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Sexta-feira, 20 de Outubro de 2000 I Série - Número 13

DIÁRIO da Assembleia da República

VIII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2000-2001)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 19 DE OUTUBRO DE 2000

Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex. mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
José de Almeida Cesário
António João Rodeia Machado
António José Carlos Pinho

S U M Á R I O

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia.- Deu-se conta da entrada na Mesa de requerimentos e de respostas a alguns outros.
A Sr.ª Deputada Isabel Pires de Lima (PS), a propósito do centenário da morte de Eça de Queirós, referiu-se à importância e actualidade da sua obra e propôs várias iniciativas comemorativas a serem tomadas pelo Parlamento.
O Sr. Bernardino Soares (PCP) criticou a forma como o Governo está a conduzir o processo relativo ao Euro 2004, tendo questionado a proveniência dos fundos e os critérios de financiamento de infra-estruturas de apoio. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados António Capucho (PSD), Laurentino Dias (PS) - que também deu explicações ao Sr. Deputado António Capucho, a propósito do exercício de defesa da honra -, e Hermínio Loureiro (PSD).
O Sr. Deputado Castro de Almeida (PSD) protestou pela falta de investimento público no distrito de Aveiro, nomeadamente em infra-estruturas e equipamentos, nos sectores rodoviário, ferroviário, da saúde, da educação e do saneamento básico. Respondeu, no final, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Margarida Rocha Gariso (PS) e António Pinho (CDS-PP).
A Sr.ª Deputada Jovita Ladeira (PS) salientou o investimento que os Governos do Partido Socialista têm levado a cabo no Algarve no sentido de implementar melhorias ao nível das acessibilidades, do ambiente e património cultural, da gestão e ordenamento da orla costeira, da educação e formação profissional e da saúde. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputados Carlos Martins (PSD).
O Sr. Deputado António Capucho (PSD) insurgiu-se contra o facto de ainda não ter sido enviado ao seu grupo parlamentar um relatório sobre os telemóveis de terceira geração, tal como havia prometido o Sr. Primeiro-Ministro, tendo sido informado pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (José Magalhães) de que aquele documento iria ser entregue até ao final do dia.
O voto n.º 82/VIII - De saudação à delegação portuguesa aos Jogos Olímpicos de Sidney (PS) foi aprovado, tendo-se pronunciado os Srs. Deputados Laurentino Dias (PS), Pires da Silva (CDS-PP) e Hermínio Loureiro (PSD).
Sobre os votos n.os 91/VIII - De saudação ao povo da Sérvia (PS e CDS-PP) - que foi aprovado - e 93/VIII - De saudação ao povo da Jugoslávia (PCP) - que foi rejeitado - intervieram os Srs. Deputados Carlos Encarnação (PSD), Luís Fazenda (BE), António Reis (PS) e António Filipe (PCP).

Ordem do dia. - Procedeu-se à discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 238/VIII - Reciclagem e regeneração de óleos usados e de solventes (PSD), tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado do Ambiente (Rui Gonçalves), os Srs. Deputados José Eduardo Martins (PSD), Renato Sampaio, Casimiro Ramos e Natalina Moura (PS), Álvaro Castello Branco (CDS-PP), Joaquim Matias (PCP), Luís Fazenda (BE) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).
Entretanto, a Câmara deu assentimento à viagem do Sr. Presidente da República ao Panamá, entre os dias 16 e 20 de Novembro.
Foi aprovado o projecto de resolução n.º 77/VIII - Aprova medidas de combate a factores de risco na adolescência e na juventude (PS).
Os projectos de lei n.os 101/VIII - Contracepção de emergência (BE), 308/VIII - Garante o acesso aos medicamentos contraceptivos de emergência (PCP), 313/VIII - Da gravidez na adolescência (PSD) e 314/VIII - Contracepção de emergência (PS) foram aprovados, na generalidade.
Foi também aprovado, na generalidade, o projecto de lei n.º 156/VIII - Processo especial de constituição das associações juvenis (PCP).
Na generalidade, foi ainda aprovado o Decreto da Assembleia da República n.º 25/VIII - Define o regime jurídico aplicável ao consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, bem como a protecção sanitária e social das pessoas que consomem tais substâncias sem prescrição médica.
Após aprovação de um requerimento, subscrito pelo PS, no sentido de, efectuada a votação na generalidade, o Decreto ser imediatamente submetido a votação na especialidade e final global, foi apresentada e, admitida pela Mesa, uma proposta de alteração, subscrita pelo PSD e CDS-PP, do artigo 29.º do Decreto, que suscitou recurso interposto pelo PS, tendo o mesmo sido aprovado. Usaram da palavra os Srs. Deputados Jorge Lacão (PS), Luís Marques Guedes (PSD), Telmo Correia (CDS-PP), António Filipe (PCP) e Luís Fazenda (BE).

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Na especialidade, foi aprovada a proposta de alteração, apresentada pelo PS, PCP e BE, do artigo 29.º do referido Decreto, tendo usado da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Durão Barroso (PSD), Guilherme Silva (PSD), Telmo Correia (CDS-PP), Fernando Seara (PSD), Jorge Lacão (PS), Paulo Portas (CDS-PP) e António Filipe (PCP).
Em votação final global, o Decreto mereceu aprovação, com a alteração entretanto aprovada.
Em votação global, foram aprovadas as propostas de resolução n.os 28/VIII - Aprova, para adesão, a Emenda ao artigo 8.º da Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial, aberta para adesão a 1 de Março de 1993, e 36/VIII - Aprova, para ratificação, a Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e da Dignidade do Ser Humano face às Aplicações da Biologia e da Medicina: Convenção sobre os Direitos do Homem e a Biomedicina, aberta à assinatura em Oviedo, a 4 de Abril de 1997, e o Protocolo Adicional que Proíbe a Clonagem de Seres Humanos, aberto à assinatura em Paris, a 12 de Janeiro de 1998.
Foi, ainda, aprovado, na generalidade, na especialidade e em votação final global, o texto de substituição, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 41/VIII - Autoriza o Governo a alterar o Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de Fevereiro, alterado pelos Decretos-Leis n.º 387-E/87, de 29 de Dezembro, n.º 212/89, de 30 de Junho, e n.º 317/95, de 28 de Novembro, e pela Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto.
A Câmara aprovou ainda três pareceres da Comissão de Ética, dois autorizando dois Deputados do PS a deporem em tribunal, por escrito, como testemunha, e outro denegando autorização para suspensão do mandato a um Deputado do PSD para ser presente a tribunal.
Por fim, a Câmara apreciou, na generalidade, o projecto de lei n.º 297/VIII - Proíbe a passagem de navios contendo cargas radioactivas na zona económica exclusiva (ZEE) portuguesa (Os Verdes), tendo usado da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Isabel Castro (Os Verdes), Maria Santos (PS), Lucília Ferra (PSD), Cláudio Monteiro (PS), Honório Novo (PCP), Álvaro Castello Branco (CDS-PP) e Isabel Castro (Os Verdes).
O Sr. Presidente encerrou a reunião às 20 horas e 40 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 15 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Aires Manuel Jacinto de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António Fernando Marques Ribeiro Reis
António Fernando Menezes Rodrigues
António José Gavino Paixão
António Manuel Dias Baptista
António Manuel do Carmo Saleiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Bruno Renato Sutil Moreira de Almeida
Carla Maria Nunes Tavares Gaspar
Carlos Alberto
Carlos Alberto Dias dos Santos
Carlos José Gonçalves Vieira de Matos
Casimiro Francisco Ramos
Cláudio Ramos Monteiro
Dinis Manuel Prata Costa
Eduardo Ribeiro Pereira
Emanuel Silva Martins
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Serrasqueiro
Filipe Mesquita Vital
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Francisco José Pinto Camilo
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho
Helena Maria Mesquita Ribeiro
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco D'Almeida
Isabel Maria dos Santos Barata
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge Tinoco de Faria
Isabel Maria Soares Pinto Zacarias
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Alberto Martins Sobral
João Francisco Gomes Benavente
João Pedro da Silva Correia
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida
Jorge Lacão Costa
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão
José Alberto Leal Fateixa Palmeiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Aurélio da Silva Barros Moura
José Carlos da Cruz Lavrador
José Carlos Lourenço Tavares Pereira
José Carlos Pinto Basto Mota Torres
José da Conceição Saraiva
José de Matos Leitão
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Ernesto Figueira dos Reis
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Pires Epifânio
José Manuel Rosa do Egipto
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Rodrigues Pereira dos Penedos
Jovita de Fátima Romano Ladeira
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Miguel Gomes Miranda Teixeira
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira
Manuel António dos Santos
Manuel Francisco dos Santos Valente
Manuel Maria Diogo
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Margarida Maria Santos Soares da Rocha Gariso
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custodia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Céu da Cruz Vidal Lourenço
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino
Maria José Vidal do Rosário Campos
Maria Teresa de Oliveira Ferreira Coimbra
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo Alexandre Homem de Oliveira Fonseca
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Rui Manuel Leal Marqueiro
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Victor Brito de Moura
Vítor Manuel Alves Peixoto
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Álvaro dos Santos Amaro
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Martins Narciso
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António de Carvalho Martins
António D'Orey Capucho
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Manuel da Cruz Silva
António Manuel Santana Abelha
António Paulo Martins Pereira Coelho
Armando Manuel Dinis Vieira
Arménio dos Santos
Artur Ryder Torres Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos José das Neves Martins
Carlos Manuel de Sousa Encarnação

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Carlos Manuel Marta Gonçalves
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Jorge Loureiro de Reboredo Seara
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Santos Pereira
Francisco Augusto Caimoto Amaral
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José da Silva Maçãs
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José António de Sousa e Silva
José David Gomes Justino
José de Almeida Cesário
José Eduardo Rêgo Mendes Martins
José Frederico de Lemos Salter Cid
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel de Matos Correia
José Manuel Durão Barroso
José Manuel Macedo Abrantes
Lucília Maria Samoreno Ferra
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Manuel Machado Rodrigues
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Pedro Machado Sampaio de Sousa Pimentel
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Castro de Almeida
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Joaquim Barata Frexes
Manuel Maria Moreira
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Nuno Miguel Marta de Oliveira da Silva Freitas
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa
Pedro Manuel Cruz Roseta
Rui Fernando da Silva Rio
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Comunista Português (PCP):
Ana Margarida Lopes Botelho
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Cândido Capela Dias
Joaquim Manuel da Fonseca Matias
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Natália Gomes Filipe
Maria Odete dos Santos
Octávio Augusto Teixeira
Vicente José Rosado Merendas

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello Branco
António Herculano Gonçalves
António José Carlos Pinho
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da França
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Luís Pedro Mota Soares
Maria Celeste Ferreira Lopes Cardona
Narana Sinai Coissoró
Raúl Miguel de Oliveira Rosado Fernandes
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

Bloco de Esquerda (BE):
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Helena Augusto das Neves Gorjão

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai anunciar os requerimentos e as respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, foram apresentados na Mesa vários requerimentos. Na reunião plenária de 4 de Outubro de 2000: ao Ministério do Equipamento Social, formulados pelos Srs. Deputados João Cravinho e Altino Bessa; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Martins; ao Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território, formulados pelos Srs. Deputados Fernando Penha, João Maçãs e Heloísa Apolónia; aos Ministérios da Saúde, dos Negócios Estrangeiros e da Administração Interna, formulados pelo Sr. Deputado Machado Rodrigues; aos Ministérios da Economia e do Trabalho e da Solidariedade, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Moreira; ao Ministério da Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Cândido Dias; aos Ministérios do Equipamento Social, da Educação e à Secretaria de Estado das Pescas, formulados pelo Sr. Deputado Honório Novo; aos Ministérios da Educação e do Trabalho e da Solidariedade, formulado pela Sr.ª Deputada Margarida Botelho; a diversos Ministérios, ao Secretário de Estado Adjunto e da Indústria e à Câmara Municipal de Ovar, formulados pelo Sr. Deputado Paulo Portas; aos Ministérios do Ambiente e do Ordenamento do Território e da Saúde, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro; aos Ministérios da Administração Interna e do Ambiente e Ordenamento do Território e ao Instituto Nacional da Habitação, formulados pelo Sr. Deputado Luís Fazenda e a todas as câmaras municipais, formulados pelo Sr. Deputado José Cesário.
No dia 10 de Outubro de 2000: ao Ministério das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Caio Roque; aos Ministérios da Cultura e da Educação, formulados pelo Sr. Deputado David Justino; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Basílio Horta; ao Ministério

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dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado João Rebelo; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Paulo Portas e ao Ministério da Saúde e ao Governo Regional dos Açores, formulados pelo Sr. Deputado Francisco Louçã.
Na reunião plenária de 11 de Outubro de 2000: ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado Caio Roque; ao Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território, à Junta Metropolitana do Porto e à Empresa Metro do Porto, SA, formulados pela Sr.ª Deputada Paula Cristina Duarte; ao Ministério do Equipamento Social, formulado pelo Sr. Deputado Matos Leitão; ao Ministério do Equipamento Social e à Câmara Municipal de Viana do Castelo, formulados pelo Sr. Deputado Carvalho Martins; ao Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território, formulado pelo Sr. Deputado António Capucho; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado Hermínio Loureiro; ao Ministério da Educação, formulado pela Sr.ª Deputada Lucília Ferra; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Luís Marques Mendes; ao Ministério da Justiça, formulado pelo Sr. Deputado António Filipe; ao Ministério da Justiça e da Economia, formulados pelo Sr. Deputado Cândido Dias; ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulados pelos Srs. Deputados Lino de Carvalho, Herculano Gonçalves, Rosado Fernandes e Luís Fazenda; à Presidência do Conselho de Ministros, formulado pelo Sr. Deputado João Rebelo; a diversos Ministérios, formulados pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia e à Secretaria de Estado da Administração Pública, formulado pelo Sr. Deputado Ricardo Castanheira.
Nas reuniões plenárias de 12 e 13 de Outubro de 2000: aos Ministérios do Ambiente e do Ordenamento do Território e das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Luís Miguel Teixeira; ao Ministério da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados Luís Marques Mendes e Ana Manso; ao Ministério da Educação, formulados pelos Srs. Deputados Manuel Moreira, Caio Roque e Herculano Gonçalves; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado Machado Rodrigues; aos Ministérios da Educação e das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Oliveira; ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade, formulado pelo Sr. Deputado Vicente Merendas; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Álvaro Castello Branco; aos Ministérios da Economia e do Trabalho e da Solidariedade, formulados pelo Sr. Deputado Barbosa de Oliveira e ao Governo Regional da Madeira, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Sena Lino.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: no dia 16 de Outubro de 2000, Agostinho Lopes, nas sessões de 23 de Março, 13 de Abril, 30 de Junho e 26 de Julho; Natália Filipe, na sessão de 7 de Abril; Bernardino Soares, na sessão de 12 de Abril; Álvaro Amaro, na sessão de 28 de Abril; João Amaral, na sessão de 25 de Maio; Luísa Mesquita, na sessão de 9 de Junho; Carlos Martins, na sessão de 20 de Junho; Eugénio Marinho e José António Silva, na sessão de 28 de Junho; Francisco Louçã, na sessão de 5 de Julho; Honório Novo, no dia 13 de Julho e Casimiro Ramos, no dia 13 de Setembro.
No dia 17 de Outubro de 2000: Rui Rio, na sessão de 26 de Janeiro; Narana Coissoró, na sessão de 14 de Março; Maria Celeste Cardona, na sessão de 6 de Abril; José Barros Moura, no dia 2 de Maio; Santinho Pacheco, na sessão de 7 de Junho; Carlos Marta e Miguel Anacoreta Correia, na sessão de 15 de Junho; Fernando Santos Pereira, na sessão de 16 de Junho; Carlos Martins, no dia 20 de Junho; Machado Rodrigues e Honório Novo, na sessão de 21 de Junho; José António Silva, Manuel Moreira e Luísa Mesquita; Jovita Ladeira, na sessão de 28 de Junho; Luís Cirilo, na sessão de 29 de Junho; Agostinho Lopes, José Eduardo Martins e Heloísa Apolónia, nas sessões de 30 de Junho, 26 de Julho, nos dias 30 de Agosto, 19 de Setembro e na Comissão Permanente de 5 de Setembro; Arménio Santos, na sessão de 5 de Julho; Pedro Duarte e Ricardo Fonseca de Almeida, na sessão de 6 de Julho e António Capucho, na sessão de 3 de Outubro.

O Sr. Presidente: - Para tratamento de assunto de interesse político relevante, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires de Lima.

A Sr.ª Isabel Pires de Lima (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Defender a necessidade de evocar este ano, na instituição onde nos encontramos, a figura e a obra de Eça de Queirós, quando este ano se comemora a passagem dos 100 anos sobre a data da sua morte, parece despiciendo, tanto mais quanto se está a falar daquele que é, porventura, o maior ficcionista do século XIX português, que ao Parlamento e à vida política e social portuguesas votou a maior atenção, a ponto de da sua obra se poder dizer que tem Portugal como tema obsessivo, primeiro e último, onde todos os outros desaguam.
Despiciendo ainda porque Eça de Queirós é um escritor que mantém uma indiscutível actualidade, na medida em que a sua obra se revela, mais de 100 anos volvidos, capaz de gerar sempre novos e entusiastas leitores. Os seus textos reúnem diversos factores que são garante de perenidade - problematizam questões humanas de todos os tempos, geram beleza pelo manuseamento original da matéria prima com que lidam, a linguagem, e retratam um tempo através de uma visão pessoal do mundo.
Eça de Queirós soube criar tipos sociais e humanos que são do seu e de todos os tempos. Conselheiros Acácios, Condes Abranhos, Primos Basílios não faltavam no seu tempo, não faltam hoje, não faltarão amanhã, mas essas personagens dão-nos também e vivamente um retrato do Portugal do século XIX, através da mundividência de um intelectual vivendo em contradição o facto de se sentir simultaneamente empenhado e desencantado, crente na mudança e desiludido face ao imobilismo reinante. Ele conseguiu tudo isto através de uma arma que manuseia como poucos, a ironia. Uma ironia dupla, que constantemente obriga a suspender o juízo crítico e que produz ambiguidade, isto é, cria um texto aberto a permanentes reinterpretações.
Produziu Eça de Queirós arte através da linguagem obsessiva e penosamente trabalhada até ao último momento da publicação. Ele, um escritor realista, empenhado e desencantado, disse, clarividente no seio da sua contradição: «A Arte é tudo, porque só ela tem duração. Tudo o resto é nada.».
É, portanto, para a comemoração do centenário de um grande artista que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista está a apelar, na sequência aliás do mesmo espírito que levou S. Ex.ª o Sr. Presidente da República a visitar Tormes, em Santa Cruz do Douro, no concelho de Baião, em 16 de Setembro passado. Exactamente na data em que volviam 100 anos sobre a morte do escritor, o Presidente Jorge Sampaio cumpriu o gesto ritual de

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depositar flores junto à campa de Eça de Queirós, tendo depois escolhido o alto lugar queirosiano de Tormes, a quinta que inspirou ao escritor A Cidade e as Serras, hoje sede da Fundação Eça de Queiroz, para assinalar a passagem do centenário.
Na sessão comemorativa, o Sr. Presidente da República acentuou a vertente cívica do escritor, o qual, na sua opinião, foi de um espírito crítico e de uma lucidez sem complacências para com o País e para consigo próprio. Se Eça de Queirós não poupou nada nem ninguém quando escalpelizou a «choldra ignóbil», que para ele o País constituía, fê-lo no mais vivo, agudo, quando não dramático, espírito patriótico. «Patriotarras, patriotaças, patriotarraças», assim designou ele tantos quantos não poupavam elogios ao País decadente que, a seus olhos e aos da geração iconoclasta a que pertenceu, Portugal era. Todos os sectores da vida política, económica, cultural lhe mereceram uma farpa, visando acordar o «velho porco adormecido», isto é, a Pátria. Farpas assumidas pela designação de Farpas ou farpas que ganharam contornos ficcionais, como esta, contida no seguinte desabafo de Ega em Os Maias, perante a inoperância do rotativismo político regenerador: «É extraordinário! Neste abençoado país todos os políticos têm 'imenso talento'. A oposição confessa sempre que os ministros, que ela cobre de injúrias, têm, aparte os disparates que fazem, um 'talento de primeira ordem'! Por outro lado, a maioria admite que a oposição, a quem ela constantemente recrimina pelos disparates que fez, está cheia de robustíssimos 'talentos'! De resto, todo o mundo concorda que o país é uma choldra. E resulta portanto este facto supracómico: um país governado 'com imenso talento!', que é de todos na Europa, segundo o consenso unânime, o mais estupidamente governado! Eu proponho isto, a ver: que, como os talentos sempre falham, se experimentem uma vez os imbecis!»
O Ega irreverente do comentário que acabámos de ler é o mesmo que ao longo do romance faz a reflexão mais patriótica, que funciona simultaneamente como uma autocrítica e um apelo à acção, em atitude idêntica à que o mesmo Eça poderia ter tomado perante a constatação de que a cera de que é feita Portugal é boa, quem a trabalha é que não presta. E, como não poderia deixar de ser, reflecte Ega, como Eça reflectiria, «se nós, que possuímos as aptidões, nos contentamos em governar os nossos dog-cars e escrever a vida íntima dos átomos? (…) No fim, este diletantismo é absurdo. Clamamos por aí, em botequins e em livros, 'que o país é uma choldra'. Mas que diabo! Porque é que não trabalhamos para o refundir, o refazer ao nosso gosto e pelo molde perfeito das nossas ideias?».
Este é o Eça irónico, contraditório, ambíguo, dialecticamente duplo, que detesta e ama o seu país, que acredita na sua regeneração e se desencanta, se ilude e se desilude, se sente vencido e com isso ironiza. É que, como ele tão bem explicou ao inefável Pinheiro Chagas, «para um homem, o ser vencido ou derrotado na vida depende, não da realidade aparente a que chegou, mas do ideal íntimo a que aspirava.» E continua, concretizando com a sua inexcedível ironia: «Se um sujeito largou pela existência fora com o ideal supremo de ser oficial de cabeleireiro, este benemérito é um vencedor, um grande vencedor, desde que consegue ter nas mãos uma gaforina e a tesoura para tosquiar, embora atravesse pelo Chiado cabisbaixo e de botas cambadas. Por outro lado, se um sujeito aí pelos 20 anos, quando se escolhe uma carreira, decidiu ser um milionário, um poeta sublime, um general invencível, um dominador de homens (ou de mulheres, segundo as circunstâncias), e se, apesar de todos os esforços e empurrões para diante, fica a meio caminho do milhão, do poema ou do penacho, ele é para todos os efeitos um vencido, um morto da vida, embora se pavoneie por essa Baixa amortalhado numa sobrecasaca do Poole e conservando no chapéu o lustre da resignação.».
Eça agarrou por vezes nas suas mãos uma gaforina, mas sentiu-se muitas outras amortalhado numa sobrecasaca elegante do Poole alfaiate. Como todo o grande artista, viveu na contradição, experimentou-a e exprimiu-a dramaticamente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No sentido de dinamizar um programa de comemorações do centenário, o Governo, através do Ministério da Cultura, designou uma comissão nacional que tem acolhido e apoiado inúmeras iniciativas, desde colóquios a exposições, de produções teatrais a prémios de incentivo à criação, procurando cobrir a maior diversidade de públicos e de regiões do País. Por sua vez, o Ministério da Educação vem desenvolvendo um programa especial de incentivo à leitura de Eça nas escolas e tem dado o seu apoio a colóquios realizados até ao momento nas Universidades de Évora, Coimbra e Porto. Também o Ministério dos Negócios Estrangeiros, através do Instituto Camões, desencadeou no exterior uma vasta acção de promoção da obra e da figura do escritor-diplomata, intitulada «Eça de Queirós entre milénios: Pontos de olhar», que tem incluído colóquios, exposições, vídeos e traduções.
Agora que se aproxima a data simbólica do nascimento de Eça de Queirós, o dia 25 de Novembro, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista propõe que, sob a égide do Sr. Presidente da Assembleia da República, a Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares congregue os diversos grupos parlamentares no sentido de ser dado corpo a iniciativas do tipo das adiante propostas, partilhando, assim, a Assembleia da República do espírito das comemorações que temos vindo a assinalar.
1. A organização de um colóquio intitulado «Eça e o Parlamentarismo», onde seja possível proceder-se à análise contrastiva da visão crítica do escritor sobre a vida social, política e parlamentar do seu tempo e da visão crítica que a história da cultura e das mentalidades tem hoje dessa mesma realidade. Para o colóquio seriam convidados especialistas das áreas da história e dos estudos queirosianos e os diversos grupos parlamentares integrariam os painéis dando a sua própria perspectiva sobre a actualidade da crítica queirosiana.
2. A publicação de um livro com o mesmo título, «Eça e o Parlamentarismo», incluindo três partes: a publicação das comunicações apresentadas ao colóquio, a publicação de uma antologia dos textos de Eça de Queirós sobre o parlamentarismo, o Estado e a sociedade, a encomendar a um investigador de uma instituição idónea, e a publicação de comentários dos diversos grupos parlamentares aos textos antologiados.
3. A exibição da exposição «Eça de Queirós - Marcos Biográficos e Literários (1845-1900)», concebida pelo Instituto Camões.
Estas iniciativas e, porventura, outras que venham a ser sugeridas pelos diversos grupos parlamentares, poderão contribuir para que a Assembleia da República assinale condignamente a efeméride queirosiana, de modo a que em relação a estas comemorações não seja possível dizer do Parlamento o que o jovem Eça disse ao dar conta do unânime tédio da opinião pública de então a respeito do

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Parlamento: «A Câmara não tem princípios, nem ideias, nem consciência, nem…».

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, esteja certa de que as suas sugestões não cairão em saco roto, até porque de há muito está firme no meu espírito, e penso que no da Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, a ideia de que a Assembleia não pode deixar de associar-se à comemoração da efeméride relativa ao nosso maior romancista, em meu entender de sempre e não apenas do século XIX.
Se o programa será o que anunciou aqui ou outro qualquer, veremos depois na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, mas isso far-se-á na oportunidade devida e da forma que os grupos parlamentares entendam adequada e conveniente. Na altura, tornaremos isso público.
Também para tratamento de assunto de interesse político relevante, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Está fora de causa a importância do Euro 2004 como um importante projecto para o nosso país a que o PCP deu desde o início o seu apoio convicto e empenhado. Continuamos a manifestar com clareza este apoio, e sempre dissemos também que este importante evento teria de ter um forte impacto na vida desportiva nacional e na promoção do desporto no seu conjunto.
Mas o empenho que pomos neste projecto não tem de ser conivente com a forma como o Governo está a conduzir o processo.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Trata-se de uma gestão política muito mais marcada por objectivos de aproveitamento mediático do que por uma vontade sincera de que o projecto se desenrole com clareza e transparência. O desenrolar dos trabalhos da Comissão Eventual de Acompanhamento da Utilização dos Recursos Públicos no Euro 2004 é disto a melhor prova. De reunião a reunião e à medida que a comissão vai reunindo com os diversos intervenientes no projecto, vamos descobrindo novidades sobre a actuação e as intenções do Governo. Se não vejamos: no início, o Governo assumiu o compromisso de comparticipar apenas os estádios em 25% de um custo pré estabelecido sobre o número de lugares de cada um. Viemos depois a saber, apesar das garantias iniciais de que nem mais um tostão haveria para os clubes e autarquias com estádios a construir (vide as declarações do ministro anterior), que haverá afinal também um pacote de acessibilidades onde se gastarão, repare-se na precisão, 10 a 12 milhões de contos. Ainda esta semana, na última reunião, descobrimos afinal que também os parques de estacionamento nos lugares exigidos pela UEFA seriam pagos pelo Estado. Levanta-se ainda, também o soubemos esta semana, a possibilidade de existir uma linha de crédito específica para os clubes, cujo juro seria bonificado ou, porventura, até sem qualquer juro, que seria obviamente suportado pelo Estado.
É justo, pois, perguntar quando irá o Governo dar-nos novidades nesta matéria. Quando conseguiremos, finalmente, ter a visão completa do que vai ser o investimento do Estado nesta matéria e de como vai ser feito? Só com o conhecimento completo das intenções do Governo nesta matéria e dos compromissos, que, como é fácil de perceber, já assumiu com as entidades envolvidas, designadamente com os clubes, é que cada partido e esta Assembleia poderão avaliar o que nestes apoios está de acordo com o interesse público, que, obviamente, existe neste projecto, e o que não é mais do que favorecimento de outros interesses.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O comportamento do Governo, que tenta disfarçar ou adiar o conhecimento por esta Assembleia dos apoios que já se comprometeu dar às diversas entidades que vão construir estádios, sejam autarquias ou clubes, levanta fundadas e sérias preocupações. E é legítimo suspeitar que o Governo se prepara para arcar com o fundamental das despesas com a construção dos estádios, tentando de caminho disfarçar o facto o mais possível para não sofrer a crítica política que essa atitude obviamente merece. Aliás, se dúvidas houvesse em relação a essa preocupação dos nossos governantes, a revelação de que teria havido solicitações para que as verbas inicialmente comparticipadas a 25% fossem orçamentadas por baixo, vem confirmar os receios que já tínhamos.
Por outro lado, é fundamental esclarecer de onde vêm os financiamentos para acessos e para parques de estacionamento. Sendo certo que haverá, eventualmente, na questão dos acessos nalguns projectos uma parte de interesse público não desprezável e que deve ser alvo do apoio do Estado, é preciso saber com que critérios isto se fará. E é também preciso saber se a entrega de verbas para estes projectos respeita o equilíbrio que tem de existir entre as diversas autarquias locais, especialmente aquelas que não têm estádios a construir no seu território mas que nem por isso devem ser prejudicadas nos investimentos necessários para o bem estar das suas populações.
O mesmo deve dizer-se para o resto dos investimentos desportivos. Num tempo onde tantos se afligem agora com as prestações internacionais dos atletas portugueses, é preciso recordar que, nos primeiros debates sobre o Euro 2004, o Governo garantiu que não haveria prejuízo para os restantes investimentos desportivos. Julgamos que haverá sérias razões para temer que o já desastroso panorama financeiro das federações desportivas, das associações e dos clubes amadores se torne ainda mais negro, e são eles quem proporciona o grosso da prática desportiva à população do nosso país.
A clarificação de toda esta situação é, pois, obrigatória. E nem venha o Governo nem o Partido Socialista com a chantagem de que quem faz críticas não quer o Euro 2004 em Portugal. Essa demagogia é inaceitável. Não nos peçam para passarmos pura e simplesmente um cheque em branco ao Governo. No PCP, não aceitamos que o projecto do Euro 2004 continue a não ser conhecido na totalidade dos seus contornos. Não aceitamos que sob a etiqueta do Euro 2004 se acobertem outros interesses bem distintos do interesse público, nem aceitamos que o Euro 2004 funcione como um eucalipto que seque tudo à sua volta, seja em investimentos desportivos vários, seja em projectos de autarquias de importância decisiva para as suas populações e que provavelmente serão agora preteridos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

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O Orador: - A melhor maneira de defender o projecto do Euro 2004 é defender a seriedade, a transparência e a boa utilização dos recursos públicos, e é nisso que o PCP se empenhará.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Bernardino Soares, tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado, quero, desde logo, afirmar a minha concordância geral com a intervenção que acaba de produzir e solicitar uma tomada de posição concreta da sua bancada e, se possível, pessoal a propósito desta questão que foi tratada em sede de comissão de acompanhamento e que tem a ver com as afirmações, no mínimo, sensacionais do Dr. João Vale e Azevedo.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Outra vez?!

O Orador: - Não é outra vez! Estas afirmações ainda não estão esclarecidas e parece que VV. Ex.as estão com medo que elas o sejam!
De facto, Sr. Deputado Manuel dos Santos, o Dr. João Vale e Azevedo disse, em sede de comissão e isso está gravado, a propósito do sensível agravamento dos custos do Estádio da Luz, que os valores inicialmente orçamentados foram expressa e deliberadamente subavaliados por indicação do Governo.
Na altura, era titular da pasta o Sr. Ministro José Sócrates e, com toda a naturalidade, o PSD sugeriu, em sede de Comissão, uma audição parlamentar para o Sr. Ministro esclarecer, confirmando ou infirmando, estas declarações do Dr. João Vale e Azevedo. Mais, no caso de serem verídicas ou fundamentadas, deveria esclarecer a Comissão se tinham sido transmitidas iguais indicações a outras entidades promotoras.
Ora, escandalosamente, os Deputados Socialistas da Comissão inviabilizaram a presença do Sr. Ministro José Sócrates. Parece que têm medo da verdade!
É também verdade que acabo de requerer directamente ao Sr. Ministro este esclarecimento porque, conhecendo como conheço o Sr. Ministro José Sócrates, penso que ele é o primeiro interessado em que este apuramento seja feito. Todavia, gostaria de ouvir a posição da bancada do Partido Comunista sobre este aspecto.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Bernardino Soares, a Mesa recebeu uma terceira inscrição para pedir esclarecimentos. Contudo, o Sr. Deputado dispõe apenas de 4 minutos para responder, pelo que gostaria de saber se pretende responder desde já ou acumular as respostas.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Vou acumular as respostas, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Uma decisão prudente, Sr. Deputado.
Para pedir esclarecimentos, tem, então, a palavra o Sr. Deputado Laurentino Dias.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, em relação à matéria sobre a qual interveio, eu deveria, sobretudo, pedir esclarecimentos muito claros relativamente àquela que é uma grande preocupação para todos aqueles que, como eu e V. Ex.ª, têm vindo a trabalhar em sede da Comissão Eventual para Acompanhamento do Euro 2004.
A grande preocupação é esta: vamos ter, nesta Assembleia, o debate do Orçamento do Estado para 2001, findo o qual este passa ou não passa. Ora, neste Orçamento, é suposto estarem previstas, em obras novas, todas as obras que vão fazer parte do Euro 2004, quer ao nível dos estádios, quer ao nível das acessibilidades, quer ao nível dos parqueamentos, entre outras. É também suposto, por via deste Orçamento, termos a nossa comparticipação de acesso juntamente com os fundos comunitários. É ainda suposto as autarquias terem, por via deste Orçamento, a possibilidade e os meios financeiros para poderem lançar mão às obras a que se obrigaram e que comunicaram ao País que iriam fazer.
Pergunto-lhe, Sr. Deputado, o que acontecerá, isto é, qual o resultado para o Euro 2004 se tiver lugar um facto possível, que é o Orçamento do Estado para 2001 não passar? Gostaria de ouvir a opinião de V. Ex.ª a esse respeito.
Gostaria de colocar-lhe uma outra questão, Sr. Deputado: penso que na reunião de ontem da Comissão Eventual para Acompanhamento do Euro 2004, V. Ex.ª entendeu a posição do PS quanto à questão das declarações prestadas pelo Presidente Vale e Azevedo na Comissão. O que o PS disse na Comissão e que reafirma aqui no Plenário, foi que as declarações e as posições do Sr. Presidente do Benfica merecem do PS, sempre, todo o respeito e atenção, mas essa frase não merece!

O Sr. António Capucho (PSD): - Então, deixem o Sr. Ministro esclarecer!

O Orador: - Sr. Deputado António Capucho, se estiver interessado em ouvir, ouça!
Mais: não merece, porque a pessoa que diz que há dois anos atrás foi instada a assinar um documento com valores mais baixos, é a mesma pessoa que, voluntariamente, em representação do Benfica, assinou o mesmo documento na semana passada.
Explique-me isto, se faz favor...

O Sr. António Capucho (PSD): - Ah! Eu é que explico?!

Orador: - ... e diga-me se o PS pode ou não, deve ou não dizer que não acredita e não valora essa afirmação.

Protestos do PSD.

Que diga o Sr. Presidente do Benfica, se quiser, se alguém o obrigou a assinar, na semana passada, um contrato exactamente com o mesmo valor do contrato que assinou há dois anos atrás.
Estamos disponíveis para tudo mas não para fazer chicana política em relação a uma matéria que é da maior responsabilidade para o Parlamento e para o País.
O Sr. Ministro José Sócrates actuou muito bem, os senhores aplaudiram-no, e não têm agora o direito de duvidar da sua honorabilidade a propósito de uma frase dita pelo Sr. Presidente do Benfica.

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Aplausos do PS.

O Sr. António Capucho (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. António Capucho (PSD): - Para exercer o direito regimental de defesa da honra, Sr. Presidente, na medida em que foi insinuado que eu estava a duvidar da honorabilidade do Sr. Ministro José Sócrates, o que é ofensivo da minha dignidade.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Laurentino Dias, não tenho a mínima dúvida que não é a isso que está em causa. Aquilo que eu entendo é que o Sr. Ministro José Sócrates é o primeiro a querer vir aqui esclarecer os factos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Devia ser!

