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Quinta-feira, 21 de Setembro de 2000 I Série - Número 1

DIÁRIO da Assembleia da República

VIII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2000-2001)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 20 DE SETEMBRO DE 2000

Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex. mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
José de Almeida Cesário
António João Rodeia Machado

S U M Á R I O

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 10 minutos, tendo saudado os Deputados na abertura do ano parlamentar.
Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de lei n.º 45/VIII, dos projectos de lei n.os 294 a 297/VIII, das propostas de resolução n.os 42 e 43/VIII, da moção de censura n.º 2/VIII, do projecto de resolução n.º 72/VIII, da interpelação ao Governo n.º 6/VIII e da apreciação parlamentar n.º 23/VIII.
Foi aprovado um parecer da Comissão de Ética relativo à retoma de mandato de 13 Deputados do PS, à substituição de 14 Deputados, sendo 2 do PCP, 1 do CDS-PP e 11 do PS, e à transição da situação de suspensão de 1 Deputado do PS.
Procedeu-se à leitura da mensagem do Sr. Presidente da República, sobre a promulgação como lei do diploma recentemente aprovado pela Assembleia da República, que altera a Lei n.º 20/99, de 15 de Abril, relativo ao tratamento de resíduos industriais.
A abrir o debate da moção de censura n.º 2/VIII, apresentada pelo PSD, intervieram o Sr. Deputado Durão Barroso (PSD) e o Sr. Primeiro-Ministro (António Guterres).
Seguidamente, usaram da palavra, a diverso título, além daqueles Oradores e dos Srs. Ministros das Finanças (Pina Moura) e do Estado e do Equipamento Social (Jorge Coelho), os Srs. Deputados Paulo Portas (CDS-PP), Francisco de Assis (PSD), Carlos Carvalhas (PCP), Isabel Castro (Os Verdes), Francisco Louçã (BE), Manuela Ferreira Leite (PSD), Basílio Horta (CDS-PP), Guilherme Silva (PSD), Maria Celeste Cardona (CDS-PP), António Capucho e Luís Marques Guedes (PSD), Telmo Correia (CDS-PP), Sílvio Rui Cervan (CDS-PP), Octávio Teixeira (PCP), Manuel dos Santos (PS), Luís Fazenda (BE), Manuela Ferreira Leite e Luís Marques Mendes (PSD), José Barros Moura (PS) e Rui Rio (PSD).
No encerramento do debate, proferiram intervenções o Sr. Ministro do Estado e dos Negócios Estrangeiros (Jaime Gama) e o Sr. Deputado Durão Barroso (PSD).
No final, a Câmara procedeu à votação da moção de censura, que foi rejeitada.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 10 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Aires Manuel Jacinto de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
António Alves Marques Júnior
António Alves Martinho
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António Fernando Marques Ribeiro Reis
António Fernando Menezes Rodrigues
António José Gavino Paixão
António Manuel Dias Baptista
António Manuel do Carmo Saleiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Bruno Renato Sutil Moreira de Almeida
Carla Maria Nunes Tavares Gaspar
Carlos Alberto
Carlos Alberto Dias dos Santos
Carlos José Gonçalves Vieira de Matos
Carlos Manuel Luís
Casimiro Francisco Ramos
Cláudio Ramos Monteiro
Dinis Manuel Prata Costa
Eduardo Ribeiro Pereira
Emanuel Silva Martins
Filipe Mesquita Vital
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Francisco José Pinto Camilo
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho
Helena Maria Mesquita Ribeiro
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco D'Almeida
Isabel Maria dos Santos Barata
Isabel Maria Soares Pinto Zacarias
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Alberto Martins Sobral
João Cardona Gomes Cravinho
João Francisco Gomes Benavente
João Macedo Lourenço
João Pedro da Silva Correia
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
João Rui Gaspar de Almeida
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão
José Alberto Leal Fateixa Palmeiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Aurélio da Silva Barros Moura
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos da Cruz Lavrador
José Carlos Lourenço Tavares Pereira
José Carlos Pinto Basto Mota Torres
José da Conceição Saraiva
José de Matos Leitão
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Ernesto Figueira dos Reis
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Pires Epifânio
José Manuel Rosa do Egipto
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Rodrigues Pereira dos Penedos
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Miguel Gomes Miranda Teixeira
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António dos Santos
Manuel Maria Diogo
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Margarida Maria Santos Soares da Rocha Gariso
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custodia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Céu da Cruz Vidal Lourenço
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino
Maria José Vidal do Rosário Campos
Maria Luísa Silva Vasconcelos
Maria Teresa de Oliveira Ferreira Coimbra
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Paulo Alexandre Homem de Oliveira Fonseca
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Rui Manuel Leal Marqueiro
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Victor Brito de Moura
Vítor Manuel Alves Peixoto
Vítor Manuel Caio Roque
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Álvaro dos Santos Amaro
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Martins Narciso
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António de Carvalho Martins
António D'Orey Capucho
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Manuel da Cruz Silva

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António Manuel Santana Abelha
António Paulo Martins Pereira Coelho
Arménio dos Santos
Artur Ryder Torres Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos José das Neves Martins
Carlos Manuel de Sousa Encarnação
Carlos Manuel Marta Gonçalves
David Jorge Mascarenhas dos Santos
Domingos Duarte Lima
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares
Eugénio Fernando Sá Cerqueira Marinho
Fernando Jorge Loureiro de Reboredo Seara
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Santos Pereira
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Monteiro Chaves
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
João Bosco Soares Mota Amaral
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José da Silva Maças
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Martins Ferreira do Amaral
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José António de Sousa e Silva
José David Gomes Justino
José de Almeida Cesário
José Frederico de Lemos Salter Cid
José Luís Campos Vieira de Castro
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel de Matos Correia
José Manuel Durão Barroso
José Manuel Macedo Abrantes
Lucília Maria Samoreno Ferra
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Manuel Machado Rodrigues
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Pedro Machado Sampaio de Sousa Pimentel
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Castro de Almeida
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Joaquim Barata Frexes
Manuel Maria Moreira
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria do Céu Baptista Ramos
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Nuno Miguel Marta de Oliveira da Silva Freitas
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa
Pedro Manuel Cruz Roseta
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rui Fernando da Silva Rio
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Comunista Português (PCP):
Ana Margarida Lopes Botelho
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Cândido Capela Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
João António Gonçalves do Amaral
Joaquim Manuel da Fonseca Matias
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Natália Gomes Filipe
Maria Odete dos Santos
Octávio Augusto Teixeira
Vicente José Rosado Merendas

Partido do Centro Democrático Social (CDS-PP):
Altino Bernardo Lemos Bessa
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello Branco
António Herculano Gonçalves
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da Franca
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
José Martins Pires da Silva
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Luís Pedro Mota Soares
Maria Celeste Ferreira Lopes Cardona
Narana Sinai Coissoró
Raúl Mário Carvalho Camelo de Almeida
Raúl Miguel de Oliveira Rosado Fernandes
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

Bloco de Esquerda (BE):
Francisco Anacleto Louçã
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, dirijo-vos, antes de mais, uma especial saudação nesta primeira reunião da II Sessão Legislativa da actual Legislatura. Como disse há dias, em conferência de líderes, por mais estranho que pareça, já tinha saudades vossas. É incrível, mas acontece.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai ler o expediente.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: proposta de lei n.º 45/VIII - Aprova o regime penal especial para jovens entre 16 e 21 anos, que baixou à 1.ª Comissão; projectos de lei n.os 294/VIII - Enquadramento do Orçamento do Estado (BE), que baixou à 5.ª Comissão, 295/VIII - Altera a legislação penal em vigor, reduzindo a idade de inimputabilidade de menores para 14 anos, baixando os limites mínimo e máximo de idade para efeitos de aplicação de normas penais especiais para jovens e introduzindo o conceito de prisão-escola (CDS-PP), que baixou às 1.ª e 12.ª Comissões, 296/

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VIII - Estatuto, direitos e deveres das organizações não governamentais de direitos das mulheres (BE), que baixou à 13.ª Comissão, e 297/VIII - Proíbe a passagem de navios contendo cargas radioactivas da Zona Económica Exclusiva (ZEE) portuguesa (Os Verdes); propostas de resolução n.os 42/VIII - Aprova o Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta entre o Governo da República Portuguesa e o Governo da República Federativa do Brasil, assinado em Porto Seguro, a 22 de Abril de 2000, e 43/VIII - Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e a República da Hungria sobre readmissão de pessoas em situação irregular, assinado em Lisboa, a 28 de Janeiro de 2000, que baixou às 1.ª e 2.ª Comissões; moção de censura n.º 2/VIII ao XIV Governo Constitucional (PSD); projecto de resolução n.º 72/VIII - Pela dignificação dos jovens professores e por uma política de saídas profissionais (PSD); interpelação ao Governo n.º 6/VIII - Sobre a situação económica portuguesa (CDS-PP); e a apreciação parlamentar n.º 23/VIII - Requerimento do PCP solicitando a apreciação pela Assembleia da República do Decreto-Lei n.º 166/2000, de 5 de Agosto.
Em matéria de expediente é tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de um relatório e parecer da Comissão de Ética, uma vez que implica importantes alterações no universo parlamentar.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o relatório e parecer é do seguinte teor:

1. Em reunião da Comissão de Ética, realizada no dia 20 de Setembro de 2000, pelas 14 horas e 30 minutos, foram observadas as seguintes retomas de mandatos e substituições de Deputados:
a) Retomas de mandatos nos termos do artigo 6.º, n.os 1 e 2, do Estatuto dos Deputados (Lei n.º 7/93, de 1 de Março):
Grupo Parlamentar do Partido Socialista (PS) - Fausto Correia (círculo eleitoral de Coimbra), cessando Ricardo Castanheira, em 15 de Setembro corrente, inclusive; Luís Patrão (círculo eleitoral de Faro), cessando Carlos Matos, em 15 de Setembro corrente, inclusive; Osvaldo Castro (círculo eleitoral de Leiria), cessando António Calvete, em 15 de Setembro corrente, inclusive; Helena Roseta (círculo eleitoral de Lisboa), cessando Carla Gaspar, em 30 de Julho passado, inclusive; Arons de Carvalho (círculo eleitoral de Lisboa), cessando Emanuel Martins, em 15 de Setembro corrente, inclusive; José Clemente de Carvalho (círculo eleitoral de Lisboa), cessando Natalina de Moura, em 15 de Setembro corrente, inclusive; Acácio Barreiros (círculo eleitoral de Lisboa), cessando José Egipto, em 15 de Setembro corrente, inclusive; Fernando Gomes (círculo eleitoral do Porto), cessando Eduarda Castro, em 15 de Setembro corrente, inclusive; Maria de Belém Roseira (círculo eleitoral do Porto), cessando Barbosa Ribeiro, em 15 de Setembro corrente, inclusive; Manuel Diogo (círculo eleitoral do Porto), cessando Fernando Jesus, em 15 de Setembro corrente, inclusive; Maria José Campos (círculo eleitoral de Santarém), cessando Paulo Fonseca, em 18 de Setembro corrente, inclusive; Vítor Ramalho (círculo eleitoral de Vila Real), cessando Alexandre Chaves, em 15 de Setembro corrente, inclusive; Ana Benavente (círculo eleitoral de Viseu), cessando Joaquim Sarmento, em 15 de Setembro corrente, inclusive;
b) Substituições nos termos do artigo 5.º, n.º 2, alínea c), do Estatuto dos Deputados (Lei n.º 7/93, de 1 de Março), por um período não inferior a 45 (quarenta e cinco) dias:
Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português (PCP) - Agostinho Lopes (círculo eleitoral de Braga), por Cândido Capela Dias, com início em 18 de Setembro corrente, inclusive; Fátima Amaral (círculo eleitoral de Lisboa), por Margarida Botelho, com início em 18 de Setembro corrente, inclusive;
Grupo Parlamentar do Partido Popular (CDS-PP) - Manuel Queiró (círculo eleitoral do Porto), por Álvaro Castello Branco, com início em 20 de Setembro corrente, inclusive.
c) Substituições nos termos do artigo 20.º, n.º 1, alínea a), do Estatuto dos Deputados (Lei n.º 7/93, de 1 de Março), com início em 18 de Setembro corrente, inclusive:
Grupo Parlamentar do Partido Socialista (PS) - Fausto Correia (círculo eleitoral de Coimbra), por Ricardo Castanheira; Carlos Zorrinho (círculo eleitoral de Évora), por José Alberto Leal Fateixa Palmeiro; Luís Patrão (círculo eleitoral de Faro), por Carlos Matos; Arons de Carvalho (círculo eleitoral de Lisboa), por José Egipto; José Clemente de Carvalho (círculo eleitoral de Lisboa), por Natalina de Moura; Acácio Barreiros (círculo eleitoral de Lisboa), por Emanuel Martins; José Magalhães (círculo eleitoral de Lisboa), por Carla Gaspar; Miranda Calha (círculo eleitoral de Portalegre), por Francisco Camilo; Nelson Baltazar (círculo eleitoral de Santarém), por Paulo Fonseca; José Junqueiro (círculo eleitoral de Viseu), por Joaquim Sarmento; Ana Benavente (círculo eleitoral de Viseu), por Isabel Maria Soares Pinto Zacarias.
2. Transitou da situação de suspensão, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 20.º do Estatuto dos Deputados para a situação de suspensão nos termos da alínea h) do n.º 1 do artigo 20.º do mesmo Estatuto, em 18 de Setembro de 2000, o seguinte Deputado:
Grupo Parlamentar do Partido Socialista (PS) - Narciso Miranda (círculo eleitoral do Porto).
O parecer da Comissão de Ética vai no sentido de que as retomas de mandatos e as substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Os Srs. Deputados substitutos podem, desde já, ocupar os seus lugares no Hemiciclo.
Srs. Deputados, em 27 de Julho, recebi uma mensagem de S. Ex.ª o Presidente da República, relativa à promulgação do diploma que introduz alterações à Lei n.º 20/99, de 15 de Abril, sobre tratamento de resíduos industriais. Despachei no sentido de que se circulasse, desde logo, aos grupos parlamentares a referida mensagem, que seria lida na primeira sessão plenária ordinária na nova sessão legislativa.

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Vai proceder-se à sua leitura, excepcionalmente, pelo Sr. Secretário, porque estou com a voz tomada, como já devem ter reparado.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, a mensagem à Assembleia da República é do seguinte teor:

Promulguei nesta data a lei, recentemente aprovada pela Assembleia da República, que altera a anterior Lei n.º 20/99, de 15 de Abril, sobre tratamento de resíduos industriais.
Trata-se da quarta lei que, no período de pouco mais de um ano, a Assembleia da República aprova sobre esta matéria, sendo que, por sua vez, essas quatro leis sucessivamente revogam, alteram ou suspendem os três decretos-leis que no mesmo período foram aprovados pelo Governo.
A mera alusão a esta sucessão de actos legislativos sobre uma questão de grande importância ambiental que continua por resolver indicia suficientemente a existência de uma situação que, se não é de anomalia constitucional, é, pelo menos, de gravidade suficiente para convocar a atenção de todos os intervenientes.
Ao longo do meu mandato suscitei em diferentes ocasiões ao Tribunal Constitucional o esclarecimento jurídico-constitucional das dúvidas subjacentes a casos deste tipo, ou seja, situações em que há fundados motivos para questionar se não estará a Assembleia da República a invadir a área do Executivo ou se, inversamente, não estará o Governo a violar a reserva da Assembleia da República. Pelo menos nos casos das vagas adicionais nas Universidades, das portagens do Oeste e da aprovação de convenções internacionais por parte do Governo, o Tribunal Constitucional considerou não haver inconstitucionalidade nem da parte da Assembleia da República nem da parte do Governo, sem que, porém, dessa douta jurisprudência tenham resultado critérios claros e exequíveis de distinção sobre o que compete a um ou a outro órgão.
Mantendo total interesse no progressivo esclarecimento destas questões, pois, como tenho defendido, o equilíbrio e separação de poderes são condições vitais do bom funcionamento do sistema democrático, decidi, todavia, promulgar esta lei sem prévio recurso ao Tribunal Constitucional.
Não obstante o interesse que sempre teria o conhecimento da posição do Tribunal Constitucional, entendi que, nas circunstâncias do caso presente, fosse a decisão jurídica num ou noutro sentido, ela não contribuiria para a resolução do sério problema político e ambiental que há que enfrentar e que só pode resultar de uma atitude de cooperação institucional entre Assembleia da República e Governo.
A questão do tratamento dos resíduos industriais gerou, no último ano, intensa controvérsia política, social e institucional, mobilizou o interesse das populações afectadas, da opinião pública e da comunidade científica. Deu origem à produção sucessiva de sete actos legislativos e de um relatório da responsabilidade de uma Comissão Científica Independente segundo procedimentos e condições de composição e funcionamento legislativamente enquadrados. Contudo, em termos de resolução do problema ambiental, pouco se avançou.
Promulguei a lei no entendimento de que ela pode constituir um último contributo para a decisão política do problema e na convicção, sustentada na opinião das diferentes forças políticas que a aprovaram, de que em caso algum ela será utilizada como pretexto para uma eternização da controvérsia. Fi-lo, sobretudo, porque pude perceber que, para a grande maioria dos intervenientes, o relatório sobre o impacto dos processos de queima de resíduos industriais perigosos sobre a saúde pública - cuja elaboração a lei regula - será o último procedimento a anteceder as decisões políticas que urge tomar sobre o problema ambiental em apreço».

O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A ordem de trabalhos de hoje é preenchida com a discussão e votação da moção de censura n.º 2/VIII, apresentada pelo Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata.
Para abrir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Durão Barroso.

O Sr. Durão Barroso (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Ao apresentarmos na Assembleia da República uma moção de censura, dizemos que este Governo não serve os interesses de Portugal. E não serve porque se tem mostrado incapaz de realizar as tarefas de que o País absolutamente necessita.
Não serve, também, porque o Primeiro-Ministro não está à altura das suas responsabilidades.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos da Deputada do PS Natalina de Moura.

O Orador: - O Primeiro-Ministro e o seu Governo desiludiram aqueles que neles acreditaram. O Primeiro-Ministro e o seu Governo estão a levar o País para um impasse.
O PSD censura o Governo pela situação a que conduziu o País na economia, nas finanças e na segurança.
Se alguém tem dúvidas quanto ao bem fundado desta moção, pergunte aos portugueses, pergunte aos utentes e aos funcionários do SNS se estão satisfeitos com a situação de ruptura e de completo caos em que aquele sistema se encontra.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Se alguém dúvidas quanto ao bem fundado desta moção de censura, pergunte aos cerca de 30 000 professores que ficaram sem colocação se estão satisfeitos com o actual sistema de educação no nosso país.

Aplausos do PSD.

Pergunte, também, a todos aqueles que têm processos em tribunal, e que conhecem a tortura que é entrar no sistema de justiça português, se estão satisfeitos com um sistema que em vez de lhes garantir a justiça só lhes oferece prescrições.
Pergunte-se aos agricultores se já substituíram por esperança a angústia em que vivem e que resulta, em grande medida, das negociações da Agenda 2000 que o

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Governo pretendeu apresentar como tendo sido uma grande vitória para o nosso país.
Por todas estas razões e, sobretudo, pela situação da economia e da segurança no nosso país, censuramos o Governo e, ainda, porque não tem uma linha de rumo para Portugal nem uma estratégia que indique aos portugueses o caminho que Portugal deve seguir.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tenho ouvido com estupefacção alguns comentários críticos ao facto de o PSD manter a moção apesar de a recente remodelação do Governo ter sido apresentada como constituindo uma vitória para o PSD ou até para a sua liderança.

Vozes do PS: - Oh!…

O Orador: - Srs. Deputados, engana-se quem pensa que oriento a intervenção política do meu partido ao sabor da conjuntura, ou por este ou aquele pequeno ganho político.

Aplausos do PSD.

Que fique para todos claro que o que me move não é o ganho imediato ou uma qualquer vitória própria do pequeno mundo dos pequenos factos com que se vai fazendo a pequena política.
O que justifica esta moção de censura é o estado a que este Governo conduziu o País. E esse estado não se alterou recentemente por esta dita remodelação e, pior do que isso, o Primeiro-Ministro não dá qualquer sinal de ser capaz de poder vir a alterar esse estado de coisas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quem, aliás, melhor justificou esta moção de censura foi o próprio Primeiro-Ministro, quando disse: «Pensei muito durante as férias e concluí que, na formação do Governo, tinha cometido erros (…) A verdade é que essa orgânica tornava praticamente impossível que os ministros pudessem ter êxito na concretização das suas tarefas».
Isto é extraordinário, é verdadeiramente extraordinário!
O Primeiro-Ministro reconhece e confessa que, por sua culpa, o Governo paralisou durante 10 meses. O Primeiro-Ministro reconhece e confessa que, por seus erros, o Governo não foi capaz de governar o País em áreas tão fundamentais como as que agora foram remodeladas.
Sr. Primeiro-Ministro, o País não é um laboratório de experiências para o senhor produzir os seus ensaios.

Aplausos do PSD.

Sr. Primeiro-Ministro, o senhor reconhece que se enganou - fica-lhe bem! -, mas quem paga os seus erros é o País, não apenas na escolha dos ministros, não apenas em questões de orgânica. Todos aqueles que acreditaram nas suas previsões económicas, em matéria de taxas de juro ou em relação aos números previstos para a inflação, estão agora a pagar um preço elevado. As famílias, os trabalhadores, as classes médias, os jovens que compraram casa própria, todos os que acreditaram em si estão a pagar com mais inflação, com mais juros e com mais impostos os erros do Primeiro-Ministro de Portugal.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os portugueses, que ao longo destes anos conseguiram aproximar-se de níveis de desenvolvimento próximos da média europeia, vêem agora todo esse esforço colocado em causa pela forma irresponsável como este Governo tem conduzido o País.
É preciso falarmos verdade. Não é possível combater ilusões e mentiras com mais ilusões e mais mentiras.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

Protestos do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Oiçam!

O Orador: - Falar verdade implica dizer que Portugal está, hoje, à beira de uma grave crise no plano económico. Falar verdade implica dizer que parámos de subir, e até já estamos a descer, os degraus da convergência com a média da União Europeia.
Com este Governo caímos de uma perspectiva de vir a atingir o nível médio de vida na Europa daqui a 25 anos para um horizonte de cerca de 75 anos!

A Sr.ª Rosa Maria Albernaz (PS): - É uma desgraça!

O Orador: - Mas a continuar como estamos neste ano e no próximo, ou seja, em situação de divergência, nem daqui a 75 anos! Essa meta transformar-se-ia numa miragem para todos os portugueses.
Perante isto, o que faz o Primeiro-Ministro? Ou faz mais promessas ou pede desculpa.
Há quem diga que esta situação se deve à subida das taxas de juro, à subida do petróleo ou à subida do dólar.

Vozes do PS: - Não!…

O Orador: - Mas os outros países europeus não sofrem também as subidas do dólar, das taxas de juro ou do petróleo?! Por que razão continuam, então, esses países a desenvolver-se e a modernizar-se enquanto Portugal marca passo?! Por que razão é que, por exemplo, a Irlanda está a crescer acima de 9%, enquanto Portugal marca passo?! Por que razão vemos uma Espanha pujante, afirmativa, tanto do ponto de vista económico como do ponto de vista político, enquanto Portugal, ao lado, marca passo?!
A resposta é simples: Portugal não progride, porque tem à sua frente um Governo incompetente.

Aplausos do PSD.

Portugal tem, hoje, o crescimento mais baixo da zona euro e a mais baixa taxa de poupança das famílias da União Europeia.
As remessas dos emigrantes já mal chegam para pagar os juros líquidos da dívida externa. Isto é, aquilo que os emigrantes enviam para Portugal volta a sair de Portugal apenas para pagar juros.

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Os portugueses estão a empobrecer.
O défice da balança externa deverá situar-se, este ano, entre 12% e 14% do PIB. As importações continuam a crescer muito mais do que as exportações e estas continuam a perder, significativamente, quotas de mercado.
Até a alegada situação de «pleno emprego» denuncia uma realidade que nos suscita as maiores preocupações. É que esse chamado «pleno emprego», ao coexistir com a desaceleração da economia, quer dizer, afinal, que Portugal tem uma baixíssima produtividade e que nos estão tapados muitos dos caminhos para sairmos desta situação.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Estes dados revelam as terríveis debilidades estruturais da nossa economia e são, ao fim e ao cabo, o maior atestado de incompetência a um Governo que, ao longo destes anos, não foi capaz de fazer qualquer reforma estrutural.
Perante isto, o que faz o Primeiro-Ministro? Ou faz mais promessas ou pede desculpa.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo insiste, ainda, na falta de transparência das contas do Estado, no despesismo incontrolado e na sistemática desorçamentação.
Insiste, também, em manter previsões para a inflação que se vêm a revelar completamente erradas e, às vezes, desmentidas no próprio dia pelo Banco de Portugal. Este é o terceiro ano consecutivo - repito, o terceiro ano consecutivo! - em que o Governo falha na previsão da inflação; é o terceiro ano consecutivo em que o Governo procura, em sede de concertação social, enganar os trabalhadores portugueses.
O Primeiro-Ministro, com aquela sua tendência natural para não reconhecer a realidade sempre que esta traz más notícias, tentou até ao fim iludir a mais que provável subida das taxas de juro; com isso induziu em erro as famílias, os trabalhadores e as empresas.
Isto quer dizer que, por erros directamente imputáveis ao Governo e ao Primeiro-Ministro, a degradação económica não é apenas uma questão para os macroeconomistas é, cada vez mais, um problema ou, por vezes, um drama para as famílias, para os trabalhadores e para todos os portugueses.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que verdadeiramente importa é esta questão: para onde vamos? Para que destino transporta o Governo os jovens, as famílias, os trabalhadores, os pensionistas, as empresas, a própria economia nacional? Estará Portugal irremediavelmente condenado ao atraso?
A continuação desta desastrosa política económica e financeira por mais três anos conduzirá a resultados que todos reconhecem ser catastróficos.
Poderemos ficar na situação de nunca mais atingirmos o nível médio de rendimentos da União Europeia.
Poderemos, também, como têm advertido tantos economistas, ser confrontados com uma crise sem precedentes, com uma recessão prolongada e uma trajectória de divergência por muitos anos.
Poderemos, até, vir a ser sujeitos a pesadas sanções financeiras e às respectivas consequências políticas, se não cumprirmos o Pacto de Estabilidade.
Poderemos vir a ser obrigados a vender quase todos os nossos activos para pagar as dívidas ao exterior, como, aliás, infelizmente, já começou a acontecer, uma vez que os actuais rendimentos já nem sequer chegam para isso.
Esta é a verdadeira situação do País no aspecto económico e só a ponderação desta situação levaria a que este Governo merecesse plenamente a censura que, hoje, aqui lhe dirigimos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas, no domínio da segurança, o País vive uma situação de crise grave, com profundos reflexos na autoridade do Estado e, sobretudo, na vida das pessoas. O Governo desleixou a segurança dos cidadãos e permitiu que se instalasse um sentimento de intranquilidade ou até de medo.
O Primeiro-Ministro e o seu Governo permitiram que instituições fundamentais do nosso Estado de direito na área da segurança ficassem bloqueadas pela descoordenação ou pelo antagonismo dos responsáveis.
Quando sublinhamos as questões de segurança é porque estamos verdadeiramente preocupados com a garantia da liberdade e da tranquilidade das pessoas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Hoje, assistimos, por parte do Governo, ao mais profundo desrespeito pelos cidadãos, que confiam no Estado para garantir a segurança das pessoas e dos seus bens.
O que está em causa na questão da segurança, Sr. Primeiro-Ministro, são os fundamentos da democracia e da vida em sociedade. É o próprio exercício da liberdade.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - As pessoas não querem viver com medo. As pessoas querem viver tranquilas. As pessoas têm o direito a viver sem medo. As pessoas têm o direito a viver tranquilas.
Assistimos, agora, ao crime a aumentar, crime tantas vezes associado ao consumo de droga, e é precisamente nesta altura que o Governo dá sinais de capitulação no combate à toxicodependência.

Aplausos do PSD.

O que é mais estranho - e, de facto, merece realce - é que o crime aumenta precisamente numa altura em que já se encontra em plena aplicação o rendimento mínimo garantido.
Mas, então, não era o rendimento mínimo garantido a proposta que o Sr. Primeiro-Ministro…

A Sr.ª Rosa Maria Albernaz (PS): - Já cá faltava o ataque!

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O Orador: - … apresentava como forma de combater a exclusão social e a marginalidade e, assim, reduzir também os índices de criminalidade?!

A Sr.ª Rosa Maria Albernaz (PS): - Não diga asneiras!

O Orador: - Existe, a todos os níveis, uma preocupante erosão da autoridade do Estado bem patente nas guerras de declarações entre os responsáveis por forças de segurança e, até, em confrontos entre magistraturas.
O próprio Governo consentiu e contribuiu para a desmotivação das forças policiais.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É verdade!

