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Sexta-feira, 16 de Fevereiro de 2001 I Série - Número 50

DIÁRIO da Assembleia da República

VIII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2000-2001)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 15 DE FEVEREIRO DE 2001

Presidente: Ex.mo Sr. Manuel Alegre de Melo Duarte

Secretários: Ex. mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
José de Almeida Cesário
António João Rodeia Machado
António José Carlos Pinho

S U M Á R I O

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia.- Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de lei n.º 58/VIII, da interpelação n.º 8/VIII, de requerimentos e da resposta a alguns outros.
Em declaração política, o Sr. Deputado Rosado Fernandes (CDS-PP) contestou o sistema educativo português, sobre o qual teceu várias considerações.
Também em declaração política, o Sr. Deputado Luís Cirilo (PSD) criticou a política cultural do Governo, tendo apontado alguns problemas com que se debate a cidade de Guimarães, devido à falta de apoio do Estado. Respondeu, depois, a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP).
O Sr. Deputado Joaquim Sarmento (PS) salientou a importância da candidatura do Alto Douro vinhateiro a património mundial e respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados António Nazaré Pereira (PSD) e Medeiros Ferreira (PS).
O Sr. Deputado João Amaral (PCP) condenou o processo disciplinar instaurado ao sargento da Força Aérea Lima Coelho por, na qualidade de dirigente da Associação Nacional de Sargentos, ter prestado declarações a um órgão de comunicação social. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Eduardo Pereira (PS), Carlos Encarnação (PSD) e Basílio Horta (CDS-PP), tendo ainda usado da palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (José Magalhães).
Após os Srs. Deputados António Capucho (PSD), Manuel dos Santos (PS) e Basílio Horta (CDS-PP) terem interpelado a Mesa, o Sr. Ministro das Finanças (Pina Moura), ao abrigo do n.º 2 do artigo 83.º do Regimento, informou a Assembleia da orientação e da acção do Governo no que respeita à situação autodenunciada pela actual direcção do Sport Lisboa e Benfica de incumprimento de obrigações fiscais deste clube e da respectiva sociedade anónima desportiva durante o mandato do Dr. Vale e Azevedo como presidente.
Seguiu-se um debate, no qual usaram da palavra, além do Sr. Ministro, os Srs. Deputados Maria Celeste Cardona (CDS-PP), Octávio Teixeira (PCP), Hermínio Loureiro (PSD), Laurentino Dias (PS) - que deu ainda explicações, a propósito do exercício do direito de defesa da honra da bancada, ao Sr. Deputado António Capucho (PSD).
Foram discutidos conjuntamente os votos n.os 126/VIII - De protesto pela violência que tem vitimado a comunidade portuguesa na África do Sul e pela resposta dada à mesma pelo Ministro da Defesa e Segurança daquele país (CDS-PP), que foi aprovado, 127/VIII - De protesto contra as declarações do Ministro da Defesa e Segurança da África do Sul em relação à comunidade portuguesa (PSD), que foi rejeitado, após se ter verificado um empate em duas votações sucessivas, conforme o artigo 107.º do Regimento, 128/VIII - De pesar pelo falecimento das vítimas de assaltos e de crimes mortais na África do Sul (PCP), que foi aprovado, e 129/VIII - De solidariedade para com as vítimas da criminalidade violenta na África do Sul, nomeadamente os portugueses (PS), que também mereceu aprovação. Proferiram intervenções os Srs. Deputados Manuela Aguiar (PSD), Basílio Horta (CDS-PP), Rodeia Machado (PCP), Caio Roque (PS) e Luís Fazenda (BE).

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Ordem do dia.- Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 44/VIII - Estabelece o enquadramento orçamental do Estado, e dos projectos de lei n.os 272/VIII - Lei de Enquadramento Orçamental (PCP), 294/VIII - Enquadramento do Orçamento do Estado (BE) e 344/VIII - Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado (PSD). Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro das Finanças e dos Srs. Secretários de Estado Adjunto e do Orçamento (Fernando Pacheco) e dos Assuntos Parlamentares, os Srs. Deputados Manuela Ferreira Leite (PSD), Maria Celeste Cardona (CDS-PP), Rui Rio (PSD), Octávio Teixeira (PCP), Machado Rodrigues (PSD), Luís Fazenda (BE), Fernando Serrasqueiro e João Cravinho (PS), Herculano Gonçalves (CDS-PP), Joel Hasse Ferreira e Manuel dos Santos (PS).
Entretanto, foi rejeitado o projecto de resolução n.º 93/VIII - Sobre o uso de armas com urânio empobrecido pelas Forças Armadas Portuguesas e sobre a presença militar na Bósnia e no Kosovo (Deputado do BE Francisco Louçã).
Foram aprovados os projectos de resolução n.os 103/VIII - Combate aos maus tratos e abuso sexual sobre menores e reforço das medidas de apoio às comissões de protecção de crianças e jovens (BE) e 104/VIII - Recomenda ao Governo que proceda à regulamentação urgente do regime de execução das medidas de promoção e de protecção de crianças e jovens em risco previstas no n.º 1 do artigo 35.º da Lei n.º 147/99, de 1 de Setembro (CDS-PP).
Na generalidade, foram aprovados os projectos de lei n.os 319/VIII - Institui um sistema de reparação aos trabalhadores pela morosidade da justiça, em processo de falência, e reforça os privilégios dos créditos laborais (PCP), 347/VIII - Altera o artigo
178.º do Código Penal, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 65/98, de 2 de Setembro (PS), 355/VIII - Torna público o crime de abuso sexual de crianças (altera o artigo 178.º do Código Penal) (Os Verdes) e 369/VIII - Altera os artigos 169.º, 170.º, 176.º e 178.º do Código Penal (PCP).
Ainda na generalidade, foi rejeitado o projecto de lei n.º 348/VIII - Estabelece medidas de protecção do património urbano (CDS-PP).
A Câmara aprovou também um requerimento, subscrito pelo PS, PCP, Os Verdes e BE, no sentido de os projectos de lei n.os 6/VIII - Altera a Lei n.º 135/99, de 28 de Agosto (Adopta medidas de protecção da união de facto) (Deputada de Os Verdes Isabel Castro), 45/VIII - Altera a Lei n.º 135/99, de 28 de Agosto (Adopta medidas de protecção das uniões de facto) (Deputado do BE Francisco Louçã), 105/VIII - Adopta medidas de protecção das pessoas que vivam em economia comum (PS) e 115/VIII - Adopta medidas de protecção das uniões de facto (PCP) baixarem à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sem votação na generalidade.
A Câmara aprovou ainda sete pareceres da Comissão de Ética, seis autorizando uma Deputada do PSD, outra do PCP e quatro do PS a prestarem depoimento, como testemunha, em tribunal, e um denegando autorização para suspensão do mandato a uma Deputada do PS para ser presente a tribunal.
Foi apreciado o relatório final da Comissão de Inquérito Parlamentar para Apreciação dos Actos do Governo Referentes ao Processo que Conduziu à Participação da Eni e Iberdrola no Capital da Galp, SGPS, tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, os Srs. Deputados Basílio Horta (CDS-PP), Joel Hasse Ferreira (PS), Vicente Merendas (PCP), Jorge Neto (PSD), Lino de Carvalho (PCP) e Manuel dos Santos (PS).
O Sr. Deputados do PSD Fernando Penha foi autorizado, por escrutíneo secreto, a ser ouvido, como arguido, em tribunal.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 40 minutos

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O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, temos quórum pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 15 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Aires Manuel Jacinto de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António Fernandes da Silva Braga
António Fernando Marques Ribeiro Reis
António Fernando Menezes Rodrigues
António José Gavino Paixão
António Manuel Dias Baptista
António Manuel do Carmo Saleiro
Armando António Martins Vara
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Bruno Renato Sutil Moreira de Almeida
Carla Maria Nunes Tavares Gaspar
Carlos Alberto
Carlos Alberto Dias dos Santos
Carlos Manuel Luís
Casimiro Francisco Ramos
Eduardo Ribeiro Pereira
Emanuel Silva Martins
Fernando Alberto Pereira Marques
Fernando Manuel de Jesus
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Serrasqueiro
Filipe Mesquita Vital
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Francisco José Pinto Camilo
Gil Tristão Cardoso de Freitas França
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho
Helena Maria Mesquita Ribeiro
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco d'Almeida
Isabel Maria dos Santos Barata
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge Tinoco de Faria
Isabel Maria Soares Pinto Zacarias
Jamila Barbara Madeira e Madeira
João Alberto Martins Sobral
João Cardona Gomes Cravinho
João Francisco Gomes Benavente
João Pedro da Silva Correia
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão
José Alberto Leal Fateixa Palmeiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Aurélio da Silva Barros Moura
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos da Cruz Lavrador
José Carlos Pinto Basto Mota Torres
José da Conceição Saraiva
José de Matos Leitão
José Ernesto Figueira dos Reis
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Pires Epifânio
José Manuel Rosa do Egipto
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
Jovita de Fátima Romano Ladeira
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Manuel dos Santos Silva Patrão
Luís Miguel Gomes Miranda Teixeira
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António dos Santos
Manuel Francisco dos Santos Valente
Manuel Maria Diogo
Margarida Maria Santos Soares da Rocha Gariso
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira
Maria do Céu da Cruz Vidal Lourenço
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria José Vidal do Rosário Campos
Maria Teresa de Oliveira Ferreira Coimbra
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Paulo Alexandre Homem de Oliveira Fonseca
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Teresa Maria Neto Venda
Victor Brito de Moura
Vítor Manuel Alves Peixoto
Victor Manuel Caio Roque
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Álvaro dos Santos Amaro
Ana Maria Martins Narciso
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António d'Orey Capucho
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Manuel da Cruz Silva
António Manuel Santana Abelha
Armando Manuel Dinis Vieira
Armindo Telmo Antunes Ferreira
Artur Ryder Torres Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino

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Carlos José das Neves Martins
Carlos Manuel de Sousa Encarnação
Carlos Parente Antunes
Domingos Duarte Lima
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Jorge Loureiro de Reboredo Seara
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Francisco Baptista Tavares
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
João Bosco Soares Mota Amaral
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José da Silva Maçãs
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Martins Ferreira do Amaral
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José António de Sousa e Silva
José David Gomes Justino
José de Almeida Cesário
José Eduardo Rêgo Mendes Martins
José Frederico de Lemos Salter Cid
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel de Matos Correia
Lucília Maria Samoreno Ferra
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Manuel Machado Rodrigues
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Castro de Almeida
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Joaquim Barata Frexes
Manuel Maria Moreira
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria do Céu Baptista Ramos
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria . Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Nuno Miguel Marta de Oliveira da Silva Freitas
Nuno Miguel Sancho Cruz Ramos
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa
Pedro Manuel Cruz Roseta
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Miguel de Santana Lopes
Rui Fernando da Silva Rio
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
Alexandrino Augusto Saldanha
Ana Margarida Lopes Botelho
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
João António Gonçalves do Amaral
Joaquim Manuel da Fonseca Matias
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Octávio Augusto Teixeira
Vicente José Rosado Merendas

Partido Popular (CDS-PP):
António Herculano Gonçalves
António José Carlos Pinho
António Manuel Alves Pereira
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da Franca
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Luís Pedro Mota Soares
Manuel Tomás Cortez Rodrigues Queiró
Maria Celeste Ferreira Lopes Cardona
Narana Sinai Coissoró
Paulo Sacadura Cabral Portas
Raúl Miguel de Oliveira Rosado Fernandes
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

Bloco de Esquerda (BE):
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Helena Augusto das Neves Gorjão

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai anunciar os diplomas, os requerimentos e as respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguinte iniciativas legislativas: proposta de lei n.º 58/VIII - Alterações à Lei n.º 17/2000, de 8 de Agosto (Assembleia Legislativa Regional da Madeira), que baixou à 9.ª Comissão e interpelação n.º 8/VIII - Sobre criminalidade, violência e política de segurança interna (CDS-PP).
Foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos:
No dia 5 e na reunião plenária de 7 de Fevereiro - ao Ministério do Ambiente e Ordenamento do Território, formulados pelos Srs. Deputados Francisco Louçã, Helena Neves e José Eduardo Martins; ao Ministério da Justiça, formulados pelos Srs. Deputados Maria de Belém Roseira e Vicente Merendas; à Electricidade de Portugal, S.A. e ao Instituto de Estradas de Portugal, formulados pelo Sr. Deputado Armindo Telmo Ferreira; aos Ministérios dos Negócios Estrangeiros e do Trabalho e da Solidariedade, formulados pelo Sr. Deputado Correia de Jesus; aos

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Ministérios dos Negócios Estrangeiros e das Finanças, formulados pela Sr.ª Deputada Manuela Aguiar; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Agostinho Lopes; ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade, formulado pelo Sr. Deputado Alexandrino Saldanha; à Presidência do Conselho de Ministros e aos Ministérios do Equipamento Social e da Saúde, formulados pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; aos Ministérios da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, do Ambiente e Ordenamento do Território e da Saúde, formulado pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita; ao Ministério da Educação e à Câmara Municipal da Guarda, formulados pela Sr.ª Deputada Margarida Botelho; ao Ministério das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan; a diversos Ministérios, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro; à Câmara Municipal de Almada, formulado pelo Sr. Deputado Bruno Vitorino; e à Câmara Municipal de Lisboa, formulado pelo Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.
Nas reuniões plenárias de 8 e 9 de Fevereiro - ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulado pela Sr.ª Deputada Ana Manso; ao Governo, ao Ministério do Ambiente e Ordenamento do Território e à Câmara Municipal de Santa Marta de Penaguião, formulados pelo Sr. Deputado António Nazaré Pereira; ao Ministério da Economia, formulado pelo Sr. Deputado Hermínio Loureiro; aos Ministérios da Cultura e do Ambiente e Ordenamento do Território, formulados pelo Sr. Deputado José Cesário; ao Ministério da Administração Interna, formulados pelos Srs. Deputados Machado Rodrigues e Manuel Oliveira; ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Mota Amaral e Ricardo Fonseca de Almeida; ao Governo e aos Ministérios do Trabalho e da Solidariedade e da Educação, formulados pelo Sr. Deputado Alexandrino Saldanha; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Agostinho Lopes; aos Ministérios do Equipamento Social e do Trabalho e da Solidariedade, formulados pelo Sr. Deputado Honório Novo; ao Ministério das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Joaquim Matias; aos Ministérios do Equipamento Social e do Planeamento, formulado pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Vicente Merendas; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Bruno Vitorino; e ao Ministério do Equipamento Social e à Câmara Municipal de Lisboa, formulados pelo Sr. Deputado João Rebelo.
Entretanto, o Governo respondeu a requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados:
No dia 9 de Fevereiro - Carlos Martins, na sessão de 31 de Maio; Agostinho Lopes e João Amaral, na sessão de 30 de Junho; Nuno Teixeira de Melo, no dia 31 de Julho; Luísa Mesquita, no dia 16 de Novembro; Honório Novo, na sessão de 28 de Novembro; Francisco Amaral, na sessão de 6 de Dezembro; João Rebelo, na sessão de 14 de Dezembro; Manuela Aguiar, na sessão de 3 de Janeiro; e Machado Rodrigues, no dia 16 de Janeiro.
No dia 12 de Fevereiro - Fátima Amaral, na sessão de 21 de Junho; Luís Fazenda, no dia 12 de Julho; Vicente Merendas, nas sessões de 26 de Julho e 28 de Setembro; Miguel Miranda Relvas, na sessão de 3 de Outubro; Margarida Botelho, na sessão de 4 de Outubro; José Eduardo Martins, na sessão de 25 de Outubro; Telmo Correia e Lino de Carvalho, no dia 21 de Novembro; Alves Pereira, na sessão de 19 de Dezembro; Carvalho Martins, no dia 11 de Novembro; e Carlos Parente Antunes, na sessão de 24 de Janeiro.
No dia 13 de Fevereiro - Rui Rio, no dia 2 de Novembro; Ricardo Fonseca de Almeida e Fátima Amaral, na sessão de 6 de Julho; Luís Fazenda, nas sessões de 28 de Setembro e 3 de Outubro; Vicente Merendas, nas sessões de 29 de Setembro e 19 de Outubro; Carlos Luís, no dia 17 de Outubro; José Eduardo Martins, na sessão de 2 de Novembro; e Adão Silva, na sessão de 18 de Janeiro.
Em termos de expediente, é tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Rosado Fernandes.

O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A intervenção política que vou proferir sobre a instrução pública e privada no nosso País não tem como intuito convencer esta Câmara de verdades consabidas; é mais uma forma de aliviar a minha consciência e de vos alertar para a realidade educativa que se nos depara, a nós e aos nossos filhos.
Ainda ontem, a minha bancada viabilizou um voto de apoio ao protesto dos estudantes, há poucos dias por nós presenciado e ouvido fora e dentro do edifício de São Bento. Moveu-nos mais a precariedade do futuro profissional dos que protestavam do que muitas das razões alegadas nos panfletos distribuídos.
Num ponto, porém, é impossível não se estar de acordo: estamos, mais uma vez, perante uma reforma do ensino básico e secundário, que se seguiu a outra reforma do ensino superior. Ainda uma reforma não se esgotou e já outra está na forja, concebida no silêncio dos gabinetes isolados da realidade, impondo novas configurações da instrução pública e privada, no modelo manualista que não deseja ter em conta as verdadeiras necessidades de um País integrado num espaço europeu do mundo ocidental e cada vez mais sujeito a uma concorrência desenfreada que o próprio mercado único nos impede de refrear administrativamente.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Contudo, os efeitos dessa concorrência podem ser minimizados pela competência profissional dos nossos concidadãos.
Os protestos que ouvimos dos estudantes do ensino secundário poderão ou não ter motivação partidária, mas em grande parte são provocados pela insegurança sentida quanto ao futuro, embora não se dêem conta de que o acesso ao ensino superior, o único sector de ensino que verdadeiramente interessa à grande maioria das famílias portuguesas, está, neste momento, atulhado de estudantes, os quais nem sempre estão vocacionalmente motivados, uma vez que a vocação individual é ignorada no nosso sistema de ensino, porque a montante deste nível de ensino não há suficientes ramos de instrução que garantam dignidade e saídas profissionais para preencher as necessidades da agricultura, que apesar de tudo ainda existe, da indústria e dos serviços.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, está muito ruído na Sala.

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Peço aos Srs. Deputados o favor de criarem condições que permitam ao Sr. Deputado Rosado Fernandes fazer a sua declaração política. Também peço às pessoas que estão a assistir nas galerias o favor de fazerem o mínimo ruído possível.
Faça favor de continuar, Sr. Deputado.

O Orador: - Srs. Deputados, estou a falar de instrução e não de educação, por isso não se preocupem.
Quando há dias, numa das nossas concorridas sextas-feiras, perguntei ao Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior se não pensava que tínhamos ensino superior a mais e ensino médio profissional a menos, respondeu-me que a sua missão era ocupar-se do ensino superior. Esqueceu-se que o ensino superior só poderá resultar como motor de desenvolvimento do País se tiver o ensino médio - que o liga ao terreno agrícola, industrial ou de serviços - a apoiá-lo, caso contrário, terá de contentar-se, depois de o sistema esconder o insucesso escolar, com o ingresso de licenciados, numa percentagem acentuada, na função pública, a qual, essa sim, pelo seu estatuto, lhes garante um futuro risonho e cheio de impunidade em que a última exigência é, na generalidade, a competência profissional.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sabemos que o ensino superior bem conduzido terá de ser dirigido para os sectores mais carenciados, que, como é do conhecimento geral, são as tecnologias, novas ou antigas, pois verificamos que os diplomados nesse sector não têm dificuldade em encontrar emprego. Noutros sectores, porém, como direito, história, filosofia ou bioquímica, sabe-se qual é a situação.
A pretexto da defesa da democracia e do livre acesso a todos aos mais altos graus de ensino tem-se criado, nos últimos anos, um fosso cada vez mais gritante entre ricos e pobres, com o pretexto de que a percentagem de licenciados em Portugal é inferior à dos países mais desenvolvidos, esquecendo-se de que a rácio dos diplomados não deve ser medida em relação à nossa população, mas, sim, em relação à riqueza produzida ou a produzir.
A verdade é que, na situação actual, são os mais ricos, não só de bens materiais, mas de cunhas políticas e familiares, que são encaixados nos lugares de Estado ou na política nacional!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Os mais pobres não só têm de frequentar as universidades privadas, como acabam muitas vezes no subemprego, depois de 16 ou 18 anos de custos e de estudos, como, por exemplo, atrás de uma caixa registadora de um grande supermercado.
Tudo nos indica que o chamado ensino médio - e apresso-me a chamar-lhe assim antes que os licenciados em ciências de educação lhe encontrem qualquer nome abstruso, próximo da motricidade humana ou da expressão física ou motora, vulgo ginástica -, que responda às necessidades do mercado português na sua componente privada e estatal, será a única forma de aliviar a enchente que já há muito rebentou os «diques» da universidade, cada vez mais caracterizada pelo ensino sebenteiro e pouco superior, e que ainda não enche as salas do ensino politécnico, porque este até agora não provou que é capaz de produzir diplomados que satisfaçam as necessidades básicas das actividades que há a desenvolver nas empresas e no Estado.
Dizem os dirigentes mais qualificados que conheço, e cuja opinião respeito, que não há meio de levar as famílias portuguesas a admitir que alguns dos seus filhos não têm vocação universitária ou politécnica, que, neste momento, são uma e a mesma coisa. Estamos, pois, certos que o desemprego generalizado e certamente alguma acção pedagógica de alguns governos as convencerá - mas já será tarde - de que mais vale um técnico profissional com trabalho do que um licenciado sem saber o que fazer.
As consultas que fiz a cerca de 170 escolas profissionais deste país convenceram-me de que o grau de empregabilidade dos seus alunos é de molde a atenuar o snobismo mais empedernido das famílias portuguesas. E dou alguns exemplos: cerca de 85% dos seus alunos encontram emprego assegurado em vários ramos, desde a hotelaria, à construção civil, à mecatrónica e sistemas informáticos, ao fabrico de queijo e à construção civil tradicional.
Uma coisa é certa: um pedreiro, um canalizador e um mecânico não diplomados, e muitas vezes com preparação deficiente, ganham mais e têm melhor qualidade de vida, sem que para tal necessitem de meter cunhas, do que muitos licenciados que à minha volta encontro, que se não fora o ambiente familiar que os rodeia teriam uma vida cheia de necessidades.
Sabemos que o ensino tecnológico proposto nos novos currículos dificilmente terá sucesso, a menos que venha a ser adaptado às necessidades do País e à realidade do seu povo, que é o que é e que nem sempre corresponde aos níveis do resto da Europa, que depois da última guerra foi construída não só com riqueza, mas com esforço, sacrifício e sobretudo com trabalho, noção tão detestada por tanta gente mas que é o fundamento da instrução, seja ela de que nível for.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sentimos que o sistema educativo português tem sistematicamente ignorado as diversas vocações da juventude e impedido que se siga o modelo que sugerimos, que se pratica nos países mais avançados, em que os alunos têm na escola preparação teórica que baste, passando o resto da semana a trabalhar, orientados por monitores, em empresas de todo o género.
Calculo que assim não acontecerá no nosso país, a menos que os representantes desta Câmara decidam que necessitamos de propor à nossa juventude um sistema mais prático, que os habilite a enfrentar os desafios que já lhes estão a ser movidos, o que levaria a preencher as lacunas existentes em pontos cruciais da nossa instrução de que vai depender o desenvolvimento do País.
Temos poder para alterar a situação actual, só duvido - e tenho razões para isso - que o façamos, porque o desejo de agradar à ilusão popular é mais forte do que a vontade de resolver os problemas do futuro de um povo inteiro.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Também para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Cirilo.

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O Sr. Luís Cirilo (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Venho, hoje, a esta Câmara falar-vos de problemas de cultura, não tanto da cultura mediática de Lisboa e do Porto - que tanto entusiasma os intelectuais e interessa aos jornais, mas pouco diz ao país real - mas, sim, da cultura que, apesar de tantas incompreensões, teima em existir lá fora, que tem os seus problemas para resolver e que, com todo o respeito pelo que se passa (ou deveria passar) nas grandes cidades, está farta de ser o parente pobre em muitas políticas.
Conscientes da importância que, para o País, têm os «centros culturais de Belém» e outros, sabedores da mais-valia das capitais de cultura que Lisboa foi, o Porto é, e Braga será ou não, variando a opinião do Sr. Ministro sobre o assunto na proporção directa do local em que se encontra, não podemos deixar de considerar, hoje e aqui, sem inveja mas com alguma mágoa, que os orçamentos afectados a uma só dessas realizações permitiriam, se racionalmente distribuídos pelo País, se não mais cultura, pelo menos, melhor cultura para todos.
Permitam-me, pois, que passe a alguns exemplos concretos retirados de um município do distrito de Braga, o tal distrito cuja capital, Braga, o Sr. Ministro da Cultura, falando no Porto, diz não ter condições para ser capital europeia da cultura, chegando a Braga afirma que, enfim, talvez, e, posteriormente, acabará, se calhar, por admitir que «Braga - Capital Europeia da Cultura» é o grande sonho da sua vida!
Mas é de Guimarães, cidade que candidata o seu inigualável centro histórico a património mundial, que venho hoje aqui falar-vos, citando três exemplos concretos de como, em Portugal, a cultura, quando nasce, ainda não é para todos.
O primeiro exemplo é a Sociedade Martins Sarmento, associação científico-cultural fundada em 1881, destinada, no seu início, à promoção da instrução popular no concelho de Guimarães, que rapidamente orientou as suas preocupações para a defesa do património cultural, tomando como base os legados do notável arqueólogo que foi Francisco Martins Sarmento, patrono da instituição.
Para além da actividade subjacente à manutenção, defesa e divulgação do riquíssimo património que lhe está confiado, no qual avulta a Citânia de Briteiros, exemplar magnífico da arte castreja em Portugal, destacam-se ainda relevantes serviços comunitários prestados pela sociedade, como sejam a entrada gratuita de público na sua biblioteca, que conta com mais de 80 000 volumes, e no Museu Martins Sarmento, bem como a visita igualmente gratuita à referida citânia de todos os grupos escolares e dos grupos de terceira idade.
Se a tudo isto juntarmos uma intensa actividade cultural, traduzida na realização de inúmeros seminários, colóquios e congressos sobre arqueologia, etnografia e municipalismo, na realização de centenas de conferências com destacados investigadores, cientistas e escritores nacionais e estrangeiros, a par da realização de mais de 1000 exposições sobre os mais diversos temas, ficaremos, pelo menos, com uma pequena ideia da importância que esta sociedade tem em termos de cultura e numa área de influência muitíssimo superior ao concelho em que está sediada.
Naturalmente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, esta relevante actividade cultural aqui traduzida, a par da manutenção e recuperação do património a seu cargo, que é muito e dispendioso, e o envolvimento da sociedade em novos projectos acarreta um vultuoso esforço financeiro que está para além das suas capacidades de gerar receitas.
Como tantas outras instituições que «produzem» cultura por sua conta e risco, a Sociedade Martins Sarmento, ao longo destes seus 119 anos de história, nunca recebeu um apoio condigno da autarquia e, do poder central, recebeu, em mais de um século, a espantosa verba total de 16 500 contos. Uma autêntica vergonha, Sr. Presidente e Srs. Deputados!
A insensibilidade do poder central, do Estado, em relação a esta benemérita instituição é de tal ordem que, na discussão dos dois últimos Orçamentos do Estado, o Governo e a maioria que o sustenta - às vezes com dificuldade, convenhamos - rejeitaram propostas apresentadas, em 1999, pelo PCP e, em 2000, pelo PSD para apoios a esta sociedade e à sua relevante actividade em prol da cultura. Esses apoios mereceram o voto favorável de toda a oposição, mas foram inviabilizados pelo Partido Socialista. É a cultura a que temos direito, Sr. Presidente e Srs. Deputados!…
O segundo exemplo é o Teatro Jordão. Esta tradicional e magnífica casa de espectáculos vimaranense, com mais de meio século de relevantes serviços prestados ao teatro, ao cinema, à revista e à musica, detentora do maior palco e fosso de orquestra existente a norte do Porto, por onde passaram os grandes nomes da cultura e do espectáculo como Amélia Rey Colaço, Amália Rodrigues, Laura Alves, João Villaret, Raul Solnado, os Trovante, entre tantos e tantos exemplos possíveis, encontra-se encerrada há alguns anos, em avançado estado de degradação, sem qualquer viabilidade na sua exploração por parte dos actuais proprietários.
Desta forma, mais que merecer, exige uma intervenção dos poderes públicos, de molde a permitir a sua recuperação e manutenção em funcionamento como verdadeira casa da cultura, não só de Guimarães como de toda a região. A exemplo, aliás, do que aconteceu no cine-teatro de Viana do Castelo, no Teatro Circo, em Braga, ou no Teatro Nacional de S. João, no Porto, onde autarquias e Estado foram capazes de dar as mãos na preservação de um património cultural verdadeiramente relevante e insubstituível.
Em Guimarães, Sr. Presidente e Srs. Deputados, da autarquia, o mais absoluto desinteresse, do Estado, apenas em 1992, pela voz do Secretário de Estado da Cultura de então, Dr. Pedro Santana Lopes, houve empenho efectivo na resolução do problema, esbarrando no já referido desinteresse da Câmara Municipal de Guimarães, então, como hoje, de maioria absoluta do Partido Socialista.

