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Quarta-feira, 31 de Março de 1999
I Série - Número 66
DIÁRIO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA

VII LEGISLATURA
4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1998-1999)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 30 DE MARÇO DE 1999

Presidente: Exmo. Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Exmos. Srs. José Ernesto Figueira dos Reis
Maria Lusa Lourenço Ferreira
João Cerveira Corregedor da Fonseca

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 35 minutos. ,

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da apresentação das propostas de lei n.os 259 a 262/VII, do projecto de lei n.º 649/VII, das apreciações parlamentares n.os 87 a 89/VII, de requerimentos e de respostas a algun4 outros.
Foi lido o pedido de renúncia ao mandato do Deputado do PSD Faria de Oliveira.
Em interpelações à Mesa e de novo a propósito do envolvimento de militares portugueses na intervenção militar da NATO na Jugoslávia, usaram da palavra os Srs. Deputados Luís Queiró (CDS-PP).
Octávio Teixeira (PCP).
Acácio Barreiros (PS) e
Carlos Encarnação (PSD).
Ao abrigo do artigo 81.º, n.º 2, do Regimento, o Sr. Deputado Carlos Encarnação (PSD) trouxe à colação o sistema de justiça, particularmente o que entende ser a crise nas magistraturas, e respondeu a pedidos de esclarecimento em defesa da honra dos Srs. Deputados Manuel Alegre (PS).
José Magalhães (PS) e
João Amaral (PCP).
Também ao abrigo do artigo 8l.º, n.º 2, do Regimento o

Sr. Deputado Medeiros Ferreira (PS) fez um balanço dos resultados do Conselho Europeu de Berlim sobre a Agenda 2001, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan (CDS-PP).
Ainda ao abrigo da mesma figura regimental, o Sr. Deputado Manuel Jerónimo (PS) salientou a política social que tem sido levada a cabo pelo Ministério do Trabalho e da Solidariedade ein prol dos reformados e dos pensionistas.

Ordem do dia - Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, das propostas de lei n.os 228/VII - Estabelece as bases da política e do regime de protecção e valorização do património cultural e 258/VII - Estabelece o regime fiscal do património cultural, tendo usado da palavra, a diverso título, além dos Srs. Ministros da Cultura (Manuel Maria Carrilho) e dos Assuntos Parlamentares (António Costa), os Srs. Deputados António Brochado Pedras (CDS-PP).
Joaquim Sarmento, António Braga e Medeiros Ferreira (PS).
Luísa Mesquita (PCP).
Manuel Frexes (PSD).
Fernando Pereira Marques (PS).
Carmem Francisco (Os Verdes).
Carlos Brito (PSD) e
Fernando de Sousa (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 5 minutos.

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O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 35 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

PARTIDO SOCIALISTA (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Albino Gonçalves da Costa.
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes.
Aníbal Marcelino Gouveia.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Armando Jorge Paulino Domingos.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Casimiro Francisco Ramos.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Yernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Pedro da Silva Correia.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
Jovita de Fátima Romano Ladeira.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Júlio Meirinhos Santanas.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís António do Rosário Veríssimo.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Afonso da Silva Strecht Monteiro.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Ferreira Jerónimo.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Eduarda Bento Alves Ferronha.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Manuela de Almeida Costa Augusto.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Paulo Jorge Lúcio Arsênio.
Pedro Luis da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Ráimundo Pedro Narciso.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Victor Brito de Moura.

PARTIDO SOCIAL DEMOCRATA (PSD):

Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
António Costa Rodrigues.
António d'Orey Capucho.
António de Carvalho Martins.
António dos Santos Aguiar Gouveia.
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leite.
António Manuel Taveira da Silva.
António Moreira Barbosa de Melo:
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Carlos Eugénio Pereira de Bato.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.

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Domingos Dias Gomes.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares MotaAmaral.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Gama.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José Carlos Pires Póvoas.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Manuel Costa Pereira.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria de Lourdes Lara Teixeira.
Maria de Lurdes Borges Póvoa Pombo Costa.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Sérgio André da Costa Vieira.
Vasco Manuel Henriques Cunha.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
António Carlos Brochado de Sousa Pedras.
Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Rui Manuel Pereira Marques.
Rui Miguel Gama Vasconcelos Pedrosa de Moura.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):
Alexandrino Augusto Saldanha.
António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
António Luís Pimenta Dias.
Bernardino José Torrão Soares.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Joaquim Manuel da Fonseca Matias.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):
Carmen Isabel Amador Francisco.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

Deputado independente:
José Mário de Lemos Damião.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai anunciar os requerimentos, as respostas a requerimentos e os diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (José Reis): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: propostas de lei n.os 259/VII - Altera a Lei n.º 46/98, de 7 de Agosto (Lei-Quadro das Leis de Programação Militar), no sentido de acomodar a locação e outros contratos de investimento no âmbito do equipamento das Forças Armadas, que baixa à 3.ª Comissão, 260/VII Revê o regime dos acidentes em serviço e das doenças profissionais no âmbito da Eldministração Pública, 261/VII - Regula a constituição, organização, funcionamento e atribuições das entidades de gestão colectiva do direito de autor e dos direitos conexos, que baixa à 1.ª Comissão, 262/VII - Aprova o regime jurídico do referendo local, que baixa, igualmente, à 1.ª Comissão; projecto de lei n.º 649/VII - Estabelece as bases do inter-profissionalismo florestal (PS), que baixa à 10.ª Comissão; apreciações parlamentares n.os 87/VII - Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de Março, que aprova o novo regime jurídico das empreitadas de obras públicas (CDSPP), 88/VII - Decreto-Lei n.º 60/99, de 2 de Março, que cria o Instituto dos Mercados de Obras Públicas e Particulares e do Imobiliário (BUIOPPI) e extingue o Conselho de Mercados das Obras Públicas e Particulares (CMOPP) (CDS-PP), 89/VII - Decreto-Lei n.º 61/99, de 2 de Março, que define o acesso e permanência na actividade de empreiteiro de obras públicas e industrial de construção civil e revoga o Decreto-lei n.º 100/88, de 23 de Março (CDS-PP).

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Entretanto, foram também apresentados à Mesa vários requerimentos. Na reunião plenária de 17 de Março de 1999: aos Ministérios da Cultura e da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulados pelo Sr. Deputado Fernando Jesus; ao Governo, ao Ministério da Administração Interna e à Câmara Municipal de Lisboa, formulados pelo Sr. Deputado António Rodrigues; ao Ministério do Ambiente, formulados pelo Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho; ao Ministério da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados Filomena Bordalo e Bernardino Soares; ao Governo, ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território e à Câmara Municipal de Penafiel, formulados pelo Sr. Deputado Pimenta Dias; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Rodeia Machado.
Na reunião plenária de 18 de Março de 1999: ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulados pelos Srs. Deputados Carlos Alberto Santos, Roleira Marinho e Pimenta Dias; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado António Rodrigues; ao Ministério da Justiça, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Alves de Oliveira; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado Paulo Pereira Coelho; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho.
Na reunião plenária de 19 de Março de 1999: ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território e à Câmara Municipal de Lisboa, formulados pelo Sr. Deputado António Rodrigues; ao Ministério da Defesa Nacional, formulado pelo Sr. Deputado João Amaral; à Comissão de Coordenação da Região Norte, à Delegação Regional de Economia do Norte, à Direcção Regional do Ambiente do Norte e à Câmara Municipal de Santo Tirso, formulados pelo Sr. Deputado Pimenta Dias.
Nó dia 23 de Março de 1999: ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade, formulado pela Sr.ª Deputada Manuela Aguiar; ao Ministério das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Rui Pedrosa de Moura; aos Ministérios da Administração Interna e daEconomia, formulado pelo Sr. Deputado Rodeia Machado; à Secretaria de Estado da Indústria e Energia, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
Na reunião plenária de 24 de Março de 1999: aos Ministérios do Equipamento, do Planeamento e cia Administração do Território e da Administração Interna, formulados pelos Srs. Deputados Fernando Serrasqueiro, Manuela Aguiar e José Cesário; ao Ministério do Ambiente, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho; ao Ministério da Justiça, formulado pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho.
Entretanto, o Governo respondeu a requerimentos apresentados por vários Srs. Deputados. No dia 19 de Março de 1999: Manuela Aguiar, formulado no dia 2 de Novembro; Miguel Miranda Relvas, formulado na sessão de 11 de Novembro; Bernardino Soares, formulados nas sessões de 12 de Novembro e 13 de Janeiro; Moreira da Silva, formulado na sessão de 7 de Janeiro; Antonino Antunes e Rui Pedrosa de Moura, formulados na sessão de 8 de Janeiro; Manuel Alves de Oliveira, formulado na sessão de 20 de Janeiro; Sílvio Rui Cervan, formulado na sessão de 10 de Fevereiro.
No dia 22 de Março de 1999: Lourdes Lara, formulado na sessão de 11 de Dezembro; Carlos Duarte, formulado na sessão de 14 de Janeiro; Rodeia Machado, formulado na

sessão de 20 de Janeiro; Lino de Carvalho, formulado na sessão de 10 de Fevereiro; Duarte Pacheco, formulado no dia 2 de Março.
No dia 23 de Março de 1999: Jorge Roque Cunha, formulado na sessão de 16 de Setembro; Carmem Francisco, formulados no dia 17 de Novembro e na sessão de 15 de Janeiro; Isabel Castro, formulados nos dias 3 de Dezembro e 26 de Janeiro; António Filipe, formulado na sessão de 9 de Dezembro; Manuel Moreira, formulado na sessão de 21 de Janeiro; Jovita Ladeira, formulado na sessão de 28 de Janeiro.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr.- e Srs. Deputados, o Sr. Deputado eleito Faria de Oliveira enviou uma carta à Assembleia, declarando a sua renúncia ao mandato de Deputado. Recordo aos Srs. Deputados que o Sr. Deputado Faria de Oliveira foi eleito nas últimas eleições mas já tinha o seu mandato suspenso há algum tempo, estando substituído, na bancada do PSD, pelo candidato que se seguia na lista.
A mensagem do Sr. Deputado Faria de Oliveira é do seguinte teor: «Como é do conhecimento de V.Ex.ª, tenho suspenso o mandato de Deputado à Assembleia da República, pelo círculo eleitoral de Lisboa, em representação do PSD - Partido Social-Democrata, em virtude de estar a exercer funções de Administrador do IPE - Investimentos e Participações Empresariais, S. A.
Tendo, na Assembleia Geral do EPE, realizada no passado dia 15 do corrente, sido reeleito para membro do seu Conselho de Administração e restando escassos meses para o final da presente legislatura, venho apresentar a V. Ex.ª a minha renúncia ao mandato de Deputado».
A renúncia é imediata, Srs. Deputados, pelo que a questão seguirá os trâmites sucessivos:
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, faz hoje praticamente uma semana que se desenvolve o conflito no Kosovo e na Sérvia. A intervenção da NATO naquele conflito e na ofensiva que, entretanto, se desencadeou contou, na semana passada, aqui, com a compreensão de todos os grupos parlamentares, à excepção do do Partido Comunista Português.
No entanto, Sr. Presidente, ao longo destes dias e a cada dia que passa, cada vez é menos compreensível que o Governo e o Sr. Primeiro-Ministro, em particular, não venham à Assembleia da República e, através dela, ao País dar todas as explicações de natureza político-militar sobre os fundamentos e os objectivos da participação portuguesa na ofensiva da NATO naquela região.
Na verdade, a situação agrava-se, são adoptadas fases cada vez mais graves e mais arriscadas de intervenção militar naquela zona e nós, que somos fonte de soberania, aqui, na Assembleia da República, precisamos de ser esclarecidos pelo Governo e pelo Sr. Primeiro-Ministro sobre se, na realidade, a intervenção portuguesa se justifica, sobre quaís são os desenvolvimentos previsíveis e os fundamentos que levam à intervenção da NATO para além de um determinado limite. E, Sr. Presidente, não estamos a pedir nada além do que está a acontecer em todos os Estados integrantes da União Europeia.

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Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

0 Orador: - 0 Sr. Primeiro.-Ministro inglês, o Sr. Primeiro-Ministro italiano, o Sr. Primeiro-Ministro espanhol, o Sr. Presidente da República francesa, para além, naturalmente, do Presidente dos Estados Unidos da América, todos eles, têm vindo junto das respectivas opiniões públicas e parlamentos explicar e esclarecer o desenvolvimento deste conflito.
Estão cada vez mais em risco vidas humanas, pelo que temos de saber bem quais os objectivos que nortearam o Governo português nesta intervenção, sem embargo de conhecermos as nossas responsabilidades e obrigações no âmbito da NATO e da ONU, como tivemos oportunidade de salientar aqui, nesta Assembleia, na passada semana. Mas também dissemos que esperávamos que esta intervenção fosse rápida e eficaz e se destinasse a permitir que se alcançasse a paz o mais urgentemente possível. A verdade é que o prolongamento do conflito exige a presença do Sr. Primeiro-Ministro nesta Assembleia da República e não que, de qualquer capital europeia, envie, de repente e de vez em quando, uma qualquer mensagem, seja por seu intermédio, seja por intermédio do Ministro dos Negócios Estrangeiros e, pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros, às vezes até falando sobre assuntos internos do Estado português, como sucedeu com a Justiça, deixando-nos compreender bem quais os assuntos que considera externos relativamente às suas preocupações e àquela que é hoje a sua perspectiva de governação seja na Europa, seja em Portugal.
Portanto, Sr. Presidente, a minha interpelação vai no sentido de saber se V. Ex.ª concorda ou não que é absolutamente indispensável e urgente, não esperando pelo fim da guerra ou do conflito, que o Sr. Primeiro-Ministro se dirija a esta Assembleia da República, que, como disse, é fonte de soberania, e, nesse sentido, convocá-lo a vir cá - a palavra «convocam é utilizada apropriadamente e propositadamente para prestar os esclarecimentos necessários à Assembleia da República, aos Deputados de todos os partidos e, por seu intermédio, ao povo português.

Vozes do CDS-PP: -Muitobem!

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Presidente, Almeida Santos.

0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Queiró, a Mesa apenas lhe pode dizer o seguinte: dei conhecimento ao Sr. Primeiro-Ministro da carta que me dirigiu, como é natural, e o Sr. Primeiro-Ministro, como sabe, está no estrangeiro mas no próprio local em que se encontra fez a declaração de que está disponível para tratar esse assunto quando vier à Assembleia, sendo certo que virá cá logo a seguir à Páscoa, uma vez que durante a Páscoa seria inviável a sua vinda.
Portanto, tenhamos a certeza de que quando o Sr. Primeiro-Ministro vier à Assembleia se pronunciará sobre esse assunto.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

0 Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, a minha interpelação surge na sequência da interpelação do Sr. Depu-

tado Luís Queiró e começo por registar a posição assumida agora pelo Sr. Deputado Luís Queiró, em nome do Grupo Parlamentar do CDS-PP, nomeadamente a sua preocupação com os aspectos formais da agressão à Jugoslávia em que Portugal participa. É que não podemos esquecer que, na semana passada, o CDS-PP apoiou aqui clara e absolutamente a agressão militar e a participação portuguesa nessa agressão.

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Orador: - Para nós, a questão não é formal mas de conteúdo, substancial: é que não há qualquer razão política e muito menos qualquer razão sustentada de Direito Internacional para que se possa registar a. intervenção da NATO e a participação portuguesa numa agressão militar a um país independente.

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Orador: - É isso que o Sr. Primeiro-Ministro e o Governo têm de explicar à Assembleia da República. Mas a explicação tem de incidir sobre a questão substancial e a necessidade absoluta de Portugal deixar, rapidamente, de dar apoio à agressão militar a um país independente - a Jugoslávia -, retirando todos os portugueses que se encontram a participar, por instruções, por ordem, por determinação do Governo português, nessa agressão militar.

Aplausos do PCP.

0 Sr. Presidente: - Também para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Acácio Barreiros.

0 Sr. Acácio Barreiros (PS): - Sr. Presidente, como o Sr. Presidente já recordou, há cerca de 15 dias, o Sr. Primeiro-Ministro manifestou o seu interesse em retomar os debates na Assembleia, os chamados debates mensais.

0 Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Mensais?!

0 Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Esses debates já são

0 Orador: - Como o Sr: Deputado Luís Queiró sabe, não foi possível marcar uma data anterior à do próximo dia 8 de Abril, mas já está agendada a presença do Sr. Primeiro-Ministro aqui, neste Plenário, nessa data. Aliás, era mesmo intenção do Governo deslocar-se à Assembleia numa data anterior mas isso não foi possível por dificuldade de agenda deste Parlamento.

0 Sr. Luis Queiró (CDS-PP): - Onde é que está o Sr. PrimeiroMinistro?

0 Orador: - Como o Sr. Deputado também sabe, este assunto já foi debatido em reupião conjunta da Comissão de Negócios Estrangeiros e da Comissão de Defesa Nacional...º

0 Sr. João Amaral (PCP): -Não é verdade!

0 Orador: - ... e o Governo manifestou sempre a sua disponibilidade, como fez agora junto do Sr. Presidente, des-

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de que a Assembleia mareasse essa reunião. Portanto, a reunião está marcada para o próximo dia 8 de Abril, não só para abordar esta questão mas também outras, pelo que o Governo não pode ser acusado. de um menor empenho ou de um menor respeito por esta Assembleia.
Além do mais, como acabou agora de ser aqui frisado; a participação de Portugal nesta operação, em solidariedade com os restantes países da Aliança Atlântica, teve o apoio inequívoco de todos os partidos desta Assembleia da República, à excepção do Partido Comunista. Trata-se de uma acção que decorre dos nossos compromissos na Aliança Atlântica e dos compromissos da própria Aliança Atlântica e, como tal, não representa qualquer atitude menos própria por parte do Governo.
De qualquer forma, o Governo aqui estará no próximo dia 8, através do Sr. Primeiro-Ministro, e estará disponível, como sempre esteve, para, nas respectivas comissões, dar.os esclarecimentos que entenderem.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, quero dizer três ou quatro coisas muito simples.
Em primeiro lugar, já dissemos, nesta Assembleia, o que pensávamos em relação à questão que está colocada com a intervenção da NATO no Kosovo. E a nossa posição de princípio é a seguinte: entendemos que o País deve respeitar os seus compromissos para coma Aliança Atlântica.
Outra questão é a preocupação que temos com o que está a acontecer e com o que poderá vir a acontecer, ou seja, com as evoluções do conflito. Neste sentido, entendemos que devemos recordar ao Sr. Primeiro-Ministro, nesta Câmara, que o Governo tem o dever de falar sobre esta matéria ao Parlamento e ao País, que o Sr. Primeiro-Ministro e o Governo têm a obrigação de prestar atempada informação à Assembleia sobre o contínuo evoluir da situação e entendemos também que devemos lembrar ao Governo e ao Sr. Primeiro-Ministro que é particularmente preocupante quando isto não acontece e quando, além de isto não acontecer, o Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Ministro da Defesa, em declarações públicas no estrangeiro, resolvem dizer coisas diferentes sobre o futuro da participação portuguesa.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem de novo a palavra o Sr. Deputado Acácio Barreiros.

O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Sr. Presidente, quando estamos aqui a tratar de um assunto da maior seriedade, não posso deixar de lamentar que venham aqui para pequena especulação política. Quando estamos a tratar de um assunto da maior importância, que é o empenho militar de Portugal numa operação com as características e a gravidade da que está a ser, neste momento, levada a cabo pela Aliança Atlântica; peço desculpa, Sr. Deputado Carlos Encarnação, mas isso não é aceitável. Dizer que o Governo português,

nesta matéria, não tomou uma decisão absolutamente clara?!...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E não!

O Orador: - Dizer que o Governo português não se disponibilizou, desde sempre, a prestar a esta Assembleia os esclarecimentos que entendessem necessários?! É que nós, Sr. Deputado, também podemos dizer, por exemplo - mas não queria entrar neste tipo de discussão -, que o debate não é já amanhã porque estava marcado um agendamento potestativo do PSD, que não prescindiu desse agendamento! O Sr. Deputado quer que comecemos este tipo de debate?!
Sr. Deputado Carlos Encarnação, o que é preciso saber com clareza é quais são os partidos que estão solidários com esta operação. E o que me deixou absolutamente tranquilo, porque foi afirmado várias vezes pela sua bancada - a não ser que tenha havido qualquer mudança de posição, como outras houve... -, foi que o PSD estava solidário com esta operação.
Esta operação tem objectivos bem claros, estão definidos pela Aliança Atlântica, há uma evolução, mas essa evolução, como sucede em países democráticos, é absolutamente transparente e Portugal tem perfeitamente definidos os objectivos que prossegue. Isso tem estado absolutamente claro, quer da parte do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros quer da parte do Sr. Primeiro-Ministro ou do Sr. Ministro da Defesa.
Sr. Deputado Carlos Encarnação, a luta política é muito interessante, mas há coisas com que não sé brinca!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Também para uma interpelação à Mesa, e será a última deste género, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Com certeza, Sr. Presidente, e nem seria necessária não fora a interpelação feita pelo Sr. Deputado Acácio Barreiros.
Através desta interpelação, quero dizei ao Sr. Deputado Acácio Barreiros e à Mesa, o seguinte: sabemos muito bem qual a gravidade da situação, sabemos muito bem quais as responsabilidades de Portugal, sabemos muito bem quais as responsabilidades do maior partido da oposição e, em matérias destas, nunca por nunca ser as escondemos ou deixámos de dizer aquilo que pensávamos ou até de estar solidários com as forças portuguesas quando elas intervieram nos compromissos da NATO.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O que o Sr. Deputado Acácio Barreiros está a querer fazer é uma intoxicação, essa, sim, em relação àquilo que eu afirmei.
Já agora, quero dizer-lhe o seguinte: aquilo que V.Ex.ª diz, infelizmente, não substitui o pronunciamento do Sr. Primeiro-Ministro à Nação. Todos os outros primeiros-ministros por esses países fora dirigem-se diariamente, ou quase, à Nação a dizer o que está a acontecer. Não é, pois, V. Ex.ª, Sr. Deputado Acácio Barreiros, que pode substitui-lo.