O Orador: - Foi insinuado que ele deu instruções no sentido de o orçamento ser subavaliado, o que, a ser verdade, seria gravíssimo. Se essa declaração é ou não verdadeira, não me compete a mim decidir. V. Ex.ª fará a apreciação que quiser.
O que tentei foi dar a oportunidade ao Sr. Ministro José Sócrates - e tenho a certeza de que ele é o primeiro a querer prestar esse esclarecimento - de vir à Comissão dizer que é falsa essa insinuação, que é falsa em relação ao estádio da Luz e que é falsa em relação aos outros estádios.
Portanto, não venha agora V. Ex.ª dizer que pus em causa a honorabilidade do Ministro José Sócrates. Não! Eu dei a oportunidade ao Sr. Ministro José Sócrates de vir, em audição pública, esclarecer os factos que lhe são imputados.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, querendo, tem a palavra o Sr. Deputado Laurentino Dias.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Capucho, eu não disse que V. Ex.ª pôs em causa a honorabilidade do Ministro José Sócrates.

O Sr. António Capucho (PSD): - Ah, pois não!

O Orador: - O que eu disse…

O Sr. David Justino (PSD): - Disse, disse!

O Orador: - … Peço perdão. Se me permitirem, posso esclarecer.

Protestos do PSD.

O que eu disse foi que V. Ex.ª está a valorizar e a dar como boa uma expressão que, ela sim, põe em causa a honorabilidade do Sr. Ministro José Sócrates.
E se quer que acrescente alguns testemunhos de como essa expressão é «falsa» - como, aliás, o Sr. Ministro Sócrates já teve oportunidade de dizer na comunicação social -…

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Na comunicação social?!

O Orador: - … isto é, essa expressão existiu mas não corresponde à verdade, o Sr. Deputado António Capucho perguntará a todos os Srs. Deputados do PSD que estão na Comissão se algum dos outros presidentes de clube ou donos de obra do Euro 2004 alguma vez fez a mais leve referência a uma atitude ou a um comportamento do Governo parecido, sequer, com aquele que o presidente do Benfica referiu. Acrescento, ainda, se for preciso, que aquilo que o Sr. Presidente do Benfica assinou na passada semana foi exactamente o mesmo documento, pelo mesmo valor e pelos mesmos montantes, que na Comissão tanta celeuma provocou e que agora provoca, de oito em oito dias, o pedido de esclarecimento, a interpelação ou a indignação de V. Ex.ª. Foi exactamente pelo mesmo valor e, que eu saiba, ninguém de novo instou o Sr. Presidente do Benfica - como VV. Ex.as parece que acreditam - a assinar papéis por valores inferiores àqueles que são os valores reais.
Esta é a realidade e acredita nestas matérias quem quiser.
Folgo muito em ver que VV. Ex.as depositam total e cega confiança nas declarações que vêem produzidas por quem quer que seja, neste caso na Comissão Eventual para Acompanhamento do Euro 2004. É esse o vosso caminho, cada um escolhe o seu. Nós escolhemos este.

O Sr. António Capucho (PSD): - Não vá tão longe!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Bernardino Soares, tem a palavra o Sr. Deputado Hermínio Loureiro.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, em boa hora este Plenário decidiu criar a Comissão Eventual para Acompanhamento do Euro 2004, porque temos vindo, audiência após audiência, a ser surpreendidos com declarações das entidades promotoras que nos vão ajudando a perceber a «novela» em que se está a transformar o Euro 2004.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Ainda ontem, na Comissão Eventual para Acompanhamento do Euro 2004, o Sr. Presidente do Sporting Clube de Portugal informou esta Assembleia da República e os Srs. Deputados do Partido Socialista que o Governo vai financiar 500 lugares de estacionamento a cada uma das entidades promotoras e que esse financiamento é feito a 100%. Ou seja, a Assembleia da República foi ontem surpreendida com esta afirmação do representante do Sporting Clube de Portugal, que veio trazer esta boa nova.
Quanto a esta questão dos parques de estacionamento e das acessibilidades, muito pouco ou quase nada temos ouvido de quem tem responsabilidades sobre esta matéria. Ora, quem tem essa responsabilidade são os Srs. Ministros da Juventude e do Desporto e do Equipamento Social e sobre isso «zero», a Assembleia da República não tem ainda conhecimento de qualquer démarche que tenha vindo a ser desenvolvida pelo Governo nesta matéria.
Além disso, Sr. Deputado Bernardino Soares, na nossa opinião, o Euro 2004 é - desde sempre o afirmámos -, e deve ser, motivo de orgulho e de consenso nacional. Penso que todas as forças político-partidárias, bem como

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a sociedade civil deste país, se devem mobilizar em torno do Euro 2004. Mas também lhe digo, Sr. Deputado Bernardino Soares, que estas últimas exposições do Partido Socialista sobre esta matéria têm-me deixado algo preocupado. É que em circunstância alguma o Euro 2004 deve ser utilizado como uma arma de arremesso político.

O Sr. José Barros Moura (PS): - Essa é boa!

O Orador: - É muito mau, é feio, e não fica bem ao Partido Socialista estar a transformar este projecto nacional numa arma de arremesso político.
Sr. Deputado Bernardino Soares, pergunto-lhe ainda se não lhe parece estranho que, estando associado à realização de um campeonato futebol da Europa, o Governo português financie mais as entidades promotoras em acessibilidades e em parques de estacionamento do que na própria construção dos estádios. Julgo que isto é estranho, Sr. Deputado Bernardino Soares, pelo que gostaria de saber a sua opinião sobre esta matéria.
Termino dizendo que acho inconcebível, inadmissível mesmo, que o Partido Socialista esteja a querer quebrar o consenso nacional em volta do Euro 2004.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Agradecendo desde já aos Srs. Deputados os três pedidos de esclarecimento que fizeram, começo por responder ao Sr. Deputado António Capucho, dizendo que obviamente votámos a favor da proposta do PSD para que o Sr. Ministro José Sócrates pudesse estar na Comissão, porque é fundamental - julgo mesmo que essa é a única reacção que a Comissão pode ter - que, perante determinadas afirmações de conteúdo grave, a Comissão procure apurar qual é o seu rigor, isto é, se são verdadeiras ou não.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Se não é verdadeira, parece!

O Orador: - Ora, não há outra maneira de o fazer se não ouvindo os visados na questão, neste caso o Sr. Ministro José Sócrates.
De resto, esta afirmação que agora foi feita, e que não sabemos se é verdadeira ou falsa, encaixa perfeitamente naquilo que é o desenvolvimento mais recente deste processo do Euro 2004, porque sabemos agora que vão surgindo outras formas de financiamento. Ora, se isto é assim, muito provavelmente será verosímil uma afirmação que diga que, naquele momento, foi orçamentado o projecto por baixo porque se sabia que, depois, haveria outras formas de o financiar.
Portanto, esta evolução tem alguma lógica, o que não quer dizer que seja verdadeira. Mas para se saber se é verdadeira ou não é que a Comissão Eventual para Acompanhamento do Euro 2004 tem de ouvir todos os intervenientes neste processo.

O Sr. António Capucho (PSD): - Nem mais!

O Orador: - Parece-me absolutamente inaceitável, e, aliás, muito estranho, que o Partido Socialista esteja convencido que não há nesta afirmação qualquer fundo de verdade. Devo até salientar que o raciocínio que o Partido Socialista aqui faz, quanto ao respeito por todas as intervenções, de todos os intervenientes, excepto numa frase determinada, num contexto determinado e numa reunião determinada, por provavelmente não convir ao Partido Socialista e ao Governo, não tem qualquer seriedade e só está a adensar as suspeitas sobre esta questão, não se compreendendo, portanto, que a sua atitude não seja outra que não a de aceitar o cabal esclarecimento de todo este problema.
Quanto ao Sr. Deputado Hermínio Loureiro, devo dizer-lhe que o maior comprovativo de que o Governo tem neste processo, em primeiro lugar, um desrespeito pela Assembleia e, em segundo lugar, uma grande vontade de protagonizar, em termos mediáticos e políticos, a questão do Euro 2004, é o facto de, na prática, termos um ministro no Governo que é pura e simplesmente o Ministro do Euro 2004. Na prática, ele não é o Ministro do da Juventude de do Desporto, porque não se lhe conhecem praticamente intervenções públicas noutras áreas do desporto, e exerce sobretudo a tutela do Euro 2004, com tudo o que nisso há de apetecível e de projecção mediática. Desrespeito pela Assembleia porque também se sonega informação fundamental a esta Assembleia para que ela possa fazer o acompanhamento do projecto, como por todos é desejado.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Devo dizer também que, quando se fala de consenso nacional nesta matéria, consenso não é conivência com procedimentos que não respeitem a necessária transparência, clareza e objectividade na aplicação dos recursos públicos.
Aliás, devo dizer ao Sr. Deputado Laurentino Dias que o que se deve esperar do Governo nessa matéria é que essa responsabilidade tenha estado presente quando elaborou o Orçamento do Estado para apresentar a esta Câmara, porque é aí que está o factor decisivo para a bondade ou não de um orçamento do Estado, porque a responsabilidade do Governo na elaboração do Orçamento do Estado tem paralelo na responsabilidade de dar todas as informações sobre esta matéria e de permitir uma análise transparente sobre esta questão.
Assim, o que se esperava do Sr. Deputado Laurentino Dias e da bancada do PS era se indignasse também com o facto de esta Assembleia e da Comissão Eventual do Euro 2004 vir conhecendo por episódios a verdade sobre os compromissos que já estão assumidos pelo Governo nesta matéria.

O Sr. Presidente: - Peço-lhe que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
O facto é que isso não tem acontecido e isso não beneficia nem valoriza o projecto do Euro 2004, antes pelo contrário.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Castro de Almeida.

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O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O distrito de Aveiro tem vindo a ser fortemente discriminado, prejudicado e marginalizado pelos governos socialistas do Engenheiro António Guterres. Sendo um dos maiores e mais industrializados no plano nacional, apresenta, contudo, baixíssimos níveis de infra-estruturas e serviços públicos.
Naquilo que depende do trabalho e do espírito empreendedor dos aveirenses, apresentamos os melhores indicadores, mas passamos para o fundo da tabela quando analisamos os investimentos públicos ou a qualidade dos serviços prestados; a pagar impostos somos o terceiro distrito do País, mas a receber a atenção e o apoio do Governo somos dos últimos. O Governo socialista tem sido padrasto para o distrito de Aveiro.
Basta ver o que se passa com as acessibilidades: a falta de boas comunicações é hoje o maior problema do distrito de Aveiro, faltam estradas e falta investimento a sério no caminho de ferro.
Nos cinco anos de Governo socialista foram construídos, no distrito de Aveiro, 3 km de estradas. Foram cinco anos de promessas, compromissos, anúncios, proclamações, declarações, deslocações... Tudo isto não valeu mais do que 3 km de estradas! Prometidos pelo Governo estão mais de 180 km, mas feitos só estão 3 km!
O IC2, entre Arrifana e os Carvalhos, continua prometido, mas adiado. Uma simples reunião técnica, prometida há mais de um ano, não teve ainda lugar. É bem o sinal do desinteresse do Governo. O volume de tráfego que circula nesta estrada é 12 vezes superior à sua capacidade. Duvido que, no País, se encontrem outros casos semelhantes.
Também a ligação do nó da auto-estrada em Santa Maria da Feira até ao IC2, em Arrifana, está a desesperar diariamente os milhares de pessoas que ali passam. Em muitas horas do dia demora-se um quarto de hora para fazer 2 km. É inaceitável e revoltante! No entanto, não se vislumbra sequer qualquer movimentação do Governo para desbloquear este assunto. É, mais uma vez, o desinteresse e o desleixo do Governo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É o costume!

O Orador: - A ligação entre Castelo de Paiva e Santa Maria da Feira, no troço entre Pedorido e Cruz da Carreira, continua também sem qualquer evolução nos últimos cinco anos, apesar de o primeiro Governo socialista ter prometido a abertura do concurso para 1997.
E o que se passa com a substituição do IP5? Parece que é segredo! Se não é segredo, é, pelo menos, misteriosa esta demora, tratando-se de substituir uma estrada, que é conhecida como «estrada da morte», tantos são os acidentes mortais que ali se verificam.
Se a demora do Governo tem a ver com as dúvidas ou incertezas acerca do perfil que deve ter a nova estrada, então, fica o Governo a saber que, pela nossa parte, defendemos uma verdadeira auto-estrada, com todos os requisitos de segurança, velocidade e conforto que são próprios das auto-estradas. Não aceitamos uma auto-estrada a brincar, só de nome, com inclinações e curvas que limitam a velocidade máxima a 50 e a 40 km/hora nalguns troços, conforme já apareceu relatado na comunicação social. Já que o Governo está a demorar a decisão, então, que decida bem, a pensar no futuro, no desenvolvimento do País, na segurança e na vida das pessoas.
Também não se conhece qualquer evolução nos processos de construção do IC2, nos troços entre Mealhada, Anadia, Águeda, Albergaria-a-Velha e Oliveira de Azeméis. O mesmo se diga do IC35, que ligará Penafiel a Sever do Vouga, passando por Castelo de Paiva, Arouca e Vale de Cambra. Está tudo parado.
Há uma excepção, no entanto, que quero destacar - e aproveito para cumprimentar o Governo: refiro-me ao lançamento do IC1, entre Vagos e Ovar. Trata-se de uma obra da maior importância que peca só pelo seu atraso, obra esta que este Governo não irá pagar, pois será paga pelos próximos governos no regime de portagens virtuais.
Se o panorama das acessibilidades rodoviárias é péssimo, não é melhor o estado da ferrovia no distrito de Aveiro.
A CP decidiu extinguir a linha do Vouga ou, pelo menos, alguns dos seus ramais. Não adianta negar as evidências! É que, ao diminuir de nove para dois o número das viagens diárias entre Águeda e Sernada, a REFER está a liquidar, em morte lenta, qualquer possibilidade de exploração deste ramal.
A linha do Vale do Vouga carece de urgente modernização; precisa de investimento e não pode suportar por mais tempo o desleixo e abandono a que tem sido votada; precisa de se modernizar e de se reconverter, conforme propuseram os autarcas da região, que têm em vista a transformação dos troços mais urbanizados da linha em metro de superfície. Seria particularmente adequada esta solução no troço que atravessa os concelhos de Oliveira de Azeméis, São João da Madeira e Santa Maria da Feira. O futuro é do transporte urbano e suburbano ferroviário, o progresso vai no sentido de modernizar os sistemas ferroviários existentes e não no da sua liquidação.
Mas ao distrito de Aveiro não basta manter a rede ferroviária existente, é fundamental e muito urgente a instalação de uma linha ferroviária partindo da linha do Norte até ao porto de Aveiro. Sabemos dos contactos que têm existido entre as autarquias de Aveiro e Ílhavo e a REFER, mas não podemos silenciar a demora e o atraso inexplicável no desenvolvimento deste assunto. Também nesta matéria vigora um clima de secretismo acerca das intenções da REFER no que respeita ao traçado. O secretismo tem de dar lugar à transparência, o confronto tem de ceder o lugar à cooperação e as hesitações sem fim têm de dar lugar à capacidade de decisão.
O Governo anuncia que está a preparar outra decisão da maior importância para o distrito de Aveiro. Refiro-me à rede de alta velocidade. Sobre esta matéria, os aveirenses não têm qualquer pretensão especial que não seja a do estrito cumprimento da promessa solenemente produzida pelo então Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território do XIII Governo Constitucional. O então Ministro João Cravinho garantiu, inequivocamente, que Aveiro seria uma importante estação onde parariam os comboios de alta velocidade.
Refiro isto hoje, aqui, para que não se corra o risco de alguém se esquecer de uma decisão que já foi tomada pelo anterior Governo. Em nenhuma circunstância os aveirenses poderão tolerar que aquela promessa solene não seja cumprida.
Se na área das infra-estruturas e equipamentos as coisas não vão bem no distrito de Aveiro, também nas áreas sociais não estão melhor.
Aos níveis da saúde e da educação há carências gritantes. Há necessidade de construir várias novas escolas e muitas outras continuam sem pavilhão desportivo; falta

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instalar sistemas de aquecimento; faltam equipamentos e material de laboratório; há generalizada carência de recursos humanos, designadamente pessoal auxiliar. Para além destas carências nas escolas do 2.º e 3.º ciclos e secundárias, há um forte deficit de formação tecnológica e profissional.
Mas também na área da saúde este Governo está a maltratar o distrito de Aveiro. É a maternidade do Hospital de Ovar que já foi encerrada; é a ameaça de encerramento das urgências dos Hospitais de S. João da Madeira e Visconde de Salreu, em Estarreja; é o quadro do Hospital Distrital de Aveiro que não é aprovado, tornando impossível atrair novos profissionais ou sequer manter o pessoal, a quem não se oferecem possibilidades de progressão na carreira; são as obras do Hospital de Oliveira de Azeméis que não avançam, como também não arrancam as obras do centro de saúde; é a anunciada integração do Hospital de Vale de Cambra no centro de saúde, ameaçando deitar por terra os esforças persistentes do presidente da câmara.
Em todos estes casos, os Deputados do PSD eleitos pelo distrito de Aveiro puderam constatar directamente estes problemas e conversar com os responsáveis destes serviços. Estivemos lá, fomos ao encontro das pessoas, vimos como se empenham no seu trabalho e observámos quanto se sentem frustrados face às precaríssimas condições em que exercem a sua actividade!
Quero referir-me ainda à situação verdadeiramente grave que se vive no distrito em matéria de saneamento básico. Nos maiores concelhos do distrito, o abastecimento domiciliário de água não excede os 40 % e a rede de saneamento não chega ainda aos 30 %. É certo que as autarquias estão a desenvolver um esforço enorme para vencer este atraso e a concessão de serviços a empresas privadas está também a dar frutos muito positivos, mas o atraso é imenso e, em alguns casos, impossível de superar, em tempo aceitável, sem um apoio financeiro adicional do Governo.
No concelho da Murtosa, por exemplo, a taxa de cobertura com rede de esgotos e estação de tratamento ainda não atinge os 5%. É uma verdadeira calamidade que não pode durar mais tempo. É necessário um programa especial de financiamento às autarquias do distrito de Aveiro para investimento acelerado nas redes de saneamento básico.
E não se pode desligar este assunto de todo a gestão da ria de Aveiro. Desde há dois anos e meio que a gestão da ria de Aveiro se encontra num intolerável estatuto de precariedade, sob a responsabilidade provisória da administração portuária. Falta, por isso, definir uma nova e definitiva autoridade de gestão da ria, que esclareça, de uma vez por todas, as competências de cada entidade, que acabe com a descoordenação reinante e garanta a prevalência das autarquias locais na gestão da ria.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Este clima de águas turvas só favorece a irresponsabilidade e esta descoordenação provoca conflitos de competências, que são paralisantes.
Tudo isto poderia ser diferente se o Partido Socialista tivesse acolhido a nossa proposta de criação da Área Metropolitana de Aveiro. Com o tempo acabarão por arrepender-se!
O distrito de Aveiro tem vindo a ser discriminado, prejudicado, marginalizado. Os projectos que apresentámos nesta Assembleia, através dos Deputados do PSD do distrito de Aveiro, pretenderam romper com a passividade e a indiferença com que os poderes públicos têm olhado para este distrito. Pena foi que os Deputados socialistas de Aveiro tenham pactuado com esta situação. Terão brevemente oportunidade de corrigir a trajectória, votando a nosso lado o projecto de resolução, que já apresentámos nesta Assembleia, que visa transferir para o distrito de Aveiro a sede do IAPMEI.
Pela nossa parte, continuaremos a lutar pela valorização do distrito, de todo ele, desde Espinho à Mealhada, desde Sever do Vouga até Ílhavo.
Porque Portugal não é só Lisboa e Porto, não nos conformamos nem nos resignamos perante a discriminação, o esquecimento e a marginalização a que os governos socialistas tem votado o distrito de Aveiro.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Margarida Rocha Gariso e António Pinho.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Rocha Gariso.

A Sr.ª Margarida Rocha Gariso (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Castro de Almeida, bem-vindo à discussão sobre desenvolvimento do distrito de Aveiro e à preocupação sobre a qualidade de vida e de bem-estar daquela população.
Na verdade, para quem faz um discurso tão dramático como o que o Sr. Deputado acabou de fazer, não se percebe como é que o Partido Socialista obteve uma maioria nas últimas eleições legislativas.

Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos do PSD.

A Oradora: - É o reconhecimento de que não tem razão no que diz. Há, efectivamente, muitas necessidades naquele distrito, mas muitas delas estão a obter resposta. Sintomático é o facto de, pela primeira vez, o distrito de Aveiro ter um PIDDAC superior a 60 milhões de contos, quando, no último governo do PSD, apenas tinha 15 milhões.

O Sr. Francisco Valente (PS): - Bem lembrado! Bem lembrado!

A Oradora: - Muitas obras e muitos investimentos foram feitos, designadamente na rede viária, como o caso do IC1, que está a avançar, do IP5, que está a avançar, do IC24 e da ligação de Arouca à Feira.
Em termos de saúde, temos o Hospital da Feira e muitos centros de saúde; em termos de segurança, temos muitos quartéis da GNR, que avançaram; em termos de cultura, foram construídas no distrito muitas bibliotecas; em matéria de ambiente, temos, efectivamente, algum atraso, também devido a grande responsabilidade de algumas câmaras do PSD,…

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - … que, ao longo destes anos, não conseguiram fazer projectos capazes de aderirem aos fundos de coesão, para se resolver esse grave problema.

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Logo vi que a culpa era do PSD!

A Oradora: - Assim sendo, Sr. Deputado, relativamente à temática do ambiente, que é uma temática que está a ser desenvolvida e que reveste grande importância para este Governo, mas numa perspectiva de harmonização do desenvolvimento com a sustentabilidade ambiental, contrariamente ao que os senhores fizeram, por exemplo, no IC2, que não avançou porque não conseguiram resolver esse problema da harmonização da sua construção e dos estrangulamentos existentes com o respeito pelas normas ambientais, pergunto-lhe, uma vez que os governos do PSD passaram mal, pela rama, estas temáticas, o que é que me diz em relação ao sistema integrado de recolha, tratamento e rejeição dos efluentes líquidos que está a ser desenvolvido pela SIMRIA, da qual, como sabe, fazem parte 10 concelhos do distrito de Aveiro, em que os fundos de coesão têm um investimento de 24 milhões de contos, uma vez que não foram capazes de dar viabilidade e satisfação a estas efectivas necessidades do distrito de Aveiro.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Castro de Almeida, pretende responder já ou responde no final aos dois pedidos de esclarecimento?

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Respondo no final, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Pinho.

O Sr. António Pinho (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Castro de Almeida, em virtude da escassez de tempo de que dispomos e também porque, nesta altura, pedi a palavra não tanto para lhe colocar questões mas mais para o felicitar pelo elenco de problemas que aqui referiu, que são problemas que também nós constatamos no terreno, porque também nós andamos constantemente a visitar as pessoas e os locais onde estes problemas se fazer sentir, gostaria de deixar aqui, uma vez mais, uma referência aos constantes requerimentos ao Governo que fazemos sobre estas e outras questões. Muitas das questões que aqui foram referidas pelo Sr. Deputado Castro de Almeida já foram objecto de requerimentos, não só da nossa parte mas também, certamente, por parte das outras bancadas, e continuam sem resposta.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - É grave!

O Orador: - Por exemplo, na questão do quadro de pessoal do Hospital de Aveiro, conseguiu-se obter mais informação através de uma conversa particular entre Deputados do PS e a Sr.ª Ministra da Saúde do que através dos requerimentos que a oposição, constantemente, vai dirigindo ao Governo.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - É gravíssimo!

O Orador: - Nomeadamente, quanto ao requerimento do Engenheiro João Cravinho, não sei se terá merecido já alguma resposta.
Sr. Deputado Castro de Almeida, felicito-o uma vez mais pela sua intervenção e reafirmo que o CDS-PP de Aveiro está, obviamente, disponível a participar na resolução destes problemas.

O Sr. Presidente: - Para responder conjuntamente aos dois pedidos de esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Castro de Almeida.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Pinho, quero agradecer-lhe a sua intervenção e manifestar aqui toda a disponibilidade para continuarmos o trabalho que temos vindo a fazer no distrito de Aveiro, onde frequentemente nos temos encontrado nas deslocações aí efectuadas.
Quanto à Sr.ª Deputada Margarida Rocha Gariso, que aqui saúdo e que é uma minha conterrânea, tenho muita pena de não estar aqui de «braço dado» com V. Ex.ª a defender os interesses do distrito de Aveiro. Infelizmente, a Sr.ª Deputada, para meu espanto e minha tristeza, coloca-se a defender o indefensável, que é o estado de paralisia em que está o distrito de Aveiro e em que o Governo o tem colocado ao logo deste tempo.
Mas se quer discutir a sério este assunto, se quer debatê-lo, então, peço à Sr.ª Deputada e aos Deputados socialistas de Aveiro que pressionem a direcção da bancada do PS para aceitar a proposta do PSD de agendamento de um debate de urgência sobre a situação do distrito de Aveiro.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Eles não ouvem!

O Orador: - Fizemos essa proposta e, por isso, peço à Sr.ª Deputada que use os seus bons ofícios para que rapidamente se faça aqui um debate, porque estamos interessadíssimos em esclarecer todas essas matérias que aqui colocou.
Sr.ª Deputada, a situação é bem pior do que aquela que eu disse! Por exemplo, nada disse aqui sobre a situação das pescas, em que há um desemprego enorme, e sobre a carência de destinos para a frota de Aveiro, que está a fazer com que os pescadores vão para o desemprego e se refugiem na pesca costeira, sem condições de segurança e provocando, com isso, imensas vezes, calamidades; nada referi aqui acerca dos problemas da segurança, e conhece os problemas que estão a surgir no distrito em relação a essa matéria; nada disse sobre as quotas leiteiras; nada disse sobre o marasmo que se verifica relativamente à Pateira de Fermentelos; nada disse sobre o atraso em matéria de construção de estradas no sul do distrito; enfim, falta dizer muito mais, a situação é bem pior do que aquela que eu aqui apresentei.
Lamento, de facto, que a Sr.ª Deputada, em vez de juntar a sua voz para defender o distrito, venha aqui defender a posição do Governo, fazendo crer - e este é o seu contributo para o debate - que a culpa dos problemas do distrito de Aveiro é, afinal, dos presidentes de câmara do PSD.
Há um problema gravíssimo no distrito de Aveiro de saneamento básico. É o distrito mais atrasado do País em matéria de saneamento básico, e a contribuição que a Sr.ª Deputada dá no Parlamento é dizer que a culpa é dos presidentes de câmara do distrito de Aveiro!
Sr.ª Deputada, nem quero entrar por aí, senão tinha de lhe recordar que o distrito mais atrasado é o da Murtosa, que só agora é da gestão do PSD - durante os anos em

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que se investiu a sério neste país em matéria de saneamento básico, a Murtosa foi dirigida por autarcas socialistas. Mas eu não quero entrar nesse debate. Os municípios do PSD ou do PS, todos eles, merecem a mesma ajuda. É preciso que a Sr.ª Deputada junte aqui os seus votos aos nossos para arranjar um programa de emergência para resolver o atraso enorme, gravíssimo, do Distrito de Aveiro em matéria de saneamento básico.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Jovita Ladeira.

A Sr.ª Jovita Ladeira (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Algarve, ao longo dos séculos, tem revelado uma posição de total solidariedade com os grandes interesses do País, identificando-se em plenitude com a Nação, de que é parte integrante, sem prescindir das suas especificidades.
Esse sentido de efectiva solidariedade é hoje expresso no gerar de um forte contributo para o PIB, através de um relevante segmento da economia portuguesa, o turismo. Turismo que é reconhecido como a indústria do futuro, sendo o sector que apresenta maior dinamismo e capacidade de crescimento a nível mundial. Decididamente, o Algarve é um valor acrescentado para o país e, como muito bem afirmou o mais alto magistrado português, deve ser cuidado e olhado como se de uma «porcelana delicada» se tratasse.
Sr.as e Srs. Deputados, as acessibilidades determinam, em grande medida, o desenvolvimento económico, a qualidade de vida e valorização dos recursos humanos de uma região. Mas sejamos claros e objectivos: na política de acessibilidades, e de transportes em particular, nunca foi considerada prioritária a «opção» Algarve. O Algarve foi. preterido face ao resto do País, em matéria de investimentos na área das acessibilidades, o que contrasta, inequivocamente, com a relevância estratégica que a região representa para a economia portuguesa.
A auto-estrada para o Algarve não era, à data, um investimento prioritário. Em 1993, aquando do lançamento do QCA II, foi-nos negada a ligação por auto-estrada ao Algarve, entendendo o governo do PSD que até 1999 não havia possibilidades financeiras de o fazer, dando-se prioridade à ligação Lisboa/Porto e Lisboa/Vendas Novas/Elvas/Madrid. Quanto à VLA, mais conhecida pela Via do Infante, construiu-se o troço Guia/Castro Marim - nada mais foi projectado. Ou seja, para o PSD, o Barlavento não existia politicamente, os seus interesses e as suas populações podiam esperar.
Quando se fala de ferrovia o panorama agrava-se; torna-se claro o total esquecimento a que foi votado, nas últimas décadas. A linha do sul e do Algarve há muito são o parente pobre num quadro de insuficiências da nossa rede ferroviária. À linha do Algarve só falta o vapor para nos enquadrar no início do século passado e na linha do sul (Lisboa/Faro) o PSD inviabilizou a possibilidade de acesso directo Lisboa/Faro pela ponte 25 de Abril, não contemplando a ligação Fogueteiro/Pinhal Novo. O esquecimento e abandono a que foi sujeito o Algarve faz com que hoje seja necessário um esforço muito superior para se vencer o atraso estrutural de décadas neste sector e para que se adapte às necessidades actuais de transporte de mercadorias e pessoas em termos competitivos com outros meios de transporte. Hoje, o Algarve, com o Governo do PS, está a mudar agulhas e a acertá-las pelos padrões de desenvolvimento sustentado que pretendemos para a região. A ligação ferroviária Lisboa/Faro, com comboios eléctricos, será uma realidade em finais de 2003. As primeiras intervenções já aconteceram. Cerca de 80 milhões de contos será o valor que o Governo se propõe investir.
No plano aeroportuário, 16 milhões de contos é o investimento previsto para o Plano de Desenvolvimento do Aeroporto de Faro e, em 2002, duplicará a sua capacidade, confirmando-se como o melhor aeroporto turístico da Península Ibérica.
Sr.as e Srs. Deputados, conseguiu-se compatibilizar uma grande obra pública de necessidade nacional com os constrangimentos ambientais: no Verão de 2002, a auto-estrada do Algarve estará concluída (espero bem que sim!) e no final do mesmo ano a VLA chegará até Lagos.
Se é verdade que hoje o Algarve pode contar, no que se refere às acessibilidades, com os eixos estruturantes básicos definidos, as necessidades da Região não se esgotam nestes sinais positivos. A necessária ligação ferroviária Algarve/Andaluzia, a reestruturação de toda a linha do Algarve, a ligação ferroviária ao aeroporto de Faro e à Universidade das Gambelas, a ponte Alcoutim/S. Lucas, o necessário aceleramento na intervenção no IC4 e no IC27 como vias complementares de acesso ao Algarve, e o sistema viário nacional e municipal dentro da região são os desafios seguintes.
Sr.as e Srs. Deputados, na região do Algarve o ambiente e o património natural são recursos estratégicos e factor chave de competitividade para a região. Se, em 1995, tínhamos um Algarve com 21 lixeiras a céu aberto, que não cumpriam as regras mínimas exigíveis do ponto de vista de protecção do ambiente e saúde pública, se só 51 % das águas residuais eram tratadas, se a água domiciliária era de deficiente quantidade e qualidade, hoje, felizmente, as lixeiras estão seladas, substituíram-se por aterros sanitários, há água em quantidade e qualidade e cerca de 80% das águas residuais estão a ser tratadas. Isso deve-se ao Governo Socialista, que apostou nesta área e que investiu cerca de 80 milhões de contos. A aposta é clara, Srs. Deputados: nos próximos quatro anos, o Algarve conta com um investimento de 60 milhões de contos para concluir o seu saneamento básico ambiental e atingirá padrões ambientais ao nível dos mais altos da Europa.
Sr.as e Srs. Deputados, o litoral algarvio é hoje o espelho dos efeitos negativos de um modelo de desenvolvimento ultrapassado. A gestão e ordenamento da orla costeira nunca foi preocupação até há bem pouco. Hoje, há investimento e planeamento, que irão contribuir certamente para a tão sentida e necessária requalificação do litoral e valorização ambiental. Os POOC são disso exemplo: o de Borgau/Vilamoura iniciou a sua implementação; o de Vila Moura/Vila Real de Santo António estará concluído no final deste ano. Há que reconstituir os laços entre crescimento económico e preservação/valorização do meio envolvente natural para bem do futuro do Algarve. E ao poder local cabe um papel decisivo - os valores do ordenamento e o rigor dos PDM são aspectos a acautelar para o bem do futuro.
Um esforço notável tem sido realizado no sentido de melhorar níveis de educação e formação profissional, suporte indispensável para o futuro da sociedade e economia algarvia. Mas há uma estrutura que urge criar no Algarve: o ensino superior na área das ciências da saúde certamente seria, para além das medidas nacionais

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já tomadas, a abertura de uma janela para a resolução de um problema grave com que se debate o Algarve na área da saúde - a falta de recursos humanos, consequência de uma política errada, seguida por anteriores governos, o que nos obriga a recorrer continuamente a médicos e enfermeiros espanhóis.
O PS tem a humildade democrática de reconhecer que a saúde é uma área sensível e que nos preocupa seriamente. O Algarve, sendo periférico, com uma população flutuante de mais de 6 milhões de pessoas, exige um empenhamento sério e rigoroso, e esse esforço revela-se, nestes cinco anos de mandato do PS: na construção de dezena e meia de extensões de saúde e de cinco centros de saúde de raiz; construiu-se e equipou-se o hospital do Barlavento Algarvio, o tal que foi objecto do lançamento de duas primeiras pedras, por sinal em dois locais diferentes e que até nem tinha concurso lançado; construiu-se uma escola de enfermagem, há mais de uma dezena de anos prometida; efectuaram-se fortes investimentos no Hospital Distrital de Faro e aprovou-se o seu plano director, o que permitirá requalificar o mesmo. É este esforço que tem de ser continuado no sentido de garantir um sistema de saúde mais eficiente que preste melhores serviços aos cidadãos e de qualidade reconhecida.
Quanto ao QCA III muito se disse, mas é bom que clarifiquemos: neste quadro, hoje, o Algarve pode contar com cerca de 500 milhões de contos contra os 245 milhões do passado e pode gerir directamente 147 milhões de contos contra os 28 milhões de então. Sublinhe-se que o desenvolvimento do Algarve é insustentável sem o interior. É sintomático verificar que, quer o Programa Operacional do Algarve, quer o Plano Estratégico da Associação dos Municípios do Algarve, apontam a necessária requalificação do litoral e desenvolvimento do interior e o equilíbrio territorial e ambiental como fundamentais para o desenvolvimento sustentado no Algarve.
Sr.as e Srs. Deputados, hoje, o Algarve está a construir as condições de competitividade regional e a afirmar a sua competitividade económica. No entanto, há que ser sempre e sempre mais exigentes. É necessário que a estratégia a desenvolver se faça com base numa dimensão de qualidade e variedade, e não na massificação desenfreada que, obviamente, a médio prazo, deitará tudo a perder. Uma região com certificação de qualidade é o que queremos para o Algarve.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Martins.

O Sr. Carlos Martins (PSD): - Sr. Presidente, começo por cumprimentar a Sr.ª Deputada Jovita Ladeira e por dizer que, ao ouvi-la, recordei aquela velha máxima de que a melhor defesa é o ataque. Porque, face aos sinais de descontentamento, face aos sinais de crise, face às constantes promessas e aos já habituais adiamentos de obras estruturantes para o Algarve, a Sr.ª Deputada veio aqui traçar-nos um cenário virtual daquilo que pensa mas não daquilo que os algarvios sentem.

O Sr. António Capucho (PSD): - É o costume!

