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Sábado, 19 de Outubro de 2002 I Série - Número 51

IX LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2002-2003)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 18 DE OUTUBRO DE 2002

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Ascenso Luís Seixas Simões



S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 15 minutos.
Ao abrigo do n.º 2 do artigo 76.º do Regimento, procedeu-se ao debate, da iniciativa do Sr. Presidente, sobre o tema "A família e a escola". Após o Sr. Deputado António Braga (PS), na qualidade de relator, ter apresentado o relatório da Comissão de Educação, Ciência e Cultura, intervieram, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa (Abílio de Almeida Morgado) e da Sr.ª Secretária de Estado da Segurança Social (Margarida Correia de Aguiar), os Srs. Deputados Ana Benavente (PS), Ana Manso (PSD), João Teixeira Lopes (BE), Bruno Dias (PCP), Isabel Castro (Os Verdes), Cristina Granada e Fernando Cabral (PS), Aurora Vieira (PSD), João Pinho de Almeida (CDS-PP), Luísa Mesquita (PCP), Paulo Pedroso e Rosalina Martins (PS).
Seguidamente, procedeu-se ao debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar do PS, sobre as dotações do Fundo de Garantia da Justiça, no qual usaram da palavra, além da Sr.ª Ministra da Justiça (Maria Celeste Cardona), os Srs. Deputados António Costa (PS), Francisco Louçã (BE), Isabel Castro (Os Verdes), António Montalvão Machado (PSD), António Filipe (PCP), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP) e José Magalhães (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 14 horas e 35 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 15 minutos.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Fernando de Pina Marques
António Henriques de Pinho Cardão
António Manuel da Cruz Silva
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
António Paulo Martins Pereira Coelho
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
Arménio dos Santos
Bernardino da Costa Pereira
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Diogo Alves de Sousa de Vasconcelos
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Gustavo de Sousa Duarte
Henrique José Monteiro Chaves
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
João António Pistacchini Calhau
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Barreiras Duarte
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José Gago Horta
João Manuel Moura Rodrigues
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José Luís Ribeiro dos Santos
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel de Lemos Pavão
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Manuel Machado Rodrigues
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria Assunção Andrade Esteves
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Maria Elisa Rogado Contente Domingues
Maria Eulália Silva Teixeira
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria Isilda Viscaia Lourenço de Oliveira Pegado
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Mário Patinha Antão
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro do Ó Barradas de Oliveira Ramos
Pedro Filipe dos Santos Alves
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis

Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros
Aires Manuel Jacinto de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António José Martins Seguro
António Luís Santos da Costa
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões
Augusto Ernesto Santos Silva
Carlos Manuel Luís
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Serrasqueiro

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Fernando Ribeiro Moniz
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins
João Barroso Soares
João Cardona Gomes Cravinho
João Rui Gaspar de Almeida
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José António Fonseca Vieira da Silva
José Apolinário Nunes Portada
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José da Conceição Saraiva
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Santos de Magalhães
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Capoulas Santos
Luís Manuel Carvalho Carito
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson da Cunha Correia
Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo José Fernandes Pedroso
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Teresa Maria Neto Venda
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
António Herculano Gonçalves
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
Henrique Jorge Campos Cunha
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Narana Sinai Coissoró

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Jerónimo Carvalho de Sousa
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita

Bloco de Esquerda (BE):
Ana Isabel Drago Lobato
Francisco Anacleto Louçã
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

O Sr. Presidente: - Sr.as e Srs. Deputados, os trabalhos de hoje iniciam-se com um debate de interesse relevante, ao abrigo do n.º 2 do artigo 76.º do Regimento da Assembleia da República, sobre o tema "A família e a escola".
Este tema foi por mim proposto, tendo em vista a recente abertura do ano lectivo e a circunstância de, no âmbito europeu, se ter celebrado recentemente, no passado dia 8 do corrente mês, o dia europeu sobre o papel da família na escola.
Conforme dispõe o Regimento, em primeiro lugar, é dada a palavra ao relator da Comissão de Educação, Ciência e Cultura, o Sr. Deputado António Braga, que dispõe de 10 minutos para fazer a apresentação do relatório.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A garantia de condições de participação dos cidadãos na vida colectiva reforça a sociedade democrática. Particularmente no domínio da educação, há consciência dos benefícios directos que daí resultam para a vida da comunidade educativa.
A realização deste debate representa, neste dia especial, o reconhecimento da co-responsabilização da família e reforça a noção de pertença à escola.
Ao longo da história, a simples existência de escolas desde logo provocou um certo tipo de convivência com as famílias, por mais afastada que fosse. Já em 1895, ao director de classe, cargo que hoje poderíamos equiparar ao actual director de turma, foi atribuído o "papel de mediador, relativamente aos pais dos alunos, a quem deve prestar todas as informações que a estes dizem respeito".
Contudo, até ao 25 de Abril, pouco evoluiu a natureza desta relação. Antes de 1974 formaram-se algumas associações de pais, cujo início terá ocorrido a partir de 1960, e a sua organização parece ter sido impulsionada pela Escola de Pais, organização surgida no seio do ensino particular de inspiração católica.
A consagração do direito à representatividade e associação de pais viria a resultar de uma dupla condição: a escolarização de massas no pós-primário e um regime

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político democrático. No entanto, essa participação não foi automática.
Legislação de 1974 - o Decreto-Lei n.º 735-A/74 -, por exemplo, refere "o importante papel das associações de pais e encarregados de educação dos alunos, cuja criação será apoiada pelo Ministério da Educação e Cultura e com as quais os conselhos directivos dos estabelecimentos manterão estreitos contactos de cooperação em assuntos de interesse comum".
Mas o documento relativo à gestão no ensino primário foi mais longe, ao consagrar a possibilidade de os encarregados de educação poderem estar presentes no conselho escolar.
É em 1976, com o chamado "decreto da gestão democrática", que são alteradas as condições de funcionamento das escolas preparatórias e secundárias, onde se prevê a integração de um representante da associação de pais da escola no conselho de turma, embora sem direito a voto. Pela primeira vez, estamos perante um direito, uma representação por inerência, e não uma mera possibilidade dependente de decisão do presidente do órgão ou dos outros seus elementos.
Em 1977 é publicada a primeira legislação das associações de pais, a Lei n.° 7/77, de 1 de Fevereiro, mas com aplicação restrita aos ensinos preparatório e secundário. Mesmo assim, só virá a ser regulamentada mais de dois anos depois.
Com o Decreto-Lei n.º 376/80 verifica-se, contudo, um recuo, ao introduzir-se alterações ao conselho pedagógico que levam a participação do representante da associação de pais naquele órgão para a dependência de convocatória do respectivo presidente. Mas, ainda em 1980, "O Estado reconhece a liberdade de aprender e ensinar, incluindo o direito dos pais à escolha e à orientação do processo educativo dos filhos", através da publicação do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo (Decreto-Lei n.º 553/80).
Com a criação do Conselho Consultivo do Ensino Particular e Cooperativo, a representação de pais e de professores passam a ser idênticas, ou seja, dois da associação de pais e dois de associações sindicais de professores - tal acontece pela primeira vez.
A primeira revisão constitucional, que teve lugar, em 1982, introduziu um novo artigo 77.° (Participação democrática no ensino), que, no seu primeiro ponto, restringe o direito à participação na gestão democrática aos professores e alunos, embora no n.º 2 remeta para lei as formas de participação das associações de pais e outras.
Todavia, só em 1984, 10 anos volvidos sobre o 25 de Abril, é que a aplicação da Lei das Associações de Pais será estendida ao ensino primário e à educação pré-escolar, através do Decreto-Lei n.° 315/84, de 28 de Setembro.
A aprovação da Lei de Bases do Sistema Educativo conduz à reforma de todo um leque de normativos sobre avaliação, currículos, gestão e administração, autonomia. O ano de 1986 é ainda o ano da publicação dos Estatutos da Confederação Nacional das Associações de Pais, que, em 1987, adopta a sigla CONFAP e é declarada de utilidade pública.
Em 1989, o conselho pedagógico das escolas dos 2.° e 3.° ciclos dos ensinos básico e secundário passa a incorporar um representante dos pais com direito a voto. É um duplo salto qualitativo: por um lado, os representantes dos pais passam a membros de pleno direito e, por outro, mantém-se o direito de representação parental em caso de inexistência de uma associação de pais.
Em 1990, a Assembleia da República aprova a Lei n.º 53, que autoriza o Governo a legislar sobre associação de pais, com a incumbência de "facilitar o seu exercício" e "reforçar o estatuto interventor das associações e respectivas federações e confederações", entre outros aspectos.
Por isso é que, ainda em 1990, é publicada uma nova lei das associações de pais - o Decreto-Lei n.º 372/90, de 27 de Novembro -, que fixa "o regime de constituição, os direitos e os deveres a que ficam subordinadas as associações de pais". A principal alteração consiste, talvez, em facilitar o processo de constituição das associações, tornando-o muito mais simples, rápido e, sobretudo, gratuito.
O Decreto-Lei n.° 172/91, de 10 de Maio, cria um novo sistema de gestão para todos os graus do ensino público não superior e integra representantes dos pais em vários órgãos das escolas e jardins de infância.
Dois anos mais tarde, através do Despacho n.° 239/ME/93, de 20 de Dezembro, adopta-se a representação dos encarregados de educação nos conselhos escolares das escolas do 1.° ciclo e nos conselhos pedagógicos dos jardins de infância como membros de pleno direito.
Em 1998, o Decreto-Lei n.° 115-A consolida a representação parental.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A família intervém de forma marcante e insubstituível no desenvolvimento da criança e do jovem, segundo a sua própria prática educativa e as suas premissas culturais. Estudos demonstram que isso há-de traduzir-se nos resultados escolares.
A implicação educativa dos pais é pontuada por sucessos e fracassos que produzem muito mais alterações na prática educacional familiar do que na escola.
Sabe-se, por outro lado, que as famílias favorecidas garantem mais possibilidades de desenvolvimento e inserção escolar, e se as experiências vivenciadas nos primeiros três anos de idade forem de elevada qualidade de educação, os filhos poderão atingir as máximas capacidades do seu potencial de crescimento. Ao contrário, um meio familiar pobre pode ser causa de inibição.
Há, assim, ao que parece, uma condicionante do meio familiar que, tendo embora várias matizes, pode influenciar quer a integração na escola quer os resultados das aprendizagens. E, sendo assim, a co-responsabilização dos pais no governo das escolas poderá constituir um elemento de estruturação dos projectos educativos que certamente contribuirão para o sucesso das aprendizagens.
A relação escola/família é também uma relação entre culturas; é a questão da relação entre práticas docentes predominantemente monoculturais perante a diversidade cultural presente na escola através dos seus alunos.
As políticas educativas, designadamente os normativos legislativos sobre a relação escola/família, têm posto mais o acento tónico na representação parental nas escolas do que na procura de meios que permitam aproximar, efectivamente, escolas e famílias. Assim, tudo parece recomendar que seja evitado o funcionamento em circuito fechado entre os representantes dos pais e a direcção das escolas.

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Por outro lado, os professores representam muitas vezes uma atitude de resistência quanto à participação parental, com receio de ingerência nas suas actividades. No entanto, a experiência tem demonstrado que essas práticas têm sido mais de colaboração do que de intromissão. O caso é que a grande maioria dos professores não será preparada para lidar com os pais, dado que esta temática é tratada de uma forma muito incipiente na sua formação inicial.
O êxito de qualquer dinâmica de colaboração dependerá sempre do grau de respeito dedicado a todos os intervenientes. Por isso, à desejável maior presença dos pais no espaço escolar talvez deva corresponder um reforço do prestígio e da autonomia dos professores, num resguardo das suas próprias competências técnicas e profissionais.
Mas o apelo à responsabilidade social teria sentido se não contemplasse o direito de as famílias participarem na definição das políticas de educação e no governo das escolas, sem pôr em causa as competências profissionais dos professores, nem a legitimidade dos decisores políticos? São mudanças que, ligando-se à ideia de participação, pressupõem igualmente atitude de compromisso face ao serviço público, porque a escola é vista como uma instituição em que a família delega responsabilidades mas que deseja prestação de contas. Sobretudo parece tratar-se de identificar agora direitos da família, numa vertente inalienável de soberania quanto ao património educativo parental.
A escola é sem dúvida lugar de conhecimento. Será, certamente, lugar de encontro, de afirmação e vivência da cultura, da solidariedade e da participação cívica, da liberdade, da justiça, da tolerância e do pluralismo. Mas é também o lugar da família.
A escola e a família hão-de ser aquela "árvore que floriu por detrás da casa, uma árvore dentro de Março, contra a rotina, e contra o espaço", como escreve o poeta Manuel Alegre.

Aplausos do PS.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Lino de Carvalho.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Benavente.

A Sr.ª Ana Benavente (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quando falamos da família e da escola estamos a falar da educação das crianças e dos jovens, educação pela qual somos todos responsáveis. E é por isso que o debate de hoje é importante e nos diz respeito a todos - lamento que o Srs. Ministros se tenham feito representar neste debate -, tanto mais quanto, em tempos de desinvestimento em educação, ciência e cultura, como está patente no Orçamento do Estado para 2003, apresentado pelo actual Governo, estamos muito preocupados com o retrocesso político, preocupados como Deputados, como cidadãos e como pais e mães que somos.
Desde que há escola que existem relações entre os pais e a escola, mas a existência de legislação que o Sr. Deputado António Braga acabou de referir, que consagra e incentiva o direito de associação dos pais e o da sua representatividade, essa é solidária da democracia. Com efeito, só depois do 25 de Abril se consagra a participação dos pais e encarregados de educação, explicitamente, na vida das escolas. Até então, não havia qualquer tradição nem movimentos organizados nesta área.
Também já aqui foi referido que os primeiros anos de escola, a educação pré-escolar e o 1.º ciclo, foram o "parente pobre" no reconhecimento da participação dos pais, e não será por acaso, no nosso país. Trata-se de um processo gradual e nem sempre fácil que se tem vindo a afirmar, passando dos textos à prática, considerando estes sempre presentes mas, durante muito tempo, invisíveis parceiros educativos.
Ninguém duvida da importância do envolvimento dos pais para o sucesso escolar dos filhos, ninguém contesta que a escola, cada escola, tem de estar ligada, enquanto investimento e recurso, à comunidade, ninguém desconhece que o direito de participação dos pais na escola é um direito de cidadania. Mas, Sr.as e Srs. Deputados, falando de famílias e de escola, não podemos deixar de referir todas as famílias, e todas as famílias significa não apenas aquelas para quem a escola, conhecida e já habitada, é uma experiência familiar, mas todas aquelas para quem o mundo letrado e, em particular, a instituição escolar são labirintos em que se orientam com muita dificuldade.
São inúmeros os trabalhos e estudos que evidenciam as diferentes expectativas e estratégias das famílias em relação à escola, segundo os meios sociais a que pertencem. Se há famílias próximas dos universos escolares, famílias cuja organização, modos de vida e projectos estão próximos dos da escola, cujas linguagens e referências são comuns, outras há, tão cidadãs quanto as primeiras, para quem um livro é um objecto pouco familiar, para quem um diploma é um sonho - que muitas vezes não se ousa sonhar -, famílias para as quais o funcionamento e os critérios da escola são relativamente misteriosos.
Com efeito, os pais não querem todos o mesmo da escola, não têm todos a mesma informação e meios de intervenção, têm todos o mesmo poder. Mas há, para todos, um ponto comum: todos os pais querem a melhor escola para os seus filhos,…

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Muito bem!

A Oradora: - … mesmo se a melhor é aquela que pode ser, a única, muitas vezes.
Em geral, os pais que fizeram estudos longos - entre os quais nos contamos, a maior parte de nós - esperam da escola a manutenção e melhoria dos saberes e diplomas que eles próprios obtiveram. Outras famílias, conscientes da importância da escola para o futuro dos filhos, esperam, inquietos, o "veredicto" escolar - será ele bom aluno? Será ela capaz? Gostará de estudar? Nuns casos a resposta é positiva, noutros é negativa, mas é a escola que responde. São estes pais os que menos dominam as regras do jogo e os que se sentem mais impotentes quanto à sua participação escolar.
Mas há também famílias, e são numerosas, que vivem afastadas da escola, porque dela tiveram uma experiência negativa e só o afastamento lhes permite evitar o confronto com os quase certos limites escolares dos seus filhos. É importante, assim, chamar a atenção para as famílias mais afastadas da vida da escola, que dificilmente têm estratégias

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adequadas para o sucesso, sem esquecer, em cada sociedade, os pais imigrantes, ansiosos pela integração dos seus filhos mas sem meios culturais, sociais, educativos, para apoiar tal integração. Aliás, é importante desfazer um preconceito corrente e que muitos estudos sociológicos, nacionais e internacionais, desmentem, o de que as famílias dos meios populares não dão importância à escola. Isso não é verdade. Todos os pais querem uma vida melhor para os seus filhos.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - A realidade social é diversa e desigual e não podemos, neste debate sobre escola e família, deixar de referir todas as famílias, porque são todas, e não apenas algumas, que aqui estão representadas neste Parlamento.
Nas relações entre escola e famílias, processo com as suas dificuldades e paradoxos, sublinharei ainda dois aspectos.
O primeiro tem a ver com as práticas tradicionais da escola, de mudança muito lenta, que reforça (ou reforçava) as relações pela negativa, só chamando os pais quando havia problemas e muito raramente para lhes comunicar algo de positivo ou agradável, ou para trabalhar em conjunto. Não estamos ainda muito longe daquela história do pai que, chamado à escola, pergunta imediatamente ao filho: "O que é que tu fizeste"? Ou daquele outro, mais na linha da actual maioria parlamentar, que diz à professora: "Olhe, eu já lhe bati... Vamos lá a ver então o que é que ele fez...".
Diga-se que, ao contrário do que acontece noutros países, o tema das relações entre escola e família não tem, entre nós, grande importância na formação inicial e contínua de professores e que é, muitas vezes, o maior ou menor à-vontade de uns e de outros que marca a vida do dia-a-dia neste campo.
O segundo facto que quero referir é o seguinte: se é verdade que o enquadramento familiar é muito importante para a aprendizagem das crianças e dos jovens, os resultados escolares não podem estar directamente dependentes do apoio da família à escola, ou de uma outra prática socialmente muito desigual, as explicações. É por isso que uma área como a do estudo acompanhado, consagrada no Decreto-Lei n.º 6/2001, e actualmente generalizada a todo o ensino básico, área que assegura o enquadramento de todos os alunos e desenvolve a sua responsabilidade e competências de estudo, faz mais pela efectiva igualdade de oportunidades que muitos discursos cheios de boas intenções.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Vou concluir, referindo alguns aspectos em que as políticas sociais e educativas podem contribuir para melhores relações entre escola e família, tendo sempre a criança e o jovem como preocupação central.
As políticas podem criar condições para que os pais e mães trabalhadores passem mais tempo com os seus filhos e acompanhem a sua escolaridade, em vez de lhes tornarem os recursos mais escassos, a vida mais pesada e a esperança mais longínqua; as políticas podem melhorar a oferta educativa e cultural para as crianças e os jovens, em actividades nas comunidades e no próprio espaço escolar, em vez de cortar os fundos para as creches, para os complementos educativos e para a oferta artística nas escolas;…

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - … as políticas podem investir na qualidade dos edifícios escolares e seus equipamentos, nas cantinas e no desenvolvimento de modos de vida saudáveis para os jovens, em vez de cortar nos investimentos em educação; as políticas podem apostar no aumento dos níveis de educação e de formação dos pais enquanto cidadãos, pois sabemos - e os estudos sobre literacia assim o provam - que o acesso à informação útil e a sua utilização pertinente estão ligados aos níveis educativos, em vez de desinvestir na educação de adultos;…

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Muito bem!

A Oradora: - … as políticas podem apoiar as escolas nas suas práticas de trabalho com as famílias, valorizar a participação dos pais, levar muito a sério o seu papel na melhoria da educação e das condições em que ela ocorre para cada criança e cada jovem.
As políticas podem e devem, em suma, assegurar uma educação de qualidade, em vez de divulgarem, em nome do interesse dos pais, informação distorcida e abusiva, como recentemente aconteceu com os ditos rankings.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Muito bem!

A Orador: - Nesta sessão, que celebra o Dia Europeu dos Pais e da Escola, fica a certeza do nosso empenhamento numa escola mais participada, num diálogo sério com os pais enquanto parceiros educativos, numa responsabilidade partilhada por mais e melhor educação para todos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa (Abílio de Almeida Morgado): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Se me permitem, quero, em primeiro lugar, felicitar a Assembleia da República, especialmente na pessoa do Sr. Presidente, pela promoção deste debate que, tocando num tema absolutamente estruturante da sociedade portuguesa, do seu devir como Nação e, deste modo, da própria pujança de Portugal no contexto estratégico internacional, é um debate que, saindo justamente dignificado por aqui ocorrer, igualmente muito contribui para acrescentar prestígio a este Parlamento.
Contem, Srs. Deputados, com toda a disponibilidade do Governo para participar activamente neste tipo de iniciativas.

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Quanto a mim, Srs. Deputados - e Sr.ª Deputada Ana Benavente -, é um prazer, direi mesmo uma honra, estar hoje, aqui, em representação do Sr. Ministro da Educação.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Queria saudar o Sr. Deputado relator pelo relatório que nos apresentou e deixar uma saudação também muito especial aos alunos das escolas que hoje aqui estão e à direcção da CONFAP, que veio assistir a este debate.
A política da família e a política da qualificação são, decidida, expressa e efectivamente, desígnios essenciais do Programa do XV Governo Constitucional. Tenho para mim muito claro que escola e família - e sublinhemo-lo, porque tem significado político relevante a relação entre ambas - constituem verdadeiras questões de Estado, direi mesmo questões da maior relevância para a soberania que, como comunidade responsável, queremos exercer e, acima de tudo, queremos e quereremos afirmar dentro das nossas fronteiras, não apenas do nosso território mas também dos nossos interesses estratégicos.
Intervir hoje politicamente na educação e na família e nos sistemas que as estruturam não nos permite ver hoje os resultados. É, por natureza, uma sementeira do que acreditamos ser um amanhã melhor. Porque assim é, Sr. Presidente e Srs. Deputados, estamos perante uma ética do futuro, estamos perante uma ética de que a UNESCO nos falava a propósito do desenvolvimento sustentável e que, em tudo, se deve aplicar às políticas de qualificação, de desenvolvimento social e cultural.
Sendo assim, Srs. Deputados, sendo que estamos perante desígnios estruturantes de soberania e de compromisso vital com as gerações vindouras, então temos - todos nós, o País - de abordar as políticas da família e da escola com desprendimento da pequenez da táctica partidária ou sindical,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - … com a coragem de promover e partilhar opções substancialmente estratégicas, com a perseverança das convicções, com a competência metódica de prosseguir objectivos sistematizados e sistémicos, bem como - é sempre saudável lembrá-lo - com a abnegação do desinteresse perante o mediatismo imediato.
Mais, Srs. Deputados: precisamente porque assim é, e também porque nos tempos que correm (como alguém já sublinhou) o futuro já não é o que costumava ser, não há espaço algum para visões e opções dirigistas do sistema educativo e da escola,…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … fatalmente sempre ultrapassadas por incapacidade de acompanhamento das dinâmicas socioculturais.
Também já não nos chega a afirmação, sobretudo quando inconsequente ao longo dos anos, da autonomia de gestão das escolas, por demasiado pobre para significar aquilo que nas sociedades plurais modernas as escolas são chamadas a desempenhar.
Sr.as e Srs. Deputados: O que hoje realmente está em causa é a concretização da liberdade responsável das escolas,…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … numa síntese personalista de autonomia e compromisso para com o papel sublime de estruturação e formação do saberes, dos seres e até dos sentires de milhões de crianças e jovens, a quem, precisamente, vai pedir-se que saibam ser livres e responsáveis.
Só num projecto de liberdade responsável da escola faz hoje sentido falar em liberdade de aprender e de ensinar, em projectos educativos próprios, em contratos de autonomia com as escolas - dos quais não há um feito -, em comunidades educativas locais actuantes e informadas (e não fechadas sobre a escola, mas aberta a todas as vivências e dinâmicas locais), em participação e parceria dos pais e suas associações, em descentralização de competências educativas nos municípios, em agrupamentos de escolas genuínos e eficazes, em redes de ofertas educativas equilibradas.
Só para um tal projecto de escola faz hoje sentido programar os desenvolvimentos curriculares e assumir a inovação educacional, que, sejamos claros, deve apoiar-se e promover-se, mas nunca dirigir-se.
Só no seio de um tal projecto de escola faz hoje sentido falar em promoção da estabilidade e da gratificação acrescida dos recursos humanos, docentes e não docentes.
Só na lógica de um tal projecto de escola faz hoje sentido falar em modernização da gestão das escolas, em planeamento educativo, em avaliação do sistema educativo, em função inspectiva da educação.
Falar num projecto de liberdade responsável da escola, na escola e para a escola pressupõe uma atitude muito atenta ao binómio família/escola, no sentido de garantir a integridade dos papéis de cada uma delas. E quantas vezes tem sido pedido à escola e aos professores que respondam pela família? Quantas vezes isso disfarça a ausência de verdadeiras políticas activas de promoção familiar?
Para o Governo, é muito claro que a existência da escola, com todo o seu potencial social, não pode, em caso algum, substituir as políticas activas da família, como melhor referirá a Sr.ª Secretária de Estado da Segurança Social.
Para o Governo, é muito claro que a escola, complementando a família e suprindo as carências desta, é, ainda assim, um fim em si mesma. Não fosse a escola e a grande maioria dos professores que a constituem verdadeiros referenciais da transmissão de saberes e de formação de seres, da tradição e da modernidade, da ética nas experiências de convívio, fundamentais nas crianças e jovens, da estabilidade perante os mais variados contactos com a desestruturação, por vezes mesmo subversão, social.
Srs. Deputados, no entanto, deve ficar bem claro que este Governo não tem uma visão determinística da realidade social, da escola ou da sociedade em geral. Não ignoramos as causas e, dentre estas, as perversas devem combater-se, mas acreditamos convictamente na livre determinação das pessoas e das organizações.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - Vemos a escola não como um produto social, um qualquer resultado de causas exógenas, mas antes como um pilar da autonomia para o desenvolvimento nacional. Também por isso, só somos capazes de conceber a escola como um espaço de grande liberdade e, consequentemente, de inequívoca responsabilidade.
É este o projecto de escola do XV Governo Constitucional, que o prosseguirá através de um conjunto muito coerente de opções já anunciadas em maior ou menor extensão.
Refiro-me, desde logo, ao alargamento da escolaridade obrigatória até aos 12 anos,...

