Página 553
Quinta-feira, 20 de Novembro de 1997 I Série - Número 15
DIÁRIO da Assembleia da República
VII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1997-1998)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 19 DE NOVEMBRO DE 1997
Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos
Secretários: Ex.mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Carlos Manuel Duarte de Oliveira
João Cerveira Corregedor da Fonseca
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
SUMÁRIO
O Sr Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa de um ofício da Presidência do Governo da Região Autónoma dos Açores, de requerimentos e de respostas a alguns outros.
Foi aprovado o voto n.º 92/VII - De pesar pelas vítimas do acidente ferroviário recentemente ocorrido perto de Estombar, no Algarve (PS), tendo produzido intervenções os Srs. Deputados Martim Gracias (PS), Nuno Correia da Silva (CDS-PP), Isabel Castro (Os Verdes), Cabrita Neto (PSD) e Lino de Carvalho (PCP). No fim, a Câmara guardou um minuto de silêncio.
O voto n.º 93/VII - De congratulação pela passagem do Dia da Qualidade (PS, PSD, CDS-PP, PCP e Os Verdes) foi também aprovado, tendo usado da palavra os Srs Deputados Henrique Neto (PS), Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP), Isabel Castro (Os Verdes) e Artur Torres Pereira (PSD).
Foi igualmente aprovado o voto n.º 94/VII - De pesar pela morte do Professor Orlando Ribeiro (Deputada do PSD Teresa Patrício Gouveia). Intervieram os Srs. Deputados Teresa Patrício Gouveia (PSD), José Calçada (PCP), Fernando Pereira Marques (PS), Isabel Castro (Os Verde) e Nuno Abecasis (CDS-PP), tendo, no fim, a Câmara guardado um minuto, de silêncio.
Em declaração política, o Sr Deputado Rui Namorado (PS) deu conta das conclusões saídas das Jornadas Parlamentares do seu partido subordinadas ao tema «Interioridade, Desenvolvimento e Regionalização».
Igualmente em declaração política, o Sr. Deputado Carlos Encarnação (PSD) acusou o Governo de falta de clareza quanto aos referendos sobre a Europa e a regionalização e respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Luís Sá (PCP) e Acácio Barreiros (PS).
Ainda em declaração política, o Sr Deputado Jorge Ferreira (CDS-PP) falou da existência de um acordo celebrado entre o PS e o PSD com vista à viabilização do Orçamento do Estado para 1998, que criticou Respondeu, depois, a um pedido de esclarecimento da Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite (PSD), que originou a defesa da honra da bancada por parte da Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP).
O Sr Deputado Rodeia Machado (PCP) acusou o Governo, de má fé negocial para com os trabalhadores da Função Pública.
Ordem do dia. - Procedeu-se à discussão, na generalidade da proposta de lei n.º 144/VII - Altera a lei orgânica do Banco de Portugal, tendo em vista a sua integração no Sistema Europeu de Bancos Centrais. Após o Sr. Deputado Francisco Torres (PSD) ter procedido à síntese do Relatório da respectiva comissão, usaram da palavra, a diverso título, além daquele orador e do Sr Ministro das Finanças (Sousa Franco), os Srs. Deputados Lino de Carvalho (PCP), Luís Queiró (CDS-PP), Manuel dos Santos (PS) e Lalanda Gonçalves (PSD).
A proposta de lei n.º 148/VII - Lei das Finanças das Regiões Autónomas foi debatida na generalidade, tendo usado da palavra, além do Sr. Ministro das Finanças, os Srs. Deputados Teixeira Dias (PS), Guilherme Silva (PSD), Medeiros Ferreira (PS), Luís Sá (PCP), Augusto Boucinha (CDS-PP), Joel Hasse Ferreira (PS), Lalanda Gonçalves (PSD) e Arlindo Oliveira (PS).
Por último, foram também apreciadas conjuntamente, na generalidade, as propostas de lei
n.os 119/VII - Autoriza o Governo a alterar o Código do IRC no sentido de equiparar o Instituto de Gestão de Crédito Público a instituição de crédito residente, para efeitos de tratamento concedido aos instrumentos financeiros derivados no âmbito do imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas e alterar o estatuto dos benefícios fiscais - e 137/VII - Estabelece o regime geral de emissão e gestão da dívida pública. Intervieram no debate, a diverso título, além do Sr. Ministro das Finanças, os Srs Deputados Sílvio Rui Cervan (CDS-PP), Octávio Teixeira (PCP), João Carlos da Silva (PS) e Carvalho Martins (PSD).
O Sr Presidente encerrou a sessão eram 21 horas.
Página 554
554 I SÉRIE - NÚMERO 15
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 30 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Agostinho Marques Moleiro.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
Aníbal Marcelino Gouveia.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António de Almeida Santos.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Gavino Paixão.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Júlio Meirinhos Santanas.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira.
Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.
Victor Brito de Moura.
Partido Social Democrata (PSD):
Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Manuel Taveira da Silva.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Roleira Marinho.
António Soares Gomes.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Eugénio Pereira de Brito.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Domingos Dias Gomes.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Página 555
20 DE NOVEMBRO DE 1997 555
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Manuel Lopes Moreira da Silva.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Costa Pereira.
José Mendes Bota.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Sérgio André da Costa Vieira.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
Armelim Santos Amaral.
Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Kruz Abecasis.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.
Partido Comunista Português (PCP):
António João Rodeia Machado.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Joaquim Manuel da Fonseca Matias.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Partido Ecologista Os Verdes (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.
ANTES DA ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de um ofício, dos requerimentos e das respostas a requerimentos que foram apresentados à Mesa.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, da Presidência do Governo da Região Autónoma dos Açores recebemos um ofício do seguinte teor:
«Com referência ao Vosso ofício n.º 6797, de 6 de Novembro de 1997, encarrega-me Sua Excelência o Presidente do Governo Regional dos Açores de, em seu nome pessoal e do Governo Regional dos Açores, agradecer, sensibilizado, o voto n.º 87/VII - De pesar e solidariedade, aprovado, por unanimidade, na Assembleia da República, na reunião plenária de 31 de Outubro do corrente ano, por motivo dos trágicos acontecimentos ocorridos na Ilha de São Miguel.
Solicito a V. Ex.ª que seja dado conhecimento deste agradecimento a Sua Excelência o Sr. Presidente da Assembleia da República e a todos os Excelentíssimos Srs. Deputados».
Srs. Deputados, foram apresentados na Mesa vários requerimentos. Nos dias 16 e 17 de Outubro de 1997: ao Ministério da Saúde, formulado pela Sr.ª Deputada Maria do Carmo Sequeira; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Coelho; ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulado pelo Sr. Deputado José Calçada; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulado pela Sr.ª Deputada Odete Santos, e ao Ministério da Educação, formulados pelo Sr. Deputado Rui Namorado.
Na sessão plenária de 22 de Outubro de 1997: à Secretaria de Estado da Indústria e Energia, formulado pelo Sr. Deputado Francisco Camilo; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado José Cesário; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado Miguel Relvas; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho, e ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado Rodeia Machado.
Página 556
556 I SÉRIE - NÚMERO 15
Nas sessões plenárias de 23 e 24 de Outubro de 1997: ao Ministério da Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Pereira Marques; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado Antonino Antunes; ao Ministério da Educação, formulados pelos Srs. Deputados Cruz Oliveira e Manuel Moreira; aos Ministérios da Educação e da Administração Interna, formulados pelo Sr. Deputado António Filipe; ao Ministério do Ambiente, formulado pelo Sr. Deputado António Martinho; ao Ministério para a Qualificação e o Emprego, formulados pelo Sr. Deputado António Rodrigues; ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulado pelo Sr. Deputado Rodeia Machado, e à Câmara Municipal de Lisboa, formulado pelo Sr. Deputado Francisco José Martins.
Nos dias 27 e 28 de Outubro de 1997: aos Ministérios do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território e da Saúde, formulados pelo Sr. Deputado Jorge Roque Cunha, e ao Ministério do Ambiente e à Câmara Municipal de Góis, formulados pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia;
Na sessão plenária de 29 de Outubro de 1997: ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulado pela Sr.ª Deputada Jovita Matias; ao Ministério da Solidariedade e Segurança Social, formulados pelo Sr. Deputado António Filipe: aos Ministérios da Educação e do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulados pelo Sr. Deputado Bernardino Soares; ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulado pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado Jorge Ferreira, e à Câmara Municipal de Vila Nova de Cerveira, formulado pelo Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa.
Nas sessões plenárias de 30 e 31 de Outubro de 1997: ao Sr. Primeiro-Ministro e ao Ministério da Economia, formulados pelo Sr. Deputado Cruz Oliveira; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Frexes; ao Ministério da Solidariedade e Segurança Social, formulado pelo Sr. Deputado Roleira Marinho; ao Ministério da Defesa Nacional, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Encarnação, e ao Ministério da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados Manuel Moreira e António Filipe.
Nos dias 4 e 5 de Novembro de 1997: ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulados pelo Sr. Deputado Francisco Torres, e aos Ministérios do Ambiente e da Cultura, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
Na sessão plenária de 6 de Novembro de 1997: ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulado pelo Sr. Deputado Victor Moura; ao Governo, formulados pelo Sr. Vice-Presidente Mota Amaral; ao Ministério para a Qualificação e o Emprego, formulados pelo Sr. Deputado António Rodrigues; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado António Filipe; aos Ministérios da Saúde e da Solidariedade e Segurança Social, formulados pelo Sr. Deputado Bernardino Soares, e ao Governo Regional da Madeira, formulado pelo Sr. Deputado Gonçalo Almeida Velho.
No dia 10 de Novembro de 1997: ao Sr. Primeiro-Ministro, formulado pela Sr.ª Deputada Filomena Bordalo, e ao Ministério do Ambiente, formulado pelo Sr. Deputado Francisco Torres.
Entretanto, o Governo respondeu aos requerimentos apresentados por vários Srs. Deputados. Nos dias 22 e 27 de Outubro de 1997: Heloísa Apolónia, nas sessões de 5 de Dezembro, 18 e 24 de Julho; Silvio Rui Cervan, Jorge Ferreira e Bernardino Soares, no dia 11 de Março, nas sessões de 25 e 29 de Julho, nos dias 11 e 18 de Setembro; António Barradas Leitão, na sessão de 8 de Maio: António Filipe, na sessão de 23 de Maio; Manuel Frexes, na sessão de 12 de Junho; 15abel Castro, na sessão de 18 de Julho; Jorge Roque Cunha e Octávio Teixeira, na sessão de 19 de Junho e no dia 13 de Agosto; Rodeia Machado, nas sessões de 2 e 17 de Julho, Fernando Pedro Moutinho e Cruz Oliveira, nas sessões de 3 e 10 de Julho, Carlos Luís, no dia 8 de Julho; Lino de Carvalho, na sessão de 23 de Julho: Ismael Pimentel, no dia 28 de Julho e na sessão de 24 de Setembro; Roleira Marinho, Arménio Santos e José Luís Moreira da Silva, nas sessões de 30 e 31 de Julho, e Filomena Bordalo, na sessão de 2 de Outubro.
No dia 30 de Outubro de 1997: Miguel Macedo, na sessão de 2 de Julho; Augusto Boucinha, na sessão de 3 de Julho: Jorge Ferreira, na sessão de 9 de Julho; Jorge Roque Cunha, na sessão de 16 de Julho; Manuel Alves Oliveira, na sessão de 3O de Julho; Carlos Beja, no dia 18 de Setembro; Paulo Pereira Coelho, no dia 23 de Setembro, e Lino de Carvalho, na sessão de 22 de Outubro.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, foram apresentados na Mesa dois votos, o voto n.º 92/VII - De pesar pelas vítimas do acidente ferroviário recentemente ocorrido perto de Estombar, no Algarve, subscrito pelo PS, e o voto n.º 93/VII. De congratulação pela passagem do Dia da Qualidade, subscrito por todos os grupos parlamentares, que podíamos começar, desde já, por discutir e votar.
Para a leitura dos dois votos, tem a palavra o Sr. Secretário.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto n.º 92/VII subscrito pelo PS, é do seguinte teor:
«Como se já não bastassem as destruições provocados pelas fortes chuvadas que caíram no Algarve, com especial intensidade e violência no barlavento algarvio, arrasando bens públicos e privados, deixando atrás de si a desolação e a dor e deixando-nos a todos mais pobres do que éramos, restando-nos o alívio de não haver mortos a lamentar e ainda não refeitos, eis que mais uma vez, o destino quis, de novo, trazer a tragédia ao barlavento algarvio e às suas gentes.
No princípio da noite do dia 8 de Novembro, sábado, na linha do Algarve, perto de Estombar um trágico acidente ferroviário ceifou quatro vidas humanas, semeando o pânico nos restantes passageiros, deixando cerca de 17 feridos, felizmente já livres de perigo.
A protecção civil acorreu rapidamente ao local do desastre e cumpriu a sua missão com eficiência e rigor, justificando o reconhecimento dos algarvios.
A CP já assumiu a responsabilidade pelo trágico acidente, comprometendo-se a indemnizar as famílias das vítimas mortais havidas, assim como a compensar todos os que, em resultado do acidente, viram os seus bens pessoais destruídos, cumprindo a sua obrigação.
Do mesmo passo instam a CP a tomar todas as providências em matéria de segurança ferroviária que impeçam a repetição de acidentes como o agora ocorrido.
Os Deputados do Partido Socialista, eleitos pelo círculo eleitoral de Faro, inconformados com esta triste ocor-
Página 557
20 DE NOVEMBRO DE 1997 557
rência que provocou vítimas mortais, apresentam à Assembleia da República a presente proposta de voto de pesar a transmitir às famílias enlutadas as suas condolências e aos feridos os votos de rápida recuperação».
Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto n.º 93/VII, subscrito pelo PS, PSD, CDS-PP, PCP e Os Verdes, é do seguinte teor:
«Comemora-se, hoje, o Dia da Qualidade. A defesa e a exigência dos valores da qualidade são alicerces do desenvolvimento e crescimento sustentado do País.
Corresponde por si a uma atitude inovadora que a todos deve envolver; empresários, trabalhadores e consumidores, no sentido de uma mudança de atitudes e comportamentos, cada vez mais exigente e eficaz.
A qualidade de vida dos cidadãos e as condições do seu exercício não são por isso dissociáveis deste esforço que, no seu domínio específico, também a economia portuguesa está a empreender.
A qualidade como opção nacional é um objectivo que, a todos os níveis, a Assembleia da República tem de subscrever.
Nestes termos, a Assembleia da República congratula-se com a passagem de mais um Dia Mundial da Qualidade e exorta os portugueses a continuarem a prosseguir esse valor fundamental à dignidade humana e ao progresso».
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão o voto n.º 92/VII.
Tem a palavra o Sr. Deputado Martim Gracias.
O Sr. Martim Gracias (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Efectivamente, o Algarve foi martirizado neste passado recente. As intempéries tocaram todo o País e as ilhas. Foi um acontecimento fruto da natureza. cujo aspecto nefasto os homens fizeram o possível para contrariar e combater.
No entanto, não ficou por aqui o Algarve e, devido a uma imprudência ou talvez a uma falta de perícia, houve um choque de comboios junto a Estombar, bem perto de Portimão. Nesse choque de comboios, morreram quatro pessoas. Foi esta a tragédia de morte, que também nos atingiu no Algarve.
Se no resto do País houve mortes, fruto, como disse, da natureza e da imprevisão, no nosso caso, Algarve, fomos efectivamente maltratados pelos próprios homens. Houve homens que morreram às mãos de outros homens, que não tiveram o cuidado necessário, e o inquérito irá demonstrar quais as causas que provocaram este malogrado acidente ferroviário.
Não estou a lamentar as destruições e os gastos materiais deste acidente: estou, sim, a lamentar quatro vidas humanas, que hoje, estariam connosco no mundo dos vivos, mas que, neste momento, já nos deixaram, talvez antes do tempo que lhes estaria determinado para viver.
É nesse sentido que os Deputados do Partido Socialista, eleitos pelo círculo eleitoral de Faro, entenderam dever mostrar o seu inconformismo, perante esta Assembleia da República, o povo do Algarve e todos os portugueses, porque muito fomos afectados por esta tragédia.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.
O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Popular quer naturalmente associar-se a este voto de pesar e lamentar o acidente ferroviário que ocorreu em Estombar, no Algarve.
Porém, neste momento em que todos os Deputados desta Câmara devem associar-se a este voto de pesar, entendemos que importa nós próprios fazermos uma reflexão sobre as causas desta ocorrência, para evitar que se repitam acidentes desta natureza.
Apontam os primeiros indícios para falha humana. Na intervenção feita há pouco, o Sr. Deputado dizia, a determinada altura, que houve homens que morreram por irresponsabilidade de outros homens. A questão que gostava de deixar clara é que a irresponsabilidade de outros homens não é apenas a irresponsabilidade daqueles que directamente estiveram envolvidos no acidente, mas também a daqueles - e por isso, também nossa - que ainda não tiveram capacidade de dotar as vias ferroviárias da técnica que permita viajar em segurança e em que a vida de outros homens não esteja dependente da perícia de outros homens.
Era isto que, penso, deveria ser objecto de reflexão, para evitar que haja mais votos de pesar desta natureza nesta Câmara.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Telegraficamente, em nome de Os Verdes, gostaria de dizer que nos associamos a este voto de pesar pela perda de vidas, no Algarve. Foi um acidente, que não nos compete ajuizar nem avaliar, porque não está nas nossas mãos poder dizer em rigor e com justiça, quais as suas causas, as suas razões e os seus responsáveis. Porém, há seguramente um problema inerente a esta questão, que não pode ser ignorado: é o de termos linhas ferroviárias obsoletas e atrasos muito grandes na modernização dos nossos transportes e de não se considerar as questões de segurança e a sua prevenção como um investimento, no sentido de se pouparem vidas, bens e valores não passíveis de troca.
É neste exacto sentido que, independentemente daquilo que venha a ser a conclusão do relatório a elaborar, importa considerar que tudo o que seja feito para prevenir acidentes e investir em segurança é um investimento com futuro e que não pode ser só pautado, como tem sido, por valores economicistas e por uma visão pequena daquilo que está em causa.
Assim, associamo-nos sentidamente à perda destas vidas e pensamos que importa ter em conta outros indicadores e outras formas de considerar o bem-estar das pessoas, a prevenção e a segurança.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar este voto de pesar...
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
Página 558
558 I SÉRIE - NÚMERO 15
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de referir duas coisas: primeiro, já solicitei, desde o início da sessão, a distribuição dos votos que vão ser votados. Parece que foram distribuídos na semana passada, mas hoje não o foram, e não creio que seja possível a Assembleia votar documentos que não estão distribuídos.
Em segundo lugar, tinha transmitido oportunamente à Mesa a inscrição do Sr. Deputado Cabrita Neto para usar da palavra sobre este voto, coisa que não ocorreu. Peço, pois, a V. Ex.ª que, em qualquer circunstância, o PSD possa exprimir a sua posição a propósito deste voto.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, os votos não foram distribuídos, porque já tinham sido. É evidente que podem voltar a sê-lo, não há qualquer problema. Só que temos hoje uma agenda tão carregada que, se vamos perder tempo a fazer o que já foi feito, carregamo-la ainda mais.
Em segundo lugar, percebi que a inscrição do Sr. Deputado Cabrita Neto era para usar da palavra sobre o voto que, agora, deu entrada na Mesa. Porém, vejo que não, que é também para intervir sobre este assunto.
Tem a palavra o Sr. Deputado Cabrita Neto.
O Sr. Cabrita Neto (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PSD associa-se, com grande dor, à infeliz morte de quatro cidadãos no acidente ferroviário ocorrido perto de Estombar e lamenta profundamente que estes factos venham a acontecer com alguma periodicidade.
Foi-nos transmitido que teria havido falha humana nas razões que levaram a esta trágica ocorrência, que ceifou quatro vidas num acidente, de algum modo, inexplicável. E inexplicável, tendo em conta que estamos no fim do século XX, aproximamo-nos de um novo milénio e ainda é concebível fazerem-se meios de transporte de grande responsabilidade sem meios técnicos, que não são altamente sofisticados, como seja um rádio existente nas estações de caminho-de-ferro e também nas composições.
Lamentamos estes factos, nos quais todos temos alguma responsabilidade. Aliás, ainda há pouco tempo, tive oportunidade de requerer ao Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território informações sobre o que se vai passar com a linha do Sul e a linha do Algarve e, até hoje, o Sr. Ministro não se dignou dar qualquer resposta.
Lamento profundamente estes factos e espero que eles sirvam de lição para que, daqui a algum tempo, não tenhamos de lamentar novamente mais mortes por deficiências que, embora podendo ser humanas, são também técnicas e sinal de que não estamos a fazer os pequenos investimentos que uma linha justificava. Os grandes investimentos, de milhões, são importantes, mas, nesta linha, para além dos milhões, também podíamos fazer um investimento de tostões, na aquisição de equipamento de segurança, já à altura deste fim de século.
Lamentamos este facto e esperamos que, depois deste infeliz acidente, não tenhamos novamente de o fazer, por razões idênticas, no futuro.
Não é um mau presságio; é um desejo sincero de que todos sejamos capazes, começando pelo Governo e pela própria CP, de actualizar o seu funcionamento.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP também quer associar-se a este voto de pesar pelo trágico acidente ferroviário, no Algarve, que ocasionou 4 mortos e 17 feridos.
Associamo-nos a este voto de pesar, mas também queremos dizer que mais este acidente obriga-nos, a nós e particularmente ao Governo, a reflectir sobre as condições de segurança em que hoje funcionam muitas das nossas vias ferroviárias, designadamente quanto aos meios de comunicação entre os condutores dos comboios e as estações da CP. Na verdade, de acordo com as notícias vindas a público, parece que aí reside uma das falhas do sistema.
Se assim é, será bom que não nos fiquemos por mais um inquérito sem consequências, mas que desse inquérito e desta reflexão resultem medidas práticas que reforcem os sistemas de segurança e, particularmente em relação a este caso concreto, que reforcem os sistemas de comunicações entre os condutores dos comboios e as estações da CP.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar o voto n.º 92/VII - De pesar pelas vítimas do acidente ferroviário recentemente ocorrido perto de Estombar, no Algarve, subscrito pelo PS.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Este voto será transmitido às famílias enlutadas.
Srs. Deputados, vamos guardar um minuto de silêncio.
A Câmara guardou, de pé, um minuto de silêncio.
Agradeço aos Srs. Deputados e também aos jovens que estão na galeria a assistir à sessão e que quiseram guardar connosco este minuto de silêncio.
Passamos à apreciação do voto n.º 93/VII - De congratulação pela passagem do Dia da Qualidade. Este voto foi apresentado na Mesa, distribuído e lido na data em que se comemorou o Dia da Qualidade e vamos apreciá-lo e votá-lo hoje.
Tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Neto.
O Sr. Henrique Neto (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Socialista congratula-se com a passagem de mais um Dia Mundial da Qualidade, que ocorreu na semana passada. A este propósito, há que referir a importância que a qualidade tem nas sociedades modernas a todos os níveis, bem como a cultura da qualidade.
Quero deixar-vos uma palavra especial relativamente à existência de sistemas formais de qualidade.
É que, para ser real, a qualidade tem de ser mais do que um desejo, têm de existir sistemas formais, tem de existir uma organização dirigida à qualidade e, nos últimos anos, as empresas portuguesas têm vindo a fazer um esforço nesse sentido. Portugal tem, já hoje, umas centenas de empresas certificadas por organismos nacionais e internacionais do sector da qualidade, mas ainda há um grande trabalho a fazer nesta área da certificação e de consciencialização da sociedade portuguesa para a importância da existência de sistemas formais de qualidade.
Chamo a vossa atenção através do exemplo do que acontece no transporte aéreo: um sistema de elevadíssima
Página 559
20 DE NOVEMBRO DE 1997 559
fiabilidade, quase infalível. Isto acontece porque existem sistemas formais de qualidade extremamente rigorosos que têm a ver com a qualidade dos equipamentos utilizados, com a qualidade da formação humana que é realizada a todos os níveis e com a qualidade das organizações. O transporte aéreo é, provavelmente, o exemplo mais evidente da importância da qualidade formal na eficácia e na
fiabilidade dos sistemas.
Ainda para demonstrar a importância dos sistemas de qualidade, não posso deixar de referir que, entre nós, ao inverso, continuam a existir muitos
acidentes, nomeadamente acidentes de trabalho - ainda agora acabámos de formalizar um voto de pesar por mais um acidente, embora não queira dizer que tenha ocorrido por razões de falta de qualidade. Isto acontece devido à nossa ainda insuficiente consciência quanto à importância da qualidade e, principalmente, quanto à importância da existência de sistemas formais de qualidade, não só nas empresas mas também na Administração Pública.
Já agora, devo dizer que, muitas vezes, a qualidade começa por nós próprios, começa pela nossa própria consciência da necessidade da existência de qualidade à nossa volta. Nesse sentido, a própria Assembleia da República faria bem em criar um sistema formal de qualidade dos seus serviços e da sua própria organização.
Neste dia em que saudamos o Dia Mundial da Qualidade, a qualidade deverá começar também por nós próprios.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A minha bancada também deseja associar-se a este voto de congratulação pela passagem de mais
um Dia Mundial da Qualidade. O mesmo não poderemos dizer em relação à qualidade que todos os dias sentimos nos serviços, no que consumimos e na forma como desenvolvemos a nossa vida. Isto para dizer que, de facto, em Portugal, a qualidade ainda não é hoje uma realidade pelo menos acessível à maioria dos portugueses.
A propósito da qualidade, gostaria de dizer que não somos a favor de uma cultura da qualidade. A cultura da qualidade é a que assenta na competição e esta última, só por si, não é um valor, pelo contrário. Temos, pois, de ter muito cuidado com este tipo de culturas que já várias vezes foram censuradas em Portugal quando se tomaram excessivas.
Consideramos, sim, que a qualidade deve ser um objectivo, integrando o objectivo final do desenvolvimento humano, do desenvolvimento sustentado, da valorização do factor humano e da valorização da dignidade humana.
Pensamos que Portugal ainda tem um longo caminho a percorrer neste domínio. Por um lado, é óbvio que o próprio desenvolvimento leva a que, hoje, se tenha um grau crescente de exigência e verificamos que, constantemente, esse grau de exigência é defraudado pela incapacidade de, com qualidade e com consciência, fazer o trabalho de cada dia.
Portanto, intervenho no sentido de sublinhar que a qualidade é instrumental para atingir objectivos finais e, portanto, não é, em si, objecto de uma cultura, deve ser integrada no nosso quotidiano como um instrumento e não como um objectivo final e deve ser vivida, pois, de outra forma, vai ficar mais um conceito esvaziado como tantos outros.
A minha bancada associa-se a este voto apenas e só no sentido que apontei até porque, como sabemos, é muito pouca a importância que actualmente têm estes Dias Mundiais, exactamente porque remetemos para estas comemorações as tarefas que nos competia fazer em cada dia das nossas vidas e no exercício das nossas responsabilidades.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tomo a palavra para apontar as razões pelas quais Os Verdes subscreveram este voto e por que o consideram importante.
Os Verdes entendem este voto não como sinónimo de uma efeméride igual a tantas outras que se comemora para alívio mas, sim, pela importância que hoje têm as questões da qualidade.
Quando digo «questões de qualidade» não me refiro a elas como um rótulo, como um bem de consumo passível de ser o exclusivo de uma minoria que dele possa fazer uso. Pelo contrário. as questões da qualidade implicam um outro olhar em relação ao futuro, uma outra consideração dos direitos.
Para nós, as questões da qualidade têm a ver com o ar que respiramos. com a água que bebemos, com o solo que nos rodeia, com as características do que consumimos.
Nesta perspectiva, perante valores que, hoje, numa sociedade consumista que se afirma pelo ter e não pelo ser, fazem a apologia do consumo, da panóplia de objectos, muitos dos quais sem qualquer significado e não correspondendo a necessidades reais, a qualidade impõe-se como um direito de todos, numa visão de solidariedade, de longo prazo, no que é, seguramente, uma outra forma de conceber a sociedade e os seus valores.
Do ponto de vista de Os Verdes, é por aqui que passa a questão da qualidade e é nesta perspectiva que entendemos discuti-la na Assembleia da República, onde tem de ser pensada a qualidade das próprias instituições e da democracia porque também ela precisa de ser reformada.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Artur Torres Pereira.
O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sr. Presidente, V. Ex.ª tem sempre solicitado que as nossas intervenções tenham a qualidade de serem breves e, neste dia. não posso deixar de corresponder em especial à sua solicitação, fazendo uma breve intervenção.
Pela nossa parte, associamo-nos com gosto à celebração desta virtude que é a qualidade e fazemo-lo essencialmente por duas razões.
A primeira é porque entendemos a qualidade não associada à competição, geradora de novas injustiças, irias geradora de uma cultura de responsabilidade social, de responsabilidade de todos e, sobretudo, de responsabilidade de cada um relativamente à sua vida própria, às suas relações com os outros, à forma de encarar o trabalho e à maneira como garante os serviços que presta ou que recebe.
Em segundo lugar, encaramos a qualidade numa perspectiva temporal, na perspectiva de um país que, para além de ter de resolver as graves carências herdadas do passa-
Página 560
560 I SÉRIE - NÚMERO 15
do, tem de fazê-lo de forma adequada que permita não só a satisfação das necessidades quantitativas mas, sobretudo, que as satisfaça de uma forma adequada.
Por isso, porque a política também vive de símbolos e de imagem, associamo-nos com gosto à celebração simples deste Dia Mundial da Qualidade com base nesta cultura de responsabilidade e de futuro.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação deste voto n.º 93/VII - De congratulação pela passagem do Dia da Qualidade, subscrito pelo PS, PSD, CDS-PP, PCP e Os Verdes.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Este voto vai ser transmitido ao Sr. Ministro da Economia.
Srs. Deputados, entretanto, deu entrada na Mesa, e foi distribuído, um outro voto, ao qual foi atribuído o n.º 94/VII, subscrito pela Deputada do PSD, Teresa Patrício Gouveia, de pesar pelo falecimento do Professor Doutor Orlando Ribeiro que, como sabem, foi uma grande figura de pedagogo, académico, cientista e escritor cujo falecimento representa, de facto, uma grande perda cultural para o nosso país.
Para proceder à leitura do voto, tem a palavra o Sr. Secretário.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto n.º 94/VII é do seguinte teor:
«Orlando Ribeiro foi o último de um conjunto de personalidades suas contemporâneas e seus colegas de magistério como Lindley Cintra, Borges de Macedo, Mário Chicó, Manuel Antunes, Delfim Santos ou Jorge Dias que ensinaram e, certamente, marcaram sucessivas gerações em Portugal.
Orlando Ribeiro deixou-nos uma obra com um significado único nas Ciências Humanas em Portugal.
Introdutor do estudo da Geografia no nosso país, Orlando Ribeiro estudou e cultivou esta ciência como um lugar onde se cruzaram vários saberes e desafios, olhar para o território e para a paisagem portuguesa, nelas fazendo convergir a história e a sociedade, numa síntese verdadeiramente iluminadora.
Por isso, a sua obra e a sua personalidade humanista transcenderam a disciplina da Geografia, «ciência de ver e agir», como ele próprio a definiu.
O seu livro Portugal Mediterrânico e o Atlântico, entre a sua vasta obra, fica entre nós como um retracto sempre dinâmico, no qual os portugueses se podem ver na sua diversidade e na sua unidade, testemunhando a interacção entre os constrangimentos da geografia e a liberdade dos homens.
Pode dizer-se que talvez nenhum outro contributo individual tenha, neste sentido, oferecido aos portugueses um tão profundo conhecimento de si próprios, do seu território, da sua civilização.
A Assembleia da República, no momento em que Orlando Ribeiro nos deixou, presta-lhe uma sentida homenagem».
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Patrício Gouveia.
A Sr.ª Teresa Patrício Gouveia (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Professor Orlando Ribeiro foi uma das grandes personalidades da cultura e da ciência em Portugal. Pertenceu a um conjunto de estudiosos e professores com que muitos tiveram o privilégio de conviver, como foram Manuel Antunes, Lindley Cintra, Jorge Dias, Borges de Macedo ou Mário Chicó.
As suas aulas e as páginas dos seus livros constituem o património espiritual e cultural de muitos em Portugal e no estrangeiro, onde também foi professor. A veemência da sua personalidade e a luminosidade da sua obra tocaram várias gerações de estudantes e de leitores.
Essa obra teve a originalidade que resultou da inteligência e da frescura com que olhou os sítios, o território e a paisagem e daí ascendendo ao homem, não só na sua vida hodierna, mas como longa caminhada que as civilizações percorreram no tempo, «enriquecendo-se ou deteriorando-se», para usar palavras suas,
Orlando Ribeiro deixou-nos uma das mais iluminadoras sínteses sobre a terra portuguesa e sobre o homem que a habita. Infelizmente, a sua obra é pouco conhecida, quando, na realidade, deveria ser obrigatória em todas as escolas portuguesas, pelo conhecimento que proporciona sobre a própria identidade cultural do País e do território.
Os seus escritos foram sempre ao arrepio do politicamente correcto, qualquer que ele fosse. A sua obra desfez lugares comuns que os regimes e as oportunidades políticas pretenderam, sucessivamente, projectar sobre a realidade nacional, ou com que a quiseram interpretar, esses lugares comuns foram sempre subvertidos pelo rigor da sua investigação, pelo seu olhar certeiro, pela sua palavra livre e belíssima.
