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Sexta-feira, 19 de Fevereiro de 1999 I Série - Número 50
DIÁRIO da Assembleia da República
VII LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1998-1999)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 18 DE FEVEREIRO DE 1999
Presidente: Exmo. Sr. António de Almeida Santos
Secretários: Exmos. Srs.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Maria Luísa Lourenço Ferreira
João Cerveira Corregedor da Fonseca
SUMÁRI0
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de lei n.º 624/VII.
Procedeu-se ao debate da interpelação n.º 20/VII - Centrada na defesa do Serviço Nacional de Saúde e a política do Governo para o sector (PCP), tendo usado da palavra, a diverso titulo, além do Sr. Deputado Carlos Carvalhas (PCP) e da Sr. Ministra da Saúde (Mana de Belém Roseiro), que proferiram intervenções na fase de abertura, o Sr. Secretário de Estado da Saúde (Francisco Ramos) e os Srs. Deputados Manuel dos Santos (PS), Maria José Nogueira Pinto e Rui Marques (CDS-PP), Júlio Fana (PS), Octávio Teixeira (PCP), Francisco José Martins (PSD), Moura e Silva (CDS-PP), Isabel Castro (Os Verdes), Bernardino Soares (PCP), José Carlos Póvoas (PSD), Luísa Mesquita (PCP), Fernando Pedro Moutinho (PSD), Alexandrino Saldanha (PC), Jorge Roque Cunha (PSD), Rodeia Machado e Antónia Filipe (PCP), João Rui de Almeida, Alberto Marques e José Barradas (PS) e João Corregedor da Fonseca (PCP).
No encerramento do debate, intervieram, pelo partido interpelante, o Sr. Deputado Bernardino Soares e, pelo Governo, a Sr.ª Ministra da Saúde.
Entretanto, foram aprovados, na generalidade, os projectos de lei n.º 590/VII - Competências das câmaras municipais no âmbito das instituições de carácter social do respectivo pessoal autárquico (PCP), 607/VII - Competências das câmaras municipais na concessão de apoio às instituições de carácter social e cultural dos respectivos funcionários municipais (PSD) e 619/VII - Competência das câmaras municipais na concessão de subsídios às instituições criadas pelos funcionários da administração local, com carácter social e cultural (PS). A requerimento apresentado pelo PS, PSD, CDS-PP e PCP para votação na especialidade e final global do texto de substituição, apresentado pelo PS, PSD e PCP, relativo aos projectos de lei atrás mencionados, o referido texto de substituição foi aprovado na especialidade e em votação final global
As propostas de lei n.º 218/VII - Regula a aplicação de medidas para protecção de testemunhas em processo penal e 232/VII - Altera a Lei n.º 36/94, de 29 de Setembro, que estabelece medidas de combate à corrupção e à criminalidade económica e financeira foram também aprovadas na generalidade.
A Câmara aprovou ainda três pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias autorizando Deputados do PS a prestarem depoimento, por escrito, em processos que correm em tribunal.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 15 minutos.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 30 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes.
Aníbal Marcelino Gouveia.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Armando Jorge Paulino Domingos.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Casimiro Francisco Ramos.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Pedro da Silva Correia.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Júlio Meirinhos Santanas.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís António do Rosário Veríssimo.
Luís Pedro de Carvalho Martíns.
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho.
Manuel Afonso da Silva Strecht Monteiro.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Ferreira Jerónimo.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Eduarda Bento Alves Ferronha.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Maria Manuela de Almeida Costa Augusto.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Paulo Jorge Lúcio Arsênio.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Raimundo Pedro Narciso.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.
Victor Brito de Moura.
Partido Social Democrata (PSD):
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Alvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António d'Orey Capucho.
António dos Santos Aguiar Gouveia.
António José Barradas Leitão.
António Manuel Taveira da Silva.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Roleira Marinho.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder.Torres Pereira.
Carlos Eugénio Pereira de Brito.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
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Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José Carlos Pires Póvoas.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luis de Rezende Moreira da Silva.
José Manuel Costa Pereira.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Fiiipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Barata Freges.
Manuel Maria Moreira.
Maria de Lourdes Lara Teixeira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Sérgio André da Costa Vieira.
Vasco Manuel Henriques Cunha.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
António Carlos Brochado de Sousa Pedras.
Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Francisco Amadeu Gonçalves Peixoto.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Pedro José Dei Newo Feist.
Rui Manuel Pereira Marques.
Rui Miguel Gama Vasconcelos Pedrosa de Moura.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.
Partido Comunista Português (PCP):
Alexandrino Augusto Saldanha.
António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
António Luís Pimenta Dias.
Bernardino José Torrão Soares.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Joaquim Manuel da Fonseca Matias.
Lino António Marques de Carvalho.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Octávio Augusto Teixeira.
Partido Ecologista Os Verdes (PEV):
Carmem Isabel Amador Francisco.
Isabel Maria de Almeida e Castro.
Deputado independente:
José Mário de Lemos Damião.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai anunciar o diploma que deu entrada na Mesa.
A Sr.ª Secretária (Rosa Maria Albernaz): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deu entrada na Mesa, e foi admitido, o projecto de lei n.º 624/VII - Isenta de emolumentos a apreciação das contas de gerência das autarquias locais (PCP), que baixou à 4.ª Comissão.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a ordem do dia de hoje é preenchida com uma interpelação ao Governo requerida pelo PCP e centrada na defesa do Serviço Nacional de Saúde e a política do Governo para o sector.
Para iniciar o período de abertura do debate, tem a palavra o Sr. deputado Carlos Carvalhas.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.ª Ministra da Saúde, restantes Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A questão da Saúde é séria demais para se deixar ao sabor de paixões, sejam elas serôdias ou eleitoralistas.
Como é sabido, o PCP tem vindo a alertar, repetidas vezes, para a gravidade da situação existente na área da Saúde: são os atrasos no atendimento de utentes; são as enormes listas de espera que, só nas áreas clínicas consideradas prioritárias, ascendem a um total estimado em cerca de 85 000 doentes; são os problemas com a qualidade e com a humanização da prestação de cuidados de saúde em muitas unidades e serviços; é o crescente e, cada vez mais, incomportável recurso ao sector privado para obtenção de cuidados de saúde e para a utilização de meios complementares de diagnóstico, quando há capacidades instaladas não aproveitadas no SNS; é a carestia dos medicamentos e o preço especulativo que as multinacionais praticam em muitas especialidades farmacêuticas.
E, - consequência de tudo isto, é a situação paradoxal em que nos encontramos: enquanto o País gasta com a Saúde, em relação ao produto, acima da média da União Europeia, os portugueses e as portuguesas são. entre os
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europeus, os que mais pagam directamente para a Saúde, para além do que desembolsam através dos impostos.
O que motiva a interpelação que o PCP hoje dirige ao Governo não é o repisar da descrição dos problemas existentes em muitos hospitais e centros de saúde, porque eles são, infelizmente, bem conhecidos e sentidos pelos portugueses; o que justifica e impõe esta interpelação é, sobretudo, o exame das razões por que esta situação tem permanecido no fundamental inalterada e as medidas necessárias para as ultrapassar.
Aplausos do PCP.
Não nos move o propósito de obtenção fácil de dividendos eleitorais, como acontece com outros, que, depois de terem sido responsáveis pela área da Saúde durante quase uma década e meia, desde o VI Governo Constitucional, só recentemente descobriram a sua «paixão» pelo sector e como se observa, igualmente, com o Sr. Primeiro-Ministro, que necessitou de quase uma legislatura para reconhecer, há poucos dias, no Congresso do PS, que a Saúde deve constituir uma prioridade da acção governativa.
A postura e a posição do PCP são bem diversas.
Prosseguimos hoje, aqui, uma luta que travamos desde há muito tempo. É uma luta contra as políticas neoliberais que têm procurado destruir o Serviço Nacional de Saúde - universal, geral e tendencialmente gratuito, como é proclamado pela nossa Constituição - e substituí-lo por um sistema puramente residual e caritativo de prestação de cuidados de saúde para os pobres, a par do fomento do mercado capitalista de prestação de cuidados de saúde para a restante população.
É uma luta contra a desresponsabilização do Estado no que respeita aos seus deveres básicos de garantir a protecção da saúde a todos os portugueses.
E uma luta contra os processos privatizadores na área da Saúde, nas suas diversas modalidades, conducentes, em linha recta, a mais desigualdades e a mais discriminações sociais e a um aumento incontrolado das próprias despesas com a Saúde.
E é um combate, iniciado há mais de seis anos, pela concretização de uma profunda reforma democrática dos serviços de saúde.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Uma reforma susceptível de reconduzir o Serviço Nacional de Saúde à filosofia e à inspiração democrática e humanista iniciais, capaz de ajusta-lo às novas condições de progresso técnico e aos problemas que o crescimento dos custos e a evolução organizativa colocam, de forma a colocar novos e mais exigentes padrões de saúde à disposição de todos os portugueses e que valorize e dignifique os profissionais da Saúde.
Ao longo da legislatura, o PCP reclamou insistentemente do actual Governo uma verdadeira imersão da política neoliberal, de mercantilização da Saúde e de destruição do Serviço Nacional de Saúde, conduzida, nomeadamente, pelos anteriores governos.
É um facto, e por isso o reafirmamos, que, nos últi-. mos anos, foram apresentadas oficialmente orientações para alcançar ganhos em Saúde para os portugueses e para afirmar o papel estratégico essencial do sector prestador do Serviço Nacional de Saúde, que o PCP avaliou de forma positiva.
Mas, apesar do dedicado empenho de muitos profissionais do sector e de inegáveis melhorias pontuais, o balanço da situação no terreno, no seu conjunto, não evidencia progressos: Isto acontece porque, apesar das orientações traçadas, o Governo continuou a não querer enfrentar, antes cedendo às pressões dos grandes interesses que disputam e absorvem o grosso dos recursos públicos disponibilizados para o sector - as multinacionais dos medicamentos e dos equipamentos, a área das convenções, os grandes grupos económicos empenhados na privatização da Saúde.
E o Governo, em vez de. privilegiar os interesses dos utentes, tem, objectivamente, deixado alastrar o autêntico cancro que é a promiscuidade entre o público e o privado no interior do Serviço Nacional de Saúde. Nada nos move contra a existência do-sector privado mas, sim, contra a sua utilização abusiva e contra os gastos desnecessários dos dinheiros públicos.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Desta forma, não se vai a lado algum.
Foram necessários quase três anos e meio de mandato do Governo, e a marcação desta interpelação pelo PCP, para que o Conselho de Ministros, na sua última reunião, tivesse finalmente aprovado diplomas relativos a questões tão essenciais como os centros de saúde e os sistemas locais de saúde. Mas questões como o sistema de qualidade e outras importantes matérias permanecem em longa fila de espera legislativa.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Quanto aos diplomas relativos às convenções e ao controlo de preços de medicamentos comparticipados, seja pela modéstia dos objectivos visados pelo Governo seja pela falta de vontade política para vencer as resistências opostas pelo sector privado, a verdade é que tudo ficou praticamente na mesma.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - É verdade!
O Orador: - Os problemas do Serviço Nacional de Saúde não se compadecem com mais demoras, nem com mais hesitações...
Aplausos do PCP.
... e, muito menos, podem estar à espera da «paixão» que o Primeiro-Ministro começou a prometer para a próxima legislatura, se for essa a vontade do eleitorado.
Em relação à resolução do problema das listas de espera é, naturalmente, importante que a Assembleia da República tenha aprovado o projecto de lei apresentado pelo PCP. Correspondendo a votação final ao que nós propusemos, isto significa que passará a ser imposta por lei a realização de um recenseamento rigoroso e actualizado dos utentes em lista de espera, ou seja, de todas as situações em que foram excedidos os tempos clinicamente aceitáveis.
Significa ainda que será feita a avaliação da capacidade instalada do SNS em recursos humanos, infra-estruturas e equipamentos e a mobilização de todos os meios para a resolução sustentada do problema.
0 Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
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O Orador: - Significa que passará a existir uma dotação orçamental adicional e própria para o efeito. E significa, ainda, que o recurso a meios externos ao SNS terá apenas lugar em situações de insuficiência ou esgotamento da capacidade instalada. E significa; fundamentalmente, que com ele se poderá, por fim, fazer face ao drama das listas de espera.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - E digo «poderá fazer» porque a existência de legislação não é suficiente para resolver uma situação que tem a dimensão e a gravidade que são conhecidas. É decisivo que o Ministério da Saúde assuma rapidamente a concretização do nosso projecto de lei como uma prioridade nacional e que acompanhe muito de perto as medidas de ordem prática indispensáveis à concretização dos objectivos nele afirmados.
Aplausos do PCP.
Pela parte do PCP, propomos que, a partir de Março, passe a ser fornecida à Comissão de Saúde informação bimestral sobre o grau de concretização desses objectivos.
Compreendemos a reforma do Serviço Nacional de Saúde como um processo complexo, desdobrado em objectivos múltiplos e faseado no tempo, mas há questões fundamentais, como a do primado do interesse público sobre os interesses privados, que não podem deixar de ser frontalmente assumidas pelo Governo para que tenha verdadeiramente sentido falar-se na reforma de um serviço público, sobretudo numa área de tão decisiva importância social como é esta.
A este respeito, é conhecido que o PCP assume a necessidade de se concretizar um plano de separação do público e do privado no SNS. E reafirmamos a necessidade de serem, urgentemente, dados sinais e adoptadas medidas concretas, tais como: a alteração do sistema que permite o desenvolvimento de medicina privada no interior dos estabelecimentos públicos, em simultâneo com a introdução de modalidades remuneratórias que permitam fixar no SNS técnicos de elevada competência; o estabelecimento de um código de conduta que torne ilícito aos médicos do SNS o desvio de doentes para consultórios privados e a garantia de gestão pública de todos os estabelecimentos públicos.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Ao fim destes três anos e meio, que medidas é que o Governo tomou neste domínio? E que medidas práticas tem em vista e para quando a sua concretização?
Tomaria muito tempo a esta Assembleia abordar o problema dos medicamentos com o desenvolvimento que a importância da matéria exige.
Direi apenas, algo telegraficamente, que o Pais e os utentes não podem continuar à mercê de interesses ilegítimos das multinacionais de medicamentos, as quais não estão a actuar apenas como fornecedores, mas como entidades que, simultaneamente e por diversas formas, influenciam de forma significativa o perfil de receituário dos serviços, conduzindo assim a um largo consumo de medicamentos desnecessários, ineficazes e dispendiosos.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - É verdade! É verdade!
O Orador: - Afirmamos que não são inevitáveis as sucessivas derrapagens orçamentais e o aumento da despesa com medicamentos, sem que isso se traduza em ganhos para a população, mas tão-só em fabulosas margens de lucro para os interesses das multinacionais.
É sabido como o sistema actual de comparticipação de medicamentos e a forma como são prescritos favorecem os medicamentos mais caros e penalizam o SNS e os utentes.
Em praticamente todos os países da União Europeia estão em curso medidas visando a contenção de gastos com os medicamentos e nos últimos anos diversos países têm vindo a tomar medidas no sentido de promover o mercado dos medicamentos genéricos.
O Governo, no seu Programa, prometeu tomar medidas para incentivar a prescrição por princípio activo e para desenvolver o mercado de genéricos, mas, cedendo mais uma vez às multinacionais, limitou-se, na prática, a abrir a porta aos genéricos de marca, dificultando o efectivo desenvol,,zmento do mercado de genéricos.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Por outro lado, a carestia dos medicamentos afecta cada vez mais os portugueses, que pagam do seu bolso uma parte cada vez mais significativa dos cuidados medicamentosos a que têm direito.
Não é defensável que se continue a penalizar a população e a desbaratar os recursos do Serviço Nacional de Saúde e que se assista, passivamente, ao embolsar ilegítimo de recursos públicos pelos grandes interesses económicos.
Aplausos do PCP.
Por isso, o PCP apresentou publicamente um fundamentado programa de redução dos gastos com medicamentos, onde se incluem diversas medidas de comprovada eficácia na redução e racionalização dos gastos com medicamentos, quer do SNS quer dos utentes, e em que são apontadas medidas tais como: a prescrição médica em todas as unidades do Serviço Nacional de Saúde passar a ser feita pela substância activa; a implementação de um formulário nacional de medicamentos; o desenvolvimento do mercado de genéricos e da função farmácia no âmbito do próprio SNS; a dispensa gratuita ou a preço simbólico aos utentes, após prescrição num estabelecimento do Serviço Nacional de Saúde, dos medicamentos cuja comparticipação pelo Estado seja mais dispendiosa do que a sua dispensa gratuita.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Daqui fazemos uma pergunta ao Governo e deixamos um desafio, e estendemo-lo também às bancadas do PSD e do PP que, quando ouvem falar em redução dos gastos com medicamentos e em atingir interesses ilegítimos das multinacionais, fogem logo como uo diabo da cruz».
Vozes do PCP: - Exactamente!
O Orador: - Que medidas assumem, que medidas propõem para promover a urgente e efectiva racionalização dos gastos públicos e dos gastos dos utentes na área do medicamento?
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E, se não assumem qualquer intervenção significativa neste domínio, que explicação apresentam ao País para recusarem as medidas que o PCP propõe e que podem representar, para além da poupança directa no bolso dos utentes, uma poupança de dezenas de milhões de contos de recursos públicos por ano, o que permitiria, por exemplo, aumentar significativamente a comparticipação por parte do Estado de muitos medicamentos?
Deixaria, para último tópico, a momentosa questão do aproveitamento integral da capacidade do SNS, que é quase sinónimo do não recurso a meios exteriores sem que esteja, prévia e comprovadamente, esgotada a utilização dos existentes nos serviços públicos.
Pois não constitui um absurdo que tantos dos nossos concidadãos suportem demoras absolutamente inaceitáveis do ponto de vista clínico, que tantos se queixem de dificuldades de acesso a serviços de saúde, que tantos exprimam críticas em relação à qualidade e à humanização dos serviços; ou que tantos se vejam empurrados para a prestação privada de cuidados de saúde, onde, em muitos casos, lhes exigem elevadas somas, quando existem muitos recursos humanos e materiais no Serviço Nacional de Saúde que estão longe de ser integralmente aproveitados?
Colocam-se aqui, evidentemente, questões que têm a ver com orientações e medidas de natureza estruturante, ao nível do aperfeiçoamento da direcção e da gestão dos hospitais e dos centros de saúde, mas nós deixamos a sua discussão para o momento em que subir ao Plenário desta Assembleia o projecto de lei-quadro, que o PCP aqui apresentou, relativo às administração e gestão democrática dos centros de saúde, hospitais e sistemas locais de saúde do SNS.
Mas isso não dispensa, em nosso entender, uma consideração do problema a curto prazo. Daí a questão que colocamos ao Governo sobre as medidas implementadas e as que tenciona concretizar até ao final do seu mandato no sentido do aproveitamento do conjunto da capacidade instalada na rede de serviços do SNS.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - O PCP tem apresentado propostas fundamentadas no domínio da política de Saúde, cuja adopção já teria permitido há muito tempo travar, do nosso ponto de vista, a degradação do Serviço Nacional de Saúde, globalmente avaliada, e atingir uma efectiva melhoria da prestação de cuidados de saúde.
Aplausos do PCP.
E tem ligado essas propostas à indispensável concretização de uma profunda reforma do SNS, cujas linhas fundamentais foram oportunamente apresentadas.
É nossa convicção que a adopção destas medidas, inteiramente viáveis e cuja concretização poderia já ter sido iniciada, representaria uma rápida inversão no panorama actualmente existente no Serviço Nacional de Saúde. E criaria, ao mesmo tempo, condições muito favoráveis para as reformas de fundo que se impõem para a construção de um futuro com mais saúde para todos os portugueses e para todas as portuguesas.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Foi para contribuir para este propósito que aqui viemos interpelar o Governo sobre a situação
existente na área da Saúde, dele reclamando que governe de acordo com os princípios constitucionais e legais que incumbem o Estado de concretizar o direito à saúde de todos os portugueses.
Em relação à campanha populista em torno dos problemas da Saúde desencadeada por outros partidos, nomeadamente a AD, não nos deixamos impressionar. Essa campanha constitui, do nosso ponto de vista, uma indecorosa tentativa de alijarem responsabilidades em relação aos problemas do SNS provocados pelas políticas que levaram a cabo durante o período que tiveram responsabilidades governativas e representa uma operação contra o Serviço Nacional de Saúde e contra o direito à saúde que a sua existência visa assegurar.
Vozes do PCP: -Muito bem!
O Orador: - Estamos certos de que o povo português, que aspira a um moderno e reformado SNS, compreende bem o que está em causa e que apoiará uma corajosa resolução dos problemas do SNS que estão, cada vez mais, na ordem do dia.
Aplausos do PCP, de pé.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Carlos Carvalhas os Srs. Deputados Manuel dos Santos, Júlio Faria, Maria José Nogueira Pinto e Rui Marques, aos quais darei a palavra após a intervenção da Sr.ª Ministra da Saúde, que usará da palavra no período introdutório, em representação do Governo.
Tem a palavra, Sr.ª Ministra.
A Sr.ª Ministra da Saúde (Maria de Belém Roseira): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.ªs e Srs. Deputados: Com o objectivo de melhorar o nível de saúde das populações, o Programa do Governo faz uma opção clara pelo Serviço Nacional de Saúde, no sentido do seu reforço em termos de eficiência e eficácia, colocando o cidadão no centro do sistema.
A intervenção do Ministério da Saúde ao longo destes cerca de três anos e meio teve como primeira prioridade a progressiva correcção das desigualdades no acesso aos cuidados de saúde, priorizando a vertente dos cuidados de saúde primários como base do sistema e através, fundamentalmente, do seguinte: aumento do número de horas de consulta nos centros de saúde e nos estabelecimentos hospitalares; alargamento dos horários de atendimento, com criação de consultas, designadamente em horário pós-laboral; simplificação administrativa que permitisse reconduzir funções meramente auxiliares naquilo que é a função da prestação de cuidados de saúde, nomeadamente através da simplificação do processo de concessão das baixas por doença, permitindo, assim, canalizar mais capacidade de atendimento específica dos centros de saúde;...
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - ... criação de programas específicos de recuperação de listas de espera em consultas, meios auxiliares de diagnóstico e intervenções cirúrgicas; reforço de determinados programas de Saúde, designadamente na vertente do planeamento familiar, através de um programa de acção articulado com outros Ministérios, privilegiando a actuação junto dos grupos mais vulneráveis;...
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Vozes do PS: - Bem lembrado!
A Oradora: - ... inequívoco desenvolvimento da capacidade de atendimento do Serviço de Prevenção e Tratamento da Toxicodependência, quer através do aumento do número de consultas quer através do alargamento da rede oficial de centros de atendimento, bem como do número de camas convencionadas em unidades de desabituação (tudo isto conseguido também à custa de um enorme esforço de formação de recursos humanos nesta área, que foram totalmente absorvidos pelo sistema); reforço dos meios de emergência médica, através do aumento e modernização da frota de ambulâncias, bem como da cobertura por meios aéreos; reforço da promoção da saúde e prevenção da doença, através de acções e campanhas próprias do Ministério ou da iniciativa de outras entidades com o apoio público; alargamento da Rede de Escolas Saudáveis com programas próprios de intervenção (e, só para vos dar uma ideia, refiro que existiam nove escolas integrando a Rede de Escolas Saudáveis e, neste momento, mais de 600 têm programas de acção aprovados).
Aplausos do PS.
Tudo isto foi feito a par de uma melhoria progressiva das condições de trabalho e de atendimento, designadamente: abertura e início de funcionamento de cinco novos hospitais, de dezenas de novos centros de saúde e de novas extensões; remodelação e ampliação de mais de 10 hospitais; criação de quartos de isolamento existiam cinco e, neste momento, existem mais de 80 nos estabelecimentos hospitalares, para garantir o adequado atendimento de determinados doentes e a melhoria das condições de trabalho dos profissionais.
Ao mesmo tempo, desenvolveram-se os instrumentos de gestão indispensáveis a um sistema desta magnitude. O cartão de utente está, neste momento, com uma cobertura superior a 60%. Tem sido feita a informatização progressiva dos centros de saúde e dos hospitais - de um total de 108 hospitais, em 54 já está instalado e em funcionamento o Programa Sonho, 34 estão em fase de instalação e 20 têm outras aplicações em fase de compatibilização.
Elaborou-se um instrumento fundamental à adequada rentabilização da capacidade instalada no Serviço Nacional de Saúde, a Carta de Equipamentos de Saúde, com uma equipa que procede à sua actualização sistemática. Desenvolveram-se variadíssimos sistemas de informação, como os relativos à gestão das convenções, ao controlo da facturação e outros bastantes mais específicos.
Criaram-se cinco agências de contratualização, uma por cada região de saúde, com intervenção a nível da elaboração dos orçamentos-programa - este ano, todos os orçamentos serão elaborados com esta filosofia - e também intervenção na gestão de projectos específicos como os da recuperação de listas de espera.
Foi desenvolvido um amplo programa de auditorias de gestão e outras áreas temáticas, com vista à rentabilização de todos os meios e à adequada cobrança e emissão da facturação.
Para dar suporte a todas estas acções, desenvolveu-se uma política de recursos humanos que permitisse a sustentabilidade de todas as medidas relativas ao aumento da capacidade de atendimento e rentabilização da capacidade instalada a nível do Serviço Nacional de Saúde e, assim, foi possível absorver todos os recursos médicos e de enfermagem, de acordo com programas que privilegia
ram as áreas e os locais mais carenciados; revalorizaram-se as carreiras com base em compromissos de aumento da produtividade dos serviços; criaram-se e reforçaram-se os programas de fomento da investigação em variadíssimas áreas, desde as especificamente clínicas até às de enfermagem e de gestão; foram utilizados, na sua totalidade, os fundos estruturais da intervenção operacional da saúde, na vertente dirigida à formação, com enfoque nas áreas temáticas das patologias e grupos vulneráveis, da promoção da saúde, da saúde pública, da gestão em saúde, dos comportamentos profissionais de saúde - desempenho de que destaco a formação em humanização e atendimento ao público -, das condições de trabalho em saúde e da formação de formadores. Estes fundos tinham sido totalmente desaproveitados no período antecedente.
Por outro lado, aumentou-se em cerca de 18% a capacidade formativa das Faculdades de Medicina para o ano lectivo em curso e decidiu-se criar mais duas Faculdades de Medicina. Além disso, uma resolução do Conselho de Ministros reformulou completamente toda a orientação do ensino relativamente às ciências das saúde...
A Sr.ª Natalina Moura (PS): - Muito bem!
A Oradora: e a capacidade formativa das esco
las de enfermagem foi aumentada em cerca de 40%.
Mas não ficámos por aqui!... Em termos de política do medicamento - e para além do acordo com a Apifarma, que permite o controlo do crescimento das despesas com medicamentos em ambulatório - tomaram-se as seguintes medidas: foi publicada uma reformulação das comparticipações no custo dos medicamentos que permite, envolver uma componente até agora perfeitamente esquecida a nível de decisão quanto a essa comparticipação, sendo que nesse diploma se tomaram também medidas de controlo dos preços dos medicamentos; foi publicado um diploma relativo aos genéricos, que cria as condições indispensáveis para a sua expansão; foi aprovado o formulário hospitalar; foi desenvolvido o formulário para o ambulatório nos centros de saúde, com base no formulário europeu, o qual entrará em vigor este ano na Administração Regional de Saúde do Norte; foi desenvolvido, por um grupo de profissionais, com base nos projectos Alfa, na Sub-Região de Saúde de Setúbal, um formulário também para ambulatório, que entrará em vigor nessa subregião também este ano; foram desenvolvidos formulários por patologia, em relação aos principais problemas de saúde dos portugueses, em articulação com a Ordem dos Médicos; foi criada uma base de dados, que a informatização dos serviços permitirá disponibilizar a todos os profissionais, para apoio à prescrição por grupos terapêuticos, contendo toda a informação relativa às várias apresentações, preços e encargos para o utente e para o Serviço Nacional de Saúde; foram aprovadas novas regras no relacionamento entre a indústria farmacêutica e os técnicos habilitados a prescreverem e dispensarem medicamentos, paia se obter uma melhor transparência neste relacionamento.
Este diploma foi publicado ontem, embora tivesse já sido aprovado no Consélho de Ministros de Novembro do ano passado,...
Aplausos do PS.
... embora tudo o que atrás referi fosse um, compromisso assumido pelo programa do Governo.
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Como isso não esgota, como é óbvio, as acções levadas a cabo pelo Ministério da Saúde, deu-se inicio a um processo de reformas, através da nomeação, por resolução do Conselho de Ministros, de um Conselho de Reflexão para a Saúde, integrado por peritos independentes, que entregou já o seu relatório final. E friso isto porque esse relatório final apenas foi entregue no início deste mês, mais exactamente no dia 2 de Fevereiro.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Foi entregue há um ano.
A Oradora: - Por sua vez, o relatório provisório foi entregue há um ano,...
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Exactamente, não foi a semana passada, foi há um ano!
A Oradora: - ... para discussão pública, o que o Conselho de Reflexão para a Saúde lamentou muito que não tivesse ocorrido. Apesar da importância que todos os grupos parlamentares atribuem à discussão e à problemática da reforma da saúde, o Conselho entregou-nos o seu relatório provisório há um ano e o seu relatório com as recomendações finais no dia 2 deste mês.
