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Sexta-feira, 15 de Outubro de 2004 I Série - Número 12

IX LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2004-2005)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 14 DE OUTUBRO DE 2004

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Henrique Jorge Campos Cunha
António João Rodeia Machado

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas.
Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de lei n.º 506/IX.
Em debate mensal com o Parlamento, sobre a lei do arrendamento e decisão sobre as SCUT - o seu impacto na melhoria das condições de vida dos portugueses -, o Sr. Primeiro-Ministro (Pedro Santana Lopes), após uma intervenção inicial, deu resposta a questões colocadas pelos Srs. Deputados José Sócrates (PS) - que também defendeu a honra da bancada, após o que o Sr. Primeiro-Ministro deu explicações -, Guilherme Silva (PSD) - que, no fim, deu explicações ao Sr. Deputado Alberto Arons de Carvalho (PS), que exerceu o direito de defesa da honra pessoal -, Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP), Carlos Carvalhas (PCP), Francisco Louçã (BE), Heloísa Apolónia (Os Verdes), João Cravinho (PS), Marco António Costa (PSD) - na sequência da qual usaram da palavra o Sr. Deputado José Junqueiro (PS), em defesa da honra da bancada, o Sr. Deputado Jorge Neto (PSD), que prestou esclarecimentos na qualidade de Presidente da Comissão de Obras Públicas, Transportes e Comunicações, e o Sr. Deputado António José Seguro (PS), que interpelou a Mesa -, Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP), Bernardino Soares (PCP), Leonor Coutinho (PS) e Vítor Reis (PSD).
Sobre o voto n.º 212/IX - De congratulação pela realização das primeiras eleições livres no Afeganistão (PSD e CDS-PP), que foi aprovado, pronunciaram-se os Srs. Deputados Almeida Henriques (PSD) - que também interveio sobre o voto n.º 213/IX -, Vítor Ramalho (PS), João Rebelo (CDS-PP) - que também interveio sobre o voto n.º 213/IX -, Ana Drago (BE) e António Filipe (PCP).
Foi também aprovado o voto n.º 213/IX - De congratulação pela atribuição do Prémio Nobel da Paz a Wangari Maathai (Os Verdes), tendo-se pronunciado os Srs. Deputados Francisco Madeira Lopes (Os Verdes), Maria Santos (PS), João Teixeira Lopes (BE) e Odete Santos (PCP).
O voto n.º 214/IX - De congratulação pela atribuição do Prémio Carlos V ao Presidente da República Portuguesa, Dr. Jorge Sampaio (Presidente da AR, PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes), foi aprovado após terem usado da palavra, além do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Rui Gomes da Silva), os Srs. Deputados Guilherme Silva (PSD), José Vera Jardim (PS) e Narana Coissoró (CDS-PP).
A Câmara aprovou ainda o projecto de resolução n.º 282/IX - Viagem do Presidente da República a Espanha - Huelva (Presidente da AR).
Foi rejeitado o projecto de deliberação n.º 31/IX - Constituição de uma comissão eventual para a avaliação da execução do Plano de Acção Nacional de Luta contra a Droga e a Toxicodependência - Horizonte 2004 e acompanhamento do processo de definição do "Horizonte 2008" (PCP).
Em votação final global, mereceu aprovação o texto final, apresentado pela Comissão de Trabalho e dos Assuntos sociais, relativo à proposta de lei n.º 87/VIII - Alargamento do Fundo de Compensação Salarial dos Profissionais da Pesca (ALRM).
Por último, foram aprovados pareceres da Comissão de Ética autorizando dois Deputados do PSD, um do PS e um do CDS-PP a prestarem depoimento em tribunal.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 55 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adão José Fonseca Silva
Alexandre Bernardo Macedo Lopes Simões
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Carlos de Sousa Pinto
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António Henriques de Pinho Cardão
António Joaquim Almeida Henriques
António Manuel da Cruz Silva
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Bernardino da Costa Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Delmar Ramiro Palas
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Artur Neves Moreira
Elvira da Costa Bernardino de Matos Figueiredo
Fernando António Esteves Charrua
Fernando José Pimenta Rodrigues
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José David Gomes Justino
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Barreiras Duarte
João José Gago Horta
João Manuel Moura Rodrigues
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa

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Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Soromenho Gomes
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Joaquim dos Santos Ferreira
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Isilda Viscaia Lourenço de Oliveira Pegado
Maria João Vaz Osório Rodrigues da Fonseca
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa da Silva Morais
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Manuel Cruz Roseta
Ricardo Daniel Pinto Soares Vieira
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Susana Maria de Moura Alves da Silva Toscano
Vasco Jorge Valdez Ferreira Matias
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis
Álvaro José Martins Viegas

Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António Jorge Gonçalves e Gama de Oliveira
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões
Augusto Ernesto Santos Silva
Carlos Manuel Luís
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Serrasqueiro
Fernando Ribeiro Moniz

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Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jaime José Matos da Gama
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José António Fonseca Vieira da Silva
José Apolinário Nunes Portada
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos das Dores Zorrinho
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Santos de Magalhães
José Maximiano de Albuquerque Almeida Leitão
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
João Cardona Gomes Cravinho
João Rui Gaspar de Almeida
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Carvalho Carito
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Irene Marques Veloso
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson da Cunha Correia
Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paulo José Fernandes Pedroso
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor José Cabrita Neto
Vítor Manuel Barreto Marinho da Cunha
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

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Partido Popular (CDS-PP):
António Herculano Gonçalves
Henrique Jorge Campos Cunha
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
José Marcelo Sanches Mendes Pinto
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Narana Sinai Coissoró
Paulo Daniel Fugas Veiga
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos
Ângela Ricarda Carriço Sabino

Bloco de Esquerda (BE):
Ana Isabel Drago Lobato
Francisco Anacleto Louçã
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deu entrada na Mesa e foi admitido o projecto de lei n.º 506/IX - Cria a ordem dos psicólogos portugueses e aprova o seu estatuto (PSD e CDS-PP), que baixou à 1.ª Comissão.

O Sr. Presidente: - Sr.as e Srs. Deputados, hoje, a nossa reunião plenária é preenchida integralmente com o debate mensal com o Primeiro-Ministro, nos termos do artigo 239.º do Regimento.
O Sr. Primeiro-Ministro comunicou à Câmara que, na sua intervenção inicial, abordará os seguintes temas: lei do arrendamento e decisão sobre as SCUT e o seu impacto na melhoria das condições de vida dos portugueses.
Depois da intervenção de abertura do Sr. Primeiro-Ministro, que tem um tempo máximo de 12 minutos, segue-se o debate com os tempos usuais, que, recordo, são os seguintes: na primeira volta, cada um dos interpelantes tem 5 minutos, havendo direito de réplica por 3 minutos, e o Sr. Primeiro-Ministro responderá sempre com o tempo equivalente; na segunda volta, as intervenções são mais curtas e não se prevê o direito de réplica; e, na terceira volta, só terão possibilidade de intervir os dois maiores partidos.
Há já inscrições na Mesa para as perguntas, mas o Sr. Primeiro-Ministro e o Governo ainda não chegaram. Vamos aguardar alguns minutos.

Pausa.

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Já se encontram na Sala, nos seus respectivos lugares, o Sr. Primeiro-Ministro e os outros membros do Governo, a quem cumprimento.
Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro, para a sua intervenção inicial.

O Sr. Primeiro-Ministro (Pedro Santana Lopes): - Sr. Presidente, neste primeiro debate mensal desde que o Governo tomou posse, quero saudar V. Ex.ª, a Mesa, as Sr.as e os Srs. Deputados e dizer que é com gosto que iniciamos esta oportunidade de confronto salutar, democrático, certamente duro mas, espero, interessante para o País para que conheça a diferença dos nossos pontos de vista.
Aprovámos o Programa do Governo em 28 de Julho. Em Agosto, naturalmente, a Assembleia da República interrompeu os seus trabalhos e desde que os recomeçou, em Setembro, tem tido um trabalho árduo e intenso, sobre vários temas, em que o Governo tem participado e procurado corresponder a todas as solicitações que lhe são feitas.
Quero também saudar o principal partido da oposição e o seu novo líder, que entretanto foi escolhido pelos militantes, e dar uma palavra ao Grupo Parlamentar do Partido Comunista, que se encontra, tanto quanto foi anunciado, também em fase de substituição da sua liderança. Quero ainda saudar todos os grupos parlamentares da oposição e da maioria e dizer ao novo líder do Partido Socialista que espero que a diferença visível que existe em termos de decisões concretas neste debate em relação ao debate do Programa do Governo contribua - estou certo de que contribuirá - para mantermos, nesta fase da vida política portuguesa, aquilo que as portuguesas e os portugueses esperam de nós: confronto duro, firme, frontal, assumindo as divergências, exaltando as convergências, mas sempre com elevação, com respeito, com urbanismo, com civismo, ao fim e ao cabo, fazendo o Parlamento aquilo que tão bem sabe fazer, que é ser o exemplo de comportamento na vida política portuguesa e na vida portuguesa em geral.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Não foi naturalmente por acaso que escolhemos estes temas para o debate mensal nem optámos por dois por querer tirar importância a qualquer um deles. Cada governo tem a sua cadência, cada governo tem o seu ritmo. Devo dizer que tivemos alguma dificuldade em escolhê-los dos que são os nossos temas, aqueles que penso serem os temas de Portugal. Tenho a certeza de que nem a maioria, nem o Governo, nem a oposição querem debater alguns temas menores nomeadamente ligados a questões de funcionamento do Estado ou outros, embora tenhamos vindo preparados para debater seja que tema for. Encaramos este momento solene da vida do Parlamento, que é também o debate mensal em que o Governo, através do Primeiro-Ministro, se sujeita às questões colocadas pelos Srs. Deputados da oposição e ao princípio do contraditório - tão importante num regime democrático - como uma ocasião para, mais uma vez, podermos sublinhar a vitalidade do nosso sistema político.
Ao escolhermos estes dois temas, quisemos marcar, de modo muito preciso, uma diferença. Nestes poucos meses que levamos de governação, não podemos deixar de destacar matérias como a do arrendamento, que há décadas deveria ter sido decidida, e a das SCUT, que é um exemplo de uma matéria que não foi decidida apesar de o ter sido.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Ao escolhermos estes temas, quisemos dizer que sabemos que, em matéria de arrendamento urbano, nas cidades mais populosas de Portugal, há muitos anos que se passam fenómenos como o da degradação da sua malha edificada, o do êxodo e da migração de muita da sua população para as zonas limítrofes, as zonas que circundam esses aglomerados populacionais. Sabemos, por exemplo, que a capital do País perdeu cerca de um quarto da população na década que antecedeu a entrada em funções do governo de que fez parte o actual líder do Partido Socialista, tendo voltado à população de 1930. Sabemos que, dos contratos de arrendamento actualmente existentes, só 6% foram celebrados por pessoas com menos de 35 anos, ao contrário da média da União Europeia em que 33% dos contratos de arrendamento - ou seja, o que é normal em termos de pirâmide etária - foram celebrados por pessoas que têm menos do que essa idade.
Em Portugal, os investimentos feitos na construção estão numa relação absolutamente distorcida com os que foram feitos na reabilitação urbana. Há mais de 0,5 milhão de casas para reabilitar! Dos 700 000 fogos postos no mercado para arrendamento, cerca de 300 000 respeitam a contratos posteriores a 1990, mas mais de metade respeitam a contratos anteriores a essa data. Todos sabemos da injustiça que representa o Estado não ter tomado, durante décadas, a decisão simples de cada agregado familiar pagar segundo as possibilidades do seu rendimento, ou seja, proporcionar as condições para que haja justiça também nesse lado tão importante da vida das famílias!

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O que é facto é que isso não aconteceu. Por vezes, é mais fácil para quem tem responsabilidades de decidir, quando é informado das consequências, da agitação, das contrariedades, dos perigos eleitorais que pode ter uma determinada medida, responder: "logo vemos…", "fica para depois…" ou ir para medidas de meio-termo. Nós procurámos uma solução equilibrada que atenda à realidade dos que têm mais de 65 anos, pois tendo menos do que três salários mínimos ficam absolutamente protegidos na sua situação actual. Não podemos ignorar aqueles que durante décadas se habituaram, no seu quadro de pensamento, a um determinado esquema jurídico ou legal, segundo o qual moldaram as suas vidas. Mas também não ignoramos que mesmo os que têm mais de 65 anos e que têm rendimentos que lhes permitam entrar no regime de renda condicionada, que a lei prevê, devem, de facto, entrar por essa via. Como em relação aos que têm mais de 65 anos, atendemos à situação particular dos que vivem em condições precárias, dos que têm rendimentos exíguos e, por isso mesmo, estabelecemos os regimes de transição, que foram devidamente anunciados.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Olhámos ao número de membros dos agregados familiares e, principalmente, exigimos que, para entrar na fase de negociação de qualquer contrato de arrendamento, os senhorios apresentem o seu certificado de habitabilidade, tendo dado estímulos àqueles que o façam de modo mais expedito, mais célere, e não atirando a eficácia da reforma para depois do próximo acto eleitoral!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quanto a esta matéria do arrendamento, quero sublinhar a sua importância para as camadas mais jovens da população. É injusto que o Estado, ao longo de todos estes anos, tenha privilegiado uma política de bonificação ou de financiamento de um regime de aquisição própria, endividando milhares e milhares de famílias jovens durante décadas, obrigando-as a ir viver para longe do seu local de trabalho e, na prática, colocando-as na dependência, quase para toda a sua vida, de instituições financeiras que não lhes permitem o mínimo de desafogo nos seus orçamentos familiares. Foi uma decisão que tomámos a pensar em quem mais precisa e não em quem mais tem!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A propósito das decisões que se tomam para depois dos próximos actos eleitorais, não posso deixar de referir o caso das SCUT. Não sou daqueles que renega a importância de visões que vêm desde Fontes Pereira de Melo e outros, a importância das vias de comunicação para o desenvolvimento do território e das populações - com certeza que foram assumidas por governos em que nos revemos, durante períodos importantes da história recente Portugal, como os governos de Cavaco Silva.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Dizemo-lo com honra: sabemos a importância que tem terem sido construídas auto-estradas e comunicações mais céleres em tantos pontos do País. Agora, há algo que não fizemos, não fazemos, nem faremos: é criar nas pessoas ilusões; é, desculpem dizer-lhes, enganá-los; é dizer que podem utilizá-las porque são grátis, porque não pagam, aparecendo a conta oito anos depois, quando já não se está no poder...!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Estas são as duas diferentes maneiras de governar! É fácil dizer: "compre casa!", "compre carro!", "o crédito é simples!"; ver os bancos endividarem-se no exterior e verificar que o endividamento das famílias portuguesas passa, como passou, de 18% para cerca de 100%, desde 1992 até 2002, em relação aos seus rendimentos disponíveis.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

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O Orador: - Isto não é governar a pensar nas pessoas. Quem falava em "razão e coração" como inspirações da governação tem de ter a consciência perfeita de que para quem tem margens de endividamento e exigências de esforço financeiro superiores aos seus rendimentos disponíveis a sua vida do dia-a-dia é, obviamente, incomportável, impossível e que só pode exprimir insatisfação, quando não mesmo revolta.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E é por isso mesmo que dizemos que a maneira de governar, em que a economia cresce pelo lado do consumo, em que economia cresce pelo consumo que é permitido pelo endividamento, é uma maneira fácil. Mas se ao menos a despesa de funcionamento do Estado tivesse sido contida… Mas que surpresa que tive ao ver responder à comunicação que fiz ao País os responsáveis do crescimento de 9% e 7% da despesa corrente nos anos em que exerceram responsabilidades de governação.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É que nada foi contido dentro dos limites do sentido de responsabilidade. Foi atirado para depois, o que significa que, no próximo ano, a primeira renda será de cerca de 500 milhões de euros (pedirei depois para esse mapa ser distribuído) e, na velocidade-padrão dos encargos financeiros do Estado, será de cerca de 700 milhões de euros, atingindo os 800 dentro de poucos anos.
Em 1998 foi dito: façam-se as auto-estradas, o preço de automóvel por km na SCUT é três ou quatro vezes superior ao que é praticado pelas auto-estradas concessionadas pela Brisa, mas não faz mal dado os volumes de tráfego que se estão a verificar, sendo com base nesses cálculos que pagaremos a indemnização aos privados. Ora, essas indemnizações chegam no próximo ano...!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, o seu tempo esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente.
Esta não é a nossa maneira de governar, ou seja, dizer: "nós fazemos, endividem-se, recorram ao crédito, porque a factura chega depois, quando já não estivermos no Governo, outros irão pagá-la"...
Sr. Presidente, o mais difícil na relação entre as pessoas é a confiança. Iludi-las, enganá-las e depois reconquistar a sua confiança é uma tarefa muito difícil, mas é isso que este Governo está a fazer e irá continuar.

Aplausos do PSD e do CDS-P, de pé.

O Sr. Presidente: - Está aberto o debate e a primeira intervenção cabe ao maior partido da oposição.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Sócrates.

O Sr. José Sócrates (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, também eu quero cumprimentá-lo por ocasião deste primeiro debate entre nós desde que tomou posse.
Gostaria justamente de começar por um assunto muito nobre.
Todos os portugueses sabem por que é que eu estou aqui a liderar o Partido Socialista, por uma razão muito simples: porque fui a votos, ganhei um congresso e uma eleição democrática.

Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Orador: - E, se me permite, o Sr. Primeiro-Ministro não pode dizer o mesmo. O Sr. Primeiro-Ministro nunca ganhou um congresso e nunca ganhou uma eleição legislativa!

Aplausos do PS.

Esta é uma diferença fundamental entre nós.

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Sei que Sr. Primeiro-Ministro já marcou um congresso do PSD, mas é preciso que fique claro que nenhum congresso do PSD o transforma naquilo que o senhor não é - é um Primeiro-Ministro que não teve a escolha dos portugueses!

Aplausos do PS.

O Sr. Primeiro-Ministro propôs que fossem debatidos dois temas e eu não quero fugir-lhes, por isso vou dar sobre eles a minha opinião, não sem cometer a deselegância para consigo de abordar outros temas que fazem parte da nossa actualidade política.
Em primeiro lugar, quero comunicar-lhe a opinião do Partido Socialista sobre a lei das rendas.
O PS é favorável a uma alteração legislativa da lei do arrendamento que vise combater a degradação do nosso parque urbano, revitalizar os centros urbanos das nossas cidades e dinamizar o mercado do arrendamento, mas o Partido Socialista não pode votar uma lei como a que está proposta, que, de forma irresponsável, ligeira e leviana, permite o despejo de milhares de famílias e de comerciantes.

Aplausos do PS.

Isso não faremos porque é injusto e irresponsável, e espero que o Governo esteja disponível para, aquando do debate na Assembleia da República, corrigir os erros da lei.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Pura demagogia!

O Orador: - Em segundo lugar, Sr. Primeiro-Ministro, refiro-me ao tema das SCUT, dando-lhe a minha opinião de forma clara.
Quero começar por dizer ao Sr. Primeiro-Ministro que se não houvesse o programa das SCUT ainda hoje Portugal não tinha uma auto-estrada entre Lisboa e Guarda!

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Quem é que paga?

O Orador: - Se não houvesse o programa das SCUT ainda hoje não estaria em construção a auto-estrada entre Viseu, Vila Real e Chaves!

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Quem é que paga?

O Orador: - Se não houvesse o programa das SCUT ainda hoje não estaria a construir-se a duplicação do IP5!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Quem é que paga?

O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, conheço bem o seu argumento, o do princípio do utilizador/pagador, mas foi justamente a sua utilização abusiva durante décadas na política de obras públicas, em particular na construção de estradas, que levou à situação existente até 1996.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Qual situação?! Essa é boa!

O Orador: - Foi esse princípio que permitiu que só se construíssem auto-estradas no litoral e que o interior ficasse abandonado à sua sorte.

Aplausos do PS.

Não, Sr. Primeiro-Ministro! Não conta connosco, nós somos dos que defendemos políticas activas de promoção do desenvolvimento do interior e queremos que haja SCUT's, queremos que haja auto-estradas

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no interior justamente para defender o direito à solidariedade nacional para com o interior do País. Esta é a nossa política e é neste aspecto que nos afastamos.

Aplausos do PS.

Mas, Sr. Primeiro-Ministro, se me permite, não posso deixar de abordar outro trema, que diz respeito à insólita apresentação que o Sr. Primeiro-Ministro decidiu fazer do Orçamento do Estado em tempo de antena do Governo.
Durante dois anos, a maioria e o Governo prometeram ao País uma política baseada na obsessão do défice orçamental e para isso congelou os salários, subiu os impostos e cortou no investimento público. Ao fim de dois anos, o que é que temos? Temos crise, temos recessão, temos desemprego e não conseguiram baixar o défice abaixo dos 3%!

Aplausos do PS.

Pois, agora, o Sr. Primeiro-Ministro vem prometer tudo de uma vez. De uma só vez o Sr. Primeiro-Ministro prometeu aos portugueses que vai baixar os impostos, que vai aumentar o investimento, que vai aumentar os salários, que vai aumentar as pensões e que vai deixar o défice abaixo dos 3%!

O Sr. António José Seguro (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente.
Sr. Primeiro-Ministro, o que prometeu aos portugueses foi fazer "gelo quente", mas - lamento desiludi-lo, Sr. Primeiro-Ministro - "gelo quente" não existe!... Compreendo bem que o Sr. Primeiro-Ministro queira "comprar" o seu estado de graça perante os portugueses, mas não o pode fazer à custa da desgraça da nossa economia!

Aplausos do PS.

O que o Sr. Primeiro-Ministro fez foi substituir uma política que tinha a obsessão do défice orçamental por uma baseada na obsessão da campanha eleitoral, mas isso fá-lo-á à custa dos portugueses. Esse é o caminho da irresponsabilidade e aí não o podemos acompanhar, Sr. Primeiro-Ministro!

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Sócrates, referir-me-ei à última parte da sua intervenção, que fez lembrar alguns debates que tivemos, ainda que sem um conteúdo idêntico, mas, em primeiro lugar, falarei sobre a legitimidade.
Acho extraordinário ter-me dito que nunca ganhei umas eleições nacionais. Espere pelas próximas, Sr. Deputado, que já vai ver!…

Aplausos e risos do PSD e do CDS-PP.

Já agora gostava de dizer-lhe que não fica bem, a quem acabou de ganhar um título, dizer: "já viram o meu título?". Ó, Sr. Deputado, isso não lhe fica bem! É preciso haver humildade democrática!

Aplausos e risos do PSD.

Haverá um congresso do PSD daqui a algumas semanas, e sabe por que é que não houve antes? Porque o Sr. Presidente da República respeitou o princípio básico do funcionamento das instituições. Mas se o Sr. Presidente tivesse tomado outra decisão, não faríamos como os senhores - reconheço que o Sr. Deputado o fez cum grano salis, pois já era capaz de estar a antever algumas consequências como as que ocorreram: não desrespeitaríamos a sua decisão, apesar de terem anunciado que a respeitariam, fosse ela qual fosse.

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Pronunciaram-se o Sr. Presidente da República, o Conselho de Estado no parecer que deu, a maioria do Parlamento. Quer outros critérios? Quais? Que outro critério é que há em democracia?!
Já agora, gostava de dizer-lhe o seguinte: o senhor disse que eu nunca tinha ganho quaisquer eleições nacionais e que nunca as terei disputado com este ou com aquele. Mas as que disputei há bem pouco tempo - e foram mais do que nacionais, a alguns títulos, tendo tido como consequência a saída do seu ídolo, o primeiro-ministro da altura - ocorreram em Lisboa contra todas as bancadas e, portanto, não vieram só alguns, vieram todos. E ganhámos na mesma!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Risos de alguns Deputados do PS, que apontam para o Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional, Paulo Portas.

Podem estar a apontar para o Sr. Ministro de Estado Paulo Portas, mas ele teve um excelente resultado e à conta dele aqui está na coligação enquanto os senhores estão na oposição. Portanto, isso acontece a todos…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quanto ao arrendamento, gostava ainda de dizer ao Sr. Deputado José Sócrates que o ouvi, mas acho que ainda não teve tempo de ler toda a lei. Pelo que conheço de si, acredito que, quando ler toda a lei, chegará à conclusão de que ela é equilibrada, mas nós estamos sempre dispostos a considerar propostas de alteração.
É evidente que a ex-secretária de Estado não considerará a lei equilibrada... Sabe, é que discutir políticas com quem esteve anteriormente como titular das pastas é sempre complicado, porque acham sempre que quem fez bem foi quem lá esteve. Portanto, se trouxer outras pessoas, que não o ex-ministro das Finanças e a ex-secretária de Estado da Habitação do governo do Engenheiro António Guterres para debater connosco estas matérias, vai ver como é mais fácil encontrar pontos de convergência e de entendimento!

Aplausos e risos do PSD e do CDS-PP.

Quanto à questão das auto-estradas do interior, devo dizer, Sr. Deputado José Sócrates, que fizemos tanta auto-estrada sem o princípio de que falou… Até tenho gosto em convidá-lo…

Vozes do PS: - Onde?!

O Orador: - Srs. Deputados, não se enervem, estavam mais calmos há pouco. Já percebi por que é que já estão mais nervosos…
Por exemplo, na auto-estrada de Mira-Estarreja-Aveiro, que ainda no outro dia inaugurei, onde não está previsto pagar portagem, o rendimento per capita das pessoas, os índices de desenvolvimento são inferiores aos da região de Leiria à Figueira, onde está previsto pagar portagem.
Trata-se de um tema onde temos muito tempo para debater. Não chegámos a soluções finais! Tal como está dito na própria resolução do Conselho de Ministros, fazemos discriminação positiva a favor dos locais que tiveram expectativas criadas em relação a anos em que lhes disseram que nunca pagariam. Vamos fazê-lo!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Só para terminar, Sr. Deputado José Sócrates, quero dizer-lhe que, hoje em dia, estes são dois temas estruturantes porque respeitam a maneiras de encarar a governação do País. E, tal como gosto de dar razão a algumas propostas da oposição, espero que consigo tenhamos uma oposição que seja capaz de dizer que algumas propostas do Governo são boas.
Quem ganha em democracia como deve ser nunca é só quem diz mal de tudo o que é governo e fica à espera que um dia a economia piore para depois ocupar o lugar de quem está mas, sim, quem demonstra políticas alternativas, quem tem soluções melhores e quem merece mais a confiança e a credibilidade dos portugueses. E se um dia conseguirem convencer os portugueses, não só dizendo mal das nossas propostas

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mas fazendo melhor, que viva a democracia, que viva a liberdade, só ganharemos com isso e a alternância funcionará um dia, seguramente.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para replicar, dispondo de 3 minutos, tem a palavra o Sr. Deputado José Sócrates.