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Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação para intervir ao abrigo do n.º 2 do artigo 81.º do Regimento.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de vos falar sobre uma matéria que reputo de muita importância. A crise nos Serviços de Informação,...

Vozes do PS: - Ah...!

O Orador: - ... na Policia Judiciária e no sistema da justiça, em geral, assumiu, nos últimos tempos, contornos singularmente preocupantes.

Vozes do PS: - E a da AD?!...

O Orador: - De forma muito particular, todos os episódios em torno da demissão e da substituição do Director da Policia Judiciária vieram tornar claras a dimensão e a gravidade de uma crise nunca antes conhecida no seio das magistraturas portuguesas. Toda esta crise na justiça já era pressentida, mas agravou-se significamente nas últimas semanas.
O mal-estar no seio das magistraturas era algo que se sentia latente, mas esse mal-estar tornou-se mais nítido, mais evidente nos últimos dias.
A incapacidade do Governo para agir e para decidir; com autoridade e com firmeza, já era notória. Só que, depois de tudo quanto sucedeu nas últimas semanas, ficou claro que há quem, no nosso sistema de justiça, mande mais do que o Governo porque manda mesmo no próprio Governo.

Aplausos do PSD.

Que a Procuradoria-Geral da República, pela sua filosofia e pelo seu modo de agir, começava a distorcer o próprio equilíbrio do sistema de justiça já também muitos de nós o sabíamos.
Mas os últimos factos e os últimos dias colocaram completamente a descoberto, de forma incontestável, que a Procuradoria-Geral da República está a exagerar e a concorrer, de uma forma absolutamente inaceitável, para um perigoso mal-estar entre as magistraturas e para uma distorção preocupante do nosso sistema de justiça.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Rompeu-se um equilíbrio necessário e rompeu-se pelo aventureirismo do Governo, que é responsável por alterações legislativas apressadas e imprudentes.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Ao ponto a que chegámos, o mínimo que se poderá dizer é que Portugal está a viver um mal-estar na justiça sem precedentes nem paralelo no passado. Uma crise que toda a gente sente e vê; mas uma crise que só o Governo, uma vez mais, faz de conta que não existe, que se esforça por não ver e que teima, como é seu timbre, em não atacar nas suas causas e nos seus fundamentos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O comportamento do Governo, em tudo isto, é do mais absurdo que é dado ver.
O Ministro da Justiça não existe e o Primeiro-Ministro, igual a si próprio, não dá sinais de vida, não age, não actua, não exprime uma ideia, foge às suas obrigações e às suas responsabilidades.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Para cúmulo dos cúmulos o Governo e, em particular, o Primeiro-Ministro não percebem que, não apenas na justiça mas, sobretudo, na justiça, é fácil, mas reconstruir é particularmente difícil.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Conflitos entre magistraturas são do mais perigoso que pode suceder num Estado democrático. A justiça é um pilar essencial do Estado e um referencial incontornável para os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, agora postos em causa com tanta ligeireza.

Aplausos do PSD.

Tudo isto é o espelho da mais absoluta confusão em que o Estado mergulhou.
Mas não é menos preocupante que o Sr. Presidente da República, chamado a intervir e a pronunciar-se sobre esta grave crise na justiça e esta confissão no Estado, o tenha feito da forma e nos termos em que o fez.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - No respeito que nos é devido pelas instituições, confessamo-lo, esperávamos que o Sr. Presidente da República fosse mais longe do que foi.
A desconfiança geral é tão grande e o que sucedeu é tão grave que não se compadece com simples palavras de circunstância, que, claramente, passam ao lado do que é essencial e verdadeiramente importante.
Como diz, hoje mesmo, Vital Moreira, em prosa que significativamente titula «o Presidente bombeiro», «(...) a recente guerra de corporações na área da justiça é somente um afloramento de profunda crise de todo o sistema. A agitação pode amainar transitoriamente, mas as causas estruturais permanecem.»
Assim, tudo continuará na mesma O mesmo é dizer: a permitir um progressivo e perigoso resvalar da situação.
E com muita sinceridade, também não se nos afigura correcto que das palavras do Sr. Presidente da República tivesse transparecido uma crítica à actuação dos juízes ou dos seus órgãos, quando os problemas capitais, como se viu nos últimos dias, não se colocam, nem sobretudo nem essencialmente, no plano da magistratura judicial.

Aplausos do PSD.

Assim, ao contrário do que deve suceder, corremos o risco sério de agravar problemas entre magistraturas em vez de

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concorrer para um adequado reposicionamento de cada um dos seus vértices e para comportamentos de uma mais correcta articulação.
Há verdades comezinhas que não podem ser ignoradas. Só agora é que se descobre que as fugas de informação são perigosas e que se deve tentar determinar a sua origem e os seus responsáveis?. Tantos anos e tantas fugas depois? Só agora é que se entende que as magistraturas devem ser resguardadas de qualquer excesso de zelo na defesa da própria imagem? Tantas páginas, tantos programas, tantas entrevistas, tanta promoção de imagem depois?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Era-nos lícito esperar que o Sr. Presidente da República fosse claro e determinado, como lhe compete, a exprimir a sua preocupação pela inacção do Governo, pela demissão do Governo, pela situação ridícula, perigosa e grave de o Governo, legitimado pelo voto popular, agir a reboque de órgãos que não respondem, ao que parece, perante nada nem recuam perante ninguém.

Aplausos do PSD.

Com toda a clareza impõe-se dizer: ao ponto a que as coisas chegaram no sistema de justiça já não basta, apenas, exibir estados de alma; é preciso, sobretudo, agir com firmeza, decidir com autoridade, actuar com equilíbrio e com sentido das responsabilidades.
Em democracia, quem define a política, quem é responsável pelos seus resultados, quem responde perante os cidadãos são os órgãos de soberania livremente eleitos e, em particular, como sua emanação, é o Governo.
Não é admissível que quem não tem legitimidade política e eleitoral, como é o caso da Procuradoria-Geral da República, condicione e determine a acção ou a inacção dos órgãos de soberania e, em particular, do Governo.

Vozes do PSD: - Muito beml

O Orador: - O facto é que o estado das coisas se degradou de tal maneira que o Governo demonstrou toda a sua incapacidade.
O estado da justiça desceu esta semana ao nível mais baixo dos últimos tempos. E o que fazia o Primeiro-Ministro, entretanto? O Primeiro-Ministro fugia...

O Sr. José Junqueiro (PS): - Mas o Marcelo é que se demitiu!

O Orador: - ... e reservava o seu pronunciamento; não se lhe conheciam intenções de tranquilizar os portugueses, não se lhe arrancava uma palavra, não se lhe adivinhava um pensamento. Foi trazido à reflexão pelo Presidente da República. Saiu outro... ! É certo que continuou a fingir que não entendia o que se passava; é certo que continuou a desconversar sobre os vergonhosos dias da justiça em Portugal,...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - ... mas adiantou uma explicação, no final. Afinal, lamenta, o Governo não tem poderes, não governa, feliz ou infelizmente, esta área. Tudo lhe passa ao lado. Não há português distraído que já não receasse esta resposta e não advinhasse esta teoria, mas, não é verdade: o Primeiro-Ministro escondeu o que o Governo fez e fez mal; foi ele quem rompeu ó equilíbrio entre a magistratura do Ministério Público e a Polícia Judiciária e a sua autonomia investigatória; foi ele que fez a guerra; foi ele que originou a acentuação da conflitualidade.
Por isso, aqui venho, em nome do PSD, alertar para esta situação. As meias palavras podem ser politicamente correctas mas só a clareza pode ser boa conselheira.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Uma mensagem de meio termo, para tentar agradar a todos, pode até parecer adequada, só que o ponto a que o Governo deixou que as coisas chegassem, o meio termo não é equilíbrio, é desequilíbrio; as meias palavras nada resolvem, não agradam a ninguém. Arrastar situações que são erradas só terá um efeito: deixar tudo como está e isso é contribuir para agravar uma situação com consequências imprevisíveis.
O País não pode esperar mais seis meses para ultrapassar o pântano a que a política do Governo na área da justiça o conduziu.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Pela nossa parte, não nos cansaremos de denunciá-lo; pela nossa parte, não nos resignaremos a este espectáculo triste e degradante.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para formular pedidos de esclarecimentos os Srs. Deputados Manuel Alegre, José Magalhães e João Amaral.
O Sr. Deputado Manuel Alegre tem um minuto que lhe foi concedido por Os Verdes, mas como o Sr. Deputado Carlos Encarnação não tem tempo para responder - e aproveito para vos dizer que os senhores têm de ver melhor a gestão do vosso tempo - darei um minuto ao Sr. Deputado Carlos Encarnação para lhe responder e, depois, darei um minuto a cada um dos interpelantes e mais um minuto ao Sr. Deputado Carlos Encarnação por cada pergunta, mas não pode ser mais.
Assim sendo, tem a palavra o Sr. Deputado Mapuel Alegre.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, durante o governo do PSD, o PSD inventou a teoria das forças de bloqueío que punha em causa o princípio fundamental da separação de poderes, dando todo o poder ao governo, e a autonomia dos diferentes órgãos de soberania e de Estado.
Agora, o PSD está, á propósito do Serviço de Informações e do problema da justiça, a inventar uma teoria dás forças de bloqueio às avessas, isto é, quer que o Governo controle tudo, que o Ministro da Justiça controle os tribunais e que o Primeiro-Ministro controle tudo e todos. Ora, isto é um princípio contrário ao princípio da separação dos poderes.

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Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não há crise alguma de regime; há crises para as quais o regime democrático tem mecanismos de funcionamento e de solução. A única crise de regime é a que vem das fragilidades, das debilidades e das contradições da oposição.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Encarnação, como o tempo é escasso, se o senhor não se importa os Srs. Deputados inscritos para lhe formularem pedidos esclarecimentos fá-lo-ão primeiro e, depois, no fim, dar-lhe-ei a palavra para lhes responderem conjunto. Está de acordo, Sr. Deputado?

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Com certeza, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra o Sr. Deputado José Magalhães, dispondo de um minuto que lhe é concedido pela Mesa.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, era para interpelar a Mesa no sentido de anunciar que a nossa pergunta está feita e o que eu pretendo é usar da palavra para exercer o direito da defesa da bancada, na altura própria, quando V. Ex.ª assim o entender.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Na altura própria? Tem de ser já!

O Sr. Presidente: - Então, tem prioridade. Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Encarnação, a sua intervenção produzida neste exacto momento e depois dos eventos que todos testemunhámos nas últimas horas tem o sabor da revelação de que V.V Ex.as não aprendem nada...

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Convosco não, não aprendemos nada.

O Orador: - ... com os eventos e com as vicissitudes em que enredam a coisa que vos resta como partido e a qual, nas últimas horas, deu um espectáculo absolutamente lamentável ao País que o PS, com um alto sentido de decoro, não comentou em termos excessivamente ásperos, porqué a realidade já era em si evidente e dispensava adjectivos.
Mas há limites e quando V. Ex.ª vai à Tribuna para declarar o que declarou, esse limite é ultrapassado, porque V. Ex.ª, desde logo, além de nada ter aprendido com aquilo que historicamente aconteceu nos últimos meses, ou seja, o difícil que é o caminho para o PSD ser oposição, vem dar aulas e lições de moral numa matéria em que o PSD não tem qualquer legitimidade e deveria ter toda a vergonha.
O PSD, se tivesse algum decoro, não se esqueceria de que governou a área da justiça 15 anos a fio, sem interrupção,

sobre todas as circunstâncias, agravando e criando problemas estruturais que nenhum milagre altera instantaneamente e em relação ao Serviço de Informações arrancou com os serviços em condições que criaram dificuldades imensas, que geraram escândalos sucessivos, que abriram campo aos seus adversários e que nos trouxeram à situação que é antecedente daquela que vivemos.
Mas eu gostaria de protestar em especial e de considerar que esta bancada se sente especialmente insultada com dois aspectos: primeiro, a irresponsabilidade que o PSD revela.
O Sr. Deputado Carlos Encarnação nunca consegue escolher entre dois papéis: o de bombeiro...

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - O bombeiro não sou eu!... Não fui eu quem escreveu este artigo!

O Orador: - ... e o de incendiário e é a figura caricata do bombeiro pirómano que num sítio apaga e noutro incendeia, tendo a hipocrisia de julgar que nos engana.
Sr. Deputado Carlos Encarnação, V.Ex.ª e nesta matéria não só não tem legitimidade como não trouxe qualquer proposta. O Sr. Deputado em relação à situação da justiça, da segurança interna e dos Serviços de Informações não trouxe proposta alguma e a que o Sr. Deputado Luís Marques Mendes tinha e que apresentou, formalmente na altura própria, era a de dar ao Ministro da Justiça poderes de comando do Ministério Público, através de directivas, e a proposta que a falecida AD tinha no seu programa de governo era a de criar um super-ministério das polícias, único, aglutinados não se sabendo se sob a direcção do Dr. Portas ou do Dr. Marcelo - e tudo isso é história, não tem significado algum... -, mas era essa a proposta ridícula que os senhores tinham.
Agora, Sr. Deputado, o nosso protesto ainda mais profundo: depende do PSD, devido às regras legais, que seja eleito por 2/3 um presidente e membro do Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República e aquilo que V. Ex.ª disse ontem na rádio - e que, felizmente, hoje, não trouxe para aqui - foi manchar e dificultar ao extremo limite a obtenção de uma solução positiva que é importante para prestígio democrático das instituições.
Em segundo lugar, VV Ex.- estão a bloquear a nomeação do Director do SIEDM...

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - O quê? Isso é falso!

O Orador: - É verdade! E o Sr. Deputado devia ter mais responsabilidade, não se pronuncie com precipitação.

Vozes do PSD: - Isso é falso!

O Orador: - O novo Director do SIEDM que tem de ser nomeado depois de uma audição parlamentar não pode ser nomeado, porque VV. Ex.as boicotam e impedem a realização dessa audição parlamentar...

Vozes do PSD: - Isso é falso!

O Orador: - ... e essa é uma responsabilidade que nós não aceitamos, mas não nos acusem, depois, de não haver director do SIEDM. A responsabilidade é vossa!

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O Sr Presidente - Agradeço que conclua, Sr Deputado.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Os senhores, simultaneamente, estão a impedir e a adiar-já lá vai um mês e meio - a eleição da Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados e a eleição da Alta Autoridade para a Comunicação Social e espero que não venham dizer que há uma grande crise na comunicação social, porque não é eleita a Alta Autoridade ao mesmo tempo que VV. Ex.as bloqueiam a efectiva eleição. E isso, Srs. Deputados,...

O Sr. Presidente: - Tem de terminar, Sr. Deputado, se faz favor.

O Orador: -... pode enganar os portugueses durante alguns dias, mas não engana todos os portugueses, não nos engana, a nós, e não ficaremos de braços cruzados até que se reponha a normalidade e que acabe o vosso boicote.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Deputado José Magalhães, escolheu mal, particularmente mal, a imagem do bombeiro,...

O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Foi, foi: a de incendiário era melhor!

O Orador: -... porque hoje foi publicado um excelente artigo do Professor Vital Moreira onde se chama bombeiro a outrem que não a mim...

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas não é pirómano!

O Orador: -... e chama-o por uma razão muito clara: porque o Governo falhou em toda a sua linha de competências e porque o Presidente da República foi obrigado a, mais uma vez, intervir.

Aplausos do PSD.

Sr. Deputado José Magalhães, tem razão, pois há limites para a degradação do Estado e nós estamos a assistir à ultrapassagem desses limites, por isso eu foi à tribuna dizer o que disse.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado José Magalhães, V. Ex.ª pode dizer tudo aquilo que lhe vier à cabeça, na certeza, porém, de que eu tenho de precisar, em nome da verdade, duas coisas: primeira, quem causou toda esta imensa trapalhada no SIEDM não fomos nós, foram VV. Ex.as Quem, nesta altura, colocou a Assembleia da República na responsabilidade de fazer uma audição do SIEDM, a que nós respondemos «façamo-la já amanhã se quiserem», foram VV. Ex.as...

Sr. José Magalhães (PS): - É falso!

O Orador: - Nós já dissemos aquilo que nos competia: nós votaremos contra a nomeação do cidadão que está designado, mas isso não impede que VV. Ex.as o nomeiem, que a audição se faça, que os senhores tenham ou não tenham dores de consciência em relação à responsabilidade da nomeação que querem fazer...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não atirem é para cima de nós a irresponsabilidade do acto que VV. Ex.as praticaram.

Aplausos do PSD.

Afinal, o. Sr. Ministro Veiga Simão vai ou não mudar de candidato? Vai ou não mudar o Director do SIEDM? Diga-me isso já, se é capaz de me responder! É que isso é que é importante! Agora, que a audição seja feita quando o senhor quiser, pois nós vamos votar contra aquele nome - estamos responsabilizados nisso!

O Sr. José Magalhães (PS): - Vote contra tudo!

O Orador: - Só para terminar, Sr. Deputado José Magalhães, devo confessar-lhe que se V. Ex.ª não percebeu - e eu não lhe faço essa injustiça - aquilo que quis dizer a deliberação do Conselho Superior de Magistratura, V Ex.ª nada percebeu do que aconteceu neste país! Como V. Ex.ª é uma pessoa inteligente, deve ter compreendido, e deve ter compreendido aquilo que eu dizia no inicio, isto é, que a degradação do sistema de justiça é de tal ordem que levou o Conselho Superior de Magistratura a tomar a decisão que tomou! Para concluir, também lhe digo que, Sr. Deputado José Magalhães, em todos os 15 anos de governo que V. Ex.ª verbera e sempre verberou aqui, nesta Assembleia, nunca vi acontecer uma vergonha destas!

Aplausos do PSD.

O Sr. José Magalhães (PS): - Então, estava distraído ou a dormir! Ou, então, estava a fazê-la!

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado João Amaral para formular o seu pedido de esclarecimento, informo que assiste aos nossos trabalhos um grupo de 22 alunos dos Cursos de Língua Portuguesa da África do Sul. Não são muitos, mas merecem a nossa simpatia!

Aplausos gerais, de pé.

Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Carlos Encarnação, tem a palavra o Sr. Deputado João Amarai.

O Sr João Amaral (PCP): - Sr Presidente, Srs. Deputados do Grupo Parlamentar do PS que me cederam. Agradeço também ao Sr. Deputado Carlos Encarnação pela sua intervenção, que creio que tem a justificação principal de demonstrar que o PSD, apesar da crise,

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está absolutamente no mesmo estado, está absolutamente na mesma!

Vozes do PCP: - Muito bem!

Vozes do PSD: - É um elogio!

O Orador: - Sr. Deputado Carlos Encarnação, em relação á crise da justiça, manifestamos a nossa profunda preocupação e tomámos a iniciativa de interpelar o Governo. No próximo dia 15, o Governo estará aqui para responder à Assembleia da República, por nossa iniciativa, às múltiplas questões que se levantam. Mas há algo que tem sempre de ser dito, quando se fala da crise da justiça: é que não há crise alguma na Polícia Judiciária, na PGR, seja onde for, que possa justificar qualquer atraso, qualquer bloqueamento nas investigações dos processos que estão em curso, nomeadamente, do processo da Universidade Moderna, da JAE e de outros casos da mesma gravidade que aí andam, em cima da mesa! São estas investigações que têm de ser feitas.
Finalmente, Sr. Presidente, quanto ao Conselho de Fiscalização, é mais uma situação grave e não podemos deixar de referir aqui, quando se chega a este ponto no Conselho de Fiscalização, que o que se passou com o Conselho anterior, com a questão do envio de uma carta, fazendo do Conselho de Fiscalização uma espécie de caixa de correio, não contribuiu, seguramente, para o prestígio daquela instituição. Se ela precisa agora de meios, Sr. Presidente, sempre precisou! E nós, nos nossos projectos, sempre defendemos que o Conselho de Fiscalização tivesse mais meios para actuar!
Para concluir, Sr. Presidente, dizemos, com muita clareza, que esta situação de ausência de Conselho de Fiscalização não se pode prolongar e que, a prolongar-se, existe um projecto de lei do PCP que permite tornear, resolver, o problema da exigência de dois terços e, assim, fazer essa eleição com a brevidade que a defesa do edificio democrático e dos direitos dos cidadãos exige!