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - Por sua vez, o Governo apresentou a esta Câmara, o ano passado, um documento relativo à reforma estrutural da saúde, no qual se reafirmavam os valores e princípios essenciais do Serviço Nacional de Saúde, em particular, e do Sistema de Saúde, em geral, dos quais saliento a salvaguarda incondicional da dignidade humana, o direito à protecção da saúde, a solidariedade entre todos os portugueses para garantir aquele direito, o reconhecimento da natureza social das prestações de saúde, o respeito pelos valores democráticos da cidadania, a universalidade da cobertura e a equidade no acesso e na utilização dos cuidados.
Destes valores e princípios decorrem, como linhas mestras da estratégia de saúde desenvolvida pelo Ministério da Saúde, uma mudança centrada no cidadão, a melhoria dos indicadores de saúde como missão principal da acção dos serviços de saúde e o envolvimento de todas as componentes do sistema de saúde - pública, social e privada -, com base em regras claras e transparentes de articulação.
Sendo hoje consensual que um processo de reforma num sector social tão específico como o da saúde não pode nem deve ser feito através de rupturas abruptas que inviabilizem esse mesmo processo, adoptou-se uma metodologia de intervenção dirigida aos aspectos essenciais do sistema através da metodologia da experimentação, de que são exemplos a criação dos projectos Alfa, como forma de reorganização do atendimento nos centros de saúde, o desenvolvimento de um sistema remuneratório experimental para os médicos de família, que privilegia o atendimento dos grupos miais vulneráveis, e o desenvolvimento de acções, tais como o atendimento domiciliário, que constituem uma falha importante no sistema.
As análise e avaliação deste projecto inovador permitiram já a aprovação, em Conselho de Ministros, de uma nova regulamentação para os centros de saúde, que lhes introduzirá, progressivamente, uma nova dinâmica e filosofia de funcionamento.
Foi também aprovado um novo estatuto jurídico hospitalar experimental, o qual que já entrou em vigor no novo Hospital de Vila da Feira.
Além disso, encontram-se em processo de desenvolvimento os centros de responsabilidade integrados, como nível intermédio de gestão nos hospitais, por forma a permitir a rentabilização de todos os recursos disponíveis, através da criação de condições que facilitem e possibilitem a dedicação a tempo inteiro dos profissionais de saúde; entraram em funcionamento experimental sistemas locais de saúde - um por cada região de saúde -, como forma organizativa de prestação de cuidados, que permitem a rentabilização de todos os recursos existentes numa determinada área geográfica e comunidade, que convergem para a realização de objectivos de saúde. O diploma que os rege foi já também aprovado em Conselho de Ministros e elaborado em função dos ensinamentos colhidos através da experimentação feita nos cinco locais iniciais de implementação.
Aplausos do PS.
Os Srs. Deputados que tiveram já a oportunidade de visitar um desses sistemas locais de saúde, o de Viana do Castelo, puderam, in loco, apreciar e aperceber-se da enorme potencialidade que esta fonna organizativa acarreta para o Serviço Nacional de Saúde e para o Sistema de Saúde. Isso deve-se à criação de condições de articulação que nunca existiram até agora, apesar das regras definidas em variadíssimos despachos.
A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Muito bem!
O Sr. Nelson Baltazar (PS): - É assim mesmo!
A Oradora: - Além disso, desenvolveram-se as agências de contratualização, como suporte à separação entre financiamento e prestação e, consequentemente, à reformulação dos critérios de financiamento já em curso, que apostam na produção e não na mera existência dos serviços.
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - Reformulou-se também o Regime Jurídico das Convenções, apontado quer no relatório da OCDE quer no relatório do Conselho de Reflexão da Saúde, como um dos factores mais condicionadores da não rentabilização do Serviço Nacional de Saúde.
Por outro lado, para além de terem sido adoptados mecanismos de avaliação, monitorização e vigilância na área da saúde pública, adoptou-se também um programa de avaliação de qualidade nos centros de saúde, o qual permitiu já a avaliação de cerca de 80% de todos os centros de saúde existentes, programa este que se alargará, no âmbito de um sistema de qualidade já em adiantada fase de preparação, aos estabelecimentos hospitalares.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Isso é falso!...
A Oradora: - Desenvolveu-se ainda uma política de saúde mental - e isto é extraordinariamente importante, porque a última reestruturação tinha sido feita em 1961 -, sustentada numa reorganização dos serviços de saúde mental, também já publicada em diploma legal e em vigor;...
Aplausos do PS.
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... introduziram-se mecanismos fortes de articulação com outros sectores vitais, para as consolidação e eficácia de uma política de saúde como a segurança social, de que já é exemplo o crescimento, em termos de percentagem de cobertura da população, da região do Algarve, através do apoio domiciliário, como forma alternativa e bastante mais humanizada à da institucionalização, articulação que também foi feita com a educação, com a juventude e com a justiça, no primeiro caso através de programas inseridos nas redes das escolas promotoras de saúde, o que já atrás anunciei, os quais já levaram à criação de programas específicos de acção em mais de 600 escolas, em articulação com os centros de saúde locais, no segundo caso através de atendimento específico aos jovens, designadamente na vertente do aconselhamento sexual e, no terceiro caso, através de programas específicos com o sistema prisional.
Tudo isto foi feito no sentido de afirmar o Serviço Nacional de Saúde como instrumento estratégico da política de saúde, com três funções distintas: a de investir em saúde, criando melhor saúde para os portugueses; a de financiar os cuidados de saúde; a de potenciar a correcta utilização de todos os recursos de prestação de cuidados, articulando-os com os sectores social e privado, com base em regras claras e transparentes.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.ªs e Srs. Deputados: Muito ficou por dizer quanto ao que já fizemos, mas muito há ainda por fazer. Não vim aqui traçar um cenário de «oásis»,...
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Não parece! ...
A Oradora: - ... porque os problemas, além de serem muitos e enormes, radicam em questões estruturais e complexas que implicam mudanças de atitudes e de comportamentos dificeis de alcançar em prazo curto. Mas, existindo um rumo, um caminho traçado, uma opção clara e inequívoca, determinadamente afirmada, o ganhar deste desafio está ao nosso alcance.
Aplausos do PS, de pé.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos à Sr.ª Ministra da Saúde, os Srs. Deputados Octávio Teixeira, Francisco Martins, Maria José Nogueira Pinto, Isabel Castro, Bernardino Soares, José Carlos Póvoas, Luísa Mesquita, Fernando Pedro Moutinho, Alexandrino Saldanha, Jorge Roque Cunha, Rodeia Machado e António Filipe.
Antes de mais, darei a palavra aos Srs. Deputados que se inscreveram para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Carlos Carvalhas e, em primeiro lugar, ao Sr. Deputado Manuel dos Santos.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, permitia-me retomar a última frase do discurso da Sr.ª Ministra para lhe lembrar que é comportamento normal do Governo, do partido qlle apoia o Governo e do grupo parlamentar que também apoia o Governo não fazer aqui o discurso do «oásis», o discurso de que «tudo está bem».
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Não se notou!
O Orador: - E se isto é válido para áreas tão complexas e discutíveis em termos de apreciação qualitativa como são, por exemplo, os índices macroeconómicos, é, sobretudo; válido para as áreas sociais.
A Sr.ª Natalina Moura (PS): - Muito bem!
O Orador: - Evidentemente, nunca tudo estará bem em nenhuma sociedade relativamente à saúde, porque a saúde é, pela sua própria natureza, um sector permanentemente deficitário. Enquanto houver um cuidado de saúde que demore mais do que o normal a ser prestado, naturalmente, haverá um défice na saúde. Portanto, a mensagem que o Governo tem permanentemente trazido à opinião pública e, por diversas vezes, a esta Câmara e a mensagem que a Sr.ª Ministra transmitiu no discurso que acabou de fazer é, exactamente, a mensagem de que há um longo caminho a percorrer, mas que há, sobretudo - e isso é que é muito importante -, um desígnio e um objectivo para que esse caminho seja percorrido.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Aproveito, aliás, para saudar a intervenção do Sr. Deputado Carlos Carvalhas, porque penso, com franqueza, que, na linha de outras intervenções que-em matéria de políticá de saúde têm sido feitas pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, é mais uma achega e uma contribuição positiva para o pacto, o verdadeiro pacto de regime que tem de ser estabelecido em Portugal para resolver problemas complexos, um dos quais é, naturalmente, o problema da saúde.
O Sr. José Barradas (PS): - Bem lembrado!
O Orador: - Lembraria aqui o que já disse em momento oportuno, a propósito da discussão das listas de espera, ou seja, que o Sr. Primeiro-Ministro lançou um desafio à sociedade portuguesa e aos partidos: o desafio de que colaborassem com o Governo na elaboração de um autêntico pacto de regime para algumas das reformas estruturais mais importantes. Com a excepção do PCP, nenhum dos partidos se mostrou disponível para colaborar com o Governo e para lhe apresentar ideias, sugestões ou propostas de medidas. Acontece, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, que há uma boa parte da oposição que usa o sofrimento dos portugueses como arma de arremesso político e como arma de luta partidária. Isso é que é manifestamente intolerável, Sr. Deputado!
Aplausos do PS.
Em questões como a da saúde, questões extremamente sensíveis para todos os portugueses, ricos e pobres, é perfeitamente inqualificável e imoral que se utilizem as deficiências do sector para fazer luta partidária e para usar como arma de arremesso político.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Pura demagogia!
O Orador: - V. Ex.ª não o fez, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, e, por isso, merece, sinceramente, os meus cumprimentos e os cumprimentos desta Câmara.
Contudo, V. Ex.ª tem ainda de formular algumas respostas, porque, naturalmente, no seu discurso não pode referir tudo. Pareceu-me entender que V. Ex.ª defende a subsistência e a consolidação do Serviço Nacional de Saúde. A Sr.ª Ministra da Saúde acabou agora de afirmar que entende o Serviço Nacional de Saúde como uma arma estratégica fiìndamental para a política de saúde em Portugal. Portanto, o apelo que lhe faço, sob a forma de uma
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pergunta, é exactamente o seguinte: está V. Ex.ª de acordo com o Serviço Nacional de Saúde, com os três objectivos que a Sr.ª Ministra definiu e, sobretudo, com os dois grandes desígnios que estão incorporados nessa reforma, que são o desígnio da centralidade do cidadão, isto é, a colocação do cidadão no centro das políticas de saúde, e uma nova administração pública da saúde? Está, ou não, V. Ex.ª de acordo com esta política?
Por último, quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que não olhamos apenas para o nosso umbigo. Como tal, quero fazer-lhe uma pergunta que envolve a acção deste Governo, mas que também envolve a acção de governos anteriores. Não entende o Sr. Deputado que, ao fim de 20 anos de Serviço Nacional de Saúde, é completamente diferente a situação da saúde em Portugal? Não entende V. Ex.ª que a saúde em Portugal é hoje completamente diferente do que era há 20 anos...
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - É pior!
O Orador: - ... e que, portanto, este é o caminho justo que deve ser prosseguido?
São estas as perguntas, Sr. Deputado, não deixando de cumprimentá-lo pela elevação da sua colaboração neste debate.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Carlos Carvalhas, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, penso que esta interpelação ao Governo só terá algum interesse se, realmente, a Câmara entender o que está aqui em causa. E o que está aqui em causa é o que tem vindo a estar em causa neste Hemiciclo sempre que o Partido Comunista fala de saúde e desde que o Governo sentiu necessidade de se apoiar no Partido Comunista, não sabemos bem para quê.
A avaliar-se o titulo desta interpelação, terá de se concluir que é um titulo ánteressante, porque pensava que o Partido Comunista vinha em defesa do cidadão,...
O Sr. José Barradas (PS): = Para isso, está cá V. Ex.ª! Não é preciso mais ninguém!
A Oradora: - ... mais concretamente em defesa do cidadão doente, mais concretamente em defesa do doente que, estando doente, não é atendido e, ainda mais concretamente, em defesa do cidadão que estando doente não é atendido e que tem fracos recursos, sendo obrigado a «vender os anéis para ficar com os dedos». Era isto que pensava que o Partido Comunista vinha fazer, mas, afinal, o Partido Comunista vem defender um instrumento e o instrumento, Sr. Deputado, é aquele que os portugueses querem e que eu também quero: o Serviço Nacional de Saúde. Mas o que queremos é o Serviço Nacional de Saúde ao serviço dos cidadãos e não um Serviço Nacional de Saúde que seja um instrumento por si. O instrumento por si vale pelos resultados que tem para os cidadãos e se o senhor disser aos cidadãos que é um grande defensor deste Serviço Nacional de Saúde monopolista e anquilosado e depois disser que, porque este Serviço Nacional de Saúde é uma bandeira e um símbolo que tem de defender, o cidadão tem de sofrer, ninguém vai entender o seu discurso.
Queria ainda dizer outra coisa: é que o Governo vai ter muita dificuldade em aceitar o contributo que os senhores trazem, porque em 1990, já lá vão nove anos, o Sr. Deputado Jorge Catarino - penso que se chama assim -, do Partido Socialista, dizia, a propósito do vosso projecto de lei de bases da saúde: «O projecto de lei do PCP retoma a velha ideia de um SNS centralizador.». E, depois, explica por que é que esse projecto devia ser abandonado - èra, então, uris Deputado do Partido Socialista na oposição.
Não vamos pensar que, nove anos depois, o Partido Socialista no poder e no Governo vai receber estes contributos enganosos do Partido Comunista... É isso que está aqui hoje em questão, é a defesa não do instrumento ao serviço dos cidadãos mas de um símbolo. O que está em questão é a ideia da bancada do Partido Comunista de que pode ir fazendo a reforma que o Governo não quer fazer e a ideia de que, no fim disto tudo, o Partido Comunista e o Governo resolveram o problema de saúde dos portugueses. Nós estamos cá para dizer que isso não é assim.
Concretamente, queria fazer-lhe uma pergunta, Sr. Deputado Carlos Carvalhas: numa dada altura, um Deputado do seu partido acentuou o grande risco que se corria com as empresas privadas com fins lucrativos, o grande risco que se corria com os acordos leoninos celebrados com as empresas privadas com fins lucrativos e o grande risco que representava a entrega dos hospitais públicos à gestão privada. Tenho uma grande curiosidade que gostava que me satisfizesse. A primeira situação com que me deparei enquanto Deputada e que me constrangeu, em nome dos valores que o Serviço Nacional de Saúde defende e em nome do contributo que, como contribuinte, dou ao Serviço Nacional de Saúde, foi o acordo com a Cruz Vermelha. Pergunto: por que é que o Partido Comunista nunca disse nada? Por que é que o Partido Comunista nunca levantou a sua voz para denunciar uma situação que, pelo menos, é obscura e nos deixa inquietos, porque, de certa forma, prejudicou o trabalho de dois hospitais públicos e de dois centros importantes de dois hospitais públicos e baralhou a relação com um sistema que, para todos os efeitos, é privado? Não ouvi o Partido Comunista dizer fosse o que fosse.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Ouve mal!
A Oradora: - Por outro lado, penso que é curioso ouvir hoje o Partido Comunista dizer que gosta muito da gestão privada do Hospital de Amadora-Sintra, que, realmente, parece que está a dar bons resultados. Afinal de contas, não foi tão demoníaco assim entregar este Hospital à gestão privada. Isto porque hoje não ouvi o Partido Comunista dizer o que quer que fosse sobre a gestão privada do Hospital Amadora-Sintra.
Concretizando, queira a bancada do Partido Comunista dizer por que razão não fala de uma questão ou de outra e por que é que vem defender um SNS fossilizado e anquilosado como instrumento, em vez de vir defender os cidadãos, todos os dias prejudicados com o mau funcionamento deste instrumento.
O Sr. Presidente: - Para mais um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Carlos Carvalhas, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Marques.
O Sr. Rui Marques (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Hoje não restam dú-
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vidas de que há um acordo político global entre o Partido Socialista e o Partido Comunista, sendo que este debate sobre matéria de saúde faz parte desse acordo global.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Outro que precisa de ir ao otorrino!
O Orador: - O que se está a utilizar é uma técnica conhecida. É a técnica de se rir aqui fazer um debate para se criar a imagem de que o Partido Comunista critica a política do Ministério da Saúde, de que o Partido Comunista discorda da política do Ministério da Saúde, mas, depois, como trabalho de casa, em comum acordo, elaboram os projectos de lei. É assim que as coisas funcionam.
Risos dos Deputados do PCP.
O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Não se riam, porque é verdade!
O Orador: - Quem se dá ao trabalho de ler os projectos de lei que o Partido Comunista apresentou, designadamente o projecto de lei n.º 581/VII - Lei-quadro da administração e gestão democrática dos centros de saúde, hospitais e sistemas locais do Serviço Nacional de Saúde, lerá no artigo 30.º uma coisa que penso ser importante trazer a esta Câmara, porque, sendo uma redácção remetida para o artigo trigésimo, é importante que aqui se discuta. Este artigo, referindo-se à exoneração dos cargos de administração e de gestão dos centros de saúde e dos hospitais, diz o seguinte: «A exoneração ocorrerá por incumprimento do orçamento-programa (...)» - e, depois, atente-se - «(...) falta de observância da lei ou violação grave dos deveres de gestor (...)». O que esta norma, a ser aprovada, permite é a atribuição às administrações regionais de saúde de um poder discricionário de exoneração. Ou seja, o que aqui está em causa é um verdadeiro processo de saneamento político!
Esta norma, sendo simples e remetida para um artigo que está no meio do projecto de lei, permitirá verdadeiros saneamentos políticos e insere-se no quadro mais geral do assalto, por parte do Partido Socialista, a toda a máquina administrativa e de gestão do Estado. Naturalmente, porque esta é uma questão que estou a colocar, gostava de ouvir o Sr. Deputado Carlos Carvalhas pronunciar-se sobre esta matéria, dizendo por que é que a redacção está feita desta forma, porque, para nós, trata-se de um fato feito à medida dos interesses do Partido Socialista.
Uma outra questão que quero colocar tem a ver com os medicamentos, porque o Sr. Deputado também se referiu aos medicamentos. Como sabe, o Partido Popular várias vezes tem debatido esta matéria e tem propostas muito concretas sobre ela. É óbvio que as nossas concepções são diferentes, se bem que ambos estejamos contra os monopólios privados. No entanto, nós também somos contra os monopólios públicos e os senhores não são. Mas há aqui uma outra diferença fundamental: é que os senhores preocupam-se com quem vende, conto nós fazemos, mas nós preocupamo-nos muito mais com quem compra, que são os doentes, os desprotegidos e os desfavorecidos.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Não se tem notado!
O Orador: - A prova disso, Sr. Deputado, é que nós temos vindo a propor há muito tempo o escalonamento do
preço dos medicamentos, ou seja, quem pode mais, paga mais, quem pode menos, paga menos. Os senhores não fazem esta proposta.
Também tive oportunidade de ler o vosso projecto de lei relativo aos medicamentos e reparei que, no artigo 3.º, VV. Ex.as dizem que a receita médica relativa aos genéricos passa a ser efectuada com indicação da substância activa, o nome genérico ou denominação comum internacional, seguida da dosagem e a forma farmacêutica. A minha pergunta é esta: porque não o número de unidades? Todos nós sabemos que não há família portuguesa que não tenha em casa uma gaveta carregada de medicamentos.
A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Os que podem!
O Orador: - Ou seja, têm muito dinheiro metido em gavetas. Isto passa-se porque, como sabem, as doses estão uniformizadas e ao médico não é dada a possibilidade de dar a indicação do número de doses que são receitadas. Gostava de saber por que é que o Partido Comunista não faz essa proposta e, para terminar, gostava que me explicassem como é que entendem que se pode implantar um formulário nacional de medicamentos que tenha em conta o balanço entre o custo e o benefício terapêutico dos fármacos.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Júlio Faria que, por lapso meu, não falou antes do Sr. Deputado Rui Marques. Peço-lhe desculpa.
Tem a palavra, Sr. Deputado Júlio Faria.
O Sr. Júlio Faria (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, consideramos natural e oportuna esta interpelação do PCP, centrada na defesa do Serviço Nacional de Saúde e na política do Governo para o sector.
Consideramos esta interpelação natural, porque o partido interpelante, à semelhança deste grupo parlamentar e do Governo, identifica-se claramente com a defesa do Serviço Nacional de Saúde, uma referência especial da política social do País, ao contrário do que sucede com outros grupos parlamentares aqui presentes. É, por isso, natural esta interpelação neste momento. Mas, para além de natural, ela também é oportuna, porque acontece após o Governo ter tornado público um conjunto de propostas,...
O Sr. Alberto Marques (PS): - Muito bem visto!
O Orador: - ... a que chamou «SNS/XXI - Uma estratégia para o virar do século», que consubstancia um conjunto de formulações políticas que permitem, ao contrário do que se disse anteriormente, ajustar o Serviço Nacional de Saúde à realidade de hoje e criar condições para que haja uma resposta aos cidadãos nesta área da saúde. É, por isso, também oportuna esta interpelação e vemos que ela é tanto mais oportuna quanto, depois da intervenção do Sr. Deputado Carlos Carvalhas, tivemos ocasião de ouvir mais uma vez a Sr.ª Ministra da Saúde referir exactamente o conjunto de formulações que foram tornadas públicas, algumas delas objecto de apreciação em Conselho de Ministros, que permitem dar resposta a algumas das nossas legítimas pretensões e preocupações.
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Por isto, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, a questão que lhe coloco, estando nós de acordo quanto ao perfil estratégico essencial do sector prestador do Serviço Nacional de Saúde, é a seguinte: estamos ou não de acordo quanto aos princípios da reforma da saúde e à tal formalização de algumas políticas mais específicas, algumas das quais o Governo apresentou e aprovou em Conselho de Ministros, designadamente as que têm a ver com sistemas locais de saúde, com centros de saúde de terceira geração, com centros de responsabilidade integrada?
Pergunto-lhe também se estamos ou não de acordo quanto à nova lei das convenções e quanto à política do Governo que recentemente propôs e criou duas Faculdades de Medicina no interior do País. É que nós pensamos, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, ao contrário do que pensa o sector mais à nossa direita, que aqui está à nossa esquerda, que, com estes propósitos, com estas acções concretas no terreno, o que acontece é que estamos a fazer do Serviço Nacional de Saúde não um serviço anquilosado, como se pretendeu dizer, mas, pelo contrário, um serviço actual, capaz de dar resposta às satisfações mais legítimas dos cidadãos, satisfações que foram esquecidas, fruto de uma política de abandono do Serviço Nacional de Saúde por parte do governo que antecedeu o actual Governo de maioria PS.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para responder aos quatro pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, em primeiro lugar, quero agradecer as questões que me foram colocadas, começando por responder primeiro aos Deputados do Partido Socialista e depois aos Deputados do CDS-PP.
Quanto aos objectivos estratégicos de defesa do Serviço Nacional de Saúde, estamos de acordo. Mas não estamos de acordo com um pacto de regime, porque há já um, que é o pacto de regime da Constituição da República Portuguesa, que defende o Serviço Nacional de Saúde como universal, geral e tendencialmente gratuito.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Este é que é o grande pacto. Aqueles que se querem «reciclar» fora do arco constitucional têm naturalmente outras opções. Mas quando se decide uma marcha é preciso avançar. Esta é que é a questão de divergência. São apontadas linhas, com algumas das quais estamos de acordo, mas, depois, não se avança, a máquina emperra, patina, passa o tempo. E, apesar de não sermos daqueles que afirmamos que tudo está mal, que nada se tem feito, se ouvirmos os utentes, se formos para a rua ouvir os cidadãos que precisam de cuidados de saúde, que estão nas listas de espera, ouvimos queixas e mais queixas.
De facto, quando não se quer enfrentar as multinacionais dos medicamentos ou os grandes interesses das convenções, é evidente que, depois, não há dinheiro para melhorar o Serviço Nacional de Saúde.
Vozes do PCP: - Muito bem!
Orador: - Esta é a questão geral.
Quanto à questão mais particular, da lei das convenções, foi apenas um passo, consideramos que ela foi tímida e insuficiente, porque o que vemos é que ela não avança. O mesmo se passa em relação aos genéricos. Os genéricos de marca abriram as portas, mas a quê? Às multinacionais, para que consigam, por esse meio, entravar todo um processo de reforma e de poupança de milhões de contos!?...
Vozes do PCP: - Muito bem!
Orador: - É, pois, necessário avançar e dar a volta a esta questão. No entanto, do outro lado do Hemiciclo, as questões são diferentes, porque quando o PP vem, à última da hora, dizer que «estamos aqui num acordo global com o Partido Socialista», até dá vontade de rir... Um Partido, que, ao longo desta sessão legislativa, até numa suite de hotel negociou com o Partido Socialista; que telefonava diariamente ao Secretário-Geral do Partido Socialista; que foram bengala durante estes anos em relação ao orçamento e às principais leis; vir, agora, à última da hora, dar o dito por não dito, virar a situação, é, no fundo, faltar à verdade.
Vozes do PCP: - Muito bem!
Orador: - Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, os cidadãos pobres não têm anéis para vender...
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Têm, têm! Aliás, é só o que têm!...
O Orador: -... e aqueles que os têm, pelos vistos, deviam vendê-los aos Mello para Generalle des Eaux... De facto, a senhora e a sua bancada são da democracia cristã, mas o «Padre Nosso» sabe-o só até ao < venha a nós»,...
Aplausos do PCP.
Risos.
... porque aquilo que a senhora defende é a privatização, são as multinacionais, são os grandes lucros para os grandes interesses. Por que é que a senhora é contra o Serviço Nacional de Saúde? Disse: «Nós também queremos o SNS, o que somos é a favor do utente!»
É a favor do uténte? Daquele que tem de deixar o «couro e cabelo» quando vai aos serviços privados? É isso? É a favor da promiscuidade entre sector público e sector privado? Por que é que o sector privado tem de parasitar o sector público? Porquê? É isto o serviço do utente? São esses os anéis?
Vozes do PCP: - Bem lembrado!
O Orador: - Quem foi bengala e cúmplice do que se passou no passado é responsável pela actual situação.
Por último - e respondendo à pergunta do Sr. Depútado Manuel dos Santos -, quero dizer que, apesar de tudo, hoje, em 1999, depois do 25 de Abril, a situação da saúde em Portugal é substancialmente diferente da que era antes do 24 de Abril. Fiquem com o 24 de Abril, que nós ficamos com o 25 de Abril!
Aplausos do PCP.
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19 DE FEVEREIRO DE 1999
O Sr. Presidente: - Para defesa da honra da sua bancada, tem a palavra a Sr.º Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente; quero .apenas dizer ao Sr. Deputado Carlos Carvalhas que aquilo que ele não suporta é o facto de Portugal não querer o modelo que o senhor quer impor para tudo, se pudesse, e para a saúde, concretamente.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
A Oradora: - Sr. Deputado; nós não estamos no dia 24 de Abril, estamos em 1999, mas, já em 1990, nesta Câmara, todas as bancadas, excepto a. do Partido Comunista - e mesmo da bancada do Patido Comunista as vozes eram mais lúcidas e clarividentes, os senhores retrocederam -, reconheceram que havia uma alteração. E para manter o Serviço Nacional de Saúde suficientemente vitalizado ao serviço do cidadão, como ele tem de estar, era preciso reformá-lo. E é isso que o Sr. Deputado não quer, porque só quer o monopólio estatal, anquilosado, fossilizado.
O Sr. Deputado disse-me que «os cidadãos pobres não têm anéis». S6 têm anéis! Daqui a pouco, não terão nem couro nem cabelo. Não me parece que das propostas que o Sr. Deputado faça resulte qualquer bem para os cidadãos. Esse é que devia ser o debate de hoje, ou seja, saber que alterações era preciso introduzir no sistema para que ele, efectivamente, esteja ao serviço dos cidadãos.
Quanto à promiscuidade entre o público e o privado, sabe de onde vem? Vem da incapacidade, da falta de coragem de se reconhecer que vivemos num país que tem, legitimamente, iniciativa privada e tem - e muito bem! - um Serviço Nacional de Saúde público, e tem que compatibilizar duas realidades que têm que ser compatibílizadas. Mas isso os senhores não podem por questões dogmáticas! O Governo não faz porque não tem coragem política! Nós temos coragem política e não temos qualquer pejo em dizer que vivemos num país que tem iniciativá privada, que vivemos num país que tem um Serviço Nacional de Saúde, e que tudo isto tem que conviver, como, aliás, foi dito em 1990 pelos Deputados da bancada do Partido Socialista.
Fazer conviver estas realidades é o futuro, fazer conviver estas realidades é, talvez, a salvação do Serviço Nacional de Saúde e é, certamente, o bem do utente e o bem do doente português. Querer fechar os olhos não vale a pena, porque o tempo passou, a vida é esta, o mundo em que vivemos é este, é deste que temos que cuidar e foi para isso que fomos eleitos, foi para cuidar deste mundo e não de uma ficção que o Sr. Deputado tem na cabeça e á qual, felizmente, já ninguém presta muita atenção.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Mas, felizmente, o mundo presta «muita atenção» á Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto...
O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - A si, então, nem queira saber!...
O Orador: - E, como lhe presta < muita atenção», o mundo pode definir a sua filosofia de uma maneira muito simples, que é esta: quem quer saúde que a pague; quem quer ensino que o pague e se quer pagar menos impostos torna-te rico. Mas nem todos se podem tornar ricos, nem todos têm dinheiro para pagar a saúde, nem todos têm dinheiro para pagar o ensino.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Não, não! Não é nada disso!
