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Quinta-feira, 29 de Novembro de 2001 I Série - Número 23
VIII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2001-2002)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 28 DE NOVEMBRO DE 2001
Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos
Secretários: Ex. mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
José de Almeida Cesário
António João Rodeia Machado
José Ernesto Figueira dos Reis
S U M Á R I O
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 15 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa das propostas de lei n.os 109 a 111/VIII, dos projectos de lei n.os 519 a 521/VIII, dos projectos de resolução n.os 164 e 165/VIII, das apreciações parlamentares n.os 54 a 57/VIII e ainda do projecto do Orçamento da Assembleia da República para 2002.
Foi discutida e aprovada, na generalidade, na especialidade e em votação final global, a proposta de lei n.º 111/VIII - Altera a Lei n.º 30-C/2000, de 29 de Dezembro, que aprova o Orçamento do Estado para 2001, tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (José Magalhães), do Sr. Ministro da Presidência e das Finanças (Guilherme d'Oliveira Martins) e do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (José Magalhães), os Srs. Deputados Manuela Ferreira Leite (PSD), Lino de Carvalho (PCP), Francisco Louçã (BE), António Pires de Lima (CDS-PP), Isabel Castro (Os Verdes), Fernando Serrasqueiro e Luísa Vasconcelos (PS), Paulo Portas (CDS-PP), Hugo Velosa e Jorge Neto (PSD) e Maria Celeste Cardona (CDS-PP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 13 horas e 40 minutos.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 10 horas e 15 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Aires Manuel Jacinto de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Américo Jaime Afonso Pereira
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
António Alves Marques Júnior
António Alves Martinho
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António Fernando Marques Ribeiro Reis
António Fernando Menezes Rodrigues
António José Gavino Paixão
António Manuel Dias Baptista
António Manuel do Carmo Saleiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Carlos Alberto
Carlos Alberto Dias dos Santos
Carlos José Gonçalves Vieira de Matos
Carlos Manuel Carvalho Cunha
Carlos Manuel Luís
Casimiro Francisco Ramos
Cláudio Ramos Monteiro
Eduarda Maria Castro de Sousa
Eduardo Ribeiro Pereira
Fernando Manuel de Jesus
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Serrasqueiro
Fernando Ribeiro Moniz
Filipe Mesquita Vital
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres
Gil Tristão Cardoso de Freitas França
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho
Helena Maria Mesquita Ribeiro
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco d'Almeida
Isabel Maria dos Santos Barata
Jamila Barbara Madeira e Madeira
João Alberto Martins Sobral
João Cardona Gomes Cravinho
João Francisco Gomes Benavente
João Pedro da Silva Correia
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Alberto Leal Fateixa Palmeiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Aurélio da Silva Barros Moura
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos da Cruz Lavrador
José Carlos Lourenço Tavares Pereira
José Carlos Pinto Basto Mota Torres
José da Conceição Saraiva
José de Matos Leitão
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Ernesto Figueira dos Reis
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Pires Epifânio
José Manuel Rosa do Egipto
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Miguel Marques Boquinhas
Jovita de Fátima Romano Ladeira
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Manuel Ferreira Parreirão Gonçalves
Luís Miguel Gomes Miranda Teixeira
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Francisco dos Santos Valente
Manuel Joaquim Barbosa Ribeiro
Manuel Maria Diogo
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Margarida Maria Santos Soares da Rocha Gariso
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira
Maria do Céu da Cruz Vidal Lourenço
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Luísa Silva Vasconcelos
Maria Teresa de Oliveira Ferreira Coimbra
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Paulo Alexandre Homem de Oliveira Fonseca
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Rui Manuel Leal Marqueiro
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Victor Brito de Moura
Victor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Alves Peixoto
Victor Manuel Caio Roque
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo
Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Álvaro dos Santos Amaro
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
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Ana Maria Martins Narciso
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António d'Orey Capucho
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Manuel da Cruz Silva
António Manuel Santana Abelha
António Paulo Martins Pereira Coelho
Armando Manuel Dinis Vieira
Arménio dos Santos
Armindo Telmo Antunes Ferreira
Artur Ryder Torres Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos José das Neves Martins
Carlos Manuel de Sousa Encarnação
Carlos Parente Antunes
David Jorge Mascarenhas dos Santos
Domingos Duarte Lima
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares
Eugénio Fernando Sá Cerqueira Marinho
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Jorge Loureiro de Reboredo Seara
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Santos Pereira
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Monteiro Chaves
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
João Bosco Soares Mota Amaral
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José da Silva Maçãs
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Martins Ferreira do Amaral
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José António de Sousa e Silva
José David Gomes Justino
José de Almeida Cesário
José Eduardo Rêgo Mendes Martins
José Frederico de Lemos Salter Cid
José Luís Campos Vieira de Castro
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel de Matos Correia
José Manuel Durão Barroso
Lucília Maria Samoreno Ferra
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Manuel Machado Rodrigues
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Pedro Machado Sampaio de Sousa Pimentel
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Castro de Almeida
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Joaquim Barata Frexes
Manuel Maria Moreira
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria do Céu Baptista Ramos
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Nuno Miguel Marta de Oliveira da Silva Freitas
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa
Pedro Manuel Cruz Roseta
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Miguel de Santana Lopes
Rui Fernando da Silva Rio
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Sérgio André da Costa Vieira
Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
Ana Margarida Lopes Botelho
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
João António Gonçalves do Amaral
Joaquim Manuel da Fonseca Matias
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Natália Gomes Filipe
Maria Odete dos Santos
Vicente José Rosado Merendas
Partido Popular (CDS-PP):
António de Magalhães Pires de Lima
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da Franca
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Luís José de Mello e Castro Guedes
Luís Miguel Capão Filipe
Manuel Tomás Cortez Rodrigues Queiró
Maria Celeste Ferreira Lopes Cardona
Narana Sinai Coissoró
Paulo Sacadura Cabral Portas
Raúl Miguel de Oliveira Rosado Fernandes
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro
Bloco de Esquerda (BE):
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
Deputado Independente:
José Daniel Rosas Campelo da Rocha
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início aos nossos trabalhos, que hoje são preenchidos com a votação na generalidade, na especialidade e votação final global da proposta de lei n.º 111/VIII - Altera a Lei n.º 30-
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-C/2000, de 29 de Dezembro, que aprova o Orçamento do Estado para 2001, o chamado Orçamento rectificativo.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário da Mesa vai dar conta dos diplomas que entraram na Mesa.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram aceites, as seguintes iniciativas legislativas: propostas de lei n.os 109/VIII - Procede à revisão da Lei das Finanças das Regiões Autónomas, que baixou à 5.ª Comissão, 110/VIII - Altera a Lei n.º 91/97, de 1 de Agosto (Define as bases gerais a que obedece o estabelecimento, gestão e exploração de redes de telecomunicações e a prestação de serviços de telecomunicações), que baixou à 6.ª Comissão, e 111/VIII - Altera a Lei n.º 30-C/2000, de 29 de Dezembro, que aprova o Orçamento do Estado para 2001; projectos de lei n.os 519/VIII - Alteração à Lei n.º 31-A/98, de 14 de Julho (Aprova a Lei da Televisão) (Os Verdes), que baixou às 1.ª e 9.ª Comissões, 520/VIII - Elevação da povoação de Cadima, no concelho de Cantanhede, à categoria de vila (Deputada do PS Maria do Céu Lourenço), que baixou à 4.ª Comissão, e 521/VIII - Estabelece a inversão do ónus da prova no âmbito da prestação de serviço público (PCP), que baixou às 1.ª e 4.ª Comissões; projectos de resolução n.os 164/VIII - Sobre a situação laboral das empresas em Portugal (CDS-PP), 165/VIII - Sobre a utilização de amianto em edifícios públicos (Os Verdes); apreciações parlamentares n.os 54/VIII (PCP) - Decreto-lei n.º 281/2001, de 25 de Outubro (Altera o Decreto-Lei n.º 34/2001, de 8 de Fevereiro, que institui o regime de modulações aplicável aos pagamentos concedidos aos agricultores no âmbito da Política Agrícola Comum, prorrogando por um ano o prazo da sua entrada em vigor), 55/VIII (PSD) e 56/VIII (PCP) - Decreto-lei n.º 276/2001, de 17 de Outubro (Estabelece as normas legais tendentes a pôr em aplicação em Portugal a Convenção Europeia para a Protecção dos Animais de Companhia e um regime especial para a detenção de animais potencialmente perigosos) e 57/VIII (PCP) - Decreto-lei n.º 280/2001, de 23 de Outubro (Aprova o regime aplicável à actividade profissional dos marítimos e à fixação da lotação das embarcações)
Srs. Deputados, informo a Câmara de que deu entrada na Mesa o projecto de Orçamento da Assembleia da República para 2002.
Em matéria de expediente é tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Agradeço que caracterize a matéria que está em causa, Sr. Deputado.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, a matéria em causa tem a ver com o processo de votação e com os documentos que irão ser votados no final deste debate do Orçamento rectificativo.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, quando, na semana passada, o Governo entregou este segundo Orçamento rectificativo não juntou o Mapa I, o mapa relativo à alteração das receitas do Estado. Depois de instado na Comissão de Economia, Finanças e Plano, distribuiu-o, a título informativo, à Comissão de Economia, Finanças e Plano e aos grupos parlamentares. Contudo, para efeitos de votação, o documento tem de dar entrada durante o debate, nos termos regimentais. E é para isto que chamamos a atenção da Mesa, do Governo e, em particular, da bancada do Partido Socialista, ou seja, para darem entrada do Mapa I de forma a que possa ser junto ao articulado, a fim de poder ser votado, na medida em que não basta a entrega feita, a título informativo, na Comissão.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (José Magalhães): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Deseja usar da palavra certamente para dar um esclarecimento.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Exactamente, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, é tão-só para fique em Acta que o documento a que o Sr. Deputado Lino de Carvalho se refere foi transmitido não só à Sr.ª Presidente da Comissão de Economia, Finanças e Plano como também, oficialmente e para todos os efeitos, ao Sr. Presidente da Assembleia da República, como mandam o Regimento e a cortesia institucional. Assim, a bancada do Partido Socialista adoptará, nesta sede, todas as medidas necessárias para a assunção parlamentar do documento, que é oficial.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, uma vez que foi entregue o Mapa I, o qual, obviamente, terá de ser alterado, primeiro deverá ser introduzido um artigo na proposta de lei apresentada pelo Governo. Se o Partido Socialista não o fizer, o PSD já tem pronta uma proposta de alteração para ser entregue na Mesa.
O Sr. Presidente: - O Governo e o Partido Socialista tomarão em consideração a intervenção da Sr.ª Deputada.
Srs. Deputados, vamos, então, dar início à discussão da proposta de lei n.º 111/VIII.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro da Presidência e das Finanças (Guilherme d'Oliveira Martins): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O respeito pelos princípios fundamentais de rigor e de coesão social determina que ponhamos o contribuinte e o cidadão em primeiro lugar e que nos disponhamos a usar a transparência e o rigor como marcas de acção no sentido de apelarmos à responsabilidade de todos.
Sr. Presidente, talvez fosse de…
O Sr. Presidente: - Tem toda a razão, Sr. Ministro.
Srs. Deputados, agradeço que guardem o necessário silêncio para o Sr. Ministro poder ser ouvido em condições normais por toda a Câmara.
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Faça favor de prosseguir, Sr. Ministro.
O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Há alguns dias ouvimos aqui o desafio sobre a necessidade de clarificação a respeito de saber de onde partimos para aprovar o Orçamento do Estado para 2002. A resposta não se fez esperar, não poderia deixar de ser dada com muita clareza. Logo, na altura, dissemos que cumpriríamos os objectivos da despesa pública em 2001, objectivos a que nos obrigámos em Junho, acrescentando que faríamos funcionar a margem de manobra que o Pacto de Estabilidade e Crescimento nos permite, para não sacrificarmos os compromissos de investimento público e as obrigações de natureza social.
Aqui, estamos a cumprir o que dissemos e aquilo a que nos obrigámos, sem atrasos nem hesitações. Concordámos, afinal, com o que aqui muitos afirmaram, que deveríamos apresentar a alteração necessária ao Orçamento para 2001 antes da aprovação do plano financeiro para o próximo ano.
Trata-se, pois, de uma alteração à Lei do Orçamento do Estado, originada pela quebra de receita pública inerente ao abrandamento económico. Estamos perante uma alteração que não se traduz em aumento de despesa pública mas, sim, numa cautelosa previsão de aumentos da dívida pública para compensar a redução de outras receitas. Estamos, pois, perante uma previsão que visa fundamentalmente garantir que o efeito multiplicador das despesas de investimento possa funcionar plenamente, sobretudo num momento crucial, como o que atravessamos, no qual ocorre a entrada, em velocidade de cruzeiro, do QCA III.
Seria inaceitável e contrário ao interesse nacional não aproveitarmos a flexibilidade inerente ao Pacto, como está neste momento está a ser já utilizada pelos nossos parceiros da União Europeia. Não se trata, pois, de uma questão apenas portuguesa mas, sim, de uma consequência do abrandamento económico e dos efeitos dos eventos de 11 de Setembro. E por muito que aqui assistamos à repetição de discursos dramáticos ou teatrais, a verdade é que o que estamos a fazer está a ser feito por todos os nossos parceiros europeus.
Não estamos, porém, a usar qualquer pretexto. Estamos, sim, com sentido patriótico, a criar condições sólidas e seguras para responder, através do investimento público e privado e de um reforço da confiança, aos novos desafios com que se defronta a nossa economia.
A comunidade internacional e as organizações económicas verificaram que as consequências da tragédia de Nova Iorque e de Washington são mais profundas e duradouras do que há um mês se previa. Entendemos, por isso, retirar as devidas consequências no momento próprio. Seria incorrecto não apresentar imediatamente a alteração ao Orçamento para 2001 e também seria errado não alterar o quadro macroeconómico e a previsão das receitas fiscais para 2002. Correndo o risco da incompreensão, a verdade é que agimos de acordo com o interesse nacional, usando o método da verdade e procedendo às alterações indispensáveis. Manda a verdade que se diga que muitos dos que disseram que deveríamos agir deste modo encontram agora outros argumentos para formular outras críticas, esquecendo os seus «conselhos» e desafios de há poucos dias. Seria bem melhor usarmos a coerência dos argumentos e a pertinência das soluções.
Para decidir bem temos de ser capazes de nos antecipar. Não queremos correr atrás dos acontecimentos, queremos criar condições para dominar a situação presente, com todas as suas dificuldades. Não nos condiciona o facto de estarmos a pedir uma segunda vez a este Parlamento que altere uma lei do Orçamento.
Em toda a Europa, os governos responsáveis estão ora a rever as suas receitas fiscais em baixa, ora a rever o respectivo quadro macroeconómico, ora a adoptar medidas visando apoiar o investimento e a confiança.
Poder-se-á usar de toda a demagogia, invocando as mais diversas raízes para o facto. O certo, porém, é que prosseguimos um esforço férreo em relação à despesa pública, para que o bem comum seja defendido, o que não pode fazer esquecer os efeitos inexoráveis do abrandamento económico em relação à receita.
A prioridade ao investimento público, o cumprimento dos objectivos de políticas sociais, a competitividade fiscal, a determinação no prosseguimento da convergência real com os nossos parceiros europeus: eis os objectivos fundamentais que temos de prosseguir. E se a cobrança de receita pública foi afectada em 2001 pelo abrandamento económico no valor de 3,5% a 6,5%, reportando-nos ao Orçamento rectificado em Junho passado, o certo é que este mesmo valor se repercute nas necessidades de financiamento, não poderíamos fazer outra coisa senão considerar os novos factos.
Qual o efeito da não aprovação desta alteração à Lei do Orçamento do Estado de 2001? As Sr.as e os Srs. Deputados sabem-no bem. Nesta altura do ano, com o fim do exercício à vista, só a despesa de investimento poderia ainda ser sacrificada, com consequências profundamente negativas de norte a sul do país e nas regiões autónomas. Não queremos fazê-lo, e quem votar contra esta alteração assume inteiramente as responsabilidades de não apresentar qualquer solução, prejudicando a consolidação dos projectos do QCA III. Onde está a coerência de quem aprova ou não alterações ao Orçamento ao sabor do vento ou das circunstâncias?
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Assumimos as nossas responsabilidades. Acreditamos sinceramente em que o País só sairá beneficiado por recusarmos interromper o investimento público ou atrasar os respectivos pagamentos. Queremos que o Estado seja uma pessoa de bem. Perante as graves dificuldades e incertezas na cena internacional, queremos que todos tenham consciência de que o espírito de crise se combate com vontade e espírito inconformista, antecipando as notícias que não são boas, de forma a usarmos este tempo para credibilizar as contas públicas e para apostar audaciosamente na convergência real com os nossos parceiros europeus.
Houve circunstâncias que mudaram fortemente. As previsões são instrumentos que queremos usar bem. Por isso, optamos por ser mais pessimistas e por usar aqui o pior dos cenários. Não há qualquer mistério. Há, sim, a firme intenção de usar bem o que o Pacto nos permite. Queremos, por isso, olhar sobretudo o futuro, esforçando-nos cada vez mais para que a consolidação das finanças públicas se faça no médio e longo prazos, em ligação com as mudanças no Estado e na Administração Pública, do lado da receita e da despesa pública, e, sobretudo, a pensar nos cidadãos.
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Se é verdade que não divergimos da Europa, o certo é que se nos exige mais e melhor convergência real e um esforço muito sério de recuperação da confiança, sem objectivos imediatistas e com um forte sentido do dever e da responsabilidade. Limpar as contas públicas, torná-las claras e transparentes, apostar no rigor e no serviço público - eis o que se nos exige.
Deixando de lado considerações superficiais e fáceis, a verdade é que foi o abrandamento económico o responsável pela redução das receitas fiscais. Cumprimos as reduções de despesa pública de 150 milhões de contos, decididas em 29 de Junho passado. No entanto, estando a despesa controlada e o Governo no uso da margem de manobra que o Plano de Estabilidade e Crescimento lhe dá quanto ao défice (como, aliás, está a acontecer em França e na Alemanha), só o facto de prevermos um défice maior em 2001 já levaria a que se fizesse uma rectificação. Preferimos, no entanto, realizar cálculos seguros, para não termos surpresas. Onde outros nos acusaram, precipitadamente, de sermos optimistas, assumimos, neste momento, um discurso do realismo e da dúvida metódica.
