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Sexta-feira, 11 de Maio de 2001 I Série - Número 80

DIÁRIO da Assembleia da República

VIII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2000-2001)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 10 DE MAIO DE 2001

Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex. mos Srs. José Ernesto Figueira dos Reis
José de Almeida Cesário
António João Rodeia Machado

S U M Á R I O

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa de requerimentos e da resposta a alguns outros.
Em declaração política, o Sr. Deputado Fernando Rosas (BE) censurou a política da educação em geral nas universidades e em particular o projecto de alteração ao Estatuto da Carreira Docente Universitária apresentado pelo Governo. No fim, respondeu ao pedido de esclarecimento da Sr.ª Deputada Isabel Pires de Lima (PS).
Ainda em declaração política, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia (Os Verdes), a partir de um estudo elaborado pelo OBSERVA, que traduz os resultados de um inquérito feito aos portugueses sobre matérias ambientais, criticou o Governo por não adoptar uma política de prevenção nesta área. Respondeu, no fim, ao pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Renato Sampaio (PS).
O Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan (CDS-PP) teceu críticas à forma como o Governo está a preparar a realização do EURO 2004. No fim, respondeu aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Hugo Velosa (PSD), Laurentino Dias (PS) e Rui Gomes da Silva (PSD).
A Sr.ª Deputada Margarida Botelho (PCP), a propósito de atletas de dois clubes madeirenses poderem vir a ser penalizadas por engravidarem, falou da discriminação das mulheres nas áreas do desporto e da actividade física, dizendo que o desporto tem de ser encarado como Direito Constitucional que é.
Ao abrigo do n.º 2 do artigo 83.º do Regimento, o Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas (Capoulas Santos) deu conta à Câmara de um novo rumo para a agricultura europeia, como contributo português para a reforma da PAC, tendo também usado da palavra os Srs. Deputados António Nazaré Pereira (PSD), Basílio Horta (CDS-PP), Lino de Carvalho (PCP), António Martinho (PS) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).

Ordem do dia.- Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 346/VIII - Estabelece e regula os sistemas de cobrança de quotas sindicais - Revoga a Lei n.º 57/77, de 5 de Agosto (PS) e 395/VIII - Novo sistema de cobrança e entrega de quotas sindicais (PCP). Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado do Trabalho e Formação (António Dornelas), os Srs. Deputados Artur Penedos (PS), Eugénio Marinho (PSD), Vicente Merendas (PCP), Barbosa de Oliveira (PS), Telmo Correia (CDS-PP), Fernando Rosas (BE) e José Luís Ferreira (Os Verdes).
A Câmara aprovou sete pareceres da Comissão de Ética autorizando cinco Deputados do PS e dois do PSD a deporem em tribunal como testemunha e, ainda, um parecer da mesma Comissão relativo à incompatibilidade no exercício de funções de um Deputado do PSD.
Foram também aprovados, na generalidade, a proposta de lei n.º 71/VIII - Altera o artigo 31.º e adita os artigos 31.º-A a 31.º-F da Lei n.º 29/82, de 11 de Dezembro (Lei da Defesa Nacional e das Forças Armadas), os projectos de lei n.os 14/VIII - Altera o regime de exercício de direitos pelos militares (alteração do artigo 31.º da Lei de Defesa Nacional) (PCP), 394/VIII - Altera a Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas (CDS-PP), 428/VIII - Capacidade eleitoral dos militares e agentes militarizados dos quadros permanentes em efecti

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vidade de serviço e exercício dos cargos políticos para que sejam eleitos (PSD), 429/VIII - Alteração do artigo 31.º da Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas (PSD), 430/VIII - Associativismo militar (PSD), 346/VIII - Estabelece e regula os sistemas de cobrança de quotas sindicais - revoga a Lei n.º 57/77, de 5 de Agosto (PS) e 395/VIII - Novo sistema de cobrança e entrega de quotas sindicais (PCP).
Mereceram ainda aprovação, em votação global, os projectos de resolução n.os 126/VIII - Sobre avaliação, informação e disciplina da actividade de extracção de areias em meio hídrico (Os Verdes), 136/VIII - Reposição de um sistema de fiscalização e de uma base de dados batimétrica para acompanhar a evolução dos leitos dos principais cursos de água (CDS-PP) e 80/VIII - Sobre a instalação de um sistema de controlo de tráfego marítimo (Os Verdes).
Finalmente, foi aprovado um requerimento, apresentado por Deputados do PS e do PCP, de baixa à Comissão de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, por um prazo de 15 dias, sem votação, do projecto de lei n.º 116/VIII - Institui o Dia Nacional de Prevenção e Segurança no Trabalho (PCP).
Os projectos de lei n.os 338/VIII - Define o número máximo de alunos por turma no ensino público não superior (PSD) e 376/VIII - Define o número máximo de alunos por turma no ensino não superior (BE) foram debatidos conjuntamente, na generalidade, tendo usado da palavra, a diverso título, além da Sr.ª Secretária de Estado da Administração Educativa (Maria José Rau), os Srs. Deputados Fernando Rosas (BE), José Cesário (PSD), Teresa Coimbra (PS), Luísa Mesquita (PCP), António Pinho (CDS-PP), Margarida Botelho (PCP), Rosalina Martins (PS), David Justino (PSD) e António Braga (PS).
Por fim, a Câmara discutiu, também na generalidade, o projecto de lei n.º 408/VIII - Altera o artigo 172.º do Código Penal, criminalizando a conduta de quem for encontrado na posse de fotografias, filmes ou gravações pornográficas envolvendo menores de 14 anos (CDS-PP), tendo proferido intervenções, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (José Magalhães), os Srs. Deputados Telmo Correia (CDS-PP), João Sequeira (PS), António Montalvão Machado (PSD), Odete Santos (PCP) e Maria de Belém Roseira (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 15 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 15 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Aires Manuel Jacinto de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
António Alves Marques Júnior
António Alves Martinho
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António José Gavino Paixão
António Manuel Dias Baptista
António Manuel do Carmo Saleiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Bruno Renato Sutil Moreira de Almeida
Carla Maria Nunes Tavares Gaspar
Carlos Alberto
Carlos Alberto Dias dos Santos
Carlos Manuel Luís
Casimiro Francisco Ramos
Cláudio Ramos Monteiro
Eduardo Ribeiro Pereira
Fernando Manuel de Jesus
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Serrasqueiro
Filipe Mesquita Vital
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Francisco José Pinto Camilo
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres
Gil Tristão Cardoso de Freitas França
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho
Helena Maria Mesquita Ribeiro
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco d'Almeida
Isabel Maria dos Santos Barata
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge Tinoco de Faria
Isabel Maria Soares Pinto Zacarias
Jamila Barbara Madeira e Madeira
João Alberto Martins Sobral
João Pedro da Silva Correia
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Alberto Leal Fateixa Palmeiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Aurélio da Silva Barros Moura
José Carlos da Cruz Lavrador
José Carlos Pinto Basto Mota Torres
José da Conceição Saraiva
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Ernesto Figueira dos Reis
José Manuel Pires Epifânio
José Manuel Rosa do Egipto
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Miguel Correia Noras
Jovita de Fátima Romano Ladeira
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Manuel Ferreira Parreirão Gonçalves
Luís Miguel Gomes Miranda Teixeira
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António dos Santos
Manuel Francisco dos Santos Valente
Manuel Maria Diogo
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Margarida Maria Santos Soares da Rocha Gariso
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira
Maria do Céu da Cruz Vidal Lourenço
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Luísa Silva Vasconcelos
Maria Teresa de Oliveira Ferreira Coimbra
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura
Nuno Fernando Teixeira Ferreira da Silva
Ofélia Maria Lapo Guerreiro
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Paulo Alexandre Homem de Oliveira Fonseca
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Rui Manuel Leal Marqueiro
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Victor Brito de Moura
Victor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Álvaro dos Santos Amaro
Ana Maria Martins Narciso
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António d'Orey Capucho
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado

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António Manuel da Cruz Silva
António Manuel Santana Abelha
António Paulo Martins Pereira Coelho
Armando Manuel Dinis Vieira
Arménio dos Santos
Armindo Telmo Antunes Ferreira
Artur Ryder Torres Pereira
Carlos José das Neves Martins
Carlos Manuel de Sousa Encarnação
Carlos Parente Antunes
Domingos Duarte Lima
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares
Eugénio Fernando Sá Cerqueira Marinho
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Jorge Loureiro de Reboredo Seara
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
João Bosco Soares Mota Amaral
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Monteiro da Mota e Silva
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José António de Sousa e Silva
José David Gomes Justino
José de Almeida Cesário
José Eduardo Rêgo Mendes Martins
José Frederico de Lemos Salter Cid
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel de Matos Correia
José Manuel Macedo Abrantes
Lucília Maria Samoreno Ferra
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Manuel Machado Rodrigues
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Pedro Machado Sampaio de Sousa Pimentel
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Castro de Almeida
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Maria Moreira
Maria do Céu Baptista Ramos
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Nuno Miguel Marta de Oliveira da Silva Freitas
Nuno Miguel Sancho Cruz Ramos
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa
Pedro Manuel Cruz Roseta
Rui Fernando da Silva Rio
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
Ana Margarida Lopes Botelho
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
João António Gonçalves do Amaral
Joaquim Manuel da Fonseca Matias
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Natália Gomes Filipe
Maria Odete dos Santos
Octávio Augusto Teixeira
Vicente José Rosado Merendas

Partido Popular (CDS-PP):
António Herculano Gonçalves
António José Carlos Pinho
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da Franca
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Luís Pedro Mota Soares
Maria Celeste Ferreira Lopes Cardona
Narana Sinai Coissoró
Raúl Miguel de Oliveira Rosado Fernandes
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
José Luís Teixeira Ferreira

Bloco de Esquerda (BE):
Fernando José Mendes Rosas
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário da Mesa vai dar conta do expediente.

O Sr. Secretário (José Reis): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos:
Na reunião plenária de 2 de Maio de 2001: ao Ministério do Equipamento Social, formulados pelo Sr. Deputado Duarte Pacheco; à ADSE, ao Centro Regional de Segurança Social - Sub-Região de Braga e Caixa Geral de Aposentações, formulados pelo Sr. Deputado Eugénio Marinho; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado Luís Pedro Pimentel; ao Governo, formulado

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pelo Sr. Deputado Mota Amaral; ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade, formulado pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; a diversos Ministérios e ao Governo, formulados pela Sr.ª Deputada Margarida Botelho; ao Ministério da Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Rosado Fernandes; a diversos Ministérios, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro; e ao Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território, formulados pelo Sr. Deputado Fernando Rosas.
Na reunião plenária de 3 de Maio de 2001: ao Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Alberto; ao Ministério da Saúde, formulados pelas Sr.as Deputadas Sónia Fertuzinhos e Natália Filipe; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado Adão Silva; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Mota Amaral; aos Ministérios do Trabalho e da Solidariedade e do Equipamento Social, formulados pelo Sr. Deputado Honório Novo; e à Câmara Municipal de Anadia, formulado pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
No dia 4 de Maio de 2001: ao Instituto para a Conservação e Exploração da Rede Rodoviária (ICERR) e à Direcção de Estradas de Castelo Branco, formulado pela Sr.ª Deputada Maria do Carmo Sequeira; ao Ministério da Educação, formulado pela Sr.ª Deputada Jovita Ladeira; ao Ministério da Administração Interna, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Castro; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Fernando Rosas; e ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Luís Fazenda.
Entretanto, o Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados:
No dia 4 de Maio de 2001: João Amaral, na sessão de 25 de Maio; Vicente Merendas, na sessão de 29 de Setembro; Maria Manuela Aguiar, na sessão de 19 de Outubro; Honório Novo, nas sessões de 28 de Novembro, 15 de Fevereiro e 8 de Março; Margarida Botelho, na sessão de 3 de Janeiro; José António Silva, na sessão de 4 de Janeiro; Machado Rodrigues, no dia 16 e na sessão de 26 de Janeiro; Nuno Teixeira de Melo, na sessão de 17 de Janeiro; Helena Neves, na sessão de 24 de Janeiro; Agostinho Lopes, nas sessões de 7 e 8 de Fevereiro; Carlos Martins, na sessão de 9 de Fevereiro; Lino de Carvalho, na sessão de 21 de Fevereiro; Heloísa Apolónia, na sessão de 22 de Fevereiro; Lucília Ferra, no dia 6 de Março; Mota Amaral, na sessão de 23 de Março; e Feliciano Barreiras Duarte e João Rebelo, na sessão de 4 de Abril.
No dia 8 de Maio de 2001: Miguel Miranda Relvas, na sessão de 21 de Junho; Luísa Mesquita, na sessão de 26 de Julho; Vieira de Castro, na sessão de 6 de Dezembro; António Abelha, na sessão de 7 de Dezembro; Caio Roque e Francisco Louçã, na sessão de 25 de Janeiro; Alexandrino Saldanha, na sessão de 7 de Fevereiro; Agostinho Lopes e Margarida Botelho, nas sessões de 8 de Fevereiro, 8 e 14 de Março; Isabel Castro, na sessão de 7 de Março; Mota Amaral, na sessão de 23 de Março; e António Nazaré Pereira, na sessão de 4 de Abril.
Foram também respondidos os requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: José Cesário, na sessão de 4 de Outubro; e Honório Novo, na sessão de 6 de Abril.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para declarações políticas, os Srs. Deputados Fernando Rosas, Heloísa Apolónia e Sílvio Rui Cervan.
Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Rosas.

O Sr. Fernando Rosas (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em 1994, o ocaso do cavaquismo foi marcado por um acontecimento social e politicamente singular: a greve dos docentes universitários contra a degradante desvalorização da sua situação profissional e contra a não política para as universidades dos governos PSD.
Sete anos depois, é preciso reconhecer que quase nada mudou, a despeito de alguns esforços meritórios de alguns ministros da Educação, mas abafados por essa espécie de «autismo burocrático» que paralisa o Ministério da Educação.
Na realidade, a universidade pública portuguesa vive um momento particularmente difícil, cujo aspecto mais imediatamente determinante é o da verdadeira situação de estrangulamento financeiro em que se encontra. Desrespeitando os seus compromissos, o Governo retirou às universidades, no passado ano lectivo, as verbas respeitantes aos aumentos dos professores e demais funcionários públicos; várias escolas estão a aplicar 100% do seu orçamento para pagar ordenados; as propinas, ao contrário do que o Governo prometeu, pagam despesas correntes; a falta de meios de instalação e a degradação de infra-estruturas atingem, em certas escolas, especialmente escolas de ciências sociais, aspectos aviltantes; os ratios professores/alunos, imposição indirecta do Governo às universidades, bloqueiam contratações indispensáveis e, sobretudo, o desenvolvimento de estudos de pós-graduação e a investigação; as universidades estão a perder os seus melhores valores, incapazes que são de lhes oferecer carreiras atractivas. Entretanto, a carreira docente universitária, justamente a mais exigente da função pública, é aquela em que a progressão, independentemente do mérito, é praticamente impossível, dado o bloqueamento dos seus quadros. Ninguém sabe, ninguém é capaz de definir qual é a política do actual Governo para o ensino superior.
Como se isto não bastasse, o Ministério da Educação acaba de fazer desabar, inopinadamente, sobre as universidades, ao fim de anos de hesitações e adiamentos, um projecto de Estatuto da Carreira Docente Universitária (ECDU) que parece saído de outro mundo, de tal maneira não só é alheio como agrava a já de si tão difícil situação da docência universitária.
Na realidade, estamos perante um projecto de ECDU que é, a vários títulos, inegociável, como têm salientado praticamente todos os sindicatos e escolas superiores que sobre ele se estão a pronunciar.
Em primeiro lugar, porque foi feito à revelia das universidades públicas, dos sindicatos de professores e até de outros Ministérios interessados, sem diálogo, sem audição prévia, e, depois, despejado arrogantemente sobre o silêncio dos interessados.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Muito bem!

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O Orador: - Assim sendo, não admira que faça tábua rasa quer da experiência de 20 anos do actual ECDU, quer mesmo de qualquer sistema conhecido de carreiras em países estrangeiros.
Em segundo lugar, porque ignora a lei da autonomia das universidades, negando-lhes qualquer margem de liberdade para elas defenderem as suas próprias estratégias de desenvolvimento científico e pedagógico.
Em terceiro lugar, porque omite escandalosamente toda e qualquer referência ao alargamento e actualização dos quadros da carreira docente universitária, onde, como se disse, as possibilidades reais de mobilidade e progressão na carreira são quase nulas, neste momento. Para agravar esta situação, o projecto suprime as provas de agregação, que eram o único recurso que restava à promoção pelo mérito, isto é, independentemente do recrutamento, impossível, ou da abertura de vagas. Toda a concepção de carreira se afunila nos concursos e nas vagas, contraria-se a diversidade dos meios de promoção e reforça-se uma concepção hierárquica, linear e antiquada, de progressão na carreira.
Em quarto lugar, o Estado demite-se da formação dos doutores ao decretar o início da carreira no doutoramento, mas mesmo quando se aceite esta medida o projecto não salvaguarda minimamente os direitos dos docentes não doutorados e dos docentes especialmente contratados - actualmente cerca de 50% do corpo docente -, que se vêem privados de dedicação exclusiva, de segurança de trabalho e do direito de dispensa para preparação do doutoramento. Criam-se, assim, nas universidades dois tipos de docentes: os doutorados, integrados na carreira, e os outros, espécie de mão-de-obra barata, em regime precário e sem perspectivas de carreira.
Em quinto lugar, o projecto desconhece tudo o que respeita à indispensabilidade de ligar a docência universitária à investigação científica, à comunicabilidade e mobilidade entre as duas carreiras e à criação de condições para uma partilha acrescida das responsabilidades docentes com as de investigação.
Em sexto lugar, o projecto não cria uma carreira apontada para a excelência científica e pedagógica como meta. Cria um exaustivo processo burocrático de avaliações, de provas, de relatórios, de planos, que dividiria os futuros docentes, em permanência do seu tempo útil em avaliadores, avaliados e avaliadores/avaliados, sem tempo para estudar, actualizar-se, investigar, leccionar ou prestar serviços à comunidade.
Em sétimo lugar, ao precarizar a dedicação exclusiva, transformando-a em regime de excepção, o projecto substitui a criação de mecanismos transparentes e exigentes de avaliação permanente por um sistema em que quem cumpre não tem compensação, quem não cumpre pode ser beneficiado com actividades externas e em que os famigerados planos quinquenais de actividade se irão transformar em artifícios para ludibriar a dedicação exclusiva.
Estes são os sete pecados mortais que tornam o actual projecto de ECDU imprestável, até como base de negociação, tal como vem apontando, num verdadeiro cilindro compressor de críticas, sindicatos, conselhos científicos, universidades e especialistas. Se o projecto não for abandonado pelo Governo, é natural que os docentes universitários, e justamente, tenham de encarar formas de luta e de protesto. Como se, neste melancólico Outono da governação do PS, um novo gesto de protesto dos docentes universitários viesse anunciar a necessidade de mudar de rumo e de política no País e em defesa do ensino superior público. Para isso, gostaria de o tornar aqui claro, poderão contar os docentes universitários com todo o apoio por parte do Bloco de Esquerda e do seu grupo parlamentar.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se as Sr.as Deputadas Isabel Pires de Lima e Luísa Mesquita.
Tem a palavra a Sr.a Deputada Isabel Pires de Lima.

A Sr.ª Isabel Pires de Lima (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Rosas, antes de colocar algumas questões, começo por dizer que concordo com algumas das preocupações que acaba de manifestar. No entanto, chamo a atenção para o seguinte: ao contrário do que sugeriu, este é apenas um anteprojecto do Estatuto da Carreira Docente Universitária, pelo que está, neste momento, sujeito a discussão pública. O anteprojecto encontra-se disponível na Internet, está a ser negociado com os sindicatos, os conselhos de reitores, a comunidade científica e académica estão a pronunciar-se sobre ele. Portanto, tratando-se de um anteprojecto, não vejo razão para o abandonarmos à partida, antes de terminada a discussão pública.
Relativamente a alguns pontos que abordou, gostava de fazer-lhe uma pergunta: entende que é negativo o facto de a carreira docente universitária começar exactamente pelo doutoramento? Isto é, os Centros de Ciência e Tecnologia têm apostado na formação de jovens doutores, de uma forma nunca antes feita entre nós. Ora, há uma coincidência entre essa política e exactamente uma nova carreira docente que passe por um doutoramento em fase inicial de carreira, como acontece, por exemplo, nos países anglo-saxónicos, de modo a fazer desaparecer o doutoramento, como sendo uma espécie de grande obra, culminando uma carreira. É um dos aspectos e não vejo por que é que considera haver uma demissão por parte do Ministério, relativamente à formação dos jovens doutores. Não me parece que seja possível dizer isso.
Por último, gostava de colocar-lhe uma questão relativamente à exclusividade. De facto, pode ser perigoso aquilo a que chamou precarização da exclusividade. Penso que isto é perigoso se não for de facto acompanhado de uma política de abertura de quadros. Todavia, tem um lado positivo, se pensarmos que quem determina a exclusividade é a escola, é o conselho científico da escola, em função de um programa de investigação apresentado, o que pode ser um incentivo ao prosseguimento da investigação, designadamente a uma não tendência para um anquilosamento por parte dos professores do quadro. Portanto, penso que pode ser trabalhado no sentido de ser um elemento passível de funcionar como incentivo à investigação, e não o contrário.

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Fernando Rosas, antes de lhe dar a palavra para responder, informo-o de que a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita prescindiu de usar da palavra para pedir esclarecimentos.
Assim, tem a palavra, Sr. Deputado Fernando Rosas.

O Sr. Fernando Rosas (BE): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Pires de Lima, vou responder-lhe muito brevemente.
É claro que o anteprojecto do Estatuto da Carreira Docente Universitária está em discussão. Vou passar por cima do facto de o Sr. Ministro da Educação ter dito aos sindicatos que aquele anteprojecto não era negociável, que o que ali estava e era para pegar ou largar. Vamos considerar que esta foi uma frase de má disposição nas negociações.
Agora, o que estou a dizer é que neste momento aquele anteprojecto do ECDU - de todos os documentos que conheço, dos sindicatos, dos conselhos científicos das universidades - não é a base de negociação, não é o ponto de partida. O que se está neste momento a negociar com o Ministério - e, a meu ver, bem! -, é um outro ponto de partida, porque aquele anteprojecto do ECDU é, em si mesmo, tão mau que não é o ponto de partida.
Em segundo lugar, eu aceito a vossa posição, pois não tenho uma posição fechada sobre a questão de começar a carreira docente pelo doutoramento. Até agora, o Estado encarregava-se do conjunto da carreira; e, como sabe, a carreira docente começava em assistentes e seguia por aí fora. É um sistema que pode ser discutível, mas o que me parece preocupante é sobretudo a ausência de direitos com que o ECDU contempla aqueles que ficam fora da carreira docente universitária, ou seja, aqueles que permanecerão nas escolas não como doutores mas como leitores, especialistas, encarregados, etc., que ficam sem tempo para fazer o doutoramento, que ficam em regime de trabalho precário e com subvenções muito baixas. Isto significa que vamos ter nas escolas dois tipos de docentes: os que estão na carreira e uma espécie de subcontratados, em trabalho precário, que não têm quaisquer direitos. Ora, mesmo que se aceite o princípio de que a carreira docente começa pelo doutoramento - o que considero ser discutível, mas pode aceitar-se -, o ponto principal que levanto quanto a esta questão são os direitos dos que ficam de fora, que não são contemplados por este anteprojecto de ECDU.
Quanto à dedicação exclusiva, estou inteiramente de acordo em que ela esteja a cargo dos conselhos científicos e seja feita mediante a prestação de provas. O problema é que o regime que o ECDU estabelece é um regime em que quem cumpre não é premiado e quem não cumpre pode ter uma vida santa, porque os que cumprem nada têm de especial - cumprem! -, os que não cumprem continuam a trabalhar em universidades paralelas, em empregos paralelos, etc., sem que lhes aconteça coisa alguma.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - O que são universidades paralelas?!

O Orador: - Mais: exige-se um plano quinquenal para ter dedicação exclusiva, e a Sr.ª Deputada sabe tão bem como eu que estes planos quinquenais vão ser a maior aldrabice imaginável e pensável.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Foram sempre! Isso é um perigo!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Até o BE é contra os planos quinquenais!

O Orador: - É que toda a gente vai fazer extraordinários planos quinquenais de investigação que não vão ser, pura e simplesmente, cumpridos.
Pela minha parte, entendo que se tem de ir obedecendo a sugestões, aliás, muito interessantes, de outras universidades para regimes mais transparentes e mais continuados de avaliação. Esta coisa de precarizar a dedicação exclusiva não resolve qualquer problema e agrava a precariedade dos professores em dedicação exclusiva.
Portanto, concordo em que a sede da averiguação deva estar na escola, com base na prestação de provas mas não com base nestes planos quinquenais, que me parece que irão ser uma nova forma de defraudar a transparência da carreira.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos o prazer e a honra de ter na nossa presença, na tribuna dos embaixadores, o ilustre Lord Russell-Johnston, Presidente da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, o Presidente da Comissão de Acompanhamento das Obrigações dos Estados-membros do Conselho da Europa, que é o nosso colega Deputado Mota Amaral, e mais 20 membros representativos dos 43 países democráticos que fazem parte daquela organização.
O Presidente Lord Russell-Johnston deslocou-se, ontem, a Castelo de Paiva, por iniciativa própria, para exprimir, em pessoa, às autoridades locais, o pesar e a solidariedade da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa pelo trágico desastre da ponte de Entre-os-Rios.
Bem merecem, todos eles, uma calorosa salva de palmas.

Aplausos gerais, de pé.

Também para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi divulgado um estudo do OBSERVA que traduz os resultados de um inquérito feito aos portugueses sobre matérias ambientais.
Os resultados do inquérito vêm revelar que a intervenção sobre as problemáticas ambientais constitui uma prioridade na perspectiva dos cidadãos, o que tem, certamente, a ver com o facto de a degradação ambiental ser cada vez mais visível e sentida, afectando claramente a saúde das populações e a sua qualidade de vida. Aliás, é perceptível que os cidadãos se preocupam fundamentalmente com o que é mais visível, como os maus cheiros, o ruído,

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a poluição do meio hídrico ou os lixos, e ignoram mais o que não é visível, como o efeito de estufa, a destruição da camada de ozono ou os organismos geneticamente manipulados.
Pena é que esta prioridade de intervenção para os portugueses não corresponda a uma prioridade de intervenção para o Governo, porque, ainda hoje, apesar de ter optado por juntar no mesmo ministério o ambiente e o ordenamento do território, continua a não haver uma articulação entre estas duas vertentes, o que é notório pelas sucessivas classificações de áreas em diplomas, onde depois se permite a utilização mais abusiva dos solos, se houver interesses económicos nisso mesmo, e a degradação desses espaços.
Os cidadãos portugueses consideram que um investimento sério em matérias ambientais é um investimento útil. Ocorre que, em Portugal, não se aposta seriamente, em termos de investimento, naquilo que é fundamental - a prevenção. Apostar na prevenção, como forma de preservação ambiental, é algo que ainda está longe de ser aplicado. A aposta vai fundamentalmente para a correcção de situações que já não são suportáveis e, a partir daí, tenta-se remediá-las, quando, muitas vezes, os danos causados são mais do que irreversíveis. É evidente que uma política de prevenção trocada por uma política de tentativa de correcção e de remendo implica muito mais gastos e desperdício de dinheiros públicos.
Por outro lado, permite-se tudo! Permite-se que uma diversidade de actividades funcionem sem licenciamento, permite-se que os índices de poluição ultrapassem os níveis-limite, permite-se que o crime ambiental compense. A fiscalização não actua devidamente e encontra muitas carências ao nível dos meios humanos por forma a darem resposta às necessidades de fiscalização, o que significa que, na maior parte das vezes, os infractores ficam impunes e, portanto, prontos para outra.
É relevante que os portugueses entendam, maioritariamente, que, perante os problemas ambientais, o Estado não se ocupa suficientemente deles e que, portanto, deveria ocupar-se mais ou que, quando se ocupa, não é eficaz. É evidente que estas respostas são reflexo daquilo que atrás referi.
Uma outra ideia que ressalta dos resultados do inquérito é a de que os portugueses se consideram pouco informados sobre o ambiente. Esta é uma realidade! E o certo é que vivemos num país onde o Governo mantém um hábito e uma cultura do «quanto menos as pessoas souberem, menos chateiam». Deste princípio resulta uma aposta quase nula na educação ambiental, que é um pilar fundamental para uma estratégia de intervenção ambiental e para a procura de uma mudança de comportamentos, de modo a adequá-los à preservação e valorização do meio ambiente. O IPAMB, organismo responsável por essa matéria, não tem promovido projectos nesta área, o que é lamentável, dadas as claras competências que lhe estão atribuídas por lei.
Aliás, esta carência de educação ambiental em Portugal foi profundamente manifestada e insistentemente colocada no 1.º Encontro Nacional de Professores Ecologistas, que Os Verdes organizaram, em Aveiro, no passado dia 21 de Abril. Nas escolas, por exemplo, aquela que se vai fazendo é muito ao sabor da motivação dos próprios professores e, logo, muito dependente da formação pessoal e do interesse particular dos docentes, bem como do seu interesse no envolvimento dos estudantes. E é pena que não exista, de facto, uma estratégia de educação ambiental, porque a população em geral e os jovens em particular estão receptivos a esta formação. É curioso, por exemplo, apercebermo-nos de que as camadas mais jovens da população são mais sensíveis às matérias ambientais e até mais preocupadas. Das já algumas sessões que se organizaram entre Deputados e estudantes que visitaram a Assembleia da República, é notório que quanto mais jovens mais são vincadas as problemáticas ambientais, de entre as questões colocadas aos Deputados.
É curioso também apercebermo-nos de que o único projecto educativo que resultou numa petição à Assembleia da República, já discutida nesta Câmara, teve precisamente a ver com um problema ambiental que envolveu as diferentes escolas da região.
Mas, para além da questão da não promoção de educação ambiental, o certo é que, muitas vezes, a participação dos cidadãos não é viabilizada, quanto mais estimulada!… O acesso dos cidadãos a documentos e a estudos realizados, os quais, à partida, sustentam certas decisões políticas, é muitas vezes dificultado. Também os períodos de discussão pública são transformados em meros períodos de consulta pública, não sendo promovidos quaisquer tipos de debate ou de sessões de auscultação e esclarecimento à população. São tidos como meros cumprimentos de formalidades legais, o que é, evidentemente, muito negativo. Isto mesmo verificou-se a propósito dos documentos em consulta pública no processo da co-incineração, na qual milhares de cidadãos participaram com opiniões escritas, pois, findo o prazo de consulta, não obtiveram qualquer espécie de resposta ou qualquer oportunidade de obtenção de esclarecimentos e as suas opiniões não foram, como se costuma dizer, tidas nem achadas.
Mas, já que se fala de co-incineração, é interessante confirmar também, através dos resultados do estudo do OBSERVA, que, afinal, o Sr Ministro José Sócrates não tem razão quando afirma que a grande maioria dos portugueses concorda com a opção do Governo no que respeita à co-incineração. Afinal, o estudo revela que cerca de metade dos inquiridos não acreditam mesmo na segurança da co-incineração.
Para além disso, os portugueses parecem ter sérias dúvidas relativamente ao funcionamento e eficácia de certas infra-estruturas, o que se deve, seguramente, ou ao seu mau funcionamento ou às expectativas que em relação às mesmas se criaram e que foram depois frustradas. Os portugueses assistiram, por exemplo, à pressa na instalação dos aterros, com base em estudos de bradar aos céus, localizados onde quer que fosse, porque o que interessava era que lá estivessem a funcionar por um período de mais ou menos 15 anos. Pede-se, depois, aos portugueses que acreditem no quê, quando, passados 4 ou 5 anos da instalação de uma estrutura daquelas, assistem ao esgotamento da sua capacidade, na medida em que a quantidade de resíduos a depositar era, de todo, desconhecida, e ou

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vem já falar da necessidade de construção de novo aterro?! São as más opções do Governo que descredibilizam a sua própria política!
Gostaria ainda de realçar o facto de os portugueses entenderem que o trânsito e a qualidade do ar são dois dos problemas que mais se vão agravar nos próximos tempos. São precisamente duas matérias fundamentais, em termos de cumprimento dos compromissos assumidos no âmbito do Protocolo de Quioto, mas é evidente que, nestas áreas, a carência de medidas, por parte do Governo, nomeadamente na promoção séria da utilização do transporte colectivo, da sua coordenação e modernização, a falta de soluções determina a desacreditação relativamente à possibilidade de inverter a tendência do aumento de emissões de gases nocivos e do estado caótico do trânsito nas grandes cidades.
Também em relação à segurança alimentar, os portugueses demonstram ter cada vez menos confiança naquilo que põem à sua mesa, tais têm sido as ameaças e a violação economicista na segurança dos alimentos - são os pesticidas, as galinhas com dioxinas, as vacas loucas, agora a febre aftosa e sabe-se lá o que por aí vem mais. A resposta do Governo foi a criação da Agência para a Segurança Alimentar, uma agência que concentra todas as responsabilidades relativamente a esta matéria, fiscalizando-se a si própria. Entretanto, a comissão instaladora demite-se e a única medida tomada pelo Governo, em termos de segurança alimentar, tem sido ineficaz.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este estudo do OBSERVA vem confirmar muitas coisas que Os Verdes têm denunciado com regularidade na Assembleia da República.
Os cidadãos estão receptivos à aceitação e à adopção de medidas que promovam a segurança ambiental, a sua saúde e a sua qualidade de vida. Por isso, esperam do Governo medidas eficazes no que respeita à preservação e valorização do meio ambiente. Para isso, a política para o ambiente não pode estar ao serviço de grandes interesses económicos, ao serviço de grandes lobbies, mas, sim, ao serviço das populações. Neste estudo, as populações revelam estar atentas e daí resultará uma exigência sempre maior.
O Governo deveria retirar deste inquérito uma lição: urgem, fundamentalmente, mudanças de política para o ambiente.

