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0523 | I Série - Número 010 | 08 de Outubro de 2004

 

Tive o privilégio de o conhecer bem, de o admirar, e de o estimar. Quando ele "nos deixou", vim do Algarve, em pleno verão, render-lhe a minha última homenagem. Eu tinha por ele uma autêntica veneração.
Pude escrever um pequeno texto para um livro que um dos seus filhos organizou, e no qual vários amigos e admiradores de Henrique de Barros depuseram sobre a sua personalidade. Pude afirmar então que ele era um dos últimos cidadãos romanos do nosso tempo. Já tinha dito isto de um outro português que associo sempre à personalidade de Henrique de Barros, até porque os achava fisicamente parecidos, além de, ambos, intelectualmente veneráveis. Refiro-me ao grande Alexandre Herculano. Considerava-os, a ambos, figuras de uma certa austeridade, de uma seriedade que infundia respeito. O simples facto de olharmos para o Prof. Henrique de Barros, tal como ele era, levava-nos a respeitá-lo e a ouvi-lo com veneração e respeito.
Depois, tive o privilégio de ser ministro de um Governo, o I Governo Constitucional do período posterior ao 25 de Abril. Eu era Ministro da Justiça e ele era Ministro de Estado. Também aí a sua palavra era ouvida com veneração e respeito. Falava poucas vezes. Mas o que dizia tinha um peso específico que só as grandes personalidades logram ter.
Também aí ele teve um papel relevante. Quer quando substituía o Primeiro-Ministro, sem sair da sua cadeira (ele recusou, aliás, o lugar de Vice-Primeiro-Ministro por pura modéstia), quer quando exercia a sua função de Ministro. Foi esse Governo que iniciou o período constitucional, e também aí ele se impôs pela sua personalidade excepcional, respeitável e séria, chegando a parecer sisudo sem o ser. Era, efectivamente, uma personalidade venerável, e foi uma personalidade venerada.
Mas não foi apenas isso! Ele foi um académico ilustre, um brilhantíssimo professor do Instituto Superior de Agronomia, um especialista em economia agrária reconhecido em todo o mundo, e não apenas em Portugal.
Foi também um democrata de todas as horas da vida e da alma, e não se privou de, nos momentos em que julgou necessário, assumir posições contra a ditadura de Salazar, e depois de Caetano, apesar de este ser seu cunhado.
O Prof. Henrique de Barros foi um dos signatários das famosas listas do MUD, que criaram inúmeros problemas a tanta gente e levaram muitos à cadeia.
Além disso, apoiou a candidatura do General Norton de Matos, em que me baptizei, digamos assim, como político activo. Não o conheci nessa época, mas admirei-o e tive notícia dele.
Depois, apoiou a candidatura do Almirante Quintão Meireles, que eu não pude apoiar, porque estava na tropa, em Beja. Por coincidência, estava como oficial de dia no dia das eleições, tendo recebido uma notificação para me apresentar no quartel-general em Lisboa. Perguntei porquê, ninguém me disse. Mas também não vim cá fazer nada, limitei-me a apresentar-me. Depois, percebi: é que, estando eu como oficial de dia, no dia das eleições, e não sendo excluída a possibilidade de vir a ser necessário o uso do chanfalho, eu não era muito indicado para usar esse instrumento, nobre, como todos sabem, para o regime anterior.
Mas já estive com o Prof. Henrique de Barros no apoio ao General Delgado, representando o General Delgado em Moçambique, enquanto ele o apoiava aqui, na então Metrópole.
Em todos os momentos em que foi necessário tomar uma atitude cívica exemplar ele tomou-a. Foi, assim, não apenas um ilustre académico, mas um exemplar cidadão, um carácter exemplar, exemplo para todos nós.
Foi ainda um brilhante e importante cooperativista, defensor do ideal cooperativo. No governo de que fizemos parte, ele criou o Instituto António Sérgio do Sector Cooperativo e - lembro-o em especial às senhoras - remodelou e revigorou a Comissão da Condição Feminina. Espero que um dia essa condição acabe e haja uma só condição e uma só cidadania em Portugal.

O Sr. António José Seguro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Henrique de Barros teve uma grande fé no ideal cooperativo, tal como eu também a tive na minha juventude. Cheguei a conceber o ideal cooperativo como alternativa global ao modelo capitalista para poder substituir o divino lucro.
Infelizmente, isso não foi possível. O lucro lá se foi impondo e o liberalismo lá foi fazendo o seu caminho. Quando caiu o muro de Berlim, o liberalismo económico e o ideal do lucro triunfaram plenamente contra os seus adversários. E o ideal cooperativo foi encolhendo cada vez mais.
Ainda assim, em Moçambique, fiz parte de uma cooperativa que teve grande êxito. Tratava-se de uma cooperativa de construção de casas, mas que veio a ter uma excelente livraria e também - vejam só! -um banco! Havia, pois, em Portugal, uma cooperativa com um banco, não autorizado, como é óbvio, mas

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