O Orador: - Perante esta desmotivação, perante este declínio de autoridade, perante esta decadência da responsabilidade, o que faz o Governo? Faz mais promessas e pede desculpa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que temos, então, a propor aos portugueses onde o Governo falhou?
Em matéria de droga, por exemplo, o Governo, como se sabe, optou pela descriminalização; esta opção não resolve o problema de um único toxicodependente.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Além disso, esta opção transmite à sociedade e à juventude sinais de facilitação do consumo.
É, pois, necessária uma política alternativa baseada, isso sim, na prevenção, no tratamento e na reinserção. Essa política deve estruturar-se em três pilares essenciais.
O primeiro consiste: no reforço dos meios de prevenção através de um efectivo aumento de oferta nos Centros de Atendimento a Toxicodependentes (CAT); na articulação entre todas as entidades públicas envolvidas, quer ao nível do Ministério da Saúde, quer entre o Ministério da Saúde e o Ministério da Justiça e os tribunais; no reforço do apoio aos toxicodependentes nas prisões; na criação de mecanismos que permitam a colocação no terreno de apoios aos que precisam; no incentivo à inserção do toxicodependente em formas de trabalho social; no reforço dos programas de apoio às instituições particulares de solidariedade social (IPSS) que auxiliam os toxicodependentes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O segundo pilar baseia-se: na valorização da escola, através da criação de um corpo de especialistas em prevenção primária a funcionar nos estabelecimentos de ensino; na sensibilização dos professores, intervindo ao nível da sua formação; na introdução no curriculum escolar, logo desde o início, de referências ao problema das dependências, incluindo o alcoolismo e o tabagismo; na criação de mecanismos específicos de acompanhamento psicológico, quer para prevenir a iniciação nas drogas quer para auxiliar aqueles que já consomem.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O terceiro pilar assenta na família e visa: envolver as associações representativas dos pais e das famílias no apoio à estratégia nacional de combate à droga; valorizar as formas terapêuticas que envolvam os grupos de pais e todas as formas de terapêutica familiar; tomar medidas no plano laboral que possibilitem aos pais um efectivo acompanhamento dos filhos toxicodependentes.
Com certeza que, por si só, estas medidas não resolvem na íntegra o problema da droga, mas seriam, pelo menos, um sinal sério do empenhamento do Estado e da sociedade em combater um problema que o actual Governo, verdadeiramente, já desistiu de enfrentar.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em matéria de segurança, o essencial reside na atitude, no modo como o Governo credibiliza e reforça a autoridade do Estado. Ou seja, precisamente o contrário do que este Governo tem feito.
Contudo, independentemente desta atitude e deste modo de exercer o poder, há medidas concretas que podem, e devem, ser tomadas desde já.
Entre as medidas que proponho está a reestruturação das forças de segurança, com vista a conferir-lhes maior operacionalidade.
Dever-se-á, desde logo, colocar as diferentes forças de segurança (PSP, GNR e Polícia Judiciária) no âmbito de um só ministério - o Ministério da Administração Interna -, de modo a garantir a coerência e a coordenação da actividade destas forças.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Deverá proceder-se, também, à aprovação de uma lei de programação dos investimentos em matéria de segurança similar à que existe no domínio da defesa.
Deve reforçar-se a visibilidade da acção policial.
Deve rever-se todo o procedimento relativo aos delitos praticados por menores, por forma a evitar que sejam o instrumento de actuação de gangs organizados.
Deve baixar-se a idade de imputabilidade criminal e autonomizar o crime de incitamento à delinquência juvenil, punindo os instigadores, não apenas como autores morais mas, cumulativamente, pelo próprio incitamento.
Deve implementar-se, de forma rápida e efectiva, as polícias municipais, de modo a libertar as forças de segurança de âmbito nacional…

Risos do PS.

… para as tarefas para que estão vocacionadas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Deve adoptar-se uma política de imigração séria, solidária, responsável, controlada e rigorosa, evitando as bolsas suburbanas de marginalizados e socialmente excluídos.
Deve levar-se a cabo uma política de ordenamento urbano que elimine os ghettos.
Deve restaurar-se uma educação que privilegie os princípios e os valores. A escola é sempre fundamental: se formarmos homens e mulheres, na verdadeira acepção da palavra, não deixaremos que os jovens sejam excluídos ou se auto-excluam.

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Com certeza, também, que estas medidas, por si só, não resolveriam o problema da insegurança mas seriam, pelo menos, o sinal de que o Estado e a sociedade não se demitem, fazendo precisamente o contrário do que este Governo tem feito, que é demitir-se na luta contra o aumento da criminalidade e da delinquência no nosso país!

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: É necessário mudar de Governo, mas não vale a pena mudar de Governo para que tudo fique essencialmente na mesma. O País necessita de uma outra política e de um outro modelo.
Especialmente na economia, as diferenças não são apenas quanto ao conteúdo concreto das políticas, têm a ver, desde logo, com o modo como os socialistas e nós próprios olhamos o Estado; têm a ver com o modo como os socialistas vêem a relação entre Estado e sociedade e a nossa perspectiva da relação entre Estado e sociedade; têm a ver, ao fim e ao cabo, com o modo como uns e outros estão no poder, com a própria cultura de exercício do poder.

Vozes do PS: - Olha quem fala!

O Orador: - Onde os socialistas falam de «Estado», nós entendemos «sociedade»; onde os socialistas falam de «sistemas nacionais», ou de «serviços nacionais», ou de «sistemas públicos», nós entendemos «pessoas»!

Protestos do PS.

Em Portugal, os sistemas públicos, nomeadamente a saúde e a educação, são hoje dos menos eficientes do mundo desenvolvido. Em especial na segurança social, ao contrário do que o Governo sugere, o sistema caminha para a ruptura e continua a ser urgente a sua reforma.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Segundo os melhores estudos internacionais, Portugal é dos países que, comparativamente, mais gasta em saúde e em educação, mas os cidadãos não vêem resultados concretos, não vêem o desempenho do Estado ao serviço das suas necessidades.
Uma mudança fundamental exige a reformulação destes sistemas, de forma a evitar mais desperdício de dinheiro dos contribuintes. O que queremos é conferir racionalidade e eficiência aos sistemas e canalizar os recursos do Estado, ou seja, os recursos dos contribuintes, para aqueles que verdadeiramente mais necessitam. Não queremos continuar a ver tantos recursos do Estado absolutamente esbanjados por um sistema parasitário, que não cessa de crescer à custa do esforço, cada vez maior, que é pedido aos contribuintes!

Aplausos do PSD.

A situação na Administração Pública, na saúde e na educação diz bem do esbanjamento de recursos que hoje existe. Não há dinheiro que chegue para manter estruturas arcaicas e tão desadequadas. Não basta «afogar» os problemas em dinheiro para dizer que eles estão resolvidos. Este não é o bom caminho!
Tal como está organizado, o Estado esbanja recursos, porque alimenta o tal «monstro» que se desenvolve por redes parasitárias, que minam a boa execução das políticas públicas. Mas como é bom, como é agradável esse «monstro» para as sucessivas clientelas do partido do poder que vivem, precisamente, «empoleiradas» nesse «monstro».
Como é bom e simpático esse «monstro» para o actual partido do poder!

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Mas que bem que este Governo tem alimentado esse «monstro», de forma a «engordar» a sua clientela, cada vez mais voraz, cada vez mais presente no conjunto da sociedade portuguesa!
Temos de dizer: basta! «Basta» a esta política económica e financeira que se prepara para arruinar o País.
De qualquer modo, há questões urgentes que devem ser desde já enfrentadas. Por isso, o PSD apresentará as bases de um programa de emergência para a economia portuguesa, ainda antes da conclusão do debate orçamental.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Esse programa tem como grandes desígnios a correcção dos graves desequilíbrios que afectam a nossa economia e a retoma do processo de convergência com a União Europeia.
O programa de emergência baseia-se na alteração radical das políticas financeira e orçamental e, também, das diferentes políticas estruturais a que temos estado sujeitos nos últimos anos. Contudo, não se iludam Srs. Deputados do partido do Governo, esse programa de emergência tem um pressuposto fundamental: a mudança do próprio Governo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este Governo não segue uma linha de rumo, porque não tem realmente um projecto para Portugal.
Apesar do partido que apoia o actual Governo dispor de metade dos Deputados nesta Assembleia, o Primeiro-Ministro não consegue definir uma acção consistente. Pelo contrário, preocupa-se em encontrar apoios, ora à esquerda, ora à direita, assim demonstrando a sua inconstância, a sua volubilidade, a sua incoerência e a sua indeterminação.
Coerência, Sr. Primeiro-Ministro, só lhe encontramos na obsessão de, a todo o custo, procurar manter o poder, seja lá com quem for, seja lá como for!

Vozes do PS: - Olha quem fala!

O Orador: - Não importa o projecto, não importa a linha de rumo, não importa o objectivo! O poder pelo poder, um poder sem projecto, sem energia e sem ambição.

Aplausos do PSD.

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O país está num impasse. Mas em vez de reconhecer esta situação e de definir um caminho, procurando o apoio de uma maioria parlamentar, o Primeiro-Ministro nega sistematicamente as evidências e atira sempre para cima dos outros as responsabilidades; não procura resultados, anda atrás de desculpas. Não temos um Primeiro-Ministro de decisões mas sim de hesitações.
Que fraco, aliás, este Governo, quando a estabilidade é o único argumento que apresenta para continuar a pedir apoio para si próprio!
O normal seria o Sr. Primeiro-Ministro apresentar obra e justificar a manutenção do seu Governo pela necessidade de continuar essa obra. Mas que obra tem este Governo para apresentar?

Vozes do PSD: - Nada!

O Orador: - O normal seria o Primeiro-Ministro dizer que quer continuar a governar, porque tem um projecto para o país. Mas que projecto tem este Primeiro-Ministro a oferecer?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta moção de censura cumpre, desde logo, um objectivo: o de clarificar a situação política no nosso país. O país deve saber se esta Assembleia é ou não capaz de gerar uma maioria de apoio a um projecto consistente de poder.
Para nós, uma coisa é certa: a continuação da actual situação, das actuais indefinições e hesitações, prejudica seriamente o País. A nossa responsabilidade, a responsabilidade dos sociais-democratas, hoje e aqui, é a de dizer que não contem connosco para pactuarmos com este estado de coisas. Não somos cúmplices desta situação.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Os portugueses podem estar seguros: o PSD assumirá sempre todas as suas responsabilidades.
Ao apresentarmos esta moção de censura ao Governo damos o nosso contributo, abrimos caminho a um projecto capaz de dar força a Portugal e de mobilizar os portugueses para um novo começo. Como sempre, por Portugal.

Aplausos do PSD, de pé.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, em representação do Governo, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro (António Guterres): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero, em primeiro lugar, saudar todas e todos os Srs. Deputados no início deste ano parlamentar, oferecendo-vos a mais leal colaboração do Governo.
Sr. Deputado Durão Barroso, antes de ler a intervenção que preparei, gostaria de dizer-lhe com muita clareza o seguinte: a sua moção de censura baseia-se numa caricatura que não corresponde à realidade do País,…

Vozes do PS: - Exactamente!

O Orador: - … por isso é, em si, um absurdo.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

E a prova disso é que começa por assentar numa visão da economia nacional que é a de uma grave crise. O Sr. Deputado Durão Barroso não sabe o que é uma crise económica, mas vou explicar-lhe.

Protestos do PSD.

Uma crise económica é quando o produto desce, é quando o emprego desce, é quando o investimento desce. E isto não é uma figura de retórica, aconteceu em Portugal em 1993, com o PSD no Governo, quando a economia se afundou, e se afundou muito mais do que a economia europeia.

Aplausos do PS.

Ora, não é isto que está a acontecer à economia portuguesa. O que está a acontecer à economia portuguesa é um crescimento acima dos 3%, é um crescimento do emprego, é um crescimento do investimento, é até mesmo um crescimento do consumo!

Vozes do PSD: - E também da criminalidade!

O Orador: - Temos, naturalmente, dificuldades - com certeza! -, mas não vivemos a crise que descreveu.
Também lhe digo, Sr. Deputado, que, se a crise é tal e se é necessário um programa de emergência, era sua obrigação apresentá-lo hoje, na apresentação da moção de censura.

Aplausos do PS.

Afinal de contas, o que o Sr. Deputado veio fazer foi pedir desculpa por apresentar a moção de censura e fazer a promessa de um programa de emergência para o debate orçamental.

Aplausos do PS.

Já agora, Sr. Deputado Durão Barroso, em relação às medidas dispersas que apresentou para outros sectores, quero dizer-lhe que não reparou, seguramente, que muitas delas estão em execução, mas também quero dizer-lhe que algumas merecem o nosso enérgico repúdio. Sou e serei sempre contrário à proposta apresentada pelo CDS-PP - à qual, segundo parece, agora aderiu -, a de colocar na prisão jovens de 14 anos, em Portugal.

Aplausos do PS.

Protestos do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Depois de se ter encerrado com uma moção de censura do PP o último ano parlamentar, abre-se este com uma moção de censura do PSD.
As coisas não podiam ser mais claras. Os dois partidos políticos da direita parlamentar têm um objectivo comum: provocar a instabilidade política e derrubar o Governo do PS.

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Orador: - Fazem-no, aliás, ora um, ora outro, ora em conjunto, com uma linguagem crescentemente agressiva - tivemos hoje um bom exemplo - e radical e, por isso, cada vez mais afastada da situação real do País. País que tem as suas dificuldades, mas que apresenta também inúmeros aspectos positivos e oportunidades que nos galvanizam.
Os dois partidos não têm sequer uma alternativa política comum para enfrentar os problemas nacionais. A sua lógica é meramente destrutiva, mesmo com o risco de tornar o País ingovernável. O PP e o PSD ora se entendem, ora se desentendem, num interminável jogo de zangas e reconciliações, de aproximações e afastamentos que revelam um único verdadeiro ponto de contacto, o «apetite» pelo poder.

Aplausos do PS.

Vozes do PSD: - Fala do PS!

O Orador: - A relação entre PSD e o PP faz-me lembrar a famosa vichyssoise, que tão depressa entra como sai da ementa do jantar.

Risos do PS.

Vozes do PSD: - Fale de Portugal!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta moção de censura é, aliás, politicamente absurda. Começou com um ultimato e, como todos os ultimatos em política, tinha como objectivo evitar o que pedia, ou seja, uma remodelação do Governo. Rejeitei naturalmente o ultimato, mas não fechei os olhos ao País,…

Risos do PSD.

… procurando não só entender as preocupações dos portugueses, como sobretudo encontrar as melhores formas de organização governativa para dar respostas às suas preocupações e anseios. Sempre pensei que agindo assim teria de pagar o preço político de ver o PSD reclamar uma qualquer vitória, ainda que fictícia. Nem isso! Ao PSD só interessa dizer mal. Desaparecido um pretexto, arranjam-se outros: a moção de censura aí está!

Protestos do PSD.

Apetece perguntar: para quê?

Protestos do PSD.

Srs. Deputados, estejam calmos, porque o pior está para vir!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço-vos que façam silêncio, para que o Sr. Primeiro-Ministro possa ser ouvido.
Faça favor de prosseguir, Sr. Primeiro-Ministro.

O Orador: - Cada um de nós tem o seu estilo e, em conformidade, é sempre possível exprimir as mesmas ideias com maior ou menor agressividade, elegância ou clareza. Embora em estilo diverso do meu, permito-me responder à pergunta «moção de censura para quê?», utilizando a doutrina aqui expressa pelo anterior Primeiro-Ministro, líder do PSD, quando confrontado, em Outubro de 1994, com uma moção de censura contra o seu próprio governo, passo a citar: «Sejamos claros, sejamos muito claros: se o partido censurante apresenta, convictamente, uma moção de censura, é porque deseja derrubar o Governo. É esta a implicação constitucional necessária de uma moção de censura: lançar o País numa crise política, com todas as consequências graves que daí advêm para o bem-estar dos portugueses e para a defesa dos interesses de Portugal». E continuo a citar o Professor Cavaco Silva: «Se o partido censurante, ao invés, apresenta, com ligeireza, uma moção de censura mas não quer o derrube do Governo, então, temos de denunciar veementemente perante os portugueses a sua leviandade e falta de sentido de Estado, a sua apetência pela baixa política e, tal como sucede com outros, o seu total distanciamento dos requisitos da verdade, da nobreza de princípios e do espírito de responsabilidade».
Peço aos Srs. Deputados do PSD que não levem a mal exageros de linguagem que obviamente não são meus.

Risos do PS.

Seria, aliás, uma boa oportunidade para relembrar, a quem tem a obsessão de se reencontrar com a história, que é conveniente ter cuidado com a forma como se dizem as coisas.
Mas, Srs. Deputados do PSD, terão de reconhecer que, quanto ao fundo da questão, a citação é inteiramente adequada. A estabilidade não é um fim absoluto - é, no entanto, condição essencial para que haja governabilidade, confiança no futuro e respeito por todos os cidadãos. Quem apostar num salto no escuro ou em interromper o ciclo normal de vida democrática terá de assumir as responsabilidades por isso.
Num momento decisivo da nossa vida colectiva não podemos dar-nos ao luxo de apostar na instabilidade e na incerteza em nome de ambições futuras que esquecem o dia-a-dia do País.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Dir-se-á que esta moção de censura tem muito poucas hipóteses de ser aprovada. É verdade. Mas, ela é apenas um passo numa estratégia de desestabilização, de que o PSD é crescentemente intérprete com o objectivo cada vez mais claro de «chumbar» o Orçamento do Estado.
Não os parece demover sequer a limitação constitucional decorrente das eleições presidenciais. Não havendo as condições mínimas de governabilidade, que só um Orçamento do Estado proporciona, não poderemos ter eleições antes de Junho, nem Orçamento, por muito absurdo que pareça, na melhor das hipóteses, antes de Outubro. Os prejuízos que esse longo período de incerteza causaria ao País e à vida concreta das pessoas e das famílias são incalculáveis e não deixa de ser patético o esforço de alguns elementos do PSD, tentando explicar que o Orçamento não faz falta, porque se podem viver 9 ou 10 meses com os duodécimos do ano anterior.

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Quem assim pensa não tem a menor preocupação com as famílias de centenas de milhar de trabalhadores da função pública, bem como dos respectivos pensionistas, que ficariam todo esse período à espera dos seus aumentos; quem assim pensa não cuida de verificar se isso pode causar interrupção de obras, ruptura de fornecimentos em hospitais, perda de fundos comunitários, estrangulamentos financeiros em escolas ou municípios.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Muitos argumentarão que a moção de censura decorre da instabilidade interna do PSD ou, aproveitando uma expressão do seu líder parlamentar, da necessidade do seu presidente aparecer na fotografia. Não se estaria a pensar no País mas nas circunstâncias passageiras de uma conjuntura partidária.
Só que é a governabilidade do País que está em causa. Não podemos aceitar que o «vírus» da ingovernabilidade de um partido se projecte na vida nacional.
Esta insistência em vir aqui fazer a liturgia da censura só vem demonstrar aquilo que temos defendido em várias circunstâncias, de acordo, aliás, com o pensamento já expresso pelo Dr. Durão Barroso no passado: a necessidade de as moções de censura, independentemente do quadro constitucional, deverem ser construtivas, isto é, definirem a alternativa global de pessoas e de políticas, contra a lógica permanentemente derrubante do «agora vota-se e logo se vê as consequências».
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O facto de rejeitarmos que alguns procuram alimentar um clima artificial de crise, não nos impede de estar atentos ao País e às dificuldades dos portugueses para lhes dar a melhor resposta.
Como tive já ocasião de dizer, verificou-se este ano a transição para um novo ciclo na economia portuguesa, por ter praticamente alcançado o pleno emprego e estar sob o fogo cruzado, particularmente significativo em Portugal, nas suas consequências negativas para o Estado e as famílias, dos aumentos do dólar e do preço do petróleo bruto e da subida das taxas de juro internacionais, que sempre tiveram maiores implicações em Portugal do que na generalidade dos países europeus.
Os novos problemas concretos causados a tantas famílias portuguesas não podiam deixar de dar sinais de inquietação e de dúvida. É meu dever estar atento a esses sinais, para compreender os anseios e preocupações que os motivam e lhes dar uma resposta de esperança e de confiança.

A Sr.ª Rosa Maria Albernaz (PS): - Muito bem!

O Orador: - A grande virtualidade da democracia está em que ela nos permite sempre melhorar o que estamos a fazer e, quando necessário, corrigir avaliações ou erros. Ora, não terei nunca qualquer dificuldade, ao contrário do processo mental dramático do PSD, em admitir que errei para corrigir esses erros.

Aplausos do PS.

O drama do PSD é ficar permanentemente agarrado aos seus erros, e, até, ter tido quem teorizou essa forma de comportamento político.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Corrigir erros, corrigir avaliações precisamente em nome da confiança e da defesa de interesses legítimos dos cidadãos.
As pessoas estão primeiro; é com gosto que ouço o PSD chegar também a esta tese.

Risos do PSD.

Mas para isso é preciso ouvi-las e compreendê-las, dever e responsabilidade que nunca recusarei, até para ser mais capaz de mobilizar o País em torno de um projecto nacional de modernização e solidariedade, e não vir tentar manipular ou instrumentalizar em torno de ideias que não correspondem à realidade.
Por isso, este ano parlamentar marca também, por parte do Governo e do PS, um novo ciclo político, capaz de corresponder ao novo ciclo económico e social de que falei. Já dei provas de que o assumo sem reservas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: De acordo com os dados da União Europeia, o nosso crescimento económico actual está já ligeiramente acima do chamado crescimento potencial, atentos os recursos existentes. É uma dificuldade real.
Daí a nossa aposta num fortíssimo impulso modernizador para crescer mais, criar riqueza, desenvolver melhor a economia e a sociedade. O nosso problema é essencialmente qualitativo, a qualificação das pessoas, a produtividade das empresas, a renovação das cidades, a qualidade dos serviços prestados pelo Estado e pela Administração, e nunca a destruição dos sistemas de protecção social, como me pareceu intuir do fundo da intervenção do Sr. Deputado Durão Barroso.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Modernizar, modernizar, modernizar,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O Governo!

O Orador: - … é esta a questão central para a economia e a sociedade portuguesas e, por isso, o eixo central da estratégia do Governo. Modernizar com equidade e com consciência social, tendo nas pessoas e na sua valorização a grande alavanca transformadora de Portugal: da educação e formação ao longo da vida, aos investimentos produtivos inovadores; do combate sistemático à burocracia, recorrendo às tecnologias do futuro, à reforma dos sistemas de saúde e protecção social para lhes garantir sustentabilidade e qualidade; da sociedade de informação, com participação generalizada na Internet, às grandes redes de telecomunicações e infra-estruturas; da requalificação das cidades à resolução dos problemas ambientais; da valorização da ciência ao reconhecimento do papel essencial da cultura e da identidade na formação da economia e da sociedade do conhecimento.
Não se trata de figuras de retórica mas de estratégias definidas, de políticas em curso, que têm no III QCA, o primeiro a ser aprovado em Bruxelas, e nos seus

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instrumentos recursos e objectivos clarificados até 2006, fazendo dele um elemento fundamental para garantir a concretização do processo de modernizar o País.
O País não será o mesmo quando, todos os anos, 10% da sua população activa participar em programas de formação ao longo da vida. O País não será o mesmo quando 85% dos jovens na idade própria frequentarem o ensino secundário. O País não será o mesmo quando em metade das casas portuguesas existirem computadores e ligação à Internet. O País não será o mesmo quando for capaz de dar adequado tratamento a mais de 90% dos seus esgotos e à totalidade dos resíduos urbanos, industriais e hospitalares. O País não será o mesmo quando todos os pagamentos e recebimentos do Estado e todas as relações com os serviços públicos se puderem fazer por via electrónica, poupando tempo, preocupações e dinheiro às pessoas e às empresas. Com estes objectivos já em concretização o País, aliás, já hoje não é o mesmo que era em 1995.

Aplausos do PS.

São exemplos apenas, mas ilustram uma visão e uma estratégia que, ao serviço da República moderna, estamos a desenvolver.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para ter êxito nesta estratégia precisamos de estabilidade política e precisamos também de ultrapassar as dificuldades da conjuntura económica nas finanças públicas, no défice externo e na inflação. Por isso o Governo está profundamente empenhado na gestão rigorosa do Orçamento do Estado para 2000, para cumprir o limite do défice de 1,5% do PIB acordado com a União Europeia, tudo fazendo para evitar a necessidade de um orçamento rectificativo.
Estamos empenhados em estimular ao máximo a dinâmica do investimento produtivo nacional e estrangeiro e das exportações, única forma de combater sustentavelmente o défice externo.
Estamos empenhados em contribuir para conter as fortes tensões inflacionistas a que temos vindo a ser submetidos, com um impulso exterior que, não nego, ultrapassou todas as nossas expectativas. Para isso agiremos na redução, em 2001, do ritmo de crescimento da despesa pública, no acompanhamento das políticas de rendimentos, simultaneamente com rigor e sentido de justiça, e na gestão equilibrada e realista da política de preços dos combustíveis. Quando, hoje, se olha por essa Europa fora, creio que os portugueses começam a compreender as razões que me levaram a travar este ano, contra a opinião de quase todos, os aumentos dos combustíveis.

Aplausos do PS.

Risos do PSD.

Já que tanto se fala em alternativa, gostaria que o PSD, hoje, aqui esclarecesse, se fosse governo em Portugal, qual seria hoje o preço do gasóleo e da gasolina praticado nas nossas bombas.

Aplausos do PS.

Risos do PSD.

Também por isso estamos empenhados num aprofundamento da reforma fiscal que alivie as famílias de trabalhadores por conta de outrem e as classes médias, obrigando a pagar impostos a quem o não faz indevidamente.
Reconhecer as dificuldades e encontrar para elas, com equilíbrio, as necessárias soluções nada tem a ver com o alarmismo despropositado com que o PSD analisa a economia portuguesa e a sua visão catastrófica claramente contrastante com a verdadeira realidade do País.
Pela nossa parte recusamos hoje, como recusámos sempre, o discurso do «oásis».

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas a realidade é a realidade e mede-se sobretudo pelos dados verificáveis. Olhando para os dados já apurados, não para previsões, a verdade é que o emprego por conta de outrem cresceu 2,4%, no primeiro semestre - não diminuiu; o crédito ao investimento das empresas não financeiras cresceu, no mesmo período, 31,1%, - não decresceu; as contribuições para a segurança social e as receitas do IVA, bons indicadores da actividade económica, subiram, até ao final de Agosto, 8,9% e 11,2% - não se reduziram; as exportações aceleraram em relação ao ano anterior, e até o consumo privado continua a subir, embora de forma mais moderada, como é natural.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Vale a pena, aliás, para compreender a completa falta de autenticidade do PSD, voltar à comparação da situação económica neste momento com a realidade existente nos primeiros anos da segunda legislatura dos governos da maioria PSD, ou seja, em 1992 e 1993. Vivemos então uma verdadeira recessão económica, com quedas apreciáveis no produto, no emprego e no investimento, quando ainda era bem mais alta a taxa de inflação, e com uma situação muito mais grave do que a situação internacional. Só que esse foi exactamente o período em que o Ministro das Finanças do tempo dizia: «Portugal é um 'oásis'!»; em que o Primeiro-Ministro meu antecessor apostrofava esta Câmara afirmando: «os portugueses são hoje uma orgulhosa excepção em todo o mundo» e continuava «neste quadro, como querem que levemos a sério a retórica de crise e desgraça aqui trazida por alguns Srs. Deputados da oposição?!». Isto dizia o governo do PSD, de que fazia parte o actual líder do PSD, da mais grave crise económica dos anos 90. Pergunto: que credibilidade tem o PSD para dizer hoje o que diz? O PSD e o seu líder não têm neste debate qualquer autoridade moral.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A abertura do ano político coincide também com o arranque de diversos aspectos da vida nacional. É bom lembrar aos que tão asperamente nos censuram que abriu o ano escolar. E abriu, em termos gerais, com uma normalidade de que não tenho memória, tal como normal foi o encerramento do anterior, com a realização de 300 000 exames e provas aferidas nacionais, marcando o regresso do sistema educativo ao rigor há muito tempo perdido; perdido, nomeadamente, sempre que o partido censurante teve responsabilidades no sector.

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Abre também o ano judicial no quadro de um dinamismo que há muito tempo a justiça portuguesa não conhecia: alargamento significativo do número de magistrados e oficiais de justiça.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em 1 de Janeiro de 2001, ficará completo o quadro dos oficiais de justiça, facto este de que também não há memória em Portugal. Mais dinamismo no acelerar da modernização tecnológica, nas medidas de simplificação processual, no alívio dos tribunais, no combate a normas burocráticas sem sentido que perduram há décadas.
Como Primeiro-Ministro compete-me naturalmente estar atento e activo em relação a todos os aspectos da vida nacional. Neste momento, acompanho com particular intensidade e determinação as questões da segurança, da saúde, do combate à toxicodependência e da reforma fiscal, tema de que o PSD tem sido o único partido ausente nas propostas apresentadas nesta Câmara.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - Não vou repetir aqui o leque de medidas que, a este respeito, tive a ocasião de propor ou anunciar no debate do estado da Nação. Permitam-me que me concentre brevemente numa questão que mobiliza as preocupações de todos nós: a segurança.
Ao partido interpelante, ao partido do fracasso das superesquadras, ao partido que, no governo, não cuidou da formação adequada de número suficiente de novos agentes da PSP e da GNR, ao partido interpelante, que deixou a autoridade do Estado degradar-se a ponto de termos visto polícias a baterem noutros polícias,…

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

… ao partido interpelante, mas, sobretudo, aos portugueses, quero manifestar o profundo empenhamento do Governo e o meu próprio em trabalhar melhor para a nossa segurança colectiva.
Seis exemplos recentes, desde o final do ano parlamentar, postos à vossa consideração e reflectindo essa determinação: já estão ao serviço os 2090 novos agentes da PSP e da GNR que anunciei no referido debate;…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António Capucho (PSD): - Aonde?! E quantos saíram?!

