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Sábado, 4 de Novembro de 2000 I Série - Número 19

DIÁRIO da Assembleia da República

VIII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2000-2001)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 3 DE NOVEMBRO DE 2000

Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex. mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António João Rodeia Machado
António Carlos de Pinho

S U M Á R I O

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 15 minutos.
Procedeu-se ao debate conjunto, na generalidade, da proposta de lei n.º 49/VIII - Altera os artigos 9.º, 10.º, 12.º, 14.º, 17.º, 18.º e 24.º e adita os artigos 10.º-A e 14.º-A à Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto (Lei das Finanças Locais) e do projecto de lei n.º 321/VIII - Altera a Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto - Lei das Finanças Locais (PCP), que foram aprovados. Intervieram, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado da Administração Local (José Augusto Carvalho), os Srs. Deputados Honório Novo (PCP), Álvaro Amaro (PSD), Casimiro Ramos (PS), Manuel Oliveira (PSD), Agostinho Gonçalves (PS) e Álvaro Castello Branco (CDS-PP).
De seguida, foi apreciada e aprovada a Conta Geral do Estado do ano de 1997, tendo-se pronunciado, além do Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento (Fernando Pacheco), os Srs. Deputados Teresa Venda (PS), Maria Ofélia Moleiro (PSD), Pedro Mota Soares (CDS-PP) e Lino de Carvalho (PCP).
Por último, a Câmara procedeu à apreciação, e foi aprovada, da proposta de resolução n.º 18/VIII - Aprova, para ratificação, as emendas à Convenção relativa à Organização Europeia de Telecomunicações por Satélite (EUTELSAT), adoptadas e confirmadas pela 26.ª Assembleia daquela Organização, realizada em Cardife, de 18 a 20 de Maio de 1999. Usaram da palavra, além do Sr. Secretário de Estado Adjunto e das Obras Públicas (Luís Parreirão), os Srs. Deputados Zelinda Marouço Semedo (PS), Joaquim Matias (PCP) e Sílvio Rui Cervan (CDS-PP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 12 horas e 45 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 15 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Aires Manuel Jacinto de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
António Alves Marques Júnior
António Alves Martinho
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António Fernando Marques Ribeiro Reis
António Fernando Menezes Rodrigues
António José Gavino Paixão
António Manuel Dias Baptista
António Manuel do Carmo Saleiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Bruno Renato Sutil Moreira de Almeida
Carla Maria Nunes Tavares Gaspar
Carlos Alberto
Carlos Alberto Dias dos Santos
Carlos José Gonçalves Vieira de Matos
Carlos Manuel Luís
Casimiro Francisco Ramos
Cláudio Ramos Monteiro
Eduardo Ribeiro Pereira
Emanuel Silva Martins
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Serrasqueiro
Filipe Mesquita Vital
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Francisco José Pinto Camilo
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho
Helena Maria Mesquita Ribeiro
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco D'Almeida
Isabel Maria dos Santos Barata
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge Tinoco de Faria
Isabel Maria Soares Pinto Zacarias
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Alberto Martins Sobral
João Cardona Gomes Cravinho
João Francisco Gomes Benavente
João Pedro da Silva Correia
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
João Rui Gaspar de Almeida
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão
José Alberto Leal Fateixa Palmeiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Aurélio da Silva Barros Moura
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos da Cruz Lavrador
José Carlos Lourenço Tavares Pereira
José Carlos Pinto Basto Mota Torres
José da Conceição Saraiva
José de Matos Leitão
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Ernesto Figueira dos Reis
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Pires Epifânio
José Manuel Rosa do Egipto
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Rodrigues Pereira dos Penedos
Jovita de Fátima Romano Ladeira
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Miguel Gomes Miranda Teixeira
Luísa Pinheiro Portugal
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António dos Santos
Manuel Francisco dos Santos Valente
Manuel Maria Diogo
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Margarida Maria Santos Soares da Rocha Gariso
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custodia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira
Maria do Céu da Cruz Vidal Lourenço
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino
Maria José Vidal do Rosário Campos
Maria Luísa Silva Vasconcelos
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Paulo Alexandre Homem de Oliveira Fonseca
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui Manuel Leal Marqueiro
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Victor Brito de Moura
Vítor Manuel Alves Peixoto
Vítor Manuel Caio Roque
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Social Democrata (PSD):

Adão José Fonseca Silva
Álvaro dos Santos Amaro
Ana Maria Martins Narciso
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António de Carvalho Martins
António D'Orey Capucho
António Manuel da Cruz Silva
António Manuel Santana Abelha

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António Paulo Martins Pereira Coelho
Armando Manuel Dinis Vieira
Arménio dos Santos
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos José das Neves Martins
Carlos Manuel de Sousa Encarnação
Carlos Manuel Marta Gonçalves
Domingos Duarte Lima
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares
Eugénio Fernando Sá Cerqueira Marinho
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Jorge Loureiro de Reboredo Seara
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Francisco Augusto Caimoto Amaral
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
João José da Silva Maçãs
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José António de Sousa e Silva
José Eduardo Rêgo Mendes Martins
José Luís Campos Vieira de Castro
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel de Matos Correia
José Manuel Durão Barroso
José Manuel Macedo Abrantes
Lucília Maria Samoreno Ferra
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Manuel Machado Rodrigues
Luís Pedro Machado Sampaio de Sousa Pimentel
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Castro de Almeida
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Joaquim Barata Frexes
Manuel Maria Moreira
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria do Céu Baptista Ramos
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rui Fernando da Silva Rio
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva

Partido Comunista Português (PCP):
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Cândido Capela Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
João António Gonçalves do Amaral
Joaquim Manuel da Fonseca Matias
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Natália Gomes Filipe
Maria Odete dos Santos
Octávio Augusto Teixeira
Vicente José Rosado Merendas

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello Branco
António de Magalhães Pires de Lima
António José Carlos Pinho
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da França
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Luís Pedro Mota Soares
Maria Celeste Ferreira Lopes Cardona
Narana Sinai Coissoró
Raúl Miguel de Oliveira Rosado Fernandes
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

Bloco de Esquerda (BE):
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Helena Augusto das Neves Gorjão

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos começar os nossos trabalhos com a discussão da proposta de lei n.º 49/VIII - Altera os artigos 9.º, 10.º, 12.º, 14.º, 17.º, 18.º e 24.º e adita os artigos 10.º-A e 14.º-A à Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto (Lei das Finanças Locais) e do projecto de lei n.º 321/VIII - Altera a Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto (Lei das Finanças Locais) (PCP).
Para introduzir o debate, em representação do Governo, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Local.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Local (José Augusto Carvalho): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo submete a VV. Ex.as uma proposta de lei de alteração da Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto, a qual, aplicada pela primeira vez ao Orçamento do Estado para 1999, veio introduzir demonstradamente um novo relacionamento financeiro entre os poderes central e local.
O cálculo dos fundos municipais passou a estar indexado a valores de cobrança efectiva de impostos em alternativa a falíveis e manipuláveis estimativas orçamentais. Garantindo maior consistência e estabilidade no financiamento autárquico, as autarquias passaram a participar não apenas do produto de um imposto sobre a despesa mas igualmente de impostos sobre o rendimento. Simplificaram-se os critérios de distribuição dos fundos municipais através da utilização de indicadores de fácil acesso, mesmo para o cidadão comum.
Com a Lei n.º 42/98 deixou igualmente de ser manipulável o montante a transferir para as freguesias, passando o respectivo envelope financeiro a ser distribuído por todas elas, em termos nacionais, independentemente do financiamento do município em que se inserem.

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A nova lei trouxe consigo também - o que, aliás, era essencial - o reforço dos meios financeiros das autarquias locais. Os municípios, no primeiro ano de aplicação deste diploma, viram as transferências financeiras subir 44 milhões de contos.
Graças à actual Lei das Finanças Locais, na transição de 2000 para 2001, os municípios beneficiam de um aumento de transferências de 13,6% e as freguesias de 10,1%.
Os municípios, na vigência dos XIII e XIV Governos constitucionais, vêem as respectivas transferências do Orçamento do Estado crescer mais de 80%, de 1995 a 2001, e as freguesias mais de 138%, percentagens que me atrevia a afirmar serem quase inacreditáveis face às taxas de inflação que neste período se têm verificado.
Não se pense, contudo, que o reforço dos meios financeiros dos municípios se tem processado apenas através das transferências do Orçamento do Estado, pois no restante da receita municipal a evolução também tem sido relevante. Basta atentar a que, se em 1995, as receitas municipais globais foram de cerca de 622 milhões de contos, o que corresponde a 3,9% do PIB, as mesmas atingiram, em 1999, cerca de mais 400 milhões de contos, o que representa um acréscimo de mais de 64%. Em 1999, as receitas municipais representaram, assim, 4,8% do PIB.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Lei das Finanças Locais em vigor suscitou o aplauso de muitos eleitos locais quanto aos acréscimos globais das respectivas transferências financeiras. Neste aspecto decisivo, como noutros, diria que esta lei «está bem e recomenda-se».
Mesmo no respeitante às freguesias, a evolução de 12,8 milhões de contos, em 1995, para quase 31 milhões de contos, em 2001, é bem expressiva.
Permitam-me, a propósito dos recursos para as freguesias, que reproduza aqui as palavras que proferi na sessão de encerramento do 7.º Congresso da ANAFRE, que se realizou em Junho último, e que, obviamente, mantenho.
Disse então: «O processo de transferência de atribuições e competências para os municípios ditado pela Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, não pode parar aí. O processo de descentralização não pode ignorar as freguesias. É que se houve pontos de consenso da agenda política da anterior legislatura, com o «não» à regionalização, foi o da transferência de competências para as autarquias existentes. E é precisamente neste enquadramento que justificam a devida reponderação questões que têm merecido as vossas prioridades, como o estatuto social dos eleitos de freguesia, o regime de permanência e os recursos financeiros».
Afirmei, então, que estava certo que, nos próximos tempos, iríamos poder trabalhar na concretização da estratégia de subsidiariedade e de descentralização. Permitam-me VV. Ex.as que aqui afirme e informe que já acordámos com o Conselho Directivo da ANAFRE trabalhar nesse sentido.
Estamos, entretanto, perante VV. Ex.as para fazer a apresentação e defesa de uma proposta de lei de alteração dos critérios de distribuição dos fundos municipais. É uma alteração ditada pela experiência de aplicação da lei em 1999 e 2000, a qual não se terá revelado suficientemente redistributiva, embora tenha dado passos significativos nesse sentido, face aos municípios de menor dimensão populacional.
Os pequenos municípios são muito dependentes da verba que é anualmente inscrita no Orçamento do Estado. Permitam-me VV. Ex.as que, a este respeito, exemplifique, recorrendo à média dos dados de 1995 a 1999. Por exemplo, enquanto para Lisboa se verifica uma taxa de dependência de 9,5%, isto é, a transferência do Orçamento do Estado representa apenas 9,5% no conjunto das receitas municipais, para Barrancos essa taxa é de 75,2%.
Em termos médios, ainda reportando-me ao período de 1995/1999, registamos uma taxa de dependência de 56% para os 108 municípios até 10 000 habitantes e uma taxa de 23,7% para os 23 municípios que estão no lado oposto do espectro, ou seja, para os que têm mais de 100 000 habitantes.
O constante da presente proposta de lei recolhe, por isso, alargado consenso entre a generalidade dos destinatários, bem como merece a concordância da Associação Nacional de Municípios Portugueses. Na essência, o que está em causa na proposta do Governo é a autonomização de cerca de 15% dos fundos municipais a transferir ano a ano, parcela que, a valores de 2001, se traduz em 55 milhões de contos, verba com a qual pretendemos que se constitua o fundo base municipal, a distribuir em partes iguais por todos os 308 municípios.
Porque a este novo fundo fazemos corresponder 15% da verba global, ficam os restantes 85% para repartir na proporção preexistente, na proporção originária, pelos Fundo Geral Municipal e Fundo de Coesão Municipal, já estabelecidos na lei.
O Fundo de Coesão Municipal não suscita da nossa parte qualquer reparo; propomos que continue a ser distribuído como até aqui, segundo os valores do índice de desenvolvimento social, que são valores de natureza censitária, como VV. Ex.as se recordarão.
O Fundo Geral Municipal deve continuar a repartir-se segundo os critérios indicativos da dimensão de cada município constantes da Lei n.º 42/98, excepção feita a uma parcela de 5% que deixa de exercer a função de repartição igualitária que exercia porque é substituída pelos primeiros 15%, ou seja, pelo tal fundo base municipal.
A diferença está em que, a valores de 2001, os referidos 5% representariam apenas 14,7 milhões de contos, enquanto que o fundo base municipal, que pretendemos que seja criado, significa 55 milhões de contos. Portanto, a diferença está entre 14,7 e 55 milhões de contos. É este fundo base municipal que vem corresponder às preocupações dos pequenos municípios.
Igualmente a presente proposta de lei assume o objectivo de garantir crescimentos mínimos e máximos reportados ao crescimento médio que, em cada ano, se verifique. Crescimentos mínimos diferenciados por escalões populacionais, com discriminação positiva dos municípios de menor dimensão pelas razões atrás expostas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sem vos ocupar mais tempo, concluo dizendo que a proposta de lei n.º 49/VIII visa atingir uma distribuição mais justa dos fundos municipais.
A presente proposta de lei, a ser acolhida por VV. Ex.as, permitirá uma aproximação significativa ao princípio constitucional de equilíbrio financeiro consubstanciado na correcção de desigualdades entre autarquias do mesmo grau. Servirá, enfim, a causa do desenvolvimento regionalmente equilibrado no Portugal moderno e competitivo, mas igualmente fraterno e solidário, que estamos a construir.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado da Administração Local, a apresentação desta proposta de lei por parte do Governo, dois anos depois da aprovação solitária por parte do PS da actual Lei das Finanças Locais, quer queiramos quer não, tem uma leitura política: o Governo reconhece, de uma forma relativamente rápida, que a aplicabilidade da lei não cumpriu os objectivos a que se propunha. De certa forma, pode dizer-se que algumas das críticas que nos levaram então à abstenção foram justificadas, tendo-as a vida confirmado.
No entanto, parece-nos que é de aproveitar este momento para, em conjunto, trabalharmos para que uma nova lei das finanças locais melhor, com melhores e maiores recursos, com maior capacidade redistributiva, com novas fórmulas para que o poder local possa desempenhar cabalmente a sua função e sem sujeição a conjunturas, possa vir a ser aprovada.
Cremos, no entanto, salvo melhor opinião, que a proposta de lei em debate enferma, à partida, de duas contradições, que poderemos considerar repetitivas em relação ao passado recente, isto é, aos termos da Lei n.º 42/98.
A primeira delas é que a proposta de lei nem sequer satisfaz um dos problemas que, ao longo destes dois anos, foi sentido: o do aumento global da participação percentual das autarquias na média aritmética das receitas dos impostos. Tem sido uma manifestação inequívoca da vontade dos autarcas e das suas estruturas representativas, seja dos municípios, seja das freguesias, essa reivindicação.
Assim, em primeiro lugar, pergunto-lhe o seguinte: como é possível aumentar a capacidade financeira das autarquias e das freguesias em termos sustentados e promover a recuperação financeira, vilipendiada ao longo de anos, sem partirmos de uma posição política que corresponda, de base, a um aumento dessas dotações?
Em segundo lugar, tem o Sr. Secretário de Estado a consciência de que as compensações que vai introduzir na lei vão adulterar alguns princípios que a própria lei pretende ver garantidos, designadamente os mínimos, mínimos esses que, depois, podem vir a não ser cumpridos?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Local.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Local: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Honório Novo falou de duas alegadas contradições e disse que esta proposta de lei não satisfaz a percentagem global de participação que as autarquias almejam.
Gostaria de dizer que, no respeitante às freguesias, a metodologia que propomos e queremos assumir é a que aqui apresentámos e, mais do que isso, que apresentámos perante os eleitos de freguesia, olhos nos olhos, em pleno congresso da ANAFRE, em Junho passado, ou seja, que a problemática dos recursos financeiros seja associada ao desafio da descentralização, a qual pretendemos que não pare nos municípios. Isto a bem da imagem extremamente bem cotada que os autarcas de freguesia têm perante a sociedade portuguesa. Seria injusto associá-los a qualquer efeito de aumento de despesa pública nesse propósito louvável, justo, de reforço dos seus instrumentos financeiros.
Portanto, parece-me táctica e estrategicamente muito mais correcto concretizar esse reforço e tratar igualmente outras questões que são consideradas prioritárias pelos mesmos no contexto desse esforço do processo descentralizador.
No respeitante aos municípios, Sr. Deputado, eu, que por vezes sou conotado como sendo expressão do lobby autárquico, quero dizer-lhe, sem qualquer equívoco e com toda a frontalidade, que penso que os recursos das autarquias, no contexto das suas atribuições e competências, têm evoluído de forma muito satisfatória e são recursos adequados.
A este propósito, disse aqui que, para tal, têm contribuído as transferências do Orçamento do Estado, mas não só. É que, globalmente, a evolução das receitas municipais é histórica, excepcional. Na verdade, referi que, em 1995, as receitas municipais foram de 622 milhões de contos e que, em 1999, situam-se acima de 1000 milhões de contos, o que significa um aumento de 64,5%, de 1995 para 1999. Assinalei, ainda, que, de 1995 até 2001, os municípios beneficiam de um crescimento superior a 80% no que toca às transferências do Orçamento do Estado.
Por isso, Sr. Deputado, nós divergimos. O senhor considera que os recursos dos municípios ainda continuam a ser insuficientes, certamente não tendo em conta o que representa o III Quadro Comunitário de Apoio, enquanto, pela minha parte, tenho outro entendimento, num quadro de realismo, de adequada ponderação do que são os recursos nacionais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Amaro, também para pedir esclarecimentos.

