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Quinta-feira, 18 de Novembro de 1999 I Série — Número 8

VIII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1999-2000)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 17 DE NOVEMBRO DE 1999

Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex. mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos José de Almeida Cesário António João Rodeia Machado António José Carlos Pinho

S U M Á R I O

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minu- (CDS-PP), João Amaral (PCP) e Isabel Castro (Os Verdes) e também tos. o Sr. Presidente.

Após discussão, foi igualmente aprovado o voto n.º 8/VIII — De Antes da ordem do dia. — Deu-se conta da apresentação dos pesar pelo massacre de Santa Cruz em 12 de Novembro de 1991 (PS,

projectos de lei n.os 10 e 11/VIII, da proposta de lei n.º 1/VIII e dos PSD, PCP, CDS-PP, Os Verdes e BE), sobre o qual intervieram os projectos de resolução n.os 3 e 4/VIII, de requerimentos e da resposta Srs. Deputados Natália Carrascalão (PSD), Carlos Luís (PS), Ber-a alguns outros. nardino Soares (PCP), Isabel Castro (Os Verdes), Miguel Anacoreta

Foi aprovado um parecer da Comissão Eventual de Verificação Correia (CDS-PP) e Manuel Alegre (PS). de Poderes relativo à substituição de um Deputado do PS. Procedeu-se ao debate de urgência, requerido pelo PCP e pelo

Em declaração política, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia (Os PSD, sobre o acordo de pescas com Marrocos. Usaram da palavra, a Verdes) abordou a necessidade de se proceder à revisão do regime de diverso título, além do Sr. Secretário das Pescas (José Apolinário), os avaliação do impacte ambiental, tendo informado que o seu grupo Srs. Deputados Honório Novo (PCP), João Maçãs (PSD), Paulo parlamentar vai apresentar um projecto de lei nesse sentido e critica- Portas (CDS-PP), António Martinho (PS), Lino de Carvalho (PCP) e do o Governo pela falta de vontade política nesta matéria. No final, Luís Fazenda (BE). respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Manuel Queiró (CDS-PP). Ordem do dia. — Procedeu-se à apreciação da proposta de

Também em declaração política, o Sr. Deputado Basílio Horta resolução n.º 116/VII — Aprova, para ratificação, a Convenção de (CDS-PP) criticou o Governo pela solução encontrada para o caso Conciliação e Arbitragem no quadro da OSCE, concluída em Esto-Champalimaud/Santander, que considerou uma desautorização e uma colmo a 15 de Dezembro de 1992, no Terceiro Conselho Ministerial submissão à Comissão Europeia, em contradição com afirmações da OSCE, tendo proferido intervenções, além do Sr. Secretário de produzidas durante o debate do Programa do Governo. No fim, Estado das Comunidades Portuguesas (José Lello), os Srs. Deputados respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Manuel Henrique de Freitas (PSD), Mafalda Troncho (PS), Bernardino dos Santos (PS), Lino de Carvalho (PCP), Francisco Louçã (BE) e Soares (PCP) e Francisco Louçã (BE). Manuela Ferreira Leite (PSD). Foi igualmente apreciada a proposta de resolução n.º 117/VII

Foi aprovado o voto n.º 4/VIII — De saudação ao ex-Presidente — Aprova o Tratado entre a República Portuguesa e o Reino de do Conselho de Administração da sociedade Porto 2001, S.A., Dr. Espanha para a Repressão e Tráfico Ilícito de Droga no Mar, Artur Santos Silva, pela acção desenvolvida no âmbito do projecto assinado em Lisboa a 2 de Março de 1998. Usaram da palavra, Porto – Capital Europeia da Cultura (PSD). Usaram da palavra os além do Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, os Srs. Deputados António Montalvão Machado (PSD), Isabel Pires de Srs. Deputados Telmo Correia (CDS-PP), Nuno Baltazar Mendes Lima e Manuel Alegre (PS), Francisco Louçã (BE), Sílvio Rui Cervan

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(PS), António Filipe (PCP), Francisco Louçã (BE) e Carlos Encar- da República de Moçambique, da República Portuguesa e da Repú-nação (PSD). blica Democrática de S. Tomé e Príncipe, tendo-se pronunciado, além

Por fim, foi apreciada a proposta de resolução n.º 137/VII — do Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, os Srs. Aprova o Protocolo Modificativo ao Acordo Ortográfico da Língua Deputados Manuel Frexes (PSD), Rosado Fernandes (CDS-PP), Portuguesa, assinado na Praia, Cabo Verde, aos 17 de Julho, pelos Luísa Mesquita (PCP) e António Braga (PS). Governos da República de Angola, da República Federativa do O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 45 minutos. Brasil, da República de Cabo Verde, da República da Guiné-Bissau,

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O Sr. Presidente: —Srs. Deputados, temos quórum, José Carlos Lourenço Tavares Pereira pelo que declaro aberta a sessão. José Carlos Pinto Basto Mota Torres

José da Conceição Saraiva Eram 15 horas e 30 minutos. José de Matos Leitão José Eduardo Vera Cruz Jardim Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados: José Ernesto Figueira dos Reis

José Manuel de Medeiros Ferreira Partido Socialista (PS): José Manuel Pires Epifânio

Agostinho Moreira Gonçalves José Manuel Rosa do Egipto

Aires Manuel Jacinto de Carvalho José Manuel Santos de Magalhães

Alberto Bernardes Costa José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros

Alexandre António Alves Chaves José Rodrigues Pereira dos Penedos

Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes Jovita de Fátima Romano Ladeira

António Alves Marques Júnior Júlio Francisco Miranda Calha

António Alves Martinho Laurentino José Monteiro Castro Dias

António Bento da Silva Galamba Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal

António de Almeida Santos Luís Manuel Carvalho Carito

António Fernandes da Silva Braga Luís Miguel Gomes Miranda Teixeira

António Fernando Marques Ribeiro Reis Luís Pedro de Carvalho Martins

António Fernando Menezes Rodrigues Luísa Pinheiro Portugal

António Jorge Freire de Brito Calvete Luiz Manuel Fagundes Duarte

António José Gavino Paixão Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho

António Manuel Dias Baptista Manuel Alberto Barbosa de Oliveira

António Manuel do Carmo Saleiro Manuel Alegre de Melo Duarte

Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho Manuel António dos Santos

Artur Rodrigues Pereira dos Penedos Manuel Francisco dos Santos Valente

Bruno Renato Sutil Moreira de Almeida Manuel Joaquim Barbosa Ribeiro

Carlos Alberto Margarida Maria Santos Soares da Rocha Gariso

Carlos Manuel Luís Maria Amélia do Carmo Mota Santos

Casimiro Francisco Ramos Maria Celeste Lopes da Silva Correia

Cláudio Ramos Monteiro Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa

Dinis Manuel Prata Costa Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira

Eduarda Maria Castro de Sousa Maria do Céu da Cruz Vidal Lourenço

Eduardo Ribeiro Pereira Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro

Fernando Manuel de Jesus Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa

Fernando Pereira Serrasqueiro Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta

Filipe Mesquita Vital Maria Isabel da Silva Pires de Lima

Francisco José Pereira de Assis Miranda Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino

Francisco Xavier Pablo da Silva Torres Maria José Vidal do Rosário Campos

Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho Maria Luísa Silva Vasconcelos

Helena Maria Mesquita Ribeiro Maria Teresa de Oliveira Ferreira Coimbra

Isabel Maria Batalha Vigia Polaco d’Almeida Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque

Isabel Maria dos Santos Barata Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura

Jamila Bárbara Madeira e Madeira Nelson Madeira Baltazar

João Alberto Martins Sobral Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes

João Cardona Gomes Cravinho Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte

João Carlos da Costa Ferreira da Silva Paulo Alexandre de Carvalho Pisco

João Francisco Gomes Benavente Renato Luís de Araújo Forte Sampaio

João Macedo Lourenço Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves

João Pedro da Silva Correia Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz

João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira Rosalina Maria Barbosa Martins

João Rui Gaspar de Almeida Rui do Nascimento Rabaça Vieira

Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida Rui Manuel Leal Marqueiro

Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos

Jorge Lacão Costa Victor Brito de Moura

Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro Vítor Manuel Alves Peixoto

José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro Vítor Manuel Caio Roque

José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

José Aurélio da Silva Barros Moura

José Carlos Correia Mota de Andrade Partido Social Democrata (PSD):

José Carlos da Cruz Lavrador Adão José Fonseca Silva

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Álvaro dos Santos Amaro Mário da Silva Coutinho Albuquerque Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto Mário Patinha Antão Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso Melchior Ribeiro Pereira Moreira António d’Orey Capucho Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva António da Silva Pinto de Nazaré Pereira Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas António de Carvalho Martins Nuno Miguel Marta de Oliveira da Silva Freitas António Edmundo Barbosa Montalvão Machado Pedro Augusto Cunha Pinto António Manuel da Cruz Silva Pedro José da Vinha Rodrigues Costa António Manuel Santana Abelha Pedro Manuel Cruz Roseta Armando Manuel Dinis Vieira Pedro Miguel de Azeredo Duarte Arménio dos Santos Rui Fernando da Silva Rio Artur Ryder Torres Pereira Rui Manuel Lobo Gomes da Silva Bruno Jorge Viegas Vitorino Sérgio André da Costa Vieira Carlos José das Neves Martins Carlos Manuel de Sousa Encarnação Partido Comunista Português (PCP): Carlos Manuel Marta Gonçalves David Jorge Mascarenhas dos Santos Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes

Eugénio Fernando Sá Cerqueira Marinho António Filipe Gaião Rodrigues

Feliciano José Barreiras Duarte António João Rodeia Machado

Fernando Jorge Loureiro de Roboredo Seara Bernardino José Torrão Soares

Fernando José da Costa Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas

Fernando Manuel Lopes Penha Pereira João António Gonçalves do Amaral

Fernando Santos Pereira Joaquim Manuel da Fonseca Matias

Francisco Baptista Tavares José Honório Faria Gonçalves Novo

Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva Lino António Marques de Carvalho

Henrique José Monteiro Chaves Maria de Fátima Caeiro Queimado Amaral

Henrique José Praia da Rocha de Freitas Maria Luísa Raimundo Mesquita

Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves Maria Natália Gomes Filipe

Hugo José Teixeira Velosa Maria Odete dos Santos

Jaime Carlos Marta Soares Octávio Augusto Teixeira

João Eduardo Guimarães Moura de Sá Vicente José Rosado Merendas

João José da Silva Maçãs

Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte Partido do Centro Democrático Social — Partido

Joaquim Martins Ferreira do Amaral Popular (CDS-PP):

Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa António de Magalhães Pires de Lima Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto António José Carlos Pinho José António de Sousa e Silva Basílio Adolfo de Mendonça Horta da Franca José David Gomes Justino João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo José de Almeida Cesário José Augusto Meleiro Rodrigues José Eduardo Rego Mendes Martins José Duarte de Almeida Ribeiro e Castro José Frederico de Lemos Salter Cid José Miguel Nunes Anacoreta Correia José Luís Campos Vieira de Castro Luís José de Mello e Castro Guedes José Manuel de Matos Correia Manuel Tomás Cortez Rodrigues Queiró José Manuel Durão Barroso Maria Celeste Ferreira Lopes Cardona Lucília Maria Samoreno Ferra Narana Sinai Coissoró Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho Paulo Sacadura Cabral Portas Luís Manuel Machado Rodrigues Raúl Miguel de Oliveira Rosado Fernandes Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan Manuel Alves de Oliveira Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia Manuel Castro de Almeida Manuel Filipe Correia de Jesus Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV): Manuel Joaquim Barata Frexes Manuel Maria Moreira Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia

Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida Isabel Maria de Almeida e Castro

Maria do Céu Baptista Ramos

Maria Eduarda de Almeida Azevedo Bloco de Esquerda (BE):

Maria Manuela Aguiar Dias Moreira Francisco Anacleto Louçã Maria Manuela Dias Ferreira Leite Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda Maria Natália Guterres Viegas C. da Conceição Antunes Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro Maria Teresa Pinto Basto Gouveia ANTES DA ORDEM DO DIA

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O Sr. Presidente: —Srs. Deputados, o Sr. Secretário Pausa. vai proceder à leitura do expediente.

Não havendo inscrições, vamos votar. O Sr. Secretário (Artur Penedos): — Sr. Presidente e

Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram aceites, as Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade. seguintes iniciativas legislativas: projectos de lei n.os 10/VIII — Lei de bases da segurança social (PCP), que O Sr. Presidente: —Inscreveram-se, para declarações baixou à 9.ª Comissão, e 11/VIII — Altera a Portaria n.º políticas, o Sr. Deputado Basílio Horta e a Sr.ª Deputada 29/89, de 17 de Janeiro, que aprova a Tabela de Perfis Heloísa Apolónia. Vejo que o Sr. Deputado Basílio Horta Psicofísicos e de Inaptidões para Efeitos de Prestação do non est hic. Se a bancada do CDS-PP não me garantir que Serviço Militar (Os Verdes), que baixou à 1.ª Comissão; ele vai entrar como uma seta dentro dos próximos minutos, proposta de lei n.º 1/VIII — Alteração à Lei n.º 87-B/98, darei a palavra à Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia e depois de 31 de Dezembro (Lei do Orçamento do Estado para dar-lha-ei a ele. 1999), que baixou à 5.ª Comissão; projecto de resolução n.º 3/VIII — Sobre a «taxa Tobin» (BE); apreciações par- Pausa. lamentares n.os 3/VIII — Decreto-Lei n.º 236/99, de 25 de Junho, que aprova o novo Estatuto dos Militares das For- Tem, então, a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apoló-ças Armadas (PCP) e n.º 4/VIII — Decreto-Lei n.º 439- nia, para uma declaração política. A/99, de 29 de Outubro, que altera o artigo 3.º-A, do De- creto-Lei n.º 379/93, de 5 de Novembro, na redacção da A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presiden-Lei n.º 176/99, de 25 de Outubro (PSD). te, Srs. Deputados: O Regime de Avaliação de Impacte

Foram apresentados na Mesa os seguintes requerimen- Ambiental, incompreensivelmente, continua por rever em tos: nos dias 5 e 9 de Novembro — aos Ministérios da Portugal. Significa isto que inúmeros projectos continuam Saúde e da Educação e ao Secretário de Estado Adjunto e a culminar em obras que não são sujeitas a uma avaliação das Obras Públicas, formulados pela Sr.ª Deputada Luísa de impacte ambiental séria, quer porque não são sujeitos a Mesquita; ao Sr. Primeiro-Ministro e ao Ministro de Esta- parecer vinculativo resultante do estudo de impacto ambi-do e dos Negócios Estrangeiros, formulados pela Sr.ª De- ental, quer porque não envolvem seriamente uma discus-putada Manuela Aguiar; ao Ministério da Justiça, formula- são pública desejável, que, muitas vezes, não passa de do pelo Sr. Deputado Ricardo Fonseca de Almeida. mera farsa porque não é tida em conta, quer porque a

Na reunião plenária de 10 de Novembro: ao Ministério implementação das medidas minimizadoras fica por efec-da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado tuar, quer ainda porque continuam a permitir decisões Luís Miguel Teixeira; ao Governo, formulado pelo Sr. anteriores aos estudos que mais não servem do que enco-Deputado Mota Torres; ao Ministério da Defesa Nacional, mendas de argumentos para justificar decisões previamen-formulado pelo Sr. Deputado Carlos Encarnação; ao Secre- te tomadas. tário de Estado Adjunto e das Obras Públicas, formulado Com isto, continua a desvirtuar-se todo o processo de pelo Sr. Deputado Manuel Frexes; ao Ministério da Edu- avaliação de impacte ambiental, desvirtuando todo o senti-cação, formulado pelo Sr. Deputado José Cesário; ao do deste regime, que tem como objectivo a avaliação dos Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e efeitos de determinadas obras no meio ambiente, no terri-das Pescas, formulado pelo Sr. Deputado Mota Amaral; tório e na qualidade de vida dos cidadãos, tal como define aos Ministérios das Finanças e da Economia, formulados a Lei de Bases do Ambiente. E, com isto, continua o Go-pelos Srs. Deputados Lino de Carvalho e Odete Santos; ao verno a permitir que os interesses dos grandes grupos Ministério da Saúde, formulado pela Sr.ª Deputada Natália económicos se sobreponham a um direito fundamental dos Filipe. cidadãos, previsto na Constituição da República Portugue-

O Governo respondeu aos requerimentos apresentados sa: o direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecolo-pelos Srs. Deputados Bernardino Soares e Lino de Carva- gicamente equilibrado. lho. Ora, a questão é precisamente essa. Que outra razão

Temos também um relatório e parecer da Comissão haveria para o eterno adiamento da revisão do Regime de Eventual de Verificação de Poderes que importa tratar Avaliação de Impacte Ambiental, quando, em termos dis-desde já e que é do seguinte teor: cursivos, o Governo e o PS afirmam da necessidade dessa

Em reunião da Comissão Eventual de Verificação de revisão e, na prática, inviabilizam todas as hipóteses de Poderes, realizada no dia 17 de Novembro de 1999, pelas alteração e credibilização do regime? É assim por demais 14 horas e 30 minutos, foi observada a seguinte substitui- visível que o problema reside na falta de vontade política ção de Deputado do Grupo Parlamentar do PS: Fernando do Governo nesta matéria, chegando ao limite do profundo Ribeiro Moniz (Círculo Eleitoral de Braga) por Ricardo desrespeito pelos direitos das pessoas. É que, de uma vez Manuel Ferreira Gonçalves. por todas, tem de se ter em conta que a avaliação de

O parecer é no sentido de que a substituição em causa é impacte ambiental não tem por objectivo proibir projectos, de admitir, uma vez que se encontram verificados os requi- inviabilizar tudo e mais alguma coisa, mas tem um objecti-sitos legais. vo fundamental, que é avaliar da sustentabilidade ambien-

tal, social e económica dos projectos, é escolher, muitas O Sr. Presidente: —Srs. Deputados, o parecer está em vezes, a opção mais equilibrada de entre opções diversifi-

discussão. cadas e minimizar os custos do empreendimento de deter- minadas obras.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio ser, porventura, justo reconhecer que o Grupo Parlamentar de Os Verdes A Oradora: —Sr. Presidente, dizia eu que, na verda-tem dado um precioso contributo para a discussão e análise de, provou-se que a autorização legislativa não serviu para desta matéria na Assembleia da República. Desde logo, mais do que o arrastamento do processo. Daí nada resul-com a apresentação de um projecto de lei, na anterior tou! Como adverte o Sr. Provedor de Justiça, em recomen-legislatura, que propunha um novo Regime de Avaliação dação dirigida ao Sr. Presidente da Assembleia da Repú-de Impacte Ambiental, que acabou por ser rejeitado e que blica, a autorização legislativa, nos termos constitucionais, foi sempre acompanhado do argumento, por parte do caduca com o termo da legislatura e voltamos, por isso, à Governo e do PS, de que se estava a ultimar uma alteração estaca zero. E imaginem os Srs. Deputados que esta histó-à Directiva Comunitária 85/337/CEE, da qual, aliás, já se ria toda decorreu com o XIII Governo Constitucional, que conheciam todos os princípios e pressupostos, afirmando- assumia como sua prioridade, ao nível ambiental, a credi-se que não faria sentido legislar antecipadamente, permi- bilização dos estudos de impacte ambiental! Desta priori-tindo-se assim a continuidade de inúmeros atentados dade resultou um «tudo na mesma» durante uma legislatu-ambientais. O mesmo argumento, aliás, que o PSD dera em ra inteira. Olhando agora para o Programa do XIV Gover-Maio de 1992 para justificar a rejeição de iniciativas legis- no, a vergonha resultante das atitudes de descrédito já lativas sobre a matéria, o que então o PS contestou. conseguiu eliminar dos textos essa conversa!

Entretanto, o Estado português sentava-se no banco dos Sr. Presidente e Srs. Deputados, Os Verdes consideram réus do Tribunal de Justiça, por transposição incorrecta da que basta de brincadeiras com coisas tão sérias quando se Directiva 85/337/CEE, o que levou Os Verdes a solicitar trata de um dos instrumentos fundamentais de política para um debate de urgência nesta casa, na medida em que o o ambiente como é a necessidade de uma avaliação de Decreto-lei n.º 186/90 deixava de fora inúmeros projectos impacte ambiental séria, credível e, fundamentalmente, sujeitos a avaliação de impacte ambiental. E, afinal, antes responsável por um desenvolvimento sustentável que afine da revisão da dita directiva, o Governo teve que mexer na progresso e preservação ambiental e qualidade de vida. Ou legislação sobre a matéria, de modo a permitir, no mínimo, se trata de reconhecer que o regime de avaliação de impac-uma transposição correcta, pelo Decreto-lei n.º 278/97, te ambiental não serve, de uma vez por todas, e há vontade sendo que as consequências desta «brincadeira» pesaram política na sua alteração, ou, então, que se reconheça que o por certo nos bolsos dos contribuintes. único objectivo é o dinheiro que entra com projectos de

Portanto, afinal, o Governo, que não queria mexer na grande impacto no meio ambiente, e que serve interesses legislação, teve de fazê-lo, não por interesses de defesa da que em nada têm que ver com desenvolvimento equilibra-qualidade de vida das pessoas, de garantia de um desen- do. Por isso, esta declaração política serve também para volvimento sustentável, mas por obrigação do Tribunal de informar que Os Verdes vão voltar a apresentar novo pro-Justiça, isto é, para utilizar as próprias palavras da Sr.ª jecto de lei para a revisão do Regime de Avaliação de Ministra de então, por «arrastamento» e por «medo de Impacte Ambiental e esperemos que desta vez a Assem-punição» e não, ao contrário do que afirmava, por interesse bleia da República dê a volta necessária à garantia do futu-do País. ro no ambiente, território e qualidade de vida em Portugal.

Entretanto, havia sido publicada a nova Directiva 97/11/CE, cujo prazo de transposição era Março de 1999, Aplausos de Os Verdes e do PCP. mas a vontade política de revisão do Regime de Avaliação de Impacte Ambiental era de tal modo falsa que a mesma, O Sr. Presidente: —Para pedir esclarecimentos, tem a até hoje, não foi transposta, continuando o actual regime a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró. servir os interesses da obra a todo o custo, mesmo que o custo seja a acumulação de atentados ambientais e da irre- O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): — Sr. Presidente, versibilidade desses crimes, com o aval do Governo. E Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, há um pressuposto fun-referiam então a Sr.ª Ministra Elisa Ferreira e a Sr.ª Depu- damental na sua intervenção que é o de que o facto de os tada Natalina Moura, em 1997, que os trabalhos de trans- estudos de impacte ambiental não terem carácter vinculati-posição estavam de tal modo adiantados que se considera- vo desvirtua por completo o seu papel. Poder-se-ia pensar vam com um ano de avanço. O certo é que a directiva não que, sem um carácter vinculativo, os estudos acabam por foi transposta! não servir o seu objectivo, acabam por não servir para

Entretanto, armando-se em bom dialogante, vem o nada. Ora, a meu ver e no desta bancada, as coisas não são Governo, em Maio deste ano, apresentar uma proposta de exactamente assim: os estudos acabam por desempenhar, autorização legislativa que visa a alteração do Regime de em Portugal, sobretudo para as obras e para os projectos Avaliação de Impacte Ambiental. Na verdade, provou-se mais polémicos, um papel de despertar as consciências e que a autorização legislativa não serviu para mais do que o de chamar a atenção para que não podemos desprezar e arrastamento do processo. devemos valorizar, inclusivamente, esta circunstância.

Chamo a atenção da Sr.ª Deputada para o facto de que O Sr. Presidente: —Sr.ª Deputada, dê-me licença de a há certas obras de iniciativa pública que se destinam, jus-

interromper. tamente, a actuar na área ambiental e que seria desejável, a Há um ruído de fundo na sala e peço aos Srs. Deputa- nosso ver, que se começasse a mudança por aí. Não é por

dos que façam o silêncio possível para que a Sr.ª Deputada acaso que os estudos não são, eles próprios, vinculativos, possa fazer-se ouvir em condições. alguma razão há-de haver. Mas, a desejarmos uma mudan-

Queira continuar, Sr.ª Deputada.

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ça, será bom não apontar para uma mudança radical e nesta matéria para a efectiva credibilização desses estudos. preferir uma mudança gradativa. O Sr. Deputado terá depois oportunidade de ler também

A pergunta que deixo à Sr.ª Deputada é se não será atentamente o projecto de lei que Os Verdes irão apresen-mais positivo, nessa circunstância, defender que, para tar sobre a matéria e que cremos que será um contributo certos tipos de obra, passem os estudos a ter carácter vin- fundamental para essa mesma credibilização. culativo.

Por exemplo, quanto à localização da incineradora para O Sr. Presidente: —Também para uma declaração resíduos tóxicos industriais perigosos em Estarreja, decidi- política, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta. da pelo governo da altura, ou quanto à incineração em cimenteiras, decidida já por este Governo, é sabido que os O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. estudos de impacte ambiental desautorizaram a decisão Deputados: O Sr. António Champalimaud tem todo o direi-que foi tomada, isto é, evidenciaram que a decisão teve um to de proteger os seus interesses, desde que respeite a lei. carácter político. Assim, pergunto se não será, de momen- O Banco Santander tem todo o direito de tentar conquistar, to, mais avisado propor que, para projectos deste tipo, com em Portugal, a quota de mercado que fixar como objectivo, incidência ambiental, de iniciativa pública e de grande desde que respeite a Constituição e a lei portuguesas. Em dimensão, aí sim, os estudos passem a ter carácter vincula- termos políticos de interesse do Estado, não deve esta tivo. Assembleia analisar ou sequer comentar as condutas de

agentes privados, desde que respeitadoras das leis e das Vozes do CDS-PP: —Muito bem! instituições. O Sr. Presidente: —Para responder, tem a palavra a O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia. O Orador: —O que deve interessar a esta Assembleia A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presiden- da República é conhecer em detalhe a política do Governo

te, Sr. Deputado: Agradeço a questão que acaba de me relativamente ao sistema financeiro nacional e saber se o colocar. No entanto, quem ouvisse o pedido de esclareci- Governo considera ou não indispensável manter em mãos mento do Sr. Deputado podia ser levado a pensar que a nacionais os principais centros de decisão do mercado, nossa reivindicação relativamente à credibilização dos como forma de garantir, numa Europa alargada, a nossa estudos de impacte ambiental passaria, única e exclusiva- autonomia e a nossa identidade. mente, pelo carácter vinculativo do parecer dado por estes Todos os países, sem excepção, defendem os seus inte-estudos. Não se trata, naturalmente, disso, embora essa resses de uma forma firme e vigorosa. É ver como a Ale-seja uma questão, na nossa perspectiva, importante para a manha, a França e a própria Espanha o fazem, não temen-credibilização e utilidade dos próprios estudos de impacte do entrar em conflito com a Comissão quando estão em ambiental e da própria avaliação de impacte ambiental, causa aspectos considerados vitais para a preservação da que, como sabe, não se resume aos estudos mas também sua autoridade política. Portugal não pode aceitar que a consagra uma fase de consulta, a qual, do nosso ponto de riqueza ou a influência política sirvam de critério para vista, tem sido mais uma farsa do que outra coisa qualquer. justificar dois pesos e duas medidas na valoração das con-

Portanto, aquilo que pretendemos, no fundo, não ape- dutas dos governos quando está em causa a defesa de rele-nas em relação a determinadas obras mas no conjunto vantes interesses nacionais. abrangente de todas as obras, nomeadamente as previstas Por isso, o CDS-PP entende mal, entende mesmo muito na Directiva 97/11/CE — que ainda não foi transposta e mal, que o Governo português resolva ou pretenda resolver que necessita de o ser efectivamente —, é a credibilização uma situação delicada decorrente de uma decisão sua fun-efectiva dos estudos de impacte ambiental. Ora, isso passa damentada em relevantíssimos interesses nacionais, sub-por muitas outras questões para além do carácter vinculati- metendo-se por inteiro ao diktat da Comissão. vo, nomeadamente pelo facto de não acontecer aquilo que acontece actualmente, ou seja, que sejam tomadas as deci- Aplausos do CDS-PP. sões políticas e que, depois, os estudos de impacto ambien- tal vão servir apenas como meros estudos de argumentação É uma profunda desautorização e é um péssimo prece-para fundamentar as ditas decisões políticas. Isto, na nossa dente, substancialmente agravado com a ida apressada do perspectiva, não pode acontecer! Aliás, é por isso que, por Ministro das Finanças e da Economia a Bruxelas, dando, diversas vezes, não existem alternativas para as decisões a interna e externamente, a imagem de, qual Egas Moniz, tomar; ou seja, são tomadas decisões e os estudos incidem, estar pronto a fazer a paz a qualquer preço para salvar a única e exclusivamente, sobre as decisões tomadas, sem presidência portuguesa. Se Paris valia bem uma missa, a que haja uma abrangência efectiva de escolhas alternati- presidência portuguesa, seguramente, não vale tamanha vas. humilhação.