Seria bom tê-lo hoje como companheiro de reflexão em muitas das questões que se discutem na sociedade portuguesa e nos ocupam aqui, nesta Casa, e que dizem respeito ao debate político sobre o território, a diversidade e a identidade nacional. A sua ponderação e saber, a sua chamada ao terreno e ao real mitigariam, com a humildade dos cientistas e dos estudiosos, algum voluntarismo próprio dos políticos que somos todos nós.
Parafraseando Borges de Macedo, o seu companheiro de faculdade, «a sua autoridade científica provaria indispensáveis as advertências que a história e a ciência trazem para a vida contemporânea». Na sua ausência, ficamos com a riqueza dos seus livros que, certamente, nos acompanharão.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.
O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Geografia e Orlando Ribeiro são praticamente sinónimos em Portugal; geografia e geografia humana são, em Orlando Ribeiro, praticamente sinónimos.
Para Orlando Ribeiro o que sempre contou e conta, porque as suas obras continuam connosco, é o homem no espaço, na geografia e, deste modo, a geografia do ser humano. Por isso, Orlando Ribeiro é o paradigma do geógrafo que não é entendedor apenas de Geografia porque, se o fosse, nada dela entenderia.
Orlando Ribeiro levou toda a sua vida a dizer-nos que a Geografia é habitada pelos homens e que, em bom rigor, não faz qualquer sentido sem eles. Foi deste modo que Orlando Ribeiro deu um contributo inestimável para a construção da nossa própria identidade enquanto pessoas, enquanto povo, enquanto povo português.
Página 561
20 DE NOVEMBRO DE 1997 561
Orlando Ribeiro ensinou-nos que devemos pensar e devemos «pensar-nos» com os pés bem assentes na terra, e nesta terra e no povo que a habita. Daí a nossa inevitável homenagem.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Pereira Marques.
O Sr. Fernando Pereira Marques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Orlando Ribeiro doutorou-se aos 25 anos com uma tese sobre a Arrábida e a sua geografia e prosseguiu esta brilhante carreira universitária, logo assim iniciada, fundando, em 1943, a primeira instituição nacional de investigação em Geografia. o Centro de Estudos Geográficos, que passou a editar a primeira publicação regular do País sobre Geografia e que temo muito que ainda seja uma das únicas, senão a única, publicação regular sobre esta disciplina.
Em 1949, organizou em Lisboa, o XVII Congresso Internacional de Geografia, o único até hoje realizado em Portugal, facto que ilustra, desde logo a projecção internacional do professor e da obra, já publicada em várias línguas.
Orlando Ribeiro ensinou, assim, na Sorbonne, no Collège de France, no Rio de Janeiro, no Quebeque e nas universidades de Salamanca, Valladolid e Sevilha e entrou para a Academia das Ciências italiana antes de ser admitido na Academia das Ciências portuguesa, assim como também pertenceu às Academias de Ciências de Madrid e de Bordéus.
Não era um geógrafo de gabinete de calculadora e algo burocrático, mas um homem que percorria os territórios que estudava com botas de montanhês, um «andarilho» de uma curiosidade intelectual inesgotável que cultivava uma visão humanista da Geografia, que se cruzava com a História, a Antropologia, a Arqueologia. Ainda há pouco, a minha colega Helena Roseta sublinhava o contributo de Orlando Ribeiro para a formação de toda uma nova geração de arquitectos que passou a olhar a arquitectura com «novos olhos».
Deixou-nos, numa prosa luminosa e apaixonada, através de muitas obras, uma reflexão sobre Portugal e os portugueses liberta de clichés e mitologias várias, para além de outras obras que escreveu sobre a expansão portuguesa, sobre o Mediterrâneo enquanto zona terrestre e domínio de civilização. sobre a colonização ou, até, sobre as erupções na ilha do Fogo.
Portugal perdeu uma grande figura da sua cultura. Pena é que, apesar do esforço de Orlando Ribeiro e da sua obra, a Geografia continue a não encontrar o lugar que merece nessa mesma cultura e na Universidade portuguesa e...
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - ... a ser considerada um género da disciplina menor, isto num país que tanto gosta dos floreados retóricos e comemorativistas sobre a epopeia dos Descobrimentos.
Sr. Presidente. Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PS associa-se, naturalmente, a este voto de pesar e transmite os seus pêsames à família enlutada.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar de Os Verdes associa-se a este voto pelo falecimento do Professor Orlando Ribeiro.
O Professor Orlando Ribeiro, tal como ficou sublinhado, foi alguém que teve um papel marcante no conhecimento e na divulgação da Geografia como ciência, marcou uma geração e é autor de diversas obras de referência que todos os estudantes das nossas universidades deveriam conhecer.
No momento da sua perda, em que a Assembleia da República se associa a esta homenagem através deste voto, julgo que a maior homenagem que esta Assembleia pode dar a alguém como Orlando Ribeiro, numa perspectiva de futuro, é divulgar a sua obra e acima de tudo colher nas suas decisões e na sua prática aquilo que ele nos ensinou nos seus livros. Refiro-me às questões que são hoje cruciais para o desenvolvimento. Não pode haver desenvolvimento se o ordenamento do território e o ambiente viverem «divorciados» e se nossa diversidade, do ponto de vista da fauna, da flora e também, cultural, domínio que está intimamente ligado a estes aspectos, não for considerada.
Vale, sobretudo, a actualidade de uma mensagem que, embora datada, continua sem ser hoje uma prática do nosso quotidiano, designadamente quando os decisores políticos continuam a ignorar que o nosso progresso, em termos de equilíbrio com a natureza e o homem, implica ter em conta uma diversidade e
uma identidade que nos são próprias e singulares. É precisamente o reconhecimento dessa singularidade que nos diferencia que tem de actuar como matriz do desenvolvimento.
Homenagear Orlando Ribeiro é trazer para o debate os seus ensinamentos, é trazer para a decisão política o que as suas obras nos ensinaram.
Vozes de Os Verdes e do PS - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecasis.
O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Nada melhor para homenagear a grandeza de Orlando Ribeiro do que a simplicidade das palavras. Aliás, Orlando Ribeiro, como muitos grandes homens da sua geração, foi um homem simples.
Conheceu e estudou Portugal, correndo o País e falando com os portugueses - penso que quando o fazia não dizia para si próprio que era um professor universitário mas, sim, um homem curioso que levava a sua curiosidade aos limites e alguém que estava a abrir caminhos.
Todos os que se preocupam com o urbanismo neste país sabem qual foi a força pioneira de Orlando Ribeiro que atraiu a atenção de quem se preocupa com a cidade, com os aspectos mais humanos, mais do nosso dia-a-dia.
Orlando Ribeiro, como Vitorino Nemésio, foi um homem simples que soube conter na sua simplicidade
uma grandeza ímpar.
Sr. Presidente, Portugal está mais pobre e esta Assembleia deve reflectir sobre isso. Felizmente, Orlando Ribeiro deixou muitos discípulos. Fervorosamente desejo que eles sejam capazes de continuar a sua obra e que nós sejamos legítimos e bons herdeiro, de tudo aquilo que ele nos ensinou.
Página 562
562 I SÉRIE - NÚMERO 15
Presto, em nome do Grupo Parlamentar do CDS-PP, a homenagem da simplicidade das palavras para um homem de uma gigantesca dimensão.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Presidente e a Mesa associam-se às vossas palavras, comovidamente.
Vamos proceder à votação do voto n.º 94/VII, subscrito pela Deputada do PSD, Teresa Patrício Gouveia.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, o voto será levado ao conhecimento da família enlutada e, também, do Ministro da Educação, uma vez que Orlando Ribeiro foi um ilustre professor.
Srs. Deputados, uma vez mais, vamos guardar um minuto de silêncio.
A Câmara guardou, de pé, um minuto de silêncio.
Srs. Deputados, encontram-se a assistir à sessão 25 alunos da Escola Profissional da Região do Alentejo, de Évora, e 50 alunos da Escola Secundária de Pinhal Novo, para os quais peço a vossa habitual saudação.
Aplausos gerais, de pé.
Srs. Deputados, para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Namorado.
O Sr. Rui Namorado (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Decorreram, recentemente, em Vila Real, as Jornadas Parlamentares do PS que tiveram como eixo temático «Interioridade, Desenvolvimento e Regionalização», representaram uma homenagem h região de Trás-os-Montes e Alto Douro e traduziram solidariedade para com todos os que, em Portugal, suportam os custos da interioridade.
Os Deputados do PS percorreram o distrito, ouvindo e dialogando com as populações. Estiveram, assim, mais perto dos seus problemas, mas sentiram também a multiplicidade de iniciativas dos mais diversos agentes, de muitas colectividades, que bem mostram que ali não mora o conformismo nem o desânimo perante as dificuldades. Foi possível detectar a consonância profunda com algumas das preocupações centrais do actual Governo, quer pela importância atribuída à educação pré-escolar, quer pelo empenho na ajuda aos mais desfavorecidos, quer pela vontade de um protagonismo próprio na luta pelo desenvolvimento.
Por isso, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista reforçou a sua determinação de apoiar todos os processos políticos que se traduzam numa verdadeira e efectiva descentralização...
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - ... e, nessa medida, reafirmou com vigor que a regionalização administrativa é o único caminho que permitirá que o municipalismo se desenvolva realmente.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!
O Orador: - E, se ainda houvesse dúvidas, o ambiente vivido e as posições tomadas pelos diversos autarcas tornaram claro que a regionalização administrativa é uma oportunidade única de abrir as portas à participação das regiões do interior na definição da sua estratégia de desenvolvimento e de entusiasmar, verdadeiramente, os agentes económicos e sociais com os desafios da mudança.
Aplausos do PS.
Neste contexto, foi dado pleno valor à ideia de que uma estratégia de desenvolvimento do interior de base regional será um precioso reforço da posição de Portugal no processo negocial que envolve a distribuição dos fundos estruturais, a partir de 1999.
Ficou, assim, ainda mais evidente que a regionalização não é uma reforma entre outras, que possa ser bloqueada sem que daí resultem efeitos negativos e perturbadores de outros processos de reforma.
Por exemplo, é impensável conseguir-se reformar profundamente a Administração Pública, sem que o processo de regionalização se consuma. Paralelamente, sem que o nível regional funcione democraticamente, multiplicar-se-ão os obstáculos nos processos de reforma da educação, da saúde e da segurança social e o combate à exclusão social e a luta pelo emprego e pela qualificação do trabalho enfrentarão dificuldades maiores.
As reformas visadas pelo Partido Socialista são reformas humanizantes, democratizantes, dirigidas às pessoas. Dirigidas às pessoas, encaradas como titulares de uma cidadania activa, reformas pensadas como elementos de uma justiça social que seja um factor estruturante da democracia. Por isso, mais difícil seria levá-las a bom porto se a regionalização fosse bloqueada.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!
O Orador: - Isso não acontecerá, o Governo do PS e da nova maioria vai continuar a levar por diante as mudanças necessárias. Mas quanto a essas mudanças, a essas reformas, as oposições não devem alimentar ilusões sobre a possibilidade de enredarem o PS na teia dos seus fundamentalismos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O PS tem procurado abrir um espaço de debate que consensualize a natureza dos problemas a enfrentar e torne possível persuadir os portugueses do essencial das políticas a praticar.
O actual Governo continuará empenhado no diálogo, disposto a pesar todas as opiniões, mas não esquecerá o essencial das propostas que apresentou ao eleitorado e que este expressivamente apoiou.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - As mudanças necessárias no campo da educação, da saúde, da segurança social, da qualificação do trabalho e da equidade fiscal, cuja aceleração e sistematização podem ser designadas por reforma, não serão as que a direita liberal gostaria de conseguir, não serão ditadas nem pela oposição de direita, nem pelos liberais incrustados em organismos internacionais, serão as que o PS propôs ao eleitorado e que este sufragou.
Aplausos do PS.
Página 563
20 DE NOVEMBRO DE 1997 563
É bom também não esquecer que os processos de reforma em causa estão longe de ser um acordar de activismos que sucedem a inércias. Pelo contrário, estão já a ser vividos através da sua preparação ao longo destes dois anos de governação. Preparados não só no sentido de estarem a ser projectados e submetidos, em muitos dos seus aspectos, ao contraditório democrático mas também no sentido de os ir inscrevendo no espírito dos cidadãos, para que estes os vão compreendendo e os possam assumir com plena autenticidade. Mas, principalmente, preparados no sentido de existirem medidas prévias que têm de ser tomadas para que a fase mais global e sistematizada das reformas possa ser posta em prática com o mínimo de custos e sobressaltos.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As reformas por que o PS se responsabilizou não são uma versão retocada das célebres reformas que a direita apelidou de estruturais, mas que não eram mais do que uma retórica destinada a ocultar uma vontade real de precarizar a protecção social, de desresponsabilizar o Estado pela educação e pela saúde e de reduzir os direitos dos trabalhadores.
Queremos racionalizar a afectação de recursos, potenciar a eficácia das organizações, aproximar os serviços das pessoas, melhorar a justiça na distribuição do que é escasso, mas não vamos afastar o Estado do cumprimento dos seus deveres e, muito menos, transformar os problemas e as dificuldades dos portugueses em oportunidades de lucro especulativo para um escasso punhado de agentes económicos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com serenidade e firmeza, o Governo do PS e da nova maioria, em conjugação com o nosso grupo parlamentar, vai continuar a realizar o seu Programa. Sem pressa mas sem tergiversar, fiel, como sempre, aos seus compromissos e às suas convicções. É nessa medida que o PS tudo fará para que, uma vez actualizados os cadernos eleitorais, os dois referendos que estão no horizonte tenham lugar em simultâneo durante o primeiro semestre de 1998.
Aplausos do PS.
Lançar dúvidas sobre a determinação do PS nesta matéria é algo tão destituído de fundamento que só pode significar reserva mental ou hesitação de quem lança essas dúvidas.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Exactamente!
O Orador: - É a serenidade e a firmeza do Partido Socialista que fazem com que as oposições se mostrem inquietas. Compreende-se!...
Todos os estudos de opinião permitem concluir que quem votou PS em 1995 não se desiludiu. A opinião pública está, assim, em consonância com a incontornável linguagem dos números, com a evolução positiva dos indicadores
macro-económicos. E está nesta conjugação a raiz do alarme das oposições, que têm oscilado entre um terrorismo argumentativo que apouca a democracia e um primarismo que seria ingénuo se fosse sincero.
Na verdade, incapazes de criticarem em concreto o actual, Governo as oposições acusam-no de não governar. Como se fosse possível um Executivo que não governasse conduzir o País aos resultados económicos e sociais que foram alcançados.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Antes, diziam que o PS levaria, necessariamente, o País para a catástrofe económica. Agora, dizem que o êxito do seu Governo é obra do acaso.
Mas a oposição de direita, com destaque para o PSD, não se coibiu sequer de recorrer a uma arma que se julgava prescrita na democracia portuguesa. Precipitou-se com sofreguidão sobre as catástrofes naturais recentemente ocorridas e sem pudor usou os dramas pessoais de muitos portugueses como fornecedores da energia política de que estava carecida.
Vozes do PS: - Uma vergonha!
O Orador: - A crítica das oposições é um vector irrenunciável da democracia, se souber ser um estímulo à cidadania dos eleitores, ao seu saudável inconformismo e à sua generosidade, mas pode também ser um cínico aproveitamento de pulsões destrutivas, susceptível de inquinar o debate político e de a todos nos diminuir na nossa cidadania democrática.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Façamos votos de que as oposições se acalmem. O medo dos resultados das próximas eleições autárquicas, por mais justificado que seja, não legitima tudo. De qualquer modo, o povo não deixará de as sancionar com severidade no próximo dia 14 de Dezembro, constrangendo-as, provavelmente, a uma atitude crítica mais conforme com as regras da convivência democrática. E, por certo, enviará nesse mesmo dia ao Governo uma mensagem de estímulo e confiança. O Governo e o Partido Socialista receberão com orgulho mais esse encorajamento.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Também para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero, em primeiro lugar, constatar que as Jornadas Parlamentares do Partido Socialista correram muito bem...
Vozes do PS: - É verdade!
O Orador: - ... e que os Srs. Deputados do Partido Socialista vêm muito contentes e muito rejuvenescidos, com as mesmas teimosias de sempre.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Desde que S. Ex.ª o Presidente da República levantou o problema do efeito vinculativo do referendo em função do universo real ou presumido dos recenseados, tem sido um verdadeiro desassossego.
O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Isso faz parte da discussão de amanhã!
Página 564
564 I SÉRIE - NÚMERO 15
O Orador: - Não há um dia em que se não inventem métodos, datas, tentativas, soluções engenhosas.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Deixe lá o Marcelo em paz!
O Orador: - Por sinal, antes, nenhum membro do Governo tinha prestado atenção ao problema. O recenseamento não passava pela preocupação do Partido Socialista, que acordou com o PSD no requisito da participação para a eficácia vinculativa do referendo, nem pela atenção do Partido Socialista ao aspecto essencial da participação eleitoral, quando também acordou com o PSD as alterações aos sistemas eleitorais.
O recenseamento era o parente pobre e, todavia, já por várias vezes se havia colocado o problema e se havia mesmo dito da conveniência em utilizar os anos de 1996 e 1997 para a sua correcção e informatização.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A pressa é hoje tanta e tanta a perturbação que, pressionado pelas circunstâncias, o Governo propôs à Assembleia da República uma solução de recurso. Entendamo-nos! Alterar o recenseamento eleitoral e informatizá-lo é uma tarefa de grande melindre e de grande responsabilidade.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Não basta existir um estudo com prazos sugeridos para a sua realização e uma proposta com maior urgência.
É preciso que o Governo nos diga e assuma a responsabilidade de uma data a partir da qual se garanta a fixação dos cadernos eleitorais.
Aplausos do PSD.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Pouco aplaudido, Sr. Deputado!...
O Orador: - É este o primeiro problema político que queremos esclarecido.
É conveniente que, considerando a seriedade do processo de correcção do recenseamento, o Partido Socialista compreenda também que há exigências suplementares a satisfazer.
O Partido Socialista deve responder se aceita ou não a constituição de uma comissão parlamentar de fiscalização da actualização do recenseamento eleitoral. É este o segundo problema!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Vamos falar claro: sem uma e outra exigências cumpridas o Partido Social Democrata não viabilizará a proposta de lei do Governo.
O Governo compreendeu por fim a essencial instrumentabilidade do recenseamento, em face dos referendos a que se comprometeu perante o povo. Não estamos assim tão certos de que tenha compreendido bem mais algumas particulares exigências.
Por isso, é também bom que nos entendamos enquanto é tempo.
Queremos ter a garantia de que os referendos sobre a Europa e a regionalização serão feitos sem adiamentos nem desculpas. O Partido Socialista e o Governo estão publicamente vinculados em relação a ambos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A pressa do negócio entre o PS e o PCP já levou a um problema que o Presidente da República foi chamado a resolver: a lei aprovada sobre a divisão do País corre o risco, sério, de ser devolvida à Assembleia por inconstitucionalidade. Chamámos para isso, no devido tempo, a atenção, mas não fomos ouvidos. Para que não volte a acontecer o mesmo é bom que o recordemos.
Enquanto é tempo, para pôr fim ao ruído das várias vozes que sobre estes assuntos do Partido Socialista e do Governo se fazem alternadamente ouvir. convém alinhar mais algumas simples questões políticas.
É bom que os portugueses compreendam que o Partido Social Democrata não quer iludir, não quer adiar, não quer esconder as suas posições de fundo.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Não quer nada!
O Orador: - Já lá vamos, Sr. Deputado!
Recenseamento e referendos são questões essenciais que ocupam a agenda deste ano e do próximo.
O Governo deve assumir sem rodeios se quer ou não realizar ambos os referendos. adiar algum deles ou não promover nenhum.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - A inconsideração patenteada ou as sucessivas soluções de recurso atabalhoadamente avançadas levam-nos a desconfiar.
O segundo aspecto a reclamar resposta clara é o seguinte: digam-nos, mas digam-nos depressa e de uma vez por todas, qual o calendário político para cumprir os referendos. Ambos, no ano de 1998? Um nesse ano e outro no próximo? Mas quando, em que datas?
Não queremos confusões nem desculpas.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Terceiro aspecto: não se tente esconder a participação essencial dos cidadãos portugueses residentes no estrangeiro.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Falamos num referendo próximo sobre a Europa.
A cidadania europeia não distingue entre os portugueses. A regionalização do País, como processo de alteração estrutural, não permite a dúvida quanto ao interesse participativo de todos os cidadãos nacionais. É certamente possível identificar áreas de interesse que não digam especificamente respeito aos portugueses não residentes no território nacional, mas em relação àquelas não é possível concluir assim. Aliás, é mesmo a proposta de lei do referendo, apresentada pelo
Governo, que adianta: «Entende-se existir especificidade sempre que as questões referendadas se repercutam de forma directa e imediata no exercício de direitos e deveres de não residentes em território nacional».
Página 565
20 DE NOVEMBRO DE 1997 565
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - É condição assumida, pela nossa parte, que os cidadãos portugueses residentes no estrangeiro sejam chamados a votar nos dois actos referendários anunciados.
Aplausos do PSD.
Quarto problema: os referendos sobre a Europa e a regionalização não podem ser realizados em simultâneo.
Sabemos que a Constituição é particularmente exigente quanto aos referendos, ao não admitir que, na mesma consulta, se juntem matérias diferentes. Querer outra coisa é querer subverter a norma constitucional e ultrapassar o seu comando artificialmente.
Seria fácil e engenhoso que a proibição de múltiplas matérias num referendo fosse iludida pela realização, ao mesmo tempo, de vários referendos, tantos quanta a multiplicidade de matérias que se quisessem referendar.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Do ponto de vista partidário, é-nos indiferente qual seja o primeiro. Do ponto de vista do interesse nacional, continuamos a considerar que o referendo sobre a Europa deve ser o primeiro. Mas que ninguém se iluda: se o Partido Socialista e o Governo insistirem na simultaneidade, solicitaremos a fiscalização preventiva da constitucionalidade.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E também não queremos que restem dúvidas sobre a nossa opção clara pela necessidade de dois momentos sucessivos na realização das consultas sobre a regionalização. Este é o quinto aspecto político a clarificar.
Uma coisa é a pergunta sobre se os portugueses querem ou não a regionalização, outra coisa é a resposta à oportunidade de concretização de cada região. Ambas constituem o referendo híbrido, misto de nacional e regional, cuja estrutura contestámos mas que o PS, na ânsia de perder a face, impôs como irrecusável.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Mas não tem sentido que tudo se faça ao mesmo tempo e deve mediar um prazo entre ambas as respostas.
Sempre o dissemos e começam agora também a ouvir-se algumas vozes de dirigentes nacionais do PS a verificar que o modelo pelos senhores preconizado está longe de ser adequado.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - É igualmente uma questão a ser dirimida, a final, não havendo acordo sobre ela e prevalecendo uma opinião contrária pelo Tribunal Constitucional.
Sexto problema: convirá esclarecer que a maioria exigida para a validade das consultas referendárias é a que resulta de o número de votantes ser superior a metade dos eleitores inscritos no recenseamento. E o que se conclui, com absoluta evidência, do n.º 11 do artigo 115.º da Constituição da República. Qualquer outra interpretação levaria a reduzir os efeitos do referendo a uma simples sondagem de opinião.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Para nós, é a própria natureza do regime constitucional do referendo que impõe esta especial exigência. Aliás, sendo o referendo sobre a regionalização o único de realização constitucional obrigatória, evidente se torna que, quanto a ele, não sejam enfraquecidas as exigências de participação popular.
Aplausos do PSD.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Felizmente, ainda não é juiz do Tribunal Constitucional!
O Orador: - Aqui está, Sr. Presidente e Srs. Deputados, como imediatamente antes de duas importantes questões serem debatidas neste Parlamento resolvemos reafirmar as nossas posições de princípio. Elas são, todas elas, absolutamente incontornáveis! E, se não forem consagradas, desde já fica clara a nossa postura: não viabilizaremos as iniciativas legislativas respectivas e recorreremos ao Tribunal Constitucional.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Chantagem!
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Transparência!
O Orador: - O Partido Socialista pode continuar a enredar-se nas suas contradições, nas suas chantagens ou nas suas meias verdades, porque connosco é simples: sempre pensámos, quisemos e dissemos o que agora, aqui, de maneira transparente, repetimos.
Concordem ou assumam a discordância! Esta é a nossa fronteira! Estes são os fundamentos da nossa convicção profunda! Os senhores podem andar ao ritmo das conveniências, nós preferimos o caminho da certeza.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Encarnação, nesta Câmara, o Sr. Deputado é provavelmente a pessoa que estaria em melhores condições para equacionar o problema do recenseamento eleitoral e o estado em que se encontra, sem enredar esta questão nas outras trapalhadas em que se envolveu com o Partido Socialista.
O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Muito bem!
O Orador: - Mais: estaria em excelentes condições para perceber que esta questão não deve ser enredada noutro tipo de processos de chantagem ou de qualquer outro tipo.
O Sr. Deputado sabe bem, pelas responsabilidades que teve no Governo, pelos estudos que foram entregues ao Governo na altura própria, que há muitos anos que o recenseamento eleitoral não está numa situação que o torne perfeitamente fiável. O Sr. Deputado sabe que esta situação se agravou ano após ano, sabe que a abstenção técnica é, provavelmente, um record nos países com sistemas
Página 566
566 I SÉRIE - NÚMERO 15
políticos eleitorais, sabe perfeitamente que muitos municípios do País, inclusive algumas das cidades mais importantes, têm mais eleitores do que habitantes.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Lá isso é verdade!
O Orador: - Perante uma situação deste tipo, o PSD deveria, em tempo oportuno, já no tempo em que esteve no Governo, ter tomado medidas para actualizar e corrigir esta questão, separando-a, agora, inteiramente do conjunto de trapalhadas em que se envolveu com o Partido Socialista, em particular na sequência da revisão constitucional.
Por outro lado, o Partido Socialista não tem razão quando adianta a proposta de que os dois referendos, o chamado referendo europeu e o referendo sobre as regiões, sejam simultâneos. Trata-se de uma proposta de constitucionalidade duvidosa e, independentemente disso, politicamente criticável.
Agora, o que é verdade é que também aqui o Sr. Deputado Carlos Encarnação perde inteiramente a razão quando vem, ao mesmo tempo, colocar a questão da ordem dos referendos e envolver todo este problema com o do recenseamento, com o do voto dos emigrantes em todas as eleições e com outro tipo de questões que referiu na sua intervenção. Efectivamente, é um modo absolutamente intolerável de colocar o problema, mais ainda por parte de quem tem a obrigação política de conhecer muito bem a questão do recenseamento e a sua gravidade e por isso mesmo deveria dar-lhe toda a prioridade e separá-la do conjunto de outras questões que estão aqui colocadas e em relação às quais já conhecemos as posições do PSD, mas que, em todo o caso, não podem nem devem ser envolvidas com outro tipo de questões da gravidade daquela que referi.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, querendo, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, querendo e podendo responder, desejo, desde logo, cumprimentar o Sr. Deputado Luís Sá, porque lhe reconheço uma grande capacidade para se ocupar destas matérias.
O Sr. Deputado Luís Sá é um excelente constitucionalista e, além disso, é um especialista em direito eleitoral. Portanto, é com grande consideração - muito embora estejamos, frequentemente, em discordância em relação a medidas e a pontos concretos - que respondo às suas perguntas.
Em primeiro lugar, quero dizer-lhe que não é verdade - e V. Ex.ª sabe-o muito bem, porque participou comigo em vários debates e em várias mesas redondas sobre este problema, noutras ocasiões - que não tenhamos feito nada em relação à questão da informatização e da correcção dos cadernos eleitorais.
O nosso grande problema, Sr. Deputado - e penso que V. Ex.ª partilharia da nossa posição -, é que nunca tivemos nenhum ano no qual não houvesse uma eleição e entendíamos que a correcção dos cadernos eleitorais, que é um assunto fundador da participação democrática eleitoral, deveria ser feita quando não houvesse eleições...
O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Quando acabassem as eleições?
Sr. Deputado, compreendo a sua posição. V. Ex.ª quis dizer esta conclusão, que foi brilhante e que eu também subscrevo, mas, entretanto, teve de ganhar também lastro em dirigir-me um pedaço de crítica. Compreendo-o!
O Orador: - e tudo apontava e estava preparado para os anos de 1996 e durante o ano de 1997, até às eleições autárquicas, justamente para que, nessa altura, não se pudessem questionar - com seriedade, como é evidente - os problemas resultantes da modificação dos cadernos eleitorais durante os períodos eleitorais.
Já várias vezes discutimos isto, V. Ex.ª sabe muito bem que esta é a minha posição há muitos anos (não é de agora), pelo que não necessito de dar qualquer «cambalhota» para vir agora defender isto, pois, repito, já o defendo há muito tempo.
Aliás, curiosamente, esta foi também a posição defendida, várias vezes, pelo Professor Jorge Miranda nas intervenções que fez sobre este assunto em diversos debates nos quais também participámos.
Portanto, Sr. Deputado, em relação à primeira questão que me colocou sobre esta matéria, tenho a impressão que V. Ex.ª não tem razão em criticar a minha posição. No entanto, admito que tenha dito isso para poder arranjar lastro para o que disse a seguir em relação ao Partido Socialista, e aí acompanho-o inteiramente. V. Ex.ª disse isso em relação a mim para poder, depois, afirmar que o Partido Socialista se tinha enredado em «trapalhadas» foi esse o seu termo, e muito bem - que não compreende e das quais não consegue sair.
Sr. Deputado, essa é a sua conclusão brilhante. e eu acompanho-o perfeitamente. Só escusava de ter dito o resto porque, na verdade, no resto V. Ex.ª não tem qualquer razão.
Em relação ao último argumento utilizado V. Ex.ª também está bem. É, de facto, isso! Esta situação em que o Partido Socialista se coloca, a de querer, teimosamente. fazer os dois referendos num só dia - «os dois em um! ... » - é, de facto, como V. Ex.ª disse, não só de constitucionalidade duvidosa, mas, quanto a mim, de flagrante inconstitucionalidade.
Diz o Sr. Deputado que eu perco a razão por ter citado este problema em conjunto com outros. ó Sr. Deputado. eu até o individualizei, como individualizei todos os outros problemas e os enumerei pois até disse «primeiro, segundo, terceiro, quarto, quinto e sexto problema», justamente porque não queria que tudo se confundisse.
O Sr. Presidente: - Agradeço que termine. Sr. Deputado.
O Orador: - Terminarei imediatamente. Sr. Presidente.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Também para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Acácio Barreiros.
O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Sr. Presidente. Srs. Deputados, Sr. Deputado Carlos Encarnação, a sua intervenção não se percebe, porque tratou de um assunto que está agendado para amanhã e de outro agendado para depois de amanhã. A não ser que lhe tenham encomendado e, como não lhe ocorreu mais nada, leu a intervenção que tencionava fazer amanhã!
Página 567
20 DE NOVEMBRO DE 1997 567
O assunto que abordou é matéria que está devidamente agendada para debate nesta Assembleia, com a presença do Governo. Portanto, nada justifica que tenha feito esse tipo de intervenção nesta altura.
Mas há uma coisa que quero dizer-lhe, sem antecipar um debate cuja antecipação não faz qualquer sentido: é que, uma vez mais, o PSD reclama as reformas, reclama o referendo, e quando chega a altura de fazer a discussão substantiva das matérias o PSD foge logo para as «tricas» processuais;...
O Sr. José Junqueiro (PS): - É logo!
O Orador: - ... incendiando todos os assuntos. Temos um problema sério diante de nós, que o senhor não pode desconhecer, sobretudo pelas responsabilidades que teve no anterior Governo: a actualização dos cadernos eleitorais.
É um problema sério!... Portanto, o Governo, a tempo e horas, apresentou-o aos partidos na respectiva Comissão, pediu-lhes o seu contributo para se encontrar uma solução e, finalmente, elaborou uma proposta para ser debatida, com todo o espírito de abertura, neste Parlamento. E os senhores já estão a criar as «tricas» processuais!... Porquê?!...
Sr. Deputado, vou-lhe dizer qual é, no meu entendimento, a razão de fundo destas tricas processuais: o PSD está com medo - e tem razões para isso! - de perder o referendo sobre a regionalização.
Risos do PSD.
Está com medo!... E tenta, sem a revisão dos cadernos eleitorais, abrir outra trica processual sobre a questão da «vinculatividade» da decisão do referendo, isto é, o que o PSD pretende é que sem a revisão dos cadernos eleitorais, o peso dos mortos nos cadernos eleitorais, que durante todos estes anos não foram actualizados, permita uma abstenção de tal forma grande que venha a criar problemas à «vinculatividade» da decisão referendária. E esse o problema!
O problema de fundo é que o PSD, diante de qualquer reforma - e nós veremos, quando chegarem as propostas concretas para as reformas em matéria de segurança social e matéria fiscal -, refugia-se nas questões processuais!... Mas, Srs. Deputados, embora possam criar dificuldades, não diminuem em nada a determinação do PS de fazer estas reformas. Vai haver referendo sobre a regionalização;...
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Como fez a colecta mínima!
O Orador: - vamos ganhar o referendo sobre a regionalização, o PS vai proceder à regionalização e os senhores fiquem na discussão jurídica e nas «tricas» processuais, porque também não têm ideia nenhuma sobre as matérias de fundo que estamos a debater.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.
O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Ó Sr. Deputado, não venha outra vez com os termos processuais!... Não venha com o «115.º» ou com o «160.º»...!
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, Sr. Deputado Acácio Barreiros: O «115» era o número nacional de emergência, o que V. Ex.ª utilizaria nesta altura.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Por acaso até está atrasado, agora é o «112».
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Ó Sr. Deputado Acácio Barreiros, tenho a impressão de que o seu problema, ou melhor, de que o seu conjunto de problemas é passível de identificação rápida.