O Sr. José Sócrates (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, lamento muito recordar-lhe que V. Ex.ª ocupa esse lugar sem ter ganho uma eleição legislativa nacional.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Outra vez?!...

O Orador: - Esta é a pura das verdades, Sr. Primeiro-Ministro, e vai ter de conviver com isso. Este não é um tema qualquer nem um tema secundário, é um tema da maior importância,…

O Sr. António José Seguro (PS): - Muito bem!

O Orador: - … porque só a legitimidade política dá autoridade. E, desculpe-me, Sr. Primeiro-Ministro, mas só essa autoridade é que é fundamental para poder coordenar um governo.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Fait divers!

O Orador: - Há um ponto em que todos os analistas estão de acordo, Sr. Primeiro-Ministro:…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Quais?!

Vozes do PSD: - Ora..., analistas do PS.

O Orador: - … é que o Governo não tem rumo, não tem estratégia e não tem coordenação!!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E se é verdade que, há uns meses atrás, os portugueses não compreenderam por que é que V. Ex.ª é Primeiro-Ministro, à medida que o tempo passa vão percebendo cada vez menos.

Aplausos do PS.

O que verdadeiramente falta a este Governo é orientação e rumo, é aquilo a que se chama, Sr. Primeiro-Ministro, liderança. Porque os portugueses não podem confiar num Primeiro-Ministro que uma vez diz umas coisas, outra vez diz outras;…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Quais?!

O Orador: - … não podem confiar num Primeiro-Ministro que deixa o seu Governo à deriva e que deixa os ministros digladiarem-se na praça pública à volta das questões da governação;…

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Isso não é debate!

O Orador: - … não podem confiar num Primeiro-Ministro que não imprime aquilo que é fundamental a um Governo que é uma orientação, um rumo, uma estratégia e uma liderança.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - É um debate ad-hoc!

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O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro - desculpe dizer-lhe -, os portugueses vão ficando com a sensação, e nós também, de que verdadeiramente o Dr. Santana Lopes não está no lugar certo, não tem jeito para isto...! A conclusão a que chegamos é que o Dr. Santana Lopes não tem jeito para Primeiro-Ministro. É essa a aparência que este Governo dá.

Aplausos do PS.

O Orador: - Notei que o Sr. Primeiro-Ministro não teve tempo, nos seus 5 minutos, para falar na economia. Cá espero pela sua resposta.
Mas, Sr. Primeiro-Ministro, gostaria de lembrar-lhe o seguinte: não podemos passar de uma fase em que estamos em recessão para uma fase de crescimento estouvado, porque essa não é a realidade da nossa economia.
Gostaria também de recordar-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, que este mês temos mais 16 000 desempregados; que os dados do comércio internacional de Portugal apontam para o agravamento do défice comercial; que as exportações não arrancam; e que somos o segundo pior país da União Europeia em termos de confiança. Esta é que é a realidade da nossa economia que nenhuma central de comunicação poderá disfarçar ou mascarar.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - Mas, Sr. Primeiro-Ministro, V. Ex.ª não se vai daqui embora sem falarmos num último tema. Dei-lhe todas as oportunidades para isso. Poderia ter falado nele no seu discurso inicial e também podia ter falado nele, a seguir, na resposta à minha pergunta. E o caso a que este tema diz respeito não é resolvido pelo seu silêncio e é um caso a que não pode fugir.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Falo do caso de um ministro do seu Governo que fez uma pressão ilegítima junto de uma estação de televisão privada, que conduziu à eliminação de uma voz incómoda para o seu Governo.

Aplausos do PS.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Ah!…

O Orador: - O Sr. Primeiro-Ministro desculpar-me-á, mas quero dizer-lhe com clareza que esse episódio é indigno de um governo democrático e é inaceitável. E mais: é uma "nódoa" que o vai perseguir, porque essa "nódoa" não vai ser apagada facilmente, pois fez Portugal regressar aos tempos em que havia condicionamento da liberdade de expressão.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Bem lembrado!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Peço-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, que resista à tentação de um controlo da comunicação social. Não vá por aí, porque nós cá estaremos para evitar essas tentações.

Aplausos do PS.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Falta de assunto!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Sócrates, devo dizer que, normalmente, quando as pessoas resvalam para as considerações de ordem pessoal, é porque lhes falta a razão nas outras matérias. É sempre assim.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Cá estaremos, com o tempo, para apreciar a eficácia da sua liderança. Cá estaremos!...

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Já se nota!

O Orador: - Mas devo dizer-lhe que o ter "jeito" para isto ou não ter nunca me levará a uma atitude que é dizer: o País está cheio de dificuldades, por isso, se não se importam, vou-me embora.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Está a falar do Durão Barroso?!...

Risos do PCP.

O Orador: - É essa falta de jeito que não tenho, mas tenho jeito para ir em frente, para continuar firme no meu posto.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Deputado José Sócrates, como eu já sabia que V. Ex.ª iria falar nessa matéria, trouxe - irei entregar-lhe em breve - recortes vários de entrevistas suas, do Sr. Deputado Jorge Coelho e do Dr. Armando Vara a queixarem-se, enquanto membros do governo, da falta de coordenação do Eng.º Guterres, da falta de ligação entre o governo e o partido, de 1997, 1998 e 1999, e artigos do director de um órgão de comunicação social diária que, agora, escreve exactamente o que escreveu sobre o Dr. Durão Barroso - e, agora, o Dr. Durão Barroso é o "rei dos reis"... -, é só tirar o nome dele e pôr o meu, que os editoriais são iguais.

Risos.

Tenho todo o gosto em oferecer-lhe o recortes dessas suas preocupações na altura quanto à falta de capacidade de coordenação do Engenheiro António Guterres - por cujo regresso, não sei para onde, o senhor agora anseia...!
Quanto à economia, Sr. Deputado José Sócrates, não quer ver o que todos vêem? É que o senhor, nesse aspecto, está com o mesmo discurso do tempo em que tínhamos os tais debates na televisão como homens livres. Não fale nesses temas que são… A responsabilidade da imagem de um país não é só do Primeiro-Ministro e do Governo é também dos dirigentes da oposição e de todos os responsáveis da instituição.
Se quer insinuar que não há liberdade de expressão num país como Portugal, isso é ofensivo do regime democrático saído do 25 de Abril e da liberdade em que todos vivemos. Não faz sentido!!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Deputado José Sócrates, o senhor que falou em novas fronteiras, tire esses "fantasmas" da cabeça - a Dr.ª Maria Barroso, aquando da campanha para as autárquicas em Lisboa, disse que vinha aí o fascismo, se eu ganhasse, que acabava o 25 de Abril. Isso já não se usa...! A maior parte da população portuguesa, que são jovens de 30 a 40 anos, não compreendem esse discurso.
O senhor não vê que a economia está a crescer? Não vê que as receitas dos impostos…

Vozes do PS: - Não!

O Orador: - Ó Sr. Deputado José Sócrates, foi o próprio Governador do Banco de Portugal, Dr. Vítor Constâncio, que, há uma semana, reviu em alta as suas previsões de crescimento para a economia portuguesa para este ano.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Os senhores preferem ter esta atitude: a realidade não nos convém, a realidade não nos interessa. Venha barco da Holanda, venha "folhetim" da liberdade de expressão, venha a tese de que o Orçamento do Estado é do Primeiro-Ministro e não dos ministros ou que nos desmentimos, venham histórias de

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assessores ou de carros - aliás, tenho aqui a lista dos seus quatro assessores de imprensa na altura, e eu não tenho nenhum, garanto-lhe!... -, o que os senhores querem, como a realidade não vos convém, é viver de casos, de ficção. Mas já temos horas de ficção que cheguem nas televisões portuguesas.
O que os portugueses querem da política é a realidade, é o debate das alternativas, é elevação, é a verdade e o rigor.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António José Seguro (PS): - Pois é!

O Sr. Presidente: - Para formular a pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado José Sócrates, deve lembrar-se que não há uma segunda oportunidade para deixar a primeira impressão…

Protestos do PS.

… e, Sr. Deputado, aquilo a que assistimos agora foi ao regresso do "guterrismo" reciclado…

Protestos do PS.

… ou recauchutado, para usar uma expressão do Sr. Eng.º Henrique Neto. Como todos sabemos, esta cópia do "guterrismo", como todas as cópias, é pior do que o original, que já foi tão mau, como também todos sabemos.

O Sr. José Lello (PS): - Já está a confundir o Primeiro-Ministro!

O Orador: - Já chega deste estilo de muito palavreado, de muita conversa, de "muita parra, mas pouca uva".

O Sr. Afonso Candal (PS): - O Sr. Deputado José Sócrates ainda não é Primeiro-Ministro!

O Orador: - Não ouvimos uma ideia alternativa, o que ouvimos foi exactamente a defesa acérrima do erro que foram as SCUT ao atirar os encargos para as gerações futuras.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas não me espanta que assim seja, porque já o Deputado Vítor Ramalho dizia: "A candidatura de Sócrates é despida de ideias". E comprovou-se aqui que não foi apenas despida de ideias para dentro do Partido Socialista, foi também, o que é mais grave, despida de ideias para o País. Não foi aqui apresentada por V. Ex.ª uma única proposta alternativa consistente.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Tivemos aqui esta comparação feliz entre este rumo insistente das soluções tipo SCUT, agora defendido renovadamente pelo novo líder do Partido Socialista, e o contraste, aqui perfeitamente identificado na pessoa do Sr. Primeiro-Ministro, que está à frente deste Governo e que revela uma coragem excepcional.
Os dois temas que V. Ex.ª, Sr. Primeiro-Ministro, trouxe aqui são perfeitamente reveladores de um Governo de coragem,…

O Sr. José Lello (PS): - Como é que são as SCUT na Madeira?!

O Orador: - … de um Governo que não hesita em assumir uma reforma que anda há décadas a ser prometida, anda há décadas a ser arrastada, porque ninguém teve coragem de a fazer pelas implicações sociais que tem.
É assim que se governa. Governa-se a pensar no País.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

V. Ex.ª, Sr. Primeiro-Ministro, e o seu governo não têm apenas de reformar e de corrigir os erros acumulados de décadas, como é o caso do arrendamento, têm também de assumir a correcção dos erros graves que os socialistas cometeram e que estão a repercutir-se agora em encargos de milhões e milhões de euros atirados para o futuro. Os socialistas receberam os "louros" e deixaram-nos em cima dos ombros os encargos desses "louros".

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É esta matriz, é esta diferença que saliento.
Quero fazer um parêntesis para lembrar a tirada que, na segunda volta, o Sr. Deputado José Sócrates teve ao acusar este Governo de pressões sobre a comunicação social.
Sr. Deputado, sobre essa matéria, basta lembrar a reacção do Dr. Eduardo Cintra Torres ao lembrar a carta que o então Secretário de Estado da Comunicação Social enviou ao director do Público pedindo que ele fosse afastado por delito de opinião, por criticar uma opinião que tinha expresso nesse jornal. Essa carta foi publicada no jornal Público. Foi o Secretário de Estado da Comunicação Social que tomou a iniciativa de fazer esta censura, de pedir o afastamento de um jornalista do jornal Público.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Uma vergonha!

O Orador: - Mais: foi também o Sr. Deputado Arons de Carvalho que lembrou, no seu livro, que aqui também já citámos,…

O Sr. José Lello (PS): - Está a citar bons autores!

O Orador: - … o comportamento do Partido Socialista de reduzir a publicidade no 1.º canal e de acabar com ela no 2.º canal para privilegiar a SIC e a TVI, evitando, assim, que esta última fosse para a falência. Isto foi dito expressamente pelo Sr. Deputado Arons de Carvalho, criticando o Eng.º Guterres por ter essa opção de pressão sobre as privadas e de prejuízo para a televisão pública.
Sr. Primeiro-Ministro, a questão que quero colocar-lhe é esta: pode aqui assegurar-nos que o seu Governo e V. Ex.ª vão continuar com a opção das reformas profundas, de governar para as novas gerações e de não governar a pensar em eleições?
É este o desafio que deixo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Peço desculpa, Sr. Primeiro-Ministro, mas as interpelações à Mesa têm prioridade.
Tem a palavra, Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, antes de mais, quero agradecer a gentileza do Sr. Primeiro-Ministro.
Sr. Presidente, é só para precisar que este é um debate mensal com a presença do Primeiro-Ministro e que é inaceitável, sabendo que não há possibilidade de usar o direito de resposta, que o líder do Grupo Parlamentar do PSD possa dirigir-se ao líder do partido da oposição.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Ah!…

O Orador: - Se o quer fazer, o Sr. Presidente tem de dar o mesmo tempo para o Sr. Deputado José Sócrates poder responder.
É injusto, é inaceitável…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

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… e vindo de quem defende o contraditório está muito mal, porque não é coerente.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António José Seguro, este assunto é recorrente neste tipo de debates. O Sr. Deputado sabe qual é a minha opinião sobre esta matéria, mas existe uma longa praxe que vem de tempos antigos e que permite estes parêntesis.
Em todo o caso, é um assunto que podemos perfeitamente discutir em Conferência de Líderes para, eventualmente, alterarmos a regra do jogo que nos rege. Dentro dessa regra do jogo, os parêntesis feitos pelos oradores não podem deixar de ser considerados como tal.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, pedi a palavra apenas para que a Mesa registe que o Partido Socialista quer trazer o seu ímpeto censor até dentro do Parlamento.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a interpretação das declarações feitas por cada membro do Parlamento é livre para todos os membros do Parlamento. A interpretação que a Mesa faz da interpelação do Sr. Deputado António José Seguro difere, evidentemente, da interpretação que o Sr. Deputado Guilherme Silva faz.

O Sr. Alberto Arons de Carvalho (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Alberto Arons de Carvalho (PS): - Sr. Presidente, fui directamente acusado de coisas que não são verdadeiras e tenho, presumo, o direito de defesa da honra.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado. Ser-lhe-á dada a palavra no final do debate.
Para responder ao Sr. Deputado Guilherme Silva, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, relativamente aos dois temas que trouxemos para debate, devo dizer que, como com toda a certeza todos os governos fazem, pensámos muito sobre quais os temas que deveríamos escolher, sobre quais seriam os mais adequados ao momento actual da sociedade portuguesa. E escolhemos estes porque, com franqueza e sem piada, considerámos que representavam uma fronteira para definir a capacidade e a coragem de estar com as exigências deste tempo novo e o significado que têm para um crescimento saudável da economia portuguesa e não manter a mesma atitude da oposição.
Na verdade, enfrentamos problemas vários de subfinanciamento em vários sectores do Estado e da Administração Pública, que teremos ocasião de debater no próximo Orçamento do Estado, e só acreditamos no crescimento de uma economia, como em tudo na vida, se as raízes forem sãs, se crescer em bases sólidas e com base na verdade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por isso mesmo, trouxemos a questão das SCUT, em relação às quais - imagine-se! - a principal proposta que recebi dos estudos financeiros que estavam feitos foi a de securitizar as receitas das portagens depois de 2030 - quando não se sabe se haverá carros exactamente como os que há hoje ou se a inovação tecnológica irá noutro sentido! -, porque a realidade é que os 500 milhões de euros da primeira renda do próximo ano são superiores ao orçamento anual do Instituto de Estadas de Portugal (e não estou só a falar do nosso Orçamento mas também o dos anos anteriores) para a construção de novas estradas, bem como para a manutenção e conservação das que existem.
E o problema é que, além destes 500 milhões de euros, como os contratos foram feitas na base "Construam auto-estradas. Estudos de impacte ambiental depois. Expropriações depois. E as correcções que tiverem de ser feitas serão depois apresentadas", até agora, em função dessas correcções resultantes

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desses termos contratuais, já chegaram ao Ministério pedidos de pagamentos de outros tantos 500 milhões de euros, em função do que foi deixado ao livre arbítrio. Ou seja, 1 bilião de euros que está nessa factura, que chegaria anos mais tarde para pagamento. É isto que está em causa quando debatemos matérias como esta.
Na saúde, por exemplo, o problema é diferente. O Serviço Nacional de Saúde é tendencialmente gratuito e, portanto, não temos de procurar modelos de financiamento privados.
Agora, há questões de justiça de que nós não prescindimos. Quem pode mais tem de pagar mais;…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … quem não pode não paga. São estas as regras que inspiram as nossas decisões.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Há populações que vivem em zonas como as abrangidas pela Via do Infante ou pela A23 em que lhes foram criadas expectativas por vários governos e que não têm percursos alternativos. Ora, é para melhorar as condições de vida dessas populações que estabelecemos discriminação positiva a essas populações isentando-as durante três ou quatro anos até essas populações terem as condições que também lhes permitam pagar portagem.
Dou um exemplo: hoje em dia, há populações com rendimento per capita muito superior ao do Alentejo ou ao dos arredores de Lisboa ou do Porto que têm de pagar portagem quando outros não a querem pagar.
Portanto, vamos continuar no caminho da justiça e da coesão em todo o território nacional. O que não iremos fazer, nunca, é dizer que tomámos esta decisão e que a factura vai ser paga 10 anos depois. Isso é que nunca iremos fazer, e nesse sentido iremos continuar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Já agora, permita-me, Sr. Deputado Guilherme Silva, que me dirija ao Sr. Deputado José Sócrates para lhe dizer, já que há pouco não tive tempo - e, se quiser, dou ao Sr. Deputado José Sócrates algum tempo de que disponho, apesar de ser pouco, para poder responder-me porque não gosto que ninguém fique sem resposta -, que me parece que lhe fica mal falar em legitimidade, porque está a pôr em causa a história do seu partido.

O Sr. José Lello (PS): - Doeu-lhe!

O Orador: - Não doeu! Para as dores preciso de muito mais, Sr. Deputado José Lello! Muito mais!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Deputado José Sócrates, o seu antecessor, a quem o Sr. Deputado deve respeito, disputou as últimas eleições legislativas sem ser legitimado em congresso.

Vozes do PS: - Não é verdade!

O Orador: - Isso já aconteceu na história do vosso partido!

Vozes do PS: - Não é verdade!

O Orador: - Sei o argumento que os senhores usam, o da convenção, e que foi utilizado…

Protestos do PS, batendo com as mãos nos tampos das bancadas.

Sr. Deputado José Sócrates, iremos conferir os termos exactos quando da sucessão do Dr. Ferro Rodrigues. Agora, em termos de legitimidade, não vamos falar mais…
Vamos falar do fundamental. As vossas reformas foram no sentido de serem pagas a prazo; as nossas reformas são no sentido de as responsabilidades serem agora assumidas!

O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, o seu tempo esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

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O Orador: - É isso que está em causa.
Uma coisa garanto tanto às bancadas da maioria e da oposição: quando se fala em continuidade, não podemos ficar só com o que os Srs. Deputados dizem que é difícil e negativo e que vem do governo anterior. As decisões como a do serviço militar obrigatório, a dos antigos combatentes e outras, que concretizámos neste Governo e que vêm do governo anterior, também nos pertencem, ou seja, o que é difícil e vem detrás é nosso, mas o que é positivo e que também vem detrás é também nosso. Não pode haver dois pesos e duas medidas.
É preciso justiça e é preciso sentido de equidade!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Deputado Guilherme Silva comunicou à Mesa que não pretende exercer o direito de réplica.
Dou agora a palavra ao Sr. Deputado José Sócrates, que entretanto a pediu para exercer o direito de defesa da honra da bancada.

O Sr. José Sócrates (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, desculpe dar-lhe de novo um conselho, mas é melhor estudar antes de falar.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Dr. Ferro Rodrigues, líder do Partido Socialista, disputou as últimas eleições legislativas depois de ter sido escolhido por voto directo por todos os militantes socialistas.

Aplausos do PS.

Enganou-se, Sr. Primeiro-Ministro! Enganou-se!
Por isso, aconselho-o, Sr. Primeiro-Ministro, a estudar antes de falar, a pensar antes de falar. É que não estudou bem.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Quando é que teve lugar o congresso?!

O Orador: - O congresso foi no início do ano, ou melhor, o congresso não, desculpe, a eleição foi imediatamente antes.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Ah!…

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados…

O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, não vale a pena tentar confundir. O Dr. Ferro Rodrigues foi escolhido por voto secreto e directo dos militantes socialistas,…

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - … nas tais directas que o senhor queria antes de ser Presidente do PSD e que agora se esqueceu delas. Lembra-se disso, Sr. Primeiro-Ministro?

Aplausos do PS.

Já agora, Sr. Primeiro-Ministro, há também um ponto que não pode ficar sem resposta:…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

… o Sr. Primeiro-Ministro invoca um "buraco" financeiro a propósito das SCUT deixado pelo governo do PS. Essa afirmação também ofende a minha bancada.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

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0606 | I Série - Número 012 | 15 de Outubro de 2004

 

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Sócrates…

O Orador: - Quero dizer-lhe o seguinte, Sr. Primeiro-Ministro: não há "buraco" financeiro nas SCUT, só há "buraco" porque os senhores não disponibilizam o dinheiro que devia ser posto no Orçamento.
Mais: se o Sr. Primeiro-Ministro quer falar de "buracos"…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Deputado José Sócrates faz uso da figura regimental da defesa da honra conforme entende invocando-a claramente.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Peço aos Srs. Deputados da maioria que aceitem a autoridade do Presidente da Mesa.

O Orador: - Se não se importam, oiçam até ao fim, tal como nós os ouvimos.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Sócrates está no uso da palavra e depois darei a palavra ao Sr. Primeiro-Ministro para dar explicações.

O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, falava eu do "buraco" financeiro que invoca a propósito das SCUT. Isso não é verdade! O "buraco" existe apenas por uma única razão: é que os senhores não põem no Orçamento o dinheiro que é devido ao interior para o desenvolver.

Aplausos do PS.

Quero dizer-lhe uma outra coisa, Sr. Primeiro-Ministro: também lhe recomendo que pense duas vezes antes de falar em "buracos". Porque "buraco" é aquele que está à entrada de Lisboa e esse chama-se "túnel do Marquês". Esse, sim, é que é um "buraco" e é uma vergonha para a carreira política de qualquer governante!

Aplausos do PS.

Escusava de ter de ouvir esta a propósito de "buracos", Sr. Primeiro-Ministro.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado, eu não falei em "buracos", não utilizei esse termo. Deve ser um acto falhado, Sr. Deputado. Deve estar a referir-se ao tal "buraco" dos 4,4% de défice em 2001, e por aí fora!

O Sr. José Magalhães (PS): - Agora são 5%!

O Orador: - Sr. Deputado José Sócrates, já que quer falar em túneis, para desgraça dos lisboetas e dos portugueses, podemos fazer um percurso guiado entre o Marquês de Pombal e o túnel do Terreiro do Paço, porque quando o senhor foi ministro do ambiente deixou acontecer aquele "buraco" que lá está há anos e anos e as obras ainda não estão prontas.

O Sr. José Sócrates (PS): - Por amor de Deus!…

O Orador: - Podemos fazer uma visita guiada.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Portanto, em matéria de "buracos"…

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Mas, voltando à questão de há pouco, Sr. Deputado, as autárquicas foram em Dezembro de 2001 e as eleições foram em Março de 2002. O Sr. Deputado José Sócrates diz que o congresso é despiciendo. Ficámos a saber que o acto que teve lugar há poucas semanas era desnecessário!

O Sr. José Sócrates (PS): - Porquê?!

O Orador: - Eu fui eleito nos termos que os estatutos do meu partido prevêem, e o Sr. Deputado também. Não há nada mais a dizer sobre isso. A legitimidade está esclarecida.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Disse o Sr. Deputado que não disponibilizámos verbas no Orçamento para o interior. Mas está a falar de que Orçamento? Tenha calma, porque ele virá na devida altura. É bom ter calma para recuperar do choque que o anúncio do Orçamento vos provocou! O tal Orçamento que não percebiam e que não entendem como é possível. Mas vão perceber em detalhe muito em breve.
O Sr. Deputado sabe que anunciei, e vamos fazê-lo, a construção da auto-estrada Vila Real/Bragança, são 130 km, e a auto-estrada Castelo Branco/Portalegre, no interior, para o Plano Rodoviário a assumir? Isso é que é fazer obras. Só que não vou dizer "pague quem vier 10 anos depois, quando eu já não estiver no Governo". Somos nós que vamos assumir as responsabilidades!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Já agora, Sr. Deputado, volto a dizer-lhe, nunca lhe direi para pensar antes de falar. Nunca vou responder-lhe nesses termos. O tempo demonstrará como o Sr. Deputado consegue ou não manter um determinado padrão. Eu nunca vou responder-lhe nem aos instrumentos que utiliza para poder falar, nem se pensa antes ou se pensa depois. Nunca irei responder nesses termos. Só falo de ideias, de projectos, de programas. Tenho por si toda a consideração. Sei que pensa antes de falar, outra coisa não me passa pela cabeça. Esse tipo de considerações ficam consigo, porque eu prefiro ficar desta maneira.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para formular a pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, V. Ex.a traz-nos hoje aqui duas questões muito importantes: a da reforma do arrendamento urbano e a das SCUT.
Por ora, vou referir-me ao arrendamento urbano, já que das SCUT tratará o meu colega, Eng.º Anacoreta Correia.
O arrendamento urbano é verdadeiramente uma questão de Estado. E é-o, porque afecta gerações inteiras de portugueses. É uma questão que o próprio Estado Novo, embora tenha tentado resolvê-la, não o conseguiu porque temeu as óbvias convulsões sociais que a simples coragem de iniciativa poderia trazer.
A verdade é que, por isso, temos hoje um parque imobiliário degradado, temos rendas exorbitantes no que toca aos prédios devolutos, rendas ridículas no que toca aos contratos mais antigos, famílias obrigadas a endividarem-se para comprarem casa e senhorios e inquilinos descontentes. Daí a importância decisiva do tema e a razão de Estado da questão que aqui nos traz.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Tema que, por isso, os portugueses querem mesmo ver discutido, muito mais do que as questões acessórias e laterais que a oposição aqui suscita.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Mas a verdade é que o Sr. Primeiro-Ministro verificará - de resto, o Partido Socialista já o indiciou - que só muito ao de leve, com pena nossa, a oposição tratará destes temas, ou seja, da reforma do arrendamento urbano e das SCUT, sendo que, neste último caso, até se compreende o desconforto que causa à bancada do Partido Socialista, o qual foi, de resto, demonstrado pela tímida referência do Deputado José Sócrates…

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Vozes do PS: - Tímida?!

