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Quinta-feira, 15 de Julho de 1999 1787
I Série - Número 103
DIÁRIO Da Assembleia da República
VII LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1998-1999)
COMISSÃO PERMANENTE
REUNIÃO DE 14 DE JULHO DE 1999
Presidente: Ex.mo Sr. Manuel Alegre de Melo Duarte
Secretário: Ex.mos Sr. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a reunião às 16 horas e 15 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa das apreciações parlamentares n.os 108 a 110/VII, de requerimentos e de respostas a alguns outros e do pedido do Deputado do PSD Francisco Torres de continuar a exercer o seu mandato na qualidade de deputado independente.
A Câmara aprovou dois pareceres da Comissão de Ética sobre retoma e substituição de Deputados do PS, do PSD, do CDS-PP e do PCP.
Em interpelação à Mesa, o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan (CDS-PP) condenou as recentes declarações do Sr. Presidente da Assembleia sobre o processo de paz em Angola, na sequência do que intervieram também, a diverso título, os Srs. Deputados Acácio Barreiros (PS), Octávio Teixeira (PCP) e Luís Marques Guedes (PSD).
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP) trouxe d colação a denúncia unilateral feita pelo Brasil do tratado sobre dupla tributação celebrado entre Portugal e aquela República Federativa, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira (PS). O Sr. Deputado João Amaral (PCP) criticou as acções de pré-campanha eleitoral que Governo e governos civis vêm desenvolvendo, bem como a política governativa para a TAP e a Portugália. No fim, deu resposta aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados José Junqueiro (PS) e Manuela Ferreira Leite (PSD).
Também o Sr. Deputado Carlos Encarnação (PSD) se referiu d pré-campanha eleitoral levada a, cabo pelo Governo e à falta de informação sobre a denúncia unilateral feita pelo Brasil do tratado sobre dupla tributação. Depois, respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Acácio Barreiros (PS).
Ordem do dia. - Em debate requerido pelo CDS-PP, sobre a gestão do Serviço Nacional de Saúde, intervieram, a diverso título, além: do Sr. Secretário de Estado da Saúde (Francisco Ramos), os Srs. Deputados Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP), Manuela Ferreira Leite (PSD), Manuel dos Santos (PS) e Octávio Teixeira (PCP).
Em debate requerido pelo CDS-PP, sobre a decisão da localização do novo aeroporto, pronunciaram-se, a diverso título, além do Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território (João Cravinho); os Srs. Deputados Rui Pedrosa de Moura (CDS-PP), Ferreira do Amaral (PSD), José Junqueiro (PS), Sílvio Rui Cervan (CDS-PP), Octávio Teixeira (PCP), Heloísa Apolónia (Os Verdes) e Falcão e Cunha (PSD).
Em debate requerido pelo CDS-PP, sobre a decisão da União Europeia na renovação do embargo a Portugal na chamada "crise das vacas loucas., usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas (Capoulas Santos), os Srs. Deputados Sílvio Rui Cervan (CDS-PP), António Martinho (PS), Carlos Duarte (PSD) e Lino de Carvalho (PCP).
O Sr. Presidente encerrou a reunião eram 20 horas.
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O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.
Eram 16 horas e 15 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Alberto de Sousa Martins.
António Alves Martinho.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Pinto Simões.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Partido Social Democrata (PSD):
Artur Ryder Torres Pereira.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Fernando José Antunes Gomes Pereira
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
João Bosco Soares Mota Amaral.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Rui Miguel Gania Vasconcelos Pedrosa de Moura.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.
Partido Comunista Português (PCP):
João António Gonçalves do Amaral.
Lino António Marques de Carvalho.
Octávio Augusto Teixeira.
Partido Ecologista Os Verdes (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
ANTES DA ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta do expediente.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa e foram admitidas, as apreciações parlamentares n.º 108/VII - Decreto-Lei n.º 242/99, de 28 de Junho, que cria o Instituto Portuário do Norte e extingue a Junta Autónoma dos Portos do Norte (PCP), n.º 109/VII - Decreto-Lei n.º 243/99, de 28 de Junho, que Cria o Instituto Portuário do Centro e extingue a Junta Autónoma do Porto da Figueira da Foz e a Junta Autónoma dos Portos do Centro (PCP) e n.º 110/VII Decreto-Lei n.º 244/99, de 28 de Junho, que cria o Instituto Portuário do Sul e extingue a Junta Autónoma dos Portos do Sotavento do Algarve e a Junta Autónoma dos Portos do Barlavento do Algarve (PCP).
Foram apresentados na Mesa, na reunião plenária de 30 de Junho, os seguintes requerimentos: ao Banco de Portugal, formulado pelo Sr. Deputado Alexandrino Saldanha; ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulado pelo Sr. Deputado António Saleiro; ao Ministério do Ambiente, formulado pela Sr.ª Deputada Jovita Ladeira; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado Antonino Antunes; ao Ministério da Economia, formulado pelo Sr. Deputado João Moura e Sá.
Na reunião plenária de 1 de Julho: ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulados pelos Srs. Deputados Manuel dos Santos, Fernando Pedro Moutinho e Roleira Marinho; ao Ministério da Economia, formulado pela Sr.ª Deputada Paula Cristina Duarte; aos Ministérios da Cultura e da Educação, formulados pelo Sr. Deputado Paulo Jorge Arsênio; ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade, formulado pela Sr.ª Deputada Filomena Bordalo aos Ministérios do Trabalho e da Solidariedade e das Finanças, formulados pelo Sr. Deputado Hermínio Loureiro; ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulado pelo Sr. Deputado Costa Pereira; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Moreira; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Manuel Alves de Oliveira; aos Ministérios do Trabalho e da Solidariedade e da Justiça, formulados pelo Sr. Deputado António Filipe.
Na reunião plenária de 2 de Julho: ao Ministério do Ambiente, formulado pelo Sr. Deputado Jorge Valente; à Secretaria de Estado das Pescas, formulado pelo Sr. Deputado José Carlos Tavares; à Secretaria de Estado do Ensino Superior e a diversos ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Jorge Lacão; ao Sr. Presidente do Tribunal de Contas, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Pereira; aos Ministérios da Economia, do Ambiente e do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulados pela Sr.ª Deputada Lucília Ferra; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulados pelos Srs. Deputados Fernando Santos Pereira, Manuel Alves de Oliveira e Jorge Roque da Cunha; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território e da Justiça, formulados pelo Sr. Deputado Manuel Moreira; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado Correia de Jesus.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, cumpre-me ainda anunciar um oficio dirigido ao Sr. Presidente da Assembleia da República do seguinte teor: Ex.mo Senhor, venho por esta comunicar a V. Ex.ª, ao abrigo do artigo 9.º do Regimento da Assembleia da pública, a minha decisão de passar a exercer o meu mandato de Deputado como independente.
Subscrevo-me com a mais elevada consideração e os melhores cumprimentos amigos. Deputado Francisco Torres."
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Srs. Deputados, vou ainda dar conta de um relatório e parecer da Comissão de Ética sobre a retoma de mandato, nos termos do artigo 6 º, n.os 1 e 2 do Estatuto dos Deputados, de Luís Sá, do PCP, em 5 de Julho corrente, inclusive, cessando Alexandrino Saldanha, bem como das substituições, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 20.º do Estatuto dos Deputados, dos Deputados do PS: José Seguro, por Victor Brito de Moura, com início em 20 de Julho corrente, inclusive; Maria Carrilho, por José Manuel Oliveira de Sousa Peixoto, com início em 20 de Julho corrente, inclusive e Sérgio Sousa Pinto, por Patrícia Monte Pinto Ribeiro, com início em 20 de Julho corrente, inclusive.
O parecer é o seguinte: "A retoma de mandato e as substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais".
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, está em discussão.
Pausa.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de outro relatório da Comissão de Ética.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o relatório e parecer refere-se à substituição, nos termos da alínea i) do n.º 1 do artigo 20.º do Estatuto dos Deputados, do Deputado do PS Paulo Neves (Círculo Eleitoral de Faro) por Filipe Mesquita Vital, com início em 15 de Julho corrente, e às substituições, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 20.º do Estatuto dos Deputados, do Deputado do PSD, Pacheco Pereira (Círculo Eleitoral de Aveiro), por Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco, com início em 20 de Julho corrente, inclusive, e do Deputado do CDS-PP Luís Queiró (Círculo Eleitoral de Lisboa), por Ismael Pimentel, com início em 20 de Julho corrente, inclusive.
O parecer vai no sentido de admitir as substituições em causa, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Pausa.
Não havendo inscrições, vamos votar este parecer.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, na ausência da presidência desta Assembleia do Sr. Presidente Dr. Almeida Santos, quero, através de V. Ex.ª, interpelar a Mesa a propósito da última visita feita a Angola pelo
Sr. Presidente da Assembleia da República com uma comissão parlamentar representativa de todos os partidos com assento nesta Assembleia.
Sr. Presidente, nós não concordamos, achamos profundamente incorrectas as declarações do Sr. Presidente da Assembleia da República e até achamos surpreendente que todos os outros partidos tenham "compreendido" o âmbito e o alcance das declarações feitas pelo Sr. Presidente Almeida Santos.
Sr. Presidente, para nós, a paz não é o problema; para nós, a guerra é o problema.
Sr. Presidente, o Partido Popular só acredita numa via para a paz em Angola e essa via é a negociai, nunca a da guerra e, nesse sentido, quero transmitir ao Sr. Presidente da Assembleia a nossa profunda indignação porque Portugal, que devia ter um papel liderante no processo de paz em Angola, através do segundo representante do Estado português, fez declarações com as quais o Partido Popular não pode estar mais em desacordo.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, a sua intervenção não foi propriamente uma interpelação à Mesa, mas fica registada. O Sr. Presidente da Assembleia da República regressará dentro de dois dias e o Sr. Deputado terá oportunidade de fazer essa apreciação na presença do próprio Presidente da Assembleia.
Para uma interpelação, tem a palavra o Sr. Deputado Acácio Barreiros.
O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Sr. Presidente, gostaria apenas de referir que o Sr. Presidente da Assembleia da República, que está, neste momento, numa importante reunião de todos os presidentes das Assembleias Nacionais dos Países da CPLP, estará cá na próxima sexta-feira e seria, com certeza, mais correcto da parte do PP levantar essa questão na presença do Sr. Presidente, como é óbvio aliás, o Sr. Presidente da Assembleia da República já esclareceu todas as questões.
Eu acompanhei o Sr. Presidente, não só eu mas todos os partidos representados nesta Assembleia, nesta visita que foi extremamente importante e na qual o Sr. Presidente, em várias intervenções públicas, frisou, de forma perfeitamente correcta, o empenho de Portugal numa solução de paz para Angola e a necessidade, para nós muito importante, de a Assembleia da República e de os Deputados estreitarem relações com os Parlamentos dos vários países da CPLP.
Quanto às declarações que o Sr. Deputado referiu, o Sr. Presidente já teve oportunidade de esclarecê-las, de forma perfeitamente satisfatória.
Assim, nós limitamo-nos aqui a expressar toda a nossa solidariedade para com o Sr. Presidente da Assembleia da República e voltamos a frisar este aspecto que nos parece muito importante: é absolutamente deslocado fazer críticas ao Sr. Presidente da Assembleia sem ele estar presente, tanto mais sabendo que ele estará de volta muito em breve e poderá, com certeza, esclarecer este assunto -, aliás, aproveito para dizer que o Sr. Deputado do PP que acompanhou a visita também poderia ter esclarecido e evitado ao Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan este tipo de intervenção, que considero perfeitamente infeliz e que em nada contribui - essa sim - para o prestígio...
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O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Está completamente equivocado!
O Orador: - ... da diplomacia portuguesa, da Assembleia da República e do papel que esta tem desempenhado...
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, eu não posso permitir que, sob a forma de interpelação à Mesa, esteja a fazer-se uma discussão política sobre declarações que foram proferidas pelo Presidente da Assembleia da República na sua ausência. Isso eu não vou permitir! Abriu-se aqui um precedente, que lamento, mas acho que o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan podia ter feito essa declaração sob outra forma regimental.
De qualquer forma, acho que esta discussão é extremamente deselegante e embaraçosa para esta Assembleia e para quem substitui o Presidente.
O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito de defesa da honra da bancada.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, foi precisamente pelo máximo respeito que temos pela figura do Sr. Presidente da Assembleia que optámos por fazer esta declaração aqui; por respeito e pela consideração pessoal, mas, sobretudo, pelo respeito institucional que nos merece a segunda figura do Estado. Por isso esta declaração devia ter sido e foi feita aqui.
Esta questão não é pessoal; é política, por isso eu disse o que disse, da forma que disse e reitero: para nós, a paz é, efectivamente, o objectivo. A guerra não é um objectivo nem nunca é a fornia de resolução de um problema
Sr. Deputado Acácio Barreiros, por estas razões defendo a honra da minha bancada.
Resta-me apenas, Sr. Deputado, lembrar-lhe que aquilo que acabou de dizer foi-nos absolutamente negado há um ano atrás - e é bom que possamos hoje avivar a memória -, quando quisemos, nós, Deputados eleitos pelo PP, fazer umas jornadas parlamentares conjuntas com o grupo parlamentar da UNITA, o que nos foi expressamente vedado pelo Governo angolano.
Essa cooperação que o senhor disse que o Sr. Presidente da Assembleia e alguns dos representantes dos partidos foram a Angola sublinhar foi aquela mesma cooperação que nós tentámos praticar há um ano atrás.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para dar explicações, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Acácio Barreiros.
O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Sr. Presidente, gostaria apenas de dizer ao Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan que ele não percebe que é absolutamente deslocado e deselegante estar a criticar as declarações do Sr. Presidente da Assembleia da República na sua ausência.
Sr. Deputado, lamento muito, mas eu não vou contribuir para o prolongamento de um debate que considero deslocado, deselegante e que não contribui para o prestígio desta Assembleia.
Vozes do PS: - Muito bens!
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Bom, uma vez que o mal começou, agora tem de ir até ao fim; aquilo que eu lamento é que se tenha utilizado a forma da interpelação à Mesa para abordar este assunto, além das muitas dúvidas quanto à substância.
Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira, ao que suponho, para uma interpelação que não o é.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Exactamente, Sr. Presidente. É para aquilo que V. Ex.ª referiu, mas será muito breve.
Gostaria de, pela nossa parte, dizer que, em todo este processo, o CDS-PP podia dar um grande e inestimável contributo: convencer os seus amigos íntimos, os seus parceiros, os seus colegas, Jonas Savimbi e companhia de que, de facto, os resultados eleitorais devem ser democraticamente aceites; de que os acordos assinados devem ser cumpridos e tentar fazer com que ele perceba, de uma vez por todas, que a paz é o caminho; não é a guerra que ele tem desencadeado contra a população angolana.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma interpelação, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, usando a figura da interpelação à Mesa, há duas coisas que eu, em nome do PSD, quero aqui deixar claro: do ponto de vista estritamente partidário, o PSD já se pronunciou sobre esta questão, através do Presidente do partido, e para além das declarações do Dr. Durão Barroso nada temos a acrescentar sobre este assunto.
Há, no entanto, do ponto de vista parlamentar, algo que a minha bancada tem a dizer. Eu relembro ao Sr. Presidente que as declarações proferidas pelo Presidente da Assembleia da República, que estão em causa nesta interpelação, não foram proferidas na presença da totalidade da comitiva parlamentar que se deslocou a Angola. De resto, o representante do PSD que acompanhou o Sr. Presidente da Assembleia da República só teve conhecimento dessas declarações através da comunicação social portuguesa já em território nacional. Portanto, é evidente que o Partido Social-Democrata é totalmente alheio às declarações do Presidente Dr. Almeida Santos.
No entanto, em qualquer circunstância, o PSD, através do seu grupo parlamentar, aguardará a presença do Presidente da Assembleia nesta Câmara, seguro de que o seu Presidente, quando estiver aqui connosco, não deixará de dar uma explicação aos grupos parlamentares e de, pela sisa voz, explicar à Câmara o porquê e o contexto das declarações que decidiu proferir.
Assim, o Grupo Parlamentar do PSD aguardará que o Presidente dê essas explicações nesta Câmara.
O Sr. Silvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan, o senhor já pediu uma vez a palavra para defender a honra da sua bancada nesta matéria.
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Pede a palavra para que efeito?
O Sr. Silvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da honra da bancada, pois considero que foi ofendida pela interpelação directa feita pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira ao meu grupo parlamentar.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, vou dar-lhe a palavra para defender a honra da sua bancada, mas a mais ninguém darei a palavra para intervir sobre este assunto.
O Sr. Silvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o meu grupo parlamentar foi directamente interpelado pelo líder da bancada do Partido Comunista, que disse que poderíamos ajudar a contribuir para a paz em Angola convencendo os nossos amigos, Dr. Jonas Savimbi e companheiros, a respeitarem o resultado das eleições angolanas.
Sr. Deputado Octávio Teixeira, que eu saiba, as relações de amizade dos muitos angolanos que são amigos de dirigentes do meu e de outros partidos - de quase todos os partidos - nada têm a ver com isto.
Que eu saiba, a UNITA não é o Partido Democrata-Cristão. As relações que temos com a UNITA são as relações cordiais de dois grupos parlamentares, as relações cordiais com um país com o qual temos obrigações.
Mas V. Ex.ª pode ajudar muito, porque tem a mesma matriz ideológica que o MPLA, são ambos marxistas-leninistas, têm a mesma tradição. Sendo assim, pode ajudar convencendo a "sua parte" a cumprir também os acordos, porque, infelizmente, quem não cumpre os acordos não é apenas um dos lados, são os dois.
Portanto, se o Sr. Deputado conseguir que, o MPLA liberte os quatro Deputados, nossos colegas, que estão presos, efectivamente, V. Ex.ª e o seu partido darão um grande contributo para a democracia, nomeadamente parlamentar.
Nós ajudamos como podemos, através da paz, da negociação, da imparcialidade. W. Ex.º5, se quiserem ajudar-nos, serão bem vindos.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Manuel Alegre). - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, espero que não haja um novo pedido de palavra para defesa da honra e consideração da bancada do CDS-PP, dado a forma como vou começar a minha intervenção.
Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan, aquilo que V. Ex.ª acabou de referir sobre o MPLA e a matriz ideológica marxista-leninista só mostra a sua ignorância sobre o que é o MPLA.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Ignorância total e completa, pois ainda não há muito tempo o MPLA pediu a adesão à Internacional Socialista!
Sr. Deputado, espero que não peça a palavra para defesa da honra, porque o que acabo de dizer é, pura e simplesmente, um facto!
Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan, V. Ex.ª considerou-se ofendido, bem como a sua bancada, por eu ter dito que havia laços estreitos entre o CDS-PP e Jonas Savimbi e a UNITA?!
O Sr. Rui Pedrosa de Moura (CDS-PP): - Não, não foi isso!
O Orador: - Vocês são inimigos?! Então, se são inimigos nunca o declararam! Explicitem a questão!
O problema é que quem tem falhado, quem não tem cumprido aquilo a que se obrigou para que o conflito em Angola se resolva pela paz, como a comunidade internacional e a ONU têm referido claramente, é o Sr. Jonas Savimbi e, logicamente, todos aqueles que o apoiam em todos os países do mundo!
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (ÇDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.º9 e Srs. Deputados: Farei uma breve intervenção que penso vir a propósito deste cruzamento de interpelações à Mesa, porque muita coisa tem de ser revista na nossa política de cooperação e no relacionamento dos países de expressão portuguesa.
O que me leva a falar hoje, aqui, é algo que me causou, e a muitos portugueses, uma profunda surpresa: a formalização da denúncia do tratado para evitar a dupla tributação da renda, firmada pela República Federativa do 'Brasil e Portugal, que declara que este Tratado cessará a sua vigência a partir de 1 de Janeiro do ano 2000.
Surpresa, desde logo, porque o acto de denúncia de um tratado é um acto diplomático "quase hostil", praticado somente quando se verificou um impasse irreversível no processo negocial. Tanto assim é que são raríssimos, na história diplomática, os casos de denúncia de tratados contra a dupla tributação.
Incredulidade porque o destinatário da primeira denúncia efectuada pelo Brasil é precisamente Portugal, país com o qual, como todos sabemos, pela história e pela língua, o Brasil tem relações de grande profundidade.
Surpresa, também, pelo momento político em que a denúncia se realizou, em vésperas das comemorações dos 500 anos do Descobrimento do Brasil e no decurso da cimeira de chefes de Estado visando uma maior aproximação entre os países da América Latina e a União Europeia, de que Portugal é parte integrante. Aliás, como se recordam, o Sr. Primeiro-Ministro fez grande alarido em torno desta viagem.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
A Oradora: - Pasmo porque a ruptura deste tratado ocorre num momento em que Portugal se apresenta como um dos maiores investidores no Brasil, .em importantes sectores da economia (financeiro, cimentos, madeiras, bebidas, cabos eléctricos,, telecomunicações, etc.).
Para se ter uma ideia da relevância do investimento português no Brasil, basta referir que Portugal ocupa, no domínio das. privatizações, o terceiro lugar no ranking dos, investidores estrangeiros, logo a seguir aos EUA e á Espanha e muito á frente da Itália, do Chile, da Suécia e da França.
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A consequência prática desta denúncia é deixar sem protecção, face às flutuações das leis fiscais internas, todos os investimentos portugueses no Brasil e todos os investimentos brasileiros em Portugal, submetendo à violência da dupla tributação não apenas os negócios em si mesmo considerados mas também os emigrantes e as suas famílias radicados nos dois países.
Consta que uma das razões que conduziram à denúncia do tratado foi a existência de um regime fiscal mais benéfico para as empresas instaladas na zona franca da Madeira, o que estaria a permitir a utilização abusiva do tratado em detrimento dos interesses brasileiros.
Parece-nos, rio entanto, que a reacção do Brasil é manifestamente desproporcional em relação aos motivos que a justificaram. Lembrava que, ainda recentemente, o Brasil, por causa de três cidadãos brasileiros que ficaram retidos no Aeroporto da Portela, fez um escarcéu medonho e que todo o país se mobilizou.
Portanto, parece-nos que esta matéria deveria merecer mais atenção por parte do Governo português, pois ficamos com a estranha sensação, muito desconfortável. de uma total insuficiência de informação e diálogo entre as partes envolvidas na negociação.
Seja como for, o certo é que a denúncia deste tratado é um acto diplomático que cria um perigosíssimo precedente, que vai deteriorar, com certeza, a confiança entre os dois países irmãos.
A diplomacia portuguesa tem, neste caso, a grave responsabilidade de evitar uma capitulação humilhante, propondo, desde já, soluções técnicas aceitáveis por ambas as Partes.
Deixamos, nesta Câmara, esta preocupação expressa e lançamos um alerta ao Governo para que tome as necessárias medidas numa matéria que tem a maior relevância para muitos portugueses e para a economia nacional.
Para terminar, queria também dizer que não bastam discursos nem visitas, que parecem contentar totalmente o Partido Socialista. Aliás, das palavras do Sr. Deputado fiquei com a ideia de que, para o Partido Socialista, "o que é preciso é visitar", "o que é preciso é discursar", "o que é preciso é chegar cá e dar conferências de imprensa". Não, Sr. Deputado, o que é preciso é que estas situações não aconteçam!