O Sr. Álvaro Amaro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, antes de formular uma pergunta muito directa, quero começar por dizer que, pela parte que me toca, jamais o acusarei de pertencer ao lobby dos autarcas. Se alguma vez o acusarem disso, não penso que deva ter grandes preocupações, pois creio que é natural que, no seio do Governo, haja quem defenda mais as autarquias e quem as defenda menos. Portanto, não tenha essa preocupação.

O Sr. José Penedos (PS): - Eis um certificado!

Risos.

O Orador: - Em segundo lugar, o Sr. Secretário de Estado lembrar-se-á, porventura, do ex-ministro que tutelava as autarquias locais. Ora, quando, na legislatura anterior, o PSD se atreveu a apresentar um projecto de lei sobre as finanças locais, ia caindo o governo quando esse ministro veio a esta Assembleia dizer que ia acontecer um conjunto de circunstâncias terríveis porque o Grupo Parlamentar do PSD tinha tido o feliz atrevimento (assim o considero) de apresentar um projecto de lei, justamente para corrigir o que, já desde 1979, era considerado pelo legislador de então como o objectivo claro da Lei das Finanças Locais.
Não vale a pena enveredarmos pela discussão de saber quem fez mais ou quem fez menos quanto às finanças locais, desde 1979 até hoje. Certo é que, na legislatura

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anterior, discutiu-se um conjunto de projectos de diplomas sobre as finanças locais.
O PSD votou contra a Lei das Finanças Locais que está em vigor. A prova de que o PSD estava certo é a sua presença hoje, aqui, Sr. Secretário de Estado, a apresentar esta nova proposta de lei de alteração da Lei das Finanças Locais, que a bancada do PSD saúda porque corrige um erro que, teimosamente, o governo não quis reconhecer na altura, isto é, que estava a beneficiar, manifestamente, os municípios grandes em detrimento dos mais pequenos e objectivo defendido no projecto de lei então apresentado pelo PSD era precisamente oposto.

O Sr. Casimiro Ramos (PS): - Essa agora!

O Orador: - Alguns dos que por aí falam estavam cá e lembram-se do que digo; outros nem tanto!
Passada esta nota, ainda queria dizer-lhe algumas coisas, Sr. Secretário de Estado.
Se se corrige agora estes desequilíbrios terríveis em matéria de municípios grandes e municípios pequenos - permita-me esta linguagem pouco convencional, mas é a realidade -, pergunto-lhe se o Governo admite ou não que consagrar o regime de autonomia financeira dos municípios passa pelo facto de cada um deles poder arrecadar cada vez mais um maior volume de receitas próprias, que é o que os torna cada vez mais autónomos, sem embargo, naturalmente, dos fundos de perequação devidos às assimetrias existentes entre eles.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Local.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Local: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Álvaro Amaro, em primeiro lugar, quero agradecer o amável certificado que me conferiu no início.
Em segundo lugar, devo dizer que não posso estar mais de acordo consigo. Demonstradamente, na lógica dos princípios da autonomia municipal, o nosso objectivo deve ser o de propiciar aos municípios que arrecadem o maior volume possível de verbas no quadro das suas receitas próprias. Estou, pois, inteiramente de acordo.
Já quanto aos malefícios da Lei n.º 42/98, aos terríveis desequilíbrios - para empregar a sua própria expressão! - que a lei terá trazido ou que manteve, permita-me que refira dados muitos simples relativamente à fase de transição, ao último ano de aplicação da Lei n.º 1/87 e ao primeiro ano de aplicação da Lei n.º 42/98 que, hoje, estamos aqui a tentar melhorar.
No último ano de aplicação da Lei n.º 1/87, os municípios do interior tiveram um crescimento de 7,2% e os municípios do litoral tiveram um crescimento de 7%. No primeiro ano de aplicação da nova lei, os municípios do interior tiveram um crescimento de 16,7%, enquanto os do litoral cresceram 12,4%. Estes dados indiciam já o sentido redistributivo que a Lei n.º 42/98 transportava consigo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Secretário de Estado da Administração Local, Sr.as e Srs. Deputados: Retomamos hoje um debate que ficou mal encerrado há pouco mais de dois anos, quando, em Junho de 1998, o Partido Socialista aprovou sozinho a actual Lei das Finanças Locais.
Logo aí, o PCP disse, em declaração de voto então feita pelo meu saudoso camarada Luís Sá, que a «recuperação da capacidade financeira das autarquias, resultante de anos de incumprimento da lei das finanças locais, continuaria por fazer»; logo aí, o PCP afirmou, ainda pela voz do meu saudoso camarada Luís Sá, que não ficaria «encerrada a questão do estatuto financeiro das autarquias locais», já que um aspecto central que se prende «com a capacidade financeira própria das autarquias locais» não tinha sido cabalmente resolvido; logo aí, o PCP advertiu para o facto de a lei em vigor actualmente poder vir a gerar injustiças relativas na redistribuição das verbas, com prejuízo mais notório e relevante para os pequenos concelhos com menor população e cujas receitas globais estivessem mais dependentes dos fundos transferidos do Orçamento do Estado.
Estes dois anos de aplicação da Lei n.º 42/98 confirmaram, no fundamental, a justeza das observações então feitas pelo PCP.
De facto, desde logo foi notória e visível a insatisfação de autarcas municipais e de autarcas de freguesia e, por isso, de imediato se reiniciaram contactos, se refizeram estudos, se retomou uma luta de há longos anos, com vista a tentar alterar a lei, a tentar assegurar a recuperação e a sustentabilidade financeira das autarquias, a alterar os critérios de distribuição das verbas disponíveis.
Ao apresentar uma proposta de lei para alterar aspectos centrais da actual Lei n.º 42/98, apenas dois anos após a respectiva aprovação, o Governo vem também, ainda que indirectamente, reconhecer que eram bem justas as críticas que foram dirigidas por diversos sectores a alguns dos traços fundamentais da mesma.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O debate de hoje centra-se, pois, em torno da proposta de lei do Governo e do projecto de lei do PCP, que visam alterar a Lei das Finanças Locais.
O projecto do PCP dá resposta às principais críticas e lacunas que têm caracterizado a actual lei, podendo resumir-se as alterações propostas nos cinco aspectos centrais que passo a expor.
Em primeiro lugar, o PCP propõe que a verba global posta à disposição das autarquias passe de 33% para 35% da média aritmética simples das receitas provenientes do IRS, do IRC e do IVA. Trata-se de um aumento de dois pontos percentuais em relação ao que estipula a actual lei.
O PCP propõe, assim, que os municípios passem a receber 31,5% da média aritmética simples das receitas daqueles três impostos - mais um ponto percentual do que até agora -, enquanto que, para as freguesias, se propõe que passem a receber 3,5% em vez dos actuais 2,5% da receita média desses mesmos impostos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Com estas alterações, o PCP visa permitir que os municípios disponham finalmente de verbas globais capazes de lhes assegurarem uma adequada capacidade financeira própria, ao mesmo tempo que lhes garante meios suficientes para encetarem de forma decidida a tão ansiada recuperação de possibilidades financeiras perdidas por sucessivos incumprimentos da lei das finanças locais num passado ainda não muito longínquo.

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Aqui, permito-me fazer um parêntesis para contrapor os argumentos do Sr. Secretário de Estado, que, sistematicamente, faz comparações percentuais entre aumentos verificados nos últimos anos, lembrando-lhe que essas comparações são bem feitas mas partem de uma base - e não diria que é errada porque é a que existia - que, comummente, era denunciada pela maior parte desta Câmara, ou seja, que a Lei n.º 1/87 não era cumprida e que, portanto, os valores de referência eram muito subfinanciados em relação ao valor do cumprimento da mesma.
Recordo-lhe, ainda, que é inequívoco que, se a Lei n.º 1/87 tivesse sido perfeita e completamente cumprida, o Sr. Secretário de Estado não me desmentirá quando digo que, logo em 1998, o então Fundo de Equilíbrio Financeiro para as Autarquias Locais deveria ter sido perto de 375 milhões de contos, o que, como sabe, não aconteceu, porque a referida lei não estava a ser aplicada.
Como dizia, com estas propostas de alteração, o PCP visa dar resposta positiva ao repto de rever a actual Lei das Finanças Locais através da consagração - e passo a citar a ANMP - de um «aumento do montante global dos recursos a distribuir». E esta é uma questão central.
Com estas alterações, portanto, o PCP pretende também corresponder às posições defendidas pela ANAFRE, que pretendia ver contemplado, já no orçamento para 2001, um montante global correspondente a 3% da média das receitas dos impostos, o que, como sabe, não acontece, pois a percentagem é de 2,5%.
No seu projecto de lei, o PCP vai mais longe e propõe, desde já, que a dotação legal para as freguesias passe para 3,5% das receitas dos impostos referidos, objectivo que as freguesias e seus representantes reclamavam apenas para o final desta legislatura.
A proposta do Governo não altera os valores previstos na actual lei, não aumenta a participação das autarquias nem das freguesias nos impostos do Estado.
Não se trata apenas de não dar resposta a anseios longamente expressos pelos autarcas deste país, trata-se de uma contradição, porventura insanável. É que não se entende como será possível anunciar a justa recuperação de capacidade financeira sem aumentar a participação das autarquias no montante global a distribuir.
Com o seu projecto de lei, o PCP viabiliza, ainda, a obtenção de um valor (muito próximo dos 200 000 contos) bem superior ao proposto pelo Governo, a distribuir igualmente por todos os municípios através do novo fundo de base municipal, fundo este que será destinado a despesas correntes e constituirá uma base essencial de funcionamento, sobretudo para os municípios mais pequenos e menos populosos.
Em segundo lugar, o PCP propõe que as transferências de novas atribuições e competências para os municípios se processem através de dispositivos previstos na lei que clarifiquem os meios financeiros que as acompanham, fazendo com que essas novas verbas sejam objecto de um tratamento autónomo em sede de Orçamento do Estado.
Em terceiro lugar, o PCP garante mínimos de crescimento a todos os municípios; assegura ainda que as compensações a atribuir para garantir tais mínimos sejam apenas feitas - sublinho e insisto - à custa dos valores que excedam determinados tectos definidos em lei e, se necessário (novidade e diferença em relação à proposta do Governo), à custa de transferências adicionais do Orçamento do Estado.
Este é, repito, mais um elemento que separa o projecto do PCP da proposta do Governo. Para o PCP, não é aceitável, como volta a fazer o Governo, que as compensações se façam integralmente por transferências entre municípios. Com esta técnica compensatória voltarão a repetir-se os erros da actual lei.
O que vai acontecer é que o que se pretende garantir com as alterações agora propostas será desvirtuado; o que vai acontecer é que as verbas «cedidas» por certos municípios para compensar outros vão exceder o valor do próprio fundo de base municipal que lhe tinha sido atribuído à partida. E o que pode acontecer é que muitos municípios, aos quais a proposta de lei diz querer garantir determinados mínimos de crescimento, não vejam garantidos esses mínimos, de facto, face às verbas que são obrigados a ceder para efectuar compensações.
A este propósito, citaria dois ou três exemplos de cálculo: desde logo, são 76 os municípios com menos de 10 000 habitantes, 73 do continente e 3 das regiões autónomas, cujas receitas vêm diminuídas em relação aos mínimos que o próprio Governo anuncia garantir. Ou seja, o Governo (e nós acompanhamos essa garantia) defende que os municípios com estas características devem ter um aumento mínimo ponderado de 1,25%, mas o que é certo é que, com as compensações, estes municípios também são atingidos, perdem dinheiro e, na prática, não vêem garantido aquilo que a própria lei pretende garantir-lhes!
Um outro exemplo prende-se com o volume das transferências. Desde logo, o concelho de Barcelos - escolhi-o apenas porque foi onde nasci - cede, para compensações, o dobro daquilo que recebe como fundo de base municipal; em Vila Verde, no distrito de Braga, acontece o mesmo; em Amarante, no distrito do Porto, acontece o mesmo; em Penafiel, também no distrito do Porto, sucede o mesmo! Isto é, todos eles cedem o dobro do que recebem como fundo de base municipal, o que me parece claramente contraditório.
Posto isto, defende e propõe o PCP que as compensações devem ser feitas apenas e exclusivamente à custa de excedentes bem definidos em lei e de transferências adicionais do Orçamento do Estado. E não se diga que estas transferências adicionais se traduzem num valor absolutamente incomportável para as despesas do Estado: em 2001, elas não ultrapassarão, certamente, 3,6 milhões de contos.
Não devem, portanto, as compensações ser feitas à custa do próprio incumprimento da lei, como parece ser intenção da proposta do Governo.
Em quarto lugar, o PCP considera ser necessário alterar o enquadramento legal que limita de forma drástica a capacidade de recurso ao crédito por parte das freguesias, restringindo-o ao crédito a curto prazo para solver apenas problemas de tesouraria. Hoje, muitas freguesias dispõem de capacidades, de competências e de meios suficientes para realizar investimentos que necessitam do recurso ao crédito de média e longa duração. Por isso, o PCP considera necessário permitir que também as freguesias possam servir-se deste recurso para melhor concretizarem planos de investimento local que beneficiem as populações locais.
Em quinto e último lugar, o PCP considera que é desejável e necessário revitalizar o funcionamento das assembleias distritais. Este objectivo é defendido pelos representantes dos autarcas e consta igualmente do parecer do Comité Económico e Social sobre as Grandes Opções do Plano apresentadas pelo Governo para o ano 2001. Sendo um objectivo desejável, ele só poderá tornar-se possível

