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Sábado, 21 de Outubro de 2000 I Série - Número 14
DIÁRIO da Assembleia da República
VIII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2000-2001)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 20 DE OUTUBRO DE 2000
Presidente: Ex.mo Sr. João António Gonçalves do Amaral
Secretários: Ex. mos Srs. José Ernesto Figueira dos Reis
Manuel Alves Oliveira
António João Rodeia Machado
António José Carlos Pinho
S U M Á R I O
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 15 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa dos projectos de lei n.os 317 a 319/VIII e do projecto de resolução n.º 81/VIII.
Foi apreciado o Decreto-Lei n.º 82/2000, de 11 de Maio, que cria a sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos Portugal Global, SGPS, S. A. [apreciação parlamentar n.º 20/VIII (CDS-PP)]. Pronunciaram-se, a diverso título, além do Sr. Ministro da Presidência (Guilherme d'Oliveira Martins), os Srs. Deputados Telmo Correia (CDS-PP), José Saraiva (PS), Luís Marques Guedes (PSD) e António Filipe (PCP).
O Decreto-Lei n.º 197/2000, de 24 de Agosto, que regulamenta a Lei n.º 43/99, de 11 de Junho, que prevê o direito à revisão da situação militar dos quadros permanentes que, em virtude da sua participação ou envolvimento no processo de transição para a democracia iniciado em 25 de Abril de 1974, viram as suas carreiras afectadas por esse evento [apreciação parlamentar n.º 24/VIII (PS, PSD, PCP, Os Verdes e BE)], baixou, sem discussão, bem como a proposta subscrita pelo PS, PSD, PCP, CDS-PP, Os Verdes e BE, à Comissão de Defesa Nacional para debate e votação na especialidade.
Foi também apreciado o Decreto-Lei n.º 205/2000, de 1 de Setembro, que altera o Decreto-Lei n.º 118/92, de 25 de Junho, que estabelece o regime de comparticipação do Estado no preço dos medicamentos [apreciação parlamentar n.º 30/VIII (PCP)], tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado dos Recursos Humanos e da Modernização da Saúde (Nelson Baltazar), os Srs. Deputados Natália Filipe (PCP), Fernanda Costa (PS), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP), Luís Fazenda (BE) e Bernardino Soares (PCP).
Foi ainda apreciado o Decreto-Lei n.º 183/2000, de 10 de Agosto, que altera o Código do Processo Civil, na redacção que lhe foi dada pelos Decretos-Leis n.os 329/95, de 12 de Dezembro, 180/96, de 25 de Setembro, e 375-A/99, de 20 de Setembro, e o Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 383/99, de 23 de Setembro [apreciação parlamentar n.º 25/VIII (PSD)]. Usaram da palavra, a diverso título, além dos Srs. Secretários de Estado dos Assuntos Parlamentares (José Magalhães) e Adjunto do Ministro da Justiça (Eduardo Cabrita), os Srs. Deputados António Montalvão Machado (PSD), Dias Baptista (PS), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP), Jorge Lacão (PS) e Odete Santos (PCP).
O Sr. Presidente encerrou a reunião às 12 horas e 50 minutos.
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O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 10 horas e 15 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Aires Manuel Jacinto de Carvalho
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
António Alves Marques Júnior
António Fernandes da Silva Braga
António Fernando Marques Ribeiro Reis
António Fernando Menezes Rodrigues
António José Gavino Paixão
António Manuel Dias Baptista
António Manuel do Carmo Saleiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Bruno Renato Sutil Moreira de Almeida
Carla Maria Nunes Tavares Gaspar
Carlos Alberto
Carlos Alberto Dias dos Santos
Carlos José Gonçalves Vieira de Matos
Casimiro Francisco Ramos
Cláudio Ramos Monteiro
Dinis Manuel Prata Costa
Eduardo Ribeiro Pereira
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Serrasqueiro
Filipe Mesquita Vital
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Francisco José Pinto Camilo
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho
Helena Maria Mesquita Ribeiro
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco D'Almeida
Isabel Maria dos Santos Barata
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge Tinoco de Faria
Isabel Maria Soares Pinto Zacarias
Jamila Barbara Madeira e Madeira
João Alberto Martins Sobral
João Cardona Gomes Cravinho
João Francisco Gomes Benavente
João Pedro da Silva Correia
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão
José Alberto Leal Fateixa Palmeiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Aurélio da Silva Barros Moura
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos da Cruz Lavrador
José Carlos Lourenço Tavares Pereira
José Carlos Pinto Basto Mota Torres
José da Conceição Saraiva
José de Matos Leitão
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Ernesto Figueira dos Reis
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Pires Epifânio
José Manuel Rosa do Egipto
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Rodrigues Pereira dos Penedos
Jovita de Fátima Romano Ladeira
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Miguel Gomes Miranda Teixeira
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira
Manuel António dos Santos
Manuel Maria Diogo
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Margarida Maria Santos Soares da Rocha Gariso
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Céu da Cruz Vidal Lourenço
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino
Maria José Vidal do Rosário Campos
Maria Luísa Silva Vasconcelos
Maria Teresa de Oliveira Ferreira Coimbra
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo Alexandre Homem de Oliveira Fonseca
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Rui Manuel Leal Marqueiro
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Victor Brito de Moura
Vítor Manuel Alves Peixoto
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo
Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Álvaro dos Santos Amaro
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Martins Narciso
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António de Carvalho Martins
António D'Orey Capucho
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Manuel da Cruz Silva
António Manuel Santana Abelha
António Paulo Martins Pereira Coelho
Armando Manuel Dinis Vieira
Arménio dos Santos
Artur Ryder Torres Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos José das Neves Martins
Carlos Manuel de Sousa Encarnação
Carlos Manuel Marta Gonçalves
Domingos Duarte Lima
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Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Jorge Loureiro de Reboredo Seara
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Santos Pereira
Francisco Augusto Caimoto Amaral
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José da Silva Maçãs
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Martins Ferreira do Amaral
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José António de Sousa e Silva
José David Gomes Justino
José de Almeida Cesário
José Eduardo Rêgo Mendes Martins
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel de Matos Correia
José Manuel Durão Barroso
José Manuel Macedo Abrantes
Lucília Maria Samoreno Ferra
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Manuel Machado Rodrigues
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Pedro Machado Sampaio de Sousa Pimentel
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Castro de Almeida
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Joaquim Barata Frexes
Manuel Maria Moreira
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria do Céu Baptista Ramos
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Nuno Miguel Marta de Oliveira da Silva Freitas
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa
Pedro Manuel Cruz Roseta
Rui Fernando da Silva Rio
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Partido Comunista Português (PCP):
Ana Margarida Lopes Botelho
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Cândido Capela Dias
João António Gonçalves do Amaral
Joaquim Manuel da Fonseca Matias
José Honório Faria Gonçalves Novo
Maria Natália Gomes Filipe
Maria Odete dos Santos
Octávio Augusto Teixeira
Vicente José Rosado Merendas
Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello Branco
António Herculano Gonçalves
António José Carlos Pinho
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
José Martins Pires da Silva
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Narana Sinai Coissoró
Raúl Miguel de Oliveira Rosado Fernandes
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Bloco de Esquerda (BE):
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas que deram entrada na Mesa.
O Sr. Secretário (José Reis): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os projectos de lei n.os 317/VIII - Altera o regime jurídico do contrato de trabalho a termo, combatendo a precariedade no emprego (PCP), que baixa à 9.ª Comissão, 318/VIII - Actualização das pensões degradadas da função pública (PCP), que baixa à 9.ª Comissão, e 319/VIII - Institui um sistema de reparação aos trabalhadores pela morosidade da justiça, em processo de falência, e reforça os privilégios dos créditos laborais (PCP), que baixa às 1.ª e 9.ª Comissões, e o projecto de resolução n.º 81/VIII - Recomenda ao Governo a adopção de uma efectiva política de combate à toxicodependência (PSD).
O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, vamos dar início à apreciação do Decreto-Lei n.º 82/2000, de 11 de Maio, que cria a sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos Portugal Global, SGPS, S. A. [apreciação parlamentar n.º 20/VIII (CDS-PP)].
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O CDS-Partido Popular pediu a apreciação parlamentar do Decreto-Lei n.º 82/2000, que cria a Portugal Global, SGPS, S. A., basicamente por considerar que a criação desta entidade pode conflituar com princípios fundamentais, designadamente com princípios de ordem constitucional que consideram ser incumbência do Estado assegurar, por um lado, a liberdade e a independência dos órgãos de comunicação social e, por outro, que, ao nível da especialidade e da titularidade das próprias empresas de comunicação social, se impeça a existência de fenómenos de concentração. Isto é dito expressamente, desde logo e à partida, na Constituição da República Portuguesa, designadamente nos n.os 4 e 6 do artigo 38.º. Refere-se aí claramente que é incumbência e função do Estado garantir a especialidade dos vários órgãos de comunicação social e procurar impedir a existência de fenómenos de concentração e os riscos que deles possam advir,…
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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - … matéria que, de resto, é depois também tratada e regulamentada na Lei n.º 24/98 - Estatuto do Direito de Oposição, a qual confere variados direitos à oposição nesta matéria.
Ora, a Portugal Global é, de alguma forma, uma resposta aos fenómenos concentracionários a que assistimos na comunicação social, designadamente a criação dos grandes grupos - aponto como exemplos, entre outros, a Lusomundo ou a Media Capital -, e, enquanto accionista, o Estado não terá talvez uma posição muito diferente da que teria em qualquer outro grupo. A questão que se levanta é a de saber se a existência de uma opção claramente política e, até, de nomeação política na direcção desta mesma empresa não vem comprometer, do ponto de vista da autonomia, designadamente da autonomia editorial, a independência exigida a estes mesmos órgãos.
E sobre esta matéria vem, precisamente, a Alta Autoridade para a Comunicação Social dizer que há um risco editorial, que há um risco de ausência de independência e que este fenómeno concentracionário - aliás, com opiniões e votos interessantes nessa mesma Alta Autoridade para a Comunicação Social - existe.
Por outro lado, a criação desta empresa corresponde, ainda, a um fenómeno interessante: juntar através desta mesma holding duas empresas que têm uma situação estabilizada e razoável com uma empresa em situação de desgraça total, de praticamente falência - a RTP. Ou seja, pode haver aqui o risco de uma empresa com um passivo de, imaginamos, 130 milhões de contos,…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mais, mais!…
O Orador: - … conjugar-se com a Agência Lusa e com a RDP, empresas onde essa situação não existe, como é óbvio, com sérios prejuízos para a Lusa e para a RDP.
De resto, vejam-se as reacções a essa junção não só das administrações dessas empresas mas também dos seus próprios trabalhadores, que dizem para elas existir um risco sério, e a preocupação, quer na RDP quer na Agência Lusa - mas, sobretudo, na Agência Lusa -, de uma perda de credibilidade no mercado e de uma perda de clientes. Aliás, há mesmo o receio da ocorrência de despedimentos, na sequência desta opção.
Avaliada agora esta decisão poderia ter ainda algumas explicações, sendo a primeira delas a de que ela correspondeu a um objectivo, a um plano, a um programa, a uma alteração e a uma situação.
Parece-nos que assim não é. E para além de o Governo não cumprir as suas obrigações nesta matéria, que resultam dos diplomas legais que já mencionámos - e, logo à partida, do Estatuto do Direito de Oposição -, e de se registar, por exemplo, tanto quanto consegui apurar, que não é dada sequer resposta aos requerimentos dos Srs. Deputados sobre a situação na RTP, designadamente sobre a situação económica na RTP - existe, inclusivamente, um requerimento de um Sr. Deputado do PSD, que não obteve qualquer tipo de resposta nessa matéria -, não cumpre também a obrigação de informar regularmente esta Câmara sobre essa situação económica e sobre os resultados. E a ideia que temos é a de que esta matéria da Portugal Global, para além de um controlo por parte do Governo e de um controlo político, não terá resolvido nenhum dos problemas fundamentais. A RTP continua completamente em perda, não se percebe qual é o caminho da reestruturação, hoje em dia as audiência e os resultados dessa empresa, pese embora as manobras mais ou menos mediáticas do seu responsável, não apresentam resultados de espécie alguma e, portanto, não é compreensível esta opção.
Assim, considerando que a opção não é compreensível e que tem riscos de perda, de isenção, de autonomia, sobretudo de autonomia editorial, considerando, por outro lado, que uma empresa cujo passivo desconhecemos mas que imaginamos situar-se acima dos 130 milhões de contos põe em causa a situação de empresas saudáveis, sem problemas, somos de opinião de que esta matéria devia ser reapreciada, que este diploma não devia ter apreciação e que, portanto, devia ser chumbado, pura e simplesmente, pela Câmara.
Aplausos do CDS-PP e de Deputados do PSD.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Saraiva.
O Sr. José Saraiva (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em Maio deste ano, a propósito de uma iniciativa do PSD, tivemos oportunidade de discutir aqui a questão da Portugal Global. Fizemo-lo em breves instantes, porque já nessa ocasião o Sr. Presidente da República tinha promulgado, em Abril, o decreto que institui a Portugal Global.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Lamentavelmente!
O Orador: - É a sua opinião, não é a nossa!
A verdade é que a questão da televisão e das outras empresas que estão associadas à Portugal Global merecia, obrigava, exigia, uma resposta do Governo. Eu próprio considerei que uma das coisas em que o Sr. Primeiro-Ministro falhou…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mais uma!
O Orador: - … na legislatura anterior foi na forma como se encarou o problema da RTP. O Governo adoptou uma forma para tentar resolver uma questão permanentemente adiada durante anos, mas a responsabilidade disso não pode ser imputada só aos governos do PS, tem também de o ser, sobretudo ou principalmente, com todo o respeito, aos governos do PSD - foi com eles que começou -, que deixaram deslizar, resvalar e completamente tombar a gestão da RTP, situação que não acontece, evidentemente, nem na Agência Lusa nem na RDP, empresas que têm formas de gestão bastante aceitáveis.
Assim, chegou-se a um ponto em que tudo exigia que o accionista único da RTP tomasse uma atitude de ataque de um problema que começava a tornar-se até perigoso, já que estava a transformar-se num «poço sem fundo».
Adoptou-se a forma de gestão que consta no decreto que institui a Portugal Global e já em Maio houve duas críticas. Nessa altura, o Sr. Deputado Telmo Correia disse que as duas outras empresas estavam a ser sacrificadas e voltou a falar do gestor nomeado para a Portugal Global, uma crítica que é de todo incompreensível. É que o Dr. João Carlos Silva, como, na altura, tive oportunidade de dizer, é uma pessoa competente,…
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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não é isso que está em causa!
O Orador: - … eticamente responsável e não manipuladora da RTP.
Risos do PSD.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Estragou tudo. Ia tão bem!
O Orador: - É verdade!
Na altura, tive oportunidade de lembrar aquilo que, no governo do PSD, o Dr. Luís Marques Mendes fazia. E toda a gente sabe o que foi, isso é história.
Agora, não está ainda provado que as sinergias que se procuram com esta empresa - era impossível prová-lo neste tempo - resultam positivamente. Por isso, parece-me que a apreciação parlamentar apresentada pelo CDS-PP é uma manobra dilatória. O pedido de apreciação já tem alguns meses e, no fundo, é um ataque enviesado à RTP. Aliás, o CDS-PP faz agora aquilo que o PSD quis fazer em Maio, ou seja, ataca para tentar descredibilizar a RTP e o serviço público de televisão, de que não gosta, que não aprecia e que, mais do que isso, detesta e procura criar as condições e o ambiente psicológico para que, mais tarde ou mais cedo - e espero que muito mais tarde - possa operar no sentido de vender a RTP ao desbarato.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Nunca o defendemos!
O Orador: - Então, porventura alguém procura vender a RTP ao desbarato.
O argumento que usou contra a concentração parece-se perfeitamente excessivo, porque os meios são completamente diferentes: o serviço prestado pela RDP a nível de radiodifusão é perfeitamente exemplar, o serviço prestado pela Agência Lusa é perfeitamente exemplar. Quanto à RTP, eu próprio tenho dúvidas sobre o serviço que presta.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem! Começa a fazer-se luz!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado José Saraiva, tenho de interromper a sua interessante intervenção, porque esgotou o tempo de que dispunha. Terá de dizer o resto noutra ocasião.
O Orador: - Sr. Presidente, deixe-me dizer que, para nós, o projecto da Portugal Global continua, até prova em contrário.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso é que é pena!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Há mais de três anos que o PSD se vem opondo, com frontalidade, à política seguida pelo Governo no que respeita à RTP.