O Brasil, por causa dos odontologistas, moveu uma operação diplomática, envolvendo o Governo e o próprio Presidente da República, até que a questão se resolveu, por causa de três cidadãos que ficaram retidos, e muito bem, no Aeroporto da Portela "moveu mundos e ,fundos", a revista Vela gastou não sei quantas páginas centrais sobre este assunto.
Sobre esta questão tão importante, o que é que os portugueses sabem? Nada! O que é que esta Assembleia sabe? Nada! O que é que faz o Ministério dos Negócios Estrangeiros? Que se saiba, nada! O que é que faz o Governo? Que se saiba, nada! Á única coisa que ouvimos são discursos de circunstância. Aliás, a mesmíssima coisa passa-se em relação a Angola. Basta de visitas, basta de discursos, vamos ver se conseguimos fazer alguma coisa!
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Acácio Barreiros (PS): - "Orgulhosamente sós!..."
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr Deputado Joel Hasse Ferreira.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, queria saudar a sua preocupação com a importância dos investimentos portugueses no Brasil, que é uma questão política, talvez de fundo, que o Sr. Prof. Marcelo Rebelo de Sousa nunca entendeu.
Os seus interesses e as suas perspectivas não serão, necessariamente, coincidentes com as nossos, mas partilharemos uma larga fatia quanto à questão dos interesses nacionais.
O quero dizer a V. Ex.ª - suponho que sabe - é que a denúncia do acordo só terá efeitos em 1 de Janeiro do ano 2000.
O Sr. Silvio Rui Cervan (CDS-PP): - Já!
O Orador: - Por outro lado, está acordado entre os governos português e brasileiro a negociação de um novo acordo, modelado no paradigma dos acordos da OCDE sobre este domínio. Portanto, contrariamente ao que V. Ex.ª disse, o Governo português está a trabalhar. Mais: neste momento, encontra-se em Brasília uma delegação de altos funcionários portugueses a renegociar com o governo brasileiro este acordo.
O que é que se pode dizer sobre isto? Pode dizer-se que alguns dos aspectos que, no Brasil, têm sido considerados críticos relativamente a este acordo e que a questão das zonas francas tal como tem -,rindo a ser encarada na União Europeia terão de ter, logicamente, uma evolução. Se V. Ex.ª conhece bem o acordo da zona franca relativamente à Madeira vê que, contrariamente a outras regiões onde existem zonas francas, a Região Autónoma da Madeira, e Portugal no seu conjunto, não tira o partido que poderia tirar desse acordo.
Concluindo, Sr.ª Deputada, saúdo a sua preocupação, mas quero dizer-lhe que está a ser feito o que deve ser feito, ou seja, está uma delegação em Brasília a renegociar o acordo. Obviamente, não vou pronunciar-me nem comentar, dado o órgão em que estamos, a fornia como se procedeu à denúncia. Há pessoas, nesta Assembleia, que, às vezes, parece que estão noutro sítio qualquer, que não sabem bem onde estão, porque não têm em conta que, nos acordos, há um prazo de denúncia, portanto, para forçar a renegociação foi feita a denúncia. Poder-se-á discutir esta questão, é discutível, mas não vou entrar por aí.
A questão central é que os investimentos portugueses no Brasil são muito importantes e são feitos numa estratégia de internacionalização da economia portuguesa, que tem sido defendida por este Governo e que é correcta. Os problemas que estão em cima da mesa estão a ser renegociados e, efectivamente, neste momento, está uma equipa, em Brasília, a renegociar estes acordos. Portanto, estou perfeitamente convencido de que, muito antes de 1 de Janeiro do 2000, a breve prazo, haverá condições para o acordo estar renegociado. De qualquer maneira, saúdo a preocupação de V. Ex.ª, que me parece importante.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, queria apenas fazer três observações às palavras do Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.
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Em primeiro lugar, parecia-me - e é para isso que serve e sempre serviu, ao longo de séculos, a diplomacia - que as negociações deviam anteceder a denúncia. Parece-me extraordinário que se vá negociar depois de uma denúncia unilateral, que é um acto entendido diplomaticamente como hostil! Por isso, desejaria que o meu país tivesse tido, nesta questão, a diligência de negociar antes da denúncia, embora também tenha de censurar a atitude do Brasil, que denunciou, de certo, precipitadamente.
A questão das zonas francas tem de ser compatibilizada, ou seja, o grande desafio que se coloca a Portugal é saber compatibilizar o facto de ser parte integrante da União Europeia e de ter esta vertente atlântica, é para isso serve
a CPLP.
A CPLP, hoje, já não é uma romaria de saudade, espero! Também deveria ser um forum onde se tratariam estas questões sem complexos de culpa e de forma "arejada" - e voltamos ao cruzamento de interpelações à Mesa que já
referi, sobre o qual havia muito para se dizer.
Portanto, não faz sentido que o Brasil, estando na CPLP e entendendo a utilidade de Portugal estar na Comunidade Europeia, até para aquele país, possa levantar um obstáculo que advém exactamente da nossa presença na União Europeia.
São estas questão que não vemos ser tratadas, ao que acresce um défice de informação. Levo uma informação que, muito simpaticamente, o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira me transmitiu, mas isto não é forma de um país viver. A
forma de um país viver é a opinião pública ser informada pelo Governo, é a Assembleia ser informada pelo Governo e não, casualmente, porque levanto a questão, o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, prestimoso, prestar-me estas informações, que, estou certa, são verdadeiras!
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para, sob a forma de interpelação à Mesa, prestar uma curtíssima informação sobre um assunto que foi Risos gerais.
abordado.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, espero que seja mesmo uma interpelação, pois não vou permitir mais interpelações que não o sejam verdadeiramente.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, quero apenas dizer que se encontram em curso as negociações.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso é pior! É mais grave!
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, para tratar de assunto de interesse político relevante, tens a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aproximam-se as eleições legislativas e o Governo, em vez de adoptar uma atitude de rigorosa isenção e imparcialidade, entrou numa descarada campanha eleitoral,
com todos os seus membros a percorrerem o País e a distribuírem promessas, autopropaganda e abraços.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Esses deveres de isenção e de imparcialidade, mais do que deveres inscritos na lei, são uma absoluta exigência da vida democrática tal como está configurada na Constituição, que reserva aos partidos políticos a apresentação de candidaturas e vincula o Governo e a Administração a um tratamento em plano de igualdade, sem favorecimentos nem discriminações, das diferentes propostas partidárias.
Vozes do PCP: - Exactamente!
O Orador: - Durante anos, o PS juntou a sua voz aos que protestavam contra as campanhas eleitorais que o PSD promovia através dos governos do Professor Cavaco Silva. Agora, é o PS que faz aquilo que criticava ao PSD; é mais uma promessa de mudança que o PS não cumpriu!
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Os exemplos são tantos que não é em escassos minutos que se podem descrever.
Lembro aqui a promessa, repetida mais urna vez, de um TGV Lisboa-Porto para daqui a 10 anos! O tal TGV em forma de T - que deve ser o T de tonto, nome que o Governo tem para aplicar aos que ainda acreditam nestes delírios ferroviários.
Ontem, o Primeiro-Ministro voltou a anunciar a mesma rede de Metro que já foi anunciada há um, há dois e há três anos. Até linhas que foram remetidas para as "calendas gregas", como é o caso do prolongamento do Metro até Sacavém, voltaram ontem a ser referidas!
O Primeiro-Ministro não tem parado. Há pouco mais de uma semana, levou 250 autocarros com idosos para Bragança, não para passearem, mas para ele "aterrar" nos braços de uma multidão dirigida pelo Sr. Presidente da União das IPSS. Foi aí que o Primeiro-Ministro, perturbado, fez a famosa cena de afinfar dois "chochos" no microfone da Renascença, num claro aviso à comunicação social dos mimos que lhe reserva.
Risos gerais.
Mas o caso paradigmático que aqui trago é o da actuação propagandística dos governos civis ao serviço da campanha eleitoral. Trago aqui como exemplo o Balanço da Legislatura 95/99 no Distrito de Évora - que é esta "coisinha" bonita -, publicação do Governador Civil de Évora que é um escândalo e um despudor de campanha eleitoral do Partido Socialista.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Ministros e Secretários de Estado são aos molhos - eu creio que até são mais do que aqueles que existem -, em visitas, em reuniões, em discursos, e, particularmente, em pose.
Em papel couché, 46 páginas e centenas de fotografias, o Governo Civil mistura promessas e lançamentos da primeira pedra com numerosas obras e iniciativas dos municípios e da associação `de municípios, numa apropriação absolutamente indecorosa do trabalho dos outros.
Vozes do PCP: - Muito bem!
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O Orador: - Este folheto de propaganda representa, de uma forma inquestionável, a utilização de dinheiros públicos por entidades públicas para fins estritamente partidários. Mas não bastava isso, ainda tinha de o fazer apropriando-se do trabalho alheio.
Estas situações não podem continuar. Por isso, o Grupo Parlamentar do PCP não só denuncia estas situações de abuso como apela aos órgãos de soberania no sentido da sua clara condenação, em nome da exigência democrática de eleições justas e genuínas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para terminar, uma palavra sobre os negócios da aviação civil portuguesa. Relatam os jornais que o Governo português forçou duas empresas de capitais do Estado, a Partest e a Caixa Geral de Depósitos, a meterem dinheiro na Portugália, a fim de facilitar a operação da Swissair de toma dessa empresa, garantindo, assim, à Swissair, que, apesar de minoritária no capital da Portugália, fica com o seu controlo. Ainda por cima, esta operação insere-se na venda do capital da TAP à mesma Swissair. Isto é, o Governo entrega toda a nossa aviação comercial à empresa suíça, pagando para isso na compra da Portugália.
É um escândalo e não se admite, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que o Governo não dê públicas explicações.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos, tens a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Vem explicar isso dos "chochos"! ...
Risos.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Amaral, penso que é compreensível a preocupação do PCP, quando o Governo, com grande naturalidade, faz aquilo que lhe compete fazer, ou seja, aparece junto das realizações que concretizou, contrariando um conjunto de profetas que, ao longo dos anos, dizia que o Governo não governava, nada concretizava e nada fazia.
É evidente que o Sr. Deputado fica preocupado quando aparecem mais 175 centros de saúde e extensões, quando aparecem dezenas de novos quartéis da GNR, dezenas de novos quartéis de bombeiros, quando aparecem dezenas de escolas e de pavilhões, quando há um estímulo aos transportes, quando há uma política para a terceira idade, para a infância e para a juventude - tantas vezes reveladas por alguns -, e quando, ao nível das estradas, nos podemos aperceber das realizações em concreto.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Onde?! Ó diabo...
O Orador: - Nestas alturas, V. Ex.ª fica, de facto, preocupado.
Mas eu não estranho. Era preferível e, se calhar, desejável para o Sr. Deputado João Amaral, para além dessa preocupação ou dos "chochos" que tanto sensibilizaram o Sr. Deputado Artur Torres Pereira, que o Governo não governasse e que não pudesse ser visível para a população a contradição em que, de uma forma insistente, a oposição cai, relativamente ao Governo.
Mas deixo-lhe uma pergunta, Sr. Deputado João Amaral. Ao pegar no Boletim Informativo do Governo Civil de Évora - pelos vistos, na sua opinião, feito até com bom gosto... -, pergunto-lhe por que é que o Governo Civil de Évora não pode fazer um boletim informativo, quando as câmaras municipais do PCP podem fazer os boletins informativos que querem, fazendo a publicidade que entendem, cone recurso aos dinheiros das autarquias locais, que, se calhar, melhor seriam aplicados na vida quotidiana dos cidadãos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Também para pedir esclarecimentos, inscreveu-se a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.
Não sei se o Sr. Deputado João Amaral prefere responder desde já ou se prefere responder no fim.
O Sr. João Amaral (PCP): - No fim!
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Então, para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Amaral, também me chegou à mão o tal boletim do Governo Civil de Évora e não é tanto o luxo da publicação...
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - A Sr.ª Deputada, eleita pelo círculo eleitoral de Évora, está preocupada!
A Oradora: - Exactamente, eleita por Évora!
Dizia que o que mais me choca não é tanto o luxo da publicação, mas a mistura entre as actividades próprias do Governo e as actividades que nada têm a ver com o Governo. Essa mistura no mesmo "pacote" é, realmente, verdadeiramente chocante.
Mas, Sr. Deputado, pedi a palavra porque o Sr. Deputado fez uma referência à política que neste momento está a ser seguida na questão da TAP e da Portugália. Penso que nessa matéria o Governo nos deveria ter dado alguma explicação, já que, ingenuamente, pensava, de acordo com o que se tinha passado aqui, na Assembleia, e com algumas declarações, nomeadamente do Ministro João Cravinho na Comissão de Economia, Finanças e Plano, que era política do Governo privatizar a TAP. Não vou dizer se concordo ou não, mas era política do Governo privatizar a TAP.
Com a operação que foi feita, cheguei à conclusão de que estão a pensar nacionalizar uma companhia de aviação privada e que, portanto, por um lado privatizam e por outro nacionalizam. Penso que seria bom que o Governo viesse a esta Assembleia explicar, afinal, qual é a política que segue nesta matéria.
Aplausos do PSD.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Nacionaliza nuns casos e privatiza noutros! É urna política perfeitamente aceitável!
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder aos pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, responderei de forma muito breve.
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Começo por responder à Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, dizendo-lhe que estou inteiramente de acordo, porque, de facto, o Governo quer nacionalizar a nossa aviação civil, dando-lhe nacionalidade suíça.
Quanto ao Sr. Deputado José Junqueiro, sei que V. Ex.ª ficou aborrecido pelo facto de, na minha intervenção, não ter referido as viagens do Sr. Primeiro-Ministro e Secretário-Geral do PS, nessa dupla qualidade, nos Pumas da Força Aérea sobre os mosteiros de Viseu, mas fica dito agora: o Sr. Primeiro-Ministro também andou pelos mosteiros de Viseu! Não se esqueçam!
Mas 175 centros de saúde, Sr. Deputado?! Tantos centros de saúde?! Então, por que é que os portugueses se queixam do estado em que está a saúde?
O Sr. Rui Namorado (PS): - O Cavaco deixou aquilo num estado lastimável!
O Orador: - Essa é que é a questão central!
Quais 175 centros de saúde! Provavelmente, o que o senhor tem é aquele esquema das informações do ministério, com as listagens dos "sonhos" da Sr.ª Ministra, dos "sonhos" dos ministros anteriores e dos "sonhos" dos futuros dos ministros que aí hão-de vir!
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - No ano 2010! ...
O Orador: - Portanto, quanto muito, isso é o chamado "Programa dos Centros Putativos".
O que realmente tem sido feito com abundância são anúncios de jornais. Por exemplo, no que respeita a estradas e auto-estradas, não há jornal que não traga, a vermelhinho, a azul e a verde, não digo quilómetros, mas centímetros e centímetros de estradas e de auto-estradas: 3 em de 1P3 não sei onde, 4 em de auto-estrada não sei onde, 1,5 em aqui, etc.! Uns azuis, outros verdes e outros - eu disse vermelhos, ruas peço desculpa - rosa!
Risos gerais.
Quanto a obras, não posso deixar de referir uma excelente obra, o transporte ferroviário. Se o Sr. Deputado quer falar do que é a actividade do Governo, aí tem um bom tema. O transporte ferroviário deu a situação mais escandalosa e inexplicada, até hoje, em todo este período, que é a situação espantosa de se terem gasto dezenas de milhões de contos a comprar novos comboios pendulares, para, depois, se dizer que eles só podem circular daqui a seis, sete ou oito anos, isto é, numa altura em que eles já estiverem desactualizados. É uma situação perfeitamente escandalosa e é uma situação perante a qual o Governo devia responder e sobre a qual ainda não deu, até este momento, qualquer explicação plausível.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desde há muito tempo que o Governo ocupa cole insistência e sem qualquer rebuço os espaços de informação da televisão pública. Mas agora que foram marcadas as eleições o caso é ainda mais grave.
A figura a promover obrigatoriamente é a figura do Sr. Primeiro-Ministro. Já não há disfarce possível. A pré-campanha lança, ao mesmo tempo, um cartaz na rua e uma imagem no televisor. Há uma complementaridade necessária. Há um aproveitamento abusivo dos meios de comunicação públicos.
Às vezes, nota-se uma certa descoordenação no plano. Há repetições, há excesso, há exagero, mas todos os dias o Sr. Eng.º António Guterres, aparece - segundo dizem, quem não aparece, esquece... E verdadeiramente a máxima desta campanha escandalosa.
Basta qualquer cidadão fazer as contas aos tempos do Governo nos telejornais para nos darmos conta da desproporção com os tempos das outras forças políticas.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Mas, para que não haja dúvidas, aprecie-se o alinhamento das emissões, os comentários elogiosos, o tom triunfalista. Esta pré-campanha do Primeiro-Ministro tem de vender bela. Os portugueses em férias são condenados a consumir o Sr. Primeiro-Ministro como quem bebe um refresco. Tudo com suavidade. O Sr. Primeiro-Ministro só aparece com boas notícias, com bons anúncios ou com boas promessas; é o Primeiro-Ministro abraçado aos idosos; é o Primeiro-Ministro rodeado de moradores de casas recém-distribuídas; é o Primeiro-Ministro, de capacete, antecipando um qualquer metro que ninguém vê, porque vem ainda a anos de distância; é o Primeiro-Ministro de um país das maravilhas. Nesse país, o do Sr. Primeiro-Ministro, nada de mau acontece, simplesmente porque tudo o que é mau, negativo e condenável, passa, por decreto do Governo, a ser bom.
Haverá lugar para os portugueses se preocuparem com as várias más noticias que se acumulam? Não! Há mal-estar com os militares? Há para com eles promessas incumpridas? Há, por parte deles, manifestações de desagrado nas ruas? Mas que importância pode ter isso? O novo Ministro entra, pressiona o Ministro das Finanças, descobre-se o dinheiro, promete-se o pagamento a prestações, consolam-se os militares descontentes, paga-se a tranquilidade e talvez, até, se comprem votos. No meio de tudo isto, esta proximidade das eleições ajuda à inventiva e à descoberta de pontos de entendimento. O Orçamento é sobrecarregado à última hora, mas salva-se o Ministro em part-time.
É esta consciente inconsciência, esta verdade de enganos construída que marca e caracteriza este Governo. Um Governo fraco, dado a tais fraquezas. Mas não é possível perpetuar a ilusão.
Um exemplo gritante passou-se há poucos dias. Como é possível manter a imagem de um Primeiro-Ministro triunfante na Cimeira da União Europeia com o Mercosul? Pode coexistir com ela um acto de tão profunda gravidade como a denúncia do Tratado de Dupla Tributação entre Portugal e o Brasil? Depois de tantas parangonas sobre a excelência das relações entre os dois países, o Brasil denuncia assim, sem mais, unilateralmente, o acordo?
Dizem alguns comentadores, certamente com bonomia, que o Sr. Eng.º António Guterres saíra do Brasil sem se aperceber do autêntico corte de relações económicas entre os dois países. Mas, afinal, que diálogo é este? Como é que pode acontecer isto? A menos que se acredite, com a explicação do Partido Socialista, que a denúncia unilateral foi combinada.
Este assunto não convém, este assunto deve ser rapidamente esquecido, este assunto não é assunto de gran-
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de informação. Prejudica empresas? Prejudica trabalhadores? Prejudica emigrantes? Que seja, mas não deve ser salientado, logo agora que tudo estava a correr tão bem... O silêncio é a resposta do Governo. Decididamente, este não é um tema da propaganda oficial, não cabe nos tempos de antena.
Portugal assiste, hoje, à maior manipulação informativa de que há memória nas televisões públicas. Só existe o que o Governo quer.
E o escândalo da publicidade dos ministérios em todas as televisões? O que dizer disto?!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Uma vergonha!
O Orador: - Só existe o que o dinheiro público paga para ser impingido aos portugueses como se fosse realidade!
Vozes do PSD1 - Muito bem!
O Orador: - É neste ambiente que as próximas eleições vão ser disputadas e daqui até lá só pode ser pior!
Valia a pena que o Sr Presidente da República se mostrasse mais atento e, mesmo num intervalo da sua presidência aberta, passasse e desse uma palavra sobre o assunto. É porque o que está em causa é o valor da igualdade de condições entre Governo e oposição, é a garantia de direitos fundamentais, é o equilíbrio dos órgãos de informação públicos. É do bom exercício da democracia que se trata como é do rigor e da isenção na aplicação dos dinheiros públicos que se trata também.
Temos o direito de exigir uma palavra, de denunciar o silencio, de impedir um justo privilégio, de afastar uma cortina, de impedir um terceiro-mundismo informativo.
Que fique bem claro para todos: damos perfeitamente conta do que está a acontecer e o que está a acontecer não pode continuar porque é um verdadeiro insulto aos portugueses!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr Deputado Acácio Barreiros.
O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Sr. Deputado Carlos Encarnação, já estava com algumas saudades de o ouvir, embora - desculpe que lho diga - não me tenha parecido muito inspirado.
Devo dizer-lhe que ouvia há pouco críticas do Partido Comunista, que, mesmo injustas, têm alguma coerência. Todavia, ouvir o PSD falar de manipulação da comunicação social, de influências da televisão e do facto de o Primeiro-Ministro estar sempre a aparecer .. Ó Sr. Deputado penso que um dos problemas do PSD - e tenho-o dito várias vezes, mas já vi que não os convenço - é pensar que os portugueses são estúpidos, que tem memória curta e que não se lembram do que se passou. A verdade é que os portugueses tem perfeita consciência de que, com este Governo, houve uma profunda transformação nas relações do poder político com a comunicação social e, particularmente, com a RTP. Houve, como digo, uma profunda alteração, no sentido de uma liberdade de actuação da comunicação social, que é perfeitamente reconhecida. Acabou aquele tempo da tentativa de controlo da comunicação social que existia com o PSD e que toda a gente sabe que existia.
Sr. Deputado, não comece a deitar culpas para toda a gente. Se o líder do seu partido não aparece, por razões respeitáveis mas não aparece, a comunicação social não pode inventar. Sc o líder do seu partido não diz coisas interessantes nem diz coisas novas - está a pensar dizê-las em Setembro.., não atire culpas para cima dos outros. A verdade é que o PSD nada de novo tem a dizer ao País e, sobretudo, não resolve aquele problema, que já foi aqui várias vezes focado, de vir dizer que é capaz de fazer agora em 100 ou em 200 dias aquilo que não fez durante 10 anos.
Sr. Deputado, o Governo está a apresentar a obra que fez, mas acho que não deviam estar preocupados, porque os senhores andaram todo o tempo a dizer que «o Governo não fez nada, rigorosamente nada». Por isso, não deviam estar preocupados. Como se demonstra, o que é verdade é quo há obra feita pelo Governo e nós confiamos profundamente no sentido de justiça dos portugueses.
O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): - Tem toda a razão!
O Orador: - Deixe-me fazer-lhe um último apelo: não facilite mais a vida ao PS! Não é por nada, é que nós gostamos de uma boa luta política, com toda a tolerância, mas de uma boa luta política eleitoral.
O Sr Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Vão ter!
O Orador: - Andarem pelo País a dizer que o Governo nada faz, quase nem precisamos de fazer qualquer campanha, porque a própria obra do Governo responde e nega toda essa vossa publicidade.
