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Sábado, 3 de Março de 2007 I Série — Número 56
X LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2006-2007)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 2 DE MARÇO DE 2007
Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama
Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Fernando Santos Pereira
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 20 minutos.
Foi apreciado, na generalidade, o projecto de lei n.º 344/X — Nomeação e cessação de funções dos membros das entidades reguladoras independentes (PSD), sobre o qual intervieram os Srs. Deputados Hugo Velosa (PSD), Fernando Rosas (BE), Nuno Magalhães (CDS-PP), Sónia Sanfona (PS) e Agostinho Lopes (PCP.
A proposta de lei n.º 114/X — Autoriza o Governo a alterar o Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, que estabelece o regime jurídico do sector empresarial do Estado, foi debatida na generalidade. Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças (Carlos Costa Pina), os Srs. Deputados José Manuel Ribeiro (PSD), Honório Novo (PCP), Rosário Cardoso Águas (PSD), Leonor Coutinho (PS) e João Semedo (BE).
A Câmara apreciou, ainda, o Decreto-Lei n.º 15/2007, de 19 de Janeiro de 2007 — Sétima alteração do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário, aprovado pelo DecretoLei n.º 139-A/90, de 28 de Abril, e altera o regime jurídico da formação contínua de professores, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 249/92, de 9 de Novembro [apreciação parlamentar n.º 39/X (PCP)]. Intervieram, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado da Educação (Valter Lemos) e do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva), os Srs. Deputados João Oliveira (PCP), Pedro Duarte (PSD), Cecília Honório (BE), Abel Baptista (CDS-PP), Emídio Guerreiro (PSD), Luiz Fagundes Duarte (PS) e Francisco Madeira Lopes (Os Verdes). No final, o Sr. Presidente anunciou a apresentação de propostas do PCP e do PSD, as quais, juntamente com o Decreto-Lei, baixaram à Comissão de Educação, Ciência e Cultura para discussão na especialidade.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 13 horas e 20 minutos.
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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 10 horas e 20 minutos.
Srs. Deputados presentes à sessão:
Partido Socialista (PS)
Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto de Sousa Martins
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Cardoso Duarte da Rocha Almeida Pereira
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Ceia da Silva
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
Armando França Rodrigues Alves
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
David Martins
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Esmeralda Fátima Quitério Salero Ramires
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Fernando dos Santos Cabral
Horácio André Antunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jaime José Matos da Gama
Joana Fernanda Ferreira Lima
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joaquim Ventura Leite
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Jovita de Fátima Romano Ladeira
João Barroso Soares
João Carlos Vieira Gaspar
João Cândido da Rocha Bernardo
Júlio Francisco Miranda Calha
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel José dos Mártires Rodrigues
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Marcos Sá Rodrigues
Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
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Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Irene Marques Veloso
Maria Isabel Coelho Santos
Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Júlia Gomes Henriques Caré
Maria Manuel Fernandes Francisco Oliveira
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Maria de Lurdes Ruivo
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson Madeira Baltazar
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paula Cristina Nobre de Deus
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Renato Luís Pereira Leal
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Jorge Teixeira de Freitas
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino da Costa
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes
Teresa Maria Neto Venda
Vasco Seixas Duarte Franco
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vitor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Partido Social Democrata (PSD)
Adão José Fonseca Silva
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Joaquim Almeida Henriques
Arménio dos Santos
Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Domingos Duarte Lima
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Santos Pereira
Fernando dos Santos Antunes
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Virgílio Leite Almeida Costa
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Jorge José Varanda Pereira
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Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José António Freire Antunes
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
José Manuel de Matos Correia
José Mendes Bota
José Pedro Correia de Aguiar Branco
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
João Bosco Soares Mota Amaral
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Miguel Pais Antunes
Luís Miguel Pereira de Almeida
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Mário Henrique de Almeida Santos David
Mário Patinha Antão
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Paulo Artur dos Santos Castro de Campos Rangel
Paulo Miguel da Silva Santos
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Miguel de Santana Lopes
Pedro Quartin Graça Simão José
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos
Ricardo Jorge Olímpio Martins
Vasco Manuel Henriques Cunha
Zita Maria de Seabra Roseiro
Partido Comunista Português (PCP)
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Francisco José de Almeida Lopes
José Batista Mestre Soeiro
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Partido Popular (CDS-PP)
António Carlos Bivar Branco de Penha Monteiro
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
José Helder do Amaral
José Paulo Ferreira Areia de Carvalho
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Paulo Sacadura Cabral Portas
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro
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Bloco de Esquerda (BE)
Alda Maria Gonçalves Pereira Macedo
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
Helena Maria Moura Pinto
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca Ferreira
Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV)
Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai dar conta das iniciativas que deram entrada na Mesa.
A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, deu entrada na Mesa, e foi aceite, a interpelação n.º 11/X — Sobre política para o desenvolvimento rural e agricultura (PEV).
Em termos de expediente é tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos iniciar o primeiro ponto da ordem do dia de hoje, que consta da apreciação, na generalidade, do projecto de lei n.º 344/X — Nomeação e cessação de funções dos membros das entidades reguladoras independentes (PSD).
Para apresentar este diploma, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As autoridades reguladoras independentes tornaram-se um elemento essencial da moderna governação das democracias liberais e da economia de mercado. Elas proporcionam um redimensionamento da administração governamental directa ou indirecta; asseguram uma maior separação entre a esfera da política e a da economia; são instrumentos essenciais da própria constituição do mercado concorrencial, em muitos sectores anteriormente fora da sua lógica; fomentam uma nova «cultura regulatória», menos «Estado-dependente», mais nacional e mais objectiva. Com elas, o Estado e a economia têm melhor governação.
Estas palavras e muitas das que se lhes seguem têm as suas raízes num dos textos mais importantes, elaborado no nosso país sobre esta matéria, a chamada «Declaração de Condeixa», de 4 de Outubro de 2002, documento elaborado na sequência dos debates realizados no âmbito do «Fórum de Condeixa», iniciativa regular do Centro de Estudos de Direito Público e Regulação da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, o CEDIPRE.
Entre as razões que militam a favor da independência das autoridades reguladoras importa, nomeadamente, destacar as seguintes: separação entre a política e a economia: necessidade de assegurar a estabilidade e segurança do quadro regulatório; favorecimento do profissionalismo e a neutralidade política; separação do Estado-empresário e do Estado regulador; «blindagem» contra a captura regulatória; criação de condições que facilitem o autofinanciamento.
Mas a independência das entidades reguladoras não é, nem pode ser, um fim em si: exige um escrutínio democrático forte.
Num Estado de direito democrático não pode haver independência sem responsabilidade pelo exercício dos cargos públicos. A accountability (ou seja, dar conta pública da actividade) é uma exigência básica de todo o poder público. Um défice de responsabilidade pode pôr em causa a legitimidade das autoridades reguladoras independentes.
Por isso, a independência das autoridades reguladoras implica os necessários mecanismos de responsabilidade. Entre os mais importantes, contam-se os seguintes: rigorosa definição do mandato da autoridade reguladora; transparência e publicidade; relatório regular da actividade regulatória; existência de controlos transversais gerais; sanção por faltas graves; e escrutínio da comissão parlamentar competente.
Ou seja: a independência dessas entidades não pode equivaler a falta de mecanismos de prestação de contas perante o público e o Parlamento. Por isso, é entendimento geral que a independência perante o Governo deve ser, por assim dizer, «compensada» por um reforçado escrutínio público da sua actividade, incluindo perante as comissões parlamentes competentes.
Permito-me acrescentar um requisito, não menos necessário: o do processo de nomeação dos membros dos órgãos de direcção das entidades reguladoras — precisamente, o que agora aqui discutimos e por razões actuais e bem claras.
Julgo ser, hoje, pacífico que a divulgação do currículo dos nomeados e uma prévia apresentação dos indigitados pelo Governo perante a comissão parlamentar competente poderiam ajudar a reforçar a imagem da
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independência. Mas é nosso entendimento que tal intervenção parlamentar, sendo absolutamente necessária, não é por si só suficiente.
Poder-se-á verdadeiramente falar de «independência perante o Governo» quando, na grande maioria dos casos, a nomeação dos membros dos órgãos de direcção das entidades reguladoras depende, única e exclusivamente, do Governo, sem a intervenção de qualquer outro órgão de soberania? Há excepções, é certo. Existe, com efeito, uma entidade reguladora em que a própria Constituição estabelece expressamente que a designação dos seus membros compete à Assembleia da República. Não é, contudo, essa a regra aplicável à generalidade das entidades administrativas independentes que têm vindo a ser criadas ao longo dos anos mais recentes.