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Quando?!

O Orador: - ... com uma mais lógica sequência entre ciclos e com uma claríssima opção por uma mais e eficaz e harmónica articulação entre as vias gerais e as vias tecnológicas, num projecto de educação e formação vocacional ao longo da vida, garantindo melhores condições de integração e de sucesso nas aprendizagens e as adequadas saídas profissionais de prosseguimento de estudos superiores.
É um objectivo que determinará uma extensa revisão da Lei de Bases do Sistema Educativo, para a qual todos nos devemos sentir convocados, e que não pode deixar de ser já tido em conta nas linhas mestras da revisão curricular do ensino secundário, que serão colocadas à discussão a muito breve trecho, bem como do respectivo sistema de avaliação das aprendizagens.
Refiro-me também à efectiva concretização do modelo de avaliação das escolas e do sistema educativo, enquanto veículo de transparência do sistema, de promoção da qualidade, de responsabilização social e de indicador de gestão. A concretização deste modelo, cujo enquadramento jurídico acabou de ser aprovado nesta Assembleia, deverá, a prazo, ter consequências numa acrescida liberdade de escolha dos estabelecimentos de ensino pelos pais.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Refiro-me, ainda, a uma política de acção social mais racional e profícua, que passa por medidas que vão desde o desenvolvimento das valências das bibliotecas escolares, nomeadamente no empréstimo de manuais, até à criação dos centros de apoio social escolar, que potenciarão um conjunto interdisciplinar de veículos de suprimento das diferentes carências sociais.
Refiro-me à efectiva criação de condições para que, a nível local, se estruturem e funcionem verdadeiras comunidades educativas, interessadas e actuantes, não fechadas em torno dos interesses especificamente escolares, mas abertas à intervenção das autarquias, das famílias, das empresas, das associações e demais organizações comprometidas com objectivos de desenvolvimento sociocultural.
Nesse sentido, considero uma verdadeira reforma estrutural o acordo que se obteve com a Associação Nacional dos Municípios Portugueses quanto à descentralização de competências na área da educação, assumindo a lógica de subsidiariedade, consubstanciada em dois instrumentos marcantes que agora passam a ter capacidade de ser efectivos: as cartas educativas e os conselhos municipais de educação.
Refiro-me, por fim, mas sem menor importância, à criação de condições para uma real gestão estratégica dos recursos humanos da educação, muito especialmente os professores. É uma área onde a lacuna é gravíssima. Estamos a falar da criação de capacidades para planear e concretizar políticas de desenvolvimento de recursos humanos nos momentos do recrutamento e selecção, da formação inicial e contínua, da avaliação, do mérito, entre outraa. Simplicidade, transparência, estabilidade e previsibilidade são palavras totalmente estranhas aos mecanismos actuais de recrutamento e mobilidade dos docentes, mecanismos esses que todos dizem não compreender porque perduram, mas perduram, com efeitos perversos notórios de há muito.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Ainda que de forma não exaustiva, estamos a falar de uma profunda reforma do sector da educação, já visível naquilo que foi feito em 6 meses de governação deste Governo. Para a concluir com sucesso, revela-se inevitável uma profundíssima reforma estrutural da administração educativa.
O estado a que chegou a administração educativa inspira-me uma enorme preocupação. Pergunto-me diariamente como foi possível ignorar que a qualidade do desempenho do sistema educativo depende da eficiência e eficácia da administração educativa. Pergunto-me diariamente como foi possível ignorar durante tantos anos que a ausência de resultados se deve ao desperdício que o sistema gera. Pergunto-me diariamente como foi possível não terem há muito detectado que a qualificação do sistema educativo, que é premente, exige recursos que ele próprio inutilmente deglute.
Há que regenerar a administração educativa, modernizá-la, racionalizá-la, dar-lhe coerência, eficiência e eficácia. Disto depende, em, absoluto, o desenvolvimento do sistema educativo e a sua qualidade.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr. Secretário de Estado, peço desculpa, não o querendo interromper, queria informar que o Sr. Secretário de Estado tem seis pedidos de esclarecimento e ainda há outro Membro do Governo para intervir. Convém olhar para o tempo disponível para o Governo.

O Orador: - Muito obrigado pelo alerta, Sr. Presidente. Vou terminar.
Como relativamente a qualquer sistema, mas com especial acuidade quanto a este, o sistema educativo tem de adquirir as condições para ser gerido.
A este propósito, permitam-me que assinale a feliz coincidência da publicação, ontem mesmo, da nova Lei Orgânica do Ministério da Educação. Sem alarde, sem tensão, sem mediatismo, a lei orgânica está aprovada e publicada.
A afirmação do estado preocupante a que chegou a administração educativa é, em si mesma, o melhor testemunho do grande mérito e da enorme vitalidade das escolas, dos professores e das famílias.
Tenho podido verificar o muito de muito bom que em muitas escolas acontece, quase sempre de forma discreta. Tenho podido verificar o denodo que caracteriza o dia-a-dia

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dos professores. É gratificante, mesmo que por vezes incómodo, constatar uma crescente exigência das famílias quanto ao desempenho das escolas - é o resultado do fortalecimento da sociedade civil que desejamos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Tenho uma visão tão persistente quanto optimista: vale francamente a pena apostar nas escolas, nos professores e na sua autoridade (que é uma questão, Sr.ª Deputada Ana Benavente, de legitimidade, não de poder) e no papel das famílias. São eles o princípio e o fim do sistema educativo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Manso.

A Sr.ª Ana Manso (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, depois da sua intervenção, permita-me que faça alguns comentários.
Em primeiro lugar, queria reafirmar a importância que a política da família representa e a sua relevância na mobilização e acompanhamento da escola, como forma de potenciar os seus resultados
Em segundo lugar, gostaria de manifestar que não temos quaisquer dúvidas de que as famílias portuguesas continuarão a dar sinais bem evidentes de que pretendem assumir a sua co-responsabilidade na melhoria do sistema educativo.
Em terceiro lugar, queria realçar o facto de a escolaridade obrigatória ser alargada para 12 anos, até 2010, já definida pelo actual Governo e que porá Portugal no pelotão da frente da União Europeia, permitindo também recuperar os atrasos estruturais que ainda se verificam no nosso sistema educativo.
Finalmente, gostaria de realçar o facto de a nova matriz pretender acabar com a discriminação e selectividade do ensino privado e consagrar, na prática, o princípio constitucional da liberdade de escolha no aprender e no ensinar, colocando no terreno princípios que nos são tão caros como a liberdade de escolha, a justiça e a coesão social.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Por isso, gostaria de lhe colocar algumas questões.
Como vai o Governo concretizar o direito dos pais, o direito dos trabalhadores, de se deslocarem justificadamente, em horário laboral, às escolas para acompanharem os seus filhos no ano lectivo?
Quando e como pretende V. Ex.ª, Sr. Secretário de Estado, implementar a escolaridade alargada a 12 anos e qual, na sua perspectiva, o alcance social a nível de toda a sociedade e especialmente a nível da política de família?
Como vai concretizar a liberdade de escolha na opção do ensino público versus privado? Vai ou não haver total liberdade de escolha? Se sim, como é que ela vai ser concretizada, em termos da intervenção a nível da política de família?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Estou informado que o Sr. Secretário de Estado responde de três em três pedidos de esclarecimentos, pelo que dou agora a palavra ao Sr. Deputado João Teixeira Lopes.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Das famílias sabemos já que a actual maioria tem uma concepção que apenas as remete para um singular: famílias entendidas como a família nuclear tradicional, católica, com uma forte divisão assimétrica de papéis entre homem e mulher.

Risos do CDS-PP e do PSD.

Tudo o resto, é um resto! E poderemos, depois, se quiserem, debater este aspecto.
Entretanto, ficámos a saber também que este Governo conseguiu introduzir em muitas famílias portuguesas uma enorme perplexidade. Felicitou, há pouco, a presença da CONFAP - aproveito para me associar a essa felicitação -, mas a CONFAP, precisamente, referiu, aquando da publicação dos rankings, aquando da célebre trapalhada dos rankings, que eles acabam por ser um instrumento extraordinariamente injusto, em particular para a capacidade de percepção das famílias sobre a qualidade das escolas.
A prestigiada revista The Economist, Sr. Secretário de Estado, dizia que rankings há para todos os gostos, e apresentava uma série deles com resultados totalmente diversos, chegando à conclusão de que mais vale conhecer quem faz o ranking do que propriamente a realidade estudada.
Diz o Sr. Ministro que a realidade não é determinística, mas é curioso que, se observarmos os resultados destes rankings, que foram uma trapalhada, de facto, chegamos à conclusão de que o País está dividido entre litoral e interior, entre famílias e concelhos de grande poder económico e outros, em que esse poder é escasso. Poderá dizer que a sua visão não é determinística, mas a realidade lá vai determinando algumas coisas.
Já agora, permita-me também que lhe pergunte, Sr. Secretário de Estado: é possível que, através de um número, através de um só número, se consiga percepcionar a complexidade da realidade escolar? Não lhe parece que, como referiu Joaquim Azevedo, Secretário de Estado de um dos governos de Cavaco Silva, o que interessa não é o resultado final mas, sim, toda a complexidade da realidade escolar? Onde é que está essa complexidade reflectida nos rankings?
E como responder aos professores e aos pais da Escola Secundária Oliveira Martins, n Porto, uma das piores classificadas do ranking, que receberam um telefonema de uma assessora do Ministério da Educação (porque, para dar más notícias, convém sempre dá-las com cuidado e, neste caso, os senhores decidiram ter uma mediação, pois não ia ser, com certeza, o Ministro a transmitir a má notícia)? O que é que vão fazer agora? Os senhores dizem que vão fazer alguma coisa. No entanto, não há nada no Orçamento do Estado que permita percepcionar o que é que os senhores vão fazer, é uma mão cheia de nada!

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Sabemos também do enorme abismo que existe entre a escolaridade dos actuais estudantes e a escolaridade dos pais: mais de 2/3 da população activa tem apenas seis anos ou menos de escolaridade, e o senhores reduzem o orçamento para a educação de adultos.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr. Deputado, chegou ao termos do seu tempo. Peço-lhe que termine.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Por isso mesmo, não tratem as escolas como se fossem um produto, uma mercadoria, como se fossem o "supermercado da educação", obrigando os pais a ter de escolher como se tratasse de um detergente. As escolas merecem mais e os pais merecem mais!

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Não se pode fazer este debate em toda a sua extensão e alcance sem o situar na esfera do Orçamento do Estado e do investimento real que o Governo pretende fazer nesta área. E, nesta área, Sr. Secretário de Estado, a realidade é que o orçamento proposto pelo Governo vem apontar, a todos os títulos, para uma afronta aos estudantes e às suas famílias, principalmente às mais carenciadas, porque a racionalização que o Sr. Secretário de Estado advoga e anuncia, nomeadamente para a Acção Social Escolar, não é mais do que preocupantes e significativos cortes na Acção Social Escolar. É o que está no Orçamento do Estado!
Este é o caso da Acção Social Escolar, mas também é o dos apoios educativos, deixando em suspenso e em sufoco - ainda mais! - aqueles que já hoje mais dificuldades atravessam.
O Sr. Secretário de Estado afirmou que a escola não é um produto social. Pois bem, a escola que temos e a escola que teremos é, e vai continuar a ser, um produto, um resultado das políticas do Governo, e é o resultado das opções que este Governo toma hoje que já se vai começar a sentir no terreno e, claramente, os dados indiciam que vamos ter aí um mau resultado.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, o Sr. Secretário de Estado falou na descentralização de competências, saudando e anunciando esta nova/velha solução de desresponsabilização do Estado e do poder central.
Sr. Secretário de Estado, quanto ao pré-escolar, em que falta muito ainda para garantir a efectiva cobertura nacional, em que falta muito ainda para responder cabalmente às necessidades de alargamento da componente não lectiva, por exemplo, ou então, quanto ao 1.º ciclo, que continua a ser o parente pobre do ensino básico, em que é tão necessário investir, aprofundar e resolver carências gravíssimas, ao nível da rede, ao nível de infra-estruturas, ao nível de equipamentos, ao nível de pessoal docente, ao nível de pessoal não docente, nesse quadro, são transferidos, enfim, não são transferidos, Sr. Secretário de Estado, são sacudidos para o poder local! E isto num quadro ainda mais escandaloso, que é o do garrote financeiro a que os municípios estão sujeitos este ano, com este Orçamento do Estado, com a proibição do endividamento, em que a própria Associação Nacional de Municípios Portugueses (que V. Ex.ª referiu e saudou na sua intervenção) é a primeira a afirmar que está em causa para o próximo ano o funcionamento do pré-escolar e do 1.º ciclo do ensino básico! É neste quadro, repito, que é sacudido - de facto, não é transferido mas, sim, sacudido! - um conjunto de competências para o poder local.
Por outro lado, e para terminar, Sr. Secretário de Estado, não considera que a pretensa medida de avaliação, de aferição de qualidade, de designação de factores comuns de qualidade das escolas e da rede pública - que são os rankings - não são mais, afinal, do que a consagração das desigualdades, do que a consagração das assimetrias regionais?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - É neste pressuposto que V. Ex.ª, o Governo e a maioria defendem a suposta liberdade de escolha?!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr. Deputado, terminou o seu tempo. Peço-lhe que termine.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Temos o top 30 das melhores escolas e o top 30 das mais acessíveis! E é nesse quadro que os portugueses - os estudantes e as suas famílias - têm de escolher! É um mau quadro, Sr. Secretário de Estado.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para responder a este primeiro conjunto de perguntas, e por um tempo máximo de 5 minutos, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Educativo.
Desde já, Sr. Secretário de Estado, chamo-lhe a atenção para o tempo total de que o Governo dispõe e para o facto de ainda haver mais três pedidos de esclarecimento.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa: - Sr. Presidente, de facto, o tempo que me dá é muito pouco para tanta coisa, mas vou tentar ser…

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr. Secretário de Estado, não sou eu quem dá o tempo, é o Regimento da Assembleia da República.

O Orador: - Vou tentar ser tópico.
Sr.ª Deputada Ana Manso, agradeço as suas perguntas. A escolaridade obrigatória até 12 anos é um objectivo programático do Governo até 2010 - foi anunciado pelo Sr. Primeiro-Ministro. Segundo expressão do Sr. Deputado Santos Silva utilizada num debate televisivo que ouvi, com a qual estou completamente de acordo, trata-se sobretudo, Sr.ª Deputada, de ser capaz de, na actual escolaridade

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obrigatória, criar as condições para progressivamente ir desenvolvendo a obrigatoriedade até ao 12.º ano. É óbvio que não se trata de uma medida que seja o princípio de uma opção política - é o fim de uma opção, é o fim de um conjunto de medidas, é o fim de um conjunto de um programa que acabei de explicitar em termos muito gerais na minha intervenção.
Falou a Sr.ª Deputada na questão da facilitação da participação dos pais na vida da escola, nomeadamente através da possibilidade de haver dispensas de horários laborais para que os pais possam participar. Deixe-me ser muito claro relativamente a essa matéria, Sr.ª Deputada: admito que seja necessário intervir no estatuto das associações de pais, mas deixe-me que lhe diga também que nunca essa intervenção poderá deixar de traduzir uma harmonia na relação entre o mundo do trabalho e o mundo da escola. Portanto, vamos ter, sobretudo, de considerar a possibilidade de a escola se organizar de forma a que, em termos de horário laboral mas também de horário pós-laboral,…

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr. Secretário de Estado, permita-me que o interrompa para pedir aos Srs. Deputados do PS da quinta fila que não perturbem a intervenção do Sr. Secretário de Estado.
Pode prosseguir, Sr. Secretário de Estado.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Relativamente à questão relativa a ensino público/ensino privado, Sr.ª Deputada Ana Manso, é para o Governo um desígnio dar condições de livre escolha para os pais entre o ensino particular e o ensino público. Isso depende de um factor absolutamente essencial que, até este momento, nunca foi assumido: uma equilibrada rede de ofertas educativas. Nesse sentido, é através do mecanismo dos contratos de associação, é através do mecanismo dos contratos simples, que nós queremos agora racionalizar, que essa liberdade será conferida. Não vamos, neste momento, ter condições para avançar por outros momentos da intervenção nesta área, na qual, aliás, todos os outros países que se integram no nosso espaço cultural também não avançaram.
Relativamente às questões colocadas pelos Srs. Deputados Teixeira Lopes e Bruno Dias, que agradeço, devo dizer que, de facto, não nos vamos conseguir entender.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Eu já desconfiava!

O Orador: - É que, realmente, o nosso ponto de partida é muito distante. Pergunto ao Sr. Deputado Teixeira Lopes se é melhor ser-se feliz e ignorante, se é melhor não se conhecer a realidade, se é melhor estar-se feliz porque não se conhece a realidade. Pergunto aos Srs. Deputados se não será absolutamente necessário conhecer o que se passa para corrigir o que se passa. Pergunto-lhes mais: estão satisfeitos com a realidade actual? Estão satisfeitos com aquilo que são os resultados de uma separação radical entre o norte e o sul, entre o interior e o litoral?

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Para pior já basta assim!

O Orador: - É ou não é necessário intervir? E, para intervir, é ou não é necessário conhecer? Vamos tapar os olhos? Vamos "tapar o sol com a peneira"? Não é possível, Srs. Deputados!
Agradeço ao Sr. Deputado Teixeira Lopes por não ter atracado a este Governo uma visão patriarcal humana da família. Mas, segundo o Sr. Deputado, voltámos ao Código Civil anterior! Nesse sentido, Sr. Deputado, deixe-me desdizê-lo: a visão que temos da família não é essa, mas sim uma visão muito mais activa, uma visão igualitária, uma visão em que as funções se complementam entre pai e mãe (porque estamos a falar da educação dos filhos), uma visão de responsabilidade. Mas também não vale a pena perdermos muito tempo mais com essa questão, Sr. Deputado, porque a sua pergunta não foi feita para obter a minha resposta; foi para o senhor ser ouvido!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

Risos do Deputado do BE João Teixeira Lopes.

O Orador: - Quanto a detergentes e escolas... Sr. Deputado, não vamos misturar escolas com detergentes! A escola não se escolhe como um detergente! A opção relativamente à escolha da escola é uma das mais importantes decisões dos pais. Portanto, vamos dar aos pais as condições para conhecerem a realidade e para poderem fazer uma opção verdadeiramente livre relativamente a essa escola, coisa que actualmente não existe! Actualmente, não existe essa possibilidade de escolha, e eu gostava que tivéssemos consciência disso! E é absolutamente necessário que a transparência que resultará de um processo de avaliação, que não é destes rankings... Aliás, o Ministro da Educação sublinhou variadíssimas vezes que este ranking não é um processo de avaliação das escolas. E é quando esse processo estiver concluído que teremos, aí sim, efectivas condições para essa escolha.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr. Secretário de Estado, terminou o seu tempo.

O Orador: - Terminei, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Antes de dar a palavra aos Srs. Deputados que ainda estão inscritos para pedir esclarecimentos, quero anunciar à Câmara que, acompanhado pelo Sr. Presidente da Assembleia da República, se encontra, na tribuna destinada ao corpo diplomático, o Sr. Presidente da Câmara dos Deputados de Itália, Sr. Pier Ferdinando Casini, com uma delegação. Para eles, as nossas saudações.

Aplausos gerais, de pé.

Srs. Deputados, para pedir esclarecimentos ao Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, começo por lhe dizer que me parece que, teimando na ignorância, "feliz" poderá continuar o Governo com o discurso que aqui faz! Permita-me que lhe diga isto por duas ordens de razões muito claras: em primeiro lugar, é verdadeiramente insultuoso teimar em dizer que as pessoas têm liberdade de escolha!

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - É bom que se diga que as pessoas não têm liberdade de escolha porque a maioria das famílias não tem condições económicas para poder ter duas opções! Portanto, é bom que nos situemos, como é bom que esclareçamos que o facto de as crianças e os jovens serem provenientes de famílias mais desfavorecidas condiciona o seu percurso - todos os estudos o concluem.
Não estamos, pois, todos em igualdade quando entramos na escola, nem temos todos liberdade total de decidir para onde vamos.
É perante esta realidade concreta e também perante a realidade concreta de um sistema que continua a excluir, através do insucesso, um número extremamente significativo de alunos, que nos parece que devemos discutir a questão da escola. Por um lado, devemos reflectir sobre a escola que temos ou não e que precisamos de ter e, por outro lado, devemos reflectir sobre o papel das famílias, porque são parceiros importantes para eventualmente ajudar a reduzir essa exclusão, como entidades que não cumprem uma formalidade protocolar, mas cujas opiniões devem ser consideradas.
A minha pergunta é a seguinte: tendo em conta que a escola tem problemas e que devemos "colocar o dedo" na ferida - fazer o discurso do faz-de-conta não os resolve -, como é que se soluciona esta questão com o orçamento que vamos discutir, quando não há apoios suficientes no acompanhamento dos alunos, quando as dificuldades de aprendizagem não são consideradas, quando os meninos das minorias étnicas não têm hoje programas que correspondam às suas necessidades, quando as crianças das famílias desestruturadas não têm resposta para as suas necessidades específicas de aprendizagem, quando os deficientes ou as crianças limitadas nas suas capacidades são excluídas?
Não estando o orçamento da educação virado para uma escola de inclusão, pergunto como é que concilia esse objectivo com aquilo que se propõe ou diz propor fazer.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr.ª Deputada, o seu tempo terminou, pelo que tem de terminar.

A Oradora: - Dado já não dispor de tempo, remeto o segundo aspecto que iria referir, e que tem a ver com a família, para uma intervenção. É que a discussão dessa matéria, que é para nós importante, está por fazer.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cristina Granada.

A Sr.ª Cristina Granada (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado, se olharmos para a relação entre a família e a escola numa perspectiva histórica, compreendemos que ela foi sempre, ou quase sempre, desigual. Só muito recentemente se passou a assumir que a interacção entre a família e a escola é não só desejável, como também indispensável.
É frequente observar da parte da escola uma postura paternalista no que concerne à participação dos pais ou encarregados de educação, assim como geralmente se verifica que, na construção e execução do projecto educativo, as famílias resignam-se a uma atitude de submissão aos modelos e preceitos que lhes são apresentados.
Por outro lado, a experiência mostra-nos que as famílias procuram tanto menos a escola quanto menor for o seu grau de formação escolar ou escolarização. E todos, com maior ou menor grau de escolarização, se vão distanciando da vivência escolar dos seus educandos à medida que os jovens crescem.
Nem a legislação existente conseguiu ainda alterar profundamente a relação escola/família. O Decreto-Lei n.º 372/90, de 27 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 80/99, de 16 de Março, consagra um lugar dos pais e encarregados de educação na escola. Os pais, através dos seus representantes, têm lugar na assembleia de escola, no conselho pedagógico e nos conselhos de turma.
Como é que se explica então, Sr. Secretário de Estado, a contradição entre esta legislação em vigor e a vontade política de reforçar o espaço e a intervenção dos pais na escola e a legislação ontem votada aqui na Assembleia da República, que não deixa antever a valorização do espaço e da intervenção dos pais na escola, uma vez que, no que respeita concretamente ao estatuto do aluno do ensino básico e secundário, os pais e encarregados de educação, que, antes, através do Decreto-Lei n.º 270/98, de 1 de Setembro, tinham dois representantes, um da turma, outro da associação que os representa, perdem um representante nos conselhos de turma disciplinares?

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Não é verdade! Antes pelo contrário.

A Oradora: - Como é que explica que a participação dos pais na construção de um documento tão importante como o regulamento interno da escola não seja grandemente incentivada, não seja reforçada, não seja mesmo requisitada?

Aplausos do PS.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Cabral.