Aplausos do PCP

O Sr. Presidente: - Para responder aos dois pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação, dispondo de 3 minutos.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Amaral, sei que a amizade que V. Ex.ª tem por mim é igual à que tenho por V. Ex.ª e que V. Ex.ª não resiste a fazerme um elogio, de vez em quando... !

Risos do Deputado do PCP João Amaral.

V. Ex.ª disse, pois, que eu sou coerente e eu aceito e agradeço esse elogio!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quero dizer-lhe também, Sr. Deputado João Amaral; que V. Ex.ª também está, cada vez mais, na mesma!
Mas, independentemente disso, o problema que temos, em relação ao Conselho de Fiscalização dos Serviços de

Informação, é tão-só este: até encontramos as pessoas, mas a situação de degradação e de confusão é tal que as pessoas, por mais bem indicadas que sejam, não aceitam!

O Sr. José Magalhães (PS): - Isso é de uma hipocrisia!

O Orador: - Veja bem, V. Ex.ª, a gravidade da situação a que chegámos: o problema não é de lei, é de confiança nas instituições!

Aplausos do PSD.

V. Ex.ª também disse algo que subscrevo. Não queremos o bloqueamento das investigações, mas V. Ex.ª, na Comissão, também se lembrou de subscrever a pergunta: mas é o Sr. Ministro da Administração Interna que faz a investigação criminal? V. Ex.ª sabe muito bem que não! Portanto, é bom que separemos as águas e os campos: quem deve fazer a investigação criminal, que vá até ao fim, doa a quem doer!

O Sr. José Magalhães (PS): - É evidente!

O Orador: - Mas não venha o Sr. Ministro da Administração Interna fazer disto um motivo de afirmação política.
E quanto a si, Sr. Deputado Manuel Alegre, queria dizerlhe...

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Fiquei para o fim?

O Orador: - Ficam para o fim as pessoas por quem tenho uma especial consideração!

O Sr. João Amaral (PCP): - Quer dizer que não a tem por mim?

O Sr. José Magalhães (PS): - Acabou de o insultar!

O Orador: - V. Ex.ª é, porventura, um dos Deputados socialistas e um dos portugueses que mais distraído tem andado, nos últimos tempos. Acredito que a V. Ex.ª não convenha dizer e reconhecer que há uma crise geral das instituições e do Estado. Admito que V. Ex.ª esteja mais vóltado para a construção de uma poesia sobre isto do que para encarar a dura realidade!

Aplausos do PSD.

Mas o facto, Sr. Deputado Manuel Alegre, é que V. Ex.ª, certamente, não esteve no País, não ouviu nem leu a deliberação do Conselho Superior de Magistratura, não ouviu nem leu o que disse o Sr. Bastonário da Ordem dos Advogados, não ouviu nem leu aquilo que disse a Associação Sindical de Juízes Portugueses, porque se V. Ex.ª tivesse lido isto tudo não teria dito a enormidade que disse há pouco!

Aplausos do PSD.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da honra pessoal.

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O Sr. Presidente: - Dado que não estamos a discutir qualquer diploma, posso dar-lhe a palavra imediatamente. Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, eu não esperava do Sr. Deputado Carlos Encarnação uma referência desprimorosa em relação à poesia, da qual Portugal deve orgulhar-se!
Li tudo aquilo a que o Sr. Deputado se referiu, mas também li o pedido de renúncia do presidente do seu partido, o Professor Marcelo Rebelo de Sousa!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, agradeço que façam silêncio, por forma a que o Sr. Deputado Carlos Encarnação possa dar explicações, querendo.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, é só para dizer que, às vezes, até um poeta sente uma falta de tema extraordinária!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, também ao abrigo do n.º 2 do artigo 81.º do Regimento, tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ªs Srs. Deputados: Vou falar de um assunto que diz respeito a 650 milhões de contos por ano. Não sei se isso interessará a alguém... !

Risos.

O Sr. José Magalhães (PS): - A nós, interessa!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Numa Europa em plena crise política, institucional e até militar, os resultados da Cimeira de Berlim sobre a Agenda 2000 merecem ser avaliados serenamente, quer a nível nacional quer a nível comunitário.
Os resultados são, aliás, muito melhores a nível nacional do que a nível europeu, e esta é já uma conclusão que aponta para a excelência do desempenho negociai do Governo presidido por António Guterres.
Ao seguir as conclusões da presidência alemã sobre o Conselho Europeu de Berlim dos passados dias 24 e 25 de Março, deparamos com um quadro de resultados globalmente favoráveis para Portugal, nalguns pontos excedendo mesmo as previsões mais optimistas.
Esta não é ainda a hora dos números detalhados, mas já se pode antever o futuro quadro comunitário para Portugal entre 2000 e 2006 como um quadro de prosperidade e de estabilidade.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Deste modo, está prevista uma subida de 3% em relação ao total de verbas do II Quadro Comunitário de Apoio, que vigora desde 1994. As verbas passarão de 3823 milhões de contos, ou seja, 19 071 milhões de euros, para 4592 milhões de contos, ou seja, 22 905 milhões de euros. Isto é, a média anual de fundos comunitários para o nosso pais passa de 637 milhões de contos para 656 milhões de contos, por ano. É uma ligeira subida, mas é uma subida, e chamo a atenção dos Srs. Deputados para este detalhe, quando todo o exercício da União, em termos de fundos, é para a sua descida.
Essa tendência para a descida dos findos estruturais nas perspectivas financeiras da União Europeia para os exercícios orçamentais até 2006 não deixa de colocar alguns problemas sobre o futuro da Europa que queremos construir.
A construção inteligente de um «caso português» nestas negociaGÕes, por parte do Governo, teve logo a sua consagração na parte respeitante à Política Agrícola Comum quando o Conselho Europeu reconheceu (e cito) a «especificidade da agricultura portuguesa» e reconheceu a necessidade de reforçar o apoio concedido à agricultura através de medidas de desenvolvimento rural financiadas pelo FEOGA/Garantia, medidas essas a propor pela Comissão.
Esse mesmo desenvolvimento rural já constava dos Grandes Objectivos (p.3) do Plano Nacional de Desenvolvimento Económico e Social para 2000/2006, apresentado pelo Governo, o que só vem comprovar o sentido de antevisão dos negociadores portugueses.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Também não deixa de merecer uma referência muito especial a reafirmação do objectivo da coesão económica e social consagrado no Tratado da União Europeia e na Constituição da República Portuguesa. Como se afirma nas conclusões da Presidência, «Este objectivo deverá ser mantido no futuro, à medida que as prioridades continuem a evoluir numa União mais diversificada, tendo em conta que há que conseguir uma maior concentração do auxílio estrutural».
Esta preocupação com a coesão económica e social, manifestada por nós todos e, particularmente, pelos projectos de resolução n.os 122 e 123/VII do PCP e do PSD, na altura em aliança com o PP,...

A Sr.ª Maria Manuela Augusto (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - ... mereceu, pois, o devido relevo nesta Cimeira. Aliás, os resultados para Portugal dão uma resposta global positiva às exigências internas e externas daquelas resoluções, aprovadas por esta Câmara.
Também a situação específica da região de Lisboa foi considerada, como pretendiam aquelas resoluções, tendo sido atribuída uma ajuda especial de 500 milhões de euros para o seu phasing-out do Objectivo I, enquanto os problemas específicos de Berlim Leste receberam apenas um adicional de 100 milhões de euros. Isto só para termos em conta a diferença de tratamento destas duas cidades.
No que respeita ainda aos fundos, a Grécia, a Irlanda, a Espanha e Portugal beneficiaram de um subsídio financeiro especial para manterem o nível médio global de ajuda per capita em valores de 1999.

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Deste modo Portugal, receberá 450 milhões de euros, juntamente com a Grécia, enquanto a Espanha receberá pouco mais de metade (200 milhões de euros) e a Irlanda apenas 40 milhões, devido ao seu crescimento económico. O objectivo destes fundos é, aliás, o de permitir o desenvolvimento, a coesão e a convergência. Com a introdução do euro novas exigências neste domínio aparecerão - e não queria deixar de chamar a atenção para este ponto.
Quanto ao Fundo de Coesão, o Conselho Europeu decidiu mante-lo para promover a coesão económica e social na União e a solidariedade entre os Estados membros, através de contribuições financeiras especiais para projectos nas áreas do ambiente e das redes de transporte transeuropeias para os países como Portugal, cujo produto nacional bruto per capita é inferior a 90% da média comunitária.
Caíram, assim, por terra as teses perversas que queriam penalizar os países da coesão que entraram por mérito próprio na Zona Euro, como Portugal. Foi mais uma vitória da verdadeira ideia europeia de união política e económica e mais uma vitória do Governo de Portugal.

Aplausos do PS.

Portugal irá, assim, receber 631 milhões de contos até 2006, ou seja, uma média de 90 milhões de contos por ano do Fundo de Coesão, quando recebe actualmente uma média de 95 milhões. Nem tudo são rosas na Europa. Mas ninguém se picou, ainda, nos espinhos.
Também as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira aparecem explicitadas, por duas vezes, nas conclusões da presidência alemã. Uma dessas referências diz respeito à sua especificidade no quadro das iniciativas comunitárias e acções inovadoras da responsabilidade da Comissão.
Haverá, neste particular, que manter a pressão das autoridades portuguesas e regionais para que venham a ser estabelecidos programas especiais paras as regiões ultra-periféricas. Tal atitude foi hoje confirmada pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros Jaime Gama, na reunião da Comissão de Assuntos Europeus.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Muito mais haveria a dizer sobre os resultados desta Cimeira para o nosso país. Bastará talvez sintetizar, dizendo que agora o Plano Nacional de Desenvolvimento Económico e Social tem os meios para os seus objectivos e que, até 2006, a Europa não nos faltará, mas nem tudo são facilidades e nem sempre será assim.
Neste momento, não sabemos sequer se há uma crise na Europa ou uma crise europeia. O Conselho Europeu de Berlim deu, no entanto, um passo em frente e introduziu alguma esperança num projecto exigente e que a todos obriga.
O Conselho Europeu de Berlim manteve o projecto da União Europeia como projecto político e económico e nem sequer estava dito que assim seria.
Há, agora, que olhar em frente. Queremos mais Portugal e queremos mais Europa!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Medeiros Ferreira, o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan, que dispõe de l minuto para o fazer. Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Medeiros Ferreira, teve uma tarefo absolutamente grata neste Parlamento: é que, num Governo que fez quase tudo mal, quando fez algo mais ou menos,...

Vozes do PS: - Mais ou menos?!

O Orador: - ...parece que V. Ex.ª pode aqui dizer que foi tudo muito bom.
Mas vou dizer-lhe, Sr. Deputado, com o mesmo sentido de responsabilidade que sempre presidiu à posição do Partido Popular nesta matéria, que houve resultados positivos para Portugal com esta negociação. E o que é bom para Portugal é bom para os portugueses e o PP aplaude. Por isso, em nome do Partido Popular, estou aqui, hoje, a dizer que conseguimos resultados positivos.

O Sr. José Magalhães (PS): - Que grande contraste com o PSD!

O Orador: - Mas, Sr. Deputado Medeiros Ferreira, há uma questão que, para nós. foi, é e será sempre crucial: é a de saber se este dinheiro será ou não bem gasto. E quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que gostaria de vê-lo ao nosso lado, como outrora já o fizemos, com outros fundos europeus, a saber se o dinheiro que hoje parece termos conseguido servirá ou não para termos uma agricultura competitiva, uma indústria competitiva, um tecido produtivo competitivo, mais e melhores infra-estruturas, neste País.
Isto porque o dinheiro é importante e será decisivo para o período compreendido entre os anos 2000 e 2006, mas sê-lo-á na justa medida em que ajude o nosso tecido produtivo, a nossa agricultura, a nossa indústria, em suma, os portugueses.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, gostava de saudar o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan pelo tom de responsabilidade que deu à sua intervenção.
Quer-me parecer que a posição do CDS-PP quanto à Europa não está, neste momento, à mercê das flutuações das coligações que o seu partido faz ou não fez, pelo que saúdo o CDS-PP por essa posição, independentemente de estar ou não coligado com o Partido Social Democrata.
Gostava de dizer ao Sr. Deputado Silvio Rui Cervan, bem como a todos os Deputados da Assembleia da República, o seguinte: a sua pergunta coloca, de facto, um problema verdadeiro, que é o da gestão interna dos fundos conseguidos na negociação da Agenda 2000. Ora, esse é, verdadeiramente, um acto de Governo de Portugal e que significa que a União Europeia não inibe os governos nacionais de poderem partilhar, dirigi* e fomentar políticas nacionais com graus de independência e de autonomia assinaláveis.
Nas audições que decorreram na Comissão de Assuntos Europeus sobre esta matéria tivemos oportunidade de ouvir

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várias propostas no que diz respeito, por exemplo, a uma nova aplicação dos fundos da política agrícola comum em termos internos. Aliás, estou convencido de que o Governo aponta já nesse sentido e, que mais não fosse, o novo reforço das verbas para o desenvolvimento rural levará, estou certo, a uma remodelação do nosso mundo rural, tendo em conta, exactamente, as novas perspectivas abertas pela conclusão da Agenda 2000.
Para terminar, Sr. Deputado, creio que, caso o Partido Socialista volte a ganhar as eleições, o exercício que aqui se anuncia até ao ano 2006 tem todas as condições para fazer Portugal aproveitar este ciclo da sua integração europeia de tal maneira que lhe permita, quando o alargamento tiver lugar, deixar de estar entre os países da coesão.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Também para uma intervenção ao abrigo do n.º 2 do artigo 81.º do Regimento, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Jerónimo.

O Sr. Manuel Jerónimo (PS): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Permita-me, Sr. Presidente, dado ser a primeira vez que uso da palavra nesta nobre Casa da democracia portuguesa, que cumprimente e saúde todas as Sr.ªs e Srs. Deputados e, muito em especial, V. Ex.ª, cujo empenho e dedicação à causa dos reformados e pensionistas do nosso país são hoje sobejamente reconhecidos. O meu bem haja.

Aplausos do PS.

Permitam-me, ainda, que saúde deste prestigioso lugar todos os reformados e pensionistas do nosso país, homens e mulheres que ajudaram a construir o Portugal de Abril e que nos devem merecer o mais profundo respeito, reconhecimento e consideração.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Os reformados e pensionistas representam, actualmente, um universo de cerca 2,5 milhões de cidadãos portugueses que depositam grande esperança e confiança nos poderes públicos para a resolução dos problemas que os afectam no plano económico, social e cultural.
O ano de 1999 é um ano em que esta esperança é acrescida para muitos. Com efeito, a Assembleia Geral das Nações Unidas, ao proclamar, através da Resolução n.º 47/5, o ano de 1999 como o Ano Internacional das Pessoas Idosas, reconheceu, explicitamente, o papel que os idosos poderão desempenhar para o desenvolvimento social e para a paz global no próximo século e criou nesta camada populacional grande esperança e expectativa quanto ao futuro.
O Ano Internacional das Pessoas Idosas, que este ano se celebra, constitui uma oportunidade única para reafirmar a nossa contribuição para a criação, neste fim de milénio, de uma sociedade para todas as idades.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Uma sociedade para todas as idades implica uma sociedade mais justa e humanizada, uma sociedade que reforce a cidadania das pessoas idosas, uma sociedade que respeite os seus mais elementares direitos, uma sociedade que dignifique o seu papel na vida social, cultural e económica e, sobretudo, uma sociedade que fortaleça as redes de solidariedade intergeracional; indispensáveis à satisfação das necessidades de todos, no respeito pela reciprocidade e pela equidade de justiça social.
O Partido Socialista tem sido, desde sempre, um acérrimo defensor dos direitos sociais dos idosos e do reforço da participação destes cidadãos na construção de uma sociedade mais justa, de uma sociedade onde, de facto, a solidariedade entre gerações possa estar presente e onde as pessoas idosas, ao invés de excluídas e de discriminadas, se sintam integradas e respeitadas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Com este grande objectivo, o Governo do Partido Socialista tem vindo a prosseguir, com grande empenho e persistência, uma política social que contribuiu, no nosso país, para um efectivo reconhecimento e reforço dos direitos sociais, económicos e culturais das pessoas idosas.
Reconhecendo as insuficiências do plano substantivo do sistema de segurança social, o Governo da «nova maioria» do Partido Socialista iniciou uma profunda reforma do sistema criado com a Lei n.º 28/84 - Lei de Bases da Segurança Social -, tendo em vista não apenas a sua subsistência económica e financeira no futuro, mas, igualmente, numa perspectiva de garantia e melhoria do acesso dos cidadãos às prestações sociais e à acção social, de que dependem, em larga medida, milhares de reformados e pensionistas.
Todos, sem excepção, reconhecerão ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade o papel determinante que, desde 1995, vem desempenhando na recuperação da qualidade de vida dos cidadãos e cidadãs reformados e pensionistas.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Ò vasto conjunto de medidas levadas a cabo ao longo dos últimos três anos por este Ministério, pela relevância que assumiram junto deste estrato populacional, merece ser realçado, até porque correspondem a um compromisso eleitoral do Partido Socialista, reiterado pelo XIII Governo Constitucional no seu programa:...

Vozes do PS:- Muito bem!

O Orador: - ... a actualização anual das pensões de reforma acima da taxa de inflação, de modo a preservar e aumentar o poder real de compra destes cidadãos mostra bem o esforço de justiça social levado a cabo pelo Governo, pese embora considerarmos ainda baixos os valores das pensões dos idosos, mas estamos convictos de que o Governo irá prosseguir a sua política de recuperação das pensões, sobretudo das mais degradadas. Assistimos, desde 1996, a um aumento médio global das pensões superior à taxa de inflação, isto é, de 5,6% em 19%, de 4% em 1997, e para 1998 foi aprovada uma actualização extraordinária das pensões dos pensionistas com carreiras contributivas superiores a 15 anos (a primeira actualização ocorreu em Outubro de 1998 e a segunda actualização ocorrerá em Junho do corrente ano), princípios estes observados igualmente para 1999; o aumento selec-

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tívo das pensões de reforma, que beneficia os pensionistas de menores recursos económicos, permitindo dar mais a quem, de facto, mais precisa, é uma política que consubstancia o primado da solidariedade social;...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... a aprovação de um diploma legal que veio possibilitar a flexibilização da idade de acesso à pensão de velhice, possibilitando que, em determinadas situações especificas, possam aceder à pensão de reforma, garantindo a continuidade da sua autonomia financeira sem perigar a relação familiar e a coesão social; o apoio domiciliário que, no inicio desta legislatura, era uma realidade apenas para cerca de 21.000 pessoas e que, actualmente, atinge cerca de 35.000 idosos e que, segundo as previsões do Governo, chegará a 40 000 no final de 1999. Ou seja, podemos com orgulho afirmar que, em quatro anos, o Governo do Partido Socialista duplicou a oferta no domínio do apoio domiciliário, serviço social imprescindível e fundamental para as pessoas idosas, sobretudo para as de menores recursos ou incapacitadas. Neste domínio permito-me, ainda, destacar o apoio domiciliário especializado, que combina serviços de acção social e de saúde para idosos dependentes e que este ano contará com um equipamento instalado em cada distrito; desta nova geração de políticas, quero também sublinhar o combate aos lares lucrativos clandestinos, de que resultou o encerramento de cerca de 60 lares e o realojamento de mais de 650 idosos, que neles se encontravam em situação degradante e incompatível com a dignidade de qualquer ser humano;...

Aplausos do PS.

... a criação e desenvolvimento do Programa PELAR, em 1997, destinado a aumentar o número de lugares em lares, com um orçamento de oito milhões de contos para execução em três anos, que possibilitou já a apresentação de mais de 70 projectos e permitirá, no final deste ano, beneficiar cerca de 5.000 idosos, a eliminação de barreiras arquitectónicas, que constituem barreiras físicas para os idosos incapacitados, foi outra das medidas postas em prática por este Governo, com obrigação nas edificações públicas; a instituição do cartão do idoso, que actualmente conta com mais de 400 000 utentes, com o objectivo de contribuir para o desenvolvimento e promoção de iniciativas que visem o bem-estar e a plena participação dos idosos; a celebração do Pacto de Cooperação para a Solidariedade Social, envolvendo o compromisso da Administração Central e das Administrações Regionais e Locais, por um lado, e a sociedade civil representada pelas IPSS, por outro, configura uma nova política de relacionamento do Estado com a sociedade civil, de que beneficiam sobretudo as pessoas idosas ou em risco de exclusão.
No âmbito do Pacto, entre outros objectivos, visou o Governo fomentar a formação de uma consciência colectiva e responsável dos diferentes problemas sociais que hoje nos atingem. Estes objectivos serão atingidos pela conjugação de esforços articulados e de diferentes formas de entreajuda no sentido da erradicação da pobreza e da exclusão; a corresponsabilização dos diversos sectores, público 'e social, que envolve cerca de 3 000 IPSS e que abrange cerca de 400 000 utentes da acção social, ilustra bem um sistema que se apoia numa vertente de cobertura dos direitos subjectivos e por uma gama diversificado de apoio social complementar dirigido, sobretudo, aos idosos mais desfavorecidos e carenciados através de prestações personalizadas.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: A promoção do desenvolvimento económico, social e cultural encontra-se espelhado no vasto conjunto de medidas tomadas pelo Governo do Partido Socialista, algumas das quais que, pela sua importância, enunciei.
Tal como aqui foi referido pelo Primeiro-Ministro, Eng.º António Guterres, aquando da discussão do Orçamento do Estado para 1999, relembramos que a despesa com as funções sociais representavam, em 1995, menos de metade da despesa total do Estado (48,7%) e que em 1999 passará a representar 55,4% da mesma despesa.

