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Sábado, 10 de Janeiro de 1998 I Série - Número 26

VII LEGISLATURA 3.A SESSÃO LEGISLATIVA (1997-1998)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 9 DE JANEIRO DE 1998

Presidente: Exmo. Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Exmos. Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Maria Luísa Lourenço Ferreira
João Cerveira Corregedor da Fonseca

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a .sessão às 10 horas e 25 minutos.
Foram aprovador os n.ºs 1 a 9 do Diário.
Deu-se conta da apresentação da proposta de resolução n.º 81/VII e do projecto de lei n.º 443/VI1.
Foi apreciado o Decreto-Lei n.º 209/97, de 13 de Agosto. que regula o acesso e o exercício da actividade das agências de viagens e turismo [ratificação n.º 38/VII (CDS-PP)], tendo o decreto-lei e as propostas de alteração apresentadas baixado à 5.ª Comissão para apreciação e votação na especialidade. Intervieram, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado do Turismo (Vítor Neto), os Srs. Deputados Augusto Boucinha (CDS-PP), Lino de Carvalho (PCP), Carlos Beja (PS) e António Vairinhos (PSD).
O Decreto-Lei n.º 205/97, de 12 de Agosto, que regulamenta o Estatuto Legal do Defensor do Contribuinte, criado pelo artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 158/96, de 3 de Setembro (Lei Orgânica do Ministério das Finanças) ratificação n.º 39/VII (PSD) E foi igualmente apreciado, tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (António Costa) e do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (António Carlos dos Santos), os Srs. Deputados Rui Rio (PSD), Joel Hasse Ferreira (PS), Isabel Castro (Os Verdes), Luís Queiró (CDS-PP), Octávio Teixeira (PCP), Vieira de Castro (PSD) e João Carlos da Silva (PS).
Finalmente, foi também apreciado o Decreto-Lei n.º 304/97, de 8 de Novembro, que regulamenta o pagamento de propinas às instituições do ensino superior [apreciação parlamentar n.º 41/VII (PCP)]. Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior (Alfredo Silva), os Srs. Deputados Bernardino Soares (PCP), Afonso Candal (PS), Nuno Correia da Silva (CDS-PP), Ana Catarina Mendes (PS), Carlos Coelho (PSD) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).
A Câmara aprovou ainda dois pareceres da Confissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias autorizando dois Deputados do PSD a deporem em tribunal como testemunha.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 13 horas e 10 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 25 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto Bernardes Costa.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
Ana Catarina Santos Mendonça Mendes.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Gavino Paixão.
António José Guimarães Fernandes Dias.
António Manuel Carmo Saleiro.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Augusto Carlos dos Santos Leite.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Pedro da Silva Correia.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Raimundo Pedro Narciso.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.
Victor Brito de Moura.

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Soares Gomes.
Arménio dos Santos.
Carlos Eugénio Pereira de Brito.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.

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Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Manuel Costa Pereira.
José Mendes Bota.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira. Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria. Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário dá Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Armelim Santos Amaral.
Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Kruz Abecasis.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Joaquim Manuel da Fonseca Matias.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

Deputado Independente:

José Mário de Lemos Damião.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão em aprovação os n.ºs 1 a 9 do Diário, respeitantes às reuniões plenárias dos dias 8, 9, 15, 16, 17, 22, 23, 24 e 29 de Outubro.
Não havendo objecções, consideram-se aprovados.
O Sr. Secretário vai anunciar os diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: proposta de resolução n.º 81/VII - Aprova, para ratificação, a adesão de Portugal ao Acordo que institui o Laboratório Europeu de Biologia Molecular, concluído em Genebra em 10 de Maio de 1973, no âmbito do Acordo Relativo à Criação da Conferência Europeia de Biologia Molecular, que baixou às 2.ª e 6.ª Comissões, e projecto de lei n.º 443/VII Regime de incompatibilidades e impedimentos dos autarcas (CDS-PP, PSD e PS), que baixou às 1.ª e 4.ª Comissões.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início à apreciação do Decreto-Lei n.º 209/97, de 13 de Agosto, que regula o acesso e o exercício da actividade das agências de viagens e turismo [ratificação n.º 38/VII (CDS-PP)].
Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Augusto Boucinha.

O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.ªs e Srs. Deputados: O Partido Popular, ao solicitar a ratificação do Decreto-Lei n.º 209/97, fá-lo, na convicção de que o referido decreto-lei, para além de não ser consensual, poderá sofrer algumas alterações que muito beneficiarão o sector do turismo em Portugal. Com isto, não queremos dizer que o diploma, na sua generalidade, não contenha a virtude de apresentar avanços positivos na regulamentação da actividade das agências de viagens.
Parece-nos, ainda, que o sector do turismo está a ter o justo tratamento que merece, em função da importância que representa para a economia nacional, embora, a nosso ver, haja algo mais a fazer.
Para tal, entendemos que a introdução de algumas alterações, no sentido da sua efectiva melhoria, enriqueceria ò diploma em apreço.

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Também consideramos que o mesmo diploma não tem um critério claro e equilibrado sobre a actividade de um segmento do sector turístico que reputamos fundamental. E isto por várias ordens de razões: em primeiro, lugar, por poder contribuir para a degradação técnico-profissional deste subsector e, como consequência, para a degradação da imagem do turismo em Portugal; em segundo lugar, pelo facto de, objectivamente, não ser equilibrado em matéria de obrigações; em terceiro lugar, por poder vir a ser gravosa para o consumidor a sua aplicação; em quarto lugar, por não apartar, claramente, «as águas», num subsector do turismo que tem sido o suporte de outros subsectores, como a hotelaria, o rent-a-car, a aviação comercial e outros.
Por isso, entendemos que não estão perfeitamente definidas neste diploma, embora algo seja abordado, em sentido lato, as iniciativas consagradas nos n.os 4 e 5 do artigo 3.º, o qual deverá merecer um maior cuidado do legislador.
Nestes termos, propomos, para posterior reapreciação em sede de comissão, as seguintes alterações: a eliminação dos n.os 4 e 5 do artigo 3.º; a eliminação dos regimes especiais previstos nos artigos 52.º, 53.º e 54.º; a eliminação dos artigos e dos respectivos pontos que estejam directamente relacionados com os artigos anteriores; e, no n.º 2, alínea a), do artigo 5.º, propomos que os comerciantes em nome individual tenham também uma capacidade própria e suficiente, igual ou superior ao capital social previsto neste artigo.
Assim sendo, propomos que o diploma baixe à Comissão de Economia, Finanças e Plano para reapreciação e eventuais melhoramentos, de modo a atingir-se a satisfação dos múltiplos interesses em jogo, para bem do turismo nacional, da economia nacional e de Portugal.

Vozes do CDS-PP. - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Agradeço ao Sr. Deputado que faça chegar à Mesa a formulação das propostas, se já dispõe dela, a fim de que sejam fotocopiadas e circuladas.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Augusto Boucinha, em primeiro lugar, quero recordar-lhe que a baixa do diploma à comissão não decorre de uma proposta do PP mas do Regimento da Assembleia da República, pois, desde que se apresentem alterações, a baixa à comissão é automática.
Mas, sem prejuízo da posição de fundo que assumiremos em seguida, quando intervirmos sobre esta matéria, a pergunta que dirijo ao CDS-PP, partido democrata cristão. é muito simples: ao propor a eliminação dos n.os 4 e 5 do artigo 3.º, que permite que, para além das agências de viagens, haja outras entidades que promovam excursões, o PP quer proibir as paróquias de levar os paroquianos a Fátima, no dia 13 de Maio, todos os anos, através de excursões?

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Tão preocupado que está com isso agora!... Estou touché!

Risos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Augusto Boucinha.

O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, é evidente que proponho a eliminação destes números e a sua futura reapreciação porque entendo que este diploma não consagra perfeitamente o tipo de situações que acaba de anunciar e, por isso mesmo, considero que, com o conjunto de boas intenções que aqui revelou e com o empenhamento de todos os grupos parlamentares, poderemos melhora-lo e dar uma plena satisfação aos múltiplos interesses em jogo.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Como o tempo disponível que temos é limitado, vamos directos ao essencial deste debate que visa a ratificação da lei que regula a actividade das agências de viagens e turismo.
O que o PP pretende, aliás, confirmado pela intervenção do Sr. Deputado Augusto Boucinha, é alterar o artigo 3.º, proibindo ou condicionando fortemente a possibilidade de, em Portugal, se poderem realizar viagens turísticas, vulgo excursões, organizadas por outras entidades que não as agências de viagens.
Sem pôr em causa a actividade, o respeito e a consideração que nos merecem as agências de viagens, a verdade é que, com as alterações que o PP propõe introduzir ou anuncia propor, na prática, pretende-se proibir ou condicionar que as múltiplas instituições de solidariedade social existentes centros de dia, casas do povo, paróquias, juntas de freguesia, associações recreativas, etc. - e simples cidadãos que se organizem informalmente realizem excursões como aquelas que hoje fazem parte do tecido cultural e social do País. Queremos dizer ao PP, muito claramente, que nos opomos a esta intenção. E opomo-nos por duas razões: por um lado, porque a proibição iria chocar com uma tradição ou uma prática há muito existente em Portugal, e que até consideramos saudável, que permite, designadamente, a sectores da população mais carenciados, mais idosos e mais jovens conhecerem o País e beneficiarem, em condições vantajosas, de momentos de lazer e de prazer, através das excursões que são realizadas; por outro lado, porque, no seu conjunto, este tipo de, actividades informais, sem prejuízo de considerarmos que devem ser acompanhadas, controladas, verificadas e garantidos os direitos dos consumidores, no sentido de quem é transportado nesse tipo de excursões, assume uma dimensão económica relativamente menor em relação aos grandes eixos do volume de actividades que orientam e sustentam as agências de viagens. Aliás, mesmo neste aspecto concreto, quero, desde já, considerar que, sem prejuízo de melhorias, em sede de especialidade, de alguns aspectos que, porventura, o justifiquem, parece-me que o diploma é perfeitamente equilibrado, até porque exige às instituições que não sejam agências de viagens e que queiram fazer esse tipo de excursões um depósito de caução de 1000 contos ou um seguro obrigatório de responsabilidade civil, para fazer face a prejuízos que decorram de eventuais não realizações de excursão ou de perca de bens dos transportados. Portanto, nesse domínio, parece-nos que até há equilíbrio suficiente no diploma.
Assim, opomo-nos ao pedido de ratificação, mas, Sr. Deputado Augusto Boucinha, compreendemos perfeitamente a reacção que nos chegou da estrutura representativa das agências de viagens. E compreendemos, porque a responsabilidade é de quem criou e garantiu expectativas que, depois, não assegurou no texto final, que foi o Governo.

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O Governo, desresponsabilizando-se dos seus deveres, entregou ao sector a elaboração do anteprojecto de diploma legal, criou um grupo de trabalho para esse efeito, com representantes da Secretaria de Estado e da Direcção-Geral do Turismo, trabalharam sobre várias versões do diploma até que chegaram a uma 6.ª versão, a uma redacção final que a própria estrutura representativa do sector, em certo momento do processo, enviou ao Sr. Ministro para publicação, como versão final do grupo de trabalho criado. E evidente que, porventura após a sua circulação pelos diversos departamentos do Estado, alguém verificou que não podia ser, isto é, que não era possível, em Portugal, face à tradição e ao nosso tecido social e cultural, proibir milhares de pequenas agremiações e organizações informais de cidadãos de continuarem a fazer excursões. Por isso mesmo, alteraram esse aspecto, que era um dos aspectos essenciais reivindicados pela Associação Portuguesa das Agências de Viagens e Turismo. Por isso, reconhecemos legitimidade à Associação para este tipo de protesto, para este tipo de desacordo e para este tipo de desilusão em relação a expectativas criadas pelo Governo, com a sua política de diálogo e de transferir a resolução dos problemas que tem para os outros. Mas isso é um problema que o Governo tem de resolver com as agências de viagens!
Em relação à matéria substancial, entendemos que, de facto, o diploma que está em vigor, no essencial; assegura equilibradamente os direitos e os deveres dos vários intervenientes no processo. Quanto ao resto, trata-se de um problema de política de diálogo ou de desresponsabilização que o Governo costuma assumir quando os problemas são complicados mas que tem de resolver com as entidades a quem criou falsas, expectativas, as quais foram, depois, defraudadas no texto final do diploma.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos; tem a palavra o Sr. Deputado Augusto Boucinha.

O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, está à tirar conclusões que me parecem profundamente precipitadas. Propusemos a reapreciação do diploma porque entendemos que ele merece ser reapreciado. E não estamos a excluir quem quer que seja! O Sr. Deputado enumerou uma série de instituições, mas, em sede de comissão, vamos debater este problema. Se o Sr. Deputado pretende que se continue na anarquia que existe, na indisciplina reinante, pela nossa parte; entendemos que a situação deve ser disciplinada. É uma forma diferente de estar na vida!... Mas será em sede de comissão que iremos discutir estes assuntos.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, nada mais tenho a dizer. O PP vai apresentar propostas, nós veremos quais são as propostas concretas e se, na prática, significam aquilo que referi, isto é, o condicionamento ou a proibição de os cidadãos informais e as mais várias instituições fazerem excursões a Lagoaça, por exemplo, ou a outros pontos do País,...

O Sr. Presidente: - Não sertã mau de todo fazermos essas excursões!

Risos.

O Orador: - ... ou se, de facto, são outros aspectos que merecem ser considerados. Enfim, esperaremos pelas propostas do PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Beja.

O Sr. Carlos Beja (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados.: O pedido de ratificação, apresentado pelo PP, sobre o Decreto-Lei n.º 209/97 tem, pelo menos, o mérito de reconhecer e registar o avanço em matéria de regulamentação da actividade das agências de viagens e turismo, aliás, mérito reconhecido não apenas pelo PP mas também pelo PCP, através das palavras do Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O diploma em causa - e esta é a nossa postura de princípio - pode, obviamente, ser susceptível de melhorias, de aperfeiçoamentos 'e até da satisfação de algumas lacunas existentes, mas, no essencial, procura ser o reflexo de uma harmonização de interesses na sociedade portuguesa, no respeito, por um lado, pela actividade económica e pela associação que representa essa actividade económica e, por outro, pelas tradições e pelos hábitos mais consuetudinários do povo português.
Teria sido mais cómodo não regulamentar a actividade das excursões e no vazio dessa não regulamentação permiti-la, porque não estaria regulamentada. Todavia, penso que é mais sério ter regulamentado neste diploma esse tipo de actividade, que permite que algumas associações e instituições de solidariedade social possam organizar excursões, as chamadas «viagens por medida».
Mas, obviamente, há algumas omissões e até uma ou outra contradição que, do nosso ponto de vista,. poderiam ser ponderadas em sede de comissão, nomeadamente a possibilidade de as cooperativas, enquanto sociedades. poderem ser também elas empresas-agências de viagens com direito a alvará, independentemente de cooperativas com outra finalidade poderem vender aos seus sócios excursões, o que está contemplado nos artigos 52.º e 53.º do diploma.
Em sede de comissão, estaremos abertos a introduzir as melhorias, a corrigir deficiências ou preencher lacunas que todos os grupos parlamentares encontrarão numa lei que não é perfeita, pois não há leis perfeitas, mas sem que isso signifique desvirtuar o princípio fundamental deste diploma.
Trata-se de uma proposta de lei equilibrada que corresponde àquilo que pensamos ser a necessidade de compatibilizar interesses profissionais com interesses mais gerais da sociedade e por isso, em sede própria, estaremos abertos, tal como o Governo, a melhorar o diploma, mas não contem connosco para desvirtuar o fundamental do seu espírito.
Quero, ainda, aproveitar esta ocasião para saudar o Sr. Secretário de Estado do Turismo, pois é a primeira vez que está neste Parlamento, e saudá-lo, não só como Secretário de Estado do Turismo, mas também porque, como vínhamos dizendo há muito tempo, ó turismo merecia já um Secretário de Estado.
Gostaria, pois, de desejar ao turismo português, na pessoa do seu Secretário de Estado, as melhores felicidades e um bom trabalho em prol do turismo português e da actividade das agências de viagens.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontram-se a assistir à nossa reunião um grupo de 53 alunos da Escola Primária n.º 4 do Fogueteiro, Amora, e um grupo de 98 alunos do Externato São José de Lisboa.
Para eles, peço o vosso aplauso.

