O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

20 DE FEVEREIRO DE 1998
1397
cima quando esse membro do Governo é quem tutela as Forças Armadas, que derrubaram o governo de Marcelo Caetano e o fascismo nesse dia 25 de Abril.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Muito bem!
O Orador: — Marcelo Caetano não retirou uma vírgula ao salazarismo. Manteve a censura, a perseguição política, a guerra colonial e a PIDE com todo o seu cortejo de violência. Quando subiu ao poder houve quem acreditasse que era possível mudar alguma coisa, mas não demorou a desiludir-se, como, por exemplo, sucedeu com uma figura de referência do PSD.
Ouvi na TVI o fotógrafo que fotografou Rosa Casaco dizer que conseguiu que ele lhe cedesse as fotografias que tirou por causa da corrente de simpatia que se estabeleceu entre os dois. Tenho de dizer a esse profissional da fotografia que ou não sabe quem é Rosa Casaco nem sabe o que significa o fascismo ou então não se entende com o Portugal democrático. Nem em nome de critérios jornalísticos é possível branquear o fascismo!
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — Daqui a dois meses comemoramos o aniversário do 25 de Abril. Faço aqui um apelo: talvez seja altura de voltar aqui a lembrar às novas gerações o que foi o fascismo, o que foi a PIDE, voltar a saudar a acção corajosa dos capitães de Abril. A liberdade e a democracia consolidam-se todos os dias.
Sr. Presidente, este é o apelo que aqui deixo: é o apelo da liberdade, mas, sobretudo, o apelo da memória da luta pela liberdade!
Aplausos do PCP, de Os Verdes e de alguns Deputados do PS.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado João Amaral, inscreveram-se os Srs. Deputados Rui Namorado, Manuel Alegre, Carlos Encarnação e Nuno Abecasis. ,
Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Namorado.
O Sr. Rui Namorado (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, não queremos deixar de nos associar ao protesto do Sr. Deputado João Amaral. Na verdade, quem se lembra dos longos interrogatórios, eivados e misturados de torturas, quem, se lembra das horas de «estátua» perante os mais cínicos esbirros, quem se lembra dos toques de campainha às 8 horas da manhã, quem se lembra das manifestações dispersas a tiro directamente por agentes da PIDE, quem se lembra dos horizontes profissionais vedados por uma seca informação policial, quem se lembra da perseguição à inteligência e à cultura, não pôde deixar de se emocionar e de se revoltar com a notícia de que um alto responsável pela PIDE, um foragido, se passeava entre nós desportivamente. Mas esse foragido, esse criminoso, foi o elemento-chave do pequeno grupo de conspiradores, que incluía o próprio ditador, que assassinou Humberto Delgado, o general sem medo, que personificou a esperança e a revolta do povo português!
Associamo-nos ao protesto que foi feito por ter acontecido esse desafio à nossa democracia, ao Estado de direito, e fazemos votos para que, rapidamente, seja posto termo à impunidade desse criminoso.
Aplausos do PS, do PCP e de Os Verdes.
O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado João Amaral informa-me de que pretende responder no fim aos pedidos de esclarecimento.
Assim sendo, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.
O Sr. Manuel Alegre (PS): — Sr. Presidente, associando-me também a este protesto, relembro que, ainda há alguns anos, na vigência do anterior governo, fiz um requerimento ao Governo perguntando que diligências tinham sido feitas no sentido de localizar Rosa Casaco e outros implicados no assassínio de Humberto Delgado e que diligências tinham sido feitas para o extraditar. Isto, porque me parece que a passividade do Estado português revela, neste caso, uma má consciência da democracia consigo mesma, uma má consciência com o seu próprio passado. Não o fiz por um qualquer desejo de vingança, mas porque uma política de reconciliação nacional não pode nunca ser confundida com uma política do esquecimento, sobretudo do esquecimento na aplicação da justiça.
O assassínio de Humberto Delgado é um crime que, em si mesmo, simboliza os crimes do fascismo e um crime que, em si mesmo, revela a natureza criminosa do Estado Novo, não apenas da brigada assassina chefiada por Rosa Casaco, mas dos.chefes supremos da PIDE e do responsável político supremo do Estado Novo, António de Oliveira Salazar. Porque é preciso chamar as coisas pêlos seus nomes! Ninguém ignora que Salazar despachava quotidianamente com os directores da PIDE — viu-se a fotografia do próprio Rosa Casaco junto do ditador! —, ninguém ignora que um crime daqueles não era possível sem que o responsável político supremo, o então Presidente do Conselho, dele tivesse tomado conhecimento ou que, de uma forma ou de outra, o tivesse autorizado!
O julgamento de Humberto Delgado era um julgamento símbolo, era um julgamento que, e em si mesmo, continha o julgamento do Estado Novo, o julgamento do fascismo. Esse julgamento não foi feito — é uma lacuna gravíssima da democracia portuguesa!
Que Rosa Casaco tenha podido entrar em Portugal desta maneira, que tenha podido entrar impunemente, é uma vergonha para o Estado português, é uma vergonha para a nossa geração, é uma vergonha para o Estado democrático! Não porque adiante muito prender agora um homem com 83 anos, ou que isso possa permitir a reconstituição da História, mas porque essa impunidade demonstra que existem problemas por resolver na sociedade portuguesa, que há uma má consciência.
Pergunto, pois, uma vez mais — tal como perguntei ao anterior governo, faço-o agora a este: o que é que vai ser feito para localizar e extraditar Rosa Casaco? E o que é que vai ser feito para saber onde é que param os outros implicados neste crime, que é um crime impune, que é uma lacuna gravíssima na democracia portuguesa?