Primeira questão: V. Ex.ª não leu o relatório que eu fiz para a 1.ª Comissão...
O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Li!
O Orador: - sobre a proposta. Era importante que lesse, porque se o tivesse lido com atenção concluiria que a discussão do nível político que tivemos aqui hoje não invalida a discussão técnica do conteúdo dos diplomas, que, eventualmente, ocorrerá hoje, amanhã e depois;...
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Técnica?!...
O Orador: - ... nem invalida as considerações políticas que eu fiz hoje, porque são considerações políticas essenciais, que VV.
Ex.as têm de ter em linha de conta antes de percorrerem os tais problemas, como V. Ex.ª diz, com alguma piada, das «tricas formais».
isto é, há questões fundamentais que tem de ter em linha de conta quando aprecia estes problemas.
Eu sei que VV. Ex.as, como disse há pouco, e insisto, se enredaram em várias complicações, porque partiram de um princípio errado, partiram de soluções erradas que quiseram, por força, fazer adoptar por esta Casa, e nesta altura têm a maior das dificuldades em sair delas. Então, a única coisa que têm a fazer é dizer que a culpa é do PSD, que inventa sempre problemas, estratégias, conceitos novos, etc. Não é nada disso, Sr. Deputado!...
O que acontece verdadeiramente é que V. Ex.ª não compreende que, tendo nós um problema essencial, o de actualização do recenseamento, que é verdadeiro, não tendo ele sido feito na altura própria, que era os anos de 1996 e de 1997, estamos agora com uma gravíssima dificuldade. E nós queremos fazer a actualização do recenseamento eleitoral!
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Mas não fizeram!
O Orador: - Agora o que queremos é que o Governo nos garanta o prazo em que ele estará pronto, ou seja, o prazo em que os cadernos eleitorais serão afixados.
O que acontece - e esse é o problema - é que a linguagem do Governo e os estudos que apresenta à Assembleia são absolutamente díspares!... O Governo, dia sim, dia não - ou alguém por ele, ou responsáveis da maioria da bancada - vem adiantar datas;...
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não é a maioria da bancada, é a bancada da maioria!
O Orador: - ... todas elas diferentes e cada dia uma diferente. Todavia, os estudos que o Governo apresenta apontam, claramente, para um problema complicado em relação à data de afixação dos cadernos eleitorais.
Página 568
568 I SÉRIE - NÚMERO 15
Por isso, V. Ex.ª, não tendo tido a bondade de ler nem o relatório nem, porventura, os estudos que o Governo apresentou, não pode acompanhar-me na minha conclusão.
Compreendo perfeitamente que a sua posição seja essa, mas o facto é que a questão substancial é a que defini aqui.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Qual? Qual?
O Orador: - O Sr. Deputado não quer que eu cite os artigos e eu não vou fazê-lo porque já os citei há pouco, mas o facto é que há vários compromissos que, a nível da revisão constitucional, VV. Ex.as assumiram e, porventura, por estarem distraídos, ao mesmo tempo não curaram de salvaguardar a sua aplicabilidade. A responsabilidade é vossa, não é nossa!
O Sr. Presidente: - Agradeço-lhe que termine, Sr. Deputado.
O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Portanto, não podem estar nesta altura a atirar-nos à cara o incumprimento dos preceitos que VV. Ex.ª aprovaram.
Aplausos do PSD.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Isso é uma «história da carochinha»!
O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.
O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em democracia, e sobretudo quando não existe uma maioria absoluta, é normal e legítimo que existam acordos entre os vários partidos a propósito de matérias de interesse nacional.
O Partido Popular fez com o Governo do PS dois acordos para viabilizar os Orçamentos do Estado para 1996 e 1997. Fê-los às claras, sem mentir ao País e ao Parlamento, sem fingir e sem fazer teatro.
As notícias que nos últimos dias têm vindo a público sobre o acordo secreto entre o PS e o PSD para viabilizar o Orçamento do Estado para 1998 são verdadeiramente chocantes e exigem uma posição clara de todos os que prezam a verdade política e a dignidade das instituições.
Este acordo secreto, que finalmente se veio a descobrir que é verdadeiro, põe em causa a credibilidade dos dois maiores partidos do sistema eleitoral português. São negociatas políticas destas, feitas, como diz um órgão de comunicação social, pela calada da noite, que descredibilizam o Parlamento aos olhos da opinião pública.
O debate parlamentar do Orçamento do Estado para 1998 foi transformado pelo Governo e pelo PSD numa mentira política, numa farsa institucional e num puro exercício de teatro inaceitável do ponto de vista da dignidade deste Parlamento.
O Governo fez um papel triste e lamentável: o Sr. Ministro das Finanças, neste Parlamento, desautorizou, perante todos nós, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, quando este disse a uma estação de rádio que existia um compromisso entre o Governo e o PSD.
Afinal, o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais estava a ser sincero! Afinal, o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais entendia do que falava, pois, sabemos hoje, teve de pronunciar-se em segredo sobre as propostas do PSD.
Por outro lado, o PSD fez um papel ainda mais triste e deplorável. Como está longe este PSD do PSD de Sá Carneiro, e até do PSD de Cavaco Silva e de Durão Barroso! Nessa altura, mesmo quando discordávamos víamos clareza e convicções: nós discordávamos do federalismo do Professor Cavaco Silva, mas ele não o escondia, proclamava-o; nós discordávamos da política angolana do Governo português, mas o Dr. Durão Barroso nunca fingiu que era apoiante da UNITA nem nunca escondeu a sua simpatia pelo MPLA.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Orador: - Vejamos agora o PSD de hoje.
No PSD de hoje, a pena experiente e autorizada do seu líder escreveu, num semanário de reputação nacional, no dia 1 de Novembro, esta frase deliciosa: «Não houve, não há, nem haverá qualquer negócio em torno da viabilização do Orçamento do Estado.»
O Sr. José Junqueiro (PS): - E não houve!
O Orador: - Para quê então recorrer ao seu automóvel particular, um Golf descapotável, para se encontrar com o Sr. Primeiro-Ministro?
O líder do PSD, pela sua pena experiente, escreveu no mesmo artigo que a posição do PSD sobre o Orçamento do Estado estava tomada nos seguintes termos: «tudo na praça pública, tudo sujeito à reacção dos restantes partidos e do Governo.»
Aqui ele acertou parcialmente no «tudo sujeito à reacção do Governo», porque já no que diz respeito aos partidos a matéria foi ocultada.
Mas, ainda nesse artigo, escrevia mais a pena experiente e autorizada do líder do PSD: «o que é certo é que tudo isto foi feito com conhecimento total dos portugueses, o que é certo é que não negociei, nem eu nem ninguém do PSD, com o Engenheiro António Guterres ou outrem, no PS, a viabilização do Orçamento ou qualquer contrapartida exterior ao Orçamento».
Foi isto o que o líder do PSD andou a dizer ao País sobre as suas posições relativamente ao Orçamento do Estado para 1998.
Como temos presente, S. Presidente e Srs. Deputados, uma frase da Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite proferida no debate da especialidade que há alguns dias aqui fizemos do Orçamento! Disse então a Sr.ª Deputada que o interesse nacional não é negociável. Nós estamos de acordo consigo, Sr.ª Deputada, V. Ex.ª é que não está de acordo com o líder do seu partido.
Perguntamos nós: como é que os eleitores poderão continuar a acreditar no PSD quando é o próprio PSD quem não acredita no que faz nem assume o que faz perante a opinião pública, com verdade, com frontalidade, com transparência e com clareza?
A verdade, também, é que o PSD está hoje para a política portuguesa como o programa «Os Filhos da Nação» está para a televisão...
Risos do CDS-PP.
Ou, como diz o povo sábio, o PSD é «gato escondido com o rabo de fora.» O PSD está para a política portuguesa como «Os Filhos da Nação» para a televisão, porque vive da realidade virtual e não dos problemas verdadeiros do País. Faz teatro, faz dissimulação, não assume
Página 569
20 DE NOVEMBRO DE 1997 569
os seus actos, não assume as suas convicções, e é «gato escondido com o rabo de fora» porque ninguém percebe por que razão julga que é crime fazer um acordo com o Governo. Não é!... Crime, se calhar, é esconder os acordos que faz com o Governo e que não assume.
E por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que, uma vez que o articulista que citei não pode vir ao Parlamento e não é Deputado, o Grupo Parlamentar do CDS-PP vai entregar na Mesa da Assembleia um pedido formal para que o Sr. Primeiro-Ministro António Guterres venha ao Parlamento esclarecer cabalmente todas as cláusulas do acordo secreto que fez com o Professor Marcelo Rebelo de Sousa. Se o Primeiro-Ministro António Guterres é a mesma pessoa que era quando foi líder da oposição. virá a este Parlamento, sem hesitações, esclarecer cabalmente, perante os Deputados e perante o País, todas as combinações secretas que fez com o líder do PSD. A partir do momento que dois líderes políticos fazem um acordo secreto, o órgão de soberania Assembleia da República tem o direito de exigir conhecer todas as cláusulas que foram negociadas e que têm a ver com uma matéria cuja aprovação é da sua estrita competência. Se o acordo não tivesse sido secreto, não havia dúvidas, mas quem escolheu o método tem de assumir as suas consequências, e a primeira delas é a responsabilização. Perante os Deputados e perante a opinião pública, nós queremos saber tudo o que foi negociado. porque suspeitamos sempre quando são feitos acordos secretos, e mais do que isso, quando, sendo feitos acordos secretos, se insiste e persiste na mentira de dizer que não há acordo, que nada foi negociado. que tudo não passa de uma invenção, quando todos os portugueses já se aperceberam de quem mentiu e só não perceberam ainda por que razões mentiu.
Esperamos, por isso, que brevemente o País seja esclarecido, porque quem descredibiliza as instituições e quem degrada a imagem do Parlamento perante a opinião pública é quem transforma em teatro e em farsa aquilo que aqui se passa.
Sr. Presidente, os Deputados do CDS-PP não foram eleitos pelos portugueses para serem cúmplices de farsas ou de peças de teatro. Se há Srs. Deputados que se sentem bem nessa pele, não é esse, seguramente, o caso dos Deputados do CDS-PP.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Ferreira, o que disse na parte final da sua intervenção deveria ter impedido que o senhor tivesse falado hoje sobre este assunto. E devia tê-lo impedido porque foi o senhor, aqui, nesta Assembleia, como porta-voz do seu partido, o primeiro a insinuar que havia um acordo entre o PSD e o Governo que faria o PSD ceder na questão das portagens. Foi esse o primeiro boato, e tal boato foi lançado pelo Sr. Deputado nesta Assembleia. Portanto, pergunto-lhe, Sr. Deputado, se sabe quantos Deputados do PSD estiveram nessa votação, feita aqui, nesta Câmara, e se o senhor, por acaso, aproveitou esta ocasião para pedir desculpa à bancada do PSD.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Em segundo lugar, foi também o Sr. Deputado quem lançou a ideia de que, nesse acordo que o senhor sonhou, havia uma cedência do PSD relativamente à colecta mínima do IRC. Vamos ver se os factos confirmam ou desmentem a posição do PSD sobre essa matéria.
Mas há um ponto sobre o qual eu gostaria que o Sr. Deputado ponderasse e que é o seguinte: considera que o líder do PSD e o Primeiro-Ministro fazem negócios tão absurdos quanto esse que o senhor insinuou?
Sr. Deputado, no ano passado o PSD viabilizou o Orçamento do Estado para 1997 abstendo-se nas votações na generalidade, na especialidade e final global. Fez rigorosamente o mesmo este ano. Rigorosamente o mesmo! Em troca de quê, Sr. Deputado? Em troca de absolutamente de nada, porque o que estava em causa não era isso mas sim, simplesmente, uma posição de princípio.
Mas eu percebo, Sr. Deputado, qual é a sua preocupação este ano, apesar de a nossa posição ter sido rigorosamente a mesma do ano passado! O senhor não se incomodou no ano passado porque teve margem de manobra para fazer o seu negócio, mas, este ano, o facto de termos anunciado com muita antecedência qual seria a nossa posição retirou margem de manobra ao CDS-PP para fazer quaisquer tipos de negócios, às claras, às escuras, na suite de um hotel ou dentro da Assembleia. Isso tornou-se-lhes inviável. E é evidente, Sr. Deputado, que deveriam ter alguma vergonha dos acordos que fizeram o ano passado. E deveriam ter vergonha porque, realmente, não foi o interesse nacional que esteve na sua base. Todos os pontos do acordo que fizeram no ano passado tinham um retrato, tinham um nome subscrito ... e não eram o do interesse nacional. E foi sem esse ponto corporativo que os senhores ficaram este ano!
O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr.ª Deputada.
Oradora: - Sr. Presidente, termino já.
absurdo da vossa posição está em perguntar que vantagem tinha o PSD em fazer qualquer tipo de negócio, como o senhor lhe chama. Obtivemos o quê?! Obtínhamos o quê?! Nós dissemos, há muito tempo, que viabilizávamos o Orçamento, e fizemo-lo em troca de nada, porque se o Sr. Primeiro-Ministro tivesse chegado aqui e tivesse mantido as colectas mínimas o PSD teria viabilizado na mesma o Orçamento! Portanto, só se o Primeiro-Ministro estivesse realmente com qualquer tipo de negociação muito absurdo poderia ter dado ao PSD algo que ninguém lhe tinha pedido.
Sr. Deputado, espero que agora, quando responder, comece por pedir desculpa ao PSD pelo boato levantado sobre o problema das portagens e espero também que, qualquer dia, torne a pedir desculpa ao PSD por esses boatos que tem tentado lançar e que apenas podem beneficiar o seu partido; e talvez ao Sr. Ministro das Finanças, para que ele não fique com a «capa» de que o Sr. Primeiro-Ministro «lhe tirou o tapete».
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, apesar de o painel de tempos registar que a Sr.ª Deputada gastou 7,5 minutos, a minha sensibilidade diz-me, empiricamente, que não gastou nada que se pareça com isso e que se ficou pelos 3,5 minutos. Portanto, agradeço que seja feita a respectiva correcção.
Página 570
570 I SÉRIE - NÚMERO 15
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.
O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente e Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, compreendo perfeitamente as dificuldades que tem, depois de ter dito o que disse aqui, no Parlamento, durante o debate do Orçamento, em lidar com esta realidade que, entretanto, foi dada a conhecer ao País pela comunicação social, de todo incompatível com as proclamações de princípio que V. Ex.ª aqui fez.
Mas quero responder ponto por ponto ao que me questionou e, relativamente à questão das portagens, a Sr.ª Deputada está equivocada. Eu fiz uma pergunta à Sr.ª Deputada sobre rumores que corriam acerca da eventualidade de o PSD negociar a viabilização do Orçamento contra deixar cair a questão das portagens. Como V. Ex.ª falou a seguir e nada disse, a pergunta ficou no ar. O problema do vazio da resposta é imputável exclusivamente ao seu silêncio sobre esta matéria.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
Em segundo lugar, perguntou-se qual era a vantagem do PSD em fazer um acordo com o Governo sobre o Orçamento, Sr.ª Deputada, não tenho a pretensão de lhe
explicar vantagens sobre acordos em matéria de Orçamento, mas falando-lhe como cidadão comum, cito-lhe uma muito importante: validar, retroactivamente, um cartaz.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Orador: - VV. Ex.as andaram, durante um ano, a mentir ao País com cartazes de propaganda que diziam:
«Pena máxima para as colectas mínimas». Ora bem, chegámos à conclusão de que não havia colectas mínimas, que havia pagamentos por conta, e, portanto, ou VV.
Ex.as se enganaram na campanha de propaganda ou, então, verificaram que tinha havido um erro de casting e, à pressa, tiveram de tentar negociar esta matéria para validar esses cartazes.
Aliás, foi certamente por isso que, há poucos dias, vi um cartoon em que apareciam o Professor Marcelo Rebelo de Sousa e o Engenheiro António Guterres a decretarem a tal pena máxima para a colecta mínima, que nunca existiu.
Aí tem V. Ex.ª uma vantagem para o PSD do acordo que o seu líder fez com o Governo sobre o Orçamento do Estado.
Por outro lado, Sr.ª Deputada, quero dizer-lhe, com a maior lealdade e até com alguma amizade, que aqui, nesta bancada, ninguém se envergonha das negociações que fez com o Governo para melhorar os Orçamentos do Estado para 1996 e para 1997, V. Ex.ª pode estar absolutamente tranquila que, aqui, ninguém - antes pelo contrário - se envergonha das negociações que fez, às claras, transparentemente, em reuniões públicas em que vários Deputados do meu partido participaram, em reuniões em São Bento em que o líder do meu partido participou com
o Sr. Primeiro-Ministro, em variadíssimos actos públicos que rodearam essas negociações.
É a diferença, Sr.ª Deputada! Compreendo que isto a preocupe, que lhe doa, mas, de facto, há uma grande diferença!
O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr. Deputado.
O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Há uma grande diferença entre quem faz política às claras e quem a faz às escuras. VV.
Ex.as andam a fazê-la às escuras. O problema não é nosso. Resolvam o vosso problema. Agora, vergonha, nesta bancada, não há e espero sinceramente que, por estes motivos tristes, não venha a haver em qualquer outra bancada.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: - Para defesa da consideração da sua bancada, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite teceu algumas considerações acerca desta bancada que não são correctas.
Mas o que quero dizer-lhe é que V. Ex.ª não respondeu à pergunta fundamental e, nesse sentido, perdeu toda a legitimidade de dizer fosse o que fosse a esta bancada. Ou seja, ou a Sr.ª Deputada diz aqui que não houve, de ciência certa, nenhum acordo entre o PSD e o Governo em matéria orçamental...
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Outras vez!?
A Oradora: É que as notícias não foram desmentidas.
Vozes do PSD: - Foram, foram!
A Oradora: - Não foram! Não foram!
Vozes do PSD: - Foram desmentidas!
A Oradora: - As notícias vêm a lume, não são desmentidas...
Vozes do PSD: - Foram todas desmentidas!
A Oradora: - Não temos essa informação.
Ou a Sr.ª Deputada diz que não houve absolutamente nenhum acordo ou considero que a Sr.ª Deputada poderá ter um direito regimental mas não tem qualquer legitimidade moral e, nesse sentido, tudo aquilo que disse não ouvimos.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, os senhores oscilam entre acreditar totalmente naquilo que diz a
comunicação social e, depois, em não lerem o que vem na comunicação social.
A Oradora: - Portanto, essa oscilação é um pouco difícil de gerir. Eu compreendo.
Mas, Sr.ª Deputada, só lhe posso dizer que ou a senhora acredita mais no que diz a comunicação social ou acre-
Página 571
20 DE NOVEMBRO DE 1997 571
dita nos desmentidos formais que já foram feitos, não só pelo Gabinete do Primeiro-Ministro como pelo Presidente do partido. Assumo a legitimidade no que respeita ao Presidente do partido e digo-lhe que não houve qualquer acordo entre o PSD e o Governo sobre matéria orçamental. E não houve só por uma coisa muito simples, Sr.ª Dr.ª Maria José Nogueira Pinto: é que nós não tratamos de absurdos! E isso era um verdadeiro absurdo! Não tinha sentido, não íamos buscar nada, ninguém negoceia sem ser em troca de qualquer coisa.
Quando o Sr. Deputado Jorge Ferreira fala de caricato, que é, enfim, fazer-se o que eu considero uma caricatura - o Sr. Deputado costuma ter graça, mas desta vez só teve assim-assim -, atingiu um pouquinho de graça ao dizer que era, pelo menos, para legitimar um cartaz, o que, evidentemente, só por graça pode ser dito. Então, Sr.ª Dr.ª Maria José Nogueira Pinto, do ponto de vista da oposição, de desgaste do Governo o que é que era mais importante: legitimar um cartaz ou que os portugueses fossem pagar efectivamente esse imposto? Era, com certeza, que os portugueses fossem pagar esse imposto!
Portanto, Sr.ª Dr.ª Maria José Nogueira Pinto, fique à espera da questão das portagens (a vossa bancada insinuou, ficou provado)! Sobre o IVA, colecta mínima do IRC, fique à espera do nosso pedido de ratificação do diploma, caso ele venha a ser aprovado!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Descontando a meia-hora gasta com as três declarações políticas, dispomos ainda de 10 minutos, que podem ser preenchidos com uma intervenção do Sr. Deputado Rodeia Machado, para tratar de assuntos de interesse político relevante.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.
O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As promessas que o Partido Socialista fez aos trabalhadores da Função Pública, quer quando ainda era oposição, ou já depois de empossado o Governo, continuam a não ter resposta prática. Pior ainda, os factos mostram que o Governo adopta com os trabalhadores da Função Pública uma posição de má fé negocial.
Senão vejamos: - existem 13 mesas negociais, II das quais já terminaram os seus trabalhos há alguns meses, sem que muitas das matérias aí debatidas e acordadas tenham visto, até hoje, qualquer proposta de lei ou decreto-lei, no sentido de levar à prática o que foi acordado.
É, nomeadamente, a mesa relativa às ajudas de custo, cuja negociação terminou em Julho, e até agora nada foi resolvido; é a relativa à formação profissional na Função Pública que terminou também em Julho e até agora nada foi resolvido; é a dos escriturários-dactilógrafos, cuja negociação exaustiva terminou em Julho e que continua à espera de correspondente consagração legal.
A mesma sorte teve a mesa negocial sobre férias, faltas e licenças, que encerrou em Julho passado, com matérias negociadas e que, até hoje, não se conhece qualquer tomada de posição sobre o assunto. Isto é, o Governo negoceia ou diz negociar, mas depois não cumpre o negociado.
Mas mais grave ainda é a mesa que tratava das carreiras de pessoal da Função Pública. E conhecido de todos que há trabalhadores que não têm qualquer promoção há mais de 20 anos, nomeadamente na segurança social, cujos quadros se encontram bloqueados à espera destas negociações. Os representantes dos trabalhadores dedicaram uma particular atenção a esta mesa e o Governo comprometeu-se, no acordo que fez com os sindicatos, que as mesmas sofreriam uma alteração, de modo a permitir que, durante a vida laboral de 36 anos, o trabalhador pudesse atingir o topo da carreira. Para isso, era necessário que se desbloqueassem as carreiras e os concursos, o que até hoje não aconteceu.
A mesa negocial sobre as carreiras não teve, até hoje, qualquer proposta do Governo sobre esta matéria, o que diz bem da má vontade negocial do Governo. Comprometeu-se, acordou com os sindicatos, criou as mesas negociais, mas, na prática, isso em pouco ou nada se traduziu. Existem mesmo matérias que foram negociadas e já tiveram expressão real em autorização legislativa desta Assembleia da República, mas continuam em difícil aplicação: é o caso dos recibos verdes, ou seja, dos trabalhadores precários da Função Pública. O Governo comprometeu-se, nessa autorização legislativa, a uma calendarização de concursos, cuja sequência não cumpriu e comprometeu ou está em vias de comprometer todo o processo.
Sabe-se já que o Tribunal de Contas não irá dar acolhimento a qualquer concurso que seja efectuado fora do prazo estabelecido no Decreto-Lei n.º 195/97, enquanto o Governo, por seu lado, considera que os prazos são meramente indicativos quando eles são imperativos, o que, em nosso entender, vem efectivamente comprometer todo o processo.
Para além desta situação, um recente despacho de 18 de Novembro do Sr. Secretário de Estado da Administração Pública veio criar ainda maior instabilidade, pois contraria o artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 195/97, onde se pode ler que «a integração do pessoal precário faz-se nas carreiras que correspondam às funções efectivamente desempenhadas», e o Sr. Secretário de Estado entende que a situação é inversa, o pessoal precário deve ser integrado nas funções para que foi contratado. É um perfeito disparate.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!
O Orador: - O Governo quer obrigar os trabalhadores a concorrerem para categorias que nunca exerceram.
A confusão está instalada, não se cumprem prazos dos concursos e agora também não se quer cumprir a integração do pessoal nas carreiras que efectivamente desempenham. A situação criada pelo Governo é de tal forma comprometedora que basta ver que, até hoje, não foi integrado nos quadros da Função Pública qualquer trabalhador oriundo desta situação precária.
Por outro lado, o Governo continua apostado em admitir trabalhadores com contratos a prazo, quando o que deveria fazer era desbloquear os quadros e permitir a admissão de pessoal com vínculo definitivo, porque as tarefas que desempenham não são de carácter eventual mas visam tão-só satisfazer necessidades permanentes dos serviços.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!
O Orador: - O Decreto-Lei n.º 195/97 proíbe claramente este tipo de contrato, mas o Governo teima em mantê-los.
Vou dar dois exemplos para que não se diga que se fala no abstracto. No Ministério da Educação foram já
Página 572
572 I SÉRIE - NÚMERO 15
contratados, pelo menos, 5000 trabalhadores a prazo e no da Saúde cerca de 2000, o que indicia que o Governo do Partido Socialista não pretende acabar com o trabalho precário na Função Pública, contrariamente ao que afirma publicamente, e no desrespeito claro por esta Assembleia da República quando aqui se comprometeu a fazê-lo no âmbito da autorização legislativa, que, para o efeito, solicitou.
O Sr. José Calçada (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Mas há mais, Sr. Presidente e Srs. Deputados: o Governo do Partido Socialista pretende aumentar os salários numa percentagem perfeitamente escandalosa em 1998, em cerca de 2,25%, sem ter em conta os ganhos de produtividade, a inflação e a aproximação, embora por baixo, à média europeia. No mínimo, o que se exige deste Governo é que o índice 100 da tabela da Função Pública se equipare ao salário mínimo nacional, no sentido de que os salários se não degradem ainda mais conforme defendia também o Partido Socialista quando era oposição.
O Sr. José Calçada (PCP): - É o mínimo!
O Orador: - Agora, que é Governo, deve cumprir o que ainda recentemente defendia.
Razões acrescidas têm os trabalhadores da Função Pública para desconfiarem de um Governo que não cumpre os acordos que faz com os sindicatos ou, se o faz, fá-lo de forma deficiente, como é o caso do trabalho precário.
Exige-se que o Governo cumpra os acordos que firmou. Exige-se que o Governo se porte com seriedade e não continue a comportar-se com manifesta má fé.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.
Eram 17 horas e 30 minutos.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 144/VII - Altera a lei orgânica do Banco de Portugal, tendo em vista a sua integração no Sistema Europeu de Bancos Centrais.
O Sr. Deputado Francisco Torres vai, em representação da Comissão de Assuntos Europeus, fazer uma breve síntese do respectivo relatório.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Francisco Torres.
O Sr. Francisco Torres (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, como relator da proposta de lei n.º 144/VII, que altera a Lei Orgânica do Banco de Portugal, que baixou à Comissão de Assuntos Europeus, gostaria de fazer algumas considerações.
Em boa hora se faz esta alteração, que é um novo texto que entrará em vigor em 1 de Janeiro de 1999, caso a 3.ª fase comece, como é provável, em 1 de Janeiro de 1999.
Esta proposta compreende alterações à lei orgânica actual para o período que vigora desde a aprovação da proposta até à passagem à 3.ª fase ou a substituição de alguns artigos da nova lei orgânica, caso Portugal não adira de imediato ao euro.
Resultavam ainda da lei orgânica actual várias inconsistências apontadas pelo Instituto Monetário Europeu que urgia corrigir, para que Portugal cumprisse o critério jurídico de convergência. Assim, no espírito do consenso obtido nesta Câmara, na resolução de 13 de Fevereiro, em que os dois maiores partidos da Assembleia pugnaram pela adesão ao euro, foi decidido compatibilizar toda a legislação nacional com a legislação comunitária nesta matéria.
Como sabemos, uma potencial - potencial, porque a questão é discutível - inconsistência era o próprio artigo 65.º da Constituição, que foi entretanto alterado. e o artigo 102.º remete-nos para a lei orgânica. esta lei que agora está a ser alterada. Ou seja, de certa forma, a constituição macroeconómica fica na lei orgânica do Banco de Portugal, que remete para os estatutos do Banco Central Europeu e para os estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e para o Tratado da União Europeia.
Havia também outra crítica implícita do Instituto Monetário Europeu que dizia respeito ao facto de o artigo 3.º da actual lei orgânica dizer que o Banco de Portugal tem como objectivo a estabilidade dos preços, tendo em conta a política económica global do Governo. «Tendo em conta» não é, a nosso ver, uma inconsistência, é talvez uma inconsistência, com a independência do Banco Central Europeu, a expressão «no quadro», como acontece na Lei Orgânica do Banco de França. Até pode dar-se o caso, teoricamente, de um governador olhar para uma política orçamental laxista e ter em conta essa política aumentando as taxas de juro, tendo uma política monetária mais restritiva. Teoricamente, até pode ser essa interpretação.
De qualquer modo, este artigo desaparece também da nova lei orgânica que entra em vigor em 1 de Janeiro de 1999. Mantém-se, no entanto, na transição até ao início da 3.ª fase, mas como é meramente transitória não levanta quaisquer problemas por parte do Instituto Monetário Europeu.
Acresce que existia uma série de pequenas inconsistências, como os avisos do Banco de Portugal, que passam a ser assinados apenas pelo Governador. Portanto, podia verse isso como um pedido de instruções ao Ministro das Finanças. pelo facto de serem avalizados pelo Ministro das Finanças. Aliás, lembro aqui - e fá-lo-ei como uma sugestão ao Sr. Ministro - que os avisos em matéria de supervisão ainda têm a assinatura do Sr. Ministro, o que já não acontece com as outras duas instituições de supervisão (a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários e o Instituto de Seguros de Portugal), pelo que, não só por uma questão de igualdade de tratamento mas também porque uma maior autonomia em matéria de supervisão responsabiliza e torna mais transparente a própria actividade do Banco, seria de aplicar o mesmo princípio agora aqui consagrado.
O veto do governador, cujo voto passa a ser de qualidade e mesmo exigível nas deliberações que afectem as decisões relativas ao Sistema Europeu de Bancos Centrais, deixa de ser também enviado ao Ministro das Finanças.
A possibilidade de exoneração do governador e do Conselho de Administração ficam regulados pelos estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu.
Mantém-se o aditamento proposto pelo PS ao Decreto Lei n.º 231/95, de 12 de Setembro. ratificado na Lei n.º 3/96, de 5 de Fevereiro. Esta lei não é referida no preâmbulo da proposta mas é importante porque tem este adita-
Página 573
20 DE NOVEMBRO DE 1997 573
mento, que diz que o governador deve vir ao Parlamento informar a Assembleia da República na sequência da apresentação do relatório. O próprio relatório do Instituto Monetário Europeu sobre esta matéria não considera mal que haja este diálogo entre as entidades monetárias e o Parlamento; não tem nada a opor porque o governador não vem receber instruções. Nós achamos bem, embora na altura nos
tivéssemos manifestado contra porque achámos que o governador poderia vir mais do que uma vez, poderia vir várias vezes, sempre que a Assembleia da República o quisesse.
Devo dizer que o governador do Banco de Portugal já veio duas vezes discutir esta mesma matéria à Subcomissão de Acompanhamento da União Económica e Monetária, onde, obviamente, não recebe instruções, mas o diálogo com os Deputados é muito útil para o acompanhamento, no âmbito da Lei n.º 20/94 por parte desta Assembleia e para o entendimento claro da classe política quanto a estas matérias.
É também retirado o estatuto de empresa pública ao Banco de Portugal e outras pequenas inconsistências são eliminadas.
Resta, Sr. Presidente, para concluir, um desafio grande, que é um desafio a todos os Parlamentos nacionais e também ao Parlamento Europeu e a toda a classe política: como compatibilizar a independência do Banco Central Europeu com a responsabilização perante o poder político num sistema que não é federal?
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Isso é a chamada quadratura do círculo!
O Orador: - Não, vai ver que não!
O Sr. Presidente: - Para introduzir o debate, em nome do Governo, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças (Sousa Franco): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Tenho a honra de apresentar a proposta de lei n.º 144/VII, que, numa primeira versão, em anteprojecto, o Governo comunicou em Junho passado para apreciação aos grupos parlamentares, submetendo depois esse anteprojecto a parecer do Instituto Monetário Europeu antes de, incorporando as observações do Instituto Monetário Europeu, elaborar esta proposta de lei cuja origem e significado o relatório da Comissão, apresentado pelo Sr. Deputado Francisco Torres, claramente explicita.
A participação de Portugal no primeiro grupo da União Económica e Monetária é a razão fundamental, embora outras pudessem ser aduzidas, para a apresentação desta proposta. Essa participação foi, desde sempre, considerada como desígnio nacional pela larga maioria do povo português representado na Assembleia da República e por sucessivos governos, entre os quais o actual. Tendo o Governo concretizado com sucesso a preparação das estruturas económicas, o que é traduzido pelo cumprimento dos critérios de convergência nominal previstos no Tratado da União Europeia, importa agora desenvolver os esforços necessários para a concretização dos restantes preparativos e aperfeiçoar a condição de acesso que é a plena independência do banco central. Neste aspecto, é, pois, essencial, nesta dupla perspectiva de preparação do euro e de preenchimento completo de uma condição de acesso que, até agora, se não verificava, o reforço da autonomia do Banco de Portugal que, nas vestes actuais, não tinha
ainda condições adequadas de operacional idade para a terceira fase da União Económica e Monetária nem satisfazia os critérios exigentes de independência constantes do Tratado da União Europeia e precisados pela jurisprudência do Instituto Monetário Europeu cujo parecer, como disse, a presente proposta de lei considerou e. no essencial, atende. Na verdade, a participação de Portugal na terceira fase da União Económica e Monetária exige profundos ajustamentos da actual Lei Orgânica do Banco de Portugal, os quais decorrem directamente do tratado que institui a Comunidade Europeia, na revisão de Maastricht, com vista a garantir não só a sua inteira independência - critério de convergência impropriamente chamado convergência jurídica - para o acesso à terceira fase da União Económica e Monetária, mas igualmente para possibilitar o pleno desempenho das atribuições decorrentes da sua integração no sistema europeu de bancos centrais que ocorrerá a partir da vigência da moeda única. A proposta está, aliás, também em inteira conformidade com o novo texto do artigo 102.º da Constituição, resultante da IV revisão constitucional e também ele claramente inspirado pela necessidade de estabelecer um enquadramento constitucional adequado para a independência do banco central no âmbito da terceira da União Económica e Monetária e da moeda única.