Portanto, relativamente a esta questão, à credibilização Quanto à forma adoptada pelo Governo para solucionar das consultas públicas, ao carácter vinculativo e a muitas o chamado problema «Champalimaud-Santander», assal-outras questões que estão em causa para a credibilização tam-nos inúmeras dúvidas e não poucas perplexidades. dos estudos de impacte ambiental, eu recomendaria ao Sr. Em primeiro lugar, durante a campanha eleitoral para Deputado que, se não o fez até ao momento, lesse a reco- as eleições realizadas há meia dúzia de dias e ganhas pelo mendação do Sr. Provedor de Justiça feita ao Sr. Presiden- Partido Socialista, o Governo sempre justificou e defendeu te da Assembleia da República, que cremos muito útil politicamente o veto ao negócio privado celebrado entre o

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Sr. Champalimaud e o Banco Santander com base na nalizações. Porém, como explicar que o Presidente do garantia de que o terceiro maior grupo financeiro portu- Conselho de Administração da Caixa tenha ontem vindo guês não iria para Espanha. Durante a discussão do Pro- expressamente admitir que esta instituição pode vir a inte-grama do Governo, o novo Ministro veio a esta Assem- grar definitivamente a Mundial Confiança e o Sotto, au-bleia reafirmar que se mantinha a posição oficial do Estado mentando assim enormemente a estrutura e a dimensão do português. Então, como pode o Governo justificar, decor- grupo que já é o maior grupo financeiro português?! ridos apenas 40 dias sobre o acto eleitoral, a quebra do seu compromisso para com os portugueses, aparecendo agora a O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem! dar o dito por não dito, ao permitir que o Banco Santander e, consequentemente, os espanhóis, integrem os bancos O Orador: —O CDS não pediu a privatização isolada Totta e Crédito Predial, ficando assim com uma quota de e por si só da Caixa Geral de Depósitos, porque considera 10% do mercado nacional, bem maior do que aquela a que, esta instituição um instrumento fundamental do equilíbrio na situação anterior, podiam aspirar? e da própria moralização do sistema financeiro, mas dis-

Por outro lado – e peço a especial atenção do Partido corda com igual intensidade da opção de transformar a Socialista para isto –, se for confirmada a notícia hoje Caixa no tal banco de verdadeira dimensão europeia, feito veiculada pelo Diário Económico de que o Santander vai à custa do mercado e das entidades privadas nacionais. ficar com a participação de 24,5% do Grupo Champali- maud no capital da Petrocontrol, ficando com a porta aber- Aplausos do CDS-PP. ta para entrar no capital da GALP, teremos de concluir que o Governo é totalmente insensível à passagem para mãos De outro modo, Portugal corre o sério risco de adoptar estrangeiras, designadamente espanholas, de centros deci- o modelo próximo do de algumas antigas repúblicas do sores nevrálgicos da nossa economia e do nosso sistema leste europeu, caracterizado pelos grandes protagonistas financeiro. dos sectores chave da economia e das finanças serem em-

presas privadas multinacionais, convivendo com grandes Aplausos do CDS-PP. sociedades de capitais públicos. Algo muito semelhante ao que ocorreu aqui em 1975, quando as sociedades estran-Foi pena, Srs. Deputados do Partido Socialista, que não geiras e multinacionais foram as únicas a ficarem imunes

o tivessem dito durante a campanha eleitoral, pois os por- às nacionalizações que se abateram sobre as empresas tugueses ter-lhes-iam, seguramente, sabido dar a devida portuguesas. resposta.

Numa outra perspectiva, analisando o papel da Caixa Aplausos do CDS-PP. Geral de Depósitos nesta operação, teremos, desde logo, de nos espantar com a insólita e creio que única circuns- O CDS-PP lança daqui o seu alerta ao País para que a tância de o Governo intervir neste processo simultanea- história se não repita, até com alguns dos mesmos prota-mente como parte, enquanto accionista único da Caixa, e gonistas, só que agora aparentemente reciclados ou aditi-como juiz, enquanto decisor administrativo do mesmo. vados. Talvez o facto de o Sr. Ministro acumular as Finanças com a Economia o confunda sobre quais os limites à interven- Risos do CDS-PP. ção do Estado na economia. O Sr. Ministro, embora tenha mudado de líder e de convicções, pelo menos neste caso Finalmente, uma última questão. ainda não mudou de estilo. Quanto é que vai custar aos contribuintes portugueses

esta intervenção da Caixa? É que no último Orçamento do O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem! Estado a Caixa foi objecto de uma dotação de 50 milhões de contos para reforço do seu capital. Ora, será muito pro-O Orador: —Aliás, a nossa perplexidade aumenta vável que a Caixa, para fazer aquisições no valor de cente-

quando constatamos que o Ministro avaliza o negócio feito nas de milhões de contos, necessite de novo reforço de pelo Governo consigo próprio e com o Banco Santander, capital para manter integralmente o ratio de solvabilidade. dispensando autorizações que julgávamos indispensáveis, Se assim é, de quanto vai ser esse reforço? Consta tal re-nomeadamente, no caso, as autorizações do Banco de forço do orçamento suplementar ontem entregue nesta Portugal e do Instituto de Seguros de Portugal. Assembleia? É que devia constar!

Por outro lado, como compatibiliza o Governo o res- peito que diz ter pelo mercado quando nele intervém num O Sr. Manuel dos Santos (PS): — Se for necessário! momento em que estão ainda em curso três ofertas públi- cas de aquisição sobre sociedades objecto deste negócio? O Orador: —Sê-lo-á, certamente. A menos que quei-O Sr. Ministro, embora seja um recém convertido, para ram levar a Caixa à falência! não lhe chamar «cristão novo», não pode ignorar que o respeito pelo mercado vive de comportamentos concretos e O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Parece evidente que não de meras proclamações. é!

O Governo ter-se-ia indignado quando aqui afirmámos que a intervenção da Caixa, nos moldes em que foi reali- O Orador: —Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS-zada, se traduzia afinal num verdadeiro processo de nacio- PP aguarda com a maior expectativa a ida do Sr. Ministro

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da das Finanças e da Economia à respectiva comissão Basílio Horta. Aliás, foi exactamente isso que esteve na parlamentar para explicar aos portugueses em que consiste origem de uma comissão de inquérito cuja constituição e como vai ser aplicado este novo modelo que ironicamen- aprovámos nesta Assembleia na anterior legislatura, co-te podemos classificar de dirigismo estatal da economia de missão que se destinou a investigar alguns actos dos go-mercado. vernos do PSD, tendo concluído, de forma inequívoca e

clara, a existência de um claro favorecimento do governo Aplausos do CDS-PP. de Cavaco Silva ao Sr. António Champalimaud. Como vê, se V. Ex.ª tivesse ficado por aqui, tudo bem. Entendemos igualmente indispensável ouvir o Sr. Pre- Infelizmente, aconteceu-lhe como àquele senhor que caiu

sidente da Caixa Geral de Depósitos sobre as questões do 12.º andar, veio por ali abaixo atrapalhado e, quando especificamente pertinentes à gestão desta instituição e ao chegou ao nível do rés-do-chão, disse: «Até agora, tudo seu relacionamento com a tutela. O CDS-PP tirará, então, bem»! O problema era o que vinha a seguir! E V. Ex.ª, a as suas conclusões e assumirá as iniciativas políticas ten- seguir, disse um conjunto de coisas completamente contra-dentes a corrigir abusos ou distorções e a acautelar direitos ditórias com tudo o que tinha dito anteriormente. ou legítimas expectativas de entidades privadas nacionais, na óptica de uma economia social de mercado incompatí- O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): — Quais?! vel com qualquer tipo de capitalismo de Estado, economia cada vez mais transparente, mais socialmente justa e mais O Orador: —Claro que se salvou a parte final, em que consciente do papel que lhe cabe desempenhar na preser- reclamou a presença do Sr. Ministro das Finanças e da vação da identidade nacional. Economia – e, seguramente, o Sr. Ministro virá a esta

Assembleia quando as comissões estiverem instaladas –, Aplausos do CDS-PP. em que reclamou informação, que, seguramente, virá, e, sobretudo, quando disse que o CDS-PP reservará a sua O Sr. Presidente: —Inscreveram-se, para pedir escla- posição final para quando tiver um conhecimento mais

recimentos ao Sr. Deputado Basílio Horta, os Srs. Deputa- detalhado da situação. dos Manuel dos Santos, Lino de Carvalho, Francisco Lou- O que V. Ex.ª não pode é defender o imperativo da de-çã e Manuela Ferreira Leite. fesa dos interesses nacionais e, por outro lado, não querer

Para pedir esclarecimentos, tem, então, a palavra o Sr. que o Estado intervenha no mercado. Como V. Ex.ª sabe, Deputado Manuel dos Santos. compete ao Estado regular o mercado e, obviamente, para

regular o mercado, para regular a concorrência e para O Sr. Manuel dos Santos (PS): — Sr. Presidente, Sr. defender os tais relevantes interesses nacionais que V. Ex.ª

Deputado Basílio Horta, apreciei muito os três primeiros refere, e muito bem, é necessário utilizar mecanismos minutos da sua intervenção. Foi pena que, depois, tivesse apropriados. Ora, a utilização da Caixa Geral de Depósitos «descarrilado»! como instrumento fundamental e fulcral era absolutamente

V. Ex.ª diz, entre outras coisas seguras e certas, três necessária. coisas fundamentais. Em primeiro lugar, que alguns países da União Europeia não têm qualquer problema em entrar O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): — Bem lembrado! em conflito com a Comissão, quando se trata de defender o interesse nacional. Foi exactamente o que fez o Governo O Orador: —Naturalmente, não vou criticar, até por-português, foi exactamente o que fez Portugal. que não conheço em pormenor, a referência que fez a uma

notícia do Diário Económico de hoje. Aliás, V. Ex.ª não Vozes do PS: —Muito bem! disse isso com grande convicção, já que disse «Se for verdade que (…). Se eventualmente se verificar que (…).». O Orador: —V. Ex.ª também disse que é necessário De qualquer modo, eu, como lhe digo, não conheço a notí-

que haja uma política de defesa dos relevantes interesses cia, não tive oportunidade de ler esse jornal e, portanto, nacionais. Foi exactamente essa política que o Governo não posso fazer qualquer comentário sobre isso. levou a cabo, é exactamente essa política que o Governo Há, contudo, uma coisa que lhe quero dizer muito cla-continua a levar a cabo. ramente, Sr. Deputado: vivemos num mundo globalizado,

V. Ex.ª ainda disse uma outra coisa e devo confessar pelo que, se é verdade que o investimento directo estran-que essa é surpreendente. Talvez sejam os novos tempos geiro vai ocupando algumas posições em Portugal, tam-da sua bancada! V. Ex.ª disse que a condição económica, a bém é verdade que o investimento directo português vai riqueza material, não deve ser um elemento de favoritismo ocupando algumas posições no exterior. e de excepcionalidade, tendo dito ainda que o Estado deve tratar todos pelo mérito respectivo das causas que, even- O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem! tualmente, apresentem e não pelo quantitativo do seu patri- mónio. O Orador: —Lembro-lhe, por exemplo, o caso da

Cimpor e o caso das cadeias de distribuição, da EDP, da O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): — É humanista- Portugal Telecom, etc. Tal quer dizer que, nesse mundo

cristão! globalizado, o que é fundamental, como V. Ex.ª diz – e devo dizer-lhe que estou inteiramente de acordo consigo –, O Orador: —Ainda bem que V. Ex.ª referiu isso, por- é defender o interesse nacional. Ora, o comportamento do

que é exactamente isso que defendemos, Sr. Deputado Governo, quer do governo anterior, quer do actual, neste

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caso concreto, entrando em conflito com a Comissão, foi O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Conhece-o claramente um comportamento de defesa do interesse mal! nacional.

Temos, aliás, Sr. Deputado, algumas boas razões para O Orador: —Não pode! O senhor, que foi membro de estarmos satisfeitos com o relacionamento que temos tido um governo e a quem vi defender posições intransigentes com a Comissão. Lembro-lhe, para terminar, que ainda em nome do interesse público e nacional, não pode con-ontem o Governo português conseguiu impor à Comissão cordar com isto! Pode, enfim, dizer alguma coisa para uma mudança de política relativamente à exportação da justificar aquilo que, em nosso entender, é injustificável... madeira de pinheiro. Como vê, o interesse nacional está O CDS-PP, por história e por posição, é um partido que substancialmente defendido e o Governo português tem acredita claramente na Europa e que sempre a defendeu ao esse interesse em consideração. longo da sua história, com mais ou menos cepticismo.

Aplausos do PS. O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): — Houve uma época em que isso não era assim tão claro! O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Mas o Santander

também quer o dinheiro?! O Orador: —Como sabe, a questão europeia atravessa horizontalmente todos os partidos. Se o Sr. Deputado olhar O Sr. Presidente: —Para responder, tem a palavra o para dentro do seu partido, verá o que é que lá tem!

Sr. Deputado Basílio Horta. O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): — Mas pouco! O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs.

Deputados: Responderei com muito gosto ao Sr. Deputado O Orador: —Pouco, não! Muito! Muitíssimo! Manuel dos Santos, pelo menos àquilo que é respondível. Dizia eu que o facto de acreditarmos na Europa não si-

Creio que o Sr. Deputado Manuel dos Santos – e peço- gnifica que não tenhamos em conta a necessidade de, lhe que não me leve a mal por lho dizer – deve ser o único numa Europa cada vez mais alargada, preservarmos cada português, já que não conheço mais nenhum, que pensa vez mais a nossa identidade. que a posição do governo anterior é igual à posição deste Governo! O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

Risos do CDS-PP. O Orador: —E, em nosso entender, ela preserva-se pela cultura e pela economia, que são coisas que se resol-Compreendo que o Sr. Deputado Manuel dos Santos vem.

diga, como camaradas seus disseram, que era essencial Peço ao Sr. Deputado que, num dia em que tiver tem-para Portugal resolver esta questão e que esta foi a maneira po, faça um pequeno exercício. Ponha um «transparente» mais hábil e expedita de o fazer. Não concordo com esta sobre a Lei dos Sectores, a antiga Lei dos Sectores do visão da intervenção do Estado nem com esta visão da falecido Melo Antunes, e veja bem quais eram os sectores estratégia das prioridades do Governo, mas admito que me prioritários da economia e onde é que esses sectores se digam isto. encontram hoje, veja em que mãos se encontram hoje esses

Contudo, não concordo com estas visões e foi isso que sectores, começando pela EDP. O senhor vai ver que con-fui ali dizer. Por que é que não concordo? Não concordo clusões tremendas tira desse exercício! porque penso que a Comissão tem os seus direitos e que o Como há pouco dizia, brincando, Paris não valia uma Governo português tem os seus direitos e os seus deveres e missa para alguns reis que não eram católicos. Para nós, que para estes é que há tribunais. Não é um problema gra- este tipo de procedimento constitui um precedente extre-víssimo os tribunais julgarem de uma maneira ou de outra, mamente grave. mas já é um problema mais grave, de cada vez que a Co- Finalmente, devo dizer-lhe que é evidente que defen-missão diz que não, irmos «a correr» como foi o Sr. Minis- demos uma economia social de mercado e não um neolibe-tro. Vimos na televisão que o Sr. Ministro foi para ali «a ralismo primário. Somos um partido de democratas-correr», dando todas as explicações, de cerviz baixa e, cristãos e, como tal, temos pessoas mais ou menos liberais. mesmo assim, a Comissão ainda diz: «Não! Nós exigimos Eu, por exemplo, não sou um neoliberal nem nunca o fui que o veto seja expressamente levantado! Não chega mu- na minha vida. Contudo, sempre lhe digo que uma coisa é dar o negócio!». E o Ministro — que já esteve não sei intervir no mercado, racionalizando, moralizando, assegu-quanto tempo à espera do Administrador do Santander e rando a concorrência, e outra coisa muito diferente, Sr. que até perdeu os telejornais por causa disso, coitado — Deputado, é fazer negócios… tem de vir outra vez, dizendo: «E agora, como é que eu vou fazer?! Tenho mesmo de sofrer a humilhação fatal e O Sr. Presidente: —Agradeço que termine, Sr. Depu-final de dizer que levantamos o veto, desautorizando tudo tado. o que o governo anterior fez?!».

Sr. Deputado Manuel dos Santos, compreenderá que, O Orador: —Termino já, Sr. Presidente. se bem o conheço, não acredite que o senhor, no fundo, Ainda por cima, quando esses negócios são feitos con-concorda com isto. sigo próprio, pois é o Estado que tem de negociar com ele

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próprio. Isso é que é incrível, e único, na história económi- processo, era procurar que uma alavanca tão importante ca portuguesa. para a economia portuguesa como é aquela que constitui o

conjunto do sistema financeiro e segurador do ainda Grupo Aplausos do CDS-PP. Champalimaud, pudesse voltar às mãos do sector financei- ro público português e servir como elemento de fortaleci-O Sr. Presidente: —Para formular um pedido de es- mento da nossa economia, designadamente do sector fi-

clarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carva- nanceiro. lho. Mas não é isso que se vai passar, afinal. Aliás, uma

parte deste património, ironicamente, fica na mesma em O Sr. Lino de Carvalho (PCP): — Pelos vistos, o úni- Espanha — passou do Banesto, do Sr. Mário Conde, para

co partido que agora defende o neoliberalismo primário é o o Santander, do Sr. Botín Amusategui. Vamos ver para Partido Socialista. onde vai o resto do património!

A primeira questão é, portanto, esta, Sr. Deputado: pre-O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Parece evidente! tendemos ver esclarecido o papel da Caixa Geral de Depó- sitos neste processo, mas queremos ver esse papel esclare-O Orador: —Sr. Presidente, Srs. Deputados: Concor- cido na perspectiva que nos parece ser a única que deveria

damos que esta nova etapa do «romance» que é, já, o ne- ser defensável, a do interesse nacional, ou seja, que este gócio entre António Champalimaud e os espanhóis do património se conservasse ao serviço do reforço da eco-Banco Santander tem ainda muito por esclarecer. Por isso nomia portuguesa e ao serviço de uma intervenção e de um mesmo, o Grupo Parlamentar do PCP requereu já a vinda reforço no sector financeiro público nacional. do Sr. Ministro da Economia, ou do Sr. Ministro das Fi- A outra questão, Sr. Deputado, é que todo este episódio nanças — ou de ambos, simultaneamente — à Comissão — mais as referências que o Sr. Deputado fez e as pergun-de Economia, Finanças e Plano, para esclarecer o muito tas que colocou quanto à questão de onde se encontram as que há para esclarecer. empresas que foram privatizadas, e deu o exemplo da EDP

Desde logo, Sr. Deputado, para esclarecer uma coisa — traz ao debate uma grande oportunidade de reflexão, tão simples como, por exemplo, responder aos muitos que devia ser feita nesta Casa, acerca de qual foi, afinal, o «ses» que o Sr. ex-Ministro Sousa Franco escreveu num destino das privatizações. Para que serviram as privatiza-significativo artigo no suplemento de economia do Expres- ções? Para que têm servido, ao longo deste tempo? Para so da semana passada. Seguramente que ele sabe mais enfraquecer a economia portuguesa? Para passar parte dos deste «romance» que todos nós juntos. nossos sectores estratégicos para mãos e interesses exterio-

res… O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sabe de certeza! O Sr. Presidente: —Agradeço que termine, Sr. Depu-O Orador: —Mas o Sr. ex-Ministro Sousa Franco tado.

poderá, talvez, responder a outros «ses», Sr. Deputado, nomeadamente, a um outro «se» que tem a ver com o papel O Orador: —… aos interesses nacionais? Esta é uma que foi dado à Caixa Geral de Depósitos neste processo. questão que valeria a pena discutirmos, Sr. Deputado.

Ao contrário das preocupações do Sr. Deputado — não Seguramente, é do interesse nacional trazer esta discussão tenha medo, Sr. Deputado, porque não tem razões para à colação. essas preocupações — e ao contrário do que o Sr. Ex- Ministro das Finanças disse ao Financial Times, temos Aplausos do PCP. muitas e fortes razões para suspeitar que a intervenção da Caixa Geral de Depósitos, neste processo, não tem a ver, O Sr. Presidente: —Para responder, tem a palavra o infelizmente, com o reforço do sistema financeiro público Sr. Deputado Basílio Horta. português ou com a sua utilização como instrumento para a sua estruturação nos quadros da defesa do interesse nacio- O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. nal. Tem a ver, sim, unicamente, com o servir como um Deputados: Creio que 15 segundos chegam para responder instrumento que o Governo tinha à mão ou servir de inter- ao Sr. Deputado Lino Carvalho, porque é muito simples: a mediário para regular os interesses dos vários grupos pri- democracia é exactamente isto, Sr. Deputado, e onde V. vados financeiros. Servir de intermediário, se calhar, para Ex.ª vê Estado, nós vemos iniciativa privada. a tal 4.ª fase, que ainda está muito por clarificar, que é a passagem de uma parte deste património dos espanhóis O Sr. Manuel dos Santos (PS): — E nós estamos no para um grupo privado português, seja ele o BCP seja ele o meio, na linha justa! Espírito Santo. Vamos ver se não será isso, Sr. Deputado.

Portanto, se assim for, é evidente que este é um papel O Orador: —Vocês não estão em parte nenhuma! que nós não aceitamos, exactamente pelas razões contrá- rias às suspeitas ou preocupações do Sr. Deputado. O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): — Depende do

dia, depende do mês… O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): — Ainda bem! O Orador: —Como eu estava a dizer, Sr. Deputado O Orador: —Para nós, Sr. Deputado, a questão cen- Lino de Carvalho, onde vocês vêem Estado, nós vemos

tral que deveria resultar da intervenção do Governo, neste iniciativa privada e quero apenas fazer um apontamento

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em relação ao que V. Ex.ª disse, ou seja, que é pena que a que pela razão, mais pela retórica política do que propria-Caixa Geral de Depósitos acabe por perder e que os nossos mente pelos conteúdos de fundo, «há muitos alçapões e receios não têm razão de ser… Vamos ver! não menos perigos».

A questão é esta: o que é que faz ao resto do sistema Devo dizer-lhe, por isso, que tem ilustres antecedentes financeiro português? Como é que o reorganiza? Este é a este respeito. Faz agora cinco anos, no dia 15 de Novem-que é o problema. Acha que ele fica bem como está, ou bro de 1994, em Bogor, na Indonésia, um presidente muito nacionaliza-o também? Julgo que não será lógico ir por aí! ilustre explicou que o seu país passaria a ser regido, justa-

Finalmente, o Sr. Deputado fez uma pergunta: para que mente, pela doutrina da economia social de mercado: esse é que servem as privatizações? Respondo-lhe com outra: presidente chama-se Jiang Zemin… para que é que serviram as nacionalizações? Bem-vindo ao clube, Sr. Deputado Basílio Horta!

Aplausos do CDS-PP. Risos do PS. O Sr. Presidente: —Para formular um pedido de es- O Sr. Presidente: —Para responder, tem a palavra o

clarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Sr. Deputado Basílio Horta. Louçã.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. O Sr. Francisco Louçã (BE): — Virá, certamente bre- Deputados: Gostaria de dizer, também muito brevemente,

ve, o dia em que se possa discutir com mais detalhe — que o Sr. Deputado misturou habilmente o Doutor em tanto na Comissão como, eventualmente, em Plenário — economia, o Deputado, o homem de extrema esquerda e o os contornos deste negócio e da sua evolução. democrata ocidental. Também é um cocktail difícil!

Queria, no entanto, a propósito desta intervenção, pedir os esclarecimentos que considero necessários. Aplausos e risos do CDS-PP.

Antes de mais, queria felicitá-lo, Sr. Deputado Basílio Horta, porque creio que na sua intervenção conseguiu o Tem de concordar que também é um cocktail difícil. que é raro para o mais hábil dos oradores desta Casa: con- Talvez mais difícil do que o equilíbrio que o Sr. Deputado ciliar, numa mesma intervenção, pontos de vista tão dife- diz que eu fiz. rentes. Quero focar dois pontos, apenas, para lhe dizer o se-

Ouvi, com a mesma atenção, o Deputado «nacionalis- guinte: não concordei nem deixei de concordar com o ta» contra a assistência completa do Governo à Comissão, Governo anterior. Aliás, o Ministro da Finanças era uma no contexto desta segunda posição, deixando, aliás, per- pessoa que eu respeitava muito — e não posso deixar de passar a suspeita de que era partidário do primeiro veto e dizer aqui que o Sr. Prof. Sousa Franco é uma pessoa que da «solução Sousa Franco»; ouvi o Deputado «privatiza- merecia,… dor» a acentuar a importância da empresa e, portanto, da privacidade do acto empresarial que, em última análise, A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): — E merece! como compreenderá, remete sempre para a possibilidade de a vender a quem quer que seja — por outras palavras, O Orador: —… da minha parte, o maior respeito e a uma vez privatizada uma empresa, nenhuma barreira pode maior consideração. Ponto final! É uma questão pessoal hoje ser constituída quanto ao facto de ela poder ser ven- que nada tem a ver com questão política. dida, também a estrangeiros; mas ouvi, finalmente, um A questão, portanto, não é essa e eu não tenho nada de terceiro Deputado, ouvi, até, um Deputado «colectivista» saber se fez bem ou se fez mal. O que eu digo é que nós que apelava à intervenção do Estado num sector tão sensí- não devemos ter medo dos tribunais. Não devemos! Se há vel como o sector financeiro e a regulação do sector bancá- um conflito de interesses, há tribunais para julgar. rio.