O Sr. Fernando Cabral (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado, tal como já aqui foi retratado em várias intervenções, há um afastamento da família da escola.
Vou mencionar um caso concreto, que a Sr.ª Deputada Isabel Castro também referiu, que é o problema das famílias desfavorecidas e também o de algum analfabetismo que, infelizmente, ainda existe no nosso país.
Muito do afastamento dos pais em relação à escola acontece porque os pais não percebem o funcionamento da escola, uma vez que, infelizmente, não têm essa cultura e esse conhecimento dos mecanismos da escola. Por isso, do nosso ponto de vista, precisamos de falar em educação e em formação destas pessoas. Nesse sentido, pergunto o que é que o Governo pensa fazer nesta área e se tem previstas algumas iniciativas para que estas pessoas possam ter outra

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formação, outro grau de cultura, de forma a que tenham uma maior participação na vida escolar.
Em relação ao que hoje ouvimos por parte do Sr. Secretário de Estado, quero colocar duas questões muito concretas.
O Governo, de há uma semana a esta parte, tem "enchido a boca" com a expressão "escolaridade obrigatória dos 12 anos". Disse o Sr. Secretário de Estado que se trata de um objectivo a atingir em 2010. Mas, para além do discurso, precisamos de saber que medidas é que o Governo já tomou para o atingir. Diga-me, Sr. Secretário de Estado, uma única medida que o Governo tenha tomado nesse sentido!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Governo também tem falado muito em liberdade de escolha. Ora, ao falar em liberdade de escolha, com certeza não se está a referir ao litoral do País, nem a concelhos como Lisboa ou Porto, por exemplo. Mas, Sr. Secretário de Estado, dado que a grande maioria dos concelhos deste país só têm uma escola, diga-me qual é a liberdade de escolha que as famílias ou os jovens podem ter nesses concelhos?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para responder aos pedidos de esclarecimento, em tempo cedido pelo PSD e pelo CDS-PP, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, a forma como colocou a sua pergunta parece-me de facto muito séria, merecendo um cuidado especial na resposta.
Terá reparado que fui claro ao dizer que não ignoramos as causas e que as causas perversas têm de ser combatidas. O problema é que para ultrapassar essas dificuldades não nos basta conhecer as causas, temos que ter condições para acreditar nas pessoas que fazem as escolas. E é aí que reside a diferença que existe entre nós: a Sr.ª Deputada vê a escola como uma realidade que se resolve através da intervenção fora dela; eu vejo a escola como uma realidade que se resolve intervindo nela própria, por ela própria e com a energia que ela própria tem capacidade para desenvolver.
Quanto ao orçamento para a educação, pedia aos Srs. Deputados que não entrássemos neste debate. Temos visões diferentes…

Vozes do PS: - Ah!…

O Orador: - Srs. Deputados, peço desculpa, mas não disponho de tempo.
Tivemos já uma discussão em sede de comissão e vamos ter outra, pelo que vos peço que deixemos para aí uma análise milimétrica do orçamento. Mas com certeza já perceberam, pela discussão que tivemos inicialmente, que não têm grande razão nos argumentos que apresentam, embora não me custe assumir que gostasse de ter um orçamento muito maior. Só que a verdade é que o País que temos hoje impõe estes orçamentos. De qualquer maneira, o esforço feito a nível da mutação do desperdício para a recuperação do sistema é notável. Mas falaremos disso noutra altura.
Sr. Deputado Fernando Cabral, agradecendo as suas questões, dir-lhe-ei que é óbvio que não se corrige por decreto o distanciamento dos pais relativamente ao sistema educativo. Há três níveis de intervenção que são fundamentais, começando um aqui na Assembleia, que consiste em passarmos a ter um discurso diferente, mais de Estado, mais assumido relativamente às questões da educação.

Protestos do PS.

Isto é importante, Srs. Deputados, porque um dos sintomas de alguma menoridade política que vejo neste País deve-se ao facto de as questões da educação não assumirem a dimensão de questões de Estado.
É, pois, importantíssimo que se faça isso.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Começa pelas vossas escolhas, pelo vosso orçamento!

O Orador: - Em segundo lugar, direi que há muito a fazer em termos de promoção cultural neste País. E, se repararem, a questão da educação de adultos consta do orçamento, estando prevista uma reforma estrutural relativamente à articulação entre a formação vocacional e as vias gerais do ensino. Está lá! Leiam o orçamento naquilo que diz respeito à nova direcção-geral de formação vocacional do Ministério da Educação! Vamos ver os resultados dentro de algum tempo.
Em último lugar, Sr. Deputado, se há só uma escola num determinado concelho, aí não pode haver liberdade de escolha. Mas não é desse tema que estamos a falar, mas sim da efectiva liberdade de escolha onde e quando ela puder acontecer, que, neste momento - estou de acordo com os Srs. Deputados - não acontece, pelo que temos que trabalhar nesse sentido.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado, os problemas concretos que lhe apresentei não se resolvem só - não é isso que eu defendo - fora da escola, resolvem-se dentro e fora. E sobre os problemas que é possível resolver dentro da escola o Sr. Secretário de Estado nada disse! Além de que o orçamento que o Governo apresenta diz tudo, ou seja, diz que dentro da escola não há condições para os resolver!
Passo a referir-me a uma outra questão, também colocada pela Sr.ª Deputada Cristina Granada (que não obteve resposta), que tem a ver com a família.
Não serve a retórica de dizer que a família tem uma enorme importância, que é um parceiro indispensável e que

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o seu papel é de tal forma que lhe compete, segundo às vezes se diz, uma responsabilidade em relação àquilo que o Estado cada vez mais se quer desresponsabilizar de fazer. Ontem mesmo votámos um diploma que reduz o papel da família, que torna mais limitada a sua esfera de intervenção!
E há uma questão, Sr. Secretário de Estado, a que o Governo, tão cioso do papel da família, não pode seguramente escapar: é que as coisas resolvem-se dentro e fora da escola e resolvem-se também na sociedade, e não se pode escamotear o facto de na sociedade em que vivemos o Governo estar a apresentar uma proposta, que está em discussão, que modifica radicalmente, no plano do trabalho, as condições para que as famílias estejam no sítio próprio.
Caso não seja travado o anunciado código de trabalho, acontecerá uma desregulação profunda, com repercussões na família, instalando-se o caos institucional e familiar. Sr. Secretário de Estado, não tenha ilusões, se hoje as famílias têm dificuldades para acompanhar os projectos educativos, para participar na comunidade educativa e acompanhar a vida dos seus filhos, num sistema em que os horários são desregulados, em que os membros da família passam a ter o completo caos instalado entre si, seguramente que é nas crianças e nos jovens que isso se vai reflectir, as quais irão ter mais problemas na escola, pelo que isso vai significar menos possibilidade de participar e de convocar as famílias para um dever a que, do nosso ponto de vista, não se devem furtar, direito que têm mas ao qual irão ser colocados maiores obstáculos de poder ser exercido.

O Sr. Presidente: - Também para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Aurora Vieira.

A Sr.ª Aurora Vieira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: O tema que ora debatemos é um tema fulcral na sociedade, mas é sobretudo um tema crucial na perspectiva do futuro das nossas crianças e jovens, que é o mesmo que dizer do futuro do nosso País.
O tema hoje aqui em debate é também uma preocupação da Europa, reflectida na iniciativa do passado dia 8 de Outubro - O Dia Europeu dos Pais e da Escola. Co essa iniciativa pretendeu-se reflectir realidades educacionais de alguns países, salientando com particular ênfase a temática dos pais e da escola.
Desta iniciativa, gostaria do reverter para o nosso debate a relevância da troca de experiências entre diferentes intervenientes - pais, professores, alunos e responsáveis políticos - de escolas e de diferentes países europeus, que não só nos serve de exemplo de parceria e participação, mas nos remete ainda para três realidades de grande importância no processo educativo: a participação dos diferentes agentes educativos, e em particular dos pais e encarregados de educação; o papel da educação em Portugal e na Europa; e a importância da inovação tecnológica no processo educativo.
O que pretendemos com estas iniciativas, e também com esta, hoje, é: celebrar a escola, contribuir para a tomada de consciência dos pais enquanto parceiros no processo educativo e em particular na educação do seus filhos e encorajar o desenvolvimento de parcerias.
É, pois, atinente considerar a escola e a família como uma relação a desenvolver. A relação escola/família não é um exclusivo do nosso tempo, ela existe desde o início da história da educação. Mas a relação destas entidades é hoje, mais que nunca, um aspecto nuclear da nossa sociedade. A escola e a família são a sociedade!
Por um lado, o ritmo vertiginoso dos avanços técnicos e científicos que introduzem dificuldades na escola e, por outro, a alteração do esquema tradicional da vida familiar provocaram uma situação de entrega à escola de responsabilidades sócio-educativas que originariamente não lhe pertenciam.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - É na família que se deve desenvolver o processo fundamental da transmissão dos costumes, das tradições e dos valores entre gerações. Daí a actuação do grupo familiar como factor decisivo na definição do tipo, do nível da vida social e do desenvolvimento de qualquer país.
É na família que ainda hoje reside um papel educativo essencial, pois é nela que se constrói a estrutura nuclear da personalidade dos filhos; é nela que se constrói o quadro de referência primária para a prática educativa; é nela que começa a existência do homem; e é ela o meio natural e mais adequado para o indivíduo se promover como pessoa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Reconhecida como primeira instância do processo educativo, a família assume-se com direitos e deveres, conforme o consignado na Constituição da República Portuguesa. A educação dirige-se à formação integral da pessoa e, consequentemente, ao bem da sociedade de que o homem faz parte integrante. O processo educativo é, e tem que ser cada vez mais, um processo interactivo. A educação destina-se a proporcionar a cada um um caminho individual para o universal, implementando em cada um os processos de saber/fazer, mas sobretudo maturando os processos do saber/estar e do saber/ser, em muito e desde logo adquiridos no seio das famílias.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - O acto pedagógico não pode, pois, ser um acto unidireccional, mas um processo de múltiplas trocas, de partilhas e, sobretudo, de parcerias onde a escola deve exprimir e promover o pluridimensionamento da cultura e da sociedade.
Assim, a escola deverá ser vista como o núcleo no qual se agregam solidariamente os promotores da vida cultural e cívica da sociedade civil: os professores e os pais. Em suma, a comunidade!
A escola deverá ser, sobretudo, um pilar da educação, assumindo-se como condutor de um desígnio nacional e estratégico, e erigir um sistema de ensino não só de parcerias mas que promova a formação e a qualificação ao nível dos melhores, não só da Europa mas até do mundo.
Nesta rede de parcerias em que se pretende relevar como primordial o papel dos pais - porque eles são os primeiros

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agentes da educação e educadores -, onde faltam os pais dificilmente a educação será cumprida na totalidade.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - A cooperação família/escola é hoje, com vista ao futuro, um desígnio da nossa sociedade. É um desígnio nacional!
Cabe, assim, à escola colaborar, reciprocamente, com a família, com vista à formação de jovens para o mercado de trabalho, com vista ao combate ao insucesso e abandono escolar. Em conjunto, a escola e a família podem e devem conjugar-se no melhor e maior investimento que um país pode fazer no seu futuro: um investimento nas suas crianças e nos seus jovens; um investimento na qualificação das novas gerações.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Nos últimos anos têm sido desenvolvidos inúmeros estudos acerca da relação escola/família, e em todos eles é defendida uma cada vez maior participação dos pais, no pressuposto de que os modelos participativos são o garante da vivência democrática. Porque a escola existe para prestar um serviço de ajuda à família na construção do indivíduo, é óbvio que os pais têm o direito de saber o que fazem as escolas frequentadas pelos seus filhos, tendo igualmente direito de participarem no seu desempenho.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Cabe-lhes o direito e o dever de colaborar com a escola de forma adequada na concretização de uma educação para os valores, tomando parte activa no processo sócio-educativo da formação dos seus filhos como pessoas, devendo para isso serem-lhes facultadas condições para o exercício desse direito.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - É neste contexto que surge legislação integradora da participação dos pais no processo educativo.
A assunção desta componente pelo Estado partiu, em crescendo, de um grau zero, principalmente no período pós-25 de Abril.
O processo da escola como entidade fechada foi sendo progressivamente alterado, como consequência das modificações científicas e tecnológicas, mas sobretudo como consequência das modificações sociais.
Com o decorrer dos anos, e com a produção legislativa desde 1976 até ao Decreto-Lei n.º 80/99, caminhamos no sentido da institucionalização, regularizando o diálogo entre pais e escola e facilitando a participação dos pais e encarregados de educação.
Tendo-se dado passos importantes na relação família/escola, no sentido da institucionalização dessa participação, verificamos, ainda assim, que essa participação não é tão efectiva quanto o desejável. Estamos perante um paradoxo entre a afirmação e a legitimação social da participação dos pais. Por isso, é cada vez mais preciso estabelecer pontes entre a participação decretada e a participação efectiva dos pais.
A educação é um desígnio estratégico para o nosso país, cabendo um papel de grande relevância à escola e à família numa tarefa em que os resultados do futuro começam já hoje, aqui e agora!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Por isso, o Governo, através do Ministro da Educação e do Sr. Primeiro-Ministro, apresentou já, publicamente e nesta Câmara, como essencial uma política de combate ao abandono escolar e o aumento do número de anos do ensino obrigatório (como aposta na qualificação das gerações futuras) e, no sentido do apoio à família, uma redução nas pausas lectivas.
Será então que entre os pais e os professores existe um diálogo impossível?
Menos organizados, os pais têm tido um poder limitado sobre a política escolar, desde logo na escolha livre dos seus projectos educativos e da escola que querem para os seus filhos.
Os pais não se têm relacionado em pé de igualdade com os professores e com a escola. Esta assimetria, que é sociológica, existe não só porque ambos os intervenientes são actores individuais e colectivos, mas é tanto maior quanto maior é a diferença cultural entre as famílias e a cultura da própria escola.
No entanto, a tentativa de relacionamento, por desigual que seja, não pode ser um óbice, mas é, por si, uma força, pois estar implicado nas situações permite uma visão mais correcta dos problemas, responsabilizando quem neles participa: os pais e a escola.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Estudos demonstram que há efeitos positivos visíveis no aproveitamento escolar das crianças quando há envolvimento dos pais. Os programas concebidos com o envolvimento dos pais produzem alunos com melhor aproveitamento. E os professores podem desempenhar as suas tarefas com mais eficácia se forem ajudados pelos pais, com os quais partilham algumas das suas maiores preocupações. Quando os pais têm uma relação positiva com os professores contribuem naturalmente para que os filhos tenham um comportamento correcto na escola, o que nos nossos dias não pode ser considerado irrelevante.
Sr. Presidente Sr.as e Srs. Deputados: A educação é um legado que podemos deixar aos nossos filhos, mas é também um legado que a escola deve assumir como um desígnio: o desígnio de ser o principal veículo de uma educação que se assuma em formar e não em limitar-se a ensinar, que se assuma como pólo e factor de desenvolvimento, que acompanhe e desafie até as exigências da sociedade - sociedade que é a nossa, mas também a sociedade da mundialização - e que se assuma em parceria com os pais num conjunto de esperança e ambição.
Admitindo, pois, como relevante, importante e primordial a participação dos pais na educação dos filhos, é necessário criar condições da sua informação e até formação que conduzam a uma participação maior e mais efectiva, que se não esgote na organização colectiva, mas que conduza a uma participação individual na preocupação de cada pai por cada filho, como indivíduo e como pessoa.

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O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Sendo assim, não só é relevante o reconhecimento da importância das associações de pais, como é agora o tempo de incentivar a participação de todos e de cada um.
Cabe aos pais o direito e o dever de escolher, em igualdade e liberdade, a educação dos seus filhos. Cabe ao Estado promover esse direito.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Somos um partido humanista. É, pois, preciso não esquecer que a educação é uma tarefa de todos. Mas cada aluno é o protagonista da sua própria educação e é cada indivíduo, com sede na família, que constitui a base da nossa sociedade.
Queremos, em conjunto, formar cidadãos livres, conscientes e responsáveis. Cidadãos para os quais os valores da civilidade e do personalismo tenham significado. Devem os pais e a escola, em conjunto, promover a educação para a cidadania, para a sociedade.
Hoje, a complexidade das sociedades, a velocidade das mutações científicas e tecnológicas e as movimentações dos povos geram fenómenos de analfabetismo funcional e de exclusão social.
A escola tem de integrar os valores da cultura, da comunidade e da sociedade. Há que estabelecer pontes culturais entre os diferentes grupos neste contexto essencial. Por isso, há que pensar na missão dos directores de turma, no conceito de encarregado de educação, nas causas da pouca participação dos pais e nos factores facilitadores e integradores dessa participação.
Além disso, há ainda que pensar em como flexibilizar o horário de e para a participação dos pais, o direito à liberdade e igualdade de escolha das escolas, a informação e a formação de pais e professores no sentido do incremento da interacção pais/escola e a valorização e reconhecimento do investimento das famílias na educação dos seus filhos.
Sr.as e Srs. Deputados, a participação deve ser efectuada pela positiva. A participação deve resultar de e em fenómenos de inclusão e não de exclusão. A participação dos pais deve ser um acto de normalidade nas nossas escolas.
A terminar esta intervenção no debate da família/escola, não podemos esquecer, contudo, que o papel que a criança e o jovem desempenham na construção quotidiana desta relação é crucial. Não podemos esquecer que a criança é a mensagem, é o mensageiro, é o presente, é o futuro!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Vamos voltar a falar de famílias, e vamos falar, em particular, daquilo que tem sido a linha dominante deste Governo no que se refere à segurança social.
Assistimos, de facto, à crescente substituição de políticas activas de inserção social por políticas neofilantrópicas, assistencialistas e caritativas, que retiram a almofada social necessária para a integração social de muitas famílias. É a Igreja que o diz hoje! São as instituições privadas de solidariedade social que o dizem, porque lhes batem à porta!
Temos, neste momento, 1/5 da população portuguesa em situação de pobreza relativa. Para estas famílias, a questão da escolha nem é sequer a da escolha entre a melhor escola do ranking ou uma escola pior classificada, mas é, pura e simplesmente, a escolha de poder ou não colocar os filhos no sistema formal de ensino. Esta é a realidade! Vejam-se as taxas de abandono escolar precoce! Vejam-se as taxas de insucesso escolar!
Pense-se um pouco no fenómeno do trabalho infantil e compreenda-se por que é que ele acontece. Temos um triângulo explicativo: de um lado, o que se passa com as famílias, do outro lado, a escola e, no terceiro vértice, o mercado de trabalho.
Das famílias, temos muitas vezes a representação de uma escola socialmente inútil, uma escola que as tratou mal, uma escola que nunca as quis lá, uma escola que sempre as excluiu.
Dos próprios jovens, temos a ideia de que 9, 11 ou 6 anos de escolaridade é tudo a mesma coisa em termos de empregabilidade, preferindo por isso entrar rapidamente no mercado de trabalho desqualificado.
Temos, finalmente, o mercado de trabalho, onde predomina ainda a utilização intensiva de mão-de-obra barata e em que são os próprios empregadores que vão bater às portas das famílias a dizer: "Coloquem os vossos jovens a trabalhar! A escola não dá nada, assim sempre ganham alguma coisa! E acima de tudo, ganhamos nós!".
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O que está em causa é o modelo de desenvolvimento económico. O que está em causa é uma nova concepção para o País. O que está em causa, evidentemente, são outras políticas.
Por isso mesmo, dizemos, com toda a clareza, que, ao assistirmos à crescente selectividade social no sistema de ensino, ao assistirmos àquilo que é verdadeiramente uma vergonha, que é o facto de as escolas imporem um autêntico numerus clausus em escolas do básico e do secundário para a entrada de aluno - as escolas querem que sejam os melhores alunos a integrar o seu corpo discente para que no final obtenham uma classificação satisfatória -, porque mais uma vez está tudo pervertido e o que conta é o output, o resultado final e não os processos de aprendizagem, nós acabamos por reforçar a exclusão social!
Criamos escolas de primeira, de segunda e de terceira categorias, como se houvesse alunos de primeira de segunda e de terceira categorias! Como se houvesse famílias de primeira, de segunda e de terceira categorias!
Bater-nos-emos, sempre, contra uma escola para os "bons jovens" e uma escola para o "lixo social", porque não é essa a nossa concepção de sociedade, porque não é esse o nosso modelo de País!
Decididamente, aquilo que os senhores querem é aumentar as desigualdades sociais, mistificando esse aumento com um discurso e uma retórica onde o personalismo e o humanismo acabam por ser slogans do mais rasteiro senso comum.
Perdoar-me-ão, mas ou mudamos rapidamente o norte destas políticas ou, de facto, continuaremos na cauda da

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Europa nos indicadores da qualificação, nos indicadores do abandono escolar precoce e do insucesso escolar. E essa é a nossa maior vergonha, Srs. Deputados! Essa é a vergonha que a todos nos atinge e não apenas aos pais ou às escolas, que tantas vezes os senhores querem responsabilizar por todos os males.

Vozes do BE e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Comemorou-se pela primeira vez, no passado dia 8 de Outubro, o Dia Europeu dos Pais e da Escola. Este evento foi instituído pela Associação Europeia das Associações de Pais, com sede em Bruxelas, e tem como objectivos, fundamentalmente, celebrar a escola de um modo geral, despertar a consciência dos pais e sublinhar-lhes as suas responsabilidades enquanto parceiros na educação dos filhos.
Os pais são, como é óbvio, o referencial mais fundamental na vida de uma criança. São eles os primeiros responsáveis pelos seus filhos, são eles que marcam e condicionam indelevelmente aquilo que vai ser a vida dos seus filhos, a sua personalidade e a sua formação. É nas famílias que começa e acaba a educação das crianças e, por isso, elas não podem viver arredadas da escola, nem a escola arredada delas.
A escola é a outra peça essencial no desenvolvimento das crianças. A escola é fonte do saber, é o local onde a criança vai beber as bases do conhecimento. Tudo o que na escola se aprende vai condicionar o conhecimento que se continuará a adquirir ao longo da vida. É também na escola que se fazem as primeiras e grandes amizades, é lá que se aprende a conviver com o outro e a olhá-lo como pessoa, a trabalhar em equipa e a desenvolver projectos. É também lá, e por último, que se aprende a cidadania, a participação e a responsabilidade na decisão de um caminho que vai também ser comum a outros.
Por tudo isto, perguntamos simplesmente: podem os pais e a escola estar de costas voltadas, numa relação tão inevitável quanto próxima, mas ao mesmo tempo distante, rígida e formal? A resposta só pode ser um rotundo "não". Pais e escola são duas partes de um todo, que tem que se entender, que tem de cooperar, que tem de dialogar. Como pode uma criança entender que as duas matrizes mais centrais não actuem juntas, de forma a encontrar os melhores caminhos para a sua educação?
O grande desafio do nosso tempo é, portanto, dinamizar a participação dos pais na escola. A intervenção dos pais enriquece a escola, faz parte dela, e é, ao mesmo tempo, um direito e um dever dos pais.
Um dever, porque é a eles que compete em primeira instância a educação dos filhos, a orientação da sua formação, bem como o acompanhamento do seu comportamento. Mesmo nos dias de hoje, em que os pais e as famílias se deparam com problemas e dificuldades que nunca antes se tinham feito sentir, a escola não pode substituir o seu papel, tão primordial quão fundamental.
Por outro lado, a participação dos pais é também um direito inalienável, pois não pode conceber-se uma escola que se interpõe entre os pais e as crianças, arredando-os dessa dimensão fundamental da sua formação que é a escola.
O mundo de hoje em dia coloca-nos todos os dias perante questões novas, para as quais as respostas nem sempre são óbvias ou, sequer, perceptíveis.
Quem actualmente tem a seu cargo a responsabilidade da educação de filhos vive com inquietações: como garantir que os seus filhos se sintam seguros na escola? Como acompanhar os estudos e a actividade escolar das crianças, quando tantas vezes os pais chegam a casa já muito tarde, tendo pouco tempo para conversar e acompanhar os seus filhos? Como saber como vai o seu educando na escola, como é o seu comportamento, o seu aproveitamento escolar ou o seu relacionamento com os colegas?
Foi precisamente por reconhecer estes problemas e por considerar o papel dos pais uma dimensão fundamental da vida na escola que o novo estatuto dos aluno reconhece um papel especial aos pais e encarregados de educação. Este papel especial é uma especial responsabilidade, inerente ao seu poder/dever de dirigirem a educação dos filhos e educandos e de promoverem activamente o seu desenvolvimento intelectual e moral.
Não podemos deixar de realçar aqui que este papel é reconhecido a ambos e a cada um dos pais, e não apenas ao encarregado de educação. Este detalhe, que poderá parecer pequeno, tem uma enorme importância. São muitos os casos de pais que, pelas mais diversas circunstâncias da vida, se encontram afastados da educação dos filhos, da sua orientação e do seu acompanhamento. E foi também a pensar nesses pais, nas suas naturais preocupações com o futuro dos filhos, tantas vezes mais distantes do que desejariam, nos seus direitos e nos seus deveres como educadores dos filhos, que o novo estatuto os incluiu no elenco de responsabilidades que veio atribuir a ambos e a cada um dos pais.
O reconhecimento de todo um elenco de deveres que consubstanciam direitos inerentes ao papel dos pais é, em si mesmo, de vital importância. Cada um dos pais tem o dever de acompanhar activamente a vida escolar do seu educando, tem o dever de cooperar com os professores e tem o dever de contribuir para a preservação da disciplina na escola. Cada um dos pais é também co-responsável, juntamente com os filhos, pelo cumprimento do dever de assiduidade.
A escola e os pais têm de cooperar no zelo pelo cumprimento deste dever, pelo que têm os pais o direito de ser informados quando os filhos ultrapassem metade do limite das faltas injustificadas, como têm também o dever de, neste caso, comparecer na escola a fim de se encontrarem soluções para o problema do aluno em questão.
Cada um dos pais tem também o dever de integrar activamente a comunidade educativa, informando-se e sendo informado sobre todas as matérias relevantes no processo educativo dos seus educandos, devendo comparecer na escola sempre que tal seja necessário.
Os pais aparecem, assim, como partes de pleno direito do processo educativo da criança.
É claro que também não nos podem passar ao lado as dificuldades que muitos pais experimentam quando, tendo