Um exemplo que todos bem recordamos mostra que a exclusividade de competências nas mãos do Governo pode pôr, dizendo melhor, põe mesmo em causa a respectiva independência e, no limite, pode condicionar, como efectivamente aconteceu, o exercício, pela Assembleia da República, dos poderes de fiscalização que lhe estão cometidos — lembremos, aqui, o recente caso da ERSE.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Se dúvidas houvesse sobre os limites da interferência governamental, elas foram claramente dissipadas pela forma precipitada como foi posto termo pelo Governo às funções de um responsável de uma entidade administrativa independente, na véspera de uma audição parlamentar para a qual havia sido convocado.
Houve, aliás, quem, logo na altura, tivesse sublinhado com veemência que poderíamos estar em presença do fim da regulação independente no nosso país. Dir-se-á que foi a primeira vez. Seja como for, foi uma vez a mais. O que era desejável — uma participação alargada dos principais órgãos de soberania e um escrutínio democrático mais alargado — passou a imprescindível.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — A democracia não se pode dar ao luxo de voltar a ser confrontada com uma comissão parlamentar vazia, porque um qualquer ministro achou por bem antecipar a cessação de funções de um presidente de uma entidade reguladora que havia sido chamado para uma audição sobre o sector por cuja regulação era responsável.
Aplausos do PSD.
A regulação não pode continuar a ver a sua independência e a independência dos seus responsáveis postas em causa em nome de uma real ou alegada governamentalização das escolhas realizadas pelos decisores políticos. Impõe-se, por conseguinte, que o regime de nomeação e de cessação de funções dos membros dos respectivos órgãos de direcção assegure uma participação alargada dos principais órgãos de soberania, favorecendo uma legitimidade e um escrutínio democrático mais alargados.
Nesse sentido e, naturalmente, sem prejuízo do direito de iniciativa do Governo, entidade a quem deve competir a formulação das propostas de nomeação dos membros dos órgãos de direcção das entidades reguladoras, propomos que a nomeação de tais membros caiba ao Presidente da República e, por outro lado, que a decisão de nomeação seja precedida da realização de uma audição pública na comissão parlamentar competente da Assembleia da República.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Isto evitaria, obviamente, aquilo que aconteceu com a ERSE, nomeadamente a nomeação apressada de um ex-membro do conselho directivo da ERSE para actual presidente da ERSE.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — «No meu entender, para dar independência e solidez às entidades reguladoras, o Governo deveria propor e o Presidente da República deveria designar (…). Portanto, precisamos de reguladoras acima de qualquer pressão e interesse, que possam afirmar o interesse nacional, aferido, naturalmente, pelo Parlamento, que é o órgão que tem esse direito próprio.»
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Estas palavras, proferidas no dia 8 de Dezembro de 2004, poderiam tê-lo sido por alguns ou, mesmo, muitos de nós. Foram-no, contudo, pelo então Presidente da República Jorge Sampaio, poucos dias
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após a dissolução da Assembleia. Mal sabíamos nós que o que se passou entretanto viria a torná-las tão actuais…
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Rosas.
O Sr. Fernando Rosas (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda tem seis objecções ao projecto de lei, apresentado pelo PSD, sobre nomeação e cessação de funções dos membros das entidades reguladoras independentes.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!
O Orador: — Em jeito de nota prévia, gostaria de dizer que consideramos muito legítima a preocupação com a independência e a isenção do exercício das entidades reguladoras, mas ela é de acautelar tanto em relação ao Governo como aos interesses que estejam ligados a determinados sectores. É a defesa independente do interesse público, fora de pressões e manipulações ilegítimas do Governo ou de interesses privados, que é necessário ter como critério.
Neste quadro, temos a observar o seguinte: em primeiro lugar, não nos parece fazer sentido, a propósito dos órgãos dirigentes das entidades reguladoras, legislar unicamente sobre as nomeações e as destituições.
Mas mesmo quando assim fosse, como é o caso do presente projecto de lei, faz ainda menos sentido, a nosso ver, tratar delas sem qualquer menção ao regime de impedimentos e de incompatibilidades para as nomeações dos membros dos órgãos directivos dessas entidades, a menos que se entenda que uns — impedimentos — e outras — incompatibilidades — não existam ou são desnecessários, o que, para nós, seria totalmente inaceitável em matéria de tamanha relevância.
Em segundo lugar, não se compreende por que se exclui do âmbito de aplicação do presente projecto de diploma a Entidade Reguladora da Saúde. Quanto à entidade reguladora da comunicação social, já sabemos que tem um regime próprio, mas haveria de ser explicado, ao menos na exposição de motivos, por que é que a entidade reguladora de saúde fica de fora. Um lapso? Uma escolha política? Haveria de se entender a razão desta omissão.
A terceira observação: não se aceita, como regime-tipo para a nomeação dos órgãos directivos das entidades reguladoras o regime da sua nomeação pelo Presidente da República, ainda que sob proposta do Governo e numa situação de real subalternização da Assembleia da República, convocada para o processo a título meramente consultivo.
É mesmo de duvidosa constitucionalidade, a nosso ver, a admissibilidade desta incursão dos poderes presidenciais em áreas tipicamente da competência do Governo! Estou seguro de que, fosse outro o Presidente da República, não se lembraria o PSD desta solução, que é de uma pura habilidade conjuntural.
Não se pode reduzir este processo de nomeação a uma espécie de acordo negociado entre o Governo e o Presidente da República, ainda por cima, com exclusiva competência para o efeito do Presidente da República.
O Bloco de Esquerda entende que a iniciativa da nomeação, no geral, das entidades reguladoras, com algumas excepções, deve ser do Governo, submetida essa nomeação a prévio parecer vinculativo da comissão parlamentar competente na respectiva área, a quem haveria de ser sujeita a proposta de nomeação de todos, ou de alguns dos membros do órgão directivo a designar.
A excepção é obviamente a entidade reguladora da comunicação social, dada a sua especial natureza e o especial regime que já tem, eleita em Assembleia da República, o seu órgão directivo, mas haveria de ser com representação de todos os partidos com assento parlamentar e não o «negócio» do bloco central actual, previsto no actual regime legal.
Quarta observação: não se compreende que o projecto de lei não refira os requisitos genéricos dos candidatos — o mérito, a experiência, o currículo. Bastaria, portanto, um acordo do Presidente com o Governo para que qualquer pessoa pudesse ser nomeada, independentemente do seu perfil (até, porque, no projecto de lei, a própria audição da Assembleia da República é praticamente irrelevante, é uma mera questão de forma), e estaríamos, portanto, no domínio do puro clientelismo, como em parte já sucede, actualmente, com a completa governamentalização das nomeações em vigor.
Em quinto lugar, como observação mais pontual, valerá a pena referir que, no artigo 3.º do projecto de lei em apreciação, o regime de proibição deveria naturalmente estender-se às destituições dos membros directivos das entidades reguladoras — as destituições são tanto ou mais importantes do que as nomeações para este efeito.
Sexta e última observação: as destituições, pelo menos as destituições dos órgãos directivos em bloco, sempre de grande significado político, para além dos fundamentos indicados e com os quais se concorda, deveriam estar dependentes de um processo simétrico ao das nomeações. No nosso entender, o Governo deveria fundamentá-las, perante a comissão parlamentar competente, e sujeitar-se ao parecer vinculativo
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desta ou, pelo menos, ao parecer do conselho consultivo da entidade reguladora em causa, mesmo que não se quisesse ir para um parecer vinculativo, quanto às destituições da comissão parlamentar.
Nestes termos, quer as discordâncias de fundo, que já enunciámos, quer a divergência contra várias soluções indicadas quer as omissões e lacunas ao regime proposto, demasiado importantes, que aqui verificámos, levar-nos-ão — determinarão! — o voto contrário desta bancada ao projecto de lei agora proposto pelo PSD.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos, hoje, um projecto de lei do PSD relativo à nomeação e cessação de funções dos membros das entidades reguladoras independentes.