O Orador: - … a partir de 1 de Janeiro de 2001 - já está aprovada a respectiva legislação - os tribunais deixarão de recorrer às forças de segurança para as citações de processo cível, libertando um número considerável de agentes para o patrulhamento;…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

… o Conselho de Ministros de amanhã aprovará 15 resoluções preparadas pela anterior equipa do Ministério da Administração Interna, criando a polícia municipal, que tanta oposição mereceu do PSD, nos 15 primeiros concelhos, a maioria dos quais nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto, tendo a formação dos agentes início já no mês de Outubro;…

Aplausos do PS.

… estão já em execução, também, 12 das medidas aprovadas na Resolução do Conselho de Ministros, de 19 de Agosto, sobre a prevenção do crime e a reinserção dos jovens delinquentes e a protecção aos jovens em risco. Cito apenas duas: já começaram as obras, decididas em Agosto, de adaptação ao regime fechado dos Colégios dos Olivais, Caxias e Mondego, que são colégios…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Colégios!

O Orador: - … e nada têm a ver com prisões, a concluir até 1 de Janeiro, e arrancou a selecção dos novos 275 técnicos e monitores para colégios e grupos de reinserção social. Os Srs. Deputados que conhecem mal estes assuntos ficarão a saber que um dos colégios cujas obras começaram para se adaptar ao regime fechado é o do Mondego, na Guarda, e que apesar de ainda não estar realizado, o que nos comprometemos a fazer e estamos a fazer - a decisão é de 19 de Agosto - não deixa de ser apreciável reconhecer a excelente cooperação que, ao contrário do que aqui foi dito, existiu entre todas as forças de segurança na rápida apreensão daqueles que saíram.

Aplausos do PS.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Mas fugiram!

O Orador: - Entrou em vigor a Lei da Organização da Investigação Criminal, que estabelece as regras de uma efectiva colaboração entre a PJ, a PSP e a GNR, por forma a clarificar e a resolver um problema, bem conhecido em todos os países, de articulação da actividades das polícias que intervêm na investigação criminal. Os Ministros da Justiça e da Administração Interna já convocaram a primeira reunião do respectivo conselho coordenador;…

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Também era o que mais faltava! Por favor!

O Orador: - … é entregue à GNR, no próximo sábado, a primeira das 12 lanchas rápidas destinadas a operar nas nossas águas territoriais para o combate aos traficantes de droga.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, agradeço que façam silêncio.

O Orador: - Sem estes equipamentos era manifesta a inferioridade de meios para perseguir os criminosos.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Seis exemplos apenas, que valem por si, poderia citar muitos outros na segurança ou em qualquer outro domínio, mas o importante é o seu significado simbólico. Eles são a prova de que o Governo de Portugal está atento aos problemas dos portugueses, profundamente empenhado em encontrar para

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eles, com espírito de diálogo, as melhores soluções e determinado a aplicá-las.
Um governo esgota-se quando se resigna. Foi isto o que vos aconteceu, Srs. Deputados do PSD, em meados da década de 90. É isto que, posso garantir-vos, nunca me acontecerá, nem acontecerá ao Governo do PS.

Aplausos do PS.

Para o PSD este debate é uma ocasião de criar instabilidade, porventura também uma espécie de prova de vida, na lógica cartesiana do «censuro, logo existo».

Risos do PSD e do CDS-PP.

Para mim e para o Governo este debate é, acima de tudo, uma oportunidade para, serena e confiadamente, dizer aos portugueses: Portugal está à altura de responder aos desafios da modernidade e estamos ao vosso lado, nos bons e nos maus momentos, nas dificuldades e nos progressos. Contem connosco, nós contamos convosco!

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente: - Informo a Câmara que se inscreveram, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Durão Barroso, o Sr. Deputado Francisco de Assis e, ao Sr. Primeiro-Ministro, os Srs. Deputados Durão Barroso, Paulo Portas, Carlos Carvalhas, Isabel Castro, Francisco Louçã, Manuela Ferreira Leite, Basílio Horta, Guilherme Silva, Maria Celeste Cardona, António Capucho, Telmo Correia e Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito regimental da defesa da honra da bancada.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que identifique o motivo da ofensa.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, os meus cumprimentos neste início da sessão legislativa.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Sr. Presidente, o Sr. Primeiro-Ministro faltou à verdade, em termos objectivos, à Câmara. Fê-lo pela segunda vez em um mês, e temos o direito a defender a nossa honra como humanistas e democrata-cristãos que somos.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Sr. Primeiro-Ministro, o senhor afirmou pela segunda vez em um mês, e desta vez com a solenidade de estar a proferir um discurso na Assembleia da República, que o CDS-Partido Popular quer pôr os menores de 14 anos na cadeia.
Sr. Primeiro-Ministro, já lhe tinha dito uma vez que se tinha enganado e veio aqui, desta vez suspeito que com má fé, repetir o engano. O nosso projecto de lei relativo à imputabilidade dos menores defende que a imputabilidade em geral comece aos 14 anos e não aos 16, defende um regime penal especial para os menores e diz expressamente, na sua introdução, que uma nova política precisa de novos equipamentos, obviamente especiais, dada a diferente natureza desta criminalidade, inconciliável com o sistema prisional normal, já de si esgotado e fonte de erros, como a junção dos preventivos e dos condenados.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, temos todo o direito de entender que a responsabilidade penal deve começar mais cedo, que um jovem que comete um crime e sabe que nada lhe acontece sabe que o está a fazer, que por isso deve responder, devendo ser-lhe dado um sistema especial como o constante do nosso projecto, que simultaneamente é privativo da liberdade e permite uma oportunidade em termos educativos.
O que não queremos, com certeza, é que nos chamados centros de reinserção se fuja à vontade, se vão roubar viaturas para vir para o sul do País assaltar e agredir pessoas e depois se volte ao centro de reinserção para se voltar a fugir!

Aplausos do CDS-PP.

Sr. Primeiro-Ministro, isto é que não queremos, porque isto não dá segurança a ninguém!

Aplausos do CDS-PP.

Sr. Primeiro-Ministro, termino dizendo-lhe o seguinte: V. Ex.ª disse da tribuna que se apresenta como uma pessoa que, quando erra, rectifica. Sr. Primeiro-Ministro, leia o nosso projecto de lei, reconheça que errou, tenha a coragem e a dignidade de rectificar.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, querendo, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Portas, para nós, a questão central é, de facto, a da imputabilidade aos 14 anos e a de se admitir um regime prisional a partir dos 14 anos.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Especial! Nada tem a ver com prisões!

O Orador: - Regime prisional é um regime com prisões, senão, não se chamava regime prisional mas outra coisa qualquer!

Protestos do CDS-PP.

Aliás, a preocupação do Governo não começa nesse aspecto do regime prisional especial a partir dos 14 anos. A nossa intenção é a de separar todos os presos dos 16 aos 21 anos dos restantes presos.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Isso é engenharia de palavras!

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O Orador: - Queremos um regime prisional diferente dos 16 aos 21 anos e é isso que estamos a pôr em vigor! Agora, regime prisional implica pôr na prisão!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - V. Ex.ª acusou-nos de algo que não defendemos!

O Orador: - Na nossa visão, o que está em causa não é pôr na prisão mas, sim, num colégio de reinserção; não é ter guardas prisionais, é ter agentes, monitores e técnicos de reinserção social;…

Protestos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, agradeço que não estabeleçam diálogo.
Faça favor de prosseguir, Sr. Primeiro-Ministro.

O Orador: - O que queremos é garantir que esses colégios de reinserção, nos casos especiais, que são conhecidos, tenham um regime fechado. Mas são colégios de reinserção, não são prisões, não têm guardas prisionais mas técnicos de reinserção, não é um regime prisional mas, sim, um regime de reinserção. Por isso, se algo está errado, é o projecto do PP!

Aplausos do PS.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Não é, não, Sr. Primeiro-Ministro!

O Orador: - Percebo que o PP tenha compreendido que se enganou e pretenda agora corrigir aquilo que é, de facto, um grave atentado contra o humanismo que proclama, mas não venha lançar poeira para os olhos! Neste aspecto, o PP morre com a própria designação utilizada no seu projecto de lei!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Durão Barroso, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Durão Barroso, procurando censurar o Governo, V. Ex.ª não logrou mais do que autocensurar-se, a si e ao seu partido, na intervenção que acabou de proferir.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É que, se há evidência que resulta dessa intervenção, é a da total incapacidade do PSD se constituir hoje numa alternativa credível de poder em Portugal!

Aplausos do PS.

Sr. Deputado, V. Ex.ª oscilou entre a pose de um provedor de ressentimentos e a de um puro vendedor de ilusões! Mas projectos, propostas, um rumo claro para Portugal, foi coisa que não se viu na sua intervenção! Atentemos em alguns pormenores da mesma.
O Sr. Deputado enunciou como um dos motivos para a apresentação desta moção de censura uma discordância de fundo em relação à política económica e financeira que tem vindo a ser prosseguida pelo actual Governo. E sobre isso, o que é que o Sr. Deputado foi capaz de aqui dizer de positivo? Foi apenas capaz de dizer que era necessária uma nova política, uma mudança radical, sem apresentar um único contorno, uma única linha de orientação dessa nova política económica e financeira!

Protestos do PSD.

E chegou até ao ponto fantástico de considerar ser necessário apresentar um plano de emergência que, na sua opinião, é tão inadiável que até pode ser apresentado daqui a alguns dias, perante esta Assembleia! Isto é, do seu ponto de vista, a situação do País é tão grave e a necessidade de mudar políticas tão inadiável que o maior partido da oposição chega a esta discussão sem apresentar uma só proposta concreta visando uma alteração da política económica e financeira do Governo!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Aliás, se alguma coisa de concreto se percebeu da sua intervenção nessa matéria foi apenas a de que as propostas do PSD nesse domínio são duas. A primeira era a de considerar que as taxas de juro já deveriam ter sido aumentadas há mais tempo para não estarmos a fornecer más indicações aos agentes económicos. Na óptica do líder do PSD, fornecer boas indicações aos agentes económicos era, pura e simplesmente, já ter aumentado as taxas de juro no mercado. A outra, em relação à política dos combustíveis, era a de considerar que eles já deveriam ter sido aumentados.
Sr. Deputado, há um outro pormenor da sua intervenção que demonstra em absoluto a incoerência de quem não tem um projecto sério de governação para o País.
O Sr. Deputado Durão Barroso começou a sua intervenção condenando o Governo pela circunstância de 30 000 professores não terem tido colocação este ano e acabou a sua intervenção fazendo crer que um sistema público educativo é um sistema parasitário, que carece de ser completamente alterado. Aí está uma demonstração prática de uma incoerência absoluta. E essa incoerência é possível porque, verdadeiramente, hoje o PSD não tem uma visão para o País! O Sr. Deputado não foi sequer capaz de enunciar as linhas essenciais de uma governação alternativa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já terminou o seu tempo.

O Orador: - Vou já concluir, Sr. Presidente.
Se os portugueses projectavam, hoje, alguma expectativa, era a de que o PSD apresentasse algo de novo. Infelizmente, o PSD voltou a apresentar a mesma evidência: a de uma total impreparação para governar Portugal!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Durão Barroso.

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O Sr. Durão Barroso (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco de Assis, já estava à espera que V. Ex.ª viesse hoje repetir aquilo que sempre tem dito quando me apresento nesta Assembleia.

Protestos do PS.

Vozes do PSD: - É o «cassete Assis»!

O Orador: - Por isso, para que V. Ex.ª conheça as alternativas que o PSD propôs e que tem para a apresentar ao País, trouxe-lhe até, devidamente autografado,…

Risos do PSD.

… e vou oferecer-lho a seguir, se me der licença, o programa eleitoral, em cor-de-laranja brilhante,…

Risos do PSD.

… apresentado pelo PSD nas últimas eleições.
A minha dedicatória ao Deputado Francisco de Assis é a seguinte: «Para o Dr. Francisco de Assis, com consideração e estima, procurando que, da próxima vez, introduza alguma novidade no seu discurso.»

Aplausos do PSD.

Este é o programa que apresentámos nas últimas eleições. Nas próximas eleições, V. Ex.ª pode estar seguro de que vai ter direito a outro programa, também em cor-de-laranja brilhante, bem diferente do programa cor-de-rosa pálido - ou será que será o tal cor-de-rosa mais vermelho que alguns agora anunciam?…

Risos do PSD.

De qualquer forma, vai ter direito ao nosso programa nas próximas eleições.
Entretanto, e porque a situação económica é, de facto, uma questão especialmente urgente e difícil e, em alguns casos, tecnicamente mais sofisticada, aproveito para lhe dizer que eu nunca poderia ter dito sobre as taxas de juro aquilo que referiu, porque, como V. Ex.ª deveria saber, actualmente as taxas de juro não estão na dependência do Governo mas, sim, do Banco Central Europeu.

Protestos do PS.

Apresentaremos um programa de emergência no que respeita à questão económica. Agora, VV. Ex.as querem algo em que não podemos seguir-vos. Sempre que trazemos aqui os problemas do País, procuram desviar a atenção para a eventual discussão de alternativas da oposição. Mas, atenção, na moção de censura, quem responde é o Governo, quem está a ser examinado é o Governo e é ao Governo que temos de pedir contas!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - VV. Ex.as não podem continuar com as vossas habituais tácticas de distrair a atenção dos portugueses!
De qualquer modo, esteja tranquilo, Sr. Deputado, que em devido tempo oferecer-lhe-emos todas as alternativas, pois nós temos um projecto para Portugal!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem, de novo, a palavra o Sr. Deputado Durão Barroso, agora para pedir esclarecimentos ao Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Durão Barroso (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, ultimamente, V. Ex.ª e o Partido Socialista têm chamado muitas vezes à colação, para apoiar as vossas próprias posições, o Professor Cavaco Silva, citando-o. E V. Ex.ª refere o facto de, num debate em 1989, ter sido dito pelo Professor Cavaco Silva exactamente aquilo que V. Ex.ª citou.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Foi em 1994!

O Orador: - Peço desculpa. O debate foi em 1994. Mas em 1989 foi dito aproximadamente o mesmo.

Risos do PSD.

De qualquer forma, Sr. Primeiro-Ministro, há uma diferença entre aquilo que se passava nessas diferentes conjunturas e o que se passa hoje. É que, nessa altura, o governo tinha obra, podia mostrar obra.
Sr. Primeiro-Ministro, trabalhei 10 anos com o Professor Cavaco Silva e digo-lhe que V. Ex.ª não é o Professor Cavaco Silva e que esse não é o governo do PSD! Esse Governo não pode comparar-se aos nossos governos!

Aplausos do PSD.

Mas gostaria que, em vez de citar o Professor Cavaco Silva, V. Ex.ª me dissesse se se revê na sua própria declaração feita nesta Assembleia da República, em 21 de Outubro de 1989.
Também perante um governo que não podia, na altura, ser derrubado, numa moção de censura apresentada pelo PS, quando V. Ex.ª era, se não me engano, líder do grupo parlamentar, V. Ex.ª disse o seguinte: «Esta moção de censura é oportuna, porque permite dar voz, no plano político e institucional, ao profundo e crescente descontentamento que grassa de norte a sul do País, na generalidade dos sectores da população, descontentamento gerador de uma evidente instabilidade social. É preciso que a democracia portuguesa, que as instituições ofereçam uma esperança e uma alternativa a todo esse descontentamento.» - António Guterres, 1989.
V. Ex.ª está arrependido? V. Ex.ª vai, outra vez, pedir-nos desculpa por mais este erro que cometeu há alguns anos atrás?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Durão Barroso, em primeiro lugar, quero tranquilizá-lo. Não

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cito o Professor Cavaco Silva para o embaraçar. Aliás, em matéria de estabilidade política, tinha também, na minha intervenção, uma citação de palavras suas que só não utilizei porque a introdução que fiz me roubou o tempo.
Quero começar por concordar consigo de uma forma claríssima: eu não sou o Professor Cavaco Silva!

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso sabemos nós!

O Orador: - E, se comparar a citação que fez das minhas palavras com a citação que fiz das palavras do Professor Cavaco Silva, reconhecerá que, no estilo e na elegância, há uma diferença fundamental! Espero que o tome em boa linha de conta.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Na obra é que está a diferença!

O Orador: - Mas, já agora, quero dizer-lhe com sinceridade que, em matéria de moções de censura, o PS já reconheceu aqui que, no caso relevante, e o caso relevante era aquele em que o governo não dispunha de maioria absoluta - porque, quando um governo dispõe de maioria absoluta, como nesse caso, a situação é completamente diversa desta -, e nessa altura não foi a minha voz que falou, mas estou à vontade, assumo-o, o PS já reconheceu aqui, repito, que o mais grave erro político que alguma vez cometeu na sua estratégia foi o de ter votado a favor da moção de censura do PRD contra o governo minoritário do Professor Cavaco Silva.
Foi por ter reconhecido isso que o PS ganhou legitimidade para estabelecer com as oposições uma relação de diálogo, sendo Governo minoritário, e, infelizmente, nunca encontrou da parte do Sr. Deputado a menor correspondência para garantir a governabilidade!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Já agora, pego nas suas palavras. Foi publicado um livro chamado Sistema Governativo e Sistema Partidário, da autoria de Pedro Santana Lopes e José Durão Barroso, do qual consta um artigo chamado «Parlamentarismo racionalizado», cujo autor é José Durão Barroso, o qual tem ocasião de dizer, ao defender uma fórmula semelhante à moção de censura construtiva, o seguinte: «Acaba-se, pois, com a irresponsabilidade que constitui derrubar os governos sem ter uma alternativa para a sua substituição.»

Aplausos do PS.

Nada mais adequado em relação ao comportamento do PSD de hoje!
Finalmente, Sr. Deputado Durão Barroso, quero convidá-lo para visitar comigo, no domínio das infra-estruturas e dos equipamentos, da educação, da saúde e de qualquer área governativa, como a justiça, a administração interna, ou a que quiser, a obra inteiramente começada e concluída por este Governo e verificará que essa obra - e foi por isso que tivemos a confiança dos portugueses - é bem mais impressiva, porque mais humanizada, do que a obra legada pelos governos a que pertenceu.

Aplausos do PS.

O Sr. Durão Barroso (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Durão Barroso (PSD): - Para defesa da honra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Durão Barroso (PSD): - Sr. Presidente, penso que o debate político…

O Sr. Presidente: - Peço desculpa, Sr. Deputado, mas, por uma questão de igualdade de tratamento, gostaria que identificasse a razão da ofensa.

O Sr. Durão Barroso (PSD): - Utilizo esta figura regimental por causa de uma citação feita pelo Sr. Primeiro-Ministro completamente fora do contexto, a qual sugere uma interpretação…

Vozes do PS: - Ah!…

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Durão Barroso (PSD): - Sr. Presidente, estava eu a dizer que o debate político, para além do seu natural carácter polémico, tem certas regras e uma delas tem que ser, penso eu, um mínimo de rigor e de objectividade, sobretudo quando se citam outras posições. Ora, o Sr. Primeiro-Ministro citou um artigo que publiquei, não sei agora a data,…

O Sr. Primeiro-Ministro: - Em 1980!

O Orador: - … de 1980, ou seja, antes das sucessivas revisões constitucionais e antes de, em Portugal, pela primeira vez com o PSD, ter havido governos de legislatura. É verdade que, nessa altura, defendi, de jure condendo, isto é, para o futuro, em termos jurídicos, a figura da moção de censura construtiva, mas, como o Sr. Primeiro-Ministro sabe, essa moção não existe actualmente no nosso ordenamento constitucional.
De qualquer modo, quero dizer-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, que, quanto ao essencial, o meu espírito é o mesmo e que, quando achamos que o Governo deve cair, saberemos julgar o momento de tomar as iniciativas que levem à sua queda e que garantam ao País uma alternativa, sabendo, contudo, que, infelizmente, ela não vai ser possível no quadro desta Assembleia. Terá de ser o eleitorado a formá-la pela sua livre expressão, pela sua decisiva vontade.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra ao Sr. Primeiro-Ministro, para dar explicações, querendo.

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O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Durão Barroso, gostaria de recordar que, em 1995, já depois de o PSD ter assegurado governos de legislatura, o Sr. Deputado Durão Barroso teve ocasião de se referir, num artigo de jornal que eu aqui citei, à governabilidade e à necessidade da estabilidade em termos muito mais entusiásticos do que aqueles que hoje utilizei. Esta é que é a questão essencial.
Para os Srs. Deputados do PSD, a estabilidade só é um valor quando o PSD está no poder.

Vozes do PS: - Exactamente!

O Orador: - Quando o PSD passa para a oposição, a estabilidade deixa de ser um valor, e essa é uma diferença fundamental entre nós.

Vozes do PSD: - Não é verdade!

O Orador: - É que eu sempre entendi que a estabilidade era um valor, de tal forma que não encontrará nenhuma citação minha, desde 1980, pondo em causa a legitimidade e o interesse de governos de maioria absoluta em Portugal, mesmo quando estes eram do PSD, e muitas pessoas discordavam desse conceito.
A grande diferença que existe entre nós é que, para mim, a estabilidade é um valor para governar melhor e para resolver os problemas das pessoas, para si a estabilidade é um instrumento ao serviço do PSD quando ele está no poder.

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não é verdade! Isso é falso!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, gostaria de fazer regressar o debate ao ano 2000,…

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Era bom!

O Orador: - … trazendo-o das citações do passado para as questões do futuro e de o fazer sair do pequeno circuito que interessa aos políticos e de o devolver ao circuito grande que interessa às grandes questões nacionais que se colocam ao futuro da Nação.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Quanto à moção de censura, dou por inteiramente reproduzido o discurso que aqui fiz há dois meses quando apresentámos uma moção de censura: o Governo é mau, as políticas são fracas.
Está agora na moda um tipo de organização denominada, por exemplo, «Na minha cidade sem carro». Chegará a ocasião em que os portugueses possam celebrar o dia «No meu país sem este Primeiro-Ministro»!

Aplausos do CDS-PP.

Sr. Primeiro-Ministro, gostaria de fazer perguntas muito concretas em dois domínios: o da segurança social e o da segurança dos cidadãos.
Os jornais noticiam, hoje, com consistência, que o Governo utilizou 88 milhões de contos da segurança social para pagar o défice do Estado. Uma, de duas: ou se trata de uma operação de contabilidade e, nesse caso, é grave, ou é uma transferência de fundos, e é ainda mais grave.
Se é uma operação de contabilidade, isso quer dizer que V. Ex.ª dispunha, como sempre afirmámos, de, pelo menos, 88 milhões de contos para ter melhorado as pensões de quem tem reformas de 25 e de 34 contos. Isto é, o Sr. Primeiro-Ministro dispunha de um montante que é quase o dobro do valor do nosso projecto de convergência das pensões no seu primeiro ano, não o usou em favor dos pensionistas e, agora, sacrifica os idosos para pagar os seus próprios erros. Se se trata de uma transferência de fundos, V. Ex.ª toca no seguro de vida da segurança social para o futuro, porque significa que está a usar dinheiro e contribuições do trabalhador e do empresário para financiar os erros do Eng.º António Guterres e do Dr. Joaquim Pina Moura.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Gostaria de obter o seguinte esclarecimento por parte de V. Ex.ª: é falso ou verdadeiro que houve ou transferência de fundos ou de contabilidade de 88 milhões de contos da segurança social para cobrir o défice do Estado? Já agora, diga-me, em relação ao Orçamento do Estado para 2001, qual é o aumento que prevê para a pensão mínima e para a pensão social!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Portas, gostaria de sublinhar o facto político de, hoje, haver tréguas entre o PP e o PSD.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Sr. Primeiro-Ministro…!

O Orador: - Estas coisas mudam com frequência e por isso, hoje, estamos em dia de lua-de-mel entre os dois partidos!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Sr. Primeiro-Ministro…!

O Orador: - Mas vamos à questão central.
Sr. Deputado Paulo Portas, há uma coisa que eu nunca pensei: que o Sr. Deputado Paulo Portas não conhecesse a forma como funcionam as contas nacionais,…

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Conheço, conheço!

O Orador: - … e que não conhecesse a forma como tem funcionado a segurança social em Portugal.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Conheço, conheço!

O Orador: - Uma das coisas que tem acontecido todos os anos em Portugal é o facto de o sistema social, graças

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à qualidade da sua gestão e, nomeadamente, graças ao facto de estarmos a recuperar receitas que anteriormente não eram pagas e de estarmos a combater fraudes em prestações sociais que anteriormente não eram controladas, ter conseguido ganhos de gestão. Para onde vão esses ganhos de gestão? Não vão para o Orçamento do Estado, visto que, como sabe, desde que cumprimos (é que os seus amigos do PSD não cumpriam quando estavam no governo!) a Lei de Bases da Segurança Social, o Orçamento do Estado dá à segurança social um contributo muitíssimo superior a esse valor, que é o que a lei fixa para atingir os regimes não contributivos.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Houve ou não uma transferência de fundos?!

O Sr. Primeiro-Ministro: - Não! O que se apurar como excedente adicional na segurança social irá para o Fundo de Capitalização da Segurança Social, ou seja, irá fazer o que é essencial não apenas para os actuais pensionistas mas também para os futuros, porque se há algo que em Portugal todas as pessoas dizem é que o problema central da sustentabilidade prende-se com a capitalização e o que estamos a fazer é gerir bem e capitalizar. Por isso, não há qualquer transferência de verbas do orçamento da segurança social para o Orçamento do Estado nem houve uma transferência de carácter contabilístico.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Ai não?!

O Orador: - A única coisa que acontece é que, além da contabilidade pública, Bruxelas faz, em relação ao sector público administrativo, uma contabilidade nacional, na qual entram o Estado, a segurança social, um conjunto de fundos e de serviços autónomos, as autarquias locais, as regiões autónomas e o que conta, no final, é saber qual é o défice global deste sistema, que é de 1,5, segundo esperamos, já que estamos a trabalhar para isso. Por isso, não há qualquer manobra contabilística,…

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Claro que há!

O Orador: - … há a normal gestão de um sistema de segurança social em que as receitas estão a crescer 8,1% todos os meses em relação a idêntico mês do ano passado. Isto quer dizer que o País não está em crise económica, quer dizer que a eficácia da fiscalização é maior, porque se o País estivesse em crise económica ou não houvesse eficácia de fiscalização era impossível.
Portanto, o Sr. Deputado ataca-nos pelo êxito da nossa política em matéria de crescimento e pelo êxito da nossa política em matéria de fiscalização.

Aplausos do PS.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Para defesa da consideração da bancada, que foi acusada de não conhecer o funcionamento das contas nacionais.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa mas ou caracteriza claramente o que eu não ouvi, ou seja, qualquer ofensa à sua bancada, ou temos que entender que estamos a abusar da figura da defesa da honra.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Sr. Primeiro-Ministro, gostaria de dar uma explicação muito sucinta…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tem de caracterizar a ofensa.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - O Sr. Primeiro-Ministro disse expressamente: «O Dr. Paulo Portas não conhece o funcionamento das contas nacionais.»

O Sr. Presidente: - Peço desculpa, mas essa expressão não ofende a sua honra. Sr. Deputado, não podemos admitir excesso de sensibilidade.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Sr. Presidente, farei seguir a explicação para o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado. Agradeço que faça isso.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Se o Sr. Primeiro-Ministro pode fazer uma operação de contabilidade é porque o dinheiro estava disponível!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro, nas últimas negociações salariais, o Sr. Primeiro-Ministro apresentou a esta Câmara uma taxa de inflação manifestamente subavaliada. Na base da mesma procederam-se aos aumentos salariais dos trabalhadores da Administração Pública e dos demais trabalhadores. O Governo admitiu o erro, disse, inclusivamente, que o iria corrigir, mas persiste nele. E sabe bem que, com o aumento dos preços, uma boa parte dos salários desses aumentos já foi absorvida e ainda mais com o aumento das taxas de juro.
Ora, quando podíamos pensar que o Sr. Primeiro-Ministro iria corrigir esse erro - aliás, como o ouvimos dizer há pouco -, persistiu nele, porque nas Grandes Opções do Plano apresentou uma taxa de inflação para o próximo ano manifestamente subavaliada, o que é inaceitável, é uma fraude.

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - Dizer que, no próximo ano, a taxa de inflação se vai situar nos 2,5% é não fazer contas, porque, como sabe, mesmo que, no próximo ano, não houvesse subida de preços, a taxa de inflação ficaria nos 2%. Se, no próximo ano, os preços subirem a uma taxa média do ano mais favorável, que foi o de 1998, a taxa ficará nos 3%.
Ora, o Sr. Primeiro-Ministro diz que está preocupado com a governabilidade, com a estabilidade, e eu pergunto se

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não está preocupado com a governabilidade dos orçamentos familiares, dos orçamentos dos trabalhadores, dos orçamentos dos jovens que compraram casa própria e que, por isso, se encontram numa situação extremamente difícil, dos orçamentos dos pensionistas e dos reformados.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Esta é que é a questão central da governabilidade e da estabilidade.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Com todo o gosto, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Carlos Carvalhas, três precisões: em primeiro lugar, se é verdade que há trabalhadores da função pública que tiveram aumentos de 2,5%, é também verdade que os aumentos da massa salarial foram muito superiores e, porventura, mais de metade dos trabalhadores da função pública tiveram, este ano, aumentos superiores a 2,5%. E a massa salarial andará pelos, neste momento não tenho de cor, 8% ou 9%. Mas não é isso que está em causa.
O que está em causa é dizer que aquilo que eu aqui prometi será cumprido e, portanto, àquilo que for a normal negociação com os sindicatos da função pública e o seu resultado será acrescentada a perda do poder de compra que os trabalhadores menos bem remunerados, ou seja, os que tiveram 2,5%, tiverem este ano.
Em segundo lugar, a previsão da inflação apresentada não é de 2,5% mas de 2,7%.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - No próximo ano!