Vozes de Os Verdes e do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Renato Sampaio.

O Sr. Renato Sampaio (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, o Governo vai tirar, e tira, com certeza, lições deste relatório; e tira lições, porque já em 1997 patrocinou um relatório deste tipo! É o Governo que patrocina este relatório, exactamente para saber do estado do ambiente em Portugal.
O que não é legítimo, Sr.ª Deputada, é que de um relatório destes se faça um aproveitamento para o combate político na área do ambiente. E a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia fez algumas afirmações que não são rigorosas. Não leu, com certeza, todo o relatório, porque, se não, não as teria feito!
Se verificar, no relatório refere-se que é preciso prevenir, e prevenir significa fazer educação ambiental. Ora, em 1995, tínhamos 10 000 alunos atingidos pela educação ambiental; hoje, temos 123 000 alunos, existindo uma grande capacidade de progressão nesta matéria.
Por outro lado, o relatório também revela que, para prevenir, é necessário fiscalizar; por isso, este Governo criou a Inspecção-Geral do Ambiente, exactamente como contributo fundamental para as questões ambientais.
Por outro lado ainda, no que se refere à política de prevenção, a Sr.ª Deputada não diz que a recolha selectiva, que é fundamental numa política ambiental, é a área em que mais crescemos. Se verificar, verá que, na questão da recolha selectiva, duplicou a recolha do vidro, passando de 25% para 49%, triplicou a recolha do papel, passando de 10% para 36,5%, e duplicou também a recolha do plástico. Como vê, Sr.ª Deputada, na política central deste Governo, que é a política da prevenção, está exactamente a solução dos problemas.
Mas a Sr.ª Deputada também sabe que, hoje, não é possível ver os reflexos de uma política ambiental muito mais tarde. Além disso, foi necessário construir um conjunto de equipamentos para a resolução desses problemas, nomeadamente os aterros sanitários, as centrais de combustagem e todas as infra-estruturas necessárias. Por isso, esse reflexo sempre vem mais tarde. E este relatório reflecte exactamente isso!
A questão que, para nós, é mais importante, no âmbito deste relatório, é o problema da informação. E, neste domínio, os órgãos de comunicação social têm um papel fundamental na divulgação clara e correcta das políticas ambientais. Gostaria, pois, que se pronunciasse sobre esta matéria.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Renato Sampaio entende que se tem feito muito em termos de política ambiental; Os Verdes consideram que não, e, pelos vistos, os portugueses também consideram que não, pois é precisamente isso que resulta deste inquérito realizado pelo OBSERVA. O Sr. Deputado é que deveria lê-lo atentamente, de modo a também poder dele retirar uma lição, tal como o Governo deveria fazer.
Portanto, ao contrário do que o Sr. Deputado Renato Sampaio tenta fazer crer, não vivemos num mar de rosas em termos de ambiente, em Portugal, muito pelo contrário.
O Sr. Deputado entende que não é legítimo eu pegar em alguns factos deste estudo e fazer deles uma leitura; entendo que tenho toda a legitimidade para isso, assim como entendo que tanto o Sr. Deputado como o Governo o deveriam fazer para, depois, sendo consequentes, adoptarem políticas adequadas, de modo a responderem às preocupações que aqui estão referidas, o que não se tem verificado.

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O Sr. Deputado deu, inclusive, o exemplo dos aterros sanitários, que é, precisamente, uma das matérias em que os portugueses estão descrentes, tal como sucede quanto à co-incineração.
Sr. Deputado, se lhe colocassem um aterro à frente, em qualquer local, com base num estudo qualquer, e lhe dissessem «Este aterro funcionará para o depósito dos lixos destes concelhos durante 15 anos» e, passados 4 ou 5 anos, dissessem «Está esgotada a capacidade deste aterro e, portanto, é necessário começar a pensar noutra estrutura semelhante a esta», então, o Sr. Deputado, ao pensar no que isto significaria daqui a uns anos e na forma como poderia ver Portugal, coberto de aterros, perceberia que, de facto, esta política não é a mais adequada e que, efectivamente, é preciso sermos coerentes em termos, nomeadamente, da política de resíduos. E o Sr. Deputado sabe que a primeira coisa a fazer é perceber que tipo e que quantidade de resíduos temos! Já está provado que, sem esta primeira fase, não vamos lá! Aliás, alguns aterros sanitários provam precisamente isto, por já estar esgotada a sua capacidade!
Por outro lado, o Sr. Deputado disse que o relatório refere que é preciso prevenir. Sim! Os portugueses dizem que é preciso prevenir! Mas, Sr. Deputado, olhe para as acções do IPAMB, que são completamente nulas relativamente a uma matéria em que tem essa competência. Aliás, como referi, o 1.º Encontro Nacional de Professores Ecologistas, promovido por Os Verdes, onde vários nomes de mérito e reconhecidos estiveram presentes, denotou precisamente a falta, a escassez de educação ambiental nas escolas portuguesas, a qual anda muito ao sabor da boa vontade e da boa formação dos docentes. É pena que assim seja, porque o Estado tem, naturalmente, um papel fundamental nesta matéria.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, há pouco, anunciei que o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan também estava inscrito para uma declaração política, mas, entretanto, ele desistiu de a fazer.
Assim sendo, passamos ao ponto seguinte da ordem de trabalhos.
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas requereu, ao abrigo do n.º 2 do artigo 83.º do Regimento da Assembleia da República, o direito de intervir no período de antes da ordem do dia. Não sei se o Sr. Ministro já se encontra presente…

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (José Magalhães): - Sr. Presidente, se me permite…

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, quero apenas anunciar que o Sr. Ministro está, neste momento, a deslocar-se para o Hemiciclo, uma vez que estava prevista, na programação dos trabalhos, uma intervenção do Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.
Portanto, Sr. Presidente, a diligência está, neste momento, em curso, pelo que peço um compasso de espera de alguns segundos.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Sr. Presidente, quero apenas informar que o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan não fará uma declaração política, porque, segundo informação da Mesa, o nosso grupo parlamentar já tinha feito uso dessa figura regimental no passado dia 2.
No entanto, como dispomos de 5 minutos, o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan inscreve-se para tratamento de assunto de interesse político relevante.

O Sr. Presidente: - Para esse efeito, tem, então, a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Portugal candidatou-se à realização do EURO 2004 com um projecto ambicioso. O então ministro da tutela, José Sócrates, o Sr. Carlos Cruz e o Presidente da Federação Portuguesa de Futebol, Gilberto Madaíl, sempre souberam colocar esta candidatura como uma oportunidade de melhorar o parque desportivo nacional e de promover o País nas suas vertentes turística, comercial e produtiva, não a encarando com uma visão redutora, para um punhado de clubes e autarquias fazerem umas «obritas» nos seus estádios.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Ver o EURO como uma construção ou remodelação de 10 estádios é condenar a grandeza da sua realização, é deturpar o seu objectivo inicial, é desbaratar dinheiros públicos sem utilidade compatível, é, em suma, perder uma oportunidade singular de projectar o panorama desportivo no nosso país.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Portugal não pode gastar milhões de contos; Portugal deve investir dinheiro em estruturas modernas e capazes que possibilitem a prática desportiva com qualidade e que, sobretudo, fomentem a prática desportiva em Portugal.
Os custos da realização do EURO 2004 em Portugal nunca foram claros e continuam a não ser assumidos com a transparência e a exigência de que tanto fala o Ministro da tutela.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Lembremos que os números iniciais já não eram os números do ministro Fernando Gomes, anunciados, aliás, em entrevista a Judite Sousa na RTP, que esses números já não eram, depois, os números do ministro Armando Vara…

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

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O Orador: - … e que mesmo esses números já não são hoje os números do Ministro José Lello. Bem, a confusão é tanta que o Estádio Municipal de Coimbra, que o então ministro Fernando Gomes elogiou por ser uma obra realista, não megalómana e que iria custar 4 milhões de contos, passou - soubemo-lo, hoje, pela voz de um vereador da Câmara Municipal de Coimbra - a custar não 4 mas 7 milhões de contos!

Vozes do CDS-PP: - É um escândalo!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vamos tentar ser rigorosos!
Em Outubro passado, 48 horas antes de assinar o protocolo com o Governo, o então presidente de um clube disse, e passo a citar: «Portanto, nós vamos assinar o contrato-programa no pressuposto e confiantes na palavra do Sr. Ministro (…) e eu posso revelar, e julgo que esta Comissão já deve saber, que nos foi na altura pedido pelo Governo de então e pelos responsáveis de então para pormos valores mais baixos em relação ao EURO 2004 para politicamente se conseguir o apoio para aquilo. Mas, na altura, toda a gente sabia que esses valores não eram possíveis». Estou a citar o pressuposto com que se assinaram protocolos em Portugal.

Vozes do CDS-PP: - É uma vergonha!

O Orador: - Mais: afirmava aquele dirigente que tal tinha sido dito a outros presidentes de autarquias e clubes.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Todos os números são defensáveis, todas as opções são aceitáveis. O que não é aceitável, nem defensável, nem desejável, é esta política de «esconde-esconde», de desperdiçarmos muito fazendo de conta que somos muito rigorosos, de «vamos fazendo que logo se vê quem paga», de ainda não termos projectos mas já termos derrapagens. Nós defendemos o EURO 2004, porque julgamos que ele é útil como uma peça na política desportiva nacional, mas é preferível assumir as contas e controlar os custos, para, no fim, constatarmos que os custos são efectivamente iguais às previsões. Deixar de enganar, deixar de mentir, deixar de esconder, deixar de fingir, será, talvez, a melhor solução que o Governo, o vosso Governo, Srs. Deputados do PS, tem.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Defender o EURO 2004 é aplicar rigor e transparência. O EURO 2004 faz sentido e tem razão de ser para promover Portugal, como uma pedra-de-toque de uma política desportiva nacional que neste momento não existe. Ao mesmo tempo que a Confederação do Desporto lembra que Portugal não tem uma estratégia a médio prazo, que as Federações têm cortes nos apoios de 13,5%, que o Comité Olímpico de Portugal diz que não há dinheiro para os Jogos Olímpicos de 2004 e que nem sequer se fala num projecto para 2008, dizem-nos que são normais as derrapagens de alguns milhões!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que conclua, pois já esgotou o tempo de que dispunha.

O Orador: - Termino, Sr. Presidente, dizendo que EURO 2004 será uma grande vitória se, em 2005, tivermos mais umas dezenas de milhares de praticantes de desporto. O EURO 2004 será melhor e será uma vitória se aqueles que nasceram no dia da candidatura tiverem em 2005 mais condições para praticar desporto em Portugal.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, ao Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan os Srs. Deputados Hugo Velosa, Laurentino Dias e Rui Gomes da Silva. Sucede, porém, que o Grupo Parlamentar do CDS-PP não dispõe de mais tempo.
Assim, pergunto se os grupos parlamentares que requerem o direito de o interpelar lhe cedem algum tempo.

O Sr. José Barros Moura (PS): - Sr. Presidente, o Grupo Parlamentar do PS cede ao CDS-PP 2 minutos para que o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan possa responder.

O Sr. Presidente: - Muito bem!
O Grupo Parlamentar do PSD também cede 2 minutos?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O máximo que podemos fazer é ceder 1,5 minutos, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Muito bem. A Mesa concederá mais 1 minuto e, assim, creio que o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan já poderá responder.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan, começo por felicitá-lo por ter trazido aqui esta matéria, que é efectivamente preocupante. O Grupo Parlamentar do PSD também está preocupado com as notícias que começam a surgir e que nos demonstram que existem muitas dúvidas de que o Partido Socialista, o Governo e o Grupo Parlamentar do Partido Socialista consigam manter a ideia que foi transmitida, de que a comparticipação do Estado nos custos do EURO 2004 serão apenas aqueles que resultam dos protocolos e dos contratos que foram assinados.
Este é, de facto, um projecto e um objectivo nacional. Todos estamos de acordo em dizer que o EURO 2004 é muito importante em muitas áreas para este país. No entanto, não podemos fechar os olhos ao que se vai passando e V. Ex.ª, daquela tribuna, já manifestou algumas das preocupações que todos devemos ter em relação a esta matéria.
Uma comissão da UEFA esteve agora a visitar os estádios e, segundo as suas declarações, tudo está bem, mas nós temos sérias dúvidas de que os prazos venham a ser cumpridos e de que os custos venham a ser apenas aqueles que têm sido divulgados.
O Grupo Parlamentar do PSD manifesta, portanto, grande preocupação e chama a atenção para o que se está a

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passar com o Estádio da Luz, o estádio do Benfica, em relação ao qual não sabemos qual vai ser a comparticipação efectiva do Estado, numa altura em que os prazos já estão ultrapassados e numa altura em que já começa a ser tarde para iniciar a construção de estádios novos. É, portanto, preocupante a situação do EURO 2004.
Em consequência, pergunto-lhe: V. Ex.ª crê que é possível, face ao que se passa, que os custos do EURO 2004 sejam apenas aqueles que se divulgaram e que a comparticipação pública seja apenas aquela que foi anunciada e garantida? Crê V. Ex.ª que neste momento é possível cumprir os prazos que desde o início têm sido tidos como os prazos certos para que o EURO 2004 seja um sucesso?

O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan, como só dispõe de 5 minutos, sugiro-lhe que responda apenas no fim, aos três pedidos de esclarecimento.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Com certeza, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Assim, tem a palavra o Sr. Deputado Laurentino Dias.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan, permita-me que lhe diga, em síntese, algo sobre o significado da sua intervenção. Intervenções dessas são um péssimo contributo para o êxito do EURO 2004. São, repito, um péssimo contributo! Sabe porquê, Sr. Deputado? Porque V. Ex.ª, por um lado, aplaude a iniciativa - remonta a dois anos atrás e diz «andou bem o Governo quando meteu mãos a este projecto» - e, por outro, sem qualquer fundamento concreto, vem agora dizer: «mas, daí até hoje, o Governo vai permitindo que haja…» - este é o seu discurso e o de outros grupos parlamentares de outros partidos desde o princípio - «… derrapagens». Porém, tanto no seu discurso como no de outros há «derrapagens» desde o primeiro dia.
O senhor, como eu e outros parlamentares, faz parte da comissão eventual de acompanhamento do EURO 2004, onde já teve oportunidade de ouvir todos os intervenientes no EURO 2004, todos os donos de estádios que vão ser remodelados ou feitos de novo. Curiosamente, de todos esses intervenientes que ouviu, o senhor só trouxe ao Plenário uma expressão de um deles para fundamentar o seu discurso. Trouxe uma expressão de alguém que já foi presidente do Benfica, mas que já não é, o Sr. Dr. Vale e Azevedo, e que durante quatro horas de intervenção na Comissão disse apenas de importante uma frase, que é, aliás, recorrente no discurso de quem quer complicar o EURO 2004.
Por isso, Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan, creio que não se pode ao mesmo tempo dizer que o EURO 2004 é um projecto nacional e tudo fazer para denegrir, minimizar e pôr em risco o sucesso deste certame.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O senhor deu um exemplo disso, ao afirmar que hoje mesmo leu algures que um vereador da Câmara Municipal de Coimbra disse que o estádio dessa cidade vai ser mais caro. Mas o senhor lê muitas coisas!

O Sr. José Barros Moura (PS): - E lê mal!

O Orador: - Ontem, se calhar, terá lido num outro jornal que responsáveis de um outro estádio diziam que esse iria ficar mais barato; ontem, se calhar, leu também num jornal que responsáveis de outro estádio diziam que estava tudo a ser cumprido de acordo com o que estava inicialmente protocolado. O senhor não tem declarações de qualquer dono de estádio a dizer que esse estádio irá ficar mais caro do que o que foi inicialmente protocolado. Não tem!
Um destes dias, se quiser esclarecer devidamente este assunto e que esta Câmara, na parte que lhe toca, seja também um exercício de clareza e de transparência política para os cidadãos, faça aquilo que há tempos o seu grupo parlamentar ameaçou: suscite um debate, em Plenário, de urgência, como diziam os senhores, se bem que essa urgência já tenha passado há dois meses, sobre o EURO 2004. Façam isto e esclareceremos tudo como deve ser, e não faça intervenções como a que acabou de produzir.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Gomes da Silva, que dispõe de mais 1 minuto, tempo cedido pelo Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes», o que perfaz 1 minuto e 16 segundos.

O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan, o Sr. Deputado Laurentino Dias veio aqui dizer que, em relação ao EURO 2004, não havia qualquer derrapagem desde o princípio. No entanto, chamo a sua atenção para o facto de haver derrapagem desde o início, desde logo porque o Estado não se comprometeu com acessibilidades, e, por aquilo que sabemos, hoje estão já consagrados 10 milhões de contos para as mesmas.
Mas, Sr. Deputado, em relação aos desvios em termos orçamentais, pergunto: é ou não verdade que, pela voz do Sr. Deputado Laurentino Dias, o PS, em sede de Comissão, comprometeu-se em sustentar 25% de qualquer verba orçamentada, quer seja em termos de renovação quer seja em termos de construção de um novo estádio, isto é, abrangendo todas as renovações ou todos os novos estádios, incluindo o do Sport Lisboa e Benfica.
A segunda questão que quero colocar, Sr. Deputado, tem a ver com as cláusulas penais.
A inexistência de cláusulas penais nos protocolos poderá ou não determinar uma derrapagem no orçamento para a realização do EURO 2001, que, inicialmente, foi anunciado como sendo de 16 milhões de contos e que agora o Sr. Ministro já fala em 38 milhões de contos, mas que, pelas minhas contas, Sr. Deputado, não ficará por menos de 120 milhões de contos?

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

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O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente, visto que não conheço outra figura regimental que me permita…

O Sr. Presidente: - A figura regimental, Sr. Deputado, é a Mesa conceder-lhe 1 minuto para prestar o esclarecimento que entende que deve prestar. Não há outra!

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, nem sequer preciso de 1 minuto.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, quero apenas solicitar ao Sr. Deputado Rui Gomes da Silva o favor de juntar à Acta desta sessão a acta da reunião da Comissão em que ouviu o Deputado Laurentino Dias dizer aquilo que ele diz que eu disse.

Vozes do PS: - Exactamente!

O Orador: - Sr. Presidente, gostaria que ele a anexasse à Acta desta reunião plenária apenas para se saber quem fala verdade.

O Sr. Presidente: - Fica registado, embora o Sr. Deputado Laurentino Dias também o possa fazer, se assim o entender.

O Orador: - Fá-lo-ei, Sr. Presidente, se o Sr. Deputado Rui Gomes da Silva não quiser fazê-lo.

O Sr. Presidente: - Para responder aos três pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, permitam-me os Srs. Deputados do Partido Social Democrata que comece por responder ao Sr. Deputado Laurentino Dias, do Partido Socialista.
O Sr. Deputado Laurentino Dias, apesar da consideração pessoal que sabe que tenho por si, tem sempre estas tarefas absolutamente ingratas, que é as de, em Plenário, tentar defender o indefensável! Ora, vamos tentar ser rigorosos, Sr. Deputado.
V. Ex.ª foi desde logo sintomático quando eu, da tribuna, disse que reduzir o EURO 2004 à questão dos estádios era um mau serviço. V. Ex.ª, na sua intervenção, reduziu o EURO 2004 aos estádios, pois V. Ex.ª não veio aqui falar de centros de estágio para a juventude portuguesa; V. Ex.ª não veio aqui falar de acessibilidades para os portugueses; V. Ex.ª não veio aqui falar de hospitais e de centros de saúde. V. Ex.ª veio aqui falar da versão redutora e minimalista que - e hoje temos consciência disso - o PS tem do EURO 2004.
Mas V. Ex.ª também não veio aqui falar de outras coisas, não veio, por exemplo, explicar por que é que o Comité Olímpico não tem dinheiro para os atletas olímpicos portugueses. V. Ex.ª não explicou por que é que os clubes, tanto os da sua cidade como os da minha cidade, estão a fechar. Não explicou por que é que clubes como o Vigorosa, o Académico do Porto, o Vasco da Gama, que têm os pavilhões a cair, não têm tostões para milhares de jovens praticarem desporto. No entanto, as derrapagens no orçamento para a construção e renovação dos estádios são consideradas «normais», mas são de milhões!

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - V. Ex.ª não veio explicar isto, porque não consegue explicar, nem no seu íntimo consegue concordar, por que é que o seu Governo cortou 13,5% de verbas às federações desportivas. Não consegue explicar por que é que, enquanto o seu Governo aceita como «normais» as derrapagens orçamentais, V. Ex.ª vem aqui dizer que também é «normal» o corte para os clubes?
V. Ex.ª não veio dizer que 810 000 contos para o Desporto Escolar é inacreditável! V. Ex.ª veio falar de estádios e da única coisa de que não pode falar, porque veio citar o estádio de Coimbra… Mas eu não quero particularizar, apesar de também ter falado do Estádio da Luz. Não vamos falar nem de Coimbra nem da Luz, embora eu possa falar-lhe de todos os estádios. Posso dizer que o Estádio José de Alvalade, para o qual estava prevista uma lotação de 43 000 pessoas, vai ter uma de 52 000 pessoas, que o Estádio das Antas, para o qual estava prevista uma lotação de 50 000 pessoas, terá 52 000 lugares, que Braga já corrigiu…, que o estádio de Guimarães já saiu da tutela do clube para a tutela da câmara municipal, que Coimbra é o que se sabe, que o Benfica tem um problema que todos nós temos consciência de que existe.
V. Ex.ª falar de estádios, Sr. Deputado, é meter-se no ghetto de onde não terá saída!

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado, quero dizer-lhe que não deixa de ser sintomático quando eu venho falar de transparência, de rigor, de qualidade e de excelência, V. Ex.ª dizer que estou a denegrir, a minimizar e a fazer um mau contributo ao EURO 2004.
Ora, fiquemos então entendidos: para V. Ex.ª, para o Partido Socialista e para o Governo do Partido Socialista, rigor, qualidade e excelência significam denegrir um evento. V. Ex.ª pode concordar com esta postura, mas, lá fora, os portugueses demarcam-se todos os dias dessa vossa atitude, e com os portugueses vão também os votos, e com os votos vai o poder que vocês tão mal exercem em Portugal.
Mais, Sr. Deputado: o EURO 2004 pode ainda ser um sucesso, mas V. Ex.ª tem de arrepiar caminho e o Governo de V. Ex.ª não pode continuar nesta atitude autista.
Aos Deputados do Partido Social Democrata, quero muito rapidamente dizer-lhes que é evidente que se mentiu aos portugueses. É evidente que o EURO 2004 vai custar muito mais caro. E também é evidente que atrasos nos prazos serão seguramente aumentos nos custos.

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Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para tratamento de assuntos de interesse político relevante, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Botelho.

A Sr.ª Margarida Botelho (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Recentes notícias da comunicação social denunciavam que em dois clubes madeirenses, de voleibol e de futebol, as atletas são penalizadas se engravidarem, sendo que num deles incorrem numa multa de 2000 contos. Seja qual for o desenvolvimento que este caso venha a ter - e preferiríamos que a notícia não se confirmasse -, é sintomático de um mal-estar grande entre o desporto e as mulheres.
Social e politicamente, assume-se a discriminação em outras áreas que não esta, a do desporto e da actividade física das mulheres.
Apesar do esquecimento a que tem estado votada esta realidade, existem alguns dados dispersos que convém lembrar e procurar resolver: apenas 14% das mulheres portuguesas, menos 4% do que há 10 anos, praticam desporto, contra 31% dos homens. Em competição, a percentagem não chega a 1%, enquanto que em outros países a situação é bem diferente.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, peço desculpa por a interromper, mas quero pedir à Câmara que crie condições para que a Sr.ª Deputada possa ser ouvida.
Entretanto, aproveito para lembrar os Srs. Deputados que já está a decorrer, na Sala D. Maria, a eleição do Presidente para a Comissão Nacional de Protecção de Dados, para a qual há um único candidato, o Dr. Luís da Silveira. Agradeço que os Srs. Deputados que exerçam o vosso direito de voto.

Protestos do Deputado do PCP Octávio Teixeira.

Não se zangue, Sr. Deputado Octávio Teixeira!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Zango-me, sim, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: - Se o Sr. Deputado quiser usar da palavra, faça favor.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - O Sr. Presidente não pode interromper a oradora para fazer esse anúncio!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, devo dizer que comecei por interromper a Sr.ª Deputada Margarida Botelho, para melhorar as condições em que ela estava a ser ouvida, e, depois, aproveitei para fazer um anúncio que já devia ter feito, porque a eleição que referi já começou há 15 minutos.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Com franqueza!

O Sr. Presidente: - Não quis prejudicar a Sr.ª Deputada, nem, de facto, a prejudiquei.
Faça favor de prosseguir, Sr.ª Deputada Margarida Botelho.

A Oradora: - Muito obrigada, Sr. Presidente. Vou recomeçar a intervenção.
Como eu estava a dizer, apenas 14% das mulheres portuguesas, menos 4% do que há 10 anos, praticam desporto, contra 31% dos homens. Em competição, a percentagem não chega a 1%. Em outros países a situação é bem diferente: 24% das mulheres em Espanha, 63% na Holanda, 67% em França, 70% na Suécia.
A percentagem de mulheres nas delegações olímpicas portuguesas vem descendo desde 1984, sendo 23% contra 20,6% em 2000. As mulheres participaram em apenas 11, das 32 modalidades olímpicas, em 48 anos de participação olímpica feminina portuguesa.
A participação das mulheres nos Jogos Paralímpicos também tem vindo a diminuir: em 1988, eram 39% da delegação portuguesa, cifra que caiu rapidamente até aos 13% de Sidney.
Aos outros níveis da vida desportiva, a situação não é melhor: um estudo de 1999 aponta para que a participação de mulheres nas direcções dos clubes e das federações desportivas não chegue aos 10%; as mulheres árbitras são ainda muito poucas e pouco consideradas. Existem discriminações graves no acesso aos espaços, aos prémios de jogo, aos patrocínios e ao estatuto de alta competição.
Que argumentos existem para que para provas iguais existam estatutos e prémios completamente diferentes?
A comunicação social dá pouca cobertura ao desporto feminino e, por estranho que pareça, é a comunicação social desportiva quem mais perpetua esta discriminação.
A disciplina de Educação Física e o desporto escolar representam muitas vezes para as raparigas más experiências. Ao mesmo tempo, a quase impossível conciliação entre a vida familiar e a vida profissional deixa às mulheres pouco tempo para o resto da vida, nomeadamente ao nível do desporto, do associativismo e da cultura. Temos criadas as condições para que a situação que descrevi se agrave.
Foi com a preocupação de tentar conhecer melhor esta realidade e de recolher opiniões sobre medidas concretas para a sua alteração que o Grupo Parlamentar do PCP realizou uma audição sobre «A Mulher, o Desporto e a Actividade Física». Contámos com a participação do Comité Olímpico de Portugal, da Confederação do Desporto, da Associação Portuguesa dos Árbitros de Futebol, de federações desportivas, de associações de mulheres, de professores de educação física e de investigadores, e todos confirmaram esta situação lamentável.
É certo que há muito caminho a percorrer ao nível das mentalidades, nesta como em outras áreas. Há, no entanto, medidas políticas que têm de ser tomadas. A política desportiva em Portugal não contempla a promoção da igualdade de oportunidades, ao contrário do que se passa internacionalmente.
Nenhum contrato-programa no nosso país contempla a promoção do desporto feminino. O I Plano para a Igualdade de Oportunidades incluía um ponto sobre este objectivo, do qual não se conhece nenhuma medida e do qual o

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Governo não tem qualquer balanço, a avaliar pela ausência de resposta ao requerimento do PCP. De resto, também requeremos na mesma altura ao Governo que fornecesse os estudos que o próprio Centro de Estudos e Formação Desportiva encomendou sobre a actividade física das mulheres e que mantém na gaveta há anos, impedindo a divulgação de dados fundamentais para a compreensão deste fenómeno.

O Sr. Bernardino Soares (PCP). - Muito bem!

A Oradora: - O Governo enviou uma publicação parcelar, donde só podemos concluir que há receio de revelar que a participação das mulheres no desporto tem descido ao longo dos anos.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O desporto tem de ser encarado como Direito Constitucional que é, seja ele praticado como actividade de recreio ou de lazer, por razões de saúde ou em alta competição. Criar condições para que este direito seja exercido igualmente por mulheres e homens é um objectivo do PCP.

Aplausos do PCP.

O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - A interpelação é sobre que matéria, Sr. Deputado?

O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD): - Sr. Presidente, é relativamente à matéria que há pouco foi objecto de interpelação à Mesa por parte do Sr. Deputado Laurentino Dias.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD): - Sr. Presidente, é apenas para dizer que pretendo que seja junto à Acta desta sessão plenária uma cópia deste recorte de jornal que inclui as declarações do Sr. Deputado Laurentino Dias, onde ele diz rigorosamente aquilo que eu aqui referi.

