do espírito e já não posso alegar nessa matéria.

Risos do PS.

O Sr. Macário Correia (PSD): - Um operador de reprografia!

O Orador: - Sr. Deputado Silva Carvalho, V. Ex.ª perguntou quanto é que vai custar a decisão do Governo do PS sobre as portagens: Posso responder-lhe, desde já, que vai custar muito mais comodidade, por direito, às centenas de milhar de cidadãos que têm de percorrer as Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto.

Vozes do PS: - Muito bem!

Vozes do CDS-PP: - Quem paga?!

O Orador: - Sr. Deputado Silva Carvalho, quando, há uma semana, o Sr. Deputado Pacheco Pereira fez uma intervenção política - toda a Câmara se recordará -, tive ocasião de o saudar pela sua decisão de nos ter brindado com essa declaração e dizer: «bom regresso ao debate político franco e de peito aberto». Porque é isso que importa! Podemos divergir totalmente, mas o debate claro deve ser inteiramente assumido.
E, Sr. Deputado Silva Carvalho, perdoará que lhe diga, não faz qualquer sentido a sua bancada vir manifestar-se um pouco menos conformada com o facto de também o PS preferir o debate político frontal e aberto. Pelo contrário, deveria era sentir-se penalizado pelo facto de o líder do seu partido preferir fazer a luta política fora das bancadas parlamentares, quando, por direito próprio, deveria estar aí sentado.

Vozes do CDS-PP: - Vocês têm medo disso!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Ferreira do Amaral.

O Sr. Ferreira do Amaral (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, a sua intervenção de há pouco centrou-se em dois pontos, que quis trazer ao debate.
O primeiro tem a ver com a questão da eleição presidencial, onde, de uma maneira clara, defendeu o seu candidato...

O Sr. José Magalhães (PS): - Só faltava apoiar o Professor Cavaco Silva!...

O Orador: - ... e, devo dizer, curiosamente foi apoiado também pela bancada do PCP, que talvez se esqueça de que tem um candidato próprio. Pensamos que irá haver um candidato comum, dito da maioria de' esquerda, resta saber se é o Sr. Jerónimo de Sousa quem decide desistir a favor do Dr. Jorge Sampaio ou se é o Dr. Jorge Sampaio quem decide desistir a favor do Sr. Jerónimo de Sousa. Mas será sempre só um.

Risos do PSD.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Com essa inteligência toda, explique lá porquê?

O Orador: - Fiel ao seu tema e à sua norma de, nesta fase, pelo menos até ao dia 14, que o que é preciso é afastar a «bola da área», também resolveu fazer uma análise completa e profunda, bem documentada, sobre a vida do PSD e, mais do que isso, temos a agradecer os bons conselhos que nos deu sobre a forma de fazer oposição. Isto é, explicou-nos como seria útil para o PS que o PSD fizesse oposição. Aceitamos que seja essa a norma, a maneira que convinha ao PS, mas devo dizer que não vamos fazer oposição ao Governo simplesmente porque convém ou não

Página 546

546 I SÉRIE - NÚMERO 19

ao PS, mas, sim, por entendermos que é justo, em nome dos interesses do País e não dos do PS. E sabe, Sr. Deputado, não é fácil a um partido da oposição que se preza e que até certo ponto prometeu claramente fazer oposição séria em nome dos interesses de Portugal deixar de ser crítico em relação a estes primeiros dois meses de acção governativa. Não é nada fácil, por mais boa vontade, por mais espírito natalício e até por mais que possamos refrear um excesso de entusiasmo. É muito difícil. É muito difícil deixar de ser crítico!
Repare, Sr. Deputado, o Governo é acusado, não sei se a justo ou a injusto título, mas é acusado - há suspeitas disso, como ainda há pouco foi referido, sendo várias vezes refecido e glosado - de provocar o adiamento da apresentação do Orçamento do Estado para favorecer a campanha eleitoral de um candidato à presidência da República. Não considero isso legítimo, antes uma acusação. É acusado disto, mas, na realidade, independentemente da interpretação que se faça deste desígnio do Governo, se olharmos para trás e virmos o que foi a acção governativa, o que temos a dizer é que antes mesmo da apresentação do Orçamento, antes mesmo da avaliação dos recursos disponíveis e das despesas prementes que há que fazer, antes mesmo de avaliar aqui, nesta sede, as prioridades de que o país necessita, antes de tudo isto, sem fazer absolutamente nada de construtivo, o Governo, por mera acção diária, quase que por despacho corrente, já gastou 100 milhões de contos. Isto é qualquer coisa que não pode ser passado em claro. Não é possível o Governo apresentar todas as semanas, para não dizer todos os dias, aos portugueses uma nova factura de despesas apenas por simplesmente achar que essa despesa agrada aos seus objectivos e não propriamente por obedecer a um critério.
Sr. Deputado, tendo o Programa do Governo estabelecido claramente que as portagens das Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto iriam acabar por acção do Governo - está lá escrito - e tendo o Sr. Primeiro-Ministro defendido posição contrária, em que ficamos: a bancada do PS vai defender o que está no Programa do Governo, fazendo oposição ao Primeiro-Ministro, ou, pelo contrário, vai defender o Primeiro-Ministro, contra o Programa do Governo?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Ferreira do Amaral começou as suas considerações dizendo que não sabia se um candidato presidencial desistiria a favor do outro. Se não me leva a mal, gostaria de sugerir-lhe que desistisse de fazer intervenções desta natureza, pois não dão rigorosamente qualquer contributo...

Protestos do PSD.

... para o esclarecimento do que quer que seja. A questão central, que aqui está colocada, é a seguinte: aquando da discussão...

Protestos do PSD.

A questão central é que, aquando da apreciação do Programa do Governo, o Sr. Deputado Mota Amaral, que já tive o gosto de citar na minha intervenção, veio dizer que o PSD estaria com atenção ao cumprimento do Programa do Governo e consideraria até que ó eventual incumprimento significativo desse Programa poderia vir a ser motivo de crise que justificasse ao, PSD, por causa disso, a apresentação de uma moção de censura. O que o PSD não explica é se é nesta postura de oposição em que se quer colocar. Se assim for, seja bem-vindo à cooperação de ajudar o Governo e a maioria a realizarem o Programa do Governo, e é sinal de que concorda, nó essencial, com as medidas nele contidas, ou, então, não é isto o que o PSD quer.
Aquilo que o PSD acha, como pelo menos parece das intervenções que até agora ouvimos ao Sr. Deputado Fernando Nogueira, é que as medidas do Programa do Governo são más. Os senhores têm de combater a aplicação das medidas do Programa do Governo e apresentar aqui soluções de alternativa. Esta é a questão para a qual o PSD tem de decidir: ou quer fazer oposição em nome de um objectivo ou em nome de outro objectivo.
O que mais uma vez fica claro das palavras do Sr. Deputado Ferreira do Amaral é que querem fazer oposição em nome dos dois objectivos, mas, como isso é uma contradição nos termos, tal significa a negação da responsabilidade política do próprio PSD.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, interrogo-me desde ontem e de hoje de manhã sobre a razão de o Sr. Deputado Jorge Lacão se ter vindo meter nestes sarilhos.

Risos do PSD.

E interrogo-me desde ontem porque o Sr. Deputado Jorge Lacão veio aqui demonstrar, mesmo sem abrir a boca, três coisas, que são exactamente as que não convinha ao PS vir agora demonstrar. A primeira, por as últimas semanas parlamentares lhe terem corrido mal, é que se sentiu obrigado a vir, uma semana depois, tentar responder àquilo que deveria ter respondido uma semana antes.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, acabou por mostrar, na prática, o incómodo que os últimos trabalhos parlamentares levaram ao Grupo Parlamentar do Partido Socialista.

O Sr. José Magalhães (PS): - Está a falar do seu discurso! É um auto-elogio!

O Orador: - Esta é a primeira verificação.
Segunda verificação: hoje, o Partido Socialista não consegue ser mais do que o espelho daquilo que o PSD diz. O Sr. Deputado Jorge Lacão não tem uma única questão, um único problema, na sua intervenção, que não seja um espelho daquilo que os Deputados do PSD têm vindo a dizer, a discutir, a declarar publicamente. Ou seja, em termos de ideias, os senhores vivem do reflexo daquilo que nós discutimos, daquilo que nós debatemos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas estas duas primeiras verificações até nem são as mais importantes, há uma terceira.

Página 547

22 DE DEZEMBRO DE 1995 547

O Sr. Deputado Jorge Lacão vem aqui dar à sua bancada uma lição de conformismo. Vem dizer-lhes, virados para nós: «Aqueles senhores não se entendem. Dizem coisas diferentes. Pensam coisas diferentes...

O Sr. José Magalhães (PS): - É um facto!

O Orador: - ... e, por isso, têm de ser punidos publicamente!» Estamos a começar a perceber uma coisa: tanto os senhores como nós estamos a começar de novo. Durante 10 anos os senhores disseram que iam fazer diferente, o povo português deu-vos uma oportunidade para mostrarem que são consequentes com o que disseram durante esses 10 anos, e a mesma oportunidade, de começar de novo, que deu aos senhores, deu-nos a nós.

Vozes do PS: - Aproveitem-na!

O Orador: - Logo, também nós temos uma oportunidade de começar de novo, analisando os erros e mostrando que somos capazes de os corrigir. Estamos, neste ponto de vista, exactamente iguais, mas há uma coisa que estamos a começar a perceber e que os senhores não perceberam nestes 10 anos: é que hoje, na vida política moderna, a área política e o espaço político que não tenha controvérsia e debate público perde, e pende junto do eleitorado. E a controvérsia e o debate público sobre as presidenciais, sobre a actividade política, estão neste momento na área do PSD pois a vossa intervenção não é senão um pálido reflexo daquilo que estamos a discutir. Nós estamos noutra, os senhores, infelizmente, estão a repetir o pior do que nós fomos.

O Sr. José Magalhães (PS): - E o Cavaco o pior do pior!

O Orador: - E a lição de conformismo é uma lição que o Sr. Deputado Jorge Lacão, líder parlamentar, provavelmente, por não ter ido para o Governo, quer dar à sua bancada. É perigoso começar a pensar de forma diferente, é perigoso começar a discutir e, implicitamente, esta é a primeira lição pública de conformismo dada pelo líder parlamentar à bancada do Partido Socialista. Convém que aprendam; nós, felizmente, estamos a desaprender.
Por último,...

Protestos do PS.

...vou dar-lhe mais algumas questões para o senhor responder na próxima semana, que é normalmente o tempo que demora.

Risos do PSD e do CDS-PP.

Sabe qual é o problema do Orçamento e da candidatura presidencial? É que o Dr. Jorge Sampaio vai jantar com artistas, aquilo que, muito pitorescamente, se chama «agentes culturais», uma coisa que não sei bem o que é.

O Sr. José Magalhães (PS): - Nota-se!

O Orador: - E os senhores não são capazes de explicar por que razão é que têm aparecido noticias públicas, com fonte no Partido Socialista, de um substancial corte no orçamento do Ministério da Cultura para o próximo ano. E é exactamente a contradição entre esse corte não explicado e o comportamento da candidatura presidencial que os senhores querem esconder não revelando o Orçamento do Estado.

O Sr. Presidente: - Faça favor de terminar, Sr. Deputado, pois já ultrapassou em muito o tempo regimental.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Tenham aqui a coragem de dizer publicamente que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista não permitirá cortes no orçamento do Ministério da Cultura, pelo contrário, conforme as promessas eleitorais, haverá um aumento substantivo e real desse orçamento, se não,...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, terminar não é continuar. Faça favor de terminar.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Dizia eu que, á não ser assim, os senhores ficarão conhecidos como «os senhores 20%».

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Não, 10% é o atraso do Cavaco!

O Orador: - Os senhores vão dar 20% de aumentos salariais, sendo 3% de salários reais e 17% de diálogo, e isso os portugueses vão perceber muito bem como é.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pacheco Pereira, confesso que estava na expectativa de ver se, desta vez, melhorava o perfil da sua intervenção política e fazia afirmações substantivas. Nada, Sr. Deputado Pacheco Pereira! Pura retórica!

O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD): - Olha quem fala!

O Orador: - Não há, Sr. Deputado Pacheco Pereira, dificuldade de intervenção política por parte da bancada do PS. Pelo contrário, reveja-se aquilo que muito recentemente aconteceu: tendo o líder do PSD demonstrado um estrondoso falhanço na sessão em que esteve presente o Primeiro-Ministro, depois dessa verdadeira falência política, a bancada do PSD, impotente, foi pedir-lhe, em SOS, «socorra-nos e venha fazer uma declaração contra o PS».

Aplausos do PS.

Não foi, pois, o PS que teve de rever-se no espelho, aliás, bastante baço, do PSD.

Risos do PS.

Acontece que, agora, o Sr. Deputado Pacheco Pereira tenta explicar-se a si próprio nas lições que tenta dar ao Grupo Parlamentar do PSD sobre a forma de fazer oposição.

Aplausos do PS.

Já agora, Sr. Deputado Pacheco Pereira; sobro a forma de fazer oposição, a questão é a de saber se à sua seriedade intelectual não repudia o facto de ter ouvido dizer aqui, na primeira fila da sua bancada, que, seja qual for o Orçamento do Estado, porque o PSD não quer ser muleta do Governo, não o viabilizará? O Sr. Deputado Pacheco Pereira não considera que, do ponto de vista político, esta irresponsabilidade não pode ficar sem um reparo da sua parte ou também passou ao estatuto de politicamente irresponsável? Não acredito que o faça.

Página 548

548 I SÉRIE - NÚMERO 19

Protestos do PSD.

Por outro lado, em matéria de candidaturas presidenciais, quem é que, sem razão, na altura, muitas vezes, subia àquela tribuna para criticar o exercício de uma pura magistratura de influência? Era o Deputado Pacheco Pereira, para acusar o Presidente da República daquilo que não tinha, feito. Agora, quando o Prof. Cavaco Silva toma uma posição de ingerência manifesta na decisão de um Governo e colide abertamente com a atitude de um Primeiro-Ministro, o Deputado Pacheco Pereira silencia-se a si próprio como se fosse um dogma o que tinha dito antes e finge que vamos começar tudo de novo, porque o passado está enterrado.
Sr. Deputado Pacheco Pereira, faça a si próprio um obséquio: não se enterre politicamente!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa tomou nota de duas inscrições para declarações políticas, as quais serão agendadas para o período de antes da ordem do dia da sessão plenária de 4 de Janeiro de 1996.
Inscreveram-se, ainda, para exercer o direito regimental de defesa da honra e consideração da bancada, os Srs. Deputados Jorge Ferreira e Carlos Encarnação.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente,...

O Sr. Jorge Lacão (PS): - A quem se dirige?

O Orador: - Ao Deputado do Partido Socialista que pediu esclarecimentos à Deputada Alda Vieira após a sua declaração política, e que afirmou textualmente que o Dr. Manuel Monteiro, no último verão, tinha incendiado o país.
O excesso e o ridículo desta afirmação não desculpam a irresponsabilidade que ela representa, significam simplesmente que, quando não há argumentos políticos para opor aos dos outros partidos, há Srs. Deputados, e estou a falar neste caso concreto do espírito de um, já que o corpo se ausentou ou, então, está distraído...

O Sr. António Martinho (PS): - Estou aqui!

O Orador: - Muito obrigado. É a si, Sr. Deputado, que me dirijo. É que, quando faço estas coisas, gosto de olhar as pessoas na cara.
Sr. Deputado, quando não tiver argumentos políticos, não faça afirmações deste tipo porque lhe ficam mal. Aliás, é exactamente este tipo de afirmações que, muitas vezes, lança _o descrédito da Assembleia da República na opinião política.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Combata politicamente e não diga falsidades; combata politicamente e não injurie quem quer que seja porque...