A Sr.ª Natalina Moura (PS): - Muito bem!

O Orador: - De facto, através de uma política social rigorosa e de uma forte consciência social que sempre nos dominou, foi possível propiciar, numa só legislatura, um aumento de 6,7 pontos percentuais da despesa com as funções sociais, melhorando substancialmente, deste modo, a situação penosa em que se encontravam milhares de reformados e pensionistas do nosso país.

Aplausos do PS.

Muito tem sido feito neste domínio pelo Governo da nova maioria, todos o reconhecem. Mas, apesar do muito que foi feito, julgamos que é ainda pouco e é por isso que o Partido Socialista, continuará a pugnar, quotidianamente, pela melhoria das condições e da qualidade de vida dos cidadãos em geral, e dos reformados e pensionistas em particular.
Tudo faremos para afirmar os valores da solidariedade social, da solidariedade intergeracional, da justiça e da equidade. Numa só palavra, tudo faremos pela promoção dos direitos de cidadania dos mais idosos, dos mais jovens e sobretudo dos mais carenciados.

O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - A celebração do Ano Internacional das Pessoas Idosas constitui um momento único para o aprofundamento das políticas de terceira idade e para o repensar de uma nova sociedade, onde seja possível a coabitação dos cidadãos de todas as idades em grande harmonia e fundada no respeito mútuo e na solidariedade.
Este será o enorme desafio que a todos, sem excepção, se deve colocar e que deverá mobilizar-nos por uma sociedade de todas as idades.
Este compromisso existe pela parte do Partido Socialista e boa parte dos seus fundamentos foi concretizada pela política dos últimos três anos, em favor dos reformados em geral e dos mais idosos em particular.

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Aplausos do PS.

O Sr Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 50 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos iniciar a discussão conjunta, na generalidade, das propostas de lei n.ºs 228/VII - Estabelece as bases da política e do regime de protecção e valorização do património cultural e 258/VII - Estabelece o regime fiscal do património cultural.
Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Ministro da Cultura.

O Sr. Ministro da Cultura (Manuel Maria Carrilho): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apresentamos hoje a esta Assembleia a proposta da lei de bases do património, que visa substituir a Lei n.º 13/85 (Património Cultural Português), que foi aprovada por este Parlamento em 21 de Março de 1985. Porém, esta foi uma lei que durante 10 anos esperou regulamentação, foi uma lei que, tendo sido aprovada por unanimidade e suscitado um amplo consenso, levou, na altura, a pensar que seria fácil obter essa regulamentação rapidamente.
No entanto, um crescendo de dificuldades levou a que entre 1985 e 1995 a lei não conhecesse qualquer regulamentação e que a situação de enquadramento, de defesa e de valorização do nosso património ficasse, assim, dificultada e diminuída.
Srs. Deputados, lembro que a defesa do património é objecto de um imperativo constitucional muito claro, uma vez que na alínea c) do n.º 2 do artigo 78.º da Constituição se atribui ao Estado, em colaboração com os agentes culturais, o dever de «Promover a salvaguarda e a valorização do património cultural, tornado-o elemento vivificador da identidade cultural comum».
Por sua vez, o n.º l deste mesmo artigo diz, muito claramente: «Todos têm direito à fruição e criação cultural, bem como o dever de preservar, defender e valorizar o património cultural.»
Foi por isso que o Governo, tão logo iniciou funções, proeurou trabalhar no sentido de regulamentar a Lei n.º 13/85. Acreditava-se então que isso seria possível, mas muito rapidamente se verificou que dificuldades de diversa ordem não facilitavam esse objectivo.
Por isso, na altura criou-se uma comissão com o objectivo de avaliar a situação, com a perspectiva já definida de se elaborar uma nova proposta de lei de bases, a trazer a esta Assembleia. Essa decisão foi tomada em Dezembro de 1996 e a comissão então constituída, presidida pelo Professor Sérvulo Correia, começou de imediato a trabalhar e apurou uma situação, que foi apresentada no chamado relatório intercalar, em Fevereiro de 1998, e que levou a que se destacassem alguns aspectos que conduziram às dificuldades que eu referi com a Lei n.º 13/85.
A razão pela qual essa lei deveria, do nosso ponto de vista, ser substituída por outra, tem a ver com dificuldades que se prendiam com sete aspectos nucleares: em primeiro lugar, o aspecto híbrido da lei, uma vez que ela contempla aspectos claros de uma lei de bases, nomeadamente o estabelecimento dos seus princípios, e aspectos que são claramente de índole regulamentar, que têm a ver com a vida própria de organismos, na altura como IPPC; em segundo lugar, tem a ver com a indeterminação de diversos conceitos, nomeadamente com o conceito de valor cultural; em terceiro lugar, tem a ver com a controversa constitucionalidade de algumas disposições muito referidas; em quarto lugar, tem a ver com a inoperância do regime de protecção dos bens móveis à luz do direito comunitário e dos atritos que, entretanto, isso suscitou; em quinto lugar, tem a ver com as incongruências das disposições relativas à exportação de bens culturais e às insuficiências quanto à sua restituição; em sexto lugar, tem a ver com a desadequação do regime fiscal e, em sétimo e último lugar, com a insuficiente clarificação da repartição de responsabilidades entre as Administrações Local e Central.
No entanto, o relatório intercalar não fazia só esta avaliação e não destacava só estas dificuldades, entretanto apuradas e explicitadas; o relatório intercalar, apresentado em Fevereiro de 1998, para lá do elenco destas dificuldades, fazia também o enquadramento de toda a problemática, que se alterou muito, dos últimos 15 anos do património, e propunha também um conjunto de princípios que deviam enquadrar no futuro a nova lei de bases do património.
Seguiu-se um período de discussão pública, de debate muito interessante, em que foram múltiplos, de muitos sectores e instituições, os contributos para este problema, contributos com os quais a comissão muito ganhou e que foram preciosos em relação a diversos problemas e para o seu esclarecimento e aprofundamento.
E foi assim que nasceu, a partir desse relatório e do trabalho constante da comissão até ao Verão do ano passado, a nova proposta de lei de bases que hoje se apresenta ao Parlamento.
Os Srs. Deputados conhecem a proposta de lei - ela foi distribuída - e, em síntese, diria que na nova lei de bases há 10 pontos fundamentais que gostava de destacar.
Em primeiro lugar, a definição clara do conceito de património cultural, ausente na lei de bases anterior, que é precisado também pela introdução do conceito que visa delimitar, de um modo muito preciso, o universo do património, que é a noção de bens culturais, uma definição de critérios, algo que é fundamental para a defesa do património, para a determina cão do valor cultural, e que se encontra no artigo 17.º.
Destaco também a consagração do principio da contratualização, vital para uma lei do património que se pretenda moderna e que consta do artigo 4 º. Este principio da contratualização é, justamente, um princípio que visa tornar mais eficaz e mais aberta a lei do património, visando uma articulação na acção dos vários agentes e responsáveis pelo nosso património, que não é só, como se sabe, o Estado.
Saliento ainda a criação de três formas de protecção do património, uma vez que até aqui, segundo a lei de bases em vigor, só existia uma forma de protecção, que era a classificação. Nós propomos três níveis de protecção do património: o inventário, começando, desde logo, O conhecimento do bem por ser o primeiro nível de protecção do património, a qualificação, que responde já a um conjunto de quesitos de um determinado bem; e a classificação, que se reserva para aqui-

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Io que é mais indiscutível e de um valor superior na ordem patrimonial. Esta hierarquização da protecção do património permitirá também uma maior eficácia na acção patrimonial e cruza-se, naturalmente, com três níveis: o nível nacional, o nível regional e o nível municipal.
A proposta de lei aponta também para uma menor intervenção do sector estatal, com a excepção do nível de classificação, e, por último, a clarificação das atribuições da administração central, da administração regional e da administração municipal.
Destaco ainda uma definição muito clara dos instrumentos de valorização, como consta do artigo 74.º, e a introdução de um regime diferenciado em função da natureza do bem ou da sua titularidade, como consta do artigo 99.º.
Consta também desta proposta de lei uma clarificação inovadora de direitos e deveres dos particulares e do Estado e, por fim, o que é objecto de uma proposta paralela hoje apresentada, um sistema de incentivos e de benefícios fiscais que se pensa, sem dúvida, ser mais eficaz e mais estimulante.
A estes 10 pontos acrescentaria ainda dois que completam os traços fundamentais do carácter mais inovador desta proposta.
Em primeiro lugar, a criação de regimes especiais de protecção do património. Nós passamos a ter, com está proposta de lei, regimes especiais que dizem respeito não só à arqueologia, como já existiam, mas também ao património arquivístico, ao património audiovisual, ao património fotográfico, fonográfico e bibliográfico. A consagração destes regimes especiais é vital para uma defesa alargada do património.
Por último, dá uma atenção muito particular ao património imaterial.
Esta proposta de lei de bases pode, portanto, sintetizar-se como procurando eliminar todas as convulsões que existem no diploma em vigor entre o que deve ser uma lei de bases, uma lei de grandes princípios, e as normas regulamentares que devem fazer parte da legislação de desenvolvimento a aprovar posteriormente. Caracteriza-se também por um conjunto de princípios sólidos e por uma eficaz articulação entre a administração central, as autarquias e as regiões, sendo de destacar aqui, como aspecto particular, que os poderes das autarquias são, ao contrário do que já haviam aqui referido, aumentados e clarificados.
Com este diploma há uma clara inovação ao nível das formas de protecção dos regimes especiais e da fiscalidade, que se alargam de modo muito substancial, assumindo-se, portanto, uma concepção moderna, uma concepção que resulta da experiência da anterior lei de bases, mas também da gestão do património, que é muito importante, alargando-se a uma concepção mais transversal, como os regimes especiais de protecção demonstram, uma concepção que é a única verdadeiramente moderna e actual do património.
Há, na base desta proposta de lei, uma aposta num espírito muito mais aberto e flexível do que tem a lei actual, que não deixa de ser uma lei com muito bons princípios e com uma intenção de defesa do património muito clara. Esta proposta de lei assume tudo aquilo que a lei actual tem de bom, mas também resulta de um diálogo com as autarquias, que se iniciou desde que se verificaram as primeiras dificuldades com a regulamentação da Lei n.º 13/85, de 6 de Julho, e que, de resto, deu origem a múltiplos protocolos de colaboração entre o
Instituto do Património e as autarquias. Este diálogo efectuou-se ainda com a Igreja Católica e deu origem à criação de uma comissão paritária que, de há dois anos a esta parte, vem resolvendo muitos dos problemas que surgiram no sector e também a um pacto patrimonial que foi justamente assinado entre o Ministério da Cultura, a Associação Portuguesa de Municípios com Centros Históricos e a União das Misericórdias.
Penso que esta abertura e este espírito construtivo se traduzem muito claramente na actual proposta e, naturalmente, o voto que faço é o de que o Parlamento, na discussão na generalidade e na especialidade, possa prosseguir o aperfeiçoamento da lei, uma vez aprovada, porque, certamente, há muitos aspectos a melhorar. Isto de modo a que seja possível, desta vez, no espaço de um ano, que é o que a proposta de lei prevê, constituir um efectivo código do património, ou seja, de modo a que seja possível que os diplomas de desenvolvimento, nesse espaço de tempo, se venham juntar a esta lei de bases, num todo harmónico, num todo sistemático que, efectivamente, possa garantir a defesa do património.
Penso que estamos hoje num período e num momento em que, na área do património, há um consenso muito alargado, um acordo profundo ao nível dos princípios entre todos os proprietários intervenientes e os principais responsáveis pelo património a nível nacional - os municípios, o Estado central e a Igreja Católica -, mas em que há também uma grande sintonia nos procedimentos e uma grande convergência nos objectivos.
Penso que esta proposta de lei procura traduzir este espirito e procura servir melhor o nosso património, fazendo-o de um modo mais eficaz e, sem dúvida, mais ousado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr Ministro da Cultura, os Srs. Deputados António Brochado Pedras, Joaquim Sarmento, António Braga e Medeiros Ferreira.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Brochado Pedras.

O Sr. António Brochado Pedras (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Cultura, do nosso ponto de vista, a proposta que o Governo apresentou à Assembleia aparece eivada de alguma estatização, já que notámos que há uma dicotomia entre o preâmbulo e o articulado, entre a teoria e as normas. É evidente que esta proposta ultrapassou, como já a Lei n.º 13/85 tinha ultrapassado, aquela ideia de que o cidadão é visto como um potencial inimigo do património. Dir-se-á que hoje é um parceiro do Estado, que é tido como um colaborador, mas ainda não como um sujeito activo de corpo inteiro, parecendo-nos que esta circunstância, porventura, poderá ter 6 efeito de afastar os cidadãos da colaboração necessária com o Estado nesta matéria do património cultural
Não pensa V. Ex.ª, Sr. Ministro, que esses resquícios de estatização que ainda existem, e que são de alguma monta, poderão evitar o enraizamento na sociedade desta consciência patrimonial que todos desejamos e que, certamente, o próprio Governo também deseja? Esta é a primeira questão.
A segunda questão prende-se com a extinção da Direcção-

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Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais. Trata-se do organismo que, em Portugal, e nos últimos 70 anos, tem feito algo de importante no que diz respeito à conservação dos edifícios. De facto, esta proposta, pura e simplesmente, de uma penada, extingue a única instituição que tem sido utilíssima na questão da conservação dos monumentos nacionais. Pergunto se V. Ex.ª não pensa que é um perigo acabar com este organismo, quando se sabe que o IPPAR, que a vai substituir, tem sido acusado por variadíssimas instituições de nada ter feito no que diz respeito à conservação dos edifícios e monumentos nacionais.
Por outro lado, parece-nos que a proposta passa ao lado da questão, que pensamos ser fulcral, da necessidade de existirem cartas de risco para situações de catástrofe ou de conflito armado, o mesmo se passando em relação às acções coordenadas Estado/sociedade civil em situações de emergência. V. Ex.ª não pensa que esta matéria também deveria merecer uma maior atenção do diploma?
Finalmente, refiro a questão do plano esquemático de um código do património cultural. Sei que a comissão que produziu o relatório intercalar também se obrigou, na última fase, a produzir um projecto de código do património que reunisse toda ou a principal regulamentação necessária para o desenvolvimento desta proposta. Por que razão é que, no fim do trabalho desta comissão que produziu o relatório - trabalho que tenho de salientar como positivo -, não se produziu um projecto de código do património cultural?

O Sr. Presidente:- Agradeço que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - Já coloquei as quatro questões e agradecia que o Sr. Ministro da Cultura me respondesse.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Cultura.

O Sr. Ministro da Cultura: - Sr. Presidente, Sr. Deputado, tenho todo o prazer em procurar responder às suas questões, apesar de o modo como foram formuladas não facilitar a resposta.
Em relação às duas primeiras questões, que são as fundamentais, devo dizer, antes de mais, que penso que esta proposta traduz uma alteração substancial, como, de resto, penso que reconheceu, no sentido de flexibilizar muito a lei do património e os seus objectivos, diminuindo aquilo que tem sido muitas vezes referido como - apesar de não gostar do «chavão» - o aspecto estatizante desta lei.
O Sr. Deputado fala de resquícios de estatização, mas não deu qualquer exemplo. Eu responderia mais facilmente se o Sr. Deputado pudesse dar um, dois ou três exemplos de resquícios - para usar a sua expressão - de estatização constantes do diploma.
Em relação ao segundo aspecto, fico perplexo, porque o Sr. Deputado fala da extinção da DGEMN e eu não sei de onde pode vir essa ideia. Também lhe agradecia que me dissesse em que ponto desta proposta de lei de bases é declarada a extinção da DGEMN, uma vez que esta proposta não Ma com grande cuidado - ao contrário da anterior que, em boa parte por isso, inviabilizou a sua regulamentação - de qualquer organismo de qualquer ministério. Portanto, e a menos que tenha lido o que não está cá, gostava que o Sr. Deputado me dissesse onde é que leu algo sobre a extinção da DGEMN.
Já agora, e porque sei que este é um ponto que preocupa os Srs. Deputados, gostava de esclarecer o seguinte: nós temo-nos batido por uma gestão integrada do património e temos conseguido fazê-lo, tendo dado passos importantes neste sector no decurso da actividade dos últimos anos. Foi isso que profiramos fazer ao clarificar, com a Lei Orgânica do IPPAR, a nova Lei Orgânica do IPPAR, as responsabilidades deste instituto, a sua articulação de trabalho com a DGEMN e, inclusivamente, com a Direcção-Geral do Património do Ministério das Finanças, que são os três organismos do Estado que têm responsabilidades no sector do património. Mas fazemo-lo com a ideia muito clara de que o património e as obras públicas são coisas diferentes, Sr. Deputado, e com a ideia de que a tutela dos imóveis afectos é, como consta da lei orgânica, naturalmente, uma tutela do IPPAR.
No decurso dessa lei orgânica, que o Sr. Deputado certamente conhece, e que remete claramente para a Lei Orgânica da DGEMN, que está em vigor, há inclusivamente uma colaboração que é consagrada anualmente, por despacho conjunto dos Ministros do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território e da Cultura. Recentemente, esse despacho conjunto foi feito para o ano em curso, para o conjunto de obras de essência patrimonial, que são desenvolvidas pela DGEMN, com o acordo do IPPAR.
Portanto, se o Sr. Deputado puder esclarecer onde é que estão, na lei, estes dois pontos, por um lado, exemplos de resquícios de estatização e, por outro, onde é que se fala e onde é que se prevê a extinção de qualquer organismo, eu também lhe ficava reconhecido e poderia, talvez com mais detalhe, poder responder-lhe.
A terceira questão remete para a legislação de desenvolvimento. E a questão do código, não sei se foi ou não assumida quando foi elaborada a anterior lei, acho que é uma obrigação de quem tem a responsabilidade desta legislação a ideia de sistematicidade da legislação sobre o património. Enfim, posso assumir o compromisso de que essa legislação se faça num ano, como estabelece esta lei, uma vez aprovada pelo Parlamento, se merecer a sua concordância.

Vozes ao PS:- Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Sarmento.

O Sr. Joaquim Sarmento (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Cultura, Sr.ª e Srs. Deputados, a proposta de lei que hoje aqui se discute é, no meu entender, o corolário, ao nível legislativo, do esforço que este Governo e o Ministério da Cultura têm devotado ao património, não numa matriz meramente monumental mas numa concepção mais ampla, abrangendo todos os bens materiais e imateriais portadores de interesse cultural relevante.
Nessa perspectiva, e porque os factos não desmentem, destacaria a autonomização da política arqueológica, a criação do Parque Arqueológico do Vale do Côa, o sucesso do processo de candidatura do Vale do Côa a património mundial, um conjunto de intervenções do património para o período de 1996/1999, no valor de 23 milhões de contos, salientan-

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do a recuperação e valorização dos Conventos de Mafra, de Santa Clara-a-Velha, Mosteiros de Alcobaça, Tibães, Pombeiro, Tarouca, Grijó, entre outros, a assinatura que o Sr. Ministro referiu na sua intervenção de um pacto patrimonial entre o IPPAR, a Associação Portuguesa dos Municípios com Centros Históricos (APMCH) e a União das Misericórdias e também destacaria o lançamento do programa de apoio à rede de arquivos municipais, numa política de gestão integrada do património.
Sr. Ministro da Cultura, tem V.Ex.ª interpretado correctamente o conceito constitucional de cultura que abrange seguramente tradição e património, o que exige, por um lado, a preservação da tradição e, por outro, a promoção inovadora da criação e fruição cultural por parte do Estado e de outras estruturas autónomas. Daí, a apreciação positiva que fazemos da sua actuação à frente do Ministério da Cultura. Fez V. Ex.ª muito mais em três anos em prol do património, para não falar no âmbito do livro e da leitura, na criação, nas artes, no teatro, no cinema, no audiovisual, na descentralização e internacionalização da cultura portuguesa, do que o Governo anterior em 10 anos de mandato.
Nós, os socialistas, orgulhamo-nos de colocar a cultura e o debate ideológico como patamares primordiais da consciencialização humana. A presente proposta de lei é, assim, no nosso entender, o complemento desse esforço e de uma filosofia humanista, assumindo-se tal proposta como uma futura lei estruturante de todo o património cultural, com a qual se pretenderam colmatar omissões e lacunas que a Lei n.º 13/85, de 6 de Julho, foi revelando progressivamente, desajustada que está às novas realidades e exigências da vida contemporânea.
Por conseguinte, Sr. Ministro da Cultura, impõe-se que lhe coloque duas questões. Primeira: quais os bloqueios que a lei actual apresenta, do ponto de vista da sua regulamentação e que resolução V. Ex.ª entende que a presente proposta traz? Segunda questão: de que modo esta lei dá continuidade ao esforço que o Ministério da Cultura tem feito, no sentido de assegurar uma gestão integrada do património?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Cultura.

