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Quinta-feira, 10 de Maio de 2001 I Série - Número 79

DIÁRIO da Assembleia da República

VIII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2000-2001)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 9 DE MAIO DE 2001

Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex. mos Srs. José Ernesto Figueira dos Reis
José de Almeida Cesário
António João Rodeia Machado

S U M Á R I O

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 20 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de lei n.º 73/VIII, da proposta de resolução n.º 55/VIII, dos projectos de lei n.os 436 e 437/VIII e do projectos de resolução n.o 138/VIII, de requerimentos e da resposta a alguns outros.
A Câmara aprovou um parecer da Comissão de Ética relativo à substituição de um Deputado do PS.
Foi ainda aprovado o projecto de deliberação n.º 14/VIII - Constituição de uma comissão eventual para a revisão constitucional (PS, PSD e CDS-PP).
Em declaração política, o Sr. Deputado António Capucho (PSD) criticou o XII Congresso do PS pela ausência de ideias e vazio de propostas, bem como o Primeiro-Ministro por, no seu discurso de encerramento, ter tentado criar uma crise política, responsabilizando a oposição em geral e o PSD em particular.
O Sr. Deputado Francisco de Assis (PS) deu conta das conclusões do XII Congresso do PS, tendo elogiado o esforço que o Governo tem levado a cabo na reforma fiscal, na segurança social, na saúde e na administração pública. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Manuel Queiró (CDS-PP), Luís Fazenda (BE), Octávio Teixeira (PCP) - que também exerceu o direito regimental da defesa da honra da bancada - e António Capucho (PSD). Entretanto, o Sr. Deputado Carlos Carvalhas (PCP) prestou um esclarecimento ao Sr. Deputado Francisco de Assis e deu explicações ao Sr. Deputado Jorge Coelho (PS), que exerceu o direito regimental da defesa da honra pessoal.
Seguiu-se um debate de actualidade com o Sr. Ministro da Ciência e da Tecnologia (Mariano Gago), sobre a situação e perspectivas da política científica e tecnológica nacional, no qual intervieram, a diverso título, além daquele membro do Governo, os Srs. Deputados Luísa Mesquita (PCP), Rosado Fernandes (CDS-PP), Carlos Lavrador (PS), José Luís Ferreira (Os Verdes), Natalina Tavares de Moura e António Braga (PS), David Justino (PSD), Manuel Queiró (CDS-PP) e Fernando Rosas (BE).

Ordem do dia. - Procedeu-se ao debate do projecto de resolução n.º 80/VIII - Sobre a instalação de um sistema de controlo de tráfego marítimo (Os Verdes), tendo intervindo, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado da Administração Marítima e Portuária (José Junqueiro), os Srs. Deputados Heloísa Apolónia (Os Verdes), José Eduardo Martins (PSD), Manuel Queiró (CDS-PP), Joaquim Matias (PCP) e Natalina de Moura (PS).
Por fim, procedeu-se à discussão do projecto de resolução n.º 116/VIII - Institui o Dia Nacional de Prevenção e Segurança no Trabalho (PCP), tendo proferido intervenções o Sr. Secretário de Estado do Trabalho e Formação (António Dornelas) e os Srs. Deputados Vicente Merendas (PCP), Arménio Santos (PSD), Herculano Gonçalves (CDS-PP), Barbosa de Oliveira (PS), Luís Fazenda (BE) e Heloísa Apolónia (Os Verdes)
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 30 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 20 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Aires Manuel Jacinto de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
António Alves Marques Júnior
António Alves Martinho
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António Fernando Marques Ribeiro Reis
António Fernando Menezes Rodrigues
António José Gavino Paixão
António Manuel Dias Baptista
António Manuel do Carmo Saleiro
Armando António Martins Vara
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Carla Maria Nunes Tavares Gaspar
Carlos Alberto
Carlos Alberto Dias dos Santos
Casimiro Francisco Ramos
Cláudio Ramos Monteiro
Eduardo Ribeiro Pereira
Emanuel Silva Martins
Fernando Manuel de Jesus
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Serrasqueiro
Filipe Mesquita Vital
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Francisco José Pinto Camilo
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres
Gil Tristão Cardoso de Freitas França
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho
Helena Maria Mesquita Ribeiro
Isabel Maria dos Santos Barata
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge Tinoco de Faria
Isabel Maria Soares Pinto Zacarias
Jamila Barbara Madeira e Madeira
João Alberto Martins Sobral
João Cardona Gomes Cravinho
João Pedro da Silva Correia
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Alberto Leal Fateixa Palmeiro
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos da Cruz Lavrador
José Carlos Pinto Basto Mota Torres
José da Conceição Saraiva
José Ernesto Figueira dos Reis
José Manuel Pires Epifânio
José Manuel Rosa do Egipto
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Miguel Correia Noras
Jovita de Fátima Romano Ladeira
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Luís Manuel dos Santos Silva Patrão
Luís Manuel Ferreira Parreirão Gonçalves
Luís Miguel Gomes Miranda Teixeira
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira
Manuel António dos Santos
Manuel Maria Diogo
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Margarida Maria Santos Soares da Rocha Gariso
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira
Maria do Céu da Cruz Vidal Lourenço
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Luísa Silva Vasconcelos
Maria Teresa de Oliveira Ferreira Coimbra
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura
Nuno Fernando Teixeira Ferreira da Silva
Ofélia Maria Lapo Guerreiro
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Paulo Alexandre Homem de Oliveira Fonseca
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Rui Manuel Leal Marqueiro
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Victor Brito de Moura
Victor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Alves Peixoto
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Álvaro dos Santos Amaro
Ana Maria Martins Narciso
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António d'Orey Capucho
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Manuel da Cruz Silva
António Manuel Santana Abelha
António Paulo Martins Pereira Coelho
Armando Manuel Dinis Vieira
Armindo Telmo Antunes Ferreira
Artur Ryder Torres Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos José das Neves Martins

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Carlos Parente Antunes
Domingos Duarte Lima
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares
Eugénio Fernando Sá Cerqueira Marinho
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Jorge Loureiro de Reboredo Seara
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Monteiro Chaves
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
João Bosco Soares Mota Amaral
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Martins Ferreira do Amaral
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
José António de Sousa e Silva
José David Gomes Justino
José de Almeida Cesário
José Eduardo Rêgo Mendes Martins
José Frederico de Lemos Salter Cid
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel de Matos Correia
José Manuel Durão Barroso
Lucília Maria Samoreno Ferra
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Manuel Machado Rodrigues
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Pedro Machado Sampaio de Sousa Pimentel
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Castro de Almeida
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Joaquim Barata Frexes
Manuel Maria Moreira
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria do Céu Baptista Ramos
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Nuno Miguel Marta de Oliveira da Silva Freitas
Nuno Miguel Sancho Cruz Ramos
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa
Pedro Manuel Cruz Roseta
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rui Fernando da Silva Rio
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Comunista Português (PCP):
Ana Margarida Lopes Botelho
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
João António Gonçalves do Amaral
Joaquim Manuel da Fonseca Matias
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Natália Gomes Filipe
Octávio Augusto Teixeira
Vicente José Rosado Merendas

Partido Popular (CDS-PP):
António Herculano Gonçalves
António José Carlos Pinho
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da Franca
Fernando Alves Moreno
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Luís Pedro Mota Soares
Manuel Tomás Cortez Rodrigues Queiró
Maria Celeste Ferreira Lopes Cardona
Narana Sinai Coissoró
Paulo Sacadura Cabral Portas
Raúl Miguel de Oliveira Rosado Fernandes
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
José Luís Teixeira Ferreira

Bloco de Esquerda (BE):
Fernando José Mendes Rosas
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário da Mesa vai dar conta do expediente.

O Sr. Secretário (José Reis): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: proposta de lei n.º 73/VIII - Altera o artigo 143.º do Código Penal, que baixa à 1.ª Comissão; proposta de resolução n.º 55/VIII -Aprova, para ratificação, o Acordo relativo à Aplicação Provisória, entre determinados Estados-membros da União Europeia, da Convenção elaborada com base no Artigo K.3 do Tratado da União Europeia, sobre a utilização da informática no domínio aduaneiro, assinado em Bruxelas, em 26 de Julho de 1995, que baixa às 2.ª e 10.ª Comissões; projectos de lei n.os 436/VIII - Revê o regime jurídico da reparação dos acidentes de trabalho e doenças profissionais, procedendo à regularização das pensões, ao aumento do capital de remição e à melhoria de outras prestações (PCP), que baixa à 9.ª Comissão, e 437/VIII - Elevação da freguesia de Valdigem à categoria de vila (Deputado do PS Joaquim Sarmento); e o projecto de resolução n.º 138/VIII - Sobre a concessão da energia eléctrica em baixa tensão (PCP).
Foram também apresentados na Mesa os seguintes requerimentos:
Nas reuniões plenárias de 26 e 27/04/2001: ao Ministério das Finanças, formulados pelos Srs. Deputados Casimiro

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Ramos, Jorge Lacão, João Benavente, Manuel dos Santos, Maria de Belém Roseira, Maria Celeste Correia, Natalina de Moura, Osvaldo Castro e Pedro Mota Soares; aos Ministérios da Saúde e da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulados pelo Sr. Deputado Bruno Vitorino; aos Ministérios do Equipamento Social e da Saúde, formulados pelo Sr. Deputado Hermínio Loureiro; ao Ministério da Administração Interna, formulados pelos Srs. Deputados António Filipe e Eugénio Marinho; ao Ministério da Educação, formulado pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia; aos Ministérios do Ambiente e do Ordenamento do Território e do Equipamento Social, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro; à Secretaria de Estado dos Assuntos Fiscais, formulado pela Sr.ª Deputada Jovita Ladeira; ao Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território, formulados pelos Srs. Deputados Miguel Ginestal e Arménio Santos; ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulado pelo Sr. Deputado António Nazaré Pereira; aos Ministérios da Saúde e da Administração Interna, formulados pelo Sr. Deputado Duarte Pacheco; aos Ministérios da Administração Interna e do Equipamento Social, formulados pelo Sr. Deputado Luís Cirilo; a diversos Ministérios, formulado pelo Sr. Deputado Agostinho Lopes; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado Rodeia Machado; aos Ministérios do Equipamento Social e da Justiça, formulados pelo Sr. Deputado Fernando Rosas; e a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Luís Fazenda.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, há ainda um relatório e parecer da Comissão de Ética que se refere à substituição, nos termos do artigo 5.º, n.º 2, alínea c), do Estatuto dos Deputados (Lei n.º 7/93, de 1 de Março), do Sr. Deputado Caio Roque, do PS (círculo eleitoral de Fora da Europa), com início em 7 de Maio corrente, inclusive, por um período não inferior a 45 dias, por Maria Ofélia Lopo Guerreiro.
O parecer da Comissão de Ética vai no sentido de que a substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares incumbiu-me de pôr à votação, no início dos trabalhos, o projecto de deliberação n.º 14/VIII - Constituição de uma comissão eventual para a revisão constitucional (PS, PSD e CDS-PP), para que a Comissão tome posse já amanhã, por forma a começar a trabalhar imediatamente.
O projecto de deliberação é do seguinte teor: «Considerando que a Assembleia da República assumiu poderes de revisão extraordinária da Constituição;
Considerando que já terminou o prazo para os Deputados tomarem a iniciativa de apresentar projectos de lei de revisão.
A Assembleia da República delibera, ao abrigo do disposto no artigo 39.º e 40.º do Regimento:
1 - Que seja constituída uma comissão eventual para a revisão constitucional extraordinária que aprecie os projectos de revisão constitucional atempadamente apresentados.

2 - Fixar em 90 dias, prorrogáveis, por decisão do Plenário da Assembleia da República e a solicitação da própria Comissão, o prazo de funcionamento desta.

3 - Que a Comissão tenha a seguinte composição:

16 Deputados designados pelo Grupo Parlamentar do PS;
10 Deputados designados pelo Grupo Parlamentar do PSD;
2 Deputados designados pelo Grupo Parlamentar do PCP;
2 Deputados designados pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP;
1 Deputado designado pelo Grupo Parlamentar do Partido Ecologista "Os Verdes";
1 Deputado designado pelo Grupo Parlamentar do BE.

4 - Que a Comissão inicie os seus trabalhos imediatamente, após ter tomado posse».
Srs. Deputados, se não houver objecções, vamos votar de imediato este projecto de deliberação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, antes de iniciar a intervenção, gostaria de interpelar a Mesa para confirmar o que julgo saber, se alguém do Partido Socialista está inscrito para proferir uma declaração política sobre o tema magno da reunião do Congresso…

Protestos da Deputada do PS Natalina de Moura.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, nem magno nem mínimo, porque, como sabe, o Partido Socialista já usou o direito de proferir uma declaração política nesta quinzena, não podendo fazer mais do que uma. Mas inscreveu-se para tratamento de assunto político relevante, e suponho que o tema será esse.
Como as declarações políticas têm precedência sobre o tratamento de assuntos políticos relevantes, tem de usar da palavra, Sr. Deputado António Capucho.

O Orador: - Sr. Presidente, uso da palavra imediatamente e com muito gosto! Foi apenas uma manifestação de disponibilidade para ouvirmos primeiro o que o PS tem a dizer sobre o seu Congresso,…

Vozes do PS: - Oh!

O Orador: - … e, como o meu tema será o mesmo, eu falaria depois.

O Sr. Presidente: - É um acto elegante, Sr. Deputado, mas, neste momento, ineficaz.

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O Orador: - Deixo ao critério do Sr. Dr. Francisco de Assis.

O Sr. Presidente: - Não posso dar a palavra ao Dr. Francisco de Assis, antes de lha dar a si.
Faça favor.

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Congresso do Partido Socialista, sendo uma reunião interna, não pode, no entanto, escapar ao nosso comentário, dados os reflexos que tem na vida política nacional.
É verdade que a esmagadora maioria das intervenções no Congresso do PS foram, em nosso entender, desperdiçadas em questões domésticas que nada interessam aos portugueses e que não nos cabe apreciar.

Protestos do PS.

Não vou, por isso, falar da purga e dos adversários fictícios,…

Vozes do PS: - Eh!…

O Orador: - … dos abcessos de fixação, das manifestações de desânimo, frustração e angústia, da falta de paixão, da ausência de ideias, do vazio das propostas, salvo no que esses epifenómenos possam afectar a vida política nacional e o futuro dos portugueses.
Por princípio, só falarei aqui na repercussão do Congresso na situação política do País. E isto resume-se, praticamente,…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - A zero!

O Orador: - … ao paupérrimo discurso de encerramento do Sr. Primeiro-Ministro,…

Vozes do PS: - Oh!…

O Orador: - … nas afirmações e nas omissões, e a um ou outro incidente mais ou menos rocambolesco, mas com impacto óbvio na vida política nacional.
O Primeiro-Ministro, acossado pela opinião pública e pelo próprio partido que era suposto liderar, bem precisava de aproveitar esta oportunidade para nos convencer que afinal tem ainda uma reserva de ânimo para redinamizar a acção governativa; que é ainda capaz de assumir, de facto, a liderança e a coordenação de uma equipa, ao que parece, proximamente renovada; que pode ainda erradicar o apetite devorador de um partido acomodado ao poder e que dele quer continuar a desfrutar abusivamente, em violação dos mais elementares princípios de ética política;…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … enfim, que tem um rumo novo, ideias definidas e objectivos claros.
Rapidamente, essas esperanças esvaíram-se quando o Primeiro-Ministro persistiu no discurso autista da auto-satisfação com a suposta melhoria das condições de vida dos portugueses e esqueceu, por exemplo, o crescente endividamento das famílias, que, pela primeira vez, ultrapassou o endividamento das empresas, omitiu o próprio endividamento externo do País, sem paralelo há duas décadas, enfim, quando o Primeiro-Ministro descolou completamente da realidade sentida por todos os portugueses.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Foi um discurso paradigmático de quem se preocupa essencialmente com as aparências e os sinais exteriores de quem vive acima das possibilidades, de quem despreza e não acautela o futuro, de quem sistematicamente remete para as gerações futuras os encargos com os devaneios do presente.

Aplausos do PSD.

Mas, infelizmente, o Sr. Primeiro-Ministro esqueceu-se de muito mais: esqueceu-se do inaceitável e crescente afastamento de Portugal em relação à Europa;…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … esqueceu-se do desprezo votado aos critérios de isenção e competência que deveriam presidir à selecção de pessoas e do escandaloso aumento do número de trabalhadores na função pública;…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … esqueceu-se do fracasso das duas grandes paixões políticas não consumadas e que ele escolhera livremente - a educação e a saúde; esqueceu-se do despesismo, da desorçamentação e da derrapagem da economia, fruto de uma gestão desastrosa do ainda responsável pelas Finanças e dele próprio, Primeiro-Ministro;…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … esqueceu-se da crescente insegurança sentida pelos cidadãos; esqueceu-se, após a derrota da regionalização, de que ainda não tomou uma só medida a favor da descentralização e da municipalização; enfim, esqueceu-se de tudo aquilo que é hoje motivo de crítica fundamentada à acção e às omissões do Governo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas a situação mais grave subjacente a este Congresso do PS é a pretensamente subtil, mas óbvia e descarada, tentativa por parte do Primeiro-Ministro de provocar uma crise política…

Risos do PS.

… e responsabilizar por isso a oposição em geral e o PSD em particular.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Os portugueses, ao contrário do que possa julgar o PS, não são parvos…

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Nós sabemos!

O Orador: - … e estarão atentos a essas manobras. Entre estas, a mais bizarra poderá ser um chamado

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programa de redução de despesas a apresentar a este Parlamento. Bizarra, porque não faz qualquer sentido vermos o filho a pedir autorização aos pais para poupar a semanada. Querem poupar? Poupem! Querem reduzir a despesa? Reduzam-na! É isto mesmo que reclamamos há mais de cinco anos!

Aplausos do PSD.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Já estávamos à espera disso!

O Orador: - É bom que fique claro, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que este Governo só não governa, com esta maioria, se não quiser. Se não tem maioria suficiente procure-a com transparência e em diálogo político com os parceiros dessa área do Hemiciclo, com quem tem negociado no antecedente.
Entretanto, Srs. Deputados, será curioso assistirmos à remodelação governativa imposta - pasme-se! - por moção aprovada em Congresso com o voto do próprio Primeiro-Ministro e proposta - imagine-se! - por uma estrutura laboral do Partido Socialista.
Confesso-lhes que julgava que já nada me espantaria neste Congresso e neste PS. Mas enganei-me! Esta moção, que traduz uma ingerência, impensável, do partido numa questão do foro exclusivo do Primeiro-Ministro, ultrapassou toda a capacidade de imaginação do cidadão comum.
Ficámos, para além do mais, a saber que o Sr. Primeiro-Ministro concorda com a seguinte análise que consta do próprio texto da moção aprovada, e vou citar: «Há um excessivo peso da estrutura operacional da cúpula do Partido e grande distanciamento das bases (…) urge proceder à imediata …» - e, repito, à imediata - «… remodelação do Governo (…)», que «(…) o PS não desenvolveu uma reforma de fundo em sectores como a saúde, a justiça, a fiscalidade e a educação (…)»,…

O Sr. David Justino (PSD): - Apoiado!

O Orador: - … e, ainda, que a reforma fiscal não é mais do que uma «operação de cosmética», e, finalmente, que a democracia interna não passou de «mero formalismo».

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Faço minhas as palavras da própria moção aprovada em Congresso do PS!
Srs. Deputados, antes do Congresso, o Sr. Primeiro-Ministro deu uma volta pelo País, ao que parece, para ouvir as bases do PS.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - E hoje vai-se encontrar outra vez com elas!

O Orador: - Recomendo-lhe, hoje, vivamente, que dê mais uma volta, mas agora para ouvir não os militantes do PS, não os boys do PS, mas as populações e sentir os verdadeiros problemas que afligem os portugueses.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Muito mal!

O Sr. Presidente: - Para tratamento de assunto de interesse político relevante, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Sr. Deputado António Capucho, eis ao que está reduzido o PSD neste Parlamento, a ser uma espécie de «nota de rodapé» do Congresso do Partido Socialista, que foi muito mais do que aquilo que V. Ex.ª aqui disse.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Sr.as e Srs. Deputados, realizou-se no passado fim-de-semana o XII Congresso do Partido Socialista, acontecimento sempre revestido de grande significado nacional, dada a iniludível importância cívica e política de uma organização partidária, que, desde os tempos heróicos da resistência à ditadura até à presente data, tem concorrido decisivamente para a afirmação, consolidação e aprofundamento do regime democrático e para o desenvolvimento económico e social do País.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Este Congresso decorreu numa altura de particular importância na nossa vida pública, quando ao PS incumbem, por vontade expressa dos portugueses, tarefas da maior responsabilidade na governação do País, da Região Autónoma dos Açores e de um número significativo de autarquias locais.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Muito bem!

O Orador: - Durante três dias assistimos a um debate vivo, intenso, em alguns instantes até mesmo acalorado, como é próprio de um grande partido que reconhece, no pluralismo de opiniões que o estrutura e percorre, uma das mais genuínas manifestações da sua própria matriz genética e sempre estabeleceu o princípio da tolerância democrática e liberal, como o princípio regulador das suas inevitáveis e até mesmo desejáveis tensões internas.

Aplausos do PS.

Ancorado doutrinariamente num núcleo de valores fundadores de clara identidade socialista, laica e republicana,…

O Sr. António Reis (PS): - Muito bem!

O Orador: - … o PS tem sabido, ao longo dos seus 28 anos de existência, promover as alterações programáticas reclamadas pela necessidade de permanente adaptação a uma realidade em contínua mudança.

Aplausos do PS.

Somos hoje um Partido Socialista moderno, plenamente aberto à sociedade, atento às novas questões emergentes e dotado de um projecto político que se nos afigura o mais adequado em ordem à superação dos atrasos estruturais que ainda afectam a sociedade portuguesa e à promoção de um desenvolvimento mais justo e solidário. Ao longo

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dos últimos seis anos temos vindo a aplicar esse projecto que visa aumentar a competitividade da sociedade e da economia, pela via da acrescida qualificação das pessoas e da modernização das empresas e instituições públicas, reforçar a coesão social, através da promoção do emprego e do combate à pobreza e à exclusão, e credibilizar o sistema político, por recurso a inovações que o tornem mais aberto, transparente e responsabilizante. Temos razões para olhar para o passado recente com orgulho, mas não podemos de modo algum perder de vista o muito que ainda permanece por realizar.

Aplausos do PS.

Deste Congresso saiu um PS mais empenhado em prosseguir o desígnio nacional que a si próprio, enquanto partido investido em responsabilidades governativas, se impôs: recuperar, no tempo de uma geração, o atraso estrutural que ainda nos afasta dos países mais prósperos da Europa.
Como afirma o Secretário-Geral, Engenheiro António Guterres, na moção que apresentou ao Congresso e suscitou uma ampla adesão dos militantes, e passo a citar, «o Século XXI tem de afirmar-se como o da consagração de Portugal entre os países mais evoluídos e dinâmicos da Europa».

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - É este o nosso propósito, a nossa meta, a nossa ambição. Não nos limitamos a produzir diagnósticos, nem nos restringimos ao domínio das meras e inúteis proclamações retóricas. Temos um projecto, uma estratégia e múltiplas medidas concretas que têm vindo, aliás, a ser aplicadas.
Reconhecemos a importância fundamental da economia de mercado, mas atribuímos ao Estado um papel relevante e insubstituível na promoção de políticas públicas que permitam reforçar o desenvolvimento, a modernização e a coesão social. Neste sentido, o PS considera fundamental o prosseguimento do esforço que o Governo tem vindo a levar a cabo em quatro domínios estratégicos fundamentais: a reforma fiscal, a segurança social, a saúde e a administração pública.

Aplausos do PS.

Queremos um Estado activo, ao serviço das necessidades dos indivíduos e da comunidade, preocupado com a modernização estrutural do país e com a promoção da solidariedade social, mas rejeitamos um Estado mastodôntico que sugue as energias e os recursos da sociedade portuguesa.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Muito bem!

O Orador: - Por isso mesmo estamos empenhados em garantir, de forma séria e selectiva, o controlo do crescimento da despesa pública de modo a alcançar o equilíbrio orçamental em 2004.

O Sr. António Reis (PS): - Muito bem!

O Orador: - No contrato eleitoral que estabelecemos com os portugueses atribuímos especial importância à realização de uma reforma fiscal que, concretizada em estreita articulação com o processo de consolidação das finanças públicas, possibilite o combate à fraude e evasão fiscais, a redução da carga fiscal incidente sobre os trabalhadores por conta de outrem, as classes médias e as empresas cumpridoras e o reforço das garantias dos cidadãos. Já cumprimos uma parte substancial desse programa, dado que a legislação, entretanto aprovada, permite alcançar de imediato um desagravamento de 100 milhões de contos em IRS e uma evolução progressiva da taxa de IRC, de 36%, em 1995, para 32%, hoje, e 28% no final da Legislatura, estabelecendo o horizonte de 25% como objectivo a atingir a médio prazo.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Importa prosseguir por este caminho com a apresentação de propostas de lei sobre tributação do património imobiliário e da energia, consumando desta forma uma reforma fiscal que, pela sua amplitude e profundidade, não tem paralelo na história da democracia portuguesa.

Aplausos do PS

No domínio da segurança social pretendemos continuar o trabalho iniciado com a acção dos governos socialistas e que assenta em dois princípios fundamentais: a universalização dos direitos sociais e a diferenciação positiva. Somos pela universalidade de direitos, porque recusamos, contrariamente aos partidos da direita, um Estado de bem-estar com um conteúdo meramente assistencialista. Apostamos na diferenciação para reforçar o combate a desigualdades iníquas.
A saúde constitui também um sector prioritário no âmbito da actividade governativa. Para nós, o Serviço Nacional de Saúde constitui a pedra angular e insubstituível de todo o sistema de saúde, mas queremos transformá-lo, tornando-o mais eficiente na prestação de serviços e mais rigoroso e transparente na respectiva gestão financeira.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Que bom que ele é!

O Orador: - Para isso têm vindo a ser tomadas, desde 1995, importantíssimas medidas, e temos a plena convicção de que a reforma da saúde não é um acto instantâneo mas, sim, um processo participado e devidamente contratualizado que tem vindo a ser realizado com tenacidade e determinação.
Por último, não ignoramos a imperiosa necessidade de promover importantes transformações no modelo de organização e gestão da Administração Pública portuguesa. Precisamos de uma administração mais moderna, ágil e flexível que incentive a uma cidadania mais interventiva e responsável. Isto implica uma aposta na descentralização, na desconcentração, na responsabilização e na participação.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Olhamos para trás com a consciência de obra realizada, mas voltamo-nos para o futuro com a inquietação de obra por fazer.
Pela nossa parte empenhar-nos-emos na manutenção de um clima de estabilidade política que permita ao Governo concretizar o Programa que atempadamente submeteu à apreciação desta Assembleia. Estamos, como sempre

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estivemos, abertos à celebração dos entendimentos necessários à consumação de tal objectivo, já que não ignoramos a natureza da maioria de que dispomos no Parlamento. Estabelecemos apenas como limite ético a tais entendimentos a não descaracterização dos compromissos programáticos assumidos com o País.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Muito bem!