Vozes do PS: - Sanguessugas!

O Orador: - A esse propósito, quero dizer que chamámos sanguessuga a um Deputado que propôs que os Deputados recebessem mais dinheiro por cada relatório elaborado na Assembleia, como é seu dever.

Aplausos do CDS-PP.

Já que foi abordado esse episódio, pretendo esclarecê-lo desde já, de forma a que ninguém, nunca mais, o invoque. Esse Sr. Deputado, que era do PSD, não constava das listas das últimas eleições. Perguntem ao PSD por que razão isso sucedeu e, depois, voltem a falar nos sanguessugas!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado do Partido Socialista, quero pedir-lhe que, quando não tiver argumentos políticos contra o presidente do meu partido, não faça as afirmações irresponsáveis e falsas que proferiu a esse respeito.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado António Martinho.

O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Ferreira, ainda que me sente na sexta fila deste Hemiciclo, não fujo. Para além de Deputado, sou culturalmente transmontano, o que, tem um significado muito grande...

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Demonstre-o!

O Orador: - :..e não são afirmações de V. Ex.ª, tentando desviar a atenção do meu pedido de. esclarecimentos, que me fazem ter medo.
Ao exercer o direito regimental de defesa da honra da bancada, o Sr. Deputado devia ter citado a. frase que proferi e não apenas as primeiras palavras, ou seja, «tentou incendiar o País no Verão com declarações bombásticas». É que, desta forma, a frase tem o sentido devido, não sendo irresponsável nem descabida no debate parlamentar.
V. Ex.ª tem de habituar-se, e aceite este meu conselho, ao facto de, em democracia representativa, o debate parlamentar ser essencial...

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Mas com respeito!

O Orador: - ... e fazer falta o confronto de opiniões e a demonstração da diferença entre as propostas políticas apresentadas pelos vários partidos. Foi o que fiz!
Agora, o Sr. Deputado não pode ter razões para lançar sobre a minha bancada e sobre mim expressões que dêem conteúdo ao que é ser Deputado como alguns colegas da sua bancada fizeram ainda não há muito tempo. Essas afirmações, sim, Sr. Deputado, é que lançam o descrédito sobre o Parlamento, uma instituição tão essencial à democracia representativa, e não as minhas palavras, que nada mais significam do que o confronto político, a discordância e a diferença, que são essenciais em democracia.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para exercer o direito regimental de defesa da honra e consideração da bancada, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Silva Carvalho, relativamente à alusão que fez em relação à minha posição, gostava de dizer-lhe que não referi que o seu partido ia abster-se, votar contra ou a favor do Orçamento nem tenho nada a ver com isso. V. Ex.ª -

Página 549

22 DE DEZEMBRO DE 1995 549

e o seu partido - fará o que a sua consciência patriótica mandar.
Apenas quis fazer um aviso solene ao Partido Socialista (não se tratou de uma moção de censura nem de um voto contra) que significa, pura e simplesmente, o seguinte: ou o rega-bofe acaba ou estamos todos colocados perante uma posição muito difícil face ao próximo Orçamento do Estado!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Carvalho.

O Sr. Silva Carvalho (CDS-PP): - Sr. Presidente, não pretendo dar explicações.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 17 horas e 10 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Para enumerar os Diários em aprovação, tem a palavra o Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, estão em aprovação os n. os 1 a 12 do Diário, respeitantes às reuniões plenárias dos dias 27 e 31 de Outubro, e 7 a 30 de Novembro.

O Sr. Presidente: - Não havendo objecções, consideram-se aprovados.
Está agendada uma declaração do Sr. Presidente da Comissão Parlamentar de Ética, mas, em virtude de não se encontrar presente, passo ao ponto seguinte da ordem de trabalhos.
Srs. Deputados, vamos dar início à discussão do 1.º Orçamento Suplementar da Assembleia da República pata 1995, para o que cada grupo parlamentar dispõe de cinco minutos.
Para uma intervenção, na qualidade de Presidente do Conselho de Administração, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Vieira.

O Sr. Rui Vieira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A apresentação, para apreciação e votação pelo Plenário da Assembleia da República, do l.º Orçamento Suplementar para 1995, cujo projecto foi aprovado em Conselho de Administração, deve-se fundamentalmente à necessidade de integrar no Orçamento o saldo de gerência respeitante a 1994, bem como de outras receitas cobradas pelos serviços e ainda as verbas resultantes da aplicação de capitais disponíveis. Trata-se de dar cumprimento ao disposto no artigo 66.º da Lei Orgânica da Assembleia da República.
Devo dizer, desde já, que este Orçamento suplementar não envolve qualquer aumento de encargos para o Orçamento do Estado. Procede-se também à alteração de algumas dotações com o objectivo de as adequar às necessidades da execução prevista até ao final do exercício.
Assim, é acrescido, do lado da receita, o montante de 1 397 677 contos. No capítulo da despesa, procedeu-se ao reforço de algumas dotações consideradas insuficientes para suportar os encargos obrigatórios bem como à diminuirão de outras consideradas excedentárias.
de salientar o reforço das dotações destinadas à construção do parque de estacionamento subterrâneo e do bloco de gabinetes para Deputados. A adjudicação destas obras mereceu parecer favorável do Conselho de Administração e o seu início está previsto para os primeiros meses do próximo ano. Trata-se, como todos reconhecem, de duas estruturas muito importantes que hão-de contribuir para uma melhoria acentuada das condições de funcionamento da Assembleia da República.
Procedeu-se, igualmente, ao reforço das dotações destinadas ao melhoramento das instalações já existentes e à aquisição de material informático. De referir também o reforço das dotações relativas ao apoio aos grupos parlamentares, subvenção aos partidos políticos e subvenção estatal às campanhas eleitorais, cujos montantes orçamentados inicialmente não podiam prever, quer o valor do salário mínimo, quer os resultados eleitorais, vectores a partir dos quais são calculados.
Há ainda a referir a inscrição de uma dotação para a comemoração do 21.º Aniversário do 25 de Abril e o reforço da dotação para a realização da Conferência Interparlamentar por Timor Leste. Acresce que, por decisão do Presidente da Assembleia da República e do Conselho de Administração, está prevista a transferência para os órgãos autónomos da Assembleia da República (Comissão Nacional de Eleições, Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados e Comissão de Acesso aos Documentos da Administração) dos valores correspondentes aos respectivos saldos de gerência de 1994.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, seja-me permitido que, na qualidade de Presidente do Conselho de Administração, dirija uma palavra de reconhecimento pela dedicação e competência demonstrados por todos os funcionários que colaboraram na elaboração deste Orçamento suplementar e na Conta de Gerência de 1994.
Permita-me ainda, Sr. Presidente, que, na primeira vez que tomo a palavra nesta Câmara na qualidade de Presidente do Conselho de Administração,. faça uma referência justa e merecida ao excelente trabalho desenvolvido pelos membros do anterior Conselho de Administração. E, já que vivemos, em pleno, o espírito do Natal, apresento-lhe, Sr. Presidente, bem como aos membros da Mesa, Srs. Deputados, jornalistas e funcionários desta Casa, e respectivas famílias, votos de bom Natal e um ano novo muito feliz.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Presidente do Conselho de Administração.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais e, sendo a primeira vez que intervenho nesta Câmara; quero saudá-la na pessoa de V. Ex.ª, não só por ser tradição mas tenho um gosto pessoal muito próprio em fazê-lo.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado.

O Orador: - Entende o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, como é seu direito regimental, pronunciar-se em Plenário sobre o Orçamento suplementar da Assembleia da República para 1995, previsto no artigo 65.º da Lei Orgânica da Assembleia da República. Fazêmo-lo porque esta é também a, forma de não limitar a intervenção do Plenário ao cumprimento de uma mera e simples formalidade burocrática. A dignidade da Assembleia da República assim o exige e determina.
O Grupo Parlamentar do PS considera plenamente justificável e pertinente o Orçamento suplementar em aprecia-

Página 550

550 I SÉRIE - NÚMERO 19

ção, tendo em atenção os termos da nota justificativa elaborada pelos respectivos serviços, bem como o parecer do Conselho de Administração.
Cumpre ainda salientar a circunstância, não totalmente imprevisível, mas ainda assim aleatória, dos encargos decorrentes dos aumentos que incidiram nos abonos a Deputados e funcionários do quadro da Assembleia da República, o que provocou, necessariamente, um aumento da rubrica despesas.
Por outro lado, o acerto das dotações a que se refere o Orçamento, cujo cálculo tem por base o salário mínimo nacional, tem também a sua razão de ser, atenta a variação do valor deste último, sendo certo que as verbas adstritas às dotações em causa são múltiplas e variadas, como é o caso dos montantes destinados ao pessoal de apoio aos grupos parlamentares, à assessoria aos Deputados, à subvenção para as campanhas eleitorais e aos partidos políticos representados na Assembleia da República.
Impõe-se também a inclusão do saldo de gerência de 1994, bem como a afectação das receitas directamente cobradas pelos serviços, tudo alterações ao Orçamento da Assembleia da República que merecem a nossa concordância, nomeadamente os critérios adoptados para a distribuição do saldo positivo da gerência de 1994 pelas dotações mencionadas.
Permita-me, especialmente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que faça referência à destinada à construção do parque de estacionamento subterrâneo e do bloco de gabinetes para Deputados, cujas obras estão previstas para os primeiros meses do próximo ano.
Por último, cumpre-me salientar que não existe qualquer encargo para o cidadão nem se verifica o aumento da despesa
Entende, pois, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista estarem reunidos os requisitos é pressupostos necessários para a aprovação por esta Câmara do Orçamento suplementar da Assembleia da República.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Não havendo mais inscrições, dou por encerrado o debate relativo ao 1 º Orçamento suplementar da Assembleia da República, cujo votação se realizará à hora regimental.
Srs. Deputados, como já se encontra na Sala o Sr. Presidente da Comissão Parlamentar de Ética, Sr. Deputado Mário Videira Lopes, dou-lhe a palavra para fazer a sua intervenção.

O Sr. Mário Videira Lopes (PS): - Sr. Presidente, as minhas desculpas por este li eira atraso, mas o facto é que a Comissão Parlamentar de Ética tem trabalhado sempre em equipa e fiz questão que esta intervenção que vou ler fosse aprovada, por unanimidade, por todos os seus membros. Daí que, dentro do consenso que todos procuramos, tenhamos tido de fazer algumas alterações, ligeiras embora, ao texto inicial, o que obrigou a novo envio do texto para dactilografar, tecido provocado este meu pequeno atraso. Apresento, pois, as minhas desculpas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Comissão Parlamentar de Ética foi empossada por S. Ex.ª o Sr. Presidente da Assembleia da República no passado dia 23 de Novembro.
Logo no dia 27, teve a sua primeira reunião. Desde então, decorreram até hoje apenas 24 dias.
Apesar de ser tão escasso ainda o tempo da sua existência, muito se tem falado e escrito entretanto sobre ela. As competências que a lei lhe atribui justificam certamente esse interesse por tudo aquilo que a Comissão faz ou não faz. Em causa está, afinal, a deontologia e a transparência da vida política portuguesa ao nível deste órgão de soberania fundamental da organização democrática do Estado que é a Assembleia da República e também alguns interesses particulares dos Srs. Deputados, seus membros.
É que tais interesses, sendo embora legítimos enquanto titulados por qualquer cidadão, podem todavia colidir com aqueles princípios. Em função da hierarquização dos valores, nesses casos colocar-se-á para os Srs. Deputados o dever de optarem entre a vida pública/política e a sua vida privada, sob pena de, se não o fizerem voluntariamente, a lei lhes impor o afastamento da primeira.
É, pois, neste campo da transparência da vida política portuguesa e dos seus mandatados interventores que a Comissão Parlamentar de Ética terá de actuar.
Ora, porque, em primeira linha e directamente, esta acção é relevante para os Srs. Deputados e porque a opinião pública está justificadamente atenta a ela, a forma mais digna e mais clara de se apresentar o resultado do trabalho desenvolvido até agora e também as orientações que irão reger a actividade futura nesta matéria seria fazê-lo desta tribuna. Por isso, em nome da Comissão a que tenho a honra de presidir, agradeço a V. Ex.ª, Sr. Presidente, e aos ilustres líderes dos grupos parlamentares desta Assembleia a oportunidade que nos concederam de assim nos expressarmos publicamente.
Mas, afinal, o que é a Comissão Parlamentar de Ética?
Com simplicidade, poderíamos dizer que se trata de uma comissão parlamentar de natureza muito específica, que surgiu com carácter perfeitamente inovador no âmbito desta Assembleia da República. Não é, porém, - uma comissão especializada permanente e igualmente não é uma comissão eventual de inquérito. Destas se distingue em vários aspectos, que não apenas no das suas competências.
Assim, enquanto para estas há muito estão definidos na lei os respectivos regimes jurídicos e os seus modos de funcionamento, sendo o seu elenco variável nas sucessivas legislaturas por deliberação do Plenário, no que toca à Comissão Parlamentar de Ética, há desde logo três características que lhe são próprias: a de que foi criada expressamente por lei; a de que a sua composição difere substancialmente de todas as demais comissões parlamentares; e a de que os seus membros gozam de independência no exercício das suas funções.
Só que, se a lei foca especialmente estas três vertentes, nada adianta, porém, quanto à forma como a Comissão se deve organizar internamente e quanto ao modo como deve exercer as suas competências, entre as quais, não esqueçamos, se conta a de verificar as situações que possam determinar o impedimento do exercício do mandato de Deputado. e, se assim for, implicarem a própria perda do mesmo mandato, cabendo-lhe pois, nesse sentido, instruir os respectivos processos. Estes não são, todavia, comparáveis aos que se desenvolvem nas comissões especializadas permanentes ou nas comissões eventuais de inquérito. Daí o primeiro problema que se colocou a esta Comissão Parlamentar de Estica: o de precisar as regras por que terá de orientar o seu funcionamento e a sua actividade.
Mas, depois, uma segunda questão se tornava evidente.
É que à Comissão compete também receber e registar as declarações de «interesses» dos Srs. Deputados e ainda dos Srs. Membros do Governo e, analisando-as, apreciar a sua correcção e, sobretudo., suscitar eventuais conflitos de interesses. Essas declarações de «registo de interesses» constituem, portanto e necessariamente, um