Por fim, só mais uma coisa: levou quatro anos, mas valeu a pena, porque, finalmente, parece que o PSD, pela voz do seu líder, está de acordo com uma das grandes medidas deste Governo e que é a criação do Rendimento Mínimo Garantido. E já agora pergunto se o Sr. Deputado também está de acordo com o que foi uma grande obra - o Rendimento Mínimo Garantido.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Bem perguntado!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Acácio Barreiros, o senhor disse que eu não estava muito inspirado quando me pronunciei sobre isto. Sabe que é difícil as pessoas estarem inspiradas quando é com profunda tristeza que tem de dizer aquilo que dizem.
Risos do PS.
Nunca imaginei ter de dizer isto, principalmente, perante um governo socialista que anunciou aos portugueses que se ia portar de maneira completamento diferente daquela que se porta. Nunca imaginei que vinha dizer a VV. Ex.ªs que tinham enganado os portugueses quando prometeram uma coisa e deram outra. Nunca imaginei que VV. Ex.ªs se assenhoreavam da comunicação social pública com o desplante com que o fizeram. E, ainda por cima, não consigo compreender como é que V. Ex.ª com toda a sua
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bonomia, se presta a vir aqui fazer esse papel, e dizer: "Nós? Não deve ser connosco, deve ser com outrém!".
Sr. Deputado Acácio Barreiros, o problema da inteligência dos portugueses também é medido por isso. Todos os portugueses estão a assistir ao que está a acontecer. "E convém lembrar aos portugueses aquilo que, exactamente, está a acontecer" - diz V. Ex.ª! Mas os portugueses não podem ser enganados, pois não? Isto é, os portugueses sabem que este Governo nada fez, mas o que acontece é que este Governo anda a dizer, nos canais de televisão, que fez muita coisa. Fez inaugurações de coisas que foram, feitas por governos anteriores; fez coisas que nunca praticou mas está a anunciar para o ano de 2010, 2020, 2030. Portanto, o que acontece é que há actos de perfeito engano e são esses actos de perfeito engano que têm de ser denunciados.
Se V. Ex.ª me viesse dizer que eu estava a criticar o Governo por vir apresentar o seu trabalho feito, então, sim, V. Ex.ª podia ter essa recriminação. Por mim, seria justa, mas o problema, Sr. Deputado Acácio Barreiros, é que os senhores estão a mostrar aquilo que não fizeram, estão a dar a ideia daquilo que não são capazes de fazer, estão a tentar "lançar poeira para os olhos das pessoas", a fingir que este Governo fez alguma coisa. E como entendo, e como a maioria dos portugueses também entende, que W. Ex.as nada fizeram e, provavelmente, muito pouco irão fazer, tenho o dever estrito, do ponto de vista democrático, de vir denunciá-lo. Se V. Ex.ª concorda ou não, é um problema seu. Agora, o que não posso é deixar de denunciar um embuste. E é exactamente isso que quero fazer aqui.
Sc houve medidas boas..., mas, que diabo, só terá havido uma medida boa neste Governo?
O Sr. Rui Namorado (PS): - Houve uma? Afinal, houve uma?
O Orador: - Foi exactamente isso que aconteceu: só houve uma medida boa! E chega para fazer um governo? Não chega para fazer um governo! Houve tantas outras medidas boas que, entretanto, se praticaram em governos anteriores e de que W. Ex.as nunca se lembram. Não há qualquer mal em dizer isto. O que é importante é tentar explicar aos portugueses aquilo que VV. Ex.as não fizeram e aquilo que estão a fazer e que, do ponto de vista democrático, é muito grave: é utilizarem os meios de comunicação social pública para enganarem os portugueses. E estão a tentar fazer isto até às eleições e a fazer com que o Sr. Presidente da República esteja distraído em relação ao que, se está a passar.
E para isto que a nossa palavra se levanta aqui e é essa afirmação que queremos deixar para todos.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.
Eram 17 horas e IS minutos.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, vamos dar inicio ao debate de urgência sobre a- gestão do Serviço Nacional de Saúde, requerido pelo CDS-PP.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr. a Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Esta recente notícia que veio a lume na sequência do relatório do Tribunal de Contas traz uma questão que é bem mais importante, e vai mais além do que a do buraco orçamental.
Como todos sabemos, compete à Assembleia da República discutir e aprovar os orçamentos ordinários e rectificativos. E aquilo que este relatório traz ao de cima - e que entendo ser muito mais grave - é que demonstra à saciedade que o Governo ludibriou a Assembleia da República ao iludir os pressupostos, os números e os motivos. Privou, assim, a Assembleia da República de elementos fundamentais de análise e, de certa forma, prejudicou o trabalho dos Deputados.
Como é que, por exemplo, o Tribunal de Contas pode saber que o défice estimado em 1998 era de cerca de 330,2 milhões de contos e o Governo - como se pode ler nos Diários da Assembleia da República - dizia ignorar como se repartiam os 159 milhões de contos - e não são os 330 - pelos anos a que supostamente diziam respeito?
O Governo desprezou também completamente os relatórios e as recomendações da OCDE, do Fundo Monetário Internacional, da Comunidade Europeia, do Conselho de Reflexão da Saúde e do Conselho Económico e Social. Todos eles, mais ou menos, em termos de diagnóstico e de medidas, apontavam os mesmos caminhos. Recordo mesmo que o- Sr. Ministro das Finanças disse, neste Hemiciclo, uma coisa extraordinária: que o FMI nada percebia e que era uma entidade ultraliberal e ortodóxa.
O Sr. Ministro das Finanças não está presente para lhe perguntar se ele acha que o Tribunal de Contas de nada entende e que é uma entidade ultraliberal e ortodoxa...
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Ortodoxa é!
A Oradora: - Sim, ortodoxa deve ser - e se já o era no tempo em que ele o presidia.
Depois, o Governo não só desprezou estas medidas, recomendadas de tantas fontes, de tantos lados, que algumas devem ser certas, como não as substituiu por outras. Ou seja, também se coloca aqui a questão de saber se um governo, legitimamente designado, pode fazer "orelhas moucas" numa área em que o seu desempenho é tão catastrófico. Que mais relatórios, que mais entidades poderiam ter surgido em Portugal a dizer o mesmo para que o Governo tivesse tido alguma atenção por esta matéria?
De qualquer maneira, penso que se prova aqui ser inteiramente verdade aquilo que várias vezes afirmámos e temos pena de constatar a veracidade daquilo que afirmámos muitas vezes, apenas temendo, mas não desejando que tal acontecesse.
Em relação aos pressupostos falsos, eu daria aqui dois exemplos: primeiro, o cartão de utente. Como se recordam, o cartão de utente era tuna medida que a Sr.ª Ministra da Saúde e o então Secretário de Estado da Saúde nos disseram, aquando da discussão do Orçamento do Estado para 1996, que iria estar pronto no final do ano. Estamos em 1999 e o cartão de utente não está ainda em vigor em todo o território nacional, nem vai estar e percebe-se muito bem porquê. Estas coisas demoram, levam tempo e, portanto, menos voluntarismo e mais segurança no sentido de mai-
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or conhecimento das situações teriam sido muito mais úteis ao Governo, ao Ministério da Saúde e aos cidadãos.
Quanto às receitas orçamentadas, que foram sempre sobre orçamentadas e que em 1998 atingiram o ponto ridículo de serem sobre-orçamentadas em muitos milhares de contos, quando aqui se dizia "atenção, que a receita está sobre-orçamentada", o Sr Secretário de Estado dizia que não, que ia cobrar aquelas receitas com toda a segurança.
Quanto aos motivos, que também nunca corresponderam à verdade, o aumento da produção, a uma dada altura, como nada mais havia, ouvimos da bancada do Partido Socialista alguém dizer "sim, senhor, isto não é um descontrolo orçamental, está a custar mais dinheiro porque estamos a produzir mais, a tratar mais doentes, a dar mais consultas, a fazer mais cirurgias". Perguntámos coisas evidentes: que produção é esta? Como é que esta produção é medida? Quais são os parâmetros para medir esta produção, é avaliada por que critérios? E quais os objectivos? Ninguém nos respondeu.
Depois, também houve aqui uma dança de números. Umas vezes era o INE, outras, era o 1G1F (Instituto de Gestão Informática e Financeira); umas vezes eram dados ditos aqui directamente, à boca de cena pelos membros do Governo. Às vezes, vinham nos jornais, uma grande cortina de fumo desceu sobre isto, nunca soubemos qual era essa famigerada produção, tememos que tenha sido, sobretudo, uma enorme desorganização.
Depois, já em grande desespero de causa, ouvimos não o Secretário de Estado da Saúde, não a Ministra da Saúde, não o Secretário de Estado do Orçamento, mas o Ministro das Finanças dizer esta coisa extraordinária: "A saúde é por natureza orçamentalmente incontrolável". Ou seja, o Ministro das Finanças assistiu aqui que a despesa da saúde nunca teria controlo. Até lhe sugerimos que deixasse "em branco" a saúde no Orçamento do Estado e que se preenchia no fim do ano. Foi, mais ou menos, o que fizeram.
Ora, este aspecto chocou-me particularmente. Isto significou que, nesse dia, o Sr. Ministro das Finanças dissesse aos directores dos hospitais, aos directores clínicos, aos administradores delegados, às diferentes chefias de níveis hierárquicos, o seguinte: "Desistam! Não vale a pena, porque isto não tem controlo. E como não tem controlo, para que se estão aí a cansar?". Desresponsabilizou uma máquina, que, melhor ou pior, existe e tenta responder.
Em relação aos números, foi uma dança hilariante. O Sr. Secretário de Estado do Orçamento falou de uma dívida rolante de 80 milhões de contos, de um défice acumulado, em 13 de Dezembro de 1997, de 190 milhões de contos, fez uma operação de tesouraria de 159 milhões de contos, e o Tribunal de Contas aparece-nos agora com 330 milhões de contos.
Recordo-me que, perguntado sobre a repartição por 1996 e 1997 dos 159 milhões de contos, disse "não sabemos nem podemos saber". Não sabemos nem podemos saber o défice de 1998. Explicaram-nos, então, que as facturas andavam por aí "a voar", muitas facturas, muitos milhões de contos de facturas e quando "aterrassem" no Ministério da Saúde, então, o Ministério saberia ao certo os números. Ora, também é uma verdade que, nos hospitais, mesmo não funcionando muito bem, mesmo sem um sistema de informação, mesmo com os computadores muitas vezes avariados, ligados a uma coisa obsoleta que existe no Ministério da Saúde, com dois técnicos que vão de um lado para o outro tentar arranjar as coisas, mesmo assim,
toda a gente sabe o que é uma dívida comprometida. Toda a gente sabe! Sr. Secretário de Estado, o mais fraco administrador delegado do seu Ministério sabe-o e pode responder-lhe a isso, mais número menos número, mas nunca mais de 330 milhões de contos. Isso posso garantir-lhe.
Ora bem, o que se conclui disto tudo é que o Governo, não governando... - e até admito que quando os portugueses elegem, correm esse risco, correm o risco de eleger um governo que não governa, agora, o que não podem é correr o risco de eleger um governo que não diz a verdade, que não fornece os elementos necessários para que a avaliação possa ser feita.
O Sr. Moura e Silva (CDS-PP): - Isso é grave!
A Oradora: - Para terminar, quero dizer o seguinte: não me afligem os 330 milhões de contos, aflige-me hoje aquilo que me afligia em 1995, e já antes disso em 1990 e em 1985: é que continuamos a saber o que se gasta e não sabemos quanto custa um bom sistema de saúde em Portugal.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
A Oradora: - Essa era a resposta que o Ministério da Saúde devia, hoje, estar habilitado a dar aos portugueses: " um bom sistema de saúde em Portugal custa tanto. Querem pagá-lo ou não?". "Queremos, sim senhor!" Agora, aquilo que dizem é: este mau sistema de saúde gastou aquilo que previmos, aquilo que confessámos e aquilo que não confessámos e que, agora, o Tribunal de Contas nos vem contar a todos. Isso, acho lamentável!
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, Sr Secretário de Estado, Srs. Deputados: No debate de hoje não vou denunciar a desgraça da política de saúde seguida por este Governo, porque ela é sobejamente conhecida, especialmente porque os seus efeitos são demasiadamente sentidos por todos os que, de alguma forma, precisam de recorrer ao Serviço Nacional de Saúde.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
A Oradora: - Tanto os profissionais deste sector como aqueles que necessitam de se socorrer dos serviços de saúde não precisam de ninguém que os alerte para o pesadelo que os espera. Sentem-no no seu dia-a-dia.
Para quê falar a todos os que necessitam de uma consulta e só a conseguem marcar daí a alguns anos? Para quê falar a todos os que trabalham nas urgências? Os factos gritam por si muito mais alto do que quaisquer palavras, por mais realistas que sejam.
Também não vou denunciar, nem explicar, o caos financeiro do sector de saúde. E não o faço porque já há muito tempo tem vindo a ser feito não só pelo PSD como por toda a oposição, a que, se juntou, em 1998, o Relatório do OCDE e que culminou, recentemente, com o relatório do Tribunal de Contas. E todos apontaram sempre no mesmo sentido: um enorme. desperdício de recursos, que se traduz num crescimento descontrolado das despesas, sem que
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daí resulte qualquer correspondência a uma melhoria dos serviços prestados.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Do que vou falar hoje, Sr. Secretário de Estado, é do modo como este Governo encara estes factos. O Primeiro-Ministro e a Ministra da Saúde encaram um dos mais sérios problemas com que a sociedade portuguesa hoje se confronta de uma forma natural e tranquila.
Tão natural, que reagem às mais graves acusações de má gestão de dinheiros públicos, como se nada tivessem a ver com esse assunto.
Tão natural, que caso não fosse uma auditoria de um tribunal de contas a escrever e a condenar o que se está a passar na área da saúde, o Governo continuava a fingir que não tinha dado ainda por nada do que se estava a passar.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Tão natural, como se os problemas das pessoas, a que supostamente o Governo devia dar resposta, não lhes dissessem respeito.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - É este, na minha opinião, o aspecto mais grave de toda esta realidade.
Terá o Governo o direito de desperdiçar o dinheiro dos nossos impostos, sem que daí decorra qualquer melhoria dos serviços prestados?
Não vou discutir, Sr. Secretário de Estado, se a sua utilização é legal porque a lei a legaliza, quero, sim, dizer que a actuação do Governo neste domínio pode ser legal, mas é, seguramente, ilegítima.
É ilegítimo gastar cada vez mais para ter um serviço cada vez pior.
É ilegítimo e é imoral, porque uma sociedade não é justa se o dinheiro dos seus impostos não for aplicado para o fim para que estão destinados. E, no caso da saúde, estes destinam-se a dar acesso digno aos cuidados de saúde dos mais desfavorecidos. Se tal não se verificar, estamos perante um logro colectivo que temos de repudiar.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Há dias, uma auditoria do Tribunal de Contas tornou explícito aquilo que já não é uma novidade - o descalabro no Serviço Nacional de Saúde. O que se passou depois, perante o País, foi algo verdadeiramente chocante.
O Governo - em que o Sr. Secretário de Estado foi um dos protagonistas -, com ar simultaneamente de espanto e de ingenuidade, pela voz do Secretário de Estado da Saúde, falou ao País numa declaração que só consigo qualificar como de um descaramento revoltante.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Tentou-se falar do relatório como se ele fosse uma simples recomendação e não uma violenta crítica, como se fosse a descrição de algo inevitável e não a condenação de uma política irresponsável.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Não há dúvida de que se tratou de uma mistificação, que nada mais pretendeu senão iludir a única consequência possível de tais críticas do Tribunal de Contas.
Aplausos do PSD.
E a única consequência possível teria sido a imediata assunção de responsabilidades políticas pela Ministra e respectivo pedido de demissão, inevitável em qualquer país civilizado.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - E ainda bem, Sr. Secretário de Estado da Saúde, que, desta vez, o senhor não veio aqui acompanhado, como é seu hábito, do Sr. Secretário de Estado do Orçamento, porque, efectivamente, não queremos discutir os meios financeiros de que o senhor dispõe; estamos a responsabilizá-lo pela forma como o seu Ministério aplica esses meios que lhe são postos à disposição e essa responsabilidade é exclusivamente da sua equipa.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - O Sr. Secretário de Estado do Orçamento ou o Sr. Ministro das Finanças hão-de vir, em devido tempo, responder como é que calculam o défice orçamental que comunicam a Bruxelas, dadas as operações de tesouraria ilegais que tem realizado a propósito do Ministério da Saúde, para não falar das famosas indemnizações compensatórias que ninguém ainda viu.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - O Sr. Ministro das Finanças há-de ter de explicar como é que já não está a cumprir o objectivo do défice orçamental que ainda há meses lhe serviu para entrar na Moeda Única.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não é verdade!
, A Oradora: - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: São muitas as vozes socialistas contra propostas de intervenção do sector privado nos cuidados de saúde. Espanta-me, por isso, que seja o Governo do Partido Socialista, tão apoiante do serviço público de saúde, que está a conduzir, paulatinamente, através da sua política, à destruição do Serviço Nacional de Saúde.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Olhe que não! Isso é um exagero!
A Oradora: - Porque não vale a pena encobrir, Sr. Secretário de Estado. Não estamos longe do momento em que já nada é possível fazer, senão olhar para os destroços do nosso sistema de saúde.
Vozes do. PS: - Eh!
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Esteve a ver o «Titanic».
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A Oradora: - É mesmo este o resultado mais visível do trabalho de uma equipa que apostou na popularidade pessoal, em desfavor do interesse dos utentes.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Com efeito, uma política que só pensa na imagem e não na acção concreta só pode contribuir para o seu descrédito e conduzir ao seu colapso.
Os portugueses só terão tranquilidade e segurança no futuro se não permitirem que esse futuro se mantenha nas mãos dos socialistas.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, confesso a minha estupefacção relativamente à intervenção da Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite porque esperava que ela viesse hoje trazer aqui a questão, que tem tratado várias vezes neste Hemiciclo, e também no âmbito das comissões, da verdadeira dívida da saúde e da forma como ela foi contabilizada, quer em termos de contabilidade nacional, quer em termos de contabilidade pública.
Interpreto o silêncio da Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite como uma aquiescência da bondade das explicações que lhe foram dadas, quer pelo Governo, quer pela bancada socialista e até pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira do PCP, no debate orçamental e, portanto, presumo que já não haja acerca disso qualquer espécie de dúvida.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Tem de ler!
O Orador: - Exactamente! Convinha que fizesse os trabalhos de casa! É muito importante que os Deputados façam os trabalhos de casa, que leiam o que os outros Deputados dizem e o que cada um diz em cada momento! Aliás, vou fazê-lo já a seguir!
Dito isto, há, no entanto, uma questão que a Sr.ª Deputada trouxe para a discussão que me parece extremamente importante, e que tem a ver com aquilo a que chamou a destruição do Serviço Nacional de Saúde. É que, efectivamente, é isso que está em causa, Sr.ª Deputada! É a destruição do Serviço Nacional de Saúde. Só que quem quer destruir o Serviço Nacional de Saúde, com as valências que o caracterizam e que o identificam, são VV. Ex.ªs, desde logo fazendo uma intervenção, a meu ver perfeitamente despudorada, sobre aquilo que são dificuldades reais sentidas pela população portuguesa nessa área, fazendo, portanto, uma imputação negativa ao Serviço Nacional de Saúde e, depois, ao intervir com falta de rigor, que, aliás, não é característica de V. Ex.ª, como sucedeu desta vez.
V. Ex.ª referiu-se, por exemplo, ao relatório da OCDE. É sempre muito bonito exibir - relatórios - da OCDE, do Fundo Monetário Internacional, do Tribunal de Contas -, mas talvez fosse mais importante ler os relatórios e tirar as devidas conclusões deles.
Quero dizer-lhe que li o relatório da OCDE, aliás sem saber que VV. Ex.ªs iriam requerer este debate, porque, normalmente, todos os anos leio esse relatório, que destina, como V. Ex.ª sabe, uma parte significativa das suas páginas aos problemas da saúde.
E não sendo eu, naturalmente, um especialista de saúde, concluiria - e concluí, lendo o relatório da OCDE - que ele é globalmente positivo para a política do Governo português. Portanto, V. Ex.ª ou não leu o relatório da OCDE ou não fez a tradução adequada do francês, que é a edição disponível neste momento, ou, efectivamente, inverteu completamente aquilo que são as indicações do relatório da OCDE. Estou a referir-me ao relatório de 1998. Só não tenho o prazer de o oferecer a V. Ex.ª porque só há um exemplar na Biblioteca e está esgotado na Livraria Portugal, que é onde normalmente se compra. Mas é ali no Chiado, é muito pertinho, e VV. Ex.ªs podem lá ir.
Realmente, a apreciação que o relatório da OCDE faz, na generalidade, sobre o sistema nacional de saúde e sobre a política de saúde do Governo português é uma apreciação extremamente positiva.
E ainda era mais positiva se pudéssemos exibir os quadros e o sentido da sua evolução. Por exemplo, a despesa: V. Ex.ª sabe, seguramente, qual é a noção de derivada, e sabe que a evolução das curvas se mede exactamente pelas derivadas, e poderia concluir facilmente que a evolução da despesa global - a OCDE faz a análise da despesa global que, depois, descrimina em despesa pública e despesa privada - vem, manifestamente, a desacelerar. A despesa global com os cuidados de saúde está manifestamente a desacelerar, mas, em simultâneo, Sr.ª Deputada, todos aqueles que são indicadores essenciais da evolução da riqueza dos cuidados de saúde em Portugal são indicadores extremamente positivos. Refiro-me, por exemplo, à mortalidade infantil, onde há uma evolução extremamente significativa, e à recuperação de dias de vida, medida pela esperança de vida a partir dos 60 e dos 65 anos, e esses são índices estruturais da evolução dos cuidados de saúde e de uma certa política de saúde em Portugal.
Agora, Srs. Deputados, eu disse aqui - e por isso é que digo que faço o trabalho de casa -, há uns meses atrás, o seguinte: «Ninguém ignora que a saúde é um sector deficitário na sociedade portuguesa. A saúde é, aliás, pela sua própria natureza, um sector onde as expectativas das pessoas ultrapassam sempre em muito as acções, os programas e as medidas que são progressivamente aplicadas, por isso não podem nem devem ser usados neste sector critérios de gestão política exclusivamente economicistas,...
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Isso é para os boys.
O Orador: - ... que constituam um espartilho demasiado apertado e asfixiante de um sector de crucial interesse social».
E foi exactamente isso que o Sr. Ministro das Finanças aqui disse. O que o Sr. Ministro das Finanças aqui disse foi que não devem ser utilizados, em relação às despesas de saúde, critérios excessivamente economicistas, porque, efectivamente, não é esse o padrão relativamente ao qual devem ser medidas as despesas da saúde em Portugal.
Aliás, a questão das finanças públicas não é uma questão sectorial, é uma questão global! A Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite sabe, e sabe muito bem, que o que tem de ser apreciado é o nível da despesa pública global e o nível do défice global do Orçamento do Estado do sector público administrativo. Se quiser, isso é que é significativo. E temos uma notícia, de há dois ou três dias, do Sr. Ministro das Finanças que aponta exactamente no
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sentido de uma correcção em baixa do défice orçamental para o ano de 1999.
Portanto, jogar desta forma, na minha opinião incompetente, quer do ponto de vista técnico, quer do ponto de vista político, não me parece ser unia boa solução, até porque, como tive oportunidade de dizer também nesta intervenção que aqui citei, com a saúde dos portugueses não se brinca ou, pelo menos, não se deve brincar.