O Orador: - Por isso, Sr.º Deputada Maria José Nogueira Pinto, lembre-se da Constituição, que define o Serviço Nacional de Saúde como geral e tendencialmente gratuito. É isto que defendemos. Não estamos contra o serviço privado, estamos contra o facto de o serviço privado andar a parasitar o serviço público. E a Sr.º Deputada quer o contrário, mas se quer o contrário tem de lutar por isso. O que a Sr.º Deputada defende é a privatização, a promiscuidade, a parasitagem do Serviço Nacional de Saúde pelo sector privado. É isto que a Sr.ª Deputada defende. Nós estamos contra isto, dissemos não e estamos convencidos de que os utentes, os cidadãos, os doentes, estão contra essa proposta.
Aplausos do PCP
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos à Sr.º Ministra da Saúde, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr.º Ministra: A senhora, no final da sua intervenção, referiu que não veio apresentar um cenário de < oásis» para o sector da saúde. Se não vem com essa intenção, disfarçou bastante bem, porque aquilo que a Sr.ª Ministra nos veio dizer foi que o Governo já fez de tudo, já fez praticamente tudo - aliás, julgo que não haverá nenhum sector ou subsector da saúde que a Sr.º Ministra não tenha dito que o assunto não esteja resolvido. O problema é que a realidade mostra-nos que os utentes, os cidadãos, os doentes não sentem isso - e eles não são masoquistas... Não sentem porque, de facto, não tem melhorado, no fundamental, a prestação dos cuidados de saúde.
Aliás, depois deste discurso, a Sr.º Ministra terá ficado muito espantada e não ~esperava, certamente, que 15 dias antes da realização desta interpelação, esta mesma interpelação do PCP tivesse sido, ao fim e ao cabo, sufragada, quase por unanimidade, pelo Partido Socialista,...
O Sr. Bernardino Soares (PCP): ~- É verdade!
O Orador: - ... porque, no Congresso de há 15 dias, do Partido Socialista, foi aprovada, entre outras coisas, quase por unanimidade (não sei se a Sr.º Ministra também votou favoravelmente, é capaz de ter votado a favor), foi aprovado, por exemplo, o seguinte: u(...) Há, em Portugal, uma doença da saúde, o SNS está em crise, há problemas estruturais de financiamento e de organização por detrás da crise, mas há quem dela beneficie. A crise do sistema público é a melhor estratégia para forçar as pessoas a recorrer aos novos sistemas privados».
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Bem lembrado!
O Orador: - Isto foi aprovado, quase por unanimidade, no Congresso do Partido Socialista, o que confirma
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que há, de facto, uma crise. Aliás, o Sr. Eng.º Guterres, nessa altura, vestindo a pele de Secretário-Geral do Partido Socialista, também sufragou esta tese da crise no sector de saúde, em Portugal, quando afirmou que, para a próxima legíslatura, a grande < paixão» do Governo será a saúde. Isto é, reconheceu explicitamente que, durante três anos e meio, a saúde foi abandonada no essencial, precisando, agora, de uma grande «paixão».
Por isso, Sr.ª Ministra, o seu discurso . está desenquadrado, o seu discurso do «oásis» - embora não queira chamar-lhe «oásis» -, está desenquadrado da realidade, porque a verdade é que a crise existe. E a questão central da crise, que existe, é, por um lado, a de saber de quem é a responsabilidade. Ora a crise no sector de saúde existe por responsabilidades do Governo!
O Governo do Partido Socialista pode queixar-se do ónus que lhe foi deixado pelos governos anteriores, mas já está a governar há três anos e meio. Já não pode desculpar-se apenas com isso. Tem responsabilidades claras, responsabilidades que são do Governo, da Sr.ª Ministra, em particular, e do Sr. Primeiro-Ministro. Mas, por outro lado, resta saber, para além da, responsabilidade do Governo, por que é que está em crise? Está em crise - e isso foi explicitado pelo meu camarada Carlos Carvalhas - devido às hesitações do Governo em toda a matéria de saúde, às cedências aos grandes interesses, aos interesses das multinacionais, aos interesses do sector convencionado, aos interesses dos grupos monopolistas, empresariais, económicos, que querem a privatização da saúde. Aliás, todos eles, ao fim e ao cabo, querem a privatização da saúde, reduzindo a componente pública do Serviço Nacional de Saúde a uma mera forma assistencialista, para que o resto aumente os lucros em milhões para o sector privado.
Assim, a questão que lhe deixo, Sr.ª Ministra, é esta: Sr.º Ministra, por favor, explique-nos, de uma vez por todas, por que razão ou razões é que o Governo continua a ceder às pressões e aos interesses dos grandes lobbies instalados no sector da saúde? Por que é que o Governo continua, quando cede, a privilegiar esses lobbies em detrimento e contra os interesses, esses sim, legítimos e prioritários dos utentes, dos cidadãos, dos doentes de Portugal?
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a
Sa r. Ministra da Saúde.
A Sr.ª Ministra da Saúde: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, por vezes, uma coisa é aquilo que dizemos e outra é a imagem que damos. 'Não quis traçar o quadro do oásis, nunca o tracei em qualquer das intervenções que fiz nesta Câmara, limitei-me a dizer aquilo que tinha sido feito e que pode ser comprovado,...
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - A Sr.ª Ministra anda desatenta!
A Oradora: - ... sem ter, nunca, a tentação nem a veleidade de dizer que não há problemas, que eles não são graves, não estão profundamente enraizados e resolvem-se com facilidade.
A Sr.ª Natalina Moura (PS): - Muito bem!
A Oradora: - E se os problemas são graves e são estruturais, obviamente, determinam muitas situações que
são totalmente inadequadas, porque prejudicam, e gravemente, os utilizadores do sistema de saúde em geral e do Serviço Nacional de Saúde em particular.
E porque os problemas são estruturais, graves e profundos, radicando-se frequentemente também em questões culturais, muitas vezes o Sr. Deputados me terá ouvido referir nesta Câmara, como em muitas intervenções tive ocasião de fazer, que é indispensável que haja uma concertação, pelo menos em relação às linhas essenciais; para que, efectivamente, se possa conduzir, num quadro de estabilidade, uma profunda reforma do sector.
Agora, o Sr. Deputado diz que os lobbies não são afrontados. Penso que as medidas que este Governo tem tomado, designadamente, no que se refere ao quadro das convenções, à criação de um regime de incompatibilidades, geraram, inequivocamente, muitas perturbações, não porque haja razões para isso - porque a procura em cuidados de saúde é tão grande que ela existirá sempre, quer para o sector privado, quer para o sector público, e crescerá à medida que a oferta aumenta - mas porque isto interfere com um processo de funcionamento criado há muitas e muitas décadas e, no imaginário das pessoas e de muitos profissionais, o mau funcionamento do Serviço Nacional de Saúde é angariador, digamos, de clientela ou de procura para o sector privado.
Foi identificado no relatório do Conselho de Reflexão para a Saúde, que explicitamente o refere, que é a existência do duplo emprego e de relações pouco claras entre aquilo que é a prestação de serviços num e noutro sector que gera desperdícios enormes em termos da utilização da capacidade instalada no Serviço Nacional de Saúde. Defendo que é possível, desejável e imperioso que exista uma articulação que estabeleça essas regras de ligação de forma clara, como o diploma relativo às convenções com um regime de incompatibilidades definido, que foi bastante criticado, como o Sr. Deputado sabe. O sistema de gestão de convenções privilegia que elas sejam utilizadas em função daquilo que são os principais problemas de saúde dos portugueses e traça um quadro muito claro no que 'se refere à não pactuação com aquilo que é um procedimento e um comportamento tradicional.
Por outro lado, todos os trabalhos que estão a ser desenvolvidos no sentido de criar, progressivamente, condições, quer no que se refere à restruturação do funcionamento dos serviços, quer no que se refere à restruturação das políticas remuneratórias, visão fidelizar, de certa forma, os profissionais a uma determinada instituição, no sentido de termos, cada vez mais, pessoas que optam por estar no sector público, e aí estão, e pessoas que optam por estar no sector privado, e aí estão, e poderá, assim, estabelecer-se um quadro de relacionamento muito claro e inequívoco.
Não me diga também, Sr. Deputado, que os diplomas relativos à questão dos medicamentos não afrontam aquilo que são interesses muito fortes e. muito sólidos existentes neste domínio, porque, se assim não fosse, eles não teriam sido objecto de tanta contestação e, sobretudo, de tantas atitudes no sentido de adiar sine die a sua aplicação.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco José Martins.
O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr. Presidente, Si-s. Membros do Governo, Sr." e Srs. Deputados, Sr.º
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Ministra: Uma questão prévia, para referir, porventura, aquele que é o elemento que temos em comum, um imperativo constitucional, ou seja, o sistema de saúde assente num verdadeiro Serviço Nacional de Saúde e, como V. Ex." disse e eu repito, uma verdadeira complementaridade quanto ao aspecto privado e social. Em relação a esse ponto estamos plenamente de acordo.
Uma segunda nota, que para o PSD é fundamental: toda e qualquer política de saúde deve estar assente sempre no cidadão, ou seja, a centralidade no cidadão é um referencial e temos de ter isso presente.
Mas permita-me V. Ex.a que lhe diga o seguinte: a intervenção que V. Ex.ª trouxe a esta Câmara — de resto, muito habitual naquilo que são as características dessa mesma mensagem —, nada tem a ver com aquilo que são as preocupações efectivas do PSD.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Entendemos que V. Ex.a trouxe aquilo que é produto de unia estratégia, a última estratégia que o Ministério da Saúde tem para a política de saúde,...
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — É a sexta!
O Orador: — ... que é a sexta, ou seja, são já seis os projectos de estratégia reformulados — como V. Ex.a, de resto, tem dito — e hoje trouxe-nos, uma vez mais, estratégias, propósitos, promessas.
Mas não é isso que interessa ao cidadão e estamos preocupados, mais do que com estratégias - que são absolutamente indispensáveis, é verdade -, em responder àquilo que são, diria, as mais elementares carências do cidadão e do utente, que é aquele que é o destinatário das políticas do Ministério da Saúde. Aí, permita-me V. Ex.a que diga que estamos a cerca de sete ou oito meses do final de uma legislatura e é profundamente triste que tenhamos um re-trato tão grave e tão mau daquilo que é a prestação de cuidados ao cidadão.
Disse V. Ex.a que o cartão de utente é - e estamos de acordo - um instrumento fundamental para a gestão da saúde. Pois bem, já chegaram aos 60%. Porém, em 1997, diziam muito claramente que, durante esse ano, todo o País estaria coberto pelo cartão de utente e não foi assim!
Quanto às urgências em concreto, quanto àquilo que é tão sensível aos portugueses e que, no dia a dia, tem de responder de forma eficaz, o que é que se passa neste País?
V. Ex.a recebeu, em Maio de 1996, o resultado de um estudo, ou de um levantamento nacional, que foi feito por uma comissão ainda nomeada pelo governo do Partido Social Democrata. O que vemos em 1999, Sr.a Ministra? Vemos que, nomeadamente em Lisboa — V. Ex.a já o afirmou e quero confirmá-lo —, as urgências não diminuíram, são graves, naturalmente, entram em ruptura nalguns casos e são os responsáveis dos próprios serviços de urgência que o dizem, claramente. E mesmo assim, a que é que assistimos? Ao encerramento de outros serviços de urgência e à diminuição de horários dos centros de saúde, sem que isso tenha sido acompanhado, de uma forma eficaz, daquilo que seria uma pedagogia de uma nova cultura de articulação entre centros de saúde e urgências.
Nada disso foi feito, a situação é grave e os profissionais reclamam daquilo que é um verdadeiro estado caótico nas urgências.
E quanto às listas de espera, Sr.a Ministra? Também seria bom que V. Ex.a, nesta estratégia toda, tivesse pre-
sente aquilo que é o verdadeiro problema das listas de espera. E grave, continua a sê-lo, que cidadãos deste país continuem a ir a um hospital público e a ouvir dizer que a sua intervenção cirúrgica só terá lugar, talvez, daqui por dois ou três anos. Isso é impensável!
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Mas V. Ex.ª, o seu Governo e, naturalmente, também o partido que o suporta, uma vez mais — o que é grave —, assumiram uma posição que foi dizer «não» a um projecto que o Partido Social Democrata apresentou aqui em Maio de 1998 e voltou a apresentar em Janeiro de 1999, o qual estava devidamente organizado, respondia ao problema de forma eficaz, tinha uma estimativa de custos. Mas a vossa resposta foi «não»! Não, porquê?
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, esgotou o tempo de que dispunha, pelo agradeço que termine.
O Orador: — Sr. Presidente, vou concluir.
Isto é grave e a conflitualidade entre os intervenientes, os recursos humanos, é também um referencial que nos indicia algo de muito grave: os médicos, a incapacidade para responder a uma greve dos médicos e a substituição do Sr. Primeiro-Ministro pelo Presidente da República, o conflito latente com os enfermeiros, com os técnicos de saúde...
Sr.ª Ministra, lembro que a dívida da saúde, em 1995, era de 67,5 milhões e hoje é cerca de 250 milhões, e isto é assim também nas farmácias, na indústria farmacêutica. Sr.a Ministra, concluo dizendo: Basta! Tem de se acabar com esta situação, e perguntando o que é que VV Ex.ªs vão fazer.
Esperemos que, em Outubro, os portugueses respondam de uma forma eficaz para que possamos ter não uma mudança mas uma nova política.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, tendo sido informado de que a Sr.a Ministra responde aos primeiros cinco pedidos de esclarecimento um a um, dou-lhe a palavra de imediato.
A Sr.a Ministra da Saúde: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco José Martins, fico muito satisfeita por concordar com a nossa política no que se refere à complementaridade do sector privado. Foi isso que o Sr. Deputado afirmou e fico muito satisfeita...
O Sr. Francisco José Martins (PSD): — E social!
A Oradora: — E social, naturalmente.
No que se refere à centralidade no cidadão, fico muito satisfeita também, pois vejo que já há aqui, pelo menos, um partilhar desta preocupação. Estamos de acordo e isso é importante.
Agora, diz o Sr. Deputado que já apresentei seis estratégias de saúde e que elas, ao fim e ao cabo, consubstanciam propósitos e promessas.
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consubstanciadas em propostas do Ministério; no segundo ano, uma estratégia para o ano, que já teve a participação de um conjunto de entidades e, portanto, foi uma definição mais participada; aquilo que apresentei no ano passado foi uma estratégia a médio prazo, que é revista anualmente, como é feito em todos os países civilizados, e, portanto, não são seis estratégias, pelo contrário, é uma estratégia a médio prazo, que é fundamental.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Todas diferentes e todas inaplicadas!
A Oradora: - Sr. Deputado, ouça-me com atenção...
É que se não tivermos uma estratégia definida, as medidas avulsas - que são uma enorme tentação na saúde -, que não tenham um fio condutor e um objectivo claramente definido, correm o risco de não permitir uma actuação direccionada e, como tal, não atingir aquilo que são os resultados que se propõem.
O Sr. Alberto Marques (PS): - Não estão habituados a estratégias!
A Oradora: - É assim que se faz nos países onde há definição de objectivos é de metas calendarizadas que permitam a sua avaliação, para que o sistema possa ser corrigido e ajustado, porque o sistema de saúde tem no seu centro o cidadão, tem como missão principal obter ganhos em saúde e isso tem de ser avaliado. E o Sr. Deputado tem esse instrumento, de que não deve abdicar, sob pena de não poder acompanhar a bondade das medidas que se tomam, devidamente enquadradas.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Mas entretan-
A Oradora: - Entretanto, e no que se refere à questão das vigências, sabe o Sr. Deputado que existiram, no final do ano passado e durante o mês de Janeiro, problemas muito graves com o surto de gripe que se registou, e que foi quantificado e acompanhado pelas autoridades de saúde. Esta foi uma situação que ocorreu também, como tive ocasião de referir, em vários países da Europa que, provavelmente, até têm mais recursos do que nós, nomeadamente em Espanha, em França e no Reino Unido, onde as vigências tiveram também problemas gravíssimos, que o Sr. Deputado pode ver documentados em todos os recortes de imprensa atinentes a esta matéria.
Diz o Sr. Deputado, o Ministério nada fez em relação a esta matéria. Não é verdade!
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - E hoje?
A Oradora: - Tive ocasião de mostrar e enviar aos Srs. Deputados vários elementos relativos à reorganização das vigências em vários pontos do País, em que houve, nitidamente, em quase todas as administrações regionais de saúde - e, na altura, tive ocasião de excepcionar Lisboa uma reorientação da procura, através dos centros de saúde, no seguimento daquilo para que apontava o relatório das vigências, para um aumento grande nas consultas extenuas de grande parte dos hospitais distritais. Ora, o Sr. Deputado sabe, pelo relatório das vigências, que havia uma inversão enorme no que se refere ao número de atendimentos em urgências e ao número da actividade desenvolvida em termos programados.
Houve já uma grande inversão, houve uma reorganização das vigências do Porto, designadamente as pediátricas, que levou a que o recurso ás urgências hospitalares decrescesse em cerca de 50%; vão começar em Lisboa novas formas de reorganização, designadamente uma linha de encaminhamento e de orientação relativamente à vigência pediátrica, que entrou em funcionamento ontem mesmo e que espero que venha a dar bons resultados.
O Sr. Presidente: - Sr.ª Ministra, agradeço que termine.
A Oradora: - Sr. Deputado, não tenho agora oportunidade de prosseguir, mas espero, nas respostas conjuntas, poder responder às restantes questões.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Movia e Silva.
O Sr. Moura e Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado, permitam-me que lhe diga que, quanto a nós, o Governo afastou-se dos Estados Gerais. O Governo afastou-se do seu próprio Programa. O Governo actuou, no sector da saúde, como se fosse um concurso de ideias. Este debate é mais uma sessão deste concurso de ideias!
O Governo sabe que tem de mexer em pontos críticos do Serviço Nacional de Saúde, precisamente em nome do SNS, da sua defesa e revitalïzação: tem de o alargar para um conceito de sistema; tem de reequacionar os recessos humanos em função das necessidades; tem de clarificar, em definitivo, no que ao SNS se refere, se quer a socialização dos custos mas não quer, como o PCP, a socialização do sector, como na ocasião referia o então Deputado António Guterres, em 1990, na discussão da Lei de Bases da Saúde: «afirmamos o princípio da socialização dos custos, o que não quer dizer, necessariamente e em todos os casos, o princípio da socialização do sector da saúde, pois são coisas diferentes». Dizia ainda - e julgo que tinha, e tem, toda a razão - que «é muito mau que o Governo, em troca de uma pequena bengala, venda a alma reformadora prevista para este mandato e já anunciada para o próximo». Seria extraordinário este retrocesso, nem que fosse apenas verbal, se nos lembrarmos e ajudarmos o Governo a lembrar-se destas palavras, proferidas por um Deputado socialista em nome da sua bancada na discussão da actual Lei de Bases da Saúde, em 1990.
Pergunto, Sr.ª Ministra: por que razão escolheu o Governo e o Ministério da Saúde o PCP para parceiro na resolução dos problemas da Saúde? Alguma vez o Partido Popular - que, mais do que uma vez se disponibilizou para dar o seu contributo, que o Governo sempre rejeitou - fechou a porta a criar os entendimentos necessários para se fazer a reforma de que o SNS precisa?
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Saúde.
A Sr.ª Ministra da Saúde: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que o Governo não escolheu muletas; nem o PCP nem nenhum dos partidos presentes nesta Câmara é muleta de ninguém.
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Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - Penso que o Governo tem uma determinada ideologia na sua sustentação, tem um programa inequívoco, claro e público e nunca o Ministério da Saúde desperdiçou nenhum apoio que não ponha em causa aquilo que são os princípios e valores que enunciei há pouco.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Que o diga a FNAM!
A Oradora: - Fiz variadíssimos apelos na Comissão Parlamentar de Saúde e tenho feito um discurso permanente no sentido de que são importantes os acordos em relação às linhas consensuais que podem ser encontradas relativamente a todos os partidos com assento nesta Câmara. Penso que todos ganharíamos em tentar encontrar essas linhas de consenso, em vez de estarmos todos com políticas de arremesso a dizer que eu tenho uma muleta, que eu sou uma muleta, que eu deixei de ser e que eu passei a ser... Apesar da herança...
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - E que pesada herança!
A Oradora: - Sr. Deputado, ainda bem que me fala nisso!
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Às vezes, esquece-se!
A Oradora: - Todos reconhecerão que faço questão, por uma razão de formação pessoal e de comportamento, de não atacar as pessoas que me precederam e várias vezes tenho afirmada que, por certo, todos os que passaram por esta área quiseram fazer o melhor possível. Se o conseguiram ou não, é outra questão! Mas eu não tenho por metodologia, por estilo, atacar as pessoas que me antecederam porque têm e tiveram a sua forma de actuar, a sua forma de fazer; sempre que foi necessário, critiquei-as frontalmente e na altura própria. Não faço política estando permanentemente a dizer que a verdade sou eu que a possuo - não sou! Contudo, considero que devo actuar em respeito pelos meus princípios, de acordo com a minha coerência e de acordo com aquilo que conheço há mais de 25 anos de trabalho neste sector, numa perspectiva de defesa daquilo que são os serviços públicos ao serviço do cidadão.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sx.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, registámos a clareza da opção do Governo pelo Serviço Nacional de Saúde. Isso é um dado positivo, mas é um dado positivo se servir para aquilo que é a razão de ser da sua existência, ou seja, aumentar a acessibilidade a todos os cidadãos, melhorar os serviços, humanizar a prestação dos cuidados de que as pessoas estão carenciadas.
Julgo que há duas questões, pelo menos, cuja discussão é incontornável, e que são as seguintes: o papel dos técnicos de saúde, médicos e enfermeiros.
Quanto aos médicos, a Sr.ª Ministra refere na sua intervenção o problema que se coloca, do ponto de vista
ético, em relação à forma como os médicos se envolvem, ou não, na prestação dos cuidados de saúde. Ora, se, em média, um médico no sector público ganha menos cerca de 70% da média europeia e se um médico no sector privado ganha cerca de 30% mais do que essa mesma média, julgo que há aqui um desequilibrio que tem de ser discutido claramente, sob pena de o trabalho se tornar uma rotina e não ser fácil modificar a situação. Penso que esta questão não foi ainda abordada pela Sr.ª Ministra e gostaria que o fosse, porque há problemas que se colocam, não num prazo tão alargado quanto isso, em relação a um défice muito grande de médicos.
Por outro lado, também não ouvi a Sr.ª Ministra referir-se à questão dos enfermeiros. O défice que existe de profissionais deste sector é muito elevado. Todos sabem que a maior parte dos enfermeiros trabalha em duplo horário e a manutenção dessa situação não é, seguramente, uma forma de corresponder às necessidades das pessoas que precisam de ser atendidas. Gostaria que a Sr.ª Ministra se referisse concretamente a este aspecto, que me parece não ser um aspecto menor, que não é desvalorizável. Qualquer política de saúde tem de ter uma perspectiva não imediata mas, pelo menos, de médio e longo prazo e não me parece que este aspecto tenha sido ponderado.
Um segundo aspecto que já aflorado é a questão das convenções. Julgo que o problema não se coloca apenas quanto aos medicamentos mas também em relação a outros serviços cujo preço está excessivamente inflacionado e que envolve fatias importantes do orçamento, que são absorvidas nesta situação. Gostaria que a Sr.ª Ministra pudesse referir-se quer aos serviços de análises que aos serviços de radiologia.
Por último, Sr.ª Ministra, há um aspecto que considero preocupante e em relação ao qual, de todo em todo, o Governo português continua, à margens de tudo o que se passa no mundo, impávido e sereno, alheado e ignorante de debates extremamente importante e que têm a ver com os novos problemas de saúde que se colocam actualmente. Trata-se de questões que têm a ver com disfunções hormonais de consequência ambiental e sempre que se fala nisso, o Governo, não concretamente da parte do Ministério da Saúde mas do Ministério do Ambiente, desvaloriza completamente estas questões, como se não fizessem hoje parte da agenda e das preocupações dos governos em todo o lado.
Outro aspecto em relação ao qual o caos e a insegurança são totais, e gostaria que a Sr.ª Ministra se referisse a eles porque são factores de risco, são factores de perturbação, são os transgénicos.
A questão está colocada em todo o lado mas, como sabe, Portugal não tem nenhuma entidade que faça nenhum controlo destes produtos, destes alimentos ou destes medicamentos que são colocados no mercado, para venda ou para ensaio. Gostaria que a Sr.ª Ministra - dado que não se trata de uma questão de ficção, que não é uma questão do futuro mas, sim, do presente, que é uma questão que preocupa os cidadãos - se pronunciasse, já,que não vemos outros membros do Governo mostrarem sobre esta questão o mínimo de conhecimento ou preocupação e julgo que este é um bom local para o fazer.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Saúde.
A Sr.ª Ministra da Saúde: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Sr.ª Deputada disse, e bem, que se o objectivo
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do SNS é melhorar os níveis de saúde das pessoas, evidentemente, tem de apostar na acessibilidade e no atendimento adequado, e não só, pois também a promoção da saúde é fundamental. E refiro isto precisamente devido à parte final da sua pergunta. Vou tentar centrar-me apenas em dois ou três aspectos, uma vez que o tempo corre demasiado depressa.
A Sr.ª Deputada referiu a questão da melhoria da humanização no atendimento, que é fundamental e vital. Aliás, tive ocasião, na minha intervenção, de dizer que, das verbas de formação obtidas através da intervenção operacional da saúde, portanto, dos fundos estruturais, uma das fatias mais importantes foi destinada a esta área. Se a Sr.ª Deputada me perguntar se os resultados finais, em termos da sua avaliação, são 100% positivos, é evidente que responderei que não. Na verdade, uma das áreas importantes é fazer a avaliação da formação que temos proporcionado, uma vez que é neste domínio do atendimento que existe o maior número de queixas relativamente ao SNS.
No que se refere a médicos e enfermeiros, começo pelos enfermeiros, dizendo o seguinte: aumentámos a capacidade formativa das escolas de enfermagem, estando algumas delas a funcionar em dois turnos, todas as que têm capacidade e corpo docente para isso. Isso significou aumentar em 40% a capacidade formativa, mas também absorver todos os enfermeiros saídos das escolas ao longo destes três anos. Tivemos descongelamentos excepcionais, um deles plurianual, e conseguimos absorvê-los todos. Infelizmente, como sabe a Sr.ª Deputada, para a abertura do Hospital da Feira tivemos de recorrer a enfermeiros de outra nacionalidade porque em Portugal já não havia mais ninguém para absorver.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Que tristeza!
A Oradora: - Por acaso, é pena, Sr. Deputado! E foi pena que se tivesse tomado anteriormente uma decisão no sentido de acabar com um dos turnos de formação dos enfermeiros! Isso foi reposto e aumentou-se substancialmente a capacidade formativa.
Em relação a um outro aspecto que a Sr.ª Deputada referiu e que é importante, que é a questão do que se ganha a menos em termos dos serviços públicos de saúde, em termos da remuneração de um médico, e daquilo que se gasta a mais em termos do sector privado, pelos custos da prestação de cuidados privada, comparativamente aos outros países da OCDE, de facto, o relatório da OCDE apontou muito claramente para preços excessivos relativamente a essa comparação, em relação a algumas especialidade no sector privado. Assim é! Mas é evidente que, mesmo aumentando bastante as remunerações a nível do sector público, tendo uma política em que pretendemos fixar cada vez mais as pessoas a uma determinada instituição, temos fracos mecanismos de competição, porque aquilo que se ganha com um complemento na privada é bastante apelativo e leva a que as pessoas prefiram e pretendam estar nos dois sectores.
De qualquer modo, temos previsto um programa, a que chamamos de apoio às pequenas empresas de profissionais, em que, através de um financiamento específico dirigido a profissionais que queiram montar a sua própria actividade, possam desenvolvê-la a custos controlados, diversificando, assim, a oferta e permitindo atenuar essa assimetria em relação aos preços praticados. Penso que é uma medida inequívoca de grande alcance social.
Relativamente aos preços inflacionados nas análises e radiologias, temos aqui algum desequilíbrio, que resulta de preços bastante degradados em relação àquilo que são os exames convencionais e preços muito elevados, que, de certa forma, compensam, em termos de média, aquilo que foi e é uma política a nível das convenções, que nem sempre obedeceu ao que consideramos mais adequado.
De qualquer das formas, a nossa aposta muito clara e inequívoca é, em termos de sistema local de saúde, na rentabilização daquilo que existe a nível do sector público. Já temos amostras muito claras e muito evidentes, em termos de beneficio,...
O Sr. Presidente: - Agradeço-lhe que termine, Sr.ª Ministra.
A Oradora: - ... no que se refere quer ao sistema local de saúde de Viana do Castelo quer ao do nordeste transmontano.
