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21 DE MARÇO DE 1998 18O9

propostas que concretamente lhe sejam presentes pelos parlamentos regionais. Vem daí a resistência de alguns sectores mais centralistas em alcandorar à dignidade estatutária temas especialmente melindrosos, como são os de natureza financeira. Pretende-se assim evitar que as regiões autónomas passem a dispor de um poder exclusivo quanto à iniciativa da respectiva alteração.
Decorre, por outro lado, da Constituição que os direitos das regiões autónomas consagrados nos respectivos Estatutos não podem ser violados por quaisquer leis emanadas dos órgãos de soberania. mesmo as leis orgânicas e as leis de valor reforçado, sob pena de declaração de nulidade pelo Tribunal Constitucional.
Sr. Presidente, Sr.ªs Deputadas e Srs. Deputados: O Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores data de 1980. Os primeiros quatro anos da experiência da autonomia constitucional decorreram ao abrigo de um Estatuto provisório, aprovado pelo Decreto-lei n.º 318-B/76, de 3O de Abril, emendado pelo Decreto-Lei n.º 427-D/76, de 1 de Junho. O respectivo projecto foi elaborado por um grupo de trabalho nomeado pelo Junta Governativa dos Açores, um organismo de carácter revolucionário, criado pelo V Governo Provisório em pleno decurso do escaldante Verão açoreano de 1975. A conformidade de tal projecto com a Constituição, então acabada de aprovar pela Assembleia Constituinte, foi atestada por uma Comissão de Análise, para o efeito designada pelo Conselho da Revolução, da qual fez parte, entre outros, Vitorino Nemésio. Num dos seus livros mais polémicos, Nemésio dá conta do ambiente que rodeou esses trabalhos, no belo poema intitulado: «Corsários à Vista!».
O Estatuto de 1980 foi aprovado pela Assembleia da República integralmente conforme a proposta apresentada pela Assembleia Regional dos Açores, incluindo pontos e vírgulas! Este facto não tem precedentes na nossa histórica política - e também não criou precedente, diga-se já em abono da verdade.
Quando se promoveu a primeira revisão do Estatuto, para nele inserir os avanços autonómicos consagrados na revisão constitucional de 1982 - alguns dos quais vieram afinal constitucionalizar a posteriori certas audácias do legislador estatutário de 1980 - as diferentes circunstâncias políticas impuseram uma árdua negociação. O texto correspondente foi aprovado, em votação final global, por unanimidade e aclamação. numa manifestação eufórica de simpatia nacional para com os Açores, na altura em que se celebrava a primeira década da nova autonomia democrática. No entanto, mercê de movimentações de certos sectores militares retrógrados, posteriormente varridos da cena política portuguesa, o decreto da Assembleia da República viria a sofrer veto presidencial, humilhando-se o Parlamento e forçando-o a dar o dito por não dito quanto a um certo preceito. Foi a guerra das bandeiras. de triste memória!
Após a entrada em vigor da primeira revisão do Estatuto dos Açores, ocorreram três revisões constitucionais. Duas delas abrangeram preceitos referentes à autonomia insular, a de 1989 e a de 1997. Esta última, sobretudo, teve como um dos seus principais objectivos ultrapassar os impasses que em tal domínio se vinham acumulando. A partir de meados da década de oitenta, por acção conjugada dos perniciosos Ministros da República e do Tribunal Constitucional, o poder legislativo das regiões autónomas - pedra de toque da autonomia política, consagrada na Lei Fundamental - sofreu dura perseguição e foi mesmo cerceado por uma jurisprudência fortemente restritiva.
Por outro lado, a situação financeira regional foi-se agravando pela conjugação de dois factores contraditórios: por um lado, a necessidade de manter a funcionar, conforme os padrões nacionais. os serviços públicos essenciais e, ao mesmo tempo, de investir fortemente para aproveitamento dos fundos comunitários; por outro lado, a recusa do poder central em proceder a uma repartição mais justa dos recursos nacionais.
Argumentam alguns, a este respeito, que melhor teria sido moderarem os açoreanos os seus ímpetos regionalizadores, limitando-os à escassez dos respectivos recursos próprios. Nada mais errado, em minha opinião! Para além de que a lógica da autonomia é a lógica da solidariedade e não da separação - solidariedade nos dois sentidos, hoje já bem comprovada, felizmente, de parte a parte - se não tivessem os órgãos de governo próprio democrático dos Açores avançado na afirmação e consolidação dos respectivos poderes, a eficácia da regionalização não teria sido comprovada e estariam decerto os Açores parados no tempo, como antes acontecia - ou como ficaram os serviços periféricos do Estado situados nas ilhas, para cuja dinamização o Governo delega presentemente no Ministro da República poderes de superintendência, que quando tal figura os teve como próprios nunca deram qualquer resultado.
Ao avançar com a proposta de lei agora em debate, para a segunda revisão do Estatuto dos Açores, o Parlamento açoreano manifesta, por sinal até em votação unânime, o seu empenho na pronta aplicação dos novos poderes definidos na Constituição. Em matéria de faculdades legislativas, a revisão constitucional de 1997 abriu novas perspectivas para as regiões autónomas. Atrevo-me por isso a desafiar a Assembleia Legislativa Regional a reconhecer tais poderes como os mais importantes do seu mandato democrático, destinados a moldar os Açores, no exercício do seu direito à diferença e na escolha das soluções adequadas aos seus problemas específicos: e, convicta da sua importância, deve fazer mesmo leis regionais. que ocupem o espaço que lhes está aberto no ordenamento jurídico-constitucional do nosso país.
No domínio do poder executivo, a redução das competências do Ministro da República também não pode deixar de ter reflexos. O legislador constituinte apontou claramente para uma mais estreita cooperação institucional entre o Governo da República e o governo regional. Em meu entender, a já aludida delegação de poderes no dito Ministro contraria tais intuitos e acaba afinal por manter o statu quo que se quis alterar.
Quanto aos aspectos financeiros, a revisão constitucional inovou amplamente. A Lei das Finanças das Regiões Autónomas, recentemente aprovada, em execução dos imperativos constitucionais, concretizou já alguns pontos importantes. Mas é natural que um instrumento tão decisivo para a autonomia, do qual dependem os meios materiais necessários para o funcionamento dos serviços e para o impulso ao desenvolvimento, tenha projecção no estatuto regional.
Inovação importantíssima da recente revisão constitucional foi ainda o referendo regional, instrumento de democracia directa na gestão dos interesses específicos insulares, que reforça a democraticidade das instituições autonómicas.
Para além de tudo isto, que consubstancia a revisão estatutária decorrente da revisão constitucional, é natural que, em função da experiência adquirida, a Região Autónoma dos Açores deseje modificar algumas das regras do

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