Dito isto, Sr.ª Deputada, o que é que nos diz o Relatório do Tribunal de Contas? Olhe, devo dizer-lhe que, em boa parte, transcreve as conclusões do Relatório da OCDE.
Antes de mais, quero dizer-lhe que a auditoria do Tribunal de Contas foi pedida por este Governo. Há um despacho em que se pede esta auditoria e se diz que ele seja profundamente rigoroso na apreciação da evolução da despesa pública, do seu eventual descontrolo, e que se apresentem medidas concretas para obviar à continuação desse descontrolo.
Vozes do PS: - Bem lembrado! Isso é verdade!
O Orador: - Veja que diferença entre esta postura, que é uma postura extremamente responsável, e a vossa, quando qualificavam o Tribunal de Contas de força de bloqueio. Também já tive oportunidade de dizer que, para nós, o Tribunal de Contas não é unia força de bloqueio, mas também não é uma vaca sagrada, e, portanto, nós, com o respeito que temos pelo Tribunal de Contas, também podemos discutir o que o Tribunal de Contas diz. Aceitamos aquilo que o Tribunal de Contas sugere como positivo e introduzimos essas melhorias na nossa política, mas também podemos discutir. É o que tenros feito, é o que, seguramente, treinos fazer e é, seguramente, o que o Sr. Secretário de Estado não deixará de dizer quando anunciar à Câmara o conjunto de medidas que vão ser tomadas pelo Governo imediatamente, na sequência, aliás, das recomendações feitas pelo Tribunal de Contas.
Portanto, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite e Srs. Deputados do PSD, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto e Srs. Deputados do PP, efectivamente, estas são questões extremamente sérias que não devem servir de areia de arremesso político e muito menos como areia de arremesso partidário. Todos nós ternos consciência de que há um longo caminho a percorrer no domínio da saúde em
Portugal. Por isso é que a nova maioria definiu a saúde como espaço prioritário da acção para a próxima legislatura.
Temos consciência disso, mas também temos a certeza das profundas modificações e, sobretudo, das profundas melhorias que os cuidados de saúde tiveram em Portugal nos últimos anos. E tudo isto tem de ser balizado por um
valor essencial para rios, e que, aparentemente, não é para os Ss. Deputados. do PSD, que é o valor da defesa do Serviço Nacional de Saúde tal qual está consagrado na Constituição da República Portuguesa e implantado na legislação de Portugal.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel dos Santos, gostaria, realmente, de terminar a legislatura minimamente esclarecida.
Quero saber se o Sr. Deputado entende que 330 milhões de contos é um número suficientemente redondo para caber em critérios como "asfixiantes", "demasiado apertados" e "economicistas"? É que não mais se pode "tapar o sol com a peneira"! Os critérios economicistas, asfixiantes ou demasiado apertados, que também têm sido um alibi para não tomar conta do sector da saúde como ele merecia, não têm cabimento, do meu ponto de vista, quando estamos perante estes números.
Depois, quero lembrar-lhe que o Sr. Ministro das Finanças disse, em 1996, uma coisa completamente diferente daquilo que veio a dizer mais tarde. O Diário da Assembleia da República aí está para não nos deixar mentir nem esquecer! O Sr. Ministro das Finanças começou por afirmar que a saúde precisava de ser controlada, que era preciso introduzir medidas de controlo de carácter administrativo; depois, quando viu que já nada podia fazer, mudou o seu discurso, e acho que foi grave porque até respeito bastante o Professor Sousa Franco e penso que ele já não tem, do meu ponto de vista, qualquer beneficio ou condição para mudar o discurso a meio do caminho
Por outro lado, quero lembrar-lhe aqui o que é que o Engenheiro Guterres disse quando era Deputado da oposição: que, inclusivamente, suspeitava que tais gastos na saúde pudessem ser originados por fraudes. Imagine só! Imagine a nossa bondade! Nós não estamos a imaginar que haja qualquer fraude, só estamos a imaginar que há desgoverno, mas, perante números muito mais reduzidos, o na altura Deputado António Guterres achava que podia haver mesmo uma fraude.
Penso que o discurso que o Sr. Deputado fez agora é - um discurso coveiro do Serviço Nacional de saúde, porque aquilo que se está a passar para a opinião pública é um pouco o que disse a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite: é que não há remédio, e um dia o Ministério da Saúde fica...
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr.ª Deputada, já ultrapassou o seu tempo. Peço-lhe que termine.
A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente.
Como estava a dizer, um dia o Ministério da Saúde fica anexo ao Ministério das Finanças e, em vez de um Ministro da Saúde, haverá só um Ministro das Finanças.
Finalmente, queria dizer-lhe que se pediu a auditoria porque não se pensou que o resultado fosse este - de outra forma, não se tinha pedido. Agora, só espero que, unia vez que têm este resultado nas mãos, sigam as reconciderações do Tribunal de Contas, contrariamente àquilo que fizeram em relação à OCDE, ao FMI, ao CRES e ao CES.
Vozes do CDS-PP: - Muito bens!
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, penso que a história dos 330 milhões de contos já, foi explicada aqui várias vezes. Portanto, à pergunta, como a faz, ou seja, se eu integro 330 milhões de contos rios meus critérios de "espartilho asfixiante", respondo-lhe: naturalmente que sim!
O que é muito importante para mim - diz muito bem, não preciso de ajuda, mas de qualquer maneira está a aju
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dar-me (bem, talvez não esteja, porque está a falar de coisas diferentes) - é haver uma política financeira do sector público administrativo do Estado perfeitamente coerente com aquilo que são os objectivos nacionais. Isso é que é importante para mim!
Portanto, os 330 milhões de contos são, como V. Ex.ª muito bem sabe, um deslizamento da dívida:
Vozes do PSD e CDS-PP: - Deslizamento?!
O Orador: - Neste momento, o saldo não é esse, o que me permitiu dizer há pouco que não considerávamos...
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Ó Sr. Deputado...
O Orador: - Sr. Deputado, assim não tenho tempo para responder! Se não se importa, deixe-me responder, com o respeito que devo à Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
Como sabe, não são 330 milhões de contos que neste momento estão em jogo. Já foi feita uma operação, discutível - eventualmente, o Tribunal de Contas discute-a -, que transferiu para a dívida pública uma parte desse valor. O que está neste momento em dívida corresponde a quatro meses de pagamento, o que não é exagerado.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Oh! Oh!
O Orador: - Não é exagerado!
Portanto, claro que estou de acordo que este valor, e sobretudo a evolução que este valor está a ter, cada vez menos crescente - repare no que eu digo, cada vez menos crescente -, se ajusta perfeitamente aos critérios que referi.
Quanto à imputação que faz de eu ser ou deixar de ser "coveiro", é evidente que não é essa a minha interpretação. Disse exactamente o contrário!
Finalmente, vou referir-me à questão das fraudes. Foi talvez por isso que, recentemente, o Ministério das Finanças emitiu um despacho, através do Secretário de Estado do Orçamento, onde, ao contrário do que sucedia no passado, é exigido a todos os serviços da Administração Pública, nomeadamente aos serviços do Serviço Nacional de Saúde, uma informação muito rigorosa e tempestiva - dada trimestralmente - exactamente para evitar esse tipo de deslizes a que o Sr. Deputado' se refere.
Relativamente às determinações do Tribunal de Contas, estou seguro de que o Sr. Secretário de Estado explicará, a seguir, o que vai fazer na sequência do relatório que recebeu do Tribunal de Contas.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgo que o grande interesse do relatório do inquérito do Tribunal de Contas é o facto de ter sido feito por uma entidade com independência política e com competência técnica reconhecida pelo próprio Governo, porque as questões de fundo suscitadas há muito que são conhecidas.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!
O Orador: - E o Governo tem vindo a tentar escamoteá-las, tem vindo a tentar dizer que não existem ou que não são tão más como parecem.
Do nosso ponto de vista, digamos que o ponto de partida para a análise da situação tem de ser este: somos o País da OCDE que mais gasta em saúde e o que mais gasta em medicamentos, e temos uma prestação de cuidados de saúde bastante inferior à de muitos dos outros países da OCDE. No caso concreto dos medicamentos, pagamos, em termos do produto interno bruto, o dobro do que paga a média dos países da OCDE. Por isso, das duas uma: ou somos um país extremamente doente, ou então os medicamentos são excessivamente caros em relação ao resto dos países da OCDE.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!
O Orador: - Suscitam-se, do nosso ponto de vista, quatro questões ou áreas críticas no âmbito do Serviço Nacional de Saúde e do sistema de saúde.
A primeira é a questão do custo das despesas com os medicamentos e com os convencionados. Não há regras, não há limites, não há controlo. E esta situação permaneceu nos últimos quatro anos - os quatro anos deste Governo.
Pela nossa parte, não vamos acusar o Governo daquilo que foi feito anteriormente, mas durante estes quatro anos a situação não se alterou.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Piorou!
O Orador: - E não se alterou, fundamentalmente, nesta perspectiva: porque o Governo tem medo de entrar em confronto com a indústria farmacêutica.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!
O Orador: - Essa é a questão essencial, básica. Ou seja, o Governo tem medo, tem receio.
Certamente que, para moralizar o sistema, o Governo teria o apoio da generalidade da Câmara, do ponto de vista político. Mas nunca o tentou, nunca o quis, porque tem medo de ferir interesses ilegítimos.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!
O Orador: - A segunda questão tem a ver a promessa dos genéricos. Aliás, agora já toda a gente promete os genéricos, mas o Governo não quer avançar com eles mais uma vez o problema das indústrias farmacêuticas!
Aliás, agora até o Dr. Paulo Portas vem anunciar a defesa dos genéricos, esquecendo-se que o Grupo Parlamentar do CDS-PP, há pouco tempo atrás, votou contra um projecto de lei do PCP que defendia os genéricos.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Bem lembrado!
O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Estava no nosso programa de Governo!
O Orador: - A terceira questão é a da prescrição que está ligada a tudo isto, designadamente aos genéricos e ao embaratecimento do custo dos medicamentos: a questão do formulário.
E o Governo, aí, tem medo de quem? Se o formulário existe para os hospitais, por que é que não há de existir
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para os centros de saúde e para os médicos, de forma a prescreverem de acordo com as regras estabelecidas para os hospitais para que fique mais barato para o Estado e para os utentes?
Outra área crítica é a da gestão das instituições do Serviço Nacional de Saúde, sobre a qual também tivemos ocasião de apresentar aqui um projecto de lei. Em relação a essa questão, gostaria de referir apenas um, que é referenciado, claramente, no relatório do Tribunal de Contas: o problema das prestações ou subsistemas, designadamente às seguradoras, em que, para além de ser
defeituosa a facturação que é feita pelo sistema público, depois, as seguradoras pura e simplesmente não pagam e o Governo vai acumulando os créditos e nada faz para cobrar aquilo a que tem direito.
Temos ainda o problema do subaproveitamento das capacidades instaladas e, finalmente, a questão do subfinanciamento crónico, que decorre de tudo isto.
Em relação a este ponto, gostaria de chamar a atenção apenas para um aspecto particular deste problema, não vá o Governo ou o Partido Socialista dizerem: "mas, se já há subfinanciamento crónico, se já há os 330 milhões de con
tos, se já há os 700 ou 800 milhões de contos por ano, etc., etc., ainda quer gastar mais dinheiro para fazer controlos?" O aspecto que quero salientar é este: os juros estão a ser pagos!
Sr. Secretário de Estado, vou dar-lhe um exemplo: com 6 milhões de contos, V. Ex.ª pode contratar 2000 pessoas e pagar-lhes um vencimento médio de 200 contos por mês para que tratem da contabilidade e de todos esses aspectos! Não passa a gastar nem mais um tostão e resolve muitos e muitos outros milhões de contos que, depois, podem entrar nos cofres do Estado, o que pode reduzir a
despesa que as famílias e os utentes da saúde têm de pagar do seu próprio bolso.
Para terminar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, diria o seguinte: sou daqueles que não acredita em bruxas, embora haja quem diga que elas existem. Se eu acreditasse em bruxas, diria que aquilo que tem estado a ser feito em relação ao Serviço Nacional de Saúde aponta numa perspectiva objectiva de degradação do sistema nacional de saúde público, talvez para criar as condições subjectivas que permitam a preponderância do sector privado na prestação de cuidados de saúde em Portugal. Ora, isto é inaceitável!
E repito, mais uma vez, Sr. Secretário de Estado: eu não acredito em bruxas!
A última questão a que me vou referir é que, depois de tudo isto, e ouvindo declarações recentes do Sr. Primeiro Ministro sobre esta matéria, gostaríamos de dizer o seguinte: do nosso ponto de vista, os utentes do Serviço Nacional de Saúde estão fartos de declarações de intenção sobre paixões e sobre prioridades. Estou convencido de que os utentes do Serviço Nacional de Saúde também dispensam alguns dos muitos "sorrisos" que existem no âmbito da saúde, mas exigem que os problemas do Serviço Nacional de Saúde sejam resolvidos, e esses, até este
momento, não foram resolvidos, continuando o Governo, apenas, a fazer promessas que não soube cumprir, que não quis cumprir. E essa é a questão central: não cumpriu as promessas que agora faz, porque não as quis cumprir.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, Srs. Deputados, queria começar por agradecer ao Partido Ecologista Os Verdes o tempo que me concedeu para formular o meu pedido de esclarecimento.
Sr. Deputado Octávio Teixeira, se não tiver melhor leitura para férias, leve o programa eleitoral do Partido Popular. E de 1995 e fala amplamente de genéricos. Se não tiver melhor leitura, fica já com esta informação, que pode ser útil a quem está na política - eu penso que é.
Queria perguntar-lhe o seguinte: quando não votámos o único projecto que o PCP apresentou na área da saúde, o dos medicamentos - que, do nosso ponto de vista, era muito aceitável -,foi porque não quisemos votar o que estava lá implícito e explicito, ou seja, tornar público 0 comércio de medicamentos. Pensamos que tem de se impor os genéricos, como se fez em muitos países, mas sem necessidade de se criar uma rede infindável de farmácias públicas. Também o aconselho a que, em férias, reveja esse pormenor, porque se nós insistirmos numa grande rede de farmácias públicas, vamos ter a canga da indústria farmacêutica e da Associação Nacional de Farmácias em cima de nós todos por muitos anos.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, depois de a ouvir falar do programa eleitoral de 1995, chego à conclusão de que VV. Ex.as "metem" no programa eleitoral para depois não cumprir, tal como o Governo. Seguem a mesma linha...
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Não, não!
O Orador: - Repare que a proposta que fazemos - por acaso até tenho aqui o projecto de lei - sobre as farmácias não é assim como pretendeu fazer crer: criar farmácias em todo o lado. Nos hospitais, certamente, Sr.ª Deputada. Mas se por acaso o problema fosse apenas esse, o CDS-PP, como normalmente se faz nesta Câmara, votaria a favor na 'generalidade e, depois, na especialidade, ia tentar alterar essa parte. Mas não! Chumbou logo na generalidade! Voto contra; nem sequer a abstenção. Isto é, quer é manter isso no programa eleitoral para o Sr. Portas agora ter alguma coisa para dizer.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr.ª Deputada, o tempo das interpelações acabou!
Risos.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - É só 0 tempo de um poema! De um verso!
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - É que, se não for, corto-lhe a palavra, o que é muito desagradável, cortar a palavra a uma senhora.
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A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, é para informar a Mesa e, através da Mesa, a Câmara e o Sr. Deputado Octávio Teixeira de que, estava no nosso projecto de lei de bases da saúde, que o PCP chumbou!
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Saúde.
O Sr. Secretário de Estado da Saúde (Francisco Ramos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de começar por dizer - aliás, na sequência daquilo que já foi citado aqui, hoje, da reacção do Governo a esta auditoria do Tribunal de Contas - que já houve oportunidade de reafirmar que esta auditoria foi solicitada por este Governo, exactamente por se entender que a gestão do Serviço Nacional de Saúde tem de ser rigorosa, tem de contribuir para a melhor utilização dos dinheiros públicos, tendo em vista, naturalmente, o objectivo e a produção para que o Serviço Nacional de Saúde existe.
Portanto, os seus resultados vêm contribuir para este objectivo e, conforme também já foi aqui dito hoje, não basta olhar para os relatórios, é preciso lê-los!
Vozes do PS: - Bem lembrado!
O Orador: - Recomendaria, portanto, uma leitura atenta, quer de todo o relatório, quer das conclusões, quer das recomendações, para se perceber algo que não é surpreendente para ninguém, ou seja, que o Tribunal de Contas aponte problemas e lacunas na gestão de serviços integrados no SNS. Não é novidade para ninguém! É, aliás, provavelmente, a constatação e a antecipação desse facto que levou também o Governo a pedir e a solicitar essa auditoria.
Mas, nas suas conclusões, o Tribunal de Contas aponta, de facto, para uma série de problemas estruturais. E, se repararem bem, em todos eles, o Tribunal de Contas tem a preocupação de acrescentar um conjunto de medidas, ou já tomadas, ou em curso, ou propostas.
Em primeiro lugar, em relação a auditorias, não há apenas a auditoria do Tribunal de Contas, há um conjunto vastíssimo de auditorias temáticas, desenvolvidas pelos próprios serviços do Ministério da Saúde, nomeadamente pela Inspecção-Geral de Saúde, que visam exactamente detectar as questões na facturação, no aprovisionamento, 'e empreender medidas correctivas dessa situação.
Quanto a financiamento em função da produção - é essa uma recomendação do Tribunal de Contas -, já todos sabem nesta Casa que foi exactamente a partir de 1996 que o financiamento dos serviços de saúde deixou uma lógica meramente incrementalista para passar a ser feito com base na produção dos serviços de saúde, alteração essa que, naturalmente, não pôde ser feita de um momento para o outro, mas tem vindo acrescer, ano após ano, a parcela do financiamento que os serviços recebem, em função daquilo que produzem e não apenas do facto de existirem.
Responsabilização dos dirigentes dos serviços - os processos de contratualização (outra recomendação). Aí, mais uma vez o Tribunal de Contas cita a criação das agências de contratualização como sendo um método mais eficaz de proceder a essa distribuição de recursos.
Falta de articulação entre serviços de saúde - crítica velha também com tantos anos como o Serviço Nacional de Saúde: é o próprio Tribunal de Contas que aponta a criação dos sistemas locais de saúde como resposta a essa falta de articulação.
Problemas de gestão nas sub-regiões de saúde: o próprio Tribunal de Contas aponta que a autonomia dos centros de saúde pode ser a resposta a isso.
E por aí fora. Não tenho tempo para referir todas as conclusões.
Não vou assumir a posição, como disse logo no princípio, de que o Tribunal de Contas não aponta problemas de gestão, e sérios, ao funcionamento do Serviço Nacional de Saúde - naturalmente que sim. Mas gostava de deixar claro que, em termos de ir ao fundo dos problemas e de dar resposta às questões estruturais que o SNS tem, as conclusões do Tribunal de Contas são claramente coincidentes e apontam para que as medidas que o Governo tem tomado podem ser, de facto, a resposta para as questões estruturais que o SNS tem.
Mesmo em termos de medicamentos, o que o Tribunal de Contas aponta é, claramente, uma lista de variadíssimas medidas empreendidas por este Governo: desde a elaboração de formulários, desde a promoção de genéricos, desde a rectificação ao sistema de comparticipação, introduzindo também mais rigor e critérios económicos, desde a racionalização, desde a informação quer ao prescritor quer ao consumidor. Ou seja, em termos de medidas estruturais, quanto ao que se diz, de que há uma série de relatórios e que este Governo não toma medidas, podemos constatar claramente que o conjunto dos relatórios, aqueles que são credíveis, apontam, na sua grande parte, para a coincidência com o programa do Governo e com as medidas que o Governo tem vindo a implementar.
Também há pontos que não estão no relatório e que eu gostaria de trazer à colação: quer um maior rigor na construção de hospitais, deixando uma fase e uma era em que - aí, sim - havia uma clara situação de descontrolo; quer na formação de recursos humanos, outra questão estrutural da saúde em Portugal que, finalmente, tem dado passos sérios no sentido de ser resolvida; ainda em termos de olhar para as pessoas, nomeadamente na recuperação de listas de espera, o programa de melhoria do acesso não é hoje uma proposta, é hoje uma realidade em execução, que já está a resolver o problema a centenas de portugueses que, de facto, o têm.
Sobre a questão dos números, já agora, se me permite, Sr. Deputado Octávio Teixeira, uma pequena rectificação, quando diz que "somos o país da OCDE que mais gasta em saúde". Não é verdade! Temos gastos totais (isso nem vem no relatório) já superiores à média da União Europeia em termos de gastos públicos, mas estamos ainda bastante abaixo, ou seja, teremos claramente de equacionar uma larga margem de progressão para os gastos públicos em saúde em Portugal. Mas, sobre as questões de tesouraria, nunca o Governo escamoteou, de facto, o problema de tesouraria do Serviço Nacional' de Saúde e por isso propôs a esta Assembleia, no Orçamento do Estado para 1999, um processo de regularização de dívidas que permitisse
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regularizar parte das dívidas existentes até ao final de 1997, promovendo o saneamento do SNS.
Ou seja, nunca esta questão foi escamoteada - também aí o Tribunal de Contas não nos trouxe uma novidade -,sempre foi afirmada e reafirmada. E, insisto novamente, não se adoptou uma política meramente de resolver o problema financeiro, mas sim de encarar de frente as questões estruturais do SNS, política essa que está a ser desenvolvida e que terá de ser acompanhada também com as devidas medidas, quer de gestão - que estão em curso -, quer de saneamento financeiro.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para nova intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, estava a ouvi-lo e não sei bem se estava a ouvir um discurso virtual ou um discurso real! Não sei em que país é que o Sr. Secretário de Estado está quando fala sobre o problema da saúde!
Há pouco, comecei por dizer que não ia discutir o problema financeiro da saúde, que não ia discutir o problema da política da saúde, porque ela é suficientemente conhecida, o que eu ia discutir era a posição do Governo perante este problema. E o Sr. Secretário de Estado acaba, mais uma vez, por dar o exemplo mais acabado de como não pode, face a este problema, reagir dessa forma perante a Assembleia da República.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Uma de duas, Sr. Secretário de Estado: ou o senhor fez alguma coisa nesta matéria - o senhor, a Sr.ª Ministra ou o Sr. Primeiro-Ministro - ou não fizeram absolutamente nada! Uma das duas! Se não fizeram absolutamente nada, acho que esta equipa devia demitir-se, porque não tem possibilidades de estar à frente de um governo sem fazer absolutamente nada.
Vozes do PSD: - Exactamente! Muito bem!
A Oradora: - Se, efectivamente, o senhor tomou medidas e o descalabro é aquele que se vê, isso quer dizer que o senhor só tomou medidas erradas e então pergunto o que é que os senhores estão a fazer à frente do Ministério da Saúde.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Não há terceira alternativa, Sr. Secretário de Estado!
Por outro lado, é verdade ou mentira - não quero saber o que diz o Tribunal de Contas, não quero saber dos valores que vêm do Tribunal de Contas, não quero saber do relatório da OCDE, não quero saber de nada... - que o senhor triplicou o défice do Serviço Nacional de Saúde em três anos? E, se isto é verdade, aquilo a que o senhor tinha de responder perante o País é o seguinte: o que é que fez ao dinheiro dos nossos impostos, que levou a triplicar o défice em três anos, se os serviços estão piores? Isso é dito não por mim mas por qualquer utente, pelos profissionais de saúde e também pelos tais relatórios que o senhor só cita quando quer.