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se a Lei das Finanças Locais estipular verbas que permitam o respectivo funcionamento sustentado e autónomo dos municípios. É o que propomos no projecto de lei que apresentamos.
No fundo, trata-se de recuperar um dispositivo legal que leis de finanças locais anteriores à actual Lei n.º 42/98 já previam e que importa recuperar.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O PCP considera que o seu projecto de lei para alterar a actual Lei das Finanças Locais constitui um documento responsável capaz de permitir dar mais e novos passos, seguros e sustentados, para uma crescente descentralização administrativa e financeira. Continuaremos firmes neste objectivo até que Portugal tenha mais e melhores condições para se desenvolver, para esbater assimetrias, para fomentar uma aproximação mais participada das populações aos centros de decisão.
Importa dar consistência a estes objectivos de médio prazo, trabalhando agora, desde já, na busca de consensos que permitam, com a participação de todos, incluindo aqueles que representam os próprios autarcas, encontrar as melhores soluções para construir uma nova Lei das Finanças Locais mais justa e equilibrada.
Estamos convictos que temos boas soluções para aumentar os meios disponíveis, para os distribuir de forma a melhor assegurar princípios de coesão nacional e de combate às assimetrias, para enquadrar de forma clara e transparente a transferência de novas atribuições e meios financeiros. Na especialidade, estaremos disponíveis para realizar este trabalho e para reflectir sobre o conjunto das soluções que venham a ser propostas.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Com o único fito, Sr.as e Srs. Deputados, de contribuir para a sustentação financeira e administrativa do poder local em Portugal.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro Ramos.

O Sr. Casimiro Ramos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Honório Novo, a propósito da discussão que estamos a travar neste momento, começaria por referir dois aspectos fulcrais da questão levantada pelo PCP.
Em primeiro lugar, o PCP argumenta - e já ouvimos essa mesma argumentação noutros sectores - que a lei em vigor não foi suficiente para que os recursos financeiros colocados ao dispor das autarquias superassem os défices resultantes dos anos em que o PSD esteve no governo. Ora, o Sr. Deputado Honório Novo sabe, tanto quanto nós, que era muito difícil repor esses recursos na totalidade, dada a forma depauperada como o PSD deixou as autarquias: ao longo de 10 anos, inclusive no ano de 1994, em que a inflação atingia os 5,5%, a taxa de crescimento para os municípios foi de apenas 2,6%.
Assim, cerca de 500 milhões de contos seria a verba necessária para repor o que o PSD deixou em défice nas autarquias. Logicamente, a distribuição desse montante, ou de um montante inferior, teria de ser feito por escalões e não de uma vez, como um todo.
Em segundo lugar, quanto ao contributo para atenuar as assimetrias e injustiças entre concelhos em todo o Pais, na arquitectura da actual Lei das Finanças Locais há uma lógica (à qual o PCP, com a sua proposta, também se associa), que é a de procurar que todos os municípios tenham um crescimento em redor da taxa de crescimento médio nacional. Ora, sempre que ensaiamos as possibilidades para que a generalidade dos municípios, a começar por aqueles com menos de 20 000 habitantes, tenham um crescimento próximo da média nacional, afastamos todos os municípios de um outro critério importante de assimetria, o da capitação.
Sem querer ser exaustivo em números, gostaria de referir o seguinte: com a aplicação da Lei das Finanças Locais, todos os municípios com menos de 10 000 habitantes têm uma capitação acima da média - 20 destes municípios têm, inclusivamente, uma capitação superior a 150 contos; entre 10 000 e 20 000 habitantes, há 71 municípios com capitação acima da média e apenas 2 estão abaixo da média. No total, 237 municípios têm uma capitação acima da média, 71 situam-se abaixo da média e 54 destes municípios têm mais de 40 000 habitantes.
Portanto, de acordo com a lógica actual, existe um sistema que, sempre que aproximamos todos os municípios do crescimento médio, de certa forma, cria uma assimetria relativamente à capitação média, o que faz com que os municípios mais pequenos sejam os mais compensados.
Ao nível distrital e ao nível do País, no seu conjunto, também verificamos que são os distritos do litoral e metropolitanos que têm um crescimento abaixo da média e, logicamente, há aqui um justo favorecimentos dos distritos do interior e das zonas rurais.
Sr. Deputado Honório Novo, em relação aos números de que falou a propósito das questões das compensações, nomeadamente quanto às regiões autónomas, gostava de referir que, tanto nos Açores como na Madeira, todos os municípios têm crescimentos acima dos 17%.
Por último, coloco-lhe a seguinte questão: segundo a arquitectura da actual lei, que se baseia num princípio de solidariedade nacional intermunicipal, parece-lhe lógico que a questão da compensação deva ser vista tecnicamente nos moldes presentes, ou será que tem consciência e tem presente quanto custaria ao Orçamento do Estado a compensação que é proposta por VV. Ex.as?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, havendo mais um orador inscrito para pedir esclarecimentos, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?

O Sr. Honório Novo (PCP): - Respondo já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Casimiro Ramos coloca uma questão que se prende com o incumprimento das leis de finanças locais de então, como é o caso da Lei n.º 1/87, por parte de anteriores governos, designadamente do PSD. Essa é uma questão pacífica, que até os próprios membros do PSD já reconhecem, creio eu. Portanto, não vale a pena voltarmos a insistir nessa tónica, porque me parece que ela é perfeitamente consensual em termos de espectro político nacional.

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Contudo, Sr. Deputado Casimiro Ramos, devo dizer-lhe que também não é justo insistir na técnica de comparar os valores hoje atribuídos com os que eram atribuídos em 1994 e 1995 porque, como é evidente, tal comparação beneficia quem hoje atribui, isto é, beneficia o Sr. Secretário de Estado da Administração Local e o Governo, mas apenas e exclusivamente porque faz comparações com valores em relação aos quais deveria haver vergonha de comparar.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Portanto, creio que não é de bom tom que se façam tais comparações. É que, para além de manipuladoras, elas só ficam mal a quem pretende fazê-las com valores absolutamente inadmissíveis.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - A questão fundamental, Sr. Deputado, é a de saber se estamos de acordo com o princípio de aumento global da parte a que as autarquias têm direito no conjunto das receitas do Estado. Esta é a primeira questão que temos de discutir. Ou seja, quer freguesias quer municípios defendem que o aumento dessa participação, nos valores que o PCP apresentou na sua proposta de lei, é possível, é responsável e não põe em risco a despesa do Estado. Vocês têm tido, até agora, um entendimento diferente. Vamos ver se é possível encontrarmos uma plataforma que responda às necessidades e aos anseios dos autarcas.
A segunda questão tem a ver com os limites, com os plafonds, com os tectos, com as compensações. Disse-lhe daquela tribuna que para compensar os municípios, em 2001, garantindo todos os mínimos e não os subvertendo à custa dos excedentes dos municípios que ultrapassam determinados valores que estão inscritos na proposta de lei e no projecto de lei, e que consideramos razoáveis, é possível fazer essa compensação, sem ir buscar aos municípios mais pobres, com um único valor: 3,6 milhões de contos. Não me parece excessivo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Honório Novo, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Local.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Local: - Sr. Presidente, Sr. Deputado, a questão que gostaria de ver clarificada é a seguinte: V. Ex.ª considerou excessiva a contribuição, a compensação, de alguns municípios para assegurar os crescimentos mínimos, e citou quatro casos: Barcelos, Vila Verde, Amarante e Penafiel. Pergunto: não concorda com a fixação de um tecto máximo, de um crescimento máximo? Presumo que responderá afirmativamente, até porque isso consta do projecto de lei do PCP, que aí é coincidente com a proposta de lei. Então, estamos de acordo relativamente ao tecto máximo, que é uma vez e meia a média geral, a média nacional.
Sr. Deputado, pergunto-lhe se confirma, ou não, que, corrigida essa distorção, esse excesso, colocando os municípios no tecto máximo de uma vez e meia a média, os valores de compensação, nessa fase posterior, continuam a ser assim tão expressivos? Dir-lhe-ia que não, pois tenho aqui números.
O Sr. Deputado falou de Barcelos. Ora, Barcelos vai ter um crescimento de 3,6%. Reconduzido ao tecto máximo, não se lhe pede nem mais um tostão de compensação adicional. A compensação adicional é zero.
Vila Verde, Amarante e Penafiel vão ter um crescimento de 16,17%, ou seja, depois de reconduzidos ao tecto máximo de uma vez e meia a média, o contributo, o esforço adicional que se lhe pede para a solidariedade entre municípios é de umas poucas de dezenas de milhares de contos, que andam entre 60 000 e 80 000, para transferências na ordem dos dois milhões de contos. Ora, trata-se de um quadro muito distinto, apresentado nestes termos, que são reais, indesmentíveis e muito diferentes do que o Sr. Deputado referiu com o dramatismo do esbulho que perpassou pelas suas palavras.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, já o disse, e volto a reafirmá-lo, que não vemos como obstáculo - aliás, temos isso no nosso projecto de lei - a colocação de limites máximos. Parece-nos adequado e justo e pensamos que, através deste mecanismo, é possível compensar sem ir buscar verbas adicionais. O que propomos é que se imponham limites às compensações a transferir, mesmo nesses casos.
Falei desses concelhos mas podia falar num que está, hoje, cada vez mais na berra, que é o de Ponte Lima, que vai ceder 220 000 contos, isto é, uma verba superior ao fundo base municipal.
O que nos parece algo contraditório - e tem de o reconhecer - é que na proposta de lei se esteja a criar um fundo igual para todos, dizendo-se que esse fundo, para 2001, na proposta de lei, é de 178 000 contos, e, depois, faz-se com que esses municípios cedam verbas que são superiores, e nalguns casos claramente superiores, em relação a essa verba que se diz estar a atribuir igualmente a todos os municípios.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O que nos parece contraditório e pouco coerente é que haja ainda, pelas técnicas de compensação que o Governo propõe, cerca de 76 municípios, que inventariámos - podem ser mais, podem ser menos -, com menos de 10 000 habitantes que, Sr. Secretário de Estado, ainda vão entregar verbas para compensar. Ora, sabemos - só a título de exemplo e sem qualquer significado especial, pois não pretendo fazer demagogia com isto - que estes 600 000 contos de compensações são para entregar ao município de Lisboa e 600 000 contos são para entregar ao município de Albufeira, que não são propriamente sinónimos de municípios altamente carenciados em termos de finanças locais.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Oliveira.

