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Quinta-feira, 27 de Janeiro de 2005 I Série - Número 23

IX LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2004-2005)

COMISSÃO PERMANENTE
REUNIÃO DE 26 DE JANEIRO DE 2005

Presidente: Ex.mo Sr. Manuel Alegre de Melo Duarte

Secretários: Ex. mos Srs. Manuel Alves de Oliveira
António Bento da Silva Galamba

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a reunião às 15 horas e 10 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de resolução n.º 202/IX, do voto n.º 228/IX, de requerimentos e da resposta a alguns outros.
Em declaração política, o Sr. Deputado António José Seguro (PS) expressou indignação por, após a dissolução do Parlamento, o Governo não se limitar à prática de actos estritamente necessários para assegurar a gestão dos negócios públicos. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Guilherme Silva (PSD), Francisco Louçã (BE), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP) e do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Montalvão Machado).
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia (Os Verdes) falou da falta de opções políticas que resolvam os desequilíbrios sociais, económicos e ambientais que afectam os portugueses.
Igualmente, em declaração política, o Sr. Deputado António Filipe (PCP) verberou o Governo pelo que considera ser a instrumentalização do aparelho de Estado para fazer propaganda eleitoral, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputado Guilherme Silva (PSD) e Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.
Ainda em declaração política, o Sr. Deputado Francisco Louçã (BE) fez um balanço da actividade parlamentar do seu partido na IX Legislatura e elogiou o trabalho desenvolvido por vários Deputados que não são candidatos nas próximas eleições, em particular o Sr. Ex-Presidente da Assembleia da República António Almeida Santos e a Sr.ª Vice-Presidente do PSD Leonor Beleza.
O Sr. Presidente, a propósito dessas elogiosas referências, enalteceu também o papel desempenhado na consolidação da democracia pelos Srs. Deputados Almeida Santos (PS) e Leonor Beleza (PSD), no que foi secundado pelos Srs. Deputados António José Seguro (PS), Guilherme Silva (PSD), João Pinho de Almeida (CDS-PP) e António Filipe (PCP). No fim, a Sr.ª Vice-Presidente Leonor Beleza interveio agradecendo as palavras que lhe foram dirigidas.
Ao abrigo do n.º 2 do artigo 84.º do Regimento, o Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Florestas (Carlos Costa Neves) referiu-se ao pacote de medidas, adoptadas pelo Governo, de apoio aos agricultores para fazer frente à situação de seca e de febre catarral. Seguiu-se um debate, no qual intervieram, além do Sr. Ministro, os Srs. Deputados Carlos Zorrinho (PS), Fernando Penha (PSD), Rodeia Machado (PCP), João Pinho de Almeida (CDS-PP) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).

Ordem do dia. - Procedeu-se ao debate, requerido pelo Grupo Parlamentar do BE, sobre a negociação do Pacto de Estabilidade e Crescimento, tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Manuel Teixeira), os Srs. Deputados Francisco Louçã (BE), Miguel Frasquilho (PSD), Guilherme d'Oliveira Martins (PS), Honório Novo (PCP), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP), Joel Hasse Ferreira (PS), Heloísa Apolónia (Os

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Verdes) e Guilherme Silva (PSD).
A Câmara aprovou o projecto de resolução n.º 302/IX - Viagem do Presidente da República à República de Moçambique (Vice-Presidente da AR Manuel Alegre).
Sobre o requerimento de adiamento de apreciação e votação do voto n.º 228/IX - De protesto contra a violação, pelo Executivo demitido, de regras constitucionais e legais que limitam os poderes dos governos de gestão (PS), apresentado pelo PSD, pronunciaram-se os Srs. Deputados José Magalhães (PS), Luís Marques Guedes (PSD), Francisco Louçã (BE), Honório Novo (PCP) e António José Seguro (PS).
Por fim, foram também aprovados nove pareceres da Comissão de Ética, dois relativos à retoma de mandato de Deputados do CDS-PP e do PSD e sete autorizando Deputados do PS e do PSD a deporem por escrito em tribunal.
A Sr.ª Presidente encerrou a reunião eram 18 horas e 30 minutos.

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O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 15 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados presentes à reunião:

Partido Social Democrata (PSD):
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Arménio dos Santos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Fernando António Esteves Charrua
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
José Luís Campos Vieira de Castro
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho

Partido Socialista (PS):
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
António Bento da Silva Galamba
António José Martins Seguro
Fernando Pereira Serrasqueiro
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
José Carlos das Dores Zorrinho
José Manuel Santos de Magalhães
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Manuel Alegre de Melo Duarte
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Rui António Ferreira da Cunha

Partido Popular (CDS-PP):
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
José Honório Faria Gonçalves Novo

Bloco de Esquerda (BE):
Francisco Anacleto Louçã

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia

ANTES DA ORDEM DO DIA

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O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, antes de mais, peço ao Sr. Secretário que dê conta do expediente.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, o projecto de resolução n.º 302/IX - Viagem do Presidente da República à República de Moçambique (Presidente da AR) e o voto n.º 228/IX - De protesto contra a violação pelo Executivo demitido das regras constitucionais e legais que limitam os poderes dos governos de gestão (PS).
Foram também apresentados na Mesa, vários requerimentos.
Nos dias 4 e 6 de Janeiro: ao Sr. Primeiro-Ministro, formulados pelo Sr. Deputado António Galamba; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulado pelo Sr. Deputado Jerónimo de Sousa; aos Ministérios da Cultura, da Segurança Social, da Família e da Criança e da Administração Interna, formulados pelo Sr. Deputado António Filipe; e ao Ministério da Educação, formulado pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.
No dia 7 de Janeiro: aos Ministérios da Saúde e da Administração Interna, formulados pela Sr.ª Deputada Ângela Sabino; e aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Comunicações e das Actividades Económicas e do Trabalho, formulados pelo Sr. Deputado Bruno Dias.
No dia 18 de Janeiro: ao Sr. Primeiro-Ministro, formulados pelo Sr. Deputado José Magalhães; ao Ministério da Segurança Social, da Família e da Criança, formulado pelo Sr. Deputado António Filipe; e ao Ministério da Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Bruno Dias.
Foram ainda respondidos, nos dias 5, 6, 10, 11, 14, 17 e 18 de Janeiro, os requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Luís Rodrigues, Herculano Gonçalves, Marcelo Mendes Pinto e Álvaro Castello-Branco, Narana Coissoró, Laurentino Dias, Isabel Castro e Carlos Luís.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, em período destinado a declarações políticas, tem a palavra, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Uso da palavra para expressar a nossa indignação pelo despudor a que chegou a actuação do Governo de gestão.
Relembro à Câmara que a nossa Constituição, a que todos estamos obrigados e a que os membros do Governo juraram lealdade, no artigo 186.º, n.º 5, estabelece o seguinte: "Antes da apreciação do seu programa pela Assembleia da República, ou após a sua demissão,…" - que é o caso - "… o Governo limitar-se-á à prática dos actos estritamente necessários para assegurar a gestão dos negócios públicos.". Repito: o Governo "limitar-se-á à prática dos actos estritamente necessários para assegurar a gestão dos negócios públicos.".
Pergunto se as visitas, os anúncios, os protocolos, a distribuição de subsídios, a antecipação de conclusões de obras públicas, com os inerentes custos para o erário público, se podem enquadrar na acção que é exigida a um Governo de gestão.
Acresce a essas visitas o facto de muitos membros do Governo demitido, que são simultaneamente candidatos a Deputados, percorrerem freneticamente o País, não hesitando em dar prioridade a zonas do círculo eleitoral da sua candidatura partidária ou a regiões vizinhas.
Trata-se de uma situação anómala em democracia a que se juntarmos mais dois factos compreendemos bem por que é que este Governo a ela recorre, violando o espírito da Constituição. Um desses factos reconduz-se às nomeações em catadupa, nomeações essas que são publicadas no mês de Janeiro e que fazem referência a decisões do Conselho de Ministros de 7 de Dezembro de 2004, mas, quando vamos verificar as conclusões desse Conselho de Ministros, o comunicado não tem uma única linha a esse propósito, como sucedeu com o caso da nomeação da administração e, particularmente, do ex-presidente do Instituto de Estradas de Portugal.
Compreende-se, por isso, Sr. Presidente, que o Governo tenha faltado a esta reunião neste caso concreto, e que se tenham recusado, quer o Governo quer os partidos da maioria, a discutir este tema, agendado expressamente para esta reunião da Comissão Permanente.
Pergunto: que outro tema deveríamos nós colocar neste debate? Chega agora o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, que talvez possa intervir e dar-nos respostas.
Como estava a perguntar, que outro tema poderíamos nós colocar neste debate, sendo uma das principais competências desta Comissão Permanente precisamente a de fiscalizar a acção do Governo, para dizer ao Governo, claramente e olhos nos olhos: "Não utilizem recursos públicos, do erário público, em favor da campanha partidária que os senhores estão a fazer ao longo deste mês de Janeiro"?
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, entendemos que o esforço que este Governo está a fazer visa esconder os resultados da má governação.

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Recordo os dois grandes objectivos deste Governo: a redução do défice público e o controlo da despesa do Estado. Por tudo isso, diabolizaram o Partido Socialista, ou tentaram fazê-lo, e, mais grave, exigiram enormes sacrifícios aos portugueses: congelaram os salários da função pública durante dois anos, aumentaram o IVA, fizeram cortes cegos no investimento público. Quais foram os resultados destes sacrifícios que pediram aos portugueses? Ainda ontem, a Direcção-Geral do Orçamento, com 10 dias de atraso em relação ao que é normal, divulgou a execução orçamental do ano de 2004. Recordo: o défice do subsector Estado atingiu os 7,2 milhões de euros em 2004, com um aumento de 5,4% do PIB. Este agravamento fica a dever-se, essencialmente, ao acréscimo da despesa corrente primária, no montante de 2.284 milhões de euros, ou seja, mais 7,9%, quando a taxa de variação implícita na estimativa de 2004, apresentada pelo Governo no Orçamento do Estado para 2005, era apenas de 4,9%.

O Sr. José Magalhães (PS): - Notável!…

O Orador: - Podia continuar a apresentar outros dados, Sr. Presidente e Srs. Deputados, mas quero apenas dizer-vos que o Banco de Portugal já tinha anunciado que o défice real, em 2004, era de 5,3%.
Ficámos a saber que este Governo não cumpriu o objectivo (o défice é superior ao que herdaram) e não controlou a despesa corrente primária do Estado, pois ela aumentou, entre 2003 e 2004, de 22,4% do PIB para 23,4% do PIB, ou seja, 1%, ou seja, 1300 milhões de euros, o que, em moeda antiga, é cerca de 260 milhões de contos.
Ainda segundo a Direcção-Geral do Orçamento, as despesas com pessoal cresceram 578 milhões de euros, ou seja, mais 4,7% do que em 2003, com congelamento de salários. E o mais ridículo, Sr. Presidente - e vou já terminar -, é que a previsão para despesas com salários, no Orçamento do Estado para 2005, dizendo este Governo que vai aumentar um pouquinho os salários da função pública, é inferior à despesa que a Direcção-Geral do Orçamento veio agora dizer que foi a da execução orçamental de 2004.
É uma declaração de incompetência, de irresponsabilidade e de ausência de seriedade.
Os vossos erros saem muito caro aos portugueses. O que os senhores deviam fazer, nas vossas deslocações, era pedir desculpa aos portugueses pelos sacrifícios que lhes pediram e pelos resultados que não conseguiram obter.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Guilherme Silva, Francisco Louçã e Nuno Teixeira de Melo e o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.
Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, a sua declaração política foi uma amostra da demagogia com que o PS continua a fazer política em Portugal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Foi assim quando foi Governo, foi assim quando foi oposição, é assim neste momento pré-eleitoral, e de forma ainda mais refinada.
O que o Sr. Deputado não disse, na sua declaração política, e devia começar por dizer, é que a situação em que o seu Governo deixou o País foi tão grave que, apesar das medidas que se tomaram, não foi possível, neste curto espaço de tempo, corrigir a situação difícil em que as contas públicas se encontravam, e encontram, graças à vossa acção, ao vosso desperdício, ao vosso desregramento.

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Orador: - Foi esta situação que determinou que, efectivamente, a União Europeia levantasse o processo contra Portugal e o arquivasse pela acção política dos Governos da maioria.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Esta é a diferença entre nós e não é conversa de partido, é conversa da instância europeia, isenta, que ajuizou o procedimento de um e de outro Governo.

O Sr. José Magalhães (PS): - O resultado está à vista!

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O Orador: - Mas o mais estranho de tudo isto é que VV. Ex.as, que levaram dois anos e meio, aqui, nesta Assembleia, a criticar as medidas do Governo do Dr. Durão Barroso e da Dr.ª Manuela Ferreira Leite por excessivas - aliás, o Sr. Presidente da República até fez coro convosco, dizendo que havia mais vida para além do défice -,…

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Orador: - … sejam agora os defensores intransigentes das medidas contra o défice. Imagine-se! Se nós tivéssemos seguido o vosso conselho, muito mais grave era a situação, muito piores eram os números que V. Ex.ª vinha aqui trazer. Veja lá o bem que fizemos em não seguir a vossa orientação!
Em relação à actuação do Governo, agora, que está em gestão, quero dizer-lhe várias coisas. Em primeiro lugar, há uma diferença entre o que aconteceu com o Eng.º Guterres e o que acontece agora com este Governo em gestão: o Eng.º Guterres, como sabemos, fugiu, abandonou o cargo, deixou tudo num pântano, como ele reconheceu, e este Governo, apesar de uma maioria estável na Assembleia da República, foi afastado, mas foi ele próprio que assumiu o pedido de demissão, exactamente para ter o estatuto de Governo de gestão.
Em segundo lugar, V. Ex.ª sabe quantas nomeações fez o governo do Partido Socialista em gestão? Fez 446 nomeações! V. Ex.ª sabe quantos diplomas, designadamente leis orgânicas de ministérios, o governo do Partido Socialista em gestão aprovou? Cerca de 88 diplomas!

O Sr. José Magalhães (PS): - Não seja injusto! Não misture as coisas!

O Orador: - Olhe, Sr. Deputado António José Seguro, o Sr. Deputado Pedro Silva Pereira veio justificar a questão das nomeações do Eng.º Sócrates com a circunstância de ser uma fusão, uma reestruturação… Enfim, um escândalo. Em pleno Governo de gestão, os senhores fizeram uma alteração à lei orgânica de um ministério e a norma que o Sr. Deputado Pedro Silva Pereira disse que impunha aquelas nomeações diz apenas o seguinte: "Os cargos dirigentes do Instituto do Ambiente e do Instituto Geográfico Português podem ser providos". Ou seja, "podem", não havia nenhuma obrigatoriedade.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Orador: - VV. Ex.as fizeram isto à pressa e o Sr. Deputado José Sócrates, agora candidato a Primeiro-Ministro, como Ministro do Ambiente, fez quatro ou cinco nomeações de altos cargos dirigentes, elaborando à pressa a lei para o poder fazer. Esta é que é a situação e quanto a isto não há equívocos, não há confusões, está no Diário da República, é uma vergonha, é um escândalo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, agradeço-lhe o pedido de esclarecimento que me dirigiu.
Quanto às nomeações, no dia 7 de Janeiro de 2005, no Diário da República, foi feita uma nomeação para coordenador da Acção Integrada de Base Territorial Acção de Valorização do Norte Alentejo, do Programa Operacional Regional do Alentejo. Sabem quem foi nomeado? O presidente da distrital do PSD de Portalegre.

O Sr. José Magalhães (PS): - Coitado!

O Orador: - Quero, ainda a propósito de nomeações, Sr. Deputado Guilherme Silva, dizer-lhe o seguinte - e veja se se recorda de quem disse isto: "E nós tivemos a coragem de pôr agora na lei que os governos de gestão estão impedidos de fazer nomeações." Vou repetir: "E nós tivemos a coragem de pôr agora na lei que os governos de gestão estão impedidos de fazer nomeações."

Vozes do PSD: - Leia outra vez!

O Orador: - Foi dito por Guilherme Silva, no dia 30 de Janeiro de 2004, na Assembleia da República.

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O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Dê-me o exemplo de um caso que esteja abrangido pela lei!

O Orador: - "Pela boca morre o peixe", Sr. Deputado!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Dê-me o exemplo de um caso!

O Orador: - Não esteja nervoso, Sr. Deputado!
Vou ler-lhe outra frase dita pelo então Primeiro-Ministro Dr. Durão Barroso: "Quanto à questão do clientelismo…" (que é disso que estamos a tratar) "… pergunto: Até hoje, qual foi o governo que teve a coragem de apresentar uma proposta, que foi aprovada na Assembleia, de pura e simplesmente proibir nomeações quando o governo se encontra numa fase de governo de gestão?"

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

O Orador: - Tal foi dito por Durão Barroso, no dia 30 de Janeiro de 2004, na Assembleia da República.
Sr. Deputado Guilherme Silva, tem aqui a resposta ao seu pedido de esclarecimento.

O Orador: - Quanto à questão das contas públicas, apresentámos factos. Apresentámos, inclusivamente, as contas publicadas pela Direcção-Geral do Orçamento. Percebemos a dificuldade: no mês de Janeiro, a publicação da sua execução em relação ao Orçamento do Estado para 2004 atrasou 10 dias.
A esses factos, a esses números, o Sr. Deputado Guilherme Silva acrescentou o tradicional discurso da cassete: se o País está mal, a culpa não é deste Governo, mas do anterior.

Protestos do PSD.

E diz, a certa altura, esta coisa fantástica: "Não pudemos corrigir tudo o que os senhores fizeram de mal."

Vozes do PSD: - É verdade!

O Orador: - No entanto, pergunto: o défice que os senhores herdaram foi corrigido? Não, Sr. Deputado, foi agravado!

O Sr. José Magalhães (PS): - É verdade!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Foi corrigido!

O Orador: - O défice que existe, neste momento, não é de 4,4%, mas de 5,3%!
Pergunto, Sr. Deputado Guilherme Silva: o peso da despesa corrente primária foi reduzido? Não, Sr. Deputado, foi agravado em 1% da riqueza nacional!
O despesismo está do vosso lado! Aquilo que os portugueses vão fazer no próximo dia 20 de Fevereiro é julgar a acção deste Governo, das promessas que foram feitas em 2002 e dos resultados com que, infelizmente, o País neste momento se confronta. Esses resultados são inegáveis e o pior deles, que é a vossa face mais visível da governação, infelizmente para os portugueses, são os mais de 150 000 desempregados que há no País.
Os senhores deviam ter humildade democrática e pedir desculpa pelo comportamento e pelos resultados infelizes da vossa política ao longo destes quase três anos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - O Sr. Deputado Guilherme Silva pediu a palavra para uma interpelação à Mesa.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, a minha interpelação tem a ver com a intervenção do Sr. Deputado António José Seguro, designadamente com o facto de me ter imputado uma afirmação

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de forma truncada. Gostaria, por isso, de fornecer elementos à Mesa, para serem distribuídos, no sentido de ficar claro aquilo que eu disse e o fundamento legal da minha afirmação.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Deputado António José Seguro, esquece-se que o seu partido votou contra a Lei n.º 2/2004,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas não contra essa norma!

O Orador: - … proposta e aprovada pelo PSD, aqui, na Assembleia, que inclui a norma moralizadora, segundo a qual "não pode haver nomeações para cargos de direcção superior depois da demissão do Governo ou da convocação de eleições para a Assembleia da República, nem antes da confirmação parlamentar do Governo recém-nomeado".
Mantenho esta afirmação, que é a que está na lei. Vou, pois, pedir para ser distribuída não apenas a minha intervenção, mas também o diploma em que esta norma se insere.
Pedi-lhe que indicasse um caso apenas em que esta norma tenha sido violada, mas V. Ex.ª não indica, porque não tem.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Diga um!

O Orador: - A maioria dos cargos de nomeação que o seu governo preencheu enquanto estava em gestão inserem-se nesta limitação!

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - O Sr. Deputado António José Seguro pediu a palavra para que efeito?

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, queria interpelar a Mesa nos mesmos termos em que o Sr. Deputado Guilherme Silva o fez.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra, Sr. Deputado, mas peço-lhe que seja rápido.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, serei muito rápido.
Apenas citei uma parte da intervenção do Sr. Deputado Guilherme Silva no que a este respeito se aplica. Já dei aqui dois exemplos…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não, não!

O Orador: - … e quero dar-lhe um terceiro.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Esse de Portalegre não serve! Venha outro!

O Orador: - Estão muito nervosos.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, por favor, não entram em diálogo.
Faça favor de continuar, Sr. Deputado António José Seguro.

O Orador: - Dou-lhe um terceiro exemplo, que tem a ver com a recente realização da assembleia geral da Empresa de Desenvolvimento do Aeroporto de Beja, onde constava da ordem de trabalhos a eleição de um novo conselho de administração e a actualização dos índices salariais dos administradores.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso é uma empresa! Não é Administração Pública!

O Orador: - Sabem qual é a participação da Direcção-Geral do Tesouro nessa empresa? É de mais de dois terços! Aqui tem, pois, um exemplo, que também vou pedir à Mesa para ser distribuído.