O Orador: - Veio falar da auto-estrada para o Algarve, da VLA, mas esquece-se de que, em relação à auto-estrada havia um trabalho que estava em curso em 1995/96 e que, no início de 1996, na primeira visita oficial do Sr. Eng.º António Guterres como Primeiro-Ministro ao Algarve, ele prometeu a auto-estrada para 1998; depois, mais à frente, prometeu-a para 1999; depois, para 2000; e, agora, a Sr.ª Deputada vem pedir que estejamos satisfeitos com uma nova promessa para 2002! Esqueceu-se também que, nessa altura, em 1996, foi prometido, para acelerar o processo, que a auto-estrada ia arrancar do Algarve para Lisboa e, simultaneamente, na direcção Lisboa/Algarve para um ponto de encontro mais rápido e mais célere.
Dir-lhe-ei que não vou tecer grandes comentários - não comento as críticas que a Sr.ª Deputada aqui fez sobre os governos PSD. Temos muita honra no que fizemos, temos muito orgulho naquilo que oferecemos e naquilo de que dotámos o Algarve, nos passos que demos para o desenvolvimento e para o crescimento sustentado.
A Sr.ª Deputada aflorou as questões da saúde, mostrou alguma satisfação pelos passos importantes da Universidade do Algarve, instituição que foi a única criada nesta Casa, neste Parlamento, e referiu-se aos cursos na área das ciências e tecnologias da saúde. Esqueceu-se, mais uma vez, de que, desde Fevereiro, esses cursos estão para homologação no respectivo ministério, do seu Governo, e que são cursos indispensáveis para o desenvolvimento da saúde no Algarve, mas que continuam a marcar passo, tal como o esforço de 1,2 milhões de contos do Instituto Piaget no município de Silves (quiçá por ser um município social-democrata) que também está parado, com cursos na área das ciências da saúde.
Perguntar-lhe-ia, a terminar, ainda sobre esta matéria, se a Sr.ª Deputada concorda ou não com a necessidade do hospital do Sotavento - por acaso, definindo-se a sua localização em Tavira -, se concorda ou não com a construção de um hospital de substituição do Hospital Distrital de Faro e, por último, se concorda com a relocalização do Hospital Distrital de Lagos. São matérias importantes sobre as quais era bom ouvirmos a sua voz junto à voz daqueles que defendem os legítimos e reais interesses do Algarve.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Jovita Ladeira.

A Sr.ª Jovita Ladeira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Martins, a verdade é que o Algarve está bem e recomenda-se. Não é por acaso que, dos oito Deputados pelo Algarve, cinco são do PS e três do PSD.

O Sr. António Capucho (PSD): - Vai ver na próxima!

A Oradora: - Os algarvios continuaramm a depositar no PS as esperanças que têm em termos de desenvolvimento para o Algarve. Este é um sinal inequívoco de que, efectivamente, o Algarve está bem, de que o PS está bem no Algarve e de que tem feito os investimentos devidos no sentido de que esta região tenha uma projecção em termos regionais, nacionais e internacionais. É isso que se pretende.
Aquilo que foquei na minha intervenção, Sr. Deputado, não são dados virtuais, são dados reais. Nós não fabricamos números para apresentar aqui, Sr. Deputado! São dados que o Sr. Deputado, que diária ou semanalmente está no Algarve, pode verificar, tendo, inequivocamente, de me dar razão. Compreendo a sua

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posição, ao ter de defender o seu partido, mas, no fundo, o seu coração certamente que não o sente. Aliás, há um Sr. Deputado do seu partido, que até se encontra sentado próximo de si, que, em recente declaração pública a um jornal regional, afirmou que não há alternativa credível, neste momento, ao PS. Isso é bom sinal para o Governo do PS.
Passemos às questões, Sr. Deputado. No que diz respeito às acessibilidades, quanto à auto-estrada para o Algarve temos uma postura diferente da do PSD. A verdade é que sempre tentámos compatibilizar as questões das grandes infra-estruturas com as questões ambientais; nós não construímos e só depois é que vamos fazer os estudos de impacte ambiental, como aconteceu com a VLA, no tempo do governo do seu partido, Sr. Deputado! Foi isso que aconteceu! Portanto, é natural que a auto-estrada para o Algarve esteja atrasada relativamente àquilo que se pretendia, ao assumir de compromissos por parte do nosso Governo, porque teve de ser desviada por três vezes no sentido de se encontrar o melhor corredor de forma a compatibilizar a necessidade da obra com as questões ambientais. E penso que isso é de louvar.
A outra questão colocada pelo Sr. Deputado tem a ver com a saúde. Nessa área, como, aliás, referi, temos a humildade democrática de reconhecer que as coisas não estão bem. Mas o Sr. Deputado, que tem tido responsabilidades nessa área, devia reconhecer que nós apostámos na saúde. Temos, por exemplo, o hospital do Barlavento Algarvio em funcionamento, o tal para a construção do qual foram lançadas duas pedras, mas que nunca apareceu, porque nem projecto, nem orçamento, nem concurso havia - não havia, e é na sua cidade, Sr. Deputado! Além disso, construímos uma série de centros de saúde e temos praticamente a rede fechada…

O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr.ª Deputada.

A Oradora: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Em relação ao Instituto Piaget, Sr. Deputado, não se constroem as escolas e só depois se pede a homologação dos cursos.
Quanto ao Hospital Distrital de Faro e à construção de um outro em Tavira, Sr. Deputado, estou de acordo com um hospital para o Sotavento, só que ele deve ser localizado onde sirva melhor a população.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente e Srs. Deputados..., aliás, Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares e Srs. Deputados…

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - O Sr. Secretário de Estado não ouviu! Está a falar ao telefone!

O Orador: - E a ênfase que dou a «Sr. Secretário de Estado» tem a ver com uma questão que gostaria de colocar ao Governo e que já é do conhecimento do Sr. Secretário de Estado, pelo que não tem muita importância o facto de ele não ouvir.
O problema é o seguinte: faz agora um mês, Sr. Presidente, que, em debate nesta Câmara, S. Ex.ª o Sr. Primeiro-Ministro prometeu fazer entrega nesta Casa - e, em especial, à minha bancada - do já célebre, mas ainda omisso, «relatório dos americanos» sobre os telemóveis UMTS, os telemóveis da terceira geração, relatório esse que, aparentemente, justificaria o negócio - do nosso ponto de vista, ruinoso - que foi decidido pelo Governo.
Passado um mês, o percurso, aparentemente curto, desse relatório continua por percorrer e a questão que se coloca é: porquê? Trata-se de uma afirmação pública do Sr. Primeiro-Ministro, que saúdo, a de fornecer o relatório aos Deputados. O relatório, certamente, está na posse de membros do Governo. Não acredito que o Dr. Jorge Coelho, Ministro de Estado e do Equipamento Social, não o tenha, não acredito que o Sr. Primeiro-Ministro, que o citou, não o tenha, mas, mesmo que não o tenham, basta que o peçam ao Instituto das Comunicações de Portugal, situado ali ao lado.
A questão é esta, Sr. Presidente. O assunto é suficientemente grave para não se compadecer com esta demora.

Aplausos do PSD.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (José Magalhães): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, V. Ex.ª pede a palavra e vou conceder-lha, mas, um dia, Srs. Deputados, temos de entender-nos sobre em que medida o Governo tem direito a intervir no período de antes da ordem do dia.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Também me parece!

O Sr. Presidente: - Em meu entender, só está consagrada essa intervenção de 15 em 15 dias, desde que o Governo a requeira. Mas também é verdade, parece-me, que se trata de uma intervenção demasiado exígua, até porque podem surgir situações como esta, em que um membro do Governo quer dar um esclarecimento, que é pedido por um Sr. Deputado, e não pode fazê-lo por estarmos no período de antes da ordem do dia. Também não pode, em princípio, defender a sua honra, o que também penso ser excessivo não poder fazê-lo.
Temos, pois, um dia, que nos entender sobre esta matéria. Mas, por isso mesmo, porque ainda não o fizemos, e para já, a Mesa concede 3 minutos ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares para poder dar o esclarecimento solicitado pelo Sr. Deputado António Capucho.
Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Muito obrigado, Sr. Presidente. Parece-me uma decisão justa. Aliás, o Governo não reivindica o direito a intervir, em termos usuais, no período de antes da ordem do dia, salvo nos termos em que o Regimento o prevê e nos termos que V. Ex.ª acaba de enunciar.
Neste caso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, faço-o com todo o gosto, porque julgo que estão completamente votados ao insucesso quaisquer esforços do Sr. Deputado António Capucho para transformar a situação que descreveu no «caso A. T. Kearney».

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Tem aí o relatório?

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O Orador: - Não haverá o «caso do relatório da A. T. Kearney» pela simples razão, Sr. Deputado António Capucho, de que estou inteiramente em condições de informar o Plenário, e em particular V. Ex.ª, de que o relatório em causa vem, neste momento, a caminho do Plenário…

Aplausos do PSD.

… e o estafeta permitirá, Sr. Deputado, que lhe entreguemos o relatório. E o caso acaba!

O Sr. António Filipe (PCP): - Daqui a um mês, ele está cá!

O Sr. Presidente: - Aguardemos o estafeta.

Risos.

Srs. Deputados, façam silêncio, porque podem assustar o estafeta e ele acaba por não chegar.

Risos.

Srs. Deputados, concluímos a parte do período de antes da ordem do dia dedicada ao tratamento de assuntos de interesse político relevante. Separam-nos agora 5 minutos do tempo-limite de duração deste período. Tínhamos acordado que hoje se discutiriam e votariam os votos que ficaram da sessão de ontem, mas não há tempo para tal. A menos que os Srs. Deputados prescindam não digo de toda a discussão mas da leitura dos mesmos e que eles sejam discutidos em conjunto, usando cada grupo parlamentar como entender os 3 minutos para falar sobre os votos, após o que procederemos à sua votação separadamente. Mesmo assim, vamos gastar quase 30 minutos, o que significa que vamos retardar, por igual período, o fim do período de antes da ordem do dia.
Estão de acordo, Srs. Deputados?

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, pode fazer-se uma interpretação dupla do que V. Ex.ª acaba de dizer. São 3 minutos a cada grupo parlamentar para cada voto ou para todos os votos?

O Sr. Presidente: - Se fossem 3 minutos para cada voto, gastaríamos 60 minutos ou mesmo cerca de 90 minutos.
A minha sugestão foi de 3 minutos para todos os votos e cada grupo parlamentar realçaria, nesse tempo, os aspectos que entendesse de qualquer dos votos.

O Orador: - Então, eu tinha interpretado bem e, assim, parece-me que não há consenso por parte da minha bancada.
De qualquer maneira, se V. Ex.ª me der 10 segundos para conferenciar com os meus colegas…

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

Pausa.

O Orador: - Sr. Presidente, gostaria de apresentar uma proposta alternativa: a de cada grupo parlamentar usar 5 minutos para a discussão conjunta de todos os votos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, assim gastaríamos 30 minutos na discussão, mais o tempo para a votação… Nunca mais entramos no período da ordem do dia…

O Orador: - Mas, Sr. Presidente, parece-me manifestamente necessário para…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, penso que, dos três votos, dois são comuns. Parece que são três, mas, no fundo, são só dois, a saber, os votos n.os 91/VIII - De saudação ao povo da Sérvia (PS e CDS-PP) e 93/VIII - De saudação ao povo da Jugoslávia (PCP), que são ou a saudação da parte ou a saudação do todo, mas não têm grande divergência.
E a discussão do outro voto, o voto n.º 82/VIII - De saudação à delegação portuguesa aos Jogos Olímpicos de Sidney (PS), penso que também não suscitaria muita divergência.
Portanto, penso que 3 minutos, bem aproveitados, davam para…

O Orador: - Sr. Presidente, 3 minutos sim, mas com alguma tolerância por parte de V. Ex.ª , seguramente.

O Sr. Presidente: - Tolerância, não, Sr. Deputado, porque, aí, já me coloca a responsabilidade de ter de dar igual tratamento a todos os Srs. Deputados e, se houver tolerância para um, haverá para todos… Então, ficamos a meio caminho e vamos estabelecer 4 minutos a cada grupo parlamentar para a discussão conjunta.

O Orador: - Muito bem, Sr. Presidente.

O Sr. António Capucho (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, 2 minutos chegariam para cada um dos votos, mas sugeria o adiamento, para amanhã, de um deles, designadamente do voto n.º 82/VIII - De saudação à delegação portuguesa aos Jogos Olímpicos de Sidney (PS).

O Sr. Presidente: - Amanhã há período de antes da ordem do dia?

O Orador: - Passaria a haver!

O Sr. Presidente: - Não há! A menos que todos queiram que passe a haver…
Estão de acordo que se adie para amanhã a discussão do voto n.º 82/VIII?

Pausa.

Muito bem. Então, fica adiada, para amanhã de manhã, a discussão do voto n.º 82/VIII e o Sr. Vice-Presidente que presidir à sessão tomará isso em conta. Se ele se esquecer, agradeço que lho recordem.
Em todo o caso, a agenda para amanhã também é um pouco extensa. Mas, enfim, é só um voto.

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O Sr. Laurentino Dias (PS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, a propósito da ordem de trabalhos, gostaria de dizer que sou o primeiro subscritor do voto n.º 82/VIII - De saudação à delegação portuguesa aos Jogos Olímpicos de Sidney (PS). Este voto deu entrada na Mesa há mais de 15 dias (fez terça-feira passada 15 dias) e tem a ver com a participação de Portugal nos Jogos Olímpicos, que acabaram há quase três semanas.
É a quinta vez que este voto é adiado, o que me parece pouco razoável, Sr. Presidente, pelo que apelava a V. Ex.ª, no sentido de, com os grupos parlamentares, se encontrar 1 minuto que seja, ou 2 minutos, para se proceder à discussão deste voto - o tempo dessa discussão também merece a pena.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, essa é uma visão das coisas perfeitamente justificada. A outra é que os Srs. Deputados deviam ter isso em conta quando se inscrevem, em grande número, para fazer declarações políticas e intervenções de interesse político relevante, com os respectivos pedidos de esclarecimento e respostas, no período de antes da ordem do dia. Os Srs. Deputados deviam ter isso em conta, sabendo que há limites temporais - é que não se pode «meter o Rossio na Rua da Betesga»! Além disso, já estamos no limite do prazo do período de antes da ordem do dia e já há muita tolerância por parte da Mesa.
Se os Srs. Deputados não chegam a acordo no sentido de discuti-los todos em conjunto dentro dos 3 minutos que a Mesa concede, ou até dos 4 minutos a que a Mesa já tinha acedido, a discussão e votação desse voto terá de ficar para amanhã.
Sr. Deputado António Capucho, vamos estabelecer 4 minutos a cada grupo parlamentar e discuti-los em conjunto?

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, Srs. Deputados, vamos proceder à discussão conjunta dos votos n.os 82/VIII - De saudação à delegação portuguesa aos Jogos Olímpicos de Sidney (PS), 91/VIII - De saudação ao povo da Sérvia (PS e CDS-PP) e 93/VIII - De saudação ao povo da Jugoslávia (PCP), dispondo cada grupo parlamentar de 4 minutos para o efeito.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Laurentino Dias.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Esforçar-me-ei por dar o exemplo, Sr. Presidente, e, em pouco mais de 1 minuto, apresentar a razão do voto relativo aos jogos olímpicos.
O PS apresentou um voto em que faz duas saudações: uma delas, à delegação de Timor nos jogos olímpicos. De facto, foi a primeira vez que Timor, embora sob bandeira do Comité Olímpico, participou na comunidade desportiva internacional e penso que este Plenário não pode deixar de saudar essa delegação.
Relativamente à outra saudação, à equipa olímpica portuguesa, cuja actuação entendemos ser globalmente positiva, aproveito para acrescentar a essa saudação a honra e a homenagem de ler aqui, para justificar esse voto, aquilo que, hoje, num jornal diário, o Sr. Mário Moniz Pereira diz sobre esta matéria. Diz ele o seguinte: «Como é possível que pessoas que não percebem nada de desporto tenham a lata de falar de cátedra sobre os jogos olímpicos do modo como alguns falam. Portugal ganhou duas medalhas de bronze em Sidney: uma, pela Fernanada Ribeiro, nos 10 000 m, na mais fabulosa prova da história da distância, e outra, pelo Nuno Delgado, no judo. Mas, além das medalhas, teve mais uma mão cheia de resultados de honra: Miguel Maia, João Brenha, Gustavo Lima, Miguel Nunes, Álvaro Marinho, João Costa, Michel Almeida, Afonso Domingos, Diogo Caiola, Pedro Caravana, Carlos Calado, Teresa Machado, Maria José Schuler e outros. Ou seja, 20 atletas, entre os 16 melhores do mundo. Isso é mau?! Em que áreas Portugal se poderá dar a este luxo? Só mesmo quem não sabe nada de desporto, quem não sabe nada de jogos olímpicos ou quem julga que tem capacidade para falar de tudo é que pode considerar maus os resultados portugueses de Sidney».
Sr. Presidente, são palavras de Mário Moniz Pereira, que, pela 12.ª vez, esteve nos Jogos Olímpicos de Sidney, e que é a maior autoridade de Portugal a falar sobre esta matéria.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pires da Silva.

O Sr. Pires da Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, sendo esta a minha primeira intervenção nesta Câmara, quero cumprimentar V. Ex.ª e, por intermédio de V. Ex.ª, todas as Sr.as e Srs. Deputados.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado. Desejo-lhe as maiores felicidades.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Também o Partido Popular saúda os atletas, treinadores e dirigentes do Comité Olímpico que integraram a delegação portuguesa aos Jogos Olímpicos de Sidney.
Também o Partido Popular se congratula com as medalhas de bronze conquistadas, no judo, por Nuno Delgado e, no atletismo, por Fernanda Ribeiro. Foram, na verdade, as únicas jóias da coroa!
Consideramos fundamental que se invista na modernização de infra-estruturas e na valorização da prática desportiva, com vista a um programa nacional de desenvolvimento desportivo sério e sustentado.
Congratulamo-nos vivamente com a presença da delegação de Timor-Leste, ainda que sob a bandeira do Comité Olímpico Internacional. Esperamos ver em Atenas uma delegação alargada sob a bandeira da sua independência.
Merece também o nosso maior apreço a medalha de ouro conquistada, no atletismo, pela moçambicana Maria de Lourdes Mutola, que enalteceu internacionalmente as raízes lusófonas.
Todavia, não podemos deixar de lembrar as intenções do Executivo no Programa do Governo, onde, explicitamente, se reconhecia a «importância dos resultados de relevo conseguidos pelos desportistas portugueses, pelo que se desenvolverão programas específicos visando

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o apoio à alta competição e à preparação atempada para os Jogos Olímpicos».
Na prática, os resultados de relevo limitaram-se a duas medalhas de bronze e o Governo ficou-se pelas intenções.
Serão quatro anos suficientes para uma preparação atempada, quando assistimos a países com projectos de preparação de 12 a 16 anos?
É, sem dúvida, relevante o facto de a fundação do desporto incluir, no seu programa de actividades, um projecto de apoio às carreiras desportivas e escolares de atletas que sejam considerados «esperanças olímpicas», com vista aos Jogos Olímpicos de Atenas 2004.
No entanto, mais uma vez, estamos a fazer projectos a quatro anos!
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, não podemos pensar que os resultados aparecem só por si.
Para finalizar, permitam-me que diga que é fundamental a aposta no desporto escolar. Não se pode descurar a falta de pavilhões gimnodesportivos nas escolas, porque, de facto, é aí que começa!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hermínio Loureiro.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao analisarmos a participação portuguesa nos Jogos Olímpicos de Sidney, e sem prejuízo do esforço da generalidade dos atletas participantes e de algumas excelentes prestações, importa reconhecer que os resultados obtidos ficam aquém das expectativas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não queremos deixar de evidenciar o empenho dos atletas, dos treinadores, dos dirigentes e das respectivas federações que representaram Portugal nos Jogos Olímpicos de Sidney.
Saudamos de forma particular a Fernanda Ribeiro e o Nuno Delgado.
Reconhecemos o esforço, o empenho e a dedicação de todos. Sabemos das inúmeras horas de treino e de sacrifício antes e durante os jogos e sabemos que tudo fizeram para honrar o nome de Portugal.
Agora, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, este voto apresentado pelo Partido Socialista é, desculpem-me o termo, uma pura hipocrisia!

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Ele serve para tentar branquear a ausência de uma política desportiva do Governo socialista.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Este voto é a confissão clara e inequívoca que muito pouco ou quase nada foi feito nos últimos cinco anos!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Queremos perceber porque é que existe um atraso cada vez maior em relação a países que nos estão próximos ou que têm uma dimensão semelhante à nossa!
É preciso incutir cultura e espírito de ambição ao desporto português, pois ele é, hoje em dia, um meio de formação e lazer, mas é também um meio de competição onde os Estados projectam a sua imagem internacional.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: «Os resultados de Portugal nos Jogos Olímpicos de Sidney foram maus, mas se não mudar muita coisa, em Atenas serão iguais ou piores». Quem disse isto foi o ex-Ministro das Finanças do Governo socialista, Prof. Sousa Franco, mas ele ainda acrescentou mais: «É preciso analisar o que falta na política de desporto que temos, ou não temos»!
Queremos olhar para o desporto português com seriedade! Dizer sim a este voto seria passar uma esponja sobre a realidade e pactuar com os muitos erros que o Governo socialista tem feito no desporto português! Por nós não o fazemos! A nossa opção desportiva é outra e está para além de um mero voto! O que queremos é uma outra política, uma outra ambição desportiva, uma nova cultura desportiva! Enfim, uma mentalidade desportiva para o século XXI!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.
Antes de iniciar a intervenção, informo-o de que dispõe de 1 minuto e 20 segundos para o efeito.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, tentarei dizer o que penso acerca destes dos votos n.os 91 e 93/VIII dentro do tempo de que disponho.
Em relação ao voto n.º 93/VIII, da autoria do PCP, é fácil dizer algo, porque o próprio intróito do voto é explicativo. No fundo, trata-se de um manifesto descontentamento popular com o regime de Slovodan Milosevic, apesar do que foi dito antes.
Isto significa que o regime de Milosevic não era propriamente agradável e simpático; antes pelo contrário, era um regime que continha em si mesmo dois tipos de política: uma política interna, que era opressiva e manipuladora, e uma política externa, que era geradora de conflitos, agressiva e que produziu sucessivos e trágicos conflitos, quer na Bósnia, quer na Croácia, quer na Eslovénia, quer no Kosovo.
De facto, o que aconteceu depois foi que a história das eleições jugoslavas e da tentativa de viciação dos seus resultados - embora apreciada, na altura, pelo Sr. Deputado António Filipe - acabou por fazer com que a revolução acontecesse, e bem. E esta aconteceu para instituir um regime democrático. E hoje, se bem que a questão jugoslava não esteja totalmente resolvida, há pelo menos um princípio de que o povo jugoslavo elegeu o seu intérprete democrático e é esse intérprete democrático que tratará da questão jugoslava com a comunidade internacional.
Dito isto, apenas queremos …

O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Orador: - … endereçar ao povo jugoslavo, ou sérvio, como entenderem, o nosso desejo de que as privações e as provações de que foram objecto, em função de um regime como aquele que esteve à sua frente, acabem e de que se faça a paz no Kosovo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.
Sr. Deputado, tem 1 minuto e 42 segundos para intervir, mas a Mesa arredonda esse tempo para 2 minutos, tal como fez em relação ao PCP.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há cerca de duas semanas discutimos aqui votos sobre a situação na federação jugoslava, na sequência das eleições gerais.
Na altura, o Bloco de Esquerda teve ocasião de apresentar um voto que estabelecia, claramente, o respeito pelos resultados eleitorais, a alteração da situação e a democratização na federação jugoslava, mas que não embarcava no conteúdo geral de outros votos que aqui foram apresentados, que incensavam a operação da NATO, o bombardeamento da Jugoslávia e do Kosovo, e que estabeleciam até uma certa relação directa de causa/efeito entre a operação da NATO e os resultados subsequentes que vieram a ocorrer na Jugoslávia.
Não temos o entendimento de que não foi a operação da NATO que causou esses resultados e continuamos a deplorar aquilo que, na nossa opinião, foi uma actividade ilegal de um conjunto de países da comunidade internacional e uma agressão ilegal aos povos da federação Jugoslava e do Kosovo.
Os votos que aqui se apresentam, hoje, já vêm, felizmente, numa sequência em que está claramente eleito um novo presidente na Sérvia e em que fazemos votos para a estabilização e o desenvolvimento do país.
No voto que apresentámos há duas semanas apelámos à normalização das relações e ao levantamento de sanções e esperamos que tudo se encaminhe nessa direcção.
Temos algum regozijo em ver que, de facto, o Presidente Kostunica não é, está muito longe disso, um incondicional defensor da NATO. Talvez isso seja uma razão para que alguns Deputados, nesta Câmara, «torçam um pouco a orelha» e deixem uma sombra de suspeita sobre o que poderá seguir-se, agora, na federação jugoslava.
Quero dizer que o Bloco de Esquerda, tendo já assumido a sua posição há duas semanas, não viu necessidade de apresentar um novo voto.
Vamos apoiar o voto do Partido Socialista no entendimento de que este voto, quando se refere ao isolamento internacional a que foi votado o presidente Milosevic, …

O Sr. Presidente: - Terminou o tempo, Sr. Deputado.

O Orador: - … não se confunde com a operação militar da NATO, e de que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, como disse expressamente que faria, vai retirar do voto a expressão de que a federação jugoslava deve integrar o Pacto de Estabilidade dos Balcãs, porque, a nosso ver, isso é uma ingerência na política interna da Jugoslávia.
Apoiaremos igualmente o voto n.º 93/VIII do Partido Comunista Português.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Reis. Dispõe de 2 minutos.

O Sr. António Reis (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No dia 5 de Outubro, em Belgrado, foi reimplantada a República no seu significada mais rico e mais profundo de vivência colectiva dos ideais de liberdade e de igualdade perante a lei, de fraternidade e de exercício do direito à cidadania.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Milosevic, o criminoso de guerra dos massacres de Vukovar, de Srebrenica e de Rakac, o megalómano nacionalista da grande Sérvia, foi, finalmente, afastado do poder.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Foi, sem dúvida alguma, uma grande vitória do povo sérvio, mas temos de reconhecer que essa vitória foi largamente facilitada pela constante e determinada pressão internacional exercida quer pela União Europeia quer pelos Estados Unidos da América.
São graves e muito difíceis os desafios que esperam, agora, o Presidente Kostunica, nomeadamente na definição do estatuto do Kosovo e do Montenegro.
Por isso, tem extrema importância que a comunidade internacional, nomeadamente a União Europeia, possa dar uma ajuda económica fortíssima ao povo jugoslavo, ao povo da sérvio, e à República Federal da Jugoslávia, neste momento, de forma a ajudar o Presidente Kostinuca a enfrentar e a vencer os desafios que tem pela frente.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, também temos de estar atentos para que Milosevic não venha a converter-se numa espécie de Pinochet da Jugoslávia, para humilhação dos seus povos e para vergonha da comunidade internacional.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, com a duração de 2 minutos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP apresentou um voto de saudação ao povo da República Federal da Jugoslávia.
O povo jugoslavo encetou um processo de mudanças políticas, na sequência da realização, em 24 de Setembro, de eleições presidenciais, legislativas e locais, num quadro político, económico e social dramático e de uma enorme complexidade, de onde avultam quase uma década de injustas e severas sanções internacionais; enormes destruições causadas pelos bombardeamentos da NATO, que deixaram atrás de si um imenso lastro de perda de vidas humanas, de postos de trabalho, de equipamentos e infra-estruturas, para além de terríveis consequências ambientais; a ocupação militar da província do Kosovo por tropas da NATO, dando aval à consumação de uma limpeza étnica determinada por radicais albaneses; apoios internacionais explícitos às forças separatistas do Montenegro; inadmissíveis pressões e ingerências externas, assumidamente exercidas, visando condicionar a expressão da vontade dos eleitores jugoslavos; e também uma forte vontade de mudança, resultante de um manifesto descontentamento popular, pelo qual a acção de Slovodan Milosevic foi largamente responsável.
Numa situação cujos desenvolvimentos são ainda, em larga medida, imprevisíveis, importa registar o acordo obtido entre os principais partidos representados no parlamento, eleito em 24 de Setembro último, visando

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assegurar uma solução governativa, bem como os esforços já encetados pelas novas autoridades jugoslavas com o objectivo de defender a sua soberania e integridade territorial.
Saudamos, por isso, o povo jugoslavo com a coerência de quem nunca apoiou as sanções e os bombardeamentos que o vitimaram e de quem sempre respeitou a sua dignidade e o seu direito a decidir, livre e soberanamente, o seu próprio destino.
Saudamos o povo jugoslavo sem os problemas de consciência dos seus agressores que perpassam, de ponta a ponta, no voto apresentado pelo PS.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto n.º 82/VIII - De saudação à delegação portuguesa aos Jogos Olímpicos de Sidney (PS).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, do CDS-PP e do BE e votos contra do PSD.

É o seguinte:

Voto n.º 82/VIII
De saudação à delegação portuguesa aos Jogos Olímpicos de Sidney (PS).

A Assembleia da República saúda os atletas, treinadores, dirigentes associativos e do Comité Olímpico que integraram a delegação portuguesa aos Jogos Olímpicos de Sidney, na Austrália.
Reconhecendo a dignidade da representação nacional e o nível positivo global dos resultados desportivos, com destaque para as medalhas de bronze de Nuno Delgado e Fernanda Ribeiro, a Assembleia da República deseja que, da análise da presença portuguesa nos jogos, resulte um programa nacional de desenvolvimento desportivo sério e sustentado, assumido pelo movimento associativo no âmbito das diferentes modalidades desportivas e manifesta o seu empenhamento na criação de condições e meios que assegurem um reforço dos apoios da administração central e local no quadro do alargamento da participação desportiva, da modernização das infra-estruturas e da generalização e valorização da prática desportiva.
A Assembleia da República saúda igualmente a representação de Timor que, embora sob bandeira do Comité Olímpico Internacional, participou nos jogos, afirmando a sua nova realidade no movimento desportivo internacional e manifesta o desejo de que Portugal contribua, com meios financeiros e técnicos, para que a prática desportiva em Timor seja um factor decisivo de formação da sua juventude e de desenvolvimento e paz social.

O Sr. Presidente: - Este voto será levado ao conhecimento do Sr. Ministro da Juventude e do Desporto e do Comité Olímpico de Portugal.
Srs. Deputados, agora vamos votar o voto n.º 91/VIII - De saudação ao povo da Sérvia (PS e CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS-PP e do BE e votos contra do PCP.

É o seguinte:

Voto n.º 91/VIII
De saudação ao povo da Sérvia (PS e CDS-PP)

No dia 5 de Outubro de 2000 o povo sérvio revoltou-se em massa contra o regime de Slovodan Milosevic e o seu governo, impondo o respeito pela expressão da sua própria vontade nas recentes eleições presidenciais jugoslavas, contra a manipulação, a intimidação e a fraude, e conquistando, assim, a sua liberdade.
A Assembleia da República, reunida em sessão plenária no dia 12 de Outubro de 2000, regozija-se com esta conquista corajosamente alcançada e para a qual contribuiu o isolamento internacional a que foi votado o regime de Milosevic; saúda o Presidente Kostunica, desejando-lhe o maior êxito no desempenho da sua missão com vista à criação e consolidação de novas instituições democráticas na república federativa jugoslava e à resolução do problema do Kosovo nos termos das resoluções aplicáveis das Nações Unidas; apoia o levantamento das sanções contra a República Federativa da Jugoslávia, com excepção das disposições que afectam Milosevic e a elite política e empresarial a ele associada.

O Sr. Presidente: - Este voto vai ser levado ao conhecimento do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto n.º 93/VIII - De saudação ao povo da Jugoslávia (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PCP e do BE.

Era o seguinte:

Voto n.º 93/VIII
De saudação ao povo da Jugoslávia (PCP)

Nos últimos dias, na sequência da realização de eleições presidenciais, legislativas e locais, o povo da República Federal da Jugoslávia encetou um processo de profundas mudanças políticas, num quadro político, económico e social complexo e dramático, fortemente marcado por quase 10 anos de sanções internacionais, por enormes destruições causadas pelos bombardeamentos da NATO, por intoleráveis pressões e ingerências externas e também por um manifesto descontentamento popular perante a acção do regime personificado em Slovodan Milosevic.
A Assembleia da República, reunida em sessão plenária em 12 de Outubro de 2000, expressa a sua solidariedade ao povo da Jugoslávia, no respeito pelo seu inalienável direito a decidir livre e soberanamente o seu destino, sem pressões e ingerências externas; apela ao levantamento de todas as sanções que afectam o povo jugoslavo e à normalização das relações com a República Federal da Jugoslávia, no respeito pela sua soberania e integridade territorial.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 17 horas.

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ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos iniciar a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 238/VIII - Reciclagem e regeneração de óleos usados e de solventes (PSD).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Pensar numa política de ambiente para o começo do terceiro milénio é, antes de mais, equacionar e reflectir sobre a sociedade e os cidadãos e a sua capacidade de percepção e determinação para a necessária mudança global de atitudes perante a utilização dos recursos naturais e a conservação do património ambiental do planeta.
De entre os diversos desafios que se colocam às várias regiões e às suas populações, a luta pelo direito a um ambiente são e equilibrado, suporte biofísico do desenvolvimento sócio-económico e premissa para a qualidade de vida e bem-estar, constitui, sem dúvida, pela sua transversalidade e globalidade, um dos principais e mais decisivos desafios.
Pensar globalmente e actuar localmente numa partilha de direitos e responsabilidades terá de ser o paradigma da civilização actual e é a via única para o bem-estar, para o desenvolvimento colectivo da humanidade ou até mesmo para a sua sobrevivência.
Os recursos ambientais e, de entre estes, os recursos vivos, naturalmente associados à biodiversidade, são já hoje assumidos como uma valia económica, em pé de igualdade com os recursos alimentares, energéticos ou minerais. Portugal, inserido no espaço da União Europeia, terá forçosamente de seguir uma política de ambiente que dê seguimento aos nossos compromissos internacionais e comunitários, sobejamente conhecidos.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Na matéria que hoje discutimos, embora os compromissos internacionais e comunitários sejam exactamente os objectivos que o PSD persegue com a apresentação deste diploma, a verdade é que é preciso, no início deste debate, para discutir seriamente, recusar a mistificação que o Governo quis impor aos portugueses, desde 1997, ao pretender reduzir o debate do tratamento dos resíduos industriais perigosos à pífia questão da co-incineração.
A táctica é sobejamente conhecida: quando há pouco a apresentar, o barulho sempre vai disfarçando a ausência de iniciativa e de concretização.
Sr. Presidente, Colegas Deputados: A gestão dos resíduos industriais, em especial, de entre estes, dos tóxicos e perigosos, assume indubitavelmente o perfil de um dos maiores e mais desafiantes problemas ambientais dos nossos tempos.
Consequência directa dos processos de desenvolvimento das sociedades modernas, a produção de resíduos representa um custo, não apenas ambiental mas, de igual modo, social, de saúde pública e de segurança que, por isso mesmo, deve ser passível de expressão económica.
A análise dos ciclos de vida dos diversos bens e produtos, desde a sua concepção, produção e utilização, até à rejeição final, espelha, de forma clara e evidente, a co-responsabilidade que atravessa e compromete todos os actores neles envolvidos, desde os seleccionadores das matérias-primas até aos promotores do design, passando, naturalmente, pelos distribuidores e pelos consumidores.
Daqui resulta não poder a problemática da gestão dos resíduos deixar de ser analisada e assumida senão de uma forma global e integrada, co-responsabilizando, na justa extensão dos seus contributos para o peso final do sistema, todos os actores e intervenientes, desde o Estado e respectivos órgãos aos cidadãos e restantes agentes económicos, todos eles, ao fim e ao cabo, beneficiários finais directos dos bens e serviços produzidos na comunidade em que se integram e, por essa via, colocados à sua disposição.
Desde há muito se tornou pacífico, adquirido e consabido que qualquer sistema destinado à gestão de resíduos, ou que, pelo menos, a tal qualificativo, com rigor e isenção técnica, legitimamente pretenda aspirar, terá de assentar prioritariamente e em sucessão ordenada em certos princípios.
Em primeiro lugar, terá de assentar na prevenção e na redução da produção dos resíduos. Em segundo lugar, na identificação dos locais da sua produção, do tipo de resíduos produzidos, da sua inventariação e rigorosa caracterização. Em terceiro lugar, na implementação, promoção e multiplicação das actividades de valorização dos resíduos, designadamente da sua reutilização, regeneração e reciclagem. Em quarto lugar, e só depois da consabida teoria dos três rr, no suporte e incentivo à neutralização ou redução da sua perigosidade e volume mediante o adequado tratamentos físico-químico. Em quinto lugar, na sua valorização energética através da co-incineração ou da incineração dedicada. Em sexto lugar, finalmente, na deposição em aterro ou na exportação de resíduos eventualmente sobrantes.
São, de resto, as legislações, tanto nacional como comunitária, que vertem abundantemente estes princípios de hierarquização de procedimentos e de precedentes. Desta forma, torna-se evidente que será ao Estado, em primeira instância, que caberá o papel de garante de todo o processo, não sendo, então, de descurar não só o seu papel de referencial ao nível do necessário arbítrio na distribuição parcimoniosa dos contributos e encargos dos vários agentes envolvidos na cadeia do sistema descrito, como também toda a gama de apoios, incentivos e estímulos que a estes devem ser proporcionados pelos poderes públicos enquanto orientadores dos percursos e das prioridades a percorrer.
Deste modo, as chamadas soluções de «fim-de-linha», como a valorização energética, só poderão vir a ser adoptadas desde que integradas num contexto de actuação global e sistematizada que leve em linha de conta as prioridades atrás descritas. Aliás, a situação já teve um case study prático e foi ilustrada recentemente com a condenação da Alemanha, em Setembro de 1999, enquanto Estado-membro da União Europeia, pelo Tribunal de Justiça das Comunidades, por haver optado pela co-incineração de resíduos industriais prioritariamente à regeneração de óleos usados e de solventes.
A instância judicial europeia considerou, então, que tal prática consubstanciava, sem sombra de dúvida, uma violação da Directiva n.º 75/439, alterada pela Directiva n.º 87/101/CEE, do Conselho.
Não obstante, em Portugal, o Governo acaba sempre por trazer à baila a mesma solução, isto é, a «queima» apriorística dos resíduos industriais perigosos através do método da co-incineração em unidades cimenteiras.