Página 551

22 DE DEZEMBRO DE 1995 551

dos elementos base do trabalho da Comissão. A lei determina que esse «registo» seja inscrito em «livro próprio», mas, todavia, não o criou nem o formulou. A Comissão teve, por isso, de se debruçar atentamente sobre estes problemas e outros de menor importância e de definir uma metodologia para o seu trabalho.
A primeira deliberação fundamental tomada neste âmbito foi a de que sem estar organizada e apetrechada interna e devidamente, sem dispor de um regulamento específico para o seu funcionamento e para a instrução dos processos que lhe cabem, sem definir o modelo da declaração destinado a registar os «interesses» dos Srs. Deputados e dos Srs. Membros do Governo, sem tornar aquele e esta públicos, sem conhecer, tão abstractamente quanto possível, as dúvidas que a legislação em causa suscitava, a Comissão não deveria avançar na apreciação de casos concretos. O objectivo desta deliberação era claro: visava generalizar e impessoalizar os casos da. sua competência, assentando critérios uniformes e conhecidos para evitar qualquer discricionariedade e proceder com toda a isenção e imparcialidade.
Consequentemente, a Comissão desencadeou três iniciativas correspondentes: primeira, convidar os Srs. Deputados a, se quisessem, exporem as dúvidas que porventura tivessem sobre ó alcance da lei; segunda, elaborar o seu regulamento; terceira, definir o modelo da declaração que há-de servir para o «registo de interesses».
Quanto àquele convite, foram muitos os Srs. Deputados que se dignaram responder-lhe. A todos agradecemos, já que, procedendo dessa maneira, contribuíram, relevante e dignamente, para a identificação dos problemas que a lei suscita. Nessa perspectiva, a Comissão ficou muito melhor habilitada para abordar e decidir aspectos concretos da instrução dos processos que lhe cabem e também para precisar aquilo que deve ser objecto do «registo de interesses».
Quanto ao regulamento da Comissão, três casos mereceram a especial atenção dos seus membros, que sobre eles mantiveram aprofundado debate.
Vejamos o primeiro caso: para além das competências definidas na lei, quais os poderes da Comissão para bem exercer aquelas? Sob este prisma, duas respostas: a de que a Comissão deve ter o poder de solicitar a qualquer entidade as informações que entenda necessárias para o desenvolvimento do seu trabalho; a de que, em casos de dúvidas de natureza estritamente jurídica, a Comissão deve dirigir-se ao Sr. Presidente da Assembleia da República, com vista à obtenção dos adequados pareceres junto das competentes instâncias da mesma Assembleia da República.
Quanto ao primeiro, embora a lei não o preveja, esse poder de solicitar informações terá de considerar-se implícito no âmbito das competências atribuídas à Comissão.
Quanto ao segundo, resolveu-se a questão de saber se a Comissão deveria esclarecer dúvidas junto de entidades externas à Assembleia da República ou esclarecê-las apenas no âmbito deste órgão de soberania.
A nossa deliberação assenta na consideração de que esta Comissão, embora subordinada à lei, também é política, pelo que, logo por aí, não faria sentido recorrer a entidades exteriores à Assembleia para resolver ou mesmo apenas opinar sobre casos da sua competência, o que, de resto, nunca teria qualquer valor vinculativo.
Se a Comissão foi expressamente constituída no âmbito da Assembleia da República, se o «registo de interesses» foi expressamente criado, também na Assembleia da República, se as incompatibilidades e impedimentos determinam a suspensão ou a perda de mandato, que só à Assembleia da República cabe declarar, é evidente que o esclarecimento de dúvidas que tenham implicações em qualquer dos casos referidos deve ser solicitado às instâncias próprias da mesma Assembleia da República, que as tem.
Ainda no âmbito da elaboração do regulamento, outro dos aspectos especialmente debatidos foi o da forma como se deve assegurar o que poderíamos chamar «direito de audição» a qualquer interessado directo nos casos a apreciar por esta Comissão.
A solução encontrada foi a seguinte: os Deputados interessados podem sempre, por sua iniciativa ou por convocação do Presidente da Comissão, ser ouvidos para esclarecimento dos factos e dos motivos subjacentes às dúvidas e/ou aos comportamentos em causa, sendo que esta diligência, em princípio, é de natureza oral e os Srs. Deputados podem ainda fazer-se acompanhar por quem entenderem para melhor esclarecimento da situação. No entanto, se preferirem, poderão apresentar por escrito uma exposição ou pareceres sobre o assunto que estiver em causa, bem como requerer que a Comissão proceda a qualquer diligência complementar.
Assim, ficam; pois, perfeitamente asseguradas todas as garantias de defesa constitucionalmente instituídas como princípio inviolável.
Quanto às primeiras, admite-se perfeitamente a reserva na sua abordagem e no seu tratamento. Quanto às segundas, resolveu-se abrir à comunicação social a audição ou exposição dos interessados e a reunião final da Comissão destinada à discussão e votação do relatório, determinantes da decisão a proferir.
Sobre o modelo da declaração destinada ao «registo de interesses» houve que esclarecer quais os factos que do mesmo devem constar. E a primeira constatação foi esta: teleologicamente, a lei foi estruturada no sentido de atribuir primacial relevância a todos os actos e actividades susceptíveis de gerar incompatibilidades, impedimentos ou conflitos de interesses. Só isto, aliás, tem importância determinante para a transparência da vida política, tal como está desenhada na nova Lei n.º 24/95, de 18 de Agosto.
Aspectos patrimoniais específicos ou rendimentos dos Srs. Deputados ou dos Srs. Membros do Governo são objecto de tratamento noutras leis, designadamente nas que regulamentam a declaração sobre o valor do património e os rendimentos dos titulares de cargos políticos, que estes têm de entregar no Tribunal Constitucional. Seria, pois, redundante a duplicação de declarações com o mesmo ou muito aproximado conteúdo. Logo, nesta perspectiva e sinteticamente, do «registo de interesses» devem constar todos os factos que tenham ou possam ter relevância para os efeitos de incompatibilidades, impedimentos ou conflitos de interesses. Nestas condições, a Comissão tratou de elaborar o modelo de declaração em referência, tentando precisar e/ou completar os factos que a lei nele manda em especial inscrever. É o que consta das notas explicativas introdutórias de cada uma das rubricas por que se desenvolve o modelo elaborado.
Um caso houve, porém, que mereceu profundo debate: como conciliar a exigência feita pela lei de que no «registo de interesses» devem ser inscritas as entidades a quem sejam prestados serviços remunerados de qualquer natureza com o sigilo profissional que outras leis impõem a certos actos ou actividades?
Aliás, este problema é tanto mais pertinente quanto é sabido que a Lei n.º 24/95 não exige exclusividade quanto ao exercício do mandato de Deputado, antes admite o contrário ao estatuir

Página 552

552 I SÉRIE - NÚMERO 19

que «os Deputados podem exercer outras actividades, desde que não incompatíveis» com os oito tipos de situações que a mesma lei expressa e taxativamente fixa.
Ora, como o «registo de interesses» não pode criar novos impedimentos, mesmo que por via indirecta, - como resolver, portanto, esta questão do sigilo que afecta várias profissões e que o Deputado pode legalmente exercer em regime de acumulação, como acontece com os médicos, os advogados, suponho que também com os revisores oficiais de contas e, eventualmente, outras?.
Para toda esta problemática a Comissão adoptou a solução que passo a expor.
A Lei n.º 24/95 deve ser cumprida pelos destinatários, na perspectiva em que a mesma lei se coloca. Assim sendo, no «registo de interesses» devem inscrever-se todas as entidades a quem o Deputado pessoalmente preste serviços remunerados de qualquer natureza, com carácter de permanência ou pontualmente, e que sejam susceptíveis de gerarem conflitos de interesses nos termos daquela lei. Porém, quando tais serviços sejam prestados no exercício de actividades sujeitas a sigilo profissional, o declarante obterá o consentimento da entidade a quem o presta, para a identificar, podendo admitir-se que a sua declaração seja feita, nesta parte, em documento autónomo, a .tratar reservadamente pela Comissão Parlamentar de Ética. Desta maneira, o controlo que a esta cabe fazer fica, pois, perfeitamente assegurado e não se viola o sigilo profissional.
Problema é, ainda, o de que a lei não fixa prazo algum para a apresentação da declaração destinada ao «registo de interesses».
Definido e aprovado que está por esta Comissão o modelo dessa declaração, deliberou-se que o prazo para a sua entrega por cada destinatário será de 15 dias a contar da data em que esse modelo esteja impresso e apto a ser distribuído, o que se prevê aconteça a partir do próximo dia 3 de Janeiro.
Por último, Sr. Presidente, Srs. Deputados, a Comissão Parlamentar de Ética, como resulta do exposto, avançou na escalpelização de matérias e na solução de problemas que, afinal, não respeitam a ela, até porque não teve qualquer interferência na feitura da lei, cabendo-lhe apenas aplicá-la.
Por isso, porque se trata de assuntos que interessam à própria Assembleia da República, enquanto órgão de soberania que se quer cada vez mais dignificado, e também a todos os Srs. Deputados, seus membros, que se querem cada vez mais insuspeitos no exercício da acção política, permita-me, Sr. Presidente, que lhe faça entrega do modelo que esta Comissão elaborou e aprovou para nele serem inscritas as declarações destinadas ao «registo de interesses». Como referi, dele constam todas as notas explicativas segundo as quais, em nosso entender, se deve proceder ao seu preenchimento.
A solicitação que faço, em nome da Comissão Parlamentar de Ética, é que V. Ex.ª apresente com urgência este modelo aos Srs. Líderes dos grupos parlamentares para que, em Conferência de Líderes ou neste Plenário, se assim o julgarem preferível, o mesmo modelo possa ser ratificado ou rejeitado, antes de se passar à sua distribuição pelos destinatários e à tramitação subsequente.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Presidente da Comissão Parlamentar de Ética. Agradeço-lhe que me forneça não apenas o modelo que referiu como também uma cópia desta sua intervenção.
Srs. Deputados, vamos passar à discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n. os 28/VII - Sobre o regime de competências e meios financeiros das freguesias com vista à sua dignificação e fortalecimento (PCP) e 42/VII - Atribuições e competências das freguesias (PS). Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr: Presidente, Srs. Deputados: Os projectos de lei que vamos discutir fazem parte de um núcleo mais vasto, do qual destaco, em particular, o projecto de lei sobre o regime de exercício de mandato a tempo inteiro por parte de membros das juntas de freguesia, e têm, naturalmente,- de ser vistos em conjunto. Por isso, independentemente do debate de hoje, chamamos a atenção da Câmara para a importância e o carácter complementar do debate agendado para o próximo dia 3 de Janeiro, que permitirá caminhar não apenas para o reforço das atribuições e competências bem como das verbas das autarquias mas também para a criação de condições a fim de usar da melhor maneira os meios que vão ser reforçados.
As nossas propostas têm a ver com uma grande luta que se veio a desenvolver ao longo de muito tempo bem como com a experiência concreta, muito positiva, vivida em vários municípios do País. em particular naqueles onde há maioria CDU. Quando propomos, por exemplo, um mínimo de 20% da verba prevista no Fundo de Equilíbrio Financeiro para despesas correntes e ouvimos dizer, como aconteceu no passado com o - PSD, que é uma proposta demagógica e irrealista -, refiro-me a uma intervenção do Sr: Deputado Manuel Moreira -,temos em conta o facto de grande parte dos municípios de Portugal já estarem, neste momento, a transferir verbas de 30 e 40%, conjuntamente com protocolos de delegação de atribuições e competências. Essas transferências estão, de facto, a ser efectuadas com grande êxito e vantagem para o poder local e para as populações.
Por outro lado, quando propomos um elenco de atribuições e competências alargado, temos em conta as várias propostas da Associação Nacional de Freguesias, designadamente os encontros e congressos realizados - aliás, queria aproveitar para saudar essa associação e respectiva luta por ela travada -, bem como as várias iniciativas e debates promovidos pelo próprio Partido Comunista Português acerca do estatuto das freguesias.
A verdade é que nesta matéria tivemos um ponto de partida verdadeiramente lamentável. Refiro-me ao facto de estar previsto na Constituição, por um lado, um nível autárquico - as regiões -,que nunca ,foi criado, por outro, um nível municipal, que se foi fortalecendo, embora sofrendo grandes ataques da direita ao longo do tempo, e, por outro, um nível de poder local - exactamente o que está mais perto das populações - verdadeiramente constituído por autarquias de. segunda categoria.
Neste âmbito, talvez valha a pena lembrar o que, ainda em 1986, escrevia o Professor Diogo Freitas do Amaral, no Curso de Direito Administrativo, ministrado na Faculdade de Direito de Lisboa: «Deve reconhecer-se, em abono da verdade, que a importância das freguesias, enquanto autarquias locais, na nossa Administração Pública é escassa, dispõe de poucos meios humanos, de pouquíssimos meios financeiros e praticamente de nenhuns meios técnicos. São unidades administrativas que se, arrastam penosamente numa vida difícil, somente feita de boas vontades e de dedicação cívica. No fundo, as freguesias não passam, no nosso sistema, de meras delegações de municípios e vivem praticamente dos subsídios que as câmaras lhes possam dar. Entretanto, quase todas as funções das freguesias desapareceram». Seguia-se, depois, uma extensa lista de

Página 553

22 DE DEZEMBRO DE 1995 553

atribuições que foram suprimidas ao longo do tempo. E concluía: «Nas autarquias de. fraca importância e significado, mais tarde ou mais cedo, o problema da sobrevivência da freguesia como autarquia local terá de ser encarado».
A verdade é que, entretanto, houve um grande movimento que abalou o País e provocou a revisão de muitas posições nesta matéria. Aliás, até o próprio Professor Diogo Freitas do Amaral reviu a posição defendida e participou, designadamente, num colóquio promovido pela ANAFRE, em 1989, rectificando o próprio ensino que vinha ministrando na Faculdade de Direito de Lisboa e na Universidade Católica.
No entanto, podemos dizer que, apesar de todas estas movimentações, apesar dos congressos da ANAFRE, apesar da petição da Associação Nacional de Freguesias, aqui apresentada em 1990, apesar da manifestação feita à porta desta Assembleia, apesar da Carta Europeia de Autonomia Local e, sobretudo, apesar da Constituição da República, que não prevê autarquias de primeira e de segunda, apesar de tudo isso, o PSD manteve-se inteiramente surdo a este grande movimento, tal como se manteve surdo com os resultados reconhecidos em relação a grande parte dos movimentos importantes que se desenvolveram no País. A arrogância e a auto-suficiência são péssimas conselheiras e, neste caso, por um lado, assistimos à movimentação das freguesias, à movimentação do País real, incluindo muitos eleitos do próprio PSD, e, por outro, à inoperância do PSD nesta Câmara, bloqueando as iniciativas alheias e não tomando iniciativas próprias.
Para o efeito, o PSD serviu-se de um conjunto de pretextos que entendo serem verdadeiramente peregrinos.
Defendeu, nomeadamente, a ideia de que não poderiam ser aprovadas estas medidas porque a revisão do Decreto-Lei n.º 100/84 não deveria ter carácter pontual, como se não houvesse todos os dias introdução de alterações pontuais a diplomas e, além do mais, alterações que podem envolver um significado profundo na Administração Pública e na construção de uma democracia participativa em Portugal!
Afirmou também que os protocolos dos municípios com as freguesias, para delegação de competências seriam suficientes nesta matéria. De facto, esses protocolos foram importantes, mas o que se passou, em grande parte do País, foi que os municípios andaram para a frente em concertação com as freguesias e estas continuaram a arrastar a tal vida penosa, a passarem atestados e a fazer o recenseamento eleitoral, com os eleitos, tanta e tanta vez, a deitarem-se às 3 e 4 horas da manhã porque, para além da actividade profissional, tinham de passar o tempo que devia ser dedicado ao descanso e à família a tratar dos assuntos colectivos.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, afirmou-se que a revisão dos meios financeiros das autarquias obrigaria à revisão global da Lei das Finanças Locais. Ou seja, tudo pretextos para, insisto, bloquear as iniciativas alheias e não tomar iniciativas próprias, travando todo este processo de dignificação do poder local.
Neste momento, esperamos quê os projectos de lei em debate sejam aprovados na generalidade e rapidamente examinados na especialidade, a fim de que, finalmente, seja possível estabelecer a justiça que os eleitos das freguesias esperam há tanto tempo e, em resultado, aumentar a participação dos cidadãos na vida administrativa, bem como a capacidade de resposta aos problemas locais.
Naturalmente, temos divergências pontuais em relação ao projecto de lei do PS. Por exemplo, entendemos que a experiência portuguesa aponta para que a parte do Fundo de Equilíbrio Financeiro destinado a despesas correntes deva ser da ordem dos 20% e não dos 15%, bem como que algumas atribuições propostas podem ser excessivas se transferidas para todas as freguesias sem excepção, particularmente na área da saúde, atribuições essas que, de resto, até agora não foram reivindicadas pela Associação Nacional de Freguesias. Contudo, estes são problemas de especialidade, de carácter pontual, e que, julgamos, poderão ser rapidamente resolvidos.
Por isso, apelamos à Câmara, em particular aos Deputados membros da Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente, no sentido de que se empenhe num trabalho célere e de qualidade para que, finalmente, se faça justiça às freguesias, ao poder local que está mais perto das populações.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Barbosa de Oliveira e Jorge Rato.
Tem a palavra o Sr. Deputado Borges de Oliveira.