A Sr.ª Manuela Aguiar (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O terceiro e último exemplo é o Centro Cultural de Vila Flor.
Previsto pela Câmara Municipal de Guimarães como uma casa da cultura vimaranense, com valências diversas, da música ao teatro, seria também o substituto idealizado pela Câmara para disfarçar a sua notória incapacidade, aliás, partilhada pelo Estado, para resolver a contento o caso do Teatro Jordão e a sua transformação naquela que devia ser, de facto, a verdadeira casa da cultura.
Tendo encontrado receptividade para o efeito por parte do anterior titular da cultura, foi o projecto dotado de um ambicioso orçamento, na casa dos três milhões de contos, dos quais, cerca de 270 000 contos a investir ao longo do

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ano agora terminado, consoante protocolo atempadamente assinado entre Governo e autarquia, com a promessa do anterior Ministro da Cultura, face ao volume de investimento previsto, de disponibilizar mais algumas verbas do poder central para a edificação da obra, competindo o restante à autarquia de Guimarães.
A verdade, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é que na tradição de todos conhecida, e como imaginarão sem dificuldade, até à data nada foi feito, com uma agravante: o novo Ministro da Cultura, como se o protocolo não tivesse sido assinado por um ministro de um Governo socialista, presidido, aliás, pelo mesmíssimo Primeiro-Ministro, resolve não cumpri-lo, adiar o investimento e reanalisar todo o projecto.
Para este Governo, Sr. Presidente e Srs. Deputados - e as provas são tão evidentes quanto incontestáveis -, a cultura, em Guimarães, pode esperar, até desesperar.
Não investir, não fazer, adiar, mais do que traduzir as posturas do Executivo socialista perante, respectivamente, a Sociedade Martins Sarmento, o Teatro Jordão e o Centro Cultural de Vila Flor, são o retrato perfeito do Governo socialista que ainda temos, que na cultura, como noutras áreas, não investe, não faz, adia, até um dia!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, dispondo de 30 segundos.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Cirilo, depois de ouvi-lo com atenção, e como só disponho de 30 segundos, quero colocar-lhe telegraficamente uma questão.
Não lhe parece que este desgoverno socialista no que à cultura diz respeito, muito mais do que em Guimarães, é extensivo à generalidade do distrito de Braga, desde logo, por exemplo, ao concelho de Vila Nova de Famalicão, onde a única casa de espectáculos que existia, o cine-teatro Augusto Correia, foi pura e simplesmente encerrada porque o Governo entendeu que, de cultura, Famalicão já estava «cheia»?

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Cirilo.

O Sr. Luís Cirilo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, agradeço a questão que me colocou. Em boa verdade, não a considero sequer como uma questão, tão de acordo estamos quanto a esta matéria.
É evidente que, na área da cultura, e no distrito de Braga, há outros exemplos de incumprimento do Governo socialista. Aliás, muitos outros casos poderíamos citar da forma como o PS e o Governo tratam este distrito. Poderíamos falar, por exemplo, do PIDDAC, da auto-estrada Guimarães/Braga, do IC14, de Braga a Barcelos, do novo hospital de Barcelos, da linha férrea Porto/Nine/Braga.
Tantos e tantos exemplos poderíamos referir, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, a par do caso da cultura, em que lhe dou razão. Penso que todos nós teremos, com certeza, um papel a desempenhar para alterar este estado de coisas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para tratamento de assunto de interesse político relevante, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Sarmento.

O Sr. Joaquim Sarmento (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na era da mundialização em que vivemos, com o puro triunfo do económico, assistimos, no dizer de Eduardo Lourenço, à mais perversa «desideologização» do signo cultural, remetendo-nos o insigne ensaísta para os exemplos insólitos de Che Guevara ter ilustrado já, no âmbito da publicidade, o sucesso mítico das jeans e de a muralha da China ter servido de pano de fundo às performances da Renault.
Nesta vertigem, em que o cultural é apropriado como mercadoria, as tradições e os ícones imaginários das nossas comunidades locais e regionais são bolsas de resistência que merecem ser defendidas e preservadas.
Não admira que essa resistência à lógica do mercado pague um elevado preço, expresso na desertificação e na discriminação, mas vale a pena resistir e inverter a corrente mercantilista, de forma a que sejam os nossos valores culturais a condicionar as rotas económicas e turísticas.
Para os impormos não precisamos sequer de exorcizar a coca- cola, não precisamos de qualquer exorcismo para reclamar orgulhosamente a identidade do património histórico-cultural, com a sua memória revitalizante e a sua projecção para o futuro, enquanto fermento de progresso e desenvolvimento.
Nessa identidade entronca a candidatura do Alto Douro vinhateiro a património mundial. Está a UNESCO a fazer, presentemente, in loco, uma avaliação da proposta de candidatura, cujo deferimento em muito depende das garantias que formos capazes de dar à manutenção da paisagem, preocupações já salvaguardadas pelo Plano Intermunicipal de Ordenamento do Território, estabelecido pelo Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro, cujas orientações serão transpostas para os planos directores municipais.
A criação de um Gabinete do Alto Douro Vinhateiro e a Associação Promotora do Alto Douro para Património Mundial complementam essas garantias. A proposta tem todo o cabimento e, a vingar, como é a convicção de todos nós, abre amplas perspectivas aos durienses, às diversas instituições que se articulam com a mais velha região demarcada do mundo (Casa do Douro, Instituto do Vinho do Porto e diversas adegas cooperativas) e as que se forjaram com o horizonte de a complementarem, primordialmente, nas suas vertentes cultural e turística.
Refiro-me, quanto a estas, essencialmente, ao Museu do Douro, cuja sede será instalada na cidade de Peso da Régua, prevendo-se uma grande exposição programática, no segundo semestre de 2002, sobre as rotas do vinho do Porto, as rotas das vinhas de Cister, as rotas medievais do Douro, os comboios turísticos e históricos do Douro, a Bienal de Prata, sem esquecer a acção relevantíssima do Instituto da Navegabilidade do Douro.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - De notar que, nos últimos cinco anos, o fluxo de turistas passou de 6 000 para 123 000. Tem, por isso, todo o sentido a criação da Escola de Hotelaria e Turismo de Lamego e da Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Lamego, já ambas em pleno funcionamento, sendo um dos cursos desta última exactamente o de gestão

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turística, cultural e patrimonial, em clara compaginação com as necessidades do Douro.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Há, além disso, que aproveitar as sinergias resultantes do Programa Operacional da Região Norte, no âmbito da Acção Integrada de Base Territorial do Douro, programa inserido no III Quadro Comunitário de Apoio.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta é a hora ómega para o Douro, o qual, sem deixar de ser memória, terá que ser memória activa, projectada para a qualidade de vida das populações que o integram. Sem deixar de ser memória, enquanto espelho de uma identidade cultural singular, que é também «kantianamente» universal, terá que ser um instrumento de riqueza económica a gravitar, mas não só em torno desse produto emblemático da economia do Douro e do País, de forma imprópria designado vinho do Porto, indiscutivelmente uma das preciosidades enológicas internacionais e exemplo paradigmático da comunhão entre o cultural e o económico.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Nessa comunhão não cabem apenas os vinhos generosos do Douro, mas igualmente os excelentes vinhos de mesa, o azeite, o fumeiro, os queijos, a caça, o pão, numa moldura fluvial única, onde, como refere o Professor Gaspar Martins Pereira, «os socalcos de vinha cedem, a cada passo, lugar à vegetação aromática espontânea».
Mas todas estas riquezas têm a marca indelével de um património histórico inconfundível e o abraço humaníssimo de saberes e tradições que urge dimensionar, preservando e valorizando, e divulgar, agregando o que de relevante, no plano cultural, já foi feito a muitas outras acções que nesse patamar poderão ser prosseguidas.
A aposta decisiva do Ministério da Cultura nas gravuras rupestres do Vale do Côa deverá ser continuada a outros níveis, nomeadamente através do levantamento dos socalcos, adegas e armazéns antigos.
O museu da região do Douro poderá constituir um forte lenitivo a esse desiderato, podendo e devendo assumir-se como um verdadeiro museu de nível internacional.
A aposta da candidatura do Alto Douro vinhateiro a património mundial é, por conseguinte, um imperativo cultural, na defesa das raízes identitárias do Douro e um instrumento de desenvolvimento sustentado, a exigir destreza, criatividade e empenhamento de todos os agentes decisórios locais, regionais e centrais.
Vale a pena recordar de novo Miguel Torga, quando diz que «O Douro é, no mapa da pequenez que nos coube, a única evidência incomensurável com que podemos assombrar o Mundo».

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados António Nazaré Pereira e Medeiros Ferreira.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Nazaré Pereira.

O Sr. António Nazaré Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Joaquim Sarmento, foi com muito gosto que ouvimos falar da candidatura do Douro vinhateiro a património mundial, que o PSD apoia e deseja porque considera extremamente relevante para toda a região e para o País.
Sr. Deputado, há, no entanto, realidades no Douro de que o PS não pode estar alheado. Dizem respeito à situação da Casa do Douro e à infeliz tragédia que, nos últimos tempos, abalou a região. Assim, é com grande expectativa que gostaríamos de ouvir, por parte do seu partido, nomeadamente do Sr. Deputado, se é sua intenção apoiar a Casa do Douro com os meios de que necessita e reforçar as condições que as autarquias, neste momento, não têm para compor os prejuízos causados pelas últimas tragédias.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Uma vez que o Sr. Deputado Joaquim Sarmento pretende responder conjuntamente às duas perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira para formular o seu pedido de esclarecimento, sendo certo que o Grupo Parlamentar do PS dispõe apenas de 2 minutos.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, não necessito de todo esse tempo, pois só quero saudar o Sr. Deputado Joaquim Sarmento pela sua oração, pelo amor e o conhecimento que demonstrou em relação à região do Douro.
Já agora, Sr. Deputado, gostaria de perguntar-lhe até que ponto considera que uma acção conjugada dos órgãos de soberania poderá levar ao reconhecimento da região do Douro como património mundial.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Sarmento.

O Sr. Joaquim Sarmento (PS): - Sr. Presidente, antes de mais, quero agradecer aos Srs. Deputados António Nazaré Pereira e Medeiros Ferreira pelas questões que me colocaram.
Não tenho tempo para responder escalpelizando as questões que me foram colocadas pelo Sr. Deputado António Nazaré Pereira, mas em relação à tragédia que assolou o Douro quero dizer que o Governo tomou medidas drásticas e de execução imediata, que podem ser postas em prática em termos de candidaturas pelos lesados dessa região, nomeadamente das localidades que os Deputados da Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas e eu, na qualidade de Deputado do Douro, visitámos.
Portanto, esses apoios à reconstituição, sobretudo dos muros (ficaram destruídos 50 km de muros), podem ter execução imediata, estando o Governo com capacidade de resposta, ao contrário do que V. Ex.ª referiu.
Sr. Deputado Medeiros Ferreira, quero agradecer-lhe o contributo que deu com a sua curtíssima intervenção. Vindo de um homem que é um referencial da cultura deste país é profundamente gratificante ouvi-lo associar-se à candidatura do Douro vinhateiro a património mundial.
Julgo que esta é uma aposta que envolve todos os agentes económicos, sociais e culturais, nomeadamente os órgãos decisórios, do ponto de vista local, nomeadamente

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os autarcas, do ponto de vista regional, os órgãos desconcentrados, e o Governo.
Julgo que todos estão solidários na substância desta aposta.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Com a concordância de todos os grupos parlamentares, a Mesa vai conceder 3 minutos ao Sr. Deputado João Amaral para tratamento de assunto de interesse político relevante.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O sargento da Força Aérea Lima Coelho, da direcção da Associação Nacional de Sargentos, está a ser arguido num processo disciplinar por, na qualidade de dirigente, ter produzido declarações públicas a um órgão de comunicação social sobre questões do âmbito da associação que dirige.
Este processo disciplinar constitui uma grave inconstitucionalidade e uma desautorização institucional a raiar a provocação.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Constitui uma inconstitucionalidade ao violar os princípios constitucionais da proibição do excesso e da necessidade na limitação de um direito fundamental, como é o direito de expressão, que assiste àqueles dirigentes.
Constitui uma desautorização institucional ao afrontar uma associação que é recebida na Comissão Parlamentar de Defesa Nacional, na Presidência da República e - imagine-se! - pelo próprio Ministro da Defesa Nacional para abordar os mesmos assuntos das declarações agora postas sob processo. Aliás, nas sucessivas comemorações do Dia do Sargento, o dia 31 de Janeiro, abertas à comunicação social, têm estado representantes do Ministério da Defesa Nacional, da Presidência da República e da Assembleia da República, ao nível da representação pessoal do seu presidente, sendo que nelas a Associação Nacional de Sargentos aborda as mesmas questões que são objecto do processo disciplinar.
Finalmente, constitui uma quase provocação, porque os dirigentes da Associação Nacional de Sargentos, no termo de uma entrevista com o Ministro Defesa, foram precisamente por este convidados a produzir declarações à comunicação social sobre os exactos termos que agora motivam o processo.
Para além do vivo protesto que aqui, em nome do PCP, exprimo, fica a exigência de que seja reposta a legalidade constitucional e o espírito de diálogo e respeito pelos militares e suas estruturas, com o cancelamento imediato do processo.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Mas há duas questões que queria colocar aos Srs. Deputados. Primeira: qual é a posição do Partido Socialista e do Ministro perante esta situação? Cruzam os braços? O mínimo é que façam coincidir as palavras, mais ou menos simpáticas, que dirigem às associações com actos efectivos de garantia dos seus direitos. Onde está a palavra de condenação do processo e a decisão política de o fazer cessar?
A segunda questão tem a ver com a revisão do artigo 31.º da Lei da Defesa Nacional. Aqui têm, Srs. Deputados, o que resulta desta situação de inaceitável atraso na revisão deste artigo. Há anos que o PCP põe esta questão; nesta legislatura, há um ano que está um projecto de lei posto em cima da Mesa; e há anos que a Assembleia está tolhida.
Fica claro, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que a obstrução a uma revisão justa do artigo 31.º da Lei da Defesa Nacional contribui para inaceitáveis tentativas de limitações de direitos e é forçosamente fonte de instabilidade e conflitualidade indesejadas por todos.
Vão os Srs. Deputados deixar este artigo 31.º na mesma? Então, assumam todas as consequências. A responsabilidade do mau clima que isso provocará é vossa!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Eduardo Pereira, Carlos Encarnação e Basílio Horta. A Mesa concede 1 minuto a cada um.
Tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Pereira.

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Amaral, compreendo perfeitamente a situação que o senhor acaba de descrever. Eu próprio, como Presidente da Comissão de Defesa Nacional, recebi uma série de elementos sobre essa situação, que já despachei no sentido de que sejam analisados em conjunto.
Como o Sr. Deputado referiu, e muito bem, o problema de fundo, de substânca, é o da revisão da Lei da Defesa Nacional e das Forças Armadas e do seu artigo 31.º. Sabem muito bem o Sr. Deputado e esta Câmara qual a minha posição sobre este assunto e do meu empenhamento para continuar essa luta. Não lhe vou falar da posição do meu grupo parlamentar, embora ela seja clara, porque, da última vez que este assunto foi discutido, fomos ao encontro de uma solução que permitiria ter feito a revisão.
Renovo, pois, o meu agradecimento pela posição aqui colocada.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Amaral, quero dizer-lhe que, de facto, chegou a altura de resolvermos este problema e de, de uma vez por todas, esclareceremos a questão do associativismo militar e de o enquadrarmos, de acordo, eventualmente, com aquilo a que conseguirmos chegar, com o nosso vector de aproximação entre as várias orientações.
O que não se pode é assistir ao que se está a assistir neste momento: é o Governo e o Ministro da Defesa terem uma linguagem num momento e terem um comportamento noutro; é as coisas, ao mesmo tempo, serem permitidas e serem punidas. É, de facto, fundamental que esta incerteza não permaneça. E, perante esta incerteza que não pode permanecer, posso-lhe dizer, Sr. Deputado, que, muito brevemente, apresentaremos um diploma só sobre esta matéria: associativismo militar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Amaral, ouvimos a sua intervenção e com muita frontalidade e cordialidade lhe dizemos que não concordamos consigo. Entendemos que o artigo 31.º deve ser revisto e que o Governo deve fazê-lo com brevidade. Mas creio que esta Assembleia não é o local apropriado para discutir processos disciplinares e actos de hierarquia das Forças Armadas. Se abrimos esse princípio estamos a transformar a Assembleia da República em órgão de recurso hierárquico, estamos a meter-nos onde não somos chamados, estamos a afectar a disciplina das Forças Armadas, e para isso V. Ex.ª não contará com esta bancada.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - A Mesa concede também 1 minuto ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, que pediu a palavra.
Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (José Magalhães): - Sr. Presidente, pedi para usar da palavra tão-só e a título excepcional porquanto foi invocada aqui a atitude do Governo quanto à revisão do artigo 31.º da Lei da Defesa Nacional e das Forças Armadas.
Dessa matéria, posso dar, em primeira mão, à Câmara a notícia que corresponde ao compromisso que assumi na conferência de líderes: o Conselho de Ministros começou hoje a discutir, em primeira leitura, a respectiva proposta de lei, indo aprová-la, de resto, em leitura final, na próxima semana, e através da qual se visa proceder à revisão do artigo 31.º.
De acordo com o estatuto do direito de oposição - e a Lei de Defesa Nacional consta entre os itens quanto aos quais é obrigatória a consulta dos partidos da oposição -, haverá um conjunto de audições aos partidos da oposição para que se pronunciem sobre esta lei. Como sabem, esta lei carece de uma maioria qualificada de dois terços para ser alterada e muito nos congratularíamos se pudesse ser motivo de votação unânime ou muito alargada na Assembleia da República, para defesa da estabilidade das Forças Armadas e protecção dos direitos dos que delas fazem honrosamente parte.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, a Mesa concede 1 minuto ao Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, pode ser uma aquisição deste debate que há vontade de proceder à revisão do artigo 31.º. Mas esta «aquisição» já teve lugar não sei quantas vezes, tendo sido adiada não sei quantas vezes. É preciso que este ciclo termine.
Ninguém, aqui, quer criar dificuldades às Forças Armadas ou ingerir-se nas suas competências: nem eu, nem o Sr. Deputado Eduardo Pereira, nem todos aqueles que consideram que há um problema real nesta questão. O que todos queremos é dar estabilidade às Forças Armadas, clarificando com rigor toda esta matéria, para que não permaneçam e sucedam situações como esta.
A intervenção do Sr. Deputado Basílio Horta é a de quem não compreende isto e de quem quer, ao fim e ao cabo, manter uma situação, que, ela sim, é causa de instabilidade, é causa de dificuldades para as Forças Armadas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Não é verdade! É exactamente o contrário!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado António Capucho, a propósito de que matéria pediu a palavra para interpelar a Mesa?

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, é sobre o agendamento da declaração política a cargo do Sr. Ministro das Finanças, que se vai seguir na nossa ordem de trabalhos.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, é fundamental que se esclareça que o debate que se vai seguir é essencial, é importante, é sobre um tema muito relevante da actualidade política, mas que o grupo parlamentar socialista inviabilizou a presença do Sr. Ministro das Finanças em sede de comissão, onde haveria tempo para um debate aprofundado. Não apenas inviabilizou a presença do Sr. Ministro em sede de comissão, como inviabilizou um debate de urgência requerido pela bancada do CDS-PP,…

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - … que, necessariamente, teria um tempo de debate maior do que o que vai ter agora, que considero ridículo.
É, portanto, fundamental que fique claro, Sr. Ministro e Srs. Deputados, que o PSD não pode deixar de protestar pelo recurso a este expediente regimental da declaração política, em lugar ou de uma audição em sede de comissão, onde o tempo não é limitado, ou de um debate de urgência, tal como foi requerido.
Esclareço V. Ex.ª, e por isso interpelo a Mesa, que depende exclusivamente do Presidente da Assembleia da República o agendamento do debate de urgência. Portanto, lamento o recurso a esta figura, que vai no sentido de minimizar a possibilidade de os partidos da oposição debaterem, com o tempo necessário, uma questão fundamental.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - O Sr. Deputado levanta um problema de natureza política, e eu apenas posso dizer, estando, a partir de ontem à tarde, como Presidente em exercício, que o Governo recorreu ao n.º 2 do artigo 83.º do Regimento. E, como Presidente em exercício, nada mais posso fazer senão cumprir o Regimento.
Também para uma interpelação, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, queria dizer que o Sr. Deputado António Capucho tem quase

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totalmente razão, mas falta o «quase». É que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista não inviabilizou um debate no Plenário sobre esta matéria. O Partido Socialista pediu que o assunto fosse deliberado na próxima semana.

Risos do PSD.

O Partido Socialista continua a pensar que essa seria a melhor solução, mas o Governo entendeu seguir outro caminho. Vamos, pois, fazer o debate nos termos regimentais.
Mas o que se passou foi isto. Não houve nenhuma inviabilização, houve, sim, um pedido de adiamento do Grupo Parlamentar do Partido Socialista para que este assunto fosse tratado na próxima semana.
As razões foram aduzidas na conferência de líderes. No plano pessoal, continuo a mantê-las como válidas. O processo teve o desenvolvimento que teve. Naturalmente que estamos dentro das regras regimentais e não temos de nos opor a elas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas assim não há debate!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Também para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Sr. Presidente, ouvi o Sr. Deputado Manuel dos Santos com o maior interesse. E dado que a proposta de realização de um debate de urgência foi do meu grupo parlamentar, agradeço ao Sr. Deputado António Capucho a intervenção que acabou de fazer, porque vem muito no sentido da posição nossa bancada.
Mas, uma vez que o Sr. Deputado Manuel dos Santos diz não inviabilizar o debate de urgência, propunha que o Sr. Ministro fosse dispensado de estar aqui hoje e que procedêssemos ao debate de urgência! Mas o debate de urgência é decidido por nós..., o Governo ainda não tem essa capacidade...
Se o PS não inviabiliza o debate de urgência, connosco e com o PSD - seguramente o PCP também não inviabiliza - temos maioria nesse sentido.
Se outro for o entendimento, é evidente que mantemos o pedido que fizemos no sentido de o Sr. Ministro vir à Comissão de Economia, Finanças e Plano prestar os esclarecimentos necessários. Mas preferíamos dispensar o Sr. Ministro por agora e que se procedesse ao debate de urgência.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado Basílio Horta, as suas interrogações são dirigidas à condução dos trabalhos, e eu reitero aquilo que já disse: por parte do Governo, foi feito um pedido nos termos regimentais - está conforme o Regimento! -, pelo que a Mesa, sob a minha presidência, não pode fazer mais nada, senão, ao abrigo do n.º 2 do artigo 83.º, dar a palavra ao Sr. Ministro das Finanças.

Vozes do PSD: - E os tempos?

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Os tempos vão ser fixados. Penso que o Sr. Ministro terá 10 minutos, o PS 7, o PSD 5... Depois, o Sr. Ministro terá 5 minutos para responder. É a grelha do costume.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É uma grelha de rolha!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, a acusação que fez não pode ser feita à Mesa. É a grelha regimentalmente adoptada por conferência de líderes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - A crítica é ao Governo, não é à Mesa!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Ao abrigo do n.º 2 do artigo 83.º do Regimento, tem, pois, a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças (Pina Moura): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A minha vinda aqui hoje, neste período de antes da ordem do dia, destina-se a dar uma primeira informação à Assembleia da República da orientação e da acção do Governo no que respeita à situação autodenunciada pela actual direcção do Sport Lisboa e Benfica de grave incumprimento de obrigações fiscais deste clube e da respectiva sociedade anónima desportiva durante o mandato do Dr. Vale e Azevedo como presidente.
Tal situação de incumprimento configura, em princípio, um crime de abuso de confiança fiscal, cujas consequências, nos termos da lei em vigor, podem ser atenuadas apenas em função de uma atitude de autodenúncia da situação que a actual direcção do Sport Lisboa e Benfica, numa atitude responsável, praticou.
É neste quadro - aliás, aplicável a qualquer contribuinte nas mesmas circunstancias - que a situação fiscal do Sport Lisboa e Benfica clube e também do Sport Lisboa e Benfica, SAD tem de ser e está a ser regularizada.
Dada a dimensão e a natureza dos valores envolvidos, determinei, no meu despacho de 5 de Fevereiro, a constituição de uma equipa conjunta da Inspecção-Geral de Finanças e da Direcção-Geral dos Impostos com duas missões essenciais: primeiro, determinar o valor dos impostos em dívida, quer pelo Sport Lisboa e Benfica, SAD, quer pelo Sport Lisboa e Benfica, clube; segundo, analisar, em profundidade, as escritas destas entidades, bem como das entidades com estas envolvidas, designadamente várias sociedades ligadas ao anterior presidente do Benfica, para determinar eventuais irregularidades.
É hoje possível - e, por isso, pedi para vir aqui hoje, neste período de antes da ordem do dia - apresentar à Assembleia da República um primeiro balanço do trabalho até agora efectuado.
Posso informar a Assembleia de que está determinado o valor da dívida fiscal do Sport Lisboa e Benfica, SAD, tendo o respectivo relatório merecido a concordância do contribuinte, a quem já foi notificada a correspondente nota de cobrança.
Quer isto dizer que, a partir de hoje, o Sport Lisboa e Benfica, SAD dispõe de um prazo de 30 dias úteis para o seu pagamento, podendo então ser emitida a certidão de inexistência de dívidas.

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A segunda informação que gostava de prestar aos Srs. Deputados tem a ver com o facto de estar também estabelecida pela administração tributária a metodologia para a determinação das dívidas do Sport Lisboa e Benfica clube relativas aos exercícios de 1998, 1999 e 2000. Uma vez concluídos esses trabalhos, serão também emitidas as respectivas notas de cobrança, para permitir a sua liquidação e a total regularização da situação fiscal do Sport Lisboa e Benfica clube.
A terceira informação que gostaria de dar aos Srs. Deputados é a de que, do trabalho já feito na análise das relações económicas, financeiras e monetárias do ex-presidente do Benfica, directamente ou por intermédio de sociedades por ele controladas, com o Sport Lisboa e Benfica (SAD e clube), há indícios de irregularidades que impõem e justificam o prosseguimento e o alargamento da acção inspectiva.
Feito este ponto de situação, outra questão se coloca.
Porque não detectou a administração tributária o incumprimento verificado e que tipo de responsabilidades daí derivam?
Uma primeira evidência é a de que a Comissão de Acompanhamento da Situação Tributária dos Clubes, criada em 1998, falhou na sua missão.
Por isso, decidi, em 31 de Janeiro, substituir os seus membros, colocando-a na responsabilidade directa do Director-Geral dos Impostos, terminando, assim, com uma situação de diluição da cadeia hierárquica existente, na comissão e na relação desta com a administração tributária, desde o início.
É também evidente que a substituição da composição da comissão verificada e a clarificação da sua cadeia hierárquica não representam nem podem significar o encerramento do apuramento de responsabilidades e de avaliação da situação tributária de todos os clubes.
Por isso, tomei também as seguintes decisões: a nova comissão de acompanhamento recebeu, no quadro das suas funções, o mandato para apresentar, com brevidade, o diagnóstico da situação fiscal dos clubes, com prioridade para os da I Liga; em despacho de 5 de Fevereiro, determinei, como é de lei, ao Conselho Directivo da Administração Geral Tributária a realização de uma auditoria interna para apuramento total das causas e de eventuais responsabilidades, no âmbito da administração tributária, em relação à falha verificada; determinei igualmente ao Conselho Directivo da Administração Geral Tributária a elaboração de um conjunto de propostas de medidas que, no futuro, evitem a repetição de situações semelhantes.
Concluídos os trabalhos, quer da comissão de acompanhamento quer da auditoria interna que o Conselho Directivo da Administração Geral Tributária está a fazer sobre este caso, serão tomadas as decisões e tiradas as consequências que delas sejam decorrentes.
Para terminar, e antes de colocar-me à disposição das Sr.as e dos Srs. Deputados para responder às questões que queiram colocar-me, gostaria de sublinhar que este é, hoje, o estado do andamento deste processo. Quis dar conta dele porque, hoje, pela primeira vez, tenho resultados concretos para apresentar à Assembleia.
Em segundo lugar, quero sublinhar que a possibilidade de, já hoje, trazer a esta Assembleia resultados concretos quanto ao apuramento da situação fiscal do Sport Lisboa e Benfica resulta de uma atitude de colaboração total da actual direcção do Sport Lisboa e Benfica com a administração fiscal, ao longo de oito dias de trabalho permanente, com vista à avaliação e ao levantamento de toda a situação tributária, nomeadamente do Sport Lisboa e Benfica, SAD.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Inscreveram-se os Srs. Deputados Maria Celeste Cardona e Octávio Teixeira.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP) - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, curiosamente, o CDS, que foi o partido que pediu o debate de urgência, apenas vai dispor de 3 minutos neste debate para discutir um problema que ultrapassa em muito o que o Sr. Ministro aqui veio dizer.
Quero começar por dizer-lhe, Sr. Ministro, que há um equívoco que importa desmistificar.
Nós não pretendemos discutir cada caso concreto de cada dívida de cada agente desportivo, empresa ou cidadão. Não é essa a nossa função nesta Casa, não é assim que entendo a função fiscalizadora da Assembleia da República no que toca aos actos governamentais.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - Interessa-me muito mais do que isso, Sr. Ministro das Finanças. Por isso lhe pedi - e espero que o senhor se disponibilize para o efeito - que vá a Comissão de Economia, Finanças e Plano deslindar esta bela trapalhada em que o senhor e o Governo se envolveram.
O senhor criou uma comissão de acompanhamento. Sr. Ministro, acompanhou o quê? Parece que a tal comissão podia emitir certidões, acompanhar o cumprimento das dívidas a serem pagas ao abrigo do Plano Mateus…
Mas há mais, Sr. Ministro das Finanças. É que, no caso vertente, essa adesão ao Plano Mateus traduziu-se por dações em pagamento que tinham a ver com o regular cumprimento das obrigações fiscais.
E, pasme-se!, quem declarou aos serviços competentes da administração fiscal, que têm por missão arrecadar os impostos, foi, justamente, o contribuinte!