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Deste modo, impõe-se introduzir na gestão dos resíduos industriais a adoptar no nosso país os princípios e as lógicas universalmente consolidados, que apontam para uma valorização não energética de todos os resíduos cujas características os tornem passíveis, designadamente, de reutilização, de reciclagem ou de regeneração.
Assim, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Caros Colegas Deputados, sobre a matéria do tratamento adequado a dar aos óleos e solventes, é novamente o PSD a propor ao País legislação reguladora da actividade.
Em 1992, legislámos no sentido de consagrar um sistema assente na colaboração dos empresários. Oito anos depois, considerando que Portugal é o único país da União Europeia em que os óleos usados têm um valor comercial positivo, o que, naturalmente, contribui para desregular todo o sistema e tem efeitos graves do ponto de vista ambiental e de saúde pública;
Considerando que, ao fim de cinco anos, é manifesta a falta de iniciativa do Governo, quer para pôr em prática a hierarquização de prioridades da União Europeia em matéria de tratamento de resíduos industriais perigosos, quer para fazer cumprir a legislação nacional em vigor (só para citar um exemplo, um estudo recentemente divulgado pela Querqcus demonstra que nem as regras da Portaria n.º 240/92, de 25 de Março, que proíbem a utilização, como combustível, de óleos usados em indústrias de alimentação está a ser cumprida e que, em muitos casos, ainda há, em Portugal, queima de óleos usados nos fornos das padarias, o que faz com que, naturalmente, nenhum dos presentes possa garantir que a carcacinha do pequeno-almoço não estava cheia de metais pesados, nomeadamente de cádmio, entre outros);

Protestos do PS.

Considerando ainda que a maioria do óleo recolhido em Portugal tem como destino final a queima sem tratamento prévio ou o despejo directo no meio ambiente;
Considerando, por último, que, em Portugal, não existe fiscalização, nem sequer campanhas de informação e sensibilização dos diversos agentes do mercado, é novamente o PSD, na vanguarda da discussão de política ambiental, como várias vezes aconteceu, a trazer esta matéria para decisão à Câmara alta da política portuguesa.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, os óleos usados são, de entre os resíduos industriais, dos mais perigosos: 1 litro de óleo usado pode poluir um milhão de litros de água; a queima de 5 litros de óleo polui a mesma quantidade de ar que um ser humano respira durante 3 anos; 1 litro de óleo pode formar uma película de 4000 m2 num sistema aquífero.
Ora, como estamos, graças a Deus, ao mesmo tempo, a falar de um resíduo que pode ser reciclado indefinidamente, sendo que, em cada 3 litros de óleo usado podemos obter 2 litros de óleo novo, e que ninguém contesta que a regeneração reduz as emissões de dióxido de carbono, de óxido de azoto e de outros gases com efeito de estufa, é, por isso mesmo, tempo de Portugal ter, de uma vez por todas, um sistema nacional de reciclagem e regeneração de óleos usados e solventes tal como este ora proposto.
Trata-se de um sistema que proíbe a venda de óleos em estabelecimentos que não assegurem a sua recolha. Em Portugal, como todos sabem, é possível ir ao hipermercado comprar uma embalagem de óleo e, a seguir, deitar no lixo aquele que se tirou do carro. Nem no Brasil isto acontece!

O Sr. Casimiro Ramos (PS): - Lá não há óleo!

O Orador: - O sistema proposto pelo PSD estabelece o princípio da gratuitidade de recolha, sem o qual nunca poderá haver a regulação económica necessária ao funcionamento do mercado da regeneração, como é unanimemente sabido.
É um sistema, em suma, que co-responsabiliza o Estado para que, sob a sua iniciativa e à semelhança do que se faz nos bons exemplos de Itália, de França ou até da Catalunha, aqui mais perto, permita, através de um sistema de ecotaxas e de concessões, promover, por um lado, a responsabilidade dos agentes e, por outro lado, a eficácia do processo, de sorte a que, de uma vez por todas, se caminhe finalmente no sentido de uma adequada gestão ambiental destes resíduos.
Por último, o PSD orgulha-se igualmente de trazer a esta Câmara uma proposta elaborada, fruto de muitas horas de reuniões, com organizações não governamentais, com empresários e com o meio académico, depois de muitas visitas a todas as unidades industriais envolvidas neste processo, em Portugal, e depois de um acompanhamento sério e discutido com todos os parceiros sociais.
Entendemos que a política não deve só servir a sociedade, deve também resultar desta interacção com a sociedade.
É nesse espírito que, antecipando a questão, o PSD vos transmite, desde já, a disponibilidade para, em sede de especialidade, proceder à alteração do ora proposto artigo 5.º, de modo a que, após a certificação da entidade regeneradora, se possa proceder à combustão apenas dos óleos que não possuam qualidade para serem regenerados, excluindo sempre, obviamente, em qualquer caso, a mera destruição térmica por processo de co-incineração.
Aqueles que abanam a cabeça provavelmente estão hoje tristes por terem recebido, como receberam ontem todos os grupos parlamentares, a comunicação da Quercus, uma organização não governamental de pergaminhos reconhecidos e insuspeita de qualquer alinhamento pelo PSD, que diz o seguinte: «A Quercus apela ao consenso entre os partidos políticos com assento parlamentar de forma a ser aprovado o projecto de lei da autoria do PSD sobre a reciclagem e regeneração de óleos usados e solventes, que prevê que, em Portugal, dentro de um prazo a definir na lei em discussão, somente seja permitida a reciclagem e a regeneração desses dois tipos de resíduos, em detrimento de processos como a incineração, a co-incineração ou como a queima desses resíduos.»
Assim, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, chegados a este ponto, depois de todas as bancadas já terem, nos debates da passada sessão legislativa, tecido loas à estratégia dos três rr, é hoje o dia de finalmente sabermos se essas afirmações correspondiam a um sentimento genuíno ou a um pregão de ocasião.
No caso particular da bancada da maioria, um voto contra certamente contribuirá para nos esclarecer melhor a todos sobre o alcance do compromisso do Governo com as cimenteiras, por via do qual nos tem sido imposta co-incineração a martelo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Renato Sampaio e Casimiro Ramos.

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Tem a palavra o Sr. Deputado Renato Sampaio.

O Sr. Renato Sampaio (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Eduardo Martins, a intervenção que V. Ex.ª fez na Câmara não se refere, com certeza, a todo o projecto de lei apresentado. É minha convicção, pelo que entendi, que se refere exclusivamente ao preâmbulo do projecto de lei, o qual expressa princípios genéricos - é verdade! -, que são correctos e até subscrevemos. Porém, o conteúdo normativo do projecto de lei apresentado é contraditório com o seu preâmbulo. E é sobre o conteúdo normativo que eu gostaria que o Sr. Deputado respondesse a algumas questões.
O projecto de lei, ao desresponsabilizar as empresas produtoras e distribuidoras de óleos usados, cometendo ao Estado o princípio de ser ele próprio a resolver esta questão, está a subverter um princípio consagrado em toda a legislação nacional e comunitária: o princípio do «poluidor-pagador». Ou seja, o Sr. Deputado, com esta medida, subverte completamente este princípio.
O projecto de lei não só atribui ao Estado em concessão exclusiva a resolução deste problema, revelando uma visão demasiadamente estatista e monopolista, como também assenta num pressuposto errado, o de atribuir aos óleos usados um estatuto não de resíduo mas de matéria-prima de interesse estratégico para o próprio Estado; ou seja, há uma grande confusão entre se o óleo é um resíduo ou uma matéria-prima.
Por outro lado, o projecto de lei estabelece uma grande confusão entre a valorização energética e a queima. Ou seja, o diploma proíbe a valorização energética mas não a queima.
Gostaria, portanto, que o Sr. Deputado nos esclarecesse claramente sobre estas três questões.
Sr. Deputado, quero ainda dizer que, se, por absurdo, este projecto de lei vier, eventualmente, a ser aprovado, seremos o único país do mundo a não aceitar que os óleos usados e solventes sejam uma valorização energética, como destino final. Concordo em que há vários destinos possíveis, mas o proposto no vosso diploma não pode ser o único.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Eduardo Martins, há ainda outros pedidos de esclarecimento. Deseja responder já ou no fim?

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sendo assim, tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro Ramos.

O Sr. Casimiro Ramos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Eduardo Martins, ouvimos a sua intervenção sem estranhar o facto de não ter passado da exposição de motivos, do plano das intenções, porque, com o diploma do PSD, seria difícil passar do plano das intenções à prática, isto é, ao articulado.
Logo no artigo 1.º - Âmbito, o PSD diz que elabora este projecto de lei em conformidade com o artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 239/97, de 9 de Setembro, pela nova redacção que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei n.º 321/99, de 11 de Agosto. Ora, o Decreto-Lei n.º 321/99, de 11 de Agosto, não atribui qualquer nova redacção ao artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 239/97, de 9 de Setembro, legisla sobre a Secção II do Capítulo III, ou seja, sobre resíduos industriais banais, sendo que, neste caso, estamos a falar de resíduos industriais perigosos.
Com boa vontade poderemos ultrapassar o enquadramento legislativo deficiente que o PSD deu ao projecto de lei, difícil será ultrapassar todo o articulado, através do qual V. Ex.ª não consegue passar à prática o que fica no plano das boas intenções: uma gestão global e integrada dos resíduos.
Ora, há quatro diplomas do PSD em comissão sobre esta matéria; contudo, o PSD traz à discussão simplesmente um deles. Elimina a quarta medida das hierarquias preconizadas no preâmbulo, só intervindo na terceira. Será isto uma gestão global? Se este não é um projecto de lei de fim de linha é, pelo menos, de meio de linha.
Sr. Deputado, propor a elaboração de um sistema nacional de reciclagem, preconizando a nacionalização das empresas que hoje se dedicam à regeneração deste tipo de produtos, não sei se significa uma nova forma de Estado que o PSD defende ou se é um contributo para o CDS-PP como considerar aquilo que é a vossa visão de nacionalizar empresas, hoje em dia.
Por tudo isto, para além de haver um conjunto de medidas que o diploma preconiza mas que não quis escalpelizar, porque, logicamente, fazer propostas de incentivos e de ecotaxas, que simplesmente conduziriam à produção de mais resíduos, pois estaria a propor incentivos não à redução da produção de resíduos mas ao funcionamento e financiamento do sistema, seria difícil justificar a sua proposta.
Ficou claro na parte final da sua intervenção que propõe uma alteração ao artigo 5.º, aliás, o próprio texto já tinha a duplicação do artigo 4.º. Ou seja, depois de tanto trabalho, de ouvir tantas entidades, de tantas horas de reuniões, de anunciar, por duas ou três vezes, que iria apresentar este projecto de lei, o Sr. Deputado propõe uma alteração ao artigo 5.º, reconhecendo que o mesmo está errado e anunciando à Câmara que pretende que ele seja «chumbado».
Deveríamos ter aqui um trabalho sério, mas, de facto, o projecto de lei em causa é pontual, contraditório, extemporâneo e tecnicamente incorrecto, não contribuindo rigorosamente em nada.
Sr. Deputado, pergunto: é fácil para si admitir que não é por aqui que consegue alcançar o que está no plano das boas intenções?

A Sr.ª Natalina Moura (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Sr. Presidente, Caros Colegas, muito obrigado pelas dúvidas que colocaram, até porque espelham, em primeiro lugar, e é isto que conta, que VV. Ex.as ou não leram ou, pior do que isso, não perceberam o que está escrito.

O Sr. António Capucho (PSD): - As duas coisas!

O Sr. Casimiro Ramos (PS): - Não se percebe!

O Orador: - Comecemos pelo princípio, pela curiosa acusação de estatização do sistema por quem tem procurado centralizar todas as actividades na área do ambiente.

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É de estranhar que quem tem suportado, como os senhores, uma actividade centralizadora em matéria de gestão de resíduos sólidos urbanos e anda a propor ao País uma actividade centralizadora em matéria de água considere o diploma estatizante, quando não percebe que se trata de concessionar este sistema.

Protestos do Deputado do PS Casimiro Ramos.

Se o Sr. Deputado quiser ouvir, talvez consiga perceber melhor! Se não quiser perceber, não vale a pena calar-se, pode continuar a falar, porque continuarei a responder, e cada um de nós faz o seu monólogo!
O Sr. Deputado tem de perceber que o que o PSD prevê não é a estatização mas, sim, um sistema de concessão igual ao que foi feito na Catalunha, o qual conduz a que, hoje, não haja qualquer investimento especial necessário por parte do Estado, porque as ecotaxas, essas sim, fazem prevalecer o princípio do «poluidor-pagador».
Os senhores, hoje, não têm nada que «roce», nem ao de leve, o princípio do «poluidor-pagador». Se os resíduos têm um valor económico e são vendidos para a queima em padarias, onde é que aqui os senhores têm a aplicação do princípio do «poluidor-pagador»? Quando um resíduo, que qualquer lógica ambiental manda tratar como um custo, tem para os empresários portugueses valor económico para ser vendido, para ser queimado nas padarias, onde é que, aí, os senhores vêem alguma iniciativa para consagrar o princípio do «poluidor-pagador»?

O Sr. Casimiro Ramos (PS): - Não é com este projecto de lei!

O Orador: - Não vêem em lado algum!
Logo, o projecto de lei do PSD tem, desde logo e à cabeça, este princípio essencial, sem o qual não corrige este mercado, que é o de considerar o óleo um resíduo, e, portanto, insusceptível de ser vendido. Parece-me que isto resulta claro e não percebo onde é que viram outra coisa.
Quanto à leitura do artigo 5.º - e deixem-me dizer-lhes que, embora não duvidando dos vossos pergaminhos em matéria de conhecimento ambiental, sinto-me mais reconfortado com o apoio das organizações não governamentais e do Centro de Resíduos da Quercus -,…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … ela é óbvia, não pode ser outra. A verdade, a realidade, é esta, Srs. Deputados: há óleos que, por não serem cumpridas as suas regras de acondicionamento, por não haver em Portugal fiscalização - os senhores nunca foram capazes de promover na área do ambiente a fiscalização, temos 17 fiscais que não saem para a rua, nem de cumprir as regras implementadas pelo PSD em sede de portaria, para que o acondicionamento dos óleos usados fosse feito em condições, nem estas são cumpridas -, estão de tal forma contaminados que são insusceptíveis, infelizmente, de serem regenerados e para estes faz sentido um projecto, como, por exemplo, aquele que o Sr. Secretário de Estado do Ambiente aqui veio defender uma vez, o da Enviroil, que produzirá energia eléctrica, dando aos óleos que não podem ser regenerados um tratamento adequado! Estamos absolutamente de acordo quanto a isto!
Quanto ao mais, se quiserem introduzir alterações ao projecto de lei aprovem-no, na generalidade, e o PSD tem disponibilidade para, em sede de especialidade, discuti-lo convosco.
Quanto a saber que caminho vamos seguir daqui para a frente, é tão simples quanto isto: ou os senhores têm uma iniciativa - uma que seja - para mostrar que acabam com a vergonha de os óleos serem vendidos e queimados «sem rei nem roque», onde muito bem os empresários o conseguem fazer, ou, então, a vossa posição não poderá deixar de ser desligada do contexto do compromisso assumido com as cimenteiras e da vontade de enviar para queima o que pode ser regenerado.
Sr. Deputado, dê lá a volta que der, mas um óleo e um solvente são materiais que só existem uma vez no nosso ecossistema. Quando os queimar, quando deles fizer valorização energética, sabendo-se que eles são produzidos a partir de combustíveis fósseis, não voltam a existir no ecossistema. Esta lógica tem de ser combatida. Temos de regenerar, porque o que queimarmos desaparece de uma vez por todas do nosso ecossistema!
Esta é a convicção do PSD; manifestamente, já vi que não é a vossa!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Natalina de Moura.

A Sr.ª Natalina de Moura (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os problemas ambientais com que nos deparamos hoje, no que concerne ao tratamento de resíduos industriais perigosos, são, em grande parte, resultantes de uma insuficiente, incorrecta ou nula gestão ambiental.
As actividades industriais conduzem, em qualquer circunstância, à produção de resíduos, aos quais há que assegurar destino adequado tendo sempre presente a qualidade de vida das populações.
Se partirmos do princípio que existem cinco parâmetros básicos da gestão ambiental - o da prevenção, o da precaução, o do «poluidor-pagador», o da cooperação e o da subsidariedade -, temos de nos interrogar: por que é que estão atropelados ainda hoje estes princípios e a quem aproveita uma tal situação?
Se nos apoiarmos igualmente na hierarquia dos princípios de gestão de resíduos estabelecidos na estratégia comunitária desde 1989, na estrita observância da prevenção, da valorização e da eliminação final, temos igualmente de nos questionar: face ao crescendo dos resíduos industriais gerados hoje numa sociedade cada vez mais desenvolvida, a que não é alheio o aumento da população, o consumismo desenfreado e, consequentemente, o aumento da produção de resíduos, as soluções que têm vindo a ser preconizadas e, por vezes, adiadas não acarretarão cada vez mais e com maior grau de gravidade problemas para a saúde pública?
A necessidade de uma estratégia coerente para o destino final de todos os resíduos produzidos, designadamente os industriais e, de entre estes, os que pela sua toxicidade - e perdoe-se-me a expressão simplista - maiores dificuldades encontram na sua arrumação, tem exigido uma flexibilidade nas opções a adoptar, face ao respeito que merecem todas as sensibilidades e opiniões em presença.

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As opções estratégicas, por força do que atrás se afirmou, têm sofrido algumas flutuações, convenhamos, por ser igualmente consensual a necessidade da clarificação de alguns pressupostos.
No fundo, todos se têm preocupado com o destino final mais adequado dos resíduos industriais perigosos e aparentemente poderíamos ter hoje o problema, se não totalmente resolvido por força da evolução e da descoberta de novas linhas de actuação, num estado seguramente mais avançado.
Senão, vejamos: o diagnóstico parece estar feito, no mínimo, desde 1985, em que com o Decreto-Lei n.º 488/85, de 25 de Novembro, foram lançadas as bases da política nacional de resíduos, incentivando-se a sua redução e reciclagem; em 1986, a Secretaria de Estado do Ambiente e Recursos Naturais estava na posse do levantamento da produção, tipologia e destino final dos resíduos produzidos em Portugal; entre 1987 e 1990 foi apontado para a gestão dos resíduos industriais um sistema integrado dos mesmos, o Sistema de Trabalho de Resíduos Industriais (STRI); o relatório sobre o estado do ambiente, de 1994, dizia: «A situação actual dos resíduos em Portugal é preocupante, uma vez que a falta de alternativas viáveis empurra a indústria para a descarga dos resíduos da sua produção (…)» e, num outro passo, afirmava ainda «A quantidade de resíduos perigosos produzidos nos diferentes sectores de actividade é de cerca de 1,4 milhões de t/ano, ou seja, cerca de 30% superior aos quantitativos operados em 1986».
Serve isto tão-só para nos interrogarmos se algo não deveríamos ter encontrado realizado nesta matéria.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Da legislação comunitária à nacional se apura a preocupação dominante. É também este o caso do projecto de lei hoje em apreço. A Directiva n.º 75/439/CEE, de 16 de Junho de 1975, nos seus 20 artigos reclama dos governos cuidados especiais, chamando atenção igualmente para os procedimentos a ter em conta quer pelas empresas produtoras quer pelas empresas que recolhem e/ou eliminam óleos usadas, tendo como pano de fundo que a eliminação dos óleos usados se efectue por reutilização, ou seja, regeneração e/ou combustão como fins diferentes do da destruição (vide artigo 3.º).
A Directiva n.º 87/101/CEE, de 22 de Dezembro de 1986, relativa à eliminação dos óleos usados, vem alterar alguns dos artigos da directiva atrás referida, convidando os Estados-membros a tomar as medidas necessárias para assegurar a sua destruição sem perigo ou o seu armazenamento ou depósito controlado, exclusivamente no caso de não se proceder nem à sua regeneração nem à sua queima.
O edifício jurídico nacional da gestão de resíduos foi definido, pela primeira vez, com o Decreto-Lei n.º 488/85, revogado 10 anos mais tarde pelo Decreto-Lei n.º 310/95, o qual transpõe, respectivamente, as Directivas n.os 91/156/CEE e 91/689/CEE.
O Decreto-Lei n.º 239/97, de 9 de Setembro, invocado no projecto de lei agora em análise, sem deixar de incorporar o desenho comunitário reafirma o princípio da responsabilidade do produtor pelos resíduos que produz.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O artigo 1.º do projecto de lei do PSD faz referência ao artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 239/97, que aqui passo a reproduzir para melhor compreensão do articulado que lhe serviu de suporte: «1 - A gestão de resíduos visa, preferencialmente, a prevenção ou redução da produção ou nocividade dos resíduos, nomeadamente através da reutilização e da alteração dos processos produtivos, por via da adopção de tecnologias mais limpas, bem como da sensibilização dos agentes económicos e dos consumidores.
2 - Subsidiariamente, a gestão de resíduos visa assegurar a sua valorização, nomeadamente através de reciclagem, ou a sua eliminação adequada».
O Decreto-Lei n.º 321/99, de 11 de Agosto, igualmente invocado no projecto de lei do PSD, vê todo o conjunto dos seus 37 artigos conotado com os resíduos industriais banais, vulgo RIB.
Depois desta base de suporte legislativo o projecto de lei do PSD, nos quatro artigos seguintes, dedica-se a resíduos industriais perigosos - óleos usados e solventes -, culminando o artigo 5.º por proibir a valorização energética dos óleos usados e dos solventes em todo o território continental, cometendo-se ao Estado, num outro artigo, a gestão deste tipo de resíduos.
Algo, nesta composição de fundamentos, invocações e disposições propostas, escapa à minha compreensão.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Assembleia da República aprovou, em 10 de Agosto, a Lei n.º 22/2000, dando uma nova redacção aos artigos 4.º e 5.º da Lei n.º 20/99, de 15 de Abril.
Com a aprovação desta lei, que teve o apoio bem explícito do PSD, foi cometida à Comissão Científica Independente a tarefa de elaborar uma inventariação, tão rigorosa quanto possível, dos melhores tipos de tratamento para cada tipo de resíduo industrial, na óptica do ambiente e da saúde pública, sendo o prazo para a apresentação do respectivo relatório o dia 31 de Dezembro de 2000. Parecer-nos-ia razoável aguardar a publicação deste relatório, que tão disputado foi.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É igualmente defendida no preâmbulo, no caso vertente, a hierarquia de destinos preferenciais de harmonia com esses mesmos princípios, quer com a legislação nacional, quer com a comunitária, no que concerne à preservação, reutilização, regeneração, reciclagem, valorização energética e deposição em aterro. Porém - pasme-se! -, a valorização energética referida no artigo 5.º do diploma em discussão é, pura e simplesmente, proibida, não se encontrando qualquer razão profunda para que assim seja.
Todos sabemos que há alterações estruturais que devem ser efectuadas, quer nos sectores da recolha, quer na valorização de óleos e solventes usados. Temos a humildade de reconhecer que muito há a fazer neste domínio, passando, necessariamente pela instalações de novas unidades - a título meramente indicativo damos conta da Ecosocer, unidade de regeneração e reciclagem de solventes em funcionamento em Pombal, e ainda da unidade de re-refinação de óleos usados, em Torres Vedras, ainda em fase de construção.
Mas o salto qualitativo não se dará só com a criação destas novas unidades, há ainda que actuar numa vigilância apertada sobre os operadores.
Não estando em causa a prevenção, a regeneração e a reciclagem, seria cometer um erro grosseiro e uma enorme irresponsabilidade eliminar a valorização energética por via, pura e simplesmente, proibicionista. Não foi certamente por esta via que outros países desenvolveram técnicas alternativas no estrito respeito pela legislação em vigor, valorização que é praticada em todos os países desenvolvidos, que pode passar pelo processo de reciclagem, provocando a sua entrada num novo produto,

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e que ainda pode passar, nos termos da legislação comunitária, pela exportação dos mesmos.
Por força da toxicidade deste tipo de resíduos, a exportação deverá pautar-se pelo princípio da excepcionalidade e pontualmente utilizada. Todo o transporte destes resíduos encontra-se, em Portugal, regulado pela Portaria n.º 335/97. No entanto, de acordo com o Regulamento n.º 59/93, da Comunidade Europeia, deverão ser levados em conta os princípios da proximidade e da auto-suficiência nacional e comunitária.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Se alguma coisa está bem percepcionada pelos portugueses é a de que o Governo do Partido Socialista, em termos do papel desempenhado na área do ambiente, se tem pautado por muita acção, muita persistência, muita humildade e, acima de tudo, por muita paciência.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, o Sr. Deputado Álvaro Castello Branco.

O Sr. Álvaro Castello Branco (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Enquadra o projecto de lei em apreço, que versa a reciclagem e regeneração de óleos usados e de solventes, uma iniciativa que o CDS-PP acolhe com agrado.
Por isso mesmo aprovaremos, na generalidade, este diploma, que iremos analisar na especialidade, procurando, com o nosso contributo, que ele se mostre adequado, na sua redacção final, aos objectivos enunciados pelos seus autores.
Em nosso entender, trata-se de uma iniciativa que deveria ter sido tomada pelo Executivo e como tal o nosso voto favorável traduz necessariamente também um outro sentido decorrente desse nosso entendimento, que é o de um voto de censura ao Governo.
Nesta matéria, convém dizê-lo uma vez mais, a primeira preocupação do CDS-PP é a saúde dos portugueses,…

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … porque, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Sr.as e Srs. Deputados, com a saúde dos portugueses não se brinca.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Tem sido esta a inabalável preocupação que nos tem orientado - e que continuará a orientar-nos - em toda a questão da co-incineração. Escandalosamente, não tem sido esta a prioridade do Governo e do Sr. Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território. É prova disto o facto de ter sido por iniciativa do CDS-PP e por decisão desta Assembleia que o Governo, nitidamente contrariado, acabou por entregar a um grupo médico especializado a tarefa de elaborar um estudo aprofundado e conclusivo acerca dos riscos para a saúde pública provenientes da localização junto de zonas habitadas dos processos de queima.
É lamentável que tenha sido necessária a intervenção do CDS-PP e do Parlamento para que o Sr. Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território e o Governo cumprissem o seu dever e, ao fim de dois anos, acabassem por dar atenção ao óbvio, ou seja, à abordagem por onde deviam ter começado.
Mas se o Governo cumpriu, neste referido e importante particular, as deliberações da Assembleia da República, o mesmo já não se pode dizer no que há de urgente e não menos importante na questão da instalação de aterros.
Com efeito, de acordo com a mencionada lei que o CDS-PP ajudou a redigir e a aprovar, o Governo devia, até 31 de Dezembro deste ano, ter todos os aterros necessários devidamente aprovados. Infelizmente, não é isto o que vai acontecer, devido ao facto de o Sr. Ministro José Sócrates, no seu critério muito particular, ter entendido sobrepor-se aos juízos do Sr. Presidente da República e do Tribunal Constitucional, e considerar, de motu proprio, que a lei em vigor é inconstitucional nesse ponto. Como tal, decidiu não aplicá-la. Ou seja, um Sr. Ministro teimoso entendeu que a sua opinião era mais importante do que a legalidade e o interesse dos portugueses.
Concluindo, o Sr. Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território não cumpriu o seu dever: os aterros continuam atrasados, e os resíduos industriais continuam a colocar a saúde dos portugueses e das portuguesas em risco, por todo o lado.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Casimiro Ramos (PS): - Não é verdade!

O Orador: - É verdade, Sr. Deputado!
Em toda esta questão, a verdade é uma: a Assembleia da República legislou e cumpriu a sua quota parte de responsabilidade;

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … o Governo, com as competências que lhe cabem, fará o que entender.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Mas sempre que não cumprir o seu papel, como neste caso, o CDS-PP estará presente para lhe assacar as responsabilidades políticas do seu incumprimento.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - A visão e as atitudes do Governo e do Sr. Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território no que respeita a toda a questão que debatemos nesta Câmara, como alguém já disse, enquadram-se numa definição do Século XIII, da autoria de Pedro Hispano, o filósofo português que, como todos sabem, mais tarde ascendeu ao trono pontifício com o nome de João XXI, quando definiu «falácia» como uma forma de «fazer crer que é aquilo que não é, mediante alguma visão fictícia, sem consistência real».

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - O Governo e o Sr. Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território são, sem dúvida, falaciosos no que se refere à questão da resolução da problemática dos resíduos industriais.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo Sr.as e Srs. Deputados: Termino reforçando o entendimento que o CDS-PP perfilha da utilidade que a aprovação do projecto de lei n.º 238/VIII, hoje em discussão, tem para beneficio da

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saúde dos portugueses, que, como já referi, é e será a nossa principal preocupação.
Repito, com a saúde dos portugueses não se brinca!

Aplausos do CDS-PP e do Deputado do PSD José Eduardo Martins.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Matias.

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Segundo os proponentes, o objectivo do projecto de lei n.º 238/VIII, do PSD, é a reciclagem e regeneração de óleos usados e de solventes, obrigatórias em todo o território nacional, consideradas, a par da recolha, como actividades de serviço público e como tal exercidas mediante gestão do Estado ou em regime de concessão.
Todavia, a exclusividade expressa no artigo 5.º do articulado, com a função aparente de obrigar a cumprir esse objectivo, limita-se a excluir, sem qualquer fundamento, outros processos, reduzindo as possibilidades de opção ao dispor de uma correcta gestão deste tipo de resíduos.
Não é tarefa fácil, com os meios técnicos à disposição desta Assembleia, legislar sobre esta matéria, corre-se mesmo o risco de, por via legislativa, introduzir procedimentos incorrectos, propor acções impraticáveis ou até apontar soluções que, do ponto de vista da saúde pública e do ambiente, não sejam as mais convenientes.
Por outro lado, este projecto enferma do mesmo pecado das soluções que o Governo tem apresentado; isto é, começando por referir, no preâmbulo, a importância da gestão global e integrada dos resíduos industriais e em especial dos perigosos, acaba por consumar-se apenas na particularidade de dois resíduos, que constituem uma ínfima parcela do grave problema que afecta de facto o nosso país e para o qual é urgente encontrar a necessária solução global e integrada.
Apesar das legislações, portuguesa e comunitária, privilegiarem a prevenção na produção e a política dos 3 R, apesar do Plano Estratégico de Gestão de Resíduos Industriais (PESGRI) apontar claramente para a eliminação dos resíduos como solução de fim de linha, quando após a implementação de programas de redução não é possível ou desejável reutilizar ou reciclar, este Governo do Partido Socialista, incapaz de efectuar uma correcta gestão dos resíduos, tem-se limitado a procurar soluções parciais e incompletas para eliminar parte dos resíduos (por coincidência ou preferência), sempre e só quando essa eliminação tem interesse económico para alguns grupos ou sectores. Por isso, não temos quaisquer dúvidas sobre a necessidade de introduzir a reciclagem e a regeneração como operações obrigatórias e indispensáveis a uma correcta gestão dos resíduos industriais perigosos e em particular para os óleos e solventes.
O projecto em si, sem entrar em detalhes de especialidade que só em sede de comissão deverão ser analisados, não pode deixar de nos suscitar, na generalidade, alguns comentários críticos.
Em primeiro lugar, o conceito da inevitabilidade dos resíduos. Se é um facto que a produção de resíduos é consequência directa do processo de desenvolvimento, os custos ambientais, sociais, de saúde pública e de segurança, estes já dependem, qualitativa e quantitativamente, do modelo de desenvolvimento escolhido. O neoliberalismo económico, onde o mercado promove e incentiva o abandono e substituição de produtos muito antes de atingirem o seu tempo de vida útil, não é de forma alguma compatível com a política dos 3 R.
Em segundo lugar, e como consequência directa deste conceito, a co-responsabilização de todos os actores e intervenientes não parece ter em conta que há uns mais responsáveis do que outros, contrariando, aliás, o princípio adoptado na nossa legislação, o do «poluidor-pagador».
Assim, a solução encontrada é também ela tipicamente neoliberal ao pretender lançar uma ecotaxa cujo custo cairá, inevitavelmente, sobre os consumidores.
Em terceiro lugar, sendo inegavelmente de grande interesse público a reciclagem de óleos usados e solventes, a promoção desta actividade deve merecer incentivos públicos adequados; daí a considerá-la serviço público, parece-nos uma medida desproporcionada.
Por fim, existem algumas contradições entre o articulado e deste com alguma legislação nacional, incluindo a produzida por esta Assembleia, bem como com directivas europeias.
A alínea e) do artigo 2.º aceita unidades industriais que utilizam óleos usados ou solventes como combustível alternativo quando, em completa contradição com este artigo, o artigo 5.º proíbe, pura e simplesmente, a valorização energética de óleos usados e solventes.
Esta Assembleia proibiu a valorização energética pela co-incineração de todos os resíduos quando houver outro processo melhor dos pontos de vista ambiental e da saúde pública e não é certo que a reciclagem de óleos seja sempre a mais vantajosa. Esta vantagem só se pode determinar com o recurso à análise dos ciclos de vida, que, apesar de referida no preâmbulo, é esquecida, depois, no articulado. Ora, em França, uma LCA justamente sobre as cadeias de reciclagem e valorização energética de óleos usados, encomendada pela Agência do Ambiente e da Energia Francesa em 1998, deu resultados desfavoráveis a alguns tipos de regeneração face a outras opções possíveis.
A Directiva n.º 87/101/CEE, no novo artigo 10.º aditado, estabelece nos pontos 3, 4 e 5 algumas restrições à regeneração de alguns tipos de óleos, para os quais o projecto não só não tem solução como impede a valorização térmica como uma das opções possíveis após adequado tratamento.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Não há, igualmente, solução para os óleos que são perdidos. Como é sabido, embora com tendência a melhorar, apenas 43,4% dos óleos vendidos em Portugal são recolhidos e um sistema de gestão de óleos usados tem, inevitavelmente, de procurar recuperar a maior quantidade possível de óleo, incentivando a sua entrega, em vez do abandono puro e simples. Questão que este projecto de lei ignora.
Não há espaço, igualmente, segundo o diploma em apreço, para operações prioritárias sobre a reciclagem, como, por exemplo, a redução de solventes orgânicos através da sua progressiva substituição por solventes aquosos nas tintas.
Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Apesar da apreciação que fazemos do articulado deste projecto de lei, tendo em vista a necessidade de caminhar para processos de gestão de resíduos industriais que não passam pela sua eliminação pura e simples, como têm sido as propostas sistemáticas