Aplausos gerais, de pé.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Vairinhos.

O Sr. António Vairinhos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por cumprimentar o Sr. Secretário de Estado do Turismo e desejar-lhe as maiores felicidades no desempenho das suas funções no sector do turismo, que tão carenciado e tão esquecido tem estado nos últimos dois anos.

Vozes do PSD:. - Muito bem!

Vozes dó PS: - Dois anos?!...

Risos do PS e de alguns Deputados do PCP.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Essa é para rir!...

O Orador: - A prova disso, Sr. Secretário de Estado, é que esta é a primeira vez, repito, a primeira vez, em mais de dois anos, que se vê o Secretário de Estado do Turismo sentado nessa bancada.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Lá isso é verdade!

O Orador: - Tivemos oportunidade de ver o seu antecessor uma vez na Comissão de Economia, Finanças e Plano, numa visita rápida e curta, onde expressou o desejo de voltar rapidamente, mas não tivemos esse prazer!
Sr. Secretário de Estado, o turismo precisa de si e precisa muito, principalmente no ano de 1998 onde muitas coisas importantes poderão e deverão acontecer, devendo, pois, este sector. estar preparado para o futuro.
Já é tempo de o Partido Socialista assumir, na prática, o lema de que o turismo é uma prioridade nacional,...

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Já está!

O Orador: - ... atendendo a que o turismo é um sector extremamente importante no contexto da economia nacional.
Mas, Sr. Primeiro-Ministro...

Risos do PS.

A minha vontade de promover o turismo é tão grande que até chamo Sr. Primeiro-Ministro ao Sr. Secretário de Estado do Turismo!
Sr. Secretário de Estado, independentemente de todas as questões que agora se levantam, já foi solicitada a sua presença na Subcomissão de Turismo e na última reunião desta subcomissão o Sr. Presidente ficou encarregue de indagar, quer junto da Sr.ª Presidente da Comissão de Economia, Finanças e Plano, quer junto do Governo, da possibilidade de o Sr. Secretário de Estado se deslocar à Subcomissão para discutirmos assuntos tão urgentes como, por exemplo, o da publicidade por via da Expo 98, as suas consequências no curto prazo, para além de outras questões que são muitos importantes e que não podem continuar adiadas.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Ws, agora, estamos a discutir as agências de viagens!

O Orador: - Quanto à matéria em discussão, a posição do PSD é muito clara. No início da presente legislatura, aquando do pedido de ratificação da, então, lei hoteleira, o PSD manteve sempre uma posição de coerência dizendo o seguinte: Meus senhores - e porque foi dito que a lei tinha bastantes benefícios relativamente à anterior -, mantenha-se em vigor o actual diploma e se há sugestões de melhoria, que não apareceram, então vamos melhora-lo. O que é que se passou? Levámos, praticamente, mais de 18 meses com um vazio legislativo à espera do pacote turístico...

Vozes do PS: - Isso não é verdade!

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Pois, o País está parado! Não há Governo!...

O Orador: - É verdade, sim! E este decreto-lei, o n.º 209/-97, foi o último do conjunto do pacote legislativo que saiu.
No entanto, com tanto envolvimento que houve por parte das entidades, atendendo à assessoria que o Governo teve da associação representativa do sector, que se fartou de fazer projectos, é lamentável que tenha aparecido um decreto-lei que tem avanços significativos, reconhecêmo-lo,...

O Sr. Carlos Beja (PS): - É verdade!

O Orador: - ... embora o Governo não tenha tido a coragem de assumir as posições que manifestou e correspondido às expectativas que criou ao sector, inclusivamente pondo-lhe nas mãos a feitura desse projecto de decreto-lei. Isto para nós é que não é correcto! Tanto mais que, assim que tomou posse a nova equipa do Ministério da Economia, o Sr. Ministro, há cerca de um mês, declarou que este diploma necessitaria de ser alterado, pois havia correcções a fazer, tendo, inclusive, dito que já tinha dado instruções ao Sr. Secretário de Estado do Turismo para apreciar as propostas de alteração sobre esta matéria provenientes dos sectores privados e institucionais.
Bom, então, é necessário ainda fazer aqui uma «ponte» entre aquilo que são os agentes do sector e outros tipos de interesses que se colocam no âmbito daquilo que já foi referenciado, que são as nossas tradições histórico-culturais.

O Sr. Carlos Beja (PS): - Então, o que é que quer melhorar?

O Orador: - Os senhores é que estão a dizer que querem melhorar!
Assim, aquilo que pergunto, muito concretamente, ao Sr. Secretário de Estado é o seguinte: no âmbito das análises que fez, por solicitação do Sr. Ministro da Economia, quais são, no seu entender, as alterações que este diploma deve sofrer? É que o CDS-PP apresenta uma proposta muito concreta, o PS não adianta coisíssima nenhuma...

Vozes do PS: - 0 PSD também não...

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O Orador: - ,... e o Governo parece que já pensou sobre o assunto!
Bom, mas seria muito mais correcto e facilitaria o trabalho desta Câmara e, certamente, da Comissão se o Governo dissesse o que é que está mal e o que pretende corrigir.
Este é, pois, o desafio que lanço ao Sr. Secretário de Estado do Turismo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Turismo.

O Sr. Secretário de Estado do Turismo (Vítor Neto): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, gostaria de sublinhar que é para mim uma enorme honra estar nesta Casa, o que acontece pela primeira vez, e ainda mais fazendo parte da bancada de um Governo do PS dirigido pelo Sr. Primeiro-Ministro, Engenheiro António Guterres.
Srs. Deputados, agradeço as palavras que me foram dirigidas, enquanto Secretário de Estado do Turismo, sobretudo no que respeita à importância que o sector do turismo tem, cada vez mais, na economia nacional.
Evidentemente que estou à disposição dos Srs. Deputados para prestar todos os esclarecimentos e para dialogar sempre que acharem oportuno. O turismo é uma matéria extremamente complexa. em crescimento, com distorções e que exige o acompanhamento, o diálogo, a compreensão e a participação de todas as forças sociais e políticas do nosso país.
Entrando directamente no assunto que aqui nos traz, isto é, no pedido, por parte do CDS-PP, de ratificação do Decreto-Lei n.º 209/97, de 13 de Agosto, que regula o acesso e o exercício da actividade das agências de viagens e turismo, começarei por dizer que o Governo tem a maior consideração e respeito por esta actividade e pelas empresas que nela participam - aliás, o Sr. Ministro da Economia e eu próprio tivemos ocasião de o expressar em Dezembro passado, na Madeira, durante o Congresso da associação do sector.
Nessa altura, o Sr. Ministro da Economia comprometeu-se a encarregar o Secretário de Estado do Turismo de analisar as propostas, e as ideias da Associação em relação ao Decreto-Lei n.º 209/97.
O Governo tem ideias assentes sobre esta matéria, mas, neste momento, é em sede de Assembleia da República e na sua comissão especializada que, esses problemas e essas propostas terão de surgir, não deixando o Governo de acompanhá-las.
De qualquer forma, penso que o Governo não se desresponsabiliza da elaboração ,deste decreto-lei, nem da actual fase de discussão, tendo em vista o aperfeiçoamento deste diploma - aliás, devo dizer que este decreto-lei nasceu de uma ideia de potenciar, e ajudar a desenvolver a actividade deste sector.
Portanto, discordo plenamente de algumas das razões apresentadas pelo Partido Popular no pedido de ratificação, sublinhando que, apesar de tudo, o Partido Popular não pode deixar de reconhecer que o diploma apresenta avanços positivos na regulamentação da actividade deste sector.
Os Srs. Deputados sabem muito melhor do que eu que a actividade legislativa é susceptível permanentemente de aperfeiçoamentos e, desde já, quero manifestar a disponibilidade do Governo para acolher as alterações que se apresentem como justas e coerentes e não desnaturem o espírito e a substância da lei.
Entretanto, para que fique claro, gostaria de fazer algumas considerações. Discordo da afirmação de que o presente diploma não tem um critério claro e equilibrado sobre a actividade a que se destina. Antes de mais, creio que é necessário não esquecer que um governo, seja ele qual for, ao legislar sobre um sector específico de actividade económica, não pode menosprezar ou lesar valores e interesses sociais, culturais ou morais que envolvem largos sectores da nossa sociedade, quiçá muitas vezes sectores mais desfavorecidos, sob pena de se cometerem graves injustiças e discriminações.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Assim, Srs. Deputados, o objectivo do Governo, ao consagrar a possibilidade de outras entidades utilizarem meios que são utilizados pelas agências de viagens, não foi o de lesar os interesses das agências de viagens, não foi o de introduzir elementos de concorrência desleal, porque as entidades que estão claramente estabelecidas no presente decreto-lei têm objectivos muito distintos dos das agências de viagens: Essas entidades não organizam viagens com carácter regular, não têm como objectivo o lucro, mas respondem, sim, a necessidades reais de estratos das nossas populações, estando, no fundo, sujeitas às mesmas exigências nessa actuação de segurança e protecção das agências de viagens.
Discordo também, Srs. Deputados, da afirmação de que o diploma contribui para a degradação técnico-profissional do sector. Admito que podem fazer-se algumas correcções no texto para eliminar certas ambiguidades que possam existir sobre essa matéria, mas daí a referir-se que se contribui para uma degradação técnico-profissional do sector acho que é um exagero. As actividades próprias das agências de viagens são aquelas a que elas respeitam e estão claramente definidas no artigo 2.º do Decreto-Lei. Portanto, as actividades que estão previstas no n.º 4 do artigo 3.º, Sr. Deputado, só são aplicadas às associações, às cooperativas, que só prestam serviço aos seus associados, às misericórdias, às mutualidades, etc., com as limitações previstas nos artigos 52.º e 53.º deste diploma. Em todo o caso, admito que possa haver aqui alguns aperfeiçoamentos.
Como o Sr. Deputado sabe, essas entidades estão sujeitas, à excepção das regras de licenciamentos, às mesmas regras que se aplicam às agências de viagens, com excepção do seguro, até porque o âmbito de actuação destas associações é muito diferente. Os clientes - podemos dizer assim - são diferentes, o objectivo dessas viagens é diferente e, portanto, salvaguardam-se aqui algumas questões no que diz respeito ao seguro. Penso que isso não são razões suficientes para se dizer que se pretende uma degradação técnico-profissional, embora, no aspecto de uma clarificação do tipo de empresas que podem efectivamente aceder a esta actividade, se possa, em sede de comissão, aperfeiçoar essa questão.
Já agora, Srs. Deputados, ao contrário do que foi dito, creio ser justo afirmar que há aspectos da nova lei que melhoram nitidamente essa prestação técnico-profissional e os direitos dos consumidores e dos utentes das agências de viagens. Penso, pois, que é justo poder afirmar-se que estamos perante um decreto-lei que, no essencial, dignifica, valoriza e estimula a actividade das agências de viagens e turismo e que, ao mesmo tempo, salvaguarda im-

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portantes valores sociais fortemente radicados na nossa sociedade, nomeadamente nas zonas do interior e nas zonas rurais.
Não custa reconhecer ao Governo que são possíveis correcções susceptíveis de eliminar algumas imprecisões, alguns defeitos, algumas gralhas que possam existir. O Governo não se opõe a que se faça um esforço de aperfeiçoamento, desde que se salvaguarde o espírito e a substância do Decreto-Lei: contudo, o Governo irá opor-se a qualquer tentativa de alteração substancial do presente diploma.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente. Sr. Secretário de Estado, registei as suas palavras iniciais de disponibilidade para tratar das políticas de turismo com a Assembleia da República. Só espero que elas se traduzam em factos, porque os secretários de Estado mudam, nesta área, ao ritmo da luz, mas o Governo é o mesmo e a prática que temos tido nesta matéria é a de uma franca menorização do sector da actividade turística nas preocupações globais do Ministério. Vamos ver se as palavras do Sr. Secretário de Estado se traduzem em actos ou se são meras palavras de boa vontade protocolares, que sempre se fazem no início de funções!
A segunda questão é esta, Sr. Secretário de Estado: o Sr. Ministro, como já foi aqui referido pelo Sr. Deputado António Vairinhos, no Congresso da Associação Portuguesa das Agências de Viagens e Turismo, realizado na Madeira, assumiu a possibilidade de se introduzirem alterações ao diploma, e o Sr. Secretário de Estado confirmou-o agora.
Recentemente, recebi notícias de que a Secretaria de Estado estava em conversações com a estrutura representativa do sector no sentido de serem feitas algumas alterações ao diploma em sede de Governo. Como o Sr. Secretário de Estado sabe, o Governo não é parte nesta alteração aqui, na Assembleia da República. E a Assembleia da República, em sede de Comissão de Economia, Finanças e Plano, só vai poder debruçar-se sobre as alterações em relação aos artigos para os quais forem apresentadas propostas em sede de Plenário.
A minha questão é a seguinte: que alterações concretas, que propostas concretas é que o Governo tem nesta matéria que permita; eventualmente, se for caso disso e se houver campo de manobra regimental para o efeito, a Comissão ponderar, uma vez que da parte do Partido Socialista não há qualquer proposta de alteração? Como, em sede de Assembleia da República, o Governo não faz parte e como o Partido Socialista não apresentou qualquer proposta de alteração, como é que a Assembleia da República pode estar atenta às preocupações do Governo nesta matéria? É que as únicas propostas que. existem são as do PP, de eliminação pura e simples dos n.ºs 3 e 4 do artigo 3.º e, quanto a isso, parece que há um consenso maioritário para impedir a alteração global do diploma.
Portanto, Sr. Secretário de Estado, há aqui uma contradição, pelo menos, entre o Governo e a bancada do Partido Socialista que convinha clarificar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Uma vez que o Sr. Secretário de Estado dispõe de pouco tempo e ainda tem outro pedido de esclarecimento, sugiro que responda conjuntamente aos pedidos de esclarecimento.

O Sr. Secretário de Estado do Turismo: - Com certeza, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Vairinhos.

O Sr. António Vairinhos (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, a minha questão vem na sequência daquilo que foi dito pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho. Na intervenção que há pouco fiz fui muito claro ao Suscitar ao Sr. Secretário de Estado que, depois de todas essas análises feitas no último mês, nos dissesse quais são as possíveis alterações a que o Governo chegou.
Se tivermos consciência de que, se não forem apresentadas, hoje e aqui, propostas de alteração, este debate é inócuo, ao Sr. Secretário de Estado sou obrigado a dizer que ou existem propostas de alteração - e a posição da Secretaria de Estado evoluiu sobre esta matéria e o Sr. Secretário de Estado fará o favor de no-las trazer aqui para podermos aproveitar ou não o pensamento do Governo - ou, então, a presença do Governo nesta reunião fica praticamente sem efeito, pois não chegamos a saber se defende «a» ou «b» ou se tem algo a dizer a esta Câmara, para que ela possa utilizar mais esse contributo no sentido de melhorar o decreto-lei em vigor.

O Sr. Presidente: - Para responder aos dois pedidos de esclarecimento, no tempo regimental de 3 minutos, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Turismo.

O Sr. Secretário de Estado do Turismo: - Sr. Presidente, ao Sr. Deputado Lino de Carvalho devo dizer que aquilo que eu disse não foram meras palavras de circunstância, como se fazem nestas ocasiões, mas, pelo contrário, quero manifestar-lhe que se trata de um compromisso concreto de disponibilidade para vir a esta Casa discutir os problemas do turismo em sede de subcomissão ou de comissão, como os senhores entenderem, porque pensamos que é uma matéria que tem muita necessidade de contributos, de ideias e de participação, para se dignificar, de uma vez por todas, o turismo como uma actividade económica importante do nosso país e não como uma actividade secundarizada e menorizada, como tem sido muitas vezes. Portanto, esse é um compromisso que assumo com toda a clareza e frontalidade.
Em relação às questões que foram aqui abordadas sobre o presente decreto-lei e as possíveis alterações, devo dizer que não gostaria de me substituir àquilo que são atribuições concretas desta Casa e deixaria que, em sede de comissão, os Srs. Deputados de todas as bancadas fizessem as propostas que considerassem importantes, mas, evidentemente, estou disponível para estar presente e para discutir com os senhores tudo o que entenderem.
Devo acrescentar que ternos uma relação permanente com a Associação Portuguesa das Agências de Viagens e Turismo, conhecemos as propostas que eles têm sobre esta matéria, mas, neste momento, não há qualquer negociação entre o Governo e essa associação, pelo que nem sequer se coloca essa questão de negociações de última hora. É uma matéria que está na Assembleia da República e cabe à Assembleia da República fazer o seu papel e, a sua parte.