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Diga um que seja ilegal!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, creio que a perturbação que trouxe a esta Assembleia tem alguma injustiça.
Dizia-nos um jornal de referência na passada segunda-feira que, no domingo, dia anterior, o Primeiro-Ministro demissionário inaugurou 11 lápides - 11! - em Vila Nova de Poiares.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Inaugurou lápides?!

O Orador: - Descerrou 11 lápides. Não todas inaugurações, mas havia mais lápides do que inaugurações.

Protestos do PSD.

E o que é extraordinário é que há sempre quem sugira, na oposição, que o Governo trabalha pouco, mas quem consegue saltitar em 11 locais diferentes em Vila Nova de Poiares é, certamente, muito trabalhador.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Está a ver!…

O Orador: - Mas o Governo deve ter aprendido, porque há um tempo atrás, sentado no lugar onde hoje está o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, o Primeiro-Ministro explicou-nos por que razão tinha ido inaugurar uma central de combustíveis à Madeira em plena campanha eleitoral para as eleições regionais, apesar de essa central de combustíveis não estar a funcionar. Ele garantiu que não voltaria à Madeira em Maio, seis meses depois, quando essa central entrasse em funcionamento, e temos agora a grande alegria de saber que, de certeza, não será ele a inaugurar essa central.

Protestos do PSD.

Sabemos também que o Primeiro-Ministro, 12 dias antes de começar a campanha eleitoral, distribuiu uma fotografia para ser afixada nas juntas de freguesia. Faltam 24 dias para os portugueses escolherem o Parlamento de onde decorre o próximo governo e, no entanto, o Primeiro-Ministro, já depois de o Governo ter sido demitido, já depois de terem sido convocadas eleições, entende que um bom acto de gestão é distribuir a sua fotografia.

Protestos do PSD.

Creio que os Srs. Deputados devem estar muito perturbados, porque não receberam ainda a fotografia, mas ficava muito bem no vosso gabinete, visto que talvez não seja precisa noutros lugares.

Vozes do PSD: - Já a temos!

O Orador: - Se calhar, já lá a têm, sim.
É uma boa prova de como este Governo, com ponderação, com diligência, com muito trabalho, vai encaminhando o País até às eleições do dia 20 de Fevereiro.
No entanto, a questão fundamental não é só o que faz este Governo, porque, Sr. Deputado António José Seguro, no final de contas, o que faz é relativamente indiferente. O que é fundamental é saber, das contas do País, como é que se justifica aquilo que estamos a viver.
A Direcção-Geral do Orçamento não disse só que em 2003 houve 5,8% de défice e em 2004 5,3%. Acrescentou um detalhe muito mais importante: é que há 2300 milhões de euros, ou seja, 460 milhões de contos, cerca de 1,5% do PIB, que estão registados no défice deste ano, mas são reportados a anos anteriores e, portanto, têm de ser contabilizados, necessariamente, no défice dos anos anteriores.
Portanto, apesar das medidas extraordinárias, assim sendo, quando soubermos da distribuição exacta, por cada ano, desta fatia de dinheiro que esteve escondida nas despesas e que agora aparece nos dados do Governo, então, sim, saberemos se, para Bruxelas, a conta dos 3%, com as receitas extraordinárias, foi ou

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não tida em conta e se foi ou não verdadeira.
Os portugueses perguntam-se, então, se com tanta "camuflagem orçamental" se justificou a contenção das pensões e a diminuição do emprego. Creio que essa é a única questão fundamental, Srs. Deputados.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, agradeço o pedido de esclarecimento que me dirigiu. Devo dizer-lhe que as nossas preocupações, quanto às execuções orçamentais deste Governo, crescem cada vez mais e fundamentam-se nos dados que, a pouco e pouco, os serviços vão libertando para o exterior.
Não sei se reparou - foi curioso - que, no pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Guilherme Silva, a questão das contas públicas passou de relance. Apenas se referiu às questões das nomeações, porque desistiram, obviamente, de "ir a jogo".

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Aliás, o PSD estava inscrito para ser o primeiro grupo parlamentar a intervir nesta reunião, no período de antes da ordem do dia, e prescindiu, segundo as informações que me foram dadas da Mesa. De facto, não tendo assunto, não se vão inscrever - não acredito que tenha sido uma daquelas tácticas baixas de política.

Protestos do PSD.

A segunda nota tem a ver com os anúncios, com as inaugurações, com as cerimónias. Ao ter recordado a da Madeira, lembrei-me, de imediato, da dos Açores, quando, em plena campanha eleitoral, um primeiro-ministro vai anunciar, antes de o fazer no Parlamento, aquilo que era, julgava ele, a retoma económica, tendo-se, infelizmente, vindo a verificar que no terceiro trimestre do ano passado o País entrou em recessão.
Falou das fotografias enviadas para as juntas de freguesia. Sr. Deputado Francisco Louçã, não me admirava que, ao ritmo a que o despudor e a falta de ética estão - que, sejamos rigorosos, não atinge todos os membros do Governo, mas quase todos os do PSD -, um dia destes fossemos surpreendidos por sessões de autógrafos do Primeiro-Ministro nas fotografias, precisamente nas juntas de freguesia do próprio PSD.

Protestos do PSD.

Voltemos à seriedade destas questões.
Sr. Deputado Francisco Louçã, sei que para alguns partidos representados nesta Câmara a qualidade da democracia não tem importância e que para outros esse é um objectivo essencial. E sei que nesta campanha eleitoral não somos todos iguais e que há, de facto, políticos que estão interessados em debater os problemas sérios do País,…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Mas há uns que não querem!

O Orador: - … que apresentam propostas e que não lançam "fumos" para criar, na opinião pública, a ideia de que são todos iguais e que não vale a pena ir votar.
Por isso, quero dizer com muita clareza que, pessoalmente, defendo um código de conduta para que os membros do Governo respeitem os portugueses e que, em alturas como esta, mesmo que não se trate de governos de gestão, deixem o momento político aos partidos para que, em igualdade de circunstâncias, estes possam debater os problemas do País e apresentar soluções para a sua resolução. É que estes são maus exemplos para a democracia.
Ainda por cima, acreditamos que os portugueses saberão dar a devida recompensa ao PSD, a recompensa de vos penalizar nas urnas, porque os senhores não merecem outra e, com a vossa actuação, demonstram realmente que não respeitam os portugueses.
Os portugueses são exigentes e quereriam um comportamento diferente da vossa parte.

Aplausos do PS.

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Continuou sem indicar uma única nomeação que não tenha sido legal!

O Sr. António José Seguro (PS): - O Deputado Marques Guedes está muito nervoso!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, devo dizer-lhe que vou gastar muito pouco tempo a falar das nomeações que o Sr. Deputado diz que o Governo fez, mas vou salientar a graça.
Vou salientar a graça que não deixa de ter o facto de o líder parlamentar do Partido Socialista ter sentadas a seu lado pessoas que exerceram cargos no governo do PS há bem pouco tempo e que assistiram impávidos e serenos e sem uma palavra de censura à nomeação de mais de 300 pessoas quando o governo que integravam já se encontrava em gestão.
Ressalvo a comparação porquanto, ao que parece, para este Partido Socialista o que é fortemente condenável agora era perfeitamente normal há pouco mais de três anos, o que releva a bondade de quem faz tal afirmação.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Mas já nem vou por aí - o Sr. Deputado dirá o que quiser sobre as nomeações que foram feitas -, apenas vou dar-lhe um exemplo do que aconteceu no meu próprio partido, pedindo-lhe que me dê alguns relativamente ao seu.
São muitos os elementos do CDS-PP que, desempenhando cargos, nem sequer de nomeação política, mas até em meros gabinetes governamentais, foram agora exonerados…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - … para poderem participar na campanha eleitoral por parte do CDS-PP. Dou-lhe como exemplo o caso do chefe de gabinete do Dr. Paulo Portas, o Dr. Manuel Brandão, que foi exonerado…

O Sr. Afonso Candal (PS): - Esse foi por incompetência!

O Orador: - …para poder tratar da volta do líder pelo País durante a campanha eleitoral.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Isto é que é transparência!

O Orador: - Dê-me agora o Sr. Deputado exemplos similares por parte do Partido Socialista quando exercia a governação.
Este que lhe deixo é um bom exemplo, mas é um de muitos que o meu partido pode apresentar relativamente a várias outras pessoas do CDS-PP que foram exoneradas para poderem participar na presente campanha eleitoral com toda a transparência.
Quanto ao presente, Sr. Deputado António José Seguro, diga-me agora se me dá a mesma garantia nomeadamente quanto às câmaras municipais presididas por membros do Partido Socialista, por exemplo as do distrito de Braga, por cujo círculo eleitoral tanto o Sr. Deputado como eu próprio somos candidatos. Diga-me que essas câmaras municipais com maioria do Partido Socialista não estão empenhadas na promoção do vosso partido na campanha eleitoral que agora decorre. Diga-me, nomeadamente, que os assessores dessas mesmas câmaras municipais de vários concelhos do distrito de Braga - e são 14 - foram exonerados das suas funções para fazerem o que estão a fazer. Diga-me, então, que o moralismo que aqui nos traz em relação ao presente Governo é o mesmo que o Partido Socialista tem sido capaz de praticar, nomeadamente ao nível do distrito pelo qual o próprio Sr. Deputado é candidato.
Portanto, se conseguir demonstrar-me o que lhe peço, então, conseguirei, pelo menos, ver pela positiva muito do que acabou de dizer. Se não o fizer, terão sido meras palavras de circunstância de quem aponta o dedo porque já lá não está mas quer estar e na certeza de que fará exactamente a mesma coisa quando porventura puder exercer o poder - e espero bem que não possa! - a partir do próximo dia 20 de Fevereiro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, serei rápido. Começo por agradecer-lhe a pergunta que me fez, chamando a atenção para que disse que seria rápido mas tendo excedido o tempo de que dispunha.
Apenas quero dizer-lhe que já respondemos pela avaliação global que os portugueses fizeram em relação à nossa acção governativa. Ora, neste momento, estamos a tratar não de governos anteriores mas do actual Governo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Pediu-me um exemplo. Quer ouvi-lo? É o meu próprio.
Em 1999, eu era Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro, integrei a lista de candidatos do Partido Socialista às eleições para o Parlamento Europeu. Não era obrigado a fazê-lo, mas no dia em que o Partido Socialista formalizou a candidatura da sua lista, pedi ao então Primeiro-Ministro que me exonerasse por considerar que não deveria continuar a desempenhar aquelas funções de membro do governo.
O Sr. Deputado pediu-me um exemplo. Aí o tem.
Quanto à questão que levantou relativamente às câmaras municipais do distrito de Braga, respondo-lhe que sejam de que partido forem e seja qual for o distrito em causa, se o Sr. Deputado Nuno Melo tiver algum exemplo concreto para denunciar com certeza que o acompanharei nessa denúncia.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, se me dá licença, usaria ainda da palavra dado ter-me esquecido de dar resposta ao Sr. Deputado Nuno Melo sobre uma outra questão.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Faça favor.

O Orador: - Sr. Deputado Nuno Melo, quanto a presidentes de câmara que deveriam dar o exemplo, ocorreu-me o caso de um que concorre precisamente no distrito por que somos eleitos, sendo cabeça de lista pelo PSD, e que dá o triste exemplo de dizer que, após as eleições legislativas, retomará o seu lugar na Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia. Exemplos como este são o que corrói e denigre a qualidade da democracia porque enganam os portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares também para pedir esclarecimentos.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Montalvão Machado): - Sr. Presidente, não uso da palavra propriamente para pedir esclarecimentos, mas porque o Sr. Deputado António José Seguro, cuja intervenção ouvi com particular atenção, apontou diversas aparentes irregularidades que o Governo terá cometido, nomeadamente de estar a utilizar os recursos públicos para fazer campanha eleitoral através da nomeações de pessoas para diversos cargos, tendo ainda criticado a actuação de membros do Governo em relação a inaugurações, etc.
Devo dizer, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que essa acusação é inacreditável, injusta e até imoral.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Vou explicar porquê.
A acusação é inacreditável porque é falsa.
Sei que os Srs. Deputados do Partido Socialista gostariam que o Governo desaparecesse, desistisse. Mas não são VV. Ex.as que mandam e quem vai decidir isso é o povo português, no dia 20 de Fevereiro.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - VV. Ex.as queriam que as obras que estão prontas para serem inauguradas, para bem de Portugal e dos portugueses, não fossem inauguradas. E queriam que as obras que estão em curso não

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continuassem?
Sr. Presidente e Srs. Deputados, permitam-me que, com muita calma, relembre certos pormenores do que aconteceu há muito pouco tempo.
Em 22 de Dezembro de 2001, já o governo do Partido Socialista estava em gestão, a Lusa dava conta que "as concessões de auto-estradas e do metro sul do Tejo que se encontram em curso vão ser adjudicadas no âmbito da normal gestão de assuntos correntes do Governo".
Acusado de estar a fazer campanha eleitoral, disse então Vieira da Silva que "o País tem de continuar a funcionar". Tratava-se de concessões pelo prazo de 30 anos!
Sucede, porém, que o Sr. Deputado criticou anúncios de cerimónias e inaugurações levadas a efeito pelo actual Governo, pelo que deitei mão a uma notícia posterior à que acabei de citar, esta datada de 24 Fevereiro de 2002, mais de três meses depois de o então governo do Partido Socialista estar demissionário.
Naquela altura, eis, por exemplo, o que se passava em Montemor-o-Novo: "Em clima de festa, e com a presença de centenas de populares, muitos deles agricultores, foi hoje inaugurada a barragem (…)" - V. Ex.ª falou em "descerramento de lápides" - "(…) A lápide comemorativa da cerimónia inaugural foi descerrada pelo Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, Capoulas Santos, depois de a comitiva percorrer a pé mais de 1 km (…)".

Risos do PSD e do CDS-PP.

Mais adiante dizia a notícia: "Sob um sol primaveril, também não faltou uma banda de música…" - faltava a banda de música! -…

Risos do PSD e do CDS-PP.

"… antes de S. Ex.ª o Ministro se congratular pela construção de um sonho. No seu discurso, Capoulas Santos evocou a herança do governo demissionário do PS, sem deixar de fazer comparações com a anterior governação social-democrata. Entre os participantes da cerimónia, contavam-se SS. Ex.as os Secretários de Estado do Desenvolvimento Rural, Vítor Barros, Adjunto do Ministro da Administração Interna (…)", etc.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Portanto, quando fala em falta de ética, V. Ex.ª é que devia ter a memória suficiente para não fazer ao Governo uma acusação como a que fez.
Quanto às nomeações, Sr. Deputado, por pudor, não falo; dou por reproduzidas as palavras do Sr. Deputado Guilherme Silva.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, percebe-se por que é que o Governo não quis que este fosse o ponto essencial do debate nesta reunião da Comissão Permanente…
Aliás, percebe-se por que é que a maioria, em vez de cumprir o Regimento, que obriga a que esta Comissão Permanente se reúna de quinze em quinze dias, anulou uma destas reuniões…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): -Mentira!

O Orador: - É porque os senhores não querem ser fiscalizados!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso é mentira!

O Orador: - Uma outra nota é a de que estamos aqui a fiscalizar a acção deste Governo. Por favor não se refugie nos alegados erros de governos anteriores. O senhor está aqui para responder às questões que os Deputados lhe colocam.
Ora, citei exemplos concretos, quer de visitas, quer de distribuição de subsídios, quer de assinaturas

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de protocolos, quer de nomeações que nós consideramos ilegais. A essas questões, o Sr. Secretário de Estado nada disse, não tendo correspondido ao que é uma exigência do cargo que exerce que é a de dar explicações e informações, em nome do Governo, a este Parlamento.
Por exemplo, quanto custa ao erário público a antecipação da conclusão de obras públicas por forma a serem inauguradas pelo Primeiro-Ministro antes do dia 20 de Fevereiro?

O Sr. José Magalhães (PS): - Exactamente!

O Orador: - Sr. Secretário de Estado, diga-me, ainda durante esta reunião, quantos milhares de euros é que isso custa ao erário público.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não sabe!

O Orador: - Por outro lado, o Sr. Secretário de Estado não acha que teria sido interessante que, no pedido de esclarecimento que me dirigiu, do qual tomei nota, se tivesse referido à derrapagem das contas públicas, aos números da execução orçamental de 2004 que, com 10 dias de atraso, a Direcção-Geral do Orçamento ontem divulgou aos portugueses? O que tem a dizer quanto ao aumento e ao descontrolo da despesa corrente primária?
Os senhores tantas vezes bramaram nesta Câmara que nós é que éramos os despesistas… e, afinal, veio a verificar-se que os senhores não controlaram a despesa, agravaram o défice e, pior ainda, a despesa cresceu 1%, isto é, 1,3 milhões de euros, em relação à riqueza gerada no País!! Essa é a vossa herança, Sr. Secretário de Estado, e sobre isso, desculpe que lhe diga com todo o respeito pessoal, o Sr. Secretário de Estado disse zero!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - O Sr. Deputado Luís Marques Guedes pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sobre que matéria, Sr. Deputado?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, é para que a Mesa dê uma informação correcta relativamente àquilo que se passou na Conferência de Líderes e não permita afirmações a esse respeito como a que acabou de ser proferida pelo Sr. Deputado António José Seguro, a qual é completamente falsa.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado António José Seguro acabou de referir que tinha sido por oposição da maioria que não se tinha realizado a reunião da Comissão Permanente na semana passada. Ora, essa afirmação é rigorosamente falsa.
O que se passou na Conferência de Líderes - e, de resto, estão aqui presentes todos os partidos que nela participaram, excepto o Sr. Presidente, Mota Amaral, porque está doente - foi que o Partido Socialista e o Partido Ecologista "Os Verdes" disseram que prefeririam a reunião da Comissão Permanente no dia 20, tendo todos os outros partidos sido da opinião que era preferível essa reunião realizar-se ou no dia 26 ou no dia 27.
Está aqui o Sr. Deputado Bernardino Soares que pode comprovar - já o Sr. Presidente não pode fazê-lo, porque não esteve presente - que a verdade é esta e que foi por consenso que ficou estabelecida a data de hoje para a realização da reunião da Comissão Permanente.
É, pois, falsa a afirmação feita pelo Sr. Deputado António José Seguro, pelo que peço à Mesa que reponha a verdade. Isto não pode ser, Sr. Presidente, não pode valer tudo, inclusive pôr em causa as decisões da Conferência de Líderes!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, não estive presente na reunião da Conferência de Líderes e o Sr. Presidente está doente, pelo que tenho de obter informações. Agradeço a sua informação e

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sou obrigado a acreditar na sua palavra, mas vou dar a palavra ao Sr. Deputado António José Seguro, também para uma interpelação à Mesa, pedindo-lhe que se cinja a esta matéria.

O Sr. António José Seguro (PS): - Fá-lo-ei, Sr. Presidente, com muita tranquilidade em relação a esta matéria, e descontando, aliás, o nervosismo que levou…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Quando se mente a gente tem de reagir assim!

O Orador: - … a expressões impróprias e até a uma falta de educação que não é habitual por parte do Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - "Quem não se sente não é filho de boa gente"!!

O Orador: - O que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes aqui referiu na parte final é exactamente correcto, excepto a questão do consenso. O Partido Socialista, nessa reunião da Conferência de Líderes, disse que não dava consenso e que quereria, nessa altura, uma reunião no dia 20, para que pudesse ser discutida a acção do Governo de gestão.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares está, penso, com a sua expressão facial, a dizer que sim, que foi nesse sentido.
Conheço o Sr. Deputado Luís Marques Guedes há muito tempo e acredito que aquilo que ele disse signifique que não tenha ouvido totalmente essa intervenção, porque acredito que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes é uma pessoa séria. Agora, não é correcto aquilo que ele disse no início.
Não quero prolongar este incidente porque, infelizmente para os portugueses, são estes incidentes que também contribuem para que a democracia, em Portugal, seja desprestigiada.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Então não o começasse!

O Orador: - O Sr. Deputado Luís Marques Guedes devia ter mais respeito pelos colegas.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Creio que está tudo esclarecido, Srs. Deputados.
Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O mesmo Governo que elevou o número de desempregados aos cerca de 500 000, que vê nos trabalhadores o empecilho ao desenvolvimento económico, que dificultou o acesso à habitação, que diminuiu o poder de compra dos portugueses, que degradou e contribuiu para descredibilizar o ensino público, que deu largos passos para que a saúde em Portugal fosse gerida sob a óptica do lucro e não das necessidades da população, que teve uma inércia inqualificável em diversos sectores relacionados com o ambiente, contribuindo assim para a acentuação das problemáticas ambientais, é o mesmo Governo que anda agora preocupadíssimo em gerir a imensa agenda de inaugurações.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, numa hora e tal fazer mais de uma dezena de inaugurações, convenhamos que deve criar uma agenda intensíssima, mas não ilude ninguém!...

Protestos do PSD.