Assim, este diploma visa adequar a Lei Orgânica do Banco de Portugal ao novo enquadramento institucional que decorre do sistema europeu de bancos centrais e da adesão de Portugal à moeda única. Fá-lo, introduzindo ajustamentos à mesma Lei Orgânica a fim de, por um lado, garantir a inteira autonomia, independência em sentido técnico, do banco central nacional e, por outro, criar condições necessárias à sua integração no sistema europeu de bancos centrais; fá-lo, ainda aprovando uma nova Lei Orgânica plenamente coerente com o regime monetário europeu da moeda única, conforme foi sublinhado no parecer da Comissão.
No plano da independência, está em causa a consideração que os estatutos do sistema europeu de bancos centrais prevêem: uma decisiva participação dos bancos centrais nacionais no desempenho das atribuições cometidas ao sistema europeu e ao próprio Banco Central Europeu, pelo que a independência dos bancos centrais nacionais é um pressuposto da independência do sistema europeu de bancos centrais no seu conjunto. Nestes termos, é indispensável que o Banco de Portugal, como os outros bancos centrais nacionais, goze do mesmo grau de independência que o Tratado assegura ao próprio Banco Central Europeu no exercício das suas atribuições de autoridade monetária. Daí que essa independência deva ser garantida nos planos institucional, pessoal, funcional e financeiro.
Quanto à integração do Banco de Portugal no sistema europeu de bancos centrais, o artigo 14.º, n.º 3, dos estatutos do sistema dispõe que os bancos centrais nacionais dos Estados membros que adoptem a moeda única constituirão parte integrante do sistema europeu de bancos centrais e deverão actuar de acordo com as orientações e instruções do Banco Central Europeu, cabendo ao Conselho do Banco Central Europeu tornar as medidas adequadas para assegurar o cumprimento de tais orientações e instruções. Este artigo reflecte o princípio básico de que o sistema europeu de bancos centrais é um sistema autónomo e auto-regulado, cujos componentes têm de estar em condições não só de participar na tomada das decisões a nível do seu mais elevado organismo decisório, o Conselho do Banco Central Europeu, do qual fazem parte os
Página 574
574 I SÉRIE - NÚMERO 15
governadores dos bancos centrais nacionais dos Estados membros plenamente participantes na terceira fase da União Económica e Monetária e seis membros executivos, mas também de lhes dar o devido cumprimento. Assim, as disposições da lei nacional, com especial, embora não exclusiva, incidência nos estatutos do respectivo banco central, que impeçam o cumprimento das decisões tomadas a nível central, serão incompatíveis com o funcionamento do sistema e, consequentemente, têm de ser modificadas sob pena de, não o sendo, ao país que estiver nessas condições, ser legitimamente recusado o acesso ao primeiro grupo componente da moeda única.
A presente reforma legislativa visa, pois, cumprir plenamente esse requisito qualitativo e, ao mesmo tempo, preparar o País para o funcionamento dos mecanismos de decisão e regulação previstos no Tratado da União Europeia e na respectiva legislação derivada. Esta reforma legislativa está também, por isso, condicionada por uma calendarização específica resultante do próprio Tratado da União Europeia, revisto em Maastricht. Por um lado, as adaptações a fazer no domínio da autonomia dos bancos centrais nacionais deverão estar em vigor, o mais tardar, na data da instituição do sistema europeu de bancos centrais, data esta que precederá a do início da terceira fase da União Económica e Monetária - início da terceira fase a 1 de Janeiro de 1999; e instituição do sistema europeu, a constituição do Banco Central Europeu, que é de prever ocorra no seguimento das reuniões simultâneas do Parlamento, do Conselho Europeu e do Conselho ECOFIN, previstas de 1 a 3 de Maio de 1998.
Por outro lado, as modificações relativas à integração desses bancos no sistema europeu de bancos centrais devem ser adaptadas até à data da instituição do sistema, mas bastará que vigorem a partir do início da terceira fase para
os Estados membros sem derrogação ou da plena participação do respectivo país na União Económica e Monetária para os Estados membros com derrogação. Deste modo,
por constituírem condições de ilegibilidade para o grupo de países susceptíveis de adoptar a Moeda Única no início da terceira fase da União Económica e Monetária, entre os quais temos a certeza de que Portugal se contará, as
alterações à Lei Orgânica do Banco de Portugal devem ser adoptadas antes da confirmação formal pelo Conselho Europeu no princípio, de 1 a 3 de Maio de 1998, de que Portugal vai integrar esse grupo fundador do euro.
Assim, a presente proposta de lei, que é estritamente necessária para realizar este objectivo nacional,
concretiza-o desta forma. A proposta divide-se, essencialmente, em duas partes: a primeira, a entrar em vigor de imediato, tem, fundamentalmente, em vista alterar alguns artigos da actual Lei Orgânica do Banco de Portugal, a fim de reforçar a autonomia da instituição; a segunda, a entrada em vigor quando Portugal adoptar a moeda única, o que tudo indica irá suceder na data em que se iniciar a terceira fase da União Económica e Monetária, substitui integralmente a Lei Orgânica por um novo texto que, além dos requisitos da independência, incorpore também todos os requisitos de integração no sistema europeu de bancos centrais.
A firme convicção que temos de que Portugal participará plenamente, desde o início da terceira fase da União Económica e Monetária, não impede
porém, em nome da economia legislativa, que se configure, ainda que por mera hipótese, um cenário em que tal não sucedesse, pois ainda assim, independentemente da participação plena do respectivo país nessa fase, manter-se-iam as exigências de autonomia dos bancos centrais nacionais e certos requisitos de integração teriam de ser salvaguardados desde o início da terceira fase. Por isso, a proposta de lei, que tem de cumprir formalmente todas as hipóteses, até no seguimento da jurisprudência do Instituto Monetário Europeu, também prevê desde já as normas modificadoras da
actual Lei Orgânica que, nesse caso, meramente hipotético, se destinariam a compatibilizar a Lei Orgânica com tais exigências e requisitos que constituem um sistema lógico completo, embora nos pareça que vá servir, necessariamente, para a concretização de uma opção política que se encontra delineada e que, exceptuado este requisito que agora esperamos que a Assembleia da República concretize pela sua aprovação, está plenamente acessível a Portugal. Entre outras vantagens, este procedimento tem a de dar uma visão completa do que Portugal se propõe fazer neste domínio, o que é tanto mais importante quanto é certo que o Instituto Monetário Europeu foi consultado previamente acerca desta proposta e emitiu sobre ela um juízo, na generalidade, favorável, com observações de especialidade que, no essencial, aqui foram incorporadas.
A proposta de lei tem uma estrutura tripartida: o artigo 1.º trata das alterações a introduzir imediatamente na Lei Orgânica do Banco de Portugal com vista ao reforço da sua independência; o artigo 2.º aprova uma nova versão integral da Lei Orgânica, que constituirá um anexo à lei no caso de a proposta ser aprovada, substituindo integralmente a versão actual da Lei Orgânica, contemplando não apenas a independência do Banco de Portugal como a sua completa integração no sistema europeu de bancos centrais; e o artigo 3.º contém as alterações adicionais em matéria de integração, que apenas entrarão em vigor no início da terceira fase se a participação plena de Portugal só ocorresse mais tarde e cujo período de vigência se limitaria a esse período intercalar.
Nas disposições tendentes a reforçar a independência do banco, destacam-se: a exigência de voto favorável do Governador do Banco de Portugal nas deliberações do Conselho de Administração que possam afectar a sua autonomia de decisão como membro dos órgãos do Banco Central Europeu ou o cumprimento das obrigações do banco como parte integrante do sistema europeu de bancos centrais; e a que garante a estabilidade de exercício das funções do governador e demais membros do Conselho de Administração do Banco de Portugal. os quais deixam de poder ser exonerados por mera conveniência de serviço e apenas cessarão funções pelo decurso completo do mandato ou outro factor legalmente impeditivo do exercício deste.
Deve dizer-se que, neste plano, a harmonização completa resulta de uma iniciativa que o Governo conhece e que apoia, considerando-a imprescindível à concretização do novo estatuto do banco como autoridade monetária independente, mas responsável - e já foi apontado, no relatório da Comissão, em que é que se traduz essa responsabilidade pública e política.
No que toca à integração do banco no sistema europeu de bancos centrais, permito-me realçar as disposições que visam confirmar o banco como parte integrante desse sistema, prosseguindo os seus objectivos e participando no desempenho das atribuições deste: retirar ao banco o exclusivo da emissão de notas sob decisão do Governo, embora mantendo-o quanto às notas denominadas em escudos enquanto estas tiverem curso legal, no período transitório; adequar as atribuições do banco em matéria de política monetária e cambial ao novo quadro de competência comunitária; mandatar o governador para o exercício das funções de membro dos órgão de decisão do Banco Central Euro-
Página 575
20 DE NOVEMBRO DE 1997 575
peu e sujeitar as contas do banco à fiscalização de auditores externos, sem prejuízo da competência do seu próprio Conselho de Auditoria; mantém-se a atribuição ao Banco de Portugal da supervisão bancária, mas deve ficar claro que esta é a atribuição de um poder do Estado que não da política monetária contemplada no Tratado da União Europeia. Neste momento, não vemos razão para propor a remodelação desse poder mas importa distinguir, pela sua natureza, regime, fundamento e regras, claramente, a supervisão, que continua a ser um poder do Estado, do exercício da autoridade monetária, que é um poder partilhado com os poderes comunitários e o Banco Central Europeu no âmbito do sistema europeu de bancos centrais.
Por último, uma palavra que se aproveita para dizer que esta proposta deixa de qualificar o banco como empresa pública passando a qualificá-lo como pessoa colectiva de direito público - em rigor, um instituto independente com regime especial - dotada de autonomia administrativa e financeira e de património próprio, que parecem ser requisitos instrumentais necessários para a perfeita independência do banco como autoridade política monetária no âmbito do sistema europeu de bancos centrais, para regular igualmente outras funções e poderes como os de supervisão bancária que, por lei, lhe são atribuídos e se propõe que sejam mantidos.
Convindo, porém, que essa mudança se faça sem quebras de continuidade e sem que ela equivalha a uma maior estatização do banco ou sem que ela possa ser entendida como factor descaracterizador da sua independência, introduzem-se na proposta algumas normas que a delimitam. Assim, o banco mantém todos os direitos e obrigações legais e contratuais que actualmente integram a respectiva esfera jurídica; não está sujeito ao regime financeiro dos fundos e serviços autónomos da Administração Pública; continua a não estar sujeito à fiscalização prévia do Tribunal de Contas nem, no que respeita à sua participação no sistema europeu de bancos centrais, à fiscalização sucessiva - estando sujeito a esta, no entanto, relativamente à sua administração corrente; os seus trabalhadores continuarão sujeitos às normas gerais do trabalho, quer individuais quer colectivas, mantendo o regime de segurança social e outros benefícios da mesma natureza que, actualmente, possuem; além da Lei Orgânica e respectivos regulamentos, o banco reger-se-á pelas normas aplicáveis da legislação reguladora da actividade das instituições de crédito e, subsidiariamente, pelas normas de direito privado; e, enfim, salvo nos casos em que o banco actue no exercício de poderes de autoridade, os tribunais competentes para julgar os litígios em que o banco seja parte serão os tribunais judiciais.
A concluir com uma apreciação de ordem geral, Sr. Presidente, Srs. Deputados, o Governo não ignora as dúvidas e argumentos que têm sido apontados publicamente contra a independência do banco central nacional, como, aliás, relativamente à independência do Banco Central Europeu. A transferência para entidades independentes, sem uma direcção eleita, de uma política importante como o é a política monetária, incluindo a sua componente cambial, pode certamente suscitar problemas não de legitimidade democrática - pois a legitimação pela escolha por entidades representativas do poder político democrático e a limitação do mandato parecem claramente bastantes para entender que há legitimidade democrática no exercício de funções, quer da administração do banco central, quer da futura administração do Banco Central Europeu -, mas de conveniência e oportunidade política. Esses problemas foram, porém, resolvidos quando foi discutido, assinado e ratificado, com autorização desta Assembleia, o Tratado de Maastricht e ao legislador ordinário nada mais resta do que conformar-se com as suas regras e dar-lhes plena execução, compatibilizando a plena independência, garantida pelo Tratado da União Europeia, com a responsabilidade democrática. Acresce que a experiência de independência das autoridades monetárias começou com a criação do Federal Resource Systent norte-americano, em finais de 1913 e não, como é frequente dizer-se, com a do Bundesbank alemão, em Julho de 1957. E tem dado bons resultados em países com economias tão poderosas, moedas tão sólidas e políticas monetárias tão claramente geradoras de estabilidades como são os Estados Unidos da América e a Alemanha Federal. Não se vê, portanto, que não possa dar bons resultados em matéria europeia, com o Banco Central Europeu e o sistema integrado por este e pelos bancos centrais nacionais. Permito-me, aliás, anotar que tão pouco qualquer um destes países - os Estados Unidos da América e a Alemanha Federal - pode ser suspeito de menor democraticidade formal das suas regras constitucionais ou da sua estrutura de poder.
Penso que esta argumentação, que merece ser ponderada, deve conduzir ao estabelecimento de formas de responsabilidade que, na lei geral e nesta proposta, estão contempladas, mas não permite impugnar a opção da independência com toda a configuração institucional que propomos e que resulta do Tratado da União Europeia. Não cremos que haja alternativa para Portugal, mas também não cremos que alguém haja proposto melhor solução do que esta. Fica em aberto, ao nível nacional. a estruturação da supervisão bancária, que é um poder do Estado, não de política monetária, mas que continua atribuído ao Banco de Portugal, e, ao nível europeu, a contrapartida de um exercício mais adequado e democrático, de coordenação de políticas económicas, sem perturbar a independência do futuro Banco Central Europeu que, no âmbito do Conselho ECOFIN da União Europeia, Portugal tem defendido com vigor.
Estamos certos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, de que este passo para reforçar a construção da Europa corresponde ao interesse nacional português, que se não conforma com nacionalismos caducos nem com concepções de soberania impróprias do nosso tempo e que, pulverizando e fragilizando a Europa e os seus
poderes, só a condenariam a maior atraso no mundo altamente competitivo e exigente em que vivemos. Está o Governo aberto, como sempre, a alterações. O poder legislativo desta Assembleia é soberano, mas o Governo pede que se tenha em conta o longo processo negocial nacional e europeu que precedeu esta proposta e que a Assembleia dê ao processo a celeridade e o rigor necessários à concretização da entrada de Portugal para o euro que a aprovação e a entrada em vigor desta proposta condicionam. Nestes termos, a sua aprovação, que pedimos e esperamos da Assembleia, representará um passo decisivo na caminhada de Portugal na direcção da moeda única e confirmará a nossa participação na construção, claramente desejada pelos portugueses, de uma Europa mais forte no século XXI. Esperamos de vós, em coerência com decisões anteriores, mais este impulso decisivo para um futuro melhor de Portugal e da Europa unida e para a concretização da moeda única, para a qual esta proposta é condição de acesso e que permitirá preparar e realizar com êxito.
Aplausos do PS.
Página 576
576 I SÉRIE - NÚMERO 15
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro das Finanças, os Srs. Deputados Francisco Torres, Lino de Carvalho e Luís Queiró.
Como o Governo já não dispõe de tempo para responder, pergunto aos Srs. Deputados que se inscreveram se cedem tempo ao Sr. Ministro.
Informam-me que o PS cede 5 minutos ao Sr. Ministro das Finanças. Assim sendo, tem a palavra, Sr. Deputado Francisco Torres.
O Sr. Francisco Torres (PSD): - Sr. Presidente, tenho pouco tempo para tecer algumas considerações sobre esta matéria - condicionalismos da vida parlamentar que, muitas vezes, não compreendemos -, mas gostava de começar por me referir a uma afirmação que o Sr. Ministro das Finanças agora fez, e que está também exposta num jornal de hoje, sobre a responsabilização do Banco Central Europeu.
Julgo que há democraticidade em todo este processo, no entanto é bom responsabilizar as autoridades independentes. A autonomia do Banco Central Europeu, e, por isso, a autonomia dos bancos centrais nacionais, também se traduz na sua responsabilização. Ora, no modelo europeu, que não é federal, é difícil saber a quem responde o Banco Central Europeu. Não é. certamente, aos parlamentos nacionais - aliás, as várias considerações desta proposta afirmam-no claramente, de acordo com os estatutos do sistema europeu de bancos centrais, do Banco Central Europeu e do próprio Tratado -, mas há que saber se os próprios objectivos, estatutária e democraticamente consignados, estão a ser cumpridos.
O Sr. Ministro das Finanças tem defendido uma posição nesse sentido - que eu diria mais próxima da posição francesa -, a de haver um contrapeso económico por parte do Conselho ECOFIN. Fala aqui no bom entendimento entre o Conselho ECOFIN e o Banco Central Europeu, e acho que isso, obviamente, é importante, mas julgo - e isto está claro numa proposta de resolução apresentada pelo PSD sobre o Tratado de Amsterdão, sobre a Conferência Intergovernamental - que as instituições supranacionais, como o Banco Central Europeu ou a Comissão, devem ser responsabilizadas perante órgãos supranacionais, como é o Parlamento Europeu, e os aspectos de natureza intergovernamental devem responder perante os parlamentos nacionais. Nesse sentido, defendo - e gostava de ouvir a opinião do Sr. Ministro - que deve ser encontrada uma forma mais clara, mais nítida de responsabilização do Banco Central Europeu, sem perder a sua independência nem autonomia na condução da política monetária, como é óbvio, na prossecução do seu objectivo estatutário, perante o Parlamento Europeu.
Em segundo lugar, há aqui um aspecto pouco claro, quer relativo ao Conselho de Auditoria - aspecto esse que tinha sido apontado pelo Instituto Monetário Europeu e no qual não há grandes alterações mas, com certeza, ele retirou a objecção -, quer no que se refere ao artigo que consagra a função de prestamista de última instância por parte do Banco Central - que teria levantado também alguns problemas por parte do Instituto Monetário Europeu a alguns dos bancos centrais, mas, pelos vistos, ficou aqui, se não se mantém qualquer objecção.
Volto a perguntar de forma mais clara ao Sr. Ministro das Finanças se não considera que o facto de os avisos em matéria de supervisão bancária poderem ser assinados, como acontece já nas outras duas instituições de supervisão, apenas pelo Governador do Banco de Portugal não poderia trazer mais transparência ao próprio processo de supervisão. Lembro que a falta de transparência deste processo, muitas vezes, resulta de não se saber de quem é a responsabilidade clara. Autonomia significa sempre responsabilidade e os casos de falta de transparência verificados nos anos
90 em Portugal e em Espanha resultam dessa falta de responsabilização.
O Sr. Presidente: - Informado de que o Sr. Ministro das Finanças responde conjuntamente aos três pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, duas expressões percorrem permanentemente o preâmbulo desta proposta de lei e a intervenção do Sr. Ministro: autonomia e independência. Seria bom falarmos sobre elas, porque, no mínimo, o que se pode dizer é que são expressões equívocas e estamos a jogar com as palavras.
Na verdade, há autonomia e independência em relação ao País e aos interesses nacionais, mas, como, aliás. está traduzido nas preocupações, segundo a imprensa. que o Sr. Ministro ontem terá emitido em Estrasburgo e no discurso insuspeito do Sr. Deputado Francisco Torres. há dependência total em relação ao Sistema Europeu de Bancos Centrais, ao Banco Central Europeu, às orientações emitidas pelo Banco Central Europeu e aos interesses financeiros que comandam o Banco Central Europeu. que não são. seguramente, os interesses nacionais, aproximando-se muito mais dos interesses do Bundesbank.
Esta é a questão, porque não há, mesmo no quadro do modelo que os senhores aceitam e nós não, qualquer mecanismo que possa responsabilizar o Banco Central Europeu ou, por extensão, o banco central nacional, respectivamente, em relação aos Estados membros ou em relação ao seu país.
Talvez o exemplo mais paradigmático disso esteja na forma de eleição do governador e na sua forma de demissão. O governador e os administradores são eleitos ou nomeados pelo Governo português, mas só podem ser demitidos se violarem os estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais, do Banco Central Europeu. Isto nada tem a ver com a legislação nacional, nada tem a ver com os interesses nacionais.
De facto, Sr. Ministro, estamos a alterar os estatutos do Banco de Portugal com vista à sua integração no Sistema Europeu de Bancos Centrais e, com isto, o País não só perde todas as possibilidades de ter mecanismos de intervenção na política monetária, decorrentes, aliás, da moeda única, como perde também qualquer possibilidade de, através do banco central nacional, ter alguma intervenção de responsabilidade na defesa dos interesses nacionais, no quadro da política monetária e das políticas cambiais.
Esta é uma questão central, preocupante para a defesa dos interesses da economia portuguesa, quando ela, por exemplo, divirja - e seguramente divergirá muitas vezes - dos interesses das economias dominantes na Europa.
Portanto, Sr. Ministro, esta é uma questão que, independentemente do modelo, que os senhores aceitam e nós não - e aí somos claro -, seguramente nos deve preocupar a todos e em relação à qual não há respostas, não há qualquer compatibilização entre autonomia, independência e responsabilização. São tudo palavras piedosas para esconder a questão central da total dependência futura do
Página 577
20 DE NOVEMBRO DE 1997 577
banco central nacional em relação aos interesses dos mercados financeiros internacionais e aos interesses e às orientações do Banco Central Europeu.
Mesmo a respeito da própria supervisão, como o Sr. Ministro sabe, ao abrigo do n.º 6 do artigo 105.º do Tratado de Maastricht, há a possibilidade de o Conselho vir a deliberar futuramente que a supervisão financeira bancária passa para a responsabilidade do Banco Central Europeu. Porventura, esse será o caminho, no quadro do federalismo económico que está aqui patente, que tudo isto vai seguir.
Por isso, Sr. Ministro, eu quase diria que, neste quadro, em vez de estarmos aqui a discutir esta proposta de lei com o Governo, deveríamos estar a discuti-la com o Instituto Monetário Europeu, porque, em boa verdade, quem já aprovou os estatutos e quem teria outra vez de dar um parecer se, porventura, a Assembleia da República, no uso dos seus já limitados poderes soberanos, quiser introduzir alterações, seria o Instituto Monetário Europeu. Entre ele e a Assembleia, o Governo é, neste quadro, um mero intermediário.
No fundo, a minha questão é esta: como é que o Sr. Ministro compatibiliza as suas preocupações de inimputabilidade, de confidencial idade permanente, que são inerentes ao funcionamento do sistema, com a integração plena do banco central nacional nas normas, nas orientações e nas regras do Banco Central Europeu? Como é que, nesse quadro, os interesses nacionais podem ser defendidos?
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Mota Amaral.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.
O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, o meu pedido de esclarecimento ao Sr. Ministro das Finanças, a quem aproveito para cumprimentar, está muito relacionado com as preocupações que já aqui foram trazidas pelas intervenções anteriores. Curiosamente, com motivações completamente diferentes, pois as perplexidades do Sr. Deputado Francisco Torres têm a ver sobretudo com a autonomia e as relações do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu com o poder político num quadro federal, enquanto as nossas preocupações têm a ver muito mais com o facto de se saber como é que se defendem os interesses nacionais no quadro desta independência e desta autonomia. a nível comunitário, do Banco Central Europeu e, agora, do que vai passar a ser a sua filial portuguesa, o Banco de Portugal.
Sr. Ministro, li na imprensa de hoje declarações suas prestadas ontem em Estrasburgo e quero dizer-lhe aqui que não as formularia melhor. O Sr. Ministro afirma que «a desejável independência do futuro Banco Central Europeu não deverá impedir a instituição de prestar contas ao poder político, sob pena de se aumentar o défice democrático da União Europeia». Isto poderia ter sido dito por mim. aqui, ou pela minha bancada.
O Sr. Ministro diz que a independência é boa, mas a ausência de explicações, a inimputabilidade política, é má. O Sr. Ministro manifestou a sua oposição a um directório do Banco Central Europeu que trabalhe em confidencialidade permanente. O Sr. Ministro disse ainda que, pelo contrário, «os Estados membros da União deverão criar condições para explicar à opinião pública as decisões do Banco Central Europeu, por forma a que a instituição não agrave o défice democrático». Sr. Ministro, eu não o diria melhor!...
O Sr. Deputado Francisco Torres diz que o Sr. Ministro se aproxima mais da posição francesa, na visão geográfico-federalista que ele tem, muito respeitável, aliás, mas o que quero perguntar-lhe é o seguinte: onde está, na proposta de diploma que estamos a discutir, esta sua preocupação, quanto ao espaço interno, ao espaço português, de atenuar, ao menos atenuar, este défice democrático? É que não a encontro, na leitura atenta que fiz do diploma, pelo que agradecia ao Sr. Ministro a explicação.
Há ainda duas perguntas de pormenor que não resisto a fazer-lhe e, uma vez que li o diploma. vamos ver se nos esclarecemos.
Curiosamente, a proposta de lei já fixa o capital social do Banco de Portugal numa quantia;...
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Em euros!
O Orador: - ... em euros, equivalente a 200 000 contos, que deve ser aquilo com que a Comunidade nos deixa brincar. É um montante tão pequeno que não consigo perceber um significado que não meramente simbólico deste capital social. Mas, tem graça, porque o legislador, Governo, já teve necessidade de dizer que a quantia será equivalente em euros a 200 000 contos. No entanto, no artigo 10.º, logo à frente, e a propósito de umas contraordenações e umas coimas, prevê essas coimas em escudos!... Já agora, sugiro ao Sr. Ministro que estas coimas também sejam já aplicadas em euros, porque, se não, há pelo menos alguma desarticulação no diploma.
Finalmente. Sr. Ministro, o n.º 2 do artigo 52.º diz o seguinte: «O orçamento de cada ano será comunicado ao Ministro das Finanças até 30 de Novembro do ano anterior». Ponto final! Para quê? Sr. Ministro, já agora, previa também que fosse enviado à Assembleia da República, comunicado, publicado num jornal de grande circulação. Se, quanto ao relatório e contas, o Ministro das Finanças aprova - e só aprova, não está previsto desaprovar -, pergunto-lhe por que razão, quanto ao orçamento, não está dito o mesmo, em vez de se dizer apenas que comunica ao Ministro das Finanças. sem qualquer consequência, Zero! Ponto final! Gostaria de saber qual é a utilidade prática que o Sr. Ministro vê da introdução, no diploma, desta comunicação do orçamento do Banco de Portugal ao Ministro das Finanças. Ponto final!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Luís Queiró, ultrapassou já o tempo regimental para pedir esclarecimentos. Queira terminar.
O Orador: - Como temos agora um Presidente disciplinador, fico-me por aqui. Terei oportunidade de voltar ao assunto na minha intervenção.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - O Sr. Presidente Almeida Santos é muito disciplinador, devo dizer-lhe.
Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças. De acordo com o Regimento, dispõe de cinco minutos.
O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, vou dar respostas muito rápidas às questões de pormenor.
Página 578
578 I SÉRIE - NÚMERO 15
Começando pelo fim, no artigo 52.º, a diferença em relação ao regime actual é que se prevê a mera comunicação, ao passo que agora há aprovação. É essa a diferença. A comunicação, como é evidente, também pode ser feita à Assembleia da República, não há qualquer objecção de princípio em relação a isso. O importante é que o orçamento seja, como poder instrumental, embora essencial à independência, e poder dê autonomia em sentido estrito, aprovado pelo órgão próprio do Banco.
Quanto à moeda em que estão denominadas as coimas e o capital, a escolha foi intencional. Pensamos que, neste momento, devemos seguir o padrão da legislação portuguesa. Por isso, estamos a legislar em escudos. Haverá normas sobre conversão dos valores em escudos, para efeito de aplicação de coimas e muitos outros, para euros.
No que toca ao capital, pensávamos que deveria ser o mesmo. mas o Instituto Monetário Europeu preferia que o capital fosse denominado em euros. A fórmula que consta da proposta de lei corresponde já, de algum modo, à lógica do período de transição: o valor em euros, na medida em que o banco central estará integrado no Sistema Europeu de Bancos Centrais, correspondente ao valor actual do capital em escudos.
O Sr. Deputado diz que o valor é baixo. Pois é! Esse valor corresponde ao capital actual, que o Conselho de Administração do Banco de Portugal entendeu que se deveria manter apenas como valor simbólico, porque, de facto, se o Banco de Portugal fosse medido pelo seu capital, seria confundido com instituições da banca comercial ou outra, e isso seria errado.
Por outro lado, o Banco de Portugal deixa de ser empresa pública, o capital tem um significado meramente simbólico, nada representa, nem da importância dos poderes nem do valor real económico do Banco. A proposta de manter o valor actual, sem uma actualização que não teria sentido mas também sem alterações que mantivessem esse valor a um nível quase ridículo mas simbólico, é do próprio Conselho de Administração do Banco de Portugal, que entendeu que essa era a forma mais clara de acentuar que se trata de uma instituição cuja importância económica não resulta do seu valor de capital.
Quanto à autonomia e à função de prestamista em última instância, creio que a redacção corresponde às observações do Instituto Monetário Europeu e é também aceitável para nós.
Resta o problema fundamental colocado pelos três pedidos de esclarecimentos, e a esse vou responder durante mais tempo.
Na minha opinião, a responsabilização compatível com a ideia de independência é a que resulta da transparência das decisões e da possibilidade de ser chamado a prestar esclarecimentos, nomeadamente perante o Parlamento, a opinião pública e os órgãos políticos. Não há, em relação a um órgão independente, outra forma de responsabilização.
Independência é mais do que autonomia, independência é o que caracteriza. num domínio, os tribunais e, noutro, os bancos centrais, quando se opta pela sua independência, não se podendo tratar a independência como uma mera autonomia técnica. A autonomia tem direcção e tutela; a independência não tem. Mas isso não significa que a independência não tenha responsabilidade. Só a, responsabilidade é compatível com a independência. E essa a lógica das declarações que fiz e é essa a lógica que separa a independência da mera autonomia técnica, que pressupõe direcção e tutela dos órgãos políticos.
Os bancos centrais, quer nacionais, quer o Banco Central Europeu, não podem estar sujeitos a direcção ou tutela, mas, sendo independentes, não podem assumir-se como órgãos tecnocráticos, têm de assumir responsabilidade política nas formas compatíveis com a independência.
Quanto ao Sistema Europeu de Bancos Centrais, penso que é claro que há uma interdependência, não vale a pena termos ilusões. Como é evidente, a lógica da União Económica e Monetária é a existência de uma união económica e monetária com transferência para o Banco Central Europeu, em colaboração com os bancos centrais nacionais no Sistema Europeu de Bancos Centrais, dos poderes de política monetária. Ponto final parágrafo! Não vale a pena iludir isto!
Por outro lado, é evidente que há um primado do Direito Comunitário, que Portugal aceitou quando se integrou na Comunidade e que faz parte da ordem jurídica em que estamos legítima e democraticamente integrados. Assim, o poder legislativo aqui exercido é exercido no âmbito desse princípio que Portugal aceitou e que faz parte da ordem jurídica vigente em Portugal.
Não é verdade que o Banco de Portugal passe a estar dependente do Banco Central Europeu. Ele integra o Sistema Europeu de Bancos
Centrais, cujo órgão principal é constituído pelos governadores dos bancos centrais nacionais, que, presume-se, serão uma maioria, e por um conselho executivo designado pelo Conselho Europeu em termos de consenso, com base em propostas do Conselho de Ministros também em termos de consenso.
Penso que este é um sistema de interdependência em que não há subordinação de ninguém a ninguém, mas há evidente atribuição ao Sistema Europeu de Bancos Centrais da autoridade de política monetária. Como é que ela pode ser limitada? Pela responsabilidade perante o Parlamento, comunitário no caso dos órgãos comunitários, nacional no caso dos órgãos nacionais e pela coordenação de políticas que será objecto de unia proposta do Conselho ECOFIN ao Conselho Europeu do Luxemburgo e que se espera que venha a ser definida em execução dos artigos 106.º, 109.º e outros do Tratado.
São estas as duas respostas: interdependência e responsabilidade perante o poder político e coordenação de políticas.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados. Sr. Ministro das Finanças, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Sr. Secretário de Estado do Tesouro: A discussão que hoje aqui levamos a cabo a propósito da alteração da Lei Orgânica do Banco de Portugal, quer no imediato, quer a partir do dia em que Portugal adoptar o euro como moeda, remete-nos para a questão de fundo que lhe é subjacente e que é basicamente a da participação de Portugal na União Económica e Monetária desde o primeiro dia e na plenitude de todos os direitos e deveres dela decorrentes. Esta é que é a questão de fundo.
Portugal cumpre os critérios de convergência nominal para integrar o pelotão da frente da moeda única, Portugal cumprirá, com a aprovação desta proposta de alteração da Lei Orgânica do Banco de Portugal, o critério da chamada convergência jurídica, que também é indispensável para atingir esse objectivo.