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É, pois, com esta opinião e com este sentimento que termino a minha intervenção, desejando a todos os Srs. Deputados um bom trabalho.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos ao fim do debate deste decreto-lei...

O Sr. José Magalhães (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, é apenas para anunciar que, antes de declarar formalmente encerrado o debate, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista gostaria de apresentar um conjunto de propostas de alteração, o que será feito, nos termos regimentais, dentro de segundos.

O Sr. Presidente: - Iremos aguardar que essas propostas entrem na Mesa. Lembro também aos Srs. Deputados que, em sede de comissão, podem ainda ser apresentadas propostas relativas aos artigos objecto de discussão e votação na especialidade.
As propostas vão ser fotocopiadas e distribuídas a todos os grupos parlamentares, pelo que vos peço que me autorizem, desde já, a encerrar o debate deste decreto-lei.

Pausa.

Srs. Deputados, como não foi apresentada qualquer recusa de ratificação deste diploma, o mesmo baixa, juntamente com as propostas apresentadas, à 5.º Comissão para apreciação e votação na especialidade.
Vamos passar, agora, à apreciação do Decreto-Lei n.º 205/97, de 12 de Agosto, que regulamenta o Estatuto Legal do Defensor do Contribuinte, criado pelo artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 158/96, de 3 de Setembro (Lei Orgânica do Ministério das Finanças) [ratificação n.º 39/VII (PSD)].
Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, inicio esta intervenção dizendo que, para o PSD, é necessário caminhar no sentido da defesa do contribuinte. Tudo o que de eficaz possa ser feito no sentido de que os contribuintes portugueses tenham melhores mecanismos de defesa face aos seus conflitos quotidianos com a administração fiscal. Nesse sentido, é evidente que o PSD está de acordo com o princípio que subjacente à existência deste decreto-lei e aos princípios que nortearam o Governo quando pensou na criação de um Defensor do Contribuinte.
Só não estamos de acordo com este decreto-lei pela forma como ele está formulado. Não o contestamos em questões de pormenor, não vale a pena sequer contestar pequenos pormenores do decreto-lei porque contestamos uma coisa que é fundamental na lógica do decreto: é precisamente o facto de o Defensor do Contribuinte ser nomeado e, portanto, estar na dependência do Ministro das Finanças ou, no caso concreto, na dependência do Ministério das Finanças. Não faz sentido que o Defensor do Contribuinte, que pretende defender o contribuinte em conflitos com o Ministério das Finanças, dependa precisamente do Ministério das Finanças e faça parte desse Ministério. É um pouco mais ou menos como se, num jogo desportivo, o árbitro fosse nomeado por uma das duas equipas que vão disputar o jogo! Não faz sentido. E julgo que qualquer português entende que uma solução deste género é o mesmo que atirar areia para os olhos das pessoas!
Por isso, defender o contribuinte, criar mecanismos para defesa do contribuinte, com certeza! Mas alguém que seja independente de facto e não apenas independente no papel, como está consagrado neste decreto-lei. Uma coisa é melhorar os serviços. melhorar aquilo que já existe no sentido de aprender com as reclamações dos contribuintes, no sentido de se ir aperfeiçoando o sistema; outra, completamente diferente, é criar-se algo de novo. Aquilo que o Governo aqui faz, é tentar criar algo de novo, mantendo, no entanto, praticamente tudo na mesma em termos de independência do órgão que se pretende que seja o principal defensor dos contribuintes.
Muito sinteticamente, é esta, a objecção de fundo que temos, à lógica e à filosofia do decreto-lei. Que defenda arranjar uma figura que reforce a defesa dos contribuintes, com certeza, mas independente do Ministério das Finanças. Repito, não faz sentido que o contribuinte vá queixar-se do Ministério das Fianças e quem vai defendê-lo seja alguém que pertence ao Ministério das Finanças. Eu diria que esta lógica não faz sentido e diria mesmo, se me permitem, Srs. Deputados, que esta lógica até tem o seu quê de ridículo, em termos daquilo que são os principais pressupostos para a existência de um decreto-lei deste género.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por isso, o PSD entende que este decreto-lei não deve ser ratificado. Porquê? Precisamente porque ele vai contra aqui que seria a lógica da sua própria existência.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradeço que formule a recusa de apreciação parlamentar.
Tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira para pedir esclarecimentos.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs.
Deputados, Sr. Secretário de Estado, Sr. Deputado Rui Rio,, ouvi com muita atenção a curta intervenção de V. Ex.ª Neste contexto em que estamos, algumas pessoas mais distraídas não reparam que está a haver um esforço grande no sentido da reforma fiscal, em coerência com o programa eleitoral do PS e da nova maioria e com o Programa do Governo, que já houve uma resolução do Conselho de Ministros que estabelece as bases gerais do desenvolvimento da reforma fiscal, que já houve um relatório sobre o Imposto sobre Património feito pela comissão presidida pelo Prof. Sidónio Pardal. Julgo que, na altura, V. Ex.ª estava demasiado ocupado como Secretário-Geral. Felizmente, do nosso ponto de vista, voltou a enriquecer com mais brilho os trabalhos parlamentares e já teve oportunidade de participar em algumas das audições que, por proposta socialista, a Comissão de Economia, Finanças e Plano fez sobre a reforma fiscal. Nesta altura, em que chegaram à Assembleia da República relatórios, nomeadamente sobre a reestruturação do Imposto Automóvel, sobre a alteração dos escalões do IRS, sobre a questão do reporte de prejuízos, estando todos estes processos em curso, gostaríamos de ouvir com mais clareza o que é que

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o PSD pensa - se é que pensa alguma coisa - sobre esta questão global da reforma fiscal. Não é disso que estamos a tratar hoje, mas esta problemática liga-se com a questão da defesa do contribuinte.
É evidente que o aparecimento desta figura não mexe no estatuto global e nas defesas que os cidadãos já têm, que, por vezes, não são muito eficazes, como sabemos - mas, se não o são, deve-se um pouco também aos dez anos anteriores, em que não se proeurou demasiada eficácia nesse domínio -,face ao funcionamento da administração fiscal.
Entendo o argumento de que a defesa do contribuinte, em muitos casos, terá de passar por entidades independentes, mas não vejo que aspecto negativo é que V. Ex.ª vê, e que aspectos negativos - disse que não valeria a pena objectivar - veria para além desse, no sentido de esta figura da defesa do contribuinte dentro do Ministério levantar estas dificuldades face ao contribuinte. Cria alguma dificuldade nova? Ou é alguma coisa que tem contra, como poderia ter contra o Provedor das Telecomunicações, que existe na Telecom, e por aí fora.
A minha dúvida é a seguinte: se estão em desacordo com alguns aspectos, porque é que não sugerem alterações? Estão em desacordo apenas por se inserir isto no Ministério das Finanças? É porque têm medo que isto entrave a administração fiscal? Qual é, efectivamente, o vosso receio de fundo quanto a esta figura? Tem a ver apenas com o aspecto que, formalmente, aqui identificou, de discordar da inserção do Defensor do Contribuinte na área do Ministério das Finanças?
É este aspecto, para enriquecimento do debate e esclarecimento dos colegas e da opinião pública, que eu agradecia que clarificasse.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, a questão - disse-o aqui claramente, diversas vezes, e não me importo de repetir mais uma vez - que se coloca é a seguinte: se isto for enquadrado no sentido de melhorar o funcionamento dos serviços que já existem, de aprender com as reclamações que as pessoas já fazem, no sentido de uma maior eficácia, com certeza! Mas não é isso o que se pretende. O que se pretende é institucionalizar um Defensor do Contribuinte e, em boa verdade, o que está aqui afazer-se, é, com essa capa de institucionalizar o Defensor do Contribuinte, deixar tudo na mesma, ou melhor, fazer apenas aquilo que se pode fazer sem a existência do decreto-lei, que é melhorar os serviços, melhorar aquilo que já existe!
O Sr. Deputado diz «mas vamos arranjar um defensor isento, independente do Ministério das Finanças, para os contribuintes». Muito bem! Quer uma sugestão? Pode haver muitas, mas, se quer uma sugestão, pegue nas verbas e nos meios que serão afectos ao denominado Defensor do Contribuinte e dê-o ao Provedor de Justiça, por exemplo, e ele que crie um departamento - ele é suficientemente independente e isento para o fazer - com mais meios para fazer aquilo que, de uma forma independente, os senhores, e bem, acham que deve ser feito! Só que não desta maneira! Esta é uma sugestão que pode ser feita, mas podiam ser feitas outras.
Mas relativamente à recusa de apreciação parlamentar e não de alterações de pormenor, isso tem a ver com a discórdia de base: discordamos de base, de raiz, com a filosofia subjacente à solução que o decreto-lei preconiza.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, queria dizer que me parece absolutamente consensual a necessidade de o Estado garantir os direitos dos cidadãos em matéria fiscal. Julgo que essa é uma necessidade que requer maior eficácia dos serviços, que requer uma informação em relação aos direitos e regalias de que os cidadãos contribuintes podem beneficiar, mais ainda, implica o dever de devolução, a todo o momento, de quantias indevidamente cobradas por erros dos serviços. É óbvio que esta é uma questão importante. Aliás, consideramo-la tão importante que sustentou uma das propostas que fizemos em sede do texto constitucional.
Contudo, parece-me que o diploma que estamos a apreciar não tem muito a ver com isto porque a criação, através da lei orgânica do Ministério, de uma figura do Defensor do Contribuinte, é algo um pouco de fachada. É simbólico, vale o que vale, mas não tem nada a ver com aquilo que, suposta e aparentemente, pretendia: querer ser um provedor dos direitos dos cidadãos junto do Ministério. Um provedor que tinha a bizarria de não ser um órgão independente, ou seja, de ser um órgão tutelado pelo próprio Ministério.
Portanto, em nossa opinião, esta apreciação parlamentar que foi suscitada pelo Grupo Parlamentar do PSD tem todo o cabimento, como tem todo o cabimento pôr em causa a eficácia e a existência de um órgão que se diz ser independente, mas que não o é, e que pela sua natureza nem o pode ser, mas que está associado a uma questão que, essa sim, é importante e tem de ser corrigida, do ponto de vista dos serviços, para garantir o seu bom funcionamento, a sua eficácia e, sobretudo, para garantir os direitos dos cidadãos, que é a melhoria do acesso à informação, da divulgação e a garantia de que os direitos dos cidadãos, também em matéria fiscal, sejam salvaguardados.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, também farei uma intervenção muito breve, para dizer já, à partida, que o nosso grupo parlamentar não encontra razões para aprovar esta apreciação parlamentar. E fá-lo por três ordens de razões, que vou procurar sintetizar e não ser muito extenso nesta intervenção.
Em primeiro lugar, achamos que este diploma concorre com as competências do Provedor de Justiça, e não vemos nenhuma vantagem nisso. O Provedor de Justiça é, de facto, um órgão independente; tem possibilidades de fiscalização do conjunto da actividade da Administração Pública e também, portanto, da administração fiscal; tem condições de independência; inclusivamente, as suas recomendações e as suas acções inspectivas têm consequências nos termos em que, na lei, estão previstas, relativamente à Administração. Assim, não vemos razão nenhuma para que se crie esta figura concorrendo com a do Provedor de Justiça.
Em segundo lugar, esta é uma medida avulsa, é uma medida completamente desinserida da reforma fiscal, que

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está sempre em curso, o que é a mesma coisa que dizer que está sempre adiada.
Em terceiro lugar, parece-nos um diploma inócuo, inútil e até contraditório relativamente aos fins para que foi criado.
Vou desenvolver rapidamente este pontos, dizendo que, a meu ver, e sem querer fazer processos de intenção, o que se passa, é que o Governo não faz aquilo que promete, isto é, não faz a reforma fiscal, mas depois entretém-se a fazer aquilo que não promete e, portanto, faz mal porque faz desinserido do quadro de referências que devia ser aquele em que devia movimentar-se. Este diploma é um bom exemplo disso porque cria a figura deste Defensor do Contribuinte como órgão de apoio interno do Sr. Ministro das Finanças mas, por outro lado, refere que é um cargo que permite criar uma entidade independente e, por esta via, assegurar o respeito pelos direitos, liberdades e garantias dos contribuintes relativamente à administração Fiscal.
Ora, ou se é uma coisa ou se é outra: não se é um órgão de apoio do Sr. Ministro das Finanças e depois pretende-se que ele tenha competências no domínio da defesa dos direitos, liberdades e garantias dos contribuintes relativamente à máquina da administração fiscal. Neste sentido, os contribuintes também poderiam, sei lá, recorrer, na defesa dos seus direitos, para o Director-Geral dos Impostos ou até mesmo para o Inspector-Geral da Fiscalização! Julgo que, nestes casos, não seriam estas as primeiras entidades de que os contribuintes se lembrariam ao recorrerem no sentido da defesa dos seus direitos.
Vou dar, muito rapidamente, dois exemplos de como este é um diploma errado: o artigo 21.º permite que, em certos casos, a apresentação de petições pelos contribuintes tenha efeitos suspensivos; mas só tem efeitos suspensivos se os contribuintes prestarem caução nos termos do
Código do Procedimento Tributário, o que significa que têm de prestar caução relativamente à dívida em causa e também ao acrescido legal - e o acrescido legal são juros moratórios, são juros compensatórios e são mais 25%.
E depois? Como as recomendações do Sr. Defensor do Contribuinte não são vinculativas, nem sequer a Administração tem de fundamentar a recusa dessas recomendações.
O que pode acontecer é que ele beneficie de uma recomendação favorável, que a administração fiscal não acata e depois ainda paga os juros moratórios, os juros compensatórios e o demais acrescido legal! Ora bem, isto parece-me manifestamente errado e exagerado.
Há um outro exemplo relativamente à inocuidade e ineficácia destas recomendações do Defensor do Contribuinte precisamente naquilo que eu estava dizer: é que a recusa da administração fiscal não tem sequer de ser fundamentada nem a lei consagra qualquer possibilidade de revisão da decisão de não acatamento. Portanto, fitais vale dizer que estas recomendações são uma mera figura de retórica. Aliás, este diploma tem um artigo, que é o 35.º, que é muito curioso: é um artigo que me faz lembrar os contratos de adesão, aqueles contratos com cláusulas gerais que têm sempre umas letras muito pequeninas, que são, normalmente, as mais importantes, mas que se pretende que sejam aquelas que não são lidas.

Risos do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes.