O Orador: - Sim! Para o próximo ano, a previsão da inflação é de 2,7%. Vem nos jornais 2,5%, mas isso não corresponde ao documento entregue pelo Governo ao Conselho Económico e Social. Aliás, esse valor vem com um asterisco, dizendo que aguardamos necessariamente para ver aquilo que se vai passar nos próximos tempos e as próprias previsões da União Europeia para podermos acertar esse valor, porque queremos que ele tenha o máximo de realismo.
É evidente que as pressões inflacionistas que existiram este ano ultrapassaram todas as nossas expectativas - reconheço-o sem qualquer problema -, elas vieram do exterior. Vamos ver qual é a abordagem do próximo ano nesse domínio para fixar o valor definitivo para a previsão da inflação.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, queria colocar-lhe uma questão que, até agora, tem estado ignorada deste debate quer pelo PSD, partido que apresentou a moção de censura, quer pelo Sr. Primeiro-Ministro, que entendeu não atribuir grande importância à questão e que, pura e simplesmente, a ela não se referiu.
A questão em concreto é a que se prende com um problema extremamente importante, o da desigualdade entre mulheres e homens na nossa sociedade, «uma chocante desigualdade» (eram as suas palavras), uma desigualdade no plano do emprego, uma desigualdade no plano salarial, uma desigualdade «que persistia» (assim o dizia o Eng.º Guterres, no ano passado) na nossa sociedade e que justificava a criação do lugar de Ministra para a Igualdade como prova da sua não resignação perante esse facto.
Sr. Primeiro-Ministro, nós não fazemos parte daqueles que reivindicaram a criação deste lugar, nós não nos incluímos, tão-pouco, se esteve atento à imprensa, no grupo daqueles que, tendo sempre criticado fortemente, em privado, a criação deste lugar, vieram agora, espantosamente, a público, manifestar a sua indignação, nós incluímo-nos, seguramente, no grupo daqueles para os quais a igualdade é importante, para os quais esta não é uma questão folclórica ou menor, para os quais esta é uma questão de sociedade e de projecto de sociedade.
Aquilo que eu gostaria que dissesse, Sr. Ministro, e que, até agora, não fez é a razão pela qual, pura e simplesmente, é extinto este lugar e não se encontra politicamente expressão daquilo que era a prova da sua não resignação.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Com todo o gosto, Sr. Presidente, e prestando, aliás, homenagem ao trabalho da minha colega que desempenhou essas funções.
O problema foi o de se ter criado um lugar que não tinha a apoiá-lo uma estrutura suficientemente eficaz. A minha convicção, feita a experiência, é a de que não vale a pena «construir a casa pelo telhado», vamos solidificar os «alicerces e as paredes» para depois lhe colocarmos o «telhado político» correspondente.
Em qualquer caso, o Sr. Ministro da Presidência é responsável por todo o conjunto de acções que, a esse nível, vão ser desenvolvidas e aquilo que vamos fazer é melhorar a qualidade do trabalho de todas as áreas que dependem deste sector nos diversos ministérios e criar as condições para que, eventualmente no futuro, possa fazer sentido a criação de um lugar político, então, sim, com instrumentos de acção que, neste momento, manifestamente, não existiam.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Primeiro-Ministro, disse ao País que o Governo cometeu erros. E, certamente, o pior erro é não corrigir os erros que se reconhecem.
O Governo cometeu, no entanto, muitos erros. Cometeu um erro na avaliação da inflação e cometeu o erro de enganar, com isso, os trabalhadores da função pública. Cometeu um erro nas taxas de juro e, com isso, cometeu o erro de não orientar a economia. Cometeu o erro de «manter os olhos fechados e a mão morta» em relação a benefícios fiscais, em relação ao off-shore da Madeira, que agora é criticado pela Comissão Europeia, em relação ao adiamento da reforma fiscal, em relação à saúde - temos uma

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maternidade em Lisboa que teve obras de 500 000 contos e que continua fechada semanas e meses a fio. Cometeu erros sistemáticos.
Mas cometeu, Sr. Primeiro-Ministro, se me permite a franqueza, o maior erro de todos, que é um erro de orientação política essencial: este Governo, cinco anos a fio, na continuidade da legislatura anterior, fez um Orçamento com a direita para políticas anti-sociais, anti-populares, que nada tem que ver com qualquer crise política artificial, hoje, mas tem tudo que ver com uma crise social profunda de credibilidade de políticas, de orientação de fundo, de que o Governo é o principal protagonista.
Por isso, a moção de censura que vale a pena discutir é aquela que, a partir de amanhã, cada dia no debate parlamentar, deve conduzir ao esclarecimento das orientações de fundo sobre a política orçamental, ou seja, sobre as escolhas que se fazem para o País em matérias de pensões de reforma, em matérias de recuperação de salários, em matérias de reforma fiscal que sustente uma nova orientação económica.
O que é preciso, Sr. Primeiro-Ministro, é um novo ciclo político e um novo ciclo político tem, necessariamente, que significar a ruptura com o velho ciclo que se baseou na escolha que o Sr. Primeiro-Ministro fez em 1995, em 1996, em 1997, em 1998 e em 1999, que foi a de fazer um acordo político com a direita, com os resultados que temos.
Por isso, a apresentação desta moção de censura, hoje, é inconsequente: o Big Brother imita o Little Brother e, na fraternidade, propõem-nos que, com prisões normais e com prisões anormais, vamos resolver o problema da toxicodependência, dos jovens delinquentes e, até, dos suspeitos do costume, que são os do rendimento mínimo garantido. Essa alternativa não é alternativa!
Mas o País precisa de uma alternativa clara, o País precisa de uma resposta conclusiva. Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, quero dizer-lhe, com a clareza que o País precisa nestes debates, o seguinte: disse-nos o Sr. Primeiro-Ministro que o Orçamento faz falta. Permita-me que lhe diga que o que faz falta é um bom Orçamento. Não faz falta, e deve ser por isso recusado, qualquer mau Orçamento que, na sequência de políticas anti-populares, contra a recuperação do salário, contra o crescimento sustentado das pensões ou na base da permissividade em relação à fraude fiscal, mantenha a obscuridade.

O Sr. Presidente: - Esgotou o seu tempo, Sr. Deputado. Faça favor de terminar.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
O erro maior é prometer algo de novo, o erro maior é esta condução que diz que vai em frente e que tem estado sempre no centro e na direita.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, penso que o Bloco de Esquerda também terá que ter a mesma capacidade para reconhecer erros, quando os cometer.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Penso que, quando o Bloco de Esquerda afirma que as políticas deste Governo foram, ao longo destes anos, políticas anti-sociais e que os Orçamentos o reflectiram, comete um erro de avaliação completo. Isto porque se alguma coisa os Orçamentos reflectiram ao longo destes anos foi uma nova, ineditamente nova, na democracia portuguesa pós-25 de Abril, atenção aos problemas sociais, na lógica do reconhecimento dos direitos de cidadania das pessoas, que é a lógica correcta de encarar os problemas sociais, e não na lógica esmoler de procurar dar resposta a esta ou àquela situação concreta.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Esta foi, e é, a lógica deste Governo.
Valerá também a pena que as forças políticas de oposição, que têm, naturalmente, necessidade de fazer o seu discurso (e isso nós compreendemos), saibam nos momentos de verdade reconhecer qual é a verdade das coisas. E, se algumas coisas há a fazer no sentido de garantir maior eficácia fiscal e maior combate à fraude e evasão, não encontrará nesta Câmara gente mais disponível para isso do que aqueles que encontra neste Governo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, por mais que se fale ou por mais afirmações que se façam, há um facto que já ninguém consegue discutir nem negar: é que nós, em relação aos restantes países europeus, estamos a empobrecer. Esse é o facto mais evidente do resultado da sua governação dos últimos cinco anos.
É claro, Sr. Primeiro-Ministro, que o senhor (e o seu Governo) evoca, com frequência, aspectos que para isso têm contribuído e que não controla: é o caso da evolução da taxa de juro, que não é controlada por si, e o caso da evolução dos preços dos combustíveis, que não é controlada por si.
Sr. Primeiro-Ministro, isso é verdade! E é exactamente por ser verdade que a sua responsabilidade é maior. Isto porque aquilo que se pede a um governo é que perspective, resolva, pondere e evite as consequências de todos aqueles aspectos que podem ser negativos para a economia.
O Sr. Primeiro-Ministro, quando tomou conta do Governo, recebeu uma boa situação económica. E o que lhe fez, Sr. Primeiro-Ministro? Delapidou-a com festas…

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

A Oradora: -… e pouco fez para consolidar e prever situações como aquelas que, neste momento, estamos a passar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - O que é que o senhor fez? O senhor teve a actuação própria da «cigarra», menosprezando e desdenhando do trabalho próprio da «formiga»! E é a ausência de trabalho da «formiga» que nos leva, neste momento, a estar na situação em que nos encontramos!

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Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Mas pior do que isso, Sr. Primeiro-Ministro, porque este é um facto que, pelos vistos, neste momento é inultrapassável, é o Sr. Primeiro-Ministro e o seu Governo continuarem, neste momento, a falarem exactamente nos mesmos termos em que falavam há cinco anos. Isso é que é altamente preocupante!
A ideia de facilitismo, a ideia de não crise - palavra que, penso, ofendeu o Sr. Primeiro-Ministro, pegando nas definições teóricas, que para aqui pouco interessam, porque aquilo que interessa é que estamos a crescer menos do que a Europa - esse é que é o ponto fundamental, é isso que nos faz atrasar. Não é estarmos a baixar, é estarmos a crescer menos do que eles. O senhor agarrou-se a uma palavra, quando devia, antes, ter-se agarrado a um conceito. Esse problema, Sr. Primeiro-Ministro, o senhor não o resolve de forma alguma, nem apresenta qualquer tipo de solução! Nem diz como é que vai fazer! Sr. Primeiro-Ministro, tem que agradecer às oposições, porque é a oposição que tem alertado os portugueses para os verdadeiros perigos em que estamos metidos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Foram os portugueses que alertaram para o perigo do endividamento das famílias. O Governo sempre entendeu que isso não tinha problema.

Protestos da Deputada do PS Maria Celeste Correia.

Nós sempre alertámos para o perigo da actual situação,…

O Sr. Presidente: - Esgotou o seu tempo, Sr.ª Deputada.

A Oradora: - … a qual, se não se inverter, irá, com certeza, transformar-se num verdadeiro descalabro.
A terminar, Sr. Primeiro-Ministro, não deixo de lhe dizer o seguinte: o Sr. Primeiro-Ministro convidou o Presidente do meu partido a visitar a sua obra. Tenha a honestidade suficiente para o convidar a visitar apenas aquela obra que está paga, não aquela que vai ser paga por nós, no futuro.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, é necessário falar com rigor. E falar com rigor é dizer com clareza que os défices do sector público administrativo e a dívida pública, hoje, em percentagem do PIB, são consideravelmente menores do que eram quando o PSD estava no governo.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Mas maiores do que o que deviam ser!

O Orador: - O que quer dizer que, se herdámos uma situação económica que considera boa - e eu não posso subscrever as suas palavras -, temos hoje, felizmente, nesse aspecto, uma situação económica melhor.
Depois, acusa-nos de errar previsões. Bem, se há alguma coisa em que todos estão de acordo é que este foi um ano de incerteza.
Mas também lhe quero dizer uma coisa: em matéria de PIB e em matéria de inflação, nunca este Governo, no Orçamento do Estado, teve erros superiores a 1%.

Vozes do PSD: - Não é verdade!

O Orador: - Pois bem, o último governo do PSD, em matéria de PIB, nunca se enganou por menos de 1% e houve um ano em que se enganou por 4,40% - o ano de 1993!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Quando a Europa estava em crise!

O Orador: - O que quer dizer que, apesar de tudo, a nossa capacidade de prever, e com rigor, é substancialmente superior à vossa.
Uma questão muito importante: na carta que me enviou e que deu início a todo este processo, dizia o líder do PSD: «Pela primeira vez, após a adesão de Portugal à Comunidade Europeia, o nosso país crescerá menos do que a média.» É falso! Cresceu menos do que a média, como sabe, em 1993 e em 1994,…

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Quando a Europa estava em crise!

O Orador: -… consideravelmente menos do que, eventualmente, virá a crescer agora, com uma ou, se quiser, duas diferenças fundamentas: primeiro, o último relatório do FMI ainda nem sequer confirma esse aspecto; segundo, nessa altura, havia uma grande diferença entre o crescimento da economia portuguesa e o seu crescimento potencial, o chamado output gap. Não vamos entrar numa discussão técnica, mas mostro-lhe as projecções da União Europeia e verificará que nesse tempo o potencial de crescimento da economia portuguesa era bem maior do que aquele que as vossas políticas conseguiram realizar.
Um dos problemas que temos hoje e que decorre, em grande parte, de estarmos próximos do pleno emprego e com elevados níveis de capacidade utilizada é que o nosso crescimento está ligeiramente acima do chamado «crescimento potencial».

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Quer dizer que os senhores nada têm a fazer!?

O Orador: - É por isso que a única solução é aquela que eu hoje aqui reforcei, é qualitativa, passa pela qualificação das pessoas, pela produtividade das empresas e pela qualidade do Estado e da Administração. É esse salto qualitativo que estamos a dar; é a esse salto qualitativo que o PSD se revela completamente insensível.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Sr. Presidente, permita-me que, muito rapidamente, saúde V. Ex.ª na primeira intervenção que faço nesta sessão legislativa.

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O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado.

O Orador: - Antes de fazer uma pergunta muito concreta ao Sr. Primeiro-Ministro, não resisto a fazer uma pequena reflexão sobre a estabilidade de que ele fala.
O Sr. Primeiro-Ministro esquece-se que não tem maioria absoluta nesta Assembleia e que é o primeiro responsável em garantir essa estabilidade.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - V. Ex.ª não pode chegar aqui e atirar para cima das oposições o problema da governabilidade e da estabilidade, quando V. Ex.ª é o primeiro a não cumprir.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - É que não é garantir a estabilidade negociar tudo com todos, desde a droga, com o Bloco de Esquerda, à reforma fiscal, sabe-se lá com quem. Esse é um aspecto realmente difícil, e o Sr. Primeiro-Ministro, em meu entender, é o primeiro factor da instabilidade. V. Ex.ª não tem conseguido um rumo certo, tem tentado sobreviver,…

Aplausos do CDS-PP.

… sem escolher um caminho. E é isso, Sr. Primeiro-Ministro, permita-me que lhe diga, que justifica este debate tão aborrecido, tão maçador, porque faz falta aqui um rumo, um caminho, onde a gente saiba onde está…

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - … e onde se possa discutir projectos e algo de interessante para o País e não sistematicamente o passado e as situações que pouco interessam a muito pouca gente.
A pergunta muito concreta que lhe queria colocar é esta: falou-se aqui na gasolina e nos combustíveis. Sr. Primeiro-Ministro, não lhe vou perguntar quanto é que custou e quem é que pagou. Há dias, um economista de esquerda, e bastante de esquerda, dizia que quem pagou foram os velhos reformados. Se calhar, foram! E ninguém lhes perguntou nada!

Aplausos do CDS-PP.

Mas o Sr. Primeiro-Ministro disse que a gasolina ia aumentar em Janeiro. O Sr. Primeiro-Ministro disse isto: «Até ao fim do ano não aumenta, depois vai aumentar». Quanto é que vai aumentar, Sr. Primeiro-Ministro? Vai reflectir no aumento este congelamento, ou não? Vai aumentar quando? No dia 1 de Janeiro ou no dia 1 de Fevereiro? É que, entre 1 de Janeiro e 1 de Fevereiro, há eleições presidenciais!

Risos do Deputado do CDS-PP Paulo Portas.

O Sr. Primeiro-Ministro não vai, seguramente, aumentar a gasolina depois das eleições presidenciais! Não vai, porque isso era a «descredibilidade» completa da política dos políticos e de qualquer política económica!

Aplausos do CDS-PP.

Estou certo de que o Sr. Ministro das Finanças não deixaria. Já deixou uma vez, mas duas era demais!
Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, o que é que vai fazer sobre essa matéria? E, depois, se o preço do petróleo normalizar, como todos esperamos, e baixar, o Sr. Primeiro-Ministro vai manter os preços administrativos ou vai, finalmente, liberalizar? Como sabe, a liberalização só se pode dar em baixa e nunca em alta. O que é que vai fazer? Vai manter isto como está ou vai, realmente, mudar tudo para que não se repercuta e não continue esta situação que não agrada a ninguém?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado e candidato presidencial Basílio Horta,…

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito obrigado.

O Orador: - … o seu comentário é interessante, porque, no fundo, o que ele quer dizer - o que, convenhamos, para um candidato presidencial,…

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Aqui, é Deputado!

O Orador: - … que deve procurar ter uma visão de alguma capacidade genérica de apreensão do que é uma Câmara na sua multiplicidade, é incompreensível - é: ou se entendem em tudo connosco ou não há nada para ninguém.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Não, não!

O Orador: - Foi isso que quis dizer. Percebi perfeitamente a mensagem.
Quero dizer-lhe que a lógica de estabilidade de um governo minoritário é a lógica de estar aberto ao diálogo com todos e de procurar encontrar com todos as melhores soluções para os problemas nacionais.
Já agora, sobre a gasolina, não devia ter colocado essa questão, porque ela embaraça muito o seu Presidente,…

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Não embaraça, não!

O Orador: - … porque está hoje a reclamar um novo aumento. Quando houve o outro aumento…

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Vai faltar à verdade!

O Orador: - Aliás, essa exigência de um novo aumento parece-me evidente na sua intervenção e até com exigências de não ser adiado para depois das eleições presidenciais!
Mas, como eu estava a dizer, quando houve o último aumento, feito, aliás, com grande preocupação em relação à situação dos portugueses e que, como sabe, foi acompanhado da decisão de não haver aumentos até ao final do ano, o que foi muito criticado por toda a gente, estando os senhores a dizer que isso é pago pelos pensionistas, o que foi dito pelo seu Presidente foi que o aumento era uma medida socialmente injusta,

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economicamente perigosa e estrategicamente inaceitável. E disse mais: «o Primeiro-Ministro só se compromete com este aumento brutal, entre os 15$ e os 17$, mas devo lembrar-lhe que é previsível, na Primavera ou no Verão, a queda progressiva do preço do petróleo. Os portugueses têm os preços mais altos da Europa».

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - E tinham!

O Orador: - Ou seja, o Sr. Deputado Paulo Portas, que, seguramente, alinha no coro daqueles que dizem que nós induzimos em erro os portugueses fazendo previsões optimistas, previa a queda do preço do petróleo bruto durante este Verão e dizia que, por causa disso, o aumento era injusto, economicamente perigoso e estrategicamente inaceitável.

Aplausos do PS.

Como não sou tão adivinho como o Sr. Deputado Paulo Portas, o que lhe vou dizer é o seguinte: vamos, até ao final do ano, apreciar a evolução do preço do petróleo, e bem gostaria eu que não fosse necessário aumentá-lo! Se, no final do ano, ele tiver os preços que tem hoje, é evidente que se torna incomportável e terá de ser aumentado,…

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Quanto?!

O Orador: - … de acordo com a capacidade que, nessa altura, entendermos. Mas não esqueceremos a situação particular do rendimento das famílias e não esqueceremos a situação particular da nossa indústria de transportes, que nos levou a ser particularmente moderados nos aumentos que fizemos, os quais foram tão criticados pelos Srs. Deputados, mas, hoje, talvez valha a pena olharem para o que se passa por essa Europa fora e verem a discussão que, a esse respeito, está a ser travada.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, V. Ex.ª, numa atitude tipo Perdoa-me, veio pedir desculpas ao País por ter errado na forma como concebeu a estrutura do Governo, designadamente com o acumular no mesmo responsável o desporto, as autarquias e a administração interna. E ter-se-á também enganado na escolha do Ministro, o Dr. Fernando Gomes, hoje, significativamente, ausente,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É verdade!

O Orador: - … demitido de forma indigna, aos trambolhões pelas escadas de S. Bento abaixo.

Protestos do PS.

A questão é preocupante. V. Ex.ª terá resolvido o mal menor, a mudança do Ministro, mas o que é imperiosa é a necessidade de uma política de segurança interna, a definição e a adopção de uma política de segurança que o Governo de V. Ex.ª, até agora, não teve. A pergunta que lhe quero colocar é qual é essa política, Sr. Primeiro-Ministro. É a aprovação, em 19 de Agosto, como disse, das medidas da anterior equipa da administração interna? Vai chamar, de novo, o Dr. Fernando Gomes?
Sr. Primeiro-Ministro, não é possível continuarmos a assistir ao que se tem verificado em matéria de delinquência juvenil, aos gangs, aos assaltos de menores e à evasão dos estabelecimentos de reinserção social para virem cá para fora praticar crimes violentos.
Aprovámos aqui, há mais de um ano, a lei tutelar educativa. Levou um ano para regulamentar, Sr. Primeiro-Ministro, e ainda estão em curso as medidas que são necessárias para a sua execução. Não é tempo demais face à premência desta matéria?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Ministro da Justiça disse que só em 2001 é que esta lei vai ser implementada e executada. Estamos aqui, na Assembleia, a aprovar leis para o Governo levar um ano a regulamentá-las e a executá-las?
E as forças de segurança? Que é feito do subsídio de piquete e de turno que o seu Governo, também há mais de um ano, ainda não regulamentou nem implementou?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E não cumpre!

O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, vamos continuar a assistir a esta prática corrente de levar os menores aos tribunais e mandá-los de novo para a prática criminal, sem tomar as medidas de internamento necessárias à sua recuperação? Não me venha responder, de forma demagógica, que o PSD quer mandar os menores para a prisão. O PSD quer recuperar os menores, quer reintegrá-los na sociedade, quer defendê-los e quer defender a sociedade.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - V. Ex.ª disse aqui, há pouco, que nem o senhor nem o seu Governo resignam, disse que errou e pediu desculpas por isso. Os portugueses também acreditaram, de boa fé, nas suas promessas e erraram na escolha do Primeiro-Ministro, mas fique sabendo que os portugueses também não resignam e rapidamente vão corrigir o erro: vão mudar de Governo e vão mudar de Primeiro-Ministro!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, em primeiro lugar, ficou claro na sua intervenção que o objectivo do PSD é mesmo derrubar o Governo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Substituí-lo!

O Orador: - É bom que isso fique claro!
Em segundo lugar, o PSD escolheu mal a pessoa para interpelar o Governo em matéria de justiça e administração

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interna, porque, curiosamente, não houve apenas uma remodelação no Governo, também houve uma remodelação no PSD, só que incompleta. Demitiu-se o «ministro-sombra» da justiça, coisa que, aliás, é inédita,…

Risos do PS.

… e ainda não está nomeado um novo, precisamente por discordar do facto de o líder do PSD não assegurar a autoridade do Estado em relação àquelas que foram as declarações do líder madeirense do Sr. Deputado Guilherme Silva.

Aplausos do PS.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - O que é que isso tem que ver com a segurança interna?!

O Orador: - Por isso o Sr. Deputado Guilherme Silva, nestas matérias de autoridade do Estado, não é o melhor intérprete.
Nesta matéria pode estar tranquilo porque as acções que estão a ser desenvolvidas, neste momento com particular intensidade, vão, estou certo, produzir uma política de justiça e assuntos internos que terá em Portugal o impacto para o qual trabalhamos com a maior intensidade.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Sr. Presidente, antes de mais, os meus cumprimentos neste primeiro dia dos nossos trabalhos.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado.

A Oradora: - Sr. Primeiro-Ministro, não tenho, naturalmente, outro remédio senão corrigir mais uma das suas «habilidades» neste debate. Isto parece mais um conjunto de citações do que uma moção.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - De facto, o Presidente do meu partido disse que o aumento tinha sido socialmente injusto e economicamente perigoso, mas V. Ex.ª esqueceu-se de acrescentar o resto. É que o Estado andou, durante mais de dois anos, a engordar à custa dos contribuintes, quando o petróleo estava baixo e os senhores se esqueceram de liberalizar o respectivo preço.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Exactamente!

A Oradora: - Viram-se, portanto, na contingência de agir na sequência dos factos e não de os prevenir.
Sr. Primeiro-Ministro, voltando novamente ao ano 2000, àquilo que nos aflige e àquilo que aflige os portugueses, nós, nesta bancada, como vai reparar, somos persistentes. Vou falar da Maria e do Zé,….

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - … daqueles que, por erro seu de previsão e de falta de visão, sofreram um aumento na sua prestação ao banco, durante o último ano, de cerca de 33% a 40%. Dou-lhe um exemplo: todos os meses, desde o último ano, o Zé e a Maria tiveram de pagar mais cerca de 25 000$ por mês ao banco.

Aplausos do CDS-PP.

Até parece a cantiga que o senhor conhece, que é do seu tempo: Sobe, sobe, balão sobe! No caso, «sobe, sobe, prestação sobe!».
A questão é muito simples, Sr. Primeiro-Ministro: o que vai V. Ex.ª fazer no próximo Orçamento do Estado para ajudar estas famílias?

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - Vai aumentar a actual dedução de juros de empréstimos de 96 200$, que é o limite máximo, para 98 605$, isto é, uma actualização com base na taxa de inflação que os senhores esperam, mas que se enganam sempre, ou, por outro lado, vai ter a coragem de actualizar a dita dedução de juros de empréstimos para habitação no mínimo pelo valor que estes, efectivamente, subiram, de modo a que as pessoas, aquelas com quem o senhor diz que está preocupado e para quem faz política, possam ser aliviadas, pela via fiscal, daquilo que sofreram por via dos seus erros e das suas erradas avaliações?
E, já agora, Sr. Primeiro-Ministro, não uma pergunta mas um pedido: responda, por favor.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona, devo dizer-lhe que a primeira parte da sua intervenção me fez lembrar aquela frase da Rainha Santa Isabel: «São rosas, meu Senhor…». Só que, desta vez, não houve milagre!…
Percebo a gentileza e a galhardia de procurar defender o seu líder,…

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Repor a verdade!

O Orador: - … mas, como sabe, durante dois anos, houve uma política de estabilidade de combustíveis e essa política foi fiscalmente neutra.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Foi de «engorda»!

O Orador: - Isto é, essa política abrangeu períodos de subida e períodos de descida e teve um resultado que foi fiscalmente neutro. Portanto, ninguém «engordou», ficámos exactamente na mesma. A Sr.ª Deputada sabe isso perfeitamente, mas fica-lhe muito bem este seu esforço para tentar salvar o seu líder de um passo mal dado nos debates parlamentares.

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E, já agora, em relação à Maria e ao José, a todas as Marias e a todos os Josés, seja um pouco mais justa, Sr.ª Deputada: não é por minha culpa que a Maria e o José pagam mais. Posso ter a culpa de não ter previsto que os juros iam aumentar; agora, não fui eu que fiz aumentar os juros - tenhamos a noção das coisas! -, foi o Banco Central Europeu, como sabe. D. Isabel vai fazendo sucessivos milagres!…

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Baixou a bonificação!

O Orador: - Isso também já está corrigido, como sabe.
Agora, quero dizer-lhe o seguinte: em matéria de IRS, vamos fazer, no próximo Orçamento do Estado, a maior redução de sempre para todas as Marias e todos os Josés que existem em Portugal, desde que nos sejam dados simultaneamente os meios que permitam um combate à fraude e à evasão fiscais com novos instrumentos que consideramos necessários.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - E o valor?

O Orador: - Isso permitirá atingir todas as Marias e todos os Josés: os que compraram casa, os que alugam casa, os que trabalham e, infelizmente, não têm condições para comprar casa… Todos!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - E o valor da dedução?

O Orador: - Não lhe vou dar já resposta a essa pergunta; tê-la-á no próximo Orçamento do Estado. Mas há algo a que não ficaremos insensíveis: ao esforço de poupança das famílias portuguesas para adquirirem casa própria.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Ah! Essa já foi uma resposta melhor!

O Sr. Ministro do Estado e do Equipamento Social (Jorge Coelho): Isto está a correr bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, permita-me que o interpele, em primeiro lugar, sobre polícias municipais, de que V. Ex.ª falou, para lhe perguntar se a esse grande alarido corresponde aquilo que, julgo, está no terreno, que são polícias municipais em meia dúzia de municípios com 10 agentes em cada um. E, ainda por cima, segundo somos informados, não está a ser cumprida a lei que estipula o financiamento da ordem de 90% por parte do Estado. De resto, em matéria de polícias, cada vez que V. Ex.ª fala das resmas - permita-me essa expressão - de polícias que são admitidos, era bom que falasse também das resmas de polícias que, entretanto, são «devolvidos à procedência», que saem dos quadros da polícia.
Volto aos combustíveis, Sr. Primeiro-Ministro, para lhe recordar aquilo que V. Ex.ª referiu nesta Casa, muito recentemente - e não na Pré-História! -, em 18 de Maio de 2000, a esse propósito. Disse V. Ex.ª: «Respondo ao Deputado António Capucho reafirmando aquilo que disse, ou seja, que, no exercício orçamental deste ano, não haverá aumentos dos combustíveis e é minha convicção de que o aumento não será necessário nesta Legislatura». Foi um ligeiro engano de previsão!…

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Foi, foi!

O Orador: - Agora, o importante é que - e, como V. Ex.ª não respondeu ao Sr. Deputado Basílio Horta, insistiria - V. Ex.ª reconheça que o aumento na origem do preço dos combustíveis será sempre suportado pelas populações. Como, embora tenha biblioteca, não sei nada de Finanças, vou precisamente citar o tal economista de esquerda, que diz o seguinte: «A forma de pagamento é que difere. Se o Governo tivesse feito as actualizações devidas, o custo seria suportado pelos proprietários dos automóveis. Ao proceder como procedeu, numa tentativa falhada de iludir a realidade, o Governo transferiu aquele ónus para os pagadores de impostos». Ou seja, na prática, está a dizer àqueles menos favorecidos que não têm viatura que paguem a gasolina daqueles que têm automóvel.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem! Isso é que é verdade!