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Sá, a questão que quero colocar prende-se com o regime de pessoal previsto no projecto de lei n.º 28/VII. De facto, os meios financeiros das juntas de freguesia são extremamente parcos e, embora o vosso projecto de lei preveja a transferência de pessoal com a anuência dos trabalhadores, não é claro sobre quem vai suportar depois os encargos com os vencimentos desses trabalhadores. Gostaria, pois, que nos esclarecesse melhor essa matéria.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Sá, como há mais oradores inscritos para pedidos de esclarecimento, pergunto se deseja responder já ou no fim.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Respondo no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Rato.

O Sr. Jorge Rato (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, sendo a primeira vez que intervenho nesta Câmara, quero saudar, na pessoa do Sr. Presidente e do democrata Almeida Santos, toda a Câmara.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Deputado Luís Sá, a questão que vou colocar tem a ver com uma matéria que me parece omissa no projecto de lei apresentado por VV. Ex. as e que se refere aos benefícios dos funcionários e agentes das freguesias relativamente à ADSE. Gostava de saber se, nesta matéria, o Grupo Parlamentar do Partido Comunista está de acordo com a solução proposta no projecto de lei do Partido Socialista, no que diz respeito ao alargamento dos benefícios da ADSE do pessoal da administração central do Estado para os funcionários e agentes das freguesias.
Uma outra questão tem a ver com a celebração dos protocolos, mais propriamente com o artigo onde se refere que os mesmos têm de ser aprovados pelas assembleia de freguesia e pela assembleia municipal. Ora, entende o Par-

Página 554

554 I SÉRIE - NÚMERO 19

tido Comunista que essa celebração dos protocolos deve ser feita, aliás à semelhança do que tem acontecido na Câmara Municipal de Lisboa, pela aprovação de um protocolo genérico, que depois venha a ser celebrado pontualmente por cada uma das freguesias e quanto à componente assembleia de freguesia que ele tenha de ser ratificado exactamente nos termos em que foi assinado pela junta de freguesia, ou entende que esta aprovação pela assembleia municipal terá de ser feita ponto por ponto, isto é, protocolo a protocolo? É que, a ser assim, prevejo que, por exemplo, no funcionamento da Assembleia Municipal de Lisboa, teríamos alguma dificuldade processual de ratificação das centenas de protocolos que têm sido celebrados pelo executivo camarário nos últimos dois mandatos.

O Sr. Presidente: - Para responder, querendo, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, agradeço as questões que colocaram.
Quanto ao problema do regime de pessoal e de quem suporta os custos, a freguesia, naturalmente, é uma pessoa colectiva pública, detém autonomia financeira e um trabalhador ao seu serviço é pago por ela própria. O grande problema, a meu ver, é a resolução da questão financeira. E a questão financeira, Sr. Deputado, pode e deve resolver-se, garantindo uma transferência de maior verba do que aquela que o PS propõe, isto é, a verba que o PCP propõe é de 20% e não de 15%, como sabe, mas se não chegar e os trabalhadores forem fundamentais para exercerem competências transferidas, o município, naturalmente, poderá e deverá transferir uma verba adicional. Aliás, como tive oportunidade de dizer, há muitos municípios que, neste momento, já transferem não 10% nem 20% mas 40% e trata-se de uma experiência que se revelou altamente positiva para permitir resolver esta questão.
Estamos inteiramente abertos a qualquer outra solução que o Grupo Parlamentar do PS queira propor- e quero sublinhar bem este aspecto -, designadamente o pagamento a partir do Orçamento do Estado ou qualquer outra proposta que, eventualmente, queiram aventar.
No que diz respeito ao problema dos benefícios dos trabalhadores - questão colocada pelo Sr. Deputado Jorge Rato -,creio que, em muitos anos de intervenção nesta Câmara e fora dela, nunca ninguém terá visto o Partido Comunista contrariar qualquer medida que seja prejudicial aos trabalhadores. Tudo reside em' garantir, simultaneamente, que o ponto de vista do poder local seja devidamente salvaguardado nessa matéria e, por essa via, não teremos, com certeza, dificuldade em entender-nos.
Quanto à questão da celebração de protocolos, creio que o núcleo fundamental do nosso projecto de lei vai no sentido de substituir a ideia pura e simples da delegação de competências, que, tradicionalmente, está ligada às ideias de desconcentração e, inclusive, de hierarquia e não de descentralização, por uma ideia de acordo entre duas partes. Trata-se de um aspecto que creio ser, efectivamente, inovador e tem a ver com a prática que, mesmo à margem da lei, foi já executada por muitas autarquias locais, ao longo dos últimos tempos. Muitos municípios não resolveram unilateralmente delegar competências, antes, pelo contrário, negociaram e as freguesias aceitaram celebrar protocolos, mesmo se depois isto teve de ser formalizado nos termos estritos do Decreto-Lei n.º 100/84 como uma delegação de competências de tipo tradicional.
A nossa proposta é no sentido de que a prática dos municípios seja agora consagrada em lei, pois parece-nos que dignifica as freguesias e os próprios municípios e, além disso, é urna prática de negociação e concertação e não de actuação unilateral, o que a torna vantajosa.
Neste plano, há municípios do País com duas, três, quatro e cinco freguesias e que podem ter, nesta matéria, uma determinada forma de actuar, mas há outros com 53 freguesias e que, com o nosso inteiro acordo, têm a experiência positiva do município de Lisboa nesta matéria. Creio que são práticas a que devemos estar abertos, assim como temos de estar atentos ao que tem estado a decorrer na própria vida, não criando, com esquemas legais espartilhantes, dificuldades em relação àquilo que a vida tem mostrado ser positivo, criativo e favorável às populações.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão agendadas votações para as 18 horas, pelo que peço às direcções das diferentes bancadas para convocarem os Deputados que estão a trabalhar noutros locais da Assembleia.
Entretanto, dou a palavra ao Sr. Deputado José Junqueiro, para apresentar o projecto de lei do Partido Socialista e, no fim da sua intervenção, procederemos à realização das votações.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei que o Partido Socialista hoje apresenta, sobre as atribuições e competências das freguesias, encerra um ciclo de jejum e de desprezo, funcional e político, a que o PSD votou o poder local, em geral, e as freguesias, em particular.
Através do vazio legislativo assim gerado, do ambiente de intimidação «institucionalizado», da força irracional de um poder absoluto, o PSD tentou colocar as freguesias e os seus titulares numa situação de inaceitáveis subalternidade e dependência, incompatíveis, aliás, com o exercício democrático próprio a um Estado de direito moderno e europeu.
Durante anos longos e intermináveis, a Associação Nacional de Freguesias, que saúdo e está aqui representada, reflectida na pluralidade do seu espectro político, tentou pelo seu esforço de diálogo pôr termo a tão decepcionante comportamento do passado Governo. Os partidos políticos que acompanharam esse mesmo esforço, através de iniciativas legislativas nesta Assembleia da República, não tiveram melhor sorte. Foram, permanentemente, impedidos pelas mesmas pessoas e pelo mesmo partido, que hoje, certamente, poderá vir aqui dizer que o agora proposto é pouco ou insuficiente. Nada mais natural, para quem ainda não acordou da realidade eleitoral recente e continua à pensar que o País não está atento ou esqueceu a teia enorme de interesses e anacronismos que hão-de transparecer nesta Casa, em tempo breve.
Terminará hoje o culto centralista da relação com o poder local. Dirá o PSD, eventualmente, que se trata de legislação avulsa, feita à pressa, que deveria inserir-se num contexto legislativo mais vasto, ou qualquer outra argumentação de um PSD a tropeçar em buracos, encalhado nas portagens, refém de um candidato à Presidência da República que dele se divorciou há 10 meses e que dele, mais não quer do que os seus serviços para uma estratégia pessoal, muito diferente da que o País real necessita e merece.
Que ninguém se esqueça,. que todos os presidentes de junta se lembrem, que o ex-Primeiro-Ministro, candidato à Presidência da República, é exactamente o mesmo que, durante 10 anos, negou aquilo que lhes pertence por direi-

Página 555

22 DE DEZEMBRO DE 1995 555

to próprio: o direito ao exercício digno das suas funções e o direito a uma melhor qualidade de vida das populações.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Passemos ao projecto de lei.
Para além das atribuições já cometidas às autarquias pelo Decreto-Lei n.º 100/84, as freguesias são acrescidas de mais competências próprias, nomeadamente no que toca à segurança e ao ordenamento rural, o qual se traduz pela capacidade de intervenção nos espaços verdes, nas propostas de planeamento local, na elaboração de projectos de parcelamento e loteamento do seu domínio patrimonial, de projectos de licenciamento para ocupação da via pública e, entre outros, a título facultativo, de projectos de loteamento e licenciamento de obras particulares.
No âmbito ou no capítulo da segurança, as freguesias passam a poder participar nos conselhos municipais de segurança, a colaborar com a Polícia Municipal no âmbito do plano de acção municipal de segurança, bem como nos sistemas locais de protecção civil e de combate aos incêndios.
Outro aspecto importante são as competências administrativas, que visam simplificar a vida das populações locais e, até, aliviar os municípios de alguns excessos burocráticos, facto que, certamente, convém a ambas as partes. Refere-se também, a título de exemplo, o licenciamento de publicidade afixada directamente nas montras e nas portas dos estabelecimentos comerciais, o licenciamento e registo de velocípedes e veículos de tracção animal ou licenças de caça, entre outros.
Ao nível das competências delegadas, é permitido às freguesias realizarem investimentos cometidos aos municípios, mediante protocolos onde deverão constar, para além dos direitos e obrigações das partes, as condições financeiras e o apoio técnico a assegurar pelo município, assim como também é vinculativo que as competências a delegar constem do plano de actividades e do orçamento da respectiva câmara municipal. O estabelecimento dos requisitos exigíveis e das formalidades em causa, de uma forma clara e objectiva, visa clarificar, em definitivo, o regime da delegação de competências, evitando, como é óbvio, alguns casos de abuso, conhecidos por todo o País, que, ao abrigo da delegação de competências, mais não são do que transferências de responsabilidades dos municípios para as freguesias, em flagrante violação de alguns dispositivos legais.

O Sr. José Leitão (PS): - Muito bem!

O Orador: -- Também no que respeita ao regime financeiro, o projecto do PS teve a preocupação de deixar expresso que, na celebração de protocolos, e por ser esse um dos requisitos essenciais para a sua celebração, devem constar quais as condições financeiras para a concretização dessa delegação de competências e que irá assegurar o seu cabal exercício pelas freguesias, bem como permitir que as verbas adstritas à realização dos investimentos, ao abrigo dos protocolos, constituam receitas próprias.
Para as verbas provenientes do FEF, o PS propõe o aumento de transferências para o limite de 15%, sendo que, no nosso entender, este aumento de 50% é o possível nas circunstâncias actuais. Aliás, convém reflectir que os 15% poderiam representar mais autonomia se o próprio FEF fosse igualmente mais elevado. Esperemos que assim venha a ser no futuro, de modo progressivo e de acordo com os recursos que o País for capaz de ir gerando.
Igualmente importante é a possibilidade agora consignada às freguesias de poderem aceder ao crédito nas mesmas condições em que tal já sucede nos municípios.
Quanto ao regime do pessoal, o projecto de lei do PS permite que, ao abrigo das delegações de competências, sejam transferidos trabalhadores dos municípios para as freguesias, sem prejuízo dos seus direitos e regalias. Esses trabalhadores continuam ainda a pertencer aos quadros de pessoal do município. e a ser por este remunerados. O mesmo sucede com os encargos da contribuição para o regime de segurança social, que continuarão a ser suportados pela câmara respectiva.
Relevante é ainda a atribuição, aos funcionários e agentes das freguesias, do mesmo regime de benefícios que, aos funcionários da administração central do Estado, é concedido pela ADSE.
Mais uma vez, o projecto do PS é meritório, porque vai ao encontro das preocupações manifestadas pelas autarquias no sentido da simplificação e desburocratização dos procedimentos administrativos, como sucede com o caso presente, em que o PS vem propor a eliminação da exigência a visto prévio, do Tribunal de Contas, dos contratos celebrados com freguesias que tenham por objectivo o exercício de funções ou a prestação de serviços, o que, para além de simplificar este procedimento, permitirá aos órgãos autárquicos contratar pessoal que possa, desde logo, a partir do momento da sua contratação, realizar tarefas em prol do desenvolvimento da respectiva freguesia.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Com o presente diploma, o PS pretende ver consagrada uma velha aspiração das freguesias: o livre associativismo de freguesias em regime de direito público, associações estas que devem, no entanto, respeitar a complementaridade territorial e geográfica, tendo como limite a área dos respectivos municípios, sempre na prossecução dos interesses comuns e específicos das respectivas populações.
Para além do livre associativismo, o PS propõe a abertura das freguesias à participação em empresas de âmbito municipal - por razões óbvias que têm a ver com um conhecimento muito concreto e profundo dos problemas das respectivas populações -, tal como também não vê inconvenientes, antes, pelo contrário, em que as freguesias possam constituir empresas próprias para a prossecução de acções no estrito limite das suas atribuições e competências.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este projecto é o contributo do Partido Socialista para uma maior eficácia do poder local ao nível das freguesias, para uma melhor qualidade de vida das populações, para uma inelutável dignidade dos titulares dos órgãos autárquicos e um réquiem à política governativa da indiferença que Cavaco Silva exerceu sobre o poder local, durante 10 anos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado José Junqueiro, os Srs. Deputados Álvaro Amaro, Luís Sá e Manuel Moreira. Ser-lhes-á dada a palavra depois das votações.
A primeira votação a que temos de proceder é a do projecto de deliberação n.º 7/VII - Veda o uso de telefones celulares no espaço do Plenário e das comissões da Assembleia da República, no decurso das respectivas reuniões, apresentado pelo Sr. Presidente da AR. O texto deste

Página 556

556 1 SÉRIE - NÚMERO 19

projecto de deliberação foi distribuído e, por isso, tenho a esperança legítima de que dispensem a sua leitura.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, a minha interpelação tem a ver com a última votação agendada, que é a votação final global da ratificação n.º 2/VII. Não sei se o Sr. Presidente quer que a faça já ou se...

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado. Já que está de pé, não vale a pena levantar-se duas vezes.

O Orador: - Sr. Presidente, pergunto à Mesa se interpreto bem que o que será votado, em votação final global, é um decreto de alterações ao Decreto-Lei n.º 337/90, decreto esse que terá um artigo único e deverá dizer mais ou menos o seguinte: «é aditado ao artigo 64.º do decreto-lei um novo número, que é o seguinte: (...)».
Ou seja, será sensivelmente isto que será votado e devidamente redigido como redacção final ou será coisa diferente?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a minha interpretação pessoal é a seguinte: o texto que vem da comissão não está rigorosamente intitulado e, em meu entender, o que estará em votação dentro de breves momentos é uma lei de alteração da lei anterior. Portanto, o facto de se votar a favor ou contra este artigo único não significa que se reveja a votação que se fez relativamente ao decreto-lei alterado, pois o Regimento refere «ficando o decreto-lei modificado nos termos da lei na qual elas se traduzam». Portanto, há uma nova lei e é assim que vou interpretar a votação, pelo que, depois, pedirei aos serviços que alterem o texto em conformidade, aquando da redacção final.
Se dispensam a leitura do projecto de deliberação n.º 7/VII, e espero que sim, sobre a proibição do uso de telefones celulares no Plenário e nas comissões da Assembleia da República, com o qual me congratulo, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Felicito os Srs. Deputados pela aprovação deste projecto de deliberação.
Vamos agora votar o 1.º Orçamento Suplementar da Assembleia da República para 1995.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Vamos agora proceder à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 115/VI - Manutenção na ilha de Santa Maria do Centro de Controlo Oceânico (ALRA).
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Lírio de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, quero apenas informar a Mesa de que, em face de uma proposta de lei simples, com dois artigos, que mereceu o consenso ou, pelo menos, uma larga maioria nesta Casa, pela nossa parte, existe disponibilidade para procedermos à sua votação integral na generalidade, na especialidade e final global, se, por acaso, houver acordo de todas as bancadas. Entendemos que não se justifica a sua baixa à comissão.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, quero apenas dizer que, pela nossa parte,' estamos de acordo. Se merecer o consenso da Câmara, poderemos fazer as três votações simultaneamente.