O Governo teve acesso, há dias, a um estudo sobre a tipificação das situações de exclusão em Portugal, que encomendara ao Instituto da Segurança Social, que veio concluir aquilo que já todos sabemos há muito tempo, ou seja, que as políticas que têm sido implementadas têm contribuído para um preocupante despovoamento do interior do País e que há zonas no País deprimidas, empobrecidas e em risco de "morte social", como o qualificava o referido estudo.
Que novidade haverá nesta caracterização? Por que não foram tomadas medidas para os inúmeros gritos de alerta que já foram dados quanto a esta questão? Por que é que as medidas implementadas têm contribuído mais e mais para a acentuação deste problema, em vez da sua resolução? Por que é que o Orçamento do Estado para 2005 continua a aprofundar as assimetrias regionais? Por que é que o Governo adoptou medidas para, de uma forma cega, encerrar escolas, sem olhar ao potencial de desenvolvimento de cada localidade, para encerrar serviços como os postos dos correios, para encerrar e diminuir horários de funcionamento de centros de saúde, fragilizando em muitas localidades o acesso aos cuidados de saúde? Por que é que as medidas são sempre tomadas ao contrário dos objectivos centrais que devem ser atingidos, entre eles o desenvolvimento harmonioso do País? Por que é que as políticas económicas hão-de

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ditar sempre escassos objectivos ambientais e sociais, por que é que não estão ao serviço da justiça social e ambiental?
Os sucessivos governos têm dado mostras de incapacidade de resolução dos problemas estruturais do País, têm prosseguido políticas de agravamento desses problemas e, depois, vêm, designadamente em altura de campanha eleitoral, fingir que não têm responsabilidade em nada e, às vezes, até se dão ao desplante de ir "chorando sobre o leite que derramaram".
Um exemplo concreto prende-se com algo que vamos discutir hoje, a seca de que Portugal está a ser vítima. É evidente que "Os Verdes" não atribuem ao Governo a culpa da seca! Mas não temos dúvidas em atribuir a este Governo, e a governos anteriores, a culpa pela não adopção de medidas, por exemplo, para o uso eficiente da água, quando andaram foi tão preocupados em ver como é que privatizavam o sector da água e faziam daí um negócio chorudo,…

Protestos do PSD.

… e a culpa pela revoltante inércia que têm tido em relação à implementação de medidas, em sectores que estão mais que definidos e caracterizados, para diminuir as emissões de gases com efeito de estufa, para cumprir os objectivos do Protocolo de Quioto, para contribuir para inverter a tendência de aquecimento global do planeta. Portugal, que tinha como objectivo aumentar, até aos anos de 2008 a 2012, em não mais que 27% as suas emissões de gases com efeito de estufa, com valores de referência de 1990, conseguiu atingir já um aumento superior a 40%!
Mas este Governo e governos anteriores têm também culpa de nunca terem agido no sentido de adaptar o País aos efeitos das alterações climáticas, prevenindo designadamente as suas consequências no plano económico, social e ambiental. Os governos têm tido culpa por permanentemente confundirem desenvolvimento com necessidade de aumento dos índices de poluição, quando é justamente da óptica oposta de desenvolvimento que precisamos.
Sabe-se muito bem hoje quais as consequências, também em Portugal, das alterações climáticas, nas próximas décadas, caso não sejam tomadas medidas para travar a sua aceleração: generalização de picos e extremos ora de secas ora de intempéries, durante períodos prolongados, maior regularidade de catástrofes naturais, descida dos caudais dos rios, subida dos níveis do mar com graves impactos nas zonas costeiras, aumento de doenças e epidemias, entre outros.
Os sucessivos governos têm ignorado estas previsões e têm continuado a cometer erros ao nível do ordenamento do território (continuando a despovoar o interior e a acentuar a pressão no litoral), das políticas energéticas (continuamos a ter muito pouca eficiência energética e a depender demasiadamente do petróleo), da política de transportes (dos maiores emissores de CO2 e com uma aposta muito reduzida no transporte colectivo, sendo que nos movimentos pendulares o recurso ao transporte individual tem aumentado) e da política de construção (em épocas de muito frio, como a actual, os consumos domésticos de energia disparam para níveis preocupantes).
As soluções todos as conhecem, estão retratadas em inúmeros estudos actualizados. O que falta é vontade política, são opções políticas que permitam desenvolver com sustentabilidade, com visão de futuro, que permitam servir as necessidades das populações.
É por isso que "Os Verdes" insistem que este País precisa de mudar, precisa de justiça, e é nesse sentido que continuaremos a dar completamente o nosso contributo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vamos voltar a uma questão que já foi aqui hoje abordada em outras intervenções, mas que também do nosso ponto de vista não pode passar em claro, e que tem a ver com a falta de pudor com que os partidos da ainda actual maioria (e, particularmente, o PSD) estão a instrumentalizar o aparelho de Estado para fazer propaganda eleitoral, pondo o Governo ao serviço dos respectivos partidos e a funcionar verdadeiramente como uma comissão de campanha eleitoral do PSD e do CDS-PP.
As acções que o Governo tem vindo a levar a cabo a este nível vão desde o muito sério e muito grave até ao muito ridículo. A corrida às inaugurações é conhecida. Reportando-nos a dados do passado domingo, que, como se sabe, são dados em permanente evolução,…

Vozes do PCP: - Exactamente!

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O Orador: - … o Governo já tinha feito 63 inaugurações, o que equivale, desde a dissolução da Assembleia da República e a demissão do Governo, a uma média superior a uma inauguração por dia. Inaugurações que vão desde o mais irrelevante até obras, as quais obviamente têm a sua relevância, mas de entre as quais algumas nem sequer foram lançadas por este Governo e outras ainda não estão a funcionar. Por outro lado, tudo indica que alguns municípios de maioria PSD estão já a antecipar ou a esgotar as inaugurações que tinham previsto para as eleições autárquicas.
A este propósito, também apetece dizer que a dissolução da Assembleia da República, se teve muitos méritos, inclusivamente democráticos, também acaba por ter este mérito: o de relançar a dinamização da actividade governativa, porque não acreditamos que estas inaugurações fossem feitas se o Governo estivesse em plenitude de funções.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Homessa…!

O Orador: - O Sr. Deputado Luís Marques Guedes poderá dizer que sim, mas não vai fazê-lo, porque, se não, até ouvia uma gargalhada na sua própria bancada. Portanto, não vale a pena brindar-nos com esse momento de bom humor, ninguém acreditaria em si.
Obviamente, o que o Governo está a fazer é a delapidar dinheiros públicos e a utilizar cargos governativos para, de uma forma absolutamente despudorada, fazer campanha eleitoral.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Isto acontece com as inaugurações, mas também acontece com outros actos, absolutamente despudorados, praticados por membros do Governo. Desde logo, a apresentação de promessas eleitorais, feitas por um Governo de gestão, o que é algo de absolutamente insólito.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Exactamente!

O Orador: - O PSD e o CDS-PP têm toda a legitimidade para fazer as promessas que quiserem - aliás, se quiserem, até podem prometer o mesmo que prometeram há três anos e não cumpriram…! Esse é um problema entre os senhores e os eleitores.
Os partidos têm legitimidade para fazer promessas; um governo de gestão não tem! Um Governo de gestão não tem qualquer legitimidade para fazer o anúncio de que, daqui a não sei quantos anos, vai mudar os ministérios de sítio e que os que estão agora no Terreiro do Paço vão passar para Chelas, como se o Governo, nessa altura, tivesse alguma coisa a ver com isto. Este Governo já cessou funções!

Vozes do PSD: - Mas o País pára?!

O Orador: - Anuncie aquilo que fez, mas não aquilo que outros vão fazer, se quiserem!
Um Governo de gestão não tem qualquer legitimidade para anunciar futuras travessias do rio Tejo, futuras deslocações de ministérios, para anunciar aquilo que manifestamente não lhe pode dizer respeito.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Protestos do PSD.

O Orador: - Os senhores prometem agora fazer aquilo que não fizeram quando puderam, quando tiveram essa possibilidade, quando governaram o País em plenitude de funções.

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto!

Protestos do CDS-PP.

O Orador: - O senhores, agora, chegaram ao ridículo de pôr o Governo a enviar às juntas de freguesia uma fotografia do cabeça-de-lista do PSD às próximas eleições legislativas, que só é Primeiro-Ministro em funções de gestão, porque já foi demitido dessas funções.

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O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Não, não! Demitiu-se!

O Orador: - Se o Sr. Deputado Jorge Nuno Sá tiver um pouco de calma e me deixar falar, agradeço.

O Sr. Honório Novo (PCP): - "Está a gastar os últimos cartuxos"!!

Risos do PCP.

O Orador: - Há também outros aspectos particularmente graves, como a questão das nomeações. A única justificação que os senhores aqui dão para as nomeações que têm feito nos últimos dias é a de que o Partido Socialista também as fez quando foi governo de gestão. Devo dizer que essa justificação não serve ao País. Não é justificação para as ilegalidades cometidas por este Governo dizer que um governo anterior também já as cometeu.
Mas é também por isso que os portugueses estão confrontados nestas eleições com uma opção muito clara: a de saber se querem continuar a ser governados por governos que têm tido este tipo de atitudes e de orientações.

Vozes do PCP e de Os Verdes: - Muito bem!

O Orador: - Os actos criticáveis, e que nós criticámos, praticados por outros governos, particularmente do Partido Socialista, não podem servir de justificação para ilegalidades e faltas de pudor cometidas pelo Governo do PSD e do CDS-PP.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O escândalo é tão grande que até o Presidente do CDS-PP se acha na obrigação de vir agora fazer uma promessa, visando impedir que outros governos, no futuro, façam exactamente aquilo que o CDS tem vindo a fazer no Governo, que é nomear as suas clientelas políticas para o aparelho de Estado.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - É falso!

O Orador: - Terminaria, Sr. Presidente, com aquele que parece ser o último escândalo, hoje mesmo anunciado, que tem a ver com a passagem de infantários sob a dependência directa do Ministério da Segurança Social, da Família e da Criança para as mãos de entidades privadas…

Vozes do PSD: - IPSS!

O Orador: - Isto é: um processo que estava anunciado que seria feito até 2008, afinal, vai ser feito até às eleições de dia 20 de Fevereiro de 2005!!

Vozes do PSD: - Eficiência!

O Orador: - E porquê? Porque personalidades ligadas ao PSD - e algumas delas ligadas ao próprio Ministério, ao próprio aparelho de Estado - estão a criar entidades privadas, designadamente fundações, para que o PSD lhes passe para as mãos a gestão de infantários que são da rede pública, são do Ministério da Segurança Social.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Diga uma!

O Orador: - Estamos a assistir a operações que eu nem diria de privatização, mas de partidarização. O PSD e o Governo estão a retirar da rede pública instituições para entregá-las claramente nas mãos de clientelas partidárias.
E para terminar fica aqui o desafio: um próximo governo não pode deixar de rectificar esta situação, porque este escândalo em democracia não pode ser permitido.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme

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Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, o senhor veio aqui tentar fazer o coro de toda a esquerda relativamente ao comportamento do Governo em gestão.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Porque é que será?

O Orador: - E V. Ex.ª teve uma oportunidade extraordinária, pois V. Ex.ª deveria ter começado por dizer que foi por iniciativa desta maioria que se fez uma lei para moralizar as nomeações dos governos de gestão.

O Sr. José Magalhães (PS): - Para ser violada imediatamente!

O Orador: - Ora, o senhor deveria ser o primeiro a dizer qual é o caso das nomeações deste Governo que violam essa lei, porque essa lei diz exactamente quais são os cargos que não devem, e não podem, ser nomeados por um governo de gestão. Cargos de direcção superior não disse um que fosse e ficámos a saber que a visão estatista…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Estatista?

O Orador: - … do PCP vai ao ponto de querer impedir que as IPSS, as instituições particulares de solidariedades social, possam gerir com o seu know how, com as provas dadas ao longo do País, e de muitos anos, na gestão de entidades com esta configuração, os infantários e os centros de apoio às crianças.
Vejam: VV. Ex.as querem o Estado, o Estado, o Estado, mesmo que mau Estado; nós queremos menor Estado e melhor Estado e queremos que a sociedade civil, através das suas organizações, particularmente dessas instituições de solidariedade social a quem o País tanto deve, possa, efectivamente, dar um valor acrescentado neste domínio.
É este o objectivo, mas sabemos que o PCP, mais uma vez, está contra e sabe que, estando contra, vai prejudicar os destinatários dessas medidas, que são as crianças, aquelas que merecem a maior protecção e a maior atenção.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, no fundo, o senhor vem aqui reivindicar o facto de o PSD ter aprovado uma lei que afinal não cumpre.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Cumpre, cumpre! Diga um caso!

O Orador: - O PSD dá o pior exemplo de nomeações feitas por um governo de gestão e foram já dados aqui hoje não um mas vários exemplos.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Diga todos!

O Orador: - Os senhores com a vossa gritaria não conseguem abafar o clamor que vai por este País, que já se apercebe de que o PSD está a fazer nos últimos dias o que pode…!
Mas, relativamente à questão das tais instituições que o Sr. Deputado Guilherme Silva invoca, queria dizer-lhe, Sr. Deputado, que não temos nada contra as IPSS…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Têm! têm!

O Orador: - De qualquer modo o que está em causa não são IPSS, são "IPSD", são instituições do PSD.
Por que razão é que o Ministério anuncia um processo previsto para ser realizado até 2008, isto é, nos próximos quatro anos, e afinal decide fazê-lo nas próximas quatro semanas?
A razão é simples: é que o PSD tinha esse processo combinado com as suas clientelas políticas e tem o justificado receio de que, saindo o PSD definitivamente do Governo, após as eleições do dia 20, esse

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escândalo já não fosse para a frente. É essa a única razão, porque os senhores através das vossas clientelas políticas…

Vozes do PSD: - Mas quais clientelas?

O Orador: - Srs. Deputados, vou fazer-vos um desafio muito concreto: os senhores esclareçam publicamente quais são as ligações que a Fundação Silva Leal…

Protestos do PSD.

Srs. Deputados, querem um exemplo? Desafio os senhores a explicitarem claramente quais são as ligações existentes entre personalidades do PSD, inclusivamente ligadas ao actual Ministério da Segurança Social, e a Fundação que na região de Lisboa se prepara nos próximos dias para receber a gestão de instituições que estão na dependência directa do Ministério da Segurança Social, concretamente da Fundação Silva Leal.
Os senhores tenham a ombridade de esclarecer o País sobre quais são e quem são os corpos gerentes dessa Fundação e quais são as suas ligações ao actual Governo e ao PSD.

Vozes do PSD: - O senhor é que tem de dizer! O senhor acusa e não prova! Diga lá quem são!

O Orador: - Porque assim o País fica claramente a saber os processos que os senhores seguem para poderem passar património público para a gestão de clientelas partidárias.
Fiz aqui uma acusação muito concreta e desafio os senhores a esclarecerem essa questão muito claramente.

Aplausos do PCP.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não, não desafie, prove! Quem acusa é que prova!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, o senhor queria, naturalmente, que os partidos que apoiam o Governo, o PSD e o CDS-PP, se mantivessem neste momento político calados.
Ou seja, o Sr. Deputado queria que houvesse uma capitis deminutio só porque o PSD e o CDS-PP são partidos que apoiam este Governo.
Não é assim! O Sr. Deputado não cala, nem calará, nenhuma corrente política, nem é correcto que o queira fazer.
Mas, Sr. Deputado António Filipe, o que me leva a usar da palavra - sabe que tenho por V. Ex.ª uma grande estima e consideração pessoais - é o seguinte: é que V. Ex.ª não pode chegar ao Plenário e dizer que o Governo, como já foram aqui dados vários exemplos, está farto de cometer ilegalidades nas nomeações, e, depois, não dar um único exemplo dessas ilegalidades.
Não é o senhor que desafia o Governo a demonstrar que não há ilegalidades, porque é o Sr. Deputado que acusa, portanto tem de prová-las.
Peço-lhe que tenha a mesmíssima ombridade de demonstrar quais são, porque eu posso daqui assegurar que o Governo não cometeu uma única ilegalidade, uma única irregularidade, nas nomeações que até hoje levou a cabo.
Por isso, Sr. Deputado, peço-lhe que reveja a sua intervenção, peço-lhe que reconsidere. V. Ex.ª é jurista, um experiente Deputado, sabe muito bem que é a V. Ex.ª que cabe alegar os factos e que é sobre V. Ex.ª que recai o ónus da prova desses factos - não é o visado que tem de provar que os factos não aconteceram.
Portanto, reconsidere, peço-lhe que reconsidere e que corrija a sua intervenção.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Secretário de Estado, eu, com um espírito muito liberal em matéria política, deixei-o fazer um pedido de esclarecimento, mas, de facto, o período de antes da ordem do dia, pertence em exclusivo à Assembleia.

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De qualquer maneira, para esclarecimento, não vejo inconveniente nisso.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Peço desculpa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, já tenho pouco tempo, porque ainda precisamos de algum tempo para debater outras questões nomeadamente no debate que se vai seguir, mas, Sr. Secretário de Estado, gostaria de dizer-lhe o seguinte: o senhor finge ignorar a diferença que há entre um Governo em plenitude de funções e um Governo demitido.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Não é isso que está em causa!

O Orador: - O actual Governo apresentou a sua demissão…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Quem acusa tem de provar!

O Sr. António Filipe (PCP): - Já lá vamos Sr. Deputado, tenha calma, se os Srs. Deputados do PSD me deixarem eu falo!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Não fuja!

O Orador: - Não fujo, não!
O Sr. Secretário de Estado pretende ignorar que este Governo está demitido e que não pode estar em plenitude de funções.
Agora, a acusação que fiz é muito clara: a pessoa que preside à Fundação… Aliás, hoje a rádio creio que se referia a uma Fundação Silva Leal, mas creio que o nome correcto é Sousa Leal, mas a questão do nome é perfeitamente fácil de esclarecer, no entanto, a questão é esta: essa Fundação que vai receber a gestão de instituições que estão sob a dependência do Ministério da Segurança Social, particularmente na região de Lisboa, tem como Presidente uma personalidade que, para além de ser militante do PSD, está ligada ao próprio Ministério da Segurança Social.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Quem é?

O Orador: - Esta é uma acusação muito concreta e muito clara…

Vozes do PSD: - Como é que se chama?

O Orador: - Eu não sei como é que o senhor se chama…

Vozes do PSD: - Ah!

O Orador: - … mas sei o cargo que desempenha, mas se isto não é verdade os senhores que o demonstrem e não demonstraram até agora.

Vozes do PSD: - É ao contrário!

O Orador: - E o Governo ainda nem sequer respondeu ao requerimento que já há algumas semanas fizemos sobre esta matéria.
Portanto, se o Governo quer estar em plenitude de funções então que responda a este requerimento. É tão simples como isso, porque os senhores para não responderem aos requerimentos da oposição aí já invocam o facto de não estarem em plenitude de funções, agora para as inaugurações já estão.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Só era legítimo se o Presidente da Fundação fosse do PCP!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

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O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, até agora discutiu-se com muito calor, e com alguma excepcionalidade, o aspecto, certamente importante, das nomeações.
Tem havido muitas interrupções, o Sr. Secretário de Estado tem feito perguntas, mas até agora não há, que eu saiba, que a Mesa me tenha dito, inscrições para intervenções de fundo dos partidos da anterior maioria…

Vozes do PSD: - Actual!

O Orador: - … e algum esclarecimento é importante sobre esta matéria, naturalmente sobre factos, mas, sobretudo, sobre critérios, porque creio que o que importa discutir agora e aqui, são critérios que, obviamente, não são respeitados e, porventura, nem sequer estão suficientemente claros ou vinculativos na lei.
E se assim acontecer, se essa correcção permitir que futuros governos de gestão, quaisquer que eles sejam, ou qualquer governo na véspera de eleições possa, e deva, ficar condicionado a outras regras, que não estas, que permitem esta discussão de hoje, a democracia beneficiará.
No entanto, não é sobre isso que pretendo intervir, mas sobre o balanço desta Legislatura. Sendo certo que a Comissão Permanente não reúne durante o período da campanha eleitoral, que começa daqui a pouco mais de uma semana, nós temos de avaliar, como Deputados eleitos, estes três anos de mandato que tivemos e em que o PSD e o PP formaram uma coligação que governou nos dois governos que constituiu.
No entanto, antes de me referir a esse aspecto fundamental queria dizer duas palavras sobre Deputados que hoje exercem as suas funções e que no término desta Legislatura deixarão de o fazer.
E entre muitos e muitas que estão nesta situação, quero destacar o papel do Ex-Presidente da Assembleia da República, o Deputado Almeida Santos, que, não sendo candidato, não voltará a ocupar as bancadas da Assembleia e que a prestigiou com a sua opinião e intervenção durante muitos anos e, também, da actual Vice-Presidente da Assembleia da República, Dr.ª Leonor Beleza, que, não sendo candidata, não estará aqui depois.
Portanto, queria referir o contributo de personalidades como estes Deputados que foram tão relevantes nesta Legislatura e nas anteriores.