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vontade de participar e de integrar a vida escolar dos seus filhos, não conseguem deixar o seu trabalho para serem recebidos nas horas disponíveis na escola. Foi a pensar nestes pais que foi introduzida uma nova regra de funcionamento dos conselhos de turma disciplinares: foi consagrado que estes devem, preferencialmente, ter lugar em horário posterior ao final do turno da tarde do respectivo estabelecimento de ensino. Com esta simples medida, muitos e muitos pais passarão a poder estar presentes nas reuniões onde, no fundo, se discute o futuro dos seus filhos.
Parece-nos que esta é, sem dúvida, uma inovação a todos os títulos fundamental, no sentido de criar as condições para a participação cada vez mais activa dos pais na vida escolar dos seus filhos.
Sobretudo, parece-nos que é chegada a altura de começarmos a pensar em consagrar o direito dos pais a faltarem justificadamente aos seus empregos quando precisarem de ir à escola informar-se sobre a vida escolar dos seus filhos.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O acompanhamento dos filhos na escola é, mais do que um direito dos pais, um dever inerente à sua condição de educadores, dever esse que tem de ser reconhecido pela sociedade de uma maneira geral.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Falámos já muito aqui dos direitos e deveres dos pais e do seu papel na escola, mas não se julgue que esquecemos uma importante dimensão dessa participação: a participação das associações de pais. Nunca será demais salientar a acção destes pais que, quantas vezes com grandes sacrifícios, se juntam para tentar dar a sua contribuição na escola dos seus filhos, para tentar aproximar as famílias das escolas e para, por fim, tentar melhorar as condições e apoios aos alunos na frequência dos estabelecimentos de ensino, que muitas vezes estão longe de ser as ideais.
Estes pais são peças essenciais da educação em Portugal e têm lugar, de pleno direito, nos mais variados órgãos: no Conselho Nacional de Educação, no Conselho de Opinião da RTP, no Plano de Acção Nacional de Luta contra a Droga e Toxicodependência, no Conselho Executivo para os Assuntos da Família e em muitos e muitos outros fóruns, quer a nível nacional quer a níveis regional e local.
As escolas em Portugal precisam destes pais e de todos aqueles que todos os dias se esforçam e dão o melhor de si para contribuir para um futuro melhor para os seus filhos.
Mas importa também aqui relembrar alguns princípios fundamentais: desde logo, o princípio do papel subsidiário do Estado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Estado na educação tem de ter um papel subsidiário, tem de conseguir criar as condições para que a educação vá para além daquilo que as famílias conseguem dar. É importante explicar que a escola não substitui, em circunstância alguma, a família - tem de ser complementar; é aí que o Estado tem de intervir!
Uma outra coisa que é importante relembrar é que a participação dos pais na escola não se resolve por decreto; o poder político tem de ter um papel activo na aproximação entre os pais e a escola, mas não se pode pensar que se resolve o problema da participação dos pais, única e exclusivamente, fazendo leis.
Por isso, o grande apelo que todos temos aqui de deixar, pondo de parte as discussões políticas, pondo de parte as discussões ideológicas e pondo de parte as lógicas partidárias, é um apelo à sociedade portuguesa acerca da importância que tem a participação de todos os pais na vida dos seus filhos. Essa é que é a diferença que nós hoje devemos marcar; este é o futuro que todos queremos cumprir.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O debate de hoje sobre a família e a escola deverá, na nossa perspectiva, constituir mais um momento de reflexão relativamente aos reais objectivos do Governo e da maioria que o sustenta ao desencadearem um ataque sem precedentes a direitos fundamentais e constitucionalmente consagrados.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Quando um Estado de direito democrático põe em causa o direito ao trabalho, o direito à educação, o direito à saúde, o direito à segurança social e à solidariedade e o direito à habitação, são os princípios basilares da democracia que estão em causa, é a efectivação dos direitos económicos, sociais e culturais que está questionada, e, naturalmente, a família e a escola, independentemente da sua vontade, transformar-se-ão em alvos preferenciais de opções políticas retrógradas e atentatórias do desenvolvimento do País.
De acordo com o Texto Constitucional, a família tem direito à protecção da sociedade e do Estado e à efectivação de todas as condições que permitam a realização pessoal dos seus membros. E o texto matricial é claro quanto às incumbências do Estado: deve promover a independência social e económica dos agregados familiares.
E a resposta do Governo PSD/CDS-PP não se fez esperar, aí está: são as funções sociais do Estado a viverem à míngua das "migalhas" orçamentais, da cultura à educação e da ciência à saúde; é o quadro dos "disponíveis"; é o desemprego a aumentar; são as reformas a reduzir; é o poder de compra a diminuir; é o congelamento dos salários; é a carga fiscal a pesar nas bolsas, cada vez mais vazias, dos trabalhadores e das trabalhadoras portuguesas; é o emprego cada vez mais precário; é o fim do regime de crédito bonificado!...

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem!

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A Oradora: - Claro que afirmarão o Governo e a maioria que o sustenta que tudo isto é em "nome de algumas famílias" e só de algumas famílias...
Mas ao Estado compete também promover a criação e garantir o acesso a uma rede de creches e a outros equipamentos sociais de apoio à família. E mais uma vez a resposta não se fez esperar: reduzem-se os investimentos em todas as áreas sociais e remetem-se as responsabilidades para as autarquias, a quem, simultaneamente, se retira capacidade financeira para intervir.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Bem lembrado!

A Oradora: - Afirma o Sr. Presidente da Associação Nacional dos Municípios Portugueses, um conhecido social-democrata, que, a confirmarem-se as verbas orçamentadas, o ensino básico e o pré-escolar irão paralisar no País. Naturalmente que tudo isto, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados da maioria, será em nome de algumas famílias, e só de algumas famílias. Mas quais, Srs. Secretários de Estado? As que vivem com salários mínimos? As que vivem com salários em atraso? As que vivem de contratos de vida a prazo? Esclareçam a Câmara, porque têm uma oportunidade óptima para o fazer! Esclareçam o País, as associações de pais que aqui estão, os milhares e milhares de trabalhadores e trabalhadoras portuguesas a que famílias se dirigem as opções deste Governo!

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - A todas!

A Oradora: - Também ao Estado se exige a cooperação com os pais na educação dos filhos, e o Governo não perdeu tempo: às famílias mais carenciadas presenteou-as com a redução das verbas no âmbito da acção social escolar; às crianças e aos jovens oriundos de contextos sócio-familiares mais desprotegidos ofereceu-lhes uma escola selectiva e autoritária, uma escola que prefere a retenção e a exclusão à pedagogia e à inclusão, uma escola que nega a realidade multicultural e perfilha nacionalismos balofos.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Não diga isso, Sr.ª Deputada!

A Oradora: - E um Governo, Srs. Secretários de Estado e Srs. Deputados da maioria, que maltrata a escola maltrata as famílias, maltrata o País.
Por isso não foi inócua a decisão de publicar a classificação ordenada das escolas, por isso não foram sina nem distracção as afirmações proferidas pela Sr.ª Secretária de Estado relativamente à falta de idoneidade e de ética dos professores.

Aplausos do PCP e do BE.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Ela não disse isso!

A Oradora: - É a igualdade de oportunidades na família e na escola que está em causa; é o sucesso e o insucesso que este Governo quer previamente determinar, primeiro na família e depois na escola, situação que se agudizará, naturalmente, com o Orçamento do Estado para 2003 e com a ofensiva legislativa em curso; são as assimetrias, as desigualdades, as discriminações e a exclusão social que penalizam as famílias e se reproduzem cada vez mais nas escolas portuguesas.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Este Governo afronta as famílias portuguesas, afronta a escola pública gratuita e de qualidade para todos; este Governo não quer a qualificação dos portugueses; este Governo não quer o desenvolvimento do País; este Governo quer a grande maioria dos portugueses e das portuguesas sujeitos à canga do código dos despedimentos fáceis, dos interrogatórios de violação da privacidade, do trabalho sem rumo nem local certo, dos horários sem horário, do trabalho diurno durante a noite, das férias como prémio e não como um direito.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Não diga isso, Sr. Deputada! Ninguém acredita nisso, nem mesmo V. Ex.ª!

A Oradora: - Custa ouvir, mas é verdade, Srs. Deputados!
Srs. Membros do Governo, expliquem que é assim que pretendem proteger a família, que é assim que pretendem fazê-la participar na formação e na educação dos seus filhos. Aproveitem a oportunidade que o Parlamento vos dá para dizerem que são estas razões que levaram os Srs. Deputados da maioria a rejeitarem, na semana passada, uma proposta do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português que aditava à proposta de lei do Governo, relativa ao estatuto do alunos, um artigo que garantia a criação de melhores condições aos pais e encarregados de educação para participarem na vida escolar dos seus filhos! Digam porquê!

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Bem lembrado!

A Oradora: - E enquanto o Governo exercita a sua ofensiva, com claros tiques de arrogância, os pais e os encarregados de educação, sozinhos ou integrados em milhares e milhares de associações de pais,…

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, peço-lhe que termine, porque já esgotou o seu tempo.

A Oradora: - Estou a terminar, Sr. Presidente.
Estava eu a dizer que, enquanto o Governo exercita a sua ofensiva, os pais e os encarregados de educação, sozinhos ou integrados em milhares e milhares de associações, têm enriquecido a comunidade educativa e têm demonstrado que, sem a sua participação e o seu empenhamento, não se concretizam melhorias no sistema educativo. Pais, professores, auxiliares educativos e alunos são indispensáveis à construção de soluções eficazes.
Afirmava recentemente o Sr. Presidente da CONFAP que as famílias estão disponíveis para partilhar a sua disponibilidade e vontade de melhorar as escolas e espaços que combinem a aquisição de conhecimentos com o lúdico e o feliz, formando cidadãos activos e conscientes.
Este é o caminho, mas não é este o caminho deste Governo e da maioria que o sustenta!

Aplausos do PCP, do BE e de Os Verdes.

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O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Pedroso.

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Quero, em primeiro lugar, saudar o Sr. Presidente por esta iniciativa, porque se trata de uma iniciativa que nos permitiu hoje ter aqui um debate sério sobre a relação "Escola e Família", e também lamentar aquela que me parece ter sido uma atitude do Governo de desvalorização desta iniciativa, pela maneira como aqui surgiu e pelo modo como se colocou perante o tema.
Há perguntas que foram colocadas e a que os Membros do Governo aqui presentes - não falo dos ausentes - optaram por não responder. Estamos a falar da relação entre escola e família. Então concretizemos: não basta proclamar - todos estamos de acordo com as proclamações - que se quer um papel mais forte das famílias na escola.

O Sr. João Nuno Sá (PSD): - Exactamente!

O Orador: - Mas é querer um papel mais forte das famílias nas escola o que acabou de ser aprovado por vossa imposição, que retira o representante das associações de pais no Conselho Disciplinar, que retira a advertência comunicada aos pais das sanções disciplinares?! Isto são passos nesse sentido?! Não são! São passos no sentido contrário e, como passos no sentido contrário, devem ser denunciados e isto deve ser aqui dito.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ficaram por responder outras questões. O Sr. Secretário de Estado optou por não responder -, e pode ser que a Sr.ª Secretária de Estado da Segurança Social o possa ajudar, respondendo agora - a perguntas tão simples como a que lhe volto a colocar.
Dizer hoje que, em 2010, haverá escolaridade obrigatória de 12 anos é mais uma das tais proclamações,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Olha quem fala de proclamações!

O Orador: - … talvez seja só "bater no peito" para esconder o facto de este ser o primeiro ano em que desce o investimento em educação em Portugal. Que medida concreta - uma só, Srs. Membros do Governo - está já presente para tornar possível este objectivo da escolaridade obrigatória de 12 anos em 2010?
E não nos digam que se trata de uma lei de bases, porque não é com uma nova lei de bases que se torna mais fácil ou possível a escolaridade obrigatória.! É com medidas concretas e é, nomeadamente - e dou um exemplo que o Sr. Secretário de Estado também poderá comentar -, pondo, desde já, a funcionar o tempo de formação nos contratos de trabalho dos jovens de menos de 18 anos, que é uma lei que está em vigor e que este Governo não está a cumprir. Este é um tipo de contrato que devia estar já no terreno e não está. A Sr.ª Secretária de Estado terá oportunidade de me corrigir se eu estiver errado.

Aplausos do PS.

Mas este Governo, quando se fala de família e de escola, esquece-se ainda de uma outra dimensão. É que, com os níveis educativos que temos, não se trata apenas de trazer os pais à educação dos filhos, trata-se também de dar oportunidade à educação dos pais de hoje, de melhorar a educação e formação ao longo da vida. E o que tem este Governo dito sobre a educação e formação ao longo da vida? Zero!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Não é verdade!

O Orador: - A única coisa que este Governo é capaz de fazer é denunciar fraudes de jovens no ensino recorrente.

O Sr. João Pinho de Almeida (PSD): - Então, devia pôr-se ao lado?! Devia tapar os olhos?! Esse branqueamento é inacreditável!

O Orador: - Nunca teve uma palavra de apreço para os milhares, para as dezenas de milhares de cidadãos que o frequentam com honestidade, com esforço e para sua própria valorização.

Aplausos do PS e do BE.

Falta essa palavra de apreço pelos trabalhadores de hoje e pela sua valorização.
Para finalizar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a relação entre a família e a escola é algo que deve procurar ser melhorado pelo esforço de todos nós. E devo dizer-vos que sinto que há muito a fazer do lado da escola e do lado dos pais, mas este é um debate que fica insuficiente se não pensarmos também na necessária reorganização do trabalho, porque um modelo em que as famílias trabalhadoras são obrigadas a trabalhar cada vez mais horas, é um modelo que não beneficia a colaboração entre a família e a escola, mesmo que episodicamente, uma vez por trimestre, possam frequentar a escola.
Por último, uma nota para dizer o seguinte: o ranking das escolas divulgado não me parece ter sido apenas de qualidade duvidosa, pois o Governo continua a fazer dele uma utilização desastrosa...

Vozes do PS e do BE: - Muito bem!

O Orador: - Dizer hoje, aqui, que o problema do ranking é o da liberdade de escolha, isso é não perceber a situação da educação da maior parte da população portuguesa!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que termine, porque já esgotou o seu tempo.

O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente.
A esmagadora maioria da população portuguesa precisa de uma escola de qualidade no sítio onde vive,…

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - É uma "descompaixão"!

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O Orador: - … não precisa desta liberdade de escolha circunscrita a uma ínfima percentagem da população. E saibam uma coisa: sempre que houver uma má escola acessível a uma pessoa que não tem acesso a outra ou a informação sobre o sistema educativo é uma geração que se pode perder.

Aplausos do PS e do BE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção no encerramento do debate, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Este debate que hoje se fez em torno das famílias - e eu insisto que é das famílias, porque não há um modelo único de família, é sobre a totalidade de modelos familiares que a discussão se deve fazer - e do seu papel em relação à escola é, a nosso ver, um debate de extrema oportunidade.
E pensamos que é um debate de extrema oportunidade não porque esta discussão se possa entender como um exercício académico, não porque esta discussão se possa entender como retórica, mas porque, efectivamente, a questão da escola é da máxima importância num país com problemas estruturais grandes e em que a qualificação dos seus cidadãos é ainda uma meta longínqua, para a qual é preciso convocar todos os meios que são fundamentais para o seu próprio desenvolvimento.
É nesse exacto sentido que nesta discussão e na discussão de qual o papel que cabe às famílias, como parceiras em relação ao processo educativo, como parceiras em relação ao projecto escolar e como interlocutoras indispensáveis, que o debate implica uma visão alargada sobre as próprias condições em que hoje a família e a sociedade se confrontam.
Seguramente que esta discussão obriga a reflectir sobre a forma e os limites, mas também sobre as enormes preocupações em torno das quais se desenha a participação futura destes cidadãos. Assim, num País em que, como refere um inquérito europeu sobre as condições de trabalho recentemente publicado, o número das horas gastas em termos de trabalho são superiores àquelas que os outros países da União atingem, onde o desordenamento do território é grande e onde o número de mulheres que participam no mundo do trabalho é dos mais elevados, seguramente que as modificações que se prevêem ou se admitem, ou que a maioria pretende impor no plano do trabalho, são entraves à participação. Sem que estes entraves sejam eliminados, seguramente que é retórica e é demagogia falar-se do papel que deve ser atribuído aos cidadãos, enquanto famílias, na educação e na participação da comunidade escolar.
Pensamos que, independentemente de tudo aquilo que foi dito, ao longo deste debate, os múltiplos pontos negros identificados que são dificuldades a que o Orçamento do Estado não dá resposta: ao contrário, ao reduzir os investimentos, pela primeira vez, num domínio tão importante, vai de facto reduzir as possibilidades de se ultrapassar estes obstáculos.
Do nosso ponto de vista, só se pode dar resposta na escola e a escola só cumprirá a sua função de uma forma responsável e livre se a própria escola pública não abdicar do papel que constitucionalmente lhe está atribuído e que não é, ao contrário do que o PP disse, um papel subsidiário.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Até é!

A Oradora: - E é nessa perspectiva que, do nosso ponto de vista, é fundamental encontrar respostas para os diferentes jovens e crianças que estão na escola. Isto significa a renovação pedagógica; isto significa, tendo em conta as desigualdades de oportunidade com que à partida os diferentes jovens e crianças se apresentam,…

Protestos do Deputado do PSD Jorge Nuno Sá.

A Oradora: - … currículos diferenciados; isto significa apoios educativos; isto significa um ensino mais virado para a realidade; isto significa necessidades educativas especiais contempladas na educação, tendo em conta, designadamente, os emigrantes e os seus filhos; isto significa ter em conta os meninos portadores de deficiência; isto significa seguramente uma diversificação e um outro papel, diferente, da escola porque, manifestamente, têm de ser tratados diferentemente. Ora, ser-se tratado diferentemente não é, como o Governo pretende, desresponsabilizar-se ou, quando tal interessa, atirar para a família uma responsabilidade que lhe cabe partilhar e que, do ponto de vista de Os Verdes, não se esgota e não se dispensa, quando a família não está (e em muitas situações, lamentavelmente, não está!) em condições de assumir a educação dos seus filhos.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se. Peço-lhe para concluir, por favor.

A Oradora: - Vou terminar, Sr. Presidente, dizendo que os meninos que têm famílias desestruturadas, eles próprios, têm o direito de ter da comunidade, do Estado, da escola pública, a responsabilidade que manifestamente o Governo da maioria de direita não lhe quer dar.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: As famílias - já aqui foi dito - devem ser ouvidas em todas as etapas do processo de aprendizagem.
Aliás, para nós, a avaliação é isso mesmo: é um processo de audição vastíssimo, de promoção da qualidade, mas é um processo que tem de ser, acima de tudo, auto-formativo. A avaliação faz-se para que se possam corrigir as deficiências; não se faz para punir nem para seleccionar; não se faz para instigar a competitividade nos estabelecimentos de ensino. Somos a favor da avaliação, somos a favor da transparência dos processos de avaliação, mas não queremos que um número acabe por resumir toda a complexidade desse processo.
Sr.as e Srs. Deputados, é evidente que há uma tradição ancestral no nosso País de desconfiança dos pais face à

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escola, e da escola face aos pais e às famílias. Queremos que a educação seja cada vez mais educação territorializada, o que significa, em forte ligação com o meio, o que significa que os pais e as famílias e as suas culturas e aquilo que eles representam sejam considerados como uma mais-valia, como um recurso e não como um obstáculo ou um ruído.
Ao considerarmos esta territorialização, queremos evidentemente que aumente a interacção entre saberes formais e saberes informais. É fundamental que aquilo que as crianças e os jovens trazem para a escola seja valorizado: a aprendizagem de rua tem de ser valorizada; a aprendizagem que vem da socialização familiar tem de ser valorizada; a aprendizagem que vem da herança cultural tem de ser obviamente valorizada. Mas o que este Governo pretende, pelo contrário, não é esta valorização.
Importa igualmente criar mediações entre os pais e a escola, interfaces - os pais têm de ser ouvidos e compreendidos; a escola tem também de falar a linguagem dos pais, mas devem ser dadas condições aos pais para que possam compreender a linguagem da escola.
Por onde nós não iremos, decididamente, é pelo discurso da competitividade, e da selectividade e da eficácia. A analogia, aliás, não podia ser mais clara - fala-se do sistema de ensino, constantemente, como se estivesse a falar de uma unidade de produção, como se as escolas fossem empresas. Mas as escolas não são empresas, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo! As escolas são um serviço público e apenas a vossa profunda desconfiança em relação aos serviços públicos, apenas a vossa concepção de um Estado minimal, de um Estado fraco e débil, nos leva a entender o que vocês pretendem. E o que pretendem, volto a repeti-lo, é o "supermercado da educação",…

Protestos do PSD.

… é que as escolas sejam escolhidas como se fossem produtos ou mercadorias e em que, obviamente, quem tem mais poder de compra compra o melhor produto.
Não queremos transformar as nossas escolas em agências de publicidade ou de recrutamento dos melhores alunos. Queremos, isso sim, valorizar o serviço público e a ideia de serviço público.
Contra uma sociedade de vendidos e de vencedores, nós dizemos que vencidos são os que desistem de lutar pela transformação da realidade. Por isso mesmo, o nosso desafio é, e será sempre, a reinvenção permanente da escola pública.

Vozes do PSD: - O serviço público pode ser feito por privados!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos na parte final deste debate sobre a família e a escola, e há que reconhecer que, se ele foi importante para a Assembleia da República, se ele tornou claras as posições dos grupos parlamentares, sem dúvida alguma, foi menorizado pelo Governo do PSD e do CDS-PP.
E foi menorizado porque os Ministros não consideraram suficientemente importante a discussão desta matéria e fizeram-se representar pelos Srs. Secretários de Estado! Foi menorizado porque os Ministros não quiseram, mais uma vez, ser confrontados com a responsabilidade que têm na área do trabalho, da solidariedade social, da segurança social e da educação, com os cortes orçamentais nas respectivas tutelas, e a reenviaram para um discurso de segunda fila dos Srs. Secretários de Estado!
Esta é uma primeira conclusão deste debate!!
Uma outra conclusão é a de que os Srs. Secretários de Estado traziam à Assembleia da República um recado, tentaram que fosse uma imposição, mas não o conseguiram. Esta matéria tinha de ser discutida no plano das intenções, no plano das promessas, como se estivéssemos em campanha eleitoral, mas não podíamos discutir o Orçamento do Estado. Foi aqui pedido pelo Sr. Secretário de Estado da Educação: "não discutamos o Orçamento do Estado, isso é em sede mais fechada, é na Comissão; aqui, não convém". "Srs. Deputados, deixem-me prometer; deixem-me prometer, mas não me perguntem pelas verbas, porque eu não as tenho!".

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Deve haver alguma razão!

A Oradora: - Foi isto o que o Sr. Secretário de Estado quis dizer e que a maioria defende ao aprovar exactamente estas medidas.
É porque os Srs. Secretários de Estado sabem que tudo aquilo que aqui disseram não passa de perfeitas farsas, de perfeitas falácias. Nada tem cobertura orçamental - nem a escolaridade obrigatória, nem os apoios educativos, nem a acção social escolar! Nada tem cobertura orçamental - esta é que é a verdade! Porque este Governo, pela voz da Sr.ª Ministra das Finanças, foi apresentar um Orçamento selectivo nos cortes, e selectividade significou "cortar" em matéria de educação, de ciência, de cultura; significou "cortar" na qualificação dos portugueses e no desenvolvimento do País. É isto que também podemos concluir, hoje, neste debate sobre a família e a escola.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Também ficou aqui claro que este debate veio demonstrar, mais uma vez, que este Governo não quer ser responsável em matéria de educação; que este Governo não quer ser responsável na qualificação dos portugueses, no combate ao insucesso escolar, no combate ao abandono precoce da escola, no apoio àqueles que são os mais carenciados e desprotegidos; e por isso reenviou para as autarquias, "sacudiu" as suas responsabilidades, e criou o "garrote", não só o do Orçamento rectificativo como o "garrote" do próprio Orçamento do Estado para 2003, impedindo as autarquias de responder a uma política de proximidade àquilo que é a resposta em termos de educação pré-escolar e em termos de ensino básico,...

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - ... os dois sectores do nosso sistema que mais fragilizados estão, os dois sectores que precisam de maiores investimentos - o sector do pré-escolar, para responder às necessidades das famílias, não só na vertente educativa mas também na de apoio às famílias; o sector do ensino básico onde o reapetrechamento das escolas é fundamental.
Há escolas que vivem como no início do século passado, com um quadro, uma carteira e um giz, e para responder a este problema este Governo "reenviou-o" para as autarquias a quem, simultaneamente, cortou as verbas, impedindo o reapetrechamento do ensino básico e impedindo a melhoria do pré-escolar.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Uma vergonha!

A Oradora: - Este debate veio confirmar também esta questão.
Falemos das famílias: esta é a política educativa que este Governo tem para as famílias. Mas presenteou as famílias de uma outra forma: aos pais e às mães, transformou o seu horário de trabalho diurno em trabalho "diurno-noturno"; as férias em "prémios"; o seu local de trabalho num local de passagem - isto "em nome das famílias"; isto em "nome da proximidade dos filhos"; isto "em nome do acompanhamento escolar"; isto "em nome do combate ao insucesso escolar"; isto "em nome da aposta do sucesso escolar"!

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Bela vida familiar...!

A Oradora: - Quanto à participação na vida escolar e no acompanhamento da vida escolar dos seus educandos, as medidas que aqui foram trazidas, Srs. Deputados da maioria que sustenta este Governo, fundamentalmente - sejamos sérios! -, a vertente que sustenta a proposta de lei que aqui foi aprovada é a vertente de uma escola autoritária,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

A Oradora: - … selectiva, penalizadora dos mais fracos e dos mais fragilizados!

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Vocês confundem disciplina com autoritarismo!

A Oradora: - É uma escola que aposta na retenção, na exclusão, na expulsão!

Protestos do PSD.

É bom que a CONFAP (Confederação Nacional das Associações de Pais) que aqui está presente, que os representantes das associações de pais que aqui estão, saibam que a maioria que sustenta este Governo viabilizou que uma criança de 11 anos possa, pela primeira vez na história deste País, ser expulsa de uma escola por um comportamento considerado não dentro das normas que este Governo determina, mesmo que o seu processo de ensino/aprendizagem seja excelente - com 11 anos de idade pode ser expulsa da escola!

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se, tem de concluir, por favor.

O Sr. Bernardino Soares (PCP) : - Contra factos não há argumentos!