O Orador: - … a uma questão tão importante e de tanta responsabilidade para o Partido Socialista. E é óbvio, porque o Partido Socialista, neste dossier, sente culpa, o Partido Socialista sabe que teve uma má opção, o Partido Socialista percebe hoje que endividou gerações inteiras de portugueses com esta má opção. E tal como, no passado, fugiram do Governo por estas más opções, hoje, na oposição, também fogem a dar as explicações que só o Partido Socialista pode dar.

A Sr.ª Maria Santos (PS): - Nós estamos aqui!

O Orador: - Aliás, só por isso se compreende que o Eng.º João Cravinho - agora sentado ao lado do Eng.º José Sócrates -, o "pai" das SCUT, o ideólogo das SCUT,…

O Sr. Afonso Candal (PS): - Faça lá uma perguntinha ao Primeiro-Ministro!

O Orador: - … o ministro socialista que teve tão brilhante ideia, se tenha recusado, na comissão competente, a explicar aquilo que só ele, assessorado, porventura, por outros Deputados socialistas, poderia explicar.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não é verdade!

O Orador: - De resto, Sr. Deputado João Cravinho, ainda estamos, hoje, à espera dos estudos que, a este propósito, o senhor disse que iria apresentar a esta Assembleia para demonstrar essa opção do Partido Socialista, na opinião do Partido Socialista uma boa opção, na nossa opinião uma muito má opção.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, Sr. Primeiro-Ministro, terá hoje aqui uma oposição preocupada em falar de outros temas, sempre na base do boato, sempre na base das suspeições, sempre na base dos juízos infundados.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Fale pelo CDS-PP!

O Orador: - Vão querer falar de liberdade de expressão - o Eng.º José Sócrates já o indiciou - mas é claro que, nesta discussão, se esquecerão de referir que, por exemplo, de acordo com o mais recente relatório da associação Repórteres Sem Fronteiras, Portugal, no que toca à liberdade de expressão, está em sétimo lugar, relativamente a todos os países deste Planeta,…

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … à frente de outros como a França, a Espanha, o Reino Unido, os Estados Unidos ou a Alemanha.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. António José Seguro (PS): - Isso foi antes do caso do Marcelo!

O Orador: - Isto, para não falar de um outro relatório, hoje publicado, de uma outra entidade, a Freedom House, que coloca Portugal exactamente à frente de todos esses países.
Mas a oposição vai dizer mais, Sr. Primeiro-Ministro. A oposição vai dizer que a economia portuguesa vai de mal a pior. O Partido Socialista já o afirmou! Mas, também a este propósito, nada dirão sobre o relatório publicado ontem, da responsabilidade do Fórum Económico Mundial, que coloca Portugal a crescer, em termos de competitividade, e já à frente de países como a Grécia, o que não era de estranhar, e de outros, como a Irlanda, que, como sabemos, tem sido apresentado como paradigma de crescimento ao nível da União Europeia.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - E isto para não lembrar ainda um outro facto importante: é que, de acordo com outros dados, no terceiro trimestre deste ano, Portugal foi o País da União Europeia que mais cresceu.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Este é outro facto que o Partido Socialista também se esquecerá de referir.
Como se esquecerão de dizer, por exemplo, que, embora tenham afirmado, repetidamente, que o Governo tinha sido nomeado na base de promessas não cumpridas, porque, por exemplo, entre outras coisas, não baixava os impostos, este foi o Governo que acabou com um imposto injusto - o imposto sucessório -, que reformou outros dois impostos…

O Sr. Afonso Candal (PS): - O IVA!…

O Orador: - … e que, no que toca ao IRC e ao IRS, baixou o IRC em 5 pontos percentuais e o Sr. Ministro das Finanças já teve ocasião de afirmar como é que vai ser possível baixar o IRS de 12% para 10,5%.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Claro que isto, hoje, são questões que já não importam ao Partido Socialista. Antes, o Governo não cumpria, porque não baixava, hoje, é demagogo, porque baixa!

Risos do Deputado do CDS-PP João Pinho de Almeida.

Mas, enfim, Sr. Primeiro-Ministro, é a oposição que temos e nada há a fazer.
Termino com duas notas…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe o favor de terminar, porque já se esgotou o tempo de que dispunha.

O Orador: - A primeira nota diz respeito a uma pasta que, por razões óbvias, tem a ver com a defesa, para dizer que também abrangeu, transversalmente, vários estratos sociais: os mais velhos, os ex-combatentes, começaram a ver o seu problema resolvido, os mais novos viram o fim do serviço militar obrigatório, todos com a valorização das Forças Armadas.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Faça lá uma perguntinha!

O Orador: - Quanto à questão que lhe deixo, porque nós, nesta bancada, queremos centrar o debate naquilo que o Governo quer tratar e que é muito importante, pergunto-lhe de que forma, no que toca ao regime do arrendamento urbano - já que de SCUT falará o Deputado Anacoreta Correia -, esta reforma permitirá reabilitar o património imobiliário degradado, beneficiar os mais jovens, devolver vida aos centros das grandes cidades, hoje mortos, por razões que se conhecem, e baixar as rendas das casas devolutas, e sabemos que muitas existem, por aí fora, à espera de serem arrendadas.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Melo, falou do que representa, de facto, esta reforma do arrendamento e quero sublinhar, como Primeiro-Ministro, o nosso empenho sincero em conseguirmos um acordo, tão amplo quanto possível, sobre esta matéria. Pela nossa parte, existe disponibilidade natural para trabalhar com as bancadas de todas as forças políticas, que conhecem bem a realidade do parque habitacional degradado, quer por responsabilidades autárquicas nas grandes cidades, quer pelo seu trabalho normal neste Parlamento, designadamente pelo contacto com o eleitorado.
Devo dizer-lhe que, com a formulação do programa Reabilita, temos inscrita uma verba de 28,5 milhões de euros, para o ano, só para a reabilitação, mas trata-se de uma verba progressiva, e temos, no conjunto dos programas para apoiar este primeiro ano da reforma do arrendamento, uma verba próxima dos 50 milhões de euros.

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Porém, o principal, aquilo em que mais acreditamos é na dinamização do próprio mercado. Os senhorios, os proprietários, aqueles que têm casas que necessitem de reabilitação vão ter de fazer as obras, e vão fazê-las, para poderem conseguir o certificado de habitabilidade e, então, poderem propor aos inquilinos a renda que consideram justa, desde que o inquilino tenha um rendimento familiar que caiba nos parâmetros definidos por lei. E se não for aceite, pelo senhorio, o valor de renda proposto pelo inquilino, o senhorio terá de pagar três anos da renda que ele propôs ao inquilino, de indemnização, para ele poder sair. Mesmo assim, se sair, a segurança social dar-lhe-á um apoio social à renda, desde que as suas condições económicas provem que tem direito a ele, nos termos da lei.
Para além disso, também continuará o subsídio de renda para jovens.
Agora, quero dizer-lhe que a bonificação do crédito para aquisição de casa, no Orçamento do Estado para 2003, atingiu valores ainda próximos dos 500 milhões de euros, concretamente 483 milhões de euros.
Portanto, o que não faz sentido são os valores que o Estado investiu durante todos estes anos, financiando a aquisição de casa própria, com encargos que, como disse, estão para lá dos rendimentos disponíveis das famílias, em vez do investimento na reabilitação. Atendendo aos números comparados, de 2001 e 2002, com o resto da União Europeia, o nosso esforço financeiro na reabilitação é sete, oito e onze vezes menor do que na zona euro ou na União Europeia. Essa é uma política completamente ao contrário e é essa política que tencionamos inverter. E penso, com franqueza, que todas as bancadas sabem que esta é a realidade das coisas. Aqui não há democratas-cristãos ou sociais-democratas ou socialistas ou comunistas ou bloquistas. Não há! Há pessoas que sabem que existem 990 000 casas às quais falta uma das cinco infra-estruturas básicas! Ou não têm luz, ou não têm água, ou não têm instalações sanitárias! Há 990 000 casas em Portugal neste estado! Ora, não faz sentido este panorama e que, depois, o Estado, nomeadamente por acordos com a banca e com o estatuto actual do Instituto Nacional de Habitação, financie aquisições de casa própria, com encargos extraordinariamente onerosos para as famílias que têm menos proveitos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É nessa perspectiva de conjunto que estamos a trabalhar a reforma de todo este sistema. E para permitir o quê? Para permitir dinamizar o mercado e baixar os preços das rendas, sendo que o Estado vai também aí buscar financiamento, através do IVA e do IRC gerados, nomeadamente, pelas empresas de construção, com a actividade de reabilitação, e com essas receitas adicionais poderá fazer um saldo equilibrado entre aquele que vai ser o esforço financeiro necessário à aplicação desta lei e os proveitos que receberá da natural dinamização do mercado.
Mas a nossa grande preocupação é a de que as famílias que não conseguem encontrar casa junto ao local onde trabalham o consigam fazer, é a de que possam ser, efectivamente, colocados no mercado os milhares e milhares de fogos que, hoje em dia, estão devolutos.
Por isso, Sr. Deputado Nuno Melo, esta medida e o fim do serviço militar obrigatório, que exigirá também, no próximo ano, um esforço financeiro significativo - cerca de 38 milhões de euros -, são medidas que, naturalmente, há muitos anos eram ansiadas. Muitos jovens do nosso país pensavam que esse dia, de ouvir falar dele há tantos anos, nunca chegaria! Mas chegará no próximo dia 19 de Novembro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, tudo isto exige algum esforço financeiro - sem dúvida! - mas tem um efeito indutor de desenvolvimento para a economia nacional, para a sociedade portuguesa, e gera o efeito de esperança de os políticos e os governantes concretizarem o que anunciaram e prometeram e ao qual as pessoas disseram "Muito bem!". Disseram que iam acabar com o serviço militar obrigatório, acabou! Disseram que, graças ao esforço de contenção na primeira metade da Legislatura, iam baixar um pouco o IRS, e não baixa apenas a taxa que vem referida, mas, na altura, o Sr. Ministro das Finanças falará nisso. Muito bem! Com a actualização correspondente dos escalões!
Há quantos anos o Dr. Durão Barroso dizia que as pensões mais baixas iam convergir para o salário mínimo nacional?!
Não anunciámos nada de novo, não fizemos um Orçamento de magia, limitámo-nos a cumprir aquilo que foi prometido. É raro em política, mas é disso que gostamos e é dessa maneira de estar que queremos ser donos e senhores!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, deseja replicar?

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Não, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, para formular a pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, não dê importância ao ruído que gira à volta do seu Governo, a essas minudências, a esses pequenos detalhes, como os casos de Marcelo Rebelo de Sousa, da colocação dos professores, do aumento dos passes sociais, do aumento do desemprego. Não dê importância a isso!… E, pondo de lado as questões de jeito, ou falta de jeito, ou a discussão dos caboucos, como a que estivemos há pouco a ter, vamos, então, às questões concretas.
Começamos pela lei das rendas, dizendo que, pela nossa parte, estamos abertos à discussão. Mas, Sr. Primeiro-Ministro, a vossa lei das rendas, permita-me que lhe diga, não vai resolver o problema da juventude nem o problema da recuperação das casas degradadas,…

O Sr. António Filipe (PCP): - Exactamente!

O Orador: - … porque a sua concepção é a concepção da casa como uma mercadoria, como um mero bem, sem a sua função social. É uma concepção neo-liberal do estilo "quem quer saúde, que a pague", "quem quer ensino, que o pague", "quem quer casa, que a pague" e "se queres pagar menos impostos, torna-te banqueiro". Esta é a sua concepção! É um assalto que vai ser permitido aos bairros históricos, aos centros da cidade, para as segundas casas, é a falta de segurança para o inquilino, porque, como sabe, o senhorio vai ficar com "a faca e o queijo na mão", ao fim de três anos.
Depois, o Sr. Primeiro-Ministro vem dizer-nos que está disponível para debater com todas as forças da oposição, mas o que vem aqui apresentar à Assembleia da República não são propostas de lei material mas, sim, autorizações legislativas.

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - Apresente aqui as propostas de lei material para as discutirmos!

O Sr. Honório Novo (PCP): - Discuta aqui!

O Orador: - Mas, Sr. Primeiro-Ministro, se o mercado vai resolver todo o problema, então, explique-me por que é que, havendo, neste momento, 500 000 fogos devolutos e não havendo qualquer restrição ao aumento da renda, nenhum deles é posto no mercado?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Porquê? Qual é a razão? Pode explicar-nos?
As SCUT são o outro tema que aqui nos trouxe. A última SCUT, como sabe, foi assinada pelo Eng.º Valente de Oliveira, ou seja, os senhores e o Partido Socialista estiveram de acordo com as SCUT. Agora, o Sr. Primeiro-Ministro olha para a factura e diz "É impossível pagar-se isto!". Mas quem é que fez os contratos? Como é que eles foram feitos? É o mesmo que aconteceu com a Brisa! Sabe que, por cada 100$ que se pagam nas portagens, 90$ vão para os bolsos dos patrões?! Não sabe isso?! E agora vai acontecer o mesmo!
Então, os senhores prometeram às populações que tínhamos auto-estradas sem pagamento e agora, de um momento para o outro, dizem "Assim, não temos dinheiro! Todos têm de pagar as auto-estradas."
Sr. Primeiro-Ministro, como sabe, na Alemanha não se pagam as auto-estradas, na Bélgica também não e, em Espanha, a sua maior parte também não é paga. Agora, de um momento para o outro, em Portugal, depois de terem criado expectativas, vamos ter de pagar as auto-estradas. E quais são as alternativas, por exemplo, no IP5? O Sr. Primeiro-Ministro conhece o IP5? Vai dar aquela volta, no Vale do Vouga, para chegar a Aveiro, ou o contrário? E, por exemplo, na Via do Infante? É aquela rua que vai servir de alternativa? O Sr. Primeiro-Ministro diz: "Ah! Mas vamos ter discriminações positivas." Por quanto tempo? Por quanto?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

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O Orador: - O Sr. Primeiro-Ministro vai "ter à perna" a contestação das populações, dos transportadores e, naturalmente, também do meu partido,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - … porque nós estamos contra essa frustração de expectativas, sem uma atenção social relativamente a este caso.

Aplausos do PCP.

A terceira questão que gostaria de lhe colocar, Sr. Primeiro-Ministro, tem a ver com o seguinte: o Sr. Primeiro-Ministro, em Agosto, quando os fogos varriam as serras algarvias, visitou o Algarve daquela forma discreta que lhe é habitual, não convidando a comunicação social, e fez promessas. Explique-nos, Sr. Primeiro-Ministro, por que é que passado este tempo as populações ainda não receberam as indemnizações que lhes foram prometidas e a que têm direito?

O Sr. Honório Novo (PCP): - Exactamente!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Uma vergonha!

O Orador: - Sr. Primeiro-Ministro, vamos às questões concretas, ao problema do jeito ou da falta de jeito.
No último debate que aqui tivemos, o Sr. Primeiro-Ministro, eventualmente por ainda conhecer mal o dossier e os problemas institucionais da Casa do Douro, disse-nos que tínhamos razão, que se tratava de um problema que não estava resolvido e que iam procurar resolvê-lo e tomar medidas.
A Casa do Douro encontra-se numa situação aflitiva: continua a não poder vender o Vinho do Porto a não ser aos exportadores, não vende uma garrafa, e não tem possibilidades de pagar aos trabalhadores. Sr. Primeiro-Ministro, passado este tempo todo, que medida tomou? Que alterações fez? O que é que pode apresentar-nos aqui, na Assembleia da República?

O Sr. Honório Novo (PCP): - É para o Natal!

O Orador: - Outra questão: os salários da Administração Pública.
O Sr. Primeiro-Ministro disse em comício, no Açores, que este ano os salários da Administração Pública iam ter aumentos iguais aos da inflação ("um bocadinho mais", disse o Sr. Ministro das Finanças), mas sabe que isso é continuar a diminuir os salários reais. Vou explicar-lhe porquê, aliás, o Sr. Ministro das Finanças também o pode fazer: em primeiro lugar, porque a previsão da inflação, mesmo quando oficial, é sempre inferior à inflação real, aos preços; em segundo lugar, porque o Sr. Ministro das Finanças sabe que, não incorporando os ganhos de produtividade, a distribuição do rendimento nacional vai, mais uma vez, ser desfavorável aos trabalhadores, como é evidente, depois de vários anos de diminuição de salários reais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Por último, o Sr. Primeiro-Ministro disse na sua última comunicação que os portugueses deveriam preocupar-se com o seu rumo para o País, com o crescimento económico, com a retoma. Já há alguma retoma (não podíamos estar toda a vida a decrescer, isso é uma evidência!), mas que retoma? Quando vamos nós aproximar-nos da média europeia? Quando é que vamos atingir o tal crescimento de dois pontos acima da média europeia prometido pelo seu antecessor para recuperarmos a média europeia? Vamos continuar, neste e no próximo ano, a afastar-nos da média europeia!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

O Orador: - De quem é a responsabilidade? É de uma política errada e injusta que levou o País à recessão!

Aplausos do PCP.

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O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, ouvi com gosto as suas palavras.
O Sr. Deputado misturou realidades muito importantes com outras que têm uma dimensão absolutamente diferente, dizendo que não o preocupa este ou aquele caso quando comparado com a situação do desemprego. Não se compara, Sr. Deputado, e penso que V. Ex.ª não compara também!
Sr. Deputado, tive, de facto, de estudar os números do desemprego em termos de trabalhadores desempregados. O número de trabalhadores desempregados no período mais complicado da recessão do ensino na década de 90 é superior ao número máximo atingido agora, 485 000 desempregados. Se quiserem comparar, façam favor!
Os números do último mês têm que ver com a possibilidade de os professores se inscreverem nos respectivos centros de desemprego. Portanto, são números relativamente aos quais foi previamente feito o alerta.
Sabe o Sr. Deputado Carlos Carvalhas, e sabemos todos, que o efeito de recuperação do emprego tem, em relação ao início do período de recuperação económica, uma décalage, normalmente de um ano, mas depende da realidade económica da altura. De qualquer modo, não é coincidente o início da recuperação económica com o aumento do emprego.
Volto a dizer que não nos serve de consolo o facto de a nossa taxa de desemprego ser inferior à da zona euro, de 9%, e à da União Europeia, de 8%. Isso não nos serve de consolo, pois queremos que a taxa de desemprego baixe.
Situações de pleno emprego, dizem os economistas, são normalmente reveladoras de estagnação da economia, mas são essas queremos, isto é, que todos tenham emprego, tenham trabalho e possam contribuir de facto para o esforço de desenvolvimento da economia nacional.
Não vemos - isso garanto-lhe! - a casa como uma mercadoria. O Sr. Deputado Carlos Carvalhas conhece com certeza, tal como eu também conheço, a realidade de outras cidades europeias. Olhe, por exemplo, para Bruxelas, the cross road of Europe.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Primeiro-Ministro, dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Primeiro-Ministro, V. Ex.ª cita sempre Bruxelas, mas essa cidade é um caso especial, mesmo na Europa. E sabe porquê? Porque, quando o Parlamento Europeu foi sediado em Bruxelas - fui lá Deputado antes do Sr. Primeiro-Ministro -, os ingleses fizeram grandes investimentos, havendo um excesso de oferta em relação à procura. É o único caso da Europa!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado diz que esteve em Bruxelas antes de mim, antes de 1987?

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sim!

O Orador: - Não sei se foram os ingleses que fizeram aqueles investimentos todos, mas oxalá os façam também em Lisboa!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Não se informou!

O Orador: - É que havia tantas casas com rendas tão baratas para as pessoas poderem escolher que era uma felicidade para todos os estudantes universitários e para todas as famílias de baixos rendimentos! E é isso que queremos, ou seja, que as casas sejam colocadas no mercado.
Hoje em dia, há falta de confiança. Se há mercado que está bloqueado é o do arrendamento, quer urbano quer comercial.
Quem não tem casa, quem não tem rendimentos, quem não tem depósitos a prazo, quem tem de pagar a renda de casa do seu bolso, sabe as centenas de contos que tem de despender por mês (150, 180 ou 300 contos) para conseguir uma casa perto do seu local de trabalho. O que queremos não é ver a casa como uma mercadoria mas, sim, como um espaço de vida de uma família, tão cómoda quanto possível, sem esta

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ter de gastar todos os dias uma hora e meia para ir trabalhar e uma hora e meia para voltar a uma casa que o seu orçamento familiar tenha possibilidades de pagar.
Há algo que está "na cara" para todos: a situação existente não pode continuar! E não diga, Sr. Deputado, que temos uma visão neoliberal - nem neoliberal, nem neo-realista, dos tempos de um certo urbanismo. Não temos nenhuma dessas visões, por isso mesmo a nossa lei tem mecanismos de regulação social.
Sr. Deputado Carlos Carvalhas, a nossa lei tem mecanismos de apoio aos mais carenciados e às faixas etárias com situações mais dignas de atenção que nenhuma outra lei do arrendamento urbano tem, na Europa.
Este é um trabalho que foi feito - estou à vontade para o dizer, pois veio do governo anterior - pela Secretária de Estado Rosário Cardoso Águas, pelo ex-ministro António Carmona Rodrigues e, agora, pelo Sr. Ministro José Luís Arnaut e pelo Sr. Secretário de Estado Jorge Costa, mas com a participação das associações, de muitas entidades e das câmaras municipais. Esta é uma reforma de que a sociedade portuguesa precisa como de pão para a boca!
Sr. Deputado, se tem melhores ideias, mesmo ao abrigo do pedido de autorização legislativa…

O Sr. Honório Novo (PCP): - Não! Aqui é que se discute isto!

O Orador: - Srs. Deputados, se têm melhores ideias, criámos um observatório de acompanhamento da lei onde podem fazer propostas para resolver a situação das pessoas. Se as têm, façam favor de as apresentar, porque o que nos preocupa é quem está numa casa degradada. Apresentem-nas, que nós incorporá-las-emos na lei!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A lei do arrendamento - posso garanti-lo - não é uma proposta fechada!
O Sr. Deputado falou na serra do Caldeirão. O Sr. Deputado pode acreditar ou não - cada um é que sabe! - mas já lhe dei a minha palavra de que foi para mim uma absoluta surpresa ver lá a jornalista do jornal Expresso.

Vozes do PCP: - Oh!

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - E o dinheirinho?!

O Orador: - Sr. Deputado, conheço as suas graças, e vejo-o com um ar mais descontraído, agora que está em vias de entrar noutra fase da sua vida. Compreendo-o, mas gosto destas preocupações e destes desafios.
Sr. Deputado, sabe quais foram os problemas…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - O dinheirinho?

O Orador: - O dinheirinho?!
O levantamento do número de pessoas atingidas foi feito pelas autarquias, juntamente com os centros regionais de segurança social. Quando estive no Algarve encontrava-se ainda muito atrasado o processo, pois os incêndios tinham acontecido há um mês e pouco.

O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, peço-lhe que conclua, pois já esgotou o tempo de que dispunha.

O Orador: - Concluo de imediato, Sr. Presidente.
Está pronto todo o processo para pagamento e, feito o levantamento das situações, o Ministério da Segurança Social, da Família e da Criança e o Ministério das Cidades, Administração Local, Habitação e Desenvolvimento Regional já fizeram o despacho de transferência para os vários pagamentos, a vários títulos, de que as pessoas precisam.

O Sr. José Apolinário (PS): - Zero! Não chegou lá nada!

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O Orador: - Sr. Deputado José Apolinário, estive com o Sr. Presidente da Câmara Municipal de São Brás de Alportel, do seu partido, que me disse que o processo ia demorar um pouco porque o levantamento das situações estava demorado.

Protestos do Deputado do PS José Apolinário.

Já que o Sr. Deputado está a puxar esta questão, deixe-me dizer-lhe que espero que este ano o Fundo de Solidariedade da União Europeia tenha, por parte das autarquias abrangidas, uma execução superior à que conseguimos no ano passado, porque a opinião pública não sabe mas as verbas que foram utilizadas para acorrer a essas situações correspondiam a 2,5%, até há pouco tempo, por vezes em autarquias onde ouvíamos as maiores queixas de faltas de apoio!
Da nossa parte, o processo está pronto, não parámos o trabalho nem um segundo e, como dissemos, os pagamentos serão feitos até 15 ou 20 de Outubro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Apolinário, tenho de o advertir de que não pode fazer perguntas adicionais à que está a ser respondida pelo orador.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas, para exercer o seu direito de réplica.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, ouvindo as suas respostas, creio que não se pode esperar que tire todas as consequências de ser o mais destacado continuador de uma política que vem desde 2002 e que levou o País à recessão, à estagnação, ao aumento do desemprego, à acentuação das desigualdades, à debilitação do aparelho produtivo e à concentração da riqueza.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, o desafio que lhe faço não é que negue os interesses que serve mas, sim, que tenha um sobressalto de alma e pense que não é nem com a legião de publicitários nem com os "enlatados" em telejornais que altera a realidade e o sentimento dominante na sociedade portuguesa.
O desafio que lhe faço é outro: desafio-o a ver o "filme" destes três meses de governação (as trapalhadas, a descoordenação, aquilo que tem afligido o povo português) para tirar uma conclusão. Isto é, desafio-o para que diga aqui, na Assembleia da República, ao povo português, com um gesto de audácia, de desprendimento pessoal e de grandeza: "Obviamente, demito-me!"
O Sr. Primeiro-Ministro disse que conhece Portugal e o que pensam os portugueses. Então, sabe com certeza - e isso basta - que os portugueses ouviriam isso congratulando-se, reconhecendo que essa seria uma decisão democrática, um gesto ajuizado e sábio.
Pague, Sr. Primeiro-Ministro, o favor que deve ao Sr. Presidente da República facilitando-lhe a vida e novas decisões!
O Sr. Primeiro-Ministro tem uma oportunidade, a última, a única oportunidade que está ao seu alcance, de dar uma alegria aos portugueses!

O Sr. António Filipe (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Faça-o, porque aquilo a que temos vindo a assistir é à degradação da vida social e da vida política, com o nosso país a atrasar-se cada vez mais.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, de facto, não temos a mesma maneira de estar na vida. A última pessoa de quem esperava ouvir hoje um desafio desses era do Sr. Deputado Carlos Carvalhas. Compreendo que o Sr. Deputado não se queira ir embora sozinho, mas arranje outro!