Trata-se do artigo que diz que «deverá...» - é isso o que estou a fazer, uma ver. que este diploma ainda está em vigor! - «...ser explicado aos contribuintes que recorram ao Defensor do Contribuinte que as recomendações ou pareceres eventualmente emitidos não vinculam a administração fiscal». Portanto, senhores contribuintes, tenham isso bem em atenção! Mas, como este é o último artigo do diploma e está nas disposições finais e transitórias, eu, aproveitando o eco que a Assembleia da República me permite, lembro aos contribuintes que, na verdade, estas recomendações ou pareceres do Defensor do Contribuinte não têm qualquer efeito sobre a administração fiscal uma vez que não vinculam e, inclusivamente, como já disse, a administração fiscal não está sequer obrigada a fundamentar a recusa do acatamento das recomendações deste defensor.
Talvez houvesse algum sentido útil para. este diploma e para este Defensor do Contribuinte se ele pudesse intervir nos casos em que já ocorreu uma decisão final administrativa. Aí, sim, fazia sentido! Se o contribuinte se sentisse lesado e, para além dos meios de impugnação judicial que tem, ainda pudesse recorrer de um acto administrativo definitivo, seja, por exemplo, um acto de um ministro em matéria fiscal, então, este diploma tinha algum sentido mesmo que fosse só no plano da recomendação. Mas é precisamente nestes casos que o artigo 3.º proíbe ao Defensor do Contribuinte intervir! Portanto, o que se quis mesmo foi criar uma Figura inútil e de retórica, sem outra razão.
Talvez seja aqui o momento, Srs. Deputados e Secretário de Estado, de lembrar ao Governo e ao Partido Socialista; que a promoção da defesa dos direitos e das garantias dos contribuintes perante a administração fiscal se alcança, não com diplomas avulsos e inúteis como este, mas com uma sempre prometida e sempre em curso reforma fiscal. E esta reforma fiscal devia consagrar impostos justos para as pessoas e para as empresas; devia simplificar e modernizar a máquina da administração fiscal; devia promover, dignificar e formar os seus agentes; devia modernizar e reformar os tribunais tributários consagrando, nomeadamente, o princípio da igualdade das custas, coisa que ainda não está adquirida apesar de prometida; e devia trazer à luz do dia o diploma ordenador de todo o sistema, a lei geral tributária. Nada disto é feito, falta este quadro de referências e cria-se este Defensor do Contribuinte, esta figura ambígua, que me parece inútil.
A nossa recusa tem precisamente o sentido de convidar o Governo a fazer melhor, a legislar melhor, a trazer. aqui medidas de mais profundo alcance, a fazer aquilo que promete e não o que não prometeu e que, portanto, não merecia ver a luz do dia.
Aliás, Sr. Secretário de Estado, suspeitamos de que este diploma tem outro objectivo. Sabemos que o Sr. Ministro das Finanças e provavelmente o Sr. Secretário de Estado também, tem a sua secretária cheia de reclamações, exposições, petições, que lá jazem e as quais não tem tempo de resolver. Ora bem, este diploma cria um Defensor do Contribuinte para onde poderiam ser enviadas e remetidas todas estas petições levando a que elas tivessem algum curso, não queria dizer o cesto dos papéis, mas a recusa de atendibilidade das pretensões dos contribuintes. Mas, se é assim, Sr. Secretário de Estado, não chame a este cargo Defensor do Contribuinte mas director-geral da defesa do Sr. Ministro das Finanças.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

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O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. .Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A figura do Defensor do Contribuinte, tal como é conformada no Decreto-Lei n.º 205/97, não tem razão de ser. No sistema português existe o Provedor de Justiça, que tem a seu cargo a defesa dos cidadãos perante a Administração, e cujas competências não podem nem devem ser esvaziadas explícita ou implicitamente.
Ora, a criação de provedores sectoriais, dê-se-lhes ou não este nome, teria inevitável e objectivamente aquela consequência. O Defensor do Contribuinte, tal como foi configurado pelo Governo, conduziria ao esvaziamento prático das competências do Provedor de Justiça no âmbito fiscal. Consideramos esta via indesejada e indesejável. Por um lado, porque dela resultaria uma menos valia no âmbito das competências e de acção da Provedoria de Justiça, da confusão junto dos cidadãos sobre a natureza do Provedor e do defensor, do quase certo conflito de competências que entre os dois órgãos se estabeleceria na vida prática. Por outro, não vislumbramos mais valias para a defesa dos contribuintes resultantes da criação desta figura do Defensor do Contribuinte, porque, independentemente da personalidade que ocupasse o cargo, o Defensor do Contribuinte não é uma entidade independente da Administração, antes dependendo política, administrativa e financeiramente do Governo. Por acréscimo, e incongruentemente, com um mandato que ultrapassa o mandato do próprio Governo e sem que ao Defensor do Contribuinte seja legalmente exigido o exercício das suas funções em exclusividade!
No entanto, que urge aumentar os meios de defesa do contribuinte disso não temos quaisquer dúvidas, mas a via para o conseguir deverá ser outra: primeiro, melhorar substancialmente a justiça fiscal; depois, e se necessário, por exemplo, reforçar os meios colocados à disposição do Provedor de Justiça; promover e melhorar as acções de formação e fiscalização no âmbito da administração fiscal incluindo o controle interno da sua actuação; adensar a malha das normas legais de defesa do contribuinte e limitar fortemente a discricionariedade da administração Fiscal.
Em suma, o PCP considera que a criação do chamado Defensor do Contribuinte é inconveniente e por isso indesejável, quer na perspectiva da eficácia da actuação do Provedor de Justiça, quer na perspectiva da defesa do contribuinte.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (António Carlos dos Santos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, ouvi atentamente as explanações efectuadas pelos partidos da oposição e delas posso concluir três coisas.
Em primeiro lugar, teoricamente, dizem defender os contribuintes, mas, na prática, pretendem exactamente o contrário, ou seja, invalidam um útil instrumento de defesa dos contribuintes.
Segundo, a oposição permanece com uma visão arcaica do que é uma administração económica e financeira moderna onde proliferam normalmente as chamadas autoridades administrativas independentes, os órgãos de autocontrole da administração, onde proliferam órgãos em que a Administração e o Governo se autolimitam. E como isto é, claramente e sempre, um passo em frente, tem o Governo toda a legitimidade para propor órgãos desta natureza.
Mas se a oposição continua a ter uma visão marcelista da administração...

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Essa é que eu não aceito!

O Orador: - Marcelista no sentido de ser uma administração...

O Sr. João Amaral (PCP): - Os senhores é que têm no Governo um ministro de Marcelo Caetano!

O Orador: - Srs. Deputados, não os interrompi enquanto falaram...

O Sr. Vieira de Castro (PSD): = O senhor é malcriado!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço que façam

O Orador: - O Sr. Deputado Vieira de Castro está muito excitado.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - O senhor é malcriado!

O Orador: - Não sou malcriado.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - É!

O Orador: - Como é que sou malcriado?! Fiz uma observação meramente técnica!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Vieira de Castro, é tão ou mais grave o que o .senhor acaba de dizer do que o que poderá ter dito o Sr. Secretário de Estado. Desculpe, tenho que chamar a sua atenção, mas não pode chamar malcriado a quem está no uso da palavra. Dar-lhe-ei a palavra no fim da intervenção do Sr. Secretário de Estado.

Sr. Secretário de Estado, faça favor de continuar.

O Orador: - Em terceiro lugar, têm medo da experimentação. Ninguém demonstrou aqui que o Defensor do Contribuinte retirasse garantias aos contribuintes...

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Nem acrescentou!

O Orador: - Vamos ver, Sr. Deputado.
... e o que fazem na prática é ter medo da experimentação. Por que não deixam a instituição funcionar e depois vêem os efeitos?!
Sr. Presidente, Srs. Deputados, vou agora analisar algumas das questões concretas que foram ditas.
Primeiro, o problema da independência. Obviamente que a independência não pode ser idêntica à do Provedor de Justiça, nem essa seria a função pois, a ser assim, entraríamos em colisão com as competências e atribuições do próprio Provedor de Justiça, que é um órgão de Estado, é um órgão com características políticas. O Defensor do Contribuinte é um órgão técnico, de autocontrole da administração e que se traduzirá num observatório do fun-

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cionamento do sistema fiscal podendo propor alterações e modificações ao próprio sistema. Estes dois órgãos não têm nada a ver um com o outro.
Efectivamente, com uma total e completa. independência já existe um órgão - o Provedor de Justiça -, mas a independência que aqui atribuímos ao Defensor do Contribuinte é no mesmo sentido em que, por exemplo, o Banco Central Europeu é independente, que a Comissão Europeia é independente ou que a acção da Inspecção-Geral de Finanças, apesar de ser uma inspecção ao serviço do ministério, é independente, e creio que nenhum dos Srs. Deputados até hoje a pôs em causa.
Falaram também em melhorar os serviços, mas, sem dúvida, é o que está a ser feito, só que o Defensor do Contribuinte é o órgão horizontal e não diz respeito a cada um dos serviços em si, não é um órgão da DGCI, não é um órgão da DGITA, não é um órgão das Alfândegas, é um órgão de coordenação horizontal e que, portanto, diz respeito às três direcções-gerais. E, nesse sentido, é independente porque não está subordinado hierarquicamente a nenhum dos directores-gerais, tem total independência em relação a eles. Aliás, as condições que o diploma estabelece, quer no plano das imunidades, quer no plano da nomeação, quer no plano da duração do mandato, quer no plano da não renovação do mandato, quer no plano de se dizer que o Ministro das Finanças não pode alterar nenhum dos actos produzidos pelo Defensor do Contribuinte, fazem com que, de facto, este seja totalmente independente como órgão de controle interno da administração (independente no sentido de autónomo). É um órgão interno, e nesse aspecto não tem autonomia financeira nem administrativa, existindo vários artigos na lei que demonstram isso mesmo.
Em suma, creio que o Defensor do Contribuinte não esvazia funções do Provedor de Justiça, pelo contrário. Aliás, este já disse publicamente que nada tem a opor ao actual estatuto do Defensor do Contribuinte. Em segundo lugar, pode ser um órgão complementar da acção do Provedor de Justiça, deixando para a Provedoria de Justiça as questões mais complexas. De qualquer modo, qualquer dos órgãos emite recomendações ou pareceres, mas não são tribunais - estes sim, são o grande órgão independente na estrutura constitucional portuguesa - a quem os contribuintes podem recorrer, e isso não está de forma nenhuma posto em causa. E é exactamente por isso que não faria sentido, por exemplo, a suspensão da contagem dos prazos ou de juros, porque mesmo quando se recorre para os tribunais isso não acontece.
Na prática, é um órgão que vai além das antigas funções que os auditores do Ministério das Finanças tinham, esses sim totalmente na dependência do Ministério, e, por outro lado, permitirá verificar como funciona o sistema fiscal, que alterações devem ser produzidas não apenas no plano normativo mas no do funcionamento administrativo dos serviços e aí o Provedor de Justiça nunca interfere.
Acresceria, Sr. Deputado Luís Queiró, que esta medida faz parte da reforma fiscal e, como vem enunciada no Acordo de Concertação Estratégica, se o diploma não for ratificado, ficará inviabilizada, mas não por culpa do Governo porque consta de resolução de Conselho de Ministros. Como disse há pouco, tudo isto faz parte de um conjunto de medidas que estão em curso porque a reforma fiscal não é, obviamente, a «tomada do Palácio de Inverno», a reforma fiscal é um processo, é um movimento e não a estação de chegada de uma qualquer linha de caminho de ferro.
Assim, neste sentido, a recusa de ratificação de um diploma deste género em nada vai beneficiar os contribuintes que dificilmente compreenderão essa recusa. Mas a Assembleia da República é soberana.

O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Presidente, é evidente que nesta Casa todos nos devemos tratar com respeito e educação.

Vozes do PS: - Tal e qual!

O Orador: - É sempre assim que tenho procurado agir. O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais desrespeitou-me, bem como, creio, também alguns dos meus colegas. Desrespeitou ainda o Parlamento e o Governo, porque o Sr. Prof. Veiga Simão é Ministro da Defesa Nacional.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O .Sr. Presidente: - Sr. Deputado, como é natural, respeito os seus critérios pessoais de apreciação da gravidade ou não e da natureza respeitosa ou não das afirmações que se fazem, mas, estando a presidir a esta sessão, os critérios de apreciação da Mesa têm de ser os da própria Mesa e não os dos Srs. Deputados.
Pareceu-me que uma referência a uma visão marcelista cabe dentro da vivacidade do diálogo, a qual, aliás, defendo. Pareceu-me também que chamar malcriado a um orador não cabe dentro da vivacidade do diálogo, por isso peço-lhe desculpa por ter tido de fazer a breve apreciação que fiz.
Também para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (António Costa): - Sr. Presidente, a minha interpelação vai no mesmo sentido da que foi feita pelo Sr. Deputado Vieira de Castro, para que não subsista qualquer equívoco sobre esta matéria.
Os membros do Governo intervêm nos debates com a vivacidade própria destes e com o natural respeito institucional que a Assembleia merece. Convém precisar, contudo, que neste caso concreto, conto aliás decorria do contexto da própria intervenção, o Sr. Secretário de Estado estava a discutir uma questão de ciência da Administração, da qual, como sabemos, o Professor Doutor Marcelo Caetano, para além de ter exercido funções políticas, foi um cultor.
Foi neste sentido óbvio, como aliás decorria do contexto da intervenção, que foi referida a visão marcelista, e não tem qualquer carácter ofensivo, nem sequer tratando-se de um debate com alguém que, por razões familiares, também está muito envolvido no culto da ciência da Administração. Não se tratava de uma guerra entre a escola de Lisboa e a escola de Coimbra, portanto, em nenhum dos sentidos deveria ser entendido como ofensivo.

Risos do PSD e do PCP.

O Sr. João Amaral (PCP): - Foi um debate queirosiano!

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O Sr. Presidente: - Não me parece que tenha sido uma verdadeira interpelação à Mesa, portanto, a Mesa não tem de se pronunciar sobre a intervenção do Sr. Ministro.
Também para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, quase desistiria de fazer a interpelação depois das suas palavras e das do Sr. Ministro. Não obstante, gostaria que ficasse claro que considerei completamente desajustada, pelas razões já expostas, a reacção ao que disse o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
Foi também dito aqui, em conversa cruzada, algo que não queria deixar passar. Quero lembrar que o Professor Veiga Simão, personalidade que merece o maior respeito, foi também membro de um governo em que participou o PSD e é uma pessoa que há muitos anos...

Protestos da Deputada do PSD Manuela Ferreira Leite.

Sr.ª Deputada, não disse que estava a falar consigo. Nem sempre que uso da palavra a estou a criticar, muitas vezes não estou, posso também referir-me a outros Deputados.
Gostaria que ficasse claro que houve, de facto, algum excesso neste debate, mas não foi da parte do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Secretário de Estado dos- Assuntos Fiscais, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, independentemente do tom com que entendeu por bem - e entendemos nós por mal - responder às questões suscitadas neste debate, julgo que há uma questão de fundo que reside nesta análise do Decreto-Lei n.º 205/97.
Disse o Sr. Secretário de Estado que o diploma não retira garantias aos cidadãos. Melhor fora que retirasse! Mas o que está por provar é saber que garantias ele acrescenta.
Em relação a esta questão de fundo, que é a de saber para que serve o chamado Defensor do Contribuinte, tal como é preconizado, essa prova ficou por fazer e até que o Sr. Secretário de Estado a consiga fazer aquilo que temos, e aquilo que para Os Verdes esta figura continua a ser, é não uma forma séria de alterar o sistema, de lhe dar maior justiça, maior operacionalidade e maior eficácia, mas, sim, uma forma de propaganda enganadora, dando aos contribuintes «gato por lebre».
Portanto, a prova da utilidade deste diploma terá de ser o Sr. Secretário de Estado a fazê-la, no que toca ao que ele acrescenta, resposta essa que, até agora, ainda não foi dada.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: Sr. Presidente, Sr. Deputada Isabel Castro, o reforço das garantias dos contribuintes faz-se por várias vias, e todas elas estão a ser desenvolvidas pela política fiscal do Governo: pela futura lei geral tributária, pelo reforço da eficácia da administração fiscal - e não me refiro à DGCI mas, sim, a uma visão integrada e orgânica da administração tributária no seu conjunto, englobando a DGITA e as alfândegas -, e pela melhoria da informação e da comodidade dos contribuintes.
É neste aspecto que o Defensor do Contribuinte tem todo o sentido e reforça as garantias dos cidadãos. Antes de mais, porque embora os seus actos se traduzam, em última instância, em funções consultivas, portanto, dá pareceres e recomendações. que vão valer aquilo que valerá a figura que vier a ser escolhida, é a autoridade moral e técnica, é a autoridade de persuasão de um órgão especializado que estará em jogo. como, por exemplo, na Comunidade, os advogados gerais junto do tribunal, Figura que, em termos de filosofia, é semelhante e ninguém põe em causa, hoje em dia, a sua importância.
Neste sentido, melhorará certamente o funcionamento das garantias, sobretudo na óptica da prevenção, ,porque permite detectar, como observatório, quais são os principais problemas decorrentes do funcionamento dos serviços - o que os serviços, por si só, não dão -, visto ter poderes de visita, de livre trânsito, de fiscalização e de requerer os documentos e os processos que lhe importe analisar.
Assim, sem dúvida que as suas recomendações e os seus pareceres serão um ponto muito importante de melhoria do sistema fiscal e das garantias.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Ponham isso na lei!