O Sr. Manuel Oliveira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O regime das finanças locais aplicável ao poder autárquico democrático teve a sua consagração legal, no início de 1979,

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com a denominada Lei das Finanças Locais, ou seja, a Lei n.º 1/79, de 2 de Janeiro.
O enquadramento então adoptado representou uma grande alteração no processo de financiamento das realizações autárquicas, que passou a fazer-se de uma forma não casuística, como anteriormente, por submissão, aprovação e financiamento dos projectos de forma individualizada, mas, sim, atendendo aos planos municipais e às decisões autónomas dos órgãos respectivos.
A definição dos recursos financeiros das autarquias locais passou, assim, a ser estabelecida por critérios mais objectivos, deixando de vigorar o quadro sincrético anterior.
A partir de 1979, foi notório o salto qualitativo na via do reforço do poder local, ocorrendo alterações legislativas mais profundas em 1987 e 1999.
Também é verdade que as finanças locais têm sido, durante vários anos, matéria controversa e motivo de discussão entre o poder e a oposição, essencialmente a respeito dos critérios da lei, critérios que tendem a ser mais rígidos por parte de quem aplica e define os montantes a distribuir, agora por índices objectivos, enquanto que alguns municípios destinatários das verbas se exprimem e actuam como penalizados ou prejudicados.
Com a Lei n.º 1/87, de 6 de Janeiro, foram incorporadas neste corpo normativo, de 1979, as ricas experiências vividas pelo poder autárquico e consagrados quadros expressos de transferência de verbas para as autarquias locais.
Passados 11 anos sobre esta lei, aprovada por unanimidade na Assembleia da República, ela veio a ter alterações motivadas pelas novas experiências adquiridas, pela necessidade de adequar o quadro normativo às novas realidades das autarquias locais e pelas modificações entretanto operadas no País.
A conclusão, pela revisão da lei de 1987, colheu unanimidade no discurso, na perspectiva de que a lei devia ser revista, especialmente no sentido de responsabilizar as autarquias pela gestão de uma mais substancial fatia das receitas públicas.
Porém, é verdade factual registada nas actas desta Assembleia que o Partido Social Democrata apresentou iniciativa legislativa no sentido da revisão da lei, como o PCP e o CDS-PP, com a apresentação de projectos de lei, e o Partido Socialista e o Governo através das promessas eleitorais e do Programa do Governo, posteriormente concretizadas em iniciativa legislativa mitigada. Aliás, esta era de todas a proposta mais radical: o PS e o Governo prometiam duplicar, durante os quatro anos da legislatura, os fundos a transferir para as autarquias.
Apesar de estarmos noutra legislatura e de ter sido aprovada nova Lei das Finanças Locais, não se descortina quando estarão duplicadas as verbas transferidas para as autarquias, promessa solene de 1995.
É de pessoa de bem o cumprimento do prometido.
A questão essencial que se pretendia ver resolvida com a Lei n.º 42/98, o anular das assimetrias existentes entre parcelas do território nacional, não se concretizou.
Entre outros aspectos, a proposta de lei do PSD então discutida estabelecia uma distribuição dos fundos pelas autarquias de forma a contribuir para a correcção e eliminação das reais desigualdades com que se confrontam, de modo particular, os municípios e as freguesias de menores recursos.
As propostas e projectos aprovados, em 1998, não foram neste sentido tão longe como se esperava, pelo que mereceram o voto contra desta bancada.
A proposta de lei hoje em apreço não é mais do que o reconhecimento de que o tempo veio a dar-nos razão. Tal já havia acontecido, aliás, quando o Orçamento do Estado para 2000 incorporou uma norma transitória do Fundo Geral Municipal e do Fundo de Coesão Municipal.
Constata-se que, contrariamente ao que sucedia há algumas décadas atrás, os grandes problemas da qualidade de vida que afectam o cidadão no seu quotidiano têm, na sua maioria, natureza e resolução com intervenção autárquica.
Hoje, é na autarquia que o cidadão procura e encontra as soluções para os problemas com que se depara na relação com a sociedade local. O papel das autarquias sempre foi unanimemente considerado importante. É o autarca, seja da freguesia, seja do município, que tem de enfrentar o primeiro impacto dos problemas; a quem é colocada a dificuldade e pedida solução, seja pelo cidadão, seja pela colectividade organizada. É na autarquia e no autarca que se procura resposta para a conduta da água que está assoreada; para a água pública que não sai da torneira; é o pavimento da rua que está degradado; é o pavimento na rua que não existe; é a escola para construir; é o material didáctico que a escola precisa; é o subsídio para limpeza que a escola não tem; é a piscina que não existe ou precisa de reparação; é a interrupção lectiva e não há onde deixar o filho; é o planeamento, etc.
Se o cidadão, legitimamente, tem maior consciência dos direitos de cidadania; se ganha dimensão o papel que é exigido às autarquias na resolução dos problemas que, hoje em dia, preocupam os cidadãos, também terão, obrigatoriamente, de crescer os recursos públicos postos à disposição das autarquias locais para resolverem os problemas dos mesmos cidadãos.
Se são transferidas atribuições e competências da administração central para as autarquias locais, necessário se torna aumentar as transferências financeiras para a administração autárquica.
Se os portugueses, por referendo, rejeitaram a reforma do século, ou seja, a divisão do País em regiões, resta aprofundar e aperfeiçoar o municipalismo como meio de desenvolver formas de descentralização das políticas públicas. Para tal será necessário aperfeiçoar os mecanismos de financiamento das autarquias locais.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: As alterações que hoje analisamos resultam na proposta do Governo pela manutenção da participação por parte dos municípios nos impostos do Estado, ou seja, IRS, IRC e IVA, numa percentagem de 30,5%, alterando a distribuição, pois é criado um novo fundo, isto é, o fundo base municipal.
O fundo base municipal visa dotar os municípios da capacidade financeira mínima para o seu funcionamento, sendo repartido igualmente por todos os municípios. Não é nova a ideia materializada nesta proposta de lei. Já foi anunciada quando se discutiu nesta Casa o Orçamento do Estado para 2000. Merecerá, contudo, a aprovação do PSD, porém poderíamos e deveríamos ter ido mais longe.
O projecto de lei do Partido Comunista Português parece-nos reapresentar o que não foi possível consensualizar na elaboração da Lei das Finanças Locais actualmente em vigor, ou seja, a Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto.

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Merece da parte do PSD particular atenção a proposta que eleva para 3,5% a participação das freguesias nas receitas dos impostos do Estado, bem como aquela que propõe novas formas de acesso ao crédito por parte das freguesias.
Neste quadro, Sr. Presidente e Srs. Deputados, nos termos da Constituição e do Regimento, estas iniciativas legislativas devem ser objecto de consulta, a promover pela Assembleia da República, aos órgãos próprios das Regiões Autónomas e também à Associação Nacional de Municípios Portugueses e à Associação Nacional de Freguesias, pelo que, da parte do PSD, estamos disponíveis para que os mesmos passem à comissão especializada e aí, com toda a diligência de consensualização, se aprove um diploma coerente e voltado para responder aos anseios das autarquias locais, sejam do município ou da freguesia.
Temos propostas concretas a fazer, no domínio das finanças locais, para os municípios e para as freguesias. Mas também temos propostas, cuja apresentação concretizaremos oportunamente, para valorizar e dignificar a actividade dos autarcas, aqueles que cuidam da resolução dos problemas que quotidianamente afectam os cidadãos. Afinal, é para os autarcas que são dirigidos, em primeira mão, os impactos dos problemas locais.
Esperamos que se obtenha um consenso alargado sobre matérias autárquicas que necessitam de revisão.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Manuel Oliveira, tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro Ramos.

O Sr. Casimiro Ramos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Deputado Manuel Oliveira, não era minha intenção trazer à discussão temas do passado, apesar de o Deputado Álvaro Amaro já o ter feito. Mas, efectivamente, o PSD, em 1998, quando votou contra a actual Lei das Finanças Locais não votou contra a questão dos critérios. Votou contra a lei. Ora, o PSD votou contra quê? Votou contra o acréscimo das verbas em 164 milhões de contos para os municípios, no período entre 1995 e 2001; votou contra um acréscimo de mais do dobro das verbas para as freguesias, de 13 milhões de contos para 31 milhões de contos, isto é, 139% de acréscimo.
O assunto recorrente do PSD foi a questão da duplicação das verbas como objectivo do governo, em 1995. Pois, Sr. Deputado, quero relembrar-vos o seguinte: o que era objectivo do governo, e manteve-se sempre, era que a duplicação das verbas fosse também acompanhada da transferência de atribuições e de competências. Ora, também em 1998, no debate parlamentar sobre esta matéria, isto foi referido e repetido pelo governo e pelo Partido Socialista. Como o PSD não quis entrar na discussão em 1998, não tendo feito sequer parte do grupo de trabalho na especialidade, vemos com bons olhos que, desta vez, esteja disponível para discutir connosco, na especialidade, a nova alteração à lei.
Todavia, se o PSD nos acompanhar na aprovação do Orçamento do Estado para 2001, onde estão previstas 39 medidas de atribuições e competências para os municípios, pela transferência de verbas da administração central nas respectivas atribuições e competências, podem ser, finalmente, duplicadas as verbas para os municípios no período de cinco anos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Oliveira.

O Sr. Manuel Oliveira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Casimiro Ramos, agradeço a questão que colocou.
Relembrar aqui os debates ocorridos, em 1997 e 1998, à volta da Lei das Finanças Locais é negativo para o Governo e para o Partido Socialista.
Se bem se recorda, por impulso do PSD, os projectos que então estavam na Mesa da Assembleia foram discutidos, e só nesse momento o Sr. Ministro do Equipamento da altura veio ao debate anunciar a apresentação de uma proposta de lei, o que, como disse o meu companheiro Álvaro Amaro, quase levava à queda do governo. Por isso, esta não é questão para trazermos a este debate, que se quer construtivo.
O Sr. Deputado fala nas transferências de competências previstas na proposta de lei do Orçamento do Estado. Enfim, trata-se uma situação que já vem retardada.
A promessa feita pelo Sr. Secretário de Estado, aquando da apresentação do Orçamento para 2000, era já no sentido da concretização dessas transferências de competências acompanhadas de meios. O que é facto é que, praticamente, nada foi feito, o que parece indiciar que durante o ano passado não houve ministério que se encarregasse das autarquias locais.
Naturalmente, esperamos que as medidas enunciadas na proposta de lei do Orçamento do Estado, cuja discussão se iniciará na próxima semana, se transfiram, se aquela proposta for aprovada, e se transfiram, consequentemente, as verbas necessárias para essas transferências de atribuições e competências.
Já agora, deixo uma outra nota. É que há um outro diploma - a Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro - que ainda não se encontra regulamentado. Naturalmente, espera-se que o Governo, diligentemente, faça a sua regulamentação.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Gonçalves.

O Sr. Agostinho Gonçalves (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo apresentou à Assembleia da República a proposta de lei n.º 49/III, para introduzir alterações aos artigos 9.º, 10.º, 12.º, 14.º, 17.º, 18.º e 24.º, e aditar os artigos 10.º-A e 14.º-A à Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto - Lei das Finanças Locais.
Sr Presidente, Srs. Deputados: Só perto do termo do primeiro mandato democrático dos órgãos das autarquias locais é que foi aprovado um normativo contendo o regime jurídico do seu financiamento. Falamos da Lei n.º 1/79, de 2 de Janeiro, que, inovando no ordenamento jurídico português, instituiu a autonomia financeira das autarquias locais, subordinada aos princípios orçamentais da anualidade, universalidade, especificação, não consignação e não compensação, sendo que o ano financeiro é coincidente com o ano civil.
Consagram-se receitas próprias dos municípios, das freguesias, bem como a participação dos municípios nas receitas fiscais, mantendo-se a competência para a liquida

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ção e cobrança dos impostos cujo produto reverte para as autarquias locais nas repartições fiscais.
Pela primeira vez, estabelece-se que o imposto sobre veículos é pago no município de residência do proprietário, conferindo-se aos municípios a possibilidade de lançarem derramas sobre a colecta da contribuição industrial e do imposto de turismo cobrados na área do município, ao mesmo tempo que se outorga aos municípios o poder de cobrarem taxas, que constituem o cerne das suas receitas próprias.
Com a Lei n.º 1/87, de 6 de Janeiro, aprovada por unanimidade nesta Assembleia, através de um trabalho de cooperação com os órgãos representativos do poder local, estabelecem-se alguns novos princípios importantes de que se destaca o consagrado no artigo 3.º: o de que a cada nova competência atribuída aos municípios deve corresponder a transferência de verba necessária para a sua prossecução, verba essa a ser transferida directamente do Orçamento do Estado.
Mas também se alarga o quadro das receitas provenientes na participação de impostos, o que fica consagrado na alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º, enquanto o corpo deste artigo desenha o figurino das receitas municipais.
É definido o Fundo de Equilíbrio Financeiro (FEF), estabelece-se uma fórmula para o seu cálculo e consagram-se critérios para a sua distribuição.
Fica proibida a atribuição de quaisquer formas de subsídios ou comparticipações para as autarquias por parte do Estado, de institutos públicos ou de fundos autónomos. Abrem-se, porém, as excepções tipificadas no artigo 13.º.
Estabelece-se um regime jurídico para o mútuo celebrado pelos municípios, bem como as condições em que podem ser celebrados contratos de reequilíbrio financeiro. Recortam-se as receitas das freguesias e define-se de que modo participam das receitas municipais.
A tutela inspectiva é de legalidade, competindo à Inspecção-Geral de Finanças efectuá-la, criando-se ainda novas regras para o julgamento e apreciação das contas, que é da competência do Tribunal de Contas.
A Lei n.º 1/87, de 6 de Janeiro, revogou o anterior regime contido na Lei n.º 1/79, de 2 de Janeiro.
Lamentavelmente, esta Lei não foi cumprida por parte dos governos do PSD, o que levou muitos municípios ao endividamento para cumprirem minimamente os planos de desenvolvimento local.
As grandes alterações vieram só com a aprovação da Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto. Desde logo, ao consagrar-se um regime de contabilidade para as autarquias locais que se constitua como um instrumento de gestão económico-financeira, que permita o conhecimento completo e actualizado do valor contabilístico do património e que proporcione a apreciação e julgamento do resultado anual da actividade autárquica.
Mas as inovações face ao anterior regime jurídico mais importantes são a consagração de um Fundo Geral Municipal e do Fundo de Coesão Municipal, constituídos, respectivamente, pelo cálculo de 24% e 6,5% da média aritmética simples das receitas resultantes da cobrança do IRS, do IRC e do IVA.
Os critérios para a constituição destes modelos de transferência financeira para as Autarquias são os seguintes: o Fundo Geral Municipal visa transferir para os municípios as condições financeiras para o desempenho das suas atribuições; o Fundo de Coesão Municipal visa reforçar a coesão municipal, em ordem a assegurar a correcção de assimetrias, em benefício dos municípios menos desenvolvidos, sendo distribuído com base nos índices de carência fiscal e de desigualdades de oportunidade, sendo que estes indicadores traduzem situações de inferioridade face às correspondentes médias nacionais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta de lei apresentada pelo XIV Governo Constitucional visa atingir um maior equilíbrio na distribuição dos fundos municipais, de forma a que fique assegurada aos municípios de menor dimensão uma maior capacidade financeira, visando, ainda, assegurar crescimentos mínimos, atendendo à respectiva população.
O instrumento para a prossecução dos princípios atrás enunciados é o Fundo de Base Municipal, criado pela presente proposta de lei, cujo valor será repartido igualmente por todos os municípios e que equivale a 15% da participação global em impostos do Estado.
São estabelecidos crescimentos mínimos referenciados à taxa de crescimento média nacional, com um factor de correcção mais favorável para os municípios de menor população, enquanto a correcção é progressivamente menor para os municípios de maior índice populacional.
Consequentemente, a ponderação dos critérios de repartição do Fundo Geral Municipal é alterada pelo aumento da percentagem do indicador «população residente e média diária de dormidas em estabelecimentos hoteleiros e em parques de campismo», que sobe de 35% para 40%, subtraindo-se do elenco de critérios os 5% a repartir igualmente por todos os municípios.
As alterações que se apresentam no texto do normativo proposto são introduzidas para prossecução do princípio constitucionalmente consagrado do equilíbrio financeiro, atenta a correcção das desigualdades entre autarquias locais do mesmo grau.
A alteração ao artigo 9.º pretende ajustar o contido naquele normativo às alterações orgânicas verificadas no Governo. Já as alterações ao artigo 10.º são materiais, visando introduzir alterações ao regime de financiamento das autarquias.
Assim, face à nova redacção proposta para as alíneas do n.º 1 do artigo 10.º: é criado o Fundo de Base Municipal, que é equivalente a 4,5% das receitas previstas no n.º 1 do artigo 10.º; o Fundo Geral Municipal é de apenas 20,5% do cômputo das receitas previstas no n.º 1 do artigo 10.º, sendo o regime deste Fundo o que se encontra consagrado nos artigos 11.º e 12.º. Será de 5,5% o Fundo de Coesão Municipal, de acordo com o seu regime já consagrado nos artigos 13.º e 14.º.
A nova redacção a conferir ao n.º 4 do artigo 10.º com a aprovação da proposta do Governo estabelece que as verbas previstas nas alíneas a), b) e c) do n.º 1 do artigo 10.º serão inscritas nos orçamentos dos municípios atentos os seguintes padrões: as receitas do Fundo de Base Municipal serão inscritas como receitas correntes; das receitas provenientes de transferências ao abrigo do Fundo Geral Municipal (FGM) e do Fundo de Coesão Municipal (FCM), 55% serão inscritas como receitas correntes e 45% como receitas de capital.
O artigo 12.º é também objecto de uma proposta de alteração, ao pretender consagrar-se o critério segundo o qual a distribuição do FGM se fará, em 40%, na razão directa da população residente e da média diária de dormidas em estabelecimentos hoteleiros e parques de campismo.
A proposta governamental vem ainda inovar ao consagrar, pela adição do artigo 14.º-A ao diploma existente,