Mantemos, pois, o compromisso do controlo da despesa pública, de incentivo à boa despesa e de combate à má despesa, irreprodutiva e inútil, recusando quaisquer ilusões a este respeito.
Usaremos, pois, em suma, a dupla margem de manobra de que dispomos - no défice público e a no peso da dívida pública no PIB -, uma vez que, nesta matéria, somos, como todos sabem, um dos cinco países da União Europeia em melhor situação. Usaremos, assim, uma flexibilidade prudente para não sacrificarmos as políticas sociais e o investimento. Eis o que está em causa.
Optimismo ou pessimismo? Não se espere facilidade ou visão idílica das coisas. Recusamos as atitudes simplificadoras. Precisamos do mercado nacional a funcionar bem e com fronteiras abertas; precisamos da confiança dos agentes económicos e dos trabalhadores; precisamos de um Estado regulador sério e sistemático. Recuse-se, assim, qualquer pessimismo fatalista, porque do que necessitamos é de um pessimismo na inteligência a que seja capaz de corresponder um optimismo na vontade. Só assim mobilizaremos esforços, aproveitaremos oportunidades e atrairemos recursos e iniciativas criadoras para recuperarmos a nossa economia sem ilusões e com segurança. As dificuldades podem e devem ser motivadoras. Vamos trabalhar para que assim seja.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Manuela Ferreira Leite, Lino de Carvalho, Francisco Louçã, António Pires de Lima e Isabel Castro.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Ministro das Finanças vem hoje aqui dizer-nos que o País se endividou em mais 446 milhões de contos do que aquilo que o senhor tinha previsto no início do ano.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Foi um pequeno lapso!
A Oradora: - Sr. Ministro, trata-se de uma situação que não é um pormenor, não é um preciosismo da sua parte, é uma situação grave e muito significativa: são mais 446 milhões de contos relativamente àquilo que o senhor tinha previsto no início do ano.
Vozes do PSD: - Que vergonha!
A Orador: - Mas, pior do que isso, Sr. Ministro, é o facto de V. Ex.ª atribuir esta dívida a uma perda de receita e não se propor, sequer, a pagar as dívidas que tem para pagar.
O senhor disse que o orçamento da despesa estava controlado; está controlado no sentido de que o senhor consegue controlar o adiamento dos pagamentos, e, portanto, ao controlar o adiamento dos pagamentos não precisa de reforços na despesa para a pagar. Mas está com dívidas. Ao contrário do que aconteceu no primeiro Orçamento rectificativo, onde pretendeu pagar dívidas que estavam por solucionar, desta vez pô-las de lado e assenta a sua afirmação exclusivamente numa perda de receita.
Mas, como penso que se trata de uma questão grave e séria, porque não é coisa pouca, é de um grande significado, até em valores absolutos, a pergunta que tenho para lhe fazer, Sr. Ministro, é muito concreta e muito directa.
O Sr. Ministro esteve neste Plenário, há três semanas, a discutir o Orçamento do Estado para 2002 na generalidade e esteve na Comissão, há 15 dias, a discutir o Orçamento em sede de especialidade. Pergunto: o senhor sabia ou não deste endividamento, tão significativo, nas contas públicas?
Vozes do PSD: -Muito bem!
A Oradora: - Porque se o senhor sabia, então, cometeu uma falta grave relativamente à Assembleia da República, no que diz respeito aos Deputados e ao País. Veio fazer um discurso sobre o Orçamento do Estado para 2002, sabendo que estava com um endividamento muito superior àquele que nos estava a explicar e encobriu-o.
Mas, Sr. Ministro, vou dar-lhe o benefício da dúvida e vou admitir que o senhor, há 15 dias, não sabia. Como não sabia, foi, portanto, apanhado de surpresa.
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, esgotou o seu tempo regimental, agradeço que termine.
A Oradora: - Foi algo de repentino. Não conhecia. E, então, Sr. Ministro, devo dizer-lhe que estou perplexa, porque, quando eu pensava que havia um governo que tomava conta do País, percebi que ninguém toma conta de nós!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro das Finanças, se quiser responder, desde já, tem a palavra.
O Sr. Ministro da Presidência e das Finanças: - Sr. Presidente, é muito simples, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.
Risos do PSD, do PCP e do CDS-PP.
A Sr.ª Deputada parte de um pressuposto que não é correcto; parte do pressuposto que aquilo que aqui vimos solicitar é a regularização de uma dívida que nós já assumimos.
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Sr.ª Deputada, o limite da dívida que aqui vimos solicitar é aquele que queremos que o Parlamento legitime com inteira transparência e inteira verdade!
Não é dívida já assumida, Sr.ª Deputada, não podia ser, uma vez que não podemos emitir dívida se esta não for autorizada por este Parlamento.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É um «buraco»!
O Orador: - Mas também lhe digo, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, que o limite que aqui é solicitado, como tive oportunidade de referir na Comissão de Economia, Finanças e Plano, é o de segurança.
O Sr. José Luís Arnaut (PSD): - Oh!
O Orador: - E o Governo não espera vir a utilizá-lo completamente.
Mais: eu disse que o Governo virá a este Parlamento, porque é a sede própria, onde esse esclarecimento tem de ser feito, dar nota, em Janeiro, logo que tenhamos fechadas as contas, do modo como utilizámos esta autorização. É disto que se trata, Sr.ª Deputada.
Pergunta-me se eu tinha conhecimento desta situação quando apresentei à Assembleia o Orçamento do Estado para 2002 e quando estive na Comissão de Economia, Finanças e Plano. Sr.ª Deputada, relativamente a isto, funciona a transparência. E a transparência é o facto de eu ter divulgado todos os meses a situação relativa à cobrança de receita e à realização de despesa. Sabem os Srs. Deputados, tão bem como eu, qual é o ritmo de cobrança de receita. E, sabendo tão bem como eu qual é o ritmo de cobrança de receita, sabiam naturalmente que ela tinha de ser coberta de alguma maneira. Ora, a maneira regular, transparente, clara e rigorosa é esta: vir a este Parlamento, no momento próprio, solicitar a autorização respectiva. Para quê? Para garantir, Sr.ª Deputada e Srs. Deputados, que não haja atrasos nos pagamentos, que o investimento público seja inteiramente cumprido e respeitado, para garantir, afinal, que os compromissos assumidos perante o País sejam plenamente cumpridos!
A Sr.ª Deputada parte de um pressuposto de que estamos a fazer isto sozinhos, apenas por nossa alta recreação. Não, Sr.ª Deputada! A Sr.ª Deputada sabe que, ainda esta semana, os principais países-membros da União Europeia procederam a ajustamentos, a alterações, designadamente à aprovação de orçamentos rectificativos.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, sobre as razões que levam à apresentação deste segundo Orçamento rectificativo, designadamente a quebra de receitas de 349 milhões de contos, dos quais cerca de 200 milhões de contos são de receita fiscal e, em especial de IRC, é matéria que abordaremos na nossa intervenção e que indicia um grave défice do Estado, no combate à fraude e à evasão fiscais.
Mas a questão que queremos colocar agora, Sr. Ministro, tem a ver com a desconformidade entre o que nos é pedido e a documentação que nos é entregue.
O Governo solicita uma autorização da Assembleia para aumentar o endividamento em 446 milhões de contos, mas só nos apresenta uma quebra de receitas de 349 milhões de contos. Há, pois, aqui um diferencial não justificado de cerca de 100 milhões de contos, mais rigorosamente de 97 milhões de contos. Porquê, Sr. Ministro das Finanças?
O Sr. Ministro vem dizer-nos que esta é a sua margem de segurança. Mas, Sr. Ministro, no Orçamento, a margem de segurança está na dotação provisional. Se o Sr. Ministro quer ter margem de segurança, aumente a dotação provisional! Se não aumenta a dotação provisional, então tem de alterar os mapas de despesas efectivos, onde o Sr. Ministro não quer mexer com medo das críticas da direita!
Assim, apresenta-nos um Orçamento e um pedido de endividamento acima do nível do défice que o Governo aqui nos apresenta - um diferencial de 100 milhões de contos. Por isso, Sr. Ministro, queremos uma justificação política e jurídica para esta questão.
O Sr. Ministro, sabendo que o nível do endividamento tem de corresponder ao valor do défice, não pode vir aqui pedir-nos um valor de endividamento superior, em quase 100 milhões de contos, à quebra da receita sem alterar o mapa da despesa e, no mínimo, sem aumentar a dotação provisional, porque é aí que o Sr. Ministro tem de ter essa margem de segurança.
A razão é muito simples: o Sr. Ministro não quer mexer no mapa das despesas com medo das críticas da direita! Esta é a questão.
Sr. Ministro, já agora, acresce que no Mapa I, que nos entregou, as contas estão erradas. O Governo mantém o mesmo valor no total das receitas, quando, se se fizer as contas, o valor das receitas inscrito deveria ser superior em cerca de 100 milhões de contos, mais concretamente 97 milhões de contos.
Por coincidência, Sr. Ministro, este número, que está errado, do total das receitas do Mapa I é exactamente igual ao valor do endividamento a mais para o qual os senhores não têm cobertura. Não me parece que seja um mero erro de soma. Porém, se for um mero erro de soma, Sr. Ministro, faça favor de mandar rectificar. Mas parece-nos que esta é mais uma tentativa de escamotear, de enganar a Assembleia da República, apresentando valores que não são os reais para apresentar um nível de endividamento para o qual não tem cobertura no novo défice, para não ter de alterar os mapas das despesas.
A isto, Sr. Ministro, chama-se falta de rigor; a isto, Sr. Ministro, de facto chama-se vontade de enganar a Assembleia da República.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro da Presidência e das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, com toda a cordialidade que há muitos anos tem caracterizado as nossas relações, digo-lhe que a sua acusação é claramente injusta e despropositada. Por uma razão simples: o Sr. Deputado sabe bem que não há sinonímia, não há correspondência entre necessidades de financiamento solicitadas e défice. O défice é aquilo que se consegue no fim do exercício orçamental. Isso é o défice! E, sendo isto o défice - e não há aqui qualquer dúvida nem menor rigor, como o Sr. Deputado sabe -, temos de ser muito claros ao aprovar, no dia de hoje, como espero, esta alteração ao Orçamento do Estado, porque estamos, isso sim, a prevenir
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todas as situações de execução de receitas até ao final do mês de Dezembro. É disto que se trata, porque, como o Sr. Deputado sabe, o fecho das contas faz-se no dia 31 de Dezembro ou reportado ao dia 31 de Dezembro. E como calcula, eu entendo que é indispensável termos a prudência necessária para que a utilização deste limite, que está solicitado, se faça de acordo, estrito, com a quebra da receita que ocorrer.
Como calcula, o Governo não pode utilizar esta margem de manobra para além da quebra de receita. Não pode fazê-lo! E sendo isto inexorável - isto decorre da Constituição, decorre da lei -, é falaciosa a sua crítica, uma vez que, em bom rigor, esta é a margem de manobra que o Governo solicita à Assembleia para, depois, justificar à Assembleia, face ao ritmo concreto de cobrança de receitas, a dívida que teve de ser emitida. Para quê? Sabe bem, Sr. Deputado, que é para não se sacrificar o investimento e as obrigações fundamentais do Estado. Esta é a questão fundamental.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, para chamar a atenção da Mesa…
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tem de me dizer qual é a matéria que coloca em causa, se fizer favor.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, tem a ver com a violação da Lei de Enquadramento Orçamental, que o Governo acaba de anunciar.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa, mas isso não é matéria da ordem de trabalhos!
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Porque a margem de segurança do Governo, Sr. Presidente,…
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, peço desculpa, mas não pode alegar!…
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - … está na dotação provisional.
O Orador: - O Sr. Deputado não pode fazer alegações.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Não está em…
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, ainda não lhe dei a palavra.
Peço desculpa, mas não está em causa a ordem de trabalhos. O Sr. Deputado fará outras intervenções, na altura própria, pois já está inscrito.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Mas é evidente, Sr. Presidente, que estamos a caminhar para uma votação que não está conforme…
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado fará as alegações que entender quando usar da palavra para intervir. Agora, não pode introduzir aqui uma alegação fora de tempo e sem ser ao abrigo da figura regimental própria.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.
O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, raras vezes o Governo se apresentou tão frágil aqui, na Assembleia.
Porque, repare, Sr. Ministro, está a reconhecer dois pontos essenciais acerca dos quais, no debate preparatório deste Orçamento rectificativo, o Governo fez, até há poucos dias, finca-pé na posição exactamente contrária àquela que aqui adopta.
Em primeiro lugar, sobre o Pacto de Estabilidade e Crescimento, aquilo que nos está a dizer, Sr. Ministro, é que a conformidade das declarações do Governo sobre a execução orçamental em relação ao programado, no âmbito do Pacto, foi um obstáculo à verdade das contas públicas e não um instrumento para o controlo da despesa e para a disciplina orçamental.
Foi-nos dito que era preciso manter esse princípio de rigor e conformidade; agora vem dizer-nos que o défice, que estava previsto em 502 milhões de contos, passa para 896 milhões de contos, que é exactamente a conta que nos apresenta agora - repito, 896 milhões de contos, praticamente duplicando o défice! E prova-nos que as oposições tinham razão, aquelas que disseram que a conformidade com o Pacto de Estabilidade e Crescimento impedia, numa política de resposta à crise, a adopção das medidas capazes de combater o ciclo negativo.
Mas o aspecto mais importante da fragilidade do Governo, neste Orçamento rectificativo, é a queda das receitas. Até há poucos dias atrás, a sua equipa ministerial insistiu, continuou a teimar em que não havia queda de receitas, previsível, ao nível a que agora nos situa. Com uma queda de 10% no IRC, na execução de Outubro, ainda há duas semanas atrás nos diziam que, em Novembro e Dezembro, ocorreria o «milagre das rosas» e chegaríamos aos índices positivos. Resultado: IRC, queda de 128 milhões de contos; IVA, queda de 104 milhões de contos; diminuição das receitas correntes da ordem dos 10%, quase 11%.
Ora, o problema central, Sr. Ministro, e é a razão pela qual este Orçamento rectificativo só pode ser rejeitado pela esquerda, é a queda das receitas fiscais, e esta é a «prova provada» da necessidade de uma reforma fiscal.
No momento em que se constituiu a «fronda» social contra a reforma fiscal e em que o Governo deu um sinal da cedência ficou comprovado que, quando o Sr. Ministro se juntou àqueles que queriam enfraquecer esta reforma, que queriam pô-la em causa - e puseram-na, nos factos, nas declarações e na sua prática social -, era precisa capacidade e coragem para dizer que a democracia coloca, de um lado, a maioria dos cidadãos portugueses, que, pagando impostos, exigem o rigor fiscal, e, do outro, aqueles que querem as isenções e, portanto, a continuação da política de fraude. E, estes, neste Orçamento, ganharam! É por isso que se acentua o défice e é por isso que constatamos que não pagaram impostos.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro da Presidência e das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, há uma contradição evidente na sua intervenção e no seu raciocínio. Reclamou, durante muito tempo, a necessidade de flexibilizarmos
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ou, melhor, na sua perspectiva, o facto de não cumprirmos os compromissos consagrados no Pacto de Estabilidade e Crescimento e vem agora dizer-nos que a flexibilidade que aqui propomos não será suficiente, não será adequada.
Ora, Sr. Deputado Francisco Louçã, sabe bem que, para cumprimos os compromissos que estão no próprio Orçamento do Estado, designadamente no que se refere à despesa de investimento, torna-se necessário realizar a despesa para que ela tenha efeito positivo na economia. Esta é a questão!
Diz o Sr. Deputado que estamos aqui a dizer o contrário do que dissemos ao longo do tempo. Sr. Deputado, estamos completamente à vontade em relação a isso, porque nunca escamoteámos os números, divulgámo-los sempre, e o Sr. Deputado sabe, exactamente como eu, qual é a situação. Repito: o Sr. Deputado sabe exactamente como eu.
Mais: a demonstração de que não queremos fazer qualquer leitura idílica relativamente à execução do Orçamento está no facto de apresentarmos esta proposta, para prevenir todas as situações relativas à execução do Orçamento até ao dia 31 de Dezembro. É esta a questão fundamental!
Agora, Sr. Deputado, há um ponto em que estamos inteiramente de acordo e posso garantir-lhe que haverá, aí, convergência de preocupações, que é no combate, sem tréguas, à fraude e à evasão fiscais, na defesa clara e inequívoca dos direitos e dos interesses da maioria dos cidadãos e dos contribuintes. Esta questão é essencial! E, Sr. Deputado, não acredito que a sua argumentação seja a correcta, uma vez que é indispensável que o cumprimento das mudanças fiscais, a salvaguarda dos princípios fundamentais nesta matéria, os quais constam da Constituição e da lei, obriguem, como vai suceder com a proposta de lei de Orçamento do Estado para 2002, à adopção de medidas claras e inequívocas de combate à fraude e à evasão fiscais. Nisto, estou do seu lado, Sr. Deputado! E parece-me que nenhum dos Srs. Deputados que aqui se encontram presentes poderá dizer o contrário sobre a necessidade de lutarmos, de forma clara e inequívoca, para defender os interesses daqueles cidadãos que aqui representamos.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Pires de Lima.
O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, com toda a simpatia, o seu percurso breve, tememos que não longo, de Ministro das Finanças tem sido um percurso de equívocos, enganos e contradições. Numa palavra, o seu percurso tem sido de pequenas, médias e, agora, grandes incompetências, as quais começam a tornar a sua posição verdadeiramente insustentável.
Em Junho, o Sr. Ministro esteve aqui, ao lado do ainda Ministro das Finanças de então, a apresentar o primeiro Orçamento rectificativo, garantindo a esta Assembleia que a despesa pública iria estar, a partir desse momento, controlada e que não haveria necessidade de um segundo Orçamento rectificativo.
Em Setembro, garantiu a todos os órgãos de comunicação social que o quiseram ouvir que o défice se iria cifrar, no final do ano, em 1,1% e pediu-nos que fizéssemos uma leitura inteligente do défice, confundindo défice com despesa e esquecendo a componente das receitas. Para toda a gente, o défice continua a ser igual a receitas menos despesas e, com base neste conceito, aquilo que se vai verificar no final do ano, Sr. Ministro, é que o défice das contas do Estado português vai ser, seguramente, superior a 2% e não de 1,1%, como o Sr. Ministro prometeu.