Entendem os proponentes como negativo o facto de a generalidade destas entidades, dispersas por diversos diplomas, terem órgãos de direcção designados, exclusivamente, pelo Governo, sem qualquer intervenção de outros órgãos de soberania. Acrescentam que, no Direito Comparado, existem diversas soluções desde a designação pelos Parlamentos até à designação pelos Presidentes da República.
No entanto, o que, na verdade, preocupa o PSD é que, no actual regime, não se mostram suficientemente acautelados os princípios da isenção e da independência.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — Ao CDS-PP também preocupa tal facto! E propõe que a nomeação e a demissão dos membros dos respectivos órgãos deva caber ao Presidente da República, precedida de uma audição pública neste Parlamento, ou seja, o Governo propõe ao Presidente da República e este nomeia, mas, como fase intermédia deste processo, os nomes dos membros indigitados devem ser comunicados à Assembleia da República para audição pública e a emissão de um parecer não vinculativo sobre essa mesma proposta.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No entender do CDS-PP, que confia no mercado e não vê «fantasmas» onde eles não existem,…
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — … as entidades reguladoras desenvolvem um trabalho fundamental, que deve ser orientado por três princípios: isenção, independência e imparcialidade. Só assim se pode falar, verdadeiramente, em regulação, tanto mais que em Portugal, muitas vezes, o Estado (através do Governo) é igualmente um parceiro e também a sua actividade carece, por isso mesmo, de ser regulada convenientemente.
Não olvidamos, de algum modo, como já foi aqui recordado, que, nos últimos tempos, este Governo tem criado ou potenciado um conjunto de problemas com estas entidades e com os membros nomeados. Basta relembrar a demissão do Presidente da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos, todo o imbróglio aí subjacente, a recusa do Sr. Ministro e a procura de instrumentalização governamental desta mesma entidade, a que ninguém foi indiferente.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — Já para não falar do papel de «almofada» para certas políticas deste Governo que sistematicamente tem sido desempenhado pelo Governador do Banco de Portugal.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — É preciso mudar as formas de fiscalização destas entidades fiscalizadoras, que, é bom lembrar, exercem funções de Estado e que, por isso mesmo, não podem deixar de ser objecto de um escrutínio de Estado pelas responsabilidades e importância que assumem, e devem assumir, na nossa organização pública.
Disso tudo não temos dúvidas e estamos completamente de acordo com o Partido Social -Democrata. No entanto, se assim ocorre quanto aos princípios, às ideias e aos objectivos do presente projecto de lei, o mesmo já não poderemos dizer quanto às soluções apresentadas, que nos suscitam diversas questões.
Em primeiro lugar, a proposta de aditamento às competências do Presidente da República.
Não só juridicamente, pela dificuldade que vislumbramos da conformidade com o artigo 133.º da Constituição, que prevê a competência do Presidente da República quanto a outros órgãos (e que nos parece taxativo), como, politicamente, por nos parecer que o escrutínio que defendemos, e é exigível, deve pertencer à Assembleia da República e aos legítimos representantes do povo.
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Aceitamos, coerentemente com o que sempre defendemos, uma «parlamentarização», e um reforço da mesma, deste escrutínio, mas não nos parece adequada uma «presidencialização», que é o que se pretende, que não só não é conforme, juridicamente, com a Constituição como cremos que, politicamente, poderá criar, ou potenciar, climas de tensão entre órgãos de soberania, perfeitamente indesejáveis, e que até vai em sentido inverso à génese da organização do nosso sistema político.
Na verdade, os poderes que se pretendem instituir ao Presidente da República dificilmente se encaixam na repartição dos poderes executivo, legislativo e judicial, afastando-o de um poder moderador, que deve ter, para um poder de direcção, que, a nosso, não deve possuir.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — O papel de um chefe de Estado, no nosso sistema, deve manter-se em pronunciar-se sobre todas as emergências graves para a vida da República, sobre os assuntos respeitantes à condução da política interna e externa do País, enquanto representante dessa mesma República e garante da independência nacional.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — São estas as competências atribuídas ao Presidente da República. A nosso ver, elas são suficientes e em nada colidem com os necessários regulação, escrutínio e fiscalização da actividade das entidades reguladoras.
Também temos algumas objecções na especialidade, porquanto não se descortina a finalidade de um parecer não vinculativo da Assembleia da República na sequência de uma audição a realizar, tanto mais que num caso que poderia ser considerado similar, o da indigitação do Secretário-Geral do Sistema de Informações da República Portuguesa, esta audição é realizada em sede de comissão, mas não dá lugar a qualquer parecer da parte dessa mesma comissão.
Com efeito, o controlo político dessa nomeação é garantido em si mesmo pela realização dessa audição pública, e cada partido representado na Assembleia da República pode tomar as posições que entender e, assim, pronunciar-se sobre a bondade, ou falta dela, destas nomeações.
Preferíamos, assim, uma solução que consagrasse a obrigação de o indigitado apresentar previamente um currículo e um programa de acção, seguida dessa à audição, e que permitisse ao Parlamento conhecer, com a antecedência possível, o percurso profissional e o respectivo programa que o nomeado pretende exercer.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — É verdade que nos parece positiva a proibição de nomeação de membros dos órgãos das entidades reguladoras depois da fixação da data das eleições presidenciais e até à posse do novo presidente, bem como após a convocação de eleições para a Assembleia da República e até à posse da nova Assembleia, mas desde que a competência de nomeação não pertença, como agora se pretende, ao Presidente da República.
Proíbe-se o Sr. Presidente da República de praticar um acto que se contenha dentro das suas competências só porque existem eleições justamente marcadas pelo próprio. Não compreendemos esta solução do Partido Social-Democrata! Sr. Presidente, em suma, o presente projecto de lei do PSD tem uma motivação que partilhamos inteiramente, mas apresenta soluções que nos merecem muitas dúvidas, para não dizer sérias reservas.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — Tudo visto e ponderado, é nosso parecer que devemos, em conjunto, estudar de forma mais aprofundada esta proposta, em nome de uma regulação que, para o CDS-PP, deve ser cada vez mais presente, responsável, eficaz e, sobretudo, Srs. Deputados, independente.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sónia Sanfona.
A Sr.ª Sónia Sanfona (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata apresentou, nesta Câmara, o projecto de lei n.º 344/X, visando a adopção de um novo regime de nomeação e cessação de funções dos membros das entidades reguladoras independentes.
Em nome dos princípios da independência e da isenção, por todos reconhecidos, relativamente às entidades administrativas que exercem funções reguladoras, o PSD pretende, agora, alterar de forma avulsa o regime de nomeação e de cessação de funções dos membros dos respectivos órgãos de direcção.
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Em concreto, propõe que a competência para o acto formal de nomeação dos titulares dos órgãos de direcção das entidades reguladoras seja transferida para o Presidente da República, sob proposta do Governo, sendo essa decisão de nomeação antecedida da realização de uma audição pública na comissão parlamentar competente desta Assembleia.
A solução técnica proposta pelo PSD apresenta claras insuficiências, desde logo ao nível da sua compatibilização com o texto constitucional. De facto, no elenco das competências do Presidente da República relativamente a outros órgãos, constante do artigo 133.º da Constituição da República Portuguesa, não consta o poder de nomeação dos membros das entidades reguladoras. A solução proposta suscita, por isso, fundadas dúvidas de natureza jurídico-constitucional, atendendo a que se trata de um catálogo fechado de competências do Presidente.
Ao remeter para a esfera presidencial, e sem qualquer suporte constitucional, os poderes de nomeação e exoneração dos membros das entidades reguladoras, o PSD não está a reforçar o estatuto de independência destes organismos, mas tão-somente a introduzir um factor de destabilização, susceptível de afectar negativamente a imagem e a credibilidade destas entidades.
A alteração completa do procedimento de nomeação e exoneração proposta pelo PSD, visando o reforço dos poderes presidenciais, afecta gravemente a imagem de isenção e independência destas entidades, resultante de uma prática de vários anos, agitando injustificadamente o eterno fantasma da governamentalização.
A neutralidade dos titulares dos órgãos das entidades reguladoras é desde logo garantida pelo respectivo estatuto legal definido em cada lei orgânica, onde se estabelecem, em concreto, os respectivos regimes de incompatibilidades e impedimentos, nomeadamente por via da aplicação do regime dos titulares de altos cargos públicos.
No sistema actual, não existe um poder efectivo ou real de direcção e controlo por parte do Governo: a intervenção do órgão executivo encontra-se limitada à faculdade de nomeação e de exoneração dos respectivos membros directivos.