Para além do protesto e da denúncia à manipulação partidária que, de uma forma tantas vezes grosseira, vem sendo praticada, temos repetidamente afirmado a necessidade de se alterar profundamente o modelo de serviço público que vem sendo seguido. Criticamos o modelo e apresentámos já, mais de uma vez, propostas alternativas com linhas bem claras. Defendemos: a privatização do Canal 1; a manutenção de um único canal, em língua portuguesa e sem publicidade; a contratualização com os operadores privados da produção e difusão de programas que preencham os requisitos de serviço público; e o estabelecimento de uma parceria entre o Estado e os privados no que respeita às emissões internacionais, que o Estado deve continuar a suportar.
Há vários anos que defendemos, com coerência, este modelo. E são já muitos os que, entretanto, evoluíram para a adesão a esta nossa solução, tanto em Portugal como lá fora.
Veja-se o debate público que se trava em torno da emblemática BBC, em que a opção de futuro, colocada sobre a mesa, acaba por ser o decalque daquilo que o PSD vem defendendo para a nossa apagada RTP.
Em recente editorial do Financial Times sobre o assunto, é não só a solução como também muito do diagnóstico que, quase a papel químico, podia ter sido retirado das propostas do PSD e da realidade portuguesa.
Mas o Governo que temos continua cego a esta necessidade e, com isto, os portugueses continuam a pagar fortunas dos seus impostos para um buraco sem qualquer futuro.
Mais: com a inaceitável cumplicidade do Presidente da República, como na altura denunciámos com veemência, insistiu o Governo na sua política absurda criando esta holding Portugal Global. Foram, na altura, vários e esfarrapados os argumentos utilizados pelos socialistas para o justificar. Não vale a pena aqui repeti-los.
Vejamos, antes, o que a realidade se encarregou de esclarecer.
Passados seis meses, qual é o saldo objectivo desta opção? Ponto um, aceleração na queda de audiências, sendo hoje a RTP a estação de televisão menos vista pelos portugueses; ponto dois, total ausência de um qualquer plano estratégico de relançamento ou recuperação da programação; ponto três, nem uma pinga das propaladas sinergias positivas entre as três empresas que foram forçadas a concentrarem-se sob a holding; ponto quatro, uma continuada degradação financeira da empresa e a persistente injecção de dinheiro dos contribuintes para alimentar uma falência há muito anunciada.
Ainda há 15 dias, Sr. Ministro, o Conselho de Ministros aprovou a transferência de mais 18 milhões de contos do Orçamento do Estado para a RTP. Só à conta da RTP, metade do total destinado para todas as empresas que prestam serviço público no nosso país.
Em boa verdade, Srs. Deputados, o único resultado palpável desta nova criatura socialista foi aquilo para que o PSD cedo apontou o dedo: a colocação de um militante e Deputado do Partido Socialista na presidência e direcção de conteúdos da RTP e a continuação da «dança de cadeiras» entre socialistas e suas clientelas, por critérios que não se explicam e, muito menos, se percebem.
Nós, os portugueses, continuamos a pagar.
Ponha o Governo socialista e, já agora, o novo Ministro responsável pela RTP - salvo erro, o quarto, desde que o PS está no poder! - a mão na consciência, não virem a cara para o lado a fingir que não vêem aquilo que todos vêem, dêem ouvidos às vozes da razão e acabem de vez com esta agonia podre.
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Nem os contribuintes nem os profissionais da empresa merecem o vosso autismo.
É claro que nos opomos a este estado de coisas e é claro que tudo isto iremos mudar, assim que tenhamos responsabilidades de Governo.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Vou fazer algumas considerações acerca desta proposta de apreciação parlamentar sobre a holding Portugal Global.
Começo por dizer que temos algumas preocupações, as quais, aliás, tivemos oportunidade de exprimir, na altura em que o Governo tomou a sua decisão, em intervenção no período de antes da ordem do dia. No entanto, as nossas preocupações não são exactamente aquelas que são colocadas pelos proponentes desta apreciação parlamentar.
Em primeiro lugar, a nossa preocupação não é a de que haja um problema de concentração de órgãos de comunicação social nas mãos do Estado. Em Portugal, existe um problema grave de concentração dos média, que é conhecido. Curiosamente, os proponentes não se preocupam com a concentração de grupos de multimédia em mãos privadas; o que os preocupa é que o Estado tenha uma holding com o controlo de três empresas de comunicação social, as quais, aliás, prestam um serviço público no sector da comunicação social onde se inserem.
Pelo contrário, existem milhares de páginas escritas, em todos os países, no sentido de que um forte sector público de comunicação social é um contraponto fundamental precisamente à concentração dos média, na medida em que o sector público possui mecanismos democráticos de fiscalização…
O Sr. António Capucho (PSD):- Nota-se!
O Orador: - … a que, infelizmente, grande parte dos meios de comunicação social privados, na prática, estão imunes.
Portanto, é fundamental que exista um forte sector público de comunicação social que sirva de contraponto à concentração dos média e que funcione, também, com uma programação de referência, o que é fundamental para qualquer país do mundo, que é reconhecido na generalidade dos países europeus e que em Portugal é importante que seja também defendido.
Neste sentido, não compartilhamos, nem com o PSD nem com o CDS-PP, essa ideia de combater, a todo o custo, o sector público da comunicação social e, se possível, distribuí-lo e privatizá-lo.
Posto isto, creio que há preocupações, que, aliás, exprimimos, relativamente à Portugal Global.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Basta que haja qualquer coisa para nacionalizar!
O Orador: - Em primeiro lugar, a Portugal Global foi uma operação financeira que foi anunciada como trazendo muito mais consigo, designadamente a reestruturação da RTP, mas efectivamente não trouxe. A única medida tomada de reestruturação da RTP foi precisamente a autonomização da produção, o que, aliás, já se falava há muitos anos. E foi acompanhada também pelo discurso das sinergias do Ministro Armando Vara, que ninguém percebeu muito bem o que era porque ele também não explicou, mas que criava o risco sério de contaminar a RDP e a Lusa com uma situação financeira gravíssima que a RTP atravessava.
Por outro lado, há uma preocupação que também deve ser expressa de que a Lusa, pelas suas características de agência noticiosa, tem de manter um estatuto editorial de absoluta independência relativamente a qualquer outro meio de comunicação social. Não é sustentável para uma agência que haja uma televisão e uma rádio que a tenham como clientes preferenciais. Assim, importa salvaguardar, efectivamente, a independência editorial da Lusa em relação a todo e qualquer órgão de comunicação social, pelo que, de facto, a sua inclusão numa holding poderia criar alguma confusão negativa, o que, aliás, importa antecipar.
Resta o discurso das sinergias. O problema é que, segundo o que pudemos ler hoje na imprensa, parece que o Governo já não adopta o discurso das sinergias. Portanto, antes que o Governo tivesse feito qualquer reestruturação na RTP, acabou por ser o próprio Governo a ser reestruturado primeiro.
O que verificamos é que parece que o actual Ministro responsável pela pasta já não tem as mesmas opções que tinha o ministro anterior. Neste sentido, seria interessante que o Governo nesta matéria, antes de estarmos a intervir, clarificasse a sua posição, porque, tendo em conta aquilo que lemos hoje na imprensa, já não sabemos se o Partido Socialista vai votar contra a proposta apresentada pelo CDS-PP ou se a vai viabilizar, de forma a que o Governo, tendo mudado a sua opção, possa consumar essa decisão.
Assim, era importante sabermos, aqui, o que é que o Governo pensa, afinal, relativamente à Portugal Global e o que é que quer fazer, se quer desfazê-la ou se quer prosseguir com ela.
E, já agora, o que é que pensa relativamente à reestruturação da RTP, porque, apesar de o Ministro Armando Vara ter tido muitas oportunidades para nos explicar, nunca o fez, e ainda não tivemos oportunidade de ouvir, da parte do Ministro Guilherme d'Oliveira Martins, quais são as suas opções relativamente à futura reestruturação da RTP, o que, de facto, é inequivocamente urgente.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Presidência.
O Sr. Ministro da Presidência (Guilherme d'Oliveira Martins): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta é uma óptima oportunidade para esclarecer uma série de questões a propósito desta apreciação parlamentar.
Antes de tudo, Srs. Deputados do CDS-PP, designadamente Sr. Deputado Telmo Correia, esta iniciativa é, sobretudo neste momento, inoportuna, desajustada e visa o alvo errado.
O Sr. António Reis (PS): - Muito bem!
O Orador: - Comecemos, por isso, por explicar a famigerada questão das sinergias.
O Sr. Deputado António Filipe pode ficar descansado porque vou explicar-lhe o que são sinergias.
O Sr. António Filipe (PCP): - Famigerada?!
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O Orador: - Famigerada na sua expressão. Vou-lhe explicar o que verdadeiramente está em causa quando falamos de sinergias.
Estamos a falar fundamentalmente na integração, sob forma empresarial, da gestão das participações detidas pelo Estado nas empresas de comunicação social. É disso que se trata! E, sendo disso que se trata, é indispensável salvaguardar a identidade e a natureza próprias das diferentes entidades que aqui estão em causa.
Noto, pela primeira vez, aliás, o reconhecimento do sucesso da política do Partido Socialista relativamente à RDP e à Lusa. É um reconhecimento positivo, uma vez que fica claro que a situação financeira das empresas RDP e Lusa é positiva. Ora, sendo uma situação positiva, é necessário salvaguardá-la e preservá-la, designadamente tendo em conta a própria natureza específica da Lusa.
Isto não põe em causa a necessidade de um instrumento importante, hoje, como a Portugal Global, e o instrumento não tem apenas em consideração as três empresas, RTP, Lusa e RDP, tem também em consideração aquilo que é, hoje, a própria evolução da sociedade da informação.
É indispensável percebermos que o serviço público, designadamente o serviço público de televisão, tem de se adequar aos desafios, às exigências da modernização científica e tecnológica. É disso que se trata.
Diz o Sr. Deputado Luís Marques Guedes que não está claro o que está a ser feito relativamente ao plano estratégico do serviço público de televisão.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Claro está. Não está é a ser feito nada!
O Orador: - Sr. Deputado, pode ficar plenamente descansado que, relativamente à salvaguarda do interesse público, relativamente à salvaguarda do pluralismo, da diversidade, dos direitos fundamentais previstos na Constituição, seremos os principais e fundamentais garantes!
Mais: permita-me esclarecê-lo sobre o equívoco em que aqui incorreu relativamente à invocação do exemplo inglês. Sr. Deputado, é o pior exemplo possível que pode invocar, porque, como sabe, o que está a fazer-se na BBC, em nome do serviço público de televisão, é exactamente o contrário do que acaba de referir e daí que, na BBC, vão aparecer sete canais do serviço público, o que, naturalmente, não pode ser esquecido. O seu exemplo é, pois, falacioso e parte do pressuposto de não se conhecer exactamente aquilo que está a ser feito hoje relativamente ao exemplo inglês.
Eis porque, Srs. Deputados, o que está aqui em causa é uma medida positiva e necessária de racionalização, de articulação, mas com salvaguarda não só da identidade própria de cada uma das empresas mas também daquilo que é indispensável: um plano estratégico para a RTP que salvaguarde o serviço público de televisão. É isto que está em causa.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Presidência, como tenho muito pouco tempo, vou direito ao assunto.
Alguém lhe segredou, aí do lado, uma coisa errada e o Sr. Ministro incorreu num erro. O que eu disse está gravado e tem aí o meu discurso. Eu citei um editorial do Financial Times (penso que o Sr. Ministro é uma das pessoas que, de vez em quando, também lê o Financial Times), no qual o Sr. Ministro pode encontrar (foi o que eu referi) uma proposta colocada sobre a mesa para a reestruturação da BBC, que vai rigorosamente ao encontro, repito, vai rigorosamente ao encontro, daquilo que são as propostas que vêm sendo lançadas em Portugal pelo PSD e, hoje em dia, acompanhadas já por muitos. Foi isso que referi e é isso que é a pura verdade.
Quanto ao resto, Sr. Ministro, devo dizer que a sua intervenção praticamente não esclareceu nada.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Orador: - Sr. Presidente, vou terminar.
Como é possível que a RTP receba cerca de sete vezes mais do que a Carris em indemnizações compensatórias ou, por exemplo, 18 vezes mais do que os transportes colectivos do Porto, em cada ano?
O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro da Presidência.
O Sr. Ministro da Presidência: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, é muito fácil esclarecer este ponto.
Primeiro, estamos em sede de apreciação parlamentar e o Governo está disposto e disponível para esclarecer tudo o que for de esclarecer, designadamente quanto às respostas aos requerimentos. Podem estar plenamente descansados que eles vão ser respondidos imediatamente e que o esclarecimento ficará plenamente evidente.
Por outro lado, registo o esclarecimento daquilo que disse, mas, como sabe, o Governo inglês ainda não decide com base nas orientações do Financial Times e, portanto, é preciso esclarecer que a posição do Governo inglês é idêntica à do Governo português. Isto que fique completamente claro.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, resta-me informar que a Mesa recebeu, nos termos regimentais, um projecto de resolução apresentado pelo CDS-PP e PSD, visando a recusa de ratificação. Nestes termos, o debate está encerrado, votando-se o projecto de resolução no dia regimental de votações, que suponho ser na próxima quinta-feira.
Em relação ao Decreto-Lei n.º 197/2000, de 24 de Agosto, que regulamenta a Lei n.º 43/99, de 11 de Junho, que prevê o direito à revisão da situação militar dos quadros permanentes que, em virtude da sua participação ou envolvimento no processo de transição para a democracia iniciado em 25 de Abril de 1974, viram as suas carreiras afectadas por esse evento [apreciação parlamentar n.º 24/VIII (PS, PSD, PCP, Os Verdes e BE)], foi apresentada uma proposta subscrita pelos Srs. Deputados António Reis, Carlos Encarnação, João Amaral, João Rebelo, Isabel Castro e Luís Fazenda. Creio que o que está em questão, relativamente a esta apreciação parlamentar, é unicamente esta proposta de alteração, como não há inscrições, informo que a referida proposta, bem como o Decreto-Lei, bai
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xarão à Comissão de Defesa Nacional, para debate e votação na especialidade. O debate será encerrado depois de a proposta ter sido apreciada e votada, sendo posteriormente votado o texto final em Plenário.
Srs. Deputados, passamos à apreciação do Decreto-Lei n.º 205/2000, de 1 de Setembro, que altera o Decreto-Lei n.º 118/92, de 25 de Junho, que estabelece o regime de comparticipação do Estado no preço dos medicamentos [apreciação parlamentar n.º 30/VIII (PCP)].
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Natália Filipe.
A Sr.ª Natália Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A política do medicamento assume particular importância no conjunto da prestação de cuidados de saúde. Os recursos financeiros despendidos nos gastos com medicamentos exigem do Governo legislação adequada que salvaguarde a saúde pública e a racionalidade dos gastos públicos e, acima de tudo, que assegure critérios de decisão objectivos e com fundamento científico.
As alterações introduzidas pelo Governo ao regime de comparticipações do Estado no preço dos medicamentos contrariam os princípios enunciados e levantam fundadas preocupações sobre os efeitos que irá produzir.
A Lei n.º 14/2000, de 8 de Agosto, aprovada nesta Assembleia, por iniciativa do PCP, define medidas para a racionalização da política do medicamento, no âmbito do SNS, entre elas a reavaliação sistemática dos medicamentos comparticipados.
Para o PCP é fundamental que, da reavaliação da comparticipação dos medicamentos, haja benefícios para os utentes. Não podemos aceitar que, em nome da defesa dos interesses da saúde pública e dos doentes, se criem condições para continuar a alimentar os interesses dos grupos económicos que intervêm na área do medicamento.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!
A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O PCP requereu a apreciação parlamentar do Decreto-Lei n.º 205/2000 por entender que as alterações ali introduzidas contrariam o princípio da racionalidade dos gastos públicos com medicamentos e a tomada de decisão consubstanciada em critérios objectivos e de carácter científico.
A criação de um novo escalão de comparticipação em que poderão dar entrada directa novos medicamentos surge para o PCP como uma autêntica manobra de artistas e é contraditória com a própria lei, com o Programa do Governo e com a tão propalada política de contenção e de rigor.
Por um lado, reforçam-se os critérios de avaliação, reavaliação, de medicamentos comparticipados e, por outro, são criadas condições para que novos medicamentos, os mais caros, sejam automaticamente comparticipados, independentemente de avaliação posterior e de uma decisão assente em pressupostos científicos e de análise de custo/eficácia.