Em Outubro, o Sr. Ministro fez finca-pé em relação a um conjunto de premissas macroeconómicas que foram criticadas e discutidas por toda a oposição, em sede de discussão do Orçamento na generalidade, fez aprovar um orçamento com base nessas premissas, de uma forma que não queremos mais discutir, para, agora, a dois dias da discussão do mesmo, rever essas mesmas premissas em cima do joelho e por arrastão, dando razão à oposição.
O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!
O Orador: - Finalmente, apresenta agora um orçamento rectificativo número dois - e ainda não é, provavelmente, a última parte na história dos orçamentos rectificativos de 2001 -, que, para nós, é um verdadeiro mistério, um mistério técnico que exige explicação. Como é possível, Sr. Ministro, que se proponha um aumento do endividamento de cerca de 450 milhões de contos, quando o corte assumido nas receitas é apenas de 100 milhões de contos?! Precisamos de ter uma explicação técnica, cabal, rigorosa e competente, aqui e agora, para o diferencial de 350 milhões de contos, que, a nosso ver, encobre despesa oculta que os senhores não estão a conseguir controlar, nomeadamente na área do pessoal, e não arrecadação de receita fiscal muito superior àquela que têm previsto.
A grande questão, Sr. Ministro das Finanças, é a de que é impossível continuar a acreditar nos Ministros das Finanças do Eng.º Guterres, por muito mérito e estima que nos mereçam as pessoas que ocupam essa função. É impossível ser Ministro das Finanças credível e rigoroso de um Primeiro-Ministro que sustenta estas trapalhadas!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, esgotou o tempo de que dispunha.
O Orador: - Se me permite, Sr. Presidente, vou já terminar.
O Sr. Presidente: - Agradeço que o faça, Sr. Deputado.
O Orador: - Quero apenas perguntar ao Sr. Ministro das Finanças que consequências pessoais e políticas tirará se, como nós prevemos, houver necessidade de, durante o 1.º trimestre do próximo ano, apresentar um terceiro Orçamento rectificativo relativo às contas de 2001.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro da Presidência e das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Pires de Lima, estou um bocadinho atónito, em virtude desta parte final, porque o Sr. Deputado disse que - vou repetir e confirmará ou não o que vou dizer - seria necessário, no 1.º trimestre do ano de 2002, um novo Orçamento rectificativo relativo ao ano de 2001. Foi o que disse, não foi, Sr. Deputado?
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O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): - Exactamente!
O Orador: - Ora, muito bem!
Sr. Deputado, quero explicar-lhe que, entre nós, funciona o sistema de gerência, ou seja, temos de fechar as contas no dia 31 de Dezembro. Por conseguinte, todas as autorizações que não possam ser concedidas até ao dia 31 de Dezembro, já não o podem ser mais, relativamente ao Orçamento do Estado para 2001. Trata-se de um pequeno esclarecimento técnico que fica aqui plenamente sanado.
Mas, Sr. Deputado, quero ainda dizer-lhe o seguinte: quem tem consciência das realidades e das dificuldades não tem medo de rectificar o que tem de ser rectificado, não tem medo de dizer, no momento próprio, o que tem de ser dito, uma vez que se trata, no fundo, de assumir a verdade dos factos, o rigor e a transparência. Só assim limparemos as contas públicas portuguesas, só assim consolidaremos, a médio e longo prazos, a situação das nossas finanças públicas.
O que os Srs. Deputados gostariam, Sr. Deputado António Pires de Lima, era que viéssemos aqui fazer um qualquer exercício de prestidigitação, iludindo os factos, iludindo as circunstâncias. Mas não, Sr. Deputado! Para nós, a questão que se coloca, muito claramente, é a de que, um mês passado sobre a apresentação do Orçamento do Estado, houve circunstâncias, houve factores que nos levaram a dizer o que dissemos. Se não o tivéssemos feito, gostava de saber o que estariam, a esta hora, a dizer as oposições. Provavelmente, estariam a dizer que nós não tínhamos a coragem de assumir, com clareza, aquilo que tinha de ser assumido neste momento.
Aplausos do PS.
Mas, Sr. Deputado, não podemos ser criticados pelo que fazemos e pelo que deixamos de fazer! Estou certo de que, a esta hora, se não tivéssemos feito o que fizemos, os senhores estariam a dizer exactamente o contrário e a desafiar-nos para termos a coragem de fazer justamente aquilo que estamos a fazer.
Sr. Deputado Pires de Lima, aproveito, a propósito da clareza das contas - e, já agora, respondo ao Sr. Deputado Lino de Carvalho -, para vos pedir que leiam os mapas com atenção e que articulem as coisas.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente! Li todos! Os mapas estão todos lidos!
O Orador: - Sr. Deputado, como pode verificar, no Orçamento rectificativo que estamos a apresentar, temos em Passivos Financeiros (endividamento do Estado) 2588 milhões de contos.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!
O Orador: - No Mapa IV, a diferença, relativamente à despesa, aos Passivos Financeiros, é de 923 milhões de contos, uma vez que os passivos financeiros têm uma verba de 1664 milhões de contos.
O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr. Ministro.
O Orador: - Sr. Presidente, vou já terminar, são apenas mais 2 segundos, dado que este esclarecimento é importante e estou a poupar tempo à Câmara.
Por outro lado, relativamente ao endividamento dos fundos e serviços autónomos, temos, neste Orçamento rectificativo, aquilo que já tínhamos anteriormente, ou seja, 17 milhões de contos, o que, na soma, dá 940 milhões de contos.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Não dá!
O Orador: - Sr. Deputado, é a soma que dá!
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - O Sr. Ministro sabe que não é!
O Orador: - Se comparar bem, são estes os valores das receitas correntes.
O Sr. Presidente: - Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, não deixa de ser complicado o Governo dirigir-se à Câmara e ao País e, a propósito de um orçamento rectificativo, justificar e apelar à compreensão, à necessidade de gerar confiança, ao rigor e à transparência, quando é o próprio Governo o gerador de descredibilidade e de desconfiança. E o problema não está apenas no facto de, em Junho, há cinco meses, ter sido discutido um Orçamento rectificativo, o problema está nas próprias contradições que, nesta matéria, o Partido Socialista alimenta.
Mas é, verdadeiramente, difícil que alguém acredite em transparência e em rigor nas contas, quando o próprio Governo e o Partido Socialista são contraditórios. Aliás, recordo que, não há muito tempo, um Deputado da bancada do Partido Socialista, um dirigente do Partido Socialista, concretamente o Sr. Deputado Jorge Coelho veio a esta Câmara falar da possibilidade de ser apresentado um novo orçamento rectificativo, no momento em que o Governo continuava a insistir que ele não seria necessário.
Portanto, o que está em discussão não é saber se é este o momento indicado, porque, como é evidente, a acontecer, é este o momento certo - não é isto que está em causa -, o que está em causa é que se continua a brincar ao faz-de-conta e a não falar verdade em relação a algumas coisas.
Mas, Sr. Ministro, já que fala em limpeza de contas, o que gostávamos que esclarecesse, para além da quebra de receitas assumida, eram outros aspectos que importa, necessariamente, avaliar, para saber em que medida é que estamos ou não a «arrumar» correctamente as contas. Há desorçamentação, há dívidas que estão por pagar - das universidades, dos hospitais -, há devolução de impostos que não foi feita, pelo que gostaríamos de saber qual é o seu montante exacto, para vermos com que é que podemos contar no médio prazo.
Mas, se se fala em clarificação e transparência, há, seguramente, uma questão, Sr. Ministro, que nos parece essencial, que é o escândalo da fuga fiscal. E, em relação à fuga fiscal, que é um problema recorrente e, aparentemente, uma preocupação do discurso do Governo, entendo que, muito mais do que discurso, preocupação e manifestar intenções, importa proceder a alterações.
No entanto, sobre essa matéria, aquilo que o Governo disse foi muito pouco, como diz, aliás, muito pouco sobre as razões que justificam a ineficácia da máquina administrativa,
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a tal ponto que pode continuar a existir uma economia paralela que não paga impostos e uma situação que é perfeitamente insultuosa, a de quem tem maiores recursos continuar a pagar menos impostos!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro da Presidência e das Finanças: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, agradeço-lhe as questões que colocou e os dois aspectos positivos que registo nas suas palavras.
Em primeiro lugar, a Sr.ª Deputada reconheceu aquilo que todos temos de reconhecer, ou seja, que este é o momento próprio para estarmos a discutir este tema.
Em segundo lugar, a Sr.ª Deputada foi clara e inequívoca quanto à necessidade de cerrarmos fileiras no combate à fraude e evasão fiscais. Devo dizer que esta é uma questão essencial num regime democrático e na qual o Governo e a Assembleia deverão trabalhar em conjunto. Quanto a este ponto, não posso estar mais de acordo consigo, Sr.ª Deputada, não só porque a transparência e o rigor são essenciais como também temos necessidade de, em cada momento, conhecer a situação exacta para podermos consolidar as finanças públicas.
Continuando a minha resposta por «fascículos» ao Sr. Deputado Lino de Carvalho, para poupar tempo à nossa…
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Ficaram levemente incomodados!
O Orador: - Não, Sr. Deputado! Não ficamos incomodados. Como calcula, Sr. Deputado Lino de Carvalho, a verdade é indispensável e não se compraz com uns temas em detrimento de outros!
Chamo a sua atenção para o Mapa I e para o facto de ter havido um equívoco da sua parte. É que há alguns aspectos que estão remetidos para o Mapa I que já existe…
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Eu sei!
O Orador: - … e, nesta medida, a conta está certa, como sabe!
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Não está, Sr. Ministro! Meta isso na sua máquina de calcular!
O Orador: - Peço desculpa, mas a conta está certa, Sr. Deputado!
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Mostro-lhe como não está, Sr. Ministro.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças: Estamos a discutir o segundo Orçamento rectificativo de 2001 e não posso deixar de dizer que o Presidente do meu partido tinha razão quando, no debate na generalidade do Orçamento para 2002, desafiou o Governo a apresentar um segundo Orçamento rectificativo. Na altura, o Sr. Primeiro-Ministro reagiu de uma forma pouco convicto - não me pareceu muito convicto quanto à urgência dessa apresentação -, mas a verdade é que, estando agora perante a apresentação desse segundo Orçamento rectificativo, não posso deixar de dizer que ao ter a perda de receita por mote, este Orçamento tem um mote inesperado, porque quando se pedia um segundo Orçamento rectificativo para 2001, pensava-se não apenas má evolução da receita mas também na falta de pagamento de muitas despesas e, portanto, de dívidas, das quais tínhamos conhecimento através das notícias.
O Governo veio apresentar o Orçamento rectificativo sob o mote da perda de receita e a essa perda de receita, nunca de forma muito directa e talvez nem sempre muito bem referida, está sempre subjacente a ideia dos acontecimentos de 11 de Setembro, que, tendo provocado alguma insegurança e incerteza no panorama económico, estão na base desta correcção que agora é necessário fazer. Não seria preciso, mas não deixo de relembrar ao Sr. Ministro que já passaram pouco mais de dois meses sobre os acontecimentos de 11 de Setembro. Já estamos, portanto, em Novembro, há uma perda tremenda de receita e é absolutamente extraordinário que ainda ninguém tenha referido - eu ainda não ouvi - um aspecto que penso que já devia ter sido trazido a lume, que é a introdução da reforma fiscal feita por este Governo no início do ano.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Percebemos, portanto, que a vigência de uma reforma fiscal durante um ano não é argumento para a perda de receita, e que o argumento seja o abrandamento económico que surgiu no panorama há pouco mais de dois meses! Sr. Ministro, é extraordinário que isto possa ser assim!
Aplausos do PSD.
Isto significa, Sr. Ministro, que o Governo está a esconder-se atrás de um acontecimento trágico para evitar confessar o falhanço de uma reforma, que, como já tínhamos dito, não tinha hipótese de sobrevivência.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Sr. Ministro, nenhuma reforma fiscal pretende apenas simplificar processos mas, sim, captar mais receita, trazendo para o sistema pessoas que não pagavam impostos.
O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Muito bem!
A Oradora: - Uma reforma não deve levar ao agravamento de impostos mas, sim, criar as condições para que estes possam ser reduzidos. Só pode ser este o objectivo de uma reforma fiscal.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
A Oradora: - Com esta reforma fiscal chegamos à conclusão de que quem não pagava continua a não pagar e de quem pagava passou a pagar menos.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Nem mais!
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A Oradora: - Isto porque nunca houve uma quebra de receita semelhante a esta que se verifica. Como tal, Sr. Ministro, o facto de não se ter invocado ainda o falhanço da reforma fiscal é uma desresponsabilização que só pode prejudicar as expectativas dos agentes económicos e dos cidadãos, o que não é próprio de um Governo que pretende levar a cabo uma política transparente e capaz de fomentar o desenvolvimento da actividade económica. Por isso lhe pergunto, Sr. Ministro: como é possível aos portugueses continuarem a confiar no vosso Governo, se este ponto essencial ainda não veio sequer a debate?
Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!
A Oradora: - Depois, Sr. Ministro, mais uma vez afirmo que o Governo reagiu perante esta quebra de receita como se ela constituísse uma surpresa. Reagiram de surpresa, de repente, como se não fosse algo de grave que estava a acontecer. Mas esta surpresa e esta reacção repentina vêm dar-nos a convicção de que não preveniram uma situação grave, não tomando quaisquer medidas, não evitando ou corrigindo nada, ou seja, não governaram perante uma situação grave que se antevia no panorama.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
A Oradora: - Os senhores assistiram ao desenrolar dos acontecimentos, viram a receita a cair e não tomaram medidas, deixaram o assunto continuar a evoluir e é por isso que lhe pergunto, mais uma vez, como é que pretendem que os portugueses continuem a confiar no vosso Governo.
Não deixo, no entanto, de lhe dizer que a alteração que teve de fazer ao Orçamento de 2001 teve consequências sérias - como V. Ex.ª, aliás, já reconheceu - no Orçamento para 2002. Isto é, o Sr. Ministro, ao ter apresentado este Orçamento rectificativo de 2001, o que o obrigou a rectificar e alterar o Orçamento para 2002, veio dizer que aquele Orçamento para 2002 que aqui aprovámos, na generalidade, há três semanas era falso, o que é algo de verdadeiramente espantoso!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É isso mesmo!
A Oradora: - É algo de espantoso porque os senhores defenderam o Orçamento do Estado para 2002 com todas as explicações e esclarecimentos, fizeram várias afirmações sobre esta matéria e não reagiram, ou reagiram ao contrário, às críticas feitas pela oposição salientando o irrealismo da receita. Todos falámos aqui do irrealismo da previsão da receita e, nessas circunstâncias, há três semanas, o senhor e a sua equipa defenderam o fundamento dessa receita. Todos sabemos, ou todos calculamos, o que aconteceu, porque não acredito que V. Ex.ª não soubesse, que tenha sido apanhado de surpresa, de repente, por esta evolução. E o que aconteceu, Sr. Ministro, é que o Governo pretendeu apresentar o Orçamento rectificativo depois das eleições autárquicas, mas, por motivos de necessidade da sua aprovação, aproveitou a presença de um Deputado nesta Casa para viabilizar este Orçamento.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Ou seja, o Sr. Ministro geriu este dossier de acordo com critérios de oportunismo político…
Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!
A Oradora: - … e não de acordo com critérios de racionalidade e de seriedade económicas!
Aplausos do PSD.
Nestas circunstâncias, Sr. Ministro, pergunto-lhe, novamente: como é que quer que os portugueses continuem a confiar neste Governo?
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Sabemos que a má estimativa da receita, uma receita estimada acima das possibilidades de cobrança, não tem um efeito menor, o que nos permitiria, depois, fazer acertos no mapa da receita ou pedir para nos endividarmos mais. Não é só isto, Sr. Ministro. V. Ex.ª sabe bem que não é apenas esta a consequência de uma receita sobrestimada. O problema grave que aqui está colocado é que os senhores, ao terem teimado na evolução da receita, ajustaram a despesa a uma receita que sabiam que não podiam cobrar, pondo o País a viver acima das suas possibilidades.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Endividaram mais uma vez o País e puseram-no a caminho do descalabro para o qual já estávamos verdadeiramente a evoluir!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
A Oradora: - Quando o Governo apresentou um Orçamento rectificativo em Junho, fê-lo com o objectivo de pagar dívidas, mas a verdade é que apresenta este segundo Orçamento rectificativo com o objectivo de ultrapassar o problema de receita, invocando o Sr. Ministro que o Pacto de Estabilidade e Crescimento nos dá margem suficiente para não mexermos no investimento. Penso que todos percebem o que o Sr. Ministro quer dizer com isto: quer dizer-nos que, neste momento, o Orçamento não tinha qualquer margem, a não ser que se cortasse na despesa de investimento. Considero preocupante e lastimável que quando o tal défice permitido pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento, por motivos trágicos, nos permite gozar de alguma folga não a utilizemos para, por exemplo, dar um choque fiscal à economia. Podíamos, por exemplo, usar essa folga para provocar um violento choque fiscal através de uma quebra de receita, de uma redução drástica dos impostos, concretamente do IRC, mas não é para isto que a estamos a utilizar. Porquê, Sr. Ministro? Porque não temos qualquer margem na receita ou na despesa que nos permita levar a cabo qualquer política desta natureza. Ao invés disso, ficamos à espera dos acontecimentos, ficamos a ver como eles evoluem, sabendo que, se a receita cair, aumenta-se a dívida e que, se a despesa aumentar, deixa-se de pagar. Não há, portanto, qualquer espécie de controlo ou de política orientada neste sentido.
Julgo que qualquer Deputado desta Casa é capaz de defender que se alivie a restrição do défice numa situação de crise, desde que haja daí qualquer espécie de benefício para a situação económica. No entanto, ninguém defenderá esse aligeirar da restrição do défice por perda de receita, que provavelmente não se cobra por
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por causa de uma reforma fiscal falhada que fez fugir dinheiros e que aumentou a evasão. Sr. Ministro, este curso de acção não faz nada pela situação económica, ao contrário do que aconteceria, por exemplo, com um choque fiscal ou de um aumento de despesa em investimento, e então percebia-se. No entanto, não há qualquer aumento de despesa em investimento, apenas se procura evitar a redução dessa despesa. Isto é, este Governo está à beira de cortar na despesa, mas apenas na despesa de investimento, o que me permite dizer que os senhores não têm margem, ou não querem tê-la, porque não fizeram qualquer espécie de reforma para reduzir a despesa corrente, como era necessário.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
A Oradora: - Onde é que estão as políticas de reformas para que haja uma redução da despesa corrente e para que o Sr. Ministro não torne a vir dizer-nos que, se houver uma quebra de receita, temos de cortar no investimento?! Não podemos cortar no investimento, Sr. Ministro, e é por isso que o desafio a apresentar as reformas necessárias para podermos cortar na despesa corrente. Não existe nenhuma, Sr. Ministro, e, assim, estamos todos a dirigir-nos para um caminho que é altamente preocupante!