Risos do PSD e do CDS-PP.

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Pela minha parte, não me vou embora, porque sinto que tenho o apoio da esmagadora maioria de quem tem de me apoiar, ou seja, do povo português, e o apoio unânime da coligação que suporta o Governo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Há muitos anos que os Srs. Deputados do PCP dizem a mesma coisa a todos os primeiros-ministros: "Demita-se! Vá-se embora!" Se o Governo fosse assim tão fraco, os senhores estariam tão nervosos?
Por que é que, desde que tomei posse, as lideranças partidárias - não todas! - vão mudando? Por que é que o lema do Congresso do PS foi "quem é melhor para derrotar Santana"? Bem, quem dizia isso mais alto teve 4% dos votos, pelo que não deve ser isso o que os eleitores socialistas querem! Foi o único que perdeu!…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Por que é que desde essa altura os senhores concluíram: "Deixa cá mudar de líder que isto agora vai tocar de outra maneira!"?
Os senhores podem falar no que quiserem, podem falar em dificuldades. Na verdade, tivemos um período de transição difícil, um Governo novo, medidas difíceis, porém, pergunto às portuguesas e aos portugueses o seguinte: se considerassem que isto ia ser tão mau para nós, os partidos da oposição pediam para nos irmos embora ou mudavam de líderes? Eles sabem que vão perder, sabem que estão numa situação mais difícil, como nunca estiveram, e que, como de costume, quando chegar a hora, com humildade, determinação, afinco e coragem, lá faremos as contas do que o povo quer.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra, para defesa da honra da bancada.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Não costumamos ser muito tolerantes sobre a questão da defesa da honra, mas hoje é o primeiro debate para uns e o último debate para outros.
Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, o Sr. Primeiro-Ministro gracejou mas não respondeu a uma questão séria.
Sr. Primeiro-Ministro, eu não me vou demitir, vou continuar, e o senhor vai continuar a ter-me pela frente!

O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): - Então, não vai embora!

O Orador: - Mas com certeza que o Sr. Ministro não estará, nem como Primeiro-Ministro nem como Secretário-Geral do PSD, tanto tempo como eu estive. Por uma razão simples: estou convencido que o povo português acabará por derrotá-lo. As suas explicações são tão erradas, são tão más e criam tanta contestação que não é com anúncios publicitários, com propaganda do estilo "Lisboa está mais bonita" que consegue alterar a realidade.
Por isso, mais tarde ou mais cedo - muito mais cedo, seguramente, do que o que nós pensamos -, V. Ex.ª não estará aqui.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Primeiro-Ministro, pretende dar explicações?

O Sr. Primeiro-Ministro: - Pretendo, sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, é só para cumprimentar, com simpatia, o Sr. Deputado Carlos Carvalhas. Mais nada!

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma pergunta ao Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro: Também eu tenho muito gosto em vê-lo nesta Assembleia, a que tem vindo tão pouco, e quero aproveitar a oportunidade para lhe colocar questões sobre o seu Governo.
Há dois dias, o Sr. Primeiro-Ministro esteve na Madeira, que é uma bela terra. Mas a Madeira é uma região SCUT, onde - e correctamente - não se pagam portagens. Mas essa é a única região - talvez isso ocorra também no Uganda - onde se faz campanha eleitoral com inaugurações uma, duas, três e quatro vezes por dia.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - Provavelmente, Sr. Primeiro-Ministro, nem no Uganda se faz a inauguração que o Sr. Primeiro-Ministro foi fazer, a de uma central de combustíveis que só entrará em funcionamento em Abril de 2005 mas que foi inaugurada agora!
Todavia, na Madeira acontece algo de mais especial, que tem uma dimensão política constitucional nacional: o seu candidato na Madeira, Alberto João Jardim, está esta semana em campanha porque está indignado com uma investigação sobre corrupção, que ele define como "intentona", ao ponto de ter atacado de tal modo a Justiça, que quer regionalizar ou privatizar para si próprio, que o coordenador da Polícia Judiciária que conduziu esta investigação, apesar de, pela respectiva lei orgânica, poder continuar no seu cargo até 8 de Janeiro, vai abandonar imediatamente - soube-se hoje - as suas funções.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - A Polícia Judiciária podia investigar as contas das eleições europeias!

O Orador: - Isto é de uma gravidade imensa. Quer dizer, quando a Justiça incomoda, o seu homem na Madeira decide acabar com a justiça e afastar quem o incomoda. A isto chama-se governar com os amigos e governar para os amigos.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - Segunda questão: o Sr. Primeiro-Ministro falou-nos do ritmo do Governo. Vamos ver qual foi esse ritmo no mês que passou.
No mês que passou houve 560 desempregados por dia; no mês que passou, o senhor contratou 13 assessores por dia; no mês que passou, Sr. Primeiro-Ministro, por cada assessor que o senhor contratou foram despedidos 40 homens ou mulheres. A isto chama-se governar para os amigos.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Tenha vergonha do que está a dizer!

O Orador: - Amanhã o Sr. Ministro das Finanças e da Administração Pública vai anunciar o Orçamento do Estado e dirá que vai dar um generoso aumento de pensões a quem mais precisa, porque precisa mesmo. Assim, os mais pobres dos mais pobres irão receber mais 60 cêntimos por dia. Há poucas semanas, na Caixa Geral de Depósitos, um administrador, depois de 19 meses de trabalho, passou a receber 3500 contos de pensão vitalícia por mês. Quer isto dizer, Sr. Primeiro-Ministro, que o valor dessa reforma por mês é o equivalente ao aumento de 100 anos para uma pessoa que trabalhou a vida inteira. É isso o que o senhor vai anunciar amanhã, com grandes "lantejoulas". A isso chama-se governar para os amigos.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - E essa é também a crítica que fazemos à sua lei de rendas, que estamos dispostos a discutir, para a qual apresentamos uma alternativa, porque não concordamos nem com a visão da facilidade dos despejos nem, muito menos, com a imposição de rendas que não tenham regras claras. É sobre isso que queremos que haja uma modificação modernizadora e não aceitamos a "lei das rendas Santana", como o povo irá conhecê-la.

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Isso seria governar para os amigos…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Para os amigos?! Tenha vergonha!

O Orador: - … e o que nós queremos é resolver estes problemas.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Orador: - Aliás, na lista dos professores, o senhor não deixou que houvesse um responsável. Acabou a tragédia do País que mais se atrasou na colocação de professores e aos alunos, aos pais, às famílias, nada foi dito sobre responsabilidade.
Mas o Sr. Primeiro-Ministro fugiu também, aqui, à responsabilidade sobre outra matéria, a liberdade de expressão. Compreendo que o senhor se indigne com a questão da censura, porque ela vem do seu partido: foram Luís Marques Mendes e Cavaco Silva que falaram dos riscos gravíssimos da censura.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Orador: - Mas hoje não sabemos e temos o direito de saber!
O Sr. Primeiro-Ministro protege-se com o silêncio, mas proponho-lhe um exercício muito simples. Imagine que fechamos numa sala uma galinha e uma vaca e aparece um ovo. Quem é que pôs o ovo, Sr. Primeiro-Ministro?

Risos gerais.

Vozes do PSD: - Foi o Bloco de Esquerda!

O Orador: - Imagine que fechamos noutra sala o Prof. Marcelo Rebelo de Sousa, a criticar o Governo, o presidente da Media Capital, que tem negócios com o Governo, e o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, para quem o Prof. Marcelo tem ódio ao Governo e que exige uma intervenção. Aparece um ovo: é "corrido" o Prof. Marcelo! Quem é que pôs o ovo, Sr. Primeiro-Ministro? Com franqueza, percebe-se claramente o que aconteceu!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Concluo, Sr. Presidente.
Isto chama-se censura e, três meses depois de um Governo de dois anos e meio, o que tenho a dizer-lhe é que isto já não se usa. Não se usa!
Mas num aspecto estou de acordo consigo: é preciso oposição mesmo que o Governo não seja eleito. É por isso que aqui apresentamos uma proposta sobre as rendas, sobre a procriação medicamente assistida, sobre os acidentes de trabalho, sobre a formação profissional, sobre as políticas económica e social, e que aqui estaremos, Sr. Primeiro-Ministro, sempre que o senhor aqui vier, para discutir políticas, respostas para as pessoas, que essas é que decidem a qualidade de uma política, se ela é boa ou se é má, se o Governo governa bem ou se governa mal.
É isso que nos distingue, mas é esse o debate que aqui queremos ter consigo também.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, registo a disponibilidade manifestada para trabalharem no sentido de encontrarem ainda, se possível, melhores soluções para a lei das rendas. A nossa proposta não é dogmática, não é fechada e é isso o que espero do funcionamento do sistema democrático em Portugal.
Quanto ao facto de não se pagarem portagens na Madeira, quero dizer-lhe que, realmente, é pena que toda a população portuguesa não possa ir à Madeira ver a obra, enorme, lá realizada. É pena!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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Quando se fala nas transferências para a Madeira, devo dizer-lhe que os níveis de PIB per capita na Madeira, a obra realizada, as estradas construídas… No outro dia, para irmos para o Caniçal demorámos 10 minutos, quando antes se demorava 45 minutos… As pessoas sabem que é verdade!

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Tem SCUT?

O Orador: - Não. Porém, a realidade de uma ilha, com uma orla com aquela configuração geológica, é, com certeza, diferente.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Tudo é diferente!

O Orador: - Por isso mesmo entendo que o regime a aplicar lá não pode servir de precedente nem de comparação para cá.
Perguntou o Sr. Deputado Francisco Louçã por que é que eu fui à inauguração daquela central logística de combustíveis. Sr. Deputado, julgo que ninguém, mas absolutamente ninguém, felizmente, me fez um reparo sobre qualquer declaração minha - e registei todas as forças políticas - que tivesse a ver com as eleições na Madeira. Estive naquela inauguração por uma razão simples: a obra estava pronta.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Não está pronta!

O Orador: - Só entra em funcionamento daqui a uns meses, porque, agora, tem de começar a ser testado todo o sistema dos pipeline, todo o funcionamento daqueles equipamentos. Mas a obra em si está pronta…

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Não está pronta!

O Orador: - … e, quero dizer-lhe, é um investimento superior a 60 milhões de euros, que garante melhor os valores do ambiente e da segurança.
Havia, de facto, havia uma central de combustíveis na zona da Praia da Formosa, que agora passa para outra zona garantindo melhor esses valores de protecção do ambiente e de segurança e integridade das pessoas. Para este Governo, valores como os desenvolvimentos sustentável e sustentado são muito importantes e, por isso mesmo, entendi que o significado daquela obra justificava a presença do Primeiro-Ministro, sem fazer nenhum comentário.
Sobre as eleições na Madeira o que eu disse foi: os cidadãos da Madeira sabem as propostas de cada um; que escolham, em consciência, aquele que merece a sua confiança para os anos que aí vêm. Foi isso o que eu disse, como Primeiro-Ministro, quando lá estive.
Falou também da questão da Polícia Judiciária. Sr. Deputado Francisco Louçã - e o Sr. Ministro da Justiça está aqui, perto de mim - há comissões de serviço desses responsáveis e eu quero garantir-lhe o seguinte: nunca ninguém poderá provar nada, não há nenhuma instrução dada para qualquer mudança em qualquer serviço.
O que defende o Governo, e o que eu defendo, como Primeiro-Ministro, é que os órgãos de investigação, as entidades da justiça, desenvolvam a sua actividade com todos os meios de que necessitem. Até à sua condenação, as pessoas presumem-se inocentes, mas quem for suspeito deve ser investigado até final, e não me prenuncio sobre a gestão de efectivos da Polícia Judiciária.

Risos do Sr. Deputado João Teixeira Lopes.

Está a rir-se? Se calhar o senhor pronunciar-se-ia!
Estive na posse do Director Nacional da Polícia Judiciária e nunca mais o encontrei, nunca mais falei com ele, como nunca mais falei com o Sr. Ministro da Justiça sobre questões que tenham a ver com essas matérias, porque respeitamos a separação de poderes.
Aliás, ouvi declarações do Presidente do Governo Regional da Madeira muito claras sobre essa matéria: "Se alguém tiver que pagar erros que cometeu, que pague". Foram as referências que ele fez, e é assim que se deve fazer.
Para terminar, gostava de dizer ao Sr. Deputado Francisco Louçã, como a todos os Srs. Deputados e ao País, que o que eu espero é que no próximo fim-de-semana, nas eleições regionais dos Açores e da Madeira, as pessoas votem em massa e escolham quem considerarem merecedor do seu voto para governar nos próximos quatro anos.

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A democracia é feita de participação, há autonomia nas regiões autónomas e o que eu espero é que as pessoas escolham livremente o melhor para as suas vidas, sem olharem a outras questões que não ao seu futuro, à sua felicidade, seja de que partido forem, e que o resultado das eleições seja respeitado. É só isso o que espero, como Primeiro-Ministro.
Naturalmente, tenho as minhas preferências, mas aqui, nestas funções, não vou manifestá-las. Estou a responder a perguntas sobre a governação e não vou falar sobre eleições nas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira.
Quanto às outras matérias, mais "de mercearia", de que o Sr. Deputado Francisco Louçã falou, confesso que em Zoologia…Em Ciências Naturais tive sempre uma nota fraca, nunca passei muito do 10 ou 11, como se lembra. Em Zoologia, galinhas e vacas nunca foram o meu forte...

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Risos gerais.

O Sr. Presidente: - Para replicar, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro: Registo que estamos, de facto, de acordo sobre as SCUT na Madeira, o que me deixa satisfeito. Creio é que vai ter um problema: em Abril do próximo ano vai receber um convite para a segunda inauguração da central de combustíveis que inaugurou na terça-feira passada.

Aplausos do BE.

Aliás, Alberto João Jardim vai inaugurar amanhã uma estrada, entre Seixal e Porto Moniz, que já inaugurou há três meses atrás, sendo que ontem inaugurou a Rua da Consolação. Enfim, tudo isto é possível!
Sr. Primeiro-Ministro, é tão importante quem faz como quem fecha os olhos. Não sei se o senhor mandou afastar o responsável da Polícia Judiciária, o que sei é que ele está ameaçado de afastamento. Segundo a Lei Orgânica da Polícia Judiciária, ele podia ali ficar até ao dia 8 de Janeiro e terá sido afastado hoje, pouco depois de ter começado, no fim de semana passada, a produzir resultados a investigação à corrupção numa câmara municipal, que eu também não preciso de situar. Afastá-lo hoje é tão grave para quem o faz como para quem fecha os olhos em relação a quem o faz.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - Bem pode dizer que não faz comentários, mas, Sr. Primeiro-Ministro, é necessário que se garanta em todo o País as mesmas regras de seriedade e de justiça.
Quanto à questão zoológica e à questão política, há aqui uma matéria decisiva: a liberdade de expressão. O senhor esqueceu-se, fugiu do assunto!

O Sr. Primeiro-Ministro: - Não, não esqueci!

O Orador: - No jornal Público dizia-se: "Patrão da TVI queria Marcelo mais moderado nas críticas". Noutros jornais referia-se: "Governo despede Marcelo", "Marcelo sai da TVI sob suspeita de pressões", "Saída de Marcelo da TVI abre crise política".

Vozes do PSD: - E A Bola?

O Orador: - Talvez A Bola também tenha falado do assunto, visto que os senhores a lêem com tanta atenção.
Isto não são galináceos! Isto é política concreta sobre uma questão que tinha de unir sobre as diferenças! A razão pela qual esta bancada defende a liberdade de expressão, a começar pela do Prof. Marcelo, ao qual nada nos une, é porque ao adversário político tem de ser o primeiro a quem garantimos a liberdade de expressão. E governar, Sr. Primeiro-Ministro, é justamente assegurar essas boas regras, é garantir essas regras acima de tudo.
Não sei se o senhor fez ou se fechou os olhos, mas, sabendo que foi Rui Gomes da Silva que falou, até imagino quem é que lhe soprou aos ouvidos o que é que tinha de dizer.

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Aplausos do BE

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Que insinuação!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, se não levam a mal, volto a repetir o que disse na comunicação ao País que fiz na passada segunda-feira.
Sou Primeiro-Ministro de um Portugal livre, um Estado democrático de direito. Não acredito - repito, não acredito! - que alguém dê uma ordem e que outro alguém a aceite para calar alguém, ou mudar alguém, ou sanear alguém por causa das opiniões que expende. Acredito que as pessoas possam protestar, insurgir-se, manifestar indignação pois, como diria o Dr. Mário Soares, todos têm direito à indignação.
Não acredito que, no país da liberdade, que amo e que não admito que ninguém mutile, haja alguém que aceite uma ordem para calar alguém, nem que haja alguém que dê uma tal ordem. Não acredito!
Como Primeiro-Ministro de Portugal livre, quero dizer a todo o Portugal que ninguém nos dá lições de democracia.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E a prova está em que o País é livre, continuará a ser livre e outra coisa não se passa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma pergunta, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, uma vez que não teve contraditório na comunicação ao País que fez na passada segunda-feira, creio que temos aqui uma boa oportunidade para colocar algumas questões, nomeadamente sobre a sua intervenção inicial neste debate. Se me permite, começarei por citar justamente uma parte da sua intervenção.
Assim, quando o Sr. Primeiro-Ministro falou na questão das SCUT e na saúde, apontando-as como exemplo, disse que "é por isso que devemos perguntar às portuguesas e aos portugueses, muito especialmente aos que vivem do trabalho por conta de outrem, onde consideram mais justo pagar esses encargos: na repartição de finanças, como impostos cobrados a todos e descontados directamente no vencimento, ou, por exemplo, nas portagens, sempre que recorrerem às auto-estradas. Defender que deve ser o sistema fiscal, ou seja, o aumento cego de impostos, a suportar tais encargos é defender que seja a classe média a pagar os custos dessas opções. Mais: se o sistema fiscal ainda não é perfeito e alguns com muitos rendimentos ainda conseguem fugir ao fisco, será justo ir buscar tudo aos impostos dos que pagam sempre?"
Portanto, o Sr. Primeiro-Ministro reconhece, na sua intervenção, que, de facto, existe em Portugal uma profunda injustiça fiscal - quem paga o grosso dos impostos são os que trabalham por conta de outrem -, reconhece a brutal evasão e fraude fiscal que existe neste país, reconhece que há ricos, e muitos, que não pagam impostos, mas, de qualquer modo, não conclui o que era fundamental que um primeiro-ministro concluísse nestas circunstâncias que é o imperativo de mudar esta realidade. Ora, Sr. Primeiro-Ministro, é justamente isto que considero uma profunda desonestidade para com os portugueses.
De igual modo, nós, Os Verdes, consideramos que este Governo PSD-PP, quer na primeira versão quer na segunda, tem sido profundamente desonesto para com os portugueses.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Digo-o porque, seguramente, todos ainda se lembram das promessas eleitorais que foram feitas, nomeadamente pelo PSD, relativamente às políticas que prosseguiria quando chegasse ao governo. Todos se lembram claramente da taxativa promessa de baixa do IRS. Ora, tal promessa não foi cumprida, nem no primeiro nem no segundo ano de governação, mas foram exigidos enormes sacrifícios aos portugueses.
Agora, o Sr. Primeiro-Ministro, tal como já tinha anunciado, veio repetir o anúncio da redução do IRS, do aumento dos salários da função pública, do aumento das pensões. É evidente que, dito assim, isto não vale por si só, porque é fundamental verificar em que moldes será feito - e, em sede de Orçamento do Estado, teremos oportunidade de o fazer.
De qualquer modo, tudo isto pressuporia garantir mais alguma folga nos orçamentos familiares. No entanto, anteriormente, o Sr. Primeiro-Ministro e outros membros do Governo haviam anunciado ao País

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um outro conjunto de medidas que penalizam fortemente os orçamentos familiares. Refiro-me ao aumento trimestral dos transportes colectivos, ao aumento das taxas moderadoras na saúde,…
Sr. Presidente, peço desculpa por parar de falar, mas estou a dirigir-me ao Sr. Primeiro-Ministro e ele está ao telefone, pelo que, provavelmente, não vai conseguir responder-me.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o Sr. Primeiro-Ministro é capaz de estar a ouvi-la em simultâneo.

A Oradora: - É um bocadinho difícil, Sr. Presidente…

O Sr. Presidente: - Talvez! Mas sobre isso nada posso fazer.
Faça favor de continuar, Sr.ª Deputada.

A Oradora: - Dizia eu, Sr. Primeiro-Ministro, que todas aquelas medidas que enunciei pressuporiam que os portugueses acreditassem que iriam ter alguma folga nos seus orçamentos familiares.
Disse também que, entretanto, o Sr. Primeiro-Ministro e outros membros do Governo anunciaram um conjunto de medidas que, de facto, vêm penalizar fortemente aqueles mesmos orçamentos familiares, como por exemplo, o aumento trimestral dos transportes colectivos, o aumento das taxas moderadoras, o pagamento da circulação nas SCUT, etc. Ou seja, as medidas agora anunciadas, como a baixa do IRS e outras que tais, são compensadas por tudo o que as famílias vão passar a pagar agora em virtude das outras medidas anteriormente anunciadas.
Concluo, pois, que o Governo dá com uma mão mas imediatamente tira com a outra. Deste modo, há, de facto, desonestidade, não há seriedade relativamente aos objectivos que se pretende atingir.
A propósito dos aumentos do preço dos transportes colectivos e das taxas moderadoras e do pagamento nas SCUT, vou debruçar-me sobre dois argumentos que o Governo sempre utiliza, entre os quais o da justiça social.
No que se refere à justiça social, é preciso que se entenda, de uma vez por todas, que a mesma se atinge através do sistema fiscal. Ora, um primeiro-ministro que reconhece que há injustiça fiscal mas que não adianta qualquer tipo de medidas imperativas para alterar essa situação, é evidente que, de facto, não conseguirá atingir o objectivo de justiça social, inclusivamente pondo em causa o princípio da solidariedade que é fundamental.
Acresce que é sempre invocado o princípio do utilizador/pagador. Quero dizer ao Sr. Primeiro-Ministro que este princípio, tal como o do poluidor/pagador, tem um objectivo, o de diminuir a utilização dos serviços, evitar exageros na sua utilização. Ora, quando se fala em aplicar aqueles princípios a serviços tão imprescindíveis como a saúde ou até a água, domínio em que os senhores agora querem aplicá-los, fala-se em algo completamente intolerável e que demonstra uma profunda desonestidade para com os portugueses.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, os Srs. Deputados falam muito em "seriedade" e em "desonestidade". Não são termos que eu próprio goste de usar, volto a dizê-lo, portanto, não vou falar nisso.
De igual modo, não vou voltar a falar na situação que existia nos anos pretéritos. O meu antecessor disse que queria fazer o choque fiscal e falava na situação que encontrou quando chegou ao governo, mas eu próprio não vou falar mais nisso.
A Sr.ª Deputada falou nas exigências da justiça social, isto é, nas medidas que, em dois meses e meio, este Governo tomou para conseguir alcançá-la. Podia ter referido, por exemplo, uma medida - e já irei às outras - que penso que todos os Deputados registarão com agrado. No primeiro Conselho de Ministros a que presidi tomámos a deliberação de, até ao princípio de 2006, criar uma rede de cuidados de tratamento a doentes do foro oncológico, a estender por todo o País, pois estes são doentes que apenas podem tratar-se em Lisboa, Porto ou Coimbra mesmo que morem longe destas cidades. Esta foi uma das primeiras decisões que tomámos.
A Sr.ª Deputada fala em aumentos das taxas moderadoras do Serviço Nacional de Saúde e no pagamento das vias em regime de SCUT e diz que eu reconheço que o sistema fiscal não é perfeito. Respondo-lhe que é evidente e que, aquando do debate do Orçamento do Estado, o Sr. Ministro das Finanças e eu próprio falaremos mais nisso. No entanto, digo-lhe desde já que cerca de 50% das famílias portuguesas, devido aos seus baixos rendimentos, não pagam IRS.

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A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Mas os ricos também não pagam!