Página 579
20 DE NOVEMBRO DE 1997 579
Ao aprovar esta lei e ao reforçar, em consequência, a autonomia e a independência do Banco Central, o Governo cria também as condições necessárias ao desempenho das atribuições decorrentes da integração do Banco de Portugal no Sistema Europeu de Bancos Centrais.
Já foi suficientemente esclarecido pelo Sr. Ministro das Finanças o alcance, a dimensão e os objectivos (que nalguns casos sobrelevam a necessidade de ajustamento face ao Sistema Monetário Europeu) da alteração proposta, pelo que o essencial desta discussão parlamentar tem de ser, e deve ser, o do enquadramento político deste processo
legislativo.
Interrogam-se os adversários da actual forma de construção europeia - e ouvimos o Sr. Deputado Lino de Carvalho falar muito sobre isso - sobre os malefícios que podem decorrer do reforço de autonomia e independência do Banco Central, da sua integração no Sistema Europeu de Bancos Centrais e, posteriormente, da sua articulação com o Banco Central Europeu.
O que estará em causa é a perda de soberania decorrente da redução da capacidade de uso das políticas monetária e cambial e consequentemente da dependência relativamente aos interesses definidos pelo actual núcleo central mais poderoso da Europa. Esta é uma discussão recorrente, mas nem por isso menos importante e emblemática.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!
O Orador: - Os paradigmas tradicionais em que assentava o crescimento e o desenvolvimento económico dos países, estão hoje ultrapassados, nomeadamente em relação a uma pequena economia aberta como é a portuguesa.
Ao aceitar integrar a Comunidade, Portugal alargou o seu mercado interno para os seus limites naturais: precisamente os limites da Europa actual, dentro dos quais estabelece e concretiza a parte mais significativa do seu comércio e, de uma maneira geral, das suas relações económicas e financeiras.
Partilhar da coesão financeira que resultará da integração das diferentes políticas monetárias, numa disciplina geral mais vasta e estável e consequentemente mais forte, não é, não pode ser, uma fraqueza, antes deve
entender-se e qualificar-se como uma reforçada autonomia. Reforçada autonomia relativamente aos cicios económicos, que ainda hoje são razoavelmente imprevisíveis, sobretudo nas consequências que provocam sobre as economias mais frágeis, e reforçada autonomia na relação da economia portuguesa com os espaços terceiros tradicionais ou emergentes, porque ficará ancorada numa moeda e numa sustentação monetária bastante mais fortes.
O Sr. João Carlos Silva (PS): - Muito bem!
O Orador: - É evidente que este processo de integração monetária (de algum modo decorrente do artigo 108.º do Tratado) não pode apreciar-se num contexto isolado, antes deve articular-se com a necessidade cada vez mais imperativa - e isso foi aqui referido pelo Sr. Ministro das Finanças na resposta que deu às questões que lhe colocaram - da coordenação das políticas económicas, consagrada no Conselho Europeu de Madrid, e com o reforço do controlo democrático das opiniões públicas sobre as políticas europeias, incluindo naturalmente a própria política monetária.
É, por isso, que esta fase não é tanto uma fase de chegada, antes deve entender-se como um ponto de partida para enfrentar novos e actuais problemas e encontrar as melhores soluções para eles. E novos problemas é o que não falta na caminhada europeia.
Para os 18 milhões de desempregados, que constituem um verdadeiro 16.º país da União, as formas de integração monetária não são indiferentes. São eles os primeiros destinatários das opções de política, neste domínio, e é para a solução do vasto problema do desemprego e, sobretudo, para a criação de sustentadas situações de empregabilidade que deve orientar-se a política monetária. Sem deixar de respeitar, naturalmente, os dois pilares fundamentais da União Económica e Monetária - a moderação dos preços e a contenção financeira - mas assegurando também - recordêmo-lo - em contrapartida. a evolução progressiva dos níveis de coesão e de bem estar.
De igual modo, para os 11 países que se perfilam à entrada da Europa, e aos quais não podemos responder com um «não», pois tal seria a negação do espírito fundador essencial da União, não é indiferente o nível e a forma da integração monetária. É que a sua entrada, precedida dos naturais apoios de pré-adesão, é tributária do crescimento e do desenvolvimento económico da Europa actual.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vive-se hoje na Europa uma fase da qual já não se pode recuar. Defender o recuo é, portanto, um rematado disparate. É claro que, como em tudo na vida, ao actual nível de integração se associam vantagens e inconvenientes. E o que torna ainda tudo mais difícil (e, por vezes, mais controversa) é que as vantagens e os inconvenientes não vão distribuir-se homogeneamente pelos países, pelas empresas, pelos estratos sociais e mesmo pelos níveis etários. É errado pensar e dizer que todas as vantagens reverterão para os que são actualmente mais fortes e que todos os inconvenientes se orientarão para aqueles que são, na actualidade, mais fracos.
A lógica da União é também esta: é a partilha, no desconhecimento das fronteiras (territoriais ou sociais), do bem e do mal que todos soubermos construir. Neste contexto, o papel da opinião pública é insubstituível.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!
O Orador: - O propalado défice democrático europeu no domínio da informação (e nalguns casos da participação) tem de ser superado e anulado. Impõe-se, assim, um grande investimento no esclarecimento e no debate.
No caso concreto em apreciação, nada justifica que a desejável independência do Banco Central Europeu e o reforço da autonomia e da independência do Banco de Portugal, impeçam estas instituições de prestar contas ao poder político. Ainda recentemente o Governo português, pela voz autorizada do Sr. Ministro das Finanças, assumiu uma vez mais o comando da agenda política e formulou preocupações e recomendações nesse sentido.
O Sr. João Carlos Silva (PS); - Muito bem!
O Orador: - Aqui está uma prova inequívoca de como a nossa integração não é um mero exercício voluntarista, antes se orienta por uma lógica e um projecto de desígnio nacional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vamos aprovar a proposta de lei do Governo que altera a Lei Orgânica do Banco de Portugal, visando a sua integração no Sistema
Página 580
580 I SÉRIE - NÚMERO 15
Europeu de Bancos Centrais. Fazêmo-lo, aliás, na sequência e em obediência ao princípio constitucional que assegura a autonomia e independência do Banco Central e que foi objecto de revisão recente. Não aprovamos esta lei, contudo, de uma forma automática e pouco reflectida.
Como procurei demonstrar, a construção europeia é uma tarefa de todos os dias e de todos os domínios, que deve ser orientada por uma finalidade motora e desenvolvida em obediência a um imperativo nacional. A aceitação das regras de articulação das políticas monetárias, numa V fase, e de integração plena, numa 2.ª fase, é um elemento essencial e fundamental para essa construção.
Ao fazê-lo e ao propô-lo à Assembleia da República, o Governo apenas está a cumprir o dever que decorre do seu programa, respeitando o desejo da esmagadora maioria do povo português que, no Parlamento, está representado. Compete aos Srs. Deputados partilharem conscientemente esta mesma responsabilidade.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.
O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: A Assembleia da República é chamada hoje a discutir e votar uma nova orgânica para o Banco de Portugal. Pode parecer que os Deputados desta Câmara irão aprovar uma lei de acordo com a sua legítima competência e liberdade normativa, seguros de que o respectivo articulado não deixará de reflectir as opções maioritárias desta Câmara. Nada mais enganador!
Se bem analisarmos, verificamos que a proposta que o Governo socialista aqui nos trás, certamente com o apoio entusiástico do Partido Social Democrata, não é outra coisa senão a transcrição obediente - e dirão os Srs. Deputados do bloco central, inevitável - das disposições do Tratado de Maastricht e dos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais, anexos a esse tratado, relativas à condução exclusiva pelo Banco Central Europeu da política monetária e cambial dos países do euro.
Ou seja, a Assembleia da República não vai hoje, aqui, expressar qualquer vontade legislativa autónoma - aliás, o Sr. Ministro já o reconheceu - mas apenas como que rectificar ou apostilhar a imposição decorrente do Tratado de Maastricht relativa aos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu e, por consequência, da sua futura delegação portuguesa, o Banco de Portugal.
Deve esta Câmara, portanto, reflectir acerca da natureza e alcance desta proposta e as suas consequências no que diz respeito ao controlo democrático sobre as questões de política monetária e cambial.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, na essência o sistema é o seguinte: «O Banco Central Europeu e os bancos centrais nacionais, ou qualquer membro dos respectivos órgãos de decisão, não podem solicitar ou receber instruções das instituições ou organismos comunitários, dos governos dos Estados membros ou de qualquer outra entidade», diz o artigo 7.º dos Estatutos do SBCE, aliás, na esteira do artigo 107.º do Tratado.
Por sua vez, o artigo 2.º dos mesmos estatutos, de acordo com o disposto no artigo
105.º do Tratado, impõe que o objectivo primordial cometido ao Sistema Europeu de Bancos Centrais seja o da «manutenção da estabilidade dos preços».
Acresce que os governos dos Estados membros interessados na participação imediata na 3.ª fase da União, desde 1 de Janeiro de 1999, como é o caso de Portugal, comprometeram-se já, através do chamado Pacto de Estabilidade, a manter depois dessa data o objectivo dos critérios de convergência nominal, que bem conhecemos. Quer dizer que o Sistema de Europeu de Bancos Centrais, livre de quaisquer pressões, adquire um estatuto de total irresponsabilidade no domínio da condução da política monetária e cambial da Comunidade, estando vinculado apenas aos ditames da ortodoxia monetária. Até - com todo o respeito lho digo - já o nosso Ministro das Finanças descobriu isto, quando ontem mesmo, em Estrasburgo, perante os Deputados portugueses ao Parlamento Europeu, defendeu a necessidade de o Banco Central Europeu prestar contas ao poder político, sob pena de se aumentar o défice democrático.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Popular está inteiramente de acordo com esta formulação. Na verdade, a inimputabilidade e a confidencial idade permanente do futuro directório do Banco Central Europeu é negativa, sendo absolutamente indispensável criar condições para explicar à opinião pública as decisões que venham a ser tomadas. Por maioria de razão, deve ser esta também a principal preocupação relativamente ao Banco de Portugal. Como já referi, este, no sistema a instituir, não passa de uma filial portuguesa do Banco Central Europeu. Basta pensar que é o Banco Central Europeu que irá ter o direito exclusivo de autorizar a emissão de notas de banco na Comunidade - para o Banco de Portugal ficam as moedas comemorativas, já não é mau! -, segundo o artigo 16.º do Estatuto; que os activos de reserva que não sejam moeda comunitária serão transferidos para o Banco Central Europeu (artigo 30.º do Estatuto); que a supervisão das instituições de crédito nacionais fica sujeita às determinações do Banco Central Europeu (artigo 19.º do Estatuto); ou, que as contas do Banco de Portugal serão fiscalizadas por auditor externo designado por recomendação do Conselho do Banco Central Europeu, com total afastamento da fiscalização, prévia ou sucessiva, do Tribunal de Contas (artigo 46.º do Estatuto).
Ora, é possível, mesmo sem afrontar o Tratado, prever mecanismos na lei - e falo da lei portuguesa, obviamente - que previnam os perigos que há pouco enunciei. Ao menos, Srs. Deputados duas medidas se impõem, que não estão previstas na proposta do Governo: uma tem a ver com a forma de nomeação do Governador do Banco de Portugal. Sempre dissemos que deveria caber à Assembleia da República a designação do seu governador e vice-governadores. Esta forma de designação permitiria manter algum controlo de natureza política, ainda que indirecto. sobre o funcionamento do Banco de Portugal.
É que, Sr. Presidente e Srs. Deputados, indiscutivelmente, melhora-se o funcionamento da democracia quando criamos entidades autónomas e independentes mas ao mesmo tempo garantimos para essas entidades um controlo político que tenha algum fundamento, ao menos algum fundamento, na legitimidade eleitoral.
O PS, e veremos se o PSD, continuam a não demonstrar qualquer abertura e sensibilidade para esta nossa preocupação democrática, agora tornada mais urgente pela vinculação das decisões do Banco de Portugal a uma entidade externa: o Banco Central Europeu.
Uma segunda salvaguarda da reserva de soberania nacional consubstancia-se no direito de informação permanente que a Assembleia da República deve ter sobre a activida-
Página 581
20 DE NOVEMBRO DE 1997 581
de do Banco, a qual também não está consignada na proposta do Governo e ao contrário do que já aqui nos quiseram fazer crer.
A obrigação, prevista no artigo 54.º da proposta, de o Governador «informar a Assembleia da República, através da Comissão de Economia, Finanças e Plano» - talvez até directamente ao Sr. Deputado Francisco Torres ainda fosse melhor - «sobre a situação e orientações relativas à política monetária e cambial», na sequência da apresentação do Relatório, Balanço e Contas anuais do Banco de Portugal, é manifestamente insuficiente para atingir o objectivo. Não sei se reparam que a obrigação é apenas anual e no âmbito da Comissão de Economia, Finanças e Plano.
Para o Partido Popular, este deveria ser um direito irrestrito da Assembleia da República, o direito de chamar a capítulo o Governador do Banco de Portugal e exigir-lhe as explicações que em cada momento se revelem necessárias e pertinentes sobre a condução daquelas políticas e da participação nacional no Sistema Europeu de Bancos Centrais.
Convirá aqui recordar que exigem o voto favorável do Governador as deliberações do Conselho de Administração do Banco que possam afectar a sua autonomia de decisão enquanto membro do Conselho do Banco Central Europeu ou o cumprimento das obrigações do Banco enquanto parte integrante do Sistema Europeu de Bancos Centrais - é o que dispõe o artigo 32.º da proposta do Governo. Trata-se de um verdadeiro direito de veto do Governador do Banco de Portugal, enquanto comissário ou delegado do Banco Central Europeu junto da autoridade monetária nacional.
Poderá este direito de veto não estar submetido a nenhuma espécie de controlo democrático, já que ainda por cima está praticamente vedada ao Governo português a possibilidade de exoneração do Governador?! Pensamos que não!
O debate político nesta Câmara, suscitado em tomo das audições do Governador. permitiria com certeza orientar a atenção da opinião pública e dos eleitores para a forma como são conduzidos as questões essenciais da nossa vida colectiva. É isto, Sr. Presidente, Srs. Deputados, julgamos nós, a essência da democracia.
Cabe também aqui dizer, para concluir, que nos parece politicamente pouco sério estar a dar passos decisivos para a integração de Portugal no Sistema Europeu de Bancos Centrais, ou seja, da moeda única e do federalismo económico e monetário, com a transferência de soberania nacional que isso implica, sem saber ainda qual é a vontade última do povo português, para o efeito expressamente consultado.
Na semana passada. foi aprovado nesta Assembleia, com os votos do PS e do PSD, o orçamento da entrada no euro. Hoje, o Governo vem aqui propor-nos a aprovação do novo estatuto do Banco de Portugal - mais um instrumento de consecução da moeda única. Neste quadro, ocorre perguntar qual, no entender desta Câmara, o sentido útil do referendo sobre a construção europeia que há tanto tempo vimos reivindicando e que se irá realizar no próximo ano. Que perguntas substantivas e politicamente consistentes se podem fazer num referendo em que já tudo o que havia para decidir está decidido, com a cumplicidade dos Srs. Deputados do PS e do PSD? É a pergunta que provavelmente, mais uma vez, neste debate, Sr. Presidente, Srs. Deputados, ficará sem resposta.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Presidente, Sr. Ministro das Finanças, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: O acto a que a Assembleia da República é hoje chamada é, por si só, um significativo exemplo do que serão, no futuro, após a criação da moeda única, as enormes limitações ao exercício da soberania nacional. Vamos, formalmente, votar a alteração dos estatutos do Banco de Portugal. Mas só formalmente! É que antes de nós já «votou» quem de facto. decide (e já decidiu), o Instituto Monetário Europeu, cujas «ordens» foram, aliás, prontamente acatadas e incorporadas no texto da proposta que nos é presente.
Poderia a Assembleia da República querer, eventualmente, introduzir alterações à proposta de lei mas esta nova «democracia do euro» diz-nos que quem tem poderes para decidir dos estatutos do Banco Central não são os Deputados nacionais eleitos com o voto popular mas os burocratas do Instituto Monetário Europeu submetidos às ordens do Deutsche Bundesbank. Instituto Monetário Europeu que, no seu parecer sobre os novos estatutos do Banco de Portugal, saúda significativamente «a oportuna e correcta adaptação dos estatutos» e sublinha «com particular satisfação a maneira abrangente como a adaptação dos estatutos está sentida na proposta de lei n.º 144/VII. Sempre, sempre bons alunos da Comunidade!
Ao contrário do que afirma a nota justificativa e o preâmbulo da proposta de lei, não estamos perante alterações que consagrem um maior quadro de autonomia para o Banco de Portugal. Bem, pelo contrário! O Banco de Portugal passa a ficar e seguramente ficará, com mais autonomia face ao País mas passa ficar dependente quanto às decisões fundamentais na orientação e fiscalização dos mercados monetário e cambial do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu, como. aliás, está claramente, expresso no futuro artigo 3.º, que sujeita o Banco de Portugal «ao disposto nos Estatutos» daquelas entidades e «actuando em conformidade com as orientações e instruções que o Banco Central Europeu lhe dirija». É um estatuto que não podemos aceitar!
Toda a actuação futura do Banco de Portugal fica sujeita ao acordo e à orientação do Banco Central Europeu, cuja Comissão Executiva será constituída por seis funcionários, delegados dos mercados financeiros, nomeados por oito anos, irresponsáveis e inimputáveis perante quaisquer parlamentos ou órgãos democraticamente eleitos, com poderes de execução da política monetária e com poderes de dar instruções aos bancos centrais nacionais. E de tal modo que o próprio governador e membro do conselho de administração, que são nomeados pelo Governo português, só podem ser demitidos de violarem não as leis nacionais mas os estatutos do Banco Central Europeu. É a total alienação da soberania de Portugal em matéria de definição da política económica e monetária. É a construção do edifício - sede do federalismo económico.
E até por essa razão que maior importância assumem as propostas da Comissão de Trabalhadores do Banco de Portugal no sentido, que nos parece positivo, de consagrar uma maior transparência na actividade da instituição e de reforçar a intervenção dos trabalhadores do Banco e da sua organização representativa, que, em sede de especialidade, deverão ser consideradas.
Srs. Deputados, como afirmam os mais insuspeitos analistas, a criação do Banco Central Europeu - de que a
Página 582
582 I SÉRIE - NÚMERO 15
alteração dos Estatutos do Banco de Portugal é parte integrante - «é um passo para a construção de um estado europeu», naturalmente com o apoio e o aplauso do PS, do PSD e agora, finalmente despida a máscara, do PP.
Protestos do Deputado Luís Queiró.
É por isso, Sr. Deputado Luís Queiró, que me parece que o seu discurso já não está em sintonia com as novas orientações do seu partido, porque desde o momento em que os senhores anunciaram, aqui no debate final do Orçamento do Estado, que estão a favor da moeda única têm que estar a favor de todo o enquadramento jurídico-constitucional que decorre do Tratado de Maastricht e da moeda única. O Sr. Deputado tem que actualizar o seu discurso face às orientações do seu partido!
Protestos do Deputado Luís Queiró.
O PCP não aceita este passo decisivo para a perda de soberania monetária, em particular da soberania monetária. Não por razões de um qualquer nacionalismo estreito e atávico, mas porque a total subordinação do Banco de Portugal e da nossa política monetária às ordens do futuro Banco Central Europeu, mais a mais neste quadro, não serve os interesses da economia portuguesa, não serve Portugal nem os portugueses.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Ao contrário do que nos pretendem fazer crer, a moeda única não vai criar estabilidade, o que vai criar é uma moeda forte, com uma taxa de câmbio elevada. prejudicial ao emprego e às economias de menores produtividades, como a portuguesa; A moeda única não vai fazer desaparecer a especulação monetária num universo onde o dólar não é suprimido, pelo contrário, o desejo de competir com o dólar provocará, não fenómenos de cooperação mas de choques dentro da própria União Europeia.
Em contrapartida, a gestão da política monetária e da taxa de câmbio ou as margens de manobra necessárias a uma política orçamental que responda às necessidades de mais investimento, mais emprego e mais desenvolvimento, ficam coarctadas e sujeitas aos critérios restritivos do Banco Central Europeu, que por sua vez são definidos em função não dos interesses dos Estados membros mas dos interesses das economias dominantes, da economia alemã em particular, e dos grandes grupos financeiros europeus.
Um exemplo imediato já aí está: em nome das restrições monetárias impostas pelo caminho para a moeda única, a tão propagandeada Cimeira do Emprego não irá ter qualquer decisão efectiva nem influência real na criação de emprego. Não será mais do que uma caridosa declaração de intenções para acalmar espíritos inquietos e dar a ilusão de que moeda única também rima com emprego.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É isto que está em jogo, hoje e aqui, na alteração dos Estatutos do Banco de Portugal com vista à sua total subordinação às orientações do Banco Central Europeu, como instrumentos necessários à construção do edifício que irá gerir a moeda única e toda a política monetária e cambial do nosso país.
No essencial, o Banco de Portugal não será mais, no futuro, do que uma delegação, em Portugal, do Banco Central Europeu, como o Governo, neste debate, não é mais do que o intermediário entre o Instituto Monetário Europeu, que já aprovou os estatutos, e o poder de aprovação formal da Assembleia da República. O que estamos a fazer hoje aqui não é, por isso, mais do que darmos cenário a uma decisão que já foi tomada na sede do Instituto Monetário Europeu à aprovação destes novos estatutos.
A esta alienação da nossa soberania numa questão fundamental, a este caminho para o federalismo económico, a esta democracia virtual, o PCP diz «não».
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - O Sr. Deputado Manuel dos Santos pediu a palavra para pedir esclarecimentos, mas o PCP não dispõe de tempo para responder.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, o PS cede, com grande generosidade, um minuto.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - A ser assim, tem a palavra, Sr. Deputado Manuel dos Santos.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, lamento mas não tenho perguntas a fazer, quero apenas fazer um comentário, que é até, a meu ver, de louvor par; o Sr. Deputado.
O Sr. Deputado Lino de Carvalho e o PCP, em matéria europeia, não nos surpreendem, porque apresentam sempre, surpreendentemente, os mesmos testemunhos e as mesmas previsões.
Embora correndo o risco de incomodar o Sr. Deputado Octávio Teixeira, que ao me ouvir dizer isto muitas vezes também já me respondeu muitas vezes, portanto já nos conhecemos muito um ao outro, devo dizer que o PCP sempre fez previsões perfeitamente catastróficas sobre a evolução de Portugal na Comunidade Europeia e que aqui se verificaram ser sistematicamente desmentidas pelos factos. Estou a recordar-me da célebre previsão da contribuição líquida de Portugal para a Comunidade Europeia... Sei bem que foi por causa dos fundos estruturais e dos fundos de coesão, mas isso também faz parte da lógica da construção europeia.
Portanto, eu diria que o discurso do Sr. Deputado Lino de Carvalho contra a moeda única foi, no fundo, coerente e, nessa perspectiva, até se percebem algumas das observações que fez. Mas o que o Sr. Deputado não pode fazer é analisar esta lógica um pouco na perspectiva, essa sim, pela primeira vez surpreendente, que o Sr. Deputado Luís Queiró aqui apresentou, que andará desfasado daquilo que são as posições políticas do respectivo partido nos últimos tempos e nomeadamente as contribuições, muito oportunas, dadas recentemente pelo Sr. Dr. Fernandes Thomaz - penso que é assim que se chama - a propósito do apoio recente do PP ao euro. Portanto, já é mais surpreendente o tipo de intervenção feita pelo Sr. Deputado Luís Queiró, que é tentar, digamos, «tapar o sol com a peneira», o que me parece manifestamente impossível.
Mas o que mais me marcou na intervenção do Sr. Deputado Lino de Carvalho foi a afirmação peremptória de que a moeda única não rima com emprego. E que a nossa lógica é exactamente ao contrário. Pensamos que é exactamente através de uma construção europeia e de um edifício europeu cada vez mais forte, cada vez mais integrado e convergente que alguns dos problemas fundamentais, que já não são os problemas do passado, havendo aqui um problema de análise do enfoque.
Página 583
20 DE NOVEMBRO DE 1997 583
Os problemas do emprego actuais não são os problemas do princípio do século e têm de ter soluções diferentes. As soluções desenvolvimentistas, assentes nos modelos keynesianos, já hoje não se podem aplicar exactamente da mesma maneira que no passado.
Portanto, onde há a nossa grande linha de margem, a tal margem que uns são capazes de passar e outros ainda o não foram, mas lá irão com o tempo, é exactamente aqui: entendemos que esses problemas - e não é só o problema do desemprego, aliás, como sabe, e hoje os 18 milhões de desempregados da Europa são considerados verdadeiramente o 16.º Estado da União - só poderão ser resolvidos, a meu ver, com uma Europa mais forte, a qual vai construir-se também, a meu ver e ao que parece (ao que parece não, tenho a certeza e segundo o que pensa o meu partido), através da moeda única e da integração monetária. É exactamente esta a questão e a linha de limitação, Sr. Deputado Lino de Carvalho.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Tem a certeza, segundo pensa o seu partido!? Está certo!
O Sr. Presidente (Mola Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho, que dispõe de um minuto, tempo cedido pelo PS.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, vou ser muito rápido.
Não fiquei a perceber se o que pensa o PS é o que pensa o Sr. Deputado Manuel dos Santos, ou se o que pensa o PS é aqui transmitido pelo Sr. Deputado Manuel dos Santos, sem ser bem esse o seu pensamento. Mas ele, depois, poderá esclarecer isto.
Sr. Deputado Manuel dos Santos, estou de acordo consigo quando diz que somos coerentes.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Nós também!
O Orador: - Numa perspectiva aberta de evolução da sociedade portuguesa. somos coerentes! Coerentes na defesa do que consideramos ser o interesse nacional, o interesse da nossa economia e o interesse do emprego. E, nesta matéria, a realidade, ao contrário do que o Sr. Deputado tem dito, tem-nos dado razão.
Por exemplo, se o Sr. Deputado olhar para muitos sectores da economia nacional - e não vou desenvolver porque não tenho tempo -, para os comentários preocupados vindos de muitos sectores da actividade económica produtiva, da agricultura, das pescas ou da indústria, verificará as preocupações que por aí andam quanto às consequências da forma como o processo da construção europeia tem vindo a ser conduzido e quanto às consequências futuras da própria moeda única. Aliás, estamos longe de ter um balanço, já que os tais célebres estudos que um dia, aqui, num Orçamento, o PP, como início do seu caminho para a adesão à moeda única, pediu ao Governo, ainda estão por ser do conhecimento público. Nem sequer há estudos sobre esta matéria, Sr. Deputado, e, como o Sr. Deputado sabe, em matéria de emprego, o que a realidade nos tem dito é que o desemprego tem vindo a crescer.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - O quê!?...
O Orador: - É evidente, Sr. Deputado! É evidente! À medida que os critérios de convergência têm vindo a ser de impostos...
Quando o pacto de estabilidade estiver em pleno vigor, Sr. Deputado, cá estaremos para verificar e fazer o balanço desse crescimento do desemprego, do crescimento do emprego precário, do crescimento da instabilidade do emprego. De tal modo é assim, Sr. Deputado, como sabe, que a Cimeira do Emprego que amanhã se vai realizar é uma cimeira de piedosas intenções;...
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Veremos, Sr. Deputado!
O Orador: - ... é uma cimeira para procurar, como eu disse, aquietar espíritos inquietos, como o do Sr. Deputado Manuel dos Santos, porque, de facto, não irá ter qualquer medida concreta para combater o desemprego exactamente por o caminho para a moeda única não o permitir. É exactamente ao contrário do que o Sr. Deputado referiu.
O Sr. Presidente (Mola Amaral): - Sr. Deputado Lino de Carvalho, peço-lhe que termine, pois já ultrapassou em muito o pouco tempo de que dispunha.
Orador: - Termino de imediato, Sr. Presidente.
Sr. Deputado e o PS, nesta matéria, são aliás mais fundamentalistas, ao que parece, do que o próprio Ministro das Finanças, que veio aqui trazer preocupações, no quadro das quais interrogámos o Governo sobre a compatibilização, neste modelo, que os senhores defendem, mas que nós não defendemos, entre a chamada autonomia. a independência e a responsabilização desse Banco Central Europeu...
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - ... a responsabilização do banco central nacional perante os órgãos democraticamente eleitos. E aí todos nós, independentemente das nossas posições, reflectimos preocupações. Porém, o que o PS fez foi aplaudir, de uma forma linear, sem quaisquer interrogações, sem quaisquer dúvidas, todo este processo de integração e de federalização económica. Aí surpreende-nos. Sr. Deputado! Aí, surpreende-nos!...
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para que efeito?
O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Para uma brevíssima interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, as interpelações não têm de ser breves ou deixar de ser. Ou são interpelações à Mesa ou não são.
O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, desejo fazer uma brevíssima interpelação à Mesa, se V. Ex.ª me conceder a palavra.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra, mas peço-lhe que faça mesmo uma interpelação à Mesa.
Página 584
584 I SÉRIE - NÚMERO 15
O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Pedi o uso da palavra apenas para dizer a V. Ex.ª e, por seu intermédio, à Câmara o seguinte: fui aqui objecto de uma crítica do PCP no sentido de que caminho alegremente para o euro; fui, depois, objecto de uma interpelação, para a qual não tenho direito de resposta, do Sr. Deputado Manuel dos Santos, no sentido de que não aproveitei a abertura dada pelo meu Vice-Presidente Dr. Fernandes Thomaz numa entrevista recente. Ora, estas intervenções antagónicas, Sr. Presidente, só provam que estou no sítio certo, como o meu discurso sério revelou.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - A Mesa regista que o Sr. Deputado está então numa posição intermédia entre aderir ou não ao euro.
Aplausos do PS.
Pelo menos é a dedução que a Mesa faz...
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lalanda Gonçalves.
O Sr. Lalanda Gonçalves (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Após a adesão de Portugal às Comunidades Europeias foi necessário adaptar a orgânica do Banco de Portugal às novas exigências e tarefas decorrentes do progresso da União Económica e Monetária.
Foram assim relevantes as alterações introduzidas pelos Decretos-Leis n.os
337/9O e 231/95 e, posteriormente, pela Lei n.º 3/96.
O empenhamento dos governos social democratas, liderados pelo Professor Cavaco Silva, foi decisivo e fundamental para que, hoje, com serenidade e com a firmeza das convicções, se possa analisar o conteúdo da proposta de lei do Governo que altera a orgânica do Banco de Portugal.
Ainda recentemente esta Assembleia discutiu e aprovou uma alteração ao artigo 105.º da Constituição, visando clarificar o papel do Banco de Portugal e abrir caminho à proposta de alteração da lei orgânica agora em apreciação.
Esta proposta de lei produz uma alteração da orgânica do Banco de Portugal que, em conjunção com as alterações anteriores, não tem paralelo nos 151 anos da sua história.
Com efeito, a ratificação do Tratado da União Europeia não obrigou apenas os Estados membros a calendários e metas referentes a critérios económicos de convergência, também aprovou a arquitectura do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu.
O Conselho Europeu de Madrid, de Dezembro de 1995, chegou a acordo quanto à denominação da moeda única europeia, o euro, adoptou o cenário de transição para a 3.ª fase da UEM e confirmou a data de 1 de Janeiro de 1999 para o seu início, sendo os Estados membros participantes na área Euro seleccionados o mais cedo possível em 1998, previsivelmente em Maio, com base em dados fiáveis e actualizados para o ano de 1997.
Assim, o Sistema Europeu de Bancos Centrais (SEBC) será instituído a meados do próximo ano, na sequência da decisão de participação dos diferentes Estados membros na 3.ª fase da UEM. A sua função será supervisionar a introdução do euro e, subsequentemente, gerir a política monetária da área do euro. Como se sabe, o Sistema Europeu de Bancos Centrais é composto pelos bancos centrais de todos os Estados membros, mesmo daqueles que não participam na 3.ª fase da UEM e não têm personalidade jurídica autónoma.
O Banco Central Europeu, este sim, terá personalidade jurídica e gozará em cada Estado membro da mais ampla capacidade jurídica reconhecida às pessoas colectivas pelas legislações nacionais, podendo designadamente adquirir ou alienar bens móveis e imóveis e estar em juízo. Assim, logo que os membros do Conselho de Administração do Banco Central Europeu sejam nomeados, serão instituídos tanto o Banco Central Europeu como o Sistema Europeu de Bancos Centrais. Porém, estes só começarão a exercer em plenitude as suas funções a partir de Janeiro de 1999.
Como referimos, todos os bancos centrais dos Estados membros farão parte do Sistema Europeu de Bancos Centrais, todavia haverá diferenças nos respectivos estatutos. Para os países que adoptarem o euro os seus bancos centrais terão de actuar de acordo com as directrizes do Banco Central Europeu (BCE); os outros não terão esta obrigação, mantendo, porém, todos os bancos centrais as suas personalidades jurídicas autónomas.
O Sistema Europeu de Bancos Centrais será governado pelas estruturas de decisão do Banco Central Europeu: a Comissão Executiva e o Conselho do Banco Central Europeu.
Salienta-se, no âmbito da sua actuação, a sua independência. De acordo com o artigo 107.º do Tratado da União Europeia e do artigo 7.º do seus Estatutos, o Banco Central Europeu, os bancos centrais nacionais, ou qualquer membro dos seus órgãos de decisão, não podem solicitar ou receber instruções das instituições ou organismos comunitários dos governos dos Estados membros ou de qualquer outra entidade. E no domínio dos seus objectivos salienta-se a estabilidade dos preços.