Em relação aos transgénicos, acompanhamos tudo isso através da Direcção-Geral de Saúde; precisamos de acompanhai muito mais, mas, sobretudo, de estarmos ligados, como estamos, em rede a todos estes sistemas de vigilância. Noutra altura, Sr.ª Deputada, terei ocasião de explicar-lhe melhor este ponto.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Sr.ª Ministra, perdoe-me que lhe faça este reparo: está a gastar 5 minutos por cada resposta e, se vai responder em conjunto aos. próximos cinco pedidos de esclarecimento, só tem 5 minutos para o fazer. Não sei como vai conseguir «encaixar» cinco respostas em 5 minutos, mas a gestão do tempo é sua.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Sr.ª Ministra começou a sua intervenção falando das promessas do Programa do Governo. E se é verdade que, felizmente, algumas das perspectivas não se concretizaram, por serem privatizadoras, também é verdade que propostas concretas e vantajosas para o Serviço Nacional de Saúde acabaram por não ter a tradução, na prática, que desejaríamos, para o defender.
É que não basta fazer uma intervenção ao nível da planificação, da programação dos ganhos em saúde e da definição de objectivos nessa matéria, quando, depois, todas estas matérias podem ser inviabilizadas e impedidas pelas questões mais estruturantes e mais fracturantes, que são as verdadeiras razões para que o Serviço Nacional de Saúde tenha dificuldades em dar melhor resposta às necessidades dos cidadãos.
O Sr. Octávio Teigéira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Portanto, podemos fazer a planificação mais perfeita e a avaliação mais rigorosa das necessidades de saúde do nosso país que isso não nos servirá de nada se não conseguirmos inverter a estrutura base que tem tolhido os movimentos e a acção do Serviço Nacional de Saúde.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Algumas das medidas que a Sr.ª Ministra aqui invocou merecem-nos sérias dúvidas: umas, em
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relação ao seu conteúdo e à sua formulação, e, outras, em relação à aplicação pelo Governo daquilo que ele próprio decidiu fazer. Veja-se o exemplo das convenções: o novo regime das convenções aqui referido pela Sr.ª Ministra e que já estará plenamente em vigor, provavelmente não terá atingido os resultados que se desejaria para impor uma clara barreira entre a prestação privada e a prestação pública, no âmbito do Serviço Nacional de Saúde, e para claramente gerir com rigor os dinheiros e a prestação do Serviço Nacional de Saúde.
E pergunto à Sr.ª Ministra se é capaz de dizer aqui que o novo regime que o Governo apresentou e pôs em vigor em relação aos convencionados atingiu, num mínimo aceitável que seja, os objectivos a que estava destinado ou se continuamos a estar numa situação de grande promiscuidade, de grande confusão, entre os interesses públicos e os interesses privados na prestação dos cuidados de saúde.
A Sr.ª Ministra falou também dos vários formulários-piloto, que irão, este ano, entrar em vigor, aqui e ali. Mas o que é preciso pôr como meta fundamental e que já devia ter sido atingida, é a questão da prescrição pelo princípio activo, que, aliás, constava do Programa de Governo do Partido Socialista, pelo que não estamos sequer aqui a exigir algo que não tivesse sido já um compromisso assumido junto dos portugueses e apresentado nesta Assembleia no inicio da legislatura.
Será que a Sr.ª Ministra pretende alguma vez implementar a verdadeira medida de racionalídade na prescrição dos, medicamentos, que é a prescrição pelo princípio activo, ou vamos continuar apenas com as experiências-piloto?
Sobre a questão da saúde mental, Sr.ª Ministra, quero colocar-lhe tuna questão muito concreta, que tem a ver com o seguinte: a Sr.ª Ministra falou na reorganização dos serviços de saúde mental,...
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Virtual!
O Orador: - ... mas esqueceu-se de se referir à concretização de uma proposta do PCP, aprovada em sede do último Orçamento do Estado, que diz respeito à passagem para o escalão A de comparticipação dos medicamentos psiquiátricos.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Bem lembrado!
O Orador: - Está a Sr.ª Ministra em condições de nos dizer quando - e esperemos que seja a breve prazo - é que estes medicamentos vão ser finalmente, como é de toda a justiça, comparticipados pelo escalão A, isto é, comparticipados a 100%, ou vamos ter mais uma das situações de incumprimento por parte do Governo daquilo que é determinado e legislado nesta Assembleia?
E que o Orçamento do Estado tem uma norma que faz com que o Governo deva transferir para o orçamento do Ministério da Saúde as verbas para que essa comparticipação passe a ser uma realidade. E o que quero perguntar à Sr.ª Ministra é se já está em condições, ou quando estará em condições, de cumprir esta obrigação que lhe é imposta pelo Orçamento do Estado.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Termino, Sr. Presidente, dizendo que não é possível intervir na política de saúde, não é possível intervir em defesa do Serviço Nacional de Saúde, sem
afrontar os interesses que lhe tolhem os seus movimentos e que o impedem de atingir a sua verdadeira vocação e de dar resposta cabal às necessidades dos portugueses. Podemos programar tudo, mas não podemos levar as programações à prática se continuarmos a deixar mandar em algumas áreas do Serviço Nacional de Saúde interesses que não são os do serviço público, interesses que não são os da defesa dos direitos dos cidadãos.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Uma vez que a Sr.ª Ministra está a acumular pedidos de esclarecimento para uma resposta única, tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado José Carlos Póvoas.
O Sr. José Carlos Póvoas (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Antes de abordar o assunto dos médicos de família no meu círculo eleitoral, que é o do Porto, gostava de informar a Sr.ª Ministra que os Deputados da Comissão Parlamentar de Saúde, há cerca de 15 dias, fizeram uma visita de trabalho à Sub-Região de Saúde de Viana do Castelo.
V. Ex.ª já referiu, por mais de uma vez, que Viana do Castelo é um local que VV. Ex.as gostam de dar como referência. Acontece que, no debate que teve lugar, o coordenador da sub-região de saúde fez uma radiografia da subregíão e a ideia que passou foi a seguinte: a greve dos médicos não se fez sentir; listas de espera não havia, nem pensar; o planeamento familiar era um sucesso; quanto à falta de médicos, já havia mais médicos espanhóis; em relação aos enfermeiros, não havia razões de queixa; o pessoal administrativo já ia a Espanha fazer compras. Fran-
camente, ficámos espantados com esta situação.
O Sr. Alberto Marques (PS): - Não ficou contente?
O Orador: - Eu fiquei contente, Sr. Deputado... VV. Ex.as, a seguir, é que ficaram muito tristes, quando os autarcas, por sinal socialistas, pediram a palavra e disseram: «Calma, não é verdade, Sr. Coordenador da Sub-Região, tudo isso é mentira! Faltam médicos, faltam enfermeiros, há problemas com a carreira do pessoal administrativo!» E V. Ex.ª estava lá e sabe que é verdade.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Isto é um drama! Sr.ª Ministra, é preciso ter cuidado com as pessoas que se nomeiam, porque, caso contrário, ninguém sabe... E V. Ex.a, com certeza, está mal informada, pelo menos no que diz respeito à visita que os Deputados fizeram a Viana do Castelo.
Atendendo a estas circunstâncias, gostava de abordar o assunto dos médicos sem família no distrito do Porto.
A Sr.ª Ministra da Saúde: - Médicos sem família?! Não! Médicos de família!
O Orador: - Médicos sem família, exactamente.
E começo por me referir directamente a Amarante - e não está cá o líder da bancada socialista -, onde se verifica uma situação muito preocupante, porque, aí, 14% da população residente está a descoberto, cerca de 8226, pessoas. Em Baião, 12,16%; em Gondomar, 11,3% de utentes não têm médicos sem família; em Paredes, 28,23%. Isto é um drama!
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Posso dar-lhes já os dados, Srs. Deputados. É que os senhores esquecem-se de que, quando falo, falo com algum cuidado. Os senhores, nos últimos quatro anos, triplicaram os médicos sem família.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Isso é que é um facto!
Risos do PS.
O Orador: - Isso é que é um facto! É uma dor de alma e os senhores sorriem, mas têm de resolver o problema.
Na Póvoa de Varzim, há 14,72% de médicos sem...
Vozes do PS: - De médicos sem família!
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Casem-se os médicos!
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - A questão é séria! Não brinquem!
O Orador: - Na Póvoa de Varzim, 14,72%; em Santo Tirso - na altura, ainda não havia Trofa -, 12,51%; em Valongo, 16,37%... Julgo que chega, não vale a pena continuarmos...
Gostava de saber o que a Sr.ª Ministra pretende fazer, face a esta situação catastrófica, para resolver este problema dos cuidados de saúde primários, onde não existem médicos de família.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.
A Sr.º Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Até este momento, falou-se neste Hemiciclo do exercício da medicina, da prática médica. Só que, Sr.ª Ministra, o povo costuma dizer que «fazer omeletas sem ovos» é um pouco complicado. Talvez possamos pensar, neste momento do debate, se estamos em condições de continuar a falar do exercício da medicina nos próximos anos.
O Governo do Partido Socialista reconhece a falta de médicos; considera que as repercussões negativas da falta de médicos vão já até meados do próximo milénio; considera, inclusivamente, que os números preocupantes de 1999 nada são comparados com aquilo que será a falta de médicos no ano de 2007; avalia e reconhece que um médico não se forma em cinco ou seis anos, que algumas. especialidades implicam 11 e 12 anos de formação; reconhece que se formam, anualmente, no máximo, como no último ano, cerca de 500 médicos; reconhece e avalia que, no início do próximo milénio, se reformarão, anualmente, cerca de 700 médicos; reconhece e avalia como preocupante o envelhecimento da classe médica. E estes diagnósticos seriam profícuos, positivos e extremamente importantes se, simultaneamente, na área da formação, se tomassem medidas que pudessem, de algum modo, colmatar aquilo que é a avaliação negativa da falta de médicos neste país.
Vozes do PCP: - Ora aí é que está! Muito bem!
A Oradora: - E é aqui, Sr.ª Ministra, que provavelmente se justificará aquilo que, há pouco, foi referido na minha bancada, que é a dicotomia entre o discurso da Sr.ª Ministra e aquilo que são as repercusssões conhecidas da actuação médica, da medicina, junto do utente, junto do português comum. De facto, é sobejamente diferente.
Poderíamos falar de muitos mais números do que aqueles que acabei de referir, mas dir-lhe-ia só, isto: em 1994, entrava-se nas Faculdades de Medicina, em Portugal, com uma média que rondava os 14 valores; em 1995, inesperadamente, a média mínima rondava os 17 valores e, em 1998, os 19 valores. Dos 3000 candidatos, em 1998, entraram cera de 500; dos cerca de 3000 candidatos, Sr.ª Ministra, cerca de 1000 candidatos são jovens portugueses, de 17, 18 e 19 anos, que, vocacionados para a área módica, se disponibilizam para todos os anos, durante dois, três ou quatro anos, repetirem as duas provas específicas necessárias e aumentarem centésimas na sua avaliação, para poderem entrar em Medicina; destes 3000 candidatos, 1000 são repetentes - e não são repetentes por insucesso, são repetentes de médias de 18 valores que transfonroam em 19 valores, de 19 valores que transformam em 19,1 valores - e destes 1000 repetentes de «boa vontade» são admitidos pouco mais que 100. No ano passado, que, penso, foi o ano em que entraram mais, foram admitidos cerca de 168 alunos.
O numerus clausus é aquilo que sabemos, as condições de trabalho das faculdades de medicina, sem excepção, são péssimas. Digo-lhe, como exemplo, que todos os professores reconhecem que no dia em que os alunos de determinada disciplina teórica resolverem entrar na Faculdade de Medicina de Lisboa, do Porto ou de Coimbra não poderá haver aulas porque não terão espaço suficiente.
Sr.ª Ministra da Saúde, perante este cenário, que medidas práticas vão ser tomadas nestes poucos meses que restam para o terminus da actuação do Governo do Partido Socialista? Porque quanto ao resto do mandato já sabemos que nenhuma medida foi tomada! Talvez tenha sido tomada uma medida muito recente, que veio anunciada na comunicação social: um desentendimento entre os Ministérios da Educação e da Saúde permitiu que uma faculdade privada de medicina dentária fosse homologada pelo Ministério da Educação apesar do parecer negativo do Ministério da Saúde. Esta poderá ser uma das medidas para resolver o problema da área da medicina dentária!
Aplausos do PCP.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Bem lembrado!
O Sr. Presidente: - Para o quinto pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho.
O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Saúde, a questão que quero colocar-lhe diz respeito a uma matéria que, de certo modo, é recorrente em intervenções que tenho feito perante V. Ex.ª mas que, de facto, até pela sua actualidade, merece ser renovada nesta Casa.
A Sr.ª Ministra esteve, na semana passada, de acordo com um documento oficial do seu ministério, a inaugurar a ampliação do Hospital Distrital de Vila Franca de Xira e o Centro de Saúde do Forte da Casa. Ambas as obras tiveram início durante o mandato do governo anterior, não só em termos de projecto como também de orçamentação, apenas não tiveram conclusão. V. Ex.ª teve o prazer de as
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inaugurar e ainda bem, pois as obras estão prontas e V. Ex.a tem, pelo menos, o mérito de ter continuado a obra do governo anterior.
Agora, gostaríamos de ter também a oportunidade — e no fundo é esta a grande questão que quero colocar-lhe — de ver a Sr.a Ministra a inaugurar obra sua e, eventualmente, até a deixar obra para outros inaugurarem, quando estiverem no poder.
Sr.a Ministra da Saúde, aquilo que tenho de dizer, e reforçar, neste momento, é que o novo Hospital Distrital de Vila Franca de Xira foi anunciado e aprovado, nesta Casa, no Orçamento do Estado de 1996, no PIDDAC, passando a constar em todos os Orçamentos a partir dessa data. Curiosamente, em Outubro de 1997, numa célebre volta de helicóptero que a Sr.a Ministra da Saúde e o Sr. Primeiro-Ministro efectuaram pelo País, em que anunciaram um conjunto de novos equipamentos de saúde — não só este, mas outros —, apontavam como data da sua conclusão Dezembro do ano de 200. Tenho a aqui a fotocópia desse documento oficial do Ministério da Saúde.
Sr.a Ministra da Saúde, aquilo que V. Ex.a foi dizer, na semana passada, a Vila Franca de Xira é que o ano de 2001 como data de conclusão do hospital está, de facto, posto fora de hipótese — e não disse datas, teve prudência, neste momento, em relação a datas —, o que, de facto, vai ao arrepio de tudo o que foi programado em Orçamento de Estado, através do PIDDAC. Sobretudo, é de reconhecer que não estaremos a falar da conclusão deste hospital antes do ano de 2004, mesmo que ele esteja, neste momento, a arrancar sem quaisquer entraves, admitindo que isso possa acontecer nestas circunstâncias.
Sr.a Ministra, estaremos perante uma situação de praticamente oito anos de adiamento se a conclusão deste hospital vier a ser concretizada no ano de 2004, mas, mesmo assim, não temos sequer a certeza se, com este Governo, será possível cumprir este último calendário, que já nem sequer é a primeira programação deste Governo, a primeira estava no Orçamento de 1996, a segunda, que estava neste documento que referi, divulgado em 1997, era para o ano de 2001 e, agora, pêlos vistos, não será em 2002 nem 2003, provavelmente 2004, se não houver novos adiamentos, novos atrasos.
Tendo em conta que vamos ter dificuldades na Área Metropolitana de Lisboa com o novo quadro comunitário de apoio, se as coisas não correrem bem para Portugal, vamos ter, com certeza, restrições orçamentais para financiar a área da saúde e, portanto, terá de ser o Orçamento do Estado a responder. E, Sr.ª Ministra, qualquer atraso neste aspecto é dramático para a saúde de todos aqueles que vivem nesta zona.
Vozes do PSD. — Muito bem!
O Sr. Presidente. — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Saúde.
A Sr.ª Ministra da Saúde — Sr Presidente, Srs. Deputados. Como só tenho cinco minutos para responder, vou tentar ser o mais concisa possível.
Relativamente à questão sobre se o novo regime das convenções já atingiu os resultados que se esperaria, gostaria de dizer que já atingiu alguns, não todos, pois é um processo em curso, e está cm desenvolvimento um sistema informático de gestão das convenções que, pensamos, permitir-nos-á ajustar completamente aquilo que é pretendido relativamente a esta questão.
No que se refere à pergunta sobre os novos formulários e a prescrição por princípio activo, quero dizer que o novo suporte de receita médica já prevê a prescrição por princípio activo, embora, primeiro, na modalidade de voluntária, uma vez que, como o Sr. Deputado sabe e eu já tive ocasião de referir, há grandes suspeições em relação a esta questão.
Relativamente à saúde mental, gostaria de dizer que está em estudo a questão da comparticipação a 100% de determinados medicamentos, a qual não vai ser aprovada em Setembro, como um Sr. Deputado estava a insinuar,...
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): — Em Outubro?
A Oradora: — ... uma vez que a postura do Ministério da Saúde não é aprovar medidas em cima dos actos eleitorais.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Nem em cima nem antes!
A Oradora: — Em relação à questão apresentada pelo Sr. Deputado José Carlos Póvoas, sobre a Sub-Região de Saúde de Viana do Castelo e a falta de médicos de família, posso dizer-lhe que são grandes as faltas de médicos de família. O Sr. Deputado sabe que são necessários seis anos de preparação, um ano e meio de internato geral e mais três anos de especialidade. A falta não começou agora, já existia antes!
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): — Lá está!
A Oradora. — Sr. Deputado, este é um dado objectivo! A falta de médicos de família já existia há muito tempo!
Esta questão tem de ser, e tem sido, objecto das mais variadas medidas: desde a abertura de toda a capacidade formativa dos serviços — felizmente tem havido opção, nos dois últimos anos, pela especialidade de clínica geral —, a criação de condições especiais, designadamente a remuneração experimental, em que um dos objectivos que se pretendeu atingir foi tornar apelativa esta especialidade, e também a necessidade de criação e alargamento de lugares nas faculdades de medicina, aproveitando para responder à Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.
Portanto, Sr. Deputado José Carlos Póvoas, posso dizer-lhe que temos falta de médicos de família e ainda vamos continuar a ter durante alguns anos, mas também lhe digo que o processo do cartão de utente tem levado à actualização das listas e, até neste aspecto, é uma medida muito importante, pois há já muito tempo que os ficheiros, como o Sr. Deputado sabe, não eram revistos nem actualizados, havendo, assim, algum ganho, que, obviamente, não resolve as dificuldades do sector.
Este é um problema preocupante que tem de ser objecto de um conjunto concertado de medidas, as quais estão a ser tomadas: mais médicos e maior criação de condições de opção pela especialidade de clinica geral é uma aposta inequívoca em relação à qual há dados objectivos.
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questão enquadra-se na Lei de Autonomia Universitária, sobre que tipos de médicos estamos a formar com as médias elevadíssimas que estão a ser exigidas para a entrada nos cursos de medicina.
Uma vez que quem entra nos cursos de medicina são pessoas que têm de estabelecer uma relação com os livros de tal forma intensa como aquela que é determinada pelas médias, hoje, tão elevadas, se calhar, não estamos a formar os melhores médicos para lidar com pessoas. Esta é uma preocupação enorme do Ministério da Saúde, que tem sensibilizado as faculdades de medicina, as quais estão disponíveis para ensaiar uma nova metodologia de avaliação do perfil do candidato à faculdade de medicina de modo a que a nota não seja o critério exclusivo, sendo «temperado» com determinado tipo de coisas.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É preciso abrir mais vagas!
A Oradora: — Em relação às vagas, posso dizer que foi aumentada a capacidade formativa em 18% e foram criadas duas novas faculdades de medicina, das quais, pela, informação que tenho, a de Braga estará em condições de abrir no próximo ano lectivo.
Continuará a ser feito um esforço para aumentar o numerus clausus, de qualquer das maneiras, acredite, Sr.a Deputada Luísa Mesquita, a pressão do Ministério da Saúde é enorme, até porque tem o problema em mãos e ele não é da tutela do Ministério da Educação.
Em relação à questão da medicina dentária, devo dizer-lhe, Sr.a Deputada Luísa Mesquita, que, neste momento, já não temos falta de médicos dentistas em Portugal. Podemos ter falta de médicos dentistas nos quadros do Ministério da Saúde, mas não em termos de pessoas formadas.
No que diz respeito ao caso concreto que referiu, o Ministério da Saúde chamou a atenção para o facto de o curso, cujo plano se propunha, não nos oferecer tranquilidade em termos da formação que seria ministrada.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Mas ele foi aprovado!
A Oradora: — Também gostaria de dizer à Sr.ª Deputada Luísa Mesquita que uma das medidas que propus às faculdades foi a conversão de algumas das vagas de formação cm medicina dentária para medicina geral, no sentido de aproveitarmos aqueles três anos de formação comum e podermos canalizar mais recursos para a área da medicina geral.
O Sr. Alberto Marques (PS): — Muito bem!
A Oradora: — Esta foi também uma das medidas que, este ano. solicitamos às faculdades de medicina.
As condições de trabalho nas faculdades de medicina são péssimas, por isso está em desenvolvimento um estudo entre todas as faculdades no sentido de criar novas fórmulas de articulação, mas o ensino da medicina, hoje, não pode fazer-se só nos hospitais, tem de fazer-se nos centros de saúde Um dos nossos grandes dramas relativamente à opção pela medicina familiar tem de ver com um ensino muito centrado no hospital, o que, de certa forma, «formata» as opções dos novos médicos.
Por último, gostaria de dizer ao Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho que nunca gosto de me comprometer com
prazos, não porque tenha medo de os cumprir mas porque não gosto de criar falsas expectativas. O Sr. Deputado sabe que é dramático, para as pessoas, ter hospitais, por vezes, praticamente prontos por fora que, depois, não são disponibilizados nem abertos.
Vou ter todo o gosto em deixar para os meus sucessores muitos equipamentos de saúde para inaugurar...
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): — Quais?
A Oradora: — ... e tenho feito questão de, naqueles que inauguro e que são decisão de governos anteriores, dizer: «Isto não começou comigo, a decisão foi tomada pelo anterior governo». Faço sempre questão de o dizer, mas não sei se, quando suceder o inverso, também os meus sucessores farão questão de ter esse procedimento.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (António Costa): — Falta muito tempo para haver sucessores!
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Alexandrino Saldanha.
O Sr. Alexandrino Saldanha (PCP) — Sr. Presidente, Sr.a Ministra da Saúde, penso que, nesta discussão, não será novidade dizer-se que os enfermeiros são uma componente fundamental na prestação de cuidados de saúde. Esta componente é tão importante que justifica que haja medidas que garantam a sua estabilidade e a sua motivação para que este sector possa cumprir cabalmente a sua tarefa. Parece-me também óbvio que se constata que hoje isso não existe, pois é evidente a instabilidade no sector.
Há uma grande carência de enfermeiros nos hospitais e nos centros de saúde. É claro que se pode dizer que o anterior governo, do PSD, contribuiu para isso ao diminuir para metade o número de lugares das escolas de enfermagem, o que agravou esta situação, mas o que é facto é que há cerca de 12 000 lugares vagos. Embora o descongelamento de 2000 vagas, feito no final de Dezembro, venha atenuar este problema, este despacho demorou cerca de um ano, o que é muito tempo.
Por outro lado, gostaria de dizer que não há reforma da saúde sem ter em conta os recursos humanos. Já aqui se falou no problema dos médicos e, de facto, a questão da estratégia de formação de maior número de profissionais, quer de enfermeiros quer de médicos, é importantíssima para a prestação de cuidados de saúde primários. Todos os utentes deveriam ter direito, e merecem-no, a um médico de família e aos cuidados domiciliários.
Penso que foi neste sentido que, em Março de 1998, houve negociações com os enfermeiros, tendo o Ministério da Saúde assumido compromissos, os quais não deverão ficar nas promessas não cumpridas, dada a gravidade da situação hoje existente no sector. Foi publicado, com data de 30 de Dezembro, um diploma que resultou desse compromisso, o qual equiparava a carreira de enfermagem à carreira dos técnicos e dos técnicos superiores da função pública, mas com a publicação do novo regime da estruturação de carreiras da função pública ficou desactualizado. Aliás, por ironia, este regime ainda saiu com data anterior à daquele outro que vinha equiparar os enfermeiros aos técnicos e aos técnicos superiores da função pública.
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os técnicos superiores da função pública, que, em Março, considerou que era justa e correcta mas que, neste momento, deixou de existir.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Orador: — Outros dois compromissos que foram assumidos têm a ver com a compensação pelo risco e pela penosidade através de benefícios para efeitos de aposentação dos enfermeiros e com a contagem do tempo de serviço aos designados «agentes precários».
Assim, pergunto também o que é que o Ministério da Saúde vai fazer quanto a esta matéria no sentido de cumprir, em concreto e com os diplomas legais respectivos, aqueles acordos que fez com os enfermeiros portugueses.
Este problema tem uma actualidade muito grande porque, além do problema dos médicos, também estes trabalhadores são extremamente importantes para que sejam dignificados os cuidados de saúde que são prestados nos hospitais.
Por último, embora este problema já tenha sido abordado, pergunto, também, se o Ministério da Saúde tem estudos feitos sobre a necessidade da formação, designadamente, dos enfermeiros, que metas pretende atingir e em que prazos.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Roque Cunha, para um pedido de esclarecimento.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): — Sr. Presidente, Sr.a Ministra, ao ouvi-la falar na tribuna mais parecia que quem falava era a ministra da saúde de um país provavelmente da Galáxia Alfacentauro, afirmando que «o mel e o âmbar» fluíam com grande vigor. Facto é que todos nós e os portugueses sabemos que, infelizmente, a situação é o contrário do que veio expressar, sabemos que é o que acontece nos hospitais e nos centros de saúde.
O meu colega Fernando Pedro Moutinho já aqui disse, e eu volto a reafirmar, que foi naquela célebre viagem de helicóptero — e parece que, ultimamente, os seus colegas do Governo, por razões muito importantes, têm utilizado helicóptero nas suas deslocações — que, objectivamente, houve um compromisso do Sr. Primeiro-Ministro e da Sr.a Ministra da Saúde em relação a um conjunto de hospitais: Vila Franca de Xira, Loures, Cascais, hospital novo de Braga, etc. Ora, a questão que se coloca é, tão simplesmente, a de que vai deixar muito pouco para inaugurar aos seus sucessores porque, de facto, não lançou nenhuma obra em termos de hospitais, com excepção do hospital de Tomar que, na altura, estava em processo de análise, em Bruxelas.
A Sr.a Ministra vem falar em novas formas de gestão e fez um decreto-lei sobre o Hospital de Santa Maria da Feira Ora, Sr.ª Ministra, será que é uma nova forma de gestão a utilização do piso 7, destinado a ortopedia, para camaratas das Sr.as Enfermeiras que vêm de Espanha?
Será que constitui uma nova reformulação do sistema de saúde falar no Projecto Alfa quando sabemos que, em Fernão Ferro, a implementação deste projecto está com problemas graves em subsistir porque deixa de ter médicos?
A Sr.ª Ministra falou, também, nos Centros de Responsabilidade Integrada que inaugurou. Ora, Sr.ª Ministra, estes centros têm «andado para trás e para diante», pois há hospitais que já tinham marcado prazos específicos para
o início daqueles centros e que tiveram de retroceder na sua efectivação, como é o caso, por exemplo, do Hospital do Barreiro.
A Sr.ª Ministra disse, ainda, que os sistemas locais de saúde constituem uma grande medida inovadora. Ora, tenho aqui uma publicação, datada de Maio de 1994, contendo a legislação sobre a constituição das unidades de saúde na Região de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo. De facto, o que aconteceu foi que se perderam exactamente três anos, porque não foram constituídas essas unidades funcionais de saúde, que, em nossa perspectiva, são fundamentais.
Sr.a Ministra, será que acredita sinceramente no que disse naquela tribuna? Será que não vê os telejornais, que não vai ao terreno,...
A Sr.a Natalina Moura (PS): — Vai ao terreno! O senhor é anda noutra galáxia!
O Orador: — ... não lê os jornais, não recebe as cartas das pessoas com apelos lancinantes para resolver a situação em que se encontram?
Sr.a Ministra, devo dizer que é fundamental que, para se credibilizarem, os políticos complementem o seu discurso político com a capacidade efectiva de fazer obras.
Assim, e mais uma vez, para quando os dados, quer em termos de execução financeira do Ministério da Saúde quer em termos daqueles alegados programas de recuperação de listas de espera, relativamente aos quais queremos conhecer, hospital a hospital, patologia a patologia, os custos, os critérios que fizeram com que alguns hospitais tivessem tido alguns programas de recuperação de listas de espera enquanto outros não.
Efectivamente, enquanto não disponibilizarem à Assembleia da República, como é vosso dever, aqueles números, entendemo-lo como mais um acto de propaganda do Ministério da Saúde.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado, para pedir esclarecimentos.
O Sr. Rodeia Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr.a Ministra, já foram abordadas várias temáticas da saúde e também quero tratar de um assunto que não é de somenos importância, antes pelo contrário, pois tem a ver com a segurança hospitalar na área dos incêndios, o que há pouco tempo veio à colação na comunicação social.
Todos sabemos que, a nível hospitalar, há uma população composta por doentes, médicos e pessoal administrativo que urge defender no âmbito da segurança contra incêndios. Sabe-se que há edifícios velhos, com condições precárias, nos quais é necessário e fundamental que sejam implantados os planos de segurança, que há cargas combustíveis que, em caso de incêndio, são extremamente dramáticas, que há toda uma plêiade de situações que merece um olhar oportuno e urgente.
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Por outro lado, há uma outra questão que tem a ver com o transporte de doentes em ambulâncias dos bombeiros e com as dívidas do Ministério da Saúde aos bombeiros portugueses. Já tivemos oportunidade de inquirir a Sr.a Ministra sobre esta matéria em sede da Comissão de Saúde mas não ficámos satisfeitos com a resposta que nos foi dada.