Quando no final da discussão deste Orçamento rectificativo tivermos a percepção de que nos endividámos em mais 446 milhões de contos, de que não temos margem de manobra para reduzir a despesa corrente e de que não temos margem de manobra para reduzir os impostos, porque, mesmo com os impostos que existem, a receita não se cobra, estaremos verdadeiramente «sem rei nem roque», estaremos verdadeiramente sem ninguém que tome conta de nós e com tudo destruído! Gostava, portanto, de saber, Sr. Ministro, qual é a perspectiva que este Governo é capaz de dar a este País para que haja alguém que tenha qualquer espécie de fundamento para continuar a confiar neste Governo.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, os Srs. Deputados Fernando Serrasqueiro e Luísa Vasconcelos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro.
O Sr. Fernando Serrasqueiro (PS): - Sr. Presidente, Dr.ª Manuela Ferreira Leite, já nos habituou ao sistemático discurso da crise, que normalmente ocorre durante a discussão do Orçamento do Estado. Na verdade, Sr.ª Deputada, da sua parte vem sempre o discurso de que está para «cair o céu», de que os impostos vão aumentar, de que o desemprego vai crescer. Enfim, a Sr.ª Deputada traz-nos sempre uma novidade em termos de crise.
Permita-me que realce várias contradições resultantes da sua intervenção.
A Sr.ª Deputada começou por nos desafiar a apresentar o segundo Orçamento rectificativo, para depois nos criticar por o termos apresentado. Ou seja, começa por exigir o Orçamento rectificativo e depois critica-o.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!
O Orador: - Mais: diz que o Orçamento rectificativo, a surgir, deveria surgir após as eleições autárquicas. Como o Orçamento rectificativo é apresentado como preparatório da discussão do Orçamento do Estado para 2002, discussão que vamos ter da parte da tarde, critica-o porque ele aparece por motivos obscuros.
Dr.ª Manuela Ferreira Leite, diz a Sr.ª Deputada que estamos perante um Orçamento rectificativo por causa (faltava ainda essa!) da reforma fiscal. Gostaria que me esclarecesse que impacto tem a reforma fiscal nesta quebra da receita.
O Sr. Durão Barroso (PSD): - Então não tem?!
O Orador: - Diga-me, imposto a imposto, Dr.ª Manuela Ferreira Leite, qual foi essa quebra e que impacto é que teve.
Protestos do PSD.
A crítica que temos ouvido da parte do PSD relativamente à reforma fiscal é sempre a crítica referente às mais-valias. Ora, as mais-valias produzem de receita 1 ou 2 milhões de contos, no máximo. Se a Sr.ª Dr.ª Manuela Ferreira Leite entende que 2 milhões de contos resolvem o problema… Não sei como é que quer resolvê-lo pela via da reforma fiscal!
Protestos do PSD.
Se o problema é ao nível do IRC, o que se fez foi passar de 34 milhões de contos para 32 milhões de contos, e a Dr.ª Manuela Ferreira Leite vem hoje sugerir que deve passar para 28 milhões de contos. Se o problema que a reforma fiscal introduziu é ao nível do IRS ou ao nível do IRC… Dr.ª Manuela Ferreira Leite, descubra lá outra justificação, que não a da descida dos impostos. É que, contraditoriamente, o PSD vem sugerir que deveria haver um choque, sendo que esse choque seria o de passar para 28 milhões de contos. Não estou a ver alguma lógica neste processo para poder justificar a quebra das receitas!
Dr.ª Manuela Ferreira Leite, a redução da despesa corrente já foi feita no primeiro Orçamento rectificativo.
O Sr. José Luís Arnaut (PSD): - Ai sim?!
O Orador: - Ó Sr. Deputado, se não se importa, estou a falar para a Dr.ª Manuela Ferreira Leite!
Aplausos do PS.
Dr.ª Manuela Ferreira Leite, no primeiro Orçamento rectificativo, como bem se deve recordar, houve um corte muito significativo na despesa corrente.
Entende que é pela via da redução da despesa corrente, por coincidência até da despesa social, que deveríamos ir? Entende a Sr.ª Deputada que o corte deveria ser feito no investimento? Então, o investimento, ele próprio, não produz riqueza? Só é pela via do choque fiscal?
Dr.ª Manuela Ferreira Leite, o reforço do investimento, que é continuado no Orçamento do Estado para 2002, produz, ele próprio, através de um efeito multiplicador, riqueza, novos rendimentos, nova cobrança de impostos, sendo, pois, virtuoso sob esse aspecto.
Vozes do PS: - Muito bem!
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O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro, quando o PSD exigiu a apresentação do Orçamento rectificativo estava cheio de razão. Isto porque se estava a ver pela evolução da receita e pela evolução da despesa que o quadro que o Governo aqui nos estava a apresentar para discutirmos o Orçamento do Estado para 2002 era falso…
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - … e que aquilo que estávamos a discutir era uma verdadeira ficção!
Tanto assim era, Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro…
Protestos do Deputado do PS Fernando Serrasqueiro.
Não percebo onde é que está a sua dúvida. É que eu não estou a criticar que o Governo tenha apresentado um Orçamento rectificativo. Estou a criticar, isso sim, que o Orçamento rectificativo não tenha sido apresentado antes do Orçamento do Estado para 2002.
Vozes do CDS-PP: - É evidente!
A Oradora: - É que escusávamos de ter tido o trabalho de analisar o Orçamento do Estado para 2002, de ter estado aqui a discuti-lo e a aprová-lo, para, de seguida, o deitarmos fora e começarmos a estudar uma coisa completamente diferente. Isso é que eu critico!
Aplausos do PSD.
Pergunta-me o Sr. Deputado se eu sou capaz de dizer onde é que a reforma fiscal tem efeitos nos diferentes impostos. É óbvio que não tenho tempo, neste momento, para lhe explicar esta questão em pormenor, mas há um aspecto que o Sr. Deputado não vai com certeza negar: tem ou não tem aquilo que vocês chamaram uma reforma fiscal, a partir do início do ano? Tem ou não tem uma evolução de receita que, muito antes do 11 de Setembro, se via que estava a evoluir mal?
O Sr. José Luís Arnaut (PSD): - Exactamente!
A Oradora: - Então, tem uma reforma fiscal para fazer perder receita?!
Ó Sr. Deputado, «metam as reformas fiscais todas na gaveta», porque quando o Partido Socialista faz uma reforma é só para prejudicar o parceiro! Portanto, o que o Governo faz bem é, realmente, não fazer reformas!
O Sr. Deputado conhece algum caso de uma reforma fiscal que faça perder receita? É que se a apresentação do Orçamento rectificativo não é por causa da reforma fiscal, então, o Governo vai ter de vir explicar aqui, à Assembleia, qual é o motivo pelo qual, de repente, nós perdemos receitas que não se conseguem cobrar! Há-de dizer-nos porquê, dado que não tem nada a ver com o 11 de Setembro, uma vez que essa evolução já vinha a verificar-se.
Vozes do PSD: - Claro!
A Oradora: - Sr. Deputado, será que, por ineficácia ou incompetência do Governo (porque também pode ser, não excluo essa hipótese), os serviços da administração fiscal, de repente - vá-se lá saber porquê? - deixaram de funcionar! Bom, mas, se assim for, isso é culpa do Governo!
Por isso, Sr. Deputado, se me arranjar uma explicação melhor para a perda de receita, gostaria de conhecê-la.
Para finalizar, gostaria de lhe dizer que não me ouvirá, nunca, dizer que sou a favor do corte nas despesas de investimento. Se tiver paciência, Sr. Deputado, faça favor de analisar todas as intervenções que eu aqui fiz desde que estão no poder e verificará que sempre alertei para a inviabilidade e para a impossibilidade de algum dia os senhores se atreverem a cortar nas despesas de investimento. Sou uma defensora total das despesas de investimento.
O Sr. Presidente: - Faça favor de concluir, Sr.ª Deputada.
A Oradora: - Portanto, Sr. Deputado, aquilo que lhe pergunto, mais uma vez, é isto: onde é que está aquela célebre reforma da despesa pública que, em Junho, veio à Assembleia da República?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr. Deputada Luísa Vasconcelos.
A Sr.ª Luísa Vasconcelos (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, começo por cumprimentá-la e dizer-lhe que a Sr.ª Deputada apresentou um conjunto de argumentos que, embora toquem em temas importantes como a consolidação orçamental, a condução das finanças públicas e, até, os níveis de endividamento, neste caso concreto, na minha opinião, não são mais do que um emaranhado de argumentação que não se aplica à apresentação deste Orçamento rectificativo.
Isto porque a apresentação deste Orçamento rectificativo deve-se a uma quebra de receita resultante do abrandamento ao nível do crescimento das economias, abrandamento esse agravado pelo acontecimento de 11 de Setembro e não, como sugere a Sr.ª Deputada, ao descontrolo da despesa, ou à existência de dívidas, ou, ainda, à existência de um suposto falhanço ao nível da reforma fiscal, que, sabemos, tanto agradaria à direita nesta Assembleia.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Que seria se tivesse sido…!
A Oradora: - Por isso, pergunto, Sr.ª Deputada, se compreende ou não o significado de se estar a assistir em toda a Europa a processos de revisão em baixa ao nível do crescimento, independentemente de, nesses países, ter ocorrido ou não uma reforma fiscal.
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - Pergunto também se compreende ou não o significado de ter sido apenas hoje dada a indicação por parte da economia americana da existência de um processo recessivo, mas datando o início desse processo recessivo em Março.
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Por fim, pergunto se compreende que, sendo certo que faz parte de uma boa governação saber prevenir, não se pode nunca fazer equivaler previsão a antecipação, designadamente a antecipação de cenários catastróficos, que (e a Sr.ª Deputada com certeza concordará) só agravam, ao invés de auxiliar, a resolução dos problemas da nossa economia.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Luísa Vasconcelos, não vou falar mais da reforma fiscal. Mas vamos admitir a hipótese de que esta quebra de receita tem a ver com um abrandamento da actividade económica. Vou dar-lhe isto de barato!
Vamos, então, ponderar no seguinte: o que é que este Governo fez para minimizar esse abrandamento da actividade económica, que se previa que ia acontecer? Se a quebra de receita tem a ver com um abrandamento da actividade económica, o Governo tinha a obrigação de ter tomado as medidas necessárias e inerentes a esse cenário. Mas não o fez! Há 15 dias estiveram na Comissão e há três semanas estiveram aqui e tinham um cenário macroeconómico que previa um crescimento de receita em que ninguém acredita!
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Não havia crise!
A Oradora: - Todos nós dissemos que aquele crescimento da receita era inviável, sem sabermos que o cenário que estava subjacente na «cabeça» do Governo era bem pior do que aquele que estava aqui a ser apresentado. A Sr.ª Deputada não me vai querer dizer, com certeza, que esta evolução é dos últimos 15 dias! Creio que não vai dizer-me isso!
Por conseguinte, Sr.ª Deputada, o erro fatal deste Governo - que é o que faz com que, em relação a ele, não haja a mínima das credibilidades, que tenha perdido a total credibilidade - é exactamente porque, quando nos diz uma coisa, diz aquilo que lhe convém no momento, não diz aquilo que é essencial fazer-se para a evolução do País.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Portanto, o facto de este abrandamento da actividade económica (dou-lhe de barato que foi só isso) não ter levado a que o Governo tomasse medidas drásticas relativamente à despesa - porque os cortes que houve na despesa não corresponderam a nenhuma reforma, foi um corte cego, o Governo não tomou qualquer medida nessa matéria - significa que o Governo não teve a visão de Estado que lhe é exigida para tomar as medidas necessárias com vista a evitar a situação em que hoje nos encontramos, que, de resto, não é surpreendente. Estava-se à espera dela! Era óbvia!
Sr.ª Deputada, lamento se a antecipação dos cenários que faço são mais de crise do que aqueles que deveriam ser. Mas entendo que só assim é que um governo pode conduzir o País em segurança e não nesta intranquilidade que todos desconhecemos onde vai parar.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Aos ziguezagues!
A Oradora: - Pior do que o ziguezague é a cegueira, que faz com que o Governo esteja sem rumo e a levar-nos para algo que nos vai ser penoso conseguir ultrapassar!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A apresentação de propostas de alterações orçamentais pelos governos não é, só por si, motivo de escândalo. A evolução das situações económicas e da própria execução orçamental pode, naturalmente, obrigar a esse exercício, sem que daí venha mal ao mundo. A questão não é, pois, a da existência de Orçamentos rectificativos mas a das razões para a sua apresentação e para o seu conteúdo.
O PCP posiciona-se, pois, não pela apresentação em si e em abstracto de uma proposta de alterações orçamentais - mesmo sendo a segunda em relação ao mesmo Orçamento -, mas pelo seu conteúdo material. E, convenhamos, o conteúdo material deste segundo Orçamento rectificativo tem muita matéria para legítimas, profundas e preocupadas críticas. Nem tanto sequer pela sua justificação, mas, sobretudo, pelas razões escondidas atrás da justificação. Desde logo, porque os valores apresentados pelo Governo configuram uma deliberada intenção política de enganar a Assembleia da República.
O Governo começou por se recusar a apresentar o mapa alterado das receitas fiscais. Percebe-se agora porquê!
A quebra total de receita que nos é apresentada é de 349 milhões de contos. Na ausência de alterações na despesa, como o Governo tem argumentado (o que, aliás, não é verdade, como demonstraremos mais à frente), aquele deveria ser o valor que corresponde ao aumento do défice, e, portanto, à necessidade de aumento do nível de endividamento com vista ao seu financiamento. Mas o Governo propõe-nos um aumento do nível de endividamento em mais cerca de 100 milhões de contos.
A que se deve este mistério? É simples. É sabido que o Governo já ultrapassou - basta ver a execução de Outubro - o nível de despesas correntes autorizado pela Assembleia. Teria, por isso, obrigatoriamente, neste Orçamento rectificativo, de propor uma alteração aos mapas da despesa. Não o faz propositadamente. E não o faz, porque o Governo não quer assumir esse facto. Tem medo das críticas à sua direita e quer manter o défice, aparente, dentro dos limites do «bom aluno», não questionando frontalmente a irracionalidade, sobretudo em fase de abrandamento da economia, dos critérios decorrentes do Pacto de Estabilidade.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Por isso, prefere «martelar» o Orçamento do Estado.
O problema não está, Sr. Ministro, na comparação do Mapa I com o Mapa IV. A questão é que o aumento dos passivos de 923 milhões de contos não tem correspondência na quebra das receitas que nos é apresentada. Esta é que é a questão!
Constituem, pelos vistos, estes 100 milhões de contos a margem de segurança de que fala o Sr. Ministro das Finanças. Mas, Sr. Ministro, a margem de segurança é resolvida,
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resolvida, tem de ser resolvida, única e exclusivamente, através do aumento da dotação provisional - é para isso que serve a dotação provisional.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!
O Orador: - Ou, então, Sr. Ministro, tem mesmo de alterar o mapa das despesas. Nem vemos onde está o problema! Dentro, obviamente, de limites razoáveis, o aumento da despesa não é nenhum drama, designadamente quando tal tem a ver com a necessidade de aumentar o investimento público e as despesas sociais. Problema e drama é o que nos é apresentado: uma mentira orçamental, que só desprestigia as instituições e o País.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Acresce ainda, Sr. Ministro das Finanças e Sr. Primeiro-Ministro (que não está cá), que o total das receitas que o Governo apresenta no novo Mapa I (8,968 000 milhões de contos) e que é igual ao do primeiro Orçamento rectificativo, está «errado», insisto, está errado, também em quase 100 milhões de contos, mais precisamente em 96,7 milhões de contos. Deviam ser de 9,065 000 milhões de contos. Porquê? Trata-se de um mero erro de soma? Então, têm de o corrigir. Ou, face a esta estranha coincidência dos números, tal quererá dizer que o Governo, propositadamente, introduziu um número errado na soma total das receitas para melhor poder escamotear a necessidade de alterar o mapa das despesas, sabendo-se, como se sabe, que, à luz da Lei de enquadramento orçamental, o valor global das receitas mais os passivos financeiros - o nível de endividamento - tem de ser igual ao valor das despesas? Não o queremos crer, Sr. Ministro. No mínimo, é a mais completa e total falta de rigor.
Mas suspeitamos, Sr. Presidente, que alguns membros do Governo acreditaram demasiado nos disparates do livro do ex-ministro do Partido Socialista Marçal Grilo, pensando que aqui, na Assembleia, somos todos «uns tontos» e que quaisquer números orçamentais servem para enganar o Parlamento e o País. Enganam-se redondamente, como vários episódios do debate orçamental já o provaram amplamente, e, por isso, depois, fazem tristes figuras e têm de dar o dito por não dito.
Tudo isto constitui, Srs. Deputados, um facto sem precedentes, que deve merecer o mais severo julgamento desta Assembleia, e o mais severo julgamento é mandar este Orçamento rectificativo para trás, chumbando-o.
Mas, como se não fosse suficiente, há mais razões para recusarmos este segundo Orçamento rectificativo.
O Governo apresenta-nos uma quebra de receita fiscal da ordem dos 200 milhões de contos e 40% deste valor deve-se ao IRC. Será isto, como o Governo justifica, unicamente o resultado de um abrandamento do «dinamismo económico nacional e internacional»? Em parte é possível que sim. E só esta questão deveria ser alvo de uma profunda reflexão para, de uma vez por todas, se perceber as razões porque é que a nossa estrutura produtiva é aquela que, em toda a União Europeia, mais profundamente sofre periodicamente os efeitos dos ciclos de crises e menos está preparada para lhes responder. A isto não são estranhas, seguramente, as políticas económicas que têm sido seguidas e que têm vindo a destruir progressivamente o nosso tecido produtivo, sem capacidade competitiva, assente cada vez mais nos voláteis mercados financeiros e em meia dúzia de grandes grupos económicos, excessivamente dependente da procura externa.
Mas a crise económica não explica tudo. A quebra na cobrança da receita fiscal em relação ao projectado tem três grandes explicações.
A primeira é a sobreavaliação das receitas a arrecadar no Orçamento do Estado para 2001, que criou um cenário de ficção, para procurar esconder o défice real por causa do Pacto de Estabilidade. O Governo constrói, assim, Orçamentos de ficção, que, mais tarde ou mais cedo, acabam por rebentar, criando ainda mais dificuldades à expectativa dos agentes económicos e dos trabalhadores, bem como à credibilidade das previsões económicas e do País.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!