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crescimentos mínimos e máximos que, em relação a cada um dos Fundos, não poderá ser inferior à taxa de inflação prevista, estabelecendo o n.º 2 níveis de crescimento mínimo relativamente à participação global de cada município em cada um dos Fundos, sendo que a taxa máxima de crescimento dos Fundos para municípios com 100 000 ou mais habitantes é idêntica à taxa de crescimento médio nacional e o crescimento em relação ao ano anterior não poderá exceder, em cada município, o equivalente a 1,5 vezes o acréscimo médio nacional.
O n.º 5 da proposta governamental para o artigo 14.º-A vem consagrar que os crescimentos mínimos referidos nos n.os 1 e 2 serão assegurados por: excedentes provenientes da aplicação dos n. os 3 e 4; por dedução proporcional nas transferências dos municípios que apresentem uma taxa de crescimento, face ao ano anterior, superior à taxa média nacional; por dedução proporcional nas transferências para os municípios que apresentem uma taxa de crescimento, face ao ano anterior, superior à taxa de inflação prevista.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta proposta de lei, aqui em apreciação, permite uma aproximação ao princípio constitucional de equilíbrio financeiro, consubstanciado na correcção das desigualdades entre autarquias locais do mesmo grau. Dignifica o poder local para melhor servir as populações.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Castello Branco.

O Sr. Álvaro Castello Branco (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Representantes do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei que hoje debatemos, que visa rever a Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto, pouco acrescenta a uma necessária revisão da Lei das Finanças Locais por forma a assegurar a efectiva descentralização, tão necessária ao País.
Logicamente, não se pode começar a construir uma casa pelo telhado e, portanto, não se pode aumentar financiamento sem que tal seja justificado por mais atribuições e competências.
Do mesmo modo, não se pode aumentar atribuições e competências, sem que, se aumente o financiamento necessário à sua prossecução.
Assim, e pese o tão badalado processo de descentralização, que teima em não passar de palavras de intenção, devesse ser já uma realidade (e infelizmente, para Portugal, não o é), temos que ter a noção, ao analisar esta proposta de lei, que o que está em discussão é o financiamento das autarquias para o exercício das actuais atribuições e competências.
Relembro aqui também o princípio constitucional da adequada proporcionalidade entre o montante dos recursos afectos às autarquias e o volume das atribuições que lhe são conferidas.
Ora, esta proposta de lei mantém inalterado o n.º 2 do artigo 10.º, ou seja, as freguesias continuam apenas a ter direito a uma participação em impostos do Estado equivalente a 2,5 % da média aritmética simples da receita proveniente do IRS, do IRC e do IVA. Era, e continua a ser esta, a constituição do fundo de financiamento das freguesias.
E se, de per si, já considerávamos esta verba inadequada, mais grave a situação se tornou, quando, com a entrada em vigor da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, no seu art. 34.º, n.º 6, alínea e), as juntas de freguesia passaram a ter a competência de fornecer material de limpeza e de expediente às escolas do 1.º ciclo do ensino básico e estabelecimentos de educação pré-escolar.
É que, Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, a criação desta competência não foi acompanhada por um aumento de financiamento às freguesias, já de si depauperadas nos seus meios financeiros. Resultado: a maioria das freguesias do nosso país não exercem a sua nova competência, pois não têm recursos financeiros para o fazerem. De que adianta criarem-se mais competências, se a lei do financiamento não as acompanha ?
Assim, o CDS-PP entende que os 2,5% previstos na Lei n.º 42/98, deveriam ter sido aumentados, não só por uma questão de eficácia das freguesias, como por um aumento lógico, decorrente do aumento das suas competências. Não faz sentido aumentar competências, se não se fornecem os meios para o seu exercício.
No que se refere ao financiamento dos municípios, a principal proposta de alteração que, no nosso entender, deveria ter sido feita, também não se verificou. Refiro-me ao valor global de financiamento dos municípios, ou seja, a 30,5% da média aritmética simples da receita proveniente do IRS, do IRC e do IVA.
Também este valor se nos afigura manifestamente insuficiente por forma a criar as condições, que defendemos, de necessária e urgente descentralização do País. Se bem que esse aumento devesse ser escalonado, deveria, desde já, ser iniciado esse processo.
Por outro lado, de entre os três fundos previstos, o Fundo Geral Municipal, o Fundo de Base Municipal e o Fundo de Coesão Municipal, é este último que garante um maior carácter redistributivo do volume de transferências.
Uma vez que o Fundo de Coesão Municipal baixa de 6,5 % para 5,5 %, assiste-se, com esta proposta de lei, a uma diminuição do carácter redistributivo do volume de transferências, o que se nos afigura errado, uma vez que prejudica os municípios mais desfavorecidos.
Seria, sem dúvida, mais vantajoso beneficiar o Fundo de Coesão Municipal em detrimento do Fundo de Base Municipal, prosseguindo, assim, o preceito constitucional da redistribuição das receitas entre as autarquias do mesmo grau, por forma a corrigir as desigualdades entre estas mesmas autarquias.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Termino fazendo uma pergunta e apresentando um protesto. O que quero perguntar ao Sr. Secretário de Estado prende-se com o seguinte: como saberá, decerto, no âmbito das reformas estruturais prometidas por este Governo, assume relevância a reforma fiscal da tributação sobre o património, reforma essa fundamental no entendimento do CDS-PP.
As alterações legislativas neste âmbito implicam, necessariamente, uma alteração ao Código da Contribuição Autárquica, matéria que, como sabe, tem óbvias implicações nas receitas próprias das autarquias.
Saliento uma vez mais a necessidade da consideração integrada do problema do financiamento das autarquias locais, que considero extremamente importante. Os critérios e as alterações propostas visam necessariamente resultar em previsões rígidas ou, pelo menos, estáveis.
Assim, pergunto: na elaboração da presente proposta, o Governo teve em conta as alterações que visa propor em matéria fiscal e que terão um reflexo na aplicação prática desta lei?

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Por fim, apresento um protesto pelo facto de o Governo não ter apresentado mapas de simulação da aplicação da presente proposta de lei, de forma a que, de um modo esclarecido, todos pudéssemos, na prática, antever o alcance da distribuição financeira ora em discussão.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, tenho a informação de que existe consenso no sentido de se proceder à votação no fim do debate.
Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Local para uma pequena intervenção, como o próprio a classificou.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Local: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero tão-só reafirmar que ficou demonstrado que a proposta do Governo introduz uma maior justiça na distribuição das transferências financeiras. Ficou igualmente demonstrado que, num exercício de solidariedade intermunicipal, a parte significativa das compensações para assegurar os crescimentos mínimos é efectuada com o excesso de crescimento relativamente ao tecto máximo.
Ficou também demonstrado que a Lei n.º 42/98 já de si incluía aspectos extremamente relevantes de cunho redistributivo - recordo que, em 1999, o primeiro ano de aplicação desta lei, os municípios com população inferior a 10 000 habitantes tiveram um acréscimo superior a 14%, enquanto os municípios com mais de 100 000 habitantes tiveram um crescimento de cerca de 9%.
Mas, sendo a presente alteração acolhida por VV. Ex.as, atente-se no seguinte: municípios com menos de 10 000 habitantes, que são 108 e representam 7% da população, arrecadarão, em 2001, 20% dos 373 000 contos que estão inscritos na proposta de Orçamento do Estado para 2001. Ou seja: 7% da população, 108 municípios - 20% dos fundos para 2001. 23 municípios com mais de 100 000 habitantes, respeitando a 42% da população, arrecadarão 22% dos mesmos fundos para 2001.
Não entendo, pois, como é que o Sr. Deputado que falou em representação do CDS-PP refere que esta proposta de lei prejudica os pequenos municípios.
Efectivamente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o que a nossa proposta não contém é o agravamento da despesa pública. O que a nossa proposta prevê é que as transferências financeiras para 2001 atinjam o maior valor absoluto na vigência do poder local democrático: 48 milhões de contos de aumento de 2000 para 2001.
Por isso, não nos peçam para acompanharmos propostas que aumentem a despesa pública eventualmente com um ónus que recairia, em última instância, sobre os autarcas. Os autarcas não o mereceriam! O que está em causa, demonstradamente, é o interesse público, não é o interesse deste ou daquele, deste ou daquele grupo, desta ou daquela instituição.
Com o quadro legal vigente, a Lei n.º 42/98, actualizado com a nossa proposta de lei, o interesse público continuará a ser prosseguido. E, reafirmo, continuará a ser prosseguido num quadro de adequados recursos que a Lei n.º 42/98, actualizada como propomos, consagra.
A prossecução do interesse público também será assegurada, e de forma relevante, com o processo de descentralização ditado pela a Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro. Todos sabemos que o processo de descentralização, de transferência de atribuições e competências, está dependente da decisão soberana de VV. Ex.as de aprovação do Orçamento do Estado para 2001.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação da proposta e do projecto de lei que acabámos de discutir.
Começamos, então, por votar a proposta de lei n.º 49/VIII - Altera os artigos 9.º, 10.º, 12.º, 14.º, 17.º, 18.º e 24.º e adita os artigos 10.º-A e 14.º-A à Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto (Lei das Finanças Locais).

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS e do PSD, votos contra do CDS-PP e abstenções do PCP, de Os Verdes e do BE.

Srs. Deputados, vamos agora votar o projecto de lei n.º 321/VIII- Altera a Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto - Lei das Finanças Locais (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PCP, do PSD, de Os Verdes e do BE e abstenções do PS e do CDS-PP.

Tanto a proposta de lei como o projecto de lei baixam à 4.ª Comissão.
Srs. Deputados, vamos passar à apreciação da Conta Geral do Estado do ano de 1997.
Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (José Magalhães): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, o Governo está inteiramente disponível para qualquer fórmula de debate que a Câmara considere adequado. No entanto, Sr. Presidente, gostaria de ter a certeza da modalidade que as bancadas preferem, uma vez que, se bem me lembro, o critério seguido no ano passado foi distinto e traduziu-se em dar a palavra ao relator, uma vez que estamos a discutir, não um qualquer documento do Governo, mas o relatório que a Assembleia da República aprova, consolidando e aprovando as contas do Estado.
Neste sentido, Sr. Presidente, talvez sugerisse que se fizesse uma consulta muito rápida às bancadas no sentido de saber qual a metodologia que consideram mais adequada.

O Sr. Presidente: - Considero razoável o que acaba de propor. Se todos os grupos parlamentares concordarem, dou, em primeiro lugar, a palavra ao relator por 5 minutos.

Pausa.

Não havendo objecções, tem a palavra a Sr. ª Deputada Teresa Venda.

A Sr.ª Teresa Venda (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. as e Srs. Deputados: Estamos aqui para apreciar a Conta Geral do Estado de 1997.