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - É verdade!

A Oradora: - Apetece-me recordar uns ditos que há uns tempos se utilizavam no âmbito de alguns clubes desportivos. Dizia-se, então: «Bom, formalmente está pago. Quanto a dinheiro, isso é outro problema…!» Só que, Sr. Ministro das Finanças, aqui está em causa dinheiro que o Estado tem direito a arrecadar.
Já agora, Sr. Ministro, vou citar-lhe um caso de que dei nota esta semana.
O sistema informático da segurança social, detectou um erro - e bem! - de 151 «mil réis» por atraso de um dia na entrega de uma comparticipação.
Ora, se, no dia 20 de cada mês, tem de fazer-se entrega da declaração modelo 42 para efeitos de entrega das retenções na fonte relativamente aos salários, como é possível que nada tenha acontecido no caso do Sport Lisboa e Benfica, Sr. Ministro das Finanças? Foram as ditas declarações falsificadas? Foram as ditas declarações entregues com erros, omissões e inexactidões? Foram as

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ditas declarações falsificadas? Foram as ditas declarações entregues com erros, omissões e inexactidões? Foram as ditas declarações entregues formalmente correctas mas sem o «dinheirinho» incluído, Sr. Ministro? Foi isso que aconteceu?
Perante isto, e não só, pergunto-lhe, por fim: como é que, sob a sua orientação, sob a sua responsabilidade, foi isto possível, Sr. Ministro das Finanças?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro, gostaria de começar por dizer que, independentemente da declaração que acabou de fazer, julgo que há toda a vantagem, toda a utilidade e a necessidade de, em sede de uma comissão, se poder analisar esta questão em mais pormenor e com mais tempo.

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Claro!

O Orador: - Parece-me que isso é importante porque, de facto, há muitas questões que vão continuar a suscitar dúvidas, pelo menos por parte do meu grupo parlamentar e de mim próprio.
Aliás, a primeira questão que vou colocar já aqui foi suscitada.
Não quero afirmar peremptoriamente, mas julgo que uma das exigências para um determinado clube de futebol poder inscrever-se para disputar uma prova nacional no âmbito da I Liga era a de apresentar uma declaração de que tinha em dia todas as suas obrigações fiscais. Ora, se, no caso concreto, o Sport Lisboa e Benfica foi inscrito e tem disputado as provas que se sabe, a minha bancada parte do princípio de que as entidades competentes tiveram perante si uma declaração segundo a qual estavam cumpridas as obrigações fiscais. Se assim tiver acontecido, é preciso apurar as responsabilidades, é preciso ver quem fez essa declaração, como a fez, porque a fez e como é que a mesma pôde ser feita sem que tal tivesse sido detectado por mais ninguém a não ser pelo próprio que a terá feito.
A segunda questão tem a ver com o problema da comissão de acompanhamento.
O Sr. Ministro tomou de imediato a medida de demitir os elementos que compunham a comissão de acompanhamento. Ora, numa situação destas, pergunto, Sr. Ministro, se foi suficiente a demissão das pessoas que integravam aquela comissão,…

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - … se, possivelmente - e não faço a afirmação peremptória -, não haverá a necessidade de apurar outras responsabilidades pelo facto de aqueles elementos não terem acompanhado o que estavam obrigados a acompanhar.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - É, pois, fundamentalmente neste sentido que intervenho, Sr. Ministro, repetindo o que disse de início. Para total clarificação desta situação, é certamente conveniente que o Sr. Ministro se reúna com uma comissão parlamentar para aí serem analisadas as questões mais em pormenor e por forma a que a análise de todos os outros clubes, incluindo o meu, seja de facto feita e levada às últimas consequências.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, não vou perguntar-lhe qual é o seu clube…

Risos.

Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Hermínio Loureiro.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, em 23 de Março de 1998, foi nomeada uma comissão de acompanhamento das dívidas dos clubes. Os objectivos da comissão foram definidos de uma forma clara e objectiva. Passados 1043 dias, mais concretamente em 5 de Fevereiro de 2001, o Sr. Ministro das Finanças demitiu a comissão, criando uma outra de imediato. A mera demissão sem a assunção de responsabilidades é um acto de fraqueza do Governo que coloca em causa a confiança dos contribuintes.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Pensava, então, o Sr. Ministro que tudo estava resolvido e que tudo ficava branqueado - assunto encerrado.
Engana-se Sr. Ministro, mais uma vez, tal como em todas as suas previsões, o Sr. Ministro falhou, o Sr. Ministro voltou a errar.
Nós queremos, nós exigimos: os portugueses, todos sem excepção, merecem uma explicação para o sucedido e um rigoroso apuramento de responsabilidades. Para além de ser uma questão que toca o mundo do desporto é, obviamente, como hoje se comprova, um assunto político de elevada importância.
Para se atingir este estado actual existiu um conjunto de falhas e omissões que retiram credibilidade a todo o sistema fiscal e, por consequência, ao Governo e ao próprio Estado. Demonstra bem as fragilidades da máquina fiscal.
Se a direcção do Sport Lisboa e Benfica não tem denunciado esta situação, com coragem e sentido de responsabilidade, tudo continuaria como antes. O Governo não pode ter desculpa. Nada fez quando, ainda há bem pouco tempo, o combate à evasão fiscal era uma das prioridades.
A questão impõe-se: que moral tem o Sr. Ministro para fazer exigências, quando não é capaz de detectar uma falha de 2 milhões de contos?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro, não fuja às suas responsabilidades. A culpa não pode morrer solteira. A responsabilidade não pode ser nem do computador, nem do funcionário A ou do funcionário B. A responsabilidade política é sua, Sr. Ministro, e o senhor vai ter de a assumir. O seu Ministério não teve nenhuma intervenção, nem mesmo de acompanhamento. Verificou-se, no mínimo, uma grave negligência em relação ao próprio Estado e não menos preocupante em relação à verdade desportiva, não respeitando as regras de equidade que se exigem.

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Quais terão sido os motivos que levaram o Governo, de forma declarada, a pecar por omissão ou a ser cúmplice nesta questão?
Não quero acreditar naquilo que muitos dizem, que a inércia do Governo tem alguma relação com actos eleitorais.
Sr. Ministro, diga-me, olhos nos olhos: a comissão de acompanhamento, agora demitida, entregava os relatórios ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e este, por sua vez, informava o Sr. Ministro desta triste, grave e preocupante situação?
Sim ou não, Sr. Ministro?
Acha o Sr. Ministro que basta ter demitido os funcionários da comissão?
Quem vai ser responsabilizado, política e criminalmente?
É necessário proceder-se a uma avaliação realista e rigorosa. Não podemos nem devemos continuar a viver na ilusão de que tudo está bem.
Falei em «rigor». É o que falta a este Governo, pois não consigo perceber como, ainda ontem, o Sr. Ministro das Finanças demonstrou publicamente algumas dúvidas sobre qual dos ministérios envolvidos detém a responsabilidade política do Plano Mateus.
Sr. Ministro, permita-me um conselho: se tem dúvidas, elas devem ser discutidas em Conselho de Ministros e não, nunca, na praça pública!
Mas, Sr. Ministro, a dúvida só podia ser entre as Finanças e a Economia. Ora, como bem se lembra, era a mesma pessoa, por coincidência o mesmo que agora tem dúvidas!
Já agora, Sr. Ministro, onde estão os relatórios que, trimestralmente, o Governo está obrigado a entregar de acordo com o artigo 20.º da lei Mateus? Que eu saiba, os relatórios não foram entregues.

O Sr. David Justino (PSD): - Zero!

O Orador: - E agora, Sr. Ministro, quem vai ser demitido?
Não defendemos critérios nem regimes de excepção, defendemos o principio da igualdade. Não podem existir discriminações entre os clubes e a generalidade da população. Todos têm de ser tratados por igual. Os mecanismos a adoptar têm de estar ao alcance de um qualquer contribuinte. Nesta matéria, não cedemos nem um milímetro.
Este caso é a prova mais evidente de que tínhamos razão quando colocámos em causa a verdadeira vontade do Governo numa pretensa reforma fiscal que combata a evasão e a fraude fiscal.
Que moral tem o Sr. Ministro para falar, por exemplo, de sigilo bancário? Que confiança podem ter os contribuintes?
Nós exigimos rigor e responsabilidade ao Governo socialista.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, antes de prosseguirmos, quero anunciar que assistem hoje à reunião plenária 48 alunos da Escola Secundária Dr. João Carlos Celestino Gomes, de Ílhavo, 50 alunos da Escola Secundária Anselmo Andrade, de Almada, 70 alunos da Escola Secundária Carolina Michaelis, do Porto, 45 alunos do Externato D. Duarte, do Porto, 40 alunos da Escola Secundária do Rodo, de Peso da Régua, e 50 alunos da Escola Conde de Oeiras.
Para todos a saudação do Plenário.

Aplausos gerais, de pé.

Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Laurentino Dias.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, Sr. Ministro da Juventude e Desporto, Sr. Secretário de Estado: Antes de mais, quero manifestar ao Sr. Ministro das Finanças o meu reconhecimento pela forma clara como quis trazer a este Plenário o ponto de situação de uma questão que, não sendo a questão geral de que falava a Sr.ª Deputada Celeste Cardona, é a questão específica de que falavam todos nestes últimos quinze dias.
Como é que não queriam que o Sr. Ministro viesse aqui falar especificamente sobre esta questão se, nestes últimos quinze dias, se fartaram de «atirar pedras», à direita e à esquerda, sobre esta questão? Quando quiserem, também discutiremos aqui todas as outras questões.
Com alguma autoridade moral, com alguma legitimidade moral…

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Alguma, mas pouca!

O Orador: - Já agora, pode ser pouca em relação a si, Sr. Deputado, mas talvez seja muita em relação a quem acabou de intervir antes de mim!

Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos do PSD.

O Orador: - Com muita autoridade moral, confrontando estes últimos 4 ou 5 anos de Governo do PS com os 10 anteriores anos de Governo do PSD.

Vozes do PSD: - É a «pesada herança»!

O Orador: - Os senhores lembram-se da última vez que aqui foi discutida a relação do Estado com os clubes desportivos e com os clubes de futebol? Lembram-se? Ao tempo do Governo dos Srs. Deputados Durão Barroso, Manuela Ferreira Leite e outros… Lembram-se?

Vozes do PSD: - Bons tempos!

O Orador: - Que autoridade moral tem o PSD para vir dizer o que acabou de dizer quando, ao longo de 10 anos, o que o Governo do PSD fez, na sua relação com os clubes desportivos e com os clubes de futebol, foi um faz-de-conta, puro e completo,…

Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos do PSD.

O Orador: - … apenas disfarçado com uma penhora - de efeito fantástico! - no Estádio das Antas?

Aplausos do PS.

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Lembram-se, certamente, pois foram aqui ditos esses números, qual era o montante do débito dos clubes desportivos ao fisco e à segurança social dos «vossos» 10 anos de responsabilidade no Governo? Lembram-se de quanto era? Lembram-se do que fizeram sobre isso?

Protestos do PSD.

A nove anos e meio do vosso mandato, ou seja, a meio ano de eleições e de deixarem de ser Governo, o Ministro Catroga trouxe aqui algumas iniciativas legislativas. Não chegou a aplicá-las, nem os clubes que a elas queriam aceder ou a elas pensaram em aceder estavam em condições de aceder, porque ninguém pagava a ninguém, com a vossa completa cumplicidade!
Portanto, meus caros amigos, não falemos de autoridade moral, nem de responsabilidade, nem de legitimidade, porque a este respeito estamos conversados.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Mais uma vez, a culpa é do Cavaco!

O Orador: - Sr. Ministro das Finanças, para me ajudar neste raciocínio, pergunto-lhe o seguinte: está em condições de informar esta Câmara sobre qual o montante arrecadado pelo Estado, no âmbito do Plano Mateus, nestes últimos cinco anos? Isto é para sabermos se, bem ou mal, o Estado e o Governo têm cumprido a sua função de cobrar aos clubes desportivos e aos clubes de futebol aquilo que, em termos legais, é devido ao Estado.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - E o artigo 20.º?

O Orador: - Srs. Deputados, não estou a fazer o tradicional discurso - já basta ouvi-lo na praça pública - de que a política nada tem a ver com o futebol e de que, de vez em quando, é preciso «castigar» o futebol para no entretanto podermos «dar beijinhos e abraços» e estar nas tribunas VIP dos campos de futebol. O meu discurso nada tem a ver com isto.
Sr. Deputado Hermínio Loureiro, recomende, por favor, ao Sr. Presidente do PSD, Dias Loureiro,…

Risos do PSD e do CDS-PP.

… ou, melhor, ao Sr. Presidente do PSD, Durão Barroso, que quando quiser discutir estas matéria, olhos nos olhos -…

Risos do PSD.

… isto foi futurologia, nada tem a ver com nada, peço imensa desculpa! -…

Risos.

Foi algo em que andei a pensar há tempos!

Risos.

Mas, como eu estava a dizer, recomende ao Sr. Presidente do PSD que quando quiser tratar deste assunto, olhos nos olhos, não precisa de ir muito longe, porque tem aqui quem explique tudo sobre o futebol e sobre o mundo do futebol: os Srs. Deputados Hermínio Loureiro, Hugo Velosa, Santana Lopes, Montalvão Machado, David Santos, que é presidente da SAD do Farense, Luís Cirilo, que é Secretário-Geral do Vitória de Guimarães, tantos e tantos que podem explicar-lhe, mas explicar mesmo, quais são os limites da autoridade moral que aqui querem arrogar-se e quais são as obrigações do Estado para com os clubes desportivos e para com os clubes de futebol, sem prejuízo das responsabilidades que esses clubes desportivos e esses clubes de futebol têm de ter.

Protestos da Deputada do PSD Manuela Ferreira Leite.

Não tenha quaisquer dúvidas, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, porque o irmão de V. Ex.ª também poderá explicar-lhe, também sabe destas coisas!

Risos do PS.

Sr. Ministro e Srs. Deputados, quando quiserem, o Partido Socialista está pronto para assumir as suas responsabilidades nesta matéria enquanto grupo parlamentar e também enquanto Governo.
Já quisemos, um dia, convosco discutir com seriedade a situação financeira e, eventualmente, o saneamento financeiro dos clubes desportivos de que vocês tanto gostam quando é preciso gostar. Não o quiseram fazer connosco, mas continuamos disponíveis para o fazer, mesmo com as vossas ameaças.

Risos do PSD.

Já agora, permitam-me que diga o seguinte: não ameacem só com a constituição de uma comissão de inquérito sobre esta matéria, requeiram-na! Para tal basta um papel com x nomes por baixo! Requeiram-na, apresentem-na e vamos a isso! Mas os senhores assumem a responsabilidade dos resultados de um inquérito desta natureza, das respectivas consequências, dos papéis que todos vamos ler, escrever, requerer e mandar não sei para onde!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Façam isto, não ameacem! E, por amor de Deus, respeitem quem neste Governo tem feito e continuará a fazer os possíveis por honrar os seus compromissos, garantindo que os clubes desportivos paguem o que têm de pagar, em vez de fazer o que os senhores fizeram durante todos estes anos: fechar os olhos a uma situação verdadeiramente indecorosa!

Aplausos do PS.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito regimental da defesa da honra da bancada.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, uma vez que foi insinuado que a bancada do PSD não tinha a

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coragem política para ir até onde deveria ir, na opinião do Sr. Deputado Laurentino Dias, que passou 7 minutos a «deitar bolas para fora e a colocar-se em situação de off-side», quero dizer, Sr. Deputado Laurentino Dias, que quem inviabilizou um debate sério sobre esta matéria foi a bancada socialista, que objectivamente recusou…

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

… a presença do Sr. Ministro em sede de comissão, que objectivamente recusou um debate de urgência sobre esta matéria e que apenas favoreceu…Ou, melhor, presumo que tenha sido o Sr. Ministro das Finanças, Pina Moura, a dizer: «Desculpem lá, deixem-me ir explicar o que entendo que devo, como explicações, à Assembleia da República».
Sr. Deputado Laurentino Dias, leia a lei! Quem não remete as informações à Assembleia da República é o Sr. Ministro, que, a propósito do Plano Mateus, as deve remeter trimestralmente. Só que, até hoje, «zero»! Portanto, não esteja a pedir informações ao Sr. Ministro para si; peça-lhe antes que envie os relatórios à Assembleia da República.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quanto ao essencial, e para terminar, Sr. Deputado Laurentino Dias, ficámos a saber que V. Ex.ª não discutiu o objecto da declaração política, limitou-se a concluir que, em matéria de política desportiva, o culpa dos nossos males é do Professor Cavaco Silva.

Vozes do PS: - E é!

O Orador: - É elucidativo!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Laurentino Dias.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Capucho, não carece de explicações a sua intervenção. Reafirmar-lhe-ei o meu propósito e a minha disposição: já que VV. Ex.as têm posto, nestes últimos dias e por várias vezes, «a bola na marca de penalty», «chutem», se faz favor!

Aplausos do PS.

O Sr. António Capucho (PSD): - Vocês têm medo!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem, agora, a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, muito obrigado pelas questões que me foram colocadas, às quais procurarei responder de forma sintética.
Começo pelas questões concretas colocadas pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira.
Sr. Deputado, a disponibilidade, tanto do Governo como minha, para irmos a comissão, mal tenhamos mais informação e a situação apurada no que respeita a este problema, é total. Aliás, tive oportunidade de o dizer na minha intervenção.

Protestos do PSD.

Srs. Deputados, agradecia que me dessem licença para prosseguir.
Pedi para intervir hoje, aqui, antes da ordem do dia, para dar esta informação à Assembleia da República, porque hoje, exactamente hoje, o Sport Lisboa e Benfica, Sociedade Anónima Desportiva, foi notificado da dívida que tem. O relatório foi ontem entregue, a título provisório, à direcção do Sport Lisboa e Benfica e, também ontem, a direcção do Sport Lisboa e Benfica deu o seu acordo a esse relatório. Como eu dispunha de elementos novos, vim à Assembleia.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - É pouco!

O Orador: - Portanto, a disponibilidade para se discutir e informar tudo o que haja para informar sobre esta matéria, no quadro legal existente, é, tanto da minha parte como da parte do Governo, total.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado Octávio Teixeira perguntou-me se tinha sido suficiente ter substituído a Comissão de Acompanhamento da Situação Tributária dos Clubes. Ora, a esta questão respondi claramente na minha intervenção, dizendo que a substituição desta comissão de acompanhamento partiu de uma situação de facto: a comissão falhou e não nos informou! Porém, foi o início de um processo de apuramento de responsabilidades, que está em curso com uma auditoria interna que abri e da qual encarreguei a administração geral tributária, e que vai prosseguir nos próximos dias, para além da avaliação da situação dos outros clubes que incumbi à comissão de acompanhamento.
Em relação às perguntas formuladas pela Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona, quero dizer que há uma grande contradição na forma como coloca a questão: por um lado, diz que não vem aqui para discutir um caso concreto e, por outro, pergunta-me que explicações tenho eu para deslindar «esta bela trapalhada»! Portanto, é absolutamente contraditório.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Não é, não!

O Orador: - Aliás, Sr.ª Deputada, quero dizer-lhe que, independentemente de todas as responsabilidades que vão ser apuradas, a prova de que pode haver situações de falha da administração fiscal na detecção de situações de contribuintes reside no facto de a própria lei valorizar as situações de autodenúncia dos contribuintes quando estejam em situação irregular.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Claro!

O Orador: - Não, não é claro, Sr.ª Deputada! Quero dizer que esta situação está prevista na lei, apesar de ser indesejável que falhas destas existam por parte da administração tributária.
No que respeita às questões colocadas pelo Sr. Deputado Hermínio Loureiro, gostava de dizer que a

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intervenção que proferiu não foi sobre a questão que me trouxe aqui.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Ai não?!

O Orador: - Aqui trouxeram-me duas questões: primeira, esclarecer que um contribuinte que está em falha tem de regularizar a sua situação de acordo com as regras iguais para todos os contribuintes e, segunda, dizer que as falhas que tenha havido, e algumas já foram detectadas, na administração fiscal no que respeita a esta matéria têm de produzir consequências. Foi isto que cá vim dizer.
O Sr. Deputado Hermínio Loureiro quer usar este caso para atacar o Governo e politizar esta questão.

Risos do Deputado do PSD Hermínio Loureiro.

Muito bem! Então, também vou responder-lhe nesse plano, dizendo-lhe o seguinte: é evidente que foi uma falha grave não terem sido detectados 2 milhões de contos em falta com a administração.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - É evidente que foi uma falha grave!

Protestos do Deputado do PSD Hermínio Loureiro.

Sr. Deputado, deixe-me acabar e ouça o que tenho para dizer - e aproveito para responder ao Sr. Deputado Laurentino Dias.
Tenhamos em conta que o Plano Mateus foi lançado para recuperar dívidas ao fisco e à segurança social até 1995, autodeclaradas pelos contribuintes, as quais também não foram detectadas pela administração tributária, no montante de 520 milhões de contos. E, destes 520 milhões de contos, o Estado recuperou, até hoje, 267 milhões de contos.

Aplausos do PS.

Há um segundo aspecto que é muito importante sublinhar. O Sr. Deputado Hermínio Loureiro saltou desta questão para, uma vez mais, atacar a reforma fiscal - e aqui é que bate o ponto, Sr. Deputado! Com o discurso e com o ataque que fez à administração tributária, o Sr Deputado está a querer desestruturar um dos corpos fundamentais do Estado que tem ao serviço…

O Sr. David Justino (PSD): - Já está, Sr. Ministro!

O Orador: - Não está, não, Sr. Deputado! E já vou dizer por que é que não está!
Dizia eu que, desta forma, o Sr. Deputado está a querer desestruturar um dos corpos fundamentais do Estado que tem ao serviço do Estado português uma enorme prestação pública…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Queira concluir, Sr. Ministro, pois já ultrapassou o tempo regimental.

O Orador: - Peço-lhe, Sr. Presidente, só mais alguns minutos para acabar.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Não posso dar-lhos, Sr. Ministro. Tem mesmo de concluir.

Vozes do PSD: - Fica para o debate de urgência!

O Orador: - Sr. Presidente, não pude usar todo o tempo de que dispunha, porque estive constantemente a ser interrompido.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Dispõe apenas de mais 30 segundos, Sr. Ministro.

O Orador: - Obrigado, Sr. Presidente.
Quero apenas dizer ao Sr. Deputado Hermínio Loureiro que, precisamente porque não estamos a desestruturar mas, sim, a fortalecer a administração tributária, hoje, só para falar em rede informatizada da administração, existem 30 serviços centrais da Direcção-Geral dos Impostos informatizados e quando os senhores saíram do Governo havia «zero»; há hoje 325 serviços locais de cobrança informatizados e quando os senhores saíram do Governo havia 29; há hoje 217 tesourarias informatizadas e quando os senhores saíram do Governo havia «zero»!

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Faça favor de concluir, Sr. Ministro.

O Orador: - Não vá, pois, pelo caminho da politização deste meio.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, deram entrada na Mesa quatro votos que versam a mesma matéria, embora em perspectivas não totalmente coincidentes. Como não dispomos de tempo para os discutir, um a um, caso estejam de acordo, sugiro que se faça a discussão conjunta dos votos, dispondo cada grupo parlamentar de 3 minutos para o efeito.

Pausa.

Visto não haver objecções, estão em discussão os votos n.os 126/VIII - De protesto pela violência que tem vitimado a comunidade portuguesa na África do Sul e pela resposta dada à mesma pelo Ministro da Defesa e Segurança daquele país (CDS-PP), 127/VIII - De protesto contra as declarações do Ministro da Defesa e Segurança da África do Sul em relação à comunidade portuguesa (PSD), 128/VIII - De pesar pelo falecimento das vítimas de assaltos e de crimes mortais na África do Sul (PCP) e 129/VIII - De solidariedade para com as vítimas da criminalidade violenta na África do Sul, nomeadamente os portugueses (PS).
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Aguiar.

A Sr.ª Manuela Aguiar (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A comunidade portuguesa na África do Sul é uma grande comunidade em todos os sentidos, porque é uma comunidade constituída não só por mais de 0,5 milhão de pessoas como também por gente honesta, com um grande dinamismo e uma grande capacidade de empreendimento, que goza do respeito e do apreço do povo e dos políticos da África do Sul.