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Oradora: - De certa forma, também é hipocrisia política utilizar o argumento do interesse público e os doentes para se introduzir a possibilidade de negociação directa entre o INFARMED e a empresa farmacêutica com vista à celebração de acordos que condicionem a comparticipação de novos medicamentos.
Se as circunstâncias de interesse público o justificam, seria mais racional criar condições para que fosse acelerado o processo de decisão e não introduzir na lei autênticos «submarinos» que dão verdadeiros «tiros» na transparência de procedimentos e nos interesses dos utentes.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Fernanda Costa.
A Sr.ª Fernanda Costa (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A política do medicamento e a comparticipação pública no preço dos medicamentos têm assumido grande relevância no quadro da política de saúde a nível internacional e nacional.
Todos os países da União Europeia têm procurado formas inovadoras de comparticipação pública nos gastos com medicamentos de modo a poder acompanhar, por um lado, a evolução do sector e, por outro, continuar a garantir a capacidade de resposta e a acessibilidade ao sistema de saúde.
Também Portugal tem de adaptar a sua política do medicamento às novas realidades e desafios que se colocam neste domínio, equacionando o peso que os medicamentos assumem, nomeadamente no quadro da política de saúde, com vista a garantir a plenitude do direito de acesso de todos os cidadãos às formas mais adequadas de terapêutica medicamentosa e de modo a que o aumento dos gastos com os medicamentos possa ser cada vez mais rigoroso, transparente, racional e justo, do ponto de vista da defesa dos interesses dos cidadãos, mas também da sustentabilidade do próprio sistema.
O Decreto-Lei n.º 205/2000, de 1 de Setembro, que vem alterar o regime de comparticipação do Estado no preço dos medicamentos, dá passos significativos nesse sentido, concretizando medidas anteriormente anunciadas e há muito reclamadas.
Com efeito, para permitir um maior rigor na comparticipação do Estado nos medicamentos e tendo por base a sustentabilidade, a equidade, a racionalidade, o equilíbrio e a eficácia do Serviço Nacional de Saúde, o Decreto-Lei n.º 205/2000, objecto da presente apreciação parlamentar, alcança, na nossa perspectiva, os seguintes objectivos:
Em primeiro lugar, este Decreto-Lei vem conferir maior rigor ao processo de aplicação e verificação dos critérios técnico-científicos e económicos que determinam a comparticipação dos medicamentos, quer no que se refere a novas comparticipações, quer no que respeita à sua reavaliação para efeito de manutenção ou exclusão dessa comparticipação.
Em segundo lugar, este Decreto-Lei vem introduzir um processo de revisão sistemática de comparticipação dos medicamentos, com uma periodicidade não superior a três anos cujo objectivo é aferir se os mesmos continuam a reunir os requisitos da comparticipação atribuída, tendo em conta a normal evolução científica verificada, bem como o aparecimento de novas terapêuticas e a sua comparação relativa. Estas medidas foram definidas como prioritárias pelo Governo e concretizadas com este Decreto-Lei.
Em terceiro lugar, este Decreto-Lei procede a uma majoração em 10% na comparticipação dos medicamentos
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genéricos, concretizando a política anunciada de promoção do uso dos mesmos.
A implementação destas medidas contribuirá para o reforço da política do medicamento e para a garantia do acesso por parte dos cidadãos às terapêuticas medicamentosas.
Finalmente, o citado Decreto-Lei introduz um novo escalão de comparticipação D, de 20%, destinado a novos medicamentos, a medicamentos com comparticipação condicionada a acordos com as empresas farmacêuticas e a medicamentos, que, por razões específicas e após parecer fundamentado, fiquem abrangidos por um regime de comparticipação transitório.
Relativamente aos novos medicamentos, que podem ser comparticipados ao abrigo do novo escalão D, é de salientar que ficam sujeitos ao normal processo de avaliação, nos termos dos artigos 6.º e 7.º do diploma, para efeitos de comparticipação, e, posteriormente, a um processo de revisão periódica para continuidade da comparticipação, processos esses que têm em linha de conta os interesses da saúde e dos doentes e que estão sujeitos, também como é óbvio, a critérios de custo/eficácia, mas não esquecendo a função social do medicamento, que continua a ser relevante na nossa sociedade.
No que respeita aos medicamentos de comparticipação condicionada, a acordos entre o INFARMED e os titulares da respectiva autorização de introdução no mercado, tais acordos de comparticipação dos medicamentos são, na nossa perspectiva, claros, rigorosos e transparentes, apenas podendo ser celebrados com fundamento na defesa do interesse da saúde pública e dos doentes.
Como é sabido, os processos de avaliação dos medicamentos para efeitos de comparticipação são levados a cabo de forma idónea, transparente e rigorosa, cabendo aqui sublinhar que as alterações introduzidas pelo referido Decreto-Lei, contrariamente ao que diz o PCP, vão precisamente nesse sentido, nomeadamente ao conferir um maior rigor na aplicação dos critérios técnico-científicos que presidem à decisão de comparticipação, por um lado, e, por outro, ao introduzir um sistema de revisão sistemática para aferir da continuidade da comparticipação.
Nestes termos, por considerarmos que o Decreto-Lei n.º 205/2000, de 1 de Setembro, consubstancia soluções normativas justas e adequadas ao regime de comparticipação dos medicamentos, nomeadamente tendo em conta princípios de justiça, equidade, custo e eficácia, não podemos acompanhar o Grupo Parlamentar do PCP no seu propósito ao apresentar esta apreciação parlamentar.
Apesar disso, não nos mostraremos avessos a que o regime de comparticipação seja harmonizado e deste modo simplificado, tendo sempre em conta que o doente não deve ser prejudicado.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: No dia 31 de Maio de 2000, nesta Assembleia, foi discutido o projecto de lei n.º 204/VIII, originário do CDS-PP, relativo à prescrição de medicamentos genéricos.
Tal projecto, que era tão importante para centenas de milhar de doentes, foi, como é sabido, irresponsavelmente inviabilizado pela bancada socialista. Nessa data, o Deputado socialista Nelson Baltazar usou, para justificar este facto, uma argumentação surpreendente, afirmando que o Ministério da Saúde havia apresentado, pública e formalmente, as grandes linhas de orientação para a política do medicamento, fazendo incidir as orientações na promoção da prescrição e uso dos medicamentos genéricos, na dispensa dos medicamentos na urgência, na reorganização da farmácia hospitalar, no redimensionamento das embalagens dos medicamentos, na revisão do sistema de comparticipações, na promoção do uso nacional do medicamento e no aumento da fiscalização e controle, reforçando a qualidade da saúde.
Supõe-se, por isso, que o Decreto-Lei n.º 205/2000, de 1 de Setembro, hoje em apreciação, tenha sido produzido com este espírito anunciado, mas, se o foi, salvo melhor opinião, entendemos que o foi pouco e mal.
No essencial, pois o tempo não nos permite mais, cria-se agora um novo escalão, o escalão D, para o qual a comparticipação do Estado é de 20% do preço de venda ao público dos medicamentos, podendo ser incluídos neste novo escalão de comparticipação novos medicamentos com comparticipação ajustada, ou novos medicamento, ou medicamentos que, por razões específicas, fiquem abrangidos por um regime de comparticipação transitória.
Neste ponto, o propósito inconfessado do Governo, na nossa opinião, é claro: não se trata de criar mais um caso de comparticipação com que beneficiariam os doentes, trata-se, isso sim, de retirar dos escalões A, B e C, objecto de muito maior comparticipação, respectivamente, 100%, 70% e 40%, um enorme número de medicamentos que passa agora a ser objecto de um escalão muito menos comparticipado, ou seja, com o objectivo inconfessado de gastar menos, o Governo não se coíbe de prejudicar centenas de milhar de doentes.
Não obstante, independentemente do exposto, a verdade é que o regime de comparticipação vigente navega no caos.
Dou-vos um exemplo: como é sabido, a vinheta rosa dá lugar a uma comparticipação de 100%, 70% ou 40% e a vinheta verde a uma comparticipação superior, de 100%, 85% ou 55%. Ora, de acordo com a Associação Nacional de Farmácia, a vinheta verde, aplicável em casos de doentes com poucos rendimentos (por exemplo, doentes com pensões de reforma inferiores ao salário mínimo nacional), corresponde a cerca de 45% das receitas passadas. Pergunta-se: será que a alguém acredita no absurdo de que 45% dos doentes têm poucos rendimentos, que são, por exemplo, doentes reformados com pensões inferiores ao salário mínimo nacional? É evidente que não! É uma fraude e é uma fraude que o Governo não fiscaliza.
Deixamos aqui a seguinte sugestão ao Governo: mais do que criar diferentes escalões comparticipados, faria sentido criar um sistema de comparticipação equivalente ao valor médio ponderado dos preços dos vários medicamentos existentes no mercado para cada substância activa. Com esse sistema, e de acordo com a opinião de vários especialistas ligados aos sectores da saúde, os doentes seriam mais beneficiados e o Estado pouparia, no mínimo, cerca de 12 milhões de contos anuais.
Acresce que o montante de apenas 10% na comparticipação de genéricos, proposto no diploma em apreciação, é manifestamente inferior não só ao que o Partido Socialista prometera como em relação ao que o CDS-PP previa no seu diploma relativo aos genéricos, diploma que foi «chumbado», como se referiu, graças à má vontade da maioria rosa.
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Em jeito de conclusão, o Governo legislou mal e legislou de má fé, tentando combater a despesa pública com a saúde, onde menos devia, ou seja, reduzindo a comparticipação dos doentes.
Ao mesmo tempo e por absurdo, a par desta realidade em que o Governo tenta reduzir as comparticipações de inúmeros doentes, o mesmo Governo permite, por exemplo, que os objectores de consciência tenham medicamentos e assistência médica, para si e para todo o agregado familiar a seu cargo, completamente gratuitos. Não se compreende, repito, como é que doentes com necessidades efectivas tenham comparticipações limitadas e, ao mesmo tempo, que objectores de consciência, pelo simples facto de o serem, obtenham gratuitamente não só medicamentos como assistência médica, para si e para todo o agregado familiar à sua guarda!
Impõe-se que o Governo combata efectivamente a despesa pública com a saúde, mas julgamos que não o deve fazer por este caminho, isto é, à custa dos interesses dos doentes, que são, precisamente, aqueles que menos devem ser sacrificados. Isso, e no que dependa de nós, nunca o permitiremos.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Ponte.
O Sr. Joaquim Ponte (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O Decreto-Lei n.º 205/2000, de 1 de Setembro, que reformulou o regime de comparticipações do Estado no preço dos medicamentos, não só não resolveu nenhum dos problemas graves que a legislação em vigor suscitava como agravou esses problemas.
O primeiro problema que o regime em vigor suscita é o da sua falta de rigor e transparência. O regime é vago e remete sistematicamente para despachos ministeriais a decisão de comparticipação. Sabemos bem onde tem conduzido este carácter remissivo do diploma: foram já publicados dezenas e dezenas de despachos ministeriais concedendo comparticipações do Estado no preço de determinados medicamentos, por razões que podem ser muito louváveis mas que ninguém conhece. O sistema é, assim, cada vez mais burocrático, menos controlado, mais injusto e mais caro.
Entende o PSD que, em matérias de tão grande impacto na despesa pública e em que se jogam interesses económicos tão relevantes, o Estado deve resguardar-se numa posição de total isenção e independência, definindo com rigor na lei as condições em que um medicamento será ou não comparticipado.
Esta falta de rigor resulta ainda do facto de o regime em vigor comparticipar, ou não, o preço dos medicamentos em função das entidades que os prescrevem ou dispensam. Esta solução, em vigor desde 1998, veio dar cobertura a situações de discriminação injustificada entre o Serviço Nacional de Saúde e o sector privado, em prejuízo deste último, porque se tem traduzido sempre em comparticipar melhor os medicamentos prescritos ou dispensados nas instituições do Estado.
Esta situação é subjectiva, arbitrariamente discriminatória e totalmente injustificada. Os medicamentos devem ser comparticipados, ou não, em função de critérios técnicos, contrariamente ao que está previsto na legislação em vigor.
O favorecimento das instituições do Serviço Nacional de Saúde neste domínio é, por outro lado, um dos factores de crescimento da despesa, na medida em que faz crescer a intervenção do Serviço Nacional de Saúde na distribuição de medicamentos. É conveniente lembrar que, já hoje, 2/3 do orçamento da saúde correspondem a despesa pública e apenas 1/3 a despesa privada.
O regime de comparticipações, em vigor desde 1998, contém assim, pelas razões sumariamente indicadas, um grau de incerteza tal que o tornou praticamente incontrolável.
Ora, o Decreto-Lei n.º 205/2000, de 1 de Setembro, não só não resolveu nenhum dos problemas do regime anterior, como veio agravar substancialmente o seu grau de subjectividade, pelas razões que a seguir indicamos.
Em primeiro lugar, deixou intocáveis todos os aspectos negativos do artigo 3.º do regime anterior.
Continua a admitir-se a comparticipação de medicamentos utilizados no tratamento de «determinadas patologias» ou de «grupos especiais de doentes» em condições a regulamentar. Que patologias? Que grupos? Em que condições? Com que critérios? Ninguém sabe!
Continua a admitir-se comparticipar diferentemente o mesmo medicamento em função das entidades que o prescrevem ou dispensam. Que entidades? Com que critérios? Ninguém sabe, nem há qualquer regulamentação a este propósito. Proliferam, às dezenas, as situações desta natureza, com custos para o Orçamento do Estado que ninguém consegue controlar.
Continua a admitir-se que a comparticipação pode ser aprovada apenas para determinadas indicações terapêuticas, a fixar no despacho de comparticipação. Que indicações terapêuticas? Ninguém sabe! Como é que estas situações se controlam? Ninguém sabe!
Em segundo lugar, o Decreto-Lei n.º 205/2000 deixa intocável o reconhecido uso e abuso do regime especial de comparticipação para os pensionistas com rendimento abaixo do salário mínimo nacional.
Em terceiro lugar, o diploma em apreciação criou um novo escalão de comparticipação cuja aplicação vai depender de um processo de negociação entre o Infarmed e o laboratório! É inacreditável como em matéria de tal relevância se deixa assim, ao sabor de uma negociação com todo o grau de incertezas, pressões e subjectividades a que um processo desta natureza está naturalmente sujeito, a aplicação do referido escalão de comparticipação.
Este novo escalão é, aliás, uma porta aberta para o Estado reduzir a comparticipação nos medicamentos, transferindo encargos para os doentes sem adoptar, simultaneamente, medidas eficazes no domínio dos preços.
A Sr.ª Natália Filipe (PCP): - Exactamente!
O Orador: - Aquilo que foi, no passado, um processo objectivo e transparente está hoje transformado numa balbúrdia, em que as decisões de comparticipação podem ser casuísticas, obtidas por despacho ministerial ou negociação e, como tal, muito subjectivas e potencialmente injustas. Como é possível que o Governo faça promessas sucessivas de contenção da despesa e acolha ao mesmo tempo esta confusão? É preciso não esquecer que, para além de outros aspectos, o regime de comparticipações é um dos factores essenciais do crescimento da despesa.
Entendemos, assim, que é nosso dever recusar a ratificação do diploma e desencadear os mecanismos legislativos
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necessários para fazer aprovar um regime objectivo e transparente.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Recursos Humanos e da Modernização da Saúde.
O Sr. Secretário de Estado dos Recursos Humanos e da Modernização da Saúde (Nelson Baltazar): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, uma saudação especial a todas V. Ex.as, que personalizo na pessoa do Ex.mo Presidente da Assembleia da República em exercício, nesta primeira intervenção que faço da bancada do Governo, nesta sessão legislativa.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Obrigado, em nome da Assembleia da República, Sr. Secretário de Estado.
O Orador: - Solicita o PCP, por direito próprio, a apreciação parlamentar do Decreto-Lei n.º 205/2000, que altera o regime de comparticipação do Estado no preço dos medicamentos. Para além de referências acerca de critérios de exigência que a legislação deve assegurar, e com os quais o Governo está perfeitamente de acordo, nomeadamente quanto à protecção da saúde pública e à racionalidade dos gastos, manifesta ainda o Partido Comunista Português preocupações quanto à falta de transparência dos procedimentos a que algum articulado do referido diploma poderia vir a conduzir.
A Sr.ª Natália Filipe (PCP): - Exactamente!