O Sr. Presidente: - Agradeço que faça chegar à Mesa esse documento, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, ao abrigo do n.º 2 do artigo 83.º do Regimento, o Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas inscreveu-se para usar da palavra no período de antes da ordem do dia.
Assim, tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas (Capoulas Santos): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Como certamente se recordam, fui, em Março de 1999, o único ministro dos Quinze que no Conselho de Ministros da Agricultura, então realizado em Bruxelas, rejeitou formalmente o compromisso agrícola da Agenda 2000, apesar dos reconhecidos ganhos para Portugal que dele resultaram.
Considerei na altura que, não obstante o significativo acréscimo da parcela dos fundos estruturais destinados à agricultura, a melhoria da posição relativa de Portugal face ao FEOGA-Garantia traduzida num aumento global de cerca de 24%, e a mais do que duplicação das verbas destinadas ao programa de desenvolvimento rural, a reforma ficava muito aquém do que considerei aceitável, como Portugal sempre defendeu, para reequilibrar os apoios entre agricultores, entre sectores e regiões da União Europeia.
Não esperava, devo confessá-lo, que apenas dois anos depois, alguns dos então mais fervorosos opositores do aprofundamento da reforma, no sentido do que então Portugal isoladamente preconizou, alterassem o discurso e se tivessem reconvertido em arautos de novas mudanças, sem contudo apresentar propostas concretas.
Sinto-me por isso com total autoridade moral para tomar a iniciativa do lançamento de um debate sobre este tema, fundado numa proposta concreta, que, espero, possa ser enriquecida e merecer o consenso das forças políticas e dos parceiros sociais portugueses, antes de formalmente apresentada em Bruxelas.
Trata-se de um modelo substancialmente diferente do actual, mas teve-se o cuidado de não pôr em causa as expectativas criadas pela Agenda 2000, através da previsão de mecanismos e de prazos de transição que garantem uma mudança tranquila.
A proposta que vos apresento tem por base um documento de trabalho intitulado Um Novo Rumo Para A Agricultura Europeia - Contributo Português para a Reforma da PAC, que apresenta um modelo de reforma da política agrícola comum que permitirá reorientar a agricultura europeia para dar resposta aos grandes desafios da competitividade, da qualidade e da sustentabilidade com o que o mundo de hoje nos confronta.
O documento avança com um novo modelo de política agrícola e rural e com uma proposta de transição entre o actual e o novo modelo que se preconiza. Trata-se do primeiro documento de orientação para o lançamento de um debate ao nível europeu que considero inadiável.
Porquê reformar a política agrícola comum?
Muitos argumentos têm vindo a ser recentemente invocados em favor de uma nova reforma da PAC. As crises alimentares, da BSE em particular, têm levado muitos a propor uma agricultura menos intensiva e mais respeitadora dos modos de produção naturais. A questão orçamental, os custos do alargamento a Leste e as incertezas quanto aos resultados das negociações no âmbito da OMC têm vindo a ser encaradas como as principais pressões que, num futuro próximo, poderão inviabilizar o actual modelo de política agrícola.
Não pondo em causa a pertinência destes argumentos nem a necessidade de os incluir no debate, julgamos que a discussão deve centrar-se, preferencialmente num outro aspecto mais premente, o dos problemas com que nos confrontamos, a saber: o modo como a estrutura de incentivos criada pelo actual modelo de política agrícola impede a reorientação da agricultura europeia no sentido da competitividade, da qualidade e da sustentabilidade.
No que diz respeito à competitividade, o tipo de regime de ajudas directas saído da reforma de 1992, aprovado durante a então presidência portuguesa, permanece funda

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mentalmente inalterado, pelo menos no que se refere aos seus princípios básicos. Estas ajudas são dadas de modo a compensar os produtores pelas perdas de rendimento resultantes das baixas de preços previstas com base nas reformas das respectivas organizações comuns de mercado, e são atribuídas por cabeça de gado, por quilograma ou por hectare de superfície afecta às actividades agrícolas relevantes. Assim, estas ajudas continuam ligadas à produção, obrigando o produtor a manter as cabeças ou áreas declaradas, além de conduzirem a uma grande complexidade na administração das ajudas e no controlo, o que introduz uma enorme rigidez estrutural face aos ajustamentos que deveriam ter lugar para dar resposta ao mercado ou às novas exigências ambientais.
Assim, por exemplo, uma decisão no sentido de orientar a sua exploração para a produção hortifrutícola, supostamente mais vantajosa do ponto de vista dos recursos existentes (regadios, bons solos) e dos preços de mercado, um agricultor poderá decidir continuar a produzir cereais, apenas porque só assim terá acesso à ajuda por hectare de culturas arvenses. Deste modo, produz-se um uso ineficiente dos recursos existentes face à procura dos consumidores.
Outro exemplo é o de um agricultor que produz carne de bovino com base num sistema intensivo de engorda. O mercado, bem como questões ambientais e de qualidade do produto, poderiam aconselhar a reduzir o número de animais por hectare, a reduzir a componente alimentos concentrados (ração) e a aumentar a componente pastoreio. No entanto, o facto de receber a ajuda por cabeça de gado induzirá, em muitos casos, o agricultor a tomar a decisão oposta. Deste modo se inviabilizam estratégias de promoção da competitividade pela via da diferenciação de produtos de superior qualidade.
Ainda no que se refere à actual PAC, as ajudas directas e, sobretudo, os elevados preços no mercado comunitário face ao mercado mundial reduzem o potencial exportador da agricultura europeia: muitas exportações europeias só conseguem chegar aos mercados internacionais através da atribuição de subsídios (restituições à exportação), que são muito caros, como sabem, para o orçamento comunitário e limitados pelos acordos da OMC.
Por outro lado, as ajudas directas absorvem grande parte do orçamento agrícola, assim impedindo a reorientação das ajudas no sentido de promover o agro-ambiente, o emprego rural e o ajustamento qualitativo das explorações agrícolas.
No âmbito da qualidade, a actual PAC, embora não possa ser apontada como única responsável pela excessiva intensificação da agricultura europeia, incentivou, sem dúvida, um modelo agrícola intensivo, hoje associado a muitos dos problemas de segurança alimentar.
Por outro lado, no que se refere ao nível de apoio via preços e ajudas directas ligadas à produção, a actual política agrícola comum promove a intensificação nas zonas mais favoráveis, com os problemas ambientais que lhe estão associados (poluição por nitratos, destruição de habitats, etc.).
Acresce ainda que, uma vez que as ajudas são calculadas em função do nível de produtividade histórica de cada zona, a PAC beneficia sobretudo as zonas à partida mais favorecidas e pouco faz pela vitalidade económica e social das zonas mais marginais da União, reforçando, assim, as assimetrias regionais e pondo em causa a sustentabilidade.
Este é um problema central para Portugal. Assim sendo, que futuro para a agricultura europeia?
Na proposta que vos apresento, formulam-se três grandes objectivos:
Primeiro, promover os mecanismos de mercado na orientação da produção para a satisfação da procura, desligando os apoios da produção para fomentar um uso mais racional dos recursos, simplificar e desburocratizar as ajudas e libertar o potencial produtivo, promovendo a competitividade da agricultura europeia;
Segundo, estabilizar os rendimentos agrícolas;
Terceiro, redireccionar os apoios, para promover uma agricultura de qualidade, respeitadora do ambiente, criadora de diversidade e geradora de oportunidades económicas em todos os espaços rurais da União Europeia.
Para não defraudar as expectativas criadas pela Agenda 2000 e garantir uma mudança tranquila é indispensável que sejam contemplados prazos e mecanismos de transição. Assim, propõe-se o seguinte calendário indicativo: até ao final de 2002, discussão das propostas e sua aprovação; de 2003 até ao fim de 2006, período de vigência da Agenda 2000, 1.ª fase do período de transição; de 2007 a 2010, uma 2.ª fase do período de transição; e de 2011 em diante, novo modelo em pleno funcionamento.
Preconizam-se as seguintes medidas de política para o período de transição de 2003 a 2010:
Primeiro, criar um novo sistema de ajudas, por exploração, desligadas da produção, contrariamente ao que agora acontece, e orientadas para a promoção do ambiente, do emprego e da qualidade. Estas ajudas aplicar-se-ão tanto aos novos agricultores como aos agricultores existentes que optem pelo novo sistema, em detrimento da ajuda transitória de garantia de rendimento a seguir referida.
Segundo, garantir aos agricultores existentes um nível de ajuda, por exploração, não inferior à média do período de referência 1999/2001 (soma das ajudas directas recebidas ao abrigo das OCM relevantes), sem prejuízo do mecanismo de modulação abaixo referido. Esta ajuda transitória de garantia de rendimento, que vigorará durante a 1.ª fase do período de transição, visa salvaguardar as justas expectativas dos agricultores para o período 2000/2006 (decisões da Agenda 2000), bem como apoiar a reconversão dos sistemas produtivos. Esta ajuda será desligada da produção, a fim de permitir a referida reconversão.
Este desligamento das ajudas poderá ficar condicionado à obrigatoriedade de manutenção (não abandono) da SAU sempre que isto se justifique por razões de emprego, desenvolvimento rural ou ambiente.
A criação de uma ajuda desligada da produção, em substituição dos actuais regimes de ajudas directas no âmbito das OCM, levará à eliminação das restrições actualmente em vigor em matéria de direitos a prémios e ajudas.
Terceiro, instituir um mecanismo de modulação da ajuda transitória, obrigatório para todos os Estados-membros, de acordo com regras comuns, e tendo em vista o finan

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ciamento do novo sistema de ajudas durante a 1.ª fase do período de transição. A modulação obrigatória dará corpo ao objectivo central da reforma proposta, ou seja, a reorientação das ajudas no respeito pelo princípio da reafectação dos recursos financeiros à escala europeia, de acordo com regras comuns.
Quarto, manter os actuais sistemas de suporte de preços, comportando preços objectivo e de intervenção, bem como quotas de produção, direitos de importação e restituições à exportação, até ao fim do período de transição, com os ajustamentos que vierem a ser considerados necessários no âmbito da revisão intercalar prevista na Agenda 2000 (1.ª fase), seguidos de uma aproximação progressiva ao mercado mundial (2.ª fase).
Com o novo modelo em pleno funcionamento, de 2011 em diante, serão apenas aplicáveis: o novo sistema de ajudas, por exploração, desligadas da produção e orientadas para o ambiente, o emprego e a qualidade, o qual constituirá o essencial do novo modelo de política agrícola e rural, e o sistema de estabilização do rendimento dos agricultores face à instabilidade dos preços no mercado mundial e outros factores responsáveis por fortes oscilações do rendimento agrícola.
Eis, Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, em síntese, a proposta que coloco à vossa consideração, como base de partida para um debate inadiável à escala europeia. Só faz, porém, sentido apresentá-lo formalmente em Bruxelas se o modelo que é preconizado, ou qualquer alternativa melhor, reunir internamente um adequado consenso político e social.
Estou certo de que o Parlamento irá dar um contributo decisivo para este debate e coloco-me à vossa disposição para que ele possa ser célere e conclusivo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Nazaré Pereira.

O Sr. António Nazaré Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e Srs. Deputados, o Sr. Ministro trouxe-nos hoje à Assembleia uma proposta que disse pretender ser de revolução da PAC.
Dir-lhe-ia, Sr. Ministro, que os Deputados desta Assembleia já tiveram oportunidade de conhecer a sua proposta pela comunicação social. Esse aspecto é de sublinhar, porque revela um desrespeito por esta Assembleia da República, que é um órgão de soberania e um órgão de legitimação do Governo, que não quero deixar de salientar aqui.
Lamento, Sr. Ministro, que a Assembleia da República, ao fim e ao cabo, seja a última entidade a conhecer as suas propostas; lamento que tenha tido o cuidado de as transmitir à comunicação social e a agentes económicos e que só agora o faça à Assembleia da República. Eu diria que é um mau princípio para admitir que é uma proposta politicamente séria.
Mas, Sr. Ministro, permita-me que lhe diga que a informação que, agora mesmo, nos trouxe, e que ouvi com muita atenção, espero que não por falta de tempo, é uma informação escassa e superficial. Tal como foi aqui formulada, é uma proposta que espero não revele um trabalho relativamente frouxo de sustentação técnica e, sobretudo, de sustentação política. De facto, Sr. Ministro, mais parece - devo dizer-lhe - uma campanha de propaganda. Espero que não seja uma campanha de propaganda de recuperação da imagem do Sr. Ministro no período pós-congresso do Partido Socialista.

O Sr. José Barros Moura (PS): - Essa é boa!

O Orador: - Espero que não seja, antes de mais nada, uma propaganda que visa exclusivamente um aspecto interno de gestão do Governo, na tentativa de segurar a cadeira do Sr. Ministro contra a agitação indiciada por algumas moções apresentadas no congresso do PS, nomeadamente as aprovadas. Gostaria de perceber, Sr. Ministro, se, ao fim e ao cabo, não é uma campanha de propaganda do Sr. Ministro quanto a acções que possam resultar de uma moção aprovada nesse congresso. De facto, diria que os autores dessa moção já tiveram a primeira consequência dela, pois houve um ministro que se sentiu.
Vendo bem - e peço-lhe desculpa, Sr. Ministro, por insistir -, espero que o documento de trabalho que referiu na sua intervenção seja entregue à Assembleia e venha acompanhado de documentos técnicos suficientes para que os diferentes partidos políticos possam fazer uma avaliação clara do relevo da proposta que nos traz, porque, na comunicação social, ouvimos o Sr. Ministro falar de algumas simulações parciais, e isso, em linguagem eufemística, muitas vezes significa «contas em cima do joelho».
Não é, aliás - devo dizer-lhe -, a primeira vez que promete a esta Assembleia e, depois, não cumpre. Lembro, Sr. Ministro, mais uma vez, que, na Comissão da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas e aqui, no Plenário, aquando da proposta relativa ao processo de modulação, se comprometeu enviar à Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas e a esta Assembleia documentos técnicos de suporte da sua proposta, que nunca cá chegaram, provavelmente porque nunca foram enviados. E promessas, Sr. Ministro, não valem! Promessas temos nós ouvido demais!
Além disso, também lhe quero dizer, Sr. Ministro, que, se é uma campanha de propaganda, escolheu o momento errado. No mesmo momento em que é conhecida, em Portugal, a quebra de rendimentos do sector agrícola em 2000 - dados do Eurostat -, nomeadamente com a diminuição da produtividade por agricultor de 9,3%, quando, simultaneamente, aqui mesmo ao lado, em Espanha, houve uma subida de 4,8%, o que significa uma diferença de cerca de 15%, pergunto, Sr. Ministro, se da sua proposta não pode resultar alguma inquietude.
Das tais «contas em cima do joelho», eufemisticamente designadas como documentos de simulação, referentes à proposta que acaba de nos trazer, e que, espero, seja documentada com informação técnica suficiente, pergunto-lhe que outros países podem ganhar mais do que Portugal.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro, parece, de há alguns anos a esta parte, um facto adquirido que a actual política agrícola comum é injusta, é iníqua e é dispendiosa. É injusta, porque prefere os países já de si ricos aos países que mais necessitavam do apoio comunitário; é iníqua, porque tira competitividade a outros sectores da economia europeia para a dedicar a uma agricultura que, depois, gera excedentes, que têm de ser pagos; é dispendiosa, porque os meios não são elásticos, mesmo para os países ricos, e há já quem se vá fartando de subsidiar este tipo de política.
Por isso, parece-me uma questão de tempo a alteração da PAC, e várias iniciativas surgem no sentido de a mudar.
Dito isto, convirá dizer também que não é por esta PAC, seguramente, que temos uma diversidade tão grande no rendimento agrícola dos diversos países. Portugal desceu, como bem sabe, 9% em 2000 e a Finlândia, com a mesmo política agrícola, subiu 25%.

O Sr. António Martinho (PS): - Onde é que está o erro?!

O Orador: - Se o Sr. Deputado quiser interromper, faça favor.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - É melhor não interromper!

O Orador: - Se quiser interromper, interrompa!
Dizia eu que, nesta conformidade, embora não possamos assacar à política agrícola comum todos os defeitos e todos os males do mundo, a verdade é que ela tem de ser alterada, e temos de reconhecer que a alteração e a negociação da política agrícola comum, quando foi feita por Portugal, foi feita, em nosso entender - e dissemo-lo na altura -, sem o necessário empenhamento e sem a necessária força que devia possibilitar a Portugal um regime diferente daquele que veio a ser adoptado.
Por isso, Sr. Ministro, com inteira franqueza e liberdade lhe digo que o Governo faz bem em antecipar-se à Comunidade Europeia. Por uma vez o Governo não está à espera que a Comunidade lhe imponha uma política agrícola comum, tenta antecipar-se.
Eventualmente já devíamos saber, eventualmente pode haver erros de processo, acredito que sim, mas a intenção é tudo, e nós não podemos abdicar deste interesse, que é um interesse nacional.
A questão mais grave é saber se vamos ter força de mudar a política agrícola comum na Europa, e mudá-la no sentido dos nossos interesses e dos interesses dos outros países que estão na mesma situação que nós.

Vozes do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - Essa é a questão que temos colocado! E para isso, Sr. Ministro, conta connosco. Para esse trabalho sério e de profundidade, que empenhe o País e a agricultura nacional, contem connosco.
É preciso fazer uma PAC que sirva a PAN, que esteja em conformidade com a PAN, que sirva o ambiente, que sirva o futuro da nossa agricultura e não a desertificação que, até agora, tem estado a acontecer.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - É para este trabalho que V. Ex.ª conta connosco, sem malabarismos nem partidarites desnecessárias.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o Sr. Ministro disse na intervenção que fez (aliás, escreveu-o também na carta que, hoje de manhã, enviou aos grupos parlamentares com a proposta) que, em matéria de autoridade, se sente à vontade, face à posição que tomou durante a discussão da Agenda 2000, em Março de 1999. Não vamos discutir os resultados da então reforma da PAC, digamos só, Sr. Ministro, que, infelizmente, o Governo chegou tarde a este combate,…

O Sr. José Barros Moura (PS): - Essa é boa!

O Orador: - … porque há muito que nós, PCP, como sabe, colocamos em cima da mesa a necessidade de reequacionar completamente esta política agrícola comum, que não serve a diversidade das agriculturas europeias e, dentro delas, não serve Portugal e não serve, em particular, as explorações familiares.
Mas «mais vale tarde do que nunca»! O Governo chegou agora a este combate e, nesse sentido, consideramos importante que ele e Portugal impulsionem, embora, porventura, tarde demais, este debate no seio da União Europeia.
A questão está em saber se este documento que o Governo agora divulga, sem prejuízo do seu desenvolvimento, é um mero documento interno, de marketing interno, ou se é um documento com perspectiva de eficácia na reforma da PAC e nas negociações a que, obviamente, esta reforma da PAC vai ter de dar lugar, quando e como não sabemos.
Sr. Ministro, queremos colocar duas questões.
A primeira tem que ver com dois conceitos, os quais não encontro previstos nos documentos que li rapidamente, que é o conceito do direito a produzir e o conceito do respeito pela diversidade e pelas especificidades das agriculturas europeias.
O Sr. Ministro fala em desligar os apoios da produção, com base na ideia do combate ao produtivismo. Mas isso, Sr. Ministro, não pode ser aplicado de forma cega. Isto porque, se é verdade que o combate ao produtivismo se pode aplicar nos países do Norte, que são responsáveis por excessos de produção, em Portugal o problema colo

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ca-se ao contrário, isto é, não se trata de produzir a mais, trata-se de produzir a menos. Portanto, o combate ao produtivismo deve ter ligado intimamente o direito a produzir e, dentro do direito a produzir, o respeito pela diversidade das agriculturas europeias. Se este conceito não estiver colocado no documento do Governo, o problema é que a aplicação cega do combate ao produtivismo vai prejudicar-nos, vai prejudicar um país que precisa de produzir mais, que precisa de aumentar a sua produtividade.
A segunda questão, Sr. Presidente e Sr. Ministro, refere-se ao problema da distribuição dos apoios.

O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Não basta falar de modulações que, depois, na prática, têm uma tradução tímida e ineficaz, como a que o Sr. Ministro aplicou a Portugal. É preciso, de facto, redistribuir os apoios dentro da Comunidade Europeia, mas é preciso que, dentro de cada país, os apoios sejam distribuídos de modo a que termine a situação que hoje se vive, que é a de a pequena agricultura, as explorações familiares, receberem, como recebem, muito menos do que as grandes explorações, o que leva a que 90% dos apoios sejam entregues a menos de 10% dos agricultores.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tem de concluir.

O Orador: - São duas questões centrais que não estão previstas nos conceitos deste documento e que podem pôr em causa toda esta orientação que o Sr. Ministro traz agora à discussão.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, por descuido meu, não anunciei, antes de se ausentarem, o nome de algumas escolas cujos alunos estiveram hoje a assistir aos nossos trabalhos. Porém, como ainda se encontram alguns, justifica-se que anuncie que estiveram, e alguns ainda estão, a assistir aos trabalhos um grupo de 108 alunos da Escola Básica dos 2.º e 3.º Ciclos de Sofia de Mello Breyner, de Arcozelo, um grupo de 43 alunos da Escola Básica 2, 3 e Secundária n.º 1 de Condeixa-a-Nova, n.º 1, um grupo de 40 alunos da Escola Secundária de D. João II, de Setúbal, um grupo de 80 alunos da EB1 n.º 167 e Jardim de Infância do Bairro Padre Cruz e um grupo de 20 alunos da Escola Secundária C/3.º Ciclo da Escola Básica de Anadia.
Uma saudação para os que ainda estão connosco.

Aplausos gerais, de pé.

Tem a palavra o Sr. Deputado António Martinho.

O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, quero começar por afirmar, em nome do Grupo Parlamentar do PS, que nos congratulamos por mais esta iniciativa do Governo corporizada por si, Sr. Ministro.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Registamos com muito agrado que a apresentação pública desta iniciativa tenha sido feita no Parlamento no dia a seguir ao dia 9 de Maio, que é o Dia da Europa.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Registamos, também, que, nesta Câmara, há posições muito diferentes entre os grupos parlamentares.
Sr. Deputado Basílio Horta, aquele meu aparte de há pouco referia-se ao seguinte pormenor: o Sr. Deputado, e muito bem, referiu uma constatação, a baixa de produtividade de 2000, e eu lembrei que, em 1999, nós tínhamos tido um aumento de 14%.
Porém, registo com agrado a análise que fez ao documento, tal qual foi possível fazê-lo neste momento, bem como a do Grupo Parlamentar do PCP.
Registo, igualmente, que o Grupo Parlamentar do PSD, mais uma vez, se pôs fora do debate, se pôs fora de uma atitude construtiva, em relação a um dossier tão importante como este para Portugal, para os agricultores portugueses.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro, defendida e aprovada já uma política agrícola nacional, com uma estratégia de prioridades, de metas e instrumentos de política bem precisos, o Governo acaba de lançar, através de V. Ex.ª, com estas suas propostas, as bases de uma nova política agrícola comum. É bem necessária esta iniciativa, Sr. Ministro.
Na verdade, como alguém afirmou, a actual política agrícola comum nem é agrícola nem é comum. Não é agrícola, porque não respeita nem a estrutura das explorações, nem a sua adequação ao ambiente e ao mundo rural, nem a orientação da produção. Mas também não é verdadeiramente comum, porque as disparidades que existiam entre os diversos países não têm vindo a diminuir significativamente.
A actual PAC é iníqua, porque feita à medida dos países fundadores da Comunidade Europeia, com os apoios atribuídos com critérios desajustados, como, por exemplo, o da produtividade histórica, que já referiu.
A actual PAC é ineficiente, porque conduz à produção de bens por vezes excedentários e não procurados pelos consumidores.
A actual PAC é anticoesão, pois não trata de igual modo todos os agricultores europeus e contribui para a manutenção das disparidades e assimetrias regionais.
Mas a sua iniciativa, Sr. Ministro, mostra realismo, inconformismo, capacidade de iniciativa e coerência.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Também neste domínio, através desta proposta, Portugal manifesta, mais uma vez (aliás, na senda do que tem vindo a fazer desde 1995), capacidade de lançar para o debate temas novos, de indiscutível interesse

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para Portugal e fundamentais para o aprofundamento da construção europeia.
A sua proposta evidencia realismo, pois exprime um aprofundado conhecimento da realidade agrícola europeia, bem como das exigências do mundo de hoje no que respeita à produção agrícola, bem expressas, por sinal, numa certa angústia tanto dos produtores como, sobretudo, dos consumidores face às crises dos últimos anos: BSE, febre aftosa, dioxinas, por exemplo.
A sua proposta mostra o inconformismo do Sr. Ministro na esteia, aliás, que aconteceu nas negociações havidas no âmbito da Agenda 2000, apesar dos avanços e dos ganhos que então se verificaram para a agricultura portuguesa e de que todos temos consciência - aliás, o Sr. Ministro já lembrou a sua atitude nessa altura.
A sua proposta mostra capacidade de iniciativa e arrojo ao lançar as bases de um modelo verdadeiramente alternativo à actual PAC.
A proposta agora avançada privilegia o apoio à produção de qualidade e à segurança alimentar, defende claramente a agricultura familiar e a multi-funcionalidade e assume que a produção de bens alimentares passa por uma agricultura sustentável, não agressiva do ambiente, perfeitamente adequada ao meio em que se desenvolve. Por outro lado, valoriza a componente emprego. Qualidade, ambiente, emprego são critérios importantes e fundamentais hoje, no quadro nacional, no quadro europeu ou no quadro mundial.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A sua proposta, Sr. Ministro, mostra, ainda, coerência com um passo que já deu, quando fez aprovar o diploma da modulação das ajudas do Governo, através do Decreto-Lei n.º 34/2001.
A sua proposta, Sr. Ministro, podemos dizê-lo, lança também as bases de um pacto de confiança entre produtores e consumidores, mas ela cria de igual modo condições para que a PAC constitua um efectivo instrumento de coesão económica e social, o que é fundamental, a nosso ver.
Este debate vai continuar, Sr. Ministro e Srs. Deputados. O Grupo Parlamentar do PS, nas Comissões de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas e de Assuntos Europeus, fará uma proposta neste sentido.
Para terminar, Sr. Ministro, o Grupo Parlamentar do PS estimula o Governo a prosseguir com os passos necessários para o sucesso desta iniciativa, aguarda os contributos que possam vir dos grupos parlamentares e das confederações e espera que a Comissão e o Conselho compreendam o verdadeiro alcance desta proposta e, com espírito construtivo, reconheçam as suas prerrogativas e virtualidades e sejam capazes de a analisar, aprofundar, aprovar e implementar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados, o problema está, Sr. Ministro, no facto de ser preciso, muitas vezes, chegar-se a pontos insustentáveis para se agir. Esse é um dos grandes problemas. E foi preciso resultarem tantas questões negativas desta política agrícola comum para que se reconhecesse a necessidade de ser alterada.
As coisas, por outro lado, Sr. Ministro, muitas vezes, só são conhecidas pelas populações e reconhecidas por parte de quem toma decisões políticas quando tomam proporções alarmantes. Assim aconteceu, por exemplo, a propósito da BSE. E, depois, chega-se ao ponto de ninguém saber o que fazer. Assim se passa relativamente às toneladas de produtos resultantes do abate de «vacas loucas», não se sabe bem à espera de quê, não se sabe bem que solução adoptar, não se sabe bem em que condições - aliás, sabe-se que estão armazenados em condições e em quantidades perfeitamente alarmantes e que não existe concordância na solução apontada para esta matéria entre o Ministério da Agricultura e o Ministério do Ambiente. A situação é, de facto, insustentável.
Por outro lado, sabe-se, é público, que continua a produzir-se em Portugal carne à base de hormonas. Sr. Ministro, como é? Que fiscalização? Afinal, o que está a acontecer? Que resposta é que o Sr. Ministro tem perante estas questões?
Pela parte de Os Verdes, gostava ainda de referir que sempre defendemos uma agricultura mais sustentável, uma agricultura menos intensa, uma agricultura mais ligada ao meio rural; sempre defendemos uma aliança entre a qualidade alimentar e a defesa do ambiente, a defesa do mundo rural e o trabalho.
Sr. Ministro, espero que o «salto de cabeça» próximo não seja para os organismos geneticamente manipulados.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, às questões que lhe foram colocadas, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas.

O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: - Sr. Presidente, muito sinteticamente, começando pelo Sr. Deputado António Nazaré Pereira, registo que, relativamente à proposta, disse nada! E lamento, porque fiquei sem perceber se está de acordo ou se está contra. Fiquei sem perceber se defende o actual modelo ou se defende outro e, se defende outro, qual é.
O Sr. Deputado António Nazaré Pereira disse que esta proposta é propaganda, que tem que ver com o Congresso do PS, que foi entregue tarde à Assembleia da República e manifestou-se muito preocupado com o anunciado pelo Eurostat sobre a queda do rendimento agrícola no ano passado. Sobre isso, terei muito gosto em responder-lhe.
O Sr. Deputado esqueceu-se, certamente, que a comparação do rendimento agrícola se faz relativamente ao ano imediatamente anterior e esqueceu-se, de certeza absoluta, que o ano imediatamente anterior foi, pura e simplesmente, o melhor da década e que o ano 2000, que teve esta pequena quebra, continua a ser o segundo melhor da dé

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cada. Mas terei todo o gosto em fazer distribuir pelas diversas bancadas o gráfico do rendimento desde 1990 até hoje para o Sr. Deputado perceber bem em que ponto se encontra o rendimento do ano passado, que tanto criticou, e em que ponto se situaram todos os anos do governo que o seu partido sustentou.

Protestos do PSD.

Lamento não poder dizer nada sobre a sua apreciação desta proposta, mas ficarei muito curioso para conhecer o que é o PSD pensa dela, ou de qualquer outra.
Ao Sr. Deputado Basílio Horta agradeço a postura que assumiu. Gostaria de lhe dizer que só faz sentido apresentar formalmente e desencadear um combate, que será extremamente difícil (temos de ter consciência disto), porque somos um pequeno país e, para que os apoios possam ser mais justamente redistribuídos, alguns países, de entre eles as grandes potências, terão de perder alguma coisa, se houver um consenso nacional adequado. Conto com o PP e disponibilizo-me inteiramente para os esclarecimentos e para a introdução de melhorias que sejam passíveis de introduzir na proposta, porque penso que se trata de uma questão que, sendo comunitária, é, obviamente, nacional.
Tenho consciência das dificuldades e, apesar de alguns Estados membros terem vindo a fazer um discurso neste sentido, estou certo de que apenas o fazem porque não têm consciência do alcance prático dessas declarações e que, quando forem confrontados com elas, como já começa a verificar-se nalgumas situações, tenderão a recuar, pelo que esta vai ser uma batalha extremamente difícil para um debate que ainda nem sequer ninguém aceitou iniciar. Portanto, trata-se, em primeiro lugar, de colocar, quanto antes, o debate na agenda e, depois, tentar defender uma proposta.
O Sr. Deputado Lino de Carvalho diz que o Governo chegou tarde. Devo dizer que não cheguei tarde, porque a última vez que isso se discutiu foi em 1999 e, como disse, estive contra a Agenda 2000 e a proposta de 1999. Penso que esse teria sido o momento oportuno para se ter ido muito mais longe. Não houve coragem para isso e não deixa de ser espantoso…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Mas o Governo, nessa altura, já era do PS! Convém não esquecer isso!

O Orador: - O Sr. Deputado colocou duas questões sobre a proposta e penso que só o fez porque não teve disponibilidade de a ler com atenção, uma vez que, em relação à proposta que lhe fiz chegar, essas perguntas estão respondidas.
Aquilo que nós propomos é que as ajudas passem a ser atribuídas por exploração, segundo novos critérios, mas com a obrigatoriedade de que se continue a produzir. Só que com uma diferença: enquanto agora se tem de produzir na lógica do subsídio e para as culturas subsidiadas, com esta nova lógica, desde que cumpridas as regras ambientais que condicionarão as ajudas, cada agricultor, sem limites de quotas ou direitos de produção, poderá produzir aquilo que quiser em condições económicas, ecológicas mais adequadas. Desse ponto de vista, há uma alteração absolutamente radical.
Ao Sr. Deputado António Martinho agradeço as referências que fez.
À Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia terei muito gosto, quando achar conveniente, em me deslocar à Assembleia para entrar no debate em que a senhora quis entrar e que nada tem que ver com o que acabámos de discutir aqui.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Acha que não tem nada a ver?! Então, muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 55 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, informo que está a decorrer a eleição do Presidente da Comissão Nacional de Protecção de Dados. Quem ainda não exerceu o seu direito de voto, mais uma vez, lembro que deve fazê-lo.
Vamos agora dar início à discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 346/VIII - Estabelece e regula os sistemas de cobrança de quotas sindicais - Revoga a Lei n.º 57/77, de 5 de Agosto (PS) e 395/VIII - Novo sistema de cobrança e entrega de quotas sindicais (PCP).
Para apresentar o projecto de lei n.º 346/VIII, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Penedos.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Socialista tomou a iniciativa de apresentar o projecto de lei n.º 346/VIII, relativo aos sistemas de cobrança de quotas sindicais, visando o aperfeiçoamento, o alargamento e a actualização do regime jurídico vigente nesta matéria, que se mostra, hoje, desajustado e desconforme às transformações ocorridas no sistema de relações laborais e no plano dos direitos sociais, nas últimas décadas.
Tendo constituído, à data da sua aprovação, um marco importante no que concerne à implementação de sistemas de cobrança de quotas sindicais, constata-se que, volvidos mais de 20 anos sobre a sua aprovação, o regime jurídico em vigor carece de uma reformulação e actualização, no sentido de melhor proteger os interesses que visa tutelar.
Com efeito, nos termos do actual regime, a instituição de sistemas de cobrança de quotas sindicais está dependente da celebração de acordos para esse efeito entre as associações patronais ou entidades equiparadas e as associações sindicais, sendo que a adopção do sistema de desconto no salário só produzirá efeitos se o trabalhador assim o autorizar, mediante declaração individual a enviar ao sindicato e à entidade empregadora.
Significa, pois, que, ao fazer depender a cobrança de quotas sindicais por dedução na retribuição exclusivamente de acordos a celebrar entre as associações patronais e

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sindicais, a referida solução normativa acabou por limitar, na prática, a sua aplicação e eficácia.
Por outro lado, a revogação pelo trabalhador da declaração de autorização de desconto nos salários, nos termos da citada lei, só pode ocorrer três meses após a sua entrega e mediante entrega de uma nova declaração escrita com essa finalidade, o que manifestamente constitui um mecanismo penalizador dos interesses dos trabalhadores, na justa medida em que ficam obrigados, naquele período, ao desconto na retribuição, ainda que tal seja contra a sua vontade.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Foi neste contexto que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista entendeu ser chegado o momento de se proceder à revisão do sistema de cobrança de quotizações sindicais vigente, sobretudo no sentido do seu alargamento, melhoria e aperfeiçoamento.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Com o presente projecto de lei, visa-se, pois, em concreto: alargar o sistema em vigor, permitindo que o desconto da quota sindical na retribuição possa ocorrer mesmo nas situações em que não tenha sido possível a celebração de acordos entre as associações sindicais e patronais, ou seja, desde que o trabalhador o solicite expressamente à entidade empregadora, ficando esta obrigada a proceder à sua entrega junto do sindicato em que aquele se encontra inscrito; estabelecer a obrigação de a entidade empregadora, nos casos de instituição do sistema de cobrança de quotas, proceder à dedução do valor da quota e sua entrega ao respectivo sindicato, durante o mês seguinte respeitante ao da cobrança; eliminar a exigência de, nos casos de revogação da declaração de autorização do desconto na retribuição, o trabalhador ficar obrigado ao pagamento da quota durante três meses, permitindo-se que a referida revogação possa ocorrer a todo o tempo e segundo a vontade do trabalhador; por último, a consagração expressa, e na sede própria, das contra-ordenações aplicáveis aos infractores, em resultado do incumprimento das disposições legais em matéria de sistemas de cobrança de quotas sindicais.
Trata-se de um conjunto de soluções normativas, cuja aprovação, estamos convictos, constituirá certamente uma clarificação e uma melhoria relativamente ao regime jurídico vigente e que, em simultâneo, contribuirá para a desejável generalização da implementação dos sistemas de cobrança de quotas sindicais no nosso país.