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Apreciar a Conta Geral do Estado de 1997 passa não só por avaliar da sua adequada execução em termos financeiros, mas também por avaliar se foram cumpridas as prioridades sociais, económicas e políticas assumidas pelo Governo aquando do Orçamento do Estado de 1997.
A este propósito, recordo as palavras do então Ministro das Finanças que, na sessão final da discussão na especialidade do Orçamento de Estado, referiu: «Este Orçamento é, decisiva e definitivamente, o Orçamento da consolidação financeira, o Orçamento com o mais baixo défice, desde o início do regime democrático.
Trata-se de um Orçamento que permitirá baixar o endividamento, mas não é um Orçamento financista e monetarista.
É um Orçamento colocado ao serviço do Programa do Governo e da sua profunda aspiração social, das reformas que começaram e vão continuar, em 1997, da prioridade para as despesas sociais, para a justiça e para a satisfação das necessidades colectivas do povo português.
É, ainda, um Orçamento ao serviço do investimento e do emprego pois o investimento e o emprego foram sempre, a par das necessidades colectivas e das despesas de desenvolvimento, aquilo que ganhou com o sacrifício de contenção dos gastos de funcionamento, das despesas supérfluas e desnecessárias (...)».
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Quero salientar alguns aspectos que, na Conta Geral do Estado, confirmam globalmente o cumprimento das prioridades sociais, económicas e políticas assumidas pelo Governo. Quero assinalar ainda o bom desempenho global da economia portuguesa, que lhe permitiu cumprir os critérios de convergência necessários para a adopção da moeda única.
Nesse ano, Portugal apresentou um défice, em percentagem do PIB, muito próximo da média da União Europeia. O défice do Sector Público Administrativo, na óptica da contabilidade nacional, cifrou-se em 435,1 milhões de contos, o que correspondeu a 2,5% do PIB e reflectiu um comportamento mais favorável do que o previsto.
Em 1997, Portugal apresentou um rácio de dívida pública nitidamente abaixo da média da União Europeia, situando-se em 61,5% do PIB.
Para a diminuição da dívida pública em 3,5 pontos percentuais relativamente a 1996 contribuiu o elevado montante das receitas de privatizações afectas à amortização da dívida, no valor de 633,7 milhões de contos, ou seja, 3,6% do PIB.
Os juros da dívida pública diminuíram 5,6%, situando-se em 4,3% do PIB, contra 4,8%, em 1996. Este resultado é explicado, quer pela própria evolução da dívida, quer pela baixa das taxas de juro nacionais e internacionais.
Em 1997, à semelhança do registado em 1996, o investimento público excedeu o défice do Sector Público Administrativo em 1,8 pontos percentuais do PIB, cumprindo-se a chamada regra de ouro das Finanças Públicas.
A inflação situou-se em 1,9%, um ponto percentual menos que no plano anterior, marcando assim o culminar de um processo gradual e sustentado de desinflação que se vinha desenrolando desde 1990.
A receita efectiva cresceu 911,8 milhões de contos face ao ano anterior, o que representou um crescimento de 20,1 %. A taxa de execução situou-se nos 97,5%.
As receitas fiscais aumentaram 9,3%, evidenciando uma maior eficiência fiscal e destacando-se o comportamento muito diferenciado do IRS e do IRC.
A receita em sede de IRS aumentou 2,9%, apesar de afectada negativamente pela redução das taxas de juro nominais e pela actualização acima da inflação dos limites de alguns escalões e de outros parâmetros do imposto.
Em sede de IRC, a receita apresentou uma elevada taxa de crescimento, 26,3%, explicada, designadamente, pela forte expansão da actividade económica em 1996.
As despesas correntes aumentaram 4,4% face ao ano anterior.
Este aumento combinou a redução das Despesas em Juros e Subsídios e o acréscimo das Despesas com Pessoal, das Despesas em Bens e Serviços e das Transferências do Estado, deste modo concretizando a prioridade dada ao reforço das políticas sociais.
Assim, em 1997, na óptica da classificação funcional, as Funções Sociais registam o maior peso relativo (27,1 % do total das despesas) e também o maior acréscimo, quer em valor absoluto (mais 228,4 milhões de contos), quer em valor relativo (mais 9,3%).
Paralelamente, as Funções Gerais de Soberania crescem 1,8% e as Funções Económicas 0,5%.
Em 1997, destacam-se as despesas efectuadas com os Investimentos do Plano, que atingiram 460,7 milhões de contos, correspondendo a uma taxa de execução de 85,5% e beneficiando de uma comparticipação comunitária de 31,6 milhões de contos.
Por fim, salienta-se a transferência para o orçamento da segurança social no montante de 369,1 milhões de contos, para financiamento dos regimes sociais não contributivos, cumprindo assim o estabelecido na Lei de Bases da Segurança Social.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. as e Srs. Deputados: Para concluir, quero assinalar o trabalho desenvolvido pelo Tribunal de Contas no desempenho da sua função de fiscalização da legalidade das receitas e despesas públicas.
Este trabalho culminou com a emissão do parecer sobre a Conta Geral do Estado que, a par de algumas recomendações, reconhece e refere, expressamente, a introdução de práticas que evidenciam um maior rigor técnico no processo de orçamentação e contabilização da Conta Geral do Estado.

Aplausos do PS.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente João Amaral.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Ofélia Moleiro.

A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Registamos com agrado a continuação da normalização do processo de discussão e aprovação das contas do Estado.
O atraso na apresentação das contas é agora substancialmente menor do que o que decorria da prática seguida no passado, sendo de salientar o papel da Sr.ª Presidente da Comissão de Economia, Finanças e Plano e dos Deputados relatores pelo esforço desenvolvido e empenho no sentido de normalizar os procedimentos para que, de forma mais atempada, possamos debater tão importante documento.
De facto, a Conta do Estado é o instrumento de grande valor para a análise do desempenho do Governo, no

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ano a que se refere, permitindo tirar conclusões importantes pela aferição da execução orçamental do Governo que se deseja com a transparência necessária a essa avaliação.
Gostaria de referir alguns aspectos que decorrem do relatório apresentado pela Sr.ª Deputada relatora, que cumprimento pelo excelente esforço que desenvolveu. A taxa de execução da receita foi de 97,5%, valor superior ao de 1996, o qual se situou em 96,5%. Ainda assim, a receita efectiva foi inferior à prevista no Orçamento final em 2,5%.
O grau de execução da receita está ligado aos graus de execução dos impostos directos, que foram executados em 98,5%, dos impostos indirectos em 99,5% e ainda dos rendimentos de propriedade, activos financeiros e venda de bens e de investimento. Estas últimas rubricas apresentaram uma execução que excedeu o previsto.
Numa análise comparativa com 1996, as receitas efectivas cresceram 20,1% e as fiscais aumentaram 9,3%. A receita fiscal representou, neste conjunto, 73,2%, diminuindo o seu peso como componente que era de 81,4%, em 1996, mas representou 22,3% do Produto Interno Bruto contra os 21,6% no ano anterior.
A taxa de execução da despesa foi de 89%, valor inferior a 1996, em que se registou um valor de 91,8%. O crescimento da despesa global foi de 9,7% relativamente a 1996.
O défice global do sector público administrativo correspondeu a 1,1% do Produto Interno Bruto, segundo a óptica da Contabilidade Pública. A dívida pública directa representou, no final do ano, 61,5% do Produto Interno Bruto. Portugal cumpriu, em 1997, os critérios de convergência para integrar a moeda única em 1 de Janeiro de 1999.
Em 1997, o produto das privatizações ascendeu a 825,9 milhões de contos, transferida para o fundo de regularização da dívida pública.
O Tribunal de Contas, na sua apreciação, considera fundamental uma nova lei de enquadramento do Orçamento do Estado que possa suprir lacunas actuais, como a falta de informação sistematizada sobre os fluxos financeiros com a União Europeia.
Refere também a auditoria ao Rendimento Mínimo Garantido em curso à data do parecer, mas cujos trabalhos de campo evidenciavam já estrangulamentos na implementação da medida no que concerne a meios humanos, execução física e financeira, realçando a utilização frequente de meios humanos e financeiros afectos ao regime geral, originando impactos negativos nas tarefas correntes e distorções orçamentais. Na sequência desta primeira avaliação, recomenda que os custos inerentes ao funcionamento do Rendimento Mínimo Garantido sejam rigorosamente imputados à respectiva dotação.
Por último, importa ainda recordar alguns dos factos económicos mais relevantes ocorridos durante a execução orçamental de 1997 e com efeitos na Conta do Estado de 1997.
Refiro a transferência do fundo de pensões do Banco Nacional Ultramarino para a Caixa Geral de Aposentações. Durante o ano de 1997, o Ministério das Finanças efectuou uma operação contabilística de transferência de 52 milhões de contos do fundo de pensões do BNU para a Caixa Geral de Aposentações, operação essa que influenciaria o montante do défice do Sector Público Administrativo.
Esta operação compensou alguma derrapagem que se verificaria nas receitas fiscais na execução orçamental de 1997.
Depois de discutido e aprovado o Orçamento de 1998, o Governo apresentou uma proposta de Orçamento Rectificativo para 1997, destinada, sobretudo, a aumentar a dotação do Serviço Nacional de Saúde em 54 milhões de contos: um reforço de 14 milhões de contos e uma afectação de 40 milhões de contos da dotação provisional.
Durante a discussão do Orçamento do Estado para 1998, o Governo afirmava que a dívida da saúde não ultrapassava os 106 milhões de contos. Poucas semanas mais tarde, justificava a necessidade de um Orçamento Rectificativo para 1997 com o facto de a dívida do Serviço Nacional de Saúde ser substancialmente mais elevado, próxima dos 160 milhões de contos, indiciando, assim, uma desorçamentação do Orçamento de 1997.
A contestação generalizada à carta/aviso de pagamento de IVA, dirigido pela Direcção-Geral dos Impostos aos pequenos retalhistas e prestadores de serviços fez com que o Governo fosse obrigado a recuperar o Decreto-Lei n.º 237-A/96, de 31 de Dezembro. O episódio com a colecta mínima do IVA mostrou que a designada luta contra a fraude e evasão fiscais promovida pelo Governo incidia, sobretudo, nos contribuintes de mais baixos rendimentos.
Por fim, é de assinalar o aval do Estado feito à UGT. O acto de concessão pelo Ministro das Finanças do aval do Estado ao empréstimo contraído pela UGT viria a ser objecto de um pedido de impugnação pelo Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República e, posteriormente, seria declarado ilegal pelo Supremo Tribunal Administrativo. Este episódio motivou a aprovação, pela Assembleia da República, do novo regime jurídico da concessão das garantias pessoais do Estado.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - A importância deste debate é inequívoca e talvez não tenha assumido, em tempos, nesta Câmara, a concretização exigível do primado financeiro do Parlamento.
Relembre-se que, até Junho de 1991, se aprovaram em poucos minutos todas as Contas de 1976 até 1988 e, em 1991, foi aprovada a Conta referente ao ano de 1989.
Com a discussão de hoje, relativa ao ano de 1997, o CDS-PP não deixa de valorizar uma maior normalização na avaliação política das contas públicas que, em resultado do cumprimento dos prazos de apresentação, só dignifica esta Câmara.
O que se trata de discutir, nesta sede, é uma matéria de elevada exigência técnica e que se resume à questão de saber de que forma se procedeu à execução do Orçamento do Estado durante todo o período financeiro.
Esta discussão, eminentemente técnica, foi devidamente desenvolvida pelo Tribunal de Contas através do parecer que integra o relatório da Comissão de Economia, Finanças e Plano.
Não posso deixar de afirmar que, num primeiro momento, o acto que consubstancia esta discussão, dada a disparidade temporal relativamente à aprovação do Orçamento do Estado de 1997, parece, nessa medida, representar apenas e só um acto de mera natureza formal.
No entanto, a Conta não é apenas um registo e síntese da execução. Constitui, sobretudo, um meio de con