É também de salientar que o artigo 2.º dos Estatutos do Banco Central Europeu prevê que este apoiará as políticas económicas gerais da Comunidade tal como se encontram definidas no artigo 2.º do Tratado da União Europeia, ou seja um amplo conjunto de políticas e princípios fundamentais no qual relevamos a coesão económica e social, o crescimento sustentável e não inflacionista, um alto grau de convergência das economias, um elevado nível de emprego e de protecção social e o aumento do nível e da qualidade de vida.
É neste quadro que devemos analisar a proposta de lei que agora o Governo submete a esta Assembleia.
Com efeito, esta está estruturada em três artigos e um anexo integrante do texto, tendo em vista adequar os Estatutos do Banco de Portugal ao próprio processo da institucionalização do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu.
O artigo 1.º prevê as alterações a entrar em vigor imediatamente; o artigo 2.º dispõe das alterações a entrar em vigor, logo que Portugal integre o pelotão dos países que integrarão o euro; e o artigo 3.º prevê as alterações necessárias caso Portugal não adira na data prevista ao euro. Trata-se de uma técnica jurídica particular, adoptada face à própria complexidade do processo de integração no âmbito da UEM e que mereceu parecer favorável do Instituto Monetário Europeu.
Das alterações que entrarão em vigor após publicação da lei salientamos: o reforço dos poderes e competências do governador, tendo em conta a sua autonomia de deci-
Página 585
20 DE NOVEMBRO DE 1997 585
são, enquanto membro dos órgãos de decisão do Sistema Europeu de Bancos Centrais, a alteração à composição do Conselho Consultivo, no sentido de passar a integrar o Presidente do Instituto de Gestão do Crédito Público e o Presidente da Associação de Bancos; o reforço da autonomia do Banco, que deixa de ter a natureza de empresa pública, de estar sujeito ao regime financeiro dos serviços e fundos autónomos da Administração Pública e à fiscalização prévia do Tribunal de Contas ou à fiscalização sucessiva, no que diz respeito a matérias relativas à sua participação no desempenho das atribuições cometidas ao Sistema Europeu de Bancos Centrais.
Este e outro conjunto de alterações permitirá ao Banco e ao seu Governador participarem, desde a primeira hora, no quadro do Sistema Europeu de Bancos Centrais.
Das alterações que entram em vigor aquando da 3.º fase da UEM, aqui radica praticamente uma nova lei orgânica. Neste quadro, salientamos: a definição do Banco como parte integrante do Sistema Europeu de Bancos Centrais; o Banco passa a emitir notas com curso legal e poder liberatório, de acordo com o n.º 1 do artigo 105-A do Tratado; são eliminadas as referências às orientações governamentais na condução das especiais competências do Banco; é vedado ao Banco a concessão de descobertos ou qualquer forma de crédito ao Estado e serviços ou organismos dele dependentes, a outras pessoas de direito público e a empresas públicas ou a quaisquer entidades sobre as quais o Estado, as regiões autónomas ou as autarquias locais possam exercer, directa ou indirectamente, influência dominante; fica também vedado ao Banco garantir quaisquer obrigações do Estado ou de outras entidades referidas anteriormente, bem como a compra directa de títulos de dívida emitidos pelo Estado ou pelas mesmas entidades (segundo o Parecer da Assembleia Legislativa Regional dos Açores, a extinção da conta gratuita do Banco de Portugal deveria ser substituída pelo Estado por uma nova modalidade de financiamento que garanta os seus objectivos); a competência de orientação e de fiscalização dos mercados financeiro e cambial passa a ser exercida no âmbito da sua participação no Sistema Europeu de Bancos Centrais e é aberta a possibilidade, sem prejuízo das competências do Conselho de Auditoria do Banco, as contas do Banco serem também fiscalizadas por auditores externos.
Estas e as outras alterações previstas neste artigo 2.º da proposta de lei conjugam-se com as do artigo l.º, configurando o Banco de Portugal como parte integrante do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu.
Radica aqui a aposta decisiva de Portugal: o acesso ao euro com os países que formarão o núcleo fundador.
As alterações que entrarão em vigor se Portugal não aderir na data prevista ao euro estão previstas no artigo 3.º da proposta de lei. Esta é uma hipótese que, em nossa opinião, não se irá colocar, apesar de provavelmente alguns partidos que combatem o processo da UEM poderem ver neste artigo uma espécie tábua de salvação. Contudo, tal não resulta da sua análise, dado que este artigo acaba por regular aquela singular situação em que, sendo o Banco parte integrante do Sistema Europeu de Bancos Centrais, não pode influenciar decisivamente o próprio sistema por não poder participar nos seus órgãos de decisão.
Trata-se. sem dúvida, da pior de todas as situações no quadro de um processo dinâmico, onde muito se joga a afirmação de Portugal no contexto europeu e internacional.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD considera fundamental a construção de uma UEM credível e sólida que permita a afirmação da Europa no contexto dos mercados financeiros e cambiais internacionais.
O Sistema Europeu de Bancos Centrais deve, neste quadro, manter a independência relativa face aos governos e às instituições comunitárias previstas nos seus Estatutos. Porém, para dar plena concretização à virtualidade deste Estatuto, urge, no quadro europeu, definir com precisão como se articula esta independência com a obrigação de dar forma e conteúdo aos objectivos do Tratado, conforme, aliás, já foi referido.
É que, a construção europeia é sui generis e absorve elementos de tradições político-institucionais diferenciadas. Porém, a «independência» dos bancos centrais, mesmo nos países que a integram como valor fundamental, nunca se confundiu com a ausência de coordenação da acção destas instituições com os governos nacionais no desenvolvimento das suas políticas económicas ou com os parlamentos.
Da vigilância multilateral introduzido de forma efectiva na concretização dos objectivos fixados pelo Tratado para a convergência nominal dever-se-á evoluir para novas formas de coordenação a nível europeu. O Pacto de Estabilidade e Crescimento não pode nem deve esgotar a necessidade de evoluir para estas novas formas de coordenação económica.
Neste contexto, é necessário garantir a responsabilidade democrática do Banco Central Europeu, para evitar, como é afirmado na Resolução do Parlamento Europeu de 23 de Maio, que «a independência do Banco Central Europeu não se traduza num isolamento institucional». De facto, esta necessidade de responsabilidade democrática e de uma maior coordenação macro-económica a nível europeu decorre dos próprios desafios que a Europa terá de enfrentar nos próximos anos e com os limites dos seus próprios meios, face às suas próprias ambições.
De facto, em pleno debate da Agenda 2000, surgem fragilidades de um processo de integração que não consegue, com um orçamento limitado, assegurar efeitos fiscais distributivos entre os Estados com níveis de desenvolvimento e bem-estar diferenciados. Os fundos estruturais estão vocacionados para investimentos de longo prazo e não existem mecanismos de curto prazo que compensem situações conjunturais de um ou outro Estado.
A problemática do alargamento e da reforma das instituições e das políticas comunitárias introduz no contexto europeu novas e complexas questões. O papel do Banco Central Europeu deverá ser, efectivamente, contribuir para ultrapassar estas e outras fragilidades do modelo de desenvolvimento europeu, abrindo um novo leque de oportunidades não apenas às empresas mas a todos os cidadãos dos diferentes Estados membros.
Ao Banco de Portugal, neste novo quadro institucional, serão cometidas novas responsabilidades, como parte integrante do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu, e que muito terão a ver com a sua capacidade de influenciar o quadro decisional no âmbito comunitário. É sem dúvida um novo e importante desafio.
O PSD afirma aqui a sua concordância, na generalidade, com esta alteração orgânica. Coerente com os princípios que sempre defendeu, o PSD assume o importante desígnio nacional de fazer com que Portugal esteja presente no conjunto de países fundadores do euro.
Aplausos do PSD.
Página 586
586 I SÉRIE - NÚMERO 15
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, esgotámos as inscrições, pelo que declaro encerrado o debate na generalidade da proposta de lei n.º
144/VII, que altera a Lei Orgânica do Banco de Portugal. Oportunamente procederemos à sua votação.
Srs. Deputados, vamos entrar agora no ponto seguinte da ordem do dia, que corresponde ao debate na generalidade da proposta de lei n.º 148/VII - Lei das Finanças das Regiões Autónomas.
Por coincidência, cabe-me presidir aos trabalhos da Assembleia nesta oportunidade e, por isso, não posso ocultar o prazer e a emoção com que ocuparei a cadeira presidencial no momento em que se discute uma matéria tão relevante para o projecto de autonomia constitucional, ao qual dediquei, no exercício de outras funções, muitos anos da minha vida.
Para apresentar a proposta de lei, em nome do Governo, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É com o maior gosto que tenho a honra de apresentar esta proposta de lei das finanças das regiões autónomas, desde logo porque ela concretiza uma importante reforma estrutural. Pela primeira vez se formula um regime geral, profundamente inovador, acerca das finanças das regiões autónomas, 21 anos decorridos sobre a sua criação e legitimação pelo texto constitucional.
Este regime, que é uma verdadeira reforma estrutural, é coerente não apenas com a dimensão financeira - que é instrumental mas essencial para a concretização da autonomia político-administrativa das nossas regiões insulares - mas também com outros objectivos não menos importantes da política de reformas estruturais que o Governo tem vindo a prosseguir no domínio das finanças públicas, que é dotar o País de uma estrutura e de uma legislação financeira modernas, compatíveis com as exigências decorrentes da integração monetária e financeira europeia e com a criação de condições sustentáveis de rigor e de disciplina financeira nas contas públicas para os anos vindouros.
Temos tomado iniciativas e apresentado propostas a esta Assembleia em diversos domínios e este é mais um.
Além disso, a satisfação e a honra com que faço a apresentação desta proposta de lei resultam de ela dar concretização a um compromisso fundamental deste Governo. Com efeito, o Programa do Governo previa, desde logo, a elaboração de uma proposta de lei das finanças regionais e definia princípios, que foram executados nas Leis do Orçamento do Estado de 1996 e 1997, quanto ao relacionamento entre as regiões autónomas e o Estado antes da sua aprovação, sendo certo que muitas das regras desta proposta de lei já foram, por proposta do Governo convergente com a iniciativa parlamentar, vertidas em letra de lei no Orçamento do Estado para 1998.
Além do Programa do Governo, sublinho a aprovação da Resolução do Conselho de Ministros n.º 12/96, de 24 de Janeiro, na qual se lançou uma dinâmica amplamente participada e concertada de preparação desta proposta de lei, que contou com a supervisão esclarecida do nosso melhor especialista em finanças das regiões autónomas, o Professor Eduardo Paz Ferreira, e com a participação não apenas do Governo e dos órgãos do governo próprio das regiões autónomas mas também dos agentes e forças sociais e políticas e parceiros sociais das regiões.
A participação foi alargada ao nível político e traduziu-se num acordo entre o Governo da República e os governos das regiões autónomas que está na base desta iniciativa do Governo.
Ao mesmo tempo, é relevante que, na revisão constitucional de 1997, a Assembleia da República, no exercício de poderes constituintes e sob proposta do Sr. Deputado Medeiros Ferreira, tenha incluído no elenco da sua competência legislativa absoluta o regime das finanças das regiões autónomas, subordinando a matéria das finanças regionais a uma lei de finanças das regiões autónomas.
Assim, estamos, neste domínio, também a dar cumprimento a esta inovação, que corresponde a uma necessidade que há muito se sentia nas regiões autónomas e, no âmbito da articulação funcional, moderna e democrática de um Estado democrático e descentralizado, também a nível nacional.
Diálogo, reformas, concertação. Foi com estes ingredientes e com estudo acertado e participado que esta proposta foi elaborada e que o Governo tomou a iniciativa de a apresentar.
Importa recordar que ela assenta na ideia de que a autonomia político - administrativa das regiões autónomas corresponde a um fenómeno ímpar na nossa estrutura constitucional, um caso de autogoverno assente em factores históricos, culturais, sociais, económicos e geográficos, que constitui a única limitação a uma estrutura de Estado politicamente unificado mas administrativamente descentralizado, criando unidades dotadas de poderes político-administrativos próprios.
A Constituição e os Estatutos Político-administrativos, no entanto, criaram um modelo que no domínio financeiro era claramente imperfeito e que foi acentuando situações de conflito, de dependência e de travagem crescente à contribuição das finanças públicas regionais para o desenvolvimento económico-social das regiões.
Ao mesmo tempo, a coesão nacional e a solidariedade, pela deterioração da situação e pela gestão, mesmo bem intencionada, de conflitos estruturais crescentes, eram postas em risco pela situação até agora existente. Por isso, esta proposta de lei tem um objectivo político do mais largo alcance, que é relançar, numa base sustentável, finanças regionais que permitam dotar de verdadeiro sentido e de dinâmica estável a autonomia político-administrativa das regiões autónomas e criar condições financeiras de estabilidade, de equilíbrio, de rigor e de solidariedade que permitam o desenvolvimento económico-social das regiões autónomas.
A proposta de lei, em muitos domínios, reafirma ou concretiza situações existentes, mas em muitos mais resolve problemas concretos que permaneciam sem solução às vezes há quase 20 anos e propõe a definição de um novo modelo estrutural compatível com a opção constitucional pela autonomia político-administrativa, das regiões autónomas e também com as necessidades de desenvolvimento e de descentralização político-administrativa, por um lado, e de integração das finanças públicas portuguesas na disciplina sustentada e concertada, por outro, que, no âmbito da União Económica e Monetária, deve comprometer todos os órgãos e agentes políticos portugueses numa perspectiva de solidariedade e coordenação europeias.
Esta proposta de lei tira também a lição da experiência de funcionamento de um modelo
autonômico razoavelmente assente na utopia da capacidade de crescimento autosustentado das regiões e propõe a ultrapassagem desse modelo para aquilo que tem sido chamado autonomia cooperante ou de cooperação, em que, abandonando a ideia irrealista, utópica e comprovadamente desprovida de fun-
Página 587
20 DE NOVEMBRO DE 1997 587
damento na realidade de que as regiões seriam capazes de, só por si e com as suas receitas, garantir o seu desenvolvimento, se prevêem formas estáveis e permanentes de funcionamento da co-responsabilidade e da solidariedade entre os governos regionais e o Governo da República, quer através da celebração de protocolos financeiros, quer através da formulação, se esta Assembleia assim deliberar, de regras estáveis que ponham cobro à situação de negociação ou mesmo de regateio anual das transferências de solidariedade do Orçamento do Estado para os orçamentos regionais, criando regras pré-definidas que permitam opções de médio prazo e políticas esclarecidas com o horizonte de médio prazo, quer por parte do Governo da República, quer por parte dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas.
Este é o modelo que inspira a proposta; esta é a génese que permitiu a sua apresentação por iniciativa do Governo da República, largamente concertada e participada, nomeadamente com os órgãos de governo próprio das regiões autónomas.
Dito isto, sublinho os aspectos principais desta proposta de lei, que me atrevo a considerar como de alcance não apenas estrutural mas histórico, na perspectiva do desenvolvimento das regiões autónomas insulares de Portugal.
A presente proposta de lei precisa, de forma muito concreta e penso que consequente, os princípios da autonomia financeira plena, até agora nem consagrada formalmente nem assente na real substância da disponibilidade de recursos que correspondessem aos poderes atribuídos na lei; da coordenação entre finanças estaduais e regionais, não baseada na gestão de conflitos de curto prazo mas em regras estáveis e num horizonte de médio prazo; da solidariedade nacional, não invocada para decisões casuísticas e ad hoc mas como fundamento permanente de relações estruturadas entre o Estado e as regiões autónomas; da cooperação entre o Estado e as regiões autónomas, quer nos termos definidos pela lei, quer com base no autogoverno cooperante; e da plena transparência e controlo, com responsabilização dos órgãos regionais.
Regulamentam-se especialmente três formas de institucionalização deste novo modelo de cooperação financeira, solidária e não assistencialista, permanente e não casuística e de curto prazo: os projectos de interesse comum, no artigo 7.º, os protocolos de cooperação - prática até agora discutida e quase sub-reptícia e agora prática normal estimulada pelo modelo legislativo - e o Conselho de Acompanhamento das Políticas Financeiras, sem esquecer o Fundo de Coesão; as transferências orçamentais de solidariedade, fixas de acordo com critérios permanentes e predeterminados, conhecidos por todos os agentes e susceptíveis de inspirarem políticas de médio prazo; a cooperação administrativa fiscal, dando cumprimento à previsão da revisão constitucional de 1982 do princípio da adaptação fiscal, que permanecia letra morta na nossa ordem jurídico-financeira, bem como, como medida de emergência necessária ao reequilíbrio actual das finanças regionais e ao seu equilíbrio futuro em bases sustentáveis, a amortização inicial da dívida pública regional pelo Estado, permitindo, assim, às regiões arrancarem de novo numa base estável para terem políticas de rigor e equilíbrio e apagarem um passado, em que as responsabilidades estão partilhadas, para que lhes seja exigível não apenas rigor e equilíbrio mas uma travagem futura ao endividamento.
Este novo modelo de relacionamento, baseado numa cooperação responsável e estável, permitirá - estou certo - não apenas rigor e disciplina a nível das finanças regionais e a nível das finanças do Estado português na sua relação interna e na relação externa com a União Económica e Monetária Europeia, mas também a criação de condições sólidas de equilíbrio financeiro sustentável, por um lado, e desenvolvimento económico-social, por outro.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - As regiões autónomas serão também, na perspectiva da proposta que apresentamos. responsabilizadas pela gestão das suas receitas fiscais.
O fenómeno da adaptação fiscal, permitindo que os órgãos de governo próprio das regiões autónomas disponham, como a Constituição já prevê, mas era letra morta, de poder legislativo de adaptação e de poder tributário de criação de novas formas, de acordo com decisão política própria desses órgãos, cria uma articulação que não existia entre poder fiscal e responsabilidade fiscal.
O que existia, até agora, era dependência e irresponsabilidade fiscais.
Quanto às transferências do Estado, sublinho que a fórmula de transferência, prevista no artigo 30.º da proposta de lei, permite diferenciar as estruturas fiscais e as estruturas físicas, com as suas consequências, em termos de despesa, dos Açores e da Madeira e assegurar a articulação entre estruturas de despesa com uma larga matriz comum no Estado e nas regiões.
Baseada na experiência de outros países, esta fórmula de fixação legislativa do modelo de cooperação financeira parece representar uma solução, certamente aperfeiçoável, mas de resultados comprovados em vários países e situações análogas, para estabilizar o relacionamento financeiro num Estado unitário regional, com diferenciação político-administrativa, como é o nosso.
A regularização e a normalização do endividamento público regional, como disse, constituem uma medida que se integra simultaneamente na coordenação e na solidariedade da República e das regiões autónomas perante a União Económica e Monetária, uma vez que todas integram o sector público administrativo e todas são co-responsabilizáveis pelas obrigações de respeitar estabilidade e crescimento, em termos duradouros, no âmbito europeu, como suportes financeiros da moeda única, mas também de correcção de uma travagem fundamental, resultante do agravamento sistemático e da não resolução dos desequilíbrios das regiões autónomas.
Nesta medida, prevê-se que o Estado chame a si o pagamento, em 1998 e 1999, de 110 milhões de contos de dívida por cada região. Ora, isto significa que a dívida do sector público administrativo português diminuirá num montante idêntico ao que resultaria da amortização da dívida da República e, ao mesmo tempo, lançar-se-á numa base estável a capacidade de equilíbrio e rigor para as regiões autónomas.
É contrapartida desta medida a adopção de limites ao endividamento, a extinção da conta corrente junto do Banco de Portugal e diversas outras medidas de rigor e disciplina, que são naturalmente condição de finanças públicas sãs, com base no desenvolvimento económico regional.
Além da transferência orçamental de acordo com uma fórmula pré-fixada, fixa-se ainda o funcionamento, a partir de 1999, de um fundo de coesão para as regiões ultraperiféricas, destinado a financiar, mediante transferência do Orçamento do Estado, investimentos inscritos nos planos anuais de investimento das regiões autónomas - é outra das demonstrações de que esta é uma aposta no desenvolvimento das regiões.
Página 588
588 I SÉRIE - NÚMERO 15
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É tempo de terminar.
Penso que, sendo uma reforma estrutural financeira, uma reforma claramente descentralizadora, uma reforma que transfere para o campo das finanças públicas e da prática social e estrutural portuguesa um modelo constitucional, até agora, irrealizado e, em muitos aspectos, irredento, esta é claramente uma forma, virada para o futuro. de modernizar a política de desenvolvimento do Estado e das regiões e de co-responsabilizar ambos, na perspectiva da União Económica e Monetária europeia.
Sabemos que esta proposta pode certamente ser melhorada e não é, como sabem, por mero exercício de estilo ou de retórica que o Governo o diz nesta Assembleia. Mas sejamos muito claros: ela foi cuidadosamente ponderada nos seus aspectos financeiros e não poderá ser melhorada em termos que representem agravamento de encargos, maior despesa ou menor receita.
O que vos propormos é a definição de um modelo financeiro regional, que, na perspectiva dos encargos assumidos, representa, no horizonte plurianual para que a lei está pensada, o máximo de esforço financeiro possível para permitir o máximo de responsabilidade financeira do Estado e das regiões, perante o desenvolvimento comum e a participação de todos, solidariamente, na União Económica e Monetária.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para apresentar o relatório da Comissão de Economia, Finanças e Plano, tem a palavra o Sr. Deputado Teixeira Dias, a quem, de acordo com o artigo 153.º do Regimento, a Mesa concede cinco minutos para intervir.
O Sr. Teixeira Dias (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ª e Srs. Deputados: A proposta de lei sobre a Lei das Finanças das Regiões Autónomas, que, neste momento, se encontra em discussão neste Plenário, é o corolário natural de uma antiga aspiração dos povos insulares e, de modo especial, dos açorianos.
Permitam-me recordar-lhes que os anseios autonómicos tiveram a sua génese nos fins do século passado e, num rasgo de alguma audácia, Hintze Ribeiro, promulgou, a 2 de Março de 1895, o primeiro decreto que permitiria aos distritos das ilhas adjacentes aceder à autonomia administrativa, caso o desejassem.
Consagravam-se, nesse decreto. alguns benefícios de carácter económico e fiscal que as entidades regionais aplicariam, conforme os seus critérios, nas obras dos seus distritos.
A I República e, sobretudo, o Estado Novo, no seu afã centralista, foram-se apropriando, pouco a pouco, desses benefícios, relegando os anseios autonómicos para as páginas dos jornais e conversas de café.
O 25 de Abril e a consequente Constituição de 1976 reavivaram os ideais autonómicos. A redacção dos respectivos estatutos, em conjunto com a entrada em função dos governos autónomos. foram um passo importantíssimo na consagração desses ideais. As poucas precisões da Constituição e dos estatutos originaram querelas, mais ou menos intensas, uns querendo mais, outros procurando reduzir. de modo que, para fazer face aos encargos cometidos, as regiões se viram obrigadas a recorrer ao endividamento, cujo montante começava a tornar inviável a própria autonomia, uma das mais belas concretizações dos ideais do 25 de Abril.
O XIII Governo Constitucional, primeiro, no seu programa eleitoral, depois, no apresentado aqui no Parlamento, deu claramente a entender que estávamos perante um problema que urgia ser resolvido.
Após um trabalho digno de louvor, e mesmo perante muitas e variadas resistências, o grupo nomeado pelo Sr. Ministro das Finanças e liderado por um especialista em Finanças Regionais, Prof. Doutor Paz Ferreira, apresentou
um anteprojecto, que, discutido em várias instâncias, deu origem à presente proposta de lei.
Que pensar desta? Muito mais do que um simples regular das receitas a arrecadar pelas regiões é uma filosofia global, que procura estabilizar, de modo duradouro, o relacionamento entre o Estado e as regiões.
Através desta proposta, o Estado e as regiões conhecem, com exactidão, os seus direitos e correlativos deveres.
O acordo gerado em torno da proposta é um indício claro de que a era das discussões anuais terá aqui o seu fim.
Não significam as palavras ditas que se está perante obra perfeita, acabada e definitiva. A própria proposta prevê a sua revisão, até ao ano 2001, e todas as beneficiações serão bem-vindas, se, no entanto, não descaracterizarem a arquitectura da lei.
Esperamos que a votação nesta Câmara confirme a aceitação da proposta, que, certamente, muito favorecerá as regiões autónomas e, com elas, o todo nacional.
Não me quero, no entanto, substituir à decisão e ao relatório da Comissão, de que fui relator.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Passados mais de 20 anos sobre a consagração constitucional das autonomias regionais, agora reforçadas na recente revisão da nossa lei fundamental, é possível ter uma visão retrospectiva e fazer algum balanço do que já se tem designado por uma das mais bonitas flores da nossa democracia - a autonomia dos Açores e da Madeira.
A análise fria do Texto Constitucional de 1976 e a prática dos últimos 20 anos permitem concluir que houve alguma reserva mental centralista, na institucionalização das regiões autónomas, permitindo-se. durante anos, que se tirasse com uma mão, na área financeira, aquilo que se tinha dado com a outra, na área política.
Na verdade. não obstante conhecerem-se o atraso e o abandono a que as regiões insulares haviam sido sujeitas pelo Estado Novo e o grau acrescido de carências elementares das suas populações, não se
curou, devidamente, então, da questão financeira.
Ora, como lembra, o Prof. Paz Ferreira, no seu interessante estudo «As Finanças Regionais», «os objectivos que presidem à criação de regiões políticas só poderão, de facto, ser cumpridos se lhes forem concedidos os meios necessários à satisfação das necessidades que lhes estão confiadas e se for claramente resolvido o problema da repartição de receitas e de despesas entre o Estado e as Regiões».
Curiosamente, as autonomias regionais constituem uma experiência nova da nossa democracia, embora com raízes profundas no sentir ancestral das suas populações.
Página 589
20 DE NOVEMBRO DE 1997 589
Experiência nova, vivida e implementada, em ambas as regiões, predominantemente por gente jovem que, apesar disso, manteve um rumo certo e cuja governação, durante mais de 20 anos, assegurou às populações insulares sensíveis melhorias das suas condições de vida.
Enquanto isto, no Continente, o PREC conduzia o País a graves situações de ruptura financeira, sujeitando Portugal a regras impostas pelo FMI, o que obrigou os governos socialistas, de então, a impor o recurso ao crédito por parte das regiões autónomas.
O que deveriam ser dotações do Orçamento do Estado para infra-estruturas regionais essenciais assumiu, então, a forma de empréstimos avalizados pela República.
Aos governos regionais colocava-se, pois, ou a opção do endividamento, assegurando os necessários investimentos públicos, ou abdicar de fazê-los, mantendo-se o subdesenvolvimento regional.
No que diz respeito à Região Autónoma da Madeira, a oposição regional, em coro, durante anos seguidos, criticou a opção do governo regional, manifestando-se contra o endividamento, preferindo, antes, o imobilismo e a estagnação.
Impôs-se às regiões autónomas o recurso ao crédito, com a promessa de que o Estado honraria o seu aval e assumiria o pagamento à data do seu vencimento, como forma sucedânea da obrigação, que lhe competia, de dotar as regiões de meios financeiros indispensáveis à recuperação do seu atraso, em cumprimento dos imperativos constitucionais de solidariedade.
O incumprimento dos compromissos assumidos por parte de sucessivos governos da República só se alterou com o Prof. Cavaco Silva e com o Ministro Cadilhe, ao celebrar-se com a Região Autónoma da Madeira, o Programa de
Reequilíbrio Financeiro, precedente preparatório da solução agora adoptada, tendo o Estado assumido, a partir de então, os encargos correspondentes a 50% do serviço da dívida.
E preciso que se diga que foram a omissão e o incumprimento do Estado, que levaram à «bola de neve» de acumulação dos juros das dívidas regionais, de tal modo que a componente relativa a juros se tornou mais elevada do que a própria dívida de capital.
Havia, pois, que corrigir ou superar a falha constitucional, no que dizia respeito à vertente financeira das autonomias regionais. E foi o que se fez na última revisão da Constituição e se completa com a proposta de Lei das Finanças das Regiões Autónomas, agora em discussão.
Efectivamente, na revisão constitucional recentemente concluída, além do reforço dos poderes legislativos dos parlamentos regionais e de um recorte mais aligeirado do cargo de Ministro da República, impôs-se a obrigatoriedade de as relações financeiras entre o Estado e as regiões autónomas serem objecto de uma lei da Assembleia da República, que tem de revestir a forma de lei orgânica.
E é bom, aliás, que se passe a ter presente esta exigência constitucional, pois, como denunciámos a propósito de determinadas normas da Lei do Orçamento do Estado, o normativo constitucional referido não foi respeitado.
Não foi fácil chegarmos aqui e só espero que os contumazes críticos da dívida e zurzidores do Governo Regional da Madeira reconheçam e aplaudam agora, com a mesma veemência que emprestaram às críticas, a capacidade e a habilidade política do Dr. Alberto João Jardim, ao negociar, com êxito, uma solução para a dívida regional e a Lei das Finanças das Regiões Autónomas.
Curiosamente, os que atacaram o endividamento regional e a conflitualidade por ele gerada, por atentatória da unidade nacional, foram os mesmos que, com contas de verdadeiros «merceeiros da soberania» (com manifesta apetência para «coveiros da autonomia»), atacam, com feroz centralismo, a solução agora adoptada, sem se aperceberem de que são os agentes do mais perigoso separatismo (de cá para lá), que em nada se coaduna com o Estado unitário, que dizem acerrimamente defender.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esses, apesar das muitas pressões, dos lobbies, do muito que escreveram e disseram e dos muitos anos em que intoxicaram a opinião pública nacional com a ideia das regiões autónomas como sorvedouros financeiros, esses, ficaram. felizmente pelo caminho e terão agora tempo de continuar as contas, ainda não apuradas, dos últimos 500 anos!
Essa preocupação do «deve e do haver», que sempre agitaram, não respeita nem se identifica com a forma como os madeirenses sentem e vivem a autonomia, no quadro da Pátria que somos e que só engrandecemos quando nos pomos de acordo para encontrar as soluções nacionais, que reforçam as autonomias e consolidam a democracia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Assembleia Legislativa Regional da Madeira conferiu-me a honra de a representar no grupo de trabalho que elaborou o anteprojecto desta proposta de lei, pelo que posso aqui testemunhar quanto ela deve ao saber e à particular preparação em matéria de finanças regionais, por parte do seu Presidente, o Sr. Prof. Doutor Paz Ferreira, do que não podia deixar de dar conta e registo nesta intervenção, por elementar justiça.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Bem lembrado!
O Orador: - Como reconheceu o Sr. Ministro das Finanças, em artigo recentemente publicado no jornal Público, muito devem a solução política encontrada, para as dívidas das regiões e a lei agora em discussão ao trabalho e empenhamento de muitos anos do Dr. Mota Amaral, nos Açores, e do Dr. Alberto João Jardim, na Madeira.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A estabilização e a transparência das relações financeiras entre o Estado e as regiões têm um valor inestimável para a concretização tranquila da solidariedade nacional e para o rigor da gestão das finanças regionais.
Haverá ainda que introduzir pequenas correcções e aclaramentos na lei, que, em sede de especialidade, pode ser aperfeiçoada, como haverá que perspectivar,
complementarmente, uma integral solução das dívidas regionais, de forma a que a nova era que, a partir da presente lei, se vai encetar não seja afectada por questões do passado, que a desvirtuem e a impeçam de alcançar totalmente o efeito útil que dela se espera.
A definição das regras relativamente à fixação das dotações orçamentais anuais, as medidas de apuramento e obtenção tendencialmente integral das receitas regionais, a regulamentação do exercício do poder tributário próprio pelas regiões e a criação do Fundo de Coesão são, entre outras, soluções que esta lei consagra.
Naturalmente que, como em tudo, é discutível se poderia ou poderá ser melhor aqui ou ali, se poderia ter-se, ou não, optado, neste ou naquele caso, por solução diferente. É assim em tudo o que é obra do homem!
Página 590
590 I SÉRIE - NÚMERO 15
Porém, a delicadeza e as dificuldades sempre sentidas em matéria das relações financeiras entre o Estado e as regiões, com toda a carga e sensibilidade que se foi acumulando, exigiam equilíbrio e esforço de consenso, o que, de uma forma geral, foi conseguido.
Particularmente importante, no que ao contributo da Madeira diz respeito, foi a qualificada colaboração do Sr. Secretário Regional do Plano e da Coordenação, Dr. Paulo Fontes, profundo conhecedor das finanças regionais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta lei prevê a sua própria revisão até ao ano 2001.
Estou certo de que então, e independentemente das melhorias e aperfeiçoamentos que esta Câmara entenda introduzir-lhe, há-de reconhecer-se que, ao pormo-nos, hoje, de acordo, para aprovarmos a primeira Lei das Finanças das Regiões Autónomas, fazemos justiça aos Açores e à Madeira e prestamos um bom serviço a Portugal.
O edifício da autonomia, reforçado na última revisão constitucional, fica agora ainda mais sólido.
Por tudo isto, mais importante do que reivindicarmos louros de carácter partidário é a legítima satisfação de, em matéria de relações financeiras entre o Estado e as regiões autónomas, termos feito o melhor que soubemos e pudemos, reforçando a solidariedade entre os portugueses e fortalecendo a unidade nacional.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, deixe-me saudá-lo especialmente, lamentando que o facto de estar a presidir aos trabalhos o impeça de tomar parte activa nesta nossa discussão, que muito lhe interessa a vários títulos.
Sr. Ministro Sousa Franco, também para si, uma saudação muito especial pelo empenho que pôs na elaboração da proposta de lei que estamos a discutir.
Aplausos do PS.
Finalmente, Srs. Deputados: O debate de hoje tem uma dimensão nacional excepcional que eu, como Deputado eleito pelo círculo dos Açores, gostaria aqui de acentuar.