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O relacionamento da comunidade portuguesa com os políticos da «nova» África do Sul tem sido excelente e muitas das nossas associações têm sido mais ajudadas ao longo destes últimos anos do que o foram no regime do apartheid, que todos repudiamos.
Há um problema grave na África do Sul, sobretudo na região de Joanesburgo e de Gauteng. É o problema do crime, que não tem atingido particularmente os portugueses como portugueses mas por muitos deles serem comerciantes, sendo por isso vítimas prioritárias de acções de banditismo.
Em cinco anos foram mais de 300 os portugueses assassinados na República da África do Sul. É uma estatística tenebrosa, que não tem paralelo em qualquer outra comunidade portuguesa do mundo.
Os portugueses têm-se sentido abandonados. Abandonados, também, pelo seu Governo, que já devia, há muito, como um dos votos salienta - e muito bem! - o do Partido Comunista Português, ter organizado serviços de apoio à comunidade portuguesa, apoio psicológico e financeiro às famílias das vítimas. E são os próprios portugueses, alguns portugueses, que, a partir de uma paróquia católica, o estão a tentar. Organizaram uma marcha de protesto contra o crime! Contra o crime, repito! Não é contra a África do Sul! É pela África do Sul, pela paz na África do Sul! Foi isto que os portugueses fizeram. E fizeram porquê? Porque acreditam que a África do Sul é uma democracia. Há liberdade! Há liberdade de sair à rua! Há liberdade de se dizer o que se pensa! Foi nisto que os portugueses acreditaram. Foi esta a mensagem que eles foram levar ao governo da África do Sul. Foi também, digamos, uma atitude de amor pela África do Sul, de vontade de mudar para melhor! Foram dizer ao governo da África do Sul que querem a mudança positiva no controlo da segurança, da ordem, da paz.
Não se compreende, por isso, a reacção isolada de um ministro, que responde a críticas construtivas com insultos, talvez porque reconheça a sua incapacidade para garantir a ordem e a paz no país.
Não podemos tolerá-lo, e, por isso, solidarizados com a nossa comunidade da África do Sul, pedimos ao Governo português uma resposta firme contra os insultos, exigindo uma reparação pública da ofensa feita a uma comunidade ordeira, pacífica, honesta, leal e tolerante, como é no seu conjunto a comunidade portuguesa.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS-PP apresentou um voto de solidariedade e de protesto em relação aos acontecimentos de África do Sul, e creio que fomos o primeiro Partido a fazê-lo, porque entendemos que o que se passou com os portugueses toca toda a comunidade portuguesa. Toca os que estão aqui e os portugueses que estão espalhados pelo mundo. São ofensas gratuitas e injustas que merecem o nosso inteiro repúdio.
O memorando que consta da carta apresentada pela comunidade portuguesa é correcto, não é exagerado e revela uma situação perfeitamente insustentável, em que a segunda comunidade de estrangeiros na África do Sul é sistematicamente agredida, atacada, sem que sejam tomadas as necessárias medidas para evitar essa situação. E a resposta, em vez de ser a de corrigir os erros cometidos, é a insultar as pessoas.
Creio que é necessário lembrarmo-nos, neste momento, que não é a primeira vez que o governo da África do Sul tem, em relação a portugueses, atitudes de hostilidade. Lembramo-nos da expulsão do nosso Embaixador, nunca completamente esclarecida; e agora esta ofensa que recai sobre todos os portugueses.
Creio que o Sr. Primeiro-Ministro, quando há dias, numa intervenção, disse que se considerava satisfeito com as explicações dadas pelo governo de África do Sul, avaliou mal esta situação. Não se deve dar por satisfeito, porque o governo e o primeiro-ministro da África do Sul em nada desmentiram ou corrigiram as declarações, infelizes, feitas pelo seu ministro.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, o CDS apresenta este voto, e solicita ao Governo, exige ao Governo, se assim se pode dizer, firmeza nas suas relações externas e que não dê, de forma alguma, a imagem de que Portugal não está atento a valores essenciais da sua comunidade. Uma e outra vez dá uma imagem de fraqueza na defesa destes valores.
Este é um assunto grave, não é um assunto menor. Quando se insulta, indiscriminadamente, de racista a nossa comunidade que lá está, quando, em vez de se proteger os portugueses, se diz que quem tem razão, ou quase, são os atacantes, não podemos ficar indiferentes.
Portugal tem de repensar o seu relacionamento diplomático com a África do Sul, tendo em conta, obviamente, interesses vitais da nossa comunidade, mas demonstrando que esses portugueses não estão sozinhos, têm a seu lado a solidariedade de todos os portugueses e devem ter a acção empenhada deste Governo.
Espero que assim aconteça!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É do conhecimento de todos que a comunidade portuguesa residente na África do Sul tem uma forte expressão no país, contribuindo com o seu trabalho, a sua luta, o seu labor diário, para o engrandecimento desse mesmo país.
No entanto, o drama que ali é vivido pelas famílias portuguesas a todos preocupa, sobretudo devido aos crimes de assalto e de morte. Mas também é necessário conhecer as duas faces do problema, e não apenas uma como é proposto no voto do CDS-PP. É preciso conhecer o problema em toda a extensão.
Ora, o memorando que foi entregue às autoridades sul-africanas não é, em si mesmo, muito correcto, tanto assim é que parte da comunidade portuguesa não concorda com ele, por ele encerrar alguma ofensa às autoridades sul-africanas. Mas é também verdade que a resposta do ministro sul-africano é extremamente desagradável, pois visa a comunidade portuguesa como um todo e não como uma parte. Aliás, estas declarações já foram desautorizadas pelo governo sul-africano.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que, em nosso entender, pode e deve ser feito é pedir tranquilidade sobre o assunto. A comunidade portuguesa residente na África do Sul deve, acima de tudo, participar no processo democrático do país, contribuindo ela mesma para a consolidação do regime democrático. A sociedade sul-africana é uma sociedade multirracial, com problemas imensos, mas a lei deve ser igual para brancos, negros e mestiços. E é neste contexto que a comunidade portuguesa deve viver, trabalhar e contribuir para o desenvolvimento daquele país.
Por outro lado, é igualmente verdade que as autoridades sul-africanas tudo devem fazer para garantir a segurança de pessoas e bens, e, naturalmente, aqui se insere a comunidade portuguesa.
Entendemos que o Governo português tudo deve fazer a nível diplomático para encontrar com o governo sul-africano as melhores condições de segurança para a comunidade portuguesa ali residente e criar, por outro lado, as condições junto do consulado português de Joanesburgo para, com pessoal especializado na área social, dar o máximo apoio às famílias das vítimas.
Em nome do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, expressamos o nosso voto de pesar às famílias enlutadas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra o Sr. Deputado Caio Roque.

O Sr. Caio Roque (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, gostaria de saudar a acção clara com que o Governo de Portugal, o Governo socialista, tratou esta questão.
O Governo, de imediato, chamou ao Ministério dos Negócios Estrangeiros a encarregada de negócios acreditada em Portugal e, também de imediato, instruiu o nosso Embaixador na África do Sul para solicitar esclarecimentos ao governo de Pretória. Não podemos, portanto, de forma alguma, acusar o Governo de inércia. Aliás, também não recebemos lições de ninguém na defesa intransigente das comunidades portuguesas, estejam elas onde estiverem.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Penso também que um grupo de pessoas não pode de forma alguma ser pretexto para que se ataque de forma tão descabida uma comunidade inteira, que é composta por cidadãos honestos e trabalhadores, que muito têm contribuído, na sua generalidade, ao longo de muitos anos, para o desenvolvimento económico, cultural e social daquele país, e, de forma clara, na reconstrução e apoio ao processo democrático na RAS.
Faço aqui um apelo a todos à contenção verbal, ponderação e moderação nesta questão, para que se defendam os legítimos interesses da comunidade portuguesa que reside e trabalha naquele país.
A nossa posição é de acabar com quaisquer ressentimentos que, porventura, possam existir, acabando com esta escalada verbal que não serve ninguém, muito menos a comunidade portuguesa residente naquele país, cuja segurança interessa preservar por todos os meios.
Por isso mesmo, não podemos esquecer que, em 1986, determinado presidente de uma região autónoma deste país, contrariando tudo e todos, insistiu em receber na Madeira os responsáveis pelo regime do apartheid. Recebeu-os de braços abertos, porque não estava a defender os interesses dos madeirenses, e, eufórico por estar no centro da polémica, esqueceu-se que o regime racista e do apartheid tinha os dias contados.
É por isto que temos de ter aqui muita ponderação e, acima de tudo, moderação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda verbera também as declarações do ministro sul-africano, atentatórias da dignidade de uma comunidade, confundindo parte de elementos ou de grupos com um todo de uma comunidade, que não merecia a classificação labéu e, sobretudo, o sentido político entre a convivência das autoridades sul-africanas e da comunidade portuguesa.
Neste sentido, condenamos abertamente as declarações do ministro da África do Sul e, independentemente de algum excesso que possa estar contido no memorando, teremos de ponderar aqui uma situação entre uma comunidade que passa momentos de algum desespero e autoridades instituídas que, certamente, não podem tomar na mesma conta e proporção aquilo que são as suas declarações e o sentido da sua actuação.
Gostaria de dizer que, a meu ver, o Governo terá de avaliar um pouco melhor a forma como incentivará a cooperação com as autoridades sul-africanas para aumentar a segurança à comunidade portuguesa, que tem convivido com essa dificuldade crescente - não apenas a comunidade portuguesa mas, em geral, a sociedade sul-africana -, para além da de transição do pós-apartheid. Mas este reforço de cooperação certamente não se conseguirá com alguns actos menos felizes como foi o do «medalhamento» das autoridades policiais, exactamente no momento em que se deveriam estar a negociar e a discutir algumas das medidas para reforçar a segurança da comunidade portuguesa.
Não quero estar aqui a condenar o Governo português, pois houve alguns aspectos positivos neste processo, mas este foi claramente um erro de avaliação e de cálculo que em nada terá ajudado o processo.
Finalmente, gostaria de dizer que vamos votar a favor os votos apresentados pelo PSD, pelo PS e também pelo PCP, e lamentamos não o poder fazer em relação ao voto do CDS-PP, mas este contém de facto uma pequena frase que, neste momento, não ajudará ao «clima» e que é impróprio, que é chamar racista ao governo sul-africano. Em nosso entender, não será este o caminho a seguir neste momento.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, terminou a apreciação dos votos. A Mesa parte do pressuposto de que os Srs. Deputados têm conhecimento de cada um deles, e vamos votá-los separadamente.
Assim, vamos votar, em primeiro lugar, o voto n.º 126/VIII - De protesto pela violência que tem vitimado a

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comunidade portuguesa na África do Sul e pela resposta dada à mesma pelo Ministro da Defesa e Segurança daquele país (CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do PCP, de Os Verdes e do BE e a abstenção do PS.

É o seguinte:

Considerando que a comunidade portuguesa, que na sociedade multirracial sul-africana constitui a segunda maior comunidade imigrante, tem contribuído decisivamente, ao longo dos anos, para o desenvolvimento socioeconómico deste país;
Considerando que a comunidade portuguesa tem sido particularmente atingida pela criminalidade violenta que grassa na África do Sul e que tem uma das maiores taxas de incidência do mundo;
Considerando que a preocupação por este aumento de criminalidade justificou uma justa marcha de protesto em que participaram cerca de 12 000 portugueses, junto da sede do Governo em Pretória, data em que foi igualmente entregue um memorando ao Primeiro-Ministro sul-africano, exigindo tomadas de medidas contra a violência;
Considerando que, passados vários meses, a comunidade portuguesa foi objecto de uma violenta reacção por parte do Ministro da Defesa e Segurança da África, Steve Tshwete, que, ao invés de anunciar medidas em defesa daquela comunidade, a veio acusar de conivência com o regime do apartheid e de não ter ultrapassado ideias e práticas supremacistas brancas;
Considerando que esta atitude do Ministro da Defesa e Segurança da África do Sul foi injustificável, e traduz uma inadmissível visão de carácter racista contra a comunidade portuguesa da África do Sul;
O Grupo Parlamentar do Partido Popular - CDS-PP, propõe a aprovação de um voto de protesto pela violência na África do Sul, pela forma como a mesma tem vitimado em particular a comunidade portuguesa e pelo inadmissível teor da resposta dada a esta comunidade por parte do Ministro da Defesa e Segurança da África do Sul.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, passamos à votação do voto n.º 127/VIII - De protesto contra as declarações do Ministro da Defesa e Segurança da África do Sul em relação à comunidade portuguesa (PSD).

Submetido à votação, verificou-se um empate, tendo votado a favor o PSD, o PCP, o CDS-PP, Os Verdes e o BE e contra o PS.

Srs. Deputados, dada a situação de empate, tem de haver uma segunda votação, o que vamos fazer de imediato.

Submetido à votação, verificou-se novo empate, tendo votado a favor o PSD, o PCP, o CDS-PP, Os Verdes e o BE e contra o PS.

Srs. Deputados, tendo-se registado novo empate, ao abrigo do artigo 107.º do Regimento, o voto n.º 127/VIII foi rejeitado.

Era o seguinte:

A Comunidade Portuguesa da África do Sul é composta por mais de meio milhão de cidadãos que, no seu conjunto, tem dado àquele País um extraordinário contributo de trabalho e de espírito empreendedor e também provas inequívocas da sua ligação afectiva ao povo e à terra sul-africana.
Os responsáveis políticos a nível nacional, regional e autárquico têm-no reconhecido, manifestando o seu apreço pelos nossos emigrantes e assegurando às suas iniciativas, nomeadamente de instituições sociais e culturais, apoios que não haviam tido durante o lamentável regime do apartheid.
As acusações e o labéu de racismo lançados sobre os portugueses pelo Ministro da Defesa e Segurança da África do Sul, como resposta a um legítimo apelo cívico e a uma marcha pacífica contra o crime, organizada a partir da Paróquia de Nossa Senhora de Fátima de Benoni, são assim inesperadas, insensatas e absolutamente injustas, configurando uma insólita reacção, incompatível com o exercício democrático do poder.
Não se deverá confundir este posicionamento isolado do Ministro Steve Tschwete com o sentir e o agir da maioria das autoridades sul-africanas, mas tendo as suas declarações sido proferidas publicamente e na qualidade de membro de um governo considerado democrático e amigo, o PSD propõe que a Assembleia da República aprove um voto de protesto contra aquelas declarações e que inste o Governo português a exigir a reparação pública a que os nossos concidadãos têm direito.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto n.º 128/VIII - De pesar pelo falecimento das vítimas de assaltos e de crimes mortais na África do Sul (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PCP, de Os Verdes e do BE, votos contra do CDS-PP e a abstenção do PS.

É o seguinte:

A comunidade portuguesa residente na África do Sul é a segunda maior comunidade de estrangeiros que ali procuram acolhimento, estimando-se que ali vivam cerca de 500 000 emigrantes portugueses e luso-descendentes.
Os portugueses que neste país se encontram lutam e trabalham por melhores condições de vida e contribuem também eles para o desenvolvimento da África do Sul, e por isso são reconhecidos como uma comunidade extremamente importante.
É de todos conhecido o drama destas famílias portuguesas, que, nos últimos meses, têm visto seus membros serem vítimas de assaltos e de crimes mortais, que a todos preocupa.
Senda certo que não é só atingida a comunidade portuguesa, mas de uma forma geral toda a sociedade sem olhar a cor de pele, credo e cor política, é necessário e fundamental que haja uma resposta pronta e eficaz da parte das autoridades sul-africanas, para que parem de uma vez por todas estes crimes hediondos.
Declarações como a do Ministro Steve Tshwete (que já foram desautorizadas pelo governo sul-africano), visando

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a comunidade portuguesa como um todo, são inadmissíveis e em nada contribuem para a resposta necessária aos problemas levantados.
Mas é necessário e fundamental também que à comunidade portuguesa atingida sejam criadas condições por parte das autoridades portuguesas no sentido de apoio às famílias vítimas de crimes.
Neste sentido, o Grupo Parlamentar do PCP propõe a aprovação de um voto de pesar pelo falecimento das vítimas, e, ao mesmo tempo que rejeita as declarações do Ministro sul-africano Steve Tshwete, apela ao Governo português para que, através dos canais diplomáticos, tudo faça junto do governo da África do Sul, para o reforço da segurança dos portugueses ali residentes e ao mesmo tempo se reforcem as condições no Consulado de Joanesburgo com o destacamento de pessoal especializado na área social para apoio às famílias vitimadas.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, vamos votar o voto n.º 129/VIII - De solidariedade para com as vítimas da criminalidade violenta na África do Sul, nomeadamente os portugueses (PS).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS e do BE, votos contra do PSD e abstenções do PCP, do CDS-PP e de Os Verdes.

É o seguinte:

Considerando que tem havido na África do Sul entre a comunidade portuguesa e de luso-descendentes um número elevado de vítimas de actos de criminalidade violenta - o que causa justificada apreensão entre todos os membros dessa comunidade que se têm manifestado em público, conjuntamente com muitos membros de todos os estratos e etnias da sociedade sul-africana;
Considerando os incidentes, por esse motivo, verificados entre membros da comunidade portuguesa e de luso-descendentes e um membro do governo sul-africano que fez, com carácter de generalidade, declarações inaceitáveis que deram lugar às apropriadas iniciativas de carácter diplomático do Governo português;
Considerando que o governo da África do Sul considera os portugueses uma comunidade da maior importância para o futuro daquele país;
A Assembleia da República:
Exprime a sua solidariedade para com todas as vítimas da criminalidade violenta na África do Sul, nomeadamente os portugueses.
Manifesta a sua confiança no futuro democrático e anti-racista do país que derrotou o apartheid, na permanência, com o papel relevante que lhe é reconhecido, de uma importante comunidade de portugueses e no reforço de relações amigáveis e mutuamente vantajosas entre dois Estados soberanos - Portugal e a África do Sul.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, os votos aprovados serão transmitidos ao Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 17 horas.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, vamos dar início à discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 44/VIII - Estabelece o enquadramento orçamental do Estado, e dos projectos de lei n.os 272/VIII - Lei de Enquadramento Orçamental (PCP), 294/VIII - Enquadramento do Orçamento do Estado (BE) e 344/VIII - Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado (PSD).
Para apresentar o diploma do Governo, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento (Fernando Pacheco): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não vou alongar-me muito no lugar-comum que consiste em dizer-se que a Lei n.º 6/91, de 20 de Fevereiro, a Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado, está desactualizada. Foi uma boa lei; teve o seu tempo, mas houve mudanças que levam a que seja preciso dar a essa lei uma nova modernidade e tornam essencial a existência de uma revisão. A maior prova disso está no facto de os vários grupos parlamentares também terem proposto alterações a esta lei.
Passo a informar a Câmara das quatro principais prioridades ou linhas de revisão constantes da proposta apresentada pelo Governo. A primeira tem em vista responder à necessidade de um maior controlo da despesa pública. Precisamente para que haja esse maior controlo da despesa pública, o Governo inclui medidas essenciais nesta proposta de lei que têm a ver com o reforço da orçamentação por programas. A orçamentação por programas dá outra transparência ao Orçamento do Estado e permite ligar os meios aos objectivos a atingir.
Um outro elemento do reforço do rigor e do controlo da despesa pública é a plurianualidade. É dado um maior peso à plurianualidade no Orçamento do Estado através dos programas orçamentais que já mencionei, que, pela sua própria essência, são plurianuais, e também através da programação financeira do próprio Estado, que constituirá, de acordo com esta proposta do Governo, um novo anexo informativo.
O segundo aspecto estruturante desta proposta de lei é a adaptação aos novos instrumentos financeiros, o que o Governo faz com transparência. Já várias vezes disse nesta Câmara que, na sua actual versão, há obrigações contratuais do Estado que não têm reflexo no Orçamento do Estado e que não são perceptíveis em qualquer mapa orçamental. Assim, o Governo propõe um mapa no qual se pretende traduzir esses encargos plurianuais futuros, que não têm repercussões no Orçamento presente. Haverá, portanto, toda a transparência, relativamente a esta Câmara, do Orçamento do Estado nesse domínio, sendo esse o mapa orçamental que será apreciado e votado aqui. E esse mapa não é um anexo informativo mas, sim, como eu disse, um mapa orçamental.
A terceira linha tem a ver com o reforço e o relevo dado ao controlo e à responsabilização nas várias fases do ciclo orçamental. Refiro-me ao reforço do papel do controlo interno e externo, passando a figurar, na própria Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado, o controlo cruzado, que é cada vez mais essencial, até pela via do próprio controlo dos financiamentos que temos com co-financiamento da União Europeia. Há também uma maior aproximação entre o Orçamento e a Conta, o que facilita a

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transparência, quando se passa de um ao outro, e permite avaliar melhor os resultados finais de execução do Orçamento do Estado.
Finalmente, a quarta linha orientadora desta proposta é a maior adequação à nossa inserção na União Europeia e, em particular, na União Económica e Monetária. Isto consegue-se através das novas regras, que propomos, de estruturação dos programas de investimento mais adequadas ao figurino do Quadro Comunitário de Apoio e pela própria programação financeira plurianual, agora introduzida no Orçamento como mapa informativo, e que permitirá, inclusive a esta Câmara, melhor compreender o programa de estabilidade e crescimento que resultará dessa programação financeira, passando também a ser um elemento de discussão nesta Câmara.
Para já, é tudo, Sr. Presidente e Srs. Deputados.

Vozes do PS: - Muito bem!

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Maria Celeste Cardona e Rui Rio.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para formular um protesto em nome da minha bancada.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sendo assim, tem a palavra, visto a figura regimental do protesto ter prioridade.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, com toda a consideração que tenho pelo Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento e não tendo qualquer dúvida de que ele é, técnica e politicamente, muito capaz de discutir a Lei de Enquadramento do Orçamento - não é isto que está em causa -, não posso deixar de protestar veementemente pelo facto de o Sr. Ministro das Finanças ter estado aqui, no Parlamento, para discutir o problema que todos conhecemos e de se ter ausentado, não estando presente e tendo sido o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento a usar da palavra, quando se discute algo que, para ele, deveria ser verdadeiramente crucial para a sua função!

O Sr. Rui Rio (PSD): - É evidente!

A Oradora: - Mais uma vez, estamos na dúvida sobre se este Governo tem ou não Ministro das Finanças!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para um contraprotesto, ao abrigo do artigo 93.º do Regimento, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, dispondo, para o efeito, de 2 minutos.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, do ponto de vista parlamentar, acaba de acontecer uma espécie de contraprotesto em efígie, uma vez que o motivo que a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite invocou é francamente abusivo, para não dizer mesmo completamente artificial!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Não é, não!

O Orador: - O Sr. Ministro, tendo prestado à Câmara um conjunto de informações sobre uma questão que é do maior interesse da mesma, deslocou-se ao exterior…

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sem fazer a intervenção inicial!

O Orador: - … e, como se sabe, entrou-se um pouco abruptamente na ordem do dia. Perante isto, a Mesa inscreveu - e bem! -, a meu pedido, o Sr. Secretário de Estado Fernando Pacheco, que usou da palavra por direito próprio para apresentar uma proposta de lei que conhece profundamente e que, como a Sr.ª Deputada sabe, e, de resto, reconheceu na sua intervenção, é objecto de um seu aturado estudo há muitos e muitos anos, tendo contribuído para a sua redacção…

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Exactamente!

O Orador: - … e tendo tido um papel essencial na defesa das razões do Governo perante a Assembleia da República.
Portanto, Sr. Presidente, trata-se de um caso de absoluta «descoincidência» entre a indignação expressa e as causas reais da indignação,…

Protestos da Deputada do PSD Manuela Ferreira Leite.

… que devem filiar-se num outro qualquer facto, cuja genealogia não me interessa escavar, porque não é esta a função do Governo na Assembleia da República!
Como tal, Sr. Presidente, sugiro que se dê este incidente por absolutamente terminado e se passe ao debate da questão do enquadramento orçamental, explorando a fundo a presença dos Srs. Membros do Governo, uma vez que o Sr. Ministro das Finanças está presente, e não de corpo presente, e disponível para participar no debate, o que fará nos termos que Sua Excelência entender e não nos termos determinados, naturalmente - a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite desculpar-me-á -, por V. Ex.ª!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Exactamente!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - O incidente está encerrado.
Passamos, então, aos pedidos de esclarecimento.
Em primeiro lugar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona, dispondo, para o efeito, de 3 minutos.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo: Começo por dizer que, para a bancada do CDS-PP, este debate é muito importante. Consideramos que esta é uma matéria estruturante do funcionamento das nossas instituições. Por esta razão, apresentámos, como sabe, um projecto de lei que foi aprovado, na generalidade, neste Parlamento, e que tem estado a aguardar a iniciativa do Governo nesta matéria.
Como é sabido, o nosso objectivo ao tempo, era o de que o anterior Orçamento já tivesse tido a oportunidade de ser elaborado ao abrigo de novas regras. Infelizmente, tal não aconteceu por responsabilidade exclusiva do

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Governo, que abandonou (mal, a nosso ver) um projecto (muito bom, a nosso ver), da autoria do Sr. Prof. Sousa Franco, sobre esta matéria, que havia dado entrada na Assembleia da República.
Seja lá como for, a responsabilidade é dos senhores; pela nossa parte, fizemos o trabalho de casa que nos competia!
Seguidamente, quero dizer que a proposta de lei hoje em apreciação, tendo sido extirpada de algumas das boas regras constantes da anterior proposta, não traz, a nosso ver, soluções concretas para problemas que já são muito velhos, Sr. Ministro das Finanças e Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento.
Aliás, permito-me ler-vos um pequeno excerto de um autor que, tenho a certeza, muito apreciam, Eça de Queirós. Dizia ele, já lá vão dois séculos: «O desleixo mata-nos, a nós e aos vindouros. Se vamos agravar o défice, se não andamos prudentemente na questão financeira, se lançamos indevidamente impostos, se não cortamos certas despesas, se não coibimos certas necessidades, preparamos a bancarrota para as gerações infelizes que hão-de vir.»!
Vejam lá, Sr. Ministro das Finanças e Srs. Deputados, como o nosso Eça de Queirós já falava tão brilhantemente de um fenómeno, que os senhores conhecem, que nós conhecemos e que queremos eliminar, a que gostamos de chamar «desorçamentação».
O Sr. Ministro das Finanças já sabia que eu iria falar sobre isto. Obviamente!
Sr. Ministro, na proposta do Governo, eu não encontro qualquer solução para este problema, só mapas e mais mapas! Está bem! Não está mal, mas é curto! Não chega! É preciso saber se os senhores aceitam autolimitar-se. É preciso saber se os senhores aceitam ou não prever as consequências para as gerações vindouras, aquelas de que já falava Eça de Queirós, e que, naturalmente, se vão ver confrontadas, durante muitos anos, com muitos milhões de contos… Ainda recentemente vimos mais 359 milhões de contos a propósito de grandes projectos governamentais na área da construção das auto-estradas.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr.ª Deputada, já terminou o seu tempo, peço-lhe que conclua.

A Oradora: - Vou já terminar, Sr. Presidente.
Para concluir, gostaria de perguntar - não sei se ao Sr. Ministro das Finanças, se ao Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento, que foi quem aqui apresentou a proposta de lei - qual é, de facto, a resposta concreta que trazem, no contexto do seu enquadramento orçamental, para este problema tão concreto, de modo a que, mais uma vez, não se vejam obrigados a aumentar, imprudentemente, os impostos de todos nós.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Ministro das Finanças, deseja responder já?

O Sr. Ministro das Finanças: - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sendo assim, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio, para pedir esclarecimentos.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento, começo por dizer que é evidente que, nas prioridades políticas do Governo, é mais importante a dívida de um clube de futebol do que a lei de enquadramento orçamental.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Mas não devia!

O Orador: - Não tem efectivamente a ver com a capacidade técnica dos governantes mas com a valorização política que o Governo faz do enquadramento orçamental face à dívida concreta de um clube de futebol.
Dito isto, Sr. Presidente, constato o seguinte: muito recentemente, a uma pergunta que lhe foi feita em Plenário, pelo que consta em Acta, o Sr. Ministro das Finanças respondeu que não havia desorçamentação em Portugal. Ouvimos hoje o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento dizer que agora esta situação vai melhorar porque até há mapas onde irá estar explícita a desorçamentação.
Portanto, há aqui, desde logo, uma contradição: um Ministro que diz que não há, e um Secretário de Estado que diz que há, quando efectivamente há, e que a situação vai ficar melhor porque agora há um mapa.
Sr. Secretário de Estado, há um mapa que os senhores classificam de «derivado», o quer dizer que é um mapa indicativo, não é um mapa imperativo. Os senhores apresentarão aqui o mapa que quiserem, mas, não sendo ele imperativo, não têm de o cumprir - ponto um.
Ponto dois, os senhores não estabelecem limite à dita desorçamentação, não estabelecem um limite a esse mapa que referiram. De que vale se não estabelecerem um limite?! Ficamos ao sabor político da Assembleia da República, ora de um partido ora de outro, porque não há uma lei estrutural, como é a lei de enquadramento, que imponha limites para todos por igual, em nome do interesse nacional.
Há uma pergunta que eu gostaria de ver respondida mas que não sei como poderá responder a uma coisa desta, embora alguma coisa irá dizer.
Tenho aqui o Programa de Estabilidade e Crescimento - 2001/2004, o qual foi apresentado pelo Sr. Ministro das Finanças há poucos dias, e penso que também na presença do Sr. Primeiro-Ministro, embora não me recorde muito bem disso - mas sei que foi apresentado pelo Sr. Ministro das Finanças com pompa e circunstância. Neste documento diz-se que a despesa vai ser de x, que as receitas vão ser de y e que a estratégia de redução do défice leva a que, em 2004, o défice seja de 0%, havendo, entretanto, uma evolução sempre no sentido positivo.
Como é que é compaginável apresentar isto aos portugueses, comprometer-se a fazer uma coisa destas quando todos sabemos que, por fora, há imensa despesa pública que não está inscrita neste documento?! Isto é um documento virtual; isto é um documento que engana os portugueses, porque nada tem a ver com a realidade do País no âmbito das finanças públicas.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento, que dispõe de 5 minutos.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento: - Sr. Presidente, a Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona começa por dizer que, em sua opinião, a proposta apresentada à Câmara pelo Governo tem uma qualidade técnica inferior à da proposta anterior elaborada pelo Governo, e presumo que se estivesse a referir à proposta do governo anterior.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - É mais curtinha!