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Muito bem!

O Orador: - No que concerne ao outro projecto de lei em discussão, o do PCP, cujo objecto e fundamentos são coincidentes com a iniciativa legislativa apresentada pelo PS, saudamos o mesmo, na medida em que reconhece a razão que nos assiste no tocante à necessidade de se alterar o regime jurídico da cobrança de quotas sindicais e por constituir, também ele, um contributo para a adopção de um quadro legal adequado aos interesses em causa.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No seu projecto de lei, o Grupo Parlamentar do PCP acolheu a generalidade das soluções normativas preconizadas no nosso projecto, divergindo, sobretudo, em dois aspectos: o primeiro prende-se com a recondução do sistema de cobrança de quotas sindicais à autorização de desconto na retribuição a dar pelo trabalhador, deixando de ser expressamente uma matéria de negociação colectiva; o segundo prende-se com a consagração da não entrega pela entidade empregadora dos valores da quotas deduzidas na retribuição ao sindicato como crime de abuso de confiança, nos termos previstos no Código Penal.
Relativamente à primeira divergência, considera-se a solução normativa preconizada no projecto de lei do PS mais abrangente e conforme aos interesses em jogo, ou seja, entendemos que a instituição de sistemas de cobrança de quotas sindicais deve poder ser levada a cabo em termos colectivos, através de acordos entre associações sindicais e patronais e/ou, em termos individuais, pela vontade expressa dos trabalhadores. Valoriza-se a contratação colectiva e, na sua ausência, possibilita-se outras alternativas, evitando-se, assim, qualquer vazio normativo.
Quanto à segunda divergência, tendo em consideração, por um lado, a gravidade que assume o acto de não entrega aos sindicatos pelas entidades empregadoras dos valores das quotas sindicais e, por outro, que a jurisprudência maioritariamente tem vindo a considerar que se trata de um crime de abuso de direito, desde já manifestamos a nossa abertura para evitar qualquer problema de ordem jurídica e para aceitar a consagração expressa do referido comportamento como crime de abuso de confiança.

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Muito bem!

O Orador: - Em suma, trata-se de dois projectos de lei muito próximos, quer do ponto de vista dos objectivos que preconizam, quer no plano das soluções normativas que espelham.
Finalmente, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PS votará favoravelmente os projectos de lei em discussão, na certeza de que, em sede de discussão na especialidade, será possível, e mesmo muito fácil, adoptar um texto de substituição, que vá ao encontro das reais expectativas dos trabalhadores e das associações sindicais e constitua um quadro jurídico adequado e conforme aos interesses que importa tutelar.

Aplausos do PS.

O Sr. Fernando Rosas (BE): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Agradeço que explicite o tema, Sr. Deputado.

O Sr. Fernando Rosas (BE): - Sr. Presidente, é sobre o processo, que me deixa perplexo, de eleição do Presidente da Comissão Nacional de Protecção de Dados.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

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O Sr. Fernando Rosas (BE): - Sr. Presidente, provavelmente, é por ignorância minha,…

O Sr. Presidente: - É capaz de não ser, Sr. Deputado.

O Orador: - … mas verifico que a lista A, a única lista concorrente, apresentada pelo PS, tem um único quadrado à frente, o que significa que só podemos votar a favor, abster-nos ou anular, não havendo qualquer espaço para podermos votar contra.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já me tinham chamado a atenção para esse facto. Se algum Sr. Deputado - nomeadamente, o Sr. Deputado Fernando Rosas - entender que deve ser anulada a votação, imediatamente darei ordens para ela ser suspensa.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Claro que deve ser!

O Orador: - Sr. Presidente, efectivamente, pretendo requerê-lo, porque me parece que não é muito…

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado. Será suspensa, porque, de facto, quem queira votar contra, não pode fazê-lo; só pode abster-se.

O Orador: - Ou anular.

O Sr. Presidente: - Ou anular, escrevendo um palavrão no boletim.

O Orador: - Exactamente.

O Sr. Presidente: - Assim sendo, vou mandar suspender a eleição e marcaremos outro dia para a sua realização.
Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Artur Penedos, tem a palavra o Sr. Deputado Eugénio Marinho.

O Sr. Eugénio Marinho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Artur Penedos, gostava que o senhor me esclarecesse algumas das questões que abordou na apresentação que fez do projecto de lei do PS.
V. Ex.ª fala no alargamento, na melhoria e no aperfeiçoamento do regime vigente. Confesso que não consigo perceber onde está, designadamente, o alargamento do regime vigente. O que julgo que há, mas queria que V. Ex.ª o esclarecesse, é uma alteração do regime vigente.
VV. Ex.as, curiosamente, propõem aqui um sistema de cobrança de quotas sindicais assente em duas possibilidades: ou há acordo entre entidades patronais e sindicatos ou, então, o trabalhador, per si, pode solicitar que a entidade patronal, por declaração expressa, faça o desconto no seu vencimento da quota sindical.
Sr. Deputado, a questão é esta: V. Ex.ª acredita que, a partir do momento em que os senhores consagram a possibilidade de ser o trabalhador directamente a fazer essa declaração por vontade expressa, algum dia mais vai funcionar a vossa primeira condição? V. Ex.ª acha que há possibilidade de co-abitação desses dois sistemas? A que propósito se torna necessário que funcione a possibilidade de acordo, quando, na realidade, o que vai funcionar - e VV. Ex.as sabem-no muito bem - é a declaração do próprio trabalhador?
V. Ex.ª diz que este diploma é mais abrangente. Justiça seja feita, o projecto de lei do Partido Comunista Português, pelo menos, tem mais coerência e não suscita dúvidas. Contém uma orientação com a qual, obviamente, não concordamos, mas é coerente no que propõe. Já o projecto de lei de VV. Ex.as, não. Os senhores, por um lado, vão ao encontro daquilo que é a perspectiva do PCP, mas, por outro, fazem uma cosmética a este projecto de lei, para dizerem, ao fim e ao cabo, que também mantêm a possibilidade de acordo. VV. Ex.as sabem que não funciona; de qualquer forma, gostava que me esclarecesse esse aspecto, que considero importante.
Gostava também que me explicasse o seguinte: o actual regime está desajustado porquê? Por que é que está desajustado, Sr. Deputado? Mais: visa acautelar quem? Quem é que é preciso acautelar? V. Ex.ª não defende o livre associativismo? Então, quem é que se visa acautelar com isto? Que princípios orientadores estão subjacentes ao projecto de lei da sua bancada?
Eram estes os esclarecimentos que gostava que me prestasse, Sr. Deputado.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Penedos.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Eugénio Marinho, perguntou-me V. Ex.ª onde estava o alargamento do regime vigente. O alargamento está, obviamente, no seguinte: enquanto que, hoje, só por negociação colectiva, se pode chegar a uma situação em que a entidade patronal faz o desconto no vencimento dos trabalhadores, com o nosso projecto de lei - o qual, contrariamente ao que o Sr. Deputado disse, não vai atrás do do PCP (eventualmente, o do PCP é que viria atrás do nosso, porquanto o nosso deu entrada em primeiro lugar na Mesa) -, criam-se condições para que, em casos onde não possa verificar-se negociação colectiva, haja a possibilidade de o trabalhador, por vontade própria, declarar que pretende que lhe seja descontado no seu vencimento o valor da quota sindical.
Quanto ao actual regime estar ou não ajustado à realidade, somos da opinião de que efectivamente está, e vou dar-lhe um exemplo. Hoje, por via da negociação colectiva, há inúmeras situações em que, por via do acordo celebrado entre a associação sindical e a associação patronal que representa a empresa, esta última procede ao desconto do valor da quota sindical na remuneração do trabalhador e não há nada na lei que a obrigue, no mês seguinte, a entregar essa quotização ao sindicato. Ou seja, neste momento, o que se verifica, em algumas situações, é uma retenção desse valor da quota sindical por parte de algumas empresas, criando dificuldades gravíssimas aos sindicatos. Ora, o que pretendemos é terminar rapidamente com este tipo de situações, é criminalizar comportamentos que são verdadeiramente inadmissíveis

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na nossa sociedade. É este, Sr. Deputado, o significado do nosso projecto de lei.

O Sr. Presidente: - Para apresentar o projecto de lei n.º 395/VIII, tem a palavra o Sr. Deputado Vicente Merendas.

O Sr. Vicente Merendas (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aos sindicatos, dada a sua natureza de organização de classe, tem vindo a ser reconhecida uma cada vez maior e mais importante dimensão social, que se alarga para além dos interesses socioprofissionais estritos dos seus associados, o que torna o movimento sindical como um movimento social crescentemente indispensável na sociedade do presente e no futuro, ao contrário do que alguns teóricos têm sucessivamente anunciado.
Constituindo uma peça indispensável na construção e no desenvolvimento democrático da sociedade, é necessário que sejam criadas todas as condições que permitam garantir um movimento sindical forte, autónomo e financeiramente sustentado. É neste sentido que o Grupo Parlamentar do PCP apresenta este projecto de lei, instituindo um novo sistema de cobrança e entrega de quotas sindicais, como contributo para melhorar a concretização do princípio da independência dos sindicatos, consagrado na Constituição da República Portuguesa, o qual, nos termos da lei fundamental, deverá ser garantido por lei.
A Lei n.º 57/77, de 5 de Agosto, em vigor, que, no essencial, tem sido uma lei positiva, carece, naturalmente, ao fim de 24 anos, de actualização e adaptação à sociedade dos nossos dias e de compatibilização com a legislação laboral entretanto aprovada.
O presente projecto de lei tem como objectivo melhorar, alargar e aperfeiçoar o sistema de cobrança vigente.
Tratando-se de uma matéria de grande sensibilidade e com fortes repercussões na actividade sindical, frequentemente motivadora de conflitos nos locais de trabalho com entidades patronais que ignoram ou se recusam à cobrança das quotas que os trabalhadores querem pagar, consideramos que o novo regime jurídico a estabelecer deverá ser um regime claro e objectivo.
É neste sentido que propomos:
O abandono da exigência de celebração prévia de um acordo entre entidades ou associações patronais e associações sindicais para a cobrança das quotas sindicais, o que, na vigência da lei que se pretende substituir, se tem traduzido, em muitos casos, na sua não aplicação, porque muitas associações patronais fazem uso do poder de «veto», que, na prática, a lei lhes confere, ao recusarem qualquer acordo com as associações sindicais;

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - A consagração expressa da possibilidade de tratamento automatizado de dados pessoais dos trabalhadores referentes à filiação sindical, desde que exclusivamente utilizados na aplicação do sistema de cobrança e entrega de quotas sindicais, possibilidade que, embora expressamente prevista na nova redacção da lei de protecção de dados pessoais, continua a ser fonte de litígio em muitas empresas;

A Sr.ª Natália Filipe (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O sancionamento adequado das situações de retenção ilícita por parte das entidades empregadoras dos valores deduzidos a título de quotização sindical nas retribuições dos trabalhadores;
A disposição reguladora da sucessão dos regimes jurídicos de cobrança de quotas sindicais, acautelando a validade dos sistemas de cobrança de quotas sindicais que vêm a ser praticados.
Há outras situações que urge alterar, pelo que o nosso projecto de lei prevê, por um lado, que a omissão de cobrança da quotização sindical, relativamente ao trabalhador que a haja autorizado, constitui uma contra-ordenação grave, e, por outro lado, que a retenção dos valores, por parte da entidade empregadora, com a sua não entrega em tempo ao sindicato, configura crime de abuso de confiança, previsto e punido nos termos do Código Penal.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei apresentado pelo Partido Socialista, que tem vários aspectos que merecem o nosso acordo, suscita-nos, porém, algumas dúvidas, que aqui deixo expressas.
Por exemplo, no que se refere às consequências para as entidades empregadoras pelo incumprimento do presente diploma, especialmente no que concerne à retenção e não entrega das quotizações, se numa primeira leitura parece representar um agravamento do regime, não passa de um real desagravamento penal.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Já está esclarecido!

O Orador: - Obrigado, Sr. Deputado.
Sendo a retenção e não entrega das quotizações uma situação idêntica à retenção ilícita das contribuições dos trabalhadores para a segurança social e para o IRS, entendemos que deverá estar sujeita à moldura penal prevista para o crime de abuso de confiança, sob pena de se estar a discriminar os destinatários destas verbas, os sindicatos.
Por outro lado, o projecto de lei do PS não contempla uma disposição normativa que assegure a sucessão dos regimes jurídicos de cobrança das quotas sindicais, garantindo a dispensa de apresentação de novas declarações a todos os trabalhadores cujas entidades empregadoras já procedem actualmente à dedução das quotas sindicais nas respectivas retribuições. A transição, no nosso projecto de lei, está expressamente garantida pelo texto que apresentamos.
Pensamos, contudo, que a discussão, na especialidade, dos dois projectos de lei pode conduzir à elaboração de uma boa lei, que corresponda às preocupações que estão subjacentes à sua apresentação.
Pela nossa parte, estamos disponíveis para esse trabalho de aperfeiçoamento.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os sindicatos, como instituições, merecem que os seus direitos sejam salvaguardados e que a sua dignidade seja respeitada.
Para o desenvolvimento do País, onde a presença de sindicatos fortes constitui uma componente indispensável, é fundamental que a dignidade do trabalho e os direitos dos trabalhadores sejam não só respeitados mas também

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tidos em conta como um meio indispensável e indissociável da construção do futuro. Reforçar os sindicatos é também um meio para atingir este fim. É o que o nosso projecto de lei garante.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Eugénio Marinho.

O Sr. Eugénio Marinho (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os projectos de lei em apreciação merecem, da parte do PSD, o competente voto contra.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Ponto final parágrafo!

O Orador: - Sr. Deputado, V. Ex.ª não me deixa acabar. Eu comecei por aí para que não fiquem dúvidas ab initio de que, efectivamente, estamos contra estes projectos de lei. Vou agora explicar porquê, se V. Ex.ª me permitir.
O que está aqui em causa, e que me parece importante clarificar, é que o regime legal vigente já foi para além daquilo que é o normal quando estamos a falar em livre associativismo. Não podemos deixar de referir que o que está subjacente ao regime legal vigente são os princípios da livre e voluntária colaboração dos empregadores. O associativismo livre funciona com a voluntariedade dos seus associados.
Neste caso concreto, houve, efectivamente, por parte do legislador, a vontade de encontrar uma forma de alargar esta matéria e de permitir, com a colaboração da entidade empregadora, encontrar uma plataforma para facilitar a actividade dos sindicatos no que à cobrança das quotas sindicais concerne.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Isso é dificultar!

O Orador: - Não, não é dificultar. O senhor não respondeu foi à minha pergunta, e isso é que eu gostava que tivesse feito. Contudo, não explicou a quem serve o vosso projecto de lei. Não explicou.
Sr.as e Srs. Deputados: Queria relembrar que o Decreto-Lei n.º 215-B/75, no seu artigo 21.º, que previa que a cobrança das quotas não dependesse de uma autorização dos trabalhadores, acabaria por ser revogado pelo Decreto-Lei n.º 841-B/76, tendo-se posteriormente chegado àquele que é o diploma legal ainda em vigor.
Há um ou noutro pormenor com o qual estamos de acordo, designadamente quanto ao facto de o trabalhador, quando se quiser desvincular, não ter de estar a contribuir para o sindicato durante três meses mas apenas durante um mês, como é agora proposto; só que a questão de fundo, a questão essencial, decorre do artigo 2.º do projecto de lei do Partido Socialista e do artigo 2.º, penso, do projecto de lei do PCP e em relação a essa matéria, Srs. Deputados, que é o âmago, o essencial destes projectos de lei, nós não podemos concordar.
Aliás, gostaria de dizer que o PCP, embora não perfilhasse de há muito esta ideia, porque pensava de forma diferente quanto ao acordo - considerava que o acordo deveria funcionar não sendo necessária a declaração do trabalhador, esta apenas seria necessária quando o trabalhador não quisesse que o regime do acordo entre a entidade patronal e os sindicatos lhe fosse aplicado -, evoluiu para uma posição diferente.
O PS também evoluiu, e de que maneira, mas, na minha perspectiva, mal!
Sr.as e Srs. Deputados, gostava de vos ler uma passagem, que considero estar ainda perfeitamente actual, de uma intervenção do saudoso Deputado do Partido Socialista, Marcelo Curto, feita nesta Assembleia no dia 6 de Maio de 1977: «De facto, não se pode compreender um sistema legal em que as entidades patronais sejam obrigadas a descontar por uma lei de Estado e não por acordo entre os seus representantes e os representantes sindicais, e, portanto, ficando vinculados a uma ingerência do Governo ou do Estado nos problemas sindicais»!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Tem razão!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Isto foi afirmado pelo Deputado Marcelo Curto, da vossa bancada, e esta afirmação está perfeitamente actual! Não venham dizer que decorridos 20 anos precisa de ser actualizada! É uma afirmação que está perfeitamente actual, e é lamentável que VV. Ex.as, por formas não confessadas, não venham aqui explicar cabalmente o que motiva esta alteração, que vai plenamente ao encontro do projecto de lei do Partido Comunista Português! Isto porque, como já afirmei no pedido de esclarecimento que fiz ao Sr. Deputado Artur Penedos (disse-lhe claramente, e é verdade), a alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do vosso projecto de lei nunca mais funcionará a partir do momento em que a alínea b) do mesmo número entre em vigor.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Está enganado!

O Orador: - Não tenha dúvidas, Sr. Deputado! Aliás, estou convencido de que V. Ex.ª não tem qualquer dúvida! V. Ex.ª sabe que esta foi uma forma de mascarar a realidade! Não quiseram ter um projecto de lei exactamente igual ao do PCP, embora o vosso tivesse surgido primeiro, mas sabiam qual era o sentido de orientação do projecto de lei do PCP. O que VV. Ex.as quiseram fazer, aqui, foi iludir a questão, o que, na minha perspectiva, não tem qualquer cabimento!
Como eu disse, o PCP, verdade seja dita, pelo menos, é coerente e assume a sua posição. Eu já disse que não concordamos com ela, mas admitimo-la. É a perspectiva do PCP, é uma perspectiva correcta.
A vossa perspectiva, Srs. Deputados do Partido Socialista - permitam-me -, não é coerente, nem condizente com os princípios programáticos que defendem, com o direito ao livre associativismo e com aquilo que é a realidade dos sistemas a este nível, que temos que respeitar: que é a não ingerência do Estado neste tipo de actuação. Aliás, essas ingerências, o Sr. Deputado sabe-o muito bem, aconteciam no antes 25 de Abril, e foi com isso que tanto nós como vocês quisemos acabar.

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Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Deputado Barbosa de Oliveira inscreveu-se para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Eugénio Marinho. Porém, o Sr. Deputado Eugénio Marinho não tem tempo para responder, nem, aparentemente, o Sr. Deputado Barbosa de Oliveira tem tempo suficiente para conceder, porque apenas dispõe de 2 minutos, concedidos por Os Verdes.
Sr. Deputado Barbosa de Oliveira, que dividir irmãmente o seu tempo, ficando cada um com 1 minuto?

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Sr. Presidente, conto com a sua magnanimidade.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, eu não posso abrir uma excepção.

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Nem 1 minuto?

O Sr. Presidente: - Nesse caso, o Sr. Deputado Barbosa de Oliveira fica com 2 minutos e o Sr. Deputado Eugénio Marinho com 1 minuto.
Tem a palavra, Sr. Deputado Barbosa de Oliveira.

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Eugénio Marinho, para poupar tempo dispenso-me de vocativos.
Sr. Deputado Eugénio Marinho, gostava de lhe dizer o seguinte: o senhor confunde o livre associativismo com os escolhos e os empecilhos que certos patrões - não digo os empregadores, digo certos patrões - colocam a esse mesmo livre associativismo. E se o meu camarada Marcelo Curto - e há-de fazer-me a justiça de entender que eu o conhecia melhor - porventura aqui pudesse estar estaria em desacordo consigo, porque aquilo que hoje verificamos é que (a prática demonstrou isso mesmo) essa bondade foi ultrapassada e corroída por esses empecilhos e escolhos que certos patrões colocam aos sindicatos.
E, ao contrário do que o Sr. Deputado disse, devo dizer-lhe que o nosso projecto de lei criará condições para a dinamização da contratação colectiva! É que esses mesmos patrões, sabendo que o trabalhador, se não houver acordo, pode complementar e individualmente pedir que as quotas sindicais sejam descontadas no seu salário, não têm vantagem nenhuma em não acordar um sistema de cobrança de quotas, nos exactos termos que a contratação colectiva prevê.
Por isso, Sr. Deputado, gostava de lhe perguntar, em primeiro lugar, se, eventualmente, conhece quem dirige o Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado - se conhece, leia o parecer! -, e, em segundo lugar, se, eventualmente, conhece alguns Deputados da sua bancada que dirigem determinadas correntes sindicais - e, se conhece, pergunte-lhes qual é a sua opinião acerca das quotizações sindicais. Depois, se calhar, constatará que quem está errado é o Sr. Deputado e quem vai votar contra a posição de muitos sindicalista do seu partido é o Sr. Deputado! Mas esse é um problema seu!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Eugénio Marinho, que dispõe de 1 minuto.

O Sr. Eugénio Marinho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Barbosa de Oliveira, ao contrário do que disse, os senhores estão é a dar uma machadada forte na contratação colectiva!

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Não estamos, não!

O Orador: - Estão, estão! Vocês estão é a dar uma machadada forte na contratação colectiva, provavelmente porque não lhes convém!
Sr. Deputado, V. Ex.ª não me convence, nem me convencerá nunca, de que os princípios que aqui li, que eram defendidos, à data, pela vossa bancada, estão desactualizados!

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Só os burros é que não mudam!

O Orador: - Vocês, pelos vistos, mudam muitas vezes!

Risos do PSD.

Diz V. Ex.ª, Sr. Deputado Barbosa de Oliveira, que há determinados patrões que não deixam…

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Há! Há!

O Orador: - Sr. Deputado, mas eu nisso estou de acordo. Repare que eu estou de acordo que, havendo acordo entre as entidades patronais e os sindicatos, se penalize quem não cumprir!
Quanto ao crime de abuso de confiança, o senhor sabe muito bem que já hoje os tribunais condenam as entidades patronais nesse crime, porque havendo retenção das quotizações, elas têm de ser entregues aos sindicatos! Veja a jurisprudência, Sr. Deputado!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, confesso que depois de ouvir esta última troca de palavras entre os Srs. Deputados Barbosa de Oliveira e Eugénio Marinho fiquei mais preocupado do que quando aqui cheguei. Isto porque eu vinha aqui tentar perceber uma coisa e agora percebi uma coisa mais complicada, ou seja, parece que - cuidado! - há partidos que se voltam contra os sindicalistas,…

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Eu não disse isso!…

O Orador: - … porque haverá sindicalistas que mandam nos partidos, partidos que mandam nos sindicatos, sindicatos que são correias de transmissão de partidos…

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O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Que grande confusão!

O Orador: - Coisas que eu nem imaginava que pudessem acontecer no nosso país!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Que grande confusão!

O Orador: - Que coisa complicada isto é!…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - O melhor é acabar com os sindicatos!

O Orador: - Eu cheguei aqui, Sr. Deputado Lino de Carvalho, à procura de outra coisa, ou seja, de perceber o que é que motiva o Partido Socialista e o Partido Comunista, dois partidos que não são «mandáveis» por sindicatos, que não mandarão em nenhum sindicato…

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Jamais!

O Orador: - Nunca tal coisa lhes passaria pela cabeça!…

Risos do CDS-PP.

O que é que, no fundo, motiva estes partidos a virem aqui com uma proposta cuja intenção tem de se compreender? Eu tentei entender, quando o Sr. Deputado Vicente Merendas, por quem tenho muita consideração e que é meu colega na Comissão de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, há pouco disse: o que é preciso é respeitar os sindicatos, eles são muito importantes para o progresso do País e, portanto, nós, Partido Comunista Português, fazemos uma proposta para ajudar os sindicatos.
Eu aí percebi qualquer coisa e, na parte das boas intenções, até posso estar de acordo. Nós também consideramos que a existência de sindicatos livres - não a existência de sindicatos, porque, como sabemos, já os havia antigamente -, de sindicatos independentes, de um sindicalismo forte, de liberdade dos trabalhadores em relação a esses mesmos sindicatos, de participação ou de não participação, tudo isso são elementos essenciais e fundamentais de uma sociedade que queremos democrática e plural.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Com isso estamos de acordo. Mas não nos esquecemos que o princípio da liberdade sindical, transcrito no artigo 55.º da Constituição da República Portuguesa e desenvolvido na própria lei sindical, é um princípio de liberdade negativa e de liberdade positiva, ou seja, de direito de os trabalhadores participarem, de estarem nos sindicatos se assim quiserem, mas também de, com igual direito, não estarem ou não contribuírem para esses sindicatos se assim entenderem.
Portanto, repito, a liberdade sindical contempla estes dois aspectos: a liberdade positiva, a de estar, e a liberdade negativa, a de não estar, se for essa a vontade.

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Nenhum dos projectos nega isso!

O Orador: - Isto leva-me a reflectir sobre a tal intenção dos projectos de lei, Sr. Deputado Barbosa de Oliveira. Dei por mim a pensar - e acho que não estarei muito enganado, mas digam-me se estiver - que, de facto, isto tem a ver com um outro problema, ou seja, com aquilo em que os sindicatos - e eu não vou usar a expressão «frouxo», que tem estado na moda mas que é desagradável - têm estado assim mais para o fraco e que é o decréscimo que tem havido do seu peso e da sua influência.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Isso é verdade!

O Orador: - O sindicalismo tem estado fraco.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - É verdade!

O Orador: - E o sindicalismo em Portugal, ao contrário do que acontece noutros países, tem muito pouca capacidade económica. De facto, em países como a Inglaterra, a Alemanha e tantos outros, fazem-se greves de duração ilimitada, com sindicatos fortes a suportar e a apoiar os grevistas. Ora, como em Portugal isso não acontece, temos as «greves-trombose», as «greves-relâmpago», as «greves de estrangulamento», e por aí fora. Isto porque, em Portugal, o sindicalismo está fraco.

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - E os senhores querem estrangular ainda mais!

O Orador: - Não, Sr. Deputado Barbosa de Oliveira. Não é nada disso.
Estes projectos de lei levam a quê? Levam a que o trabalhador passe a utente. Requer um serviço à empresa e diz: «façam lá o favor, retenham-me aí o dinheiro das quotas». Não as do clube mas as do sindicato, pois as do clube toda a gente paga voluntariamente, não há problema. O futebol não está fraco, fracos estão os sindicatos!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Alguns!

O Orador: - «Alguns». Faço-lhe a justiça de reconhecer que são alguns, Sr. Deputado Octávio Teixeira.
Portanto, o trabalhador pede para fazerem o favor de reter a sua quota e entregarem o dinheiro ao sindicato. No fundo, é isto que pede o trabalhador.
Portanto, a empresa passa a cobrador e, pelo que ouvimos aqui, até de cobranças difíceis, é quase um «cobrador do fraque». Ou seja, a empresa, como não consegue cobrar as quotas para os sindicatos, passa a cobrador e os sindicatos são os beneficiários dessa mesma cobrança.
É um sistema que talvez venha a resolver o problema da fraqueza do sindicalismo, se bem que a fraqueza do sindicalismo tenha a ver com a inadequação da intervenção sindical aos novos temas e aos novos problemas dos trabalhadores. Esse é que é o problema! Porque, no momento da globalização, no momento em que se põem problemas tão graves de mobilidade e de flexibilidade em re

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lação ao trabalho, no momento em que se põe o problema das fusões de empresas, que aqui já discutimos - e aí até tivemos muitos pontos de concordância e de convergência -, os sindicatos «perderam o pé» quanto a esses temas. E é por isso que se torna difícil cobrar quotas, é por isso que os trabalhadores não pagam essas quotas.
E sabem por que é que os sindicatos não percebem esses novos temas, Srs. Deputados? Eu sou um observador da realidade sindical e creio que, se calhar, eles não percebem os novos temas porque são sempre os mesmos.

O Sr. Vicente Merendas (PCP): - Isso também acontece nas associações empresariais!

O Orador: - Também acontece nas associações empresariais, mas, olhando para os sindicatos, vemos lá sempre os mesmos, há tanto tempo, sem nenhuma capacidade de controlo ou de renovação, a dizerem as mesmas coisas. Se eles são os mesmos há tantos anos, como é que hão de perceber os novos problemas?

Aplausos do CDS-PP.

Se calhar é esse o problema!
Quanto aos projectos de lei em concreto, porque já tenho pouco tempo, direi apenas que o projecto do PS é inócuo, pouco inovador e pouco interessante, inclusivamente na parte que o Sr. Deputado Artur Penedos destaca, a das sanções.
Sr. Deputado, as sanções já existem, estão previstas hoje em dia! Está prevista a gravidade em matéria contra-ordenacional e o crime de abuso de confiança também, e é aplicável, obviamente! De resto, é o que acontece com as contribuições para a segurança social, como sabe. O regime é aplicável exactamente nos mesmos termos e, portanto, não há aí nenhuma novidade de fundo, ao contrário do que os senhores dizem.
O projecto do PCP tem exactamente esse mesmo problema e, portanto, não há nessa matéria sancionatória novidade alguma. Porém, creio que há uma gravidade maior: na minha opinião, instituir como princípio único este sistema de cobrança por parte da empresa por vontade do trabalhador, vai claramente contra um princípio fundamental, que já não é o da liberdade sindical mas, sim, o da autonomia colectiva. É que estes direitos são de facto direitos colectivos e exercê-los no quadro da autonomia colectiva e regulá-los nestes termos atenta contra essa autonomia colectiva.
Repare, Sr. Deputado, que não há lei alguma que seja tão clara como a que diz que o Estado não pode intervir na organização e no funcionamento dos sindicatos. Porquê? Para assegurar - e todos o sabemos - a liberdade sindical. Os senhores, ao criarem por lei um sistema único de cobrança, estão a intervir por lei e por vontade do Estado na autonomia e na organização dos sindicatos e é por isso que este projecto não é aceitável, Srs. Deputados.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Rosas.

O Sr. Fernando Rosas (BE): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, gostava de contribuir para esta discussão contando-vos uma pequena história da minha investigação, há uns anos, sobre as realidades económicas na indústria têxtil do norte.
Durante essa investigação, encontrei, em relação aos anos 40, um conjunto de entidades patronais requerendo à Polícia de Vigilância e Defesa do Estado, como então se chamava, que interviesse na sua área e nas suas empresas contra a tentativa subversiva de constituir sindicatos. A Polícia de Vigilância foi às empresas e fez um relatório aos empregadores dizendo-lhes: os trabalhadores que nós interrogámos acerca destas actividades estão a tentar constituir sindicatos nacionais, ou seja, sindicatos corporativos. E os patrões respondiam: mas nós nem desses cá queremos.
Ou seja, só foi possível, num regime de falta de liberdade de associação e de total desequilíbrio entre o capital e o trabalho, manter o sindicalismo com sindicatos corporativos do Estado, de filiação obrigatória, com quotas obrigatoriamente cobradas, porque não havia, de todo em todo, nenhuma espécie de relação de igualdade.
Essa cultura de hostilização à existência de sindicatos e, ainda por cima, à cobrança de quotas, está extremamente enraizada na cultura empresarial portuguesa, vendo-se com desconfiança, em geral, a pura actividade sindical e a cobrança das quotas.

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Por isso, em democracia, houve que mudar estas coisas. Quando se fala em livre associativismo, parece que, dentro de uma empresa, sobretudo nos tempos actuais, de flexibilização de desregulamentação do trabalho, em que há uma verdadeira ofensiva implícita às organizações de trabalhadores nas empresas, há uma relação de igualdade nas empresas. Mas não há!
É evidente que, sobretudo numa situação como a actual, o arbítrio do patronato, exactamente tentando punir, intimidar e desincentivar quem se sindicaliza, é uma realidade perfeitamente actual e que todos conhecem. E foi por isso que em democracia se tentou, numa primeira lei, criar um sistema em que se estabelecesse uma relativa imposição quanto à cobrança das quotas, em defesa dos direitos sindicais, que é a parte mais fraca. O Estado tem de intervir em favor dos sindicatos porque, na relação empresarial, sobretudo nos dias de hoje, a parte mais fraca é a que trabalha para o empregador.
Ora, essa lei foi insuficiente e ao que se assiste hoje na maioria das empresas é à violação aberta desses normativos. Há pressões de todos os lados, de norte a sul do País, para não sindicalizar, para não cobrar quotas, tornando-se necessário tomar alguma medida legislativa nesse sentido.
Portanto, o Bloco de Esquerda considera que os dois projectos de lei são bons, identifica-se com ambos e entende que eles devem ser aprovados e baixar à comissão especializada.