A ideia da autoridade reguladora independente, cuja tradução no nosso texto constitucional é a de entidade administrativa independente, admite a sua previsão legal no quadro constitucional, mas exige, simultaneamente, a consagração de um princípio de unidade da acção governativa. Isto é, a regulação independente que este processo procura apreender é, fundamentalmente, uma regulação independente, enquanto entidade, face ao Governo e aos interesses regulados.
Por isso, o grande desenho desta arquitectura institucional tem que ver, sobretudo, com o equilíbrio entre a salvaguarda das linhas gerais de política governamental, que cabem ao Governo, e a responsabilidade autónoma e independente destas entidades.
A natureza independente das entidades reguladoras não é em si mesma incompatível com o actual processo de nomeação dos respectivos titulares. O exercício neutral deste tipo de funções, visando uma regulação eficaz dos mercados ou de determinados sectores de actividade, constitui também uma responsabilidade governamental sujeita ao escrutínio público normal em democracia, através do exercício regular do direito de voto.
Daqui decorre que o procedimento vigente de nomeação governamental dos titulares dos órgãos das entidades reguladoras independentes não é susceptível de inquinar a isenção ou a independência dos mesmos, desde logo porque esse procedimento se encontra balizado pela lei, através dos respectivos estatutos orgânicos, e pelas normas genéricas decorrentes do regime aplicável aos titulares de altos cargos públicos, como se disse.
Por outro lado, a menos que o PSD assuma a sua desconfiança face à independência e neutralidade destas entidades (e lá saberão porquê), não se divisam o alcance e a utilidade desta iniciativa.
Aliás, nesta matéria como noutras, o Partido Socialista não aceita lições de qualquer outra bancada.
Importa recordar, porque assume toda a relevância no actual contexto, que o único grupo parlamentar que historicamente apresentou uma iniciativa tendente a definir um quadro genérico de regulação de entidades desta natureza foi exactamente o do PS, nomeadamente na anterior Legislatura, tendo a maioria PSD/CDSPP chumbado tal iniciativa.
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Bem lembrado!
A Oradora: — O projecto de lei n.º 178/IX, do PS, então inviabilizado pela maioria de direita, previa, entre muitos outros aspectos, ajustamentos na forma de nomeação dos titulares de órgãos reguladores valorizando o papel desta Câmara, mas não subvertendo a lógica constitucional de equilíbrio entre os diversos órgãos de soberania.
Assim se demonstra, para além do mais, Sr.as e Srs. Deputados, que o PS não é insensível a esta temática, nem recusa a discussão da mesma. Tal não significa, contudo, que encontre no projecto do PSD ora em apreço um caminho válido e útil para a prossecução dos objectivos de valorização do papel regulador destas entidades.
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No momento oportuno, da forma adequada e de acordo com a sua agenda, o Partido Socialista estará, uma vez mais e como sempre, à altura das suas responsabilidades.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei em apreço tem como objectivos assegurar a independência e reforçar o escrutínio democrático na nomeação e cessação de funções dos membros das ditas entidades administrativas independentes, face à relevância de funções, que lhes estão cometidas, de regulação ou de supervisão do mercado, através da intervenção neste processo da Assembleia da República e do Presidente da República.
Embora seja uma questão secundária, começa por não se perceber por que se deixam de fora, na enunciação feita no n.º 1 do artigo 1.º, relativo ao âmbito de aplicação, entidades como o Instituto Portuário e dos Transportes Marítimos, a Entidade Reguladora da Saúde ou o Instituto Nacional da Farmácia e do Medicamento.
Percebem-se melhor as tempestivas preocupações do grupo parlamentar proponente, os «tratos de polé» a que tem estado sujeita a pretensa independência de algumas das referidas entidades independentes.
Mas é um facto que quando se chega à oposição se vêem muito melhor estas coisas, clarifica-se a visão como que por milagre da água de Santa Luzia…! Aliás, o PSD repesca ideias de projectos do PS de 2000 e de 2003, então chumbados pela maioria governamental PS/CDS-PP.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Onde é que já vi isto?
O Orador: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para a consideração da oportunidade desta iniciativa legislativa, certamente que muito contribuiu o «filme» de intriga e suspense, com uns toques de comédia, «Afinal, quanto vamos pagar pela tarifa eléctrica em 2007?», filme que teve como actores principais o Ministro da Economia e da Inovação e o Presidente da ERSE.
Qualquer ilusão ou dúvida que houvesse sobre a independência da ERSE esfumou-se rapidamente: segundo o novo presidente, a independência passa, fundamentalmente, pelo exercício de um magistério de influência sobre o Governo.
Mas este «filme» tinha sido antecedido pela «curta-metragem» «Concentração nas auto-estradas».
Como é sabido, a Autoridade da Concorrência pronunciou-se contra a tomada da posição maioritária da Brisa — Auto-estradas de Portugal na Auto-estradas do Atlântico, por eliminação da concorrência. O Ministro da Economia e da Inovação decidiu em sentido contrário, invocando o interesse nacional, o que nesta matéria é difícil deixar de estar em causa, mas não rebateu a argumentação da Autoridade da Concorrência.
Mas algumas das entidades administrativas independentes também não ajudam, pelas suas decisões contraditórias e incoerentes, à afirmação da dita independência, como é patente nos «filmes» das ofertas públicas de aquisição (OPA) em projecção há mais de um ano.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Orador: — Em qualquer dos casos se reporta a monopolização, outros dirão oligopolização, dos sectores.
Na OPA da Sonae sobre a Portugal Telecom (PT), se concretizada, onde havia três operadores passará a haver dois, com o controlo de 2/3 do mercado das telecomunicações móveis.
No caso da OPA do BCP sobre o BPI, actualmente há quatro grupos a controlar 75% do mercado bancário e passará a haver três.
Em qualquer dos casos, a Autoridade da Concorrência «põe umas peninhas nos chapéus» — os operadores virtuais, uns tantos balcões, etc. —, mas não vê, ao contrário do que sucedeu nos casos da Brisa/Auto-Estradas do Atlântico ou dos grupos Arriba/Barraqueiro, problemas para a concorrência.
Poderíamos ainda perguntar qual é a efectiva actividade reguladora do Banco de Portugal sobre a actividade predatória da banca em torno das comissões, dos arrendamentos, e muitos outros aspectos.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Boa pergunta!
O Orador: — Mas o «filme» recente da nomeação da nova administração da ERSE é também muito elucidativo de independência destes órgãos.
Depois de demitir Jorge de Vasconcelos, assim impedindo a sua audição na Assembleia da República (disse o Ministro da Economia e da Inovação, na passada quarta-feira, na Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Desenvolvimento Regional: «não o autorizei a vir à Comissão de Assuntos Económicos»),…
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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Afinal, foi ele!
O Orador: — … o Governo nomeou como novo presidente o ex-secretário de Estado do ministro Pina Moura do governo PS. E, segundo notícias públicas não desmentidas, o Ministro da Economia terá mesmo tentado nomear como vogal um dos seus assessores, mas o líder do PSD ter-se-á oposto, pelo que Manuel Pinho terá optado por José Braz, amigo de longa data e ex-secretário de Estado do ministro Braga de Macedo do governo de Cavaco Silva. Está dito tudo, ou quase tudo, em matéria de independência!...
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Orador: — Isto para lá da evidente «captura» de algumas dessas entidades reguladoras pelos poderosos interesses que deveriam ser regulados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: As chamadas entidades reguladoras, constituídas por grupos de peritos, personalidades nomeadas pelo Governo, pretensamente independentes e isentos para arbitrar e harmonizar interesses contraditórios, vão sendo multiplicadas por áreas e sectores de bens e serviços de relevante interesse público.
De facto, significam o afastamento do Estado da direcção e regulação económica dessas mesmas funções, bem como uma operação política e uma mistificação ideológica visando desresponsabilizar o poder político e os partidos que o exercem das decisões dessas entidades, que podem atingir gravemente a maioria da população e os agentes económicos mais frágeis.
Como explica um insuspeito constitucionalista da área do Governo, a importação europeia das comissões reguladoras independentes norte-americanas aconteceu com a Sr.ª Thatcher, acompanhando a liberalização e a privatização da economia. Esta via britânica, segundo o mesmo constitucionalista, estabeleceu as grandes linhas de regulação da economia pós-intervencionista a seguir à revolução neoliberal da liberalização e privatização da economia.