A Oradora: - Vou terminar, Sr. Presidente, anunciando, mesmo para terminar, duas iniciativas legislativas que o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português vai apresentar, no início da próxima semana, sobre esta matéria: uma que vai melhorar e dar condições aos pais que acompanhem os seus filhos no processo escolar; e uma outra que ajudará os jovens portugueses e facilitará o seu acesso aos produtos e aos bens simbólicos, de natureza cultural e desportiva. Isto sim, são medidas!
Vejamos como se comporta a maioria que sustenta este Governo, quando procedermos à discussão e à votação dessas duas iniciativas do PCP.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Neste tipo de debates, há duas posturas possíveis, uma das quais é a de se entrar por um caminho de discutir soluções, discutir o futuro, enfim, fazer uma discussão que, normalmente, não se tem hipótese de fazer noutro tipo de debates parlamentares - em debates em que estamos condicionados por iniciativas legislativas e que não permitem uma abertura tão grande em termos de reflexão e de discussão dos problemas em profundidade.
E há uma segunda hipótese: a de se entrar pela trica parlamentar, de se entrar em discussões meramente partidárias, que são, obviamente, um tipo de postura e uma actuação estéril e nada trazem de novo às questões que estão a ser discutidas.
Sem querer classificar qualquer uma das posturas que os vários partidos aqui assumiram, a única coisa que posso dizer, em nome do CDS-PP, é que estamos de consciência tranquila em relação ao papel que desempenhámos neste debate.

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Falta de auto-análise!

O Orador: - E estamos de consciência tranquila, porque o que dissemos, dissemos verdade. Dissemos uma verdade que custa a admitir à oposição e que a oposição não é capaz de reconhecer: Que o estatuto do aluno introduziu uma grande novidade em favor dos encarregados de educação, dos pais e das famílias portuguesas.
A possibilidade de os conselhos disciplinares de turma reunirem fora do horário laboral, podendo assim a participação dos pais nessas mesmas reuniões ter uma abrangência muito maior, é uma mudança histórica no sentido da participação dos pais que a oposição tenta ignorar.

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O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Mas que mal fizeram as associações de pais?

O Orador: - Por outro lado, há um princípio de justiça que não posso deixar de defender.
Quando ouvimos falar da fraude do ensino recorrente de uma forma tão leviana, com tanta irresponsabilidade, temos de defender os milhares de jovens que foram prejudicados por essa fraude. É que, de facto, preocupa-nos fazer justiça, mas para com aqueles que não entraram na Universidade, porque à frente deles entraram outros que tiveram notas baseadas numa fraude!

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Exactamente!

O Orador: - É uma vergonha que quem tinha responsabilidades governativas à época não tenha assumido a responsabilidade de combater esta realidade e que agora, fora do governo, continue a tratá-la como uma questão menor.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Exactamente!

A Sr.ª Cristina Granada (PS): - Vamos aos "Casos de polícia"!...

O Orador: - Quando reflectimos sobre a educação, é também importante abordar a questão da liberdade de educação e dizer que o Estado não pode de forma alguma limitar o acesso ao ensino particular e cooperativo, nomeadamente no âmbito dos contratos de associação, limitando o número de turmas, induzindo assim os pais a porem os seus filhos no ensino público quando muitas vezes não é essa a sua vontade.
O Estado não pode obrigar as famílias a quererem a educação que ele próprio dá.
O Estado tem de trabalhar no sentido de que todas as famílias, com mais ou menos recursos, possam escolher não só entre a educação pública e a educação particular e cooperativa mas também, dentro do universo público, a escola e o modelo que querem, tendo assim a possibilidade de escolher a educação que pretendem para os seus filhos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Nos últimos tempos, foi tomada uma decisão história pelo Supremo Tribunal dos Estados Unidos.

Protestos do PS e do PCP.

Quando esse tribunal reconheceu a extensão do cheque de ensino a todas as realidades educativas, sem excepção, reconheceu, pela primeira vez, verdadeiramente, o acesso à liberdade de aprender e de ensinar.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Mas olhe que esse tribunal ainda não tem jurisdição sobre Portugal!

O Orador: - E vou pegar novamente na liberdade de aprender e de ensinar, consagrada no artigo 43.º da Constituição da República Portuguesa, especialmente no seu n.º 2, que diz o seguinte: "O Estado não pode programar a educação e a cultura segundo quaisquer directrizes filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas e religiosas.". E repito: filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou religiosas.

Protestos do PS e do PCP.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Não se esqueça do que leu!

O Orador: - A visão que temos do ensino em Portugal é a de que este artigo da Constituição da República Portuguesa não é cumprido pelo Estado.
O Estado pode não promover, mas autoriza a que nas suas escolas sejam promovidas visões filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou religiosas parciais,…

Protestos do PS, do PCP e do BE.

… que induzem a educação dos filhos das famílias portuguesas num determinado sentido. E o apelo que temos de fazer ao Governo de Portugal é que não permita que isto se generalize; que não permita que esta realidade continue; que não permita, por exemplo, que a educação relativa à História de Portugal seja perfeitamente orientada ideologicamente, controlada…

Protestos do PS, do PCP e do BE.

… por professores que muitas vezes têm opções políticas verdadeiramente conhecidas e que não se preocupam em transmitir uma visão isenta…

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - É uma vergonha! Tenha respeito pelos professores!

O Orador: - … daquilo que é a nossa História! E é perfeitamente natural que o Partido Comunista Português se indigne com isto, porque, de facto, uma escola livre…

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Você é um fascista! Tenha respeito pelos outros!

O Orador: - … não vai permitir que continuem a usar esse espaço para promover a vossa ideologia!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Vozes do PCP e do BE: - É uma vergonha!

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Você conseguiu fazer pior do que a Sr.ª Secretária de Estado!

O Sr. Presidente: - Para intervir, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rosalina Martins.

A Sr.ª Rosalina Martins (PS): - Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Permitam-me, antes de iniciar a minha intervenção de encerramento, que saúde os representantes da Confederação Nacional das Associações de Pais (CONFAP) que se encontram a assistir a este debate sobre a escola e a família.

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A valorização da comunidade educativa é um elemento essencial e "estruturante" de qualquer política de educação consistente. Embora o papel das famílias na escola tenha vindo a aumentar, sobretudo a partir da década de 90, podemos concluir, após este debate, que a necessidade de aprofundamento desta parceria requer políticas próprias.
A escola dos nossos dias é chamada a resolver problemas para os quais não foi pensada nem preparada. Hoje, espera-se que escola desempenhe um papel que antes era, em parte, desempenhado pelas famílias.
Neste quadro de novos desafios, os mecanismos de cooperação com os pais devem por isso ser flexíveis, no sentido de proporcionarem as respostas adequadas aos problemas emergentes. Assim, o desenho do projecto educativo de cada escola deve ser assumido, negociado e partilhado com a comunidade educativa de modo a inverter uma cultura secular de escola centrada e fechada em si própria.
A escola é, por definição, uma instituição socializadora, logo de transmissão de valores e um dois valores que é suposto transmitir é o da convivência democrática, Sr. Deputado João Pinho de Almeida!!

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - É, pois, nesta vertente de democratização e emancipação que se concretiza a dimensão política e cívica da escola, através da co-responsabilização dos diversos actores - pais, professores, alunos e restante membros da comunidade.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Ora, os pais, independentemente da sua profissão ou condição social, são antes de mais educadores. Os professores investem na educação e formação das mesmas crianças e jovens. É, pois, nesta encruzilhada da educação escolar e familiar que a interacção entre pais/professores deve acontecer.
Mas aprofundar a relação escola/família exige também mudanças organizacionais, desde logo aceitar dentro da escola outros actores sociais que não os exclusivamente tradicionais; significa, por outras palavras, aceitar uma alteração do próprio conceito de escola.
Se a adequação do projecto educativo, como atrás referi, representa um primeiro passo no aprofundar desta relação, importa também adaptar outras realidades que muitos obstáculos criam à participação das famílias na vida das escolas.
Todos sabemos que os pais exercem profissões diferenciadas e estão geograficamente dispersos. Caberá à escola criar espaços de reflexão, de partilha e de convívio em horários compatíveis com a realidade laboral de cada família.
No estatuto do aluno do ensino básico e secundário, ontem aprovado nesta Câmara, aponta-se, como o Sr. Deputado João Pinho de Almeida aqui referiu, para a realização de reuniões de conselhos de turma no final do turno da tarde. É um primeiro passo muito tímido e muito pouco concretizador do discurso demagógico de um Governo que tende a promover e a defender a família: é muito pouco para esse discurso! Do discurso à prática falta percorrer um longo caminho, sobretudo quando verificamos, Srs. Deputados, que no terreno apenas existem cerca de 2000 associações de pais, funcionando muitas delas graças à militância e ao empenho dos pais.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não obstante o enorme consenso que actualmente suscita a ideia das participação dos pais na vida da escola, ela necessita de um maior aprofundamento.
A sociedade multicultural em que vivemos levanta novos problemas e exige da escola novas soluções. Aprofundar as relações entre pais e professores não significará esbater muitos dos problemas latentes?
O reconhecimento da diversidade cultural implica a noção de cultura como prática social. E será que as práticas profissionais dos professores não são sempre práticas sociais?
Sabemos que as famílias contemporâneas vivem num mundo cada vez mais complexo: a educação das crianças e dos jovens é uma tarefa partilhada entre a família e a escola.
Um recente estudo do EUROSTAT veio demonstrar que as mulheres portuguesas são as que menos tempo têm para dedicar aos filhos, apenas 35 horas semanais, em média, muito longe das 70 horas das irlandesas ou das 60 horas das espanholas.
De facto, só por si isto evidencia a importância e o peso da escola e implica a adopção de medidas sociais de apoio às famílias.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - A educação é um serviço público e a qualidade deste serviço deve responder às necessidades das famílias e das populações que não são apenas necessidades educativas mas também necessidades de natureza social e cívica.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - E os Srs. Deputados da maioria estavam muito preocupados por não haver unanimismo relativamente à política de educação que está a ser seguida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - O unanimismo é uma coisa que nunca queremos!

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se.

A Oradora: - Vou terminar, Sr. Presidente.
É que do ponto de vista do Partido Socialista há uma diferença: só há uma maneira de conduzir a política educativa na lógica da qualidade que é envolvendo todos os parceiros e considerando as escolas como centros de aprendizagem participada!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Manso.

A Sr.ª Ana Manso (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: O Partido Social Democrata sempre expressou, de forma clara e inequívoca,

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o princípio da complementaridade entre os dois elementos centrais do nosso debate político. E essa expressão não resulta de qualquer perspectiva tecnocrática ou orgânica, mas de uma verdadeira expressão do nosso modelo ideológico e doutrinário que encara a família como elemento nuclear da vida social e, por consequência, da afirmação do indivíduo na sua vivência colectiva.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - A família é, e não pode deixar de ser, um elemento estruturante do nosso sistema educativo - sistema educativo entendido numa dimensão ampla -, que não se esgota nas fronteiras do sistema escolar, nem se confunde com o sistema de valores ético-morais que a vivência social, cívica e cultural induz na formação do indivíduo. Para nós, todas estas dimensões enformam o sistema de educação, sendo que, em cada uma delas, está reservado um papel decisivo para a família.
Bem sabemos que, no processo educativo, a escola surge como um dos factores determinantes da evolução das nossas crianças e dos nossos jovens. Sem um bom sistema escolar não é possível criar um lastro educacional no nosso país que nos compatibilize com os sistemas mais avançados da Europa e com a modernidade do pensamento, da criação e da liberdade cultural que caracterizam os povos desenvolvidos. É esse, aliás, o sinal distintivo dos níveis de desenvolvimento civilizacional e não tanto os índices materiais de vida.
Às políticas nunca deixam de estar associados os recursos, sendo que uma parte significativa das despesas públicas se dirige ao reforço e melhoria dessas políticas. Mas a responsabilidade social do processo educativo não pode recair exclusivamente nos ombros do nosso sistema escolar e, por consequência, nas opções políticas do Estado.
À família cabe um papel determinante nesse processo, porque também entendemos que não há a estruturação de um bom sistema educativo sem a consolidação estruturada do núcleo familiar e a sua responsável comparticipação na formação das crianças e dos jovens.
Não temos dúvidas de que as famílias portuguesas têm dado sinais bem evidentes de que pretendem assumir essa responsabilidade de contribuir para a melhoria do sistema.
As famílias dão também - há que reconhecê-lo - sinais de preocupação no que respeita à desestruturação do nosso sistema de valores e à relativa perturbação que o quotidiano do sistema escolar transmite para a sociedade. Isto é, o investimento no sistema educativo só faz sentido, até pela necessidade de dar plena expressão à sua materialidade, se contribuir para a melhoria do nosso funcionamento em sociedade, para o bem-estar social dos cidadãos, para a eficiência das nossas instituições e do nosso tecido económico e empresarial e, também, para a afirmação da nossa cidadania.
Estes factores não podem deixar de ter significado na realidade do nosso sistema educativo. É óbvio que uma família desestruturada, com dificuldades económicas e com os consequentes impactos sociais negativos, não está apta a acompanhar o esforço a que aqui nos tentamos todos comprometer. Já muito fazem as famílias. Mas, ao mesmo tempo que devem desenvolver-se políticas que estimulem o seu envolvimento no sistema de educação, temos de avançar colectivamente para a criação de fundamentos de riqueza e de bem-estar que facilitem a participação da família na vida das escolas, no debate das políticas educativas, na vida das nossas crianças e dos nossos jovens, fora do contexto familiar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Nem a família se esgota nas quatro paredes, nem a escola pode confundir-se com o sistema.
O caminho do sucesso do nosso sistema de educação não pode ser outro senão o da aproximação progressiva da escola e da família, ultrapassando progressivamente a ideia de que a escola ensina e a família educa, no sentido ético-moral da expressão. Não! De maneira nenhuma!
A responsabilidade social pela educação e a formação dos cidadãos não é estanque, ela envolve os agentes educativos, a família, mas igualmente os meios e estruturas de reprodução de valores, desde os meios de comunicação social às lideranças políticas, desde as elites culturais às colectividades e associações de vária índole, desde os agentes económicos às formas de organização e representação de interesses, enfim, toda a sociedade.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Ninguém se pode eximir a esta responsabilidade. A educação está no âmbito da nossa cidadania, mas deixemos que na sua dimensão objectiva e concreta se realize na relação de complementaridade e co-responsabilidade escola/família, com a atenção fina e crítica de toda a sociedade portuguesa. É, de facto, um desígnio nacional.
Mas, Sr.as e Srs. Deputados, não vale a pena continuar a dizer que o orçamento é penalizador para a educação. Já basta!

Vozes do PS: - Vale, vale!

A Oradora: - Este Governo está disposto a melhorar o sistema educativo, com rigor, responsavelmente e não obedecendo a quaisquer lobbies,…

Protestos do PS e do PCP.

O Sr. António Braga (PS): - É um aparte para o CDS-PP? O Sr. Deputado do CDS-PP vai ter de defender a honra da bancada!

A Oradora: - … mas não está disposto, Sr.as e Srs. Deputados, a gastar mal, muito mal, e a pagar os desperdícios de tantos e tantos anos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Sobre o ensino recorrente, Sr.as e Srs. Deputados, é importante falar verdade e fazê-lo é sermos justos para com aqueles que se esforçam neste ensino. Mas não fiquemos todos com o ónus daqueles que não aproveitam desse mesmo ensino e apenas desperdiçam os recursos que são de todos nós.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado da Segurança Social.

A Sr.ª Secretária de Estado da Segurança Social (Margarida Correia de Aguiar): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, apresento a todos os meus cumprimentos.

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Antes de mais, quero felicitar a Assembleia da República por esta iniciativa, que nos permitiu debater e reflectir o tema "A família e a escola", que é um tema de Estado, que é um tema estratégico ao qual o Governo dedica, no seu Programa, uma importância política determinante.
Felicito também o Sr. Deputado António Braga, enquanto relator da reflexão que trouxe a este debate.
A presença do Governo nesta sessão parlamentar é bem a prova da importância que a família e a escola assumem no contexto das suas políticas de desenvolvimento económico e social.
A família, como grupo social fundamental da sociedade, tem direito, conforme o preconizado na Constituição da República Portuguesa, à protecção do Estado e da sociedade e à efectivação de todas as condições que permitam a realização pessoal dos seus membros. Ao Estado incumbe, baseado no princípio da subsidiariedade, apoiar e estimular o desenvolvimento pleno das funções específicas da família, sem a substituir no que lhe é e deve ser próprio, como meio privilegiado de transmissão de valores e princípios éticos, educacionais e cívicos.
Por isso, importa fomentar o fortalecimento da instituição familiar, no respeito pelos valores da liberdade, autonomia e solidariedade.
É dentro desta óptica que deve ser perspectivada a política de família, necessariamente transversal, para atender à ampla diversidade das necessidades das famílias.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - A progressiva diversificação e natureza dos riscos sociais que podem afectar as famílias determinam uma abordagem de intervenção cada vez mais integradora, na linha de uma dinâmica preventiva crescente e não meramente reparadora.
O Governo reconhece e destaca, no respectivo Programa, o papel essencial da família como espaço privilegiado de realização da pessoa e de reforço da solidariedade entre gerações, preconizando a prossecução de políticas integradas e coerentes que promovam as potencialidades da família.
Considerando a universalidade e a transversalidade das políticas com incidência familiar, o desenvolvimento harmonioso e eficaz das mesmas não pode cingir-se à mera sobreposição de políticas sectoriais e carece de uma coordenação globalizante que privilegie uma actuação abrangente e alargada a todos os membros da família, dos mais jovens aos mais idosos.
Com efeito, a política de família não é a soma de diversas políticas sectoriais. Como política transversal, deve dar dimensão familiar às políticas sectoriais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Neste sentido, o Governo aprovou, na última reunião do Conselho de Ministros, um diploma que cria o cargo de Coordenador Nacional para os Assuntos da Família, o Conselho Consultivo para os Assuntos da Família e o Observatório para os Assuntos da Família.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

É desta forma institucionalizada uma estrutura orgânica e participada que permitirá concertar, de forma coerente e eficaz, as medidas sectoriais dos diversos ministérios que abrangem a pluralidade unitária da vida das famílias.
Realço o papel do Coordenador Nacional para os Assuntos da Família, cuja actividade visa contribuir para o desenvolvimento e valorização da família. Compete ao Coordenador Nacional coordenar os programas, os projectos e as acções que reconheçam e valorizem a importância da família na sociedade e o seu contributo para a realização das pessoas e da solidariedade entre gerações.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - Compete-lhe assegurar o carácter global e integrado das diferentes políticas sectoriais e propor medidas de protecção e de apoio à maternidade e à paternidade, de protecção à infância e à formação das crianças e de protecção às pessoas idosas.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Realço também a instituição do Conselho Consultivo para os Assuntos da Família, enquanto órgão consultivo do Governo, constituído por uma ampla representação da administração central, regional e local e da sociedade civil, designadamente organizações não-governamentais representativas das famílias, competindo-lhe, entre outras, participar na definição da política de família e das medidas e acções que a concretizam.
O Observatório para os Assuntos da Família tem como função primordial o estudo e acompanhamento da evolução da política familiar, constituindo parte privilegiada da informação modelar para a definição das políticas e das medidas mais adequadas.
A segurança social, como trave mestra de todo um sistema de protecção social, concorre decisivamente para a garantia da melhoria das condições de vida das famílias, sem perder de vista a transversalidade com outras políticas.
No sector da segurança social, a par da continuidade da protecção que vem sendo garantida, mediante a atribuição de prestações pecuniárias, a acção social concretiza o acesso a serviços e equipamentos sociais, dinamizando também iniciativas de promoção social dos indivíduos e das famílias.
Neste contexto, a concretização da política de família determina que se privilegiem medidas que visem: a protecção da maternidade e paternidade, como valores humanos e sociais inalienáveis;…

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - … a igualdade de oportunidades entre homens e mulheres, designadamente na partilha das responsabilidades familiares; a conciliação da vida familiar com a vida profissional; a consagração de prestações familiares mais selectivas, privilegiando as famílias de menor rendimento e em função do número de filhos; a garantia de uma mais acentuada discriminação positiva das prestações sociais para filhos com incapacidade ou deficientes; o apoio a instituições de solidariedade social e a promoção do voluntariado no desenvolvimento de medidas relevantes de apoio à família.

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Reconhecemos também, no anteprojecto de código do trabalho, a protecção da família, através da introdução de disposições no regime jurídico de faltas e licenças parentais.
A lei do rendimento social de inserção espelha também a preocupação deste Governo com uma intervenção clara e firme de apoio à inclusão social das famílias.
Sr.as e Srs. Deputados: A política de família do Governo promoverá soluções de parcerias entre pais, escola e entidades locais, de modo a obter um maior entrosamento e integração da escola na formação e desenvolvimento dos nossos jovens. Será colocada uma maior ênfase no envolvimento da família, numa cultura de exigência dos vários graus de ensino, dotando as escolas dos instrumentos necessários a uma cultura de esforço pessoal, respeito, entreajuda, solidariedade e disciplina, tendo um duplo objectivo: coesão da família e melhoria da qualidade da educação.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, Sr.ª Secretária de Estado, Sr. Secretário de Estado, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, chegámos ao fim deste debate.
Alguns Srs. Deputados e Sr.as Deputadas tinham pedido a palavra, ao abrigo daquelas figuras regimentais que todos conhecemos, mas pedi-lhes, tentando exprimir o sentir da Câmara, que tivessem dó, porque vamos ter agora um debate extremamente vivo, com certeza, e precisamos de tempo para ele. Agradeço-lhes a compreensão.
Em todo o caso, nesta altura, não posso deixar de me congratular com o interesse do debate desta manhã. Não há dúvida de que o facto de se ter ressuscitado esta figura regimental dos debates mensais sobre assuntos de actualidade ou de interesse relevante tem sido prestigiante para o Parlamento e tem-nos permitido abordar questões de efectiva actualidade. E esta manhã dedicámo-la a um assunto de primeira prioridade, porque diz respeito, de alguma forma, à educação da geração jovem e à projecção do futuro de Portugal.
Estiveram a assistir ao debate elementos ligados à Confederação Nacional das Associações de Pais, a quem também saúdo, e desempenhámos o compromisso com eles assumido de que no Parlamento houvesse também um sinal do interesse desta ligação importantíssima entre as famílias e a escola.
Vamos, então, passar ao ponto seguinte da ordem do dia, que é a realização de um debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista, sobre as dotações do Fundo de Garantia da Justiça. Também a este respeito, conforme já ontem disse, congratulo-me pela circunstância de termos encontrado uma plataforma de consenso para alterar a ordem do dia e podermos realizar hoje mesmo este debate. Fico muito satisfeito com isto, porque é um sinal da rapidez com que respondemos aos problemas políticos que surgem, na mira de centrarmos o debate político no Parlamento. Eis um bom passo em frente.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, permite-me uma interpelação à Mesa?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, como V. Ex.ª acabou de dizer, vamos ter agora um debate importante. E, para que este debate seja sério e não lançado em bases virtuais, é importantíssimo que sejam conhecidas as declarações que a Sr.ª Ministra da Justiça proferiu na 1.ª Comissão, porque são as declarações que estão na base da polémica que nos trouxe até este debate.
Nesse sentido, Sr. Presidente, peço à Mesa que proceda à leitura dessas declarações, para que a Câmara saiba exactamente qual é o debate que vamos ter e não passemos aqui o resto da manhã a debater coisas virtuais.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, existe na Mesa um texto transcrito da gravação feita na 1.ª Comissão sobre esta matéria, o qual já foi distribuído e, portanto, suponho que é do conhecimento geral.
Se o Sr. Deputado insiste, o texto pode ser lido pela Mesa mas há intervenções de várias pessoas relativamente a esta matéria que, ainda por cima, estão presentes e, portanto, não sei se será muito curial fazê-lo. Aliás, admito mesmo que isso levante alguns problemas, porque esta transcrição corresponde a um texto provisório. A transcrição da reunião da Comissão será posteriormente feita e aprovada pela Comissão para ser plenamente validada.
De qualquer forma, se não houver oposição da Câmara, poderemos proceder à sua leitura.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, se me permite, o que está em causa não é a acta, como é evidente, o que está em causa são as declarações da Sr.ª Ministra que geraram alguma polémica. E é evidente que, para um debate ser lançado com bases sérias, temos de partir exactamente daquilo que se passou e não de quaisquer interpretações virtuais sobre o que putativamente se possa ter passado.
Não sei se o Sr. Presidente quer saber a posição das outras bancadas mas penso que, rapidamente, poderia ser feita a leitura da pergunta e da resposta que a Sr.ª Ministra deu, que é o que está em causa, porque, desse modo, o debate ganharia em seriedade e toda a Câmara ganharia com isso.

O Sr. Presidente: - Também para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, quero apenas manifestar a posição da nossa bancada. Não temos qualquer objecção a que as declarações sejam lidas e até devo dizer que, uma vez que existe uma gravação, preferíamos que elas pudessem ser ouvidas.

O Sr. António Costa (PS): - E há um vídeo!

O Orador: - Aliás, há até um vídeo mas, enfim, o vídeo será pouco prático, porque a Câmara não está apetrechada para esse efeito.
No entanto, a Câmara está apetrechada para ouvirmos a gravação e temos condições para injectar o som na Sala. E, se o Sr. Presidente quiser, até posso ser agente disso ou podem ser os serviços.

O Sr. Presidente: - Obrigado, Sr. Deputado.

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Srs. Deputados, uma vez que não há objecções da Câmara, vamos, então, proceder à leitura do texto, que é curto e, portanto, não vai atrasar muito os nossos trabalhos.
Sr. Secretário, faça favor de proceder à leitura do referido texto.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente, leio também a pergunta formulada pelo Sr. Deputado Eduardo Cabrita ou apenas a resposta da Sr.ª Ministra da Justiça?