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trolar as operações em que se constituiu tal execução e de responsabilizar os seus agentes pela fiscalização a posteriori.
Nos termos constitucionais, a apreciação da responsabilidade orçamental (o designado «tomar contas») é feita por esta Câmara. Por isso, o CDS-PP não deixa de evidenciar certos aspectos constantes do parecer do Tribunal de Contas, os quais merecem uma reflexão a este grupo parlamentar, e, penso, a toda a Câmara. A saber: em primeiro lugar, e no que respeita à execução do orçamento das receitas, destaco a 3.ª Recomendação, no sentido em que o modelo de contabilização das receitas passe a ser sustentado por um sistema informático de registo dessas próprias receitas, capaz de as controlar. Este aspecto é de extrema importância, de modo a que possam ser conhecidos, analisados e criticados os elementos fundamentais do comportamento dos contribuintes e da Administração Fiscal e, nessa medida, avaliar a eficácia de todo o sistema fiscal, informação que todos sabemos ser essencial para apurar e concluir acerca dos fenómenos de evasão e fraude fiscais.
Sublinho que o reforço desta informação teria sido, a todos os títulos, de extrema importância para fundamentar, de forma rigorosa, as questões que estiveram em debate, a propósito da reforma da tributação sobre os impostos sobre o rendimento.
Ainda neste âmbito, um outro aspecto prende-se com a eficiência dos serviços da Administração Fiscal que constitui uma das pedras basilares para a eficácia de qualquer reforma fiscal anunciada. Também segundo o parecer existem lacunas graves, designadamente na troca de informação e documentação entre a DGCI, a DGT e a DGO, bem como na deficiência dos sectores auditados no que respeita à carência de recursos humanos e materiais, à inadequação da generalidade do equipamento informático e à necessidade de formação (veja-se, a título meramente exemplificativo, os pontos 27 e 32 do parecer).
No domínio dos investimentos do Plano é de realçar, de uma forma sintética, a falta de compatibilização entre o PIDDAC e as grandes opções estratégicas, bem como a inexistência de informação agregada que abranja o conjunto de despesas de investimento do sector público de natureza plurianual.
Em suma, a conclusão que me parece resultar, na análise do parecer do Tribunal de Contas, é a de que existem procedimentos e irregularidades a corrigir - e que, decerto, serão tidos em consideração pelos serviços visados -, mas, sobretudo, de que certas irregularidades ou contrariedades na execução orçamental resultam da ineficiência dos serviços administrativos.
Quanto a este último aspecto, é necessário recordar que, para além da prossecução de uma adequada política financeira, é igualmente importante não ignorar problemas de base e de ineficiência do sistema, sem os quais, por mais que se prossiga uma efectiva política de rigor orçamental e de transparência nas contas públicas, não se logrará obter quaisquer resultados.
É preciso não esquecer que a fiscalização financeira e política não se resume apenas à discussão deste debate. Ela vai-se efectivando ao longo do ano, no Parlamento, com o apoio da Comissão de Economia Finanças e Plano.
Nesta matéria, quero realçar o contributo do CDS-PP com a apresentação do recente projecto de alteração à Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado, norteado por três princípios fundamentais: maior rigor e clareza das contas públicas; aumento do grau de responsabilização política relativamente à realização de despesas públicas; e, por último, um maior acompanhamento político da execução orçamental por parte desta Assembleia da República.
Por fim, e ainda no âmbito do projecto citado, o CDS-PP assume a posição de que a elaboração da Conta Geral do Estado é um instrumento fundamental de ajuda à previsão e elaboração dos orçamentos.
Em matéria de previsão, saliente-se, ainda, a medida proposta no sentido de regular a designada «desorçamentação» em sentido técnico: primeiro, reforçando o controlo político pela Assembleia da República no que respeita ao recurso ao endividamento; segundo, tornando mais transparente a forma de regularização de despesas não orçamentadas, através da obrigatoriedade de discriminação e justificação da assunção da dívida por parte do Governo; e, terceiro, prevendo a obrigatoriedade de inscrição do saldo remanescente da despesa não regularizada no orçamento subsequente, sem prejuízo dos mecanismos de responsabilidade já previstos na actual Lei de Enquadramento.
Esperamos, sinceramente, que a existência de regras bem claras e definidas do ponto de vista da previsão e do reforço da fiscalização política da execução orçamental venham valorizar os seguintes debates sobre a Conta Geral do Estado, reforçando assim a transparência e os mecanismos de fiscalização que deram origem à presente discussão.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Pela nossa parte, sublinhamos também o facto de, esperemos que com carácter definitivo, a Assembleia da República ter entrado num regime de normalidade em relação à apreciação das contas do Estado. Infelizmente, o mesmo já não se pode dizer em relação à situação de anormalidade em que continuam as contas do Estado, designadamente quando aferidas pelos orçamentos que também aqui votamos.
De facto, a leitura do parecer do Tribunal de Contas sobre a Conta Geral do Estado de 1997 é elucidativa sobre o estado de desacerto e descontrolo que as contas do Estado continuam a apresentar. Na execução do orçamento da receita repetem-se, porventura agravados, os factores de perplexidade pelo facto, por exemplo, de nunca se saber, efectivamente, qual a receita arrecadada pelo Estado, designadamente em matéria fiscal. Cito o parecer do Tribunal de Contas: «Os valores de cobrança apurados pelas entidades administradoras das receitas (…) divergem, em termos globais, dos valores efectivamente arrecadados». E não são pequenos os valores de divergência, por exemplo, em matéria de impostos sobre o rendimento lê-se o seguinte: «Divergência de 23,8 milhões de contos entre o valor da receita bruta cobrada de imposto sobre o rendimento escriturada na contabilidade do Tesouro e o constante da Conta Geral do Estado» ou, por exemplo, a referência à «existência de contas bancárias que não estão integradas na tesouraria do Estado».
Mas avancemos para a execução do orçamento da despesa, onde as disfunções apuradas pelo parecer do Tribunal de Contas não são menores. Desde logo, uma consideração de ordem geral que confirma o que desde sempre

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temos criticado nas propostas de Orçamento do Estado e que o Governo sistematicamente tem negado, a de que, em matéria de acessibilidades, por exemplo, «foram agravadas as assimetrias regionais entre o litoral e as regiões de maior interioridade».
Mas, fazendo uma análise mais fina, não há praticamente nenhum capítulo onde o descontrolo das contas públicas não seja posto em evidência pelo parecer do Tribunal de Contas. Por exemplo, a existência de deduções à colecta do IRC de importâncias superiores às legalmente permitidas. Dos 189,3 milhões de contos previstos na proposta de Orçamento do Estado para 1997 para benefícios fiscais, conclui-se que, afinal, o valor ascendeu a 276,7 milhões de contos. Só em IRC, a diferença para mais atinge os 149%, de 68 milhões de contos previstos na proposta de Orçamento do Estado para 169,4 milhões de contos de benefícios efectivos, dos quais 103,5 milhões de contos dizem respeito a despesa fiscal gerada na zona franca da Madeira, como, aliás, refere a própria Deputada relatora.
Em matéria de património financeiro confirmam-se expressamente as operações ilegais em torno da PARTEST. Como afirma o Tribunal de Contas, «a Lei n.º 11/90, de 5 de Abril, não prevê outra forma de transmissão das partes sociais das empresas sujeitas ao seu regime para além da privatização propriamente dita, pelo que carece de fundamento legal a alienação pelo Estado à PARTEST, seja a que título for, de acções dessas empresas, como as que foram realizadas em 1997, diz mais, «Os lucros da PARTEST derivam essencialmente dos ganhos obtidos por esta nos processos de privatização em que participou». Há aqui, obviamente, não simplesmente uma errada escrituração, como o Governo tantas vezes aqui afirmou, mas uma clara violação da lei com a ocultação e falta de transparência evidente nas contas públicas.
Mas se percorrermos, por exemplo, o capítulo dos «fluxos financeiros com a União Europeia», saltam à vista os «sacos azuis» que o Governo sempre tem negado. Um exemplo: o valor dos juros gerados pela conta FEDER foi de cerca de 4,7 milhões de contos, mas destes só 930 000 contos foram contabilizados. A diferença de 3,8 milhões de contos serviu para pagar despesas - e cito de novo o parecer do Tribunal de Contas - «efectuadas sem base legal e sem se encontrarem orçamentadas».
Analisando, pois, a Conta Geral do Estado e o parecer do Tribunal de Contas mais se acentua a ideia não só das ilegalidades cometidas pelo Governo na execução do Orçamento do Estado como, sobretudo, Srs. Deputados, a ideia, para mim, de que o exercício que aqui fazemos todos os anos para debater e votar o Orçamento do Estado mais se assemelha, à luz deste parecer, a um exercício virtual. A falta de transparência nas contas públicas é uma evidência e, nesta matéria, a situação está longe de ser melhor do que era antes dos governos do Partido Socialista. Por isso, não é legítimo que nos peçam para concordar com a tomada de contas pela Assembleia da República ou com a aprovação da Conta Geral do Estado, como diz agora a Constituição da República Portuguesa, que correspondem muito pouco à verdade orçamental que aqui votámos há quatro anos e que devem muito à legalidade.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento (Fernando Pacheco): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo a minha intervenção por referir a questão que foi levantada pela Sr.ª Deputada Ofélia Moleiro e pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho, que se referia ao facto de estarmos, finalmente, numa situação de normalidade. Isto desde aquele exercício que foi referido pelo Sr. Deputado Pedro Mota Soares, no ano de 1991, em que foi preciso estar a aprovar 12 Contas Gerais do Estado.
Devo dizer também, no seguimento das intervenções que foram feitas, que o estarmos numa situação de normalidade é um motivo de satisfação para todos, para o Governo e para os Srs. Deputados, e que a Conta Geral do Estado de 1998 já cá está, foi entregue dentro do prazo estabelecido na Lei do Enquadramento do Orçamento do Estado, estando a Conta Geral do Estado relativa ao ano de 1999 neste momento em fase de ultimação, no verdadeiro sentido do termo, pelo que muito brevemente será enviada quer ao Tribunal de Contas quer a esta Câmara. Como tal, penso que isto acrescenta um pouco ao que os Srs. Deputados referiram sobre esta situação de gradual normalidade do acompanhamento político pela Assembleia da República da execução do Orçamento do Estado.
Gostaria ainda de me debruçar sobre as questões relativas à execução do orçamento das receitas que aqui foram levantadas pelos Srs. Deputados Lino de Carvalho e Pedro Mota Soares e, de uma forma transversal, por uma observação da Sr.ª Deputada Ofélia Moleiro.
Disse o Sr. Deputado Lino de Carvalho, que foi quem chegou mais longe na análise feita, que há um desacerto e um descontrolo, que, segundo ele, se nota na divergência existente entre os valores das receitas apontadas como receitas arrecadadas, quando se olha, por um lado, para aquilo que é informação original de base dos serviços dos impostos e, por outro, para aquilo que a Direcção-Geral do Tesouro obtêm. Devo dizer-lhe, Sr. Deputado Lino de Carvalho, que estas divergências têm a ver com aspectos de natureza técnica, com o exercício de conciliação, e são coisas tão simples como, por exemplo, a seguinte situação: quando num documento de cobrança é indicado o mês de Dezembro como o mês em que o imposto é devido, é contado pela Direcção-Geral dos Impostos como receita do mês de Dezembro e é imputado a esse ano; porém, se esta receita, embora imputada ao mês de Dezembro pela Direcção-Geral dos Impostos, tiver entrado em Janeiro do ano seguinte na Direcção-Geral do Tesouro, esta Direcção-Geral já a imputará ao mês de Janeiro, o que significa que já constará do ano seguinte. Há, portanto, um exercício de conciliação, um exercício técnico de esmiuçar, que é feito depois e que, evidentemente, tem de ser aperfeiçoado.
Tenho de dizer ao Sr. Deputado Lino de Carvalho, respondendo também à questão levantada pelo Sr. Deputado Pedro Mota Soares, que, se a divergência nos impostos sobre o rendimento patente no relatório da Conta Geral do Estado de 1997 era de 23,8 milhões de contos, neste momento, em relação à Conta Geral do Estado de 1999, esse exercício é de 1,5 milhões de contos no que toca ao IRS e de zero no que toca ao IRC. Isto mostra, portanto, que o Governo tem dado a devida atenção e o devido cuidado e as correctas instruções aos serviços para que se dêem passos no sentido de eliminar este problema que o Tribunal de Contas apontou e que tanto os Srs. Deputados como o Governo consideram importante. Diria, por isso, que,

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neste momento, esta é uma situação que está em vias de resolução e que o facto de ainda termos uma diferença de 1,5 milhões de contos não nos deve deixar tranquilos, mas já é uma redução muito importante do valor que existia e é, em percentagem dos impostos de que estamos a falar, um valor diminuto.
Em sede de IVA, devo dizer que os valores são da mesma ordem de grandezas. É um imposto cujo volume de receita é superior a qualquer dos outros dois impostos e, neste momento, a divergência, em termos destes procedimentos de conciliação, está na casa dos 3,5 milhões de contos no que toca ao exercício de 1999. Penso que isto mostra que estamos a caminhar no bom sentido, no sentido do rigor técnico e financeiro.
Também sobre o mesmo assunto o Sr. Deputado Lino de Carvalho disse que, relativamente à dedução à colecta do IRC e aos benefícios fiscais, há uma grande diferença entre o valor inicial e o valor final. E o Sr. Deputado colocou o «dedo na ferida», se me é permitida a expressão, ao dizer que isso se deve, em grande medida, à zona franca da Madeira. De facto, isso é verdade, já que a zona franca da Madeira explica a quase totalidade desta variação, que se deve apenas ao facto de se tratarem de benefícios fiscais que são muito difíceis de antecipar, porque, sendo criado o esquema para o benefício, nem sequer se consegue compreender o que ele poderá ser fisicamente, já que, neste caso concreto, trata-se de empresas com uma grande mobilidade, que podem localizar-se na Madeira por existirem estas condições fiscais como tão depressa num outro qualquer ponto do globo. Tal significa, portanto, que, não havendo zona franca da Madeira, por exemplo, não haverá também esta despesa fiscal. Há aqui, portanto, um grande grau de mobilidade de capitais que explica a dificuldade de previsão do seu valor.
O Sr. Deputado Lino de Carvalho referiu a questão do património financeiro e citou o caso da PARTEST, mas penso que não vale a pena estarmos aqui a debater este assunto, pois ele já foi, pelo menos por duas vezes, discutido nesta Câmara. No entanto, devo dizer-lhe, Sr. Deputado, como, aliás, já foi dito aquando da apreciação da Conta Geral do Estado de 1996, que esta é uma situação definitivamente resolvida em termos da Conta Geral do Estado de 1998 e da Conta Geral do Estado de 1999, onde não verá qualquer tipo de problema desta natureza. Foi uma situação que levantou algumas dúvidas; o Governo tinha uma interpretação, que, pelos vistos, não era a mais correcta, é verdade, mas esse problema foi resolvido e não voltará a aparecer nas Contas de 1998 e de 1999. De qualquer modo, já voltarei a esta questão, mas numa perspectiva um pouco diferente.
Problemas desta natureza, que também têm a ver com a transparência e a facilidade de apreciação, foram levantados pela Sr.ª Deputada Ofélia Moleiro, porque, por diversas vezes, na apreciação feita pelo Tribunal de Contas menciona-se que os elementos informativos não são suficientes e que, em sede de alteração da Lei do Enquadramento do Orçamento do Estado - como a Sr.ª Deputada especificamente mencionou - haveria que tomar o cuidado de tornar esta informação acessível e transparente. Ora bem, essa proposta já foi entregue pelo Governo, havendo também propostas dos vários partidos, e penso que, se esta questão é para ser resolvida, o momento para o fazermos terá de ser precisamente durante este e o próximo ano, quando procedermos à revisão da Lei do Enquadramento do Orçamento do Estado, onde poderemos definir com clareza qual a informação que deve ser fornecida, para que, com transparência, possam ser apreciados nesta Câmara os pontos onde se diz haver menor transparência.
Ainda em relação a esta matéria há um ponto, que foi abordado tanto na intervenção do Sr. Deputado Lino de Carvalho como na do Sr. Deputado Pedro Mota Soares, que eu gostaria especificamente de focar e que tem a ver com o património financeiro e com a assumpção de passivos, com as regularizações de situações do passado. Pela leitura que fiz do relatório do Tribunal de Contas, parece-me que esta questão é mais relevante, já que tenho a sensação de que é criticada com mais veemência do que a situação da PARTEST.
Devo dizer aos Srs. Deputados que o Governo não vê aí uma ilegalidade, até porque essas operações são realizadas de acordo com procedimentos que a própria Lei do Orçamento do Estado nele torna explícitos. Ou seja, a própria Lei do Orçamento do Estado diz qual é o montante que pode ser usado para essas operações, como elas são processadas, por operações de tesouraria, e especifica quais são os destinos das verbas para esse fim, que, assim, são inscritas no articulado da Lei do Orçamento do Estado. Portanto, por esta razão parece-nos que não há qualquer ilegalidade, havendo, aliás, a transparência de ser indicada a forma como essas verbas são aplicadas.
Mais do que isto, Sr. Deputado, eu diria que não há desorçamentação por uma razão muito simples: se desorçamentação houve, ela ocorreu no ano em que essas situações foram criadas e não foram devidamente contabilizadas no Orçamento do Estado e não no ano de 1997, altura em que se vem precisamente regularizar a situação, lançando-a na dívida pública. Ou seja, se no ano em causa, no ano em que foi gerado esse compromisso tivesse sido lançada no défice orçamental estaria, neste momento, na dívida pública e não no défice orçamental. É por isto que, do ponto de vista técnico, também me parece correcto que seja lançada na dívida pública.
Por fim, Sr. Presidente, se me permite, porque me esqueci de o fazer no momento inicial, gostaria de cumprimentar a Comissão de Economia, Finanças e Plano pelo excelente trabalho de apreciação do parecer do Tribunal de Contas sobre a Conta Geral do Estado e que deu origem ao excelente relatório que aqui tivemos oportunidade de nos debruçar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, visto não haver mais inscrições, dou por concluído a apreciação da Conta Geral do Estado do ano de 1997.
Contudo, para podermos passar à votação, gostaria que os Srs. Deputados me dissessem se o que se vai votar é o relatório da Conta Geral do Estado do ano de 1997 ou a própria Conta Geral do Estado do ano de 1997.