Esta minha intervenção é o prolongamento natural do que disse e escrevi ao longo dos últimos anos sobre a necessidade de se encetar uma nova fase nas relações entre a República e as regiões autónomas, nomeadamente durante a campanha eleitoral para as legislativas, em 1995, e, recentemente, na declaração política que proferi nesta Assembleia, em 15 de Outubro, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista.
De facto, a necessidade de uma lei que permitisse maior transparência e solidariedade entre o Estado e as regiões autónomas já se fazia sentir há muito, por isso ela figurava com destaque no Programa do XIII Governo Constitucional, o primeiro presidido por António Guterres. Também cabe aqui referir que, já em Maio de 1992, o Partido Socialista apresentara, na Assembleia Legislativa Regional dos Açores, uma anteproposta de lei sobre estas matérias.
Ora, foi precisamente a partir de 1991 que as verbas provindas do Acordo das Lajes começaram a escassear no caso dos Açores. Se, em 1983, as contrapartidas decorrentes das facilidades dadas aos norte-americanos na Base das Lajes representavam cerca de 113 do investimento na região, já no início da década de 90 não atingiram 116 das verbas orçamentais da Região Autónoma dos Açores destinadas ao investimento. Os rendimentos com essa origem, distribuídos pelo Governo da República, não eram suficientes, embora também se repartissem por outros encargos gerais do Estado.
Esta não foi a única causa da urgência em estabelecer um quadro estável e transparente nas relações financeiras entre o Estado e as regiões autónomas; apenas o tornou mais evidente para os que, até então, não se tinham dado conta da precariedade de alguns pressupostos e preferiam a negociação anual das transferências do Orçamento do Estado para os Açores e para a Madeira quando o mesmo partido governava o todo e as partes. Foi a época dos protocolos financeiros entre Alberto João Jardim e Aníbal Cavaco Silva.
Também as diferentes reformas fiscais que introduziram novas formas de impostos, sobretudo depois da adesão de Portugal à Comunidade Europeia, a gestão dos programas da Comunidade, com a particular situação dos arquipélagos dos Açores e da Madeira nesse contexto, assim como o saudável aumento do nível das políticas sociais definidas pelos governos da República, com imediatas repercussões nos orçamentos regionais na coluna das despesas sem novas receitas, obrigaram ao estabelecimento de um quadro legal que acolhesse essas realidades.
Como afirmou recentemente o Prof. Doutor Eduardo Paz Ferreira, coordenador do grupo de trabalho já aqui referido, numa conferência proferida no Fórum Açoriano, a 7 deste mês em Ponta Delgada: «O Estado assume inequivocamente a impossibilidade de discriminar cidadãos pela simples circunstância de residirem numa região insular, o que implica que o acesso à saúde, à educação e aos outros bens sociais deve poder verificar-se nos mesmos termos em todo o território continental ou insular». É, essencialmente, o que estamos a tratar.
Tendo tudo isto em conta, a recente revisão constitucional abriu as porias a um novo ordenamento nas relações entre a República e as regiões autónomas.
O Sr. Ministro Sousa Franco já se referiu a esse aspecto, pelo que passo a resumir muito rapidamente a parte mais importante.
No artigo 229.º, que trata da cooperação entre a República e os órgãos regionais, acrescentou-se um ponto que tomou obrigatória uma lei de finanças das regiões autónomas revestindo a forma de lei orgânica.
Mas, como aqui também já tive ocasião de referir, o envio tão rápido desta proposta de lei de finanças das regiões autónomas não teria sido possível sem a capacidade política e técnica do Ministro das Finanças, Sousa Franco, que para este efeito nomeou com antecedência um grupo de trabalho coordenado pelo Prof. Doutor Paz Ferreira.
Aliás, seja-me ainda permitido saudar o Governo presidido por António Guterres pela ampla participação que promoveu, quer das entidades regionais quer de peritos nestas matérias, antes de enviar à Assembleia da República a proposta de lei agora em discussão.
Deste modo, e do lado dos Açores, colaboraram o Presidente do Governo, Carlos César, o Secretário das Finanças, Roberto Amaral, o Doutor Gualter Furtado do Partido Social-Democrata e representantes da Assembleia Legislativa Regional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta de lei agora em discussão já foi apresentada nas suas linhas fundamentais pelo relator da Comissão de Economia, Deputado
Página 591
20 DE NOVEMBRO DE 1997 591
Teixeira Dias, especialmente bem colocado para apreciar o que está em jogo até porque, sendo continental, reside há largos anos na ilha de S. Miguel
Não queria, no entanto, deixar de referir alguns tópicos na linha do que foi aqui assinalado por aquele meu ilustre Colega e amigo e pelo que eu próprio já disse na declaração política do dia 15 de Outubro passado.
O artigo 4.º sublinha com especial empenho que o princípio da solidariedade nacional é recíproco - e quem tiver paciência de reler a minha intervenção nesta Assembleia, em 29 de Julho, percebe o contexto - mas a proposta é clara quanto ao conteúdo, ao exigir que se assegure «um nível adequado de serviços públicos» em todo o território. E, no seu n.º 2, reforça o objectivo de autonomia financeira como o primeiro da lei e do qual decorrem todos os seus espírito e letra.
Esta é, aliás, uma lei em que se associa estreitamente autonomia e responsabilidade, sobretudo depois do consignado no artigo 47.º sobre o apoio especial à amortização das dívidas públicas regionais por parte do Governo da República. Este era um problema do passado que, no passado, ninguém assumiu e que, agora, se resolve numa via solidária.
Esta é uma lei orientada para o futuro como o indicam as novas figuras dos projectos de interesse comum (artigo 7.º) e do fundo de coesão para as regiões ultraperiféricas (artigo 31.º), assim como a aplicação de uma fórmula para dar cumprimento ao princípio da solidariedade (artigo 30.º) através de transferências do Orçamento do Estado.
Assim, o artigo 30.º que trata das transferências orçamentais apresenta, no seu n.º 2, uma fórmula para as transferências anuais automáticas baseadas na ponderação do PIDDAC continental, com exclusão dos montantes do PIDDAC/Apoio e do PIDDAC/Tradicional e tendo em conta o factor população e um coeficiente de correcção - da insularidade para a Madeira e da dispersão arquipelágica para os Açores. Ora, parece mais correcto que o PIDDAC em consideração seja o do total do PIDDAC nacional e não só o do chamado PIDDAC continental, que sofre oscilações mais variadas devido às circunstâncias do Plano. Só assim a lei garantirá a estabilidade, a transparência e o automatismo a que se propõe, caso se mantenham a natureza e o quadro legal do PIDDAC nos actuais termos. Caso contrário, estaremos perante um logro.
Ainda dentro do principio das transferências automáticas, estabeleceu-se um fundo de coesão para as regiões ultraperiféricas para apoiar exclusivamente os programas e projectos de investimento constantes nos planos anuais das regiões autónomas.
Porém, convém esclarecer que o limite máximo das transferências previstas na proposta é o seu limite mínimo, sob pena de se esvaziar o conteúdo da ideia. Embora o critério para as transferências orçamentais devesse ser outro, ele
potência o mecanismo automático da sua aplicação no pleno respeito pela autonomia do plano regional de investimentos.
Onde o mecanismo automático não funciona é na previsão de projectos de interesse comum entre a República e as regiões insulares (artigo 7.º) cujas condições de financiamento pelo Estado serão fixadas por decreto-lei.
Esses projectos de interesse comum serão promovidos por razões de interesse ou estratégia nacionais e deverão incidir, no nosso entender, especificamente no domínio das infra-estruturas portuárias e aeroportuárias, dos transportes e da energia, por forma a fortalecer a coesão entre as diferentes partes do território.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta proposta de lei não é apenas uma lei sobre transferências orçamentais - e este é um ponto que gostaria de sublinhar.
A proposta de lei em apreciação responsabiliza especificamente os órgãos de governo próprio das regiões autónomas em matéria fiscal.
No que respeita às receitas fiscais, importa notar que esta proposta de lei desenvolve o princípio, já expresso na Constituição e nos Estatutos das Regiões Autónomas, de que pertencem às regiões não só as receitas cobradas mas aquelas que nelas são geradas e cria obrigações acessórias para os contribuintes neste domínio.
É de esperar que aumente, assim, a receita do IRC e do IRS, embora para tanto se torne necessário que o Governo da República desenvolva ainda algumas medidas no sentido de assegurar o cumprimento pelos grandes contribuintes das regras que os obrigam a imputar o volume de negócios realizados na região à própria região. Será mais uma tarefa para o Ministério das Finanças, agora que está em curso a rede informática de contribuições e impostos...
Por outro lado, a lei das finanças das regiões autónomas é expressamente qualificada como a lei-quadro de adaptação do sistema fiscal às especificidades regionais, abrindo terreno para que as assembleias regionais possam exercer os poderes tributários próprios previstos no artigo 227.º da Constituição. Com efeito, o artigo 34.º da proposta equipara a presente lei à lei-quadro referida na Constituição.
Esses poderes tributários próprios podem ser de agravamento da carga fiscal - através do lançamento de adicionais que não podem ultrapassar 10% ou da criação de novas figuras nas áreas previstas, tais como impostos ambientais e contribuições de melhoria relacionadas com obras públicas - ou de desagravamento através da concessão de incentivos especialmente virados para o investimento.
A concessão de poderes fiscais às autoridades regionais cria importantes instrumentos de política económica e permite uma maior responsabilização pela sua utilização.
Também se prevê que possam diminuir as taxas nacionais dos principais impostos e dos impostos especiais de consumo (artigo 37.º, n.º 4), mas gostava de chamar a atenção da Câmara para o facto de que esses poderes regionais podem acarretar diminuição das próprias receitas regionais.
Essa possibilidade de atribuir um conjunto de incentivos fiscais ou de isentar parte dos lucros reinvestidos nas ilhas, tão reclamada pelas câmaras de comércio e indústria insulares, inspira-se, aliás, no exemplo das Canárias.
As regiões mantêm igualmente a capacidade de endividamento, embora sujeita a limites.
A autonomia financeira não é sujeita a qualquer tutela, continuando a política económica nas mãos dos órgãos de governo regional que só estão sujeitos à fiscalização do Tribunal de Contas através da secção regional como até agora.
O Conselho de Acompanhamento, previsto no artigo 9.º, n.º 2, não altera este enquadramento.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como referem os relatórios das Comissão de Economia, Finanças e Plano da Assembleia da República e da Assembleia Legislativa Regional dos Açores, são muitos os aspectos positivos desta proposta de lei, mas há ainda cabimento para algumas alterações significativas.
A primeira e a principal tem a ver com a alteração já referida da fórmula de transferência das verbas do Orçamento do Estado que deve ter em conta o PIDDAC naci
Página 592
592 I SÉRIE - NÚMERO 15
onal total e não o chamado PIDDAC continental, até repito - pelas oscilações que este último sofre de ano para ano.
Também se não afigura compatível com a lógica da autonomia financeira que o chamado PIDDAC regional seja deduzido no cálculo do montante a transferir. Por hipótese académica, num ano em que o Estado resolvesse financiar serviços seus nos Açores com cerca de 20 milhões de contos não haveria praticamente transferências orçamentais para os órgãos de governo próprio.
A segunda é meramente cautelar, pois destina-se a garantir que as transferências não possam ser inferiores ao montante previsto no Orçamento do Estado do ano anterior.
Em terceiro lugar, convém colmatar a omissão referente à comparticipação do Estado em certos sistemas de incentivos nacionais, embora previsto na lei em geral mas, sobretudo, à habitação. Deste modo, e no seguimento do parecer da Assembleia Legislativa Regional dos Açores, sugere-se que no artigo 30.º, n.º 4, se refira que a bonificação de juros do crédito à habitação seja assegurada pelo Orçamento do Estado.
Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, Srs. Deputados: A aprovação desta proposta de lei de finanças abre o cicio da autonomia cooperativa, como muito bem foi referido pelo Sr. Ministro Sousa Franco, reforça a solidariedade nacional e marca historicamente esta VII Legislatura do regime democrático em Portugal.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sã.
O Sr. Luís Sã (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP há muito que defende uma lei de finanças regionais que possa estabelecer um quadro transparente, adequado e estável, de normas que regulem as relações financeiras entre o Estado e as regiões autónomas. Caberia aqui perguntar o que levou a que, ao longo de 20 anos, com vários governos e vários partidos no poder, o regime de finanças das regiões autónomas não tenha sido aprovado, quais foram os interesses e quem foram os responsáveis. A dívida acumulada, problema que agora é resolvido, é uma faceta do problema. Mas há, seguramente, outras.
A presente proposta de lei estabelece um conjunto de regras e mecanismos que só a prática política poderá testar eficazmente. É com expectativa que encaramos, por exemplo, a criação do fundo de coesão (artigo 31.º) e a criação do conselho de acompanhamento das políticas financeiras (artigo 9.º). Não podemos, entretanto, deixar de sublinhar que o fundo de coesão não entrará imediatamente em vigor devido à prioridade dada pelo Governo do PS, e também por parte do PSD, à moeda única.
Temos reservas no que respeita à possibilidade de todas as soluções constantes da presente proposta legal poderem constituir solução completamente adequada. Mas aprovaremos na generalidade a presente proposta de lei por entendermos que ela pode constituir uma evolução relativamente favorável face à situação de irresponsabilidade actualmente existente e porque esperamos que constitua uma base de trabalho em que os vários partidos, com abertura, sejam capazes de ponderar várias alternativas a propósito de outros problemas. Por outro lado, as críticas que temos a fazer a soluções desequilibradas em alguns pontos constituem uma consequência da revisão constitucional. No tempo próprio procedemos à sua crítica e propusemos alternativas, mas, neste momento, são obrigatórias.
Entretanto, há críticas e reflexões que se impõem, e que faremos, em termos de especialidade.
Por exemplo: o n.º 2 do artigo 30.º (fórmula de transferência) está ferido de um vício pouco aceitável. De facto, a primeira parte da fórmula estabelece uma regra de transferência assente no investimento público nacional no Continente, na população existente (no Continente e na região) e num coeficiente de correcção. A segunda parte da fórmula impõe a subtracção ao montante assim achado do valor do PIDDAC gasto na região.
Esta solução, que visa claramente abater o valor da transferência, pode ter um efeito perverso que, para nós, não é aceitável. Com efeito, num ano em que o Estado venha a cumprir melhor as suas responsabilidades na região, dotando adequadamente o PIDDAC, a região vê a sua receita potencial diminuir. Inversamente, se o Estado deixar arruinar ainda mais os chamados palácios da justiça, as capitanias, os faróis e outros serviços públicos periféricos da Administração Central, não investindo, então, a região é beneficiada. Parece que se pretende, assim, garantir que haja um empenho no funcionamento o mais deficiente possível da administração periférica do Estado, eventualmente para retirar daí ilações políticas. Naturalmente, não queremos tirar esta conclusão - seria um processo de intenções! - mas, em todo o caso, é uma solução que, a nosso ver, deve ser melhor ponderada em sede de especialidade.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A situação das regiões ultraperiféricas é reconhecidamente diferente e é específica. Mas não podemos deixar de chamar a atenção neste momento para outros problemas complementares que é importante ter em conta.
Em primeiro lugar, importa sublinhar que as relações financeiras entre as regiões autónomas e os municípios de cada região têm de ser objecto de
reexame e devidamente acauteladas para o futuro. A autonomia regional não pode ser construída à custa da autonomia dos municípios das regiões autónomas. Este ponto tem de ser devidamente acautelado no futuro.
Em segundo lugar, esta lei torna oportuno levantar o problema do carácter imperioso de uma política de desenvolvimento harmonioso de todas as parcelas do território nacional, sem esquecer a especificidade das regiões ultraperiféricas. Mas temos também - importa lembrá-lo regiões esquecidas no território do Continente, que continuam a perder população e a não ter as oportunidades de desenvolvimento a que têm direito. O Secretário de Estado António Costa, numa incursão lamentável pela política politiqueira, afirmou ontem que a responsabilidade por esta situação de desertificação é das autarquias do PCP.
O Sr. José Calçada (PCP): - Francamente ... !
O Orador: - «Esquece» que são geridos pelo PS (e também pelo PSD) municípios com menos população e menor desenvolvimento no País, em Trás-os-Montes, na Beira Interior, em mais de um terço dos municípios do Alentejo cuja presidência é do PS, bem como municípios do interior do Algarve. Não é o que é transferido para os Açores e a Madeira que está em causa quando levantamos este problema; é dar às regiões do Continente aquilo a que têm direito.
Página 593
20 DE NOVEMBRO DE 1997 593
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Daqui desafio o PS a referir qual foi a evolução populacional nas muitas dezenas de municípios em crescente desertificação em que a maioria é do Partido Socialista. É bom que pondere para não usar argumentos demagógicos e intoleráveis do tipo deste que foi utilizado pelo Sr. Secretário de Estado.
Em vez da demagogia sem escrúpulos seria melhor que o Governo explicasse por que não há uma política de desenvolvimento regional harmonioso e coerente e por que meteu o PS na enorme trapalhada em que meteu a regionalização do Continente que poderia dar uma contribuição neste sentido.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Finalmente, o Grupo Parlamentar do PCP entende esta proposta de lei, com as correcções que deverão ser introduzidas na especialidade, como manifestando ao mesmo tempo o firme propósito de garantir a autonomia dos Açores e da Madeira e como uma aposta de todo o País no seu desenvolvimento e na unidade nacional.
Aplausos do PCP e de Os Verdes.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - No que toca à distribuição dos tempos, devo dizer que o Partido Socialista beneficiou de uma cedência de 3 minutos por parte do PP e de outros 3 minutos por parte de Os Verdes.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Augusto Boucinha.
O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, Sr. Secretário de Estado,
Sr.as e Srs. Deputados: Também o Partido Popular não pode deixar de se regozijar com a apresentação da proposta de lei das finanças das regiões autónomas.
Lamentamos ter de dizê-lo, mas esta proposta de lei já deveria ter sido apresentada há, pelo menos, 10 anos...
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - É verdade! É verdade!
O Orador: - Por isso, peca por muito tardia. Mas, como diz o povo, «mais vale tarde do que nunca».
Temos consciência de que a harmonia do todo nacional e as especificidades das regiões autónomas tornam imperioso recuperar os atrasos dessas regiões, por isso, são altamente necessitadas de elevados investimentos.
Num passado recente, as regiões autónomas tiveram um comportamento perfeitamente descontrolado, em termos de endividamento, pela inexistência de qualquer espécie de órgão que exercesse um rigoroso e efectivo controlo sobre as despesas efectuadas.
Vozes do CDS-PP e do PS: - Muito bem!
O Orador: - Por isso, é urgente que se clarifiquem as relações entre as regiões e o Estado e se criem órgãos que definam um quadro de princípios e de regras claras, que regulem o financiamento das regiões e que
definam, com a amplitude possível, o domínio da autonomia financeira regional.
A autonomia financeira das regiões autónomas é uma importante prerrogativa que tem o seu enquadramento legal quer nos termos do Estatuto Político-Administrativo das Regiões Autónomas quer por força da Constituição (artigo 164.º), que confere à Assembleia da República competência exclusiva para legislar sobre o regime das finanças das regiões autónomas.
É pois esta proposta de lei uma medida legislativa que se propõe melhorar significativamente o relacionamento entre os governos do Estado e das regiões autónomas, ficando deste modo os governos regionais aptos a aceitar novas regras de rigor e de disciplina, a partilhar a responsabilidade comum da consolidação orçamental perante a União Económica e Monetária, a apostar na concertação e na cooperação das políticas com a clara percepção de que isso não diminui os poderes autonómicos, antes pelo contrário, reforça-os.
Fazemos votos para que esta proposta de lei permita atingir o desejado equilíbrio orçamental sem recurso aos sistemáticos endividamentos das regiões autónomas.
Por fim, relativamente à proposta de lei em discussão, apresentamos um conjunto de alterações, a discutir em sede de especialidade, das quais faremos entrega na Mesa de imediato.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, para uma intervenção.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este debate é sobre finanças das regiões autónomas e não sobre as autarquias locais do continente! Não sei se todos já perceberam...
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro das Finanças: É com particular gosto que, como Deputado da República, uso brevemente da palavra neste debate.
A necessidade de clarificar as relações financeiras entre a República e as regiões autónomas impunha-se no quadro de um respeito profundo pelas autonomias. A ascensão do PS ao Governo da República. que lhe permitiu, pela primeira vez, ver três orçamentos seguidos aprovados, veio criar as condições políticas para esta clarificação.
Tomava-se essencial garantir aos governos regionais os meios necessários à prossecução das suas atribuições, como se verificou a imprescindibilidade de melhor assegurar a coordenação das finanças estatais e regionais, num claro quadro de solidariedade nacional. A própria transparência das relações entre a República e as regiões autónomas, no domínio financeiro, exige uma lei como a que decorre da proposta de lei que estamos a apreciar.
A clarificação das obrigações do Estado e das questões relativas às receitas fiscais são também importantes neste quadro. Importava ainda clarificar a questão dos empréstimos, o que era relevante e esclarecedor no âmbito destes assuntos que estamos a tratar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro das Finanças: Julgo oportuno sublinhar a importância do aspecto relativo às transferências do Estado. O processo de negociações anuais, habitualmente realizado no quadro dos debates e da preparação do Orçamento do Estado, no Plenário e em comissão, nos gabinetes e nos Passos Perdidos, na comunicação social e nos corredores, não seria útil que continuasse. Interessava garantir outras condições de dignidade a este processo. Em nosso entender, esta proposta de lei cria essas condições de dignidade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro das Finanças: Os Açores e a Madeira têm uma importância na Re-
Página 594
594 I SÉRIE - NÚMERO 15
pública Portuguesa que ultrapassa em muito a sua escala geográfica e a sua dimensão populacional. Muito se poderia referir, mas hoje apenas lembraria, a finalizar, que se 1832 marcou o arranque. a partir dos Açores, da vitória da liberdade em todo o território português, foi a
partir da Madeira, em Abril de 1931, e englobando os Açores, que se desencadeou a mais duradoura tentativa de derrube do Estado Novo.
É no quadro de liberdade do povo português, de que os Açores e a Madeira também são garantes, que, num esforço de solidariedade e com espírito de rigor e seriedade, encaramos o progresso que esta proposta de lei das finanças das regiões autónomas representa.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção. tem a palavra o Sr. Deputado Lalanda Gonçalves.
O Sr. Lalanda Gonçalves (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, Srs. Secretários de Estado,
Sr.as e Srs. Deputados: A afirmação dos princípios da autonomia política, administrativa e financeira dos Açores, no quadro nacional, tem consumido, desde os meados do século XIX, gerações e gerações de açorianos.
Nem sempre compreendidas, mas sempre persistentes, as personalidades que deram corpo a este projecto profundamente atlântico, europeu e nacional tiveram sempre como princípio que a livre administração dos Açores pelos açorianos era uma forma de engrandecer Portugal, desenvolvendo, de uma forma global e integrada, a potencialidade de um território naturalmente disperso.
Foi com o 25 de Abril e com a implantação da democracia que este projecto político assumiu a sua verdadeira dimensão política, institucional e cultural. A Constituição de 1976 acolheu este projecto e as sucessivas revisões. constitucionais vieram a reforçá-lo, sendo de salientar a mais recente, na qual, com especial protagonismo do Dr. Mota Amaral, foram estabelecidos importantes avanços nos domínios do poder legislativo das regiões autónomas e na fixação dos parâmetros do relacionamento financeiro entre a República e as regiões autónomas.
Resulta directamente da revisão constitucional a necessidade de uma lei de carácter orgânico que fixe não apenas as transferências financeiras mas que regule e permita a adaptação do sistema fiscal nacional às especificidades regionais.
Foi com a nomeação, pelo Ministro das Finanças, em Fevereiro de 1996, de um grupo de trabalho no Ministério, presidido pelo Sr. Prof. Doutor Paz Ferreira - aqui presente, a assistir a esta sessão - e com a participação de representantes dos governos das regiões autónomas e dos Ministros da República - quais zelotas do Templo! -, que se deu início aos trabalhos que culminaram, após acordo com os governos das regiões autónomas, nesta proposta de lei.
Se os trabalhos se iniciaram com os Governos do PSD em funções na Região Autónoma dos Açores, foi com o Governo do PS, entretanto eleito, que tais trabalhos foram concluídos.
Os representantes da Região Autónoma dos Açores trouxeram ao grupo de trabalho a sua experiência arquipelágica e açoriana, mas também a história de um relacionamento financeiro que teve, como em todos os processos, as suas dificuldades e incompreensões. A proposta de lei agora em apreço, é, pois, resultado de um processo de quase dois anos de trabalho e de múltiplos contributos.
Globalmente, esta proposta de lei marca um importante passo na clarificação das relações financeiras entre o Estado e as regiões autónomas e no lançamento das bases de um sistema fiscal nacional adaptado às especificidades regionais, numa época em que se avança para uma anunciada reforma fiscal.
No que concerne às relações financeiras entre o Estado e a região, foi desde há muito afirmado pelos sucessivos governos das regiões autónomas que o problema financeiro, no caso dos Açores, por exemplo, resultava da estrutura da receita e não do volume da despesa. Ainda nas últimas eleições legislativas, o Partido Socialista invocava a problemática da despesa como sendo a crucial, afirmando em documentos de campanha que teria de haver uma assumpção por parte do Governo central das despesas com a educação e com a saúde, por exemplo.
Felizmente, a sua curta experiência de poder fez amadurecer conceitos e evitar entrar por um perigoso caminho para o equilíbrio institucional e político que é
travemestra no desenvolvimento do sistema autonômico.
Com efeito, à excepção dos serviços do Estado Forças Armadas, Justiça, Negócios Estrangeiros e Serviços de Fronteiras e Alfândegas - e de alguns serviços públicos de transportes, telecomunicações e correios, as regiões autónomas assumem todos os outros serviços que no continente estão sob a tutela da administração central. Atendendo ao volume do PIB das regiões autónomas, designadamente a dos Açores, a receita fiscal efectivamente cobrada não permitia dar, sem recurso ao endividamento, cumprimento às obrigações que o próprio Estado, através de legislação de âmbito nacional, impunha às regiões autónomas.
Hoje, da aceitação do princípio de que o que estava em causa era um problema na estrutura da receita, decorrem, necessariamente, algumas importantes disposições na proposta de lei, como seja a assumpção por parte do Estado da dívida regional, entre 1998 e 1999, até um montante de 110 milhões de contos para cada uma das regiões autónomas; a tentativa de regular, de uma forma clara e explícita, os montantes das transferências anuais; a definição, no quadro das receitas próprias, do conceito de imposto gerado, ultrapassando a questão dos impostos efectivamente cobrados; a criação de um Fundo de Coesão orientado para o financiamento de projectos inscritos nos planos anuais das regiões autónomas e a aceitação do financiamento dos projectos de interesse comum, entre outros.
No que concerne à adaptação do sistema Fiscal nacional às especificidades regionais, constitui um especial avanço a aceitação de uma fiscalidade nacional adaptada pelas assembleias legislativas regionais, podendo estas diminuir as taxas nacionais dos impostos sobre o rendimento, autorizar os governos regionais a concederem benefícios fiscais temporários e condicionados relativos a impostos de âmbito nacional e regional.
Tal disposição assume particular relevância no quadro europeu numa época em que a harmonização fiscal voltará, certamente, com premência à ordem do dia. Não obstante os avanços contidos nesta lei, é necessário questionar alguns princípios e disposições que, em sede de especialidade, serão ,objecto de proposta pela nossa parte.
De facto, há que clarificar a já aqui referida, por várias vezes, disposição do artigo 30.º da proposta de lei (Fórmula de transferência), tendo em vista evitar a ruptura do compromisso do Estado em reforçar o investimento nos serviços periféricos do Estado na região, que no caso dos
Página 595
20 DE NOVEMBRO DE 1997 595
Açores, diga-se em abono da verdade, se encontram especialmente degradados. A actual disposição cria uma tensão desnecessária entre a transferência para o orçamento regional e o volume do PIDDAC afecto às regiões.
Há que clarificar a articulação das finanças das regiões autónomas com os fundos estruturais no âmbito dos QCA, para além dos sistemas de incentivos aplicáveis e co-financiados; clarificar e, explicitamente, mencionar a comparticipação do Estado no crédito à habitação; reforçar o Fundo de Coesão desde 1999 e ainda clarificar a referência a endividamento adicional, conforme consta no disposto no n.º 2 do artigo 31.º da proposta de lei.
Também deve definir, com clareza, a titularidade da dívida entretanto acumulada, nos anos de 1998, 1999, 2000 e 2001, sendo certo que, em 1998 e 1999, o Estado irá assumir os tais 110 milhões de contos para cada região autónoma - no caso da Região Autónoma dos Açores está previsto, até ao ano 2000, que esta ainda venha a endividar-se no montante global aproximado de 50 milhões de contos; tal deriva da formulação da própria transferência.
Reformular a estrutura e lógica de funcionamento do Conselho de Acompanhamento também me parece que será uma medida necessária.
A aprovação desta lei de finanças das regiões autónomas é necessária e será, na sua amplitude, testada pela sua aplicação, envolvendo responsabilidades acrescidas aos órgãos de poder das regiões, mas também aos órgãos de soberania.
Compete agora, com especial participação das assembleias legislativas regionais e num trabalho efectivo em sede de especialidade, dar o maior consenso e efectividade a este projecto.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Arlindo Oliveira.
O Sr. Arlindo Oliveira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, Srs. Secretários de Estado, Sr.- e Srs. Deputados: A proposta de lei das finanças das regiões autónomas, que hoje se discute nesta Assembleia, abre novo capítulo na história da autonomia das regiões insulares.
A autonomia conquistada na manhã do 25 de Abril de 1974 depressa consagrou mitos e utopias de auto-suficiência financeira e auto-subsistência económica que alimentaram sonhos de gerações e gerações de ilhéus.
Unidos no mesmo ideal autonômico, ilhéus houve, no entanto, que cedo se aperceberam da possibilidade de as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira ultrapassarem as suas capacidades de endividamento, face às suas receitas, e assim se tomarem, consequentemente, cada vez menos autónomas, sendo esse endividamento o verdadeiro «calcanhar de Aquiles» das autonomias regionais.
Os governos regionais de então e muitos dos seus apoiantes assim não entenderam e encetaram o investimento público, com base no endividamento, utilizando o slogan de que alguém haveria de pagar.
Na Região Autónoma da Madeira, a uma dívida inicial de 23 milhões de contos que se iniciou em 1980, aquando do Governo AD, liderado por Sã Carneiro, gerou juros no valor de 60 milhões de contos.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Vivia-se em período difícil, as transferências do Orçamento do Estado eram reduzidas ao mínimo e a solução era o recurso à dívida, com o aval do Estado.
Os custos de insularidade, que então se fixou em 50% relativamente às receitas corrente e de capital, foram drasticamente reduzidas a 15% com Cavaco Silva, então Ministro das Finanças de Pinto Balsemão. Os protocolos de
reequilíbrio financeiro, impostos pelos Governos de maioria absoluta PSD, com Cavaco Silva, estrangularam financeiramente as regiões e as autarquias das regiões autónomas, estas impossibilitadas de qualquer investimento que viesse de encontro aos anseios populares em termos de infra-estruturas locais.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Os ilhéus comeram pela medida grande.
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - É verdade!
O Orador: - O mais forte impôs as suas condições e a solidariedade estava arredada da mesa das negociações, em que uma das partes ditava a lei. Era o diálogo dos Governos de maioria absoluta de Cavaco Silva.
O Sr. José Calçada (PCP): - Do Alberto João!
O Orador: - Há muito que as oposições regionais, especialmente o meu partido, vinham reclamando uma lei de finanças das regiões autónomas que clarificasse o relacionamento financeiro entre o Estado e as regiões autónomas.
Libertaram-se, assim, os governos regionais das indefinições e negociações anuais, de última hora, que precediam a apresentação do Orçamento do Estado na Assembleia da República, muitas vezes em condições muito difíceis.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Eles até gostavam!...
O Orador: - Esta situação, embora, eventualmente, do gosto de alguns governantes da República e das regiões, não servia a unidade do Estado, nem o desenvolvimento regional harmonioso, nem os interesses das populações insulares.
Essa situação servia, quanto muito, o ego de alguns políticos que, de forma míope, encontravam aí maneira de esgrimir, verbalmente, contra tudo e contra todos, mobilizando a população indefesa contra pseudo-cabalas de inimigos continentais que nunca existiram, a não ser nas suas cabeças doentias, na caça ao voto de gente, infelizmente, ainda desprevenida.
Vozes do PSD: - Ó Sr. Deputado, isso não é miopia, é cegueira!
O Orador: - Não podemos confundir nunca o Portugal democrático saído da Revolução de Abril corri o centralismo despótico, vivido antes dessa manhã, a mais madrugadora que alguma vez Portugal viu.
Não podem hoje arvorar-se em heróis da autonomia aqueles cujo passado está manchado pela resistência aos ideais democráticos e contra aqueles que, não olhando a sacrifícios pessoais para si e para as suas famílias, tudo fizeram para que Abril fosse a liberdade; não podem hoje arvorar-se em genuínos defensores da autonomia aqueles que, ainda hoje, no exercício do poder democrático, não respeitam as regras mais elementares do relacionamento democrático; não podem hoje arvorar-se em democratas aqueles que não respeitam as regras do jogo democrático,
Página 596
596 I SÉRIE - NÚMERO 15
nem fazem o mínimo de esforço nesse sentido, porque encontraram, oportunisticamente, na democracia valores de generosidade e de tolerância que a torna uma presa fácil das suas ambições desmedidas.