O Orador: - Assumimos assim, integralmente, as nossas responsabilidades e incitamos as diversas oposições, na sua diversidade e até mesmo no seu antagonismo, a fazerem o mesmo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mais do que nunca a sociedade portuguesa precisa de um poder político forte e determinado, que não sucumba a pressões mediáticas nem se deixe atemorizar por resistências corporativas.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Muito bem!

O Orador: - É mesmo imprescindível o reforço da autoridade democrática, entendida, esta, como vontade e comando e nunca como inclinação para asfixiar a discussão e o debate.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Grupo Parlamentar do PS empenhar-se-á, como, aliás, tem vindo a fazer até agora, em participar activamente no esforço de afirmação de um projecto político que continua a suscitar a adesão da maioria dos portugueses. Apoiamos e apoiaremos sempre com lealdade, mas igualmente com exigência e sentido crítico, o Governo presidido por António Guterres e não nos inibiremos de apresentar neste Parlamento as iniciativas legislativas que reflictam a nossa identidade doutrinária.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Estaremos todos juntos, firmes e coesos nesse propósito, sem exclusões impostas nem auto-afastamentos voluntários.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O País continua a ver em nós, socialistas, na nossa maioria parlamentar, no nosso Governo e no nosso líder, agora relegitimado, António Guterres, referenciais insubstituíveis de esperança e confiança no futuro. Saibamos estar à altura dessas expectativas, servindo Portugal e contribuindo para a concretização das mais legítimas aspirações dos portugueses.

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Francisco de Assis, os Srs. Deputados Manuel Queiró, Luís Fazenda, Octávio Teixeira e António Capucho.
Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco de Assis, não estive no vosso Congresso, por uma razão simples: pensei que ele fosse transmitido na televisão, como os congressos dos outros partidos, mas as televisões, não sei porquê, não fizeram grandes transmissões, transmitiram apenas uns pedacinhos, não ligaram nenhuma ao vosso Congresso.

Protestos do PS.

Tenho procurado novidades que o vosso Congresso tenha trazido e só hoje é que percebi que o vosso Congresso teve uma novidade: produziu uma consequência, aliás, positiva, a meu ver, que foi a de o Sr. Deputado Jorge Coelho ter, finalmente, descido à primeira fila da vossa bancada.

Risos do CDS-PP e do PSD.

Sr. Deputado Francisco de Assis, aqui, na nossa bancada, temo-lo, há já bastante tempo, como o Sr. Deputado das tarefas impossíveis. O Sr. Deputado, hoje, foi à tribuna dizer-nos que o vosso Congresso tinha tido um debate democrático…

Vozes do PS: - E teve!

O Orador: - … e que tinha havido pluralismo de opiniões.

Vozes do PS: - E houve!

Vozes do PSD: - Viu-se!

O Orador: - Porém, a visão que temos do vosso Congresso, com todo o respeito, é a de que foi um equívoco. Foi um Congresso marcado há quatro meses para dar um murro na mesa, para o Sr. Primeiro-Ministro mostrar autoridade e, fundamentalmente, para «cortar a cabeça» ao Dr. Fernando Gomes.

Protestos do PS.

Mas o Dr. Fernando Gomes entrou no Congresso, esteve lá tranquilo,…

O Sr. Casimiro Ramos (PS): - Então, viu ou não viu o Congresso?!

O Orador: - … saiu de lá com a cabeça nos ombros,…

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Vá lá!

O Orador: - … bem erguida, dizendo que ia tranquilamente apanhar o avião.
Srs. Deputados do Partido Socialista, Sr. Deputado Francisco de Assis, a pergunta que faço é, essencialmente, a seguinte: será que o Sr. Deputado está hoje na disposição de dar ao País as respostas que o Congresso do Partido Socialista não deu?

O Sr. José Egipto (PS): - Se você não viu o Congresso, como é que sabe que não deu respostas?!

O Orador: - E as respostas que o País espera são, fundamentalmente, duas, que se reduzem a uma: saber se

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o Governo do Partido Socialista ou o Governo que o Partido Socialista suporta tem ainda energias para restituir ao País já não digo o optimismo mas a confiança nele próprio para continuar a conduzir os destinos de Portugal até às próximas eleições, de forma a que se possa acreditar, de novo, na economia, na capacidade de reformar a Administração e de fazer as reformas necessárias, ou se o vosso partido já decidiu que vai apostar numa saída em frente. É que a alternativa, Sr. Deputado Francisco de Assis, é a repetição do cenário do ano passado! E já estamos a ver indícios disso, ou seja, a reconstituição de um clima de dramatização em torno do Orçamento do Estado, o qual, desta vez, começa bem mais cedo. Será que o vosso partido vai acabar por fazer passar o próximo Orçamento com uma habilidade do mesmo género daquela com que fez passar o anterior?!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Queiró, é natural que televisões que, nos últimos tempos, se especializaram na produção e emissão de programas do tipo do Big Brother e das Noites Marcianas tenham mais interesse em ir aos vossos congressos do que aos nossos.

Aplausos do PS.

Mas isso, Sr. Deputado, é uma coisa que, verdadeiramente, não nos diminui, antes, nos engrandece. É natural que dediquem mais interesse ao vosso congresso ou a um eventual congresso extraordinário do PSD, que estará já, provavelmente, a ser preparado para logo depois das eleições autárquicas, e que não tenham tanto interesse em relação ao nosso.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado, o nosso Congresso foi um congresso onde os militantes do PS exprimiram, sem qualquer inibição, as suas opiniões: convergiram, divergiram, manifestaram apoio em relação a algumas circunstâncias, manifestaram a sua oposição em relação a outras, e, no final, tudo se reconduziu ao método democrático.
Mas o que é fundamental afirmar aqui é que, para este grande combate em que todos estamos investidos e empenhados, não há socialistas dispensáveis. E todos vamos, no nosso pluralismo, dar um contributo para a afirmação do nosso projecto político, que é um projecto político comum e que a todos une.
Quanto à questão que o Sr. Deputado me colocou, de saber como é que vamos enfrentar o futuro, quero dizer-lhe que vamos enfrentá-lo da forma que acabei de enunciar na intervenção que produzi há pouco. O PS, o Governo e o Grupo Parlamentar do Partido Socialista estão inteiramente disponíveis para negociar, com toda a seriedade e transparência, com todos os grupos parlamentares, a viabilização dos documentos imprescindíveis para garantir a governação do País, estabelecendo como único limite o da decência e da ética, que é o de não permitir a descaracterização dos compromissos programáticos assumidos perante o País. E não venha o Sr. Deputado dizer que já se está a antecipar o cenário do ano passado! Quer, com isso, V. Ex.ª dizer que o PP, mesmo sem conhecer a proposta de Orçamento do Estado, está já a manifestar indisponibilidade…

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - … para uma negociação séria com o Governo, tendo em vista a criação de condições que permitam a aprovação do Orçamento do Estado?!
Sr. Deputado, pela nossa parte, vamos continuar a ser o que temos sido na vida política portuguesa: um referencial de estabilidade, mas um referencial de estabilidade que se não esgota nisso e que entende a estabilidade como um instrumento fundamental em ordem à concretização de um projecto de modernização solidária do nosso País.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco de Assis, com o devido respeito, a sensação com que fiquei em relação ao Congresso do Partido Socialista, e na qual devo ser acompanhado por muitos cidadãos deste País, é a de que foi mau demais para ser verdade. Esta foi a primeira impressão! E interroguei-me a mim próprio como era possível, porque reconheço, no Partido Socialista, muita gente qualificada para um debate político elevado. Mas a verdade é que, em matéria de opiniões de apoio às políticas governamentais, nada se ouviu; em matéria até de críticas às políticas governamentais, nada se ouviu! Foi um congresso de entronização do seu líder, ouviu-se um discurso de poder, mas não houve, verdadeiramente, um debate interno, que interessaria também ao País, sobre as alternativas, as correcções ou até a assunção, por parte do Partido Socialista, de algumas das suas políticas mais polémicas. Deste ponto de vista, perdoe-me que lhe diga, entendemos que foi um Congresso bastante vazio de ideias e de discussão. Mas isso ter-se-á devido a quê? Talvez - e arrisco esta opinião, sem, com ela, me ingerir nos assuntos internos do Partido Socialista - porque existiu ali, realmente, um estrangulamento de «chegadas» e «partidas» das mais variadas opiniões, que se anularam no Congresso. Uns são a favor da privatização, outros são a favor da regulação. Enfim, a privatização tem sido um leilão de incoerências! Onde é que estão as parcerias estratégicas? E a regulação? Nem sequer há actividade inspectiva do Estado! Doutrinariamente, tanto ali se reclamou uma identidade e, em relação a política prática e concreta, não houve, no Congresso do Partido Socialista, o plasmar de política nenhuma. Por conseguinte, algumas frases contra o neoliberalismo não passam disso, são apenas frases, não se traduzem em política concreta do Partido Socialista.
O episódio do queijo Limiano passou, envergonhadamente, pelo Congresso do Partido Socialista. Diz-se agora que o Partido Socialista vai dialogar com todos os grupos parlamentares, mas não é exactamente esta a questão que se pretende colocar. A questão que se quer colocar, e já ouvimos o Engenheiro António Guterres dizê-lo, é a de saber se o Partido Socialista também vai dialogar com Deputados individualmente considerados, aquando da

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apreciação e votação do próximo Orçamento do Estado. Esta é que é a questão e esta é que é a barreira ética e política que gostaríamos de ver esse Partido Socialista tão renovado do último Congresso aqui afirmar frontal e cabalmente.
Sr. Deputado Francisco de Assis, o Bloco de Esquerda foi brindado com a observação de que se dedica a questões laterais, não sei se do mesmo género daquela a que, no dia do Congresso do Partido Socialista, o Ministro da Justiça se dedicou, em manchete do Expresso, admitindo a possibilidade de prescrição de heroína a doentes terminais, não sei se do género daquela que, realmente, motivou, e com grande coragem cívica, o interesse da opinião pública, que é a da despenalização do aborto, mas quero aqui recordar que não me parece que essa crítica deva ser feita ao Bloco de Esquerda. Provavelmente, é uma crítica de ricochete interno para a vossa própria bancada, em relação a uma série de matérias que aqui foram aprovadas.
Para terminar, Sr. Deputado Francisco de Assis, faço-lhe uma singela pergunta: esse programa de redução da despesa pública só pode ser um orçamento rectificativo. Vão aqui apresentá-lo? Vão incluir os défices da saúde? O que é que pretendem fazer?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, o PS é um partido profundamente pluralista, como provavelmente não haverá outro na sociedade portuguesa, mas o nosso pluralismo ainda não chegou ao ponto de serem os senhores a determinar a agenda interna do PS; isto é, não são os senhores que vão determinar o que é que se discute ou deixa de discutir nos congressos do Partido Socialista.
Estive no Congresso do PS, sou um homem tão livre e tão isento como o Sr. Deputado Luís Fazenda - nem mais, nem menos! - e, devo dizer-lhe, pelo que conheço de si, do ponto de vista da exigência e da discussão, tão exigente - nem mais, nem menos! - como o Sr. Deputado. E a verdade é que pude presenciar, no Congresso do PS, uma discussão intensa e participada em torno dos mais diversos domínios da vida política portuguesa, nomeadamente até em torno de assuntos que são tradicionalmente trazidos para o debate político pelo Bloco de Esquerda.
O que o Sr. Primeiro-Ministro disse não foi que o Bloco de Esquerda traz indevidamente para o debate político alguns temas, mas que se limita a trazer apenas esses, quando temos de trazer muitos outros temas para o debate político em Portugal. E é isto que vamos continuar a fazer! Nós temos a noção de que devemos garantir, e refiro-me estritamente ao PS e ao Governo, a liderança do Parlamento, no que se refere ao agendamento do debate político em Portugal, tratando os mais diversos assuntos. O Bloco de Esquerda tem dado algum contributo para isso, e sou o primeiro a reconhecê-lo, mas mal iria Portugal se nos limitássemos apenas a tratar os temas que resultam do vosso contributo.
O Congresso do PS foi, por isso, um congresso em que nós, com absoluta liberdade de espírito, como é característico do Partido Socialista e como resulta, de resto, de toda a nossa tradição histórica, discutimos com total abertura os mais diversos assuntos da vida nacional.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Em que Congresso é que o Sr. Deputado esteve?!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - No Congresso do PS!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Não parece!

O Orador: - E saiu do Congresso uma linha de rumo, o que também é fundamental - porque os partidos políticos não são apenas associações de diletantes que se reúnem esporadicamente para debater os mais diversos assuntos, antes, têm a obrigação de apresentar um projecto, um caminho e um rumo -, a qual consta da moção que foi aprovada, bem como do Programa do Governo, e será, certamente, aplicada, como tem vindo a suceder, nos próximos anos, em Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco de Assis, civilizadamente, começo por cumprimentar o Grupo Parlamentar do Partido Socialista pela realização do vosso Congresso.

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Ai que amores!

O Orador: - Em segundo lugar, dir-lhe-ia que, contrariamente ao Sr. Deputado Manuel Queiró, tenho televisão por cabo…

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - O Sr. Deputado é rico!

O Orador: - … e, por conseguinte, pude assistir às intervenções do Secretário-Geral do Partido Socialista. Não me vou referir à sua intervenção inicial, porque essa, pelo menos segundo ele, está mais virada para o interior do partido; a segunda intervenção é que estava virada para o País, e é esta que poderá, aqui e neste momento, ter alguma, muito sucinta, reflexão da minha parte.
Diria que a intervenção do Sr. Secretário-Geral do Partido Socialista dirigida ao País, a tal segunda intervenção, se pautou quase exclusivamente pelo autismo do Primeiro-Ministro, que também é Secretário-Geral do Partido Socialista, em relação às questões do País. Ao ouvir aquela intervenção, quase fiquei convicto, pelo ardor do Sr. Primeiro-Ministro, de que são as oposições as responsáveis únicas pela desaceleração do crescimento económico,…

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Não é verdade!

O Orador: - … de que são as oposições as responsáveis únicas pelo desvio da taxa de inflação, de que são as oposições as responsáveis únicas pelo que está a suceder com os défices externos!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Não é verdade, não disse nada disso!

O Sr. Casimiro Ramos (PS): - O cabo da sua televisão devia estar torcido!

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O Orador: - Sucede, porém, Sr. Deputado Francisco de Assis, que, para além do discurso do Sr. Secretário-Geral, foram votadas muitas moções no vosso Congresso. Da moção subscrita pelo Secretário-Geral e Primeiro-Ministro, ninguém sabe nada, ninguém conhece, ninguém fala!

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Olhe que não!

O Orador: - Já a moção dos socialistas da EDP é conhecida por toda gente! Como esta moção foi aprovada - e isto não tem a ver com questões internas do PS - no Congresso do Partido Socialista, partido que está no Governo, é de supor que houve responsabilidade na votação daquela moção. Aliás, há pouco, o Sr. Deputado referiu que o debate foi vivo e intenso. Ora, se o debate foi vivo e intenso, todas as pessoas estavam cabalmente…

O Sr. Durão Barroso (PSD): - Conscientes!

O Orador: - … conscientes daquilo em que estavam a votar!
O Sr. Primeiro-Ministro já veio dizer que está em desacordo com o detalhe da remodelação imediata do Governo e da separação dos cargos políticos no Partido Socialista dos cargos governamentais.
A questão que lhe quero colocar, Sr. Deputado Francisco de Assis, é a de saber se o Partido Socialista na sua globalidade e o Primeiro-Ministro em particular estão de acordo com os outros detalhes, designadamente o da acusação de que o Governo mantém o estrangulamento do progresso do País, o da contestação à política de privatizações decididas ao lado de interesses estratégicos do País e ainda o do apelo, feito nessa mesma moção, a uma maior intervenção dos socialistas na gestão das empresas públicas, isto é, mais jobs for the boys!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, não transformemos uma questão marginal na questão essencial do Congresso, tenhamos uma abordagem séria - V. Ex.ª habituou-nos a isso - da questão em causa! A aprovação dessa moção resultou seguramente das circunstâncias especiais e inéditas em que se verificou a votação das moções sectoriais em congressos do Partido Socialista,…

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Ninguém sabia o que estava a votar!

O Orador: - … já que foi a primeira vez que essas moções foram votadas em pleno Congresso (até então eram votadas em reunião posterior da Comissão Nacional do Partido Socialista).
Mas V. Ex.ª mostrou algo que me parece fundamental, mostrou que desconhece inteiramente a moção do Secretário-Geral do PS.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Nós, o PS e o País!

O Orador: - Se a conhecer, até corremos o risco de o Dr. Octávio Teixeira aderir ao essencial da moção do Engenheiro António Guterres!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas, hoje, usarei da gentileza que o Dr. Durão Barroso já usou para comigo e terei todo o gosto em lhe oferecer uma cópia da moção do nosso Secretário-Geral. Isto é que fundamental, pois são lá colocadas questões em relação às quais é importante saber o que pensa o Partido Comunista Português!

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Octávio Teixeira, as questões fundamentais são, pois, as de saber o que é que o Partido Comunista Português pensa sobre as reformas que nós estamos hoje a levar a cabo na Administração Pública, na saúde, na segurança social, no sector fiscal e sobre as propostas que apresentamos. Importa saber se o PCP vai continuar a ter aqui um papel de apoiante útil da direita portuguesa ou se, pelo contrário, está disponível para estabelecer entendimentos parlamentares com o Partido Socialista em torno dos mais diversos assuntos, que, aliás, constam explicitamente da moção apresentada pelo nosso Secretário-Geral.
Assim, será com todo o gosto que lhe enviarei uma cópia dessa moção, na expectativa de obter resposta às propostas constantes da mesma!

Aplausos do PS.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, para exercer o direito regimental da defesa da consideração da bancada, face à acusação feita pelo Sr. Deputado Francisco de Assis de que o PCP é um apoiante útil da direita portuguesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco de Assis, manifestamente, o vosso Congresso decorreu tão bem e saíram de lá tão reforçados que todos vocês perderam a cabeça, inclusivamente o Sr. Deputado, que até hoje tem mantido sempre uma postura…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - De cabeça fria!

O Orador: - … de cabeça bastante fria, bastante gelada, muitas vezes, e, por conseguinte, não entra nessas coisas. Hoje, perdeu a cabeça, mas - e permita-me a expressão - terá certamente a hombridade de, a seguir, pedir desculpa pela afirmação que fez!
Nós não somos apoiantes de qualquer direita!

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Não foi uma ofensa, foi um elogio!

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O Orador: - Repito, não somos apoiantes de qualquer direita! Por isso mesmo, também não apoiamos a direita do Partido Socialista e as políticas de direita do mesmo!

Aplausos do PCP.

E é isto que vos dói! Dói-vos que não apoiemos as políticas de direita do Partido Socialista! Sabe que em relação às outras, às orientadas para a esquerda, tem sempre o nosso apoio, a nossa convergência - sobre isto, não há dúvidas!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Vamos ver!

O Orador: - Aliás, repare que as únicas medidas, as únicas decisões, as únicas aprovações de que o Partido Socialista se recorda, quando lhe perguntam o que o Governo fez de bem nestes últimos três anos, são sempre três, e só três -…

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - E são más!

O Orador: - … lá está…! São más para a direita! -, são: o rendimento mínimo garantido, a Lei de Bases da Segurança Social e a reforma fiscal. Ainda não conseguiram descobrir mais nenhuma! E repare que nessas houve sempre convergência com o Partido Comunista Português.
Por isso, se há alguém que possa, eventualmente, de forma indirecta, apoiar a direita portuguesa, é só quem, no Governo, executa o que ela executaria se lá estivesse!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, querendo, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, também não enfatizemos, ao nível do nosso relacionamento, o que é marginal em detrimento do que é essencial!
Eu teria de pedir desculpa se, porventura, tivesse dito que o Partido Comunista Português era um apoiante convicto da direita portuguesa, mas eu apenas disse que era um apoiante útil. Isso é um resultado, porventura indesejado, das vossas intervenções.
Quando o vosso Secretário-Geral afirma aqui, num debate com o Primeiro-Ministro, que, a partir de agora, o Partido Comunista Português entende que um objectivo central da sua actividade política poderá ser o de derrubar o Governo português, do nosso ponto de vista, o que está em causa é pôr em causa um governo de esquerda, sem perspectivas algumas que não sejam as de abrir caminho para a sua substituição, eventualmente por um governo de direita! E foi neste sentido que o afirmei.
Quanto ao resto, se o Sr. Deputado esteve atento ao Congresso, terá verificado que eu fui um dos militantes do Partido Socialista que subiu à tribuna justamente para defender um novo relacionamento entre as principais forças políticas da esquerda portuguesa.

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Dê-lhe uma medalha, Sr. Deputado Octávio Teixeira!

O Orador: - Por isso, não valorizemos o que é marginal; valorizemos o que é essencial.
Leia a moção, Sr. Deputado, e responda às questões que aí colocamos!

Aplausos do PS.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Para exercer o direito regimental da defesa da honra pessoal, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Qual é a matéria que considera ofensiva, Sr. Deputado?

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - As afirmações proferidas pelo Sr. Deputado Francisco de Assis sobre o debate com o Sr. Primeiro-Ministro, atribuindo-me afirmações que não produzi, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Quais foram as afirmações, Sr. Deputado, porque nelas é que pode estar a ofensa?

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, as afirmações de que o objectivo central do meu partido seria o derrube do Governo.

Vozes do PS: - E não é?!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Octávio Teixeira, isso não é propriamente uma ofensa à honra mas, antes, um ponto de vista, que até pode ser defensável!

Aplausos do PSD.

Risos do PS.

Protestos do PCP.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Se o Sr. Presidente considera que uma mentira, uma falta à verdade, pode ser defensável… Eu considero que não!

O Sr. Presidente: - Claro que sim, Sr. Deputado. Considero que é uma opinião defensável, pois todos os partidos, até mesmo os que não estejam na oposição, têm o direito de defender o derrube do governo. Não vejo que isto constitua uma ofensa pessoal!
Assim, se não me levar a mal, não lhe darei a palavra, até porque eu próprio fiz a sua defesa!

Protestos do PCP.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, quanto a esta decisão que V. Ex.ª acabou de tomar, de não dar a palavra ao meu camarada Carlos Carvalhas para exercer o direito regimental da defesa da sua consideração pessoal, a meu ver não há razão alguma para o fazer.

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Aquilo que o meu camarada Carlos Carvalhas referiu foi que a afirmação feita pelo Sr. Deputado Francisco de Assis, que lhe atribui, a ele, o tê-la feito aqui, é uma pura mentira! A mentira ofende, pelo que ele tem todo o direito e toda a legitimidade de se sentir ofendido com as declarações do Sr. Deputado Francisco de Assis!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Octávio Teixeira, peço desculpa, mas não foi isso que disse o seu camarada Carlos Carvalhas.
De qualquer modo, penso que não vale a pena prolongarmos este assunto, porque, sinceramente, considero que o incidente está sanado.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, eu não considero o incidente sanado, mas admito, naturalmente, que V. Ex.ª tenha entendido mal as minhas palavras. Porém, o que eu disse foi precisamente isto: o que aqui foi afirmado é uma mentira, uma falta à verdade, e, como tal, tem de ser corrigida. E eu não deixo passar isto, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, posso dar-lhe a palavra para um esclarecimento, mas não considero que uma afirmação como a que está em causa, mesmo inverídica, e que pode até nem ter sido mal-intencionada, constitua uma ofensa à honra.
De qualquer modo, tem a palavra para prestar um esclarecimento, Sr. Deputado Carlos Carvalhas.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco de Assis, leia o registo do debate! Creio que, quando não se tem argumentos, não se devem adulterar os argumentos dos outros para se ter razão.
No debate com o Sr. Primeiro-Ministro, citei vários socialistas e depois disse ao Sr. Primeiro-Ministro para não se crispar, porque aquilo que eu estava a dizer não era nosso, tinha sido afirmado por vários socialistas, tendo sido um deles o Dr. Jorge Coelho, que estava lá atrás e que agora está aqui à frente. O Dr. Jorge Coelho disse: se continuarmos assim, ainda vamos parar todos ao Largo do Rato, isto é, à oposição! Foi tão-só isto que afirmei!
O que eu afirmei consistiu na transcrição clara de citações de membros e de ex-membros do Governo e de Deputados socialistas, as quais não foram desmentidas. Portanto, não ponha na minha boca aquilo que eu não disse! Se quiser dizer que há alguém que quer derrubar o Governo do Partido Socialista, então vire-se para o Dr. Jorge Coelho - talvez seja ele que o queira fazer!

Aplausos do PCP.

Risos do PS.

O Sr. Jorge Coelho (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Jorge Coelho (PS): - Para exercer o direito regimental da defesa da honra pessoal, Sr. Presidente.

Risos do PSD, do PCP e do CDS-PP.

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - «Zangam-se as comadres…!».

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, qual é a matéria que considera ofensiva?

O Sr. Jorge Coelho (PS): - Sr. Presidente, para mim, não pode haver maior ofensa do que a de referir que o coordenador da Comissão Permanente do Partido Socialista quer derrubar o Governo do Partido Socialista!

O Sr. Presidente: - De facto, seria grave.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

Protestos do PCP.

Srs. Deputados, peço desculpa, mas o critério para dar a palavra para exercer o direito regimental da defesa da honra é do Presidente, e não de quem se considera ofendido!

Protestos do PCP.

Dei a palavra ao Sr. Deputado Carlos Carvalhas para prestar um esclarecimento, e o caso ficou arrumado! Mas, de facto, considero ofensivo para o Sr. Deputado Jorge Coelho a acusação de ele querer derrubar o seu próprio Governo.
Assim, tem a palavra, Sr. Deputado Jorge Coelho.

O Sr. Jorge Coelho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, reconheço que, dado o facto de os vossos congressos não terem grande animação, queiram animar esta sessão, esta tarde, mas cá estamos para tratar dessa questão!
Gostaria de lhe dizer, com sinceridade, que aquilo que é, para mim e para o Partido Socialista, determinante, nos congressos, na vida política do dia-a-dia, é trabalharmos todos, procurando fazê-lo com o País, para que Portugal seja um país mais moderno, mais desenvolvido, e que isso seja feito…

Protestos do PSD.

Está tudo um bocadinho nervoso, hoje! Não sei porquê!
Srs. Deputados, se me permitem…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Coelho, só se deixa interromper quem quer!

O Orador: - Tem razão, Sr. Presidente.
Como eu dizia, nós procuramos trabalhar sempre com um grande pluralismo no Partido Socialista.
Ora, como é evidente, aquilo que o Sr. Deputado Carlos Carvalhas referiu é algo que acontece na vida normal de um partido, principalmente de um partido com a ética republicana do Partido Socialista, que se traduz na noção de poder, efémera, de ganharmos as eleições quando as merecemos ganhar e de irmos para a oposição quando devemos de ir.

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Portanto, para nós, estar no poder e estar na oposição é a mesma coisa, porque somos democratas, somos republicanos e não temos a obsessão do poder que se vê que existe aqui, em outras bancadas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, querendo, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Jorge Coelho não desmentiu a sua afirmação.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Exactamente, pelo contrário!

O Orador: - Portanto, aquilo que vem nos jornais é verdade! Isto é, o Sr. Deputado disse para o seu partido: tenham juízo, porque, se continuamos assim, vamos todos parar ao Largo do Rato, isto é, à oposição!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - É o chamado «socialista consciente»!

Risos do PSD, do PCP e do CDS-PP.

O Orador: - Portanto, não atribua afirmações à minha bancada e a mim próprio que eu, de facto, não produzi!
Quero dizer-lhe, muito claramente, o seguinte: o que queremos derrotar, isso sim, é a política de direita, e a política de direita, na sua expressão concreta, está traduzida em muitos indicadores, designadamente na aceitação de desigualdades. E não somos nós que o afirmamos! Leia, por exemplo, as estatísticas da União Europeia, onde pode verificar que somos o país com o maior fosso entre os 10% mais ricos e os 10% mais pobres, e isto agravou-se com os governos do Partido Socialista! Somos também o País com o mais baixo salário mínimo, as mais baixas pensões de reforma e o mais baixo salário médio.
Mais, quando o Sr. Primeiro-Ministro e Sr. Deputado Jorge Coelho falam da pobreza sabem, porque têm de saber, que uma das principais fontes da pobreza reside precisamente nos salários baixos e nas baixas pensões de reforma. E tudo isto deve-se a uma política que acentua as desigualdades! Ou não os choca, por exemplo, que a alta finança, a banca, tenha 177 milhões de contos de lucro e que, simultaneamente, haja pessoas que chegam ao fim do mês a contar os tostões?!
Esta é a política de direita, que combatemos! Nós queremos derrotar é a política de direita, e para isso temos ao nosso lado muitas pessoas, mesmo da vossa bancada!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, informo que se encontram a assistir à reunião plenária alunos da Escola Secundária de Bocage, de Setúbal, da Escola Básica 2.º e 3.º Ciclos, da Pontinha, da Escola Secundária D. Dinis, de Lisboa, da Escola Secundária de Valbom, da Escola Básica 2, 3 Miguel Torga, da Amadora, da Escola Neves de Rendufe, de Amares em Braga, da Escola Secundária de Odivelas e aguardamos ainda a presença de um grupo de 70 alunos da Escola Básica 2/3 Ciclos Maria Manuel de Sá, de S. Mamede de Infesta.
Peço para todos eles uma calorosa saudação de todos nós.

Aplausos gerais, de pé.

Para formular o último pedido de esclarecimentos ao Sr. Deputado Francisco de Assis, tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco de Assis, agora, sim, três notas de rodapé.
Primeiro, quero cumprir, com muito gosto, a praxe parlamentar de cumprimentar os membros dos órgãos eleitos neste Congresso do Partido Socialista.
Segundo, felicito-me pelo reforço da liderança da bancada parlamentar do Partido Socialista, bem simbolizado pela presença do Sr. Deputado Jorge Coelho,…

Risos do PSD e do CDS-PP.

… Presidente da Comissão Permanente do Partido Socialista, que se encontra ao seu lado.

O Sr. Jorge Coelho (PS): - Não se preocupe! É só hoje!

Risos.

O Orador: - A terceira nota é para lhe dizer, Sr. Deputado, que, ouvindo atentamente a sua intervenção, tenho exactamente a mesma sensação do que a generalidade dos observadores políticos e do que generalidade dos comentadores políticos, não os da área adversa à sua, refiro-me àqueles inúmeros comentadores e analistas políticos da área política do Partido Socialista que abundam todos nesta mesma análise: o Partido Socialista descolou da realidade; o Partido Socialista e o Governo entraram num autismo completo. E quer melhor exemplo do que aquilo que eu disse da tribuna, Sr. Deputado? Como eu disse da tribuna, a propósito da reforma fiscal, não há um agente económico que não diga que a reforma fiscal não passa de uma mera «operação de cosmética», mas não apenas! É a já célebre moção aprovada no vosso Congresso que diz que a reforma fiscal não é mais do que uma «operação de cosmética»; contudo, V. Ex.ª considera ser esta a reforma fiscal mais espectacular da história da democracia! Isto é bem o símbolo da descolagem total entre o Partido Socialista e o Governo, por um lado, e a realidade objectiva, por outro!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, Sr. Deputado, sem prejuízo dos meus cumprimentos, estamos mesmo convencidos de que VV. Ex.as vão regressar ao Largo do Rato, mais depressa do que julgam.

Aplausos do PSD.

Vozes do PS: - Queriam!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Capucho, permita-me que use apenas

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meio minuto para dizer ao Sr. Deputado Carlos Carvalhas que eu apenas fiz - e na altura não fui só eu - a interpretação que aqui exprimi acerca das palavras que então proferiu. O Sr. Deputado diz-me que não foi isso que disse ou, pelo menos, não foi isso que quis dizer. Tanto melhor. Fico satisfeito por isso! Agora, foi esta a interpretação que na altura foi feita e é a que tem corrido. V. Ex.ª diz que não foi isso que quis dizer, só tenho de ficar satisfeito com o que o Sr. Deputado vem agora dizer!

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Muito satisfeito!

O Orador: - Sr. Deputado António Capucho, V. Ex.ª acha que tratar temas como a reforma fiscal, a reforma da saúde, a reforma da Administração Pública, a reforma da segurança social, é tratar temas que não interessam aos portugueses?!

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Exactamente!

O Orador: - O Sr. Deputado acha que melhorar o sistema de saúde, estabelecer a distinção entre o público e o privado, avançar no sentido de melhorar os cuidados prestados aos utentes e garantir uma melhor gestão financeira é tratar de temas que não interessam aos portugueses?!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado acha que garantir a sustentabilidade financeira da segurança social e avançar com uma política de solidariedade social mais rigorosa, apostada no princípio da diferenciação positiva e empenhada em garantir apoios maiores para os mais carenciados, é tratar de temas que não interessam aos portugueses?!
O Sr. Deputado acha que promover uma reforma fiscal no sentido de combater a fraude e evasão fiscais e no sentido de diminuir a tributação incidente sobre os rendimentos do trabalho dos trabalhadores por conta de outrem, a classe média, é tratar de assuntos que não interessam aos portugueses?!
Sr. Deputado, é esta a razão por que os portugueses cada vez mais se interessam menos pelo PSD!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início ao debate de actualidade com o Sr. Ministro da Ciência e da Tecnologia, sobre a situação e perspectivas da política científica e tecnológica nacional.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência e da Tecnologia, que dispõe, para o efeito, de 10 minutos.

O Sr. Ministro da Ciência e da Tecnologia (Mariano Gago): - Sr. Presidente, Sr as e Srs. Deputados: Procurarei ser mais breve na intervenção oral do que no texto escrito, poupando-vos aos números que dele constam, uma vez que o mesmo estará à disposição dos Srs. Deputados e dos grupos parlamentares.
Sr. Presidente, Sr as e Srs. Deputados: Em 1995, criou-se, pela primeira vez na história portuguesa, o Ministério da Ciência e da Tecnologia.
Uma das linhas de orientação seguidas desde a primeira hora pelo Ministério da Ciência e Tecnologia foi a avaliação e a reforma do sistema científico e tecnológico nacional, promovendo a sua crescente ligação à comunidade científica internacional e à sociedade portuguesa. Foi, assim, estabelecido um enquadramento legal das funções de coordenação do sistema científico, lançados programas de avaliação de instituições, projectos e programas de formação, envolvendo peritos de instituições estrangeiras e tendo-se garantido princípios de qualidade, rigor, independência e transparência.
Procedeu-se, assim, nestes anos, a uma profunda reforma do sistema científico e tecnológico nacional, institucionalizando-se práticas sistemáticas de avaliação independente internacionalizada e um modelo estável de financiamento público, criando-se simultaneamente uma nova carreira de investigação, um novo estatuto do bolseiro e definindo-se, de forma inovadora, o regime jurídico das instituições de investigação.
No plano da cooperação internacional, concretizou-se a adesão de Portugal a programas e organismos científicos internacionais. Aliás, neste período, Portugal entra para todas as grandes organizações e programas científicos internacionais de que ainda não era membro, designadamente o Laboratório Europeu de Biologia Molecular (EMBL), o Laboratório Europeu de Radiação Sincrotrão (ESRF), o Programa Internacional de Perfuração Oceânica (ODP), associa-se à NASA e adere à Agência Espacial Europeia (ESA), assim como à Organização Europeia de Astronomia. Hoje, Portugal participa em 15 organismos e redes internacionais de cooperação científica.
A cooperação com espaços não-europeus foi também uma prioridade, designadamente pelo lançamento da Iniciativa Eureka-Ásia destinada à troca de tecnologia e conhecimento científico. Promoveu-se a primeira reunião dos responsáveis de ciência tecnologia da CPLP e foi criado o Centro Histórico das Ciências Luso-Chinês.
O orçamento do Ministério da Ciência e da Tecnologia consagrado à cooperação internacional em C & T cresceu neste período de 1,4 milhões de contos, em 1995, para 5,4 milhões de contos, em 2001.
Foi iniciado, neste período, o Programa de Apoio à Reforma dos Laboratórios do Estado, na sequência da avaliação internacional efectuada em 1996 e acompanhada regularmente desde então. Este Programa foi organizado em torno do financiamento de equipas de projecto, orientadas para temas de interesse público e contemplando o rejuvenescimento dos recursos humanos e a flexibilidade da gestão científica. Hoje, envolve já 22 programas estruturantes em sete laboratórios do Estado (dos nove avaliados), com um investimento da ordem dos 3 milhões de contos (6 milhões de contos, se considerarmos todos os outros apoios suplementares concedidos pelo Ministério, para lá dos orçamentos desses laboratórios).
Ainda no quadro da reforma das instituições públicas de investigação, foi aprovada na semana passada uma Resolução do Conselho de Ministros que visa a preparação de novas medidas tendentes ao aprofundamento e aceleração do processo de reforma dessas instituições, dando-lhes, em especial, uma ainda maior capacidade e autonomia de gestão e dotando-as de meios acrescidos.
Foram, entretanto, criados os primeiros laboratórios associados, no Porto, em Coimbra e em Lisboa, e novos laboratórios associados serão criados a breve prazo.

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Pedra basilar deste esforço de modernização, verificou-se um reforço continuado dos recursos orçamentais para o desenvolvimento do sistema científico, por forma a garantir a sua expansão através do apoio à formação de novos recursos humanos e do reforço das condições de realização de actividades de Investigação e Desenvolvimento (I & D), em condições de crescente exigência e qualidade. Entre 1995 e 2000, o orçamento do Ministério da Ciência e da Tecnologia quase triplica, passando de 23 para 66 milhões de contos; o orçamento de Ciência e Tecnologia do Estado, envolvendo todos os ministérios e o ensino superior, já representa mais de 2% do Orçamento do Estado consolidado.
A promoção do desenvolvimento tecnológico e da inovação, com o objectivo de aumentar a participação empresarial no esforço global de I & D levou ao apoio a um número crescente de projectos de investigação em consórcio entre empresas e instituições científicas. Foram, assim, apoiados mais de 180 projectos com financiamentos no valor superior a 8 milhões de contos. Foram lançados programas específicos de apoio ao emprego científico nas empresas e os primeiros cursos de mestrado na própria indústria, e está em plena aplicação um sistema de incentivo fiscal à actividade de investigação nas empresas, aliás, agora reforçado na sequência da reforma fiscal, que colocará Portugal ao nível dos países mais atractivos para o investimento empresarial em I & D, sendo ainda estimulada a participação empresarial em programas internacionais de investigação e desenvolvimento.
As despesas das empresas com I & D cresceram a um ritmo de 15%/ano, a preços constantes, entre 1997 e 1999. Estes dados vêm confirmar a entrada da investigação empresarial numa dinâmica de crescimento depois de 1995, após um período de enorme estagnação durante a primeira metade da década de 90. O essencial deste crescimento deve-se ao alargamento do número de empresas com actividades internas de I & D, que passou de 200, em 1995, para mais de 500, em 1999.
A importância dada à inovação e desenvolvimento tecnológico está, aliás, patente no recente pacote de medidas aprovadas pelo Conselho de Ministros, em 3 de Maio último, a que terei certamente ocasião de me referir durante o debate.
Gostaria de sublinhar o financiamento das bolsas de investigação e da formação de novos recursos. Desde 1994 até 2000, nos últimos seis anos, foram atribuídas mais de 10 000 bolsas, metade das quais de doutoramento. A atribuição de bolsas de pós-graduação, principalmente de doutoramento e pós-doutoramento, tem permitido estimular o crescimento de doutorados a um ritmo de cerca de 10%/ano, em Portugal, o que permitirá, esperamos, atingir a média europeia nos próximos anos.
A partir de 1998 começou a afirmar-se a capacidade de Portugal para atrair cientistas estrangeiros, designadamente ao nível da formação pós-graduada. São presentemente mais de 300 os estrangeiros em actividade de pós-doutoramento e de preparação do doutoramento no nosso país.
Gostaria de sublinhar, ainda, que para lá de uma política de orientação aberta para todas as áreas científicas, das ciências sociais e humanas às ciências das engenharias e ciências naturais, que se concretiza através de concursos sistemáticos, anuais, abertos a todas as área científicas, o Ministério da Ciência e da Tecnologia lança também, em parceria com outras instituições do Estado e fora do Estado, concursos orientados para objectivos de interesse público. É o caso do Programa Dinamizador das Ciências e Tecnologias do Mar e diversos concursos para projectos de I & D, desde o combate aos incêndios florestais até à segurança social e às políticas sociais em Portugal.
Outro dos vectores em que assentou a acção do Ministério da Ciência e da Tecnologia foi o da promoção da cultura científica e tecnológica, em especial através da melhoria da educação científica experimental nas escolas do ensino básico e secundário e do estímulo à iniciativa nesta área. Foi, assim, lançado o Programa Ciência Viva, estimulando-se a aprendizagem experimental das ciências, a colaboração organizada entre escolas e institutos de investigação, a sensibilização do grande público, o estímulo à participação da população nas práticas e nos debates da ciência, procedendo-se simultaneamente à criação de centros de divulgação científica em vários pontos do país. Além dos já construídos, estão actualmente em construção ou em projecto seis novos centros Ciência Viva em vários pontos do país.
O Programa Ciência Viva organiza na próxima sexta-feira e sábado o seu 5.° Fórum Nacional, afirmou-se como um importante contributo para o desenvolvimento da cultura científica e tecnológica em Portugal e como exemplo e fonte de inspiração para iniciativas recentes em outros países. No dia 10, amanhã, realiza-se em Lisboa, por iniciativa portuguesa, uma reunião de representantes dos governos de todos os países da União Europeia e da Comissão Europeia, os quais, em conjunto com peritos internacionais, vão preparar uma iniciativa europeia para a cultura científica e tecnológica.
Aos Srs. Deputados que o desejem, tenho todo o gosto em convidar para assistir e visitar o Fórum Ciência Viva deste ano.
Estes cinco anos de reforma, desenvolvimento e consolidação do sistema científico e tecnológico nacional foram, assim, decisivos. Este é um momento de viragem no desenvolvimento científico e tecnológico do país. A batalha é agora de persistência, trabalho, qualidade, continuidade e prioridade.
Nos últimos anos, o reforço das nossas capacidades e o seu enraizamento na vida económica, cultural e social do país são inegáveis. Mas o ponto de partida era baixíssimo!
Em 1995, o país investia 0,6% do seu PIB em I & D e, em 1999, este número subia para 0,8%. Este crescimento é extraordinário no que revela de trabalho profissional e de prioridade nacional, mas revela também o muito que há a fazer, pois, se estávamos abaixo de um terço da média europeia, em 1995, em 1999 estávamos em 43%.
Em 1995, o número de investigadores representava 2,4‰ da população activa; em 1999, este número já era 3,1‰, o dobro da permilagem de 1990, mas ainda apenas 62% da média europeia.
É preciso, acima de tudo, resistir à tentação da fraqueza dos que não suportam que o crescimento se consegue apenas pelo trabalho, a pulso, pelo estudo, pela avaliação sistemática e aberta, pela competência das rotinas bem feitas, pela ética do saber e do saber fazer bem feito, captando e incluindo as capacidades de todos.
Tudo faremos para que as capacidades científicas e tecnológicas do País continuem a crescer, e poderão mesmo crescer depressa, numa progressão sem paralelo noutros países, como se provou nos últimos anos.

O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr. Ministro.

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O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Mas não há fórmula milagrosa que substitua o trabalho, a persistência das orientações e a qualidade e a continuidade do esforço a realizar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Luísa Mesquita, Rosado Fernandes, Carlos Lavrador, José Luís Ferreira e Natalina Tavares de Moura.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência e da Tecnologia, ouvi-o muito atentamente e devo dizer que não foi inesperado o discurso que aqui nos trouxe: um relato exaustivo de números, do feito e do prometido e não cumprido desde 1995 até 2001.
Esperava uma outra intervenção, esperava o enunciar de um conjunto de medidas urgentes para o desenvolvimento da ciência e da tecnologia nacionais, para, de algum modo, despoletar o verdadeiro desenvolvimento dos centros de investigação universitários e daquilo que é o trabalho de investigação e desenvolvimento nos laboratórios do Estado.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - O Sr. Ministro apostou numa outra intervenção e é urgente que nos responda também àquilo que não entendemos ter sido omisso na sua intervenção.
O Sr. Ministro referiu que os laboratórios do Estado têm vindo a ser objecto de avaliação desde 1996. O Sr. Ministro já recebeu três relatórios de avaliação, tendo recebido, há cerca de dois meses, em Março de 2001, o último relatório da Comissão de Avaliação Internacional, escolhida pelo seu Governo, para avaliar, mais uma vez, os laboratórios do Estado.
O relatório que o Sr. Ministro recebeu é extremamente preocupante. Diz, por exemplo, acerca dos laboratórios do Estado avaliados, que não há recursos humanos, não há recursos materiais e não há recursos financeiros; chama a atenção para algumas delegações que estão prestes a fechar por não terem recursos humanos, financeiros e materiais; chama a atenção para o não pagamento do Estado aos seus laboratórios, pondo em causa o seu funcionamento; chama a atenção para o atraso dessas prestações de serviço; chama a atenção para o facto de os recursos humanos estarem envelhecidos e de não haver condições para melhores e mais rápidas contratações; chama a atenção para o material na área da Ciência e da Tecnologia, que, há anos e anos, não é renovado; chama a atenção para aquilo que foram os compromissos do Governo do Partido Socialista na realização de um conjunto de legislação, fundamentalmente as chamadas «leis orgânicas» dos respectivos laboratórios, que deveriam, por compromisso do Sr. Ministro, estar concluídas em Maio de 2000.
Sr. Ministro, estamos em Maio de 2001 e aquilo que o relatório diz é que apenas uma lei está concluída, as outras estão para discussão pública, estão para produção e algumas delas não se sabe por onde é que andam.
Este documento - considera a Comissão de Avaliação - é fundamental para o funcionamento em condições destes mesmos laboratórios.
Acerca destas questões o Sr. Ministro nada nos disse. Criou-nos aqui um figurino perfeitamente certinho - permitir-me-á a expressão - daquilo que é a tecnologia e o desenvolvimento científico no nosso país.
Relativamente a todas estas questões do relatório, que o Sr. Ministro possui desde Março de 2001, quais são as respostas que o Governo e a tutela têm para não asfixiar definitivamente os laboratórios do Estado?
Gostaria, ainda, de lembrar ao Sr. Ministro uma última questão. A Comissão de Avaliação Internacional chama a atenção para o facto de qualquer governo, no presente momento e face às últimas crises nacionais e internacionais, concretamente a do urânio empobrecido, a da BSE, a da febre aftosa, a dos acidentes devidos aos temporais, designadamente o de Castelo de Paiva, não poder deixar de ter laboratórios ágeis e eficientes para responder a estas necessidades. Seria um crime se o não fizesse.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, peço-lhe que termine.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Termino já, Sr. Presidente.
Relativamente a esta questão, Sr. Ministro, o que tem para nos dizer?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Ministro irá responder no fim de cada conjunto de três pedidos de esclarecimento.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rosado Fernandes.

O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência e da Tecnologia, estou muito contente em vê-lo aqui entre nós.
Devido aos meus já longos anos, tenho a experiência de ter visto o que foi uma avaliação feita pela OCDE cá, em Portugal, e, portanto, a colega Luísa Mesquita não se preocupe, porque, em geral, «cozinha-se», com alguma simpatia, um relatório que não seja perfeitamente desfavorável quanto ao nível da Ciência portuguesa.
Pertenci à Comissão de Avaliação e lembro-me, num relatório que fiz, que o exemplo que eu dava de como a Ciência, em Portugal, muitas vezes não funcionava era que, mesmo na Fundação Calouste Gulbenkian, com dinheiro, com meios humanos e com recursos financeiros disponíveis, não conseguiam fazer nada que tivesse interesse prático para o País.
Achando eu que, muitas vezes, não sabemos a quem nos dirigir, tendo sido, outro dia, instado, a propósito de Alqueva, por alguns ambientalistas, que me vieram expor o caso dos resíduos tóxicos que, neste momento, estão na Portucel Recicla, gostava de saber, Sr. Ministro, se haveria possibilidade de, com o Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território, se é que, porventura, não andam às turras, mas se andarem também têm de fazer as pazes, porque é para o bem do País, para o bem da Nação…

O Sr. Ministro da Ciência e da Tecnologia: - Não ando às turras com ninguém!

O Orador: - Se não anda às turras com ninguém, é mau sinal!

Risos.

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Sr. Ministro, porque me têm vindo a instar para que me interesse pelo assunto, pergunto se haverá possibilidade de se fazer um estudo sobre a qualidade da água e o que vão fazer aos resíduos tóxicos da fábrica, porque são milhões de contos que estão implicados, para lá do problema das gravuras, que parece um problema mais pictórico e arquelógico do que outra coisa, uma vez que, na Europa, não conheço nenhum vale com rochas que não tenha pinturas rupestres. Não existe nenhum, porque era ali, junto aos rios, que o ser humano vivia. Isso é normal.
Sr. Ministro, diga-me se, porventura, o Ministério da Ciência e da Tecnologia tem possibilidade de ter uma palavra sobre um assunto que preocupa gente, e sobre o qual também se diz muito dislate, para pôr um ponto final, se é que é possível pôr um ponto final em discussões deste tipo, naquilo que muitas vezes suscita dúvidas e que merece a nossa atenção.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lavrador.

O Sr. Carlos Lavrador (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência e da Tecnologia, a questão que lhe quero colocar prende-se fundamentalmente com o incremento da capacidade de inovação das empresas portuguesas de modo a torná-las tão competitivas quanto possível num mercado globalizado e muito exigente nesta área.
Sabemos que tem sido feito um enorme esforço no sentido do apetrechamento das empresas, dando-lhe, inclusivamente, meios, nomeadamente através de linhas de crédito, para a sua modernização e para a incrementação da sua capacidade de investigação e de desenvolvimento, mas também sabemos que esta área da inovação pressupõe que as empresas não ajam por si sós mas, sim, em parceria com outras entidades, para as quais, inclusivamente, o erário público disponibiliza verbas avultadas, nomeadamente as universidades, outros centros de investigação e desenvolvimento e vários serviços públicos.
Neste sentido, vou colocar duas questões ao Sr. Ministro: primeira, gostava que desse exemplos concretos das políticas que vai adoptar no sentido de vencer um certo atavismo negativo, uma certa relutância, que existe na cooperação entre empresas e entidades de investigação e universitárias; segunda, mais localizada, tem que ver com um vector anunciado pelo Sr. Primeiro-Ministro, isto é, com o mercado próximo da vizinha Espanha, que se apresenta recheado de potencialidades mas também de grande exigência em termos de garantir uma competitividade acrescida. O que é que, neste caso concreto, poderá e deverá ser feito com o contributo do Ministério da Ciência e da Tecnologia?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder aos primeiros três pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência e da Tecnologia, dispondo, para o efeito, de 5 minutos.

O Sr. Ministro da Ciência e da Tecnologia: - Sr. Presidente, a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita levanta a questão da reforma dos laboratórios do Estado e da sua avaliação.
Eu gostaria, no pouco tempo que tenho para responder, mas ficando, evidentemente, à disposição da Sr.ª Deputada para lhe fornecer todos os elementos necessários, de dizer, em primeiro lugar, que o relatório de avaliação dos laboratórios do Estado é totalmente independente, uma vez que não escolhi os membros da Comissão de Avaliação, escolhi exclusivamente o seu presidente, que é uma pessoa de indiscutível independência à escala internacional, que estes relatórios são públicos e que é o próprio relatório de avaliação dos laboratórios do Estado - e insisto que é inédito que um governo não só peça a avaliação como também o acompanhamento dos resultados dessa avaliação a um grupo internacional -, na sua última versão, que afirma, com clareza, os passos positivos dados e as dificuldades encontradas e recomenda ao Governo novas medidas.
É em resposta também a esse relatório, para lá da nossa própria análise, que foram tomadas medidas. E as medidas tomadas não são de somenos importância, Sr.ª Deputada! O facto de se ter alterado drasticamente, pela primeira vez na história portuguesa, o regime de recrutamento de investigadores dos laboratórios do Estado, que não estão sujeitos a regime de congelamento, não é uma medida de somenos importância. Não é de somenos importância terem-se criado os conselhos científicos dos laboratórios do Estado. Não é de somenos importância ter-se obrigado os laboratórios do Estado a concorrerem para programas de longo prazo, estruturantes, cada um deles dotado de autonomia de gestão financeira e administrativa. Estas medidas são de uma enorme relevância, e já estão em curso nesses laboratórios.

O Sr. António Braga (PS): - Muito bem!

O Orador: - Continuo a estar convencido de que os laboratórios do Estado portugueses têm um papel importantíssimo no desenvolvimento do País. Defendi-o sempre. Nunca defendi a política liberal da maioria dos países europeus, que fecharam parte dos seus laboratórios do Estado e entregaram exclusivamente ao sector privado essas funções. Não estou de acordo com essa política - aliás, a história parece estar a dar-nos razão, porque noutros países se está a voltar à recriação dos laboratórios do Estado. Mas também nunca pactuarei com a mediocridade de laboratórios,…

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - … que nada produziam e não eram competentes em muitos departamentos.
Fui o primeiro a defender que tínhamos capacidades científicas para prevenir riscos públicos. Existem hoje laboratórios do Estado com essas capacidades, mas existem outros em que não temos essas capacidades e, por isso, estamos a criá-las. E quando essas capacidades existem noutras instituições, sejam elas públicas ou privadas, é preciso recorrer a elas.
O Sr. Deputado Rosado Fernandes coloca-me um problema concreto, o da qualidade da água no Alqueva. Terei, obviamente, todo o gosto em olhar para esse problema com as autoridades competentes e em pôr à disposição a capacidade científica nacional do Ministério nesta matéria. Aliás, o próprio Ministério já tem trabalho feito nesta área.

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O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - E sobre os resíduos tóxicos?

O Orador: - No que respeita aos resíduos tóxicos, devo dizer, para lhe dar um exemplo menos conhecido, que, neste momento, estamos a analisar metais pesados - utilizando, inclusivamente, o próprio reactor - em várias fontes de contaminação em Portugal e em Espanha, a pedido e por contrato de entidades industriais de outros países.
Sr. Deputado Carlos Lavrador, levantou duas questões: uma, relativa à investigação em consórcio, e outra, relativa às políticas para estimular a cooperação empresa/universidade.
Gostava de dizer o seguinte: em primeiro lugar, isto não é novo. Nestes últimos anos, financiámos, avaliámos e concluímos muitos projectos de investigação em consórcio, muitos dos quais (tenho aqui vários exemplos, que poderei dar aos Srs. Deputados) deram lugar à criação de produtos e de empresas. Não se trata meramente de projectos. Mal seria que, ao fim de cinco anos, houvesse só projectos! Não há só projectos. Há projectos, felizmente concluídos, há empresas novas criadas, de tecnologia, e é isso justifica que hoje tenhamos praticamente o dobro das empresas que fazem investigação em Portugal do que tínhamos há cinco anos atrás.
Antes que eu seja acusado de estar a descrever uma situação de oásis, direi que a situação não é nenhum oásis! Sou o primeiro a dizer que termos 500 empresas que fazem investigação em Portugal é pouco. É o dobro do que tínhamos há cinco anos atrás, mas é ainda pouco! Agora, elas não se inventam por decreto. É pelo trabalho sistemático. É com a criação de recursos humanos, com a criação de condições financeiras e de estímulo que isso se faz.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): - Sr. Presidente, sendo esta a primeira vez que uso da palavra neste Plenário, gostaria de apresentar os meus cumprimentos a S. Ex.ª o Sr. Presidente da Assembleia da República e aos demais Deputados.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Ministro, o desenvolvimento tecnológico e a sociedade de informação colocam ao nosso alcance instrumentos que podem e devem ser postos à disposição também da defesa e da afirmação dos valores ambientais e da qualidade de vida dos cidadãos. Isto porque, no nosso entendimento, a política científica e tecnológica deverá ser transversal e multidisciplinar.
No presente e no futuro, colocam-se sérios problemas à humanidade. Uma política científico-tecnológica terá de estar atenta a esses problemas para lhes dar resposta.
Ora, na nossa perspectiva, um desses grandes desafios é a questão energética. É verdade que não sabemos a quantidade de energia necessária para fazer face às necessidades do futuro, mas sabemos, certamente, que, a médio prazo, as necessidades de petróleo e de gás serão superiores às reservas existentes. Também sabemos que Portugal importa entre 80% e 90% da energia que consome.
Por outro lado, e considerando a necessidade imperiosa de se criarem mecanismos que permitam alguma independência face aos combustíveis fósseis, todos sentimos a necessidade de um grande investimento em energias renováveis, que constituem o único recurso energético que nos é próprio e que não é nocivo para o ambiente.
Ora, um desenvolvimento que se pretenda sustentável exige uma política que permita a utilização de uma variedade de fontes de energia, principalmente num país como o nosso, que tanto depende a esse nível do exterior.
Assim, pergunto ao Sr. Ministro o seguinte: considerando a necessária transversalidade da política científica e tecnológica, em que medida o Ministério da Ciência e da Tecnologia tem promovido e colaborado em projectos de investigação, com vista à pesquisa e desenvolvimento de técnicas para a conservação e redução do consumo energético e à pesquisa de energias alternativas mais favoráveis ao ambiente?

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Natalina Tavares de Moura.

A Sr.ª Natalina Tavares de Moura (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, V. Ex.ª é um homem altamente qualificado e credenciado na área das novas tecnologias - já o era, não é pelo facto de ser Ministro!
Mas eu vou ter de voltar a colocar-lhe uma questão que se prende com a infoexclusão. Jurei a mim mesma que não o deixaria em paz enquanto não tiver solução para esta questão!
V. Ex.ª sabe, tal como todos nós, que os cegos e os amblíopes tinham o apoio, em termos de suporte, do sistema braille e também em livros com suporte audio.
Bom, hoje, o livro está digitalizado e os nossos cegos e amblíopes não têm acesso ao livro. E não têm acesso ao livro - o que parece ser simples para quem está de fora - por falta desta sintonia, que não existe, de uma harmonização de interesses entre editores e livreiros. Esta questão também não pode ficar de fora do leque das preocupações do Sr. Ministro só por força da não harmonização de interesses entre estas entidades.
Coloquei-lhe a questão aquando da discussão do Orçamento do Estado, gostaria de saber, Sr. Ministro, se, neste momento, há ou não alguns progressos nesta área e qual o caminho que ainda falta percorrer, porque temos de dar resposta a uma grande parte da população portuguesa.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência e da Tecnologia.

O Sr. Ministro da Ciência e da Tecnologia: - Sr. Presidente, relativamente às questões energéticas, colocada pelo Sr. Deputado José Luís Ferreira, quero dizer que estou inteiramente de acordo consigo.
Penso que a questão energética é uma questão central não só para Portugal mas também à escala europeia e à escala mundial e que o problema se coloca em novas fontes de energia e em poupanças de energia. Alguns dos progressos nesta matéria são lentos, porque não é possível introduzir facilmente a preços proibitivos energias novas

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no mercado, enquanto há outras energias baratas no mercado. Mas isso é, com certeza, mais do que conhecido do Sr. Deputado.
O que é que temos estado a fazer em Portugal na área da Ciência e Tecnologia nesta matéria?
Em primeiro lugar, estimulamos a participação de todos os grupos portugueses e empresas portuguesas nos programas europeus. Há, essencialmente, dois grandes programas europeus que dizem respeito à investigação em matéria de energia, e aí temos tido uma evolução muito apreciável. Recentemente, foram descobertas em Portugal novas formas de colectores solares de alto rendimento, em ligação com projectos europeus, e, simultaneamente, temos uma participação extraordinamente activa no nosso país (aliás, mais activa do que a dimensão do País) no Programa Europeu de Fusão.
Eu não sei, nem o Sr. Deputado saberá, se o Programa Europeu de Fusão, um dia, dentro de 20 ou 30 anos, dará os resultados esperados, ou seja, produzir energia eléctrica a baixo preço, sem poluição radioactiva e em boas condições económicas, designadamente de disseminação por vários países das suas competências. Contudo, entendemos que devemos participar activamente nesse programa para que os reactores europeus de fusão, quando forem constituídos, sejam constituídos com empresas portuguesas e, também, com investigadores portugueses.
É por isso que, por exemplo, um determinado sistema técnico - que é hoje utilizado em toda a investigação de fusão - é português, e foi adoptado à escala europeia.
Estamos a acompanhar a investigação na área das pilhas de hidrogénio e outras investigações semelhantes.
Porém, Sr. Deputado, há uma questão crítica que é preciso ter em atenção: há 10 ou 15 anos atrás, nós bem podíamos acompanhar, mas não tínhamos engenharia, nem física nem química, nem investigação em materiais em qualidade e quantidade competitivas no nosso país que nos permitisse dar contribuições significativas. Neste momento, conseguimos acompanhar, sim, e, nalguns casos, dar contribuições em nichos significativos. É esta a situação em que estamos, neste momento.
Gostaria também de lhe dizer que, no que diz respeito à energia eólica, foi aprovado neste Parlamento, aquando do debate do Orçamento do Estado, o encorajamento a que o Instituto de Meteorologia, com outras instituições, fizesse, reforçasse e ampliasse o mapa eólico em Portugal.
Sr.ª Deputada Natalina de Moura, agradeço a sua pergunta relativamente à questão da info-exclusão dos cidadãos com necessidades especiais, designadamente os cegos e amblíopes.
Como sabe, temos um grande trabalho nesta matéria: lançámos a iniciativa para os cidadãos com necessidades especiais à escala europeia e foi aprovada, fizemo-lo à escala nacional e foi aprovada; criámos normas de acessibilidade em todos os sites públicos, que estão a ser progressivamente transformados segundo as regras de acessibilidade; fizemos formação para os responsáveis de informática da Administração Pública e de empresas que quiseram participar; estamos a investir na criação rápida de um processador de voz que consiga, a partir de textos escritos no computador, ler esses textos automaticamente, o que será uma revolução para os cegos portugueses, que não terão de ler esses textos exclusivamente através de braille.
A questão que me coloca, além destas, que é a do mercado livreiro para os cegos, é uma questão crítica. Gostaria de encorajar o Parlamento - e darei todo o apoio técnico de todos os organismos que trabalham nesta área - para que uma iniciativa, que é, necessariamente, nacional, que tem, necessariamente, de contar com o apoio nacional de todas as bancadas, porque envolve uma conciliação difícil de interesses entre o interesse futuro com as novas gerações, com aqueles que poderão nascer cegos ou poderão ficar cegos, e os interesses materiais, legítimos também, das várias entidades em presença, possa ser tomada nesta matéria.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro: Gostaríamos de começar por afirmar que é importante e desejamos que possa ter efeito prático na actual situação do sistema científico e tecnológico nacional o debate que o Governo propõe à Assembleia da República.
A Constituição enuncia, no seu artigo 73.º, que «A criação e a investigação científicas, bem como a inovação tecnológica, são incentivadas e apoiadas pelo Estado, por forma a assegurar a respectiva liberdade e autonomia, o reforço da competitividade e a articulação entre as instituições científicas e as empresas». O fundamental está dito e escrito. Afinal, o que falta é cumprir.
Também o Programa do Governo propõe, nesta matéria, um conjunto de medidas que teriam como objectivo dar passos decisivos «para vencer o atraso científico do País» e acrescenta: «O crescimento dos recursos públicos para I&D permitirá a Portugal aproximar-se, neste período, do nível médio europeu de recursos humanos em investigação.»
A este propósito, vale a pena lembrar o Orçamento do Estado para 2001, do Ministério da Ciência e da Tecnologia. Os laboratórios do Estado, importantes instituições públicas de investigação e desenvolvimento, prestadores de serviços com elevado conteúdo tecnológico em domínios tão diversos como o ambiente, a saúde ou a construção civil, contaram com um aumento, para 2001, de 0,6%. As verbas orçamentais previstas não cobrem, sequer, as despesas com o pessoal permanente dos 13 laboratórios, que são assim forçados a ir buscar o resto a receitas próprias. Quanto ao PIDDAC, decresceu, de 2000 para 2001, 16%, apesar das carências de investimento, quer em instalações quer em equipamentos.
É importante lembrar também que, de acordo com as estatísticas oficiais, o peso da despesa total em I&D no produto interno bruto em Portugal só não é o mais baixo de toda a União Europeia porque a Grécia nos faz companhia.
Relativamente aos recursos humanos, a leitura comparada com os nossos companheiros europeus deixa-nos em último lugar. A verdade, afinal, é de todos conhecida. O que falta é alterá-la.
A ciência e tecnologia assumem, na nossa opinião, uma capital importância para o desenvolvimento económico e social do País, para a modernização do sector produtivo e dos serviços, para a preservação e gestão dos recursos naturais. Ao Governo competia a definição de uma política com objectivos claros, prioridades e metas, considerando as dificuldades existentes.

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Algumas medidas foram desenvolvidas no sentido da formação do ensino experimental das ciências e da divulgação científica, mas que não alteraram a precária situação do sector. É evidente a carência de recursos humanos, materiais e financeiros; continuam por resolver sérios problemas organizativos; não existem mecanismos de participação efectiva na tomada de decisões, não apenas da comunidade científica mas também das próprias instituições e pessoas colectivas e privadas, que devem protagonizar as actividades de ciência e tecnologia, e a prática governativa, particularmente as estratégias anunciadas, têm sido decepcionantes e incapazes de transformar e desenvolver o sistema científico e tecnológico nacional.
E hoje, a situação é deveras preocupante.
As instituições de investigação, porque demasiado dependentes dos mecanismos de financiamento de projectos através de concursos, têm vindo a perder - e não a ganhar, como Sr. Ministro disse há pouco - autonomia e capacidade de programação. Alguma legislação, entretanto publicada, veio confirmar a sua inadequação às realidades do sector e não a sua adequação, como o Sr. Ministro disse há pouco. É reconhecidamente insuficiente quer o nível de actividade das empresas, em ciência e tecnologia, quer a articulação das medidas de investigação com o sector produtivo, reflectindo num caso e noutro a ausência de incentivos governamentais. O subfinanciamento nacional à actividade científica tem vindo a acentuar-se, reforçando-se, cada vez mais, a dependência dos fundos estruturais europeus sem resultados estruturantes e duradouros visíveis.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - O envelhecimento dos recursos humanos, quer nos laboratórios do Estado quer nas unidades de investigação universitárias, é preocupante.
O Governo tem vindo a optar, também - e o Sr. Ministro esqueceu-se de o referir -, pela precarização dos vínculos laborais, com nefastos reflexos na produtividade das instituições.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

A Oradora: - No entanto, não é por falta de avaliações, de relatórios e de repetentes propostas de intervenção que o diagnóstico da situação se mantém estagnado.
Em Fevereiro de 2000, o Partido Comunista Português realizou, nesta Casa, uma audição sobre a situação dos laboratórios do Estado com a presença de investigadores e técnicos destas instituições, que confirmaram as inúmeras dificuldades com que se confrontavam, diariamente, na procura de um funcionamento eficiente, capaz de responder às solicitações nacionais e internacionais.
Recentemente, em Março último, e pela terceira vez, a Comissão de Avaliação Internacional, escolhida pelo Governo, formulou mais um relatório que enumera todas as dificuldades e todos os constrangimentos dos laboratórios do Estado e que constitui também um teste à política do Governo no que se refere à situação e perspectivas da política científica e tecnológica nacional.
Os resultados da avaliação permitem aferir da urgência de medidas nestas instituições, indispensáveis em inúmeras situações de prestação de serviços especializados, como, por exemplo, na avaliação dos recursos pesqueiros ou na informação climatológica e sismológica; em situações de emergência, como o acidente de Castelo de Paiva, ou no caso do urânio empobrecido; ou ainda quando se definem políticas e se tomam medidas em questões específicas, como a BSE, a febre aftosa, a co-incineração de resíduos perigosos, e é necessário contar sempre com apoios científicos e técnicos actualizados.
É esta também a opinião dos avaliadores, quando afirmam que as mais recentes crises nacionais e internacionais demonstram a necessidade de existirem estruturas ágeis e eficientes e que o Governo deverá envidar esforços para melhorar o serviço público dos laboratórios do Estado, de modo a que eles sejam capazes de enfrentar os desafios do novo século.
Muitas destas recomendações, agora propostas, não são novas, como o Sr. Ministro referiu há pouco; já foram enunciadas, em 1997, aquando da primeira avaliação.
Por exemplo, as lei orgânicas destas instituições, instrumento fundamental para melhorar o seu funcionamento, foram propostas por sucessivas avaliações, determinadas por legislação governamental e, até agora, só o Laboratório Nacional de Engenharia Civil tem a lei aprovada. As restantes estão ou em fase de consulta ou de produção e outras nem se sabe qual é o estádio.
Outros exemplos poderíamos enunciar do atraso na execução de medidas fundamentais várias vezes propostas, outras tantas prometidas e sistematicamente proteladas.
No relatório da Comissão de Avaliação Internacional, a análise, caso a caso, destas instituições, dá um cenário pouco atraente.
Por exemplo, a falta de recursos financeiros é preocupante no INIA, no IPIMAR, no LNIV, no LNEC e no IICT e muito grave no INSA e no IM, cujas dificuldades financeiras põem em causa as obrigações nacionais e internacionais.
Esta ausência de recursos impede a renovação de equipamento, a resposta adequada à diversidade das matérias e impede a contratação de novos quadros, em suma, paralisa o funcionamento dos laboratórios.
Por exemplo, a falta de recursos humanos científicos e técnicos e o envelhecimento dos quadros cria dificuldades ao funcionamento do IPIMAR, do LNIV, do IGM, do INETI, do LNEC e do IN.
E se este é o cenário dos laboratórios do Estado, segundo esta Comissão de Avaliação Internacional, longe não anda o dia-a-dia dos centros de investigação universitários, que, apesar da importância que todos lhes reconhecem, não têm sido objecto das necessárias intervenções.
O crescimento da despesa em I&D, no ensino superior, tem sido determinado, sobretudo, pelo crescimento da despesa de pessoal. A grande maioria destas unidades conservam equipamentos e infra-estruturas de origem, que, naturalmente, se encontram desactualizadas.
Nos últimos anos, têm surgido inúmeras unidades de I&D; no entanto, de 1999 para 2001, o Orçamento do Estado não tem reflectido essa realidade, antes pelo contrário, abrandou o esforço financeiro. Relativamente aos recursos humanos, há uma clara preponderância dos docentes sobre os investigadores e bolseiros.
Nestas unidades de I&D, não há, na prática, possibilidade de criar emprego científico, dado que não existem quadros de investigação nem verbas para contratações.

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Por outro lado, o Governo tem impedido, na prática, a comunidade científica de se fazer ouvir, em termos de representação institucional.
O Conselho Superior da Ciência e Tecnologia, criado em novos moldes, na anterior Legislatura, há mais de 4 anos, continua sem reunir, por não se encontrar constituído, cabendo nesta matéria, obviamente, responsabilidades acrescidas à tutela e ao Sr. Ministro.
Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Urge, em nossa opinião, formular a política nacional de ciência e tecnologia e concretizar medidas que tenham em conta as necessidades do País, as carências e as potencialidades do sistema.
A realidade tem demonstrado: a importância determinante do sector público e das responsabilidades do Estado no fomento destas actividades; a necessidade de um desenvolvimento sustentado do sistema e da coordenação dos vários subsistemas; a necessidade de mecanismos de participação democrática da comunidade científica; a necessidade de acrescidos recursos financeiros e humanos e a necessidade de uma lei de financiamento das instituições públicas de I&D, contemplando um financiamento-base, regulado por parâmetros objectivos, e um sistema de financiamento por contratos-programa e por projectos.
Para terminar, Sr. Ministro, apetece-me plagiar o poeta, também investigador, e lembrar-lhe que os átomos não foram fabricados de propósito para si - já cá estavam, estão e estarão.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Não havendo pedidos de esclarecimento, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Sr. Ministro, a nossa preocupação não reside apenas nos laboratórios do Estado, contrariamente ao que referiu a minha colega Luísa Mesquita, do PCP, cuja intervenção apenas verteu e transportou para a Assembleia uma preocupação, em certa medida justa, relativamente ao enquadramento dos funcionários.
No entanto, Sr. Ministro, devo dizer-lhe que «não lhe doa a mão», porque as instituições improdutivas devem ser liquidadas, as instituições que não produzem não podem ser apoiadas. «Não lhe doa a mão», Sr. Ministro, a reformar os laboratórios nacionais; «não lhe doa a mão», Sr. Ministro, a renovar o pessoal desses laboratórios. Nesse sentido, o Sr. Ministro conta com o entusiasmo e o apoio desta bancada.
É preciso, de uma vez por todas, romper com alguns preconceitos estabelecidos, uns mais corporativos que outros, porque, quer uns quer outros, têm impedido, infelizmente, avanços significativos na ordem do desenvolvimento dos laboratórios nacionais. Sr. Ministro, este é um ponto que, para nós, é uma pedra-de-toque e em relação ao qual conta, como sabe, com o nosso apoio.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com o desenvolvimento exponencial das tecnologias de informação e comunicação, inicia-se uma nova transformação de carácter civilizacional. A era industrial e a sociedade de consumo cedem o seu lugar à nova sociedade da informação. Há, por isso, muitos pensadores, como Ramonet e Forrester, para citar apenas dois, um mais optimista que outro, que vaticinam, de qualquer modo, as maiores e mais profundas consequência na vida dos povos, maiores e mais profundas do que as que sucederam com a Revolução Industrial. Alterações vitais, aliás, em sectores das actividades económicas, no lazer, na investigação e na educação, que já aconteceram e estão a acontecer, para citar algumas.
A combinação e interacção das aplicações da tecnologia dão, por isso, origem a novos produtos e a novos serviços.
As tecnologias do digital, combinando informática, telecomunicações e televisão, trazem alterações em praticamente todos os domínios, do económico ao social, sendo a mais perturbadora a distinção entre o que se pode chamar de países info-ricos e países info-pobres, o que, na prática, assinalará as actuais diferenças entre os países bem equipados e os países menos bem equipados.
Contudo, há, de novo, oportunidades para países como Portugal poderem dar saltos no seu desenvolvimento e garantirem, por isso, um lugar nos novos contextos tecnológicos que vão desenhando um novo mapa geopolítico do mundo.
O Governo do Partido Socialista e da nova maioria inauguraram as políticas desta nova era, ao criar, pela primeira vez na história da República, um ministério dedicado exclusivamente à cada vez mais importante área da Ciência e Tecnologia.
Dado que assim foi - e foi-o pela primeira vez -, os vectores fundamentais desta política, à luz do interesse vital da competência, incidiram na avaliação e reforma de todo o sistema científico e tecnológico nacional. Alguns, porém, como pudemos ouvir por parte da Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, resistem.
Fundamentalmente, tratou-se de, por um lado, construir novos quadros de referência quanto às funções e, por outro, lançar programas de avaliação e formação, garantindo-se, desse modo, os princípios da qualidade, de rigor, de independência e de transparência nestas acções.
Não sendo hora de balanço, mas de reflexão tranquila quanto ao que se está a processar, é importante referir que, neste período de tempo que leva a governação socialista, Portugal aderiu às grandes organizações internacionais e programas científicos.
É igualmente um momento histórico, porque, anteriormente, também aqui havia um certo isolamento. Mesmo em democracia, mesmo com o exercício da liberdade, Portugal estava afastado dos grandes centros de investigação internacionais, dos grandes programas científicos internacionais, e, hoje, felizmente, não está.
Foi iniciado o ambicioso programa de apoio à reforma dos laboratórios do Estado, com 22 projectos em execução em sete laboratórios, que se traduz num investimento que já ultrapassa os 3,3 milhões de contos - assinalável!
De relevar, ainda, a criação dos primeiros laboratórios associados, envolvendo cerca de 900 investigadores, de entre os quais mais de 300 doutorados.
O orçamento da Ciência e Tecnologia já representou, em 1999, cerca de 2% do Orçamento do Estado consolidado.

O Sr. David Justino (PSD): - De novo?!

O Orador: - É verdade que o Sr. Ministro já o disse, mas, como os senhores não ouviram nada, precisam de ouvir de novo. É que, nomeadamente, todo o discurso da Sr.ª Deputada Luísa Mesquita esqueceu esta realidade…

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Esqueceu?! O Sr. Deputado é que não ouviu!

O Orador: - … e, por isso, nunca é demais repeti-lo. Repetir é também uma maneira de aprender.

O Sr. David Justino (PSD): - É a chamada «táctica da fotocópia»!

O Orador: - Não, não é fotocópia, Sr. Deputado; é a repetição da lição! Sabe, o «Sumário» também dizia isso: «Repetição da lição».
Sei que os senhores não gostam de ouvir alguns números; nem é, aliás, o nosso estilo,…

O Sr. David Justino (PSD): - Não tem é mais nada para dizer!

O Orador: - … nem somos bons nisso,…

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - É a revisão da matéria dada!

O Orador: - … não somos muito bons a citar números, Srs. Deputados, é verdade. Agora que eles existem, existem. E se os Srs. Deputados são bons a tentar inventariar situações, do vosso ponto de vista, menos agradáveis, é natural que quem governa releve o que, de facto, está a acontecer e não se cinja a aspectos particulares ou muito específicos, até de génese mais corporativa, que não interessa trazer a um debate desta natureza. É, sim, importante trazer a este debate as questões estruturantes. E estruturante é o Orçamento do Estado e são as iniciativas de apoio e estímulo à investigação científica nos laboratórios do Estado, mas também em laboratórios associados - são esses os vectores mais importantes. Se vos aborrece que nós relevemos esse facto, lamento, mas terão de ouvi-lo mais vezes.

Vozes do PS: - Exactamente!

O Orador: - Contudo, Srs. Deputados, as preocupações com o desenvolvimento e o apetrechamento tecnológico vão ainda muito mais longe. Refiro-me ao apoio à participação empresarial em projectos de investigação, em consórcio entre empresas e instituições de investigação científica.
As despesas das empresas com Investigação e Desenvolvimento cresceram, em média, 15% ao ano, a preços constantes entre 1997 e 1999, dados que confirmam o acerto destas opções políticas. Foi por isso que citámos estes números e não para vos incomodar.

O Sr. David Justino (PSD): - Oh!

O Orador: - Foi apenas para demonstrar o acerto das opções políticas quanto às iniciativas em curso.
E, como o Sr. Ministro, aliás, já referiu, o crescimento do número de empresas que, hoje, possuem investigação é, de facto, assinalável. Não estamos contentes, não é ainda um bom número, mas, relativamente ao esforço que tem vindo a ser feito, é assinalável. E é nossa obrigação dizê-lo, uma e duas vezes, aos portugueses, dado que é com eles que temos o nosso contrato eleitoral e para que também eles conheçam este aspecto.
Para além de inúmeras outras iniciativas no âmbito da sociedade de informação, a qual constitui, como sabemos, uma prioridade nacional, estas opções reveladas são já bons indicadores para fazermos um juízo político, nesta Câmara.
Não somos dos que permanentemente apelam a que as acções políticas sejam vistas pelo lado das «unanimidades», não temos esse típico comportamento. Mas, no caso presente, apetece-me citar Aristóteles, que na sua Metafísica, a dado passo, nos diz, justamente quanto à ciência: «O começo de todas as ciências (…)» - neste caso, perdoem-me a comparação, do Ministério da Ciência e da Tecnologia - «(…) é a surpresa de que as coisas sejam aquilo que são».

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado David Justino.

O Sr. David Justino (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Antes de iniciar a reflexão sobre alguns dos pontos que considero importantes sobre a política científica, em Portugal, gostaria de manifestar ao Sr. Ministro a maior simpatia e o reconhecimento de que o Sr. Ministro tem feito um esforço assinalável para que o desenvolvimento científico possa atingir padrões europeus, o que, infelizmente, ainda está longe de acontecer. Portanto, como também é normal nas provas de doutoramento, nas provas académicas, começamos pela troca de galhardetes para, depois, passarmos ao fundamental. Quer isto dizer que passaremos agora ao fundamental.
Sr. Ministro, face à sua intervenção e à do Sr. Deputado António Braga, gostaria de lhe dizer que há sempre uma resposta para as dúvidas ou para as críticas que se possam fazer e há sempre uma solução para qualquer pergunta que se possa fazer sobre a situação da ciência em Portugal. E a imagem que encontro - e já a utilizei uma vez - para descrever a situação é esta: o Sr. Ministro, para apagar um grande fogo numa grande serra, está a utilizar regadores de 5 litros. Portanto, todas as medidas que está a tomar, sendo reconhecidamente importantes, não têm a dimensão, a expressão ou, acima de tudo, a eficácia e a incidência que aparentemente poderiam prometer sobre o desenvolvimento científico. Ou seja, temos aqui um claro deficit entre aquilo que é o esforço político e aquilo que são os resultados.
Sr. Ministro, devo confessar que toda a sua intervenção era capaz de merecer o meu apoio; o meu grande problema está, depois, nos resultados. Nomeadamente, estamos já a entrar também aqui em algo que me parece quase paranóia, que é o facto de, no programa integrado de apoio à inovação, que tive oportunidade de consultar durante os últimos dias, se chegar ao ponto de - e sendo ele um documento que provém do Governo e que resulta de uma iniciativa do próprio Primeiro-Ministro - parte das maiores críticas que vimos fazendo ao Governo estarem lá todas. Ou seja, trata-se daquela velha táctica, que o Partido Socialista tem utilizado ultimamente, de ser governo e oposição ao mesmo tempo. Em suma, o Partido Socialista critica-se a si próprio. Quer isto dizer que o diagnóstico feito por esse documento sobre a situação, nomeadamente, da investigação e tecnologia, em Portugal, e sobre as perspectivas que existem não é, na sua estrutura e

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substância, um diagnóstico diferente daquele que o Sr. Ministro fazia em 1994 e 1995, antes de ser Ministro, pois contém os mesmos problemas, as mesmas deficiências e, eventualmente até, a mesma falta de perspectivas, com que muitas vezes somos confrontados, para superar estes problemas de carácter estrutural que se vêm repetindo desde há muito tempo.
Nesse sentido, a sensação que tenho, independentemente dos indicadores que citou, é a de que, nestes últimos cinco ou seis anos, o Governo socialista, na área da Ciência, não obstante os esforços feitos, não teve resultados.

Protestos do PS.

O desenvolvimento científico não teve resultados, nomeadamente naquilo que é fundamental, que é precisamente a sua repercussão na criação cultural, no desenvolvimento da Ciência, na sua propagação e generalização, etc.
Isto porque, nesse mesmo estudo, todos os indicadores de comparação com outros países da Comunidade Europeia estão como sempre: quando são 13 países, estamos em 12.º ou em 13.º lugar; quando são 14 países, estamos em 13.º ou em 14.º lugar; quando são 15 países, estamos em 14.º ou 15.º lugar. Ou seja, relativamente ao nosso posicionamento desde há cinco ou seis anos atrás, estamos na mesma.

O Sr. António Braga (PS). - Olhe que não!

O Orador: - Sr. Deputado António Braga, sabe onde é que houve melhoria? Na despesa. Gasta-se mais!

O Sr. António Braga (PS): - Gasta-se melhor!

O Orador: - Os senhores continuam com o raciocínio de que gastando mais significa termos melhor. Não é verdade! Temos mais ineficiência, Sr. Deputado!

O Sr. António Braga (PS). - E o número de empresas?

O Orador: - O que me interessa são os resultados!
Por outro lado, considero que a política de ciência - e é essa a proposta que faço; aliás, já tive oportunidade de, em sede de comissão, conversar e reflectir convosco sobre estes problemas - é condicionada por três pecados originais, desde 1995/1996.
Primeiro pecado original: o Ministério da Ciência e da Tecnologia separado das políticas do ensino superior.

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem! Isso é uma asneira!

O Orador: - É o primeiro pecado que limita qualquer política de desenvolvimento da investigação científica.
Segundo pecado original: o Ministério da Ciência e da Tecnologia sem tutela sobre os laboratórios nacionais. Ainda que possa promover programas de reforma e iniciativas de articulação, o seu grande problema, Sr. Ministro, é que, não tendo essa tutela, não consegue remover os obstáculos de carácter burocrático e corporativo que a maior parte destes laboratórios nacionais acaba por apresentar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Terceiro pecado original: o Ministério da Ciência e da Tecnologia diverge, nos princípios e na acção, do Ministério da Educação. Isto é, não há sintonia, quer nos princípios quer na acção, relativamente ao tipo de actuação do Ministério da Educação.

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A partir destes três pecados, difícil será ter êxito numa política de desenvolvimento científico.
Mas vamos analisar cada um deles.
Primeiro pecado: o Ministério da Ciência e da Tecnologia separado das políticas do ensino superior.
Se analisarmos a política existente, nomeadamente, da Secretaria de Estado do Ensino Superior, verifica-se que a preocupação básica desta Secretaria de Estado não tem que ver com o desenvolvimento científico. Tem que ver, única e simplesmente, em, de uma forma «estatístico-controleira», querer meter-se em assuntos para os quais não é chamada. E a Secretaria de Estado não é chamada para que assuntos? Não é chamada ao nível da liberdade do ensino; não é chamada ao nível da regulação do ensino privado; não é chamada no sentido de controlar o próprio ensino público. Isto transformou toda a política do ensino superior numa mera política de ensino, e não, o que seria desejável, numa política de desenvolvimento científico, com projecção no ensino, o que é algo completamente diferente.
Aquilo que se viu, no que respeita à Lei de Organização e Ordenamento do Ensino Superior, revela bem que a grande preocupação é a do bacharel e a do licenciado, não é a preocupação do cientista.
Nesse sentido, penso que o Sr. Ministro da Ciência e da Tecnologia, com o muito mérito que lhe reconheço, não conseguiu convencer nem o Ministro da Educação nem o Secretário de Estado do Ensino Superior de que esta política não serve a Ciência em Portugal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Segundo pecado: o Ministério da Ciência e da Tecnologia sem tutela sobre os laboratórios nacionais.
Sr. Ministro, eu sei que existe, da sua parte, uma profunda preocupação relativamente à reforma dos laboratórios científicos nacionais. Existe mesmo a convicção de que nesses laboratórios nacionais existem saberes, competências, isto é, um capital de conhecimentos e de experiência acumulados que merece ser rentabilizado.
Mas o retrato que nós temos, o retrato de quem conhece minimamente esses laboratórios, é o de que eles navegam entre o marasmo e a falência técnica. Digamos que muitos deles estão, com algumas excepções que são conhecidas publicamente, entre o desfasamento do que se produz cientificamente a nível internacional, continuando a repetir erros que já foram superados há muito tempo, e a falta de verbas para fazer funcionar as coisas mais elementares. E já não falo do INIA, do INETI, etc., que, independentemente da classificação que possa ter sido feita, se confrontam com problemas de desorganização, de desmotivação, de desmobilização dos próprios investigadores e de falta de verbas para o fundamental.
Nos últimos seis anos, a investigação científica dos laboratórios do Estado rendeu-se, praticamente, à burocracia das tutelas, acomodou-se ao funcionalismo público, no pior sentido da palavra, e, acima de tudo, divorciou-se das necessidades da economia, dos desafios

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das novas tecnologias e da procura sustentada de soluções para os problemas da sociedade portuguesa.
Terceiro e último pecado (e ficar-me-ei por aqui): a articulação entre as políticas dos Ministérios da Ciência e da Tecnologia e da Educação está a falhar desde há muito tempo.
Ao nível da promoção do ensino da Matemática e das Ciências continuamos com o mesmo problema. Agora, o tal programa integrado de apoio à inovação já vem dar razão ao PSD, quando refere que há que promover o ensino da Matemática e das Ciências, precisamente porque há uma lacuna grave.
Agora, já se reconhece que, por exemplo, há uma falta enorme de professores de Matemática. No último concurso, alguns milhares de vagas ficaram por preencher, precisamente porque não há recursos humanos suficientes. Ora, este é um problema central, para o qual não tem havido resposta.
Por outro lado, a cultura científica promovida pelo Ministério da Ciência e da Tecnologia é uma gota de água, pelo que é necessário promover a cultura científica através do Ministério da Educação.
Quanto às tecnologias da informação, o Ministério da Ciência e da Tecnologia promove o programa Tecnologias de Informação e Comunicação na Educação/NONIO SÉCULO XXI, mas o Ministério da Educação elimina os centros de recursos.
Nessa perspectiva, avaliando os desempenhos, quer de um quer de outro, até lhe posso dar nota 20, Sr. Ministro. Mas, para eu lhe dar essa nota, tenho de dar nota 3 ou 4 ao Ministro da Educação, porque, na verdade, nesta perspectiva, são completamente eliminadas a sinergias que deveriam existir, nomeadamente ao nível da Administração Pública.
Por último, penso que o diagnóstico feito pelo programa integrado de apoio à inovação revela bem isto. Diz o relatório que há «falta de orientação estratégica a nível das instituições públicas, reflectindo prioridades e visões diferentes do que deverá ser uma política de inovação para Portugal. Este facto é bem patente quando se separa a política seguida pelos Ministérios da Ciência e da Tecnologia, por um lado, e o da Economia, por outro.» E, no parágrafo seguinte, diz a mesma coisa relativamente à estratégia do Ministério da Ciência e da Tecnologia quanto ao Ministério da Educação.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - O PS não lê essas coisas!

O Orador: - Está tudo dito. Não tenho mais nada a dizer. Apenas espero que os três pecados originais possam ser remidos, para que Deus nos volte a acolher no seu seio, nomeadamente para que haja um melhor e maior desenvolvimento da comunidade científica nacional.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: A actividade do Ministério da Ciência e da Tecnologia tem tido indiscutivelmente aspectos positivos. Não é possível falar do que se passa neste sector sem referir, por exemplo, o aumento do investimento. Não estamos a falar de um aumento qualquer, trata-se um crescimento muito sensível do investimento público nos últimos anos, em que, por exemplo, as verbas dedicadas a instituições de investigação foram multiplicadas por algumas unidades; e esse aumento, assim como a implementação da avaliação das instituições de investigação, traduzem necessariamente uma vontade e uma opção políticas que devem ser reconhecidas e analisadas no contexto da utilidade que a comunidade nacional pode e deve retirar deste esforço.
As questões de política científica e tecnológica devem, pois, ser objecto de um debate centrado nesta análise, que pese simultaneamente os custos conhecidos e os benefícios que eventualmente se estarão a retirar. Ora, é precisamente neste âmbito que queremos identificar algumas preocupações e levantar outras tantas interrogações.
Os benefícios a retirar da política científica e tecnológica serão directos - aqueles que se registam por intermédio do seu impacto no tecido produtivo - e indirectos - aqueles se obtêm na formação de recursos humanos e de uma comunidade científica qualificados, que possam permanecer em Portugal e trabalhar para o seu progresso.
A respeito do impacto no tecido económico, conviria que o Governo nos pudesse esclarecer do seguinte: embora sabendo que este tipo de efeitos nunca são imediatos, será que o Governo tem dados sobre os agentes e os elementos económicos que este aumento da actividade de investigação, nomeadamente a aplicada, estará a beneficiar? E, se pode identificar esses benefícios, como resulta da intervenção inicial do Sr. Ministro, será que já os pode quantificar?
Quanto aos benefícios indirectos na formação e na educação, as nossas preocupações têm que ver, fundamentalmente, com a relação entre o sistema científico e as universidades ou, mais geralmente, entre o Ministério da Ciência e da Tecnologia e o Ministério da Educação.
Não se trata de falar do passado, nem de analisar pela milésima vez a questão de saber se foi boa ou má a criação de um Ministério da Ciência e da Tecnologia separado do Ministério da Educação, trata-se de falar de algumas questões concretas, de problemas que permanecem, de perguntas que se colocam e que me parecem merecer atenção.
Por exemplo, nos últimos meses, foi anunciada a criação de vários laboratórios associados (já aqui referidos pelo Sr. Ministro), como um novo tipo de instituição científica cujo financiamento pode ir até 10 anos.
A minha pergunta não se refere a estas novas unidades de investigação na forma em que se encontram hoje, mas pergunto o seguinte: entende o Sr. Ministro que faz sentido e é desejável a criação, em Portugal, de uma ou mais estruturas permanentes de investigação fundamental totalmente desligadas do sistema universitário, ou concorda com a ideia de que tais estruturas enfraqueceriam o sistema universitário, não trazendo reais vantagens científicas para o País, podendo até criar problemas novos?
Refiro-me, por exemplo, à inclusão de recursos humanos que, depois do financiamento e da associação a objectivos específicos da política nacional, poderiam ser encarados como estando desligados do sistema universitário.
Já agora, ainda no campo das relações, ou da falta delas, entre o Ministério da Ciência e da Tecnologia e o Ministério da Educação, e apesar do Programa Ciência Viva,

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já aqui referido, tem o Sr. Ministro alguma opinião sobre as recentes reformas curriculares dos ensinos básico e secundário?
Tem o Sr. Ministro alguma opinião sobre a redução das cargas horárias nas áreas científicas no 3º ciclo, ou entende que não deve ter opinião e que estas questões são indiferentes para a política científica nacional?
Considera que o único papel do Ministério da Ciência e da Tecnologia, em relação ao ensino, é o de colocar nas escolas ligações à Internet?
Finalmente, há uma pergunta que não posso deixar de fazer-lhe, que é uma curiosidade que tenho e, se calhar, o Sr. Ministro poderá satisfazer facilmente esta minha curiosidade .
O Decreto-Lei n.º 146/96, de 26 de Agosto, instituiu, no papel, os chamados colégios de especialidade. Estes eram concebidos, e cito o preâmbulo do decreto-lei, «(…) como uma das formas de agrupamento da comunidade científica, por grandes áreas de conhecimento, que permita a existência de estruturas de aconselhamento do Ministro da Ciência e da Tecnologia formadas por cientistas eleitos pelos seus pares.» Dizia-se mais adiante que a constituição dos colégios «(…) visa completar os mecanismos institucionais de organização e participação da comunidade científica e tecnológica na construção e acompanhamento das políticas científicas e tecnológicas (…)».
A minha pergunta é muito simples: foram ou não criados estes colégios de especialidade, que o próprio Governo decidiu instituir há cinco anos? Se não foram, por que é que isso não aconteceu?
Note-se que esta questão é da maior relevância política, porque o que está aqui em causa é a participação da comunidade científica nacional na formulação e no acompanhamento da política científica e tecnológica do País, nomeadamente, e volto a citar o preâmbulo do decreto-lei, pela «(…) sua contribuição para o reforço e isenção dos mecanismos de avaliação(…)».
Aliás, o artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 146/96, que fixa as «Atribuições» dos colégios, é explícito: estes «(…) indicam investigadores da respectiva área que podem fazer parte das comissões de avaliação das candidaturas a financiamentos atribuídos no âmbito do Ministério da Ciência e da Tecnologia (…)».
Por outro lado, se estes colégios não foram criados, que mecanismos formais estão a ser usados para assegurar a participação da comunidade científica «(…) na construção e acompanhamento das políticas científicas e tecnológicas», participação cuja indispensabilidade o próprio governo afirmou há cinco anos, para assegurar «(…) o reforço e isenção dos mecanismos de avaliação»? Ou não há mecanismos nenhuns?
Repito que esta questão é relevante em termos de política científica nacional. Não se trata só de saber se o Governo cumpre um decreto-lei que ele próprio elaborou já há cinco anos, é a própria concepção de política científica que aqui está em jogo. Se há, em Portugal, comunidade habilitada a participar na formulação, acompanhamento e controlo das políticas que lhe dizem directamente respeito,…

O Sr. Presidente: - Acabou o seu tempo, Sr. Deputado. Faça o favor de terminar.

O Orador: - … essa é a comunidade científica que congrega os melhores valores do país nas suas áreas de especialidade. Mas pode ser que haja aqui algum engano e o Sr. Ministro fará o favor de corrigir.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Rosas.

O Sr. Fernando Rosas (BE): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados: Seria estulto da minha parte não reconhecer que o actual Governo iniciou um esforço por definir e aplicar uma política científica para o País. O que é extraordinário é que ela tenha começado tão tarde e que, apesar de tudo, continue a ter tão pouca relevância relativa para um Governo que anunciou a inovação como seu novo tema de paixão. Para esta não ter o triste destino das paixões anteriores, para não se transformar, também ela, num oco e demagógico exercício de retórica, é necessário atentar seriamente naquilo que parecem ser alguns dos principais estrangulamentos desta jovem política de investigação científica, a matriz instrumental de qualquer estratégia de inovação.
No escasso tempo que a divisão partidária do trabalho no Parlamento me permite, gostaria de levantar cinco problemas principais:
Em primeiro lugar - e já foi referido -, o da incompreensível e inaceitável desarticulação do Ministério da Ciência e Tecnologia com o Ministério da Educação, ou das suas políticas, mais concretamente entre a ciência e o ensino universitário.
Se é certo que não existe verdadeira política de investigação desapoiada ou desligada das universidades e dos seus centros de pesquisa, é preciso dizer que esta separação institucional traduz não só isso, a separação institucional, mas uma verdadeira inadequação da política pedagógica e científica imposta às universidades para se constituírem como centros de apoio estratégicos à investigação. Mais concretamente: como é possível um salto de qualidade e de quantidade na investigação científica, permanecendo nas universidades, por imposição governamental, políticas e ratios professores/alunos absolutamente contrárias ao fomento da investigação e ao trabalho de pós-graduação? Quando em muitas escolas superiores a tutoria ou a orientação de teses de mestrado, de doutoramento ou de projectos de investigação, não conta directamente para a carga horária dos docentes? Quando a leccionação de cursos de doutoramento não é contabilizada no trabalho docente a não ser suplectivamente?
As actuais ratios, tal como foram concebidas, transformaram-se, nas universidades portuguesas, em instrumentos de estrangulamento financeiro das escolas e de bloqueamento gravíssimo ao desenvolvimento dos estudos de pós-graduação e de investigação em geral.
Sem se alterarem radicalmente estes critérios, à luz de uma estratégia integrada de política científica com a universidade, não vejo que se possa ir muito longe no desenvolvimento da investigação científica portuguesa.
Ainda dentro da mesma ordem de problemas, o Governo continua a inviabilizar financeiramente as carreiras de investigação nas universidades sem estreita ligação ao ensino. Hoje, qualquer investigador sabe que as universidades estão hoje praticamente impedidas de apoiar ou fomentar a investigação científica. É absolutamente verdade quer no tocante às carreiras de investigação, que

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não deixam criar, quer quanto ao apoio aos centros de investigação, que não tem capacidade para apoiar, quer mesmo na viabilização das pós-graduações, cada vez mais curtas, cada vez mais pobres e cada vez mais pedagógica e cientificamente difíceis de viabilizar.
Uma política de financiamento do ensino superior público restritiva, regida por critérios estritamente monetaristas e claramente hostil ao fomento da investigação, é a responsável por este impasse. Pensa o Sr. Ministro da Ciência e Tecnologia que é possível ter uma política de ciência para o País com uma universidade onde a investigação sofre tal tipo de bloqueios e de hostilização?
Em segundo lugar, constata-se a ausência de apoios por parte do Estado às saídas profissionais dos jovens doutores e de outros graduados saídos das pós-graduações. Em muitos cursos de mestrado e doutoramento estamos, neste momento, a formar jovens especialistas para o desconhecido, para o trabalho precário, para o trabalho subqualificado ou até para o desemprego, como se o desenvolvimento do País pudesse prescindir deste tipo de quadros de alta qualificação, como se a comunidade pudesse dar-se ao luxo de desperdiçar especialistas em cuja preparação dispendeu, e bem, verbas avultadíssimas, como se o Estado pudesse desinteressar-se, como faz agora, do aproveitamento de tais quadros, não procurando assegurar as suas saídas profissionais. Não só se não criaram, como já referi, carreiras de investigação ligadas ao ensino universitário que possam parcialmente absorvê-los, como não existem laboratórios do Estado, em número e em qualidade, que funcionem como centros estratégicos de investigação científica sectorial, como não vejo medidas no sentido, por exemplo, de impor às empresas e ao Estado, em ligação com as associações profissionais, normas vinculativas de recrutamento de doutorados e outros graduados para o desempenho de certo nível ou tipo de funções.
Pensa o Sr. Ministro da Ciência e Tecnologia que é possível desenvolver a política científica se não se interessar pelo investimento profissional dos valores humanos que cria?
Em terceiro lugar, permitam-me que refira, agora só muito de passagem, porque não tenho tempo, o problema dos critérios de apoio à criatividade científica. Parece que persistimos, por parte do Ministério da Ciência e Tecnologia, em muitas situações, na definição de apoios a instituições ou a investigadores em função de parâmetros essencialmente formais ou burocráticos. Não seria altura de optar claramente por averiguar e premiar o mérito de forma preferencial?
Em quarto lugar, vejo com preocupação que se mantém a não representatividade de alguns órgãos consultivos previstos na legislação orgânica do Ministério da Ciência e Tecnologia. Os conselhos de especialidade, ou colégios de especialidade, com funções consultivas e integrando representações eleitas pela investigação, não estão eleitos e, que eu saiba, nem sequer funcionam, como já foi referido. Também isto se destina a não passar do papel?
Por último, há-de argumentar-se que as medidas aqui propostas precisam de dinheiro e ele é escasso. Eu diria que precisam de uma política que dê prioridade ao investimento na investigação científica, por exemplo, em detrimento dos submarinos ou de outras opções lunáticas de despesa pública.

O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado, queira concluir.

O Orador: - Sr. Presidente, quero só dispor dos 30 segundos de que o Sr. Ministro beneficiou na sua intervenção.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado é novo no Parlamento e eu várias vezes tenho dito, embora lhe dê os 30 segundos, que a violação de uma regra regimental não cria direitos.

O Orador: - Eu sei, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça o favor de continuar, Sr. Deputado.

O Orador: - Não cria direitos mas cria complacências.

O Sr. Presidente: - Essas não precisam ser criada, existem.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Apesar da fatia de despesa em investigação e desenvolvimento ter subido discretamente nos últimos anos, a percentagem da despesa em investigação e desenvolvimento continua, no PIB, abaixo de 1% - só a Grécia e a Espanha nos acompanha neste valores -, isto é, continua a ser irrisória em termos europeus, e especialmente em termos das urgentes necessidade do País de andar muito melhor e muito mais depressa para recuperar o dramático atraso em que se encontra na matéria. Ou pensa - e concluo - seriamente o Sr. Ministro da Ciência e Tecnologia que é possível falar em inovação com tais percentagens da despesa pública aplicadas na ciência e tecnologia?

O Sr. Luís Fazenda (BE) - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para mais uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência e Tecnologia.

O Sr. Ministro da Ciência e Tecnologia: - Sr. Presidente, tentarei não abusar da sua complacência, mas as perguntas…

O Sr. Presidente: - Creio que já tomou consciência de que ao tempo de que dispunha foi acrescido o que sobrava ao Grupo Parlamentar do Partido Socialista, ou seja, tem agora 7 minutos e 37 segundos.

O Orador: - Sr., Presidente, tomei disso consciência, mas tomei consciência também que a divisão desses 7 minutos e 37 segundos pelas perguntas que anotei dá alguns segundos para resposta a cada uma delas, o que é manifestamente impróprio das minhas capacidades e disso me penitencio.
Gostava, obviamente, de agradecer à Câmara a oportunidade deste debate e as questões que foram levantadas, muitas delas importantes para o desenvolvimento de uma política científica e tecnológica eficaz para o País. Mas permitam-me uma observação inicial.
A Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, num comentário que muito me surpreendeu, terminou dizendo que os átomos não tinham sido inventados para mim. Eu julgava que eles não tinham sido inventados para ninguém!…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Isso é verdade.

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O Orador: - E a ideia teleológica de que Deus criou os átomos para alguém, esse era o último sítio de onde eu esperava que ela viesse.

Risos.

Mas foi sobre a senda da exaltação do milagre que se passou grande parte deste debate. Vejamos: em cinco anos, o orçamento de ciência e tecnologia do Estado, a preços constantes, aumentou 50%. Isto tem alguma importância, porque significa uma prioridade.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso significa desperdício!

O Orador: - Sr. Deputado, essas palavras são suas, fique com elas.
Além disso, aumentou para o dobro em menos de 10 anos, e o número de investigadores activos em Portugal em todos os sectores aumentou mais de 50% nos últimos cinco. Nunca isso tinha acontecido na história portuguesa.

O Sr. António Braga (PS): - E também na universidade!

O Orador: - Duplicou a produção científica portuguesa reconhecida internacionalmente em quatro anos - temos aqui resultados - e duplicou o número de empresas que investem em investigação e desenvolvimento, afectando-lhe recursos humanos e materiais, com certeza porque esperam resultados.
Os Srs. Deputados acham pouco? Eu também acho pouco, mas, neste momento, não conheço país algum no mundo que tenha conseguido estes ritmos de crescimento. Se os Srs. Deputados conseguirem esse milagre, gostaria que me dissessem. Isto com níveis mais baixos ou iguais aos nossos,…

O Sr. David Justino (PSD): - Começámos de baixo!…

O Orador: - … porque, obviamente, se tivéssemos os níveis mais altos seria absolutamente impossível.
Os números de produtividade, de produção, de relevância de número de investigadores, estacionaram na Europa há vários anos. Não é isso que me consola, mas uma coisa é certa: há convergência real do País com a União Europeia em matéria científica e ela faz-se a um ritmo muito superior àquele que alguma vez se fez na história portuguesa. Isto também é verdade!
Agora, uma coisa é certa: com base neste ritmo de crescimento, os senhores não podem apelar para a existência do milagre, isto é, estávamos abaixo de 1/3 das médias europeias, queriam que em cinco anos estivéssemos na média europeia? Não é possível!…

O Sr. David Justino (PSD): - Continuamos é na mesma posição!

O Orador: - Portanto, repito, este é um crescimento de resultados absolutamente invulgares e é sobre ele que temos de construir o futuro. Fui eu o primeiro a dizer que o ponto de partida era baixíssimo e que o ponto de chegada não é baixíssimo; é baixo mas não é baixíssimo!
Não me queixei das políticas anterioresm, e não o fiz porque entendo que as pessoas que as conduziram quiseram, com certeza, o melhor para o País. Melhor ou pior, foi isso o que tentaram. Mas o País é este e o problema que se põe quando se analisa o desenvolvimento científico/tecnológico de um País não é o de culpa, é, sim, o de estratégia, de realidade e de boas ou más políticas que podem ser apreciadas à distância.
Quanto aos resultados desta política, julgo que estamos, de certa forma, conversados.

O Sr. António Braga (PS): - Muito bem!

O Sr. David Justino (PSD): - Tirando os adjectivos!

O Sr. António Braga (PS): - Não, com os adjectivos!

O Orador: - Sr. Deputado, eu também gostava de ter nascido num berço de ouro e que a ciência, em Portugal, tivesse nascido num País que desde o século XIX estivesse na liderança do progresso científico!… Mas não há nada mais devastador para a possibilidade de crescimento nesta área do que ter a ideia que existe uma solução milagrosa para resolver em pouco tempo os problemas. Não há! Mas existem soluções, pelo trabalho constante, como se provou, para superar, passo a passo, os problemas e espero que toda a Câmara e todos os partidos políticos considerem esta questão como uma prioridade nacional.
Aliás, do ponto de vista estratégico, vejo que não há, de facto, uma oposição a esta política, há antes contributos no sentido de reforçá-la e eu agradeço esses contributos.
Alguns dos Sr. Deputados levantaram um problema que tenho todo o gosto em referir e que é o da relação entre as políticas científica e educativa, embora pudéssemos, da mesma maneira, falar da política económica ou de outras políticas.
Srs. Deputados, a solução governativa portuguesa não é uma solução invulgar na história recente europeia, antes pelo contrário. Esta é, em geral, a solução adoptada quando se quer dar absoluta prioridade ao desenvolvimento científico e resume-se a dar-lhe condições institucionais e financeiras para que tenha uma autonomia relativa face a outras políticas. Foi essa a solução adoptada em França durante os cerca de 10 anos do seu maior crescimento, essa é a solução que acaba de ser copiada em Espanha e é a que existe na Dinamarca, com excelentes sucessos, há quase 10 anos. E essa solução é criar um Ministério da Ciência e Tecnologia com responsabilidades na coordenação da política para a sociedade de informação.
Dito isto, quero também referir que, a níveis muito elevados de crescimento científico, a solução governativa é quase irrelevante. Repito, a níveis muito elevados de crescimento científico.

O Sr. David Justino (PSD): - Não creio!

O Orador: - Tivemos soluções semelhantes na Suécia, um país que se manteve no topo do desenvolvimento científico europeu, e tivemos soluções muito variadas nos últimos 15 anos, sem que isso representasse grandes inflexões de política científica e tecnológica. Porquê? Porque a base institucional e científica da Suécia, acumulada há mais de um século, é fortíssima e é possível que uma solução governativa aponte mais para a relação com um sector ou mais com outro, em determinados períodos.

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Agora, Srs. Deputados, há uma questão que é absolutamente crítica e que era preciso fazer, como devem ter compreendido. Aliás, agradeço as manifestações de aplauso a esta política, vindas de praticamente todas as bancadas, porque sem esse aplauso era impossível continuá-la.
A um país pequeno, como Portugal, que parte de uma situação de enorme subdesenvolvimento científico, é absolutamente essencial uma política de enorme rigor na avaliação do progresso científico do País, de enorme rigor no desenvolvimento. E isso exigia uma independência do Ministério da Ciência e Tecnologia relativamente a todos os factores que pudessem condicionar essa avaliação. Julgo que isto devia ser absolutamente claro para toda a Câmara.

O Sr. David Justino (PSD): - Só queria que o Sr. Ministro da Educação fizesse o mesmo.

O Orador: - As universidades são, por lei, autónomas e eu gostaria de dizer ao Sr. Deputado Fernando Rosas, aliás, um eminente universitário, que está nesta matéria, talvez por agora se encontrar fora desse sector, um pouco mal esclarecido.

O Sr. António Braga (PS): - Exactamente!

O Orador: - Aliás, neste momento, existe a carreira de investigação nas universidades. No entanto, se não têm sido criados mais lugares de investigação nas universidades é porque algumas delas não querem criar esses lugares.
Fique sabendo, Sr. Deputado, que propus a todas as universidades portuguesas - e isso está, neste momento, nos programas do Ministério - compensar financeiramente os seus orçamentos para a criação de qualquer lugar da carreira de investigação. Não há, pois, restrição de natureza orçamental para a criação de lugares da carreira de investigação nas universidades.

O Sr. António Braga (PS): - É verdade!

O Orador: - Peço desculpa, Sr. Deputado Manuel Queiró, por não poder responder a todas as questões que colocou, mas não considero que a questão de poder haver, no futuro, institutos de investigação, até fundamental, em Portugal, fora das universidades seja um tabu. Em todos os países desenvolvidos existe investigação fundamental dentro e também fora das universidades.
Há áreas de enorme competição internacional, absolutamente estratégica para os países, que só se conseguem realizar com pessoal a tempo completo, que não faz absolutamente mais nada, e com uma estrutura internacional…

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, agradeço que termine.

O Orador: - … que, inclusivamente, estabeleça uma relação mais forte com as empresas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, beneficiou de mais 1 minuto e 48 segundos que lhe foram concedidos pelo Partido Comunista.
Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 17 horas e 50 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos iniciar a discussão do projecto de resolução n.º 80/VIII - Sobre a instalação de um sistema de controlo de tráfego marítimo (Os Verdes).
Para introduzir o debate, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Portugal tem uma zona económica exclusiva muito significativa, correspondente a quase 20 vezes a nossa área continental.
A nossa zona económica exclusiva é cruzada pelas mais importantes e movimentadas rotas marítimas para o Mediterrâneo, norte da Europa, África e América. Muitos desses navios transportam hidrocarbonetos ou outras substâncias perigosas e a frequência da passagem destes navios é muito intensa, apontando-se uma média de mais de 100 navios por dia.
O risco de acidentes provocados por encalhes, afundamentos ou abalroamentos é uma realidade permanente e deles podem resultar problemas de poluição com uma dimensão muito grave. Imagine-se o que resultaria de um acidente ao largo do cabo de S. Vicente, por exemplo. Seria uma catástrofe ambiental e sócio-económica.
Aliás, a preocupação que constituem estes riscos já motivou, inclusivamente, a entrada de uma petição na Assembleia da República, à qual Os Verdes vêm dar resposta com este projecto. Tive o prazer de ser a relatora dessa petição e, na altura, fiz um relatório intercalar, porque considerava serem necessários um conjunto de explicações por parte do Ministério do Equipamento Social. Infelizmente, essas explicações nunca chegaram à Assembleia da República. Será esta, por isso, uma oportunidade para o Sr. Secretário de Estado prestar essas explicações necessárias ao Parlamento.
O risco de processos intencionais de lavagem de tanques ou de despejo deliberado de substâncias perigosas no mar são igualmente uma realidade, tanto mais que a falta de vigilância é um convite à prática do crime e é já comum a total impunidade e até a identificação dos infractores.
Por estas razões, também, um sistema de vigilância marítima deve, sem dúvida, constituir uma questão prioritária de defesa nacional. A costa portuguesa já foi, infelizmente, afectada diversas vezes por derrames de crude que afectam em larga escala a economia regional e nacional, fundamentalmente no que toca aos sectores da pesca e do turismo, tendo daí resultado também graves implicações, em boa parte, para os ecossistemas marinhos.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: A Convenção da ONU sobre o Direito do Mar atribui aos Estados direitos de usufruir dos recursos da sua zona económica exclusiva e, simultaneamente, atribui-lhes a obrigação, o dever, de os proteger.
Existem, evidentemente, diversos métodos de vigilância marítima que, articulados, resultam numa acção mais perfeita e eficaz de fiscalização, de prevenção do risco e de acção em caso de emergência.

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É evidente que estes métodos de vigilância implicam meios que escasseiam muito entre nós, desde aviões a navios patrulha, helicópteros, satélites, passando, obrigatoriamente, por mecanismos de fiscalização preventiva, como as inspecções portuárias a parte dos navios que entram nos portos nacionais.
Ora, um dos métodos de vigilância fundamentais - o qual é, precisamente, o objecto do nosso projecto de resolução - é um sistema de controlo de tráfego marítimo ou VTS, sigla da expressão inglesa Vessel Traffic System, constituído por estações costeiras e portuárias que controlam a navegação por radar, telecomunicações e outras radioajudas, durante 24 horas por dia, sejam quais forem as condições atmosféricas, permitindo obter informação detalhada sobre a passagem de navios nas nossas águas.
Este sistema torna-se tanto mais necessário quanto temos, em Portugal, uma suposta vigilância marítima repartida por diversas entidades: o sistema de autoridade marítima com órgão central e órgãos regionais e locais, a força aérea, comandos navais, portos, brigada fiscal da GNR. Enfim, entidades, ainda por cima, dependentes de Ministérios diferentes, o que, incompreensivelmente, neste Governo, não determina outra coisa que não a falta de coordenação traduzida em inoperância.
Basta ver, por exemplo, o caso de um navio holandês que naufragou, há cerca de quatro ou cinco meses, ao largo da costa de Sines, não se sabia muito bem onde. Para se obter informação, que tentámos de uma forma muito intensa, andavam as entidades a «passar a bola» (se me permite a expressão) de umas para outras, e ainda hoje está por esclarecer muita coisa sobre esse navio e sobre as substâncias que transportava. Fiz, inclusivamente, um requerimento sobre esta matéria, ao qual também ainda não consegui obter resposta.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: A criação dos VTS tem sido anunciada muitas vezes, mas até hoje nada. Nas várias discussões em sede de Orçamento do Estado, Os Verdes têm apresentado propostas de inclusão de verba para instalação das estações de controlo de navegação costeira, mas foram sempre chumbadas, com os votos contra do Partido Socialista.
Os Verdes consideram que a vigilância marítima, na qual o VTS é uma peça fulcral, é verdadeiramente imprescindível para a protecção ambiental e económica das águas e da costa do nosso país, de gestão e obrigação de protecção que temos em relação aos recursos da nossa zona económica exclusiva. Trata-se, pois, de um prioridade estratégica para o País.
Por isso, esta matéria não deve e não pode ser mais adiada e a Assembleia da República deve, no âmbito das suas competências, alertar o Governo para a urgência destas medidas e, nesse sentido, manifestar ao Governo a necessidade de, em Portugal, se instalar um sistema de controlo de tráfego marítimo que funcione em todo o território nacional e que, rapidamente, seja complementado com um sistema de informação e de gestão de tráfego, isto é, que integre outras formas mais detalhadas de informação.
É este, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o âmbito do projecto de resolução de Os Verdes que apresentamos hoje a discussão nesta Câmara.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Eduardo Martins.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Precisamente há cerca de um ano, aquando da apresentação pelo Governo, nesta Câmara, da proposta de lei n.º 6/VIII, relativa ao aumento do limite máximo das sanções pecuniárias aplicáveis aos actos geradores de poluição e degradação da nossa orla costeira, exigiu o PSD do Executivo a apresentação urgente de um plano estruturado de fiscalização e vigilância da costa e das águas sob jurisdição nacional, no qual se incluíssem as melhores tecnologias, designadamente o VTS, e meios disponíveis para assegurar uma adequada tutela daqueles bens jurídicos de valor inestimável.
Na ocasião, não obstante a bondade com que qualificámos a iniciativa do Governo, fizemos questão de denunciar a insuficiência dos meios propostos com base nos factos de na nossa costa existirem cerca de oito corredores de tráfego marítimo por onde passa cerca de 30% do crude mundial, embora, afinal, apenas 30 milhões de toneladas com destino ao Portugal, e de tal movimento representar, segundo o Centro Internacional de Luta Contra a Poluição do Atlântico Nordeste, um movimento diário nas nossas águas de cerca de 200 navios, dos quais 30 a 40 são embarcações petroleiras de grande tonelagem.
Invocámos, ainda, nessa altura, o facto de Portugal continuar a ser o único Estado membro da União Europeia que não possuía, sequer, um sistema de controlo da costa por vídeo de longo alcance - o também denominado VTS ou Vessel Traffic System -, quando, para mais, ele era até financiável por fundos comunitários. Tudo isto numa altura, aliás, em que já vários países europeus recorriam a sistemas de vigilância por satélite, designadamente através de um organismo chamado Oil Watch.
Por tudo isto, não pudemos deixar de registar com moderado agrado e expectativa o anúncio feito, em finais de Março findo, pelo Sr. Ministro Ferro Rodrigues de que entraria em funcionamento o Vessel Traffic Service no porto de Leixões, estando aprazados, para Junho deste ano, idênticos equipamentos para os portos de Lisboa, Setúbal e Sines.
Assim, saudamos de igual modo a presente iniciativa do Partido Os Verdes, embora, em virtude da oportunidade da proposta entretanto apresentada pelo Governo, se devesse, quiçá, aditar ao n.º 1 do projecto de resolução o advérbio «totalmente». Isto é, Portugal e a nossa costa deviam estar totalmente dotados de um sistema de vigilância deste modo.
Reveste-se também de inequívoca importância estratégica a complementação, ora proposta por Os Verdes, do VTS com um sistema de informação e gestão de tráfego - o Vessel Traffic Management Information System -, porque se trata, na verdade, como várias vezes já tivemos a oportunidade de mencionar, de pressionar o Governo do Partido Socialista no sentido de trocar as simples representações de cariz dramático a que nos tem habituado por uma efectiva governação responsável e tendente à resolução dos grandes desígnios nacionais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Manuel Queiró.

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: O CDS-PP vai votar favoravelmente esta iniciativa de Os Verdes, a qual

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devemos saudar, porque aborda uma matéria que é de grande importância para o nosso país.
Estamos a falar da protecção da nossa zona económica exclusiva, que é desproporcionadamente grande em relação a qualquer outro país da Europa porque se situa em torno da costa do continente e dos arquipélagos dos Açores e da Madeira, o que a torna extraordinariamente extensa para a dimensão do nosso país. Por isso, constitui uma base de recursos para Portugal cuja manutenção deveria ser um dos nossos objectivos fundamentais para o nosso futuro e para a nossa própria autonomia, no quadro de uma integração europeia.
A protecção deste recurso é um dever nacional, que deve ser veiculado pelas nossas instituições, sejam elas quais forem, de uma forma coordenada e diligente. Não está apenas em causa este sistema do VTS, mas a operacionalidade, por exemplo, das nossas próprias Forças Armadas nesta função. A marinha de guerra tem sido o principal vector militar utilizado na vigilância da zona económica exclusiva, mas também a força aérea o tem sido e, hoje em dia, não podemos deixar de utilizar estes sistemas apoiados em satélite, pela simples razão de que, tradicionalmente, não temos meios suficientes ao nosso dispor para efectuar uma cuidada e necessária vigilância da nossa zona económica exclusiva.
É evidente que se este sistema está prometido há já bastante tempo, e por diversas vezes, e a sua implementação tem sido sucessivamente adiada, esta intervenção da Assembleia da República faz todo o sentido, pelo que colocamos esta nossa breve intervenção ao serviço desse objectivo.
Assim, gostaríamos de ouvir por parte do Governo algumas explicações para o facto de só agora, e dada a magnitude do problema e das chamadas de atenção que já ocorreram no passado, parecer finalmente apostado e disposto a implementar definitivamente este sistema, e em que grau está disposto a fazê-lo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Joaquim Matias.

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Há cerca de um mês, quando subiu a Plenário a petição n.º 29/VIII, solicitando a intervenção da Assembleia da República com vista à revisão do regime em que se processa a navegação ao largo do Cabo de S. Vicente, de acordo com o que a este propósito recomenda o Centro Internacional de Luta contra a Poluição do Atlântico Nordeste (CILPAN), petição significativamente subscrita por 28 000 peticionantes, tivemos oportunidade de justificar a necessidade urgente desta Assembleia tomar, a curto prazo, iniciativas, com o objectivo de fazer o Governo passar das promessas, sucessivamente reiteradas e sistematicamente não cumpridas, de garantir a segurança no tráfego marítimo na nossa zona costeira, à tomada de medidas efectivas e consequentes nesse sentido.
Esperemos que as recentes declarações do Sr. Ministro e o documento entregue agora pelo Sr. Secretário de Estado não sejam mais uma vez uma promessa, porque é bem justificado o valor do investimento, que é sempre inferior ao de um grande acidente ambiental que possa acontecer. Infelizmente, no documento, não vem datada e programada a sua execução no terreno, pelo menos que eu tenha visto nos breves minutos que o tive em meu poder.
É de todos sobejamente conhecido que ao elevado tráfego marítimo que se processa dentro da nossa zona económica exclusiva está associado o risco de acidentes que poderiam ter consequências desastrosas nos ecossistemas marinhos e, também, que se multiplicam as transgressões às leis do mar, no que se refere à prática de agressões ambientais, cujos autores passam impunes, beneficiando das faltas de vigilância e fiscalização existentes.
Por outro lado, o desenvolvimento dos nossos portos, que constitui uma questão central no desenvolvimento estratégico do País, exige que tenhamos credibilidade, o que passa, no mínimo, por garantir a segurança da navegação e exercer uma vigilância sobre o tráfego marítimo no sentido de fiscalizar e fazer cumprir as leis do mar junto da nossa costa.
O Estado português subscreveu o Acordo de Cooperação para a Protecção das Costas e das Águas do Atlântico Nordeste - Decreto-Lei n.º 37/91, que, no seu artigo 18.º, cria o Centro Internacional de Luta contra a Poluição do Atlântico Nordeste - e ratificou igualmente a Convenção para a Protecção do Meio Marinho do Atlântico Nordeste (Decreto-Lei n.º 59/79), obrigando-se a tomar medidas de prevenção, protecção e vigilância da zona marítima. Mais: obriga-se, ao pôr em prática a Convenção, a adoptar programas e medidas que fixam datas limites de aplicação e que têm sempre em consideração a utilização dos últimos progressos técnicos realizados e dos métodos concebidos para prevenir e suprimir integralmente a poluição. No entanto, nada foi feito. Apenas promessas que serviram para justificar o voto contra do PS relativamente a iniciativas anteriormente propostas e discutidas nesta Assembleia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de resolução de Os Verdes, que saudamos, constitui o primeiro passo indispensável para a prestação de um serviço público de interesse relevante, que assegure o cumprimento das leis do mar, garanta a segurança da navegação e previna acidentes e problemas ambientais.
O sistema VTS permitirá, se instalado, um controlo efectivo e permanente da navegação na zona abrangida e a consequente separação do tráfego, sistema que, posteriormente, deve ser complementado com sistema de notificação para navios que obrigue à sua identificação, facilitando o controlo do seu percurso nas nossas águas territoriais e, consequentemente, a sua fiscalização.
Devem, ainda, ser disponibilizados os meios necessários às autoridades marítimas, por forma a possibilitar o cabal cumprimento da sua actividade fiscalizadora.
O consenso manifestado na apreciação da petição n.º 29/VIII, há um mês atrás, sobre a necessidade de garantir condições de segurança ao tráfego marítimo na nossa costa, antecipou desde logo a justificação do presente projecto de resolução, apenas ultrapassado nas datas, facto de que os proponentes obviametne não terão culpa, projecto de resolução que, como referimos já nessa altura, merece indiscutivelmente o nosso acordo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Natalina Tavares de Moura.

A Sr.ª Natalina Tavares de Moura (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Portugal

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convive desde sempre com o mar e nele perspectiva todos os dias uma parte do seu futuro colectivo.
Por força desta relação tão íntima, Portugal subscreveu todas as convenções e acordos internacionais com vista à prevenção de existência de acidentes resultantes da circulação no meio marinho, incluindo os espaços da zona económica exclusiva, tendo sempre presentes os princípios da precaução e do poluidor-pagador.
Estão nesta esfera de competências a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, adoptada em Montego Bay, a 10 de Dezembro de 1982, que consagra integralmente o capítulo XII à Prevenção de Poluição do Ambiente Marítimo, tendo em linha de conta a sua conservação, nomeadamente no que concerne à protecção da flora e da fauna. Esta matriz encontra-se igualmente retratada na Convenção de Londres (MARPOL).
Aprovou-se, ainda, em Julho de 1987, a Convenção Internacional para a Prevenção da Poluição por Navios e dela se extrai, entre outros princípios, a necessidade de preservação do ambiente marinho. É, ainda, de referir que as emendas que foram aprovadas no protocolo introduziram a necessidade de elaborar, no mais curto espaço de tempo, relatórios sobre ocorrências que envolvam descargas de hidrocarbonetos e outras substâncias líquidas nocivas.
Em 18 de Maio de 1991, ratificou-se, igualmente, o Acordo de Cooperação para a Protecção das Costas e das Águas do Atlântico Nordeste Contra a Poluição.
São tidas, ainda, como credoras do respeito que Portugal teve e tem pelas condições de conservação do meio marítimo as Convenções de Oslo, de Paris, de Ospar e de Solas. A prática obriga-nos, no entanto, a reconhecer que a existência de um edifício diplomático-jurídico não gera por si só mecanismos de total segurança.
Nesse sentido, outros instrumentos jurídicos têm sido introduzidos.
Assim, importa recordar a Lei n.º 8/2000, de 3 de Julho, que concedeu ao Governo autorização para aprovar o regime especial de ilícitos de mera ordenação social em matéria de poluição do meio marinho sob jurisdição marítima nacional, incluindo espaços da zona económica exclusiva, e os factos praticados em áreas de alto mar não abrangidas pela jurisdição de qualquer Estado por agentes poluidores que arvorem a bandeira nacional.
O Decreto-Lei n.º 235/2000, de 26 de Setembro, regulamentou esta lei, revogando então o Decreto-Lei n.º 90/71, de 22 de Março.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não esgotámos a elencagem dos instrumentos jurídicos, focámos apenas aqueles que se enquadram na análise do presente projecto de resolução.
A este propósito, afirmámos, a 22 de Janeiro de 1997, e reafirmámo-lo a 4 de Maio de 2000, que qualquer iniciativa legislativa desta Assembleia, ou do Governo, que visasse aumentar a eficácia e a aplicação das Convenções Internacionais seria bem-vinda. É o que fazemos no caso vertente.
O projecto de resolução que o Partido Ecologista Os Verdes apresentou em 16 de Outubro de 2000 e hoje, aqui, em análise é de grande oportunidade, vem de encontro ao trabalho em curso levado a cabo pelo Governo, permitindo dar-lhe visibilidade verbal. Naturalmente, este trabalho decorre tão-só da aplicação do Programa de Governo.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Plano Integrado de um Sistema VTS (Vessel Traffic System) para a costa portuguesa é composto por um conjunto de centros de vigilância, controlo e fiscalização da navegação e das actividades marítimas nas águas de jurisdição nacional até 50 milhas, incluindo e integrando duas redes, uma costeira e outra portuária.
Prevê-se igualmente a cobertura por VTS, quer na Madeira, quer nos Açores, sendo objectivos deste sistema aumentar a segurança marítima nas águas da costa portuguesa e nos Esquemas de Separação de Tráfego (EST) existentes junto às Ilhas Berlengas, no Cabo da Roca e no Cabo Raso.
Proteger e melhorar o ambiente marinho na costa continental e nas águas costeiras é um dos objectivos bem patente neste plano.
Dispor de meios capazes de detectar e seguir situações de intrusão, desembarque de pessoal ou actividades ilícitas, nomeadamente descargas de hidrocarbonetos que ocorrem com frequência e estão muitas vezes relacionados com a lavagem de tanques em petroleiros, é, igualmente, um dos objectivos. Esta realidade é por vezes infelizmente bem visível nas praias portuguesas. Com este sistema possibilita-se uma melhor identificação dos prevaricadores.
São igualmente objectivos deste sistema a monitorização de navios ao longo da costa continental portuguesa, tendo em vista a verificação e o cumprimento dos regulamentos internacionais respeitantes à navegação.
Em suma, com este sistema assegura-se um elevado nível de segurança, pois tem a possibilidade de antecipar e evitar situações de risco, assim como minimizar rapidamente eventuais acidentes nas áreas costeiras e portuárias. É igualmente um precioso auxiliar no policiamento e fiscalização de águas territoriais, águas internas e áreas portuárias (em simultâneo ou fora do alcance do sistema LAOS da Brigada Fiscal da GNR, que opera nas 16/18 milhas).
A implementação de um sistema VTS costeiro na costa continental portuguesa constitui um investimento em tecnologias de informação, sendo conhecido na União Europeia como da maior importância para a implementação de uma rede transeuropeia de transportes, tendo como finalidade, entre outras, como já afirmámos, a monitorização dos navios, por forma a verificar o cumprimento das regras internacionais de navegação, a preservação das condições ambientais, o policiamento e a fiscalização das águas territoriais, a melhoria das condições de assistência e de segurança à navegação na área portuária e de gestão de tráfego, trazendo implícito uma série de benefícios, que devem ser analisados, respeitantes a questões ambientais e de segurança que contribuem positivamente para a melhoria da competitividade dos portos nacionais.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na lista de acidentes ocorridos no período de 1975-1995, admite-se que o sistema VTS poderia ter evitado os seguintes desastres: o derrame de 80 000 t de crude, em Leixões; o derrame de 1600 t de produtos químicos, na Ericeira; o derrame de 42 t de combustível, na Figueira da Foz.
O sistema VTS é, essencialmente, uma norma (para navios de comércio) e um conjunto de serviços (prestados pelas estruturas baseadas na terra) que devem ser vistos na perspectiva da segurança marítima, da prevenção de acidentes no mar e da resultante protecção ambiental.
Aquando da realização das jornadas técnicas «Por uma navegação mais segura», o Dr. Jean François Bédin proferiu a seguinte afirmação, que aqui transcrevo por nela me rever: «A segurança da navegação nas vias marítimas e nos portos de todo o mundo é imprescindível quando

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se pretende proteger a vida humana, o meio ambiente e facilitar o comércio».

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Marítima e Portuária para uma intervenção.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Marítima e Portuária (José Junqueiro): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É com todo o gosto que aqui estou para discutir este assunto, até porque o mesmo faz parte de uma das prioridades do Governo, a qual está em concretização neste momento.
Em primeiro lugar, gostaria de dizer à Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia que tem toda a oportunidade o vosso projecto de resolução, aliás, apresentado no ano passado mas que só agora temos oportunidade de discutir.
A Sr.ª Deputada apresentou, ainda, dois requerimentos ao Governo, um sobre o acidente ocorrido com um cargueiro ao largo de Sines, o qual foi reenviado para a Defesa, e um outro relativo ao Seixalinho, o qual foi reenviado para os Transportes, mas, neste momento, esta Secretaria de Estado ainda não recebeu qualquer resposta. Aliás, a resposta ainda não foi dada devido à especificidade das atribuições e competências nas respectivas matérias.
Este sistema VTS, que está a ser implementado, como foi dito e bem, é composto por duas partes distintas, um VTS portuário e um VTS costeiro.
No que diz respeito ao VTS portuário, está já em funcionamento o de Leixões e penso que até finais de Junho ou princípios de Julho estaremos em condições de ter em funcionamento os VTS de Lisboa, de Setúbal e de Sines. Pela mesma altura, também teremos oportunidade de entrar na última fase de implementação de todo o sistema, o lançamento de um concurso internacional para implementação da rede de VTS costeiros.
Os objectivos de implementação dos VTS costeiros e dos VTS portuários são distintos e muito concretos e vão de encontro às preocupações aqui manifestadas pelas diferentes bancadas, nomeadamente pela Sr.ª Deputada, porque contribuem para aumentar a segurança marítima nas águas portuguesas, para proteger o meio ambiente marinho, para apoiar as acções de busca e salvamento, para detectar e seguir situações de intrusão, de desembarque de pessoal ou actividades ilícitas.
Embora não sendo exaustivo, devo dizer que a implementação dos VTS portuários visa melhorar as condições de segurança e assistência à navegação portuária, à aproximação, ao acesso, à gestão do tráfego de navios dentro do próprio porto.
A verdade é que este projecto é algo já em concretização. Não pode ser feito de um dia para o outro, mas também não se trata de algo que não exista ou esteja apenas no papel, não só pela realidade que acabei de confirmar relativamente ao VTS portuários mas também pelo que se espera da implementação dos VTS costeiros.
A ideia é a de ter um centro de coordenação nacional, o qual ficará situado em Paço de Arcos e coincidirá com o centro de coordenação regional-centro, igualmente situado em Paço de Arcos. Haverá, ainda, um centro de coordenação regional-norte, em Viana do Castelo, e um outro situado em Sagres.
Por outro lado, há um conjunto de centros de coordenação local: em Viana do Castelo, em Leixões, em Aveiro, na Figueira da Foz, em Lisboa, em Setúbal, em Sines, em Portimão e em Faro. Digamos, portanto, que há uma cobertura completa da costa do continente.
Ainda de acordo com os objectivos do Governo e correspondendo às preocupações manifestadas, já está feito o estudo para implementação destes sistemas na Madeira e nos Açores.
Há poucas semanas, tive ocasião de discutir este assunto com o Sr. Presidente do Governo Regional da Madeira e de informá-lo sobre o estado em que se encontra este projecto.
No que toca à Região Autónoma dos Açores, mais propriamente às ilhas das Flores, Faial, Terceira, São Miguel e Santa Maria, já estão definidos, com a respectiva latitude e longitude, os locais de implementação deste sistema e respectivo raio de acção, nomeadamente nas localidades de Morro Alto, Cabeço Gordo, Santa Bárbara, Pico da Cruz e Pico Alto.
Quanto à Madeira, passa-se exactamente o mesmo, sendo certo que, num e noutro caso, estes sistemas servirão para apoiar o Centro de Coordenação de Busca e Salvamento e, também, para servir de centro de coordenação às operações de combate à poluição.
Todo este programa desenvolve-se através de uma calendarização específica. Assim, neste momento, quanto aos estudos complementares que tinham sido iniciados e às consultas já realizadas, podemos informar que a entrega do relatório sobre esta matéria foi feita em Dezembro de 2000, a respectiva aprovação ocorreu em Março de 2001 e, até Julho de 2001, contamos lançar o concurso internacional.
Estima-se que a entrega das propostas dos concorrentes ao referido concurso fique concluída até Outubro de 2001, enquanto a adjudicação será feita até Dezembro de 2001 e a consignação até Janeiro de 2002.
Prevê-se que a recepção provisória de todo o sistema possa ter lugar em Dezembro de 2004.
O que prevemos que seja feito no continente até finais de Junho deste ano, como já referi, será implementado até finais de Agosto no que diz respeito à Madeira e aos Açores, na medida em que, nessa altura, será possível lançar, através do Instituto Marítimo e Portuário, os concursos internacionais que permitirão dotar com estes sistemas todo o território nacional, incluindo as regiões autónomas.
As verbas envolvidas neste programa são cerca de 14 milhões de contos, a que acrescem as verbas destinadas à implementação dos sistemas nas regiões autónomas.
Está feito um cronograma de execução das verbas envolvidas, que ignoro se está contido no pequeno dossier que fiz distribuir pelos Srs. Deputados, pelo que poderei explicitar-vos.
Assim, para este ano, já há verbas consignadas para estudos e projectos, não propriamente no Orçamento do Estado mas no orçamento do Instituto Marítimo e Portuário, entidade que está a fazer a gestão do processo. Para 2002, estão previstos mais 1 milhão de contos.
Em matéria de construção civil, estão orçamentados 1,8 milhões de contos para o próximo ano, de um total de 2,9 milhões de contos.
No que diz respeito a equipamentos, já para a instalação concreta após esta fase inicial, começaremos com uma verba de 2 milhões de contos, que irá até 9,4 milhões de

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contos. Todas estas parcelas totalizam 14 milhões de contos, no que diz respeito a sistemas a implementar no continente.
Portanto, estamos perante um compromisso sério por parte do Governo e, sobretudo, essencial, na medida em que faz parte integrante da candidatura que Portugal acaba de apresentar para ser a sede da Agência Marítima.
De facto, como disse o Sr. Deputado José Eduardo Martins, não era só Portugal que não dispunha destes sistemas, pois o mesmo se passava com a Grécia e parte da costa italiana. No entanto, a falta destes sistemas constituiria sempre uma das grandes debilidades daquela candidatura do nosso país se não pudéssemos concretizar este projecto.
Assim, até por maioria de razão e pelos motivos aqui apontados, verifica-se que estamos empenhados em que possa ser concretizado tudo o que acabei de referir e que, repito, corresponde às preocupações manifestadas pelos diferentes grupos parlamentares.
Em meu entender, o projecto de resolução agora apresentado por Os Verdes vem em boa hora e limito-me a apontar que a parte final do mesmo poderia ser adaptada à calendarização que acabo de explicitar, a que o Governo se obriga e que a Assembleia decide aprovar para que se cumpra com segurança e se assuma com toda a seriedade algo que está no terreno em concretização real.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, fundamentalmente, há duas funções que este sistema de segurança deve cumprir: a salvaguarda da costa e a protecção dos nossos recursos na zona económica exclusiva.
A salvaguarda da costa é um problema fundamentalmente do continente, porque existe aqui um sistema de corredores marítimos, que já foi referido, que têm uma utilização intensiva, o que diariamente faz correr riscos à nossa costa, nomeadamente através da lavagem de tanques dos navios que fazem transporte de hidrocarbonetos, mas não só.
Portanto, sobre o continente e relativamente à distância de salvaguarda, gostaria de perguntar-lhe qual a noção que o Governo tem sobre a distância a que esses corredores estão e se pensa ser uma distância suficiente para os prevaricadores, cuja existência, estatisticamente, se tem vindo a verificar.
Se a resposta for negativa, gostaria ainda de saber se Portugal, não tendo outros meios, não poderia, no plano internacional e nos organismos onde essa negociação é feita, ameaçar com uma tentativa de renegociação para um aumento dessas distâncias de salvaguarda, porque isso, evidentemente, penalizaria esses transportadores, pelo aumento sensível da distância a percorrer, e, então, talvez eles percebessem que Portugal está preocupado em defender a sua costa.
Quanto às regiões autónomas, a protecção dos recursos é a primeira frente de batalha, nomeadamente na zona económica exclusiva em torno dos Açores.
Ora, essa zona económica exclusiva estende-se, só ela, por uma área bastante mais extensa do que aquela que encontramos à volta da costa do continente. Assim, pergunto-lhe se um radar para este sistema de rasteio, de vigilância, será suficiente ou se combinado com os meios militares em presença, que tradicionalmente fazem essa vigilância, o Governo não perspectiva um reforço absolutamente necessário da vigilância nessa área, porque, como sabe, os recursos pesqueiros, nomeadamente nos Açores, são de grande utilidade para os nosso operadores económicos e para os operadores estrangeiros que aí actuam.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Marítima e Portuária: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Queiró, agradeço a oportunidade que me dá para responder, porque o assunto é relevante.
Sr. Deputado, temos uma zona económica exclusiva com a dimensão que conhecemos e este sistema, que hoje apresentamos, tem um raio de acção, na área dos VTS portuários, de cerca de 20 milhas, em boas condições, e cerca de 50 milhões nos VTS costeiros.
Portanto, este raio de acção permite-nos avaliar o esquema de separação de tráfego e nas ilhas é eficaz, pois, em mais de 90%, faz a cobertura de tudo aquilo que é o tráfego inter-ilhas.
Porém, é evidente que, para termos uma cobertura de toda a zona económica exclusiva, deveremos contar com os outros meios, porque este tem uma função específica, que foi essa que apontou. Quer dizer, trata-se da aproximação da costa, é até esta distância, mas haverá uma unidade de comando, em quem o Sr. Primeiro-Ministro delegará…

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Um só radar!

O Orador: - Não, há mais que um radar!
Repito, o Sr. Primeiro-Ministro delegará essa competência em quem entender, porque, para confirmar estes casos de navios parados, lavagem de tanques, lanchas rápidas, etc., é preciso uma unidade de comando que, depois, dê ordens à Força Aérea ou à Marinha portuguesas para actuar e confirmar os casos detectados.
Na restante zona económica exclusiva terá de existir um esquema de patrulhamento feito através dos nossos meios navais e aéreos, que, como sabe, são muito escassos nesta matéria.
Neste concurso, associado ao sistema VTS que aqui foi apontado e para além do DGPS que já foi comprado pelo Instituto Hidrográfico, um DGPS diferencial, tivemos também o cuidado de fazer a sua adaptação à realidade do próprio Instituto Hidrográfico. No entanto, há um EDIGPS que permitirá dentro de dois, três anos, que é o tempo que demorará a implementação de todo este sistema, termos o nosso próprio controlo GPS, através dos satélites europeus. Isto porque, até à era Clinton, havia uma informação diferenciada, que não nos dava uma localização exacta e quem a tinha era a marinha de guerra norte-americana.
Portanto, isso está a ser superado através dos próprios meios científicos e tecnológicos europeus, o que quer dizer que no caderno de encargos e naquilo que estamos a fazer, estamos a contar com os recursos próprios.

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - E as distâncias de salvaguarda?

O Orador: - Relativamente às distâncias de salvaguarda, penso que podemos fazer essa detecção.

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Aliás, é matéria que consideramos pertinente para tentar perceber e fazer uma discussão, a qual me permitira dizer que poderia aqui ocorrer em breve, aquando de uma iniciativa que teremos para apresentar relativa a esta agência europeia de segurança marítima, exactamente para podermos participar e até propor acções conjuntas nesta matéria.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Ainda para pedir esclarecimentos ao Sr. Secretário de Estado da Administração Marítima e Portuária, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, em primeiro lugar gostaria de lhe dizer que fiquei surpreendida pelo facto de o Sr. Secretário de Estado ter enviado para o Ministério de Defesa um requerimento que eu enderecei ao Ministério do Equipamento. Sabe porquê, Sr. Secretário de Estado? É porque eu considerava que quer o Ministério do Equipamento, quer o Ministério da Defesa tinham responsabilidades e deveriam responder sobre a matéria. Daí ter enviado um requerimento a cada um dos ministérios.
Gostaria, pois, de obter resposta dos dois ministérios, nem que a resposta do Ministério do Equipamento fosse a de considerar não ter responsabilidade alguma nessa matéria.
Assim, sugiro ao Sr. Secretário de Estado que solicite ao Ministério da Defesa o reenvio do meu requerimento para que eu possa obter uma resposta por parte do seu Ministério.
Por outro lado, o Sr. Secretário de Estado referiu que este projecto de resolução, na sua perspectiva, não vem em boa hora uma vez que seria um pouco despropositado, dadas as intervenções que o Governo tem preparadas sobre a matéria.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Marítima e Portuária: - Eu disse que vem em boa hora!

A Oradora: - Percebi «não vem em boa hora». Então, ainda bem que, nesse caso, percebi mal.
Ele vem, precisamente, em boa hora no sentido em que o Sr. Secretário de Estado veio aqui referir mais um conjunto de intenções com datas previstas para a sua concretização. Registámos esses factos e esperamos que eles sejam cumpridos. Resta esperar que o Governo passe das intenções para a prática, mas cá estaremos, numa acção de fiscalização, como é da nossa competência, do cumprimento destes anúncios hoje aqui feitos pelo Sr. Secretário de Estado.
Por outro lado, V. Ex.ª referiu que estas matérias levam tempo e que não podem ser feitas de um dia para o outro. Naturalmente que não, Sr. Secretário de Estado, mas se este Governo já tivesse ouvido Os Verdes, se o Partido Socialista tivesse aprovado as nossas propostas em sede de Orçamento do Estado, se calhar já há algum tempo o Sr. Secretário de Estado tinha tido verbas inclusas no Orçamento no sentido de proceder à concretização da instalação do VTS e, provavelmente, hoje, já estaríamos noutra fase deste processo.
Por último, gostava também de deixar aqui a nossa preocupação relativamente à necessária coordenação entre os diferentes sistemas de fiscalização e vigilância marítimas, porque, de facto, quando se trata de ministérios diferentes ao nível do Governo do Partido Socialista, como referi, parece-me óbvio que a descoordenação é total.
Por outro lado, e como verifico que o Sr. Secretário de Estado se voltou a inscrever, gostaria de saber qual é a disponibilidade deste Governo para, depois da instalação do VTS, porque consideramos que uma coisa tem a ver com outra, influir na redefinição dos corredores de navegação, nomeadamente do seu afastamento da costa.

O Sr. Presidente: - Para responder, em 2 minutos cedidos pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Marítima e Portuária.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Marítima e Portuária: - Sr.ª Deputada, em relação ao requerimento ele será reenviado nos moldes em que deseja.
Este é um projecto para cumprir - já sei que o seu «VTS político» estará atento, pelo que procurarei responder e não falhar a calendarização e o cronograma.
Relativamente à coordenação, ela existe. Estão já em Conselho de Ministros não só o documentos relativo ao sistema de autoridade marítima como também o documento harbour master, o que significa que há uma definição em concreto do conceito de autoridade marítima em geral, das funções, em concreto, do capitão de porto e também daquilo que é agora o conjunto de funções da autoridade portuária e do harbour master, que permite simplificar esses procedimentos.
Ou seja, é fundamental que tenhamos consciência de que essa coordenação, que durante mais de duas ou três décadas foi difícil de efectuar, está na iminência de acontecer através da aprovação destes dois diplomas e do conceito que temos nessa matéria.
Quanto aos corredores de navegação, com certeza que a disponibilidade é total para discutir estas matérias, que não dizem apenas respeito ao Governo, dizem respeito a todos nós. Portanto, no âmbito de uma discussão se calhar temática e específica para esta matéria que aqui poderemos produzir, estamos disponíveis para fazer essa avaliação em concreto.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início à discussão do projecto de resolução n.º 116/VIII - Institui o Dia Nacional de Prevenção e Segurança no Trabalho, apresentado pelo PCP.
Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Vicente Merendas.

O Sr. Vicente Merendas (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao abordar a problemática da prevenção e segurança no trabalho, é necessário meditar sobre as suas origens.
Está provado que os acidentes de trabalho não são uma fatalidade, são quase sempre o resultado da falta de condições de trabalho, originadas por erros ou defeitos do processo produtivo.
Não se pode conseguir o progresso nos domínios social e económico se se continua a pagar um tributo tão grande em vítimas como acontece actualmente. O número de mortes anuais por acidentes de trabalho em Portugal é chocante: mais de 600 pessoas perdem a vida a trabalhar; por cada dia útil, regista-se, em média, 3 acidentes mortais.

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Os acidentes são, assim, como uma desgraça, como se acontecessem porque estava escrito. Embora todos nós nos comovamos quando um avião se despenha, com os acidentes rodoviários, com as tragédias que matam pessoas, também do mesmo modo nos temos de afligir quando milhares de trabalhadores são vítimas de acidentes de trabalho e, em especial, quando tantos morrem a trabalhar.
É necessário, pois, reflectir e meditar sobre as razões de tanta sinistralidade laboral em Portugal; é necessário conhecer quantos acidentes que, não matando, comprometem a vida e ocorrem todos os dias a coberto do silêncio.
E quantas mortes não são anunciadas? A verdade é que, em média, em Portugal, os acidentes de trabalho atingem cerca de 300 000 por ano; só no primeiro trimestre de 2000 registaram-se 49 312 acidentes, dos quais 36 mortais. Ou seja, os acidentes fazem parte do quotidiano dos trabalhadores. Porque acontecem? De quem é a responsabilidade? Como evitá-los? Urge encontrar resposta a todas estas questões.
O muro do silêncio é mais espesso do que se julga e parece haver aqui uma estranha filosofia que pode resumir-se em dois traços essenciais - um deles é que a culpa pertence sempre ao trabalhador, o outro é que o seguro paga.
Os acidentes acontecem porque a grande maioria dos locais de trabalho não oferecem as mais elementares condições de higiene e segurança; os acidentes acontecem, igualmente, na relação directa da precarização do emprego e perante a ausência de fiscalização, de investimentos e de formação na área da prevenção.
Em muitas empresas, os trabalhadores não têm a liberdade de recusarem os riscos que fazem parte do seu trabalho. Para receber o seu salário, para manter o seu emprego, o trabalhador é forçado a obedecer. A sua luta contra o processo de degradação da sua saúde é assim um compromisso entre o risco de agravar ou perder a vida e o de perder o emprego de que ele e os seus dependem. Por um paradoxo, pode dizer-se que ele perde a vida para viver.
Sempre que ocorre um acidente de certa gravidade, isso reflecte-se em toda a empresa, afectando o ambiente de trabalho, as relações sociais e laborais, factores que, conjugados, conduzem sempre a perdas de produtividade.
Neste sentido, a degradação das condições de trabalho obriga a que o Governo e as entidades patronais tomem consciência da necessidade de uma prevenção eficaz, que actue permanentemente, adoptando medidas técnicas e organizativas que eliminem ou reduzam os riscos, esclarecendo e formando os trabalhadores, é sempre um investimento que se traduz na salvaguarda da saúde e da vida dos trabalhadores, bem como na rentabilidade das próprias empresas.
É urgente o funcionamento dos serviços de saúde, higiene e segurança nas empresas e serviços com a participação dos representantes eleitos dos trabalhadores.
Esperamos que o Acordo recentemente assinado com os parceiros sociais relativo às condições de trabalho, higiene e segurança no trabalho e combate à sinistralidade, dê eficácia à aplicação das normas legais e convencionais para atacar a sinistralidade na sua raiz e prevenir, nos locais de trabalho, o risco de acidente ou doença profissional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, o Grupo Parlamentar do PCP, perante a evidente dimensão e agravamento da sinistralidade laboral, que atinge uma escala que percentualmente nos coloca tristemente na primeira fila dos países europeus, decidiu avançar com este projecto de resolução visando criar uma dinâmica de prevenção que conduza ao cumprimento das normas de segurança e gere uma cultura de segurança a todos os níveis, com o objectivo de combater a inércia das entidades competentes, e as insuficiências da fiscalização ao nível das empresas.
Este projecto de resolução pretende instituir o dia 16 de Janeiro como o Dia Nacional de Prevenção e Segurança no Trabalho.
A aprovação pelo Governo, por ratificação, da Convenção n.º 155 relativa à segurança e saúde dos trabalhadores e ao ambiente de trabalho, adoptada pela Conferência Internacional do Trabalho, foi efectuada pelo Decreto do Governo n.º 1/85, de 16 de Janeiro.
Foi através deste decreto que se introduziram, no nosso ordenamento jurídico, os princípios gerais consagrados na Convenção que determinou, em consequência, a criação de um sistema de princípios de segurança, higiene e saúde no trabalho aplicáveis a todos os ramos de actividade e a todos os sectores laborais.
O nosso projecto de resolução pretende ainda recomendar ao Governo, no âmbito das comemorações do dia nacional, a realização de uma campanha de informação, formação e prevenção com o objectivo de reduzir os acidentes de trabalho.
Consideramos também que é importante o Governo apresentar, anualmente, um relatório, à Assembleia da República, das medidas de prevenção adoptadas e dos dados relativos à sinistralidade laboral.
Obviamente que sabemos que não é um dia nacional de prevenção e segurança no trabalho que ultrapassa os graves problemas existentes. Mas, certamente, poderá dar um contributo útil para aumentar a sensibilização de empresas, de trabalhadores, do Estado e da sociedade em geral para este grave problema do País, promovendo iniciativas que permitam tornar Portugal um lugar seguro e saudável para trabalhar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Não ficamos presos à data que apontamos. Estamos, aliás, abertos a outras sugestões. Para nós, o importante é a aprovação do sentido útil deste projecto de resolução.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Assembleia da República, perante esta tragédia nacional, não se pode tornar cúmplice pela indiferença. O PCP, com este projecto de resolução, dá o seu contributo significativo para a defesa da saúde e da vida dos trabalhadores portugueses.
Porque a questão é política, porque é preciso e possível acabar com esta vergonha e com a sistemática humilhação do trabalhador, todos não seremos demais para alterar este estado de coisas.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Arménio Santos.

O Sr. Arménio Santos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de resolução que estamos a

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discutir é uma boa oportunidade para nos pronunciarmos sobre o panorama da segurança, higiene e saúde no trabalho no nosso país.
Para o PSD, a política deste sector constitui um instrumento básico para melhorar as condições de trabalho e aumentar a produtividade, a competitividade e a qualidade das nossas empresas.
Consideramos também que a promoção da saúde e segurança no trabalho deve ser consequência de uma acção integrada e global, envolvendo os trabalhadores, as empresas e o Estado.
No entanto, o nível de sinistralidade laboral em Portugal, em especial a mortal, obriga a que se faça um esforço suplementar no tratamento deste problema, de molde a que ele seja drasticamente reduzido.
A não ser assim, Portugal continuará a ser um país atrasado e adiado. De facto, nesta área, os indicadores dos últimos três anos e a análise da sua evolução não nos oferecem muitas razões de satisfação. Bem pelo contrário, continuam por resolver muitas das situações negativas, e a apreciação aos números oficiais disponíveis revelam, em toda a sua crueza, o muito que há ainda por fazer e a urgência que existe em adoptar medidas neste domínio.
Os números são alarmantes: para além das centenas de mortos por ano, o valor total de acidentes de trabalho registados, em 1997, foi de 214 626; em 1998 foi de 212 013; e em 1999 foi de 213 008.
Se a este panorama juntarmos o das doenças profissionais, cujo número real de vítimas não é conhecido, mas que se apresentava em finais de 1999 com um universo de 18 762 pensionistas, vemos que a situação tem de ser encarada com grande preocupação.
Lamentavelmente, na sinistralidade laboral e nas doenças profissionais, Portugal também está no lugar mais triste da União Europeia.
E, curiosamente, não é por falta de legislação adequada ou da não transposição de directivas europeias ou convenções da OIT sobre a matéria que o panorama é o que é. Somos até um dos Estados-membros que mais rapidamente faz, ou fez, a transposição dessa legislação
Sucede que esta situação negra resulta, em grande medida, das más condições de trabalho nas empresas, da ausência de uma cultura relativa à segurança, higiene e saúde no trabalho, do incumprimento da lei, do deficiente funcionamento dos serviços inspectivos e da falta de sensibilização, informação e formação da generalidade dos trabalhadores e dos empresários portugueses.
É necessário, por isso, apostar em medidas concretas, enquadradas numa política nacional de prevenção e segurança no trabalho para corrigir as insuficiências e alterar as mentalidades. Não podemos acordar para este problema apenas quando acontecem tragédias que ceifam vidas humanas e a comunicação social traz esses acontecimentos tristes para a opinião pública.
Nem nos podemos dar por satisfeitos com os acordos obtidos em sede de concertação social, como o que foi celebrado em Dezembro último, se depois não houver vontade política para os levar à prática.
Importa, por isso, e desde logo, sensibilizar e ganhar os trabalhadores, que são as maiores vítimas, e empregadores para esta causa. É necessário que os empresários portugueses percebam que os gastos com a prevenção e a segurança constituem um investimento e não um custo acrescido.
Outra arma importante no combate à sinistralidade laboral é a Inspecção-Geral do Trabalho. A legislação só servirá para alguma coisa se for aplicada. Ora, cabe à Inspecção-Geral do Trabalho fiscalizar a sua aplicação de forma pedagógica, mas também de forma repressiva. Só que todos sabemos como essa sua função tem sido condicionada pela escassez de meios técnicos e humanos, havendo a lamentar muitos acidentes e muitas tragédias, porque a fiscalização não actua e falha onde não poderia falhar.
A Inspecção-Geral do Trabalho não existe para aparecer nas televisões, quando há acidentes mortais, a anunciar a abertura de inquéritos. A sua função tem, sobretudo, um carácter preventivo, que deixa muito a desejar.
Outra área de acção é a da negociação colectiva, fundamental para uma prevenção adequada em vários sectores, cabendo aos sindicatos um papel relevante na luta pela eliminação dos riscos profissionais.
É também indispensável dotar as empresas de meios para cuidarem da segurança no trabalho, bem como habilitar e creditar técnicos para essas funções, sendo de reconhecer os passos que estão a ser dados neste domínio.
Mas para que daqui a 10 ou 15 anos não continuemos a queixarmo-nos do elevado número de mortos e feridos por acidentes de trabalho, pensamos que é nossa obrigação começar já pelos bancos da escola e introduzir nos currículos escolares matérias sobre segurança, higiene e saúde no trabalho, promessa sempre feita pelo Governo e até hoje nunca cumprida.
E não estamos a defender nenhuma nova disciplina, basta aproveitar os actuais currículos para se ensinar aos jovens atitudes preventivas, que passa também pela formação dos professores nesta matéria.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta é a nossa visão sobre a sinistralidade laboral.
É preciso despertar e mobilizar a sociedade para este problema, promover uma cultura de segurança a todos os níveis e confrontar o Governo com os resultados da política nacional em matéria de segurança e saúde dos trabalhadores e ambiente de trabalho.
Para o Partido Social Democrata, todas as iniciativas que contribuam para reduzir os acidentes no trabalho ou possam ajudar a criar uma maior consciência cívica sobre o problema devem ser consideradas e apoiadas.
Por isso, o projecto de resolução n.° 116/VIII, que propõe a criação do dia nacional de prevenção e segurança no trabalho, bem como outras recomendações, terá do PSD uma posição de acordo com as preocupações expressas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Gonçalves.

O Sr. Herculano Gonçalves (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Propõe o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português a institucionalização do dia nacional da segurança no trabalho.
Começando pela segurança no trabalho, há que reconhecer que esta é uma questão de enorme gravidade e seriedade na sociedade portuguesa.
Refira-se que estes aspectos relacionados com o núcleo do direito laboral que se reporta à protecção do trabalho

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constituem a parte mais nobre, para além dos princípios fundamentais do próprio direito laboral.
Com efeito, é com base na necessidade de proteger os trabalhadores perante, numa primeira fase, a mecanização e a industrialização que nasceu o direito laboral. E esta preocupação de protecção dos trabalhadores marcou toda a sua existência e marcou, definitivamente, as características de tutela e garantia dos trabalhadores que o caracterizam.
Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Acontece que o direito e as condições de trabalho não existem, se não existir efectiva fiscalização. É esse o problema!
É muito clara a Organização Internacional do Trabalho em vários documentos, ao referir que «o direito do trabalho sem fiscalização não é mais do que um mero exercício de ética». Facto que assume a maior gravidade no nosso país.
Grave é a inexistência de dados estatísticos do Ministério do Trabalho, que seriam preciosos para a elaboração de um diagnóstico mais rigoroso e, em consequência, de um plano de prevenção.
Os número disponíveis pelo Ministério da Justiça referem a existência de 14 024 acções por acidente de trabalho (apurados em 1999), com 612 a corresponderem a mortes. Também os dados estatísticos internacionais dão-nos conta de uma situação séria e muito preocupante.
De acordo com o Fórum da Segurança no Trabalho, Portugal é o país europeu com maior número de acidentes de trabalho por cada 100 mil trabalhadores. 6 949, números de 1996, é o mais alto número numa lista de 16 países.
Não é caso único, pois ocupamos, lamentavelmente, o primeiro lugar da lista negra de acidentes de trabalho de qualquer relatório internacional sobre este tema.
Sublinhe-se ainda que os anúncios recentes de grandes investimentos e obras públicas, conjugados com a precariedade e mesmo a clandestinidade de mão-de-obra, não nos permitem grande optimismo para o futuro.
Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Propõe o PCP a instituição de um dia nacional de segurança no trabalho. O CDS-PP não é, verdade seja dita, um entusiasta da criação destes dias para tudo, com vários temas por dia. Por uma razão simples e compreensível: a generalização destes dias leva forçosamente a uma banalização que acaba por se traduzir numa referência institucional - 50 segundos na comunicação social - e o esquecimento do problema durante o resto do ano. Não será por acaso que uma imaginativa campanha publicitária de uma empresa de comunicações ironiza com diversos dias, de que ninguém se apercebeu, sugerindo mensagens a propósito.
No domínio específico do foro laboral existe já, para além de um dia com a importância do 1º de Maio, um dia mundial de luto pelos trabalhadores sinistrados, que é o dia 28 de Abril. Data esta, caso não saibam, lançada, em 1966, pela confederação internacional dos sindicatos livres.
Para nós, mais importante que «um dia», seria a existência de um reforço dos meios de fiscalização e de uma estratégia eficaz de combate a este grave problema.
Não obstante, e considerando que o projecto de resolução requer uma maior acção por parte do Governo, e, sobretudo, a apresentação anual de um relatório com medidas de prevenção, o CDS-PP considera dever, com as reservas já expostas, viabilizar este projecto.
Fá-lo com a consciência clara de que, mais do que a institucionalização de um dia, o fundamental será sensibilizar, fiscalizar, divulgar e, sobretudo, agir todos os dias para combater esta sinistra e inaceitável realidade.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Oliveira.

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A promoção das condições de higiene, saúde e segurança no trabalho e, muito em especial, a redução da sinistralidade laboral, assumem cada vez maior importância no contexto das relações laborais.
Conciliar o desenvolvimento e o progresso económico com a melhoria das condições de trabalho, constitui, hoje, um dos mais importantes factores estratégicos para o aumento da produtividade, competitividade e qualidade das empresas.
Desde há muito que o Partido Socialista tem feito da promoção das condições de segurança, higiene e saúde no trabalho, um dos eixos fundamentais da política laboral.
O vasto conjunto de medidas adoptadas neste domínio pelos Governos do PS, desde 1995, são, por si só, um claro indicador da importância que atribuímos a esta matéria.
Senão vejamos: o Acordo de Concertação Estratégica, que enquadrou os princípios e medidas indispensáveis à melhoria das condições de trabalho, como sejam o levantamento e adaptação do quadro legal existente, a criação e consolidação dos instrumentos operativos necessários à certificação de empresas e técnicos de higiene e segurança; o Livro Branco sobre os serviços de prevenção das empresas, que constituiu um importante instrumento de reflexão e diagnóstico e que aponta soluções tendentes à promoção das condições de trabalho nas empresas; o reforço dos direitos dos trabalhadores, com apresentação da proposta de lei que deu lugar ao novo regime jurídico dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais; a aprovação dos Decretos-Lei n. os 109/200 e 110/2000, de 30 de Junho, que introduziram melhorias ao regime jurídico relativo à organização e funcionamento das actividades de segurança, higiene e saúde no trabalho, e às condições de acesso e de exercício das profissões de técnico de segurança e higiene; a constituição de uma comissão composta por membros do IDICT, do IEFP e dos parceiros sociais com a incumbência de proceder à definição dos perfis profissionais dos técnicos na área da segurança e higiene; a apresentação pelo IDICT do Manual de Certificação de Técnicos e Técnicos Superiores de Segurança e Higiene no Trabalho.
E, por ser uma peça fundamental na dinamização e reforço do papel dos parceiros sociais na área da prevenção dos riscos profissionais, quero sublinhar, com relevo, o recente acordo sobre condições de trabalho, higiene e segurança, subscrito por todos os parceiros sociais, que, entre outras medidas, prevê: a reactivação imediata do Conselho Nacional de Higiene e Segurança no Trabalho com novas atribuições e competências; a criação de um Observatório da Prevenção; a revisão da Tabela Nacional de Incapacidades por Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais; a elaboração de um plano nacional

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de acção para a prevenção, concebido como um instrumento de política global de prevenção dos riscos profissionais e combate à sinistralidade laboral; a promoção do funcionamento do Conselho Superior de Saúde e Segurança no Trabalho da Administração Pública; a implementação e melhoria da organização dos serviços de segurança, higiene e saúde no trabalho nas empresas e em todos os locais onde os trabalhadores desenvolvam a sua actividade.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Dando a importância que damos às questões laborais, e em particular à promoção das condições de segurança, higiene e saúde no trabalho, não poderíamos ficar indiferentes ao projecto de resolução n.º 116/VIII, da iniciativa do PCP.
Reconhecemos mérito a essa iniciativa, discordamos, no entanto, de dois pontos. A primeira discordância é quanto à data escolhida para a instituição do dia nacional da prevenção e segurança no trabalho.
Ainda que o dia 16 de Janeiro seja a data da publicação do Decreto do Governo n.° 1/85, que ratifica a Convenção n.º 155 da OIT, relativa à segurança, à saúde dos trabalhadores e ao ambiente de trabalho, parece-nos mais adequada a escolha do dia 28 de Abril.
Esta é a data que, de alguns anos a esta parte, o movimento sindical internacional, a nível mundial, e a Confederação Europeia de Sindicatos, a nível europeu, têm consagrado à dinamização de uma jornada sobre a prevenção e segurança no trabalho e de sensibilização e informação dos trabalhadores e empregadores no combate aos acidentes de trabalho e doenças profissionais.
Com o mesmo sentido e preocupações, a própria OIT, já este ano e pela primeira vez, assinalou o dia 28 de Abril como memorial a lembrar as vítimas dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais e, simultaneamente, como uma jornada de reflexão sobre as condições de segurança, higiene e saúde no trabalho.
Nas cerimónias realizadas em Genebra, Manuel Simon, Director da OIT, recomendou, na sua intervenção, a adopção pela Organização Internacional do Trabalho da data do dia 28 de Abril como dia oficial dedicado às questões da segurança, higiene e saúde no trabalho, no que foi apoiado pelo Director-Geral daquela organização, Juan Somavia.
De assinalar ainda a favor da escolha do dia 28 de Abril que alguns países, como a vizinha Espanha, o Canadá e a Tailândia, têm vindo a fixar ou, como no caso do Brasil e de Inglaterra, propõem-se fixar esta data como dia nacional da prevenção e segurança no trabalho.
A consagração por Portugal de um dia nacional da prevenção e segurança no trabalho, em data coincidente com a fixada pela OIT e por tantos outros países, terá certamente mais força e cumprirá mais eficazmente os seus objectivos.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Muito bem!

O Orador: - A segunda discordância é quanto ao ponto três. Não nos parece oportuno determinar, desde já, a obrigação da apresentação anual pelo Governo à Assembleia da República de um relatório com a indicação das medidas de prevenção adoptadas.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - É essa a questão de fundo!

O Orador: - Nós não separamos uma da outra, Sr. Deputado! Ouça a explicação!
Por enquanto, estamos no momento em que, em resultado do recente acordo entre todos os parceiros sociais, vai ocorrer a reactivação do Conselho Nacional de Higiene e Segurança no Trabalho, a criação do Observatório da Prevenção, a entrada em funcionamento do Conselho Superior de Saúde e Segurança no Trabalho da Administração Pública e a criação de uma comissão de acompanhamento da implementação da legislação relativa à segurança, higiene e saúde no trabalho, organismos com competências nesta matéria e relativamente aos quais terão de ser estabelecidos e desenvolvidos os necessários mecanismos de articulação.
Logo que estes organismos estejam em pleno e articulado funcionamento, admitimos vir a reflectir sobre o que será mais adequado estabelecer. De resto, não nos parece que haja, entretanto, qualquer impedimento à boa informação desta Assembleia, já que constitui obrigação constitucional do Governo prestar à Assembleia da República, sempre que esta o entenda, todos os esclarecimentos e informações, o que se aplica, naturalmente, aos dados relativos à sinistralidade laboral.
Uma vez ultrapassadas as discordâncias que referi, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista estará em condições de aprovar uma resolução que institua o dia nacional de prevenção e segurança no trabalho.
Não gostaríamos de votar contra. Preferíamos, isso sim, que o projecto de resolução n.º 116/VIII, hoje aqui em discussão, baixasse à Comissão de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, por um curto período de 15 dias, para que ali fosse possível elaborar um texto de consenso.
Registamos a abertura do PCP e estamos disponíveis para subscrever, em conjunto, um requerimento nesse sentido.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Não é demais referir, é preciso dizer e redizer, que Portugal é, de longe, o país da União Europeia com o maior índice de frequência de sinistralidade laboral.
A realidade que nos cerca é bem dura. O primado do económico sobrepõe-se ao social e têm-se reforçado, na razão directa, da pressão para a desregulamentação laboral e social, para o desemprego e a precariedade, num mundo de globalização crescente, mas de um capitalismo selvagem.
São diárias as notícias da morte no trabalho. Entidades patronais e companhias seguradoras «lavam as mãos» como Pilatos, «em águas cada vez mais escuras». As suas consciências tranquilizam-se em míseras indemnizações que nunca pagarão sofrimentos ou vidas.
Os lucros têm-se avolumado na razão directa do sofrimento daqueles que perderam a vida ou a possibilidade de venderem a sua força de trabalho. Os acidentados são imediatamente substituídos, em muitas das situações, por novos precários, quantas vezes imigrantes, sem direitos, sem seguros, qual escravatura do século XXI. A construção civil é bem o exemplo da crueza da velha economia, que não há nova economia que a pague.

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Paradoxalmente, hoje retrocede-se na qualidade de vida e fragiliza-se o bem-estar social e humano. Avolumam-se problemas há muito detectados, equipamentos ergonomicamente desadequados, incorrectas posições de trabalho, elevados ritmos laborais, violação de regulamentos de segurança, repetição de movimentos absurdos, ausência de planeamento das tarefas, desgaste e cansaço extremados pelo trabalho contínuo ou pelo prolongamento da jornada de trabalho.
Hoje é preciso contrapor a cultura da informação, da prevenção e segurança no trabalho ao culto do risco, da acção imediata e da irresponsabilização. Os serviços de medicina ocupacional não existem em muitas empresas e na maioria das que existem só têm existência formal.
O ruído, por exemplo, considerado hoje como flagelo social, está na origem de milhares de acidentes de trabalho. Constituindo a causa mais frequente de invalidez profissional, é responsável por cerca de 20% de internamentos psiquiátricos. A industrialização acelerou o aparecimento de graves perturbações de audição, com a procura do lucro máximo a sobrepor-se às necessidades de investimento que tenham em conta o trabalho em função do homem.
O stress, cujas consequências podem ir da simples irritabilidade ao esgotamento nervoso, é a doença mais comum nos locais de trabalho. O stress é também fruto da insegurança que se vive na indústria, em bancos, seguradoras, serviços públicos e privados sujeitos a reestruturações, ameaças de deslocalização e privatizações. O stress, imputável a factores psicossociais, atinge, hoje, segundo a Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho, níveis preocupantes no nosso país, e está a montante e a jusante de um bom número de acidentes de trabalho.
Dados obtidos no nosso país nesta avaliação de stress profissional em sectores específicos, como médicos de clinica geral, controladores de trafego aéreo, operadores de caixa de supermercados, profissionais de saúde hospitalar, entre outras, devem chamar a atenção para a presente situação, cabendo às empresas uma responsabilidade directa nesta matéria.
São conhecidos os muitos exemplos de entidades patronais que, sem despedirem trabalhadores, lhes fazem a vida num inferno, para serem os próprios trabalhadores a despedirem-se ou a deixarem o emprego devido a problemas de saúde. Como exemplo, sempre lamentável, aponta-se o das tendinites das operárias da Ford Electrónica, em Palmela e a forma como a multinacional se procurou livrar do problema e das trabalhadoras.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É preciso deixarmos de ser os «campeões europeus» da sinistralidade laboral. Para isso, é preciso fazer cumprir a legislação existente no nosso país, que tem um quadro jurídico-legal adequado, mas não tem havido vontade nem de o pôr em prática - Sr. Deputado Barbosa de Oliveira, não é com aspirinas que resolvemos os problemas que precisam de medicinas de fundo - nem se tem procedido à fiscalização do incumprimento da legislação.
A impunidade continua a ser reinante, o Governo, através das entidades competentes, não tem uma fiscalização adequada, não pune suficientemente, nem incrimina penalmente os empregadores responsáveis pela morte ou lesão grave dos trabalhadores, tantas vezes resultante do incumprimento ou não adopção das normas aplicáveis. A não criminalização directa dos acidentes de trabalho é, sem dúvida, a nosso ver, a maior lacuna do ordenamento jurídico em matéria de sinistralidade laboral.
A irresponsabilidade do patronato, a inoperância da Inspecção de Trabalho, a inépcia do Governo custa ao País, anualmente, várias centenas de milhões de contos.
É um escândalo que não pode ser mais tolerado. Por isso, o Bloco de Esquerda, concordando com o recente acordo subscrito pelos parceiros sociais no passado dia 7 de Fevereiro, gostaria de perguntar ao Governo: passados 3 meses, como tem vindo a evoluir a concretização das medidas de curto prazo ? Serão apenas estas que estão a ser enunciadas pelo Partido Socialista?
Que medidas estão a ser assumidas para a elaboração do Plano Nacional de Acção para a Prevenção?
Urge dizer «basta» ao agravamento da sinistralidade laboral, cada vez mais ligada à precariedade dos vínculos laborais e à desregulamentação.
O Bloco de Esquerda manifesta totalmente a sua concordância com os propósitos e objectivos do projecto de resolução apresentado pelo PCP a esta Assembleia.
A data de 28 de Abril será absolutamente secundária. O facto de haver uma concomitância de datas a nível internacional não faz com que, directamente, em Portugal, tenha de ser uma data coincidente. É bem de ver que fazer o dia nacional da prevenção a 28 de Abril, entre o 25 de Abril e o 1.º de Maio, é condená-lo a um apagamento directo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Se calhar, era essa a intenção!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome do Grupo Parlamentar de Os Verdes, subscrevo na íntegra as propostas que são apresentadas neste projecto de resolução do PCP, no sentido de instituir o Dia Nacional de Prevenção e Segurança no Trabalho. Na nossa perspectiva, este projecto permite a criação de um dia de reflexão nacional que sensibiliza e alerta para uma realidade que é, de facto, dramática e que soma anualmente, como se diz na exposição de motivos do projecto de resolução, centenas de milhar de acidentes de trabalho por ano.
Esta realidade provoca a perda da vida a muitos trabalhadores e leva a que muitos outros passem a ser portadores de deficiência, ficando impossibilitados de continuar a trabalhar e não encontrando, muitas vezes, os apoios necessários para que consigam enfrentar essa situação. Muitas vezes, estes trabalhadores encontram, depois, uma situação de discriminação que, a nível psicológico, também não é nada fácil de suportar, não sendo de descurar as pessoas vítimas de doenças profissionais que também sofrem bastante as consequências da precarização das condições de trabalho, infelizmente ainda bastante acentuada no nosso país.
Cremos também, e gostávamos de vincar isso mesmo, que se a fiscalização do trabalho actuasse de uma forma mais séria, assistiríamos a uma redução significativa destes acidentes de trabalho, porque eles estão em muito relacionados com as condições de trabalho a que assistimos em Portugal.

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Concordamos inteiramente com a recomendação feita ao Governo no segundo ponto do projecto de resolução, sendo que na nossa perspectiva a sensibilização deveria partir não só do Governo mas também para o Governo, alertando-o para a necessidade da tomada de medidas necessárias à redução e prevenção dos acidentes de trabalho.
Por outro lado, consideramos também fundamental o terceiro ponto do projecto de resolução n.º 116/VIII, que o Partido Socialista considera perfeitamente dispensável.

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Eu não disse que era perfeitamente dispensável!

A Oradora: - Consideramos que a apresentação deste relatório anual à Assembleia da República é uma boa medida, porque obriga o Governo a prestar contas sobre esta matéria ao Parlamento e porque este, que cumpre um papel de fiscalização, passaria, assim, a inteirar-se de uma forma regular sobre as medidas de prevenção adoptadas e sobre os dados relativos à sinistralidade laboral. Consideramos, portanto, que esta medida recomendada neste projecto de resolução é muito positiva.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Trabalho e Formação.

O Sr. Secretário de Estado do Trabalho e Formação (António Dornelas): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o Governo atribui a maior importância aos problemas que subjazem à iniciativa do PCP, motivo pelo qual se congratula com a existência do acordo sobre condições de trabalho, higiene e segurança no trabalho e combate à sinistralidade, que negociou e assinou em 9 de Fevereiro passado com todos os parceiros sociais que têm assento na Comissão Permanente de Concertação Social e que consubstancia uma estratégia consistente de curto e de médio prazo para a acção neste domínio.
Gostaria de lembrar algumas medidas que estão em preparação para serem realizadas a curto prazo e que constam de um programa de intervenção especificamente pensado para o curto prazo. Em primeiro lugar, as acções de sensibilização, informação e formação de trabalhadores e de empregadores. Em segundo lugar, o aperfeiçoamento das normas específicas de segurança no trabalho no sector da construção civil e obras públicas, que, como se sabe, é um dos mais penalizados neste domínio. Em terceiro lugar, o reforço dos meios e da actividade de fiscalização. Em quarto lugar, a reactivação imediata do Conselho Nacional de Higiene e Segurança do Trabalho, a redefinição das suas funções com aprofundamento de competências e a criação, junto a esse Conselho Nacional, de um Observatório da Prevenção. Por último, refiro a revisão da tabela nacional de incapacidades por acidentes de trabalho e doenças profissionais e a revisão da lista de doenças de profissionais.
Por outro lado, o acordo prevê um conjunto de medidas de médio prazo que estão também já a ser preparadas, e com isto começo a responder à questão que foi suscitada pelo Sr. Deputado Luís Fazenda. Estão, portanto, a ser preparadas as medidas de médio prazo com a totalidade dos parceiros sociais, no quadro de um grupo de acompanhamento que segue a aplicação do acordo pelo Governo. Entre essas medidas de médio prazo constantes do acordo, gostaria de salientar a elaboração de um plano nacional de acção para a prevenção, que estruturará a acção nesse domínio temporal, e a adopção de um programa de adaptação dos serviços de prevenção nas empresas, que, à semelhança do que aconteceu no campo ambiental, permitirá mudar as tecnologias, os equipamentos e melhorar o nível de formação das empresas que aceitem fazê-lo. Por último, saliento o plano da formação profissional dos técnicos, dos empregadores e dos trabalhadores que desenvolvam eles próprios a sua acção nas empresas onde trabalham, o que, como sabem, é legalmente possível em condições bem determinadas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, neste contexto, o Governo encara positivamente e com agrado o consenso que aqui parece desenhar-se quanto à criação de um Dia Nacional de Prevenção e Segurança no Trabalho, bem como, nesse âmbito, quanto à realização de uma campanha de informação. Todavia, o Governo permite-se lembrar, quanto à data prevista pelo PCP, que se realizará em Outubro deste ano a Semana Europeia da Saúde e Segurança no Trabalho e que a Organização Internacional do Trabalho (OIT) decidiu adoptar outra data para efeitos semelhantes, motivos pelos quais preferimos não nos pronunciarmos sobre a data concreta proposta pelo PCP.
Por último, permitam-me, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que exprima dúvidas, senão mesmo reticências, do Governo quanto à utilidade do ponto 3 do projecto de resolução, em que se prevê a apresentação de um relatório a esta Assembleia, sem prejuízo de se dar conta aos Srs. Deputados dos esclarecimentos que entenderem necessários sempre que, nos termos constitucional e legalmente previstos, virem nisso vantagem.

O Sr. Presidente: - Para uma nova intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vicente Merendas, a quem o Grupo Parlamentar de Os Verdes concedeu 2 minutos.

O Sr. Vicente Merendas (PCP): - Sr. Presidente, queria, antes de mais, congratular-me com o apoio dado por todas as bancadas a este projecto de resolução, o que é demonstrativo da oportunidade da sua apresentação pelo Partido Comunista Português.
O Sr. Secretário de Estado lembrou agora que a Agência Europeia para a Segurança e Saúde no Trabalho fez sair um comunicado a 28 de Fevereiro, propondo para Outubro a comemoração de uma jornada europeia sobre higiene e segurança no trabalho. Avança com vários eventos a nível da Europa para veicular a mensagem e um programa especial de prevenção de acidentes. Em determinada altura, chamo a vossa atenção, o comunicado diz que cabe a cada Estado-membro decidir a semana exacta em que quer levar a cabo a comemoração relativa a este domínio. Ou seja, também cabe a cada Estado-membro definir o seu dia nacional. Queria dizer ainda que, se se instituir este dia a 28 de Abril, como já aqui foi referido, ninguém saberá neste país o que é que se comemora, nenhum trabalhador o saberá.
Em relação a outra questão aqui levantada, relativa à apresentação de um relatório pelo Governo à Assembleia da República, e constante do ponto 3 do nosso projecto de resolução, queria perguntar o que é que a Assembleia da República sabe sobre esta problemática da higiene e segurança do trabalho. Nada ou pouco mais do que isso.

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O Governo tem o dever de informar esta Casa, que, por sua vez, tem o direito de exigir ao Governo essa informação sobre esta situação tão dramática no nosso país.

A Sr.ª Natália Filipe (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Daí ser fundamental que o Governo apresente anualmente na Assembleia da República um relatório com a indicação das medidas de prevenção adoptadas e dos dados relativos à sinistralidade laboral. Não é exigir muito, Sr. Secretário de Estado, e faz sentido!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - E para nós é muito útil!

O Orador: - Quanto ao que disse aqui o Sr. Deputado Barbosa de Oliveira, apenas reafirmo o sentido que tem este terceiro ponto do nosso projecto de resolução!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma nova intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Oliveira.

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Sr. Presidente, há pouco registámos as palavras que o Deputado Vicente Merendas proferiu em nome do PCP, tendo manifestado a abertura de que tomámos nota.
Sugerimos aqui e insistimos que este projecto deve baixar à Comissão de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, para que, no curto espaço de 15 dias, seja encontrado um texto de consenso. Disse e repito: não gostaríamos de ter de votar contra, mas, se assim tiver de acontecer, apresentaremos na altura oportuna uma iniciativa legislativa que consagre o dia 28 de Abril como Dia Nacional de Prevenção e Segurança no Trabalho. Esta questão é, para nós, uma questão fechada e o PCP fará a sua gestão como entender!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Isso não é nada consensual!

O Orador: - Nós colocámos a questão de forma a que este projecto baixasse à Comissão de Trabalho para ali encontrarmos um texto de consenso, porque queremos instituir o Dia Nacional de Prevenção e Segurança no Trabalho. Se o PCP já «vendeu» ou «mandou às urtigas» o internacionalismo proletário, nós, que somos apenas o Partido Socialista, entendemos que a celebração do dia nacional em coincidência com os demais países tem mais força e é isso que queremos!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Lá se foi o verniz!

O Orador: - O PCP fará o que entender e amanhã votaremos em consonância!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Lino de Carvalho pede a palavra para que efeito?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Para utilizar os 39 segundos de que o meu grupo parlamentar ainda dispõe, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - São seus! Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Barbosa de Oliveira passou de um registo moderado e equilibrado para um registo completamente desproporcionado.

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Para o registo necessário!

O Orador: - Da nossa parte, estamos disponíveis para deixar baixar à Comissão, por 15 dias, o projecto de resolução, desde que essa baixa não signifique o posterior desvirtuamento do sentido útil do projecto. Nesse sentido, convém lembrar ao Partido Socialista que não tem a maioria absoluta nesta Casa!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma segunda intervenção, tem ainda a palavra o Sr. Deputado Arménio Santos.

O Sr. Arménio Santos (PSD): - Sr. Presidente, gostaria também associar-me a este estado de boa vontade para que, em sede da Comissão de Trabalho, se encontre uma solução que não desfigure o projecto de resolução que estamos hoje a discutir. Espero que não haja qualquer «posição musculada» para impor o que deve ser encontrado com equilíbrio e com bom senso.
O Sr. Secretário de Estado enunciou um conjunto de iniciativas que também já tinham sido referidas pelo Sr. Deputado Barbosa de Oliveira, as quais resultam do acordo celebrado sobre esta matéria, em Fevereiro passado, entre o Governo e os parceiros sociais. O Sr. Secretário de Estado referiu-se, particularmente, à comissão nacional das tabelas de incapacidades, à comissão nacional das doenças profissionais e ao Conselho Nacional de Higiene e Segurança no Trabalho. Mas, Sr. Secretário de Estado, particularmente as duas primeiras comissões que referi estão constituídas e curiosamente não funcionam. E não funcionam porquê? E quem é que nos garante que vão funcionar no futuro, se o Governo as paralisou? Como é que sabemos que todas as promessas que os senhores hoje apresentaram em relação a novos organismos, novas comissões e novos observatórios vão, de facto, funcionar? Desculpe dizê-lo, mas isso provavelmente vai acontecer pela primeira vez!
Mas gostaria também de deixar a seguinte pergunta: como é que a Inspecção-Geral do Trabalho vai funcionar em termos futuros? Com mais eficácia ou tolhida pela escassez de meios técnicos e humanos, que a tem caracterizado?

O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Trabalho e Formação.

O Sr. Secretário de Estrado do Trabalho e Formação: - Sr. Presidente, começo pelo último ponto colocado pelo Sr. Deputado Arménio Santos para lembrar, como ele provavelmente saberá, que os efectivos da Inspecção-Geral do Trabalho têm estado a aumentar e há um compromisso no acordo de fazer aumentar o número de inspectores para 60 por ano. Mas eles não se fabricam da manhã para a tarde, é preciso formá-los.

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Sr. Deputado, se quiser fazer o favor de me chamar daqui a um ano, e se eu ainda estiver nestas funções, terei ocasião de lhe mostrar que o compromisso foi cumprido.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Muito bem!

O Orador: - Quanto à sinistralidade laboral em Portugal, não há nada nesses números que agrade ao Governo, mas vale a pensa dizer que se tiver a cautela de ponderar o número de acidentados e o números de acidentados mortais, quer o Sr. Deputado tenha em conta o total dos sectores, quer apenas o da construção civil, e se ponderar estes números com o crescimento do emprego, verificará que a ratio mostra uma diminuição da sinistralidade laboral. Se estiver interessado em números detalhados, que constam de fontes públicas, terei todo o gosto em lhos fornecer.
Quanto ao relatório em que insistem, os Srs. Deputados tomarão a decisão que bem entenderem, eu só posso dar a opinião do Governo. O Governo considera que 10 anos depois de um acordo de concertação social sobre este domínio, que produziu escassos resultados, a reactivação de um compromisso feito na concertação social com todos os parceiros sociais deveria merecer uma oportunidade para que o essencial do trabalho fosse aí feito. Esse trabalho é público, portanto não há qualquer razão para não o referir nesta Câmara, mas o que não nos parece útil - e esta é a minha opinião - é que se comecem desde já a criar ao lado novos deveres e novos sistemas de informação sem testar primeiro os que foram alvo de um compromisso.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos os nossos trabalhos.
A próxima sessão plenária realizar-se-á amanhã, às 15 horas e, para além do período de antes da ordem do dia, da ordem do dia constará a discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 346/VIII (PS) e 395/VIII (PCP), bem como a discussão conjunta, também na generalidade, dos projectos de lei n.os 338/VIII (PSD), 376/VIII (BE) e 408/VIII CDS-PP)
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 30 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Bruno Renato Sutil Moreira de Almeida
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco d'Almeida
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Aurélio da Silva Barros Moura
José Eduardo Vera Cruz Jardim
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal

Partido Social Democrata (PSD):
Arménio dos Santos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Joaquim Monteiro da Mota e Silva
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José Manuel Macedo Abrantes

Partido Comunista Português (PCP):
Maria Odete dos Santos

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Carlos Manuel Luís
João Francisco Gomes Benavente
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
José Manuel de Medeiros Ferreira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Francisco dos Santos Valente

Partido Social Democrata (PSD):
Carlos Manuel de Sousa Encarnação
João José da Silva Maçãs
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro

Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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