O Orador: - Há uma série de cidadãos com altos rendimentos que, infelizmente, ainda conseguem fugir, de modo indevido, a essa mesma justiça fiscal - e já dei boas notícias sobre o combate à evasão fiscal -, por isso, os que pagam são sempre os mesmos. Estou convencido que temos razão quando digo que não é justo pedir ao sistema fiscal o esforço para pagar, por exemplo, as rendas das SCUT ou o défice do Serviço Nacional de Saúde, que se verifica todos os anos, como tem acontecido. Não é justo pedir esse esforço ao sistema fiscal porque são sempre os mesmos pagar, ou seja, não é justo chegar junto dos que auferem o seu vencimento por conta de outrem e dizer-lhes "olhem, para o ano, há que pagar 100 milhões de contos de rendas das SCUT!" É que tem de se ir buscar esse dinheiro a algum lado!
É bom que as pessoas entendam que o défice não pode aumentar. A economia vai crescer 2,3% ou 2,4% no próximo ano, o que equivale a cerca de 500 milhões de contos. Ora, todo esse valor é absorvido apenas por estas novas facturas a que temos de fazer frente.
Por outro lado, há que saber que cada ponto percentual de aumento nos vencimentos dos funcionários públicos significa um valor de 50 milhões de contos. Ora, não pode dizer-se "não aumente o défice; não aumente os impostos;…" - o crescimento da economia está todo absorvido por estas novas exigências - "…aumente os funcionários públicos; aumente as pensões". É impossível! O povo português sabe que o tal défice de que tanto se fala existe por causa do desequilíbrio entre as receitas que o Estado recebe e as despesas que tem de fazer. E o Estado não é uma pessoa qualquer que mora ali, ao lado, o Estado somos todos nós! O dinheiro que temos para gerir no Orçamento do Estado é o dinheiro proveniente das contribuições dos cidadãos portugueses, e governar é fazer opções, é decidir.
Não aceito, por exemplo, que alguém, com um carro de alta cilindrada, que ainda consiga iludir o fisco, passe em qualquer auto-estrada sem pagar portagem, auto-estrada essa que vai ser paga pelo esforço fiscal dos que - sempre os mesmos! - pagam impostos ao fim do mês! Isso é que não aceito.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Esta é a minha visão. Esta é a nossa visão da justiça redistributiva: quem utiliza deve pagar e fazê-lo à medida das suas possibilidades. Isto é que é justo. Não há modelos perfeitos, mas este é o modelo mais justo de todos, Sr.ª Deputada.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para replicar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, apenas quero dizer-lhe que pagam os carros de alta cilindrada mas também os de pequena cilindrada. De facto, não é assim que se faz justiça. A justiça faz-se através do sistema fiscal.
Se há quem consiga iludir o fisco, é justamente nesse domínio que este Governo deveria batalhar para que, daqui a muito pouco tempo, o Sr. Primeiro-Ministro pudesse não repetir aquela sua afirmação, garantindo que há moralidade fiscal neste país, coisa que, hoje, não existe.
De qualquer modo, penso que, através da resposta que deu, os portugueses perceberam perfeitamente que o Governo dá com uma mão e tira com a outra. Portanto, os portugueses vão continuar a sentir a necessidade de fazer sacrifícios, os seus orçamentos familiares vão permanecer exíguos e vão continuar a sentir profundas dificuldades.
O Sr. Primeiro-Ministro não gosta de ouvir falar em desonestidades, pois nós próprios também não gostamos que a oposição e as críticas ao Governo sejam intituladas pelo Sr. Primeiro-Ministro como um "ruído" que anda à sua volta. Um governo democrata deve saber ouvir. Essa é uma questão fundamental, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Por outro lado, e para não fugir às questões que o Sr. Primeiro-Ministro hoje trouxe à Assembleia da República, quero manifestar a posição do Partido Ecologista "Os Verdes".
Uma vez que, para a semana, teremos oportunidade de debater em profundidade a futura lei do arrendamento, gostaria de manifestar a nossa profunda preocupação relativamente ao facto de a proposta de lei acentuar a instabilidade no que se refere ao direito à habitação, nomeadamente fragilizando a posição dos

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inquilinos, promovendo o aumento das rendas, reduzindo de cinco para três anos o prazo mínimo de vigência dos contratos de arrendamento e facilitando o despejo das pessoas.
No que diz respeito à questão das SCUT, este é, de facto, o exemplo de como, muitas vezes, os governos adoptam os caminhos mais fáceis. Isto é, o Estado desresponsabiliza-se do seu compromisso e põe sempre os mesmos a pagar, mesmo contra as expectativas que foram criadas, mesmo contra a inexistência de alternativas viáveis àquelas vias rodoviárias.
É evidente que a questão da mobilidade e das assimetrias regionais levar-nos-ia a um longo debate que, seguramente, teremos oportunidade de aprofundar em sede de Orçamento do Estado. No entanto, devo dizer que fiquei com uma curiosidade, Sr. Primeiro-Ministro, porque recordo-me de, há uns anos atrás, ter ouvido um senhor, de nome Feliciano Barreiras Duarte, agora Secretário de Estado, que, nomeadamente, publicou um livro, em 1997, que dizia "Guerra contra as portagens". Esta é uma pessoa com responsabilidades no actual Governo do PSD. Diga-nos aqui, Sr. Primeiro-Ministro, qual foi a reacção deste Sr. Secretário de Estado em face da medida que o Governo tomou agora em relação às SCUT.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, provavelmente o Sr. Secretário de Estado Feliciano Barreiras Duarte até deveria fazer uma segunda edição desse livro. Sabe porquê? Porque foi percursor. As populações locais que tenham sido objecto de expectativas ou de discriminação excessiva, injustificada, devem ter direito à isenção que agora vamos conferir àquelas que residem nos concelhos que não têm alternativa de itinerários, assim como àquelas a quem foi feita a promessa de não pagarem portagens.
O Sr. Secretário de Estado Feliciano Barreiras Duarte foi, pois, um percursor das medidas que agora estamos a adoptar e, por isso mesmo, se calhar, fará uma segunda edição do livro.

Risos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.

Gostava de deixar bem claro que não considero "ruído" as observações, discordâncias e críticas que as Sr.as e Srs. Deputados hoje aqui fizeram em relação às nossas opções políticas. Discutir políticas, discutir as policies, discutir as nossas opções para cada sector da governação é o que quero, o que gosto. A isso nunca me ouvirá chamar "ruído".
Mas, Sr.ª Deputada, ouvir, da maneira como ouvi, falar em carros, em assessores, em liberdade de imprensa, este um assunto tão sério, isso já é "ruído" para nos distrair dos verdadeiros problemas e dos debates que temos para travar.
Por isso, "ruído" no Parlamento, nunca! No Parlamento, gosto muito de travar estes debates, como já teve ocasião de comprovar.
Se o Sr. Presidente me autorizar, volto um pouco atrás, a uma questão há pouco colocada - e ainda bem que dá agora entrada na Sala o Sr. Deputado Francisco Louçã, para poder ouvir o que vou dizer -, sobre as reformas da Caixa Geral de Depósitos para referir, porque não quero fugir à questão, que o modelo foi decidido em 2000, não no tempo deste governo. Quanto ao administrador que saiu agora e cuja reforma tem sido objecto de tanta polémica, devo dizer que ele tinha direito a essa mesma reforma, nos mesmos termos, no BPI.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

Protestos do Deputado do BE Francisco Louçã.

O Orador: - Não faço comentários, mas no BPI tinha!
E quando foi convidado pelo Estado para a administração da Caixa Geral de Depósitos, o modelo a que teve direito era o que estava em vigor desde 2000. Eu não concordo com esse modelo, o Governo não concorda, o Sr. Ministro das Finanças também já disse que não concorda, pelo que, até ao final do mês, estará em vigor na Caixa Geral de Depósitos um modelo completamente diferente, equitativo e que os portugueses considerem justo.
Não estou a dizer que tenha sido um governo do PS a decidir que fosse assim, mas tão-só que foi em 2000, não no nosso tempo. Não considero que o modelo em questão faça sentido, mas gostava de dizer que a pessoa em causa tem serviços prestados ao País e que quando foi para a Caixa Geral de Depósitos tinha esses direitos num banco privado.

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Mas são situações com que não concordamos e, por isso, o modelo vai ser alterado até ao final do mês.

O Sr. António Filipe (PCP): - Já havia pessoas a concordar!

O Orador: - Não, não! Não concordamos mesmo! E o Sr. Ministro das Finanças também já disse que não concorda. Aliás, nenhum de nós, nesta bancada, concorda. Achamos que não faz sentido e por isso vamos decidir dessa maneira.
Assim sendo, penso que a questão colocada pelo Sr. Deputado é legítima. Aliás, quando tivemos conhecimento dela, incomodou-nos, não pela pessoa em causa, pois teria direito a essa mesma reforma se estivesse no sector privado, mas pelo facto de, naquele caso, se tratar de capitais públicos e de todas as entidades que tenham capitais públicos deverem dar um exemplo diferente, de contenção e de austeridade.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à segunda volta de perguntas.
A primeira pergunta cabe ao Sr. Deputado João Cravinho, a quem informo que tenho anotado o seu pedido de palavra para defesa da honra, mas, para esse fim, dar-lha-ei no final do debate.

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, uma vez que estou inscrito para usar da palavra agora, prescindo da defesa da honra, porque não me ofende quem quer, como V. Ex.ª sabe.

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado.
Então, tem V. Ex.ª a palavra para formular a sua pergunta ao Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, orgulho-me de ter contribuído para o desenvolvimento das SCUT e sou um defensor convicto da sua bondade estratégica e financeira.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Gostaria de colocar-lhe várias questões, a primeira das quais tem a ver com o seguinte: a Espanha tem, neste momento, em construção, e já concluídos, cerca de 10 000 km de autovias sem portagem. Tendo a Espanha uma pressão fiscal bastante inferior à portuguesa, o Estado espanhol consegue financiar esses 10 000 km. Como é que o Sr. Primeiro-Ministro não consegue?
Em segundo lugar, está o Sr. Primeiro-Ministro consciente de que a alegada crise orçamental do IEP é uma autêntica fraude política, destinada a enganar o País e os autarcas? Em 2002, o orçamento do IEP (isto é, do conjunto que hoje é o IEP) era de 2117 milhões de euros; em 2004, é de 35% - em valor nominal, 742 milhões de euros -, o que traduz um corte brutal, como certamente não há nenhum outro no Orçamento, de dois terços. Porquê? Para criar deliberadamente esta impressão de crise, para fundamentar aquilo que não tem fundamento.

Aplausos do PS.

Sabe o Sr. Primeiro-Ministro que, em 2005, bastará colocar o orçamento do IEP ao nível que tinha três anos antes, em 2002, para se poder pagar as SCUT e aumentar para mais do dobro o que fica para o resto?
Sr. Primeiro-Ministro, sabe que o Banco Europeu de Investimento (BEI), o principal financiador das SCUT, considera que o pagamento das SCUT não constitui problema relevante para o Estado português? Sabe que, de acordo com o BEI, o Estado tem capacidade financeira para as suportar? Se existe problema é porque o Governo estrangula financeiramente o IEP, seja lá por que razão for.
Sr. Primeiro-Ministro, vai impor portagens sem haver alternativas? Considera que a EN125 é alternativa à Via do Infante?

O Sr. António José Seguro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Quais são as alternativas na Beira Interior? E no IP5? E na Costa da Prata? E no Litoral Norte?

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Aplausos do PS.

Sr. Primeiro-Ministro, vai cobrar portagem em vias rápidas já pagas com impostos e fundos estruturais? Falo, por exemplo, das vias rápidas Vila Real de Santo António-Guia ou Aveiro-Albergaria. E poderia citar outros exemplos.
Sr. Primeiro-Ministro, vai fechar nós nas SCUT? Quantos? Serão 50, 100,…? E quais são?
O Sr. Primeiro-Ministro está consciente de que o Governo decidiu acabar com as SCUT, sem ter feito qualquer estudo sério, ao fim de dois anos e meio?

O Sr. António José Seguro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Está consciente de que isso indicia no exterior - e agrava a credibilidade do Estado português - uma instabilidade contratual de que não há memória?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Finalmente, Sr. Primeiro-Ministro, quero dizer-lhe o seguinte: o caos que o senhor está a lançar neste país, quando o País precisa de serenidade e de coesão, tem um custo terrível.
Nós somos pela defesa do desenvolvimento do interior. O Sr. Primeiro-Ministro, com falas mansas, é contra!

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Os outros que paguem, não é?!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Cravinho, tenho aqui…

Vozes do PS: - É só papéis!

O Orador: - São papéis, são! São artigos de jornal. Trata-se de liberdade de imprensa!
Passo a ler: "Sem portagens no Oeste não haverá novas auto-estradas. Gostaria de acabar com as portagens, mas construir uma auto-estrada no valor de 600 ou 700 milhões de contos não recorrendo a portagens não é possível sem aumentar os impostos".
Tal como esta, tenho tantas declarações suas, Sr. Deputado, a dizer o contrário do que agora diz!
Sr. Deputado João Cravinho, vou ler-lhe o que o Tribunal de Contas diz sobre o contrato das SCUT (e até a propósito de túneis): "O Estado lançou estes concursos sem a prévia aprovação de estudos de impacte ambiental, sem a existência de projectos aprovados e sem a realização de expropriações. Os riscos inerentes foram transferidos para as concessionárias que, depois, as repercutiram nos custos. Muito grave é o facto de o Estado não ter assumido uma partilha de riscos defensora dos seus interesses, aumentando custos e diminuindo o seu poder negocial. Por exemplo, o Estado ficou limitado no que respeita à melhoria nas vias alternativas e à construção de novas vias sem compensar as concessionárias por haver vias alternativas e perderem tráfego nas auto-estradas." O Estado até disso ficou privado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Continuo a citar o Tribunal de Contas: "O procedimento concursal não encontra paralelo em qualquer dos concursos ou procedimentos adjudicatórios típicos previstos quer no direito comunitário quer no direito interno".
O Sr. Deputado diz que vamos acabar com as SCUT sem termos feito qualquer estudo, mas o Tribunal de Contas diz: "O lançamento deste programa de concessões não foi precedido de uma avaliação sobre a sua economia, eficiência e eficácia, face ao modelo tradicional. Por outras palavras, o programa foi lançado sem se avaliar se era mais eficaz do ponto de vista financeiro (…)".

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Arrasador!

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O Orador: - Se o Sr. Deputado quiser que continue a ler tudo o que o Tribunal de Contas refere a este propósito, continuo, mas digo-lhe, Sr. Deputado João Cravinho, que o orçamento do IEP não chega. Tenho comigo os orçamentos de 1996, 1997, 1998 e 1999.
Quanto aos cerca de 700 milhões de euros, essa verba é inferior à velocidade padrão das rendas que o Estado vai ter de pagar nos próximos anos, ao que vamos ter de pagar durante 25 anos por causa das auto-estradas que fizeram, dizendo "passem, porque são de graça!". Isto é a governação socialista: "passem à vontade porque jamais alguém pagará!". Mas não dizendo ao povo que tinha de pagar 10 anos depois! Essa é uma maneira de governar que não é a nossa.
O Sr. Deputado João Cravinho diz que nós lançamos o País no caos. Sr. Deputado, se não tomássemos estas medidas é que, sem dúvida, o País ficaria num caos financeiro.
Deu ainda o Sr. Deputado o exemplo de Espanha e da diferente pressão fiscal aí existente. Só que o governo espanhol anterior deixou uma situação de superavit, que este governo quer manter. A situação orçamental de Espanha é, pois, completamente diferente.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Por isso, Sr. Deputado João Cravinho, se acha que tem tanta razão, foi pena não ter tomado a atitude democrática de ter ido ontem à Comissão de Obras Públicas, Transportes e Comunicações, onde esteve o Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, António Mexia, que tem percorrido todo o País, para responder cara a cara. Isso é que foi pena!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Sr. Deputado João Cravinho, quem lançou este país no caos foi o Sr. Deputado com as nacionalizações e, agora, com as SCUT. Mas nós não vamos deixar que isso volte a acontecer, porque temos coragem e sabemos assumir as nossas responsabilidades.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. João Cravinho (PS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, a minha interpelação é no sentido de solicitar à Mesa que faça distribuir documentação oficial que desmente totalmente o Sr. Primeiro-Ministro.
Em segundo lugar, em sede de defesa da honra e consideração, gostaria de dizer…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, para esse efeito, inscrevo V. Ex.ª e dar-lhe-ei a palavra no momento oportuno.
Quanto à sua interpelação, vou fazer distribuir de imediato os documentos que V. Ex.ª solicitou.
Para formular a sua pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado Marco António Costa.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, não fosse por mais e este debate já tinha valido a pena. É que, passadas 24 horas, voltámos a reencontrar o Sr. Deputado João Cravinho, que, ontem, faltou à Comissão de Obras Públicas, Transportes e Comunicações, onde pretendíamos ouvi-lo sobre a questão das SCUT.
O que pretendíamos era algo muito simples: numa altura em que se prepara o debate da proposta de lei de Orçamento do Estado para 2005, em que o tema do utilizador/pagador é um tema central dessa proposta de lei, queríamos fazer o contraditório simples, transparente e objectivo entre aquele que foi o mentor das SCUT e o Ministro que tem agora a responsabilidade de dizer aos portugueses que é preciso novamente recolocar portagens e corrigir esta situação.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Era só isso que queríamos, esse confronto democrático, livre, aberto e transparente.

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Mas a verdade é que a Comissão ficou à espera, em vão, dessa explicação do Sr. Deputado João Cravinho.
No entanto, hoje, o Sr. Deputado veio cá para colocar questões ao Sr. Primeiro-Ministro. Bem-haja por isso, porque a nós, Deputados de uma comissão parlamentar, exigiu-nos prévios quesitos para responder.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Só faltava dizer que só compareceria na Comissão parlamentar acompanhado de advogado de defesa!
O que pretendíamos era um confronto simples, transparente e objectivo entre os dois protagonistas desta matéria.
Vou recordar-lhe, Sr. Deputado João Cravinho - o senhor fala de "falinhas mansas" e do interior -, que o IP2, que tem início em Bragança e termina em Faro e atravessa todo o interior do País, tem neste momento 500 km construídos, dos quais 300 km foram construídos por governos do PSD e 200 km por governos do PS. Que grande oportunidade que o Sr. Deputado teve de completar o IP2! Mas vai ser este Governo a ter essa responsabilidade de completar o IP2 e de garantir ao interior do País uma ligação desde o norte ao sul, assegurando a coesão que o País exige.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas é espantoso, Sr. Primeiro-Ministro, que hoje se tenha ouvido aqui falar de eleitoralismo a propósito do anúncio feito por V. Ex.ª do aumento das pensões e dos vencimentos dos funcionários públicos e da descida do IRS, no Orçamento do Estado para 2005! Mas que contradição existe na oposição! É eleitoralismo ter a coragem de trazer o tema das portagens e das SCUT para discussão com os portugueses, não continuando a "meter esta questão debaixo da carpete"?!
A verdade é que o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, ontem, em sede de comissão parlamentar, deu-nos os números. Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, pergunto-lhe objectivamente: é verdade ou não que há portugueses que não pagam portagens e que têm rendimentos superiores a outros e que os que têm menores rendimentos são os que vão pagar portagens, no tal sistema justo das SCUT idealizado pelo Partido Socialista?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tem de terminar.

O Orador: - Esta é a grande questão que merece ser esclarecida.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro. De seguida, darei a palavra ao Sr. Deputado José Junqueiro, que deseja defender a honra da bancada face à intervenção do Sr. Deputado Marco António Costa.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Marco António Costa, dou-lhe uma resposta afirmativa à questão que me coloca.
De facto, esse é um dos grandes problemas da justiça equitativa, o qual teremos de considerar na solução final que viermos a adoptar.
O Conselho de Ministros adoptou decisões, como foi a renegociação do contrato com as concessionárias, a tratar junto com as diferentes populações, do modelo mais justo que se aplica a cada região, tendo em conta a respectiva realidade económico-social, as expectativas que foram criadas, a existência ou não de percursos alternativos.
Posso dizer-lhe que, nos termos dos contratos que foram feitos com as concessionárias - julgo que, há pouco, mencionei esse facto -, agora, por quilómetro, cada carro que passa nas SCUT tem um preço calculado, para pagamento das rendas aos privados, três ou quatro vezes superior ao do carro que passa numa auto-estrada concessionada à Brisa. Portanto, todas estas renegociações, que agora têm de ser feitas, são complexas. Acredito que quando o Estado negociou com os privados o fez de boa fé - não ponho em causa a boa fé de quem negociou -, considero é que foi uma má negociação.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

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O Orador: - Nunca ponho em causa as intenções das pessoas, nem a sua seriedade.
Aliás, quando eu era Presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz, tive ocasião de receber o ex-Ministro João Cravinho, na altura em que anunciou a obra da auto-estrada, agora chamada da Costa de Prata, que liga Leiria - Figueira da Foz - Mira e a obra de conclusão do IP3, a ligação de Coimbra à Figueira da Foz, que pagam portagem. Eu, que era Presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz, disse: "Quero é que terminem esta ligação". E não há percursos alternativos em Montemor-o-Velho, tendo, logo à saída da Figueira da Foz, de pagar-se portagem.

Protestos do Deputado do PS Renato Sampaio.

Na altura, o Sr. Ministro João Cravinho e eu fomos, de helicóptero, sobrevoar todo aquele território, e vimos as carências que existiam naquela zona, como noutras zonas do País.
Penso que o princípio é um: ou não se paga a utilização das vias, sendo as portagens todas grátis, o que é insustentável; ou quem as utilizar tem de pagar segundo as suas possibilidades.
O Ministro António Mexia tem percorrido o País todo, desde o Algarve ao interior do País, como Castelo Branco e Portalegre, deslocando-se a todos os sítios para falar. Tal como ele, eu também irei, porque acreditamos naquilo que defendemos.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Não posso ignorar que já me chegaram (de Odemira, de Almodôvar) vários telegramas, dizendo: "Desculpem, mas temos um rendimento económico inferior ao das pessoas no Algarve; temos um rendimento médio, pelo que não queremos pagar quando utilizamos a auto-estrada." E o mesmo sucedeu também em São Domingos de Rana, ao pé de Lisboa. Porque se alguém considera a estrada marginal como alternativa à auto-estrada para Lisboa, com tudo o que representa, então, entre a estrada marginal Lisboa-Cascais e a EN125 "venha o diabo e escolha"!
Sem dúvida que há um sistema de transportes públicos diferente nas zonas de Lisboa e do Porto.

Vozes do PCP: - Então, quem é que paga?

O Orador: - Mas, a propósito de buracos, conhece o "buraco" que representa o prejuízo acumulado, ao longo de anos e anos, por esses sistemas de transportes?

Protestos do PS.

Em relação a tudo isto, há duas atitudes possíveis: ou fazemos de conta que não existem as dívidas, e os passivos continuam a acumular-se; ou, então, tomamos as medidas de forma a economia registar um crescimento são e não assente em pressupostos falsos.

O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Só se os portugueses souberem tudo, o que são os seus encargos, as suas responsabilidades e as suas esperanças de proveitos, é que podem compreender as opções que são tomadas para o seu futuro.
Sr. Deputado Marco António Costa, de facto, há diferenças de rendimentos: há quem tenha menos rendimentos e pague e há quem tenha mais rendimentos e não pague.
Tenho muito mais a dizer sobre isto, bem como o Ministro António Mexia e outros Ministros. Mas iremos ter com as populações para defendermos os nossos pontos de vista e para chegarmos à solução final em diálogo com os autarcas e com as populações. Queremos enfrentá-las, estar com elas e trabalhar construtivamente para encontrar a solução final, que, em princípio, será a isenção de pagamento num raio de cerca de 30 Km em relação ao local do seu domicílio fiscal. Pensamos que essa é a solução mais justa, mas vamos ver qual a melhor solução final que será encontrada.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para defesa da honra da sua bancada, dou agora a palavra ao Sr. Deputado José Junqueiro, que se sentiu agravado pela intervenção do Sr. Deputado Marco António Costa, a quem, de seguida, também darei a palavra para dar explicações, se assim o entender.
Tem a palavra, Sr. Deputado José Junqueiro.

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O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Marco António Costa, V. Ex.ª esteve presente na Comissão de Obras Públicas, Transportes e Comunicações e sabe o que se passou relativamente à audição do Sr. Deputado João Cravinho. Deixe-me, pois, que lhe diga que aquilo que disse, vindo da sua pessoa, não ilustra, só deslustra.

O Sr. António José Seguro (PS): - Muito bem!

O Orador: - E porquê?
Em primeiro lugar, os partidos da maioria requereram uma audição, cujos termos foram acordados do seguinte modo: viriam à Comissão, no mesmo dia, primeiro, o Sr. Ministro e, depois, o Sr. Deputado João Cravinho. Mas quando o Sr. Presidente da Comissão fez a convocatória, arrependeu-se e inverteu os termos: queria ouvir primeiro o Sr. Deputado João Cravinho e só depois o Sr. Ministro

O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): - É inacreditável!

O Orador: - Em segundo lugar, o Sr. Deputado João Cravinho dirigiu uma carta à Comissão, na qual dizia três coisas essenciais.
Disse que estava absolutamente disponível e interessado em discutir a questão das SCUT e em comparecer na Comissão,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não dizia nada disso!

O Orador: - … porque as SCUT eram algo da nossa responsabilidade; que as portagens nas SCUT eram da responsabilidade do Governo e da maioria, mas que a sua construção era da nossa responsabilidade.
Portanto, ele tem interesse em comparecer na Comissão.

O Sr. Afonso Candal (PS): -Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas não vai!

O Orador: - "Mas, para isso…", disse o Deputado João Cravinho, "…, eu, que saí há cinco anos do Governo, gostaria que os senhores me dissessem, para ser mais útil, mais rigoroso e usar de maior transparência, quais são os quesitos sobre os quais me deverei pronunciar." E o Partido Socialista fez uma proposta no sentido de serem enviados os quesitos ao Sr. Deputado João Cravinho para ele comparecer na Comissão.

Protestos de Deputados do PSD.

E o que é que fez a maioria? Escudando-se num procedimento parlamentar, rejeitou essa proposta e respondeu que não adiava a audição e que só aceitava votar essa questão na próxima semana seguinte.

O Sr. António José Seguro (PS): - Exactamente!

O Orador: - Ao que o Deputado João Cravinho respondeu: "Então, só responderei a isso na próxima semana."

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Marco António Costa, quando a maioria vem aqui dizer uma inverdade, temos de rejeitá-la.

O Sr. António José Seguro (PS): - Muito bem!

O Orador: - E quando o Sr. Primeiro-Ministro, mal informado, repete uma coisa que não é verdade, sentimo-nos ofendidos. E mais ofendidos nos sentimos quando o Sr. Primeiro-Ministro, dizendo que não faz ataques pessoais, vem aqui fazer, perdendo um pouco a sua compostura, desculpe que lhe diga, um ataque pessoal ao Deputado João Cravinho a propósito da matéria das nacionalizações.

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Aplausos do PS.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Um ataque pessoal?!…

O Orador: - Termino, Sr. Deputado Marco António, dizendo-lhe o seguinte: à enorme demagogia que aqui ouvimos, sobre o "carro artilhado" que vinha aí, sem pagar portagem, numa estrada qualquer… - eventualmente, o Passat ultra-moderno do Sr. Primeiro-Ministro -, contrapõe-se com uma outra coisa, que vou perguntar-lhe.
Sr. Primeiro-Ministro, os transportes públicos dão 250 milhões de euros de prejuízo por ano - Metropolitano de Lisboa, Soflusa…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Pergunto-lhe: porque é que um cidadão de Bragança, de Viana do Castelo, de Viseu, de Trás-os-Montes ou de outro ponto do País tem de pagar os 250 milhões de euros de prejuízo dos transportes públicos?

Aplausos do PS.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Deputado Marco António Costa, tem a palavra para dar explicações.

O Sr. Marco António Costa (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, gostaria de começar por dar um exemplo clarificador, que traça uma linha que nos diferencia do Partido Socialista.

Vozes do PS: - Há muitas!

O Orador: - É que o Sr. Deputado João Cravinho, ontem, faltou à Comissão de Obras Públicas, Transportes e Comunicações, mas o Sr. Deputado David Justino, à mesma hora, estava presente na Comissão de Educação, Ciência e Cultura a responder às perguntas dos Srs. Deputados. Essa é a diferença que nos separa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Deputado José Junqueiro, já que quis ser tão preciso em relação a esta questão, gostaria de recordar-lhe o seguinte: a verdade é que a reunião da Comissão de Obras Públicas, Transportes e Comunicações se iniciou sem que tenhamos obtido uma resposta, nomeadamente o seu Presidente, sobre se o Sr. Deputado João Cravinho compareceria ou não.