O Orador: - O Governo é incapaz de tomar decisões, pelo que olha para a Europa e diz: «Toda a Europa tem o passo trocado, nós é que temos o passo certo!»
Sr. Primeiro-Ministro, a pergunta que lhe faço é a seguinte: como já nos afirmou que, porventura, terá de aumentar o preço dos combustíveis a partir do próximo ano, diga-nos, nesta Casa, se vai fazê-lo antes ou depois das eleições presidenciais. Responda concretamente.
Permita-me agora que fale de uma questão que interessa também muito ao seu vizinho da esquerda, o Sr. Ministro Jorge Coelho, meu colega candidato a Deputado pelo círculo eleitoral de Setúbal, para lhe dizer o seguinte: os 120 milhões de contos que, até ao fim do ano, vão custar o agravamento do défice por culpa das gasolinas e ainda mais uma importante parcela do défice podiam ser anulados com encaixes da concessão dos telemóveis da terceira geração, que VV. Ex.as se propõem atribuir pela irrisória quantia de 80 milhões de contos.
Indo directo à questão, Sr. Primeiro-Ministro, porque entendemos que não valem 80 milhões de contos mas muito mais,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Valem 800!

O Orador: - … gostaria que me explicasse por que é que o Governo não aceitou a sugestão séria do PSD, no sentido de solicitar a entidades isentas uma avaliação credível do valor real das licenças, não alterando as condições do concurso, ou seja, mantendo aqueles condicionalismos de democratização, de espalhar os telemóveis por todo o País, etc.

O Sr. Presidente: - Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.

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VV. Ex.as estão a propor um Ferrari aos portugueses para daqui a não sei quantos anos, em vez de lhes oferecerem um utilitário imediatamente.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Capucho, vou responder-lhe telegraficamente.
Em primeiro lugar, quanto aos quadros da PSP e da GNR, tenho a dizer o seguinte: em 10 anos - 10 anos! -, os governos do PSD promoveram um aumento de 3172 agentes, ao passo que, em cinco anos, os governos do PS promoveram um aumento de 5266 agentes - correspondendo isto a um saldo entre entradas e saídas. Ou seja, em cinco anos, fizemos muito mais do que os senhores fizeram em 10 anos!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Porquê? Essa agora!

O Orador: - Esta é a diferença! E nós fizemo-lo dando cursos de formação a sério; os senhores sabe Deus como…
Mas continuemos… Em matéria de combustíveis, acho que os senhores ainda não perceberam uma coisa: diz-se que, se não subir o preço dos combustíveis, aumentam os impostos. Mas vamos lá ver: os preços dos combustíveis não são os preços de custo dos combustíveis, são os preços de custo dos combustíveis mais o ISP. Por isso, quando não sobe o preço dos combustíveis, baixam os impostos - é isso que os senhores têm de compreender, esta é que é a realidade! -, baixa o ISP.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Não, não! E o subsídio?!

O Orador: - E o preço que o público paga pelos combustíveis fica mais próximo do custo do combustível. Ou seja, quando se reduz o preço dos combustíveis, o que há é uma baixa fiscal do ISP - esta é esta a verdade, o resto é fantasia!

Protestos do PSD.

Quanto aos UMTS, Sr. Deputado, os governos do PSD fizeram as concessões dos telemóveis que actualmente existem levando «zero» - e não foi a «irrisória quantia de 80 milhões de contos», foi «zero»!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - E depois?!

O Sr. Ministro do Estado e do Equipamento Social: - É preciso ter vergonha!

O Orador: - Portanto, é preciso ter alguma…

O Sr. Ministro do Estado e do Equipamento Social: - Vergonha!

O Orador: - … - e não digo a palavra - e não vir acusar este Governo de, numa questão decisiva, ter optado por convidar a entidade que nós considerámos mais competente e que é internacionalmente reconhecida - é uma empresa americana, cujo nome lhe posso dizer depois - para fazer uma avaliação, confirmada pelo ICP, e ter feito não o que os senhores queriam, que era um leilão financeiro, mas, sim, fixado uma taxa com condições sociais. O que nos interessa é que os novos telemóveis, que permitem o acesso à Internet em banda larga e têm características fundamentais para revolucionar a nossa economia, não sejam um privilégio de alguns para o Estado ganhar mais dinheiro - é o Estado e as pessoas!
Tem isto a ver com o que, há pouco, referia o Sr. Deputado Durão Barroso: os senhores querem dinheiro para o Estado; nós queremos benefício para as pessoas.

Protestos do PSD.

Nós não vamos fazer um leilão, que levaria a exigências de rentabilidade, a altas tarifas, à cobertura das regiões onde há maior concentração de tráfego e a tarifas para a Internet incompatíveis com a sua democratização. Nós fixámos uma taxa e, depois, atribuiremos as licenças a quem oferecer melhores condições sociais às pessoas para a sua utilização, com tarifas mais baixas, maior cobertura do País e melhor acesso à Internet.
É isso que conta e é isso que evidencia a diferença entre as duas políticas.

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Primeiro-Ministro.

O Orador: - É que os senhores são pelo Estado e não pelas pessoas, quando toca à questão financeira.
Em matéria de preços dos combustíveis, o que posso dizer-lhe é que agiremos de acordo com a evolução dos mercados e não o faremos antes do fim do ano, mas também não o faremos tendo em conta as eleições presidenciais.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. António Capucho (PSD): - Não respondeu!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Agradecia que identificasse o objecto da interpelação, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de saber se seria possível a Mesa obter do Governo os dados agora anunciados pelo Sr. Primeiro-Ministro, mais concretamente o mapa, relativos aos agentes das forças de segurança, para serem distribuídos por toda a Câmara, em particular à bancada do PSD.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - O mapa dava jeito!

O Sr. Presidente: - A bancada do Governo ouviu a sua interpelação, pelo que espero que dê a resposta adequada.

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Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, apetecia-me começar por lhe perguntar se a multa aplicável a Barrancos já terá sido paga ou não,…

Risos do CDS-PP e do PSD.

… porque é algo que certamente terá alguma curiosidade para o País.
Sem começar por aí e sem querer entrar no rol de citações, quero fazer-lhe uma pergunta que considero de fundo e séria…

Protestos do PS.

Estão muito nervosos! Não lhes fizeram bem as férias…
Como dizia, sem querer entrar no rol de citações, quero remetê-lo, Sr. Primeiro-Ministro, para uma citação sua, não em Barrancos mas em Esposende. Em Esposende, há cerca de um mês, na rentrée, o Sr. Primeiro-Ministro disse: «Eu não sirvo a cabeça de camaradas meus numa bandeja». A declaração foi sua e para mim foi surpreendente, tendo eu a legitimidade de, várias vezes, aqui, ter pedido a demissão do seu terceiro Ministro da Administração Interna. Essa afirmação foi sua e ela é importante por uma razão simples: do que os portugueses não gostam é de políticos que dizem uma coisa e fazem outra, de políticos que fazem uma afirmação e, pouco tempo depois, fazem uma coisa diferente. Entre Esposende e Lisboa, entre Esposende e São Bento, o Sr. Primeiro-Ministro, «entre a espada e a parede», brandiu a espada e a cabeça dos seus colegas desapareceu. Só a bandeja terá ficado em Esposende…

Aplausos do CDS-PP.

A propósito da mudança das pessoas, também queremos saber é se as políticas vão ou não mudar, designadamente nessa matéria da segurança. E aí, recordando que os números da PSP representam, em relação a 1999, um aumento de 15 000 para 16 000 e que a GNR relata, em Julho e Agosto, de 1999 para 2000, um aumento de 27 000 para 29 000, quero fazer-lhe quatro perguntas concretas.
Primeira pergunta: sendo que, este ano, entram 500 formandos na Escola Superior de Polícia, quantos se reformam? Isto, para sabermos qual é o efectivo aumento.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Segunda pergunta: o que falta e vai ou não o Governo preencher o quadro da GNR, onde, ao que sabemos, faltam cerca de 1400 efectivos?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Terceira pergunta: aceita ou não, é sua intenção ou não, uma vez que quer abrir um novo ciclo, fazer a coordenação de toda a política de segurança num único ministério?
Quarta e última pergunta concreta: está ou não o Governo disposto, em relação aos subsídios de turno e de piquete, que estão na lei, mas não foram pagos, e uma vez que diz agora querer prestigiar as forças de segurança, está ou não o Governo disposto, repito, e vai ou não pagar esses mesmos subsídios de turno e de piquete?
Aguardo a sua palavra, porque, sem palavra e sem decisão, nunca haverá confiança e o ciclo continuará, mas em decrescendo, Sr. Primeiro-Ministro.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, serei muito rápido e irei ao essencial.
Em relação à PSP e à GNR, em 2000, há uma entrada de mais de 2000 efectivos e haverá uma saída ligeiramente inferior à da ordem de 1000, o que significa que há um acréscimo líquido de cerca de 1000, que é o que conta e é o mais importante.
Uma segunda questão, que me parece extremamente relevante, em relação àquelas que colocou, e ainda sobre a PSP e a GNR e a Polícia Judiciária, é esta: elas não vão ser incluídas no mesmo ministério. Está aprovada uma lei e estão criadas as estruturas de coordenação, indo os dois ministros fazer essa coordenação, como, aliás, acontece na generalidade dos países europeus, onde os dois modelos coexistem, como sabe - e não é, aliás, pelo facto de estarem no mesmo ministério que os problemas de coordenação não se colocam.
Finalmente, em relação ao início da sua intervenção, gostaria de dizer-lhe, Sr. Deputado, que não me citou completamente. Eu disse: «Não sirvo em bandejas de prata cabeças de colegas meus; faço, quando o entender, reorganizações globais do Governo». Foi o que fiz. E fi-lo em nome daquilo que me parece ser o interesse nacional e de acordo com os meus próprios critérios de avaliação. Quanto ao resto, tudo faremos para dar cumprimento àquilo que estiver disposto na lei. Quando a lei exige a regulamentação, essa regulamentação terá de ser feita com todo o cuidado, como é óbvio.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - E os subsídios?!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, chega de erros e equívocos! Todos ficámos muito satisfeitos com a atribuição a Portugal da realização do Euro 2004. Porém, mais de um ano volvido, a certeza de inevitáveis derrapagens é hoje mais que segura. Bem sei, Sr. Primeiro-Ministro, que o Ministro Sócrates, que ajudou a trazer para Portugal o Euro 2004, nada tem a ver com o Ministro Gomes, que, até há pouco, comandou a pasta. Nem o Dr. Gomes, que, até há pouco, tinha comandado a pasta, coincidia em todas as suas opiniões com o, também «remodelado», Dr. Vasco Lynce. Sabemos, ainda, que o Ministro Vara apenas agora chegou ao Ministério, mas sabemos também que esse Ministério está envolto num grande mistério.
O que aconteceu à tão propalada Comissão Interministerial? Estava previsto que o Estádio do Sporting

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de Braga custasse 6 milhões de contos, mas vai custar 11 milhões de contos;…

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Num mês!

O Orador: - … estava previsto que o Estádio José Alvalade custasse 11,2 milhões de contos, mas custará 16, 17 ou 18 milhões de contos; quanto ao Estádio da Luz, que estava previsto que custasse 5 milhões de contos, soube-se hoje, em reuniões com um membro do seu Governo, que ou custa 14 milhões de contos ou não faz parte de estádios do Euro 2004.
O Ministro Jorge Coelho, sempre preocupado com estas questões,…

Risos do CDS-PP.

… cedo se apressou a dizer que, além do preço inicialmente previsto, haveria já mais 11 milhões numa linha de crédito para acessibilidades!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - À cautela!

O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, ninguém sabe quanto vai custar o Euro 2004! Todos sabemos que não vai custar a quantia que estava projectada pelo Ministro José Sócrates! Todos sabemos que não vai custar o anunciado, em entrevista à RTP, pelo Ministro Fernando Gomes! Todos sabemos, até, que não irá custar o projectado com as pequenas correcções anunciadas, em sede de Comissão, pelo então Secretário de Estado do Deporto Vasco Lynce!
Sr. Primeiro-Ministro, quantas linhas de crédito irão ser abertas?
Sr. Primeiro-Ministro, haverá mais uma linha de crédito para parqueamento? Haverá uma outra para os 24 centros de estágio necessários?
Sr. Primeiro-Ministro, os clubes e as autarquias estão em condições de suportar o pagamento dos 75%?
Em suma, Sr. Primeiro-Ministro: diga-nos, com rigor, com o rigor que todos desejamos, quanto vai custar o Euro 2004, porque, sinceramente, os portugueses querem saber qual é o dinheiro dos contribuintes que irá ser investido nesta realização, porque não me parece que o Dr. Armando Vara seja suficiente para «saltar por cima» de tamanho problema!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, no fim das interpelações que me são dirigidas, gostaria de agradecer ao partido interpelante esta oportunidade que me deu para esclarecer tantos e tão variados aspectos da política do Governo.
Quero aproveitar para dizer ao Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan que a melhor maneira de proteger o interesse público em projectos desta natureza é fazer o que nós fizemos: garantir que o Estado paga 25% e que o dono da obra tem de pagar 75%,…

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Depende do preço!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sem limite?

O Orador: - … o que evitará, naturalmente, qualquer derrapagem incompatível com as possibilidades do dono da obra.
As orientações que o Ministro Armando Vara vai imprimir serão no sentido de garantir o máximo rigor em toda a avaliação de projectos.
Quanto ao mais, não há qualquer linha de crédito, há, sim, uma dotação que tem que ver com candidaturas, no quadro normal das candidaturas, em função de acessibilidades, que tanto podem ser válidas para isso como podem ser válidas … É que, como sabe, há acessibilidades em que se gasta dinheiro para as mais diversas coisas que têm que ver com o enriquecimento urbano do nosso país. O Sr. Deputado não me vai dizer que entende que não deve haver melhoria dessas mesmas acessibilidades.
Agora, há uma coisa que lhe quero dizer: tenho muito orgulho em que Portugal organize o Euro 2004…

O Sr Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Eu também!

O Orador: - … e que me preocupa o facto de haver pessoas que nunca falam das preocupações em valorizar o papel de Portugal e a única coisa que procuram é, uns, pôr em dúvida que sejamos capazes de o fazer, outros, antecipar, desde já, que vai haver, com isso, um descalabro financeiro.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Queremos saber quanto é que o descalabro financeiro custa, Sr. Primeiro-Ministro!

O Orador: - Esteja o Sr. Deputado tranquilo porque vamos trabalhar com o máximo rigor e a máxima determinação, mas com a consciência de que o impacto do Euro 2004 sobre a visibilidade externa da nossa sociedade será brutal. Basta ver o que aconteceu recentemente com o campeonato da Europa,…

O Sr. António Capucho (PSD): - Quanto custa?!

O Orador: - … basta ver o que acontece, neste momento, com os Jogos Olímpicos!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à fase do debate propriamente dito.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Num curto espaço de tempo e nas vésperas da apresentação e votação do Orçamento do Estado, a Assembleia da República é, de novo, convidada a censurar o Governo do Partido Socialista e do Sr. Eng. Guterres.
Como se poderia dizer, recorrendo a uma expressão popular, esta é matéria em que o PCP se sente «como peixe na água», porque, desde a apresentação do Programa de

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Governo, o PCP se tem apresentado, coerentemente, como um partido de oposição, de oposição de esquerda, à política do Governo do PS, sem nunca nos demitirmos, como partido responsável que somos, da apresentação de propostas alternativas.
E esta coerência é fácil de manter por uma razão fundamental: porque a nossa oposição, as nossas críticas e censuras ao Governo se dirigem ao fio condutor da sua política global e não a aspectos particulares dessa política ou às pessoas que por ela, conjunturalmente, dão a cara.

Aplausos do PCP.

Diversamente de outros partidos políticos, as razões da crítica e da censura ao Governo por parte do PCP sustentam-se e assentam nas orientações políticas, económicas e sociais de natureza essencialmente liberal, quando globalmente consideradas, e não apenas em medidas pontuais e avulsas.
Por isso que, para o PCP, face ao Governo e às suas políticas, a norma seja a da crítica e da censura e os momentos de convergência sejam a excepção, exactamente porque as medidas políticas do Governo de natureza progressista, com recorte de esquerda, são apenas a excepção que confirma a regra de uma política essencialmente de direita.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Assim sendo, são muitas as razões que nos assistem para censurar o Governo.
Hoje como ontem, censuramos o Governo, porque ao longo destes dez meses que medeiam desde a sua tomada de posse se mostrou sempre mais preocupado com a sua preservação no poder e com a criação de muitos e muitos «jobs for the boys and girls» do que com as razões dos portugueses e com a definição de um projecto claro e sustentado para o desenvolvimento económico e social do País.

O Sr. António Filipe (PCP): - Exacto!

O Orador: - Tal como, de forma inequívoca, criticamos o Governo pela sua postura de passiva aceitação de políticas e orientações da União Europeia que penalizam claramente o nosso País, de que é exemplo recente e actual a penalização que as instituições comunitárias pretendem impor aos produtores de leite nacionais, manifestando uma inaceitável política de obstaculização ao aumento da produtividade neste sector da actividade económica portuguesa.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Mais amplamente, condenamos, sem subterfúgios, a postura do Governo na União Europeia, que condena, a prazo, a viabilidade da agricultura, da pecuária, das pescas e de importantes sectores da indústria portuguesa e que, simultaneamente, alinha e dá força ao desenvolvimento de um projecto federalista europeu, limitador e eliminador de qualquer soberania nacional.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Assim como censuramos o Governo do Partido Socialista por prosseguir uma política fundamentalista de privatização de empresas e serviços públicos, alienando importantes instrumentos de defesa dos interesses do povo português nas esferas económica e social, subordinando serviços que sempre deveriam ter a natureza de públicos à lógica do lucro, eliminando milhares de postos de trabalho e lesando direitos dos trabalhadores e dos consumidores, enriquecendo ilicitamente grupos económicos à custa do património público e entregando ao capital estrangeiro a propriedade e a orientação estratégica de sectores fulcrais para a economia portuguesa, como de forma paradigmática o atestam a entrega do sector energético não eléctrico à Eni e o desenvolvimento do processo de privatização da EDP, da Portugal Telecom ou da Cimpor.
Responsabilizamos o Governo por não ter uma política económica consistente com os interesses da economia portuguesa, do que vem resultando a desaceleração do crescimento económico, a persistência de uma estrutura produtiva frágil, um grave aumento dos défices externos e a perda de quotas de mercado da produção nacional, tanto no mercado externo como no interno.
Em particular, criticamos o Governo pela falência da sua política agrícola, bem espelhada na situação das quotas leiteiras resultante da inépcia negocial do Governo no âmbito da Agenda 2000, na visível e rotunda falha da política de prevenção de incêndios florestais e nas ameaças que hoje pesam sobre os apoios às raças autóctones.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Acusamos o Governo pelo aumento dos graus de insegurança e de intranquilidade das populações, resultado directo da inépcia da sua política de segurança.
Diversamente do que os partidos de direita pretendem, a resolução dos problemas de insegurança não passa por medidas de endurecimento irracional de penas, passa, isso sim, por uma política de policiamento de proximidade, pela libertação dos agentes de segurança de tarefas meramente burocráticas e pela adopção de medidas de motivação dos agentes policiais, incluindo, necessariamente, o reconhecimento dos seus direitos sócio-profissionais. Tudo coisas que o Governo prometeu e que continua a não cumprir.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Criticamos vivamente o Governo por uma política de saúde crescentemente subordinada aos grandes interesses económicos do sector, pela ausência de medidas de reorganização, de modernização e de humanização do Serviço Nacional de Saúde, pela capitulação do Governo em matéria da política do medicamento, quer no que respeita aos genéricos quer no que concerne à comparticipação dos novos medicamentos. Assim como condenamos o Governo pela abertura encapotada à privatização do Serviço Nacional de Saúde que está em curso, a pretexto da recuperação de listas de espera, em violação da lei aqui aprovada, como no âmbito de modelos de gestão dos serviços públicos de saúde.
E, igualmente, condenamos o Governo pela política educativa, com o subfinanciamento, a todos os níveis, do

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sistema, com milhares de professores que percorrem o País à procura de um qualquer horário que os livre do desemprego, ou com o cada vez maior afastamento do princípio da gratuitidade da educação, mesmo na escolaridade obrigatória.

Aplausos do PCP.

O Orador: - Acusamos o Governo pela ausência de uma política de igualdade entre mulheres e homens em todas as esferas da sociedade e de combate às discriminações sexistas a que as mulheres continuam sujeitas no mundo do trabalho e na sociedade em geral.
E, fundamentalmente, condenamos o Governo pela ausência de uma política assumida de combate eficaz à inaceitável precarização, insegurança e perda de direitos que hoje se abate sobre o mundo do trabalho e, com especial brutalidade, sobre os trabalhadores mais jovens.
Condenamo-lo ainda pela sua política de rendimentos conduzida sempre contra os trabalhadores, ora através da fraude da subestimação das taxas de inflação previstas, ora pretextando as dificuldades económicas do País, mas sempre visando o favorecimento dos lucros e dos grandes interesses económicos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: São, pois, múltiplas e fundamentadas as razões que justificam a permanente censura do PCP às políticas governamentais, ao Governo do PS, e não nos deixamos iludir pelas promessas implícitas no «novo ciclo político» anunciado pelo Primeiro-Ministro, nem nos deixamos levar por remodelações que visam mudar algumas caras para que as políticas se mantenham inalteradas.
Preocupa-nos mais, mas muito mais, a desestabilização que a política do Governo provoca nas condições de vida e nos orçamentos dos trabalhadores e das famílias portuguesas do que a estabilidade governativa que aflige o Sr. Primeiro-Ministro. Sobre isso que ninguém tenha dúvidas, e o Governo certamente as não terá.
Mas a votação de uma moção de censura não pode nem deve sustentar-se, exclusivamente, nas razões de crítica e de condenação da acção governativa.
Essa votação exige, igualmente, a consideração de outros factores, desde logo o da oportunidade.
O PSD entendeu ser este o momento oportuno. O PCP não comunga da mesma ideia porque, por um lado, dois meses passaram desde a moção do PP, por outro lado, e basicamente, estamos nas vésperas da votação do Orçamento do Estado, momento esse que será, de facto, o momento da verdade do posicionamento dos partidos políticos face às políticas globais do Governo do Partido Socialista.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Mas também as motivações da moção de censura têm de ser pesadas na decisão sobre o voto. É público que o PSD fez depender a apresentação ou a não apresentação da moção de censura de três exigências dirigidas ao Primeiro-Ministro. Duas delas foram por este satisfeitas, com a atrapalhada remodelação a que procedeu na passada semana, sem que nada de essencial mude em matéria de orientações da política do Governo, o que, aliás, também não era nem é algo que pareça preocupar o PSD.
Resta, pois, como razão de fundo para a apresentação desta moção de censura, a terceira exigência, aquela que está espalhada em grandes outdoors de cor negra por todo o País, a exigência de um referendo sobre a descriminalização do consumo de drogas. E aí, é total a nossa oposição à posição do PSD.
Em terceiro lugar, é evidente que a convergência na crítica e no diagnóstico nem sempre corresponde a uma convergência na prescrição da solução. Também aí são profundas e conhecidas as nossas divergências com o PSD: enquanto o PSD quer mais do mesmo, para o PCP a solução dos problemas reside numa profunda mudança de política, na substituição de uma política de direita por uma política de esquerda, de progresso e de justiça sociais.

Aplausos do PCP.

Por isso, a nossa posição de voto em relação a esta moção de censura será a abstenção e ficamos a aguardar o Orçamento do Estado para 2001.

Aplausos do PCP, de pé.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Octávio Teixeira, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, é sempre com satisfação que o ouvimos, dada a elevada consideração que temos por si e o seu elevado nível de intervenção política. Mas este seu discurso podia ser feito em qualquer circunstância, é o discurso recorrente do Partido Comunista.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - O Governo é o mesmo!

O Orador: - O Partido Comunista elegeu como inimigo principal o PS! O Partido Comunista fecha-se sistematicamente a qualquer diálogo com o PS! Depois, o Partido Comunista critica o PS de se aliar à direita, na mesma altura em que o Sr. Deputado Paulo Portas faz gestos perfeitamente encenados reclamando um diálogo preferencial e exclusivo.
Portanto, Sr. Deputado, se alguma coisa tem de mudar nas políticas socialistas - e muito pouco terá de mudar, mas reconheço que alguma coisa tem de mudar -, há muita coisa que vai ter de mudar em VV. Ex.as e no vosso comportamento em relação ao Partido Socialista. Aliás, o Sr. Deputado foi um exemplo disso, porque consumiu boa parte da sua intervenção a dizer que a posição de censura ao Governo é a vossa posição sistemática. Quer dizer que faça este Governo o que fizer, faça o PS o que fizer, VV. Ex.as são sempre contra! Portanto, não há grande coisa a dialogar!
Mas digo-lhe que, com essa posição, pelo menos há uma coisa importante para a estabilidade da democracia e do sistema político português: é que VV. Ex.as são previsíveis, ao contrário do PSD, que é completamente imprevisível.
Há, no entanto, duas questões que o Sr. Deputado colocou na sua intervenção que vou comentar muito rapidamente.

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A primeira tem a ver com as quotas leiteiras. Não quero antecipar um debate que vamos ter aqui brevemente, mas V. Ex.ª critica o Governo pela questão das quotas leiteiras?! O Governo, que se desdobra em iniciativas?!

Protestos do PCP.

O Governo, que até é criticado pela Comissão Europeia por resolver o problema dos agricultores?! V. Ex.ª vem aqui criticar o Governo em termos de quotas leiteiras?!
Isso é, manifestamente, virar o ónus da prova! V. Ex.ª devia estar a apoiar o Governo! V. Ex.ª devia estar a elogiar, a aplaudir o Ministro da Agricultura por estar a correr alguns riscos! É espantoso que isto se possa passar, com toda a franqueza!
A segunda questão tem a ver com a esquerda. Sr. Deputado, governar à esquerda não é - não é exclusivamente isso! - governar a favor dos mais desfavorecidos?!
O Sr. Deputado leu o relatório do Banco de Portugal? Viu, por exemplo, qual foi a evolução do rendimento disponível das famílias nos últimos anos? Esteve sempre crescimento real, 4 vírgula tal por cento!
Por exemplo, o Sr. Deputado não notou, no mesmo relatório, que a manutenção do ainda elevado nível de consumo resulta do optimismo que os portugueses têm na evolução da situação económica?! Então, pensa que isso não é governar para os trabalhadores, não é governar para a esquerda?!
Apesar de tudo, trazendo aqui o discurso do costume, penso que o Sr. Deputado se pôs «fora da fotografia».