O PS e o PSD, e também o CDS-PP, estiveram, e estão, juntos na promoção e implementação das entidades reguladoras e da sua dita independência.
Trata-se de uma reconfiguração do Estado para a fase do capitalismo neoliberal reduzido, como agora pretende o Governo do PS, às suas funções nucleares. É a tentativa de neutralização política e ideológica das decisões do Estado, em particular das decisões económicas, a expulsão da política de decisões políticas que cabem ao Governo, como se a fixação de uma tarifa de energia eléctrica ou telefónica ou a deliberação sobre a fusão de empresas em sectores estratégicos não fossem questões centrais das políticas económicas de qualquer governo e pelas quais os governos devem, politicamente, ser responsabilizados!!...
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Orador: — Como se essas decisões pudessem ser entregues ao jogo, dito livre, do livre mercado, sob tutela e vigilância de umas quantas personalidades tecnicamente competentes e politicamente isentas! Não foi por acaso que ontem, durante o debate aqui efectuado, a propósito da OPA da Sonae sobre a PT, um Deputado da maioria clamava nada ter o Governo que ver com a operação.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Está na bancada do PS!
O Orador: — Não, era apenas o mercado de capitais a funcionar sob a visão atenta da Comissão do Mercado de Valores Imobiliários e ao Governo restava-lhe assistir e esperar pelo fim do jogo, independentemente da importância desta OPA para o País e para os portugueses.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto do PSD quer reforçar se não uma independência, que sabe ser impossível, pelo menos a imagem pública de independência das ditas entidades reguladoras, comprometendo no processo de nomeação e cessação dos mandatos dos seus membros a Assembleia da República e o Presidente da República. Julgamos que não é um bom caminho. Bem pelo contrário, o que julgaríamos adequado era a sua clara e transparente subordinação à tutela do Governo.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Orador: — É este que vai ser julgado em futuras eleições e não as entidades ditas independentes.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção final, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Assistimos, neste debate, a algo de muito interessante: todos os grupos parlamentares dos partidos que não estão no poder concordam que há uma
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excessiva governamentalização nas entidades reguladoras. Até foi aqui dito que a nomeação exclusiva pelo Governo marca, certamente, todo o mandato. Estamos de acordo! Marca, certamente, todo o mandato! Só é pena que esses grupos parlamentares, que defendem esta ideia geral da excessiva governamentalização, venham com questões formais, muitas delas facilmente ultrapassáveis na especialidade, para dizer que o projecto de lei não presta. Ou seja, é preciso que tudo fique na mesma, apesar de entendermos que existe uma excessiva governamentalização. Isto, naturalmente, é inaceitável!!
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — É uma incoerência!
O Orador: — Portanto, os grupos parlamentares da oposição que não estão de acordo com o projecto, por ser vinculativo ou não, por ser nomeado pelo presidente ou não — aliás, aproveito para dizer que o facto de essa competência não estar na Constituição não significa que o Presidente da República não a possa ter, posso até fazer uma relação completa de poderes do Sr. Presidente da República que não estão expressamente previstos na Constituição, pelo que penso que esta é uma questão que não se coloca —, devem deixar de lado as questões formais.
Vamos, pois, sair das questões formais e passar às questões materiais. E, aqui, cabe dizer, ao Partido Socialista, algo que é perfeitamente claro: a regulação, em Portugal, não tem assim tantos anos e parece que o Partido Socialista esqueceu o tal conselho do Presidente Jorge Sampaio, em 2004, que apontava no sentido de uma maior independência das entidades reguladoras. Já esqueceu, com certeza, esse conselho! É porque, agora, o que vem fazer é suscitar uma série de questões, invocando, nomeadamente, o passado, que, efectivamente, levam a nada, para dizer por que é que não concordam com este diploma.
Deixe-me que lhe lembre, Sr.ª Deputada Sónia Sanfona e demais Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, que o que se passou, nos últimos meses, em relação à regulação em Portugal é um verdadeiro escândalo.
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Uma vergonha!
O Orador: — Lembro o que se passou, por exemplo, com a Autoridade da Concorrência, em relação à questão da fusão Brisa/Auto-Estradas do Atlântico, em que ficou claramente demonstrado que é preciso que não haja uma relação tão directa entre o regulador e o Governo.
Mais: se formos, então, para a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos, o que se passou é um superescândalo,…
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Bem lembrado!
O Orador: — … com a demissão do ex-Presidente da ERSE e a nomeação apressada pelo Governo — se este diploma estivesse em vigor, isso não aconteceria —, para ouvirmos o Professor Vítor Santos aqui, no Parlamento, e não está em causa a sua pessoa, dizer: «Estou de acordo com tudo o que o Governo vai fazer em relação às tarifas eléctricas».
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Grande tirada!
O Orador: — Poderá existir maior ligação entre o Governo e o novo Presidente da ERSE?!... É que ele não está em desacordo com nada, no fundo, vai fazer tudo aquilo que o Governo quer,…
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — A ERSE não é uma entidade reguladora, é uma entidade certificadora!
O Orador: — … e ainda bem que o vai fazer, porque, com este Ministro da Economia, era necessário ter como Presidente da ERSE alguém que fizesse tudo o que ele quer. As trapalhadas com as questões das tarifas eléctricas vêm demonstrar que, em Portugal, era fundamental que a nomeação dos representantes das entidades reguladoras tivesse uma participação do Parlamento. E não me venham os grupos parlamentares da oposição em relação ao actual Governo suscitar questões, como o Bloco de Esquerda, que suscitou seis questões... Bom! É que há questões formais e não formais que se podem, obviamente, resolver em sede de especialidade, e é esse o desafio que aqui se deixa.
Se há uma governamentalização, como há, e isso fica no Diário, porque existe, como nunca houve, em relação às entidades reguladoras, em Portugal, é preciso que se faça alguma coisa. E o PSD fica de consciência tranquila, porque apresentou um projecto de lei, exactamente para evitar a vergonhosa governamentalização das entidades reguladoras.
Aplausos do PSD.
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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, concluído este debate, vamos passar à apreciação, na generalidade, da proposta de lei n.º 114/X — Autoriza o Governo a alterar o Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, que estabelece o regime jurídico do sector empresarial do Estado.
Para apresentar a proposta de lei, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças.
O Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças (Carlos Costa Pina): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Estado, pela posição que ainda ocupa em importantes empresas, deve, naturalmente, ser um exemplo catalisador da adopção de boas práticas de governação empresarial, tendo em vista a definição de um quadro de gestão que fomente o rigor, que responsabilize os responsáveis e promova uma maior transparência da sua acção. O Estado, deste ponto de vista, é um accionista como os demais e deve reger a sua actividade dentro do quadro normativo vigente.
Quanto às empresas do sector empresarial do Estado não abertas ao mercado, o Estado deverá integrar, com os devidos ajustamentos, as regras de governo empresarial aplicadas às sociedades cotadas no mercado regulamentado.
O Estado deverá também, como accionista, fomentar uma relação contratualizada com a administração das empresas, através de uma definição clara das responsabilidades assumidas pelo accionista e pela administração, abstendo-se de intervir na sua gestão corrente.
Desta forma, as administrações disporão de um quadro claro de referência para a gestão das empresas, sendo possível uma efectiva responsabilização dos administradores quanto ao sucesso ou insucesso da sua acção.
Sr.as e Srs. Deputados: Tudo o que acabei de referir encontra-se, ipsis verbis, no Programa do Governo.
Pois bem, é precisamente a este ponto do Programa do Governo que se visa dar concretização com a proposta de lei de autorização legislativa que, hoje, é aqui apresentada e está sob apreciação.
Esta proposta de lei de autorização legislativa insere-se, naturalmente, num quadro mais amplo de reforma do regime do sector empresarial do Estado, que abrange, para além desta iniciativa legislativa, um diploma já aprovado em Conselho de Ministros que estabelece o novo Estatuto do Gestor Público e ainda uma resolução do Conselho de Ministros relativa ao estabelecimento de princípios de governo empresarial para as empresas públicas.
Estas três iniciativas são, por sua vez, complementadas com diplomas estatutários especiais relativos a diversas entidades públicas, entretanto aprovados.
Trata-se de medidas de reforma que estão, além do mais, alinhadas com iniciativas legislativas recentes, levadas a cabo pelo Governo, ao nível do Código das Sociedades Comerciais.