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O Orador: - Sr.ª Deputada, nesta proposta de lei, a preocupação do Governo é de grande operacionalidade e de ela poder ser rapidamente aprovada, após um trabalho de apreciação e de conjugação com os outros diplomas, para dispormos de uma nova lei de enquadramento do Orçamento do Estado que responda a alguns dos problemas que, regular e ciclicamente, surgem nesta Câmara. É por isso que me parece que certas questões, que foram eliminadas de uma proposta tecnicamente tão correcta, como disse a Sr.ª Deputada - e, de facto, idealmente, era uma proposta muito perfeita -, ganham em ser retiradas neste contexto, quando se passa para a proposta que apresentamos neste momento.
A primeira questão que aqui se coloca é saber por que é desapareceram da proposta de lei de enquadramento do Orçamento do Estado as autarquias locais e as regiões autónomas, porque dantes, na proposta anterior, elas constavam e, para a determinação do défice orçamental do sector público administrativo (SPA), por exemplo, essa seria uma proposta mais correcta. O que acontece é que o tratamento que aí era dado era no plano dos princípios; tanto assim era que até se mencionava que depois haveria leis de enquadramento orçamental para as autarquias locais e para as regiões autónomas. Ora bem, estamos a falar apenas do plano dos princípios, não há qualquer operacionalidade e o que há a fazer depois são essas leis de enquadramento.
Mais do que isto: mesmo no plano dos princípios, uma coisa tão essencial como o défice orçamental é avaliado, tanto na proposta de lei do Orçamento do Estado que o Governo aqui apresentou como em todas as outras propostas de lei, a partir da relação entre as despesas efectivas e as receitas efectivas. Ora, quando passamos para a administração local, o que acontece é que a avaliação é feita pela diferença entre as receitas e as despesas correntes. Porém, uma não é mais correcta que a outra. O que acontece é que a primeira forma de avaliação dá uma melhor percepção do défice, enquanto forma de o Estado intervir na economia, já que se trata da diferença entre todas as receitas e todas as despesas que o Estado tem. A segunda avaliação tem uma outra vantagem, que é a de, nas aplicações das despesas ou das receitas de capital, não haver uma alteração da situação patrimonial do Estado, apesar de haver uma acumulação ou desacumulação de activos, porque, quando há, por exemplo, uma acumulação de activos, o Estado tem a possibilidade de, mais tarde, vender esses mesmos activos e de realizar de novo o encaixe.
Portanto, as duas ópticas serão correctas, só que a primeira é mais interessante do que a segunda, dado o objectivo que pretendemos atingir, e já aí, até no plano dos princípios, haveria uma diferença que prejudicaria o bom andamento da lei. Aliás, relembro, Sr.ª Deputada, que a inserção das autarquias locais obrigaria a que, nesta Câmara, a apreciação da lei ocorresse em duas comissões diferentes, o que, só por si, alongaria os tempos.
Mais: por exemplo, a unidade da tesouraria, que constava na proposta de lei anterior e que não consta nesta, e que é uma questão muito importante, já está hoje resolvida pelo Governo - há até uma resolução do Conselho de Ministros em fase de implementação e que já tem produzido os seus resultados. E esta questão apareceu ligada ao Fundo de Estabilização Financeira, que agora também foi suprimido, porque, na minha opinião, configura, associada aos programas de acção conjuntural, que era o que pretendia financiar, uma espécie de dotação provisional II. Portanto, penso que o que agora é proposto é até vantajoso para esta Câmara, porque há mais transparência e uma melhor apreciação da actuação do Estado.
O Sr. Deputado Rui Rio faz sempre a rábula da desorçamentação e pinta sempre uma situação negra; parece que o mundo vai acabar amanhã! Quer dizer, isto aqui é tudo uma desgraça, estamos todos para aqui a morrer!

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - E é mesmo uma desgraça!

O Orador: - Penso que um dia verei o Sr. Deputado Rui Rio, pela Avenida da Liberdade abaixo, com um grande cartaz a dizer «O fim está próximo» e convence outra pessoa a vir 100 m atrás dele com um grande cartaz a dizer «Fim», só para ser verdade.
Ora bem, Sr. Deputado Rui Rio, a desorçamentação não existia, com o peso que o Sr. Deputado quis dar à afirmação que aqui fez, porque se tratava de encargos em anos futuros que nem sequer a lei de enquadramento do orçamento do Estado previa que deviam integrar o Orçamento. Mas nunca o Governo escondeu isto à Câmara. Aliás, na sequência do debate parlamentar o Sr. Deputado ficou a saber, porque foi dito aqui pelo Sr. Secretário de Estado do Planeamento, que isso representava uma verba na ordem dos 200 milhões de contos - não me lembro agora do número exacto. Mas isto foi dito aqui pelo Sr. Secretário de Estado do Planeamento. E, portanto, isto foi comunicado à Câmara e não havia porquê esconder.
Agora, Sr. Deputado, a vantagem, ao contrário do que disse, é que, apesar de ser um mapa derivado, é o mapa que é votado nesta Câmara. Se o Sr. Deputado não concorda com o que lá está, até pode explicar as suas razões e a Assembleia até pode decidir que não é assim. Mas, como todos os mapas, este tem tectos de despesas, Sr. Deputado.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - «Tectos»?!

O Orador: - Sim, tectos de despesas!
Mais, Sr. Deputado: se olhar para o PIDDAC aprovado este ano, só verificará que só para o ano que vem ele contempla investimentos da ordem dos 865 milhões de contos e, para 2003, contempla investimentos da ordem dos 630 milhões de contos; apenas em dois anos são 1500 milhões de contos, enquanto que estamos a falar de 200 milhões de contos para um período superior a 20 anos. Penso que isto mostra bem a dimensão do que estamos aqui a tratar.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Julgo ser pacífica, neste momento, para todos, pelo menos para os que se encontram nesta Casa, a necessidade de alterar a Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado. Julgo que esta é uma questão pacífica, consensual e, por conseguinte, não é por aqui que virão a registar-se quaisquer dúvidas em termos da aprovação de uma nova lei.

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Há várias razões para fazer esta alteração orçamental; há o consenso em relação à necessidade da revisão da lei de enquadramento orçamental; e há uma outra questão que me parece importante e que tem reflexos no que estamos a discutir e que vamos discutir certamente em sede de especialidade. É que, entretanto, foi feito um trabalho técnico de base, um trabalho que, julgo, vale a pena realçar pela sua amplitude, pela seriedade com que foi feito e pelo facto de ele ter permitido, e penso que o posso afirmar, haver também um grande consenso, no essencial, quanto às soluções técnicas.
Por conseguinte, o trabalho feito ainda durante o ano de 1998, que, aliás, como já aqui foi referido, deu lugar à apresentação de uma proposta de lei por parte do Governo de então e que não veio a ser discutida porque, entretanto, não houve tempo para o fazer, já que estávamos no final da legislatura, vai permitir - e julgo que isto talvez seja o mais importante neste momento - que nos debrucemos apenas sobre aquilo que pode ser, e são-no do nosso ponto de vista, as opções políticas sobre a mesma matriz técnica. E estou a referir-me ao caso concreto da proposta do Governo e do nosso projecto de lei, em que as opções políticas são divergentes ou, pelo menos, não são convergentes.
Neste âmbito, gostaria de referir as opções políticas que, neste momento, nos parecem ser as mais importantes.
A primeira tem a ver com a opção política sobre o âmbito da nova lei de enquadramento. Refiro, embora isto seja do conhecimento de todos, que, na revisão constitucional de 1997, passou a ser reserva exclusiva da Assembleia da República a competência de legislar sobre o enquadramento orçamental de todos os subsectores do sector público administrativo. Assim, a Assembleia da República está neste momento numa posição de inconstitucionalidade por omissão, pelo que vamos tentar resolver o problema rapidamente.
Parecer-me-ia errado fazer aquilo que o Governo propõe, que é agora resolver o problema dessa inconstitucionalidade - e, neste momento, estou apenas a referi-me à problemática da inconstitucionalidade por omissão - apenas em relação ao Orçamento do Estado propriamente dito. Penso que devemos aproveitar a oportunidade para resolver esse problema em relação a todo o sector público administrativo.
Por conseguinte, em relação a esta primeira opção política, que, no nosso projecto de lei, repito - e não gostamos de «pavonear-nos com penas que não são nossas» -, tem por base o trabalho técnico que foi realizado em 1998 e a proposta de lei que, nessa altura, daí resultou, optamos por esta ser uma lei de enquadramento orçamental para todo o sector público administrativo naquilo que são os princípios estruturantes e fundamentais de qualquer lei de enquadramento. Como é lógico, não pretendemos, pelo que não consta do nosso diploma, fazer uma lei pormenorizada para os orçamentos das autarquias locais e das regiões autónomas. Mas, em relação às questões centrais, às questões estruturantes, às questões dos princípios básicos e essenciais, que, aliás, não podem nem devem ser diferentes para o Orçamento do Estado e para os outros orçamentos, penso que a nossa opção política é mais correcta do que a que foi feita pelo Governo. E esperamos que, em sede de comissão, esta questão possa ser dirimida, porque, além do mais, permite, desde logo e à partida, não só que haja uma certa unidade e uma certa coerência de todos esses princípios centrais e fundamentais orientadores dos orçamentos para todo o sector público administrativo como resolver o problema da inconstitucionalidade que há pouco referi.
A segunda grande diferença significativa, que é, mais uma vez, uma opção política, tem a ver com o Tribunal de Contas, sendo que este problema tem de ser visto em duas perspectivas. E esta questão já é uma pecha muito antiga - lembrei-me dela porque olhei para o meu lado esquerdo… -, por conseguinte não é apenas deste Governo, que, a meu ver, tem e deve de ser ultrapassada, e, do nosso ponto de vista, da única forma que pode ser: compete ao Tribunal de Contas fiscalizar a execução orçamental. Esta é uma competência e um dever constitucional, e é um dever político que todos nós lhe exigimos.
Porém, para se fazer essa exigência, o Tribunal de Contas tem de ter os instrumentos necessários para fazer a fiscalização do controlo de execução em tempo, à medida que a execução orçamental se vai fazendo, e não apenas depois do fecho da Conta, porque, então, não há controlo de execução orçamental. Nesta perspectiva, esta questão é essencial; poderemos ver depois, eventualmente em sede de outra lei, como se regulamenta esta matéria, mas há um princípio que, do nosso ponto de vista, deve ficar na lei de enquadramento orçamental: o Tribunal de Contas tem de ter acesso online à execução orçamental durante o ano.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Isso é linguagem da Internet!

O Orador: - Se não gosta da palavra online, arranjamos uma expressão portuguesa, o que, aliás, também prefiro.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Em linha!

O Orador: - Agora, tem de ter essa competência e essa capacidade! Os termos de alguma regulamentação poderão, eventualmente, ser estabelecidos noutra lei.
Ainda em relação ao Tribunal de Contas, para além deste aspecto, coloca-se o problema do prazo para apresentação ao Tribunal de Contas, pelo Governo, da Conta definitiva. O Tribunal de Contas já há muito que expende «doutrina» sobre o assunto, tanto na presidência do anterior Presidente como na do actual, no sentido de que a situação actual não se pode manter. Não podemos estar a aprovar a Conta passado um ano e tal, dois anos ou três anos de ela estar encerrada, porque o Tribunal de Contas, ao fim e ao cabo, só pode apresentar essa Conta, na melhor das hipóteses, um ano e meio depois de ter fechado o exercício orçamental, pelo que até vir à Assembleia, para ser discutida, passam-se, pelo menos, dois anos. Portanto, também neste domínio, precisamos de encarar a necessidade de redução dos prazos para apresentação da Conta definitiva.
Em terceiro lugar, coloca-se o problema do orçamento consolidado do sector público administrativo. Pela nossa parte - e, mais uma vez, é uma questão de opção política e não técnica -, propomos que o Governo apresente à Assembleia da República, com o Orçamento do Estado, o orçamento consolidado do sector público administrativo, na óptica da contabilidade pública e das contas nacionais e, logicamente, com os elementos necessários para se poder fazer a conciliação entre estes dois orçamentos. E não

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vemos razão para que assim não seja! Não compreendemos que o Governo proponha apenas a apresentação à Assembleia da República do orçamento consolidado do sector público administrativo, na óptica da contabilidade pública, quando, simultaneamente, tem de apresentar à União Europeia o orçamento consolidado do sector público administrativo, na óptica das contas nacionais. Se tem de fazer os dois, porque tem de os fazer, é lógico, é natural, até por responsabilidades em termos de cumprimento de algumas regras definidas pela União Europeia, independentemente daquilo que possamos pensar sobre elas, a Assembleia da República deve ter a possibilidade de encarar, analisar, discutir e votar o orçamento consolidado do sector público administrativo, nas duas ópticas.
Em quarto e último lugar, gostaria de realçar, nestas diferenças, de que suscito aqui apenas as mais substantivas, a questão dos compromissos plurianuais.
Propomos, no nosso projecto de lei - e, do ponto de vista técnico, repito, não é uma novidade nossa -, que haja uma contabilidade não apenas de caixa mas também de compromissos, para que sejam sempre conhecidos esses compromissos.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Mas há também um problema que se coloca - e já tive oportunidade de referir isto noutra sede mas necessita de uma análise aprofundada, em termos de especialidade, fundamentalmente do ponto de vista político -, que é o da necessidade ou não de se promover a limitação da assunção de encargos plurianuais. Entendo que, em sede de especialidade, devemos fazer uma apreciação política das vantagens e/ou eventuais inconvenientes em que isso seja feito. Pela nossa parte, neste momento, não estamos a nada fechados; pelo contrário, estamos abertos a qualquer das soluções, porque o que é importante, desde já, é que a Assembleia conheça esses encargos plurianuais, esses compromissos, coisa que, actualmente, não se verifica. Aliás, recordo que, durante a discussão do último Orçamento do Estado, pessoalmente, questionei vários Ministros sobre quais eram os compromissos já existentes, por exemplo, em relação às SCUT, e nenhum me respondeu.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Já vai em mais de 400 milhões!

O Orador: - Nenhum me respondeu! Aliás, isto permite-me terminar esta intervenção, dizendo o seguinte: referimos este problema dos compromissos, da necessidade de isso ser clarificado e integrado no texto da nova lei de enquadramento orçamental, porque a questão não ficou esclarecida em relação à situação actual no debate do último Orçamento do Estado.
Nós próprios, hoje, enviámos uma carta à Sr.ª Presidente da Comissão de Economia, Finanças e Plano, solicitando-lhe que, com a maior brevidade possível, convoque o Ministro que o Governo considerar em condições de poder vir à Comissão de Economia, Finanças e Plano esclarecer, cabalmente, todo o conjunto dos compromissos financeiros já assumidos neste momento e também a veracidade ou não dos desvios que já existem em relação aos valores inicialmente considerados,…

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Isso já é mais difícil!

O Orador: - … que, segundo alguma comunicação social, já estarão a ultrapassar os 350 milhões de contos. Na carta que enviámos à Sr.ª Presidente da Comissão de Economia, Finanças e Plano não propomos um ministro em concreto, solicitamos que seja um ministro a escolher pelo Governo, a definir pelo Governo, mas que o Governo considere que é o Ministro que está em condições de responder cabalmente a estas questões.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Deve ter de vir o Conselho de Ministros inteiro!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se o Sr. Deputado Machado Rodrigues e o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento.
Tem a palavra o Sr. Deputado Machado Rodrigues.

O Sr. Machado Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Octávio Teixeira enumerou um conjunto de diferenças e de abordagens diferentes entre a proposta do Governo e o projecto de lei que o PCP apresentou e, há pouco, ouvimos o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento enumerar também um conjunto de elementos adicionais que aparecerão nesta proposta do Governo relativamente ao nível da informação anterior e cobrindo matérias novas, nomeadamente os compromissos plurianuais, etc.
Há um aspecto que pode parecer de pormenor mas que, na minha opinião, tem um significado - e também foi esta a posição tomada na Comissão de Economia, Finanças e Plano, porque este ponto está expressamente mencionado no seu relatório sobre os diplomas em apreciação -, que diz respeito àquilo que o PCP chama a repartição regionalizada dos programas de investimentos. Refiro-me, basicamente, ao PIDDAC. Efectivamente, comparando a proposta do Governo com a lei que está em vigor, é cortada a menção relativa a esse aspecto.
Por isso, quando acabamos de ouvir dizer que dois terços de um PIDDAC até já estão provavelmente programados - o Sr. Secretário de Estado falou em 800 milhões, em mais ou menos 1200 milhões ou por aí, o que significa que dois terços até já estão programados -, quando estamos a falar do Orçamento do Estado para o ano seguinte, em que se sabe, mais ou menos, aquilo que se vai fazer, quando estamos numa época em que as tecnologias que permitem preparar estes documentos com eficiência estão muito mais disponíveis, pergunto-me: que razão pode estar por detrás desta omissão ou atitude deliberada do Governo nesta sua proposta? E isto, sobretudo, numa altura em que, em termos políticos, cada vez há maior sensibilidade ou, pelo menos, é apregoado que há maior sensibilidade para a aproximação dos cidadãos à política e sendo estes elementos relativos aos investimentos do Estado muito importantes, não tanto, porventura, nas grandes metrópoles, em que os grandes projectos até estão inscritos nas Grandes Opções do Plano ou no Relatório do Orçamento do Estado e são projectos de bandeira, mas principalmente no conjunto do País que, para estar perto da política, quer saber quais são os compromissos e o que se vai verificar,…

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O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, esgotou-se o tempo de que dispunha, pelo que tem de concluir.

O Orador: - Sr. Deputado, gostava de ouvir um comentário seu sobre esta matéria.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Octávio Teixeira, pretende responder imediatamente?

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Respondo em conjunto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Então, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, na sequência da sua intervenção, registo o grau de abertura e a procura de compromisso com que a fez, e é neste sentido que vou fazer-lhe algumas perguntas, para identificar se as palavras que aqui proferiu e que mostram essa abertura se podem concretizar na direcção que vou tentar avançar.
Relativamente à contabilidade nacional e à contabilidade pública - esta seria uma forma de responder à questão aqui colocada pelo Sr. Deputado -, perguntam-me se há o compromisso, por parte do Governo, a que esses mapas fossem elementos do Orçamento do Estado, ou seja, a Conta em contabilidade pública e em contabilidade nacional. E agora faça-se justiça à Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, que há pouco me fez a pergunta - parece-me que é de facto obrigação do Governo fornecer a esta Câmara, e o Governo tem fornecido, os mapas em contabilidade nacional e em contabilidade pública.
Por outro lado, tanto a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite também como o Sr. Deputado, têm pedido que haja uma chave de conversão entre as duas coisas, e a chave de conversão, na minha interpretação, Sr. Deputado, seria toda a regulamentação do EUROSTAT sobre como é que se faz o SEC-95. O que penso que também seria possível fornecer - e isto responde à questão suscitada pelo Sr. Deputado - era uma nota a explicar as grandes diferenças entre uma coisa e a outra.
Portanto, o que acabo de dizer responde à pergunta de saber se o Governo se compromete - e isto em tradução da lei de enquadramento do Orçamento do Estado - a apresentar a contabilidade nacional, a contabilidade pública e documentos a explicarem as principais diferenças entre uma coisa e outra, o que é também na linha daquilo que o Sr. Deputado Rui Rio tem vindo a pedir regularmente.
Em segundo lugar, quanto à questão dos compromissos plurianuais, o Sr. Deputado falou em tectos. A diferença entre o mapa de base e o mapa derivado tem apenas a ver com a capacidade de fazer alterações orçamentais. Portanto, os tectos existem e estão lá. Pergunto se isto não é também um elemento suficiente. Poder-se-ia eventualmente até, embora eu pense que aí haveria prejuízo, considerar o Mapa XVII um mapa de base. Pessoalmente, parece-me que não deveria ser assim; penso que o Mapa XVII deveria ser considerado um mapa derivado, porque os tectos funcionam, são obrigatórios, são vinculativos e apenas têm a ver com a capacidade de fazer alterações orçamentais. Mas isto o Sr. Deputado poderá investigar depois, vendo a faculdade que há, por parte do Governo, em fazer alterações orçamentais. Pergunto-lhe se isto não responde já à sua questão.
No que toca à Conta, Sr. Deputado, faço-lhe também uma pergunta. O Governo tem entregue a Conta nesta Casa dentro dos prazos. Por exemplo, a Conta de 1999 foi aqui entregue antes da data prevista, que era 31 de Dezembro, e foi aqui entregue em 10 de Dezembro. O Sr. Deputado vê necessidade de serem antecipados estes prazos ou a continuação de o Governo verificar o prazo que já existe hoje em dia, e que está mantido nesta proposta de lei, chega ao Partido Comunista Português como forma de estabelecer um compromisso relativamente à lei de enquadramento orçamental? Ou seja: entende que o prazo que existe agora - 31 de Dezembro - é suficiente, desde que seja cumprido, ou considera que deve ser antecipado?

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço desculpa mas, por uma questão de educação, gostaria de responder aos pedidos de esclarecimento.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Peço desculpa, Sr. Deputado Octávio Teixeira, é óbvio que tem de responder.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, foi, certamente, um lapso, aliás, de vez em quando há lapsos nesta Câmara, e ainda ontem assistimos aqui a alguns.
Começo por responder ao Sr. Deputado Machado Rodrigues, dizendo-lhe que não seria, certamente, necessário fazer esta reafirmação da posição do PCP. Somos claramente defensores de um Estado unitário. Mas o Estado unitário pode sobreviver bem, não é colocado em risco ou minimamente beliscado, se houver uma «regionalização», ou seja, a apresentação de um PIDDAC regionalizado. Por isso, temos a posição que, ao fim e ao cabo, o Sr. Deputado explicitou como sendo também a posição do PSD, razão por que integrámos essa norma no nosso projecto de lei.
Consideramos que seria um retrocesso grande retirar da nova lei de enquadramento orçamental uma norma que já existe. Mais do que isso: consideramos que não só se deve manter essa norma, a da obrigação de o Governo apresentar um PIDDAC regionalizado, como deve ser clarificado que essa apresentação deve ser feita logo, ab initio, em simultâneo com a apresentação do PIDDAC por programas e outras coisas em que os programas possam vir a desdobrar-se - mas deixarei isto para a discussão na especialidade.
Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento, quanto ao problema da apresentação do orçamento consolidado do sector público administrativo na óptica da contabilidade pública e das contas nacionais, não passou pela minha mente a ideia de termos de votar, na Assembleia da República, o orçamento consolidado do sector público administrativo. Ele tem de aparecer e deve aparecer como informação. Por conseguinte, esta questão, para nós, está dirimida na perspectiva de que não o queremos integrar no Orçamento para que seja votado, queremo-lo apenas como uma informação à Assembleia da República.

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Quanto à chave de conversão, não queremos, como é lógico e natural, Sr. Secretário de Estado, todos os tostões, não queremos a discriminação, não queremos mais um mapa com 200 ou 300 páginas discriminadas escudo a escudo, queremos, isso sim, as grandes verbas que permitam a conciliação entre um e outro. Julgo que isso seria suficiente.
Em relação aos compromissos plurianuais, o Sr. Secretário de Estado colocou a questão dos tectos e, relacionada com eles, pôs a questão de ser um mapa vinculativo ou não. Como há pouco tive oportunidade de referir, eu gostaria de discutir essa matéria com mais profundidade e em conjunto com os demais partidos na especialidade.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - É melhor!

O Orador: - Isto porque, como tive oportunidade de dizer em aparte à Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona, é uma solução que apresenta vantagens mas que também pode ter inconvenientes - e estou a referir-me a vantagens e a inconvenientes do ponto de vista político, porque a informação técnica e numérica virá, seja o mapa vinculativo ou não. Quanto ao mais, é preferível ponderarmos bem sobre qual será a melhor solução do ponto de vista político.
Por último, temos a questão relativa ao prazo de apresentação das Contas. Repare, Sr. Secretário de Estado, o Governo tem de apresentar as Contas até ao dia 31 de Dezembro e, como tal, apresenta-as até essa data. Depois, o Tribunal de Contas - e penso que já faz um esforço bastante grande, principalmente quando não tem o tal acesso em directo…

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Em linha!

O Orador: - … à execução orçamental, fazer aquele trabalho em seis meses… O que eu acho é que tem de haver, e admito até que possa haver alguma graduação em termos do avanço, uma redução do tempo que é concedido ao Governo para apresentar a Conta definitiva, por forma a que o Tribunal de Contas possa fazer uma análise. E, se a memória me não trai, no nosso projecto de lei tentamos fazer um «jogo» de prazos que permita que em Janeiro, isto é, passados três meses de findo o exercício orçamental, a Assembleia possa estar a votar a Conta. Admito que isto, de repente, possa não ser totalmente exequível, mas parece-me que devemos tentar avançar neste sentido.
Penso que foram estas as questões que me colocaram e que as respostas foram claras.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda junta também um projecto de lei a este debate e gostará de contribuir, na especialidade, para a elaboração de uma lei de enquadramento orçamental moderna e verdadeiramente transparente e que auxilie a elaboração e execução orçamental.
De facto, como já aqui foi realçado, poucas matérias tiveram uma preparação técnica tão longa, tão específica e com tanta informação, tendo havido até uma proposta de lei, preparada há muito tempo. Daí que vejamos com alguma estranheza as hesitações do Governo e algo que nos pareceu contraditório com a filosofia da lei de enquadramento orçamental que o Governo havia preparado, que foi a aprovação do projecto de lei do CDS-PP. No entanto, talvez se tenha escrito direito por algumas linhas tortas, já que, neste momento, o processo legislativo se encontra numa direcção muito melhor, o que gostaríamos de assinalar e de sublinhar, dando-lhe o devido mérito.
Com a modéstia dos nossos contributos, procuraremos ajudar a consagrar alguns princípios e a trabalhar outras matérias, como é o caso do princípio da publicidade, do desenvolvimento orçamental, do alargamento do conceito de programa orçamental em termos plurianuais, das regras sobre a transição dos saldos económicos, etc. Não irei ocupar-me muito disto nem tenho condições para o fazer neste momento, mas não quero deixar de sublinhar um ponto destacado no projecto de lei do Bloco de Esquerda, que é o acesso, pari passu, à informação por parte do Tribunal de Contas, desde o momento em que a própria Assembleia da República tem acesso a essa informação.
Parece-nos que isto é absolutamente necessário, tal como vem sendo reclamado pelo Tribunal de Contas, até porque permitiria que entre a Assembleia da República, o Governo e o Tribunal de Contas houvesse uma interacção em todo o processo de elaboração e não apenas na execução orçamental e nos controlos a posteriori, que, como sabemos, têm diferenciais de tempo demasiadamente grandes para o controlo final. Creio que todos ganharíamos com esta interacção e com este acesso atempado do Tribunal de Contas à própria elaboração orçamental, pelo menos a partir do momento em que a Assembleia da República também tem acesso à informação da proposta de lei de Orçamento do Estado.
A este título, apraz-nos sublinhar que hoje mesmo o Presidente do Tribunal de Contas achou mérito nesta solução e gostaríamos, de facto, que ela tivesse vencimento neste debate que ora iniciamos.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, muito rapidamente, começo por lembrar-lhe o que o meu colega de bancada Machado Rodrigues há pouco referiu, aquando do seu pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Octávio Teixeira, que foi o facto de a proposta do Governo pretender acabar com a apresentação do PIDDAC de forma regionalizada. Quer isto dizer que, se a proposta de lei for aprovada tal como está, o País deixará de saber como vai ser feito o investimento público pelas diversas regiões. Esta parece-nos ser, como referiu o meu colega de bancada, uma informação fundamental em termos de democracia e da divisão dos próprios círculos eleitorais.
Muito concretamente, pergunto se o Bloco de Esquerda está de acordo em que essa informação deixe de ser dada à Assembleia e em que a Assembleia deixe de votar o PIDDAC regionalizado.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Manuel Alegre.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

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O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, sucinta e laconicamente: não, não estamos de acordo!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em obediência a princípios pelos quais se vem batendo há muito, o PSD não pode deixar de fazer um discurso na mesma linha daquele que produziu no passado mês de Maio, quando aqui foi discutida esta mesma matéria. Com efeito, se há 10 meses atrás a necessidade de revisão da lei de enquadramento orçamental era determinante, hoje a questão ainda se põe com mais acuidade, porque quanto mais tempo passa, mais a situação se agrava.
Esta matéria tem duas vertentes claras: uma, eminentemente técnica e contabilística, que a Assembleia pode apreciar em sede de debate na especialidade, e, outra, que encerra opções políticas de fundo que o Parlamento tem de debater em todas as suas componentes.
A primeira componente política fundamental prende-se, desde logo, com a magna questão da transparência das contas públicas. A lei em vigor não garante, face à evolução da oferta de produtos financeiros, uma capaz transparência das nossas finanças públicas. Quando, actualmente, a Assembleia da República aprecia e vota uma proposta de Orçamento do Estado não está de posse de toda a realidade, porque nessa proposta não estão muitos milhões de contos de despesa pública que vai ser feita sem o devido controlo democrático. Essa despesa «vadia» não está orçamentada, escapa ao Parlamento e empenha o futuro do País. Essa despesa é aquilo a que se convencionou chamar «desorçamentação» e que constitui, inequivocamente, mais um sério problema do regime. Não é aceitável que o Parlamento não possa julgar a totalidade da despesa pública. Melhor, talvez se deva emendar: não é aceitável num regime que se quer democrático. É óbvio que em ditadura esta limitação não incomoda rigorosamente nada. Mas ao Grupo Parlamentar do PSD isto incomoda!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desde 1998 que se têm vindo a adjudicar obras públicas que não se pagam. Estradas que são construídas ao abrigo de engenharias financeiras que visam, essencialmente, ocultar uma dívida que as gerações futuras terão de pagar com custos acrescidos. Essa habilidosa engenharia financeira, baptizada com o nome de SCUT ou de portagem virtual, consiste em pôr uma empresa privada a endividar-se junto da banca para, assim, financiar a construção de uma estrada que o Estado, depois, pagará em prestações, em 30 anos. Quer isto dizer que há hoje muita dívida pública que está escondida nos balanços de empresas privadas e que, portanto, não aparece nas finanças públicas, ou seja, que escapa ao controlo democrático.
O problema não seria dramático se estivéssemos a falar de uma ou outra estrada. Só que, Sr. Presidente, estamos já a falar de muitas centenas de quilómetros de estradas e quanto mais tempo passa mais esta penosa dívida oculta cresce, agredindo a transparência e empenhando o futuro do País. Até porque a desorçamentação não é feita só por esta via. O material militar já é comprado em leasing, os carros da polícia já são adquiridos em ALD (Aluguer de Longa Duração), o equipamento de bombeiros já recorre igualmente a «imaginações financeiras» algures entre o leasing e o ALD e até a manutenção da rede viária nacional tem também já um esquema financeiro próprio, cujo objectivo é o de atirar o pagamento para as calendas gregas.
Como vão estar as finanças públicas portugueses dentro de quatro ou cinco anos?

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Uma desgraça!

O Orador: - É isto, Srs. Deputados, que nos preocupa.
A continuarmos por este caminho, dentro de quatro ou cinco anos o peso dos juros e das amortizações desta dívida oculta será de tal ordem que condicionará as governações futuras. Num regime que se pretende democrático, quem ganha eleições deve ter a oportunidade de implementar as suas opções, o que não é possível quando existe uma dívida pública de grande dimensão. Se tal suceder em Portugal, quem ganhar as eleições terá a sua margem financeira muito reduzida para poder levar a cabo a sua obra, pois terá os futuros Orçamentos do Estado largamente comprometidos com o pagamento da dívida entretanto herdada. Os meios que existirem terão de ser destinados ao pagamento do que não foi pago em devido tempo, ou seja, terá de andar a pagar as obras que anteriores governos inauguraram mas não pagaram. Concordarão os Srs. Deputados que, sendo a possibilidade de escolha de projectos políticos alternativos por parte dos cidadãos um dos principais alicerces do regime, não podemos tolerar práticas orçamentais que são susceptíveis de inviabilizar esse aspecto nuclear do seu funcionamento. É por isso que a revisão da lei de enquadramento orçamental se tornou também um assunto político importante para o regime.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, podemos divergir anualmente, em sede de debate orçamental, quanto ao montante do défice. O PSD defende um orçamento equilibrado, o PCP ou o Bloco de Esquerda acreditam na virtualidade de um assinalável défice público. É uma matéria que nos separa ideologicamente. Só que o que não nos pode separar é a necessidade de transparência e de gestão racional dos dinheiros públicos. Um particular não pode emitir dívida pública. O Estado pode! As taxas de juro da dívida pública são taxas de juro mais baixas do que as praticadas no mercado. Por isso, não é sustentável que o Estado se endivide a taxas mais altas, quando se pode endividar a taxas mais baixas. Não é sustentável que os futuros contribuintes tenham de pagar impostos para cobrir juros mais altos, ou seja, para cobrir as margens de intermediação financeira da banca.
A banca cumpre legitimamente o seu papel ao tentar ganhar dinheiro e o mesmo se aplica às empresas de construção civil que lucram com o seu novo papel de intermediários financeiros em que o Estado os coloca. O Governo é que não tem estado a cumprir o seu papel, porque o seu papel é o de se financiar à taxa de juro mais baixa de que dispõe, porque o seu papel não pode ser o de empenhar futuros impostos para pagar margens de lucro de empresas privadas que, objectivamente, não é preciso pagar.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A esquerda parlamentar não assinou o Pacto de Estabilidade com a União Europeia porque não o defende. O PS e o Governo assinaram esse compromisso.

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Aliás, até o divulgaram há poucos dias com assinalável aparato público. Por isso, não entendemos como é possível assumir esse compromisso, publicitar as suas virtualidades e depois, na prática, rompê-lo grosseiramente. Os níveis de despesa e de défice a que o Governo se obriga nesse documento são, infelizmente, logo à partida, valores perfeitamente virtuais. Esta atitude não é democraticamente correcta e não é justa para com os contribuintes portugueses, que futuramente terão de pagar «impostos mais caros» por essa razão.
Mas também não é só por via da desorçamentação que a actual lei permite a ocultação de dívida pública. Ao não serem criados limites à dívida dos institutos públicos, é evidente que também por aí o endividamento do Estado pode subir ao ritmo das necessidades políticas de quem estiver no poder. Isso não é em nada aconselhável e, por isso, o projecto de lei do PSD consagra oportunos limites a essas situações, limites que, obviamente, se aplicarão a este Governo e a todos os demais, no futuro.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, sendo o problema da desorçamentação a principal questão que a Assembleia da República deve resolver em sede de revisão desta lei, entendemos que outras há que devem ser também objecto de aperfeiçoamento. Entre diversas outras alterações que o projecto de lei do PSD propõe, será de salientar a redução dos prazos de debate do Orçamento do Estado e os da sua apresentação em anos de eleições legislativas ou em caso da sua não aprovação pelo Parlamento. Reduzimos, igualmente, os prazos de entrega e de aprovação da Conta Geral do Estado. Entendemos que a conta global do sector público administrativo deve ser também apresentada na óptica da contabilidade nacional, tal como é apresentada em Bruxelas, e estabelecemos um limite máximo para a dotação provisional.
Pretende-se também legislar no sentido de que todas as rectificações ao Orçamento submetidas a esta Assembleia tenham de ser devidamente fundamentadas, sob pena de não poderem ser aceites para discussão.
Aumenta-se o nível de fiscalização da execução orçamental e da evolução dos programas financeiros com apoio comunitário e alivia-se o Plenário em matéria de votação da proposta orçamental em sede de especialidade.
Prevêem-se reuniões trimestrais do Ministério das Finanças com a Comissão de Economia, Finanças e Plano no sentido de um melhor e mais oportuno acompanhamento da execução orçamental.
Prevê-se também acabar com a situação contraditória que hoje existe em matéria de execução do PIDDAC. Por um lado, a Assembleia é chamada a debater e aprovar o PIDDAC; por outro, o Governo pode, durante a execução, alterá-lo a seu bel-prazer. É uma situação que não faz qualquer sentido. Propomos, por isso, que o Executivo só possa reduzir os montantes aprovados até um máximo de 10% em cada projecto. A partir daí, apenas o deverá poder fazer com autorização de quem aprovou a dotação inicial, ou seja, da Assembleia da República.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O actual texto legal permite que Portugal insista num erro que tem cometido e pelo qual já começou a pagar: o erro de ter um Estado que vive ocultamente acima das suas possibilidades. De truque contabilístico em truque contabilístico, temos vindo a condicionar o nosso potencial de crescimento e de desenvolvimento. Não é por acaso que começamos a divergir no preciso momento em que a União Europeia mais nos ajuda a, com ela, convergir. O momento em que começamos a receber as avultadas verbas do III Quadro Comunitário de Apoio é o momento em que nos começamos a atrasar em relação à Europa.
De quem é a responsabilidade de isto assim ser? Será do povo português, que deixou de ser capaz, ou será de uma política económica inadequada e de uma política orçamental permissiva que a actual lei de enquadramento orçamental tolera e que a presente proposta de lei se recusa a alterar?
Em nome do interesse nacional, esperamos que o Grupo Parlamentar de PS e o Governo assumam o compromisso que há pouco mais de um ano assinaram perante a Comissão de Economia, Finanças e Plano e que votem favoravelmente a consagração de limites rigorosos que possam pôr cobro ao crescimento da dívida oculta.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, se assim acontecer, não devemos considerar que tal constitui uma vitória do PSD, porque tal constituirá em primeira linha uma vitória de todo o País pelo que isso representa de benefício em termos do nosso futuro colectivo. Mas, se assim acontecer, isso constituirá também uma vitória do próprio Partido Socialista, porque dessa forma não só honrará a palavra dada como, acima de tudo, honrará o compromisso que na devida altura achou por bem assinar.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Informo que, após ter dado a palavra ao Sr. Deputado Rui Rio para responder ao pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro, que irá fazê-lo de imediato, iremos proceder às votações regimentais.
Tem a palavra, Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro.

O Sr. Fernando Serrasqueiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, num debate com esta importância e com esta dignidade, o Sr. Deputado gastou cerca de 17 minutos a tratar de um tema que lhe é caro, eu diria mesmo que é a sua obsessão, que é a desorçamentação.
Em primeiro lugar, gostava de lhe perguntar, para aprender, o que é a desorçamentação. Habituei-me a ler nos manuais de finanças públicas que se trata de algo qualitativo e perfeitamente identificável. Contudo, percebi pelo seu projecto de lei que, afinal, a desorçamentação é algo quantitativo, que há um mês atrás era de 1% da dívida pública e que agora pode ir até 2% da dívida pública.
Portanto, o que pergunto é: o que é a desorçamentação e qual o critério que o Sr. Deputado insiste em usar para a definir? É 1%, 2%, 3%? Habituei-me a considerar que a desorçamentação, por razões técnicas, não tem a ver com qualquer aspecto quantitativo mas com aspectos qualitativos.
Em segundo lugar, gostaria de saber se o Sr. Deputado concorda com as novas ofertas de produtos financeiros e se, em seu entender, o Estado os deve utilizar, no caso concreto, o sistema de project finance, o sistema de leasing ou o sistema ALD. O Sr. Deputado fala nisto, mas, depois, faz várias críticas, porque procura comparar aquilo que não é comparável. Ou seja, quer fazer uma análise de balanços entre um processo tradicional de financiamento, através da condução da obra pelo Estado, e um outro em que o financiamento é feito através de um privado. O Sr. Deputado faz a comparação dos juros, mas esquece-se das vantagens do project finance ao nível da antecipação da obra e do impacto que esse investimento tem, pelo

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efeito multiplicador, no desenvolvimento económico, se for antecipado. Mas, sobretudo, esquece-se de uma coisa, Sr. Deputado: da receita fiscal. É que, enquanto que do lado do Estado há só despesas, do outro lado há despesa, mas há também uma contrapartida, que é a receita fiscal que essas empresas vão trazer, se, porventura, os processos avançarem por essa via. É por isto que lhe coloco esta questão.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Mas como?

O Orador: - É através dos lucros! Porque, se essa actividade é tão aliciante como diz o Sr. Deputado Rui Rio, essas empresas são, naturalmente, lucrativas e, como tal, pagam impostos, os quais revertem a favor do Estado. Esta é a explicação técnica.
Em terceiro lugar, o Sr. Deputado fala das novas gerações. Não defende o princípio do utilizador-pagador, que é o que existe nas SCUT, e que se traduz em pagar-se na medida em que se utiliza? Portanto, a contrapartida que aparece no Orçamento do Estado é a do número de utilizadores que recorrem a este tipo de investimento. Esta é de facto a questão que defendemos, contrariamente ao que vínhamos defendendo, numa visão conservadora, que era pagar tudo e, depois, as gerações vindouras utilizavam e nada pagavam. Actualmente, com este processo, o que estamos a defender é que quem utilize essa auto-estrada pague essa despesa, através do Estado, se for uma SCUT, ou através dele próprio, se for uma privada.
Portanto, pensar na solução que devemos pagar agora e utilizar mais tarde…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, tem de concluir.

O Orador: - … não me parece correcto.
Eram estes os esclarecimentos que eu gostaria de obter.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio. Tem muito pouco tempo, Sr. Deputado.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, precisamente por isso vou responder telegraficamente.
Com certeza que quem o Sr. Deputado pretendia atingir era o Sr. Ministro das Finanças e não a bancada do PSD, que trata o debate com dignidade.
O Sr. Deputado não sabe o que é a desorçamentação? Tenho pouco tempo para lhe explicar, mas se o Sr. Deputado tivesse ido ao seminário da Ordem dos Economistas, saberia o que é. Porém, posso dizer-lhe que se trata de despesa não inscrita no Orçamento do Estado que agride a transparência e os princípios democráticos elementares e que empenha a geração futura.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Essa é boa!

O Orador: - Quanto ao project finance, tenho a dizer-lhe que as SCUT nada têm a ver com este assunto. Porque o project finance não deixa uma dívida oculta para o Estado. Os senhores utilizam incorrectamente este termo, tecnicamente, para a solução…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino, Sr. Presidente, dizendo que estamos de acordo quanto ao sistema utilizador-pagador. É que a SCUT é exactamente o contrário, porque SCUT significa «sem pagar portagem», enquanto que o sistema utilizador-pagador diz respeito ao que paga a portagem. É rigorosamente o contrário!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, antes de darmos início às votações regimentais agendadas para hoje, lembro que está a decorrer aqui, no Plenário, uma votação por escrutínio secreto no sentido de a Assembleia autorizar o Sr. Deputado do PSD Fernando Penha a ser ouvido como arguido, votação na qual, até agora, só participaram 50 Srs. Deputados. Por isso, após as votações regimentais, agradeço que votem.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação do projecto de resolução n.º 93/VIII - Sobre o uso de armas com urânio empobrecido pelas Forças Armadas Portuguesas e sobre a presença militar na Bósnia e no Kosovo (Deputado do BE Francisco Louçã).

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, há oito dias, solicitámos a retirada deste projecto de resolução para posterior votação na sessão de hoje.
Gostaria de recordar à Mesa e à Câmara que retirámos do projecto de resolução os três primeiros pontos resolutivos, mantendo-se, única e simplesmente, o quarto e último ponto que dizem respeito ao apoio à proposta do Parlamento Europeu no sentido da aplicação de uma moratória ao uso de qualquer munição feita com urânio empobrecido.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - A explicação está dada, Sr. Deputado, que, neste caso, creio, se justifica, mas, agora que entramos em processo de votações, não vamos explicar cada diploma que vai ser votado.
Srs. Deputados, vamos, então, votar o projecto de resolução n.º 93/VIII.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PCP, de Os Verdes e do BE.

Srs. Deputados, passamos à votação do projecto de resolução n.º 103/VIII - Combate aos maus tratos e abuso sexual sobre menores e reforço das medidas de apoio às comissões de protecção de crianças e jovens (BE).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, de Os Verdes e do BE e abstenções do PSD e do CDS-PP.

Srs. Deputados, vamos votar o projecto de resolução n.º 104/VIII - Recomenda ao Governo que proceda à

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regulamentação urgente do regime de execução das medidas de promoção e de protecção de crianças e jovens em risco previstas no n.º 1 do artigo 35.º da Lei n.º 147/99, de 1 de Setembro (CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos proceder à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 319/VIII - Institui um sistema de reparação aos trabalhadores pela morosidade da justiça, em processo de falência, e reforça os privilégios dos créditos laborais (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PCP, de Os Verdes e do BE e abstenções do PS, do PSD e do CDS-PP.

Srs. Deputados, o projecto de lei n.º 319/VIII baixa à 9.ª Comissão.
Srs. Deputados, vamos passar à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 347/VIII - Altera o artigo 178.º do Código Penal, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 65/98, de 2 de Setembro (PS).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, do CDS-PP, de Os Verdes e do BE e a abstenção do PSD.

Srs. Deputados, o projecto de lei n.º 347/VIII baixa à 1.ª Comissão.
Srs. Deputados, vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 355/VIII - Torna público o crime de abuso sexual de crianças (altera o artigo 178.º do Código Penal) (Os Verdes).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, de Os Verdes e do BE e abstenções do PSD, do CDS-PP e do Deputado do PS José Vera Jardim.

Srs. Deputados, o projecto de lei n.º 355/VIII baixa à 1.ª Comissão.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 369/VIII - Altera os artigos 169.º, 170.º, 176.º e 178.º do Código Penal (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PCP, de Os Verdes e do BE e abstenções do PS, do PSD e do CDS-PP.

Srs. Deputados, o projecto de lei n.º 369/VIII baixa à 1.ª Comissão.
Srs. Deputados, vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 348/VIII - Estabelece medidas de protecção do património urbano (CDS-PP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PCP, de Os Verdes, do BE, votos a favor do CDS-PP e a abstenção do PSD.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Qual é a matéria, Sr. Deputado?

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sobre a condução dos trabalhos, Sr. Presidente. É para uma verdadeira interpelação à Mesa, como diria o Sr. Presidente, Almeida Santos.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, vamos votar de seguida um requerimento de baixa à comissão de quatro projectos de lei e eu solicitava a V. Ex.ª que seja aplicado o Regimento da Assembleia da República. Não sei se se prevê ou não um período para apresentação do requerimento,…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Não, Sr. Deputado.

O Orador: - … pelo que deixo a decisão nas mãos de V. Ex.ª.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Não prevê, Sr. Deputado.

O Orador: - De todo o modo, parecia-me útil que houvesse um curto período de debate.
De qualquer maneira, o Sr. Presidente é soberano e decidirá.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, vou falar apenas sobre a questão regimental.
Neste momento, não tenho comigo o Regimento, mas peço à Mesa que leia o artigo em que refere que os requerimentos baixam à comissão pelo prazo que for decidido. Isto só para focar desde já, e só, a questão regimental. Porque se for necessário passar à parte política, fá-lo-emos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Isso é uma ameaça?

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado Manuel dos Santos, os requerimentos são votados sem discussão.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Sr. Presidente, era só para informar V. Ex.ª e a Mesa que, se houver consenso, não nos opomos, pelo contrário, até achamos útil, a que haja um curto debate sobre o requerimento.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Não, Sr. Deputado! Não é regimental!

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, não se trata de discutir o teor do requerimento mas de indicar o prazo. E o prazo que está contido no requerimento é de 30 dias.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Mas no requerimento não está indicado o prazo!

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Está, está!

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Não está!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, por consenso dos proponentes, foi comunicado à Mesa que fosse acrescentada ao requerimento a expressão «por um prazo de 30 dias».
O Sr. Secretário Artur Penedos vai proceder à leitura do requerimento, subscrito pelo PS, PCP, Os Verdes e BE.
Tem a palavra, Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o requerimento é do seguinte teor:

Os Deputados abaixo assinados vêm solicitar, nos termos do disposto no artigo 156.º do Regimento da Assembleia da República, que os projectos de leis n.os 6/VIII - Altera a Lei n.º 135/99, de 28 de Agosto (Adopta medidas de protecção da união de facto) (Os Verdes), 45/VIII - Altera a Lei n.º 135/99, de 28 de Agosto (Adopta medidas de protecção da união de facto) (BE), 105/VIII - Adopta medidas de protecção de pessoas que vivam em economia comum (PS) e 115/VIII - Adopta medidas de protecção das uniões de facto (PCP) baixem à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, por um prazo de 30 dias.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, vamos votar o requerimento. Informo que não há lugar a declarações de voto orais.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sobre quê, Sr. Deputado?

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Sr. Presidente, gostava que a Mesa me dissesse qual é o preceito legal em que se baseia para alterar este requerimento, porque ele foi alterado, aditando-lhe um prazo que dele não constava, aditamento esse que só chega ao conhecimento da nossa bancada agora, aliás nem chega, é dado a conhecer por via oral. Como é que um requerimento nestes termos pode ser votado hoje. É esta a pergunta que gostava de lhe colocar.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado Basílio Horta, o n.º 3 do artigo 89.º do Regimento diz que «Os requerimentos escritos são imediatamente anunciados pela Mesa e distribuídos pelos grupos parlamentares» e o n.º 4 diz que orais também são lidos.
Este aditamento foi feito pelos proponentes, de acordo, aliás, com o que vem disposto no artigo 89.º do Regimento.
Srs. Deputados, vamos votar…

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Peço novamente a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - V. Ex.ª desculpará…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Pode recorrer para o Plenário, se assim o entender!

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - V. Ex.ª desculpará, não é essa a minha intenção.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Faça favor.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - A minha intenção é a de ser esclarecido, se V. Ex.ª entender fazê-lo.
Quero apenas saber onde é que, no artigo 89.º do Regimento, está a previsão daquilo que V. Ex.ª anuncia, que é a alteração dos requerimentos depois de serem entregues. É isso que pretendo saber!

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Não é verdade! Foi substituído!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, o artigo 89.º, n.º 5, diz que «Admitido qualquer requerimento, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 17.º, é imediatamente votado sem discussão».

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Sr. Presidente, com certeza! E, portanto, V. Ex.ª tem de pôr à votação imediatamente sem discussão o requerimento sem a alteração, como foi proposto. É isso que V. Ex.ª tem de fazer!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - O artigo 159.º do Regimento diz que «O Plenário pode deliberar, a todo o tempo, avocar a si a votação na especialidade, a requerimento de, pelo menos, 10 Deputados».

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, é muito rápido, é para acrescentar ao artigo 159.º o artigo 156.º, com a epígrafe «Requerimento de baixa à comissão», que diz que «Até ao anúncio da votação podem 10 Deputados, pelo menos, requerer a baixa do texto a qualquer comissão para o efeito de nova apreciação no prazo que for designado (…)».

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, não vou fazer agora um colóquio nem um seminário sobre a interpretação do Regimento. A Mesa está de acordo com a interpretação que eu próprio faço.
Se o Sr. Deputado Basílio Horta discorda, faça favor de, de acordo com o Regimento, recorrer para o Plenário.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

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O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Sr. Presidente, o que acaba de ser dito é verdade, não o contestamos, em relação ao requerimento tal como ele foi apresentado. Mas ele não tem prazo! E a questão é política, Sr. Presidente! Não é jurídica! A questão é saber se este requerimento, na forma como foi feito, tinha prazo ou não tinha e o que é que significa o aditamento do prazo agora! Esse é o problema!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Essa agora!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, já expliquei que os proponentes pediram para o acrescentar! Apenas isso!

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Sr. Presidente, mas isso…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - E a leitura do requerimento foi feita! Eu já o anunciei!

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Sr. Presidente, V. Ex.ª desculpará, mas esse tema não constava - é bom que fique claro - do requerimento que foi entregue, ele foi aditado agora, e isso tem um significado político. Fica registado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Certo! Isso é evidente! Não constava, mas foi acrescentado!
Srs. Deputados, vamos, portanto, votar o requerimento, subscrito pelo PS, PCP, Os Verdes e BE, de baixa à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, sem votação na generalidade, dos projectos de lei n.os 6/VIII - Altera a Lei n.º 135/99, de 28 de Agosto (Adopta medidas de protecção da união de facto) (Deputada de Os Verdes Isabel Castro), 45/VIII - Altera a Lei n.º 135/99, de 28 de Agosto (Adopta medidas de protecção das uniões de facto) (Deputado do BE Francisco Louçã), 105/VIII - Adopta medidas de protecção das pessoas que vivam em economia comum (PS) e 115/VIII - Adopta medidas de protecção das uniões de facto (PCP), por um prazo de 30 dias.

Submetido à votação, foi aprovado, com os votos a favor do PS, do PCP, de Os Verdes e do BE e votos contra do PSD e do CDS-PP.

Srs. Deputados, a aprovação deste requerimento faz baixar os quatro projectos de lei à 1.ª Comissão.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para que efeito, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para anunciar à Câmara que entregarei na Mesa uma declaração de voto escrita, em nome da bancada do Partido Socialista.

O Sr. António Capucho (PSD): - Peço também a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de dizer que não há declarações de voto em relação a requerimentos.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Sr. Presidente, dado, seguramente, o interesse político que esta declaração de voto vai ter, gostaria que V. Ex.ª providenciasse, de imediato, se fosse possível, a sua distribuição pelos grupos parlamentares.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Não posso, antes de a mesma ser entregue, Sr. Deputado!

Risos.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Sr. Presidente, se me permite, imediatamente a seguir, obviamente!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Só foi anunciado que a declaração de voto iria ser entregue. O que o Regimento diz é que não são admitidas declarações de voto orais.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, é óbvio que a declaração de voto que a Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça vai apresentar, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, é sobre a votação do requerimento. Essa votação fez-se e, portanto, a declaração de voto é perfeitamente legítima.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Nós queremos saber como é que o PS justifica!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de diversos pareceres da Comissão de Ética.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 1.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Porto de Mós, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar a Sr.ª Deputada Ana Narciso (PSD) a prestar depoimento, por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos do processo comum singular n.º 139/99.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

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O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 2.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita (PCP) a prestar depoimento, como testemunha, em audiência marcada para o próximo dia 9 de Março de 2001, pelas 10 horas, no âmbito do processo n.º 436-D.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial da Comarca de Anadia, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Rui Marqueiro (PS) a prestar depoimento, por escrito, como testemunha, no âmbito do processo n.º 646/99.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela 1.ª Secção dos Serviços do Ministério Público do Tribunal Judicial de Loures, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Vítor Peixoto (PS) a prestar depoimento, por escrito, como testemunha, no âmbito do processo n.º 2147/00.4TALRS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 2.º Juízo Criminal do Tribunal da Comarca de Santarém, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Jorge Lacão (PS) a prestar depoimento, como testemunha, no âmbito do processo n.º 436/00, em audiência marcada para o próximo dia 9 de Março de 2001, pelas 10 horas.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 2.º Juízo Criminal do Tribunal da Comarca de Santarém, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Manuel Alegre (PS) a prestar depoimento, por escrito, como testemunha, no âmbito do processo n.º 436/00.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial de Castelo Branco, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de que a Sr.ª Deputada Maria do Carmo Sequeira (PS) não deve ser autorizada a ser ouvida como arguida, no âmbito do processo n.º 383/99-R.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, terminámos o período de votações.
Renovo o apelo que fiz há pouco no sentido de os Srs. Deputados participarem na votação que está a decorrer aqui, no Plenário.
Srs. Deputados, vamos retomar a discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 44/VIII e dos projectos de lei n.os 272, 294 e 344/VIII.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado é, de certo modo, a constituição da administração financeira do Estado. É uma lei com carácter muito especial, uma autêntica lei de regime, e, por isso, deverá ser estudada por todos nós com abertura, de modo a assegurar a melhor defesa do interesse público.
Assim o entendeu o anterior governo - e devo deixar aqui uma palavra de profundo apreço pelo trabalho que o Professor Sousa Franco e a sua equipa desenvolveram, trabalho já realçado, verdadeiramente notável - e também o actual, aqui representado pelo Ministro das Finanças, Dr. Pina Moura, e pelo Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento, Professor Fernando Pacheco, a quem deixo uma expressão de muita satisfação, por ver que souberam dar continuidade a esse trabalho com um enorme sentido de Estado e com uma grande abertura a sugestões, nomeadamente àquelas que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista lhes apresentou.
O meu colega Hasse Ferreira desenvolverá a economia geral da proposta de lei do Governo relativamente aos projectos de lei que aqui estão também em discussão e eu, porque o tempo é escasso, passarei imediatamente à explicação das principais propostas que o Grupo Parlamentar do PS acaba de apresentar na Mesa.
Comecemos pela questão dos empreendimentos, a que correspondem encargos plurianuais, designadamente sob a forma de contratos de parceria público/privado.
O Governo abordou com grande correcção esse problema, nomeadamente nos artigos 13.º e 14.º da sua proposta de lei e o Grupo Parlamentar do PS louva-se nessa abordagem. E para que não subsista a menor hipótese de dúvida sobre a vontade total de dar transparência e rigor a essa matéria, apresentámos propostas de alteração e de aditamento aos artigos 13.º e 14.º.