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel dos Santos, começo pelo fim do seu pedido de esclarecimento, para estar totalmente de acordo consigo.
Coloco-me sempre «fora das fotografias», porque não estou aqui para isso. V. Ex.ª levantou-se só para ter a «fotografia»?! Não acredito que tenha sido só para isso. Sinceramente, faço-lhe a justiça de pensar que não tenha sido apenas para isso.
Mas, Sr. Deputado Manuel dos Santos, vamos a outras questões, mais importantes e interessantes.
As nossas críticas são recorrentes, porque se dirigem à política do Governo. O problema não é o da nossa crítica ser recorrente, as políticas do Governo é que são recorrentes! Mudam as caras, fazem remodelações, semi-remodelações, e as políticas mantêm-se! A recorrência vem daí! Esse é que é o grande problema! Esse é o problema central de todas as questões que o Sr. Deputado suscita sobre problemas de esquerda ou direita!
Aliás, já hoje aqui foram levantadas algumas questões sobre o posicionamento saltitante do Governo do Partido Socialista, deste e do anterior, que, de facto, não tem um rumo, não quer ter um rumo! Ou melhor, tem um rumo, mas fica atrapalhado quando, nesse rumo que escolheu, não tem o apoio para algumas questões!
Como sabe, é público e notório, a questão central para qualquer governo é sempre o Orçamento de Estado.
Desde o início do primeiro governo do Sr. Eng.º Guterres, o rumo escolhido foi o daquela bancada, foi o rumo do CDS-PP, primeiro com Manuel Monteiro, agora com Paulo Portas! E só quando o Sr. Primeiro-Ministro recebe a nega daquele lado é que diz «alto lá, salvem-nos vocês, os da esquerda, a ir pela esquerda»! Não pode ser, a não ser que altere as políticas que aqueles senhores apoiavam - e tinham razão para apoiar, pois eram políticas convergentes com o que eles pensavam e queriam!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Respondendo à sua terceira questão, Sr. Deputado Manuel dos Santos, eu não disse que somos sistematicamente contra. Aliás, isso é bastante diferente daquilo que referi! A norma é estarmos contra o Governo e as suas políticas, porque são políticas que não servem e não se enquadram numa orientação de esquerda.
Eu não disse que somos sistematicamente contra! Aliás, o Governo e VV. Ex.as têm provas provadas de que não há uma oposição sistemática, pois algumas leis e medidas têm sido aprovadas com o PCP. Se reparar bem, essas são as leis e as medidas positivas.
Mais: o Sr. Deputado Manuel dos Santos, julgo que no último debate ocorrido na Assembleia, lembrou as alterações ao IRS aprovadas no Orçamento de 1999. Lá está: uma vez que o Governo se virou para a esquerda, conseguiu fazer aprovar medidas positivas. E na Lei de Bases da Segurança Social, que é preciso levar à prática concretizando os aumentos das pensões de reforma, também o conseguiu.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que termine, pois já esgotou o tempo de que dispunha.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Para concluir, Sr. Deputado Manuel dos Santos, quero dizer-lhe que está enganado quanto às quotas leiteiras! Pergunte ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros que ele explicar-lhe-á tudo sobre a responsabilidade do Governo, designadamente do Ministro da Agricultura.
Como última nota, quero referir-me à distribuição do rendimento nacional. Sr. Deputado, repare que, em termos de distribuição de rendimento nacional, a parte dos salários tem sido «comida». Isto é, tem aumentado, mas tem aumentado ainda mais a parte dos lucros.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A moção de censura do PSD apresentada ao Governo constitucional, neste Parlamento, denota o indisfarçável desejo de competição entre partidos e líderes partidários na direita. Entre os arrufos e alguma experimentação proveta a AD desponta. Seja o que for a AD, porventura mais difícil de decifrar do que o genoma

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humano, ela aflora aqui em dois tempos de antena, os das moções de censura.
O PSD tem má consciência, pois foi co-responsável, com o PS, pelo global da política económico-social do Governo. Basicamente, a nova AD em projecção é titular de cinco anos de colaboração com os governos do PS, não apenas na política económico-social, mas também nas opções europeias, de política externa, de defesa e até nos novos objectivos da NATO.
O PSD tem má consciência. Fala dos sinais permissivos da descriminalização das drogas, mas admite, aqui ou além, no futuro, medidas descriminalizadoras. O Eng.º Ferreira do Amaral vai até bem mais longe com programas de substituição de estupefacientes e uma política que não se coaduna com a que o líder do PSD apresenta em matéria de combate à toxicodependência. O texto da moção fala envergonhadamente nesta matéria, porque é notória a incapacidade do PSD em articular uma política alternativa neste campo.
A apresentação desta moção de censura é até uma atitude de ingratidão, agora que, num gesto de boa vontade - e tão sofrido ele foi - o Eng.º Guterres remodelou o Governo a régua e esquadro, como o PSD pretendia.
A esquerda - dizêmo-lo claramente - tem razões para censurar o Governo pela ausência de uma reforma fiscal que introduza equidade e pelo agravamento da injustiça social. Se se fizer o zapping da educação à saúde, ao ambiente, todos os monitores mostram índices negativos.
Vemos com preocupação insuficiências na segurança social, atrasos para conseguir a qualidade no emprego e nos serviços públicos.
A esquerda tem razão para criticar o balanço lamentável das privatizações, da impreparação do País para o euro, da derrapagem das contas exteriores.
Amanhã mesmo, o Bloco de Esquerda suscita uma interpelação ao Governo sobre a questão fiscal, a justiça nos impostos, porque, como se sabe, quem mais ganha ou não paga ou paga menos.
O Portugal da vigarice fiscal não merece uma linha na moção de censura do PSD. É o realismo do bloco central que tem unido, infelizmente, o PS e o PSD.
Os reformados e pensionistas, os trabalhadores da função pública e de outros sectores teriam todo o direito a aumentos intercalares porque, se a inflação é cega, convenhamos, o Governo «trocou os óculos».
Até vozes do PSD já disseram que, possivelmente, a verdadeira moção de censura será a discussão e votação do Orçamento de Estado. Já sabemos que o Sr. Primeiro-Ministro, com aquele toque guerreiro que passou a caracterizá-lo, tem andado entre a espada e a parede. Parece que ainda não encontrou o alfageme das espadas a haver. Mas não terá ele uma secreta esperança de que o PSD abra uma janela na parede ?
É inquestionável que o Sr. Primeiro-Ministro pôs na gaveta o discurso do diálogo, sendo, hoje, voz de chantagem. O estilo pode não ser elegante e, talvez, tocado por algum galicismo, mas, no fundo e na substância, é essa a palavra que usamos no vocabulário português.
Hoje também são dirigidas ameaças à população, porque uma crise política pode estar no bojo e em surgimento.
Repetimos que o Sr. Primeiro-Ministro tem de encontrar no arco dos que defendem por proximidade as suas políticas a necessária co-responsabilidade. Essa é a sua estabilidade, não a da esquerda das preocupações sociais.
Nesta medida, o Bloco de Esquerda quer deixar claro que as suas razões de crítica ao Governo não são as da direita. Não tendo qualquer eficácia prática uma moção de censura no actual quadro parlamentar, ela reduz-se ao debate político e ao esclarecimento de posições que os cidadãos e as cidadãs possam verificar.
Também nesta medida, e porque o PSD nada acrescentou à moção de censura do CDS-PP, trazendo, afinal, o segundo acto do mesmo auto, a votação do Bloco de Esquerda, em coerência, é de total reprovação. Afinal, afinal, a moção de censura do PSD traz também uma desorçamentação oculta. Trouxesse aqui o Governo uma moção de confiança pela política que tem seguido que o voto seria idêntico, ou seja, claramente um voto contra.
Vamos pela seriedade. Não nos norteia o jogo parlamentar mas, sim, o exercício da cidadania e a clareza das escolhas.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, decidi falar a título de intervenção para, de alguma forma, poder esclarecer e pôr alguma ordem em muitas das afirmações proferidas nesta Sala, nomeadamente pelo Sr. Primeiro-Ministro.
Começo por me desgostar pela forma perversa como o Sr. Primeiro-Ministro faz comparações. A forma como o Sr. Primeiro-Ministro faz comparações - peço desculpa por dizer-lho - retira-lhe qualquer espécie de credibilidade, o que é um aspecto sério para um Primeiro-Ministro que pretende afirmar-se perante o País.
Vou explicar porquê: o Sr. Primeiro-Ministro, quando vislumbra qualquer aspecto de crise, tem a tendência de fazer comparações com o PSD. Percebo que uma tentativa de atacar o PSD seja a de utilizar aspectos de governos anteriores, mas a comparação é sempre perversa quando não se mantém nos mesmos pressupostos. Portanto, se não se mantém nos mesmos pressupostos, não é correcto fazer-se essa comparação.
O Sr. Primeiro-Ministro falou de uma crise e quer compará-la com a potencial crise que possa existir neste momento. Esquece-se, no entanto, de um ponto absolutamente essencial, pelos vistos um pormenor sem importância para o Sr. Primeiro-Ministro: neste momento estamos no euro e, na altura, não estávamos. Ou seja, nessa altura, as condicionantes essenciais para que a nossa economia pudesse sobreviver no espaço europeu não têm rigorosamente nada a ver com a situação actual porque, entretanto, e muito bem, entrámos no euro. Ora, isso tem consequências inevitáveis para a condução da política económica, algo para que sempre avisámos e dissemos no Parlamento.
O senhor faz comparações como se nada tivesse acontecido, considera que tanto faz estar no euro como não estar, considera que determinados dados existentes há alguns anos são rigorosamente os mesmos agora. Não são! Não pode fazer a comparação das duas realidades!

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Portanto, não pode fazer a comparação das duas realidades, o que seria sempre um ponto essencial.
O outro ponto essencial é que, naquela altura, a Europa estava em crise e, neste momento, não está. Como o Sr. Primeiro-Ministro bem sabe, nos últimos anos, é a primeira vez que Portugal não cresce mais do que a média europeia num momento em que a Europa cresce a bom ritmo. É a primeira vez que tal sucede! Este é um ponto grave, sobre o qual o Sr. Primeiro-Ministro deveria dar qualquer espécie de tranquilidade ao País ou, no mínimo, apontar qual o caminho a seguir.
O senhor fala tanto nas alternativas que o PSD deveria apresentar mas, sendo Governo, não diz o que vai fazer amanhã. Nós temos de dizer o que faremos daqui a um ano ou daqui a dois meses, mas o senhor não diz o que vai fazer amanhã! Nessa circunstância, evidentemente, deixa-nos uma enorme intranquilidade.
Para além disto, o Sr. Primeiro-Ministro dá a sensação que está contente com a inflação, pois considera-a uma coisa menor, invocando a inflação que vigorava no tempo em que o PSD era governo. Sr. Primeiro-Ministro, no tempo em que o PSD era governo chegou a vigorar uma inflação de 20%, e até superior, mas era uma época completamente diferente!
O problema da inflação, neste momento, tem a ver com o facto de ela ter de ser comparável com a de outros países, mas o senhor nem as pode comparar porque não há mais nenhum país que tenha a política de combustíveis que nós temos. Só introduzindo uma política de combustíveis à semelhança dos outros países é que poderá comparar a nossa inflação, por exemplo, com a de Espanha. Os números absolutos por si só nada dizem! Portanto, Sr. Primeiro-Ministro, não torne a comparar o valor da nossa inflação com o de Espanha porque não são comparáveis. Não são!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Por outro lado, Sr. Primeiro-Ministro, parece que estamos com enorme orgulho do nosso défice externo! Isto é, parece que me devo sentir verdadeiramente orgulhosa por, do grupo dos países do euro, o nosso ser o que tem o maior desequilíbrio externo! Parece que estarmos em primeiro lugar é motivo de orgulho!
Ó Sr. Primeiro-Ministro, este é um ponto altamente preocupante! O Sr. Primeiro-Ministro disse uma palavra a este Parlamento sobre o que pensa fazer quanto a este aspecto? Disse como vai inverter as tendências e as expectativas das pessoas e dos agentes económicos no sentido de alterar esta situação?
O Sr. Primeiro-Ministro diz que não estamos em crise, mas o Governador do Banco de Portugal disse, na Comissão de Economia, Finanças e Plano, aquilo que cada um de nós mais ou menos sabia ou pressentia: se não houver qualquer tipo de alteração entraremos numa crise seriíssima! Ora, isto significa que essa alteração tem de existir! O Sr. Primeiro-Ministro veio ao Parlamento, mas não disse uma palavra sobre a alteração da política económica que vai ter lugar.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - Que alteração é essa?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não há!

A Oradora: - Por que está o Sr. Primeiro-Ministro tão interessado em saber o que pensamos? Para sermos seus assessores económicos? Não, Sr. Primeiro-Ministro! Com certeza que temos as nossas propostas, mas gostaríamos, antes de mais, de ouvir as suas, porque são aquelas que vão gerir as expectativas dos agentes económicos.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Exactamente!

A Oradora: - Este é um ponto essencial em política económica, mas, pelos vistos, o senhor continua a considerar que está tudo bem. Aliás, considera que está tudo tão bem que o que faz para se desculpar é mostrar o que acontecia há uns anos numa situação que não é comparável, Sr. Primeiro-Ministro.
Como não é comparável, tudo o que façamos nessa circunstância leva a que o povo português, que viveu muito bem nessa época, pois o período do cavaquismo é o mais brilhante da história democrática deste país,…

Vozes do PSD: - Muito bem!

Risos do PS.

A Oradora: - … considere que a situação que o senhor está a proporcionar é ainda melhor do que essa. Sr. Primeiro-Ministro, como se sabe que não é assim, a sua credibilidade passa por fazer um acto de contrição e dizer:«Isto está mal, por isso vamos enveredar por outra via».
Portanto, Sr. Primeiro-Ministro, estamos verdadeiramente ao contrário do resto do mundo! Será que é o mundo que está errado e nós certos? Penso que não, Sr. Primeiro-Ministro. E este é um facto sobre o qual não há dúvida alguma, pois qualquer analista económico diz o mesmo. Assim sendo, é grave que o senhor teime em esconder este aspecto.
Da mesma forma, o Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Ministro do Equipamento Social têm falado de uma forma muito superficial, do meu ponto de vista, sobre a questão dos operadores para a terceira geração de comunicações móveis. Este é um assunto sério, Sr. Primeiro-Ministro!

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Exactamente!

A Oradora: - Não é um assunto menor pensarmos se, neste momento, entram para o Estado cerca de 80 milhões de contos ou se entrarão 800 milhões de contos! Não é um assunto menor, é um assunto que tem e deve ser discutido!
Não sei qual é o valor, mas se pressuponho que pode ser muito diferente, não percebo porque não aceita o Governo uma avaliação nesta matéria. O critério que os senhores estão a seguir e o argumento que utilizam para demonstrar a validade e a bondade de semelhante opção é rigorosamente o argumento inverso ao que os senhores utilizam para fazer as estradas por via das SCUT! É rigorosamente o argumento inverso!

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente! Faz-se agora e paga-se depois!

A Oradora: - E como é rigorosamente o argumento inverso, gostaria bem de saber se este é um problema de oportunidade ou de política. É que, se é um problema de política, o senhor não podia ter «feito» estes 80 milhões de contos; se é um problema de oportunidade, isso, então, já não discuto, o povo que o julgue.
Além do mais, como sabe, os outros governos socialistas têm tido uma posição diversa desta, portanto, mais uma vez, provavelmente, estamos numa situação em que todos os outros estão errados e nós é que estamos certos.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Há o caso escandinavo!

A Oradora: - Sr. Primeiro-Ministro, gostaria que este tipo de discussão fosse fundamentada, com regras e com a verdadeira noção do que pode acontecer ao País. Nesse sentido, devo dizer-lhe que pensava que o senhor dissesse alguma coisa sobre a forma como vai organizar o Orçamento do Estado, especialmente quando, por via do seu partido, não deixou passar a lei de enquadramento orçamental. Ora, isso faz-nos pressupor que aquilo que o senhor, mais uma vez, vem apresentar ao País, e está preparado para fazer, é uma mistificação daquilo que é o documento do Orçamento do Estado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Ó Sr. Primeiro-Ministro, pode mistificar à vontade, porque a mistificação que, neste momento, existe em todas as contas nacionais na Europa tem como consequência óbvia o valor do euro em relação ao dólar!

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Não vale a pena estar-se a encobrir por um lado porque está-se a destapar pelo outro; não vale a pena continuar a lamentar os prejuízos que as populações estão a ter devido a este tipo de desvalorização porque a sua origem está exclusivamente no facto de as pessoas começarem a não acreditar no euro. E não acreditam no euro porque as políticas económicas que estão a ser seguidas são, em grande parte, tão fictícias quanto a nossa.
Gostaria, Sr. Primeiro-Ministro, que utilizasse alguns dos seus conhecimentos e que na sua internacionalização, de que tanto gosta de falar, de alguma forma defendesse o que é bom para a Europa, para que não seja fatal para Portugal.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, o seu líder partidário afirmou ontem, numa entrevista, que as moções de censura eram momentos para discutir a real situação do País, presumo que também a situação económica. Ora, trata-se de uma interpretação pessoal. Não é bem assim, porque isso acontece sobretudo nos debates sobre o estado da nação, mas concedo que possa discutir-se a real situação do País.
A visão que VV. Ex.as aqui trouxeram, nomeadamente a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, é a de que vivemos em plena catástrofe económica. É essa a vossa percepção da situação do País!
Foi amplamente justificado na intervenção do Sr. Primeiro-Ministro, e tem sido denunciado por nós em várias intervenções ao longo do tempo, que essa visão não corresponde minimamente à verdade: não corresponde às estatísticas nem, sobretudo, ao espírito e à avaliação que os portugueses fazem da situação económica do País.
Não tenho, infelizmente, nenhum livrinho para oferecer-lhe... Aliás, se pudesse fazê-lo, oferecer-lhe-ia um livro para o futuro, porque o que nos ofereceram é um livro do passado, que o povo português já rejeitou e que, portanto, não tem interesse nenhum. A não ser que VV. Ex.as queiram reproduzir esse livro nas próximas eleições, o que seria «o já visto»!…
Mas, não tendo nada para oferecer-lhe, disponho de alguns dados recentes sobre a evolução da situação económica, que colocam claramente em crise as suas afirmações. Por exemplo, neste momento - e a Sr.ª Deputada não o desmentirá -, as exportações estão a crescer mais do que as importações; o crescimento do PIB para 2000 e 2001 vai ter por base as exportações e o investimento, o que, manifestamente, é um modelo de crescimento do PIB bastante mais saudável ou salutar, como todos nós sabemos, nomeadamente os economistas, em relação ao futuro; vamos, seguramente, ter um défice orçamental abaixo de 1,5%, cumprindo o pacto de estabilidade; pela primeira vez, desde há muitos anos a esta parte, não haverá, provavelmente, um orçamento rectificativo; o investimento estrangeiro tem crescido, sobretudo em áreas de valor e qualificação e não exactamente como sucedia no vosso tempo, em que isso acontecia em áreas comerciais e em áreas em que, manifestamente, não era necessária a mais-valia tecnológica estrangeira; a segurança social acomoda o excedente de 600 milhões de contos, o que permite, finalmente, dizer que temos um espaço de visão, de manutenção e de força desse sistema absolutamente fundamental para os mais carenciados, sem que, obviamente, estejam resolvidos todos os problemas.
Portanto, não vejo, Sr.ª Deputada, onde está o cenário de catástrofe que VV. Ex.as aqui nos trazem!…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Quem não quer não vê!

O Orador: - Mas gostaria, e foi por isso que estive muito atento à sua intervenção, que a senhora respondesse a quatro questões - a uma delas, aliás, respondeu lateralmente. Tinha-as aqui, preparadas, e estava à espera da sua intervenção.
Primeira questão, a que, de algum modo, respondeu: parece que, finalmente, a senhora desautorizou as afirmações feitas há uns tempos atrás pelo porta-voz do seu partido para a economia, o qual queria a saída do escudo do euro.

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O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Presidente, eu queria fazer as três perguntas…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, deveria ter tomado isso em conta.

O Orador: - Vou tentar ser rápido, Sr. Presidente.
Segunda pergunta: Sr.ª Deputada, qual seria o preço dos combustíveis, neste momento, se o PSD governasse o País? Não respondeu ao Sr. Primeiro-Ministro, mas deve responder.
Faço-lhe só mais uma pergunta, para mim muito importante, à qual esta não hesite responder...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradeço que seja conciso.

O Orador: - A senhora afirmou que governar em duodécimos era uma situação perfeitamente normal?! A senhora desconhece que governar em duodécimos é impedir o aumento da função pública?!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É mentira!

O Orador: - O senhora desconhece que governar em duodécimos é impedir o aumento das pensões sociais?!

O Sr. Presidente: - Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Gostava muito que me respondesse, Sr.ª Deputada.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD) - Sr. Presidente, lamento que o tempo não me permita responder a todas as perguntas, mas vou, telegraficamente, responder…

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Responda à última, sobretudo!

A Oradora: - Se quer, posso começar por aí, mas vou começar um pouco atrás.
Sr. Deputado, contra a honestidade de afirmações, não aceito a mistificação de afirmações!

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - E o senhor começou logo por falar em aspectos que está a mistificar!
Eu não falo em catástrofe económica, falo, sim, que, se nada se fizer, entraremos em catástrofe económica!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Claro!

A Oradora: - E estou a tentar não «pôr trancas à porta» depois da «casa roubada».

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Se os senhores aceitam que se deve «pôr trancas na porta» antes da «casa roubada», a verdade vai ser efectivamente essa. Portanto, não ponham as «trancas na porta» e verão como é…!
Depois, o Sr. Deputado tentou falar do orçamento rectificativo, dizendo que a sua não apresentação é um êxito. Ora, eu digo que é uma birra. E digo-o pelo seguinte: era preciso que nós não soubéssemos, pelo dia-a-dia, que todas as instituições estão sem dinheiro. Portanto, quando se fazem dívidas ou se paga ou se adiam os pagamentos para o próximo ano.
Não é preciso orçamento rectificativo para nada?!.... O senhor tem toda a razão, e o Sr. Ministro das Finanças também..., só que as dívidas são mais que muitas. Já não há dinheiro para pagar as ajudas de custo, os funcionários estão a pagá-las do seu próprio bolso. E isto passa-se no dia-a-dia, independentemente do que se passa na saúde e noutros sectores.
Todos sabemos isso, e o Sr. Deputado Manuel dos Santos também sabe! E, como também sabe, deixe que o Sr. Ministro Pina Moura se defenda sozinho! Fique o senhor calado e não fale do orçamento rectificativo, porque isso não passa de uma birra, com custos enormes para o País, pois estão a adiar para o próximo ano as dívidas deste ano.

Aplausos do PSD.

Relativamente ao que eu fazia com os combustíveis,…

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Com o preço dos combustíveis.

A Oradora: - … digo-lhe o seguinte: quando um médico está perante um doente e lhe vai dizendo «o senhor não faça isto, o senhor não faça aquilo» e o doente vai-se equilibrando, essa é uma situação semelhante ao tipo de governação do PSD; o tipo de governação do PS é dizer-lhe «vá, continue, viva à vontade, não tenha problemas», e quando o doente chega às «minhas mãos» vem em estado de coma. E, como vem em estado de coma, vou ter de fazer-lhe um tratamento violento.
Portanto, se o senhor me pergunta o que é que vai acontecer, digo-lhe que o PSD vai ter de fazer um tratamento violento neste país, de verdade, para endireitar a vossa herança. Não tenha dúvidas acerca disso!
Quanto aos duodécimos, Sr. Deputado, colocam-se dois problemas, um técnico e outro político. Sei como é que ele se resolve do ponto de vista técnico, mas como não sou assessora económica do Ministro das Finanças vou transmitir esses meus conhecimentos técnicos aos sindicatos. O grande problema político é o de, exactamente, não haver orçamento rectificativo. Portanto, o Sr. Ministro das Finanças está aflito sem saber como é que há-de pagar a…

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, tem mesmo de terminar.

A Oradora: - Terminei, Sr. Presidente.

Aplausos do PSD.

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Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A Assembleia da República discute e vai votar hoje, a escassas semanas da apresentação do Orçamento do Estado, uma moção de censura do PSD.
A moção que se tinha tornado previsível desde a chamada rentrée política, o ritual a que os portugueses passaram a assistir para ver os partidos tradicionais assinalarem o convencionado fim de férias, que, aliás, a maioria dos portugueses ainda não goza.
A moção, que é pública desde a divulgação dos seus termos, que, aliás, o PSD deu a conhecer aos partidos das diferentes oposições.
A moção, que se justifica, segundo os seus proponentes, «pela grave situação, tanto do ponto de vista económico quanto no plano da segurança e da autoridade do Estado».
Justificação essa que tinha levado o PSD a exigir a demissão do Ministro da Administração Interna e a separação dos Ministérios da Economia e das Finanças.
Iniciativa política esta com a qual «Os Verdes», pelos seus contornos, não se identificam, da qual se distanciam e em relação à qual se vão abster.
A abstenção, desde logo, pela inoportunidade do momento escolhido pelo PSD - assim o entendemos -, a duas semanas da discussão do Orçamento do Estado, momento privilegiado para avaliar políticas e exprimir concordâncias ou discordâncias.
Inoportunidade, que acaba por fazer da moção um - mais um! - exercício, nesta Câmara, de marketing político, afinal tão igual ao estilo do Partido Socialista, que nessa matéria criticamos.
A abstenção porque, coincidindo na crise que só o Partido Socialista teima em não ver, não partilhamos os termos do diagnóstico feito, muito concretamente no tocante às questões da segurança e da alegada erosão da autoridade do Estado, que para nós mais não são do que uma consequência natural, directa e indissociável da própria situação social e de exclusão que prevalecem no nosso país.
A abstenção, acima de tudo, pelas soluções preconizadas pelo PSD, que manifestamente não partilhamos, e que se revelaram, no passado, desastrosas.
Uma posição de voto, a de Os Verdes, que não poupa, contudo, o Partido Socialista, que não o iliba, que não ilude nem ignora a sua responsabilidade política maior perante a situação de crise em que começamos, cada vez mais, a mergulhar.
Uma crise que não é artificial, mero estado de espírito, simples inquietação.
Uma crise que é preocupante, que está a enraizar-se na sociedade portuguesa e no modo superficial como esta é estimulada pelo Governo a viver e a pensar.
Uma crise que é vivida pelas pessoas, sentida nas crescentes dificuldades do seu quotidiano e na degradação da sua qualidade de vida, bem como na generalidade dos serviços públicos.
Uma crise indisfarçável na persistência de problemas - velhos de anos, é certo - na saúde, no ensino, no ambiente, na fiscalidade.
Uma crise indisfarçável e manifesta, ainda, na dificuldade demonstrada pelo Governo em ser capaz de pensar, de preparar e de cuidar seriamente dos desafios incontornáveis em qualquer sociedade, hoje, quer se fale da mudança climática, quer se fale da energia, quer se fale da modernização da economia, da transformação dos processos tecnológicos, da igualdade de direitos, da política de imigração, da formação e do ensino ou da utilização sustentável dos nossos recursos.
Uma crise preocupante, que o facilitismo e o permanente adiar das questões tenderá, cada vez mais, a tornar mais difícil de gerir.
Uma crise que não se compadece com meros actos simbólicos, que não se resolve com a busca de bodes expiatórios, com políticas de fachada.
A crise que não se resolve só tão-pouco, em nosso entendimento, com melhor coordenação, mais coesão, mais eficácia. Aliás, porque não resulta só disso, já que, é evidente, não estamos perante uma simples falta de articulação dentro do governo, mas sim perante a desistência pura e simples do PS de adoptar políticas alternativas, políticas de esquerda, pautadas pelos valores da solidariedade, da justiça e do interesse público.
Políticas alternativas essas de que o governo tem sistematicamente abdicado; políticas que não passam por novas promessas do céu, com o anúncio de novos ciclos radiosos; políticas alternativas que radicam, isso sim, com os pés assentes na terra, em medidas concretas, definidas no tempo, com clareza de objectivos, participadas, medidas que enfrentem com coragem, sem tibiezas e na rotura com velhas receitas estafadas, os vários grupos de interesse instalados na nossa sociedade.
Medidas que ponham fim à escandalosa alienação do património público; que, na fiscalidade, ponham fim à insustentável injustiça fiscal, à evasão e fraude, e à manutenção de escandalosos benefícios fiscais; que, na saúde, dêem prioridade absoluta à optimização dos recursos humanos e dos equipamentos disponíveis, em nome dos cidadãos e do seu direito a serviços humanizados; que na política florestal e dos solos deixem de se orientar e ceder à lógica dos interesses imediatistas da indústria papeleira ou da especulação imobiliária, mas se movam pelo interesse público, pelo interesse nacional e por uma perspectiva de longo prazo; que, na energia, deixem de considerá-la uma coutada de influência e de decisão exclusiva de alguns, mera fonte de financiamento directo do Estado, com é o caso da venda dos combustíveis, ou uma questão que só se torna relevante em momento de crise, e passem a considerá-la uma questão estratégica nacional, com consequências para o ambiente, para a saúde e para o bem-estar da economia. Uma questão que implica, naturalmente, um investimento prioritário no transporte público e de eficiência energética, apoio à conservação, investimento nas fontes alternativas, que, no nosso país, lamentável e estranhamente, continuam tão esquecidas.
Medidas que à segurança dêem, finalmente, uma perspectiva actualista, que não se confina na estreiteza de um horizonte policial ou militar mas na aposta efectiva, até hoje ignorada, da prevenção dos nossos recursos e bens patrimoniais como o mar.
Políticas que, no plano dos direitos, da desigualdade e da discriminação, não podem ficar-se por meros slogans

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ou por ficções, que têm antes de ser traduzidas em acções concretas.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Estas são políticas que faltam e cuja prioridade é tempo de o Governo compreender. Mas que não tenha uma compreensão resignada, que opte por uma compreensão que o leve a assumir a responsabilidade ética e política de transformar o País, que, seguramente, bem pode, diferentemente, ser vivido, gerido e amado.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Mendes.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Nada melhor que os exemplos do dia-a-dia para ilustrar a situação política a que chegámos em Portugal. Três exemplos apenas.
Primeiro exemplo: no passado sábado, um semanário dava à estampa a notícia de que a Faculdade de Direito de Lisboa está em risco de não abrir por falta de verbas. Ou seja, na mesma ocasião em que o Ministro da Educação era promovido no seio do Governo, percebia-se o caos a que o mesmo Governo tinha deixado chegar uma das mais prestigiadas faculdades públicas do nosso país.
Mas - segundo exemplo -, ontem mesmo, um outro jornal informava que o Ministério da Educação vai proporcionar nova oportunidade, mais precisamente a quinta, aos alunos das escolas de Guimarães que se têm recusado a fazer exames. Ou seja, em vez de iniciar o seu mandato com a preocupação de se dar ao respeito, fazendo cumprir a lei, o novo Ministro da Educação preferiu não ter aborrecimentos e ceder novamente à imoralidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Terceiro exemplo: no mesmo dia, um outro diário dava conta que os cinco menores presumíveis assaltantes de uma espingardaria de Aveiro e de um posto de combustíveis na CREL se tinham evadido do estabelecimento de reinserção social onde estavam internados.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Não podem ir para a prisão!… O País fica chocado!…

O Orador: - O Ministro da Justiça, esse, mais fiel aos princípios da discrição do que da responsabilidade, resolveu lavar as mãos da situação incómoda que ocorreu, prometendo, apenas e como sempre, um rigoroso inquérito.
Estes três exemplos, bem recentes, não são fruto do acaso e também não representam contingências da sociedade moderna e aberta dos nossos dias, como o nosso Primeiro-Ministro tanto gosta de dizer para permanentemente se desculpar. Pelo contrário, entre si, estas situações têm uma marca clara em comum: em Portugal, tem-se hoje mais tendência para falar de direitos do que para falar de deveres e os poderes públicos são os primeiros a dar o mau exemplo, declinando responsabilidades e fugindo, sistematicamente, a exercer o seu próprio dever e a sua autoridade.
Não espanta, por isso, que o País se sinta desorientado e com uma crise de confiança: se aqueles que são escolhidos democraticamente para governar têm medo de exercer o seu dever, a sua autoridade e as suas responsabilidades, é toda a sociedade que fica desprotegida e afectada.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Os casos que aqui referi, Srs. Deputados, entre muitos outros, que são públicos e notórios, têm uma causa que é conhecida e que não é nova: a falta de autoridade.
Esta geração de socialistas que se apossou do Estado nunca percebeu, não percebe e nunca perceberá que só e possível falar de direitos falando reciprocamente de deveres e que só é possível falar de ambos, direitos e deveres, se existir autoridade para os garantir e para os realizar. E, infelizmente, não tem havido.