O Orador: - Mas está lá! Está lá!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Carlos da Silva.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Esta medida de criação de um Defensor do Contribuinte é já, há muito tempo, um ansiado refresco às relações entre o contribuinte e o Estado, que muito inquinadas estiveram no passado.
Os contribuintes que se querem dirigir à administração fiscal deparam, desde logo, com o imenso tempo que demora a obterem uma resposta a uma reclamação graciosa ou a um recurso hierárquico. De facto, a forma como a justiça fiscal foi deixada nos últimos anos por governos anteriores que nada fizeram para alterar a situação criou um estado de quase total descrédito do sistema de justiça fiscal e, dentro dele, do sistema de resolução dos problema por via da reclamação a quem pratica o próprio acto tributário. Na verdade, é frequente que os processos de reclamação graciosa demorem quatro, cinco, seis anos a serem resolvidos.
A criação do Defensor do Contribuinte, que, aliás, já foi bastante debatida em orçamentos do Estado anteriores apresentados por este Governo e nunca mereceu a objecção das bancadas da oposição, figura esta que constava já da Lei Orgânica do Governo, no seu artigo 27.º, e que não mereceu pedido de ratificação por parte de qualquer das bancadas, aparece agora regulamentada em decreto-lei, o que nos parece um natural desenvolvimento do referido artigo 27.º.
Ora, parece-me pelo menos incoerente que. se ninguém atacou o artigo 27.º da Lei Orgânica do Governo e ele foi dado como adquirido na nossa ordem jurídica, se ataque agora e não se concorde com o desenvolvimento da figura que já estava criada.

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O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem! Bem lembrado!

O Orador: - Por outro lado, gostaríamos de referir, em termos substanciais, a criação de um gabinete de contacto directo muito próximo com o contribuinte, que é, no fundo, uma consciência crítica da própria administração fiscal dentro do Ministério das Finanças, com características de independência, quer pela duração do seu mandato, quer pelo regime de incompatibilidades aqui previsto, que permitem, de certa forma, dar maior conforto aos contribuintes e a existência de uma voz tecnicamente autorizada que seja, do ponto de vista moral e da justiça, a favor da equidade do sistema fiscal. Aliás, são essas competências que lhe estão adstritas neste diploma.
Daí que a não criação do Defensor do Contribuinte iria com certeza parecer aos contribuintes portugueses como uma situação bastante bizarra.
E não venha dizer-se que com a criação desta entidade se estará a retirar competências ao Sr. Provedor de Justiça. Bem pelo contrário, a figura do Provedor de Justiça, na nossa opinião, é um alium em relação à figura do Defensor do Contribuinte. O Provedor de Justiça, que continuará com as suas competências nesta área e ao qual o Defensor do Contribuinte se subordinará - pois vem definido neste diploma que o Defensor do Contribuinte terá de respeitar os pareceres emitidos pelo Provedor de Justiça -, tem funções constitucionalmente consagradas, que incluem funções de fiscalização da constitucionalidade das normas, coisa que não é adstrita ao Defensor do Contribuinte. Este, na nossa opinião, actua num plano muito mais prático, muito mais directo na relação com os contribuintes e mais no âmbito do desenvolvimento célere e adequado aos interesses dos cidadãos.
O cidadão que é mal tratado numa repartição de finanças ou se vê envolvido em processos kafkianos de tributação de imposto tem condições, aqui, para uma resolução muito célere do seu problema, através do parecer que o Defensor do Contribuinte poderá emitir, também de forma rápida.
Com certeza que as instâncias políticas do Ministério das Finanças estão também interessadas em saber quais são os problemas que surgem na relação com os contribuintes e em resolvê-los rapidamente. porque todos sabemos que, muitas vezes, os grandes problemas que surgem aos balcões das repartições e ao nível das acções de fiscalização por parte dos órgãos de inspecção tributária nem sequer chegam ao conhecimento dos órgãos políticos do Ministério das Finanças, para que possam ser resolvidos a favor do contribuinte e da justiça.
Se VV. Ex.as se vão agarrar a um problema de eventual afectação das competências do Sr. Provedor de Justiça para reprovarem a criação do Defensor do Contribuinte, penso que estarão a prestar um mau serviço ao desenvolvimento da reforma fiscal e aos cidadãos que têm de pagar os seus impostos todos os dias.
Faço ainda uma mera referência final de carácter genérico. Se VV. Ex.as vão continuar a inviabilizar todos os actos que visam dar moralidade, equidade e celeridade ao sistema fiscal, estaremos muito mal com a reforma fiscal que este Governo quer empreender.

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado João Carlos da Silva.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado não dispõe de tempo, e o PS também não tem para lho conceder.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, o PSD cede todo o seu tempo disponível, que são 2 minutos, ao CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sendo assim, tem a palavra, Sr. Deputado Luís Queiró.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, começo por agradecer a V. Ex.ª e à bancada do PSD, mas não vou usar sequer os 2 minutos.
Sr. Deputado João Carlos da Silva, por favor, não diga, até por uma questão de lógica e racionalidade, que os partidos da oposição, designadamente o meu, não estão preocupados com a defesa dos direitos do contribuinte. O meu partido talvez esteja até mais preocupado, enquanto partido da oposição, do que o Governo, porque não temos a obrigação de arrecadar receitas de toda e qualquer maneira, tendo em vista os critérios de convergência de Maastricht.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Mas tem sentido de Estado!

O Orador:- Muito rapidamente, gostaria de saber como é que o Sr. Deputado comenta o facto, que é inelutável, que está na Lei Orgânica do Ministério das Finanças, da definição do Defensor do Contribuinte e que é definido como um órgão de apoio, cuja missão genérica consiste em coadjuvar o Ministro das Finanças na definição e execução das diversas políticas a prosseguir no âmbito do respectivo Ministério. Isto nada tem a ver calculo eu'- com a defesa dos direitos, liberdades e garantias dos contribuintes perante a administração fiscal. Pelo contrário, esta ambiguidade é que nos leva aqui a rejeitar este diploma. É, de facto, um mau diploma para a defesa dos contribuintes, ao contrário do que o senhor está a dizer.
Diga-me, Sr. Deputado, se não concorda que este decreto-lei, que hoje está aqui a ser sujeito a apreciação parlamentar, não prevê que a recusa das recomendações do Defensor do Contribuinte para a administração fiscal não sejam ao menos fundamentadas. É que nem isso! Nem se obriga a administração fiscal a fundamentar a recusa de uma recomendação do Defensor do Contribuinte relativamente, por exemplo, a uma pretensão de um qualquer contribuinte.
Por outro lado, diz-se no artigo 21.º - e faço-lhe esta pergunta concreta porque pode ter ficado a dúvida relativamente à intervenção do Sr. Secretário de Estado - que, para se obter a suspensão de um qualquer prazo, quando está em causa uma petição ao Defensor do Contribuinte, o contribuinte tem de prestar caução e depois, se decair no processo, terá de pagar os correspondentes juros moratórios e compensatórios. Pergunto: no caso de ele ter atendimento do Defensor do Contribuinte, relativamente à sua pretensão, que, depois, não é acolhida pela administração fiscal, não entende que ele deveria ficar eximido de pagar esses juros compensatórios? Ao menos isso! O contribu-

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inte tem o provimento por parte do Defensor do Contribuinte, depois não tem o acolhimento por parte da administração fiscal, porque ela, de facto, não está vinculada a acolher as pretensões do contribuinte, e ele, que vê premiado o seu esforço junto do Defensor do Contribuinte, ainda vai pagar juros de mora e compensatórios?! Ó Sr. Deputado!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Carlos da Silva.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Sr. Presidente, vou tentar utilizar apenas o tempo de que disponho.
Sr. Deputado Luís Queiró, em relação à preocupação que a oposição tem com a defesa do contribuinte, terei de concordar com as intenções, mas discordo com a prática. Se VV. Ex.ª estão preocupados com a defesa do contribuinte começam logo por reprovar á figura do Defensor do Contribuinte, mas depois veremos o desenvolvimento dessas vossas preocupações em actos legislativos.
No que diz respeito à recusa dos pareceres e recomendações emitidas pelo Defensor do Contribuinte, que deveria estar, pelo menos, fundamentada - e aqui não vou apelar ao marcelismo, mas ao queirosismo, ao ilustre Professor Afonso Queiró, meu professor, que muito respeito e me falava na fundamentação dos actos administrativos -, qualquer membro do Governo é obrigado a fundamentar os seus actos administrativos. E V. Ex.ª sabe, até pela experiência que tem nestas coisas, que não há Ministro ou Secretário de Estado algum que dê um despacho sobre uma folha de papel em branco, dá sempre sobre uma informação dos serviços, que normalmente é acolhida pelo membro do Governo competente, para fundamentar o despacho de «concordo» ou «não concordo».

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Mas quem é que está a falar da fundamentação?!

O Orador: - Portanto, a fundamentação do acto administrativo não está em causa, é sempre, sempre, obrigatória, pelo menos ao abrigo quer do Código do Processo Tributário quer do Código do Procedimento Administrativo, quer da lei geral tributária que aí virá.
Portanto, quanto a essa questão, V. Ex.ª não terá problemas.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Mas quem é que está a falar disso?!

O Orador: - Relativamente à questão dos juros compensatórios, devo dizer que nem no caso das impugnações judiciais ou das reclamações graciosas tal sé passa assim. Mas se o que o faz discordar do Defensor do Contribuinte é este ponto, não temos qualquer problema em discuti-lo. V. Ex.ª apresenta uma proposta de alteração, o diploma baixa à Comissão e, aí, vamos discutir esse problema num plano, digamos, mais «tu cá, tu lá», como costumamos fazer nas comissões, para vermos a que conclusão consensual se chega.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que termine, pois já não dispõe de tempo.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Portanto, Sr. Deputado, relativamente à questão de o Defensor do Contribuinte ajudar a coadjuvar o Ministro das Finanças na definição das políticas do Ministério, trata-se exactamente de uma consciência crítica junto do Sr. Ministro das Finanças, para que ele adopte medidas de carácter legislativo ou administrativo no sentido da defesa do contribuinte, porque, como ele disse, trata-se de uma maior sensibilidade, de uma maior proximidade, aos problemas dos cidadãos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Uma segunda intervenção é-me suscitada pela intervenção do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
Em primeiro lugar, quero manifestar a nossa total discordância com a afirmação que faz, ou que fez, de que o Governo se limitava a si próprio, se autolimitava. Não é verdade! O Governo não se limita, pelo contrário, o Governo pretende, pelo menos objectivamente, ficar mais livre de eventuais actuações do Provedor de Justiça.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A criação desta figura não visa a defesa do contribuinte mas, sim, do Governo contra os contribuintes.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não! Não está a ver bem!

O Orador: - Aliás, convém recordar que há uma diferença entre o nome e a alcunha. O que aqui nos é proposto não é um Defensor do Contribuinte, embora ele seja alcunhado formalmente de Defensor do Contribuinte, mas é uma mera alcunha e não um nome. Isto é um defensor do Governo, puro e simples.
Diz ainda o Sr. Secretário de Estado que - e apresenta isto como, digamos, uma grande razão justificativa para este diploma - o defensor, o alcunhado Defensor do Contribuinte, pode propor alterações ao próprio sistema da administração fiscal.
Sr. Secretário de Estado, então este é um problema de uma auditoria interna, de um auditor interno para a administração fiscal, cuja criação pode ser, digamos, complementada pela colocação à porta de um cacifo para «Deixe a sua sugestão»,...

Risos do PCP e do PSD.

... a fim de, com a análise da auditoria, poder melhorar os seus serviços?!
Aliás, o n.º 1 do artigo 1.º do decreto-lei diz claramente o que é que o Governo pretende objectivamente, em termos de funções, com a criação desta figura: «(...) funcionando como um observatório do desempenho do sistema fiscal e aduaneiro». É um mero observatório do desempenho da administração fiscal e não um Defensor do Contribuinte. Por isso, clarifique-se que não é as duas coisas. É para funcionar - está no decreto-lei - como um observatório do desempenho.

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Mas a questão fundamental que suscitou esta minha segunda intervenção tem a ver com a última frase do Sr. Secretário de Estado, quando diz «o próprio Sr. Provedor de Justiça não se opôs ou não se opõe à criação desta figura». Talvez seja uma questão de interpretação, mas vou ler apenas algumas passagens do parecer do Sr. Provedor de Justiça.
No parecer diz-se: «Por princípio, considera-se desnecessário o surgimento de uma figura cujas competências se encontrem totalmente consumidas nas do âmbito das do Provedor de Justiça». Referindo-se mais directamente a esta figura, diz ainda: «Como perigo adicional da actuação do Provedor de Justiça, temo ainda que a possibilidade de duas entidades poderem formular recomendações de teor diferente, quer em termos de resoluções, quer de meios para os alcançar, origine perplexidades por parte dos órgãos visados, dificultando a tomada de uma decisão. Em termos instrumentais, tenho fundados receios que a existência de um Defensor do Contribuinte sirva para consciente ou inconscientemente desresponsabilizar a administração fiscal, criando-lhes a ilusão de não terem de prestar atenção aos pedidos de aclaração ou recomendações do Provedor de Justiça por possuírem o seu próprio provedor».

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mais, e conclui o Sr. Provedor de Justiça: «Não creio assim que seja útil a criação do Defensor do Contribuinte, já que tal trará mais inconvenientes do que vantagens, quer na perspectiva do cidadão, quer pela eficácia da actuação do Provedor de Justiça». Isto, certamente, não são afirmações de quem não se opõe à criação da figura do Defensor do Contribuinte mas, claramente, de quem está contra, e expressamente o diz, a criação desta figura.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: Peço a. palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito?

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: Para pedir um esclarecimento ao Sr. Deputado Octávio Teixeira, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Governo já não dispõe de tempo, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: Vou ser muito rápido, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sendo assim, tem a palavra.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, gostaria de saber se, de facto, as declarações do Provedor de. Justiça a que o Sr. Deputado se referiu foram efectuadas antes do dia 30 de Junho de 1997, quando ele disse ao Diário Económico não ter objecções ao projecto aprovado no Conselho de Ministros e, portanto, que já reviu as objecções que anteriormente fez, ou se dizem respeito à primeira versão.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, tentarei responder à pergunta que me fez, e penso que o posso fazer com a última frase do Sr. Provedor de Justiça no parecer de apreciação do projecto de decreto-lei sobre o Defensor do Contribuinte.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Do projecto!...

O Orador: - Tive o cuidado de ver, no processo, aquilo que foi aceite e aquilo que não foi, e a leitura que fiz há pouco foi de declarações sobre a concepção global e geral e não sobre questões particulares.
Mas penso poder responder-lhe à questão que agora ire coloca com a parte final do parecer, e repito para que não hajam dúvidas, que diz: «Não creio assim que seja útil a, criação do Defensor do Contribuinte, já que tal trará mais inconvenientes do que vantagens, quer na perspectiva do cidadão, quer pela eficácia da actuação do Provedor de Justiça. Mas, se este projecto vier a ser aprovado, rogo a necessidade de considerarem os defeitos que apontei, bem como a necessidade de melhoramento do texto apresentado». Isto é, se, apesar de tudo isto, os senhores, Governo, resolverem fazer, então façam as alterações. Querem que eu leia as alterações?

Vozes do PS: - Não!