Assim, gostaríamos que, hoje, no Plenário da Assembleia, perante os Deputados, a Sr.a Ministra nos dissesse com rigor, já que, em nosso entender, o não fez na comissão, se, como foi dito e a Sr.a Ministra não contestou, as dividas relativas aos pagamentos em atraso aos bombeiros são hoje no valor de cerca 1,5 milhões de contos.
Concretamente, há 424 associações de bombeiros com dívidas do Ministério da Saúde. A nível nacional, nem todas estas associações têm os mesmos problemas, mas grande parte tem dívidas extremamente volumosas, o que está a criar-lhes dificuldades muito gravosas para com fornecedores e com pessoal. Diria mesmo que as dívidas do Ministério da Saúde poderão causar um «efeito de dominó» nas associações de bombeiros. É que não há dinheiro, logo, pode falhar o serviço de transporte de doentes, que creio que o governo reconhece ser fundamental para a qualidade do transporte de doentes em ambulância.
A este propósito, pergunto-lhe, concretamente, para quando o pagamento dessas dividas em atraso, que, nalguns casos, criam situações dramáticas. Recordo que, no ano de 1998, o Hospital de Vila Franca de Xira não pagou a um único fornecedor de transporte de doentes em ambulância, que o mesmo é dizer que não pagou a uma única associação de bombeiros voluntários pelo transporte de doentes.
Mas há uma carga acrescida sobre esta situação. É que revisão do acordo em matéria financeira data de 1995, pelo que, passados quatro anos, está-se numa uma situação dramática, pois aumentaram os combustíveis e não só, pelo que é necessário que o acordo seja revisto com eficiência e que os prazos de pagamento possam ser cumpridos pelo Ministério da Saúde.
Há hospitais com dívidas, há ARS que devem e gostaríamos que a Sr.a Ministra nos respondesse hoje, aqui, para quando a revisão do acordo que um grupo de trabalho tem pronto há bastante tempo, para quando o encetar das negociações, para quando a recuperação desta dívida, que é dramática e que pode causar dissabores não só às associações de bombeiros como também ao Governo e, sobretudo, aos doentes.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe, para um pedido de esclarecimento.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr.a Ministra, vou fazer-lhe, uma pergunta sobre o hospital Amadora-Sintra É uma pergunta dirigida a V. Ex.a, mas gostaria que os Srs. Deputados do Partido Popular fizessem o favor de comunicá-la à Sr.a Deputada Maria José Nogueira Pinto para que, em próxima oportunidade, não venha dizer o que disse hoje, ou seja, que nunca ouviu o PCP pronunciar-se sobre o hospital Amadora-Sintra.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Orador: — Este hospital foi, durante muitos anos, uma insistente reivindicação das populações destes concelhos; a sua construção arrastou-se por muitos anos, mais ou menos ao sabor dos ciclos eleitorais — as obras paravam e recomeçavam de acordo com as datas das eleições —, com um enorme agravamento de custos e, uma vez construído, foi entregue à gestão privada, apesar do protesto generalizado por parte das autarquias e das populações abrangidas que essa decisão suscitou.
A partir de 1996, o Estado passou a pagar 7,8 milhões de contos anualmente ao grupo financeiro que, presentemente, gere o hospital Amadora-Sintra.
Os utentes deste hospital, que constituem um universo de 640 000 — importa sublinhar isto —, foram as cobaias da gestão privada de hospitais públicos e, tanto quanto é possível avaliar hoje, esta experiência não poderia ter sido mais desastrosa. O hospital tem uma imagem péssima junto dos utentes, e não apenas junto destes mas mesmo junto dos responsáveis dos centros de saúde que se situam na área da sua influência.
Este hospital é constantemente notícia na comunicação social, quase sempre por más razões. Há notícias que referem que, segundo as Inspecção-Geral do Trabalho e a da Segurança Social, este hospital deve ao Estado 350 000 contos de contribuições e a respectiva administração recusa-se a pagá-las.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Uma vergonha!
O Orador. — Ainda segundo aquelas inspecções-ge-rais, 720 médicos e enfermeiros — isto é, um terço do corpo clínico deste hospital — trabalham em situação precária, isto é, em situação de falsos recibos verdes, todos os directores de serviço das urgências estão presentemente demissionários e, aliás, são constantes as demissões na direcção e as saídas de médicos e enfermeiros; há uma falta generalizada de pessoal; faltam algumas especialidades e os utentes sabem que quem recorre à urgência deste hospital espera sete ou oito horas até conseguir ser atendido.
As opiniões dos responsáveis pêlos centros de saúde na zona de influência do hospital Amadora-Sintra — centros de saúde dos concelhos de Sintra e da Amadora — dão conta de uma péssima relação com este hospital. Os utentes que são enviados para consultas externas ficam em listas de espera intermináveis, sem saber quando serão atendidos. Há uma falta de informação clínica por parte do hospital aos centros de saúde e, quando os utentes precisam de recorrer a meios auxiliares de diagnóstico, são sujeitos a um «ping-pong» do centro de saúde para o hospital e vice-versa. Há, ainda, queixas sobre este hospital relativamente a altas precoces que são dadas aos doentes e todos os centros de saúde se queixam deste problema.
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Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.a Ministra da Saúde, para responder.
A Sr.ª Ministra da Saúde: — Sr. Presidente, vou tentar responder ao conjunto de questões que me foram colocadas.
Começo pelo Sr, Deputado Alexandrino Saldanha e pela questão que suscitou relativamente aos enfermeiros, tendo dito que estabilidade e motivação não há. Não sei porquê, Sr. Deputado! Como já há pouco tive ocasião de referir, na resposta que dei a outro Sr. Deputado, se houve medidas de absorção dos enfermeiros foi com este Governo, com a criação de condições de assumir a falta ou a insuficiência de recursos humanos a nível de enfermagem...
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): — Tardiamente!
A Oradora: — Tardiamente? Não, Sr. Deputado! Então, absorvemos milhares de enfermeiros a partir de 1996...
Protestos do Deputado do PSD Jorge Roque Cunha.
Desculpe, Sr. Deputado, mas não colocou esse problema na sua pergunta.
O que estou a dizer, em resposta ao Sr. Deputado Alexandrino Saldanha, é que se absorveram todos os enfermeiros que se encontravam disponíveis e sem vínculo.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): — Ainda hoje há esse problema, a Sr.a Ministra sabe bem!
A Oradora: — De qualquer forma, como o Sr. Deputado sabe, ainda no final de 1998, foram atribuídas mais 2000 quotas de descongelamento, tendo nós aberto os concursos atinentes para permitir a integração das pessoas.
Houve, efectivamente, uma absorção e foram tomadas medidas para formar mais recursos humanos de enfermagem, porque necessitamos deles. Aliás, como o Sr. Deputado sabe, temos vindo a desenvolver, para os enfermeiros, uma intervenção específica cm determinadas áreas de actuação, designadamente, a nível dos centros de saúde e a criação das unidades de atendimento na comunidade permitirá reservar para essa classe um papel de inequívoca importância, por exemplo, no seguimento dos doentes crónicos e de doentes de determinados grupos.
A questão do equilíbrio relativo entre carreiras tem mais a ver com as Secretarias de Estado da Administração Pública e do Orçamento, organismos que estão a estudar esse problema. O mesmo acontece com a contagem do tempo de serviço, uma vez que não se trata de uma questão especifica do Ministério da Saúde.
No que se refere aos estudos levados a cabo pelo Ministério da Saúde em matéria de carências, efectivamente, foram feitos estudos, mas não lhe sei dizer de cor quais! De qualquer modo. poderei disponibilizar-lhe o que existir em termos do departamento de recursos humanos da saúde.
O Sr. José Barradas (PS) — O que eles querem são papéis. Sr.ª Ministra!
A Oradora — O Sr. Deputado Jorge Roque Cunha referiu-se aos novos hospitais que foram anunciados e ao facto de ainda não existir qualquer obra, cm termos objectivos.
Ora bem, como o Sr. Deputado sabe, não se começa urna obra antes do programa funcional e do projecto. O que posso dizer-lhe é que, em relação a Vila Franca de Xira — é pena não estar presente o Sr. Deputado Pedro Moutinho, porque completaria um pouco a resposta que vou dar —, havia dificuldades em encontrar o terreno adequado e a câmara municipal disponibilizou o terreno...
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): — Discutimos isso há dois anos!
A Oradora: — Desculpe, mas o terreno só agora ficou disponível e o Sr. Deputado não pode contrariar aquilo que é um dado objectivo!
Hoje em dia, se o Sr. Deputado quer construir um hospital, tem de o fazer na localização adequada para garantir as acessibilidades. Mas, como dizia, o terreno foi disponibilizado, o que constitui mais um bom exemplo de articulação com as autarquias do País.
O Sr. Nelson Baltazar (PS): — Muito bem!
A Oradora: — Com efeito, autarcas de todos os partidos políticos têm colaborado com o Ministério da Saúde, numa postura de colaboração e de articulação que aproveito a oportunidade para saudar e louvar.
Vozes do PS: — Muito bem!
A Oradora: — Em relação ao facto de existir ou não o cumprimento de promessas, devo esclarecer que falei do que fiz e que tudo aquilo de que falei está comprovado pelo que foi feito! Em todo o caso, considero que isso é insuficiente, muito insuficiente, mas considero que se está a trabalhar no sentido certo e correcto, razão pela qual continuarei a trabalhar determinadamente nesse mesmo sentido. Em meu entender, ele é sério e correcto.
Quanto às questões da segurança hospitalar, colocadas pelo Sr. Deputado Rodeia Machado, designadamente contra incêndios, em virtude da existência de grandes cargas combustíveis e de instalações que, efectivamente, nem sequer estão adequadas ao tipo de actividade que nelas se desenvolve, apenas queria referir o seguinte: solicitei a todas as administrações regionais de saúde que, em articulação com a Liga dos Bombeiros, pelo saber que as corporações de bombeiros têm, promovessem o estabelecimento de contactos pontuais entre o estabelecimento hospitalar ou o estabelecimento de saúde e as associações de bombeiros da área, no sentido de todas definirem e terem o seu plano de emergência.
A Direcção-Geral da Saúde deu instruções a todas as administrações regionais de saúde — penso que não o fez directamente aos hospitais — no sentido de cada estabelecimento ter o seu próprio plano de emergência. Também as auditorias que a Inspecção — Geral da Saúde faz, no âmbito de determinados temas, versam — sempre! — a questão dos planos de emergência.
Por outro lado, apesar de todas as instruções e orientações muito concretas que possam existir a nível de estabelecimentos identificados, no INEM está a preparar-se, e estará finalizado no fim do mês, um conjunto de guide lines relativamente à elaboração de planos de emergência, a fim de facilitar a respectiva elaboração, principalmente em hospitais mais débeis nesse conhecimento.
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nho que essa é também uma preocupação nossa. Foram dadas instruções e orientações às administrações regionais de saúde no sentido de estas privilegiarem, nos seus pagamentos, as instituições não lucrativas, face à sua especificidade e à sua insuficiência em termos de angariação alternativa de recursos. E contamos ter a situação regularizada até ao fim do mês de Março.
No que se refere à revisão do acordo, já está em estudo no Instituto de Gestão Informática e Financeira e na Direcção-Geral da Saúde a proposta a apresentar para efeitos dessa mesma revisão.
Por último, Sr. Deputado António Filipe, em relação ao Hospital Amadora-Sintra, encomendámos uma auditoria a uma entidade externa. Ou seja, apesar de este hospital ter uma comissão de acompanhamento específica a nível da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo, consideramos importante a realização de uma auditoria específica, que estará concluída em Abril, de forma a incluir já os dados relativos a 1998. Logo que esteja disponível, ela será presente ao Sr. Deputado António Filipe.
Como o Sr. Deputado referiu, existem problemas nesse hospital, designadamente a nível da urgência, também determinados pelo surto gripal - este surto gripal afectou não só os hospitais publico como os hospitais privados! As pessoas sabem que, mesmo as urgências dos hospitais privados, na época do ano que referi, ficaram completamente congestionadas e determinaram muitas horas de atraso no atendimento.
O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr.ª Ministra.
A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente.
Sr. Deputado António Filipe, o que lhe posso dizer é que, logo que dispuser do relatório, entregá-lo-ei na Assembleia da República, para que seja feita a sua análise.
Aplausos do PS.
Srs. Deputados, deu entrada na Mesa uni requerimento, apresentado pelo PS, PSD, CDS-PP e PCP, para que se proceda, desde já, à votação, na especialidade e final global, do texto de substituição relativo aos três projectos de lei que acabámos de aprovar.
Suponho que todos estarão de acordo em que se proceda, de imediato, à votação na especialidade desse texto de substituição, sem que antes se faça a votação do respectivo requerimento.
Pausa.
Como não há objecções, vamos votar, na especialidade, o texto de substituição, que adita ao n.º 1 do artigo 51.º do Decreto-Lei n.º 100/84, de 29 de Março, com a redacção dada pela Lei n.º 18191, de 12 de Junho, uma alínea j), apresentado pelo PS, PSD e PCP.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
É o seguinte:
Artigo único
É aditado ao n.º 1 do artigo 51.º do Decreto-Lei n.º 100/84, de 29 de Março, com a redacção dada pela Lei n.º 18/91, de 12 de Junho, uma alínea j), com a seguinte redacção:
Artigo 51.º
1 - Compete à Câmara Municipal, no âmbito da organização e funcionamento dos seus serviços, bem como da gestão corrente:
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos à hora regimental das votações e creio que estamos em condições de as fazer.
Começamos por votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 590/VII - Competências das câmaras municipais no âmbito das instituições de carácter social do respectivo pessoal autárquico (PCP).
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, não refiro a que comissão baixa este diploma, porque deu entrada um requerimento no sentido de se proceder à respectiva votação na especialidade e final global.
Antes porém, segue-se a votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 607/VII - Competências das câmaras municipais na concessão de apoio às instituições de carácter social e cultural dos respectivos funcionários municipais (PSD).
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Vamos agora votar, também na generalidade, o projecto de lei n.º 619/VII - Competência das câmaras municipais na concessão de subsídios às instituições criadas pelos funcionários da administração local, com carácter social e cultural (PS).
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Deliberar sobre as formas de apoio, incluindo a atribuição de subsídios, a instituições de carácter social e cultural, constituídas pelos funcionários do município, que prossigam no âmbito deste aqueles objectivos.
O Sr. Presidente: - Vamos agora proceder à votação final global deste mesmo texto de substituição.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, passamos à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 218/VII - Regula a aplicação de medidas para protecção de testemunhas em processo penal.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS e abstenções do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes.
A proposta de lei agora aprovada baixa à 1ª Comissão.
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Em seguida, vamos votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 232/VII - Altera a Lei n.º 36/94, de 29 de Setembro, que estabelece medidas de combate à corrupção e à criminalidade económica e financeira.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS e abstenções do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes.
A proposta de lei baixa igualmente à l.ª Comissão.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de três pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 2.º Juízo do Tribunal de Círculo de Portimão, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Martim Gracias (PS) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, em processo que se encontra pendente naquele tribunal.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em aprecia
Não havendo inscrições, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a solicitação do 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Beja, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado António Saleiro (PS) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, em processo que se encontra pendente naquele tribunal.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em aprecia
ção.
Não havendo inscrições, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a solicitação do 1.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Évora, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Domingos Cordeiro (PS) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, em processo que se encontra pendente naquele tribunal.
O Sr. Presidente: - Srs.Deputados, está em aprecia
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, vamos retomar o debate da interpelação ao Governo.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Rui de Almeida.
O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Saúde, Sr. Secretário de Estado da Saúde, Sr.ªs e Srs. Deputados: Duas questões centrais se colo
cam actualmente na política de saúde. A primeira, é a de saber se o nosso sistema de saúde, que assenta fundamentalmente no Serviço Nacional de Saúde, é ou não o mais adequado para o País; a segunda, é a de saber se é ou não necessário e possível reformar/melhorar este nosso sistema de saúde.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bém!
O Orador: - Quanto à primeira questão, a resolução dos problemas da saúde dos cidadãos é, hoje em dia, uma das preocupações centrais da grande maioria dos responsáveis pelos governos dos diversos países.
Confrontados com gastos cada vez maiores e muito vultuosos; confrontados com uma procura crescente e com barreiras significativas e desiguais no acesso aos cuidados de saúde; confrontados com uma prestação de cuidados em que a humanização dos serviços é frequentemente posta em causa; confrontados com uma realidade específica desta área, em que a maior oferta gera mais procura; confrontados com tantas outras realidades e dificuldades. constata-se, hoje em dia, que não há nenhum modelo de saúde que satisfaça plenamente os cidadãos e os governantes.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Portugal adoptou um sistema misto, cuja espinha dorsal da prestação de cuidados de saúde é garantido pelo Estado, através do Serviço Nacional de Saúde - criado em 1979 pelo Ministro do PS, António Arnault -, co-existindo com outros subsistemas, serviços privados, mutualismo, seguros, etc.
Passados 20 anos após a implementação do SNS, e apesar das muitas dificuldades, pode hoje afirmar-se que os portugueses passaram a ter melhor saúde.
Portugal melhorou significativamente alguns dos seus índices de saúde, aproximou-se dos países europeus. Por exemplo, a taxa de mortalidade infantil - embora saibamos que a área da saúde não pode ser responsabilizada por tudo, porque o próprio desenvolvimento do País contribui para este índice - foi reduzida em quatro quintos, encontrando-se actualmente os valores nos 6,8%o nados-vivos; também os anos de vida potenciais perdidos diminuiu para mais de metade. Mas manda também o rigor dizer que a esperança de vida dos portugueses aos 40 e 65 anos é uma das mais baixas da Europa. Mas também manda o rigor dizer que temos mais e melhores hospitais, mais e melhores centros de saúde, mais e melhor prestação de cuidados de saúde, mais e melhor prevenção, mais e melhores programas e acções de saúde pública.
Com o SNS, que cobre todo o território nacional, foi também possível consolidar o Plano Nacional de Vacinações, que se iniciou em 1975 e que, hoje em dia, se considera ter atingido um bom nível internacional, melhor mesmo do que em alguns países mais desenvolvidos do que o nosso. Com o SNS foi também ainda possível concretizar outros planos de âmbito nacional, como, por exemplo, o Programa de Saúde Materno-Infantil, o Planeamento Familiar e o Programa tios Diabéticos.
Passados 20 anos após a criação do SNS, também é altura de nos interrogarmos sobre que saúde teríamos em Portugal se, em vez do nosso actual sistema, tivéssemos um outro qualquer baseado em serviços privados, de seguros ou de convenções.
Vozes do PS: - Muito bem!
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O Orador: - Qual seria o grau de satisfação dos cidadãos? Qual seria o grau da qualidade dos cuidados prestados? Quais os índices de saúde? Qual o grau de cobertura do País em serviços de saúde? Quais as despesas públicas e privadas com a saúde? Certamente, os portugueses teriam pior saúde, teriam mais dificuldades no acesso a consultas, a tratamentos, a operações nos hospitais, a exames laboratoriais, etc.
Que ninguém se iluda: sem o SNS e com outro sistema baseado nos privados, nos seguros ou nas convenções, os portugueses teriam de pagar mais dinheiro por uma consulta, por uma intervenção cirúrgica, por exames auxiliares de diagnóstico ou pelos medicamentos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O acesso aos cuidados de saúde teria mais barreiras e mais desigualdades. Os doentes passariam a estar mais desprotegidos, principalmente os mais desfavorecidos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Mais nenhum outro sistema de saúde garantiria a todos os portugueses o direito à saúde que o SNS universal garante; mais nenhum outro sistema de saúde garantiria a todos os portugueses o direito ao acesso a todo o género de prestação de cuidados de saúde que o conceito de Serviço Nacional de Saúde geral dá; mais nenhum outro sistema de saúde garantiria a todos os portugueses o direito à saúde, independentemente das suas condições económicas.
Por isso, o .PS continua a afirmar que o nosso actual sistema de saúde, cuja espinha dorsal é o Serviço Nacional de Saúde, é o que responde mais eficazmente às necessidades do País.
Fazemos, por isso, o nosso alerta aos portugueses face aos últimos ataques que a direita tem dirigido ao SNS. Os partidos da direita, que agora formaram a segunda AD, querem acabar com o SNS para o substituir por seguros, sistemas privados ou convenções!
Não contem com o PS para acabar com o SNS, mas podem contar com o PS para melhorar o SNS.
Aplausos do PS.
O SNS é de todos os portugueses. O SNS é para todos os portugueses!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Abordemos agora a segunda questão central da actualidade política de saúde: saber se é ou não necessário e possível reformar e melhorar o nosso sistema de saúde. Respondemos, com determinação e clareza, que sim.
Consideramos prioritário separar definitivamente o sector público do privado.
O nosso sistema de saúde está construído em três pilares: o SNS, que se dirige a todos os portugueses e é financiado pelo Orçamento do Estado; os subsistemas especiais para algumas categorias profissionais que cobrem 1/4 da população; e o sector privado, que se dirige a cerca de 1/5 da população.
As despesas totais com a saúde atingiram, em 1996, 8,2% do PIB, um valor acima da média europeia, sendo
que a componente das despesas com o sector público foi de 4,9% do PIB, um valor abaixo da média europeia, e as despesas privadas de saúde atingiram 3,3% do P1B, um valor substancialmente acima da média europeia.
Trata-se de um sistema de saúde onde a não delimitação entre os sectores é causadora de distorções no consumo de serviços médicos; o livre acesso ao SNS, implantado em todo o território nacional, origina uma grande procura, co-existe com regimes sobrepostos e coexiste ainda, mas sem delimitações claras, com um sector privado cujos preços dos serviços prestados ultrapassam os 30% da média europeia.
Conservamos, ainda, modelos de funcionamento que vêm de hábitos e práticas do passado: mais de metade dos médicos que trabalham no SNS continuam a trabalhar simultaneamente no sector privado; em certos casos, é possível ter acesso aos cuidados privados com cobertura do SNS que reembolsa medicamentos prescritos num quadro de diagnóstico e tratamento privados; alguns doentes continuam a ter a possibilidade de consultar vários médicos ao mesmo tempo, o que multiplica inutilmente exames diagnósticos e prestações de cuidados e, até há pouco tempo, não fosse a iniciativa do actual Ministério da Saúde, alguns médicos do SNS concorriam com o próprio SNS, mantendo contratos privados através de convenções.
Estes e outros exemplos demonstram que o nosso sistema tem duplicações desnecessárias no seu funcionamento, originando custos elevados, ineficácia e desperdício de recursos. Daí o aprofundamento de medidas que separem claramente o sector público do não público - lembro a iniciativa do Ministério em relação às convenções. Ambos, sector público e não público, são necessários e úteis, mas com regras claras e campos bem delimitados.
Consideramos também prioritário obter uma maior rentabilização dos serviços do SNS, que passa, obrigatoriamente, pelo alargamento do período de funcionamento dos hospitais e dos centros de saúde, embora reconheçamos que muitas unidades de saúde estão já a implementar novos horários de funcionamento, como é o caso de Viana do Castelo. Já agora, como ó distrito de Viana do Castelo já foi falado várias vezes, quero precisar, de uma forma irrebatível, algumas informações e deturpações que foram feitas. Para isso, quero informar a Câmara e, através dela, o País de uma situação que é certamente novidade para todos os Srs. Deputados: é que todos os centros de saúde do distrito de Viana do Castelo - e foi este o último distrito que a Comissão de Saúde visitou - passaram a funcionar para consultas das 8 horas às 20 horas. Todos os centros de saúde,...
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Isso é que vos dói!
O Orador: - ... com uma excepção: Arcos de Valdevez, porque a própria população, oscultada sobre esta matéria, considerou que só era necessária a abertura do centro de saúde até as 18 horas.
A segunda questão que gostaria de frisar é a de que não há listas de espera nos centros de saúde de todo o distrito de Viana do Castelo. Não há listas de espera em qualquer centro de saúde de Viana do Castelo.
A terceiro questão é ade que no Hospital de Viana do Castelo há apenas listas de espera em quatro especialidades médicas e cirúrgicas.
O quarto ponto que quero precisar diz respeito às urgências no Hospital de Viana do Castelo que estão a diminuir, estando a aumentar o número de consultas no hospital.
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Todas estas realidades, que não existiam há cerca de um ano e meio, querem revelar algo de importante do qúe se está a passar numa nova política de saúde.
Aplausos do PS.
Tenho de o dizer, porque isto arrasa por completo as atitudes destruidoras que alguma oposição, nomeadamente o PSD e o CDSPP, têm tido relativamente ao Serviço Nacional de Saúde, atitudes e posturas catastrofistas que têm prestado um mau serviço à saúde neste país, criando um cenário extremamente negativo e destruíndo um bom serviço que está já a ser feito em muitas unidades de saúde deste país.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - No entanto, constatamos que algo falta fazer e refiro-me, em especial, à necessidade de alargar o período de funcionamento dos hospitais e centros de saúde. Algo falta fazer, em especial, nos grandes centros populacionais, em Lisboa e Porto, onde muitos serviços de saúde continuam a concentrar a sua actividade só numa parte do período da manhã, desperdiçando instalações e equipamentos durante quase todo o resto do dia.
Trata-se de uma maior rentabilização dos serviços que se obtém também com o caminhar progressivo para o modelo de trabalho em exclusividade nas unidades públicas de saúde e também com novos esquemas de remuneração para os profissionais de saúde, onde a produtividade deve ser premiada e tida em conta. Custa continuar a aceitar que os profissionais que cumprem os seus horários e que se dedicam ao seu serviço tenham a mesma remuneração que os seus colegas que não cumprem o horário a que estão obrigados.
Uma maior rentabilização dos serviços passa também pela implementação do novo Estatuto Jurídico do Hospitais, de forma a permitir uma gestão sólida, rigorosa, exigente e irão permissiva, uma gestão responsável e que possa ser responsabilizada pela aplicação de tão vultuoso investimento que atinge 2,4% do PIB e que representa, hoje, mais de metade das despesas públicas de saúde, maior rentabilização que passa também pela salutar competitividade, implementando, entre outras medidas, o princípio de que o financiador não tem de ser obrigatoriamente o prestador.
Com o SNS obtivemos uma boa cobertura de âmbito nacional, mas queremos melhorar a sua qualidade e a sua eficácia, melhorar o acesso, resolver as barreiras e as desigualdades ainda existentes.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Resolver as questões da saúde dos portugueses é uma das preocupações centrais do PS e do Governo através do Ministério da Saúde, que muitas medidas tem tomado: a nova lei das convenções; o cartão nacional do utente; o Projecto Alfa; o novo estatuto remuneratório do pessoal da carreira médica; a implementação dos sistemas locais de saúde (SLS); o novo decreto-lei para os centros de saúde; o novo Estatuto Jurídico dos Hospitais; os centros de responsabilidade integrados; o novo diploma dos genéricos e das comparticipações.
No entanto, reconhecemos que é necessário dar mais passos para melhorar a eficácia dos cuidados de saúde assegurados pelo SNS. Nessa perspectiva, o Ministério da Saúde apresentou recentemente um importante documento, que se designa por SNS 21, o qual corporiza linhas de acção e aponta caminhos e metas para termos melhor saúde nos próximos anos.
O próprio Primeiro-Ministro, António Guterres, afirmou já que a saúde será uma das primeiras prioridades do próximo governo do PS.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - É como a educação!
O Orador: - Os portugueses têm razões positivas para continuar a ter confiança no PS e em António Guterres como Primeiro-Ministro.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Maria José Nogueira Pinto, Bernardino Soares, Jorge Roque Cunha e Rui Marques.
Tem a palavra a Sr.` Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Rui de Almeida, antes do foral deste debate, gostaria de introduzir um outro registo. Acho que este debate oscila, como todos os debates sobre saúde, entre dois registos: um, muito partidarizado, que, do meu ponto de vista, é totalmente inútil e cheio de vacuidade, e outro, um bocadinho mais fundo que corresponde à preocupação de todos nós, que, penso, é unânime, em relação a estas matérias.
Quero voltar a 1990, porque é interessante lembrar o que foi dito pelo Sr. Deputado Ferraz de Abreu, que era Deputado do PS: «Qualquer política de saúde que considere a evolução do conceito de saúde, os múltiplos factores que nela intervêm, as novas tecnologias utilizadas na sua promoção ou na sua recuperação e os seus elevados custos, necessita, para a sua execução, de uma complexa organização que não dispensa a intervenção do Estado». E continuava: « A diferença entre as várias políticas possíveis colocase apenas na escolha do tipo de organização e no grau de responsabilidade a assumir pelo Estado». Este era um bom ponto de partida para um interessante debate, mas já perdemos a oportunidade.
Devo dizer que é nesta questão que situo o ponto mais crítico e de clivagem e, aliás, em todas as intervenções, esta questão foi considerada como tal. Quem é que não quer o SNS? Até agora, não ouvi ninguém dizer que não queria o SNS! O SNS trouxe melhorias para Portugal? Todos sabemos que sim, todos conhecemos os indicadores da saúde que Portugal tinha em 1973, 1972 ou em 1970 e os que teve cinco ou seis anos depois de o SNS ter entrado em funcionamento. Mas os pressupostos macroeconômicos que permitiram a criação do SNS em Portugal e noutros países modificaram-se consideravelmente. Portanto, a ideia da reforma é generalizada.