Sr. Secretário de Estado, continuo, pois, a afirmar que o motivo pelo qual os senhores deviam vir à Assembleia da República responder perante o País era o de explicar o vosso plano para o Serviço Nacional de Saúde. É que não há outra explicação possível, a não ser a de eu pensar que o senhores estão a destruir o Serviço Nacional de Saúde! E, perante essa destruição, o senhor fala ao lado, fala de uns relatórios, fala de uns números, fala de um País que não é o meu!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Saúde.
O Sr. Secretário de Estado da Saúde: Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, acabei de referir na minha intervenção uma lista - até esperaria que me criticasse por voltar a dizer aquilo que o Governo fez - chamando a atenção para a coincidência entre aquilo que o Governo fez e está a fazer e a análise que o Tribunal de Contas faz. Naturalmente que essas medidas não produzem efeito de um dia para 0 outro e, provavelmente, os senhores estarão em melhores condições do que eu para saber porque é que não produzem efeito de um momento para o outro.
Mas, Sr.ª Deputada, quando se diz que o Governo não fez absolutamente nada, depois de uma intervenção minha em que citei um conjunto de medidas importantes e estruturais, não posso concordar consigo. Nem posso concordar quando diz que, em relação ao crescimento, a despesa em saúde cresce cada vez menos e isso é conhecido.
Quanto à afirmação de que os serviços estão piores, também está longe de corresponder à verdade, antes pelo contrário. Só agora é que estão a ser desenvolvidos mecanismos que possam dar-nos uma avaliação da qualidade desses serviços.
Vozes do PSD: - Só agora?!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, vamos passar ao segundo ponto da ordem do dia, que consta do debate, requerido pelo CDS-PP, sobre a decisão da localização do novo aeroporto. Para dar início ao debate, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Pedrosa de Moura.
O Sr. Rui Pedrosa de Moura (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O CDS-PP propôs a realização deste debate, sobre a decisão de localização do novo aeroporto de Lisboa, numa altura em que, não estando a mesma formalmente tomada pelo Sr. Ministro João Cravinho, parece a todos os títulos irreversível a opção pela Ota.
Não são necessárias muitas conjecturas para perceber a importância política desta decisão em vésperas de eleições legislativas. Os sistemáticos adiamentos das datas aprazadas para a apresentação dos estudos de impacto ambiental - que a comissão eventual que foi constituída, nesta Assembleia, para acompanhar a de-
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cisão, muitas vezes denunciou - só podem ombrear com a deficiente informação que o Governo foi facultando ao longo de todo o processo. Falta de informação essa e atrasos esses que, aliados, empurraram a tomada da decisão para uma data politicamente mais rentável, como virá a suceder.
A primeira questão que vale a pena suscitar é precisamente esta: que legitimidade tem este Governo para decidir, numa altura em que as eleições legislativas já estão marcadas, a construção de um novo aeroporto de Lisboa, assim condicionando irremediavelmente a política de investimentos do próximo governo? Não estamos a falar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, de uma obra de meia dúzia de milhões de contos. Estamos a falar de uma obra que vai custar cerca de 500 milhões de contos - 500 milhões de contos que o próximo governo não vai poder afectar a outras prioridades, ligadas às reformas estruturais cuja falta se faz sentir na qualidade de vida dos portugueses.
Este Governo deixou por fazer, após quatro anos de mandato, as reformas estruturais decisivas para o País, nas áreas da saúde, da segurança social, da justiça, da administração pública, da fiscalidade, para apenas mencionar algumas. É por todas estas razões que nos parece que este Governo, que passou quatro anos a gerir a situação à espera da maioria absoluta, não tem, neste momento, a legitimidade moral para decidir a realização de uma obra desta envergadura, e certamente não tem a legitimidade política para o fazer nesta altura.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Orador: - Todas as entidades envolvidas disseram que o prazo de realização de uma obra desta natureza é de cerca de 10 anos, dos quais três necessariamente dedicados ao lançamento do concurso e aos trâmites subsequentes que conduzirão à adjudicação. Este Governo, que queria esta obra, deveria ter concluído pelo menos esta fase preliminar durante o seu mandato. Não o tendo feito, deve abster-se de obrigar o próximo governo a fazê-lo, por mais que as suas expectativas sejam favoráveis nas próximas eleições legislativas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, no decurso do processo que conduziu à decisão da localização do novo aeroporto de Lisboa, várias coisas ficaram por explicar. Começamos pela opção de construir um novo aeroporto de Lisboa, por oposição à opção de manter e ampliar o actual aeroporto. Deu-se por assente que a manutenção de um aeroporto dentro da cidade, com volumes de tráfego crescentes, era desaconselhável. Mas qual é a fiabilidade dos estudos sobre o aumento do tráfego no Aeroporto Internacional de Lisboa para os próximos 10 anos, quando é certo que, nos últimos 20 anos, o crescimento do tráfego se cifrou em pouco mais de três milhões de passageiros? O Governo diz que não faz sentido avançar com a opção zero, ou seja, a ampliação do aeroporto da Portela, porque este tem registado crescimentos anuais de tráfego de. 5,8%. Mas a verdade é que estas estatísticas foram influenciadas pelo facto de tomarem em consideração um ano absolutamente excepcional, que foi o ano de 1998, o ano da Expo 98. Mas não só. Cumpre igualmente registar que a consultora do Governo - a Aeroports de Paris - poderá vir a ser igualmente candidata à construção do novo aeroporto. Não será então legítima a dúvida de que as análises e as previsões se mostrem inflacionadas?
Acresce que a diferença entre construir um novo aeroporto de Lisboa e ampliar o actual se cifra em cerca de 360 milhões de contos - ou seja, a diferença entre os 140 milhões que custaria ampliar a Portela e expropriar cerca de 10.000 pessoas, e os 500 milhões que custará o novo aeroporto. Nestes termos, pergunta-se: existe algum estudo que permita saber em que outra actividade do Estado seriam melhor gastos esses 360 milhões de contos? Será que esta componente, a da rentabilização dos 360 milhões de contos de dinheiros públicos poupados com a alternativa Portela, foi contemplada nos estudos do Plano ALS 2000? Ou será que foi contemplada nos estudos desenvolvidos pela consultora do Governo? Ou será que não foi contemplada em nenhum estudo?
Outra dúvida que nos ficou foi a de saber se foram ouvidos os representantes da TAP e da Portugália, cujos voos domésticos entre Lisboa e Porto representam 25% do total de passageiros embarcados e desembarcados no actual aeroporto de Lisboa. É sabido que um novo aeroporto vai desviar significativa parte dessa percentagem de passageiros domésticos para meios de transporte alternativos, como sejam o automóvel e o comboio. Isto representa, a prazo, a morte da ligação aérea Portela/Pedras Rubras e, consequentemente, criará prejuízos graves aos actuais operadores, para além de afectar negativamente o volume de tráfego. Pensamos que a TAP, a Portugália e outros operadores do aeroporto da Portela deveriam ser ouvidos no processo, o que julgamos não ter acontecido.
Mas aquilo que leais nos causa impressão é a facilidade com que se adoptam os argumentos de princípio favoráveis à construção de um novo aeroporto. Ouvimos o Presidente da Comissão de Coordenação Regional de Lisboa e Vale do Tejo dizer, perante a comissão de acompanhamento, que o novo aeroporto é fundamental por razões estratégicas, no quadro das nossas relações com África, América do Sul e Europa.
Ora, desde que ocorreu a descolonização, o tráfego de passageiros com África tem vindo a decrescer. Quais são, pois, estas razões estratégicas? Porventura, prevê o Governo um aumento substancial dos vôos de e para África? Que aumento é esse que justifica a construção de um novo aeroporto?
Disse também o Sr. Presidente da CCRLVT que o novo aeroporto será um pólo indutor das actividades económicas, o que não pomos em causa. Aquilo que lios parece, contudo, é que, mais do que isso, ele será um elemento reanimador da economia, dado o consabido arrefecimento da mesma em virtude da falta de novas obras públicas.
Aliás, foi o próprio Presidente da CCRLVT que também disse que este novo aeroporto vem dar continuidade ao ciclo interrompido com a conclusão das obras herdadas por este Governo.
Alega-se ainda que se não formos nós a construir um novo aeroporto, certamente Espanha o construirá. Não nos parece decisivo, nem sequer provado, que assim venha a ser, como não compreendemos que se gastem 500 milhões de contos do erário público só para levar a palma a Espanha, numa espécie de disputa ibé-
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rica cujos fenómenos mais recentes são de todos conhecidos.
Por tudo isto, aquilo que parece ao CDS-Partido Popular é que o Governo decidiu construir um novo aeroporto para que este Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, que tem a seu cargo o pelouro das obras públicas, possa, também ele, ficar ligado a uma obra de regime, nem que seja pelas pontas.
Aquilo que o CDS-Partido Popular quer conhecer são as justificações cientifica, económica e socialmente sustentadas para o abandono do aeroporto da Portela, e quer sabê-lo não porque sofra de algum bloqueamento relativamente à construção do novo aeroporto mas porque, condicionados como estamos por recursos financeiros escassos, a sustentação das decisões e a avaliação da sua oportunidade face a opções de investimento alternativas é indispensável.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, chegou a altura de analisar a opção pela localização do novo aeroporto na Ota.
Resulta do estudo de impacte ambiental que, em termos de impacto no ordenamento do território, acessos rodoviários e gestão do espaço aéreo, as opções Ota e Rio Frio equivalem-se. Alegadamente a favor da Ota estão as acessibilidades a Lisboa, nomeadamente a ligação ferroviária. Assim sendo, cumpre perguntar ao Governo em que estado estão as obras da linha ferroviária do Norte e para que ano se prevê a circulação regular dos comboios pendulares nesta linha.
Mas, uma vez que os passageiros com destino a Lisboa não têm, obrigatoriamente, de se deslocar de comboio, diz-se que a Brisa já pensa no alargamento, de três para quatro, das actuais faixas de rodagem da A1, de modo a acomodar um fluxo diário médio de 35 000 veículos entre Carregado e Lisboa. Alegadamente, estarão também já em fase de projecto a A10, que ligará Bucelas ao Carregado, e a A13, entre Almeirim e Marateca.
Conviria que o Governo confirmasse estas informações.
Mas a questão mais premente é a de saber o que tem o Governo planeado face ao previsível aumento do volume de tráfego rodoviário nas principais entradas de Lisboa. Quem vens da Ota entra cru Lisboa por onde? Pela Calçada de Carriche, onde mais depressa circula um burro do que um Ferrari?
Sr. Presidente e Srs. Deputados, não somos a favor ou contra a opção Ota, da mesma maneira que não somos a favor ou contra a opção Rio Frio.
Temos a consciência de que os portugueses não obtiveram ainda justificação suficiente, por parte do Governo, quanto à necessidade de se gastarem 500 milhões de contos na construção de um novo aeroporto e, sobretudo, que têm dúvidas sobre se esse dinheiro não seria melhor empregue noutras áreas da governação, com muito maior proveito para todos nós.
Por isso se justifica, a nosso ver, que este tema seja predominante na próxima campanha eleitoral e que se deixe que seja o futuro governo a decidir, conjuntamente com o planeamento e a execução das demais reformas estruturais, no início do seu mandato.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ferreira do Amaral.
O Sr. Ferreira do Amaral (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, O Governo, a pouco mais de dois meses de terminar o seu mandato, entrou em febre inauguracionista. Simplesmente, como não tem obras para inaugurar, porque ao longo de quatro anos não as realizou, em sua substituição resolve fazer uma coisa extraordinária: inaugura promessas.
Nunca se tinha assistido a isto: inauguram-se anúncios, inauguram-se estudos, inauguram-se grupos de trabalho, inauguram-se até intenções, como se o Governo tivesse começado agora, lhas obras feitas por ele não inaugura, porque essas não há; como não se remodelou a linha ferroviária do Norte, inaugura-se um grupo de trabalho para pensar no TGV das calendas; como não se fez a auto-estrada do Algarve, inaugura-se a promessa de uma rede completa de auto-estradas, que não se sabe, aliás, para quando.
A verdade, Srs. Deputados, é que, em final de mandato, só promete obra quem não tem obra para mostrar.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E chegou também a vez do novo aeroporto de Lisboa.
Depois de andar quatro anos a falar do novo aeroporto de Lisboa, vem agora o Governo, a terminar o mandato, inaugurar a conclusão de que o impacte ambiental para a sua localização em Rio Frio é inaceitável.
Andaram, então, estas "almas" com o aeroporto para trás e para diante durante quatro anos, para, no fim do mandato, inaugurarem simplesmente a conclusão de que o aeroporto em Rio Frio não fica bem. Quatro anos! ... Quatro anos para conseguir chegar a esta conclusão!...
De resto, sobre a matéria não há, neste momento, mais decisão absolutamente nenhuma.
É que a questão fundamental do novo aeroporto de Lisboa não está, essencialmente, em saber se, ambientalmente, seria possível fazê-lo em Rio Frio. A essa conclusão poder-se-ia chegar em poucos meses e não eram necessários quatro anos. A questão fundamental é saber se se justifica fazer agora um novo aeroporto em Lisboa.
Muitas são as vozes que se levantam dizendo que não. Estão em jogo centenas de milhões de contos para um investimento de necessidade duvidosa.
O aeroporto da Portela foi, por iniciativa e obra do Governo anterior, profundamente remodelado e ampliado. Hoje é uma instalação aeroportuária que não envergonha nem a capital nem o País...
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - ... e que ainda dispõe de muitas capacidades inaproveitadas.
É certo que os estudos de tráfego prevêem a sua saturação a prazo mais ou menos longo (conforme os estudos). Mas esses mesmos estudos comportam incertezas grandes de mais para assegurarem a tranquilidade na decisão de um investimento de centenas de milhões de contos. É muito dinheiro, despendido muito concentradamente, e esses recursos podem ser aplicados em muitas outras necessidades do País, mais prementes e mais óbvias.
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A solução a tomar deveria ser de prudência. Em vez de embarcar em projectos megalómanos, baseados em incertezas, o mais prudente, para já, seria adaptar outras facilidades aeroportuárias, nomeadamente o Aeroporto Militar do Montijo, para receber tráfego civil, o que implica a necessidade de um acordo com a Força Aérea, que já se predispôs a dá-lo, mas que, naturalmente, não pode ser prejudicada na missão que lhe é confiada pelo Estado.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Esta seria uma medida que asseguraria a tranquilidade de não nos virmos a surpreender com uma situação de saturação precoce do aeroporto da Portela. Os dois - Portela e Montijo - podem trabalhar em conjunto, de acordo com estudos conclusivos anteriormente realizados. Os investimentos necessários para isso são de pequena monta comparados com os que teriam de ser feitos na construção de um aeroporto novo.
Assim, com a ampliação até ao fim do aeroporto da Portela e com a disponibilidade do aeroporto do Montijo para receber o excesso de tráfego que, em caso de saturação mais rápida do que a prevista, a Portela não tivesse capacidade de comportar, teremos uma solução certamente muito mais prudente, mais rápida, mais fácil e, seguramente, muitíssimo mais barata.
A partir daí estarão criadas as condições para se poder decidir sobre o novo aeroporto de Lisboa em melhor momento e em bases muito mais sólidas, deixando que os investimentos feitos anteriormente na Portela tenham o devido tempo para a sua amortização.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Os recursos que serão necessários para construir um novo aeroporto - convém recordarmo-nos - são superiores aos que seriam necessários, por exemplo, para construir uma rede completa de metropolitano em Lisboa e na zona a sul do Tejo, ou para criar, no Porto, uma rede de transportes suburbanos de qualidade ou, ainda, para reabilitar todas as casas degradadas, quer em Lisboa quer no Porto, investimentos certamente muito mais necessários e muito mais urgentes do que construir mais um aeroporto - seria o sexto - na Área Metropolitana de Lisboa.
O PSD, convém que se diga, não se sente vinculado por conferências de imprensa de última hora, dadas por dois ministros nas vésperas de terminarem os seus mandatos, nem se sente vinculado por nenhuma das promessas de última hora feitas pelo Governo.
Quando for Governo, o PSD aprovará soluções alternativas à construção, sem estas incertezas, do novo aeroporto, que permitam poupar recursos que serão aplicados na solução de outros problemas, muito mais graves, que, infelizmente, afectam o dia-a-dia da população das Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto. O PSD não cederá a lobbies, independentemente da sua natureza.
Sr. Presidente e Srs. Deputados. podem ter a certeza absoluta de que, quando for claro e óbvio que é necessário e imprescindível construir um aeroporto novo em Lisboa - e não antes -, o PSD não andará quatro anos a dar conferências de imprensa para, como diz o povo, "encanar a perna à rã".
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O PSD, no governo, quando o aeroporto for imprescindível, construí-lo-á.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a propósito de conferências de imprensa, ainda me lembro daquela que o Sr. Eng.º Ferreira do Amaral deu sobre o metropolitano do Porto, com desenhos animados na televisão. Como, na altura, eu estava distraído, até me pareceu que já lá havia metro!... Foi bom ouvi-lo, porque avivou-me a memória da sua experiência nesta matéria, mas hoje não estamos cá para falar, com certeza, das obras anunciadas. sem concurso!
Gostaria de dizer que quem, nesta matéria, está com tanta pressa é alguém que, ao fim e ao cabo, se esqueceu que levou quatro anos para dar início ao conjunto de obras da ponte Vasco da Gama! Quem está preocupadíssimo com promessas é alguém que, 15 dias antes das eleições, veio a público falar de uma coisa chamada A14, é alguém que fez tudo tão depressa e tão bem que o Plano Rodoviário, apesar de ter sido anunciado para 1995 a sua conclusão, ficou pelo caminho - enfim, é o que se sabe!... -, é alguém que anunciou a construção da auto-estrada para o Algarve, que, enfim, ficou pelo caminho - fez 10 ou 14 km -, é alguém que anunciou aquela história da linha do Norte e meteu as "argoladas" que teremos ocasião de discutir em sede própria..., enfim, convém avivar a memória. Aliás, já estava a esquecer-me, por tão rápido que era, do TGV, que anunciou - linha mediterrânea ou linha do Atlântico -, e a grande discussão que, na altura, isso gerou no País!
De facto, Sr. Eng.º, o que V. Ex.ª prometeu foram só obras, obras de coisa nenhuma, como se vê e como se sabe.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Mas vamos ao importante, porque o problema do Sr. Eng.º Ferreira do Amaral é mais de "dor de cotovelo" do que de interesse do Estado!
O que eu gostaria de dizer ao interpelante é o seguinte: o CDS-PP fez aqui uma interpelação para tentar falar na localização do aeroporto, mas, afinal, não foi dela que veio falar. O que fez, em primeiro lugar - e é isso que está na ordem de trabalhos - foi discutir a data e dizer que esta poderia ser para o Governo uma data politicamente rentável.
Sr. Deputado Rui Pedrosa de Moura, para quem tem de decidir sobre matéria tão importante e relativamente à qual há tantos interesses em jogo, do norte ao sul do País - certamente todas as populações quererão este empreendimento na sua zona -, se calhar, não há altura politicamente mais inadequada, em véspera de eleições, para anunciar a eventualidade da construção do aeroporto neste ou naquele local.
Vozes do PS: - Muito bem!
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O Orador: - Disse ainda o Sr. Deputado Rui Pedrosa de Moura que falta ao Governo legitimidade para decidir. Uns dias ataca-se o Governo porque não decide, mas, quando as decisões estão assumidas, é mau porque o Governo não devia ter decidido.
Protestos do CDS-PP.
Isto faz-me lembrar os Srs. Deputados, há pouco, preocupados com as obras realizadas pelo Governo, que diziam: mas que maldade, passámos nós quatro anos a dizer que o Governo não fazia nada e agora andam para aqui com uns boletins informativos iguais àqueles que nós fazemos nas nossas câmaras a mostrar as fotografias das obras que o Governo realizou. De facto, isto gera uma enorme incomodidade!
Depois, V. Ex.ª pôs em causa o aeroporto, falando na linha Portela/Pedras Rubras. Não sei se com isso estava interpretando o interesse nacional, o interesse das populações, ou se estava a ser o porta-voz de qualquer outro interesse meramente corporativo ou pontual!?
Finalmente, fiquei esclarecido com a sua afirmação - e ela foi absolutamente clara e inequívoca - sobre a localização do aeroporto na Ota ou em Rio Frio: VV. Ex.as não são a favor nem são contra, antes pelo contrário. Muito bem!
Ora, Sr. Ministro, aquilo que gostaríamos de dizer é que o Governo decidiu onde seria a construção do novo aeroporto, e decidiu bem.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Isto não pode ser uma manta de retalhos, como, muitas vezes, aconteceu com as estradas. Estas é que foram feitas a retalho, por decisões parcelares, ou seja, faltou, como referi, a generalidade das estradas.
Quero também assinalar que o Governo anunciou o estudo que foi realizado sobre o impacte ambiental, bem como o conjunto de considerações que esse estudo fazia sobre as duas possíveis localizações desse mesmo aeroporto.
Tudo isso nos parece absolutamente correcto e quem está atento ao futuro e nele interessado deve, atempadamente, poder prevê-]o, sobretudo no domínio das soluções para o problema que nos assalta.
A realidade europeia demonstra a preocupação que há em deslocar os grandes aeroportos para fora das grandes cidades - e temos vários exemplos, tais como Munique, Oslo, Atenas, Berlim ou Madrid - e sabemos que essa preocupação tema ver directamente com políticas de qualidade de vida das pessoas, com políticas de impacte ambiental, com ordenamento do território, com a utilização dos solos, com políticas do ar, com políticas de acessibilidades. É inegável e inequívoco que isso acontece por todo o lado.
O que acontece também é que a capacidade do aeroporto da Portela está a atingir os seus limites e pode esgotá-lo num tempo relativamente curto, um tempo que, com ritmos de crescimento de 6% ao ano, pode gerar um movimento de passageiros, nos próximos 8 ou 9 anos, superior a 13 milhões. Ora, a verdade é que o aeroporto da Portela não está preparado para, com eficácia, fazer frente a esse problema, e é preciso atacá-lo desde já.
A principal restrição, do lado do ar, estará nas posições de estacionamento para capacidades superiores a 30 movimentos/hora no sistema de pistas, bem como em tudo o que respeita ao tratamento de passageiros, à exiguidade das áreas de carga, ao congestionamento da rede urbana circundante, à manutenção e até, mesmo, no que diz respeito à segurança em geral. E, mesmo assim, para o suporte imediato do aumento de tráfego, para as obras que seria necessário realizar, era fundamental expropriar uma área mínima de, pelo menos, mais 80 ha, afectando cerca de 2000 habitações e mais de 10 000 pessoas.
Por isso eu afirmo que o Governo está atento ao futuro, está a decidir e deve, de facto, enfrentar essas soluções a tempo, porque as exigências físicas e operacionais do novo aeroporto poderão exigir, segundo os estudos realizados, uma área de, aproximadamente, 1400 ha, assim distribuídos, a título de exemplo: 200 ha para passageiros, 36 ha para área técnica, 60 ha para área de carga, 24 ha para manutenção.