O Sr. Ministro da Cultura: - Sr. Presidente, Sr. Deputado, começando por agradecer as suas palavras e as questões que colocou, eu diria, em relação à primeira questão, que uma lei de bases que o seja, que não tenha o carácter híbrido da actual lei de bases, facilita, desde logo, a sua posterior regulamentação que, de resto, está sendo desde já preparada para que os timings previstos se possam cumprir.
Em relação ao segundo ponto, que também foi focado há pouco pelo Sr. Deputado António Brochado Pedras, gostaria de lembrar o seguinte: a clarificação de uma gestão integrada do património, uma vez que este problema tem surgido, não se traduz nunca, não se deve traduzir nunca e não deve assumir nunca qualquer forma de conflito, de atrito, entre os serviços da Administração Pública. Temos de saber, claramente, quem são os organismos responsáveis por uma política do Estado; temos de definir, na orgânica desses serviços, quais são as suas competências e assumi-las sem qualquer problema.
Uma vez que esta situação foi avaliada - e tem sido avaliada várias vezes -, podíamos ter decidido pela alteração, eliminação de diversos organismos, mas, pelo contrário, decidimos que a boa solução de uma gestão articulada, unificada e integrada do património passava por uma articulação na acção patrimonial, na acção de defesa e valorização do património. Por isso é que, como referi há pouco, a lei orgânica do IPPAR, entretanto aprovada, consagra justamente essa articulação, particularmente com a DGEMN, mas também com a Direcção-Geral do Património do Estado, no que diz respeito à lista dos imóveis afectos que são classificados. No que diz respeito à DGEMN, consagra-se, através de um despacho conjunto anual, que é o Instituto Português do Património, que é aquele que tem a responsabilidade dos imóveis classificados, que patrocina, enquadra e autoriza as intervenções que a DGEMN faz, uma vez que esta, só numa parte do seu orçamento, de resto bastante insignificante no seu conjunto, se dedica a património classificado.
Portanto, esta articulação na acção que está a funcionar no presente e que decorre do despacho conjunto, que certamente o Sr. Deputado conhece, é aquela que me parece que tem futuro. Não são guerras de serviços, é a sua superação na acção em proveito do nosso património.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, antes de mais, gostaria de saudar o Governo, nomeadamente o Ministro, pela coragem em ter rompido com a situação de existência de uma lei que, na prática, não existia. Em vez de procurar soluções de regulamentação, aliás, muito difíceis e nunca encontradas por outros, o Governo teve a coragem de avançar - e o Sr. Deputado Manuel Frexes sabe que é verdade! - com uma lei, que é preciso dizer que é notável do ponto de vista do levantamento que faz e da sinalização do fundamental no que respeita à classificação, à valorização e protecção do património.
Gostaria, pois, de dar nota do documento que temos aqui hoje, que é, de facto, muito importante.
Contudo, Sr. Ministro, a abordagem feita nesta proposta de lei do papel das autarquias - e sei que não é esse nem o pensamento, nem o Programa do Governo o diz - é que, enquanto na lei actual, a autarquia tem capacidade, como sabe, para classificar ao nível local, nesta proposta de lei esse papel da autarquia desaparece. Por isso é que digo que o Governo e o Ministro não têm uma visão conspirativa do poder local, não têm uma visão desconfiada quer da intervenção, quer da capacidade quer da competência do poder local. Contudo, gostaria que o Sr. Ministro explicitasse aqui, um pouco melhor, qual é o papel que entende reservado às autarquias no contexto desta proposta de lei.
Sei que, em sede de especialidade, teremos ocasião de aprofundar, e provavelmente «iluminai», melhor esta ideia, que pode não estar bem transparecida do ponto de vista de uma leitura externa, mas era importante conhecermos isso, porque este é um documento que merece que essa «iluminação» seja feita para completar essa visão de enquadramento

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e de salvaguarda do património, que pela primeira vez é feita com esta especialização e com uma clara vontade política de investir, quer em meios, quer em estruturas, quer, acima de tudo, também, em princípios e em metodologias que levem a esse fim.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Cultura.

O Sr Ministro da Cultura: - Sr. Presidente, Sr. Deputado, como referiu, até aqui, as autarquias podiam classificar e, agora, refere que deixam de o poder fazer. Não é o caso. E não é o caso pelo seguinte: nós introduzimos aqui uma distinção entre três níveis de protecção.
Segundo esta proposta, a classificação que se reporta apenas a monumentos nacionais, passa a existir para dois outros níveis, o do inventário e o da qualificação. Portanto, passa a haver uma equivalência entre o interesse concelhio e a qualificação a nível municipal. Assim, as autarquias passam, a partir de agora, nesta nova terminologia, a qualificar, mas também não se está a imaginar que, uma vez que se reporta apenas a monumentos nacionais, pudesse ser a autarquia a classificar o monumento nacional. É preciso ver a nova lógica global que se introduz e, sobretudo, as suas consequências, porque as autarquias podiam fazê-lo. Mas peço ao Sr. Deputado que me dê o exemplo de uma classificação feita até hoje por uma autarquia. Se o Sr. Deputado me puder dar um único exemplo, que resulte da lei de 1985, em que uma autarquia tenha classificado, fico agradecido, porque não houve nenhum nestes últimos 14 anos.
E não houve nenhum, porquê? É isso que tem interesse compreender, ver qual foi o enquadramento que levou, apesar dessa possibilidade legal, a que isso nunca acontecesse. Para o que chamo a atenção é para a nova estratégia global e para a nova tipologia que se introduz, que, justamente, penso fazer aumentar os poderes das autarquias, definindo quando o seu poder de classificação, neste caso de qualificação, e o âmbito em que isso pode acontecer. Esta preocupação de articulação da administração central com os municípios, que será depois ouvida a nível da regulamentação, é claramente assumida em vários artigos. Eu destacaria, em particular, o artigo 98.º, em que se diz que «As regiões autónomas e os municípios comparticipam com o Estado na tarefa fundamental de proteger e valorizar o património cultural do povo português, prosseguida por todos como atribuição comum, ainda que diferenciada (...)» - e esta diferenciação parece essencial - «(...) nas respectivas concretizações e sem prejuízo da discriminação das competências dos órgãos de cada tipo de ente».
Penso que é esta lógica de diferenciação, de adequação de diversos níveis a diversos tipos de património que está na raiz desta proposta e que se adequa à diferenciação que existe no património, uma vez que todos reconhecemos que o património, normalmente classificado como concelhio é diferente do património classificado como monumento nacional.
Por isso, introduzimos para a classificação a reserva de ser a administração central a fazer, quer ao nível dos monumentos nacionais, se for um património móvel, quer aquilo que se designa, com esta proposta de lei, por «os tesouros nacionais», no caso de ser património móvel.
Sr. Deputado, esta estratégia que a proposta da lei de bases assume parece-me mais hábil, mais adequada e, sobretudo, mais eficaz.

O Sr. Presidente: - Para um último pedido de esclarecimento ao Sr. Ministro, tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Cultura, em primeiro lugar, deixe-me felicitá-lo pela apresentação do diploma. Trata-se de uma proposta de lei de bases, mas não posso deixar de lhe pedir alguns esclarecimentos, na minha qualidade de Deputado eleito pelo círculo eleitoral dos Açores.
Como sabe, há uma discussão pública na Região Autónoma dos Açores desta proposta de lei de bases. A Assembleia Legislativa Regional dos Açores já se pronunciou sobre este mesmo documento, através de um parecer da sua Comissão de Assuntos Sociais, indicando, como o Sr. Ministro certamente tem conhecimento, algumas omissões que tornam esta proposta motivo de polémica pública nos Açores, nomeadamente através da televisão e da imprensa.
Por isso, pergunto ao Sr. Ministro se tem conhecimento destas questões, levantadas na Região Autónoma dos Açores, e se, como creio que sabe, não veria com bons olhos que, em sede de especialidade, pudéssemos tentar eliminar todos esses motivos de polémica que, hoje em dia, atravessam a sociedade açoriana.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Cultura.

O Sr. Ministro da Cultura: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Medeiros Ferreira, lamentavelmente tenho de reconhecer que não me foi comunicado qualquer aspecto dessa polémica que refere e, portanto, não estou em condições de me poder pronunciar sobre ela.
De qualquer modo, penso que posso antecipar um pouco alguns aspectos das preocupações que levanta e que, certamente, estão na linha de algumas preocupações que tem havido nos Açores com a questão do património e revelar a minha abertura para que, na especialidade, sejam consideradas. Mas, efectivamente, não me foi comunicada qualquer posição sobre esta matéria.

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra, para uma intervenção, ao Sr. Deputado António Brochado Pedras, pergunto ao Sr. Deputado Medeiros Ferreira se quer usar da palavra, uma vez que, julgo, a pediu.

Pausa.

Como parece que não quer intervir, dou a palavra ao Sr. Deputado António Brochado Pedras para uma intervenção.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra

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O Sr Presidente: - Sr Deputado Medeiros Ferreira, eu perguntei-lhe se queria usar da palavra mas, como estava a falar com o Sr. Deputado Octávio Teixeira, não me ligou nenhuma.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Mas olhe que é uma excepção na minha vida, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Eu admito isso.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Estou sempre atento ao que o Sr. Presidente diz.

O Sr. Presidente: - Eu admito isso. Mas aconteceu! O Sr. Deputado quer usar da palavra para que efeito?

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, é só paia esclarecer o Sr. Ministro e V. Ex.ª...

O Sr. Presidente: - Mas quer usar da palavra para que efeito?

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Para fazer uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, a minha interpelação vai no sentido de saber se V. Ex.ª deu, ou não, conhecimento ao Sr. Ministro da Cultura do parecer da Comissão Permanente de Assuntos Sociais da Assembleia Legislativa Regional dos Açores, datado de 3 de Março de 1999.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (António Costa): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, é para, sob a figura regimental da interpelação à Mesa, informar que o Governo não recebeu qualquer comunicação relativa a esse parecer da Assembleia Legislativa Regional dos Açores.

O Sr. Presidente: - Fica prestado o esclarecimento. Agora, sim, dou a palavra ao Sr. Deputado António Brochado Pedras.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, posso interpelar a Mesa?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a figura regimental da interpelação não dá para tanto, mas faça favor.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, como este parecer foi dirigido a V. Ex.ª, Sr. Presidente da Assembleia da República, perguntava-lhe se poderia enviá-lo ao Governo.

O Sr. Presidente: - Com certeza! Terei muito gosto nisso!

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Muito obrigado.

O Sr. Presidente: - Mas também não tenho a certeza absoluta de o ter recebido. Não juro, mas admito que sim.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr Deputado António Brochado Pedras.

O Sr António Brochado Pedras (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs Deputados: Antes de iniciar a minha intervenção, julgo que seria mais útil começar por responder às questões que o Sr. Ministro da Cultura me colocou, embora eu esteja aqui mais para ser esclarecido do que para esclarecer o Sr. Ministro. No entanto, não quero furtar-me a dar-lhe a resposta que merece, porque colocou-me, de facto, uma questão que, julgo, deveria ser do seu inteiro conhecimento.
Se V. Ex.ª compulsar os artigos 46.º, n.º 3, e 52.º, no articulado da proposta de lei do Governo, e os confrontar com a Lei Orgânica da Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, facilmente verá que, se não for introduzida uma ressalva que diga, porventura,«(...) os imóveis classificados ou em vias de classificação, quando fora das competências específicas dos organismos da administração central (...)», esta entidade é, pura e simplesmente, extinta. Sr. Ministro, não tenha qualquer dúvida, porque eu, pessoalmente, não tenho!
Portanto, julgo que V. Ex.ª deveria debruçar-se, juntamente com os seus serviços jurídicos, para que esta questão fosse estripada definitivamente do articulado da proposta de lei.
Por outro lado, V. Ex.ª também me inquiriu sobre resquícios de algum estadualismo e eu apontava os casos dos artigos 46.º, 47.º, 52.º e 60.º, n.º 2.º primeiro e o terceiro tratam da autorização estadual ou regional autónoma em relação a obras de conservação ou até intervenção em obras ou monumentos nacionais; o segundo de obras de conservação obrigatória; e o quarto de depósito compulsivo de móveis. Estou absolutamente crente de que, quer num caso, quer noutro, VV. Ex.as têm aí um exemplo acabado do que são resquícios de estadualismo.
Entrando, agora, na intervenção propriamente dita, gostaria de dizer o seguinte: para o Partido Popular esta proposta de lei de bases não evoluiu do ponto de vista conceptual. E digo isto porquê? Em primeiro lugar, porque as cartas e os tratados internacionais permaneceram neste período praticamente os mesmos e não se abrem portas para os novos conceitos.
Apesar de proclamações teóricas que são feitas no preâmbulo, verificamos que não se dá muita consequência a princípios como este do alargamento do património para fora de uma estrita esfera cultural, para que se entenda antes o património como um meio de desenvolvimento social e económico.
Por outro lado, a visão do património como um factor de desenvolvimento e de investimento crescente, mormente no que diz respeito à educação e formação de técnicos e a mão-de-obra especializada, também não nos parece devidamente tratado no articulado desta proposta de lei. Pouco ou nada se mudou em relação à Leia n.º 13/85.

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Há, em todo o caso, um fenómeno que nos parece novidade e em relação ao qual também entendemos que a proposta de lei deveria dar uma resposta adequada. Quero referir-me à diferente atitude do poder local em relação ao património cultural.
De facto, vemos que os municípios têm demonstrado preocupações crescentes com a sua identidade cultural especifica e nós saudamos este comportamento novo. Os municípios têm reivindicado, crescentemente, apoio ao desenvolvimento e salvaguarda do património construído e à revitalização do seu património. Lembro, por exemplo, o caso dos centros históricos que, por todo o lado, começam a ser objecto - felizmente! - de medidas que eram urgentes. Ora, julgo que o Estado, em relação a este facto novo, tem obrigação de demonstrar um apoio inequívoco, um apoio multidisciplinar, um apoio transversal, um apoio formativo e informativo e menos executivo. Julgo que se deveria ter acentuado e consagrado normativamente a tendência para a auto-suficiência e para a capacidade de gestão locais.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Não se compreende que, numa altura em que era preciso descentralizar, este diploma tenha sido tímido, mas muito tímido,, nestas matérias que se prendem com dar mais meios humanos, técnicos e materiais aos municípios.

Vozes do CDS-PP. - Muito bem!

O Orador: - Julgo que seria também de exigir da administração central uma maior agilidade operativa, uma maior contratualização. Embora saudemos o princípio geral da contratualização, julgamos que se poderia ter ido mais além.
O programa que o Governo propõe nesta proposta de lei revela alguma confusa assimilação de conceitos e também algumas incoerências e contradições. Em que se traduzem tais contradições? Por um lado, prevê-se que uma autarquia possa celebrar acordos para efeito da prossecução de interesses públicos na área do património cultural - veja-se o artigo 4.º -, e não se lhe atribui sequer capacidade para classificar um bem cultural - veja-se o artigo 99.º; por outro lado, não se compreende a capacidade de uma autarquia celebrar acordos e que essa mesma capacidade seja incompatível com a falta de autonomia para pregar uma tábua ou sequer apertar um parafuso num imóvel classificado como de interesse nacional ou regional.
A confusão de que falava prende-se com os conceitos de classificação e qualificação. Apelo a V. Ex.ª, Sr. Ministro da Cultura, para que compulse o artigo 19.º, onde é introduzida uma nova figura - a figura da qualificação. E essa figura é justificada por se entender que quando «determinado bem se mostre possuidor de eminente valia cultural, mas para o qual a classificação se mostre desproporcionada», então, seria de optar por esse conceito novo.
Sem qualquer outra norma, sem qualquer critério, pergunto a V. Ex.ª, Sr. Ministro, como é que um bem classificado de interesse regional está acima de um bem qualificado de interesse nacional. Como é que se poderão distinguir estes dois conceitos no caso vertente, se não houver uma clarificação de conceitos?
Por outro lado, quero chamar a atenção de V. Ex.ª, Sr. Ministro, para a arbitrariedade no que respeita a prazos quanto ao procedimento de classificação.

Vozes do CDS-PP: - Bem lembrado!

O Orador: -É dito que um ano é o estritamente necessário, segundo a lei, para a conclusão do processo de classificação a partir do acto de decisão do IPPAR que determinar a abertura do processo. Isto, no fundo, quer dizer simplesmente o seguinte: entre o momento em que um cidadão ou uma instituição solicita a classificação de um imóvel, seja para travar uma destruição, seja para uma situação de emergência, seja mesmo para uma situação que não implique qualquer urgência, e o acto de decisão estatal de abertura do processo pode haver muito tempo, podem até mediar anos, não há nada na proposta de lei que obrigue a que, após um pedido de um cidadão, o Governo tenha um prazo de um ano estritamente medido e não mais do que isso. A manter-se o normativo legal, pode crer V. Ex.ª, Sr. Ministro, que poderão mediar vários anos entre um pedido de classificação de um particular e a decisão que, depois, o Governo toma.
Já disse também há pouco, na pergunta que coloquei a V. Ex.ª, Sr. Ministro da Cultura, que este diploma, pura e simplesmente, extingue a Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, e expliquei porquê. Julgo que um organismo que. tem 70 anos de existência, que tem milhares de intervenções realizadas, que tem um know-how invejável, com estruturas e equipas consolidadas no terreno, adaptado à evolução das ideias e métodos de intervenção; um organismo que criou um inventário do património arquitectónico, que está disponível na Internet e que não é salvaguardado aqui no articulado do diploma; um organismo que criou um arquivo e fontes documentais do património arquitectónico; um organismo que publicou a revista Monumentos, que desenvolveu o Projecto Carta de Risco, que tem 100 intervenções de obras, de uma forma genérica, no património por ano, obras que são maioritariamente de conservação e de manutenção, de custos relativamente baixos... É claro que não ignoro que estas obras são aquelas que não dão nas vistas, que não são mediáticas, que não puxam inaugurações! Eu sei isso, Sr. Ministro! Mas são estas obras que fazem falta ao património construído português!
O IPPAR não tem vocação nem competência técnica para este tipo de intervenções.
Acresce que a cada vez maior aproximação do património construído ao domínio social e económico, em detrimento do cultural, desaconselha a mudança de um organismo como esta Direcção-Geral para a área da cultura.
Por isso a destruição da Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, como um corpo técnico e operativo, significa para o Partido Popular um grave risco para o património histórico e cultural.
Não quero também deixar de salientar que o Estado assume o direito/dever de salvaguardar e valorizar o património cultural, garantindo a sua fruição por todos. Isto está dito claramente na lei. No entanto, do nosso ponto de vista, deve também o Estado reconhecer que não é a única entidade com esse direito/dever. Aos cidadãos e às instituições tem de, a uns e outros, assistir também o direito e o dever de ser agente

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activo na preservação e valorização do património cultural, assumindo, igualmente, a responsabilidade que lhes possa caber na inventariação do mesmo com apoio e colaboração do Estado, que deve ter acesso a todos os dados em condições a acordar.
O cidadão, Sr. Ministro, ainda não é visto como agente principal nem como protagonista desta política do património cultural. Antes de coagir - e eu mostrei a V. Ex.ª que há normas neste diploma que coagem de uma maneira que considero inadequada -, o Estado tem de ser modelar.

Vozes do CDS-PP: - Bem lembrado!

O Orador: - Por outro lado, gostaria de chamar a atenção para a necessidade de desenvolver princípios, como o da subsidiariedade. O Partido Popular defende a necessidade de aprofundar este princípio.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradeço que abrevie.

O Orador: - Não vou demorar muito mais, Sr. Presidente.
Deve ser aprofundado o princípio segundo o qual, nas suas relações com as instituições e com os cidadãos, o Estado deve promover as condições que facilitem o cumprimento das responsabilidades daquelas e destes e intervir apenas na medida em que alguns deles não sejam capazes de respeitar e de orientar a defesa do seu património. Do nosso ponto de vista também, a defesa e conservação do património cultural privado compete, em primeira linha...

O Sr. Presidente: - Tem mesmo de terminar, Sr. Deputado. Já ultrapassou muito o seu tempo.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Compete, em primeira linha, aos proprietários e possuidores e só subsidiariamente ao Estado tratar do património. Em relação ao financiamento, também o Estado deve contribuir generosamente para que as instituições privadas e os cidadãos possam defender e preservar o património.
Não quero terminar, Sr. Presidente - e peço mais l minuto para salientar os aspectos positivos...