Protestos do Deputado do PS José Magalhães.

A verdade é que o Sr. Deputado João Cravinho não teve tempo para comparecer na Comissão, mas teve tempo para ir a órgãos de comunicação social dizer que não tinham sido combinados com ele nem a hora nem o dia dessa audição.

Protestos do PS.

A verdade é que, que eu saiba, o Sr. Deputado João Cravinho, como presidente de uma comissão parlamentar, nunca envia previamente os quesitos àqueles a quem quer fazer uma audição.

Vozes do PSD: - É verdade!

Protestos do Deputado do PS José Junqueiro.

O Orador: - Sr. Deputado, demagogia é dizer que a atitude do Governo é eleitoralista, quando está a procurar, ao fim de dois anos de sacrifício, como o Dr. Durão Barroso recordou muitas vezes neste Parlamento que iria acontecer, dar aos portugueses aquilo que gostamos de dar, que é justiça social. Aquando do Orçamento rectificativo de 2002 e na altura da discussão e aprovação do Orçamento para 2003, ele recordou aqui várias vezes à oposição: "Cuidado, quando chegarmos ao final de 2004, quando

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eu apresentar um orçamento que vai trazer boas notícias aos portugueses, não venham acusar-me de eleitoralismo, porque estou hoje a pedir os sacrifícios para poder distribuir amanhã."
Os senhores acusam hoje de eleitoralismo este Governo quando ele está a enfrentar questões tão importantes, como a lei do arrendamento ou as SCUT, cuja resolução vocês "varreram para debaixo da mesa". Fizeram aquilo que, ontem, um Deputado afirmou de uma forma correcta: no caso das SCUT, "passaram cheques pré-datados" em nome do Estado para vários anos.

Protestos do PS.

Essa é que é a verdade, por muito que o Sr. Deputado José Junqueiro queira esconder.
Mas, Sr. Deputado, há uma outra questão muito importante, que não vale a pena escamotear: é que o Sr. Deputado João Cravinho, que, ontem, na televisão, num programa da SIC, se afirmou sempre um parlamentar tão frontal e que gosta tanto do confronto, aquilo que fez foi fugir ao confronto.

Protestos do PS.

É que, nesta questão, o confronto era com o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações; o confronto era entre aquele que inventou um sistema que é ruinoso para Portugal e aquele que vai ter de assumir às suas costas a responsabilidade de voltar a dizer aos portugueses que o sistema não serve e que vai ter de reintroduzir as portagens.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Jorge Neto pediu a palavra para interpelar a Mesa. Peço-lhe o favor de limitar a sua intervenção a uma interpelação à Mesa.

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Sr. Presidente, faço um interpelação à Mesa, porque pretendo, na minha qualidade de Presidente da Comissão de Obras Públicas, Transportes e Comunicações, prestar um esclarecimento à Câmara relativamente a toda a sequência de factos aqui relatada e invocada, em concreto pelo Sr. Deputado José Junqueiro, com imprecisão e falta de rigor.
É, pois, em abono da verdade e do rigor que pretendo prestar este esclarecimento aos Srs. Deputados.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, então, tenho de inscrevê-lo para lhe dar a palavra oportunamente. Neste momento não posso interromper o debate.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Sr. Presidente, trata-se de uma interpelação à Mesa. E este é o momento asado para fazer essa interpelação, sob pena de se perder a actualidade desta matéria.
Prometo ser breve, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Se me promete ser breve, dar-lhe-ei a palavra. Mas vou cobrar-lhe essa promessa, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, no dia 6 de Outubro, reuniu a Comissão das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, e nessa reunião foi apresentado e votado um requerimento, subscrito pela maioria parlamentar PSD/CDS-PP, no qual se impetrava a audição, no mesmo dia, do Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações e do Sr. Deputado João Cravinho.
Foi deliberado proceder à audição dessas duas entidades no mesmo dia, sem que da deliberação decorresse qualquer imposição de natureza cronológica, em termos de sequência dessa audição.
Imediatamente a seguir a essa deliberação, antes do envio da respectiva convocatória, fiz diligências pessoais, tendo, concretamente, na sexta-feira, dia 8 de Outubro, contactado o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares para saber da disponibilidade da vinda à Comissão do Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, tendo sido informado que apenas estaria disponível para depor no final da tarde do dia agendado, precisamente o dia 12 de Outubro.

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Na sequência dessa informação do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, contactei pessoalmente, por telefone, o Sr. Eng.º João Cravinho, dando-lhe conhecimento do que tinha sido deliberado na reunião da Comissão do dia 6 de Outubro. Disse-lhe que iria ser convocado para prestar esclarecimentos, em audição a ter lugar no dia 12 de Outubro, relativamente ao processo das SCUT, e que a sua audição estava agendada para as 12 horas, face à indisponibilidade, do ponto de vista de agenda, do Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.
O Sr. Deputado João Cravinho respondeu-me que tinha toda a disponibilidade para estar presente na Comissão, que nunca se recusaria a prestar os esclarecimentos que fossem necessários aos Srs. Deputados, mas que teria de reflectir sobre a matéria, nomeadamente com o seu grupo parlamentar. Indagou, designadamente, se existia alguma documentação, algum acervo documental em relação ao qual pudesse depor. Respondi-lhe que não, mas fiz questão de lhe dizer que a convocatória seria acompanhada de um requerimento que informava e fundamentava essa mesma audição, para que, efectivamente, o Sr. Deputado João Cravinho conhecesse o tema sobre o qual iria depor.
No dia 12 de Outubro, o dia aprazado para a reunião, recebi na Comissão uma carta do Sr. Deputado João Cravinho, dirigida à minha pessoa, na qual exigia um tratamento igual relativamente a outros responsáveis políticos pelas SCUT, de outra forma sentir-se-ia discriminado, bem como a definição de quesitos relativamente à matéria sobre a qual iria depor.
Portanto, em função destas duas condicionantes, o Sr. Deputado João Cravinho aguardava a posição que a Comissão de Obras Públicas, Transportes e Comunicações viesse a tomar para, então, decidir se iria ou não estar presente.
No dia 12 de Outubro, a Comissão reuniu novamente, apreciou o requerimento e deliberou manter exactamente nos precisos termos a deliberação anterior, isto é, a audição do Sr. Ministro responsável pela área das obras públicas da altura, o Sr. Deputado João Cravinho, sem qualquer outro tipo de condicionante.
Nesse mesmo dia, no final da tarde, foi comunicado ao Sr. Deputado João Cravinho, pelos serviços da Comissão, que se mantinha inalterada a deliberação da semana anterior, sem prejuízo de um requerimento, entretanto apresentado pelo Partido Socialista, que seria votado numa reunião ulterior, relativamente à apreciação da bondade, ou não, do acerto, ou não, dos fundamentos invocados pelo Sr. Deputado João Cravinho.
Assim, o Sr. Deputado João Cravinho foi expressamente informado pelos serviços da Comissão de que se mantinha, ipsis verbis, a deliberação anterior e, portanto, teria de estar presente no dia 13 de Outubro.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, no dia 13 de Outubro aguardei, com alguma ansiedade, uma resposta pessoal do Sr. Deputado João Cravinho, mas ele não se dignou apresentar essa resposta, não se dignou apresentar qualquer comunicação à Comissão, justificando as razões da sua ausência. Tomei conhecimento da sua ausência pela constatação de facto: efectivamente, ele não esteve presente, na hora aprazada, na Comissão.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - É óbvio que esta interpelação à Mesa não tem qualquer resposta.
Também para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, trata-se de uma interpelação à Mesa sobre a condução dos trabalhos para, sem mais argumentação, requerer ao Sr. Presidente que convoque, com carácter de urgência, uma reunião da Conferência de Líderes, no final deste debate, para esclarecimento de todo este processo e do que se passou no interior da própria Comissão de Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Já está esclarecido!

O Orador: - Julgo, Sr. Presidente - aliás, já tive oportunidade de, por telefone, expressar-lhe o que penso sobre esta questão -, que este é um assunto demasiado sério para ser tratado apenas no debate político.

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Vozes do PSD: - Pois é!

O Orador: - Está em causa a honorabilidade de um membro desta Casa e, Sr. Presidente, considero que, em defesa da dignidade de todos os Deputados desta Casa, do órgão de soberania Assembleia da República, é absolutamente necessário que não fique uma dúvida sobre o que se passou.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Não há dúvida nenhuma!

O Orador: - É neste sentido que apelo à isenção e ao alto critério com que o Sr. Presidente sempre tem presidido a estas sessões para que tenha lugar essa reunião e se esclareça, de uma vez por todas, as questões que há pouco referi.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, registo o requerimento que formulou e vou pensar sobre ele.
Para formular uma pergunta ao Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia.

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, cumprimento V. Ex.ª e a sua equipa neste primeiro debate mensal com o Parlamento, agradeço-lhe as explicações que deu às várias perguntas formuladas, que ajudam a compreender que o País tem todo o interesse em que exista uma política de ajustamento e de realismo da sua economia e que não atire para mais tarde soluções que estão nas nossas mãos resolver hoje.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Como V. Ex.ª deve recordar-se, Sr. Primeiro-Ministro, aquando da apresentação do Programa do Governo, expressei-lhe, em nome da bancada do CDS-PP, o desejo de que, no sector dos transportes, três questões que tinham tido uma primeira decisão por parte do anterior governo apoiado por esta coligação tivessem a devida continuidade. Essas questões prendiam-se com a alta velocidade ferroviária, as autoridades metropolitanas de transportes e as SCUT.
Ora, é do nosso conhecimento que prosseguem, em bom ritmo, os trabalhos de preparação dos projectos de alta velocidade ferroviária e o Governo já aprovou diplomas que permitirão às autoridades metropolitanas de transportes começarem a tomar forma e arrancarem em "velocidade de cruzeiro".
O problema das SCUT é, neste momento, objecto de um vivo debate, em que, por vezes, se perde a referência do que está realmente a ser discutido. Por isso, vamos dar uma contribuição para este debate, sobretudo relembrando as nossas posições, e vamos fazê-lo com toda a serenidade.
De facto, o problema não está em saber qual o benefício económico desse investimento - mal fora que investimentos desta natureza e desta grandeza não tivessem benefícios! -, mas, sim, em saber se o Estado tem ou não os recursos para fazer as SCUT e se tem ou não o direito de atirar para as gerações vindouras os encargos das obras que quer fazer e exibir hoje.
As SCUT não foram, não são, nem serão a única maneira de encarar este problema. E a bancada do CDS-PP evidenciou, desde sempre, que, se nada se fizesse, os custos com portagens virtuais iriam causar graves estrangulamentos, uma vez que, entre 2007 e 2025, os valores dos encargos para o Estado são sempre superiores a 600 milhões de euros em cada um desses 18 anos, pensando mesmo que a média desses 18 anos é superior a 700 milhões, mais concretamente 714 milhões de euros.
Isto comprometeria, sem sair do estrito sector dos transportes, a conservação, a reabilitação e a requalificação do nosso património rodoviário, que deve ser a primeira prioridade no quadro de uma política de infra-estruturas competente, séria e com sentido de futuro.
Um ponto que não tem sido muito debatido, e aqui entro na pergunta,…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se.

O Orador: - Serei muito breve, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Espero que sim.

O Orador: - Sobretudo a minha intervenção não vai dar origem a pedidos de esclarecimento em matéria complementar.

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O Sr. Presidente: - Ninguém sabe, Sr. Deputado!

O Orador: - Espero que não, Sr. Presidente.
Como dizia, um ponto que não tem sido muito debatido é o de que o esquema vigente das SCUT introduz, em muitos casos, distorções no equilíbrio regional, em vez de o reforçar.
Sr. Primeiro-Ministro, ponto importante na nova política das SCUT é, em certos casos, o da discriminação positiva que o Governo anunciou, designadamente para os utilizadores, baseados em concelhos mais atrasados. Pode V. Ex.ª esclarecer-nos se os benefícios para as populações desses concelhos são permanentes ou temporários? E, no caso de serem temporários, em que condições os utentes vão passar a integrar o regime geral das SCUT?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Anacoreta Correia, agradeço as questões que colocou e o facto de, coerentemente, ter relembrado os temas tratados aquando do debate do Programa do Governo.
A propósito da alta velocidade ferroviária, queria dizer ao Parlamento que na Cimeira Luso-Espanhola, como foi tornado público, foram obtidas conclusões muito positivas quanto ao empenho dos dois governos em manter o ritmo, as condições contratuais e os objectivos do acordo celebrado na Cimeira da Figueira da Foz, ainda entre o Presidente do Governo Aznar e o Primeiro-Ministro Durão Barroso.
Nesta Cimeira Luso-Espanhola, em relação aos vários traçados acordados - e esse era, para nós, um ponto muito importante -, reafirmaram-se os objectivos então acordados para que não houvesse a mínima derrapagem nos prazos estabelecidos, tal como aconteceu em relação a outro tema importante, o MIBEL - Mercado Ibérico de Electricidade.
Em relação às autoridades metropolitanas de transportes, matéria que considero que Portugal devia ter decidido há, pelo menos, 20 anos, estamos ainda algo atrasados em relação àquela que gostaria que tivesse sido a velocidade de execução deste Governo e do anterior nesta matéria. Penso que as Áreas Metropolitanas do Porto e de Lisboa precisam do trabalho destas autoridades "como de pão para a boca".
Alterámos algumas questões relativas ao seu financiamento e, até, à sua gestão, pois queremos reforçar o papel dos municípios nas autoridades metropolitanas de transportes e fazer com que não haja uma presença do Estado tão pesada, entre administradores executivos ou não executivos, como acontecia no modelo anterior.
Por isso, o Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações defendeu um modelo que apresenta agora mais garantias, principalmente em relação à Autoridade Metropolitana de Transportes do Porto, que registava um atraso maior. De facto, não podemos nem devemos perder mais tempo, até porque a entrada em vigor deste modelo liga-se à questão do saneamento financeiro de todo o sector, que necessita, também nessa matéria, de uma política de verdade e de uma sustentação em relação aos modelos do seu desenvolvimento.
Mas este é um tema em que o Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações está disponível para, nas comissões respectivas, tratar com as Sr.as e os Srs. Deputados todas as opções que temos de tomar no que respeita à rede de metropolitano, às redes de ferrovia em geral e às dos transportes aéreos, incluindo a CP, a REFER e os demais modelos que dizem respeito a todo o território nacional e não só às Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto, opções muito difíceis que temos pela frente face às situações de manifesto subfinanciamento que o sector revela.
Quanto à discriminação positiva de que falou, queria dizer que, de facto, nos termos da resolução que tomámos em Conselho de Ministros, julgamos que cerca de 130 concelhos serão abrangidos por essa discriminação positiva, ou seja, os concelhos que tenham determinado índice de desenvolvimento, que se situem na zona dos traçados e das auto-estradas em relação às quais foi dito que não pagariam portagens ou que não disponham de traçados alternativos capazes terão isenção durante três ou quatro anos - estamos agora a fazer esse apuramento - e, no fim desse período, será feita uma avaliação do respectivo progresso nos níveis de desenvolvimento e de construção das tais alternativas. Então se saberá se a isenção será mantida ou não. É o que está previsto.
Quanto ao encargo com as SCUT, perguntou o Sr. Deputado se o Estado dispõe de recursos. Ora, estão em causa 10 biliões de euros para os próximos 25 anos. Portanto, recursos o Estado pode ter, mas não sei se à custa do Ministério da Saúde, se de outro… - enfim, não quero incorrer naquilo que alguns

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poderão chamar de demagogia. Diria antes que é um esforço financeiro grande demais em termos de justiça na distribuição de recursos pelos diferentes sectores da actividade nacional e da vida do País.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para formular uma pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, bem percebo que tenha havido alguma dificuldade nos temas a escolher e que alguns Deputados da maioria tenham valorizado o facto de o Governo trazer dois assuntos em que sofre contestação, mas a verdade é que, olhando à volta, o Sr. Primeiro-Ministro e o seu gabinete dificilmente encontrariam assuntos em que não sofressem contestação.

O Sr. António Filipe (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Portanto, esta escolha era mais ou menos inevitável.
Após quase três meses de Governo sob a sua liderança, os portugueses podem tirar, já hoje, algumas conclusões.
A primeira é que se mantém a grave política para o País que o governo anterior praticou. Que o digam os trabalhadores da Sorefame, que continuam à espera da assinatura de um protocolo para a viabilização da empresa, que deveria ter sido assinado em Setembro mas que continua sem estar assinado, perante a passividade do Governo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E que o digam, Sr. Primeiro-Ministro, os professores!
Há pouco, o Sr. Primeiro-Ministro falou da primeira reunião do Conselho de Ministros, após ter tomado posse, na qual o Governo anunciou que uma das matérias prioritárias era a colocação de professores. Pois bem, passados três meses, temos hoje centenas de professores a reclamar da última "fornada" de listas, divulgada ontem pelo Ministério da Educação. É que, neste momento, temos mais de 9000 professores não colocados…

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Oiça, oiça!

O Orador: - … e mais de 300 000 alunos afectados por este problema!
Soubemos ontem, Sr. Primeiro-Ministro, que quando os serviços pediram um reforço do pessoal informático para a colocação de professores, o Governo PSD/CDS-PP reforçou os serviços com dois funcionários públicos, requisitados ao Hospital de Santa Marta, que eram auxiliares de acção médica, mais precisamente maqueiros, e estudantes de engenharia informática à noite.

Vozes do PCP: - Extraordinário!

O Orador: - Pois foi esse o "reforço" que o Governo PSD/CDS-PP quis dar para a questão da colocação dos professores!

O Sr. António Filipe (PCP): - Espantoso!

O Orador: - Uma segunda conclusão, Sr. Primeiro-Ministro, é a de que este é um Governo de trapalhadas e de contradições.
Num destes dias, um Domingo à tarde, o Sr. Primeiro-Ministro fez divulgar um comunicado (certamente depois de, naquele recanto favorito da sua residência oficial, ter visto a revista da semana…) a esclarecer que, durante essa semana, em quatro situações diferentes - Galp, GNR no Iraque, taxas moderadoras e colocação de professores - não tinha havido, afinal, contradição entre o que o Sr. Primeiro-Ministro disse e o que os seus Ministros tinham andado a dizer. É espantoso que se chegue a este nível de contradição!
Mas há mais: o Sr. Primeiro-Ministro falou aqui hoje da reforma de um administrador da Caixa Geral de Depósitos e da reforma que ele tinha antes, num banco privado. Essa reforma foi negociada antes de ele entrar para a Caixa Geral de Depósitos. E sabe por quem, Sr. Primeiro-Ministro? Pelo Governo PSD/CDS-PP!

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Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - Foi o Governo PSD/CDS-PP que negociou essa reforma! O Sr. Ministro das Finanças era membro desse Governo e devia saber que essa reforma tinha sido negociada.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Peço-lhe que conclua.

O Orador: - Vou já terminar, Sr. Presidente.
Há também uma outra questão a que o Sr. Primeiro-Ministro continua a não responder, que é a de saber a que título é que fez a dita comunicação ao País na segunda-feira passada. Isto porque não foi um tempo de antena.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Ela não foi entregue 72 horas antes, não foi anunciada com 15 dias de antecedência e também não foi uma comunicação ao País, porque não havia qualquer assunto grave ou de emergência nacional que a justificasse. Foi uma alocução ao País, sem contraditório - repito, sem contraditório -, para anunciar novidades do Orçamento do Estado, o que, aliás, já tinha feito antes, num comício eleitoral do PSD e do CDS-PP, nos Açores, e nos vir dizer que a coligação estava sólida. A que título é que o Sr. Primeiro-Ministro fez esta declaração, que conseguiu meter como "enlatado" nos telejornais de todas as televisões?!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo já esgotou há muito. Tem mesmo de concluir.

O Orador: - Afinal, Sr. Primeiro-Ministro, muitos especulam que, às vezes, o Sr. Primeiro-Ministro e as suas declarações são o seu pior inimigo, mas o certo é que, para os portugueses e para o desenvolvimento do País, o Sr. Primeiro-Ministro, o seu Governo e a vossa política é que são, sem dúvida, o pior inimigo.

Aplausos do PCP.

Vozes de Os Verdes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, penso que a Sr.ª Ministra da Educação tem estado várias vezes aqui, na Assembleia, a tratar da matéria da colocação de professores. Ainda agora me passou uma nota onde confirma que as listas de colocação cíclica para as substituições saíram e que foram pedidos pelas escolas 9000 horários, estando quase todos preenchidos. Ou seja, estão preenchidos 8400, faltam só 600 de informática e mais 300 de electricidade.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - É falso!

O Orador: - Para além disto, gostava de dizer algo em que, certamente por distracção, não repararam, porque, às vezes, só vêem o que não abre: as universidades e os politécnicos, e ninguém reparou, abriram mais cedo do que era costume, no que toca ao acesso. Tudo ficou pronto um mês e meio antes do que costumava acontecer.

Vozes do PCP: - Têm autonomia!

O Orador: - Pois têm! Mas, se tivessem aberto mais tarde, para as propinas ou para a acção social escolar, a culpa seria do Governo. Porém, quando abrem mais cedo e tudo está a funcionar em condições é porque têm autonomia!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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Protestos do PCP.

Os senhores são muito engraçados e muito interessantes!
Já agora, quero dizer ao Sr. Deputado Bernardino Soares que, no que toca à questão da comunicação - e vou tentar responder de forma contida, simpática e com bonomia - não sei quais os modelos de comunicação ao País em que se inspira para saber o que é certo ou errado.

Risos do PSD e do CDS-PP.

E, portanto, não vou responder.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Na lei da televisão!

O Orador: - Na lei…

Vozes do PCP: - É do que está na lei!

O Orador: - Está bem, mas estou a falar em termos de utopia, de sonho, do modelo gostava de comunicação ao País,…

Risos do PSD e do CDS-PP.

… com os lenços a acenar, etc.! Não é o que usamos quando fala o líder do País.
O que quero dizer-lhe é que pedi à RTP que transmitisse a minha comunicação ao País, tal como está previsto nos termos da lei, e as outras televisões manifestaram o interesse, não por pressão, não por pedido…

Risos do PSD e do CDS-PP.

Eu disse: eu falo e a mensagem é difundida, na íntegra, nos termos da lei.

O Sr. António Filipe (PCP): - Qual é o artigo?

O Orador: - É um direito que tenho, como tiveram todos os Primeiros-Ministros, antes e depois de mim,…

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Não, não!

O Orador: - … como tiveram todos os Presidentes da República, antes e depois, e todos os Presidentes da Assembleia da República, antes e depois. Portanto, o facto de outras televisões terem querido difundir a mensagem é critério editorial das mesmas. Até às 17 horas ou 18 horas eu disse que fazia a mensagem pela RTP, as outras televisões é que manifestaram esse interesse. Não foi nenhuma solicitação.
Tenho a certeza de que, um dia destes, se o Sr. Deputado Bernardino Soares quiser fazer uma conferência de imprensa, todas as televisões a darão também em directo, às 20 horas, face ao interesse de que as suas palavras sempre se revestem.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, é para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, gostaria de saber se a Mesa e o Sr. Presidente entenderam, da resposta do Sr. Primeiro-Ministro, qual era a disposição legal em que o Sr. Primeiro-

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Ministro se fundamenta para aquela comunicação. É que, até no tempo de Marcello Caetano, havia um separador entre o telejornal, as notícias propriamente ditas, e as comunicações ao País. Mas, neste caso, a comunicação ao País foi "entalada" nos telejornais. E é esta a questão que não tem cobertura legal e à qual o Sr. Primeiro-Ministro não é capaz de dar resposta.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a resposta foi dirigida a V. Ex.ª, não a mim. Logo, não me compete fazer qualquer comentário sobre ela.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Se também é para interpelar a Mesa, no mesmo esquema, tem a palavra, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Não, Sr. Presidente, quero poupá-lo.
Sr. Deputado, de acordo com o artigo 26.º da Lei da Televisão (Lei n.º 32/2003, de 22 de Agosto): "São obrigatoriamente divulgadas através do serviço público de televisão, com o devido relevo e a máxima urgência, as mensagens cuja difusão seja solicitada pelo Presidente da República, pelo Presidente da Assembleia da República e pelo Primeiro-Ministro".
Com os melhores cumprimentos, Sr. Deputado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à terceira ronda de perguntas.
Para formular a sua pergunta, tem a palavra a Sr.ª Deputada Leonor Coutinho.

A Sr.ª Leonor Coutinho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, V. Ex.ª trouxe ao debate o tema da lei das rendas. Compreendo que este Governo e, aliás, o anterior tenham criado sobre esta matéria uma enorme ilusão. A ilusão de que se trataria de aumentos de renda, de garantias dos arrendatários, de dinamização do arrendamento, objectivos nos quais todos nos revemos e para os quais existe uma grande unanimidade a nível de todos os portugueses. O problema é que - e talvez também seja por isto - nenhum dos parceiros sociais contactados teve acesso aos diplomas da lei em geral, mas apenas a estas peças de propaganda que o Governo difundiu por todos os órgãos de comunicação social.
No entanto, a lei fala-nos de algo completamente diferente. Fala-nos de despejos, de expulsão de milhares de famílias e de pequenos comércios nos centros urbanos, fala-nos não de garantias mas da desgraça de muitas famílias e de pequenas empresas, fala-nos na redução do mercado de arrendamento a nichos de mercado, onde a estabilidade se pode limitar a três anos.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Vou mostrar como estas peças de propaganda, que estão em toda a imprensa, pagas pelo Governo, contêm mentiras.
Quem tiver mais de 65 anos ficará sempre na sua casa - basta ler os artigos 42.º e 25.º para verificar que as pessoas com mais de 65 anos, caso estejam em casas degradadas, podem ser despejadas.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Graças a Deus! Se não a casa caía com as pessoas lá dentro!

A Oradora: - E, no caso de se tratarem de contratos posteriores a 1990 e com um prazo indeterminado, o despejo poderá acontecer ao fim de três anos, sem qualquer indemnização, sem qualquer auxílio, sem qualquer apoio. Basta consultar o Instituto Nacional de Estatística (INE) para ver que os contratos realizados depois de 1990 correspondem a cerca de 40%.
Esta lei também promete preços moderados e a promoção do mercado de arrendamento para os jovens. Em Espanha, a lei de 1985 - a Lei Boyer - que permitiu os contratos de arrendamento, que o Sr. Ministro Arnaut tantas vezes citou, foi revogada pela lei de 1994 e, no preâmbulo desta lei, diz-se que a lei de 1985 causou uma enorme instabilidade no mercado de arrendamento. O mercado de arrendamento,

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em Espanha, baixou de tal ordem, por essa instabilidade, entre 1985 e 1994, que, em 1994, foi de novo posto o limite dos cinco anos.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se. Queira concluir.