O Orador: - O Orçamento do Estado para 2002 sofre claramente da mesma megalomania orçamental. E, apesar de, a meio da sua discussão, o Governo já ter apresentado novas previsões para o crescimento económico, que, além do mais, colocam em causa todo um Orçamento já debatido e aprovado na generalidade, veremos se, em 2002, não teremos mais uns quantos Orçamentos rectificativos.
A segunda explicação está no laxismo com que tem sido encarada pelo Estado a cobrança da receita fiscal e o combate à fraude e à evasão. Conhece-se o escândalo que representa a fraquíssima tributação efectiva do sistema financeiro e o facto de um terço da sua poupança fiscal ter origem nas operações realizadas através do offshore da Madeira. O que fez o Governo, até ao presente, para atacar frontalmente este escândalo? Nada! Os interesses e as pressões da Associação Portuguesa de Bancos têm-se sempre sobreposto aos interesses do País, tal como os que se têm oposto a que termine o alto nível de benefícios fiscais não produtivos, que só no tempo dos dois governos do Partido Socialista cresceram 177%. Como, aliás, volta agora a acontecer no Orçamento do Estado para 2002, com a suspensão da tributação das mais-valias, com o alívio do controle de movimentos de capitais em offshore e, ainda, com as anunciadas benesses da autorização para a criação de uma nova provisão para os riscos anticíclicos da banca, não sujeita a tributação.
Mas também os impostos especiais de consumo são fonte de uma gigantesca evasão fiscal. São dignos de um filme do tempo da lei seca os célebres carrosséis de entrepostos, que continuam calmamente a existir e por onde se esvai grande parte do imposto sobre o tabaco e dos impostos sobre as bebidas alcoólicas.
Como igualmente poderíamos falar, Sr. Ministro, nos sucessivos e escandalosos perdões fiscais que, periodicamente, se vão conhecendo e que são também uma das causas da quebra de receita. O último é o perdão de 2 milhões de contos a empresas portuárias de Setúbal. Uma das empresas em causa, gestora de mão-de-obra portuária e cliente de um conhecido escritório de advogados de Lisboa, conseguiu que a Direcção de Serviços da Justiça Tributária, tutelada pela Direcção-Geral de Impostos, considerasse que a empresa em causa, sem património conhecido, fosse considerada uma associação sem fins lucrativos,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Um escândalo!
O Orador: - … e, por isso, nem ela nem os seus administradores têm de responder pelas dívidas fiscais.
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Vozes do PCP: - Uma vergonha!
O Orador: - A propósito, Sr. Ministro, onde está o relatório da Inspecção-Geral de Finanças sobre mais este escândalo? E quantos mais haverá, Sr. Ministro, que nunca chegarão ao conhecimento público?
A terceira razão, ligada à última, tem a ver com a gritante falta de meios que estão atribuídos à Administração-Geral Tributária e ao seu pessoal para o combate à evasão e à fraude fiscal. Como já denunciámos na Comissão de Economia, Finanças e Plano - denúncia a que o Ministro nos veio dar razão -, a informatização da DGITA está parada e os inspectores tributários não saem para a rua desde princípios de Outubro, porque terminaram as dotações para as ajudas de custo, para os suplementos remuneratórios, para os combustíveis e, se calhar, para os clipes. Isto é absurdo, mas é verdadeiro.
O corte cego de despesas, para responder ao irracional e demagógico discurso da direita, leva a que serviços estratégicos do Estado paralisem a partir de determinado período do ano, com todas as graves consequências para o Estado e para o País, como se está a verificar.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Portanto, Sr. Ministro, não basta tocar a tecla da flexibilidade do défice para sensibilizar a esquerda parlamentar. Isto porque há défices e défices, e, seguramente, as razões do défice que levam a este Orçamento rectificativo não são o resultado de uma opção por mais despesa de investimento e mais despesa social que constituíssem alavancas para o fortalecimento e o desenvolvimento da economia e para mais coesão e justiça social, mas o resultado de um colapso do Estado na arrecadação de receita fiscal e, em particular, no combate à fraude e à evasão fiscal. E estas, Sr. Ministro, também não são, seguramente, boas razões para o PCP viabilizar este concreto Orçamento rectificativo.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Acontecendo esta sessão quando decorre a visita a Portugal do Dalai Lama, é por aí que quero começar, e peço-lhe que, na qualidade de Ministro das Finanças ou de Ministro da Presidência, que aqui representa o Governo, transmita o recado ao Sr. Primeiro-Ministro.
Nós consideramos sinal de uma enorme falta de grandeza, de uma enorme falta de dimensão e de uma enorme falta de visão a forma constrangida e lamentável como o Governo de Portugal encarou a visita de Sua Beatitude o Dalai Lama a Portugal.
Aplausos do CDS-PP.
Esta Assembleia é uma casa de mulheres e homens livres não é um anexo nem um protectorado de qualquer Estado…
O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!
O Orador: - … que proceda a ameaças relativamente à definição da nossa política externa.
O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!
O Orador: - E o comportamento do Governo que V. Ex.ª aqui representa mancha o passado daqueles que, em Portugal, lutaram pela liberdade, porque V. Ex.ª haverá de concordar que todas as mulheres e todos os homens têm direito a lutar pela sua liberdade contra a opressão, mancha a coerência de Portugal em relação a Timor-Leste e, sobretudo, mancha o nosso brio e a nossa dignidade enquanto Estado, porquanto nem eu nem nós podemos aceitar que, quando a República da China «espirra», o Governo de Portugal se «constipe».
Aplausos do CDS-PP e da Deputada do PSD Maria Manuela Aguiar.
Dito isto, Sr. Ministro, com a legitimidade de quem propôs, enquanto partido, que esta Assembleia recebesse, com solenidade e dignidade, um homem de paz, um prémio Nobel da Paz, um homem com a grandeza do Dalai Lama, vamos, então, à questão do Orçamento rectificativo.
Uma vez, Sr. Ministro - não sei se já estava nessa pasta -, citei aqui uma pessoa que muito admiro D. Manuel Fraga Iribarne, que tinha sobre os socialistas uma expressão muito engraçada: «Os socialistas só acertam quando rectificam». Eu tenho de actualizar: «VV. Ex.as até quando rectificam nos querem enganar», …
Risos do CDS-PP.
… porque o pano de fundo de toda esta discussão orçamental é uma completa perda de bússola, de rumo, de direcção, de norte e de controlo nos principais instrumentos das finanças públicas.
VV. Ex.as começaram por fazer um Orçamento por um queijo; a seguir trouxeram-nos um Orçamento rectificativo por um buraco; não contentes com tal procedimento, voltaram a fazer outro Orçamento por outro queijo, desta vez já com um travo amargo; e agora trazem-nos um Orçamento rectificativo claramente com cheiro a bolor. A política económica deixou de ser, sob a vossa égide, uma escolha racional, uma escolha de doutrina e uma clara orientação de rumo, tornado-se um leilão ocasional e uma manta de retalhos, Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Exactamente!
O Orador: - VV. Ex.as passam a vida a tentar tapar a verdade, mas de cada vez que o tentam destapa-se a vossa incompetência.
Vozes CDS-PP: - Muito bem!
O Orador: - Lembro-me que na banda desenhada havia um personagem, Sr. Ministro, Lucky Luke, que disparava mais rápido do que a sua própria sombra; V. Ex.ª é Ministro das Finanças de um Governo que erra mais depressa do que um computador marado.
Aplausos do CDS-PP.
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O senhor parece-me uma espécie de unlucky Guilherme.
Risos do CDS-PP.
Dizia-me outro dia para eu ser como S. Tomé, «ver para crer», e é exactamente porque vejo que não creio. Como é que hei-de acreditar, Sr. Ministro das Finanças, no comportamento de um Governo que, no curto espaço de um mês, não sustenta uma única das suas previsões económicas? Eu nunca tinha visto acontecer, na História da República, diria mesmo na História constitucional, um Governo, entre a discussão orçamental na generalidade e a discussão orçamental na especialidade, minguar o crescimento económico, fazer retroceder as exportações, fazer diminuir o consumo privado e alterar completamente as previsões económicas. Não foi de uma ano para o outro! Não foi de um Orçamento do Estado para um Orçamento rectificativo! Foi da discussão na generalidade para a discussão na especialidade! Ó Sr. Ministro das Finanças, isto é insustentável, como comportamento directivo e orientador em relação às finanças públicas!
Mas VV. Ex.as têm ainda outras contradições que levam ao descrédito daquilo que nos propõem. V. Ex.ª terá assumido, na Comissão de Economia, Finanças e Plano, que foi um erro não apresentar um Orçamento rectificativo no ano 2000. Então, porque é que hei-de acreditar, Sr. Ministro das Finanças, que V. Ex.ª não vai apresentar, já em 2002, um Orçamento rectificativo deste Orçamento rectificativo ou uma correcção à conta como V. Ex.ª assume indirectamente que teve de fazer no primeiro Orçamento rectificativo deste ano
O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP). - Exactamente! Está gravado!
O Orador: - Mas ainda mais, Sr. Ministro das Finanças: V. Ex.ª sabe que aquilo que aqui nos traz não está correcto do ponto de vista da estimativa da perda da receita e também não está correcto do ponto de vista da estimativa do aumento da despesa, nomeadamente da despesa com pessoal, e isso significa que não só nos estão a propor um Orçamento errado na sua própria projecção como estão a perder a margem de manobra que nos garantiram ter para o próximo ano.
De modo que, Sr. Ministro das Finanças, quero, antes de anunciar, com indiscutível coerência, o nosso sentido de voto, chamar-lhe a atenção para dois pontos.
Eu disse-lhe aqui no debate de há um mês que era muito estranho um Estado ter um Governo que faz um Orçamento errado e, no mesmo ano de execução, nos propõe dois Orçamentos rectificativos. V. Ex.ª socorreu-se da Finlândia para tentar comparar. Olhe, Sr. Ministro, só lhe vou dizer uma coisa: o problema da Finlândia não é o problema de Portugal, nem na natureza da sua economia, nem na exigência de correcção da política económica, porque a Finlândia só está na cauda da Europa em sol e calor. Cada erro que VV. Ex.as cometem custa à economia portuguesa muito mais em atraso e falta de desenvolvimento do que acontece em qualquer outro parceiro europeu.
E quanto à crise económica que atinge todos depois de 11 de Setembro? Ó Sr. Ministro das Finanças, atinge todos, mas por alguma razão a Espanha vai crescer mais do que Portugal, a Grécia vai crescer mais do que Portugal e a Irlanda vai crescer mais do que Portugal. Eles também são atingidos pela crise, o que têm é melhores governos do que o seu.
Vozes do CDS-PP: - É verdade!
O Orador: - É inteiramente verdade! É inteiramente verdade, Sr. Ministro!
De modo que, Sr. Ministro das Finanças, mais depressa um idoso sem letras aprende a fazer contas em euros do que algum o Sr. Primeiro-Ministro António Guterres aprenderá a fazer Orçamentos sem erros. E mais, Sr. Ministro das Finanças: nós, nesta bancada, não premiamos o infractor; nós, nesta bancada, não autorizamos o erro; nós, nesta bancada, não acreditamos numa palavra que o Governo nos diga em matéria orçamental e, por isso, votamos contra o Orçamento rectificativo.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, embora tarde, porque já se encontram em retirada, não quero deixar de anunciar que esteve a assistir à sessão um simpático grupo de alunos do Agrupamento Norte do concelho de Vinhais.
Para eles, peço uma calorosa saudação.
Aplausos gerais, de pé.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.
O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, o Governo chega a este debate do Orçamento rectificativo com uma acumulação de dificuldades que não lhe invejo.
Começou pelo plano de redução da despesa pública e pelo primeiro Orçamento rectificativo, Orçamento este que o Sr. Ministro veio aqui dizer que deveria ter sido reportado ao ano anterior.
Mas é para o plano de redução da despesa pública que quero chamar a sua atenção, porque, nessa altura, o Governo argumentou que queria reduzir os gastos em 150 milhões de contos e, agora, continua a argumentar que foi uma boa medida e que está satisfeito pela sua aplicação.
Ora, Sr. Ministro das Finanças, nós temos, nesse âmbito, duas dificuldades incontornáveis. A primeira é que não sabemos bem o que é esse plano de redução da despesa pública. Sabemos os números, mas o que recebemos aqui, na Assembleia, foi um conjunto de slides de power point, com objectivos quantificados, mas injustificados. Um deles era a redução de 65 milhões de contos no Serviço Nacional de Saúde (SNS). Vale a pena perguntar, agora, se a execução desses cortes de despesas, tão cegos como eles foram, não terá sido um custo para o Estado. Esse custo foi, por exemplo, a precipitação de acordos, que o Governo, agora, vai ter de reconhecer que são errados e, portanto, de dar o dito por não dito, como o do ajuste directo com o Grupo Mello para o novo hospital de Sintra ou outras operações desse mesmo tipo, que têm um efeito imediato de redução de custos e de compromissos, mas um custo gravíssimo para o Estado, para a qualidade do serviço público, nomeadamente para o SNS.
Mas é com esse levantamento, em que, presumo, nenhum membro do Governo e, porventura, nenhum Deputado socialista pode acreditar, que nós chegamos a este
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Orçamento rectificativo. E repete-se a mesma cena: quebra das receitas fiscais. Mas o que é que a justifica, Sr. Ministro? O Sr. Ministro diz-nos, por exemplo, que, no IRC, tivemos, no ano anterior, um grande aumento de pagamentos por conta, o que é verdade. Mas isso leva-nos a uma contradição insanável, porque se o Governo tinha conhecimento de que, por sua decisão política, houve um aumento do pagamento por conta e uma antecipação do pagamento por conta, então, as projecções do crescimento do IRC estavam erradas e não podiam ser aquelas. A não ser que o Governo nos diga que, apesar disso, previu, para 2001, um tal crescimento que respondia por cima a essa correcção. E foi isso que não aconteceu.
O Sr. Ministro diz-nos que nos deu a execução fiscal mês a mês - e é verdade que o fez. Mas também é verdade que nos disse - e não me vai desmentir, porque tenho razão - que, apesar da queda da execução orçamental, iriam ser corrigidos os montantes da receita a um nível tal que a compensaria. Por outras palavras: ou o Governo estava a ser enganado pela administração fiscal, ou não sabe o que a administração fiscal faz, ou a administração fiscal não sabe o que faz. De três, uma! Mas só pode ser uma dessas três opções.
Neste momento, Sr. Ministro, quando nos pede 446,4 milhões de contos de aumento do endividamento, deixe-me dizer-lhe que, em repartições de finanças de Lisboa, em bairros fiscais de Lisboa, em determinações judiciais transitadas em julgado para execuções de dívidas ao fisco, chega a haver, num só bairro fiscal, mais de 100 milhões de contos por cobrar - mais de 100 milhões de contos! Ou seja, o colapso das contas públicas e das receitas é um colapso do combate à fraude, um colapso da coragem, um colapso da determinação - e é disso que o Governo é culpado, quando nos apresenta estes resultados.
Quem faltou à chamada no combate à evasão fiscal, apesar dos seus argumentos de convergência, Sr. Ministro, foi este Governo, que tinha instrumentos reforçados na diminuição do sigilo bancário e numa opinião pública maioritariamente mobilizada a favor da reforma fiscal - e foi aí que o Governo fracassou.
Por isso é que este Orçamento deve ser corrigido, por isso é que ele deve ser recusado, para ser corrigido. É que o necessário é um novo impulso e não esta transigência perante a quebra da receita fiscal, que não poderá deixar de ser uma nova vaga de transigência em relação ao próximo ano.
Terminaria, Sr. Ministro, dizendo-lhe que uma outra matéria em que o Orçamento tem de ser corrigido é na que consta do seu artigo 3.º. No artigo 3.º, o Sr. Ministro pede-nos uma autorização legislativa para duas matérias e apresenta-nos um decreto-lei nesse sentido. São elas: a criação de garantia pessoal do Estado e a adopção de medidas de apoio ao sector, no âmbito comunitário.
O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado. Faça favor de concluir.
O Orador: - Termino em 10 segundos, Sr. Presidente.
Sr. Ministro, não há autorizações legislativas para despesa. Assim, ou este subsídio à TAP vem da dotação provisional - e não está no decreto-lei -, ou, então, é uma alteração no mapa da despesa. Não há autorizações legislativas para despesa e, aliás, Sr. Ministro, o decreto-lei que corresponde a esta autorização legislativa só trata…
O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr. Deputado.
O Orador: - … da primeira matéria, que é a garantia pessoal, e não da segunda. Assim, este artigo tem forçosamente de ser corrigido.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro.
O Sr. Fernando Serrasqueiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A Assembleia da República debate, hoje, a circunstância singular de apresentação de um segundo documento rectificativo, dentro do mesmo exercício orçamental.
Sendo singular, este acto é igualmente decisivo ao nível da credibilização da função parlamentar, ao nível das finanças públicas, e é igualmente um momento de reconhecimento das preocupações de transparência e de disponibilidade do Governo em facultar ao Parlamento todas as informações, por forma a este poder acompanhar a evolução da execução orçamental.
Note-se que esta Assembleia já aprovou a criação de uma comissão eventual de acompanhamento da execução e controlo das contas do Estado, que permitirá que casos destes não sejam surpresa nem motivadores de espanto para os partidos da oposição mas, sim, um acto corrente, sempre que os desvios aconteçam.
Vozes do PS: - Muito bem!
Orador: - Esta comissão, que há muito defendemos e tomámos a iniciativa de propor exactamente na altura em que somos suporte do Governo, mereceu aplausos vários, mas também reservas, designadamente do PSD, que questionou que a sua eventual presidência fosse atribuída ao Grupo Parlamentar do Partido Socialista.
Se for essa a principal divergência para a boa eficácia dos seus trabalhos, estamos abertos a analisar esta situação, para que isso não inviabilize o que é o seu objectivo último, que é permitir que o Parlamento, mais prontamente e com maior informação, acompanhe a evolução da Conta. Entendemos mesmo que a presidência da comissão deverá sempre ser atribuída ao maior partido da oposição.
Vozes do PS: - Muito bem!
Orador: - A análise da presente proposta de Orçamento rectificativo merece, por isso, uma acrescida e particular atenção, devendo-se rejeitar a tentação de aproveitamentos políticos fáceis, dos quais resultariam sequelas para o próprio Parlamento.