O Sr. Presidente: - Um minuto é muito tempo, Sr. Deputado! Faça favor.

O Orador: - Sr. Presidente, não queria deixar aqui a nota de que a oposição é só para dizer mal.
Muito rapidamente, eu diria que esta lei tem, de facto, aspectos positivos: o claro reconhecimento de que os cidadãos e as entidades privadas podem ser legítimas proprietárias e possuidoras de bens culturais; o reconhecimento de que a salvaguarda e a protecção dos bens culturais não implica a sua estatização, embora essa atitude seja relativizada pela excessiva amplitude da intervenção do Estado e de outros agentes públicos; o princípio da contratualização, de acordo com o qual são admitidos acordos entre o Estado e outras entidades detentoras de bens culturais, acordos estes, ou contratos, que nos parecem fundamentais para travar intervenções arbitrárias.
E não diria muito mais. Julgo que houve alguns avanços em relação à lei de bases de 198 5, que há muito a rectificar, mas o Partido Popular vai ponderar, muito seriamente, tudo quanto for dito neste debate, sobretudo a posição que o Sr. Ministro vier a ter aqui perante todas as dúvidas que eu exprimi

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, acabo de descobrir, com alguma surpresa, porque não fui advertido deste facto durante o debate, que o parecer que aqui foi referido pelo Sr. Deputado Medeiros Ferreira se encontra no processo! Bom, se se encontra no processo, deveria ser, teoricamente, do conhecimento de todos os Srs. Deputados ou, pelo menos, dos Srs. Deputados membros da comissão competente. Mas, na dúvida e como teremos de votar amanhã esta matéria, e o Sr. Ministro não o conhece, acabo de despachar no sentido de ser distribuída uma fotocópia do parecer pelo Sr. Ministro e por todas as bancadas. Fica assim preenchido este dever de informação.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: A Assembleia tem hoje em debate uma proposta de lei que pretende estabelecer as bases da política e do regime de protecção e valorização do património cultural. E sendo este o objecto da proposta de lei não é, no entanto, concretizado ao longo dos artigos que substantivam o texto em análise. Não são visíveis as bases da política que visam o património cultural, não são eficazes nem eficientes as medidas propostas de protecção e valorização desse mesmo património e, por último, o património cultural é, fundamentalmente, entendido como um reservatório de coisas e não como um reservatório de memórias essenciais e factos de progresso e desenvolvimento do povo português.
Estamos perante uma proposta de lei que fica muito aquém das necessidades quer pela fragilidade conceptual que evidencia quer pelo carácter excessivamente generalista em que aposta.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - A ausência de uma discussão pública inviabilizou que a pluralidade dos saberes adquiridos por associações, instituições, personalidades de mérito reconhecido na matéria e por cidadãos de uma forma geral lhe tivessem incutido, naturalmente, um valor acrescentado. Os múltiplos pareceres que se tornaram públicos não se construíram sobre a proposta de lei, por mais paradoxal que isso pareça, mas resultaram do conhecimento de um relatório intercalar, esse, sim, objecto de discussão pública e que, erradamente;, se subtitulava «proposta de lei bases do património cultural».
Cito, por exemplo, o parecer da Associação Portuguesa das Casas Antigas, dirigido a todos os grupos parlamentares: «Como o próprio relatório acentua é no desenvolvimento legislativo (...) que se colocam opções legislativas quê pó-

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dem ser controversas; (...) só na fase do articulado é que surgirão plasmadas as escolhas que neste momento se traduzem em desenvolvimentos doutrinários de princípios constitucionais.» O relatório, continuo a citar: «quase esquece os arquivos, museus e bibliotecas (...); só o património arquitectónico e arqueológico mereceram atenção (...); o relatório parece não dar atenção às particularidades suscitadas pelo enquadramento natural e paisagístico dos bens culturais e imóveis, nomeadamente parques e jardins.»
Cito, ainda, o Dr. Elísio Sumavielle que, num artigo do semanário Expresso, em Maio de 1988, afirmava: «A actual lei talvez não desmerecesse uma revisão e um desenvolvimento transversal mais facilmente consensualizáveis (...); no relatório em questão não se vislumbra uma nova lei e, como alternativa ao sistema em vigor, pouco ou nada se encontra de inovador. E assim, quanto ao sentido da futura proposta de lei, permanecemos no denso nevoeiro; (...) só por vaidade ou estultícia se poderá pretender que uma nova lei de bases do património cultural redima as contradições e as carências existentes no sector, por qualquer milagrosa e momentânea unicidade redentora.»
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr." e Srs. Deputados: Muitos outros exemplos poderiam ser dados mas todos mantém o mesmo traço. Desconhecendo o conteúdo da proposta de lei, os muitos interessados na discussão pública, que não existiu, propõem-se descobrir no relatório intercalar os indícios, os vestígios que irão constituir a arquitectura do texto/proposta e relativamente ao qual têm opiniões que advêm do saber, da experiência e do trabalho realizado em prol do património.
Se confrontarmos esta decisão do Executivo de apresentar à Assembleia da República uma iniciativa legislativa sobre o património cultural com o Programa deste Governo na área da cultura, não se entenderá, porque eram outras as propostas apresentadas. Propunha-se o aperfeiçoamento e a regulamentação da Lei n.º 13/85 e proponha-se também a aceleração e sistematização do inventário do património cultural móvel.
Daí que o relatório intercalar tenha sido entendido - quase por todos - como documento preparatório de uma actualização e regulamentação da lei que visasse a sua operacionalidade. Até porque só um decreto-lei de desenvolvimento foi publicado nestes últimos 15 anos e visa, concretamente, o património subaquático. Tudo o resto ficou por fazer!
Não se regulamentaram as normas concretas de associar as populações às medidas de protecção, de conservação e de fruição do património cultural, que estava previsto no artigo 3.º, por exemplo, não se fixaram os critérios genéricos de classificação, que estava previsto no artigo 10.º; não se esclareceu o procedimento de classificação de imóveis de «valor cultural» por parte das regiões autónomas e das assembleias municipais e dos termos da intervenção do Ministério da Cultura no respectivo procedimento, que estava previsto, como sabem, no artigo 26.º; não promoveu o Governo a regulamentação da compra, venda e comércio de antiguidades e outros bens culturais móveis e, simultaneamente a fiscalização do seu cumprimento, que estava previsto no artigo 31.º. Estas são só algumas das matérias que ficaram à espera do desenvolvimento e da regulamentação.

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Bem podem esperar!

A Oradora: - Perante esta incapacidade de operacionalidade da Lei n.º 13/85, por parte de todos os governos, o mínimo que se exigia, relativamente à proposta agora em debate, é que ela fosse capaz de suprir as lacunas existentes e de propor, 15 anos depois, um quadro conceptual actualizado e propostas inovadoras susceptíveis de pôr cobro à degradação do nosso património cultural, porque a situação exige, mais do que instrumentos legislativos, vontade política para salvar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Salvar os centros históricos que não resistem à pressão urbanística desqualificada e à especulação imobiliária; salvar os monumentos, mesmo os classificados, que se degradam porque os técnicos de prevenção e restauro são poucos e sem meios para actuar; salvar os museus que lutam com falta de verbas para salvaguardar os seus espaços e as suas colecções; salvar os bens móveis que desaparecem das igrejas e das pequenas capelas, sem haver, sequer, o mínimo registo descritivo que permita a sua recuperação. E só se pode salvar, proteger e conservar aquilo que se conhece. E só se conhece, se estiver devidamente inventariado. E o inventário dó património nacional contínua por fazer, sendo, no entanto, o mais eficaz instrumento de controlo das existências, salvaguarda dos bens e combate efectivo ao comércio clandestino de obras de arte e à mercantilização da cultura. Sem inventário, não faz sentido a criação de uma nova lei do património cultural.
Portugal é o único pais da Europa comunitária que não foi capaz, até hoje, de definir as suas próprias doutrinas de inventário e de o realizar. E esta questão só se resolve, na nossa opinião, com uma autonomização do sector de inventariação, em nome da gestão integrada na área cultural, com o Estado a assumir de vez as suas prerrogativas, harmonizando acções interministeriais da cultura, do ambiente, do plano e das finanças e junto das autarquias, da Igreja, dos privados ë demais detentores de bens patrimoniais.
Mas, voltando à proposta de lei em debate, ela não evolui relativamente à lei em vigor, ela não incorpora os novos conceitos que já constituem matéria de discussão em reuniões internacionais e que implicam uma visão de património mais abrangente, tornando-o instrumento de desenvolvimento social e económico.
Sr. Presidente Srs. Membros do Governo, Sr.ªs Srs. Deputados: A confusão dos conceitos, a contradição ao articulado, quando sujeito a uma leitura comparativa, o desconhecimento do país real, a defesa de uma atitude centralizadora que desmotiva a participação democrática e incentiva o alheamento e a simultânea desresponsabilização do Estado por omissão são os caminhos que estruturam a proposta e onde se perde o valor memorial e identitário do povo português.
Vejamos alguns exemplos: o artigo 4.º pretende contratualizar a administração do património cultural, com «empresas especializadas» ou «entidades interessadas» para «prossecução de interesses públicos»; como é licito

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concluir, poder-se-á chegar à privatização de algumas áreas culturais.
Mas, se este é o alicerce doutrinário, a substância do artigo é. no mínimo, contraditória se a compararmos com os conteúdos dos artigos 46.º e 99.º: uma região autónoma ou uma autarquia pode substituir-se á administração central para realizar acordos na área da administração cultural, mas não tem qualquer capacidade para classificar um bem cultural como de interesse municipal ou regional, nem sequer autorizar e acompanhar qualquer obra ou intervenção em imóveis classificados ou em vias de classificação quer de interesse municipal quer de interesse regional.
O artigo 16.º é claro quanto à confusão conceptual de um quadro teórico criado sem qualquer preocupação de o testar e ajustar à realidade. O n º l identifica os patamares de protecção legal dos bens culturais: em primeiro lugar, a classificação; depois, a qualificação e, finalmente, a inventariação. Um conjunto de interrogações se colocam, pelo menos: como se qualifica ou classifica sem primeiramente inventariar? Como se distinguem as figuras de protecção - classificação e qualificação? A proposta de lei propõe dois adjectivos: classifica-se quando «o bem possui um inestimável valor cultural» e qualifica-se quando «determinado bem (...) se mostre possuidor de eminente valia cultural, mas para o qual a classificação se mostre desproporcionada». Nada mais é dito! Que critérios? Para além da subjectividade dos dois adjectivos?! É possível que um bem cultural classificado de interesse local exija mais protecção que um bem qualificado de interesse nacional?
O artigo 20.º pretende tornar operatório o processo de inventariação. Mas o que mais visivelmente se evidencia nos seis números que integram o artigo é, de facto, o pressuposto de que o procedimento de inventariar não é prioritário, nem determinante para a salvaguarda do património cultural. Para além de metodologias que se auto--anulam, os números 5 e 6 são disso exemplo: «Os bens não classificados nem qualificados pertencentes a pessoas colectivas privadas e a pessoas singulares só serão incluídos no inventário mediante acordo destas.» No entanto, se os referidos processos estiverem em curso, os bens ficarão inventariados, independentemente de se concretizar ou não a classificação ou a qualificação. É claro!
Sempre que um instrumento legislativo se constrói, primando por pressupor um vazio legal numa matéria tão transversal e interdisciplinar como o património, corre graves riscos. É indispensável uma visão global da cultura e das suas funções para actuar de forma concertada. É fundamental optar por estruturas polivalentes e integradas na sua multidisciplinaridade. Neste texto são visíveis sinais preocupantes de centralização cultural, falta de teorização, falta de planeamento e de estratégias de crescimento. Só assim se entende, por exemplo, que os artigos 46.º e 52.º não refiram a Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, como entidade com competência própria para a intervenção em imóveis classificados não afectos ao IPPAR, com 70 anos de existência e milhares e milhares de intervenções realizadas. Haverá, por acaso, outro organismo no País com as características técnicas e operativas desta direcção-geral?
Finalmente, uma referência à tutela penal. Também esta área não resiste a qualquer análise comparativa no sentido de surpreender o escopo penal que determinou a construção dos respectivos artigos. Dois exemplos só: «Quem destruir, no todo ou em parte, danificar, (...)» - e estou só a citar o próprio artigo - «... desfigurar ou tornar não utilizável um bem qualificado, ou em vias de qualificação, é punido com pena de prisão até três anos ou com pena de multa até 360 dias.» Mas exactamente o mesmo acontecerá a «quem proceder ao deslocamento de um bem imóvel classificado, ou em vias de classificação ou qualificado como de interesse nacional, ou em vias de qualificação.»
O artigo 110.º trata das contra-ordenações especialmente graves. Segundo este artigo, quem exportar ou expedir, temporariamente ou definitivamente bens que integram o património cultural, se for pessoa singular, será punida com coima de 500 000$ a 5 000 000$, mas (ressalva-se em seguida) só se «o agente retirar beneficio económico calculável superior a 50 000 000$»! Será caso para afirmar, Sr.ªs e Srs. Deputados, que o crime compensa!

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Terminava com uma reflexão do relatório intercalar, do tal que foi sujeito a discussão pública e que não é plasmada nesta proposta de lei que discutimos hoje: «O património cultural sendo, por um lado, um factor de identidade graças à condensação de vivências sociais revolutas, é ao mesmo tempo uma realidade em constante mutação. E isso não apenas porque a criação contemporânea o vai enriquecendo com novos valores e bens mas porque a evolução das mentalidades e da tecnologia altera os moldes como os bens herdados são valorados, protegidos e culturalmente fruídos.»

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Frexes.

O Sr. Manuel Frexes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr." e Srs. Deputados: Em 6 de Julho de 1985, foi publicada a lei do património cultural em vigor - a Lei n.º 13/85. O referido texto legal previa que o Governo promoveria a publicação, «no prazo de 180 dias, dos decretos-leis de desenvolvimento indispensáveis» (artigo 61.º, n.º 1).
No entanto, por várias razões - a principal das quais a de não ter a lei disposto sobre as formas de resolução de conflitos de competência entre os organismos da administração central, da administração regional e da administração local, o que só uma lei da Assembleia da República poderia fazer - tais textos legais nunca chegaram a ser publicados.
Em Julho de 1993, o XII Governo Constitucional, pela razão acima apontada e por o regime consagrado na Lei n.º 13/85 se revelar desactualizado em vários dos seus aspectos, nomeadamente os procedimentais, que se tinham que adequar ao novo Código do Procedimento Administrativo, optou por apresentar uma nova lei do património cultural. O projecto de lei do património em questão recebera os contributos de todos os organismos do sector da cultura

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com responsabilidades sobre o património cultural e fora objecto de audição da Associação Nacional de Municípios Portugueses e dos órgãos próprios dos Governos das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira.
Não iria constituir uma simples lei de bases, antes um verdadeiro «código do património», destinado a regulamentar, tão exaustivamente quanto possível, a matéria, uma vez que respondia à questão da inexistência, até então, da regulamentação da lei do património cultural.

o entanto, já não houve tempo de o decreto-lei de desenvolvimento da autorização, que, como dissemos, acompanhou a lei de autorização, desde a sua fase de proposta, ser aprovado e publicado pelo XII Governo Constitucional.
O novo Governo, não obstante saber dos anteriores desenvolvimentos da questão, apresentou, no seu Programa, o programa do Partido Socialista, a intenção de regulamentar a Lei n.º 13/85, de 6 de Julho, deixando, aparentemente, cair a opção pela elaboração de uma nova lei do património.
No entanto, confrontando-se, eventualmente, com o mesmo tipo de problemas com que se debatera o anterior Executivo, voltou à opção pela substituição da Lei n.º 13/85. Afinal, o XII Governo Constitucional sempre tinha razão.
Assim, veio apresentar a proposta de lei, ora em apreciação, que pretende que constitua uma «lei de bases», a desenvolver por diplomas específicos.
O Governo teve quatro anos para apresentar obra. Havia um projecto já elaborado, que, como veremos, o que é apresentado acompanha, em traços largos.
Mal se compreende que, assim sendo, venha apresentar uma simples lei de bases, para averbar no currículo o cumprimento de uma medida do Programa do Governo, que, efectivamente, não cumpre.
Mas o que contém esta «lei de bases»?
Uma leitura atenta do novo texto proposto, permite-nos, desde já, concluir que, do ponto de vista doutrinário - e ao contrário das intenções manifestadas no preâmbulo - , esta proposta de lei não evoluiu conceptualmente relativamente à lei em vigor. E também não se «abrem portas» para os novos conceitos que, no final desta década, começam a ser discutidos em reuniões internacionais e vão sendo, a pouco e pouco, assumidos em alguns países comunitários, como sejam: o alargamento do conceito de «património» para fora de uma estrita esfera «cultural», como meio de desenvolvimento social e económico, a chamada via social do património, a transversalidade, como princípio de intervenção pública; a interactividade das intervenções e sua especificidade própria aos diversos níveis (entidades públicas e privadas), e a visão do «património» como factor de desenvolvimento e de investimento crescentes, nomeadamente na educação e na formação profissional de técnicos e mão-de-obra especializada, a realidade de um novo mercado de trabalho em franca expansão nos países comunitários.
Sempre defendemos, e continuamos a defender, que uma verdadeira política de defesa e valorização do património deve assentar no princípio da participação, cada vez mais activa e empenhada, dos vários poderes centrais, regionais e autárquicos, não se podendo dispensar ou menosprezar os contributos de uma sociedade civil dinâmica e interventora.
Ora, o diploma em discussão não partilha desta visão. Bem pelo contrário, em algumas áreas, constitui mesmo um recuo, tendo em conta a Lei n.º 13/85.
Retira competências, e praticamente passa a certidão de óbito, à Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, organismo com 70 anos de existência e milhares de intervenções realizadas, sendo certo que muitas destas intervenções são de inegável importância, principalmente no domínio da conservação e manutenção dos imóveis classificados.
Abro aqui um parêntesis, apenas para dizer o seguinte: esta questão já foi colocada, hoje, por outros Deputados, que a referiram antes mim e fiquei espantado com a justificação, porque o que dizem os artigos 46.º e 52.º da actual proposta de lei é que a intervenção, em termos patrimoniais, nos monumentos ou nos imóveis classificados ou em vias de classificação compete, a partir deste momento, única e exclusivamente, ao IPPAR - é o que está escrito na actual proposta de lei em apreciação.
No entanto, o Sr. Ministro vem dizer: «Mas não há problema algum. Se os senhores compararem as leis orgânicas, irão ver que não há problema algum, porque nós temos uma visão integrada do património, ou seja, nós combinamos, através de despacho, as intervenções de cada um». Só que, ao mesmo tempo, retirou as competências autónomas que a Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais tinha. Ou seja, a visão de gestão integrada do Sr. Ministro da Cultura vai no seguinte sentido: «Bom, a DGEMN passa a ser um departamento de obras do IPPAR e o ministro da tutela é o seu mestre-de-obras».
Retira também esta proposta de lei competências aos municípios, incluindo o poder de classificar, optando por uma lógica ultrapassada, cada vez mais centralizadora e inibidora da participação dos poderes autárquicos e dos cidadãos.
Não podemos aceitar esta preterição, nem tão-pouco são discerníveis as razões desta preterição. Aliás, a valia do valor municipal delimita-se em termos de relevância espacial e não de valia intrínseca.
Julgo, aliás, que tamanho atentado ao poder local só foi possível porque o Governo não pôde, por razões temporais, ou não quis - e, neste caso, a situação é mais grave -, colocar este diploma a uma adequada discussão pública. E, tanto quanto sabemos, a Associação Nacional de Municípios Portugueses não foi ouvida. E, como ela, muitas outras associações e entidades que detêm especiais responsabilidades nesta matéria e que podem dar valiosos contributos para
enriquecer um diploma tão importante como uma lei de bases do património cultural.
Por outro lado, a actual proposta de lei baralha as apologias, provavelmente para simular inovação, sendo, no entanto, reveladora de um universo teórico mal assimilado e desajustado das realidades que deveriam presidir à redacção do diploma.
Não queremos, de forma alguma, pôr em causa a inquestionável competência técnica do Sr. Prof Sérvulo Correia, que presidiu à comissão redactora deste diploma, mas, temos de confessá-lo, a redacção deste, em muitos casos, é confusa, incoerente e contraditória: quer no Título I, na parte respeitante à contratualização, cujos princípios entram em contradição com tudo o que se diz adiante, quer ainda no Titulo IV, sob a designação «Dos bens culturais e das formas

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de protecção», em que se introduz uma nova figura de protecção - a «qualificação» -, sendo certo que esta nova figura, ao não atender à realidade existente, mais não faz do que contribuir para aumentar a confusão e a conflitualidade imanente.
Em matéria de maior melindre, isto é, em matéria de resolução de conflitos de competência, da qual, como vimos, o anterior diploma muito cuidava, o actual diploma o que faz é evitar, pura e simplesmente, a regulação. Aliás, não é por acaso que, há pouco, foi apresentado aqui um parecer da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, que, afinal, não era do conhecimento do Sr. Ministro e que deveria ser!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Como é que o Sr. Ministro devia saber? Pode explicar?!