A tudo isto acresce uma rede complementar, fundamental, nos planos rodoviário e ferroviário.
É evidente que em toda esta problemática os estudos apontam, com dúvidas mas também com dados correctos, para o facto de tanto os espaços da Ota como os de Rio Frio se situarem a cerca de 42 ou 45 km de Lisboa, mas apontam também que os acessos à capital são francamente mais favoráveis no caso da Ota, nomeadamente conjugando o IC2 com o IC18, com o IC 17 ou, mesmo, com o IC 11, atravessando o Tejo na futura ponte do Carregado.
O mesmo se passa a nível ferroviário porque, eventualmente, seria possível atingir a gare do Oriente ou a de Entrecampos, em 20 a 30 minutos.
A este propósito, importa dizer que, não estando assumida uma decisão em definitivo, é fundamental fazer notar que estão a ser seriamente ponderadas todas estas soluções e, sobretudo, este problema.
Para terminar, gostaria de dizer-lhe, Sr. Ministro, que temos consciência das penalizações ambientais eventualmente irreparáveis se toda esta problemática não fosse, de facto, considerada e ponderada. Temos a consciência de que, hoje, a qualidade de vida dos cidadãos tem algum sentido se tratarmos dos múltiplos aspectos da qualidade de vida ambiental e da própria segurança que está inerente, envolve e enquadra todo este processo.
Por isso, a bancada do Partido Socialista apoia este esforço que o Governo está a fazer e, particularmente, o esforço de planeamento e de decisão por parte do Sr. Ministro, para que, no curto prazo, não sejamos surpreendidos com problemas futuros em que nunca tivéssemos pensado.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - O Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan inscreveu-se para um pedido de esclarecimento, o que fará em tempo que lhe foi cedido pelo PSD.
Quanto ao Sr. Deputado José Junqueiro, também já não tem tempo, mas a Mesa cede-lhe 1 minuto para responder.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.
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O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Junqueiro, a questão que vou colocar-lhe é breve, mas, para nós, é importante.
O Sr. Deputado referiu, aliás, não referiu, insinuou é porque se tivesse referido e não insinuado a questão não seria tão importante nem tão decisiva - que por trás da nossa intervenção poderiam estar alguns interesses que não percebia quais eram.
Assim, vou explicar-lhe quais são os interesses que estão por trás do agendamento desta matéria que requeremos para esta reunião da Comissão Permanente.
Em primeiro lugar, há o interesse nacional. Mas há outros interesses, igualmente legítimos, quais sejam o dos passageiros que fazem a viagem Porto-Lisboa-Porto, ou vice-versa, ou que fazem a viagem Porto-Lisboa como ponto de partida para outros destinos. Estes são interesses legítimos e importantes dado que, no Porto e em Lisboa, situam-se os dois principais aeroportos portugueses. Portanto, esta não é uma questão menor, sendo muito fácil localizar os interesses envolvidos.
Acresce que também são legítimos os interesses da TAP ou da Portugália, as companhias aéreas de "bandeira" que temos. Portanto, para nós, é muito claro que são também legítimos os interesses da TAP ou da Portugália, que, obviamente, não podem sobrepor-se ao interesse nacional.
Termino, dizendo uma coisa muito simples: se o Sr. Presidente da Câmara Municipal de Lisboa fosse ministro, imagine o que pensaria desta decisão!9
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro, em tempo cedido pela Mesa, como já anunciei anteriormente.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, agradeço o tempo que a Mesa me concedeu, mas não me foi feito qualquer pedido de esclarecimento.
Assim, relativamente a esta actuação de emergência do " 112", isto é, do Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan, apenas direi que a opinião do CDS-PP sobre o novo aeroporto é a que foi referida nesta Câmara pelo seu colega de bancada. Ou seja, relativamente à localização do novo aeroporto, o CDS-PP não é contra nem é a favor, antes pelo contrário... !
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira, para uma intervenção.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: A questão do eventual novo aeroporto de Lisboa é, desde logo - e julgo que nisto todos estaremos de acordo -, um investimento que, a realizar-se, poderá ter efeitos estruturantes muito importantes, quer na zona de implantação quer nas zonas limítrofes, nomeadamente em termos de ordenamento do território e de desenvolvimento regional.
Por outro lado, e como já aqui foi recordado, trata-se de um investimento que, a realizar-se, vai custar 400 a 500 milhões de contos. Tais recursos financeiros, se forem afectos à construção do novo aeroporto de Lisboa, não poderão ser afectos a outras coisas. Como tal, em primeiro lugar, o problema que se coloca é o do estabelecimento de prioridades do investimento público.
Ora, tanto quanto sabemos, nenhuma destas questões foi analisada pelo Governo. Admito que haja desconhecimento da minha parte, mas que se saiba, nunca apareceu qualquer análise completa, coordenada, articulada, de todas essas questões.
Neste quadro, e excluindo, à partida, a análise da chamada "opção zero", o Governo decide a localização do novo aeroporto alegadamente com base nos estudos preliminares de impacte ambiental.
Para que esta decisão do Governo seja tão segura, diria que é necessário que as conclusões dos estudos preliminares sejam seguríssimas.
Vejamos, então, o que me foi dado ler em termos das conclusões da Comissão de Avaliação de Impacte Ambiental para o Plano do Novo Aeroporto de Lisboa
Começo por ler um excerto do parecer da referida Comissão: "(...) De acordo com a análise da Comissão de Avaliação e para além das lacunas, os EPIA (estudos preliminares de impacte ambiental), de per st, apresentam algumas deficiências de informação que decorrem, por um lado, da não utilização sistemática das fontes de informação disponíveis, apresentam-se demasiado genéricos, subvalorizando as especificidades e as problemáticas territoriais de cada localização, revelam uma deficiente `definição do âmbito', está ausente uma perspectiva integradora dos diferentes descritores, (...) revelam ainda uma fraca organização/sistematização de algumas áreas de estudo, dificultando uma leitura coerente e inequívoca das mesmas.
(...) a Comissão entendeu estruturar o seu parecer não no formato habitual utilizado nos procedimentos da AIA, mas organizado para dar resposta ao carácter preliminar do empreendimento (ausência de projecto) e à orientação dos EPIA para o estudo das localizações alternativas, sem análise comparativa.
(...) Finalmente e como resultante da avaliação operada, a Comissão de Avaliação recomenda, logo após a decisão sobre o Novo Aeroporto de Lisboa, sejam iniciados estudos de base, no sentido de apoiar tecnicamente as fases subsequentes do processo de avaliação, nomeadamente: Análise de Risco, Análise do Risco de Colisão de Aves com Aeronaves, Avaliação das Consequências da Revisão dos Instrumentos de Planeamento, Monitorização da Adesão das Comunidades Locais, Articulação Ruído/Planeamento e Uso do Solo' (...)".
Por último, vou ler a primeira conclusão da Comissão de Avaliação.
" (...) Conclui:
1 - Descritores dos EPIA
Existem descritores que tiveram uma abordagem deficiente e que deveriam ter sido objecto de estudos mais adequados à fase de selecção de alternativas, pelo que a Comissão de Avaliação considera que as conclusões constantes nos EPIA não são suficientes ou válidas como elementos de base para a tomada de decisão. (...)".
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - E agora?!
O Orador: - Perante esta conclusão, coloco as questões ao Sr. Ministro.
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A não ser que a fotocópia do parecer da Comissão de Avaliação que foi enviada para o meu grupo parlamentar não seja exactamente igual ao que foi enviado ao Ministério - parto do princípio de que é idêntica! -...
O Sr. José Junqueiro (PS): - Tem é 120 páginas!
O Orador: - V. Ex.ª aprenderá que, às vezes, não vale a pena ler muitas páginas porque pode haver muita "palha" para que os incautos se "espraiem" pela leitura da "palha" e não vejam o que é importante.
Como dizia, vou colocar a questão ao Sr. Ministro, tendo em atenção o parecer da Comissão da Avaliação.
Sr. Ministro, estando escrito o que está no parecer da Comissão de Avaliação e respectivas conclusões, por que razão diz que só se vier a suceder algo de impensável é que poderá haver outra localização que não a escolhida?
O Sr. Lino de Carvalho (PC): - Bem perguntado! Nem o Ministro António Costa sabia disto!
O Orador: - Sr. Ministro, não sendo, para mim, minimamente perceptível como é que um Membro do Governo - no caso concreto, o próprio Sr. Ministro faz a afirmação que faz com base nestas conclusões...
Vozes do PS: - Não fez!
O Orador: - Fez, fez! O Sr. Ministro disse à comunicação social, e foi publicado, que só se suceder algo impensável...
Mais lhe digo, Sr. Ministro, que fez, por escrito, uma coisa parecida: "(...) ao Sr. Secretário de Estado dos Transportes e ao NAER, para efeitos de acolhimento na proposta conclusiva da fase de escolha de localização, tendo em atenção o natural primado da defesa dos valores ambientais (...)". Portanto, o Sr. Ministro também escreveu "para efeitos de acolhimento (...) da escolha da localização (...)", com base nos excertos que acabei de ler e que constituem o que me parece importante.
Assim, numa situação destas, como é que o Sr. Ministro consegue tomar a decisão que toma de o aeroporto ser no local A, perante estes estudos? É-me completamente incompreensível!
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!
O Orador: - Mas há mais: se, apesar de tudo, isto é compreensível para o Sr. Ministro, não percebo mesmo é a atitude do Governo no seu conjunto porque isto não pode ser compreensível para todo o Governo!
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - É evidente!
O Orador: - E não haverá, no Governo, alguém que imponha regras de análise, de estudo, de um investimento com esta ordem de grandeza?
O que anda a fazer o Sr. Primeiro-Ministro? Onde é que ele anda,...
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Anda a passear!
O Orador: - ... para além de andar a dar aquelas "beijocas" que há pouco foram referidas? Só isso é pouco!
Risos e aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de referir que, desde o início e com base nos dados que estavam sobre a mesa, Os Verdes, para além de outras questões mas, agora, especificamente sobre a questão da localização do novo aeroporto, manifestaram sempre duas preocupações com alguma veemência.
A primeira dessas preocupações tinha a ver com o regime de avaliação de impacte ambiental que, como bem se lembram todos os Srs. Deputados, Os Verdes procuraram alterar durante a presente legislatura através da apresentação de uma proposta concreta. Tal alteração não foi possível, dado o facto de, nomeadamente, o PS ter inviabilizado a mesma.
Ocorre que, em Portugal, o regime de avaliação do impacte ambiental é deveras preocupante. Digo-o porque a decisão relativa à localização do novo aeroporto não fugiu à regra do que é o regime geral de avaliação do impacte ambiental em Portugal: as decisões são tomadas, após o que se fazem estudos de impacte ambiental para justificá-las. Ora, ao invés, o que deveria fazer-se seria estudos de impacte ambiental sérios e rigorosos para, então, se tomarem as decisões.
Desde a decisão sobre os aterros sanitários até à da localização do novo aeroporto, o que aconteceu foi na linha do que o regime de avaliação de impacte ambiental permite que se faça em Portugal. Primeiro, decide-se e, depois, fazem-se os estudos de impacte ambiental.
E por isso que os estudos de impacte ambiental apresentam sempre tantas lacunas, tantas imprecisões e tantas contradições. É que não é possível justificá-las de outra forma.
Assim, apesar da proposta de alteração apresentada por Os Verdes, não foi possível mudar o regime de avaliação de impacte ambiental em Portugal, o qual é perfeitamente permissivo e viciado.
Uma das primeiras preocupações que Os Verdes suscitaram relativamente à localização do novo aeroporto foi a de que a escolha ia ser feita com base no actual regime de avaliação do impacte ambiental. Em nossa perspectiva, esta é uma questão fundamental.
Por outro lado, havia a questão de apenas estarem em causa duas possíveis localizações. Não percebíamos porquê apenas duas possíveis localizações para a eventual construção de um novo aeroporto.
Entretanto, surge o tal pré-anúncio com base nos estudos de impacte ambiental em que o Ministério do Ambiente dá o seu parecer relativamente à localização do novo aeroporto.
É óbvio, Sr. Ministro, que uma obra desta grandeza teria sempre impactes ambientais muito significativos, não é possível negar isto. Agora, e por isso mesmo, repito, é fundamental o rigor nos estudos de impacte ambiental e em todo o seu processo de avaliação. Aliás, já foram aqui referidas, e citadas, algumas linhas
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significativas do dito parecer que também já aqui foi mencionado.
Assim, concretamente, o que gostaria de perguntar ao Sr. Ministro é que credibilidade tem uma decisão destas com base nestes estudos de impacte ambiental viciados e neste regime de avaliação de impacte ambiental também viciado. Porque, Sr. Ministro, ambos os locais tinham, na verdade, graves implicações ambientais, mas se os impactes ambientas de Rio Frio eram muito graves, os da Ota são igualmente muito graves. E assim, Sr. Ministro, muitas coisas ficaram por saber. Por exemplo, outra localização comparada com a Ota seria melhor ou pior? A Ota é a melhor solução? A Ota é a solução possível?
Por outro lado, Sr. Ministro, ficou também por fazer a confirmação da necessidade de construção de um novo aeroporto em Portugal. E, Sr. Ministro, gostaria de deixar isto bem claro: se a construção de um novo aeroporto em Portugal tem por base o fomento intensivo do transporte aéreo claramente em detrimento do investimento noutro tipo de transportes, nomeadamente o ferroviário, então, a isso Os Verdes dizem "não". É que, Sr. Ministro, sejamos coerentes, o transporte aéreo é uma das primeiras causas da destruição intensiva da camada do ozono em Portugal. Sabemos que este Governo tem poucas preocupações relativamente a esta matéria e a prova disso foi a negociação que a Sr.ª Ministra do Ambiente fez na Conferência de Quioto ao dar a possibilidade de aumentar em mais 40% os gases e emissões que destroem a camada do ozono.
Ora, um fomento intensivo do transporte aéreo em Portugal é uma grande contribuição para a destruição desta camada que teoricamente pouco importa a alguns mas que, na prática, todos nós já vamos sentindo os efeitos dessa destruição a nível planetário. Agora, se a construção do novo aeroporto tiver outro objectivo, então, é preciso que seja dito com clareza.
Sr. Ministro, para concluir, subsiste um conjunto de preocupações extremamente legítimas, às quais os estudos de impacte ambiental não dão qualquer resposta, sobre a localização e construção do novo aeroporto.
Vozes do PCP.- Muito bem!
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.
O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território (João Cravinho): Sr. Presidente, Srs. Deputados, gostaria de tecer algumas questões preliminares.
Em primeiro lugar, afirmar que através, nomeadamente, das previsões de evolução de tráfego, os ADP, que poderão estar interessados em consultadoria posterior, influenciam e manipulam, esclareço a Câmara de que há aqui um erro de informação. É que as previsões de evolução de tráfego foram encomendadas à IATA, que é uma organização internacional, à qual, aliás, também já tinham sido encomendados, em 1993/1994, estudos de previsão de tráfego. Portanto, essa objecção não tem qualquer fundamento.
Em segundo lugar, uma questão referida por várias bancadas, todas elas, à excepção da do PS, que está melhor informada, a laborarem num erro elementar que este Governo tem precisado no seu conteúdo exacto e que só pode existir para efeitos de confusão na opinião pública, pois já esclareci isto tantas vezes em público e, mesmo, na comissão eventual da Assembleia da República, que, de facto, não é um erro que se possa justificar, é esta: os tais 350 milhões de contos que possa custar o aeroporto não correspondem a fundos disponíveis, na generalidade desse dinheiro, para qualquer outra utilização que não seja o próprio aeroporto numa operação de project finance.
O projecto de Atenas, que é o modelo mais próximo e que estamos a seguir, ronda os 350 milhões de contos, dos quais 25 milhões de contos saem do Orçamento grego e 60 milhões de contos do Fundo de Coesão, o que mostra que, de facto, os 200 e tal milhões de contos vêm de financiadores privados, que não vão construir escolas, que não vão fazer creches, que não vão fazer estradas, que não fazer rigorosamente nada. Srs. Deputados, acabemos com essa demagogia tão absurda que não vale a pena falar mais nisso.
Finalmente, ainda a título preliminar, gostaria de informar que os passageiros de Lisboa/Porto são menos de 10% do tráfego total do aeroporto de Lisboa, incluindo os passageiros que vêm a Lisboa em trânsito para tomar outras linhas. Portanto, repito, são menos de 10%. Srs. Deputados, acabemos também com essa demagogia, pois distâncias de 300 Km na Europa, hoje, estão a ser estudadas em TGV, todos sabem isso.
Ao Sr. Deputado Octávio Teixeira, com todo o respeito e consideração que me merece, direi que não devemos ter as mesmas cópias do pronunciamento da Comissão de Avaliação, porque senão não lhe teria escapado o ponto 3, que é perfeitamente claro e que mostra que a Comissão, ela própria, se considerou apta a tomar decisões ou a chegar a conclusões. Notou deficiências, é verdade, mas depois acrescentou o que vou passar a ler: "(...) pareceres das entidades oficiais recebidos, resultado da consulta pública, elementos disponibilizados pelas entidades que compõem a Comissão de Avaliação e com os elementos adicionais, solicitados ao proponente no decorrer deste processo, foi possível chegar a conclusões a ter em conta na tomada de decisão.". Ou seja, a própria Comissão declara-se apta a chegar a conclusões na base de elementos posteriores que corrigiram tudo. Portanto, o vício está sanado, a não ser que o Sr. Deputado diga que os elementos da Comissão de Avaliação, coitados!, não sabem o que estão a dizer! Mas lá que propuseram, propuseram.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Ministro, dá-me licença que o interrompa?
O Orador: - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Octávio Teixeira poderá interromper-me desde que não desconte no meu tempo.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Desconta sim, Sr. Ministro.
O Orador: - Então não, Sr. Deputado Octávio Teixeira. Peço-lhe desculpa!
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Quanto aos factos expostos, a questão essencial é a seguinte, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia: analisada a viabilidade ambiental da Ota e de Rio Frio, é perfeitamente claro que não é possível garantir, por mais estudos que se façam, a sustentabilidade ambiental de Rio Frio. Essa hipótese está completamente excluída. A Sr.ª Deputada, provavelmente, tem opinião diferente, mas, então, conforme-se e seja "verde"!
Risos do PS.
Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.
Nessas condições, sendo o aeroporto uma infra-estrutura integrada na rede transeuropeia e não havendo alternativa, seria possível, em nome do interesse nacional supremo, argumentar uma excepção, mas, havendo alternativa, não me atreveria nem eu nem ninguém a sentar-me em qualquer ambiente de Bruxelas que tivesse a ver cone a rede transeuropeia para apresentar a solução Rio Frio. Está totalmente excluído. Sr.ª Deputada, não podemos correr o risco de passar pela situação insultuosa de um delegado português se sentar numa qualquer reunião a apresentar um dossier que seria rejeitado liminarmente com a qualificação de País que leão respeita o menor dos valores ambientais que diz respeitar e a que está obrigado em diversas directivas.
Devo dizer que este é um governo que se pauta pelo primado dos valores ambientais...
Risos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.
O Orador: - ... e que os concilia com a noção que tem de desenvolvimento sustentável. Lamento ter de dizer isto a uma Deputada do Partido de Os Verdes, mas isto serve para todos.
Tenho comigo - e não quero gastar mais tempo - a justificação da Comissão de Avaliação que mostra claramente que não é susceptível de defesa a sustentabilidade de um aeroporto em Rio Frio e, por maioria de razão, nem falo do Montijo.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos, tens a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, tenho também esse ponto 3 que referiu e há pouco não o li porque estava a referir-me só à decisão do Governo.
No entanto, a questão que o Sr. Ministro suscita, para mim, não está nada clara, porque nas "Conclusões e Recomendações" desse mesmo documento pode ler-se o seguinte: "(...) A Comissão de Avaliação (...) Conclui: 1 - Descritores dos EPIA (...)" e refere aquilo que eu há pouco li, ou seja: "(...) as conclusões constantes nos EPIA não são suficientes ou válidas como elementos de base para a tomada de decisão (...)". Estas "Conclusões e Recomendações" são assinadas, tanto quanto julgo saber, pelo menos pelos documentos que foram enviados, não sei se são todos, por todos os membros da Comissão de Avaliação mas, depois, no ofício que o Presidente da Comissão de Avaliação enviou, julgo eu, à Direcção-Geral do Ambiente isto não é referido, mas diz que já pode ser distribuído para decisão.
Ora, convém que isto seja clarificado, ou seja, por que é que a Comissão conclui que não é válido para decisão e depois, no ofício, diz que já pode ser distribuído para decisão.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Falcão e Cunha.
O Sr. Falcão e Cunha (PSD): - Sr. Ministro, quero só colocar-lhe duas ou três questões que me parece que seria importante serem esclarecidas nesta altura.
Primeira questão: há uma decisão da Sr.ª Ministra do Ambiente sobre a localização do novo aeroporto ou há uma aprovação da Sr.ª Ministra do Ambiente sobre os estudos de impacte ambiental?
Segunda questão: se a resposta de V. Ex.ª for no sentido, presumo, de que a Sr.ª Ministra se limitou a aprovar os estudos de impacte ambiental, quando é que o Sr. Ministro, ou o Governo, pensa tomar a decisão final?
Terceira questão: no momento em que tomar essa decisão final, V. Ex.ª vai ouvir antes, ou não, a Comissão Eventual de Acompanhamento dos Estudos de Localização e Construção do Novo Aeroporto, como V. Ex.ª, numa das sessões de trabalho com essa comissão, se comprometeu?
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): Sr. Presidente, pretendo dizer que o Sr. Ministro tentou distorcer aquilo que eu disse e não respondeu a nenhuma das questões que lhe coloquei, nem relativamente à descredibilização dos estudos de impacte ambiental, nem em relação ao porquê da necessidade de construção de um novo aeroporto, nem relativamente ao objectivo da construção de um novo aeroporto.
Portanto, Sr. Ministro, responda às perguntas que lhe fazem e não faça divagações de "verdura", porque o Sr. Ministro também está pouco "pintado de verde".
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (António Costa): - Esse "também" é significativo!
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.
O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, aquilo que citou diz respeito ao processo enviado inicialmente à Comissão de Avaliação e a própria Comissão vem dizer no ponto 3, com toda a clareza, que com todos os elementos adicionais, recolhidos de diversas maneiras, e novos elemen-
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tos enviados pela Comissão, foi possível chegar a conclusões, começando mesmo por referir que, embora "condicionado às lacunas e deficiências de informação" encontradas inicialmente nos documentos, com o seu próprio trabalho, os depoimentos recolhidos e os elementos posteriores, foi possível chegar a decisões. O Sr. Deputado não pode imputar, de maneira alguma, a decisão da Comissão apenas aos elementos que lhe foram entregues inicialmente, porque ela própria vem dizer que, com outros elementos posteriores, foi possível encontrar a decisão.
Sr. Deputado, isto está no ponto 3, é só lê-lo. É muito simples, está assinado pela Comissão. E eu acabei de ler "(...) foi possível chegar a conclusões (...)". Repito, Sr. Deputado: está no ponto 3.
Segundo aspecto: no ponto 7, lê-se que "Finalmente (...) a Comissão de Avaliação recomenda (...)" uiva série de estudos.