Neste sentido, não se pretende criar, ao nível do sector público, um regime especial diferenciado ou excepcional face àquele que é aplicável às empresas privadas. Entendemos que, sob este ponto de vista, não apenas o Estado deve estar alinhado com o sector privado, no que diz respeito às boas práticas e às exigências aplicáveis às empresas privadas, mas também, em muitos casos, o Estado e as empresas públicas, pela importância que têm, devem dar o exemplo em termos de exigências de rigor e de transparência sobre a situação económica, financeira e patrimonial das mesmas empresas.
Na especialidade, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, destacaria quatro áreas fundamentais de intervenção através desta proposta de lei.
Por um lado, ao nível da redefinição da estrutura orgânica das empresas públicas, estabelecendo, claramente, a distinção entre administradores executivos e não executivos, a possibilidade de estabelecimento, em algumas empresas, de um conselho geral e de supervisão e a existência de comités especializados ao nível das empresas, designadamente comités de auditoria e de avaliação.
Uma segunda área de intervenção deste diploma tem a ver com as orientações de gestão a dirigir às empresas públicas, estabelecendo-se aqui uma clara diferenciação em três níveis: orientações estratégicas dirigidas a todo o sector empresarial do Estado e a aprovar por resolução do Conselho de Ministros; orientações gerais dirigidas a diversos sectores de actividade, a aprovar por despacho conjunto do Sr. Ministro das Finanças e do Ministro responsável pela área em causa; orientações específicas, empresa a empresa, susceptíveis de aprovação, igualmente, por despacho conjunto e compreendendo também o estabelecimento de metas quantificadas a atingir pela gestão. Isto sendo certo que estas orientações, aos vários níveis, influenciarão não apenas os planos de actividades e de investimento das empresas mas também os próprios contratos de gestão a celebrar com as equipas de gestão das empresas.
Uma terceira área de intervenção tem a ver com o reforço do controlo financeiro ao nível das empresas públicas. E, aqui, sublinharia três pontos. O primeiro ponto tem a ver com a exigência de que não apenas os tradicionais planos de actividades sejam aprovados, o que já hoje decorre da lei, mas que a apresentação dos planos de investimento seja acompanhada da indicação das respectivas fontes de financiamento, porque o investimento tem de se enquadrar nos limites do que é financeiramente suportável e razoável.
O segundo ponto tem a ver com a exigência ou imposição de autorização prévia do Ministro das Finanças para o endividamento das empresas públicas ou para o nível de endividamento das empresas públicas que exceda, em mais de 30%, o capital das mesmas empresas.
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Um terceiro ponto tem a ver com o controlo das tomadas de participação por parte das empresas noutras empresas participadas, passando a exigir-se, também para este efeito, designadamente, a apresentação de um estudo de viabilidade e de uma justificação económica e financeira para essas tomadas de participação.
A quarta área de intervenção que se pretende atingir através deste diploma, e com isto termino, Sr.as e Srs. Deputados, tem a ver com o reforço dos deveres de transparência, sobretudo a dois níveis: em primeiro lugar, através de uma especificação clara do conteúdo dos relatórios anuais que as empresas públicas devem aprovar, com identificação detalhada dos vários elementos de informação que devem ser divulgados; em segundo lugar, a exigência de deveres de informação específicos, novos, que até agora não existiam, sobre a vida interna das empresas, sobre os factos relevantes relativos à vida das empresas e que têm impacto na sua situação financeira e patrimonial e, igualmente, informação detalhada sobre as equipas de gestão, as suas responsabilidades, as qualificações dos gestores e o próprio quadro remuneratório que lhes é aplicável.
Em suma, Sr.as e Srs. Deputados, com esta iniciativa legislativa pretende-se, sobretudo, um objectivo muito claro: trazer mais transparência, mais clareza, mais luz para uma área relativamente à qual —temos de o reconhecer — não tem havido, nos últimos anos, a devida informação e transparência. Entendemos que os cidadãos e os contribuintes têm, sob este ponto de vista, o direito de acesso a informação relevante sobre o que se passa com cada uma das empresas e com o sector empresarial do Estado em geral.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Ribeiro.
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças, quem lesse unicamente a exposição de motivos da proposta de lei do Governo, aqui em discussão, poderia ficar com a ideia de que estaria perante um documento virtuoso. Nada mais enganador! E não no que se refere aos princípios e objectivos aí plasmados mas, sim, quanto às soluções preconizadas.
Além disso, esta iniciativa legislativa está «coxa», porque analisada individualmente, como nos é proposta pelo Governo.
Na verdade, na proposta de lei, o Governo faz referência a outros dois diplomas, o do novo Estatuto do Gestor Público e o dos princípios de bom governo das empresas do sector empresarial do Estado, documentos que o Governo considera vitais, mas nada disse aqui sobre esta matéria, já para não falar do código de ética relativo às boas práticas empresariais e sociais a implementar também no sector empresarial do Estado.
No que se refere aos princípios de bom governo, o Executivo limitou-se a aprovar uma mera resolução do Conselho de Ministros, em 1 de Fevereiro último.
Quanto ao Estatuto do Gestor Público, o Governo aprovou, na mesma data, um decreto-lei que, passado mais de um mês, ainda não foi publicado. Diga-se, aliás, que esse estatuto, que o Governo considerava urgente e importante no início da Legislatura, deveria ter sido concluído e aprovado em finais de 2005. Ou seja, este estatuto, aprovado mas ainda desconhecido, surge com um atraso de mais de um ano. E, Sr.
Secretário de Estado, se tiver dúvidas relativamente a estes prazos era bom que lesse as Resoluções do Conselho de Ministros n.os 112/2005, de 30 de Junho, 155/2005, de 6 de Julho e, já agora, também o Despacho n.º 20 926, de 20 de Setembro. Aí poderá comprovar que as datas que estou aqui a invocar correspondem à verdade.
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Devem lá estar numa gaveta!
O Orador: — Isto pode parecer de pouca relevância, Sr. Secretário de Estado, mas não é. É, ao invés, de grande importância, por várias ordens de razão. Desde logo, porque o Governo assume neste diploma que esse estatuto é uma peça fundamental nas novas regras para o sector empresarial do Estado mas nada diz e nada esclareceu o Sr. Secretário de Estado quando falou sobre o mesmo.
Depois, o Governo, enquanto se atrasa e atrasa — e já lá vão dois anos de funções governativas —, vai exonerando gestores e administradores públicos e nomeando outros para os seus lugares. Os novos gestores, como se compreende, não serão abrangidos pelas novas regras, tendo em conta a não retroactividade da lei.
Por outro lado, as exonerações resultam não do reconhecimento de má gestão mas de evidente colocação de boys, tornando o sector empresarial do Estado numa verdadeira «boys zone».
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva): — Isto não é a Câmara Municipal de Lisboa!
O Orador: — Pior ainda, Sr. Secretário de Estado: estas exonerações, nestes dois anos de Governo socialista, provocaram indemnizações superiores a 3 milhões de euros. E quem o diz, Sr. Secretário de Estado, não é a comunicação social mas, sim, o Tribunal de Contas, numa das suas últimas auditorias, em que conclui que os fundamentos, as justificações da cessação antecipada do mandato dos administradores
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são vagas, imprecisas e até inexistentes. Estas são expressões, Sr. Secretário de Estado, do Tribunal de Contas, não são nem da comunicação social nem do PSD.
Bem pode este diploma falar em contenção da despesa pública e no rigor na gestão — é o que está na exposição de motivos. São palavras bonitas, Sr. Secretário de Estado, mas não passam à prática. A verdade é que o Governo, na sua prática, faz exactamente o contrário, como se verifica. É caso para lembrar Frei Tomás: «Olha para o que digo, não olhes para o que faço».
Este é, pois, o momento certo para o Sr. Secretário de Estado esclarecer onde é que estas situações se encaixam no rigor que o diploma invoca e defende.
Sente-se o Governo confortável com esta situação, que é da sua inteira responsabilidade, sendo que paralelamente vai exigindo um esforço brutal aos portugueses? Sr. Secretário de Estado, termino com dois lamentos, que são simultaneamente reparos. O primeiro deles é para referir que o Governo diz que ouviu os órgãos próprios das Regiões Autónomas e a Associação Nacional dos Municípios Portugueses mas, mais uma vez, não anexa os pareceres e também nada esclareceu quanto a estas posições.