O Sr. Presidente: - Acabo de tomar conhecimento de que as restantes bancadas estão de acordo com essa votação, pelo que vamos passar à discussão - e espero que seja «não discussão» - na especialidade.
Uma vez que ninguém se inscreve, vamos votar integralmente a proposta de lei n.º 115/VI, na generalidade e na especialidade.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Vamos agora proceder à votação final global da alteração, apresentada pelo PS, e aprovada pela Comissão de Economia, Finanças e Plano, ao Decreto-Lei n.º 231/95, de 12 de Setembro, que altera o Decreto-Lei n.º 337/90, de 30 de Outubro (Aprova a Lei Orgânica do Banco de Portugal) [ratificação n.º 2/VII (PS)], com o entendimento que referi há pouco sobre aquilo que se aprovará ou desaprovará.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, peço desculpa, mas creio que ainda nos falta uma votação...

O Sr. Presidente: - Tem toda a razão. A velocidade que estamos a imprimir aos trabalhos é muito louvável, mas não deve ser tão excessiva que «coma» alguma das fases da votação.
Falta realizar a votação final global da proposta de lei n.º 115/VI, a qual já foi votada na generalidade e na especialidade.
Vamos votar, Srs. Deputados.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Relativamente à alteração ao Decreto-Lei n.º 231/95, de 12 de Setembro [(ratificação n.º 2/VII (PS)], não há lugar a discussão, uma vez que ela j5 foi feita em sede de comissão e suponho que devem estar cientes do texto da alteração, pelo que não me parece necessária a sua leitura.
Vamos, então, proceder à votação final global da alteração, apresentada pelo PS, e aprovada pela Comissão de Economia, Finanças e Plano, ao Decreto-Lei n.º 231/95, de 12 de Setembro, que altera o Decreto-Lei n.º 337/90, de 30 de Outubro (Aprova a Lei Orgânica do Banco de Portugal) [ratificação n.º 2/V1I (PS)].

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS e abstenções do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes.

Srs. Deputados, informo que proposta de substituição, apresentada pelo PCP, relativa ao Decreto-Lei n.º 231/95, de 12 de Setembro, que altera o Decreto-Lei n.º 337/90, de 30 de Outubro (Aprova à Lei 'Orgânica do Banco de Portugal) [ratificação n.º 1lVII (PCP)], foi rejeitada na especialidade, razão por que, nos termos do Regimento, o respectivo processo de ratificação se considera caducado. Portanto, não temos que nos pronunciar sobre ele.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos retomar a discussão dos projectos de lei n.ºs 28 e 42/VII.

Página 557

22 DE DEZEMBRO DE 1995 557

Estão inscritos, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado José Junqueiro, os Srs. Deputados Álvaro Amaro, Luís Sá, Manuel Moreira e António Pedras.
Tem a palavra Sr. Deputado Álvaro Amaro.

O Sr. Álvaro Amaro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Junqueiro, como primeira nota, gostaríamos de deixar bem claro, na discussão destes diplomas, que o Grupo Parlamentar do PSD manifesta a sua total disponibilidade para trabalhar no sentido do reforço do poder local, no caso concreto das freguesias.
Como segunda nota, entendemos que esse trabalho deve ser feito em diálogo com as respectivas associações, quer com a Associação Nacional de Municípios Portugueses, quer com a ANAFRE.
Como terceira nota; queremos que esse diálogo seja feito num âmbito alargado, tanto mais que se trata de um conjunto de diplomas que, de algum modo, têm que ver com a organização administrativa do Estado. Recordo que o Partido Socialista propôs, e a sua tese venceu, que, em seis meses, daria uma volta a essa organização administrativa do Estado, ou seja, apresentaria a esta Câmara uma proposta de lei de regionalização do País. De modo que, embora querendo trabalhar afincadamente com todos os grupos parlamentares, com as associações, não podemos correr o risco de estar a aprovar estes diplomas de robustecimento do poder local. É que se o Partido Socialista viesse a cumprir a sua promessa, então, estariam desactualizados porque era preciso fazer nova legislação para a outra autarquia de nível regional.
Quarta e última nota, Sr. Deputado José Junqueiro - e faço-a com particular tristeza - , o senhor fez o discurso, e bem, de apresentação do vosso projecto de lei, cumpria-lhe fazer isso. Mas - e os senhores não conseguem disfarçar- o que o senhor quis fazer foi uma súplica à direcção da ANAFRE de apoio à candidatura do Dr. Jorge Sampaio. Demonstrou aqui a vossa pressa de apresentação destes projectos, o que é lamentável. Fê-lo no início e no fim da intervenção. O que achamos, sempre achámos, aliás, foi-nos dito pela ANAFRE e nós acreditamos, por isso é que não foi bonito, nem a ANAFRE vai permitir, é que o Partido Socialista, agora no poder, se quer apropriar da ANAFRE e, até ao dia 14, a troco disto, fazer-lhe, no fundo, a tal súplica de apoio à candidatura do Dr. Jorge Sampaio!
Os autarcas, presidentes de juntas, sabem muito bem, no terreno, aquilo que hão-de defender, de que lado hão-de estar, e não têm que misturar, e não misturam, a defesa de causas políticas - e é esta a que está em causa até ao dia 14 - com aquilo que lhes interessa e que também interessa a todos nós aqui, na Assembleia, que é tudo fazer para robustecer e dignificar o poder local.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem apalavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Álvaro Amaro, não gostaria que saísse daqui triste e queria lembrar-lhe que também disse aqui algumas coisas que, eventualmente, contribuirão para a sua alegria e contentamento, nomeadamente a disponibilidade que os senhores manifestaram para o reforço do poder local. Lembro que há cinco anos atrás, VV. Ex.as chumbaram aqui estas coisas também ao abrigo da mesma argumentação, dizendo que era preciso uma coisa mais global, que não seria bem assim, etc. Cinco anos, Sr. Deputado! Está disponível agora para colaborar?! Penso que isto é uma evolução, que registo com agrado!
Depois, falou no diálogo com as associações, aquele mesmo diálogo que V. Ex.ª e o seu partido sempre recusaram. Mas agora, fruto desta minha intervenção, está plenamente habilitado para começar a dialogar - outro motivo de contentamento para V. Ex.ª.
Quis ainda falar num diálogo alargado. VV. Ex. as, que são conhecidos no País pela ausência de diálogo, peio mutismo absoluto, querem agora o diálogo alargado. Valeu a pena, só por isso, o PS ganhar as eleições e valeu a pena, até só por isso, V. Ex.ª ter assistido à apresentação deste projecto de lei!
Por outro lado, e para terminar - não o quero ocupar demasiado tempo -, esteja tranquilo quanto ao Dr. Jorge Sampaio e quanto às eleições presidenciais. Nós não temos culpa da vossa insegurança e da vossa consciência ferida daquilo que é o passado recente! Isto nada tem a ver com a candidatura do Dr. Jorge Sampaio mas com o conhecimento preciso de uma outra pessoa que, ao longo de 10 anos, governou como governou, teve o diálogo que teve, e foi ele, pela sua mão e pela sua caneta, que assinou, relativamente à Associação Nacional de Freguesias, o «não» rotundo a todas as aspirações que eles queriam ver concretizadas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Junqueiro, creio que, no fundamental, nos temos entendido, porque nenhum dos nossos partidos, pelo menos neste momento, tem de rever bruscamente posições anteriores. Julgo - e é essa a esperança que podemos ter - que existe um empenho real no sentido de fortalecer o poder local e que é, aliás, uma luta que vem de há muito tempo e não está propriamente dependente de calendários eleitorais.
No entanto, quanto ao projecto de lei do Grupo Parlamentar do PS há duas questões sobre as quais queria ouvir V. Ex.ª.
Uma, sobre o estabelecimento de limites às associações de freguesias. Poderia ser entendível, numa lógica puramente formal, o limite que o Grupo Parlamentar do PS propõe de as associações de freguesias terem de caber nos limites de um determinado município. Mas V. Ex.ª ouviu, com certeza ontem a Associação Nacional de Freguesias, através do seu presidente, falar, por exemplo, na situação das Juntas de Freguesias da Pontinha e de Carnide, que gerem em conjunto o mercado, porque são juntas de freguesias que estão integradas em municípios vizinhos, uma no de Lisboa e outra no município de Loures, estando o mercado exactamente na fronteira entre os dois municípios e as duas freguesias. Esta é uma situação concreta que foi relatada e que me leva a perguntar se não terá razão a própria Associação. Nacional de Freguesias e ó projecto de lei do PCP quando propõem que este limite não seja consagrado na lei.
Segunda questão: uma das matérias em que o PS propõe a transferência de atribuições para as freguesias tem a ver com os centros de apoio a toxicodependentes. É sabido que, hoje em dia, esta é uma questão extremamente grave e por isso a rede de apoio a toxicodependentes deveria ser fortissimamente alargada no País, que reclama grandes investimentos e que, a nosso ver, o Estado não pode deixar de se responsabilizar profundamente.

Página 558

558 I SÉRIE - NÚMERO 19

Pergunto como é que vê a transferência de atribuições numa matéria tão complexa como esta, no quadro de uma política de apoio à toxicodependência e de não desresponsabilização do Estado e do Estado/administração central no combate à toxicodependência.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Sá, comungamos desse seu espírito, pois o projecto de lei que apresentamos não é fechado. Entendemos que o diálogo só beneficiará aquilo que finalmente vamos ter, que é uma legislação adequada e que quer modernizar o poder local, habilita-lo ao melhor e mais eficaz funcionamento. Por isso, estaremos sempre abertos, como é óbvio, a dialogar sobre essa matéria sem quaisquer limites.
Relativamente às questões que colocou e que são pertinentes, quero fazer dois pequenos apontamentos. Primeiro, consideramos que o limite territorial dessas associações é a área do município, exactamente para evitar que sejam servidos objectivamente os interesses estritos das freguesias. E, em caso de freguesias limítrofes, podemos desde já, independentemente de um diálogo aprofundado sobre essa matéria, garantir que 'muita dessa cooperação se pode fazer ao abrigo de protocolos entre freguesias vizinhas que, eventualmente, serão úteis e ajudarão a ultrapassar problemas comuns. Portanto, penso que no interesse das próprias freguesias é bom dialogarmos sobre esta matéria.
Quanto aos centros de apoio a toxicodependentes, não se pode entender o seu funcionamento sem que tenhamos aqui um processo de apoio também pela própria segurança social. Aliás, nesta matéria, se queremos que as freguesias desenvolvam um trabalho na acção social, que é um trabalho nobre, de grande profundidade, que é a participação da comunidade no seu todo ao combate a um mal dos nossos dias, não poderá passar em claro que teremos de convergir nos esquemas de apoio a essa colaboração articulada que as freguesias poderão ter.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Junqueiro, penso que, em primeiro lugar, nós, políticos, devíamos procurar falar verdade e com rigor, perante o País. Se o Sr. Deputado quiser ser verdadeiro e rigoroso, terá de reconhecer que todos os partidos, particularmente aqueles que são mais relevantes na presença nos órgãos autárquicos do País, tudo têm feito, ao longo de 19 anos de poder local instituído pela nossa Constituição da República, para a sua dignificação e para a sua valorização. Mas, se quisermos faltar à verdade, então podemos estar aqui todos a fazer picardias uns contra os outros. E, nesse caso, eu também teria de recordar aquilo que foi feito pelos governos presididos pelo seu partido também em matéria de não contemplar nem corresponder a muitas das aspirações que os autarcas portugueses reivindicaram nessa altura perante o governo do seu partido. Isso vai acontecer, se calhar, também em relação a este Governo. A ver vamos, estamos apenas no início.
Mas há uma coisa que julgo que temos de reconhecer: é que houve uma grande evolução ao longo destes 19 anos de poder local instituído e isso passou pela responsabilidade de todos os partidos que estiveram no poder, designadamente também o meu partido, de desconcentração, de descentralização da administração central para a administração local. No fundo, foi a construção de um verdadeiro poder local democrático; afirmativo, com efectiva capacidade política, técnica, financeira para dar respostas aos problemas das populações locais. Se o País, hoje, mudou - e mudou muito - não se deve apenas à acção global dos portugueses, dos governos e, em particular, do governo que cessou, há pouco tempo, funções, mas também à acção dos autarcas portugueses, todos em geral, e é essa homenagem que nós também lhes queremos prestar, para sermos verdadeiros e rigorosos. Por isso, acho que não devíamos, de forma leviana, atacar alguns partidos por responsabilidades que não têm, conforme o PS, por vezes, afirma.
Queria também dizer-lhe que, já por várias vezes, aqui, nesta Assembleia, defendi que a legislação autárquica deve evoluir e os principais diplomas que regem o poder local, actualmente o Decreto-Lei n.º 100/84, que se refere às atribuições e competências, e a Lei das Finanças Locais, que é a Lei n.º 1/87, já deviam ter sido revistos. E, se isso não aconteceu na legislatura anterior, por iniciativa da Assembleia da República, dos partidos que aqui estão, do meu partido e do governo que apoiávamos, foi porque havia um diálogo que estava em curso e que durou talvez tempo demais e não chegou a ser concluído, entre o governo...

O Sr. José Junqueiro (PS): - Foi um diálogo de surdos!

O Orador: - Não, não era de surdos, Sr. Deputado, porque chegaram a acordo em muitos aspectos, só que, depois, não foi possível concluir esse processo. Mas houve um diálogo entre o governo e a Associação Nacional de Municípios Portugueses, e houve também algum diálogo com a ANAFRE.

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Isso foi uma ficção, Sr. Deputado!

O Orador: - Talvez não fosse um diálogo tão sistemático, um diálogo tão aprofundado e conclusivo, como seria desejável - isso também não me custa reconhecê-lo mas a verdade é que esse diálogo existiu, até para consagrar, em matéria de Orçamento do Estado do ano subsequente, algumas novas atribuições e competências transferidas para os municípios portugueses e para as freguesias e depois consagra-las em termos da revisão global da legislação autárquica. Julgo, Sr. Deputado José Junqueiro, que os autarcas portugueses não desejam continuar a ver a nossa legislação muito espartilhada, pulverizada, porque, depois, é difícil também para eles, observa-la, respeita-la. Por isso, gostariam de ter um código de legislação que regulasse o funcionamento normal das autarquias locais, que consagrasse de uma forma coerente e sistemática as atribuições e competências dos municípios e das freguesias.
Creio que seria talvez muito mais vantajoso que, nesta legislatura, em vez de estarmos aqui, de uma forma precipitada e, se calhar, eleitoralista, como aqui já foi referido, a apresentar projectos pontuais, parcelares, dessa mesma legislação autárquica em vigor que se pretende rever, fizéssemos uma proposta global e déssemos oportunidade

Página 559

22 DE DEZEMBRO DE 1995 559

a que todos os partidos, particularmente aqueles que têm maior representação no poder local, colaborassem nesta matéria com a apresentação das suas próprias iniciativas legislativas. O meu partido reivindica também, naturalmente, essa quota-parte de responsabilidade no poder local e até devo dizer que, em matéria de freguesias, apesar de o PS, neste momento, tal como se convencionou, ser o maior partido do poder local porque é aquele que tem maior, número de presidentes de câmara, em bom rigor, em termos de freguesias, o PSD parece-me que ainda leva a dianteira, que tem maior número de presidentes de junta, sinal de que, efectivamente, também compete ao PSD tomar a iniciativa política no sentido de fazer esse aperfeiçoamento e essa descentralização de novas competências.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, peço-lhe para concluir.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Esta proposta só tem, penso eu, uma vantagem, ainda Risos do PS.
que, em rigor, se formos analisar a legislação actual, o elenco das atribuições e competências das freguesias é idêntico ao dos municípios. É uma questão de ver - genericamente, é idêntico. Agora, é evidente que temos de reconhecer que as freguesias não têm a mesma capacidade técnica, a mesma capacidade administrativa e, naturalmente, até humana e financeira para poder exercitar todas as competências que têm os municípios, e nem faria sentido. Daí termos defendido, durante muitos anos, que se celebrassem protocolos de delegação de competências dos municípios para as freguesias. Pena foi que essa experiência-piloto não tivesse sido generalizada a todo o País.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, peço-lhe para concluir. Já ultrapassou muito o seu tempo.