O Orador: - E nem todas foram feitas! Quanto às que o foram, elas são de pormenor e nada têm a ver... Aliás, uma delas, então, era caricata, pois, nesta matéria e neste âmbito, colocava o Provedor de Justiça, ao fim e ao cabo, sujeito às recomendações do Defensor do Contribuinte. Isto é absolutamente caricato e é evidente que teve de ser aceite.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, peço a palavra, para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, se tenho presente o Regimento correctamente, nesta fase das apreciações dos diplomas, de duas uma: ou não é apresentada qualquer proposta de alteração e o diploma permanece em vigor sem qualquer alteração, ou há uma proposta de recusa de ratificação, pura e simplesmente, e o diploma deixará de vigorar na ordem jurídica, se ela for aprovada. Se há propostas de alteração, quaisquer que elas sejam, têm de surgir até ao termo do debate - e foi por esta razão que pedi a palavra para uma interpelação neste momento, pois creio que estamos a chegar ao fim do debate.
Das intervenções das diversas bancadas, à excepção da do PSD, que teve logo uma posição de recusa limitar da existência da figura, pura e simplesmente, fiquei com a ideia de que o Sr. Deputado Octávio Teixeira, se ele não fosse um Defensor do Contribuinte mas um auditor fiscal - agora alcunhado de auditor fiscal - lhe referia menos reservas e o Sr. Deputado Luís Queiró foi mais minucioso na sua apreciação.
Assim, pergunto se os grupos parlamentares do PCP ou do PP apresentaram qualquer proposta de alteração no momento próprio, que é este, o que significaria que o

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diploma baixaria à Comissão e seria devidamente trabalhado na especialidade pela Assembleia da República, introduzindo-se as alterações que esta considerasse adequadas, ou se a única proposta que existe é de eliminar, pura e simplesmente, a figura do Defensor do Contribuinte.
Era esta a pergunta que gostaria de fazer a V. Ex.ª, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Quando o Sr. Ministro pediu a palavra eu ia exactamente dizer que não foi apresentada qualquer proposta de alteração mas apenas uma proposta de resolução no sentido. da cessação da vigência deste diploma, como agora se diz na nova formulação constitucional.
Portanto, teremos de votar esta proposta de resolução na próxima quinta-feira, dia regimental das votações.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito?

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, se me permite, e ainda tenho 1,2 minutos...

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, gostaria apenas de dizer o seguinte ao Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: a figura do auditor é completamente diferente daquilo que se pretende colocar neste decreto-lei. Aliás, a criação de um auditor interno da Administração Pública não depende de decreto-lei, é um problema de orgânica interna, dos serviços, pode ser feito por despacho, por portaria, ou pelo quer que seja. Penso até que nem uma portaria é necessário. Por conseguinte, a questão que o Sr.- Ministro coloca está totalmente enviesada:
Gostaria ainda de referir, muito claramente, que, em relação à posição que assumimos, comecei por ler o seguinte: «A figura do Defensor do Contribuinte, tal como é conformada no Decreto-Lei n.º 205/97, não tem razão de ser.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Tal como...!

O Orador: - Em suma, o PCP considera que a criação do chamado Defensor do Contribuinte é inconveniente e, por isso, indesejável.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, no fundo, para responder a uma interpelação que impropriamente foi feita a V. Ex.ª.

O Sr. Presidente: - Não, não! Não houve qualquer interpelação, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Então, a posição do meu partido relativamente à intervenção que fiz é conhecida. Era apenas isto que queria dizer.

O Sr. Presidente: - Agradeço-lhe muito o ter sido breve, Sr. Deputado. Ainda temos mais um diploma para apreciar e, por isso, tenho de ser muito rigoroso na gestão dos tempos.
Vamos, agora, passar à apreciação parlamentar n.º 41/VII - Decreto-Lei n.º 304/97, de 8 de Novembro, que regulamenta o pagamento de propinas às instituições do ensino (PCP).
Para fazer a sua apresentação, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A correcta análise do diploma que hoje apreciamos não pode fazer-se sem entendermos todo o processo de que ele é apenas um episódio. É o processo da desresponsabilização do Estado no financiamento do ensino superior público.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Não é verdade!

O Orador: - Sucessivamente, foram caindo as máscaras usadas pelo Governo para tentar esconder o seu verdadeiro propósito. A tão prometida proposta global sobre as questões de financiamento e acção social escolar acabou por se traduzir num texto em que a única medida garantida era a aplicação da ,propina; o compromisso de que cobrar propinas não se traduziria numa desresponsabilização do Estado no financiamento do ensino superior público não resistiu à objectividade dos números do último Orçamento do Estado; a promessa de mais e melhor acção social escolar esbarrou com o constante decréscimo do investimento em infra-estruturas nesta área, com que nos brindaram os sucessivos orçamentos socialistas.
O propósito do Governo foi sempre e continua a ser um só: cobrar propinas já e em força!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Olhe que não! Olhe que não!

O Orador: - O PCP sempre lutou, e continuará a lutar, contra esta política de estrangulamento do ensino superior público e de elitização do acesso ao ensino, que compromete o futuro do País.
O Decreto-Lei n.º 304/97, de 8 de Novembro, é mais uma prova de que este Governo quer propinas a todo o custo.
Aparentemente, tratar-se-ia da simples regulamentação das disposições sobre receitas próprias existentes na lei do financiamento. O artigo l.º chega a atribuir, com naturalidade, às instituições de ensino superior a competência para definir os prazos e termos do pagamento de propinas. Mas se atentarmos no artigo 2.º e no seu conteúdo, encontramos, mal disfarçada, a ânsia desenfreada do pagamento de propinas.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Desenfreada?!...

O Sr. José Calçada (PCP): - É o que cá está!

O Orador: - O regime que o Governo quis aplicar através deste artigo 2.º é uma solução tão arrogante quanto incoerente. Arrogante, porque o Governo, num claro desrespeito pela autonomia do ensino superior, impõe procedimentos que devem ser as instituições a decidir. Mais ainda: mascara de supletivo um regime que se destina a ser taxativo. Não há outra maneira de interpretar uma dis-

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posição que, publicada no dia 8 de Novembro de 1997, sábado, impõe um regime. supostamente supletivo, caso as instituições de ensino superior não estabelecessem até 15 de Novembro, isto é, oito dias depois, os prazos e termos de pagamento das propinas.
Só se explica tal procedimento pela má-fé com que o Governo socialista pretendeu, disfarçadamente, impor às instituições os prazos e as condições que desejava.

O Sr. José Calçada (PCP): - Foi óbvio!

O Orador: - Mas esta é também uma solução incoerente, já que o próprio decreto-lei se contradiz a si próprio. De facto, o artigo 2.º, a ser aplicado rigorosamente, esvazia de conteúdo o artigo 1.º.
A verdade é que o Governo nunca pretendeu, com este diploma, dar às instituições de ensino superior a margem de decisão que a sua autonomia exige.
O que aconteceu, na realidade, foi que as instituições que já tomaram as decisões em causa o fizeram, em geral, fora dos prazos draconianos do Ministério da Educação. Resta saber se o Governo vai levar até ao fim a sua afronta à autonomia e impor às instituições que ainda não decidiram ou que o fizeram depois de 15 de Novembro as soluções que inscreveu neste diploma.
Por tudo isto se tornou indispensável suscitar esta apreciação parlamentar. Porque, além de ser fundamental combater esta política educativa e em particular a imposição de propinas aos estudantes do ensino superior público, trata-se aqui também de denunciar o carácter abusivo deste diploma.
A apreciação parlamentar, pedida pelo PCP, do Decreto-Lei n.º 304/97 é uma oportunidade única, que não pode ser desperdiçada, de corrigir mais este atropelo do Governo à autonomia das instituições de ensino superior.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - É por isso que propomos que, independentemente da questão de fundo e da nossa oposição frontal à existência de propinas no ensino superior público e à Lei de Bases do Financiamento aprovada nesta Casa, se respeite a autonomia das instituições de ensino superior, sendo, assim, indispensável que se expurguem da ordem jurídica as normas que a violam.
Não pode esta Assembleia pactuar com a política do respeito pela autonomia apenas quando convém e da sua violação sempre que é necessário fazer cumprir a vontade do Governo.
Não pactuaremos com mais esta «machadada» no ensino superior público, na marcha forçada para a propina.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Candal.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, penso que assistimos aqui a mais uma tentativa do Partido Comunista - esta absolutamente frustrada - de tentar «incendiar as massas», como tem vindo a fazer ou a tentar fazer há alguns tempos á esta parte, desde que o seu Secretário-Geral disse publicamente que, a partir daí, iriam fazer a luta na rua.
Devo dizer que, se não têm sucesso, pelo menos há alguma coerência, porque o Sr. Deputado Bernardino Soares, quando acusa o Governo de má-fé, no fundo; está a fazer a defesa do incumprimento de uma lei que é da autoria da Assembleia da República.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Isso é grave, mas, no entanto, não deixa de ser coerente.
Para terminar - e era esta a questão que gostaria de lhe deixar -, se fosse possível, agradecia que pudesse expor de forma mais detalhada essa nova visão do PCP na defesa da autonomia universitária.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Bernardino Soares, tem mais um pedido de esclarecimento. Quer responder agora ou responde no fim, aos dois pedidos de esclarecimento?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - No fim, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva para pedir esclarecimentos.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, quero dizer-lhe que, de facto, não compreendi a sua intervenção nem o pedido de apreciação parlamentar que faz nesta Casa.
A redacção que o Sr. Deputado propõe ou a autonomia que defende, sem haver um modelo suplementar ou supletivo, como lhe queira chamar, permite aos reitores de algumas universidades que não concordam com a lei, que não concordam com as propinas, não impor propinas aos alunos que frequentam essa universidade.
Ora, não entendo como é que o Partido Comunista aceita que uns paguem e outros não! Não consigo compreender este sentido de justiça do Partido Comunista! Não compreendo como é que o Partido Comunista aceita que os alunos das Universidades de Évora, da Beira Interior, do Algarve ou de onde quer que seja paguem e os de Coimbra não paguem, porque o reitor não concorda com a lei.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - É que uns são mais iguais do que outros!

O Orador: - Sr. Deputado, em que país é que vivemos?! Em que país é que o senhor quer viver?! Se a lei não previsse supletivamente a estipulação de prazos, era nisto que nos íamos meter!
Compreendo as razões, Sr. Deputado. Dava imenso jeito mais um comboio de Coimbra, mais umas camionetas do Porto, etc., etc., uma convulsão à volta desta questão. Mas já chega, Sr. Deputado! Já chega! Isso não interessa aos estudantes, não interessa às universidades, não interessa ao País. Portanto, vamos ser sérios nesta matéria. Objectivamente, este pedido de apreciação é manifestamente infeliz, Sr. Deputado.

O Sr. Presidente: - Para responder aos dois pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Correia da Silva, confesso que estou es-

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pantado com a sua posição, porque foi ao PP que ouvimos aqui, nos debates acerca do financiamento do ensino superior, a defesa de uma posição no sentido de que devia ser dada ainda mais autonomia às escolas e a faculdade de cada escola do ensino superior poder determinar, ela própria, aquela que devia ser a propina a pagar em cada curso e em cada escola.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Entre limites! Entre limites!

O Orador: - Ora, este excepcional respeito, como, na altura, foi anunciado, pela autonomia das instituições do ensino superior desaparece quando se trata de contestar, que é o que fazemos aqui, um decreto-lei que impõe um suposto prazo supletivo de uma semana, que acaba por ter intenções muito mais taxativas do que meramente supletivas.
Essa é que é a questão de fundo. Evidentemente que temos posições contrárias em relação ao pagamento ou não pagamento de propinas, mas não se trata aqui de dizer princípio de que partiram tanto o Sr. Deputado Afonso Candal como o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva que os reitores e as universidades não vão cumprir alei. E que nós não partimos do princípio, ao contrário do que os senhores fazem, de que os reitores das universidades são pessoas que se vão excluir do cumprimento da lei. Não o fazemos! Quem o fez foi o vosso Governo, o Governo do PS, quando publicou um decreto-lei que, receando que os reitores das universidades e as universidades pudessem vir a pôr em causa uma lei da República, impôs determinados prazos para que, mesmo assim, essa lei fosse cumprida rapidamente e em força.
Independentemente desta questão de fundo, se somos a favor ou contra as propinas, o que tenho a dizer agora ao Sr. Deputado Afonso Candal é o seguinte: amanhã, o PCP pode continuar a defender um ensino superior público de qualidade e a contestar a imposição de propinas no ensino público e o PS e a JS continuarem a defender a progressiva elitização do ensino, o mais difícil acesso dos estudantes com mais dificuldades sócio-económicas ao ensino superior. Podemos, amanhã, continuar nestas posições, mas o que não podemos é pactuar com este desrespeito pela autonomia universitária e isso pode ser resolvido hoje, aqui.
Na verdade, não tem outro nome se não desrespeito pela autonomia universitária o facto de, num prazo de oito dias, o Governo pretender que se fixem prazos e termos para o pagamento de propinas, sob pena de se aplicar um regime supletivo, quando se sabe que os órgãos estatutariamente competentes para o fazer, na maioria das instituições, têm prazos para convocação de reuniões, têm prazos para reflexão, têm prazos para decidir todas estas questões e não podem ser condicionados por este frenesim «propinante» do Governo do PS.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendes.

A Sr.ª Ana Catarina Mendes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sendo esta a primeira vez que uso da palavra nesta Assembleia, gostaria, em primeiro lugar, de saudar o seu Presidente, Dr. Almeida Santos, e todos os Deputados desta Casa.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr.ª Deputada.

A Oradora: - O Grupo Parlamentar do PCP apresentou um requerimento solicitando a apreciação pela Assembleia da República do Decreto-Lei n.º 304/97.
A questão levantada pelo PCP, neste pedido de apreciação parlamentar n.º 41/VII, é uma falsa questão. Se não, vejamos.
A leitura, bem feita, do Decreto-Lei n.º 304/97 deixa clara a intenção do Governo de não se desresponsabilizar da sua tarefa, como que já assistimos no passado. Quer isto dizer que não basta aprovar nesta Assembleia uma lei, há que executa-la e o Ministério da Educação não pode, de forma alguma, alhear-se das dificuldades que a comunidade educativa sente no dia-a-dia.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Foi com esta preocupação que o Governo decidiu regular uma matéria que suscitou dúvidas às diversas instituições do ensino superior. Será isto, Sr. Deputado Bernardino Soares, ir contra a autonomia das Universidades?

Vozes do PS: - Não!...

Vozes do PCP: - É, sim!

A Oradora: - Não me parece, nem é este o entendimento da bancada do Partido Socialista.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Mais acrescento: leia-se atentamente a epígrafe do artigo 2.º do diploma já referido. O que está em causa é um regime supletivo, e não taxativo, como o Sr. Deputado enunciou, para o ano lectivo 1997/1998, face às dúvidas sentidas pelas próprias instituições. Ora, um regime supletivo, por definição, é para ser aplicado quando, por qualquer razão, subsistam dúvidas na aplicação da lei.
Chamo-lhe ainda a atenção para o artigo 1.º do mesmo diploma, que diz o seguinte: «(...) propinas em cada estabelecimento do ensino superior são fixadas pelo órgão legal e estatutariamente competente». Será isto, Sr. Deputado, desrespeito pela autonomia universitária

Vozes do PS: - Não!

Vozes do PCP: - É, sim, senhora!

A Oradora: - Quando os estabelecimentos de ensino têm dúvidas, terão de ter uma linha orientadora. É neste sentido, Sr. Deputado, que surge o artigo 2.º. E - atenção -, ele é, como fica bem claro, para o ano lectivo 1997/1998!
Quando se exige responsabilidade do Estado e dos cidadãos, não se podem tratar matérias como esta do pagamento de propinas da maneira pouco rigorosa com que os Srs. Deputados do PCP estão aqui a trata-la.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - A responsabilização do Estado passa pelo acompanhamento das dúvidas suscitadas pelos diversos intervenientes no processo educativo. Foi este o sentimento do Governo ao emitir - e muito bem! - este diploma.