O Orador: - As questões políticas já foram debatidas pelos Srs. Deputados; por isso, penso que hoje me compete traduzir e reflectir aqui as questões que se colocam efectivamente, ou seja, há um receio de que possam entrar no novo escalão de comparticipação - o mais baixo que está definido nesta lei - novos medicamentos. Mas que receio é este? Esses medicamentos, se são novos medicamentos, vão ser comparticipados numa determinada base, que está definida na lei; se não forem comparticipados, nunca será possível efectuar a sua avaliação para efeitos de comparticipação.
Em regra, esta questão foi discutida por diversas vezes e aceitámos que era preciso executar e demonstrar apoio a estes novos medicamentos, de forma a poder determinar o valor terapêutico acrescido que eles tinham efectivamente. Esta é a questão essencial. Assim, a partir desta fórmula, podemos fazer a avaliação in vivo, tendo em conta que esta comparticipação permite o acesso a uma experiência natural, que é preciso realizar em qualquer parte do mundo.
Respondendo ao Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, devo esclarecer que não estamos a gastar mais, não estamos a poupar nada, estamos a comparticipar novas hipóteses relativamente a novos medicamentos, ou seja, a permitir um maior acesso.
Por outro lado, há medicamentos cujo valor terapêutico é, eventualmente, controverso e, nesta medida, por algumas razões, umas relacionadas com o uso por parte dos utentes, outras com práticas clínicas, não está aconselhada a sua descomparticipação imediata. Nesse caso, passam por uma fase intermédia, fase essa em que a avaliação de maior comparticipação para os medicamentos novos, ou a descomparticipação eventual para esses medicamentos, é revista de três em três anos.
A este propósito, gostaria de referir que estamos a ser, inclusivamente, mais rigorosos que a Europa. A Europa só faz estas revisões de cinco em cinco anos e nós estamos a fazê-la de três em três anos - e bem -, penso que por arrastamento de uma lei que foi aprovada na última sessão legislativa, nesta Assembleia, e que saiu, efectivamente da intenção dos partidos políticos.
Quanto à segunda questão, a da possibilidade de negociação entre o Infarmed e as empresas farmacêuticas para efeitos de determinação desta comparticipação e, até, dos preços, devo dizer que ela já cabia ao Infarmed, ou seja, a validação ou não de um preço de medicamento, para efeitos de comparticipação, era já feita, e sempre o foi, pela via do Infarmed e depois, naturalmente, era ratificada pelo próprio Ministério da Economia.
Os rigores do critério de exclusão dos medicamentos da lista de comparticipação estão expressos no artigo 7.º; são 10 condições que lá estão expressas, e bem, o que reduz, ao mínimo, a possibilidade de criação de situações nublosas, ou seja, os processos de apreciação passam a ser mais transparentes.
Os medicamentos inovadores são caros, todos o sabemos. Se os quisermos disponibilizar aos nossos concidadãos, temos de ser exigentes na negociação dos preços e encarar mesmo a hipótese de incluir critérios que pressuponham a apresentação regular de estudos de farmacovigilância e fármaco-económicos, com calendário periódico de reavaliação. É o que se prevê no artigo 6.º-A, artigo que é proposto, como vos disse, por arrastamento do próprio sistema.
Para terminar, quero dizer-vos que esta não é uma questão política; é, essencialmente, uma capacidade gestionária plasmada e estruturada nesta lei, criando rigor e transparência.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Secretário de Estado, inscreveram-se os Srs. Deputados Luís Fazenda e Bernardino Soares. Uma vez que o Sr. Secretário de Estado não dispõe de tempo para responder, o BE cede-lhe 3 minutos para o efeito.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.
O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, saúdo o Sr. Secretário de Estado Nelson Baltazar pelo exercício das suas novas funções.
Sr. Secretário de Estado, vou ser muito breve e concreto. Todos sabemos que os gastos em medicamentos por parte do Serviço Nacional de Saúde são elevadíssimos e, por isso, creio que não nos iludiremos se dissermos que andamos a caminho do abismo. Este não é um problema de «ministras que sucedem a ministras» mas, sim, um problema mais geral, do Serviço Nacional de Saúde, da política do Estado face ao medicamento.
Gostaria de perguntar ao Sr. Secretário de Estado, talvez em complemento das explicações que aqui trouxe - explicações que, peço desculpa, também não me convenceram -, por que é que não se encara a possibilidade de alterar o sistema e, em vez do pagamento de um percentual em relação ao preço do medicamento, estabelecer-se uma lógica que tenha a ver com o preço de referência médio, de acordo com as substâncias que são prescritas. Penso que essa solução é hoje apontada de forma generalizada
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por todos os quadrantes e, por isso, não se percebe que dogma é que poderá existir para que não se altere uma filosofia de base.
Por outro lado, pergunto também ao Sr. Secretário de Estado, Nelson Baltazar, porque não podemos ignorar a política em relação aos genéricos que vem aqui concatenar-se com esta, se está de acordo com o recente decreto do Governo acerca dos genéricos, quando ele oferece bastantes discrepâncias em relação àquilo que foi a lei que esta Assembleia aprovou sobre a mesma matéria, na qual participou o Sr. Deputado Nelson Baltazar. As suas discrepâncias e a sua eventual interpretação até suscitaram dúvidas ao Sr. Presidente da República. Ora, como ainda tenho mais dúvidas do que o Sr. Presidente da República, deixo-as ao Sr. Secretário de Estado Nelson Baltazar.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Uma vez que o Sr. Secretário de Estado responderá às perguntas em conjunto, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, cumprimento também o Sr. Secretário de Estado nestas suas novas funções.
Em primeiro lugar, queria saber a sua opinião sobre a desvalorização da lei da Assembleia da República sobre a questão dos medicamentos, quer na regulamentação que vai sendo feita quer nalgumas declarações, como, por exemplo, aquelas que, citando uma fonte do Ministério da Saúde, dizem que «os Deputados Socialistas fizeram um excelente trabalho e transformaram dois projectos de lei irrealistas, do PCP e do Bloco de Esquerda, numa lei que não tem transtornos de maior».
Risos do PCP e do PSD.
Pergunto se é esta a opinião do Sr. Secretário de Estado em relação à lei desta Assembleia sobre esta matéria.
Quero também dizer que, nesta regulamentação, estamos de acordo com aquilo que regulamenta a lei, com a reavaliação sistemática, com a análise do balanço custo/benefício, com a apreciação de três em três anos, que é uma concretização daquilo que ficou estabelecido na lei. Agora, com o que não estamos de acordo é com a introdução de um novo escalão, o escalão D, de 20% de comparticipação, que provavelmente servirá, em primeiro lugar, para criar um patamar mais baixo para alguns medicamentos que hoje estão comparticipados noutros escalões, e, em segundo lugar, para permitir a entrada por ajuste directo de medicamentos que ainda não cumpriram o seu processo de avaliação para que possam vir a ser comparticipados.
Diz o Sr. Secretário de Estado que os novos medicamentos provavelmente irão ser comparticipados. Pois se assim é, eles devem ser avaliados com total transparência e objectividade, como é o processo que existe no Infarmed, para permitir que a decisão que se irá tomar nesta matéria seja fundada em critérios objectivos e técnico-científicos. De outra maneira, estamos aqui a adoptar a política de primeiro pagar para ver depois se o interesse público está aí defendido.
A Sr.ª Natália Filipe (PCP): - Exactamente!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra Sr. Secretário de Estado dos Recursos Humanos e da Modernização da Saúde.
O Sr. Secretário de Estado dos Recursos Humanos e da Modernização da Saúde: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, naturalmente que as novas condições que nos são impostas pelas novas situações de saúde levam a que os gastos com medicamentos cresçam, particularmente porque os medicamentos novos que aparecem para estas situações diferenciadas têm gastos e custos muito elevados. Não estamos a caminho do abismo, e exactamente por isso temos de controlar e gerir este e outros processos.
O que não faz sentido é que, relativamente à experiência que estamos a tentar incluir neste momento, esses novos medicamentos passem anos a serem necessários e a serem usados, sendo até alguns importados do estrangeiro porque cá não existem, sem que sejam avaliados. Esta é uma forma clara de criar processos de avaliação imediatos, tendo em conta até que algumas das pessoas que os usam precisam também de ter um mínimo de comparticipação, que durante anos não tiveram. Soubemos e avaliamos isso.
Quantos às questões de avaliação dos medicamentos, elas estão claras e definidas, e existem não só em lei da Assembleia da República mas também em leis e normativos plasmados pelo Ministério da Saúde. Penso que não vale a pena estarmos aqui a discuti-las porque perderíamos algum tempo e não há discrepâncias entre este decreto-lei e a lei aprovada aqui, pela Assembleia da República, pois a lei refere em medicamentos na generalidade.
Respondendo ao Deputado Bernardino Soares, devo dizer que não posso fazer a avaliação do trabalho dos socialistas, na medida que estaria até a fazer uma avaliação em causa própria e não o quero fazer; penso que foi o trabalho de todos os Deputados, em comissão da especialidade, que deu origem àquela lei que considero muito positiva.
Esta lei é específica para os genéricos e todos sabemos qual é a percentagem do mercado de genéricos que está em causa, como todos, Governo e Assembleia da República, sabemos também qual é a percentagem a que devemos chegar, a curto prazo, na dispensa de medicamentos genéricos. Ora, para isso temos de impor alguns incentivos; naturalmente que não há discrepâncias de forma directa mas, sim, uma lei global, bem feita, que saiu da Assembleia da República, para medicamentos, há uma lei específica para genéricos que tem aquela particularidade de que o Sr. Deputado Luís Fazenda quis fazer uma grande querela mas que não é, ou seja, a particularidade de se colocar, em termos de dispensa, o medicamento genérico mais barato, quando isso é possível avaliar.
Não há qualquer desvalorização da lei da Assembleia da República, Sr. Deputado, nem nós, que temos estado nesta luta pelos medicamentos, queremos que ela aconteça. O rigor da avaliação da fármaco-vigilância é feito por uma comissão de avaliação composta pelos mais reputados médicos, farmacêuticos e farmacologistas. Esta comissão, constituída por 50 especialistas, funciona no Infarmed, felizmente, há muitos anos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Não há mais intervenções. Porém, antes de encerrar o debate, informo que entraram na Mesa duas propostas de alteração ao diploma, que já foram distribuídas e que baixam à 8.ª Comissão, para debate e votação.
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Passamos agora ao ponto seguinte da ordem de trabalhos, a apreciação do Decreto-Lei n.º 183/2000, de 10 de Agosto, que altera o Código do Processo Civil, na redacção que lhe foi dada pelos Decretos-Leis n.os 329/95, de 12 de Dezembro, 180/96, de 25 de Setembro, e 375-A/99, de 20 de Setembro, e o Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 383/99, de 23 de Setembro [apreciação parlamentar n.º 25/VIII (PSD)].
Para dar início ao debate e apresentar o pedido de apreciação parlamentar, tem a palavra o Sr. Deputado António Montalvão Machado.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Num acto aplaudido por todos, registe-se desde já, o Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata requereu a apreciação do Decreto-Lei n.º 183/2000, por o mesmo violar os mais elementares e estruturantes princípios do direito processual civil português, por conter normas absolutamente inadmissíveis e por padecer de erros e imprecisões intoleráveis.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Feito à pressa e derivando de uma injustificada febre de mostrar serviço, cedo o decreto-lei em análise mereceu a reprovação dos mais variados especialistas na matéria, de todos os operadores judiciários e do próprio Bastonário da Ordem dos Advogados.
E a pressa foi tanta, os erros foram tantos, que o próprio Governo teve necessidade de rectificar já o seu próprio decreto-lei, corrigindo alguns dos muitos lapsos cometidos. Fê-lo, como é sabido, pela Declaração de Rectificação n.º 7-S/2000, de 31 de Agosto.
Comecemos por aquilo que consideramos uma perigosa violação dos princípios estruturantes do processo civil, o novo regime da citação.
A citação é o acto mais nobre e mais rigoroso que qualifica o contraditório. Serve ela, como se sabe, para avisar o réu de que tem pendente contra si determinada acção, para lhe proporcionar a defesa e, sobretudo, para lhe fazer saber as consequências em que incorre no caso de não se defender, as quais são, normalmente, fatais em processo civil.
Pois bem, ao arrepio de uma longa e rigorosa tradição, ao arrepio do que sucede em todos os outros ordenamentos jurídicos - como ainda há bem pouco tempo escreveu o Professor Lebre de Freitas -, em nome da pura e dura celeridade processual, aligeirou-se, ou melhor, abastardou-se por completo esse importante acto judicial, permitindo-se que em quaisquer acções de dívida emergentes de contrato escrito, qualquer que seja o seu valor, a citação se faça por via postal simples, e não sob registo, como até aqui.
Desta forma, deixará de haver o mais pequeno controlo quanto à indispensável certeza de que o réu tomou, de facto, conhecimento da pendência da acção instaurada contra si. E note-se que podem estar em causa milhões de contos.
Creio mesmo que a norma em causa viola clamorosamente a incumbência (leia-se o dever) que recai sobre os tribunais de «assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos...», como determina o n.º 2 do artigo 202.º da Constituição. Deixar uma carta na simples caixa do correio, sem mais, e presumir-se daí que o réu está, de facto, citado, constitui um risco incalculável.
O réu que está hospitalizado, o réu que está em viagem, o réu que tem a sua casa em obras e que, por isso, muda de residência durante cerca de 30 dias, ou mais, e tantos, tantos outros exemplos se poderiam dar, todos esses réus, dizia, considerar-se-ão citados sem efectivamente o terem sido e, o que é mais grave, não poderão defender-se de uma acção, porventura, infundada e injustamente proposta contra si.
Quantas arguições de nulidade derivadas da falta de citação se irão fazer, embora se reconheça que seja difícil, senão impossível, fazer a prova negativa de um facto, isto é, demonstrar que o réu processualmente citado, afinal, não foi citado.
A regra da citação por via postal simples representa, Sr. Presidente e Srs. Deputados, no nosso entender uma leviandade inadmissível.
A pressa de acabar com as pendências acumuladas não justifica tudo. Muito menos, pode legitimar a violação de direitos fundamentais.
Mas há outra inovação com que não concordamos: a notificação das testemunhas por via postal simples, igualmente não registada. A consequência disto é tão simples como a própria via postal simples: sabendo que o tribunal não pode assegurar que a testemunha foi, de facto, notificada, ela - também é simples - não vai ao julgamento. Todos sabemos o que custa ser testemunha, por razões de desconforto, de viagens, de problemas no emprego, etc.
Competirá, pois, à parte, e não ao tribunal, influenciar o comparecimento da testemunha, quiçá levando-a e trazendo-a, quiçá compensando-a pelo esforço e pelos prejuízos sofridos, quiçá pagando-lhe, o que é, no mínimo, repugnante, porque o Governo não pode pretender que sobre as partes (diga-se, sobre os portugueses) passem a recair as obrigações que competem ao Estado. Desta forma, como bem lembrou o Presidente da Ordem dos Advogados, a testemunha passará a ser um verdadeiro mercenário ao serviço da parte, e não ao serviço da verdade, como se impunha.
Acresce que o diploma em apreciação contém normas absolutamente intoleráveis. Uma delas é a que obriga o advogado de uma das partes a - imagine-se! - ser ele próprio, e, mais uma vez, não o tribunal, a notificar o advogado da parte contrária de tudo aquilo que haja requerido ou articulado nos autos. Mas, não só: depois disso, esse advogado, o tal que já viu duplicado a sua tarefa, tem ainda de demonstrar ao tribunal que procedeu à dita notificação, o que não duplica, mas, triplica a sua já difícil missão.
As normas em causa representam uma sobrecarga imensa das tarefas administrativas, burocráticas e processuais dos escritórios dos advogados e, consequentemente, provocarão um custo acrescido no final da acção.
Ora, quem vai sofrer as penalizações correspondentes são, obviamente, as partes. Porquê ? Porque este Governo quer, mais uma vez, onerar os portugueses com grande parte dos custos do serviço público da justiça.
As normas em causa demonstram até que o Governo não tem (ou não quis ter) a mais pequena ideia acerca do funcionamento de um escritório de advogados e nem tem ideia, até, da estrutura conflitual que, várias vezes, condiciona a própria tramitação da acção.
Algum Sr. Deputado presente (e apelo especialmente àqueles que exercem a advocacia) acha possível e lógico
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que o advogado do exequente notifique (e, por isso, avise e alerte) o advogado do executado que nomeou bens à penhora e quais foram esses bens ? Sim, porque aplicando-se à acção executiva as regras do processo declaratório, é mais do que provável que estas regras se apliquem também na acção executiva.
Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, deixem-me ser sincero: não há um único advogado português que concorde com esta medida que VV. Ex.as propuseram. E isso deve ou devia ser o bastante para que VV Ex.as reflectissem e aceitassem corrigir este péssimo diploma.
Passemos agora às imprecisões e aos erros do decreto-lei. Em primeiro lugar, temos a exigência de suporte digital para os articulados, alegações e contra-alegações. Aplaudimos a medida, a qual, aliás, há muito deveria ter sido tomada. Mas justificar-se-á tal exigência nos processos em que, não sendo obrigatória a intervenção do advogado, a parte litiga por si? Creio que não. Justificar-se-á tal exigência nos casos de nomeação oficiosa de advogado? Creio também que não. E estas situações estão acauteladas no diploma? Tenho a certeza de que não! Mas deveriam estar.
Por outro lado, não se percebe bem o alcance da alínea d) do n.º 1 do artigo 651.º, porque, se o advogado comunicou atempadamente a sua falta de comparência, certamente que o juiz designou nova data para o julgamento.
Acresce ainda que, por lapso dos lapsos, os novos n.os 3, 4 e 5 do artigo 646.º são, afinal, os mesmos números 3, 4 e 5 do mesmo artigo 646.º do Código de Processo Civil. Não deixa de ser original e inédito!…
Mas há lapsos maiores. No n.º 5 do artigo 623.º, continua a aludir-se à expedição de cartas precatórias para inquirição de testemunhas. Então, com o novo sistema de teleconferência que, indiscutivelmente, todos aceitamos - se funcionar, é claro! -, não acabaram as cartas precatórias para inquirição de testemunhas?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por estas - e não são poucas - e muitas outras razões, o Grupo Parlamentar do PSD apresenta hoje diversas alterações ao Decreto-Lei n.º 183/2000, que espera que venham a ser aceites por esta Câmara.
Ao fazê-lo, o PSD demonstra um alto sentido de responsabilidade política e uma vontade de cooperar com a tão desejada reforma judiciária. É que se uma reforma é, sem dúvida, um acto de coragem, ela deve ser também um acto de serenidade e de prudência, o que o Governo, neste caso, não teve.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Dias Baptista.
O Sr. António Dias Baptista (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Montalvão Machado, ouvimos com uma enorme atenção a sua intervenção e estávamos a ficar bastante surpreendidos, pois V. Ex.ª estava praticamente a terminar a sua intervenção sem se referir à apresentação de propostas, as quais, obviamente, estamos à espera de ver e que ainda não recebemos.
A questão que lhe quero colocar é muito simples. V. Ex.ª criticou e atacou de forma exacerbada e acérrima o novo sistema de citações apresentado através do Decreto-Lei n.º 183/2000. Mas acontece que passou por cima, ostensivamente (ou talvez não) daquele que é um dos objectivos desta proposta e desta reforma, que tem a ver com uma das questões fundamentais.
Todos sabemos, tal como V. Ex.ª, como ilustre advogado que é, que um dos grandes problemas do sistema judiciário se prende, precisamente, com a dificuldade da citação. Não conseguimos perceber por que é que, em relação a esse ponto, V. Ex.ª não foi capaz de dizer por que é que considera que o novo sistema não é correcto, até porque me parece que terá avançado com uma questão que não é correcta. V. Ex.ª disse que o novo regime regra passa a ser a citação simples. Ora, V. Ex.ª sabe muito bem que isso não é verdade!
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Montalvão Machado.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Dias Baptista, as propostas que disse estar à espera que apresentássemos estão, neste momento, a ser entregues na Mesa e a intenção do Partido Social Democrata foi…
Protestos da Deputada do PCP Odete Santos.
Sr. Presidente, não sei se o tempo que está a contar é o meu ou se é o da Sr.ª Deputada…
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Peço desculpa, Sr. Deputado, não é para si, é para o PS!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr.ª Deputada Odete Santos, peço que deixe o Sr. Deputado António Montalvão Machado responder ao pedido de esclarecimento.
Faça favor de prosseguir, Sr. Deputado.
O Orador: - Como dizia, as propostas do PSD estão a ser entregues na Mesa e têm, quanto mais não seja, a vantagem de proporcionarem o debate, a discussão e a melhoria de um diploma. Acredite, Sr. Deputado António Dias Baptista, até pela imensa consideração que tenho por si, que este diploma contém inúmeras novidades com as quais nos congratulamos, aceitamos e defendemos. Agora, também contém erros, e isso não aceitamos.
O erro maior é o da citação - dei-lhe exemplos disso, demonstrei-lho. Não há um único especialista na matéria - não falo por mim! - que defenda este regime da citação.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Só o Dr. Osvaldo Castro!
O Orador: - Mais: este regime da citação não existe em ordenamento algum, como bem ensinou o Professor Lebre de Freitas.
Disse que a regra geral não é a deste sistema. Ora bem, a regra geral é para as acções relativas a dívidas, que são as que existem em maior número no País - não são as acções relativas a direitos reais, mas as de dívida aquelas que existem em maior número no País, como os Srs. Deputados sabem.
E, mais: poderia ter-se tido a cautela de aplicar o novo regime só às acções especiais previstas no diploma da injunção, a título experimental, mas nem isso VV. Ex.as fizeram! O que o Governo fez foi admitir, para todas as acções, mesmo aquelas em que se discutam milhões de contos, uma citação por via postal simples, o que em parte
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alguma do mundo se admite. Isto é arriscado e garanto-lhe que vamos prejudicar os processos, pois vai aumentar-se a dilação para 30 dias e vamos ter inúmeras arguições de nulidade por falta de citação - não tenha dúvidas sobre isso!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Montalvão Machado, gostaria que comentasse algo que, para mim, é perfeitamente estranho e difícil de justificar.
Quando li, curiosamente no dia da implantação da República, a Declaração de Rectificação n.º 7/S/2000, de 31 de Agosto, ao Decreto-Lei n.º 183/2000, de 10 de Agosto, verifiquei que se tratava, mais do que de uma rectificação, de verdadeiras alterações.
Aquela declaração de rectificação contém quatro rectificações que constituem verdadeiras alterações, que foram pretensamente verificadas pelo Sr. Secretário-Geral Alexandre Figueiredo, conforme declaração constante do Diário da República datado de 31 de Agosto.
Gostaria de saber se considera razoável que, tendo sido verificadas estas alterações em 31 de Agosto, esse Diário da República só tenha sido distribuído em 4 de Outubro, ou seja, mais de 30 dias depois. Pergunto, pois, se não considera isso uma verdadeira anormalidade e, mais do que isso, se não considera que tal tem algo a ver com a forma apressada e, sobretudo, atabalhoada como se tentou fazer passar este diploma e todas as suas alterações, à socapa de todos os intervenientes processuais.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Montalvão Machado.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, não posso deixar de estar inteiramente de acordo consigo quanto àquilo que diz ter sido a pressa, a tal febre quase doentia de mostrar serviço - permitam-me a expressão, sem desprimor. Logo a seguir, o Governo viu alguns dos erros que cometeu e corrigiu, apressadamente, o diploma. Aliás, este diploma foi feito, um tanto ou quanto estranhamente, nas férias judiciais.
Quanto à questão de ter a data de 31 de Agosto e ser publicada em Outubro, não me merece comentários, até porque o Sr. Deputado já os fez de forma muito clara!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Nesta matéria de apreciação de reformas pontuais, por um lado, mas seguramente relevantes, por outro, que têm vindo a ser introduzidas pelo Governo, através do Ministério da Justiça, visando a maior eficácia da administração da justiça e a maior celeridade processual, tendo como pano de fundo e objectivo final o recobrar da confiança dos portugueses no sistema judicial, permitam que comece por verificar uma certa diferença na maneira como este tipo de matérias está a ser abordado no Parlamento.
Ontem, tivemos aqui ocasião de apreciar e de votar uma proposta de alteração que reforma pontualmente o processo penal, justamente com os mesmos objectivos que acabei de referir.
Vários Deputados manifestaram, em momento próprio, na 1.ª Comissão, natural e legítimo interesse em debater com o Ministério da Justiça as soluções constantes da proposta apresentada. Formulámos audições a entidades várias, o Ministro da Justiça debateu com os Deputados soluções pontuais de alteração possível, elas foram concretizadas e, no momento do debate, todos sabíamos quais eram as alterações sobre que incidia o essencial do debate travado no Parlamento.
Em contraste com esta metodologia de participação, verificamos da parte do PSD uma situação singular. O PSD toma uma iniciativa para apreciação parlamentar do decreto-lei relativo às autorizações do processo civil e foi várias vezes instado a apresentar com a antecipação razoável as suas alterações ao processo civil, designadamente para, utilizando uma metodologia simétrica, permitir que pudéssemos, em sede de Comissão, de forma ponderada, debatendo-as até na presença do Ministério da Justiça, dar um concurso positivo e construtivo para a avaliação do bem ou do mal fundado das propostas apresentadas pelo PSD.
Estamos, neste momento, no debate, estou, neste momento, a intervir e ainda não são conhecidas as propostas apresentadas pelo PSD.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Há, de facto, aqui qualquer coisa de diferente no modo de conduta política.
Quando os Srs. Deputados do PSD, frequentes vezes, exigem dos outros, da maioria parlamentar e do Governo, disponibilidade para, de forma tempestiva, esclarecer os seus propósitos e criar as condições para debates efectivos, procuramos, pela nossa parte, corresponder. Permitam-me que lamente que, justamente, a posição que os senhores evidenciam seja completamente contrária àquela, particularmente nesta matéria.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Tenho ainda presente nos meus ouvidos o debate recentemente aqui travado em torno das reformas do processo penal.
Quando apreciámos, na generalidade, essas matérias, o que é que ouvimos? Ouvimos, por exemplo, da parte da bancada do CDS-PP, na circunstância através do Sr. Deputado Narana Coissoró, respondendo às interpelações que tinham sido feitas pelo Ministro da Justiça com vista à introdução de soluções pontuais e efectivas para superar os estrangulamentos do processo penal e outras matérias também atinentes ao processo civil, o Sr. Deputado Narana Coissoró, em concreto, a todas as interpelações lançadas pelo Governo, dar uma resposta sistemática: não, não e não! Todos os Srs. Deputados estarão recordados deste momento interessante do nosso debate parlamentar.
Entretanto, tivemos ocasião, de forma ponderada, digamos que talvez com a cabeça mais fria, de fazer uma avaliação não emocional das soluções técnicas propostas, e o resultado viu-se. O resultado teve ontem expressão na
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votação que teve lugar nesta Câmara. Dessa votação, a propósito das reformas do processo penal, resultou o seguinte: nem o PP disse «não», nem o PSD disse «não». Abstiveram-se, o que, como sinal de partidos da oposição, é, claramente, uma participação positiva, que deve ser registada e realçada, no sentido de, feita a avaliação final das questões em causa, terem acabado por dar o seu contributo positivo - que quero aqui registar - para as soluções finais do processo penal.
Srs. Deputados, há aqui muita simetria entre as questões do processo penal e do processo civil, mas também há muita simetria relativamente à problemática de fundo a que temos de procurar dar resposta. Essa problemática de fundo é a de vencer as inércias, a de combater os factores de estrangulamento, que tantas vezes criam, na dinâmica processual, dificuldades para a administração da justiça em tempo útil e, consequentemente, para a realização efectiva dos direitos dos cidadãos.
É com esta preocupação que nos apresentamos neste debate, na expectativa de poder vir a apreciar (o que, obviamente, se fará em sede de Comissão) as propostas que o PSD, em todo o caso tardiamente, apresenta para serem consideradas.
Mas entendamo-nos quanto ao seguinte, Srs. Deputados: não deixo de olhar com alguma perplexidade para alguns aspectos. Por exemplo, em matéria de notificação pessoal simples, relativamente ao processo penal, qual foi o nosso entendimento?
Foi o de que, tendo havido a possibilidade de definição prévia de um termo de identidade e residência por parte do arguido e até por parte, voluntariamente, dos outros sujeitos processuais, designadamente do assistente e das partes civis, isso permitia, desde logo, ter uma base de referência segura quanto ao domicílio e, consequentemente, poder fazer actuar o mecanismo de notificação pessoal simples.
Vêm agora, os Srs. Deputados, a propósito do processo civil, ignorar que, por exemplo, a notificação postal simples se vai aplicar naqueles casos em que, tendo havido relação contratual entre as partes e tendo as partes assumido no contrato o próprio domicílio que serve de base a essa mesma relação contratual, uma vez havendo algum litígio no quadro dessa relação, já não serve a prévia identificação voluntária pelas próprias partes do domicílio que elas estabeleceram nessa mesma relação jurídica.
Srs. Deputados, sugiro que não tenham dois pesos e duas medidas. Se para um caso vale a prévia identificação de um termo de residência, quando voluntariamente as partes assumem também no contrato a identificação do seu termo de residência, o que é que os Srs. Deputados querem dizer? Que só porque o Estado a não avalizou, só porque não foi uma entidade pública a chancelá-la, porque as partes livremente, e de boa fé, se identificaram na residência para a base jurídica do contrato, isso já não tem o mesmo valor?!
Vozes do PS: - É evidente!
O Orador: - Srs. Deputados, façamos confiança na probidade, naquilo que é a relação contratual livremente estabelecida, por parte dos cidadãos, que, quando identificam, certamente é na base do princípio fundamental de direito de que os contratos são para cumprir e de que a boa-fé contratual é para ser preservada.
Dizem, depois, os Srs. Deputados que o regime pode ter algumas sequelas. Admito que a questão deva ser ponderada, designadamente em vista da eventual ausência do notificando da parte do seu domicílio. Houve uma regra de enorme cautela na proposta apresentada no Decreto-lei que estamos a apreciar: um prazo de dilação de 30 dias que se soma a todos os prazos peremptórios para o exercício das várias prerrogativas constantes da iniciativa processual.
O Sr. José Penedos (PS): - Bem lembrado!
O Orador: - O que significa, Srs. Deputados, que não estamos aqui a discutir uma notificação que faz precludir imediatamente um direito, da noite para o dia, por eventual inércia processual. Há regras de cautela, há regras de prudência, e elas foram inseridas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Os Srs. Deputados referiram, a outro propósito, preocupação sobre o regime de notificação das testemunhas. Eventualmente, em sede de apreciação na Comissão, quereremos averiguar se o próprio regime de notificação postal simples (que, em todo o caso, como sabemos, na sua formulação geral, exige o cuidado de que seja lavrada cota pelo funcionário judicial e que seja igualmente lavrado termo pelo distribuidor postal), se esta mesma regra de cautela se poderá igualmente aplicar à solução do aviso de notificação das testemunhas. Isto, certamente, resolverá muitos dos problemas que o Sr. Deputado Montalvão Machado aqui referia.
O Sr. José Penedos (PS): - Muito bem!
O Sr. Fernando Seara (PSD): - Quem percebe de processo civil é o Dr. Montalvão Machado!
O Orador: - O que significa, da nossa parte, Sr. Deputado, que, tal como no processo penal, estamos disponíveis para dialogar, mas com base em soluções que tenham razoabilidade,…
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Razoabilidade, acho que sim!
O Orador: - … que demonstrem a sua efectiva razão de ser e não na base de alguns fantasmas que os Srs. Deputados de vez em quando invocam e que, depois, quando vamos ver as coisas no seu rigor, demonstram ter muito pouca razão de ser.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Acho que deve ser com razoabilidade, mas não é isso que está aqui!
O Orador: - Mas, Srs. Deputados, valia a pena que, nas intervenções já feitas e eventualmente nas intervenções a fazer, também não se esquecessem de sublinhar a enorme aposta que esta reforma do processo civil que, sendo embora pontual, significa, nos objectivos, uma efectiva modernização das práticas judiciárias.
E, Srs. Deputados, não é modernização só para invocar a palavra mágica. É porque ela, efectivamente, significa acompanhar as possibilidades colocadas ao nosso alcance. Por exemplo, a possibilidade da videoconferência para a audição de testemunhas fora da comarca,…
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Muito bem!
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O Orador: - … possibilitando que ela tenha uma presença real no momento da audiência e que, em consequência, abandonemos o velho mecanismo da carta precatória que, durante larguíssimos meses, por regra, vai afectar os atrasos do procedimento e da dinâmica processual, isto é alguma coisa que me parece que os Srs. Deputados deviam colocar em evidência.