A Oradora: - Gostaria ainda de citar um embuste nas próprias palavras do Sr. Primeiro-Ministro: "Para entrar em fase de negociação, os senhorios têm de ter certificado de habitabilidade". Basta ler o artigo 19.º, n.º 1, para verificar que o senhorio pode iniciar negociações sem ter esse certificado e que, se o inquilino não responder nos 30 dias, o contrato passa automaticamente ao novo regime.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se. Tem mesmo de terminar.

A Oradora: - Sr. Presidente, para concluir, devo dizer que todos estes embustes talvez expliquem a pressa do Governo em agendar esta lei para o dia 21 de Outubro, no meio da apreciação do Orçamento e no momento em que todas as associações estão a alterar o posicionamento…

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, por favor, conclua. Não me obrigue a retirar-lhe o uso da palavra.

A Oradora: - … depois de tomarem conhecimento da lei.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Leonor Coutinho, em relação à última questão, quero dizer que, obviamente, os senhorios podem iniciar negociações, de modo informal ou formal, como quiserem e quando o entenderem, em conversas com os respectivos inquilinos. Há uma garantia: essas negociações só podem ter resultado, só podem ter tradução prática, depois de o certificado de habitabilidade ter sido emitido.
Portanto, pode haver sempre conversas. Agora, só podem chegar à conclusão das negociações, à determinação do valor da proposta que conta para efeitos de indemnização, depois de o certificado de habitabilidade ter sido emitido.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Não leu!

O Orador: - É isto que está na lei, é o bom senso, e penso que as pessoas entendem.
As pessoas com mais de 65 anos, com contratos anteriores a 1990 e que não estejam abrangidos pelo novo regime jurídico nunca poderão sair das suas casas, só se as estas estiverem num estado tal de perigo e de ruína eminente que - mas isto sucede quer seja antes ou depois desta lei - serão sempre realojadas nos termos em que todas as autarquias do País fazem.

Vozes do CDS-PP: - Claro!

O Orador: - E, portanto, não vale a pena "lançar poeira para os olhos" das pessoas!
As pessoas com mais de 65 anos e com contratos anteriores a 1990 não poderão ser despejadas das suas casas. E, se auferirem menos do que três salários mínimos, a renda não poderá ser alterada; se assim não for, ficam no regime de renda condicionada. É isto que está na lei e está claro.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Não leu!

O Orador: - Ninguém se assuste, quem, porventura, nos ouça em casa, porque nada disso se vai passar na lei.
Gostaria ainda de dizer que o Ministro das Cidades, Administração Local, Habitação e Desenvolvimento Regional também está à disposição da Assembleia da República para a realização deste trabalho fantástico,…

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Fantástico!

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O Orador: - … que é uma lei que Portugal queria há décadas e que ainda ninguém tinha tomado a decisão de a levar por diante. O Governo estará à vossa disposição para este trabalho, tão fascinante e sedutor, que é o de dar habitação mais condigna, um direito fundamental inscrito na Constituição da República Portuguesa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Tenho comigo os números do resultado da gestão da Sr.ª Deputada Leonor Coutinho e do Ministério, à época da governação do Partido Socialista, e pode ver-se que houve um aumento de 11% do total de alojamento degradados… Mas não quero dar origem a defesas da honra ou seja o que for…

A Sr.ª Leonor Coutinho (PS): - É melhor!

O Orador: - Por isso, Sr.ª Deputada, as questões são outras e já vi como fala de embustes e de outras matérias.
Volto a dizer: este não é o meu estilo, não é o meu nível de debate político, e, portanto, não vou entrar por aí.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente - Para formular perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Reis.

O Sr. Vítor Reis (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, em primeiro lugar, quero saudá-lo por esta iniciativa relativamente ao arrendamento urbano. De facto, o nosso país vem, há muitos anos, a necessitar de uma reforma profunda nesta matéria.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E, Sr. Primeiro-Ministro, se há melhor exemplo dos atrasos que temos nesta matéria basta recordarmos, em parte por aquilo que a Sr.ª Deputada Leonor Coutinho acabou de afirmar mas também por algumas declarações que membros do governo do Partido Socialista fizeram, alguns trechos da comunicação social, que, permitam-me, vou reler, porque a memória ajuda.
Em 1996, no governo do PS, o Ministro João Cravinho anunciava, nos jornais - com o título Arrendamento subsidiado -, a criação de uma política de subsidiação ao arrendamento em detrimento da bonificação do crédito. Isto foi em Abril de 1996, Srs. Deputados!
Em Novembro de 1996, lia-se nos jornais, com o título Arrendamento, novas leis da Assembleia da República: "o Governo vai enviar as propostas de alteração da lei do arrendamento, da sisa e da contribuição autárquica para a Assembleia da República até ao fim do ano".

Vozes do CDS-PP: - Ainda estamos à espera!

O Orador: - Mais exactamente, para quem tenha dúvidas, lia-se no Correio da Manhã, de 10 de Novembro de 1996.
Em Junho de 1997, num outro jornal, com o título "Governo aos pacotes" Na calha um novo pacote sobre habitação, lia-se: "Segundo um documento do Ministério do Equipamento Social, em Setembro, serão apresentadas novas soluções para a recuperação e manutenção de edifícios com contratos de arrendamento para habitação anteriores a 1990".
Srs. Deputados, nada aconteceu!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Zero!

O Orador: - Ou, melhor, a Sr.ª Deputada Leonor Coutinho, então Secretária de Estado da Habitação, fez, em final de 2000, uma alteração ao RECRIA, e é bom que se saiba, Srs. Deputados, o que é que aconteceu.
Em 2001, os processos que deram entrada no IGAPHE, organismo responsável por esta matéria, caíram para 212, um número inferior ao número de processos entrados 10 anos antes, Sr.ª Deputada! A vossa política nesta matéria representou um recuo de 10 anos!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Toda a gente sabe isto!

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O Orador: - O Partido Socialista veio hoje aqui falar em fantasmas: os despejos. Srs. Deputados, há pior despejo do que aquele que se verifica com as famílias que vivem em casas que vão caindo aos bocados até ao dia em que têm de sair porque a casa lhes caiu em cima?! Há pior despejo do que este, Srs. Deputados?!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Srs. Deputados do PS, "novas fronteiras?! Os senhores vêm falar-nos de novas fronteiras?! Primeiro, era preciso que vencessem as velhas barreiras, Srs. Deputados!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Termino, Sr. Presidente, registando que V. Ex.ª não me concede o mesmo benefício que concedeu à Sr.ª Deputada Leonor Coutinho…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, preveni-o no começo da sua intervenção. Peço-lhe que não se alongue mais, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino, Sr. Presidente, pedindo ao Sr. Primeiro-Ministro, uma vez que têm sido agitados estes "fantasmas" dos despejos - e não vale a pena ter em conta o discurso do Bloco de Esquerda ou do PCP, mas o do PS é relevante nesta discussão -, que nos explicite, do ponto de vista da defesa dos idosos e dos mais carenciados, o que é, de facto, o Governo apresentou na proposta de lei que foi entregue na Assembleia, para que não restem dúvidas, nem "fantasmas".

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Vítor Reis, felicito-o pela sua intervenção, pois o Sr. Deputado conhece muito bem o sector e os problemas que se colocam nesta área.
A proposta que o Governo apresentou procurou contemplar as várias vertentes da carência ou do apoio a que as pessoas, em situação especial, têm direito, nomeadamente em função da idade e dos rendimentos. Por isso mesmo, como já foi dito, quem tenha mais de 65 anos não pode ser desalojado do fogo que habita, e quem tenha mais de 65 anos e possua condições precárias ao nível do rendimento, obviamente, nem sequer pode ver a sua renda alterada. Quem tenha menos de 65 anos e aufira um rendimento inferior a três ou até cinco salários mínimos usufruirá do período de transição previsto na lei, com a ponderação do número de membros do respectivo agregado familiar, segundo uma fórmula constante da própria lei.
Como é evidente, quantos mais filhos e maiores forem os encargos, maior será o apoio e a contenção da nova renda a que a pessoa terá de fazer face.
Para além disto, mesmo após o período de transição e mesmo nos casos em que haja resolução do contrato por parte do senhorio - em que saia o inquilino, e este não esteja em nenhuma das condições que atrás referi -, se se demonstrar, perante a segurança social, que preenche as condições, que a lei já hoje prevê, para ter direito ao apoio do Estado em termos de subsídio à renda, tê-lo-á. Estão previstos diferentes escalões para o subsídio de renda, para essas situações de carência.
Portanto, Sr. Deputado Vítor Reis, não consigo conceber outras situações em que possamos ter de acorrer e em que não devamos deixar funcionar as regras do mercado de arrendamento, procurando colocar mais casas nesse mesmo mercado, para a oferta ser maior e as rendas poderem baixar.
As pessoas com mais idade têm a sua situação garantida.
As pessoas com menos rendimento têm a sua situação garantida e não verão prejudicado o esforço da renda que fazem em relação ao seu rendimento disponível.
Por isso, julgo que se trata de um conjunto de medidas de apoio que estabelece que a aplicação desta lei se vá fazer com muito menos custos do que se previu quando alguns admitiram levar esta decisão por diante.

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Para terminar esta intervenção, quero dizer às Sr.as e aos Srs. Deputados que o meu Governo se honra de ter trazido a este debate mensal, como já foi dito, duas matérias tão polémicas e tão difíceis como a lei do arrendamento e as SCUT.
Há pouco um Sr. Deputado dizia que, se calhar, não tínhamos outras matérias para trazer. Tínhamos muitas matérias: política externa; política interna; a revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento; a negociação das novas perspectivas financeiras. Estas são matérias que, neste momento, Portugal negoceia de modo muito árduo.
Muitas outras poderíamos trazer, mas em breve será discutido o Orçamento do Estado e também o pacto da justiça, que é uma matéria sensível, e acho curioso que ainda não tenha merecido o tratamento adequado, quando respeita a direitos, liberdades e garantias fundamentais, à eficácia da administração da justiça…

O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, o seu tempo esgotou-se. Peço-lhe que conclua.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente, com as propostas em relação às quais nos manifestámos disponíveis para um acordo suprapartidário, a da entidade reguladora da comunicação social, mesmo a da nova lei de bases da educação, a do estatuto da oposição e tantas outras. Era fértil o campo de escolha! Porém, a nossa opção é sempre pelo tema mais difícil e que mais tem a ver com os interesses dos portugueses.
Agradeço a todos os que contestaram e de nós divergiram, agradeço o apoio crítico e solidário das bancadas da maioria e manifesto o nosso respeito pela Assembleia da República e por V. Ex.ª, Sr. Presidente.

Aplausos do PSD e do CDS-PP, de pé.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminou a ronda de perguntas.
Assim, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Arons de Carvalho para exercer o direito regimental da defesa da honra pessoal relativamente a expressões utilizadas pelo Sr. Deputado Guilherme Silva. Dispõe, para o efeito, de 3 minutos.

O Sr. Alberto Arons de Carvalho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, penso que qualquer Deputado e, por maioria de razão, o líder de uma bancada tem a obrigação de ser correcto e rigoroso.
Ora, em relação ao Sr. Cintra Torres, não fiz qualquer pressão às escondidas para que esse senhor colaborador fosse afastado do jornal Público; limitei-me, quando esse senhor me criticou, defendendo uma rádio pertencente ao Grupo Media Capital, a sublinhar, ao abrigo do direito de resposta, que esse senhor não tinha isenção, nem a independência necessária, porque era, pelo menos nessa altura, funcionário da empresa Media Capital.

Risos do PSD e do CDS-PP.

E o Sr. Deputado Guilherme Silva, como, aliás, todos os Srs. Deputados do PSD e da maioria, que defendem seguramente o registo de interesses dos Deputados, deveria ser sensível à situação de um jornalista, ou de um colaborador de um jornal, que é, supostamente, crítico de televisão e que é, ao mesmo tempo, funcionário de uma empresa sobre a qual fala.
Quanto à redução da publicidade na RTP, devo dizer que ela foi decidida pelo Governo do PS e feita nas mesmíssimas condições em que o governo anterior a fez. Na altura, fui solidário com a decisão do governo, foi isso que escrevi, e, portanto, não é verdade que a tivesse criticado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não é verdade?! Essa é boa!

O Orador: - Pelo contrário, na altura defendi-a publicamente.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Arons de Carvalho, V. Ex.ª já não se sabe ler a si próprio.
Pensei que, a ter havido ofensa à honra do Sr. Deputado, teria sido por parte do jornalista Cintra Torres, e o que é estranho é que V. Ex.ª não desmentiu a afirmação do referido jornalista no Público, de 11

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de Outubro passado, que diz que o Sr. Secretário de Estado Arons de Carvalho "(…) enviou ao director do PÚBLICO uma carta na sua qualidade de secretário de Estado pressionando o meu afastamento destas páginas por delito de opinião".
Portanto, se V. Ex.ª foi ofendido não foi por mim, que reproduzi estas palavras.

O Sr. José Sócrates (PS): - Já foi desmentida!

O Orador: - Se as desmentiu, não ouvi o desmentido.
Em relação a coisas às escondidas, quem fala disto é o Sr. Deputado relativamente ao Primeiro-Ministro do seu governo, Eng.º Guterres, quando diz que às escondidas ele recebeu o Dr. Balsemão e o Dr. Carlos Monjardino e que, também às escondidas, disse aos portugueses que o negócio que tinha feito com eles - a expressão é sua - provocavam a transferência de anúncios para a televisão privada com grande prejuízo da RTP, que ficou mais dependente dos fundos públicos.
Diz também que o apelo do Presidente da TVI Carlos Monjardino e a vontade de dar um sinal de simpatia para com a poderosa SIC terão influenciado o governo nessa deliberação. Mais: diz que o seu governo mentiu aos portugueses dizendo que esta medida era imposta pela União Europeia, quando não o era.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Alberto Arons de Carvalho (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Alberto Arons de Carvalho (PS): - Sr. Presidente, é para interpelar a Mesa, no sentido de explicar a toda a Câmara e ao Sr. Deputado Guilherme Silva…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, já hoje foi usada essa figura para dar esclarecimentos à Câmara. Não esqueçam, por favor.
Tem a palavra, Sr. Deputado Alberto Arons de Carvalho.

O Sr. Alberto Arons de Carvalho (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, na própria segunda-feira passada, enviei ao jornal Público uma resposta sobre esta acusação que me é feita pelo crítico, entre aspas, Eduardo Cintra Torres.
Em relação à segunda matéria, tenho pena que o Sr. Deputado Guilherme Silva não seja mais rigoroso naquilo que lê ou, pelo menos, naquilo que finge ler mas que não está a ler.

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Essa é boa! O livro está publicado!

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, para esclarecer este debate, solicito-lhe que distribua o texto que tem vindo a ser citado e que faz autoridade para a bancada do PSD, porque é um artigo que se chama A Brutalidade Dum Governo Perigoso - e o "governo perigoso" é o Governo de Santana Lopes - e que, pelos vistos, é citado abonatoriamente pela bancada do PSD.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Julgo que toda a gente terá lido este texto, mas, já que V. Ex.ª requer a sua distribuição, fá-la-ei.
Sr.as e Srs. Deputados, quero prevenir, à puridade, o Governo e a Câmara que o modo como decorreu este debate deve considerar-se absolutamente excepcional. Como disse, era a estreia do Sr. Primeiro-

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Ministro, era a estreia do líder do primeiro partido da oposição, era a despedida do Sr. Deputado Carlos Carvalhas destas funções,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Não, não! Ainda vai ouvir mais trapalhada!

O Sr. Presidente: - … e, por isso, fui muito tolerante e compreensivo. Na próxima vez, e para futuro, iremos respeitar rigorosamente as figuras regimentais e os tempos fixados para o debate. Fica, desde já, toda a gente prevenida, porque é melhor assim e imprimiremos mais produtividade aos nossos trabalhos. Numa altura em que todo o País precisa de melhorar a produtividade, temos de dar o primeiro exemplo.
Sobre o requerimento que o Sr. Deputado António José Seguro apresentou, quero dizer que a questão suscitada é de grande importância. O tratamento condigno dos membros do Parlamento, sobretudo nas declarações mútuas, é por mim considerado de primeira prioridade e devemos discuti-lo em Conferência de Líderes. Não posso, porém, convocar a Conferência de imediato, porque tenho um compromisso ao fim da tarde com o Sr. Presidente da República e não me ficaria bem chegar atrasado, mas marcarei essa questão como primeiro ponto da agenda para a sua primeira reunião e vou procurar que a mesma se faça ainda antes da primeira reunião plenária.
É o que posso dizer ao Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, não percebi a parte final, quando disse que ia tentar marcar…

O Sr. Presidente: - Eu disse que iria tentar que essa reunião da Conferência de Líderes se fizesse antes da próxima reunião plenária, porque hoje, de facto, não posso fazê-la pelas razões que expliquei.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, estamos a falar em relação ao plenário de amanhã?

O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado! A reunião plenária de amanhã é para uma sessão solene de boas-vindas ao Sr. Presidente da República de Moçambique, Joaquim Chissano. Estou a pensar marcá-la para a próxima terça-feira, mas, depois, dar-vos-ei conhecimento da hora possível.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, na terça-feira há jornadas parlamentares de Os Verdes!

O Sr. Presidente: - Peço desculpa, então terá de ser quarta-feira de manhã. Depois acertaremos isso, é uma questão de agenda. Sublinho, em todo o caso, a minha compreensão e o meu respeito pela questão que o Sr. Deputado suscitou.

O Sr. António José Seguro (PS): - Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminado o debate mensal, vamo-nos despedir do Governo, porque o Sr. Primeiro-Ministro e todos os Srs. Ministros não têm a obrigação de ficar para o período regimental de votações. Se o quiserem fazer, teremos muito gosto nisso, mas, certamente, também têm muito trabalho e a produtividade governamental deve ser elevada…
Queremos agradecer a vossa presença e colaboração e dar-lhes um rendez-vous para o debate do Orçamento do Estado.

Pausa.

Srs. Deputados, vamos iniciar o período de votações, e, para isso, teremos, antes de mais, de proceder à verificação do quórum, utilizando o sistema electrónico.
Peço aos Srs. Deputados que não têm o seu cartão ou que verifiquem existir qualquer problema no funcionamento da sua consola o favor de o assinalarem à Mesa, para que conste, depois, no documento respectivo.

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Pausa.

O quadro electrónico regista 153 presenças, pelo que temos quórum mais do que suficiente para proceder às votações.
Srs. Deputados, há votos para apreciar e, como são vários, cada grupo parlamentar disporá de 4 minutos para a sua discussão.
Vamos começar pela apreciação do voto n.º 212/IX - De congratulação pela realização das primeiras eleições livres no Afeganistão (PSD e CDS-PP).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Henriques.

O Sr. Almeida Henriques (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Apesar de só hoje se iniciar a contagem dos votos no Afeganistão e de só termos resultados daqui a duas ou três semanas, penso que faz todo o sentido trazermos hoje aqui este voto de congratulação.
Primeiro, quanto mais não fosse, porque estamos perante umas eleições livres e, por este aspecto, penso que vale, desde logo, a pena apresentar este voto.
Depois, porque, há uns anos atrás, poucas pessoas pensariam que, com estes 20 anos de tumultuosa história do Afeganistão, chegássemos a este momento com as primeiras eleições da história do país.
Por outro lado, e de acordo com os dados revelados pelas autoridades, a adesão maciça do povo afegão nesta mesma votação.
Um outro aspecto também relevante é o facto de as mulheres terem tido oportunidade de votar pela primeira vez - lembremo-nos da postura do regime talibã face às mulheres, pelo que é, claramente, de realçar este aspecto.
Ainda numa outra dimensão, realço a actuação das forças europeias neste processo. A Europa afirma-se aqui de uma forma séria perante o mundo contribuindo com um forte empenhamento da Alemanha, da Espanha, de Inglaterra, num esforço de concertação com a ONU e também com a OECE. Portanto, é um exemplo bastante válido aquele que aqui trazemos.
Por outro lado, a NATO ganha, também aqui, ao apostar na estabilização deste país e ao conseguir que se chegasse ao ponto de haver eleições livres. É óbvio que não é motivo para "embandeirarmos em arco", porque este momento vale aquilo que vale e não saberemos qual será a evolução futura. Agora, isto dá-nos alento para continuarmos a apostar numa política séria para que haja estabilidade nestes países e uma efectiva aposta no desenvolvimento, na igualdade entre as pessoas e no respeito pelo Estado de direito democrático e direitos dos cidadãos.
Aproveito, porque o tempo é curto - e se o Sr. Presidente mo permitir -, para me referir, desde já, ao voto n.º 213/IX - De congratulação pela atribuição do Prémio Nobel da Paz a Wangari Maathai, apresentado pelo Partido Ecologista "Os Verdes", que iremos votar favoravelmente, como não poderia deixar de ser.
É o reconhecimento da mulher ecologista, a simbologia de ser a primeira mulher africana a ser galardoada com este prémio e também o reforço da ideia de que a protecção do meio ambiente é fundamental para a manutenção da paz e para a paz futura no mundo.
Assim, votaremos, repito, a favor deste voto.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Ramalho.

O Sr. Vítor Ramalho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista, enquanto partido livre, de homens livres e naturalmente respeitador das deliberações da ONU quanto ao Afeganistão, não pode deixar de apoiar esta iniciativa do PSD no que toca à realização das eleições no Afeganistão que decorreram com a participação maciça que é conhecida.
Há, naturalmente, ainda, algumas incertezas e um longo caminho a percorrer quanto à efectiva consolidação da democracia neste país, em resultado das eleições, e há sombras, em algumas regiões do globo, que se conexionam com esta realidade, que originou, aliás, por determinação das Nações Unidas, a intervenção neste país.
De qualquer forma, o nosso voto é favorável em relação à proposta apresentada.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Rebelo.

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O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação ao voto de congratulação pelas eleições que se desenrolaram a semana passada no Afeganistão, quero realçar que é um marco muito importante para este país que viveu, sobretudo nos últimos anos, aquando do regime talibã, um dos piores regimes que existiram no mundo, com as perseguições, com os crimes que cometeram, com a escravização das mulheres do Afeganistão. E convém realçar que muitas mulheres votaram nesta eleições.
Muitos problemas ainda subsistem no Afeganistão. Por exemplo, o tráfico de droga é ainda um problema gravíssimo; a garantia da existência de um Estado unitário no Afeganistão tem de levar o seu caminho; existem ainda problemas ligados ao terrorismo, a alguma intolerância religiosa, mas este é um primeiro passo no caminho certo.
Este voto não quer dizer que tudo esteja bem, é só uma referência a esse marco e também à presença das forças da NATO sob mandato das Nações Unidas, comandadas por um general francês, neste caso, mas Portugal tem uma pequena participação que convém realçar, decorrendo, primeiro, de uma decisão do governo do Eng.º Guterres e, depois, confirmada pelo governo do Dr. Durão Barroso.
Portanto, este voto quer referir isto mesmo: o primeiro passo num caminho muito difícil mas que é necessário para o equilíbrio deste país, o Afeganistão, que tanto tem sofrido ao longo dos anos.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Gostaria ainda de referir que, relativamente ao voto n.º 213/IX - De congratulação pela atribuição do Prémio Nobel da Paz a Wangari Maathai, apresentado pelo Partido Ecologista "Os Verdes", votaremos favoravelmente.
Esta senhora que recebeu o Prémio Nobel da Paz, Wangari Maathai, sofreu imenso pelas ideias que defendeu. Foi, aliás, muitas vezes vítima de violência, e todas as pessoas que são vítimas de violência pelas ideias e pelos ideais que defendem, neste caso ideais tão nobres, têm sempre de merecer o reconhecimento e o agradecimento de todos.
Portanto, este voto terá, obviamente, o apoio do CDS-PP.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O voto apresentado pelas bancadas da maioria é um voto que se pode ler como surpreendente, porque nos coloca perante uma congratulação por um processo eleitoral que, afinal, ainda não terminou.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Essa é boa! Terminou, o resultado é que ainda não está apurado!

A Oradora: - E os Srs. Deputados da maioria vieram aqui antecipar-se à própria contagem centralizada dos votos. Os votos estão a ser recolhidos por todo o território do Afeganistão e serão contados centralmente, sob a tutela das Nações Unidas, o que levará ainda duas ou três semanas.
Os Deputados da maioria antecipam-se também à própria Comissão Eleitoral Afegã, aos representantes das Nações Unidas e, pasme-se, ultrapassaram até o Embaixador dos Estados Unidos da América, que acordou com as Nações Unidas criar uma comissão independente para apurar as alegadas irregularidades, no processo eleitoral, que foram denunciadas.
Portanto, no sossego dos gabinetes parlamentares da maioria, os Srs. Deputados acham que todas estas irregularidades e todo este processo não é nada que incomode, não é nada que nos possa preocupar, e vêm já aqui apresentar um voto de congratulação.
Srs. Deputados, entendamo-nos claramente: o direito, o valor, o princípio inalienável dos povos e dos cidadãos para escolherem os seus representantes e os seus governantes é um valor que a todos une e para o qual estamos todos convocados para a sua defesa. Dada a história recente do Afeganistão, a construção de um regime democrático será, com certeza, uma tarefa difícil, mas não pode ser resolvida por um modelo de prêt-à-porter de construção de regime democrático e, acima de tudo, não pode configurar uma ilusão. E, para que este processo eleitoral não seja uma ilusão e seja, de facto, a expressão real da vontade política dos afegãos, valia a pena que os Srs. Deputados tivessem esperado pelo apuramento das irregularidades, tivessem esperado pela contagem dos votos, para, então, apresentarem o voto de congratulação,

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porque é no cumprimento de todas as regras do processo democrático que está a democracia e a defesa da mesma.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quanto ao voto relativo à realização de eleições no Afeganistão, não nos vamos opor, mas queremos marcar algumas distâncias relativamente à forma como o mesmo foi apresentado.
Passo a explicitar.
Congratulamo-nos quando as eleições são livres e democráticas, em qualquer sítio do mundo onde elas se realizem.
Também nos congratulamos com o facto de não existir no Afeganistão o odioso regime talibã. Sempre considerámos o regime talibã odioso e execrável e sempre o dissemos, mesmo quando os talibãs eram fortemente apoiados pelos Estados Unidos da América, e, nessa altura, não ouvíamos tantas críticas por parte das bancadas da direita.