Cito um Deputado do Partido Comunista, que também estava mais clarividente há 10 anos, que dizia uma coisa que é a pura das verdades, ou seja, que as três grandes questões são os custos, o acesso e a qualidade. Não há mais do que estas questões num Serviço Nacional de Saúde. O Serviço Nacional de Saúde tem de ter acesso, porque, se não, de nada serve, tem de ter qualidade e tem de ter-se em conta um pouco a ideia dos custos. Falo, por exemplo, em modelo de financiamento, modelo de organização e recursos humanos...
Quero dizer com isto - e faço-o com toda a amizade - que não vale a pena a Sr.ª Ministra fazer um rol, elencar uma série de coisas, porque quando chegamos às
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medidas concretas, «patinamos». Quando o Sr. Deputado João Rui de Almeida fala em Viana do Castelo e depois diz que o que não está muito bem é Lisboa e Vale do Tejo, tem de ter a noção do que é que se concentra em Lisboa e Vale do Tejo a nível de equipamentos, recursos humanos, utentes e recursos financeiros. Se a situação vai mal em Lisboa e Vale do Tejo, vai mal no País! Tenho muita pena de dizer isto; porque sou contra a concentração, mas esta é a verdade! E quanto a esta matéria que claudicamos por causa destes argumentos.
O Sr. Deputado disse depois uma coisa interessantíssima: temos de dar estímulos aos que cumprem o horário. No meu entendimento, é instaurado um processo disciplinar a quem não cumpre um horário. Posso dar estímulos a quem produz mais se se alterar o sistema e este permitir que se estimule de acordo com uma produção, mas não posso pagar melhor a quem cumpre o horário, tenho é de despedir quem o não cumpre! Diria o PCP que esta é a minha tendência para criar o terror. Mas é assim mesmo.
Portanto, quando começamos a particularizar e a entrar no rol é que escorregamos.
Registando que a preocupação é generalizada, que o «núcleo duro» está mais do que diagnosticado, que todas as pessoas incluindo o Partido Comunista, que tem um conjunto de medidas para propor - reconhecem que este SNS precisa de ser revitalizado, o que pergunto é se não valeria a pena apresentar, por hipótese, num projecto de alteração à lei de bases, esse tal SNS 21, porque o SNS 21 é ainda e só o SNS, e a alteração da lei de bases poderia para já acolher contributos de todas as pessoas e depois projectar um sistema de saúde de que o SNS fosse, indiscutivelmente, o eixo central.
Quero saber se continuamos com um rol que, acho, não conduz a lado algum.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Rui de Almeida, ouvi a sua intervenção aliás, o Sr. Deputado já tem feito este registo noutras alturas - sobre as vantagens que trouxe ao País, como já foi dito aqui, hoje, desta bancada, a existência do Serviço Nacional de Saúde. E vantagens nas mais diversas áreas, nomeadamente na protecção das populações.
Mas o Sr. Deputado fez até um exercício de imaginação, colocando a questão de saber como seria se não existisse o Serviço Nacional de Saúde. Agora, o exercício que lhe quero propor é outro, Sr. Deputado: como é que seria se este Serviço Nacional de Saúde fosse verdadeiramente defendido e acarinhado? Esta é a questão que temos de colocar e resolver. Que o Serviço Nacional de Saúde se traduziu e traduz em grandes vantagens para os cuidados de saúde às populações, isso, é inegável. O que é preciso saber é que medidas este Governo tem tomado para que o Senzço Nacional de Saúde possa produzir mais e melhor, para concluirmos, a final, quão melhores seriam os cuidados de saúde do nosso país se o Serviço Nacional de Saúde fosse verdadeiramente defendido.
De resto, esta questão tem de se ligar ao País que temos e à realidade em que vivemos. E a verdade é que dados de há dois ou três anos nos indicam que, em Portugal, a despesa privada com saúde se cifra em cerca de 40% da despesa total nesta área. Isto é, aquilo que cada cidadão paga, do seu próprio bolso, em despesas na área da saúde, para além daquilo que já pagou em impostos, é de
40% em Portugal, .quando na média europeia é apenas de 25%. Isto só pode querer dizer que há uma grave carência e um grave défice na prestação de cuidados às populações, que, obviamente, se reflecte muito mais nas pessoas que são mais carençiadas e que, portanto, têm menos possibilidade de recorrer a outras alternativas que não sejam o Serviço Nacional de Saúde.
Enquanto esta realidade se mantiver, enquanto esta falta de acesso se mantiver, temos de perguntar o que é que não foi feito, como sucede com este Governo, para que o Serviço Nacional de Saúde fosse mais eficaz e assegurasse com maior plenitude as funções a que estava destinado.
Quero ainda colocar-lhe uma questão sobre a separação entre o público e o privado. O Sr. Deputado João Rui de Almeida está contente com os efeitos parcos da legislação que o Governo produziu em relação a esta separação na área das convenções? O Sr. Deputado João Rui de Almeida está convencido de que a timidez da proposta e a falta de vontade na sua aplicação vão, realmente, resolver o problema da separação entre a prestação pública e a prestação privada na área do sector convencionado? O Sr. Deputado João Rui de Almeida é capaz de dizer aqui que o Partido Socialista não vai defender mais e vai alterar a situação da prestação privada em hospitais públicos? Ou essa não é uma das razões para que haja promiscuidade entre a prestação pública e a prestação privada? O Sr. Deputado João Rui de Almeida é capaz de comprometer aqui o Partido Socialista, dizendo que mais nenhum hospital e mais nenhuma experiência em unidades de saúde vai ter gestão privada, com as consequências para os cuidados de saúde às populações que já tem a experiência que temos hoje no Hospital Amadora-Sintra?
O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!
O Orador: - O Sr. Deputado é, capaz de se comprometer aqui, em nome do Partido Socialista, no sentido de que não vai haver mais experiências destas e de que não vamos ter mais privatização da gestão de serviços de saúde no nosso país em novas unidades que venham a surgir?
O Sr. João Amaral (PCP): - Bem perguntado!
O Orador: - Esta questão do Serviço Nacional de Saúde, Sr. Deputado João Rui de Almeida, dá-nos, claramente, uma linha de fractura e não é possível estar com um pé de cada lado desta linha, que define quem defende o Serviço Nacional e quem diz defendê-lo mas, na realidade, não leva à prática as soluções e as medidas que verdadeiramente se exigem para que possa ser defendido.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Roque Cunha.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Rui de Almeida, uma pergunta directa: é capaz de dizer que não existem problemas na área da saúde? Ouvi a sua intervenção e, por aquilo que percebi, havia só um pequeno « problemita», que era o de as, pessoas estarem mais tempo nas instituições de saúde. E capaz de dizer, com rigor e verdade, que não existem problemas na área da saúde?
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Sr. Deputado João Rui de Almeida, quando nos acusa de catastrofistas, será que não se está a lembrar das suas intervenções, na passada legislatura, nesta Assembleia da República? Ou estará, eventualmente, a sugerir que o PSD deixe de falar dos problemas da saúde, dos problemas que entram nas nossas casas todos os dias, bem como das cartas que recebemos semanalmente, como bem sabe, na Comissão de Saúde? Será que o Sr. Deputado está aqui a pedir que os silenciemos? Nós não podemos, não devemos e não iremos fazê-lo! Hoje, estamos a denunciar a situação, amanhã, espero eu, se os portugueses confiarem em nós, estaremos a apresentar as soluções.
Sobre a visita a Viana do Castelo, Sr. Deputado, de facto, quando o dirigente responsável da Sub-Região de Viana do Castelo acabou de fazer a sua apresentação, é ou não verdade que não um, não dois, não três mas, sim, quatro presidentes de câmara, todos eles do Partido Socialista, vieram afirmar que a situação que ali era descrita não era verdadeira, que serviços de atendimento nocturno tinham sido encerrados, que havia problemas de instalações nos centros de saúde, que há este e aquele problema, que havia dificuldades de acesso ao próprio Hospital de Viana do Castelo? Sr. Deputado, os eleitos locais, como sabe, têm responsabilidades junto das suas populações e o Sr. Deputado também as deveria ter. Aliás, Sr. Deputado João Rui de Almeida, penso que seria útil para todos nós que estas questões pudessem ser encaradas devidamente, nomeadamente quando são expressas por presidentes de câmara do Partido Socialista.
Vou terminar com a questão do novo estatuto jurídico do Hospital de Santa Maria da Feira. É que o Sr. Deputado falou no estatuto jurídico dos hospitais, mas eu não o conheço. Dadas as dificuldades que esse documento e essa discussão ocasionaram ficou só para Santa Maria da Feira, é um estatuto específico para o Hospital de Santa Maria da Feira. E o que lhe pergunto é o seguinte: é ou não verdade que estava previsto o hospital iniciar o seu funcionamento, de acordo com o que o Sr. Dr. Arcos dos Reis veio aqui dizer, em Março de 1998? É ou não verdade, Sr. Deputado João Rui de Almeida, que iniciou o seu funcionamento em Janeiro deste ano, com problemas na neonatologia, com dificuldades de recursos humanos e sem os serviços aplicados, quando tiveram dois anos de instalações praticamente concluídas havia, naturalmente, a necessidade de se equiparem essas instalações -, e que, objectivamente, não havia qualquer razão, quer por falta de instrumentos jurídicos, quer por falta de meios, para que o hospital não começasse efectivamente a funcionar? O que seria, meu caro colega Deputado João Rui de Almeida, se o Hospital AmadoraSintra tivesse aberto desta forma? Será que teria ainda o contrato de gestão que foi acordado pelo Governo, que, recordo aqui, foi visado pelo Tribunal de Contas?
O Sr. Presidente: - Para responder aos três pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado João Rui de Almeida.
O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, antes de mais, quero cumprimentar os Srs. Deputados Maria José Nogueira Pinto, Bernardino Soares e Paulo Roque da Cunha, porque são ilustres membros da Comissão de Saúde, a que tenho a honra de presidir, bem como agradecer as questões que colocaram e a forma como o fizeram, tendo em conta o conhecimento aprofundado que têm desta matéria.
Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, não resisto a dizerlhe uma coisa: de facto, o programa do CDS-PP, do qual a Sr.ª Deputada faz parte,...
O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - E com orgulho!
O Orador: - ... não defende o SNS.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Ah! Ó Sr. Deputado! ...
O Orador: - Desculpe, Sr.ª Deputada, tem uma proposta completamente diferente.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Qual?
O Orador: - Já uma vez trouxe para o Plenário, e tenho pena de não a ter trazido hoje, a fotocópia do programa do Governo em que se traduzia a proposta do CDS-PP, e que é a actual, e também do próprio...
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Deve ser do ano de 1991 ! ...
O Orador: - Não é, não! Sr.ª Deputada, terei oportunidade de lhe mostrar isso, mas, de facto, é assim que sucede.
Quanto á questão dos custos, acesso e qualidade, quero dizerlhe o seguinte: julgo que é indiscutível e indesmentível que, neste momento, o SNS e, enfim, todo o sistema que o envolve mas, fundamentalmente, a estrutura do Serviço Nacional de Saúde tem uma cobertura que temos de reconhecer positiva. Temos agora de passar para o acesso. Aliás, as medidas têm sido tomadas nesse sentido e o querer também vai nesse sentido. Temos de resolver muitos problemas nas questões do acesso. Não tenha dúvida! A Sr.ª Ministra é a primeira a reconhecer isto e, por isso, não fez aqui um discurso cor-de-rosa. E, lembro, está só há três anos e meio no Governo, que é pouco...
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - É pouco?I...
O Orador: - ... para fazer uma reforma tão profimda, Srs. Deputados! Tem o querer, tem a vontade e tem linhas de orientação nesse sentido na sua própria estrutura de pensamento sobre o que é uma solução.
O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Já percebi onde estão as grandes reformas: é na estrutura de pensamento dos Ministros! ...
O Orador: - Mas, de facto, há uma cobertura bastante positiva no País relativamente ao que o SNS proporciona.
Risos do Deputado do CDS-PP Luís Queiró.
Agora, é preciso dar o salto para melhorar o acesso, a qualidade, etc.
Em relação à questão de Viana do Castelo, dei o último exemplo, para dizer que, efectivamente, muita coisa melhorou.
De facto, há muitos problemas para resolver em Lisboa e Vale do Tejo. Não disse que está tudo por resolver, mas é preciso resolver ainda muitas questões em Lisboa e
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Vale do Tejo e aqui é mais difícil, porque, na verdade, os serviços acumulam-se. Está a fazer-se muita coisa nessa área mas é necessário fazer ainda melhor.
Em relação às questões centrais, uma vez que não posso pormenorizar tudo, dada a falta de tempo, dirijo-me agora ao Sr. Deputado Bernardino Soares.
O Sr. Deputado colocou-me a questão de saber como seria se o SNS fosse mais protegido. Sr. Deputado, o PS e, repito, a Sr.ª Ministra da Saúde estão há três anos e meio no Governo!
A Sr.ª Fernanda Costa (PS): - Bem lembrado!
Protestos do PCP.
O Orador: - É verdade! Têm de considerar que é um dado que deve ser tido em conta! O PS esteve afastado anos e anos e anos da gestão do SNS e agora, desde que retomou, novamente, a responsabilidade de gerir o SNS, temos de aceitar que há uma melhoria e que há, pelo menos, metas e directrizes que apontam para o caminho correcto. Várias propostas têm sido feitas. O Sr. Deputado disse que nem tudo está feito e a própria Sr.ª Ministra reconhece que nem tudo está feito. Mas era impossível fazer, em três anos e meio, tudo o que estava por fazer.
Em relação à questão da gestão privada dos hospitais, há uma coisa que quero dizer ao Sr. Deputado Bernardino Soares: julgo que se lembra que a gestão privada do Hospital Amadora-Sintra não foi uma proposta nossa.
O Sr. Bernardino Soares (PS): - Perguntei-lhe para o futuro! ...
O Orador: - Mas já tem a resposta para o futuro, e com segurança, que é o novo estatuto jurídico dos hospitais, o qual, como sabe, traduz uma gestão pública.
Protestos do PSD, do CDS-PP e do PCP.
É uma gestão pública! Mais: pessoalmente, até nem gosto muito do modelo de gestão do Hospital Amadora-Sintra. Não morremos de amores!...
A Sr.º Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Mas essa é uma boa solução!
O Orador: - Mas é uma experiência que está a ser avaliada e estudada. À partida, não estamos contra, mas vamos estudá-la e avaliá-la e, se for positiva, vamos...
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Srs. Deputados, o PS já abordou esta questão aqui com toda a clareza: se. for avaliada positivamente, é evidente que não vamos contrariá-la, mas o modelo que foi proposto por este Governo foi o modelo do novo estatuto jurídico dos hospitais que é uma gestão pública.
O Sr. Deputado Jorge Roque Cunha disse que eu entendia que os problemas da saúde não existem, mas eu tive o cuidado de dizer que existem e enumereis. Tive a coragem de enumerar alguns. É evidente que nós temos a noção de que é necessário... Mas os Srs. Deputados estiveram tantos anos no Governo que, Sr. Deputado, tem de convir...
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - E o que ouvimos de si!
O Orador: que só há três anos e meio é que o PS, através da Sr.ª Ministra da Saúde, está a frente do Ministério da Saúde e não é possível fazer tudo no mesmo dia.
Em relação à questão de Viana do Castelo, Srs. Deputados, por amor de Deus, estivemos lá todos e não desmintam aquilo que eu disse, porque é irrebatível. Há uma coisa que, de facto, alguns presidentes de câmara criticaram, e eram do PS - veja só!... -, o que também é importante, porque eram do PS e estavam lá, que foi a questão do atendimento nocturno. Mas o Sr. Deputado Jorge Roque Cunha tem a obrigação de ver esta realidade pelo prisma da saúde, enquanto os presidentes de câmara a vêem pelo prisma do autarca que tem de atender às solicitações dos seus munícipes.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Agora, o senhor tem a obrigação de ver que se trata de uma outra realidade e que tem de ser vista com mais rigor.
Em relação ao Hospital de Santa Maria da Feira, Sr. Deputado, é evidente que houve alguns contratempos, mas há aqui uma grande diferença: é que enquanto nós queremos resolvê-los, os senhores não o querem, para alimentar a polémica! Nós queremos resolvê-los e vamos resolvê-los!
Aplausos do PS.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Tomáramos nós que os resolvessem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Roque Cunha.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Saúde, Sr. Secretário de Estado, Sr.ªs e Srs. Deputados: Mais de 1200 dias após a sua tomada de posse, e a pouco mais de seis meses do final do seu mandato, nem a sofisticada máquina de marketing do gabinete da Sr.ª Ministra da Saúde e dos serviços centrais e regionais do Ministério da Saúde conseguem esconder a gravíssima situação que se vive neste sector.
A saúde serviu ao Partido Socialista, na parte final da legislatura passada, como importante arma de arremesso. Onde existia uma dificuldade, lá estava o Partido Socia= lista a ampliá-la; onde havia problemas financeiros, lá vinha o Engenheiro Guterres a prometer mais 1% do PIB para investimento público na saúde; onde havia um problema, lá estava o Partido Socialista a apresentar soluções miraculosas.
Nos Estados Gerais, páginas e páginas foram escritas com soluções fáceis para todos e quaisquer problemas na área da saúde. De uma forma condensada, é certo, o programa eleitoral lá vinha com a «varinha mágica».
Tudo isto foi feito no contexto de ampliar as expectativas quer dos cidadãos quer dos profissionais de saúde. O Programa de Governo e a postura da Sr.ª Ministra têm confirmado esta senda de aumento das expectativas.
O Partido Socialista teve, portanto, mais do que tempo para se preparar para conduzir os destinos da saúde neste país. Daí que o sentimento de desilusão da população e dos profissionais seja tão marcado como é hoje.
Não somos só nós, Partido Social Democrata, que o afirmamos; qualquer pessoa um pouco mais ligada e atenta a estes problemas assim o diz. Associações profissio
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nais, sindicatos, economistas da saúde e dirigentes do Partido Socialista afirmam aquilo que temos repetido nos últimos dois anos: a falta de coragem, a inacção governativa e a falta de reformas estão a conduzir a saúde a um beco sem saída e, se não se tomarem medidas, a própria saúde pública poderá ser posta em causa.
Isto é não é admissível e é tão mais inadmissível porque afecta a saúde de todos e cada um de nós, mesmo a das pessoas saudáveis, e é uma área particularmente sensível para .todos os portugueses.
A titular da pasta não se pode queixar da incompreensão da população ou dos profissionais ou do Sr. Ministro das Finanças, tendo usufruído de uma invejável quota de popularidade e da inequívoca e reiterada confiança do Sr. Primeiro-Ministro nas suas acções passadas, presentes e futuras. A Sr.ª Ministra da Saúde não tem perdão nem desculpas por ter deixado degradar a situação a este ponto.
Só o mais desatento ou míope com lentes rosa eseuro é que não reconhece que a situação que se vive hoje é pior do que a vivida há meia dúzia de anos atrás.
Não dizemos isto com alegria ou satisfação contida. Sabemos bem que as análises catastrofistas em nada ajudam a tranquilidade do sector, mas a situação que se vive hoje no dia-a-dia do Serviço Nacional de Saúde .obriga-nos a denunciar uma situação que, por falta de medidas e de coragem do Governo para desenvolver as reformas necessárias, está a atingir, como eu disse, quase um ponto de não retorno. Denunciamos isto com tristeza e preocupação porque quem sofre são as pessoas, as suas famílias, num bem que é essencial à vida de todos nós.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Apesar da mais que razoável herança do governo do PSD - e, para tal demonstrar, basta ter presente os indicadores objectivos que, em pouco mais de uma dezena de anos, nos aproximou muito dos parceiros da União Europeia e dos Estados Unidos, sempre temos falado da necessidade de um entendimento alargado da sociedade e dos partidos políticos para um bem que tem de ser preservado e que todos os cidadãos têm direito ao melhor tratamento possível das suas doenças e à melhor vigilância e prevenção da sua saúde. Demos este exemplo com a discussão e a aprovação da Lei de Bases da Saúde, em 1990. O Professor Marcelo Rebelo de Sousa, em Abril do ano passado, no Dia Mundial da Saúde, reafirmou essa intenção.
O Governo esteve surdo a estas solicitações. O Governo desistiu de encontrar soluções para o problema; foi vencido pelas circunstâncias e ultrapassado pelas consequências. Está conformado!
Nós não aceitamos esta perspectiva; é possível fazer mais e melhor.
Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Saúde, Sr.º Secretário de Estado, Sr.os Deputados: É neste contexto que o PSD afirma que, mais de 1200 dias após a tomada de posse do Governo, não só pouco se tem feito na gestão corrente da saúde, como se têm, lamentavelmente, atrasado todos os programas de reforma que vinham sendo incrementados pelos anteriores goverrios. O cartão do utente, a informatização dos serviços de saúde, os centros de responsabilidade, as unidades de saúde, o financiamento da saúde e a clarificação e o apoio aos subsistemas, permitindo o opting out, são só alguns dos exemplos.
O Partido Socialista não pode usar o argumento constitucional porque, também aí, teve uma atitude irredutível e contraditória com as promessas eleitorais, contrariando as propostas de flexibilização do PSD, o que em nada contribuiu para a reforma do sistema.
A cerca de seis meses do final da Legislatura, é impossível que o Governo possa promover qualquer processo sério de reforma na saúde.
Se até agora não foi capaz, pouco mais nos resta esperar do Ministério da Saúde do que um frenesim pré-eleitoralista, aliás, já iniciado, da titular da pasta, muito pródiga em aparições públicas, sempre com o olhar atento à câmara de televisão ou à objectiva do fotógrafo, de preferencia, a inaugurar obras lançadas pelo anterior governo!
Apesar do empenho e do esforço da generalidade dos profissionais de saúde, é evidente à população portuguesa que o sector fugiu do controle do Ministério.
Os tons cor-de-rosa do discurso do Governo, que, ainda hoje, a Sr.ª Ministra da Saúde e os Deputados do Partido Socialista aqui vieram referir, são confrontados, todos os dias, com a dura realidade dos factos. Obriga-nos, pois, a voltar a referir alguns problemas concretos que afectam o sistema de saúde em Portugal.
Em vez de se preocupar em encontrar soluções para os complexos problemas da saúde, o Governo preocupa-se muito mais com a promoção da imagem da Sr.ª Ministra da Saúde, com o branquear da situação, com o «dourar da pílula».
Em vez de procurar soluções para os problemas que se vivem no dia-a-dia e com o sofrimento das pessoas que precisam de cuidados de saúde, em vez de promover as reformas indispensáveis, adia, cria comissões, grupos de trabalho, protela, navega à vista.
Quando esses grupos de trabalho, por acaso, apresentam propostas, à primeira dificuldade, lá vão as propostas repousar numa gaveta da João Crisóstomo. O relatório do Conselho de Reflexão para a Saúde e o das urgências são só dois dos exemplos.
Perdeu, pois, três anos, preocupado com a forma e a cosmética e esquecendo-se do conteúdo.
O Sr. Azevedo Soares (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Anuncia uma, duas, três, quatro, meia dúzia de vezes que as reformas vão avançar.
Os centros de responsabilidade integrada, alguns dos quais a funcionar há quase uma década, são publicitados como ideia inovadora e são pré-inaugurados, tardando o instrumento legal, o decreto-lei, que é necessário para o seu funcionamento.
Quanto ao anúncio de datas e prazos para a generalização daquele que é um instrumento essencial para a organização do sistema de saúde, o cartão do utente, todos nos recordamos que o Sr. Secretário de Estado da Saúde, Arcos dos Reis, anunciou no Parlamento que, em Setembro de 1997, estaria a 100% no Alentejo e no Algarve e, no final-desse ano, generalizado a todo o País. Hoje, ficámos a saber que só 60% da população está, coberta.
Anuncia os projectos Alfa nos cuidados primários que, rapidamente, murcham, nomeadamente aquilo que acontece em Fernão Ferro.
Anuncia e inaugura «linhas verdes», «linhas azuis», mesmo quando já existem algumas na rotina dos serviços, ou quando se sabe que os centros de saúde encerram às 20 horas e que não têm capacidade de resposta para as pessoas que ai recorrem, mesmo em horas normais, muito menos depois da 20 horas.
Inaugura obra lançada no anterior governo com a desfaçatez de deixar a entender ser o único responsável por isso e, sempre que pode, à primeira dificuldade, desculpa-se com a «pesada herança».
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Há listas de espera intermináveis para consultas e intervenções cirúrgicas, nas quais o Governo, finalmente, assumiu estarem cerca de 80 000 pessoas, mas não apresentou qualquer razão válida para recusar, por duas vezes, a proposta do PSD neste Parlamento. Recusa-se a disponibilizar à Assembleia da República os tempos de espera e os números de pessoas em listas de espera, hospital a hospital, doença a doença, bem como dos locais em que, alegadamente, se recuperaram listas de espera nos últimos anos, o seu custo, critério de atribuição e formas de avaliação. Há uma insensibilidade total ao sofrimento das pessoas que esperam e desesperam por uma intervenção cirúrgica.
Quanto às urgências, infelizmente já todos temos presente a situação que ai se vive.
Assistimos à insatisfação generalizada dos profissionais: greve dos médicos, dos enfermeiros, dos técnicos de saúde.
Onde era prometido rigor, sempre que a Inspecção-Geral da Saúde ou das Finanças levantam questões à gestão dos directores de hospitais militantes do mesmo partido da Sr.ª Ministra, o silêncio do Governo é ensurdecedor.
Que diz o Ministério da Saúde, tão lesto em aparecer publicamente por tudo e por nada, sobre os factos, amplamente noticiados, relativos ao o Hospital de Setúbal?
Que diz sobre um acordo sui generis feito com uma sociedade anónima de capitais públicos com garantia de convenção por cinco anos a preços muito acima das convenções em vigor com outras entidades, quando recusou as propostas apresentadas pelos serviços públicos para recuperação de listas de espera, exactamente nestas áreas?
Faz isto e, ao mesmo tempo, não paga a fornecedores de tratamentos a doentes do Serviço Nacional de Saúde, pairando, às vezes, a dúvida quanto à continuidade desses tratamentos.
Há descontrole financeiro, sendo que a situação financeira era de 67,5 milhões de contos de dívida, no final de 1995. E em finais de 1998, o Sr. Secretário de Estado da Saúde afirmou, no Parlamento, não saber o valor dessa dívida. Apesar de continuar a recusar a informação credível ao Parlamento, a estimativa é a de que esse valor possa ter ultrapassado em muito os 250 milhões de contos. Isto apesar de três Orçamentos suplementares e dos recentes 159 milhões de contos de dívida pública emitida para amortizar essa dívida. Só às farmácias, devem-se cerca de 132 milhões de contos, dos quais 1 milhão de contos é de juros, quando, em Fevereiro de 1998, a dívida era de 51 milhões de contos,...
O Sr. José Junqueiro (PS): - Essa conversa é a pedido das farmácias!
O Orador: - ... aos bombeiros, como já.aqui foi referido, devemse 1,5 milhões de contos, o que afecta gravemente o seu funcionamento, etc., etc.
Será que esses volumes financeiros se repercutem na qualidade dos cuidados? Basta andar com os olhos e os ouvidos. abertos para se constatar que não!
Ao mesmo tempo que aumentam as despesas correntes, diminuem as de investimento - o PIDDAC é o mais baixo dos últimos três anos.
Há falta de médicos de família. No nosso país existem centenas de milhares de pessoas que não têm médico de família. Os médicos de família, que são pilares essenciais do sistema de saúde, não estando disponíveis para muitos portugueses, vão, com isso, causar uma maior dificuldade de acesso a consultas de especialidade, nomeadamente nos
hospitais, a meios complementares de diagnóstico, a tratamentos de oncologia, de saúde mental, etc., etc., etc.
Em relação ao planeamento familiar, nem se dignaram a comparecer na Assembleia para o debate solicitado pelo PSD e a reconhecer que é possível fazer mais e melhor.
O Sr. Azevedo Soares (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Relativamente à saúde mental, os esquizofrénicos ainda têm de pagar fortunas para o seu tratamento porque o Governo se recusa a alterar a comparticipação desses medicamentos.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Etc., etc.!...
O Orador: - Há incapacidade para pôr a funcionar os hospitais já construídos, como os de Santa Maria da Feira e do Barlavento algarvio, que viram ultrapassados em muito os prazos sucessivamente anunciados para o seu funcionamento. O que seria se a abertura do Hospital de Amadora-Sintra tivesse esses atrasos no início do seu funcionamento?
Será que estão atrasar o seu funcionamento para a inauguração ser mais próxima das eleições ou, melhor, para as inaugurações serem mais próximas das eleições?
Eu explico: a «inauguração um» feita pelo Secretário de Estado da Saúde, a «inauguração dois» feita pela Sr.ª Ministra da Saúde...
Risos do PS.
... e a «inauguração três» feita pelo Sr. Primeiro-Ministro, como aconteceu, por exemplo, no Hospital Curry Cabral!?
Vozes do PSD: - Bem lembrado!
O Orador: - Poderíamos, ainda, aqui referenciar muitos sectores que atravessam problemas sérios e desenvolver as razões da nossa crítica.
Mesmo que o fizéssemos da forma sucinta que usámos nos temas acima referidos, estaríamos aqui muitas horas a discursar e queremos poupar, a todos os colegas e ao Governo, esse sacrifício...