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Assim, no que diz respeito ao artigo 13.º, apresentámos uma proposta de aditamento de uma alínea d) ao seu n.º 3, para que os programas previstos tenham também admissibilidade no caso das «despesas correspondentes a contratos de prestação de serviços em regime de financiamento privado ou outra forma de parceria público/privado.» Ficaria, assim, consagrada na Lei do Enquadramento do Orçamento do Estado a explícita obrigação de este tipo de contratos e os seus encargos terem cabimento no Orçamento do Estado de uma forma adequada.
Quanto aos programas orçamentais - artigo 14.º -, introduz-se um aditamento, no sentido de dizer que esses programas podem ter vários objectivos, e não apenas um, relativos a uma ou mais políticas públicas, acrescentando-se que desses programas deve fazer parte, necessariamente, uma memória justificativa «(…), compreendendo, nomeadamente, um conjunto de indicadores que permitam avaliar a economia, a eficiência e a eficácia da sua realização.»
E mais se acrescenta a este artigo um n.º 2, no sentido de dizer o seguinte: «A avaliação da economia, a eficiência e a eficácia de programas com recurso a parcerias público/privado tomará como base um programa alternativo visando a obtenção dos mesmos objectivos com a exclusão de financiamentos ou de exploração a cargo de entidades privadas, devendo também incluir, sempre que possível, a estimativa da sua incidência fiscal líquida.»
Quer isto dizer que nunca mais o Sr. Deputado Rui Rio poderá dizer os disparates - perdoe-me o termo - com que vem aqui brindando esta Casa tão repetidamente. O que o Sr. Deputado Rui Rio tem dito não é verdade e, de facto, consigna uma total inversão do que é a justiça fiscal entre gerações e a possibilidade de um governo presidido pelo PSD vir, um dia, a fazer obra. Portanto, Sr. Deputado, ficará no próprio Orçamento do Estado demonstrado que, de facto, o que tem dito não tem qualquer correspondência com a verdade.
Há, depois, uma enorme preocupação do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, tal como do Governo, que acolheu muito bem estas propostas, no sentido de enquadrar nesta nova lei disposições muito concretas e fortes. Este aspecto constitui uma verdadeira revolução - eu não tenho medo da palavra, porque sou revolucionário a seu tempo, consoante as circunstâncias. Hoje, a revolução é lutar com instrumentos eficazes para garantir a melhoria e controle da qualidade da despesa pública.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Para isso, propõe-se um aditamento de um artigo novo que trata deste assunto nos seguintes termos:
«1 - O Governo envia à Assembleia da República, até 15 de Maio de cada ano, um relatório sobre as medidas e resultados da política de melhoria e controle da qualidade da despesa pública, baseada em critérios de economia, eficiência e eficácia, de forma a permitir uma melhor satisfação das necessidades colectivas, incidindo especialmente sobre a reforma da Administração Pública e a realização dos objectivos previstos nas Grandes Opções do Plano em articulação com a consolidação das finanças públicas.
2 - As despesas dos organismos referidos no n.º 2 do artigo 1.º deverão ser sujeitas a auditoria externa, na base zero, pelo menos, de oito em oito anos, abrangendo a avaliação da missão e objectivos do organismo bem como a economia, eficiência e eficácia da despesa correspondente.
3 - Os sistemas e procedimentos de controlo interno das operações de execução do orçamento a que se refere o n.º 5 do artigo 52.º devem ser sujeitos a auditoria externa, pelo menos, de seis em seis anos, procurando assegurar o reforço do controlo financeiro, com o objectivo de garantir o rigor na execução orçamental e evitar a má utilização dos dinheiros públicos.
4 - O Governo fixará no relatório a que alude o n.º 1 os programas de auditoria que promoverá por sua iniciativa no ano em curso, para efeitos do cumprimento do disposto nos n.os 2 e 3, acompanhados dos respectivos termos de referência.
5 - Em acréscimo ao disposto no número anterior, a Assembleia da República determinará em cada ano ao Governo duas auditorias suplementares para os efeitos previstos no n.º 2 e solicitará ao Tribunal de Contas a auditoria de dois sistemas de controlo interno, para os efeitos previstos no n.º 3.
6 - Os resultados das auditorias a que se referem os n.os 4 e 5 devem ser enviados à Assembleia da República em prazo não superior a um ano.
7 - O Governo responde em 60 dias às recomendações da Assembleia da República que incidirem sobre o relatório a que se refere o n.º 1 e as auditorias referidas nos n.os 4 e 5.»
Faz-se também uma melhor articulação com o Tribunal de Contas, determinando que se torne obrigatório o envio pelo Tribunal de Contas à Assembleia da República dos «relatórios finais referentes ao exercício das suas competências de controle da execução orçamental.»
Adita-se um artigo novo sobre «Sistemas e procedimentos do controlo interno», previstos na proposta do Governo, do seguinte teor: «O Governo envia à Assembleia da República, acompanhando o relatório da Conta Geral do Estado, uma informação sobre os resultados do funcionamento dos sistemas e procedimentos do controle interno das operações de execução do orçamento a que se refere o n.º 5 do artigo 52.º, especificando o respectivo impacto financeiro.»
Adita-se, ainda, um artigo novo, com a epígrafe «Gestão por objectivos», do seguinte teor: «Os orçamentos e contas dos organismos a que se refere o n.º 2 do artigo 1.º devem ser objecto de uma sistematização complementar por objectivos, considerando a definição das actividades a desenvolver por cada organismo e respectivos centros de custo, tendo em conta a totalidade dos recursos envolvidos, incluindo os de capital, visando fundamentar as decisões sobre a melhoria e controlo de qualidade da despesa pública: a) no conhecimento da missão, objectivos e estratégia do organismo; b) na correcta articulação de cada área de actividade em relação aos objectivos; c) na responsabilização dos agentes empenhados na gestão das actividades pela concretização dos objectivos e bom uso dos recursos que lhes estão afectos; d) na identificação de actividades redundantes na cadeia de valor do organismo e justificada reafectação dos recursos nelas consumidos.
2 - Os desenvolvimentos por objectivo devem ser introduzidos faseadamente de modo a abrangerem a integralidade do universo a que se referem até 2004, acompanhando a proposta de lei do Orçamento do Estado

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e a Conta Geral do Estado a título informativo enquanto a lei não dispuser de outro modo.
3 - Os trabalhos preparatórios e os progressos registados na aplicação da sistematização por objectivos devem ser objecto de especial menção no relatório a que se refere o n.º 1 do artigo 53.º-A.»
Finalmente, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, tendo como primeiro signatário o seu Presidente, Francisco de Assis, entregou na Mesa um projecto de lei de criação da Comissão Parlamentar para o Acompanhamento e Controlo da Execução Orçamental, em relação ao qual eu próprio, em nome do meu grupo parlamentar, tinha referido nesta tribuna aquando da discussão do Orçamento do Estado para 2001.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Muito bem!

O Orador: - De tudo isto, resulta, de certeza, um dos mais modernos sistemas de controlo da despesa pública existentes no enquadramento de qualquer país europeu. Assim saibam os Deputados, assim queiram os Deputados em qualquer governo, na esperança de que sendo estes aditamentos e a proposta de lei aprovados, não haja, a seguir, alguma maioria que queira modificá-los, exactamente porque venha a temer a eficácia deste controlo da despesa pública!
É uma grande alteração, que me apraz registar, que o Grupo Parlamentar do PS aqui traz, com completa aprovação, interesse e entusiasmo do próprio Governo, no sentido de considerar que o rigor orçamental e a luta pela eficácia da despesa pública são também a sua primeira tarefa.

Aplausos do PS.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Gonçalves.

O Sr. Herculano Gonçalves (CDS-PP): - Sr. Presidente, começo por agradecer o tempo cedido pelo Bloco de Esquerda.
Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: No dia 24 de Maio do ano 2000, este Parlamento discutiu na generalidade o projecto de lei n.º 191/VIII, do PSD, e o projecto de lei n.º 211/VIII, do CDS-PP, sobre a Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado, tendo terminado com a reprovação do projecto de lei do PSD e a aprovação do projecto de lei do CDS-PP, que baixou à 5.ª Comissão.
Foi assim reconhecido por esta Assembleia que o CDS-PP apresentou um conjunto de propostas de alteração à Lei n.º 6/91, de 20 de Fevereiro, com credibilidade, aliás, como acontecera já em 1977 com a Lei n.º 64/77, em 1983 com a Lei n.º 40/83 e em 1991 com a Lei n.º 6/91.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Embora não seja uma matéria que tenha grande impacto na opinião pública, estamos a falar numa das mais importantes leis da instituição parlamentar, do ponto de vista político, económico e histórico. É uma matéria de capital importância para o futuro do País.
Sob o nosso ponto de vista, a lei deve esclarecer - e a nossa esclarece -, entre outros, os seguintes pontos: qual o volume do endividamento assumido, directa ou indirectamente pelo Estado; qual o volume das responsabilidades financeiras assumidas pelo Estado, directa ou indirectamente; quem são os destinatários das transferências financeiras operadas pelo Orçamento, a sua justificação financeira e económica e a rentabilidade esperada pela injecção de capitais públicos.
A prática orçamental dos últimos governos tem revelado uma forte desorçamentação de despesas públicas, evitando o recurso imediato à dívida pública para o financiamento, bem como a contabilização directa do respectivo montante nas contas do Estado. Tal prática contribui para avultados e preocupantes défices que se tornam ocultos nas finanças públicas.
O descontrolo da despesa corrente e a incapacidade revelada ao nível da gestão orçamental por parte de algumas instituições do sector público administrativo leva à acumulação sucessiva e crescente de dívida não autorizada politicamente e não assumida como dívida pública pelo Estado.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Permitam-me que aqui vos deixe alguns exemplos nesta área: compra de automóveis em regime de aluguer de longa duração; compra de material militar com a realização de contratos de leasing; recurso às denominadas SCUT para o financiamento da construção e exploração de estradas; transferências orçamentais para cobertura de passivos e pagamento de indemnizações da mais variada ordem, sem qualquer controle pela entidade fiscalizadora; despesas realizadas por institutos públicos e outros organismos dotados de autonomia financeira sem controle e sem limites; despesas financeiras assumidas pelo Estado para fazer face a compromissos plurianuais sem inscrição dos encargos no ano da realização dos investimentos.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Com a aprovação do projecto de lei n.º 211/VIII, da autoria do CDS-PP, já verificada, passamos a ter a possibilidade de, em cada momento da execução orçamental, ser aferida a verdadeira situação financeira do Estado, através da adopção das seguintes principais medidas:
Clarificar, tornar mais transparente e mais operante o controle político do Parlamento sobre o Orçamento do Estado;
O total das responsabilidades financeiras resultantes de despesas de capital assumidas por via de compromissos plurianuais não pode ultrapassar 25% do total das despesas de capital previstas na proposta de lei do Orçamento;
Exercer um controle mais rigoroso sobre as diversas formas de desorçamentação que, não tendo nascido hoje, se vão hoje multiplicando e agravando;
Ter melhorias nos procedimentos relativos à elaboração, discussão, aprovação e execução do Orçamento;
Ter a garantia de que o Governo vai indicar os limites máximos do endividamento líquido global directo e a indicação da respectiva justificação e das formas de emissão da dívida pública;
Ter a informação trimestral por parte do Governo dos montantes, condições e relação nominal dos beneficiários das garantias pessoais do Estado;
Ter a garantia de que o Governo apresentará em anexo à proposta de lei do Orçamento a discriminação individualizada de todos os subsídios, indemnizações e/ou

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dotações de capital atribuídos a empresas públicas com a identificação da empresa beneficiária, a natureza da prestação, bem como o respectivo montante;
Ter a garantia de que os prazos de apresentação e discussão do Orçamento serão cumpridos;
Ter a garantia de ver discutidas em Plenário matérias como as que se relacionam com as alterações dos impostos vigentes que versem sobre a incidência, taxas, isenções e garantias do contribuinte.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo, assumindo que a lei vigente não é uma lei que sirva o País, comprometeu-se a apresentar uma proposta de lei de enquadramento do Orçamento do Estado de modo a que o Orçamento para o ano 2001 já pudesse ser enquadrado dentro da nova lei. Não o fez atempadamente, muito embora Srs. Deputados do Partido Socialista, em sede de Comissão de Economia, Finanças e Plano, tivessem afirmado que o Governo cumpriria a sua palavra. Sempre foram criados entraves por parte do Partido Socialista na Comissão para que o nosso projecto de lei n.º 211/VIII não fosse votado ou, se o fosse, o mesmo não merecesse aprovação, privando assim o País de ter uma lei muito melhor do aquela que, neste momento, se encontra em vigor.
Passados nove meses, enfim, nasceu a proposta de lei n.º 44/VIII, do Governo, que hoje, nesta Assembleia, debatemos conjuntamente com projecto de lei n.º 272/VIII, do PCP, o projecto de lei n.º 294/VIII, do BE, e o projecto de lei n.º 344/VIII, do PSD.
Após uma análise da proposta de lei do Governo e dos projectos dos outros partidos, o CDS-PP conclui que estes documentos contêm algumas alterações que só por si não significam que se trate de boas leis de enquadramento do Orçamento do Estado.
Por isso, vamos esperar que, se, porventura, os diplomas em debate vierem a merecer aprovação desta Câmara, se venha, em conjunto com o projecto de lei do CDS-PP, a encontrar uma boa lei de enquadramento orçamental.
Pela nossa parte, é nossa intenção dar a Portugal e aos portugueses uma boa lei de enquadramento do Orçamento do Estado.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Tendo em conta as propostas que estão em cima da mesa - a proposta governamental, os três projectos de lei e o projecto de lei do CDS, que já está em discussão na especialidade, na Comissão, bem como as proposta que o Partido Socialista apresentou hoje -, eu poderia começar por dizer que será raro encontrar-se um grupo parlamentar afecto a um governo, suporte de um governo, que tanto se identifique e promova as necessidades de mais transparência e melhor controlo orçamental do que o actual Grupo Parlamentar do PS. Poderá até a alguns parecer estranho que tal ocorra.
Efectivamente, o conjunto de propostas que apresentamos, a forma como defendemos e apoiamos a proposta de lei governamental, que vai substituir, com os necessários enriquecimentos parlamentares, um texto legal já com uma década são bem a prova disso.
A abertura que fomos encontrando noutros partidos para esta discussão é também evidenciada pela forma como as propostas governamentais, a anterior e a actual, encontraram um eco positivo, nomeadamente nas forças e sectores das oposições à esquerda e nos mais lúcidos sectores da direita, com as especificidades e as concepções próprias que cada um dos outros grupos parlamentares pretenderá introduzir no texto final.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A discussão de um Orçamento engloba, obviamente, o debate da estratégia e da concretização dos investimentos públicos, associados à aplicação dos fundos comunitários e, eventualmente, de investimentos privados.
Assim, um dos problemas centrais que se tem procurado analisar é o do debate do PIDDAC. A forma como o PIDDAC actualmente é debatido em sede de Orçamento aparece-nos como abstrusa e até eivada de irracionalidade.
Independentemente do contributo que temos dado para esse debate nos últimos Orçamentos e até das críticas que formulámos ao processo em Orçamentos anteriores, parece-nos que é importante discutir se faz sentido que se tenha de optar aqui, no Plenário, ou em sede de comissão, entre o reforço de verbas para um centro de saúde em Carrazeda ou o aumento de recursos para uma colectividade em Fafe ou para uma igreja do Olival, debater o apoio a um quartel de bombeiros em S. João de Areias ou o reforço de muralhas, que desde a guerra da Restauração se vêm danificando. É esse um trabalho que exige uma capacidade e um conhecimento do terreno que ultrapassa claramente as possibilidades de qualquer Deputado ou mesmo de um grupo parlamentar no seu conjunto.
O que parece relevante que um Parlamento nacional discuta, no âmbito do Orçamento do Estado, são, em nosso entender, as orientações, as concretizações da estratégia económica, no plano sectorial e no âmbito regional - e não no plano municipal e da freguesia -, dos investimentos públicos que o Estado promove, em conjugação com os fundos europeus e, eventualmente, com recursos privados.
Daí a necessidade de se clarificar toda a articulação entre programas, projectos e medidas, a que se procede na nova Lei de Enquadramento Orçamental. Para que o País se desenvolva e os investimentos sejam bem aplicados, o que é necessário é dar uma maior flexibilidade à execução no PIDDAC, não implicando novas restrições como aquelas que tornam completamente inexequível a execução do PIDDAC e que foram defendidas pelo Sr. Deputado Rui Rio e propostas pelo PSD. Por isso, é necessário clarificar toda a articulação entre programas, projectos e medidas, a que se procede na nova Lei de Enquadramento Orçamental.
Contrariamente ao que o PSD propõe, não se pode «rigidificar» de tal maneira o funcionamento e o controlo do PIDDAC de forma a dificultar-se a sua possibilidade real de execução.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei do PCP, como já aqui foi referido, tem largos pontos de contacto com a anterior proposta Sousa Franco, ocorrendo o mesmo com a proposta de lei do Governo. Há alguns pontos de divergência, do qual destacamos um já aqui referido pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira. O PCP, no fundo, propõe uma lei de enquadramento do orçamento do sector público administrativo, enquanto o Governo propõe uma lei de

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enquadramento do Orçamento do Estado - e este é um ponto que temos de dirimir até ao fim, em sede de comissão, com a participação dos Deputados.
Srs. Deputados, não temos dúvidas que será necessário aperfeiçoar os sistemas, os processos e os métodos orçamentais, quer nos municípios, quer nas regiões autónomas!
Mas persiste uma dúvida: será que, na altura em que se prepara a revisão imperativa da lei das finanças das regiões autónomas e na oportunidade em que se prevê a apreciação do POCAL nas diferentes autarquias, se deverá reformular o actual enquadramento orçamental das autarquias e regiões autónomas? E de que forma? Apenas o que decorra da directa aplicação da nova Lei de Enquadramento Orçamental ou vamos mais longe, com novas regras? É uma questão que, julgo, até seria importante o próprio representante do Governo discutir connosco abertamente, em sede de comissão.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Conseguir-se-á, com este debate, chegar certamente a uma nova lei de enquadramento orçamental, que, simultaneamente, melhorará a transparência e a qualidade dos controlos orçamentais, integrará os aspectos fundamentais do orçamento da segurança social, assegurará o conhecimento aprofundado dos compromissos plurianuais e permitirá um claro e racional debate da estratégia de investimento público e da sua concretização.
Em qualquer caso, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, a Assembleia da República passará a ter um papel muito mais importante, nomeadamente no acompanhamento e controlo da execução orçamental e no debate e apreciação dos compromissos plurianuais do Estado, sob as mais diversas formas, das SCUT ao leasing.
As propostas apresentadas aqui hoje, de que o Deputado João Cravinho é o primeiro subscritor e das quais evidenciou os aspectos mais importantes, exprimem bem o interesse e a acuidade com que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista vê a intervenção e o acompanhamento parlamentar, de forma permanente, neste processo, desde o debate do Orçamento, passando pelo acompanhamento da sua execução, até à apreciação final das contas do Estado. E também com esse objectivo se concretizaram e apresentaram propostas, se estabeleceram periodicidades e datas.
Sr. Presidente, Sr. Membros do Governo, Srs. Deputados: A segurança social tem, nesta lei de enquadramento orçamental, um tratamento bastante mais aprofundado, quer na proposta do Governo, quer em alguns dos projectos de lei hoje em debate. O conjunto de quadros que permitem analisar, por diversos critérios e por modos de protecção social, o funcionamento financeiro da segurança social, conjugado com os mecanismos que são propostos, no domínio do acompanhamento e controlo orçamental, permitem uma análise permanente e mais profunda de todo o funcionamento da segurança social. E, no seu conjunto, a proposta de lei do Governo procura inspirar-se numa linha de maior rigor na utilização dos recursos públicos.
Foi com esse objectivo que já se começou a adoptar, na própria prática governamental e do Estado, o sistema ABB (do Orçamento baseado em actividades), dando-se uma maior relevância à orçamentação por programas na proposta de lei e, nomeadamente, estabelecendo-se uma melhor ligação entre objectivos e meios utilizados, o que é ainda aprofundado pelas propostas apresentadas pelo Grupo Parlamentar do PS.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Impõe-se um esclarecimento, após a intervenção do Sr. Deputado Herculano Gonçalves. O CDS-PP, em meu entender, não viu o seu projecto de lei votado na especialidade porque não é normal, nem possível, que existissem duas leis de enquadramento orçamental. O processo seguido permite, assim, que as suas propostas, que estão em comissão, possam contribuir para que o texto final da lei seja o melhor possível.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em sede de comissão, chegaremos certamente a um texto excelente, que, partindo da proposta governamental e dos outros projectos de lei, os quais, realmente, dão passos significativos num sentido positivo, contribua para que a Assembleia, o Governo, a Administração Pública e o País disponham de uma nova lei de enquadramento orçamental que contribua para uma melhor apreciação, debate e preparação do processo orçamental e do acompanhamento da sua execução, a favor de uma maior transparência, eficácia e defesa do bem público.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero fazer uma intervenção muito breve para sublinhar umas poucas mensagens.
A primeira é a de que, com este debate e o trabalho que se seguirá, na especialidade, se dá mais um passo muito importante para a reforma estrutural das nossas finanças públicas e, em particular, para a adaptação do enquadramento orçamental às necessidades de sermos, hoje, um membro de pleno direito da União Económica e Monetária.
A verdade é que, sendo, hoje, Portugal membro da União Económica e Monetária, membro da zona euro, cada vez mais e de forma cada vez mais intensa, a nossa política orçamental vai sendo submetida, tal como a dos outros países da União Económica e Monetária, a exercícios de supervisão multilateral que impõem cada vez maior rigor na evolução da despesa e na qualidade da despesa pública e, por outro lado, exigem cada vez mais que a dimensão do desenho da política orçamental a nível nacional seja compatível com a evolução do conjunto da economia da União Económica e Monetária a que pertencemos.
Creio, portanto, que este é um passo muito importante, de actualização e modernização do enquadramento legal das nossas finanças públicas na nova situação e no novo grande passo que constituiu, para Portugal, a entrada e a plena integração na zona euro.
A segunda mensagem que gostava de deixar sublinhada era a de registar, com muito apreço, a posição da esmagadora maioria dos partidos presentes neste Hemiciclo, uma posição construtiva, crítica e participativa para transformar e fazer melhorar o projecto que o Governo aqui apresentou.
Infelizmente, e como já vai sendo hábito, tivemos ausente deste debate construtivo o Grupo Parlamentar do PSD - peço desculpa, mas é esta a avaliação que fazemos. É a segunda vez, nos últimos meses, que debates importantes e estruturantes das finanças públicas portuguesas - o primeiro foi o da reforma fiscal e o segundo é este - contam com a ausência, com a falta de comparência, do Grupo Parlamentar do PSD…

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O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - … na discussão dos problemas de fundo, na expressão séria de críticas e também na expressão séria de propostas alternativas ou construtivas que contribuam para melhorar os diplomas apresentados.
É pena que assim aconteça. Espero que na discussão na especialidade o PSD se possa juntar a todos os grupos parlamentares que, com espírito construtivo e prático, já hoje aqui deram contributos extremamente importantes para melhorar este debate.
Finalmente, quero sublinhar a enorme importância que tem, do meu ponto de vista, a fixação da obrigatoriedade de um debate sobre a evolução da situação orçamental e da despesa pública, a realizar no mês de Maio de cada ano. Esse debate é extremamente importante não só para a Assembleia da República poder ser informada mas também para poder participar no processo de definição das grandes orientações de política económica a nível da União Europeia, que constitui, cada vez mais, um documento enquadrador, balizador e coordenador das políticas orçamentais a nível de cada um dos países da União Europeia.
Em síntese, eram estas as mensagens que aqui queria deixar registadas no final deste debate, insisto e sublinho uma vez mais, tão importante para a modernização e consolidação das nossas finanças públicas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra, por 1 minuto cedido pelo BE, a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero apenas manifestar a minha estranheza perante a observação do Sr. Ministro das Finanças, que, também como já vai sendo costume, diz sempre a mesma coisa e, neste momento, tornou a dizer aquilo que é pouco imaginável, ou seja, que o PSD esteve ausente deste debate.
O PSD, tal como os outros grupos parlamentares, apresentou também um projecto de lei de enquadramento, que ao Sr. Ministro e à bancada do PS serve tão pouco que, da última vez que esta matéria foi aqui discutida, foi o único a não ser aprovado - e não o foi por ausência de mérito ou de contribuições mas, provavelmente, por terem considerado que era o projecto de lei que mais os incomodava.
Mas, Sr. Ministro das Finanças, quem esteve verdadeiramente ausente deste debate foi o Sr. Ministro. É que o Sr. Ministro, como previamente afirmei, esteve presente neste debate enquanto todas as bancadas fizeram as suas intervenções através de Deputados ligados à área do desporto,…

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se. Peço-lhe que conclua.

A Oradora: - … tendo considerado que era essencial para o seu ministério resolver esse problema. Mas quando se iniciou a discussão da outra matéria, deu a palavra ao muito competente Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento e limitou-se, agora, a fazer uma intervenção. Quem esteve ausente deste debate foi quem nunca o devia ter estado, foi o Ministro das Finanças deste país.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra, por 1 minuto também cedido pelo BE, o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero saudar o Sr. Ministro das Finanças, nesta fase final deste debate, exactamente por ter concluído o que, afinal, não era difícil concluir, ou seja, que o PSD esteve fora deste debate.

Protestos da Deputada do PSD Manuela Ferreira Leite.

Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, faça o favor de me ouvir.
Como dizia, o PSD esteve fora deste debate, e esteve-o, aliás, coerentemente. É que o quadro do PSD que, recentemente, foi nomeado «ministro-sombra» das Finanças - e estamos a falar de um homem que foi governador do Banco Central até há pouco tempo - declarou, há muito pouco tempo, entre outras «preciosidades»,…

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Já está na Europa?! Nós ainda estamos no Banco de Portugal!

O Orador: - … que o PSD não estava disponível para estabelecer qualquer acordo com o PS e com o Governo em matéria de reformas estruturais, quanto à administração financeira do Estado. Portanto, ele próprio confessou que o PSD se quer colocar sistematicamente de fora destas reformas.
Por isso, V. Ex.ª, Sr. Ministro, foi muito avisado ao fazer essa referência. E espanta-me que a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, conhecendo essas declarações do putativo ministro das Finanças do PSD, tenha feito a intervenção que fez. É que maior confissão do que essa não podia ter ocorrido! Aliás, a personalidade em questão…

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Peço-lhe que conclua.

O Orador: - Estava só a dizer, Sr. Presidente, que a personalidade em questão já nos brindou com afirmações deste género, há relativamente pouco tempo, ao propor a saída de Portugal da zona euro, pelo que não é de admirar.
Agora, neste caso concreto, afirmou peremptoriamente que o PSD não está disponível para colaborar com o Governo em matéria de reformas estruturais, quanto à administração financeira do Estado.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Muito brevemente, quero reafirmar aquilo que disse e lembrar à Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite que o contributo dado pelo PSD a este debate foi um contributo que esta Câmara já tinha «chumbado» há alguns meses e em relação ao qual não houve alteração alguma.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Vá-se lá saber porquê!

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O Orador: - E a intervenção do Sr. Deputado Manuel dos Santos faz-me pensar numa outra observação sobre a maneira como o PSD e os seus porta-vozes oficiais intervêm sobre as questões importantes das nossas finanças públicas, alguns mesmo sobre questões difíceis das nossas finanças públicas. Referindo-me concretamente ao porta-voz do PSD para as questões relacionadas com as finanças públicas, é realmente deprimente ver esse porta-voz, sistematicamente, fazer intervenções em que parece que se debate com um fantasma. Esse fantasma é a incapacidade desse dirigente do PSD de aceitar, nomeadamente no que respeita à avaliação das finanças públicas, que há um regime, num sistema europeu de contas, chamado SEC-95, que baliza sempre e face ao qual é avaliado o estado das finanças públicas portuguesas e de todos os outros países da União Europeia.
O Dr. Tavares Moreira quer criar como que uma espécie de SEC do Dr. Tavares Moreira, um sistema de contas públicas do Dr. Tavares Moreira, face ao qual ele avalia aquilo que ele imagina ser o estado das finanças públicas portuguesas. É esse corte autista, no sentido político, com a realidade estatística de avaliação das finanças públicas que determina um posicionamento do PSD - com as responsabilidades que tem de ser o principal partido da oposição - sempre negativo e não construtivo na resolução dos problemas que, efectivamente, temos no domínio das nossas finanças públicas.
Quanto à sua crítica sobre a minha ausência no debate, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, ela não tem justificação …

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Ministro, o seu tempo esgotou-se.
Peço-lhe que conclua.

O Orador: - Sr. Presidente, vou terminar.
Dizia eu que a crítica da Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite me fez não é exacta nem correcta.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr.as e Srs. Deputados, a lista de oradores esgotou-se e, por isso, está concluída a discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 44/VIII e dos projectos de lei n.os 272/VIII, 294/III e 344/VIII.
A votação destes diplomas será feita oportunamente, nos termos regimentais.
Sr.as e Srs. Deputados, vamos entrar no ponto seguinte da ordem de trabalhos, que é a apreciação do relatório final da Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar para Apreciação dos Actos do Governo Referentes ao Processo que Conduziu à Participação da Eni e Iberdrola no capital da Galp, SGPS.
Para intervir, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação ao inquérito cujo relatório agora apreciamos, a nossa posição centra-se em três pontos, que são três reflexões sobre todo o processo.
O primeiro ponto tem a ver com o mandato, ou seja, nós entendemos que este processo se iniciou com uma obscuridade em relação ao mandato que foi dado ao Eng.º Bandeira Vieira para negociar a privatização da Galp.
O Ministro das Finanças de então, Professor Sousa Franco, teve ocasião de dizer, com clareza, que não tinha conhecimento desta operação, que nunca deu autorização para que ela se fizesse e, sendo certo que a tutela era dos dois ministros, mal se entende que este assunto não tenha sido mais esclarecido e não tenha o seguido o caminho que estas situações obscuras devem ter.
O segundo ponto tem a ver com o que está, neste momento, a acontecer com a fusão numa única empresa da Galp Energia. Sabemos que é isso que tem acontecido um pouco por todo o lado, mas também não podemos ignorar o que se está a passar: a descoordenação é grande, as demissões são em catadupa, há um sentido de descoordenação na gestão deste sector que não pode deixar de nos chocar.
Há um outro ponto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que deve merecer a nossa atenção, e se V. Ex.ª me permite, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, agora, dirijo-me particularmente a si.
A questão que se coloca é esta: quanto custam as indemnizações das pessoas que estão a sair da Galp? O nosso grupo parlamentar gostava de ser informado sobre quais são esses montantes.
Há dezenas de pessoas a sair da Galp, consta-nos que com indemnizações enormes, que custam centenas e centenas de milhar de contos a uma empresa em que, no fim de contas, o Estado, portanto todos nós, tem uma elevada participação. O que é que se passa quanto a isto?
Faço esta pergunta porque, se aquilo que consta é verdade, também aí há deficiências que necessitam de ser esclarecidas e corrigidas o mais rapidamente possível.
Finalmente, quero fazer uma última reflexão, como diria o Eng.º Amaro da Costa, uma reflexão melancólica: não compreendemos como é que o Governo incita os privados da Petrocontrol a vender as suas participações, dando-lhes, num só dia, dezenas e dezenas de milhões de contos de lucros isentos de impostos, e agora está a pedir aos particulares para voltarem ao sector. O que é isto? Quanto é que o Estado perde com esta operação? Por que é os privados da Petrocontrol não serviam e agora se está a abrir a participação a novos privados? Há mudança de orientação? O que é que se passa no meio disto?
O relatório não nos diz nada e é pena. O relatório tem conclusões, que foram votadas, manifestamente, e nós ratificamos essa posição de uma maneira…

O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Foi o relatório possível!