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A seriedade necessária ao tratamento deste assunto impõe uma leitura correcta do que está em causa, daquilo que o PCP pretende aqui contestar - o artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 304/97. Uma leitura atenta, séria e responsável não permite ignorar a natureza supletiva do regime proposto.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Não há, como é notório, qualquer violação ou desrespeito pela autonomia das universidades. De salientar que os próprios estabelecimentos de ensino, na sua maioria, definiram prazos e termos de pagamento da propina.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Mas, face às dúvidas que se suscitavam, o Governo limitou-se - e bem! - a assumir as suas responsabilidades.
Os Srs. Deputados chamarão a estas medidas autoritarismo,...

O Sr. José Calçada (PCP): - Sem dúvida!

A Oradora: -... desrespeito ou, antes, cooperação entre o Estado e as instituições de ensino superior?

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Srs. Deputados, não escamoteemos a verdade! E a verdade é esta: ao levantarem aqui esta questão, mais não pretendem do que protelar o cumprimento da lei que já está em vigor.
Com este decreto-lei, o Governo visa criar as condições necessárias ao cumprimento rigoroso desta lei; com este decreto-lei, o Governo demonstrou que o Ministério da Educação esteve, e está, atento e respondeu, inequivocamente, às dúvidas sobre a competência das instituições, no que concerne a prazos e termos de pagamento das propinas;...

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - ... com este decreto-lei, o Governo não violou, nem viola, a autonomia das universidades, antes entendeu e entende a necessidade de um regime supletivo para os casos onde não se sabia como conduzir este processo.
Não vejamos fantasmas onde eles não existem! Sejamos justos nas nossas apreciações!

Aplausos do PS.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente João Amaral.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, uma primeira palavra pára registar e sublinhar a coerência do PCP.
O PCP, sempre que abre o Diário da República e vê a palavra propinas, dá-lhe um impulso processual ou legislativo e, neste caso, foi um impulso que o levou a pedir a apreciação parlamentar deste decreto-lei. Isto não é novo, mas merece uma nota positiva pela coerência. O PCP prossegue uma luta, que sempre conduziu.
Mas permitam-me que vos diga. Srs. Deputados do. PCP, que prosseguem uma causa injusta. E, sob esse ponto de vista, não terão naturalmente a solidariedade do PSD.
O PSD é a favor de propinas; considera que elas fazem sentido no quadro do financiamento do ensino superior; entende, ao contrário do Partido Socialista, que as propinas não podem ser desligadas de uma análise daquilo que são as capacidades sócio-económicas das famílias e, por isso, sempre foi contra esta ideia, que lhe foi apresentada pelo Governo do PS, da propina de valor único...

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Olha, olha! Quem é que votou a lei?!

O Orador: - ...e a favor das propinas escalonadas, no sentido de que quem pode mais paga mais e quem pode menos paga menos. Porém, a clarificação deste aspecto já implicava entrar na discussão das propinas e o que interessa agora, na perspectiva do PCP, é revogar um decreto-lei, que,, na opinião do Governo, foi necessário para ajudar a consolidar a ideia de que as propinas devem ser pagas. E, sob esse ponto de vista, Sr. Deputado Bernardino Soares, não restam dúvidas a quem quer que seja: o PSD não concorda com a iniciativa do PCP.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - Porém, em abono da verdade, a iniciativa de VV. Ex.as foi útil, porque deu oportunidade ao Governo de vir aqui, à Assembleia, explicar os atrasos na regulamentação da lei do financiamento.
É que este Governo, umas vezes, enreda-se no diálogo e atrasa-se, outras vezes, não dialoga e, mesmo assim, atrasa-se, mas o que é verdade é que já está em incumprimento face à lei que aprovámos.
A Lei de Bases do Financiamento do Ensino Superior Público, como todos sabemos, é de 16 de Setembro, e, por proposta do Governo - sublinho, por proposta do Governo -, a Assembleia da República fixou, para alguns dos seus artigos, o prazo de regulamentação de três meses, de 90 dias. Foi um prazo que o Governo pediu, foi um prazo que a Assembleia fixou sob proposta do Governo. E não só é condenável, sob o ponto de vista do relacionamento entre as instituições, que o Governo não cumpra a lei e os prazos que a lei fixa, como é duplamente condenável, sob o ponto de vista político, que o Governo não seja capaz de cumprir os prazos que a si próprio impôs ou que ele próprio propôs ao Parlamento.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Assim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, se é verdade que saiu este decreto-lei, um decreto-lei que o Governo considerou necessário para fazer aplicar a lei das propinas - e, sob esse ponto de vista, honra seja feita ao Governo, que cumpriu a palavra que deu ao Parlamento quando o Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior, a nosso pedido, veio à Comissão de Educação, Ciência e Cultura, em Junho do ano passado, solicitar um esforço ao Parlamento no sentido de a lei ser aprovada até Julho, porque ela era para cumprir no início deste ano lectivo - também é verdade que das vastas áreas que já deviam estar regulamentadas, só este decreto-lei, publicado pelo.

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Governo, e o despacho de 31 de Outubro de 1997, que regulamenta os artigos 19.º e 20.º, é que saíram.
O artigo 8.º - Contratos de desenvolvimento - já devia estar regulamentado e não está; quanto ao artigo 9.º - Contratos-programa -, não está regulamentado e já caducou o prazo para a sua regulamentação; também não estão regulamentados os artigos 23.º, 25.º, 27.º e 31.º, não estando nomeada a comissão aí prevista; não está elaborado o decreto-lei previsto no artigo 33.º, ou seja, não está fixado o conceito de estudante elegível aplicável aos trabalhadores-estudantes; não está cumprido o disposto no artigo 34.º, ou seja, a extensão gradual aos estudantes do ensino superior particular do disposto em relação à Acção Social Escolar; não está regulamentado o disposto no artigo 35.º, sobre mecenato educativo.

Vozes do PSD: - Isso é muito atraso!

O Orador: - Ou seja, a maior parte das disposições da lei não estão ainda regulamentadas e grande parte delas já o deveria estar.
Portanto, Sr. Secretário de Estado, o Governo seguramente não tinha dúvidas sobre isso, mas gostaria de dizer que as intenções do PCP não colhem nesta bancada qualquer apoio.
Já quanto à utilidade da iniciativa do PCP, julgo que é clara para todos nós: trouxe à presença do Parlamento e, portanto, do País, o Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior, que tem uma oportunidade de ouro - que, espero, não desperdice - para nos dizer como é que o Governo do Partido Socialista explica os atrasos condenáveis na regulamentação da Lei de Bases do Financiamento do Ensino Superior Público e o ultrapassar de prazos que o Governo propôs e constam de lei da República.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Muito brevemente, gostaria de fazer algumas considerações, em nome do Partido Ecologista Os Verdes, sobre esta apreciação parlamentar, agora em discussão, do Decreto-Lei n.º 304/97, de 8 de Novembro.
Começo por referir que, com este decreto-lei, na nossa perspectiva, ó Governo dá mais um contributo para a violação clara do princípio da igualdade de acesso ao ensino superior. Este é um primeiro princípio que gostaria de focar.
Além disso, na sequência daquilo que referiu o Sr. Deputado Carlos Coelho, gostaria de dizer que este decreto-lei contribuiu também para clarificar que a Lei de Bases do Financiamento do Ensino Superior Público não passou de uma forma de apresentação de uma lei das propinas. É preciso que isto «fique claro como água»: a Lei de Bases do Financiamento do Ensino Superior Público foi claramente uma lei das propinas. Aliás, a pressa do Governo foi em regulamentar as propinas, como bem referiu o Sr. Deputado Carlos Coelho, chamando a atenção para uma série de atrasos na regulamentação, esquecendo-se de tudo o resto.
Quanto à qualidade e à Acção Social Escolar, isso foram meras questões secundárias para aditar à questão das propinas, que, na perspectiva do Governo, era a fundamental. Em nossa opinião, esta política do Governo relativamente ao ensino superior é, obviamente, criticável. O Governo teve pressa nas propinas mas não a tem noutras questões fundamentais.
Aliás, basta dar uma olhadela num exemplo flagrante e caricato que é o facto de muitas bolsas, hoje, servirem para auxiliar os estudantes a pagarem as propinas. Isto é tão caricato que a bolsa de estudo deixa de ter a sua função fundamental e passa a ter a que o Governo lhe quis atribuir, que é a ajuda no pagamento das propinas, num sistema que, como afirmou o Sr. Deputado Bernardino Soares - e gostaria de realça-lo -, vai no sentido da elitização do ensino superior!...

Protestos do Deputado do PS Afonso Candal.

Peço desculpa. Sr. Deputado Afonso. Candal, mas é claríssimo como água que isto vai no sentido da elitização do ensino superior. Um sistema injusto, que só serve, Sr. Deputado, para excluir ou dificultar o acesso ao ensino superior e para agravar os gastos que os estudantes e as famílias hoje têm com ele. Deixe-me lembrar-lhe, mais uma vez, alguns deles, que o Sr. Deputado esquece sempre: material, transportes e alimentação. Faça bem as contas e veja bem quanto é que dá. por aluno, ao fim de um ano lectivo e, depois, acrescente-lhe ainda o valor das propinas. Se calhar, para si, não vale a pena, porque não é difícil pagar, mas para a maioria dos estudantes e das famílias será com certeza.
Quero terminar, referindo que o Partido Socialista e o Governo não querem obviamente atender á este facto, mas o movimento contra esta política educativa do Governo está a crescer com o sucessivo gorar de expectativas aos estudantes. E isto fica bem evidente se olharmos à tomada de posição das diversas associações académicas.
Penso que é tempo de o Ministério da Educação não se alhear desta realidade e de prosseguir uma política educativa na linha daquilo que prometeu há dois anos atrás e definitivamente esqueceu.

Vozes de Os Verdes e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Candal.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Sr. Presidente, é só para agradecer o pedido de desculpa da Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia. De facto, bem precisa de pedir desculpa, porque aquilo que diz é absolutamente incompreensível.
A Sr.ª Deputada bem sabe que o actual sistema é profundamente discriminatório, do ponto de vista económico e cultural, e os que ficam pelo caminho são os grandes prejudicados, porque nunca conseguem usufruir da gratuitidade. Ou seja, os problemas colocam-se muito atrás do ponto em que está a colocar a questão: são inúmeros alunos que são empurrados precocemente para o mercado de trabalho e que, depois, com os seus impostos, vão financiar a gratuitidade dos outros.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Esse é que é o problema!
Agora, pretende-se criar alguma justiça no sistema e investir fortemente em toda a educação, mas em áreas que, até agora, têm estado sem protecção, como as do pré-escolar e do ensino obrigatório. Veja ás taxas de abandono no ensino obrigatório! É importante haver investimento aí!

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Porém, os Srs. Deputados do PCP, com aquele acréscimo que é o Partido Ecologista Os Verdes, só se debruçam sobre esta questão pontual. «Vejam a floresta, não olhem apenas para a árvore», porque a gratuitidade do ensino superior público, em Portugal, não favorece quem dela necessita. Esta é que a realidade.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Afonso Candal, o Sr. Deputado «pôs o dedo na ferida». Esse é o verdadeiro problema.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - Muito bem, mas olhe que vai doer!

Risos do CDS-PP.

É que a «ferida ainda está aberta», Sr. Deputado! E sabe porquê? Porque, efectivamente, há discriminação, quando todos os portugueses pagam por igual os impostos, mas, depois - e era isto que gostava que o Sr. Deputado explicasse a. esta Câmara -, o Governo dá 400 contos por cada aluno de Economia da Universidade Nova, só dá 300 contos a um aluno de Economia do Instituto Superior de Economia e Gestão e só dá 250 contos a um aluno da Faculdade de Economia de Coimbra! Porquê, Sr. Deputado?! A propina é única, todos pagam o mesmo, mas o Governo, depois, dá, por aluno, valores diferentes a cada instituição?! Que justiça é esta, se, afinal, todos pagam os mesmos impostos, Sr. Deputado?
De facto, o senhor tem razão. Esse é o verdadeiro problema, mas essa «ferida ainda está aberta». Tentámos resolvê-lo mas os senhores não quiseram. Por isso, Sr. Deputado, ao abrir a ferida, seguramente vai sentir a dor.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Candal.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Correia da Silva, agradeço-lhe a oportunidade que me dá para explicar-lhe tão complexa matéria. Vou fazer um esforço, em termos de simplicidade dos raciocínios.
O Sr. Deputado compreenderá que há cursos com custos diferentes e que, portanto, as responsabilidades do Estado são diferentes para com essas instituições,...

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Os cursos são iguais!

O Orador: - ...havendo estabelecimentos de ensino com cursos que têm custos diferentes dos de outros estabelecimentos com cursos iguais devido à quantidade de pessoal que têm, às instalações, antigas ou novas, que têm, etc. Se me sobrar tempo, poderei pormenorizar mais esta questão, se não tiver ficado bem esclarecida.
Em relação ao pagamento de propina idêntica, parece-me óbvio que assim seja, sob pena de haver uma discriminação, aí, sim, grave. É que, como toda a gente sabe, há escalões nas bolsas, em termos de acção social escolar, escalões esses que, pela primeira vez, estão bastante clarificados e completos. No entanto, do ponto de vista do estudante, o serviço prestado pelas universidades é idêntico para todos. Isto é, não pode haver cursos mais, caros e outros mais baratos. Ora, as universidades financiam-se através da propina em maior ou menor volume e essa é exclusivamente uma responsabilidade. do Estado.
Mais uma vez, fica provado que este Governo não se desresponsabiliza do financiamento do ensino superior público. Essa sua tese é que é exactamente a inversa! Aliás, compreendo-o. Se calhar, na sua perspectiva, o Estado não deveria corresponder aos custos dos cursos do ensino superior público, deveria era fazê-lo em relação aos cursos de outro tipo de ensino, mas isso são filosofias distintas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sr. Deputado Afonso Candal, relativamente à sua infeliz expressão quanto ao «acréscimo» de Os Verdes, e para utilizar uma expressão também utilizada por si próprio, a qual vai no sentido da mesma atitude cultural que era tão comum no tempo do Partido Social Democrata, devo dizer que o Sr. Deputado tem a arrogância própria de quem convive mal em democracia. Já começa a ser uma atitude típica demais por parte do Partido Socialista, que só convive bem com as maiorias, não respeitando a pluralidade, nem uma vivência democrática.

Protestos do PS.

Portanto, lamento que o Sr. Deputado tenha aprendido com o Partido Social Democrata!
Quanto à questão concreta das propinas, devo dizer que, definitivamente, cada vez que o Partido Socialista intervém em defesa das propinas e até do princípio da existência destas, não se consegue entender para que servem as propinas. Diziam que não era por causa da justiça, agora já é! Diziam que não era para a melhoria da acção social
Enfim, Sr. Deputado, entendam-se de o princípio de existência das propinas é para tornar mais elitista o ensino escolar, agora já é! uma vez por todas: é para quê? De facto, superior público.
Não vale a pena o Sr. Deputado protestar porque as propinas são exactamente para esse fim e a sua intervenção deixou isto «claro como a água»!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior.

O Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior (Jorge Silva): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, devo dizer que o diploma que está em apreciação não é o relativo ao financiamento mas, sim, o Decreto-Lei n.º 304/97, o qual visou, simplesmente, dar cumprimento a um dispositivo da Lei de Bases do Financiamento do Ensino Superior Público, o da cobrança das propinas. Falemos, pois, claro e não vale a pena estar com meias palavras.

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O que irrita o PCP é, precisamente, o facto de estarmos determinados a cumprir aquela que é uma lei da Assembleia da República!

Protestos do PCP.

Esse diploma esclarece dúvidas que subsistiam quanto à competência de as instituições fazerem a regulamentação dos prazos e dos modos de pagamento das propinas.
É que os Srs. Deputados do PCP, quando falam em autonomia, não podem esquecer-se de que as instituições de ensino superior não têm todas o mesmo grau de autonomia. Os senhores estão a pensar nas universidades mas temos instituições politécnicas cujo grau de autonomia é menor, temos instituições de dupla tutela e temos outras em regime de instalação cujos órgãos de gestão dependem de uma nomeação directa do Governo. Portanto, era essencial o esclarecimento das dúvidas quanto ao processo e ao prazo de pagamento das propinas. E foi isso que foi feito!

O Sr. José Calçada (PCP): - «Sacar a massa»!