Pausa.

Srs. Deputados, estava a contar com uma boa discussão, mas parece-me que não consigo…

Risos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

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O Sr. Presidente (João Amaral): - Faça favor. A Mesa concede-lhe 17 minutos!

Risos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, compreendo perfeitamente a intenção de V. Ex.ª, mas, no futuro, iremos ter uma nova lei de enquadramento orçamental que irá ajudar a resolver o problema…
Sr. Presidente, respondendo à questão colocada por V. Ex.ª, penso que o que está em causa é a aprovação da Conta Geral do Estado do ano de 1997, cumprindo deste modo, no limite mínimo, o imperativo constitucional.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Muito obrigado, Sr. Deputado Manuel dos Santos, particularmente por estar convencido de que sabe exactamente o que eu pretendia.

Risos.

Srs. Deputados, vamos votar a Conta Geral do Estado do ano de 1997.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS e votos contra do PSD, do PCP, do CDS-PP e do BE.

Srs. Deputados, vamos passar à apreciação da proposta de resolução n.º 18/VIII - Aprova, para ratificação, as emendas à Convenção relativa à Organização Europeia de Telecomunicações por Satélite (EUTELSAT), adoptadas e confirmadas pela 26.ª Assembleia daquela Organização, realizada em Cardife, de 18 a 20 de Maio de 1999.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e das Obras Públicas.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e das Obras Públicas (Luís Parreirão): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais começo por agradecer à Assembleia o facto de ter tido em conta o pedido de urgência que fizemos para o agendamento da presente proposta de resolução, tanto mais que esta reestruturação da Convenção EUTELSAT e respectivas alterações foram já aprovadas na EUTELSAT em 1999 e tinham como data limite, convencionada entre os Estados, para entrar em vigor o próximo ano, para o que a ratificação por parte dos vários Estados deveria ocorrer até 31 de Agosto deste ano.
Deste modo, agora trata-se de pedir à Assembleia que ratifique estas alterações, que visam, sobretudo, dar à EUTELSAT maior eficácia e, por isso mesmo, permitir que, também no âmbito desta Convenção, as telecomunicações por satélite funcionem melhor, não perdendo os Estados as funções de controlo que têm de ter sempre neste sector.
Desta forma, alcança-se o objectivo de criarem-se as condições para, no dia 2 de Julho de 2001, estas alterações à Convenção poderem entrar em vigor, quer no âmbito internacional, quer também no ordenamento jurídico português.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Zelinda Marouço Semedo.

A Sr.ª Zelinda Marouço Semedo (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto e das Obras Públicas, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de resolução n.º 18/VIII aprova, para ratificação, as emendas à Convenção relativa à Organização Europeia de Telecomunicações por Satélite (EUTELSAT), adoptadas e confirmadas pela 26.ª Assembleia daquela Organização, realizada em Cardife, de 18 a 20 de Maio de 1999.
As telecomunicações por satélite são da maior importância para o desenvolvimento entre os povos e para a economia dos seus Estados-membros.
A resolução em apreço reconhece como pertinentes as proposições do tratado sobre os princípios que regem as actividades do Estado na exploração e utilização do espaço atmosférico, a necessidade de acompanhamento da evolução técnica, económica e ainda a vontade de transferir as actividades operacionais e os activos correspondentes da EUTELSAT para uma sociedade anónima, a Sociedade EUTELSAT, S. A., considerando que o êxito da participação europeia no mercado mundial de comunicação via satélite depende da criação de um sector competitivo no domínio dos satélites, num contexto de liberalização, de um acesso comparável e efectivo aos mercados dos países terceiros, da existência de tecnologia adequada e da captação de consideráveis investimentos privados.
Pela presente Convenção, os Estados-partes criam a Organização Europeia de Telecomunicações por Satélite (EUTELSAT), aberta à assinatura dos governos em Paris, em 15 de Julho de 1982, e posteriormente corrigidos.
A EUTELSAT terá como missão principal assegurar que a Sociedade EUTELSAT, S. A. respeite os princípios de base enunciados no Artigo III, a saber: obrigações de serviço público/serviço universal; cobertura pan-europeia do sistema de satélites; não discriminação; concorrência leal; assegurar a continuidade em matéria de direitos e obrigações internacionais resultantes da exploração do segmento espacial da EUTELSAT transferido para a Sociedade EUTELSAT, S. A.; desenvolver um mercado comum dos serviços de comunicação via satélite e promover a competitividade do sector europeu dos satélites.
A Convenção divide-se por 22 artigos, sendo o primeiro destinado a consagrar um conjunto de definições legais que obrigarão os Estados signatários durante a aplicação deste instrumento de direito internacional público.
A EUTELSAT será um entidade dotada de personalidade jurídica - Artigo IV -, podendo celebrar contratos, adquirir, locar, possuir e alienar bens móveis e imóveis, ser parte em juízo e, finalmente, concluir acordos com Estados ou organizações internacionais.
O Artigo V determina que serão estabelecidos protocolos de acordo sobre a repartição de custos entre a EUTELSAT e a EUTELSAT, S. A., estabelecendo a alínea b) do mesmo artigo os critérios sobre esses custos.
A estrutura da EUTELSAT comporta os seguintes órgãos: a Assembleia de Partes e o Secretariado, que é dirigido pelo Secretariado Executivo. Cada um dos órgãos referidos deve agir no limite das atribuições que lhe são conferidas pela Convenção.
Segundo o Artigo XI, as Partes signatárias exercerão os direitos e os deveres reconhecidos convencionalmente de forma a respeitarem e a promoverem os princípios e as disposições da Convenção, sendo que a sede da EUTELSAT será em França, de acordo com o Artigo XII.
Em qualquer momento, de acordo com o Artigo XIII, qualquer das Partes pode retirar-se voluntariamente da

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EUTELSAT, notificando por escrito o depositário e, nos termos do Artigo XXI, podem as Partes dissolver a EUTELSAT, pondo fim à Convenção por maioria de dois terços dos votos de todas as Partes, o que, porém, não põe em causa a existência da sociedade EUTELSAT, S. A., de acordo com o consagrado nas alíneas c) e d) do Artigo XIV.
A Convenção entra em vigor nos termos da alínea a) do Artigo XVII, sendo que nenhuma das Partes é individualmente responsável pelos actos e obrigações da EUTELSAT, salvo nos casos de convenções bilaterais entre os Estados signatários em que essa responsabilidade seja reconhecida.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Matias.

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Ao falarmos da Convenção relativa à Organização Europeia de Telecomunicações por Satélite estamos a referir-nos a um domínio importantíssimo do ponto de vista do futuro, nomeadamente da sociedade de informação.
Trata-se de um domínio onde a cooperação entre os Estados com vista a prosseguir o sistema de telecomunicações, a criação da rede transeuropeia e o desenvolvimento tecnológico, não pode deixar de se fazer. Contudo, é também um domínio que implica um serviço público de comunicações, quer se trate da rede telefónica pública, quer se trate do serviço de audiovisuais, quer de serviços futuros, os quais a nossa imaginação não consegue antever, creio eu, em termos de quantidade e qualidade, desde já.
A fórmula encontrada, a constituição de uma sociedade anónima, não pode deixar de merecer algumas reservas da nossa parte, porque, tal como é do conhecimento público, este serviço de telecomunicações sofre algumas apetências por parte dos grupos económicos, em termos de domínio e controlo. Assim sendo, a forma de sociedade anónima não é de modo algum um elemento dissuasor desse controlo.
Por outro lado, sendo as telecomunicações um serviço público para o qual é estabelecido uma base equitativa, não deixa, contudo, de ser admitida uma certa flexibilidade comercial que pode pôr em dúvida alguma democratização do sistema por todas as partes interessadas.
Por fim, tendo as questões das telecomunicações, das redes telefónicas e do controlo de audiovisuais a ver com direitos, liberdades e garantias, a simples definição por maioria, sem a possibilidade de veto, de algumas questões fundamentais neste serviço aconselham a que a Convenção seja acompanhada com muito cuidado por parte do Estado português.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O objecto da proposta de resolução, que hoje nos é apresentada pelo Governo, que aprova, para ratificação, as emendas à Convenção relativa à Organização Europeia de Telecomunicações por Satélite - mais conhecida por EUTELSAT -, adoptadas e confirmadas pela 26.ª Assembleia da EUTELSAT realizada em Cardife, no mês de Maio do ano transacto, assume nos dias que correm uma importância fulcral.
Hoje é, de facto, impossível passar um dia que seja sem tropeçarmos em conceitos modernos ligados aos maiores desenvolvimentos tecnológicos. Aliás, sem utilizar maledicência ou desrespeito, devo dizer que, hoje, no âmbito dos telemóveis, conceitos como WAP, GPS e celulares são uma realidade indispensável. Portanto, não vale a pena negar uma evolução que é francamente positiva, seja por uma utilidade profissional ou pessoal. Estamos a falar de uma evolução de tecnologias de ponta, de sistemas integrados e de engenharias altamente complexas e avançadas. Mas tal febre de telecomunicações alastrou também como um vírus, atingido todo o tipo de mercados e de sectores da sociedade.
Hoje em dia, os grandes «pulmões» da economia são as telecomunicações, a multimédia e os e-com, substituindo os grandes pilares, como a banca e as seguradoras, que ditavam as leis de mercado até há bem pouco tempo.
As telecomunicações por satélite são, sem dúvida, fundamentais para o desenvolvimento das economias e da economia mundial, constituindo um elo de ligação entre culturas e vivências.
O objectivo da Convenção relativa à Organização Europeia de Telecomunicações por Satélite (EUTELSAT) será, então, a criação de uma rede transeuropeia de telecomunicações como base de distribuição de serviços de telecomunicações a todos os Estados participantes. Cria-se, assim, uma sociedade anónima para explorar um sistema de satélites para fornecer serviços de satélites, sendo transferidos para esta todos os activos e actividades operacionais da EUTELSAT. É compreensível que assim se proceda, considerando a envergadura de tais investimentos e projectos, tentando sempre a optimização dos mesmos. A tal sociedade anónima é também justificada - e, em nosso entender, bem! - à luz do acompanhamento da evolução técnica, económica e regulamentar da Europa e da necessidade de um esforço constante de novas adaptações.
Está constituído um corpo de representação e de fiscalização das actividades de tal Organização, cuja estrutura comporta dois órgãos: a Assembleia de Partes e o Secretariado. Por nós, este papel tem de ser reforçado - aliás, a intervenção do Sr. Deputado Joaquim Matias, do PCP, foi, neste ponto, fundamental -, porque o lugar de Portugal, como parceiro indispensável e cooperante com os seus congéneres europeus, não pode ser descurado, devendo ser acentuada a função de fiscalização que é concedida dentro da margem de liberdade que as Partes têm e que, como sabemos, é a que decorre - e não vale a pena estarmos a evoluir muito neste caminho.
Neste sentido, o CDS-PP votará favoravelmente a presente proposta de resolução.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, não havendo mais pedidos de palavra e de acordo com o que ficou estabelecido, vamos proceder à votação global da proposta de resolução n.º 18/VIII - Aprova, para ratificação, as emendas à Convenção relativa à Organização Europeia de Telecomunicações por Satélite (EUTEL

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SAT), adoptadas e confirmadas pela 26.ª Assembleia daquela Organização, realizada em Cardife, de 18 a 20 de Maio de 1999.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP, votos contra do BE e a abstenção do PCP.

Srs. Deputados, terminámos a nossa ordem de trabalhos de hoje.
A próxima reunião plenária, realizar-se-á na próxima segunda-feira, dia 6, às 15 horas, e terá como ordem do dia a discussão, na generalidade, das propostas de lei n.os 47/VIII - Grandes Opções do Plano Nacional para 2001 e 48/VIII - Orçamento do Estado para 2001.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 12 horas e 45 minutos.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
António Bento da Silva Galamba
Dinis Manuel Prata Costa
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Teresa de Oliveira Ferreira Coimbra
Rui do Nascimento Rabaça Vieira

Partido Social Democrata (PSD):
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
Artur Ryder Torres Pereira
Fernando Santos Pereira
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Monteiro Chaves
João Bosco Soares Mota Amaral
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
Joaquim Martins Ferreira do Amaral
José David Gomes Justino
José de Almeida Cesário
José Frederico de Lemos Salter Cid
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Mário Patinha Antão
Nuno Miguel Marta de Oliveira da Silva Freitas
Pedro Manuel Cruz Roseta
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Comunista Português (PCP):
Ana Margarida Lopes Botelho
António Filipe Gaião Rodrigues

Partido Popular (CDS-PP):
José Daniel Rosas Campelo da Rocha
Paulo Sacadura Cabral Portas

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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