Quero, portanto, felicitá-lo, porque creio que, na di- O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem! plomacia florentina que é necessária para a articulação destas três intervenções, o fez com brilhantismo e, aliás, O Orador: —Nós não temos de, por via administra-em muito pouco tempo. tiva, pôr interesses, que são de claro e relevantíssimo

No entanto, deixa-nos, ou deixa-me, pelo menos a interesse nacional, nas mãos de um ministro ou de um mim, a dúvida sobre se não haverá aqui uma tentativa de governo. dirimir um conflito entre o CDS e o PP, nestas várias Há atitudes que se tomam e que têm de ser levadas até interpretações. ao fim, sob pena de perdermos a credibilidade interna e,

fundamentalmente, a autoridade externa. O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): — Essa parte é

connosco! O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem! O Orador: —E nas soluções salomónicas que são ne- O Orador: —Quanto ao problema da China, do Jiang

cessárias para este tipo de arranjo, devo citar-lhe, para Zemin, Sr. Deputado, quero dizer-lhe que nós, graças a terminar, que há, nestas frases feitas como a que utilizou Deus, não temos nenhuma Praça de Tianamen. Nós respei-para coroar o seu discurso, remetendo para uma doutrina tamos os direitos liberdades e garantias e, agora, até con-da economia social de mercado, mais pela publicidade do cordamos com o Sr. Deputado Carlos Carvalhas, quando

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diz que os direitos fundamentais, os direitos civis e políti- mos vendido a golden share que o Estado tinha no Totta. cos devem prevalecer sobre os direitos económicos. Só isso!

Bem-vindo, também, ao clube, Sr. Deputado, se é que quer entrar neste clube!... O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

Aplausos do CDS-PP. O Sr. Presidente: —Srs. Deputados, terminaram os pedidos de esclarecimentos e respectivas respostas em O Sr. Presidente: —Para formular um pedido de es- relação à questão em discussão.

clarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Vamos passar à leitura, discussão e votação de dois Ferreira Leite. votos: um voto de saudação, apresentado pelo PSD; e um

voto de pesar assinado por todos os grupos parlamentares. A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): — Sr. Presi- A Sr.ª Secretária da Mesa vai passar a ler o voto n.º

dente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Basílio Horta, pelo 4/VIII — De saudação ao ex-Presidente do Conselho de debate que aqui se viu hoje percebe-se que, sobre esta Administração da sociedade Porto 2001, S.A., Dr. Artur questão, todas as bancadas apenas conseguem fazer per- Santos Silva, pela acção desenvolvida no âmbito do pro-guntas. Mesmo o Sr. Deputado Manuel dos Santos, que jecto Porto – Capital Europeia da Cultura, apresentado tentou de alguma forma ser afirmativo, tenho poucas dúvi- pelo PSD. das de que só fez perguntas. O que significa e justifica o facto de que todas as bancadas menos a do Partido Socia- A Sr.ª Secretária (Rosa Maria Albernaz): — O voto é lista terem pedido a vinda do Ministro da Economia à do seguinte teor: O Grupo Parlamentar do PSD propõe ao Comissão, porque, evidentemente, é apenas aí, junto da Plenário da Assembleia da República um voto de reconhe-Comissão, que o Ministro da Economia poderá explicar e cimento ao Presidente do Conselho de Administração da responder às perguntas que todos nós temos para lhe fazer. Sociedade Gestora do Porto 2001, Dr. Artur Santos Silva,

Disse o Sr. Deputado Manuel dos Santos, bastante ufa- pela acção desenvolvida no âmbito do projecto nacional no relativamente à posição portuguesa, que Portugal entrou Porto 2001 — Capital Europeia da Cultura. em conflito e que muitos países entram em conflito com a Da acção do Dr. Artur Santos Silva podemos afirmar Comissão. que o Porto e o País saíram beneficiados com a capacidade

Creio que isso é saudável, desde que tenha um objecti- e competência de quem tem créditos firmados, de quem já vo. Mas quando não se percebe qual é o objectivo e quan- deu ao longo da sua vida sobejas provas de capacidade do qualquer um de nós fica perplexo sem perceber onde técnica, de independência pessoal e de serviço ao País. ele está — a única coisa que vimos foi alguma perda de Os projectos apresentados no âmbito da programação, credibilidade do País perante o exterior —, não consigo renovação urbanística e requalificação comercial eram, entender onde está o benefício desse conflito. desde logo, a garantia do sucesso de um projecto que,

agregado a uma cidade, deve ser assumido como um pro-O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem! jecto de importância e âmbito nacional. A Assembleia da República espera que a continuidade A Oradora: —Mas tenho poucas dúvidas, Sr. Depu- deste projecto tenha em atenção o significativo trabalho

tado Basílio Horta, de que aquela posição que o Governo desenvolvido, a determinação, a capacidade e a competên-assumiu pela voz do Primeiro-Ministro, dizendo que Por- cia agora reveladas pelo Presidente da Porto — Capital tugal não era a «república das bananas», era uma posição Europeia da Cultura para que se garanta o sucesso efectivo claramente eleitoralista, porque correspondia ao período desta iniciativa de grande importância para a afirmação em que estávamos. cultural do Porto e de Portugal no contexto europeu.

Neste momento começo a perguntar-me se o Primeiro- Ministro, ao passar aí por Lisboa, verificar que, afinal, em O Sr. Presidente: —Para iniciar o debate, tem a pala-vez de um banco eles levaram dois, qual é o nome que ele vra o Sr. Deputado António Montalvão Machado. dará a esta república.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Sr. Aplausos do PSD. Presidente, antes de mais, permita-me que lhe dirija os meus respeitosos cumprimentos e que, através de V. Ex.ª, O Sr. Presidente: —Para responder, tem a palavra o estenda também esses cumprimentos a todas as Sr.as e Srs.

Sr. Deputado Basílio Horta. Deputados de todos os grupos parlamentares. O Sr. Manuel dos Santos (PS): — Não me quer dar do O Sr. Presidente: —Muito obrigado, Sr. Deputado.

seu tempo Basílio? É que eu é que devia responder! O Orador: —O PSD tem a maior das honras em apre-O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. sentar e em submeter à votação este voto de saudação, o

Deputados: Não há uma pergunta mas uma afirmação, que n.º 4 desta legislatura, por quatro razões essenciais que merece a minha inteira concordância. passo a enunciar: em primeiro lugar, porque desta forma se

Quero apenas focar um aspecto, já que foi mencionado. reconhece a competência e o muito saber do Dr. Artur Em relação ao Banco Totta, olhando um bocadinho para Santos Silva, abundantemente demonstrados ao longo da trás, se nós estivéssemos no governo, talvez não tivésse- sua vida pelos mais variados projectos que liderou; em

segundo lugar, porque desta forma se reconhece o sucesso

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pessoal e profissional do Dr. Artur Santos Silva em todas, Como acreditamos que não há personalidades insubsti-mas todas, as actividades que desenvolveu; em terceiro tuíveis, embora lamentando o abandono do Dr. Artur San-lugar, porque desta forma se reconhece o seu prestígio e a tos Silva, cremos que o projecto Porto — Capital Europeia sua credibilidade públicas, jamais rejeitadas pelos portu- da Cultura 2001 será levado a bom porto. gueses em geral e pelos portuenses em particular; final- mente, porque desta forma se reconhece a seriedade de Aplausos do PS. meios intelectuais do Sr. Dr. Artur Santos Silva, bem de- monstrada, também, nos nove meses em que exerceu o O Sr. Manuel Alegre (PS): — Peço a palavra para in-cargo de que ora se demitiu. terpelar a Mesa, Sr. Presidente.

Vozes do PSD: —Muito bem! O Sr. Presidente: —Faça favor, Sr. Deputado. O Orador: —O Dr. Artur Santos Silva demitiu-se O Sr. Manuel Alegre (PS): — Sr. Presidente, sob a

porque se mostravam violados princípios, porque se mos- forma de uma interpelação à Mesa, quero deixar aqui um travam violados valores e porque se desrespeitaram com- testemunho. Em primeiro lugar, de homenagem pessoal promissos anteriormente assumidos pelo Governo. Quando às conhecidas virtudes de integridade cívica, moral e assim for, o PSD está, e estará sempre, a favor do respeito pessoal do Dr. Artur Santos Silva, que, de certa maneira, pelos princípios, pelos valores e pela satisfação de com- personificam as conhecidas virtudes das pessoas da cida-promissos anteriormente assumidos. de do Porto.

Mas quero também deixar aqui um testemunho sobre Vozes do PSD: —Muito bem! um lado menos conhecido do Dr. Artur Santos Silva, que conheço há muitos anos. Fomos companheiros em Coim-O Orador: —É por tudo isto, Sr. Presidente e Srs. bra e acho que fui a pessoa que o levou a uma primeira

Deputados, que a aprovação do presente voto é, evidente- reunião clandestina do, então, MUD Juvenil, na casa do mente, um acto de solidariedade para com um ilustre filho Prof. Bacalhau, que V. Ex.ª bem conheceu, em Celas. do Porto, uma insigne figura do Norte, que prestigiava, nas Ninguém se sentava, então, em cadeiras do poder, nem funções que exercia, Portugal e os portugueses, mas é, financeiro, nem económico, nem cultural, nem político, sobretudo, e muito mais do que isso, um acto de inteira sentávamo-nos no chão, porque a casa estava desabitada, justiça, que os Deputados desta Câmara lhe devem prestar. não tinha cadeiras e, cá fora, havia a repressão, a PIDE e o

risco. Aplausos do PSD. Ora, o Dr. Artur Santos Silva, com aquela modéstia que o caracteriza, correu esses riscos, participou nas bata-O Sr. Presidente: —Para uma intervenção, tem a pa- lhas da Academia de Coimbra contra a ditadura do Estado

lavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires de Lima. Novo, fiel às suas tradições republicanas e democráticas, que lhe vinham de família, apesar de ter uma carreira bri-A Sr.ª Isabel Pires de Lima (PS): — Sr. Presidente, lhante, tendo chegado, depois, como se sabe, a assistente

Sr.as e Srs. Deputados: É a primeira vez que tomo a palavra do Prof. Teixeira Ribeiro. Foi sempre um homem de espí-nesta Assembleia, pelo que me cabe saudá-los de modo rito independente, de espírito livre, um homem com uma particular e manifestar o empenho que estou disposta a pôr grande capacidade de trabalho e de uma grande eficiência. no trabalho que fui chamada a desenvolver neste órgão de Creio que foi com esse espírito, que é um espírito de soberania, procurando não defraudar as expectativas dos missão, um espírito independente, um espírito de serviço que me elegeram. à sua cidade e ao País, que ele aceitou o cargo de Presi-

Também a bancada do PS pretendeu apresentar um dente do Conselho de Administração da sociedade Porto voto de saudação à Prof.ª Doutora Teresa Lago, pela sua 2001, S.A. nomeação, e ao Dr. Artur Santos Silva, pelo trabalho Ora, é a esse espírito de um homem livre, de um ho-desenvolvido no âmbito do projecto Porto — Capital mem independente, devotado à causa pública e à sua cida-Europeia da Cultura 2001, mas o PSD não permitiu que o de, que quero prestar homenagem. fizéssemos.

Associamo-nos, pois, ao voto saudação pelo trabalho Aplausos do PS e do CDS-PP. dedicado do Dr. Artur Santos Silva, que lançou as bases da construção do projecto Porto — Capital Europeia da Cul- O Sr. Presidente: —Sr. Deputado, como sabe, não fez tura 2001, em cuja candidatura e concepção a Câmara uma interpelação. Porém, quando é a amizade que dita as Municipal do Porto, a sua vereação da cultura e o Sr. violações ao Regimento, é perdoável. Ministro da Cultura se empenharam desde o primeiro mo- Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado mento. Francisco Louçã.

O Dr. Artur Santos Silva é alguém com forte inserção na realidade local, que revelou grande sensibilidade às O Sr. Francisco Louçã (BE): — Creio que é profun-aspirações da cidade, designadamente ao nível das ques- damente desprestigiante para esta Assembleia que lhe seja tões de requalificação urbana. É alguém com um perfil submetido um voto, sob esta forma, neste momento. ético marcado pela seriedade e rigor, que sempre imprime A pedido de várias bancadas, haverá, amanhã, um de-às suas funções de gestor. bate com o Ministro da Cultura, que incide sobre a matéria

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deste voto. A pedido de várias bancadas, entre as quais a O Dr. Artur Santos Silva sai do exercício do seu cargo do proponente, será discutido, em sede de comissão, com a porque nele foram incompreendidos três «ii» e três «cc»: presença do Dr. Artur Santos Silva, o balanço da sua ges- nele foram incompreendidos o «i» de integridade, o «i» de tão na sociedade Porto 2001, S.A. isenção e o «i» de independência; nele foram também

Antes de se obterem os esclarecimentos que esta As- incompreendidos o «c» de competência, o «c» de capaci-sembleia entendeu necessários e imprescindíveis, subme- dade e o «c» de correcção. ter a discussão, a priori, a uma votação que condicione Desejo toda a sorte à administração e à nova presidente essas conclusões, porque impõe um veredicto e uma da sociedade Porto 2001, S. A., , S. A., mas isso não faz opinião global acerca do resultado desta mesma gestão com que muitos dos protagonistas desta história, deste que está em discussão, tanto quanto à experiência da lamentável folhetim estejam isentos de erros. E isso tam-sociedade administradora quanto a respeito daquela que bém não faz com que o Dr. Artur Santos Silva saia deste foi dirigida pelo Ministério da Cultura, parece-me que é, processo como entrou: de cabeça levantada! se não uma infracção às normas, que certamente não O Dr. Artur Santos Silva é um homem para quem o será, pelo menos e seguramente uma infracção à regra do contacto com o dinheiro nunca fez com que deixasse de ser bom senso e da discussão qualificada com princípios e um homem de cultura e um homem de progresso. informação suficiente.

No quadro deste debate, aliás, suscitaram-se acusações Aplausos do CDS-PP. graves. Disse o Dr. Santos Silva que foram cometidos erros grosseiros por parte do Ministério, que merecem O Sr. Presidente: —Para uma intervenção, tem a pa-atenção e reflexão. E é justamente por se considerar a lavra o Sr. Deputado João Amaral. importância e a seriedade do Dr. Santos Silva que essas acusações devem ser levadas a sério e não devem ser su- O Sr. João Amaral (PCP): — Sr. Presidente e Srs. bordinadas a uma jigajoga política, que antecipa todas as Deputados, o voto que está em discussão e vai ser votado conclusões desse debate em sede própria. tem um objecto claro e definido: trata-se de a Assembleia

Por isso mesmo não nos podemos associar naturalmen- saudar e louvar a acção desenvolvida pelo Dr. Artur San-te a esta votação. tos Silva no cargo que exerceu, da máxima responsabilida-

Devo dizer, para terminar, que há uma expressão que de, no âmbito do projecto «Porto — Capital Europeia da aparece incidentalmente na intervenção do proponente mas Cultura 2001». É isso que está em discussão, neste que me parece francamente preocupante e merece 10 momento. segundos de atenção na Assembleia da República. Não Amanhã, discutiremos com o Sr. Ministro a sua res-votarei nem deixarei de votar qualquer resolução a respeito ponsabilidade nessas questões e poderemos ainda, quando da actividade ou da personalidade do Dr. Santos Silva por tivermos oportunidade de apreciar um voto apresentado ele ser filho do Porto, porque não o farei, naturalmente, a pelo Partido Socialista, pronunciar-nos sobre a indicação respeito de qualquer outro cidadão português por ser filho do novo nome e, de alguma forma, expressar a quem vai de Carnaxide, por ser filho de Lisboa ou por ser filha de exercer o cargo o nosso empenhamento — e seguramente Santarém. Esse argumento não deve pesar num órgão que o de todos — em que, do exercício do cargo, resulte para o tem como função representar a Nação. E digo-o, porque se Porto e para o País aquilo que todos desejamos. ouviu, em público, um autarca ilustre deste país, o Sr. No caso concreto do Dr. Artur Santos Silva é importan-Vieira de Carvalho, dizer que a substituta, a Doutora Tere- te este acto, em que a Assembleia se empenhou, de saudar, sa Lago, não merecia a indigitação por não ser filha do de aplaudir o trabalho que ele realizou. Não podemos dei-Porto, o que certamente afectaria também personalidades xar de lamentar que o seu trabalho e o da sua equipa tenha ilustres nesta administração e no projecto Porto — Capital sido interrompido por razões que vamos ter a oportunidade Europeia da Cultura 2001, como o Dr. Fernando Gomes, o de discutir, mas que, desde já, à partida, considero que Prof. António Barreto e muitos outros, que também não foram prejudiciais para os interesses da cidade do Porto, nasceram no Porto. para os interesses da cultura portuguesa e para os nossos

A irrelevância desse argumento obriga-nos a desconsi- interesses como país e como povo. derá-lo e, por razões porventura mais vastas, obriga tam- Creio que neste momento em que salientamos o traba-bém a desconsiderar esta moção. lho do Dr. Artur Santos Silva é muito importante que sobre

ele digamos que era um trabalho que queria ser desenvol-O Sr. Presidente: —Para uma intervenção, tem a pa- vido como expressão do interesse nacional e do da cidade

lavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan. do Porto e que se lamentavelmente não pôde ser concluído, se lamentavelmente foi interrompido pela forma que se viu O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): — Sr. Presidente e por excessos de protagonismo que amanhã será a altura

e Srs. Deputados, o Partido Popular associa-se a também a de escalpelizar, não podemos deixar de dizer, neste exacto este voto. E associa-se pela figura do Dr. Artur Santos momento, que uma obra como a que foi realizada até agora Silva que extravasou, e extravasa, os limites do Porto, que pelo Dr. Artur Santos Silva não se apaga. O trabalho foi extravasou, e extravasa, os limites da região norte, que feito, é um trabalho valioso, é um trabalho que ficará, extravasou, e extravasa, os limites de Portugal, como se seguramente, na memória dos portuenses, dos portugueses queria e se quer que o Porto seja a capital europeia da e dos Deputados da Assembleia da República! cultura. Ora, a escolha de uma figura que extravasa todos esses limites, locais, regionais ou nacionais, era, por si só, Aplausos do PCP. uma escolha acertada.

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Vozes do PSD e do CDS-PP: —Muito bem! Srs. Deputados, vamos passar à leitura e depois à dis- cussão e votação do voto n.º 8/VIII — De pesar pelo mas-O Sr. Presidente: —Para uma intervenção, tem a pa- sacre de Santa Cruz, que o Sr. Secretário José Cesário vai

lavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro. ler. A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): — Sr. Presidente, O Sr. Secretário (José Cesário): — Sr. Presidente, Srs.

Srs. Deputados: Em primeiro lugar, queria dizer que o Deputados, o voto n.º 8/VIII — De pesar pelo massacre de objecto deste voto nos parece claro e ele é o de não deixar Santa Cruz em 12 de Novembro de 1991, subscrito por de assinalar a intervenção, que do nosso ponto de vista foi Deputados de todos os grupos parlamentares, é do seguinte extremamente positiva, do Dr. Santos Silva no seu envol- teor: vimento para erguer o projecto «Porto — Capital Europeia O massacre do Cemitério de Santa Cruz, em Díli, per-da Cultura 2001». petrado pelas forças militares indonésias em 12 de No-

Este é um projecto que é importante para a cidade, para vembro de 1991, foi mais um dos inúmeros actos de barbá-a região e para o País e, do nosso ponto de vista, entende- rie infligidos sobre o povo timorense, por uma potência mos que é de toda a justiça e que faz todo o sentido que a ocupante que durante mais de 20 anos se empenhou numa Assembleia se pronuncie sobre alguém que pôs em marcha política de verdadeiro terror genocida. este movimento, que deixou a sua marca e que, natural- Desde a invasão do território de Timor, a 7 de Dezem-mente, nem ele nem a equipa que com ele sai demissioná- bro de 1975, que o povo timorense vinha sendo vítima das ria podem ser, pura e simplesmente, esquecidos. opressão e agressão indonésias e se registavam sistemáti-

O Dr. Santos Silva — como já foi referido — é alguém cas e brutais violações dos Direitos do Homem, mas o que reuniu, porventura como poucos teriam reunido, o massacre de Santa Cruz provocou uma onda geral de in-consenso político na cidade do Porto e que nos meios dignação e despertou a comunidade internacional para a culturais dessa cidade foi também pacificamente reconhe- gravidade da situação vivida em Timor Leste, a qual Por-cido. Seguramente que não é indiferente a isso aquilo que tugal há muito vinha denunciando em todas as instâncias é a sua personalidade e, independentemente de amanhã internacionais. irmos discutir as razões que, lamentavelmente, conduziram A violência demente a que o mundo assistiu em Santa à sua demissão e à da sua equipa, entendemos que este Cruz constituiu um marco histórico no alerta das consciên-voto é um voto de saudação a alguém e não a antecipação cias, forçando a Indonésia a inverter a sua política e permi-de uma crítica ou uma crítica a dois tempos que, prova- tindo a sucessão lenta e penosa dos passos que conduziram velmente, a maioria dos partidos políticos aqui representa- à actual situação em que os timorenses têm nas mãos o seu dos vai fazer a uma atitude e a uma forma de estar de um futuro como Estado independente, oitavo membro da determinado Ministro, de um Governo, que, do nosso Comunidade de Países de Língua Portuguesa e primeiro ponto de vista, só é preocupante porque põe em risco um país lusófono na região da Ásia-Pacífico. projecto que merecia mais do que uma saída desta forma, Para que a indiferença e o esquecimento não vençam nesta fase. sobre o terror e sobre a memória de todos aqueles que

perderam a vida nos «Santos Cruzes» de que se fez a luta A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem! de Timor Leste pela sua liberdade e independência, os Deputados subscritores propõem ao Plenário que a Assem-O Sr. Presidente: —Srs. Deputados, permitam-me bleia da República expresse um voto de pesar pelos even-

também que eu, nesta oportunidade, como velho amigo e tos trágicos de 12 de Novembro de 1991. admirador do Sr. Dr. Santos Silva lhe preste uma sentida homenagem. O Sr. Presidente: —Srs. Deputados, para uma inter-

Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação do venção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Natália Carrascalão. voto n.º 4/VIII — De saudação ao Presidente do Conselho de Administração da Sociedade Gestora do Porto 2001, A Sr.ª Natália Carrascalão (PSD): — Sr. Presidente, Dr. Artur Santos Silva, pela acção desenvolvida no âmbito Sr.as e Srs. Deputados: Antes de iniciar a minha interven-do projecto nacional Porto 2001 – Capital Europeia da ção, gostaria de me dirigir a si, Sr. Presidente, para lhe Cultura (PSD). manifestar o quanto me honra usar da palavra nesta As-

sembleia pela primeira vez e saudar todas as Sr.as e Srs. Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor Deputados.

do PS, do PSD, do CDS-PP e do PCP e a abstenção do BE. O Sr. Presidente: —Muito obrigado, Sr.ª Deputada.

Srs. Deputados, como é normal o voto será levado ao A Oradora: —Gostava também de saudar todo o povo

conhecimento do Sr. Dr. Santos Silva. português pela determinação e pelo empenho que empres-Antes de passarmos ao segundo voto, anuncio que está taram à causa de Timor Loro Sae nos seus momentos mais

connosco um grupo de 50 alunos da Escola Alfredo da difíceis. Silva do Barreiro. Saudemo-los, como é habitual. Queria ainda reafirmar as minhas admiração e amizade

por todos aqueles que nunca deixaram esquecer o povo Aplausos gerais, de pé. mártir de Timor Loro Sae.

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Por último, estou certa de que Portugal tudo fará para O Sr. Presidente: —Para uma intervenção, tem a pa-que o novo Estado de língua portuguesa se construa de lavra o Sr. Deputado Carlos Luís. acordo com o projecto idealizado por aqueles que, a partir de agora, ficam na História como os seus pais fundadores. O Sr. Carlos Luís (PS): — Sr. Presidente, Srs. Depu-

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Evocamos hoje, tados: O Grupo Parlamentar do Partido Socialista associa-nesta Assembleia, por ocasião do oitavo aniversário do se a este voto, ao momento que faz parte da história de massacre de Santa Cruz, em Díli, a memória de todos Timor e que faz parte pela negativa. aqueles que naquele dia 12 de Novembro de 1991 perde- No dia 12 de Novembro de 1991 tinha lugar, no Cemi-ram a vida. Não podemos também esquecer, neste momen- tério de Santa Cruz, o massacre que ficou conhecido pelo to, todos os outros timorenses que durante 24 anos deram a genocídio e pela barbárie. E foi necessário correr muito sua vida por um Timor livre. sangue para que a consciência internacional agisse perante

a passividade, a indiferença e quando não a conivência das O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem! potências que ajudaram a Indonésia a perpetrar os genocí- dio, a barbárie e o sofrimento de um povo indefeso que A Oradora: —O massacre de Santa Cruz ficará na lutava com a consciência de uma nação, com uns milhares

história de Timor Loro Sae indelevelmente associado ao de cidadãos que apostaram, determinantemente, que ti-princípio do fim da ocupação ilegal de Timor pela Indo- nham direito à autodeterminação e à independência. nésia. E essa consciência colectiva de um povo que fez calar a

É pena que tenha sido preciso tanto para abalar as voz às potências que colaboraram com o genocídio, com consciências internacionais e fazer ouvir o grito de um os militares e com as autoridades da Indonésia possibilitou, povo oprimido. a partir do massacre de Santa Cruz, que a causa de Timor

A mediatização dos acontecimentos, por vezes critica- tivesse visibilidade na comunidade internacional. da, assumiu nesta era da globalização e neste caso particu- E é hoje aqui, neste Hemiciclo, mais uma vez, que nos lar uma importância fundamental: o grito de que falamos associamos à vontade colectiva desse povo, do povo de não voltou a ser silenciado. Timor Leste, que durante todos estes anos lutou para que a

É caso para dizer que as imagens assumiram nesta úl- sua dignidade como povo e como nação fosse reconhecida tima década características de uma nova «arma» que, se pela comunidade internacional. E nesta mesma tribuna esgrimida com saber junto da comunidade internacional, é todos os grupos parlamentares, todos órgãos de soberania e capaz de operar verdadeiras revoluções na tradicional a sociedade civil portuguesa se têm vindo a associar a esta condução das relações internacionais. causa e nunca nos calámos perante as atrocidades da Indo-

Julgamos também que, neste final de século, a questão nésia. de Timor Loro Sae deve servir como paradigma de uma nova postura internacional dos Estados. O relativismo Vozes do PS: —Muito bem! civilizacional e cultural reinante não pode nem deve so- brepor-se a valores e a princípios absolutos e universais. O Orador: —Assim sendo, hoje recordamos o massa-

É tempo de perceber que uma vida humana vale o cre, aqui, com mágoa, mas ao mesmo tempo com a satisfa-mesmo em qualquer ponto do globo. ção de vermos um povo a caminho da sua autodetermina-

ção e da sua independência. Vozes do PSD: —Muito bem! E desta tribuna gritámos que apenas queríamos para Timor que fosse encontrada uma solução global, justa e A Oradora: —Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: internacionalmente aceite.

Queremos, nesta Câmara, expressar a nossa profunda espe- rança e o nosso desejo de que o Timor livre se reinvente Aplausos do PS, do PSD, do PCP, do CDS-PP e de Os com a mesma beleza, expressividade e paz que nos inspi- Verdes. ram as palavras e as imagens de Ruy Cinatti.