O Sr. Presidente: - Sr. Secretário, parece-me que deve ser também lida a pergunta para se conhecer o teor integral da questão.
Faça favor, Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o texto é do seguinte teor:
"Interpelação do deputado do Partido Socialista, Eduardo Cabrita acerca do Fundo de Garantia da Justiça
'Queria aliás, também aqui nesta matéria, colocar-lhe uma última questão. Um dos aspectos mais relevantes no quadro da reformulação do sistema de financiamento do Ministério da Justiça foi exactamente a criação de um Fundo de Garantia Financeira da Justiça. Porquê? Porque os tais ditos cofres que hoje financiam metade do Ministério, em 1996 estavam rigorosamente a zero. Estavam rigorosamente a zero. E foi, num quadro de utilização desses recursos que não só foi possível financiar investimentos e mesmo outro tipo de despesas do Ministério da Justiça, como acumular saldos significativos que chegaram a ultrapassar os trezentos milhões de euros. Esse fundo de garantia financeira não foi constituído entretanto. Sabemos mesmo que a senhora ministra, disse-o, veio nos jornais poucos dias após a sua tomada de posse, tinha determinado a suspensão na altura desse processo de constituição de um fundo de garantia financeira. Mais do que saber o que pensa desse instrumento, esse instrumento é fundamental quer para o futuro do sistema de justiça quer para prevenir, quer prevenir tentações. Se os tais mais de 300 milhões de euros que exactamente só por causa do financiamento da saúde na Justiça não foram acrescidos no difícil ano de 2001; se esses 300 milhões de euros não são desbaratados voltando ao nível em que estavam em 1995. Muito obrigado.'
Intervenção da Ministra da Justiça, Maria Celeste Cardona acerca do Fundo de Garantia da Justiça
'Para terminar gostaria de lhe falar daquilo que o senhor chamou à colação, do Fundo de Garantia da Justiça, senhor deputado. Quando cheguei ao Ministério eu não mandei parar nada senhor deputado. Eu mandei parar a portaria que nomeava a administradores os mesmos senhores que estavam no IGF. Não mandei parar nada como o senhor deve imaginar. Mas o que encontrei foi outra coisa. Foi um diploma que congelava 75% de 57 milhões de contos de saldos transitados a 1 de Janeiro de 2002. Destes 57 milhões de contos uma boa parte foi gasta pelos senhores, pelos senhores. Que, designadamente: 38 milhões de contos de buraco no orçamento da DGAJ. (…) 10 milhões de euros nas verbas comuns da magistratura, 20 milhões para os correios, cerca de 60 milhões de euros nas devoluções de emolumentos, de acordo com o novo regime da tabela emolumentar, buracos nos guardas prisionais, senhor secretário de Estado ou ex-secretário de Estado, antecipação dos cursos de juízes, em suma, são 40 milhões de contos a menos.…'

O Sr. António Costa (PS): - Repita essa parte!

O Orador: - '… Sabe o que é que isto originou senhor deputado? É que eu já pedi uma auditoria ao Ministério das Finanças. É porque, de facto, quando uma pessoa chega a um Ministério e se defronta com uma situação destas fica de facto bastante preocupada quando, como o senhor disse, e é verdade, cerca de metade do orçamento da Justiça é financiado com verbas provenientes dos cofres dos registos e dos tribunais. E quando nós começamos e verificamos e analisamos as contas deste fundo de garantia de facto ficamos preocupados. Eu não sei qual vai ser o resultado da auditoria senhor deputado mas brevemente cá virei dar conta dela, porque já foi pedida e já iniciou essa auditoria a essas verbas, sendo certo senhor deputado que não mandei parar nada, excepto a portaria que nomeava os senhores responsáveis por esta área'".

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está lido o texto. Devo dizer, se me permitem a evocação, que este episódio me lembrou as aulas de um determinado professor da Faculdade de Direito, que era um verdadeiro lente. Enquanto ia lendo os textos, nós íamos virando as folhas ao mesmo tempo que ele. Reparei que todos virámos a folha ao mesmo tempo que o Sr. Secretário da Mesa, que esta manhã se portou, portanto, como um autêntico lente.
Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado António Costa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr.ª Ministra da Justiça: V. Ex.ª foi à 1.ª Comissão dirigir-me duas graves acusações absolutamente falsas - uma, quanto à execução da reforma do contencioso administrativo, e outra, a que acaba de ser lida pelo Sr. Secretário. São ambas absolutamente falsas, mas concentremo-nos, sobretudo, na segunda.
O que a Sr.ª Ministra disse, e não há margem para dúvidas, foi que dos 57 milhões de contos de saldos transitados para 1 de Janeiro de 2002 "uma boa parte foi gasta pelos senhores,…" - e insistiu - "… pelos senhores", nomeadamente, 38 milhões de contos na DGAJ, 10 milhões nisto, 10 milhões naquilo. E conclui: "(…) em suma, são 40 milhões de contos a menos."
Como a Sr.ª Ministra sabe - e provei-o distribuindo a folha de execução de saldos do Instituto de Gestão Financeira e Patrimonial da Justiça -, esses 40 milhões de contos estavam disponíveis em Janeiro, em Fevereiro, em Março e continuavam disponíveis no final de Abril, ou seja, o dinheiro estava no Ministério da Justiça, e estava disponível. Aliás, o Sr. Secretário de Estado Adjunto veio, ontem, confirmar que não só estava disponível no final de Abril como parece que ainda está, tendo mesmo dito que o dinheiro era palpável. Presumo que o Sr. Secretário de Estado já tenha ido ao banco contar os 40 milhões de contos!…

Risos do PS.

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Vozes do PSD e do CDS-PP: - À cautela!…

O Orador: - Isto significa, Sr.ª Ministra, que aquilo que V. Ex.ª disse é absolutamente falso: os 40 milhões de contos não foram gastos por nós; nós poupámos os 40 milhões de contos!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas fizemos mais do que poupar os 40 milhões de contos: criámos um fundo de garantia para permitir consolidar essa poupança.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Quando?!

O Orador: - Como sabe, nos estatutos do Instituto de Gestão Financeira e Patrimonial da Justiça está previsto o Fundo de Garantia da Justiça. Assim que foi concluída a dificílima reforma emolumentar fizemos aprovar em Conselho de Ministros, em Janeiro de 2002, o diploma que cria legalmente o Fundo de Garantia da Justiça. Esse diploma, apesar de ter sido aprovado em Janeiro em Conselho de Ministros, só veio a ser promulgado e publicado em Março de 2002.
Ainda em Março, e apesar de sermos um governo de gestão, praticámos os actos necessários para poder instituir o Fundo. O então Secretário de Estado Adjunto - hoje Deputado -, Eduardo Cabrita, produziu e enviou para publicação, a 26 de Março, a portaria, que não tratava dos administradores, regulamentava, isso sim, o Fundo e permitia a dotação do seu capital inicial com os 40 milhões de contos. Esta portaria não foi publicada porque o novo Governo mandou suspender a sua publicação. Portanto, Sr.ª Ministra, nós não gastámos, poupámos!

Risos do PSD e do CDS-PP.

Não só poupámos como criámos um mecanismo de consolidação dessa poupança…

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - … e praticámos todos os actos necessários para que a consolidação da poupança viesse a concretizar-se. VV. Ex.as não dotaram o capital inicial do Fundo e estão a ameaçar esses 40 milhões de contos.
Portanto, Sr.ª Ministra, em português, relativamente ao que disse, só há uma expressão: a Sr.ª Ministra mentiu à 1.ª Comissão!

Aplausos do PS, do PCP e do BE.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isto é uma vergonha!

O Orador: - Sr.ª Ministra, ficámos ontem a saber, pelo Sr. Secretário de Estado, de uma situação muitíssimo mais grave: os senhores preparam-se para delapidar os 40 milhões de contos que receberam, o que é triplamente grave. É grave, em primeiro lugar, porque se preparam para delapidar num só ano o que nos custou a poupar durante cinco anos.

Risos do PSD e do CDS-PP.

Mas é mais grave ainda - e deve ser hoje motivo de grande preocupação para a Sr.ª Ministra das Finanças - por duas outras razões. Em primeiro lugar, porque isto significa um total descontrolo da gestão da despesa do Ministério da Justiça.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

O Orador: - A Sr.ª Ministra sabe - e os mapas de execução demonstram-no - que, em final de Março, a execução da despesa que financeiramente tínhamos feito era de 19,8% do orçamento do Ministério, sendo 81% execução da vossa responsabilidade.
Isto significa o seguinte, Sr.ª Ministra: o orçamento inicial de 2002 tinha um aumento de 6% relativamente ao orçamento executado de 2001. Não me refiro ao orçamento inicial de 2001, mas, sim, ao orçamento executado de 2001, à despesa que realizámos em 2001, sendo que a dotação inicial de 2002 tinha um aumento de 6%. VV. Ex.as, no Orçamento rectificativo, aumentaram a dotação do Ministério da Justiça em mais 60 milhões de euros, pelo que a diferença entre o Orçamento rectificado e o executado de 2001 passou a ser de 11,4%, Sr.ª Ministra!
Se, neste momento, vêm dizer-nos que ainda vão ter de gastar mais 200 milhões de euros, os tais 40 milhões de contos, isso significa, relativamente ao orçamento executado de 2001, um aumento da despesa de 28,8% e, relativamente ao orçamento inicial, um aumento de 21,2%. Sr.ª Ministra, sabe o que isto significa? Significa o total descontrolo da despesa por parte do Ministério da Justiça sob a gestão de VV. Ex.as.

Aplausos do PS.

Mas, Sr.ª Ministra, a situação é grave ainda por outra razão. Aquilo que o Sr. Secretário de Estado veio aqui dizer ontem retira qualquer credibilidade à proposta de Orçamento do Estado para 2003 que os senhores apresentaram na Assembleia da República no mês passado. Sabe porquê, Sr.ª Ministra? É que, na página 109 do relatório do Orçamento, consta a estimativa que os senhores fazem para a despesa do Ministério da Justiça no ano de 2002. Sabe o que a Sr.ª Ministra previa como execução de despesa no ano de 2002? Previa 1102 milhões de euros. Sabe qual é a diferença entre a previsão da execução deste ano que faz no Orçamento e aquilo que ontem o Sr. Secretário de Estado veio dizer-nos que vai ser a execução deste ano? A diferença é só esta: de 32,2%!
Portanto, ou o Sr. Secretário de Estado, quando disse que vai ter gastar os 200 milhões de euros, não falou a verdade, ou a previsão de execução que consta do relatório do Orçamento do Estado que apresentaram no mês passado não corresponde à verdade. Não me compete a mim, naturalmente, saber onde está a mentira, se na boca do Sr. Secretário de Estado, se no relatório do Orçamento do Estado, mas caberá a V. Ex.ª esclarecê-lo.
Certo e sabido, o que a Sr.ª Ministra disse na 1.ª Comissão a meu respeito é absolutamente falso. A absoluta verdade é que há, por parte de V. Ex.ª, um descontrolo da execução da despesa superior a 28% relativamente ao total

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da despesa que efectuámos no ano passado. Isso significa também que a proposta de Orçamento do Estado que apresentou não tem a menor credibilidade, porque apresenta um desvio de 30% relativamente à previsão de execução deste ano, de acordo com o que foi ontem confessado pelo Sr. Secretário de Estado.
Sr.ª Ministra, caber-lhe-á escolher onde está a mentira. A mim só compete retirar esta ilação!

Aplausos do PS e do BE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Justiça.

A Sr.ª Ministra da Justiça (Maria Celeste Cardona): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este debate de urgência foi convocado a propósito das declarações que proferi na 1.ª Comissão por ocasião da apresentação, na generalidade, do Orçamento do Estado para 2003.
Já aqui foi lido um excerto da acta dessa reunião, relativamente ao qual me pronuncie a instâncias do Sr. Deputado Eduardo Cabrita, do Partido Socialista, mas, em todo o caso, gostaria de ler mais duas ou três frases. São as seguintes: "Destes 57 milhões de contos uma boa parte foi gasta pelos senhores (…). Que, designadamente: 38 milhões de contos de buraco no orçamento da DGAJ. (…) 10 milhões de euros nas verbas comuns da magistratura, 20 milhões de euros para os correios, cerca de 60 milhões de euros nas devoluções de emolumentos (…)".
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o que eu disse é a verdade! Não retiro nem acrescento nada ao que disse a propósito da apresentação do Orçamento, na generalidade, na 1.ª Comissão.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Esta é a pura das verdades, Sr.as e Srs. Deputados!

O Sr. José Magalhães (PS): - A pura das verdades?!

A Oradora: - Já agora, porque se trata também de analisar politicamente todo este sururu à volta da verdade que referi na 1.ª Comissão, gostaria de explicitar três pontos que nos parecem essenciais.
Em primeiro lugar, o Fundo de Garantia foi criado em Fevereiro de 2002, tendo a respectiva publicação sido feita em 2 de Março de 2002. Não foi em 2000, não foi em 1999, não foi em 2001! Foi em 2002, ou seja, numa altura em que o governo anterior estava em gestão e sabia que brevemente cessaria funções. O governo anterior tentou condicionar o próximo governo, legítimo, eleito pelos portugueses,…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

… com instrumentos que a si próprio não aplicou. Isto, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, é de uma grande irresponsabilidade.
Como eu disse na 1.ª Comissão - e é verdade! -, não revoguei o diploma que criava este Fundo de Garantia. O que mandei - é verdade também! - foi parar a publicação da portaria que regulamentava este Fundo. Até porque há um pequeno detalhe que é preciso acrescentar: esse diploma previa que as verbas resultantes da venda do património integrassem esse Fundo.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): - Exacto!

A Oradora: - Pois é! Mas não há cadastro no Ministério da Justiça dos bens que lhe estão afectos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Ora aí está!…

O Sr. José Magalhães (PS): - É falso! Há cadastro!

A Oradora: - Em segundo lugar, Sr.as e Srs. Deputados, o governo do Partido Socialista sabia, quando fez aprovar o orçamento para 2002, que tinha inscrito despesas para as quais não tinha cabimento orçamental.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É uma vergonha!

A Oradora: - Vou dar alguns exemplos.
Para os Serviços Prisionais - pagamento de retroactivos, estatuto dos guardas prisionais, foram necessários mais 3,1 milhões de euros; para Registos e Notariado - salários para conservadores e notários, foram necessários mais 4,5 milhões de euros; para a Reinserção Social - vencimento de funcionários, mais 3 milhões de euros; para a Administração da Justiça - vencimentos de oficiais de justiça (que os senhores contrataram eventualmente), mais 37 milhões de euros; para as Magistraturas, mais 5,5 milhões de euros; para reembolsos de emolumentos provenientes de decisões jurisdicionais, mais 57,5 milhões de euros; para despesas de correio - contratos com os CTT, mais 20 milhões de euros; para a Caixa Geral de Aposentações, mais 11 milhões de euros.
Os senhores tinham orçamentado algumas verbas. Só que foi necessário dotar os serviços de mais estas verbas.

O Sr. António Costa (PS): - A senhora ainda não compreendeu como se faz o orçamento da Justiça.

A Oradora: - Só há uma conclusão possível: é que faltam, do ponto de vista da cobertura orçamental para as despesas inscritas no orçamento, mais de 40 milhões de contos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Esta, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, é a verdade.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E a auditoria vai dizê-lo!

A Oradora: - Aliás, é a verdade no Ministério da Justiça, como é a verdade na generalidade dos ministérios que foram geridos pelo Partido Socialista.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Por isso, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, começámos com uma previsão de 1,1% de défice e acabámos em

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4,1% de défice. Esta é a forma de gestão dos governos do Partido Socialista. Foi por isso, Sr. Deputado, que, no dia 17 de Março, os portugueses decidiram eleger um novo governo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Diria mais: foi por isso que, em Dezembro, os senhores resolveram, através do então Sr. Primeiro-Ministro, ir embora. É que a situação começava, de facto, a ser insustentável.

Protestos do PS.

Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Uma última nota para dizer que assumo as minhas responsabilidades. Não me podem pedir, porque isso eu não farei, que assuma as responsabilidades dos outros.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Os valores que aqui referi não estavam cabimentados no orçamento, ou seja, representam a assunção de compromissos por parte do anterior governo, sem que tenha colocado nas respectivas rubricas as correspondentes verbas para fazer face a essas despesas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Isso é que era gestão?!

A Oradora: - Por isso mesmo, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, achei, em nome do rigor, em nome da transparência e em nome da verdade, que era meu dever pedir às entidades competentes que averiguassem, do ponto de vista das verbas dos cofres dos tribunais e dos conservadores e notários, o que se passava em termos de subavaliação das despesas que nos apareciam nos respectivos orçamentos.
Como eu disse na 1.ª Comissão, e repito aqui, logo que essa auditoria esteja realizada e as suas conclusões apuradas, naturalmente remetê-las-ei à Assembleia da República.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Tais conclusões serão, naturalmente, do conhecimento de todos os Srs. Deputados, custe o que custar, doa a quem doer.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. José Magalhães (PS): - Vai doer ao Governo!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Vai doer é ao Partido Socialista!

A Oradora: - Porque foi em nome da transparência e do rigor orçamental que eu pedi a realização dessa auditoria e é em nome da assunção das minhas responsabilidade, mas não das dos outros, que essa auditoria está a ser efectuada.
Srs. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta é a verdade dos factos, estes são os números que encontrámos e de que dispomos, foram estes os números que anunciei na 1.ª Comissão e são esses número que aqui, hoje, volto a citar: existe, do ponto de vista da não cobertura de despesas orçamentais, um buraco de cerca de 40 milhões de contos.

O Sr. António Costa (PS): - Não é verdade!

A Oradora: - Esta é a verdade!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Só com rigor e muita capacidade de gestão será possível concretizar os objectivos a que este Governo se propõe.
Esta é a verdade do Ministério da Justiça!

Aplausos do PSD e do CDS-PP, de pé.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito regimental de defesa da honra da minha bancada.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tenho de pedir-lhe que concretize o motivo da sua ofensa, ou seja, as palavras da oradora que ofenderam a honra da sua bancada.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, foi a forma como a Sr.ª Ministra classificou a gestão do Ministério da Justiça, em particular, e a do conjunto dos ministérios geridos pelo Governo do Partido Socialista, em geral.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado. Dispõe de 3 minutos.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça: Constato das suas palavras, na leitura que fez questão de repetir, que omitiu uma parte muito significativa, aquela em que disse que gastámos 57 milhões de contos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Outra vez!…

O Orador: - Exemplifica várias coisas e depois conclui dizendo "em suma, 40 milhões de contos a menos".
No entanto, o que a senhora disse na 1.ª Comissão foi que tínhamos gasto 40 milhões de contos, dos 57 milhões de contos que tinham transitado.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Deixe-se dessas coisas!

O Orador: - Foi o que a senhora disse, e está provado pela contabilidade do Ministério e pelo seu próprio Secretário de Estado Adjunto que é mentira.

Aplausos do PS e do BE.

Portanto, quanto às palavras que estiveram na origem deste incidente, a senhora disse que tínhamos gasto 40 milhões de contos e isso é absolutamente falso.

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Agora, em fuga para a frente, o que a Sr.ª Ministra procura trazer é uma nova falsidade, a da suborçamentação, dizendo assim: "não, de facto, o dinheiro, como disse o Sr. Secretário de Estado Adjunto, está no banco e até é palpável. O que os senhores fizeram foi suborçamentar despesas que eram necessárias".
Sr.ª Ministra quer referir-se a dívidas?! Não deve ser, porque como sabe, no famoso relatório da comissão presidida pelo Dr. Victor Constância, no anexo D, na parte relativa a dívidas transitadas de um ano para o outro, diz-se, relativamente ao Ministério da Justiça, que há a abater à dívida desse ministério 49 milhões de contos no exercício de 2001. O que a comissão diz é que a dívida tem de diminuir 49 milhões de contos e não de ser aumentada!

Aplausos do PS.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Isto é completamente incrível!

O Orador: - Então, não são dívidas!… Os senhores sabiam que em 2002 tinham de gastar mais dinheiro, mas não o incluíram no orçamento?
Sr.ª Ministra, recordo-lhe que a dotação inicial deste orçamento é de 6% acima do que foi executado no ano passado. Os senhores, com o reforço que fizeram no Orçamento rectificativo, já aumentaram 11% relativamente ao executado no ano passado. Não chega?!… Se não chega é porque a senhora não sabe gerir. Nós saberíamos fazê-lo e tê-lo-íamos feito.

Aplausos do PS.

Se têm agora de gastar mais 200 milhões de euros, isso significa que só não vão poupar como vão ter, pela primeira vez em seis anos, défice. É a primeira vez que o Ministério da Justiça, nos últimos seis anos, não contribuirá com o seu superavit para reduzir o défice público. E sabem em quanto agrava o défice público? Em 0,2%. Se os vossos números são verdadeiros, o défice público de 2002 agravar-se-á em 0,2%, e a Sr.ª Ministra das Finanças deve estar a esta hora muito preocupada com a forma irresponsável como estão a gerir o Ministério.
Sr.ª Ministra, recordo-lhe só…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se e já lhe descontei os aplausos. Queira terminar.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Em matéria de partilha de responsabilidades, Sr.ª Ministra da Justiça, os ministérios não são o "cabaré da coxa", têm contabilidade, sabe?!…

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, isto é inadmissível! Não pode permitir esta linguagem!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Parece mentira! Agora, cada vez que fala, é isto! Não consegue falar de outra maneira?!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Grande intervenção, Dr. António Costa!…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Costa, é melhor terminar.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Sr.ª Ministra, em matéria de…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deixem ouvir a conclusão do Sr. Deputado António Costa.
Não gosto de cortar o microfone a ninguém, mas às vezes sou obrigado.
Continue, Sr. Deputado António Costa.

O Orador: - Mas, Sr.ª Ministra, em matéria de partilha de responsabilidades, a contabilidade do Ministério é muito clara. A parte que me coube executar corresponde a 19%; a parte que lhe tem cabido corresponde a 81%. Esta é a medida da minha e da sua responsabilidade!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para dar explicações, a Sr.ª Ministra da Justiça. Dispõe também de 4 minutos e 28 segundos, já que tenho de dar igualdade de condições, mas não exagere, por favor.

A Sr.ª Ministra da Justiça: - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Costa, os senhores não sabem mesmo fazer contas.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Nunca souberam!

A Oradora: - Não sabem! Os senhores são um desastre a fazer contas.
Enquanto o Sr. Deputado enumerava esses números todos, veio-me à memória, muito acentuadamente, a imagem do Sr. ex-Primeiro-Ministro António Guterres a dissertar sobre o PIB.

Protestos do PS.

Os senhores só acertam quando rectificam, e o Sr. Deputado António Costa não rectificou rigorosamente nada!
Sr. Deputado, disse e mantenho, foi lido aqui, que encontrei no Ministério da Justiça um "buraco" de 40 milhões de contos.

O Sr. José Magalhães (PS): - Ainda insiste?!

A Oradora: - Insisto, porque é a pura das verdades!

O Sr. António Costa (PS): - Então, o dinheiro não é palpável?

A Oradora: - Considera que é pouco? Até lhe posso dar mais alguns exemplos. O senhor orçamentou 27 milhões de euros para uma rubrica; foi preciso dotar mais 3,1...

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Vozes do PCP: - Outra vez?!

A Oradora: - Outra vez, sim, porque parece que os senhores não perceberam!

Vozes do CDS-PP: - Não perceberam!

A Oradora: - Os senhores orçamentaram 41,1 milhões de euros para reembolsos; são precisos mais 57,5 milhões de euros. Os senhores orçamentaram cerca de 9 milhões de euros para despesas de correio;…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Isso é reprise!

A Oradora: - … são precisos mais 20 milhões de euros para essas despesas.
Sr. Deputado António Costa, não vale a pena - porque os senhores, manifestamente, não sabem trabalhar com contas nem com números - andar à procura de alguma coisa que, de facto, não existe.
Sr. Deputado António Costa, o senhor deixou, no dia 2 de Março de 2002, um fundo de garantia criado na lei, sabendo que estes valores que aqui estou a referir de suborçamentação existiam.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Exactamente!

O Sr. José Magalhães (PS): - É falso!

A Oradora: - O senhor sabia que existiam estes valores de suborçamentação, ou seja, que não havia dinheiro para suprir estas despesas.

O Sr. António Costa (PS): - É mentira!

A Oradora: - E, como o senhor sabia, isso é que é grave!

O Sr. António Costa (PS): - É mentira!

A Oradora: - É mesmo muito grave, do ponto de vista da responsabilidade política de quem tem de gerir um orçamento.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): - Até o Sr. Secretário de Estado desmente isso!

A Oradora: - Só há aqui uma pequena questão: é que o senhor já sabia que não ia gerir o orçamento.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Deste ponto de vista, não vão vale a pena insistirem! O "buraco" que deixaram no Ministério da Justiça é, aliás, igual ao "buraco" de 4,1% que deixaram no País! Esta é a verdade!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Os Srs. Deputados do Partido Socialista, de facto, não têm perdão. Por isso mesmo, os eleitores, no dia 17 de Março, os mandaram para casa,...

Protestos do PS.

... porque não sabem fazer gestão criteriosa e rigorosa dos dinheiros públicos!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para formular um pedido de esclarecimento à Sr.ª Ministra da Justiça, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã, que dispõe de 3 minutos.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, já verificámos que as sextas-feiras são dias funestos para o Partido Popular.

Aplausos do BE e de alguns Deputados do PS.

Bem sei que, às vezes, os sábados são ainda piores, mas as sextas-feiras têm sido dramáticas.
Há pouco tempo, um digníssimo émulo da Secretária de Estado Mariana Cascais veio explicar que o ensino público estava sob suspeita, porque, imagine-se, se suspeita que os professores de História têm ideias sobre História.
Eu, que compartilho por inteiro esta preocupação, porque até suspeito que os professores de biologia são darwinistas, estou, no entanto, convencido que qualquer professor e até qualquer aluno, mesmo suspeito, perceberia que aquilo que a Sr.ª Ministra disse é uma mentira.

Aplausos de Deputados do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Ministra disse que o que foi gasto "pelos senhores" são 40 milhões de contos. Agora, diz-nos que essas verbas estão comprometidas por suborçamentação. Disse-nos também - e quis até, neste acto de exposição democrática, repetir as suas afirmações - que os 40 milhões de contos são 40 milhões de contos a menos.
Gostava de ter um ordenado, como tantos portugueses, Sr.ª Ministra, em que aquilo que gasto continua a estar lá, como me garante o Secretário de Estado do seu Ministério.

Aplausos do BE e do PS.

O facto é que, das duas uma, ou foi gastou ou não foi gasto, ou está a menos ou está lá. Portanto, ou a Sr.ª Ministra abusou da verdade ou o seu Secretário de Estado abusou da mentira.

Risos do BE, do PS e do PCP.

O seu argumento, Sr.ª Ministra, é que tudo isto devia ser respondido por aumento de dotação. Eu sei fazer contas e somei cada uma das parcelas que nos leu aqui, o que dá 143 milhões de euros. Admitamos que se esqueceu de algumas, mas o facto é este.
No entanto, isso suscita duas questões a que não quis, aqui, responder. Quem é que fez o Orçamento rectificativo? A Sr.ª Ministra!

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Vozes do PS: - Exactamente!

O Orador: - A Sr.ª Ministra, para acusar de incompetência o governo anterior, vem dizer a esta Assembleia que é incompetente e que, ao fazer o Orçamento rectificativo, não soube fazer as contas, não sabia o que se passava no seu Ministério, não sabia tomar decisões, não sabia orçamentar as verbas necessárias para a condução da sua política.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas, além disso, insiste em que, perante esta situação, o seu Secretário de Estado, ontem, terá faltado à verdade.
Não concordo, Sr.ª Ministra, que um ministro não assuma as suas responsabilidades, não concordo que utilize bodes expiatórios, não concordo que venha dizer aqui, depois do Secretário de Estado ter dito, na televisão, que o dinheiro existia e que lá estava, que se tem de manter a sua afirmação.

O Sr. António Costa (PS): - É palpável!

O Orador: - Compreendo o seu drama, ou mentiu um ou mentiu o outro, mas a mentira tem de existir. O dinheiro ou está ou não está. Não pode estar e não estar, ao mesmo tempo.

Aplausos do BE e do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Peço-lhe para concluir.

O Orador: - Por isso, Sr.ª Ministra, talvez verdadeiramente a única dúvida - e queria dizer-lhe isto olhos nos olhos - é saber se, perante esta situação, hoje, ao fim do dia, entrega o pedido de demissão do seu Secretário de Estado ou entrega o seu.

Aplausos do BE e do PS.

O Sr. Presidente: - A Sr.ª Ministra da Justiça não tem tempo para responder. Vamos ter, depois, de resolver esse pequeno problema.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Cedemos 3 minutos à Sr.ª Ministra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - No entanto, a Sr.ª Ministra tem outro pedido de esclarecimento. Quer responder em conjunto ou individualmente?

A Sr.ª Ministra da Justiça: - Respondo em conjunto, Sr. Presidente.

O Sr. José Magalhães (PS): - É mais defensivo em conjunto!

O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro, para formular um pedido de esclarecimento.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, penso que a questão que suscita este debate é extremamente importante e que a sua intervenção é de uma enorme gravidade.
A Sr.ª Ministra, na terça-feira, na 1.ª Comissão - eu e outros Srs. Deputados estávamos presentes -, fez, taxativamente, acusações gravíssimas.

O Sr. José Magalhães (PS): - É verdade!

A Oradora: - A Sr.ª Ministra fez acusações gravíssimas que se provou serem falsas.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Exacto!

A Oradora: - A Sr.ª Ministra fez acusações gravíssimas que um membro da sua equipa desmentiu; a Sr.ª Ministra vem ao Parlamento, não pede desculpa, continua a teimar em ler e reler um documento que todos temos à nossa frente.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Então, leia, porque parece que não percebeu ainda!

A Oradora: - Todos temos consciência do que foi dito, todos temos consciência da falsidade e todos temos consciência que um membro do Governo que, de uma forma tão irresponsável, falta à verdade ao País não está em condições de continuar a desempenhar o seu cargo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para responder, a Sr.ª Ministra da Justiça. Dispõe de 5 minutos cedidos pelo PSD e pelo CDS-PP.

A Sr.ª Ministra da Justiça: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, o senhor até teve graça, mas não teve razão.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Outra vez?! Isto é fantástico!

Vozes do PS: - Outra vez?!

A Oradora: - O Sr. Deputado não conseguiu desmentir, porque é impossível desmentir a verdade dos factos.

O Sr. António Filipe (PCP): - Para isso, temos o Sr. Secretário de Estado!

A Oradora: - Não consegue! Não é possível!
O Sr. Deputado tentou ainda ajudar o Partido Socialista, para quem, de facto, a sexta-feira parece ser um dia difícil.
Já agora, deixe-me dizer-lhe, Sr. Deputado Francisco Louçã: quem está aqui é a Ministra da Justiça do Governo de Portugal e era bom que isso ficasse muito claro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Riso do PS e do BE.

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O Sr. Deputado tentou também, mas não conseguiu, defender a má gestão dos governos do Partido Socialista, porque essa é a verdade dos factos.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Não é isso!

O Sr. José Magalhães (PS): - Qual má gestão? Tem um saldo para gastar e é má gestão?!

A Oradora: - O Sr. Deputado sabe fazer contas. Mais: o senhor sabe que eu também sei fazer contas.

Vozes do PS: - Ah!…

A Oradora: - E o senhor sabe que, quando enumero um número, as rubricas, os valores que faltam no Orçamento para suprir as dívidas e as despesas que lá estão, essa é a verdade dos factos.
É muito simples, Sr. Deputado Francisco Louçã: ou se procede ao pagamento de tais despesas ou o Estado não é uma pessoa de bem. Com este Governo, o Estado é uma pessoa de bem!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Nem eu, nem o senhor, nem ninguém pode transformar 40 em 80!
É muito simples, Sr. Deputado: se tenho 40 milhões de "buraco" orçamental e se tenho 40 milhões para afectar a um fundo, são 80. Mas eu só tenho 40...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

A Oradora: - Fazer contas não é assim tão difícil, Sr. Deputado!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Não é mesmo nada difícil, Sr. Deputado!
O senhor sabe, tal como eu, o drama e a vergonha que passámos com os governos do Partido Socialista a enunciarem despesas, projectos e rubricas orçamentais sem o correspondente cabimento orçamental.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É irresponsabilidade!

A Oradora: - Sr. Deputado Francisco Louçã, como é que o senhor quer que eu pague 30 milhões de euros aos correios se eu só tinha orçamentado 9 milhões de euros?!
Sr. Deputado Francisco Louçã, como é que o senhor quer que eu pague 97,5 milhões de euros para devolução de emolumentos se eu lá tenho 41,1 milhões de euros?!
Sr. Deputado Francisco Louçã, como é que o senhor queria que eu pagasse a 600 eventuais até ao final do ano se não estava lá verba para esse pagamento, porque a eventualidade terminava no dia 31 de Março?
Sr. Deputado Francisco Louçã, a isto chama-se rigor e critério na governação! Se os senhores não sabem fazer contas, talvez seja melhor começarem por aprender a fazê-las.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Exactamente!

Protestos do PS e do BE.

A Oradora: - Reitero o que disse. Não retiro uma palavra ao que disse, e considero gravíssimo que este Parlamento, em vez de fiscalizar rigorosamente as responsabilidades de cada um, se entretenha a dizer, a insinuar,…

O Sr. José Magalhães (PS): - Insinuar?!

A Oradora: - … a fazer afirmações destituídas de qualquer sentido.
Se os senhores quiserem, deixo-vos os documentos que demonstram a verdade dos factos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Magalhães (PS): - Deixe, deixe!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sr.ª Ministra, quero dizer-lhe, quanto à primeira parte da sua intervenção, que elogio a sua frontalidade ao vir ao Parlamento.
Acho bem que os políticos entendam que têm de responder sempre e quando são questionados, sempre e quando as suas declarações estão em causa. Esse bom exemplo devia colher.

Aplausos do PS e do BE.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Batem palmas ao "líder"!

O Orador: - Mas percebo, também, a perturbação que ocorreu ontem, quando o líder da bancada do seu partido quis adiar este debate de urgência para "as calendas" posteriores à execução da auditoria e quando, depois, o Sr. Ministro Marques Mendes, que nestas matérias costuma ser mais avisado, veio sugerir a realização do debate imediatamente.

A Sr.ª Ministra da Justiça: - Não foi sugerido! Quem o propôs fui eu própria!

O Orador: - Com certeza que foi em seu nome!
Hoje, Sr.ª Ministra, veio dizer-nos que tem um argumento forte, o de que, no ano passado, não se cumpriu o limite do défice, e o défice foi 4,1%, o que é extraordinário, a este respeito, porque, pelo que foi dito, neste Ministério, havia superavit. Pelo que foi dito pela Sr.ª Ministra,…

O Sr. José Magalhães (PS): - Que ainda não percebeu!

O Orador: - … com a sua governação e com a sua intervenção, a gestão orçamental deste Ministério ultrapassa

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o que estava orçamentado, o que foi rectificado no Orçamento, e é isso que hoje temos em cima da mesa.

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso é falso!

O Orador: - Talvez assim, Sr.ª Ministra, possa ficar claro que não se pode fazer afirmações gratuitamente, nem no Parlamento nem ao País. Sobretudo, não tem sentido o País ou este Parlamento aceitarem este espectáculo degradante das contradições entre a Ministra e o seu Secretário de Estado - a respeito do qual, hoje, não disse uma palavra -, porque, sobre isso, tem uma responsabilidade.
Aliás, é sobre a responsabilidade que quero falar-lhe. O País precisa de um Ministério da Justiça em que tenha confiança. O País precisa de um Ministério da Justiça que nos dê, a todos, garantias da isenção da justiça em Portugal, que nos dê garantias absolutas do compromisso no combate ao crime em Portugal, que nos dê garantias absolutas do conhecimento das responsabilidades na Polícia Judiciária, nas prisões, na gestão de toda a política do Ministério da Justiça.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É essa falta de confiança que hoje é afirmada por um Ministério que acha que um debate pode passar como sendo um mero incidente, em que se diz num dia o que se desdiz no dia seguinte, em que as contradições do Ministério são gritantes. É isso que está a ser discutido aqui.
Sr.ª Ministra, esta sua presença é a moção de censura mais óbvia que o Governo poderia dirigir a si próprio.

Aplausos do BE e do PS.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, qual é o ponto da ordem de trabalhos a que se refere a sua interpelação?

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, é que o Sr. Deputado Francisco Louçã citou-me na sua intervenção e, em minha opinião, cometeu uma inverdade, que eu gostaria de poder rectificar e esclarecer, se V. Ex.ª me permitisse. Tem a ver com o decorrer dos trabalhos de hoje e, designadamente, com os trabalhos de ontem.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado. Peço-lhe que seja breve.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Serei muito breve, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Francisco Louçã, é só para dizer-lhe que…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, dei-lhe a palavra para interpelar a Mesa, portanto, por favor dirija-se à Mesa.

O Orador: - Em relação ao que foi dito pelo Sr. Deputado Francisco Louçã, devo dizer que não vou usar expressões duras como as que estamos habituados a ouvir ultimamente,…

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Olha quem fala!

O Orador: - … mas digo-lhe que, na sua intervenção, há, efectivamente, uma incorrecção.
A incorrecção é a de que o que nós dissemos ontem foi que a auditoria que foi pedida pela Sr.ª Ministra é um passo importante e, em nossa opinião, fundamenta um debate parlamentar. O resultado dessa auditoria deve ser discutido no Parlamento. Esta foi a primeira coisa que eu disse ontem, e mantenho.
Este debate não faz precludir um outro relativamente à auditoria e ao apuramento que for feito.
Em segundo lugar, Sr. Deputado Francisco Louçã, o que eu também disse foi que…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Telmo Correia, desculpe a insistência, mas é indispensável que se respeitem as figuras regimentais. O Sr. Deputado tem a palavra para interpelar a Mesa e é o que deve fazer.
Faça favor de concluir.

O Orador: - Concluo, Sr. Presidente, dizendo que o que afirmei ontem e não corresponde ao que agora foi referido, foi que, do ponto de vista da maioria, os membros do Governo, na responsabilidade da respectiva actuação, devem vir ao Parlamento sempre que se levantem dúvidas.

Vozes do CDS-PP: - Claro!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - No que toca ao "quando", não respondo pela agenda da Sr.ª Ministra. Tenho muitas qualidades mas ainda não sou quem faz as agendas no Ministério da Justiça, nem me candidato a fazê-lo.
Nunca pensei que a Sr.ª Ministra estivesse disponível para vir ao Parlamento tão rapidamente, logo a seguir ao debate de ontem. Aliás, penso que, perante uma dúvida, nem é habitual uma ministra dispor-se a vir ao Parlamento umas horas depois, para a esclarecer.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Fico muito satisfeito e cumprimento a Ministra da Justiça por esse facto.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Temo ter de dar a palavra ao Sr. Deputado Francisco Louçã, já que, afinal, a interpelação era dirigida mais a ele próprio do que à Mesa.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, não preciso de fazer nenhuma intervenção, mas compartilho o seu ponto de vista, pois o que ouvimos agora também não se tratou de uma intervenção.

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Apesar de tudo e nestas circunstâncias, apenas queria agradecer-lhe ter disponibilizado este tempo para o Deputado Telmo Correia confirmar em absoluto o que eu tinha acabado de dizer.

Vozes do BE do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Montalvão Machado.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Antes de iniciar a minha breve intervenção, permitam-me que deixe duas notas muito breves.
A primeira é a de que quando ouvi a Mesa ler a transcrição da intervenção da Sr.ª Ministra na 1.ª Comissão, supus, muito sinceramente, que o Partido Socialista teria a coragem de desistir desta iniciativa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Passo à segunda nota introdutória.
Permita-me, Sr. Deputado António Costa, que, com a amizade que nos une, lhe dê um cognome relativamente ao tempo em que foi ministro. V. Ex.ª vai ficar para a história como o Ministro Costa, "O poupado".

Risos do CDS-PP.

Só que V. Ex.ª poupou, não pagando!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quando assim é, quando não se pagam as dívidas, de facto, poupa-se!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estive presente na reunião da 1.ª Comissão, na passada terça-feira, de princípio a fim; não me ausentei nem por um minuto.
O que a Sr.ª Ministra disse hoje, aqui - e ainda bem que disse! -, foi reafirmar, palavra por palavra, vírgula por vírgula, o que disse na passada terça-feira e corresponde exactamente à verdade.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mais: o Sr. Deputado António Costa nem estava na reunião, ouviu pela rádio uma notícia fugaz e foi atrás dela.

O Sr. José Magalhães (PS): - Temos aqui a transcrição!

O Orador: - A notícia que ainda hoje vem nos jornais é a de que a Sr.ª Ministra tinha acusado o Sr. Deputado António Costa de ter desviado 40 milhões. Ora, nunca a Sr.ª Ministra disse isso.
O Sr. Deputado foi atrás dessa notícia e, precipitadamente, muito precipitadamente, promoveu esta iniciativa absolutamente escusada. Ou, melhor, decidiu criar mais um facto político daqueles que, infelizmente, o Partido Socialista tem criado frequentemente.
O que me faz alguma confusão é que, na reunião da passada terça-feira, estava presente um Sr. Deputado, de quem tenho o prazer de ser amigo, o Sr. Deputado Eduardo Cabrita, que não é um Deputado qualquer, foi, justamente, Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça! Então, ouve o que ouve e não reage?!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

Só pode compreender-se isto por uma de três razões: ou estava desatento, a pensar noutra coisa; ou estava a descansar; ou, então, não lhe fez impressão nenhuma ouvir o que ouviu.

Protestos do PS.

Sr. Presidente, permita-me que me dirija à Sr.ª Ministra da Justiça.
A Sr.ª Ministra tem sido alvo de uma perseguição sistemática por parte dos partidos da oposição, maxime pelo Partido Socialista atrás do Bloco de Esquerda.
Conhecia-a relativamente mal, Sr.ª Ministra. Hoje, tenho por si - acredite-me! - uma profunda admiração e uma grande consideração. Continue com essa determinação. Continue com essa coragem. Tem a seu lado dois grupos parlamentares, firmes, coesos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mais, a Sr.ª Ministra deu hoje um exemplo, a sua conduta foi exemplar: ontem, foi apresentado um requerimento para um debate de urgência e, hoje, de manhã, a senhora está aqui, perante o Parlamento.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas quem é que fez o requerimento? Foi o PS!

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Partido Socialista, desde que passou para a oposição, persiste numa política de guerrilha constante - este debate demonstra-o -, com recursos e mais recursos, reclamações e mais reclamações, incidentes e mais incidentes, com permanentes juízos insidiosos, com agressões verbais e com injúrias. Recorde-se a desvergonha - para não dizer pouca vergonha - a que assistimos ainda ontem, com sucessivos actos de desautorização do Sr. Presidente da Assembleia da República.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Vozes do PS: - Oh!

O Orador: - Permitam-me que lhes lembre, Srs. Deputados do Partido Socialista, que "enchem sempre a boca" com a ética - claro que a ética é indispensável à democracia - mas esquecem a moral. É que a ética é mais social, a moral é mais pessoal. A primeira tem mais a ver com a vigência social, a segunda tem só a ver com a rectidão pessoal que este Governo todos os dias demonstra.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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Os Srs. Deputados do Partido Socialista têm deveres patrióticos a cumprir.
Têm o dever patriótico de respeitar o resultado das eleições legislativas nacionais, e não respeitam!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Não respeitam, não!

O Orador: - Têm o dever patriótico de respeitar a vontade popular, e não respeitam! Têm o dever patriótico de deixar governar quem o faz com um alto sentido de Estado e de responsabilidade, e não deixam! Têm o dever patriótico de deixar governar e pôr em prática um Programa que foi ratificado por esta Casa, e não querem permiti-lo! Os Srs. Deputados têm o dever patriótico de deixar funcionar cabalmente as instituições democráticas! Finalmente, os senhores têm o dever patriótico de fazer uma oposição séria e credível, não uma oposição cuja falta de fundamento não ignoram!
Sr. Presidente, foram-me precisos apenas três anos como parlamentar para perceber que, afinal, há algumas semelhanças entre a minha vida como Deputado nesta Casa e a minha vida como professor na Faculdade de Direito.
Ensino Processo Civil e, todos os dias, tenho de explicar aos meus alunos que a educação de uma oposição cuja falta de fundamento não se ignora equivale, nos termos da lei, à litigância de má fé. Vou dar essa indicação aos meus alunos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Por último, Sr. Presidente, Srs. Deputados, a Sr.ª Ministra fez muito bem em ter pedido uma auditoria. Esperemos por ela com serenidade e com seriedade. Logo que a auditoria esteja pronta será exibida a todos nós.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da honra da bancada.

O Sr. Presidente: - Qual é o motivo da ofensa, Sr. Deputado?

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, todos ouvimos o Sr. Deputado Montalvão Machado teorizar entre a ética e a moral e, depois, acusar-nos de abusar e de fazer litigância de má fé relativamente a este caso.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para o efeito.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Montalvão Machado, tenhamos um mínimo de bom senso.

Risos e aplausos do PSD e do CDS-PP.

Os senhores ouviram, foi aqui repetido, toda a gente ouviu na rádio, na televisão, na comissão, na transcrição, o que a Sr.ª Ministra disse.
O que a Sr.ª Ministra disse foi que nós gastámos, nas mais diversas despesas, 40 milhões de contos destinados ao Fundo de Garantia do Ministério da Justiça. Disse que os 40 milhões de contos estavam a menos. Até se baralhou, porque destas coisas percebe pouco, e disse mais: disse que tínhamos gasto 40 milhões de contos do Fundo, como se alguma vez a Sr.ª Ministra tivesse posto essa verba no Fundo.
Não venha agora dizer que são os Srs. Jornalistas, que relataram na rádio, na televisão, nos jornais, que inventaram o que a Sr.ª Ministra disse. A Sr.ª Ministra disse o que foi transcrito e que já aqui ouvimos: disse que gastámos 40 milhões de contos, que essa verba não estava lá.
Ora, isso é absolutamente falso, o que significa que a Sr.ª Ministra mentiu à Assembleia da República, mentiu à 1.ª Comissão! Esta é a verdade dos factos. É a verdade provada documentalmente e pelo próprio Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça, que ontem veio dizer que o dinheiro está no banco e que até é palpável! O dinheiro é palpável, existe mesmo, não é uma ficção!
E sabe, Sr. Deputado Montalvão Machado, pela natureza das coisas, o dinheiro ou está lá e não foi gasto, ou foi gasto e, então, não está lá. Como o dinheiro está lá, não foi gasto!

Aplausos do PS.

Diz o Sr. Deputado Montalvão Machado: "Poupou, porque ficou a dever!" Sr. Deputado, já lhe chamei aqui a atenção para o Anexo D do relatório: a dívida do Ministério da Justiça, relativamente ao ano de 2001, foi corrigida pela comissão presidida pelo Dr. Vítor Constâncio em menos 49,1 milhões de contos. Portanto, não é dívida; a dívida foi diminuída!
Sabe qual é o problema? Eu explico-lhe. É que as contas que a Sr.ª Ministra fez têm a ver com os pedidos que lhe fazem para dar tudo a todos. Ora, a diferença na forma de governar é saber se nós damos tudo a todos - e, para dar tudo a todos, nem quatro Orçamentos do Estado chegam! - ou se optamos por saber qual é a despesa que se realiza.
A nossa opção - e o senhor conhece-a bem, porque conhece a história do Fundo de Garantia do Ministério da Justiça, como a conhece o Sr. Secretário de Estado da Justiça Miguel Macedo, então Deputado; ambos sabem quanto tempo andámos a trabalhar para esse fim - foi a de constituir um fundo, que não foi uma invenção à beira das eleições para comprometer o actual Governo, o senhor conhece bem a história da reforma…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tem de concluir.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Em suma, é muito simples, Sr. Deputado: nós optámos por saber qual era a despesa que realizávamos, de forma a podermos poupar o dinheiro. E não se tratava de poupar o dinheiro para sermos poupados, mas para dotar um fundo de garantia que assegurasse a estabilidade futura do sistema de financiamento da justiça. Sabe o que é isso, Sr. Deputado? Responsabilidade!

Risos do PSD e do CDS-PP.

Nós temo-la, este Governo não!

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2102 | I Série - Número 051 | 19 de Outubro de 2002

 

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra, por 3 minutos, o Sr. Deputado António Montalvão Machado.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, bem me parecia que não tinha ofendido a honra de ninguém...

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Aliás, o Sr. Deputado António Costa sabe perfeitamente que eu era incapaz disso. Mas compreendo-o, compreendo este desespero. E até compreendo esta incomodidade de quem não queria, hoje, estar aqui. Depois de ouvir o que o Sr. Secretário leu, de facto interrogo-me sobre a razão de estarmos aqui.
O que, na terça-feira, a Sr.ª Ministra disse objectivamente - e é isso o que interessa - foi que no orçamento para 2002, apresentado pelo ex-Ministro da Justiça António Costa, agora Deputado, faltam 40 milhões de contos. E faltam!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

O Sr. António Costa (PS): - Não faltam, não!

O Orador: - Aliás, diria mesmo que esta postura da parte do Partido Socialista é, no mínimo, indigna para os Deputados socialistas que estavam na reunião de terça-feira.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Então, estão ali na reunião, assistem, passiva e paulatinamente, e não reagem minimamente?!

Vozes do CDS-PP: - Exactamente!

Vozes do PS: - Paulatinamente?!

O Orador: - Se o Sr. Deputado António Costa entende que deve chamar a atenção - e admito isso - dos seus camaradas de bancada pela passividade, pela ligeireza com que ouvem as coisas e por omissão de intervenção, faça-o, mas não aqui.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Reúna o seu grupo parlamentar e estabeleça, como ordem do dia, no ponto 1, "Passar ralhete aos meus Deputados" e, depois, então, passa aos outros pontos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Entendo que o bom senso para que o Sr. Deputado apelou devia, de facto, imperar. A verdade está demonstrada, a verdade clara de que as notícias que estão nos jornais não correspondem minimamente ao que se passou, e o Sr. Deputado foi atrás das notícias.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Magalhães (PS): - Demitam os jornalistas!

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para a defesa da honra pessoal.

O Sr. Presidente: - Dar-lha-ei depois, Sr. Deputado, para não prejudicar os outros oradores inscritos.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A Sr.ª Ministra da Justiça quase sempre que vem a este Parlamento é para tentar "apagar fogos" ateados por si própria, e mais uma vez foi o que aconteceu. E, sempre que isso acontece, a Sr.ª Ministra sai do debate pior do que entrou, e mais uma vez é o que está a acontecer.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Segunda bengala!

O Orador: - A prova disso é a intervenção que o Sr. Deputado António Montalvão Machado acabou de fazer. Falou, falou de tudo, menos do Fundo de Garantia da Justiça…

O Sr. António Costa (PS): - Claro!

O Orador: - … e da tal falta dos 40 milhões de contos.

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - Essa é uma prova cabal de que a maioria que aqui está para apoiar o Governo não tem argumentos para o apoiar e de que a Sr.ª Ministra sai deste debate pior do que entrou.
É que, Sr.ª Ministra, quem a ouviu, na reunião da 1.ª Comissão, através do que a comunicação social transmitiu, e, em qualquer caso, quem acabou de ouvir o Sr. Secretário ler as afirmações que a Sr.ª Ministra aí proferiu e que estão reproduzidas, ficou seguramente muito preocupado, porque ficou a saber (se é que não sabia) que o governo anterior criou um Fundo de Garantia da Justiça e que deixou uma dotação para esse efeito, num determinado montante, que são 57 milhões de contos, segundo afirmou a Sr.ª Ministra. Ora, o que a Sr.ª Ministra disse à 1.ª Comissão (e está transcrito),…

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - A gente já leu!

O Orador: - … foi o seguinte: "(…) são 40 milhões de contos a menos". E continua: "Sabe o que isto originou, Sr. Deputado? É que eu já pedi uma auditoria ao Ministério das Finanças. É porque, de facto, quando uma pessoa chega ao Ministério e se defronta com uma situação destas fica, de facto, bastante preocupada". E, adiante, reitera a sua preocupação, dizendo: "(…) quando (…) analisámos as contas deste Fundo de Garantia, de facto, ficámos muito preocupados. Eu não sei qual vai ser o resultado da auditoria, Sr. Deputado, mas brevemente cá virei dar conta dela (…)".

Vozes do CDS-PP: - Pois!

O Orador: - Portanto, a ideia que foi transmitida na comunicação social, com base, evidentemente, nas declarações da Sr.ª Ministra, é que, ainda no governo anterior, teria sido desencaminhada uma verba muito significativa.
Ora, tendo em conta aquela que ultimamente tem vindo a ser a prática da maioria, esperávamos que os seus Deputados viessem logo pedir um inquérito parlamentar ou uma audição urgente do Sr. Deputado António Costa e dos seus ex-secretários de Estado, para que esclarecessem o que fizeram, afinal, aos tais 40 milhões de contos que não aparecem no Ministério. É que é assim que a maioria agora está a actuar. A maioria, agora, só se lembra que é maioria para limitar os direitos das oposições,…

Aplausos do PCP, do PS, do BE e de Os Verdes.

… porque, quanto ao resto, ainda actua como se fosse oposição e como se o Partido Socialista ainda estivesse no governo: veta a vinda dos seus ministros aqui, como faz com o Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional, que se recusa a vir aqui, e quase todos os dias pede que venham aqui ao Parlamento, às comissões, ministros que já não o são! Estamos, de facto, perante uma maioria, um Governo e uma Legislatura muito originais!

Risos do PCP e do PS.

No entanto, isso não foi necessário, porque foi o Sr. Deputado António Costa que ontem veio aqui solicitar que se fizesse este debate de urgência para desmentir aquilo que a Sr.ª Ministra tinha dito. Mas nem era preciso, porque, ontem mesmo, o Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça fê-lo. De facto, a Sr.ª Ministra disse (ainda hoje aqui o repetiu) que havia um buraco de 40 milhões de contos e o Sr. Secretário de Estado Adjunto disse que ele era palpável. Ora, como nós não conhecemos buracos palpáveis,…

Risos do PCP, do PS, do BE e de Os Verdes.

… há, efectivamente, uma contradição óbvia entre aquilo que a Sr.ª Ministra diz que falta e aquilo que o Sr. Secretário de Estado diz que apalpa.

Risos e aplausos do PCP, do PS, do BE e de Os Verdes.

Portanto, o Governo enreda-se nas suas próprias trapalhadas.
Depois, foi óbvio o embaraço ontem criado à bancada do CDS-PP. O Sr. Deputado Telmo Correia foi aqui desafiado a dizer se aceitava um debate de urgência imediatamente. Ora, o Sr. Deputado Telmo Correia, sobre isso, nada disse. Disse que tinha sido pedida uma auditoria e que, depois da auditoria, falaríamos.
Ora, qual não foi provavelmente o espanto do Sr. Deputado Telmo Correia quando, passados poucos minutos, o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares chegou aqui e disse que havia uma disponibilidade para que o debate de urgência fosse feito de imediato!
Sr.ª Ministra, registo a falta de confiança que a bancada do CDS-PP tinha em que a Sr.ª Ministra estivesse disponível para participar neste debate, tendo em conta outros precedentes relacionados com dirigentes do seu partido.
Sr.ª Ministra, como é que o País pode confiar na sua governação e na sua acção à frente do Ministério da Justiça, quando a senhora e o seu Secretário de Estado falam destas verbas do Ministério da Justiça como se elas andassem pelas gavetas?! É que a Sr.ª Ministra não sabe onde é que o dinheiro está e o Sr. Secretário de Estado diz que sabe perfeitamente onde é que ele está e para que é que ele serve.
Portanto, a questão que se coloca é esta: como é que os portugueses podem confiar na sua governação, quando a senhora já é responsável por factores de instabilidade gravíssimos no Ministério da Justiça?
A Sr.ª Ministra criou uma situação absurda na Polícia Judiciária, sobre a qual ainda terá de prestar esclarecimentos nesta Assembleia, e, não satisfeita com isso, vem criar este incidente, que é revelador da sua falta de condições para continuar a exercer as funções governativas que ocupa.
A Sr.ª Ministra vem dizer que o anterior governo criou o Fundo para criar dificuldades a quem lhe sucedesse no cargo. Ó Sr.ª Ministra, por muita capacidade de previsão que esses senhores tivessem, eles nunca imaginariam que a senhora ia assumir essas funções!

Risos e aplausos do PCP, do PS, do BE e de Os Verdes.

O sector da justiça é, reconhecidamente, um sector problemático, mas a Sr.ª Ministra da Justiça faz parte do problema e em nada contribui para a solução.

Aplausos do PCP, do PS, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sr.ª Ministra, em primeiro lugar, independentemente das condições em que está, quero saudá-la. Quero saudá-la, porque cumpre o seu dever, que é estar aqui, um dever a que outros colegas seus, nomeadamente do seu partido, se têm sistematicamente furtado.
Penso que a razão deste debate, a razão de ser da sugestão feita e a urgência que, aliás, lhe é atribuída têm a ver com o facto de a senhora estar a titular uma pasta de enorme sensibilidade.

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Julgo que tem a noção da preocupação com que os cidadãos portugueses têm assistido ao que se tem passado na justiça e seguramente tem noção daquilo que de grave resulta do que aconteceu na terça-feira, neste Parlamento, na reunião da 1.ª Comissão.
E aquilo que aconteceu na 1.ª Comissão, até porque hoje foram criadas condições para que assim seja, é uma discussão que foi participada e de que muitos somos testemunhas, mas de que também são testemunhas os cidadãos portugueses, que assistiram em directo àquilo que se passou dentro da Comissão.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Ora bem!

A Oradora: - Portanto, para além da outra mediação, que hipoteticamente poderia atribuir aos jornalistas a culpa de não terem percebido nada e de terem baralhado a opinião pública, há a própria leitura que os cidadãos puderam fazer, acompanhando a discussão que foi feita. E a discussão que foi feita, a acusação que foi feita e a gravidade dessa acusação - e é essa a leitura e a interpretação que as pessoas fizeram, porque, com as suas palavras, não podiam deixar de fazer outra - foi a de que o anterior governo, neste caso o Partido Socialista, tinha feito desaparecer uma determinada verba do seu orçamento. Foi essa a acusação feita e foi essa a acusação que se provou ser falsa, ou, dito de outro modo, é essa total falta de verdade que justifica que o Governo, a senhora e a sua equipa digam ao País que faltaram à verdade, que mentiram. Mas, sobretudo, julgo que há outra consequência política, que, do nosso ponto de vista, é a de já não existirem condições para permanecer no lugar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Devo dizer, em jeito de introdução, que se nos afigura enternecedora esta solidariedade entre os camaradas da esquerda parlamentar.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Mas devo dizer também que enquanto ouvíamos há pouco o Sr. Deputado Francisco Louçã, de resto aplaudido pela generalidade da bancada de esquerda, que lidera, sob um sorriso de orgulho embevecido do Dr. Ferro Rodrigues, percebemos com surpresa que, afinal, não é só o Partido Socialista que não sabe fazer contas, não é só o Eng.º António Guterres que se enganava no PIB, não é só o Dr. António Costa que persiste voluntariamente num erro, afinal é também o Dr. Louçã e toda a esquerda parlamentar que não sabem fazer contas! Mas esse é um erro que fica com quem o pratica!
E realço um facto inédito: o da prontidão com que a Sr.ª Ministra da Justiça, aqui, um dia depois…

A Sr.ª Maria Santos (PS): - Inédito em democracia?

O Orador: - Inédito face à experiência socialista, naturalmente.
Como dizia, um dia depois de ter sido solicitada a sua comparência, a Sr. ª Ministra vem aqui.
Devo dizer que comparece até com algum despropósito, porque só comparece graças à displicência do Partido Socialista, e é bom de ver porquê. É que, afinal, tudo aquilo que a Sr.ª Ministra da Justiça hoje aqui nos disse já poderia ter sido dito na 1.ª Comissão.
Poderia ter sido dito na 1.ª Comissão quando o afirmou e quando, passivamente, o Sr. Deputado Eduardo Cabrita calou. A Sr.ª Ministra podia ter esclarecido e poupado o Plenário a este confrangedor exercício de hipocrisia política, a este erro em que repetidamente persistem. Bastava que o Sr. Deputado Eduardo Cabrita, que foi Secretário de Estado da Justiça (pelo que era suposto que dominasse com precisão esses dossiers), tivesse colocado aí todas as questões à Sr.ª Ministra, mas não o fez, naturalmente porque não estava lá o Dr. António Costa - essa tutela de outrora do Ministério persiste hoje em sede parlamentar.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Dr. António Costa, quem cala consente!
Reafirmo também aqui uma irresponsabilidade que a Sr.ª Ministra da Justiça já indiciou: o Sr. Dr. António Costa, através de um diploma publicado em 2 de Março de 2002, num governo que era de gestão, a dias de se ir embora, sabendo dos problemas que ia causar ao Ministério que tutelou e a quem o viesse a substituir nessa tutela, sabendo, antecipadamente, que não tinha dinheiro, determinou despesas que sabia que nunca poderiam ser pagas. Isso, Sr. Deputado António Costa, foi uma irresponsabilidade enquanto ministro…

O Sr. António Costa (PS): - Mostre o despacho!

O Orador: - ... e é uma irresponsabilidade hoje, na liderança dessa bancada, ao não assumir sequer essa responsabilidade!.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Sr. Deputado António Costa, há uma verdade a que V. Ex.ª não pode fugir, quer queira, quer não, e que hoje aqui foi demonstrada inequivocamente: V. Ex.ª, independentemente de qualquer apreciação sobre a tutela da pasta, foi um péssimo gestor!

Vozes do PS: - Não é verdade!

Vozes do CDS-PP: - É verdade, é! Foram todos!

O Orador: - Foi um péssimo gestor, como a Sr.ª Ministra revelou na 1.ª Comissão. E ao Partido Socialista, bem como ao Dr. António Costa em particular, perante esta denúncia, só restava uma de duas alternativas: a primeira, era naturalmente, a de reconhecer o erro, como lhe competia ou como exigia o sentido de Estado - ficava-lhe bem; a segunda alternativa, que foi aquela por que irresponsavelmente optou, era a de ficcionar um facto político, a de deturpar a verdade, a de dizer que a Sr.ª Ministra

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disse o que nunca disse, e que hoje a leitura das actas confirmou ser mentira. Fugiu, portanto, às suas responsabilidades, Sr. Deputado António Costa.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

De todo o modo, devo dizer-vos, Srs. Deputados da esquerda parlamentar, em particular do Partido Socialista, que foi governo em tempo de má memória, o seguinte: não nos espanta aquilo a que hoje assistimos em relação à pasta da justiça. É que nós sabemos o estado em que o Partido Socialista deixou o País, nós sabemos o estado em que o governo socialista - todo o governo socialista! - deixou as contas públicas.

Vozes do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - Não vou aqui repetir, até à exaustão, numerosos exemplos que têm sido dados por ministros, por deputados, e que constam de documentos que o Dr. Vítor Constâncio também já enunciou, em que lembrava o défice e lembrava muito mais. Mas leva-me a colocar a seguinte questão: por que razão é que o Ministério da Justiça, tutelado pelo Dr. António Costa, socialista, como socialistas eram todos os governantes que estiveram à frente daquele governo, haveria de ser diferente?!
Portanto, Sr.ª Ministra, o facto político que o Partido Socialista hoje criou não é para mim razão de surpresa, mas sim apenas mais uma confirmação de uma realidade que já conhecíamos e que, por isso, não justificava, sequer, tanto alarido.
Termino, dizendo que estive na 1.ª Comissão, lembro-me do que aí foi dito pela Sr.ª Ministra da Justiça, confirmei que a Sr.ª Ministra tinha razão e hoje a leitura da acta também o confirmou a todos os portugueses. Mas confirmei ainda outra coisa: o Partido Socialista não sabia fazer contas no passado, não sabe fazer contas no presente, e porque nada nos demonstra que venha a saber fazer contas no futuro confirmei que não está minimamente preparado para nos tempos mais próximos voltar a governar Portugal.
Para concluir, como alguém já disse - e não foi propriamente no "cabaré da coxa", porque essa, Dr. António Costa, continua a não ser a nossa escola -, o Partido Socialista veio hoje aqui à procura de "lã", só que, infelizmente, saiu "tosquiado".

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Costa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Devo dizer que este foi dos debates mais confrangedores a que tive oportunidade de assistir.

Aplausos do PS.

Risos e aplausos do PSD e do CDS-PP.

Um debate que nasce de uma mentira, que prossegue com uma segunda mentira e que acaba numa terceira mentira.
A primeira mentira foi o que a Sr.ª Ministra disse em Comissão. A Sr.ª Ministra poderá agora dizer o que quiser, mas o que lá disse foi que nós tínhamos gasto os 40 milhões de contos que estavam depositados no Ministério da Justiça para a constituição do fundo de garantia financeira! Está provado que é absolutamente falso que tenhamos gasto esse dinheiro! Prova-o a contabilidade do Ministério e confessou-o ontem o próprio Sr. Secretário de Estado quando disse que o dinheiro estava depositado no banco e que até era palpável. Esta fois, pois, a primeira mentira.
A segunda mentira é altamente confrangedora, Sr.ª Ministra: é vir-se agora aqui querer dizer, sob o coro da maioria - que por ser maioria não diz necessariamente a verdade -, que, afinal, a Sr.ª Ministra não disse o que disse na Comissão e que era tudo uma deturpação dos senhores jornalistas, que relataram ao País, através da rádio, da televisão e dos jornais, aquilo que consta da transcrição que o Sr. Secretário da Mesa leu. Esta é a segunda mentira, a mentira de dizer que a senhora não disse aquilo que disse.
A terceira mentira, finalmente, foi dizer-se o seguinte: "de facto, os senhores não tinham gasto, mas esse dinheiro tem de ser gasto". Essa, repito, é a terceira mentira e, infelizmente, é a que vai ter mais graves consequências se os senhores, efectivamente, vierem a gastar o dinheiro.
É porque isso significa que terá um aumento da despesa relativamente a 2001 de 28,8%; terá um aumento da despesa, relativamente ao orçamento inicial, de 21,1%; terá uma diferença relativamente à previsão de execução que apresentaram no relatório de orçamento de 32,5%. Ora isso significa duas coisas: primeira, que a proposta de lei do Orçamento de Estado para 2003 que para cá enviaram não é credível e, segunda, que "rebentam" com o défice no ano de 2002.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, a única solução que têm é a de terem juizinho e não gastarem o dinheiro que nós poupámos,…

Aplausos do PS.

Risos do PSD e do CDS-PP.

... porque se delapidam este ano o dinheiro que custou cinco anos a poupar…

Risos do PSD e do CDS-PP.

... não é só o sistema de justiça perder o seu Fundo de Garantia, é uma derrapagem absolutamente escandalosa da despesa pública, com consequências gravíssimas este ano e no próximo ano.
Por isso, Sr.ª Ministra da Justiça, não creio que seja possível que a senhora e o seu Secretário de Estado Adjunto, depois de três mentiras se mantenham de cabeça levantada no exercício das funções que exercem no Governo da República.

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2106 | I Série - Número 051 | 19 de Outubro de 2002

 

Aplausos do PS e do BE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Ministra da Justiça.

A Sr.ª Ministra da Justiça: - Antes de mais queria agradecer as referências que foram feitas à minha presença hoje aqui. Devo, aliás, dizer que foi por iniciativa minha, de acordo com o Grupo Parlamentar do CDS-PP…

Vozes do PS: - O quê?... Por iniciativa nossa!!

A Oradora: - Foi de acordo com os Grupos Parlamentares do CDS-Partido Popular e do Partido Social-Democrata.

Protestos do PS.

Os senhores estão muito nervosos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A iniciativa de vir hoje…

Vozes do CDS-PP: - Não ouviram "hoje"!

A Oradora: - Não, não ouviram. Estão um pouco distraídos.
Em todo o caso sempre lhes queria dizer, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, que agradeço as referências, mas entendo que essa é a minha obrigação. É por dever que aqui estou, é por respeito por uma Casa que também é a minha.
Quero dizer-vos que é também por obediência a outro princípio fundamental que pauta a minha vida: é porque quem não deve não teme!!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Em segundo lugar, queria fazer uma breve referência às questões que por aqui surgiram, designadamente da esquerda parlamentar, quanto à isenção como conduzo o exercício das minhas funções.
O Ministério da Justiça é gerido com isenção, com rigor, e com grande sentido de responsabilidade, e sobre isso, Sr.as e Srs. Deputados, não aceito qualquer tipo de insinuação relativamente ao meu comportamento como mulher, cidadã e, sobretudo, como Ministra da Justiça, que é o que sou.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Terceiro ponto: acerca do relatório do Sr. Dr. Victor Constâncio, que foi aqui referido uma ou duas vezes, queria recordar que esse relatório analisa e aprecia as contas de 2001, relativamente às quais não mencionei aqui as necessidades de reforço de financiamento que o Orçamento rectificativo para o Ministério da Justiça teve de receber e que foram cerca de 45 milhões de euros.
Mas a questão relativamente a estas contas, julgo eu, é um pouco tentar fugir àquilo que hoje nos trouxer aqui. Nós estamos a analisar, a discutir as questões relativas a 2002. Portanto, parece-me absolutamente despropositada a referência a esse relatório.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Há um quarto ponto que gostaria de mencionar, porque foi aqui repetido várias vezes. Falou-se aqui de mentira e eu queria dizer-vos, Sr.as e Srs. Deputados, que julgo que esta linguagem é imprópria do Parlamento.

Vozes do PS: - Ohhh...!

A Oradora: - É imprópria do debate político pela forma como é utilizada e, sobretudo, pela circunstância de não corresponder aos factos.
Quero dizer às Sr.as e aos Srs. Deputados que não acusei nem acuso, pese embora as diversas tentativas para o fazer, a comunicação social de coisa alguma.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - O que disse na 1.ª Comissão vim aqui dizer hoje, e vou repetir:...

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

... tenho dívidas constituídas pelo governo do Partido Socialista de 40 milhões de contos; um "buraco" orçamental de 40 milhões de contos!

O Sr. José Magalhães (PS): - Há um "buraco"?!

A Oradora: - A obrigação do Fundo de Garantia do Ministério da Justiça são 40 milhões de contos, pelo que precisaria de 80 milhões de contos. O que eu disse é muito fácil de entender: 40 milhões de contos mais 40 milhões de contos somam 80 milhões de contos.
Já agora, para terminar, dos tais 57 milhões de contos - que só ao de leve aqui foram referidos -, o governo do Partido Socialista, no primeiro trimestre, gastou 86 milhões de euros, ou seja, 17 milhões de contos.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Ministra, o tempo de que dispunha esgotou-se, queira concluir.

A Oradora: - Sr. Presidente, vou terminar.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Exerço - e repito - as minhas funções com seriedade, com rigor, com sentido de responsabilidade, e é no exacto sentido em que as exerço que assim continuarei, para bem da justiça no meu País!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço-lhes que aguardem um momento, porque há um pequeno problema regimental que tem de ser dirimido.

Pausa.

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2107 | I Série - Número 051 | 19 de Outubro de 2002

 

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães, que beneficia de cedência de tempo da parte do PCP e de Os Verdes.

Vozes do CDS-PP: - Isso é que é voltar aos velhos tempos!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É o "filho pródigo"!

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A moral deste debate vai ser tirada, inevitavelmente, por quem a ele pôde assistir. Pela nossa parte, julgamos que a conclusão é absolutamente clara: a Sr.ª Ministra teve aqui uma oportunidade de repor a verdade e não a utilizou.
Mais ainda: ao procurar desdizer o que, entretanto, o Governo, em recuo táctico, tinha procurado sugerir junto da comunicação social, V. Ex.ª acabou de criar uma situação muito melindrosa…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Para o PS!

O Orador: - … e pensou muito pouco no futuro.
O Sr. Deputado António Costa teve ocasião de explicar rigorosamente, com o rigor aritmético e matemático que se justificava, como o anterior governo, em vez de gastar uma verba que poderia ter gasto se não tivesse sentido de Estado e sentido do bom financiamento da justiça, mobilizou e reservou um montante do superavit do ano anterior para um fundo de garantia que era importante constituir para garantir, numa visão sustentada e a longo prazo, o financiamento da justiça.
V. Ex.ª não só não compreendeu a importância desse fundo como confessou aqui que suspendeu… E até confessou uma outra coisa: confessou que não percebeu a importância para a justiça de criar um novo mecanismo através do qual a alienação de património do Ministério da Justiça revertia a favor do orçamento da justiça e deste fundo de garantia para, precisamente, não haver delapidação de recursos mas, sim, a reserva de recursos para o financiamento futuro da justiça.
V. Ex.ª revelou, também, que não compreende a maneira como este orçamento da justiça - que é, de facto, um orçamento subtil - é gerido. Há verbas oriundas do Orçamento do Estado e verbas provenientes dos cofres, e é da junção destas duas partes que resulta o financiamento da justiça. Na 1.ª Comissão, V. Ex.ª até revelou que nem percebe bem como é que são pagos os magistrados judiciais,...

Vozes do PS: - Não sabe!

O Orador: - ... mas agora vai ter ocasião de perceber!
Retiro uma outra conclusão deste debate: se V. Ex.ª tivesse razão na leitura que faz destes números, a Sr.ª Ministra das Finanças teria hoje uma péssima noite, e não só hoje: doravante, teria noites absolutamente infernais - as "noites de Cardona", diria eu!

Risos do PS.

Noites em que V. Ex.ª teria, por um lado, este pesadelo terrível, ao contrário do seu Secretário de Estado - o tal que "apalpa" o dinheiro...!

Risos do PS.

V. Ex.ª não "apalparia" o dinheiro: andaria com uma vela à procura das notas, não as encontrando e dizendo que o seu Ministério teria a sua responsabilidade de 40 mais 40!
Tal significaria, Sr.ª Ministra, que a sua gestão não seria apenas ruinosa nesta perspectiva imediata, mas que teria também consequências devastadoras para o Orçamento do Estado.
Sr.ª Ministra, fizemos um orçamento para nós executarmos, ou seja, poupámos o que podíamos ter gasto! Se este orçamento tivesse sido feito numa óptica eleitoralista, então o actual Deputado Eduardo Cabrita e o então ministro António Costa teriam andado pelo País, anunciando tribunais, vazando 40 milhões de contos, lançando 40 milhões de contos sobre os cidadãos!

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Foi o que fizeram!

O Orador: - Fizeram exactamente o contrário!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, o tempo de que dispunha esgotou-se, peço-lhe para concluir.

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: O aspecto mais importante deste debate é o de que o crime não compensa. A Sr.ª Ministra pediu uma auditoria em Setembro, não em Julho nem em Agosto! Foi na altura em que surgiram as questões da PJ que V. Ex.ª pediu uma auditoria.

Vozes do PS: - Exactamente!

O Orador: - A Sr.ª Ministra deslocar-se-á ao Parlamento para um inquérito à PJ - que é um inquérito a V. Ex.ª -, para explicar a auditoria…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

… e, nessa altura, Sr.ª Ministra, ver-se-á quem ri melhor no fim.
Acho que vamos rir nós.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos ao fim do debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar do PS, sobre as dotações do Fundo de Garantia do Ministério da Justiça. Congratulo-me com o interesse dos nossos trabalhos nesta sexta-feira.
Lembro que a próxima reunião plenária se realiza na terça-feira, dia 22, às 15 horas e 30 minutos, para darmos início ao debate, na generalidade, das propostas de lei n.os 27/IX - Grandes Opções do Plano para 2003 e 28/IX - Orçamento do Estado para 2003.

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2108 | I Série - Número 051 | 19 de Outubro de 2002

 

O início da sessão está previsto paras as 15 horas e 30 minutos, porque às 15 horas terá lugar a cerimónia de boas-vindas ao Sr. Presidente da República Democrática de S. Tomé e Príncipe, em visita de Estado a Portugal durante esses dias.
Está encerrada a sessão.

Eram 14 horas e 35 minutos.

Srs. Deputados que deram entrada durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Alexandre Bernardo Macedo Lopes Simões
António Alfredo Delgado da Silva Preto
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
Manuel Joaquim Dias Loureiro
Melchior Ribeiro Pereira Moreira

Partido Socialista (PS):
Fausto de Sousa Correia
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
José Alberto Sequeiros de Castro Pontes
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
Pedro Manuel Brandão Rodrigues
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Social Democrata (PSD):
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Teresa da Silva Morais
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Socialista (PS):
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
Júlio Francisco Miranda Calha
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo

Partido Popular (CDS-PP):
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos

Partido Comunista Português (PCP):
José Honório Faria Gonçalves Novo
Maria Odete dos Santos

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
António Joaquim Almeida Henriques
Eduardo Artur Neves Moreira
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia

Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
José Manuel de Medeiros Ferreira
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos

Partido Comunista Português (PCP):
António João Rodeia Machado
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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2109 | I Série - Número 051 | 19 de Outubro de 2002

 

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2110 | I Série - Número 051 | 19 de Outubro de 2002

 

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