Não acreditam, Srs. Deputados do Partido Socialista? Pensam que estou a exagerar? Então, vejam o encerramento de serviços de atendimento nocturno, a questão da saúde mental, o programa de combate à tuberculose, a questão da BSE, a política, ou políticas, do Partido Socialista em relação ao medicamento, nomeadamente em relação à propriedade das farmácias, o culto da desresponsabilização, a instabilidade na medicina do trabalho, a ausência de planos de contingência para as urgências, para as situações de surtos gripais, os anúncios de hospitais virtuais - anúncios hoje tão em moda através de helicóptero! -, as dezenas e dezenas de obras adiadas, pelo menos mais um ano, com a inscrição de verbas' da ordem dos 5000 contos em PIDACC para fingir que elas vão começar.
Cito também o encerramento dos serviços de urgência do Hospital Pulido Valente, do Hospital dos Capuchos e dos serviços de atendimento nocturno das Taipas.
Portanto, como os diagnósticos estão feitos e mais do que feitos, iremos apresentar as propostas da Alternativa Democrática de cura, as quais esperamos que sejam sufragadas, para bem de Portugal e da saúde dos portuguesas.
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Para aquilo que o actual Governo mostrou incapacidade de solução, nós iremos resolver com coragem e determínação, com o sentido das responsabilidades, sem adiar os problemas e sem a eles fugir, porque sabemos que quanto mais tarde as medidas forem tomadas mais dificeis e dispendiosas elas serão.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Para nós, é fundamental que o Serviço Nacional de Saúde seja forte e capaz de responder, com segurança e qualidade, aos problemas de saúde do País. O Serviço Nacional de Saúde não é património de ninguém em particular, é património de todos os portugueses...
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Você está mesmo esmorecido! ...
O Orador: - ... e por isso orgulhamo-nos do contributo que demos para a sua construção.
Quero também assinalar que defendemos um sistema de saúde misto com uma forte componente pública, bem como fortes sectores de solidariedade social e de assistência privada lucrativos, sectores esses que devem ser articulados e funcionar em parceria e os quais estabelecerão entre si acordos de prestação de serviços transparentes e sujeitos ao escrutínio público.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Defendemos, igualmente, uma política de recursos humanos racional que promova uma melhor distribuição geográfica dos profissionais de saúde, ao invés da política desenvolvida pelo actual Governo, que tem contribuído para o agravar da desertificação de muitas zonas do País, criando instabilidade em muitas unidades de saúde e a morte prematura de vários projectos-piloto, como aconteceu, por exemplo - e é só um exemplo -, em Fernão Ferro.
O Sr. José Junqueiro (PS): - O que é isso! ...
O Orador: - Queremos também um Serviço Nacional de Saúde humanizado e que deixe de estar subfinanciado, no qual o mérito, o trabalho e a dedicação sejam recompensados.
Apesar da limitação dos meios disponíveis em muitos sectores, nós também concordamos que a medicina portuguesa está ao nível do que de melhor se faz no mundo. Connosco, ela será incentivada a manter a sua excelência, ao mesmo tempo que fomentaremos o culto da responsabilidade e uma maior acessibilidade a esses cuidados de saúde.
Para nós, um Serviço Nacional de Saúde deve providenciar cuidados continuados que dêem respostas concretas aos problemas de saúde do idoso, um sistema de saúde que permita aos doentes uma crescente livre escolha dos locais de tratamento e que se baseie no princípio de que o dinheiro segue o doente.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O que o Governo do Partido Socialista está a fazer com o seu autismo é, objectivamente, a enfraquecer o Serviço Nacional de Saúde e, com isso, a diminuir a confiança que os portugueses nele depositam, ao mesmo tempo que aumenta a dificuldade de acesso a esses serviços aos mais fracos, aos mais desfavorecidos e a todos aqueles que têm menos conhecimentos dentro do sistema.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - É fundamental, pois, mudarmos o actual estado de coisas. Assim, nos próximos tempos, iremos desenvolver as nossas propostas alternativas, as quais, estou certo, poderemos pôr em prática com a confiança que os portugueses irão depositar em nós.
Com a nossa denuncia e com o nosso trabalho, não pretendemos contribuir para a vitimização da Sr.ª Ministra da Saúde. O vigor do nosso discurso deve-se unicamente ao actual estado da saúde e á incompetência e impotência do actual Governo para propor soluções objectivas. Esperamos - mas a esperança é pouca, devo dizer - que as nossas denúncias não caiam em saco roto.
Não é ao PSD que o Governo está a penalizar com essa atitude. Quem ele penaliza é a população portuguesa, que perde a esperança em melhores dias e vê a solução dos seus problemas sempre adiada.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Marques.
O Sr. Alberto Marques (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Roque Cunha, a sua intervenção gerou em nós, inicialmente, um sentimento de contestação, porque foi longe demais na forma pouco séria...
O Sr. Azevedo Soares (PSD): - Pouco séria?!...
O Orador: - ... que usou para olhar e avaliar a realidade, neste momento, na área da saúde deste país.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Mas ficámos tranquilos porque nos lembrámos que, amanhã, haverá um congresso do PSD e, certamente, estará já hoje a preparar uma entrada em glória nesse congresso!... Por isso serenámos de imediato.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Fale de coisas
O Orador: - Mas, Sr. Deputado, porque o que nos preocupa é a saúde dos portugueses, queríamos colocar-lhe uma questão. Porém, antes disso, gostaríamos de lhe dizer o seguinte: V. Ex.ª referiu - e registámos - que a situação de saúde dos portugueses é hoje pior do que ontem.
Ficámos de boca aberta, podemos dizê-lo, porque vimos agora e finalmente - que aquilo que V. Ex.ª referiu como herança não foi herança mas, sim, irresponsabilidade.
Sr. Deputado, VV. Ex.as estiveram no Governo e, curiosamente, não foram capazes de avaliar a realidade que caracterizava a saúde dos portugueses. Se tivessem sido capazes de fazer essa avaliação, não teriam tomado a atitude, pouco séria e irresponsável,...
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Mas que arrogância!
O Orador: - ... de vir aqui dizer que este Governo nada tem feito, que os milhares de médicos, de enfermeiros, de técnicos de saúde que, por este pais dão o seu
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melhor, hoje mais do que ontem, hoje de forma mais organizada, mais disponível do que ontem, nada têm feito.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Se V. Ex.ª tivesse feito essa avaliação, não teria dito o que disse.
Mais: falou V. Ex.ª dos médicos de família, mas não tem o direito, em termos políticos, de o fazer,
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Esta agora! ... Era o que faltava! ...
O Orador: - ... porque VV. Ex.as não foram capazes de dar ao médico de família a dignidade necessária à função que desempenham e indispensável para resolver os problemas de saúde dos portugueses, principalmente no que se refere aos cuidados primários. VV. Ex.as colocaram os médicos de família a trabalhar nas urgências dos hospitais, em vez de os terem colocado a trabalhar nos seus consultórios, ...
O Sr. José Junqueiro (PS): - Bem lembrado! ...
O Orador: - ... VV. Ex.as não foram capazes de estimular o preenchimento de vagas nos internatos de clínica geral - e, hoje, a situação é diferente -, VV. Ex.as deixaram os centros de saúde sem médicos de família e hoje a situação é diferente.
Portanto, V. Ex.ª não tem o direito de vir aqui dizer aos portugueses que a situação hoje é pior do que a de ontem. Tem todo o direito de criticar a situação, tem todo o direito de avaliá-la, tem todo o direito - e o dever de apontar as deficiências e de, eventualmente, apresentar propostas para corrigi-Ias, mas não tem o direito de vir aqui dizer que nada se faz, que tudo está mal, que tudo está pior. Não tem esse direito!
Sr. Deputado, a minha pergunta é tão simples quanto isto: afinal, qual é a solução, quais são as propostas políticas da futura AD? São as propostas que V. Ex.ª não apresentou quando discursou da tribuna? São as propostas do CDS-PP, que também não foram apresentadas? São os discursos de 1990 e de 1991, que aqui foram trazidos por algumas bancadas?
Sr. Deputado, afinal qual é a vossa política, qual é a vossa proposta para os portugueses? Será que a vossa proposta é plagiar aquilo que hoje se faz e que ontem não foram capazes de fazer?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Roque Cunha.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Marques, penso que as suas tentativas de exibição perante a Sr.ª Ministra da Saúde falharam!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Eu não queria usar aqui um termo que um colega nosso usou, o do «cyesmanismo», que, por vezes - e é o caso do seu , ultrapassa o mínimo do decoro. O Sr. Deputado é capaz de dizer que, em Portugal, não há problemas na área da saúde? É capaz de desmentir, objectivamente, qualquer dos dados que fiz da tribu
na? Sr. Deputado, não pode desmentir nenhum deles! Para detectalos, basta andar com os olhos e com os ouvidos abertos!
Sr. Deputado Alberto Marques, eu ouvi-o com muita serenidade e, para mim, a verdadeira irresponsabilidade é reconhecer que está tudo feito, que o problema está todo resolvido e que nós não temos razão nas nossas denúncias. Só que o problema não são as nossas denúncias, o problema é que são as pessoas que denunciam.
O Sr. Azevedo Soares (PSD): - Muito bem!
O Orador: - E essas pessoas são os trabalhadores dos serviços de saúde, os técnicos, os beneficiário que estão à espera e que desesperam com as listas de espera, etc.
Sr. Deputado, existem ou não 80 000 pessoas em lista de espera, números oficiais do Ministério da Saúde?
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Existem, mas não se pode falar disso!
O Orador: - Existem ou não problemas na área da organização dos recursos humanos no nosso país que levaram a que, com este exame que o Ministério da Saúde fez, um pouco extemporâneo provavelmente, muitos centros de saúde da periferia deixassem de ter médicos de família para eles viessem para o centro?
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - É, mas não se pode dizer!
O Orador: - É ou não verdade que as misericórdias e o sector social estão há três anos a discutir um acordo com o seu Governo, sem terem conseguido, até hoje, qualquer resposta?
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - É, mas não se pode dizer!
O Orador: - É ou não verdade a derrapagem financeira do Serviço Nacional de Saúde?
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - É, mas não se pode dizer!
O Orador: - É ou não verdade, Sr. Deputado, que, hoje, as pessoas que pensam recorrer aos serviços de saúde se imbuem de uma pequena angústia?
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - É, mas não se pode dizer!
O Orador: - Sr. Deputado, perante isso, a nossa voz não se calará, até porque, por muito que o Partido Socialista tenha a arrogância de pensar e de falar do alto da sua poltrona do poder, nós sabemos que o poder é dado pelo povo e que será também o povo quem lhe irá tirar o poder.
Aplausos do. PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a pa
lavra o Sr. Deputado José Barradas.
O Sr. José Barradas (PS): - Sr. Presidente, Srs. Ministros, Sr. Secretário de Estado, Sr.ªs e Srs. Deputados:
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e é incompatível com governos arrogantes e autistas, constituídos por um primeiro-ministro efectivo e um conjunto de ajudantes com contrato a prazo?
Foi, pois, por incapacidade política e não técnica que o PSD não deixou marra positiva no sistema de saúde português.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Deve estar a falar do Dr. Arcos dos Reis!
O Orador: - Srs. Deputados, compreendo o vosso desassossego, mas tenham paciência, ouçam-me com atenção!
Protestos do PSD.
Eis-nos de novo a falar sobre saúde, hoje pela mão do PCP, ontem por iniciativa do CDS-PP e do PSD. A oposição parece, assim, eleger a saúde como uma das suas prioridades.
A prioridade do PCP assenta em convicções próprias, consubstanciada em propostas sérias, mais ou menos exequíveis, é certo, e que por nunca ter conseguido ser poder tem de vê-Ias ser levadas a cabo por outros.
Recordo que o PCP foi o único partido a responder ao desafio lançado pelo Primeiro-Ministro no sentido da formulação de acordos de longo prazo para, entre outras, a área da saúde. É, pois, uma prioridade oportuna e desejável, porque é estimulante, e, embora numa perspectiva um tanto idílica, pode e deve ser levada em conta.
A prioridade do PSD assenta em razões de pura oportunidade política. Reflecte a postura de um amante que é rejeitado e não aceita essa sua condição. É triste, é marginal, vive de incursões e de fugas, de acertos e de desassossegos. Não pode ser levada a sério.
Sr.ªs e Srs. Deputados, começo por vos lembrar que o actual Governo se seguiu a um outro do PSD que nos governou 10 anos, durante os quais usufruiu de todas as condições para deixar obra na área da saúde.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - E não dei
O Orador: - Teve tempo, teve fundos, teve maioria absoluta, teve ideias, sobretudo a avaliar pela torrente de propostas e de certezas que, hoje, os seus Deputados expressam. E, apesar disso, a sua época foi um tempo de destempo, foi uma oportunidade perdida, foi uma expectativa frustrada, foi uma mudança adiada.
Foi não só penosa mas trágica esta falta de coragem demonstrada pelo PSD.
O Serviço Nacional de Saúde que encontrámos era estruturalmente frágil, ...
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Está a contradizer a Sr.ª Ministra!
O Orador: - ... funcionalmente ineficaz e promíscuo, socialmente injusto e descapitalizado não só de dinheiro, mas, acima de tudo, da confiança dos portugueses. E foi isto o que nos propusemos mudar.
Srs. Deputados, fiz esta referência ao passado apenas por duas razões: em primeiro lugar, para recordar à Câmara que as pessoas que hoje nos acusam de nada fazer e se apressam a anunciar as mais promissoras soluções e as mais aliciantes propostas são as mesmas que, nos dois governos do PSD que nos antecederam, podiam tê-las implementado e não as implementaram, são as mesmas que, hoje, se sentam naquela bancada. Mesmo parecendo que nada tiveram com isso, são as mesmas que deixaram o Serviço Nacional de Saúde como acabei de referir.
Porquê? Será que foi porque não quiseram fazer melhor? Não cometo a indelicadeza de o pensar!
Será porque não souberam fazer melhor? Só em parte acredito nisso, porque conheci no PSD pessoas das mais qualificadas e acreditadas na área da saúde.
Será então - e aqui surge a segunda razão que me levou a recordar à Câmara o PSD passado - que o problema, porque é complexo, requer soluções participadas e vontades políticas expressas, condições que exigem um Governo homogéneo, constituído por um Primeiro-Ministro, por ministros e por secretários de Estado dialogantes,
Sr.ªs e Srs. Deputados, como dizia, as sociedades modernas regem-se por três princípios: um, de ordem política, é a democracia; outro, de ordem económica, é o mercado; o terceiro, de ordem social, é o maior ou menor Estado providência.
Este é o resultado do aperfeiçoamento a que, sucessivamente, se devotaram os artífices incógnitos que, ao longo dos séculos, acreditaram numa sociedade justa e equilibrada: no século XVIII, promovendo os direitos cívicos, no século XIX, desenvolvendo os direitos políticos e económicos e no século XX consagrando os direitos sociais. Vamos entrar no próximo século, o século da informação, questionando-nos: em que medida podem e devem as sociedades que criámos proteger os cidadãos dos riscos normais da vida, individual e social, da nascença à morte, como os que decorrem da doença, do desemprego, da exclusão ou da velhice? Ou seja, a Europa em que estamos, berço da segurança social, percursora e promotora do mais alto nível de protecção social do mundo, mas onde, reconhecidamente, ainda existe um deficit social e uma desarmonia entre os Estados, é confrontada com a necessidade de saber se a compatibilidade entre o conhecimento dado pelo desenvolvimento das ciências humanas e da tecnologia deve ser orientada apenas para as ideologias ou se deve ser alargada também às humanidades.
A saúde destaca-se de entre todos os sectores sociais como sendo aquele mais complexo de gerir. A maneira como se relaciona a necessidade ilimitada com a oferta existente, a forma como convivem as decisões com os interesses, por vezes cóntraditórios, de que resultam, o modo como se ajustam os direitos dos cidadãos com a capacidade finita dos recursos disponíveis, a confusão entre a saúde e os cuidados, sempre obscureceram o debate político e aprisionaram, em conceitos ideológicos e interesses partidários, o que pode e deve ser uma política de saúde boa para todas as pessoas.
Hoje, a tendência universal é a de os Serviços Nacionais de Saúde - que são aqueles suportados por 85%, eln média, do Orçamento do Estado -, imporem alguma disciplina nos gastos, alguma restrição nas prescrições e não reembolsarem os medicamentos ou os tratamentos cuja eficácia não seja claramente reconhecida.
Na Europa comunitária, a discussão sobre a contenção de custos com os dos cuidados de saúde assenta em três vectores principais: o vector da solidariedade, que responsabiliza a sociedade pelo pagamento dos custos totais dos cuidados de saúde a todos os que não possam pagá-los; o vector da subsidiariedade, que propõe a aproximação de nível das diversas políticas nacionais de saúde; o vector da farmacopolítica, que procura estabelecer o equilíbrio entre os interesses dos médicos, da indústria e dos doentes, por um lado, e dos recursos nacionais disponíveis, por outro.
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No primeiro caso, todos estão de acordo: o -Serviço Nacional de Saúde de cada pais deve sustentai as necessidades de cuidados de saúde dos mais pobres. Só divergem no modo de o fazer.
No segundo caso, é nítida a dificuldade da Comissão Europeia em entender-se com os diversos países sobre a aplicação do princípio da subsidiariedade.
Por último, afigura-se igualmente dificil a tarefa de estabelecer uma política comum de preços e de reembolsos, que, simultaneamente, contente os grupos profissionais de forte pendor corporativo e não hostilize os cidadãos eleitores.
São estes os desafios que se colocam a todos os Governos.
O PS inscreveu no seu contrato de legislatura, primeiro, e no seu programa do Governo, depois, algumas medidas de relevo, das quais destaco, pela exiguidade de tempo de que disponho e pela sua importância própria, as que dizem respeito ao medicamento.
Para avaliar essa importância, basta recordar que o mercado total do medicamento em Portugal é de cerca de 400 milhões de contos e que metade dele é pertença do Serviço Nacional de Saúde.
Todos os anos os encargos do Serviço Nacional de Saúde com medicamentos sobem: em 1987, foram de 41 milhões de contos; em 1991, foram de 76 milhões de contos; em 1995, foram de 122 milhões de contos; em 1997, foram de 156 milhões. Isto, só em facturação de farmácia.
O Sr. Azevedo Soares (PSD): - Que desperdício!
O Orador: - O preço dos medicamentos em Portugal é - e só somos igualados pela França - o mais baixo da Europa. Mas, apesar disso, a despesa pública com medicamentos - e isso já aqui foi referido pelo Sr. Deputado Carlos Carvalhas - tem subido mais do que a média europeia. Situa-se, neste momento, em 2.1% do PIB, contra 1.6% de França, 1.5% de Espanha e 1.3% da Alemanha.
Tendo o nosso país um sistema fortemente controlador de preços, o aumento deve-se mais ao alargamento do mercado do que ao aumento de preços. Mas, voltando ao programa do Governo, saliento duas das principais medidas que o PS inscreveu com o fim de controlar o aumento da factura com os medicamentos. Foram elas: em primeiro lugar, a regulamentação da prescrição por princípio activo; em segundo lugar, a adopção progressiva dos preços de referência.
No primeiro caso, o Governo fez sair um importante diploma sobre genéricos, que, prevendo a inclusão de genéricos de marca, poderá ajudar a implementar a sua prescrição, ultrapassada a discutível, do meu ponto de vista, questão da qualidade. Sei que está em preparação um diploma que irá permitir a prescrição de genéricos no Serviço Nacional de Saúde, com explicitação do princípio activo ou DCI, Designação Comum Internacional. Cumprir-se-á, assim, o primeiro objectivo proposto no Programa do Governo.
No segundo caso, o da adopção de preços de referência progressiva, desde logo o Governo se deparou com uma dificuldade acrescida: a de que fosse o utente a ser sobrecarregado, no fim da linha, com o aumento de algumas, mas significativas, prestações. A esta dificuldade acresce a dúvida que existe sobre o reflexo desta medida na diminuição dos preços. Dou um exemplo aos Srs. Deputados: a Alemanha, que havia aderido aos preços de
referência em 1990, abandonou-os 3 anos depois por se terem mostrado ineficazes.
Em face disto, o Governo optou pela imposição de formulários, isto é, por definir medicamentos a prescrever em determinadas doenças nos serviços públicos de saúde e em clínica geral. Começou pelo formulário nacional hospitalar, já editado pelo INFARMED, e seguiu-se-lhe um conjunto de formulários por patologias, acordado com a Ordem dos Médicos. E, à semelhança do que acontece na Europa, essa medida deverá ser extensiva a mais 19 outras situações em clínica geral. Foi uma atitude sensata, que, não inviabilizando a opção dos preços de referência, fa-lo-á quando tal sistema se mostrar vantajoso.
Referirei, por último, duas outras iniciativas governamentais ainda nesta área. O novo diploma das comparticipações, que exclui do co-pagamento pelo Estado os produtos mais caros do que outros já existentes com a mesma composição qualitativa e quantitativa e com a mesma forma farmacêutica, todos os medicamentos que não apresentem vantagens terapêuticas evidentes e também todos quantos apresentem embalagens inadequadas aos tratamentos a que se destinam.
A introdução no sistema de informação do Serviço Nacional de Saúde da base de dados sobre medicamentos é outra medida digna de registo.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, em saúde, como noutras áreas, andar depressa não é sinónimo de andar bem, mas todos sabemos que em saúde, como noutras áreas, é preciso não ficar parado. O medicamento é um, apenas um, elo da cadeia, mas, pelos recursos que consome, pelo acesso fácil que permite e pela dependência que gera, exige uma política própria que tenha em conta o conjunto de interdependências de que vive e a política de saúde no seu conjunto.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, é isto que, pacientemente, mas seguramente, o Governo está a fazer!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, há um telemóvel que está a tocar. Tantas vezes tenho pedido que não se distraiam deixando os telemóveis em condições de receber chamadas, porque isso interfere com o sistema de som e interfere também com os nossos nervos! Agradecia que tivessem mais cautela.
Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado José Barradas, os Srs. Deputados João Corregedor da Fonseca e Francisco José Martins.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Barradas, V. Ex.ª não pode mostrar-se aborrecido pelo facto de a questão da saúde ser considerada prioritária, como fez no início da sua intervenção. É prioritária e, por isso mesmo, estamos aqui a interpelar o Governo sobre esta matéria.
O Sr. Deputado criticou os governos anteriores, e é certo que tem razão, mas é tempo de se avançar com soluções rápidas, não pedindo apenas paciência, como fez na parte final da sua intervenção.
V. Ex.ª teceu algumas considerações, estamos de acordo com algumas delas, mas esqueceu-se de assinalar alguns aspectos graves e esqueceu-se também de avaliar o Serviço Nacional de Saúde em toda a sua complexidade e extensão. Temos tido oportunidade, um pouco por todo o País,
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de visitar e de contactar populações, temos falado com as administrações regionais de saúde, temos visitado hospitais e centros de saúde, falado com directores clínicos e com enfermeiros e verificado, enfim, como há muitos problemas que urge solucionar. V. Ex.ª não pode deixar de considerar este aspecto. É precisamente por haver consciência da situação grave que ainda se vive no sector e no Serviço Nacional de Saúde que o Grupo Parlamentar do PCP apresentou iniciativas legislativas que V. Ex.ª, com certeza, não deixará de apoiar, porque elas são credíveis e porque vão concorrer para a solução desses mesmos problemas, para a moralização do sector e para o reforço do Serviço Nacional de Saúde, que V. Ex.ª diz - e acredito - defender.
Há também que ter certos cuidados, quando os Srs. Deputados do Partido Socialista apresentam exemplos, como aconteceu há dias e mesmo hoje, ao falarem de Viana. Eu também estive em Viana, Sr. Deputado, e há que ser sensato quando surgem com esses exemplos. Nós estivemos em Melgaço, em Viana, em Arcos de Valdevez e em Ponte de Lima e verificámos que não se vive num «mar de rosas». Os próprios autarcas de Melgaço, de Vila Nova de Cerveira, de Monção, de Valença e de Paredes de Coura tiveram oportunidade de nos apresentar um quadro menos positivo do que o de VV. Ex.as. Problemas idênticos encontramos um pouco por todo o País, como os que vimos em Trás-os-Montes, no Baixo Alentejo - e recordamos bem a situação gravíssima que se vive no Baixo Alentejo -, em Vila Nova de Gaia, no Porto, em Penafiel, em Aveiro, no Algarve e noutras regiões.
Muito há a fazer. Já foi aqui dito pelo Sr. Deputado Carlos Carvalhas que nós não somos daqueles que dizem que tudo está mal, mas é necessário tomar muitas medidas. Por isto, Sr. Deputado, não tem de estar aborrecido pelo facto de a oposição, nomeadamente o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, considerar como prioritária esta área. Impõe-se fazer muito para que as populações sejam servidas adequadamente no tocante aos cuidados de saúde a que têm efectivamente direito.
Já agora, coloco-lhe uma questão muito concreta. V. Ex.ª falou dos medicamentos. Um mercado total de cerca de 400 milhões de contos, como assinalou. Cerca de metade desta verba é do SNS. Como V. Ex.ª sabe, no que respeita aos medicamentos existem muitos interesses. Declarou no seu discurso que o nosso país tem um sistema fortemente controlador de preços e que considera que «o aumento se deve mais ao alargamento do mercado do que ao crescimento dos preços.». Estava a cita-lo. Gostava que V. Ex.ª esclarecesse melhor esta posição.
De qualquer modo, não nos-parece ser essa a principal razão, tanto mais que V. Ex.ª não pode negar as espantosas margens de lucro das multinacionais que dominam tal mercado em Portugal, com prejuízo dos utentes portugueses, nomeadamente dos mais carenciados, e com prejuízo notório do Serviço Nacional de Saúde. Ainda por cima, V. Ex.ª disse e salientou no seu discurso, para minha surpresa, que se afigura difícil estabelecer uma política comum de preços e de reembolsos que contente os grupos de forte pendor corporativo e que não hostilize os cidadãos eleitores. Quer dizer, V. Ex.ª está preocupado com as multinacionais, que não podem ficar descontentes, com as farmácias e com os potenciais eleitores. Pensa, Sr. Deputado, que esta é uma forma credível de apreciar um problema tão grave relacionado com o Serviço Nacional de Saúde?
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco José Martins.
O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado José Barradas, V. Ex.ª disse, e bem, que o PSD considera a saúde como uma prioridade, o que é rigorosamente verdade. E essa prioridade, porque estamos perante um direito fundamental, que é satisfeito à luz de medidas concretas implementadas pelo Governo, deixa-nos preocupados por várias razões.
V. Ex.ª preocupa-se em desviar as atenções do essencial, ou seja, do que se deve fazer e não se fez. Quero lembrar em trinta segundos que os tais 10 anos de governação do PSD coincidiram, e é bom que o Sr. Deputado tenha isso presente, com uma alteração ao texto constitucional, em 1989, com uma nova realidade do próprio direito à saúde e com o edificio legislativo que o PSD construiu. Lembre-se da Lei de Bases da Saúde e do Serviço Nacional de Saúde, mas lembre-se também dos indicadores sérios da saúde, Sr. Deputado, porque isso é importante!
V. Ex.ª esqueceu-se, porventura, do que foi feito em termos de novos hospitais e centros de saúde, esqueceu-se de um índice extremamente importante como é a taxa de mortalidade infantil, que já foi referida pelo Sr. Deputado João Rui de Almeida. Pela primeira vez, durante os governos do PSD, atingiu-se uma taxa de mortalidade infantil de apenas um dígito. Tudo isso e muito mais V. Ex.ª esqueceu, mas nós temos presente, a bem dos portugueses, o que constituiu desenvolvimentos efectivos.
Mas estamos preocupados por várias razões, Sr. Deputado, pelo que lhe coloco a seguinte questão: é ou não razoável que estejamos preocupados com tudo aquilo que caracteriza o dia-a-dia do cidadão, quando as listas de espera para consultas externas estão a aumentar diariamente, quando cidadãos carecidos, os que têm menos meios - aqueles que mais nos preocupam - se dirigem a um hospital e recebem como resposta que a sua intervenção cirúrgica talvez se realize daí a dois ou três anos? Posso dar-lhe exemplos concretos de todo o País, Sr. Deputado. Isso, para nós, é grave e é uma preocupação. A V. Ex.ª não o preocupa?
Preocupa-nos igualmente, de forma séria - queremos aqui sublinhá-lo -, a conflitualidade dos sujeitos quotidianos dos hospitais e dos centros de saúde: os médicos e os enfermeiros. Isso não é um elemento que nos deva causar preocupação quando queremos dar um passo em frente em termos de saúde?
Sr. Deputado, não considera também grave o facto de o aumento da dívida da saúde se consubstanciar em dívidas às farmácias, aos laboratórios, mas, sobretudo, aos bombeiros, dívida grave que já hoje aqtti foi sublinhada? Esta última dívida aumentou, de forma progressiva, desde 1996. Nesse ano, era da ordem dos 700 000 mil contos, tendo eu próprio endereçado um requerimento ao Ministério a colocar essa questão, ao que me foi respondido que se ia resolver a situação. Hoje ouvimos a mesma resposta, mas já perante uma dívida de 1,5 milhões de contos! Esta questão, para nós, é preocupante, pela função social e humanitária que representam os bombeiros. Essa situação não causa preocupação a V. Ex.ª? Pois ao PSD e aos portugueses causa muita preocupação!