Como mãe estou certa de que encontraremos nos olhos O Sr. Presidente: —Para uma intervenção, tem a pa-das crianças que aprenderam a sofrer em silêncio por lavra o Sr. Deputado Bernardino Soares. Timor o futuro de um novo Estado capaz de construir e partilhar a mesma «comunidade de sonhos». Foi por esta O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, que muitos lutaram e pereceram. Srs. Deputados: O PCP associa-se ao voto de pesar apre-

Porque, hoje e aqui, queremos recordar e honrar a sentado em relação a um massacre de intolerável brutali-memória dos que perderam a vida em Timor Loro Sae, o dade como o que ocorreu no Cemitério de Santa Cruz a 12 Partido Social-Democrata propõe ao Plenário da Assem- de Novembro de 1991. bleia da República um voto de pesar que foi subscrito por E a verdade é que, ao assinalarmos o nosso pesar e este todos os grupos parlamentares. massacre condenamos a violência perpetrada pela Indoné-

Para que o massacre de Santa Cruz jamais se repita e sia, nesse dia e nesse lugar, mas não deixamos também de para que a História não volte para trás, lutemos sempre condenar toda a violência de que, desde 7 de Dezembro de contra a indiferença e o esquecimento. 1975, foi alvo o povo de Timor pelo opressor indonésio,

que nessa data invadiu aquele território, aquele país. Aplausos do PS, do PSD, do PCP, do CDS-PP e de Os O marco histórico que é o massacre no Cemitério de

Verdes. Santa Cruz é também uma representação de todos os mas-sacres que talvez mais silenciosamente foram sendo feitos

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ao longo de todos estes anos, ao longo de todos estes dias Vozes do CDS-PP: —Muito bem! em que o povo timorense lutou pela sua independência, pelo seu direito à autodeterminação. O Orador: —Santa Cruz foi o facto que revelou à

A verdade é que independentemente de o tempo ser, opinião pública mundial que o terror existia e que um povo hoje e agora, de esperança em relação ao futuro e à cons- resistia em Timor Leste; foi um verdadeiro virar de página trução de um país novo, é preciso não esquecer o horror do do povo de Timor pela sua independência. passado, é preciso continuar a assinalá-lo, a lembrá-lo, para que, no futuro, ele nunca seja esquecido. E é nesse O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): — Muito bem! sentido que também nos associamos a este voto de pesar.

O Orador: —Santa Cruz foi possível graças à deter-Aplausos do PS, do PSD, do PCP, do CDS-PP e de Os minação da Igreja e à coragem da juventude timorense,

Verdes. que desafiou o terror, as ameaças e as tentativas de desmo- bilização para estar presente no cemitério. O Sr. Presidente: —Tem a palavra a Sr.ª Deputada Por isso o nosso voto, mais do que um voto de pesar é

Isabel Castro. um voto de homenagem às vítimas e também um voto de esperança. E um voto de esperança, Sr. Presidente e Srs. A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): — Sr. Presidente, Deputados, em primeiro lugar, de que esta Câmara mante-

Srs. Deputados: Subscrevemos este voto no exacto sentido nha sobre a questão de Timor a máxima coesão, consenso em que entendemos que é importante que a memória seja e vontade de intervir — e a Assembleia da República teve, respeitada. nesta matéria, sempre uma posição muito clara; um voto de

Porventura, o massacre de Santa Cruz não foi maior do esperança, em segundo lugar, de que a juventude timoren-que muitos outros massacres que foram silenciados, mas se continue a demonstrar a coragem e o espírito de sacrifí-foi aquele que, depois da ocupação militar pela Indonésia e cio de sempre — na paz e no momento da construção do do genocídio cometido durante anos, permitiu confrontar seu país, essa coragem e essa determinação vão ser pelo os poderes com o olhar e as imagens de um estado de ter- menos tão necessárias como o foram no período da priva-ror, de violência que estava instalado. ção das liberdades; e, finalmente, Sr. Presidente, um voto

Foi porventura esse momento que permitiu que as pa- de esperança de que a comunicação social continue a lavras e os alertas que alguns de nós tentámos lançar tives- acompanhar activamente a questão de Timor e de que, sem sequência; foi isso que permitiu que as opiniões públi- parafraseando um anterior presidente da Comissão Even-cas mundiais se envolvessem e pressionassem os seus tual de Acompanhamento da Situação em Timor Leste, o governos, governos que sabiam dos massacres, governos Professor Adriano Moreira, «este assunto não passe à que alimentaram militarmente, durante anos, a ditadura categoria dos temas dispensados e não tenhamos um dia de militar indonésia mas que se esquivavam sempre ao con- lembrar o esquecimento». fronto do olhar, à realidade.

Pensamos, por isso, que lembrar o massacre é lembrar Aplausos do CDS-PP, do PS e do PSD. as vítimas ignoradas desta brutalidade, é lembrar a impor- tância de que os crimes não fiquem impunes e a necessida- O Sr. Presidente: —Srs. Deputados, associo-me, co-de de julgar todos aqueles que são responsáveis de crimes movidamente como acontece quando se trata de Timor, às contra a Humanidade e é lembrar que Timor, que sempre vossas palavra de indignação e de esperança e, parafra-teve — e queremos que continue a ter — o consenso de seando um velho desejo do grande Mahatma Gandhi, faço todas as forças políticas — e não só — da sociedade por- votos de que Portugal possa ajudar os nossos irmãos de tuguesa, é uma causa que continua a precisar de nós e que Timor a secar as lágrimas de todos os olhos. vai, por isso, merecer — e deve merecer — também a Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. De-nossa atenção no futuro. putado Manuel Alegre.

Aplausos de Os Verdes, do PS, do PSD, do PCP e do O Sr. Manuel Alegre (PS): — Sr. Presidente, creio que

CDS-PP. seria justo lembrar neste momento — e associar, de qual-quer maneira, a este voto — o nome de um Deputado que O Sr. Presidente: —Para uma intervenção, tem a pa- consagrou grande parte da sua actividade à causa de Timor

lavra o Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia. Leste, o saudoso Deputado Nuno Abecasis. O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP): — Sr. Aplausos do PS, do PSD, do PCP, do CDS-PP e de Os

Presidente e Srs. Deputados: Apoiamos sem reservas este Verdes. voto, que demonstra, se ainda fosse necessário fazê-lo, que esta Câmara continua a viver e a acompanhar, passo a O Sr. Presidente: —Essa foi uma verdadeira interpe-passo, a situação em Timor Leste. lação, que faz todo o sentido. Espero que todos nós este-

Por isso, não esquecemos os momentos mais significa- jamos de comovido acordo. tivos da luta do povo timorense pela sua liberdade e não Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação do esquecemos também aqueles que por ela mais se sacrifica- voto n.º 8/VIII — De pesar pelo massacre de Santa Cruz, ram. em Díli.

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Submetido à votação foi aprovado por unanimidade. padamente a Comissão para iniciar negociações no sentido da renovação deste acordo de pescas e, assim, evitar para-Srs. Deputados, o voto vai ser levado ao conhecimento lisações na actividade da frota portuguesa. A verdade é que

do Comandante Xanana Gusmão e do Ministro dos Negó- só no passado mês de Outubro o Conselho decidiu conferir cios Estrangeiros. tal mandato negociador à Comissão.

Há um ano dissemos ao Governo que as negociações Aplausos gerais, de pé. não deveriam visar a obtenção de acordos radicalmente diferentes do actual, através do qual se compram licenças Srs. Deputados, vamos iniciar o debate de urgência que para pescar em águas marroquinas, mas o que é certo é que

foi agendado para hoje, requerido pelos Grupos Parlamen- o tal mandato tardio conferido à Comissão prevê, como tares do Partido Comunista Português e do Partido Social- objectivo central — diria quase único —, estabelecer um Democrata, sobre o Acordo de Pescas com Marrocos. acordo baseado na criação única de sociedades mistas.

Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado O Governo parece ter esquecido que um tal acordo não Honório Novo. serve a frota portuguesa, do tipo familiar, que não possui

capacidade tecnológica, administrativa e financeira para O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, antes de criar sociedades mistas.

começar peço-lhe licença para saudá-lo pessoalmente e, O Governo quer também esquecer-se — e fazer-nos através de si, todos os colegas, Sr.as e Srs. Deputados, que esquecer — que um acordo de sociedades mistas exige o assumiram funções no passado dia 25 de Outubro. abate de barcos à frota nacional, obriga à sua matrícula em

Quero igualmente saudar todos os funcionários desta Marrocos, obriga à descarga de todo o peixe capturado em Casa, que são inestimáveis e imprescindíveis ao trabalho portos daquele país e obriga à contratação de tripulações de todos os Deputados eleitos. quase inteiramente marroquinas.

O Sr. Presidente: —Obrigado, Sr. Deputado, por mim O Sr. Lino de Carvalho (PCP): — Exactamente!

e por todos. O Orador: —O Governo quer ocultar que uma tal so-O Orador: —Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, lução provocaria também o desemprego massivo em Se-

Srs. Membros do Governo: Quando esta Assembleia deba- simbra, que tem mais de 50% dos seus pescadores a traba-teu, em Abril de 1997, o Acordo Comercial entre a União lhar em Marrocos, e teria consequências bem graves em Europeia e Marrocos, o PCP justificou então o seu voto Olhão e na Fuzeta. contra porque, entre outras razões, não tinham sido previs- Há um ano aconselhámos o Governo a potenciar as ca-tas as contrapartidas necessárias à renovação do Acordo de racterísticas próprias da frota portuguesa em Marrocos — Pescas para além do seu termo, em 30 de Novembro deste cerca de 40 barcos (e recordo, Sr. Secretário, que eram 51 ano, enquanto, por outro lado, as facilidades comerciais, em 1995 —, face perante às mais de 450 embarcações agrícolas e outras então concedidas não tinham limite espanholas, capturando a nossa frota sobretudo peixe-previsto. espada, espécie que só os portugueses pescam e comem.

O Governo nada conseguiu, já que nenhuma referência O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Muito bem! a este facto está contemplada no mandato conferido à Comissão. O Orador: —Na altura o Governo afirmou, com al-

guma agressividade até, tal como o fez o Grupo Parlamen- O Sr. Lino de Carvalho (PCP): — Exactamente! tar do PSD, que o PCP estava enganado, que as duas ques- tões estavam ligadas e que o Acordo Comercial era essen- O Orador: —Neste contexto, pergunta-se: primeiro, cial para a aprovação do Acordo de Pescas com Marrocos. vai o Governo aceitar que um futuro acordo com Marrocos

Vê-se agora quem tinha razão! preveja unicamente o estabelecimento de sociedades mis- tas? O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Muito bem! Pela sua parte, o PCP considera que o Governo só de- verá aceitar um acordo do tipo misto que, paralelamente à O Orador: —Há precisamente um ano, na sequência possibilidade da criação de algumas sociedades mistas,

de uma visita de uma delegação do Parlamento Europeu a preveja a manutenção de uma quantidade de licenças capa-Marrocos, escrevi ao titular da Secretaria de Estado das zes de garantir a manutenção da actual frota nacional em Pescas dando-lhe nota da preocupação do PCP sobre o Marrocos. futuro deste acordo e sugerindo os passos que, em nossa Segundo, que alternativas para esta frota tem o Gover-opinião, deveriam ser dados para negociar a respectiva no caso apareça uma proposta de acordo apenas com soci-renovação. edades mistas?

Estávamos longe de pensar que praticamente nada de Considera o Governo que é alternativa aceitável pro-eficaz fosse feito durante este lapso de tempo e que esti- mover — como, aliás, já sugeriu em documento oficial, de vesse eminente, numa reedição do sucedido durante sete Julho de 1998 — novos abates de embarcações, fazendo longos meses do ano de 1995, a paralisação total da frota regressar em força uma política que tristemente se notabi-nacional a operar em Marrocos. lizou durante os governos de Cavaco Silva? Ou, pelo con-

Há um ano dissemos ao Governo que era fundamental trário, estará o Governo disposto a potenciar, como é ne-agir para que o Conselho de Ministros mandatasse atem-

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cessário e desejável, através de negociações bilaterais, as tos da frota novas oportunidades de pescas, designadamen-vantagens específicas da nossa frota em Marrocos? te nas águas territoriais dos PALOP.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Não podemos continuar, Sr. Presidente, Srs. Deputados Governo: A inércia do Governo, do Conselho e da Comis- e Srs. Membros do Governo, a aceitar uma política comum são vai provocar a paralisação da frota portuguesa a operar de pescas cuja orientação fundamental é reduzir a nossa em Marrocos a partir do final do mês e por um período de capacidade pesqueira, é abrir completamente as nossas tempo ainda indeterminado, pois a primeira reunião formal águas e remeter Portugal para o estatuto de mero importa-de negociações está, infelizmente, apenas prevista para 20 dor de produtos de pesca. dias depois de o acordo caducar.

Exigem-se, assim, compensações financeiras adequa- Aplausos do PCP. das e suficientes a atribuir a pescadores e armadores, pagas desde o início da paralisação. O Sr. Presidente: —Para uma intervenção, tem a pa-

Registamos o facto de, como foi tornado público — lavra o Sr. Deputado João Maçãs. mas que gostaríamos, Sr. Secretário de Estado, de aqui ver confirmado ou desmentido —, a Comissão estar preparada O Sr. João Maçãs (PSD): — Sr. Presidente, permita-para atribuir uma compensação aos pescadores espanhóis me que, antes de iniciar esta minha primeira intervenção, 50% superior àquela que é destinada aos pescadores por- lhe apresente os meus cumprimentos e os torne extensivos tugueses. a todos os Srs. Deputados.

Registamos também o facto de, ainda segundo o que veio a lume na comunicação social, a Espanha ter requeri- O Sr. Presidente: —Obrigado, Sr. Deputado. do atempadamente tais compensações e de que o Governo português apenas comunicou telefonicamente as necessi- O Orador: —Sr. Presidente, Srs. Membros do Gover-dades portuguesas já no final do mês de Outubro. no, Sr.as e Srs. Deputados: Debatemos hoje um tema de

O que gostaríamos, Sr. Secretário de Estado, era de indiscutível interesse nacional, que o Partido Social-conhecer exactamente quais são os compromissos do Democrata, acompanhado de outras forças políticas, en-Governo sobre as seguintes questões: primeiro, quanto irão tendeu agendar com carácter de urgência. receber, mensalmente, os pescadores e os armadores para- Muito embora o sector das pescas não assuma um lisados? Segundo, o Governo garante que os pescadores grande peso no produto interno bruto, a verdade é que não serão pagos desde o primeiro mês de paralisação e até que pode ser desprezado em termos económicos e que não é ela termine? E o que vai acontecer aos trabalhadores de admissível ignorar o que representa em termos sócio-terra e aos postos de trabalho indirectos? culturais e ambientais; a actividade piscatória marcou — e

continua a marcar — de forma muito vincada a vida de O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Exactamente! múltiplas comunidades ao longo de toda a nossa costa. Como estarão recordados, desde a adesão de Portugal O Orador: —Terceiro, o Governo garante que as — e também da Espanha — à Comunidade Económica

compensações financeiras serão pagas directamente aos Europeia, em 1986, sucederam-se os convénios transitórios pescadores? Ou tal pagamento será feito por interpostas em matéria de pesca. pessoas, como ocorreu, muitas vezes em 1995? A União Europeia vem estabelecendo acordos de pesca

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do com o Reino de Marrocos desde 1992, tendo o último sido Governo: Ciclicamente a negociação do Acordo de Pescas celebrado em finais de 1995 em consequência, diga-se, de com Marrocos cria total instabilidade num segmento rele- um inegável esforço do então Governo do Partido Social-vante da frota artesanal em Portugal. Democrata, atingindo o seu terminus no último dia do mês

As dificuldades crescentes na negociação tanto deste de Novembro de 1999, ou seja, dentro de escassos 15 dias. como de outros acordos de pesca com países terceiros Eis-nos perante a questão: o prazo está a terminar e coloca na ordem do dia a discussão sobre o futuro da polí- ainda não existe novo acordo! tica comum de pescas. A coberto do acordo ainda em vigor, operam em águas

Por isso, importava sublinhar que o PCP considera es- marroquinas cerca de 40 embarcações portuguesas, oriun-sencial renegociar o futuro desta política comum, pelo das, sobretudo, de Sesimbra, do Algarve e de Peniche, as menos nos dois aspectos seguintes: em primeiro lugar, quais envolvem mais de 1000 postos de trabalho directo. conseguir a manutenção das 12 milhas na exclusiva sobe- O grande dilema que se coloca é o de não existirem no rania nacional e defender o alargamento dessa soberania momento quaisquer garantias de que venha a ser celebrado para as 24 milhas, zona marítima que passaria a ser desti- um novo acordo, o que, a verificar-se, implicaria uma nada unicamente à frota nacional, tal como, recordo, foi, situação dramática quer para os pescadores, quer para a aliás, aprovado nesta Casa e no plenário do Parlamento frota, quer ainda para as indústrias ligadas ao sector, com Europeu por iniciativa dos Deputados do PCP; em segun- os reflexos de ordem social e económica que daí adviriam do lugar, exige-se que o quadro legislativo comunitário e facilmente se depreendem. passe a contemplar a possibilidade de estabelecer negocia- Acontece que há mais de um ano que se vislumbram ções bilaterais que contemplem especificidades próprias e fortes indícios de que Marrocos terá deixado de estar inte-que no caso português, a existirem, teria permitido resolver ressado em renegociar o referido acordo com a União não só a questão de Marrocos como criar a outros segmen- Europeia, uma vez que parece valorizar hoje muito mais os

seus recursos haliêuticos e estar a ser permanentemente

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assediado por parte de grandes potências pesqueiras inter- bém, a sua apreensão pelo facto de o mencionado Acordo nacionais, como o Japão, a Correia do Sul e, sobretudo, a expirar em 30 de Novembro, sem que ainda se tivessem Rússia. iniciado negociações entre as partes afim de que outro

Como agravante, tenhamos presente ainda o facto de fosse celebrado. Pediu, ainda, a máxima das prioridades alguns Estados membros serem da opinião de que o custo para as negociações e lamentou a morosidade da Comissão orçamental dos acordos de pescas com países terceiros é em requerer o mandato necessário para o efeito, ao mesmo excessivo, o que nos parece uma apreciação pouco susten- tempo que sugeriu que fossem previstas medidas sócio-tável. económicas específicas de compensação que abrangessem

Como se estas reticências não bastassem deparamos pescadores e indústrias, para a eventualidade de as mesmas com notícias várias e recentes, veiculadas pela agência não serem bem sucedidas. Reuters, as quais referem não encarar Rabat a possibili- Poucos dias depois, o Eurodeputado Arlindo Cunha, dade de renegociação do acordo, adiantando ainda que em intervenção que produziu, manifestou idênticas apreen-será colocado um ponto final sobre a matéria no próximo sões e sugeriu algumas soluções. dia 6 de Dezembro, aquando da reunião já marcada com É, de facto, pelo menos muito estranho que uma maté-o Comissário Fischler. Aliás, o próprio Comissário Fis- ria desta importância tenha obtido semelhante tratamen-chler, segundo o Jornal de Notícias de 7 de Novembro, to!... terá também dito, na cidade de Santiago de Compostela, Porém, verdadeiramente espantoso — inacreditável que iria fazer os possíveis para que as negociações sobre mesmo! — é a forma displicente como o Governo portu-o Acordo de Pesca com Marrocos fossem iniciadas ainda guês se comportou. Ao que se sabe, nem «tugiu nem mu-durante este mês de Novembro, muito embora desconhe- giu»! Não terá pressionado, atempadamente, o Conselho cesse o que Marrocos pretendia efectivamente, o que, por Europeu! Não acautelou os interesses nacionais! Desco-sua vez, o deixava sem saber que tipo de oferta podia nhecemos mesmo que tenha pugnado pela preparação de fazer. medidas específicas de compensação pela paragem do

Se a tudo isto, que poderá ser muito pouco, mas que exercício da pesca que, infelizmente, se adivinha. também poderá significar muito, acrescentarmos a notícia Em suma, o Governo ter-se-á alheado das suas respon-do jornal espanhol El País de 9 do corrente mês, onde se lê sabilidades, remetendo-se comodamente para o papel de que representantes da UGT, das Organizações Obreras do mero espectador. Mar e dos Ministérios da Agricultura e do Trabalho chega- Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. ram a consenso quanto às ajudas a conceder à frota que Deputados: O PSD não compreende, e lamenta profunda-opera em Marrocos caso não seja renovado o acordo, espe- mente, que, a escassos dias do terminus do Acordo de cificando, desde logo, que o governo espanhol havia aceite Pescas com Marrocos, nada se saiba de concreto, em Por-as pretensões dos sindicatos e assumia pagar aos pescado- tugal, quanto a esta matéria. res cerca de 180 contos por mês e aos armadores entre Exortamos, por conseguinte, o Governo a dizer clara-1000 e 5000 contos por embarcação, convenhamos que mente aos portugueses se entende que é de menor impor-não encontraremos muitas razões para estar tranquilos e tância o impacto sócio-económico do eventual fim destas muito menos confiantes. oportunidades de pesca e perguntamo-lhe se, por acaso, já

Havia, à partida, que admitir que, tal como em se terá apercebido do impacto que tal teria em comunida-1994/1995, existiriam dificuldades com vista à obtenção des piscatórias totalmente «monodependentes» do sector do acordo o que impunha, desde logo, uma atenção espe- como é, por exemplo, o caso de Sesimbra. cial por parte do actual Governo na última Cimeira Luso- Admitindo que o pior possa ocorrer, afigura-se oportu-Marroquina. no que o Governo nos esclareça, também, quanto às medi-

Devemos ter presente que se os milhares de postos de das paliativas que adoptará para minorar esta perda. trabalho, directos e indirectos, que poderão estar em causa Para além destas medidas de natureza iminentemente com a não celebração do acordo podem assumir uma im- conjuntural, o que fez o Governo no sentido de criar outras portância relativa à escala da União Europeia, eles repre- oportunidades de pesca, designadamente através da diver-sentam, sem dúvida, muito para Portugal, já que incidem sificação dos pesqueiros externos e, a título de exemplo, sobre pequenas comunidades piscatórias onde a reconver- no que respeita aos do Atlântico Norte? Empreendeu, de são económica será extremamente difícil. facto, alguma política incentivadora da criação de socieda-

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. des mistas ao nível da captura? Até que ponto fomentou a Deputados: Perante tudo isto, não será legítimo interro- cooperação e a parceria entre a nossa indústria conserveira, garmo-nos acerca das «águas em que navegamos»? Será de congelação e as organizações produtivas? que este dossier foi atempadamente objecto das atenções São estas as questões que pretendemos ver respondi-da União Europeia? Terá o Governo português acompa- das, quer para nosso próprio esclarecimento quer para o de nhado esta matéria com o empenhamento que merecia ou milhares de portugueses que, directa ou indirectamente, terá mesmo pressionado, como lhe competia, o Conselho dependem do sector e vivem momentos de incerteza e de Europeu de forma a motivar mais celeridade ao processo? angústia.

Do que não restam dúvidas é de que o Conselho Euro- Estas são questões que, naturalmente, decorrem da au-peu apenas mandatou a Comissão a 10 de Junho, afim de sência de uma política de pescas que se adeque às especifi-que iniciasse conversações com vista à renegociação do cidades do sector em Portugal. acordo.

Em proposta de resolução sobre o Acordo de Pescas, o O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Política europeia! Parlamento Europeu, a 29 de Outubro, manifestou, tam-

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O Orador: —Fazemos votos para que o Governo último Acordo. Portanto, todo o tempo que desde aí passou aprenda, de facto, com os erros e omissões que cometeu, foi tempo perdido, por inacção, por inércia, por falta de de forma a que situações como estas não deixem de ser vontade política… devidamente equacionadas em 2002, aquando da reforma da Política Comum de Pescas. O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): — Exactamente!

Aplausos do PSD. O Orador: —… em resolver a tempo um problema que, todos sabíamos, ia colocar-se. O Sr. Presidente: —Para uma intervenção, tem a pa-

lavra o Sr. Deputado Paulo Portas. O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): — Muito bem! O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. O Orador: —Finalmente, há insensatez da política do

Deputados: É uma pena que os debates que esta Câmara Conselho e da Comissão Europeia. Insensatez porque, em tem, regular e periodicamente, sobre a situação do sector cada questão económica, a Comissão Europeia prefere a pesqueiro sejam uma avaliação dos prejuízos e da melhor visão globalizadora e não atende a um princípio que ainda forma de limitar os danos, em vez de serem, como podiam consta dos Tratados, por muito que alguns Deputados, ser, debates sobre um novo arranque, um novo começo, nesta Câmara, o não defendam: o princípio de preferência para a nossa frota, para a nossa pesca e para o bem-estar comunitária. das gentes do mar.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): — Exacto! O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): — Muito bem! O Orador: —O que é que aconteceu? Demos um O Orador: —Gostava de, a este título, abordar este acordo comercial sem prazo e obtivemos um acordo pes-

tema do Acordo com Marrocos do ponto de vista dos fac- queiro com prazo, o que significa que Marrocos colocou tos, da visão europeia deste Acordo e da posição portugue- os produtos que entendia no espaço europeu, mas Portugal sa face a ele — e tirar, depois, alguma conclusão. e os outros interessados em pescar em Marrocos só podem

A situação, de facto, é indesmentível: no próximo dia pescar até ao dia 30 de Novembro. A contrapartida a que 30, os barcos vão parar, o que significa que, em boa medi- tínhamos direito era exígua no prazo. da, os pescadores podem ficar no desemprego ou numa Mais uma vez — como aqui se vê pelo confronto en-situação que está no limite do que é a dignidade do traba- tre a atitude comercial, em geral, e a atitude relativamen-lho: serem pagos para não produzir. Tudo isto só vem te às pescas, em especial —, pescas e lavoura são, siste-adensar o campo de pobreza em que a política comum de maticamente, a moeda de troca que governos da União pescas transformou o nosso sector pesqueiro. Europeia, nomeadamente os portugueses, dão para prote-

ger sectores que consideram política e eleitoralmente O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): — Muito bem! mais convidativos. Finalmente, este problema revela os erros da visão fe-O Orador: —Por outro lado, é provável que alguns — deral nas políticas comuns da União.

para não dizer muitos — dos armadores que ainda sobram neste mercado venham, mais uma vez, a pedir o abate da O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): — Muito bem! frota que resta. Portanto, mais uma vez, adensa-se o «cemitério de barcos» em que a política comum de pescas O Orador: —Gostava de chamar a vossa atenção para transformou a nossa capacidade pesqueira. o paradoxo da situação em que Portugal se encontra: a

Europa não consegue negociar com Marrocos porque Mar-O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): — Exactamente! rocos não quer; Portugal não pode negociar com Marrocos porque a Europa não deixa. O Orador: —Mais dois portos de pesca, pelo menos,

viverão uma situação de crise indiscutível para a qual não O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): — Exacto! contribuíram: para continuarem a operar não podem parar. Mas o que lhes está vedado é o direito de pescar. O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): — Muito bem!

A situação, do ponto de vista da União Europeia, reve- la quase todos os vícios da burocracia e quase todos os O Orador: —A situação em que nos encontramos é defeitos da protecção dos interesses dos Estados maiores e absurda! da falta de protecção dos interesses dos países mais peque- nos. Há incompetência, sem dúvida nenhuma! Não faz O Sr. Manuel Frexes (PSD): — Isso é óbvio! qualquer sentido que o Acordo expire a 30 de Novembro e o mandato para o renegociar só tenha sido dado a meio de O Orador: —Como O Sr. Deputado vai ver, não é tão Outubro! Não é possível negociar, atempadamente e com óbvio assim! Porque nem a Europa garante o nosso direito qualidade, nestas circunstâncias. a pescar, a nós, País marítimo,…

Por outro lado, há negligência, porque, como todos sa- bemos, a intenção de Marrocos em não renovar era conhe- O Sr. Manuel Frexes (PSD): — Isso é absurdo! cida desde o primeiro dia ao dia seguinte da assinatura do

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O Orador: —… nem nós podemos, em alternativa, dade de, no futuro, os Estados organizarem bilateralmente, tratar da nossa própria relação com Marrocos,… de acordo com o princípio da subsidiariedade, a sua rela-

ção com Estados terceiros. A nós, isto parece-nos uma O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): — Pois não! evidência! O Orador: —… nós, País vizinho de Marrocos! O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): — Claro! É mais ilógico ainda. Como todos sabem, o Acordo de

Pescas interessa muito a poucos países da União Europeia: O Orador: —Se o facto de, dentro de dias, deixarmos interessa, nomeadamente, a Portugal e a Espanha. Mas os de ter direitos de pesca, deixarmos de ter dignidade no indiferentes não ajudam e os concorrentes prejudicam! Os trabalho para os pescadores e vida empresarial para os indiferentes não nos deixam fazer negociações bilaterais e armadores que dependem daquele mercado, não vos chega os concorrentes, como sabem, prejudicam a nossa posição para desbloquear este tipo de política que impede a relação porque o problema de Marrocos é com Espanha, com a bilateral com Marrocos em matéria pesqueira, então que natureza da sua pesca e com a dimensão do que os espa- chegue, pelo menos, o relatório da Eurodeputada Carmen nhóis pescam, não é com a natureza da nossa pesca… Fraga, vossa colega em termos de pensamento federalista.

É ela quem nos diz que, realmente, no futuro, é preciso O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): — Muito bem! flexibilizar a política comum de pescas, porque a rigidez não interessa a ninguém, a não ser àqueles que queiram O Orador: —… nem com o que os nossos pescadores paralisar, uma vez mais, o nosso sector pesqueiro.

lá fazem! O Sr. Presidente: —Agradeço que termine, Sr. Depu-O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): — Muito bem! tado. O Orador: —Portanto, estamos a ser sistematicamente O Orador: —Sr. Presidente, para terminar, gostaria de

prejudicados por esta concepção federalista das políticas dizer que, a nosso ver, é necessário que o Governo nego-comuns europeias… ceie, em termos aceitáveis e de equidade, as compensa-

ções; precisamos de saber o que vai acontecer aos postos O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): — Exactamente! de trabalho indirectos (porque disso não temos notícia) e, sobretudo, preparemo-nos, a sério, para a renegociação da O Orador: —Em termos de reflexão e porque vem aí política comum de pescas, se queremos resolver esta situa-

a revisão da política comum de pescas, chamo a atenção ção que nenhum português de bom senso pode entender. para o seguinte: o vosso federalismo, segundo o qual não é possível a um Estado fazer um acordo bilateral com um O Sr. Presidente: —Sr. Deputado, tem de terminar. país terceiro, não defende o interesse europeu e prejudica o interesse nacional! O Orador: —Sr. Presidente, só para terminar, direi

A nossa flexibilidade, que é a alternativa ao federalis- que ninguém entende que Portugal tenha, à sua frente, o mo, não prejudica o interesse europeu, porque ninguém mar que tantos invejam e que dele não possamos tirar ficará prejudicado com um acordo entre Portugal e Marro- qualquer proveito. cos,… (O Orador reviu.)

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): — Exactamente! Aplausos do CDS-PP. O Orador: —… mas defende o interesse nacional, o O Sr. Presidente: —Tem a palavra para uma interven-

direito dos nossos armadores de não terem de abater os ção, o Sr. Deputado António Martinho. barcos, o direito dos nossos pescadores poderem ter o seu «ganha pão» com trabalho e dignidade nos mares de Mar- O Sr. António Martinho (PS): — Sr. Presidente, Sr. rocos! Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Alguns parti-

dos da oposição requereram este debate de urgência a Aplausos do CDS-PP. pretexto de o acordo de cooperação em matéria de pesca entre a União Europeia e Marrocos estar a chegar ao seu O Orador: —Se entenderem que esta é uma posição termo no final deste mês. Legítimo, naturalmente!

escassamente europeísta,... Legítimo será também que o Governo, o Sr. Secretário de Estado das Pescas que participa no debate e o Grupo O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): — Suficientemente. Parlamentar do Partido Socialista tragam aqui os seus pontos de vista e dêem nota das diligências relativas ao O Orador: —… recomendo, apenas, a leitura de um assunto em análise, bem como das medidas de política de

relatório do Parlamento Europeu que é muito interessante pesca que têm vindo a ser desenvolvidas desde que os sobre o futuro da política comum de pescas e que pretende portugueses decidiram confiar os destinos do País ao Par-resolver este paradoxo: o relatório da Sr.ª Eurodeputada tido Socialista. Carmen Fraga, membro do Partido Popular Europeu e, Mas será talvez, também, legítimo questionar o mo-portanto, insuspeita de qualquer atitude antieuropeísta. mento do debate. Só agora, Srs. Deputados, se apercebe-Este relatório defende, na sua conclusão 21.ª, a possibili-

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ram do problema? Só agora detectaram dificuldades para o directamente envolvido tiraria mais dividendos? E outros sector? Só agora descobriram possíveis inconvenientes… sectores da actividade económica?

Quanto ao relatório da Sr.ª Fraga, de Outubro de 1997 O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Isso não é verdade! — já aqui citado, na semana passada e hoje, pelo Sr. Depu-

A discordância é muito antiga! tado Paulo Portas —, será bom que se sujeite a uma análise mais fina e se atente ao seu n.º 21 quando refere que «a O Sr. Lino de Carvalho (PCP): — Ó Martinho!... compensação financeira ficaria a cargo exclusivo do Esta- do membro», no caso de se vir a estabelecer um acordo O Orador: —… para armadores, pescadores… bilateral. Pagaríamos duas vezes: para o orçamento da Comunidade e em função do acordo a estabelecer. Como O Sr. Presidente: —Srs. Deputados, agradeço que oi- já reparei, é essa a opção do CDS-PP.

çam em silêncio. Poder-se-á, assim, manter a convicção de virtualidades no quadro da negociação bilateral que alguns defendem?! O Orador: —… e outros trabalhadores ligados à acti- Todos sabemos que, no actual quadro jurídico, tal situ-

vidade da pesca nas águas marroquinas ao abrigo deste ação é insustentável, como o próprio relatório o reconhece acordo? no n.º 9 da «Exposição de motivos», ao afirmar que actu-

Por sua vez, o Governo soube, oportunamente, tomar almente «a Comissão é a responsável da negociação dos algumas iniciativas sobre esta questão que remontam a acordos de pesca». Março de 1998, Sr. Deputado Honório Novo! Através Sr. Presidente, Srs. Deputados: A manutenção de um delas identificaram-se as dificuldades decorrentes do termo acordo de pescas com Marrocos é importante para o sector do Acordo, sensibilizaram-se as instituições europeias que pesqueiro português. Em coerência com esta realidade, o têm a ver com o sector, estreitaram-se laços e formas de Governo soube, nos últimos anos, estabelecer com Marro-cooperação com Marrocos — país soberano, aliás —, cos um programa de cooperação que abrange, entre outros potenciando relações de vizinhança e interesses comuns, aspectos, a investigação científica, a formação profissional enfim, estudaram-se alternativas. e a comercialização do pescado.

Foi, também, na sequência destas iniciativas que, em Necessária e naturalmente, o acordo de pescas com Março de 1999, a Comissão Europeia diligenciou no senti- Marrocos não é o único instrumento de política para o do de se dar início ao processo negocial. sector. Neste domínio, o Governo do PS soube introduzir

A 10 de Junho próximo passado, por proposta do Go- no sector novas dinâmicas, expressas, por exemplo, nos verno português, o Conselho de Ministros da União Euro- apoios verificados nos últimos quatros anos. E, Srs. Depu-peia aprovou uma Declaração instando a Comissão a des- tados do PSD, a partir de 1995 ou 1996, o País teve, final-envolver, conjuntamente com Marrocos, a identificação e a mente, uma política de pescas. elaboração de novos mecanismos de cooperação nas pes- cas. Nela se reconhece, de igual modo, a importância só- O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Como? cio-económica do acordo.

Recentemente, a 26 de Outubro, o Ministro da Agricul- O Orador: —Foi assim que, entre 1996 e 1999, se ve-tura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas entregou em rificou um forte apoio à pesca local e costeira que repre-mão, ao Comissário Fischler, uma carta alertando, mais senta 91% das embarcações registadas em Portugal e 63% uma vez, para o impacto sócio-económico da paragem da do emprego. frota e do termo do acordo com Marrocos, propondo a Foram, assim, apoiados 1526 projectos, num total de adopção de uma medida específica para apoio a armadores 4,2 milhões de contos. Ora, entre 1992 e 1995, apenas e pescadores afectados. tinham sido apoiados 510 projectos envolvendo só 1,6

E neste ponto, Srs. Deputados, quero crer que nos milhões de contos. acompanharão na concordância plena relativamente a esta Também neste período os projectos aprovados no âm-reivindicação. Aliás, este conjunto de iniciativas desmente bito do PROPESCA, do ICPESCA e do SIPESCA quase bem a acusação ao Governo, por parte de alguns Srs. De- duplicaram e o montante de investimento subiu de 15,9 putados, de inacção,... milhões de contos, no período de 1992 a 1995, para 23,6

milhões, entre 1996 e 1999. O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — E omissão! Muitas outras medidas foram tomadas no sentido do desenvolvimento sustentado do sector, com um esforço O Orador: —... acusação que repudiamos, como fica claro do investimento na área da investigação que, nos

demonstrado. quatro anos entre 1996 e 1999, ascendeu a 8,5 milhões de Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. contos.

Deputados: Há nesta Assembleia quem defenda que se Outras medidas não menos importantes foram tomadas deve caminhar para o estabelecimento de acordos de pesca — refiro-me a medidas marcadamente sociais. E, neste bilaterais, no caso, entre Portugal e Marrocos. Vêem nesse domínio, algumas oposições souberam acompanhar o Gru-tipo de acordo algumas virtualidades. po Parlamentar do PS e o Governo para encontrar solu-

Impõe-se, quanto a mim e antes de mais, que se obte- ções. nha resposta às seguintes questões: que vantagens obte- Espero bem que, na problemática hoje em análise e ríamos com esse quadro? Será fácil concluir, à partida, que com as explicações dadas pelo Governo, semelhante atitu-um tal acordo seria mais benéfico para Portugal? O sector de se possa verificar.

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Continuando, Sr. Deputado António Martinho, neste Aplausos do PS. contexto, seguramente reconhecerá que se enganou e virá responder que não foi bem isto o que disse. O Sr. Presidente: —O Sr. Deputado Lino de Carvalho Portanto, em todas estas iniciativas, sempre alertámos e

pediu a palavra para defesa da honra e consideração da previmos o que ia acontecer. Infelizmente, a vida está a bancada. dar-nos razão. Infelizmente, estamos a chegar ao fim da

Tem a palavra. vigência do Acordo, que será no próximo dia 30 de No- vembro, e a única solução que temos à vista é a de ver O Sr. Lino de Carvalho (PCP): — Sr. Presidente, pedi paralisada a frota pesqueira portuguesa.

a palavra exactamente para usar, com todo o rigor, essa Inclusivamente, o Governo nem sequer tomou em de-figura regimental. vida conta o importante estudo feito sobre esta matéria, há

O Sr. Deputado António Martinho acusou o PCP de só cerca de ano e meio, pela Direcção-Geral das Pescas. agora ter «acordado» para esta questão. Ora, o Sr. Deputa- Se tivessem sido tomadas outras iniciativas mais de-do António Martinho não tem, seguramente, a memória terminadas sobre esta questão seguramente não estaríamos curta, mas, se está esquecido, eu recordo-lhe. a lamentar aqui, hoje, que, dentro de pouco mais de 10

Recordo-lhe que, a pedido de várias bancadas, entre as dias, veremos de novo a frota pesqueira portuguesa parali-quais a do PCP, o primeiro debate que teve lugar nesta sada. Esta é que é a questão! Aliás, o Sr. Deputado sabe Assembleia no início da anterior legislatura foi precisa- que, nesta matéria, se alguma coisa há a fazer em relação à mente sobre esta questão. Concretamente, tratou-se de uma bancada do PCP é elogiá-la pelo trabalho que fez ao longo reunião da comissão competente com a presença do Minis- destes anos em defesa da frota pesqueira portuguesa, desi-tro Jaime Gama. gnadamente nesta questão.

O Sr. Deputado António Martinho, seguramente, não deverá estar esquecido de que, por iniciativa do PCP, toda Aplausos do PCP. a anterior equipa do Ministério da Agricultura foi chamada várias vezes à Comissão de Agricultura a fim de ser deba- O Sr. Presidente: —Tem a palavra o Sr. Deputado tida esta matéria. António Martinho, para dar explicações, se assim o dese-

De igual modo, seguramente não estará esquecido de jar. que foi neste Plenário, aquando da discussão do acordo comercial com Marrocos, que suscitámos esta matéria. Na O Sr. António Martinho (PS): — Sr. Presidente, apro-altura, votámos contra, exactamente porque considerámos veitarei a oportunidade para tornar claro o teor da minha que não estavam garantidas as contrapartidas necessárias, intervenção que, de facto, foi mal interpretada pelo Sr. ao contrário do PS e do PSD, que votaram a favor, e do Deputado Lino de Carvalho. PP, que viabilizou o acordo comercial com Marrocos e Na verdade, questionei esta Câmara, referindo-a gene-que, embora hoje venha criticá-lo por causa da questão das ricamente, mas o Sr. Deputado Lino de Carvalho conside-contrapartidas, o viabilizou na altura. rou que as minhas palavras se restringiam ao PCP.

O Sr. Deputado António Martinho também sabe, segu- ramente, que se no Parlamento Europeu há Deputados de O Sr. Lino de Carvalho (PCP): — Então, pertencemos alguma força política que tenham suscitado permanente- todos à mesma «família»?! mente esta questão têm sido os do PCP. Aliás, o meu ca- marada Deputado Honório Novo, enquanto esteve no Par- O Orador: —Repare, Sr. Deputado: também me lamento Europeu, fez parte de uma delegação que se des- referi genericamente ao comportamento de algumas ban-locou expressamente a Marrocos para tratar desta matéria cadas desta Assembleia relativamente a medidas de polí-com as autoridades desse país. Portanto, Sr. Deputado, não tica social. tenha memória curta!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Ainda pior! O Sr. Manuel dos Santos (PS): — Está à sua frente, na

tribuna do Governo, quem discutiu isso! O Orador: —Sr. Deputado, espere um bocadinho! Já trato de si, se for preciso! O Orador: —Sr. Deputado Manuel dos Santos, tenha Continuando, o Sr. Deputado podia ter-se recordado de

calma! O Sr. Deputado ainda não se acalmou desde a últi- que a sua bancada também participou activamente nos ma legislatura! trabalhos para encontrar medidas de política social para o

Tenha calma, Sr. Deputado, porque não estou a dizer sector da pesca, o que nunca escondi, e acho importante que fomos só nós… que o reconheçamos.

No que diz respeito às tomadas de posição de Deputa-O Sr. Manuel dos Santos (PS): — O senhor disse: dos no Parlamento Europeu, até posso mostrar-lhe a acta

«fomos só nós»! da sessão do dia 28, em que parece que também estava presente o Sr. Deputado Paulo Portas. Nessa sessão, dois O Orador: —Sr. Deputado Manuel dos Santos, tenha Deputados portugueses do PS pronunciaram-se sobre esta

calma! A sua bancada é que acusou o PCP de só agora se questão e debateram-na de forma clara, reivindicativa, ter lembrado desta matéria. O Sr. Deputado ouviu! defendendo os interesses do País no quadro da preparação

da renegociação do acordo entre a União Europeia e Mar-rocos.

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Aliás, Srs. Deputados, sabemos que, na legislatura an- O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): — Muito bem! terior, quando o actual Secretário de Estado das Pescas, José Apolinário, desempenhava as funções de Deputado ao O Orador: —O que lhe agradeço, Sr. Deputado Antó-Parlamento Europeu, recebíamos muita informação que era nio Martinho, é que não se dirija à bancada do CDS-PP veiculada por ele próprio, sinal evidente de que ele traba- como se algum dia tivessemos esquecido o problema das lhava e o fazia em articulação com a Assembleia da Repú- pescas, a defesa dos direitos dos nossos pescadores ou dos blica. nossos armadores.

Aliás, Sr. Deputado, sabe bem que a nossa divergência Vozes do PS: —Muito bem! é antiga. Diz que descobriu, depois de o PS chegar ao Governo, uma nova política de pescas. Admito que a veja O Sr. Lino de Carvalho (PCP): — O problema é que, no Tua,…

depois, chegou a Secretário de Estado e esqueceu-se do trabalho que fez enquanto Deputado! Risos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: —O Sr. Deputado Paulo Portas pe- … e, mesmo assim, duvido!

diu também a palavra para defesa da honra da sua bancada. Há uma coisa de que pode ter a certeza: o interesse que Penso que este é um dos raríssimos casos em que seria, se nota no Comissário Fischler pelos direitos da pesca de

talvez, desejável que os Srs. Deputados fossem menos Portugal em Marrocos é, certamente, bem menor do que o sensíveis… interesse que ele revela pelos lagos austríacos, onde nada

temos a defender... Risos. Vozes do CDS-PP: —Muito bem! Faça favor, Sr. Deputado. O Sr. Presidente: —Tem a palavra o Sr. Deputado O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, até António Martinho, para dar explicações, se assim o dese-

admitiria ceder à sua solicitação, mas não há dúvida ne- jar. nhuma de que a intervenção precedente do Deputado An- tónio Martinho confirmou que visava, também, a bancada O Sr. António Martinho (PS): — Sr. Presidente, Sr. do CDS-PP. Deputado Paulo Portas, é tão legítimo defender os interes-

ses de Portugal nas fragas do Tua como na planície ou na O Sr. Presidente: —Sr. Deputado, o Presidente só tem lezíria ribatejanas.

direito a dizer algumas graças uma vez por outra. Não tem outra defesa. Aplausos do PS.

Risos. Por falar em interesses nacionais, e já que o Sr. Depu- tado Lino de Carvalho lembrou com precisão, e muito O Orador: —E mantenha-se assim, Sr. Presidente! bem, a reunião da Conferência de Representantes dos Gostava de começar por dizer que, em matéria de inte- Grupos Parlamentares realizada nesta Assembleia, em

resse nacional, não interessa quem «leva a taça». 1995, no dia 6 de Novembro — e apesar de eu ser trans- montano, de junto das arribas do Tua! — , vou citar um O Sr. António Martinho (PS): — Estamos de acordo! ilustre ribeirinho, digno Deputado desta Assembleia até à anterior legislatura. Vou, pois, citar o meu colega e cama-O Orador: —Não duvido da boa e recta intenção de rada do Algarve, Luís Filipe Madeira — e talvez se lembre

qualquer Deputado desta Câmara ou de qualquer Deputado que foi em articulação consigo. ao Parlamento Europeu quando discute os direitos de Por- Dizia ele: «(…) o partido que requereu este debate co-tugal nos mares de Marrocos. meçou por falar no interesse nacional, mas é óbvio que o

interesse nacional não é exclusivamente aquele que o PP O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): — Muito bem! entende ser (…)». O Orador: —O que aqui quero discutir é o sistema, a O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Foi o que eu disse!

política, e não quem mais fez por quem. Nessa matéria, temos a consciência tranquila, e isso O Orador: —Sr. Deputado, de facto, o senhor defende

basta-nos! O número de intervenções que fizemos, em o interesse nacional, mas tome nota: à sua maneira e na sua Plenário ou em comissão, tanto nas instituições nacionais perspectiva, todas as bancadas defendem o interesse naci-como nas europeias, responde por nós. Quanto às inter- onal,… venções que ouvi, proferidas por Deputados de outras bancadas, nesta sede e no Parlamento Europeu, só tenho O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Foi o que eu disse! uma coisa a fazer: saudá-las, porque ajudam o meu país. Não me interessa saber quem «leva a taça» em matéria de O Orador: —… tal como o Partido Socialista, neste defesa do interesse nacional. caso, nesta bancada e, naturalmente, no Governo.

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Aplausos do PS. O Sr. Presidente: —Tem a palavra o Sr. Secretário de O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Então, houve um Estado das Pescas, para uma intervenção.

conjunto de esquecimentos de todos! O Sr. Secretário de Estado das Pescas (José Apoliná-O Sr. Presidente: —Tem a palavra o Sr. Deputado rio): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Sendo esta a

Luís Fazenda, para uma intervenção. minha primeira intervenção nesta Assembleia na presente Legislatura, permita-me, Sr. Presidente, que o saúde de O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Srs. De- uma forma muito especial. É um insigne democrata e figu-

putados, Sr. Secretário de Estado: O Bloco de Esquerda ra de referência deste Parlamento. acompanha a preocupação das comunidades piscatórias pela não renovação em tempo útil deste Acordo de Pescas O Sr. Presidente: —Muito obrigado, Sr. Secretário de entre a União Europeia e o Reino de Marrocos e pela imi- Estado. nente e consequente paralisação da frota pesqueira a operar nas águas deste último. O Orador: —O debate sobre a situação decorrente do

Serei conciso e muito directo. impasse negocial no Acordo de Pescas entre a União Eu-Perguntamos, à semelhança do que outras bancadas já ropeia e o Reino de Marrocos ou a análise das pescas e da

fizeram, o porquê do atraso na renegociação deste Acordo, aquicultura em Portugal exigem, em nossa opinião, uma o porquê de, no actual Quadro Comunitário de Apoio, não linguagem de verdade e de rigor perante os factos, desde podermos empunhar novos instrumentos jurídicos que nos logo sobre o domínio dos recursos. levem a acordos bilaterais, sendo certo que a maior parte 70% dos recursos piscícolas mundiais estão, hoje, em dos conflitos daqui emergentes e as dificuldades negociais situação de sobrepesca. Mesmo na nossa costa, a sardinha provêm do Reino de Espanha e não da República Portu- está num limiar de precaução, a pescada é um caso típico guesa. de sobre-exploração, o carapau é explorado nas margens

Pergunto, ainda, por que motivo, mesmo tendo em con- dos limites biológicos de segurança. A sardinha justificou sideração a paridade do poder de compra, há uma diferen- mesmo um pacto entre a Administração e o sector, estabe-ça entre as compensações previstas, em caso de paralisa- lecendo um limite anual de capturas e medidas excepcio-ção, para os nacionais portugueses e para os nacionais nais de preservação dos juvenis. espanhóis. Por outro lado, a partir de 1976, com o alargamento da

Pergunto, ainda, no âmbito da renegociação dos acor- zona económica exclusiva para as 200 milhas, 90% dos dos com Marrocos que será feita pela União Europeia, qual recursos haliêuticos e 35% das superfícies marinhas deixa-a posição portuguesa acerca da eventual pesca em águas ram de estar sujeitos ao regime de pesca livre. Paralela-que serão adjacentes ao Sara Ocidental. Levanto esta ques- mente, a legítima ambição de desenvolvimento e opiniões tão porque devemos ter uma posição unívoca nesta maté- públicas mais activas levam os países ribeirinhos a recla-ria. mar contra a sobre-exploração de frotas estrangeiras, a

É que, de modo geral, reprovámos, por exemplo, que a defender frotas de pesca próprias, estruturas de comerciali-Austrália utilizasse privilégios económicos no mar de zação e transformação dos produtos da pesca que gerem Timor graças a acordos com a Indonésia. Assim, pergunto: emprego local. que política tem Portugal, hoje, nessa matéria, relativamen- Neste quadro, o futuro da pesca, em Portugal, exige te a águas que virão a fazer parte da futura república árabe uma gestão sustentável dos recursos, o que passa por um saraui? Faço esta pergunta porque, como também é do melhor conhecimento e investigação da nossa zona eco-nosso conhecimento, aquele território tem em curso um nómica exclusiva, valorização da pesca local e costeira, processo de autodeterminação, direito que lhe é reconheci- melhoria da formação profissional e das condições sociais do pelas Nações Unidas. Portanto, em matéria de coerência e remuneratórias dos pescadores, maior controlo e fiscali-e de defesa do direito internacional, pergunto qual a posi- zação com progressiva adaptação do sistema de licencia-ção do nosso país em relação a esta questão. mento, qualidade e diferenciação na produção conserveira,

Por fim, pergunto, também, ao Sr. Secretário de Estado aumento da produção na aquicultura, mantendo um seg-das Pescas o porquê da pressão para a implementação de mento competitivo na pesca industrial e longínqua, mas uma política fortemente aberta às empresas de capitais centrando, afinal, a nossa atenção nas nossas águas e nos mistos quando não parece haver apetência para tal, nem nossos recursos. por parte dos armadores, por razões comerciais e tecnoló- Importa igualmente promover a renovação e moder-gicas, nem muito menos por parte dos trabalhadores da nização da frota, dotando as nossas embarcações de pesca, porque as tripulações das embarcações virão a ser melhores condições de segurança, trabalho e conservação constituídas praticamente por marroquinos, os quais aufe- do pescado e, por isso, travámos muitos dos pedidos de rem salários muito mais baixos do que os dos pescadores abate solicitados por armadores, só os admitindo em portugueses. casos excepcionais, de que a frota que opera em Marro-

Sr. Secretário de Estado, são estas as questões que que- cos é exemplo. ríamos pôr em evidência, manifestando desde já total aber- Prioridade também à melhoria das condições de vida tura para participar em debates posteriores e para uma das pessoas que vivem da pesca. O sector tem um quadro discussão mais de fundo que tem a ver com a política remuneratório ligado à percentagem do valor da pesca comum de pescas e com um conjunto de normativos da desembarcado em lota, implica por isso que uma maior União Europeia que são lesivos de direitos nacionais. intervenção das organizações de produtores na regulação

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do preço, ou um sistema de interprofissionalismo, sejam em países terceiros, teríamos de inscrever uma verba no implementados para melhorar o rendimento dos pescado- orçamento nacional. Ora, não me parece que isso seja res e de todos os que vivem da pesca. tratar um acesso a uma actividade económica por igual no

Há hoje, pois, — e esse é um aspecto que, falando de quadro da União Europeia. De todo o modo, é uma refle-Marrocos, temos de abordar — um novo quadro de acesso xão, e eu não tenho nenhum tabu sobre essa matéria. aos recursos que está em cima da mesa. Um quadro que Vai iniciar-se, ao longo do ano 2000 — e a presidên-passa pela busca de novas parcerias, participação em soci- cia portuguesa dará um impulso decisivo —, o debate edades mistas e em estruturas empresariais diversificadas. sobre o futuro dos acordos internacionais de pesca. É um Entre nós, são poucos os grupos de pesca com dimensão tema que está na actualidade, porque, de alguma forma, empresarial e rejeita-se liminarmente, quer por razões os acordos internacionais de pesca são um dos quatro económicas, quer por razões culturais, toda a aproximação pilares fundamentais em que assenta a política comum de a países terceiros através de sociedades mistas. pesca. E o debate sobre esses acordos é útil, é necessário,

E porque uma parte muito significativa dos nossos ar- podemos dar o nosso contributo. Não me parece é muito madores é contra estas novas parcerias, há quem repita à acertado que defendamos, sem mais, a conclusão do saciedade o discurso contra as sociedades mistas e contra Relatório Fraga, no ponto 21, na parte que tem a ver com novas parcerias, quando noutros fora se reclama a coope- o facto de eu, cidadão português, ter contribuído para o ração para o desenvolvimento e o legítimo direito ao des- orçamento comunitário e para o orçamento nacional para envolvimento social e ao emprego das populações dos ter acesso a recursos que deviam ser garantidos por acor-países terceiros. Apropriadamente, terei de dizer: estão a do comunitário. remar contra a maré! E, mais, o caso de Marrocos até é um mau exemplo

Sobre as pescas em Marrocos importa repetir que que- para citar, porque, antes da integração de Portugal na Co-remos lá manter uma presença de pesca, mas temos de nos munidade Europeia, havia licenças privadas, que envol-adaptar aos novos condicionalismos do acesso aos recursos viam 15 embarcações, à margem do acordo de cooperação da pesca. bilateral. Com a integração de Portugal, com o acordo

Estamos a falar de pescas em águas de soberania mar- negociado pela União Europeia triplicámos os barcos li-roquina, nas quais operam cerca de 450 embarcações co- cenciados para Marrocos. Portanto, no caso, até é um mau munitárias. Imagine-se este debate na situação inversa! De exemplo para citar. Portugal, estão, neste momento, licenciadas 28 embarca- Para terminar, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, ções, envolvendo cerca de 720 postos de trabalho directos em devido tempo tomámos iniciativa, junto da Comissão, com um forte impacto económico e social em Sesimbra e sobre esta matéria. No dia 10 de Junho fomos nós que na Fuzeta. liderámos o processo no sentido de que o Conselho adop-

Por outro lado, e em devido tempo, o Governo fez sa- tasse uma resolução sobre Marrocos, solicitámos atempa-ber à Comissão Europeia do interesse em manter um acor- damente a adopção de medidas específicas de compensa-do de pescas com Marrocos. ção financeira para pescadores e armadores face a uma

Portanto, o Governo nunca esteve, nem está parado. E situação de impasse social, e fizémo-lo antes do pedido a propósito do que aqui tem circulado, neste debate, quero deste debate de urgência e mesmo antes da resolução do dizer o seguinte: naturalmente que se houvesse a possibili- Parlamento Europeu sobre o assunto. dade de se fazerem acordos bilaterais de pesca, nós já Mas há um quadro que também quero sublinhar: Rabat estaríamos a negociar esses acordos, mas quero deixar aqui é a capital mais próxima de Lisboa e o quadro da coopera-uma reflexão e sublinhar, desde já, uma contradição, em ção com Marrocos é crucial nas relações com o Norte de particular na intervenção do Sr. Deputado Honório Novo. África. E com este Governo, particularmente com a reali-É que, por um lado, diz-se que Portugal não está a tomar zação anual de cimeiras, ao nível de governos entre Portu-iniciativas bilaterais, não está a negociar bilateralmente, gal e Marrocos, com grande impulso do Eng.º António como o PCP reivindicou, mas, por outro lado, diz-se que é Guterres, mas também ao nível da Presidência da Repúbli-necessário mudar a política comum de pesca para que haja ca, têm-se intensificado e reforçado as relações bilaterais a possibilidade de negociações bilaterais. com Marrocos. Tal é importante para Portugal, porque se

O Sr. Deputado Honório Novo, tal como eu próprio, queremos pedir às autoridades marroquinas a sua com-votou o Relatório Fraga, já aqui citado, mas votámo-lo preensão para com a especificidade da nossa frota, também concordando com ele na generalidade, o que não implica temos, em paralelo, de ter compreensão para com a especi-que, na especialidade, concordemos com tudo. Quando ficidade e para a posição de Marrocos neste dossier. esse relatório foi votado no Parlamento Europeu — e, mais Para haver acordo, tem de haver aproximação de posi-uma vez, quero aqui sublinhar que é um relatório de inicia- ções. É isso que faremos junto da Comissão Europeia, tiva, não é um processo legislativo —, o Sr. Deputado como temos feito e vamos continuar a fazer, porque consi-Honório Novo propôs que nele fosse inscrita a possibilida- deramos fundamental manter relações comerciais de asso-de de acordos bilaterais de pesca com Estados-membros e ciação com Marrocos e manter uma actividade de pescas países terceiros. Mas essa possibilidade foi votada no rela- condigna com aquilo que é a presença secular de Portugal tório, desde que os Estados-membros paguem aquilo que nas águas marroquinas. representam esses acessos aos recursos. Isto é, de um lado estaríamos na União Europeia e estaríamos na política Aplausos do PS. comum de pescas a contribuir para o orçamento comunitá- rio, por outro lado, para ter acesso a recursos pesqueiros O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Agora é tarde!

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vamos em 28 embarcações, pelo que já superou largamente O Sr. Presidente: —Para pedir esclarecimentos ao Sr. o previsto na redução de licenças em Marrocos.

Secretário de Estado, inscreveram-se os Srs. Deputados Lamento que o senhor, de uma forma tão simplista e Honório Novo e Paulo Portas. tão linear, anuncie previamente uma redução já tão drástica

O Sr. Deputado Paulo Portas dispõe de 1 minuto que da frota, uma redução tão significativa dos trabalhadores lhe foi concedido pelo Grupo Parlamentar do PS. implicados e diga que ainda temos acordo.

O Governo já não tem tempo para responder, pelo que O que acontecerá se não tivermos acordo ou se, even-agradeço sejam muito sucintos que eu darei ao Governo o tualmente, o novo acordo for feito à base de sociedades tempo necessário para uma resposta breve. mistas? Será o deserto total nesta frota.

Tem a palavra o Sr. Deputado António Martinho. O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Muito bem! O Sr. António Martinho (PS): — Sr. Presidente, pre-

tendo só informar que, naturalmente, nós também conce- O Orador: —Mas, Sr. Secretário de Estado, não po-demos ao Governo o tempo que nos resta. demos falar meias verdades, temos de dizer a verdade

completa, e gostava de o corrigir: é que, como sabe, tão O Sr. Presidente: —Sr. Deputado, o tempo será trans- bem ou melhor do que eu, um novo acordo requer um

ferido. novo mandato, decidido pelo Conselho, à Comissão. E em Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo. 10 de Junho, ou em Março, como disse o seu mau defensor de bancada, não foi decidido nada sobre mandatos. O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, congra-

tulo-me com esta dádiva da bancada do Partido Socialista. O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Só em Outubro! Creio que é a única forma de poder ouvir algumas respos- tas, já que o Partido Socialista não as dá. O Orador: —Só em 25 de Outubro, num Conselho de

O Sr. Secretário de Estado também não deu resposta a pescas onde o senhor estava, foi decidido conferir um nenhuma das seis perguntas que enumerei ao longo da mandato, como é necessário e imprescindível, para que as minha intervenção. Se o Sr. Secretário de Estado quiser, negociações se iniciassem. terei todo o privilégio em voltar a colocar-lhas. Trata-se Podemos dizer que o Governo andou a fazer muito de um conjunto de perguntas sobre a forma, meios, ní- pouco e andou distraído! Há um ano que eu tinha dito que veis, e a quem atingem os pagamentos pelas paralisações, era necessário forçar o Conselho a atribuir de imediato um bem como sobre se o Governo está ou não disposto a mandato à Comissão para defender os interesses dos pes-aceitar um novo acordo baseado exclusivamente em cadores portugueses. sociedades mistas.

Vozes do PCP: —Muito bem! O Sr. António Martinho (PS): — Respondeu! O Orador: —Mas também gostava de o esclarecer O Orador: —Sr. Deputado, eu ainda ouço bem, o se- sobre as negociações bilaterais. Repare, Sr. Secretário de

nhor é que parece que só ouve parte daquilo que é dito. Estado, é preciso modificar aquilo que há quando é neces-Quais são as alternativas que o Governo prevê no caso sário e quando consideramos fundamental modificá-lo. Se

de haver um acordo baseado exclusivamente em socieda- a legislação comunitária é o que é, então mude-se! des mistas? Não me respondeu a nada disto. Suponho que o Sr. Secretário de Estado está tão atrapalhado com a ne- O Sr. Presidente: —Sr. Deputado, agradeço-lhe que gociação do acordo com Marrocos que nem sequer sabe o termine! que é que há-de responder.

O Orador: —Termino já, Sr. Presidente. O Sr. Lino de Carvalho (PCP): — Muito bem! O Governo teve 12 meses para tentar alterar isso; se não o alterou é porque não tem vontade política para o O Orador: —Mas, para além disso, o Sr. Secretário de fazer.

Estado refere que há, neste momento, 28 embarcações, Sr. Secretário de Estado, para terminar, devo dizer-lhe cerca de 700 trabalhadores dependentes do acordo de pes- que se o nosso representante em matéria de pescas, o meu cas com Marrocos. amigo José Apolinário, está no Conselho Europeu só para

Eu já tinha conhecimento disto, mas, de uma forma receber recados e não forçar alterações, mais valia que o propositada, não o disse na minha intervenção, porque Sr. Eng.º António Guterres nomeasse, sem desprimor para comprova que a evolução deste acordo já reduziu a frota e V. Ex.ª, um carteiro. Era mais fácil! já reduziu o número de trabalhadores muito para além do que o próprio acordo previa. Aplausos do PCP.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): — Exactamente! O Sr. José Barros Moura (PS): — Completamente ridículo! O Orador: —Conforme o Sr. Secretário de Estado

sabe, tão bem como eu, a base de partida era a de um li- O Sr. Presidente: —Sugeria ao Sr. Secretário de Esta-cenciamento de 51 embarcações e a base de chegada, ao do das Pescas que respondesse conjuntamente aos dois fim do ainda actual acordo, era de 43 embarcações. Ora, já

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pedidos de esclarecimento, dado o escasso tempo de que isso, a possibilidade de anunciar que dispõe de 2 minutos dispõe. para pedir esclarecimentos.

O Sr. Secretário de Estado das Pescas: —Sr. Presi- O Orador: — Muito obrigado, Sr. Presidente.

dente, como considero que foram aqui ditas palavras — O Sr. Secretário de Estado afirma que a hipótese de apesar da palavra «amigo» — que me parece não serem acordos bilaterais implica, para o Estado que os celebrar, a muito correctas, tais como «distraído», «atrapalhado», necessidade de os financiar. Não me oponho a esse racio-«falta de vontade política», «carteiro», quero aqui dizer o cínio, embora ele seja discutível como tese geral. Mas há seguinte: se até agora não tivéssemos desencadeado as uma pergunta que lhe quero fazer: o Sr. Secretário de Es-iniciativas que já desencadeámos, estaríamos numa posi- tado prefere pagar, para não pescar, ou pagar, para ter o ção de fragilidade. Mas não estamos. direito a pescar? Esta, sim, é uma pergunta fundamental à

sua consciência, não apenas de governante, mas também O Sr. António Martinho (PS): — Muito bem! de socialista... O Orador: — Tomámos as iniciativas apropriadas jun- O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): — Muito bem!

to da Comissão, não podemos fazer qualquer negociação bilateral; quem tem de apresentar o mandato é a Comissão, O Orador: —Ou, se quiser: prefere receber para não que vai a Conselho. E no mês de Setembro houve dificul- trabalhar, ou pagar para ajudar a que os nossos pescadores dades para aprovar esse mandato, porque Estados- e armadores continuem a ter trabalho? Esse tipo de finan-membros tentaram impedir que houvesse um mandato de ciamentos, significativos da solidariedade interna, existe a negociações. variadíssimos títulos no Orçamento do Estado, e nunca vi

Portanto, a meu ver, o Sr. Deputado fez uma análise negá-lo como princípio! incorrecta da situação. Por último, Sr. Secretário de Estado, uma pergunta

De resto, sobre os apoios e as questões que colocou, muito concreta, e compreenda que em nome de toda a quero dizer-lhe o que, já em Dezembro, pescadores e ar- Câmara a formule: quanto, precisamente quanto — em madores envolvidos nesta operação, isto é, abrangidos pela tostões, em euros, em pesetas, como entender! —, rigoro-actividade de pesca em Marrocos, receberão as respectivas samente quanto, vão receber os nossos pescadores e os ajudas, seja através de medidas comunitárias, seja através nossos armadores por mês? de medidas nacionais

Aplausos do CDS-PP. O Sr. José Barros Moura (PS): — Muito bem! O Sr. Presidente: —Para responder, tem a palavra o Vozes do PSD: —Quanto? Sr. Secretário de Estado das Pescas. Entretanto, foi-lhe cedido mais algum tempo. O Orador: —E se for através de medidas nacionais,

naturalmente teremos em conta o que foi pago em 1995 e O Sr. Secretário de Estado das Pescas: —De quanto acrescentaremos a esse montante alguma taxa de inflação, tempo disponho agora, Sr. Presidente? como parece justo.

O Sr. Presidente: —Dispõe de pouco mais de 3 minu-Vozes do PSD: —Quanto? tos para responder, Sr. Secretário de Estado. O Sr. António Martinho (PS): — Ouçam! O Sr. Secretário de Estado das Pescas: —Sr. Presi- dente, Sr. Deputado Paulo Portas, se houver uma medida O Orador: —Esta é a resposta que quero dar à inter- comunitária, a nossa posição é de que a contribuição para

venção que fez, Sr. Deputado Honório Novo. pescadores e armadores tem de ser igual, sejam eles portu- gueses ou espanhóis. Aplausos do PS. O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Ah! O Sr. Presidente: —Sr. Deputado Paulo Portas... O Orador: —Como ainda não abandonámos essa O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. bandeira e esperamos a resposta da Comissão aos contac-

Secretário de Estado das Pescas, agradeço, em primeiro tos que estabelecemos, não estou em condições de respon-lugar, ao Partido Socialista o facto de me ter cedido 1 der à questão que colocou. minuto, minuto que tenciono usar para formular uma per- Se não houver, em tempo útil, resposta a esta medida gunta do ponto de vista conceptual e uma outra, muito específica, por parte da Comissão Europeia, assumiremos, prática. no plano nacional, iniciativas, seja utilizando fundos naci-

Primeiro, a pergunta conceptual. onais, seja utilizando fundos comunitários, eventualmente não utilizados no âmbito do período financeiro 1994/1999. O Sr. Presidente: —Tencionava conceder-lhe mais 1 Mas não deixaremos de pagar contrapartidas financeiras

minuto, mas o Sr. Deputado antecipou-se. Não tive, por durante o mês de Dezembro.

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Quanto à questão de princípio, prefiro pescar sem pa- Saúdo todos os Srs. Deputados nesta minha primeira inter-gar... venção, que será muito sucinta, na nova Legislatura.

Venho aqui apresentar, para ratificação da Assembleia O Sr. Lino de Carvalho (PCP): — Oh! da República, a Convenção de Conciliação e Arbitragem no Quadro da OSCE — Organização para a Segurança e O Orador: —Refiro-me à questão de princípio enun- Cooperação na Europa.

ciada pelo Sr. Deputado Paulo Portas, porque, no meu Como VV. Ex.as sabem, Portugal é um Estado membro entendimento, a política comum de pescas tem quatro e de pleno direito da OSCE, tendo aderido à então CSCE pilares essenciais:... em Agosto de 1975, Organização que, em 1994, daria

lugar à OSCE. O Sr. Lino de Carvalho (PCP): — «Sol na eira e chu- Pela presente Convenção, estabelece-se um Tribunal de

va no nabal!» Conciliação e Arbitragem como instância jurisdicional de recurso possível dos Estados membros da OSCE para a O Orador: — ... uma política de estruturas, uma políti- resolução pacífica de diferendos no âmbito desta organiza-

ca de mercados, uma política de recursos e uma política ção internacional. Uma temática que considero de dramáti-externa. ca oportunidade face à turbulência que se verifica, desig-

O que está a ser feito, por alguns Estados-membros, é a nadamente, na região do Cáucaso, como é do conhecimen-contestação deste pilar da política externa, sublinhando os to de todos os Srs. Deputados. custos/benefícios desta política externa. Esta Convenção estabelece, assim, que a conciliação

No meu entendimento, não é correcto pôr em causa a seja assegurada por uma comissão específica de concilia-natureza e a razão de ser dos acordos internacionais de ção, constituída, para cada diferendo, e que a arbitragem pesca. Naturalmente, teremos de reflectir como intervir seja assegurada por uma tribunal arbitral, igualmente cons-nesta matéria. Não considero tabu a relação bilateral mas, tituído para cada diferendo. neste momento, tal não é possível, do ponto de vista jurídi- Diria que esta Convenção se compagina com o Pro-co, do Direito Comunitário, e não é possível desde 1976: já grama do Governo, no qual se estabelece, naturalmente, a fazia parte do acervo comunitário quando entrámos na prossecução de uma política externa eficaz, tendo em conta União Europeia, também está expresso nos tratados e, por a maximização da actividade multilateral, e a qualidade de essa razão, temos de trabalhar no quadro daquele que é o membro da União Europeia impõe responsabilidades papel da Comissão Europeia. acrescidas na intervenção multilateral, designadamente na

Organização para a Segurança e Cooperação na Europa, de Aplausos do PS. que a Cimeira de Lisboa da OSCE, em 1996, e a actual candidatura de Portugal à presidência em exercício, de O Sr. Honório Novo (PCP): — Ó Apolinário, e o que é 2002, constituem expressão elucidativa.

que fez para alterar isso? A ratificação da presente Convenção insere-se, pois, indirectamente, também, nas políticas comunitárias rela-O Sr. Presidente: —Srs. Deputados, terminámos o cionadas com esta matéria.

período de antes da ordem do dia. O Sr. Presidente (João Amaral): — Para uma inter-Eram 18 horas e 20 minutos. venção, tem a palavra o Sr. Deputado Henrique de Freitas.

O Sr. Henrique de Freitas (PSD): — Sr. Presidente, ORDEM DO DIA permita-me que saúde V. Ex.ª e que lhe transmita da minha

honra em usar da palavra pela primeira vez, neste Hemici-O Sr. Presidente: —Srs. Deputados, vamos iniciar o clo, sob a sua presidência.

período da ordem do dia coma apreciação da proposta de resolução n.º 116/VII — Aprova, para ratificação, a Con- O Sr. Presidente (João Amaral): — Muito obrigado, venção de Conciliação e Arbitragem no quadro da OSCE, Sr. Deputado. concluída em Estocolmo a 15 de Dezembro de 1992, no Terceiro Conselho Ministerial da OSCE.

Entretanto, peço ao Sr. Deputado João Amaral o favor O Orador: —Também saúdo, na pessoa de V. Ex.ª,

de me substituir na direcção dos trabalhos. todas as Sr.as Deputadas e todos os Srs. Deputados da VIII

Legislatura.

Neste momento, assumiu a presidência o Sr. Vice- Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Convenção de Conci-

Presidente João Amaral. liação e Arbitragem no quadro da CSCE, assinada em

Dezembro de 1992, e presente hoje a esta Câmara, consti-tui uma importante etapa no processo de desenvolvimento O Sr. Presidente: —Para uma intervenção, tem a pa- das capacidades operacionais desta Organização em maté-

lavra o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portu- ria de resolução pacífica de diferendos, reflectindo o ambi-guesas. ente estratégico da década de 90.

Década que viu ruir a velha Europa, dividida artifi-O Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portu- cialmente, e viu nascer uma nova Europa que se pretendia

guesas (José Lello): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: «inteira e livre», de Vancouver e Vladivostok, e procla-

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masse a sua adesão aos valores do Estado de direito e a convenção, bem como um conjunto de propostas britânicas uma mesma concepção dos Direitos do Homem. e norte-americanas relativas a processos de conciliação.

Foi assim, que os Estados signatários da Acta Final de Este debate motivou a convocação de uma nova reu-Helsínquia se viram confrontados com a alternativa de nião especificamente encarregada de negociar «um conjun-refundar o processo CSCE, dotando-o de novas missões e to global e coerente de meios de resolução pacífica de estruturas, e escrever a História do presente, ou encerrar o diferendos, nomeadamente a criação de um Tribunal de e reduzir a Acta Final a um documento de arquivo destina- Conciliação e Arbitragem». do à História do passado. É assim, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, que o

Num ano marcado pela libertação de Nelson Mandela, Conselho Ministerial, reunido em Estocolmo em 1992, pela eleição de Boris Yeltsin, pela invasão iraniana do adopta a Convenção de Conciliação e Arbitragem, hoje em Koweit, pela unificação alemã, pela atribuição do Nobel da discussão e que teve por base um projecto francês de Ro-Paz a Gorbachev, a resposta foi a assinatura a 21 de bert Badinter. Novembro da «Carta de Paris para uma Nova Europa», «O Projecto Badinter» — como assim ficou conhecido verdadeira certidão de óbito da Guerra Fria e acto refunda- —, concebido a partir da ideia de uma grande Europa dor de uma CSCE que se institucionalizará em Janeiro de baseada nos valores da Acta Final de Helsínquia e da Carta 1995 como a Organização de Segurança e Cooperação na de Paris, exigia a instituição, no seio da CSCE, de uma Europa (OSCE). jurisdição permanente encarregada de prevenir e resolver

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Se é certo que conflitos interestaduais pela conciliação e arbitragem. podemos reconhecer no processo de Helsínquia o estabele- Tal jurisdição teria o mérito, ainda nas palavra de Ba-cimento de medidas de confiança que ajudaram a normali- dinter, de consagrar o primado do direito internacional na zar, institucionalizar e pacificar as relações Este-Oeste, e grande Europa, reforçar o prestígio da CSCE e evitar no até encará-lo como consciência moral da Europa pela feliz continente europeu uma tragédia semelhante à existente na enumeração do seu Decálogo, a verdade é que a CSCE, no ex-Jugoslávia. que à resolução pacífica de diferenças diz respeito, não Ss. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Das disposições estava dotada de capacidade operacional. A CSCE jamais constantes da Convenção em apreço, bem como do proto-geriu crises ou conflitos. colo financeiro que lhe está associado, permitam que sali-

E só agora, no quadro da desglobalização estratégica entemos três aspectos. do pós-Guerra Fria e no quadro da conflitualidade, cada Primeiro, a afirmação do carácter subsidiário da Con-vez menos internacional e cada vez mais etnicizada — venção face a outros meios de negociação, já que não se como demonstra Hassner —, é que a CSCE deu os primei- tenciona afectar a competência, nem do Tribunal Interna-ros passos na operacionalidade da resolução pacífica dos cional de Justiça, nem do Tribunal Europeu dos Direitos diferendos. do Homem, nem do Tribunal de Justiça das Comunidades

Pudéssemos nós saudar, neste Parlamento e no decorrer Europeias, nem do Tribunal Permanente de Arbitragem. desta legislatura, o sucesso da candidatura portuguesa à Em segundo lugar, o carácter não vinculativo do resul-presidência da OSCE em 2002, que contribuiria, estamos tado do processo de conciliação. certos, para novos e decisivos passos nessa operacionali- Por último, o Tribunal de Conciliação e Arbitragem dade. não deve ser considerado um órgão da OSCE, mas, sim,

Empurrada pela realidade internacional de «paz possí- um tribunal constituído no seio da OSCE. vel, guerra provável» que o drama jugoslavo e os conflitos Ss. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para o PSD, o na região da ex-União Soviética, a CSCE avançou logo em voto favorável à ratificação a conceder pelo Parlamento 1991 com a criação de um Centro de Prevenção de Confli- português a esta Convenção, que entrou em vigor a 5 de tos, mandatado pela Carta de Paris para analisar «uma Dezembro de 1994, ilustra o adágio segundo o qual, mes-gama de métodos aplicáveis à resolução pacífica dos dife- mo a mais longa das viagens, começa com um pequeno rendos, nomeadamente a intervenção obrigatória de um passo. terceiro Estado».

Em 1991 é, também, aprovado um documento, agora Aplausos do PSD. em La Valletta, intitulado «Disposições relativas a um processo CSCE para a resolução pacífica dos diferendos», O Sr. Presidente (João Amaral): — Para uma inter-que vem permitir aos Estados do processo CSCE a possibi- venção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mafalda Troncho. lidade de submeterem um diferendo bilateral a um orga- nismo da própria CSCE. A Sr.ª Mafalda Troncho (PS): — Sr. Presidente, nesta

Mas, se considerarmos que este organismo não tinha minha primeira intervenção na nova legislatura, queria carácter permanente, que as suas decisões não eram vincu- cumprimentá-lo, a si, e todas as Sr.as e Srs. Deputados que lativas, que o processo de resolução pacífica de diferendos foram eleitos, fazendo votos de um bom trabalho. não se aplicava aos conflitos resultantes de questões relati- vas a fronteiras e à integridade territorial dos Estados, O Sr. Presidente (João Amaral): — Muito obrigado, concluímos pelo reduzido alcance destas propostas. Sr.ª Deputada.

Será em Helsínquia, em 1992, que se procederá a um vasto debate sobre as capacidades operacionais da CSCE A Oradora: —Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, para a gestão de crises e conflitos. E será também em Hel- Srs. Membros do Governo: O actual Governo volta a apre-sínquia que se debaterá um projecto franco-alemão de sentar à Assembleia da República a proposta de resolução

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n.º 116/VII, que aprova, para ratificação, a Convenção de váveis de seis meses». Chamo-lhe a atenção para isto, Conciliação e Arbitragem, no Quadro da OSCE, concluída porque o texto terá de ser publicado com essas correcções. em Estocolmo, a 15 de Dezembro de 1992, no Terceiro Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Conselho Ministerial da OSCE. Bernardino Soares.

O Acto Final de Helsínquia, da Conferência de Segu- rança e Cooperação na Europa (CSCE), assinado em 1 de O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, Agosto de 1975, marcou o começo oficial de um processo Srs. Deputados: A proposta de resolução que hoje anali-diplomático flexível que criou, na Europa, uma estrutura samos propõe a ratificação da Convenção de Conciliação e de diálogo entre os dois blocos. Arbitragem no Quadro da OSCE. Criam-se, através desta

A CSCE, um pouco na tradição das grandes conferên- Convenção, mecanismos para prevenir, impedir e resolver cias internacionais do século XIX, foi desenvolvendo a sua conflitos com o respeito das soberanias, com o respeito do acção ao longo dos anos, tendo atingido pontos altos na direito de cada Estado se vincular ou não à jurisdição de Conferência de Belgrado (1977), na Conferência de Ma- cada comissão de conciliação ou de cada tribunal arbitral e drid (1980-83), na Conferência de Viena (1986-89), na com o respeito do princípio da reciprocidade no acatar das Cimeira de Paris (1990) e na Cimeira de Budapeste (1994), decisões de cada um destes órgãos. que contribuíram para o reforço do clima de segurança e A OSCE é, aliás, o espaço para a implantação efectiva cooperação a que deram origem.. de um sistema de segurança e cooperação na Europa que é,

Na Cimeira de Paris, mercê da evolução política regis- constantemente, «torpedeado» pela submissão aos ditames tada no Bloco de Leste, deu-se início à institucionalização expansionistas da política da NATO. A opção, aqui, é da CSCE, com a criação de um Conselho, um Comité de entre a criação de um clima de confiança, de desmilitariza-Altos Funcionários, um Centro de Prevenção de Conflitos ção, de equilíbrio de forças e de estabilidade na Europa em Viena, um Gabinete de Eleições Livres em Varsóvia e com vista à manutenção da paz e da segurança e a política um Secretariado em Praga. Este movimento de institucio- da imposição unilateral da ingerência, da manutenção do nalização foi aperfeiçoado na Cimeira de Budapeste, onde bloco político-militar NATO, do aumento das suas mis-o nome de CSCE foi mudado para Organização de Segu- sões, da área de influência e do novo modelo de forças. rança e Cooperação na Europa, ficando assim a traduzir Nesta opção, o que faz o nosso Governo? O nosso Go-mais fielmente a nova realidade. verno, este mesmo que no traz esta proposta, é o que se

A Convenção de Conciliação e Arbitragem no Quadro submete aos ditames da NATO e dos Estados Unidos e o da OSCE, que vamos analisar, é o resultado de um longo e mesmo que aqui defende o novo conceito estratégico desta diversificado trabalho, na área da resolução pacífica de organização. conflitos, iniciado ainda nas reuniões preparatórias da Conferência de Helsínquia de 1975. Esta Convenção esta- Vozes do PCP: — Muito bem! belece um tribunal de conciliação e arbitragem como ins- tância jurisdicional de recurso possível dos estados partici- O Orador: —Provavelmente, Sr. Presidente, Srs. De-pantes na OSCE para a resolução de um diferendo. A Con- putados, este Governo sofre de um fenómeno de dupla venção responde ao sentimento de necessidade de um personalidade. É uma espécie de «Dr. Jeckyll and Mr. sistema de resolução pacífica de diferendos no âmbito da Hyde», mas a opção é, infelizmente, cada vez mais pelo OSCE. O objectivo é a resolução de conflitos que não «Mr. Hyde». tenham sido resolvidos num razoável período temporal através de negociação que sejam apresentados pelos Esta- Aplausos do PCP. dos parte na Convenção e ou pelos Estados participantes na OSCE através da conciliação e, quando adequado, da O Sr. Presidente (João Amaral): — Para uma inter-arbitragem de acordo com as disposições da Convenção. venção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

Atentas todas as considerações já proferidas, somos de parecer que a proposta de resolução n.º 116/VII reúne O Sr. Francisco Louçã (BE): — Muito obrigado Sr. todas as condições para ser aprovada, sem prejuízo de se Presidente. ter em conta uma maior segurança jurídica dada pela com- Uma intervenção breve para registar que, tendo ouvido paração entre o texto em inglês e a versão portuguesa. com atenção as intervenções de outras bancadas e a inter-

venção do Sr. Secretário de Estado das Comunidades Por-Aplausos do PS. tuguesas, ficaram-me, no entanto, algumas dúvidas funda- mentais sobre, não tanto o texto — foi, aliás, acrescentado O Sr. Presidente (João Amaral): — Srs. Deputados, a que alguma insegurança sobre isso seria justificável, dados

Sr.ª Deputada Mafalda Troncho foi a relatora desta propos- os erros de tradução —, mas mais sobre o seu impacto ta de resolução na legislatura passada. factual, sobre a sua capacidade de cumprir esta virtude de

Chamo a atenção do Sr. Secretário de Estado das Co- arbitragem nos conflitos entre os Estados. munidades Portuguesas, José Lello, para o texto do relató- Aparentemente, esta matéria padece de duas fragilida-rio, onde foi detectado um conjunto de deficiências de des. Uma, é que este esforço arbitral está subordinado a tradução e algumas incongruências, chamemos-lhe assim, uma ordem jurídica espartilhada. Afirma-se no texto que no títulos. Creio que há, pelo menos uma, que é de impor- há um carácter subsidiário desta convenção relativamente a tância material, porque é uma deficiência de tradução: outros pilares da ordem jurídica que se pretende constituir onde se diz «renováveis de seis anos» deve dizer-se «reno- a nível internacional. Mas será óbvio reconhecer, e prova-

velmente todos poderemos partilhar desse reconhecimento,

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que não existe hoje uma estruturação, uma priorização e Espanha tendo em vista a repressão do tráfico ilícito de uma capacidade de intervenção de um qualquer organismo droga no mar. coordenador da ordem internacional em termos da sua O Grupo Parlamentar do CDS-Partido Popular não jurisprudência, em termos da sua actuação como tribunal pode deixar de manifestar a sua aprovação face a tal de recurso, como tribunal de última instância nas questões iniciativa. fundamentais dos conflitos entre as nações e dos conflitos Com efeito, merece o nosso apoio toda e qualquer me-entre os Estados. Essa fragilidade tem, portanto, a ver com dida que vise aumentar a eficácia no combate à criminali-a debilidade de uma ordem internacional mantida a partir dade, designadamente à prevenção e à repressão do tráfico de alguns escombros da «Guerra Fria» e a partir de cons- de droga. truções recentes do poder tal como foram marcados no Sr. Presidente, Srs. Deputados: Todos temos particular contexto destes anos 90 pelos avanços feitos pelos países consciência de que o tráfico se opera cada vez mais no mar mais poderosos. e que, sem uma cooperação estreita entre os Estados pode-

Por outro lado, a segunda fragilidade de que padece remos, eventualmente, ganhar batalhas pontuais, mas a este texto é o seu carácter negocial e não vinculativo que, guerra estará perdida. face à dimensão dos problemas que sentiram em termos de Dizê-mo-lo com a legitimidade de quem nunca foi de-segurança ao nível europeu, dá poucas promessas e nos fensor de soluções liberalizantes ou aceitou que esta guerra concede poucas garantias sobre a capacidade de actuação possa, alguma vez, ser perdida ou que se possa, sequer, num contexto em que de conflito se trate. baixar os braços.

Por estas duas razões, utilizarei daquele privilégio do Por outro lado, o Tratado ora sujeito a aprovação inse-direito de opinião que é entender que, nas matérias de re-se no âmbito das relações entre Portugal e a Espanha, segurança, nas matéria de direitos e nas matérias de ordem cuja cooperação, em matéria de política criminal e de segu-internacional, «o óptimo é inimigo do bom». rança, só pode merecer, obviamente, a nossa aprovação.

Não é possível, hoje, perante a globalização, também, O Sr. Presidente (João Amaral): — Não havendo mais da actividade criminal, dirigida por grandes multinacionais

intervenções sobre esta proposta de resolução, está encer- do crime, desenvolver qualquer combate eficaz sem uma rado o debate. A sua votação terá lugar amanhã, no perío- cooperação cada vez mais estreita entre Estados e, em do regimental de votações. particular, entre Estados vizinhos.

Vamos agora apreciar a proposta de resolução n.º Fazem, por isso, todo o sentido o direito de representa-117/VII — Aprova o Tratado entre a República Portugue- ção e a legitimidade de intervenção dos artigos 4.º a 7.º do sa e o Reino de Espanha para a Repressão e Tráfico Ilícito presente Tratado. de Droga no Mar, assinado em Lisboa a 2 de Março de Preocupam-nos unicamente, no seu conteúdo, alguns 1998. aspectos relacionados com a renúncia de jurisdição e o

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de exercício do direito de exigir a libertação, sem outros con-Estado das Comunidades Portuguesas. dicionantes.

Preocupa-nos, também, aproveitando esta discussão, O Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portu- sobretudo que, para além do âmbito do Tratado, seja asse-

guesas: —Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito sucinta- gurada a capacidade das autoridades portuguesas no cum-mente, referiria que, através da celebração deste Tratado primento dos seus nobres objectivos. Sabemos que os que agora é posto à apreciação de VV. Ex.as, se procura meios disponíveis, designadamente as célebres lanchas uma cooperação mais ampla entre os dois Estados, tendo rápidas, são escassos e que estamos longe de ter a capaci-em conta o fenómeno do tráfico ilícito de estupefacientes e dade suficiente de resposta… substâncias psicotrópicas em conformidade com o Direito Internacional do Mar. O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): — É verdade!

Este Tratado destina-se, assim, fundamentalmente, a dotar as autoridades de Portugal e de Espanha dos meios O Orador: —… a uma criminalidade cada vez mais adequados à cooperação, tendo em conta a necessidade marítima, dado que o próprio controle existente nos aero-de se reprimir este tráfico ilícito, designadamente no mar, portos a isso o obriga. O que é, naturalmente, agravado no que respeita ao princípio da liberdade de navegação, pela inexistência de controlo de fronteiras terrestres e pelas envolvendo a estreita cooperação das autoridades dos deficiências que, sistematicamente, temos vindo a apontar dois Estados, procurando desenvolver-se toda esta acção ao sistema de Schengen. Tudo isto aumenta, do nosso conjunta de cooperação num quadro gerador de confian- ponto de vista, a fluidez da circulação de produtos ilícitos ça que é fundamental no relacionamento entre Portugal e por via terrestre, exigindo, portanto, um maior controlo Espanha. naval e costeiro.

Trata-se, Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário O Sr. Presidente (João Amaral): — Para uma inter- de Estado, da célebre corrida entre a lebre e a tartaruga,

venção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia. sendo que a lebre (os traficantes), ao contrario da lebre da fábula, não pararam para descansar e que, bem pelo con-O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. trário, dispõem, à custa de um negócio criminoso e alta-

Secretário de Estado, Srs. Deputados: Apresenta o Gover- mente lucrativo, dos mais modernos meios e do mais sofis-no à Assembleia o Tratado entre Portugal e o Reino de ticado equipamento.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para nós, o combate à mente entre as marinhas portuguesa e espanhola, que nos droga deve ser a prioridade das prioridades da política parece de muita importância e de vital necessidade no que criminal, e esta passa, forçosamente, pelo reforço de meios diz respeito a este combate. Todos sabemos que muitas e, designadamente, dos importantes meios navais e aéreos. apreensões importantes de droga só são efectivamente

O presente Tratado, inserido no âmbito da cooperação possíveis quando são feitas em alto mar, pois todos sabe-entre Estados e do desenvolvimento de uma política global mos que este combate é bastante mais difícil e de sucesso de reforço de cooperação entre entidades policiais e de bastante mais duvidoso quando estas mercadorias chegam política criminal, merece o nosso apoio, exigindo, no en- a terra. tanto, um esforço suplementar da parte portuguesa para Portanto, se, neste momento, nos congratulamos com que as nossas responsabilidades sejam plenamente cum- este Tratado e com a necessidade absoluta de agilizar pro-pridas e que nesta guerra — que é a do combate ao tráfico cessos que ele revela, não nos assusta absolutamente nada — não se vacile um segundo, pois, repetimos, ela não pode que Portugal assuma algumas responsabilidades nesta ser perdida. matéria, conjuntamente com Espanha, que possam levar a

resultados que não temos tido até hoje. Vozes do CDS-PP: —Muito bem! Há ainda que realçar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que toda esta estratégia bilateral entre Portugal e Espanha O Sr. Presidente (João Amaral): — Para uma inter- se articula, de alguma forma, com o reforço que, nos últi-

venção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Baltazar Men- mos anos, ao nível da União Europeia, nomeadamente com des. a consolidação do terceiro pilar, tem vindo a ser concreti-

zado e defendido e estamos em crer que terá agora uma O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): — Sr. Presidente, nova oportunidade de se reforçar e de se concretizar.

Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O pre- Por tudo isto, embora entendendo algumas críticas que sente Tratado, que está neste momento à nossa apreciação, possam ser feitas (e é velha aquela crítica das fronteiras celebrado entre Portugal e a Espanha, para a repressão do terrestres de Portugal, como se o resultado do combate à tráfico ilícito de droga no mar, é, em nosso entender, um droga em Portugal fosse diferente daquele que, neste mo-instrumento muito importante e mesmo, porque não dizê- mento, estamos a conseguir no âmbito da União Europeia lo, de estratégica importância no combate à droga e ao e, mais concretamente, no âmbito do espaço Schengen), tráfico de droga. gostaria de desafiar aqueles que defendem esse controlo

Importa ter em atenção que, hoje, ao nível do tráfico de das fronteiras terrestres. droga, nos debatemos com associações criminosas, como Não sei que controlo diferenciado é esse, pois, ouvindo já aqui foi referido, com poderosos meios financeiros e o Sr. Deputado do Partido Popular, como acabei de ouvir com grande capacidade de organização, conhecida, aliás, há pouco, percebi que aquilo que o Partido Popular defen-das próprias autoridades policiais, quer nacionais quer de, neste momento, é que Portugal deve sair do espaço internacionais. Schengen, deve fechar as suas fronteiras terrestres, deve

Por outro lado, tudo o que se relaciona com droga, tudo ter fronteiras fechadas fora da própria União Europeia, o que tem a ver com o tráfico de droga e onde, obviamen- para, com isso, conseguir outros resultados. Fiquei sem te, imperam avultadas importâncias em dinheiro, não tem perceber, porque aquilo que compreendi das palavras do pátria. Sr. Deputado foi que este deficiente controlo das fronteiras

Por outro lado ainda, todos sabemos que o branquea- terrestres decorre do facto de Portugal, no âmbito da União mento de capitais que lhe está associado é outro instrumen- Europeia, ter as suas fronteiras abertas da forma que tem, to absolutamente vital para este tráfico, cujo combate urge ainda que tal seja decorrente e no âmbito do espaço implementar. Schengen.

Sr. Presidente e Srs. Deputados, todos temos também Portanto, não nos parece que seja essa a solução. O que consciência de que a réplica eficaz a este combate não nos parece é que, quer no âmbito da União Europeia, quer pode ser exercida exclusivamente à escala nacional. Na no âmbito de tratados bilaterais como este que Portugal passada legislatura, tivemos aqui muitos debates relativos teve oportunidade de celebrar e outorgar com Espanha, se a esta matéria e, por muitas críticas que sejam feitas, não poderá conseguir um combate mais eficaz a algo que, há dúvida de que hoje é absolutamente decisivo e determi- evidentemente, é uma praga. É importante que admitamos nante para este combate que haja alguma estratégia a nível que este é um meio importante ao serviço da repressão do da União Europeia. tráfico de droga, mas, quando abordamos esta questão e

Por outro lado, não podemos ignorar que Portugal e tudo aquilo que tem a ver com a droga, temos de ter em Espanha têm grandes fronteiras marítimas comuns. Não atenção que existem outros mecanismos e, sobretudo, que sendo sequer preciso conhecer determinado tipo de estatís- há um combate ao nível da prevenção que não pode ser ticas e mesmo alguns procedimentos que têm sido utiliza- descurado; bem pelo contrário, tem de continuar a ser dos ultimamente, há que dizer que a defesa da fronteira implementado e assumido por todos os responsáveis naci-sul, relativamente a Marrocos (de que ainda há pouco aqui onais de todas as instituições, independentemente do nível falámos a propósito das pescas), é muito sensível. Esta em que se encontrem. defesa da fronteira sul, nomeadamente através da coopera- Sr. Presidente, termino exprimindo a posição da banca-ção com outros países do mediterrâneo, é, para nós, abso- da do Partido Socialista, que vai no sentido da aprovação lutamente importante. deste Tratado e de aceitação da proposta de resolução que

Além disso, é evidente que este Tratado vem possibili- lhe está subjacente. tar uma cooperação entre Portugal e Espanha, nomeada-

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Vozes do PS: —Muito bem! Há pouco, o Sr. Deputado, e meu amigo, Telmo Cor- reia referia a escassez de lanchas rápidas e eu permitir-me-O Sr. Presidente (João Amaral): — Para uma inter- ia fazer uma precisão: é que elas não são escassas! Não

venção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe. são, nem deixam de ser! O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): — Não há! Nem a

Membros do Governo, Srs. Deputados: Este acordo bilate- remos! ral celebrado com Espanha, embora correspondendo a um apelo que foi feito na última Assembleia Geral das Nações O Orador: —Nos programas dos vários governos e Unidas, especialmente dedicada ao problema da droga, no em sucessivos Orçamentos do Estado as lanchas têm sido sentido de que os vários Estados celebrassem acordos mencionadas. Não queria exagerar, mas creio que, na últi-bilaterais destinados a combater o grande tráfico de droga, ma década, poucos terão sido os Orçamentos do Estado, se particularmente em alto mar, visa corresponder a uma é que houve algum, que não tivesse inscrita uma verba forma de cooperação bilateral possível entre dois Estados para as tais lanchas rápidas! vizinhos. É uma forma particular de cooperação no comba- te ao tráfico de droga. O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): — Exactamente!

Este Tratado não tem o alcance que se poderia pensar face a algumas intervenções que aqui foram feitas — vári- O Orador: —Numa interpelação ao Governo que fi-os Srs. Deputados falaram dela quase como se estivessem zemos mais ou menos a meio da legislatura anterior, tive a falar da própria Convenção das Nações Unidas em maté- oportunidade de dizer que as lanchas rápidas demoram ria de droga —, na medida em que tem um aspecto particu- mais a chegar ao Tejo do que demorou Vasco da Gama a larizado. Portanto, não tem uma importância tão global chegar à Índia em 1498! como lhe foi atribuída. De facto, tivemos oportunidade de reparar que, no Pro-

De qualquer forma, é um aspecto importante. Tem a grama do Governo, vêm, mais uma vez, referidas as lan-ver com o combate ao tráfico de droga que se processa no chas rápidas, agora prometidas para a próxima legislatura. alto mar, sendo que, através deste acordo bilateral, Portu- Vamos ver se quem cá estiver, na IX Legislatura, não gal e Espanha acordam reciprocamente que, fora das águas estará ainda a exigir, pelo menos — que diabo! —, alguma territoriais de cada um — como é evidente, cada um dos lancha rápida, dado que continuamos a não ter nenhuma! Estados mantém integralmente a jurisdição sobre as res- Isto para não falar no célebre sistema LAOS, pois, re-pectivas águas territoriais —, cada um dos Estados pode conhecidamente, são mais os espaços da costa que não pedir ao outro autorização para intervir relativamente a um estão vigiados do que aqueles cujos sistemas de vigia estão navio que navegue sob o respectivo pavilhão, mantendo o a funcionar. Estado do pavilhão do navio uma jurisdição preferencial Há, de facto, um problema de combate ao tráfico de em relação aos eventuais traficantes. Portanto, é disto que droga que utiliza as costas portuguesas que está por resol-se trata e, nesse sentido, tem alguma importância. ver e para o qual é necessário que sejam postos a funcionar

De facto, tem havido apelos das Nações Unidas, já des- os meios que estão, desde há muito, prometidos para que de a Convenção de 1988, na qual este tipo de cooperação, haja uma vigilância mínima das costas portuguesas. Há relativamente ao alto mar, vem previsto no respectivo também toda uma colaboração com autoridades de outros artigo 17.º e, como disse há pouco, isso foi reafirmado na Estados que deve ser mantida e intensificada para que esse Assembleia Geral das Nações Unidas realizada em 1998, tráfico de droga seja impedido. É que isso é muito impor-ou seja, no ano passado, tendo sido feito um apelo para tante! que sejam adoptadas entre os vários Estados formas de Mais do que uma política assente na repressão dos con-cooperação bilateral, designadamente em matéria de com- sumidores, que, quanto a nós, devem ser tratados como bate ao tráfico de droga no alto mar. doentes e não como criminosos, o importante é que os

Daí que seja importante que possam ser celebrados esforços da repressão se concentrem na alta criminalidade acordos destes entre Portugal e Espanha, porque, segura- associada à droga. Daí que também o combate ao tráfico mente, poderão vir a contribuir para combater o grande de droga no alto mar, que constitui o objecto deste Trata-tráfico de droga, sabido como é que Portugal e Espanha se do, tenha a sua importância como aspecto complementar situam geograficamente num espaço bastante vulnerável e de um esforço muito mais profundo que é necessário des-que correspondem a uma das portas de entrada de droga no envolver. continente europeu. Isso é conhecido, pelo que é importan- te que se estabeleça uma cooperação bilateral entre ambos Aplausos do PCP. os Estados. Simplesmente, não é, sobretudo, através deste Tratado que esse problema se resolve! O Sr. Presidente (João Amaral): — Para uma inter-

Como tal, o problema da vulnerabilidade das fronteiras venção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã. marítimas, quer de Portugal, quer de Espanha — e falo de Portugal porque é a que nos diz directamente respeito —, O Sr. Francisco Louçã (BE): — Muito obrigado, Sr. não é por via deste Tratado que se poderá vir a resolver, Presidente. mas através da resolução dos muitos problemas que ainda Uma breve intervenção para registar, em primeiro lu-afectam a capacidade de Portugal defender as suas costas gar, que o Bloco de Esquerda votará a favor da ratificação do grande tráfico de droga. deste Tratado, em segundo lugar, para dizer que, por breve

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que seja o tempo que lhe dedicamos, esta discussão suscita Este acordo surge na sequência de um outro existente uma referência a uma outra, que é necessária e que será, entre Portugal e Espanha, datado, se não estou em erro, de naturalmente, agendada no decurso desta Legislatura, que 1993 ou 1994, que já colocava os meios dos dois países é a discussão de fundo sobre as políticas de combate à em utilização possível comum para efectuar este combate. criminalidade e à toxicodependência. Portanto, não se trata de uma novidade. Apenas se acres-

Quis o Deputado Telmo Correia fazer uma referência, centa, na sequência da recomendação das Nações Unidas, cuja franqueza lhe agradeço, dizendo que não poderia o combate previsto em alto mar, utilizando, eventualmente, baixar os braços e declarar que esta guerra estava vencida. meios militares ou de outra natureza. Creio que é importante que haja uma declaração de expan- Neste âmbito, também reconheço — e o Sr. Secretário são bélica a esse respeito; no entanto, é minha convicção de Estado certamente permitir-me-á fazer este cumprimen-de que qualquer política que se baseasse unicamente no to — uma evolução importante do ponto de vista do Parti-combate ao narcotráfico estaria condenada à partida. Creio, do Socialista, porque, na altura em que discutimos pela aliás, que os números indicam que essas políticas têm primeira vez se poderiam ou não ser utilizados meios mili-vindo a ser condenadas e, provavelmente, estarão conde- tares em relação ao combate à droga, houve alguns Depu-nadas ainda no futuro. tados da bancada do Partido Socialista e que, então, inter-

Naturalmente, a discussão portará não só o combate à vieram que entendiam esta solução como ferida de incons-criminalidade mas mais ainda aquelas consequências que titucionalidade. Diziam eles, nessa altura, que não se têm a ver com o combate à toxicodependência no plano podiam juntar as duas coisas, que não se podia combater a interno. O facto de se tentar impedir, por todos os meios criminalidade com meios militares. Vejo agora, felizmente, constitucionais e de direito, este grande tráfico deixa ainda que evoluíram nessa perspectiva! em aberto as soluções para a política de combate à toxico- Na altura em que Portugal fez esse acordo com Espa-dependência, seja a nossa opção manter uma política proi- nha também se dizia que havia uma perda de soberania por bicionista, como é a opção aparente e manifesta, até, da Portugal utilizar meios espanhóis em relação ao combate à bancada do PP, seja ela a opção de integrar esse combate droga. Mas isso, penso eu, representava mais, nessa altura, no âmbito do Serviço Nacional de Saúde e, portanto, uma visão limitada do acontecimento, uma visão um pouco abandonar a vertente proibicionista. Essa discussão, no exterior à questão, uma visão menos dramatizada do pro-entanto, fica por fazer, não é este o momento para tal, blema! A partir do momento em que a droga passou tam-ficando remetida para essa outra discussão. bém a ser com o Partido Socialista o seu «inimigo público

Finalmente, queria registar com muito agrado o facto n.º 1» esbateram-se essas fronteiras de utilização e o Parti-de, da parte do porta-voz do Partido Socialista neste deba- do Socialista foi reconduzido ao bom caminho! te, o Deputado Nuno Baltazar Mendes, se registar uma declaração a respeito da importância do combate ao bran- Risos do Deputado do PS José Junqueiro. queamento dos capitais. Creio que isso tem a ver, a todos os títulos, com a repressão ao narcotráfico, coisa que é Diz o Sr. Deputado José Junqueiro que certamente nem fácil de perceber. Mais difícil de executar será a transposi- todo o bom caminho, e com razão. Porque aquilo que é ção dessa vontade para medidas concretas. Mas esperamos dito no Tratado é isto: Portugal e Espanha podem utilizar que, quando chegar a hora de votarmos sobre esta matéria, meios comuns. Só que é evidente que Espanha ficará sem-haja de todas as bancadas a coragem de passarmos da pre a perder, infelizmente, porque Portugal não tem prati-palavra aos actos. camente meios comuns para utilizar e para dar em troca à

Espanha. É um «pacto leonino» que estamos a celebrar, O Sr. Presidente (João Amaral): — Para uma inter- sendo certo que é a nosso favor e utilizando os meios de

venção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação. Espanha! Quero, portanto, celebrar o contentamento do Sr. O Sr. Carlos Encarnação (PSD): — Sr. Presidente, Deputado José Junqueiro com esta solução e cumprimentar

Srs. Deputados: Quero apenas dizer que votaremos favo- o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas ravelmente a ratificação deste Tratado, que vemos aparecer por, finalmente, o Governo apresentar, para ratificação, um com algum agrado, sendo certo que nos parece que já não Tratado que é muito importante e que vai completar, como falta quase nada, do ponto de vista dos acordos, tratados, eu disse, a «armadura» em relação à luta contra o tráfico convenções, recomendações, em relação a esta matéria. de droga. Portanto, desse ponto de vista, a «armadura» é completa. Faltam é meios..., mas essa é outra questão! Vozes do PSD: —Muito bem!

Em relação a este Tratado, gostaria de dizer que, sendo Portugal um País particularmente vulnerável ao tráfico de O Sr. Presidente (João Amaral): — Srs. Deputados, droga, designadamente ao tráfico de droga realizado atra- como não há mais pedidos de palavra, dou por encerrado o vés da rota atlântica, através do mar, e tendo Portugal um debate relativo à proposta de resolução n.º 117/VII, cuja interesse estratégico importante no triângulo entre os Aço- votação será amanhã, à hora regimental. res, a Madeira e as Canárias, sendo esse triângulo uma das Vamos passar à discussão da proposta de resolução n.º possíveis zonas de entrada com maior frequência de toda a 137/VII — Aprova, para ratificação, o Protocolo Modifi-droga que, por esta rota, abastece a Europa inteira, é evi- cativo ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, assi-dente que Portugal tem de se preocupar particularmente nado na Praia, Cabo Verde, aos 17 de Julho, pelos Gover-com esta questão. nos da República de Angola, da República Federativa do

Brasil, da República de Cabo Verde, da República da Gui-

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né-Bissau, da República de Moçambique, da República uma língua escrita deve obedecer. Isso é importante em Portuguesa e da República Democrática de S. Tomé e vários domínios: não só no domínio técnico e científico Príncipe. mas também no domínio da intervenção de Portugal nos

Para apresentar a proposta de resolução, tem a palavra organismos internacionais e, também, ao nível das novas o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas. tecnologias. À medida que as novas tecnologias vão inva-

dindo cada vez mais a nossa vida, cada vez mais a língua O Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portu- se vai dispersando e correspondendo ao que é falado e, a

guesas: —Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Protocolo em determinada altura, não temos uma mas várias línguas apreciação, subscrito conjuntamente pelas Partes no âmbi- escritas de diversos modos completamente distintos. Aliás, to da CPLP e assinado na cidade da Praia, em 17 de Julho é curiosíssimo verificar o seguinte: por exemplo, no Brasil, de 1998, tem como objecto a actualização do articulado do fundamentalmente, deparei com estrangeirismos escritos Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, assinado em de tal forma que praticamente já fazem parte do léxico, o Dezembro de 1990. que é inimaginável face à regra.

Deste Protocolo que agora submetemos à apreciação de Mas a uniformização do léxico também é fundamental VV. Ex.as resulta o relançamento de todo este processo, por outras razões, nomeadamente as que têm a ver com a visando a entrada em vigor do dito Acordo Ortográfico, edição de livros e com um sector económico fundamental, que, até à data, carecia de ratificação de todas as Partes. O que é o sector livreiro. objecto imediato deste Protocolo é a elaboração de um Abstraindo-me destas razões, quero fazer quatro per-vocabulário ortográfico comum da língua portuguesa, tão guntas ao Sr. Secretário de Estado, se é que me pode res-completo quanto possível, que possa contribuir para a ponder a esta matéria, porque estranho esta situação. normalização no tocante às terminologias científicas e Em primeiro lugar, gostava de saber o que é que o Go-técnicas. verno fez ao longo destes anos para que os outros Estados

membros ratificassem o Acordo Ortográfico e por que O Sr. Presidente (João Amaral): — Para uma inter- razão estamos exactamente na mesma situação da de 1994.

venção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Frexes. Por que é que não foi dado mais um passo nesta matéria? Em segundo lugar, tanto quanto sei, a comissão que O Sr. Manuel Frexes (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e estava a elaborar o dicionário ortográfico comum da língua

Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Analisamos portuguesa e que era presidida pelo Professor Doutor hoje um protocolo que modifica a redacção original e, Malaca Casteleiro já tinha a maior parte do trabalho pronto fundamentalmente, os prazos que estavam previstos no e a Academia Portuguesa de Letras tinha o processo muito Acordo Ortográfico assinado em Lisboa, em Dezembro de avançado, assim como a Academia Brasileira de Letras. 1990. Aliás, na altura, tive nessa Academia reuniões com o Mi-

Ainda bem que isto é feito, porque penso que todos nistro Houaiss e, por isso, sabia que mais de dois terços do estamos de acordo que a defesa e a valorização da língua dicionário estavam prontos. Gostava de saber qual é o portuguesa são valores cimeiros e, enquanto tal, devem ponto da situação do dicionário ortográfico comum da merecer de todos nós as respectivas atenções e os respecti- língua portuguesa. vos cuidados. O Acordo Ortográfico, que se refere funda- Já agora, Sr. Secretário de Estado, gostava também de mentalmente à preservação e à uniformidade da língua ter uma resposta a outra questão importantíssima, que é escrita, é também um instrumento estratégico e fundamen- esta: para quando a criação, também prevista, do instituto tal para a preservação desses valores cimeiros. internacional da língua portuguesa?

Se isso é assim, e suponho que todos estamos de acor- E, já que falamos em institutos, colocava, por fim, uma do em relação a esta matéria — e não estou a falar na ques- última pergunta: qual o papel do Instituto Camões em toda tão controvertida de haver ou não acordo ortográfico, essa esta matéria? é outra questão completamente distinta —, perdoe-me que o diga mas não percebi a intervenção do Sr. Secretário de O Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portu-Estado, por uma razão: as duas modificações que estão guesas: —Sr. Presidente, peço a palavra. previstas neste Protocolo dizem respeito a duas condições para que o Acordo Ortográfico entrasse em vigor. O Sr. Presidente (João Amaral): — Para que efeito, Sr.

A primeira condição era a de que todos os países subs- Secretário de Estado? critores do respectivo Acordo ratificassem esse instrumen- to até 1994 — no entanto, não o fizeram. Tanto quanto sei, O Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portu-até essa data, apenas o tinham feito três países: Portugal, guesas: —Sr. Presidente, foram-me pedidas respostas, Cabo Verde e, fundamentalmente, a República Federativa pelo que, em termos regimentais, só tenho ao meu dispor a do Brasil, uma grande conquista, na altura, para que este figura da intervenção e fá-la-ei quando V. Ex.ª quiser. Acordo pudesse vigorar no espaço da lusofonia. Mas os outros quatro países pertencentes aos PALOP não o fize- O Sr. Presidente (João Amaral): — Creio que haverá ram. acordo para que o Sr. Secretário de Estado fale depois de

A segunda condição era a necessidade de promover a todas as intervenções, o que lhe permite responder não só a uniformização do léxico, principalmente técnico e científi- esta mas também a outras. Se o Sr. Secretário de Estado co, num dicionário comum, o que é absolutamente funda- estiver de acordo... mental para se saber exactamente quais as balizas a que

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O Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portu- Risos. guesas: —Com certeza, Sr. Presidente.

Meus queridos amigos e colegas, eu não quero estragar O Sr. Presidente (João Amaral): — Dou, então, a pa- a vontade ao Sr. Secretário de Estado e dir-lhe-ei que

lavra ao Sr. Deputado Rosado Fernandes. aprovaremos esta proposta de resolução, mas com o desejo de que isto até falhe, porque não há qualquer dúvida de O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): — Sr. Presidente, que o pidgin portuguese vai existir. Não há qualquer dúvi-

Srs. Deputados: Não houve hífen ortográfico ou ortodoxo da de que o crioulo é o crioulo, o brasileiro é o brasileiro e que ligasse aqui mais Deputados para ouvir falar do Acor- o português daqui é o português daqui. do Ortográfico. Foi exactamente o que aconteceu nos paí- ses que eram afectados por esta «grave doença» que sem- Vozes do CDS-PP: —Muito bem! pre atacou os portugueses desde 1911, que é a de fazerem contínuas reformas ortográficas. Nada faz vibrar mais um O Orador: —Mas façam um dicionário! Eu, quando português do que uma reforma ortográfica! O hífen..., tenho de estudar uma regência de adjectivo ou de substan-maravilha! tivo, vejo-me aflito e tenho de recorrer ao Dicionário de

Lembro-me do Graça Moura, que defendia, com entu- Francisco Fernandes, que é um lexicógrafo brasileiro. siasmo, a abolição do hífen, lembro-me de várias vestais da minha Faculdade, que defendiam uma contra-reforma O Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portu-ortográfica, e eu, que fui aluno do Professor Rebelo Gon- guesas: —Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado? çalves, que foi o autor da reforma ortográfica de 1945, e já fui obrigado a escrever açúcar com dois «ss», açúcar com O Orador: —Diga. «ç» e outras palavras que já nem ouso repetir...

A verdade é que os países não sentem necessidade de O Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portu-que haja uma uniformização de qualquer acordo ortográfi- guesas: —Por favor, a mim, que me chamo Lello, não me co, mas também é verdade que os países mais ricos não peça para fazer um dicionário. perdem dinheiro com acordos ortográficos. O defeito dos ricos é poupar; o defeito dos pobres é gastar! De maneira Risos. que vemos que os americanos continuam com o seu boro, com «b», «o», «r», «o», como se pode ver escrito por aí O Orador: —Como estava a dizer, quando pretendo nos maços de tabaco, e os ingleses continuam a escrever encontrar uma regência de um verbo, tenho, por exemplo, borough, com «b», «o», «r», «o», «u», «g», «h», que é de recorrer ao dicionário de Francisco Fernandes. Aliás, no muito mais complicado. Portanto, o Marlborough inglês outro dia descobri – mirabile dictum – que o melhor dicio-não é o mesmo que o Marlboro americano! nário de português que ainda hoje está comprável é o

De facto, o Acordo Ortográfico nunca pode ser nada, Aurélio Buarque de Holanda, que é brasileiro; o Dicioná-porque a verdadeira escrita seria a escrita fonética, mas rio da Porto Editora é louvável, mas não é um bom dicio-esta levantaria imensos problemas. Isto porque é evidente nário, pois não tem exemplos da literatura. que a pronúncia beirã do Dr. Carlos Carvalhas não poderia Ora, tinha sido preferível que a Academia se concen-ser igual à minha, que é uma pronúncia mais ou menos trasse num bom dicionário e noutros dicionários, visto que lisboeta, e teria de aparecer com um «s» com um sinal por não temos lexicógrafos em Portugal — assim como seria cima. preferível que o Governo se concentrasse nas lanchas

Portanto, o Acordo Ortográfico é sempre uma balela, rápidas! —, do que estarem sempre a pensar em uniformi-mas, como dizia Lady MacBeth, «what is done can not be zar a língua que os povos não vão uniformizar. O portu-undone» — o que está feito não pode ser desfeito. Ela guês crioulo será o português crioulo..., mas, agora, uma disse isto depois de matar o marido... coisa é importante: é, de facto, uniformizarem e chegarem

a um acordo sobre a terminologia técnica e científica. Risos do CDS-PP. O Sr. Manuel Frexes (PSD): — Exactamente!

... e eu digo isto depois deste Acordo Ortográfico, em que os meus colegas de Coimbra andaram furiosos debatendo O Orador: —Mas sobre isso nem cá temos acordo. sobre se punham acento grave, acento agudo ou acento Porquê? Porque há uns que são influenciados pela biblio-circunflexo, hífen ou não hífen… grafia francesa, outros pela bibliografia alemã, outros pela

E, meu Deus, falta-nos um dicionário! Falaram do meu bibliografia inglesa… A verdade é que primeiramente foi a antigo aluno Malaca Casteleiro e disseram que ainda não francesa – nós ainda dizemos embrayage e não clutch para acabou o dicionário da Academia. Mas, como sabem, o o carro. primeiro dicionário da Academia acabou na palavra «azur- Portanto, digo-vos, sinceramente: vamos votar esta rar» – foi nesta palavra que acabou o primeiro volume do proposta de resolução, mas é com um voto de piedade por dicionário da Academia, do século passado… simpatia e por mais nada. De resto, poupem-me mais orto-

grafias, deixem-me o hífen em paz! Risos. Aplausos do CDS-PP. Este ainda não zurra, porque nós ainda não o vimos!…

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O Sr. Presidente (João Amaral): — Para uma inter- por mais interessantes que eles nos pareçam, por mais que venção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita. nos pareça haver alguma pretensa neocolonização desses

mesmos espaços, quanto mais não seja a partir da própria A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): — Sr. Presidente, Srs. introdução da defesa da língua portuguesa, quando não há

Deputados: Antes de passar a dar a nossa opinião sobre uma política da língua, quando não há uma política do esta matéria, devo dizer que teria sido muito importante, livro, quando não há os pressupostos fundamentais para a para que pudéssemos, de algum modo, opinar acerca desta defesa dessa mesma postura e dessa proposta política. proposta de alteração que estamos a discutir, que o Sr. Esta era a realidade, Sr. Secretário de Estado, de 1991, Secretário de Estado começasse por informar esta Assem- altura em que, de forma tempestiva, apressada, em dois ou bleia do estado do Acordo. três meses, se pressionou esta Câmara para tomar uma

Contactando algumas das partes interessadas, contac- decisão. tando algumas academias e algumas instituições, normal- Nós, desta bancada, chamámos a atenção para aquilo mente a resposta que ouvimos é esta: mas ainda há acordo? que considerávamos ser o paradoxo da data, pois havia Estávamos convencidos de que não! Que tinha caído em experiências, como já aqui foi referido, nomeadamente a 1991, depois em 1994 e que já não existia! inglesa e a francesa — países que foram confrontados

Portanto, era extremamente importante que o Sr. Secretá- muito antes de Portugal com o fim do colonialismo —, rio de Estado, em vez de nos ler os artigos sujeitos a altera- que, com muito mais condições, com muito mais tempo, ção — que todos nós já lemos, porque sabemos ler —, nos com muito mais espaço temporal, com muito mais material tivesse dito exactamente em que estado está o Acordo. didáctico e de apoio para resolver problemas desta nature-

Sr. Secretário de Estado e Srs. Deputados, estamos aqui za, precisaram de muito mais tempo para discutir estas a incorrer, mais uma vez, numa concepção que, na nossa questões. Portugal resolvia esta questão em dois ou três perspectiva, é incorrecta e que está nem mais nem menos anos, o que era perfeitamente irrealista. Só uma decisão de na continuidade da que ocorreu em 1991, ou seja, a entre- cariz perfeitamente político é que poderia determinar uma gar a esta Assembleia uma decisão meramente política por decisão temporal tão tempestiva sem o mínimo rigor, sem se considerar que esta Câmara é incapaz de encontrar solu- a mínima «cientificidade», sem a mínima capacidade de ções técnicas e muito menos linguísticas. enfrentar e de equacionar as condições não só as vigentes

De facto, em 1991, foi entregue a esta Casa uma mera em Portugal mas também as vigentes nos próprios países decisão política que, apesar de tudo – e quem ouviu a dis- nos quais apostávamos, concretamente Cabo Verde, Gui-cussão de 1991 apercebeu-se disso –, teve uma discussão né-Bissau, etc. acalorada, aprofundada, que conseguiu encontrar algumas Claro que o tempo veio dar-nos razão. Tudo aquilo que incongruências, alguns erros, algumas metodologias per- dissemos em 1991 podemos confirmá-lo hoje. De tal ma-feitamente incorrectas na construção do Acordo. Para além neira é verdade e pertinente aquilo que dissemos em 1991 disso, e acima de tudo, foi reconhecido por muitos Depu- que o Sr. Secretário de Estado achou por bem iniciar a sua tados desta Casa de que tinha havido uma atitude e um intervenção lendo as alterações aos artigos sem nada nos pragmatismo político que tinha apostado, fundamental- ter dito acerca do estado da situação. Isto porque não há mente, no sigilo e no constrangimento para encontrar o estado, porque não há situação! resultado político do Acordo e que desse sigilo e desse Aquilo que se pede hoje, mais uma vez, a esta Assem-constrangimento tinham sido afastados professores, lin- bleia é um papel de menoridade que passa, exclusivamente guistas, editores, livreiros e muita e muita gente de reco- e tão-só, por isto, Sr. Secretário de Estado: que esta As-nhecido mérito que poderia, de alguma forma, ter ajudado sembleia, que tinha colocado e aprovado duas datas nos na construção desse mesmo Acordo. artigos 2.º e 3.º de uma proposta de resolução de 1991,

Compreendo as preocupações do Sr. Deputado Rosa- torne enxuto o texto no que se refere a datas, limpe o texto do Fernandes quando — penso ter entendido isso –, das duas datas que estão presentes nesses artigos. Ou seja, numa perspectiva maximalista da defesa da dinâmica e a partir de agora, nós temos Acordo e não temos Acordo. do fluir natural da língua como organismo vivo, entende Não podemos dizer que não temos, porque num texto onde que um acordo, pela sua característica pertinentemente não é possível e passível a data do compromisso também o clássica e, de algum modo, rígida e pouco ecléctica, pode compromisso não deixa de ser assumido, porque também ser um obstáculo de tal maneira firme que possa pôr em não há pecado, porque também não há data! risco aquilo que é a dinâmica, aquilo que é o carácter Portanto, aquilo que podemos acabar por fazer nesta fluído e em contínua mutação de um organismo vivo, que Casa, se admitirmos assim e tão-só esta discussão, é, de é a língua. algum modo, a diluição de um conteúdo que já estava

Mas nós temos aqui — e permitir-me-á que, neste as- diluído por inoperância e ineficácia. pecto, discorde daquilo que afirmou – uma situação extre- Sr. Secretário de Estado, como a votação desta propos-mamente peculiar. Tal como se dizia na altura, a proposta ta de resolução só se vai realizar amanhã, sugiro que traga política tinha como pressuposto mais profundo o princípio a esta Casa alguns dados que nos permitam não brincar de que este Acordo pretendia a defesa da língua portugue- acerca de um assunto demasiado sério, que é a defesa da sa no mundo, no mundo que era, simultaneamente, o espa- língua portuguesa no mundo e a sua aposta no espaço da ço da lusofonia. Penso que o erro foi tamanho, porque lusofonia, mas ter condições sérias para discutir, por forma pretendia defender-se um espaço da lusofonia mas não a que este debate não passe apenas pela limpeza de datas havia uma política da língua portuguesa e não se pode num texto cujo pressuposto é demasiado sério para poder-defender espaços, por mais bonitos que eles nos pareçam, mos brincar com ele.

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que o Governo está empenhado nesta matéria – e não é por Vozes do PCP: —Muito bem! isso que o Governo vai deixar de implementar as condi- ções para que o dicionário se faça! O Sr. Presidente (João Amaral): — Para uma inter- Sei que tem havido algumas dificuldades. Creio que,

venção, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga. em 1991, estaria parado na palavra «asno» – há, aliás, umas coincidências engraçadas, desde o «azurrar» ao O Sr. António Braga (PS): — Sr. Presidente, Srs. «asno»… Temo-nos confrontado com atrasos sucessivos

Membros do Governo, Srs. Deputados: Não resisto a co- na elaboração do dicionário, mas esta é que será verdadei-meçar por saudar o Sr. Deputado Rosado Fernandes e ramente a trave mestra e referência de um acordo. dizer-lhe que cada um de nós tem as nossas heranças, com Não é por acaso que o Brasil tem um bom dicionário «h»: é que o PP votou a favor deste Acordo Ortográfico no que, do meu ponto de vista, pode vir a influenciar a evolu-tempo adequado. ção da própria língua portuguesa. E aqueles medos – por-

Por outro lado, devo também dizer-lhe que não estamos que há sempre medos quando se fala em acordos – de muito longe quanto à abordagem que faz relativamente à adulteração ou de «abrasileiramento» da língua portugue-língua. De facto, a língua não se regula nem por lei nem sa… E independentemente de não termos de ter medo por decreto — aliás, nós dissemos isso, em tempo oportu- disto, porque a língua vai funcionar pela sua natureza e no, quando se aprovou aqui, em 1991, pela maioria absolu- pela sua cultura, pela força da sua cultura originária, está ta do PSD, o Acordo Ortográfico. aqui envolvido um conjunto de interesses que também são,

Dissemos também outras coisas: que, independente- é preciso dizê-lo com clareza, interesses comerciais. Por-mente de estarmos com muitas divergências quanto ao seu tugal tem de estar atento a esta conjuntura e não pode, conteúdo — e, na altura, a discussão foi muito acalorada agora, resistir a pôr um acordo ortográfico, pelo menos nas mesmo na sociedade civil, dita assim —, os próprios pra- duas normas em que é possível fazê-lo, de acordo com a zos que constavam do Acordo e que, na altura, foram realidade presente e que vivemos hoje em dia. aprovados (e isso foi dito aqui com toda a clareza) eram Por outro lado, e vou terminar, Sr. Presidente e Srs. incumpríveis, porque não havia condições, nem nos países Deputados, relativamente a esta matéria, era importante que subscreveram o Acordo nem em Portugal, para fazer, fixar uma outra razão de intervenção que o Partido Socia-nomeadamente, a harmonização científica e técnica da lista sempre defendeu. língua. Na língua portuguesa, ninguém tem de ter qualquer

Nesse sentido, o Governo e os socialistas têm uma he- tipo de complexo neocolonialista de intervenção. E o que rança. A herança nossa — deixe-me também dizê-lo deste nos pareceu na altura em que o Acordo foi elaborado foi modo — é um acordo feito, e o que está feito, disse-o bem que houve vários complexos na postura de Portugal. Po-o Sr. Deputado Rosado Fernandes, está feito! rém, o que é um facto é que ele foi elaborado e ao Governo

Naturalmente que não é o Acordo que vai alterar o fun- resta cumprir e honrar os compromissos internacionais cionamento da língua na vida das pessoas. A língua faz-se assumidos e fazê-lo nesta perspectiva positiva do termo. com a história, com a história da cultura, no caso da cultu- Tanto à vontade estamos quanto o próprio PS, na época, ra portuguesa, e, nesse sentido, nós dizemos que o Acordo não teve maioritariamente uma posição favorável a este já faz parte da cultura portuguesa. Há muitos anos, houve Acordo. Isso revela também, da parte do Governo, uma várias tentativas de se fazer sucessivos acordos ortográfi- capacidade e uma visão de Estado acima de qualquer sus-cos e, portanto, o Acordo é já, em si, um elemento da cul- peita. tura portuguesa. Por isso, direi com toda a clareza: de preferência, Sr.

A verdade é que, neste momento, o Governo trata de Secretário de Estado, um dicionário, e urgente, mas tam-ser realista e de colocar no Acordo o que é possível e dese- bém estamos de acordo em não brincar com datas difíceis jável que lá esteja contido. Ou seja, as instituições, nomea- de cumprir. damente as academias, devem entender-se e encontrar a harmonização possível e desejável nos domínios científico Aplausos do PS. e técnico e não marcar prazos, Sr.ª Deputada Luísa Mes- quita. Isto porque se há matérias em que os prazos são O Sr. Presidente (João Amaral): — Para uma inter-susceptíveis de raramente ser cumpridos é numa matéria venção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das tão complexa como é esta que exige aprofundamentos Comunidades Portuguesas. muito intensos.

Pessoalmente – e o meu grupo parlamentar acompa- O Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portu-nha-me – entendo que, antes de mais nada, a existência de guesas: —Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foram feitas um dicionário regula, por natureza, uma língua. Veja-se, considerações, algumas de recorte fino, que não deixei de por exemplo, o caso de Inglaterra, já aqui citado, que tem o apreciar, como foi a do Sr. Deputado Rosado Fernandes – Dicionário Oxford, e em que não foi preciso qualquer e eu não quero interferir com o seu hífen e com as conside-acordo; existe o dicionário, é uma referência. Os países rações que fez – e algumas perguntas; no entanto, eu de que falam a língua inglesa adoptam-no como referência e modo algum quero aqui suscitar o debate que foi realizado não há nada escrito, não há qualquer acordo entre aqueles em 1991, não é essa a minha intenção, nem sequer estou que usam a língua inglesa. preparado para um debate dessa ordem, como compreen-

Também nós sempre defendemos, o mais possível, a derão. existência de um dicionário, dentro ou fora do Acordo Aliás, a pergunta que eu mais temia e que poderiam tê-Ortográfico. O dicionário pode e deve fazer-se – e creio la feito era sobre o que é que o Sr. Secretário de Estado,

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enquanto Deputado, em 1991, disse e fez em relação a esta mentos próprios, tal como acontece com o Instituto Ca-matéria, na medida em que, em 1991, eu, enquanto Depu- mões. tado desta Casa, e mais 17 Deputados votámos contra o O Sr. Deputado sabe que o Instituto Camões suscitou Acordo, coisa que não aconteceu em relação a Deputados grandes expectativas? Recordo os 24 centros que iriam ser de outras bancadas que agora afirmam, veementemente, a criados e, quando nós chegámos ao Governo, havia coisa necessidade de mudar, de interferir, de alterar, de ressusci- nenhuma. Neste momento, está a fazer o seu trabalho. tar esse debate. Não sei que posição tomaram! Eu votei É mau que, por razões meramente de interesse político-contra na altura e agora estou aqui numa posição institu- partidário, estejamos sempre a minimizar o que fazemos. O cional a assumir e a assegurar, como me compete, os acor- trabalho que fazemos é um trabalho que não deve ser par-dos internacionais do Governo a que pertenço, indepen- tidário, nem sequer do Governo, é um trabalho do Estado, dentemente, até, de esse Acordo ter sido feito por um porque a língua portuguesa é importante demais para governo que suscitou a assinatura de um acordo prévio estarmos aqui sempre a esgrimir — e não quero dizer que ortográfico, governo, esse, a que V. Ex.ª, Sr. Deputado seja a esgrima contra a parede. Em continuidade com os Manuel Frexes, pertencia… trabalhos que foram feitos pelo antecedente, estamos tam-

bém a trabalhar com o mesmo objectivo de valorizar os O Sr. Manuel Frexes (PS): — Não, não! interesses e a presença da cultura portuguesa. Minimizar apenas por mera guerrilha política, Sr. De-O Orador: —Mas assegurou a continuidade…, e bem! putado, penso que não é muito estimulante. Quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que no dia em que eu

sair do Governo, se, eventualmente, vier para esta Câmara, Aplausos do PS. jamais abordarei as questões em relação às quais geri no Governo. Voltarei para outras, porventura, serei até mais O Sr. Presidente (João Amaral): — Srs. Deputados, explícito na intervenção dessas áreas, porque, a não ser não havendo mais oradores inscritos para intervir, dou por assim, corro o risco de ser juiz em causa própria. encerrada a discussão da proposta de resolução n.º

V. Ex.ª colocou-me perguntas, designadamente a de 137/VII. saber o que fez o Governo em relação a este Acordo. Sr. A próxima sessão realiza-se amanhã, quinta-feira, às 15 Deputado, V. Ex.ª compreenderá que pertenceu a um horas, constando de um período de antes da ordem do dia, governo que suscitou a assinatura de um acordo prévio com um debate de urgência, requerido pelo CDS-PP, sobre ortográfico em 1986, que conseguiu que o Acordo fosse «Porto – Capital Europeia da Cultura 2001», e de um perí-assinado em 1990 e que depois, já quando V. Ex.ª partici- odo da ordem do dia, com discussão das propostas de pava de forma activa e dinâmica no governo, não conse- resolução n.os 140, 142 e 145/VII. guiu mais do que três ratificações. Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Pergunta-me o que é que nós fizemos, desde então. Olhe, Sr. Deputado, através de um trabalho diplomático Eram 19 horas e 45 minutos. importante e estratégico, conseguimos que fosse criada a CPLP e esta matéria está a ser dirimida nessa sede. Está a Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados: fazer-se um trabalho profundo, naturalmente com a parti- cipação de todos e não com um protagonismo especial de Partido Social Democrata (PSD): Portugal. Esta tessitura tem que ser feita com todos!

Diz o Sr. Deputado que não me compreende. Bom, é Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares

preciso, talvez, um acordo fonético ou algo assim, porque Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes

eu apenas disse que o que estava em causa era a alteração

dos prazos a que estávamos circunscritos para relançar este Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

processo e concertarmos um vocabulário ortográfico, ten-

do em conta a normalização do léxico científico e técnico, Partido Socialista (PS):

porque essa é uma matéria essencial, como foi referido Carlos Alberto Dias dos Santos pelo Sr. Deputado António Braga. José Alberto Rebelo dos Reis Lamego

Nós temos que evoluir no sentido do dicionário, da José Carlos das Dores Zorrinho multimédia, porque é por aí que se travam as batalhas do Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge próximo milénio, se queremos defender a língua. Esta matéria está a ter a sua tramitação em sede dos acordos, Partido Social Democrata (PSD): das negociações e do entendimento que se estabeleceu ao nível da CPLP. António Paulo Martins Pereira Coelho

Em relação ao instituto internacional da língua portu- Domingos Duarte Lima

guesa, devo dizer que ele foi constituído já como inte- João Bosco Soares Mota Amaral

grante da CPLP. Estão em construção as instalações e a José Luís Fazenda Arnaut Duarte

sede será em Cabo Verde. Esperemos que ele se faça, porque existe vontade, existem trabalhos e desenvolvi- A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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