O segundo é para realçar que o Governo, no artigo 5.º do projecto de decreto-lei anexo à proposta de lei, propõe a revogação do Decreto-Lei n.º 75-A/77, de 28 de Fevereiro, mas o mesmo já foi revogado em 1979, o que novamente vem demonstrar a falta de rigor deste diploma. Aproveito para aconselhar o Sr. Secretário de Estado a consultar a base de dados legislativa do Governo, a DIGESTO, onde poderá novamente comprovar que este diploma já foi revogado.
Termino, Sr. Secretário de Estado, solicitando que dê alguns minutos do seu tempo para esclarecer estas minhas considerações e questões.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, começo por uma questão recorrente e, curiosamente, não é a primeira vez que o faço com a presença de V. Ex.ª nesta Casa a propósito de iniciativas legislativas do Governo.
No preâmbulo da proposta de lei faz-se referência à audição prévia da Associação Nacional dos Municípios Portugueses e dos órgãos das Regiões Autónomas, diz-se que o Governo os ouviu, mas não sabemos de nada. Não sabemos se essas instituições estiveram ou não de acordo, se fizeram ou não observações e, sobretudo, se essas observações foram ou não seguidas pelo Governo. Pode dar-se o caso de V. Ex.ª trazer consigo esses pareceres e essas observações e, se assim for, agradecíamos que nos transmitisse o teor dos pareceres destas instituições e entidades.
Uma segunda questão é referente às inovações legislativas introduzidas pelo Governo na proposta de lei.
Vou dar dois exemplos apenas, Sr. Secretário de Estado. O primeiro consiste numa dúvida: qual é o conceito, qual é a origem, a representação de capital que o Governo atribui ao estatuto dos administradores ditos independentes? No fundo, gostávamos de saber o que são, para o Governo, administradores independentes e como é que conceptualiza a nomeação deste tipo de administradores.
Segundo exemplo: o Governo impõe a obrigação de os administradores não executivos elaborarem relatórios sobre o desempenho dos administradores executivos. O que parece claro da lei é que os administradores não executivos assumam funções de auditoria e de avaliação, mas de auditoria e de avaliação da empresa — auditoria do funcionamento da empresa, avaliação do cumprimento das orientações e dos instrumentos de gestão. Quanto a isso não há dúvidas, mas emitir relatórios de avaliação de uma forma expressa sobre a actividade dos administradores executivos não parece, quanto a nós, passível nem de tradução ética, nem muito menos política, numa lei. Portanto, a questão é esta: será mesmo esta a vontade do Governo ou trata-se apenas de um mero lapso? Terceira e última questão: habitualmente, sucede com muitos Deputados desta Casa um impasse sobre o qual, aproveitando a discussão desta proposta de lei, seria preciso ouvir de uma forma expressa o Governo.
Perante as iniciativas, de diversos tipos — perguntas, requerimentos, questões orais —, feitas por muitos Deputados directamente ao Governo e que têm que ver com empresas públicas mas, sobretudo, reconheçase, com empresas participadas pelo Estado, a maioria das vezes não há a obtenção de respostas. Argumento recorrente utilizado é o Governo dizer «trata-se de um sector empresarial, não podemos responder, não queremos imiscuir-nos na gestão interna destas entidades». As empresas públicas participadas, por sua vez, remetem-se a uma pura negação de resposta. E a questão é esta: como é que o Governo encara esta omissão grave às obrigações constitucionais que todos têm — o Governo e também, no nosso entendimento, as empresas públicas participadas — de prestar informação e elementos de acompanhamento a esta Casa, para que ela possa desempenhar cabalmente as suas funções constitucionais.
Vozes do PCP: — Muito bem!
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Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Telmo Correia.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças.
O Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Manuel Ribeiro, vou responder primeiro à questão do Estatuto do Gestor Público e da resolução do Conselho de Ministros relativa às boas práticas de governo empresarial.
Sr. Deputado, V. Ex.ª não ignora que o Estatuto do Gestor Público — e, naturalmente, tenho presente os textos quer das resoluções quer do despacho que citou — resultou de um trabalho técnico apurado, levado a cabo por um grupo de trabalho presidido pelo Sr. Prof. Jorge Miranda. E, portanto, o procedimento legislativo tendente à aprovação do Estatuto do Gestor Público iniciou-se apenas depois de o grupo de trabalho ter apresentado a sua proposta técnica, porque não poderia ser de outra maneira, não poderia ser antes.
E sobre isso também não há aqui nada de novo, porque já em ocasiões anteriores quer eu próprio quer o Sr. Ministro de Estado e das Finanças tivemos oportunidade de ir mantendo esta Câmara informada sobre o andamento dos trabalhos relativos ao Estatuto do Gestor Público.
Portanto, dizer agora que há atrasos nesta matéria não me parece nem uma questão nova nem uma questão relevante para este processo, até por uma razão muito simples: o actual Estatuto do Gestor Público data de 1982 e nunca foi revisto. Desde 1999, com a aprovação da actual lei das empresas públicas, que se previa a revisão do estatuto do gestor público. Pois bem, os senhores, quando tiveram responsabilidades governativas, não tomaram nenhuma iniciativa legislativa nesta matéria, está a ser tomada agora.
Portanto, o Estatuto do Gestor Público está aprovado em Conselho de Ministros, foi amplamente divulgado, inclusive o conteúdo das medidas aprovadas, e está neste momento pendente para promulgação. Assim, a menos que o Sr. Deputado queira suprimir a fase de promulgação, coisa que não é possível, teremos de aguardar que a mesma aconteça e só depois disso ele será publicado.
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Por que é que os outros foram publicados?
O Orador: — Quanto à resolução, terei todo o gosto em fazer chegar ao Parlamento uma cópia da resolução aprovada em Conselho de Ministros e cuja publicação se aguarda.
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Isso era bom!
O Orador: — Sobre as nomeações, as exonerações e a auditoria do Tribunal de Contas, Sr. Deputado, a auditoria do Tribunal de Contas, como bem se recorda, refere-se a um período relativamente ao qual o PSD e o CDS-PP tiveram responsabilidades governativas. Portanto, quando fala em indemnizações chorudas, estamos a falar desse período.
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Não é verdade!
O Orador: — De qualquer modo, gostaria de referir que com as iniciativas legislativas agora levadas a cabo — esta que está em apreciação, o Estatuto do Gestor Público e a resolução do Conselho de Ministros sobre as boas práticas para as empresas públicas — são integralmente acolhidas as 13 recomendações do Tribunal de Contas constantes desse relatório. Assim, ao contrário do que acontecia no passado, todas essas recomendações têm agora integral e pleno acolhimento.
Sobre o diploma de 1977 que referiu, temos consciência do que disse; o problema é que, não obstante a menção que fez, este diploma tem vindo a ser invocado e utilizado sucessivamente. Nós queremos pura e simplesmente clarificar que não se encontra em vigor e, portanto, proceder à sua revogação.
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Vai ser duplamente revogado!
O Orador: — Sr. Deputado Honório Novo, terei todo o gosto em fazer chegar ao Parlamento – aliás, pensava que já cá se encontrava – todo o expediente relativo aos pedidos de parecer e às respostas recebidas.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Não está cá, seguramente! O Sr. Secretário de Estado já devia saber disso!
O Orador: — De qualquer modo, se assim não é, confirmarei para que tal aconteça e para que os pareceres sejam entregues.
Quanto à questão dos administradores independentes, o que se pretende deles é uma coisa muito simples: que não tenham apenas em conta os objectivos do accionista, e que serão plasmados nos respectivos contratos de gestão a celebrar com os accionistas, mas que tenham sobretudo em conta e sejam os principais porta-vozes dos interesses dos restantes afectados na comunidade em que a empresa se insere. E estou a
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falar, naturalmente, dos trabalhadores, dos consumidores, dos utentes de serviços públicos, nas empresas onde esses aspectos se colocam com maior acuidade.
O Sr. Presidente (Telmo Correia): — Sr. Secretário de Estado, tem de concluir.
O Orador: — Concluo já, Sr. Presidente.
Quanto à questão dos administradores não executivos, Sr. Deputado, não estamos a inventar nada, estamos é a clarificar no diploma uma coisa muito simples: é que ao nível das empresas públicas se apliquem as mesmas regras e os mesmos procedimentos que se aplicam às empresas privadas, nos termos do Código das Sociedades Comerciais, e as regras relativas ao conselho geral e de supervisão são exemplo disso mesmo.