Vozes do PCP: - Bem lembrado!

O Orador: - Mas, relativamente a estas eleições, convinha não "embandeirarmos em arco", para usar uma expressão do Sr. Deputado Almeida Henriques, por razões óbvias: desde logo, porque a democracia não se implanta à bomba, como aconteceu com esta democracia, entre aspas, e ainda estamos para ver qual irá ser a evolução do Afeganistão; porque estamos perante um "narco-Estado", o que é reconhecido em todo o lado, e, tratando-se de um "narco-Estado", temos sempre muitas reservas quanto à liberdade e à democracia que possam existir nesse Estado; e, depois, porque é reconhecida a contestação surgida, quer no próprio Afeganistão, quer por parte de observadores internacionais, relativamente à democraticidade e à liberdade existente, quanto à regularidade do processo eleitoral no Afeganistão.
Portanto, é importante apurar isto e que as comissões independentes a criar funcionem mesmo e só depois, se fosse caso disso, congratularmo-nos quanto a este resultado.
Até lá, obviamente, não o podemos fazer.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este ano o Comité Nobel decidiu atribuir o Prémio Nobel da Paz a Wangari Maathai, mulher, activista e ecologista que se distinguiu pelo seu trabalho e empenho e uma vida dedicada à defesa do ambiente como componente fundamental no desenvolvimento económico e social local, bem como dos direitos humanos.
Para além de ser uma académica brilhante e a primeira mulher negra africana a obter um doutoramento e a ser nomeada reitora da Universidade de Nairobi, Wangari Maathai foi fundadora do Green Belt Movement - Movimento da Cintura Verde -, responsável pela implantação de mais de 35 milhões de árvores no Quénia, como forma de combater a desertificação e a falta de água. Movimento este que apelou e contou com um envolvimento profundo e alargado das mulheres, garantindo às mesmas um papel mais digno e de relevo na sociedade civil, que não tinham tido até então.
Mas a atribuição deste Prémio Nobel da Paz, para além de premiar a pessoa, a activista, a mulher, assume ainda um papel de extrema importância para todo o movimento ecologista mundial e para a mensagem de alerta que este mesmo transporta.
Representa a consagração de uma nova concepção de paz no mundo, o reconhecimento de que, sem desenvolvimento sustentável, sem salvaguarda e correcta gestão dos recursos naturais, bem como da garantia do seu acesso a todos, em termos de igualdade e justiça, não é possível garantir a paz regional e mundial.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Como afirmou Wangari Maathai, o meio ambiente é muito importante para a paz, porque quando os nossos recursos se tornarem escassos entraremos em guerra.

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Pelo enaltecimento dos valores fundamentais da paz e da ecologia que representa esta atribuição do Prémio Nobel da Paz, entendemos apresentar esta proposta de voto de congratulação, à qual esperamos que as restantes bancadas parlamentares se associem.

Vozes de Os Verdes e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Santos.

A Sr.ª Maria Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Todos os amantes da paz e, em especial, os defensores da sustentabilidade do desenvolvimento estão de parabéns.
A atribuição do Prémio Nobel da Paz a Wangari Maathai, fundadora do Movimento Cintura Verde, organização de mulheres que luta contra a desflorestação, vem recolocar na ordem do dia a problemática da sustentabilidade e a participação das mulheres na vida pública.
Esta doutorada em Biologia, incansável lutadora pelo desenvolvimento e conservação da biodiversidade e pelos direitos femininos, demonstra que as grandes causas não morreram, nem desapareceram os intervenientes dispostos a corporizá-las.
De facto, torna-se cada vez mais frequente observarmos mulheres desempenhando um papel essencial na acção política, na defesa do ambiente e do desenvolvimento sustentável, no combate às desigualdades sociais, pelo direito à diferença e à especificidade feminina.
Em todos os recantos desta nossa "casa comum" se evidenciam protagonistas femininas, agora, no entanto, mais elevadamente consubstanciadas com Wangari Maathai, do Quénia, tal como já havia ocorrido no ano transacto com Shirin Ebadi, do Irão, uma activista dos direitos humanos, ou, em 1992, com Rigoberta Menchú, da Guatemala, grande defensora das populações indígenas.
A distinção mundial agora atribuída a Wangari Maathai vem, assim, chamar a atenção para a louvável intervenção das mulheres em países onde os direitos humanos e/ou o ambiente se encontram em situação de risco e para diferentes áreas geográficas onde estas enfrentam as mais variadas violências e crimes ambientais.
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista presta a sua homenagem à coragem de mulheres como Wangari Maathai, Prémio Nobel da Paz de 2004.

Aplausos do PS, do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Wangari Maathai sofreu na pele várias formas, e cumulativas, de exploração e discriminação. Ao lutar contra elas tornou-se uma mulher livre.
Desde logo, como mulher, sofreu a discriminação de género; foi sujeita a um julgamento humilhante que o seu primeiro marido lhe moveu por adultério. Nesse julgamento, sorriu serenamente e, de forma provocadora - provocadora para uma ordem e uma norma profundamente discriminadora das mulheres -, disse que era verdade, que tinha um amante, e tinha-o porque o seu marido não a tinha satisfeito sexualmente.
Como habitante de uma colónia, lutou pela independência.
Como cidadã de um país dividido por etnias, lutou pela fraternidade entre elas.
Como cidadã de um país pobre, lutou contra a desigual distribuição da riqueza entre o Norte e o Sul.
Como cidadã de um país onde a democracia e os direitos humanos eram violentados, lutou pelos direitos humanos de forma firme, apoiou o Movimento das Mães de Maio do seu país - as mães que se reuniam na Esquina da Liberdade, em frente aos serviços de segurança e que protestavam contra a tortura a que os seus filhos estavam sujeitos. O regime mandou as tropas de choque enfrentarem essas velhas mães e elas, num gesto antigo, num gesto ancestral, despiram-se e ofereceram a sua nudez contra a brutalidade das armas.
Num país devastado pela desflorestação e pela destruição do território, ela combateu pela ecologia.
É hoje uma mulher livre, uma cidadã do mundo, a "Plantadora de Árvores".

Vozes do BE e de Os Verdes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

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A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Relativamente ao voto n.º 213/IX, apresentado pelo Partido Ecologista "Os Verdes", penso que serão de salientar três dados, que consideramos muito importantes.
O primeiro dado é o de que se vem tornando frequente a atribuição do Prémio Nobel da Paz a mulheres, o que mostra que, apesar de muitos retrocessos, estão já muito para trás aqueles tempos em que a história oficial não registava as lutas das mulheres, das mulheres do povo e de outras mulheres que foram vilipendiadas por lutarem por direitos, como Margareth Sanger e Marie Stopes, em relação ao direito ao planeamento familiar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Portanto, tem sido um dado bastante positivo a frequência com que as mulheres são agraciadas com o Prémio Nobel, designadamente com o Prémio Nobel da Paz.
O segundo dado é o de que a agraciada é uma mulher de um continente que tem sido devastado pela expropriação de matérias-primas para satisfazer interesses capitalistas. E a atribuição deste Prémio Nobel significa também uma advertência de que os povos não podem ser explorados e não podem, efectivamente, ver degradar-se o seu meio ambiente, apenas para satisfação de meia dúzia de patrões do mundo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - E comunistas, alguns deles!

A Oradora: - O terceiro dado positivo é o de que este voto significa ainda uma advertência de que a humanidade está em risco de grandes retrocessos, pela usurpação e pela corrida aos recursos energéticos, as quais põem em causa o bem-estar do mundo, põem em causa o próprio progresso e semeiam a guerra sobre o mundo, como está bem provado com dados actuais, lamentáveis e tristes.
Assim, saudamos este voto e congratulamo-nos com a atribuição do Prémio Nobel da Paz a esta mulher, que, combatendo pelo ambiente, combateu pela liberdade e pelo progresso.

Aplausos do PCP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à apreciação do voto n.º 214/IX - De congratulação pela atribuição do Prémio Carlos V ao Presidente da República Portuguesa, Dr. Jorge Sampaio (Presidente da AR, PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi com um gosto muito especial que subscrevemos e apresentámos este voto de congratulação pela atribuição do Prémio Carlos V ao Dr. Jorge Sampaio.
Quando alguém da nossa comunidade, um português, tem uma distinção tão relevante como esta, atribuída por uma instituição estrangeira, é sempre uma razão de orgulho e de satisfação para todos nós, acima de quaisquer questões de ordem partidária ou ideológica.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas quando esse alguém é o Presidente da República em exercício, em cuja figura, naturalmente, todos gostamos de nos rever, nesta sua projecção externa, quando é de lá de fora, de instituições relevantes e idóneas, que vem este tipo de reconhecimento pela sua acção, pelo seu empenho na construção europeia de que Portugal é parte integrante, em todas as suas vertentes - sociais, científicas, culturais, históricas -, e quando se trata de um prémio que tem sido também atribuído a personalidades como Jacques Delors, Felipe González, Wilfred Martens ou Mikhail Gorbachov, naturalmente, ver o Presidente da República de Portugal, a par destas entidades, ser reconhecido pela sua acção política, com projecção além-fronteiras, com um prémio desta natureza é, com certeza, motivo de regozijo para todos nós, dentro e fora desta Assembleia.

Aplausos do PSD, do PS e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Prémio Carlos V foi instituído, há cerca de 10 anos, pela Academia Europeia de Yuste, com a finalidade de distinguir personalidades que

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tenham contribuições de excepcional relevo para o engrandecimento dos valores europeus ou para o processo de unificação europeia e foi concedido, nos últimos anos, a personalidades de excepcional relevo na política e na cultura europeias, cujos nomes já foram citados e estão também referidos no voto.
Naturalmente, trata-se de uma distinção que honra sobremaneira o Dr. Jorge Sampaio, como também foi realçado nas várias intervenções, entre elas a proferida por Sua Majestade o Rei de Espanha, na cerimónia que ontem mesmo teve lugar nesse local de tanto significado europeu, que é o Mosteiro de Yuste, na vizinha Estremadura espanhola.
A distinção concedida ao Dr. Jorge Sampaio honra sobremaneira Portugal. Significa o reconhecimento, por parte de um conjunto excepcional de europeus, do alto contributo dado pelo Dr. Jorge Sampaio para a construção europeia e para o aprofundamento do debate europeu, aliás, tema da sua intervenção nessa altura.
Por isso nos congratulamos vivamente pelo Sr. Presidente da República, e o congratulamos, e iremos votar favoravelmente o voto apresentado.

Aplausos do PS, do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O dia 13 de Outubro de 2004 vai ficar memorável, pelo menos para a nossa geração, porque o cidadão Jorge Sampaio acaba de conquistar, por mérito próprio, um dos grandes prémios que actualmente existem na Europa para os defensores dos direitos humanos e dos princípios basilares da democracia.
O facto de ser Presidente da República apenas deu maior visibilidade ao prestigiar a figura do Dr. Jorge Sampaio, mas quem conhece o laureado sabe que toda a sua vida adulta foi dedicada inteiramente aos valores que o Prémio Carlos V contempla. Na verdade, o Dr. Jorge Sampaio foi, desde estudante até hoje, um dos pilares de resistência a tudo quanto era opressão e, ao mesmo tempo, um dos grandes defensores, entusiastas e pedagogos da democracia, em cada ano e em cada dia da sua actividade, e serve com dedicação este nobre ideal.
Na verdade, o Dr. Jorge Sampaio tomou o seu merecido lugar, a partir de ontem, ao lado de outras grandes figuras da Europa que conquistaram o mesmo prémio, e, por isso mesmo, é um acontecimento que a ele e a nós honra muito. É um galardão que nos emociona e nos orgulha e, para mim, que sempre apoiei o Sr. Dr. Jorge Sampaio para Presidente da República e em todos os actos que efectivamente tem praticado no seu actual alto magistério, como seu amigo e admirador, é, para mim, uma grande satisfação pessoal.
A bancada do CDS-PP também se congratula com alegria por esta alta distinção, e cordialmente felicita o Sr. Dr. Jorge Sampaio, como também felicita o povo português por o ter como seu Presidente da República.

Aplausos do CDS-PP, do PSD e do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Rui Gomes da Silva): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome do Governo, quero associar-me ao voto aqui apresentado e subscrito por Deputados de todas as bancadas. De facto, o Prémio Carlos V atribuído ao Sr. Presidente da República vem, como disse o Sr. Deputado do CDS-PP na sua intervenção, confirmar uma carreira e uma vida dedicadas às causas da Europa e à luta pelo seu engrandecimento em termos culturais, científicos e históricos.
A presença de Suas Majestades os Reis de Espanha sublinhou mais ainda a importância do prémio atribuído pela Academia Europeia de Yuste. A lista dos anteriores galardoados, também aqui referida, atesta bem a importância do voto que aqui aprovamos e da atribuição do galardão pela referida Academia.
É, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o reconhecimento de um português que exerce as mais altas funções no Estado português e cuja vida foi dedicada às questões europeias.
É, Sr. Presidente e Srs. Deputados, uma honra para Portugal, pelo que o Governo tem todo o prazer em associar-se a este voto de congratulação.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, também me associo pessoalmente e em nome da Mesa a este voto de congratulação pela distinção tão merecida que recebeu o nosso Presidente da República, Jorge Sampaio.
Srs. Deputados, vamos passar às votações.
Começamos pelo voto n.º 212/IX - De congratulação pela realização das primeiras eleições livres no Afeganistão (PSD e CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e as abstenções do PCP, do BE e de Os Verdes.

É o seguinte:

Considerando que, durante anos, o Afeganistão viveu sob controlo de um regime fundamentalista e criminoso, onde as liberdades individuais eram eliminadas, e onde as oposições políticas, e cultos religiosos diferentes eram espezinhados;
Tendo em conta que, na sequência do 11 de Setembro e no decurso das operações militares no Afeganistão dos Estados Unidos e dos seus aliados, sob mandato das Nações Unidas, provocou o derrube do regime talibã;
Considerando que a restituição da soberania ao povo afegão, bem como a reconstrução do país constituem um imperativo para a Comunidade Internacional;
Que a realização de eleições livres no Afeganistão constitui um passo para a implementação da segurança e estabilização interna;
Tendo em conta que, embora ainda sem números oficiais, a ONU fala de uma participação maciça da população afegã nestas eleições;
Ainda segundo a ONU, para além dos milhões de afegãos que participaram nestas eleições, cerca de 850 000 refugiados que vivem no Paquistão e no Irão também votaram, fazendo destas eleições um sucesso no que toca à sua participação;
Apesar de todas as ameaças de violência perpetradas pelos extremistas, e três anos após o Acordo de Bona, a impressionante participação eleitoral do povo afegão demonstra que a democracia está decididamente no caminho do Afeganistão,
A Assembleia da República, reunida em Plenário, congratula-se pela realização de eleições no Afeganistão, passo considerado essencial pela Comunidade Internacional para a construção da paz, liberdade, segurança e estabilidade no Estado afegão.

O Sr. Presidente: - Agora, vamos proceder à votação do voto n.º 213/IX - De congratulação pela atribuição do Prémio Nobel da Paz a Wangari Maathai (Os Verdes).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

É o seguinte:

O Prémio Nobel da Paz foi atribuído este ano a Wangari Maathai, uma mulher ecologista e a primeira mulher africana a ser galardoada com este prémio.
Bióloga de formação, para além da sua brilhante vida académica, que a levou a ser a primeira mulher negra professora da Universidade de Nairobi, e da sua intensa actividade política, que a levou inclusivamente a candidatar-se às eleições presidenciais em 1997, Wangari Maathai, agora com 64 anos, tem sido uma incontestável militante da luta em defesa do ambiente, como componente determinante do desenvolvimento económico e social, associando a essa luta a imperativa participação das mulheres, tendo sido fundadora do Movimento Cintura Verde (Green Belt Movement).
Através desse Movimento, impulsionado pela necessidade de resposta à intensa desflorestação do Quénia causada por interesses económicos de propriedade das terras e de rentabilização económica das florestas, as mulheres associaram-se na plantação de árvores, garantindo por essa via emprego e a sua autonomia de subsistência, designadamente através das práticas agrícolas, da produção de mel, do processamento de alimentos, e simultaneamente empenhando-se na reconstrução e defesa da floresta e no combate à erosão dos solos.
Através do seu envolvimento neste trabalho, Wangari Maathai contribuiu para promover a preservação ambiental, o desenvolvimento local, mais qualidade de vida, melhores condições económicas e mais participação pública das mulheres.

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Com a atribuição do Prémio Nobel da Paz a Wangari Maathai, pela sua militância ecologista, o Comité Nobel alargou o âmbito da concepção da paz no mundo, reconhecendo-lhe formalmente uma nova dimensão: a de que a paz na Terra depende na nossa capacidade de proteger o ambiente e que a degradação dos recursos naturais é indubitavelmente uma forma de gerar conflitos directos, podendo ter efeitos tão devastadores como uma guerra.
Como afirmou Wangari Maathai, depois da atribuição do prémio: "O meio ambiente é muito importante para a paz, porque quando os nossos recursos se tornarem escassos, entraremos em guerra".
Mais se pode concluir deste Prémio: que se reconhece uma profunda importância na acção local como uma influência e um contributo inestimável para a resolução global dos problemas.
Num momento em que o ambiente não figura entre as principais preocupações políticas, nomeadamente em muitos dos países desenvolvidos, este Prémio assume uma importância muito relevante.
A Assembleia da República congratula-se, assim, pela atribuição do Prémio Nobel da Paz a Wangari Maathai.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, de seguida, vamos votar o voto n.º 214/IX - De congratulação pela atribuição do Prémio Carlos V ao Presidente da República Portuguesa, Dr. Jorge Sampaio (Presidente da AR, PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

É o seguinte:

No dia 13 de Outubro de 2004, a Academia Europeia de Yuste em Espanha, distinguiu o Presidente da República Portuguesa, Dr. Jorge Sampaio, com o Prémio Carlos V, destinado a galardoar personalidades que, com o seu esforço e dedicação, tenham contribuído para o conhecimento geral e o engrandecimento dos valores culturais, científicos e históricos da Europa, bem como para o processo de unificação europeia.
O prémio, entregue em Cáceres ao Dr. Jorge Sampaio na igreja do Mosteiro de Yuste, na presença de Suas Majestades o Rei D. Juan Carlos e a Rainha D. Sofia, foi concomitantemente apresentado em Portugal, na Academia Portuguesa de História, pelo Presidente da Fundação Academia Europeia de Yuste, Juan Carlos Rodríguez Ibarra.
A importância deste prémio está bem patente na circunstância de a primeira edição deste galardão ter sido concedida em 1995 ao primeiro Presidente da Comissão Europeia, Jacques Delors, e posteriormente atribuído a Wilfred Martens em 1998, a Felipe González em 2000 e a Mikhail Gorbachov em 2002.
Através deste louvor, que constitui uma distinção para Portugal e muito nos honra a todos como portugueses, o Dr. Jorge Sampaio junta-se a esta galeria de ilustres personalidades, cujos contributos de cidadania são assim enaltecidos publicamente e com a solenidade devida, como reconhecimento a quem tão energicamente se tem empenhado pela causa da unificação dos povos europeus.
A Assembleia da República congratula-se e felicita o Dr. Jorge Sampaio pela distinção recebida e pelo reconhecimento internacional do trabalho que tem desenvolvido na construção de uma Europa unida por valores universais e pelo respeito pelos direitos humanos.

O Sr. Presidente: - Terei ocasião de transmitir pessoalmente hoje mesmo, dentro de poucos minutos, o resultado desta nossa votação ao Sr. Presidente da República.
Srs. Deputados, agora, vamos votar o projecto de resolução n.º 282/IX - Viagem do Presidente da República a Espanha - Huelva (Presidente da AR).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Segue-se a votação do projecto de deliberação n.º 31/IX - Constituição de uma comissão eventual para a avaliação da execução do Plano de Acção Nacional de Luta contra a Droga e a Toxicodependência - Horizonte 2004 e acompanhamento do processo de definição do "Horizonte 2008" (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

De seguida, vamos votar, em votação final global, o texto final, apresentado pela Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, relativo à proposta de lei n.º 87/VIII - Alargamento do Fundo de Compensação Salarial dos Profissionais da Pesca (ALRM).

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Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, temos ainda para apreciar e votar os pareceres da Comissão da Ética, que o Sr. Secretário vai ler.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela 2.ª Secção do 3.º Juízo Criminal do Porto - Processo n.º 28/01.3TDPRT -, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado José Manuel Pavão (PSD) a prestar depoimento presencial, na qualidade de testemunha, no âmbito do processo em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo objecções, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 3.º Juízo Criminal do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa - Processo n.º 14694/02.9TDLSB (17/04) -, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Vieira de Castro (PSD) a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, no âmbito do processo em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo objecções, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Ministério Público - Distrito Judicial de Lisboa - DIAP, Inquérito NUIPC 1890/04.3TDLSB, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Manuel Alegre (PS) a prestar depoimento por escrito, na qualidade de queixoso, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo objecções, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela Secção Única do Tribunal Judicial da Comarca de Arraiolos - Processo n.º 134/2002 -, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP) a prestar depoimento presencial, na qualidade de testemunha, no âmbito do processo em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo objecções, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

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O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): - Sr. Presidente, é para informar a Assembleia que eu e o Sr. Deputado José Apolinário vamos apresentar na Mesa uma declaração de voto sobre a votação do texto final relativo à proposta de lei n.º 87/VIII.

O Sr. Presidente: - Fica registado, Sr. Deputado. Tenha a bondade de a fazer chegar à Mesa no prazo de três dias.
Srs. Deputados, terminámos os nossos trabalhos de hoje.
Amanhã, às 10 horas, terá lugar uma sessão solene para acolher o Sr. Presidente da República de Moçambique, que se encontra em Portugal em visita de Estado, segundo tudo indica para se despedir, já que terminará as suas funções muito em breve, depois de um longo consulado.
Peço a todos os Srs. Deputados o favor de estarem presentes à hora marcada. A sessão tem de começar mesmo às 10 horas, visto que o programa da visita do Presidente da República de Moçambique inclui outros ponto, e seria muito penoso iniciarmos essa sessão com a Sala cheia de cadeiras vazias. Estará presente o corpo diplomático, os representantes do Governo, enfim, teremos aqui as altas entidades do Estado, pelo que peço a todos o favor de estarem presentes nessa altura.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 55 minutos.

Declaração de voto enviada à Mesa, para publicação, relativa à votação final global
do texto final, apresentado pela Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais,
sobre a proposta de lei n.º 87/VIII

Tal como já o fez por ocasião da votação na generalidade, o Partido Socialista vota favoravelmente o texto final da proposta de lei n.º 87/VIII, sobre o alargamento do Fundo de Compensação Salarial dos Profissionais de Pesca, apresentado a esta Câmara pela Assembleia Legislativa Regional da Madeira, com o objectivo de compensar os pescadores profissionais quando, por razões climatéricas e frequentemente por períodos de tempo consideráveis, ficam impedidos de exercer a sua actividade. E tal como já o fez por ocasião do debate desta proposta de lei (na reunião plenária de 21 de Fevereiro de 2004), o Grupo Parlamentar do Partido Socialista salienta o facto, reconhecido pela generalidade dos Deputados que intervieram na discussão, de ter sido por iniciativa de governos do Partido Socialista que se introduziu esta dimensão social no quadro legal português relacionado com a actividade piscatória: através dos Decretos-Lei n.os 311/99, de 10 de Agosto, e 255/2001, de 22 de Setembro.
No caso da Região Autónoma dos Açores, o governo do Partido Socialista presidido por Carlos César não esteve à espera deste diploma para criar um fundo de compensação para os profissionais de pesca: desde 1996 que existe nos Açores um fundo com este objectivo, o qual viria a ser revisto em 2002, à luz da legislação nacional entretanto produzida pelos governos socialistas liderados por António Guterres; no caso do atum, e perante os problemas de recursos desta espécie migratória, o governo do Partido Socialista dos Açores avançou mesmo com uma medida excepcional de compensação aos profissionais da pesca, com recurso ao orçamento regional e a fundos comunitários atribuídos para medidas sociais no âmbito do IFOP-Açores.
Por isso, se o diploma que foi hoje aprovado não o tivesse sido, pelo menos os pescadores açorianos, ao contrário do que se passa com os seus colegas madeirenses, já teriam consciência de que o governo regional do Partido Socialista fora capaz de assumir e concretizar um compromisso social para com eles.

O Deputado do PS, Luiz Fagundes Duarte - José Apolinário.

--

Os Deputados abaixo assinados, eleitos no círculo eleitoral da Madeira nas listas do PSD-Madeira, congratulam-se com a aprovação pela Assembleia da República da proposta de lei n.º 87/VIII, da Assembleia Legislativa Regional da Madeira.
Fica assim consagrado o justo direito dos pescadores de espécies migratórias como os tunídios a beneficiarem do Fundo de Compensação Salarial dos Profissionais de Pesca, o que constitui uma aspiração já antiga dos pescadores das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, que nos é grato ver agora aprovada

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pelo Plenário da Assembleia da República, graças ao empenho da maioria parlamentar que apoiou o Governo.
Face às dificuldades de agendamento das propostas das Assembleias Legislativas regionais que muitas vezes caducam nos termos legais, é importante registar a aprovação deste diploma, que resultou da possibilidade de agendamentos potestativos de propostas das Assembleias Legislativas Regionais.

Os Deputados do PSD, Guilherme Silva - Correia de Jesus - Hugo Velosa.

--

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Social Democrata (PSD):
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Carlos Alberto Rodrigues

Partido Socialista (PS):
Júlio Francisco Miranda Calha

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo José Teixeira Velosa
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
José Manuel de Lemos Pavão
José Manuel de Matos Correia
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Joaquim Dias Loureiro
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Socialista (PS):
António Bento da Silva Galamba
Fernando dos Santos Cabral
Gustavo Emanuel Alves de Figueiredo Carranca
José da Conceição Saraiva
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
João Barroso Soares
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luísa Pinheiro Portugal
Manuel Alegre de Melo Duarte
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva

Partido Popular (CDS-PP):
José Miguel Nunes Anacoreta Correia

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João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Maria Abrunhosa Sousa

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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