O Orador: - Estou a concluir, Sr. Presidente.
Queria dizer apenas o seguinte: é pena que muitas câmaras municipais, lideradas por todos os partidos, incluindo o seu e a começar pela minha, a Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, presidida pelo PS há seis anos consecutivos, e que ainda não celebrou estes protocolos. Andam a pensar nisso há tanto tempo, mas realmente ainda não celebraram esses protocolos, como seria desejável.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, chamo, novamente, a sua atenção no sentido de concluir rapidamente.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Penso que esta proposta só tem essa vantagem: é que, de algum modo, vai obrigar - é uma atitude pedagógica os municípios a reconhecer que há muitas competências que têm e que faz mais sentido estar na competência das freguesias. Mas também temos de reconhecer, em abono da verdade e do rigor, e temos consciência disso, que as mais de 4200 freguesias do País, talvez por falta dos meios humanos, técnicos e financeiros, não vão ter capacidade de exercitar aquilo que é uma vontade política que a Assembleia da República tem de consagrar novas competências e atribuições. Esse é um aspecto que temos de ter em consideração porque não interessa apenas fazer essa alteração legislativa se não houver capacidade para exercitar e fazer cumprir as novas competências e atribuições por parte das freguesias portuguesas.

(O Orador reviu.)

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Moreira, gostei muito da sua intervenção, não só pelo brilhantismo mas também por este apelo à verdade, que vou tentar respeitar na íntegra.
Em 1990, num relatório assinado, se não me engano, pelo Eng. José Macário Correia, explica-se por que é que nesse ano propostas desta índole não foram por diante: «adopção de uma técnica legislativa global quanto ao Decreto-Lei n.º 100/84», «fomentar mais os protocolos entre as câmaras municipais e as freguesias», etc., e não vou consumir muito mais tempo. Foi um rol de argumentos para não aprovarem isto. Portanto, fica, em nome da verdade e do rigor, aquilo que o PSD pensava há cinco anos e que, durante cinco anos, com maioria absoluta, não tiveram oportunidade ou tempo para fazer. Havia muitas coisas que vos preocupavam, de facto!

Risos do PS.

Outra questão importante, acerca da qual. gostaria de falar verdade, ë exactamente a ajuda que W. Ex.as deram às autarquias locais. Lembro, nomeadamente, os 8,8 milhões de contos que retiraram ao FEF das câmaras durante o ano de 1995. É a melhor maneira de ajudar as autarquias locais subtrair-lhe uns milhões de contos! E não há dúvida nenhuma de que V. Ex.ª, em matéria de verdade, de contributo e empenho nas autarquias locais, tem aqui belíssimos exemplos!
Terceiro, e para não maçar muito mais, até porque tenho muita estima por si e não queria alongar-me noutras considerações, deixar-lhe-ia aqui a lembrança de que foi o seu partido, exactamente, que, quando a própria Associação Nacional de Municípios Portugueses e a própria ANAFRE viram recusadas pelo governo a sua vontade de serem recebidas - o governo não as recebeu e, em abono da verdade, também terei de dizer isto - VV. Ex. as aconselharam, inclusivamente, aí sim, na tentativa de manipular o poder local, os vossos autarcas a saírem da Associação Nacional de Municípios Portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado António Pedras.

O Sr. António Pedras (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Junqueiro, antes de colocar uma questão, gostaria de fazer-lhe um desafio sincero: a dignidade constitucional das freguesias é, como sabemos, em tudo igual à dos municípios mas, na prática, a lei ordinária assim não pensa e assim não o estipula. No fundo, os projectos que aqui estão hoje em discussão apontam para que seja feita justiça às freguesias e para que elas sejam colocadas no papel que, de direito, lhes compete, mas suponho que todos nós reconhecemos a complexidade destas questões e, por outro lado, não tenho dúvidas nenhumas de que nem o PCP, nem o PS, nem a minha bancada querem, de verdade, modificar a lei é atribuir mais competências às freguesias, dar-lhe um estatuto financeiro diferente, modificar o estatuto remuneratório dos presidentes das juntas de forma a que eles possam estar a tempo inteiro ou a meio tempo. Suponho que, em relação à nossa bancada, não pode haver dúvidas porque já no passado exprimimos esta mesma posição. E cremos também que o próprio PSD, hoje, a isso será obrigado, mesmo que não o quisesse!

Página 560

560 I SÉRIE - NÚMERO 19

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas também quero crer que a confissão que fizeram agora é mais sincera. De toda a forma, entendo que devo apelar e até desafiar o PS para que; em termos de técnica legislativa, se abandonem estes projectos parcelares. Isto porque, se tivermos em conta as disposições de ambos os projectos que falam da entrada em vigor, verificamos que, nunca por nunca, estes dois diplomas entrarão em vigor em 1996; quando muito, a lei entrará em vigor em 1997. Ora, suponho que este compasso de espera é perfeitamente suficiente e adequado para permitir que conjuguemos todas as nossas forças e façamos um autêntico código das autarquias locais, tanto mais que o PS já exprimiu a vontade de, rapidamente, ver aprovada também a questão da regionalização.
Julgo que, em termos de sistematização legislativa, era perfeitamente adequado, até justo, fazermos um código bem sistematizado, onde todas as questões fossem tratadas porque, Sr. Deputado José Junqueiro, queria lembrar-lhe que a questão de conflitos positivos de competências vai levantar-se. Os projectos de ambos os partidos, que estão em discussão, não me permitem resolver questões de conflitos de competência positiva. Portanto, acho que tudo aponta para que o melhor seja repensar esta matéria, sem querermos com isto adiar a discussão deste problema, que julgamos que é importante. Pessoalmente, já tive ocasião de, no Congresso da ANAFRE, em Braga, ter expresso, em nome do meu partido, posições que eles defendem. De modo que quero manifestar a vontade e a disponibilidade do PP para colaborar ou até apresentar um projecto de lei próprio.
Mas há uma outra questão que gostava de apontar: em relação ao artigo 10 º do projecto de lei do PS, em que se prevê que os contratos celebrados com as freguesias não carecem do visto prévio do Tribunal de Contas, queria lembrar que este projecto, nesta parte, colide com a lei que está em vigor. Chamo a atenção para o disposto no artigo 13.º, n.º 4, da Lei n.º 86/89, que foi aditada depois pela Lei n.º 7/94, de 7 de Abril, segundo o qual nenhuma autarquia pode eximir-se ao visto prévio do Tribunal de Contas, nesta sede de contratos de prestação de serviços e é justamente por isso que, neste momento, muitos autarcas do País estão a contas com processos que lhes foram levantados pela Inspecção-Geral da Administração do Território.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, peço-lhe para concluir.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Julgo, Sr. Deputado José Junqueiro, que, para além de expurgarmos eventuais ilegalidades de disposições do articulado, que, no entanto, nós saudamos na generalidade, poderão ser repensadas se todos dermos as mãos e fizermos um código bem estruturado; bem sistematizado, que seja digno, inclusive, das próprias autarquias locais que queremos, de toda a forma, prestigiar.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado António Pedras não me colocou nenhuma questão, manifestou-me disponibilidade e preocupação, de modo que aquilo que posso dizer-lhe é que estamos abertos ao seu contributo. Eventualmente, se o seu partido também tivesse apresentado um projecto de lei ou alguma proposta nesse sentido, ela teria sido há mais tempo tomada em consideração. Não o fez, mas congratulamo-nos com essa sua abertura e disponibilidade, a bem dos autarcas e das freguesias.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa.

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os projectos de lei que hoje estamos a discutir reportam-se a uma matéria que consideramos de primordial importância, que tem a ver com o papel insubstituível que as freguesias desempenham no âmbito da função autárquica. Entendemos que as freguesias estão na primeira linha dos contactos com a população, com os seus anseios e necessidades e que ,a personalização da sua actividade política é um bom exemplo da actividade política do Governo da cidade, no fundo da raiz etimológica da própria palavra «política».
Não podemos também esquecer a função notável dos autarcas que estão à frente dos órgãos das freguesias, a dedicação e, mesmo, o sacerdócio a que se dedicam e a eficácia na resolução dos problemas, que merecem obviamente todo o nosso aplauso, todo o nosso obrigado e empenho.
Por isso mesmo, por tudo aquilo que as freguesias representam, por tudo aquilo que os autarcas das freguesias desempenham, é pena que os projectos de lei que hoje estão a ser apreciados não tenham trazido para estes titulares de cargos públicos nada de bom e nada de original.
Estamos, hoje, a assistir a lances de uma hasta pública entre o PCP e o PS para ver quem dá mais às freguesias.. Ora, o que me parece é que essa hasta pública é, afinal, uma hasta pública de presentes envenenados. Nos projectos de lei do PCP e do PS estão consubstanciados, de facto, alguns presente envenenados, a começar, desde logo, pelos conflitos positivos de' competências que se podem gerar entre as câmaras municipais e as juntas de freguesia.
Um outro presente envenenado tem a ver - e dou o exemplo do artigo 4.º do projecto de lei do PS - com as competências relativas a investimentos públicos que podem vir a recair sobre as juntas de freguesia. No fundo, atribuiu-se às juntas de freguesia a competência para fazer investimentos públicos mas não a competência para gerir a posteriori os investimentos que sobre si recaem.
Não quero também deixar de referir-me à deficiente forma como aqui é abordada a questão da atribuição de recursos humanos às juntas de freguesia. Diz-se que uma das figuras possíveis é a do destacamento, mas esquece-se que, face à legislação que rege a função pública, ela tem um prazo limite de três anos, o que significa que os recursos humanos destacados das câmaras para as juntas de freguesia, ao abrigo destes dois projectos de lei, terminam os seus destacamentos antes de terminado o mandato autárquico, o que, obviamente, deixaria «descalças» as juntas de freguesia, que ficavam assim no final do seu mandato desprovidas dos recursos que lhes são necessários.
Julgo que ambos os projectos de lei fazem uma enorme confusão entre os conceitos de transferência e de destacamento e, nesse sentido, é essencial que estas matérias sejam esclarecidas.
Há também aqui erros grosseiros em matéria de técnica jurídica em relação a alguns conceitos. Refiro-me, mais uma vez, aos recursos humanos, ao estipular-se que, apesar de haver transferência de técnicos ou de pessoal das câmaras para as juntas de freguesia, os encargos com as re-

Página 561

22 DE DEZEMBRO DE 1995 561

munerações continuam a caber às câmaras municipais. Ora, no caso de se utilizar a figura da transferência os encargos com as remunerações cabem sempre à autarquia de destino e não ao serviço ou autarquia de partida. Há, pois, erros grosseiros, que não podem ficar em branco pois são verdadeiros presentes envenenados para as juntas de freguesia.
Prevê-se ainda a possibilidade dos tais destacamentos, das tais transferências mas não a criação de quadros de pessoal nas juntas de freguesia. Não se diz uma única palavra sobre esta matéria!
Ainda em sede de recursos humanos, o projecto de lei do PS introduz uma enorme instabilidade - espante-se! - em matéria de relações laborais ao permitir o recurso ao contrato de prestação de serviços. Nada mais erróneo, nada mais grave do que construir «quadros» nas juntas de freguesia com base em contratos de prestação de serviços. Estávamos longe de imaginar que da parte do PS houvesse recurso a esta figura. Por outro lado, também não vimos da parte de outros partidos que aqui já intervieram qualquer crítica a este aspecto que reputamos de extremamente grave.
Em matéria de associações de freguesias não compreendemos por que é que se veda a possibilidade de as juntas se associarem para além dos limites dos concelhos a que pertencem. Não faz sentido que assim seja, porque a realidade de hoje das freguesias, das populações e dos seus problemas não se compadece, muitas das vezes, com as delimitações geográficas no terreno. Por isso, seria de bom tom e extremamente acertado que houvesse legislação que permitisse ultrapassar o limite geográfico dos concelhos no que respeita à associação de freguesias.
Por último, há também uma gravíssima lacuna em matéria de se saber a que órgão, se à junta de freguesia ou se à assembleia de freguesia, compete aprovar a participação nas associações de freguesias e também na criação e participação nas empresas municipais e nas empresas próprias, nas empresas da freguesia. Julgo que há gravíssimas lacunas nesta matéria, que nos deveriam obrigar a uma maior reflexão.
Quanto à entrada em vigor destes dois projectos de lei - caso venha a ser aprovado um deles ou no caso de haver uma fusão de ambos - julgo que estamos a legislar apressadamente sobre uma matéria que não vai ser aplicada, na prática, ao mandato autárquico que está em curso.
Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que o respeito que nos devem merecer os autarcas das freguesias, o respeito que nos deve merecer essa figura não menor, que é uma pessoa colectiva de direito público, obriga-nos a reflectir mais aturadamente sobre esta questão. Não queremos, obviamente, cair num superavit de diálogo em que, pelos vistos, caiu o PSD na última legislatura; não queremos cometer nenhum défice de diálogo em que, porventura, estamos aqui a cair ao legislar apressadamente. Julgo que a certeza e a segurança jurídicas que são devidas aos cidadãos, e que não estão suficientemente acauteladas em virtude de possíveis conflitos positivos de competências, podem ser gerados por esta legislação, caso seja aprovada.
Creio que uma visão estrutural e suficientemente vasta desta matéria obriga-nos a fazer uma redefinição global sobre o quadro de funcionamento das autarquias locais, das suas atribuições e competências, do seu financiamento, da atribuição de recursos humanos, do reordenamento, da divisão geográfica das próprias freguesias de forma a que possamos estar a atribuir competências, atribuições e meios a entidades que tenham viabilidade, que as possam exercer com eficácia e rentabilidade. Julgo que estamos suficientemente a tempo de começar a discutir esta matéria e de fazer coincidir a aprovação de um pacote legislativo sobre esta questão, de forma a que possa entrar em vigor no início do próximo mandato autárquico.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, já ultrapassou o seu tempo em dois minutos.

O Orador: - Sr. Presidente, com a sua benevolência, vou usar só mais um minuto.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, já se inscreveu um Sr. Deputado para lhe pedir esclarecimentos, pelo que podia concluir agora e depois, aproveitava o tempo que a Mesa lhe vai dar para responder.