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Por outro lado, o BE considera também que falar, a propósito disto, de livre associativismo é querer deixar as mãos livres a uma situação de abuso e de prepotência patronal, frequentíssima em muitas empresas, à qual o Estado, naturalmente, em nome do equilíbrio das relações de trabalho, tem de pôr cobro. E, para isso, há que haver regulamentação.
Entendemos que os trabalhadores devem poder, por livre vontade, descontar as suas quotas sindicais e que os empregadores que não cumprirem esse normativo devem ser punidos, nos termos em que os projectos propõem e de uma forma equiparável aos descontos para a segurança social.
Sabemos também que há dificuldades, que o mundo de hoje, de desregulamentação, de neoliberalismo, de flexibilização, é difícil para a actividade sindical e para a luta dos trabalhadores em geral, mas entendemos que, sendo essa uma parte que deve ser particularmente protegida pelo Estado, porque respeita aos direitos sociais, ao direito de os mais fracos se defenderem, naturalmente que o Estado deve tomar medidas no sentido de proteger e assegurar o funcionamento das associações sindicais, no sentido da defesa dos seus direitos.
O Estado não é neutro neste aspecto, porque também as relações entre o capital e o trabalho nesta matéria não são iguais, são desiguais. Nesse sentido, o Estado tem uma orientação: ou a favor de uns ou a favor de outros! Naturalmente que os senhores apoiam a gritaria que o patronato fez contra esta matéria e é natural que os partidos à esquerda apoiem o contrário, apresentando os projectos de lei que apresentaram e com os quais estamos de acordo.

Aplausos do Deputado do PS Barbosa de Oliveira.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O actual regime de cobranças e entrega de quotas sindicais tem encontrado muitas dificuldades de aplicação, nomeadamente porque a lei em vigor faz depender essa cobrança de um acordo entre as entidades patronais e as associações sindicais.
Um outro obstáculo que se levanta é o facto de haver algumas dúvidas quanto à conformidade do tratamento informático desses dados com o texto constitucional. Os projectos que hoje estamos a discutir procuram remover alguns dos obstáculos que se sentem com a aplicação da lei em vigor.
Assim, no que diz respeito à necessidade de acordo entre as associações patronais e sindicais, tanto o projecto de lei do Partido Socialista como o do Partido Comunista o dispensam. Ainda que o Partido Socialista continue a prever tal acordo no seu projecto, acaba por dispensá-lo, uma vez que abre a possibilidade de a cobrança poder ser efectuada desde que o trabalhador o solicite à entidade empregadora.
É uma medida, na nossa perspectiva, sensata, que acaba por resolver alguns problemas que resultam da actual lei e que têm a ver também com a questão da prova. É que há decisões de tribunais que, não conseguindo provar a existência desse acordo, acabam por concluir que as entidades patronais não têm a obrigação de fazer a cobrança e de a devolver aos sindicatos.

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - Por outro lado, a previsão constante do n.º 3 do artigo 5.º do projecto de lei do PCP poderá representar a chave para a resolução de alguns litígios que se têm verificado e que têm a ver com registos informáticos.
Na verdade, algumas empresas - que, aliás, se encontravam vinculadas por acordo, ao abrigo da actual lei - têm declarado, unilateralmente, deixar de praticar este sistema, pelo facto de o processamento do desconto da quotização ser informatizado, o que, na leitura dessas empresas, poderá colidir com o n.º 3 do artigo 35.º da Constituição. Os Verdes entendem que a solução apontada no projecto de lei do PCP vem pôr termo aos litígios ou às dúvidas que, sobre essa matéria, se levantavam.
Assim e apesar das diferenças entre os dois projectos, Os Verdes consideram que eles podem ser um bom contributo para a boa aplicação do regime que hoje está a ser discutido e vão, portanto, votar a favor de ambos.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Trabalho e Formação.

O Sr. Secretário de Estado do Trabalho e Formação (António Dornelas): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero começar esta minha intervenção por saudar as iniciativas que estão na origem deste debate, isto é, o projecto de lei n.º 346/VIII, do Partido Socialista, e o projecto de lei n.º 395/VIII, do Partido Comunista Português, que vêm propor a revogação do regime jurídico da cobrança de quotizações sindicais, presentemente regulado pela Lei n.º 57/77, e o consequente estabelecimento de um novo sistema de cobrança de quotas sindicais.
Permanecendo inteiramente fiel aos princípios da liberdade sindical de que se orgulha, volvidos mais de 20 anos sobre a entrada em vigor da Lei n.º 57/77, também o Governo entende que está chegado o momento de repensar as soluções então adoptadas.
Na verdade, o regime de cobrança de quotas actualmente em vigor, por fazer depender a possibilidade de dedução das referidas quotas na retribuição do trabalhador da existência de acordos previamente estabelecidos entre a entidade empregadora ou associação patronal e os sindicatos, limita o número de trabalhadores que podem usufruir desta forma facilitada de pagamento de quotas sindicais.

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Muito bem!

O Orador: - Ora, à luz do relacionamento actualmente existente entre sindicatos e associações patronais, ilustrado, para citar um só exemplo, na participação de uns e de outros na concertação social, não parece que se justifique a manutenção daquela restrição.

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Assim, salvaguardados, como estão, em qualquer das iniciativas legislativas, os imperativos decorrentes da liberdade sindical, o Governo não tem razões para se opor a que o actual sistema de cobrança de quotas sindicais seja aperfeiçoado e se adopte uma solução que garanta o princípio da igualdade de oportunidades aos trabalhadores, que permita a todos a utilização de uma forma simplificada do pagamento de quotas sindicais.
Neste sentido, ambos os projectos em discussão propõem a possibilidade de o sistema de dedução do valor da quota à retribuição pela entidade empregadora e a sua entrega aos sindicatos passar a incluir a possibilidade de tal desconto ter por base, única e exclusivamente, a vontade expressa do trabalhador. Dispensando, em determinados casos, o acordo prévio entre a entidade empregadora ou associação patronal e o sindicato, facilita-se, manifestamente, a utilização deste sistema de cobrança de quotas, que tenderá, assim, a fazer aumentar o universo dos utilizadores, o que se julga positivo.

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Muito bem!

O Orador: - Não posso, no entanto, deixar de transmitir aos Srs. Deputados duas notas sobre a iniciativa do PCP.
Em primeiro lugar, não se compreendem as vantagens quanto à proposta de eliminação da possibilidade, actualmente existente, do sistema de cobrança resultar do acordo celebrado entre o empregador ou a associação patronal e o sindicato, mesmo quando a previsão da cobrança de quotas resultar de manifestação inequívoca da vontade do trabalhador.
Em segundo lugar, embora se compreendam as preocupações subjacentes, julga-se que é excessivamente limitativa, senão mesmo perniciosa, a proposta de apenas permitir o tratamento informático da filiação sindical para uso exclusivo no sistema de cobrança das quotas.
Convém não esquecer, Srs. Deputados, que, ao impedir a aplicação do tratamento informático da filiação sindical para determinadas condições de trabalho - como, por exemplo, o cálculo das remunerações da convenção colectiva aplicável a trabalhadores sindicalizados ou os créditos de horas de dirigentes e de delegados sindicais -, se poderá, eventualmente, prejudicar de forma indirecta direitos já adquiridos e procedimentos em curso nalgumas empresas que nada têm de discriminatório.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo está ciente da necessidade de sancionar todo e qualquer comportamento ilegítimo contrário ao cumprimento do sistema de cobranças e entrega de quotas sindicais, designadamente no que toca à eventualidade de situações de não dedução ou de dedução da quota à retribuição e não entrega da quantia retida pelas entidades empregadoras aos sindicatos, matéria sobre a qual os Srs. Deputados optarão, estou certo, pela melhor solução jurídica.
Por isso, creio tão possível quanto desejável que os Srs. Deputados atinjam um amplo consenso nesta matéria, tão importante para um Estado de direito.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como não há mais inscrições, está encerrado o debate dos projectos de lei n.os 346/VIII e 395/VIII. Já foi requerido - é um direito - que sejam votados hoje, uma vez que a sua discussão terminou antes das 18 horas.
Porém, antes de iniciarmos o período de votações, o Sr. Secretário da Mesa vai dar conta de vários relatórios e pareceres da Comissão de Ética.

O Sr. Secretário (José Reis): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Comando Metropolitano de Lisboa da Polícia de Segurança Pública, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Ricardo Castanheira (PS) a prestar depoimento, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (José Reis): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela 2.ª Secção do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, a Comissão de Ética emitiu parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Castro de Almeida (PSD) a prestar depoimento, por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (José Reis): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 1.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Fundão, a Comissão de Ética emitiu parecer no sentido de autorizar a Sr.ª Deputada Maria do Carmo Sequeira (PS) a prestar depoimento, por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (José Reis): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 1.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Fundão, a Comissão de Ética emitiu parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Carlos Lavrador (PS) a prestar depoimento, por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (José Reis): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 1.º Juízo do Tribunal Judicial da

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Comarca de Fundão, a Comissão de Ética emitiu parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro (PS) a prestar depoimento, por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (José Reis): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 1.º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa, a Comissão de Ética emitiu parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Luís Patrão (PS) a prestar depoimento, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (José Reis): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 1.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Ourém, a Comissão de Ética emitiu parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Mário Albuquerque (PSD) a prestar depoimento, como testemunha, no âmbito dos autos em referência, em audiência marcada para o dia 25 de Junho de 2001, pelas 14 horas, e, em caso de adiamento, para o próximo dia 29 de Junho de 2001, pelas 9 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Como o próximo parecer se refere a um caso de incompatibilidade, agradeço que o Sr. Secretário da Mesa leia na íntegra o relatório e parecer da Comissão de Ética.

O Sr. Secretário (José Reis): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o parecer n.º 10/VIII - Pedido de apreciação de compatibilidade do exercício de função de administrador de sociedade apresentado pelo Deputado Machado Rodrigues (PSD) é do seguinte teor:

Relatório e Parecer

1. O Sr. Deputado Machado Rodrigues solicitou a apreciação a apreciação da compatibilidade do exercício de funções de Deputado com as de membro do Conselho de Administração da empresa Liscount, S.A., empresa titular de um contrato de concessão para exploração do terminal de contentores de Alcântara, em Lisboa.
A resposta à questão colocada passa pela apreciação da natureza da actividade da empresa e do contrato de concessão celebrado.
2. Da análise dos estatutos, verifica-se que a Liscount - Operadores de Contentores, S.A. é uma sociedade anónima que tem por objecto «todas as operações portuárias relativas à carga e descarga de contentores, incluindo a estiva de navios contentorizados, e ainda qualquer outra actividade de operação portuária prevista na lei».
De referir que o licenciamento da actividade desenvolvida decorre do Decreto-Lei n.º 348/86, de 16 de Outubro, que estabelece as bases gerais a que devem obedecer os estatutos orgânicos das administrações dos portos, de onde se destaca:
«Artigo 1.º (Sistema portuário nacional e organismos
portuários)
1. Para efeitos do presente diploma, entende-se por sistema portuário nacional o conjunto de infra-estruturas, instalações e equipamentos que permitem a movimentação de fluxos de passageiros e de mercadorias entre o transporte terrestre e o transporte marítimo (…).
Artigo 6.º (Trabalho portuário)
1. As operações portuárias de carga e descarga de embarcações de comércio, bem como a movimentação de mercadorias provenientes ou destinadas ao transporte marítimo nos armazéns e terraplenos interiores aos limites das margens do domínio público marítimo e das áreas sob jurisdição das administrações e juntas autónomas dos portos, serão executadas por empresas licenciadas para o efeito, (…)»
Por sua vez, da apreciação do contrato de concessão do direito de exploração de um terminal portuário de contentores em Alcântara, celebrado em 18 de Dezembro de 1984 entre a Liscount, S.A. e a AGPL - Administração do Porto de Lisboa, procede:
A AGPL era, à data da celebração do contrato de concessão, um instituto público dotado de personalidade jurídica de direito público e de autonomia administrativa, financeira e patrimonial cujo estatuto orgânico foi transformado pelo Decreto-Lei n.º 336/98, de 3 de Novembro, em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos passando a designar-se APL - Administração do Porto de Lisboa, S.A.;
De acordo com o decreto-lei atrás referido «a actuação da APL, S.A., no uso dos poderes de autoridade referidos no diploma, rege-se por normas de direito público»;
O contrato de concessão confere à Liscount, S. A. «o direito de explorar em regime de serviço público, o terminal de contentores de Alcântara por um prazo de 20 anos renovável por um ou mais períodos de 5 anos»;
Em 19 de Dezembro de 1997, o contrato de concessão foi objecto de um aditamento que entre outras disposições estabeleceu «a prorrogação do prazo da concessão, no termo do período de vigência inicial, por dois novos períodos de 5 anos».
3. Analisando o que se encontra consagrado no Estatuto dos Deputados, designadamente na alínea a) do n.º 5 do artigo 21.º, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 3/2001, de 23 de Fevereiro, é incompatível com o exercício de Deputado à Assembleia da República a «titularidade de membro de órgão de pessoas colectiva pública e, bem assim, de órgão de sociedades de capitais maioritária ou

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exclusivamente públicos ou de concessionários de serviços públicos».
Resulta do exposto que a Liscount, S.A. é, sem margem para dúvidas, concessionária de um serviço público, pelo que existe incompatibilidade entre o exercício do mandato de Deputado e as de membro de um órgão de gestão daquela empresa.
Assim e em conclusão, o parecer é o seguinte:
1. Existe incompatibilidade entre o exercício das funções de Deputado à Assembleia da República e as de membro do Conselho de Gestão da sociedade Liscount - Operadores de Contentores, S.A..
2. Deve o Deputado Machado Rodrigues ser notificado para cumprir o n.º 7 do artigo 21.º do Estatuto dos Deputados.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos agora entrar no período de votações, votando, em primeiro lugar, na generalidade, a proposta de lei n.º 71/VIII - Altera o artigo 31.º e adita os artigos 31.º-A a 31.º-F da Lei n.º 29/82, de 11 de Dezembro (Lei da Defesa Nacional e das Forças Armadas).

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Esta proposta de lei baixa à 3.ª Comissão.
Passamos agora à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 14/VIII - Altera o regime de exercício de direitos pelos militares (alteração do artigo 31.º da Lei de Defesa Nacional) (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, do CDS-PP, de Os Verdes e do BE e a abstenção do PSD.

Este projecto de lei baixa igualmente à 3.ª Comissão.
Srs. Deputados, vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 394/VIII - Altera a Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas (CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, este projecto de lei baixa também à 3.ª Comissão.
Passamos, agora, à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 428/VIII - Capacidade eleitoral dos militares e agentes militarizados dos quadros permanentes em efectividade de serviço e exercício dos cargos políticos para que sejam eleitos (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e abstenções do PCP, de Os Verdes e do BE.

Este projecto de lei baixa igualmente à 3.ª Comissão.
Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 429/VIII - Alteração do artigo 31.º da Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e abstenções do PCP, de Os Verdes e do BE.

O projecto de lei baixa à 3.ª Comissão.
Passamos à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 430/VIII - Associativismo militar (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e abstenções do PCP, de Os verdes e do BE.

Srs. Deputados, também este projecto de lei baixa à 3.ª Comissão.
Passamos à votação do projecto de resolução n.º 126/VIII - Sobre avaliação, informação e disciplina da actividade de extracção de areias em meio hídrico (Os Verdes).

Submetido à votação, verificou-se um empate, tendo votado a favor o PSD, o CDS-PP, o PCP, Os Verdes e o BE e contra o PS.

Srs. Deputados, dada a situação de empate, vamos proceder a uma segunda votação do projecto de resolução n.º 126/VIII.

Submetido à votação, verificou-se novo empate, tendo votado a favor o PSD, o CDS-PP, o PCP, Os Verdes e o BE e contra o PS.

Srs. Deputados, tendo-se registado novo empate, o projecto de resolução foi rejeitado, ao abrigo do artigo 107.º do Regimento.
Passamos à votação do projecto de resolução n.º 136/VIII - Reposição de um sistema de fiscalização e de uma base de dados batimétrica para acompanhar a evolução dos leitos dos principais cursos de água (CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PCP, do CDS-PP, de Os Verdes e do BE e a abstenção do PS.

Vamos votar agora a proposta de substituição, apresentada pelo PS, do texto relativo ao projecto de resolução n.º 80/VIII - Sobre a instalação de um sistema de controlo de tráfego marítimo (Os Verdes).

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS e do PSD, votos contra do CDS-PP, de Os Verdes e do BE e a abstenção do PCP.

É a seguinte:

Os pontos 1, 2 e 3 passam a ter a seguinte redacção:
1. Até ao final do ano 2001 que Portugal esteja dotado de um sistema de controlo de tráfego marítimo (VTS - portuário);
2. Que o Orçamento do Estado para 2002 já contenha uma dotação de meios financeiros para instalar e pôr em

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funcionamento em todo o território nacional aquele sistema;
3. Que até 2004 os sistemas VTS - costeiro e VTS - portuário e os Sistemas de Informação e Gestão de Tráfego sejam implementados.

O Sr. Presidente: - Assim sendo, encontra-se prejudicado o projecto de resolução n.º 80/VIII, não é verdade?

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Sr. Presidente, não está prejudicado o projecto de resolução, porque esta proposta de substituição que acaba de ser aprovada apenas se refere ao adiamento da instalação de determinado equipamento, contra o qual votámos, mas o resto do texto do projecto de resolução continua em vigor, obviamente.

O Sr. Presidente: - Então, vamos votar, pois basta que um Sr. Deputado queira proceder à votação para assim se fazer.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, penso que a confusão resulta de a nossa proposta ter sido classificada como sendo de substituição quando, na verdade, se trata de uma proposta de alteração.
Se tivesse sido uma proposta de substituição, julgo, Sr. Presidente, que não bastaria que um Sr. Deputado requeresse o que quer que fosse porque, então, sim, o texto do projecto de resolução teria ficado prejudicado, mas, tratando-se de uma proposta de alteração, não fica prejudicado.
Portanto, aprovámos a alteração e, a seguir, iremos votar o projecto de resolução com as alterações entretanto aprovadas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tendo havido um Deputado a pronunciar-se no sentido de que não há coincidência total entre os dois textos, o projecto de resolução sempre teria de ser votado. Ou o prejuízo é total e, então, não se vota o texto, ou é parcial e, então, pode votar-se.
Vamos, pois, proceder à votação do projecto de resolução n.º 80/VIII - Sobre a instalação de um sistema de controlo de tráfego marítimo (Os Verdes).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, peço-lhe muita desculpa, mas há aqui uma confusão que tem a ver com estas votações anteriores e tem de ficar tudo clarificado, embora eu julgue que não vou dizer nada de novo.
É que votámos uma proposta de alteração no sentido de alterar as datas contidas no projecto de resolução apresentado por Os Verdes. Assim, quando passámos à votação do projecto de resolução, naturalmente que, em resultado da aprovação da proposta de alteração apresentada pelo PS, já estavam alteradas as datas que constavam do texto original.
Portanto, não há qualquer contradição. As datas que passam a vigorar são as que constam da proposta de alteração apresentada pelo PS e que foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado.
Vamos passar à votação de um requerimento, apresentado por Deputados do PS e do PSD, de baixa à Comissão de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, pelo prazo de 15 dias, sem votação, do projecto de resolução n.º 116/VIII - Institui o Dia Nacional de Prevenção e Segurança no Trabalho (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do PCP, de Os Verdes e do BE e a abstenção do CDS-PP.

Passamos, agora, à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 346/VIII - Estabelece e regula os sistemas de cobrança de quotas sindicais - revoga a Lei n.º 57/77, de 5 de Agosto (PS).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, de Os Verdes e do BE e votos contra do PSD e do CDS-PP.

Este projecto de lei baixa à 9.ª Comissão.
Passamos à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 395/VIII - Novo sistema de cobrança e entrega de quotas sindicais (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, de Os Verdes e do BE e votos contra do PSD e do CDS-PP.

Este projecto de lei baixa igualmente à 9.ª Comissão.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Sr. Presidente, agradecia que V. Ex.ª esclarecesse os Deputados visto que esteve a decorrer uma eleição…

O Sr. Presidente: - Tem toda a razão.
Peço aos Srs. Deputados que ainda não exerceram o direito de voto na eleição que decorria na Sala D. Maria que já o não façam, pela razão simples de que, por ter sido

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invocada uma irregularidade na elaboração do boletim de voto, foi suspensa a votação, que se repetirá num dos próximos dias de reunião plenária.
Pedem-me ainda que informe que o processo relativo às apreciações parlamentares n.os 38/VIII (PCP), 39/VIII (CDS-PP) e 41/VIII (PSD), todas referentes ao Decreto-Lei n.º 56/2001, de 19 de Fevereiro, chegou ao fim em sede de comissão, tendo sido rejeitadas todas as propostas de modificação na especialidade relativas ao referido diploma.
Srs. Deputados, vamos dar início à discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.os 338/VII - Define o número máximo de alunos por turma no ensino público não superior (PSD) e 376/VIII - Define o número máximo de alunos por turma no ensino não superior (BE).
Na sequência de um acordo estabelecido em conferência de líderes e apesar de o projecto de lei apresentado pelo PSD ter dado entrada em primeiro lugar, começo por dar a palavra ao Sr. Deputado Fernando Rosas para apresentar o projecto de lei do seu grupo parlamentar.
Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Fernando Rosas (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Hoje, em jornada de protesto, estudantes na Sobreda da Caparica enfrentaram acção violenta de forças policiais e, através dela, a intimidação do Governo como resposta à sua acção de sensibilização e protesto.
De uma forma bastante generalizada no País, os estudantes destes níveis de ensino desde ontem que alertam contra o estado de coisas a que chegou o ensino básico e secundário, contra a falta de condições das escolas e a ausência de medidas concretas, para além de uma certa retórica em torno da escola inclusiva que nunca se percebe exactamente o que é e o que propõe. Mas para o que se passou esta manhã na escola da Sobreda, seguramente, não creio que o Governo encontre boas palavras.
Este ambiente reforça, de alguma maneira, o sentido do projecto de lei apresentado pelo Bloco de Esquerda e que hoje, aqui, se discute, juntamente com outro apresentado pelo PSD.
Pretende-se, com o nosso projecto de lei, propor um conjunto de medidas muito concretas para permitir a adopção de um número máximo de alunos nas turmas dos diferentes níveis do ensino básico e secundário. Evidentemente que temos consciência de que esta proposta não esgota tudo o que é necessário ser feito neste domínio, que está longe de responder sequer ao essencial, mas é um princípio assente numa solução prática, imediata, com efeitos óbvios e que o Governo, estranhamente, tem sido incapaz de adoptar.
Ao contrário do projecto de lei do PSD, a nossa preocupação não discrimina os estudantes do ensino público em relação àqueles que cumprem os seus estudos nas escolas privadas. Propomos um regime comum. Entendemos que as medidas que aqui se discutem são determinadas pela relação possível dos professores com as turmas a seu cargo, pelos conhecimentos traduzidos pela equação pedagógica da qualidade de ensino e das condições da cada escola para a poder concretizar.
Estamos certos que o Estado deve impor regras claras à iniciativa privada no âmbito da educação, e essas passam certamente pela limitação do número de alunos por turma, no ensino público ou no privado, em nome da qualidade e de limites pedagogicamente possíveis para serem concretizados pelos agentes de ensino.
Por outro lado, o projecto do PSD, ao propor um limite de 28 alunos nas turmas do 2º e 3º ciclos do ensino básico e do ensino secundário, parece-me que mais não faz do que garantir generosamente as médias já existentes. A aprovação deste projecto, aliás, bastante coincidente com o pensamento do Governo na matéria, em nada me parece que fosse alterar a realidade, mas certamente servirá o propósito da ofensiva educativa, que o meu colega David Justino tão galhardamente comanda neste Plenário em nome do seu partido.
Pelo contrário, os sinais que nos chegam quer dos estudantes, quer dos professores, que só da região de Lisboa aqui deixaram, esta manhã, mais de 5 000 assinaturas, sugerem um redimensionamento das turmas muito próximo dos limites propostos pelo BE, em nome do combate ao insucesso, à exclusão, a situações potenciadoras de indisciplina e violência na escola, pela qualidade do ensino e pela defesa do emprego dos professores, condição não menos importante para o funcionamento do sistema.
Garantida na geração anterior a democratização do acesso a estes níveis de ensino - mesmo tendo certamente efeitos perversos, deficiências a apontar e contradições que a relativizam -, estamos certamente no tempo de poder democratizar o seu uso.
A quebra demográfica, para o bem e para o mal, coincide e pode favorecer esta luta pela qualidade, pela optimização dos recursos materiais e humanos existentes e pela valorização das qualidades e do esforço dos professores.
Trata-se de uma medida simples, que, estamos em crer, o sistema poderá absorver facilmente, sem traumas, sem buracos financeiros nem rupturas, mesmo que elas sejam anunciadas por certas vozes de mau agoiro. Muitas escolas já praticam estes limites, muitos educadores já concretizaram esta relação com as suas turmas, uma relação mais personalizada, que permite um acompanhamento mais individualizado, que dá mais possibilidades aos docentes para acompanhar os alunos com maiores dificuldades de aprendizagem, que resulta numa escola mais humana, mais democrática, com mais capacidade de inclusão e que oferece melhores condições de trabalho a estudantes e a professores.
Esta relação é, aliás, obviamente reconhecida pelo Estado ao atribuir limites inferiores aos gerais para as escolas classificadas nos termos dos TEIP (Territórios Educativos de Intervenção Prioritária) ou, na mesma lógica, ao reduzir as turmas que incluam jovens com necessidade de apoios educativos especiais. Mas a realidade das escolas e dos jovens traduz-se numa enorme diversidade de carências sem que a classificação da deficiência dos alunos ou o estigma da interioridade do contexto geográfico da escola possam garantir todas as situações, ou mesmo a maioria delas.
Saibam, Srs. Deputados, que um professor com horário completo no 2º e 3º ciclos do ensino básico e no ensino secundário pode ter até sete turmas, que as médias de alunos por turma nas escolas das maiores cidades, no seu

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interior e nas periferias em crescimento rondam, quando não superam, os 28 alunos por turma e que a média de alunos no 1º ciclo é de 25 crianças em cada turma. Uma simples operação de multiplicação fará os Deputados e Deputadas desta Câmara que se queiram prestar a este exercício chegar à conclusão da impossibilidade de estes professores poderem sequer saber de memória os nomes de todos os seus alunos, quanto mais de os poder compreender, acompanhar, ensinar e guiar, como compete a um docente dos dias de hoje.
Talvez este seja um assunto considerado lateral, mas estamos convictos de que se trata de uma lateralidade bastante central para muitas, talvez para a maioria das escolas e dos agentes de ensino deste país.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Seguidamente, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Cesário.

O Sr. José Cesário (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As iniciativas do PSD para o sector da educação desenvolvem-se em torno de três questões: qualidade, exigência e racionalização.
Mais qualidade significa mais meios pedagógicos para as escolas, mais e melhor formação para os professores, maior ligação entre os mais variados membros da comunidade educativa, estabilização dos quadros; em suma, mais condições para uma educação de sucesso.
Mais exigência traduz-se em maior transparência do processo de avaliação, mais preparação para a competitividade do dia-a-dia, maior responsabilização nas relações entre Estado, sociedade e escola e assumpção da autonomia de forma partilhada entre escola e comunidade educativa.
Maior racionalização significa o fim da duplicação e triplicação de serviços de administração educativa com idênticas funções, menos clientelismo nas colocações especiais, diminuição clara das dispensas de componente lectiva, maior responsabilização das administrações aos mais variados níveis, redistribuição orçamental, permitindo gastar menos em administração e mais na escola.
Entendemos, assim, no PSD, que para o Estado poder exigir mais da escola, tem de começar por exigir mais a si próprio.
Para alterarmos radicalmente um sistema que tem cada vez maior dificuldade em responder às necessidades da sociedade de hoje, temos de pedir mais das escolas, das famílias, das comunidades em geral e, igualmente, do Estado, que, nos diversos níveis de administração, tem de se responsabilizar mais, de dar mais atenção, de ser mais capaz para poder pedir mais aos outros.
O Governo socialista tem feito exactamente o contrário! Delapida meios com um clientelismo partidário sem precedentes, destinados a satisfazer meia dúzia, desprezando os milhões que devia servir. Adopta opções organizativas perfeitamente ilógicas e desligadas da realidade, destinadas também elas a servir «cliques» e grupos a nível local. Impõe modelos pedagógicos ultrapassados às escolas, pretendendo que elas flexibilizem currículos e programas, sem as ter preparado para tal e sem ter avaliado com clareza as necessidades concretas e as experiências efectuadas. É incapaz de clarificar o que quer do ensino superior, alternando posições sobre o ensino politécnico, a autonomia universitária, a Universidade Católica, de acordo com a vontade de cada protagonista ou o público de cada momento ou circunstância.
É um Governo incapaz, que põe os nervos em franja aos Deputados do grupo parlamentar que o têm de suportar, «fazendo das tripas coração» para apoiar aquilo que «não tem pés nem cabeça».
Tenham paciência, Srs. Deputados socialistas! Nós compreendemos bem o vosso sacrifício. Por isso, temos aqui trazido diversas soluções alternativas, propostas credíveis para os senhores poderem discutir opções mais sérias do que as do vosso Governo. Fizemo-lo e vamos continuar a fazê-lo! Ontem, foram projectos relativos à qualidade do processo educativo, à transparência e à credibilização da avaliação, à difusão da língua e da cultura portuguesa no estrangeiro! Hoje, trata-se de uma proposta concreta, que aponta para a diminuição do número de alunos por turma do ensino público não-superior.
Trata-se, no essencial, de saber se a Assembleia da República quer ou não que situações pontuais de saturação excessiva e inadmissível de turmas, sobretudo em escolas de zonas de grande aglomeração populacional, continuem a existir.
No momento em que nos propomos informatizar e modernizar escolas e processos educativos, não podemos aceitar a continuação de situações degradantes com turmas de mais de 30 alunos em escolas dos 2º e 3º Ciclos do ensino básico e do ensino secundário, o que põe seriamente em causa o sucesso dos resultados finais.
Quem alguma vez deu aulas sabe bem que é extraordinariamente difícil obter resultados minimamente aceitáveis em turmas com a dimensão referida. As poucas excepções verificadas encontram-se em meia dúzia de escolas particulares, por regra para clientela extremamente seleccionada e sempre à custa de complementos educativos caríssimos que quase individualizam este tipo de ensino e impossíveis de aplicar no ensino público.
Por outro lado, também no 1º ciclo do ensino básico é necessário dar um sinal de atenção, acabando com a quase obrigatoriedade de fabricar alunos com dificuldades educativas especiais para justificar a diminuição das respectivas turmas e, posteriormente, pôr um ponto final na excessiva acumulação de vários anos de escolaridade na mesma sala de aulas.
Trata-se, assim, de dar mais condições para o desenvolvimento de um ensino de qualidade, pelo que a Assembleia da República não pode deixar de se pronunciar sobre tal questão.
Por isso, Sr.as e Srs. Deputados, estamos disponíveis para todas as alterações possíveis a este projecto, apresentadas em sede de especialidade, que permitam eventuais aperfeiçoamentos, mas sempre de acordo com o princípio da alteração clara da situação actual.
É assim um desafio apresentado à Assembleia da República que esta iniciativa traduz. Um desafio que, é claro, se dirige essencialmente aos Deputados socialistas. A

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responsabilidade de uma eventual reprovação é vossa. Trata-se de saber se os senhores nos querem acompanhar neste esforço. Se querem ou não que as situações extremas de hiperdimensionamento de turmas em diversas escolas, sobretudo na periferia de grandes centros urbanos, se mantenham.
Saibamos ser responsáveis, exigindo de nós próprios, para depois podermos exigir aos outros!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao orador, os Srs. Deputados Teresa Coimbra e Fernando Rosas.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Coimbra.

A Sr.ª Teresa Coimbra (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: De facto, tinha uma pergunta para fazer ao Sr. Deputado José Cesário, só que ele fez um balanço dos projectos que o PSD tem proposto ao longo deste tempo e, por isso, vou centrar-me mais no projecto que analisei.
Gostaria de dizer ao Sr. Deputado José Cesário que não é mais favorável do que eu em relação à diminuição do ratio aluno/professor, e suponho que essa é também a posição do Partido Socialista.