Aplausos do PSD.

Esta máxima tanto se aplica aos cidadãos como ao Estado, ao Ministro da Educação como aos estudantes, ao Ministro das Finanças como àqueles que fogem às suas obrigações fiscais, ao Ministro da Justiça como àqueles que desafiam a ordem e a segurança públicas. A todos, sem excepção.
Ora, é justamente esta filosofia que cada vez mais falta a este Governo e, sobretudo, a este Primeiro-Ministro. E é tudo isto que mina e contamina a sociedade portuguesa.
Sr. Primeiro-Ministro, quando, há oito dias, o senhor afirmou ao País, para justificar a sua falhada remodelação, que tinha andado dez meses enganado quanto à estrutura orgânica do Governo, pode bem ter a certeza de que contribuiu, dessa forma, de uma maneira irreversível, para a dissolução da responsabilidade e da autoridade do seu Governo. Porque das duas uma: ou o Primeiro-Ministro, numa questão que não é menor, mas fundamental, andou mesmo enganado durante este tempo todo, como quis fazer crer ao País, ou, pior ainda, andou simplesmente a tentar enganar o País, como parece.
Na primeira hipótese, ou seja, na hipótese de ter andado enganado numa questão essencial, a única solução óbvia que lhe restava não era fazer a remodelação do Governo; era remodelar-se, pura e simplesmente, a si próprio, ou seja, ter tido a hombridade de se demitir.

Aplausos do PSD.

Essa era a única maneira decente que tinha de assumir responsabilidades pelos erros graves em questões essenciais que cometeu e pelos prejuízos que causou a todos os portugueses. Na segunda hipótese, a de ter tentado enganar o País - como parece -, então o Primeiro-Ministro deveria ter sido imediatamente demitido pelo Sr. Presidente da República. Era uma questão de princípio, uma questão de decência política e democrática.
Srs. Deputados, como nenhuma das consequências teve lugar, e no seu devido tempo, sucede agora que ninguém mais levará a sério a acção de um Primeiro-Ministro que deu aos portugueses este exemplo lapidar: não precisam de cumprir as suas obrigações, podem errar, podem, até,

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persistir no erro e falhar, porque no fim ninguém lhes vai pedir responsabilidades.
Um Primeiro-Ministro assim é um Primeiro-Ministro politicamente ferido de morte. Pode o Eng.º António Guterres continuar, formalmente, investido no cargo de Primeiro-Ministro; na prática, ele encarna e simboliza, no pior dos exemplos, a fuga à responsabilidade e ao dever. A sua substituição tornou-se um facto absolutamente inevitável.
O pior, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é que nada disto é indiferente para o País. Bem pelo contrário. O preço a pagar por esta situação pantanosa - e pântano é, já hoje, a expressão vulgarizada na sociedade portuguesa - é elevado e tem consequências cada vez mais gravosas para todo o País.
Repare-se bem, Srs. Deputados, no que pode suceder a partir de agora. Qualquer director-geral pode enganar-se que nada lhe acontece; qualquer gestor público pode falhar que passará impune;…

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Vai para o Governo!

O Orador: - … qualquer funcionário público pode errar obstinadamente que a culpa morrerá sempre solteira. Porque ninguém, neste Governo socialista, terá agora o mínimo de autoridade para agir. O País, que tinha já um grave défice de autoridade, passou agora a ser um País ingovernável.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Onde isso já vai!

O Orador: - Ora, Sr. Presidente e Srs. Deputados, um País ingovernável e sem autoridade é um País em que os menos favorecidos ficarão ainda mais desprotegidos. Primeiro, porque quando o Estado não tem autoridade é a lei do mais forte que impera. A ideia de governar é apenas a de gerir e equilibrar grupos de pressão. Depois, porque de nada vale prometer mais direitos quando o Estado não está à altura de os fazer assegurar e de cumprir os seus próprios deveres. Logo, Sr. Primeiro-Ministro, sem autoridade não há consciência social, não há boas intenções, não há leis e não há promessas que cheguem.
Um País ingovernável e sem autoridade é também um País incapaz de gerar confiança tanto às pessoas como às empresas. E quando não há confiança não há dedicação ao trabalho, não há espírito de exigência e não há investimento. E, sem trabalho, sem exigência e sem investimento, nem sequer é possível sonhar com justiça social. Porque ninguém consegue distribuir aquilo que não tem, a riqueza que não é capaz de produzir.
Sr. Primeiro-Ministro, quer o senhor queira quer não, sem autoridade também não há nem paixão nem coração que resista.
Um País ingovernável e sem autoridade é ainda um País em que falta a credibilidade indispensável à realização dos grandes objectivos de uma política económica. E quando falham os objectivos económicos falha muito de essencial no País: ficamos mais longe da Europa, mais isolados e a cavar, a pouco e pouco, de forma progressiva, o nosso distanciamento. Hoje já é, infelizmente, assim, apesar de, com os seus governos, Sr. Primeiro-Ministro, em quase cinco anos, Portugal já ter recebido da Europa - como nenhum outro governo no passado - mais de 3 mil milhões de contos, cerca de 700 milhões de contos por ano, mais de 2 milhões de contos por dia. Por este caminho, sem autoridade e sem credibilidade, e apesar do dinheiro ímpar da Europa, que terminará um dia, ficaremos a crescer menos, a viver pior e de nada valerão as metas, os planos, os orçamentos de Estado e as previsões do Governo. Ninguém lhes dará crédito e nunca serão cumpridas.
Sr. Primeiro-Ministro, quer o senhor queira quer não, sem autoridade também não há razão que nos valha.
E sem razão que nos valha, sem paixão que resista, sem consciência social que chegue, está mais que esgotada a função útil deste Governo. O senhor, Sr. Primeiro-Ministro, pode aqui dizer que não é um Primeiro-Ministro resignado; mas é, definitivamente, um Primeiro-Ministro esgotado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É por demais evidente que Portugal precisa de um novo Governo. Mas precisa, sobretudo, de um Governo com uma nova e radicalmente diferente filosofia política. Uma nova filosofia política que, sem complexos e sem hesitações, assente numa autoridade forte e numa nova e exigente cultura de responsabilidade.
Portugal tem muitos problemas. Mas existe um problema central na sociedade portuguesa, hoje, que condiciona a resolução de todos os outros: a falta de autoridade no Estado, no País e no Governo.
Digo-o com toda a convicção: um Estado com autoridade garante a liberdade e defende o cidadão; um Estado sem autoridade permite o arbítrio e ameaça o cidadão.
Por isso, temos de escolher. É mesmo urgente escolher. Para bem de Portugal. Pelo futuro dos portugueses.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Barros Moura.

O Sr. José Barros Moura (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Ouvimos, ao longo desta tarde, os herdeiros dos que nunca se enganam e que raramente têm dúvidas a fazerem-nos o discurso do caos económico e social, o discurso da ingovernabilidade e a reclamação de autoridade. De resto, repetiu-se aqui esse cliché procurando explorar sentimentos que a própria direita, que teve a iniciativa deste debate, tem trazido, ou procurado trazer, aos meios de comunicação social e à sociedade portuguesa: o espectro da insegurança, o espectro da incapacidade de decisão e a reclamação mítica de um chefe autoritário que ponha tudo na ordem.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador:- O que divide este e esse lado do Hemiciclo é que nós aceitamos, procuramos e lutamos pela autoridade democraticamente formada e democraticamente exercida…

O Sr. Durão Barroso (PSD): - O que é isso?

O Orador: - … e orgulhamo-nos de ter um Governo que tem sido capaz de, nos momentos mais melindrosos e difíceis que Portugal atravessou nos últimos cinco anos,

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ter a decisão certa no momento certo, vencendo as dificuldades evidentes quando, precisamente, outros nos diziam para não irmos por esse caminho.

Aplausos do PS.

Lembro-vos só o caso de Timor, que é um caso paradigmático, em que os senhores criticaram o acordo que levou à independência…

Protestos do PSD.

… e as decisões que permitiram que a comunidade internacional interviesse.

Protestos do PSD.

O que nos divide é que nós temos capacidade de decisão e os senhores vivem na reclamação mítica de um chefe autoritário. Enganam-se!

Aplausos do PS.

A Sr. Manuela Ferreira Leite (PSD):- Essa teve graça!

O Orador:- Os portugueses querem medidas concretas destinadas a solucionar os problemas das pessoas. Mas os portugueses não querem ir por esse caminho. Os portugueses querem segurança, mas não querem uma plataforma securitária, que é a única que as bancadas de direita são capazes de apresentar.

Protestos do Deputado do PSD José Luís Arnaut.

Portanto, há aqui uma linha divisória que ficou claramente expressa neste debate. Verifico que a falta de tranquilidade das bancadas à direita é manifesta quando as verdades se dizem.
O outro cliché foi o da ingovernabilidade. Mas quem provoca ou quer provocar a ingovernabilidade se não o partido que, sabendo que não tem condições para fazer aprovar nesta Assembleia uma moção de censura, a apresenta? Quem quer minar, dessa maneira, a credibilidade das instituições e provocar a instabilidade?

Protestos do PSD.

A oposição de direita fez, ainda, o discurso do caos. Pintaram-nos um cenário de caos económico e social, de insegurança nas ruas, de insegurança no quotidiano das pessoas. Em contraste com isso, o Governo apresenta obra, apresenta medidas que vão no sentido de permitir o crescimento sustentável, a melhoria das condições de vida e medidas concretas a favor da segurança dos portugueses.
O Sr. Deputado Durão Barroso ofereceu-nos hoje, aqui, um livro com capa cor-de-laranja. Tive o cuidado de consultar o capítulo relativo às medidas de segurança e fiquei surpreso por lá não ter encontrado duas das propostas que o Sr. Deputado Durão Barroso veio fazer hoje: a relativa à coordenação e a das polícias municipais.

Protestos do PSD.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - É porque nós evoluímos e os senhores não!

O Orador: - Verifico que o discurso que faço incomoda a oposição de direita, que não gosta de ouvir algumas verdades, mas insisto em dizer, contra o discurso do caos, contra o discurso da insegurança, contra o discurso da ingovernabilidade, que nós temos obra, que nós reconhecemos quando erramos e que o Governo e o Sr. Primeiro-Ministro são capazes de tomar as medidas de mudança de rumo que se revelem necessárias para assegurar a governabilidade do País,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Quais?

O Orador: - … o cumprimento do Programa sufragado pelos portugueses.
É que, Sr.as e Srs. Deputados, quando um governo erra, quem tem a última palavra são os eleitores e nós não tememos o veredicto dos eleitores,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Nem nós!

O Orador: - … porque - e reafirmo-o - este Governo tem obra, tem Programa e porque do que se trata é de criar condições nesta Câmara para conseguir levar a cabo uma política na qual os portugueses confiaram e que julgamos ser a melhor para as pessoas.
É por isso, Sr.as e Srs. Deputados, que não podemos aceitar a atitude de uma oposição irresponsável que apresenta uma moção de censura sem solução de governabilidade e sem programa económico e social alternativo.
É por isso que apreciamos, e apreciaremos, a atitude das forças políticas que sejam capazes de nos apreciar pelo valor das nossas propostas económicas e sociais. É isto que, em breve, estará em debate em sede do Orçamento do Estado, estará em debate aquando da apresentação por este Governo das medidas reformistas em matéria de política fiscal.
Para nós, a política faz-se com medidas sérias. Fiéis à nossa tradição democrática, rejeitamos os apelos irresponsáveis ao autoritarismo de um chefe e a soluções securitárias para a sociedade portuguesa.

Aplausos do PS.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da consideração da bancada.

O Sr. Presidente: - Agradecia-lhe que identificasse a ofensa.

O Sr. António Capucho (PSD): .- Sr. Presidente, entre outras questões, o Sr. Deputado acaba de falar na saudade de um chefe autoritário, coisa que…

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, liminarmente, Sr. Deputado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Como é óbvio, Sr. Presidente.

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Sr. Presidente, Sr. Deputado Barros Moura, pura e simplesmente, não lhe admito a insinuação.
VV. Ex.as perderam este debate em toda a linha.

Risos do PS.

O Partido Socialista nem sequer participou no debate. Inscreveu V. Ex.ª agora, no crepúsculo do debate, à última hora, para dizer um emaranhado de asneiras, permita-se-me a expressão, e fazer uma provocação inaceitável.

Aplausos do PSD.

VV. Ex.as não foram capazes de participar no debate, defendendo o Governo, e preferem fazer uma provocação ignóbil que eu não esperava da sua parte, porque tenho a maior consideração pessoal por V. Ex.ª, desde que, há longos anos, convivo consigo politicamente.
Não admito, o meu partido não admite nem recebe lições de democracia, quer do Partido Socialista quer do Sr. Deputado Barros Moura.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Muito especialmente, o partido fundado por Sá Carneiro - e eu próprio estive ao lado dele na fundação -, hoje, passados 25 anos, não aspira, manifestamente, a qualquer chefe autoritário.
O Partido Social Democrata é um partido de raiz democrática e não recebe lições de V. Ex.ª.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Barros Moura para dar explicações, se assim o entender.

O Sr. José Barros Moura (PS): - Fá-lo-ei com todo o gosto, Sr. Presidente.
Começo por dizer que este debate ainda não terminou. O debate continua a desenrolar-se, nós interviemos no uso das nossas faculdades regimentais e, até por uma questão de deferência, quisemos ouvir-vos primeiro.

Risos do PSD.

O que ouvimos não nos satisfez. Eu disse-o com toda a clareza e repito-o com toda a clareza: uma vez «espremido» o conteúdo dos vossos discursos, resulta muito pouco a não ser o que procurei sintetizar - o espectro da ingovernabilidade, o espectro do caos económico e social e o apelo mítico a soluções de autoridade. Repito-o, com todo o respeito pelo passado do vosso partido e do seu fundador…

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - E o seu passado?

O Orador: - O meu passado confronto-o com todos os desta Câmara e faço-o sem qualquer problema, nomeadamente em matéria de democracia!

Aplausos do PS.

Meus caros senhores, para mim, isso é claro como água: não tenho quaisquer problemas relativamente ao meu passado.

Uma voz do PSD: - E quanto a Felgueiras?

O Orador: - O nome dessa localidade que o senhor mencionou deveria calá-lo porque, relativamente a esse problema, as minhas posições foram e são extremamente claras. Achava bem que o senhor não mencionasse aqui essa localidade, que deveria merecer maior consideração da sua parte.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Ó Sr. Presidente informe-nos qual é a localidade, se não a gente não entende!

O Orador: - A localidade é aquela de sou Presidente da Assembleia Municipal: Felgueiras.
Foi feita uma insinuação grave ao ter sido feita essa menção e a minha resposta foi dada a um aparte anónimo que mencionou essa localidade com significativo insidioso, o que de maneira nenhuma admito. Que isto fique claro!
Continuando, e para terminar, devo dizer que eu próprio também tenho uma enorme consideração pessoal pelo Sr. Deputado António Capucho e, por vezes, essa consideração leva-me a ficar surpreso ao vê-lo defender coisas manifestamente inaceitáveis que não o vi defender, por exemplo, quando convivemos no Parlamento Europeu, sede em que o debate era democrático,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E aqui não é?!

O Orador: - … em que se confrontavam projectos diferentes, mas em que o Sr. Deputado não era obrigado a defender soluções tão aberrantes como algumas que lhe tenho ouvido defender aqui. Mas compreendo e respeito a sua posição.
Reafirmo o sentido da minha intervenção: o PS e o seu Governo não recebem lições em matéria de capacidade de decisão nos momentos difíceis e rejeitam totalmente o apelo a políticas e medidas securitárias e o apelo implícito ao autoritarismo que constou dos discursos de alguns dos representantes da vossa bancada.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças (Pina Moura): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Qual a realidade e qual a verdade da situação económica portuguesa? Esta é a pergunta que tem estado no centro deste debate. A nossa resposta é clara e simples: nem o caos que o PSD diz ser nem o oásis que o PSD gostaria que o Governo ficcionasse.
A primeira condição para enfrentar dificuldades e começar a resolver problemas é falar verdade, recusando a mistificação. E falar verdade é assumir as duas faces que caracterizam a situação económica.
Por um lado, a economia portuguesa está a crescer em 2000 a um ritmo, pelo menos semelhante ao de 1999, mas

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a crescer melhor, mais sustentadamente, com uma composição do produto mais favorável.
Por outro lado, a economia portuguesa debate-se, neste ano de 2000, com dificuldades conjunturais, nomeadamente a evolução do preço do petróleo, a subvalorização do euro e taxas de juro mais altas, dificuldades conjunturais que se sobrepõem, evidenciam e ampliam problemas estruturais antigos: os problemas de competitividade de muitas das nossas empresas e produtos; o problema do défice estrutural da balança comercial, nomeadamente nos períodos de crescimento; os problemas de competitividade induzidos pelo funcionamento da administração e, de uma forma geral, da relação do nosso sistema legal e judicial com as actividades económicas.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Falar verdade sobre a dinâmica do crescimento da economia, no ano 2000, implica também passar o ângulo de análise da informação do plano das previsões (sejam elas favoráveis ou desfavoráveis ao Governo e à oposição) para o domínio dos resultados.
Há, na política económica, um tempo para as previsões. Mas há, também - e este começa a ser esse tempo -, o tempo para a verificação e para o ajustamento das previsões aos dados que se vão apurando.
A verdade é que, estando nós a chegar ao fim do terceiro trimestre de 2000, possuímos já ou vamos ter, a curto prazo - no emprego, no investimento, nas exportações, no consumo, na cobrança de impostos e nas contribuições para a segurança social, na própria execução orçamental -, valores reais que nos permitem afirmar que a economia está a crescer e a crescer com um melhor perfil do que há um ano atrás.
Conforme o Sr. Primeiro-Ministro disse, o emprego por conta de outrem cresceu 2,4% no primeiro semestre e o desemprego caiu 10,8%, no mesmo período; a utilização da capacidade produtiva instalada ultrapassa, em 2000, os 80%, tal como acontecia em 1999; a evolução do investimento, particularmente do privado, é inequívoca e imensurável; a importação de bens de equipamentos cresceu 15,7%, em termos homólogos (até Maio); os veículos comerciais pesados cresceram 9,6% e os ligeiros 10,8%; as vendas de cimento aumentaram 6% e a adjudicação de obras públicas 36,8%.
No que respeita às exportações, o crescimento - já referido - foi de 9,9%, apesar da interrupção temporária de produção na Auto-Europa, cuja produção, como sabem, tem um peso muito importante no conjunto das nossas exportações. Se não considerarmos, por estas razões, o sector automóvel, a taxa de crescimento das exportações foi de 13,8% no período em causa.
Neste domínio, é também significativa a evolução do nosso comércio externo extra-comunitário. Apesar de ser na balança comercial desta zona que, nas importações, se repercute o aumento do preço do petróleo, a taxa de crescimento das exportações para a zona extra-comunitária cresceu 28,2% e é, pela primeira vez, superior à taxa de crescimento das importações dessa zona, entre Janeiro e Junho.
Analisemos agora a evolução das receitas do Estado que melhor reflectem o andamento da actividade económica: o IRS, o IVA e as contribuições para a segurança social.
No final de Agosto e, em termos acumulados, o IRS cresceu 10,5%, o IVA 11,2% e as contribuições para a segurança social 8,9%. Sabemos que, tanto a administração fiscal como a da segurança social têm feito, nos últimos anos, progressos sensíveis quanto à eficiência e à eficácia da sua actividade. Mas é evidente que sem um robusto crescimento da actividade económica não seria possível atingir tais crescimentos na cobrança.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Falando em repor a verdade, é particularmente necessário fazê-lo no que respeita à evolução do consumo privado que exprime, como se sabe, a tendência de evolução do rendimento disponível, do bem-estar e das expectativas das famílias e dos consumidores.
Começo por sublinhar uma contradição no discurso do partido censurante: por um lado, o PSD responsabiliza o Governo por um nível que considera alarmante do endividamento das famílias; por outro lado, agita o fantasma da crise e do «apertar de cinto», porque o consumo privado, estando a crescer e continuando a crescer, está a operar a um ritmo mais moderado do que em 1999.
A deliberada confusão entre abrandamento do crescimento do consumo privado e «quebra do consumo privado» feita pelo PSD é um acto de desonestidade intelectual e de mistificação política.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É um facto que o consumo privado cresceu, em 1999, 4,5%, mas é também um facto que se prevê que, em 2000, crescerá menos, mas crescerá 3,4%.
É um facto que o crescimento do crédito total aos particulares, em 1999, foi de 27,9%, mas é também um facto que, em 2000, até Julho, esse crescimento, apesar de menor, foi de 19,9%.
É um facto que o crescimento do crédito à habitação aumentou 29,7% em 1999, mas é igualmente um facto que até Julho, em 2000, a mesma qualidade de crédito cresceu menos, mas cresceu ainda 22,1%.
É também um facto que não há alterações nas taxas de sinistralidade, no sistema bancário, no crédito concedido a particulares.
São estes e outros factos, relativos à evolução positiva dos salários reais e do emprego em 2000, assim como à evolução do consumo de bens não duradouros e serviços, às vendas de super e hipermercados, à evolução do turismo interno, que demonstram que está a verificar-se uma necessária e desejável desaceleração da despesa interna, que a política orçamental para 2001 vai também estimular e consolidar no que respeita ao consumo público. Sem esta desaceleração, acompanhada pelo crescimento do investimento e das exportações, não será possível prosseguir e consolidar uma nova composição do crescimento do produto, mais sustentável, mais competitiva, mais capaz de contribuir para a solução dos problemas estruturais da nossa economia. Sem esta desaceleração, acompanhada de medidas de maior rigor - aliás, já tomadas pelo Banco de Portugal, em relação à concessão de crédito pelo sistema financeiro -, não será possível abrandar o nível de endividamento das famílias e do próprio sistema financeiro em relação ao exterior que, manda a prudência e o bom senso, deve acontecer, e deve acontecer sem dramatismo, mas com determinação.

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Sabemos perfeitamente que todos os ajustamentos, mesmo aqueles que são necessários e inescapáveis, geram problemas às pessoas, às famílias e aos consumidores.
Demos recentemente, no que respeita ao crédito bonificado para a habitação, um sinal claro que o rigor financeiro não deve ser cego à consciência social, corrigindo um mecanismo que não era nem tecnicamente correcto nem socialmente aceitável. Mas temos - e tenho eu, em particular - de falar claro às pessoas: as opções de consumo, de investimento e de crédito dos particulares, das empresas e do próprio sistema financeiro devem e têm de ser medidos, ponderados e decididos pelos próprios, assumindo cada qual a plenitude das suas responsabilidades. Neste domínio, há uma garantia que o Governo pode e deve dar: a economia portuguesa prosseguirá em 2000 e continuará, em 2001, o caminho de crescimento, a estabilidade macroeconómica, a criação de emprego e a geração de riqueza que, ininterruptamente, vem percorrendo desde que o actual Primeiro-Ministro constituiu o XIII Governo Constitucional.
Temos, neste caminho, alguns factores de incerteza que condicionam as previsões de todos os governos da União Europeia: a evolução do preço do petróleo, a subvalorização do euro, as tensões inflacionistas daí decorrentes e o perfil de política económica na zona euro, que cabe ao euro-sistema decidir e aplicar.
Tudo isto, num quadro em que a economia portuguesa está numa situação de pleno emprego, operando já para além do seu próprio produto potencial, cuja expansão sustentada exige, agora e cada vez mais, políticas estruturais, políticas do lado da oferta. Exige, ao fim e ao cabo, uma nova estratégia de crescimento assente, também, num novo padrão de consolidação das finanças públicas caracterizado pela redução significativa do crescimento de despesa pública para valores sustentáveis e com o desagravamento fiscal, nomeadamente sobre os trabalhadores por conta de outrem, encetando um combate sem tréguas e, doa a quem doer, à fraude e à evasão fiscais.
Dito isto, trataremos aqui, nesta Assembleia, em dois momentos próximos, duas questões: a da reforma fiscal, debate de que o partido censurante se encontra completamente alheio e ausente, para a qual amanhã o Governo apresentará novas iniciativas; e a da política económica e orçamental, que ocorrerá aquando do debate da proposta de lei de Orçamento do Estado para 2001, que será entregue à Assembleia da República no próximo dia 16 de Outubro, onde clarificaremos as opções e as estratégias de fundo que acabei de enunciar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, como disponho de pouco tempo, serei muito breve na formulação de uma simples pergunta.
Hoje, o Sr. Primeiro-Ministro afirmou aqui, por diversas vezes, que manter o preço da gasolina não foi um acto fortuito, populista, impensado; pelo contrário, foi um acto bem pensado para evitar a perturbação social a que assistimos em França, na Alemanha e noutros países da Europa. Foi, portanto, também um acto para defender os transportadores. Foi uma política correcta e bem pensada que evitou situações piores como as que se viveram na Europa. Ou seja, o Primeiro-Ministro teve um acto de uma grande visão política e de um grande alcance. Só que, Sr. Ministro das Finanças, este acto é como os iogurtes, tem um prazo de validade, termina em Dezembro.
Posto isto, a questão que quero colocar-lhe, muito rapidamente, é a seguinte: em Janeiro, a gasolina vai ou não aumentar? Se aumentar implica, no raciocínio do Sr. Primeiro-Ministro, fazer um erro que agora se tentou evitar, e que, portanto, não se fez, o que, mais uma vez, no raciocínio do Sr. Primeiro-Ministro, implica gerar perturbação social e prejudicar os transportadores; se não aumentar o Governo não vai entrar nessa contradição, e mantém a política «de grande alcance e de grande visão» que tem tido até à data.
Sr. Ministro das Finanças, peço, portanto, que me explique a coerência da atitude do Governo e, acima de tudo, o que é que espera os portugueses.
E surgiu-me uma outra ideia, peço desculpa, mas vou colocar-lhe uma segunda pergunta.

O Sr. Presidente: - Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou ser rápido, Sr. Presidente.
Sr. Ministro das Finanças, no seu discurso a economia não está mal, até vai andando bem. Então, é capaz de me explicar por que é que houve a necessidade de separar o Ministério da Economia do Ministério das Finanças, se estava tudo bem?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, em relação à política de preços dos combustíveis e ao que o Governo vai fazer no futuro, o Sr. Primeiro-Ministro já respondeu e fê-lo de uma forma absolutamente clara.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Clara é que não foi!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Ninguém percebeu!

O Orador: - Sr. Deputado Rui Rio, o que quero dizer-lhe é que a opção tomada pelo Governo e pelo Sr. Primeiro-Ministro, quando anunciou a política que anunciou, tem - e a evolução da situação em Portugal e noutros países da União Europeia está a demonstrá-lo - uma racionalidade económica e social.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Uma injustiça social!

O Orador: - Como todas as opções de política económica, e o Sr. Deputado sabe-o perfeitamente, todas as decisões de política económica geram conflito de objectivos e efeitos contraditórios. O Governo decidiu sacrificar receita fiscal a um ambiente menos instável na

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evolução dos preços e de maior estabilidade social. É uma opção como todas as opções criticáveis, mas é e foi uma opção com esta racionalidade, em nome da qual o Governo a tem desenvolvido e mantido e que tem sido compreendida pelos portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como até agora ninguém requereu o intervalo de uma hora, a decorrer entre o fim do debate e a votação, provavelmente, no fim do debate, seguir-se-á a votação. Peço aos grupos parlamentares que tomem este facto em linha de conta.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: No momento em que nos aproximamos da fase final da discussão desta moção de censura, apresentada pelo PSD, parece adequado analisá-la, por um lado, na sua génese, por outro lado, na sua essência e, por fim, nas suas consequências, até porque estes três aspectos estão absolutamente interligados.
Comecemos pela génese da moção de censura. O PSD apresentou esta moção de censura por motivos estritamente estratégicos e que assentam em duas razões fundamentais. A primeira é porque, há dois meses, o PP também apresentou uma moção de censura ao Governo, só que na altura o PP apresentou-a com um duplo intuito: por um lado, o de se afirmar como líder da oposição da direita à acção que o Governo vinha a desenvolver, e, por outro, o de condicionar em absoluto a capacidade da actuação do PSD numa matéria fundamental que, então, estava a ser discutida e votada e que era atinente à Lei de Bases da Segurança Social.
Dois meses depois, o PSD entendeu que na disputa estratégica e política pela liderança da direita tinha, também ele, de apresentar uma moção de censura. Mas ela não assenta numa motivação de ordem exterior, assenta também numa motivação de ordem puramente interna. E não correspondendo isto a qualquer tentativa minha de me imiscuir nas questões internas do PSD, e tenho até a maior compreensão pelas dificuldades que este partido actualmente atravessa, do ponto de vista da pura análise política não podemos deixar aqui de salientar que o outro pilar que fundamentou estrategicamente a apresentação desta moção de censura tem a ver com aquilo que o Sr. Primeiro-Ministro referiu na sua intervenção inicial, utilizando a fórmula cartesiana aplicando-a: «censuro, logo existo». Era também uma prova de vida do líder do PSD.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Foram estas as motivações genéticas.
Mas passemos à essência da questão. Esta moção de censura radica numa avaliação muito negativa, até mesmo catastrófica, da situação actual do País e da governação que tem vindo a ser levada a cabo pelo Executivo do Partido Socialista. Ora, a questão que se coloca aqui, em primeiro lugar, é a de saber se há ou não uma actuação entre aquilo que o PSD pensa e diz acerca da sociedade portuguesa, do Estado, da Administração Pública e da qualidade da governação, e aquilo que é a realidade e a própria apreensão dessa realidade por parte da maioria da sociedade portuguesa. E quem hoje ouviu aqui os vários Deputados do PSD que intervieram neste debate sobre a moção de censura por eles apresentada ficou sem qualquer dúvida em relação a esta questão.
O PSD revela hoje na oposição exactamente a mesma atitude arrogante que usou quando estava no poder. Porque, Srs. Deputados, quem considera que tudo está bem ou que tudo está mal está sempre a agir da mesma forma, de uma forma arrogante, prepotente e que revela um profundo autismo político.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Quando exerciam a governação do País esse autismo manifestou-se na forma prepotente com que foram avaliando as várias situações, com que foram sistematicamente pondo em causa aquilo que eram apreensões e juízos críticos formulados por variadíssimos sectores políticos, sociais, económicos e culturais do País. Ora, essa arrogância manifesta-se agora de maneira negativa, porque a teoria do caos resulta do mesmo estado de espírito que no passado conduziu à teoria do «oásis». E esse estado de espírito revela uma total incapacidade para compreender o País, uma total incapacidade para perceber as realidades da sociedade portuguesa.
É por isso que, de uma forma que não deixa de ser sugestiva, o Sr. Deputado Luís Marques Mendes, há pouco, acusava o Sr. Primeiro-Ministro de ter posto em causa a autoridade do Estado pela simples circunstância de ter procedido a uma remodelação ministerial, como se a autoridade fosse obstinação, como se a autoridade fosse teimosia, como se a autoridade fosse a incapacidade de se introduzir mudanças, quando se entende que elas devem ser introduzidas!