Sr. Deputado, estamos a avaliar de uma maneira pioneira e inovatória, pela primeira vez, o impacte ambiental em termos de plano e nunca em termos de projecto e o que aqui diz é que o projecto de execução tem de ter novos estudos Ora, é a mesma coisa que dizer que tem de ter novos estudos de engenharia, tem de ter novos estudos aeronáuticos, tem de ter novos estudos de centenas de aspectos quando se passa de um plano para um projecto e tem de ter novos estudos de impacte ou de avaliação ambiental. Sr. Deputado, por amor de Deus! ...
Sr. Deputado Falcão e Cunha, fui convocado para uma reunião no próximo dia 28, ainda ontem confirmei a minha presença nessa reunião e, como o Sr. Deputado sabe, no mesmo dia em que fiz o despacho sobre a nota que me chegou da Sr.ª Ministra do Ambiente, enviei-o à Comissão. Posteriormente, a Comissão convocou-me. Se a Comissão me convoca para dia 28 é porque entende que eu devo vir dia 28, e a mais irão sou obrigado. Portanto, o problema é da Comissão. Se ela me quiser convocar amanhã, estarei à disposição, se me quiser convocar hoje, estou à disposição; agora, não me convoque para o dia 28, depois de ter todos os elementos do processo, e venha imputar-me responsabilidades, se eu fizer qualquer outra coisa. Estou à sua disposição para ir à Comissão hoje, amanhã ou depois de amanhã.
Sr. Deputado Falcão e Cunha, a Sr.ª Ministra do Ambiente emitiu um despacho que não é uma decisão sobre a localização do aeroporto,...
O Sr. Falcão e Cunha (PSD): - Ali!
O Orador. - como é evidente. Aliás, todo o processo é nesse sentido. A Sr.ª Ministra do Ambiente proferiu despacho sobre a sua própria opinião, digamos assim, no âmbito da sua tutela, em matéria de considerações ambientais e considerou que Rio Frio não é sustentável. Sigo a opinião da Sr.ª Ministra do Ambiente porque, eu próprio, também considero que Rio Frio não é sustentável ambientalmente.
A Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia falou ainda da descredibilização dos estudos. Neste momento, esses estudos não estão em causa; está em causa, sim, a decisão da Comissão de Avaliação. Porventura, o que a Sr.ª Deputada quererá dizer é que a própria Comissão de Avaliação não tem credibilidade, porque é sobre a decisão da Comissão de Avaliação que nos estarmos a reportar. Foi a Comissão de Avaliação que apontou quais as deficiências dos estudos, mas superámos essas deficiências a ponto de chegar a conclusões.
A Sr.ª Deputada disputa que se possa chegar a conclusões, mas isso é com a Comissão de Avaliação. Por isso, faça favor de dirigir essa questão a essa Comissão.
Quanto à necessidade de um novo aeroporto,...
Vozes do PSD: - Ah!
O Orador: - ... pergunto-lhe o seguinte: a Sr.ª Deputada defende um aeroporto de 20 milhões de passageiros em Lisboa? Atreve-se a defender, como Deputada de Os Verdes, a possibilidade de um aeroporto de 20 milhões de passageiros em Lisboa? Atreve-se a defender isso?! Julgo que defende!
Finalmente, sobre o modo ferroviário e outros modos, é evidente que irão fazemos um aeroporto para concorrer com o ferroviário. Ou melhor, é evidente que fazemos um aeroporto combinado ao ferroviário, e está perfeitamente definido rios nossos planos, inclusivamente na ligação Lisboa/Porto, que o ferroviário deve ter a primazia, porque é a melhor solução e a ambientalmente mais pura.
Portanto, estou de acordo consigo: na ligação Lisboa/Porto opto pela solução ferroviária, que é a mais pura. Evidentemente, não quero pôr as pessoas a viajar, por exemplo, para Nova Iorque, de combóio!
Aplausos do PS.
Entretanto, assumiu a presidência, o Sr. Vice-Presidente João Amaral.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, dou por concluído o debate sobre a decisão da localização do novo aeroporto, requerido pelo CDS-PP.
Passamos ao debate sobre a decisão da União Europeia ria renovação do embargo a Portugal na chamada "crise das vacas loucas", também requerido pelo CDS-PP.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.
O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, Srs. Deputados: Sr. Ministro, ontem, quando o vi na televisão, ao lado de alguns agricultores, de alguns produtores preocupados,. percebi logo que o debate de hoje não seria, para si, "pêra doce". Efectivamente, hoje, o Sr. Ministro não está, não pode estar à vontade nesta matéria, enquanto responsável político de um Governo que não fez o que devia ter feito.
Sr. Ministro, não venho tanto aqui procurar culpas e culpados, ruas venho procurar soluções. E venho aqui dizer que o Sr. Ministro e o seu Governo não fizeram o que deviam ter feito pelos agricultores portugueses.
Sr. Ministro, como se sente hoje, aqui, enquanto titular da pasta da agricultura, quando se sabe que o embargo vai ser levantado ao Reino Unido,...
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O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas (Capoulas Santos): - Olhe que não vai
O Orador: - ... país que tem três vezes mais casos de animais infectados que o caso português?
Fragilidades nos controlos sanitários e a persistência de uma elevada taxa de incidência da BSE foram os argumentos utilizados pela Comissão Europeia para justificar o prolongamento, por mais um ano, do embargo às exportações portuguesas.
Ao chegar ao termo do seu mandato, o mínimo que se pode dizer da decisão dos Comissários é que ela é revoltante. Para nós, Partido Popular, esta decisão é inaceitável porque prejudica fortemente o interesse nacional, o interesse dos nossos produtores; significa uma iniquidade e uma incompreensível diferença de tratamento face a outros países europeus, testemunhando ainda, em nosso entender, a forte incapacidade do Governo de Portugal.
A decisão é injusta, já que não está provado que Portugal tenha, comparativamente com outros países da União Europeia, taxas de incidência mais elevadas da chamada doença das "vacas loucas", tal como não está provado que Portugal não tenha a possibilidade de fazer uma erradicação ainda mais rápida do que aquela que está a ser feita em países nos quais hoje, por exemplo, está a ser levantado o embargo.
Não obstante, sofremos este embargo geral,. de que fica apenas exceptuada a região dos Açores, ficando penalizados face a outros países que têm unta menor prevenção e não sofrem qualquer medida do tipo da que foi aplicada em Portugal.
Não podemos esquecer que, entre estes Estados que votaram o embargo a Portugal, se encontram países como, por exemplo, a Espanha, sem casos de BSE declarados, que não organiza sistemas de identificação e nem sequer aceita inspecções sanitárias da União Europeia. Sr. Ministro, como é possível que esta situação se mantenha? É, então, altura de perguntar se este embargo termina em Vilar Formoso e se as nossas fronteiras com Espanha representam hoje um cordão sanitário - imaginário, já se vê! - que preserva o nosso vizinho da doença!
A presente decisão não invoca nenhuma das razões que fundamentaram o embargo declarado em 1998.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este embargo, como disse, é lesivo, fortemente lesivo do interesse nacional, já que prejudica injustificadamente milhares de produtores, a maioria dos quais têm os seus efectivos indemnes, mas, por outro lado, o encerramento dos matadouros deixa-os sem alternativa, tornando a pecuária nacional, à semelhança dos demais sectores agrícolas, em mais um "parente pobre" para o nosso Terreiro do Paço.
Face a isto, estamos perante um Governo que não actua, deixando a defesa dos nossos interesses à mercê dos ditames de Bruxelas, ou seja, um Governo que se revela, pura e simplesmente, fraco face a Bruxelas.
A questão das "vacas loucas" é o mais lamentável exemplo de como - o PSD, no início - o PS, hoje, no seu desenvolvimento, tem perante a União Europeia uma atitude sem firmeza nem consequência. Se o Governo anterior foi negligente - e eu não quero discutir se foi ou não -, a este também não quero dizer que foi ingénuo, porque acredito que ingenuidade, Sr. Ministro, o seu Governo não tenha! No mínimo, o Governo foi fraco, fraco na decisão e na capacidade de se impor à vontade dos comissários europeus, de tal forma que assistimos a este facto extraordinário: o Ministro da Agricultura queixa-se da injustiça da Comissão, mas não recomenda outra solução que não seja a resignação.
Sr. Ministro, nós temos de falar mais forte e mais alto e, a confirmarem-se as notícias de hoje de manhã de que vai ser levantado o embargo ao Reino Unido, o embargo em relação aos portugueses é completamente inaceitável. O único termo comparativo europeu que tínhamos, Sr. Ministro, e ainda assim insuficiente, ainda assim injusto, ainda assim sem concordarmos, hoje cai completamente por terra, a confirmarem-se as notícias que a comunicação social está a divulgar desde esta manhã.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Martinho.
O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan, naturalmente, nesta questão com a Comissão Europeia, o Sr. Deputado vai cerrar fileiras, ao lado do Governo. Como classificou de revoltante, inaceitável e injusta a manutenção do embargo, então, estará ao lado do Governo nas posições que este vai tomar junto da Comissão Europeia. É bom e importante que assim seja.
Contudo, lembro ao Sr. Deputado que há um problema no Grupo Parlamentar do CDS-PP: o da rotatividade dos seus representantes na Comissão de Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas. O Sr. Deputado não tem estado a par de como esta questão foi tratada pelo Ministério da Agricultura e desconhece as medidas que foram tomadas; aliás, nem sequer tem conhecimento dos apoios dados aos lavradores, para usar uma expressão do Partido Popular!
Sr. Deputado, ontem mesmo, o Governo deu uma boa prova de apoio aos agricultores portugueses quando foi anunciar apoios à produção de pêra rocha, às zonas de seca no Alentejo, bem como quando, há dias, apresentou o Programa Nacional de Regadio. Sabe, essas são efectivas medidas de apoio aos agricultores portugueses. E o Sr. Deputado conhece as medidas que este Governo tomou de reforço e de apoio à produção de carne de qualidade no País, nomeadamente através da certificação? A certificação é uma boa alternativa para afirmar a qualidade da carne portuguesa. O Sr. Deputado conhece essas medidas?
Naturalmente, este será mais um motivo para reforçar e estar ao lado do Governo nesta questão.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.
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O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): Sr. Presidente, queria dizer ao Sr. Deputado do Partido Socialista que foi um pouco deselegante em relação à questão que colocou, incidental e regimental. O Sr. Deputado sabe perfeitamente que, em sede de Comissão Permanente, o Partido Popular dispõe de apenas três Deputados. Portanto, os critérios de escolha dos Deputados presentes são, claramente, de natureza política, porque nós não temos 112 Deputados - não podemos ter aqui uma panóplia de Deputados! A questão regimental que abordou é, pois, deselegante.
Passando à questão fundamental e de fundo, quero esclarecer o seguinte: o Sr. Deputado António Martinho pergunta se vamos estar ao lado do Governo, mas a questão não é essa. Nós vamos estar, sim, ao lado dos lavradores e dos agricultores. Nós não queremos estar ao lado do Governo, o que queremos é que o Governo esteja do nosso lado, ou seja, ao lado dos lavradores e dos agricultores. Essa é que é a_ verdadeira questão para o Partido Popular.
O Sr. Deputado mostrou hoje, aqui - e eu fico preocupado com esse seu estado de espírito -, que, em vez de estar preocupado, está contente. Ou seja, o Sr. Deputado veio aqui anunciar um conjunto de medidas, algumas delas até positivas, que foram tomadas em sectores específicos, mas também veio, perante uma situação que é grave e lesiva, mostrar-se satisfeito!? Justiça seja feita, o Sr. Ministro - embora, em nossa opinião, seja politicamente fraco - não tem mostrado tamanha imprudência, pois tem manifestado a sua insatisfação. É que nenhum agente político pode estar hoje satisfeito com a manutenção de um embargo, embargo, esse, injusto.
O que quero dizer-lhe, Sr. Deputado, é que nós estaremos ao lado dos lavradores e dos agricultores. E se o Governo também estivesse ao lado dos agricultores e dos lavradores, estou completamente convencido de que o embargo já tinha terminado.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Duarte.
O Sr. Carlos Duarte (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Estamos aqui a discutir uma questão que, lamentavelmente, está a afectar a economia nacional e a prejudicar a imagem de Portugal no exterior.
Em Setembro do ano passado, numa decisão da União Europeia, criticada por unanimidade nesta Câmara - pela nossa parte, considerámos que a mesma foi humilhante para Portugal -, foi decretado o embargo à carne portuguesa. Na altura, o Governo considerou que era uma situação despicienda porque não afectava a produção bovina nacional: nós não exportávamos carne, não havia problema!
Em Novembro seguinte, o Governo apresentou um conjunto de medidas suplementares, para além daquelas que, em Março de 1996, tinha apresentado e não executado. O Sr. Ministro veio a esta Assembleia apresentar essas medidas e garantiu na altura que, três meses depois, em Janeiro, iria solicitar à Comissão Europeia a antecipação do período de embargo à carne bovina portuguesa.
Em Março passado, esteve em Portugal uma missão de peritos da União Europeia para elaborar um relatório. Em Abril, Maio, Junho e Julho, a Comissão de Agricultura, de Desenvolvimento Rural e das Pescas, ou seja, este Parlamento solicitou ao Governo esse relatório. No dia 25 de Maio, o Sr. Ministro comprometeu-se directamente a fornecê-lo, mas o Governo, que quer esconder dados, que quer confidencializar as situações, lamentavelmente, não correspondeu a este apelo da Assembleia da República.
Sr. Ministro, este embargo decretado a Portugal é, claramente, um indicador da falta de força, da falta de credibilidade e da falta de empenho do Governo português, de V. Ex.ª, em Bruxelas! É claramente uma falta de autoridade, de competência e de capacidade para executar internamente as medidas necessárias para erradicar a doença.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Para nós, Sr. Ministro, este embargo tem consequências desastrosas para a economia nacional, para a fileira bovina, mas também para a confiança necessária dos nossos consumidores em relação à carne bovina.
Se a União Europeia, onde estão 11 primeiros-ministros socialistas e 13 governos com participação socialista para defender a saúde pública de cidadãos de 14 Estados-membros, decreta um embargo a Portugal, considera que os consumidores portugueses são cidadãos europeus de segunda e, portanto, não tem necessidade de tomar medidas para salvaguardar a saúde pública.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Por isso entendemos que a União Europeia é injusta também para os consumidores portugueses.
Mas, é claro, Sr. Ministro, que o Governo criou as condições para que a Comissão tomasse estas medidas. O Governo, pela sua inacção, pelas suas deficiências, pela falta de autoridade, criou condições para que isso acontecesse. Veja-se, Sr. Ministro, o descontrolo a nível da execução das medidas; das deficiências na separação do material de risco específico e de alto risco nas salas de abate; as deficiências nos tratamentos de subprodutos a nível de toda a cadeia; a inexistência de um corpo de inspectores sanitários que garanta, nas salas de abate dos matadouros, a separação desse material e dê confiança aos consumidores e garantias aos organismos internos e externos; a ausência de uma rede de laboratórios que possa fazer análises expeditas; a ausência de formação profissional nos vários agentes: médicos veterinários e outros, fundamentais para, nesta situação, darem garantias da eficácia da execução dessas medidas.
Mas, Sr. Ministro, no momento em que o Comissário propõe o prolongamento do embargo a Portugal, penalizando mais tempo os produtores portugueses, aumentando a desconfiança dos consumidores, inexplicavelmente veio também propor a retirada do embargo à carne bovina inglesa.
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Esta é uma situação demasiado humilhante para Portugal! Esta é uma situação inexplicável!
Sr. Ministro, se o Governo considera que tomou as medidas necessárias para erradicar a doença e que esta decisão é do foro exclusivamente político, então, por que é que o Sr. Primeiro-Ministro, que há quatro anos tratava por "tu" a maioria dos chefes de governo, que tem neste momento no Conselho de Ministros da União Europeia 11 camaradas seus da Internacional Socialista, não ligou a este sector, não se empenhou? Perante um facto que já era conhecido do País, ou seja, a incapacidade do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas para se impor e se afirmar interna e externamente, o Sr. Primeiro-Ministro não estaria preocupado pelo drama dos agricultores portugueses? O Sr. Primeiro-Ministro não estaria preocupado pela desconfiança dos consumidores em relação à carne bovina portuguesa?
Sr. Ministro, algo se passa para que o Governo tome atitudes muito superficiais em relação a esta situação, não reaja energicamente em relação a esta medida que, no nosso entendimento, criou condições para a mesma ser tomada, sendo uma medida claramente política, com contornos políticos e indica a desconfiança da Comissão em relação ao governo português e a falta de argumentação técnica e científica do governo português para defender os agricultores e a economia nacional.
Sr. Ministro, no momento em que sabemos que o Comissário da Agricultura continua mais um mandato na Comissão, sabemos que V. Ex.ª e o Governo socialista não têm condições para continuarem a defender a agricultura nacional.
O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Lamentavelmente!
O Orador: - Sr. Ministro, eu, que sou produtor pecuário, que sou Deputado, que técnico do sector, tenho vergonha que o meu Governo não tenha tido condições, capacidade, inteligência e empenho para defender a agricultura portuguesa, para defender o País!
Sr. Ministro, como português, "dispa o casaco de Ministro" e diga se não sente revolta pelo facto de o representante do governo português em Bruxelas não ter tido a capacidade de defender a agricultura portuguesa, de, ao invés, marginalizar a agricultura portuguesa e de ter criado condições para destruir fileiras importantes.
Sr. Ministro, não sente também vergonha? Não acompanha o sentimento de revolta que os agricultores de norte a sul do País sentem em relação a esta situação?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado António Martinho.
O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr as e Srs. Deputados: O tema hoje em debate, por proposta do Grupo Parlamentar do CDS-PP, só pode merecer uma atitude desta Câmara - o da unidade à volta do Governo, em repúdio pela decisão da Comissão de prolongar o embargo à carne de bovino portuguesa.
Srs. Deputados do PSD e Sr. Deputado Carlos Duarte, não sejam demagogos. Se há 11 governos socialistas na União Europeia, o Sr. Deputado sabe que o Comissário Franz Fischler é da sua família política!
Estaremos perante uma tentativa de ajuda externa ao PSD que tem tantas dificuldades em afirmar-se?
Esta atitude de repúdio à decisão justifica-se por duas ordens de razões.
Primeira, porque o actual Governo tomou medidas atempadas para combater, de forma persistente e eficaz, a BSE, aplicou todas as medidas aprovadas pela União Europeia.
Protestos do PSD.
Srs. Deputados, ao menos oiçam! O actual Governo antecipou, até, a entrada em vigor de algumas dessas medidas.
Segunda, porque o actual Governo tomou uma atitude de total transparência no tratamento desta questão e de absoluta informação à opinião pública em geral, designadamente aos consumidores e aos criadores. No entanto, outros não fizeram assim quando detinham responsabilidades no governo!
Foi este Governo, e não outro, que aprovou, e tem vindo a pôr em prática, um conjunto de medidas de combate à BSE de uma forma determinada, transparente e eficaz. De entre elas, destaco a aprovação e a execução do Programa de Vigilância, Controlo e Erradicação da BSE, desde Abril de 1996. No âmbito deste programa, até 31 de Maio do corrente ano, foram abatidos 11 170 bovinos co-habitantes em 23 operações de abate.
"Deu-se continuidade ao abate e destruição de todos os animais clinicamente suspeitos, num total acumulado de 590 bovinos, com a recolha de material necessário para análise laboratorial. Destes, foi confirmada a doença em 265 animais". Acabei de citar o 7.º Relatório sobre EEB (Encefalopatia Espongiforme de Bovinos), o último dos vários relatórios que este Governo tem enviado a Bruxelas, mas também à Assembleia da República. Este Governo não esconde!
É muito provável que mais casos tivessem sido diagnosticados no País se não se tivessem abatido os co-habitantes, já que poderiam estar em período de incubação da doença e, nessa fase, como se sabe, não é possível o diagnóstico.
Este Programa de Erradicação da BSE foi considerado um "luxo sanitário" por responsáveis europeus e mereceu aprovação e aplauso por parte de membros da comunidade científica nacional.
As próprias missões veterinárias da União Europeia têm feito recentemente uma avaliação positiva a este programa - e vou citar um Professor catedrático português, que diz o seguinte: "o esforço feito por Portugal para erradicar a BSE ultrapassa as exigências feitas pela Comissão, mas lamentavelmente não tem tido devido reconhecimento". Não são políticos, é a comunidade científica que o diz!
O Sr. Carlos Duarte (PSD): - É boy!
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O Orador: - Não é boy, Sr. Deputado! Esteja calado!
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Esteja calado?!!!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, peço-lhe que faça a sua intervenção nos termos que são habituais entre nós no Parlamento.
O Orador: - Sr. Presidente, peço desculpa mas, de facto, estou a citar um professor universitário que nada tem a ver com a política, é na qualidade de cientista que ele faz esta afirmação, pelo que acho que o aparte do Sr. Deputado Carlos Duarte é também, de alguma forma, um insulto à minha bancada.
Depois, o referido Professor da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, que estava a citar, mais à frente, diz: "hoje as razões são de confiança".
Mas continuemos: este Governo defendeu, no âmbito da União Europeia, a aplicação de todas as medidas aprovadas ao conjunto dos países comunitários.
Foi mais longe quando antecipou, relativamente aos prazos estabelecidos pela União Europeia, a tomada de medidas, de entre as quais se destacam, por exemplo, as contidas no Decreto-Lei n.º 32-A/97, onde é interditada a introdução de produtos de risco na cadeia alimentar humana, bem como as que constam dos Decretos-Leis n.º5 327/98, 387/98 e 393-A/98, que interditam a introdução desses produtos na cadeia alimentar animal.
O Governo antecipou também em seis meses o disposto no Regulamento n.º 820/97/CE, instituindo o Sistema Nacional de Identificação e Registo de Bovinos a partir de 1 do corrente mês.
Este Governo aperfeiçoou o sistema de controlos, colocando-os ao nível dos melhores da União Europeia e afectou em permanência 99 agentes de controlo em todos os matadouros e fábricas de subprodutos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Reforçou a fiscalização nas vias de comunicação, nos portos e aeroportos.
Prestou, sempre com transparência, informação sobre a situação da doença em Portugal. E, Srs. Deputados, aqui reside uma diferença abissal - e sei que os Srs. Deputados do PSD não queriam que eu chegasse a este ponto da minha intervenção -, entre a atitude do Governo do PS e da nova maioria e a atitude do anterior governo do PSD: é que se este Governo agiu sempre com total transparência, o anterior, da responsabilidade do PSD, que integrava o Dr. Durão Barroso, sonegou informação, escondeu casos de BSE comprovados e só tomou algumas medidas de forma tímida e tardiamente.
Sabem os Srs. Deputados quando foi detectado o primeiro caso de BSE em Portugal? Em Junho de 1990. Sabem quando foram tomadas as primeiras medidas? Em Julho de 1994.E é por isso, Srs. Deputados, que a recente afirmação do líder do PSD, e cito: "Isto (...)" - o embargo - "(...) nunca aconteceria com um governo do PSD", soa a falso, á puro eleitoralismo e não condiz com a ausência de medidas, no tempo em que o PSD era governo e o seu actual líder era Ministro.
Não têm sentido, são mesmo inqualificáveis estes ataques do PSD ao Governo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A forma como o actual Governo tem enfrentado este problema e o tem vindo a resolver merece da nossa parte total apoio e, em nosso entender, também devia merecer o apoio desta Câmara.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O essencial do que se pode dizer sobre a decisão da União Europeia de prolongar por mais um ano o embargo à carne bovina portuguesa resume-se a uma frase: mais uma vez, o Governo, e em particular o Ministro da Agricultura, falhou nas negociações com a Comissão em matéria de política agrícola e numa questão altamente sensível e importante para os produtores e para os consumidores nacionais.