O Sr. José Cesário (PSD): - Ah! Supõe?!…

A Oradora: - Não suponho, tenho a certeza!
Todos sabemos, principalmente aqueles que foram ou que são ainda professores, que um menor número de alunos por professor se traduz em maior sucesso, embora pense que este resulta também da capacidade de se estabelecerem boas relações entre professores e alunos e também de factores de natureza social e económica, que urge minorar.
É evidente que os alunos pertencentes a uma certa camada social estão, à partida, mais apoiados para alcançar os seus objectivos, como o Sr. Deputado José Cesário fez entender. Mas devo dizer que o problema do ratio aluno/professor se coloca mais em equação nos grandes centros urbanos. Não posso, no entanto, deixar de dizer que a situação tem vindo melhorar, no nosso país, nos últimos anos, que se encontra, hoje, numa posição favorável em relação aos nossos parceiros europeus.
Hoje, no 1.º ciclo, o ratio aluno/professor não vai além de 12,8, sendo um dos melhores da Europa. A partir de 2000, 2001, o número máximo previsto de alunos por turma será de 28 e o mínimo de 25, sendo que, quando houver alunos deficientes, esse número passa para 20.
Teremos de conjugar as situações de escolas grandes com as pequenas, com o número de pessoal não docente e pessoal técnico, e também não devemos esquecer que, na nossa revisão curricular, está previsto o estudo acompanhado por dois professores por turma e que a área-projecto envolve também dois professores por turma. Há ainda o problema da educação visual e tecnológica, que fica com um ratio aluno/professor de 12, 15.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se. Portanto, tenho de dar a palavra, para responder, ao Sr. Deputado José Cesário.

A Oradora: - Então, se me dá licença, Sr. Presidente, vou colocar a questão.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Já o devia ter feito, Sr.ª Deputada.

A Oradora: - A questão que gostaria de ver respondida prende-se com o facto de não se descortinar na vossa inciativa uma nova visão quanto ao conceito da relação professor/aluno/escola. Isto é, gostaria de saber se estão disponíveis para, em sede de comissão, deixarem de olhar para a escola como se ela fosse composta por compartimentos incomunicáveis entre si e evoluírem para um novo referencial na relação entre Estado, professor, técnicos e professores.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Como o Sr. Deputado José Cesário pretende responder em conjunto, tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Fernando Rosas.

O Sr. Fernando Rosas (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Serei muito breve, porque o tempo é escasso.
Em primeiro lugar, gostaria de dizer que a situação no País, nesta matéria, tende para uma evolução favorável, sobretudo por uma causa má, que é a evolução demográfica negativa. Ou seja, estão a nascer menos pessoas e, portanto, a situação demográfica favorece a situação, sendo esta uma boa altura para tomar esta medida. Mas, do ponto de vista da situação dos professores, ela é má, porque o desemprego entre professores está a aumentar rapidamente, sendo também esta mais uma razão para se tomar esta medida, que seria, simultaneamente, boa do ponto de vista pedagógico e penso que também do ponto de vista social.
A pergunta que gostaria de fazer é muito simples. Em primeiro lugar, por que é que o PSD restringe o dispositivo ao ensino público? Seguramente, no ensino privado não há tantos problemas mas, mesmo assim, por que é que este normativo não há de ser comum?
Em segundo lugar, o artigo 2.º do vosso projecto aponta para os 28 alunos nos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e secundário, sendo esta uma medida em que traduz pouco progresso, pois é o que já se passa neste momento, já que rondamos esta média e, portanto, não é uma grande inovação.
Gostaria ainda de dizer que, da nossa parte, estamos disponíveis para, em sede de especialidade, aprofundarmos e discutirmos a adopção de uma medida, que é parcial, mas que é de uma certa urgência em termos das necessidades do ensino.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Cesário, dispondo para tal de 5 minutos.

O Sr. José Cesário (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Coimbra, estava a ver que não havia pergunta, mas houve, finalmente!
Fiquei satisfeito por verificar que V. Ex.ª concorda, no essencial, com o projecto e que nem sequer rebateu as

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críticas que fiz ao Ministério da Educação. Fico satisfeito, conheço o seu pensamento sobre a problemática geral da educação e sei bem que está comigo, que está connosco em muitas das críticas que fizemos.

O Sr. António Braga (PS): - Não é verdade!

O Orador: - Aquilo que nos trás aqui, Sr. Deputada, esta iniciativa, serve também - e tenho de recordar isto a todos os Srs. Deputados - para cumprir, por exemplo, uma recomendação recente da Inspecção-Geral da Educação, que diz expressamente ao Ministério da Educação que há que redefinir o quadro legal sobre a constituição de turmas, e estranha-se que, nomeadamente no ensino básico, haja excesso de turmas com crianças com dificuldades educativas especiais.
É preciso alterar tudo isto, porque, é evidente, todas as pessoas sabem - sabe quem está no terreno e quem está nas escolas - que o sistema actual não serve, Srs. Deputados. Portanto, trata-se de saber se a Assembleia quer ou não dar este sinal ao Governo, se quer ou não pôr ordem em algo que está completamente desordenado, completamente desregrado.

O Sr. António Braga (PS): - Não é verdade!

O Orador: - Para além disto, a disponibilidade que temos para encarar, em sede de comissão, toda a filosofia de relação da escola com a comunidade, Sr. ª Deputada, é total, sob o seguinte princípio: temos de diminuir claramente o número de alunos por turma para as situações extremas. Como disse o Sr. Deputado Fernando Rosas, é este o momento para o fazer, porque, de facto, fruto da diminuição da natalidade, somos confrontados, na prática, com a superação de muitos problemas que tínhamos no passado. Mas ainda temos muitos regimes duplos, por exemplo no 1.º ciclo, ainda temos turmas de 32 e 33 alunos em várias escolas do ensino secundário, conhecemo-las perfeitamente…

O Sr. António Braga (PS): - Isso é residual!

O Orador: - Se é residual, vamos acabar com os resíduos, Sr. Deputado!
Portanto, do que se trata é de ultrapassar estas situações.
O Sr. Deputado Fernando Rosas pergunta porquê aplicar este regime só ensino público e não também ensino privado. Sr. Deputado, em nome do direito e da liberdade de ensinar e de aprender, porque quem escolhe o ensino privado é quem o quer frequentar.

O Sr. Fernando Rosas (BE): - Mesmo o ensino privado é do interesse público!

O Orador: - Nós recusamo-nos a impor padrões, limites deste tipo às escolas privadas, mas temos de regulamentar as escolas públicas até ao limite, sob o princípio que nos trás aqui, que é o da qualidade do sistema. Isto não é dirigido só aos professores mas à escola no seu todo e, fundamentalmente, aos alunos, que temos de servir.
O Sr. Deputado Fernando Rosas disse que baixar para 28 alunos era pouco. Sr. Deputado, actualmente são 34 no 2.º e 3.º ciclos e no ensino secundário! Propomos baixar para 28 eV. Ex.ª diz que é pouco! Bom, então o que não seria noutras circunstâncias…
Mas vamos em frente, a proposta que fazemos é a de encontrar um caminho para ultrapassarmos esta situação. É essa a proposta que vos fazemos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado da Administração Educativa.

A Sr.ª Secretária de Estado da Administração Educativa (Maria José Rau): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No quadro actual da organização escolar, a unidade turma ainda representa um espaço importante de desenvolvimento da aprendizagem. Contudo, essa matéria deve ser abordada, como o Governo o vem fazendo, no contexto de dois eixos fundamentais: as condições de aprendizagem - aliás, já houve várias intervenções sobre este assunto - e o ordenamento da rede escolar.
No preâmbulo dos dois projectos de lei aqui em apreciação foca-se, com justeza, muito embora parcialmente, alguns aspectos do fenómeno do insucesso escolar, da exclusão e até mesmo da violência em meio escolar.
Os projectos de lei propostos pelo PSD e pelo Bloco de Esquerda, na nossa perspectiva, assentam numa visão redutora e pouco consistente. Com efeito, no projecto do Bloco de Esquerda pretende-se estabelecer a norma a partir de uma situação experimental e de excepção que são os Territórios Educativos de Intervenção Prioritária (TEIP).
Por outro lado, ambos os projectos equacionam a questão de uma forma pedagogicamente ultrapassada e demasiado linear. A verdadeira questão, hoje em dia, não está no número de alunos por turma mas na relação número de alunos por professor ou, melhor ainda, na relação entre o número de alunos e os agentes educativos de que a escola dispõe.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se compararmos os valores do ratio alunos/professor com os valores equivalentes observados nos outros países da União Europeia, verifica-se que Portugal se situa numa posição correspondente à média comunitária. Colocando sem ambiguidade a questão na relação número de alunos/professor, chamo a vossa atenção para a forma como o Governo está a responder às preocupações que convosco pretende partilhar, no que se refere à melhoria das condições de aprendizagem que combatem o insucesso escolar, a exclusão e a violência nas escolas.
Destaco as medidas mais importantes empreendidas pelo Governo e que se integram nos dois grandes eixos que acima referi.
Relativamente às condições de aprendizagem, em primeiro lugar, permito-me salientar que foi precisamente a preocupação do combate ao insucesso e à exclusão que levou

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o XIII Governo a criar, em escolas de zonas sociais particularmente problemáticas, os Territórios Educativos de Intervenção Prioritária. Tal medida visa encontrar respostas, dentro da escola, que contribuam para a redução e superação dos reflexos daqueles fenómenos, medidas que, quando claramente identificadas, permitem a sua generalização a todas as situações idênticas.
A segunda medida que pretendo referir visa a criação na escola de equipas educativas, constituídas por pessoal docente e pessoal não docente, que apoiem e complementem a acção dos professores, considerados como o pilar em que assenta a competência técnica da escola.
As carreiras do pessoal não docente a afectar às escolas foram negociadas com os sindicatos representativos de cada sector; foram depois negociados e publicados os conteúdos funcionais das várias categorias, e, neste momento, está formalizada a proposta relativa à sua formação.
O passo seguinte será propor, ainda este mês, em função da dimensão e características de cada escola, por carreira, o número de unidades a afectar a cada uma delas.
Estas carreiras, aprovadas em 1999, abrangem um vasto leque de técnicos superiores de educação, de técnicos superiores de serviço social, de psicólogos, de técnicos e técnicos superiores de biblioteca e documentação, de técnico profissional de laboratório e a de assistentes da acção educativa, entre outros.
Esta medida inovadora e fundamental visa responder à complexidade dos problemas que se colocam na vida de uma escola e que não se resolvem pela redução do número de alunos por turma.
A terceira medida, que se insere na Estratégia Europeia de Lisboa, visa a qualificação das pessoas através do desenvolvimento de novas metodologias de aprendizagem ao longo da vida. O Governo tem investido na utilização sistemática de recursos pedagógicos, assentes nas novas tecnologias de informação e de comunicação, com vista à promoção de grupos em situação ou em risco de exclusão. A distribuição de computadores e a formação de professores têm sido os pilares fundamentais.
A quarta medida refere-se à organização curricular do ensino básico e à revisão curricular do ensino secundário. No ensino básico serão implementadas três novas áreas: de projecto, de estudo acompanhado e de formação cívica. O ensino nestas duas primeiras áreas será assegurado por uma equipa de dois professores que irão trabalhar em simultâneo com uma mesma turma. Esta medida implica uma nova organização das escolas que, para além destes horários de docentes, a mais, gerem um crédito global de horas a atribuir a todos os professores. Assim, os órgãos de gestão das escolas procuraram envolver, da forma mais adequada, o conjunto de profissionais e o crédito horário de que passarão a dispor em actividades de apoio educativo ou de enriquecimento curricular.
Finalmente, e como quinta medida, ainda no âmbito deste primeiro eixo que se refere às condições de aprendizagem, gostaria de dar conhecimento de uma medida recentemente adoptada pelo Ministério da Educação de constituir turmas com um número máximo de 28 alunos - esse aspecto já está assegurado. Esta medida será aplicada já no próximo ano lectivo em todos os níveis de ensino, sendo certo que continuam a constituir excepções as turmas que integram alunos deficientes ou ainda as turmas do 1º ciclo do ensino básico que integrem os quatro anos de escolaridade dos vários alunos.
Um outro aspecto que aqui ainda não foi focado em nenhuma das intervenções é a questão do reordenamento da rede escolar. O Ministério da Educação está a desenvolver um esforço significativo com os parceiros sociais - e aqui saliento especialmente as autarquias - para, no âmbito do reordenamento da rede educativa, corrigir alguns dos erros estruturais da nossa oferta escolar, oferta que ainda não se adaptou à modernização da rede de acessibilidades dos transportes.
De facto, regista-se ainda um elevado número de escolas demasiado pequenas (52%). Ou seja, 4 449 escolas do 1º ciclo do ensino básico têm menos de 19 alunos - abaixo ou igual à proposta - e 26% têm menos de 10 alunos . Este aspecto é particularmente grave pelo isolamento social e cultural que afecta alunos e professores, com evidentes e notórios efeitos negativos no seu desempenho escolar. Estas escolas, Srs. Deputados, têm menos alunos, mesmo muito menos, que o número máximo de alunos por turma proposto nos dois projectos de lei.
O Ministério da Educação tem combatido o insucesso e o abandono escolar antes de concluída a escolaridade obrigatória através de medidas muito mais amplas e diversificadas, que não se limitam a uma simples redução do número de alunos por turma.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Lá vêm os currículos alternativos!

A Oradora: - Não se pode deixar de reconhecer, por outro lado, que apesar da situação ter melhorado, não se deveu à baixa de natalidade - refiram-se os anteriores governos do PSD e do PS -, mas ao grande aumento da construção escolar. Neste momento a situação é estável e existem boas condições para a implementação de certas medidas.
Queria ainda referir um aspecto importante, ou seja, reconhecer que, apesar da situação ter melhorado significativamente, ainda existem escolas excessivamente grandes, com a agravante de muitas delas estarem localizadas em zonas socialmente degradadas. Nestes casos, para além da construção de novos equipamentos educativos, incluem-se as medidas que já referi relativamente às condições de aprendizagem.
Para concluir, e voltando ao tema central deste debate - a redução do número de alunos por turma -, analisem-se os dados que constam do relatório da abertura deste ano lectivo, elaborado pela Inspecção-Geral da Educação, que contrariam totalmente os dados que o Deputado Fernando Rosas referiu. E não se trata de uma previsão; os dados têm em conta o que foi observado nas escolas, e julgo que foram distribuídos, há algum tempo, a todos os grupos parlamentares.
No 1.º ciclo do ensino básico, o valor médio da relação aluno/professor é de 12,8, valor substancialmente mais baixo que o da média dos países da OCDE, que se situa nos 17,3.

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Já no 2.º ciclo do ensino básico o rácio é de 8,8 alunos por professor e no 3.º ciclo do ensino básico de 11,2 alunos por professor. Estes são dados nacionais, mas constam do relatório do Banco Mundial sobre a educação em Portugal.
Para terminar, gostaria de insistir no facto de termos estado a falar da norma nacional (mesmo que seja, como deve ser, a da relação média professor/aluno) para o universo de todas as escolas, e, na nossa opinião, qualquer norma nacional deve ser clara e deve permitir, de forma também clara e transparente, a sua adequação às diversas situações do País. Para citar as que são mais significativas relativamente a esta questão, destaco duas situações extremas: por um lado, as zonas de fraca concentração demográfica e, por outro, as zonas problemáticas das periferias das cidades. Não é só um problema das grandes cidades, como por exemplo Lisboa, neste momento a situação é igualmente grave nas zonas com baixa taxa de população.
Gostaria ainda de frisar que o que está em causa não é o aumento de encargos que a redução do número de alunos por turma proposta nos dois projectos de lei acarretaria. O que está verdadeiramente em causa é decidir quais as medidas que devem ser adoptadas e que, apesar de envolverem, quaisquer delas, encargos financeiros vultuosos, dão garantias de contribuírem para um ensino de qualidade e para a melhoria das condições de aprendizagem, nomeadamente as que os projectos de lei referem e que são preocupação de todos nós: o sucesso escolar dos alunos, uma escola inclusiva, um ambiente educativo solidário e calmo, a que acrescentaria o empenhamento, o bem-estar e a excelência profissional das equipas educativas das escolas.
Não tenho dúvidas de que as medidas que referi se inserem neste enquadramento. Mas já tenho as maiores dúvidas, porque, que eu conheça, não existe nenhum estudo ou experiência que o comprovem, que possa ser o abaixamento do número de alunos por turma - quando Portugal, neste domínio, está tão bem situado a nível europeu - que venha assegurar um melhor desempenho quer dos alunos quer da escola.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos à Sr. Secretária de Estado, inscreveram-se os Srs. Deputados Luísa Mesquita e Fernando Rosas.
Tem a palavra a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado, a minha pergunta vai ser muito rápida, até porque o tempo de que dispomos é muito pouco.
Queria só perguntar à Sr.ª Secretária de Estado se a sua intervenção se baseia no anteprojecto de despacho conjunto que o Ministério da Educação está para publicar, e que é um retrocesso muito grande relativamente ao despacho que pretende alterar, o despacho n.º 112. Ou seja, pergunto-lhe se tem que ver com aquelas alterações que esquecem, na constituição das turmas, e, portanto, automaticamente naquilo que tem que ver com a redução dos alunos, a vertente psico-pedagógica, para a transformar numa vertente exclusivamente de natureza educativa, que deixa ter em atenção as opiniões do conselho pedagógico passando a competir à direcção executiva aplicá-los num quadro de uma eficaz gestão de recursos humanos e materiais existentes e no respeito pelas normas constantes do presente despacho.
Gostaria também de saber se a sua intervenção se baseia na alteração ao despacho n.º 112 - que está presente no novo despacho que está para publicação -, que diz que nas turmas do 1.º ciclo do ensino básico que incluam alunos dos quatro anos de escolaridade (tal qual como acontece desde a década de 20 ou de 30 neste país, mas que tem que ver com a situação de antes do 25 de Abril, e que se pensava ser uma alteração positiva a propor pelo Governo do Partido Socialista) estes ficarão integrados na mesma sala e se, nesse caso, e só nessa situação, a turma poderá ter 20 alunos, não podendo incluir, no caso de ensino especial, mais do que dois alunos com necessidades educativas especiais.
Será que a Sr.ª Secretária de Estado também se baseou, na sua intervenção, no facto de ter feito desaparecer as turmas de escolas de intervenção prioritária, presentes no despacho n.º 112, e que desaparecem neste despacho, considerando que também já não são importantes nem necessárias para o combate ao insucesso?
Agora, e em defenitivo, o Governo do Partido Socialista aposta exclusivamente na marginalidade e na exclusão, que tem como pressuposto os currículos alternativos.
Gostaríamos que a Sr.ª Secretária de Estado esclarecesse estas nossas dúvidas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Rosas.

O Sr. Fernando Rosas (BE): - Sr. Presidente, Sr. Secretária de Estado, a minha razão é maior que o tempo que tenho para lhe colocar a pergunta.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Que ego tão grande! Presunção e água benta…!

O Orador: - Creio que a Sr.ª Secretária de Estado foi, ou é, profissionalmente, inspectora do ensino. Devo dizer-lhe que não deve ir há muito tempo a uma escola da periferia de Lisboa ou de Setúbal para ver se o problema é ou não o de haver alunos a mais nas turmas e para o perguntar aos professores, que sofrem a violência e a contestação em turmas de 28, 30 miúdos!
Pergunte-lhes se o problema se deve ou não ao facto de terem alunos a mais nas turmas! Pergunte-lhes se esta solução que propomos - que é uma solução obviamente parcial, mas de urgência - é redutora ou se tem de estar à espera de «não sei quê» para ser aplicada!
A questão que se coloca é a de saber se a medida urgente que propomos é ou não incompatível com as outras

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medidas que seguramente se têm de propor. A meu ver não é, e é uma medida absolutamente urgente!
Pergunte aos sindicatos, pergunte aos professores que têm cinco, seis, sete turmas de 28 miúdos, pergunte aos professores que são agredidos, pergunte aos professores que são insultados, pergunte aos professores que não conseguem dominar as turmas, pergunte aos professores que estão nos psiquiatras se o problema é ou não o de de haver alunos a mais nas turmas!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado da Administração Educativa.
Como a Sr.ª Secretária de Estado já não dispunha de tempo para responder, o Grupo Parlamentar de Os Verdes cedeu-lhe 2 minutos.

A Sr.ª Secretária de Estado da Administração Educativa: - Relativamente à intervenção do Deputado Fernando Rosas - vou começar por ordem inversa -, é claro que reconhecemos que as zonas periféricas das cidades são zonas com problemas e que há um conjunto de respostas que se têm de assumir. E aí a taxa de natalidade não funciona completamente.
Conforme disse na minha intervenção, penso que não existe só uma solução, mas um conjunto de soluções, concretamente as que referiu há pouco relativamente aos TEIP. Essas soluções aplicam-se a zonas com dificuldades e problemáticas que não são zonas generalizadas. Na vossa proposta propõem uma norma nacional, e depois haverá - também já o referi na minha intervenção - situações específicas que são tratadas com a redução, como aqui foi referido, na relação professor/aluno ou com outras medidas, nomeadamente com a existência de outros profissionais, nessas zonas e nessas escolas, que são essenciais. O problema das equipas educativas é uma resposta, em muitos casos, muito mais adequada do que, necessariamente, descer a relação do número de aluno por turma.
Relativamente à Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, direi que não assentei a minha intervenção nessa proposta, e, como julgo que sabe, porque a conhece, acabou hoje o período em que se ouviram os parceiros. Hoje teremos o conjunto das respostas dos vários parceiros, que envolve autarquias e os sindicatos dos professores, e depois veremos a solução.
Relativamente a algumas questões que referiu, eu não as reconheço, portanto não lhe posso responder.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Curioso!

A Oradora: - Como pode calcular, conheço a proposta porque veio da minha Secretaria de Estado, mas estou a dizer que não a reconheço pela maneira como apresentou a questão.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Ah, bom!

A Oradora: - Há também uma questão que colocou que não percebi claramente. É evidente que, neste momento, um professor do 1.º ciclo com quatro turmas tem, ou pode ter, de acordo com a legislação, 25 alunos ou mais. O que se fez nesta proposta, considerando que essa é uma situação pedagogicamente mais difícil de tratar, foi dar um tratamento idêntico à situação da inclusão das...

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - O limite dos TEIP desapareceu?

A Oradora: - Os TEIP são uma situação que não é a normalidade, têm uma regulamentação própria. O despacho normativo refere a norma geral.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Mas no anterior vinha!

A Oradora: - Está bem, mas quanto a mim erradamente.

Vozes do PCP: - Ah!

A Oradora: - Um despacho que refere uma norma geral não deve referir as normas excepcionais para casos concretos. Nos TEIP não é a relação de número professor/aluno que baixa. Baixa isso e um outro conjunto de factores.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Pinho.

O Sr. António Pinho (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Os projectos de lei apresentados pelo PSD e pelo BE visam estabelecer o número máximo de alunos por turma no ensino não superior.
Os objectivos a alcançar por estes projectos são similares, diferindo apenas nos números apresentados. Em ambos os casos, o apoio da bancada do CDS-PP será claro, pois parece-nos que mais importante do que determinar aqui o número exacto de alunos por turma, trabalho que necessariamente terá de ser realizado em sede de especialidade na respectiva Comissão, é o facto de esta Câmara dar um sinal claro e inequívoco em direcção àquela que é uma aspiração dos mais variados agentes envolvidos no ensino.
De facto, contactados sindicatos, professores, alunos, pais e inclusive as direcções de estabelecimentos de ensino, quer públicos quer particulares, as opiniões são unânimes no sentido de a redução de número de alunos por turma ser uma medida extremamente válida, visando uma melhoria da qualidade do ensino ministrado aos nossos alunos. Esta medida permitirá uma maior rentabilização pedagógica do trabalho do próprio professor e dos meios colocados ao seu dispor.
O rendimento de uma aula dirigida a 24 ou 25 alunos não é comparável ao obtido quando, numa sala de aula, se concentram 32, 33 ou 34 alunos, como permite a actual lei. A rentabilização de meios informáticos, bibliográficos, equipamentos desportivos, laboratórios, etc., é, sem dúvida, muito mais efectiva com grupos de alunos mais reduzidos e equilibrados, onde a utilização destes meios é uma realidade e não apenas um mero dado estatístico.

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É óbvio que esta rentabilidade é apurada segundo critérios única e exclusivamente pedagógicos, e tendo em vista o objectivo global e final, que é o verdadeiro sucesso dos alunos, resultante de uma efectiva qualidade do ensino ministrado e não de um mero sucesso nominal ou estatístico, que esconda, por detrás de números simpáticos e politicamente «cor-de-rosa», uma realidade bem mais negra que depois nos vai chocando em inquéritos de rua, concursos de televisão ou nos anos de estudo que se seguem, nomeadamente no ensino superior.
Certamente que aos critérios pedagógicos aqui referidos serão contrapostos critérios de ordem económica e financeira. Uma escola com 600 alunos apresentará, em princípio, melhores resultados de gestão com 20 turmas de 30 alunos do que com 30 turmas de 20 alunos. Mas qual será o verdadeiro objectivo de uma escola? Será essa a principal função a que se destina? Serão esses os critérios mais importantes? Parece-nos que aqui há uma clara opção política.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Neste caso, os números são propositadamente redondos para facilitar as contas - não entrei em pormenores, obviamente que são meramente indicativos -, mas sem dúvida que nos podem fazer reflectir na utilidade e validade dos projectos aqui apresentados. O que está em causa é uma clara questão de prioridades e opção política: ou se avança no sentido que estas iniciativas apontam - e não falo em números concretos, mas aponto apenas nesse sentido - ou continuamos presos única e exclusivamente a critérios economicistas, lamentando-nos no futuro das opções estratégicas que tomámos no passado.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Veja-se o caso da Irlanda, no qual se fala várias vezes, claramente o país que mais cresce na União Europeia e cujo sucesso é atribuído unanimemente ao investimento que foi feito nas pessoas em detrimento de outros «sectores» escolhidos por países como Portugal.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Talvez seja essa a grande diferença entre o que é estrutural e o que é conjuntural, entre o curto e o longo prazo ou entre o que é realmente imprescindível e o que é apenas importante, ou, até, muito importante.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Concluo, reiterando o que ficou expresso no início da intervenção. Mais do que os números que um ou outro projecto de lei apresentam, pois pensamos que a virtude estará algures entre ambos e que terá naturalmente de ter em conta outros vectores como o equilíbrio e adequação às diversas realidades das escolas do nosso país, parece-nos que é importante dar um sinal daquele que é o caminho a seguir.
Alguns pormenores de ordem prática e algumas dificuldades, nomeadamente na imediata aplicação destes projectos, não devem servir de capa a uma eventual inviabilização de uma medida que é consensual entre os vários intervenientes no sistema de educação.
Depois de uma reforma curricular que teima em avançar contra tudo e contra todos, estamos certos de que o bom senso imperará e de que o caminho apontado por estes projectos merecerá o assentimento desta Assembleia.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Também para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Botelho.

A Sr.ª Margarida Botelho (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os projectos de lei hoje em discussão são propostas válidas e oportunas, que o PCP saúda. No entanto, consideramos que são ambos demasiado minimalistas face ao problema que enfrentamos.
O insucesso e o abandono escolares, em todos os níveis de ensino, são realidades graves com que os sucessivos governos não têm lidado bem, nem resolvido. O número de alunos por turma é uma questão muito importante, que deve ser objecto de reflexão e de análise, mas não de forma isolada, como aqui nos é colocado. Temos de encarar a constituição das turmas como um dos elementos do correcto funcionamento das escolas, a par do número de professores, da estabilidade do corpo docente e não docente, do número de alunos por professor, das condições materiais de cada escola, do seu financiamento, do envolvimento social e económico, etc..
Merece destaque especial a necessidade de reforçar o apoio pedagógico acrescido dentro e fora da sala de aula, apostando numa escola verdadeiramente inclusiva. Tanto mais que o Governo do PS diminuiu as verbas nesta área, coloca menos professores, aplica currículos alternativos, criticados por toda a comunidade educativa, numa política de exclusão inaceitável.
Globalmente, consideramos que ambos os projectos representam ganhos em termos de qualidade para o sistema educativo, ao permitir inclusivamente maior inovação pedagógica.
O projecto de lei do Bloco de Esquerda parece-nos melhor fundamentado e mais correcto, no que diz respeito aos limites máximos de alunos por turma. Faz, porém, uma associação entre turmas com número excessivo de alunos e grandes centros urbanos que não é absolutamente correcta.
Numa visita recente às escolas de Bragança, concelho insuspeito de ser grande centro urbano ou de lidar com muita população em idade escolar, os conselhos executivos das três escolas secundárias e a Federação Regional das Associações de Pais colocaram com muita veemência ao Grupo Parlamentar do PCP a preocupação com o número excessivo de alunos por turma. As direcções das escolas referiam a existência de orientações concretas da Direcção Regional de Educação do Norte (DREN) no sentido de não fazer turmas pequenas. Chegamos ao caricato de haver três escolas secundárias da capital de um dos distritos mais desertificado e envelhecido do nosso país com turmas em média de 30 estudantes, sobrando salas, com

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professores com horário zero, às quais a DREN não autoriza a existência de mais turmas, com menos estudantes.

Vozes do PCP: - É a modernidade!

A Oradora: - O PCP entregou, atempadamente, na Mesa da Assembleia um requerimento ao Ministério da Educação no sentido de esclarecer esta situação inadmissível, que não tem outro nome que não seja o de critérios economicistas.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Ainda não obtivemos qualquer resposta, o que, de resto, vai sendo norma do Ministério.
Quanto ao projecto de lei do PSD, inclui um pressuposto e uma disposição com os quais não podemos estar de acordo. Ao centrar a fundamentação do seu projecto de lei nas questões da violência, dos guetos, da criminalidade e da insegurança, o PSD pisa terreno muito delicado.
É certo que todos os estudos e todas as práticas mostram que turmas mais pequenas são propensas a menos indisciplina, em sentido lato. Mas a redução do número de alunos deve ser, na nossa opinião, colocada como uma das formas de contribuir para o sucesso escolar e educativo das crianças e dos jovens e não como uma medida mais controladora da vida na escola.
A disposição com a qual não estamos de acordo é a de que este projecto de lei se aplique, apenas, ao ensino público.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Então e o particular? Propõe o PSD que o Estado se demita das suas responsabilidades para com os estudantes do ensino privado? Ou considera que o Estado não deve intervir?
Penso que é claro para todos que estes projectos de lei, a serem aprovados, exigem da Assembleia da República uma grande capacidade fiscalizadora, de tal forma a sua aplicação depende do empenhamento e da vontade política do Governo nesta matéria, sob pena de se protelar este que é, sem dúvida, um problema. É que já passaram muitos meses desde que o Sr. Ministro da Educação reconheceu, perante o Conselho Nacional de Educação, a desadequação do limite de 34 alunos e o despacho conjunto n.º 112 dos Gabinetes dos Secretários de Estado dos Recursos Educativos e dos Ensinos Básico e Secundário, datado de 1993, e que actualmente regula o que estamos hoje aqui a discutir. Exige que o Governo invista claramente na educação, quer em termos de instalações, quer de pessoal. Estará o Governo disposto a isto? Aparentemente, não! A minha camarada Luísa Mesquita já colocou as questões da nova alteração que aí virá.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para o PCP, a educação deve ser um vector estratégico para o desenvolvimento do nosso país, atendendo à diversidade e à multiplicidade dos processos educativos e formativos, das realidades sociais e económicas e dos interesses e expectativas das crianças e dos jovens.
O Estado deve assegurar um sistema educativo da mais alta qualidade para todos, que seja um factor de elevação do nível cultural da população, da formação integral das pessoas, da afirmação de uma participação activa, criadora e democrática. A redução do número de alunos por turma é um passo importante, certamente não o único, para uma escola com mais igualdade e com mais qualidade. Assim, votaremos favoravelmente ambos os projectos de lei.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Rosalina Martins, igualmente para uma intervenção

A Sr.ª Rosalina Martins (PS): - Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Antes de começar a minha intervenção, gostaria de dizer ao Sr. Deputado Fernando Rosas que não só o Ministério da Educação conhece a realidade das escolas, nomeadamente nos distritos de Lisboa e de Setúbal,…

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - E o de Bragança?!

A Oradora: - … e no de Bragança, e, já agora, no de Viana do Castelo, mas também os Deputados da Comissão de Educação, Ciência e Cultura já tiveram a preocupação de visitar escolas do distrito de Setúbal. Precisamente no dia 18 de Abril, fizemos uma visita à escola da Bela Vista, onde encontrámos turmas, não com os dados que referiram, mas compostas por 20 alunos. Como tal, a realidade não é apenas a que foi referida nos distritos de Lisboa e de Setúbal.

Protestos do PCP.

