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1171 | I Série - Número 030 | 21 de Dezembro de 2001

 

autodeterminação dos povos como aquele em que a dimensão da barbárie e da guerra, envolvendo o extermínio em dimensões anteriormente desconhecidas e a sofisticação de tecnologias ao serviço da violência e do terror, constituíram uma face negra da História, a que a comunidade internacional muitas vezes não soube dar resposta, através da afirmação dos princípios do direito internacional nem sequer pela salvaguarda das regras mínimas do direito internacional humanitário.
Se bem cedo se perdeu a ilusão daqueles que afirmavam que a I Guerra Mundial seria «a guerra que poria fim a todas as guerras», importa reconhecer que, desde a II Guerra Mundial, o desenvolvimento do direito internacional, no quadro da Carta das Nações Unidas, constituiu uma resposta, ainda que demasiadas vezes timorata e marcada pelo realismo da política conjuntural, aos atentados aos direitos humanos, à agressão, aos crimes de guerra, à escravatura, ao racismo e à tortura.
Tanto no final da II Guerra Mundial, relativamente aos crimes de guerra cometidos pelo nazismo e no extremo oriente, como no início da década de 90, relativamente à ex-Jugoslávia e ao Ruanda, foram criados tribunais internacionais especiais, os quais se ressentiram, todavia, do seu carácter transitório, da visão necessariamente parcial dos direitos que visavam assegurar e da excessiva adesão à conjuntura em que foram criados.
A criação do Tribunal Penal Internacional permite dotar a comunidade internacional de uma instituição permanente vocacionada para a investigação e procedimento penal contra os indivíduos que cometam os «crimes mais graves no domínio internacional», como no seu artigo 1.º se diz, a saber: genocídio, crimes contra a humanidade e crimes de guerra.

O Sr. Alberto Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Constituindo um elemento de afirmação da consciência internacional na defesa dos direitos humanos, o Tribunal Penal Internacional tem natureza complementar relativamente à jurisdição interna, não afectando a competência em matéria penal dos tribunais portugueses.
Sendo Portugal um dos 120 países que aprovaram o Estatuto de Roma, importa, com a sua ratificação, dar o necessário passo no sentido da universalização e institucionalização do direito internacional dos direitos do homem.
A longa luta do povo timorense pela liberdade e pela afirmação do direito internacional, que tão significativa solidariedade nacional mobilizou, constituiu, e constitui ainda, o melhor exemplo para os portugueses da indispensabilidade da existência de instrumentos de aplicação do direito penal internacional de carácter permanente não sujeitos aos interesses geoestratégicos conjunturais.
A matéria hoje em discussão foi já objecto de aprofundada análise pela Assembleia da República, quer em colóquio parlamentar, em boa hora realizado, quer através do notável relatório elaborado pelo Deputado Alberto Costa, quer nas audições promovidas pela 1.ª Comissão, tendo suscitado a abertura de um processo de revisão constitucional extraordinária, que teve como escopo fundamental ultrapassar os obstáculos de ordem constitucional suscitados à ratificação do Estatuto de Roma.
Tendo sido aprovada a quinta revisão constitucional, designadamente consagrando o novo n.° 7 do artigo 7.°, nos termos do qual Portugal declara «aceitar a jurisdição do Tribunal Penal Internacional nas condições de complementaridade e demais termos estabelecidos no Estatuto de Roma», importa proceder agora à ratificação do Tratado.
Será, assim, possível garantir que Portugal integrará o conjunto de 60 países fundadores do Tribunal Penal Internacional, associando-se aos 12 Estados da União Europeia que procederam já à ratificação do Tratado e cumprindo o compromisso assumido por todos no âmbito da União Europeia de ratificação até ao final do corrente ano.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Julgo, aliás, neste previsível final de Legislatura, que a aprovação deste marco na história do direito internacional dos direitos do homem constitui uma forma particularmente feliz da VIII Legislatura encerrar os seus trabalhos consolidando, também no plano das responsabilidades de Portugal perante a comunidade internacional, os princípios fundadores da Constituição da República e a mensagem de justiça, de que a responsabilidade penal é componente inextrincável, que presidiram à nossa revolução libertadora, dizendo não à barbárie, ao direito do mais forte e afirmando o direito dos povos à autodeterminação e à liberdade.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A Assembleia da República é hoje chamada a aprovar, para ratificação, o Estatuto do Tribunal Penal Internacional, aberto à assinatura em Roma, em 17 de Julho de 1998, depois de ter sido efectuada a revisão constitucional destinada a viabilizar tal objectivo.
Deixámos expressa no momento próprio a nossa discordância em relação a esta última revisão constitucional e muito especialmente à forma utilizada para viabilizar a aprovação do Estatuto do TPI.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - As disposições constitucionais postas em causa com a ratificação deste Estatuto dizem respeito à imunidade dos titulares de cargos políticos, que não é invocável perante aquele tribunal, e à aceitação da pena de prisão perpétua entre as suas molduras penais. Esta última questão é para nós muito relevante, na medida em que o nosso país aboliu esta sanção penal em 1884 e a sua proibição foi inscrita na Constituição em 1976 e mantida em todas as revisões constitucionais, para além de que a extradição por crimes a que corresponda a pena de prisão perpétua só é admitida, e apenas a partir da revisão constitucional de 1997, se o Estado requisitante der garantias de não a aplicar ou executar.
Na medida em que o Estatuto do Tribunal Penal Internacional não admite reservas, sendo de pegar ou largar, para os Estados que o ratifiquem, é evidente que a sua aceitação pelo nosso país representa uma grave brecha na recusa constitucional da pena de prisão perpétua.
Afirmam os defensores da ratificação do Estatuto do TPI a qualquer preço que a questão não é relevante, na