A apresentação deste documento, relembre-se, resulta da necessidade de um ajustamento a uma diminuição da receita. Os mais cépticos dirão que não!… Que o motivo real se encontra numa sobreavaliação de receitas, concomitante com uma subavaliação de despesas… A este aspecto, se me permitirem, regressarei mais tarde nesta intervenção, sem, no entanto, deixar de referir que as revisões em baixa estão na ordem do dia, não só na Europa mas também nos Estados Unidos da América, que, hoje, já estão em recessão e influenciam todo o continente europeu, designadamente a própria Irlanda, que crescia a ritmos bem elevados.
O Sr. António Braga (PS): - Muito bem!
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O Orador: - Por enquanto, pretendo sublinhar, breve mas convictamente, o crucial processo, em curso, de consolidação orçamental, bem como o enorme, necessário e inegável esforço ao nível da contenção da despesa pública.
Hoje, já não é possível ir além nesse esforço, já preconizado, de contenção de gastos, sem penalizar despesas sociais e/ou investimento público. Esta opção, como compreenderão, é para nós ideologicamente impensável e seria, aliás, economicamente insensata, já que restringiria o próprio crescimento e emprego.
A primeira alteração orçamental já tinha reduzido a despesa corrente para níveis difíceis de suportar novo corte. Por outro lado, a opção de redução do investimento, para equilibrar a redução da receita, seria um erro na actual conjuntura, em que aquele está a servir de alavanca para contrariar a tendência regressiva.
Por estes motivos, o Governo propõe repercutir a continuada diminuição de receita num aumento de endividamento líquido global até ao limite de 940 milhões de contos. Adicionalmente, para que o nível de investimento não seja comprometido, pretende-se garantir o pagamento dos apoios financeiros no âmbito dos sistemas de incentivos à actividade económica, através da antecipação dos fundos comunitários.
Mas analisemos a necessidade concreta ao nível da evolução da receita.
O abrandamento da actividade económica provocou uma menor cobrança fiscal, relativamente ao Orçamento do Estado rectificado, de 59 milhões de contos, em IRS, 76 milhões de contos, em IRC, e 10 milhões de contos, em ISP, o que, a par com outras quebras, conduziu a um decréscimo das receitas correntes em 300 milhões de contos.
A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Não! Essa soma não dá 300!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não se trata, portanto, de uma caducidade reincidente ao nível das previsões apresentadas a esta Assembleia mas, sim, e de facto, de uma evolução não expectável ao nível do abrandamento das economias portuguesa e internacional.
Se pretenderem debater o pseudopropositado historial de não verificação de previsões, a nossa resposta será dupla: em primeiro lugar, avaliar, ao nível das previsões, o comportamento de outros países, pelo menos a nível europeu, e, em segundo lugar, avaliar as projecções do Banco de Portugal, entidade independente, não sujeita a embaraços políticos.
Tratando-se de previsões, nenhuma instituição possui o dom da clarividência, exactamente numa altura em que a incerteza domina.
Os acontecimentos mais recentes a nível internacional assim o provam, conduzindo, neste Orçamento rectificativo, à apresentação de uma norma que pretende autorização para que o Governo legisle, no sentido de garantir a cobertura de danos de terceiros na situação anómala de eventualidade de terrorismo, por essa via obstando à descontinuidade das operações das companhias aéreas portuguesas.
Em particular para Portugal, a evolução das economias dos nossos parceiros, designadamente os europeus, é de particular relevância.
O Governo, quer através do Orçamento do Estado para 2001, quer agora com o Orçamento do Estado para 2002, busca um novo patamar das finanças públicas,…
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Busca, mas não encontra!
A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - O meu cão busca melhor!
O Orador: - … num nível de consolidação mais rigoroso e com controlo mais efectivo da evolução da despesa corrente, propósito que não tem sido questionado e é até merecedor de avaliação positiva.
Este controlo, a par da adesão ao Pacto de Estabilidade, que nos disciplina num limite de 3% no défice e 60% na dívida publica, dá-nos uma linha de orientação num rumo seguro, embora a um ritmo menos rápido do que gostaríamos.
A ratio da dívida pública coloca-nos com uma margem de manobra que podemos utilizar em conjugação com o défice.
É esta margem de manobra, que este Orçamento rectificativo também incorpora, que nos permite assegurar que o nível de endividamento proposto é seguramente o ponto mais alto em termos de segurança, no que se refere à cobrança esperada da receita fiscal e não fiscal, até final do ano.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não nos esqueçamos que o Parlamento tem responsabilidades indelegáveis ao nível da condução das finanças públicas.
É precisamente no âmbito dessas competências que a Assembleia aprova, ou reprova, as propostas orçamentais do Executivo. O Governo não tem aqui nenhum voto. O Governo pratica um Orçamento na medida em que o Parlamento o legitima para praticar. As responsabilidades devem, por isso, ser partilhadas.
Também por isso, o Ministro das Finanças e a sua equipa ministerial têm-se mantido permanentemente disponíveis para, em conjunto com a Assembleia da República, desenvolver um trabalho contínuo de acompanhamento, não só da execução do Orçamento como da evolução da conjuntura macroeconómica.
Um Orçamento rectificativo não é, nem pode ser, um acto criticável em si. Qualquer organização procura avaliar, em cada momento, os desvios relativamente ao orçamentado. O importante é encontrar justificações para esses desvios e tentar, através de medidas correctivas, evitar que se repitam.
No caso presente, a situação detectada conduziu à revisão das bases de planeamento do Orçamento do Estado para 2002, sem isso significar qualquer problema.
Nesta matéria, estamos acompanhados por todos os países europeus e instituições especializadas, que, a todo o momento, revêem as suas previsões, agora em baixa, mas também em alta, como quando se conheceu o crescimento do primeiro semestre, em Portugal.
Aprovar, agora, esta alteração é uma boa base de partida para a discussão do Orçamento do Estado para 2002 que, logo à tarde, apreciaremos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Hugo Velosa e Jorge Neto.
Tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro, ouvimos a sua intervenção no
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sentido de tentar dizer a este Parlamento que esta situação é normal face à situação económica e financeira do País. Contudo, não nos informou como é que chegámos a esta situação, nem quem são os verdadeiros culpados.
Além disso, o Sr. Deputado tentou dizer, logo no início da sua intervenção, que tudo isto se resolve, porque vamos ter uma comissão de acompanhamento das contas públicas e que, estando essa comissão a funcionar, todo este problema dos Orçamentos rectificativos fica resolvido. Deixe-me que lhe diga que esta posição é inaceitável.
Nós não vamos confundir as coisas: aquilo que estamos hoje, aqui, a discutir é, efectivamente, uma questão que tem que ver com as sucessivas derrapagens que têm ocorrido no ano orçamental de 2001, e essa comissão de acompanhamento nada tem que ver com este tipo de situações. Portanto, uma coisa não implica a outra, pelo que não podemos branquear a situação inaceitável que ocorreu este ano de ter sido apresentado um Orçamento rectificativo, quando ainda estamos a discutir o Orçamento do Estado para 2002 e antes da votação na especialidade e final global do mesmo.
Mas permita-me que lhe deixe a seguinte questão: nós ouvimos dizer, aqui e hoje - e não temos dúvidas -, que quer o Partido Socialista quer o Governo já sabiam das dificuldades de cobrança de receitas em relação ao Orçamento do Estado para 2001. As dificuldades não vêm de agora, vêm de muito antes.
A questão que vou deixar ao Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro é a de saber se o Partido Socialista não sabia, já há muito mais tempo, que havia estas dificuldades nas receitas. Por que é que quando começámos a discutir o Orçamento, na especialidade, na Comissão de Economia, Finanças e Plano, o Partido Socialista não aceitou que já nessa altura era previsível que esta derrapagem claríssima das receitas ficais ocorresse?
Todos foram avisados desta situação e, apesar de tudo, o Partido Socialista aceitou que as previsões para o Orçamento do Estado para 2002 continuavam a ser aquelas! Como é que isto é possível?! Nessa altura, toda a oposição chamou a atenção para essa situação.
A pergunta que deixo é esta: como é que o Partido Socialista aceitou, então, na altura em que começámos a discutir, na especialidade, o Orçamento do Estado para 2002, que as previsões de receita para 2001 e 2002 continuavam a ser aquelas, quando já todos nós sabíamos que era impossível aceitar aquele quadro de previsões?
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro.
O Sr. Fernando Serrasqueiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Hugo Velosa, eu não disse, na minha intervenção, que a comissão de acompanhamento resolve o problema de qualquer Orçamento rectificativo. O que eu disse é que permite o conhecimento antecipado das razões que motivam qualquer Orçamento rectificativo.
Nós temos dito que, com essa comissão, vamos conhecer mais prontamente a evolução das diferentes componentes orçamentais, quer ao nível da receita quer ao nível da despesa, e entendemos que é um exercício de transparência, de verdade, que este Parlamento tem o direito de ter.
Por isso, por causa da nossa boa fé e esperança de que essa comissão funcione bem, dissemos hoje, claramente - porque sentimos que o PSD, na altura, levantou o problema da presidência da comissão -, que entendemos que ela deve ser presidida pelo maior partido da oposição, seja ele qual for, não só nesta legislatura mas em qualquer legislatura.
Mas, Sr. Deputado, pese embora uma redução de receitas, este Orçamento rectificativo é motivado, sobretudo, pela autorização do nível de endividamento.
Como o Sr. Deputado sabe, poderíamos não estar a discutir hoje o Orçamento rectificativo se a cláusula do nível de endividamento do Orçamento já contemplasse esta redução de receita. A redução de receita não é uma consequência para o Orçamento rectificativo. Ela só o é porque a cláusula do nível de endividamento já não comporta esta nova descida da receita. Se o nível de endividamento tivesse alguma margem de manobra, porventura, hoje, nem seria necessário este Orçamento rectificativo.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Neto.
O Sr. Jorge Neto (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro, o Sr. Deputado sustenta, de uma forma, direi, quase monocórdica, esta quebra de receitas no abrandamento económico.
Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro, sendo certo, como é, que o abrandamento económico não é apanágio exclusivo da economia portuguesa e sendo certo, ainda, que, apesar desse abrandamento económico, esta quebra abrupta de receitas não se verificou noutros países da União Europeia, gostava de lhe perguntar se não quer assumir com veracidade aquilo que efectivamente justifica, sem peias e sem constrangimentos, esta quebra de receitas.
Em primeiro lugar, gostava de lhe perguntar qual é o papel da reforma fiscal, ou da pseudo-reforma fiscal, nesta quebra de receitas.
O Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro está disposto a admitir que a pseudo-reforma fiscal contribuiu de forma notória para a fuga de capitais para o exterior e que isso determinou, a jusante, uma quebra acentuada na receita fiscal? Está disposto a assumir isso? Ou, ainda hoje, continua a negar algo que é evidente nos meios financeiros, que é incontornável, que foi, efectivamente, uma fuga maciça de capitais para o exterior, por força da ameaça produzida por alguns «papões» criados à volta da reforma fiscal?
Segundo ponto, Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro: acha V. Ex.ª, em consciência, que esta maleita recorrente de rectificar os Orçamentos é um sinal positivo para o mercado? Acha V. Ex.ª que esta instabilidade permanente, que é criada com Orçamentos que são sucessivamente rectificados, com previsões que não se cumprem, com expectativas que se defraudam, pode constituir um estímulo para o mercado, pode ser um sinal positivo para o mercado?
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro.
O Sr. Fernando Serrasqueiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Neto, vou continuar num ritmo monocórdico, mas, de qualquer forma, vou tentar responder-lhe a uma questão que já levantámos hoje, que é a da reforma fiscal.
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Suponho que a nossa grande divergência em termos da reforma fiscal - pelo menos, na altura, era essa, não sei se hoje ainda é a mesma - era a questão da tributação das mais-valias.
Ora, Sr. Deputado, nós estamos numa situação singular: é que não há mais-valias, há menos-valias e, suponho, não é só em Portugal! É que do PSD vem sempre esta nota de que o 11 de Setembro não existiu e de que este só teve consequências nefastas em Portugal.
Sr. Deputado, basta ler diariamente os jornais para perceber que essa quebra de receitas estendeu-se não só à Europa mas também aos Estados Unidos, que já estão em recessão, e a todos os países! Portanto, se o Sr. Deputado pensa que só em Portugal é que houve quebra de receitas, está muito enganado!
E até lhe digo mais: nós temos - e eu disse-o da tribuna -, ao nível do défice público, margem de manobra para acomodar défices, porque, singularmente também, nós somos talvez o 4.º ou o 5.º país da Comunidade com melhor ratio ao nível do défice público. Por conseguinte, ainda temos condições para acomodar alguns défices que, porventura, possam vir a surgir por necessidade de contrariar esta conjuntura.
Mas, Sr. Deputado, também lhe quero dizer que, pela nossa parte, nenhum Orçamento rectificativo é um drama - aliás, noutros países e noutros Parlamentos é uma situação tão normal que não motiva a discussão e a surpresa que aqui causa. E já foram referidos países que, tal como Portugal, já vão no segundo Orçamento rectificativo.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo apresenta-se perante a Assembleia da República, usando a expressão do Partido Socialista, de uma forma singular. Mas se singularidade é sinónimo de originalidade, nem sempre é uma virtude, e neste caso concreto, seguramente, não o é!
E não deixa de ser preocupante que, perante a realidade, o Partido Socialista insista em abordar o segundo Orçamento rectificativo como algo que é vagamente culpa de todos, não sendo concretamente culpa de ninguém.
Em nossa opinião, este não é, seguramente, o caminho para se resolver os problemas do rigor, da transparência e da «limpeza» das Contas, que o Governo pretende sanar com este seu segundo Orçamento rectificativo.
E não deixa de ser preocupante a forma contraditória e opaca como este segundo Orçamento rectificativo aparece. Ele aparece não só cinco meses depois de um primeiro Orçamento rectificativo mas também escassas semanas depois de a Assembleia da República ter iniciado o debate, na generalidade, sobre o Orçamento do Estado para 2002.
E não deixa de ser inquietante que, se há cinco meses atrás, pelo menos, estava identificado um «buraco» de 290 milhões de contos no sector da saúde e se avançava com 50 medidas genéricas para dar corpo a um plano de redução da despesa pública, cinco meses volvidos, esse plano tenha ficado pelo anúncio, não tenha sido nem debatido nem discutido de uma forma específica e não tenha tradução concreta.
Sobretudo, não deixa de ser complicado que, em vários domínios, designadamente no da saúde, continue a teimar-se em não se fazer uma avaliação crítica daquilo que se realiza ou não, dos figurinos de gestão pelos quais se opta e que, portanto, se continue mecanicamente a reproduzir no tempo soluções discutíveis na perspectiva não só da qualidade do serviço prestado, mas também daquilo que custa aos contribuintes.
Em segundo lugar, para Os Verdes é grave que, neste Orçamento rectificativo, o Governo venha, uma vez mais - razão pela qual nos parece que, nesta matéria, continua a ser fiel a Frei Tomás -, invocar um conjunto de factores que não segue.
Estamos perante um Orçamento em que há uma quebra de receitas, que não serve para aquilo que a direita parlamentar agora entusiasticamente diz, ou seja, para justificar o falhanço de uma reforma fiscal, em relação à qual, tendo dado passos tímidos, desde logo o Governo se apressou a fazer marcha atrás.
Com certeza que para todos os que querem pôr fim à situação verdadeiramente insultuosa de injustiça fiscal, à fuga e à evasão fiscais este Orçamento deveria ter implícita uma análise crítica sobre as razões por que tantos continuam a escapar ao controlo das finanças, a fugir aos impostos. E não basta anunciar combates, porque os combates só se ganham se houver combatentes, e os combatentes não podem ficar, nesta matéria, pelos estados de alma!
Por último, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, parece-nos que este segundo Orçamento rectificativo, embora falando de transparência, continua a esconder a verdadeira dimensão de dívidas que persistem em existir em alguns sectores, continua a não falar verdade, continua a brincar ao faz-de-conta, continua a usar subterfúgios como a desorçamentação ou a não transparência relativamente a dívidas do Estado. Sobre esta matéria, não é teimando na fuga à verdade, não é, seguramente, não enfrentando os problemas, que alguém - o Governo ou o País - estará em condições de os solucionar.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro da Presidência e das Finanças: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Julgo que, ao longo deste debate, em diferentes intervenções, foram suscitadas várias questões que carecem de um esclarecimento complementar.
Começaria por referir o princípio da verdade e da transparência. Todos reconheceram que ao divulgarmos, de forma clara e persistente, no tempo próprio, a evolução das contas públicas permitimos aos cidadãos, e em particular à Assembleia, o acompanhamento permanente da situação; não iludimos, pois, os factos.
Sendo a verdade e a transparência um princípio que prezo, e que todos prezam, torna-se necessário aliar a ele o princípio do rigor, designadamente das contas.
Sr. Deputado Lino de Carvalho, de acordo com aquele velho princípio da dúvida metódica, após as questões que colocou procedemos a uma verificação escrupulosa dos elementos constantes dos mapas, tendo verificado que os mesmos estavam impecavelmente correctos - esta é a questão! Haverá, neste momento, uma pequena dúvida a transparecer, que é a de saber se terão chegado ao Sr. Deputado Lino de Carvalho.
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O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - A todos os grupos parlamentares!
O Orador: - Não é, portanto, um problema de rigor, uma vez que os diferentes capítulos estão indicados; se houvesse falta de algum, naturalmente isso teria sido detectado.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Ninguém o recebeu!
O Orador: - Sr. Deputado, esse elemento foi entregue na Assembleia, e nós demonstrámo-lo!
O Sr. Deputado percebe que esta questão é importante: as contas estavam e estão certas! Naturalmente, este é o ponto essencial de onde temos de partir!
Sou rigoroso relativamente às contas, como sabe - e já me conhece há muito -, e nesse ponto não me limitei a responder tendo em conta os meus elementos: fiz a verificação sistemática, e sabemos o que se passou. Não se trata, portanto, de um problema de menor rigor relativamente às contas - as contas estão rigorosamente apresentadas -, não há nenhum montante ou parcela em falta!
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Mas há 100 milhões de contos a mais de endividamento!
O Orador: - Por outro lado, importa ainda referir que a linha de rumo que temos seguido, e continuaremos a seguir, em relação às finanças públicas e à sua consolidação é de médio e longo prazo, não de curtíssimo prazo. Vi aqui invocar-se não justamente que as medidas constantes do Programa de Reforma da Despesa Pública que todos conhecem corresponderiam apenas a intervenções pontuais no ano de 2001. Não é assim, as medidas previstas, que naturalmente entendemos dever ser concretizadas, são de médio prazo.