Apesar de tudo e de todos os escolhos que se nos depararam e se nos deparam, valeu a pena a caminhada, a caminhada da autonomia regional.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - A autonomia regional é agora reforçada com uma lei, a lei das finanças das regiões autónomas, que, em nosso entender, constitui uma reforma estrutural inovadora, a mais importante da autonomia regional, desde a consagração da autonomia em 1976.
A assumpção de parte da dívida das regiões autónomas pelo Estado fará aumentar as despesas do país no próximo ano de 1998, mas o seu efeito será nulo, atendendo ao fim da comparticipação nos juros da dívida a partir dessa data.
Esta assumpção de parte da dívida das regiões autónomas constitui uma das peças do conjunto de normas da proposta de lei das finanças regionais. O seu objectivo fundamental é a definição dos meios que possibilitem a concretização da autonomia financeira consagrada na Constituição da República e nos respectivos estatutos político administrativos.
O acordo de 9 de Outubro, entre o Primeiro-Ministro de Portugal e os Presidentes dos Governos Regionais dos Açores e da Madeira, resolveu assim o problema das dívidas das regiões autónomas, solucionando, em termos estruturais e consolidados, o problema do equilíbrio financeiro das regiões autónomas. Esse acordo marcou uma nova etapa, histórica, das autonomias das regiões insulares.
Direi que só um Governo do PS era capaz de entender as autonomias regionais e, entendendo-as, entende quão vital é a autonomia financeira.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Foi imperativa uma mudança de Governo na República. Os portugueses votaram numa forma diferente de fazer política e gerir os destinos do país. O diálogo deu lugar à arrogância.
O Programa do Governo, já com o PS, em 1995, aponta, sem ambiguidades, a necessidade de uma lei das finanças regionais e o Orçamento de 1996 estabeleceu a paridade entre os Açores e a Madeira no pagamento do Estado de 50% do serviço da dívida, até então atribuída à Madeira.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Clarificou-se assim, de forma objectiva e concreta, o futuro relacionamento financeiro entre o Estado e as regiões e iniciou-se uma nova ora no relacionamento político entre governos regionais e Governos nacionais legítimos, não havendo a partir daqui mais lugar à suspeição, reprovável num Estado de direito democrático.
Este novo relacionamento entre o Estado e as regiões autónomas expressa-se em projectos de interesse comum, em protocolos de cooperação, no Conselho de Acompanhamento das Políticas Financeiras Regionais, no Fundo de Coesão, nas transferências orçamentais de solidariedade, na cooperação administrativa fiscal e na amortização inicial da dívida pública regional pelo Estado.
As regiões autónomas dos Açores e da Madeira estão de parabéns e, com as regiões insulares, é Portugal inteiro que está de parabéns. O Primeiro-Ministro de Portugal, o Engenheiro António Guterres, está de parabéns, cumpriu o que prometeu aos portugueses no seu Programa do Governo, e depressa.
O acordo define, concreta e consequentemente, os princípios da autonomia financeira plena e o da coordenação entre as finanças estatais e regionais, tal como os da solidariedade nacional, da cooperação entre o Estado e as regiões e da transparência.
A proposta de lei agora em discussão assegura às regiões a plenitude dos impostos cobrados nos respectivos arquipélagos e ainda dos que, gerados nos seus territórios, sejam cobrados fora.
Realçamos ainda, e como refere a Constituição da República, a adaptação do sistema fiscal às particularidades de cada região autónoma. As consequências daí resultantes são várias, entre elas: benefícios fiscais, aplicação de sanções, criação e regulamentação de impostos vigentes apenas nas regiões e adaptação dos impostos nacionais às especificidades regionais, etc., etc.
As transferências do Orçamento do Estado destinadas a cobrir as despesas serão fixadas através de uma fórmula que tem em conta as estruturas fiscais dos Açores e da Madeira. A partir de 1999, esta proposta de lei cria um Fundo de Coesão para regiões destinadas a financiar investimentos inscritos nos Planos Anuais de Investimentos das Regiões Autónomas.
Esta proposta de lei honra o Governo da República, da nova maioria, da responsabilidade do PS: honra as regiões autónomas e abre um capítulo novo na história das autonomias insulares.
Assim respondem os governos das regiões autónomas, especificamente o governo da Região Autónoma da Madeira, com o mesmo sentido de responsabilidade e o alto sentido de Estado, demonstrado pelo Governo da República, ao apresentar a presente proposta de lei, a lei das finanças das regiões autónomas.
A única prova indesmentível dessa resposta consistirá em que o Governo Regional da Região Autónoma da Madeira use, para com os municípios dessa região, o mesmo peso e a mesma medida que o Governo da República usou para com o governo regional, isto é, que compense os municípios que foram obrigados pelo governo regional e pelo Governo de Cavaco Silva a pagar, até ao ano 2006, dívidas acumuladas que vieram, ao longo de todo este tempo, a diminuir a capacidade de investimento das câmaras da região em prol das populações.
O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Muito bem!
O Orador: - Concretamente, que não se limite a assumir as dívidas vincendas, mas que compense em numerário as verbas já retidas na fonte ao longo de 10 anos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mola Amaral): - Sr. - e Srs. Deputados, a lista dos oradores para intervir neste debate está esgotada. Declaro, pois, encerrada a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 148/VII, a qual contém a lei das finanças das regiões autónomas. que oportunamente será posta à votação.
Permitam-me, Sr.as e Srs. Deputados. que me congratule com o grande consenso, de ressonância nacional, que este debate revelou e permitam-me, também, que exprima ao Governo, na pessoa do Sr. Ministro das Finanças, o meu
Página 597
20 DE NOVEMBRO DE 1997 597
apreço pela coragem e sentido de Estado com que enfrentou o problema financeiro das regiões autónomas, «rasgando» novas vias de solução para ele.
Felicito o Professor Paz Ferreira, que vem seguindo a sessão parlamentar. pelo excelente trabalho que realizou.
O Governo, com a proposta de lei que subscreveu, reconhece que a questão não é tanto de despesas das regiões autónomas como. sobretudo. de receitas, isto é, de repartição justa dos recursos nacionais e, por isso mesmo, avança fazendo justiça.
No exercício das minhas funções políticas bati-me, pelo menos desde 1987, por um novo arranjo financeiro para os Açores e Madeira. por isso é com particular satisfação que vejo agora que o Governo reconhece a justiça das pretensões açorianas e madeirenses e até ao assumir a dívida pública regional, acumulada pela falta de uma resposta verdadeiramente nacional. o faz com efeitos retroactivos.
Esta nova solução, pese embora as insuficiências que, porventura, possa ter, corresponde a um salto qualitativo face à situação vigente, tendo em vista a consolidação da autonomia considerada na Constituição. É boa para os Açores e para a Madeira; é boa para Portugal no seu conjunto.
Parabéns aos responsáveis das regiões autónomas, às assembleias legislativas, maioria e oposição, e aos respectivos governos; parabéns aos povos açoriano e madeirense.
Abre-se um novo capítulo de desenvolvimento e de responsabilidade. Boa sorte!
Aplausos do PS e do PSD.
Srs. Deputados, passamos ao ponto seguinte da ordem de trabalhos, que consiste na discussão conjunta das propostas de lei n.º 119/VII - Autoriza o Governo a alterar o Código do IRC no sentido de equiparar o Instituto de Gestão de Crédito Público à instituição de crédito residente para efeitos de tratamento concedido aos instrumentos financeiros derivados no âmbito do imposto sobre rendimento das pessoas colectivas e a alterar o Estatuto dos Benefícios Ficais - e 137/VII - Estabelece o regime geral de emissão e gestão da dívida pública.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente: Permita-me uma ligeira infracção à ordem de trabalhos, para, em nome do Governo, me congratular não apenas com a conclusão da discussão anterior mas também com o facto de esta discussão, que demonstrou um tão grande consenso nacional. em matéria de autonomia regional, ter decorrido sob a presidência de V. Ex.ª.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: As duas propostas de lei em apreciação não serão, neste momento, certamente, particularmente excitantes, mas são importantes e uma delas. julgo, é mesmo muito significativa.
Quanto à proposta de lei n.º 119/VII, trata-se de uma medida essencialmente técnica que visa neutralizar o regime fiscal das operações de derivados, realizadas pelo Instituto de Gestão do Crédito Público. possibilitando, assim. a equiparação dos rendimentos dos contratos de swap de divisa ou taxa de juro ou de câmbio e taxa de juro aos rendimentos das operações realizadas por outras instituições de crédito residentes. O Instituto de Gestão do Crédito Público será, assim, tratado como as outras instituições residentes.
Aproveita-se, por razões de contextualidade e nada mais, para excluir da isenção de IRC de instituições de crédito não residentes os estabelecimentos estáveis em território português. Trata-se de matéria técnica, mas que é importante para possibilitar uma gestão mais eficiente, em termos de rendimento da dívida pública, pelo Instituto de Gestão do Crédito Público e, nesse sentido, integra-se no esforço de modernização da gestão da dívida pública.
Diversamente, tem grande relevo, não proporcional ao tempo que posso dedicar-lhe nesta Assembleia, neste momento, a proposta de lei n.º 137/VII, sobre o regime geral de emissão e gestão da dívida pública. Esta proposta visa clarificar o regime da dívida pública, modernizando a gestão de uma dívida que tem vindo a ser muito significativamente reduzida, desde 1996, e continuará a sê-lo em 1998. Essa modernização exige que se ponha cobro à verdadeira «manta de retalhos» que é hoje o regime legal do crédito público, ainda basicamente consistente na Lei n.º 1933, de 3 de Fevereiro de 1936, o que demonstra como é arcaico e, naturalmente, alheio à responsabilidade democrática na gestão da dívida pública.
Pensamos que, para sanear as finanças públicas portuguesas e modernizar a gestão da dívida, limitando, assim, os encargos que as finanças públicas fazem pesar sobre os cidadãos portugueses, em particular sobre as gerações e os contribuintes futuros, é necessário criar um novo regime geral da dívida pública, que será, depois, desenvolvido para as diferentes modalidades de empréstimos.
Nesse sentido, pôr termo a essa «manta de retalhos» pré-democrática, muitas vezes não cumprida mas geradora de enormes ineficiências e incertezas ....
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!
O Orador: - ... que é hoje a legislação do crédito público, é já, de per si, um passo significativo no caminho da modernização e da democratização não apenas da nossa ordem jurídica mas também das nossas finanças públicas.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!
O Orador: - Ao mesmo tempo, este regime geral pretende consagrar a redução muito significativa da dívida pública que se está operando, e que continuará no futuro, sustentadamente, e adaptar a sua gestão às novas condições de mercados financeiros mundiais e também europeus. Nessa medida, decorre da lógica de mundialização da economia e de realização do interesse nacional português, naquilo que é uma situação de facto, a mundialização dos mercados financeiros, permitindo uma gestão cada vez melhor da dívida pública portuguesa.
Esta proposta de lei subordina-se, pois, a princípios fundamentais que vou apenas enunciar, mas também esses princípios fundamentais constituem a parte legislativa de uma profunda mudança estrutural. Não se trata de sistematizar nem de rever aspectos de pormenor; trata-se de uma mudança de fundo no regime do crédito público, que acompanha a criação do Instituto de Gestão do Crédito Público, a redução sistemática dos encargos da dívida e do seu stock de capital e, por isso mesmo, o saneamento das finanças públicas portuguesas, que é condição de crescimento, de criação de emprego e da plena integração de Portugal na união económica e monetária.
Esta proposta de lei visa, em primeiro lugar, sistematizar os princípios da gestão da dívida pública, adequando-
Página 598
598 I SÉRIE - NÚMERO 15
os à modernidade quer dos mercados financeiros quer da gestão financeira do Estado; em segundo lugar, visa clarificar a posição do Estado como tomador de fundos nesses mercados, sem privilégios e em concorrência com os demais agentes económicos; em terceiro lugar, visa adaptar a gestão da dívida ao regime do Instituto de Gestão do Crédito Público, que pretende criar condições para que se gerem rendimentos, recorrendo a instrumentos derivados, como os que estão na origem da proposta de lei n.º 1191 VII, ou através de uma mais eficiente gestão da dívida, e, ao mesmo tempo, conseguir reduzir o peso da dívida sobre os contribuintes portugueses.
O enquadramento jurídico da emissão e gestão da dívida, bem como do seu controlo, quer pelo Parlamento quer pelo Tribunal de Contas, precisam de uma adaptação ao próprio quadro constitucional, que, em muitos casos, não é respeitado pela legislação ainda aparentemente em vigor, criando vazios e dúvidas de muito difícil resolução, deficiências de controlo parlamentar, de autorização parlamentar e de controlo jurisdicional pelo Tribunal de Contas. Pretende-se que esta situação cesse, dando, assim, garantias não apenas de modernização mas, sobretudo, de democratização, controlo e transparência da gestão da dívida pública.
Por outro lado, pretende-se compatibilizar os instrumentos de controlo do crédito público com a necessária flexibilização, modernizando quer a autorização parlamentar e, pelo Tribunal de Contas quer o controlo, pondo cobro a uma situação que oscila entre regimes jurídicos arcaicos e uma prática de falta de acompanhamento e controlo quer pelo Parlamento, quer pelo Tribunal de Contas. Pretendem criar-se formas adequadas de controlo e acompanhamento sucessivo da dívida pública e, assim, dar execução ao princípio constitucional de que a autorização e o controlo da dívida, como essencial exercício da responsabilidade dos contribuintes que pagam a dívida e suportam o seu serviço através dos impostos devem ser atribuídos ao Parlamento e a uma instituição independente, que é o Tribunal de Contas. Pretende-se, enfim, criar um quadro simultaneamente constitucional e democrático, moderno, adequado à defesa dos interesses dos contribuintes e à promoção, em Portugal, de políticas que nos permitam tirar benefício da redução da dívida e da participação na União Económica e Monetária.
Este quadro, a ser aprovado, será desenvolvido por decretos-leis específicos e será, verdadeiramente, no plano jurídico, a origem da modernização, da democratização, da europeização e da gestão profissional e empresarial da dívida pública, como se exige num país moderno e virado para o século XXI.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro das Finanças os Srs. Deputados Silvio Rui Cervan e Octávio Teixeira.
Tem a palavra o Sr. Deputado Silvio Rui Cervan.
O Sr. Silvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente. Sr. Ministro das Finanças, em relação à proposta de lei n.º 119/VII, julgo que a explicação é óbvia e nem haveria necessidade de aqui estar, atendendo a que o problema foi resolvido em sede de discussão do Orçamento do Estado.
Relativamente à proposta de lei n.º 137/VII, quero dizer, em nome do Partido Popular, que concordamos com os quatro objectivos do diploma, que foram, aliás, enunciados no relatório, isto é, a disponibilização da legislação, a compatibilização dos instrumentos de controlo do crédito público, a adequação da legislação com o Instituto de Gestão do Crédito Público e a compatibilidade com a legislação comunitária.
No entanto, ficou-nos uma dúvida que gostava que o Sr. Ministro esclarecesse: como se procederá ao direito de informação à Assembleia da República a posteriori, previsto no artigo 15.º deste diploma? Como pensa o Sr. Ministro fazê-lo?
Isto porque ficámos apenas a saber que são quatro vezes por ano, ou seja, trimestralmente.
O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro das Finanças responderá no fim, pelo que tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, começando pela proposta de lei n.º 119/VII, julgo que, neste momento, o artigo 2.º não pode nem deve ser discutido ou, melhor, pode ser discutido, o que não pode nem deve é ser votado, na medida em que não devemos nem podemos votar algo que já foi votado em sede de Orçamento do Estado.
Por conseguinte, a alteração ao Estatuto dos Benefícios Fiscais não deve, pura e simplesmente, ser tida em consideração nesta proposta de lei. E evidente que quando a proposta de lei deu entrada na Assembleia ainda não tinha dado entrada o Orçamento do Estado, mas, neste momento, a situação está completamente ultrapassada e não pode ser votado o artigo 2.º da proposta de lei n.º 119/VII.
Em relação à proposta de lei n.º 137/VII, o objectivo que nos é presente nesta proposta de lei - o estabelecimento, a adequação e a modernização do regime geral de emissão e gestão da dívida pública - é positivo. No entanto, há duas questões que quero colocar ao Sr. Ministro, a primeira das quais é um pedido de esclarecimentos no rigoroso sentido da expressão. O que lhe pergunto é se pode explicitar um pouco mais a questão relacionada com o artigo 17.º da proposta de lei, isto é, a renúncia à imunidade, em termos de subscrição de cláusulas de renúncia à imunidade baseada em soberania. Tanto mais que isto é reportado no relatório como tendo também por objectivo procurar, de alguma forma, afastar problemas de eventuais ilegalidades de situações anteriormente assumidas.
A segunda questão que lhe coloco tem a ver com dois artigos e, digamos, são as pequenas questões que se nos colocam em relação a esta lei, pois, como referi há pouco, acompanhamos os seus objectivos. Os artigos sobre os quais temos dúvidas são os artigos 2.º e 3.º. Desde logo, não percebemos que se procure estabelecer no artigo 2.º, nos princípios de emissão e gestão da dívida pública, porque é nesse campo que estamos neste momento, o objectivo do equilíbrio tendencial das contas públicas. É que isso é um problema do Orçamento! Haver mais ou menos défice é um problema do Orçamento do Estado e do nosso ponto de vista, não pode ser um problema de um diploma de emissão e gestão da dívida pública. Compreendo que o Governo procure inscrever os problemas da moeda única e do pacto de estabilidade em tudo o que é possível e em todos os momentos, mas julgo que, nesta proposta de lei, para além de ser completamente escusado inserir o pacto de estabilidade, é, ao fim e ao cabo, incorrecto, porque não é neste campo, da emissão e gestão da dívida pública. que se deve ou tem de procurar o problema do equilíbrio tendencial das contas públicas.
Página 599
20 DE NOVEMBRO DE 1997 599
A última questão que quero colocar está relacionada com a alínea c) do artigo 3.º, relativo às definições. Com toda a sinceridade, pela nossa parte, gostaríamos que quando se definem empréstimos em moeda nacional isso quisesse dizer exactamente empréstimos em moeda nacional.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Partindo do princípio de que conseguimos extrair ao Partido Socialista alguns minutos, tem a palavra, para responder, dispondo para o efeito de 5 minutos, o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, respondendo à dúvida levantada pelo Sr. Deputado Silvio Rui Cervan relativa ao artigo 15.º, devo dizer-lhe que se prevêem aqui duas formas de informação: uma, directa, através de convocatória pela Assembleia da República do presidente do Instituto de Gestão do Crédito Público, e outra, periódica, se se quiser indirecta, sobre as operações realizadas em cada trimestre.
Trata-se, de algum modo, da institucionalização das «exposições de motivos» que têm vindo repetidas nas leis do Orçamento e que, parece-me, devem traduzir a consequência do respeito pelo princípio de que a entidade que autoriza, que é a Assembleia da República, o faz nas condições possíveis na complexidade dos mercados financeiros modernos, mas deve controlar a execução dessa sua autorização por formas que sejam praticamente realizáveis.
Esta informação que está estabelecida nas leis do Orçamento tem tido. ao longo do tempo, práticas diferentes, mas deverá conter aquilo que seja considerado condição essencial e se a Assembleia da República não estiver satisfeita deverá, em diálogo com o Governo, definir quais os elementos de informação que considera necessários.
Sr. Deputado Octávio Teixeira, muito brevemente porque já esgotei o tempo, dir-lhe-ei que teria de ver agora o que se votou na lei do Orçamento para, relativamente ao artigo 2.º da proposta de lei n.º 119/VII, que é um aproveitamento circunstancial da autorização legislativa, afirmar se está ou não prejudicado. É que o artigo 36.º-A do Estatuto dos Benefícios Locais não se aplica ao estabelecimento estável de instituições não residentes, portanto alarga a regra de incidência e não a regra do benefício. Com franqueza, eu precisaria de ver o que foi votado na lei do Orçamento. Provavelmente, estará prejudicado, mas eu não quereria agora, sem ter aqui o texto, dar-lhe claramente razão. Penso que a terá, mas precisarei de estudar o problema.
Quanto ao artigo 17.º da proposta de lei n.º 137/VII
Renúncia à imunidade , sabemos que a prática do recurso à dívida pública por parte dos Estados implica hoje cláusulas que têm o seu significado técnico, mas que, muitas vezes, podem aparecer como chocantes. Neste caso, o Estado tem celebrado a generalidade dos contratos com instituições de crédito estrangeiras aceitando a jurisdição de referência dos Estados cujo direito é aplicável, mesmo que, eventualmente, pudesse, ou pelo direito nacional ou pelo direito desses Estados, invocar uma imunidade por ser uma entidade soberana. Portanto, essa é uma renúncia em que o Estado faz operação por operação.
O que está aqui previsto é que o Instituto de Gestão do Crédito Público, como gestor permanente do Estado, possa subscrever essa cláusula de renúncia à
imunidade, o que, penso, é menos chocante do que ser o próprio Governo a subscrever, como normalmente tem feito, a cláusula que, se quiséssemos designá-la positivamente, poderia ser chamada de aceitação de jurisdição.
Trata-se, portanto, de uma cláusula de aceitação de jurisdição de Estados estrangeiros para resolver diferendos em razão da competência territorial e material que fossem chamados a resolver entre o Estado português e terceiras entidades.
Há, apenas, repito, uma transposição do Estado para o Instituto de Gestão do Crédito Público, como gestor do Estado, daquilo que o Governo directamente tem feito em empréstimos externos. É, pois, uma aceitação de jurisdição - talvez esta versão seja menos chocante.
Quanto ao artigo 2.º, penso que ele contém princípios que devem ter expressão no Orçamento do Estado, mas que são também, salvo melhor opinião. princípios que devem ser respeitados pela gestão da dívida. Poderia dizer mais, mas acho que todos eles têm a ver com a gestão da dívida, independentemente de terem a ver também com o Orçamento do Estado, o que são realidades diferentes, embora secantes, isto é, não são entre si totalmente coincidentes.
Finalmente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, quanto à alínea c) do artigo 3.º, convém lembrar que já em 1928 e em 1932 a libra inglesa foi moeda com curso legal em Portugal e por isso é evidente que o euro sê-lo-á também.
Mas é natural que não estejamos de acordo, Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Carlos da Silva.
O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governos, Srs. Deputados; Muito brevemente, gostaria apenas de manifestar a posição do Partido Socialista de apoio a estes dois diplomas.
De facto, a questão da votação do Orçamento do Estado terá, eventualmente, alguma interferência num dos diplomas, mas, em sede de especialidade. com certeza, encontrar-se-á o texto adequado, uma vez que há uma parte que não está, de forma alguma, contemplada noutra lei aprovada pela Assembleia da República e, portanto, terá de ser analisado.
Mas a grande observação que o Partido Socialista pretende retirar do debate destes dois diplomas e também do debate do diploma sobre a Lei Orgânica do Banco de Portugal é a que, de facto, este Governo tem feito reformas tranquilas no que respeita à sanidade, à clareza e à transparência das contas nacionais e do regime financeiro do Estado.
Foi assim com as alterações à Lei Orgânica do Tribunal de Contas; foi assim. com a extensão da capacidade de fiscalização do Tribunal de Contas a empresas públicas ao nível da fiscalização sucessiva; foi assim com a lei que regula a concessão de garantias pessoais pelo Estado ou por outras entidades públicas; é assim, agora, com a Lei Orgânica do Banco de Portugal; foi assim com a criação deste, Instituto de Gestão do Crédito Público: e é assim, agora, com o diploma relativo ao regime geral de emissão e gestão da dívida pública.
São diplomas fundamentais que vêm, em muitos casos, revogar disposições do tempo do Estado Novo e que introduzem reformas no sentido da clareza, da transparência e da modernização da actividade financeira do Estado.
Este é o elemento político fundamental com que o Partido Socialista concorda plenamente e que apoia entusiasticamente.
Página 600
600 I SÉRIE - NÚMERO 15
Também noutras áreas tem-se verificado a modernização do sistema financeiro do Estado, agora na parte das receitas, como é o caso da reforma da Secretaria de Estado dos Assuntos Fiscais, ao nível da criação da Direcção-Geral dos Impostos, da Direcção-Geral de Informática Tributária e da Direcção-Geral das Alfândegas e Impostos Especiais do Consumo. Tudo isto no sentido de modernizar o aparelho de Estado numa área em que a concorrência da actividade privada, com capacidade tecnológica extraordinária, nomeadamente ao nível do recurso ao crédito e da utilização de produtos financeiros extremamente sofisticados, numa perspectiva de globalização dos mercados, fazia com que fosse imperiosa a modernização do Estado.
A criação do Instituto de Gestão do Crédito Público e um regime geral de emissão e gestão da dívida pública com esta flexibilidade mas, ao mesmo tempo, com esta capacidade de controlo e com esta transparência são elementos fundamentais para uma maior racionalidade da gestão da despesa pública ao nível dos juros e dos encargos da dívida.
Portanto, é importante que haja clareza, flexibilidade na gestão, rigor e definição dos objectivos da dívida pública que estão ao serviço das tarefas prioritárias do Estado, adequação a uma economia moderna e global e recurso a meios financeiros sofisticados de forma célere, porque, como se diz na fundamentação da proposta de lei, certas decisões ao nível do endividamento têm de ser tomadas em minutos, porque os mercados reagem de uma forma extremamente volátil e um minuto de indecisão ou a espera por dias para obter autorização superior pode ser catastrófica ao nível de dezenas, centenas ou até milhões de contos.
Hoje em dia, qualquer empresa privada ou mesmo pública que tenha um endividamento da ordem de um milhão ou de uma dezena de milhão de contos tem departamentos de engenharia financeira altamente «musculados». Seria, pois, um absurdo que o Estado. que tem o maior endividamento nacional, não tivesse um departamento, neste caso um instituto, extremamente «musculado», bem preparado, com recurso a técnicas sofisticadas e flexibilidade para poder gerir tão grande endividamento.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Portanto, damos o nosso grande apoio a esta medida e a nossa disponibilidade para, no caso de este regime geral de emissão e gestão da dívida pública, fazermos alguma eventual adaptação que possa ser sugerida, mas, de facto. parece-me que este diploma é extremamente claro, pelo que suscita poucas dúvidas.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral) - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carvalho Martins.
O Sr. Carvalho Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Valerá a pena, hoje, olhar para trás e relembrar o esforço feito desde 1986 em quatro domínios da dívida pública: a regularização da dívida pública; a racionalização do preço e do modo de financiamento do Estado: a redução do peso da dívida pública total; o reequilibro da dívida externa.
Foi possível que dívidas de entidades públicas que estavam excluídas da dívida pública fossem incluídas nesta.
Acabou-se com práticas do passado onde se recorria, permanentemente, ao défice e à dívida, sem que para tal houvesse de suportar o ónus que isso implicava normalmente junto da opinião pública.
Em vez de incluir no Orçamento do Estado certas despesas públicas. substituíam-se por entidades públicas autónomas, como fundos ou empresas estatais, operações facilitadas pela existência de bancos públicos.
Os empréstimos assim contraídos eram contabilizados na dívida pública indirecta, se beneficiassem formalmente do aval do Estado. Assim se explicava que alguns serviços públicos tivessem no passado largas responsabilidades por dívidas contraídas à margem da dívida pública.
A agravar isto tudo, era prática corrente até 1986, o Estado, usando os seus poderes, impor ao sistema bancário (Banco de Portugal e bancos do sector público) a concessão de crédito nas condições estabelecidas pelo próprio devedor. Era, claramente, um abuso de poder que contrariava toda a racionalidade macroeconómica, pois o Estado conseguia recorrer ao crédito, pagando uma taxa de juro inferior à praticada no mercado, o que lhe permitia, em boa medida, diminuir os encargos da dívida pública e o défice orçamental.
Felizmente. acabou-se com esta situação irracional e o Estado passou a recorrer ao crédito nas condições de mercado como qualquer agente económico, obrigando a modernizar-se e a diversificar os instrumentos para a captação de poupança.
Repôs-se o rigor e a racionalidade nas finanças públicas e, ao mesmo tempo, definiu-se uma estratégia gradualista de redução do peso da dívida pública. que passou a ser emitida a preços de mercado, sem discriminação fiscal e com colocação no público fora de quaisquer condições de favor ou imposição, acabando de vez com o financiamento que durante muito tempo foi feito recorrendo ao banco central com taxas de juro determinadas pelo próprio Estado.
Há pouco mais de 10 anos, éramos caso único na Europa, não tínhamos sequer um mercado de capitais; hoje, temos todo o tipo de mercado. A capitalização bolsista era, em 1986, de 276 milhões de contos e, em 1995, ultrapassava os 3000 milhões de contos; o mercado obrigacionista que valia 400 milhões de contos em 1986, em finais de 1995, ultrapassava os 6000 milhões de contos e os fundos de investimento geraram 10 milhões de contos e em fins de 1995 ultrapassavam os 2000 milhões de contos. Números que demonstram claramente as reformas e as mudanças que houve no País em 10 anos.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo. Srs. Deputados: Tudo isto é importante quando se analisa a proposta de lei n.º 137/VII, que estabelece o regime geral de emissão e gestão da dívida pública, pois são a demonstração clara de que os mercados foram capazes de se ir ajustando à realidade actual, que assenta na liberalização dos movimentos de capitais, num grau elevado de sofisticação tecnológica da actividade financeira, nomeadamente no domínio das telecomunicações e da informática, e numa profunda modificação dos privilégios do Estado no acesso ao financiamento creditício.
A sistematização num só diploma do regime geral da emissão e gestão da dívida pública directa do Estado parece-nos, nesta fase, importante. Por isso tem o nosso apoio.
As nossas preocupações estão vertidas neste diploma, pois, para além dos princípios que se deve orientar a gestão da dívida pública, está salvaguardada a Lei n.º 6191,
Página 601
20 DE NOVEMBRO DE 1997 601
bem como o conjunto de regras que a Lei n.º 12/90, que define o regime de empréstimos a emitir pelo Estado e que é revogada por este diploma, está também definido, assim como o respectivo controlo.
Realçamos o artigo 10.º, onde se define quem faz a certificação da legalidade da dívida, bem como a manutenção, até à respectiva extinção, dos certificados de renda perpétua e de renda vitalícia.
O artigo 13.º vai ao encontro das necessidades actuais da gestão da dívida pública, através de acções específicas do Instituto de Gestão do Crédito Público que visam obter as melhores condições dos mercados financeiros em cada momento.
Quanto ao artigo 15.º - Informação à Assembleia da República -, fazemos votos para que se cumpra, ou seja, que este órgão de soberania seja, de facto, informado de três em três meses sobre os financiamentos realizados e as condições específicas dos empréstimos.
Sr. Presidente. Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: É fundamental continuar a investir na eficiência da gestão da dívida pública, pois, apesar da descida significativa das taxas de juros, bem como os efeitos positivos das receitas das privatizações, o impacto do seu custo é significativo no esforço de consolidação orçamental.
Como já afirmámos, a gestão da dívida pública é hoje uma actividade financeira altamente sofisticada que requer uma elevada especialização e que tem de ser exerci a em forte competição com o sector financeiro. Requer uma organização altamente flexível, capaz de se adaptar às novas exigências, sem se espartilhar em formalismos e hierarquias.
Por isso concordamos com a criação do Instituto de Gestão do Crédito Público, pois poderá ter um papel importante nesse sentido, uma vez que, sendo uma estrutura mais ágil, responderá com mais eficiência aos novos desafios.
Daí que a proposta de lei n.º 119/VII, que autoriza o Governo a alterar o Código do IRC no sentido de equiparar o Instituto de Gestão do Crédito Público a instituição de crédito residente, beneficiando, por isso, da isenção de IRC nos ganhos obtidos pelo Estado, actuando através do Instituto de Gestão do Crédito Público nas operações de swap contratadas no âmbito da gestão da dívida pública e operações cambiais a prazo, nos parece correcta, indo ao encontro dos objectivos de racionalização e flexibilidade, exigência para quem tem de gerir a dívida pública, que é hoje a maior carteira financeira.
Em relação ao artigo 2.º - Alteração do Estatuto dos Benefícios Fiscais , a discussão está hoje ultrapassada, uma vez que na proposta de lei n.º 147/VII - Orçamento do Estado para 1998 foi aprovada, no Capítulo XI Benefícios Fiscais a alteração ao artigo 36.º-A desse estatuto.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, como não há mais oradores inscritos, resta-me informar que a próxima sessão se realiza amanhã, com início às 15 horas, com período de antes da ordem do dia e do período da ordem do dia a discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 145/VII e dos projectos de lei n.º, 416/VII (PSD), 420/VII (PSD), 428/VII (PCP) e 429/VII (CDS-PP). Srs. Deputados, está encerrada a sessão.
Eram 21 horas.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues.
Bernardino José Torrão Soares.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
António Bento da Silva Galamba.
António Fernandes da Silva Braga.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Cláudio Ramos Monteiro.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José da Conceição Saraiva.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Mário Manuel Videira Lopes.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Partido Social Democrata (PSD):
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Carlos Alberto Pinto.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
João Calvão da Silva.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.
Página 602
602 I SÉRIE - NÚMERO 15
DIÁRI0 da Assembleia da Republica;
Depósito legal n.º 88l8/85
IMPRENSA NACIONAL CASA DA MOEDA, E. P.
1 - Preço de página para venda avulso, 9$50 (IVA incluído).
2 - Para os novos assinantes do Diário da Assembleia da República, o período da assinatura será compreendido de Janeiro a Dezembro de cada ano. Os números publicados em Outubro, Novembro e Dezembro do ano anterior que completam a legislatura serão adquiridos ao preço de capa.
3 - O texto final impresso deste Diário é da responsabilidade da Assembleia da República.
PREÇO DESTE NÚMERO 475$00 (IVA incluído)