O Orador: - Sr. Presidente, dê-me só um minuto e eu prometo que não ultrapasso nem um segundo.
Por último, penso que seria importante avançarmos rapidamente na concessão do estatuto de direito público à ANAFRE, matéria que ainda não ouvi referir esta tarde.
É importante que fique claro e que não se extraia da posição do Partido Popular qualquer desrespeito, qualquer menor consideração pela função e pelo desempenho das juntas e dos seus autarcas. O importante, antes de tudo, e aquilo que a Assembleia deve a esses titulares de cargos públicos, é uma melhor e maior atenção do que aquela que hoje estamos aqui a dedicar.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - O Sr. Deputado José Junqueira pediu a palavra para formular um pedido de esclarecimento, mas o Partido Popular não tem tempo para responder.
Espero que o Sr. Deputado José Junqueira coloque questão simples de forma a que possa ser respondida com brevidade.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, a questão é muito simples.
Da intervenção do Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa noto duas ou três coisas essenciais.
Em primeiro lugar, acho que tem uma visão muito negativa daquilo que está a ser feito, mas, com todos os defeitos que possa ter, é bem melhor do que não fazer nada.
Em segundo lugar, gostaria que fizesse a justiça de pensar que os grupos parlamentares - e falo em nome do meu, mas penso que todos os outros pensam o mesmo - não estão aqui a pôr em hasta pública uma coisa tão séria como as freguesias. E eu conheço razoavelmente o Sr. Deputado e penso que, no seu íntimo, não tem essa ideia.
Entretanto, quero dar-lhe uma certeza: esta legislação vai ser aplicada neste mandato autárquico, e é por essa razão que a estamos a fazer agora.
De qualquer forma, são tantas as dúvidas que coloca que, creio, a sua intervenção junto de nós e o trabalho na comissão serão também um contributo valioso para o aperfeiçoamento da lei.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado, a questão que quero colocar é muito simples: tendo nós

Página 562

562 I SÉRIE - NUMERO 19

debatido esta questão em 1990, portanto há cinco anos, tendo havido manifestações à porta da Assembleia da República, uma petição da ANAFRE e toda uma movimentação pelo País, considera que legislar agora, legislar para este mandato é legislar apressadamente?
Pela parte do Grupo Parlamentar do PCP quero dizer que não só não vamos legislar apressadamente como vamos legislar tarde, porque já devia ter sido feita justiça às freguesias portuguesas há muito mais tempo.
Creio que o facto de o Sr. Deputado preconizar um código de administração local é naturalmente louvável. No entanto, com tantos objectivos de reordenamento do território, de revisão deste e daquele aspecto, o Sr. Deputado corre o risco de estar aqui a repetir os discursos do PSD e, nomeadamente, aquele que o Sr. Deputado Manuel Moreira fez há cinco anos, onde preconizava a ideia da revisão global de diplomas para, depois, o seu partido demorar todo este tempo a avançar, minimamente que fosse, nesta matéria.
Quanto à entrada em vigor desses diplomas, quero dizer ao Sr. Deputado e à bancada do Partido Popular que tudo faremos para que eles possam entrar em vigor - como, aliás, o do regime dos eleitos a tempo inteiro - conjuntamente com a lei do Orçamento do Estado para 1996.
Creio que este deve ser um objectivo desta Câmara e, em nome da minha bancada, quero declarar a V. Ex.ª, à Associação Nacional de Freguesias e às outras bancadas, que, esta é a meta para que trabalharemos e que, com certeza, a norma que proporemos, na especialidade, sobre a respectiva entrada em vigor, vai ter em conta este objectivo.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa, a quem peço que seja sintético, para não exceder em demasia o seu tempo.

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, sem querer hierarquizar os pedidos de esclarecimentos, nem sequer as respostas, começarei pelo fim, ou seja, por responder ao pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Luís Sá.
Tanto quanto li - e se é que li bem -, o projecto do Parido Comunista, no seu artigo 12.º, aponta para que esta lei entre em vigor no dia 1 de Janeiro do ano seguinte ao da sua publicação. Como eu não acredito que esta lei seja publicada em 1995, mas sim em 1996, ela só entrará em vigor no dia 1 de Janeiro de 1997. Portanto,...

O Sr. Luís Sá (PCP):- Posso interrompê-lo, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Luís Sá, pode interromper mas usando tempo do seu partido.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Deputado, é uma prática corrente na apresentação de projectos de lei, em matéria de normas em vigor, ter em conta o momento da apresentação do projecto. Depois, quando o processo legislativo se desenvolve, naturalmente que a norma de entrada em vigor é adaptada ao momento da aprovação. Portanto, o Sr. Deputado pode estar tranquilo porque a nossa posição nesta matéria é a da entrada em vigor com o Orçamento do Estado para 1996.

O Orador: - De qualquer forma, Sr. Deputado, não me parece que, entrando em vigor a menos de dois anos do fim do actual mandato autárquico, esta legislação vá beneficiar grandemente os seus principais destinatários.
Quero também referir que tinha deixado claro que o Partido Popular não pretende nenhum superavit de diálogo. Não pretendemos entrar aqui num processo de «enrolar» a discussão ao ponto de ela demorar vários anos. Nada disso. De facto, o que queremos é que haja uma discussão séria e profunda sobre todo O ordenamento jurídico, nomeadamente em matéria de competências, atribuições, financiamento e recursos humanos das autarquias locais.
O facto de se legislar apressadamente...

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, peço-lhe que abrevie. Neste momento já ultrapassou em cinco minutos o tempo de que dispunha.

O Orador: - Quando eu referi que estávamos a legislar apressadamente quis dizer que estávamos a legislar sem as devidas cautelas.
Sr. Deputado José Junqueiro, eu não disse que as juntas de freguesia estavam em hasta pública, mas sim que me parecia estarmos aqui num processo de hasta pública para ver quem dava mais competências às juntas de freguesia, pois quer o PCP quer o PS estavam a oferecer lances sobre esta matéria.
Por último, quero dizer que melhor do que fazer alguma coisa é fazer alguma coisa boa e, se tivermos de escolher, preferimos fazer coisas boas do que fazermos só alguma coisa.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Macário Correia.

O Sr. Macário Correia (PSD): - Sr. Presidente, em primeiro lugar quero chamar a atenção da Mesa para o seguinte: quando o Sr. Presidente da Assembleia da República foi eleito disse a todos nós que tinha como preocupação prioritária prestigiar o Parlamento.
Ora, várias vezes tem-se aqui referido, nesta e noutras legislaturas, sobre o interesse de, em comissão, se fazer trabalho de discussão política que facilite e encaminhe os trabalhos de Plenário e que a esse respeito se produzam e façam relatórios que não contenham apenas a insignificante frase: «Está em condições de subir a Plenário. Com os melhores cumprimentos.»
Por essa razão chamei a atenção da Mesa no princípio do debate para esse aspecto regimental, que, tradicionalmente, era cumprido com a apresentação de um documento que, sem tomar opções, clarificava o assunto em discussão, para conhecimento de toda a Câmara. Registo que isso não foi feito, como registe o facto de a Mesa, através do Sr. Secretário, me ter comunicado que, em devido tempo, isso seria feito.
Entendo agora, pela comunicação do Sr. Presidente que, de resto, mudou - que isso não vai acontecer.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, desculpe interrompê-lo mas tenho de explicar o que é que se passa.
Fui informado, quando assumia presidência, que havia uma deliberação da Mesa, que lhe tinha sido comunicada, no sentido de que a primeira parte da sua intervenção seria destinada a fazer a síntese do relatório. Há pouco dei-lhe a palavra sem fazer menção disso, mas tenho todo o gosto em referir esse facto.
Não me responsabilizo por a síntese do relatório não ter sido feita no início, mas, de qualquer forma, creio que ain

Página 563

22 DE DEZEMBRO DE 1995 563

da é oportuna e, se entender fazê-la, tem a palavra para esse efeito.
A segunda parte da sua intervenção será então já feita na sua qualidade de membro do Grupo Parlamentar do PSD.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Macário Correia (PSD): - Sr. Presidente, muito obrigado pelo seu esclarecimento. Compreendo a sua situação e, de resto, não entenda como critica o que disse mas apenas como um registo para que, de futuro, todos nós possamos dar mais contributos para o que é necessário fazer melhor nesta instituição.
Não vou, obviamente, neste momento e nesta circunstância, ater-me a isso, porque penso ser agora dispensável. Todavia, gostaria de sintetizar apenas quatro ou cinco questões muito breves, para depois fazer a minha intervenção de facto.
No nosso entendimento, em comissão, havia nestes dois projectos cinco aspectos fundamentais que importava clarificar. Um deles era, por um lado, a questão do modelo de organização das autarquias, no quadro de uma reforma que aqui é levantada e que tem a ver com as autarquias locais enquanto freguesias e enquanto câmaras municipais, e, por outro lado, com a figura e com as competências e atribuições que a regiões terão ou não em função do debate que oportunamente terá de travar-se.
A segunda questão tem a ver, obviamente, com as opções que cada um de nós tomará enquanto partido político, ao nível do estatuto das freguesias, sendo de realçar a disparidade de dimensões eleitorais e territoriais que cada rima delas tem e em relação a competências que umas podem exercer, que, outras, com mais dificuldade, exercerão, e isso tem a ver, depois, com o próprio estatuto dos presidentes em termos de permanência ou não, matéria que será objecto de discussão oportunamente.
A terceira questão que sintetizámos e circunscrevemos para discutir é a que tem a ver com o Estatuto da ANAFRE. Enquanto que há uma outra associação de autarquias, neste caso de municípios, que não sendo ainda de direito público, porque não optou por isso - mas há uma norma habilitante que por esta Casa passou e que o permite -,em relação às freguesias tal diploma não foi ainda concebido, pelo que é oportuno que a discussão aqui se faça, para concluirmos se tal medida é justa ou não, em função das opiniões que aqui forem produzidas.
A quarta questão, que é oportuna é pertinente, tem a ver com o FEF. Está em discussão hoje - e nos dias que aí vêm - o problema do Orçamento do Estado para 1996 e, estando em causa um acréscimo do FEF, importa clarificar o que é que as freguesias com isso vão beneficiar, em função de aspectos já referidos publicamente e em que medida é que o FEF autarquias/câmaras vai ou não ser afectado e como é que esses critérios irão desenvolver-se. Esta questão tem de ser clarificada, não só com este debate mas também pelo debate orçamental, que virá a seguir.
Uma última questão - e penso que quanto a essa todos estaremos de acordo - tem a ver com a protecção social dos funcionários das juntas de freguesia. Será fácil compreender que o que se passa actualmente é injusto e, de modo nenhum, poderá perdurar só face às opiniões que, de resto, já recolhi, mas também perante o significado da palavra injustiça, o que é subscrito por toda a comissão.
Não vou ater-me a mais questões de pormenor, salvo uma ou outra, que são redundantes ou despiciendas por já estarem tratadas noutra legislação e estarem aqui propostas sem grande propósito.
Era isto o que eu deveria ter dito em momento oportuno, de modo mais desenvolvido, o que não fiz.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem agora a palavra para fazer a sua intervenção, Sr. Deputado.

O Sr. Macário Correia (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Face à hora e ao avançado estado deste debate, importa aqui alinhar algumas ideias que, em nosso entendimento serão quase finais.
As grandes reformas do funcionamento das instituições oficiais devem requerer amplo debate, muito diálogo, bastante consenso e pouca precipitação.
No quadro desta legislatura, temos grandes debates a fazer, no âmbito da adaptação do Estado e da Administração Pública, quer central quer local, às realidades e às necessidades de desenvolvimento, no contexto social europeu e com os desafios tecnológicos a que a modernização nos vai aliciar.
Discutir e encontrar soluções para as regiões, para as câmaras municipais e para as freguesias constitui uma, nobre tarefa, a que este Parlamento meterá ombros, certamente com grande responsabilidade.
Definir competências e atribuições para todos estes níveis de poder não será fácil, mas cabe-nos a nós fazê-lo. Definir e instituir as receitas e as despesas de cada nível da Administração também não será fácil, como tão-pouco o será no que respeita ao estatuto e às condições de trabalho dos eleitos locais.
Temos hoje pela frente dois projectos de lei, mas vários outros já estão anunciados pela Mesa, agendados em comissão e agendados para a primeira sessão plenária do próximo ano. Portanto, naturalmente, estas matérias vão, desde já, começar por merecer amplo debate por parte de todas as forças políticas.
Não é desculpável, hoje, que se espere muito tempo por soluções globais, e que, à custa delas, nada se faça. Isso, ninguém quer. De resto, nem a composição aritmética deste Parlamento a isso levaria, se alguém tivesse essa vontade. É todavia recomendável que não se avance avulso, sem a adequada noção equilibrada do conjunto das coisas.
O Partido Socialista e o Partido Comunista só têm a ganhar se o que pretendem - e certamente que o pretendem com estes projectos for objecto do contributo de todos os outros partidos - pelo menos já dois se pronunciaram e estou em crer que um outro se pronunciará também -, no sentido de darem a sua achega, a sua sugestão para o aperfeiçoamento do edifício da Administração Pública.
Estas reformas visam, com certeza, unir os portugueses e melhorar as suas condições de representação e de acção local, e nunca dividi-los com tensões desnecessárias.
Entendemos que a reforma da administração local, por um lado, e a temática da regionalização, por outro, devem merecer um profundo debate enriquecedor da unidade e da coesão dos portugueses.
Parece-nos conveniente que este e outros diplomas baixem à comissão permanente especializada- e estou em crer que é essa a vontade - ,para que no seu seio se defina uma nobre metodologia de trabalho; operacional e eficaz, com prazos e metas concretas, para que os adiamentos não perdurem e para que com essa visão global e participada as coisas se façam.
A reforma da administração local, pela importância que tem, merece esse nosso esforço, e disso sairá certamente prestigiada a reforma do poder local, o poder local e este Parlamento.

Página 564

564 I SÉRIE - NÚMERO 19

Nas anteriores legislaturas estes debates foram tomados de forma parcelar, pelo que seria recomendável que agora, nestas circunstâncias e condições, se fizesse um trabalho que todos queremos.
Convém não esquecer as reflexões já produzidas em legislaturas anteriores, aquilo que cada um disse e o contexto em que o disse e até o próprio reordenamento administrativo que não pode deixar de estar subjacente a esta discussão.
Nas áreas urbanas - isso foi dito muitas vezes no passado - questiona-se frequentemente a configuração territorial, a identidade e o modo operacional das freguesias urbanas.
Para não irmos mais longe, talvez alguns não saibam que neste local onde estamos pertence à freguesia da Lapa, que do outro lado da rua deixa de sê-lo e passa a freguesia de Sta. Catarina e que, mais abaixo, é outra freguesia. Aliás, daqui até à Baixa de Lisboa passamos por meia dúzia de freguesias.
Posso também assinalar que quem percorre a distância entre o Marquês de Pombal e a Praça do Comércio passa por uma dúzia de freguesias, e certamente poucos dos que aqui estão sabem em que rua e em que esquina mudam de freguesia.
Esses aspectos levam a que, hoje em dia, no centro de Lisboa, algumas freguesias tenham escassas centenas de eleitores - estão em decréscimo -, que correm o risco de, daqui a algum tempo, terem eleições de braço no ar. Tal situação leva-nos a reflectir, muito concretamente, sobre esta realidade urbana e leva-nos a reflectir também sobre a realidade de algumas freguesias rurais, que não em razão da sua dimensão mas. em razão da dispersão e da distância, têm outro tipo de problemas, que devem ser ponderados também, nos critérios que aqui forem desenvolvidos ao longo dos próximos dias, nos debates que iremos travar.
Não está nunca em causa a história, a identidade e o carácter de cada freguesia e a relação da sua comunidade com uma história e uma cultura. O que está em causa é, sobretudo, a operacionalidade e a eficácia de funcionamento destas coisas.
Mas esta reforma não pode ser feita, obviamente, sem um profícuo debate com a Associação Nacional de Freguesias e com a Associação Nacional dos Municípios Portugueses, bem como, muito em particular, com as juntas metropolitanas, pela realidade geográfica, demográfica e humana que são essas áreas do país.
Um aspecto relevante e delicado é a questão da receitas dos órgãos do, poder. Em matéria de distribuição de verbas, haverá sempre dificuldades em chegar a consensos, mas há que fazer um debate em que os critérios sejam amplamente discutidos e muito claros, para que não haja dúvidas, divisões e tensões desnecessárias.
Esperamos que as contas sejam feitas por métodos diferentes dos usados, por exemplo, neste ano de 1995, em relação a critérios de coerência ou de incoerência, que são naturalmente muito discutíveis, da forma como foi abordado e tratado o Orçamento Rectificativo para 1995.
Outra questão delicada tem a ver com «a profissionalização» de mais eleitos, de mais políticos e, naturalmente, a opinião pública estará muito atenta à forma como vamos tratar essa matéria. É óbvio que, hoje em dia, quando se fala de alguns órgãos do poder local poderem dispender até 10% do seu orçamento global com a remuneração do seu próprio presidente ou de outros membros a trabalharem a tempo inteiro, isso poderá dar que pensar, mas há que fazer essa discussão com muito rigor.
Ninguém duvida que uma freguesia de 20 000, 30 000, 40 000 ou 50 000 eleitores precise, de facto, de alguém a trabalhar a tempo inteiro, quando hoje em dia há câmaras municipais com 3000, 4000 e 5000 eleitores que têm um presidente, um vereador e todo um staff a tempo inteiro, embora com competências diferentes. Todavia, a discussão é pertinente e tem de ser trazida para cima da Mesa.
Quero aqui salientar também a acção meritória da ANAFRE, muitas vezes incompreendida e, nalgumas circunstâncias, injustamente tratada, pois ela merece o nosso reconhecimento público por aquilo que fez.