A consolidação das finanças públicas, porém, não se faz exclusivamente no lado da despesa, como bem sabem, faz-se também do lado da receita. Ora, fazendo-se do lado da receita, torna-se indispensável que nos aproximemos, em primeiro lugar, de uma mais rigorosa e correcta previsão de receita e, simultaneamente, que adoptemos uma acção sistemática no que se refere ao combate à fraude e à evasão.
Faço um parêntesis na minha intervenção para dizer que, como tinha anunciado na Assembleia há dois dias, visitei uma das repartições de finanças de Lisboa, tendo tido a oportunidade, na altura, de reafirmar um conjunto de providências, de medidas práticas que estão planeadas e em curso para garantir que não haja qualquer dúvida em relação à acção concreta de combate à fraude e à evasão fiscais. Aliás, a concretização da UCLEFA (Unidade de Coordenação da Luta Contra a Evasão e a Fraude Fiscal e Aduaneira), presidida pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, vai exactamente neste sentido, havendo já um conjunto de acções concretas e de mecanismos de coordenação que estão a produzir efeitos positivos.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, importa ainda referir o tema da oportunidade e da pertinência desta iniciativa.
Quanto à oportunidade não ficaram dúvidas, apenas processos de intenção, uma vez que veio dizer-se aqui, afinal, que é certo que apresentámos no momento próprio a alteração ao Orçamento do Estado para 2001, mas que isso poderia não ter ocorrido.
A verdade é esta, Sr.as e Srs. Deputados: estamos aqui a discutir, no momento próprio, a proposta de alteração ao Orçamento do Estado para 2001. Mais, têm a possibilidade de saber com rigor qual a situação que temos e de que situação partimos quando forem chamados a pronunciar-se na aprovação final global do Orçamento do Estado para 2002. Não fica, portanto, dúvida relativamente à oportunidade.
E quanto à pertinência? Também julgo que todos reconheceram que não era possível deixar de usar a margem de manobra de que dispomos para responder positivamente em relação ao investimento de que o País precisa, ao quadro comunitário de apoio que o País está a concretizar e às despesas sociais que constituem peça essencial da nossa política e orientação.
Sr.as e Srs. Deputados, esclarecido que está o aspecto da oportunidade e pertinência, coloca-se também a questão de saber se não houve uma alteração essencial de circunstâncias entre a aprovação do Orçamento do Estado para 2002 na generalidade e a sua discussão e aprovação na especialidade. Não, Srs. Deputados!
A coluna vertebral de um Orçamento, como sabem, está na sua despesa e, depois, na sustentação coerente do seu financiamento. Sempre dissemos - e as vozes mais insuspeitas reconheceram que estamos no bom caminho - que introduzimos o limite para o crescimento da despesa corrente primária. E esse limite, coordenado e articulado com medidas na reforma do Estado e da Administração Pública, constitui peça essencial no sentido positivo da consolidação das finanças públicas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Este é o rumo, esta é a orientação, e estão plenamente claros!
Como é óbvio, poder-se-á sempre dizer que as medidas subjacentes ao Orçamento do Estado para 2002 e à alteração ao Orçamento para 2001 já poderiam ter vindo. Entendemos de forma coerente que houve sempre uma preocupação, nas políticas levadas a cabo pelo PS no domínio das finanças públicas, de ligar a coesão social e a consciência social aos objectivos financeiros. Por isso, não temos uma leitura cega, fechada, estrita, rígida, designadamente do que é o défice orçamental; para nós, a despesa social está em primeiro lugar.
Olhamos para trás, vemos a discussão que ocorreu neste Parlamento nos sucessivos Orçamentos - começou logo no Orçamento do Estado para 1996 - e lembramo-nos bem das vozes que vieram então do PSD no sentido de dizer que não iríamos atingir os nossos objectivos, não iríamos cumprir as nossas metas. Cumprimos os objectivos, cumprimos as metas e, neste momento, a linha de rumo que continua a ligar consciência social ao rigor financeiro são, a nosso ver, peças fundamentais que não podem ser esquecidas.
Pergunta a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite: «Então, e a reforma fiscal? Quais os resultados da reforma fiscal aprovada aqui em Dezembro de 2000?». Sr.ª Deputada, levo a sua pergunta à conta de uma figura de estilo,…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não é bem!
O Orador: - …uma vez que os Srs. Deputados sabem bem que as mudanças fiscais introduzidas há um ano só entram em plena aplicação no ano de 2002 (os Srs.
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Deputados sabem isso, e sabiam-no desde o início)! Designadamente, estou a falar-vos do importante método ou regime simplificado, que vai ter consequências práticas e positivas na execução orçamental em 2002. É disso que se trata!
Como é natural, temos de ser inconformistas, queremos que os resultados façam sentir-se imediatamente. Compreendo isso, porém temos de perceber que as medidas em matéria tributária têm sempre uma aplicação no tempo diferida, uma vez que não podem produzir efeitos imediatos ou milagrosos.
Sabe bem, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, que muitas da situações com que hoje estamos confrontados correspondem a medidas ou a providências adoptadas em exercícios anteriores e em circunstâncias conhecidas. É importante, Sr.as e Srs. Deputados, que percebamos do que é que estamos a falar e que percebamos que, designadamente no que se refere à reforma fiscal, às medidas fiscais, há uma preocupação de confiança que tem de ser preservada e garantida.
Afirmei aqui, a propósito da tributação sobre as mais-valias, em várias circunstâncias, que não está em causa o princípio constitucional do englobamento, que não está em causa o princípio da inexistência de situações privilegiadas. O princípio da igualdade é essencial e não se trata sequer de uma suspensão, trata-se, sim, da manutenção de um regime, claramente afirmada no que se refere ao imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas. Se houvesse uma suspensão global do regime, certamente que também o regime relativo às pessoas colectivas não estaria em vigor e não estaria praticamente em aplicação.
É disso que se trata e não podemos, pois, iludir as questões ou iludir as situações. Portanto, Sr.as e Srs. Deputados, peço que esta questão fique muito clara: entendemos que há um factor de confiança que não pode deixar de ser preservado e, simultaneamente, que há também o factor responsabilidade, em que todos, nesta Câmara, todos, nestas bancadas, estamos envolvidos e empenhados.
Relativamente às reformas estruturais, os Srs. Deputados sabem bem que reformas estruturais são indispensáveis, mas essas reformas exigem consensos alargados e um trabalho persistente, sobretudo quando se trata de competências deste Parlamento, para que possamos ter aquilo com que certamente todos concordam e que é um sistema fiscal simples, estável e compreensível por todos. É disso, naturalmente, que se trata e é essa coerência que está em causa.
Sr.as e Srs. Deputados, é pois uma política de verdade aquela que está subjacente, quer à apresentação do Orçamento do Estado para 2002, quer à alteração do Orçamento do Estado para 2001. Estamos a conduzir a política com segurança e por isso mesmo, Srs. Deputados, desde o primeiro momento que se discutiu, na generalidade, o Orçamento do Estado para 2002, afirmei na Comissão de Economia, Finanças e Plano e reafirmei neste Plenário a minha disponibilidade plena para trabalhar em permanência no acompanhamento e na execução das contas públicas. É disso que se trata e têm desde já o meu compromisso claro e inequívoco de aqui estar, logo que tenhamos contas fechadas relativamente ao ano de 2001, para vos dizer exactamente qual foi a utilização que fizemos da dívida pública e do limite da dívida pública e, simultaneamente, qual o défice que atingimos. Essa é a minha obrigação estrita, e sabem bem os Srs. Deputados de todas as bancadas que é esta a orientação correcta, uma vez que, em situação de incerteza e em situação de instabilidade, não podemos ter a ilusão de que a razão só está de um lado, seja do Governo seja das oposições. A razão tem de ser assumida por todos e naturalmente que, sendo assumida desta maneira, não podemos deixar de trabalhar com grande modéstia para admitir que os factos mudam mas, sobretudo, que na linha fundamental, os princípios, esses, não podem deixar de ser respeitados, não podem deixar de ser preservados.
O Sr. Deputado Paulo Portas referiu mais uma vez a questão que foi suscitada pelo seu colega de bancada, António Pires de Lima, quando não estava presente na Sala.
O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): - Estava, estava!
O Orador: - A verdade é que veio invocar agora uma nova figura, a da correcção à conta. Ora, essa figura também não ocorre, porque a conta reporta-se sempre ao dia 31 de Dezembro e, naturalmente, é disso que se trata. Portanto, Sr. Deputado, orçamentos rectificativos no primeiro trimestre do próximo ano não pode haver, porque a Constituição os proíbe.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Ver para crer!
O Orador: - Ver para crer, sim, Sr. Deputado. Sebe bem que esse é um bom princípio, que todos partilhamos e que todos devemos seguir.
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, deixe-me informá-lo, para gestão do seu tempo, que se encontram inscritos três Srs. Deputados para lhe formularem pedidos de esclarecimento.
O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente, vou terminar, dando conta à Câmara de que é indispensável que o curso dos acontecimentos relativamente à evolução da dívida pública, relativamente à evolução da finanças públicas, à evolução da receita e da despesa, tem de ter um acompanhamento rigoroso por todos e que o Governo é garante, perante o País, do cumprimento escrupuloso do interesse nacional.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro das Finanças, os Srs. Deputados Maria Celeste Cardona, Lino de Carvalho e Jorge Neto.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona.
A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, a minha questão é muito breve e muito simples, não sem antes fazer este breve comentário relativamente ao orçamento rectificativo: julgo que todos os Deputados das bancadas da oposição tentaram acomodar e encontrar mais cerca de 470 milhões de endividamento que o Sr. Ministro das Finanças aqui vem pedir.
O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!
A Oradora: - Ora se somava, ora se diminuía, ora se ia à execução do Orçamento para 2001, ora se ia ao primeiro
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Orçamento rectificativo, mas o que é certo é que eu - e sou insuspeita de não saber analisar um Orçamento - não consigo encontrar esses valores, a não ser na afirmação que V. Ex.ª aqui produziu, a de que se tratava de uma margem de manobra que estava a pedir-nos para depois, a partir de Janeiro, nos vir dar conta da forma como utilizou essas verbas.
Sr. Ministro das Finanças, deixe-me dizer-lhe, como o Sr. Governador de Portugal: há um problema de credibilidade na política orçamental.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
A Oradora: - Em segundo lugar, Sr. Ministro das Finanças, hoje, num jornal diário, é publicamente assumido, por um ilustre Deputado do Partido Socialista, o escândalo que é a evasão e a fraude fiscal..
Por outro lado, também ouvi há pouco o Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro dizer que um orçamento rectificativo não é um drama. Não será, Sr. Ministro das Finanças, mas concordará comigo que ele não tem lógica depois dos avisos que aqui fizeram muitos Deputados da oposição. E V. Ex.ª fará o favor de reconhecer que, da parte da minha bancada, surgiram os mais veementes avisos contra o erro das vossas previsões no Orçamento. Portanto, Sr. Ministro das Finanças, embora isso não seja um drama, é dramático, com toda a certeza.
Em suma, quero perguntar-lhe apenas duas coisas: qual é o valor da falta de arrecadação de receitas que V. Ex.ª imputa ao fenómeno da evasão e fraude fiscal? Qual é o valor da quebra de receitas que V. Ex.ª imputa à reforma fiscal que aqui fez aprovar?
E, já agora, mesmo para terminar, Sr. Ministro das Finanças: já facultou os meios de transporte aos agentes da administração fiscal que têm competência para realizar acções de fiscalização?
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: - Para responder, se quiser fazê-lo desde já, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro da Presidência e das Finanças: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona, respondo-lhe com todo o gosto.
Em primeiro lugar, as contas estão claras,…
A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Só para si!
O Orador: - … os termos estão definidos e a Sr.ª Deputada sabe perfeitamente que tudo aquilo para que pedimos autorização será utilizado em estreita articulação com este Parlamento. Tenho-o feito e sabe bem que, ainda há poucos dias, foi perante este Parlamento e perante si, entre outros Deputados, que anunciei - e não o fiz de outra forma - as novas perspectivas relativamente à economia portuguesa para o ano de 2002. Sabe que esse é o método! Eu prezo o Parlamento, há 20 anos que aqui ando e tenho muito orgulho não só de aqui pertencer mas também de usar este método, que é o correcto e usual.
Quanto à questão que me pôs sobre o efeito das medidas fiscais aprovadas há um ano relativamente à quebra de cobrança, como sabe bem, pela razão que há pouco lhe referi, não considero que tenha havido consequências negativas, em 2001, imputáveis às medidas fiscais. No entanto, como a Sr.ª Deputada sabe perfeitamente, os efeitos não eram produzidos apenas no ano de 2001, serão produzidos também no ano de 2002. E a minha consideração é que estamos a falar, Sr.ª Deputada, de novos métodos, que irão permitir-nos maior cobrança e enquadrar as medidas relativamente à fraude e à evasão fiscais. Será no próximo ano que iremos ter a velocidade de cruzeiro das medidas que foram adoptadas há um ano atrás. Esta é que é, no fundo, a questão fundamental.
A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Quando?
O Orador: - Sr.ª Deputada, já lhe disse que os efeitos são diferidos e que eu penso que eles serão positivos, que não iremos ter quebra mas sim consequências positivas, designadamente em razão da introdução dos métodos simplificados, que irão permitir-nos cobrar mais receita. Essa é que é uma peça estrutural da reforma fiscal.
A Sr.ª Deputada confrontou-me com a posição do Sr. Deputado, meu amigo, Eng.º João Cravinho. Devo dizer-lhe que estou inteiramente de acordo com essa preocupação, que estou inteiramente de acordo com a necessidade de levarmos a cabo, de forma clara, inequívoca e dura, o combate à fraude e à evasão fiscais.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados e Sr. Ministro, em matéria de transparência e da forma de apresentação das contas, como o Sr. Ministro sabe as questões que se debatem neste Hemiciclo não são pessoais, são políticas e a verdade é que só agora o Governo nos fez chegar a folha, que nenhum grupo parlamentar tinha, relativa às alterações orçamentais do Mapa I.
Acontece, Sr. Ministro, que todos os grupos parlamentares receberam, provenientes do Governo, dois grupos de documentação e num caso e noutro essa folha não existia.
Portanto, Sr. Ministro, a verdade é que na documentação entregue a todos os grupos parlamentares faltava, pelo menos, uma folha do Mapa I das receitas orçamentais para 2001 e, por coincidência - estranha coincidência ou infeliz coincidência -, os valores constantes desse Mapa que falta são, exactamente, os que se referem ao tal endividamento a mais em relação à quebra de receitas que o Governo aqui nos traz, ou seja, cerca de 100 milhões de contos.
Ainda em relação a esta questão, Sr. Presidente, até agora ainda não deu entrada a proposta de alteração ao Mapa I para o podermos votar daqui a pouco. Essa alteração tem de ser entregue na Mesa da Assembleia, suponho que pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista. Veremos se, quando der entrada, já vêm as três folhas e não as duas que nos foram distribuídas.
Em todo o caso, Sr. Ministro, subsiste um problema, que já foi colocado por nós e por outras bancadas: é que o Governo continua a solicitar uma autorização de endividamento superior, em cerca de 100 milhões de contos, ao aumento do défice, em resultado da quebra de receitas. E, obviamente, Sr. Ministro, isso não se coaduna com os princípios de equilíbrio orçamental e da transparência das contas.
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O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado.
O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Sr. Ministro, congratulamo-nos por termos denunciado o facto de a administração geral tributária estar paralisada.
O Sr. Presidente: - Tem de terminar, Sr. Deputado.
O Orador: - O Sr. Ministro anuncia agora medidas para que a recolha fiscal se faça. São bem-vindas, mas, convenhamos, são bastante tardias.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Há ainda Srs. Deputados que, não se sabe bem porquê, entram e saem da Sala das Sessões quando estamos a minutos do início das votações. Peço-lhes que, na medida do possível, deixem de migrar neste momento, porque precisamos de uma certa estabilidade de presenças a partir do início das votações.
Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, apenas para prestar um esclarecimento.
O Sr. Presidente: - Se me dá licença, primeiro tenho de dar a palavra ao Sr. Ministro das Finanças para responder.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - O Sr. Presidente fará como melhor entender. O meu esclarecimento é meramente testemunhal e técnico do processo de entrada da documentação. O Sr. Presidente inserirá esse esclarecimento quando lhe parecer melhor.
O Sr. Presidente: - A Mesa pode dar a palavra para esclarecimentos, mas tudo tem uma ordem austera.
Dou-lhe a palavra para prestar esclarecimentos depois de a dar ao Sr. Ministro das Finanças.
Tem, pois, a palavra, para responder ao Sr. Deputado Lino de Carvalho, o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro da Presidência e das Finanças: - Sr. Presidente, julgo que o esclarecimento do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares seria oportuno neste momento. Nesse sentido, se me permite, sugiro que ele o possa dar de imediato.
O Sr. Presidente: - Com o seu consentimento, com certeza, Sr. Ministro. Desaparece a prioridade a que eu estava a obedecer.
Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, as circunstâncias são afortunadas de conjugação de espíritos.
Neste caso concreto, Sr. Presidente, gostaria tão-só de esclarecer o Sr. Deputado Lino de Carvalho e todos os Srs. Deputados que estive a procurar retraçar a origem daquilo que nos preocupou a todos nesta manhã, no sentido de saber o que é que tinha acontecido. Não foi exactamente a investigação policial da minha vida, mas pude apurar que o original entregue à Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite não está acessível neste momento. Mas teremos ocasião de o verificar.
É convicção profunda do Sr. Secretário de Estado do Orçamento de que esse original, com duas folhas e três páginas, continha o texto integral. Entretanto, fiz circular, com responsabilidade directa dos meus serviços, a versão que os Srs. Deputados têm na mão.
A explicação que encontro é a de que, tendo o original páginas com frente e verso, aconteceu, como tantas vezes tem acontecido, por uma maldição reprográfica desta Câmara e minha, que a segunda folha não foi incluída na versão que foi distribuída. Devo dizer que não me apercebi do facto porque os Srs. Deputados discutiram tão sagazmente todos os dados sobre as receitas que nunca me passou pela cabeça que o Sr. Deputado Lino de Carvalho, por exemplo, não estivesse a computar exactamente aquilo de que acusava o Governo de não fazer. Portanto, não tive sequer essa percepção.