Falharam quando, de uma forma voluntarista e sem sustentação, o Ministro da Agricultura afirmava, em Janeiro deste ano, que. tinha a expectativa de o levantamento do embargo poder vir a ser antecipado em seis meses, para Fevereiro passado. Afinal aconteceu precisamente o contrário: o embargo foi prolongado por mais um ano.
Falharam quando, sabendo que os relatórios das missões de inspecção da Comissão não eram favoráveis ao nosso País, não agiram com determinação nem no piano diplomático nem no terreno das medidas que faltavam tomar para eliminar os pretextos para o prolongamento do embargo. Recordamos a este propósito que a transformação em farinhas e gorduras dos materiais de risco provenientes do abate de bovinos está a ser feita, como aliás o Governo reconhece nos seus relatórios, em condições altamente deficientes, designadamente de ordem ambiental, como o atestam os problemas e as reclamações surgidos com a fábrica de processamento contratada em Coruche. E que esse material é depois armazenado em instalações militares, quando deveriam ter sido criadas as condições para a sua célere destruição.
Recordamos que não estão completamente garantidas as inspecções veterinária e sanitária permanentes nos matadouros e nas unidades de processamento dos subprodutos, como não está garantido com eficiência o controlo do gado e produtos de origem bovina importados, como não está regulamentada a criação do Corpo Nacional de Inspecção Veterinária, tal como o encerramento de 36 matadouros, sem a criação de condições alternativas para os agricultores, pode vir a impulsionar de novo o abate clandestino, tal como a antecipação, em seis meses, da entrada em vigor do Sistema Nacional de Identificação e Registo de Bovinos - antecipação desnecessária - pode provocar que milhares de produtores fiquem de fora dos registos, com todas as consequências que isso acarreta, obrigando os serviços do Ministério e o INGA a fa-
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rem, como estão a fazer, Sr. Ministro, operações de autêntica engenharia estatística que não passam, obviamente, despercebidas a quem conhece os problemas e, no caso, às missões de inspecção da Comissão Europeia.
As medidas apressadas e voluntaristas que o Ministro da Agricultura tem anunciado não conseguem, pois, esconder o atraso com que este Governo encarou as medidas de combate à BSE e o défice de medidas estruturantes que garantam a não repetição, no futuro, de situações idênticas.
É uma verdade inquestionável que o PSD, enquanto Governo, simplesmente ignorou, negou e ocultou a existência da BSE em Portugal e que hoje os agricultores portugueses estão a pagar por isso. O PSD não tem, pois, o mínimo direito moral de vir agora criticar seja o que for sem que, antes, pelo menos, faça o seu acto de contrição. Não sei se o Sr. Deputado Luís Marques Guedes agora diz que está de acordo?
Risos.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Peço desculpa, mas estava distraído!
O Orador: - O Dr. Durão Barroso já fez esse acto de contrição em relação ao rendimento mínimo garantido e deve fazê-lo agora em relação às responsabilidades do PSD na "doença das vacas loucas" e das suas consequências na saúde animal e na saúde pública.
Mas o Governo do Partido Socialista também não tem razões para se vangloriar, depois de ter negligenciado a tomada de medidas e de o fazer agora de forma precipitada e superficial, a toque de caixa dos relatórios das missões de inspecção da Confissão Europeia. Aliás, a este propósito, Sr. Ministro, é estranho que o Ministro da Agricultura continue a sonegar...
O Sr. José Junqueiro (PS): - A sonegar?!
O Orador: - ... à Assembleia da República, como já foi aqui dito, apesar de insistentemente pedidos, os relatórios das missões de inspecção. Porquê? O que é que o Governo quer esconder e tem medo de divulgar a esta Assembleia?
Apesar disto tudo, Sr. Ministro, apesar disto tudo, sublinho, não vemos razões fundamentadas para que a Confissão Europeia mantenha e prolongue o embargo até 1 de Agosto de 2000. As deficiências ainda existentes no nosso País, e que sublinhámos agora abundantemente, e o número de casos de BSE ainda existentes não são mais graves do que os existentes no Reino Unido ou noutros países. E a verdade é que a Comissão Europeia não só não toma medidas idênticas contra mais ninguém como, pelo contrário, anunciou que iria propor o levantamento do embargo ao Reino Unido a partir de 1 de Agosto próximo. Dois pesos e duas medidas, consoante a força dos países, Sr. Ministro!, o que põe em causa as tão propaladas teses do Governo sobre uma União Europeia de países soberanos iguais em direitos. Pelos vistos, há uns mais iguais do que outros! ... Veja-se, aliás, o que se está a passar em Espanha, na Bélgica e na França, para além do Reino Unido.
Por isso mesmo e pelo facto de o Governo, inclusivamente pela voz do Primeiro-Ministro, afirmar que não há razões técnicas para a continuação do embargo, não se compreende, Sr. Ministro, a resposta frouxa do Governo português, limitada a uma carta suave de V. Ex.ª dirigida ao Comissário Franz Fischler. É que se não há razões técnicas para o embargo, então, exigia-se do Governo, português e, em particular, do Primeiro-Ministro um protesto e uma recusa firmes desta decisão. Ora, isto não foi feito. Ou o Governo tem telhados de vidro e não acredita nas declarações que faz aqui, em Portugal, para consumo interno, ou o Governo não quer abrir outra frente de conflito, a somar ao caso Champalimaud-Santander, e, por isso, sacrifica os interesses dos agricultores aos interesses dos banqueiros, ou o Eng.º Guterres anda tão entretido nas suas viagens pré-eleitorais pelo País que não tem tempo para lembrar ao Primeiro-Ministro os problemas com que se debatem a agricultura e os agricultores portugueses.
Seja pelo que for, a verdade é que o embargo penaliza injustamente os produtores portugueses que deverão ser indemnizados pelos prejuízos que estão e vão continuar a sofrer.
O PCP discorda frontalmente e protesta contra o embargo, critica o Ministério da Agricultura por não ter tomado todas as medidas que impedissem o surgimento de novos pretextos para o seu prolongamento e exige o empenhamento diplomático de todo o Governo, com vista a que na próxima reunião do Comité Veterinário Permanente, na Comissão e no Conselho, sejam criadas as condições para o levantamento urgente do embargo, que só prejudica os agricultores portugueses, a braços já com quebras de rendimento, perdas de mercado e um mau ano agrícola.
Sei, Sr. Ministro, que o Sr. Ministro vem agora, a seguir, aqui dizer aquilo que já disse na rádio, ou seja, que vai apresentar queixa no Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias contra a decisão da Comissão europeia. Se o Sr. Ministro confirmar aquilo que, deselegantemente para com a Assembleia, disse à rádio, antes de entrar na Assembleia, direi, Sr. Ministro, que é uma reacção tardia, só imposta pela conferência de imprensa que o PCP deu ontem e pelo debate que hoje está aqui a ser realizado. O que o Governo e o Primeiro-Ministro, em particular, já deveriam ter feito era terem-se empenhado, de modo firme, no plano diplomático e na adopção de medidas sustentadas, antes de o embargo ter sido prolongado, antes de a decisão ter sido tomada pela Comissão europeia. Agora - bom! -, é a medida possível mas é "chover no molhado".
O que é necessário, Sr. Ministro, tanto mais que a queixa no Tribunal de Justiça vai demorar meses a ser resolvida e, entretanto, os produtores portugueses estão sujeitos ao prolongamento do embargo, é que no próximo Comité Veterinário Permanente, na próxima reunião da Comissão e, em particular, no próximo Conselho de Ministros, o Governo português, o Sr. Ministro e o Primeiro-Ministro de Portugal adoptem as medidas necessárias a que o embargo seja levantado a Portugal. Mas isto, Sr. Ministro, não absolve o Governo português pela forma ligeira, frouxa, tardia e voluntarista como tomou medidas, para dar a ilusão, em Portugal, de que as estava a adoptar mas que, obviamente, não
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convence os produtores portugueses e, pelos vistos, não convenceu as missões de inspecção veterinária a Portugal.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - O Sr. Deputado Lino de Carvalho usou 2 minutos que lhe foram cedidos por Os Verdes, razão pela qual não o interrompi.
Tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura.
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos aqui a debater uma questão extremamente séria e por essa razão parece-me oportuno este debate, porque ele pode permitir o esclarecimento da opinião pública, que, aliás, tem tido, muito particularmente os agricultores e as respectivas organizações, uma posição que dispensa comentários. Nenhuma voz da organização dos agricultores levantou o dedo acusador, no que se refere a esta matéria, ao Governo, porque o Governo de Portugal, no que à BSE diz respeito, está a fazer mais do que, eventualmente, qualquer outro país no mundo e está a fazer um esforço a todos os títulos, designadamente no plano financeiro, sem precedentes, quando temos em conta a dimensão do sector e a dimensão do País.
Como sabem, em Novembro de 1998, foi declarado o embargo a Portugal e, nessa altura, a Comissão invocou três razões.
Em primeiro lugar, foram invocadas alegadas deficiências nos controlos nas fábricas de rações e nos matadouros, e que, conforme se veio posteriormente a verificar, no relatório da Comissão referente a todos os outros Estados membros, eram iguais àquelas que foram detectadas nesses mesmos Estados membros.
Em segundo lugar, foi invocado um aumento de casos de BSE, o que é efectivamente verdade, pois, em 1998, praticamente, triplicou ou quase quadruplicou o número de casos positivos detectados relativamente ao ano anterior. Todos sabemos que estes casos se referem a um período de incubação que vai até 1993 ou 1994, pois não há um único animal positivo nascido depois de 1 de Janeiro de 1995. Todos os animais foram contaminados numa altura em que em Portugal não só se tentou ocultar, durante alguns anos, a existência da doença como não foi tomada uma única medida para combatê-la.
Portugal registou até 31 de Maio passado 265 casos positivos e, em 1996, pôs em execução um plano de erradicação da doença, plano, esse, que foi substancialmente reforçado em Novembro de 1998. Somos hoje o único País no mundo que interditou da cadeia alimentar animal de todas as espécies a farinha de carne e ossos. E esse vasto conjunto de medidas foi objecto de verificação, por parte de duas missões que, nesse período, se deslocaram a Portugal, a meu pedido. A primeira missão veio em Janeiro, com o objectivo de antecipar o levantamento do embargo e fez um relatório altamente positivo para Portugal, o qual é referido nos próprios considerandos da decisão que agora prolonga esse mesmo embargo. A segunda missão esteve em Portugal mais recentemente, de 14 a 18 de Junho, ainda não apresentou qualquer relatório escrito - aliás, Sr. Deputado, por isso mesmo, não lho posso remeter, porque o Governo ainda nem sequer o recebeu -, mas o seu chefe, que esteve em Portugal, fez um relato verbal no último Comité Veterinário, referindo que todas as recomendações que haviam sido apontadas na missão anterior - pequenas, de pormenor - tinham sido cumpridas por Portugal. E a Comissão reconhece até, e passo a citar, que "as missões confirmaram os sérios esforços e o considerável progresso na implantação das medidas de gestão do risco num curto período, efectuado em Portugal", por este Governo.
No dia 25 de Junho, fomos surpreendidos com a notícia de que o comissário responsável pelo pelouro da agricultura ia prolongar o embargo por mais um ano. Nós fomos surpreendidos e, aliás, os próprios serviços da Comissão também o foram, porque conforme os contactos que vínhamos estabelecendo com eles até essa data, por aquilo que eles próprios nos informavam, o que estava previsto ir ao colégio de comissários era o levantamento antecipado do embargo para os touros de lide, já que, nos animais vivos, o embargo duraria mais um ano, de acordo com a declaração de 1998, de acordo com a recomendação feita pela própria missão que se deslocou a Portugal em Março. Ia também ser submetida à consideração do colégio de comissários a possibilidade de Portugal exportar as farinhas de carne e ossos, as quais estavam interditas de exportação, por serem materiais de origem bovina, para serem incineradas na Bélgica, uma vez que não há capacidade de incineração em Portugal.
Como já disse, fomos surpreendidos com esta decisão que o Governo português continua a não compreender. Por isso mesmo, e tendo recebido a decisão final que, obviamente, ainda nem sequer foi publicada no Jornal Oficial, o Governo português decidiu - não vim hoje aqui para anunciar essa decisão, pois ela já foi tomada e comunicada pelo Sr. Primeiro-Ministro ao Presidente da Comissão intentar um recurso de anulação da decisão no Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, com os fundamentos que os advogados do Ministério da Agricultura irão precisar melhor mas, em princípio, porque consideramos que existe uma violação do princípio da proporcionalidade, porque a fundamentação da decisão é deficiente e porque a decisão é inadequada quanto ao objectivo que tem em vista.
Estamos convictos - e todos os juristas com quem trocámos impressões estão de acordo - de que esta é uma causa que Portugal tem todas as condições para ganhar no Tribunal de Justiça e para, na sequência dessa decisão, reclamar. obviamente, a devida reparação por parte da Comissão Europeia. E tanto mais que, Sr. Deputado, e esta é uma questão extremamente importante, quando disse que eu tinha a expectativa de antecipação do levantamento do embargo essa expectativa era, é e continua a ser absolutamente fundamentada, já que o embargo foi declarado com determinados pressupostos e nenhum desses pressupostos consta da actual decisão. Ou seja, nenhuma das razões que foram alegadas ou invocadas pela Comissão europeia, em Outubro de 1998, para declarar o embargo se verifica agora. Qual é, então, agora, a razão invocada? Agora, querem aplicar a Portugal o novo critério da OIE, um novo critério
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15 DE JULHO DE 1999 3821
aprovado pela Organização Internacional das Epizootias em 22 de Maio deste ano, segundo o qual se considera um país de alta incidência aquele que tem mais de 100 casos por milhão de bovinos com mais de dois anos de idade. Portugal tem 170 ou 180 casos por milhão. Este critério cifrava-se, até essa data, em 200 casos e a verdade é que reclamei, em Outubro passado, do comissário que aplicasse o critério da OIE, na ausência de outro critério objectivo, o que ele recusou, alegando que a União Europeia não o reconhecia, contrariamente ao que sucede neste preciso momento.
E a prova disso é que - e os Srs. Deputados Sílvio Rui Cervas e Carlos Duarte evidenciaram uma confrangedora ignorância sobre o que se passa relativamente ao Reino Unido, mas tenho muito gosto em esclarecê-los - a Comissão não decidiu hoje levantar o embargo ao Reino Unido; quem tinha decidido levantar o embargo ao Reino Unido foi o Conselho de Ministros da União Europeia de Novembro de 1998, numa votação em que eu próprio dei o meu voto favorável, e que, mesmo assim, é, obviamente, um levantamento muitíssimo parcial, já que impõe um conjunto de condições que são mesmo mais restritivas do que as que o próprio critério da OIE recomenda.
Ou seja, a partir de 1 de Agosto, a Inglaterra só 'vai poder exportar carne desossada de efectivos que não tenham qualquer caso de BSE nos últimos sete anos, de aclimais que tenham entre seis meses e três anos de idade, que estejam inseridos mim sistema de informação que permita encontrar a mãe e o efectivo de origem, que sejam abatidos em matadouros especialmente autorizados para o efeito e que tenham um conjunto de inspecções e de outros dados.
O Reino Unido, neste momento, regista 665 casos por milhão, três vezes mais do que o que se verifica em Portugal. Estes são dados referentes há um ano atrás, porque não foi possível obter, nos documentos da Comissão, dados actualizados do Reino Unido, uma vez que, aparentemente, há um ano que não são comunicados à União Europeia. Mas os últimos dados disponíveis são três vezes o critério da OIE e, por consequência, em Novembro passado, o Comissário não invocou este critério.
Mesmo que o critério da OIE fosse aplicado, há que ter em conta que ele classifica os países em quatro categorias: os países indemnes, os países provisoriamente indemnes, os países com baixa incidência e os países com alfa incidência. Os países com baixa incidência são os que têm menos de 100 casos e os com alta incidência são os que têm mais de 100 casos. E esse critério diz que os países que têm alta incidência devem cumprir certos requisitos na exportação, designadamente a carne desossada, um sistema de identificação de bovinos. Portanto, mesmo que o critério fosse aplicado a Portugal, o mesmo não implicaria o embargo total que foi declarado pela Comissão!
Esta é unta das razões que nos leva a interpor recurso no Tribunal, porque entendemos que é unta decisão completamente injusta e sem base jurídica fundamentada, tomada por razões políticas, que temos dificuldade em compreender. E é por isso que, contrariamente à proposta que fez o líder do PSD, que era no sentido de que, perante isso, Portugal deveria retaliar, nós somos defensores de um Estado de direito e do respeito pela ordem jurídica que vigora nas organizações internacionais a que pertencemos. Ora, não foi possível inverter esta decisão, em sede própria, isto é, na Comissão.
Aproveito para manifestar a minha profunda admiração pelo trabalho que o Comissário João de Deus Pinheiro desenvolveu no sentido de tentar evitar o embargo e para dizer que foi com alguma estupefacção que verifiquei que o PSD, em vez de reconhecer esse esforço, retaliou - por outras razões, certamente compreensíveis, que a comunicação social referiu nos dias seguintes - contra o Comissário, que foi quem tentou fazer um esforço, tendo ele próprio sido incapaz de inverter a decisão no local apropriado, ou seja, onde a mesma foi tomada.
Por consequência, Srs. Deputados, temos a consciência absolutamente tranquila e apraz-me registar que todos reconhecem e comungam dá opinião de que o Governo perfilha de que este é um embargo desproporcionado, injusto e altamente lesivo dos interesses portugueses. E todos reconhecem que o esforço que está a ser feito, em Portugal, é um esforço gigantesco, que não tem paralelo em qualquer outro Estado, para tentar erradicar esta doença e pôr cobro a um problema que é, efectivamente, grave.
O Sr. Deputado Lido de Carvalho disse ainda que o Governo decidiu mal ao encerrar 36 matadouros. Há 20 anos que não havia coragem de encerrar matadouros que não cumpriam as regras de higiene e salubridade! Foram feitas sucessivas prorrogações de prazos, foi feito um ultimato, em Janeiro deste ano e, depois disso, tivemos a coragem, na véspera de uma campanha eleitoral, de fechar os 36 matadouros e de garantir as alternativas aos produtores.
Depois disso, já abriram três ou quatro, que, entretanto, em dois meses, já fizeram as obras que não tinham feito nos últimos anos, porque, certamente, nunca acreditaram que houvesse coragem para os encerrar. Já foram aprovadas mais meia dúzia de novas unidades e a cobertura territorial do País é, felizmente, mais do que suficiente.
Agora, não posso deixar de manifestar a minha profunda perplexidade quando o Sr. Deputado Lino de Carvalho diz que a antecipação do sistema nacional de risco de bovinos é desnecessária.
Sr. Deputado, se quisermos ter um dado objectivo para saber se é embargo ou não e reclamar a aplicação integral do critério da OIE, só poderemos exportar se tivermos um sistema fiável de identificação de bovinos. O que quisemos foi dar um exemplo de que somos capazes de nos antecipar.
Lanço um repto aos Srs. Deputados, e com isto termino: vamos ver quem é que, dos 15 Estados membros, no dia 1 de Janeiro do ano 2000, quando a Directiva se aplica, tem o sistema de identificação implementado.
O Sr. Liso de Carvalho (PCP): - Só a Finlândia! Mais ninguém!
O Orador: - Não acredito que, em Janeiro, nos Quinze, haja mais do que um ou dois que seja capaz de ter o sistema pronto.
Há que reconhecer o esforço enorme que foi feito e que, devo dizer, não é desnecessário, Sr. Deputado!
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O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Há que reconhecer o voluntarismo?
O Orador: - Infelizmente, não tínhamos um sistema fiável, que permitisse detectar o percurso de um animal desde o momento em que ele nasceu até à data do abate. Queremos ter o melhor sistema possível e demos um grande exemplo disso, demonstrando à Comissão aquilo em que a mesma acreditava. Isto é, fomos capazes de pôr o sistema a funcionar com seis meses de antecipação e isso pode ser muito importante, inclusivamente, na fundamentação que vamos fazer.
Em suma, Srs. Deputados, quero só dizer que espero que a justiça, na sede própria, prevaleça, que este problema, que afecta todos os criadores portugueses e a própria imagem de Portugal, possa ser rapidamente reparado e que o embargo possa ser levantado muito antes do período que a Comissão, injustamente, determinou.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho, para o que a Mesa lhe concede 1 minuto.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, não disponho de tempo para focar toda a argumentação utilizada pelo Sr. Ministro, e, dado que não quero abusar da Mesa, vou apenas referir que a posição do PCP é clara: o comunicado da Comissão Europeia que toma a decisão do prolongamento do embargo não se limita ao problema da manutenção de elevados índices de BSE, mas usa outros argumentos.
Mas, Sr. Ministro, a minha questão, neste momento, é a seguinte: entre o dia 25 de Junho, ou à volta disso, quando se tomou conhecimento da eventual decisão, e o dia 8 de Julho, que, salvo erro, foi o dia da decisão, que medidas é que o Governo português tomou? Que diligências é que o Primeiro-Ministro fez? Que pressões é que foram feitas sobre o Presidente da Comissão?
O Comité Veterinário Permanente vai reunir daqui a dois dias. Que medidas, que diligências, que operações no plano diplomático é que estão a ser feitas para que, daqui a dois dias, o Comité Veterinário Permanente altere a decisão?
É que, Sr. Ministro, se não há razões técnicas, como o Governo invoca, para o embargo continuar, então, a questão coloca-se no terreno do empenhamento diplomático do País, designadamente do Sr. Primeiro-Ministro, o qual foi "zero"?
O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra para responder, Sr. Ministro, para o que a Mesa lhe concede igualmente 1 minuto.
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: - Sr. Presidente, Sr. Deputado, devo dizer-lhe foram feitas imensas diligências, nesse período. Foram estabelecidos contactos com os responsáveis máximos dos serviços veterinários de todos os Estados membros, com diversos ministros da agricultura, com os serviços da Comissão e com o Comissário.
Foram feitos esforços pelo Comissário Europeu e espero, Sr. Deputado, que os Deputados do seu partido no Parlamento Europeu também tenham tomado algumas diligências, que, já agora, gostaria de saber quais foram!
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, não quero violar o Regimento, pelo que, ou peço a palavra a título de defesa da honra, ou, no caso de o Sr. Presidente entender que não é necessário, faço unia interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Não é necessário. Tem a palavra para uma interpelação, Sr. Deputado.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, é só para dizer ao Sr. Ministro que já interpelámos a Comissão.
Mas, já agora, o Sr. Ministro também fica a saber que, quando o Parlamento Europeu decidiu a manutenção do embargo, há uns meses atrás, os únicos Deputados portugueses que estavam na sala, a votar contra, foram os Deputados comunistas portugueses, porque mais nenhum Deputado, incluindo do vosso partido, estava presente, nesse momento!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, dado não haver mais inscrições, terminámos os nossos trabalhos de hoje.
Srs. Deputados, está encerrada a reunião.
Eram 20 horas.
Faltaram à reunião os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
António de Almeida Santos.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
Pedro José Dei Negro Feist.
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