Vozes do PSD e do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ao chegarmos ao fim desta Legislatura e na véspera de uma eleição, creio que mais do que os episódios de um governo que não nos devem merecer mais do que a atenção do epifenómeno, o País se confronta com uma opção que é também, e em primeiro lugar, a nossa responsabilidade e que é saber que escolhas fazemos para um País em graves dificuldades na avaliação destes três anos de governo e na escolha das políticas que, a partir de agora, devem nortear uma estratégia de modernização, de combate ao atraso, e de política de desenvolvimento.
Durante estes três anos creio que se podem discutir muitos episódios, graves dificuldades nas contas públicas, uma política social que, na opinião do Bloco de Esquerda, se revelou profundamente desastrosa, desde o facilitismo em relação à primeira lei que foi votada por esta maioria na Assembleia e que foi repor a isenção de tributação para as mais-valias bolsistas, de uma forma tão simbólica, até - a seguir - às transformações do rendimento mínimo, com o actual rendimento social de inserção, passando depois pela alteração da Lei de Bases da Segurança Social, continuando com o tão polémico Código do Trabalho, em medidas estruturantes da vida social portuguesa, das contas públicas, da política orçamental, da política económica.
Este Governo esteve em teste e o resultado foi uma recessão agravada pelas más políticas.
Os portugueses interrogam-se hoje sobre se o que deve imperar é a continuidade ou a transformação, se a política destes três anos deve continuar a partir de agora ou se, pelo contrário, devemos impor novas políticas pela clarificação democrática, pelo confronto político e pela escolha entre alternativas.
O Bloco de Esquerda compromete-se com esse novo ciclo de políticas, porque entendemos que a mudança da maioria, a mudança da estratégia é decisiva e a única oportunidade que temos para começar a combater o desemprego, ou seja, para responder estruturadamente à criação de qualificações, de uma cultura de inovação, de desenvolvimento e, portanto, de uma modernização que tem sido atrasada e prejudicada ao longo dos últimos anos.
A grande crítica que fazemos à governação das direitas é ao facilitismo, à incapacidade social de responder a estas dificuldades, ao acomodamento e, até, à falta de determinação em cumprir, sequer, aquelas que tinham sido as promessas fundamentais no período anterior.

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Portanto, dos confrontos que esta campanha eleitoral permite sairá uma alternativa e sairá uma resposta. Ela baseia-se, em primeiro lugar, na avaliação destes três anos, que foram um gravíssimo desastre social!
Mas, mais do que isso, Portugal desprestigiou-se também. No próximo fim-de-semana, vai a eleições um país que vive "a ferro e fogo", o Iraque. Em alguma medida, podemos fazer a avaliação do que foi a política internacional das direitas que conduziu Portugal a apoiar uma guerra a partir de uma mentira.
Creio que no facilitismo e na mentira da guerra fica tudo dito do que foram estes três anos de governação e começa a escolha que as próximas eleições nos permitem.
Quando concluímos os trabalhos desta Assembleia temos uma obrigação: a obrigação fundamental de prestar contas. Pois, aqui estamos, Bloco Esquerda, a combater a mentira da guerra e a combater as políticas sociais, com a apresentação de propostas alternativas. Essa foi a nossa função e essa foi a nossa responsabilidade de Deputados.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, como Presidente em exercício, queria associar-me às palavras do Sr. Deputado Francisco Louçã, no que respeita aos Srs. Deputados Almeida Santos e Leonor Beleza.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Um e outro deixam a Assembleia da República por vontade própria; um e outro, quer na presidência desta Assembleia (como Presidente e como Vice-Presidente) quer como membros do Governo, desempenhando os mais altos cargos nos respectivos partidos políticos, na Assembleia da República e no Estado, contribuíram de maneira inestimável para a consolidação, para a construção da democracia e para o prestígio da Assembleia da República.

Aplausos gerais.

O Sr. Deputado António José Seguro pediu a palavra para que efeito?

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, queria apenas associar-me, em nome do Grupo Parlamentar do PS, às palavras do Sr. Presidente e do Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, também queria subscrever inteiramente quer as palavras do Sr. Deputado Francisco Louçã quer as de V. Ex.ª e, em nome do PSD, associar-me à congratulação pelo trabalho e pela acção política desenvolvidos pelos Drs. Almeida Santos e Leonor Beleza.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Sr. Presidente, a minha intervenção vai no mesmo sentido, em nome do Grupo Parlamentar do CDS-PP. E, apesar de nenhum dos Srs. Deputados em causa fazer parte do nosso grupo parlamentar, obviamente é de forma sincera e sentida que também nos associamos às palavras proferidas, pois foram, sem dúvida, duas figuras que muito contribuíram para a dignificação do debate parlamentar no nosso país.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, pelas mesmas razões, também não podemos deixar passar esta referência sem que, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, nos associemos à saudação, muito justa, que foi dirigida aos Srs. Deputados que, não se recandidatando, vão deixar de exercer estas funções, em particular os Srs. Deputados que foram citados.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Leonor Beleza.

A Sr.ª Leonor Beleza (PSD): - Sr. Presidente, de forma muito breve, queria dizer que estou muito sensibilizada pelas palavras que me foram dirigidas e, também, que constituiu e constitui para mim uma grande honra ser Deputada, como constitui uma grande honra ser Vice-Presidente da Assembleia da República.

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Muito obrigada.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, ao abrigo do n.º 2 do artigo 84.º do Regimento, vou dar a palavra ao Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Florestas, que pretende fazer uso dela para uma intervenção sobre o pacote de medidas, adoptadas pelo Governo, de apoio aos agricultores para fazer frente à situação de seca e de febre catarral.
Faça favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Florestas (Carlos Costa Neves): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo, obviamente, por cumprimentar todos e cada um.
Como é do vosso conhecimento e, naturalmente, também objecto da vossa atenção, neste momento, o País está confrontado com uma situação em que, cada dia que passa, mais ansiamos que a chuva caia. É uma situação com que se confronta a população em geral, todos os cidadãos, e que depende da natureza. Segundo vejo, a opinião pública vai seguindo esta situação com atenção e o Governo também acompanha a sua evolução, à hora e ao minuto.
Nós, no Ministério da Agricultura - e é essencialmente isto que me traz aqui -, vimos seguindo esta situação, pelo menos, de há um mês a esta parte. Esta é uma situação atípica, porque, normalmente, deixa de chover cedo quando temos uma situação de seca, mas, neste caso, está a começar a chover tarde. Portanto, é uma situação de seca em Janeiro e que, por isso, apresenta alguma diferença em relação ao que é habitual.
Normalmente, os agricultores - em particular os que se dedicam à pecuária - têm a preocupação de prepararem as suas forragens para, passado o período natural de alimento no pasto, as poderem utilizar. Neste momento, estão a utilizar essas forragens sem ainda terem usado o pasto, por não haver pastagens para o gado, quer ele seja ovino, caprino ou bovino.
Acresce que, em 24 de Novembro, constatou-se a existência de uma doença, que é comummente designada por "língua azul", em determinadas zonas do nosso país - nos distritos de Beja, Portalegre, Évora e Castelo Branco -, o que fez com que, por aplicação de regulamentação nacional e comunitária, fosse necessário estabelecer alguma regulação na circulação de animais.
Portanto, a situação de seca, de falta de chuva, associada ao facto de, em certas zonas do País, os animais não poderem circular leva a que haja uma situação especialmente difícil para alguns desses agricultores. Por isso, há mais de um mês que o Ministério da Agricultura, em concerto permanente com as confederações de agricultores e com as federações de agricultores mais envolvidas nesta questão, vem trabalhando possíveis soluções, não para resolver o problema dos agricultores, porque este só será resolvido pela chuva, mas para atenuar as dificuldades que os agricultores enfrentam.
Neste momento, há um conjunto de medidas acordado com as organizações de agricultores, que passa pelo financiamento total de vacinas e testes relacionados com a doença da "língua azul" e que tem muito a ver com o controlo da situação, com um conjunto de antecipações de pagamentos de prémios atribuídos pela política agrícola comum, cuja regulamentação permite que, em certas circunstâncias, como as que estão a verificar-se, sejam antecipados, com uma série de derrogações, que serão aplicadas se a União Europeia concordar - e tudo indica que sim -, de algumas regras que impedem, por exemplo, a utilização de certos solos para poder beneficiar de certos prémios, e, por último, com a atribuição de uma ajuda directa aos agricultores que permita comparticipar na alimentação do gado, em determinadas zonas pré-definidas e que são mais atingidas quer pela doença da "língua azul", quer pela seca, quer pelo efeito conjugado da doença da "língua azul" e da seca.
Estas medidas implicam um esforço financeiro grande, mas pensamos que o que está em causa é uma situação que justifica a adopção de medidas extraordinárias. Assim, o esforço financeiro que contabilizamos é, para a ajuda à alimentação do gado, de 10 a 15 milhões de euros e, para o conjunto das outras medidas, para as outras comparticipações e reforços, de cerca de 5 milhões de euros, para um total, mínimo, de 20 milhões de euros.
Esta é a situação no momento presente, às 16 horas e 32 minutos do dia 26 de Janeiro, porque é uma situação que está permanentemente em evolução.

Vozes do PCP: - Será que o seu relógio está certo?!

O Orador: - Têm sempre piada, Srs. Deputados!

Risos do PCP e de Os Verdes.

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Mas, se estivessem tão preocupados como eu estou, não teriam sentido de humor para aceitar a piada.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Portanto, neste momento, esta é uma questão que está negociada com as federações e que está pensada em conjunto com os agricultores. Deu-se seguimento ao que sempre pensei ser o caminho correcto, o caminho das parcerias estratégicas, o caminho de abordar estas questões com responsabilidade entre todos. E tive a profunda satisfação de ver a grande responsabilidade e a forma sensata e serena como os agricultores, que estão a viver grandes dificuldades, abordam toda esta questão.
Neste dia e a esta hora, a situação é esta, e digo-o com tanto ênfase, porque outras questões e dificuldades se levantarão para outras zonas do País se, num período que contabilizamos ser entre duas a três semanas, a chuva, pela qual esperamos, não chegar entretanto.
Portanto, continuaremos a acompanhar a situação, que é preocupante, pois há agricultores que estão, realmente, numa situação difícil neste momento, e daí a necessidade da adopção de medidas extraordinárias pelo Governo. E penso que os Srs. Deputados, pelas suas funções e como primeiros representantes desses cidadãos, têm o pleno direito de as conhecer com a maior profundidade. Assim, aqui está a informação e a disponibilidade permanente para prestar todos os esclarecimentos e informações sobre a evolução desta situação nesta Câmara, ou, caso já não seja possível fazê-lo aqui, nos círculos de cada um dos Srs. Deputados.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, entrando no debate, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Zorrinho.

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Florestas, Srs. Deputados: No passado fim-de-semana pude visitar as zonas afectadas e viver directamente a situação difícil que muitos agricultores daquela região estão a passar. Reuni com os dirigentes da Federação de Agricultores do Baixo Alentejo e Alentejo Litoral e com outros agricultores afectados e quero dizer-lhe, Sr. Ministro, que pude sentir o desespero e também o abandono a que se sentiam votados por parte do Governo.
A reacção inicial do Governo a esta situação difícil foi, de facto, ao arrepio de tudo aquilo que seria recomendável para dar ânimo e confiança aos agricultores. O Sr. Ministro não teve disponibilidade para se deslocar ao local. O Sr. Ministro, que dispôs de 15 dias para governar nos Açores em véspera de eleições, não teve um dia para levar uma palavra de conforto aos agricultores alentejanos. Sei que nada havia para inaugurar, mas sabemos como nestes momentos difíceis uma atitude vale mais do que mil palavras.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Ministro é, aliás, candidato por um distrito do Alentejo…

O Sr. José Magalhães (PS): - É! E já lá esteve!

O Orador: - … e, por isso, deixe-me dizer-lhe que deveria conhecer melhor a tempera e o carácter das gentes que se propõe representar.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - As primeiras declarações do Governo sobre este problema foram de completa desvalorização. Depois, veio o tempo da trapalhada, das contradições, dos números diferentes, fornecidos pelo Sr. Ministro e pelo Sr. Primeiro-Ministro, que variaram entre os 10 e os 25 milhões de euros - foi esta a amplitude da diferença.
Finalmente, os protestos e as ameaças dos agricultores fizeram imperar o bom senso e o Governo fez o óbvio: verificou as medidas tomadas pelo governo do PS numa situação similar, que ocorreu em 2000, e fê-las suas. Foi uma atitude sensata, mas é uma atitude que não apaga o prejuízo causado pela demora, pela hesitação, pela arrogância e pela incompreensão.
Sr. Ministro e Srs. Deputados, as preocupações dos agricultores do Alentejo são conhecidas e razoáveis: o mercado está distorcido; a alimentação natural escasseia e muitos agricultores têm dificuldades

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financeiras para adquirirem as necessárias rações; o abeberamento do gado é cada vez mais difícil; o risco de propagação da febre catarral, a doença da "língua azul", torna mais burocrático e menos flexível o circuito de comercialização; as previsões das colheitas de cereais de sequeiro são pouco auspiciosas; e os apoios anunciados são por isso absolutamente necessários.
Mas importa, Sr. Ministro, que passe rapidamente ao terreno. Quanto mais depressa forem aplicadas as medidas maior será a sua eficácia. Neste caso, a rapidez é tão importante quanto a quantidade.
Não é apenas o rendimento dos agricultores que está em causa, é o bem-estar do gado e é também a salvaguarda da matriz rural do Alentejo, um território que ocupa mais de um terço da área do continente e que, se é verdade que não se pode desenvolver apenas com base em actividades do sector primário, também não se pode desenvolver sem essas mesmas actividades.
Por isso, Sr. Ministro, parece recomendável que também diga "sim" à reivindicação das associações, de criarem um gabinete de acompanhamento da evolução desta situação. É fundamental que se garanta a máxima transparência e celeridade nas decisões e se prepare, com a antecipação possível, as respostas que, como disse, podem vir a ser necessárias, nesta como noutras regiões.
Sr. Ministro, copiar as medidas tomadas pelos governos do PS, porque foram medidas adequadas, é algo que quero aplaudir. Mas não posso deixar de lhe manifestar uma estranheza: se nada há de novo, por que é que desta vez foi tudo tão mais lento e tão mais ineficaz?

O Sr. José Magalhães (PS): - Bem perguntado!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Essa é boa!

O Orador: - Ou, então, se há algo de novo, o que é que justifica a demora e a hesitação em fazer chegar as medidas ao terreno?

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - A propósito, Sr. Ministro, sabemos que há uma verba, entre 20 a 25 milhões de euros, mas seria importante que o anúncio da mesma, que faz as primeiras páginas de jornais e que, além de importante, sossega de alguma maneira os agricultores, pudesse ser acompanhado de um compromisso claro quanto aos prazos de execução das medidas.
Quando é que, de facto, os agricultores terão acesso aos recursos anunciados? Qual é a origem dessas verbas? Sabemos que algumas dessas verbas são uma simples e importante antecipação de prémios, que seriam pagos mais tarde. E em relação às outras, àquelas que não estão orçamentadas?
Sr. Ministro, qual é a resolução do Conselho de Ministros que lhe permite afectar ao INGA (Instituto Nacional de Intervenção e Garantia Agrícola) as verbas para pagar essas medidas, que acrescem ao que estava orçamentado? Diga-nos qual é a resolução. Caso ela não exista, então diga-nos que outras medidas é que vão ser desactivadas? Onde é que vai cortar?
É importante que os agricultores do nosso país saibam onde o Sr. Ministro vai cortar, onde vai buscar esses recursos, sobretudo quando suspeitamos (e suspeitamos com legitimidade!) que quem agora anuncia não vai arcar com as consequências do anúncio, nem da sua aplicação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Penha.

O Sr. Fernando Penha (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Florestas, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A irregularidade climática em Portugal é uma característica nossa, é uma característica portuguesa. Com efeito, ao longo de muitos anos, temos verificado a particularidade de num só ano termos intempéries, ou excessos de chuva, e também períodos de seca.
Sr. Presidente, a solidariedade para com os agricultores e produtores florestais tem sido francamente evidenciada e levada à prática pelos governos do PSD/PP, aqueles que nos últimos tempos têm governado Portugal.
Ficou muito claro para todos os portugueses essa solidariedade quando em 2003 e em 2004, foram aplicadas fortes medidas de ajuda ao sector florestal e aos produtores florestais, face aos incêndios verificados.
Devo recordar a esta Câmara que nunca outros governos tinham prestado este tipo de ajuda ao sector florestal português, e em Portugal arde em média 100 000 ha/ano, excepto no ano de 2003, em que arderam cerca de 400 000 ha. Só os governos do PSD/PP, do Dr. Durão Barroso e do Dr. Santana Lopes, é

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que prestaram ajudas ao sector florestal.
Mais: esta solidariedade para com os sectores florestal e agrícola, para com o meio rural português, tem sido típica nas governações do PSD. Já no governo do Prof. Cavaco Silva, onde houve três anos praticamente sucessivos de carência de água, de seca, foram aplicadas fortes medidas de apoio à agricultura, à captação de água, à armazenagem e ao transporte da mesma.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As medidas agora surgidas foram aplicadas por este Governo atempadamente e vêm prestar um precioso auxílio à agricultura, não só no que diz respeito ao abeberamento dos animais como ainda à alimentação dos mesmos.
Com efeito, as condições climáticas determinaram as pastagens, os pastos naturais e os semeados, fazendo com que estas não conseguissem vegetar de forma suficiente para satisfazerem as necessidades alimentares do sector pecuário português.
Mais ainda: este auxílio, para além de ter sido imediato, não se dirigiu apenas à zona que primeiramente o solicitou, o Alentejo, tornou-se abrangente a todas as outras zonas que em Portugal evidenciaram esta carência.
Sr. Ministro, a decisão do Governo foi atempada. Está a ser atempado o apoio dado pelo Governo. As próprias associações de produtores o têm manifestado e sentem que os agricultores estão de facto a ser apoiados com eficiência e muita solidariedade neste momento de carência e de dificuldade.
Sr. Ministro e Sr. Secretário de Estado, o Grupo Parlamentar do PSD manifesta claramente o seu apoio às medidas já definidas. Manifestamos e louvamos as medidas que vão ser aplicadas. Mais: diremos ainda que medidas destas foram por vezes anunciadas por outros governos, mas acabaram por nunca serem realizadas. Neste país, ainda estão por pagar muitas situações de secas e intempéries, relativamente às quais os governos do PS anunciaram e prometeram medidas; os pagamentos não foram cumpridos, não chegaram aos agricultores.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Estamos numa outra situação; estamos com outros governos, estamos com governos PSD/PP, que vão cumprir aquilo que anunciaram.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Florestas, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Em relação à seca que neste momento aflige os agricultores e o País, gostaria de dizer que, naturalmente, há problemas acrescidos e que urge combater. As medidas que o Sr. Ministro veio hoje trazer a esta Câmara são tardias, mas "mais vale tarde do que nunca"!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Penso que são medidas paliativas, para resolver algumas das situações aflitivas dos agricultores, mas é preciso não esquecer, Sr. Ministro, que o PCP sempre tem dito, e fá-lo desde há muito, que as secas se combatem antes; ou seja, tem de se preparar devidamente o País e os instrumentos financeiros para se combater tais situações.
É evidente que ninguém pode saber que a seca se vai verificar este ano ou no ano seguinte, mas deveríamos ter aprendido com o passado e há situações que deveriam ter sido resolvidas, nomeadamente uma que há muito é reclamada e que nunca é feita e que, de promessa em promessa, se vai retardando no tempo, que é o seguro para os agricultores.
Os seguros de colheitas que, neste momento, existem em Portugal são mais tendenciosos para as seguradoras do que propriamente para os agricultores,…

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - … e esta situação nunca foi alterada, pese embora o PCP tenha apresentado na Assembleia da República, por duas vezes, projectos de leis no sentido de se encontrar uma solução para os seguros agrícolas em Portugal.

Vozes do PCP: - Muito bem!

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O Orador: - Por outro lado, as medidas, para além de terem de ser tomadas, têm de ser pensadas com estratégia. E pensar com estratégia significa dizer, em relação ao Alentejo, que Alqueva poderia ter resolvido parte das situações de aflição que hoje temos e, para isso, bastava que houvesse projectos. A falta deles é culpa do PS, mas também é da culpa do PSD, que neste momento governa.

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - Sr. Ministro, há três anos que os senhores estão no Governo e não avançaram com uma situação que era clara e objectiva. Alqueva é uma reserva estratégica de água, mas, neste momento, não serve os agricultores, nem as populações do distrito de Beja, porque não existem os canais de irrigação para, nomeadamente, Roxo, Odivelas e outros sítios.
O Sr. Ministro poderá dizer: "O PS inflectiu! Fez a infra-estrutura 12 para Odivelas quando o prioritário seria fazê-la para Roxo". Mas os senhores estão há três anos no governo e também não o fizeram!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Esta é que é uma situação real e objectiva.

Vozes do PCP: - Claro!

O Orador: - O problema mantém-se, e hoje temos um conflito grave. Para o próximo Verão - e esta é uma situação clara -, a barragem do Roxo, que abastece os concelhos de Beja e Aljustrel, está a 22% da sua capacidade, pelo que não vai haver regadio. Os agricultores não podem servir-se dela para o regadio, porque não há água na barragem do Roxo, como não há em Odivelas e em muitas outras.
Por conseguinte, não podemos pensar só nas medidas de curto prazo. Esta é uma medida a curto prazo, mas onde estão as decisões deste Governo e dos governos anteriores em relação a medidas de médio e longo prazo sobre esta matéria?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, Sr. Ministro, é necessário que haja, de uma vez por todas, um plano estratégico não só para o Alentejo mas, sobretudo, para os agricultores, uma verdadeira política agrícola nacional que os sirva, entroncada na política agrícola comum. E isto nem este Governo nem governos anteriores o fizeram.

Aplausos do PCP e da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Florestas, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: A primeira palavra sobre esta matéria é, naturalmente, para aqueles que passam dificuldades acrescidas num momento extraordinário, do ponto de vista climático, que causa prejuízo aos nossos agricultores. É uma palavra de solidariedade, porque mais importante do que o contributo que se possa dar para resolver este problema é termos sensibilidade para perceber o que eles passam neste momento. E temos sensibilidade para perceber uma outra coisa: os problemas climáticos extravasam aquilo que é a actuação dos governos. Ou seja, os governos podem ajudar na prevenção, com medidas extraordinárias de apoio, mas não podem, obviamente, interferir naquilo que são as condições climatéricas do País.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Podem na adaptação!

O Orador: - Portugal tem condições climatéricas, como já aqui foi dito, que têm de ser tidas em conta. Por exemplo, no que diz respeito à água, conseguimos no mesmo ano ter problemas de excesso e de carência, exactamente porque por vezes chove demais no Inverno, o que não acontece este ano, e, depois, há seca no Verão.
Neste momento, enfrentamos um problema diferente deste, que é uma situação de seca no Inverno, o que, obviamente, é um problema actual e vai trazer problemas futuros, que devem ser precavidos.
Por outro lado, ainda bem que é este Governo que neste momento pode ajudar os agricultores, porque, como sabemos, ele tem uma actuação clara, como aconteceu em relação a outras situações extraordinárias,

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como foi, por exemplo, a dos fogos florestais, numa altura em que ardeu uma área bastante significativa e superior àquilo que era costume. E aqui um governo formado por esta mesma maioria soube dar apoios, também eles, extraordinários.
Agora, em que existe uma situação de seca, que, também ela, é mais significativa e que, ainda por cima, acontece fora de época, sabemos que há um governo que tem sensibilidade e capacidade para analisar esta situação e lhe dar uma resposta eficaz.
Mas há algumas questões que se levantam e, uma vez que o Sr. Ministro ainda terá oportunidade de falar no encerramento deste debate, gostaria de lhas colocar. Uma delas, que tem sido levantada por alguns intervenientes, é a de saber por que é que não foi accionado o fundo de calamidade. Se esta era uma hipótese, por que é que o Ministério da Agricultura e o Governo entenderam que esta não era a melhor solução e consideraram a solução que o Governo apresenta a mais eficaz e substancial?
A segunda questão, que também tem a ver com esta área - porque não podemos ignorar que há constrangimentos legais, do ponto de vista europeu, em relação ao tipo de apoios que podem ser prestados neste tipo de situações -, é a de saber se os apoios que neste momento o Governo está a dar podem, de alguma forma, comprometer ou limitar aquela que é a capacidade dos nossos agricultores recorrerem a apoios comunitários no futuro.
A terceira questão prende-se com uma matéria que o Sr. Ministro referiu na sua intervenção inicial e em relação à qual gostaríamos de saber, de uma forma mais pormenorizada, como é que as associações do sector estão a ser envolvidas neste programa de apoio. Concretamente, até que ponto é que os agricultores e as suas associações estão a ser envolvidos e a participar com o Governo na programação destes apoios?
Em quarto lugar, para responder a alguma inquietação manifestada pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Ainda não falou!

O Orador: - … e para se perceber que este Governo tem esta preocupação, quero referir que esta não é uma situação isolada, decorre de um problema que tem a ver com as alterações climáticas e com a evolução dessas mesmas alterações climáticas.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - E…!

O Orador: - Posto isto, pergunto, Sr. Ministro: o que é que, em termos de programação, nomeadamente daquilo que é o apoio dado à nossa agricultura face a essas alterações climáticas, está a ser feito?
Por fim, quero saudar uma atitude, que é clara, que é a transparência deste Governo. Durante muito tempo, no sector da agricultura, habituámo-nos a ver alguma precipitação e confusão, que era aquilo que normalmente acontecia no tempo do governo socialista. Ouvimos, há pouco, falar de um episódio de uma banda de música…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - O tempo de que dispunha terminou. Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente, dizendo que aquilo de que os agricultores precisam não é de inaugurações com bandas de música.

O Sr. Honório Novo (PCP): - É só fitas!

O Orador: - Ainda bem que este Governo dá aos nossos agricultores apoios concretos em relação ao problema e não dá apenas festas e bandas de música.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Ministro de Ministro da Agricultura, Pescas e Florestas, Srs. Deputados: Os Verdes não têm dúvidas de espécie alguma de que estamos todos preocupados com a situação de seca em Portugal, situação esta agravada, como bem já aqui se referiu, pela doença da "língua azul".
Temos duas opções: ou andamos permanentemente, como o Governo tem feito, a remendar situações,

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nomeadamente de calamidades, ou precavemo-las, agindo por prevenção. E o que o Sr. Ministro não pode dizer é que estas situações não são previsíveis, porque, como tive oportunidade de referir na declaração política de há pouco, existem inúmeros estudos e relatórios, quer do projecto SIAM, quer da Agência Europeia do Ambiente, que nos dão conta de que estas situações vão intensificar-se e prolongar-se. Vamos ter períodos prolongados e intensos de seca, assim como de maiores intempéries, e, de facto, temos descurado muito a questão da prevenção e da acção por antecipação.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Naquilo que se refere ao combate às alterações climáticas, este Governo falhou redondamente não só nas medidas que deveria ter tomado quer no sector da energia, dos transportes, etc.,…

O Sr. Honório Novo (PCP): - A culpa é do Isaltino!

A Oradora: - … quer naquilo que se refere às próprias medidas de adaptação a essas alterações climáticas e ao aquecimento global como também nos mecanismos de adaptação. E como esta é uma matéria transversal, importa-me também ouvir o Sr. Ministro sobre aquilo que considera que o Governo fez em matéria de adaptação ao fenómeno das alterações climáticas no campo da agricultura.
Por outro lado, este Governo também "meteu na gaveta" as medidas necessárias para o uso eficiente da água. Na verdade, no que respeita ao sector da água, a vossa única preocupação foi a sua privatização - saber como iriam tornar este sector o negócio do século XXI -, privatização esta, aliás, que é incompatível com a racionalização do recurso água e a poupança do mesmo,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - … na medida em que é feita numa lógica de obtenção de lucro e, portanto, de um maior gasto deste recurso escasso. Portanto, "meteram na gaveta" tudo aquilo que concerne a medidas para o uso eficiente da água.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr.ª Deputada, o tempo de que dispunha terminou. Peço-lhe que conclua.

A Oradora: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Em face desta nossa grande preocupação, no que diz respeito à falha deste Governo naquilo que se refere à prevenção, coloco três perguntas, muito concretas, relativamente à situação actual.
Sr. Ministro, face àquilo que se conhece actualmente, prevê-se que esteja comprometido o abastecimento de água para consumo humano neste Verão?
Qual o calendário de aplicação das ajudas antecipadas e extraordinárias anunciadas por este Governo?
Que destino está a ser dado aos animais mortos pela doença da "língua azul"?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Florestas.

O Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Florestas: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Agradeço as vossas abordagens, e vou procurar contribuir para a clarificação de algumas questões.
Em primeiro lugar, o Governo está, obviamente, a acompanhar as questões relacionadas com o abastecimento de água para consumo humano, mas devo dizer que não sou a pessoa mais indicada para dar as informações específicas sobre esta matéria, e não tenho por hábito falar daquilo que sei menos.
No que toca à antecipação de ajudas, gostaria de dizer que tudo está a ser negociado permanentemente com Bruxelas, exactamente porque não podemos fazê-lo sem o acordo prévio de Bruxelas, sob pena de corrermos o risco de existirem situações em que os próprios agricultores possam ser prejudicados relativamente a apoios concedidos no âmbito da política agrícola comum.
Portanto, parte destes apoios antecipados serão pagos amanhã, dia 27 de Janeiro, e, no que diz respeito às ajudas à alimentação do gado, estamos a trabalhar na organização do processo de tal forma que seja possível fazer esses pagamentos o mais depressa possível, ou seja, fins de Janeiro ou princípios de Fevereiro.

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Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, relativamente aos comentários que aproveitou para fazer acerca das mudanças climáticas, devo dizer que se alguém trabalhou muito, e bem, nesta questão foi o Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Ambiente, Jorge Moreira da Silva,…

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Criando o negócio do século também para esta área!

O Orador: - … e estou certo de que reconhecerá a inegável competência da sua actuação e a profundidade dos seus conhecimentos.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Pensei que fosse falar do Eng.º Carlos Pimenta!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Mesmo assim, quase que não consegue entrar nas listas!

O Orador: - É exactamente por isso que este Governo precisava de ter ido até ao fim do seu mandato, para não estarmos sempre a voltar ao princípio e não estarmos sempre a ter um País adiado.
Sr. Deputado Rodeia Machado, as medidas não são tardias (e com isto respondo também ao Sr. Deputado Carlos Zorrinho), porque, primeiro, é óbvio que é o tempo neste momento - estas medidas foram, aliás, permanentemente renegociadas com as organizações de agricultores -, segundo, há autorizações que dependem de Bruxelas, e não vou correr o risco de prejudicar os agricultores sem primeiro levar tudo a efeito, passo a passo e de acordo com as necessidades estabelecidas,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … e, terceiro, estamos dependentes de stocks, em relação a algumas das medidas. Por exemplo, não havia no mercado vacinas contra a doença da "língua azul"; a única fábrica que as faz é na África do Sul e não as tinha para fornecer, e foi graças à colaboração com a Itália que foi possível obter as vacinas de que necessitamos antes de a fábrica estar em condições de as fornecer.
Gostaria ainda de dizer que, para além das medidas de que falei, há um apoio a infra-estruturas, nomeadamente para a armazenagem de água - investimento a que vai ser dada prioridade.
Sr. Deputado Rodeia Machado, os seguros de colheitas têm de ser mudados.
O Sr. Honório Novo (PCP): - Quando?

O Orador: - Não tenho qualquer dúvida de que não servem a ninguém. E isto era uma das coisas que estava no meu plano de trabalho.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Sr. Honório Novo (PCP): - No do seu antecessor também!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Deixassem o Governo ir até ao fim!

O Orador: - Talvez por isso é que às vezes me sinto angustiado quando olho para este país adiado.
Quanto à estratégia para o Alqueva, demorámos um ano a recuperar uma obra inaugurada pelo governo do Partido Socialista, uma rede de rega que não tinha sequer a energia eléctrica necessária para promover a circulação da água e que, por não ter sido utilizada, estava em péssimo estado, e tivemos de refazer a rede toda. Não sei se é ou não herança, mas foi o que aconteceu.
Também gostava de dizer que na próxima semana vou assistir ao lançamento das obras na barragem do Roxo.

Vozes do PCP: - É mais uma inauguração?

O Orador: - Não vou fazer qualquer inauguração, e espero não ser criticado pelo facto de dar início à obra, porque, nesta altura, acho que não mereço esta crítica.
Quanto ao fundo de calamidades, Sr. Deputado, gostava de lhe dizer que ele era menos flexível e envolvia menos meios financeiros do que as soluções a que chegámos. Não poderíamos, com o fundo de calamidades, chegar a estas soluções.
No que diz respeito à sua classificação como medidas paliativas, essas foram as medidas que encontrámos com as organizações ligadas à agricultura.
No que se refere a estas medidas serem a cópia de medidas de outros governos, devo dizer que elas

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foram progressivas e que foram tomadas em conjunto com as organizações ligadas à agricultura. Algumas destas medidas coincidem talvez por alguns interlocutores serem os mesmos ou por não ser preciso imaginação neste caso. A verdade é que não tenho ideia de as ter copiado, mas, se copiei boas ideias, não me faz grande mossa dizerem que são copiadas.
Por fim, numa reacção mais política do que qualquer outra coisa, gostava de dizer o seguinte: sou, efectivamente, dos Açores, e se há alguma coisa que aprendemos a fazer nos Açores é a detestar centralistas. Se o Sr. Deputado, durante o período eleitoral, for ao seu círculo eleitoral, a Évora, ninguém lhe diz nada, mas se um cidadão dos Açores for ao círculo eleitoral onde está recenseado, já alguém tem alguma coisa a dizer. E, já agora, digo-lhe que não passei lá 15 dias, passei lá os meus fins-de-semana, paguei as minhas passagens…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … e ninguém tem nada com isso, ninguém tem nada com a forma como assumo os meus direitos cívicos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Gostava também de dizer aos Srs. Deputados que espero que não me critiquem se fizer alguma apresentação de candidatura no Círculo Eleitoral de Portalegre, por onde sou candidato, porque acho que também tenho direito de a fazer e que isto faz parte dos meus direitos cívicos.
Acho, portanto, que o Sr. Deputado não foi justo comigo e que me atribuiu algumas designações, nomeadamente a da arrogância, que eu, certamente, não tenho. Arrogante eu, Sr. Deputado?! Arrogante eu?! Podem acusar-me de tanta coisa, Sr. Deputado, mas de arrogância! Não acerta no alvo, com certeza!
Para terminar, gostava de dizer que a reacção inicial deste Governo foi em permanente e sistemático contacto com as organizações. Nunca ignorei as organizações! Tive reuniões mensais com as confederações de agricultores desde o início do meu mandato! Claro que estas reuniões com as confederações partiram do pressuposto de que elas representavam as federações e as associações que as integram, só que às vezes não há entendimento entre elas. Mas, logo que descobri esta circunstância, passei a reunir também com as federações e com as associações que não se sentiam suficientemente representadas pelas organizações de cúpula.
Gostava ainda de dizer que estas organizações já estão representadas no gabinete de acompanhamento de toda esta situação que criámos e que já está a funcionar, sob a coordenação directa do Sr. Secretário de Estado de Agricultura e Alimentação.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma curta intervenção.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): - Sr. Presidente, quero apenas referir, em primeiro lugar, que os adjectivos que utilizei foi em relação às políticas e não em relação ao protagonista e, em segundo lugar, que, quando referi a sua estadia nos Açores em período eleitoral - e devíamos reflectir eticamente sobre essa atitude -, foi, sobretudo, para assinalar que não encontrou agora disponibilidade para ir ao local ver aquilo que está a acontecer no Alentejo.

O Sr. José Magalhães (PS): - É um facto!

O Orador: - Talvez por isso é que agora pode dizer, com esse à-vontade e sem arrogância, que este é o tempo certo. Se tivesse visto o desespero das pessoas, se tivesse visto como estão os animais ou como está a situação no terreno, não teria dito que este é o tempo certo e, se calhar, concluiria que este momento já tem um grande atraso.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Só cá falta o funeral da vaca!…

O Orador: - Mas o Sr. Ministro não respondeu à seguinte questão: onde está o documento habilitante para poder dotar o INGA do dinheiro a fim de pôr em prática essas medidas?

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Vozes do PS: -Muito bem!

O Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Florestas: - Sr. Presidente, peço a palavra porque há pouco esqueci-me de dar uma resposta ao Sr. Deputado Carlos Zorrinho.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Como ainda dispõe de 32 segundos, faça favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Florestas: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Zorrinho, peço-lhe desculpa por não ter respondido à questão que colocou sobre os meios financeiros. E não o fiz talvez porque seja uma das questões em relação à qual estou tranquilo.
Mas quero dizer-lhe que estamos em permanente contacto com o Ministério das Finanças e que, numa primeira fase, essa ajuda será feita através de transferências de verbas, a forma mais rápida e eficaz de, neste momento, assegurar a imediata disponibilidade das verbas necessárias.
Em relação à sua sugestão no sentido de ir ver a situação no local, gostava de dizer ao Sr. Deputado que tive oportunidade de lá estar e com agricultores. Aliás, uma das característica da minha actuação - talvez algo que me ficou dos velhos tempos de membro do Governo Regional dos Açores - é que é preferível andar no terreno do que estar no gabinete.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Entretanto, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Leonor Beleza.

A Sr.ª Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 17 horas e 10 minutos.

ORDEM DO DIA

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, vamos dar início ao período da ordem do dia com um debate, requerido pelo Grupo Parlamentar do BE, com a presença do Governo, sobre a negociação do Pacto de Estabilidade e Crescimento.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda propôs que a ordem de trabalhos desta reunião da Comissão Permanente fosse dedicada à discussão dos trabalhos da revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento por considerarmos - e estou certo de que não estamos sozinhos e de que todos terão razões para nos acompanhar - que esta é uma matéria de enorme importância para o País e para a União Europeia. Registo, por isso, que, embora o Governo esteja representado por três secretários de Estado, o Ministro das Finanças não tenha tido oportunidade de estar aqui. Creio que teria sido razoável que viesse, dado o seu compromisso e a sua responsabilidade directa, uma vez que foi o Ministro das Finanças que esteve a representar o País nas recentes reuniões na União Europeia e o esclarecimento com todo o detalhe sobre a proposta do Governo português, da resposta aos outros governos, e da sua política mereceria essa atenção.
De qualquer modo, há duas razões pelas quais levantamos o problema agora: uma, que já foi aflorada em discussão anterior, diz respeito ao impacto directo do Pacto de Estabilidade e Crescimento na política orçamental e na regulação económica em Portugal; a outra, pela qual, aliás, vou começar, diz respeito à estratégia europeia.
Vou começar por este último ponto, porque creio que, em primeiro lugar, antes de considerarmos vantagens e desvantagens de qualquer modelo do Pacto de Estabilidade para Portugal, importa começar por reflectir sobre o que a Europa precisa e em que é que o actual Pacto se demonstrou tão frágil e incompetente para a União Europeia no seu conjunto.
Já temos anos suficientes de vigência deste Pacto para nos apercebermos das suas dificuldades, a que, aliás, o anterior Presidente da Comissão Europeia Romano Prodi, numa frase mais feliz, chamou "um Pacto estúpido", o que creio que representava algum consenso. Este Pacto não era capaz, como se demonstrou na recessão de 2002 a 2004, de responder ao critério decisivo de uma política económica, que é procurar compensar os ciclos económicos e, portanto, corrigi-los em período de expansão e, sobretudo, em períodos de recessão.
O Pacto teve exactamente o efeito contrário, foi parte da crise europeia, e, por isso mesmo, temos

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todas as boas razões para ter toda a preocupação com a revisão do Pacto a partir de agora, enfim com toda a discussão que ocorre nestas semanas e com aquela que se deve concluir tão brevemente quanto esperamos.
A este respeito, devo começar por fazer duas considerações.
A primeira é a de que, na nossa opinião, é necessário um pacto de disciplina orçamental. É, obviamente, necessário! Havendo uma moeda única - o euro -, não pode ser possível que cada país transfira défices orçamentais imponderados para ter impacto no conjunto da economia europeia. Não seria possível ter uma moeda única sem uma regra de disciplina orçamental.
A segunda consideração é a de que esta regra se revelou errada. Errada pela falta de meios de intervenção da própria União e pela regra em si. A União Europeia tem três défices do ponto de vista da regulação: em primeiro lugar, com o Pacto de Estabilidade, controla os orçamentos dos seus membros, mas a própria União não tem orçamento, o que quer dizer que não pode ter política contracíclica; em segundo lugar, não há uma política fiscal consistente na União Europeia; e, em terceiro lugar, e mais grave ainda, a entidade que regula a política monetária, o Banco Central Europeu, não tem por obrigação ter política anticíclica.
Por isso, não havendo política fiscal, havendo uma política orçamental que reduz a capacidade de manobra de cada país mas que não a compensa com capacidade de manobra da União Europeia, e havendo um banco central que acentua a crise por via das políticas monetárias, o Pacto teve o pior efeito possível.
Acresce ainda, Srs. Secretários de Estado, que o Pacto de Estabilidade impunha que, quando era necessária uma política de animação da economia, com políticas intermédias, com políticas regionais, com políticas de financiamento, com políticas de subsídios, com políticas fiscais, com políticas de resposta à recessão, o Pacto proibia-nos tal política, como a outros países europeus, e o "efeito dominó" dessas proibições de políticas orçamentais anticíclicas foi o de acentuar a recessão.
Temos, portanto, todas as boas razões para, pensando na União Europeia, nos preocuparmos com a necessidade de a União, no seu conjunto, corrigir este Pacto. Por isso mesmo, vemos, sem surpresa, que quase todos os países argumentam com esta necessidade.
O Chanceler Schröder publicou, há alguns dias atrás, no Financial Times, na edição alemã, uma proposta, de forte pendor nacionalista, aliás, dizendo que a intervenção da União deveria ser limitada para que a soberania orçamental dos países não ficasse afectada. É, de algum modo, surpreendente, porque a Alemanha foi um pilar desta ortodoxia orçamental do Pacto, e a própria Alemanha não o cumpriu.
Fala-se muito neste Parlamento da excepção portuguesa em 2002, mas importaria, em nome da seriedade do debate político, que se acrescentasse a esse caso concreto todos os outros, o da Alemanha, o da França e, sabemos agora, também o da Grécia. A Grécia reconheceu ter deliberadamente mentido à União Europeia durante estes vários anos e nunca ter cumprido o Pacto de Estabilidade. E sabemos que a Alemanha e a França também não o fizeram.
Por isso mesmo, uma correcção do Pacto era indispensável; caso contrário, ele não tem outra legitimidade que não a do acordo para uma mentira conjugada. Um Pacto que seja disciplinador não pode existir se se sabe que ele permitiu a fraude orçamental, o disfarce das contas públicas, e que nunca reagiu quando um país, desde que poderoso, pudesse impor as suas condições contra estas regras.
É por isso que, creio, ao pensar na revisão do Pacto e ao trazer este debate aqui para que haja uma confrontação das várias estratégias possíveis que Portugal deve defender para sabermos o que o Governo cessante propõe nestas reuniões e para sabermos o que a governação, que vai resultar das próximas eleições, assume como compromisso para propor na União Europeia, o Bloco de Esquerda apresentou, no debate nacional destes dias, a ideia de que as duas componentes fundamentais da proposta de alteração do Pacto deve ser, por um lado, o controlo da evolução da despesa corrente - nunca mais do que 2% acima da inflação, portanto, 2% em termos reais - e, ao mesmo tempo, a contenção, retirando da contabilidade do Pacto dois tipos de despesas muito delimitados na programação plurianual das políticas orçamentais, nomeadamente, na formação e qualificação do trabalho, para a criação de emprego com qualidade, e nas despesas de saúde.
Não creio que deva generalizar-se uma política de excepções, mas estas têm fundamentação suficiente, razoável e indispensável nos países cujos serviços públicos têm um défice significativo. Porque, se, em contrapartida, a evolução da despesa corrente, em particular, a evolução da dívida pública, vier a ser controlada, obteremos, simultaneamente, a garantia da flexibilidade e a garantia da contenção dos défices orçamentais no conjunto da União Europeia.
Creio que isso é necessário para Portugal, porque, em primeiro lugar, é necessário para a União Europeia, e é necessário também para Portugal, devido à situação de atraso estrutural em que vivemos.
É por isso que, creio, este debate deve ajudar, no clima do esclarecimento que esta Assembleia exige num debate com esta profundidade, a que se discuta o que se está a passar, as alternativas dos vários

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países que têm vindo a ser consideradas no ECOFIN e no conjunto da União Europeia, em discussões que são decisivas nas próximas semanas, enfim, com as orientações que têm vindo, aliás, a emergir e que, em geral, recusam qualquer alteração que não sejam pequenas correcções nos mecanismos de punição da excepção e não tanto na reorganização da política contracíclica, o que é a variável estratégica fundamental.
Creio serem estes os termos do debate, e é para ele que convido as bancadas parlamentares e, naturalmente, o Governo.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Manuel Teixeira): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É com muito gosto que estou, hoje, neste debate, e saúdo-vos a todos.
De facto, a existência de regras orçamentais num contexto de uma dada União Monetária é completamente necessária e imprescindível. Em qualquer caso, a saúde das finanças públicas e a estabilidade orçamental são um bem, em si: potenciam o crescimento económico e permitem que a política monetária não tenha um pendor excessivamente restritivo, o que aumentaria as taxas de juro, prejudicaria as despesas de investimento, e, portanto, iria prejudicar o crescimento. Ou seja, a existência de regras é completamente imprescindível.
O Pacto de Estabilidade e Crescimento introduz esse conjunto de regras e de procedimentos em relação à própria União Europeia. Neste momento, nas instituições da União e com a participação dos países, está em discussão a revisão dessas regras e procedimentos.
A posição que o Governo português tem vindo a assumir nestas discussões é, numa síntese inicial, a seguinte: temos vindo a privilegiar três vertentes: a primeira consiste em reforçar a componente preventiva em relação à componente da punição; a segunda consiste em aperfeiçoar os mecanismos de implementação do procedimento dos défices excessivos; e a terceira consiste na melhoria da própria governação do Pacto.
Em cada uma destas vertentes, deixai-me fazer, de uma forma muito sintética, algumas análises.
Em relação à primeira vertente, para que suceda esse reforço da componente preventiva em relação à componente punição, aquilo que tem de vigorar é, no fim de contas, a impossibilidade da política orçamental ter o tal pendor pró-cíclico que, na existência actual das regras, é muito possível.
De forma a evitar a possibilidade de existência de políticas orçamentais pró-cíclicas, há que ou criar regras ou dar poder à Comissão no sentido de obrigar a que o esforço de ajustamento orçamental seja feito naquilo a que podemos chamar "os tempos bons", que são, no fim de contas, os períodos de expansão do ciclo. Portanto, o esforço de consolidação orçamental tem de ser feito pelos países nesse período.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A forma como esse esforço há-de ser feito está em discussão. A questão de saber se tal deve ser feito de acordo com um regulamento que o Conselho irá aprovar, se deve ser feito em complemento com regras orçamentais internas, ou se deve ser feito dando poder à Comissão para fazer alertas precoces, está em discussão, neste momento. Em qualquer caso, esta componente parece-me verdadeiramente importante.
Ainda dentro desta componente, que é a de privilegiar a vertente preventiva, obviamente que é necessário fixar objectivos orçamentais de médio prazo. Como sabem, os objectivos de médio prazo que nesta altura são habitualmente referidos traduzem-se na verificação de uma situação de saldo orçamental equilibrado ou em excedente.
Mas está a ser discutida a possibilidade de definição de objectivos alternativos. Poderia ser um determinado valor do rácio da dívida, ou a obrigação de se atingir um determinado valor para esse rácio. A própria trajectória para se atingir esses objectivos tem de ser definida e, dentro dessa trajectória, está em discussão a questão de saber se deverão, ou não, existir factos que devam ser tidos em conta. Alguns países têm proposto a consideração nessa trajectória de ajustamento, para esse objectivo orçamental do médio prazo, que se pondere se o país está a implementar, ou não, reformas estruturais que aumentem o potencial do PIB, a prazo.
Em grande síntese, esta é a análise relativamente à primeira componente, que é reforçar a tal vertente preventiva do Pacto.
Na segunda vertente, que é a de aperfeiçoar os mecanismos de implementação do procedimento dos défices excessivos, o Governo português tem vindo a defender a necessidade de ser aclarado e revisto aquilo que o Regulamento (CE) n.º 1467/97, do Conselho, considera como sendo as circunstâncias

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extraordinárias e transitórias que justificariam a ultrapassagem do défice de referência.
Como sabem, nessas condições extraordinárias inclui-se a verificação no ano de ultrapassagem desse valor de referência de uma diminuição real do PIB de 2%. É, de facto, uma condição muito extrema e que não é verificada em nenhum país europeu, nos dois últimos episódios de crise.
Pensamos, pois, que deve ser assumida uma condição menos extrema, que poderia ser simplesmente a verificação de o país estar com o PIB a decrescer, em temos reais, e não dizer exactamente o valor; ou poderia ser a verificação numa série de anos consecutivos de um diferencial importante entre o crescimento do PIB potencial e o crescimento do PIB actual. Parece-nos muitíssimo importante a revisão dessa condição extraordinária e transitória, justificadora da ultrapassagem do défice de referência.
Por fim, na componente da melhoria da governação do próprio Pacto, temos vindo a defender a necessidade da melhoria sistemática das estatísticas nacionais, quer das estruturas que produzem as estatísticas quer a própria qualidade intrínseca das estatísticas, bem como a da melhoria da cooperação entre as instituições que, nestas matérias, são, de facto, relevantes - os institutos nacionais de estatísticas, os ministérios das finanças, os bancos centrais.
Em grande síntese - e estando à vossa inteira disposição para responder às vossas questões -, tem sido esta a posição que o Governo português tem vindo a defender no quadro da revisão das normas e dos procedimentos do Pacto de Estabilidade.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Informo a Câmara que se inscreveram, para pedir esclarecimentos ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento, vários Srs. Deputados.
Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Frasquilho.

O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado do Orçamento, no seguimento desta iniciativa, que me parece muito louvável, de esclarecimento dos portugueses sobre uma possível e provável revisão do Pacto de Estabilidade que se encontra em cima da mesa, creio que seria útil que o Sr. Secretário de Estado esclarecesse a Assembleia da República, nomeadamente alguns grupos parlamentares, mais especificamente, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, sobre o entendimento de Orçamento e os diferentes subsectores que compõem a política orçamental.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - É que, hoje, ouvimos aqui alguns comentários que nada abonam em favor de quem, no Partido Socialista, vem discutir estes assuntos. Desde logo, porque se sabe que o défice, o tal défice que quebrou o Pacto de Estabilidade e Crescimento em 2001 não é minimamente comparável com o que se passa nesta altura. E porquê? Porque, como qualquer economista que frequente o 1.º ano do curso de Economia em qualquer universidade, sabe que só se corrigirmos o saldo orçamental das despesas com juros da dívida pública e corrigindo-o, ainda, pelo ciclo económico é que podemos fazer comparações intertemporais.
Ora, quando o Pacto de Estabilidade foi incumprido pela governação socialista, em 2001 - o que já se adivinhava, dado o descalabro que se vivia, então -, a verdade é que vínhamos num ciclo económico muito positivo, numa fase alta do ciclo económico, o que não se passa agora, como os Srs. Deputados bem sabem.
Portanto, a comparação não tem minimamente razão para existir.

Protestos do Deputado do PS José Magalhães.

Aliás, nos últimos 18 anos, ou seja, desde 1986 até agora, os piores saldos orçamentais estão na conta dos senhores e reportam a 1999, 2000 e 2001. É bom que tomemos conhecimento desta realidade.
Mas, depois, confundiu-se a evolução das contas do sector público como um todo, em 2004, com a informação referente ao subsector Estado, que foi exactamente esta informação que a Direcção-Geral do Orçamento ontem disponibilizou.
Portanto, baralhou-se, confundiu-se o subsector Estado com o sector público administrativo como um todo e, pior, escamotearam-se, ou foram esquecidos, vários factos.
Desde logo, que a receita fiscal avançou muito mais do que aquilo que tinha sido previsto. Penso que isto pode ser claramente uma consequência de, pela primeira vez, ter sido feito o cruzamento de dados entre o fisco e a segurança social,…

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Claro!

O Orador: - … que terá levado a um melhor desempenho em termos de combate à fraude e à evasão fiscais.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas também se escamoteou que a evolução das despesas deste subsector Estado nada têm a ver com o que se passou até 2001.
Olhe: a despesa corrente primária, a tal que se subtraem os juros da dívida pública, cresceu 5,5% - acima, é verdade, da despesa corrente, que cresceu 4%; no vosso tempo, na vossa governação, crescia a 8% e a 9% ao ano, o que, isso, sim, era claramente insustentável.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, terminou o tempo de que dispunha. Conclua, por favor.

O Orador: - Termino imediatamente, Sr.ª Presidente.
Além de tudo o mais, houve uma variável, que diz respeito à segurança social e à Caixa Geral de Aposentações, a qual teve, claramente, uma evolução acima das outras. Foi a maior variação que houve neste subsector Estado e leva-nos para um debate que tem a ver com a sustentabilidade da segurança social no futuro. Daí que o nosso programa eleitoral contemple medidas nesse campo.
Se o Sr. Secretário de Estado do Orçamento pudesse esclarecer o relatório que foi ontem divulgado e o seu peso no sector público administrativo, ficar-lhe-ia muito agradecido.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas esse é o tema desta Comissão Permanente?!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - O Sr. Secretário de Estado responderá no fim ao conjunto dos pedidos de esclarecimento, pelo que dou a palavra ao Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins.

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, vamos discutir o que está, de facto, sobre a mesa mas terei muito gosto em esclarecer o Sr. Deputado Miguel Frasquilho, designadamente pelo facto de não ter ouvido…

O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): - Ouvi muito bem!

O Orador: - … o que o Presidente do meu grupo parlamentar aqui referiu, sendo certo que ele distinguiu muito bem o sector Estado e o sector público administrativo.
Sr. Secretário de Estado do Orçamento, ouvimos com muita atenção e interesse a intervenção que aqui nos trouxe. Infelizmente, não temos oportunidade de ter aqui o Sr. Ministro, embora esta questão seja suficientemente importante, como já foi dito.
A primeira nota que quero deixar é a de que não pode haver quaisquer espécie de dúvidas: as regras de disciplina orçamental e financeira são essenciais e este Parlamento não pode deixar de as assumir com muita clareza.
Segunda nota: fala-se muitas vezes em pacto mas não há qualquer pacto. O Sr. Theo Waigel, em 1997, propôs que houvesse um pacto mas esse pacto foi rejeitado por todos os seus parceiros no Conselho ECOFIN, uma vez que, como sabem, se fosse um pacto tinha uma força semelhante à dos tratados. Portanto, o que estamos a discutir é a revisão de dois regulamentos, como o Sr. Secretário de Estado aqui muito bem referiu, e não estamos a discutir a questão dos tratados.
A terceira nota é a seguinte: tivemos oportunidade de, numa iniciativa do Parlamento, ouvir aqui, há alguns meses, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais tratar de um tema extraordinariamente interessante, que é a perversidade da aplicação dos mecanismos subjacentes à lógica dos défices excessivos, designadamente incentivando a opacidade e não a transparência e também incentivando encargos contraproducentes e negativos para as gerações futuras.
Postas estas notas, coloco ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento duas questões, a primeira das quais vai no sentido de lhe pedir que nos confirme que sobre a mesa, na proposta das instâncias comunitárias - Comissão e Conselho ECOFIN -, temos a necessidade de um reforço das medidas de carácter preventivo e de incentivo a uma organização anticíclica e plurianual dos Orçamentos e uma maior ponderação

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da dívida pública. Penso que estes são os pontos que estão já sobre a mesa.
Mas importa, neste momento, referir o seguinte: em países como Portugal, que são países da coesão, países que têm de recuperar do atraso económico e social, há determinados investimentos que têm a ver, designadamente, com a Estratégia de Lisboa e com a economia do conhecimento e da inovação. O que pergunto, Sr. Secretário de Estado, é como é que o Governo português, o actual Governo, encara esta questão, isto é, o tratamento especial de investimentos, no que se refere à economia do conhecimento e à concretização da Estratégia de Lisboa.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado do Orçamento, independentemente das explicações que deu é absolutamente irrecusável que não esquecemos que hoje o País ficou a saber que o défice orçamental, em 2004, foi de 5,3% e, se não houver correcções de última hora, trata-se de um défice ainda mais agravado do que aquele que se verificou no ano transacto.
Esse anúncio público, Sr. Secretário de Estado, não surpreendeu ninguém. Ninguém ficou surpreendido, a não ser, eventualmente, o Governo. A única coisa que pode ter surpreendido foi a forma imediata e, digamos, pouco simpática como o Primeiro-Ministro tentou "sacudir a água do capote"…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

O Orador: - … e procurou logo, de imediato, atribuir as causas do agravamento do défice, em 2004, às decisões de Durão Barroso em 2003.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - É um gesto surpreendente, este, sim, mas é também, um pouco, a imagem de marca desta maioria e deste Governo.
O anúncio do agravamento do défice, Sr. Secretário de Estado, confirma, certamente, a incapacidade do Governo em controlar as contas públicas mas confirma, sobretudo, de uma forma especial, que os valores do défice e do seu agravamento são, eles próprios, consequência da submissão plena às condicionantes impostas pelo Pacto de Estabilidade.
Em vez de fazer como a França e a Alemanha, Portugal e os seus sucessivos governos, e não apenas os dois últimos, preferiram, desde logo e à partida, a submissão ao Pacto de Estabilidade e Crescimento. As consequências aí estão, nos défices crescentes sucessivos.
Sr. Secretário de Estado, hoje, está na ordem do dia a alteração do PEC, resta saber como, com que orientações e conteúdo. É que podem estar na calha alterações apenas de fachada e que deixem, por exemplo, de fora a isenção absolutamente irrecusável de certas despesas de investimento que têm deixado contar para o PEC.
Este Governo, Sr. Secretário de Estado, e vou colocar-lhe uma questão política - enfim, espero que esteja em condições de me responder -, é um Governo de gestão, não podemos esquecê-lo, mas pode e deve, certamente, participar legitimamente nas negociações de alteração do PEC; não pode, porém, quanto a nós, ter margem de manobra para, em matéria fundamental como esta, obrigar Portugal, os portugueses e o seu futuro. E esta é a questão central do debate de hoje!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O Presidente Jorge Sampaio ainda não pode dissolver a União Europeia! Graças a Deus!

O Orador: - Importa saber se o Governo tenciona ou não fechar os dossiers e se tenciona ou não aprovar, em definitivo, qualquer base de princípios, seja ela qual for, para alteração do PEC. Em caso afirmativo, Sr. Secretário de Estado, com que legitimidade é que o faz? Com quem terá acertado, se é que acertou, com quem terá combinado previamente, se é que combinou, essa possibilidade de, apesar de ser um Governo de gestão, aprovar os termos de uma alteração do PEC? É que o que está sobre a mesa é de tal forma importante que o País precisa saber se houve alguma negociação alargada prévia sobre os termos da revisão do PEC e em que sentido é que foi esse acordo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

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A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado do Orçamento, devo dizer que não deixo de achar uma certa graça àquela que foi a primeira intervenção do Deputado Francisco Louçã - ainda moderada, pois está, certamente, a guardar a "artilharia pesada" mais para a frente -, nomeadamente quando disse que o Pacto de Estabilidade foi a causa da crise europeia. Afirmou-o aqui, na sua intervenção, sem qualquer dúvida.
Ora, que me conste, Portugal é Europa. No entanto, para o Deputado Francisco Louçã, em Portugal, durante toda esta Legislatura, a culpa nunca foi da conjuntura internacional, a culpa nunca foi do Pacto mas, sim, do Governo. Isto demonstra bem aquilo que, politicamente, motiva o Deputado Francisco Louçã sempre que fala do Governo ou do seu desempenho. De resto, o Dr. Francisco Louçã tem afirmado, repetidamente, que o Pacto deveria ser violado e deveria ser violado em Portugal, desde logo pondo em causa aquela que é uma velha máxima latina que distingue as pessoas de bem, a pacta sunt servanda - os pactos são para cumprir -, e que, ao que parece, não quer que faça doutrina em Portugal nos tempos mais modernos.
Por outro lado, critica fortemente o Governo - e já o fez repetidas vezes - quando, no seu entendimento, o défice não foi, afinal, controlado abaixo dos 3%.
Bom, é outra coisa que também não joga: o Dr. Francisco Louçã não pode acusar o Governo de, por um lado, no seu entendimento, manter a obsessão do Pacto e do controlo do défice abaixo dos 3% e, por outro lado, quando no seu entendimento afinal isso só se deve a receitas extraordinárias e o défice não está controlado abaixo dos 3%, cometer um crime de lesa-pátria.
Afinal, o que é que o Dr. Francisco Louçã quer: que o Pacto, porventura, possa ser violado e o défice mantido acima dos 3% ou, quando lhe convém, exige que se contenha abaixo dos 3%?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É um facto que, certamente, o Dr. Francisco Louçã terá de explicar, mas que não joga, porque na política as coisas poderão funcionar assim, mas nas razões de Estado essa não pode ser uma argumentação e tem de haver, com toda a certeza, algum fio condutor quanto a um critério fundamental como este quando se trata de manter as contas públicas em ordem.
O Dr. Francisco Louçã (e quando me refiro ao Dr. Francisco Louçã é porque foi quem motivou o debate de hoje) não percebe que a necessidade de se controlar o défice preferencialmente abaixo dos 3% não se deve a uma mera imposição pactuada, mas à necessidade de, pelo controlo do défice, termos um instrumento fundamental para o próprio desenvolvimento do País. Contas públicas que não acautelem este rigor, que não tenham preocupações com o controlo do défice, certamente não permitirão o desenvolvimento que todos queremos para o País.
Neste ponto, devemos estar à-vontade, porque este Pacto de Estabilidade e Crescimento não foi, sequer, negociado pelo Governo da maioria. Foi negociado por um governo do Partido Socialista que, curiosamente, aceitou tudo aquilo que de impositivo consta desse Pacto, o violou, permitiu que fosse instaurado a Portugal o primeiro processo pela União Europeia, mas que agora, pela voz do Dr. Guilherme d'Oliveira Martins, parece querer dizer que, afinal, a culpa de tudo isto é do Governo da maioria.

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Eu não disso isso!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Vou terminar, Sr.ª Presidente.
Reconhecemos que, ao nível da flexibilidade do Pacto, algo tem de ser feito, quanto mais não seja pela conjuntura internacional desfavorável que, em relação a alguns países, incluindo os mais desenvolvidos, torna difícil de o comportar devido à sua rigidez.
No entanto, as notícias mais recentes dão-nos conta que o Dr. Bagão Félix "considerou que as propostas avançadas pelo Chanceler alemão Gerhard Schröder sobre a necessidade de uma maior flexibilização do Pacto de Estabilidade e Crescimento vão no bom sentido." Bagão Félix falava à entrada de uma reunião dos Ministros das Finanças da ECOFIN, onde a questão está a ser discutida. E prevê-se, de acordo com a mesma notícia, uma renegociação do Pacto com efeitos a partir de 22 e 23 de Março.
Nesse sentido, Sr. Secretário de Estado do Orçamento, gostaria que precisasse ainda mais, face ao que disse no início, o que é que o País pode esperar no que se refere à posição portuguesa para negociação do Pacto e o que é que a Europa, porventura, estará em condições de aceitar para efeitos dessa negociação.

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Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder ao conjunto de questões levantadas, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Sr.ª Presidente, quanto à primeira questão, sobre a informação que hoje foi divulgada no Boletim da Direcção-Geral do Orçamento, é sabido que a informação que o boletim da DGO incorpora é sobre o subsector Estado numa óptica de caixa.
Em relação ao deficit do subsector Estado numa óptica de caixa em 2004, para fazermos um exercício tecnicamente honesto, parece-me que terá de ter em conta que as receitas extraordinárias em 2004 não afectam o subsector Estado mas, sim, o subsector dos Serviços e Fundos Autónomos - isto numa óptica de contabilidade pública, porque numa óptica de contas nacionais a Caixa Geral de Aposentações pertence à segurança social.
Assim sendo, para se fazer um exercício tecnicamente honesto, dever-se-ia ver em 2003 qual foi o montante de receitas extraordinárias que afectou as receitas desse subsector. E, então, chegar-se-ia à conclusão de que, em 2003, se incluiu a titularização de créditos fiscais, no montante de 1458 milhões de euros, e o montante significativo da transferência do fundo de pensões dos CTT, que parcialmente passou pelo sector Estado, em 258 milhões de euros. Esses dois montantes deveriam, se quiséssemos fazer uma comparação tecnicamente consistente, ser excluídos de 2003.
Igualmente deveria ser tido em conta que em 2004, para além do facto de a receita do Estado não ter receitas extraordinárias, tem, pelo contrário, despesas relacionadas com o Orçamento rectificativo. As despesas que o Orçamento do Estado tem, relacionadas com o Orçamento rectificativo, são transferências para outros subsectores. Essas transferências, que são para o subsector dos Serviços e Fundos Autónomos, para o Serviço Nacional de Saúde e para a administração local e regional, têm, obviamente, efeito neutral no deficit do sector das administrações públicas.
Nesse sentido, não se pode tirar nenhuma conclusão sobre o cumprimento, ou não, dos critérios a que Portugal está obrigado, a partir daqueles dados. Aquilo que podemos concluir é que, corrigido o deficit do subsector Estado de forma a ser comparável, ele apresenta um valor nominal ligeiramente inferior a 2003. Isto é certo e seguro. Também se pode afirmar que estes dados que foram apresentados são compatíveis com o cumprimento do deficit das administrações públicas inferior a 3%. Obviamente que, para se ter a certeza absoluta disto, faltam os dados finais do subsector dos Serviços e Fundos Autónomos, da administração local e regional e da segurança social.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Neste momento, não sabe! Não pode assegurar!

O Orador: - Não posso assegurar a 100%.
Respondi, assim, à questão colocada pelo Sr. Deputado Miguel Frasquilho.
Quanto à questão que o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins colocou, sobre o tratamento especial possível das despesas de investimento, em particular das despesas relacionadas com a Estratégia de Lisboa, houve, de facto, alguns países que fizeram a proposta de exclusão das despesas orçamentais de rubricas de investimento. É óbvio que é muito difícil fazer uma proposta no sentido de excluir o total das despesas que estariam relacionadas com a Estratégia de Lisboa, porque o universo não é rigorosamente definível.
Neste sentido, aquilo que for considerado tem de ser referenciado de forma absoluta, de tal maneira que o tratamento dos países seja idêntico e que a revisão das regras e dos procedimentos não possa gerar tratamento diferenciado dos países de acordo com o seu poder nas instâncias comunitárias - essa seria a pior das consequências.

O Sr. José Magalhães (PS): - Portanto, a posição do Governo português é…

O Orador: - Em qualquer caso e como referi, uma das possibilidades é, na definição dos motivos que podem gerar desvios na trajectória de ajustamento para o tal objectivo orçamental de médio prazo, considerar o esforço que os países estão a fazer no sentido de reformas em sectores essenciais, quer no das pensões quer noutros. É uma das hipóteses.
Das questões que o Sr. Deputado Honório Novo me colocou, se me permite, considero relevantes as que vão no sentido de saber se o Governo está a fechar dossiers e se aprovou qualquer base de alteração do Pacto de Estabilidade e Crescimento. Neste momento, as negociações ainda estão a decorrer nas várias instâncias, quer no Comité Económico e Social, quer no Comité Económico e Financeiro, quer no próprio

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ECOFIN.
No calendário existente…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Secretário de Estado, o seu tempo terminou. Por favor conclua.

O Orador: - Peço desculpa, Sr.ª Presidente.
Como dizia, o Governo não aprovou, nem sequer estava em condições de o fazer, pois isso saía fora dos calendários.
Quanto à questão que o Sr. Deputado me colocou…

Vozes do PS: - Deixe estar!

O Orador: - Então, terminei. Muito obrigado.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Finalmente, depois de muita indignação e, acrescente-se, muita luta, a alteração do Pacto de Estabilidade e Crescimento está na ordem do dia. Só que uma coisa é aceitar a ideia, outra coisa bem diferente é o conteúdo, o sentido e as consequências das alterações que têm sido anunciadas.
O País não esquece que foi a submissão ao Pacto de Estabilidade e Crescimento, o conformismo de sucessivos governos perante este garrote orçamental, a cega obsessão pela contenção do défice orçamental abaixo dos 3% do PIB que geraram e agravaram a grave crise económica e social que Portugal atravessa.
Foi a obsessão pelo cumprimento dos ditames do PEC e o subsequente "discurso da tanga" que fizeram Portugal entrar em recessão.
Foi a submissão governamental perante as imposições do PEC que determinou e provocou os cortes no investimento público, o que provocou a retracção do investimento privado em Portugal.
Foi a cega obediência governamental a este espartilho orçamental que provocou o disparar do desemprego e o aumento inaceitável da pobreza e da exclusão social em Portugal.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O que veio a lume, Sr. Presidente, Srs. Deputados, e que o Sr. Secretário de Estado acaba de caracterizar, sobre o conteúdo da auto-designada flexibilização e alteração do Pacto de Estabilidade e Crescimento não nos deixa tranquilos e assume contornos bem preocupantes porque deixa quase tudo na mesma.
Segundo se sabe - e não foi aqui desmentido -, os investimentos públicos na formação e na qualificação continuarão a contar para a determinação do défice público. Outro tanto irá suceder com os investimentos reprodutivos e com a totalidade dos investimentos, sejam de que natureza foram, em áreas sociais, na saúde ou na educação.
Tudo o que de essencial poderia interessar ao desenvolvimento e ao crescimento rápido da economia em Portugal parece estar de fora das anunciadas alterações.
Portugal precisa de dar prioridade ao crescimento. Precisa de aumentar, modernizar e diversificar a sua capacidade produtiva, precisa de aumentar o rendimento das famílias e o poder de compra dos trabalhadores, precisa de dinamizar o consumo interno e as exportações, precisa de diminuir o desemprego, de aumentar receitas fiscais e, em consequência, Sr. Secretário de Estado - e penso que muita gente não entende isto - equilibrar as contas públicas.
Portugal precisa de investir na educação, na qualificação e formação profissionais, condições básicas para que possamos ter, de facto, acréscimos de produtividade.
Por tudo isto, Portugal não deve, nem pode, aceitar que todos os investimentos e despesas daquela natureza continuem a ser contabilizados para o défice orçamental.
Portugal não pode aceitar uma revisão mentirosa do Pacto de Estabilidade e Crescimento, com alterações de fachada, com revisões feitas à medida dos interesses dos países mais ricos. Se tal suceder, Portugal vai certamente continuar condenado a permanecer na cauda da Europa, sem condições para crescer, desenvolver-se e progredir em termos económicos, sociais e culturais.
Portugal não pode subscrever alterações do PEC que não contemplem a isenção dos investimentos

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reprodutivos, sociais e de qualificação de activos no cálculo do défice orçamental.
Este Governo, de gestão, como é sabido, cuja incompetência ou, melhor, incapacidade para controlar as contas públicas foi hoje publicamente confirmada com o anúncio de um défice bem superior a 5% em 2004, não pode nem tem legitimidade para condicionar a posição de Portugal no processo de revisão do PEC.
Um Governo que passou a vida no "discurso da tanga" e a olhar obsessivamente para o controlo do défice não pode, agora em gestão, voltar a prejudicar e a condicionar a posição de Portugal no futuro.
Por isso, é fundamental aproveitar este debate para que os diferentes partidos se pronunciem claramente sobre o processo de revisão em curso, para que expressem claramente os contornos das suas posições. Para que não restem dúvidas! Para que o País conheça bem todas as posições e possa avaliar as respectivas consequências. Aqui fica feito o desafio em nome do PCP.
A posição do PCP quanto à revisão do PEC continua bem clara e é inequívoca, porque estamos convictos que ela é a que melhor defende quer os interesses dos trabalhadores e do povo português quer também os interesses do desenvolvimento do País como nação independente e autónoma.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: A aprovação do denominado Pacto de Estabilidade e Crescimento decorreu da criação do euro e destinou-se também a tranquilizar os Estados possuidores de moedas fortes face à integração de várias moedas consideradas mais vulneráveis na mesma zona monetária europeia.
Entretanto, ultrapassada a fase inicial, verificou-se uma sistemática valorização do euro face ao dólar, aliás com consequências negativas nas exportações europeias, e o reforço do euro como moeda de reserva de muitos Estados, nomeadamente de outros continentes, bem como a sua mais frequente utilização em transacções internacionais, onde foi ganhando peso face ao dólar americano, para não falar do iene.
Sr.ª Presidente, a alteração da conjuntura económica europeia e internacional veio evidenciar alguns dos pecados originais do Pacto, o qual, na sua fase inicial, já tinha privilegiado o vector estabilidade face ao crescimento económico. Tornou-se, então, no que Sousa Franco chamou um "pacto de instabilidade", ou, na terminologia de Romano Prodi, um "pacto estúpido", ou, pelo menos, com uma leitura estúpida por parte de diversos governantes de vários Estados europeus.
Como aliás afirmei aliás em Janeiro de 2004 no II Congresso da Associação Portuguesa de Ciência Politica, "O Pacto de Estabilidade não equacionou uma estratégia global de desenvolvimento económico articulada com a solidariedade social, o que seria exigido, em rigor, por uma necessidade de coerência mínima com o projecto europeu".
Como lembra hoje mesmo Guilherme d'Oliveira Martins no Diário Económico, "desde cedo se percebeu que havia demasiada rigidez no instrumento. Dava-se uma importância quase exclusiva ao défice. Subalternizava-se a dívida pública. Esquecia-se a regra de ouro das finanças públicas".
Srs. Deputados, Caros Colegas, em Janeiro de 2003, o PS apresentou nesta Assembleia uma proposta de resolução relativa à necessária revisão do texto do impropriamente chamado Pacto de Estabilidade e Crescimento. Após a fusão dessa proposta de resolução com outra (chegando a 10 pontos originários do PS e um da maioria governamental, hoje cessante), o Plenário desta Assembleia aprovou essa resolução por esmagadora maioria e cinco dos pontos por unanimidade. Nela se afirmava, nomeadamente, que Portugal "deve empenhar-se na reavaliação do Pacto de Estabilidade e Crescimento de modo que este instrumento não comprometa, antes beneficie, o crescimento e a coesão económica e social da União Europeia".
Sr.ª Presidente, claro que subsiste, para além da revisão do chamado Pacto, um problema institucional e político na articulação das políticas económicas com a política monetária. É o que se chama o problema da governação económica europeia ou, pelo menos, de uma coordenação mais eficaz das políticas económicas articuladas com a política monetária. Neste contexto assume particular relevo a necessidade de um reforço da articulação do ECOFIN com a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu, participando, ainda, as instituições Conselho e Parlamento Europeus, bem como os Parlamentos nacionais.
Escreve também hoje no Diário Económico o Dr. Guilherme d'Oliveira Martins que "Ainda falta, no entanto, a consideração da coordenação de políticas orçamentais - para que a economia europeia não perca competitividade e para que a Estratégia de Lisboa não seja palavra vã."
Srs. Deputados, em qualquer caso, e com urgência, impõe-se a revisão do impropriamente denominado Pacto. E o Governo português deixou cair a oportunidade de ouro quando, há dois anos, há 24 meses,

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meteu debaixo da mesa, sonegou das instituições europeias, a resolução da Assembleia da República relativa à revisão do Pacto.
Sr.ª Presidente, neste mesmo domínio, no princípio de 2004, a cessante maioria parlamentar teve um comportamento que impediu o estabelecimento de qualquer consenso parlamentar.
Mas, Srs. Deputados, hoje em dia o que se impõe é ver em que condições se quer rever o Pacto de Estabilidade para que seja também de crescimento, para que se articule eficazmente com a Estratégia de Lisboa.
A nossa posição é bem clara.
Nós defendemos "uma participação activa no processo de revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento, por forma a transformá-lo num instrumento, não apenas de estabilidade mas também de crescimento e coesão europeia".
Pretendemos ainda, Sr.ª Presidente, que se "valorize devidamente a sustentabilidade das finanças públicas no longo prazo", que "o Pacto passe a ter a flexibilidade necessária para acomodar as diferentes fases do ciclo,…" - o que este Pacto, no seu texto, não contempla - "… deixando os seus limites de ser observados em termos apenas pontuais" e que no novo texto se "tome em conta a agenda europeia de crescimento, com base na inovação e na qualificação dos recursos humanos, a qual irá requerer um grande esforço de investimento, especialmente às economias com maiores défices nestes sectores".
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O que nós queremos efectivamente é que, no quadro da "revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento" se desenvolva uma "atitude pró-activa que promova uma melhor combinação de crescimento, modernização e estabilidade, valorizando as especificidades nacionais".
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Como afirmei em Novembro último, em representação desta Assembleia, na reunião da Comissão de Orçamento do Parlamento Europeu com as 25 comissões especializadas neste domínio de toda a União Europeia, nós "queremos uma moeda europeia forte, uma zona monetária do euro estável, mas também uma Europa que cresça economicamente, que se modernize de forma acelerada e que seja socialmente solidária".
É isso que o País exige de nós. É para isso que a construção europeia conta connosco.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: As regras orçamentais da União Europeia estão definidas num documento que hoje todos reconhecem ser profundamente desadequado e que, como já aqui foi referido, foi intitulado por um presidente da Comissão Europeia como um documento "estúpido". Penso que isto é perfeitamente clarificador do conteúdo deste documento.
Há algum tempo, muitos achariam que não valeria a pena entrarmos nesta discussão relativamente à revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento, enquanto outros já andavam a defender veementemente a necessidade desta revisão.
Hoje, parece que há nesta Câmara uma unanimidade relativamente à necessidade de revisão deste instrumento. Um instrumento que não tem em conta a realidade de cada economia, o estado de desenvolvimento de cada país da União Europeia, não tem em conta os ciclos económicos e, consequentemente, não tem em conta a realidade, sendo aplicado cegamente a situações bastante diferentes dos diversos Estados.
Um documento destes só tem um destino, traçado pela própria realidade: ser violado. Ser violado ou declaradamente ou com operações de maquilhagem, à portuguesa, por exemplo como a da transferência do Fundo de Pensões da Caixa Geral de Depósitos.
O que também não é tolerável na nossa perspectiva é que se evidencie aqui aquele que é o modelo de construção europeia a que assistimos: a Europa com uma realidade diferente para os grandes e para os pequenos, sendo que os grandes não são penalizados pela violação do Pacto de Estabilidade e Crescimento e os pequenos são-no permanentemente, ou seja, uma União de Estados claramente desiguais.
Por outro lado, é importante percebermos - o que, neste momento, é uma incógnita para nós - o que resultará desta revisão. Manter-se-á o limite do défice em 3%, que ninguém percebe muito bem por que é de 3%? Haverá ou não despesas de investimento que, de acordo com as necessidades de cada Estado, não serão contabilizadas para o défice? Ter-se-á ou não em conta as conjunturas económicas? Enfim, o que resultará desta revisão?
Era, pois, fundamental percebermos o estado das negociações e, fundamentalmente, a veemência das propostas do Estado português nesta matéria. E os portugueses lembram-se muito bem que o Pacto de Estabilidade e Crescimento era o grande fundamento para os sacrifícios penosos que lhes foram pedidos e

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para a estagnação do investimento público, em Portugal. Até que chegámos, depois de todos estes pedidos, a esta altura, em que, afinal, todos estes sacrifícios resultaram em 5,3% de défice.
O Governo português, conhecendo a realidade portuguesa e aquilo que causou em Portugal depois das políticas que levou a cabo, a pretexto do cumprimento do Pacto de Estabilidade e Crescimento, deveria, a partir desse conhecimento, ser uma voz profundamente veemente na União Europeia relativamente aos efeitos perniciosos para o próprio desenvolvimento do Pacto de Estabilidade e Crescimento.
Termino esta intervenção, referindo o seguinte: considerando que era fundamental esta posição veemente do Estado português, não acredito que ela apareça. Na verdade, estamos a falar de partidos - e, neste caso dos maiores partidos com representação parlamentar - totalmente submissos a este modelo de União Europeia e que, devido a essa total submissão, perdem completamente a sua força e a sua capacidade de negociação.
Temos um país que, pela sua visão da União Europeia, está automaticamente fragilizado nas negociações, com a sua total submissão a este modelo de Estados grandes e Estados pequenos.
Assim sendo, na perspectiva de Os Verdes, não se coloca aqui, relativamente à força de negociação do Governo português, o facto de estar ou não em gestão. De facto, é a sua posição quanto a este modelo de União Europeia que o fragiliza completamente nestas negociações, o que, em nossa opinião, é lamentável.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado do Orçamento, ouvi com atenção as suas explicações e quero registar que elas não foram suficientemente esclarecedoras sobre aquilo que realmente importa, ou seja, sobre qual a proposta que o Governo tem apresentado nas discussões preparatórias e qual a forma como tem reagido às outras propostas.
Como deve ter reparado, o Partido Popular saltou à liça, referindo: "há aqui uma nota, dizendo que Bagão Félix, Ministro das Finanças, veio apoiar a proposta de Schröder, o Chanceler alemão". No entanto, não foi isso que nos esclareceu, pelo que importa ter algum detalhe sobre essa matéria.
Registo também que, como no ponto político anterior, o PSD e o PP não intervêm neste debate, excepto fazendo perguntas de circunstância ao Sr. Secretário de Estado. Presumo que os Srs. Deputados vieram cá para conversar uns com os outros, o que é certamente uma coisa muito agradável e que exercem com tanta mestria.
Até agora, ficaram esclarecidos dois aspectos e ficaram em dúvida alguns outros. O primeiro é que há uma boa razão para procurarmos contas certas. A explicação do Sr. Secretário de Estado e do Sr. Deputado Miguel Frasquilho a respeito do deslizar das contas não é relevante, porque é certo que a Direcção-Geral do Orçamento publicou contas do subsector Estado e é certo que essas contas revelam um deslizar de 10,5% no défice do subsector Estado.

O Sr. Honório Novo (PCP): - A mais!

O Orador: - Tanto é assim que a notícia do dia é que o Sr. Secretário de Estado, perante estes números, diz que não sabe se pode garantir que, apesar dos resultados das receitas extraordinárias, o défice ficou ou não nos 3%. Foi exactamente isso que nos disse, ou seja, que não pode garantir que tenha ficado nos 3%.
E é isso que suscita o problema das regras. É que todos temos insistido, embora com lógicas diferentes, que são necessárias regras; o problema é se as regras conduzem à insídia, à confusão, à cosmética orçamental ou, pelo contrário, a uma convergência da União Europeia. O resultado, até agora, é que essa convergência não tem acontecido.
O Sr. Secretário de Estado falou-nos de uma regra de médio prazo: saldo orçamental zero ou positivo. Veja bem as consequências dramáticas dessa regra: se o saldo orçamental for zero ou positivo a longo prazo, quer dizer que, a longo prazo, a dívida pública é zero.
Ou seja, nos mercados financeiros só existe o stock das acções privadas e não há regulação da dívida pública. Pode pensar bem o que pode acontecer aos fundos de pensões ou à capitalização dos fundos públicos num mercado com essas características. Nenhum aluno do Dr. Frasquilho, do 1.º ano da Faculdade de Economia, pode jamais aceitar que um mercado financeiro tenha esta característica. Nunca tal aconteceu na história e nunca tal pode acontecer se o Estado e a União Europeia vão ter alguma regulação.

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O Sr. Secretário de Estado não quis dizer-nos, mas, na minha opinião, o que um bom ministro das finanças tinha de dizer no ECOFIN é que o rácio da dívida pública é o decisivo e que é a evolução do rácio da dívida pública em relação à evolução do ciclo económico e das tendências de fundo da evolução da economia que é o critério determinante para escolher se pode haver ou não uma folga maior de despesa orçamental.
Em segundo lugar, deveria dizer que as circunstâncias transitórias têm de ser bem clarificadas e o senhor não o fez. Penso que um bom ministro das finanças teria sempre de dizer que o PIB decresce ou que a evolução do produto tem um diferencial de mais de 1% em relação à evolução da média europeia.
É assim que podemos ter uma visão que permite acentuar a convergência e apostar nas despesas qualificantes em vez de permitir que a União Europeia se regionalize em espaços económicos de divergência, como aconteceu, porque essa é a grande consequência das más regras: cosmética orçamental, falta de credibilidade da política orçamental e da política europeia e, em consequência, agravamento da recessão e diminuição dos instrumentos para o combate à recessão.
Creio, por isso, que este debate é muito importante.
O silêncio do PSD e do PP é esclarecedor, mas verdadeiramente não se poderia esperar outra coisa depois destes três anos do Governo.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, usando de tempo que lhe foi cedido pelo PSD.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: No final deste debate interessante há que reafirmar que Portugal, indubitavelmente, precisa de uma política orçamental rigorosa, séria e sem desnorte. Essa é uma necessidade absoluta.
Necessita igualmente, no espaço em que se insere, de normas orçamentais que sejam simples, que sejam transparentes e que tenham uma aplicação igualitária em relação aos outros Estados. Na discussão que tem decorrido, e que continuará a decorrer, o Governo tudo tem feito no sentido de defender aquilo que pensamos ser os princípios básicos para Portugal.
Em qualquer caso, e na minha opinião, Portugal beneficia sempre de uma situação orçamental sã. O discurso de querer mais despesa, de querer menos défice é o discurso de que Portugal já não pode esperar resultados. Isto é certo, é seguro!
Neste sentido, tudo o que, em termos de normas orçamentais comunitárias, permita que a situação económica do País seja tida em conta de forma séria e de forma realista,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … tudo o que permitir, em casos de ultrapassagem dos valores de referência, um espaço temporal mais alargado para o ajustamento vai no bom sentido, porque permite políticas orçamentais sérias e consistentes.
Nas discussões que têm decorrido, o Governo tudo fez para que isso fosse assim. Tudo o que melhorar a governabilidade do Pacto, no sentido de melhorarem as estatísticas e de as instituições cooperarem de forma mais fácil, é bom para o País.
O Governo tudo fez no sentido de defender essas posições. Em relação a este processo, penso, pois, que o Governo pode sair de consciência absolutamente tranquila, dado ter feito o melhor que sabia e podia e com a consciência de que nada está totalmente fechado.
Quanto a alguns pormenores que aqui foram referidos, desde logo gostaria de, veementemente, rebater uma afirmação. Eu disse que o valor do défice do Estado é inteiramente compatível com o cumprimento das obrigações em termos de défice para com a União. Esta é a minha perspectiva com os dados de que disponho hoje. Não vale, pois, a pena fazer-se demagogia sobre o que eu disse.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Acrescentou que não tinha a certeza!

O Orador: - Meu Deus, por ser honesto… A priori, cem por cento de certeza é coisa que só Deus tem.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Por favor, não meta Deus nisto!

O Orador: - Um último pormenor: eu disse que o objectivo orçamental de médio prazo que a União tem considerado até agora nas suas análises é o de saldo tendencialmente nulo ou em excedente. Repito: este é o objectivo de médio prazo que a União tem utilizado nas suas análises. Tentei dizer que outros

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objectivos de médio prazo estão em discussão, como, por exemplo, determinado objectivo para o rácio da dívida. Mas, nesse caso, a discussão que se coloca é se nessa dívida devem ser consideradas ou não as responsabilidades implícitas.
A minha opinião pessoal é a de que se trata de uma matéria difícil, porque as responsabilidades implícitas são, por exemplo, as responsabilidades de pagamento de pensões que o Estado tem hoje.
Outro aspecto tecnicamente complicado é se, por acaso, esse objectivo fosse único para todos os países. Obviamente que nos países que têm infra-estruturas menos desenvolvidas a produtividade marginal do capital é maior, logo a taxa de rentabilidade social é superior, logo pode fazer todo o sentido o Estado endividar-se desde que a taxa da dívida seja inferior à taxa de rentabilidade.
Portanto, é admissível, em termos puramente económicos, que os países que têm um ponto de partida em termos de infra-estruturas ou de stock de capital tenham como objectivo um rácio ou um stock de dívida ligeiramente superior em relação à média. É isto que está em discussão, mas talvez na síntese que fiz não tenha sido suficientemente explícito.
Em conclusão, o Governo tudo fez no sentido de defender os interesses do País. O País é defendido desde que tenha finanças públicas sãs, desde que, a prazo, apresente uma posição de sustentabilidade financeira e desde que haja seriedade e honestidade técnica neste tema.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero sublinhar que o PSD vai procurando corrigir as contas, vai variando a proporção das exportações no PIB num texto, depois substitui novamente o texto, volta para trás, enfim… Aliás, o PSD está numa fase em que só discute o passado e não apresenta nada para o futuro. Não está preparado para ir para o Governo, está preparado para fazer a história do Governo que termina.

Protestos do Deputado do PSD Luís Marques Guedes.

O Sr. Deputado Marques Guedes está muito excitado desde que foi "ressuscitado" como Deputado!

Protestos do PSD.

Nem eu me consigo ouvir com este grasnar… Ou com este barulho, se preferirem.
Para concluir, queria dizer o seguinte: além de estar a discutir o passado e não a debater o futuro, o PSD nem sequer está a fazer força (o que todos devíamos fazer) para que o Governo se empenhe, no tempo que lhe resta - efectivamente, partiu com dois anos de atraso… -, no sentido de que Portugal e outros países não sejam prejudicados nesta negociação do Pacto de Estabilidade e Crescimento.
Também recuaram na proporção do investimento no PIB - não têm uma ideia do que vão fazer contra o PIB. E não são as habilidades do Dr. Mexia, na televisão, que resolvem o problema.
O PSD muda de programa todos os dias, expondo a sua volubilidade neste processo.

Aplausos do PS.

O Sr. Jorge Nuno Sá (PSD): - Não é verdade! Vou mandar-lhe uma cópia.

O Orador: - Desde que mande todos os dias!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Naturalmente, todos temos a noção da importância que tem, para o País e para a Europa, a questão do Pacto de Estabilidade e Crescimento e respectiva revisão.
A este propósito, queria recordar - tendo em conta, aliás, algumas das intervenções a que aqui assistimos hoje - a seguinte circunstância: Portugal, numa conjuntura favorável, não adoptou as medidas que devia em termos de estímulo à economia, de rigor nas contas públicas e de reformas estruturais.

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E pagámos um preço elevado por isso. Pagámos, designadamente, o preço do procedimento que a União Europeia levantou contra Portugal em função da actuação dos governos socialistas.
Um país que é o primeiro a entrar em incumprimento na União Europeia é um país fragilizado para negociar qualquer revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento. Todos compreendem facilmente esta circunstância.
Importava, pois, reabilitar o País perante a União Europeia, daí o esforço que foi feito nesse sentido, nos dois anos e meio de Governo da maioria PSD/CDS-PP. De tal forma que o processo foi efectivamente arquivado e Portugal restaurou a sua credibilidade.
Naturalmente, agora Portugal está nestas negociações de cabeça levantada, não está como um "cábula", que está reprovado e que, ainda por cima, se sente com legitimidade para discutir com os professores, não tendo estudado devidamente as suas lições. Portugal está, efectivamente, de cabeça levantada.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E ouvir aqui dizer, como se ouviu, que Portugal devia ter entrado em incumprimento de qualquer maneira, porque a Espanha, a Alemanha e a França também o fizeram…

O Sr. Honório Novo (PCP): - A França e a Alemanha são "professores" de quê?!

O Orador: - Meus amigos, como é natural, todos desejamos uma Europa igualitária, mas nenhum de nós ignora que o peso da Alemanha, o peso da França, como contribuintes ricos, é necessariamente diferente do peso de Portugal na União Europeia!!

O Sr. Honório Novo (PCP): - Então, podem fazer o que quiserem!?

O Orador: - Temos de ter esta humildade e este realismo, já para não falar na situação diferenciada da economia portuguesa e das suas fragilidades…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

O Orador: - … face às condições próprias da economia europeia, designadamente das economias alemã e francesa.
Há um aspecto que quero aqui assegurar e garantir. Independentemente de este ser um Governo de gestão, as reivindicações e os interesses de Portugal foram, e vão continuar a ser, defendidos no seio da União Europeia com todo o empenho. Não há, nestas circunstâncias, Governo menor face a negociações com o exterior!
A ideia de que este Governo deve apresentar-se de forma mais frágil, menos empenhada na União Europeia é um erro. Não o faremos, ainda que os senhores gritem que, também aí, estamos a violar as regras de um Governo de gestão.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, dou por concluído este debate, requerido pelo Grupo Parlamentar do BE, sobre a negociação do Pacto de Estabilidade e Crescimento.
Vamos proceder às votações agendadas para hoje.
Em primeiro lugar, vamos votar o projecto de resolução n.º 302/IX - Viagem do Presidente da República à República de Moçambique (Vice-Presidente da AR Manuel Alegre).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. José Magalhães (PS): - Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Magalhães (PS): - Para interpelar a Mesa, Sr.ª Presidente.

Vozes do PSD: - No meio das votações!?

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O Sr. José Magalhães (PS): - Precisamente, Srs. Deputados, porque se trata da votação de um voto, apresentado pelo Partido Socialista, relativo a abusos de poder por parte do Governo demitido, que deveria estar incluído na lista das votações agendadas para hoje.
Sr.ª Presidente, sei que os Srs. Deputados do PSD - e, suponho, do PP - apresentaram um requerimento de adiamento de apreciação e votação desse voto.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Extemporâneo?!

O Orador: - Sr.ª Presidente, cheguei a estabelecer diálogo sobre essa matéria com o Sr. Vice-Presidente que a precedeu, mas não chegámos a apurar o ponto de vista da Mesa sobre esta questão.
Como V. Ex.ª sabe, esta é uma reunião da Comissão Permanente e, portanto, o que o n.º 5 do artigo 79.º do Regimento prevê sobre o adiamento de votos de qualquer natureza é distinto. Ora, tendo em conta isso mesmo, na Conferência de Líderes, em que V. Ex.ª também esteve presente - julgo -, tivemos ocasião de estabelecer um consenso no sentido de que, até ao meio-dia de hoje,…

Vozes do PSD: - De ontem!

O Orador: - … pudessem ser apresentados votos de qualquer natureza. Foi o caso do apresentado pelo Grupo Parlamentar do PS.
Portanto, Sr.ª Presidente, consideramos que não há qualquer fundamento para que este voto não seja regularmente agendado para votação, como sempre tem ocorrido nas reuniões da Comissão Permanente.

O Sr. António José Seguro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Não me lembro de nenhum precedente de adiamento de votos apresentados em Comissão Permanente, porque todos sabemos que o adiamento da apreciação e votação deste voto significaria a sua votação depois de 20 de Fevereiro.
Gostaríamos, portanto, Sr.ª Presidente, que tivesse em consideração esta questão.

O Sr. António José Seguro (PS): - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, não estive na reunião da Conferência de Líderes e, portanto, não tenho memória pessoal daquilo que foi combinado sobre esta matéria.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr.ª Presidente, infelizmente, já é hoje o segundo incidente provocado pelo Partido Socialista, tentando tergiversar sobre o que foi acordado na Conferência de Líderes. O que foi acordado, e todos os Srs. Deputados sabem, foi que se um partido quisesse apresentar nesta reunião qualquer aspecto novo teria que o fazer até ontem à hora do almoço para justificar uma apreciação eventual em Conferência de Líderes ontem também.

Protestos do Deputado do PS António José Seguro.

Ora, até ontem, que nós saibamos, ninguém apresentou o que quer que fosse no Gabinete do Sr. Presidente e, portanto, é evidente que a apresentação e a distribuição hoje de uma proposta de voto por parte do Partido Socialista cai nas normas regimentais normais no sentido em que 10 Deputados podem requerer o adiamento dessa votação, e foi o aconteceu, Sr. Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr.ª Presidente, estamos a tratar de um procedimento regimental, mas creio que, com algum bom senso, poderíamos evitar perder muito tempo sobre esta questão.

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Orador: - Há obviamente uma maioria nesta Assembleia que quer recusar a crítica que é feita pelo voto do PS em relação ao Governo de gestão, e nós discutimos esta matéria.

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Parece-me um pouco esdrúxulo que se procure resolver o problema da votação, não no seu conteúdo mas num adiamento para uma próxima reunião que se sabe que não existe.
Portanto, admitindo que a questão regimental possa ser buscada nos arquivos da súmula, o fundamental é saber como é que as bancadas se pronunciam sobre esta matéria, e já o fizeram no debate.
Não compreendo a incomodidade da maioria, porque a votação política permitiria resolver o assunto de uma maneira muito simples e é preciso ter muito má consciência para querer evitá-lo.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, nós não nos queremos pronunciar sobre os aspectos formais,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Se não quer pronunciar-se sobre os aspectos formais não faz uma interpelação!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - São esses que estamos a discutir neste momento, Sr. Deputado.

O Orador: - Sei que a relevância dada aos aspectos formais tende a subvalorizar os aspectos políticos, mas a verdade é que, não tendo eu estado presente na Conferência de Líderes, como a Sr.ª Presidente, tendo a valorizar a substância do ponto de vista político.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - O Sr. Deputado dá-me licença?
Neste momento estamos a discutir aspectos de carácter regimental, portanto, as regras pelas quais nos regemos. O que está em questão é se essas regras apontam para que um determinado texto seja ou não discutido e votado nesta reunião. Portanto, vamos limitar-nos aos aspectos de carácter formal. Se não é sobre estas regras que V. Ex.ª deseja pronunciar-se, então, dou a palavra aos Srs. Deputados que desejem falar sobre elas.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães, presumo que sobre as regras.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sim, Sr.ª Presidente.
Não nos reconhecemos na interpretação dos factos ocorridos na Conferência de Líderes veiculada pelo Sr. Deputado Luís Marques Guedes. Realmente, ficou aventada a possibilidade de uma nova Conferência de Líderes ontem à tarde se o partidos quisessem agendar na ordem do dia outros temas. Daquilo que se trata aqui é de um voto e os votos, como V.ª Ex.ª sabe tão bem como todos nós, são inseridos na altura própria do período de antes da ordem do dia para serem discutidos e votados. Foi só isto. Sempre assim foi e sempre assim há-de ser.
Concluímos, Sr.ª Presidente, e atalho de imediato, que a maioria quer cobrir com o abuso de poder os abusos de poder do Governo.
O voto de protesto será aprovado nas urnas, Sr.ª Presidente!

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, a Mesa está aqui para garantir que não haja abusos de poder na interpretação e na aplicação das regras regimentais.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Como os Srs. Deputados sabem, foi apresentado um requerimento, ao abrigo do n.º 5 do artigo 79.º do Regimento, assinado por 10 Deputados, nos termos desse mesmo artigo, no sentido de que este voto de protesto não seja votado hoje, o que vale na ausência de regra em relação à Comissão Permanente no respectivo Regulamento. Todos estamos conscientes de que o Regulamento da Comissão Permanente não contém quaisquer regras sobre esta matéria, o que significa, de acordo com os seus próprios termos, que são aplicáveis as regras do Regimento.
Este requerimento, nos termos do artigo 79.º, n.º 5, apresentado por 10 Deputados, tem eficácia imediata, como também sabem, e, portanto, nessas condições não posso submeter o texto a votação. Trata-se simplesmente de aplicar as regras regimentais.
Tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro. É também sobre as regras regimentais?

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O Sr. António José Seguro (PS): - Sr.ª Presidente, nesse caso faria um pedido de interpelação à Mesa.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sobre as questões regimentais?

O Sr. António José Seguro (PS): - Sim, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Muito bem, faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr.ª Presidente, gostaria que me informasse sobre quando é que está prevista a próxima reunião em que este Parlamento se pode expressar sobre este voto que apresentámos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso não é regimental!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, como sabe, pode ou não haver uma nova reunião da Comissão Permanente. Aplicam-se as regras regimentais e as do Regulamento da Comissão Permanente. Neste momento ninguém lhe pode dizer quando e se haverá uma nova reunião da Comissão Permanente.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr.ª Presidente, se me dá licença, então posso interpretar as palavras da Sr.ª Presidente como havendo disponibilidade da Presidência da Assembleia da República para, daqui até ao dia 20 de Fevereiro, ocorrer uma nova reunião da Comissão Permanente, caso a Conferência de Líderes delibere nesse sentido.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, todos sabemos que a Mesa da Assembleia da República cumpre as regras do Regimento e do Regulamento, as quais têm disposições sobre em que termos é que pode eventualmente ser convocada uma nova reunião.
Vamos agora proceder à discussão e, se for caso disso, à apreciação de uma série de pareceres da Comissão de Ética.
Tem a palavra o Sr. Secretário da Mesa para proceder à leitura dos mesmos.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Srs. Deputados, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer sobre a retoma de mandato, nos termos do artigo 6.º, n.os 1 e 2, do Estatuto dos Deputados, do Sr. Deputado Henrique Campos Cunha, do CDS-PP (círculo eleitoral do Porto), cessando Antonino de Sousa, com efeitos a 8 de Janeiro de 2005, inclusive.
O parecer é no sentido de que a retoma de mandato em causa é de admitir.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Está em discussão.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. António José Seguro (PS): - Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. António José Seguro (PS): - Para informar a Sr.ª Presidente de que, em nome do Grupo Parlamentar do PS, apresentarei uma declaração de voto sobre a votação que acabámos de fazer.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Muito bem, Sr. Deputado.
Faça favor de continuar, Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - O segundo relatório e parecer refere-se à retoma de mandato, nos termos do artigo 6.º, n.os 1 e 2, do Estatuto dos Deputados, do Sr. Deputado Virgílio Almeida Costa (círculo eleitoral de Braga), do Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata, cessando Maria José

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Araújo Morais, com efeitos a 19 de Janeiro de 2005, inclusive.
O parecer é no sentido de que a retoma de mandato é de admitir.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Está em discussão.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr.ª Presidente, gostaria de dizer que apresentaremos também sobre esta votação uma declaração de voto.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Muito bem, Sr. Deputado.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 4.ª Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia, Processo n.º 341/00.7PDVNG, a Comissão de Ética de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Gustavo Carranca (PS) a prestar depoimento, na qualidade de assistente, no âmbito do processo em referência.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Está em discussão.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - De acordo com o solicitado pela Inspecção-Geral da Educação - Delegação Regional de Lisboa, Processo 10.07/516-2003/GAJ, a Comissão de Ética emitiu parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado José Leitão (PS) a prestar depoimento por escrito, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Está em discussão.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela 3.ª Secção da 2.ª Vara Cível de Lisboa, Processo 1320/04.OTVLSB, a Comissão de Ética emitiu parecer no sentido de autorizar a Sr.ª Deputada Maria do Carmo Romão (PS) a prestar depoimento por escrito, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Está em discussão.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - De acordo com o solicitado pela Inspecção-Geral de Educação - Delegação Regional de Lisboa, Processo n.º 10.07/516 - 2003/GAJ, a Comissão de Ética emitiu parecer no sentido de autorizar o Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS) a prestar depoimento por escrito, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência.

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A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Está em discussão.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - De acordo com o solicitado pelas varas de competência mista e juízos tribunais de Coimbra - 1.º Juízo Criminal, Processo n.º 783/99.9TACBR, a Comissão de Ética emitiu parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Nelson Baltazar (PS) a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, no âmbito do processo em referência.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Está em discussão.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - De acordo com o solicitado pelo 1.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial do Funchal, Processo n.º 392/02.7TAFUN, a Comissão de Ética emitiu parecer no sentido de autorizar a Sr.ª Deputada Helena Roseta (PS) a prestar depoimento por escrito, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Está em discussão.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - De acordo com o solicitado por varas de competência mista e juízos criminais de Coimbra, 1.ª Secção, Processo n.º 253/2002, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Massano Cardoso (PSD) a prestar depoimento por escrito, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Está em discussão.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - De acordo com o solicitado pelo 1.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial do Funchal, Processo n.º 392/02.7TAFUN, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Vicente Jorge Silva (PS) a prestar depoimento por escrito, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Está em discussão.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

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Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, nada mais havendo a tratar, está encerrada a reunião.

Eram 18 horas e 30 minutos.

Declaração de voto do PS enviada à Mesa por escrito, relativa à aprovação de dois pareceres da Comissão de Ética sobre a retoma do mandato de Deputado dos Deputados do CDS-PP Henrique Campos Cunha e do PSD Virgílio Almeida Costa

A Comissão de Ética decidiu emitir parecer sobre a retoma de mandato, nos termos do artigo 6.º, n.os 1 e 2, do Estatuto dos Deputados, de dois membros do Parlamento com mandato suspenso, fazendo cessar a respectiva substituição num momento em que o Parlamento se encontra dissolvido.
O parecer da Comissão foi no sentido de que a retoma de mandato em causa é de admitir, mas essa deliberação decorre tão-só de um juízo vinculado sobre se o procedimento adoptado está previsto na lei e não sobre a oportunidade do exercício da faculdade reconhecida aos titulares.
Só por essa razão é que o PS não votou contra a retoma de mandato. Na verdade, ocorrendo esta nas condições de dissolução do Parlamento, não pode visar o exercício pleno do mandato mas tão-só a reactivação de dimensões deste que, por si mesmas e em tal contexto, só forneceriam boa justificação ético-política precisamente para a decisão contrária.
O Deputado do PS, José Magalhães.

Srs. Deputados que faltaram à reunião:

Partido Social Democrata (PSD):
João Bosco Soares Mota Amaral

Partido Socialista (PS):
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro

Partido Popular (CDS-PP):
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Narana Sinai Coissoró

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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