Os projectos de lei n.os 338 e 376/VIII, respectivamente apresentados pelos Grupos Parlamentares do PSD e do Bloco de Esquerda, trazem à discussão um tema recorrente do sistema educativo, analisado e ponderado sobretudo nos momentos de arranque de cada ano lectivo. Ambos os projectos remetem, na respectiva fundamentação, para situações de constrangimento do sistema, nomeadamente os fenómenos do insucesso escolar, do abandono, da exclusão ou mesmo da violência no seio de algumas comunidades educativas.
Parece-nos, contudo, oportuno centrar a discussão num campo mais vasto, perspectivando o aprofundamento do tema. O PS não entende como pedagogicamente correcto orientar a presente questão exclusivamente para o universo da turma, no momento em que o problema se deve equacionar à luz do trinómio número de alunos/professor/agentes educativos ao serviço da escola.
Segundo o último relatório da OCDE (vou citar números; sei que o Sr. Deputado David Justino não gosta muito de números, mas os que vou citar hoje não são de investimentos do Estado, são números da OCDE), o número médio de alunos por professor, no 1.º ciclo, nos diferentes países, é de 17,3, ao passo que a ratio portuguesa se si

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tua nos 12,8, isto é, próxima da da Hungria, que tem a taxa mais baixa: 11.
A OCDE constata também que a relação professor/número de alunos por turma se altera significativamente quando passamos do patamar inicial para o secundário, já que o número de professores aumenta exponencialmente face ao número global de alunos. Esta disparidade reflecte não só a orientação da política educativa de cada país, mas também o número de horas de docência nos diferentes níveis e os efeitos da pluridocência em planos curriculares muito diferenciados.
Ora, a realidade do nosso país tem demonstrado a necessidade de reordenamento da rede educativa com o objectivo de correcção de erros estruturais do sistema. Temos escolas demasiado pequenas - como a Sr.ª Secretária de Estado já disse, 52% das escolas do 1.º ciclo têm menos de 19 alunos - e temos escolas sobredimensionadas - 36% das escolas dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e do ensino secundário têm mais de 1000 alunos.

Protestos do PCP.

Oiçam, oiçam!
O Governo do Partido Socialista tem procurado, com as autarquias locais, ultrapassar este constrangimento do sistema, em nome da qualidade e da melhoria das aprendizagens. A fixação de um número máximo de alunos por turma deve também ter em conta a realidade de cada escola.
Em 1999, foram aprovadas, na sequência de negociações com os respectivos sindicatos, as carreiras de pessoal não docente a afectar às escolas: os psicólogos, os assistentes de acção educativa, os técnicos superiores de educação, etc., etc.. Esta medida demonstra que a política educativa do Governo privilegia como fundamental a existência de um corpo técnico nas escolas que garanta um efectivo apoio aos professores.
Além disso, a reorganização curricular do ensino básico e a revisão curricular do ensino secundário apontam para uma organização dos currículos e da escola que implicam realidades de dupla docência, no caso da Educação Visual e Tecnológica, nos casos do estudo acompanhado, nas áreas de projecto, etc., e créditos horários que, no 1.º ciclo do ensino básico, correspondem a mais professores nos quadros das escolas com disponibilidade para o desempenho de outras funções pedagógicas.
Vários estudos demonstram que o investimento em centros de recursos, a prática de estudo acompanhado, os projectos de diversificação e de enriquecimento curricular constituem factores determinantes do sucesso educativo e de integração social e escolar de jovens, independentemente do número de alunos por turma.
Por último, convém salientar que o relatório da Inspecção-Geral da Educação relativo ao ano de 2000/2001 revela que, nos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico, apenas 30% das turmas são constituídas por 26 a 30 alunos, o que remete para uma ratio de 21,6. Já no ensino secundário o valor médio situa-se nos 23 alunos, nos cursos gerais, e nos 20, nos cursos tecnológicos.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Conforme ficou demonstrado, a questão do número máximo de alunos por turma deve ser contextualizada de acordo com as especificidades de cada escola, tendo em conta as valências de cada comunidade educativa. Na constituição das turmas, devem prevalecer critérios de natureza educativa, aprovados em assembleia de escola. A presente legislação já contempla um número máximo de 20 alunos para as turmas que incluem alunos com necessidades educativas especiais e para as turmas do 1.º ciclo que agregam os quatro anos de escolaridade.
Por outro lado, o Ministério da Educação, no projecto de despacho conjunto relativo ao ano lectivo de 2001/2002, já enviado aos parceiros sociais para obtenção de parecer, aponta como norma geral de constituição de turmas 25 alunos, estipulando 28 como limite máximo.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As iniciativas legislativas do PSD e do Bloco de Esquerda assentam numa perspectiva passadista, centrada na relação professor/número de alunos por turma,…

O Sr. António Braga (PS): - Muito bem dito!

A Oradora: - … quando as novas correntes apontam para um novo conceito de escola, abrangente, centrado na ratio professor/alunos/restantes agentes educativos da escola.

O Sr. David Justino (PSD): - É a nova moda!

A Oradora: - O Governo do PS tem desenvolvido políticas concertadas conducentes a várias reformas e de reestruturação do sistema, como é o caso da revisão curricular ou o ponto de partida desta discussão, isto é, a diminuição do número de alunos por turma.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se, pelo que tem de concluir.

A Oradora: - Vou já terminar, Sr. Presidente.
Aguardamos, por isso, que, ao longo desta discussão, os partidos proponentes manifestem disponibilidade para recentrar o problema colocado à luz dos paradigmas que acabei de enunciar. Essa é que é a visão de futuro,…

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Vê-se, vê-se!

A Oradora: - … de acordo com as novas e mais complexas realidades da escola e da realidade contemporâneas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - O último orador inscrito é o Sr. Deputado David Justino, que beneficia de uma cedência de tempo do Grupo Parlamentar de Os Verdes.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. David Justino (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado, Srs. Deputados: Gostaria de fazer um breve comentário àquilo que foi dito, isto é, que eu não gosto de números. Do que eu não gosto é de leituras

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distorcidas dos números, e estou habituado a ouvir muitas, nomeadamente da parte da bancada do PS, dando o mesmo número para tomar uma conclusão e a contrária, e isso é que eu não aceito!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. António Braga (PS): - Nós somos homens de ciência!

O Orador: - Não se nota, não se nota!
Em segundo lugar, gostaria de ressaltar o seguinte aspecto: está cientificamente demonstrado que não há uma relação directa entre sucesso e dimensão média de alunos por turma - está demonstrado! -, porque há países que utilizam um número médio de alunos por turma muito elevado e que têm elevadas taxas de sucesso, sendo que o contrário também se verifica. Quer isto dizer que, se nós até temos uma boa média de número de alunos por turma, no quadro europeu, deveríamos também estar, nos resultados obtidos, na média do quadro europeu; mas não, estamos na cauda! Isto significa que esta relação directa não existe.
Agora, há uma relação directa entre as condições de leccionação dentro das salas de aula e o tipo de ensino que se faz. Ou seja, os objectivos da revisão curricular apresentada pelo Ministério, relativamente ao estudo acompanhado, à transversalidade da informática, à não magistralidade das aulas dadas e à transmissão pura e simples do conhecimento, não são possíveis de atingir com turmas de dimensões acima dos 25, 30 alunos.
Nesta perspectiva, não podemos confundir médias, pois, estatisticamente, uma média só é pertinente quando temos uma distribuição normal. Ora, a distribuição normal não existe, havendo uma grande dispersão entre situações de número de alunos muito baixo e situações de número muito alto, o que significa que a média não reflecte nada!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - O que interessa é a norma!

O Orador: - Não, não é a norma!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se, pelo que agradeço que conclua.

O Orador: - Sr. Presidente, peço-lhe alguma da sua complacência traduzida em tempo!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - E eu peço-lhe rapidez na sua intervenção!

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Sr. Presidente, o nosso grupo parlamentar cede 2 minutos ao Sr. Deputado David Justino.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Muito bem. Sendo assim, faça favor de continuar, Sr. Deputado David Justino.

O Orador: - Muito obrigado.
Como dizia, nesta perspectiva, o que é importante é adequar as condições físicas da leccionação à dimensão da média das turmas. Nesse sentido, estamos abertos a fazer influir na forma de organizar as turmas outros critérios que não sejam o do número máximo.
Consideramos ser já um bom contributo o de podermos ajustar os tectos máximos, precisamente para eliminar situações de exclusão clara, como são as de sobrelotação de escolas. Este projecto visa eliminar situações conhecidas, e detectadas no relatório da inspecção, em larga escala, de sobrelotação de escolas. É este o objectivo!
Nesta perspectiva, penso que o PS está sensível à nossa preocupação. Não creio - nem quero acreditar! - que não estão sensíveis a isto, ou seja, a eliminar situações de extremo, de excepção. Assim, espero que, com todo o sentido da responsabilidade, o Partido Socialista e do Governo dêem acolhimento a estas propostas.
Relativamente à prossecução destes objectivos, podemos entender-nos em termos de Comissão de Educação - é perfeitamente viável que isso aconteça.
Por último, chamo a atenção para o facto de, como é óbvio, o grande desafio ser o problema da organização da rede escolar. A Sr.ª Secretária de Estado chamou precisamente a atenção para este aspecto e é esse o objectivo que deve irmanar-nos a todos. Agora, tenhamos em atenção que a rede escolar, a organização das turmas e a limitação do número de turmas devem sempre ser feitas em função dos interesses dos alunos e nunca em função dos interesses dos professores!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Mas isso também no privado!

O Orador: - No público e no privado!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Inscreveu-se ainda o Sr. Deputado António Braga, que beneficia de uma cedência de tempo do Grupo Parlamentar de Os Verdes.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ainda bem que o Sr. Deputado David Justino interveio nesta fase final do debate, pois esclareceu-nos quanto a algo importante, que é o seguinte: a visão redutora que o seu projecto de lei apresenta é agora transformada numa ideia mais relaxada quanto à intervenção nas escolas, designadamente flexível quanto a esta relação professor/aluno.

O Sr. David Justino (PSD): - Está a ver? Consegue ouvir aquilo que eu nunca disse!

O Orador: - Sr. Deputado, se não é isso, é pior! O Sr. Deputado acabou de dizer que, ao olharmos para as escolas, não podemos fixarmo-nos no número ou na relação exclusiva turma/aluno. O Sr. Deputado acabou de referir, e bem, que não há uma demonstração científica quanto à relação de bons resultados educativos e o número de alu

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nos por turma, havendo, bem pelo contrário, resultados mais díspares; donde, a ideia de futuro no sistema educativo tem de passar por uma relação número de alunos/professor no universo da escola e não na redução da turma, como sendo uma gaveta ou um comportamento incomunicável no contexto da escola!
Hoje, na escola - e ainda bem que isso acontece na escola portuguesa -, para além dos professores, há outros técnicos de educação, nomeadamente psicólogos, auxiliares da área da educação, a todos os níveis, que devem incluir-se nesta relação professor/alunos. Já acontece, nas nossas escolas, uma turma ter mais do que um professor no desenvolvimento de determinadas actividades, e esta é a visão de futuro quanto a esta relação.

Protestos da Deputada do PCP Luísa Mesquita.

Não, Sr.ª Deputada, é neste país, e a senhora sabe que isso existe, embora, naturalmente, não seja a norma!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aquilo que o PSD propõe, bem como o Bloco de Esquerda, é que tratemos como norma geral as excepções, aqueles que são hoje, claramente, casos residuais no sistema educativo e que assim devem ser tratados. Ou seja, não podemos determinar para o País uma baixa da média de alunos por turma quando o problema não é do sistema no seu todo, mas de situações residuais, como o Sr. Deputado José Cesário reconheceu, que é importante atalhar e que devem, de facto, ser tratadas.
Quanto aos TEIP, eles são justamente uma tentativa de resposta a esta situação de sobrelotação, com normas especiais para a constituição de turmas incluídas!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, já esgotou o seu tempo.

O Orador: - Vou já concluir, Sr. Presidente.
Naturalmente, estamos preocupados com o problema do sucesso escolar e das condições de leccionação nas escolas. Entendemos é que esta visão de olhar para a escola como sendo constituída por turmas é passadista. A escola é constituída por alunos e professores, e é nessa relação que têm de se encontrar as soluções de futuro!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, não há mais inscrições, pelo que terminámos o debate, na generalidade, dos projectos de lei n.os 338/VIII, do PSD, e 376/VIII, do Bloco de Esquerda. A votação destes projectos será feita oportunamente, nos termos regimentais.
Vamos passar ao ponto seguinte da ordem do dia, que consta da discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 408/VIII - Altera o artigo 172.º do Código Penal, criminalizando a conduta de quem for encontrado na posse de fotografias, filmes ou gravações pornográficas envolvendo menores de 14 anos, apresentado pelo CDS-PP.
Para apresentar este projecto de lei, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS-PP, em matéria penal, defendeu sempre dois princípios fundamentais: por um lado, a estabilidade do ordenamento jurídico ou penal - nós entendemos que este ordenamento, por natureza, deve ser um ordenamento jurídico estável, e tão estável quanto possível; por outro lado, sempre dissemos que determinadas situações sociais, determinados tipos de crimes, que têm maior incidência ou maior gravidade, devem ser distinguidos do ponto de vista jurídico-penal e merecer, por isso, um tratamento especial.
Srs. Deputados, é o que fazemos hoje em relação a um tipo de crime e de comportamento que consideramos da maior gravidade, como é o caso da pedofilia que, infelizmente, tem posto, em várias circunstâncias, pelas piores razões, o nosso país nos noticiários internacionais.
A pedofilia é um dos comportamentos que mais chocam a nossa consciência de democratas cristãos, mas certamente de qualquer humanista, seja cristão ou laico. Qualquer humanista fica profundamente chocado com este comportamento, porque incide sobre vítimas inocentes e está demonstrado - todos os relatórios internacionais assim apontam - que tem consequências graves que se vão revelar ao longo da vida na formação das crianças.
Lembro, a este propósito que, na sequência do julgamento do caso de pedofilia na Madeira, e em várias intervenções, quer de magistrados, quer de elementos da Polícia Judiciária, se levantou sempre uma questão relacionada com a prova e que aponta para a existência de uma lacuna fundamental. E qual é essa lacuna? É a de que, hoje em dia, a lei não pune a conduta de possuir material pornográfico, designadamente material relacionado com a pedofilia.
Portanto, a lei actual não pune quem possuir fotografias, filmes ou gravações envolvendo menores, tendo, naturalmente, um carácter relacionado com a pedofilia. Ou seja, alguém que tenha na sua posse um vasto catálogo de fotografias de menores a serem forçados à prática de actos sexuais não é, por esse facto, atingido ou punido pela nossa lei.
Ora, nós não ignoramos que, em alterações recentes, a lei já foi ao ponto de proibir a comercialização, a cedência desse tipo de material. Não ignoramos isso e consideramos até um avanço positivo, mas se dermos ouvidos e maior atenção àqueles que mais estão no terreno e que melhor conhecem esses problemas, designadamente os magistrados e a Polícia Judiciária, verificamos que quando têm de lidar com estas questões o que dizem é que o não punir o consumidor, o não punir aquele que recebe esse mesmo material é um enorme obstáculo ao combate a este crime e a este flagelo.
Do nosso ponto de vista, não faz, efectivamente, sentido punirmos quem promove e organiza essas mesmas redes, punirmos quem comercializa esse tipo de material, mas deixar completamente de fora desse processo aqueles que são os seus utilizadores e consumidores.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Exactamente!

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O Orador: - Perguntarão: «não será ir longe demais»? Srs. Deputados, creio que não, porque a situação é de tal forma grave e de tal forma revoltante e aviltante que não há meios excessivos para combater a pedofilia.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - É certo que se nós controlarmos e combatermos o consumo certamente que controlaremos a produção e que conseguiremos combater aquilo que mais nos choca, que é a violentação sistemática de menores, que sabemos estar tantas vezes associada a outros crimes mais graves do que estes.
Perante os relatos sistemáticos que as nossas televisões e as internacionais fazem sobre desaparecimento de menores, quantas vezes nos perguntamos se esse desaparecimento não estará associado a estas redes.
Neste caso não há, na nossa opinião, meios excessivos. É por isso que, compreendendo aqueles que dizem que a lei penal deve ser estável, nós não fazemos uma nova formulação, não criamos um novo artigo, fazemos unicamente uma mudança, mantendo o quadro legal e estável, mantendo a idade que está prevista, os 14 anos, limitando-nos a propor que, no artigo 172.º do Código Penal, se acrescente uma alínea dizendo que também é sancionado, ainda que com uma pena mais leve, quem estiver na posse deste tipo de material.
Ou seja, os consumidores, aqueles que adquirem este tipo de material, aqueles que alimentam a existência destas redes e destes crimes, serão também eles sancionados e penalizados.
Ao fazer esta apresentação, registamos que a pedofilia é de tal forma repugnante que escapa até a algumas considerações de ordem jurídico-penal que costumamos ouvir quando apresentamos qualquer tipo de penalização.
Por vezes, alguns Srs. Deputados, comentadores ou outros costumam atribuir-nos intuitos contra a sociedade, contra o clima geral, dizem que somos excessivamente criminalizadores. Isso, felizmente, não acontece na pedofilia. Haja, pelo menos, um caso em que o consenso é generalizado. Só que o consenso, neste caso, tem de ter uma consequência.
Ao apresentarmos este projecto de lei deixamos aqui uma pergunta muito simples e muito directa: devem os utilizadores e os consumidores de pedofilia ser ou não sancionados? Isto é ou não eficaz para combater aquilo que é uma vergonha e que é aviltante para as nossas consciências?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Sequeira.

O Sr. João Sequeira (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Apresenta o CDS-Partido Popular, perante esta Câmara, o projecto de lei n.º 408/VIII, que altera o artigo 172.º do Código Penal, criminalizando a conduta de quem for encontrado na posse de fotografias, filmes ou gravações pornográficas envolvendo menores de 14 anos.
Deste modo, segundo os autores, resolve-se a seguinte ambiguidade legal: se quem cede por qualquer meio, e até com intenções lucrativas, pode ser criminalmente responsabilizado, quem aceite ou quem compra só pode ser punido como cúmplice e apenas se puder ser identificado enquanto tal.
Por outro lado, seguindo a argumentação dos proponentes, quem for encontrado na posse de tais materiais, pode estar em vias de os ceder ou vender e nada lhe acontece por esse facto.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Portugal, enquanto membro do Conselho da Europa e Estado signatário da Convenção sobre os Direitos da Criança tem especiais responsabilidades quanto aos seus direitos e protecção adequada. O desenho do nosso ordenamento jurídico reflecte tal protecção. Assim, o artigo 69.º do nosso texto fundamental consagra o direito das crianças à protecção, impondo-se os correlativos deveres de prestação ou de actividade ao Estado e à sociedade.
O artigo 172.º do Código Penal, resultante da Lei n.º 65/98, de 2 de Setembro, vem consagrar expressamente a punição penal relativa ao abuso sexual de crianças.
O citado preceito pune o agente criminoso, maior de 16 anos, que exiba ou ceda, a qualquer título e por qualquer meio, imagens, filmes ou gravações sonoras de um menor de ambos os sexos e de idade igual ou inferior a 13 anos explicitamente envolvido em actos de natureza sexual.
Recorrendo às doutas palavras do Prof. Figueiredo Dias, trata-se de proteger a autodeterminação sexual, mas sob uma forma muito particular, não face a condutas que representam a extorsão de contactos sexuais por forma coarctiva ou análoga, mas face a condutas de natureza sexual que em consideração à pouca idade da vítima podem, mesmo sem coacção, prejudicar gravemente o livre desenvolvimento da sua personalidade.
Em suma, com a recente alteração do Código Penal, ocorrida em 1998, avançou-se de forma segura para uma maior reacção penal aos crimes contra a autodeterminação sexual.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, também a União Europeia, desde 1996, tem vindo a desenvolver activamente uma abordagem ampla e multidisciplinar no que se refere à prevenção e à luta contra a exploração sexual das crianças.
Em Fevereiro de 1997, o Conselho adoptou uma acção comum relativa à luta contra o tráfico de seres humanos e à exploração sexual de crianças.
Actualmente, está em preparação uma proposta de decisão-quadro relativa à luta contra a exploração sexual de crianças e à pornografia infantil. Esta proposta destina-se a abordar, conferindo-lhe a maior urgência, a questão preocupante da pornografia infantil na Internet, por forma a demonstrar a determinação da União Europeia, no sentido de aplicar disposições penais comuns nesta área e contribuir para que os utentes da Internet disponham de um contexto seguro e livre de actividades criminosas.
Também o Conselho da Europa se dedica, desde há vários anos, a denunciar todas as formas de exploração contra as crianças.

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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, resulta de tudo isto que, no âmbito desta iniciativa do Grupo Parlamentar do CDS-PP, estão aprovados, ou em vias de aprovação, diversos textos normativos internacionais, destacando-se o projecto de convenção do Conselho da Europa sobre cibercrime e a proposta de decisão-quadro sobre o combate à exploração sexual de crianças e pornografia infantil.
Podemos concluir que os instrumentos a adoptar no âmbito da União Europeia e do Conselho da Europa divergem em alguns pontos fundamentais do projecto de lei do CDS-PP, ora em apreciação.
Relativamente ao projecto de convenção do Conselho da Europa tais diferenças expressam-se, primeiro, quanto à idade das crianças, que o PP delimita aos 14 anos e o Conselho da Europa estende no mínimo até aos 16, e, depois, quanto ao objecto que o Conselho da Europa alarga aos desenhos realistas e às imagens de adultos aparentando ser menores.
Já a proposta de decisão-quadro da Comissão ao Conselho, que, cumpre lembrar, surgiu na sequência de decisão do Conselho de 29 de Maio de 2000, aprovada durante a presidência portuguesa, a ser aprovada, vai ainda mais longe que o projecto pretende em dois pontos essenciais: a idade abrangida pelo conceito de «infantil», menos de 18 anos, e a definição do material pornográfico através da introdução da expressão «representação visual».
É, contudo, sabido que a Convenção do Conselho da Europa admite a formulação de reservas, mas o mesmo já não sucede com a decisão-quadro do Conselho.
Assim sendo, e perante este estado de coisas, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, no entendimento do Grupo Parlamentar do Partido Socialista seria adequado e avisado que nos trabalhos de especialidade se tivesse em conta essencialmente a aprovação do texto final da decisão-quadro da União Europeia.
Deste modo, a Assembleia da República deverá equacionar de forma ponderada as soluções relativas a adoptar neste domínio, de forma a evitar que a breve trecho sejamos confrontados com a necessidade de introduzir alterações ao agora decidido.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, gostaria de agradecer ao orador ter-me relembrado a leitura do Código Penal anotado - que está também na nossa posse, mas é sempre agradável ouvir reler o Código Penal anotado -, como foi também muito agradável ouvi-lo reler uma carta do Sr. Ministro da Justiça dirigida ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares. Também já tínhamos lido a carta, mas não faz mal... Ouvimos ler as vezes que o Sr. Deputado entender necessário.
Mas gostaria de lhe colocar uma questão muito concreta: nós conhecemos tudo isso e sabemos que uma das diferenças substanciais entre o nosso projecto e aquilo que diz a Comissão Europeia tem a ver com a questão da idade. Agora, nós fomos muito claros - pergunto-lhe se tem consciência disso -, e dissemos: «queremos 14 anos, porque é o que está na nossa lei, é o que prevê, actualmente, a nossa lei». Portanto, nós entendemos que esse quadro, à partida, deve ser considerado relativamente estável.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - É óbvio!

O Orador: - Os senhores dirão que aprovam o nosso projecto e que, na comissão, vão avançar com os 16 anos, com os 18. Tudo bem, Sr. Deputado, mas que isso não seja argumento.
Pergunto-lhe, portanto, se sabe que a nossa lei prevê os 14 anos e se esse será um argumento para, depois, os senhores dizerem que a autoria é vossa, a inspiração é vossa, ou se, pelo contrário, os senhores estão dispostos a aprovar o nosso projecto e depois, connosco, na comissão, com outros contributos, se chegar à melhor solução.
Pergunto-lhe se é assim ou não, porque, se for, nós não aceitamos uma desculpa para não votarem uma iniciativa que é boa, que faz sentido, que é necessária e que corresponde a uma preocupação fundamental.

Aplausos do CDS-PP e do Deputado do PSD Fernando Seara.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Sequeira.

O Sr. João Sequeira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Telmo Correia, é sempre bom ler o Código Penal anotado e é sempre bom relembrá-lo.
Em relação à pergunta que colocou dir-lhe-ei que, estando em causa a questão substancial para que alertou também na sua primeira intervenção, referiu por duas vezes - tomei nota - que era fundamental haver uma estabilidade na lei penal. E o que nós não queremos - e foi isso que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, por meu intermédio, aqui veio dizer -, é estarmos agora a alterar o Código Penal, como consta da vossa proposta, e, posteriormente, com uma decisão comunitária, termos de o alterar novamente.
Não interessa a autoria das propostas, o que interessa é resolver a questão substancial, que todos achamos importantíssima para o desenvolvimento destas crianças e sobretudo para a sua autodeterminação sexual, e não estar permanentemente a alterar o Código Penal.
Portanto, respondendo mais uma vez à sua pergunta, frisamos o seguinte: queremos colaborar para a resolução desta lacuna do nosso Código Penal, mas atendendo sempre à estabilidade da própria lei penal.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Montalvão Machado.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A questão sobre a qual estamos agora a reflectir assume uma

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grande singeleza normativa, mas visa reforçar o quadro legal protector de um bem jurídico fundamental, qual seja o da protecção da criança.
Isto é, à simplicidade normativa proposta acrescentar uma única alínea ao n.º 3 do artigo 172.º do Código Penal, de modo a que se passe a criminalizar a conduta de quem for encontrado na posse de fotografias, filmes ou gravações pornográficas, que envolvam crianças e não apenas a daquele que exiba ou ceda, a qualquer título ou por qualquer meio, tais materiais, a essa simplicidade corresponde, em contraponto, uma preocupação em proteger o crescimento dos menores de idade inferior a 14 anos de todas e quaisquer agressões de natureza sexual - e estas, como sabemos, não são apenas físicas.
Nessa conformidade, reflectirei sobre três vertentes. A primeira diz respeito à bondade da proposta. Já resultou das minhas primeiras palavras, mas, para que não fiquem dúvidas à Câmara, para mim e para o Partido Social Democrata a proposta é de acolher.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Ela surge, aliás, na esteira do que se regulou já, na reforma de 1998, a propósito dos chamados crimes sexuais.

O Sr. Fernando Seara (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Como se sabe, para além de tipificar mais claramente tais crimes e de os enquadrar sistematicamente de forma beneficiada, essa reforma caracterizou-se por uma maior severidade na punição dos mesmos, maxime quando sejam cometidos sobre as crianças, assim se tendo acolhido uma opinião pública dominante que, atenta à realidade, há muito vinha reclamando tal ou tais alterações legislativas. Do que se trata, agora, é de punir não apenas aquele que exiba ou ceda, a qualquer título, material pornográfico onde figurem crianças, mas também aquele que, simplesmente, detenha tal material.
A questão é, sem dúvida, sensível, por poder conduzir a um alargamento do controlo da vida privada do cidadão, mas creio que a inovação normativa se justifica.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - E justifica-se porque se não for punido o «polo consumidor» do material pornográfico é mais do que certo que se mantenha, e até se desenvolva, um mercado potencial para esse material.

O Sr. Fernando Seara (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E se, desta forma, se favorecer o mercado, certo é também que se desenvolva a oferta, a fim de que esta possa satisfazer a consequente procura.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Claro!

O Orador: - Tal como se refere, de resto, no projecto de lei, a criminalização de mera posse constituirá uma medida dissuasora da prática de outros crimes, nomeadamente os previstos na alínea d) do n.º 3 do artigo 172.º do Código Penal.
Não exactamente, ao contrário do que pode retirar-se da exposição de motivos apresentada pelo CDS-PP, porque o bem jurídico em causa seja a liberdade sexual; muito menos, já se sabe, pela «moralidade» da comunidade, ou até pelos «bons costumes». Pelo contrário, e como bem assinalou o Prof. Figueiredo Dias, o bem jurídico em causa é «a protecção do menor enquanto tal».

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Claro!

O Orador: - É suposto que as pessoas com idade inferior a 14 anos, cuja liberdade em geral (e, também, portanto, no aspecto sexual) se encontra ainda condicionada pelo natural processo da sua própria evolução, tenham o direito de crescer ao abrigo de quaisquer agressões, tenham o direito de estar protegidas de actividades que possam lesar a sua inocência, naturalmente própria da sua idade.
Por isso, tudo, mas tudo, o que aqui fizermos em prol desse desiderato será pouco.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - O segundo aspecto que vou abordar prende-se com, no meu entender, uma imperfeita técnica legislativa evidenciada no projecto de lei.
A criação de uma quinta alínea, que remete para a quarta, a qual, por sua vez, também remete, mas para a terceira, implica que o intérprete ou o aplicador da lei, ou mesmo até o seu simples leitor, tenham de fazer uma ginástica de raciocínio difícil, quando não repetitiva.
Repare-se: na alínea proposta, a alínea e), repete-se pura e simplesmente a regulamentação da punição da actuação já prevista na alínea d) dos mesmos número e artigo, concretamente a punição daquele que exiba ou ceda, a qualquer título, ou por qualquer meio, o material pornográfico.

Vozes do PSD: - Isso é um lapso!

O Orador: - Outro lapso: os materiais pornográficos não estão previstos na alínea anterior, a d), como nos é proposto no projecto de lei em análise. Tais materiais estão previstos, isso sim, na alínea c) dos mesmos número e artigo.
Portanto, se a bondade indiscutível do projectado diploma é de facto notória, o mesmo pode não suceder com a técnica legislativa utilizada, a qual pode, por isso, e muito facilmente, ser objecto de beneficiação.

O Sr. Fernando Seara (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A terceira e última questão que pretendo abordar prende-se com o futuro destinado a este projecto de lei.
Resultou das entrelinhas do relatório elaborado, em sede de 1.ª Comissão, pelo Sr. Deputado do Partido Socialista, João Sequeira - o qual, aliás, aproveito para cumprimentar pela competência e profundidade do texto

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apresentado -, ou parece resultar, que o projecto de lei em discussão é, eventualmente, desnecessário, porquanto há uma decisão do Conselho, de 29 de Maio de 2000, sobre o combate à pornografia infantil na Internet, há um projecto de convenção do Conselho da Europa sobre o ciber-crime, há uma proposta de decisão-quadro sobre combate à exploração sexual de crianças e pornografia infantil... Aliás, diz-se no relatório que a tal proposta de decisão-quadro é mais abrangente, mais vasta do que o projecto de lei. E, quando li isto, pensei que - para bom entendedor meia palavra basta -, certamente, o Partido Socialista não desejaria votar este diploma. Mas vai ter de votar! Vai ter de votar a favor, de votar contra ou vai ter de se abster! Vai ter de votar, e, em sede de Comissão, não vai adiar perpétua e eternamente o problema!

O Sr: Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Há pouco, o Sr. Deputado Telmo Correia falou na questão da autoria dos diplomas. Claro que é isso que se passa da parte do Partido Socialista!
Cito só três exemplos recentes. Em primeiro lugar, o que se passou com o Decreto-Lei n.º 183/2000: o Governo mostrou-se disponível na discussão do pedido de apreciação parlamentar... Alterou um milímetro?! Não alterou um milímetro!
Ontem, o Sr. Deputado António Reis, na 1.ª Comissão, a propósito dos portes pagos, começou a reunião dizendo: «o Partido Socialista não altera um milímetro...!».
Entretanto, acabo de receber uma proposta de lei do Governo que visa tornar crime público o crime de ofensas corporais aos agentes da autoridade. O tal projecto de lei que os senhores chumbaram, da autoria do CDS-PP - até estou à vontade, porque nem fui eu o proponente!
Então, qual é o objectivo? É ser o autor...
Portanto, o Partido Socialista vai ter de votar. Esperemos que o faça, e sobretudo que o faça bem.
O nosso ordenamento - e este ponto é importante -, tolerante e modernamente, reconhece aos jovens, relativamente cedo, o direito à sua autodeterminação sexual. Ora, naturalmente, isto envolve riscos. Para os evitar, conforme bem recordou Eliana Gersão, «quanto maior for a abertura da sociedade e do Direito Penal em matéria sexual, maior é a necessidade de fixar rails de protecção sólidos que evitem as consequências de derrapagens».
Por nós, votaremos, pois, a favor, não por uma questão de conservadorismo, como parece ser, afinal, uma das ratios do projecto de lei, no dizer do próprio partido proponente, o qual, auto-intitulando-se «partido conservador», sustenta também, nessa qualidade, o projecto.
Nós votaremos a favor, porque se o Partido Social Democrata defende que a liberdade e a auto-determinação sexual são um dos pontos ou vectores em que deve ser analisada a liberdade humana, ele também defende a verdadeira protecção do menor, isto é, a protecção do menor enquanto menor.
Esta é uma obrigação de um partido responsável e é, afinal, uma obrigação de um partido maior.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É óbvio, e penso que não sofre qualquer contestação, que toda a escravatura sexual, toda, mas aqui em especial aquela a que são submetidas as crianças, causa repulsa e condenação. E não sofre contestação que estes são crimes hediondos que devem ser reprimidos.
Foi a propósito do desvendar de práticas de utilização de crianças que se levantou, a nível internacional, uma grande sensibilidade para o problema, através dos dramáticos acontecimentos que se verificaram na Bélgica, que envolviam a prática de tortura, de sevícias sexuais e de morte de crianças. E foi por isso que, com base em acontecimentos dramáticos, os Estados se mobilizaram no combate àquilo que se chama pedofilia, que não está, no entanto, bem definida.
A pedofilia parece ser tão velha como o mundo, só que não tinha visibilidade. Nalgumas sociedades era tolerada, ignorada e quando não constituía crime chegou mesmo a ser objecto de formas de arte - Morte em Veneza, por exemplo, é um caso desses, bem como Lolita.
A utilização de crianças na pornografia provoca, como já foi dito pelo Sr. Deputado Telmo Correia, sérios danos, pela influência negativa que tal prática exerce numa área importante da actividade humana - a sexualidade.
E sendo o exercício da sexualidade uma actividade no sentido de educar a capacidade de amar, o envolvimento de crianças na pornografia não pode deixar de actuar negativamente na formação da personalidade dos menores, pela objectivação que nela se faz dos seres humanos e pela violência que introduz na sociedade. Violência que já é bem manifesta quando são adultos os utilizados e explorados e sobe até ao horror quando se trata de crianças.
Enquanto VV. Ex.as estavam distraídos, a dialogar, estava a perguntar-me por que razão existe o Canal 18 na TV Cabo, acessível às crianças. Porque é que não se tomam medidas em relação a isso?