Esta é, aliás, uma típica reforma que não resulta apenas de uma fórmula no papel. Esta é uma típica reforma que resulta da possibilidade da norma se adequar à existência dos equipamentos efectivamente montados e a montar nos tribunais, em tempo adequado, para lhe dar resposta plena.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O que significa que a reforma que aqui estamos a fazer não é, meramente, um contributo legislativo, é um contributo legislativo associado à reforma de meios humanos e de meios tecnológicos para criar a verdadeira face moderna da administração da nossa justiça.
Ao mesmo tempo, Srs. Deputados, temos de dar combate aos expedientes dilatórios. E permitam-me que faça sobre isto, para concluir, uma pequena observação. Há dias, numa intervenção pública, o Sr. Bastonário da Ordem dos Advogados - e bem! -, questionado sobre a circunstância de, às vezes, os advogados poderem usar os expedientes do processo para, com isso, beneficiar a parte que representam, dizia que, naturalmente, é dever dos próprios advogados utilizarem todas as armas ao seu alcance para defenderem o melhor possível os interesses dos seus constituintes.
Mas, ao mesmo tempo, dizia o Sr. Bastonário que se eles o fazem é porque o legislador, muitas vezes, o tem permitido. É nossa responsabilidade de legisladores, neste momento, evitarmos que, sejam quais forem as situações, deixe de haver expedientes dilatórios para que a justiça em sentido pleno e em sentido material realize a sua verdadeira função, que é garantir os direitos dos cidadãos!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Os Srs. Deputados António Montalvão Machado e Nuno Teixeira de Melo inscreveram-se para pedir esclarecimentos.
Tem a palavra, Sr. Deputado António Montalvão Machado.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Sr. Deputado Jorge Lacão, ouvi-o com muita atenção, embora mais de metade do tempo em que V. Ex.ª esteve a falar ter sido sobre o Código de Processo Penal, o que não vem a propósito.
Tenho por si uma admiração e uma estima muito grandes, como sabe. Mas a verdade é que V. Ex.ª, de concreto, sobre o que eu falei e sobre as críticas que eu adiantei disse zero.
O Sr. José Penedos (PS): - Não é verdade!
O Orador: - E sabe por que é que disse zero? Aliás, cometeu uma pequena incorrecção: disse que o procedimento do PSD não foi coerente com o que fez no Código de Processo Penal. Tudo isto surgiu de uma diferença de atitudes do Governo, que V. Ex.ª esqueceu. É que nas alterações ao Código de Processo Penal o Governo pediu autorização à Assembleia da República e, por isso, em sede própria e momento próprio, nós, PSD, discutimos e promovemos correcções e alterações coerentes.
Quanto a este Decreto-Lei, o Governo não pediu autorização, o Governo publicou-o. E a única maneira que o PSD tem de promover o debate é fazer responsavelmente aquilo que fez, ou seja, solicitar a sua apreciação aqui no Parlamento. De que outra maneira queria que o fizéssemos?
Portanto, a única forma que temos para discutir o Decreto-Lei com VV. Ex.as - e registo a sua abertura para corrigir certos pontos - é esta. Porque tudo deriva não de uma incoerência de atitudes do PSD mas, sim, de uma diferença de promoção legislativa por parte do Governo.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É bem verdade!
O Orador: - Já agora, não cite mais, hoje, o Bastonário da Ordem dos Advogados, porque eu tenho aqui o artigo que ele escreveu sobre este Decreto-Lei e é penoso para quem o fez.
Por fim, uma pequena correcção, se me permite, que é esta: a videoconferência não é para as testemunhas que morem fora da comarca, é para as que morem fora do círculo, o que é diferente.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Jorge Lacão, deseja responder já?
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Deputado Montalvão Machado, creia que a consideração que teve o benefício de exprimir por mim é recíproca, pelo que tenho todo o gosto em manter este diálogo consigo.
O Sr. Deputado disse que eu não me referi de forma muito explícita às propostas do PSD. Admito que seja verdade, pela simples circunstância de que o Sr. Deputado não as explicitou suficientemente. E, como eu tive ocasião de chamar a atenção, elas foram apresentadas demasiadamente tarde, de tal ordem que eu estava a fazer a minha intervenção e ainda não tinha tido ocasião de as conhecer porque elas ainda não tinham chegado aqui à bancada.
Protestos do PSD.
Diz o Sr. Deputado Montalvão Machado que há aqui uma diferença de atitude. Ó Sr. Deputado, nós estamos a avaliar a nossa diferença de atitudes, como agentes parlamentares. E o que acontece, nessa matéria, é que o Sr. Deputado teve ocasião de testemunhar que não houve indisponibilidade alguma do Governo, quer relativamente a reflectir sobre a questão da autorização legislativa para o processo penal, quer sobre a questão da vossa própria iniciativa relativamente à apreciação parlamentar do decreto-lei relativo ao processo civil. E todos nós temos apelado ao PSD para que exprima concretamente o seu pensamento - vamos agora ver os termos em que ele aparece vertido - para podermos dialogar nessa base. Portanto, fá-lo-emos, com certeza.
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O que eu também quero dizer ao Sr. Deputado Montalvão Machado é que compreenda que, por um lado, há disponibilidade da nossa parte, já reflectida, aliás, nos exemplos recentes, mas, ao mesmo tempo, não espere que estejamos disponíveis para fazer uma espécie de contra-reforma da reforma. Ou seja, para deixar o essencial por resolver, sabendo nós que o essencial são, justamente, muitos daqueles aspectos que têm dado lugar a demasiados expedientes dilatórios e que, justamente, são esses expedientes dilatórios que têm arrastado a uma enorme crise da justiça.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - E, Sr. Deputado Montalvão Machado, nisto o interpelo: não façam os senhores mais discursos acerca da crise da justiça sem que previamente tenham igualmente dado o seu contributo para superar alguma da crise que existe.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, tem a palavra para pedir esclarecimentos.
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Deputado Jorge Lacão , confesso que de identidade e residência, como medida de coacção, no âmbito do processo penal, já tinha ouvido falar. Mas confesso que, no âmbito do processo civil, não compreendo, pelo menos daquilo que me ensinaram, pelo que gostaria que V. Ex.ª mo explicasse. E como, porventura, isso foi o que de mais relevante retirei da intervenção de V. Ex.ª, agradecia o seu contributo mais uma vez.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Jorge Lacão, tem a palavra para responder.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, é caso para dizer que é um privilégio que me dá, porque, repare, nós não temos ocasião para explicar tudo de todas as maneiras, a todo o tempo. Mas, agora, vou tentar.
Sr. Deputado, no processo penal, como obviamente sabe, o termo de identidade e residência é estabelecido perante uma autoridade judiciária. Daí que tenha a natureza, como referiu, de medida de coacção. Mas, como ambos sabemos, é uma especialíssima medida de coacção que visa, no essencial, certificar a localização do arguido para efeitos de ele estar na disponibilidade permanente do processo.
Introduzimos também, nesta reforma do processo penal - que os senhores ontem votaram! -, termo de identidade e residência para o assistente e para as partes civis. Sr. Deputado, não me vai dizer que é uma medida de coacção para eles, pois não? No entanto, do ponto de vista do valor processual, o prévio termo de identidade e residência vale como identificação do domicílio para o qual devem ser notificados. O que é que eu disse sobre o processo civil?
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não tem semelhança alguma!
O Orador: - Disse que, quando as partes na relação contratual estabelecem, no contrato, qual é o seu domicílio para efeitos do cumprimento e realização do conjunto dos direitos e deveres resultantes dessa relação jurídica, evidentemente que faz todo o sentido interpretar que, no quadro desses direitos e deveres, aquele domicílio também vale para efeitos de notificação das partes.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Claro!
O Orador: - Ou o Sr. Deputado não acha que não é preciso recorrer a uma figura de coacção para dar pleno valor à declaração espontânea das próprias partes acerca do seu domicílio?
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Por acaso, não acho!
O Orador: - Por mim, entendo que elas merecem respeitabilidade.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (José Magalhães): - Sr. Presidente, pedi a palavra para suscitar uma questão de relacionamento institucional entre o Governo e a Ordem dos Advogados, matéria na qual foi gerado um lapso que não gostaríamos que ficasse registado em acta.
E pedia-lhe, Sr. Presidente, para exarar em acta uma declaração curta. E a declaração, se me permite,…
O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Secretário de Estado, esse pedido não é muito ortodoxo.
Pode interpelar-me ou interpelar a Mesa com o conteúdo do que vai dizer.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Exactamente, Sr. Presidente, fá-lo-ia sob a forma de interpelação, como V. Ex.ª sugere.
O artigo a que aludiu o Sr. Deputado Montalvão Machado, da autoria de Joaquim Pires de Lima,…
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Não foi o Bastonário!
O Orador: - … Presidente da Ordem dos Advogados - como sabe, nem há presidência da Ordem dos Advogados! - não é da autoria do Sr. Bastonário. É, portanto, um grave equívoco, aliás incompreensível por parte do Sr. Deputado Montalvão Machado, que tal coisa tenha sido dita.
Gostaria, pois, que a acta da Assembleia o rectificasse, segundo uma verdade evidente e um pouco embaraçosa.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra, Sr. Deputado.
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O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, há-de registar-se na acta, e o Sr. Secretário de Estado lerá depois o respectivo registo, que quando fiz a citação, atribuí-a justamente ao Presidente da Ordem dos Advogados.
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem! É verdade!
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Mas não há presidente da Ordem dos Advogados! O senhor é advogado e devia sabê-lo!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Os Srs. Deputados consultarão o Estatuto da Ordem dos Advogados e verão se há ou não presidente!
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Mas é um erro do jornal!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados, as reformas legislativas devem fazer-se para o País que temos, e devo dizer que alguns artigos deste Decreto-Lei que estamos a apreciar me deram imensa vontade de rir. Eu nem sequer propus a sua eliminação para aquilo ficar lá para a posteridade. É que mesmo o sistema americano de os advogados se juntarem no escritório para ouvir as testemunhas cá está!
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Se é americano, para a Sr.ª Deputada Odete Santos é suspeito!
Risos do PS.
A Oradora: - Não, não é! Eu penso que é capaz de funcionar nos Estados Unidos da América! Um dia, até fiz aqui um elogio ao sistema americano. Na altura, o Sr. Deputado Narana Coissoró disse-me qualquer coisa como «Isso é filme!», ao que lhe respondi, dizendo «Tem razão! É propaganda capitalista!». Como tal, essa piada, para mim, não colhe. No entanto, peço aos Srs. Deputados, mesmo àqueles que não são advogados, que pensem se isto é capaz de ser exequível.
Vejam só o que se passa neste país. O nosso código também tem uma disposição que aqui continua e que diz que os advogados podem notificar as próprias testemunhas para irem à audiência. Ora, eu, um dia, com umas «asas de anjinho», para facilitar a vida ao tribunal, disse ao juiz que podia notificar a testemunha! Nem lhes conto o que é que se passou comigo! Não lhes conto os insultos que recebi da parte da testemunha, pelo que tive de passar uma certidão negativa! Temos um país para coisas deste género?! Não temos!
Há, de facto, coisas escandalosas nesta iniciativa legislativa. Não vejo este decreto-lei com os mesmos olhos com que vi as alterações ao Código de Processo Penal e não vejo porque não há similitude entre os dois processos. Quer, portanto, o Sr. Deputado Jorge Lacão convencer-me de que também pode aplicar aqui uma espécie de termo de identidade e residência.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Ao contrário!
A Oradora: - Ao contrário de quê?!
O Sr. Jorge Lacão (PS): - É o termo constante da cláusula contratual!
A Oradora: - Mas não é só para os contratos! Essa solução também está prevista para as outras acções quando tiver falhado a notificação pessoal registada, e isso até pode dar coisas muito engraçadas. Essa solução até pode conduzir a soluções de bigamia, porque se uma pessoa se ausenta e o autor ou autora propõem uma acção de divórcio fazendo-se uma citação simples, faz-se o julgamento, decreta-se o divórcio e a outra pessoa não foi, efectivamente, citada.
Assim sendo, o que aqui está - e peço desculpa aos Srs. Deputados do Partido Socialista e aos Srs. Secretários de Estado, pedindo-lhes que transmitam o que vou dizer ao Sr. Ministro da Justiça - é uma solução verdadeiramente própria de uma peça de teatro do Ionescu! Não percebo como é que se pode propor isto, que equivale, segundo o que aqui está, a que uma pessoa não possa estar fora da sua casa mais de 30 dias. Isto porque, entretanto, pode chegar uma citação!
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - É um termo de identidade e residência!
A Oradora: - Como tal, ninguém pode ir para o estrangeiro trabalhar (e reparem que já nem falo em passar férias)! A pessoa tem de estar em casa, porque pode ter alguns problemas, pode estar separado do seu cônjuge e, então, tem de estar ali sossegado e quietinho para facilitar a máquina judiciária! Não pode ser! Isto é absolutamente incrível! Não tenho sequer palavras para exprimir a indignação que senti quando li o que aqui estava!
Aliás, devo dizer que isto está muito bem preparado porque os ecos do que aqui se passa e os tais expedientes dilatórios de que agora tanto se fala levam a que as pessoas digam que os «malandros» dos advogados é que demoram os processos, que as testemunhas e os réus é que são «malandros»! Então e os tribunais?! Não têm culpa nenhuma?! Saliento que me refiro a uma culpa objectiva e não subjectiva. Não se deve nada ao facto de não terem dotado os tribunais com os meios técnicos e humanos necessários?! Parece que não! O que se faz aqui é alijar trabalhos dos tribunais para cima dos advogados e o que aqui se diz é que as demoras se devem a expedientes dilatórios, ao facto de as pessoas pretenderem fugir, etc.
O Sr. Deputado Jorge Lacão deve ter recebido, como eu recebi, já que vinha dirigido a V. Ex.ª e a todos os Deputados de todas as bancadas, um fax de um juiz da Relação que, em matéria de meios tecnológicos, é uma pessoa que toda a gente conhece e que sabe muito disso, que é o Dr. Bruto da Costa. Peço aos Srs. Deputados que reparem no que ele diz. Ele diz que até os mortos poderão ser validamente citados e, não contestando, como é natural e previsível que o não façam, serão condenados no pedido. Basta para isso que uma base de dados consultada pelo tribunal ou pelas partes esteja ligeiramente desactualizada, fenómeno que é bastante frequente, e, porventura, inevitável. Diz ainda que os emigrantes, ausentes e desconhecidos, não contestando, serão condenados no pedido, acrescentando que a celeridade das citações e das notificações depende apenas de um bom staff judicial que as possa executar em tempo útil. Aqui é que está o
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nó da questão. O caminho é reforçar esse pessoal e conferir-lhes mais meios tecnológicos, sem embargo de simplificar a citação/notificação, mas mantendo sempre a necessária segurança de que o cidadão em causa tenha sido, de facto, citado/notificado e não apenas virtualmente. Isto porque a vossa solução aponta para uma citação/notificação virtual. Não há dúvida de que estamos na época dos mundos virtuais!
Termino, Sr. Presidente e Srs. Deputados, dizendo que apresentámos algumas propostas de alteração para ver se, de facto, o Código de Processo Civil continua a garantir os direitos dos cidadãos, mas de todos os cidadãos e não apenas os direitos dos autores que põem uma acção, já que também é preciso acautelar os direitos dos réus que contestam. Esperamos, portanto, que haja o bom senso de fazer as alterações que se impõem. Aliás, devo dizer que estou bastante admirada, porque o Sr. Ministro da Justiça, quando tomou posse, disse que tinha terminado a época das reformas legislativas na justiça.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Isso já lá vai! Agora é o campeão das leis!
A Oradora: - Mas disse-o, disse que já tinha havido reformas demais e isso está em Diário da Assembleia da República! E, afinal de contas, vemo-nos confrontados com autênticas subversões do sistema com consequências desastrosas, neste caso.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Fernando Seara (PSD): - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Desde a publicação do Código de Processo Civil de 1961 até ao ano de 1995, este código apenas sofreu raras modificações, sempre precedidas de muito estudo e de cuidada ponderação de todos os interesses em jogo. Como exemplo, refira-se que desde 28 de Setembro de 1985, data da publicação do Decreto-Lei n.º 381-A/85, até 12 de Dezembro de 1995, data da publicação do Decreto-Lei n.º 329-A/95, ou seja, durante mais de 10 anos a redacção deste Código de Processo Civil manteve-se inalterada. Compreende-se. O processo civil, para além de muito mais, disciplina toda a vida de um processo, define o relacionamento de diversos intervenientes processuais, tudo de forma que se espera tendencialmente estável, atentos os interesses em jogo.