Aplausos do PSD.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Finalmente! Bendita oposição!

O Orador: - Ainda bem que os senhores reconhecem que nós somos pessoas sensatas e coerentes.

Risos do PS.

Mas tenham calma, porque a vossa derrota está anunciada. Não tem data marcada, mas é um destes dias. Depois se verá.
E a humildade e a modéstia devem fazer parte das qualidades de qualquer político. Pela minha parte, dei o meu sinal agora. Espero que o façam na vossa ocasião.
Mas, como disse, quero assinalar o reconhecimento que nos merece a ANAFRE e a Associação Nacional de Municípios Portugueses. Quero dizer do muito que têm feito pelo poder local e certamente que nos cabe a nós, enquanto entidade legisladora, criar-lhes melhores condições para que esse desenvolvimento associativo e esse trabalho público que têm desenvolvido em favor das comunidades possa ser ainda melhor encontrado.
As juntas de freguesia têm ao seu serviço dezenas de milhar de trabalhadores, os quais, do ponto de vista da protecção social, estão numa situação ímpar e desfavorecida, perante os demais servidores de entidades colectivas públicas. Por isso, importa equipará-los aos demais servidores do Estado, no tocante à promoção da saúde e à protecção em caso de doença.
Nesta circunstância, importa ainda lembrar que o PSD, com humildade e modéstia reconhece os seus erros, mas também não deixa de falar dos seus méritos. E o facto é que, por tudo aquilo que foi dito, dá a impressão de que alguns se esqueceram de que a maioria dos autarcas das freguesias são - e o PSD orgulha-se disso - seus militantes. De qualquer forma, temos respeito e consideração por todos os demais, sem excepção, que muito têm feito pelo poder local em todas as freguesias, de norte a sul do país.
Estes homens e mulheres, funcionando sem horários, sem marcação prévia de entrevistas, a todos atendem, a todos ouvem e a todos acodem a qualquer momento. Estes não fogem ao diálogo, esteja ele escrito ou não, ao contrário de outros que nós bem conhecemos. Dedicam horas e horas da sua vida à função autárquica, prejudicando, estes mais do que nenhuns outros, a sua vida profissional, sem auferirem em consequência os proventos adequados que outros têm, incluindo os Deputados, e, muitas vezes, sem terem o reconhecimento por aquilo que retiram à sua própria família. Queremos aqui enaltecer a sua modéstia, a sua humildade. Eles devem ser exemplo para outros políticos que não sabem mais do que fazer jogo palaciano e intriga, nestes e noutros corredores, e que muitas vezes são desconhecedores das realidades da vida

Página 565

22 DE DEZEMBRO DE 1995 565

e da democracia ao seu nível mais humano e mais directo. Temos de aprender muito com eles.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O PSD orgulha-se que eles tenham dialogado connosco e quer levar esse diálogo mais longe e com mais eficácia nos próximos tempos. O saber e a experiência feita destes autarcas devem ensinar muito à classe política. Eles deveriam ser mais ouvidos e com mais atenção, pois são os olhos e os ouvidos das populações locais, em todos os momentos e circunstâncias.
O reflexo das medidas políticas, a eficácia como elas são ou não concretizadas, os sentimentos sociais e as angústias do momento passam sempre pelo conhecimento profundo de cada presidente de junta de freguesia. São, por natureza, os «homens bons», na linguagem que, hoje em dia, se pode trazer à memória, a quem muitos pedem conselhos, opiniões, orientações e até justiça, face ao prestígio e à conduta exemplar em que são reconhecidos nas comunidades que representam. Com toda a naturalidade, a cada instante, eles exercem, em nome do povo, muitas e variadas competências, mesmo aquelas que as leis não contemplam.
Passaram - é um facto - quase seis anos sobre o debate aqui travado em volta das matérias que hoje aqui discutimos, e é, naturalmente, em volta destes diplomas que o PS e o PCP nos apresentam hoje que a discussão se vai reiniciar. Estamos, todavia, todos disponíveis para esse enriquecimento e para essa conclusão que queremos que este debate tenha. Repito: se vamos tocar nas atribuições e competências das autarquias locais, importa que se defina, muito claramente, o que queremos para cada nível de poder: freguesia, câmara e região.
Uma vez que esta legislatura tem o mérito e a honra dessa missão histórica, façamo-lo de uma forma completa e global.
Sobretudo no início desta legislatura estamos em condições de o fazer com serenidade e com a tranquilidade que alguns requerem para o Governo, pois também temos ocasião de requerer a tranquilidade, para que, sem precipitação, este debate e esta conclusão legislativa se faça.
Trata-se de uma reforma profunda do poder local a que todos queremos certamente dar o nosso contributo. Mas também não será de deixar de assinalar aqui que os autarcas, que neste momento estão legitimamente preocupados com esta matéria, também nestes dias e nestas semanas, até ao anunciado dia 20 de Janeiro, dia em que será entregue o Orçamento do Estado - por ser a seguir a 14... -, têm bem presentes alguns critérios de coerência, fazendo naturalmente apelo à memória de alguns, para que os 7,3 milhões de contos pendentes tenham reflexão no Orçamento do Estado para 1996...

Risos do PS.

Ouçam, Srs. Deputados, porque convém não esquecer esta matéria. Sou breve, vou concluir, mas ouçam, registem!
A Associação Nacional de Municípios Portugueses aprovou por unanimidade uma recomendação ao Governo para que, tendo em conta um documento que há pouco mostrei mas muitos não leram - promessas eleitorais -, datado de Setembro de 1995, a duplicação do FEF, em termos reais, conforme está escrito, se faça num horizonte de quatro a cinco anos, o que implica que para 1996 haja, em termos reais, um aumento de 20%. Essa recomendação foi aprovada por unanimidade pela Associação Nacional de Municípios Portugueses. Não nos esqueceremos deste aspecto e lembro aos colegas esta questão.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, quero lembrar também a todos que os critérios de distribuição dos 15% do FEF têm de ser clarificados. As câmaras municipais, que tinham 90%, passam a ter 85% e as freguesias passam de 10% para 15%. Num bolo de 100%, como é que isto funciona? Queremos ver mais verbas canalizadas para as freguesias, com critérios mais claros, e também para as câmaras municipais, nesse acréscimo de 20% desejável, para que ambos fiquem com mais e melhores condições de trabalho.
Por outro lado, queremos que os senhores cumpram as vossas promessas, a bem dos portugueses - porque legitimamente acreditaram -, para que as transferências de competências da administração central para a administração local se façam já com reflexos nos planos de actividades que queremos levar por diante em 1996.
Estas são as questões cruciais e urgentes que se colocam e não podem ser esquecidas, porque em momentos de preparação do Orçamento e também de campanha eleitoral tudo, de uma forma coerente e global, tem de ser chamado à atenção.
Estamos disponíveis para dar o nosso contributo, quer através de apelos à memória, quer de contributos formais, escritos, e de propostas concretas para que estas coisas se façam.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Devemos ter como objectivo central melhorar a eficácia de funcionamento dos órgãos de poder, nas suas relações com as populações. É essa a nossa vontade.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, independentemente de o Partido Ecologista Os Verdes não ter apresentado, na anterior legislatura e agora, um projecto sobre esta matéria, gostaria de saudar vivamente os dois partidos que trouxeram à discussão o que me parece ser o início de um debate importante e de uma modificação profunda em relação às autarquias locais e à necessidade de quebrar a prática anterior.
É bom lembrar que a prática anterior foi pautada pelo menosprezo da intervenção das autarquias locais no seu conjunto,...

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

A Oradora: - ... por uma visão centralista e centralizadora do poder, que se não traduziu apenas na falta de diálogo, no menosprezo e na secundarização dos municípios como parceiros do desenvolvimento - que o são mas também na asfixia financeira a que foram constantemente remetidos.

Vozes do PS: - Muito bem!

Página 566

566 I SÉRIE - NÚMERO 19

A Oradora: - Esta é uma questão que nos parece particularmente importante, pois as autarquias têm competências muito importantes em matérias que se reflectem no quotidiano dos cidadãos, na forma como este se constrói e na sua qualidade de vida.
Lembro, a propósito, que não deixa de ser bizarro é significativo que, em relação ao chamado Plano Nacional de Política do Ambiente, tendo as autarquias tantas competências em matéria de defesa do meio ambiente e da sua protecção e sendo parte integrante dessa defesa, não tenham sido ouvidas nem achadas na elaboração de algo que não foi mais do que um plano do Governo do PSD mas que abusivamente se designou por plano nacional.
É nesta perspectiva que acolhemos positivamente os projectos de lei n. os 28/VII, do PCP, e 42/VII, do PS, porque, para além de um e outro terem aspectos diferenciados e de, algum modo, se complementarem, no essencial, eles procuram começar pelo início do que deve ser a definição de competências das autarquias e, dentro destas, o papel extremamente importante que as freguesias têm, independentemente de a lei das autarquias locais o prever.
As freguesias têm sido menorizadas, secundarizadas. Entendendo nós, Os Verdes, que a democracia directa, participativa e de base é a que melhor permite um desenvolvimento sustentado, o envolvimento dos cidadãos na tomada de decisões da comunidade e a sua participação nela, é óbvio que as freguesias têm um papel importante a desempenhar. A definição dos seus territórios de competências e, mais do que isso, de meios financeiros que dêem corpo e sentido a essas competências faz todo o cabimento.
Daí que pensemos que, independentemente do interesse que as abordagens globais têm, é bom, começar pelo princípio. Este é um contributo que, julgamos, caminha nesse sentido e complementa-se com outro aspecto: desde há muitos anos, os autarcas - aqueles de quem se falou agora com tanto entusiasmo - dão as horas livres da sua vida em benefício da comunidade e das populações, mas, lamentável e estranhamente, têm sido esquecidos nas suas reivindicações, e foram-no, em particular, em 1990, quando este Parlamento vetou e impossibilitou outras condições de trabalho e outras competências. Esses autarcas têm necessidade de ser ouvidos e precisam de um novo regime de permanência, o qual, como já foi referido, em 3 de Janeiro vai também ser vetado. Por isso, pensamos que é importante começar pelo início, porque as visões globais, às vezes, por serem tão globais e se situarem tão acima, permitem que escape tudo o que está abaixo e seriem de alibi para que nada se faça.
É nesta perspectiva que saudamos estes projectos e que nos disponibilizamos para, em sede da respectiva comissão, trabalhar, de modo a incluir, na especialidade, modificações que convirjam para um bom projecto, que possa ser votado nesta Assembleia e que, em nosso entendimento, tem todas as condições para ser concretizado e completado a tempo e horas de, até 20 de Janeiro, poder ser englobado no futuro Orçamento do Estado.
É esta a nossa disponibilidade e é neste sentido e com este espírito que saudamos as iniciativas, quer do PS quer do PCP, nesta matéria.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, declaro encerrado o debate relativo aos projectos de lei n. os 28/V1I e 42/VII, cuja votação terá lugar no dia 4 de Janeiro, quinta-feira, à hora regimental.
A próxima reunião plenária realizar-se-á amanhã, às 10 horas, tendo como ordem do dia um debate com a presença do Governo, nos termos do n.º, 4 do artigo 3.º da Lei n.º 20/94, de 15 de Junho.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 25 minutos.

Declaração de voto enviada à Mesa, para publicação, relativa à votação final global da alteração, apresentada pelo PS, e aprovada pela Comissão de Economia, Finanças e Plano, ao Decreto-Lei n.º 231/95, de 12 de Setembro, que altera o Decreto-Lei n.º 337/90, de 30 de Outubro (Aprova a Lei Orgânica do Banco de Portugal) [ratificação n.º 2/VII (PS)].
A proposta de aditamento do PS relativa ao n.º 4 do artigo 64.º do Decreto-Lei n.º 337/90, de 30 de Outubro, na redacção decorrente do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 231/95, de 12 de Setembro, não deve limitar as competências existentes da Assembleia da República e dos Deputados no que respeita a informações do Governador do Banco de Portugal noutras ocasiões, para além` da apresentação do Relatório do Banco de Portugal, e sobre outras matérias, para além da situação e orientação relativas à política monetária.
A questão da autonomia e responsabilização políticas das autoridades monetárias e a sua discussão nesta Assembleia reveste-se de uma importância acrescida na perspectiva da criação do Banco Central Europeu.

O Deputado do PSD, Francisco Torres.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social Democrata (PSD):

Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
Luís Carlos David Nobre.
Manuel Castro de Almeida.
Maria do Céu Baptista Ramos.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Manuel Cruz Roseta.

Partido Comunista Português (PCP):
Maria Odete dos Santos.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

António Jorge Mammerickx da Trindade.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.

Partido Social Democrata (PSD):

João Álvaro Poças Santos.
José Guilherme Reis Leite.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Vasco Pulido Valente.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.

Página 567

22 DE DEZEMBRO DE 1995 567

José Fernando Araújo Calçada.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.

Rectificação ao n.º 4, de 10 de Novembro de 1995

No sumário, 1.ª cl., l.4, onde se lê «... projectos de lei n.ºs 14 a 17/VI» deve ler-se «.., projectos de lei n.os, 14 a 17/VII».

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

Página 568

DIÁRIO da Assembleia da República

Depósito legal n.º 8818/85

IMPRENSA NACIONAL - CASA DA MOEDA, E. P.

1 - Preço de página para venda avulso, 9$00 (IVA incluído).

2 - Para os novos assinantes do Diário da Assembleia da República, o período da assinatura será compreendido de Janeiro a Dezembro de cada ano. Os números publicados em Outubro, Novembro e Dezembro do ano anterior que completam a legislatura serão adquiridos ao prelo de capa.

3-O texto final impresso deste Diário é da responsabilidade da Assembleia da República.

PREÇO DESTE NÚMERO 342$00 (IVA INCLUÍDO 5%)

Toda a correspondência, quer oficial, quer relativa a anúncios e assinaturas do «Diário da República» e do «Diário da Assembleia da República», deve ser dirigida à administração da Imprensa Nacional-Casa da Moeda, E. P., Rua de D. Francisco Manuel de Melo, 5-1092 Lisboa Codex

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×