O Orador: - Com efeito, a regulação desta matéria, nos termos deste diploma, fica para a legislação de desenvolvimento, a aprovar pelo Governo e pelas regiões autónomas (artigo 117.º).
No entanto, óbvio é que, constitucionalmente, só a Assembleia da República pode dispor sobre esta matéria, pelo que se trata de questão que, se bem que melindrosa, deve ser resolvida pela presente «lei de bases», pois a legislação de desenvolvimento de uma lei de bases só pode desenvolver «bases» que já existam e nunca lacunas.

Vozes do PSD: - Claro!

O Orador: - Daí a pertinência do que se disse: o que de essencial a proposta de lei traz de inovatório já vinha previsto no diploma defendido pela Lei n.º 90-C/95, sendo certo que este diploma desenvolvia a inovação em todas as suas consequências e a proposta de lei em apreciação, nas questões delicadas, «esconde a cabeça na areia», para ver se as mesmas são esquecidas.
No entanto, como já o dissemos, não o podem ser, em virtude da sua essencialidade - aliás, foi esta a razão fundamental pela qual a Lei n.º 13/85 não pôde ser regulamentada.
Daí a profunda alteração que propomos para esta proposta de lei, cuja sede se encontra em diversos artigos, desde logo, os atrás referidos, que vêm permitir também aos municípios classificar os seus valores municipais. E esta questão da classificação por parte dos municípios e dos poderes dos municípios não se refere, única e exclusivamente, ao artigo 99.º, bem pelo contrário. E nós já elaborámos e apresentámos a esta Câmara um conjunto de alterações, que abrange cerca de 50 artigos e que, em mais de uma dezena, prevê que toda a questão das competências dos municípios e das assembleias regionais deva ser repensada.
Acresce, finalmente, que a proposta de lei contém inúmeras incorrecções de conceitos ou expressões. Não vou entrar aqui em minudências nem maçar esta Câmara com exaustiva análise dessas incorrecções.
Sempre entendemos que o património histórico e cultural é terreno propício à concertação de opiniões e de projectos. Esta proposta de lei, tal como é submetido a esta Câmara, não constitui, no entanto, uma verdadeira «lei de bases», mas apenas um trabalho mal concluído. Até mesmo nas próprias
proclamações de objectivos e Principios tal se nota, ou seja, essa pecha de constituir um trabalho concluído muito à pressa, para se dizer cumprida uma medida do Programa do Governo.
Pena é que o Governo não tenha dado prioridade a uma verdadeira política de defesa, valorização e recuperação do património, uma prioridade política que, ao tempo, não foi entendida pelo Partido Socialista na oposição, como continuou a não ser entendida pelo actual Executivo, porque, não obstante todos os governos, todas as políticas e todas as vontades ou faltas dela, os problemas do passado, impiedosamente, subsistem. E subsistirão para além de todas as leis, se não houver capacidade real de actuação no terreno.
A Comissão de Educação, Ciência e Cultura - e, nomeadamente, a Subcomissão da Cultura, presidida pelo Sr. Deputado Fernando Pereira Marques -, em reuniões prévias, entendeu promover a discussão da lei, ouvindo as partes interessadas, que serão todos os agentes do património. Tudo isto com o sentido único e alargado de conseguir um quadro de regulação do património cultural capaz de beneficiar do mais inequívoco consenso possível.
Entendemos que uma lei do património deverá ser a tradução jurídico-política da consciência que, porventura, tenhamos desse mesmo património, factor de reconhecimento de nós próprios, visão estrutural e transversal ao combate partidário, tópico integrador de pensamento e acção.
A actual proposta de lei, como fica demonstrado, não merece, no entanto, a nossa aprovação. Mas, se todos comungarem do espírito de abertura que aqui proclamamos, julgo ser possível chegar a uma lei que sirva para unir a vontade dos portugueses e não para desunir essas mesmas vontades.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Pereira Marques.

O Sr. Fernando Pereira Marques (PS): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Com a proposta de lei n.º 228/VII, agora em discussão nesta Assembleia, visa o Governo, nos termos constitucionais, estabelecer as bases da política e do regime de protecção e valorização do património cultural.
Como está consignado na nossa Constituição, a protecção e valorização do património cultural constituem tarefas a que não se pode furtar um Estado moderno e de que também não se pode alhear a sociedade civil. Isto, para que os cidadãos possam usufruir desse património, assegurando, ao mesmo tempo, a sua perenidade, em nome das gerações futuras e de uma identidade nacional a preservar.
O reconhecimento destes factos, infelizmente, levou tempo a afirmar-se na nossa realidade sócio-cultural e, por isso mesmo, demorou a ter transcrição legal e normativa.
Datam do princípio do século - concretamente, de 1901 - as primeiras disposições legais visando salvaguardar bens móveis e imóveis pelo seu valor artístico, histórico e arqueológico. Porém, só 1O anos mais tarde, com a l.ª República através do decreto de 26 de Maio de 1911, se instituiriam regras mais gerais de protecção, adoptando-se, nomeadamente, a figura do arrolamento dos bens patrimoniais a proteger.

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Seguem-se, depois, não só a criação ou a reestruturação de serviços públicos com responsabilidades neste domínio do património como, nos anos subsequentes, os actos legislativos e regulamentares através dos quais se reflectirá o processo de crescente valorização do património cultural perante a sociedade e os poderes públicos.
Finalmente, com a Lei n.º 13/85, de 6 de Julho, deu-se maior coerência a todo este complexo legislativo e regulamentar disperso, reunindo-o e, simultaneamente, adaptando-o a preceitos de convenções internacionais a que Portugal se vinculara entretanto.
O processo de elaboração desta lei caracterizou-se pela sua seriedade e pela forte participação não só dos diversos grupos parlamentares como da sociedade civil, que, através de várias entidades, foi devidamente, auscultada. Criou-se, assim, um positivo consenso, expresso no facto de esse diploma ter sido aprovado por unanimidade.
A aprovação da Lei n.º 13/85 constituiu, por consequência, um relevante progresso no reconhecimento da importância do património cultural no novo contexto constitucional e político do Portugal democrático. Todavia, a sua eficácia e aplicabilidade acabaria por ser prejudicada pelo facto de nunca ter sido efectivada a regulamentação de desenvolvimento prevista na própria lei, com as consequências daqui decorrentes.
Duas posições, entretanto, ganharam corpo nos meios político-administrativos e técnicos em relação à Lei n.º 13/85: uma, partilhada essencialmente por juristas, que considera essa lei de difícil ou impossível regulamentação e incontornáveis alguns dos seus problemas estruturais, pelo que defende a sua substituição; outra, que é, em grande medida, a de certos sectores profissionais ligados às questões do património, que subvaloriza esses argumentos jurídicos, acentua as virtualidades da lei e considera possível regulamentá-la e revê-la nos aspectos em que fosse necessário e justificável.
Na fase final da anterior legislatura, o Governo de então viria a optar pela feitura de uma nova lei, pelo que chegou a submeter a esta Assembleia um pedido de autorização legislativa que lhe foi concedido. Com as eleições de 1995 e a mudança de maioria, esse processo legislativo não chegou ao seu termo.
O Governo actual decidiria, também, substituir a Lei n.0 13/85, na sequência do que surge a proposta de lei que, ora, discutimos. Esta foi precedida da divulgação pública de um relatório intercalar, onde a Comissão encarregada da redacção desta proposta de lei fundamentou as suas opiniões s expôs as suas opções.
Com este diploma, pretende-se, conforme é explicitado na «Exposição de motivos», entre outros objectivos, pôr termo à dispersão legislativa e aos vazios de regulamentação ainda existentes, adequar o direito interno aos novos critérios e formas de protecção ditados pelo direito internacional e pelo direito comunitário e garantir maior eficácia na aplicação de todo o sistema normativo referente às matérias do património cultural.
Deste modo, nesta proposta de lei procede-se ainda à enunciação dos direitos, garantias e deveres dos cidadãos neste domínio, assim como se caracteriza, de forma mais sistemática, o âmbito da protecção e valorização do património
arqueológico, artístico, audiovisual, bibliográfico, fonográfico e fotográfico.
Igualmente se introduzem novas categorias, no que concerne à protecção dos bens culturais, como a de qualificação e a de inventariação, e é criada a designação de «tesouro nacional» para os bens móveis classificados como de interesse nacional.
Enunciam-se, ainda, as atribuições do Estado, regiões autónomas e autarquias locais, para além de se definirem benefícios e incentivos fiscais, assim como as tutelas penal e contra-ordenacional. No que se refere ao regime fiscal do património, a proposta de lei n.º 258/VII, também hoje em debate, já procede ao necessário desenvolvimento.
Trata-se, por consequência, de um diploma tão importante quanto complexo, sobre o qual esta Assembleia deverá debruçar-se com grande sentido de responsabilidade, de forma a poderem criar-se os consensos que o interesse nacional justifica e exige.
Nesta perspectiva, é evidente que, inclusive na minha qualidade de presidente da Subcomissão da Cultura, pugnarei para que se realize a auscultação necessária de todas as instituições, associações e organizações representativas, que, de uma forma ou de outra, são parte activa ou interessada na questão, de modo a que, em sede de especialidade, seja possível introduzir melhoramentos e corrigir eventuais insuficiências ou lacunas.
Passados 14 anos sobre a Lei n.º 13/85, conviria, com efeito, chegar a uma conclusão neste processo, para se poder, com eficácia, corresponder, em termos legislativos, às novas situações criadas no que se refere à protecção e valorização do património cultural, nomeadamente tendo em conta as actuais realidades europeias e internacionais com que nos deparamos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Carmen Francisco.

A Sr.ª Carmen Francisco (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Um governo que deixa ao abandono grande parte do património cultural do seu pais é um governo irresponsável. Foram-no, neste aspecto, os governos do PSD e é-o, hoje, o Governo do PS.
A identidade de um povo está inscrita no seu património cultura!: aquilo que nos torna únicos, o que nos foz ter orgulho no que somos, mas também o que nos faz querei crescer, evoluir e melhorar.
Portugal, país de longa História é, por isso, também riquíssimo em termos de património cultural.
Para o Partido Ecologista Os Verdes, património cultural não são apenas os monumentos construídos, não são apenas os bens móveis, não são apenas os bens arqueológicos, os arquivos, os livros e documentos, os sons, as imagens.
Património cultural é também a paisagem e todos os seus componentes, os quais, num pais quase inteiramente humanizado como é o nosso, são marcas da relação do povo português com o seu território.

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Património cultural são também os modos tradicionais de fazer, que contam a história da sabedoria do homem português na utilização daquilo que a natureza colocou á sua disposição.
Património cultural é o artesanato, é a gastronomia, são os produtos regionais.
Cláudio Torres fala muito da agricultura tradicional: o saber amanhar a terra, comer da terra, meter a água na terra Diz ele que «não é possível separar um monumento do seu passado, dessa coluna vertebral que foi a sabedoria da terra. Não é possível salvar Alfama sem salvar a pesca no Tejo.»
As paisagens e os modos tradicionais de fazer são traços distintivos do povo português, com relevância acrescida numa Europa que uniformiza, num mundo com tendência para a cultura única.
Num debate parlamentar sobre cultura, em 1992, o Partido Ecologista Os Verdes falava da cultura «num sentido mais amplo e mais profundo: a cultura feita de culturas».
A destruição de uma paisagem relevante é sempre um acto anticultural. As tentativas de normalização dos processos de fabrico de vários produtos alimentares por parte da União Europeia, a que Portugal assiste sem resistência, são actos anticulturais, atentatórios do nosso património, para além de economicamente desvantajosos para o nosso país, porque este património constitui factor determinante de desenvolvimento económico e social, são recursos preciosos para uma actividade turística de qualidade.
Daqui se conclui que ambiente e património cultural são indissociáveis, que da conservação da natureza faz parte a protecção e valorização do património, que os Ministérios da Cultura e do Ambiente devem trabalhar em parceria, que as áreas protegidas deverão ter também como objectivo fundamental o cuidar do património cultural. Infelizmente, não tem sido essa a política do Governo.
O Ministério do Ambiente, que tem tantas dificuldades em fazer respeitar a necessária transversalidade da sua política, fecha-se ao que não é ambiente num sentido demasiado estrito.
Esta proposta de lei de bases do património cultural reconhece, de algum modo, a importância da paisagem. No entanto, não resulta claro o reconhecimento das paisagens enquanto património cultural, digno de protecção porque evidência da vivência do povo português. Do mesmo modo que não resulta clara e explícita a protecção do artesanato, na sua multiplicidade entendido.
Num País que não reconhece ao artesão, na comercialização da sua produção, estatuto diferenciado ao do vendedor ambulante, num País onde o ensino das artes e ofícios está absolutamente carenciado de valorização, a não referência explícita ao artesanato numa proposta de lei que procura determinar as bases da política para o património cultural parece-nos particularmente gravoso.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: À riqueza, em quantidade e qualidade, do nosso património nunca correspondeu uma forte e determinada vontade política para a sua protecção e valorização.
São, infelizmente, comuns os casos escandalosos de desleixo, de incúria e de abandono a que é votado grande parte do nosso património, sendo os mais visíveis aqueles que se relacionam com os bens imóveis.
A não regulamentação da lei é mais uma prova deste desleixo. As causas radicam, sobretudo, numa operação de desenvolvimento que tende a ignorar os recursos endógenos como actor determinante de criação de riqueza. A esta concepção corresponde a relativa falta de importância atribuída, em termos governativos, ao património, com a consequente feita de meios, descoordenação da acção, dispersão de energias dos agentes culturais envolvidos.
Entre os diferentes serviços da administração central as relações nunca foram pacificas. O não ter claro quem é responsável pelo quê, quem deve ter meios para quê, implica, muitas vezes, a inércia.
A distribuição de competências e responsabilidades entre os diferentes níveis da administração também nunca foi clara. Esta proposta de lei parece não estar apostada em resolver estas questões.
Às autarquias propõe-se que fiquem como espectadoras do lamentável abandono a que é votado o património, ali, à frente dos seus olhos. Autarquias que quase sempre têm procurado, dentro do possível, contrariar esse abandono, investindo em obras de manutenção e até de recuperação. Chega-se ao ridículo de assinarem contratos de arrendamento de monumentos propriedade do Estado para poderem mante-los visitáveis, como acontece, por exemplo, com o castelo de Sines, monumento nacional onde nasceu Vasco da Gama.
Exemplo também trágico é o das ruínas de São Cucufate, as únicas ruínas romanas da Península Ibérica onde se mantém de pé o primeiro andar de um edifício. Propriedade do IPPAR, teve de ser a Câmara Municipal da Vidigueira a fazer alguns investimentos no local, os quais são, obviamente, insuficientes. A incúria dos sucessivos governos permitiu já a lamentável e irreversível destruição, pelo desabamento, de duas abóbadas, uma das quais em 1998.
Há também exemplos em que outras actividades económicas se tornam inconciliáveis com a protecção de imóveis. Ë o caso de Vila Viçosa, onde o tráfego pesado originado nas pedreiras está a infligir danos ao riquíssimo património daquela vila sem que algo simples como uma variante urbana para desviar o tráfego consiga ser considerada prioritária por este Governo.
Depois, há ainda exemplos de intervenções perfeitamente infelizes, de que Sagres será, porventura, o caso paradigmático.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados, nesta, como noutras áreas, o conhecimento do que temos, onde se encontra e em que estado está é fundamental para a prossecução de uma política de protecção e valorização consequente. Sintomaticamente, também nesta área, um inventário tarda em consistir-se como elemento de base das políticas do Governo.
Em 1992, o Secretário de Estado da Cultura dizia que «o inventário do nosso património,(...) prossegue em ritmo acelerado». Anos volvidos, milhões foram perdidos e do inventário nada! Os técnicos contratados para a sua realização foram «desviados» para outros trabalhos porque é gritante a falta de recursos humanos.
Sr Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: De acordo com a Constituição da República Portuguesa, incumbe ao Estado, em colaboração com todos os agentes culturais, promover a

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salvaguarda e a valorização do património cultural, tornando-o elemento vivificador da identidade cultural comum. É justo exigir que o Estado cumpra este imperativo constítucional, sempre em colaboração, diálogo e cooperaçâo com todos os agentes culturais.
Mais que uma nova lei, é, sobretudo, uma nova prática o que Os Verdes reclamam deste e dos próximos governos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr." e Srs. Deputados: A proposta de lei n.º 2587 VII pretende definir o regime fiscal do património cultural tornando mais operacional o disposto no artigo 103º da Lei de Bases do Património Cultural. Há uma nítida sobreposição entre este artigo e o disposto na proposta de lei, que será, certamente, esclarecido na discussão na especialidade, em sede de comissão. Estranha-se, no entanto, a sua chegada à última hora.
O Governo pretende estabelecer, com diversas entidades, privadas e públicas, colectivas e individuais, autênticas parcerias de património cultural. A Administração procede à classificação, à qualificação e à inventariação de bens culturais, as entidades referidas e proprietárias desses bens são candidatas a benefícios fiscais desde que conservem, mantenham, recuperem e restaurem esses bens culturais.
Os bens culturais são, pois, assumidos como bens sociais e económicos, cuja preservação merece benefícios e incentivos fiscais, bens que pela sua fruição social são autênticos «produtores de cultura», em perspectiva algo hiperbólica.
Os benefícios e incentivos fiscais têm incidência sobre o IRC, o IRS, a contribuição autárquica, o imposto municipal de sisa, o imposto sobre sucessões e doações, o imposto de selo, os emolumentos notariais e registariais. Há, assim, um preço que o Estado paga às entidades em causa por aquela fruição social.
No entanto, em situações de conjuntura geográfica de elevada valorização de terrenos urbanos, continuará a haver injustiça significativa para quem seja impedido, por motivos de património cultural, de usufruir das vantagens da conjuntura, como os seus vizinhos.

O Sr. Manuel Alves de Oliveira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Dai que, sem embargo de motivações financeiras e em lato senso, há que promover um autêntico salto cultural na percepção do património.
Por isso, mesmo que se possa conceder que, e passo a citar, «se a cultura portuguesa não for acompanhada por medidas e instrumentos institucionais (...) não só não se afirmará no mundo, como entrará em rápido colapso», estranha-se que um assunto destes não contemple uma elevada participação de todos aqueles que, directa ou indirectamente, possam interferir. Não pode ser decretado de cima para baixo, com pareceres especializados e pretensamente elitistas. É um assunto de todos e importa que seja sentido por todos como algo que lhes pertence, que os dignifica e que os honra e de que, finalmente, são responsáveis.
Afinal, para lá da «produção cultural», economicamente assumida, terá de haver, por motivos sociais e políticos e até pela viabilização daquela produção, o espírito português de património cultural comum, o que ainda se não verifica.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando de Sousa.