Todavia, só desde Dezembro de 1995 este Código de Processo Civil já foi objecto de cinco reformas sucessivas e apressadas, que lhe foram impostas, respectivamente, pelos Decretos-Leis n.os 329-A/95, de 12 de Dezembro, 180/96, de 25 de Setembro, 125/98, de 12 de Maio, 375-A/99, de 20 de Setembro e agora 183/2000, de 10 de Agosto. Isto, Srs. Secretários de Estado e Srs. Deputados, é inaceitável.
Mas mais inaceitável é que, desta feita, no que toca a este Decreto-Lei n.º 183/2000 em apreciação, com uma ou outra honrosa excepção, de que é exemplo, como já foi referido, a inquirição por tele-conferência, o Sr. Ministro pretenda impor outra reforma processual, só que agora, apesar de mais uma vez apressada, à mais completa revelia de todos aqueles a quem se destina. Isto, Srs. Deputados, é completamente inaceitável. Nunca como agora uma reforma processual mereceu tanta rejeição. Magistrados, judiciais ou do Ministério Público, advogados, professores e docentes universitários não se cansaram de denunciar os graves defeitos do diploma, principalmente em sede própria, perante o Sr. Ministro da Justiça, mas sempre sem sucesso. Recordo aos Srs. Secretários de Estado a título de exemplo, e peço-lhes que transmitam ao Sr. Ministro, duas longas sessões de trabalho, nas quais, para além do Sr. Ministro, estiveram presentes o Sr. Bastonário da Ordem dos Advogados, vários membros do Conselho Geral da Ordem dos Advogados, os Srs. Drs. José de Sousa de Macedo, como Presidente da Comissão de Legislação da Ordem dos Advogados, Armindo Ribeiro Mendes, José Correia, José Lebre de Freitas e Luís Silveira Rodrigues. Foram muitas as deficiências do diploma que então foram reveladas e que desde então o têm sido! Refiro-me ao texto legal, que padece de deficiências de redacção que são completamente inaceitáveis, refiro-me ao novo regime de pagamento de preparos, que consagra uma incompreensível desigualdade entre as partes, mais favorável aos réus do que aos autores, refiro-me à exigência de suporte digital, que, pese embora algumas vantagens, será, em todo o caso, insuportável a muitos advogados, ou porque não têm ainda escritórios informatizados e ninguém os pode obrigar a ter, ou porque não têm sistemas uniformizados, porque, como se sabe, uns podem usar o Word e outros o Scriba, que é um sistema de processamento de texto com mais de 15 anos. Por outro lado, como é sabido e como o Dr. Montalvão Machado já referiu, há até casos em que as partes não têm de se fazer representar por advogado. E nestes casos, como é que se vai fazer face à exigência do suporte informático?!
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Pagam a uma empresa para fazer esse trabalho!
O Orador: - Pois! Como a justiça já é barata!…
Refiro-me também a algumas alterações em sede de prova testemunhal que são claramente susceptíveis de violar o direito constitucional de acesso à justiça. Refiro-me ao novo regime de citações e notificações que pode comprometer o direito constitucional de defesa e que não tem paralelo em qualquer outro país civilizado da Europa! Aliás, para uma bancada que tanto apregoa os exemplos da Europa, parece que estes, aqui, de nada lhe serviram! Não me refiro a muito mais porque o tempo não me permite, mas, graças a Deus, tudo está escrito em muitos diplomas, muitos deles publicados, para que possam verificar com toda a clareza todas estas deficiências.
Em todo o caso, como já se disse, este diploma, ressalvado um ou outro aspecto, não agrada a nenhum dos agentes a que se destina ou que o deverão aplicar, porventura com uma excepção, e essa devemos reconhecê-la. Essa excepção é a dos funcionários judiciais. É que agora, ao que parece, o Sr. Ministro pretende substituir os funcionários judiciais por advogados, certamente porque até são mais baratos para o Estado. Verdade seja dita que, de tão mal tratados que os advogados têm sido, já só lhes faltava isto! Aos advogados, que a nova lei coloca numa inaceitável posição de menoridade face a magistrados e face a funcionários judiciais, incumbirá agora parte das tarefas administrativas que, por imperativo de função, competiram sempre aos funcionários judiciais, com encargos financeiros e de pessoal que poderão mesmo comprometer o funcionamento dos escritórios.
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O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - É o chamado advogado-escrivão!
O Orador: - Em causa estão, como é evidente, as novas regras relativas a notificações entre os mandatários judiciais das partes. Como já foi dito ao Sr. Ministro da Justiça, por exemplo pelo Sr. Bastonário da Ordem dos Advogados, agora, para dirigir um simples requerimento ao tribunal, passará a ser necessário o seguinte: enviar o texto para o tribunal por correio, com disquete ou por e-mail; depois, enviar cópia aos mandatários da outra parte ou de todas as outras partes, com obrigação de registo postal ou outro documento comprovativo bastante; é ainda necessário copiar os talões de registo do correio e arquivá-los para prova do envio a todas as partes.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - É a Torre do Tombo!
O Orador: - Depois, é ainda necessário, para um simples requerimento, repito, enviar de novo para o tribunal os ditos talões de registo, obtendo e arquivando o recibo deste novo envio!
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - É o advogado-distribuidor!
O Orador: - Quatro diligências que impendem agora exclusivamente sobre os advogados para fazer um simples requerimento. Estas tarefas, como é óbvio, incumbiam antes aos funcionários judiciais, como é de sua incumbência!
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - É o fim da burocracia!
O Orador: - Imagine-se agora um escritório que tenha por cliente um ou mais bancos, uma ou mais seguradoras ou até um razoável movimento judicial. Como é evidente, esta inovação é, só por si, incompreensível.
O mais incompreensível, quanto a mim, todavia, é que o Sr. Ministro tem conhecimento de causa, porque, por acaso, até foi advogado! Ora, colocar os advogados nestas circunstâncias, perante esta situação de menoridade, a fazer o papel dos funcionários judiciais, devo dizer-lhe, Sr. Ministro - ainda bem que chegou entretanto -, desculpe-me, mas é inaceitável!
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado, Sr. Ministro, quando os magistrados e os advogados, interessados e destinatários do diploma, o consideram, pelo menos em boa parte, ressalvadas as excepções que já referi, completamente inaceitável, e quando todos, juntamente com docentes universitários, denunciam os defeitos gravíssimos que o enfermam, pergunto: por que razão é que se persiste na decisão da sua entrada em vigor? Não compreendemos! Será por teimosia? Será falta de senso? Cremos que não. Pelo menos não tenho o Sr. Ministro nessa conta. Mas, então, porquê?
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Porque tem de apresentar contas ao Ministério da Justiça.
O Orador: - Sr. Ministro da Justiça, V. Ex.ª tem, é certo, a obrigação de resolver os problemas relacionados com os atrasos dos tribunais - foi para isso que foi nomeado, e é essa a sua incumbência. Mas o que não tem, seguramente, Sr. Ministro, é o direito de o fazer à custa dos interesses e dos direitos das partes - alguns consagrados constitucionalmente - ou de um sacrifício intolerável dos interesses e dos direitos dos profissionais do foro, sejam magistrados sejam advogados, por muito, repito, que isso agrade aos funcionários judiciais.
O Estado paga. Prometo-lhe que sai mais barato do que os advogados, Sr. Ministro.
Pelo exposto, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados, creio que resulta a evidência de que a não ratificação deste diploma, e principalmente a aceitação das úteis sugestões do Sr. Deputado Montalvão Machado, que já tive ocasião de ler - estou a falar de alguém que sabe de processo civil, com certeza que o reconhecerão -, são uma questão de bom senso e de legalidade.
Protestos do PS.
Obviamente, dirijo-me a quem percebe alguma coisa de processo civil, porque quem não percebe, por favor, informe-se!
Pelo que, tenho a certeza, também ao Sr. Ministro, agora devidamente advertido pelos representantes institucionais de todos os intervenientes processuais, interessa.
Saibamos, ao menos, neste Parlamento, decidir em conformidade.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça (Eduardo Cabrita): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, quero saudar o Grupo Parlamentar do PSD, que, ao trazer a apreciação parlamentar este Decreto-Lei n.º 183/2000, de 10 de Agosto, permite, no quadro do exercício dos direitos constitucionais que aos Srs. Deputados cabe exercer, dar continuidade a um debate que não tem, por imperativo constitucional, de decorrer aqui, ao contrário do debate de ontem relativamente ao Código de Processo Penal, em relação ao qual foi apresentado um pedido de autorização legislativa - o que, como o Sr. Deputado bem sabe, não se verifica relativamente ao processo civil.
De qualquer modo, quero dizer que, no quadro da ampla disponibilidade não só para o debate mas para a ponderação atenta das propostas e das sugestões dos diversos grupos parlamentares, dos profissionais que integram a comunidade jurídica e da sociedade legitimamente preocupada com a situação da justiça, estamos dispostos a atender e a ponderar as soluções apresentadas.
Aliás, outra coisa não seria de esperar, e o Sr. Deputado fará a justiça de reconhecer que, relativamente a esta matéria, a abertura do Governo para ponderar as soluções que legitimamente sejam apresentadas não poderá ser menor do que aquela que se verificou no processo que ontem, ao final da tarde, se encerrou quanto ao Código de Processo Penal.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Portanto, tratando-se de um pedido de autorização legislativa ou de um pedido de apreciação
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parlamentar, a postura de partida não pode deixar de ser essa.
Todavia, o facto de o nosso princípio ser o de ouvir e apelar à participação visa cumprir aquele que é o desígnio do Governo e do Ministério da Justiça quanto às reformas necessárias nos vários domínios da administração da justiça, especificamente naquilo que são os factores que determinam a morosidade, bem como os factores que determinam que o primeiro dos direitos dos cidadãos - isto é, o direito a uma decisão judicial em tempo útil - não possa continuar a ser postergado, diariamente, nos nossos tribunais, e a ser motivo de reiterada condenação de Portugal pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem em cerca de duas centenas de casos.
É por isso que quando dizemos que a justiça deve estar ao serviço dos cidadãos e do desenvolvimento, o debate que fazemos em torno do Código de Processo Civil não coloca como tónica o tipo de preocupações do velho debate em torno das questões da justiça aflorado nalgumas intervenções aqui feitas, em que se imputam responsabilidades ora aos magistrados judiciais, ora aos magistrados do Ministério Público, ora aos advogados, ora aos funcionários judiciais.
Há, pois, uma responsabilidade global, que o Governo assume, de colocar o sistema de justiça ao serviço dos cidadãos, fazendo com que o sistema de justiça não constitua um entrave institucional à competitividade da economia portuguesa, e que a morosidade da justiça não seja um entrave ao desenvolvimento.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Esta é a postura de base que justifica que o direito ao julgamento em tempo útil não é o direito a que não exista julgamento; que o direito à audição em tempo útil não é o direito a evitar ser ouvido, e que o direito a que se faça justiça não é o direito a, usando uma lei que exactamente por isso carece ser mudada, evitar que a justiça seja feita em tempo adequado. Aí, se tivermos consciência das diferenças existentes entre o processo civil e o processo penal, diria que, sim, assumimos neste ponto uma coerência que é comum. É o que ontem foi encerrado relativamente ao processo penal e àquilo que, com a participação dos Srs. Deputados, contamos encerrar nesta fase quanto ao processo civil.
Não nos venham, pois, dizer que neste processo não há abertura para o debate e que não há participação. O que eu diria é que há um modelo de debate em que o cidadão está no centro das preocupações do Governo e da política de justiça.
Aliás, não recuando mais, o debate do Programa do Governo, que foi este ano lançado, foi o ponto fulcral de várias intervenções feitas em Janeiro, aquando da abertura do ano judicial, nas quais fomos confrontados, Governo e comunidade jurídica, por sua Ex.ª o Sr. Presidente da República com a imperatividade de encontrar as reformas e os modelos que permitam evitar constrangimentos, que, a permanecerem, ponham em causa não esta ou aquela reforma processual, não o funcionamento deste ou daquele instituto mas, sim, a credibilidade global do sistema de justiça.
É por isso que da apreciação rápida que tive oportunidade de fazer há momentos, sem embargo de um estudo mais cuidado, e mantendo a abertura para a inovação, não deixa de me surpreender que a generalidade das propostas feitas sejam fundamentalmente marcadas pelo conservadorismo de não querer mudar, pelo receio ou aversão à mudança, e por uma insensibilidade de enfrentar aqueles que são os desafios aos quais não nos podemos furtar.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Não diga isso!
O Orador: - Este processo foi iniciado aquando do debate do Programa do Governo, continuou com a abertura do ano judicial e teve um momento fulcral aqui, no Parlamento, quando, em sede de reforma do sistema político, que ocorreu em Fevereiro, foram discutidas as causas da morosidade da justiça. Nessa altura, o Sr. Ministro da Justiça teve a oportunidade de interpelar directamente todas as bancadas relativamente à disponibilidade das mesmas para, com o Governo, percorrerem este caminho da mudança.
Foi na sequência deste debate e da avaliação feita pelo Observatório Permanente de Justiça - entidade independente, prestigiada e sem qualquer suspeita de subserviência às opções do Governo -, que, em Março, o Ministério da Justiça dirigiu a toda a comunidade jurídica um desafio de reforma em torno de 11 medidas para a mudança do processo.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Esse foi um debate intenso, participado, em que, dos conselhos superiores às associações sindicais de magistrados judiciais e do Ministério Público, à Ordem dos Advogados e à comunidade jurídica, a participação foi profunda, de onde resultou, aliás, que, das 11 medidas, uma não chegasse, sequer, à fase de articulado, por neste momento não ser possível vir a ser adoptada. Foi a partir deste debate que se passou a uma segunda fase, à do articulado, que mereceu uma segunda discussão, que também foi intensa - como, aliás, o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo já teve oportunidade de referir ao enunciar que as reuniões com a Ordem dos Advogados levaram horas, pois foram reuniões de trabalho e não de audição formal -, tendo-se verificado, no final da mesma, significativas alterações não só em relação às orientações iniciais mas também à proposta do articulado inicialmente posta à discussão pelo Governo.
De facto, do Dr. Sousa Macedo ao Dr. Garcia Pereira, que não referiu, a Ordem dos Advogados fez-se representar com a maior dignidade e, diria, com o maior empenho e pluralismo na manifestação da sua vontade, tal como todas as outras entidades. Provavelmente, não poderemos ter o acordo pleno, mas temos um acordo significativo. E nenhuma das entidades, certamente, nos poderá acusar de falta de disponibilidade não só para as ouvir mas, fundamentalmente, para trabalhar.
Espanta-me que não haja sensibilidade para o facto de 40% das notificações serem devolvidas. Espanta-me que num País onde o serviço de correios é considerado de excelência - aliás, nas sondagens à opinião pública, é o serviço público que, entre os demais, tem o nível mais elevado de apreço, por ter uma taxa de frustração de entrega de correspondência inferior a 1% - ninguém se escandalize com o facto de, reiteradamente, 40% das notificações feitas por carta registada serem sistematicamente frustradas, sistematicamente devolvidas. E o que aqui foi proposto foram apelos à manutenção e à não mudança.
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Aliás, das famosas 10 medidas incorporadas no decreto-lei em apreciação parlamentar, o PSD veio, fundamentalmente, pôr em causa duas e suscitar reservas quanto à nossa capacidade para aplicar uma terceira. O PSD pôs em causa a notificação e a citação por via postal simples, o recurso ao suporte digital na apresentação de peças processuais e a viabilidade da videoconferência.
Quanto à videoconferência, estejam descansados, porque, em Janeiro, já estará a funcionar em todos os tribunais do País.
Relativamente à obrigatoriedade do recurso ao suporte digital, manifestamente, estamos a tresler a lei e a não a acreditar na capacidade de desafio de mudança de toda a comunidade jurídica. Estamos a tresler a lei, porque não há uma imposição, há uma faculdade a partir de Janeiro e há uma obrigatoriedade apenas em 2003; isto é, há um período de transição de dois anos, que foi aqui, sucessivamente, ignorado nas várias intervenções.
Mas quero dizer-lhes, Srs. Deputados, sobretudo aos que são advogados, que acredito na capacidade de modernização e na capacidade de a nossa comunidade jurídica - dos magistrados, aos oficiais de justiça, aos advogados - dizer «sim» ao desafio tecnológico.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Qualquer dia há justiça pela Internet.