Por isso, é preciso mudar e iniciar um novo rumo e uma nova política. É para isso que estamos preparados, nomeadamente em Outubro.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Barradas.
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O Sr. José Barradas (PS). — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, agradeço-lhe a oportunidade que me dá de lhe falar de assuntos que considero importantes.
Em primeiro lugar, falar mais do Serviço Nacional de Saúde do que falei na minha intervenção não seria só penoso para os Srs. Deputados, seria certamente um desastre, porque o tempo vai longo. Não poderia, portanto, «estender-me» muito, tanto mais que já tinha sido superiormente defendido pelas pessoas que me antecederam.
Sr. Deputado, não fico agastado pelas palavras que me dirigiu. Pelo contrário, fico muito contente por ver o PCP, como não podia deixar de ser, a defender, com o vigor que lhe é habitual, o Serviço Nacional de Saúde. O exemplo de Viana põe-se apenas por uma razão. A questão é simples, se o sistema deu resultado em Viana, porque é que não há-de, em circunstâncias idênticas, dar resultado noutros lados?
O Sr. João Corregedor da Fonseca (PCP). — Ainda não deu resultados!
O Orador. — Essa é, do meu ponto de vista, a questão que continua em aberto. Foi uma situação especial, foi uma experiência promissora, vamos implementá-la.
Por outro lado, fala-me dos preços dos medicamentos. É evidente, Sr. Deputado, que nós não vivemos num país estéril, vivemos num país de interdependências. Sendo certo que 98% da produção e da investigação mundial de medicamentos está nas companhias farmacêuticas, não vejo como é que, numa legislatura, podemos alterar esta situação. Estamos, portanto, dependentes. A questão que temos de. concretamente, colocar é a seguinte: em que medida é que o Estado pode intervir sem faltar com os medicamentos essenciais às pessoas, porque essas têm de ser tratadas, independentemente dos seus custos.
Portanto, gostaria de, porventura, nesta matéria, começar do ponto «zero», mas isso é impossível. Estas são as regras, estas são as normas. Infelizmente para nós, Portugal não tem investigação e não tem produção própria na área do medicamento. Dou-lhe apenas um dado. entre 1990 e 1995 - e isto dirige-se à bancada da minha esquerda, que representa os parceiros da minha direita -, Portugal perdeu 20 unidades de produção de medicamentos nacionais, ficando reduzido apenas a 3 empresas de relevo. Quero dizer-lhe também que, no mesmo período, Portugal perdeu um terço dos trabalhadores especializados no sector, passou de 7500 trabalhadores, em 1990, para 5000, em 1995.
E qual é hoje, Sr. Deputado, a caracterização da actual indústria nacional deste sector? 70% das empresas portuguesas de medicamentos são de média ou de pequena dimensão, tendo entre 100 e 500 trabalhadores. Apenas 10% destas estão viradas para a produção de medicamentos e a média etária das pessoas que trabalham no sector é de 40 anos. Trata-se de um conjunto fortemente subsidiário do exterior e são estas interdependências que nós, com alguma sabedoria, com algum rigor e com algum equilíbrio, temos de manter.
Para terminar, Sr. Presidente, quero dizer ao Sr. Deputado Francisco José Martins que compreendo que hoje é um dia triste para o PSD, porque são confrontados com as vossas próprias incapacidades e, sempre que assim é, é triste Mas. para o alegrar, deixe-me lembrar-lhe uma quadra do Aleixo que lhe vai renovar as esperanças: «Após um dia tristonho/de mágoas e arrelias/vem um outro dia risonho/é assim todos os dias».
Sr. Deputado, o seu há-de chegar!
Risos.
O Sr. Francisco José Martins (PSD). — Isso é uma homenagem a António Aleixo!
O Orador: — Sr. Deputado, quanto às listas de espera, penso que este é um assunto já esgotado.
O Sr. Presidente: — Julguei que tinha acabado com a quadra do Aleixo, Sr. Deputado.
O Orador: — Sr. Presidente, foi a quadra do Aleixo que me perturbou o raciocínio. Vou terminar de imediato.
Relativamente às listas de espera, os senhores, em 10 anos, reduziram, aproximadamente, 200. Nós já reduzimos milhares.
Relativamente aos médicos que faltam, não prevejo nem vejo centros de saúde e hospitais a funcionar sem médicos. Ora, o que lhe pergunto é o seguinte: durante os 10 anos em que estiveram no governo, que política de recursos humanos é que VV. Ex.as tiveram para obviar a esta situação com que agora nos defrontamos?
O Sr. Nelson Baltazar (PS): — Muito bem!
O Orador: — Por último, devo dizer-lhe que não queria responder à questão dos bombeiros, mas vou responder-lhe, Sr. Deputado, dizendo que, em 1992, VV. Ex.ª deviam l milhão de contos aos bombeiros e, do meu ponto de vista, nada fizeram, até 1995, para pagar essa dívida.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Saúde.
O Sr. Secretário de Estado da Saúde (Francisco Ramos). — Sr. Presidente, Srs. Deputados. A questão da reforma da saúde em Portugal e das opções pelo Serviço Nacional de Saúde ou por outros modelos é, de facto, suficientemente importante para merecer um debate sério, aprofundado e com a participação de todas as forças políticas interessadas neste debate. Aliás, há perto de um ano, o Governo apresentou aqui, na Assembleia da República, um documento, propondo também reformas estruturais e disponibilizando-se para a sua discussão. Apenas - e penso que é importante recordar esse facto - o PCP se disponibilizou para isso. Essa discussão tem sido feita e, provavelmente nessa linha, o PCP faz hoje esta interpelação ao Governo.
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Para não me alongar demais, é importante repetir algumas questões, mas a Sr.ª Ministra já passou em revista todas as áreas que mereceram a intervenção deste Governo, reconhecendo que este é um percurso que não pára por aqui, é um percurso que continua.
Dou-vos um exemplo: a questão do sistema de informação e de informatização dos serviços de saúde. A rede interna da saúde já liga mais de metade de todas as unidades de saúde do SNS, todos os centros de saúde têm já instalado o programa SINUS e está neste momento a avançar a instalação do módulo clínico para complementar essa informatização. É importante que isto seja dito e redito, Sr. Deputado, para que, de facto, não apareça como predominante um discurso de que o sistema de saúde em Portugal está parado ou inoperante. É importante que os portugueses tenham confiança no seu sistema de saúde e que conheçam aquilo que está a ser feito e não apenas um discurso catastrofista, pouco interessante para eles.
Protestos do PSD.
No que respeita ao programa Sonho, este sistema está já instalado em 54 hospitais e encontra-se em fase de instalação em outros 34, enquanto os 20 hospitais restantes têm outras aplicações alternativas. Portanto, a informatização está a ser feita a bom ritmo, acompanhando também a generalização do cartão do utente, que, mais uma vez, atinge já 80% da população na Região Norte, 60% na Região Centro, 40% na Região de Lisboa e Vale do Tejo, 60% na Região do Alentejo e 90% na Região do Algarve. É do vosso conhecimento que houve constrangimentos em dois distritos, que estão ultrapassados, estando a divulgação do cartão do utente a ser feita a bom ritmo.
Quanto às listas de espera, como compreendem, é uma questão que também nos preocupa, e tanto assim é que elaborámos logo, desde 1996, programas específicos de recuperação de listas de espera. Temos, para 1999, um programa de melhoria do acesso global, compreensivo, para enfrentar de vez essa questão. É, no entanto, importante perguntar se as listas de espera estão hoje piores do que há 10 anos atrás. Os dados disponíveis mostram-nos, de facto, que não estão.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Dêem-nos os dados! Por que é que não nos dão os dados?!
O Orador: - A informação da Inspecção-Geral de Saúde de há l0 anos apontava para 80 000 doentes em lista de espera para intervenções cirúrgicas e dados de 1992 apontavam para 92 000 doentes em lista de espera.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Está a esquecer-se do seu rigor de economista!
O Orador: - O levantamento, feito de uma forma sistemática, confirma que não há um agravamento do problema, o que não quer dizer que não estejamos preocupados e que não estejamos a fazer tudo para que isso se resolva, evitando, de facto, reproduzir vícios que, esses sim, geram a permanência dessas listas de espera.
O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Só palavras!
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - E o Hospital de
Setúbal?
O Orador: - Sr. Deputado, o Hospital de Setúbal mereceu uma intervenção específica, foi apurado o que foi e não há aqui qualquer questão.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - O que é que vai acontecer?
O Orador: - O que vai acontecer não está relacionado com este debate!
A Sr.ª Ministra da Saúde: - Só no fim do processo é que se pode saber o que vai acontecer!
O Orador: - As questões do financiamento e das dívidas foram reconhecidas e mereceram, aliás, uma medida específica no Orçamento do Estado para 1999, medida que está agora a ser aplicada Esta é uma questão que não deve ser usada apenas para agitar problemas na saúde, já que teve uma medida adequada no Orçamento do Estado e, naturalmente, com a sua aplicação, a regularização financeira processar-se-á. Recordarei, no entanto, que os números dos últimos anos mostram claramente uma evolução positiva em termos de controlo do crescimento da despesa do Serviço Nacional de Saúde. Ou seja, há, apesar de ninguém negar os problemas de disponibilidade financeira do Serviço Nacional de Saúde, uma evolução positiva, fruto também de medidas que, naturalmente, não provocam grandes mudanças de um momento para pu outro, mas que não devem deixar de ser consideradas. E o caso do decreto-lei das convenções e de tudo quanto já se fez na área dos medicamentos, onde, pela primeira vez, se usará o preço dos medicamentos como factor e critério importante para a comparticipação e onde, pela primeira vez, se estabelecerão regras claras que apelam a questões económicas na comparticipação. Estes são passos demasiadamente importantes para deixarem de ser considerados enquanto medidas que preparam uma revitalização do Serviço Nacional de Saúde.
Quero fazer dois últimos comentários para falar do não cumprimento de prazos de abertura de hospitais. Sr. Deputado Jorge Roque Cunha, se este Governo introduziu alterações em relação ao que se passava antes, é exactamente para conseguir cumprir, quer prazos de construção de hospitais, quer orçamentos de construção de hospitais. Falou, por exemplo, do hospital de Amadora-Sintra e a comparação do que se passou com a construção desse hospital com o que se passa com o Barlavento, com a Cova da Beira...
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Todos lançados por nós!
O Orador: - Não discuto a questão dó lançamento. Estou a discutir a capacidade de gestão da obra e o que aconteceu nuns casos e noutros. Ou seja, se há, de facto, diferenças na capacidade de gestão, essas diferenças são claramente para melhor em relação a esta equipa.
Estamos, pois, a lançar as bases - é importante que se tenha isto em atenção - e a construir os instrumentos que possibilitem, não a reforma do sistema de saúde que vise a privatização ou o abandono do Serviço Nacional de Saúde, mas a reforma do sistema de saúde que o Governo tem por ideologia básica, assente em valores de solidariedade e de equidade, que pretende encarar a saúde enquanto valor social, entendendo que o Serviço Nacional de Saúde é um elemento fundamental dessa reforma.
Vozes do PS: - Muito bem!
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O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Secretário de Estado da Saúde, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, V. Ex.ª fez aqui a defesa das medidas que já tinham sido enumeradas pela Sr.ª Ministra, se bem que noutra perspectiva, mas para nós é evidente que há aqui algumas concretizações que é preciso deixar claras e algumas delas não foram referidas nas anteriores intervenções do Governo.
A primeira dessas concretizações tem a ver com a questão dos medicamentos psiquiátricos e com a sua comparticipação. Há pouco, a Sr.ª Ministra referiu-se ao assunto, sem, contudo, dizer quando é que os medicamentos psiquiátricos que sejam essenciais, segundo os critérios do escalão A de comparticipação, para os cuidados medicamentosos aos doentes mentais vão ser comparticipados a 100%, sendo que a Assembleia da República, segundo proposta do PCP, que contou com a abstenção dos restantes partidos, aprovou uma disposição orçamental nesse sentido. Esta questão é, para nós, fundamental e gostávamos que houvesse aqui um compromisso do Governo nessa matéria.
Outra questão é a que tem a ver com o problema da gestão dos serviços de saúde. Nós temos batalhado e trazido para o primeiro plano a questão da separação entre a prestação pública e a prestação privada e, inclusivamente, já falei aqui da questão das convenções. Contudo, em debates anteriores nesta Assembleia, o próprio Sr. Secretário de Estado da Saúde deixou aberta a possibilidade de se encontrarem regimes de gestão dos novos hospitais entretanto a construir, que não fossem rigorosamente os regimes de gestão pública. Portanto, o compromisso e a resposta que queria aqui ouvir do Governo, já que o Sr. Deputado João Rui Almeida não foi capaz de cabalmente assumir esse compromisso em nome do Partido Socialista, era o de que as unidades do Serviço Nacional de Saúde, tanto as que já existem como as novas, mas, em especial, estas últimas, não vão ser postas, tal como aconteceu com o governo anterior em relação ao hospital de Amadora-Sintra, sob uma gestão privada, concessionada ou de qualquer outra forma, que possa, utilizando uma lógica de lucro na exploração dessas unidades, diminuir os direitos dos utentes dessas unidades, diminuir a prestação, a produtividade e, sobretudo, a qualidade dos cuidados de saúde que essas unidades têm de prestar, dando resposta às necessidades dos cidadãos portugueses. Essa é uma questão fundamental, porque, se se afirma, como o Governo faz, que é importante separar o público do privado, não pode o Governo deixar de garantir que não haverá gestão privada em equipamentos públicos. Sem isso, não haverá verdadeira separação entre o público e o privado.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Saúde.
O Sr.- Secretário de Estado da Saúde: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, dar-lhe-ei duas respostas muito rápidas para duas questões importantes.
O Governo não deixará, naturalmente, de cumprir a lei aprovada pela Assembleia da República. Neste momento, não posso referir um prazo, mas sei que a questão está a ser analisada do ponto de vista técnico. Portanto, não dei
xará, este Governo, de cumprir aquilo que foi determinado na Assembleia da República.
Quanto à questão sobre a gestão privada, gostaria de dizer-lhe que o Governo tem, neste momento, um modelo e uma proposta de estatuto jurídico para as unidades hospitalares. E essa a proposta deste Governo! Não há, da nossa parte, qualquer intenção ou projecto de privatizar a gestão de unidades hospitalares, pois temos um modelo alternativo, que estamos a testar na Feira e que queremos testar noutros hospitais para, de facto, averiguar da sua bondade e capacidade para renovar a gestão das unidades do Serviço Nacional de Saúde.
De qualquer modo, devo dizer-lhe que se a questão crucial, do meu ponto de vista, é, de facto, a de a política de saúde dever ser baseada no aprofundamento e no reforço do Serviço Nacional de Saúde e na separação de sectores, não vejo o sector privado como um diabo a afastar.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Não é essa a questão!
O Orador: - Exactamente! Por não ser essa a questão, a gestão privada não é a nossa intenção nem o nosso modelo. Mesmo aquilo sobre que já me ouviu falar em sede de comissão parlamentar, e que estamos a estudar, é a possibilidade de financiamento privado para a construção de hospitais. Isso, sim, é o que estamos a estudar!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Com que contrapartidas?
O Orador: - Não tem nada a ver com concessão de hospitais públicos a entidades privadas! Mags mesmo em relação a isso, julgo que devemos esperar, calma e serenamente, pela avaliação que for feita da experiência do hospital. Amadora/Sintra para, então, tirarmos conclusões. Julgo que, nesta altura, é cedo para retirarmos conclusões, que seriam precipitadas, de uma experiência que merece claramente ser analisada.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, vamos entrar no período de encerramento desta interpelação.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No final desta interpelação do PCP ao Governo, sobre as questões de saúde, fica claro o nosso empenhamento na defesa do Serviço Nacional de Saúde e dos direitos do povo português nesta matéria.
Ficou claro, neste debate, que o estado em que a saúde continua a estar, no nosso país, se deve à falta de vontade do Governo em romper radicalmente com as orientações anteriores, pondo a política de saúde ao serviço de quem precisa.
Áreas fundamentais da política de saúde mantiveram-se inalteráveis ou sofreram realinhamentos insuficientes e rapidamente diluídos nos problemas e nas contradições do sector. Assim aconteceu no combate à promiscuidade entre o sector público e o privado e à parasitagem deste sobre o Serviço Nacional de Saúde, absorvendo os seus recursos, diminuindo as suas capacidades e constituindo um
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sério obstáculo a uma gestão racional, eficiente e ao serviço das populações. E preciso alterar esta situação e o Governo recusa-se a fazê-lo!
O mesmo se diga em relação ao acesso aos cuidados de saúde, fortemente limitados pelas debilidades -dos serviços ao nível dos recursos humanos, da produtividade ou do equipamento, ou em relação à questão do financiamento, em que, ao mesmo tempo que mantém uma situação de subfinanciamento do Serviço Nacional de Saúde, o Governo continuou a pactuar com a pilhagem dos dinheiros do orçamento pelos glandes interesses do sector. Ou ainda, no que aos instrumentos de gestão diz respeito, ficando por explorar as numerosas potencialidades do regime público e tendo o Governo optado, como o Sr. Secretário de Estado da Saúde acabou de referir, nomeadamente no que diz respeito aos hospitais, por soluções em que se diminuem os direitos dos trabalhadores do sector.
Para inverter a política de direita a que, durante anos, a saúde foi sujeita, é preciso aumentar significativamente a produtividade do Serviço Nacional de Saúde, é preciso impor uma barreira de transparência e de separação entre sector público e privado, é preciso declarar guerra aberta à pilhagem indecorosa dos recursos do SNS.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - E isso o Governo não faz!
O PCP tem, neste debate, uma posição de inegável seriedade. Estamos na primeira linha da crítica ao Governo, às suas opções, ou à falta delas, sempre que isso enfraquece o Serviço Nacional de Saúde. Fazêmo-lo com a legitimidade de quem verdadeiramente defende a saúde dos portugueses, apresentando propostas concretas para a resolução dos problemas mais prementes que nesta área nos afectam.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Os projectos apresentados em relação ao acesso aos cuidados de saúde (este já aprovado na generalidade), à administração das unidades de saúde, ao financiamento do SNS e à redução de gastos com medicamentos introduzem melhorias fundamentais nesta área, obrigando o Governo a mudar de rumo, a cumprir promessas e a aplicar as elaborações teóricas.
No recente congresso do PS, o Primeiro-Ministro anunciou a sua nova paixão: a saúde. Eis, portanto, que, em poucas semanas, a saúde se vê dividida entre duas paixões, qual delas a mais arrebatada: de um lado, o Primeiro-Ministro e o PS, do outro, os partidos da AD.
Ficou, aliás, provado, pelas palavras do Primeiro-Ministro, que, durante este mandato, o Governo não cuidou de defender a saúde dos portugueses nem o Serviço Nacional de Saúde, por isso sente necessidade de afirmar que, no futuro, então, sim, essa será uma prioridade de investimento. Tratou-se, afinal, de um casamento não consumado, deixando, o Governo, a noiva abandonada durante estes anos.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Também os partidos da AD viram, na saúde, uma boa oportunidade para aproveitamento partidário e lançaram-se de bata branca e ar compungido em frenéticas visitas a hospitais, afirmando que, sendo governo, tudo resolverão.
Trata-se, neste caso, não já de um casamento por consumar mas de uma promessa de casamento pouco séria e sempre com um olho no dote, neste caso eleitoral, que o assunto poderá proporcionar.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - O Governo, abrindo já o caderno das promessas eleitorais, levantou a bandeira da paixão pela saúde, inaugurando a época da caça ao voto de quem sente na pele as carências da saúde no nosso país.
Daqui para a frente, não é dificil prever que o Governo e o Ministério da Saúde vão fazer, por toda a parte, novas declarações de intenções sobre investimentos em hospitais e centros de saúde, promover inaugurações e lançamentos de primeiras pedras. Mais uma vez, estaremos perante promessas sem a correspondente concretização.
Vozes do PCP: - Exactamente!
O Orador: - Mas isso também não fará esquecer que, na hora de afrontar os poderosos interesses que condicionam o funcionamento da saúde, o Governo cedeu sempre, pactuou e aceitou disciplinado as regras do costume. Foi assim com o sector convencionado, com a invenção dos genéricos de marca ou com a baixa produtividade dos serviços.
Esta é uma realidade que não pode deixar de ser denunciada, independentemente da maior correcção das elaborações teóricas e conceptuais ou da planificação dos ganhos em saúde que, não estando resolvidas outras questões, terão reduzidó efeito prático.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Entretanto, PSD e PP anseiam por maior velocidade no trilho da política de privatização do SNS e de mercantilízação da saúde,...
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Isso não é verdade!
O Orador: - ... enquanto interiormente rejubilam com o facto de o Governo continuar a manter muitas das traves mestras da sua política anterior.
O Serviço Nacional de Saúde, que garante o direito à saúde dos portugueses, precisa, de facto, de uma reforma, mas do que necessita é de uma reforma democrática, no sentido de assegurar a melhor prestação de cuidados, com a participação dos profissionais, dos utentes e das comunidades.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - É esta reforma democrática que o Governo não quer cumprir, mas é esta a reforma que dá resposta aos legítimos interesses, ao direito dos portugueses a cuidados de saúde mais céleres, de melhor qualidade e mais baratos. É por esta reforma democrática do Serviço Nacional de Saúde que o PCP se bate e continuará a bater-se.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Saúde.
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A Sr.ª Ministra da Saúde: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta interpelação...
O Sr. João Amaral (PCP): - A Sr.ª Ministra não tem um hospital novo para anunciar, senão subia lá cima à tibuna!
Risos.
A Oradora: - Sr. Deputado, far-me-á a justiça se disser que, desde o princípio do meu mandato, tenho ido sistematicamente a hospitais e que nenhum hospital ou centro de saúde ficou fechado para ser inaugurado por mim.
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - Estes estabelecimentos existem para proporcionar melhores condições de atendimento e de trabalho.
O Sr. Deputado reconhecerá que não tenho jeito para fazer discursos de noivados, de noivas, de traições e de coisas deste género; tento trabalhar o melhor e o mais adequadamente possível.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se me permitem, começava por saudar a eleição da saúde como área prioritária para todos os programas de todos os partidos com assento nesta Câmara.
Aplausos do PS.
Penso que, efectivamente, a saúde merece ser uma prioridade. Aquilo que aqui se referiu é que há variadíssimas prioridades ou problemas importantes quando se está no Governo. A prioridade relativamente à educação e à atenuação dos problemas da exclusão foi assumida por este Governo sem prejuízo de a saúde poder dispor de apoios, os quais aqui foram sublinhados e salientados e que sou a primeira a reconhecer.
Queria terminar este debate agradecendo esta interpelação, pois ela deu a todos a oportunidade de exprimirem a suas ideias e permitiu uma primeira conclusão, que claramente se retira, hoje, desta Câmara, a qual vai no sentido de um diagnóstico que tem sido feito pelas entidades que se têm pronunciado: Portugal, com a sua estrutura sociológica, tal como ela é, não dispensa a existência de um Serviço Nacional de Saúde,...
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - ... que se pretende forte, eficaz, eficiente, regenerado e com altos níveis de produtividade. Para isso é indispensável a sequência de um processo que foi inequivocamente iniciado através da criação dos instrumentos indispensáveis para a sua concretização: foi definida uma estratégia de saúde a médio prazo que está em fase de discussão alargada. É através destes mecanismos de intervenção que, hoje, se resolvem e debatem adequada e aprofundadamente estas questões, e não através das acusações de parte a parte, que são fáceis mas que não levam à resolução dos problemas. E penso que todos estarão interessados na solução dos problemas!
Para que esse Serviço Nacional de Saúde forte, eficiente e eficaz permita o adequado atendimento das pessoas com os níveis adequados, optamos inequivocamente pela construção de um Serviço Nacional de Saúde, para o pró
ximo século, que assente em dois eixos. Um dos eixos é relativo ao acesso, o que implica que, sendo o acesso uma prioridade, temos de ter as nossas organizações a funcionar a tempo inteiro, temos de ter todos os recursos existentes em saúde a funcionar articuladamente e com uma separação adequada entre os interesses de um lado e de outro - porque só há aqui um interesse em apreço, que é o cidadão através da criação de regras absolutamente claras e transparentes, que este Governo não se tem eximido em traçar e definir.
O Serviço Nacional de Saúde também se regenerará - este novo Serviço Nacional de Saúde que queremos construir - através de uma reforma profunda em termos da sua administração. Consideramos que a saúde, pela sua especificidade, é um motor fundamental para a reforma e para a modernização da Administração Pública em Portugal.
Iniciámos esse processo através de medidas que eram completamente desconhecidas em Portugal, como a criação das agências de contratualização, proporcionando uma nova cultura, a cultura da responsabilização, de dar satisfação pelos meios que são disponibilizados por todos nós enquanto cidadãos contribuintes. Apostamos, também, numa forte responsabilização através de uma maior autonomia, o que significa que essa é uma aposta que tem de ser conseguida ao nível dos hospitais e dos centros de saúde com o novo estatuto jurídico já aprovado, o qual pode ser de inequívoca valia neste processo.
Todas estas medidas deverão estar assentes numa política para as profissões que favoreça a dedicação a tempo inteiro às organizações, que aposte na produtividade com expressão na remuneração, ou seja, não em exigir o cumprimento do que é devido mas daquilo que o excede, através de compromissos em níveis de produtividade objectivos, quantificados, avaliados e medidos através de sistemas de informação. Uma aposta inequívoca também na formação continua, pois ela é indispensável a um Serviço Nacional de Saúde e a esta área de actividade.
O sistema de qualidade na saúde está, também, em desenvolvimento, sendo hoje, cada vez mais, indissociável da prestação de cuidados. O SNS X3Q aposta inequivocamente nessa cultura de qualidade, que começou já nos centros de saúde, mas o processo, embora com alguns exemplos ainda dispersos pelo País, continuará decididamente ao nível dos estabelecimentos hospitalares.
Tudo aquilo que mencionei será possível construindo-se na saúde uma verdadeira sociedade de informação. A informatização que já conseguimos em termos de rede, o conjunto de acções de formação profissional no sentido de utilizar os instrumentos existentes, mas uma aposta também no reforço dessa formação para a utilização das novas tecnologias. Não me referi à questão da telemedicina, mas esta é também uma aposta forte e inequívoca para vencer assimetrias e isolamentos. Tudo isto deverá ser fundamentado na explicitação de regras claras de financiamento com separação inequívoca entre quem financia e quem presta os cuidados para permitir a concretização dessa cultura de contratualização.
Tudo o que referi, Sr.ªs e Srs. Deputados, é feito e desenvolvido, hoje, num contexto internacional. Embora a saúde não esteja tão dependente como outras áreas das decisões comunitárias, não há dúvida que temos de nos afirmar na Europa também pela qualidade do que fazemos e por aquilo que somos capazes de produzir. E com grande orgulho que vos digo que hoje Portugal tem - e não tinha antes - a condução de três projectos comuni
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tários, liderados pelo nosso pais, o que, para nós, é motivo do reconhecimento que, internacionalmente, é feito da capacidade dos nossos técnicos e da nossa capacidade enquanto portugueses.
Sr.ªs e Srs. Deputados, o Ministério da Saúde, normalmente, não refere aquilo que tem sido feito a nível da cooperação, com os países de expressão portuguesa mas esse é um aspecto que nos é muito caro a todos. O Ministério tem uma condução deste processo no sentido de criar, progressivamente, condições de habilitação, em termos de recursos humanos, que permitam a esses países ir-se desenvolvendo, mas ainda temos um grande recurso às nossas instituições. Constitui também algo que assumimos, penso eu, com orgulho por aquilo que foi a nossa diáspora. Se formos capazes, nestes debates, de encontrar o que nos une em vez de procurarmos aquilo que nos divide, tenho a certeza de que Portugal poderá ter um Serviço Nacional de Saúde no século XXI que se articule inequivocamente, de forma clara e transparente, com todos os outros sectores - porque os recursos que existem têm de ser todos potencializados. Para isso, o Ministério já desenvolveu os instrumentos jurídicos adequados, os sistemas locais de saúde são esse local e são a base de sustentação desta nova política para o século XXI que o Ministério da Saúde tem todo o gosto em protagonizar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, Sr.ª Ministra, chegámos ao fim dos nossos trabalhos de hoje. A próxima reunião realizar-se-á na quarta-feira, dia 24, pelas 15 horas, constando da ordem de trabalho, um período antes da ordem do dia e, no período da ordem do dia, o debate das propostas de lei n.os 178/VII, 219/VII e 220/V11 e do projecto de lei n.º 612/VII.
Desejo a todos um bom fim-de-semana e ao PSD um bom congresso.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.
Eram 20 horas e 15 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Mário Manuel Videira Lopes.
Partido Social Democrata (PSD):
António Joaquim Correia Vairinhos.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Albino Gonçalves da Costa.
António Bento da Silva Galamba.
António Manuel Carmo Saleiro.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José de Matos Leitão.
José Maria Teixeira Dias.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Partido Social Democrata (PSD):
Alberto Queiroga Figueiredo.
António de Carvalho Martins.
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Domingos Dias Gomes.
João Calvão da Silva.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Manuel Durão Barroso.
Luís Carlos David Nobre.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
Nuno Kruz Abecasis.
Partido Comunista Português (PCP):
Maria Odete dos Santos.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.
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DIÁRIO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA
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