O Orador: - Foi o relatório possível, diz-nos o Deputado Rosado Fernandes, mas não o desejável, Sr. Presidente e Srs. Deputados. Muito ficou por esclarecer; muito terá de ser esclarecido! O CDS-PP, neste domínio, não parará enquanto não ficar tudo esclarecido!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para intervir, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: Encontramo-nos, hoje, aqui, a apreciar o relatório da comissão de inquérito à GALP.
Gostaria, em primeiro lugar, de constatar que os aspectos mais duros e as críticas mais violentas referidas pelo PSD no documento que origina a criação da Comissão

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de Inquérito e nas declarações abundantemente produzidas, nomeadamente pelo seu actual líder político, deram em quase nada.
Esvaziaram-se os duros comentários, deixaram-se cair as críticas ao Eng.º Ferreira de Oliveira, antecessor do antecessor do actual Presidente da Galp, o qual era, entre outras coisas, suspeito de ganhar muito, o que aparecia como incompreensível para um presidente de uma companhia petrolífera de uma importantíssima empresa energética.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que se concluiu de essencial no relatório aprovado? O que recomendou a Comissão ao Governo?
Por proposta dos Deputados do PS, com alguns enriquecimentos oriundos de Deputados de outros partidos, a Comissão aprovou, por unanimidade, que «o Estado deverá agora fazer uso de todos os instrumentos de que possa dispor de forma a permitir a substituição da Petrocontrol por outro grupo de accionistas nacionais. Na mesma conclusão diz-se que «(…) em articulação com o parceiro privado estrangeiro e com o Estado, devem ser o garante da solidez e coerência estratégica num sector de interesse relevante para o abastecimento energético do País».
Mais se diz que dessa forma «(…) devem dar continuidade à vontade sempre afirmada em todos os decretos-leis e resoluções do Conselho de Ministros produzidos sobre a reestruturação do sector do petróleo e do gás, de manter uma componente empresarial nacional neste sector. E, em articulação com o parceiro privado estrangeiro e com o Estado, devem ser o garante da solidez e coerência estratégica num sector de interesse relevante para o abastecimento energético do País».
Esperamos, diria mais, confiamos, que as recentes modificações ocorridas na administração da Galp Energia - hoje já referidas, num tom diferente do que eu uso, pelo Sr. Deputado Basílio Horta - propiciarão condições para que se ganhe ainda mais solidez e coerência estratégica no sector, como a Comissão Parlamentar de Inquérito recomendou, por proposta, com eu disse, dos Deputados do PS.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: O que se apurou mais? Apurou-se, por exemplo, que o Estado, ao proceder à alienação das acções à Eni, não tinha conhecimento de que a Petrocontrol não tencionava manter-se como accionista da Galp, SGPS - refiro-me ao que está no quesito 10.
Apurou-se ainda que o Eng.º Ferreira de Oliveira não foi pressionado para anuir à viragem do rumo estratégico anteriormente traçado para a Galp - quesito 11 -, o que tinha sido abundantemente noticiado pela imprensa, com base em fontes geralmente bem informadas.
Também não foi apurado qualquer facto relevante que possa legitimar a afirmação de que a marca Galp vai desaparecer em Espanha - refiro-me ao quesito 7 -, o que respondia também a um conjunto de preocupações expressas.
Ou seja, e resumindo, praticamente não se extraiu qualquer conclusão relevante que confirmasse os grandes receios que alguns sectores oposicionistas, nomeadamente do PSD, diziam existir quanto a esta questão.
A Comissão entendeu importante sublinhar a necessidade de salvaguardar a manutenção futura de ambas as refinarias, e essa parece-me ser uma recomendação importante que a Comissão produziu depois de ter ouvido os depoentes e consultado todos os documentos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: É claro, não pode negar-se, que houve - o que, aliás, foi aprofundado na Comissão -, uma alteração da linha de orientação governamental, reconhecida pela Comissão e materializada no despacho do Ministro Pina Moura de 14 de Janeiro de 2000 e num conjunto de decisões subsequentes. Mas essa é uma questão de estratégia no domínio da política energética, que cabe mais apreciar à Comissão de Economia, Finanças e Plano e ao próprio Plenário do que a uma comissão parlamentar de inquérito.
Sr. Presidente, quando os trabalhos da Comissão estavam quase a ser encerrados, foram chamadas mais algumas personalidades de elevado nível, o que produziu algumas discussões interessantes mas não alterou a orientação global da Comissão.
Além das conclusões que já referi e sublinhei e da recomendação política fundamental ao Governo, saliento o envio da carta-convite do Eng.º Bandeira Vieira, ex-Presidente da Galp Energia, para a Procuradoria-Geral da República.
Importa, no quadro deste debate, referir que algumas das preocupações que o Sr. Deputado Basílio Horta mencionou, dizendo que a Comissão não as tinha focado, podem ser legítimas.
A Comissão abordou essas preocupações, mas há um conjunto de questões mais precisas que têm a ver com a evolução e a concretização da política energética, cabendo a sua análise, no actual quadro de funcionamento do Parlamento, ou ao Plenário ou à Comissão de Economia, Finanças e Plano. Aliás, estamos sempre disponíveis para discuti-las.
Sr Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Em meu entender, a Comissão cumpriu o seu dever, presidida, aliás, de uma forma excelente.
A nossa preocupação, certos de que o Governo seguirá a recomendação parlamentar, é que o nosso sector energético se mantenha forte, com empresas rentáveis, competitivas, com a satisfação dos que nelas laboram e com capacidade de intervir não só no mercado nacional como também nos mercados internacionais, a bem de Portugal e dos portugueses, que é o que nos interessa defender.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vicente Merendas.

O Sr. Vicente Merendas (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Os Deputados do PCP que integraram a Comissão de Inquérito em questão contribuíram de forma activa e votaram favoravelmente as conclusões aprovadas por constatarem, por um lado, que elas consagravam o consenso possível de obter entre todos os Deputados que integravam a Comissão e, por outro lado, que seria ética e politicamente incompreensível que, existindo esse consenso mínimo, o relatório pudesse vir a ser aprovado sem quaisquer conclusões.
Mas consideramos igualmente que, com base nos depoimentos ouvidos e na documentação fornecida à Comissão, as conclusões a retirar deveriam ter ido mais além. Temos o entendimento que, em matérias de relevante importância para o País, como a que foi objecto desta Comissão de Inquérito, a verdade factual razoavelmente aprovada deve prevalecer sobre quaisquer calculismos de natureza político-partidária.

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O Partido Comunista Português considera que o caso da Galp é bem demonstrativo dos prejuízos que para o País advêm do prosseguimento de uma política de destruição do sector empresarial do Estado, levada a cabo de uma forma brutal e sistemática, num autêntico esbulho e delapidação do património nacional.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - A concentração da riqueza, a vassalagem prestada ao grande capital e a conjugação e a promiscuidade de interesses, resultando numa crescente subordinação do poder político ao económico e financeiro em detrimento dos interesses nacionais e do povo português, são hoje traços essenciais da política do Governo PS.

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Bem lembrado!

O Orador: - Procurando esconder as reais consequências da política de privatizações, o PS afirma correntemente que a mesma beneficia o País, mas a verdade é, de forma clara, outra: o País não só perde empresas, as mais produtivas e em sectores essenciais à promoção do desenvolvimento económico e social, como acaba por tornar-se refém das estratégias e decisões de poderosas multinacionais.
Com as privatizações, os lucros das empresas públicas são subtraídos ao erário público e transferidos para os grupos económicos e financeiros. As negociatas e favores nos processos de privatizações têm demonstrado quem realmente ganha e perde com este crime de lesa-pátria.
As privatizações têm sido um mar de negociatas e favorecimentos de clientelas, onde ressalta o compadrio, a adulteração de valores e o nepotismo como componentes inseparáveis de uma política apostada na lógica da concentração da riqueza.
As consequências negativas do processo privatizador para os serviços públicos e para os interesses das populações nos vários sectores estão bem à vista.
Em relação à Galp, as consequências nefastas da estratégia do Governo estão a conduzir à perda do controlo pelo Estado de um importante segmento do sector energético, de uma importante alavanca do desenvolvimento económico e de uma salvaguarda da independência do nosso país.
No plano social, para os trabalhadores, é a destruição de postos de trabalho, envolvendo já largas centenas de trabalhadores efectivos, e o bloqueamento das reconversões de emprego dos trabalhadores afectados pelo fecho de instalações, como é o caso da produção de gás de cidade. É ainda a multiplicação da precariedade de emprego, o recurso abusivo e ilegal a pessoal de empreiteiros, a desestabilização social, que já se verifica, resultante da política de pessoal assente, principalmente, numa acção psicológica por vezes até repressiva.
A Galp Energia, que hoje agrupa e representa as empresas dos dois subsectores do petróleo e do gás e que assenta a sua estrutura na Petrogal e na GDP, como líderes de cada um dos subsectores, constitui um valioso património industrial e comercial do nosso país, quer pela natureza e importância estratégica dos serviços que presta, quer pela riqueza que cria (mais de 112 milhões de contos de cash-flow e mais de 60 milhões de contos de resultados líquidos em 1999).
É este importante património estratégico no campo da energia, para Portugal, que o Governo PS pretende colocar totalmente nas mãos do capital estrangeiro, ou seja, pretende entregar o controlo do abastecimento energético do País a uma entidade estrangeira, neste caso, a ENI.
No processo da Galp, o Governo deve empenhar-se convictamente de forma a garantir que o Estado continue, por si próprio, a assegurar o núcleo central e determinante da propriedade, gestão e decisão do sector energético do petróleo e do gás e, por conseguinte, o controlo da Galp Energia pelo Estado português.
Em relação ao objecto de apreciação pela Procuradoria-Geral da República, não pode haver entraves e devem ser respeitadas escrupulosamente e de uma forma célere as conclusões da Comissão de Inquérito, tal como deve ser clarificado o âmbito do acordo parassocial assinado com a Eni, diversamente do que resultava do acordo anteriormente estabelecido com a Petrocontrol em relação à garantia do futuro das duas refinarias portuguesas. Chamo a atenção, Srs. Deputados, para a contradição existente entre estes dois acordos.
A Petrogal deve manter-se como uma grande empresa de refinação e deve ser assegurada a concretização do plano estratégico de investimentos da Petrogal até ao ano 2005.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, peço-lhe que conclua, pois esgotou o tempo de que dispunha.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sem um sector forte e dinâmico não é possível garantir um verdadeiro projecto de desenvolvimento do País que contribua para afirmar a sua soberania no quadro da cooperação e das interdependências com a Europa e o mundo de hoje. Portugal sofrerá plenamente as consequências da entrega de alavancas económicas fundamentais às multinacionais e do reforço dos grupos económicos ditos portugueses, que, sejam quais forem as consequências negativas para o País, apenas conhecem a linguagem dos seus interesses.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Neto.

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É bom rememorar que foi por iniciativa do PSD que, em 6 de Abril de 2000, foi constituída a Comissão de Inquérito Parlamentar para Apreciação dos Actos do Governo Referentes ao Processo que Conduziu à Participação da Eni e da Iberdrola no Capital da Galp, SGPS.
Em causa estava a transparência e a confiança que têm de presidir a todos e quaisquer actos ou negócios que directamente contendam com o Estado português e que, ao cabo e ao resto, radicam naquele acervo de valores e princípios que enforma a tão em voga ética republicana.
Dito isto e entrando no âmago da questão, visava-se, primacialmente, apurar e dilucidar o feixe de razões justificativas que determinaram que o Governo do Partido Socialista, em Janeiro de 2000, tivesse inflectido abruptamente na sua posição de privilegiar a criação de um grupo português no domínio energético, com centro de decisão sediado em Portugal e em mãos nacionais, personificado na Petrocontrol.

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Traduzia-se essa inflexão pela inopinada atribuição à Eni da posição societária de minoria de bloqueio e de accionista de referência anteriormente detida pela Petrocontrol e, mais grave do que isso, conferindo-lhe por via contratual, a fortiori, direitos acrescidos de co-gestão efectiva da empresa, já nos dias de hoje, e de fundada expectativa de controlo societário e gestório absolutos num futuro não muito longínquo.
Manda a verdade dizer que os trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito foram profícuos e sagazes, no sentido de sublinhar o desacerto de toda a deriva estratégica do Governo na condução do processo de selecção da parceria estratégica na Galp. Alguns mesmo, ilustres e insuspeitos, como o anterior Ministro das Finanças Sousa Franco, não hesitam, ainda hoje, em proclamar, alto e bom som, o enigma indecifrável de todo este processo à luz da razão, da lógica empresarial ou do interesse nacional.
O PSD comunga dessa dúvida metódica, pertinente, fundamentada, mas não encontrou, nem encontra, explicação e pelo espírito dos seus Deputados perpassa, inexoravelmente, o sentimento do dever cumprido mitigado com o travo amargo da convicção de que se poderia ter ido mais longe, como o indicia a caterva de conclusões, avisadas e indeclináveis, por si apresentadas, sufragadas em bloco pelos restantes partidos da oposição mas divisavelmente censuradas pelos Deputados do Partido Socialista.
Sem embargo do que acima vai expendido, o PSD congratula-se com os resultados desta Comissão na exacta medida em que dela decorre o bem fundado dos argumentos por si terçados no momento da fundamentação da sua constituição. Exulta com as conclusões de que, ao longo do processo de privatização, deve ser preservada a manutenção do centro de decisão da empresa em Portugal, assegurada a prevalência de um núcleo accionista português de referência e usados todos os instrumentos para permitir a substituição da Petrocontrol por grupos nacionais, mantendo uma componente empresarial no sector que, em articulação com o Estado e com o privado estrangeiro, seja o garante da solidez e coerência estratégica num sector tão relevante como é o do abastecimento energético do País.
Não pode, naturalmente, o PSD deixar de pugnar, também, pelo esclarecimento integral de todo o circunstancialismo fáctico envolvente do mandato do então Presidente da Galp, ao subscrever acordos em representação da República de Portugal sem que tivesse poderes para tal, designadamente do Ministro das Finanças, à época. Esclarecimento e investigação criminal que se impõem, a montante e a jusante, sem peias, sem constrangimentos e sem limites que não sejam os da verdade.
Analisados os recentes acontecimentos na alteração da gestão da Galp, constata-se que a instabilidade persiste. Mas deseja-se que o bom senso impere e que as conclusões da Comissão de Inquérito possam constituir uma luz para os seus gestores no interesse nacional. Nesse dia, clamaremos urbi et orbi que valeu a pena esta Comissão Parlamentar de Inquérito.

Aplausos do PSD.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uso da palavra neste debate tão-só para transmitir, em nome do Governo, a nossa satisfação por estar agora encerrado um processo que se abriu no ano 2000, portanto, sensivelmente há um ano, em condições que são simétricas daquelas que marcaram a respectiva abertura na praça pública e na Assembleia da República.
É sempre possível, Sr. Presidente e Srs. Deputados, ir mais longe em tudo, mas o que ninguém consegue é encontrar o que não haja. E, por isso, quem fizer um cotejo entre o libelo acusatório que, no ano passado, o Sr. Deputado Jorge Neto apresentou ao Parlamento e ao País e o resultado das respostas aos quesitos, que já estão publicados no Diário da Assembleia da República, II Série-B, n.º 11, a páginas tantas, saberá, inequívoca e irretorquivelmente, que esse libelo acusatório não teve confirmação. E já nem aludo à campanha mediática que visava magnificar o que do libelo constava, porque, quanto a essa, está irrefragavelmente feita e, nesse sentido, «o crime compensa».
Compreendam o que eu digo, ou seja, a perpetração de uma imagem errada fez o seu curso, foi combatida nesse terreno, não cabia senão combatê-la neste. Julgo que o resultado, para quem ler este texto, não deixa de ser impressionante, porque o inquérito está bem estruturado, no sentido exacto de que formula quesitos e lhes dá resposta. Nesse sentido, cumpre uma disposição da lei dos inquéritos, que nem sempre é cumprida, e cumpre-a segundo regras que devem ser acatadas e respeitadas e que permitem distinguir situações, e dessa distinção já resulta uma importante contribuição do Parlamento para a discussão pública da questão.
Chegamos, então, às conclusões. E uma delas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, respondidos os quesitos, é relativa ao accionamento da Procuradoria-Geral da República para que esta apure uma interpretação ou uma hermenêutica para uma questão interpretativa que diz respeito a uma das dezenas de questões suscitadas pelo inquérito. Julgo que a Procuradoria-Geral da República o fará segundo os seus critérios de imparcialidade e o fará em termos que aguardamos com toda a serenidade, uma vez que nos abonamos na hermenêutica que é do conhecimento dos Srs. Deputados e que foi transmitida à Comissão de Inquérito.
Quanto ao resto, o que nos traz este inquérito ou as suas conclusões? Traz-nos, no fundo, duas recomendações de política energética, que poderiam perfeitamente ser feitas fora do inquérito parlamentar, porque, como sabem, não há, entre as missões dos inquéritos, tipicamente, a de formular análises de política sectorial. Essa é a função das comissões ad hoc, das comissões eventuais de estudo, das comissões para feitura de livros verdes, das comissões de discussão com a sociedade civil, das comissões de discussão com a Administração Pública. Portanto, quando se faz um inquérito é para apurar graves ilegalidades, graves descoinsidências entre a lei e as políticas sectoriais ou gerais seguidas pelo Governo, e, nesse ponto, não há nenhuma conclusão que faça qualquer reparo ao Governo, que deva ser sentida como de menor apreço pela sua actuação e gostaria de me congratular por isso.
Por último, Srs. Deputados, permitam-me que sublinhe um aspecto que percorreu algumas das bancadas e que, designadamente, começou por ser colocado pelo Sr. Deputado Basílio Horta. Julgo que é de todo o interesse

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que a Câmara discuta, com as formas regimentais próprias, política energética e, designadamente, a política energética na sua fase actual, em toda a sua dimensão.
Os Srs. Deputados têm ao vosso dispor - e o Governo, de resto, também tem ao seu dispor - figuras regimentais que o permitem fazer. Compreendo que esse debate é despojado de alguma da emoção, designadamente a mais rentável numa óptica do espaço público mediatizado, ao contrário desta fórmula, porque esta fórmula anuncia coisas tremendas e se, um mês depois, nada de tremendo no plano de ilegalidade se apura, isso é decepcionante, mas é uma decepção que se mete «debaixo do tapete».
Mas o desafio, Srs. Deputados, é muito maior do que isso. Essa forma de fazer política é facílima e, permitam-me que vos sublinhe, não me parece sequer muito rentável nos propósitos que se coloquem nos seus resultados.
O que é verdadeiramente um desafio é discutir alternativas. Discutir alternativas com os protagonistas, que terão todo o gosto em comparecer na Câmara, saber se a solução encontrada, por exemplo, para a Galp Energia suscita reticências nesta Câmara - curiosamente, não as vi.
A questão colocada pelo Sr. Deputado Basílio Horta é de uma outra natureza: tem a ver com o cumprimento da lei, com as consequências do cumprimento da lei e com a medição das consequências do cumprimento da lei. A medição, Srs. Deputados, está ao vosso alcance e o Governo terá todo o gosto em propiciar a auscultação e o escrutínio necessário. Usem as formas regimentais para esse feito e terão, sem dúvida nenhuma, resposta. Mas o interessante é discutir as alternativas,...

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Vem o Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares discutir isso?!

O Orador: - ... é discutir, designadamente, se tem algum sentido o discurso cerradamente ideológico que ficciona o mundo inexistente de empresas puramente públicas no sector energético, que é totalmente indiferente às vicissitudes que, por todo o mundo, avassalam o sector, que é completamente indiferente à política energética europeia, que é completamente indiferente aos factores exógenos, que é completamente indiferente ao mundo,...

Protestos do Deputado do PCP Lino de Carvalho.

... bradando, pura e simplesmente, em termos cerradamente ideológicos, o seu «Corão», repetido à saciedade, mas em exercício de autismo!

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Isto é uma coisa extraordinária!

O Orador: - Não é desse discurso que os portugueses poderão esperar um litro de sabedoria e um litro de utilidade.
Compreendo que isso irrite alguns Srs. Deputados, mas é, de facto, frustrante verificar que o seu discurso, por mais que cerre, não racha e, por mais que inculque soluções erróneas, não as demonstra.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Está a falar de energia!

O Orador: - Por isso, Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Carlos Encarnação, direi que este inquérito termina bem, e termina com a declaração de que o Governo ponderará cuidadosamente as recomendações e que algumas das soluções neste momento adoptadas decerto satisfarão aqueles que votaram uma solução que apelava a que o Governo encontrasse solidez e coerência estratégica num sector de interesse relevante para o abastecimento energético do País.
Assim será, Sr. Presidente, e assim se realizarão os melhores desejos unânimes desta Câmara.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Lino de Carvalho, tinha pedido a palavra para uma interpelação à Mesa. Faça favor.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, estava aqui a reflectir em que o Sr. Secretário de Estado nunca se deu por tão satisfeito na vida!…

Risos do PCP.

Passo à matéria da minha interpelação, Sr. Presidente.
A primeira conclusão da Comissão de Inquérito aponta no sentido do envio da carta-convite e respectivos anexos do então Presidente da Galp, Eng.º Bandeira Vieira, à Procuradoria-Geral da República para os fins que lhe são próprios.
De acordo com informação que recolhi pelas bancadas, já que não fiz parte da Comissão de Inquérito…

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Graças a Deus!

O Orador: - … surge uma dúvida de índole regimental, que o Sr. Presidente esclarecerá.
Pensa-se que, na altura, o Presidente da Comissão terá feito diligências no sentido do envio dessa carta-convite.
Assim, interpelo a Mesa, para que isto fique registado em Acta, porque tenho uma dúvida regimental - para não dizer uma certeza regimental - segundo a qual, ao abrigo do Regimento, seria necessário uma resolução do Plenário da Assembleia da República no sentido de serem enviados à Procuradoria-Geral os documentos cujo envio a Comissão de Inquérito entendeu adequado.
Perante a ausência de uma tal resolução, no quadro desta minha dúvida e a confirmar-se a informação que recolhi em todas as bancadas, fica exarado em Acta que o Sr. Presidente da Comissão de Inquérito já terá enviado os referidos documentos ao Sr. Presidente da Assembleia da República, o qual, por sua vez, terá feito as diligências que entendeu adequadas no sentido de promover o envio dos documentos ao Sr. Procurador-Geral da República.
Deixo, pois, esta questão, para efeitos de registo em Acta, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos, igualmente para uma interpelação à Mesa, suponho que sobre a mesma matéria.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Exactamente, Sr. Presidente.
É para prestar dois esclarecimentos: primeiro, em minha interpretação, a apresentação de um projecto de resolução é da competência da Comissão de Inquérito, o que está previsto no Regimento. A Comissão não apresentou qualquer projecto de resolução e, aliás, não é absolutamente necessário que assim seja.

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Estamos aqui a fazer uma discussão, nem sequer estamos a aprovar ou a rejeitar o relatório - nem poderíamos fazê-lo! - e as conclusões da Comissão são imperativas. Portanto, a Comissão concluiu pelo envio de determinado tipo de documentação para determinado órgão, e isso é imperativo.
O segundo esclarecimento tem a ver com uma discussão que tivemos em sede da última conferência de líderes, durante a qual este problema foi abordado, e em que o Sr. Presidente da Assembleia da República confirmou que já tinha recebido do Sr. Presidente da Comissão de Inquérito, o ex-Deputado José Penedos, indicação no sentido do envio à Procuradoria-Geral da República da referida documentação, mas que foram suscitadas dúvidas sobre a necessidade ou não de obter alguma autorização prévia relativamente a pessoas que depuseram perante a Comissão. Assim, o Sr. Presidente da Assembleia da República deu-nos conta de ter pedido, com carácter de urgência, um parecer à sua auditoria jurídica.
Portanto, a situação está controlada e nas mãos do Sr. Presidente da Assembleia da República, o qual, logo que tenha tomado uma decisão, accionará a disposição da conclusão da Comissão de Inquérito.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Então, é caso para dizer que está em boas mãos!
Quanto à matéria da interpelação do Sr. Deputado Lino de Carvalho, que fica registada em Acta, o que a Mesa tem a dizer é que, neste momento, não existe qualquer projecto de resolução para ser votado.
Não havendo mais inscrições, está terminado o debate.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proclamar o resultado de uma votação que teve lugar hoje.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, vou passar a ler a acta da deliberação relativa ao mandato do Sr. Deputado Fernando Manuel Lopes Penha Pereira.

Aos quinze dias do mês de Fevereiro de dois mil e um, a Assembleia da República delibera em reunião plenária, por voto secreto, autorizar o Sr. Deputado Fernando Manuel Lopes Penha Pereira a ser ouvido como arguido nos autos do inquérito n.º 41/00-F dos Serviços do Ministério Público da Covilhã, nos termos do parecer aprovado na reunião plenária da Comissão de Ética em 7 de Fevereiro de 2001.
O resultado obtido foi o seguinte: Votantes - 116; Votos «sim» - 104; Votos «não» - 9; Abstenções - 3.
Para se constar se lavrou a presente acta que vai ser devidamente assinada.
Os Deputados escrutinadores, Artur Penedos - Manuel Oliveira.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, está esgotada a ordem de trabalhos para hoje.
A próxima reunião plenária terá lugar na quarta-feira, 21 de Fevereiro, pelas 15 horas, e constará de uma interpelação ao Governo sobre criminalidade, violência e política de segurança interna, requerida pelo CDS-PP.
Nada mais havendo a tratar, está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 40 minutos.

Declaração de voto enviada à Mesa, para publicação,
relativa à votação do requerimento, apresentado pelo PS, PCP, Os Verdes e BE, de baixa à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, sem votação na generalidade, dos projectos de lei n.os 6/VIII, 45/VIII, 105/VIII e 115/VIII.

A decisão de baixar à Comissão os diplomas sobre as uniões de facto e vida em economia comum para, num prazo de trinta dias, voltarmos a esta discussão com um diploma equilibrado, depurado e justo é a resposta ao apelo que ontem fiz, nesta Câmara.
Os partidos a nossa esquerda parlamentar dão, assim, um sinal claro de responsabilidade nesta matéria e demonstram que foram sensíveis ao apelo da bancada do PS.
Este é um marco que estamos a construir para a consolidação de uma sociedade tolerante e pluralista, permanentemente atenta as questões sociais.
Com esta medida todos ficam protegidos; o direito à diferença, à privacidade e à liberdade individual fica assegurado. Somos intransigentes na não intromissão do Estado na intimidade de cada um, continuando a afirmar que o fundamental é garantir os direitos dos cidadãos independentemente da sua orientação sexual.

Os Deputados do PS, Ana Catarina Mendonça - Strecht Ribeiro - Maria de Belém Roseira - Manuel dos Santos - Maria Celeste Correia - Helena Roseta - Francisco de Assis - José Barros Moura - Maria Santos - Osvaldo Castro.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres
José Eduardo Vera Cruz Jardim
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos

Partido Social Democrata (PSD):
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
António Paulo Martins Pereira Coelho
Arménio dos Santos
Eugénio Fernando Sá Cerqueira Marinho
Joaquim Monteiro da Mota e Silva

Partido Comunista Português (PCP):
Maria Odete dos Santos

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
António Alves Martinho
António de Almeida Santos
Cláudio Ramos Monteiro
José Carlos Lourenço Tavares Pereira
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Rui Manuel Leal Marqueiro

Partido Social Democrata (PSD):
Henrique José Monteiro Chaves
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Durão Barroso

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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