O Orador: - Aquilo que se passou relativamente às injunções, em que, em menos de um ano, passámos de menos de 20% de entregas com suporte digital para mais de 80%, demonstra essa capacidade de adaptação, tal como o facto de, neste momento, se verificar já um número significativo de entregas de pedidos em processo de injunção através de correio electrónico. Não tenho a mínima dúvida de que, com a instalação e o pleno funcionamento em todos os tribunais do sistema de gestão do processo civil até final de 2001, a maior rede informática existente no País, o desafio da mudança terá resposta.
Quanto à notificação, não venham aqui com os casos, sempre estranhos, do acidente rodoviário,…
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Eu não falei nisso! Hoje, ninguém falou no acidente!
O Orador: - … da esposa do advogado que entrou em trabalho de parto. Todos nós sabemos, pelos exames nas faculdades que já fizemos e pelas consultas médicas que tivemos, qual é o carácter marginal destas situações a que nos estamos a referir.
Por outro lado, delimitemos o que está em causa. O que está em causa são os processos emergentes de contrato…
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não só!
O Orador: - … de obrigação pecuniária, onde a indicação da residência é condição essencial do contrato, recaindo, aliás, sobre as entidades um dever de, até Janeiro, o que já está a ser feito pela Associação Portuguesa de Seguradores, informar os contraentes relativamente ao dever de manter aqui actualizada a sua residência e quanto às consequências dessa residência.
Quanto ao exemplo internacional, vamos deixar a Sr.ª Deputada Odete Santos fora do fantasma americano e falemos de situações mais próximas!
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - O fantasma é para VV. Ex.as!
O Orador: - Foi o governo do Sr. José Maria Aznar que teve oportunidade de aprovar o novo código de processo civil espanhol, que recentemente entrou em vigor e que permite exactamente a notificação pela via mais expedita, designadamente a notificação por via telefónica.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - E V. Ex.ª fundamenta-se no Aznar! Óptimo!
O Orador: - Vamos olhar para os bons exemplos, independentemente da origem!
É este desafio para a mudança, é esta capacidade de juntar mais meios, inovação tecnológica e reforma do sistema processual que, conjugados, permitirão que se sinta que a justiça está ao serviço do cidadão, que não é um sistema do século XIX, inadaptado à sociedade do século XXI.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados António Montalvão Machado, Odete Santos, Nuno Teixeira de Melo e Jorge Lacão.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Montalvão Machado.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça, ouvi-o com muita atenção, mas lamento dizer-lhe que não posso afirmar o inverso, pois V. Ex.ª não me ouviu com a mesma atenção, sem que esta minha afirmação represente qualquer desconsideração.
Ninguém disse aqui que VV. Ex.as estariam surdos e indisponíveis para o debate; pelo contrário, ficámos muito contentes em saber que VV. Ex.as estão abertos ao debate. E ainda mais contentes ficamos por, em boa hora, nos termos lembrado de pedir a apreciação parlamentar do Decreto-Lei n.º 183/2000, porque, se não a tivéssemos pedido, o debate não se faria, tendo em conta que VV. Ex.as fizeram este decreto-lei contra a vontade dos juízes, dos advogados, de todos os operadores judiciários. Não há um único artigo da especialidade, um único advogado ou um único juiz que seja a favor dele!
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Ou um único professor!
O Orador: - Mais: V. Ex.ª disse que não falamos nas virtudes, apenas falamos dos males.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - É a nossa obrigação!
O Orador: - A nossa obrigação é exactamente essa!
Este diploma tem coisas boas e más, o pior e o azar para nós e para os portugueses é que as coisas más são bastante mais, em maior número, do que as coisas boas. E uma das coisas boas de que falei - por isso digo que V. Ex.ª não me ouviu atentamente - foi justamente no suporte digital de articulados e alegações, o que defendo inteiramente! Mas perguntei se se justificaria isso em dois casos: primeiro, quando a parte, por não ser obrigatório o patrocínio judiciário, litiga por si, sem advogado; e, segundo, quando o advogado é nomeado oficiosamente.
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Neste último caso é ele que tem de adiantar o dinheiro para pagar as disquettes, etc.?
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Também recebe!
O Orador: - Apenas levantei dois problemas, mas sou a favor do suporte digital.
Disse, e repito, que o Governo não tem a mais pequena noção de como funcionam os tribunais e os escritórios de advogados, porque - e é isto que acho estranho - V. Ex.ª não teve uma única palavra acerca do artigo 229.º-A, o tal artigo que obriga a uma, duas, três, quatro diligências que o advogado tem de fazer.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Isso é transferir para outros a burocracia!
O Orador: - Sr. Secretário de Estado, tenho, no meu escritório, um solicitador que, no dia em que eu lhe disse o que ele tinha de passar a fazer, disse-me: «Demito-me, porque, não vou, por cada requerimento que faça, ter de enviar à parte contrária um papel a dizer que fiz e, depois, enviar outro ao tribunal a dizer que fiz o que fiz…». Isto é ridículo!
Sr. Secretário de Estado, sabe por que é que digo que não tem a noção de como funcionam os tribunais e os escritórios de advogados? Porque isto é exactamente igual ao Decreto-Lei n.º 184-A, em que VV. Ex.as dizem que não se pode marcar julgamentos com antecedência superior a dois ou três meses. Sabe o que é que os juízes estão a fazer? Tenho aqui vários despachos de juízes de vários tribunais a dizerem, dado o Governo não ter a noção de como isto funciona: «Apresente-se-me concluso o processo em Setembro de 2001, para, então, eu marcar o julgamento».
O Sr. Ministro da Justiça (António Costa): - É isso mesmo! Exactamente!
O Orador: - Portanto, o processo irá ficar parado desde agora até 2001!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - A morosidade é a mesma!
O Sr. Ministro da Justiça: - Não é, não!
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - A morosidade é a mesma!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça, há ainda outros pedidos de esclarecimento. Deseja responder já ou no fim?
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça: - No fim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Sendo assim, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.
A Sr.ª Odete Santos (PCP). - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça, não sabia que o Ministério da Justiça tinha como referência o José Maria Aznar, mas fiquei a saber!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É a 4.ª via do socialismo à portuguesa!
A Oradora: - E, se calhar, por causa disso mesmo, o resultado é este! Isto sem qualquer falta de consideração, como é óbvio, pois trata-se de uma graça.
V. Ex.ª, Sr. Secretário de Estado, referiu-se a coisas que não foram ditas neste debate, foram ditas no debate relativo ao processo penal, como, por exemplo, a história do acidente rodoviário, etc. Isto não foi dito aqui, de maneira que…
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - São os fantasmas do Ministério!
Protestos do PS.
A Oradora: - Sim! E não foi desmentido que pudesse acontecer!
Sr. Secretário de Estado, como já ouvi citar duas vezes - uma no debate sobre o processo penal e outra aqui neste debate - os 40% de notificações que vêm devolvidas, peço que me explique se são 40% em processo penal e 40% em processo civil ou se os repartem.
Risos do Deputado do CDS-PP Narana Coissoró.
É preciso explicar bem isso, porque, senão, lá fora começam a pensar que no processo civil também é uma balda! Vamos reduzir, de facto, as questões à sua latitude.
Pergunto-lhe, Sr. Secretário de Estado, se é ou não possível, com o sistema que aqui têm e, muitas vezes, com a falta de fidelidade dos dados destes serviços que VV. Ex.as aqui indicam, que seja feita a citação de um morto ou a de um ausente a trabalhar no estrangeiro, que tenha ido para lá por mais de 30 dias, o qual, quando chega a Portugal, passados seis meses, para passar férias, se vê condenado, sem apelo nem agravo. Estas questões concretas é que têm de ser resolvidas, porque precisamos de saber qual é a modernidade que V. Ex.ª apregoou. A modernidade é uma pessoa ir trabalhar para o estrangeiro e, depois, quando chega ao seu país, ver-se condenado, sem ter possibilidade de se defender?! A modernidade é isto!? Então, se é, quero ser conservadora, devo dizer-lhe!
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Muito bem, Odete! Nisso estamos de acordo!
A Oradora: - Mas não é o mesmo conservadorismo, Sr. Deputado, é outro!
Risos.
O meu conservadorismo é o dos dinossauros! Não se esqueça!
Risos.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça, a principal virtualidade da intervenção de V. Ex.ª terá sido, do meu ponto de vista, a disponibilidade que mani
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festou para que, com o contributo de todas as bancadas e de todas as partes, se proceder ao aperfeiçoamento do diploma.
Pergunto-lhe, por isso, se o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado estariam na disposição, atenta esta disponibilidade e a mais elementar cautela, de aceitar a suspensão da entrada em vigor do diploma…
O Sr. Ministro da Justiça: - Não, não!
O Orador: - … e de proceder à sua discussão na 1.ª Comissão, sob pena de, atentas as alterações que podem ser de monta e importantes, se obrigar, com a sua entrada em vigor precipitada, os intervenientes processuais a terem de o aplicar agora e, depois, a terem de o reaprender e de o aplicar de forma diferente.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça, estou um bocadinho perplexo por ouvir aqui invocar argumentos contra esta possibilidade de reforma por, talvez, não haver recursos materiais para apresentar disquettes, é como se estivéssemos, algures num tempo pretérito, a discutir que não poderíamos mudar da esferográfica para a máquina de escrever por não haver alguma disponibilidade material para comprar a velha Olympia.
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Nunca foi advogado estagiário, de certeza!
O Orador: - Ó Srs. Deputados, francamente, têm de se actualizar um pouco e compreender que, de facto, o tempo muda, e, obviamente, os comportamentos funcionais também têm de se adaptar à mudança do tempo.
Depois, a Sr.ª Deputada Odete Santos suscitou aqui uma grande angústia e até deu aqui um exemplo de moralidade e bons costumes…
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Isso nada tem a ver com moralidade!
O Orador: - … acerca do grande risco que poderia ser a bigamia em caso de citação e, depois, dar-se uma situação de revelia absoluta e haver todo esse descalabro que referiu.
Ó Sr.ª Deputada, recorde o seguinte: é necessário fazer uma notificação por via postal registada, com aviso de recepção, à primeira tentativa, excepto nos casos que há pouco aqui discutimos, de já haver relação jurídica contratualizada com prévia identificação do domicílio.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Se esta solução, apesar de tudo, falhar, vão ver-se todos os registos de domicílio e fazem-se tantas expedições de cartas quanto todos os registos oficiais o consentirem.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - E se os dados estiverem errados?!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.
O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Depois, Sr.ª Deputada, se tal, eventualmente, não resultar, o juiz pode, em situação de revelia absoluta, mandar repetir o acto e, depois, o processo civil ainda determina que o Ministério Público tenha competência para representar os ausentes. Não se esqueça disso!
Se o Sr. Secretário de Estado quiser comentar, agradecia.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Deputado, e se os dados estiverem errados?!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder a todos os pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça: - Sr. Presidente, começarei não pela ordem por que foram feitos mas pelo seu carácter de questão de sistema.
Assim, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, a disponibilidade é a mesma; isto é, esta equipa do Ministério da Justiça - já nos conhecem - estará aqui a trabalhar hoje, quando quiserem, com a mesma disponibilidade com que estivemos relativamente ao Código de Processo Penal.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Ou seja, não concordamos com a suspensão da entrada em vigor do diploma, mas, tal como aconteceu em relação ao Código de Processo Penal, onde foi possível, numa semana, com uma colaboração valiosíssima dos Deputados das várias bancadas, concluir um diploma que foi aprovado ontem em votação final global, também no que toca ao processo civil não faremos menos, certamente, e estamos à espera de ordens da 1.ª Comissão para…
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Ordens, não!
O Orador: - Ordens sim, Sr. Deputado, porque o Governo sabe que depende do Parlamento!
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - A bancada do PS está a ser mais papista do que o Papa!
O Orador: - E isso é uma base fundamental do nosso…
O Sr. Ministro da Justiça: - E podem notificar-nos por via postal simples!
O Orador: - E podem notificar-nos não por via postal simples mas até pelo telefone e cá estaremos!
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Mandamos um e-mail!
O Orador: - Exactamente, pode ser por e-mail! E cá estaremos a responder de imediato, Sr.ª Deputada!
Esta é uma questão genérica e não poderá ser outra a nossa postura também nesta matéria.
Passando às outras questões concretas que aqui foram suscitadas pelos Srs. Deputados.
Sr. Deputado António Montalvão Machado, concordando com a mudança para o mundo digital, parece de
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alguma forma ter dúvidas, por um lado, sobre a capacidade económica e, por outro, sobre a capacidade de adequação à mudança dos senhores advogados. Não se trata de uma imposição mas de uma faculdade, uma faculdade durante dois anos, a partir de 2001, porque a obrigatoriedade apenas se colocará em 2003.
Relativamente às dificuldades, eu diria que os senhores advogados vão poupar, porque aquilo que hoje gastam em papel, vão deixar de gastar já que a disquette é entregue e é devolvida de imediato com a indicação de que foi recebida, sendo, portanto, reutilizável; isto já para não falar da economia, a títulos vários, que a digitalização significa neste domínio. Mas também aqui vai acontecer exactamente aquilo que já hoje se passa em relação às injunções: terão a disquette devolvida e certificada no próprio acto ou terão a resposta por e-mail, certificando que a peça processual entrou por essa via. Estaremos a fazer algo que irá ajudar a viabilização dos escritórios de advogados com dificuldades.
Quanto aos custos de que fala, acredito na eficiência dos escritórios de advogados, tratando daquilo que é a representação das partes com uma eficácia que hoje o sistema manifestamente não tem e que é suportada pelos cidadãos mas, fundamentalmente, pelos contribuintes que pagam os custos do funcionamento do sistema de justiça com a ineficiência que queremos ultrapassar. Isto é, queremos um sistema mais eficaz de notificações entre advogados, o que também permitirá ter ganhos de eficiência e economias para todos, até para as partes, o que é, de alguma forma, um benefício para os advogados, apesar de não ser esta a óptica que nos leva a estas mudanças.
Sr.ª Deputada Odete Santos, infelizmente, a situação no processo civil é muitas vezes bem pior do que no processo penal. Essa média estatística…
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - É! É o tempo que demoram as sentenças, por exemplo?! Disso não falam!
O Orador: - E é tanto mais estranho quando isso acontece nos processos que têm base em contrato previamente existente. Quanto aos efeitos jurídicos da notificação por via postal simples, não me cabe explicar à Sr.ª Deputada e ilustre advogada a inexistência de um efeito cominatório pleno. Esse efeito cominatório pleno não existe,…
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Pios não! Mas, depois, anulam-se processos!
O Orador: - … o efeito que teme, como bem sabe, não é possível verificar-se. Mas, ainda aí, eu cometeria a heresia de preferir menos de 1% de partes mal citadas do que 40% de cidadãos sem justiça em tempo útil.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não disse se os 40% se referem só ao penal ou também ao cível!
O Orador: - É a média!
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Ah!… É a média!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, visto não haver mais inscrições, dou por encerrada a apreciação do Decreto-Lei n.º 183/2000, de 10 de Agosto [apreciação parlamentar n.º 25/VIII (PSD)].
Informo a Câmara que deram entrada na Mesa propostas de alteração ao Decreto-Lei n.º 183/2000, de 10 de Agosto [apreciação parlamentar n.º 25/VIII (PSD)], apresentadas pelo PSD e pelo PCP, que baixarão à 1.ª Comissão para debate e votação.
Srs. Deputados, a nossa próxima reunião plenária terá lugar quarta-feira, dia 25, às 15 horas, e terá como ordem do dia a discussão do projecto de lei n.º 243/VIII, agendamento potestativo do PSD.
Está encerrada a sessão.
Eram 12 horas e 50 minutos.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Alberto Bernardes Costa
António Alves Martinho
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Carlos Manuel Luís
Emanuel Silva Martins
João Rui Gaspar de Almeida
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Francisco dos Santos Valente
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Vítor Manuel Caio Roque
Partido Social Democrata (PSD):
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares
Eugénio Fernando Sá Cerqueira Marinho
Henrique José Monteiro Chaves
João Bosco Soares Mota Amaral
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
José Frederico de Lemos Salter Cid
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Sérgio André da Costa Vieira
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Partido Popular (CDS-PP):
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da França
Luís Pedro Mota Soares
Maria Celeste Ferreira Lopes Cardona
Paulo Sacadura Cabral Portas
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan
Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Isabel Maria de Almeida e Castro
Bloco de Esquerda (BE):
Maria Helena Augusto das Neves Gorjão
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