Aplausos do PS.

O Primeiro-Ministro tem não apenas o direito mas o dever de, perante este Parlamento, o País que o elegeu, o País que no Governo projecta tantas expectativas, introduzir as modificações que ele entenda como necessárias à luz da sua interpretação do próprio interesse nacional. É por isso que devemos aqui salientar a atitude do Governo e do Partido Socialista, que é uma atitude em oposição absoluta àquela que ainda hoje caracteriza o PSD.
Bem sabemos que nem tudo vai bem no nosso país; bem sabemos que há determinadas áreas em que se deve avançar mais e mais depressa. Não perdemos o nosso juízo crítico. Esta bancada parlamentar não abdica de ter um juízo crítico, que muitas vezes formula em relação à acção do Governo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E nós próprios projectamos nesta remodelação governamental a expectativa de que ela contribua para uma melhor e mais eficaz governação do País; de resto, se assim não fosse, certamente não teria havido necessidade de a fazer.

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Orador: - Isto sem formular qualquer juízo crítico de natureza puramente pessoal em relação a quem saiu, porque o que importa é a natureza global da solução e não a apreciação em concreto do mérito ou demérito da intervenção deste ou daquele ministro. E é nesta perspectiva que projectamos, porque o que esta bancada parlamentar espera do Governo é apenas uma coisa: que o Governo cumpra os compromissos assumidos com Portugal e com os portugueses.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Temos um compromisso programático, está plasmado no programa que o Governo apresentou perante esta Assembleia da República, e depositamos em absoluto a expectativa de que seja possível cumpri-lo. Porém, não perdemos o sentido crítico.
Pensamos que há questões, que aqui foram colocadas por alguns Deputados da oposição, que também suscitam a nossa preocupação. Só que os Deputados da oposição perdem toda a razão quando confundem todas as questões e quando valoram da mesma forma aquilo que é importante e aquilo que não tem qualquer importância, ou quando mistificam completamente a realidade. É evidente que a circunstância de a nossa economia não estar a ter um ritmo de crescimento superior à média das economias europeias nos causa alguma preocupação. No entanto, isto tem de ser visto no contexto em que estamos a desenvolver a nossa actividade. Logo, não é lícito que se diga que não tem havido um crescimento significativo da economia portuguesa, que o rendimento das famílias não tem aumentado, que não temos resolvido um dos problemas maiores que é o problema do desemprego, quando, pelo contrário, temos vindo, progressivamente, a criar mais emprego. O nível e a qualidade de vida dos portugueses é, hoje, muito melhor do que era em 1995. Temos razões para estar satisfeitos, mas há uma insatisfação que nos caracteriza permanentemente e é esta insatisfação que projectamos também na acção do Governo. Esta é, também, a diferença entre a nossa forma de encarar a acção política e a governação do País e aquela que caracterizou a intervenção do PSD por fim das suas consequências.
Creio que quem apresenta uma moção de censura - e não está em causa a oportunidade de apresentação da mesma, porque esse juízo tem de ser feito por quem a apresenta, e muito menos o direito que está constitucionalmente reconhecido -, nos termos em que ela foi apresentada, tem a obrigação perante o País de apresentar alternativas, de dizer: «este caminho está errado, nós propomos outro caminho!

Aplausos do PS.

Entendemos que o País não deve ser governado desta forma, deve ser governado de outra forma».
O Sr. Deputado Durão Barroso fica muito incomodado e diz que digo sempre a mesma coisa. Até me ofereceu um livrinho cor-de-laranja.

Protestos do PSD.

Se nos tivéssemos conhecido há 30 anos, ter-me-ia oferecido um livrinho vermelho!

Aplausos do PS.

Sr. Deputado Durão Barroso, o problema não está em mim. O problema está em si. Está na sua incapacidade de apresentar uma alternativa, de chegar ao Parlamento e de expor, perante os parlamentares e o País, um projecto alternativo, uma linha de orientação diferente. Veja que o Sr. Deputado, durante 20 minutos, fez uma avaliação catastrófica do estado do País,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Uma crítica!

O Orador: - … e não apresentou uma única solução! A única coisa que disse foi: a política económica e financeira é tão má que precisa rapidamente de uma alteração radical, e esta alteração radical tem de ser feita com tanta celeridade que até estamos a elaborar uma plano de emergência que apresentaremos oportunamente ao País.
Sr. Deputado, creio que isso é uma autocensura ao próprio PSD; é o reconhecimento, perante o País, de que o PSD não está em condições de governar Portugal. Mesmo aquela parte do País que, neste momento, possa não estar muito contente com a acção do Governo encontrou, hoje, aqui razões para ainda ficar mais descontente com a acção da oposição ao Governo.

Aplausos do PS.

Mas não nos contentamos com isso. O mal dos outros não é o nosso bem, e as nossa responsabilidades são enormes.
Por isso, para terminar, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, incito o Sr. Primeiro-Ministro e o Governo a agirem em fidelidade absoluta com os compromissos programáticos assumidos com o País, porque é isso que Portugal espera de nós!

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto não haver mais inscrições…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, faça favor de especificar a questão que coloca em causa a ordem de trabalhos.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, tem a ver com um aspecto decorrente de uma intervenção do Sr. Primeiro-Ministro, que exibiu um mapa sobre o número de agentes incorporados nas forças de segurança nos últimos cinco anos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, perante esta situação, foi pedido ao Sr. Primeiro-Ministro que

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disponibilizasse o tal mapa, e pareceu-me que o Sr. Primeiro-Ministro deu anuência ao meu pedido.
Assim, pretendo saber se os serviços, por qualquer falha, não procederam à sua distribuição pelas diferentes bancadas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não posso dar-lhe qualquer informação, porque também a não disponho.
O Governo está presente, ouviu o seu requerimento. Provavelmente, encarou esse pedido como um requerimento ao Governo, pelo que pode dar-lhe a resposta neste momento ou em qualquer outro momento - o Governo tem essa liberdade.

O Orador: - Sr. Presidente, o Sr. Primeiro-Ministro fez um gesto que indicava estar disponível,…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Guilherme Silva, daqui não vejo os gestos do Governo!

O Orador: - … gesto que permitiu esta leitura.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o Governo está a ouvir e reagirá como entender.

O Orador: - Mas, enfim, é o ritmo lento do Governo!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto não haver mais inscrições, vamos dar início à fase de encerramento…

O Sr. Ministro do Estado e do Equipamento Social (Jorge Coelho): - Sr. Presidente, peço a palavra.

Aplausos do PS.

Risos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Ministro?

O Sr. Ministro do Estado e do Equipamento Social: - Para explicar a questão do mapa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Ministro do Estado e do Equipamento Social: - Sr. Presidente, fiquei muito satisfeito por ver que gostam que eu diga aqui algumas palavras!

Risos do PSD e do CDS-PP.

Têm saudades!
Sr. Presidente, só para que não se diga que o Governo não respondeu, quero informar o Sr. Deputado Guilherme Silva de que os papéis estão aqui,…

Vozes do PSD: - Ah!

O Orador: - … mas, como estão cheios de notas, vão ser passados a limpo rapidamente para serem entregues ao Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Mas podem vir mesmo com as notas! Gostaria de os ter assim!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos finalmente entrar na fase de encerramento.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, quero apenas informar que, em nome do Governo, usará da palavra o Sr. Ministro do Estado e dos Negócios Estrangeiros.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Oh!…

O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, é preciso que haja consenso para que não seja V. Ex.ª a intervir, porque o Regimento é muito claro nesta matéria, e já há pouco o Sr. Deputado Durão Barroso colocou a mesma questão.
O Regimento é muito claro no n.º 3 do artigo 239.º, onde se diz: «O Primeiro-Ministro tem o direito de intervir imediatamente após e antes das intervenções previstas no número anterior». As intervenções previstas no número anterior são as do primeiro signatário da moção de censura, que é o Sr. Deputado Durão Barroso.
Se houver consenso, como parece que há, não me oponho a que não seja o Sr. Primeiro-Ministro a produzir a intervenção de encerramento do debate.

O Sr. Durão Barroso (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Durão Barroso (PSD): - Sr. Presidente, peço desculpa, mas a sua interpretação não me parece correcta.

O Sr. Presidente: - Às vezes, engano-me!

O Sr. Durão Barroso (PSD): - Sr. Presidente, peço-lhe que verifique por favor, mas parece-me que o Regimento permite perfeitamente que o Sr. Primeiro-Ministro delegue noutro membro do Governo, o que não permite é que o censurante delegue, a não ser com o acordo das outras bancadas.
Se bem li o artigo do Regimento em causa, o Sr. Primeiro-Ministro pode delegar em qualquer membro do Governo o direito a intervir na fase final.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Vozes do PS: - Até que enfim estamos de acordo!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Durão Barroso, com muito respeito pelas suas opiniões jurídicas, que, provavelmente, são melhores do que as minhas, não vejo essa faculdade de delegação no artigo. O artigo 239.º do Regimento diz claramente o seguinte: «O Primeiro-Ministro tem o direito de intervir imediatamente após e antes das intervenções previstas no número anterior». Nada mais se diz!

O Sr. Durão Barroso (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor.

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O Sr. Durão Barroso (PSD): - Sr. Presidente, se me permite, o que é dito nesse artigo é que o Sr. Primeiro-Ministro tem o direito de intervir, não é obrigatório que seja ele a intervir. Ao passo que para o que apresenta a moção de censura não está previsto em termos idênticos. Ou seja, o n.º 2 deste mesmo artigo diz expressamente que o debate é aberto e encerrado pelo primeiro subscritor da moção de censura.
Portanto, comparando as duas normas, parece-me evidente que o que o legislador quis, neste caso em matéria regimental, foi conferir ao Primeiro-Ministro o direito de intervir ou o de delegar.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Durão Barroso, esse é um argumento brilhante de um brilhante advogado, mas não posso secundá-lo pela simples razão de que a diferença entre o Sr. Deputado Durão Barroso e o Sr. Primeiro-Ministro é a de que, necessariamente, não haveria moção se ninguém interviesse pelo partido censurante. O Regimento diz que pelo partido censurante usa da palavra, a iniciar e a encerrar o debate, o primeiro signatário e depois diz que o Primeiro-Ministro tem o direito de intervir, mas não diz que ele tem de o fazer obrigatoriamente, porque o Primeiro-Ministro pode não intervir! Ele tem esse direito, mas não tem essa obrigação - e esta é a única diferença. Mas, para que ele possa delegar este direito, seria preciso que o Regimento o dissesse expressamente.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Estamos todos de acordo, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: - Mas o problema não existe, desde que o partido esteja de acordo.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, é só para dizer, muito rapidamente, qual é a posição exacta do PCP nesta matéria.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Presidente, se o partido que apresenta a moção não se opuser a que não seja o Sr. Primeiro-Ministro a intervir, pode não ser, mas só e exclusivamente nesta situação.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, é evidente que, regra geral, o consenso supera todas as regras. Por isso mesmo, perguntei se não havia oposição. Porém, a interpretação que faço do Regimento é a única literalmente defensável, Sr. Deputado, e quanto a isto é que não há dúvida alguma!

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, como pessoa ansiosa por ouvir as duas intervenções, quero só lembrar à Mesa que no final do debate da moção de censura apresentada pelo CDS-PP, sem que fosse suscitado este incidente, foi o Dr. Jaime Gama que fez a intervenção em nome do Governo.

O Sr. Presidente: - É verdade, Sr. Deputado, mas neste debate o incidente foi suscitado. O incidente não foi suscitado pelo Sr. Primeiro-Ministro nem pelo facto de o Sr. Ministro do Estado e dos Negócios Estrangeiros ter avançado para a tribuna, ele já tinha sido suscitado antes, pelo que eu disse que, se houvesse consenso, com certeza. O problema não voltou a colocar-se, mas eu não poderia ignorar o que se tinha passado antes. Não levanto problemas por gosto!
Mas, uma vez que há entendimento, o Sr. Ministro do Estado e dos Negócios Estrangeiros tem a palavra para produzir a intervenção de encerramento do debate em representação do Governo.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Jaime Gama): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Sabíamos que seria necessariamente apresentada uma moção de censura pelo PSD desde que o PSD falhou a sua intervenção no debate da moção de censura apresentada pelo CDS-PP.

Risos do PS.

Por isso, estávamos preparados para ela, mesmo que ela fosse extemporânea na agenda parlamentar - é insólito a apresentação de uma moção de censura de carácter genérico na reabertura dos trabalhos, no início da sessão legislativa - e mesmo que o próprio PSD tivesse apresentado quatro motivos para esta moção de censura, que foram variando ao longo do tempo que antecedeu a realização deste debate.
A moção de censura, primeiro, foi um diktat, depois, foi uma crítica ao velho ciclo político, depois, já uma crítica ao novo ciclo governativo, mal ele tinha acabado de iniciar-se, e, por fim, até surpreendentemente, no dia de hoje, a moção de censura já era para o próprio PSD um teste à performance do líder!

Risos do PS.

É sintomático que esta moção de censura tenha tido a génese que teve e o desenvolvimento político que apresentou ao longo de alguns dias e semanas.
O Sr. Deputado interpelante, Durão Barroso, foi muito claro ao situar politicamente a moção de censura no início da sua intervenção. Ele disse que esta moção de censura se destinava a clarificar, no Parlamento, a situação política e a clarificar se esta Assembleia era capaz de gerar uma maioria de apoio a este Governo.
Pois bem, Sr. Deputado Durão Barroso, agora terá de extrair as ilações e as consequências de uma moção de censura que vai, obviamente, ser derrotada e que nem sequer conseguiu alcançar o pleno das forças políticas da oposição nesta Câmara. É necessário que extraia as consequências sobre o facto de que a moção de censura

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apresentada pelo PSD ir ser derrotada na Assembleia da República.
De resto, gostava de lembrar a VV. Ex.as que o eleitorado foi sábio ao limitar a possibilidade de a oposição, nesta Legislatura, usar um instrumento de que dispõe para derrubar os governos, isto é, as moções de censura, porque não deu à oposição um número suficiente de Deputados para fazer aprovar uma moção de censura e, consequentemente, para fazer derrubar o Governo na Assembleia da República. É muito importante que a própria oposição reflicta sobre o mandato que recebeu em termos de eleitorado quanto à eficácia - neste caso, à não eficácia! - das moções de censura.
O eleitorado, ao votar como votou, fez também uma opção de estabilidade, uma opção por uma oposição forte e com grande dimensão no Parlamento mas uma opção pela estabilidade governativa, porque recusou à oposição o principal instrumento constitucional para o derrube dos governos. A oposição tem que ter isso em consideração como questão de princípio e, muito particularmente, a partir do chumbo da moção de censura do PSD na Assembleia da República, tem que tirar as ilações necessárias quanto à estabilidade dos governos. Deve tirar daqui todas as consequências, designadamente em relação à discussão e à votação do Orçamento do Estado para o próximo ano.
De resto, o impedimento de eleições antecipadas por via de uma moção de censura com sucesso está também reforçado pela própria expectativa natural do País em relação ao futuro resultado das eleições presidenciais, visto que não é previsível nem plausível que os candidatos que incluiriam no seu programa político a dissolução da Assembleia da República e, consequentemente, o derrube deste Governo, tenham a menor viabilidade política. É preciso também tomar em consideração essas balizas deixadas claras pelo eleitorado: uma baliza em relação à Assembleia da República e outra em relação às futuras eleições presidenciais.
O PSD apresentou uma moção de censura sem se basear em qualquer alternativa programática, o que é o menos, mas, sobretudo, sem se basear em qualquer alternativa política na própria Câmara ou, mesmo, na perspectiva da realização de qualquer eventual mudança política com recurso a eleições. Isto significa que a moção de censura constituiu mais um valor interno para o PSD no sentido de travar alternativas no seu interior do que propriamente de apresentar alternativas ao País.
Vem o PSD brandindo a noção de crise - é a luta pela introdução da palavra «crise» no vocabulário político -, mas nada existe de mais distante da realidade do País. Quando o PSD governava, em 1995, a taxa de desemprego era de 7,2%, sendo hoje de 3,8%, quase metade; foram criados 277 000 postos de trabalho; a remuneração dos trabalhadores é crescente; a taxa de juro que, em 1995, era, para as empresas, de 12% é, hoje, de 6%; a taxa que era para o crédito à habitação de 15% é, hoje, de 7%; a inflação era superior a 4% e é hoje inferior a 3%; o crescimento do Produto era de cerca de 2% e, hoje, é superior a 3%; houve um aumento da receita fiscal das contribuições para a segurança social e do volume de negócios das empresas, do emprego e o crescimento do investimento. Tudo isto demonstra como a vossa visão de crise não tem sustentação na sociedade portuguesa e se há dificuldades, e algumas existem, essas não seriam enfrentadas com a crise política para que sistematicamente o PSD vem fazendo apelo, sem alternativa programática e sem alternativa política.
O PSD quer afirmar a crise para agravar todas as dificuldades, não as do Governo do PS mas as próprias dificuldades do País. A instabilidade é o seu objectivo, e não a mudança política,…

O Sr. António Capucho (PSD): - Não é verdade!

O Orador: - … e o seu alvo táctico é o de impedir o ciclo da legislatura. E tudo vale no sentido da dramatização.
Até há dirigentes e responsáveis do PSD que já aparecem a criticar o Governo pela baixa taxa de desemprego conseguida e há outros que, em matéria de política de combustíveis, se remetem ao silêncio. Hoje, gostaríamos de ter visto o principal líder da oposição propor um preço para o litro de gasolina e para o litro de gasóleo como alternativa a uma questão concreta que tanto tem preocupado a liderança do PSD.

A Sr.ª Rosa Maria Albernaz (PS): - Muito bem!

O Orador: - Pois bem, o calendário político que o PSD pretende vai ser derrotado com a votação desta moção de censura. A clarificação está feita: a Assembleia reforça a legitimidade do Governo e a instabilidade não vai estar no horizonte mas, sim, uma cultura acrescida de responsabilidade, como aquela pela qual se tem batido, e continuará a bater, o Governo e a bancada do Partido Socialista que aqui o apoia.

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, nesta fase de encerramento, tem a palavra o Sr. Deputado Durão Barroso.

O Sr. Durão Barroso (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Valeu a pena apresentarmos esta moção de censura, desde logo para ver as curiosas reacções do partido do Governo à própria apresentação da moção de censura.
Quando apresentámos a moção de censura, indicámos razões. Pode estar-se ou não de acordo com a nossa fundamentação, mas indicámos razões: preocupa-nos muito a evolução negativa do País, sobretudo o facto de estarmos a inverter a tendência que vinha sendo registada, que é a de nos aproximarmos da média da União Europeia; preocupa-nos imenso a degradação da autoridade do Estado e a falta de segurança que as pessoas sentem; preocupa-nos, também, o facto de se ter quebrado o aparente consenso que havia em matéria de luta contra a droga. Esta era a substância da moção de censura.
Mas o Governo nunca quis verdadeiramente discutir a substância da moção de censura. O Governo quis discutir a forma, a oportunidade. O Governo quis desviar o debate para as questões acessórias do jogo político, da estratégia política. É uma táctica que nós já conhecemos ao Governo: sempre que é confrontado pelo País, procura atirar as responsabilidades para qualquer outra questão, seja as

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lutas entre os partidos da oposição, seja qualquer conflitualidade dentro do maior partido da oposição.

Risos do PS.

Nós poderíamos também responder com a conflitualidade dentro do Governo e dentro do maior partido da oposição. Mas cabe perguntar: de quem é a responsabilidade da situação no País?

Vozes do PSD: - Do PS!

O Orador: - Por que razão estão as famílias, hoje em dia, endividadas? É por causa do PSD?
Por que razão é que Portugal se está a afastar da média da União Europeia? É por causa do PSD?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por que razão é que em Portugal se sente cada vez mais intranquilidade, insegurança e até muito medo de os idosos saírem à rua ou, mesmo, esperarem na sua própria casa pelos seus familiares? A culpa é do PSD?
A culpa, de facto, é de um Governo que não corresponde às expectativas, nem sequer às expectativas daqueles que nele votaram. Por isso esta tentativa do Governo de desviar o debate da substância, da insegurança e da situação económica do País para as questões acessórias do jogo e da estratégia política.
O Governo, ao fim ao cabo, não reconhece ao PSD o direito de apresentar uma moção de censura.

Protestos do PS.

Quando o PS estava na oposição e era líder parlamentar o Eng.º Guterres ou também, já agora, o Dr. Jaime Gama, eles apresentaram as suas moções de censura a governos que tinham a maioria absoluta e sabiam que não tinham qualquer hipótese de os derrubar com aquelas moções de censura!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É bem verdade!

Protestos do PS.

O Orador: - Mas aquilo que era um direito para o Partido Socialista parece não ser um direito para o Partido Social Democrata! Curiosa concepção de democracia e de socialismo aquela que tem este Governo!

Aplausos do PSD.

Mas eu compreendo por que é que isso acontece!

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Então, diga lá!

O Orador: - Isso não acontece porque o Partido Socialista ou o Governo e o Sr. Primeiro-Ministro tenham qualquer instinto negativo contra a democracia.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Hélas!

O Orador: - Acho que isso acontece por uma outra razão que eu só posso identificar como tendo que ver com a psicologia política do actual Primeiro-Ministro!

Risos do PS.

Eu vou conhecendo o actual Primeiro-Ministro! O Eng.º Guterres tem uma característica. Eu não digo que ele não queira que haja oposição, mas, no fundo, ele gostava que a oposição apoiasse o Governo!

Risos do PS.

Ele acha que a oposição deve apoiar o Governo!

Aplausos do PSD.

O Eng.º Guterres pensa assim: eu ando a esforçar-me imenso, eu estive sem dormir quando foi a questão de Timor, eu trabalhei imenso na presidência da União Europeia e estes ingratos - a oposição! - não reconhecem o meu valor!

Protestos do PS.

O Eng.º Guterres, ao fim e ao cabo, o que é que gostaria? Gostaria de, de vez em quando, vir aqui - concedo -, de vez em quando, reconheceria algum erro, até era capaz de pedir desculpa, pediria à oposição para apresentar alternativas, até era capaz de seguir algumas sugestões, como aquelas que eu lhe fiz em termos de remodelação,…

Aplausos de PSD.

Risos do PS.

… mas aquilo que o Eng.º Guterres não compreende, custa-lhe efectivamente a compreender - aliás, ele é sincero nesta sua posição! -, é por que razão a oposição se opõe ao Governo,…

Risos do PS.

… por que razão a oposição critica o Governo, por que razão, ao fim e ao cabo (e sejamos agora um pouco sérios), a oposição dá voz àqueles que, fora desta Assembleia, já não acreditam no Governo…

O Sr. António Capucho (PSD): - São a maioria dos portugueses!

O Orador: - … e estão sinceramente preocupados com a evolução negativa que o País tem tido ao longo destes últimos anos!

Aplausos do PSD.

Nós apresentámos preocupações reais, sobretudo relativamente à economia. E dou-lhe mais um conselho, Sr. Eng.º Guterres: Sr. Primeiro-Ministro, olhe para a economia! Atenda verdadeiramente ao que se está a passar em termos de problemas estruturais da nossa economia!

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Não foi boa - desculpe-me que lhe diga - a sua solução de manter o actual Ministro das Finanças. Por uma razão: a partir do momento em que o Sr. Primeiro-Ministro retira ao Ministro das Finanças a pasta da economia, das duas, uma: ou o Sr. Primeiro-Ministro reconhece que ele não tinha capacidade para manter a economia ou o Sr. Primeiro-Ministro reconhece que não tinha capacidade para formar o seu Governo tal como o formou há algum tempo atrás.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A questão é esta, Sr. Primeiro-Ministro: em termos de economia, ao contrário do que agora sugeriu o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, ninguém está preocupado pelo facto de baixar o desemprego. Todos estamos satisfeitos com isso!
Estamos, sim, preocupados com um dado, que é este: se, estamos, como o Governo diz, apesar de esse dado ser contestado, praticamente em situação de pleno emprego, se não podemos continuar a estimular a procura interna, porque está praticamente esgotada essa possibilidade dado o sobreaquecimento que já se nota, como o Sr. Ministro das Finanças há pouco reconheceu, se as importações estão a crescer mais do que as exportações,…

Protestos do PS.

… qual é o potencial de crescimento para a nossa economia nos próximos anos?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Claro!

O Orador: - Por onde e como vai Portugal crescer?!
Está esgotado o modelo de crescimento que este Governo defendeu, que foi um modelo de crescimento assente no estímulo à procura interna, que foi um modelo de crescimento assente no consumismo e no despesismo. Esse modelo está esgotado, até por razões de natureza externa.
Por isso, hoje, nós temos em Portugal um problema estrutural. Eu não culpo o Governo pelo problema estrutural. Mas temos um problema estrutural, que é o de estarmos a crescer muito menos do que a Espanha, muitíssimo menos do que a Irlanda, quando devíamos estar a crescer mais para ver se mais tarde ou mais cedo chegávamos a esse patamar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Este é o problema estrutural da nossa economia!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - É isso mesmo!

O Orador: - Eu não culpo o Governo pelo problema estrutural, mas responsabilizo o Governo por, ao longo destes anos, não ter tomado uma única medida capaz de enfrentar, a sério, esse problema estrutural!

Aplausos do PSD.

É por isso que, a terminar o debate, quero dizer-vos, Srs. Deputados, que com certeza nós antecipamos qual seja o resultado desta moção. É verdade que por causa da aritmética e da repartição das forças políticas neste Hemiciclo a moção de censura será, com certeza, derrotada, mas também é verdade que o Governo não vai conseguir o apoio de um único Deputado, além daqueles que constituem o seu grupo parlamentar. Ou seja, é verdade que este Governo continua a pensar que, para governar, não vai contar com o apoio maioritário nesta Câmara!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Vamos ver!

O Orador: - Este Governo, para governar, está a contar com a abstenção, nesta Câmara. Não é um Governo de decisão. Não é um Governo de maioria,…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … não é um Governo de coerência, é um Governo de abstenção!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - É um empata!

O Orador: - Está a contar com uma ou outra abstenção que venham a viabilizar o seu Orçamento!
Por isso, quero dizer-lhe, Sr. Primeiro Ministro, isto: é verdade, sem dúvida, que por causa da repartição actual neste Parlamento a moção de censura será previsivelmente derrotada, mas também é verdade, para quem viu e ouviu este debate e não conseguiu descortinar uma única voz de apoio fora do Partido Socialista às suas posições, que a moção pode ser derrotada mas, no debate, quem foi derrotado foi o Governo e o partido que o apoia.

Aplausos do PSD, de pé.

O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, chegados ao fim da fase de encerramento do debate da moção de censura n.º 2/VIII, apresentada pelo PSD, temos que votá-la.
Pergunto às direcções das bancadas se estão preparadas para esse momento solene.

Pausa.

Posso interpretar o vosso silêncio como de assentimento, pelo que vamos, então, passar à votação da moção de censura n.º 2/VIII, apresentada pelo PSD.

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS e do BE, votos a favor do PSD e do CDS-PP e abstenções do PCP e de Os Verdes.

Aplausos do PS, de pé.

Srs. Deputados, a próxima sessão plenária realiza-se amanhã, quinta-feira, dia 21, às 15 horas, e terá como ordem do dia a interpelação n.º 5/VIII - Centrada na reforma tributária e nas políticas de combate à fraude fiscal (BE).
Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas.

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Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Fernando Pereira Serrasqueiro
Manuel Francisco dos Santos Valente
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira

Partido Social Democrata (PSD):
Armando Manuel Dinis Vieira

Partido do Centro Democrático Social (CDS-PP):
Paulo Sacadura Cabral Portas

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Jovita de Fátima Romano Ladeira
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge

Partido Social Democrata (PSD):
Feliciano José Barreiras Duarte
José Eduardo Rêgo Mendes Martins
Maria Eduarda de Almeida Azevedo

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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