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do Governo, o voto do PCP quer significar a nossa disponibilidade e empenho para, em sede de comissão, podermos chegar a um texto mais adequado e conforme com os princípios da salvaguarda do meio ambiente e da saúde pública, sem exclusão, à partida, de qualquer método de tratamento, abrindo o maior leque de opções possíveis para aplicar, em cada caso, o mais conveniente. Princípio, aliás, pelo qual nos temos sempre orientado nesta matéria.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Uma vez mais a gestão de resíduos e as políticas do Estado face a graves problemas ambientais voltam à discussão nesta Assembleia.
Da parte do Bloco de Esquerda preferiríamos estar aqui a discutir opções que conduzissem à redução de resíduos na sua produção, em vez da limitação para as suas utilizações. Várias vezes já aqui a debatemos e, nesse aspecto, estamos ainda com um enorme défice no nosso país. Entendemos que devemos enfrentar os problemas na sua origem, em vez de remendar as suas consequências. Mas não nos furtamos ao debate do dia: o que fazer com parte desses resíduos que é constituída pelos óleos usados e solventes?
À primeira vista, os partidos da oposição, até mesmo o Governo, directivas comunitárias, todos parecem convergir para esta solução que hoje aqui foi apontada no projecto de lei em apreciação: a reciclagem e a regeneração dos óleos usados e solventes em detrimento de processos de queima. Até responsáveis directos pelo processo da co-incineração, vide o presidente da SCORECO, afirmam que o seu processo de viabilização económica não será posto em causa pela aprovação deste tipo de medidas.
O próprio plano estratégico dos resíduos industriais, apresentado pelo Ministério do Ambiente em 1999, defende uma análise da viabilidade dentro da implantação de unidades de regeneração de óleos usados; ou seja, a opção pela regeneração poderia ser o consenso deste debate.
A recuperação dos solventes permite a sua reutilização e poupa recursos energéticos necessários para a sua produção. Por outro lado, também parece ser claro que essa recuperação reduz simultaneamente o volume de resíduos produzido, o que diminui o impacto negativo que poderá ter no ambiente.
No caso dos óleos usados, a legislação que aponte para a sua regeneração é um meio importante para prever uma utilização cuidadosa de acordo com o conhecimento científico que, ora, está disponível, prevendo formas de recolha através do circuito comercial e também da utilização privada, incentivando hábitos de consumo, que terão também de passar a ser hábitos de participação nos mecanismos de regeneração.
Sabe esta Assembleia que o Bloco de Esquerda tem vindo a pronunciar-se contra as alternativas deste Governo no tratamento dos resíduos através de soluções de fim de linha como da co-incineração, entre outros motivos, porque não previa a alternativa do tratamento dos solventes e da regeneração dos óleos, apesar das experiências positivas, inclusive no nosso país, de unidades de regeneração para estes produtos.
A discussão e a opção que se apresenta hoje a este Parlamento pode ser um passo importante no caminho certo. É, até, curioso que se rejeite um pequeno passo, porventura, em nome de passos mais alargados, quando me parece que o sentido correcto é dar alguns primeiros pequenos passos para chegar a outros passos mais desenvolvidos. Não entendo como é que se começa um princípio de rejeição querendo o mais para recusar o menos.
A discussão e a opção pode ser um sinal daquilo que deverá ser um projecto de sociedade que saiba cuidar da produção e gestão de resíduos perigosos que produz do ambiente e da sustentabilidade das acções humanas que com ele interferem.
Gostaríamos de salientar - e aqui divergimos, eventualmente, de outras bancadas - que achamos importante a proposta de proibição da valorização energética de óleos usados e de solventes; uma medida, a nosso ver, indispensável e, até, laminar para garantir que os processos para a sua regeneração e tratamento terão as condições para abranger o universo dos resíduos considerados e a actividade fiscalizadora indispensável por parte do Estado.
Sabemos que, em termos de inspecção ambiental, se viesse a ser implementada uma medida parcial nesta área, os seus resultados seriam, provavelmente, o fracasso. A proibição da valorização energética é, assim, a única forma, no contexto a apreciar, de garantir que o universo destes resíduos pode ser, todo ele, afectado a uma solução deste género.
Não estamos a falar em algo abstracto, mas na realidade portuguesa concreta, na relação dos prejuízos ambientais com as possibilidades da administração pública.
Para o Bloco de Esquerda, o ambiente não foi nem é uma matéria para mercantilismo, para uma outra negociata do ponto de vista económico, continuamos a pensar que ao Estado incumbe garantir a aplicação de medidas claras que protejam a sociedade e o seu desenvolvimento, sempre e quando este esteja a significar a destruição de ecossistemas de desequilíbrio ambiental ou uma hipoteca sobre o futuro do planeta.
Quero ainda dizer que é espantoso que se utilize, numa forma absolutamente distorcida, o princípio do «poluidor-pagador», princípio, aliás, bastante discutível hoje em todos os fora onde estes temas se debatem, porque há, por um lado, imputação de custos ambientais e, por outro, a permissividade sobre crimes ambientais, sendo, portanto, um princípio cada vez mais ultrapassado na análise de todos estes problemas.
No entanto, deixando de lado esta polémica, é espantoso que se utilize o princípio do «poluidor-pagador» para beneficiar o infractor e não para favorecer aquilo que será a saúde pública. É uma aplicação extremamente retorcida, pelo chamo a atenção da bancada do Partido Socialista, porque também aqui, do ponto de vista conceptual e daquilo que nos propomos defender, não valerá tudo, Srs. Deputados do Partido Socialista.
Para terminar, devo dizer que iremos dar a nossa aprovação…

O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente, dizendo que, na generalidade, vamos votar favoravelmente o projecto de lei do PSD por entendermos ser importante discutirmos na

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especialidade algumas alterações sobre o conceito de serviço público e as ecotaxas.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O agendamento deste projecto de lei veio em boa hora, na medida em que permite voltar à discussão sobre a gestão e tratamento de resíduos industriais e a constatar que Portugal continua a primar pela ausência de uma estratégia para os resíduos industriais.
No entanto, existem dados novos desde que a Assembleia da República se pronunciou, intensamente, sobre o projecto de lei n.º 218/VIII, de Os Verdes, sobre a definição de uma estratégia para os resíduos industriais, definindo regras que o Governo insiste em desrespeitar e que constam hoje das Leis n.os 20/99 e 22/2000. É que, entretanto, o Governo anunciou a aprovação pontual de dois aterros para resíduos industriais banais e de um para resíduos industriais especiais.
Contrariando a determinação da Assembleia da República, o Governo apresenta apenas parcelas…

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, peço desculpa por a interromper, mas, visto haver um ruído de fundo na Sala, quero pedir aos Srs. Deputados que estão a conversar que deixassem de o fazer, a fim de se poder ouvir a Sr.ª Deputada em condições normais.
Faça o favor de prosseguir, Sr.ª Deputada.

A Oradora: - Muito obrigado, Sr. Presidente, até porque me é extremamente difícil falar mais alto.
Dizia eu, contrariando a determinação da Assembleia da República, o Governo apresenta apenas parcelas de uma solução, recusando-se a, de uma forma integrada, apresentar a totalidade de aterros para resíduos industriais banais que se pretende construir, a sua relação com os resíduos industriais produzidos, a quantidade de resíduos a depositar em aterro e a sua localização.
A única certeza dada pelo Governo, para evitar problemas para si, foi a de recusar a avaliação de impacte ambiental, isto é, a avaliação dos impactes ambientais dessas infra-estruturas, bem como a participação e a discussão pública.
Que não restem dúvidas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que Os Verdes são absolutamente favoráveis a este tipo de infra-estruturas. Mas, mais uma vez, o Governo insiste em «construir a casa pelo telhado». Em vez de definir e começar já a aplicar uma estratégia de redução, reutilização e reciclagem, para a qual é fundamental a tipificação e quantificação dos resíduos, o Governo pretende começar a enterrar todos os resíduos industriais banais em aterros, subvertendo toda a lógica destas infra-estruturas e criando condições para o rápido esgotamento da sua capacidade, levando, a médio e longo prazo, a que o País se cubra de aterros para resíduos industriais.
O Governo insiste em apresentar apenas medidas que só podem constituir soluções de fim de linha: primeiro, foi a co-incineração, que, na perspectiva de Os Verdes, constituiu uma solução incorrecta; agora, são os aterros, só alguns, é certo! Então, e tudo o que tem de ser feito para trás?
O Governo recusa-se a tomar medidas efectivas na base de qualquer política séria para os resíduos industriais, baseada numa quantificação e caracterização fiável dos resíduos produzidos e na aplicação da política dos três R, que não constituem qualquer utopia e que é possível fazer já, bastando vontade política para o efeito.
É nesta lógica que o Governo desrespeita todas as directrizes e legislação em vigor e, até, os próprios planos que encomendou. Desde logo, desrespeita a Lei n.º 20/99, aprovada na Assembleia da República, que determina, como prioridade absoluta, a redução, a reutilização e a reciclagem.
Mas especificamente sobre os óleos usados, que é a matéria sobre que, em concreto, versa o projecto de lei agora em discussão, refere a Directiva n.º 75/439/CEE que os Estados-membros tomarão medidas necessárias para que, na medida do possível, a eliminação dos óleos usados seja feita por regeneração ou combustão com fim diferente da destruição. Mas a Directiva n.º 87/101/CEE, que revogou a que referi anteriormente, é mais limitativa e determina que os Estados-membros tomem as medidas necessárias para dar prioridade ao tratamento dos óleos usados por regeneração.
O Plano Estratégico para os Resíduos Sólidos Urbanos refere que, em relação aos óleos usados, a forma preferencial de valorização a adoptar deverá ser a regeneração, se for técnica e economicamente possível. O Plano Estratégico de Gestão de Resíduos Industriais refere que se espera que, num futuro próximo, as quantidades de óleos recuperado ou reciclados venham a aumentar substancialmente e prevê como acção a implementar a análise da viabilidade técnica, económica e financeira da implantação de unidades de regeneração de óleos usados. E também a Resolução do Conselho de Ministros n.º 92/2000, de 20 de Julho, refere que só deverão ser conduzidos para co-incineração os resíduos que não sejam possíveis de redução, reutilização ou reciclagem.
Ora conhece-se as diversas experiências internacionais no sector da regeneração dos óleos usados como alternativa viável e avançada em termos tecnológicos e ambientais, garantindo maior qualidade ambiental, saúde pública e poupança em recursos naturais não renováveis e limitados.
Então, o facto de o Governo se recusar a tomar medidas concretas e a adoptar uma estratégia de redução, reutilização e reciclagem de resíduos industriais não pode deixar de estar subjacente a uma falta de vontade política para o efeito.
Hoje, o quadro do destino dos óleos usados é assustador: a inexistência de um sistema de recolha; a sua queima ao desbarato; o seu depósito descontrolado, clandestino e abusivo, contaminando solos e aquíferos; a falta de fiscalização nas operações ilegais, que constituem verdadeiros crimes ecológicos…

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, terminou o seu tempo.

A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente, dizendo que é necessário acabar com este quadro e implementar rapidamente um sistema de reciclagem e regeneração de óleos usados e de solventes, fazendo valer a legislação em vigor. Sendo este projecto de lei um contributo nesse sentido, votá-lo-emos favoravelmente, na generalidade.

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, tendo em conta que nos encontramos na hora regimental das votações, interrompemos o debate para passarmos às mesmas.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação do parecer e proposta de resolução da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação relativo à deslocação de Sua Excelência o Presidente da República ao Panamá, para participar na 10.ª Cimeira Ibero-Americana, entre os dias 16 e 20 de Novembro, que é do seguinte teor: «A Assembleia da República, de acordo com as disposições constitucionais aplicáveis, dá o assentimento nos termos em que é requerido».

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos passar à votação do projecto de resolução n.º 77/VIII - Aprova medidas de combate a factores de risco na adolescência e na juventude (PS).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes, votos contra do PSD e abstenções do CDS-PP e de 3 Deputados do PSD.

Srs. Deputados, vamos proceder à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 101/VIII - Contracepção de emergência (BE).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, de Os Verdes e do BE, votos contra do PSD, do CDS-PP e de 3 Deputados do PS e abstenções de 12 Deputados do PSD.

O projecto de lei baixa à 8.ª Comissão.
Srs. Deputados, vamos agora votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 308/VIII - Garante o acesso aos medicamentos contraceptivos de emergência (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, de Os Verdes e do BE, votos contra do PSD e do CDS-PP e abstenções de 3 Deputados do PS e de 12 Deputados do PSD.

O projecto de lei baixa também à 8.ª Comissão.
Passamos à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 313/VIII - Da gravidez na adolescência (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP e de 3 Deputados do PS, votos contra do BE e abstenções do PS, do PCP, de Os Verdes e de 9 Deputados do PSD.

O projecto de lei baixa também à 8.ª Comissão.
Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 314/VIII -Contracepção de emergência (PS).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, de Os Verdes e do BE, votos contra do PSD, do CDS-PP e de 3 Deputados do PS e abstenções de 12 Deputados do PSD.

Informo que o projecto de lei baixa à 8.ª Comissão e que a Sr.ª Deputada Ana Manso fará entrega na Mesa de uma declaração de voto relativa a este diploma.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 156/VIII - Processo especial de constituição de associações juvenis (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PCP, de Os Verdes e do BE e a abstenção do PS.

O projecto de lei baixa à 12.ª Comissão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Dinis Costa.

O Sr. Dinis Costa (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Dinis Costa (PS): - Sr. Presidente, quero apenas dizer que, em meu nome e em nome dos Srs. Deputados João Sequeira e Carla Tavares, farei chegar à Mesa uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, fica registado.
Vamos passar à votação, na generalidade, que, como sabem, é apenas a confirmação ou não do Decreto da Assembleia da República n.º 25/VIII - Define o regime jurídico aplicável ao consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, bem como a protecção sanitária e social das pessoas que consomem tais substâncias sem prescrição médica.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, de Os Verdes e do BE e votos contra do PSD e do CDS-PP.

Srs. Deputados, deu entrada na Mesa e já foi distribuído um requerimento, apresentado pelo PS, a solicitar a votação, de imediato, na especialidade e final global do Decreto da Assembleia da República n.º 25/VIII, em relação ao qual foi apresentada uma proposta de alteração ao artigo 29.º - Entrada em vigor, pelo PS, PCP e BE.
Srs. Deputados, vamos votar o requerimento.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, de Os Verdes e do BE e votos contra do PSD e do CDS-PP.

É o seguinte:

Os Deputados abaixo assinados vêm, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos n.os 169.º, n.º 4, e 159.º do Regimento da Assembleia da República, solicitar que a iniciativa legislativa relativa ao Decreto da Assembleia da República n.º 25/VIII - Define o regime jurídico aplicável ao consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, bem como a protecção sanitária e social das pessoas que consomem tais substâncias sem prescrição médica - logo que aprovada na generalidade, seja imediatamente submetida à votação na especialidade e votação final global, atenta a circunstância de ter já sido discutida na especialidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, aprovado o requerimento, vamos passar à votação, na especialidade, do artigo 29.º.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, tendo em conta que foi aprovado o requerimento de avocação a Plenário da discussão e votação, na especialidade, do artigo 29.º e que o PSD já fez entrega na Mesa de uma proposta de alteração,…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, acaba de chegar à Mesa.

O Orador: - … também subscrita pelo CDS-PP, pedimos a distribuição de um tempo mínimo, de 3 minutos por grupo parlamentar, para a sua discussão na especialidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário da Mesa está a colocar o problema de a apresentação de propostas de alteração só poder ser feita até ao fim da discussão na generalidade. Pessoalmente, entendo que a discussão na generalidade vai até ao anúncio da votação, pelo que, a meu ver, a proposta de alteração foi apresentada em tempo.
Sr. Deputado Luís Marques Guedes, faça favor de continuar.

O Orador: - Sr. Presidente, independentemente da decisão de V. Ex.ª, não concordo com a posição do Sr. Secretário da Mesa pelo seguinte:…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, essa posição já foi ultrapassada por uma deliberação.

O Orador: - Então, o Sr. Presidente vai dar tempo para a discussão?

O Sr. Presidente: - Claro que sim, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, pela nossa parte não colocaremos qualquer objecção a que seja dado tempo para a discussão na especialidade. Agora, o facto regimental de que as propostas de alteração, para discussão na especialidade, têm de ser entregues até ao fim do debate na generalidade, o qual, é incontroverso, ocorreu ontem. Portanto, só as propostas de alteração que entraram ontem até ao fim da discussão na generalidade, serão discutidas hoje.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado é capaz de ter razão. De qualquer modo, pergunto se há objecção de que se tome em conta esta proposta de alteração apresentada pelo PSD e CDS-PP.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, a circunstância de não objectarmos a decisão que o Sr. Presidente já anunciou à Câmara, se o Sr. Presidente consente, também não nos deverá inibir de exprimir o nosso ponto de vista sobre o assunto.

O Sr. Presidente: - De forma nenhuma, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Presidente, como o Sr. Deputado Octávio Teixeira acabou de referir, acontece que houve por parte de um conjunto de Deputados do PS, do PCP e do Bloco de Esquerda a preocupação de, em tempo oportuno, de tal maneira oportuno que foi mesmo antes do início do debate na generalidade, informar todos os grupos parlamentares da apresentação de uma proposta de alteração para discussão na especialidade.
Sr. Presidente, quero apenas que fique registado o diferente critério de tratamento entre bancadas relativamente a uma matéria que já poderia ter sido dada por esgotada ontem e que agora, manifestamente a destempo, é apresentada uma proposta de alteração.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, é de facto lamentável que as várias bancadas comecem a tomar a palavra sobre uma coisa que não conhecem, mas, como o Sr. Presidente já mandou distribuir, penso que nos próximos minutos as diversas bancadas terão conhecimento da proposta de alteração que foi apresentada.
A única coisa que o PSD fez, e penso que está no seu integral direito regimental de o fazer - e as outras bancadas reconhecerão que assim é -, foi, nos termos do Regimento, apresentar ontem no debate na generalidade uma proposta de alteração ao artigo 29.º. Agora, segue-se, nos termos do Regimento, a discussão na especialidade do artigo 29.º.
O que foi entregue na Mesa foi uma proposta de emenda ao artigo 29.º, e nada mais.
Concordo com os Srs. Deputados se o que querem dizer é que não é regimentalmente aceitável que relativamente a outros artigos, àqueles que não tenham sido objecto de propostas alterações até ao final do debate na generalidade, sejam apresentadas propostas de alteração. Neste ponto estamos de acordo, só que os senhores perderam uma boa oportunidade de nada dizerem para não falarem errado, porque o que o PSD apresentou foi uma proposta de emenda ao artigo 29.º, dado a discussão na especialidade ter sido aberta por uma proposta de alteração apresentada no debate na generalidade, que ocorreu ontem.
A não ser assim não fazia qualquer sentido haver discussão na especialidade, porque apresentada a proposta, apresentada estava, e todos sabemos que não é assim.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, sinceramente penso que se tivesse de decidir agora, talvez não decidisse como decidi.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não vale a pena entrarmos numa discussão interminável. Se a propósito de cada incidente cada Sr. Deputado quiser usar da palavra, nunca mais saímos daqui.
Em todo o caso, faça favor, Sr. Deputado.

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O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Sr. Presidente, com todo o respeito, e sem querer, de modo algum, tentar criar dificuldades, quero relembrar (já ontem o tinha dito e V. Ex.ª pode asseverar o que vou dizer) que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes, há 10 dias atrás, pediu aos Grupos Parlamentares do PS, do BE e do PCP que não apresentassem propostas de surpresa - …

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

O Orador: - … por isso, como referiu o meu camarada Jorge Lacão, nós entregámo-las na véspera -, mas hoje, de surpresa, apresenta uma proposta de alteração!
É apenas esta duplicidade de critérios que nós rejeitamos, Dr. Marques Guedes!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço-vos complacência... Se os senhores quiserem ficar aqui, em regime de «pinguepongue verbal», que não posso impedir… Ou talvez possa!
Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, queria esclarecer uma questão: o Sr. Deputado Luís Marques Guedes não tem razão absolutamente nenhuma naquilo que disse.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - O Sr. Deputado Luís Marques Guedes tem toda a razão!

O Orador: - Não tem razão absolutamente nenhuma! O que se pode ler no n.º 4 do artigo 169.º do Regimento é que «só há discussão na especialidade se até ao termo do debate na generalidade forem apresentadas propostas de alteração, incidindo a votação apenas sobre os artigos objecto das propostas». Se o PSD não apresentou qualquer proposta até ao fim do debate de ontem, não tem qualquer direito para o fazer hoje. Portanto, como disse, não tem razão absolutamente nenhuma e a decisão tomada foi mal tomada, Sr. Presidente.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso é um absurdo!

O Orador: - Pela nossa parte, Sr. Presidente, não queremos perder mais tempo: vamos proceder às votações do que está em condições de ser votado.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, não vou voltar a discutir o mesmo, porque entendo que me assiste toda a razão, mas apenas comentar a acusação de dualidade de critérios que me foi feita pelo Sr. Deputado Osvaldo Castro.
Não há qualquer dualidade de critérios. O Sr. Deputado sabe perfeitamente que quem apresentou propostas de supetão foram os senhores, já que hoje decidiram, de supetão, como já tinham feito no passado, aprovar «a mata cavalos» a lei da droga, requerendo hoje a sua votação na especialidade e final global!

Protestos do PS.

O que o PSD estava à espera, legitimamente - e o Sr. Deputado Osvaldo Castro assistiu ontem, nesta Câmara, à intervenção do Deputado Durão Barroso, solicitando ao Governo e ao Partido Socialista a suspensão do processo de aprovação desta lei até que fosse aprovado o pedido de referendo pela sociedade civil a esta Assembleia -, era que o processo baixasse à comissão, para discussão na especialidade,…

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Não é necessário!

O Orador: - … momento em que o PSD apresentaria essas propostas, dado que se abriu a discussão, na especialidade, do artigo 29.º.
O Sr. Deputado Octávio Teixeira sabe que assim é: está aberta a discussão só para o artigo 29.º e é apenas esse artigo que o PSD quer discutir. O PSD só não o faz em sede de comissão, porque os senhores requereram que a mesma fosse feita em Plenário! Portanto, não temos alternativa senão apresentá-la nesta sede.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Há um grande equívoco regimental!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, se tivesse de decidir agora, decidia em sentido contrário à minha primeira decisão.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Mas decidiria mal!

O Orador: - Honestamente, tenho de o reconhecer porque, de facto, não tomei em conta que a disposição do Regimento refere que só há discussão na especialidade…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Está aberta!

O Sr. Presidente: - Desculpem, agora falo eu! «Só há discussão na especialidade se até ao termo do debate na generalidade (…)», e o debate na generalidade terminou com o último orador inscrito ontem!
Portanto, não há qualquer dúvida.

Protestos do PSD.

Dêem-me licença, Srs. Deputados.
Se quiserem, os senhores recorrem da decisão da Mesa e talvez até…

Protestos do Deputado do PSD Guilherme Silva.

Sr. Deputado, tenha paciência, mas também o oiço com respeito!
Por outro lado, peço aos Srs. Deputados que se pronunciem sobre se querem ou não recorrer da decisão da Mesa, após conhecerem a proposta apresentada pelo PSD e CDS-PP, pela razão simples de que tenho algumas dúvidas sobre se a concreta redacção agora proposta pelo PSD e CDS-PP se reveste de condições de total constitucionalidade. Tenho dúvidas e tenho de ser honesto dizendo isto mesmo.
Portanto, se entenderem que devem recorrer da decisão do Presidente… Como sabem, nunca me melindro quando recorrem das decisões da Mesa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

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O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, creio que as preocupações agora manifestadas por V. Ex.ª ecoam na bancada do PS e, quero acreditar, ecoarão noutras bancadas.
Como acabámos de constatar, para além de resultar numa desconformidade à disposição regimental a fórmula que iríamos adoptar para apreciar, na especialidade, matérias apresentadas a destempo, temos ainda um segundo problema que se prende com a proposta de alteração agora distribuída, apresentada pelo PSD e CDS-PP, que prevê um condicionamento da entrada em vigor do diploma, na circunstância de vir a ser apresentado e aprovado um referendo sobre a matéria objecto do mesmo diploma.
Ora, acontece que a iniciativa para um referendo tem de ter, também ela, evidentemente, um processo próprio de apresentação para deliberação no Plenário da Assembleia da República. E nada disso o PSD cumpriu. E, para não nos envolvermos numa interminável questão de natureza procedimental, penso que atalharemos tudo da melhor maneira apresentando recurso da decisão que o Sr. Presidente tomou há pouco.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Essa decisão já está transitada!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, V. Ex.ª quase que apelou à Câmara, e perdoe-me que assim o diga, mas entendi as suas palavras como tal…

O Sr. Presidente: - Tinha de o fazer em consciência, Sr. Deputado, uma vez que não tinha lido o vosso requerimento. Peço desculpa, mas só quando o li é que reagi a ele!

O Orador: - Como dizia, V. Ex.ª quase que apelou à Câmara para colocar em causa, porventura, a constitucionalidade da proposta subscrita por Deputados do PSD e do CDS-PP.
Sr. Presidente, quero lembrar ao Sr. Deputado Jorge Lacão - que terá dito o que disse apressadamente, quero crer, porque sei que conhece bem o Direito Constitucional - que o que consta da proposta de emenda do PSD é rigorosamente igual, quase palavra por palavra, ao que existe na lei portuguesa relativamente ao processo da regionalização, uma vez que, também aí, repito, letra por letra e palavra por palavra - houve esse cuidado por parte do PSD -, se refere claramente que a entrada em vigor da lei que institui em concreto as regiões fica dependente do voto favorável da maioria dos cidadãos eleitores, em consulta de alcance nacional.
Portanto, dizer que é inconstitucional uma norma que já está perfeitamente adquirida e tomada pela própria Constituição é, de facto, uma aberração!
Politicamente, os senhores podem não querer discutir e fugir, mais uma vez, à discussão sobre o referendo nacional a propósito da alteração à lei da droga,…

Vozes do PCP: - Não é verdade!

O Orador: - … mas não vale a pena tentarem arranjar argumentos regimentais, argumentos constitucionais ou quaisquer outros! Tenham a coragem e a hombridade política de vir ao debate sobre a matéria.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Telmo Correia e dado que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes pôs em causa, legitimamente, a declaração que fiz, queria declarar, mais uma vez, que a fiz por exigência da minha própria consciência, porque não tinha lido o vosso requerimento. E, agora que o li, devo dizer que, provavelmente, seria a primeira vez - talvez até a última! - que, na história deste Parlamento, um referendo seria decidido sem discussão na generalidade. Não poderia aceitar tal situação de modo algum.

Aplausos do PS.

Tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isto não é a discussão do referendo!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - É uma mera condição para a entrada em vigor do diploma!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - É como a lei das regiões!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, começo por dizer que se trata de uma condição para a entrada em vigor do diploma e não propriamente da discussão do referendo em si.
Em segundo lugar, é difícil dizer que esta proposta é nova, uma vez que ela foi apresentada várias vezes e esteve aqui presente quando realizámos a primeira discussão sobre esta matéria. E, já então, quer o PSD, quer nós próprios, tínhamos elaborado esta proposta. Portanto, no seu conteúdo, ela não é nova, de certeza!

Protestos do PS.

Vozes do CDS-PP: - Ouçam!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, agradeço que façam silêncio.

O Orador: - Os senhores conseguem pôr um entusiasmo tal numa mera discussão de questões processuais que acho fantástico! Devo dizer-lhes que estive aqui não sei quanto tempo a tentar perceber os melindres de Regimento que os senhores inventam. E é extraordinário como conseguem pôr tanto calor numa discussão de uma matéria regimental!
Não é isso que está em causa. O que está em causa é que esta proposta, de facto, não é nova. Quem abriu a discussão na especialidade, tanto quanto percebi, foi o Partido Socialista e, se está aberta a discussão, na especialidade, do artigo 29.º, então não percebo por que razão não pode discutir-se uma proposta apresentada por outros dois partidos.
Posto isso, terminaria dizendo que me parece que o Sr. Presidente, que é um homem tolerante e sensato, esteve de acordo com a essa tolerância e sensatez na primeira decisão que tomou, só que essa tolerância parece não ter acolhimento nesta Câmara, sobretudo nesta matéria!

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Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Jorge Lacão interpôs recurso da decisão da Mesa, recurso esse que está admitido necessariamente, pelo que dispõe de 3 minutos para o fundamentar.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, as normas do Regimento já invocadas neste debate, a propósito da apreciação parlamentar de um decreto da Assembleia da República na sequência de veto presidencial, implicam que qualquer alteração que, na especialidade, lhe seja apresentada o seja até ao fim do debate da apreciação na generalidade, o que, como todos sabemos, ocorreu na passada sessão e terminou.
Até ao final desse debate na generalidade, eu próprio tive ocasião de apresentar aquela que era a única proposta de alteração, na especialidade, ao artigo 29.º do referido Decreto, proposta essa que foi, por isso mesmo, do oportuno conhecimento dos Srs. Deputados até ao encerramento do debate em causa.
Tanto bastaria para justificar o nosso recurso da decisão do Sr. Presidente em admitir, para debate na especialidade, a proposta de artigo 29.º, agora apresentada pelos Grupos Parlamentares do PSD e do PP.
Mas há mais, Sr. Presidente e Srs. Deputados: acontece que a iniciativa de referendo é, nos termos da Constituição e da Lei do Referendo, uma iniciativa autónoma, iniciativa autónoma que não pode confundir-se, de maneira alguma, com uma deliberação parlamentar no quadro das disposições legislativas. Ela tem um processo próprio de aprovação e um processo próprio para ser colocado à consideração do Presidente da República, que é quem decide, em última instância, da convocação ou da não convocação de um referendo nacional.
O que os Srs. Deputados do PSD fazem é o mais grosseiro dos atentados à Constituição, ao pretenderem que, numa disposição normativa, a Assembleia da República condicionasse a possibilidade da entrada em vigor de uma norma à eventual existência de um referendo nacional, cuja iniciativa ninguém apresentou nesta Câmara e que, portanto, esta Câmara não está em condições nem de apreciar nem de deliberar.
Quando o Sr. Deputado Luís Marques Guedes invoca um artigo da Constituição, que é especial, sobre a regionalização e consagra uma solução específica, não percebo como é que não sabe distinguir regionalização de matéria relativa à descriminalização da droga, quando uma não tem rigorosamente nada a ver com a outra. Além do mais, o Sr. Deputado não compreende que o que se diz na Constituição é para obedecer em sede de direito ordinário. Ora, em direito ordinário não temos qualquer hipótese de invocar normas constitucionais para as aplicar fora do seu contexto.
Em resumo, e para concluir, é assim que fundamentamos o nosso recurso da decisão do Sr. Presidente e permita-me, Sr. Presidente, que lhe peça - julgo que estamos em condições de o fazer - que se passe à votação deste recurso que apresentamos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lacão, tenho de conceder a palavra, também por 3 minutos, a cada um dos restantes grupos parlamentares, por isso ainda não podemos passar à votação.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, há algo que é evidente em termos políticos: os senhores fogem como o diabo da cruz de discutir, nesta Câmara, a realização de um referendo antes da aprovação da lei da droga.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Claro!

O Orador: - Quanto ao problema do recurso em si, Sr. Presidente e Srs. Deputados, devo dizer o seguinte: manifestamente, o que está em causa na proposta de emenda ao artigo 29.º, artigo que os senhores abriram à discussão no debate de generalidade realizado ontem - e é bom que fique claro que os senhores abriram à discussão o artigo 29.º - é que a discussão, na especialidade, tem de fazer-se e é evidente que nela não pode haver limitações.
Cada Deputado desta Câmara apresenta as propostas que bem entender sobre a discussão na especialidade que está sobre a Mesa. E, Sr. Deputado Jorge Lacão, vários Deputados apresentaram uma proposta que não se confunde minimamente com a convocação de um referendo! A proposta apresentada pelos Deputados do PSD e do Partido Popular relativamente ao artigo 29.º é a de fazer depender a entrada em vigor da descriminalização prevista na presente lei do voto favorável da maioria dos cidadãos eleitores que se tenham pronunciado em referendo nacional, quando e se o referendo tiver lugar.
Dou-lhe um exemplo, Sr. Deputado, neste momento, está em vigor na ordem jurídica portuguesa a lei de criação das regiões cuja revogação já foi tentada, pelo menos, por duas vezes, quer pelo Partido Popular quer pelo Partido Social Democrata, face ao referendo que já houve com a recusa do povo português à regionalização. No entanto, o Partido Socialista e o Partido Comunista, porque têm recusado essa revogação, têm mantido em vigor, na ordem jurídica portuguesa, essa lei, dizendo que algum dia podem voltar a propor o referendo nacional que venha a inverter o estado de coisas e venha a possibilitar a entrada em vigor da lei de criação das regiões.
Ora, Sr. Deputado, é exactamente a mesma coisa que aqui é proposta pelos Deputados do PSD e do Partido Popular. Não estamos com esta proposta, nem poderíamos estar, Sr. Presidente, como é bom de ver, a ultrapassar as competências do Sr. Presidente da República e a tentar decidir aqui uma convocação do referendo! Isso é o Sr. Presidente da República quem decide a seu tempo e quando houver propostas em concreto.
Agora, se for aprovada a lei como o PSD propõe, o que acontecerá é que ficará uma lei na ordem jurídica em tudo igual à lei de criação das regiões que está em vigor, que os senhores defendem que está em vigor, que a Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares tem assumido que está em vigor e que os senhores se têm recusado a revogar, exactamente com o argumento de que o tempo virá - oxalá não venha! - e o Sr. Presidente da República aprovará o novo referendo sobre a regionalização.

O Sr. João Amaral (PCP): - Esse argumento é falso!

O Orador: - Nós dizemos: o tempo virá - e esperamos que não seja longínquo - em que o Sr. Presidente da República aprove a realização do referendo, que é

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reivindicada pelos portugueses, pelo PSD e pelo Partido Popular.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. João Amaral (PCP): - Você era um jurista que merecia consideração, até agora!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, se bem percebo, estamos a discutir o recurso interposto pelo Dr. Jorge Lacão da decisão de V. Ex.ª sobre a admissibilidade da discussão, na especialidade, da proposta apresentada pelo PSD e por nós, o que, logo à partida, não é simples como tema de discussão e, se calhar, não é sequer o mais útil.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Queria dizer algumas coisas muito simples. A primeira é que consigo perceber perfeitamente por que é que o Partido Socialista, o Partido Comunista Português, de passagem Os Verdes e a seguir o Bloco de Esquerda não querem discutir o referendo e não querem o referendo.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Porque perdem!

O Orador: - Isso consigo perceber perfeitamente. É que os senhores não querem o referendo! Essa é a questão! E não querem o referendo porque os senhores fizeram uma lei à pressa, que é vanguardista, que desprestigia esta Assembleia e que não corresponde ao sentimento do País. Isso consigo perceber e justifica que os senhores não queiram o referendo.
O que já não percebo é por que é que cada vez que se diz tão-só a palavra «referendo» se acende uma luz vermelha e os senhores automaticamente não querem falar, não querem discutir e nada aceitam!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Os senhores não querem o referendo, mas a discussão na especialidade abre-se, diz o Regimento, a partir do momento em que são entregues propostas. Ora, foram entregues propostas e, neste caso, os senhores muito simplesmente discutiam-nas, votavam contra e assumiam que não queriam o referendo.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Têm medo!

O Orador: - O CDS-PP e, penso, também o PSD apresentaram projectos de resolução sobre essa matéria e, na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, não aceitaram o seu agendamento. Aqui alguém propõem questões de especialidade e acende-se a luz vermelha, porque os senhores não podem sequer ouvir a palavra «referendo»!
Srs. Deputados, votem! Assumam que não querem o referendo de uma vez por todas, porque continuaremos esse combate e dele não desistimos!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. João Amaral (PCP): - Resta saber se vocês querem mesmo o referendo!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, em primeiro lugar, importa dizer que esta proposta apresentada pelo PSD e CDS-PP é manifesta e grosseiramente inconstitucional. Aliás, o argumento do Sr. Deputado Marques Guedes sobre a regionalização vira-se contra si próprio, porque toda a gente sabe que o referendo da regionalização era imposto directamente pela Constituição, excepcional e obrigatório.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Os senhores nem o queriam!

O Orador: - Ora, se esse era o regime excepcional não era, e não é, o regime regra.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A Constituição define qual é a forma para a Assembleia da República propor um referendo e em nenhum lugar da Constituição se prevê que uma lei possa decidir um referendo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não é essa a questão!

O Orador: - Em segundo lugar, é completamente absurdo que a entrada em vigor de uma lei fique dependente de um referendo, que ninguém sabe se algum dia haverá. Assim, a proposta é, manifestamente, não só inconstitucional mas também absurda.
Entendemos, portanto, que o recurso apresentado tem plena justificação e por isso votá-lo-emos favoravelmente.
Mas, Srs. Deputados, devo acrescentar que nós não fugimos nem a esta nem a outras questões.

Vozes do CDS-PP: - Não?!

O Orador: - Se esta proposta fosse, por absurdo, admitida e submetida a votação, frontalmente votaríamos contra ela.

Aplausos do PCP.

O que o PSD e o PP pretendem não é um debate sério sobre os problemas da droga e toxicodependência mas, sim, impedir, por processo de chicana, que a Assembleia da República tome uma decisão da maior importância para o País.

Aplausos do PCP e do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, gostaria de corroborar as intervenções quer do Sr. Deputado Jorge Lacão quer do Sr. Deputado António Filipe e chamar a atenção para o seguinte: ontem, o Partido Social Democrata e o Partido Popular poderiam ter apresentado esta proposta. Por que não o fizeram?

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Eram para a especialidade!

O Orador: - Por que a deixaram para hoje?