O Orador: - Quanto ao argumento do carácter supletivo ou não dó regime previsto no artigo 2.º deste diploma, está demonstrado à saciedade que é um regime verdadeiramente supletivo, tanto que, até hoje, esse dispositivo ainda não foi utilizado porque a esmagadora maioria das instituições estabeleceu o prazo de pagamento das propinas...

O Sr. José Calçada (PCP): - Fora do prazo!

O Orador: - Não! Dentro do prazo!
VV. Ex.as falam em oito dias mas isso é perfeitamente falacioso. A Lei de Bases do Financiamento do Ensino Superior Público foi aprovada em Setembro e, até Novembro, as instituições atentas marcaram o prazo de pagamento das propinas. Portanto, tratava-se apenas de uma medida cautelar destinada às instituições que, por qualquer dificuldade, não estivessem em condições de marcar o prazo e, então, o Governo substituía-se-lhes. É que a autonomia das instituições não serve para justificar o exercício do incumprimento da legalidade.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quanto às restantes questões que foram colocadas, fora do quadro da matéria que está em discussão - e o objectivo do PCP foi precisamente o de reintroduzir, nesta sede, uma discussão da Lei de Bases do Financiamento do Ensino Superior Público -, gostaria de dizer-vos algumas coisas.
Em primeiro lugar, não é verdade que tenha havido desresponsabilização do Estado quanto ao' financiamento. O Governo aprovou este ano uma disponibilização de verbas para o ensino superior que aumenta 11,9% no que diz respeito ao funcionamento...

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - E quantos alunos há a mais?

O Orador: - ... e aumenta 24,05% relativamente à acção social escolar, verificando-se um aumento de 90% nas bolsas.
Se fizermos uma média das variações anuais per capita dos gastos .do Estado como ensino superior público, desde 1990 até 1998, verificaremos que aqueles têm um crescimento positivo de 0,45% crescendo 3,09% em 1996, 1997 e 1998, ou seja, nos anos do Governo socialista.
Relativamente à acção social escolar, as variações anuais de gastos per capita, deflacionados a 1990, têm um crescimento positivo de 2,9%, desde 1990 até 1998, sendo que, nos governos apoiados pelo Partido Socialista, desde 1996 até 1998, têm um crescimento de 7,68%, tendo aumento 15,1% este ano.
Portanto, peço desculpa por desmentir os Srs. Deputados mas não há qualquer desresponsabilização do Estado no Financiamento do ensino superior.
Já agora, se me permitem, vou recorrer a um despacho da Lusa em que noticia o que diz ó Sr. Presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas: «(...) Posso provar que não é verdade que a Lei de Bases do Financiamento do Ensino Superior Público se tenha traduzido na desresponsabilização financeira do Estado para com as instituições. O dinheiro adicional que será recebido nas propinas corresponde à possibilidade de as universidades introduzirem melhorias reais na qualidade do ensino. É um acréscimo da melhoria do sistema (...)».
Do ponto de vista da acção social escolar, há, também, «uma melhoria sem paralelo», acentuou ainda o Presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas. «(...)Os encargos com bolsas, em 1998, são quase o dobro do ano passado, correspondendo a um aumento de mais de 90% (...)» - recordo que estou a citar o despacho da Lusa.
Do ponto de vista da acção social escolar, mesmo retirando a componente cie propina aos estudantes bolseiros, há um aumento de 60% nas bolsas.
Disseram que a única medida que o Governo implementou foi o pagamento das propinas...

O Sr. José Calçada (PCP): - Isso é verdade!

O Orador: - Não é verdade! A primeira regulamentação da Lei de Bases do Financiamento do Ensino Superior Público foi relativa à extensão das bolsas para os estudantes carenciados do ensino particular e cooperativo. Fizemos isto primeiro do que a publicação de qualquer diploma que impusesse qualquer prazo de pagamento de propinas.
Falou-se também no «estrangulamento» do ensino superior...

O Sr. José Calçada (PCP): - Com aquela capitação que todos conhecemos!

O Orador: - Ora, este ano, o Governo aumentou em 10% as vagas para o ensino superior público e tinha-as aumentado 8,4% no ano passado. Portanto, não me parece que daqui possa retirar-se a ideia de que o Estado está a «estrangular» o ensino superior público até em termos de crescimento.
Quanto à autonomia das universidades, matéria que também foi referida, peço desculpa, mas terei de dizer que este Governo fez aprovar, há pouco tempo, um decreto-lei sobre a flexibilização da gestão dás universidades, em termos de gestão de pessoal, de gestão financeira e de gestão patrimonial, diploma esse que foi considerado pelos universitários o mais importante nesta matéria desde a aprovação da lei de autonomia das instituições.

O Sr. José Calçada (PCP): - Importante não quer dizer bom!

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O Orador: - Portanto, a questão que aqui nos traz prende-se com o Decreto-Lei n.º 304/97 e trata-se apenas de uma regulamentação em matéria de cobrança de propinas que era necessário fazer pela circunstância de poder acontecer que uma ou outra universidade, por dificuldades internas, não tivesse capacidade de exercer a sua competência autonômica no sentido de estabelecer este prazo de pagamento. Ora, como o Governo está muito determinado no que toca ao cumprimento da lei de Bases do Financiamento do Ensino Superior Público, teve de substituir-se-lhes nesta matéria.

Aplausos do PS.

Protestos do PCP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedirem esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Bernardino Soares e Nuno Correia da Silva.
Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, quero dar um esclarecimento à Câmara, em especial após as intervenções da Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendes e do Sr. Secretário de Estado.
O que suscitou dúvidas em relação à aplicação foi a norma da lei de bases do financiamento que estipulava que seriam reguladas por decreto-lei as normas para arrecadar receitas próprias, como era o caso das instituições de ensino superior, e era esse decreto-lei que faltava. Ora, compreender-se-ia que esta matéria fosse regulada se o decreto-lei que o Governo fez acabasse no artigo 1.º, mas não.
Assim, queria que o Sr. Secretário de Estado explicasse o que é que acontece às instituições de ensino superior que decidiram o que decidiram depois do prazo do dia 15 de Novembro imposto pelo Governo. Se não havia grande preocupação por parte do Governo em relação ao facto de poder haver dificuldades neste processo, pergunto por que é que se estabelece um prazo de oito dias para que estas medidas sejam aplicadas.
Verifico que o Sr. Secretário de Estado está a dizer que não é assim, mas o decreto-lei foi publicado no dia 8 de Novembro e o prazo que vem estabelecido no seu artigo 2.º termina no dia 15 de Novembro. São, pois, oito dias!
É verdade que temos uma divergência fundamental em relação à questão das propinas, mas não é só disso que se trata. Trata-se também da maneira como esta regulamentação foi feita em relação às instituições do ensino superior. E nisso até o Sr. Deputado Carlos Coelho e o próprio PSD deviam acompanhar-nos, independentemente da posição que tenham em relação às propinas. Até os Srs. Deputados do PSD e o «acréscimo» do Partido Socialista...

Risos.

... podiam e deviam contestar esta ingerência, este método pouco correcto de impor às instituições do ensino superior prazos para cumprirem o que deve ser da sua competência própria.
Termino dizendo ao Sr. Secretário de Estado - e dou-lhe esta sugestão «de borla» - que, provavelmente, este decreto-lei poderia ser adaptado para aplicar-se ao próprio Governo, dando-lhe o tal prazo de oito dias para regulamentar o que, na lei do financiamento, é favorável aos estudantes e que ainda falta regulamentar.

O Sr. José Calçada (PCP): - Ainda dizem que não damos sugestões úteis!

Risos gerais.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva, pois o Sr. Secretário de Estado responderá em conjunto aos dois pedidos de esclarecimentos.
Faça favor.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, não foi o Partido Comunista que provocou o debate sobre o financiamento do ensino superior.
Tenho de lembrar-lhe que quando o Ministro apresentou a proposta de lei a esta Câmara fez questão de dizer que não era a lei das propinas. Porquê? Porque assentava em três sectores: Estado-instituições, instituições-alunos e Estado-alunos. Portanto, temos de ter uma visão global da lei e tem de haver uma aplicação global da mesma.
Obviamente, é estranho que o Estado, ou o Governo, tenha pressa em regulamentar o pagamento de propinas e menos pressa - isto é, ande mais devagar, se calhar mesmo devagarinho, quase parado!... - em elaborar os regulamentos que atribuem direitos aos estudantes e às instituições, como é caso dos contratos-programa e dos contratos de desenvolvimento.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - É estranho, muito estranho, Sr. Secretário de Estado, porque o compromisso do Sr. Ministro da Educação era o de que a lei seria aplicada integralmente e não por partes, por etapas, nem, seguramente, começando por receber antes de dar!
Portanto, conforme foi aqui afirmado, nesta Câmara, pelo Sr. Ministro da Educação, se o objectivo era aumentar a qualidade do ensino, pergunto quais os instrumentos que, neste momento, por via da regulamentação, foram desencadeados para, efectivamente, aumentar essa qualidade de ensino, nomeadamente os contratos-programa. Esta, sim, é a questão fundamental, e não foi o Partido Comunista que a provocou! Foram os senhores que fizeram questão de dizer que esta era uma lei com uma dimensão horizontal, que atravessava todos os níveis do ensino e todas as relações que decorrem entre Estado-instituições e instituições-alunos.
Sr. Secretário de Estado, esta é, portanto, a questão que ainda não obteve resposta.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior.

O Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior: - Sr. Presidente, relativamente às questões colocadas pelo Sr. Deputado Bernardino Soares, gostaria de dizer que não tenho conhecimento de instituições que tenham tomado a decisão de exigir o pagamento de propinas depois de 15 de Novembro.

Vozes do PCP: - Nós damos essa informação!

O Orador: - Façam favor de nos referir quais são, para tomarmos conhecimento dessas situações!

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Vozes do PCP: - Hoje e agora!

O Orador: - Volto a repetir que não tenho qualquer conhecimento de nenhuma instituição que tenha marcado os prazos e as formas de pagamento das propinas depois desse prazo. Aliás, grande parte das instituições fizeram-no antes, até, da publicação do próprio decreto-lei. Refiro-me às instituições que tinham a consciência plena de que o cumprimento da lei era para ser assegurado.
Quanto ao prazo de 8 dias, gostaria de dizer que a maior parte das instituições não beneficiaram desses 8 dias, mas, sim, de um prazo de dois meses, porque, após a publicação da Lei do Financiamento do Ensino Superior, actuaram em conformidade. Aquelas que se atrasaram é que, se calhar, ficaram constrangidas com os 8 dias!

Vozes do PS: - Exactamente!

O Orador: - Sr. Deputado Nuno Correia da Silva, a Lei do Financiamento do Ensino Superior é para aplicar integralmente.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Quando?

O Orador: - Na sua intervenção, o Sr. Deputado referiu que primeiro recebemos e só depois damos. Só que é o contrário; porque a primeira regulamentação que elaborámos da Lei do Financiamento do Ensino Superior tinha por objecto as bolsas dos alunos carenciados, tanto do ensino público como dos ensinos particular e cooperativo. Essa regulamentação, aparece como a primeira acção do Governo relativamente à lei do financiamento.
Todas as outras questões da Lei do Financiamento do Ensino Superior que merecem regulamentação estão em fase de ultimação, nomeadamente as relativas aos contratos-programa e ao Fundo de Apoio ao Estudante, que já se encontram em fase de audição do CNASE.
Portanto, o processo está a decorrer e a lei é para se cumprir integralmente. Esse é um compromisso que aqui deixo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Por último, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Do debate que aqui travámos, é claro, pela intervenção dos Deputados da generalidade das bancadas, com a natural excepção da bancada do partido proponente e de Os Verdes, que o Parlamento não nega ao Governo os instrumentos jurídicos que este considera essenciais para que as propinas sejam cobradas. Tal significa que o impulso processual da apreciação parlamentar desencadeada pelo PCP, bem como o projecto de resolução que apresentou - o projecto de resolução n.º 74/VII -, serão, provavelmente, rejeitados na próxima quinta-feira, como, aliás, resulta deste debate e como era expectável.
É por isso menos compreensível que o Sr. Secretário de Estado tenha cedido à facilidade de centrar na iniciativa do PCP o essencial da sua intervenção...

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Bem visto!

O Orador: - ... e fugido à questão política mais embaraçosa, a do atraso do Governo; que é o que envergonha o Governo e o Sr. Secretário de Estado.
Com a mesma clareza e frontalidade com que elogiei o Sr. Secretário de Estado e o Governo, porque honraram o compromisso que estabeleceram com esta Assembleia e a Comissão de Educação, Ciência e Cultura ao legislar neste sentido, ou seja, ao criar os instrumentos jurídicos necessários para que as propinas fossem uma realidade neste ano lectivo, tenho de confessar que a intervenção do Sr. Secretário de Estado foi decepcionante.
Com efeito, o Sr. Secretário de Estado não deu uma única explicação a esta Câmara pelo facto de o Governo estar em situação de incumprimento da lei, porque é disso que se trata! 90% das matérias que era necessário regulamentar não estão regulamentadas, os prazos estão ultrapassados e,...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... se é vergonha para qualquer Governo democrático não cumprir uma lei aprovada por esta Assembleia, também é politicamente condenável que os prazos que o Governo impôs a si próprio, porque foram os que ele propôs a este Parlamento, estejam numa situação de incumprimento. E não estou a falar de quaisquer matérias, mas, sim, de todas aquelas que tive ocasião de referir na minha primeira intervenção e às quais o Sr. Secretário de Estado disse nada!
Politicamente, cada um gere o tempo como entende. O Sr. Secretário de Estado decidiu fazer essa intervenção, seguramente com muito boas razões, mas fica esta nota perante a Assembleia da República, e perante o País.
A verdade é que V. Ex.ª respondeu ao mais fácil, à interpelação do PCP, mas não quis responder ao mais difícil: a razão por que o Governo se encontra em situação de. incumprimento da lei, isto é, por que é que não está a cumprir a Lei do Financiamento do Ensino Superior.
Por último, lembre-se que, para lá da situação de imoralidade e de ilegalidade em que o Governo incorre, há uma situação perversa, que é a de estar a dar razão, neste momento - como, há pouco, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia referiu, e bem -, a todos aqueles que são contra as propinas, aqueles que tentaram «desmontar» a lei do financiamento dizendo que ela era apenas uma lei de propinas.
De facto, com a ausência de regulamentação e com a incapacidade de o Governo exercer as suas competências, estão a dar razão a todos aqueles que os criticaram.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, não havendo mais oradores inscritos. dou por encerrado o debate da apreciação parlamentar n.º 41/VII. Informo ainda que deu entrada na Mesa o projecto de resolução n.º 74/VII, que visa a cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 304/97, de 8 de Novembro, subscrito pelo PCP, o qual será submetido a votação na próxima quinta-feira.
O Sr. Secretário vai ainda dar conta de dois pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 4.º Juízo do Tribunal Criminal de Lisboa, a Comissão de Assuntos Constitucio-

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nais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Carlos Pinto a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, em processo que se encontra pendente naquele tribunal, em audiência marcada para o dia 23 de Janeiro de 1998, pelas 14 horas.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, a solicitação do Tribunal Judicial de Ponte de Lima, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Carvalho Martins a prestar depoimento, por escrito, querendo, na qualidade de testemunha, em processo que se encontra pendente naquele tribunal.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, a próxima reunião plenária realiza-se no dia 14 de Janeiro, quarta-feira, às 15 horas, e a ordem do dia será anunciada nos termos do Regimento, depois de reunida a Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares.
Está encerrada a sessão.

Eram 13 horas e 10 minutos.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Carlos Justino Luís Cordeiro.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
José António Ribeiro Mendes.
Júlio Meirinhos Santanas.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Mário Manuel Videira Lopes.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raúl d' Assunção Pimenta Rêgo.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel Palácio' Carreteiro.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.

Partido Social Democrata (PSD):

Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Manuel Taveira da Silva.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Alberto Pinto. Domingos Dias Gomes.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
José Augusto Gama.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Maria Odete dos Santos.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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926 I SÉRIE - NÚMERO 26

Depósito legal n.º 8818/85

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