Vozes do CDS-PP: - Nós já o propusemos!

A Oradora: - É que isso também introduz violência na vida das crianças!

Vozes do CDS-PP: - Nós já propusemos isso!

A Oradora: - Propuseram mal!

Vozes do CDS-PP: - Ah!

A Oradora: - Propuseram de uma forma errada!
Os novos meios de comunicação - a Internet - desenterraram práticas talvez tão velhas quanto o mundo e a que a dignidade que a criança conquistou deu visibilidade.
Foi isso que se verificou no Congresso de Estocolmo e, na base disso, houve alterações ao Código Penal, nomeadamente a neocriminalização, em 1995, de algumas con

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dutas, e outras alterações, em 1998, nesta área da utilização de crianças em pornografia.
Em relação ao projecto de lei do PP, tenho uma ou outra questão a suscitar, independentemente de entender que, de facto, deve ser apreciado na especialidade, pelo grupo de trabalho que está a proceder a audições sobre os projectos de lei relativos a crimes de abusos sexuais de menores. É que há uma coisa que não passou para o relatório que o Sr. Deputado João Sequeira fez, em sede de comissão, e que vem aqui, neste documento entregue pelo Ministério da Justiça, que é o seguinte: o que está proposto, em termos de Convenção, não criminaliza a mera posse. E é aqui que se me suscitam algumas questões.
Em relação às idades, conheço a Convenção contra a Criminalidade Organizada Transnacional, que, em relação ao tráfico de crianças, aponta a idade de 18 anos, em termos de protecção, ou seja, a vítima pode ter até 18 anos.
Por seu lado, a Convenção sobre os Direitos das Crianças considera criança a pessoa até aos 18 anos.
Mas, então, a ser assim, teríamos de mexer em todos os crimes sexuais.

Vozes do CDS-PP: - Claro!

A Oradora: - Aliás, em 1995, o PCP fez propostas relativamente a isso, as quais constam, eventualmente, do Diário da Assembleia da República.
Mas, repito, a ser assim, tem de se mexer em tudo, porque não se pode elevar a idade num caso e, depois, em outros casos, ficar de outra forma.
De facto, entendo que é uma questão um pouco complicada, na medida em que a imputabilidade penal verifica-se aos 16 anos.

Vozes do CDS-PP: - Claro!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - E o mesmo para o casamento!

A Oradora: - Por isso, não sei como é que, nestes casos, vamos poder elevar a protecção até aos 18 anos, sendo certo que há casos especiais em que a idade é elevada, pelo que, no caso da pornografia, talvez se possa também fazer. É que, a mim, causa-me extraordinária repulsa até a utilização de adultos na pornografia,…

Vozes do CDS-PP: - Claro!

A Oradora: - … quanto mais de crianças até aos 18 anos! Mas, repito, talvez a idade para protecção, nesses casos, possa também ser elevada, embora não saiba o que se passa, efectivamente, em relação a outros crimes.
No entanto, Srs. Deputados, tenho dúvidas em relação a esta questão da mera posse. Muitas dúvidas! E há um exemplo célebre de um escritor, da era vitoriana, cujo nome não vou indicar, mas é público e sabido que, no seu testamento, mandou destruir uma colecção de fotografias de crianças nuas que tinha em casa. E era um escritor da era vitoriana, que, no entanto, não esteve preso - e não sei se isso se sabia quando ele era vivo -, como sucedeu a Oscar Wilde, por homossexualidade.
Por isso, é preciso alguma cautela em relação a esta questão da posse. Na Itália, por exemplo, na lei de protecção dos menores contra estes crimes, há uma disposição idêntica à que os Srs. Deputados do PP propõem, até com a mesma medida de pena. E também aí foram feitas algumas críticas relativamente à mera posse, no sentido de que, assim, havia pessoas que tinham condutas desviantes e que eram doentes, as quais eram tratadas com a medicina da pena de prisão.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr.ª Deputada, esgotou o tempo de que dispunha. Tenha a bondade de concluir.

A Oradora: - Vou já terminar, Sr. Presidente.
Portanto, se me vierem propor a criminalização de actos preparatórios do crime de cedência ou exibição - qualquer coisa do tipo «quem, com a intenção de (…), tiver na sua posse isto, isto e aquilo, é punido com uma pena de prisão de (…)» -, adiro a essa solução. Na verdade, há exemplos de actos preparatórios que são punidos como crime e, neste caso, parece-me ser essa, efectivamente, a solução. É que também provam os estudos que quem é um especial cliente das revistas pornográficas são os jovens. São os jovens! Esse estudo foi feito na Itália! Portanto, pergunto: será que a questão da mera posse não deve ser olhada com alguma contenção?!
Entendo que, ultimamente, temos tratado, e bem - não é isso que está em causa -, dos aspectos da repressão penal, mas não temos tratado dos aspectos da prevenção. E uma das melhores formas de prevenção é aquilo contra o qual os Srs. Deputados do PP se posicionam, que é a educação sexual nas escolas. Dizem os pedopsiquiatras que essa é a melhor forma de prevenção dos abusos sexuais de menores, pois é uma forma de ensinar às crianças que têm autonomia, que podem recusar comportamentos de adultos e que não lhes devem obediência.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira.

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero associar-me a este debate, na sequência do projecto de lei apresentado pelo CDS-PP, referindo, fundamentalmente, como já tive ocasião de dizer, que me suscita questões de enorme delicadeza o problema da mera posse ou detenção.
Na sequência do debate que aqui foi realizado, aquando da apresentação dos projectos de lei relativos à tipificação como público do crime de abusos sexuais contra menores, tive ocasião de exprimir a minha preocupação quanto à questão dos crimes sexuais contra menores no contexto da família, porque é aí que há uma ruptura na assumpção da responsabilidade de quem tem o poder paternal, que, como poder/dever, teria a obrigação de defender os interesses dos menores, e é precisamente quem mais

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os ataca. Centrei, portanto, a minha intervenção nesta preocupação.
Todavia, esse debate, ocorrido em Fevereiro deste ano, coincidiu com a «Operação Catedral», então em curso, e com algumas queixas apresentadas pela Polícia Judiciária no sentido de terem sido encontrados no âmbito desta operação três portugueses que poderiam eventualmente ser incriminados e de a fórmula contida no Código Penal não o permitir. Em consequência, vamos ter de avaliar a forma de como acautelar e punir efectivamente quem tenha procedimentos que constituam um determinado tipo de crime, neste caso, a pedofilia. E os próprios agentes, com os quais falei na sequência de um seu pedido de deslocação aqui ao Parlamento para tratar desta matéria, também entendem que é muito delicado definir a fronteira do que é a posse, de como ela se afere, e em que quantidade, sobretudo num espaço cibernético…

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Quantidade?! Mas isto não é a lei da droga!

A Oradora: - Não, não é…!

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Isto não se regula a peso, Sr.ª Deputada!

A Oradora: - Deixem-me acabar, Srs. Deputados, porque eu não estou a ofender.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, peço-vos que deixem a oradora usar da palavra!

A Oradora: - A detenção do material ser ou constituir um crime suscita, obviamente, definições, designadamente, de que material, em que quantidade, para que efeitos, etc. Portanto, face à delicadeza desta questão, uma vez que existe um grupo de trabalho criado na 1.ª Comissão, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, para analisar os abusos sexuais contra os menores, e sendo a pedofilia crime de abuso sexual contra menores, pergunto se se consideraria adequado que o diploma, baixando à 1.ª Comissão, também pudesse ser remetido a esse grupo, por uma questão de economia de audições, de melhor gestão dos questionários a apresentar e para uma melhor formulação do que nesta matéria deve ser considerado crime ou até práticas indiciadoras de crime.
Toda esta matéria é, portanto, de uma enorme susceptibilidade, e também acompanho as dificuldades que, no âmbito da discussão desta directiva-quadro, se colocam quanto à definição das idades. Na altura, eu própria tinha proposto que o leque das audições fosse alargado a outras competências, designadamente aos pedopsiquiatras, porque também considero que, ou encontramos algum rumo ou alguma orientação nesta matéria ou, como já nos foi afirmado nas audições que ocorreram em sede de grupo parlamentar, as próprias entidades que intervêm neste campo têm muitas dificuldades em gerir limites de idade diferentes.
Para concluir, devo dizer que considero de toda a oportunidade e importância a análise desta matéria, que, de certa forma, já tinha sido co-optada por esse grupo de trabalho. E penso que os Deputados proponentes não irão contra a orientação de esta matéria vir a ser incluída numa discussão um pouco mais ampla, que nos permita legislar bem, tendo, sobretudo, em atenção a realidade, não é só aquela que conhecemos mas também aquela que criam os meios ao nosso dispor. Isto porque o novo espaço e a nova sociedade de informação e do conhecimento deverão levar-nos a reflectir, a estudar, aconselhando-nos, para legislarmos não só para o presente mas, fundamentalmente, para prevenir um futuro que ainda não conhecemos em todas as suas implicações.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Ministro da Justiça teve ocasião de me dirigir um ofício onde diz que adopta essas instruções, o qual tive o cuidado de distribuir a todas as bancadas atempadamente.
De todo o modo, gostaria de pedir, Sr. Presidente, que tanto esse documento como o respectivo anexo fossem incorporados, em anexo, à Acta da presente reunião plenária, a fim de poder dela constar, o que, de resto, me permitirá tecer considerações outras, adicionais e adequadas à hora e ao tempo que temos disponível.
Estas considerações são muito breves e visam apenas sublinhar alguns aspectos fundamentais.
Primeiro, julgo que nada nos divide, mas absolutamente nada, em relação à estratégia nacional e internacional de combate à pornopedofilia em todas as suas expressões. E, portanto, se alguma coisa deve estabelecer entre nós competição é a busca das soluções que sejam, por um lado, integradas na estratégia que, sabemos todos, está a ser gizada à escala internacional, e, por outro, tecnicamente rigorosas e compatíveis com a melhor técnica penal que esta Câmara possa alcançar e que é, seguramente, preocupação comum.
Este é um terreno difícil, como tivemos ocasião de perceber quando, em 1998, a Câmara decidiu o que decidiu em matéria de reforma penal, sob proposta do ex-Ministro da Justiça Vera Jardim, a qual conduziu a um longo trabalho da 1.ª Comissão. Nessa altura, permitam-me que sublinhe, tive ocasião de colocar a questão da utilização de redes electrónicas não no sentido de satanização da Internet, naturalmente, mas no sentido de dizer que o offline e que o online não têm uma dureza distinta, e aquilo que é mau offline é seguramente mau online; a Internet nem santifica nem diaboliza. Por isso utilizámos a técnica que está no preceito do artigo 172.º do Código Penal, que os Srs. Deputados bem conhecem; ou seja, quem, por qualquer meio, exibir ou fizer circular materiais como os enunciados neste artigo do Código Penal é sancionado com uma pena razoavelmente severa.
Isto não fechou um debate, mas também não resultou de um acaso, e penso que o valor que se afirmou nesse

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debate foi um valor que, se eu tivesse de o sintetizar, sintetizaria nestes termos: é uma concepção não invasiva de espaços individuais de autonomia, sagra-se a liberdade e a privacidade ao mesmo tempo, distingue-se - o que não é fácil - entre o desvalor ético e social de gostos repugnantes e a sua proibição jurídica, que só pode e deve fazer-se em condições bem precisas e com uma elevada justificação social, ela própria não excessiva em relação ao fim que se deseja atingir.
Nem sempre foi assim, como sabem. Houve na nossa tradição penal soluções penalizadoras de fenómenos como, por exemplo, o adultério, as orientações sexuais desviantes ou outras assim qualificadas, e isto foi lei da República e da monarquia. Mas não é este o conceito próprio de um Estado de Direito democrático moderno. Não se pode ser indiferente a inclinações que, se passadas do cérebro à acção, poderiam vulnerabilizar seres desprotegidos. Mas executar esta regra e este princípio exige grande rigor e grande comedimento, uma mão legislativa certeira. Por isso é que o debate internacional tem sido tão complexo e está neste momento a permitir uma reflexão tão cuidadosa, como, aliás, aquela que a 1.ª Comissão fez num documento muito interessante que julgo ser o relatório que aprovou, no qual, de resto, se compendiam, de maneira bastante sistematizada e exaustiva, as linhas de reflexão, e até de legiferação, à escala nacional e se lembra o trajecto legislativo feito em Portugal.
Julgo que o impulso inicial é uma matéria na qual a competição entre os partidos e o Governo será sempre saudável. E o Sr. Ministro da Justiça, numa ocasião em que esteve connosco na Assembleia da República - precisamente a propósito de propostas do PP e do projecto apresentado pela Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira -, teve a oportunidade de sublinhar que nesta área precisa de que estamos agora a falar havia espaço e necessidade de pensar novas soluções. Mas também não iludiu, ele que tem acompanhado o trabalho de reflexão no Conselho e em outras instâncias da União Europeia, que a União Europeia ainda não atingiu um consenso sobre esta matéria. Há Estados em que a severidade das penas é considerada limitada, e não foi por acaso que o ministro da justiça sueco teve, no início da presidência sueca da União Europeia, ocasião de lançar uma reflexão tendente, por exemplo, a sublinhar as consequências de haver um país, a Dinamarca, no caso concreto, cujo regime jurídico é não só de diferença de severidade da penalização mas de opt out em relação aos mecanismos de justiça, liberdade e segurança na União Europeia. E há os riscos de criação de oásis no território da União, numa matéria tão importante como esta, em que todos percebemos que a acção convergente e a inexistência precisamente de paraísos para pedófilos ou outra espécie de criminosos associados é muito importante; donde as grandes diferenças.
O documento que o Sr. Ministro da Justiça nos mandou é muito interessante, precisamente porque - tal como, aliás, o relatório da 1.ª Comissão - permite dilucidar as diferenças entre a decisão-quadro, em gestação, e o trabalho em curso no Conselho da Europa.
Os Srs. Deputados já observaram tudo o que é justo e certeiro observar, mas permitam-me que faça uma referência a dois aspectos: primeiro, a questão do alargamento da bitola etária é decisiva, porque teremos de ponderar se, no momento em que se equaciona a própria possibilidade de reduzir a faixa da maioridade, é hora e é adequado alargar a protecção deste tipo - a mesma aplicada a uma criança de 6, 7, 8, 9 ou 10 anos e a um jovem de 18 anos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Claro! Pedem que sejam imputáveis mais cedo!…

O Orador: - Temos de pensar cuidadosamente - seguramente, a Câmara o fará - neste aspecto: não há coincidência nas instâncias da União e do Conselho da Europa sobre esta questão, e não é por acaso.
O segundo aspecto é mais complexo ainda: a Sr.ª Deputada Odete Santos trouxe para o debate algo que entendo que deve ser radicalmente separado, ou seja devemos discutir separadamente a pornopedofilia, a questão pornográfica em geral e as fantasias eróticas entre adultos e para adultos que, evidentemente, figuram num capítulo totalmente diferente, que nada tem que ver com o direito criminal.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Ah! Mas eu não estou de acordo consigo! Até me admira que V. Ex.ª, que é todo feminista, não siga as teorias de Andrea Dworkin e de Catharine Mackinnon!

O Orador: - Não! De facto, não sigo, Sr.ª Deputada. E, de resto, vejo, com grande surpresa, que V. Ex.ª segue, porque elas se traduzem na criação de uma espécie de delitos de opinião e de perigos, ou de perigosidades, sancionados ainda antes de se traduzirem em condutas agressoras. Mas esse é um debate que teremos ocasião de fazer com todo o gosto.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não, eu não sigo isso. Eu não sigo a ideia de que os adultos, como objecto de pornografia, achem a sua liberdade!

O Orador: - Essa é uma discussão, Sr.ª Deputada, que eu teria todo o gosto em ter, se tivesse 20 minutos para utilizar. Contudo, não gostaria de assustar a Câmara com esta perspectiva apocalíptica.
Quero, no entanto, tão-só chamar atenção para um aspecto que me preocupa, que é este: o debate da Convenção do Conselho da Europa, que, aliás, merece grande atenção - e neste sentido julgo que o debate propiciado pelo PP é interessante e relevante, pois ajuda a trazer para a agenda política questões que por vezes são consideradas laterais -, tem vindo alertar para um aspecto que tem muito futuro, mas não sei com que significado. Se, além das fotos de gente concreta e gente real e dos vídeos, se aditar a este material representações gráficas de qualquer natureza - pensem, Srs. Deputados, nas representações computacionais, isto é, nas figurações resultantes da computação gráfica que permitem reproduzir com uma similitude impressionante a Sr.ª Deputada Odete Santos e pô-la a dizer coisas ditas por mim, por exemplo, o que, seguramente, não lhe agradaria todos os dias - colocam-se proble

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mas seríssimos de distinção entre o real e a protecção de seres humanos e a protecção de coisas outras que não podem ser agredidas, porque ninguém pode agredir um boneco computacional. A questão é saber se, depois, isto gera comportamentos desviantes, se semeia as sementes de um mal que a sociedade não seja capaz de erradicar, a não ser de formas, elas próprias, excessivas.
Mas esta questão, que é subtil, relevante e não faz dormir os penalistas, é uma questão que a Câmara não tem entre mãos neste exacto momento, mas vai ter de ter. E é neste sentido que eu julgo que a sugestão do Sr. Ministro da Justiça é interessante, uma vez que a Câmara tem neste momento várias alterações ao Código Penal entre mãos, que é a de fazer, no fundo, a agregação de todas ou de quase todas - não sei, mas os Srs. Deputados definirão a prioridade - essas alterações, ponderando atempadamente o enquadramento externo a que, seguramente, teremos de aderir e que devemos, aliás, acompanhar; esta é também a minha sugestão. Penso que a Câmara nada perderá com isto e o Governo teria, seguramente, todo o gosto em contribuir para este esforço, sem ditar qualquer ritmo, apenas chamando a atenção de que há uma vinculação internacional a que Portugal está sujeito, e a Assembleia da República pode e deve associar-se a ela nas melhores condições.
Portanto, Srs. Deputados, é este o meu voto.
Por último, também gostaria de felicitar a Câmara pelo facto de ter contribuído para o debate com um conjunto de reflexões, que serão seguramente substantivas e não alimentadoras de discussões secundárias.

Aplausos do PS.

Protestos da Deputada do PCP Odete Santos.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Temo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de salientar dois aspectos muito concretos.
Em primeiro lugar, estou de acordo com a maior parte das coisas que foram ditas pela Sr.ª Deputada Odete Santos, e cumprimento-a por isso. De resto, tanto o Grupo Parlamentar do PCP como o Grupo Parlamentar do BE, apesar de este último não se encontrar presente neste momento, tinham-nos transmitido a ideia de que esta matéria pode e deve ser discutida na especialidade, o que registamos. Não vou entrar na discussão sobre a relação entre a pornografia e a pedofilia, porque, na pornografia, pode-se de facto entrar na discussão sobre se há ou não consentimento, enquanto que a pedofilia não admite esta discussão. Na pedofilia não pode haver consentimento, porque um menor não pode dar o seu consentimento! Em relação a um menor de 14 anos não é sequer possível pensar na discussão sobre o consentimento, porque isto é muito grave.
Srs. Deputados, acho, sinceramente, que esta discussão chega a ser divertida, que as últimas intervenções chegaram a ser divertidas…

Protestos da Deputada do PCP Odete Santos.

Damos-lhe razão, Sr.ª Deputada Odete Santos. Tudo bem!
A questão é muito simples: esta discussão chegaria a ser divertida e as últimas intervenções chegariam a ser divertidas se este não fosse um problema sério e grave.
Porque eu estava a ouvir algumas intervenções e achei que alguém ligou um «complicómetro».

Vozes do CDS-PP: - Exacto!

O Orador: - A certa altura, parecia que isto era um problema tecnocrático, porque estamos à espera do enquadramento comunitário da gestão da superestrutura que se vai pronunciar sobre as propostas que vão ser enquadradas no âmbito de uma comissão que estudará, até às últimas consequências, a questão de saber se as fotogravuras, as criptogravuras, ou não sei quê gravuras, como dizia o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, também são, não são… Desliguem! Desliguem o «complicómetro», e vejam uma coisa tão simples como isto: a lei diz que quem actuar sobre menor de 14 anos, quem utilizar menor de 14 anos em fotografia, filme ou gravação pornográfica - está cá escrito, preto no branco -, exibir ou ceder, ou seja comercializar, é punido criminalmente. É isto que a lei diz actualmente. A lei não diz quem consumir, quem for possuidor dessas fotografias, filmes ou gravações pornográficas com menores de 14 anos.

Vozes do CDS-PP: - Claro!

O Orador: - Qual é a dúvida!?

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Peço-lhe que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - Ou entendem que os consumidores também devem ser penalizados ou não entendem, mas têm de votar! Porque esta história de esperar pelas grandes dissertações, pelos grandes não sei quê, é uma coisa de que já estamos fartos, mas que, certamente, nem os magistrados, nem os agentes policiais que têm de actuar nesta área agradecem e, certamente, que as famílias e os menores também não. Portanto, têm de dizer «sim» ou «não».

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, como não existem mais pedidos de palavra, dou por encerrado o debate, na generalidade, do projecto de lei n.º 408/VIII e, com ele, a ordem de trabalhos de hoje.
A próxima sessão plenária realiza-se amanhã, sexta-feira, às 10 horas, tendo como ordem de trabalhos a discussão conjunta das propostas de resolução n.os 47, 51, 52 e 54/VIII e a discussão do Relatório da Delegação da Assembleia da República que se deslocou a Timor-Leste.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 15 minutos.

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Documento enviado à Mesa pelo Sr. Deputado do PSD Rui Gomes da Silva, para publicação, relativo a um artigo do jornal O Jogo, publicado no dia 7 de Março de 2001.

«O acórdão vigente assegura que o Estado comparticipa com um milhão e cinquenta mil contos para a remodelação do Estádio da Luz». Foi assim que, ontem, poucas horas após terminar a reunião entre a Comissão Parlamentar de Acompanhamento do Euro 2004, da qual o Deputado socialista é vice-presidente, e os responsáveis máximos do Benfica, que Laurentino Dias resumiu as conversações travadas por mais de duas horas. A salvaguarda, porém, foi quase imediata. «O Benfica ainda não decidiu, e não se comprometeu, portanto, se pretende remodelar o Estádio da Luz ou avançar para a construção de um novo estádio».
Depois de uma sessão de esclarecimento recíproca, que o Deputado classifica de «extremamente produtiva», Laurentino Dias parece não colocar quaisquer entraves à integração plena do Benfica no rol de clubes municiadores de infra-estruturas para a realização do Euro 2004. «Parece-me absolutamente justo que o Governo venha a comparticipar na proporção de 25% nas medidas que o Benfica entender por melhor tomar, seja a remodelação ou a construção». A indefinição não será, porém, uma realidade duradoura. «Até final deste mês, o Benfica ficou de dar uma resposta concreta em relação ao que pretende fazer».
A «honestidade» e «transparência de métodos» dos responsáveis benfiquistas foi o elogio dominante entre os deputados, independentemente da «cor» partidária. À semelhança do deputado popular, Sílvio Cervan, também o socialista Laurentino Dias testemunhou da «verticalidade» protagonizada por Vilarinho e seus pares. «O Benfica encara esta questão com a máxima seriedade». Mas o Euro 2004 começa para os lados da Luz (ou não) só a 31 de Março? O deputado do partido que sustenta o Governo reitera total confiança no cumprimento de prazos. «Não sendo o Benfica uma entidade autárquica, que terá de se submeter a uma série de procedimentos burocráticos, terá muito mais facilidade em cumprir os prazos. Está em condições de o fazer».

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Documento enviado à Mesa pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, para publicação, relativo ao projecto de lei n.º 408/VIII.

Ex.mo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares

Ofício n.º 1925/2001
08 de Maio de 2001

Devido a compromissos inadiáveis anteriormente assumidos, nem eu, nem os Secretários de Estado, poderemos participar no debate na generalidade do projecto de lei n.º 408/VIII do CDS-PP que propõe a alteração do artigo 172.º do Código Penal, agendado para amanhã.
A importância da matéria e o avançado estado dos trabalhos na União Europeia e no Conselho da Europa das iniciativas sobre a pornografia infantil na Internet exigem no entanto que o Governo dê conhecimento à Assembleia da República da sua posição, pedindo-lhe por isso que, sem prejuízo da distribuição desta carta aos grupos parlamentares e aos Ex.mos Presidentes da Assembleia da República e da 1.ª Comissão, represente o Governo no debate.
Na sequência da Decisão do Conselho de 29 de Maio aprovado durante a presidência portuguesa, a Comissão propôs a aprovação de uma Decisão Quadro que está em apreciação no Conselho. Por outro lado, encontra-se já estabilizado o projecto da Convenção do Conselho da Europa sobre cibercriminalidade que também abrange a pornografia infantil na Internet.
Conforme se explicita na nota em anexo, os instrumentos a adoptar no âmbito da União Europeia e do Conselho da Europa, prevendo a criminalização da pornografia infantil na Internet, divergem contudo em alguns pontos fundamentais da proposta do CDS-PP.
Assim, quanto à idade das crianças, que o CDS-PP limita aos 14 anos, o Conselho da Europa estende, no mínimo, até aos 16 anos e a Comissão até aos 18 anos. Também quanto ao objecto, que o Conselho da Europa alarga aos desenhos realistas e às imagens de adultos aparentando ser menores. E quanto à conduta, em particular na proposta da Comissão, que é descrita como «aquisição e posse».
Sendo certo que a Convenção do Conselho da Europa admite reservas quanto a alguns destes pontos, a Decisão Quadro do Conselho não as admitirá.
Assim, penso que, sem prejuízo da aprovação do projecto de lei do CDS-PP na generalidade, seria avisado que os trabalhos de especialidade aguardassem a aprovação final, pelo menos da Decisão Quadro da União Europeia, de modo a evitar que sejamos confrontados a breve prazo com a necessidade de introduzir alterações no que fosse agora aprovado.

O Ministro da Justiça, António Costa.

Entrada de iniciativa legislativa

Projecto de lei n.º 408/VIII Partido CDS-PP
Data de entrada (AR): 21.03.2001
Data de entrada (MJ): 30.03.2001

Assunto: Altera o artigo 172.º do Código Penal

1) O projecto de lei em causa visa criminalizar aquele que for encontrado na posse (aparentemente, crime não é possuir, mas ser encontrado) de material pornográfico - filme, fotografia ou gravação - envolvendo menor de 14 anos. O texto é o seguinte:

Artigo 1.º
O artigo 172.º do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de Setembro, na redacção que lhe foi

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dada pela Lei n.º 65/98, de 2 de Setembro, passa a ter a seguinte redacção:
«Artigo 172.º
(…)
3 - (…)
d) (…); ou
e) For encontrado na posse, exibir ou ceder a qualquer título ou por qualquer meio os materiais previstos na alínea anterior, é punido com pena de prisão até três anos.
4 - (…)»

2) A este propósito estão aprovados ou em vias de aprovação diversas iniciativas normativas internacionais, a saber:

a) Decisão do Conselho, de 29 de Maio de 2000, sobre o combate à pornografia infantil na Internet (Jornal oficial n.º L 138 de 09/06/2000 P. 0001), da qual não resulta qualquer obrigação de criminalizar a posse deste material;
b) Projecto de Convenção do Conselho da Europa (DRAFT CONVENTION On CYBER-CRIME - Draft N.º 24 REV2)

Texto:
Article 9 - Offences related to child pornography
1. Each Party shall adopt such legislative and other measures as may be necessary to establish as criminal offences under its domestic law when committed intentionally and without right the following conduct:
a) offering or making available child pornography through a computer system;
b) distributing or transmitting child pornography through a computer system;
c) producing child pornography for the purpose of its distribution through a computer system;
d) procuring child pornography through a computer system for oneself or for another;
e) processing child pornography in a computer system or on a computer-data storage medium;
2. For the purpose of paragraph 1 above «child pornography» shall include pornographic material that visually depicts:
a) a minor engaged in sexually explicit conduct;
b) a person appearing to be a minor engaged in sexually explicit conduct;
c) realistic images representing a minor engaged in sexually explicit conduct.
3. For the purpose of paragraph 2 above, the term «minor» shall include all persons under 18 years of age. A Party may, however, require a lower age-limit, which shall be not less than 16 years.
4. Each Party may reserve the right not to apply, in whole or in part, paragraph 1(d) and 1 (e), and 2 (b) and 2 (c).

O diploma do Conselho da Europa, cujo texto já está estabilizado, contém assim uma obrigação de criminalizar a posse mais vasta do que a proposta pelo PP. Mais vasta no que toca à idade (18 ou 16 anos) e mais vasta no tipo de material (inclui o desenho realista e um maior com a aparência de um menor). No entanto, as alíneas respeitantes à posse e ao material não «realista» permite a formulação de reservas.

c) União Europeia: Proposal for a COUNCIL FRAMEWORK DECISION on combating the sexual exploitation of children and child pornography

Texto:
(a) «Child» shall mean any person below the age of eighteen years;
(b) «Child pornography» shall mean pornographic material that visually depicts a child engaged in sexually explicit conduct;

Article 3
Offences concerning child pornography

1. Each Member State shall take the necessary measures to ensure that the following intentional conduct, whether undertaken by means of a computer system or not, is punishable:
(a) production of child pornography, or
(b) distribution, dissemination, or transmission of child pornography, or
(c) offering or otherwise making child pornography available, or
(d) acquisition and possession of child pornography.
2. Each Member State shall also take the necessary measures to ensure, without prejudice to definitions otherwise provided for in this Framework Decision, that the conduct referred to in paragraph 1 is punishable when involving pornographic material that visually represents a child engaged in sexually explicit conduct, unless it is established that the person representing a child was over the age of eighteen years at the time of the depiction.

Este texto é ainda, apenas, uma proposta da Comissão para a Decisão-Quadro do Conselho. A ser aprovado, ele vai, por um lado, mais longe do que a proposta do PP em dois pontos essenciais:
· A idade abrangida pelo conceito de infantil (menos de 18 anos)
· A definição do material pornográfico (representação visual, o que pode abranger, tal como a Convenção do Conselho da Europa, desenho ou análogo)
Por outro lado, fica aquém na medida em que não criminaliza a mera posse.

Síntese:
Neste momento, não existe para o Estado português nenhuma obrigação de criminalizar a posse de material de pornografia infantil; nem a ratificação da Convenção do Conselho da Europa acarretará necessariamente essa obrigação, uma vez que podem ser formuladas reservas no sentido de excluir ou modular essa punição.

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O projecto de decisão-quadro da UE, tal como se encontra, envolverá uma obrigação de criminalizar, e em termos completamente estranhos ao actual enquadramento legal da questão em Portugal e ao texto proposto pelo CDS-PP.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
António Fernando Marques Ribeiro Reis
António Fernando Menezes Rodrigues
Armando António Martins Vara
Emanuel Silva Martins
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Carlos Correia Mota de Andrade
Luís Manuel dos Santos Silva Patrão

Partido Social Democrata (PSD):
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Henrique José Monteiro Chaves
Manuel Joaquim Barata Frexes
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Mário Patinha Antão
Pedro Miguel de Azeredo Duarte

Partido Popular (CDS-PP):
Fernando Alves Moreno
Manuel Tomás Cortez Rodrigues Queiró

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
João Cardona Gomes Cravinho
João Francisco Gomes Benavente
José Manuel de Medeiros Ferreira
Vítor Manuel Alves Peixoto

Partido Social Democrata (PSD):
João José da Silva Maçãs
Joaquim Martins Ferreira do Amaral
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Durão Barroso
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira

Partido Popular (CDS-PP):
Paulo Sacadura Cabral Portas

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