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25 DE OUTUBRO DE 1996 179

todas as sociedades, a sociedade portuguesa também é atravessada por esta questão - questão que a divide, reconhecidamente.
Aliás, não sei por que razão a posição do meu partido foi exautorada. Não fomos nós que lançámos esta questão na sociedade portuguesa, foi o PCP e a Juventude Socialista!

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Orador: - Se a lançaram foi porque entenderam que era oportuno fazê-lo e se assim era, por que não recorreram ao referendo? Não foram, por acaso, o Sr. Deputado José Magalhães, então Deputado do PCP, e o Sr. Ministro António Vitorino, então Deputado do PS, que reconheceram, aquando da revisão constitucional de 1989, que talvez não houvesse matéria em relação à qual se exigisse tão profundamente o recurso ao referendo como a do aborto? E se assim é, por que há hoje tergiversações em relação a esta matéria? Por que razão o PCP e o PS hoje têm dúvidas em devolver à sociedade portuguesa a resolução desta questão?
Sr.ª Deputada, a minha questão é muito simples: ,por que é que V. Ex.ª contesta a legitimidade do uso do referendo em relação à matéria do aborto?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Mota Amaral):- Tem a palavra o Sr. Deputado João Rui de Almeida.

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Odete Santos, esta é uma matéria da máxima importância, diz respeito á vida humana e, portanto, tem de ser tratada com o máximo de responsabilidade, de seriedade e, de facto, não pode ser utilizada para fins de estratégia de luta político-partidária.
Sr.ª Deputada Odete Santos, certamente V. Ex.ª tem conhecimento de que o grupo de trabalho sobre genética médica, a funcionar, na Direcção-Geral de Saúde, tira a conclusão de que a actual lei, que tem 12 anos, estabelece prazos que são tecnicamente desajustados para que o diagnóstico pré-natal se possa realizar com segurança. Por isso, após a realização de estudos aprofundados, consideram que passar o prazo de interrupção médica da gravidez por anomalia congénita grave para 24 semanas de gestação poderia permitir dar satisfação à maior parte dos problemas que têm sido levantados. Portanto, a questão é aqui colocada dentro de parâmetros e critérios exclusivamente técnicos e científicos.
Ora, a pergunta que dirijo a V. Ex.ª, Sr.ª Deputada Odete Santos, é que caracterize objectivamente, hoje, neste Plenário, e dentro do possível, os critérios que determinaram a prática da interrupção voluntária da gravidez, no projecto de lei do PCP, até às 12 semanas.
Permita-me, Sr.ª Deputada, que utilize este tempo - e é pena não poder dirigir-me directamente à bancada do PSD - para pedir ao PSD que também esclareça, de forma objectiva, o que é que quer referendar. Que referendo? Sobre o quê? Não sei se V. Ex. ª poderá responder de forma indirecta a esta questão, porque é vital que todo este processo seja debatido com a seriedade que é exigida.
Com efeito, existe uma lei, datada de 1982, que permite, de forma muito clara, a prática da interrupção voluntária da gravidez. E permita-me que diga que os responsáveis pelo PPD-PSD não estão, de forma alguma, a ter uma atitude colaborante para tratar um assunto extremamente sério.
Se esta questão tiver resposta, talvez se possa esclarecer, concretamente, quais os objectivos e com que intenção ela foi levantada.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos. A Mesa concede-lhe 3 minutos para o efeito e pede, por favor, que se contenha dentro desse tempo.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, agradeço os 3 minutos concedidos pela Mesa. Procurarei ser sintética.
Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, o PCP foi o primeiro partido que apresentou, nesta Assembleia, em 1982, um projecto de lei sobre planeamento familiar; lutámos pela sua aprovação e sempre reivindicámos que o planeamento familiar dele ser acessível a todos. Foram dados passos muito positivos, mas há muitas questões culturais em torno deste problema, e penso que ainda é possível avançar mais.
O PCP entende que o aborto não é um método de contracepção; não há nenhuma mulher que prefira usar o aborto como método contraceptivo, porque esta é uma decisão grave que a mulher toma no meio de muitas angústias. Portanto, não há nenhuma mulher que, tendo o planeamento familiar ao seu alcance, diga: «não faço planeamento familiar, vou depois tomar a decisão de abortar». Aliás, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, desculpe que lhe diga, mas V. Ex.ª , até a propósito da própria questão das 22 semanas, raciocina como se a mulher tivesse todo o prazer ou agisse de ânimo leve ao aguardar as 22 semanas, mesmo podendo ter antes a informação sobre a malformação! Ao fim e ao cabo, embora inconscientemente, é isto que está na base deste raciocínio.
Devo dizer-lhe, Sr.ª Deputada, que os documentos que tenho à disposição do meu grupo parlamentar sobre a questão das 22 semanas também estão ao dispor da Sr.ª Deputada nesta Assembleia. Existe, publicado em livros, um debate realizado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre as alterações ao Código Penal, onde encontra, para além das posições do Professor Figueiredo Dias que aqui referi, a audição a médicos especialistas nestas condições, que dizem não ser possível, em relação a muitas malformações, fazer a sua detecção até ás 16 semanas.
Não sei se no estrangeiro é assim, mas devo dizer-lhe, Sr.ª Deputada, que talvez na Holanda, a mais benévola e generosa em relação ás mulheres, prevê o aborto até ás 24 semanas por situações de emergência da mulher. E é aí, na Holanda, onde vigora esta legislação, que encontramos a menor taxa, uma taxa ínfima, de abortos clandestinos!
Depois não me venham dizer que uma legislação menos restritiva não vai, efectivamente, impedir em grande parte o aborto clandestino, promovendo a resolução dos problemas.
V.Ex.ª e o seu grupo parlamentar têm um documento, enviado pela Associação do Diagnóstico Pré-Natal em Junho deste ano ao Sr. Presidente da Assembleia da República, que informa por que razão o aborto eugénico deveria ser permitido até ás 24 semanas.