O Sr. Fernando de Sousa (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: A protecção e a valorização do património cultural constituem, como todos nós sabemos, um imperativo constitucional do Estado.
Apesar dos inúmeros esforços e iniciativas apresentadas e da aprovação, em 1985, de uma Lei do Património Cultural Português, não foi possível, ainda, consolidar a matriz legislativa adequada à salvaguarda do património cultural do povo português.
Com efeito, a Lei n.º 13/85, de 6 de Julho, apesar da confiança que o legislador nela depositou, ou não teve exequibilidade por falta da regulamentação necessária ou acabou por revelar-se progressivamente desajustada das novas exigências e realidades, conclusões estas a que chegaram tanto a doutrina como os principais aplicadores.
Existe, assim, um conjunto de problemas a que a nova lei de bases pretende pôr termo e que se podem sucintamente e desde já identificar: dispersão legislativa; ausência de regulamentação; falta de adequação do Direito interno aos novos critérios e formas de protecção ditados pelo Direito internacional, e, em especial, pelo Direito comunitário; necessidade de adequação da legislação do património cultural ao regime autonómico insular, medida tanto mais necessária quanto no novo artigo 228.º da Constituição se consagra expressamente que o património cultural é matéria de interesse específico das regiões autónomas.
Em suma, reconhece-se, no actual quadro legislativo, a inconstitucionalidade de muitas das suas normas e do seu regime de sanções, a inoperância das disposições relativas ao regime de protecção de bens patrimoniais, nomeadamente no que se refere à exportação ilícita de bens, a falta de clarificação de responsabilidades entre a administração central, regional e local, o desajustamento entre a legislação portuguesa e os direitos internacional e comunitário, a desadequação do seu regime fiscal.
É à luz desta problemática que importa analisar a nova lei de bases do património cultural, a qual pretende materializar um adequado nível de concretização da constituição do património cultural, o aperfeiçoamento da coerência interna do regime jurídico aplicável, a combinação de soluções que respeitam a tradição portuguesa neste domínio, com novas fórmulas e novos instrumentos colhidos do direito comparado e da doutrina mais recente, a garantia de maior eficácia e agilidade de todo o sistema normativo aplicável.
Em ordem à concretização dos princípios constitucionais, ressaltam, de entre as inovações, a responsabilização dos cidadãos e a definição dos seguintes princípios gerais: a explicitação dos direitos, garantias e deveres dos cidadãos; a

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enunciação dos objectivos e das componentes especificas da política do património cultural, com destaque particular para as directrizes em matéria de planeamento, coordenação, articulação de políticas, inspecção e prevenção, informação, afectação de meios, controlo e avaliação.
Outra inovação reside na matriz contratualizadora do diploma, estabelecendo-se, como princípio basilar, que o Estado deve privilegiar o acesso à fruição cultural dos bens, a descentralização das responsabilidades e a concertação com a Igreja, Associação Nacional de Municípios, misericórdias, fundações e privados, na concretização do regime de protecção e valorização do património.
Estes princípios pautam-se por uma nova visão que contraria a habitual e desactualizada estratégia «Estadocêntrica», que tem, infelizmente, fomentado reservas e até mesmo suspeições por parte dos detentores do património face à administração central.
Esta contratualização sustenta-se em dois vectores fundamentais: por um lado, garante a existência de instrumentos de planeamento descentralizados e de atribuições e competências delegadas nos diferentes níveis da administração, por outro lado, estabelece um efectivo quadro de bonificações fiscais até aqui praticamente inexistentes.
No que diz respeito à actualização dos regimes de protecção, importa chamar a atenção para o princípio geral que lhe está subjacente. Com efeito, o principal objectivo instrumental do actual projecto visa a constituição de bases de dados intercomunicáveis, que integrem «bilhetes de identidade» peça a peça, registando, com clareza, os elementos de identificação de cada bem cultural, de modo a que, simultaneamente, seja perceptível, em dado momento, a composição do património cultural português e se assegure uma reforçada protecção aos proprietários em caso de roubo.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - As bases de ciados deverão estar devidamente protegidas através da atribuição de níveis de acesso, abrangendo tanto o património móvel como o imóvel.
Este reconhecimento, destinado, essencialmente, à identificação objectiva, «mapeação», cartografia e registo de dados, deverá também integrar os bens culturais imateriais, já com a adopção das novas tecnologias.
Quanto aos níveis de protecção, importa salientar que, no campo das soluções, acolheu-se o inventário como forma básica de identificação e protecção dos bens culturais, figura que parece rodeada de especiais benefícios de modo a favorecer a sua receptividade.
Mas também se institui uma forma intermédia de protecção, a qualificação, tendo em vista, nomeadamente, racionalizar e evitar o excessivo recurso à classificação, que, todavia, se mantém como forma de protecção para aqueles bens que possuam um inestimável valor cultural, criando-se mesmo, para os bens móveis classificados, a designação de «tesouro nacional».
No que respeita às categorias de bens, sem prejuízo do acolhimentos das categorias definidas no Direito internacional, revelou-se mais adequado reservar a classificação apenas para o Estado e as regiões autónomas, podendo, porém, os bens culturais serem qualificados como de interesse nacional, de interesse regional ou de interesse municipal.
Também aqui convém chamar a atenção para algumas soluções e inovações propostas no sentido da garantia de maior eficácia e agilidade do sistema: é criado um registo próprio e um título para cada forma de protecção; são definidos, pela primeira vez, os critérios genéricos para a apreciação do interesse cultural; prevê-se o sistema nacional de informação do património cultural; os proprietários vêem reforçados os seus direitos; são previstas medidas provisórias e reforçados os instrumentos urbanísticos de protecção, além de se preverem medidas especiais para a defesa da paisagem e do contexto dos monumentos, conjuntos e sítios.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Propõe-se, assim, a criação de três níveis de registo, correspondentes a outros tantos níveis de actuação: o registo patrimonial de identificação/inventário, o registo patrimonial de qualificação e o registo patrimonial de classificação.
O regime proposto poderá, assim, promover uma maior eficácia para a protecção dos bens móveis através da figura de qualificação. De facto, no que respeita aos bens móveis, a classificação tem-se revelado impraticável por razões de ordem jurídica e, em caso de aplicação, revelou-se de controlo difícil, para não dizer impossível.
Passam a figurar igualmente, a título inovador, regimes especiais de protecção destinados a contemplar os bens patrimoniais que o meu colega Fernando Pereira Marques já aqui referiu, isto é, o património arquivístico, o património bibliográfico e o património audiovisual.
Anote-se que, no que respeita aos bens arqueológicos, área de grande sensibilidade, a actual proposta não só mantém todos os aspectos já consagrados na Lei n.º 13/85, a este respeito pioneira, como os reforça, quer através do uso de novos conceitos devidamente actualizados, quer através da imposição de medidas próprias, designadamente: a aplicação do princípio da conservação pelo registo cientifico; a proibição do uso de instrumentos de detecção remota não autorizados nos termos da lei; a definição do registo de sítios arqueológicos; a redefinição de trabalhos arqueológicos e a obrigatoriedade da elaboração de cartas do património arqueológico em conexão com os instrumentos de planeamento territorial.

Vozes do PS:- Muito bem!

O Orador: - Esta proposta de lei introduz, também, um regime geral de valorização, o que se trata de uma inovação tendente a regular as intervenções nos bens culturais móveis e imóveis de modo a consubstanciar os princípios de fruição, preservação e divulgação.
A proposta de lei de bases prevê ainda um efectivo reforço dos benefícios fiscais, capazes, agora, de incentivarem os particulares a levar a cabo a protecção dos seus bois.
Quanto aos novos conceitos ou medidas, gostaria de sublinhar os que dizem respeito ao planeamento urbano e instrumentos de gestão territorial em geral, tais coma: os planos de salvaguarda como obrigatoriedade decorrente da classificação de bens imóveis; a delegação de competências nos municípios para as áreas abrangidas por planos de

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salvaguarda; o plano integrado como nível superior de planeamento, visando a protecção e a valorização; a qualificação dos técnicos intervenientes nos processos de conservação, restauro, recuperação e valorização e a defesa da paisagem.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Como corolário da proposta da nova lei de bases, configura-se ainda a proposta altamente inovadora na criação de um código do património cultural que reúna a totalidade da legislação aplicável ao património cultural e aos bens culturais, devidamente explicitada e unificada. Este código, a criar futuramente, abrangerá, também e igualmente, toda a legislação conexa.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: A presente proposta de lei levanta duas falsas questões e três verdadeiras questões, que, em nosso entender, têm de ser colocadas e que eu deixaria à consideração da Câmara e do Sr. Ministro da Cultura.
Vamos às falsas questões. A primeira é a que concerne à delegação de competências. A proposta de lei pressupõe a possibilidade de delegação de parte das competências nas autarquias e, em casos pontuais, mesmo em detentores particulares de património. Ora, esta possibilidade tem sido encarada como uma demissão do papel do Estado quanto às suas responsabilidades a nível do património.
Àqueles que defendem um papel mais intervencionista por parte da administração central, reafirmamos a nossa convicção na perspectiva descentralizada, responsabilizadora e contratualizante do diploma, de acordo, aliás, com tudo aquilo que a experiência acumulada até ao presente tem demonstrado.
A segunda falsa questão é a que diz respeito ao património imaterial, isto é, à escassez das medidas de protecção deste tipo de património quando comparadas com os outros seguros de protecção. Ora, em abono da verdade, tal acontece apenas pela natureza imaterial do objecto que se pretende proteger.
A ausência da materialização do objecto que se pretende proteger impede a assunção clara de um estatuto genérico como bem cultural. Do mesmo modo, podemos dizer que também não faz sentido distinguir, no âmbito da lei, a cultura dita «popular» da restante cultura. A cultura ou é, ou não é!
A própria cultura dita «popular» resulta, quase sempre, da permanência de tradições antigas de uma cultura outrora corrente ou da adaptação de aspectos da cultura «erudita».
Vamos às questões reais. A primeira questão, e a principal, na nossa perspectiva, diz respeito à regulamentação da proposta de lei, de um diploma extenso, detalhado, com implicações sectoriais evidentes. Refira-se, aliás, como já lembrámos, que tal dificuldade nunca foi ultrapassada quanto à lei em vigor, de 1985.
Atendendo ao grau de complexidade da proposta de lei, a regulamentação da mesma constitui uma tarefe fundamental, sobre a qual repousa boa parte da eficácia do diploma. Esta proposta de lei só fará pleno sentido a partir do momento em que ficar estabelecida a sua regulamentação.
A segunda questão prende-se com os recursos humanos e financeiros decorrentes da aplicação desta proposta de lei, a qual vai obrigar o Estado a um acréscimo do investimento na área do património. Tal deve ser encarado como uma reforma de natureza política, tendo em conta a importância e a abrangência do diploma e a eficácia que lhe está inerente.
A terceira questão tem a ver com a clarificação de tutelas, responsabilidades e competências, e, portanto, com a racionalização dos recursos e a promoção de uma política integrada para o sector.
No caso do património edificado parece-nos incontornável a necessidade de uma reforma política que termine com a duplicação dos serviços de obras em imóveis classificados, fazendo todo o sentido que tais serviços venham a ser apenas da responsabilidade e da tutela do IPPAR. Mas parece-nos também evidente que se torna necessário definir com maior rigor o papel que as autarquias, nomeadamente as de significativa dimensão, devem ter neste processo.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Por tudo quanto foi dito, a proposta da nova lei de bases do património constitui um diploma fundamental e imprescindível, que vem, efectivamente, preencher um vazio que se fazia sentir.
Trata-se de uma proposta de lei exaustiva, uma vez que contempla, efectivamente, tudo o que diz respeito ao património, descentralizadora, inovadora mas respeitadora da tradição portuguesa, adequada às novas exigências e realidades, que responsabiliza o Estado mas também a Igreja, os municípios, as instituições privadas e os cidadãos, e promotora de um efectivo regime de bonificações fiscais.
Não é uma proposta de lei fechada e acabada; carece, porventura, de algumas melhorias e achegas, que estamos dispostos a acolher na discussão em especialidade, desde que não desvirtuem a sua natureza e o essencial do seu conteúdo.
É que o PS identifica-se com esta proposta de lei e, por isso, felicita o Governo, e o Ministro da Cultura em particular, pela sua elaboração e apresentação a este Parlamento.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente:- Tem a palavra o Sr. Ministro da Cultura para lima intervenção.

O Sr. Ministro da Cultura: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, queria agradecer toda a atenção que a apresentação desta proposta de lei de bases suscitou e as múltiplas sugestões que já aqui pude ouvir e que vão no sentido do aperfeiçoamento e da melhoria da mesma.
Mais do que comentar ponto por ponto ou responder a questões pontuais que surgiram, gostaria de destacar de novo, de algum modo, realçando outros aspectos, os objectivos desta proposta de lei de bases.
No entanto, não deixarei de referir, no que diz respeito ao Partido Popular, a questão que foi colocada, que adiante poderei comentar e que retoma a questão inicial.
No que diz respeito à intervenção da Sr.ª Deputada do Partido Comunista Português, não deixo de referir que a mesma não me surpreende, uma vez que sublinha muito a

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orientação estatizante que o Partido Comunista defende para o sector do património e que eu próprio, de resto, graças à opinião do Prof Vítor Serrão, que faz pane do Conselho Nacional de Cultura, a meu convite, tenho abundantemente ouvido e avaliado em diversas ocasiões.
No que diz respeito à intervenção do Sr. Deputado Manuel Frexes, gostaria de dizer que, certamente, há muito a aperfeiçoar nesta proposta de lei, mas é difícil poder aceitar-se que não haja nenhuma referência à articulação óbvia - de resto, hoje, totalmente óbvia - do património com o desenvolvimento social e económico, quando tal faz parte do artigo 12.º, n.º 1. É, ainda, difícil poder aceitar-se que se apresente como sendo uma novidade aquilo em que, há cinco anos, tanto insistimos, ou seja, a transversalidade das políticas do património, que está prevista nesta proposta de lei, nos artigos 6.º, 97.º e 98.º, que possa referir-se a questão da paisagem como estando ausente, quando a mesma está prevista nos artigos 44.º, 45.º e 53.º, que possa referir-se a ausência de articulação com as autarquias quando a mesma é objecto explícito dos artigos 44.º, 56.º e de vários outros, que possa referir-se a ausência de critérios para a qualificação ou para os bens culturais, quando os mesmos são igualmente objecto de artigos explícitos nesta proposta de lei, que possa referir-se tantas contradições que não existem.
Como uma elementar noção de lógica poderá ensinar ao Sr. Deputado, vemos muitas vezes, na mente humana, contradições onde apenas existe deficiência de compreensão.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - O que é que o Sr. Ministro quer dizer com isso?

O Sr. Manuel Frexes (PSD): - Realmente, o senhor tem uma relação muito difícil com a Assembleia!

O Orador: - Mas não me admira que tudo isto seja feito à luz da defesa de uma anterior proposta de lei, do tempo do anterior governo, elaborada justamente no mesmo momento em que o Sr. Deputado ocupava funções no governo. Enquanto se elaborava uma nova lei do património, justamente no mesmo momento, destruía-se ou procurava-se destruir o património mundial do Côa!

Protestos do PSD.

Há uma coincidência temporal que é ilustrativa, que é exemplar, entre esses dois processos: a tal nova lei que o PSD elaborava no mesmo momento, repito, em que procurava destruir-se o património mundial do Côa.
É por isso que, mais do que estarmos a ver agora detalhes dessa ordem, que, de resto, penso que não relevam de uma avaliação da proposta de lei de bases, gostaria de abordar três ou quatro pontos que me parecem fundamentais.
Em primeiro lugar, esta proposta de lei de bases não se imiscui em aspectos regulamentares de nenhuma ordem, porque uma lei de bases não o deve fazer.
Assim, as questões que aqui foram levantadas pelo PSD e pelo PP, sobre a DGEMN (Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais) e o IPPAR (Instituto Português do Património Arquitectónico e Arqueológico) são questões que não têm qualquer sentido, uma vez que estão resolvidas neste momento, no articulado da própria proposta de lei. Ou seja, o artigo 46.º da proposta de lei de bases não diz senão o que é compatível com o que estabelece a Lei Orgânica do IPPAR, que, uma vez que se trata de uma questão que aqui foi suscitada várias vezes, nomeadamente pelo Sr. Deputado do PP, cuja atenção pedia, visto que levantou este problema... Sr. Deputado António Brochado Pedras, se pudesse dar atenção, agradecia...

Risos.

Continuando, o artigo 6.º da Lei Orgânica do IPPAR diz o seguinte: «O IPPAR e a Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais elaborarão anualmente o programa de intervenções nos domínios a que se refere o n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 284/93 (...)», que é a Lei Orgânica da DGEMN, «(...)a aprovar pelo despacho conjunto dos Ministros do Plano e da Cultura». Ou seja, não é, como dizia o Sr. Deputado Manuel Frexes e como temia o Sr. Deputado, algo que venha a fazer-se no futuro. O último despacho conjunto data de Dezembro, Sr. Deputado! Isto está feito neste momento, uma vez que esta lei orgânica estabelece que os imóveis afectos, em Portugal como em qualquer país que preze o seu património, são de uma tutela única.
Portanto, esse receio de que haja problemas de articulação está resolvido na prática e triste é que a ocasião para se discutir uma proposta de lei de bases seja um momento para se levantarem fantasmas de atritos corporativos entre serviços. Não há qualquer razão para que isso seja feito. A articulação da acção no terreno é, neste momento, algo que se faz.
Esta lei de bases estabelece princípios, estabelece critérios, estabelece articulações fundamentais e é a essa luz que deve ser analisada.
Permito-me destacar aqui apenas um aspecto.
Um dos pontos fundamentais que destacaria - e penso que, talvez, as bases desta distinção não tenham sido avaliadas em algumas das intervenções - é o de que se propõe uma sistemática nova e, nomeadamente, novas formas de protecção do património. Portanto, não tem sentido dizer que a classificação não se faz a nível regional.
De resto, essa preocupação que aqui foi manifestada não tem qualquer razão concreta de ser, uma vez que, como referi há pouco, não houve, nestes 14 anos, uma única classificação regional com iniciativa municipal, todas foram feitas pelo IPPAR, todas! Isto é absolutamente exaustivo! Portanto, não tem qualquer fundamento a preocupação de que tal deixe de ser feito agora, uma vez que nunca foi feito.
O que se propõe é uma nova tipologia em que a noção de classificação se reserva aos monumentos nacionais. A classificação e o inventário ficam num outro nível Passamos a ter tuna protecção do património mais capaz, uma vez que é feita desde o nível do inventário, considerado o primeiro momento da protecção de um bem patrimonial, isto é, do seu conhecimento. A seguir, faz-se a qualificação, a qual se reserva só para os bens culturais de mais elevado valor.

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É preciso compreender esta proposta e avaliar o seu bom fundamento para se compreender, depois, o que se pretende da articulação nacional/regional e o alcance desta tipologia.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Mas nós não temos capacidade, não é?!

O Sr. Manuel Frexes (PSD): - O senhor é que é um «iluminado», não é?!

O Orador: - Quero destacar que é à luz desta experiência que, no terreno, a articulação com as autarquias e com a Igreja foi uma constante inovadora destes últimos anos.
Pela primeira vez, temos a funcionar - e retiramos todas as lições desse facto - uma comissão paritária constituída por membros da Conferência Episcopal e do Ministério da Cultura.
Pela primeira vez, assinámos múltiplos protocolos de colaboração patrimonial com as autarquias. Assinámos um pacto patrimonial com a Associação Nacional dos Municípios Portugueses com Centro Histórico e com a União das Misericórdias.
Portanto, esta articulação da administração central com os particulares e com as autarquias é algo que está no terreno e que esta proposta de lei de bases visa enquadrar de um modo inovador.
A proposta de lei de bases que aqui vos deixamos, do meu ponto de vista, pode e deve ser melhorada. É com esse espirito que a mesma é apresentada ao Parlamento, no sentido de que seria desejável que não se prolongasse este hiato em que, existindo apenas uma lei de bases não regulamentada, o património não está devidamente protegido e a sua valorização não pode ser bem enquadrada, o que é uma preocupação constante de todos nós.
É, pois, com esse espírito de abertura, com vista ao aperfeiçoamento desta proposta de lei, e com a noção de que se deixa aqui um trabalho exemplar do ponto de vista técnico que apresentamos este diploma. A este propósito, quero felicitar a equipa dirigida pelo Prof. Sérvulo Correia pela qualidade do trabalho efectuado na elaboração desta proposta de lei, que é um documento com visão do futuro.
É com essa tranquilidade que deixo esta proposta de lei de bases nas mãos do Parlamento.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há mais inscrições, pelo que está encerrado o debate.
Informo que as votações regimentais que costumam ter lugar á quinta-feira passarão para a sessão de amanhã, às 18 horas, uma vez que, na próxima quinta-feira não há trabalhos parlamentares.
A sessão de amanhã terá lugar às 15 horas, com a seguinte ordem de trabalhos: período de antes da ordem do dia, seguido do período da ordem do dia, do qual constará a discussão, na generalidade, dos projectos de lei n.ºs 523/VII - Estabelece as bases das organizações interprofissionais do sector florestal (PSD) e 649/VII - Estabelece as bases do interprofissionalismo florestal (PS), das propostas de lei n.º 19l/VII - Autoriza o Governo a legislar no sentido da alteração do regime jurídico da avaliação de impactes ambientais (AIA) de determinados projectos susceptíveis de produzirem impactes ambientais significativos e 246/VII - Altera a Lei n.º 65/93, de 26 de Agosto, que regula ó acesso aos documentos da Administração, do projecto de resolução n.º 126/VII - Recomenda ao Governo que, no imediato, baixe o montante do imposto sobre os produtos petrolíferos (PCP) e do projecto de lei n.º 129/VII - Taxas de imposto sobre os produtos petrolíferos (CDS-PP); pelas 18 horas, terá lugar o período regimental de votações. Nada mais havendo a tratar, está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 5 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Carlos Alberto Dias dos Santos.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
José Pinto Simões.

Partido Social Democrata (PSD):

José Augusto Santos da Silva Marques.
José de Almeida Cesário.
José Manuel Durão Barroso.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.

Partido Comunista Português (PCP):

Lino António Marques de Carvalho.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Alberto de Sousa Martins.
António Bento da Silva Galamba.
António Manuel Carmo Saleiro.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Eurico José Palheiros de Carvalho figueiredo.
Francisco Fernando Osório Gomes.
José Carlos Correia Mola de Andrade.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Maria Teixeira Dias.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Mafalda Crimina Mata de Oliveira Troncho.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Mário Manuel Videira Lopes.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.

Partido Social Democrata (PSD):

Alberto Queiroz Figueiredo.
Antonino da Silva Antunes.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.

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31 DE MARÇO DE 1999 2443

José Guilherme Reis Leite.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Manada Aguiar Dias Moreira.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Manuel Cruz Roseta.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Francisco Amadeu Gonçalves Peixoto.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Kruz Abecasis.
Pedro José Del Negro Feist.

Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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2444 I SÉRIE -NÚMERO 66

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