Neste momento, foi entregue a todos os Srs. Deputados um texto dessa segunda página, que, segundo me informou o Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro, será apresentado à Mesa, nos termos regimentais. Portanto, a Câmara poderá votar as três componentes desse Mapa, integrais e rigorosas, nas condições regimentais e constitucionais.
Peço, naturalmente, desculpa ao Sr. Ministro e à Câmara por este lapso dos serviços.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Lino de Carvalho pediu a palavra, mas suponho que, depois desta «confissão» do Governo, já não precisará de a usar.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, sublinho essa «confissão».
No entanto, quero dizer que, de facto, nenhum dos dois grupos de documentos que recebi, um directamente da Secretaria de Estado…
O Sr. Presidente: - Alegações não, Sr. Deputado.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - … e outro da Comissão, tinha essa folha. Chegou agora. Temos de ter tempo para a apreciar.
O Sr. Presidente: - Não sei se o Sr. Ministro ainda tem necessidade de complementar a resposta ao Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Ministro da Presidência e das Finanças: - Não, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra, para formular o seu pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado Jorge Neto.
O Sr. Jorge Neto (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, quero colocar-lhe duas questões muito concretas.
A primeira tem a ver com o fracasso das políticas fiscais que assentam nos impostos progressivos sobre o rendimento - este fenómeno incontornável da globalização… E deixe-me dizer que, nesse domínio, estou mais perto de Gidens, no sentido de entender que esse fenómeno é
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mesmo incontornável, do que de Boaventura Sousa Santos, que entende que ele decorre mais de um consenso das agências financeiras internacionais do que propriamente de um determinismo histórico.
A realidade é que os impostos progressivos sobre o rendimento, com a volatilidade de capitais que a globalização propicia, não são, de facto, o suporte ideal para uma política fiscal que privilegie a justiça social.
Nesse domínio, Sr. Ministro, gostava de lhe perguntar, concretamente, que política fiscal pretende implementar, no sentido de dar guarida a esse primado basilar de qualquer política fiscal hodierna, que é, efectivamente, a justiça social, combatendo de forma eficaz a evasão e a fraude ficais, hoje em dia combate ingente, árduo e difícil, tendo em conta essa volatilidade, transferência e fluxo de capitais e de rendimentos que acabei de referenciar. Gostava de saber que medidas concretas V. Ex.ª propugna para que, na prática, esse combate seja levado com sucesso.
A segunda questão, Sr. Ministro, tem a ver com o Orçamento rectificativo e a inevitabilidade constatada por todos da inexistência de folga orçamental que permita aquilo que é, porventura, uma medida fundamental para promover a competitividade das empresas portuguesas: um choque fiscal que produza uma redução drástica da tributação em sede de IRC e que confira às empresas portuguesas a necessária competitividade no mundo aberto e globalizado em que hoje vivemos.
Sr. Ministro, o que gostava de saber é se V. Ex.ª concorda ou não que a inexistência dessa folga orçamental é, de facto, um entrave sério, uma pecha insuperável para permitir uma revisão de toda a matéria fiscal, no sentido da redução fiscal, que possibilite que as empresas portuguesas sejam, efectivamente, competitivas num cenário europeu e num cenário mundial.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, depois da resposta do Sr. Ministro passaremos às votações, pelo que é necessário que não entrem e saiam da Sala com a liberdade com que o têm feito até este momento.
Tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro da Presidência e das Finanças: - Sr. Presidente, permita-me só dois segundos para esclarecer o Sr. Deputado Lino de Carvalho que o rigor não esteve em causa e que, naturalmente, as nossas contas estavam certas. Sobretudo, Sr. Deputado, é preciso perceber que o défice resulta da articulação de vários elementos, designadamente dos passivos financeiros e do endividamento dos fundos e serviços autónomos.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Qual é o valor global do défice?
O Orador: - Sr. Deputado, já disse aqui que o valor do défice é o valor que resultar da execução do Orçamento e a margem de manobra, naturalmente, permitir-nos-á…
Sr. Deputado, como sabe, estamos à volta dos 2%. Foi o Sr. Deputado que fez aqui as contas e tive já oportunidade de confirmar que as suas contas estavam certas.
Sr. Deputado Jorge Neto, o choque fiscal é um tema interessante, mas é preciso percebermos que o sentido geral da orientação que temos seguido é o do desagravamento da tributação relativamente às sociedades e às empresas. Por isso, o fazemos. Há um sinal concreto este ano, que tem consequência financeira significativa em termos de receita. É preciso perceber isto!
Sr. Deputado, se quer saber qual é a minha posição, digo-lhe a minha, a do Governo e a que está subjacente ao programa deste Governo: é, justamente, a de que temos de ir nesse sentido. Por isso, há um determinado calendário, que até desejamos seja mais exigente. E estamos de acordo, porque é necessário darmos condições concretas às nossas empresas, às nossas sociedades para poderem ter mais e melhor competitividade em relação à concorrência externa.
O Sr. Deputado coloca ainda a questão do combate à fraude e evasão fiscais ligado, naturalmente, a uma determinada coerência de política orçamental e de política fiscal. Só é possível desagravarmos, designadamente, a tributação em relação aos trabalhadores por conta de outrem, a quem tem menores rendimentos, se alargarmos de forma significativa a base tributária. É esta a grande questão.
E é esta a questão com a qual estamos todos de acordo - certamente, o Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata também está -, uma vez que não é possível fazer o contrário. Não é possível fazer gestos temerários no sentido de cortar primeiro e esperar que depois o alargamento da base tributária ocorra.
Agradeço, naturalmente, a sua questão, mas neste ponto é a própria Assembleia,…
O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Ministro.
O Orador: - … em articulação com o Governo, que tem especiais responsabilidades.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Francisco Louçã pediu a palavra para uma interpelação. Agradecia que caracterizasse a matéria da ordem de trabalhos a que respeita.
O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, é sobre a votação do novo artigo 1.º.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, creio que continuamos num imbróglio que tem de ser resolvido, porque, graças aos bons ofícios do PSD, há uma proposta de introdução de um novo artigo 1.º que refere um mapa anexo. Mas o mapa não está anexo.
Surgiu, entretanto, uma proposta de aditamento, que é a página 2 do mapa anexo. Mas falta o mapa e faltam as páginas 1 e 3, que não deram entrada como proposta de aditamento à proposta de lei do Orçamento rectificativo.
Portanto, neste momento, não temos como votar este artigo.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para dar o esclarecimento necessário, a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, efectivamente, o Grupo Parlamentar do PSD apresentou uma proposta de aditamento de um novo artigo 1.º ao Orçamento do Estado, que tem de ser votado, porque sem ele não existe Orçamento rectificativo.
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Devo confessar que não fiz os mapas, como o Sr. Presidente bem imagina, porque parti da hipótese que esses mapas existem (até foi dito que nos foram distribuídos). Portanto, é só pedir ao Partido Socialista que pegue nesses tais mapas que o Governo entregou há bocadinho para entregar na Mesa, de forma a serem votados.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, de facto, também só recebemos a página 2 do Mapa I, assinada pelo Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro, mas faltam as páginas 1 e 3. Essas é que constituem o mapa global de alterações de receitas que é preciso votar.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.
O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, estamos a organizar a documentação e sugeríamos…
Vozes do PSD e do CDS-PP: - Ah…!
O Orador: - Os Srs. Deputados têm alguma coisa contra que se organizem os papéis?
Vozes do PSD e do CDS-PP: - Não, nada!
O Orador: - Sr. Presidente, gostaríamos de solicitar um compasso de espera de cerca de 2 minutos, porque estamos, justamente, a complementar a proposta, a que aderimos, do PSD. Também a tínhamos preparada, mas uma vez que o PSD a apresentou estamos de acordo com ela. E temos aqui os originais que estamos a compilar para entregar dentro de um minuto na Mesa.
Nesse sentido, pedíamos esse compasso de espera, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos fazer uma pausa de minutos.
Pausa.
Srs. Deputados, estamos em condições de retomar os nossos trabalhos.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.
O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, estamos em condições de fazer chegar à Mesa a proposta.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estamos a minutos do início das votações, pelo que não se justifica que os Srs. Deputados, neste momento, criem instabilidade no universo dos Deputados que vão votar e que a Mesa já contou. Se continuarem a sair e a entrar, nenhuma contagem é possível. Nessa altura, contar-se-ão os votos com lesão dos Srs. Deputados que não estiverem na Sala.
Pausa.
Srs. Deputados, já foram entregues na Mesa as páginas 1 e 3 do Mapa I que estavam em falta.
O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, há uma Sr.ª Deputada do Partido Socialista que parece estar a sentir-se mal. Se ela quiser sair da Sala, predisponho-me a sair também para não alterar o equilíbrio de votos.
Aplausos do PS e do PSD.
O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado.
Eu já me tinha apercebido da incomodidade da Sr.ª Deputada, mas não me chegou nenhuma proposta do Partido Socialista, nem nesse sentido nem no da interrupção dos trabalhos.
Sr. Deputado António Braga, tem a palavra.
O Sr. António Braga (PS): - Naturalmente, o meu grupo parlamentar congratula-se com a oferta do Sr. Deputado Rui Rio, mas sugeríamos ao Sr. Presidente que passasse de imediato à votação.
O ser. Presidente: - Então, penso que estamos em condições de passar à votação, até porque a questão que nos atrasou apenas se coloca em relação à votação final global pois, até procedermos à votação na especialidade, ainda há tempo para lerem os documentos que acabam de ser distribuídos.
Antes de passarmos à votação propriamente dita, a Mesa anuncia que, segundo a contagem que fez, estão presentes todos os Deputados de todos os grupos parlamentares, ou seja, 115 do PS, 81 do PSD, 15 do PCP, 14 do CDS-PP, 2 de Os Verdes, 2 do Bloco de Esquerda e 1 Deputado independente. Portanto, se entenderem que podem confiar na contagem efectuada pela Mesa, podemos passar às votações.
Entretanto, há que tomar em conta uma proposta de aditamento - e não de alteração, como está erradamente classificada - que foi apresentada e terá de ser votada no fim da votação na especialidade, precisamente por se tratar de um aditamento. Refiro-me à proposta de aditamento de um novo artigo 1.º, apresentada pelo PSD, que, a ser aprovada, implicará a renumeração de todo o articulado.
Vamos, então, proceder à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 111/VIII - Altera a Lei n.º 30-C/2000, de 29 de Dezembro, que aprova o Orçamento do Estado para 2001.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, votos contra do PSD, do PCP, do CDS-PP, de Os Verdes e do BE e a abstenção do Deputado independente Daniel Campelo.
Srs. Deputados, de seguida, passamos à votação na especialidade, começando pelo artigo 1.º da proposta de lei.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS e abstenções do PSD, do PCP, do CDS-PP, de Os Verdes, do BE e do Deputado independente Daniel Campelo.
Vamos votar o artigo 2.º da proposta de lei.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, votos contra do PSD, do PCP, do CDS-PP, de
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Os Verdes e do BE e a abstenção do Deputado independente Daniel Campelo.
Vamos passar à votação do artigo 3.º.
O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa sobre o conteúdo da votação que se segue.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, vamos votar o artigo 3.º que prevê uma autorização legislativa.
Como é da praxe, e o Sr. Presidente bem sabe, o Governo apresentou o projecto de decreto-lei que cumpre esta autorização legislativa. No entanto, esse projecto de decreto-lei só trata de uma das partes a que se refere o corpo do artigo.
Insisto nesta questão porque, se assim for, a matéria objecto da segunda parte, ou seja, a que se refere à adopção de medidas de apoio até ao limite previsto nas orientações comunitárias, não está incluída no projecto de decreto-lei que o Governo nos apresentou, tratando-se de uma matéria distinta daquela sobre a qual nos é solicitada a autorização legislativa.
Sugiro, pois, que esta segunda parte seja separada ou, então, retirada, sem prejuízo de a medida ser adoptada sob o figurino conveniente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, qual é a segunda parte que gostaria de ver votada autonomamente?
O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, não sei se se pode votar em separado porque não há numeração.
Reparará que o texto é o seguinte: «Fica o Governo autorizado a aprovar um decreto-lei que tem por objecto a criação de uma garantia pessoal do Estado (…)», primeiro, e, em segundo lugar, «(…) a adopção de medidas de apoio ao sector até ao limite previsto (…)», o que corresponde a 4/365 do total de volume de negócios da empresa…
O Sr. Presidente: - Portanto, o que propõe é que se vote separadamente o texto deste artigo até à expressão «ocorrência de sinistro», inclusive, e, depois, em separado, a frase seguinte? É um bocado difícil…
O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, se me permite, parecer-me-ia mais fácil que o Governo retirasse a segunda parte do texto.
O Sr. Presidente: - O problema é o de saber se o Governo está disposto a fazê-lo!
Entretanto, a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite tinha pedido a palavra.
Faça favor.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, é para perguntar ao Governo, sob a forma de proposta, se não quererá ponderar e eliminar todo este artigo, dado que é totalmente inútil, seja para que efeito for.
O Sr. Presidente: - Portanto, relativamente a esta matéria, há duas propostas: uma, no sentido da eliminação da segunda parte do corpo do artigo e, outra, no sentido da eliminação de todo o artigo 3.º.
Tem, então, a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro da Presidência e das Finanças: - Sr. Presidente, o esclarecimento é muito simples.
Este artigo decorre de um conjunto de medidas que foram adoptadas no âmbito da União Europeia.
Está já claro o modo como pretendemos utilizar esta autorização legislativa no que se refere à sua primeira parte.
Quanto à segunda parte, uma vez que há uma decorrência em relação às receitas que eventualmente venham a ser percebidas em razão dos prémios que o Estado pode cobrar, há aqui um mecanismo de despesa com compensação em receita, o qual, neste momento, não estamos sequer em condições de saber se iremos utilizar. À cautela, porém, entendemos necessário que esta medida esteja prevista aqui e comprometemo-nos a, junto do Parlamento, dar toda a informação complementar sobre o modo como faremos uso, se for caso disso, desta segunda parte.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Parece, pois, que o Governo não está disposto a retirar a segunda parte do artigo 3.º nem muito menos a eliminá-lo na totalidade.
Dou agora a palavra à Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite para prestar qualquer esclarecimento, fim para o qual suponho que a pediu.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Foi sim, Sr. Presidente.
É só para dizer ao Sr. Ministro das Finanças que se está subjacente nesta segunda parte alguma ideia de despesa com compensação em receita, então, teríamos de alterar o mapa da despesa.
É que estamos a falar em alterações de despesa, mesmo que com compensação em receita, e exactamente para que isso não suceda é que propus a eliminação do artigo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para prestar um novo esclarecimento sobre a mesma matéria, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro da Presidência e das Finanças: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, agradeço-lhe a questão que coloca, que é muito pertinente, mas sabe bem que o que está aqui em causa é a eventualidade da ocorrência de riscos em razão de actos terroristas ou de actos de guerra. É disso que se trata. Naturalmente, entendemos que tal não pode prever-se à partida e todos desejamos que nunca aconteça.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, esta última intervenção do Sr. Ministro deixou-nos perplexos.
É que, neste artigo, não se trata de prever eventuais consequências futuras de acontecimentos que venham a ocorrer, mas, sim, de compensar, ao abrigo da directiva comunitária,
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as transportadoras aéreas nacionais dos prejuízos que sofreram após os acontecimentos de 11 de Setembro, compensação essa que é concedida na base de 4/365 do volume de negócios. Portanto, a directiva comunitária recai sobre um facto passado, concreto, financeiramente definível.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.
O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, serei muito preciso e muito concreto.
A primeira parte do corpo do artigo 3.º, que estabelece a autorização legislativa para o decreto-lei que tem por objecto a definição do regime de garantia, prevê ocorrências que podem ocorrer ou não e garante situações não previsíveis.
No entanto, no que se refere à segunda parte, não é assim.
A este propósito, reporto-me à carta, de 14 de Novembro, da Direcção-Geral de Energia e Transportes da Comissão Europeia, em que se diz que este apoio é autorizado para as despesas ocorridas entre 11 e 14 de Setembro, portanto, referentes a 4 de entre os 365 dias em que operam as empresas ligadas aos transportes aéreos. O apoio pode, pois, ser rigorosamente calculado porque se reporta a uma fracção do total de volume total de negócios da empresa.
Assim sendo, o Governo está em condições de nos dizer muito aproximadamente qual é o montante dessa despesa que só pode ser paga a partir de dotação provisional e nunca através do aumento do mapa da despesa, caso contrário teríamos de fazer já aqui um novo orçamento rectificativo.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro da Presidência e das Finanças: - Sr. Presidente, esta é uma questão pertinente, o que não ponho em causa.
De qualquer modo, nos levantamentos que fizemos relativamente a prejuízos não verificámos qualquer despesa a realizar quanto a esses pontos.
Esta é a situação, mas não sabemos, porque há um conjunto diverso de companhias aéreas que estão em causa. Neste momento, do levantamento que fizemos, não temos a verificação de qualquer encargo para este ano.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Governo não retira a proposta e os Srs. Deputados têm a liberdade de votarem como quiserem. A Mesa não pode é fazer outra coisa senão pôr à votação a proposta tal como está formulada.
Srs. Deputados, vamos, então, votar o artigo 3.º da proposta de lei.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, votos contra do PSD e do CDS-PP e abstenções do PCP, de Os Verdes, do BE e do Deputado independente Daniel Campelo.
Srs. Deputados, vamos agora votar a proposta de aditamento de um novo artigo 1.º ao Orçamento do Estado para 2001, apresentada pelo PSD.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, votos contra do PSD, do PCP, do CDS-PP, de Os Verdes e do BE e a abstenção do Deputado independente Daniel Campelo.
É a seguinte:
Artigo 1.º
1 - É alterado o Orçamento do Estado para 2001, aprovado pela Lei n.º 30-C/2000, de 29 de Dezembro, na parte respeitante ao Mapa I anexo a essa lei.
2 - A alteração referida no número anterior consta do Mapa I anexo à presente lei que substitui, na parte respectiva, o Mapa I da Lei n.º 30-C/2000, de 29 de Dezembro.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação final global da proposta de lei n.º 111/VIII.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, votos contra do PSD, do PCP, do CDS-PP, de Os Verdes e do BE e a abstenção do Deputado independente Daniel Campelo.
Srs. Deputados, o início da discussão e votação, na especialidade, do Orçamento do Estado para 2002 iniciar-se-á às 15 horas.
Está encerrada a sessão.
Eram 13 horas e 40 minutos.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL