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Sexta-feira, 30 de Maio de 2003 I Série - Número 127

IX LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2002-2003)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 29 DE MAIO DE 2003

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Manuel Alves de Oliveira
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
António João Rodeia Machado

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas.
Em interpelação à Mesa, o Sr. Deputado António Costa (PS) solicitou a votação urgente do parecer da Comissão de Ética relativo ao pedido de suspensão do mandato de um Deputado do PS. Sobre o assunto interveio depois o Sr. Deputado Guilherme Silva (PSD).
Ao abrigo da mesma figura regimental, o Sr. Deputado João Cravinho (PS) colocou a questão da perda de sentido da ordem do dia perante a apresentação, pelo Governo, do Relatório sobre a Execução e a Orientação da Despesa Pública em 2003. Intervieram a propósito, além do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Mendes), os Srs. Deputados Pinho Cardão (PSD), Lino de Carvalho (PCP) e Diogo Feio (CDS-PP).
Seguiu-se, então, o debate com o Governo nos termos da Lei de enquadramento orçamental, sobre a orientação da despesa pública. Após ter intervindo, na fase de abertura, a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças (Manuela Ferreira Leite), usaram também da palavra, a diverso título, além da Sr.ª Ministra, os Srs. Deputados Duarte Pacheco (PSD), Eduardo Cabrita (PS), Lino de Carvalho (PCP), Luís Fazenda (BE), Maximiano Martins (PS) - que fez a síntese do relatório da Comissão de Execução Orçamental -, Pinho Cardão - que fez a síntese do relatório da Comissão de Economia e Finanças - e Tavares Moreira (PSD), Victor Baptista (PS), Diogo Feio (CDS-PP), Joel Hasse Ferreira e Elisa Guimarães Ferreira (PS).
No encerramento do debate, proferiram intervenções os Srs. Deputados Jorge Neto (PSD), João Cravinho (PS), Luís Fazenda (BE), Luís Duque (CDS-PP) e Honório Novo (PCP) e a Sr.ª Ministra, que também deu explicações aos Srs. Deputados João Cravinho e Elisa Ferreira (PS), que usaram da palavra em defesa da honra.
Em interpelação à Mesa, o Sr. Deputado Bernardino Soares (PCP) solicitou ao Sr. Presidente o envio do parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados relativo ao Código do Trabalho ao Sr. Presidente da República e ao Tribunal Constitucional, tendo-se também pronunciado o Sr. Deputado Guilherme Silva (PSD).
A Câmara aprovou um parecer da Comissão de Ética relativo ao pedido de suspensão do mandato de um Deputado do PS, após terem usado da palavra os Srs. Deputados António Costa (PS), Guilherme Silva (PSD), Telmo Correia (CDS-PP), Bernardino Soares (PCP), Luís Fazenda (BE) e Isabel Castro (Os Verdes).
Foi aprovada, na generalidade, a proposta de lei n.º 54/IX - Transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva 2001/40/CE,

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do Conselho, de 28 de Maio de 2001, relativa ao reconhecimento mútuo de decisões de afastamento de nacionais de países terceiros.
O projecto de lei n.º 182/IX - Aprova medidas com vista à modernização do regime da realização de despesas públicas com locação e aquisição de bens e serviços de comunicações pela Administração Pública (PS), não mereceu aprovação na generalidade.
Mereceram aprovação, em votação global, as propostas de resolução n.os 25/IX - Aprova, para ratificação, a Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, assinada em 23 de Maio de 1969, 28/IX - Aprova, para adesão, o Acordo de Alteração ao Protocolo relativo aos Privilégios e Imunidades da Organização Europeia de Telecomunicações por Satélite (EUTELSAT), adoptado e confirmado pela 26.ª Assembleia de Partes daquela Organização, que teve lugar em Cardiff, de 18 a 20 de Maio de 1999, 29/IX - Aprova o Acordo para a Conservação das Aves Aquáticas Migradoras Afro-euro-asiáticas, concluído na Haia, em 15 de Agosto de 1996, e 31/IX - Aprova a Convenção entre a República Portuguesa e a República Islâmica do Paquistão para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento e respectivo Protocolo, assinados em Lisboa, em 23 de Junho de 2000.
O projecto de resolução n.º 75/IX - Atribui prioridade máxima à instalação de um sistema costeiro de vigilância marítima (VTS) (Os Verdes), foi rejeitado.
Em votação final global, mereceu aprovação o texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo ao projecto de lei n.º 175/IX - Alteração do Estatuto dos Deputados (PSD e CDS-PP).
Por último, a Câmara aprovou seis pareceres da Comissão de Ética, autorizando um Deputado do PSD, três Deputados do PS e dois Deputados do CDS-PP a deporem como testemunha.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 10 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a sessão.

Eram 15 horas.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Fernando de Pina Marques
António Henriques de Pinho Cardão
António Joaquim Almeida Henriques
António Manuel da Cruz Silva
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
António Paulo Martins Pereira Coelho
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
Arménio dos Santos
Bernardino da Costa Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Fernando António Esteves Charrua
Fernando Jorge Pinto Lopes
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Monteiro Chaves
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Barreiras Duarte
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José Gago Horta
João Manuel Moura Rodrigues
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel de Matos Correia
José Manuel dos Santos Alves
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
José Miguel Gonçalves Miranda
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Soromenho Gomes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria Assunção Andrade Esteves
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria Elisa Rogado Contente Domingues
Maria Eulália Silva Teixeira
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria Isilda Viscaia Lourenço de Oliveira Pegado
Maria João Vaz Osório Rodrigues da Fonseca
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Paula Barral Carloto de Castro
Maria Teresa da Silva Morais
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis

Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António José Martins Seguro
António Luís Santos da Costa
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões
Augusto Ernesto Santos Silva
Carlos Manuel Luís
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela

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Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
Fausto de Sousa Correia
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Cabodeira
Fernando Pereira Serrasqueiro
Fernando Ribeiro Moniz
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Barroso Soares
João Cardona Gomes Cravinho
João Rui Gaspar de Almeida
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José António Fonseca Vieira da Silva
José Apolinário Nunes Portada
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José da Conceição Saraiva
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Pires Epifânio
José Manuel Santos de Magalhães
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Capoulas Santos
Luís Manuel Carvalho Carito
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson da Cunha Correia
Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
Henrique Jorge Campos Cunha
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Luís José Vieira Duque
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Narana Sinai Coissoró
Paulo Daniel Fugas Veiga
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos
Vicente José Rosado Merendas

Bloco de Esquerda (BE):
Joana Beatriz Nunes Vicente Amaral Dias
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a ordem do dia de hoje é preenchida com o debate com o Governo nos termos do artigo 57.º da Lei de Enquadramento Orçamental e, ainda, com o período regimental de votações.
A primeira intervenção de abertura do debate cabe ao Governo cujos membros, no entanto, ainda não estão presentes. Assim, vamos aguardar uns momentos.

Pausa.

Srs. Deputados, os Srs. Membros do Governo já tomaram os seus lugares na Sala, pelo que estamos em condições de prosseguir os trabalhos.

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O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, creio que, por motivos que o Sr. Presidente conhece, na sequência da reunião de ontem da Conferência de Líderes, se aguarda que seja recebido no Plenário um relatório e parecer resultante de uma reunião da Comissão de Ética, que sei que o Sr. Presidente convocou para as 14 horas de hoje. Creio, pois, que é imprescindível que o Plenário se pronuncie imediatamente sobre o pedido de suspensão de mandato apresentado pelo Sr. Deputado Paulo Pedroso, sob pena de, perante a interpretação que, ontem, a maioria parlamentar entendeu fazer, a maioria imponha consequências inaceitáveis para o mandato do Dr. Paulo Pedroso.
Portanto, gostaria de pedir ao Sr. Presidente que iniciássemos a sessão com a apreciação do relatório e parecer que venha da Comissão de Ética e a votação do parecer.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Costa, a Mesa ainda não recebeu o documento da Comissão de Ética. Logo que me seja entregue, darei conhecimento à Câmara.
Sei que a Comissão de Ética está reunida, o seu Presidente falou-me sobre esse assunto, mas não posso pôr à apreciação e votação um documento que ainda não deu entrada na Mesa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, naturalmente, não quero atrasar os trabalhos e percebo a sua preocupação. No entanto, penso que talvez fosse útil a Mesa contactar a Comissão de Ética para saber o que se passa com esse relatório e parecer. É que a reunião tinha sido marcada para as 14 horas; neste momento, são 15 horas e 15 minutos e gostaríamos de saber por que razão ainda não deu entrada o referido relatório e parecer, cuja apreciação e votação permitiria resolver de imediato o problema.

O Sr. Presidente: - Julgo saber o que se passa, mas, em todo o caso, como quero sossegar o Sr. Deputado António Costa, devo dizer-lhe que a questão das faltas que foi suscitada ontem não se coloca de imediato, uma vez que as mesmas só são verificadas no final desta sessão. Portanto, quanto a esse ponto, não creio que haja necessidade de interrompermos os nossos trabalhos para esperar pela entrega do relatório e parecer da Comissão, trabalhos estes que já estão atrasados pelas razões que mencionei.
Assim, vou dar início ao debate agendado, sem prejuízo de tratar de saber o que se passa sobre essa outra matéria.
Entretanto, os Srs. Deputados Guilherme Silva e João Cravinho já tinham pedido a palavra para interpelar a Mesa.
Assim, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, é só para dizer que é conhecido e sabido que o Sr. Deputado Paulo Pedroso requereu a suspensão do seu mandato e, consequentemente, é impensável que, perante a existência de um tal requerimento de um Sr. Deputado, lhe seja marcada falta.
Temos de perceber que a Assembleia não pode parar por causa de um relatório, por mais importante que seja. Portanto, vamos continuar os nossos trabalhos, sem prejuízo de o relatório e parecer ser posto à apreciação e votação por parte da Mesa logo que seja entregue.
Queria aproveitar esta circunstância para clarificar um ponto relativamente à insistência do Sr. Deputado António Costa - manifestada já ontem, à saída da Conferência de Líderes e, de novo, hoje, aqui - que vem dizer, falsamente, que a maioria impôs que o Sr. Deputado Paulo Pedroso requeresse a suspensão do mandato e que as suas faltas não fossem consideradas justificadas face à situação de reclusão em que se encontra.
Deixámos muito claro que tínhamos preocupações institucionais relativamente ao precedente, por forma a que esta Assembleia funcionasse na sua plenitude com o número de membros que foram eleitos. Argumentámos, ainda, que tinha de se pensar em situações futuras que poderiam ocorrer e que nos inclinávamos para a suspensão para resolver esse problema institucional, e apenas esse.
No entanto, dissemos também que, se o Partido Socialista, o Sr. Deputado Paulo Pedroso e a Mesa entendessem que esta situação de prisão era justificativa das faltas do Sr. Deputado e se fosse essa a sua vontade e a do seu grupo parlamentar, o Partido Social-Democrata não obstacularizaria a essa solução.
Portanto, estamos perante uma matéria relativamente à qual quero reafirmar que o Grupo Parlamentar do PSD jamais utilizará como arma de arremesso político.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas não podemos ficar calados face a esta atitude do Sr. Deputado António Costa, que veio dizer que a maioria inviabilizou a solução que o Sr. Deputado Paulo Pedroso pretendia, falseando o que se passou na Conferência de Líderes e que V. Ex.ª testemunhou quanto à disponibilidade do Partido Social-Democrata para viabilizar o caminho que o Partido Socialista indicava. É falso!
Quero, pois, reafirmar a nossa posição e, de uma vez por todas, não deixar que o Sr. Deputado António Costa, ou qualquer outro Sr. Deputado, tente levar-nos para uma guerra político-partidária nestas matérias. Não vai ser assim com o Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata, não o foi nunca, nem nunca será.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Costa, tem a palavra.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, serei muito breve.
Tudo o que tiver a dizer sobre esta matéria di-lo-ei aquando da discussão, no Plenário, do relatório e parecer que virá da Comissão de Ética.
Mas que fique desde já claro que repudio totalmente as palavras ditas pelo Sr. Deputado Guilherme Silva e reafirmo tudo o que disse ontem,…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - O senhor é um mentiroso nato!

O Orador: - … à saída da Conferência de Líderes e que repeti há pouco nesta sede.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: - Parece que estamos perante posições irredutíveis!
O Sr. Deputado João Cravinho também tinha pedido a palavra para uma interpelação à Mesa. Qual é o tema da mesma, Sr. Deputado?

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, a minha interpelação é sobre a ordem do dia.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, leio na agenda que a ordem do dia para hoje é, correctamente, o debate com o Governo ao abrigo da Lei de Estabilidade Orçamental sobre a orientação da despesa pública.
Sucede, porém, que o Governo apresentou o Relatório sobre a Execução e a Orientação da Despesa Pública em 2003, ao abrigo do artigo 57.º da referida lei, diz o Governo, sustentando, portanto, que as matérias em causa, isto é, que o relatório a que está obrigado perante a Lei de Enquadramento Orçamental e, ainda, perante a resolução votada neste Parlamento, em 8 de Janeiro, sobre o Programa de Estabilidade e Crescimento, dizem respeito à execução e à orientação da despesa pública em 2003.
Questionado o Sr. Secretário de Estado, em sede da Comissão de Economia e Finanças, sobre esta interpretação, reiterou-a, aduzindo que o artigo 60.º da Lei de Enquadramento Orçamental, o qual também é chamado para este debate, não estava aqui em causa porque, na execução do Orçamento do Estado para 2003, aquele artigo estava suspenso devido à forma como foi inserida a referida decisão na votação do Orçamento para 2003, reafirmando, portanto, que apenas estamos perante uma questão de execução da despesa pública em 2003.
Ora, esta interpretação é absolutamente contrária à Lei de Enquadramento Orçamental, que expressamente menciona o artigo 57.º, e é contrária também, por total esvaziamento e ignorância, à resolução aqui já votada sobre o Programa de Estabilidade e Crescimento.
Assim, suscitam-se-nos as maiores dúvidas, que quero transmitir a V. Ex.ª, sobre o que significa discutir neste Plenário a orientação da despesa pública em 2003, uma vez que tal orientação foi consagrada de maneira formal, definitiva e muito concreta, aquando da votação do Orçamento para 2003.
Quererá isto dizer que vamos pôr em causa o próprio Orçamento? Quererá isto dizer que esta Assembleia está perante um debate sem sentido, totalmente vazio, desprovido de qualquer possibilidade de consequência? Quererá isto dizer, como invoca o Sr. Secretário de Estado, que, já no ano passado, este Parlamento terá aceite - "implicitamente", diz o Sr. Secretário de Estado - que a matéria apresentada pelo Governo quando pediu a revisão do Orçamento para 2002 fosse considerada como encontrando-se ao abrigo da Lei de Enquadramento Orçamental, artigo 57.º (Orientação da despesa pública)?
Se esta última interpretação valer, isto significa que o debate que vamos ter é preparatório de uma revisão do Orçamento, que deverá suceder nos termos da própria lei.
Isto significa, portanto, Sr. Presidente, que não sabemos o que, de facto, estamos a discutir aqui: se o ponto da agenda que o Sr. Presidente anunciou, se o relatório que o Governo acaba de apresentar à Assembleia da República, em absoluta contradição com a agenda.
Como o Governo mantém que é o relatório que deve ser discutido, gostaria de obter o esclarecimento de V. Ex.ª

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sobre esta mesma matéria pediram a palavra, igualmente para uma interpelação à Mesa, os Srs. Deputados Telmo Correia e Pinho Cardão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, a minha interpelação não é sobre esta matéria, mas porque estava a entrar na Sala quando ouvi as palavras do Sr. Deputado António Costa referindo-se à maioria…

O Sr. Presidente: - Então, Sr. Deputado, peço desculpa, mas trataremos desse assunto mais tarde.
De momento, vamos concentrar-nos sobre a questão suscitada pelo Sr. Deputado João Cravinho e mais adiante dar-lhe-ei a palavra.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito obrigado.

O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Pinho Cardão.

O Sr. Pinho Cardão (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: De facto, o Sr. Eng.º João Cravinho trouxe novamente à colação uma tese dos partidos da oposição, nomeadamente do Partido Socialista, que sustentou que o relatório não cumpria o disposto no artigo 60.º da Lei de Enquadramento Orçamental.
Ora, esta tese não tem base porquanto a gestão por objectivos a que se alude no referido artigo 60.º vem desenvolvida nos artigos 15.º a 17.º da Lei de Enquadramento Orçamental. Estes artigos, por força das disposições transitórias plasmadas no artigo 93.º dessa mesma Lei, não eram de aplicação obrigatória em 2003, nomeadamente, pela necessidade de preparar a Administração Pública para a elaboração de orçamentos por actividades.
Aliás, no último colóquio que o Partido Socialista levou a cabo, há dois dias, o que acabo de dizer até foi reafirmado pelo Dr. Fernando Pacheco, que foi Secretário de Estado no governo socialista, que disse que lhe foi impossível fazer um orçamento por actividades porque a Administração Pública não estava preparada para tal.
Donde, do meu ponto de vista e também do do senso comum, não é lícito falar em incumprimento quando é a própria lei que excepciona esse mesmo cumprimento através do artigo 93.º

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho para uma interpelação à Mesa igualmente sobre esta matéria.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, quero assinalar a ideia que temos de que, com base nos documentos que temos pela frente, este debate está esvaziado de muito da sua importância e da relevância que lhe é dada pela Lei de Enquadramento Orçamental. De facto, o artigo 57.º da referida Lei aponta para que este seja um debate sobre a orientação da despesa pública.

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É certo que o relatório apresentado pelo Governo dará conta da execução orçamental, mas não só, pois também deverá dar conta da gestão e das perspectivas estratégicas da despesa pública, não em relação ao executado mas aos próximos meses até ao final do ano.
Aliás, este é até uma espécie de debate pré-orçamental e, de facto, o que temos para discutir pouco mais é do que um somatório dos boletins de execução orçamental que a Direcção-Geral do Orçamento publica todos os meses e nos envia.
Em todo o caso, sendo a situação a que é, procuraremos dar alguma substância ao debate e, embora não podendo ter, pelo menos este ano, a dignidade que a Lei de Enquadramento Orçamental perspectiva, contribuiremos para que não seja meramente uma rediscussão dos boletins de execução orçamental da Direcção-Geral do Orçamento.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, igualmente para uma interpelação à Mesa sobre este ponto prévio.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Mendes): - Sr. Presidente, este debate decorre da aplicação do artigo 57.º da Lei de Enquadramento Orçamental, cujo n.º 2 diz que "Caberá ao Governo fazer a apresentação da execução orçamental até à data, dar conhecimento das revisões do Programa de Estabilidade e Crescimento e discutir as Grandes Opções de Política Económica, que estarão presentes no ECOFIN de Maio." É isto que está em aberto.
O Governo apresentou o relatório respectivo e, portanto, estamos a cumprir rigorosamente a Lei.
Mas há mais.
Sobre este debate já houve várias peripécias; não conviria que houvesse mais. Este debate já esteve agendado por três vezes e desagendado outras tantas. Não é nada edificante para a Assembleia da República que isto tenha acontecido.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Em segundo lugar, esta matéria também já foi tratada exaustivamente em duas Comissões, a de Economia e Finanças e a de Execução Orçamental, às quais sempre se disponibilizaram a comparecer os membros do Governo de três áreas diferentes, alguns até duas vezes, ou seja, em duplicado.
Isto para concluir que o Governo tem dado toda a informação sobre esta matéria, ajustou as datas de disponibilidade da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças às dos três debates que estiveram marcados e está presente hoje.
Por isso, Sr. Presidente, devo dizer que é totalmente legítimo que o Sr. Deputado João Cravinho ou qualquer outro tenham opiniões diferentes. Expressá-las-ão ao longo do debate, mas é importante que o debate se faça, até pela razão singular de que é a primeira vez que um debate sobre a orientação da despesa pública se faz, em Portugal, desta forma aberta e transparente. No passado, não existia. Agora, existe e ainda estão a levantar dificuldades ao que existe e que é bom para a transparência das contas públicas perante os portugueses.
Um bocadinho mais de contenção era o que se impunha e não estarmos a fazer um pré-aviso de debate ao debate, porque aquilo que interessa realmente às pessoas, lá fora, é que o debate se faça - é para isso que o Governo aqui está e acho que era a isso que devíamos passar de imediato.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Diogo Feio também se inscreveu para interpelar a Mesa sobre a mesma matéria. Mantém a sua inscrição, Sr. Deputado?

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Sr. Presidente, a minha interpelação é feita nos mesmos termos, para dizer que, independentemente de questões de natureza jurídica e da discussão sobre a interpretação de artigos e a relação entre o artigo 57.º e o artigo 60.º (sendo que concordo claramente com a interpretação aqui feita pelo Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares e que corresponde, aliás, ao elemento literal da Lei), o fundamental é que, nesta altura, não nos percamos em formalismos de natureza legal e que passemos àquilo que mais nos interessa que é o debate da matéria em causa, no qual consideramos estar em plenas condições de entrar.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. João Cravinho (PS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Vou dar-lhe a palavra, Sr. Deputado, mas, com isto, encerra-se esta questão.
Tem a palavra.

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, a minha interpelação à Mesa é no seguinte sentido: em primeiro lugar, quanto ao agendamento e ao desagendamento desta matéria em debate, ele foi feito sob a autoridade de V. Ex.ª, que, nos termos regimentais, faz os agendamentos.
Registo o agastamento do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares com V. Ex.ª, mas quero dizer que não tem razão e gostaria de interpelar a Mesa no sentido de ser esclarecido o Plenário sobre as razões do agendamento e do desagendamento, para que V. Ex.ª possa assim, de certo modo, explicar ao Sr. Ministro as razões da Assembleia da República, que ele não pode, nem deve, questionar.
Por outro lado, Sr. Presidente, gostaria também de referir o seguinte: o Sr. Ministro veio dizer que o Governo esteve nesta Assembleia numa comissão e que foi a outra. Foi à Comissão de Execução Orçamental e escreveu à Comissão de Economia e Finanças dizendo que, apesar de já ter estado na Comissão de Execução Orçamental, condescendia (o termo não é este, mas o teor é) em ir a uma outra. Isto reforça o que eu disse, ou seja, que o Governo entende que esta é uma matéria de execução orçamental e de não mais.
Em terceiro lugar, Sr. Presidente, gostaria de chamar a atenção de V. Ex.ª e de toda a Câmara, pedindo a orientação expressa de V. Ex.ª sobre a ordem de trabalhos que temos presente, para o seguinte facto: como a Lei de Enquadramento Orçamental diz expressamente, temos de discutir esta matéria da orientação da despesa pública

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relacionando-a com o Programa de Estabilidade e Crescimento. O Programa de Estabilidade e Crescimento é plurianual, vai até 2006. E, em 8 de Janeiro, foram aqui votadas 11 normas sobre o Programa de Estabilidade e Crescimento, das quais 10 se aplicam à matéria hoje em causa, numa perspectiva expressamente plurianual.
Quererá, portanto, o Sr. Presidente confirmar se, de facto, a perspectiva plurianual do Programa de Estabilidade e Crescimento não será obrigatória neste caso, por inscrição na Lei de Enquadramento Orçamental... Tal como as Grandes Opções de Política Económica, que também estão expressamente consagradas, vão até 2005, são plurianuais, e o Governo ignora e despreza isso, querendo escamoteá-lo.
Finalmente, Sr. Presidente, de que valem as resoluções da Assembleia da República sobre o Programa de Estabilidade e Crescimento? São todas para deitar fora?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sobre esta matéria, o que a Mesa tem a dizer é o seguinte: o debate está marcado ao abrigo do que dispõe a Lei de Enquadramento Orçamental. O Governo é obrigado a apresentar um relatório sobre a matéria, prévio à realização do debate. O Governo enviou um documento à Assembleia, o qual, pela minha parte, enviei à Comissão de Economia e Finanças e à Comissão de Execução Orçamental.
É, portanto, sobre este documento e o conteúdo do preceito correspondente da Lei de Enquadramento Orçamental que hoje o debate se realiza.
As posições tomadas pelo Sr. Deputado João Cravinho referem-se ao fundo da questão, fazendo obviamente parte do debate, pelo que, com certeza, serão desenvolvidas pelo Sr. Deputado durante este debate.
Vamos, então, dar início ao debate. Previno, desde já, a Câmara de que, como foi acordado em Conferência de Líderes, o tempo que consta do quadro electrónico para a abertura do debate poderá eventualmente ser prolongado, em prejuízo do tempo reservado para o debate por parte do Governo, já que a intervenção da Sr.ª Ministra, pelos vistos, é um pouco mais longa.
Para introduzir o debate, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças (Manuela Ferreira Leite): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Com a entrega deste Relatório sobre a Execução e a Orientação da Despesa Pública, relativo a 2003, o Governo dá cumprimento ao disposto sobre esta matéria na Lei de Enquadramento Orçamental.
A sua discussão vem na linha do debate que recentemente aqui tivemos, em Janeiro, sobre o Programa de Estabilidade e Crescimento para o período 2003-2006, o qual tem uma natureza plurianual, apontando para objectivos quantificados relativos aos grandes agregados de despesa, e que implica uma linha de actuação duradoura e contínua, que pode ultrapassar o período de vida de uma legislatura.
Aproveitou o Governo esta oportunidade, de apresentação do Relatório sobre a Execução e a Orientação da Despesa Pública, para rever em baixa o cenário macroeconómico que havia servido de base à elaboração quer da Lei do Orçamento do Estado para 2003, quer do Programa de Estabilidade e Crescimento.
Fizemo-lo em consonância com as novas previsões económicas revistas, também em baixa, por todas as organizações internacionais e países tomados individualmente, sem excepção.
Não obstante, porque essa é a linha de rumo que serve os interesses do País, mantém-se o objectivo do Governo em prosseguir as metas consignadas no Programa de Estabilidade e Crescimento e nas orientações do Conselho Europeu do passado mês de Março, que apontam para uma consolidação orçamental em, pelo menos, 0,5 pontos percentuais do défice orçamental, corrigido dos efeitos dos ciclos económicos, em percentagem do PIB.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Da análise do Relatório sobre a Execução e Orientação da Despesa Pública, relativo a 2003, pode concluir-se que estamos no caminho certo.
Estamos no caminho certo ao evidenciar que se está a concretizar a correcção dos principais desequilíbrios macroeconómicos com que se vinha confrontando o País, tanto no plano orçamental como no plano do défice externo, criando as condições para que o País possa acompanhar a retoma da economia internacional, logo que ela se manifeste de forma mais pujante.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Estamos no caminho certo ao mostrar, no exemplo que é dado pelo Estado, que aumentos de produtividade e de competitividade não se obtêm com mais recursos, mas, pelo contrário, fazendo mais e melhor com menos recursos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Estamos no caminho certo quando, estando em causa recursos públicos, se exige e se aplica crescentemente uma cultura de rigor, de parcimónia e de luta contra o desperdício na sua aplicação, única forma de fazer justiça e manifestar respeito para com as gerações vindouras.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Estamos no caminho certo quando fica demonstrado que não esmorecerá o ímpeto reformador deste Governo, bem patente na avaliação e projecção das medidas de política dos vários ministérios, cuja continuação, aliás, devemos incentivar inquebrantavelmente.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Estamos no caminho certo quando, por via do Estado, procuramos induzir uma mudança de atitude da nossa sociedade civil, de modo a que ela se assuma de uma forma mais independente da presença tutelar e clientelar do Estado, de modo a que ela se apresente mais atenta, criativa e confiante.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: O interesse que suscitou a apresentação deste relatório por parte dos Srs. Deputados, nomeadamente da oposição, é o espelho da consciência que todos têm de que finanças públicas sólidas e sustentáveis são uma das bases de sustentação, um instrumento essencial, para a obtenção da prosperidade económica e da justiça social.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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A atenção atribuída ao relatório decorre da consciência de que as finanças públicas constituem o cerne do enquadramento de política económica da União Económica e Monetária, de que Portugal é parte integrante.
Por isso, representa uma vantagem a possibilidade de aferir e legitimar, com regularidade anual, nesta Assembleia, a orientação e a execução da política de despesa pública.
Este facto é ainda mais relevante na actual conjuntura económica, que torna acrescidamente exigentes os desafios e os objectivos assumidos.
A preocupação pela evolução da despesa pública traduz a consciência de que uma política orçamental que induz um excesso de procura, sem cuidar de promover a oferta, provoca inflação nos custos dos factores de produção, nomeadamente do trabalho, o que afecta, directa e indirectamente, a competividade do País e conduz, directa e indirectamente, a uma situação insustentável em matéria de endividamento externo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - É a consciência de que a perda de competitividade é sempre um problema gravíssimo para qualquer país. E é também a consciência de que essa gravidade é tanto maior quando numa União Económica e Monetária existem menos instrumentos para lhe fazer face e quando o alargamento da União Europeia é uma realidade, com todas as implicações que daí decorrem.
Por isso, todos mostram tanta ansiedade em atalhar o problema. Na verdade, todos estão conscientes de que se está perante uma oportunidade, porventura derradeira, de nos tornarmos competitivos, na qual se joga a possibilidade de melhorar os níveis de bem-estar dos portugueses.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - E por isso não vale a pena tentar recuperar a competitividade perdida usando a mesma lógica que se revelou improcedente nos últimos anos e que foi a de incentivar a procura interna por via orçamental.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - É, mais uma vez, adiar, provavelmente de forma definitiva. Tal adiamento apenas resultaria, no momento actual, em novo agravamento das condições de competitividade e do nível de endividamento externo.
Neste contexto, retirar ilações do passado é particularmente importante, para que não se cometam os mesmos erros de política económica e se não enverede por um activismo macroeconómico absolutamente inútil. Aliás, tão inútil quanto pernicioso, na medida em que interromperia a correcção em curso dos principais desequilíbrios macroeconómicos e tornaria mais difícil e doloroso o ajustamento no futuro.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - E o que a experiência nos mostra é que as exportações foram sempre a variável impulsionadora da recuperação, só depois seguidas do consumo privado e, mais tarde, do investimento e do emprego.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo tem pressa em construir um futuro para o País - a situação não está para hesitações e muito menos para mudanças de rumo - e isso passa pela consolidação orçamental, não por esta ser um objectivo em si mesmo, como decorre inequivocamente do Programa do Governo, mas apenas por ser uma condição essencial para que seja possível relançar o processo de crescimento e de criação de riqueza e de emprego, numa base sólida e sustentável.
Apenas com finanças públicas mais saudáveis, será possível encarar uma redução da carga fiscal excessiva, que ainda incide sobre as empresas e os particulares e é naturalmente inibidora do investimento e do consumo e, por conseguinte, da criação de riqueza.
O Governo não prescinde de velar e de lutar para que seja possível preservar e melhorar os níveis de bem-estar dos portugueses e garantir que a relevância de Portugal, enquanto Nação, nunca venha a ser colocada em causa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Duarte Pacheco, Eduardo Cabrita, Lino de Carvalho e Luís Fazenda.
Tem a palavra, por 3 minutos, o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, começo por saudar a Sr.ª Ministra e o Governo pela apresentação do relatório, hoje aqui em discussão, sobre a despesa pública, que é coerente com o Orçamento do Estado, com o Programa do Governo e o Programa de Estabilidade e Crescimento, este último aqui aprovado com uma larguíssima maioria.
Sr.ª Ministra, o que se extrai deste relatório, de uma forma clara - e só quem tiver pensamentos enviesados não consegue detectá-lo -, é o objectivo final de uma convergência real com a União Europeia, sendo a consolidação da despesa pública um mero instrumento para esse nosso grande objectivo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E, aí, aquilo que a Sr.ª Ministra nos comunica a todos e ao País sobre a execução do primeiro trimestre só pode merecer os parabéns e o aplauso desta Casa. É que a despesa corrente diminui, invertendo uma tendência que era tradicional no nosso país; a despesa corrente primária desacelera; e somente a despesa de capital acelera, o que é positivo para promover crescimento económico, como todos nós desejamos.
Mas aqui, Sr. Ministra, permita-me que lhe coloque uma questão muito directa, que tem a ver com o seguinte: apesar de se defender a consolidação, há, em todos os quadrantes político-partidários, economistas que continuam a defender a necessidade de haver mais investimento público, mais despesa pública, para que Portugal possa crescer. Gostaria de saber, Sr.ª Ministra, se considera que isso seria importante e como é que compatibilizava isso com a consolidação da despesa pública, que todos, incluindo os partidos da oposição, consideram fundamental para um crescimento consolidado e sustentado, em Portugal.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra, também por 3 minutos, a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Duarte Pacheco, o Sr. Deputado referiu o aspecto essencial, que é o de haver sinais claramente positivos nos indicadores macroeconómicos sobre a evolução da actividade económica.
Temos pela frente dois desequilíbrios graves, o desequilíbrio externo e o desequilíbrio orçamental, qualquer um deles apresentando-se com sinais de recuperação - este é o ponto fundamental.
É evidente que, perante esses sinais de recuperação, que, julgo, ninguém nega, assim como ninguém nega a gravidade da situação que leva à coexistência destes dois desequilíbrios - e, portanto, a ânsia que todos sentem em corrigi-los, dada a inviabilidade que todos percebem em mantê-los -, quando há qualquer tipo de ajustamento, a primeira tendência é imediatamente a de recuar, de hesitar no caminho que está a ser traçado. Portanto, é natural que haja um pouco a tentação de, corrigidos alguns desequilíbrios no curto prazo, se pensar que, então, no curto prazo, existe margem para se poder fazer mais despesa pública.
Porém, Sr. Deputado, o aspecto fundamental que referi na minha intervenção está exactamente nesse ponto. É que a experiência passada já nos mostrou que não é com despesa pública que se resolvem os problemas. Se os problemas se resolvessem com despesa pública, penso que o nosso país estaria na vanguarda de todos os países europeus, porque em nenhum caso houve tanta despesa pública como no nosso.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas acontece que nós estamos com problemas de competitividade e de produtividade, pelo que a possibilidade de se continuar a enveredar por esse caminho é exactamente contrária a essa política.
Assim, e a despeito da tentação fácil que muitos governos poderão ter de melhorar e ter efeitos visíveis, a curto prazo, com efeitos verdadeiramente devastadores a longo prazo, este Governo opta por pensar nas futuras gerações e não estar interessado nas maquilhagens fáceis do curto prazo, pelo que nos manteremos rigorosamente com o mesmo objectivo de política.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Cabrita.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, a determinada altura da preparação deste debate, a maioria pretendeu criar a ilusão, a grande esperança, de que, claramente, o relatório apresentado não preenchia por inteiros os requisitos estabelecidos na Lei de Enquadramento Orçamental, mas que aqui, no debate, teríamos o verdadeiro cumprimento dos objectivos estabelecidos para o Governo quer no artigo 57.º quer no artigo 60.º da Lei de Enquadramento Orçamental.
Não teríamos aqui um debate com a Directora-Geral do Orçamento, teríamos aqui um debate de visão perspectiva sobre a evolução da orientação da despesa pública, sobre a análise das grandes linhas de reforma da Administração Pública, sobre as variáveis macroeconómicas hoje profundamente modificadas já relativamente àquilo que aqui, em Janeiro, com a participação activa do Partido Socialista, foi discutido aquando da apresentação do Programa de Estabilidade e Crescimento.
Sr.ª Ministra, o seu contributo para o debate está, de facto, ao nível do relatório, está na linha das piores expectativas anunciadas pelo Sr. Deputado João Cravinho. Na verdade, estabelece aqui uma má doutrina para aquele que deveria ser um debate importante sobre a orientação quer para 2003 quer para os anos seguintes da despesa pública.
Tentemos, então, reorientar este debate para aquilo que o Governo, manifestamente, não quer discutir. O que é que foi relevante nos últimos tempos? Este debate demonstra que o Orçamento que aqui foi discutido era irrealista e mal fundamentado, demonstra que o Programa de Estabilidade e Crescimento em cujo debate activamente participamos, hoje é já uma ilusão.
Sr.ª Ministra, quando é que nos traz aqui uma revisão do Programa de Estabilidade e Crescimento? Sr.ª Ministra, face àquilo que o Banco de Portugal, hoje, já disse, que a consolidação orçamental em matéria de despesa em nada se materializou, quando é que nos traz aqui, verdadeiramente uma orientação de consolidação da despesa pública?
Onde é que está a redução da despesa corrente? A Sr.ª Ministra aqui veio fundamentar sim, mais divergência com a União Europeia, vem aqui apontar um caminho não para um 2003 de divergência mas para três anos de divergência com a Europa. Onde é que está o cumprimento dos nossos objectivos em matéria de investimento apoiado por fundos comunitários? Onde é que está aqui uma linha que nesta medida face ao seu desprezo pelo investimento aponta para que novamente em 2003 se venham a perder fundos comunitários.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tem de terminar, senão desligar-se-á o microfone.

O Orador: - Estou a terminar, Sr. Presidente.
Finalmente, em matéria de qualidade de investimento é necessário boa despesa, mas o Governo aqui manifestamente não ouviu o apelo do Sr. Presidente da República a um investimento de qualidade e assim, em matéria quer de incentivos fiscais quer de apoio ao investimento, se incentivasse a investigação científica…

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr. Ministra de Estado e das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Eduardo Cabrita, não vou, com certeza, referir-me à parte inicial da sua intervenção porque o nível do debate fica com quem intervém nele.

Aplausos do PSD e do CDS.

O Sr. Deputado, de entre várias perguntas que me fez, questionou-me onde está a redução da despesa corrente,

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o que significa que está preocupado com a esta questão.

Vozes do PS: - Claro!

A Oradora: - O Sr. Deputado acha que a despesa corrente não foi reduzida o suficiente? É isso, Sr. Deputado? Foi pena o senhor não ter concretizado a sua proposta de redução de despesa, em vez de se limitar a perguntar onde está a redução da despesa corrente. Sr. Deputado, o senhor queria que se tivesse despedido funcionários públicos? O Sr. Deputado queria que se tivesse cortado em vencimentos de funcionários públicos? Sr. Deputado, diga qual era a sua proposta para introduzir na redução da despesa corrente.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): - Está a fugir à questão!

A Oradora: - Por outro lado, quanto à pergunta "onde está a consolidação orçamental", os senhores devem saber que deve estar em muito lado, porque os senhores até consideram que a política orçamental provocou uma recessão. Portanto, os senhores estão convencidos de que a consolidação orçamental devia ter sido muito mais forte, de que não chega, é pouca. O Sr. Deputado, nas suas dúvidas, tem subjacente, rigorosamente, a vossa ideia da política económica, ou seja, não tem qualquer ideia.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quando o senhor também diz que o Orçamento foi irrealista e está mal preparado, essa sua intervenção não deveria ser feita neste momento mas, sim, para o momento em que eu lhe disser que o Orçamento, que foi aprovado nesta Assembleia, não chega para todo o ano. Nessa altura, o senhor tem autoridade para falar; neste momento, não tem a mínima autoridade para dizer isso. O senhor tem apenas que debater a questão que neste momento está em discussão.
E quanto à pergunta, que também me fez, sobre a orientação da política de despesa, Sr. Deputado, acho extraordinária essa sua questão, outro ponto essencial do vosso problema. Sr. Deputado, a orientação da política de despesa foi definida no Programa de Estabilidade e Crescimento.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): - Então, o que é que estamos aqui a fazer se já está definida?!

A Oradora: - Acontece que os senhores não estão habituados a que haja alguma coisa que dure mais do que dois meses.

Protestos do PS.

Não estão habituados a isso. E, como não estão habituados, o senhor queria que eu, hoje, tendo já discutido, em Janeiro, o Programa de Estabilidade e Crescimento, voltasse a discuti-lo.

O Sr. Presidente: - O tempo de que dispunha esgotou-se, Sr.ª Ministra.

A Oradora: - Sr. Presidente, concluo, dizendo que aquilo que o Sr. Deputado Eduardo Cabrita me perguntou é algo que já aqui discuti, e devo dizer que não mudei de posição.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, começo por saudá-la e congratular-me pela sua presença, uma vez que não teve oportunidade de estar presente na interpelação que, ontem, a bancada do PCP fez sobre a situação económica do País, o que de certo modo é significativo, Sr.ª Ministra! Isto porque o que se depreende e o que se interpreta da sua não presença ontem é que o Ministério das Finanças desenvolve as suas opções sem ter presente as consequências das políticas orçamentais na economia real do País. E, ontem, o debate passou em grande parte pelas opções orçamentais, porque elas estão muito na base da crise económica que o País vive. Seria bom que a Sr.ª Ministra tivesse estado presente para podermos cruzar a economia real com as consequências da política orçamental.
Mas vamos ao assunto que hoje aqui nos traz. A Sr.ª Ministra tem a seguinte tese: é preciso fazer a consolidação das finanças públicas e esta tem de ser feita, exclusivamente, com base na diminuição da despesa pública para não criar mais endividamento externo. Sr.ª Ministra, parece-nos que este é um caminho errado, e a vida está a confirmá-lo!
A Sr.ª Ministra sabe que grande parte da actividade económica do País é o resultado da procura interna, da actividade interna da economia, sem menosprezar a importância das exportações e da componente externa, não estou a menosprezar isso, mas uma grande parte é feita dentro do território nacional. Diminuindo duas variáveis fundamentais, os rendimentos do trabalho e o investimento público (ao contrário do que o Sr. Ministro da Economia disse aqui ontem, os dados do INE apontam que, em 2002, a retracção do investimento público foi de 7,4%), levou, inevitavelmente, a uma contracção da procura interna, a qual, por sua vez, levou ao agravamento das condições que a própria cessação da actividade já proporcionava, levou ao agravamento dessa situação, e levou à situação de recessão que hoje se vive. Aliás, Sr.ª Ministra, esta opinião não é só nossa mas de inúmeros analistas, alguns da vossa própria área ideológica e partidária, de relatórios que estamos a ler e de instituições internacionais.
As medidas tomadas pelo Governo, no ano passado, são as maiores responsáveis pela situação de contracção da economia que hoje se vive no País.
Disse a Sr.ª Ministra: mas isso era inevitável, isso será compensado com a balança externa, com a procura externa, há uma reorientação da economia para a realidade externa. Não é assim, Sr.ª Ministra. A Sr.ª Ministra, ao contrário do que acabou de dizer, tem, com certeza, como eu tenho, a Síntese de Conjuntura do INE, 1.º trimestre de 2003, que saiu anteontem, que diz que, em matéria de procura externa, o que está também a restar, como era inevitável,…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se. Tem de terminar senão desligar-se-á o microfone.

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O Orador: - … é uma diminuição do fulgor inicial, isto é, também por aí estamos a diminuir os indicadores. O que significa, Sr.ª Ministra, que uma opção política - e vou terminar, Sr. Presidente - centrada exclusivamente na redução da despesa pública, que não tem em conta a economia real, que não tem em conta o papel do investimento…

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, o senhor falou na contracção da procura interna por via do consumo público, do consumo privado e do investimento público.
Sr. Deputado, provavelmente, o senhor esteve alheado - espero que não tenha sido pela minha ausência! - daquilo que se passou aqui, ontem. É que não tenho dúvidas de que aquilo que ontem aqui se passou foi uma análise das consequências sociais e da atenção que o Ministro da Segurança Social tem dado a estes assuntos (e, portanto, indirectamente, as Finanças, porque sem recursos nada se consegue fazer), como as medidas que têm sido tomadas na área da economia real de fomento do lado da oferta e que o Sr. Ministro da Economia, com certeza, aqui explicou.
Portanto, Sr. Deputado, nós estamos com uma visão diversa: o Sr. Deputado considera que o relançamento da economia deve ser feito por via do incentivo à procura interna…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Também!

A Oradora: - … e nós consideramos que deve ser também à despesa pública, também à despesa de consumo público, também à despesa de investimento público, ninguém reduziu drasticamente essas componentes. E o que eu acho absolutamente extraordinário, Sr. Deputado, é que, simultaneamente, sejam feitas as duas afirmações: por um lado, diz-se que houve enorme travagem do lado orçamental… Sr. Deputado, o senhor (eu sei que tem absoluta capacidade técnica para fazer essa análise) está mesmo convencido, sem ser por uma intervenção de natureza política, de que foi o Orçamento do Estado para 2002 que provocou a situação económica em que nos encontramos?! Não está, com certeza, convencido disso! Porque só a injecção de meios de recursos financeiros que foram introduzidos no ano de 2002, com o pagamento de dívidas em atraso, era algo que impediria qualquer tipo de recessão. Esse ponto não pode nunca esquecer.
Por outro lado, também não poderia, com certeza, esquecer que nenhuma política tem efeitos imediatos e que, portanto, nunca a situação de 2002 poderia ser resultado de medidas tomadas no 2.º semestre de 2002.
Sr. Deputado, nós somos eficientes, mas não tanto…! Mas o senhor sabe que isso não é assim. O senhor sabe que isso é consequência dos fortes desequilíbrios a que a nossa economia estava sujeita, motivo pelo qual todos os indicadores que os senhores agora reclamam estavam a verificar-se, na tendência em que actualmente se verificam, desde, pelo menos, o ano 2000.
Portanto, Sr. Deputado Lino de Carvalho, isso era mais do que suficiente para se perceber que a situação é consequência de políticas anteriores e que a actual política tenta resolver o problema para evitar que as consequências se agravem. E, perante esse ponto, não tenho quaisquer espécies de dúvidas de que vai continuar a ser assim.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, o Governo reviu em baixa o cenário macroeconómico - facto de que se dá conta no Relatório do Governo -, admitindo uma situação de recessão que antes não queria reconhecer e nem sequer ouvir falar. Essa será a questão factual.
Contudo, o que importa saber, neste momento, é se o Governo tem propostas no sentido de contrariar esta recessão, se tenciona ou não (percebemos que não pelo discurso proferido pela Sr.ª Ministra) utilizar o investimento público para contrariar o ciclo recessivo.
Esta não é uma obsessão de alguns partidos da oposição. Foi a Sr.ª Ministra das Finanças quem disse, a propósito de economistas da sua área política, que não poderia o Governo abrandar, alterar ou, sequer, vacilar na orientação que tem tomado. E, ainda há pouco, referiu que não mudaria de rumo e, até, acrescentou que as opiniões do Dr. Miguel Cadilhe, Presidente da Agência Portuguesa para o Investimento, eram lamentáveis. Mas serão lamentáveis porquê? Porque se demarcam de um entendimento de solidariedade política com o Governo ou, substantivamente, pelo seu conteúdo?
Gostaria que a Sr.ª Ministra das Finanças nos fornecesse conteúdos dessa divergência, porque a despesa pública também não é aqui um "bezerro de ouro" mas, sim, um instrumento essencial. Ficaremos à espera da retoma como quem espera por Godot, ou será que há medidas que, a nível interno, podem ajudar a contrariar as tendências internacionais?

A Sr.ª Joana Amaral Dias (BE): - Muito bem!

O Orador: - Também sei, Sr.ª Ministra, que não é este nem o tempo nem o espaço para discutirmos a revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento, mas notei com perplexidade que quer a imprensa nacional quer a estrangeira nos informou que, recentemente, numa reunião dos Quinze - do Conselho de Ministros da Defesa -, o Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional afirmou que tinha aceite e apoiado a ideia de que o investimento público em matéria de despesas militares, despesas de investimento militar, poderia eventualmente ser exceptuado ao cálculo do défice. Estranhei, estarreci, porque vi a primeira brecha na ortodoxia do equilíbrio orçamental!

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - Como entretanto, de então para cá, tal não foi desmentido em lado algum, gostaria de saber se o Governo admite que possa haver uma excepção de investimento público no cálculo do défice, logo em matéria militar. Gostaria, pois, de conhecer a posição do Governo.
Também temos observado, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças (e o Relatório que aqui temos presente demonstra-o à evidência), um enorme desvio orçamental

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face ao que estava previsto. Neste momento, não entraria noutras considerações sobre este ponto, mas gostaria que nos dissesse como prevê receitas extraordinárias - há alguns dias atrás, com muita ternura e familiaridade, falou delas a um conjunto de estudantes de uma escola do ensino básico.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Manuel Alegre.

O Sr. Presidente: - Tem de concluir, Sr. Deputado, uma vez que já ultrapassou o tempo de que dispunha.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Que receitas extraordinárias são essas? Disse-nos que não serão as "jóias da família", mas nós gostaríamos de saber das "jóias" do nosso endividamento e do desbaratamento do património.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, V. Ex.ª fez a observação de que as despesas públicas ajudam a contrariar a recessão. Categoricamente, é verdade no curto prazo. Isto é, elas ajudam a resolver o problema nos próximos seis meses; depois disso, fica-se pior do que anteriormente!
Portanto, ao falar nessa possibilidade, o senhor está a querer sujeitar-me à tentação de chegar à Assembleia da República e dizer que, afinal, a situação está melhor. Não vou cair nessa tentação, Sr. Deputado! É uma verdadeira tentação, porque é evidente que tem efeitos a curto prazo, não o nego - com certeza que sim! -, mas também tem efeitos perniciosos, muito perniciosos, no próximo ano.

Vozes do PCP: - Porquê?!

A Oradora: - Porque nós não temos poupança para fazer despesa, Srs. Deputados! Vamos fazer mais despesa à custa de nos endividarmos e, à medida que nos endividamos…

Protestos do Deputado do PCP Lino de Carvalho.

O Sr. Deputado Lino de Carvalho continua a querer fazer investimento público. Como qualquer outra pessoa, também eu defendo o investimento público, mas vamos lá saber de que investimento estamos a falar! Estamos a falar de quê? Se me forem apresentadas propostas de investimento público, verdadeiramente investimento público… Sr. Deputado Lino de Carvalho, não há corte algum de investimento público na verdadeira acepção da palavra; há corte nas despesas de capital, algumas delas contabilizadas como despesa corrente no PIDDAC. Agora, se se refere a investimento público em bens não transaccionáveis, que são aqueles com menor taxa de produtividade e que contribuíram para a falta de produtividade, isso não, Sr. Deputado!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Reoriente-o para bens transaccionáveis!

A Oradora: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, em valores absolutos, não há quebra do investimento, não há perda de captação de fundos estruturais por causa da despesa de investimento.
Vamos lá ver de que investimento público estamos a falar. O investimento público que efectivamente foi reduzido é salutar para a situação económica, e não pernicioso; talvez seja pernicioso no curto prazo - aceito -, mas não é no médio prazo.
Portanto, Sr. Deputado Luís Fazenda, continuo a defender que não podemos cair na tentação das análises de curto prazo, em que todos estão com a razão. Só que não estão com a razão relativamente ao que estamos a pensar: uma análise de médio prazo e não de longo prazo.
Sobre a questão de saber quais as propostas que apresento para contrariar uma recessão, vamos ver se somos todos suficientemente honestos para dizer que a recessão não é um aspecto próprio de Portugal, toda a Europa está na mesma situação. Esta não é uma característica específica de Portugal mas, sim, de toda a Europa, e sendo assim não podemos dizer que estamos numa situação diversa da dos outros países. Além de que, sendo Portugal uma economia aberta, sofremos essas consequências.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Portugal foi o primeiro país a entrar em recessão, Sr.ª Ministra!

A Oradora: - Portanto, teremos muito mais dificuldade em ultrapassar a situação, já que as influências externas são de natureza negativa.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Queira concluir, Sr.ª Ministra.

A Oradora: - Concluo já, Sr. Presidente.
É exactamente a pensar na preparação da economia do País para situações menos boas internacionalmente que não podemos manter-nos na tentação de nunca nos curarmos. Se estivéssemos numa situação diversa, provavelmente teríamos enfrentado com muito mais facilidade a situação económica europeia que se vive neste momento.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, neste momento não tenho esclarecimentos a pedir, já que a Sr.ª Ministra nada disse.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, vamos proceder, então, à apresentação dos relatórios das Comissões de Execução Orçamental e Economia e Finanças.
Em primeiro lugar, para fazer a apresentação do relatório da Comissão de Execução Orçamental, tem a palavra o relator, Sr. Deputado Maximiano Martins, que dispõe de 5 minutos para o efeito.

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O Sr. Maximiano Martins (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A primeira referência que devo fazer, enquanto relator do relatório da Comissão de Execução Orçamental, tem a ver com o título do próprio Relatório do Governo.
Durante o debate, vários participantes colocaram em questão a imprecisão do título. Por isso, sugiro, Sr.ª Ministra, que, em próximos relatórios, o Governo tenha mais cuidado. Quando muito, tratar-se-á do Relatório de 2003 sobre a execução e orientação da despesa pública e não, evidentemente, do Relatório da despesa pública em 2003.
Referirei dois aspectos e as conclusões do relatório da Comissão.
O primeiro aspecto considerado no relatório prende-se com a dimensão comunitária do debate sobre as finanças públicas.
Ainda recentemente, em 21 de Maio, a Comissão Europeia elaborou uma comunicação em que apelava à "elaboração de uma estratégia de médio prazo coerente para a União, que tenha em conta simultaneamente o problema dos crescentes desequilíbrios orçamentais e a necessidade de contribuir para um maior crescimento, em conformidade com a Estratégia de Lisboa".
Sublinho três palavras-chave: combate ao desequilíbrio orçamental mas, também, promoção do crescimento económico e, finalmente, Estratégia de Lisboa, ou seja, prossecução de objectivos de crescimento, de emprego e de inovação.
Mais se dizia, a este propósito, que "é essencial que os Estados-membros dêem execução às directrizes aprovadas pelo Conselho Europeu em Março, que apontam para um equilíbrio entre consolidação orçamental e necessidade de estimular a retoma e reforçar o potencial de crescimento", apelando, ainda, a que os Estados-membros avançassem para planos ambiciosos.
É bom ver a Comissão Europeia e o Governo português apegados a princípios desta ordem. E relembro que os princípios afirmados na Estratégia de Lisboa, subscritos durante a presidência portuguesa, o foram durante uma governação socialista
O segundo aspecto prende-se com o cumprimento ou incumprimento da Lei de enquadramento orçamental.
A oposição mantém as suas críticas ao incumprimento do Governo relativamente às disposições legais decorrentes da Lei de enquadramento orçamental, cujos objectivos essenciais são (no espírito e na forma, de resto) os de anteceder a preparação do Orçamento do Estado com um debate, no quadro das orientações da despesa pública, sobre as prioridades da acção do Estado, as missões do Estado num quadro plurianual e segundo metas quantificadas susceptíveis de avaliação e acompanhamento.
O Governo e a maioria não têm este entendimento e não reconhecem o carácter instrumental de um debate estruturante sobre as finanças públicas. Para muitos é uma oportunidade perdida de ter um debate substantivo sobre matéria da maior relevância para Portugal; para muitos, de resto, é a única forma de controlo a prazo da despesa pública - um combate de natureza estrutural.
Essa é a abordagem que poderá conduzir - digo-o a título pessoal - aos necessários entendimentos estáveis entre forças políticas em matéria de finanças públicas, Sr.ª Ministra. E a aprovação, por unanimidade, deste parecer, de que sou autor, poderá ser, nesta matéria, um sinal positivo.
Finalmente, em termos de conclusões, Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr.as e Srs. Deputados, diria o seguinte: no essencial, o Governo reafirmou a sua política de consolidação orçamental e os compromissos que mantém, em particular quanto à correcção do défice estrutural em meio ponto percentual e à manutenção do défice nominal abaixo do limiar dos 3%. Ou seja, implicitamente, reafirma o abandono do objectivo dos 2,4%.
Os grupos parlamentares dos partidos da oposição reafirmam a sua discordância quanto às opções de consolidação orçamental e à falta de uma consolidação orçamental responsável e sublinham o agravamento da situação económica e social por erros de políticas e por gestão errada das expectativas e da confiança dos agentes económicos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para apresentar o relatório da Comissão de Economia e Finanças, tem a palavra o relator, Sr. Deputado Pinho Cardão.

O Sr. Pinho Cardão (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Para a preparação do debate de hoje sobre a orientação da despesa pública, o Governo, nos termos da Lei, submeteu à Assembleia da República um relatório devidamente fundamentado.
Este Relatório foi oportunamente distribuído à Comissão de Economia e Finanças, tendo esta Comissão, no âmbito da sua apreciação, ouvido vários membros do Governo.
Compete-me, como relator, apresentar as principais conclusões e parecer aprovados por maioria.
O parecer da Comissão foi no sentido de que o Relatório do Governo cumpre o estabelecido na Lei de enquadramento orçamental, que prevê o debate em causa, fornecendo a informação adequada para uma correcta percepção da orientação da despesa pública, finalidade do debate.
Mais concretamente, o Relatório do Governo cobre totalmente os temas previstos no artigo 57.º da referida Lei, isto é, apresenta a execução orçamental até à data do debate, dá conhecimento das revisões do Programa de Estabilidade e Crescimento, informa sobre o estado dos objectivos previstos nas Grandes Opções do Plano, em articulação com a consolidação das finanças públicas, e informa sobre o curso da reforma da Administração Pública. Isto é o que a Lei diz e não me parece que ela possa ser objecto de geometria variável!
Os partidos da oposição sustentaram, a este respeito, que o Relatório não cumpria o disposto no artigo 60.º da Lei de enquadramento orçamental por não considerar uma sistematização da despesa por objectivos. Esta tese não pôde ter o acordo do PSD e do CDS-PP, porquanto a gestão por objectivos vem desenvolvida nos artigos 15.º e 17.º da Lei de enquadramento orçamental, os quais, por força das disposições transitórias, consagradas no artigo 93.º da mesma Lei, não eram de aplicação obrigatória em 2003, nomeadamente pela necessidade de preparar a Administração Pública para a elaboração do orçamento por actividades. Donde não é lícito falar em incumprimento quando é a própria Lei que excepciona o cumprimento.

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Outra posição controvertida foi a sustentada pela oposição e que referia que o Relatório do Governo apenas valorizava o curto prazo, nomeadamente a execução orçamental, em detrimento de uma visão estratégica e plurianual. Esta tese também não pôde ter o acordo do PSD e do CDS-PP, porquanto o Relatório, para além de desenvolver todos os temas previstos na Lei, deve ser enquadrado no Programa de Estabilidade e Crescimento para o período de Janeiro de 2003 a 2006, em que é perspectivada a evolução da economia. Aliás, é neste contexto que o Relatório do Governo procede a uma revisão do cenário macroeconómico.
Por razões que se prendem com o tempo, apenas referirei mais duas conclusões: a orientação da despesa no primeiro trimestre e a política de investimento público.
No que respeita à orientação da despesa, os dados apresentados pelo Governo permitem concluir por: uma desaceleração da despesa corrente, que, aliás, diminuiu em relação ao período homólogo anterior, e também da despesa corrente primária, que se situa numa percentagem inferior à implícita no Orçamento; uma desaceleração da despesa total e um controlo das despesas com o pessoal, dado que as remunerações certas e permanentes tiveram um acréscimo de apenas 1%, sendo que as despesas cobertas com as receitas gerais tiveram mesmo um decréscimo de 2%.
Por outro lado, as aquisições de bens e serviços sofreram um decréscimo de 20%. As despesas de capital, ao contrário, sofreram uma aceleração, o que se revela positivo.
Assim, o cumprimento da despesa, isto é, a sua orientação vai ao encontro dos objectivos definidos no Plano de Estabilidade e Crescimento e no Orçamento do Estado.
No que respeita à política de investimento público, conclui-se que o total da despesa executada se situa num nível um pouco acima do de 2002, mas com uma repartição mais adequada, já que as despesas de capital aumentaram enquanto as despesas correntes diminuíram.
Por outro lado, as taxas de execução experimentaram uma evolução positiva bem mais favorável se comparadas com os períodos homólogos anteriores.
Por último, e a título pessoal, caberá referir alguma incompreensão do relator para o facto de o mesmo Relatório do Governo ter sido analisado por duas comissões da Assembleia da República e ter dado lugar a dois pareceres, aliás com votações diferenciadas.
Até por isso, e também por duplicação de audições de memb1ros do Governo (o que é prejudicial!), seria desejável uma adequada definição de competências de cada Comissão.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Tavares Moreira.

O Sr. Tavares Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, demais Membros do Governo, Srs. Deputados: Este debate em torno da orientação da despesa pública e das opções de política económica proporciona-nos uma interessante oportunidade para uma breve reflexão em torno da nova política económica que está a ser implementada há cerca de um ano, designadamente sobre as suas origens, sobre os seus fundamentos, sobre os seus objectivos, sobre a sua instrumentação e, também, sobre os seus resultados, que começam a ser bem visíveis.
Creio que este tipo de reflexão é bem mais estimulante do que uma discussão em torno de questões adjectivas ou processuais, que, para além de não justificadas, seriam de manifesta esterilidade.
Diria que há cerca de um ano (para ser mais preciso, há 54 semanas), aprovámos nesta Assembleia o Orçamento rectificativo para 2002. Esta deliberação da Assembleia revestiu-se de especial significado por se ter tratado da primeira grande etapa na mudança de política económica em Portugal, após a nossa participação na zona euro, dando início a um processo que seria depois integrado por mais quatro capítulos fundamentais: a aprovação, em 26 de Julho, do Programa para a Produtividade e Crescimento da Economia, estabelecendo um conjunto de objectivos e de orientações no domínio das políticas de gestão da oferta, colocando um acento muito especial na promoção das actividades produtoras de bens e serviços transaccionáveis; a aprovação, no final de Julho, da Lei da estabilidade orçamental, consagrando um regime de solidariedade dos diferentes subsectores do sector público administrativo na realização dos objectivos de estabilidade orçamental; a aprovação da Lei do Orçamento do Estado para 2003, com a qual se elegeu a contenção da despesa pública corrente - com relevo para a despesa primária - como eixo principal da política de consolidação orçamental; finalmente, o cumprimento, com o maior sucesso, da árdua tarefa de colocar o défice orçamental de 2002 em nível inferior a 3% do Produto Interno Bruto, evitando que o País incorresse, pelo segundo ano consecutivo, na situação de défice excessivo, prevista e sancionada no Tratado da União Europeia.
É muito importante recordar, no momento em que realizamos este debate sobre a política de despesa pública e as opções de política económica, que a mudança de política económica iniciada com o Orçamento rectificativo para 2002 constituía uma questão vital não apenas para a defesa da credibilidade externa do País e para a observância dos compromissos de disciplina financeira no quadro da zona euro mas também - e sobretudo - para a criação de condições de crescimento sustentável da economia nacional.

Aplausos do PSD.

Ao mesmo tempo, essa mudança de política visava impedir que a nossa economia caísse numa fase de recessão prolongada, imposta pelo crescente, e que acabaria por ser inevitável, bloqueio financeiro dos sectores produtivos.
Este último desígnio da nova política económica, que o Governo português em boa hora elegeu, demonstra uma enorme clarividência na percepção das limitações que a participação numa zona monetária impõe hoje à política económica, mas que muito boa gente ainda não conseguiu apreender ou não quer de todo entender.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A clarividência e a justeza da nova política económica em Portugal está presente nos diferentes planos em que essa política se exprime, a saber: no plano da definição dos objectivos intermédio e final dessa política; no plano do doseamento da calibragem dos instrumentos de execução da política; e, também, no plano do discurso político, que acompanhou a sua divulgação, que fundamentou a sua necessidade e que tem sido reiterado ao longo da respectiva execução.

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Começando pelos objectivos, trata-se de matéria que suscitou recentemente alguma controvérsia só explicável, a meu ver, pela dificuldade em entender que, em política económica, é indispensável estabelecer prioridades.
O Governo deixou muito claro, desde a primeira hora, que o objectivo final da sua política é o de atingir um ritmo de crescimento económico superior à média dos nossos parceiros da União Europeia, por forma a atingir o nível médio de rendimento desses parceiros no mais curto lapso de tempo (a chamada "convergência real"). Este objectivo foi afirmado e repetido vezes sem conta nos primeiros meses que se seguiram ao período em que o Governo iniciou funções.
O Governo também não deixou dúvidas quanto à necessidade, para conseguir esse desiderato final, de se corrigirem, com a maior brevidade, os gravíssimos desequilíbrios de que a economia enfermava e que a tinham lançado num ritmo de endividamento insustentável e de que, para essa correcção, seria prioritário disciplinar as finanças públicas, eliminar os desperdícios que tinham minado a solidez da economia e estabelecer, com toda a determinação, um programa de consolidação orçamental a médio prazo.
Também esta justificação das opções de política foi repetida vezes sem conta.
O Governo percebeu, e bem, que sem uma radical alteração da desastrada política de finanças públicas que tinha herdado dos seus antecessores, os desequilíbrios da nossa economia só poderiam ser corrigidos com custos extraordinários para os sectores produtivos e também com custos sociais intoleráveis.
Não foi assim difícil definir e eleger a consolidação orçamental, a disciplina das finanças públicas, como o objectivo intermédio da nova política económica.
E é aqui que se têm suscitado as maiores confusões.
Não falta quem pretenda que o Governo cumpra ou realize em primeiro lugar o objectivo final da política e só depois se ocupe com o objectivo intermédio. Isto equivale a dizer que, em primeiro lugar, se deve pôr a economia a crescer a bom ritmo e só depois tratar de assegurar as condições necessárias para que esse crescimento possa verificar-se. Não o dizem explicitamente por esta forma, pois o ilogismo seria por demais evidente. Mas não é possível tirar outra conclusão do discurso político que, sem negar a necessidade da consolidação orçamental, ao mesmo tempo lamenta, ou objecta, que esta política está a impedir o crescimento económico e a pôr em causa o nível do emprego, que o Governo está a esquecer o estímulo da economia, não adoptando políticas para combater a recessão.
Nada de mais errado ou mais falso, sobretudo no actual contexto em que a política económica nacional perdeu os tradicionais instrumentos de regulação macroeconómica, que são as taxas de juro e a taxa de câmbio.
Sem uma séria, ou mesmo dura, disciplina das finanças públicas, nunca mais a economia teria condições para crescer, pela razão bem simples de que não haveria recursos para financiar o crescimento; a persistência dos défices gémeos acabariam por asfixiar por completo os sectores produtivos. Então, sim, é que se poderia dizer: adeus crescimento, adeus convergência.
Mas também no plano do doseamento dos instrumentos de execução da política é perceptível a sua justeza. Este aspecto está hoje bem visível no ritmo de ajustamento e de correcção dos desequilíbrios fundamentais da economia. Depois da apreciável redução do desequilíbrio externo, de 2001 para 2002 (de 8,4% para 5,7% do Produto Interno Bruto), os dados já disponíveis para o primeiro trimestre de 2003, evidenciando uma redução de 60% no défice agregado e de 40% na balança corrente, sugerem que neste ano irá verificar-se uma nova e significativa correcção deste desequilíbrio, não se podendo excluir nesta altura que o défice em 2003 venha a situar-se em redor de 3% do PIB ou mesmo abaixo deste número.
Quer isto dizer que estamos a aproximar-nos de uma nova situação de equilíbrio, num prazo de 18 a 24 meses a contar da aplicação das novas directrizes de política económica. Bem mais depressa do que muitos supunham, mas não mais depressa do que as necessidades do País reclamavam.
Abrem-se assim perspectivas muito interessantes de a retoma económica nos nossos principais parceiros económicos apanhar a economia portuguesa não em contrapé, incapaz de reagir, mas, pelo contrário, na melhor posição para aproveitar em pleno essa retoma.
A evolução das exportações de bens e serviços em Março, em função dos dados já divulgados pelo Banco de Portugal, confirma o ritmo de crescimento dos dois primeiros meses, o que constitui uma indicação muito positiva.
Por sua vez - e este é um dado muito curioso -, os movimentos de fundos estruturais da União Europeia apresentam uma evolução extraordinariamente positiva. Há quem critique a dificuldade ou a incapacidade do Governo para gerir os fundos estruturais e eu gostava de responder a essa observação com dois simples números: os fundos estruturais cresceram, em 2002, 65% em relação a 2001 e, nos três primeiros meses de 2003, cresceram, em relação a igual período de 2002, só 110%! Repito, só 110%!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Merece ainda uma referência o forte abrandamento do ritmo de endividamento externo registado neste período, que é de cerca de 30% do ritmo observado em 2000 e em 2001.
Pode assim dizer-se que o doseamento das medidas de política é perfeitamente adequado. Nem mais, nem menos. Nem mais, porque não é necessário, por exemplo, o agravamento da carga fiscal. Nem menos, porque deve prosseguir o esforço de contenção da despesa corrente, sem cedências ou hesitações.
Em ambos os casos a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças tem mantido uma posição inequívoca.
Finalmente, vou referir-me ao plano do discurso político envolvente da nova política económica, que terá sido um dos aspectos que mais polémica suscitou por causa da invocada dramatização do discurso político.
Os críticos deste discurso referem mesmo que aquilo a que chamam crise económica se deve, em boa parte, a esse discurso radical, dramático, que terá lançado o pessimismo sobre os agentes económicos, levando-os a retrair as decisões de consumo e de investimento mais do que seria necessário. Acrescentam alguns que até se compreende a necessidade de consolidação orçamental, mas que o discurso utilizado foi longe demais.
Julgo, precisamente ao contrário, que este terá sido um ponto decisivo para a eficaz gestão das expectativas dos agentes económicos. Hoje em dia, muito mais do que no passado, a gestão da política económica tem de procurar

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influenciar as expectativas dos agentes económicos para que estes assumam comportamentos convergentes com os objectivos da política.
E se o Governo tinha um objectivo sério e de realização urgente - a redução e correcção dos desequilíbrios - competia-lhe utilizar um discurso que induzisse os agentes económicos a contribuir para uma forte desaceleração da despesa interna, evidentemente com o sector público administrativo a dar o exemplo em primeiro lugar.
Não faria qualquer sentido dizer, por exemplo: "Estamos defrontados com um grave desequilíbrio económico. Temos de o corrigir o mais depressa possível. Mas não se preocupem com isso, que nós daremos notícias mais tarde".
Só me cabe, nesta circunstância, felicitar o Governo pela perspicácia que demonstrou ao fazer uso desse discurso de dramatização. Foi o discurso apropriado, no momento certo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Risos do PS.

O Orador: - O ritmo a que o processo de correcção dos desequilíbrios está a decorrer é a contraprova mais segura e visível de que esse instrumento de gestão das expectativas foi utilizado no sentido e com a intensidade requeridas.
Para concluir, cumpre dizer que a nova política económica portuguesa, pela primeira vez desde que nos tornámos membros da zona euro, é totalmente consistente com os dados macroeconómicos, com o novo contexto de integração numa zona monetária e com o objectivo final de recriar condições para a retoma do processo de convergência real.
Naquilo que tem de essencial, a política económica do Governo tem estado impecavelmente correcta. O que se deve esperar agora é que o Governo prossiga, com determinação e persistência, essa política, ajustando-a às mudanças que forem ocorrendo no contexto interno e internacional, mas mantendo, até 2006, a linha de consolidação orçamental e de controlo estrito do crescimento da despesa pública, na certeza de duas coisas: que o Governo vai ganhar esta batalha e que para isso poderá sempre, mas sempre, contar com o nosso apoio.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Victor Baptista.

O Sr. Victor Baptista (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Tavares Moreira, não lhe vou fazer qualquer pergunta sobre a questão do choque fiscal do Sr. Dr. Miguel Frasquilho, mas também não lhe vou fazer qualquer pergunta sobre a importância do investimento público no investimento privado, conforme referências do Dr. Miguel Cadilhe.
Vou optar por uma outra questão, a da chamada nova política económica. A primeira pergunta que lhe faço é se nesta nova política económica V. Ex.ª subscreve a afirmação da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças no Plenário de hoje, ao ter dito que com despesa pública não se resolve qualquer problema.
A Sr.ª Ministra acabou de fazer uma afirmação, dizendo que em sede de despesa pública não há nada que seja reprodutivo, nem o investimento, nem sequer os salários.
Ora, Sr. Deputado, isto é, no mínimo, surpreendente. É surpreendente, mas é simultaneamente compreensível face à política do Governo. O País está a chegar ao que está a chegar porque o Governo não reconhece, evidentemente, a importância da política orçamental no seu desenvolvimento.
Portugal está hoje integrado no espaço europeu, na zona do euro, e portanto não tem a possibilidade de utilizar outros mecanismos de política económica. Não tendo outra possibilidade, restava a política orçamental. Mas, pelos vistos, o Governo tem esta interpretação da função do orçamento e da política orçamental.
O Sr. Deputado fala em competitividade, crescimento e produtividade.
Vamos à competitividade. Tenho ouvido falar muito sobre as exportações. Sr. Deputado, o Orçamento previa nas exportações um crescimento de 4% a 7% nas exportações. Já é reconhecido pelo Governo que esse crescimento será de menos de 4%. Mas mais grave é que o EUROSTAT vem dizer que em Janeiro e Fevereiro de 2003, comparativamente ao mesmo período em 2002, as exportações desceram 2%.
Vamos ao crescimento. O modelo em que assentou o Orçamento tinha por base duas alternativas: ou apostava na política económica ou apostava nas exportações para atingir esse crescimento. O que constatamos é que, tendo sido completamente desprezada a política sobre a procura interna, foram privilegiadas as exportações. Mas as exportações estão a falhar, daí que o Governo tenha a necessidade de fazer revisões. Aliás, já vai na terceira revisão relativa ao crescimento do PIB. Começou com um PIB da ordem média de 1,75%, passou, depois, no Pacto de Estabilidade e Crescimento, para 1,25%, e agora já vai em 0,5%.
Portanto, entre estas revisões sucessivas, o Orçamento, o Pacto de Estabilidade e Crescimento e o que se passa neste momento, é bem evidente o que tem sido aquilo que o Governo tem feito.
Para terminar, o Sr. Deputado fala em crescimento sustentado. Será que há um crescimento sustentado, Sr. Deputado? É que o crescimento é nulo. Como acabei de dizer, tudo indicia que o crescimento do PIB será zero em 2003. Este é o crescimento sustentado do PSD?!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Tavares Moreira.

O Sr. Tavares Moreira (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Vítor Batista dirige-me, essencialmente, duas questões.
Em primeiro lugar, o Sr. Deputado pergunta-me se subscrevo a declaração da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças produzida hoje, neste Plenário, sobre a utilidade ou inutilidade da despesa pública. Suponho até que usou a expressão: "com a despesa pública não se resolve coisa nenhuma".
Devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que com a despesa pública resolve-se muita coisa. Com despesa pública a mais,

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arranjam-se problemas. Foi isso que nós, de facto, arranjámos, e em grande quantidade.
A segunda questão que me coloca é uma questão de cenário macroeconómico para este ano.
Devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que, na minha perspectiva - exprimo uma posição estritamente pessoal e assumo a responsabilidade e o risco daquilo que vou dizer -, o último cenário macroeconómico apresentado pelo Governo poderá sofrer, no Outono, uma revisão para cima, e não para baixo.
Cá estaremos, depois da rentrée política, para avaliar essa situação.

O Sr. Victor Batista (PS): - Cá estaremos!

O Orador: - Mas, se quiser, pode registar. Em Outubro, cá estaremos para falar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Relativamente à forma como o Sr. Deputado aborda estas questões e a insistência que coloca no ataque à política de controlo da despesa, quero dizer-lhe que o Sr. Deputado, no fundo, usa um discurso contraditório. Por um lado, entende que não se corta suficientemente na despesa, mas depois diz que a política está a concorrer para a estagnação da economia ou até para a recessão.
Quanto a este aspecto, insisto naquilo que há pouco referi na minha intervenção.
De facto, creio que, em Portugal, existe ainda um grande défice e uma grande dificuldade em entender as implicações para a política económica da nossa participação numa zona monetária. Não sou a única pessoa a dizer isto, pois ainda há pouco tempo a Dr.ª Teodora Cardoso, por exemplo, afirmava o mesmo, de forma até muito mais radical. É que as coisas mudaram de tal maneira que as pessoas, de facto, não se aperceberam ainda, e, por inércia, pensam que se pode actuar da mesma forma que se actuava anteriormente.
O Sr. Deputado não me levará a mal - a nossa relação amistosa certamente o permite - que lhe faça uma sugestão, que, espero, não irá ofendê-lo. Permito-me sugerir ao Sr. Deputado que, se tiver oportunidade, faça, em breve, uma visita à Guiné-Bissau, para perceber o que estou a dizer. Trata-se de um caso extremo, mas serve para o Sr. Deputado perceber as implicações que um erro de políticas pode ter no funcionamento de uma economia.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Já estamos perto da Guiné-Bissau?!

O Orador: - Sabe que na Guiné-Bissau, neste momento, os funcionários públicos não recebem salários há cerca de 8 meses, os agentes das forças armadas não recebem salários há cerca de 8 meses, e os funcionários da televisão pública não recebem salários há cerca de 1 ano?
Se o Sr. Deputado lá for ou se quiser informar-se perceberá porquê. É que a Guiné-Bissau entrou numa zona monetária, não percebeu perfeitamente as implicações desse passo, e, hoje em dia, pura e simplesmente, não há moeda, não há dinheiro na economia da Guiné-Bissau. Por isso, o Estado não pode cumprir nenhum dos seus compromissos. Não tem crédito, não tem entrada de capitais do exterior, não tem capital que lhe permita solver os compromissos, não há dinheiro, a economia não funciona. O Estado, pura e simplesmente, suspendeu completamente as suas obrigações.
Se o Sr. Deputado tiver oportunidade, debruce-se sobre este caso.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: O debate relativo ao Relatório sobre a Execução e Orientação da Despesa Pública em 2003 é inovador, na medida que, pela primeira vez, se estão a cumprir novas determinações da Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Independentemente de questões formais, aquilo que mais interessa é a questão material, ou seja, saber o que se pretende quanto à política de despesa pública, saber se esta se deve expandir ou retrair, saber quais as despesas que prioritariamente devem baixar, saber qual a relação entre as despesas públicas e privadas. Enfim, saber se a despesa pública deveria crescer descontroladamente ou, se quiserem, se se deveria defender o modelo orçamental socialista de desperdício de dinheiros públicos.
Quanto a tudo isto, afirmo que somos contra o desperdício. Queremos que termine o descontrolo e o endividamento das famílias, empresas e Estado.
Porque temos estes objectivos, porque sempre dissemos que as nossas prioridades são pôr as contas públicas em ordem, reformar elementos essenciais da nossa sociedade e auxiliar ao estabelecimento de políticas microeconómicas de investimento, a oposição decidiu chamar-nos obsessivos.
Pois, então, que assim seja: somos obsessivos porque queremos, finalmente, para Portugal, um crescimento sustentado, que tenha como motores um Estado responsável, famílias não endividadas e empresas competitivas.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O caminho da oposição parece ser outro. Defendem uma espécie de elixir da despesa pública e ainda não entenderam que esse não é o caminho. Paciência! Como alguém diria: "É a vida!".
E nós, sabendo que há bastante vida para além do Orçamento, porque temos a certeza de que este não pode ser tão monstruoso que acabe por ser o princípio, meio e fim dessa mesma dívida, estamos contentes por finalmente assim deixar de ser. Pena é que este caminho não tenha sido iniciado mais cedo.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Mas vamos directamente à despesa pública.
Com toda a certeza que, na bancada do Partido Socialista, se recordam de um plano intitulado Programa de Reforma

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da Despesa Pública, que tinha, pelo menos aparentemente, um objectivo: controlar essa mesma despesa pública. Para cumprir esse objectivo eram descritas 50 medidas. Não quero recordar todas, porque não devo causar mal-estar a ninguém, mas há algumas que não resisto a enumerar.
No Programa estava previsto que se deveria "reduzir drasticamente e de imediato a admissão de novos funcionários". Os números são, quanto a esta matéria, muito claros: em 1999, o saldo entre inscrições e aposentações era 25 503 funcionários; em 2001, era de 9114; em 2002, já graças à política deste Governo, baixou para 2764; e no 1.º trimestre de 2003 já se alcançou um resultado histórico, porque o saldo passou finalmente a ser negativo em 1589 funcionários.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Isto é, a nossa Administração, aliás, de acordo com o plano que tenho estado a referir, está finalmente a "emagrecer". Este é o caminho e o CDS não pode deixar de aplaudir que, finalmente, se esteja a pôr em prática a medida 2.ª do Programa de Reforma da Despesa Pública.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Ainda neste mesmo Programa estava prevista a moderação dos aumentos salariais e a flexibilização dos recursos humanos.
Quem, de facto, está a passar esta difícil e essencial medida do papel para a realidade é precisamente este Governo, actuando sobre os serviços do Estado, actuando sobre os institutos públicos, actuando, apesar da berraria tremenda como a que existiu quando se falou de fusão e extinção de institutos públicos.
Também nesse mesmo Programa estava prevista a reforma da gestão do Serviço Nacional de Saúde e a racionalização da sua despesa, combatendo o desperdício.
Nessa senda, o Governo e a actual maioria impulsionaram uma nova lei de gestão hospitalar, uma nova política do medicamento, em que se dinamiza o mercado dos genéricos, e foi aprovado um novo quadro jurídico para o estabelecimento das parcerias público/privado.
É este, quanto à saúde, o resultado mais importante de 365 dias em acção do XV Governo Constitucional. É esta a forma de poupar em euros e ganhar em eficácia. É esta a diferença entre a teoria e prática.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Mas ainda se pode continuar referindo mais medidas, por exemplo, aquelas que se referem à redução de dispêndios quanto a viaturas e deslocações. Como se pode notar pela leitura do relatório que aqui estamos a discutir, estas foram medidas tomadas com rigor, desde o início, pelo actual Executivo.
Os exemplos poderiam multiplicar-se. É caso para dizer que, se calhar, no plano da teoria até poderemos estar de acordo com o Partido Socialista, mas ao passo que o PS estudou, estudou, e pouco fez, este Governo está a actuar na despesa pública. É a diferença entre quem faz e aqueles que não fazem, e ainda por cima criticam os que estão a fazer.
É esta uma forma de actuar estruturada, pois a grande reforma que temos pela frente não é a do défice orçamental mas a da redução do peso do Estado na economia.
Que se saiba, o Estado não é um grande exportador e produtor de bens transaccionáveis. Por isso, era muito importante não continuar a insistir no erro típico da esquerda nacional.
Uma pequena economia como a portuguesa, muito sujeita aos condicionalismos exteriores, não pode estar a gastar mais do que aquilo que produz. Por isso, era preciso terminar com desequilíbrios que já pareciam insustentáveis. Por isso, era preciso fazer reformas. Por isso, tem de ganhar-se espaço para fazer poupança que permita a despesa, ou até perda de receita, verdadeiramente importante, isto é, aquela que consegue atrair o investimento.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O maior défice público só favorece os agentes externos à nossa economia, que assim ganham mais mercado para poderem vender os seus produtos. O défice público excessivo é, nos dias de hoje, inimigo das empresas nacionais, é o melhor meio para criar desequilíbrio externo.
Com o auxílio da melhoria da conjuntura internacional conseguiremos combater o problema conjuntural, mas só continuando o rumo seguido conseguiremos melhorar a nossa competitividade.
Está o actual Governo a proceder a todas estas alterações na pior altura do ciclo económico. Pois está, mas isso não é culpa nossa.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Bem gostaríamos que em anos anteriores se tivesse implementado este estilo reformista, mas não se implementou.
Bem queríamos que a situação na saúde, na educação, no sistema fiscal, na administração pública fosse já outra, mas não era.
Por isso, estamos agora a intervir, na altura de uma crise há muito anunciada. Por isso, estamos agora a semear para mais tarde colher. Por isso, estamos a inverter o caminho que nos levava ao abismo.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - E ainda por cima somos criticados, obsessivamente, por aqueles que dizem que temos uma obsessão. Para nos pouparem a isto era preciso que tivessem actuado mais cedo, que não se tivessem iludido com um crescimento do produto que estava baseado em despesa pública excessiva e endividamento generalizado.
Está o CDS de consciência tranquila porque sempre criticou o desvario. Estamos de consciência tranquila, pois, sabendo que não é possível mudar tudo de um dia para o outro, já estamos no caminho certo. É este o nosso programa para os próximos anos.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

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O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Estamos aqui para debater a execução e a orientação da despesa pública, no quadro estabelecido pela Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado.
No entanto, perante algumas intervenções, nomeadamente da parte do Governo e da maioria, parece-me mais que estamos a debater a desorientação da despesa pública.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Depois do modelo argentino, aparece-nos hoje o modelo Kumba Iala. Será este o benchmarking de alguns sectores da maioria?! Enfim, cada um tem as referências que pode, ou que lhe convêm.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, o debate pode ganhar consistência quando se adopte uma quádrupla perspectiva: a do cumprimento do estabelecido pelo Governo no Programa de Estabilidade e Crescimento, que a maioria parlamentar sufragou; a do cumprimento pelo Governo da resolução que a Assembleia da República aprovou em Janeiro último; a execução e concretização adequada dos objectivos orçamentalmente estabelecidos; e, last but not least, a do avanço no sentido da concretização de um caminho para o país desenvolvido que queremos ser, sendo que este Governo está a comprometer esse trajecto.
Este último ponto é extraordinariamente importante porque o debate em curso, baseando-se nos dados apresentados e analisados, deve-nos, sim, abrir os caminhos do futuro. E qualquer outra concepção será estreitar o âmbito do que foi aprovado na Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado.
Relembremos que no n.º 2 do artigo 57.º da referida Lei diz-se, nomeadamente, que: "Caberá ao Governo fazer a apresentação (…) e discutir as Grandes Opções da Política Económica"
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Concentrando-nos na resolução aprovada, nalguns pontos por unanimidade, neste Plenário, destaquemos a importância e a urgência da reforma da Administração Pública.
Ora, não temos uma reforma da Administração Pública nem sequer foi apresentada, até agora, qualquer estratégia nesse sentido. O que temos são desarticuladas fusões, amarrar os outros Ministros a fusões de institutos, que nem sabiam para quê, ou seja, o que temos são as confusões dos institutos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Srs. Membros do Governo, que saudades da Lei de Bases dos Institutos Públicos, elaborada por uma comissão coordenada por Vital Moreira - que produziu um trabalho brilhante e adequado -, e apresentada neste Parlamento pelo então Ministro Alberto Martins, na altura em que havia um Ministro que tratava das questões da Administração Pública.
Ora, além da já referida confusão dos institutos, a Sr.ª Secretária de Estado da Administração Pública, com chá e simpatia, continua a preparar as reformas, segundo nos disse. Até agora, reformas: zero!
E o que parece preocupar a actual Ministra é quase exclusivamente o estatuto dos funcionários públicos. Não conseguimos, aliás, esquecer - num contexto diferente, mas com um governo parecido com este (um pouco melhor ou menos mau) - os conflitos em torno do Novo Sistema Retributivo, tão responsáveis pelo aumento dos custos das administrações verificados durante o governo de Cavaco Silva, com efeitos em cascata nos governos seguintes.
Hoje, queremos ver o que se prepara com a obsessão de, primeiro, começar por discutir o estatuto dos funcionários, e depois logo se vê o que é que se há-de fazer à Administração Pública.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A pergunta importante a fazer à Sr.ª Ministra refere-se ao ponto 1 da resolução parlamentar (suponho que se lembram). A questão é esta: de que forma Portugal se tem empenhado na reavaliação do Pacto de Estabilidade e Crescimento, de modo a que, nos termos da resolução, "este instrumento não comprometa, antes beneficie, o crescimento e a coesão económica e social da União Europeia"? O que fizeram neste sentido, que diligências efectuaram, que propostas elaboraram e em que instâncias as discutiram? Foi só conversa de fim de tarde ou têm algum texto ou alguma acta do que fizeram?

O Sr. António Costa (PS): - Bem perguntado!

O Orador: - Por outro lado, é importante salientar o ponto 11, aprovado por unanimidade neste Plenário - desde o Sr. Deputado Diogo Feio ao Sr. Deputado Francisco Louçã -, no qual se reafirma "a necessidade de assegurar níveis estáveis e significativos de investimento público, instrumento fundamental para, no horizonte do PEC, garantir a absorção dos fundos estruturais comunitários, acelerar a modernização infraestrutural e promover a convergência real com a União Europeia". Espero que, quando votaram isto, estivessem a acreditar no que estavam a votar.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A despesa pública de um Estado como o nosso deve ser orientada por uma quíntupla preocupação: a de contribuir para um equilíbrio consolidado das contas públicas, obviamente sem manigâncias; a de reduzir gradualmente e de forma sistemática as despesas correntes com os encargos das administrações, aumentando a sua eficiência e a qualidade dos serviços prestados aos cidadãos e as empresas; a de orientar o investimento público, de forma a contribuir globalmente para o mais adequado desenvolvimento económico; a de apoiar selectivamente o investimento privado, dinamizador da maior parte dos sectores da economia, e garantir-lhe boas condições de funcionamento, o que não existe; a de assegurar o cumprimento das funções sociais do Estado, e o único local onde aumentam as despesas é no pagamento ao subsídio de desemprego e nas funções correlacionadas com esse pagamento.
Ora, Sr. Presidente, com o seu discurso e a sua prática (e o discurso conta, Sr. Deputado Tavares Moreira, os agentes económicos ouvem os discursos e, às vezes, até acreditam em quem não deviam acreditar), este Governo conseguiu reduzir brutalmente o investimento público e desencorajar o investimento privado, e não tem evidenciado qualquer capacidade de reformar a Administração Pública.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

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O Orador: - Para além da questão da redução do investimento, que demonstra alguma desorientação nas formas de execução da despesa pública, emergem diversas preocupações, das quais sublinharíamos, no momento actual e nas perspectivas futuras, as referentes aos custos da saúde.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Temos uma melhor política de preços na saúde e um melhor controlo orçamental? Não!
Efectivamente, segundo o Observatório da Associação Nacional de Farmácias, os custos dos medicamentos para os doentes subiram com a actual política. Mas o que queríamos referir é o facto de estarem a funcionar há meses dezenas de hospitais em sistema dito empresarial, estando ainda a ser definidos os preços pelos quais o Serviço Nacional de Saúde lhes irá pagar os serviços prestados. Isto para regime experimental já é um bocado longo e alargado!…
Parece-nos que tudo isto se perspectiva com um carácter aventureiro que não deixará de preocupar a Sr.ª Ministra das Finanças. Mas, Srs. Membros do Governo, há que lembrar-lhes também que não perceberam sequer, como se viu hoje, nomeadamente na maioria parlamentar, a importância da gestão das expectativas, atingindo a confiança dos portugueses os mais baixos níveis jamais verificados desde que se calcula esse indicador.

O Sr. José Magalhães (PS): - É verdade!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: No seu conjunto, o Relatório é omisso quanto à avaliação dos efeitos das políticas, cingindo-se a referências superficiais a aspectos organizativos e de funcionamento dos Ministérios, como bem sublinhou no relatório da Comissão de Execução Orçamental.
Em suma, o relatório é uma decepção. O Governo não evidencia perspectivas de futuro, a não ser a de sobreviver ele próprio. E quer sobreviver julgando que não há vida para além do Orçamento, mas tem de haver!
Com este relatório, evidencia-se, assim, a incapacidade do actual Governo não só em desenvolver como também em perspectivar o futuro deste país.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - O Sr. Deputado Duarte Pacheco inscreveu-se para pedir esclarecimentos, mas já tem pouco; por isso, a Mesa, como tem bom coração, dá-lhe mais 1 minuto.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Sr. Presidente, é uma solidariedade benfiquista, já que, nesta Casa, tanto se tem falado no Porto nos últimos dias.

Risos.

Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, não quero deixar de lhe colocar uma questão, mas estou a pensar como é que o hei-de fazer de uma forma muito directa, porque V. Ex.ª, para criticar a actual desorientação da despesa pública, nomeadamente ao nível da reforma do Estado e da administração pública, falou no magnífico valor acrescentado, no magnífico trabalho que o Sr. Ministro da Reforma do Estado e da Administração Pública dos tempos do governo socialista teria desenvolvido.
Sr. Deputado, a minha pergunta é muito concreta e muito directa, não lhe peço um discurso retórico ou retórica balofa, quero que vá directo à questão: qual o valor acrescentado que esse ministério trouxe para a reforma do Estado?

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Zero!

O Orador: - Que medidas concretas resultaram da actividade desse ministério?

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Zero!

O Orador: - Concretamente, o que é que aconteceu na reforma da Administração Pública e na despesa pública que tivesse resultado da actividade desse ministério?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, apesar de tudo, entendo dever responder, pela consideração que me merece o PSD, embora não pareça, e, nomeadamente, o Sr. Deputado Duarte Pacheco.
Tenho muito pouco tempo para analisar esse tema,…

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - É muito importante!

O Orador: - … porque quero que a minha amiga, colega e camarada Elisa Guimarães Ferreira ainda use da palavra, mas estou disponível para um debate com o Sr. Deputado em qualquer momento, embora, como V. Ex.ª sabe, nessa altura e durante algum tempo eu não tenha sido Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Diga uma medida! Diga uma!

O Orador: - Se o Sr. Deputado quiser pedir esclarecimentos, inscreva-se, porque também lhe poderei responder!
O que lhe quero dizer é o seguinte: V. Ex.ª ouviu mal, porque o que referi não foi isso - que levaria um longo debate e não tenho tempo neste momento -, foi outra coisa, foi algo de muito concreto e objectivo, a proposta de lei de bases dos institutos públicos, elaborada por uma comissão coordenada pelo Sr. Prof. Doutor Vital Moreira, que foi um trabalho exemplar, debatido nesta Assembleia e que baixou à comissão competente, tendo, depois, a Assembleia sido dissolvida.
Tratou-se de um trabalho extremamente bem feito, porque conheço bem o funcionamento dos institutos públicos, e até agora não apareceu nada, para além do "chá e simpatia" que a Sr.ª Secretária de Estado evidencia e do zero absoluto. A proposta de lei que o ministro Alberto Martins aqui trouxe estava extremamente bem feita e era uma perspectiva correcta de reforma dos institutos públicos. Ora, os senhores não têm qualquer perspectiva, fazem fusões que são autênticas confusões de institutos

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públicos. Nós tínhamos uma visão da administração pública e os senhores não têm qualquer visão.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Então, não fizeram nada! Fizeram um estudo!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, Srs. Deputados: Quero começar por confessar alguma perplexidade que me tem percorrido ao longo deste debate, porque o Governo e a maioria dizem que está em curso um processo de consolidação das finanças públicas, sem o qual, segundo o Sr. Deputado Tavares Moreira, cairíamos numa situação idêntica à da Guiné-Bissau - exemplo um bocadinho insólito e que, seguramente, a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças não acompanha, mas foi ele que o referiu e não nós -, e que em resultado desse processo de consolidação, já a partir dos próximos meses ou, como disse o Sr. Deputado Tavares Moreira, a partir de Outubro, a situação vai ser outra. Mas, Sr.ª Ministra, convenhamos que isto não corresponde nada ao que, na realidade, se está a passar.
Senão, vejamos: no que se refere à consolidação das finanças públicas, é certo, Sr.ª Ministra, que, em 2002, se reduziu o défice, mas, como diz o Banco de Portugal, reduziu-se o défice à custa de medidas extraordinárias, sem as quais ele teria alcançado um valor relativamente próximo ou até idêntico ao do ano anterior. Mas essas medidas são irrepetíveis, pelo menos na sua dimensão.
Ora, estamos agora perante uma execução orçamental, aliás, tal como previmos no debate do Orçamento do Estado, que aponta para quebras nas receitas muito, muito superiores à previsão. E a pergunta que lhe deixo é esta, Sr.ª Ministra: como é que V. Ex.ª consegue prosseguir este processo de consolidação orçamental no ano em curso sem novas medidas extraordinárias? Onde é que elas vão ser aplicadas? Vai reduzir ainda mais o investimento? Vai contrair ainda mais o poder de compra e o consumo interno, ou vai, Sr.ª Ministra - e gostava que me respondesse com clareza -, utilizar mecanismos que V. Ex.ª enquanto Deputada condenou, como seja a utilização do fundo de pensões dos CTT, transferindo-o para a Caixa Geral de Aposentações, arranjando, assim, uma receita extraordinária, mesmo à custa do equilíbrio futuro da Caixa Geral de Aposentações?
É este o caminho, Sr.ª Ministra? Mas se o caminho é, designadamente, este último, seguramente que isso não significa qualquer consolidação, significa até desequilíbrio de outras componentes da administração pública. Se isso fosse verdade, Sr.ª Ministra, contrariaria - e não quero crer que V. Ex.ª vá por esse caminho - aquele que foi o seu comportamento enquanto Deputada da oposição.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, a Sr.ª Ministra diz que estamos numa situação idêntica à de toda a Europa, mas a Sr.ª Ministra sabe que tal não é verdade, sabe que nós fomos o primeiro País a entrar em recessão!

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Fomos o primeiro a ter défice excessivo!

O Orador: - Pois fomos, Sr.ª Ministra! Pois fomos!
No 3.º trimestre de 2002 entrámos em queda, seguindo-se-lhe o 4.º trimestre, e os países que entraram em recessão, como a Alemanha, só entraram este ano! Fomos o primeiro país a entrar em recessão, com uma dimensão muito superior àquela que os outros países estão a ter.
Por outro lado, somos o país da União Europeia com o pior desempenho, incluindo já os 10 novos Estados-membros. Somos o país onde, no prazo de um ano, houve a maior taxa de crescimento do desemprego, Sr.ª Ministra, e somos o país onde as projecções de Primavera da Comissão Europeia apontam para uma quebra ainda maior de todos os indicadores da actividade, tal como acontece na síntese de conjuntura do INE. Não vejo, pois, Sr.ª Ministra, onde é que estão as razões para estarmos optimistas.
Sr.ª Ministra, estamos de acordo com a disciplina nas finanças públicas, mas não se pode confundir disciplina das finanças públicas com uma inflexibilidade tal no manejamento do único instrumento que temos na nossa posse para apoiar uma política anticíclica, que é o Orçamento do Estado, que acaba por agravar os sinais de crise da economia real; não podemos confundir disciplina das finanças públicas com um caminho para um défice zero a todo o custo, para a manutenção da quebra de meio ponto percentual no défice até 2006. Não, Sr.ª Ministra!
Aliás, não somos apenas nós que dizemos, são economistas da sua área, que, a curto prazo, não há muitas medidas possíveis. Todos estamos de acordo com isso. Portanto, a única medida, no curto prazo, para podermos apoiar a reanimação da economia é o abandono do caminho para o défice zero, sem abandono do rigor das finanças públicas, porque uma coisa nada tem a ver com a outra, repito, o abandono do défice na perspectiva do caminhar para o défice zero e uma flexibilização desse instrumento, apostando um pouco, simultaneamente, no investimento reprodutivo, no investimento eficiente, no investimento que anime a produção de bens transaccionáveis, e apontando para a uma alteração profunda do modelo de especialização da economia portuguesa.
Se não o fizermos, se continuarmos sempre a apostar em medidas que não tocam no essencial - e o essencial é uma economia dependente, subcontratada, de investimento estrangeiro que não cria valor acrescentado -, o que acontece, com sempre em cada crise da economia europeia ou da economia mundial, é que somos os primeiros a sofrer os efeitos da crise e os últimos a sair dela, apanhando uma "pneumonia" ainda antes de os outros se "constiparem", e a nossa "alta" é sempre depois de todos os outros já terem recuperado.
E isto acontece, Sr.ª Ministra, porque cometemos dois erros: apostamos sempre e só nas políticas monetaristas de contracção orçamental, com efeito na procura interna, e não apostamos, a prazo, numa política de consolidação e de alteração do perfil de especialização da economia portuguesa.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elisa Guimarães Ferreira, que também dispõe de pouco tempo.

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A Sr.ª Elisa Guimarães Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, Srs. Deputados: Vou tentar ser bastante sintética.
Sr.ª Ministra, vamos ver se nos entendemos relativamente ao que está hoje aqui em causa: quis o Governo, através de V. Ex.ª, desenvolver um conjunto de políticas que nos levantavam as maiores dúvidas em termos de resultados. Ora, neste momento, já há condições para fazermos um balanço.
Relativamente aos efeitos sobre a economia, o último relatório do INE é claro: no 1.º trimestre agravou-se a situação negativa da actividade, a procura interna manteve-se deprimida, o investimento deverá ter caído ainda mais acentuadamente, e, continuando por aqui fora, com uma perspectiva completamente negativa, que acaba por se materializar de uma forma gritante e violenta na situação do desemprego.
Mas vamos ver o que se passa relativamente ao objectivo central, ao equilíbrio das contas públicas. Sr.ª Ministra, tal como era previsível, o que se verifica no relatório oficial de Abril, comparando o ano de 2003 com o de 2002, é que as despesas correntes aumentaram 93 milhões de euros, as despesa com pessoal aumentaram 167 milhões de euros, as receitas dos impostos directos baixaram 43 milhões de euros e as receitas dos impostos indirectos renderam menos 34 milhões de euros. Isto é, com esta política e no que diz respeito àquele que era o objectivo central que a justificaria, o que acontece é que há mais despesas correntes e menos receitas.
Portanto, o problema central, que no ano passado o Governo não conseguiu resolver, agrava-se em 2003.
Ora, o famigerado défice de 2002 foi artificialmente corrigido e neste momento é generalizada a convicção, mesmo nos membros do Governo, que se chegou a 1,5% acima dos 2,8% ou 2,7%. Isto é, o défice efectivo resultante destas medidas, no ano passado, andaria à volta dos 4,3% ou 4,2%, se não fossem as vendas de património e todos os outros artifícios que entretanto foram introduzidos. Isto é do censo comum.
Sr.ª Ministra, no seu discurso - e tenho de a cumprimentar por não o ter distribuído, porque, de facto, não valia a pena, não diz nada de novo - referiu que havia uma expectativa por parte do maior partido da oposição relativamente àquilo que vinha hoje aqui dizer. Pois havia, Sr.ª Ministra!

O Sr. António Costa (PS): - Claro!

A Oradora: - É que nas suas próprias palavras estava claro, e ainda hoje o repetiu, que, sem medidas estruturais, não há volta a dar relativamente ao controlo da situação da despesa, que é aquilo que, de facto, queremos dominar.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - E se a Sr.ª Ministra não aproveita esta oportunidade para trazer aqui as tais medidas que queria explanar e consensualizar com a oposição, que eram medidas de fundo, plurianuais e de efectivo controle da despesa, então, perde uma oportunidade de ouro para, de facto, trazer a oposição, uma vez que já tem a maioria absoluta, a um controlo efectivo das razões que geram o despesismo na administração pública e no Estado.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Portanto, é esta incongruência que nos deixa absolutamente espantados.
A Sr.ª Ministra agarrou-se a uma "âncora", essa "âncora" soltou-se e a Sr.ª Ministra vai agarrada a ela, quando ela nos está a arrastar para o "fundo do mar"! E é o facto de se passar por uma oportunidade destas de controlo estrutural para o futuro e de o Governo não a utilizar, trazendo aqui o que pretende fazer de estrutural e consensualizando-o com a oposição, que nos deixa absolutamente perplexos.
Sr.ª Ministra, neste momento, quero dizer-lhe que as políticas estão erradas, os resultados estão à vista e é gravíssimo que continuemos permanentemente a insistir num discurso que já não resulta. E talvez já não estejamos a tempo de o corrigir de maneira a não termos uma situação real de desemprego galopante, de depressão económica gritante, de afastamento relativamente à média da União Europeia e de desequilíbrio agravado das contas públicas.
De facto, o Governo diz que se quer aproximar da média da União Europeia, mas aquilo que penso é que, de facto, o Governo já tanto reviu em baixa as suas expectativas que, agora, nos comparamos com a Guiné-Bissau. Sr.ª Ministra, não foi para isso que os portugueses a elegeram!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, vamos entrar na fase de encerramento do debate, dispondo cada partido de 5 minutos.
Para intervir, em nome do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Neto.

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Vem este debate sobre orientação de despesa pública na sequência do disposto na Lei de Enquadramento Orçamental, que determina que, anualmente, no decurso do mês de Maio, seja feito um debate com este conteúdo e alcance.
É bom que se diga, como, aliás, já aqui, hoje, foi sublinhado, que já no momento da discussão do Programa de Estabilidade e Crescimento para o período de 2003-2006 foi feita uma abordagem extensiva e profunda do alcance plurianual das diversas linhas de força de orientação da política económica deste Governo, alcance plurianual esse que, inclusive, extravasava o próprio período de vida da legislatura.
Vale isto para dizer que o argumento hoje aqui aduzido, à trouxe-mouxe, no sentido de que este debate não corresponderia, em rigor, àquilo que a lei postula, é um argumento falso que não corresponde minimamente à verdade e, mais do que isso, não traduz nem consubstancia aquilo que tem sido, de facto, um debate aberto e profundo em matéria de orientação da política económica, nomeadamente, no que concerne à despesa, tendo tido a sua origem já no ano passado, aquando da discussão do Orçamento rectificativo, para depois, mais tarde, no Orçamento do Estado para 2003, voltar novamente a ser sublinhado, e mais recentemente, aí com toda a profundidade, no decurso do debate do Programa de Estabilidade e Crescimento.
Trata-se, pois, de um falso argumento, deixando um pouco pairar no ar e no espírito de todos nós que, à míngua

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de argumentos de substância que possam tolher e bulir com a bondade de orientação do Governo em matéria de despesa pública, a oposição socorre-se destes expedientes adjectivos e formais para tentar pôr em cheque o acerto, a justeza e a bondade da orientação deste Governo em matéria de despesa pública.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Importa também, com brevidade, dizer que, em matéria de orientação da despesa pública consubstanciada neste relatório apresentado à Assembleia, há três linhas de força fundamentais que são elencadas.
Desde logo, no domínio da consolidação orçamental, que será o primeiro capítulo desse relatório, mantém-se o objectivo das metas do Programa de Estabilidade e Crescimento, em consonância, aliás, com os ditames do próprio Conselho Europeu de Março, designadamente no que concerne à redução da despesa estrutural, no montante de 0,5%, ao longo do ano e até 2006.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Esta é, de facto, a nota mais relevante em matéria de consolidação orçamental que importa aqui referir e que - também é bom dizê-lo - tem sido recorrentemente sufragada pelo próprio Banco de Portugal, nas diversas análises que tem feito sobre a matéria, designadamente no seu último relatório, de Março de 2003, em que, uma vez mais, sublinha o acerto e a correcção desta política de ajustamento orçamental empreendida por este Governo.
Um segundo capítulo no relatório tem a ver com a evolução recente das finanças públicas. Nesta matéria, há que reconhecer a realidade comezinha, irrebatível, de uma evolução das finanças públicas em todos os azimutes do planeta que determinou uma baixa das expectativas em matéria do crescimento económico. Isso aconteceu com os nossos parceiros da União Europeia, pelo que zurzir aqui, de uma forma recorrente e ostensiva, a sucessiva revisão em baixa dos diversos indicadores económicos é um argumento que também falece de razão, dado que ele corresponde apenas ao reconhecimento de uma realidade irrebatível, realidade essa que, como eu disse, é também comum e apanágio dos nossos parceiros europeus.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por último, quanto ao terceiro e último capítulo deste relatório sobre a despesa pública, há um aspecto fundamental e que contende com a necessidade de introduzir medidas concretas nos diferentes sectores do Estado, designadamente nos ministérios, e em particular no domínio da Administração Pública, que possam conduzir a uma redução da despesa pública e a uma melhor afectação dos recursos públicos.
Ainda recentemente, em Abril, um relatório do Fundo Monetário Internacional apontava exactamente nesse sentido.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Esse relatório não só comungava dos propósitos benfazejos, correctos e avisados do Governo em matéria de orientação da despesa, como dizia que, no domínio da despesa pública, e no da Administração Pública em particular, era fundamental reduzir a despesa e torná-la mais eficiente para que ela pudesse ser transposta para o sector dos bens transaccionáveis, apostando, aí sim, na retoma da economia por via do sector privado. Foi também isso o que a Sr.ª Ministra aqui veio hoje dizer.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Trata-se da mudança de atitudes da sociedade civil, que tem de deixar de ter uma postura bajulatória relativamente ao Estado, sempre à espera da subsídio-dependência,…

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … para ser mais ousada, para ter, de facto, mais iniciativa, mais capacidade empreendedora para vencer as dificuldades.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Só com esta linha de rumo, sem baquear, sem vacilar, sem hesitar, com mais crescimento, mais desenvolvimento e mais emprego, teremos um futuro melhor para todos nós. É esta a linha mestra que subjaz à orientação do Governo em matéria de despesa pública para 2003.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, em particular Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, Caros Colegas: Não é uma questão adjectiva, não é uma questão de forma, não é, sobretudo, uma questão secundária para ninguém a orientação da despesa pública em termos plurianuais! Que haja alguém que o diga, seja do Governo, seja apoiante do Governo, é a prova mais cabal de uma total ausência de perspectiva, de estratégia, de irresponsabilidade!
Nunca vi, em Parlamento algum, um debate de orientação da despesa pública que pudesse ser defendido em termos daquilo que já foi aprovado, e que não pode ser posto em causa, em termos daquilo que a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças logo disse, na sua intervenção introdutória, ou seja, que tudo isso já estava claro, aprovado, em execução, no sentido de dizer que vinha aqui, no fundo, passar uma hora ou duas connosco, sem qualquer consequência, sem que nada nos tivesse a dizer, o que, de facto, cumpriu.
Como já disse a minha colega Elisa Ferreira, a Sr.ª Ministra não entregou, sequer, o seu discurso, porque o seu discurso é zero quanto àquilo que interessa a este debate!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Não entregou o discurso e também nada trouxe de novo que não tivesse dito aqui já inúmeras vezes.

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Orador: - E para que a Sr.ª Ministra não fique com dúvidas, quero dizer-lhe que muitas das suas afirmações revelam que no Ministério das Finanças não há estratégia de qualquer espécie. Há contabilidade, há integridade, há empenhamento e até há muita coragem, mas estratégia até agora ninguém a viu.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Digo-lho eu e diz a comunicação social. Sabem-no os Srs. Deputados, que o dizem nos corredores,…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

… e sabe a Sr.ª Ministra, que nada traz aqui que tenha mais do que o horizonte do ano: a perspectiva de encerrar o ano com um número x, custe o que custar, seja qual for o truque contabilístico a usar.
A Sr.ª Ministra vem aqui, pela quarta vez em um ano, com uma revisão do cenário macroeconómico. Recorde-se do que nos dizia quando era Deputada!

A Sr.ª Elisa Guimarães Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sr.ª Ministra, essa revisão, um mês depois de a senhora a entregar, já está desactualizada. A perspectiva de crescimento é, porventura, zero.
E diz a Sr.ª Ministra que toda a Europa está à beira da recessão e que, portanto, nada há a fazer! Bom, a Sr.ª Ministra, no fundo, o que nos diz é que é a "Ministra da boleia da Europa"! É que se a Ministra das Finanças vem dizer-nos que nada há a fazer enquanto a Europa está em recessão, então aí é que se vê se, de facto, há alguma coisa na política ou não.
Mas não é verdade o que a Sr.ª Ministra diz! Relativamente ao crescimento, os valores são os seguintes: Portugal (na perspectiva da Sr.ª Ministra) - 0,5; Grécia - +3,6; Espanha - +2,0; Irlanda - +3,3; Finlândia - +2,2; Reino Unido - +2,2.
Sr.ª Ministra, isto é, pois, muito diferente daquilo que a senhora nos diz!
Quanto às políticas, gostaria de dizer-lhe o seguinte: o que nós hoje esperávamos era um debate que cumprisse a resolução que aqui foi votada, na Assembleia da República, em 8 de Janeiro; que nos dissesse como é possível, desejável e necessário fazer a consolidação das finanças públicas com a definição de missões e objectivos dos órgãos do Estado, da Administração Pública; como é que vai reestruturar, fazer a reforma da Administração Pública, que é tão urgente; que, ligado a esses objectivos, nos dissesse como é que vai medir os objectivos de maneira que se passe a fazer a política pelos resultados e não pelos recursos gastos, sem saber dos resultados. Era isso, Sr.ª Ministra, que deveria ter vindo aqui fazer, porque este debate era para isso, tendo em vista a orientação para o ano que vem.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

Protestos da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

O Orador: - A Sr.ª Ministra perguntará: "mas como é que isso se faz?" Sr.ª Ministra, eu gostaria de lhe oferecer um exemplo concreto, detalhado, de como se faz isto no Reino Unido. É um exemplo, entre muitos, para que veja como é diferente este mesmo exercício na Grã-Bretanha, que fica a milhas do seu. A senhora nem sequer sabe o que é fazer uma orientação da despesa pública numa perspectiva plurianual!
Gostaria, pois, Sr. Presidente, que fizesse chegar ao Governo este dossier de documentos. E gostaria de entregar um outro exemplar para que fique à disposição dos grupos parlamentares da maioria.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - É um desperdício de fotocópias! Toda a gente tem isso!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Já estava combinado. É pura operação mediática!

O Orador: - Para terminar, Sr.ª Ministra,…

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - É um exemplo típico de desperdício!

O Orador: - Admito que para V. Ex.ª tudo seja desperdício.
Sr.ª Ministra, para terminar, direi o seguinte: faço votos de que, no próximo ano, não venha com esta vergonha, com este não debate, que é um debate completamente frustrante e vazio, que a ninguém interessou, nem sequer à Sr.ª Ministra, mas que nos traga o cumprimento da resolução aprovada nesta Assembleia e que nos diga, efectivamente, como é que vai atingir resultados concretos na consolidação das finanças públicas em relação a matérias que são vitais para este país!
Lembro-lhe, se não tiver imaginação para mais, o cumprimento rigoroso…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tem de concluir a sua intervenção.

O Orador: - Termino imediatamente, Sr. Presidente.
Sr.ª Ministra, inspire-se na "estratégia de Lisboa"! Veja como, em 35 indicadores da "estratégia de Lisboa", estamos abaixo, e depois, diga-nos como é que, com a sua orientação, se poderá sobrelevar essa questão.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Creio não errar se disser que este debate foi pouco menos que decepcionante, embora ele tenha uma valoração política.
O Governo optou pelo monólogo, faz o monólogo, não quer verdadeiramente dialogar sobre a orientação da despesa pública. E faz um monólogo cheio de fé, um discurso de fé, tratando um pouco toda a oposição como se de hereges se tratassem. Mas eu reconheço que é um discurso fideísta, todo ele cheio de intencionalidade e de fé.
Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, ficámos sem saber, o que talvez tivesse utilidade, não sendo possível cumprir o défice orçamental de 2,4 - ele fixar-se-á, seguramente, acima deste valor, apesar da leitura que hoje se faz da composição desse défice -, quais serão as medidas extraordinárias previstas.

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Não queríamos que nos dissesse, ponto por ponto, exactamente, que tipo de operações estão previstas, mas, enfim, que nos indicasse qual a dimensão, o recorte, o tipo de medidas extraordinárias de que o Governo se socorrerá para o cálculo final, ou seja, qual a composição do défice orçamental. Creio que o País, os agentes económicos e a sociedade em geral estão interessados em saber isso.
Disse a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças que não ia "vender jóias da família", que iria "vender jóias de pechisbeque". Nós gostávamos de saber, que tipo de "jóias de pechisbeque". Não será, talvez, uma curiosidade excessiva saber de que tipo de joalharia, de que tipo de anéis está o Estado disposto a largar mão.
Também gostaríamos de ter sabido, do ponto de vista da revisão do Programa de Estabilidade e Crescimento, e, até, em geral, dos critérios do debate que perpassa na União Europeia e, certamente, no ECONFIN, como é que o Governo português vai interpretar com flexibilidade as regras financeiras, ou se, inclusivamente, vai sugerir algum outro tipo de regras para esse acordo monetário.
Gostaríamos de saber, e com várias incidências - e insisto na questão que lhe pus inicialmente -, se aquilo que é atribuído ao Sr. Ministro de Estado e da Defesa, numa reunião dos Ministros da Defesa dos Quinze, no sentido de querer exceptuar o investimento militar do cálculo do défice, no que era acompanhado por um bom número de Ministros da Defesa, é a opinião geral do Governo ou se há duas opiniões acerca do equilíbrio orçamental e da inclusão, ou não, de algum tipo de investimento público na excepção ao cálculo do défice.
Independentemente das alterações do cenário macroeconómico, também gostaríamos de ter ficado a saber neste debate que tipo de graduação tem o Governo em relação à espera da retoma internacional. A recessão internacional existe, o Governo tarde reconheceu que Portugal está, de facto, em recessão - os números de crescimento previstos estão perto do zero e essa é uma realidade hoje indesmentível -, que está a par com o crescimento do desemprego, que está a par com a desaceleração económica.
Disse a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças que não vai tirar despesa pública de efeito fácil e de conjuntura. Mas que outro tipo de medidas estruturais, que não passem meramente pela ortodoxia orçamental, são possíveis para essas medidas de contraciclo?
Dizia a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças há pouco tempo que, nestas circunstâncias, desejaria ter medidas anticíclicas, mas não podia tê-las. Então, quais seriam essas medidas anticíclicas? É política que não divisamos no actual Governo.
Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, com o devido respeito, é por isso que entendemos haver um monólogo governamental. Há um discurso de fé, há um discurso de não vacilação - provou-o quando disse "não vou mudar de rumo" -, mas, convenhamos que, nestas circunstâncias, não há esclarecimento, não há debate e tudo aquilo que poderia ser debate de perspectiva, de alteração de estratégias está, neste momento, confinado a uma não existência. Não há, pura e simplesmente, debate. Creio que há uma estratégia que o Governo segue, mas que não será algo entendível pela população, que não será algo entendível pelo povo português, por aqueles que hoje sofrem no desemprego, por aqueles que hoje sofrem com o congelamento salarial, por aqueles que não vêem oportunidades de investimento.
Nestas circunstâncias, creio que o Governo não só se penaliza a si próprio como também se responsabiliza por uma orientação económica que eu não creio ser apenas de "arrumar a casa". Penso que, hoje, a maior parte dos portugueses entendem que não se está apenas a "arrumar a casa", está-se, em muitas circunstâncias, a "deixar vir a casa abaixo". E este é um ponto político que o Governo não comenta nem debate, tal a inflexibilidade da orientação assumida.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Duque.

O Sr. Luís Duque (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: No respeito e de acordo com a Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto, a Lei do Enquadramento Orçamental, nascida da necessidade, já em 2001 sentida, de um maior controlo da despesa pública, veio o Governo a este Plenário para debate, tendo prévia e atempadamente enviado o relatório, devidamente fundamentado, previsto na lei, debate esse que o Partido Socialista tentou inviabilizar. Não o tendo conseguido, tratou então de o desqualificar.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É notória e, em nosso entender, essencial, a prioridade dada pelo Governo ao défice orçamental. E ainda que considerado agora por alguns, quase depreciativamente, como obsessão, há bem pouco tempo era por todos tido como o problema essencial, independentemente das imposições da Europa nessa matéria. E esta é uma questão que claramente nos separa.
A maioria defende as virtualidades de um Orçamento equilibrado, enquanto a oposição, tendencialmente, prefere um assinalável défice público, o que, aliás, criou no passado, por ser excessivo, todo um ambiente favorável a um desleixo da despesa em geral, nas empresas, na família, no Estado.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Um Estado a viver acima das nossas possibilidades, um défice comprometedor para as gerações futuras.
Não se aproveitou, na devida altura, todo um quadro favorável à promoção da consolidação orçamental e o resultado foi o descontrolado défice excessivo em que se encontravam as finanças públicas em 2001.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - E como afirmou em recente entrevista o Sr. Governador do Banco de Portugal - e já aqui citado -, "a situação objectiva é que havia um desequilíbrio orçamental muito acentuado e que era preciso corrigir", tendo referido ainda não comportar a politica orçamental muitas alternativas.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

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O Orador: - E como não comporta muitas alternativas, o actual Governo decidiu avançar com um conjunto de medidas, visando reduzir o crescimento da despesa pública, preocupado com a rigorosa utilização dos recursos disponíveis.
Com toda a determinação, foi estabelecido para o défice público um objectivo, que, apesar da revisão em baixa dos cenários macroeconómicos que serviram de base à elaboração do Orçamento, acreditamos que será cumprido. E será cumprido tal como em 2002, quando muitos e respeitados analistas não acreditavam que fosse possível fazê-lo.
Deu ainda o Governo um importante sinal de credibilidade, em nada prejudicado pela conjuntural necessidade do recurso a medidas de carácter excepcional, que numa primeira instância devemos aceitar.
Entretanto, desencadeou as reformas estruturais que possibilitarão, com toda a certeza, uma posição próxima do equilíbrio orçamental em 2006.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Um equilíbrio para retomar a confiança.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: O Governo deu mais um exemplo de respeito por esta Assembleia, de frontalidade e de coragem, aliás como é timbre das intervenções da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, e compareceu hoje, aqui, no estrito cumprimento da Lei de Enquadramento Orçamental, de acordo com a interpretação objectiva do seu artigo 56.º, não com o subjectivismo com que alguns pretendem interpretar essa norma, a debater a situação da despesa pública, uma situação nova nesta Câmara.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em nada tendo contribuído para a crise, prejudicado na sua acção por um ciclo económico claramente desfavorável, ainda assim reafirma o Governo a intenção de cumprir o limite do défice orçamental a que se impôs e que é imposto pelo tratado que institui a Comunidade Europeia.
Apresentou o Governo trabalho. Primeiro, com a actualização, para o período 2003/2006, do Programa de Estabilidade e Crescimento, assentando a estratégia política e económica "na estabilidade orçamental, nas reformas estruturais do sector público e nas reformas económicas".

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Apresentou medidas de política económica e definiu objectivos claros e de programação financeira de médio prazo amplamente debatidos e apresentou também um relatório exaustivo e coerente, possibilitando a correcta avaliação das medidas e resultados da política de despesa pública, onde se evidencia o esforço para a controlar, prestando assim o Estado a maior ajuda que pode dar à economia.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Que o Governo, e particularmente V. Ex.ª, Sr.ª. Ministra, mantenham essa mesma determinação e coragem até ao fim, no esforço de saneamento das finanças públicas e desenvolvimento da economia que até agora vem prosseguindo!
Escreveu Eça de Queiroz: "Se vamos agravar o défice, se não andamos prudentemente na questão financeira, se lançamos indevidamente impostos, se não cortamos certas despesas, se não coibimos certas necessidades, preparamos a banca rota apara as gerações infelizes que hão-de vir".

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Descontado o exagero próprio do estilo, a preocupação mantém-se século e meio mais tarde.
E por se manter e ser necessário responder de imediato, sob pena de não haver outra oportunidade, está, como V. Ex.ª afirmou, Sr.ª Ministra, o Governo no bom caminho.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. António Filipe (PCP). - Bem me parecia que esta política era um pouco queiroziana!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Membros do Governo: Uma primeira ideia que ressalta deste debate, que, aliás, foi amplamente confirmada pelo Governo durante a discussão, é a de que ele constitui em si mesmo uma espécie de oportunidade perdida.
De facto, e sem prejuízo dos dispositivos formais relativos ao enquadramento orçamental, designadamente ao artigo 57.º da Lei de Enquadramento Orçamental, a verdade é que era exigível que o Governo tivesse respeitado o espírito e os objectivos dessa mesma Lei de Enquadramento Orçamental e que não tivesse optado por se limitar, como fez, a uma mera interpretação formal dos termos dessa mesma legislação.
Na verdade, o Governo apresentou para discussão um relatório que, em si mesmo e no fundamental, constitui uma espécie de somatório de elementos que dizem sobretudo respeito à evolução estatística da execução orçamental. E manda a verdade dizer que o que seria de esperar, o que seria politicamente exigível ao Governo era termos feito aqui, hoje, um verdadeiro debate sobre a orientação da despesa, no fundo uma análise crítica que permitisse, desde já, perspectivar correcções e, sobretudo, lançar as bases em que se deveria centrar a elaboração do próximo Orçamento do Estado.
Mas não foi este o debate que o Governo quis, do que se pode concluir legitimamente, Srs. Membros do Governo, Sr.ª Ministra, que o Governo decidiu fugir do debate.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - Uma segunda nota, que o relatório governamental mostra e que o debate veio confirmar, tem a ver com a incapacidade, cada vez mais visível, de o Governo formular previsões sobre a evolução macroeconómica do País. Fazendo orelhas moucas a todas as advertências feitas ao longo de quase um ano, fazendo orelhas moucas, por exemplo, ao que o PCP aqui disse sobre o irrealismo das projecções macroeconómicas que serviram de base ao Orçamento do Estado para 2003, fazendo orelhas moucas de tudo e de todos, o Governo insiste em usar previsões que logo a seguir, diria mesmo no dia seguinte, são desmentidas

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pela realidade. Os erros de previsão começam a ser tão permanentes, começam a ser tão sistemáticos, começam a ser tão repetitivos, que se chega ao ponto de as estimativas incluídas no relatório do Governo, que aqui hoje discutimos, estarem já ultrapassadas pela realidade, que é, diga-se, bem pior do que essas estimativas.
Uma terceira nota conclusiva deste debate tem a ver com a confirmação de que o Governo vai optar por insistir no erro, vai continuar a manter-se cada vez mais isolado na sua insistência obsessiva de controlo orçamental das contas públicas. Apesar das opiniões avisadas de Deputados economistas, alguns dos quais se supunha mesmo estarem bem próximos ainda da Sr.ª Ministra das Finanças, o Governo vai manter a sua obsessão pelo cumprimento do défice quase zero. Mesmo que a economia caminhe de degrau em degrau para a recessão, como, aliás, foi aqui ontem bem demonstrado no decorrer da interpelação sobre politica económica solicitada pelo PCP, da qual registamos a ausência, que lamentamos profundamente, da Sr.ª Ministra das Finanças.
O Governo vai, assim, manter o seu fundamentalismo orçamental, mesmo que esteja a ultrapassar-se pela negativa, ameaçando até nem sequer realizar o investimento público programado e comprometendo mesmo a possibilidade de se utilizarem plenamente fundos comunitários, como ontem foi aqui afirmado e confirmado no relatório da Comissão de Gestão do III Quadro Comunitário de Apoio.
O Governo insiste na sua cegueira orçamental e tenta "lavar as mãos como Pilatos" sobre as consequências sociais, o acréscimo do desemprego, o renascer do problema dos salários em atraso e das bolsas de pobreza, porque é a isto que, na realidade, a obsessão orçamental e a ausência de políticas económicas autónomas e próprias está a conduzir cada vez mais o País.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Sr. Presidente, não sei bem por onde começar esta minha intervenção final, porque me proponho responder, na medida do possível, às observações que me foram feitas.
E a primeira observação vai no sentido da inutilidade deste debate.
Srs. Deputados, este debate não foi nem melhor nem pior do que qualquer outro debate desta natureza, foi apenas original, pois foi a primeira vez que teve lugar. Nunca houve, na Assembleia da República, debate algum sobre esta matéria!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Magalhães (PS): - Nós sabemos. Foi o Deputado João Cravinho que propôs este debate!

A Oradora: - Daí a dificuldade dos Srs. Deputados: não têm termo de comparação. Mas vamos todos trabalhar para que da próxima vez seja melhor. Admito que sim.
Mas os Srs. Deputados estão esquecidos de um ponto essencial: o de que o grande conteúdo deste debate teria sentido se não tivéssemos discutido, há três meses, o Programa de Estabilidade e Crescimento. E essa discussão deveria, provavelmente, ter sido feita hoje.
Há vários pontos que eu não posso deixar passar em claro, nomeadamente as afirmações feitas pelo Sr. Eng.º João Cravinho.
Sr. Deputado João Cravinho, é muito mau começarmos por discutir um título. É o PS no seu melhor: a aparência e não o conteúdo.

Risos e aplausos do PSD e do CDS-PP.

Depois, tanto o Sr. Deputado como a Sr.ª Deputada Elisa Guimarães Ferreira falaram sobre vários aspectos da reforma da Administração Pública e do problema da despesa pública em termos plurianuais.
Quanto à reforma da Administração Pública, Sr. Deputado, eu não nego que, por exemplo, a proposta de reforma de tributação do património beneficiou de inúmeros estudos já existentes no Ministério das Finanças. Tratava-se de estudos feitos, mas nunca executados. Nós beneficiámos deles e tomámos a decisão.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - No que respeita à Administração Pública nem isso. Não havia nada, absolutamente nada! Mas os Srs. Deputados estão ansiosos, não por estarem desejosos de uma reforma da Administração Pública, mas sim porque não têm por onde a criticar.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Exactamente!

A Oradora: - Então lá vem massa crítica para criticar!
Mas quanto a estudos que tenham deixado, nem rastos! E o Srs. Deputados achavam normal que, ao fim de um ano, já houvesse a reforma da Administração Pública!
Srs. Deputados, desiludam-se, porque vai haver reforma da Administração Pública!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quanto a virmos à Assembleia discutir a orientação da despesa plurianual, lamento dizer, Sr. Deputado João Cravinho, que o senhor era a última pessoa que podia ter falado nisso neste Plenário, porque o senhor é o responsável pela maior irresponsabilidade financeira cometida neste país, que foram as SCUT, que o senhor nunca trouxe a esta Assembleia!. Nunca cá veio com elas!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Portanto, o Sr. Deputado será a última pessoa que pode falar sobre a necessidade da discussão da orientação da despesa plurianual, uma vez que é o autor da mais grave despesa plurianual, feita sozinha, no seu gabinete.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E a Sr.ª Deputada Elisa Guimarães Ferreira poderia ter evitado a expressão "oportunidade de ouro", que fica mal a si e a todo o Partido Socialista. Oportunidade de ouro, Sr.ª Deputada?! Oportunidade de ouro foi a vossa! Vocês é que tiveram oportunidade de ouro!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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A Sr.ª Elisa Guimarães Ferreira (PS): - Só nos faltou a maioria!

A Oradora: - Vocês tiveram a entrada de Portugal na moeda única, tiveram o benefício da redução da taxa de juro, e o que é que fizeram? Aumentaram a despesa pública inexoravelmente, para nós não termos a mínima margem de manobra para, em momento de recessão, a podermos reduzir.
Foi essa a oportunidade de ouro que os senhores tiveram e que delapidaram completamente!

Aplausos do PSD e do CDS-PP

O Sr. Deputado Lino de Carvalho também foi um bocadinho atrás do discurso oficial da oposição e cai, rigorosamente, numa contradição extraordinária, que é a do artifício da consolidação orçamental.
Os senhores chegam ao ponto de dizer que, se não tivessem sido as receitas extraordinárias, se não tivesse acontecido isto, se não tivesse acontecido aquilo, o défice não teria sido este!. Pois, mas o problema é que foi, Sr. Deputado! Lamentavelmente para vocês, o défice foi apenas de 2,6%.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Só que isso não significou melhoria nenhuma!

A Oradora: - Srs. Deputados, vamos ver se nos entendemos. O que é que significa o défice? O défice mede a necessidade de financiamento do sector público administrativo. E a necessidade de financiamento do sector público, Sr. Deputado, não foi 4, nem 5, nem 3, foi 2,6! Por mais que vos custe, foi esse!
Feita como? O Sr. Deputado diz que foi com manigâncias. Contudo, a manigância não provoca recessão e o senhor diz que a consolidação orçamental provocou recessão. Em que ficamos, Sr. Deputado?

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Não sabe!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - A Sr.ª Ministra só ouve metade!

A Oradora: - São manigâncias ou é uma consolidação a sério? Se é uma consolidação a sério, o senhor fica com a sua tese; se são manigâncias, então não provoca, nunca na vida, recessão.
O Sr. Deputado incorreu também noutra contradição: diz que tenho uma obsessão inflexível sobre o défice e, seguidamente, acusa-me de obter receitas extraordinárias. Sr. Deputado, isso é uma incoerência nos seus termos,…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Não é!

A Oradora: - … porque a redução do défice orçamental faz-se por uma de duas vias: ou se aumenta a receita ou se reduz a despesa. Aumentou-se a receita na dimensão que se considerou razoável, reduziu-se a despesa no montante que se considerou razoável e o restante, para que a necessidade de financiamento do sector público não fosse excessiva, para que não nos endividássemos mais, foi obtido à custa de receitas extraordinárias, o que evitou aumento excessivo de impostos e redução excessiva de despesas. E os senhores criticam isto!?
Em que ficamos, Srs. Deputados? Queriam mais impostos? Queriam menos despesa? Ou queriam mais endividamento? Os senhores ou querem mais endividamento, ou menos despesa, ou mais receita, mas não podem querer tudo ao mesmo tempo.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Srs. Deputados, vamos ver se nos equilibramos nas críticas, porque, efectivamente, assim não vamos seriamente a lado nenhum!

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Srs. Deputados, passo a referir-me às medidas para combater a actual situação.
Sr. Deputado Luís Fazenda, para não que não volte a dizer que estou sozinha na orientação da política económica que estamos a seguir, leia, se faz favor, a página 44 do Boletim trimestral do Banco de Portugal. A página 44 toda, Sr. Deputado, do princípio ao fim! Depois, não torne a dizer que estou sozinha!

Risos e aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quanto às medidas que têm sido tomadas, o Sr. Deputado está a esquecer-se, por exemplo, das medidas de natureza fiscal, no sentido de incentivar o investimento, como o crédito fiscal ao investimento, o novo Programa Operacional da Economia, ou das medidas na área da tributação do património, em termos de medidas fiscais, no momento de contracção orçamental. Portanto, não há uma obsessão tão grande do défice como os senhores dizem, porque senão estas medidas não poderiam ter sido tomadas!

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Portanto, para os senhores, se não houver despesa nada se resolve. Nada de mais errado, do meu ponto de vista, pelo que continuamos na senda que defendemos como correcta.
Quanto à discussão dos objectivos deste relatório, não tinha o menor sentido ou possibilidade fazer-se qualquer discussão diferente daquela que foi feita quando o Orçamento, por motivos que os senhores bem sabem, porque não deixaram nada preparado nessa matéria, não foi organizado por objectivos. Portanto, se não foi organizado por objectivos, efectivamente, não era possível discutir-se, neste momento, essa matéria.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - É verdade!

A Oradora: - Para terminar, queria apenas agradecer ao Sr. Deputado João Cravinho o dossier que nos distribuiu. Considerei que seria um desperdício mandá-lo fotocopiar e porque o senhor sabe que seria natural que eu o tivesse.
Sr. Deputado João Cravinho, queria apenas deixar-lhe uma pergunta: o senhor defende uma Administração Pública portuguesa semelhante à inglesa?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado João Cravinho pediu a palavra para defender a consideração devida à sua bancada e também a sua honra pessoal.
Tem a palavra. Dispõe de 3 minutos.

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, tenho a maior consideração pessoal por V. Ex.ª e tenho-a como uma pessoa séria e íntegra. Por isso, conhecendo-a muito bem, só posso atribuir as afirmações que fez em relação a esta bancada e a mim próprio à perturbação profunda em que está.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Oh!

O Orador: - Sr.ª Ministra, relativamente à "oportunidade de ouro", quando se tem maioria parlamentar não se precisa, sequer, de ter razão, como amplamente tem sido demonstrado. Basta ter o poder do número, que na bancada do partido de que V. Ex.ª faz parte passa por ser justificação para tudo, até contra a lei de enquadramento do Orçamento.
Quanto a um aspecto especial que a Sr.ª Ministra aqui focou, que foi o facto de me dizer que sou responsável pelo mais nefando crime ou desordem financeira…

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Não utilizei a palavra "crime"!

O Orador: - … de que alguma vez há memória neste país, quero dizer-lhe o seguinte: as SCUT foram lançadas e concedidas mediante decreto-lei que esteve à disposição de V. Ex.ª para efeitos de ratificação. Nunca V. Ex.ª ou qualquer outro elemento da sua bancada teve a coragem, se atreveu sequer a pedir a ratificação, porque sabia que seria derrotado, apesar de produzir abundantes afirmações.
Em segundo lugar, saí do governo em Outubro de 1999, deixei 12 concursos lançados, adjudiquei 3, e a lei de enquadramento do Orçamento à época nada estabelecia quanto à avaliação desses concursos todos e quanto à possibilidade de o Parlamento sobre eles se pronunciar. Saído do Governo, empenhei-me - como a Sr.ª Ministra muito bem sabe, porque foi testemunha directa disso -, juntamente com outros Deputados, em alterar a lei do enquadramento. Portanto, por proposta minha, o regime que hoje está inscrito, precisamente nos artigos 15.º a 17.º, permite um mais completo e transparente exame desse tipo de contratos.
Sucede que a Sr.ª Ministra pediu a suspensão dessa medida precisamente em 2002, que era o primeiro ano em que poderia ser feito. E, sendo assim, 2003 para 2004 será o primeiro ano em que se aplicará essa medida.
Queria pedir à Sr.ª Ministra, encarecidamente, que fizesse essa avaliação como a lei manda e que a trouxesse ao Parlamento. Antes disso, Sr.ª Ministra, antes de cumprir o seu trabalho, tenha a hombridade - no caso, a feminilidade - de reconhecer que o que acaba de dizer é profundamente injusto e falso.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para dar explicações, a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças. Também dispõe de 3 minutos.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Cravinho, não negou nada daquilo que afirmei.

O Sr. João Cravinho (PS): - Não neguei?

A Oradora: - Não, Sr. Deputado, não negou.

O Sr. João Cravinho (PS): - Então, nego agora!

A Oradora: - O que o Sr. Deputado disse foi que tinha tomado uma medida com base num decreto-lei e aquilo que eu disse foi que o senhor nunca veio à Assembleia discutir o assunto. Se tomou a medida com base num decreto-lei, é natural que não tenha vindo à Assembleia. Portanto, confirmou aquilo que eu disse.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Por outro lado, o Sr. Deputado disse que tomou umas medidas, mas que depois saiu do governo... Sempre pensei que o senhor tinha sido solidário com o governo, pelo que tanto fazia o senhor ter saído como estar lá.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quanto à "oportunidade de ouro", reafirmo aquilo que disse: houve uma oportunidade de ouro neste país que foi desperdiçada pelo vosso governo. Senão, Sr. Deputado, vejamos como estava a situação em Portugal e em Espanha quando cessaram funções os governos de Cavaco Silva e de Filipe González e como é que estão Portugal e Espanha depois de Aznar e de Guterres.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para defesa da sua honra pessoal, a Sr.ª Deputada Elisa Guimarães Ferreira.

A Sr.ª Elisa Guimarães Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, gostava de lhe colocar, muito claramente, uma questão que responde à interpelação directa que me fez.
Neste momento, penso que é altura de os senhores assumirem as vossas responsabilidades. No governo anterior algumas coisas correram melhor, outras correram pior.

Risos do PSD e do CDS-PP.

Os senhores estão no Governo há 13 meses.
Antes de serem governo, candidataram-se a um conjunto de medidas que iam levar o País à convergência com a União Europeia e à correcção do défice estrutural, e os portugueses perceberam que os senhores sabiam o que iam fazer.

Vozes do PSD: - Exactamente!

A Oradora: - Agora, constatamos que a sua resposta é muito simples: se o governo anterior deixou as medidas

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todas preparadas, como no caso da legislação sobre o património, os senhores executam-nas; se o governo anterior não deixou as medidas preparadas, os senhores não têm a obrigação de as executar.
Sr.ª Ministra, houve alternância democrática para que os senhores fizessem as vossas próprias medidas. E, passados 13 meses, na primeira oportunidade que têm para nos dizer claramente quais são as medidas estruturais que o Governo se propõe implementar para corrigir, efectivamente, o problema do despesismo nacional e do défice e para que se estabeleça convergência entre os principais partidos nessas decisões, aquilo que a Sr.ª Ministra tem para dizer é que não fez nada, não tem nada para propor, porque o governo anterior não lhe deixou um legado para executar.
Podia dizer que tinha as medidas a meio, que tinha as medidas a dois terços, mas, Sr.ª Ministra, não ter nada para apresentar no primeiro debate sobre a tal convergência inter-partidária, que os senhores não necessitam porque têm maioria neste Parlamento - e têm-na utilizado para coisas muito menos dignas do que esta -,…

Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

A Oradora: - … no sentido de acreditarmos que estamos no caminho da correcção dos problemas estruturais do País, é profundamente grave! Insistir na mesma política, quando o País está a cair a pique, é muito grave e é isso que nos preocupa e que temos obrigação de denunciar!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para dar explicações, a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Sr. Presidente, creio que a Sr.ª Deputada Elisa Ferreira não fez nenhuma defesa da honra, mas apenas uma pergunta, a que não deixo de responder.
Em primeiro lugar, Sr.ª Deputada, assumimos as nossas responsabilidades. Espero que tenham a hombridade - ou a feminilidade, como disse o Sr. Deputado João Cravinho - de assumirem as vossas.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Já há pouco a Sr.ª Deputada utilizou a imagem do fundo do mar e agora referiu que estamos a cair a pique. Está completamente enganada, Sr.ª Deputada!

A Sr.ª Elisa Guimarães Ferreira (PS): - Não estou, não!

A Oradora: - Está! Sabe porquê? Porque já estávamos no fundo do mar!

A Sr.ª Elisa Guimarães Ferreira (PS): - Não, não estávamos!

A Oradora: - Como já estávamos no fundo do mar, não há forma de afogar!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos da Deputada do PS Elisa Guimarães Ferreira.

A Sr.ª Deputada está convencida que estávamos a boiar, mas estávamos à beira do afogamento!

A Sr.ª Elisa Guimarães Ferreira (PS): - E agora estamos melhor ou pior?

A Oradora: - Sr.ª Deputada, penso que há um ponto em relação ao qual não devia minimamente falar, se quisesse ser solidária com o anterior primeiro-ministro, que é na reforma do património - um primeiro-ministro que falou durante seis anos sobre o fim da sisa, que disse que a sisa era estúpida, mas que acabou primeiro do que a sisa!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Penso que é absolutamente extraordinário que a senhora venha falar nisso!
Sr.ª Deputada, veja a quantidade de reformas que já apresentámos a este Parlamento, que nada têm a ver com as coisas que os senhores tinham feito, como a reforma da Administração Pública, que a senhora verá, dentro em pouco, nos calendários…

A Sr.ª Elisa Guimarães Ferreira (PS): - Quais?

A Oradora: - … que nós próprios definirmos, se nos dá licença!
Quando a senhora diz que nada temos para apresentar, sei o que tem em mente. Os Srs. Deputados estavam à espera de que chegássemos aqui, hoje, e disséssemos, à boa maneira socialista: "Olhem, nós aprovámos há meia dúzia de meses, ou há três ou quatro meses, o Programa de Estabilidade e Crescimento, mas, agora, é outro".
Sr.ª Deputada, o que aqui vim dizer é rigorosamente o contrário. O que, hoje, vim dizer é que mantemos o Programa de Estabilidade e Crescimento.

Aplausos do PSD e do CDS-PP, de pé.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Ministra e demais Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, declaro encerrado o debate sobre a orientação da despesa pública.
Antes de passarmos às votações regimentais, dou a palavra ao Sr. Deputado Bernardino Soares para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, a minha interpelação é sobre a orientação dos trabalhos e tem a ver com a questão do parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados relativo ao Código do Trabalho.
Lido o parecer, que vem acompanhado de uma carta do Sr. Conselheiro que preside à Comissão Nacional de Protecção de Dados em que nos dá nota das diversas diligências da Comissão junto do Governo, em Julho de 2002 e em Setembro de 2002, ocasiões em que lhe foi garantido que a audição legalmente prevista não deixaria de ser feita, e após contactos com a própria Comissão de Trabalho e Assuntos Sociais no mesmo sentido, causa alguma estranheza que, estando esta última informada de que a Comissão Nacional de Protecção de Dados iria proceder à votação do respectivo parecer no dia 20 de Maio, o Código do Trabalho tenha sido enviado em data anterior para o Sr. Presidente da República.

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De qualquer forma, passo à questão sobre a qual quero apelar ao Sr. Presidente.
Esta matéria foi discutida na Comissão de Trabalho e Assuntos Sociais, onde, independentemente do conteúdo do parecer e das opiniões sobre ele, o PCP e outros partidos, incluindo o PS, propuseram que o parecer fosse enviado ao Sr. Presidente da República, seguindo o caminho do decreto da Assembleia que aprova o Código do Trabalho, e ao Tribunal Constitucional, que, como é público, e a Assembleia já foi informada desse facto, está a apreciar a constitucionalidade de alguns dos artigos do referido diploma. Ora, esta proposta foi rejeitada pela maioria.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Oh!…

O Orador: - Portanto, como julgo ser intolerável que quer o Sr. Presidente da República quer o Tribunal Constitucional não tenham recebido este parecer, que é importantíssimo para a análise do diploma em referência, solicito ao Sr. Presidente da Assembleia da República que seja o próprio Presidente da Assembleia da República a enviar o mesmo àquelas duas entidades para suprir esta falta da maioria.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Bernardino Soares, o parecer dirige-se à Assembleia da República. Portanto, é para conhecimento da Assembleia da República. É apenas à Assembleia que se coloca a questão do conhecimento.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Claro!

O Sr. Presidente: - No entanto, quando qualquer diploma é remetido ao Tribunal Constitucional em processo de fiscalização preventiva da constitucionalidade, todos os elementos do processo são obrigatoriamente solicitados pelo Tribunal e a ele são remetidos.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Ele não sabia!

O Sr. Presidente: - Ainda ontem assinei o ofício que remete para o Tribunal Constitucional toda a documentação referente ao processo do diploma em causa, incluindo o documento a que fez alusão.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O Deputado Bernardino Soares não sabia!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, permite-me que interpele a Mesa?

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Peça desculpa!

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, registo esse envio por parte de V. Ex.ª, que julgo ser o correcto, mas isso só acentua a minha estranheza quanto ao sentido de votação dos partidos da maioria em sede da Comissão de Trabalho e Assuntos Sociais.

Aplausos do PCP.

Vozes do BE e de Os Verdes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ao Tribunal Constitucional é enviado todo o processo, não só todos os documentos como também as Actas das sessões. Devo dizer que foi enviado um grande volume de papel.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, a maioria votou contra, e muito bem, porque conhece as regras.

Risos do PCP.

E, segundo as regras, a solicitação do Tribunal Constitucional, são enviados os elementos no momento e pela forma próprios.

Protestos do PCP.

V. Ex.ª, Sr. Deputado, veio colocar a questão do envio do parecer ao Sr. Presidente da República juntamente com o decreto da Assembleia para promulgação, mas deve conhecer as regras…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Não conhece!

O Orador: - … de funcionamento institucional e sabe o que deve ser enviado ao Sr. Presidente da República para promulgação.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos iniciar o período regimental de votações.
Em primeiro lugar, temos para apreciar e votar um parecer da Comissão de Ética relativo à substituição do Sr. Deputado Paulo Pedroso, porque, uma vez aprovado, o Sr. Deputado substituto já poderá participar nas votações e a sua presença ser assinalada para efeitos de quórum, cuja verificação se fará após a votação deste parecer.
Como sabem, está previsto que pareceres desta natureza possam ser votados até mesmo antes do período da ordem do dia, portanto, fora do período regimental de votações.
Tem a palavra o Sr. Secretário para proceder à leitura do relatório e parecer.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o relatório e parecer da Comissão de Ética é do seguinte teor:

1 - Em reunião da Comissão de Ética, realizada no dia 29 de Maio de 2003, pelas 14 horas, foi observada a seguinte substituição de Deputado:
Substituição nos termos da alínea d) do n.º 2 do artigo 5.º do Estatuto dos Deputados (Lei n.º 3/2001, de 23 de Fevereiro) e conclusões do relatório e parecer em anexo, aprovado pela Comissão de Ética, em 2003.05.29, que se transcreve:
"A Comissão de Ética pronuncia-se favoravelmente ao deferimento do pedido de substituição temporária requerido

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pelo Sr. Deputado Paulo Pedroso, eleito pelo círculo eleitoral de Setúbal na lista do Partido Socialista, nos termos da alínea d) do n.º 2 do artigo 5.º e para os efeitos da alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º e do n.º 6 do artigo 5.º do Estatuto dos Deputados, face ao motivo relevante que invoca, que assim se considera justificado, nos seus precisos termos, com efeitos a partir do dia 22 de Maio, inclusive":
Grupo Parlamentar do Partido Socialista (PS) - Paulo Pedroso (círculo eleitoral de Setúbal) por José Manuel Epifânio, com início em 22 de Maio de 2003, inclusive.
2 - Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que o substituto indicado é realmente o candidato não eleito que deve ser chamado ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência da respectiva lista eleitoral apresentada a sufrágio pelo aludido partido no concernente círculo eleitoral.
3 - Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
4 - Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
A substituição em causa é de admitir.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Costa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de deixar claros alguns factos neste momento.
Após a aplicação da medida de prisão preventiva ao Sr. Deputado Paulo Pedroso, ele próprio transmitiu-me que desejava suspender o mandato porque entendia que, estando impedido de comparecer perante a Assembleia da República, o deveria fazer.
Eu próprio, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, sugeri-lhe que meditasse bem no assunto, que a questão era juridicamente bastante complexa e que, portanto, não deveria haver qualquer precipitação e que se deveria reflectir serenamente sobre a mesma, visto que, tratando-se da primeira vez que esta situação ocorria, teríamos de ter em conta que poderíamos estar a criar um precedente, que, agora, se aplicaria a ele mas que, no futuro, se aplicaria a qualquer outro Deputado.
Aliás, na própria sexta-feira, o Sr. Deputado Guilherme Silva telefonou-me, pedindo que o Grupo Parlamentar do PS tivesse serenidade sobre esta matéria, que ponderássemos isto devidamente, que até tinham vindo publicadas nos jornais umas declarações imputadas a um Deputado da sua bancada mas que se tratava de ideias do próprio que não responsabilizavam a bancada. Entendia, portanto, que não deveria haver precipitação e receava, aliás, que já tivesse havido precipitação na forma como tinha sido levantada a imunidade parlamentar ao Sr. Deputado Paulo Pedroso.
Creio que estes receios eram efectivamente justificados, porque a situação é, de facto, juridicamente complexa.
Há, no entanto, algo que é claro e indiscutível, que é o que dispõe o n.º 4 do artigo 157.º da Constituição. Segundo esta norma é "Movido procedimento criminal contra algum Deputado, e acusado este definitivamente, a Assembleia decidirá se o Deputado deve ou não ser suspenso para efeito de seguimento do processo, sendo obrigatória a decisão de suspensão quando se trate de crime (…)" punível com pena superior a três anos.
Ou seja, havendo acusação definitiva, é indiscutível que, nuns casos, a Assembleia é obrigada a suspender o mandato do Deputado, noutros casos, pode fazê-lo.
Não havendo acusação definitiva, como é a situação actual, o que acontece? Penso que é claro que não pode haver uma suspensão obrigatória e pode ser discutível se a Assembleia pode ou não suspender o mandato.
Creio que a boa doutrina ensina que normas deste tipo só são susceptíveis de interpretação restritiva, sendo insusceptíveis de uma interpretação extensiva.
Portanto, a questão era a de saber se o Sr. Deputado Paulo Pedroso suspendia ou não o mandato por iniciativa própria.
Creio que, para além de termos de ter em conta o que estabelecem a Constituição e o Estatuto dos Deputados, devemos procurar saber o que acontece nos estatutos de outras pessoas que possam estar em situações semelhantes, desde logo, outros titulares de órgãos de soberania.
A questão coloca-se, por exemplo, quanto aos magistrados judiciais. Mas não há paralelismo, visto que, no caso destes últimos ou dos magistrados do Ministério Público, não pode haver sequer prisão preventiva antes da acusação definitiva ou da notificação do dia para julgamento. Logo, não poderia haver prisão preventiva nesta fase, de acordo com os seus estatutos. É dito, com muita clareza, que a suspensão das funções de magistrado só ocorre no dia em que forem notificados do despacho de pronúncia. Até à notificação do despacho de pronúncia, não há suspensão.
Em qualquer caso, poderíamos tentar saber o que acontece do ponto das vista das condições remuneratórias. Quanto a isto, o que é dito é que é aplicável subsidiariamente aos magistrados o regime aplicável à função pública.
Vamos, então, ver o que se passa no regime jurídico da função pública. Aqui, para qualquer trabalhador da função pública, de acordo com o estabelecido no n.º 1 do artigo 64.º do Decreto-Lei n.º 100/99, "As faltas dadas por motivo de prisão preventiva consideram-se justificadas e determinam a perda de vencimento de exercício e do subsídio de refeição.". Ou seja, no caso de um funcionário público, estatuto aplicável subsidiariamente, nos termos da lei, aos magistrados, verifica-se que, durante a prisão preventiva, as faltas que dá ao serviço consideram-se justificadas e só há perda do vencimento de exercício, mantendo-se o vencimento-base. Aliás, este mesmo decreto-lei estabelece, como é óbvio, que, caso venha a haver condenação definitiva, será descontado o que foi abonado durante o período da prisão preventiva.
É evidente que, no Estatuto dos Deputados, não há qualquer remissão expressa para o Estatuto dos Magistrados Judiciais, nem para o regime jurídico da função pública, e, portanto, a situação não é absolutamente clara. Mas também não estamos, ao contrário do que tenho ouvido dizer, verdadeiramente perante uma lacuna, porque o artigo 4.º do Estatuto dos Deputados explica o que determina a suspensão de mandato e não é desconhecida a questão do procedimento criminal. Estabelece o referido artigo 4.º, n.º 1, alínea b), que determina a suspensão do mandato "O procedimento criminal, nos termos do n.º 3 do artigo 11.º;". Então, o que é nos diz o n.º 3 do artigo 11.º? Diz-nos que a suspensão pode verificar-se após, e só após,

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a existência de acusação definitiva. Portanto, não há uma lacuna, está regulamentado. Podemos discordar da regulamentação, mas o que diz respeito à suspensão está regulamentado.
Aliás, há mesmo dúvidas - e esta questão foi seriamente debatida - sobre se, nas previsões do artigo 5.º, relativamente ao motivo relevante, se verificam ou não os pressupostos para o pedido de suspensão a pedido do Deputado.
Perante esta dúvida, procurou-se a existência de um consenso. Porém, ontem, na Conferência de Líderes, constatou-se que manifestamente esse consenso não existia, tendo quatro grupos parlamentares sustentado uma posição e tendo dois grupos parlamentares sustentado uma posição diversa.
Creio que o Sr. Presidente da Assembleia da República andou bem, como, aliás, o tem feito - e devo dizê-lo aqui publicamente - em todo este processo, com elevada dignidade e sentido das responsabilidades perante a gravidade da situação e a defesa do prestígio da própria Assembleia da República, ao decidir solicitar um conjunto de pareceres jurídicos, não sei se ao Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, se a ilustres constitucionalistas, para que nos ajudem a aclarar esta situação.
É em face desta sua iniciativa, da inexistência do consenso e das dúvidas jurídicas sustentadas sobre esta questão, que, hoje, transmiti ao Sr. Deputado Paulo Pedroso que me via forçado a retirar o pedido que lhe tinha feito para não suspender o mandato e pedi-lhe que reconsiderasse a sua própria decisão inicial e pedisse a suspensão do mandato.
Tanto mais que, ontem, ficou para mim muito claro que havia quem entendesse, e com força para o impor nesta Assembleia, que se consideraria a ausência do Sr. Deputado Paulo Pedroso ao Plenário como falta injustificada e que, a não haver suspensão do mandato hoje, hoje seria considerada a quarta falta injustificada, implicando a perda do mandato.
Tratava-se, portanto, da necessidade de, com carácter de urgência, adoptar uma medida preventiva, para prevenir a declaração da perda de mandato nesta Assembleia da República. Mas tratava-se também de criar a oportunidade e o tempo necessário para que a iniciativa de V. Ex.ª dê frutos e tenhamos os pareceres jurídicos, com base nos quais possamos retomar a abordagem desta questão, com elevação, e que o exemplo de dignidade que o Deputado Paulo Pedroso a todos nos deu na passada quarta-feira sirva para sabermos estar à altura e não nos deixarmos arrastar para qualquer tipo de chicana de interpretação política da Constituição ou da lei.
Estas eram as palavras que entendia dever transmitir, em nome do Grupo Parlamentar do PS, a V. Ex.ª e à Câmara, antes de procedermos à votação do parecer da Comissão de Ética.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero dizer que é extremamente doloroso para mim, neste momento, fazer esta intervenção. É extremamente doloroso, porque acho que todos devemos uma solidariedade humana profunda ao Deputado Paulo Pedroso.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - E vejo que é pela mão do líder parlamentar, que mais solidariedade deve ao Deputado Paulo Pedroso, que se vem aqui - e desculpe-me usar a expressão, Sr. Presidente - mentir descaradamente sobre a posição assumida pelo meu grupo parlamentar nesta matéria.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mentir descaradamente! E invoco a presença de V. Ex.ª na Conferência de Líderes para confirmar aquilo que passo a dizer aqui, neste Plenário, assumidamente e repetindo: mentir descaradamente, Sr. Deputado António Costa! E lamento que seja a propósito de uma matéria destas, em que V. Ex.ª deveria ter o maior dois cuidados e, em nome da defesa e da solidariedade para com o Sr. Deputado Paulo Pedroso, deveria dizer a verdade aqui a este Plenário.
Sr. Presidente, eu disse, repito e mantenho: o meu grupo parlamentar, em nenhuma circunstância, utilizará como arma de arremesso matérias deste cariz, matérias do domínio da ética, do domínio das questões elementares do Estatuto dos Deputados.
E eu mantive contactos com o Sr. Deputado António Costa e com o Sr. Deputado Jorge Lacão. O Sr. Deputado Eugénio Marinho emitiu uma opinião pessoal e fez questão de dizer que era uma opinião pessoal e não do grupo parlamentar. Alguns jornais disseram "o Grupo Parlamentar do PSD ameaça…", deturpando a posição pessoal do Deputado Eugénio Marinho. Eu assumi publicamente, fazendo um alerta, que se tratava de uma posição pessoal. E não é uma opinião pessoal que não tenha fundamento, é a opinião de uma ilustre jurista, a Dr.ª Carla Amado Gomes, que diz que, num caso de prisão preventiva, se entra numa situação de faltas injustificadas e o Deputado perde o mandato. Pela minha parte, considero esta posição inaceitável, por uma razão muito simples: temos de tratar esta matéria com pinças; temos de tratá-la de forma a conciliar os princípios constitucionais elementares, designadamente o da presunção de inocência do Sr. Deputado Paulo Pedroso.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Temos de tratá-la em termos de assegurar o funcionamento digno desta Assembleia. Eu disse, e mantenho: cuidado, temos de pensar, ao tratar esta matéria, que é uma situação nova com que o Parlamento se depara, nos precedentes que vamos criar!

O Sr. José Magalhães (PS): - E onde é que está a inverdade?

O Orador: - Por uma razão muito simples, Sr. Deputado: a pior coisa que podemos aqui fazer é, a propósito destas matérias, termos dois pesos e duas medidas. Se é um Deputado do PSD, pois muito bem, agora, pela primeira vez, vamos votar contra e não vamos autorizar o depoimento por escrito; agora, se é um Deputado do PS, vamos votar a favor.

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Srs. Deputados, mantenhamos, nesta matéria, um tratamento uniforme, não olhemos à questão partidária! De uma vez por todas, salvemos a Assembleia da República e dêmos-lhe a dignidade que ela merece e exige. Para isso, o primeiro comportamento tem de ser o nosso, Srs. Deputados!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Ora, foi com esta preocupação do funcionamento da Assembleia que eu disse: pensemos no problema da situação de a Assembleia continuar a funcionar com menos um Deputado. Mas o argumento foi: isso não tem relevância! Para o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, mais um menos um Deputado, não afecta a sua votação. Mas admitamos que eram quatro Deputados da maioria que estavam nesta situação: quando tivéssemos de votar, como era? Iríamos assistir a esse espectáculo indecoroso de trazer o Srs. Deputados, numa saída precária, em carrinha celular para virem votar?! Pensam que a solução adequada era criar um precedente que conduzisse, um dia, a uma situação destas?! Era isto, Srs. Deputados?!

O Sr. José Magalhães (PS): - Calma!

O Orador: - E foi para isto que chamei a atenção, ao dizer: cuidado, não vale o argumento de que, nesta ocasião, é irrelevante a presença do Sr. Deputado Paulo Pedroso na bancada do Partido Socialista! Pensemos numa visão global, que previna situações para o futuro, para não andarmos aos ziguezagues nesta matéria.
Mas adiantei - e aqui é que há a falta à verdade do Sr. Deputado António Costa! -…

O Sr. António Costa (PS): - Já faltava!

O Orador: - … e adiantou o Sr. Deputado Telmo Correia, em nome do Grupo Parlamentar do CDS-PP: se o entendimento do Sr. Presidente da Assembleia da República, que é quem justifica as faltas, for um entendimento contrário ao da Sr.ª Dr.ª Carla Amado Gomes, se for um entendimento contrário ao do Prof. Gomes Canotilho, que entende que o Deputado entra numa situação de faltas injustificadas, se o Sr. Presidente da Assembleia, em seu alto critério, entender que esta situação é suficiente para justificar as faltas e se for essa a pretensão do Sr. Deputado Paulo Pedroso e do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, o Grupo Parlamentar do PSD não obstaculizará essa solução.
Ora, o Sr. Deputado António Costa tinha a obrigação de dizer isto e não o que acabou de dizer aqui, não o que disse à saída da Conferência de Líderes, não o que vem insistindo em dizer à comunicação social!

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Era só esta verdade, em nome da solidariedade que todos devemos ao Sr. Deputado Paulo Pedroso, que o senhor, como líder dessa bancada, deveria, em primeiro lugar, assumir.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Sobre esta matéria, quero dizer que, da parte do nosso grupo parlamentar, como dissemos antes, como dissemos ontem, em Conferência de Líderes, e como diremos amanhã, faça o Sr. Deputado António Costa as declarações que muito bem entender, diga o que disser, não transformaremos uma questão que, para nós, é estritamente jurídica num tema de debate político de arremesso ou de chicana política.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não o faremos em circunstância alguma, digam o que disserem, façam o que fizerem!
E lembro-lhe, Sr. Deputado António Costa - e, se quiser, lembre-se disso - que não foi só o Sr. Deputado Guilherme Silva que o contactou, eu também falei consigo. Falei consigo e recolhi, dessa conversa que mantive consigo, duas coisas essenciais: pareceu-me (não sei se bem, se mal) que qualquer solução - que poderia ser a suspensão - que não resultasse na perda do mandato por parte do Sr. Deputado Paulo Pedroso era aceitável. E o que é que eu lhe disse? Disse-lhe: estou de acordo. O que não é aceitável nesta questão, em nossa opinião, é que este Deputado, que beneficia de presunção de inocência, possa perder o mandato.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Isto é que não é aceitável. No resto, vamos procurar a melhor solução.
Depois disso, não tive mais nenhuma conversa sobre o assunto - nem consigo, nem com o Sr. Deputado Guilherme Silva, nem com qualquer outro Deputado de outro grupo parlamentar, com ninguém, não tive mais nenhuma conversa.
Ora, ontem, na Conferência de Líderes, convocada por S. Ex.ª o Sr. Presidente da Assembleia da República, o Sr. Presidente, no fundo, solicitou a opinião dos vários grupos parlamentares sobre esta matéria. E o que eu disse ontem e repito hoje - e gostava que isso ficasse claro, de uma vez por todas - é que, em minha opinião, esta questão é efectivamente uma questão jurídica complexa, é uma questão jurídica de difícil solução. Porquê? Porque, na minha opinião - e, se ainda não ficou claro, repito -, qualquer regime que aplicasse faltas injustificadas ao Sr. Deputado Paulo Pedroso seria injusto. Porquê? Porque o regime da prisão preventiva é forçosamente revisto de três em três meses e, a qualquer momento, pode ser revisto. Há presunção de inocência e, a qualquer momento, o processo pode ser arquivado. E não seria admissível que este ou qualquer outro Deputado, que tivesse estado preso e viesse a sair, tivesse entretanto perdido o mandato. Era uma penalização perfeitamente inaceitável. Portanto, faltas injustificadas, para nós, está fora de questão!
O regime das faltas justificadas tem, do nosso ponto de vista, alguns problemas. Primeiro, porque eu considero que o direito à retribuição é irrenunciável e não corresponderia sequer à vontade que V. Ex.ª nos comunicou ser a do Deputado em causa, que, bem, disse que, estando nessa situação, acreditando, defendendo e batendo-se pela sua

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inocência, como é evidente, não quer estar a receber. Portanto, acho que o direito à retribuição é irrenunciável e levantei esta dificuldade.
A segunda dificuldade é que, como já referiu aqui o Sr. Deputado Guilherme Silva, altera a composição da Assembleia, o que, lembro-lhe (e citei isso ontem), como o Prof. Canotilho considera, não é respeitador nem da separação de poderes nem da própria liberdade inerente à função de Deputado. Ou seja, não é possível que a Assembleia passe a ter menos um Deputado, que está em exercício de funções, mas não pode exercer.
Levantei estas dificuldades e disse que me parecia que o melhor caminho era o regime da suspensão, ainda que reconhecesse, pelos argumentos que V. Ex.ª aduziu e com os quais não estou, no fundo, em desacordo, que o regime da suspensão tinha dificuldades jurídicas na sua sustentação, precisamente por força do texto constitucional, ainda que eu considere que efectivamente possa existir aqui uma lacuna. Não sou constitucionalista, mas admito que possa existir uma lacuna. E dei uma opinião neste sentido. E, dando essa opinião, que aqui repeti para que fique claríssima, não deixei de dizer, como não deixou de dizer o Sr. Deputado Guilherme Silva, que, da nossa parte, precisamente porque isto não é para nós uma matéria de chicana política, de debate político, de aviltamento de pessoas, seja do que for, nós não caluniamos ninguém, mas também não gostamos de ser caluniados.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Foi isto que nós fizemos. E, concluindo esta matéria, dissemos que, da nossa parte, se outro fosse o entendimento, designadamente, da maioria dos partidos (e não me referia à maioria de número de Deputados, mas à maioria de partidos), se a maioria dos partidos entendesse que o melhor regime a aplicar era o das faltas justificadas e se S. Ex.ª o Sr. Presidente da Assembleia da República estivesse disposto a seguir esse regime, nós não nos oporíamos e estávamos dispostos a isso.
Mas V. Ex.ª não esperou por essa decisão e, de imediato, disse: então, vou falar com o Sr. Deputado Paulo Pedroso e vou dizer-lhe para ele pedir a suspensão.
Ou seja, não deu tempo para essa decisão ser tomada. Portanto, não nos impute a nós responsabilidades que não temos. Sr. Deputado, nós lidámos com isto com todo o cuidado, com toda a responsabilidade, admitindo as dúvidas jurídicas e dizendo que era positivo que se pedissem pareceres, que a Comissão de Ética discutisse e que, com base nesses pareceres, definíssemos um regime que seja sólido para o futuro e que sirva para qualquer Deputado que, no futuro, possa vir lamentavelmente a estar na mesma situação.
Foi isto que nós dissemos. Portanto, não nos impute coisa diferente daquilo que dissemos.
O pedido de suspensão, que agora vamos votar, foi aprovado por unanimidade na Comissão de Ética, pelas razões que foram explicitadas. Este pedido de suspensão tem um período.
Mais: dissemos ainda que, na nossa opinião, o regime dos 10 meses nunca se poderia aplicar a este caso. Dissemos também que a questão da perda de mandato, pelos 10 meses nunca se poderia aplicar a este caso, e mantemos isso.
Este parecer e esta suspensão serão aprovadas por unanimidade, como aconteceu na Comissão de Ética. Vamos ouvir os juristas, vamos ouvir os especialistas, vamos definir, com segurança, no prazo de tempo mais curto possível, um regime que sirva não para o Deputado A, não para o Deputado B, mas para qualquer Deputado que se encontre nesta mesma situação.
Não à pressa, não a quente, não de cabeça perdida, mas com serenidade, com tranquilidade, pensando, sobretudo, na dignidade do Parlamento e nos direitos de quem possa estar numa situação deste tipo, ainda que, repito, beneficiando de presunção de inocência, que nós, obviamente, não só reconhecemos como defendemos intransigentemente.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta é uma das matérias em que o consenso e a serenidade no tratamento deste problema era a nossa orientação, e desejaríamos que tivesse vigorado até ao fim.
Julgo que ontem ficou clara a existência de opiniões divergentes em relação à melhor forma de resolver o problema, de o interpretar e de encontrar a melhor solução jurídica. Havia opções, claramente, divergentes e elas mantiveram-se até ao momento em que o Sr. Deputado António Costa anunciou que iria solicitar ao Sr. Deputado Paulo Pedroso que requeresse à Assembleia da República a suspensão do mandato.
Julgo que esta é uma situação, evidentemente, difícil de resolver e de interpretar, que não se deve partir, como, a meu ver, alguns fizeram, do problema mais circunscrito da justificação das faltas e do vencimento mas, sim, do problema, esse, sim, maior, da compatibilização de uma situação de prisão preventiva com a suspensão ou não do mandato. Este é que é o problema fundamental que mexe com as questões fundamentais.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Claro!

O Orador: - E julgo que alguns partiram do problema contrário e que houve durante estes dias determinadas especulações sobre se as faltas poderiam ser justificadas, se o vencimento seria ou não atribuído, o que não era de facto a questão principal.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Pela nossa parte, com todas as reservas que a complexidade da questão nos exige, admitimos que optar por uma suspensão não tipificada no Estatuto dos Deputados, nem na Constituição, sem pedido do próprio seria a solução mais violenta e que, portanto, seria melhor admitir uma solução que não passasse pela suspensão decidida pela Assembleia sem o pedido do Deputado. Foi esta a posição que tomámos. Este assunto está ultrapassado, porque o Sr. Deputado Paulo Pedroso pediu a suspensão e a Comissão de Ética aprovou, por unanimidade, um parecer para que o seu mandato fosse suspenso, parecer e suspensão que apoiamos sem reservas.

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Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Costa, pelas inscrições ter-lhe-ia de dar a palavra agora, mas talvez prefira usar dela após a intervenção do Sr. Deputado Luís Fazenda…

O Sr. António Costa (PS): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sendo assim, dar-lhe-ei mais tarde a palavra, para uma segunda intervenção.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, o Bloco de Esquerda defendeu, na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, que a solução, que, a nosso ver, decorre do texto constitucional do Estatuto dos Deputados, foi a apresentada pelo Presidente da Comissão de Ética, Dr. Jorge Lacão.
Reconhecendo que o caso é juridicamente complexo, creio que a posição que a maioria tomou na reunião leva a um imbróglio jurídico ainda maior, porque, dizendo-se que, em circunstância alguma, o Sr. Deputado Paulo Pedroso deve perder o mandato por decorrência de situações lacunares na legislação, a verdade é que não creio que seja possível, face ao Estatuto dos Deputados que temos, outra coisa que não a suspensão de mandato até 10 meses, que é aquilo que está actualmente previsto.

O Sr. António Costa (PS): - Claro!

O Orador: - E talvez, sem acinte, no limite do cinismo político, acabe até por perder o mandato.
Creio que não acautelámos o bem maior, que seria a preservação do mandato nestas circunstâncias e depois, mais tarde e no estrito cumprimento daquilo que é o regime constitucional e do nosso Estatuto, após uma acusação em definitivo, ocorreria a necessária suspensão do mandato do Sr. Deputado Paulo Pedroso.
Portanto, com toda a serenidade, e sem cedência a qualquer tipo de populismo fácil, devo dizer, com o devido respeito, que creio que os argumentos da parte da maioria foram, sobretudo, de natureza política. São também eles legítimos, mas foram, sobretudo, de natureza política. Não têm um devido valor reforçado do ponto de vista jurídico, não atenderam à questão da prevalência do mandato e da legitimidade de quem exerce um mandato eleito pelo povo e daquilo que poderíamos balizar de acordo com o texto constitucional e com o Estatuto dos Deputados.
Respeitando, porém, todas as interpretações, compreendendo a sensibilidade do processo e a natureza cautelar que têm medidas deste género para eventuais situações futuras, no sentido de não se criar precedentes que venham a ser danosos para uma gestão adequada da dignidade do Parlamento, creio que esta decisão, com o devido respeito, foi de natureza política e não exactamente de consenso à volta da melhor solução jurídica.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Não, não foi!

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Demagogia! É uma vergonha!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Julgo que aquilo que a Assembleia da República, com clareza, há uma semana aprovou, por unanimidade, foi o levantamento da imunidade parlamentar a um Sr. Deputado, aliás, indo ao encontro da sua vontade claramente expressa nessa manhã, e não, de modo algum, a possibilidade de decorrer desse levantamento de imunidade a perda ou a suspensão de mandato.
Aquilo que ontem a maioria acabou por impor,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Impor?!

A Oradora: - … aquilo que, de facto, vai acabar por ser a consequência da leitura feita - e o que está em jogo não é exactamente a interpretação jurídica mas, sim, fundamentalmente uma visão política -…

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

A Oradora: - … é o Sr. Deputado Paulo Pedroso, eleito por sufrágio directo, poder ser penalizado sem que o requisito legal, que, no fundo, é uma acusação, se tenha verificado. A suspensão, tal como acabou por ser sugerida, pela forma como a questão foi discutida, e acaba por ser imposta, vai ter seguramente esta tradução.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Quem é que a impôs?! A Sr.ª Deputada está a mentir!
Sr. Presidente, preciso da acta da Conferência de Líderes de ontem!

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Isto é uma vergonha!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Costa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Certamente por distracção minha e impressionado, com certeza, pelo calor da intervenção do Sr. Deputado Guilherme Silva, acabei por não perceber qual foi a mentira que me imputou.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Já todos percebemos!

O Orador: - Não me imputou mentira alguma.
Chamou-me mentiroso, mas não me imputou mentira alguma.

Protestos do Deputado do PSD Guilherme Silva.

Fico comovido com as palavras dos líderes parlamentares do PSD e do CDS-PP, mas, felizmente, não estive sozinho na reunião da Conferência de Líderes; todas as pessoas que lá estiveram perceberam e viram o que aconteceu.
Viram o Sr. Deputado Jorge Lacão, Presidente da Comissão de Ética, expor a sua posição baseado num parecer jurídico que o técnico de apoio à Comissão de Ética tinha feito sobre esta matéria.

Protestos do Deputado do CDS-PP Nuno Teixeira de Melo.

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Ouviram depois, imediatamente a seguir, com base em dois argumentos fundamentais, próprios de tablóide, o seguinte: primeiro, ninguém percebe por que se considera uma falta justificada por estar na prisão, como se alguém pudesse supor que, para se "baldar" à Assembleia, se metesse na prisão.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Eu sei que há casos em que as pessoas simulam doenças e até obtêm atestados médicos falsos para não cumprirem os seus deveres, mas não conheci, até agora, alguém que tivesse obtido um mandado de detenção falso para se furtar aos seus deveres profissionais. Não conheço!

Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Orador: - O outro argumento já não foi muito agitado ontem, porque, atempadamente, na véspera, tinha sido removido pelo próprio Sr. Deputado Paulo Pedroso, quando me pediu para transmitir ao Sr. Presidente da Assembleia da República - o que fiz - o seu desejo de, não suspendendo o mandato, obter a suspensão do processamento do seu vencimento, depois, convém que se diga, e é bom que também se saiba para não sermos todos ingénuos, de uma actividade bastante intensa de alguns dos Srs. Deputados ou, pelo menos, de um dos Srs. Deputados - de um, repito, dos Srs. Deputados - junto dos jornalistas, sublinhando como era imoral alguém estar na prisão e receber o vencimento, como se não fosse esse o estatuto aplicável a todos os agentes do Estado,…

Protestos do Deputado do CDS-PP Narana Coissoró.

… sejam eles magistrados ou funcionários públicos. E esta acção, como o Sr. Deputado sabe, foi feita intensamente por um Sr. Deputado junto dos jornalistas durante o fim-de-semana.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Quem é? Diga o nome!

O Orador: - Esta era a argumentação e foi comovente.
Ainda mais comovente foram os seguintes argumentos: primeiro, se calhar, o nosso erro foi ter levantado a imunidade parlamentar, porque, verdadeiramente, só deveríamos levantar a imunidade parlamentar após a acusação definitiva, ou, pelo menos, a autorização para a prisão preventiva; segundo, e ainda mais comovente, é irrenunciável o direito à remuneração, direito, certamente, previsto em benefício e para protecção do próprio e, portanto, como não pode renunciar à remuneração tem de renunciar a tudo.

Vozes do CDS-PP: - Que disparate!

O Orador: - É "comovente" o cuidado de proteger o carácter irrenunciável do direito à remuneração, obrigando à suspensão do mandato e, portanto, à renúncia, obviamente, também, ao vencimento.
Aliás, gerarão nessa matéria esta coisa absolutamente extraordinária: é que deixando o Sr. Deputado Paulo Pedroso de ser Deputado reassumirá, naturalmente, as suas funções de docente universitário, passando a beneficiar, enquanto docente universitário, daquilo que a maioria não queria que ele beneficiasse enquanto Deputado. Portanto, é absolutamente extraordinário! Agora, o momento decisivo e, aliás, esclarecedor, creio que para todos, da reunião da Conferência de Líderes de ontem foi quando o Sr. Deputado Jorge Lacão, julgava ele, ia argumentar por absurdo.
E diz o Sr. Deputado Jorge Lacão, julgando ele, repito, que argumentava por absurdo: "Mas a levar a esse ponto essa interpretação dos Srs. Deputados da maioria isto significa que o Sr. Deputado Paulo Pedroso já hoje(…)", ele falava ontem, "(…) perdeu o mandato porque faltou às sessões de quarta, quinta e sexta (…)" e à de ontem mesmo, "(…) e, portanto, já atingiu o limite de faltas.".
Ora, isto que tentava ser um raciocínio por absurdo recebeu a seguinte resposta do Sr. Deputado Luís Marques Guedes: "Claro que não, porque a falta de quarta-feira passada, essa estava justificada".

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não está?

O Orador: - Portanto, ficou para mim claro, para o Sr. Deputado José Magalhães, para o Sr. Deputado Jorge Lacão - e pareceu-me que para os restantes Srs. Deputados que estavam presentes na sala -, que ou o Deputado Paulo Pedroso suspendia hoje o mandato ou hoje, pelo menos na interpretação do Sr. Deputado Luís Marques Guedes, ele cumpriria a quarta falta injustificada e, neste momento, estaria a perder o mandato.
Esta foi a interpretação que todos fizemos com total boa-fé. Assim, foi perante este quadro que eu disse - primeiro ao Sr. Deputado Guilherme Silva, quando o Sr. Deputado Guilherme Silva tentava construir a tese da interpretação extensiva da Constituição e de que lhe iam impor a suspensão de mandato - que nunca deixaríamos e, sobretudo, o Sr. Deputado Paulo Pedroso nunca deixaria que fosse necessário impor-lhe a suspensão de mandato, porque esse "gosto" ele não daria e resolveria ele próprio o problema.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E disse também, depois, com toda a clareza, na Conferência de Líderes, que, obviamente, pediria e aconselharia o Sr. Deputado Paulo Pedroso, até como medida preventiva contra a tentativa da sua perda de mandato, que se antecipasse e que requeresse a suspensão de mandato com efeitos, aliás, a partir de 22 de Maio.
Para terminar, Sr. Presidente, gostaria de sublinhar que, como muito bem disseram os Srs. Deputados Bernardino Soares, Luís Fazenda e Isabel Castro, e o que resulta do próprio parecer da Comissão de Ética, é a suspensão nos termos da alínea d) do artigo 5.º do Estatuto dos Deputados que está sujeita, obviamente, ao prazo peremptório de 10 meses.
Portanto, não façamos o último dom de ingenuidade: o que nós vamos votar, nestas condições, é a suspensão de um mandato que é cominada com um prazo limite de 10 meses, findo o qual o mandato é reassumido ou o mandato tem de ser declarado perdido.
Foi nestas condições e consciente disto que o Sr. Deputado Paulo Pedroso hoje requereu o pedido de suspensão de mandato, o que apoiámos e votámos favoravelmente, por unanimidade, na Comissão de Ética.

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A história é esta e cada um ficará - não com a sua verdade, porque não há duas verdades mas apenas uma - de bem ou de mal com a sua consciência em função da atitude que tomou ao longo destes meses.
Por último, Sr. Deputado Guilherme Silva, o senhor não me insulta nem quando usa o microfone nem quando aí fala baixinho para eu ir ouvindo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, verifiquei que, nesta longa intervenção, o Sr. Deputado António Costa nada rebateu do que aqui referi sobre aquela que foi a nossa posição desde o início. E não rebateu porque não podia fazê-lo! A nossa posição é clara e perfeitamente sustentada.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - E não só não a rebateu como perguntou onde estão as mentiras. Digo-lhe que, se calhar, o que não está é dita a verdade toda. E, Sr. Deputado António Costa, a verdade toda nesta questão é tão simples como isto: a verdade toda é reconhecer que, na Conferência de Líderes, nós não fomos para a discussão (e se há dúvidas, o Sr. Presidente poderá esclarecê-lo) com uma posição de imposição, com uma posição de votar mas, sim, com dúvidas, dúvidas essas - do nosso ponto de vista - juridicamente fundamentadas e baseadas numa questão essencial, que é - e mantenho essa dúvida - a de saber como é possível um Sr. Deputado estar no exercício de funções estando preso preventivamente. Não compreendo! Não percebo!
É porque a lei é geral e abstracta, e esse tipo de situação pode aplicar-se a um Deputado ou, lamentavelmente, a dois, três, quatro… E como é que exercem o mandato? Tenho as maiores dúvidas sobre esta questão.

Vozes do PS: - E em situação de doença, no hospital?

O Orador: - É substituído, como é evidente! Pede a suspensão do mandato.

Protestos do Deputado do PS José Magalhães.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço-vos que falem um de cada vez, senão não nos entendemos. A discussão já está demasiado prolongada, por isso agradeço que sintetizem as argumentações.

O Orador: - Sr. Deputado José Magalhães, permita-me que tenha essa dúvida, dê-me esse direito!
Perante isto, julgo que é lamentável que o Sr. Deputado António Costa chegue ao ponto de fazer trocadilhos porque, sinceramente, esta situação não tem qualquer graça nem deve ser fundamento de trocadilhos, sejam de que tipo forem.
Este problema deve ser tratado de forma séria. E não me refiro, sequer, às intervenções dos Srs. Deputados Luís Fazenda e Isabel Castro, porque se, muitas vezes, o Sr. Deputado António Costa já é exagerado, eles procuram amplificar os seus exageros. Portanto, não vale a pena reportar-me às suas intervenções. É porque quando vêm dizer que nós queremos impor a perda do mandato isso é falso, falso!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É mentira!

O Orador: - E se há dúvidas, Sr. Deputado António Costa, digo-lhe o seguinte: na minha opinião, este pedido de suspensão do mandato é por sessão legislativa, o que significa que o Sr. Deputado poderá voltar a pedi-lo e, portanto, poderá não ser apenas por 10 meses.
Independentemente disso, eu só tenho uma palavra e quando se está a falar a sério (apesar de algumas pessoas, neste Parlamento, acusarem os outros de serem cínicos), isso traduz-se em consequências e em actos. E os meus actos, Sr. Presidente, Sr. Deputado António Costa e Srs. Deputados, só têm um sentido: se digo que não acho aceitável que um Deputado que esteja em prisão preventiva perca o seu mandato, sou consequente com a minha palavra...

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … e estava disposto ontem, e estou disposto hoje, a fazer o que for necessário. Se for necessário e possível alterar a lei, porque só tenho uma palavra e não admito que duvidem dela.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quero que isto fique muito claro.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, só tenho uma avaliação a fazer a determinados comportamentos de Srs. Deputados presentes nesta Câmara. É que há pessoas que se avaliam por si próprias e não percebem quando se está, com toda a isenção e a maior das boas fés, a querer resolver um problema, que é um problema de todos nós.
V. Ex.ª, Sr. Presidente, reparou na abertura com que todos fomos para a discussão na Conferência de Líderes. Mas é evidente que quando o Sr. Presidente convocou a Conferência de Líderes, tendo como primeiro ponto da agenda esta matéria, não era para todos emitirem opinião concordante com o Partido Socialista, ou com o Sr. Deputado Jorge Lacão, mas, sim, para discutirmos abertamente.
Na intervenção que proferi em Conferência de Líderes, enunciei três pontos: primeiro, que estávamos ali com o propósito de não utilizar esta matéria como arma de arremesso político-partidária; segundo, que se tratava de uma questão que interessa a todos, uma questão institucional, pelo que tínhamos de encontrar uma solução que conciliasse os princípios da presunção de inocência do Sr. Deputado Paulo Pedroso e de funcionamento institucional regular da Assembleia da República; e, terceiro, em função desta conciliação de princípios, que jamais poderíamos admitir a perda do mandato por parte do Sr. Deputado Paulo Pedroso, fosse por faltas fosse pelo que fosse!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

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O Orador: - Não era possível que a Assembleia da República, perante uma presunção de inocência, aplicasse ao Sr. Deputado uma cominação tão gravosa como essa.
Portanto, os caminhos estavam abertos para encontrarmos uma solução que impedisse essa consequência. Fui muito claro na assunção desse caminho e não vejo que possa haver outro, seja qual for o Deputado que esteja nestas condições.
Contudo, Srs. Deputados, a questão é jurídica, a questão é política, a questão é institucional, a questão é complexa.
Naturalmente, fui sensível à advertência de que seria difícil fazer-se uma interpretação extensiva do preceito da Constituição, visto tratar-se de uma restrição ao exercício do mandato de Deputado, mas também é verdade que se trata de uma ampliação à protecção da presunção de inocência. Portanto, temos aqui uma conflitualidade de princípios constitucionais.
Até sugerimos - juridicamente, creio que era possível esta solução - que se não se fizesse a suspensão de mandato com prazos mínimos nem máximos, limitados, como, em termos gerais, o Regimento impõe. Esta seria uma saída. Pode alegar-se que a situação é ligeiramente diferente, que a Assembleia da República pode limitar a suspensão do mandato ao tempo que considerar mais adequado, segundo as circunstâncias do exercício do mandato e do andamento do processo criminal.

O Sr. António Costa (PS): - Diga lá qual é a diferença? É a acusação?

O Orador: - Não, Sr. Deputado!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deixem ouvir o orador, não lhe cortemos o raciocínio.

O Orador: - Não fixávamos prazos para esta suspensão. Naturalmente, este processo há-de ter um fim. A situação do Sr. Deputado Pedroso há-de ser definida com incidência relativamente ao exercício do mandato.
Mas o mais importante de tudo, reafirmo, é que me parece absolutamente inadmissível ouvir o coro dos Srs. Deputados,…

O Sr. José Magalhães (PS): - O "coro" é dizer a verdade!

O Orador: - … a dizer que nós, maioria, impusemos a solução do pedido de suspensão…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Uma vergonha!

O Orador: - … quando, sistematicamente, o Sr. Deputado Telmo Correia e eu próprio (e o Sr. Presidente pode confirmá-lo e a acta da Conferência vai, com certeza, fazê-lo) reafirmámos que, apesar de o problema ser complicado, VV. Ex.as sabem que a interpretação da lei não pode conduzir ao absurdo: e o absurdo era que se estivessem em causa três ou quatro Deputados da maioria, teríamos de modificar, contra a vontade eleitoral, o peso dos votos da maioria. Esta é uma situação que teríamos de enfrentar amanhã, como é óbvio!

O Sr. António Costa (PS): - Os senhores não levantam a imunidade parlamentar, por isso esse problema não se põe!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deixem ouvir o orador para concluirmos este debate.

O Orador: - O Sr. Deputado António Costa referiu-se a uma afirmação que eu fiz aqui, sem ser no Plenário. Agora também disse: "Os senhores não levantam a imunidade". E eu acuso o senhor que falsamente tem dito, sobre o Deputado Cruz Silva, que não levantámos a imunidade quando sabe que ela foi levantada!
O senhor insiste nessa tecla porque é mentiroso!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

Tem mentido sobre essa situação e também está a mentir a propósito desta.
O Sr. Presidente confirmará que quer o Sr. Deputado Telmo Correia quer eu próprio afirmámos e insistimos na disponibilidade da maioria para encontrar uma solução que não a da suspensão se fosse entendido que a prisão era motivo de justificação de faltas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não vamos prolongar mais o debate sobre esta matéria. E nem vale a pena apelar para confirmações individuais ou para a acta da Conferência de Líderes porque, na realidade, todo o debate que ontem se travou foi aqui repetido, integralmente. De maneira que todos puderam ouvir exactamente o que cada um dos partidos disse na Conferência de Líderes.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Gostava de pedir ao Sr. Deputado Guilherme Silva o favor de retirar a expressão "mentiroso". Mentir é uma coisa (embora mesmo essa palavra tenha já conotações negativas), acusar alguém de mentiroso julgo que excede as nossas praxes parlamentares.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, faço-o em atenção a V. Ex.ª e à Câmara.
Retiro a expressão "mentiroso", mas confirmo que o Sr. Deputado António Costa mente.

Risos e aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Prefiro não comentar esta subtileza, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, não prolonguemos este debate, por respeito para com o nosso Colega Paulo Pedroso, que se encontra em circunstâncias tão difíceis neste momento.
O Sr. Deputado António Costa pediu a palavra para que efeito?

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, queria apenas dizer que, por respeito a V. Ex.ª, ao Sr. Deputado Paulo Pedroso e à Câmara, não respondo ao Sr. Deputado Guilherme Silva.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: - Fica, então, a questão encerrada deste modo.
Srs. Deputados, que fiquem claros dois pontos que me parecem fundamentais.
Primeiro, a Câmara é unânime em reafirmar o princípio constitucional da presunção de inocência do Sr. Deputado Paulo Pedroso, idêntica à de qualquer cidadão português que se encontre sob suspeita em prisão preventiva. Este ponto é absolutamente fundamental.
Segundo, a Câmara também é unânime em afirmar que o mandato conferido pelo povo deve ser respeitado e salvaguardado.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Perante a delicadeza dos problemas envolvidos, jurídicos e políticos - e a fronteira entre o direito político e a política é extremamente ténue, digo-o para benefício dos Srs. Deputados que fizeram alusão a essas matérias, talvez menos familiarizados com a técnica jurídica, e aí invoco a minha experiência de jurista -, tem de se encontrar uma solução que legalmente permita salvaguardar o objectivo de respeitar o mandato que foi conferido ao Sr. Deputado Paulo Pedroso enquanto se mantiver essa triste situação, que, aliás, todos desejamos que se resolva o mais rapidamente possível e em sentido favorável ao nosso ilustre Colega.
Também confirmo que pedirei parecer sobre esta matéria a juristas de nomeada. Estou até muito grato ao Sr. Deputado Paulo Pedroso por ter retomado a sua posição inicial de pedir a suspensão do mandato - aliás, a primeira que me foi comunicada quando esse assunto surgiu -, porque dá tempo ao Parlamento de reflectir, com a ajuda de especialistas, sobre matérias que até agora nunca tinham sido abordadas, mas que hoje temos perante nós e para as quais é preciso encontrar uma solução prudente. Muitas vezes as soluções "tiradas a quente" são negativas.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação do parecer da Comissão de Ética que já foi lido.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Deputado José Manuel Pires Epifânio, cujos poderes foram reconhecidos, se porventura está presente, faça favor de tomar lugar no Hemiciclo.
Srs. Deputados, para realizarmos as votações das demais matérias agendadas para hoje, vamos, antes de mais, proceder à verificação do quórum, utilizando o cartão electrónico.

Pausa.

Srs. Deputados, o quadro electrónico regista 169 presenças, pelo que temos quórum para proceder às votações.
Em primeiro lugar, vamos votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 54/IX - Transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva 2001/40/CE, do Conselho, de 28 de Maio de 2001, relativa ao reconhecimento mútuo de decisões de afastamento de nacionais de países terceiros.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e votos contra do PCP, do BE e de Os Verdes.

A proposta de lei baixa à 1ª Comissão.
Passamos à votação, na generalidade, o projecto de lei n.º 182/IX - Aprova medidas com vista à modernização do regime da realização de despesas públicas com locação e aquisição de bens e serviços de comunicações pela Administração Pública (PS).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Seguidamente, vamos proceder à votação global da proposta de resolução n.º 25/IX - Aprova, para ratificação, a Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, assinada em 23 de Maio de 1969.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Vamos proceder à votação global da proposta de resolução n.º 28/IX - Aprova, para adesão, o Acordo de Alteração ao Protocolo relativo aos Privilégios e Imunidades da Organização Europeia de Telecomunicações por Satélite (EUTELSAT), adoptado e confirmado pela 26.ª Assembleia de Partes daquela Organização, que teve lugar em Cardiff, de 18 a 20 de Maio de 1999.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e abstenções do PCP, do BE e de Os Verdes.

Vamos agora passar à votação global da proposta de resolução n.º 29/IX - Aprova o Acordo para a Conservação das Aves Aquáticas Migradoras Afro-euro-asiáticas, concluído na Haia, em 15 de Agosto de 1996.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Passamos à votação global da proposta de resolução n.º 31/IX - Aprova a Convenção entre a República Portuguesa e a República Islâmica do Paquistão para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento e respectivo Protocolo, assinados em Lisboa, em 23 de Junho de 2000.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Vamos proceder à votação do projecto de resolução n.º 75/IX - Atribui prioridade máxima à instalação de um sistema costeiro de vigilância marítima (VTS) (Os Verdes).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Vamos agora proceder à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo ao projecto de lei n.º 175/IX - Alteração do Estatuto dos Deputados (PSD e CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, atendendo à simplicidade do diploma que acabámos de aprovar, é para pedir a dispensa de redacção final, porque me parece não ser necessária.

O Sr. Presidente: - Pergunto se alguém se opõe.

Pausa.

Uma vez que ninguém se opõe, assim se fará.
O Sr. Secretário vai dar conta de pareceres da Comissão de Ética.
Faça favor, Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Ministério Público, DIAP, 2.ª Secção, Processo n.º NUIPC 1718/02.9JDLSB, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Ferro Rodrigues (PS) a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela 3.ª Vara Criminal de Lisboa, 2.ª Secção, Processo n.º 16278/99.8TDLSB, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela 8.ª Vara Criminal do Círculo de Lisboa, 1.ª Secção, Processo n.º 78/01 (NUIPC 2971/99.9TDLSB), a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado João Soares (PS) a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 5.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Oeiras, Processo n.º 904/2002, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr.ª Deputada Isabel Pires de Lima (PS) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial de Anadia, 2.º Juízo, Processo n.º 46/00.9TAAND, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado José Manuel Ribeiro (PSD) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelos serviços do Ministério Público de Loures, 2.ª Secção, Processo n.º 14692/02.2TDLSB, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar a Sr.ª Deputada Isabel Gonçalves (CDS-PP) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Concluídas as votações, resta-me dizer que a próxima reunião plenária se realiza amanhã, com início às 10 horas, e, além do período de antes da ordem dia, a ordem do dia será preenchida com a discussão conjunta da petição n.º 45/IX (1.ª) - Apresentada pela Federação Portuguesa das Colectividades de Cultura e Recreio, solicitando à Assembleia da República a aprovação de um regime jurídico para o movimento associativo, bem como a instituição do dia 31 de Maio como Dia Nacional das Colectividades e, na generalidade, dos projectos de lei n.os 99/IX - Lei-quadro de apoio às colectividades de cultura, desporto e recreio (PCP), 100/IX - Estatuto do dirigente associativo voluntário (PCP), 253/IX - Apoio ao associativismo local (cultural, recreativo, desportivo, social e juvenil) (BE), 297/IX - Pelo reconhecimento e valorização do movimento associativo popular (PSD) e 298/IX - Estatuto do dirigente associativo voluntário (PSD) e com a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 61/IX - Altera o Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, que aprova o regime jurídico aplicável ao tráfico e consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, acrescentando

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as sementes de canábis não destinadas a sementeira e a substância PMMA às tabelas anexas ao Decreto-Lei.
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Social Democrata (PSD):
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
Maria Eduarda de Almeida Azevedo

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
António Jorge Fidalgo Martins
Eduardo Artur Neves Moreira
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro

Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros
Alberto Bernardes Costa

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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