Protestos do PSD e do CDS-PP.

É necessário que se saiba que não estamos a furtar-nos nem ao debate nem à votação do que quer que seja, muito menos sobre a matéria do referendo. Na verdade, e é preciso que lá fora se saiba, o Partido Social Democrata e o Partido Popular nunca agendaram o referendo, nem em momento algum apresentaram a proposta de referendo.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Esta proposta apresentada pela «porta do cavalo» e de forma grosseira e inconstitucional é que mostra a má consciência em relação a esta iniciativa.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não é verdade!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, é só para esclarecer que aquilo que foi dito pelo Sr. Deputado Luís Fazenda não corresponde à verdade, pois há projectos de resolução do CDS-PP, e creio que também do PSD, cujo agendamento sobre a matéria do referendo foi pedido, mais do que uma vez, em Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares e foi recusado pelo Partido Socialista.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, uma leitura simples do Regimento indicará que quer um partido quer outro têm o direito ao agendamento potestativo e não o utilizaram.

Aplausos do PS, do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar o recurso interposto pelo PS da decisão da Mesa de admitir uma proposta de alteração, apresentada pelo PSD e CDS-PP, do artigo 29.º do Decreto da Assembleia da República n.º 25/VIII.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, de Os Verdes e do BE e votos contra do PSD e do CDS-PP.

Agora, que esta consideração já não tem eficácia em relação ao recurso, permitam ao velho jurista que sou que diga que seria, também, a primeira vez que eu veria uma lei sob condição…

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - … uma lei cuja validade e eficácia ficava dependente de um facto futuro e incerto. Penso que a recepção desta proposta seria um pouco estranha, se eu a tivesse lido a tempo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, o que a Câmara agora votou foi o recurso para recusar a aceitação que o Sr. Presidente fez da proposta de emenda entrada na Mesa.

O Sr. Presidente: - Exacto!

O Orador: - Outra coisa é a decisão que já está tomada e que, penso, não é questionável nos termos do Regimento, que é a discussão, na especialidade, do artigo 29.º.

O Sr. Presidente: - Exacto!

O Orador: - Essa tem de se fazer antes da votação.

O Sr. Presidente: - Antes de procedermos à votação na especialidade, vamos passar à discussão, na especialidade, da proposta de alteração, apresentada pelo PS, PCP e BE, do artigo 29.º do Decreto da Assembleia da República n.º 25/VIII.

Pausa.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Durão Barroso.

O Sr. Durão Barroso (PSD) - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este incidente processual bastante curioso, na medida em que a própria Mesa apelou à Câmara, ou a parte dela, para se movimentar em sentido contrário àquele que a Mesa tinha decidido,…

Vozes do PS: - Não é verdade!

O Orador: - … veio tornar clara uma questão - o Partido Socialista e o Partido Comunista não querem sequer discutir a sério a questão do referendo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O Partido Socialista e o Partido Comunista não querem ouvir o que pensam os portugueses sobre a questão da despenalização da droga.
O Partido Socialista e o Partido Comunista tentaram sempre uma discussão expedita aqui, na Assembleia da República, recorrendo a todas as formas e a todos os expedientes para impedir um verdadeiro debate profundo nesta Assembleia da República. Não querem ouvir o que pensam as famílias, os jovens, os técnicos, os especialistas. Não querem que o País se mobilize numa verdadeira coligação nacional contra a droga. Entendem que é mais importante, de forma expedita, usarem aqui a circunstancial maioria de que dispõem, mas não querem ouvir o povo português. Esta é a questão!

Aplausos do PSD.

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Pela nossa parte, fiéis àquilo que é a tradição democrática portuguesa, fiéis àquilo que é um princípio sagrado da nossa democracia, que é o da possibilidade de recurso à democracia directa quando há questões como estas que atravessam o espectro político, entendemos que há uma questão que merece, pela sua própria dignidade, que os portugueses, directamente, digam aquilo que pensam, aquilo que sentem e aquilo que querem. É uma questão demasiadamente séria e penso que todos os Deputados que aqui estão têm, com certeza, bem como eu, legitimidade formal para tomarmos uma posição nesta matéria.
Todavia, penso que nenhum de nós tem mais competência nesta matéria do que as famílias que conhecem o dilema que é a droga, do que aqueles que são toxicodependentes e do que todos aqueles que têm na sua família este drama.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PS.

O Orador: - Mais uma vez, os Deputados do PS e do Partido Comunista querem confiscar ao povo o direito de se pronunciar em consulta popular directa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Durão Barroso, permita-me que lhe diga que não fiz apelo algum! Não tenho culpa que o PSD tenha apresentada a proposta no último minuto em que julgou que podia fazê-lo,…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Só podia fazê-lo no momento em que o fez!

O Sr. Presidente: - … ou seja, no momento em que ia começar a discussão na especialidade, e eu não tive tempo de ler a proposta do PSD! Se bem que era apenas uma proposta sobre a entrada em vigor do diploma, quando a li, tive a reacção natural de a considerar inconstitucional porque a minha consciência assim a considera.
Por outro lado, também não tomei em conta a concreta redacção do texto do Regimento e declarei que só por via de recurso é que a minha decisão poderia ser alterada.
Peço desculpa, mas foi uma exigência da minha consciência! Não fiz apelo algum, limitei-me a ter a reacção de quem não podia deixar de a ter! É que eu tinha tomado uma deliberação, convenci-me, a seguir, que ela não era correcta e que era minha obrigação corrigi-la e até sujeitar-me à eventualidade de um recurso, como me sujeitei.
Relativamente à vossa proposta, é evidente que, a partir do momento em que a li e a considerei inconstitucional, também tinha de ter uma reacção honesta!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço-lhe desculpa,…

O Sr. Presidente: - Não tem de o fazer!

O Orador: - … mas não vejo, no Regimento, qualquer norma que permita a V. Ex.ª rejeitar propostas de alteração, na especialidade, por inconstitucionalidade. Pode fazê-lo em relação a propostas de lei e a projectos de lei; quanto às propostas, não compete ao Presidente rejeitá-las por inconstitucionalidade. E V. Ex.ª disse que, se tivesse reparado, teria rejeitado, por inconstitucionalidade, esta proposta do Partido Social Democrata!…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, quem pode o mais, pode o menos! É evidente que, se posso rejeitar um diploma por conter uma norma inconstitucional, também posso rejeitar essa norma inconstitucional, se aparecer depois! A mim, isso parece-me evidente, Sr. Deputado! Não vale a pena entrarmos nessa discussão! Melhor fora que eu pudesse rejeitar um diploma inteiro - o que nunca fiz - com base na inconstitucionalidade de uma só norma e que não pudesse rejeitar uma norma isolada que considerasse inconstitucional! É evidente que o posso fazer, Sr. Deputado! Esta é a minha interpretação.
Isto nunca aconteceu, é a primeira vez, e também não o fiz! Foi por via de recurso que essa solução acabou por me ser imposta. Mas não tenha dúvidas de que tenho de ter essa competência, pois não pode deixar de ser!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, para mim, há algo estranho nesta questão. Não retiro qualquer competência ao Sr. Presidente e o recurso do Partido Socialista resolveu o problema, agora, o que é certo é que, da primeira vez que a lei foi aqui submetida à votação, foi entendido, quanto a uma questão de inconstitucionalidade séria (a ausência de consulta às Regiões Autónomas), que se deveria votar, andar para a frente e depois logo se veria! E agora, a posição em relação a uma questão de inconstitucionalidade não segue o mesmo princípio nem a mesma lógica!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não vamos reiniciar uma discussão sobre outra matéria que não está em discussão neste momento.
Não posso dar a palavra a todos os Srs. Deputados que queiram usar dela a título de interpelação à Mesa! Cada grupo parlamentar tem direito a usar da palavra uma vez sobre esta matéria.

O Sr. Fernando Seara (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

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O Sr. Fernando Seara (PSD): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sobre que matéria da ordem de trabalhos, Sr. Deputado?

O Sr. Fernando Seara (PSD): - É sobre uma afirmação produzida por V. Ex.ª, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Fernando Seara (PSD): - Sr. Presidente, também entendo que, independentemente da organização, cada Deputado tem legitimidade para questionar afirmações, inclusive as do Presidente da Assembleia. Como tal, V. Ex.ª terá de entender que a afirmação que produziu sobre a inconstitucionalidade ou a desconformidade de uma proposta de alteração não pode colher.
E não pode colher pelo seguinte: em termos de direito parlamentar, V. Ex.ª não tem poder para apreciar a conformidade constitucional da generalidade das propostas de alteração, pois elas são, em regra, matéria da competência das comissões. Como tal, a análise concreta põe-se em termos do direito regimental, e do tradicional direito regimental, quer português, quer europeu, em relação aos projectos e às propostas, na globalidade.

Protestos do Deputado do PS Osvaldo Castro.

Sr. Deputado, é a minha opinião e tenho o direito de a exprimir!
Como dizia, a análise concreta põe-se em termos do direito regimental, sob pena de haver uma alteração tácita do Regimento, nesta matéria. V. Ex.ª terá a sua compreensão de jurista, mas eu não podia deixar de dizer que não coincide com a minha. Considero, pois, que não se pode fazer jurisprudência de assentimento daquilo que V. Ex.ª acabou de dizer.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, estou sempre disposto a reconhecer os meus erros de interpretação das leis. Não sou, de maneira alguma, imune a erros. Mas quero dizer-lhe que, neste caso, há um artigo do Regimento que diz, expressamente, o seguinte: «1 - Não são admitidos projectos e propostas de lei ou propostas de alteração que: a) Infrinjam a Constituição ou os princípios nela consignados; (…)» - é o artigo 132.º.
Sr. Deputado, há lei expressa, não é matéria de interpretação!

Aplausos do PS, do PCP e do BE.

Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão, para uma intervenção.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Não podemos eximirmo-nos à constatação do espectáculo tristemente confrangedor que a bancada do PSD nos está a dar, nesta sessão!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quero dirigir-me directamente ao Sr. Deputado Durão Barroso, que nada disse acerca dos fundamentos da proposta de alteração, na especialidade, do artigo 29.º - nesse aspecto, já tive, ontem, ocasião de justificar a proposta.
Quero dizer ao Sr. Deputado Durão Barros que, como bem sabe, ou deveria saber, age de má fé e com dolo quem, voluntariamente, provoca erro no destinatário de uma declaração.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - E o Sr. Deputado Durão Barroso está, politicamente falando, a agir com dolo e com má fé, na medida em que, em declarações televisivas, ainda ontem à noite, mesmo depois do debate de ontem, continuava a falar do diploma que está em apreciação como tratando-se de um diploma que liberaliza o consumo da droga em Portugal!

Aplausos do PS.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Mas é verdade!

O Orador: - O Sr. Deputado Durão Barroso tem de compreender que a causa por que se bate (a da convocação de um referendo sobre esta matéria) pode ser legítima, mas não lhe admite a ilegitimidade de falar mentindo aos portugueses, que escutam, com boa fé, aquilo que os responsáveis políticos lhes dizem!

Aplausos do PS.

E ainda agora o Sr. Deputado Durão Barroso disse que esta é a lei que descriminaliza e despenaliza, mais uma vez demonstrando que confunde e não percebe a diferença entre descriminalização e despenalização!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Acontece, Sr. Deputado Durão Barroso, que, ao nível do direito de ordenação social, esta lei não só não despenaliza como também cria sanções, que até são mais gravosas, relativamente aos consumidores de droga!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - É a «lei de Barrancos» adaptada à droga!

O Orador: - É que, Sr. Deputado Durão Barroso, são previstas sanções como as seguintes: proibição de exercer profissão ou actividade que possa afectar a integridade do próprio ou a de terceiros; interdição de frequência de certos lugares eventualmente perigosos; proibição de acompanhar, alojar ou receber certas pessoas; interdição de ausência para o estrangeiro sem autorização; apresentação periódica em lugar a designar pela comissão; cassação e proibição de concessão ou renovação de licenças de uso e porte de arma; apreensão de objectos que pertençam ao próprio e possam representar risco e privação de gestão de subsídio ou benefício. Isto para além de coimas, que são igualmente aplicáveis.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Mas não há sanção para o não cumprimento da obrigação imposta!

O Orador: - Sr. Deputado Durão Barroso, o que esta lei faz é definir uma grelha de sanções acompanhadas de

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um compromisso para a recuperação dos toxicodependentes. E é sobre isso que V. Ex.ª, até hoje, não disse uma única palavra séria, objectiva e serena aos portugueses!
É por isso, Sr. Presidente, que estamos aqui, ou seja, para dar combate à toxicodependência e não para alinhar em primarismos nem em demagogia!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lacão, permita que lhe faça um reparo. Tenho feito sempre a distinção entre dizer que alguém mentiu e dizer que alguém é mentiroso. Mas penso que a imputação directa de uma mentira, quando se pode alegar, simplesmente, a falsidade do facto de que se trata, pode estar na fronteira do excesso de linguagem.
Para defesa da honra da bancada, tem a palavra o Sr. Deputado Durão Barroso.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Durão Barroso (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, de facto, cometeu, pelo menos, o erro agora apontado pelo Sr. Presidente, isto é, o erro do excesso de linguagem.
Admito que, no calor do debate, às vezes, as pessoas se excedem, pelo quero apenas dar ao Sr. Deputado Jorge Lacão a oportunidade de pedir desculpa, se assim o entender.

Vozes do PS: - Oh!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra, e a oportunidade, o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Durão Barroso, independentemente do que pensarmos sobre a oportunidade ou não da convocação de um referendo, tive ocasião de dizer que, independentemente de divergência política, é legítimo que cada um assuma sobre o assunto a posição que entender.
Estamos perante um diploma que procede à descriminalização do consumo de droga, mas não à sua despenalização, e que, consequentemente, aplica um conjunto de sanções, pesadas, em alguns casos, o que significa que, face a esta lei, não estamos, de maneira alguma, perante uma situação de liberalização do consumo da droga em Portugal.
Sr. Deputado Durão Barroso, com mais ou menos eufemismo, é ou não verdade que V. Ex.ª tem dito, todos os dias, aos portugueses que está em votação na Assembleia da República uma lei que procede à liberalização do consumo da droga em Portugal? É ou não verdade?

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - É mentira!

O Orador: - Pois bem, se, do ponto de vista da linguagem - e aceitando a recomendação do Sr. Presidente -, não devo dizer que o Sr. Deputado Durão Barroso tem mentido, permita que diga que o Sr. Deputado Durão Barroso não tem falado verdade aos portugueses!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas, para uma intervenção, dispondo de 3 minutos para o efeito.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se há matéria que releva da consciência de cada um, é a relativa à posição da lei penal face ao consumo de droga. Se há matéria em que o referendo devolve à consciência de cada cidadão a resolução deste problema é a do consumo de droga. Aliás, devo dizer que, se não é aceitável para a esquerda parlamentar um referendo sobre a questão da droga, então, não sei quando é que a esquerda parlamentar se converte, finalmente e com autenticidade, à ideia do referendo!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Nunca! Têm medo!

O Orador: - Para os que entendam que o que está aqui em questão é o uso ou o abuso da figura do referendo, chamo a atenção para o facto de que, por duas vezes, a esquerda parlamentar se enganou e, por duas vezes, as bancadas que defenderam o referendo, acertaram.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - VV. Ex.as fizeram duas leis que o País recusou. O País foi chamado a votar, em consciência, e recusou as leis que VV. Ex.as julgavam que o País queria!

Aplausos do CDS-PP.

Sr. Presidente e Srs. Deputados, se há matéria em que seria útil, saudável e importante a Assembleia ter a humildade de devolver ao País a decisão é esta, a relativa à droga. Lamento que, pela terceira vez, VV. Ex.as se enganem quanto a uma lei que não prestigia esta Assembleia.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Acresce que esta lei entrou como lei de descriminalização, foi, entretanto, emendada para lei de despenalização e saíu, efectivamente, como uma lei de liberalização do consumo de droga.

Aplausos do CDS-PP.

Protestos do PS.

A razão é muito evidente: todo o sistema de sanções citado pelo Sr. Deputado Jorge Lacão não tem qualquer sanção para o respectivo não cumprimento!
De resto, quero apenas admitir o direito de o País discutir a sua opinião; V. Ex.ª nega ao País o direito de discutir a sua convicção - são duas posições completamente diferentes.
Acresce que, do meu ponto de vista, esta lei não ajuda toxicodependente algum a resolver o seu problema e coloca à sociedade que recusa a toxicodependência um sério problema. Não ajuda as pessoas e prejudica a sociedade em que vivemos e, sobretudo, a sociedade melhor em que queremos viver!
Lamento a vossa recusa de um referendo absolutamente natural sobre a questão da droga.

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Aplausos do CDS-PP e de alguns Deputados do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe, para o que dispõe também de 3 minutos.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É preciso dizer que já começa a ser um tanto ridículo que, sendo este o quinto debate que, desde Maio passado, se realiza no Plenário da Assembleia da República sobre esta matéria, os Srs. Deputados, particularmente os do PSD, insistam em dizer, pela quinta vez, que não têm condições para debater esta matéria!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Até podia haver 1000 debates!

O Orador: - Esta é uma matéria que tem vindo a ser muito debatida em todo o País, desde há muito tempo. Desde Maio passado, foi feita a discussão, na generalidade, de todas as iniciativas legislativas apresentadas; foi feita depois, aquando da votação final, mais uma discussão, na especialidade, a propósito de avocações que foram feitas; houve ainda, na última reunião plenária da passada sessão legislativa, em Julho, no período de antes da ordem do dia, um debate bastante alargado sobre esta matéria, e, desde o início desta sessão legislativa, já é a segunda vez que estamos aqui, em Plenário, a definir esta matéria, não contando com o debate da especialidade, que foi realizado em comissão…

Vozes do CDS-PP: - Durante três horas!

O Orador: - … e que todos os grupos parlamentares nele intervieram pelo tempo que muito bem entenderam!

Protestos do CDS-PP.

Repito, todos os grupos parlamentares intervieram pelo tempo que muito bem entenderam!

Aplausos do PCP e do PS.

É verdade que o contributo do PSD, neste debate, não foi muito grande. Alguns Srs. Deputados do PSD apresentaram um projecto de lei em que propunham, isso sim, a criação de um mercado legal de certas drogas. Nós discordámos disso e invocámos as razões por que discordávamos.

Vozes do PS: - Exactamente!

O Orador: - Agora, a questão é esta: os Srs. Deputados insistem, mais uma vez, em afunilar esta discussão na realização ou não do referendo, quando os Srs. Deputados o que não têm é argumentos sérios para contrariar a medida que a Assembleia da República se propõe tomar e que não é uma questão da consciência individual, é uma questão da maior importância na política criminal para o nosso país.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E isto também é necessário ser dito!
No fundo, o que o PSD e o PP pretendem é deixar tudo na mesma, e isso nós não aceitamos. O PSD e o PP não têm argumentos sérios para defender a sua posição…

Vozes do PCP: - Muito bem! É uma vergonha!

O Orador: - … e por isso se refugiam numa única questão, fugindo a todas as discussões. E mesmo agora, que abrimos o debate na especialidade, os Srs. Deputados do PSD e do PP continuam a refugiar-se numa única questão pura e simplesmente para fugirem ao debate sério…

Protestos do CDS-PP.

… e para, na falta de argumentos sérios, rebaterem a validade da lei que a Assembleia da República se prepara para aprovar.

Aplausos do PCP e do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais pedidos de palavra, vamos passar, então…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Qual é a matéria, Sr. Deputado?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Tem a ver - e entendo que devo colocar esta questão antes de passarmos à votação - com o cumprimento de formalidades no que diz respeito à apreciação e aprovação desta lei.

O Sr. Presidente: - Quais são elas, Sr. Deputado?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, como se sabe, foram ouvidos os órgãos do governo próprio das Regiões Autónomas, nos termos da Constituição, do Estatuto e da Lei n.º 40/96, acabámos de discutir uma proposta que vai alterar, de uma forma relevante, esta lei no que diz respeito à sua vigência…

Protestos do PS e do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, agradeço que oiçam com atenção.

O Orador: - … e o artigo 7.º da referida Lei n.º 40/96 diz que, quando são introduzidas alterações substanciais, relevantes ou inovatórias, «devem ser remetidas aos órgãos de governo próprio cópia das mesmas e a respectiva justificação.»

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Se isto não for efectivamente observado, temos o artigo 9.º da mesma lei, que diz: «A não observância do dever de audição, nos termos da presente lei (…)» - portanto, com todas estas formalidades - «(…)

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determina, conforme a natureza dos actos, a sua inconstitucionalidade ou ilegalidade.»
Chamo, pois, a atenção para a necessidade do cumprimento deste articulado.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Para que não se diga que não chamou a atenção em tempo!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Guilherme Silva, nós já discutimos esse assunto na conferência de líderes e chegámos à conclusão - penso que, sem votos contra, aliás, creio que nem houve votação - de que, a proceder assim, abria-se espaço a um pinguepongue em que as Regiões Autónomas podiam eternizar a feitura de uma lei. Tinham que ser ouvidas sobre esta alteração e pronunciavam-se sobre ela, porventura, era introduzida outra alteração e voltavam a pronunciar-se sobre ela… Houve o entendimento de que essa prática não tem cobertura legal.
De qualquer modo, se o Sr. Deputado entender que tem reacções legais contra a aprovação da lei sem o cumprimento dessa formalidade, faça favor de usar desses recursos.
Tem a palavra Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, é só para lembrar que esta lei fomos nós que a aprovámos aqui, na Assembleia da República.

O Sr. Presidente: - Eu sei, Sr. Deputado. O que acontece é que, se agora tivéssemos que ouvir por uma segunda vez, eventualmente por uma terceira ou uma quarta, as Regiões Autónomas, ficaria nas mãos das Regiões Autónomas a possibilidade de bloquear a aprovação de qualquer lei. Isso não tem, de facto, em meu entender, cobertura legal, nem constitucional, sobretudo.
Srs. Deputados, vamos passar à votação, na especialidade, da proposta de alteração, apresentada pelo PS, PCP e BE, do artigo 29.º do Decreto da Assembleia da República n.º 25/VIII.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PCP, de Os Verdes e do BE e votos contra do PSD e do CDS-PP.

É a seguinte:

Artigo 29.º
(Entrada em vigor)

A descriminalização aprovada pela presente lei entra em vigor em todo o território nacional no dia 1 de Julho de 2001, devendo ser adoptadas, no prazo de 180 dias a contar da data da sua publicação, todas as providências regulamentares, organizativas, técnicas e financeiras necessárias à aplicação do regime de tratamento e fiscalização nela previsto.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, embora o Regimento da Assembleia da República não exija expressamente que se faça a votação final global, penso que, por uma questão de segurança, devemos proceder a ela. Já assim se procedeu numa outra situação paralela.
Assim, vamos proceder à votação final global do Decreto da Assembleia da República n.º 25/VIII - Define o regime jurídico aplicável ao consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, bem como a protecção sanitária e social das pessoas que consomem tais substâncias sem prescrição médica, com a alteração entretanto aprovada.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, de Os Verdes e do BE e votos contra do PSD e do CDS-PP.

Aplausos do PS, do PCP e do BE e manifestações de protesto do CDS-PP, batendo com as mãos nos tampos das bancadas.

Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação global da proposta de resolução n.º 28/VIII - Aprova, para adesão, a Emenda ao artigo 8.º da Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial, aberta para adesão a 1 de Março de 1993.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Passamos à votação global da proposta de resolução n.º 36/VIII - Aprova, para ratificação, a Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e da Dignidade do Ser Humano face às Aplicações da Biologia e da Medicina: Convenção sobre os Direitos do Homem e a Biomedicina, aberta à assinatura em Oviedo, a 4 de Abril de 1997, e o Protocolo Adicional que Proíbe a Clonagem de Seres Humanos, aberto à assinatura em Paris, a 12 de Janeiro de 1998.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Vamos, agora, proceder à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 41/VIII - Autoriza o Governo a alterar o Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de Fevereiro, alterado pelos Decretos-Leis n.º 387-E/87, de 29 de Dezembro, n.º 212/89, de 30 de Junho, e n.º 317/95, de 28 de Novembro, e pela Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Eu não desejaria ter interrompido neste momento, mas, antes de V. Ex.ª submeter a votação o texto originário, gostaria de, em nome do Governo, fazer uma declaração, que é regimentalmente imprescindível, sobre o objecto da votação.

O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, eu já tinha passado à fase da votação. De qualquer modo, se não houver objecção, faça favor de usar da palavra por 3 minutos.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, não será necessário tanto.

O Sr. Presidente: - Óptimo! A economia é sempre bem-vinda.

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O Orador: - É só para declarar, Sr. Presidente, que o que vai ser submetido a votação é um texto de substituição, elaborado no âmbito da 1.ª Comissão ao longo das últimas horas, pelo que o Governo prescinde, por isso mesmo, de submeter a votação o texto originário…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Isso é que está certo!

O Orador: - … e declara esse texto substituído pelo texto de substituição. Congratulamo-nos, aliás, por ter sido possível que esse texto fosse elaborado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, Sr. Presidente, gostaria, para efeitos regimentais, de alertar para duas coisas de que só me apercebi agora, e gostaria de o ter feito antes.
A fórmula preambular deve ser corrigida, porque não pode ser a que está, e a fórmula final também, porque alude ainda ao Conselho de Ministros, bem como o que figura em anexo ao texto, ou seja, o texto do decreto-lei a emanar, o que não é, obviamente, correcto regimentalmente, na medida em que só cabe votar o texto da autorização legislativa, não cumpre haver um anexo, se estou a interpretar bem o Regimento, e julgo que sim.
Desde já, são estas as duas questões.

O Sr. Presidente: - Se todos estiverem de acordo…

Vozes do PSD: - Claro!

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, é justamente para sublinhar, também, e talvez seja um pouco redundante, que, de facto, a 1.ª Comissão enviou, hoje, para a Mesa um texto de substituição, que é, enquanto texto de substituição, assumido como tal por toda a Comissão.
Só falta aqui clarificar, no momento da votação, um aspecto, mas os Srs. Deputados das várias bancadas dirão, que é o de saber se, após a votação na generalidade do texto de substituição, haverá ou não algum propósito de votar, na especialidade, algum ou vários dos artigos (ou, até, todos, que são 12) da autorização legislativa, mas na versão texto de substituição.
Assim, uso da palavra para corroborar o que disse o Sr. Secretário de Estado e, também, para manifestar que esta é a sintonia que a 1.ª Comissão também aqui exprime, através do texto de substituição.

O Sr. Presidente: - Quanto às observações formuladas pelo Sr. Secretário de Estado, penso que podem ter tratamento em sede de redacção final.
De facto, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias não se limitou a discutir, na generalidade, a proposta de lei, elaborou um texto alternativo e fez a votação na especialidade, o que também não é normal.
Portanto, Srs. Deputados, se concordassem, fazíamos o seguinte: votaríamos, na generalidade, o texto de substituição apresentado pela 1.ª Comissão, pedia-vos que concordassem que se votasse globalmente, na especialidade, todos os artigos, apesar de isso já ter sido feito na Comissão, mas exige-se que tal seja feito no Plenário, e, depois, em votação final global, votaríamos o referido texto de substituição.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Não! A votação na especialidade tem de ser separada.

O Sr. Presidente: - Se pretendem que se vote artigo a artigo na especialidade, assim se fará.
Vamos, então, votar, na generalidade, o texto de substituição relativo à proposta de lei n.º 41/VIII, que foi «informalmente», digamos assim, aprovado na 1.ª Comissão.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, de Os Verdes e do BE e abstenções do PSD e do CDS-PP.

Passamos à votação, na especialidade, do referido texto de substituição, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 41/VIII.
Vamos votar o artigo 1.º.

Submetido à votação, foi aprovado, por unanimidade.

É o seguinte:

Artigo 1.º
Objecto

Fica o Governo autorizado a rever o Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de Fevereiro, alterado pelos Decretos-Lei n.º 387-E/87, de 29 de Dezembro, n.º 212/89, de 30 de Junho, e n.º 317/95, de 28 de Novembro, e pela Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto, sendo o sentido e a extensão das alterações a introduzir, em matérias abrangidas pela reserva de competência legislativa da Assembleia, os constantes dos artigos subsequentes.

O Sr. Presidente: - Passamos, agora, à votação do artigo 2.º.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, do CDS-PP, de Os Verdes e do BE e a abstenção do PSD.

É o seguinte:

Artigo 2.º
Notificações por via postal simples

1 - Fica o Governo autorizado a prever a notificação do arguido, do assistente e das partes civis mediante via postal simples, nos casos em que aqueles já tenham indicado à autoridade policial ou judiciária que elaborar o auto de notícia ou que os ouvir no inquérito ou na instrução a sua residência, local de trabalho ou outro domicílio à sua escolha.
2 - No caso de notificação postal simples, o funcionário toma conta no processo com indicação da data da expedição e do domicílio para a qual foi enviada e o distribuidor do serviço postal depositará o expediente na

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caixa de correio do notificando, lavrará uma declaração indicando a data e confirmando o local exacto desse depósito, e enviá-la-á de imediato ao serviço ou ao tribunal remetente, considerando-se a notificação efectuada no 5.º dia posterior à data indicada na declaração lavrada pelo distribuidor do serviço postal, cominação esta que deverá constar do acto de notificação.

O Sr. Presidente: - Vamos votar o artigo 3.º.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, do CDS-PP, de Os Verdes e do BE e a abstenção do PSD.

É o seguinte:

Artigo 3.º
Limitação do número de testemunhas

Em processo comum e abreviado, prever a limitação do rol a 20 testemunhas, podendo tal limite ser ultrapassado desde que a prestação de depoimentos se afigure necessária à descoberta da verdade material, designadamente quando tiver sido praticado algum dos crimes referidos no n.º 2 do artigo 215.º ou se o processo se revelar de excepcional complexidade, devido ao número de arguidos ou ofendidos ou ao carácter altamente organizado do crime.

O Sr. Presidente: - Passamos à votação do artigo 4.º.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

É o seguinte:

Artigo 4.º
Interrupção de comunicações

Permitir que o juiz possa limitar a audição das gravações às passagens indicadas como relevantes para a prova, sem prejuízo das gravações efectuadas lhe serem integralmente remetidas.

O Sr. Presidente: - Vamos votar o artigo 5.º.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

É o seguinte:

Artigo 5.º
Limitação dos casos de adiamento da audiência de julgamento

1 - A falta de comparência de pessoa que não possa ser de imediato substituída e de cuja presença não se prescinda ou que seja indispensável à boa decisão da causa ou cuja presença seja imposta por força da lei ou de despacho do tribunal, não determina o adiamento da audiência, sendo todas as outras pessoas inquiridas ou ouvidas, pela ordem referida nas alíneas b) e c) do artigo 341.º, sem prejuízo da alteração da ordem que seja necessário efectuar dentro do respectivo rol.
2 - As declarações referidas no número anterior serão documentadas, e ao caso nele previsto não se aplica o artigo 328.º, n.º 6.

O Sr. Presidente: - Passamos à votação do artigo 6.º.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, do CDS-PP, de Os Verdes e do BE e a abstenção do PSD.

É o seguinte:

Artigo 6.º
Realização da audiência na ausência do arguido

1 - Se o arguido, regularmente notificado, não estiver presente na hora do início da audiência:
a) O presidente toma as medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a sua comparência e a audiência de julgamento só será adiada se o tribunal considerar absolutamente indispensável para a descoberta da verdade material a sua presença desde o início da audiência;
b) Se o tribunal considerar que a presença do arguido desde o início da audiência não é absolutamente indispensável para a descoberta da verdade material, ou se a falta do arguido for justificado, ao abrigo dos n.º 2 a n.º 4 do artigo 117.º, a audiência não é adiada, sendo inquiridas as testemunhas e ouvidos o assistente, os peritos ou consultores técnicos ou as partes civis presentes;
c) O arguido mantém o direito a prestar declarações até ao encerramento da audiência e se esta ocorrer na primeira data marcada, o advogado constituído ou o defensor pode requerer que seja ouvido na segunda data designada pelo juiz nos termos do artigo 312.º, n.º 2.

2 - As declarações referidas no número anterior serão documentadas, e ao caso nele previsto não se aplica o artigo 328.º, n.º 6.

O Sr. Presidente: - Vamos votar o artigo 7.º.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

É o seguinte:

Artigo 7.º
Meios de comunicação

Permite-se o alargamento da utilização dos meios de telecomunicação em tempo real à tomada de declarações ao assistente, às partes civis, às testemunhas, aos peritos ou consultores técnicos, residentes noutra comarca, a ser solicitada ao juiz dessa comarca, e ainda o recurso à teleconferência para ouvir os peritos ou consultores técnicos, nos próprios locais de trabalho, sempre que estes disponham dessa tecnologia.

O Sr. Presidente: - Vamos votar o artigo 8.º.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

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É o seguinte:

Artigo 8.º
Perícias

As perícias requisitadas às diversas entidades devem ser cumpridas dentro do prazo fixado pela autoridade judiciária, prevendo-se:
a) A possibilidade destas assegurarem o cumprimento desse prazo através da contratação de entidades terceiras, que não tenham qualquer interesse na decisão final ou ligação com o assistente ou com o arguido;
b) A necessidade de comunicação da impossibilidade de cumprimento do prazo fixado pela autoridade judiciária, para que esta possa determinar a eventual designação de novo perito.

O Sr. Presidente: - Vamos votar o artigo 9.º.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS-PP e do BE e votos contra do PCP e de Os Verdes.

É o seguinte:

Artigo 9.º
Despacho de pronúncia ou de não pronúncia

Encerrado o debate instrutório, o despacho de pronúncia ou de não pronúncia é logo ditado para acta, considerando-se notificado aos presentes, podendo o juiz fundamentar por remissão para as razões de facto e de direito enunciadas na acusação ou no requerimento de abertura da instrução.

O Sr. Presidente: - Vamos votar o artigo 10.º.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS e do BE e votos contra do PSD, do PCP, do CDS-PP e de Os Verdes.

É o seguinte:

Artigo 10.º
Sentença nos processos sumários e abreviados

No final da audiência de julgamento dos processos sumários e abreviados a sentença é logo proferida verbalmente e ditada para a acta.

O Sr. Presidente: - Vamos votar o artigo 11.º.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, do CDS-PP, de Os Verdes e do BE e a abstenção do PSD.

É o seguinte:

Artigo 11.º
Recursos

Os acórdãos absolutórios enunciados na alínea d) do n.º 1 do artigo 400.º, que confirmem decisão de 1.ª instância sem qualquer declaração de voto, podem limitar-se a negar provimento ao recurso, remetendo para os fundamentos da decisão recorrida.

O Sr. Presidente: - Vamos votar o artigo 12.º.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

É o seguinte:

Artigo 12.º
Duração

A autorização concedida pela presente lei caduca no prazo de 120 dias.

O Sr. Presidente: - Vamos agora proceder à votação final global do texto de substituição, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 41/VIII - Autoriza o Governo a alterar o Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de Fevereiro, alterado pelos Decretos-Leis n.º 387-E/87, de 29 de Dezembro, n.º 212/89, de 30 de Junho, e n.º 317/95, de 28 de Novembro, e pela Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, de Os Verdes e do BE e abstenções do PSD e do CDS-PP.

Srs. Deputados, terminadas as votações, o Sr. Secretário vai passar à leitura de vários pareceres da Comissão de Ética.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 6.º Juízo do Tribunal Criminal de Lisboa, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado João Cravinho a depor por escrito, como testemunha, num processo que se encontra pendente naquele tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial da Comarca de Ourique, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Mota Andrade a depor por escrito, como testemunha, num processo que se encontra pendente naquele tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer com o seguinte teor:

Que o Senhor Deputado Feliciano José Barreiras Duarte não deve ser autorizado e, consequentemente, suspenso para ser submetido a julgamento, no âmbito do processo

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que, sob o n.º 113/98.1.TACLO, corre seus termos no Tribunal Judicial da Comarca de Leiria.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos continuar a discussão do projecto de lei n.º 238/VIII - Reciclagem e regeneração de óleos usados e de solventes (PSD).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente.

Pausa.

Srs. Deputados, agradecia que aqueles que pretendam sair o façam o mais rapidamente possível e que os restantes façam silêncio.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente (Rui Gonçalves): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, agora que retomamos a discussão do projecto de lei n.º 238/VIII, do PSD, gostaria de começar por enquadrar o tema que aqui nos traz hoje. É importante recordar que, no último relatório da Comissão Europeia sobre a aplicação da legislação relativa a resíduos, a percentagem de óleos usados conduzida para regeneração, reciclagem ou para combustão nos países europeus pode ser bem ilustrada pelo facto de a média ponderada global de regeneração ou reciclagem na União Europeia ser de 36%, enquanto que a média ponderada global de combustão é de 64%. Estes números são conseguidos, em especial, devido às altas taxas de regeneração conseguidas em apenas dois países, a Alemanha, com 51%, e a Itália, com 48%. Nos restantes países, as percentagens de regeneração são bastante inferiores a este número, destacando-se a França, o terceiro maior país produtor deste tipo de óleos, com 18% de regeneração ou reciclagem.
Gostava também de salientar que nos Estados Unidos, outro país de referência nas áreas do ambientes, apesar dos grandes desenvolvimentos conseguidos nos últimos anos, apenas 18% dos óleos são reciclados ou regenerados.
No que respeita a Portugal, conforme os dados dos registos de resíduos industriais de 1998, é importante referir que já se recolhem cerca de 60 000 t de óleos usados, o que corresponde, mais coisa, menos coisa, a 50% do consumo anual de óleos usados em Portugal, recolhendo-se ainda qualquer coisa como 20 000 t de solventes usados. Como tal, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o que se passa no nosso país é que não estamos a começar a política de combate ao problema dos óleos usados. Muito pelo contrário, já muito se faz desde há muitos anos e gostaria, aliás, de referir que o princípio legislativo da luta aos óleos usados começou em 1985, com o Decreto-Lei n.º 216/85, de 28 de Junho, que definia já os princípios, as estratégias e as normas para a gestão dos óleos usados. Permito-me até recordar com surpresa que hoje vem aqui como primeiro subscritor deste projecto do PSD alguém que foi ministro do IX Governo Constitucional, que aprovou uma estratégia oposta à que hoje vem propor a esta Câmara.
Depois disso, ao longo dos anos, tanto os governos do PSD como os governos do PS seguiram a estratégia de prevenção, de reutilização, de reciclagem e, finalmente, de valorização e de destino final para os óleos usados. O último exemplo dessa estratégia já foi citado nesta Câmara pelas resoluções aprovadas este ano pelo Governo, correspondendo à gestão dos resíduos industriais perigosos.
Gostaria, portanto, de apontar a estranheza que este projecto de lei do PSD nos veio trazer. Em primeiro lugar, porque o PSD se propõe nacionalizar a gestão dos óleos usados e dos solventes, dizendo o seguinte: «As actividades de recolha, de reciclagem e de regeneração de óleos usados e de solventes são consideradas de serviço público e, como tal, exercidas mediante gestão directa do Estado ou em regime de concessão.». Ou seja, vamos excluir as diversas empresas que já existem no mercado português para tratar dos óleos usados e vamos nacionalizar a gestão dos óleos usados. Creio que isto é verdadeiramente extraordinário!
Em segundo lugar, proíbe-se a valorização energética de óleos usados e de solventes em todo o território nacional, ou seja, o que o PSD quer é, dizendo no preâmbulo do seu projecto de lei que uma das coisas que se pode fazer é a valorização energética, proibi-la. Bem sei que o Sr. Deputado José Eduardo Martins já desistiu do artigo 4.º deste projecto de lei, mas isso significa, praticamente, que desiste do projecto de lei, já que, à excepção da nacionalização do sistema de gestão, pouco mais dele resta.
Por não ser pouco importante, cumpre ainda dizer que o PSD se propõe criar um sistema burocrático, pesado, estatizado e que esteja a funcionar em apenas oito meses. Que maravilha! Convido desde já o Sr. Deputado José Eduardo Martins a fazer a apresentação do esquema funcional deste sistema e a dizer-nos como é que ele estará a funcionar em apenas oito meses.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Lá chegará o tempo!

O Orador: - Assim sendo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, creio que tem de ser dito à Câmara com clareza que, se o projecto de lei do PSD fosse aprovado, passaríamos a ser o único país do mundo em que seria proibida a valorização energética de óleos e de solventes usados. Seríamos obrigados a exportar, caso isso fosse permitido pelas regras da União Europeia, os óleos e solventes que não têm viabilidade de regeneração e que, como se sabe, representam uma percentagem muito significativa dos solventes, chegando a ultrapassar, provavelmente, os 50%. Durante a fase de transição, partindo do princípio de que esta iria durar apenas oito meses, iríamos correr o risco gravíssimo de a situação ambiental piorar dramaticamente no nosso país, porque iríamos dizer aos operadores económicos que já estão instalados e têm projectos ou que se estão a instalar, que o melhor era abandonarem a sua actividade.
Por fim, cabe colocar esta questão: será que o PSD crê que os problemas do País, nomeadamente os problemas do ambiente, se resolvem por uma simples proibição? Se for o caso, posso sugerir ao Sr. Deputado José Eduardo Martins que proíba, simplesmente, a produção de resíduos. É mais simples, é mais económico e é mais óbvio proibirmos a produção de resíduos, já que escusamos de estar aqui a discutir!
Sr. Presidente e Srs. Deputados, antes de terminar quero apenas lembrar que há uma estratégia que está a ser executada no nosso país para a gestão dos óleos usados. Há já unidades a funcionar em Portugal, como a Ecosocer,

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uma unidade de regeneração e reciclagem de solventes a funcionar em Pombal, tendo uma capacidade de 5000 t por ano, e a unidade de refinação de óleos usados da Enviroil, em Torres Novas, que vai fazer valorização térmica de óleos depois de devidamente recuperados, com uma capacidade de 13 400 t/ano.
Com a instalação destas unidades e de outras que estão em projecto, estão criadas as condições necessárias para um salto qualitativo na gestão dos óleos usados no nosso país. Assim, não está em causa a preferência que estrategicamente deve ser dada à prevenção, à regeneração e à reciclagem, obedecendo sempre às determinações legais portuguesas e comunitárias.
Se aprovássemos o projecto de lei do PSD, iríamos optar por uma estratégia estatizada e fundamentalista que iria pôr um travão às medidas concretas, correctas e claras que estão a ser tomadas neste momento no nosso país.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Governo considera que este projecto não é apenas um projecto inútil, mas é também um projecto ambientalmente contraproducente.

Aplausos do PS.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente João Amaral.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado, este é o drama de ter o discurso feito antes de ouvir o que os outros têm para dizer, porque, depois, perde-se metade do tempo a elaborar sobre aquilo que não foi dito.
Quanto a essa blague da proibição de produção de resíduos, o senhor pode viver com ela, como pode viver com esse número fantasioso das 60 000 t/ano de óleos usados recolhidos.
Gostaria, no entanto, de perguntar-lhe se já alguma vez foi à Ecosocer ou à Autovila, ou à Enviroil. Aliás, quanto à Enviroil não sei, porque com a Enviroil não tenho contacto, mas em relação às outras duas, pelo menos, devo dizer que apoiam o projecto do PSD. É que são esses industriais que o senhor diz que vão ficar lesados com a alegada estatização que ainda há meia hora me enviaram mensagens para o telemóvel a dizer: «Sucesso! Vá em frente, porque essa é a estratégia adequada».

Risos do PS.

O Sr. Casimiro Ramos (PS): - Por isso é que ele estava a tocar!

O Orador: - Portanto, aqueles que o senhor vem dizer que quer defender da estatização serão os primeiros a desmenti-lo na prática, porque não há qualquer recolha de 60 000 t de óleos usados em Portugal.
O que o senhor faz, tomando-o por bom, é aceitar os números do Instituto dos Resíduos, que não têm em conta a duplicação de registos dos produtores e dos recolhedores. Se o senhor tivesse atenção à duplicação de registos, perceberia que isso é uma falácia, porque não se recolhe essa quantidade. Fale com quem os recolhe! Fale com as empresas licenciadas para a recolha de óleos e solventes sobre os registos de toda a recolha que eles fazem e venha-me cá falar, a mim, de 60 000 t!
Quanto à regeneração, pergunto-lhe se está o Governo disponível para legislar proibindo a venda de óleos, o que, como sabe, é o que toda a gente que intervém no sector considera essencial. Isto porque somos o único país da União Europeia onde os resíduos têm um valor positivo, isto é, são comercializados, vendáveis. Estará o Governo disposto a tomar alguma iniciativa nesse sentido?
Que iniciativa tomou o Governo, e falo mais uma vez pelos industriais do sector, para que se promova a regeneração de óleos no nosso país? É licenciando as entidades de queima, que são concorrentes directas por força da desregulação económica que os senhores promovem, que pensam lá chegar? Por amor de Deus!
Já agora, Sr. Secretário de Estado,…

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, tem de concluir, porque esgotou o seu tempo.

O Orador: - Concluo de imediato, Sr. Presidente, lembrando que no dia 8 de Abril, o mesmo interlocutor, respondendo ao Sr. Deputado Francisco Louçã, refere no que respeita aos óleos usados: «…tendo em conta a situação actual e os meios ao dispor para a regeneração, a recuperação, a reciclagem e a valorização de óleos usados, é natural que a função da co-incineração seja posta de lado em relação a este tipo de resíduos». Portanto, a questão é se mantém o que foi afirmado, ou seja, se o Governo, ao fim e ao cabo, vai avançar com a co-incineração,…

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, não me fiz entender?

O Orador: - … se vai ou não vai haver regeneração de óleos e solventes.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente: - Sr. Presidente, em relação às palavras do Sr. Deputado José Eduardo Martins - e dada, talvez, a minha pouca prática parlamentar -, devo dizer que não conhecia ainda o suporte a diplomas por mensagens para telemóvel.

Risos do PS.

Mas penso que vou tomar nota dessa nova figura de suporte técnico às propostas dos parlamentares.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - São as novas tecnologias!

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Fale de coisas sérias, fale do problema!

O Orador: - Contudo, gostaria de assinalar que aqui se trata apenas de uma questão de bom senso. O projecto de lei do PSD propõe a gestão exclusiva pelo Estado ou, então, a concessão, em exclusividade, a uma única empresa - recorde-se o articulado do projecto.
Ora, como é óbvio, se já existem vários operadores no mercado, que felizmente actuam em concorrência, certamente que com o sistema proposto pelo Sr. Deputado José Eduardo Martins, quando muito, haveria apenas um deles que ficaria a gerir o sistema, enquanto que os outros ficariam de fora.

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O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - O Sr. Secretário de Estado não leu. Leia de novo!

O Orador: - Não sei qual é o operador que já tem o acordo com o Sr. Deputado José Eduardo Martins para a gestão dos resíduos. Entendo, todavia, que existem dois aspectos que devem ser realçados em relação à sua intervenção, Sr. Deputado, sendo o primeiro que o Sr. Deputado refere o valor económico dos óleos usados. Com certeza, Sr. Deputado! Hoje em dia ainda há, de facto, um valor económico para os óleos usados. Esse valor económico tem vindo a decrescer e continuará a decrescer com o aumento da capacidade de tratamento dos óleos e com as exigências de tratamento. Certamente que esse valor económico chegará a zero, podendo mesmo vir a ser negativo.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - É mentira!

O Orador: - Em relação a essa evolução da situação, a que o Governo está atento, está a ser estudado um sistema que viabilize a continuidade do tratamento e da gestão dos óleos usados, desde que haja capacidade de tratamento no nosso país. Não podemos, portanto, como é óbvio, «pôr o carro à frente dos bois». Se não há capacidade para o tratamento nem para a regeneração, o facto de se estar a proibir a venda dos óleos usados é apenas um convite às pessoas que os vendem a atirá-los para o rio ou pela ribanceira abaixo. Ora, não me parece que o Sr. Deputado considere isto uma solução ambientalmente aceitável.
Finalmente, quanto à referência que o Sr. Deputado faz às minhas afirmações nesta Casa, há uns meses, quanto à co-incineração, quero dizer-lhe que, com certeza que eu referi, como o Governo sempre disse e já por mais de uma vez nesta Casa, que a co-incineração é uma solução última e de destino final para os resíduos que não podem ter outro tipo de tratamento.
Por isso, não vejo por que é que o Sr. Deputado José Eduardo Martins volta a insistir nessa tecla quando a própria empresa dos resíduos, a Scoreco, também já teve a oportunidade de referir que isso não é indispensável nem crítico, nem os seus projectos económicos foram feitos com base nessa versão.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem de concluir, Sr. Secretário de Estado.

O Orador: - Concluo, Sr. Presidente, dizendo que os óleos usados não são nem serão o «filet mignon» das empresas de co-incineração.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - O Sr. Deputado José Eduardo Martins levantou-se?

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Sim, Sr. Presidente, porque me parece que o CDS-PP fez a gentileza de me ceder uns minutos…

O Sr. Presidente (João Amaral): - Eu admito que sim, Sr. Deputado, mas é um hábito da Casa ser eu a dar-lhe a palavra.

Risos do PS.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Muito obrigado, Sr. Presidente. Respeito os hábitos da Casa, embora seja novo e não esteja muito habituado à táctica parlamentar.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Já não é tão novo quanto isso, Sr. Deputado...

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Olhe que sou, Sr. Presidente!
Pelos vistos, quem está muito habituado à táctica parlamentar é quem, em vez de ir ao fundo das questões, discute os apartes das mensagens para os telemóveis. Mas isso é só incomodidade com o desconhecimento da situação no terreno.
Só que há algo que é importante precisar, que é o seguinte: como o Sr. Secretário de Estado não é jurista, permitiu-se fazer uma leitura apressada do artigo 3.º do projecto de lei n.º 238/VIII, apresentado pelo PSD, presumindo a exclusividade. Ora, se tivesse lido o artigo como ele deve ser lido, perceberia que os termos dessa exclusividade serão definidos no âmbito da concessão.
Já agora, se fosse um governante responsável,...

Protestos do PS.

O Orador: - ... com certeza que conheceria em detalhe a experiência comparada da Catalunha, onde o mesmo sistema não criou obrigações para os dinheiros públicos, pelo contrário, regulou a situação de uma vez por todas, permitindo a regeneração de óleos usados. Porque a verdade, e essa o Sr. Secretário de Estado não pode escamotear, é que em cinco anos do vosso governo não se regenerou um litro de óleo em Portugal.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Há pouco, o Sr. Deputado José Eduardo Martins levantou-se tão depressa que me esqueci que havia uma inscrição antes da sua.
Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Casimiro Ramos.

O Sr. Casimiro Ramos (PS): - Sr. Presidente, não há qualquer problema. Aliás, os poucos minutos que vou usar têm por base a intervenção do Partido Popular e não usei, na altura, a figura regimental do pedido de esclarecimento porque os termos utilizados na intervenção do Sr. Deputado do Partido Popular justificam a figura regimental da intervenção.
Peço, pois, a atenção do Sr. Deputado Álvaro Castello Branco para lhe dizer claramente o seguinte: compreendemos que, de facto, não domine profundamente esta matéria, que não tenha acompanhado, nos últimos meses, a evolução deste processo, e que não tenha, sequer, abordado o projecto em discussão, mas não aceitamos de maneira alguma e repudiamos claramente que utilize o termo «falacioso» em relação a qualquer membro do Governo do Partido Socialista sem que tenha qualquer razão para isso.
Falacioso, Sr. Deputado, é que, depois de o Governo dizer, por várias vezes, que vai cumprir um projecto de atribuição de aterros até ao final do ano, o Partido Popular continue a dizer que o Governo não o vai fazer.
Quero informá-lo que quem disse, nesta Câmara, que o projecto de aterros devia ser reconsiderado e talvez até adiado para sempre, para prolongar por muito tempo estudos e estudos, foram Os Verdes.

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Quero também dizer-lhe, Sr. Deputado, que falacioso é invocar a saúde pública quando o Partido Popular é o primeiro a adiar as reformas que devem ser feitas nesta matéria. Falacioso, Sr. Deputado, é reivindicar louros por leis propostas pelo Partido Popular que foram aprovadas, e ser agora o próprio Partido Popular a não querer cumprir essa mesma lei que propôs nesta Assembleia.
Para terminar, Sr. Deputado - e compreendo que não saiba do que é que estou a falar, porque eventualmente não acompanhou a elaboração dessa lei -, falacioso é o Partido Popular querer passar por santo quando, afinal, é o pecador.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - O Sr. Deputado Álvaro Castello Branco pede a palavra para que efeito?

O Sr. Álvaro Castello Branco (CDS-PP): - Para defesa da honra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - O Sr. Deputado não pertence à direcção da sua bancada, portanto…

O Sr. Álvaro Castello Branco (CDS-PP): - Sr. Presidente, é para defesa da minha honra pessoal!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sim. Mas, nos termos regimentais, só lhe posso dar a palavra para defesa da sua honra pessoal no fim do debate.

O Sr. Álvaro Castello Branco (CDS-PP): - Então, Sr. Presidente, inscrevo-me para usar da palavra para esse efeito no final do debate.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Com certeza, Sr. Deputado.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A finalizar este debate, que julgo que foi bastante elucidativo sobre o estado da arte relativamente à questão da gestão dos óleos usados e dos solventes no nosso país, cabe-me notar o seguinte: a situação que temos no nosso país em relação à gestão de óleos usados e de solventes tem feito progressos assinaláveis, e não apenas nos últimos cinco anos, pois desde há 15 anos que o País tem avançado nesta área.
Trata-se de uma área, obviamente, difícil, em que não é de um momento para o outro que se resolvem os problemas, mas é absolutamente lamentável que, quando se estão a dar passos sólidos, concretos, com grandes volumes de óleos usados que estão a ser recuperados e que podem ser regenerados ou valorizados energeticamente, venha um partido responsável fazer uma proposta, que eu quase me atreveria a classificar como de terrorista, que destruiria tudo aquilo que tem sido feito nos últimos 15 anos.
No entanto, penso que este debate nos permitiu avaliar, especialmente pelas intervenções do Sr. Deputado José Eduardo Martins, que o próprio PSD reconhece que o diploma que apresentou não tinha meios, nem capacidades, nem estrutura para ser aprovado nesta Câmara. E recordo apenas dois aspectos: em primeiro lugar, o Sr. Deputado José Eduardo Martins já prescindiu do principal do artigo 2.º do seu projecto de lei, ou seja, já disse que isto não precisava de ser tratado directamente pelo Estado, não precisava de ser tratado em exclusividade, por isso arrumou com uma parte fundamental do seu projecto de lei. Em segundo lugar, acabou também por desistir daquilo que foi talvez a maior bandeira que foi agitada ao longo dos últimos meses, pois prescindiu da proibição da valorização energética dos óleos usados. Creio que faz muito bem, Sr. Deputado! Não tinha qualquer sentido propor a proibição da valorização dos óleos usados.
Julgo que agora, consequentemente e com lógica, só restará ao PSD retirar este projecto de lei, pois não há qualquer razão para o manter em agendamento, dado que acabou de se provar que a sua valia, a sua ideia, o seu leit motiv não tinha qualquer base nem qualquer fundamento.

Aplausos do PS.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Para uma intervenção, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra, Sr. Deputado. Dispõe, para o efeito, de 1 minuto e 46 segundos.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O tempo que me resta é quanto basta para que o Sr. Secretário de Estado do Ambiente não saia daqui por esclarecer, porque, efectivamente, de duas, uma: ou continua a querer forçar a demagogia, dizendo o que eu não disse, ou continua não perceber o que é óbvio. E o que é óbvio é que o princípio da recusa da destruição térmica continua de pé.
A proposta do PSD, se bem me ouviu quando fiz a intervenção, é no sentido de admitirmos processos como o da Enviroil apenas em relação aos óleos que não possam ser regenerados, e isso só acontece aos que estão demasiado contaminados - aliás, ainda ontem se demitiu o Inspector-Geral do Ambiente, o que prova que os senhores, de facto, não têm qualquer inspecção do ambiente e, portanto, nem as condições de acondicionamento e de transporte dos óleos verificam -, mas não admitimos nunca que sejam o «filet mignon» da queima para as cimenteiras, como toda agente sabe muito bem que os senhores queriam.
Por outro lado, não prescindi de rigorosamente mais nada no meu projecto de lei, o Sr. Secretário de Estado é que não o soube ler, mas disso a culpa já não é minha.
E, a terminar, sublinho: o senhor fez tantos progressos em cinco anos mas não regenerou um litro de óleo, repito, um litro de óleo! E em relação aos solventes, os progressos que o País fez não os deve, nem num milímetro, à actuação do seu Governo, deve-os, única e exclusivamente, à actuação da empresa privada que o senhor referiu.
Portanto, não cante loas nem se gabe daquilo que não fez! O que se tem feito não tem sido por vossa intervenção, porque por vossa vontade, já ficou claro, tudo se queimava e tudo se resolvia queimando.

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O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: - O Sr. Deputado José Eduardo Martins veio confirmar aquilo que eu tinha afirmado, porque acabou de dizer - e agora pode verificar se eu cito correctamente ou não - que apenas os óleos que não podem ser regenerados podem ser valorizados termicamente. Com certeza! Esses são os princípios gerais aceites, desde há uma eternidade, tanto em Portugal como pelo mundo. Assim, não teria qualquer interesse o seu projecto de lei.
Gostava ainda de referir que ainda bem - e o Governo defende isso - que há empresas privadas a actuar neste sector. É isso que queremos incentivar e que temos feito. As empresas privadas apareceram porque existe um sistema que permite que elas existam, e o que o Sr. Deputado vem hoje propor é que se acabe com a intervenção privada neste sector. É uma contradição total, Sr. Deputado!
E já agora que fez, a despropósito, um comentário sobre o abandono de funções do Sr. Inspector-Geral do Ambiente, aproveito a minha presença nesta Câmara para, em nome do Governo, agradecer o grande trabalho e o grande papel que ele fez durante os anos em que esteve à frente da Inspecção-Geral do Ambiente. Ele vai agora assumir funções de grande responsabilidade, que muito o honram e também muito honram o Ministério do Ambiente por ele ter sido escolhido para essas funções.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Como não há mais inscrições, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Castello Branco para defesa da sua honra pessoal.

O Sr. Álvaro Castello Branco (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Casimiro Ramos, compreendo que V. Ex.ª fique extremamente nervoso com a intervenção do CDS-PP, porque é evidente que o Partido Socialista tem consciência de que, nesta questão, conduziu sempre mal o processo. E, quando me refiro ao Partido Socialista, refiro-me não só ao Governo como à bancada do Partido Socialista, que tanto apoio lhe tem dado.
Sr. Deputado, não me venha dizer que não é brincar com a saúde pública dos portugueses o facto de o Governo apenas ter entregue o estudo dos riscos da co-incineração a um grupo médico especializado após dois anos e por imposição da Assembleia da República, ao aprovar a lei que aqui foi aprovada há dois ou três meses. Isso é brincar com a saúde dos portugueses, porque não se fazem processos destes sem primeiro se avaliar todos os perigos que podem advir daí para a saúde pública. E sabemos que estas coisas acontecem, como sabemos o que está a acontecer por um relatório da Quercus, que o Sr. Deputado José Eduardo Martins já aqui referiu hoje, isto é, que, neste momento, há padarias, por exemplo, que utilizam esses óleos. Se isto não é brincar com a saúde dos portugueses, diga-me o que é, porque não entendo!
Quanto à questão da falácia, o termo que tanto o incomodou e com o qual tão ofendido parece ter ficado, devo dizer-lhe que defini o que queria dizer com esse termo, não por palavras minhas mas por palavras de um filósofo português, dizendo que era fazer crer que é aquilo que não é, mediante uma visão fictícia, sem consistência real.
Peço-lhe desculpa, Sr. Deputado, mas é exactamente esta a atitude que o Governo tem tido relativamente a esta matéria.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, penso que as minhas palavras e a posição do CDS-PP estavam correctíssimas quando fiz, há bocado, em nome da minha bancada, aquela intervenção.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro Ramos.

O Sr. Casimiro Ramos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Álvaro Castello Branco, pareceu-me, efectivamente, que, na curta intervenção que fiz, não ofendi a honra de V. Ex.ª. Efectivamente, na intervenção que agora produziu, não focou qualquer caso em que eu o tivesse ofendido. No entanto, se a figura regimental de defesa da honra do Governo pudesse utilizada por esta bancada, eu tê-la-ia utilizado, porque o que aconteceu foi que o Sr. Deputado ofendeu a honra do Governo na sua intervenção.
O Sr. Deputado, no seu discurso, dizendo que o que parece é, ou não é, a verdade é que disse o que não queria, ou não poderia, porque tudo aquilo que referiu aplica-se exclusivamente à postura com que o PP, ao longo de todo este processo e de muitos outros mais, demagogicamente, continua a estar na política.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, está encerrado o debate do projecto de lei n.º 238/VIII. A sua votação far-se-á no próximo dia em que houver votações regimentais.
Passamos ao último ponto da ordem de trabalhos, que consta da apreciação, na generalidade, do projecto de lei n.º 297/VIII - Proíbe a passagem de navios contendo cargas radioactivas na Zona Económica Exclusiva (ZEE) Portuguesa (Os Verdes).
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O nuclear representa um perigo para a humanidade, uma ameaça à segurança do planeta. De Hiroshima a Nagasaki, de Rhode Island a Chernobyl mais recentemente, exemplos não faltam a confirmar esta afirmação, nos sinais de uma opção, cuja dramática herança prevalece como uma ameaça. Ameaça que não podemos ignorar e que, em nome da saúde pública, do equilíbrio dos ecossistemas, das segurança, da paz, da vida, da solidariedade para com o futuro, é nossa responsabilidade evitar.
Portugal rejeitou, felizmente, e bem, no final da década de 70, a opção nuclear. O nosso país não está, contudo, imune aos riscos que a opção nuclear de outros pode implicar. Riscos que chegam de terra, por um lado, da vizinha Espanha, com as suas centrais nucleares. Riscos que chegam do mar, com a passagem regular de navios com cargas radioactivas em águas sob jurisdição portuguesa.
E se é certo que a existência de centrais nucleares espanholas e o quase esgotamento da sua capacidade de armazenamento tem regularmente levado o Estado espanhol,

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a tentar impor a instalação de um cemitério nuclear para resíduos de alta actividade junto à nossa fronteira, na bacia do rio Douro, certo é também que o Estado português se tem oposto frontalmente a esse projecto. Projecto esse que, a concretizar-se, iria lesar o País, pôr em causa a segurança do Estado, o equilíbrio dos ecossistemas, o desenvolvimento - projecto, precisamente por isso, que Portugal recusou.
E é, justamente, em nome do mesmo país, dessa mesma segurança, desse mesmo equilíbrio dos ecossistemas e dessa mesma responsabilidade que o presente projecto de lei de Os Verdes, ora apresentado, é proposto perante uma ameaça similar. A ameaça grave, real, indisfarçável que nos vem do mar e perante a qual se reclama uma diferente atitude do Estado português. A atitude firme de oposição que, hoje e aqui, se exige e propõe, e não tem sido adoptada pelo Estado português, contra a passagem de navios com cargas radioactivas de elevada perigosidade que, nos nossos dias, cruzam livremente as nossas águas.
Cargas marítimas que, duas a três vezes por ano, atravessam, sem qualquer interdição por parte de Portugal, a nossa zona económica exclusiva. Plutónio reprocessado procedente do Reino Unido e da França, com destino ao Japão, para cumprir o seu programa nuclear que envolve transporte marítimo, transporte esse que se prolongará, admite-se, pelo menos por mais duas décadas.
Transportes cujas possíveis rotas são todas elas lesivas para Portugal. Rotas que, invariavelmente, têm significado passagens pela nossa ZEE, passagens essas que representam um elevado e inútil risco para um valioso património dos nossos mares, cuja protecção nos cabe. Uma protecção que se impõe e é fundamental numa perspectiva de eco-segurança, num país cujo litoral português se coloca numa situação particularmente fragilizada, nos seus mais de 850 km de fronteira marítima, perante estas passagens e os riscos porventura irremediáveis que comportam para as zonas costeiras. Riscos para a saúde pública, para os ecossistemas marítimos, para a manutenção das próprias actividades económicas que dependem do mar, designadamente a actividade turística e a das pescas.
Passagens que são perigos inaceitáveis também nas regiões autónomas: na Região Autónoma dos Açores, recorde-se, ao cruzar, no Verão passado, em 1999, as suas águas com toneladas de plutónio; na Região Autónoma da Madeira, igualmente, três anos antes, ao penetrar 40 milhas nos seus mares com igual carga mortífera.
Materiais de enorme perigosidade, milhares de toneladas de que basta um grama, sabe-se, para afectar o ecossistema, entrar na cadeia alimentar, provocar dano irreversível. Cargas, cujos resíduos e efeitos prevalecem durante décadas se libertadas, e transportes que podem sofrer acidentes. Acidentes, aliás, que não são de excluir, já que, particularmente em matéria do nuclear, comprovadamente, nenhuma segurança é absoluta!
É assim que o presente projecto de lei de Os Verdes, agora em discussão, que visa proibir a passagem de navios com cargas radioactivas na ZEE, se entende e justifica. Perante a obrigação do Estado português em preservar o ambiente, os seus recursos e ecossistemas costeiros e marinhos e o dever de, de acordo com as normas do direito internacional, agir no interesse da manutenção da paz e da segurança. Perante o direito de Portugal, como Estado costeiro, dever proteger-se contra potenciais, graves e irremediáveis danos à sua segurança, como objectivamente este é o caso.
Um projecto de lei, ainda, perante a necessidade de dar corpo a princípios fundamentais consagrados na Constituição da República Portuguesa, assim respeitando integralmente também o princípio da precaução, amplamente consagrado no domínio do direito internacional. Princípio da precaução esse, seus instrumentos e opções políticas a que alude, a propósito do valor dos oceanos, o relatório da Comissão Mundial Independente dos Oceanos, presidida pelo Dr. Mário Soares, que passo a citar: «Onde existam ameaças de riscos sérios ou irreversíveis, não será utilizada a falta de certeza científica total como razão para o aditamento de medidas eficazes, em termos de custos, para evitar a degradação do ambiente. Trata-se do princípio da precaução, expresso na Declaração do Rio: uma das suas aplicações foi já a moratória sobre a caça à baleia para fins comerciais, imposta pela Comissão Internacional da Baleia, em 1985. A partir dessa altura, o conceito tem sido aprofundado e geralmente aceite, como se prova pela sua incorporação numa série de acordos recentes, como o Acordo-Quadro sobre Alterações Climáticas. O princípio da precaução é, assim, uma declaração sobre graus de risco socialmente aceitáveis e sobre o ónus da prova. O princípio da precaução, por outras palavras, invocado para evitar decisões de que a sociedade possa mais tarde vir a arrepender-se.»
Princípio da precaução consagrado, pois, de forma inequívoca, na Convenção das Nações Unidas sobre Direito do Mar, ratificada por Portugal e publicada em Outubro de 1997. Princípio a que se alude ainda no conjunto, aliás muito vasto, de reservas que Portugal formulou aquando da sua vinculação àquela Convenção no âmbito da actividade fiscalizadora que a Portugal compete assumir. Uma fiscalização que, perante uma actividade de elevado risco - a livre passagem de cargas radioactivas - reclama proibição, aplicando precisamente aquele princípio na nossa zona económica exclusiva.
A proposta que fazemos nada tem, aliás, de inédito na história recente do direito internacional, já que dezenas de outros Estados costeiros têm adoptado igualmente tal proibição para navios com materiais nucleares na sua zona económica exclusiva. Exemplos muitos, de que poderia citar o do Brasil, que evocou precisamente o direito de proteger a saúde dos seus cidadãos e dos seus ecossistemas marítimos para o fazer.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o objectivo do nosso projecto é claro, a sua relevância inquestionável. A importância que assume para o interesse nacional, a defesa dos nossos ecossistemas, do ambiente, da saúde e do desenvolvimento sustentável é evidente, e é minha convicção que este é um objectivo político que dificilmente pode ser contestável num país que recusou - sublinho - a opção nuclear. E é precisamente em torno desse objectivo político que vos propomos, que somos, que sois cada um de vós, Srs. Deputados, interpelados e chamados a pronunciar-se.
Outros juízos não nos cabem, e se dúvidas houver (sobre matéria jurídica), elas deverão ser dirimidas por quem de direito, pela instância e sede próprias: o Presidente da República e, se esse for o caso, o Tribunal Constitucional.
Para nós a escolha é politicamente muito clara: decidir, prevenir e agir em nome da vida ou admitir, em nome de quaisquer outros interesses, a manutenção de um risco que, de modo irreversível a vida pode seguramente lesar.

Aplausos de Os Verdes.

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O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Santos.

A Sr.ª Maria Santos (PS): - Sr. Presidente, caros colegas, Sr.ª Deputada, não tenho qualquer dúvida de que o recurso à energia nuclear está condenado, quer por razões históricas e científicas, quer pela própria evolução sócio-económica e política na Europa, onde os reformismos de influência ambiental ganham cada vez mais espaço. Basta ler os sinais que nos chegam e que apontam para a emergência de políticas energéticas alternativas. Senão, vejamos: os Estados membros da União Europeia favoráveis ao nuclear são minoritários no Conselho. A Alemanha afirmou-se como a primeira grande potência industrial a renunciar ao nuclear, na sequência do acordo que fez com a indústria do sector, que envolverá, felizmente, o encerramento das suas 19 centrais e a proibição do reprocessamento de combustíveis nucleares. Mais recentemente, a Ministra do Ambiente francesa declarou que o governo francês irá elaborar um plano de gestão de resíduos radioactivos assente no princípio da proximidade - o que é uma boa notícia! E já este ano, em Julho, o Parlamento Europeu realizou uma audição pública sobre a segurança de transportes de cargas radioactivas, visando o estabelecimento de parâmetros mais restritivos de monitorização e controlo. Como vemos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, os sinais de mudança são claros e generalizados.
Evidentemente que este é um dossier complexo, que não permite nem uma leitura facilitista, nem uma política descartável ou isolacionista. É bom que tenhamos presente que os impactos radioactivos não param nas fronteiras ou nos limites das águas territoriais e que, efectivamente, só os esforços políticos multilaterais e concertados podem minimizar situações como Chernobyl, na Ucrânia, como a central de Temelin, na República Checa, ou como a central de Cernavoda, na Roménia, ou controlar outros casos gritantes que, infelizmente, ainda estão disseminados pela Europa Central e de Leste. O Grupo Parlamentar do PS considera que um proibicionismo de artigo único, como nos é apresentado, ao arrepio dos compromissos que Portugal assume internacionalmente, não servirá melhor o País e os portugueses. Evidentemente que o grupo socialista está interessado em implementar medidas que mantenham Portugal na linha mais progressista e coerente neste domínio. Não esqueçamos que se deve à persistência e à capacidade negocial portuguesas a inclusão na Convenção de Ospar, em 1977, a interdição de descargas radioactivas no mar.
Parece-nos, pois, ser no âmbito da Convenção de Ospar que deveríamos propor normas mais restritivas para reforçar o controle de transportes de cargas radioactivas e também preparar, para a próxima conferência das partes da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, uma proposta que suscitasse a possibilidade do estabelecimento de rotas pré-fixadas para esse tipo de movimento de navios. Pergunto-lhe, assim, qual é a disponibilidade e o interesse do vosso grupo parlamentar em contribuir para este tipo de soluções.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, muito rapidamente, porque o tempo é curto, direi à Sr.ª Deputada que o nosso é o compromisso com o direito à vida e é um compromisso contra uma opção nuclear que não é a nossa. Entendo que os países da Europa com uma opção nuclear têm de ter uma calendarização para sair das suas opções nucleares e encontrar soluções alternativas. No nosso caso, é muito claro: Portugal deve, desde já - e fazendo uso de princípios consagrados em documentos, em Convenções que ratificou -, defender uma solução imediata. Naturalmente que os outros terão de ter posições gradualistas de saída em relação a opções que tomaram. Mas o nosso compromisso é com a vida e julgo que, sobre esta matéria, não há outra saída que não a que nós propomos, independentemente de devermos influenciar os outros Estados na comunidade internacional a encontrar soluções de menorização de risco para o transporte tão perigoso quanto é o de cargas de radioactivas.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Lucília Ferra.

A Sr.ª Lucília Ferra (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Portugal, com uma costa de mais de 800 km, desde cedo sentiu uma particular necessidade de defesa e de preservação do espaço marítimo.
A preocupação nacional de combate à poluição marítima e de salvaguarda do meio ambiente envolvente encontra-se patente na adopção dos princípios enunciados nas Convenções de Oslo (1972), de Londres (1972), de Paris (1974) e de Ospar (1992), das quais Portugal é parte contratante, mas também nos princípios enunciados pela Convenção Internacional para a Prevenção de Poluição por Navios [MARPOL (1973)], respectivo protocolo, anexos e emendas, que Portugal ratificou, e, mais recentemente, na Convenção de Montego Bay.
Também a Lei de Bases do Ambiente, cujo regime jurídico é aplicável por norma expressa às águas da zona económica exclusiva, revela uma clara preocupação com a defesa do património marítimo, ao proibir, de forma inequívoca, o lançamento, a deposição ou a introdução nas águas de resíduos radioactivos e de produtos que contenham substâncias ou microrganismos que possam alterar as suas características e degradar o ambiente.
O Plano Mar Limpo, aprovado pela Resolução n.º 25/93, de 15 de Abril, estabelece o enquadramento legal em caso de derrame ou de ameaça iminente de poluição, dotando os órgãos da Administração Pública de mecanismos legais para o efeito, sem prejuízo de estabelecer as responsabilidades e competências atribuídas a cada uma das entidades envolvidas, em matéria de prevenção e combate à poluição marítima. Igualmente o Código Penal Português, nos artigos 279.º e 280.º, revela a consciência do legislador penal para a importância de salvaguardar este recurso natural, ao tipificar o crime de poluição marítima, punindo os respectivos infractores.
Recentemente, o Governo, devido à pressão da opinião pública, aprovou um regime especial de ilícitos de mera ordenação social, em matéria de poluição do meio marinho sob jurisdição marítima nacional, incluindo os espaços da zona económica exclusiva, bem como factos praticados em áreas de alto mar, não abrangidas pela jurisdição de qualquer Estado, por agentes poluidores que possuam bandeira nacional.
Esta medida legislativa veio elevar substancialmente o valor das coimas a aplicar à prática de contra-ordenações

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de poluição marítima, procurando responsabilizar os agentes poluidores.
Se, no plano do direito internacional e do direito interno, existe uma preocupação de protecção e salvaguarda do meio marinho, o mesmo não se poderá dizer quanto aos instrumentos e mecanismos disponibilizados pelo Governo para uma efectiva fiscalização e controlo do nosso espaço marítimo.
Enquanto vários países europeus possuem já sistemas de vigilância por satélite, Portugal continua a ser o único Estado membro da União Europeia que não possui um sistema de controlo da sua costa por vídeo de longo alcance, susceptível de identificar e controlar todo o tráfego marítimo, permitindo a sua reorientação e evitando a passagem por zonas ambientalmente sensíveis.
Sr. Presidente, Sr. Deputados: Vem, agora, o Partido Ecologista Os Verdes apresentar uma iniciativa legislativa que pretende ir mais além na efectiva protecção do meio ambiente marítimo, propondo a proibição da passagem de navios contendo cargas radioactivas na zona económica exclusiva portuguesa.
Para tal, invocam a necessidade de preservação dos recursos estratégicos que os mares representam, na perspectiva das actividades económicas - turismo e pescas -, mas também na perspectiva da defesa do ambiente, da saúde pública e da segurança interna, sendo que a possibilidade de um acidente envolveria uma verdadeira catástrofe de dimensões alarmantes, comprometedoras do equilíbrio ecológico.
Alegam ainda que o princípio da precaução, consagrado na Conferência do Rio, que o Estado português ratificou, deve funcionar nesta situação, não devendo o nosso país, ao recusar a opção nuclear, a ela expor-se por via de interesses e de políticas que não são as suas.
Se a iniciativa de Os Verdes tem o mérito aparente de tentar dar mais um passo na salvaguarda do meio ambiente, ela esbarra, contudo, nos obstáculos decorrentes dos normativos de Direito Internacional Público, a que o nosso País se encontra vinculado, nomeadamente no instituto jurídico de passagem inofensiva, regulado na Convenção de Montego Bay, ratificada por Portugal, em 1997.
Ora, se um Estado não pode impedir a passagem inofensiva, pelo seu mar territorial, de navios transportando resíduos radioactivos, muito menos gozará dessa prerrogativa num espaço onde a sua soberania é muito mais difusa, como acontece com a ZEE.
Mas se a compatibilização entre o ordenamento jurídico interno e o direito internacional deve impedir a aprovação do presente projecto de lei, mantém-se a necessidade imperiosa de apresentação de um plano de fiscalização e vigilância da costa e das águas sob jurisdição nacional, que o Governo, levianamente vai adiando.
Uma vez mais, reiteramos aqui a exigência do PSD, que é também, sem dúvida, uma exigência nacional, de elaboração de um plano de controlo e fiscalização das nossas águas, plano esse que integre os meios e as tecnologias disponíveis, de forma a garantir uma efectiva protecção das nossas águas territoriais.
Nestes termos, saudamos o projecto de resolução n.º 80/VIII, originário de Os Verdes, uma vez que este vem, clara e inequivocamente, ao encontro das propostas defendidas pelo PSD, em diversos momentos do debate político.
Todavia, também no ambiente, à semelhança das outras áreas governativas, se tornou notório que o Sr. Primeiro-Ministro, entediado com os ajustes de contas entre as várias tendências socialistas e as lutas de pré-posicionamento sucessório e acossado por uma bancada de correligionários despromovidos, que se acham injustiçados, deixou definitivamente de se preocupar com o País.

Protestos do PS.

É tempo de os portugueses terem uma alternativa de Governo, antes que seja tarde.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Cláudio Monteiro.

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgo que, neste debate, a primeira coisa que se deveria deixar bem clara - nomeadamente, o Partido Socialista, através do seu grupo parlamentar, queria deixar bem claro - é que este não é um debate sobre a opção nuclear. Isto é, permitir ou não permitir a passagem de navios contendo cargas radioactivas, ou, pelo menos proibir ou não proibir, no sentido de aprovar, ou não, este projecto, nada tem a ver com a opção nuclear, porque essa, como disse, e bem, já está tomada - Portugal não a tomou, não vai tomar e não é pela circunstância de, eventualmente, não ser possível proibir a passagem desses navios que Portugal passará, por essa razão, a ser favorável à opção nuclear.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Grupo Parlamentar do Partido Ecologista Os Verdes justifica a apresentação deste projecto de lei com o princípio da precaução. Bom, julgo que o Partido Ecologista Os Verdes devia ter, ele próprio, a precaução quando apresenta uma medida tão radical e tão limitada como é a da proibição pura e simples. É que, mesmo em relação ao princípio da proibição, que é invocado na exposição de motivos do projecto de lei, nomeadamente quando se diz que Portugal tem o direito de «(…) adoptar nas águas sob sua jurisdição todas as medidas reconhecidas no direito internacional para proteger a saúde dos portugueses e os ecossistemas marítimos», a primeira questão que se coloca é a de saber se a única medida proposta neste diploma é ou não reconhecida no direito internacional como admissível.
A segunda questão consiste em saber se há ou não outras medidas, como, aliás, já foi aqui referenciado, nomeadamente a possibilidade de estabelecer uma separação do tráfego para certo tipo de navios ou, eventualmente até, de fixar certo tipo de rotas, que possam ser medidas alternativas à proibição pura e simples e que, porventura, sejam medidas compatíveis com o direito internacional.
É que, como também é sabido e foi invocado na intervenção da Sr.ª Deputada Isabel Castro, Portugal, quando ratificou a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, fez um conjunto de declarações e, entre essas declarações, de facto, invocou o princípio da precaução, quando, na 9.ª declaração, afirmou que «Tendo presente a informação científica disponível e para a defesa do ambiente e do crescimento sustentado das actividades económicas com base no mar, Portugal exercerá, de preferência através de cooperação internacional e tendo em linha de conta o princípio preventivo, actividades de

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fiscalização para lá das zonas sob jurisdição nacional». O que significa que a questão foi colocada nos termos exactos em que ela deve ser colocada, que é o da cooperação internacional. Isto é, Portugal não pode, unilateralmente, por via de um diploma legal, aprovar uma medida que, para além do mais, é aprovada em relação a uma zona que não é da sua jurisdição exclusiva, porque estamos a discutir a zona económica exclusiva, que nem sequer integra o conceito do território, como é o conceito da extensão marítima do território, através do conceito de mar territorial, em que Portugal se pode considerar, ainda assim, um Estado soberano.
Como certamente a Sr.ª Deputada sabe, zona económica exclusiva portuguesa significa exactamente aquilo que a expressão indicia, isto é, zona em que Portugal tem um aproveitamento económico exclusivo. Ora, a fruição económica exclusiva dessa zona não significa jurisdição absoluta sobre essa zona, nem a possibilidade de impedir o atravessamento de navios, designadamente de navios que, porventura, podendo comportar algum risco, apesar de tudo, podem qualificar-se como navios que vêm passar inofensivamente nas águas territoriais próximas de Portugal.
Essa é, aliás, a questão fundamental e fulcral, que, de certa forma, já foi salientada na intervenção do PSD: a da admissibilidade deste projecto de lei, no quadro das convenções internacionais a que Portugal se vinculou e, em particular, no quadro da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar.
Como é sabido, essa Convenção estabelece uma distinção clara entre aquilo que é o mar territorial e aquilo que é a zona económica exclusiva. E isso significa, desde logo, que, na zona económica exclusiva, Portugal goza de uma soberania muito limitada ou de uma soberania particularmente limitada. É, aliás, tão óbvio que a própria Convenção regula a matéria da passagem de navios contendo cargas radioactivas e que o faz obviamente, desde logo, a propósito do mar territorial, isto é, a propósito da zona de 12 milhas sobre a qual Portugal e todos os demais países exercem a sua jurisdição. E, a esse respeito, nunca é de menos lembrar aquilo que diz o artigo 22.º da Convenção, ao referir que «o Estado costeiro pode, quando for necessário à segurança da navegação, exigir que os navios estrangeiros que exerçam o direito de passagem inofensiva pelo seu mar territorial utilizem as rotas marítimas e os sistemas de separação de tráfego que esse Estado tenha designado ou prescrito para a regulação da passagem de navios». E diz, designadamente, que «em particular, pode ser exigido que os navios-tanques, os navios de propulsão nuclear e outros navios que transportem substâncias ou materiais radioactivos ou outros produtos intrinsecamente perigosos ou nocivos utilizem unicamente essas rotas marítimas». Isto é, regula expressamente o problema do atravessamento do nosso mar territorial por navios contendo cargas radioactivas e fá-lo a propósito da definição dos direitos que Portugal pode exercer sobre o seu mar territorial, que são muito mais intensos do que aqueles que pode exercer sobre a zona económica exclusiva.
O que significa que, de acordo com a boa lógica jurídica, se «quem pode o mais pode o menos», «quem não pode o mais não pode coisa nenhuma». Portanto, se Portugal nem no seu mar territorial, onde exerce uma soberania plena, pode impedir a passagem desses navios, podendo apenas adoptar, se houver riscos no caso concreto, medidas nos casos concretos, impondo designadamente a separação de tráfego ou a utilização de rotas exclusivas, se só pode fazer isso na zona ou na parcela do mar em que tem uma jurisdição plena, por maioria de razão, não pode fazer nem isso, nem nada que se pareça, naquela zona em que apenas desfruta de um aproveitamento económico exclusivo em relação ao qual não tem uma soberania plena.
E essa é que é a questão que, julgo, tem de ser aqui clarificada, porque este debate está obviamente eivado, desde logo, desta distorção: pretender, a propósito da discussão de uma questão que tem uma solução no quadro da cooperação internacional, discutir um problema que não está na agenda política e que é alheio a ela, que é o da opção nuclear, que, tanto quanto eu sei, não pode ser questionado em função do resultado que tiver a votação deste projecto de lei.
Aliás, não estava à espera que o Partido Ecologista Os Verdes apresentasse este projecto de lei agora, mas só daqui a dois anos, porque, olhando para a história da Assembleia da República, verifico que, de cinco em cinco anos, aparece uma proposta sensivelmente semelhante a esta…

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - De Os Verdes não apareceu nenhuma!

O Orador: - … e, de cinco em cinco anos, é rejeitada.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em nome da segurança ambiental, da saúde pública e da própria vida, Portugal recusou, e bem, a opção nuclear, já no final da década de 70.
Não precisou, conforme ouvi aqui dizer, de estar à espera de ninguém, fossem pares europeus ou pares internacionais, para ter decidido desta maneira.
Importa, pois, que, desta opção, colectiva e conscientemente assumida, e bem, se retirem todas as ilações e consequências, que abranjam não só o nosso território como igualmente as zonas marítimas sobre as quais exerce uma jurisdição que é irrecusável.
É por isso e para isso que Os Verdes apresentaram este projecto de lei, que saudamos, o qual pretende fazer estender a opção portuguesa pelo não nuclear à zona económica exclusiva, proclamando a proibição de circulação nesta zona aos navios contendo cargas radioactivas.
Não basta, de facto, que, internamente, nos movimentemos e manifestemos quando surgem notícias do país vizinho sobre opções nucleares, sejam elas reais e/ou potenciais.
Não basta, quando tal acontece, invocarmos a legislação existente e pressionarmos o Governo que tem - e bem! - assumido essa recusa no âmbito do Direito Comunitário e do direito internacional existente e que obriga a que a soberania externa se exerça perante cautelas e interesses de países terceiros.
«É entendimento…» - consensual - «… dos modernos ordenamentos jurídicos, decorrente dos princípios enunciados na lei de bases do ambiente, cujos fundamentos foram discutidos pelos Estados na Conferência do Rio (…), que os novos conceitos de protecção e de preservação do meio marinho (…) devem radicar numa proibição genérica

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de toda a actividade humana que nele introduza qualquer substância (…), desde que provoque efeitos susceptíveis de fazer perigar a saúde, os ecossistemas e os recursos vivos (…)» - isto faz parte de preâmbulo de uma autorização legislativa do próprio Governo, não são palavras minhas, que, implícita e explicitamente, reconhece a possibilidade de proibir a actividade humana quando está em risco a vida.
Foi exactamente com este enquadramento que o próprio Governo apresentou, em Maio, um pedido de autorização legislativa para determinar o enquadramento normativo e contra-ordenacional em matéria de simples poluição do meio marinho por substâncias obviamente não nucleares.
Se este enquadramento jurídico, que suporta, repito, a proibição genérica de toda a actividade humana capaz de fazer perigar os ecossistemas vivos, é adequado para determinar meras acções repressivas relativamente a substâncias poluentes cuja perigosidade (reconheçam) é claramente inferior à das substâncias e materiais nucleares, é evidente que, por maioria de razão, este enquadramento jurídico terá também de se aplicar à circulação, em Portugal, de material radioactivo, seja ela feita no território nacional, na zona económica exclusiva ou no mar territorial, sobre o qual Portugal exerce uma soberania total ou parcial em matéria de preservação da vida.
O PCP considera assim que a proibição de circulação de navios que transportem matérias radioactivas na zona económica exclusiva é juridicamente suportável e politicamente irrecusável! Constitui, portanto, uma medida política - e é a esta questão que os senhores querem fugir - que visa defender a preservação e a vida dos ecossistemas marinhos, a saúde ambiental dos nossos mares e das nossas costas e a segurança das populações que aí vivem e trabalham.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Castello Branco.

O Sr. Álvaro Castello Branco (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Ambiente, Sr.as e Srs. Deputados: A preservação do património ambiental, como um inequívoco garante da qualidade de vida dos povos e referência cabal do progresso económico, social e cultural das nações, foi, desde sempre, incondicionalmente, advogada pelo CDS-PP.
O transporte de cargas radioactivas, designadamente por via marítima, é uma questão que deve assumir um carácter prioritário na agenda internacional, isto é, ser objecto de análise, de estudo e de reflexão, com o intuito de se definirem soluções que possam prevenir, com elevado índice de sucesso, catástrofes com nefastas repercussões para a humanidade.
Esta não é uma problemática nacional mas, sim, global e como tal impõe-se que seja abordada a nível internacional.
Não creio que seja possível a Portugal assegurar a sua imunidade face ao risco de cargas radioactivas em caso de catástrofe, mediante a proibição da passagem de navios com cargas radioactivas na sua zona económica exclusiva. Navios como o Pacific Pintail ou o Pacific Teal continuarão ciclicamente a cruzar o Oceano Atlântico e, a suceder um acidente, face às características de fácil propagação da radioactividade, as suas consequências terão um incalculável impacto ambiental no ecossistema marítimo quer a tragédia ocorra na zona económica exclusiva ou a algumas milhas para além da sua linha de delimitação.
Por outro lado, como é seguramente do conhecimento das Sr.as e Srs. Deputados, existem corredores marítimos internacionais de passagem pelas zonas económicas exclusivas para navios com cargas radioactivas, consagrados na Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, da qual Portugal é signatário.
Assim, existem limitações à nossa capacidade de acção que decorrem da integração de Portugal na comunidade internacional e das nossas obrigações nesse contexto.
O CDS-PP, não obstante comungar de todas as preocupações explanadas pelo Partido Ecologista «Os Verdes», considera a sua proposta de lei inadequada, na medida em que descura as disposições jurídicas internacionais que permitem a delimitação, no âmbito da zona económica exclusiva, de corredores especiais para a passagem de navios com carga radioactiva.
A legislação internacional vigente a que já fiz referência, a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, é um tratado assinado em Montego Bay, em 1982, que entrou em vigor em 1994, ao fim de 12 anos de esforçadas negociações. Ora, pelo que, aqui, nos é dado a conhecer ou o Partido Ecologista «Os Verdes» desconhece esse tratado, o que não creio, ou, então, não deu conta de que Portugal o ratificou em 1997. É que o projecto de lei do Partido Ecologista «Os Verdes» viola claramente o disposto no n.º 1 do artigo 58.º dessa Convenção e, como tal, com o diploma em apreço, pretende-se que Portugal viole de forma flagrante o direito internacional decorrente desse tratado.
Por isso mesmo, a inviabilização deste projecto de lei, mais do que do bom senso, deve decorrer do respeito pela legalidade e da necessidade de cumprimento, por parte do Estado português, das convenções que livremente subscreveu e não denunciou.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente (Rui Gonçalves): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei do Partido Ecologista «Os Verdes» suscita-nos apenas dois comentários, que, como já foi aqui falado abundantemente, põem em causa a sua valia.
Em primeiro lugar, o projecto de lei é, de facto, eu diria, minimalista, porque, depois de uma longa exposição de motivos, abordando muitos aspectos, nomeadamente a opção nuclear do país, que não está nem esteve em causa, apenas dispõe de um único artigo onde afirma: «É proibida a passagem de navios contendo cargas radioactivas na zona económica exclusiva (ZEE) portuguesa».
O projecto de lei não explica o que se entende por cargas radioactivas nem a que cargas radioactivas se aplica, mas eu gostaria de falar de algumas das cargas radioactivas a que poderá aplicar-se. Poder-se-á aplicar ao concentrado de urânio, de que Portugal é um país exportador, aos resíduos radioactivos, que são abundantemente referidos pelo Partido Ecologista «Os Verdes», ao combustível nuclear, aos reactores de unidades de proporção nuclear, nomeadamente os nossos parceiros da NATO, a aparelhos para fins industriais, a

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radiofármacos, e a fontes radioactivas seladas. Ou seja, o excesso de simplificação utilizado neste projecto de lei acaba por esquecer que muitas são as utilizações benéficas das cargas nucleares, que são também transportadas por via marítima, desde logo as associadas à terapêutica médica. E o Partido Ecologista «Os Verdes», com este projecto, vem impor que essas cargas radioactivas benéficas não possam ser transportadas por via marítima.
Em segundo lugar, e apesar da referência que a exposição de motivos abundantemente faz ao direito internacional - e como também já, aqui, foi dito, hoje, de forma abundante -, o projecto de lei de Os Verdes viola flagrantemente o disposto na Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, que, como todos se recordam, deu um grande trabalho ao nosso ex-Presidente da República Dr. Mário Soares para que viesse a ser aprovada, e fez questão nisso, e foi aprovada por unanimidade, também com o voto do Partido Ecologista «Os Verdes».
Assim, limitar-me-ei a lembrar que a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar vincula a República Portuguesa com um valor superior à lei ordinária, estabelecendo, na zona económica exclusiva, a mesma liberdade de navegação que existe para o alto mar. Dito isto, na zona económica exclusiva, o Estado português exerce direitos relacionados com o aproveitamento económico da mesma, mas não a pode fechar à navegação de navios que não tenham cometido, ou não estejam prestes a cometer, qualquer violação do direito internacional.
Lembro também que o transporte de substâncias perigosas, incluindo as radioactivas, obedece a regras internacionais particularmente rigorosas, de que Portugal é parte contratante (algumas dessas convenções também já foram, aqui, referidas hoje, e, por esse motivo, permito-me não as repetir).
Lembro que no mar territorial português, isto é, apenas nas 12 milhas contadas a partir da costa, o Estado português pode, enquanto Estado costeiro, estabelecer corredores de navegação que permitam que o tráfico marítimo se processe em condições de segurança e que, ao contrário de algumas afirmações aqui feitas, vigia e acompanha, com o trabalho da Marinha e da Força Aérea, esses corredores de navegação e que está, neste, neste momento, a instalar um sistema de radar conhecido como VTS (vessel traffic system), que permitirá um maior grau de segurança à navegação nesta área da nossa costa portuguesa.
Lembro também que o Governo aprovou recentemente, depois de devidamente autorizado pela Câmara, o Decreto-Lei n.º 235/2000, de 26 de Setembro, que, como o Sr. Deputado Honório Novo teve oportunidade de recordar, estabelece um regime de contra-ordenações sobre poluição marítima de grande valor e nível sancionatório.
Como uma última nota que deixo aos Srs. Deputados, devo dizer que, independentemente das preocupações quanto à poluição radioactiva, que são comuns a todos nós (ao Governo e aos grupos parlamentares), e do trabalho que está ser feito na vigilância da costa portuguesa, não existem condições para aprovar este projecto de lei apresentado por Os Verdes, porque ele falha notoriamente o alvo a que, na sua exposição de motivos, diz destinar-se.
Já agora, para terminar, quero prestar um pequeno esclarecimento à Sr.ª Deputada Lucília Ferra e ao Partido Ecologista «Os Verdes», que é o seguinte: a costa portuguesa é muito superior a 850 km, porque, como sabem, não se limita ao continente.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Lucília Ferra (PSD): - Foi um esclarecimento importante! O resto é que não ficou esclarecido!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de utilizar os minutos que me foram cedidos para fazer alguns comentários que as intervenções proferidas, com algum significado, suscitaram.
Em primeiro lugar, gostaria de dizer a quem fez exercícios de erudição a propósito da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar que esta Convenção tem, seguramente, um valor supralegislativo mas infraconstitucional. Portanto, se estão preocupados quanto a isso - e o Sr. Secretário de Estado, aparentemente, estava -, gostaria de dizer que nós sabemos que assim é.
Em segundo lugar, devo dizer ao Sr. Deputado Cláudio Monteiro que está equivocado, porque Os Verdes não têm apresentado ciclicamente projectos de lei antinucleares mas, sim, para prevenção de poluição na zona económica exclusiva por transporte de resíduos perigosos - é outra categoria -, os quais têm sido «chumbados».
Também temos apresentado regularmente, em sede de Orçamento do Estado, propostas de alteração orçamentais para a instalação do famoso vessel traffic system de que falou o Sr. Secretário de Estado, mas, no ano passado, o Governo explicou que não tinha verba orçamentada para este ano. Registamos que, finalmente, o Governo se mexeu quanto a esta matéria. Tardava! Aliás, tardava porque ele é importante para os corredores de que estamos a falar, e é bom não confundir as coisas.
Os corredores de passagem, que, do ponto de vista da segurança, são naturalmente importantes, e a possibilidade de afastamento dos mesmos da nossa costa requerem, por parte da organização marítima internacional, a instalação do sistema VTR. Portanto, esperamos que, em 2001, tenhamos, finalmente, em todo o território nacional, este sistema para que possamos, depois, iniciar o afastamento dos corredores.
Gostaria de clarificar a ideia, que o PSD aqui deixou e que considero errada, de «passagem inocente» como sinónimo de liberdade de passagem. «Passagem inocente», de acordo com a Convenção a que todos os Srs. Deputados se referiram, é ou só pode ser assim considerada desde que não ponha em causa a ordem, a paz e a segurança.
Provavelmente, concluiremos, neste debate, que Os Verdes e os demais grupos parlamentares não têm a mesma posição sobre o nuclear e têm dúvidas - aliás, houve quem dissesse «se houver risco»… - sobre se os materiais radioactivos envolvem ou não risco. Por nós, confesso, temos toda a certeza de que envolvem risco, e é precisamente para prevenir esse risco que apresentamos este projecto.
Por último, chamo atenção para o princípio da precaução, que não está só consagrado na Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, que Portugal subscreveu, mas é também abundantemente citado

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na Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, aqui referida.
Alguns poderão desejar ser «mais papistas do que o Papa», mas o princípio está consagrado, em primeiro lugar; e, se dúvidas houvesse, penso que aquilo que é referido claramente na 9.ª declaração que o Estado português entendeu formalizar quando se vinculou à Convenção, é, permito-me dizer-lhes, Srs. Deputados… O Sr. Deputado Cláudio Monteiro fez, à semelhança do nosso colega do PSD relator do projecto de lei, uma leitura diferente da nossa, porque, para nós, a fiscalização é um fim e a cooperação internacional é o meio. Penso que estamos a confundir as coisas, porque, no caso de se constatar que uma passagem de materiais radioactivos pode significar perigo - e, do nosso ponto de vista, significa -, a fiscalização, que é o fim, deve e pode significar proibição, numa leitura extensiva do que, não sendo soberania plena, é, em todo o caso, soberania na zona económica exclusiva, tal como está definido na declaração que referi, e deve poder accionar o princípio da precaução.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr.ª Deputada, peço-lhe que conclua, pois já esgotou o tempo que lhe foi cedido.

A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente.
A cooperação internacional é o meio, e é isto que eu gostaria de justificar num projecto de lei que não vem reafirmar a posição antinuclear de Portugal, porque essa está reafirmada, mas, sim, em coerência, dar-lhe conteúdo.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr.ª Deputada, informo-a de que a deixei continuar porque o PCP cedeu-lhe mais 1 minuto.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Cláudio Monteiro, dispondo, para o efeito, de 3 minutos, que lhe foram cedidos pelo Governo.
Esperemos que o Governo só transfira o tempo!

Risos.

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): - Sr. Presidente, às vezes pode não parecer, mas nós apoiamos o Governo, pelo que este também tem de nos apoiar de vez em quando!

Risos.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sempre!

O Orador: - Sr. Presidente, só pedi a palavra para clarificar um ponto que me parece importante.
Eu não disse que pode não haver riscos; eu disse que há sempre riscos e, havendo-os, é natural que Portugal possa fiscalizá-los.
Sr.ª Deputada Isabel Castro, a leitura que faz do princípio da precaução só peca por um pequeno pormenor: só posso fiscalizar aquilo que acontece, e só pode acontecer se for permitido!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - E as omissões também!

O Orador: - Ora, se eu proibir, pura e simplesmente, a passagem nada tenho para fiscalizar.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Logo, como deve imaginar, há uma relativa incongruência no que afirma, porque o que invoca como sendo o que legitima o vosso projecto de lei é precisamente uma declaração formalizada pelo Governo que pressupõe a impossibilidade de proibir e, portanto, a necessidade de fiscalizar.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Isso é uma habilidade jurídica!

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Os riscos previnem-se, não se fiscalizam!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, visto não haver mais inscrições, dou por encerrado o debate do projecto de lei n.º 297/VIII (Os Verdes) e também…

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, a minha interpelação é no sentido de me ser autorizado anunciar a entrega de um documento. Se V. Ex.ª me autorizar a fazê-lo, declaro para a Acta qual é o documento a que me refiro.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, vou entregar à bancada do PSD, apesar de saber que o Sr. Deputado António Capucho está, neste momento, numa reunião de direcção do seu partido, o relatório da A. T. Kearney, a que fiz alusão no início desta reunião e que chegou através do tal estafeta, que cumpriu a sua missão, enterrando aqui o famoso «machado».

Aplausos do PS.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Em nome do Deputado António Capucho, tenho todo o gosto em recebê-lo!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Mas, Sr. Secretário de Estado, o relatório é para ser distribuído por todos os grupos parlamentares!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Fica registado, Sr. Secretário de Estado.
Srs. Deputados, a próxima reunião plenária realizar-se-á amanhã, às 10 horas, constando da ordem do dia as apreciações parlamentares n.os 20/VIII (CDS-PP), 24/VIII (PS, PCP, PSD, Os Verdes e BE), 30/VIII (PCP) e 25/VIII (PSD).
Está encerrada a reunião.

Eram 20 horas e 40 minutos.

Declarações de voto enviadas à Mesa, para publicação.
Relativa aos projectos de lei n.os 101, 308, 313 e 314/VIII

Os Deputados do PPD/PSD abaixo-assinados, abstiveram-se na votação dos projectos de lei n.os 101/

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VIII - Contracepção de emergência (BE), 308/VIII - Garante o acesso aos medicamentos contraceptivos de emergência (PCP) -, 313/VIII - Da gravidez na adolescência (PSD) e 314/VIII - Contracepção de emergência (PS), pelas razões abaixo indicadas.
Em primeiro lugar, reiteramos que o principal objectivo de qualquer iniciativa legislativa nesta área deve incidir prioritariamente na prevenção, na informação, no acompanhamento e no aconselhamento sexual aos adolescentes, passando por um reforço das estruturas de saúde escolar e igualmente das consultas especializadas vocacionadas para a sexualidade na adolescência.
Consequentemente o desenvolvimento pessoal e relacional dos adolescentes passa por uma sexualidade informada, consciente e responsável, evitando-se assim situações e factores perturbadores de um equilíbrio psico-afectivo desejável, bem como situações extremas, nomeadamente gravidezes indesejadas.
Em segundo lugar, reafirmamos a nossa preocupação com o alto nível da taxa de maternidade na adolescência que Portugal apresenta, em que anualmente existem cerca de 10 000 novas mães adolescentes, constatamos ainda que este fenómeno - gravidezes não desejadas - acarreta desequilíbríos psico-emocionais que se prolongam para o resto da vida.
Em terceiro lugar, reconhecemos o impacto negativo que uma gravidez indesejada causa nos jovens e nas suas famílias, não sendo de relevar a angústia decorrente de uma relação sexual em que não foram utilizados meios contraceptivos no momento ou prescritos pelo médico de família.
Os projectos de lei em votação, em nosso entender, não consubstanciam uma abordagem do problema de forma integral, antes fazendo-o de forma redutora ou parcial, não acautelando algumas questões que consideramos essenciais e genericamente acima referidas.
A denominada pílula do dia seguinte - pílula contraceptiva hormonal, de toma oral, que actua nas primeiras 72 horas, após a relação sexual -, deve ser utilizada somente em situações excepcionais e ocasionais, donde, importa distinguir os métodos contraceptivos normais da contracepção de emergência.
Neste sentido, a designada contracepção de emergência deve ser distribuída de forma gratuita no Serviço Nacional de Saúde e exclusivamente por razões de saúde pública.
Por outro lado, aceitamos que a contracepção de emergência deve estar acessível nas farmácias, mas somente mediante prescrição médica, ao contrário do que é defendido em dois dos projectos de lei, aceitando-se no entanto a posição daqueles que defendem uma rigorosa e isenta avaliação do seu impacto na preocupante taxa de gravidezes na adolescência.
Continuamos também a considerar que o Ministério da Saúde, a Ordem dos Médicos, a Ordem dos Farmacêuticos e as Farmácias devem estabelecer um protocolo que designe os fármacos que, com o seu uso normal, não apresentem riscos para a saúde.
Esta situação implicará ainda a criação de um sistema de farmacovigilância, de informação e formação dos profissionais envolvidos, não se desvirtuando a clara assumpção da contracepção de emergência como último recurso e não como contracepção regular.
Desta forma, acautelam-se, em nosso entender, alguns princípios fundamentais: não se retira este medicamento do acompanhamento médico especializado e necessário, enquanto medida fundamental para detectar os casos de potencial gravidez na adolescência; assegura-se o controle das situações de risco clínico e, em simultâneo, fica garantido o acompanhamento e a informação a nível do planeamento familiar.
De sublinhar que reafirmamos a necessidade de critérios rigorosos quanto ao esquema de distribuição da designada pílula do dia seguinte, para que um avanço científico, mesmo que quase isento de riscos para a adolescente, não seja desvirtuado e usado com ilicitude.
De referir que desde há um ano que existe no mercado português fármacos de contracepção de emergência, sujeitos a receita médica, os quais têm efeitos contraceptivos se tomados até às 72 horas, após a relação sexual.
Face aos riscos e contra-indicações inerentes à sua alta dosagem e composição, existe naturalmente a obrigatoriedade de prescrição médica.
Quanto ao porquê das discórdias em relação aos efeitos deste medicamento, cumpre sucintamente aduzir algumas razões que formatam a nossa consciência nesta matéria.
Quando há fertilização (um óvulo + um espermatozóide) forma-se um ovo e este tem toda a carga genética dos progenitores, iniciando a sua caminhada até ao útero.
Esta caminhada leva 6 a 7 dias e quando chega ao útero é indispensável para o seu desenvolvimento que aí encontre condições favoráveis para a nidação, ou seja, para se implantar.
Se, no útero, não encontra estas condições favoráveis, então o ovo é eliminado espontaneamente.
Consequentemente este medicamento actua exactamente criando um ambiente hostil à nidação do ovo fertilizado, não o deixa implantar-se e ele é eliminado.
Quando um ovo fertilizado não se consegue implantar, «nidar», não se pode, em nossa opinião, falar em gravidez, pelo que se o medicamento for tomado nestes 6/7 dias não é considerado como um abortivo mas, sim, como um contra-implantatório ou um contra-gestacional.
Nesta perspectiva, esta situação é uma realidade científica para todos aqueles que consideram que a gravidez é igual a concepção (fertilização + implantação).
Para quem defende a vida humana logo a partir da concepção, então, este medicamento é um abortivo, posição que respeitamos, mas que não subscrevemos.
Aceitamos no entanto reservas éticas e religiosas, daí que aceitemos a possibilidade legal de objecção de consciência aos profissionais de saúde envolvidos na prescrição e distribuição dos fármacos de contracepção de emergência.
No entanto, retomando a perspectiva, que defendemos, de que não há gravidez sem implantação do ovo, parece-nos que é exactamente neste ponto que este medicamento poderá ter a sua mais-valia, como a última solução a montante do abortamento.
Reiterando a posição de que os projectos de lei em votação, em nosso entender, não consubstanciam uma abordagem do problema de forma integral, antes fazendo-o de forma redutora ou parcial, e por não acautelarem algumas questões que consideramos essenciais, os Deputados abaixo-assinados decidem deixar exarada em acta esta sua posição de princípio.

Os Deputados do PSD, Ana Manso - Carlos Martins - Mota Amaral - Rui Rio - Ana Narciso - Natália Carrascalão - Patinha Antão - Miguel Macedo (e mais uma assinatura ilegível).

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Relativa ao projecto de lei n.º 156/VIII

O movimento associativo tem uma enorme importância social, como escola de formação cívica e como espaço de valorização pessoal e colectiva. O projecto hoje votado tende a simplificar o processo de constituição de associações juvenis, designadamente, através de uma maior responsabilização do Instituto Português da Juventude. Não nos parece ser panaceia. Primeiro, porque o que é reclamado pelo movimento associativo é uma verdadeira lei de bases, capaz de dar resposta às múltiplas realidades que comporta; segundo, porque uma lei de seis artigos não cumpre decididamente este propósito; e, finalmente, porque o panorama traçado pelos proponentes relativo às associações juvenis, não corresponde à realidade.
Durante o debate, deixamos clara a nossa posição. De entre os argumentos expostos, frisamos a necessidade de contemplar em texto de lei uma clara definição dos limites do âmbito e das responsabilidades das associações juvenis. Acresce que o diploma ignora o amplo debate que se vem travando no Movimento Associativo Juvenil relativo às questões do Mecenato, do estatuto de utilidade pública, etc.
A resposta a estas interrogações não resulta de iniciativas legislativas avulsas e pouco ponderadas. Reiteramos a necessidade de uma lei estruturada e abrangente.
De qualquer forma, o diploma constitui um contributo para a discussão e para o aprofundado debate parlamentar que esta matéria reclama. Viabilizamos a baixa à Comissão no sentido de, com a maior brevidade, despoletar esse debate e partir para a construção de um articulado legal à altura das justas aspirações do Movimento Associativo Juvenil.

Os Deputados do PS, Dinis Costa - Carla Tavares - João Sequeira.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Maria Luísa Silva Vasconcelos

Partido Social Democrata (PSD):
Henrique José Monteiro Chaves
Maria do Céu Baptista Ramos

Partido Comunista Português (PCP):
João António Gonçalves do Amaral

Partido Popular (CDS-PP):
José Martins Pires da Silva
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Paulo Sacadura Cabral Portas

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
António Alves Martinho
Carlos Manuel Luís
João Cardona Gomes Cravinho
João Rui Gaspar de Almeida
José Carlos Correia Mota de Andrade
Manuel Alegre de Melo Duarte
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Vítor Manuel Caio Roque

Partido Social Democrata (PSD):
Domingos Duarte Lima
Eugénio Fernando Sá Cerqueira Marinho
João Bosco Soares Mota Amaral
Joaquim Martins Ferreira do Amaral
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva

Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Maria Luísa Raimundo Mesquita

Partido Popular (CDS-PP):
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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