Quanto aos pedidos de informação, e com isto termino, uma nota muito breve. Não tínhamos, desde 2001, nenhum relatório publicado sobre o sector empresarial do Estado. A primeira vez que isto aconteceu desde 2001 foi no ano passado, relativamente ao exercício de 2005. A própria Comissão Europeia, na última avaliação do programa de estabilidade português, reconheceu precisamente, no texto do relatório, a importância desta informação para um conhecimento mais transparente e actualizado da situação das empresas públicas e do sector empresarial do Estado. Portanto, falta de transparência, Sr. Deputado, é coisa de que, julgo, não nos podem acusar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Telmo Correia): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rosário Cardoso Águas.
A Sr.ª Rosário Cardoso Águas (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.
Secretário de Estado do Tesouro e Finanças, Sr.as e Srs. Deputados: As motivações apresentadas pelo Governo nesta proposta de lei não permitem discordâncias a quem, como o PSD, gosta de fazer actividade política com honestidade — estou, no entanto, a falar de motivações —, porque a revisão do Regime Jurídico do Sector Empresarial do Estado está fundamentada e sustentada num conjunto de objectivos que merecem o nosso acordo.
E foi, por isso, com um espírito animado que iniciámos a análise da proposta de lei, concordando com os objectivos que visam melhorar a gestão de um universo de empresas cujos passivos acumulados valem, no mínimo, 7% do produto interno bruto.
Contudo, após a análise do diploma, as nossas expectativas sumiram-se e o que sobrou foi um conjunto largo de dúvidas, porque não encontramos uma ligação coerente entre os objectivos enumerados na exposição de motivos e o articulado do decreto-lei, que, na substância, pouco acrescenta à actual legislação.
É até difícil de compreender por que é que o Governo propõe uma revisão a um regime desta importância e, depois, não se esforça nem se dá ao trabalho de apresentar um trabalho verdadeiramente consequente.
A nossa convicção é que esta proposta de lei, que, aparentemente, reforça os deveres de informação e os mecanismos de controlo financeiro, não contém as soluções suficientes nem os requisitos para o cumprimento eficaz dos fins a que se propõe.
A exposição de motivos começa por apresentar, como justificação, a necessidade de harmonização deste regime com o novo estatuto do gestor público. Nada de mais pacífico no campo dos princípios, mas tarefa impossível, para nós, Deputados, a quem o Governo não apresentou ainda tal estatuto.
Esta, aliás, é uma atitude recorrente do Governo, que apresenta as suas políticas numa lógica de retalho, impedindo a Assembleia da República de fazer uma apreciação política global da qualidade das iniciativas apresentadas.
O diploma enumera mais três objectivos: a necessidade de dotar as empresas públicas de modelos organizacionais que potenciem boas práticas de gestão; o reforço da intervenção e tutela do Estado, somando às orientações estratégicas que o anterior diploma já continha orientações de dois níveis, umas sectoriais e outras específicas, dirigidas a cada empresa pública individualmente; e também o reforço dos mecanismos de controlo financeiro e os deveres de informação.
Como referi anteriormente, estes são objectivos de natureza inquestionável. Mas o que nos importa, a nós, Assembleia da República, é avaliar se as soluções legislativas propostas são eficazes para cumprir estes objectivos e, por isso, gostava de ter aqui visto esclarecido, por exemplo, o artigo 11.º do diploma.
Está previsto fixar, por despacho ministerial, um conjunto de orientações sectoriais e de orientações específicas dirigidas às empresas públicas. Estas orientações, segundo o diploma, destinam-se: a) a vincular a actuação dos representantes públicos; b) a estabelecer critérios para determinar as remunerações dos gestores públicos em causa; e também para, através do cumprimento destas orientações, se definir o critério de avaliação de desempenho desses gestores públicos.
Até aqui tudo bem. Mas, Srs. Deputados, a questão é que estas orientações não são obrigatórias, são apenas facultativas, bem como é facultativa a quantificação das metas que, supostamente, devem definir.
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Por isso, gostava de ter visto aqui esclarecido a utilidade da inclusão destas normas — normas que só cumpre quem quer.
Como é que pretende o Governo aplicar um sistema de avaliação de desempenho dos gestores públicos com base no cumprimento de orientações que podem, ou não, existir e cujas metas de aferição serão quantificadas, ou não, dependendo da vontade do Ministro que, em cada momento, estiver em exercício? Este diploma também nada diz quanto à fixação das remunerações dos órgãos sociais – conselho de administração, comissão de auditoria, comissão de avaliação, etc. Se foi preocupação do Governo inspirar-se no Código das Sociedades Comerciais e no direito privado, era neste diploma que devia esclarecer sobre quem fixa as remunerações dos gestores.
Na nossa opinião, este artigo 11.º prevê um conjunto de normas de utilização discricionária que contribuirão para um tratamento disforme da totalidade do sector empresarial do Estado, o que contraria os desígnios de transparência e de simplificação administrativa que o Governo tanto apregoa.
Gostava também de abordar o novo modelo organizacional que o Sr. Secretário de Estado já hoje referiu, na sua intervenção. O diploma inova ao consagrar a existência de uma comissão de auditoria, cujos membros, estranhamente, serão os administradores não executivos do conselho de administração que a comissão de auditoria pretende fiscalizar.
Gostava de saber se o Sr. Secretário de Estado acredita mesmo, nem que seja como cidadão, que esta composição da comissão de auditoria lhe dá a garantia de independência na execução de funções de fiscalização do conselho de administração.
A nós não dá, porque viola um princípio virtuoso que é o da segregação de funções, requisito elementar para um trabalho independente.
Mas há mais: o diploma prevê que cabe ao conselho de administração a definição das competências da comissão que, supostamente, o vai fiscalizar na sua actividade.
Sr. Secretário de Estado, a isto só podemos chamar uma coisa: promiscuidade funcional.
O Sr. Presidente (Telmo Correia): — Sr.ª Deputada, já excedeu o seu tempo. Peço-lhe que conclua, por favor.
A Oradora: — Vou já concluir, Sr. Presidente.
Dir-me-á o Sr. Secretário de Estado que este modelo foi inspirado no Código das Sociedades Comerciais, mas é bem diferente. O Governo importou apenas uma parcela do articulado desse código, porque aí não é o conselho de administração que determina as funções da comissão de auditoria mas, sim, o próprio código, bem como está imposto por lei um conjunto de incompatibilidades, que têm de ser cumpridas, e assegurada a independência dos órgãos dessa comissão.
Esta comissão que aqui está em apreço, com as competências que estão previstas, não é mais do que uma secretaria de luxo, com toda a certeza bem remunerada, mas de isenção, no mínimo, duvidosa.
Pergunto ao Sr. Secretário de Estado, se ainda puder responder, se não considera que os interesses do Estado ficavam bem melhor acautelados com a obrigatoriedade de realização de auditorias externas, independentes e anuais.
Neste diploma abundam comissões e a emissão e publicação de papel, mas há muitas omissões graves quanto ao estabelecimento de incompatibilidades, quanto à garantia do desempenho independente de cada órgão, como é caso das omissões quanto às responsabilidades e consequências dos actos de gestão dos gestores públicos.
O Sr. Secretário de Estado está preocupado com planos de investimento e com o seu financiamento. Nós também. Mas não está preocupado, por exemplo, em garantir que, neste diploma, fique consagrada a obrigatoriedade do Estado publicar os contratos que prevêem a atribuição de indemnizações compensatórias, devidamente fundamentadas e calendarizadas, para os próximos anos? Era isso que queríamos ver aqui consagrado! Na opinião do PSD, este diploma está muito longe do que se esperava e frustra as perspectivas dos cidadãos ao não prever mecanismos simples e eficazes de garantia e controlo da gestão dos recursos públicos, obedecendo à aplicação dos simples princípios da economia, da eficácia e da eficiência.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Telmo Correia): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Paulo Carvalho.
O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Pretende o Governo promover alterações ao regime jurídico do sector empresarial do Estado, nomeadamente criando condições que assegurem a efectiva definição de orientações gerais para todo o sector empresarial do Estado, para determinados sectores de actividade e orientações específicas para cada empresa, adaptando o regime que regula a sua estrutura ao previsto no Código das Sociedades Comerciais e também reforçando, segundo afirma, os mecanismos de controlo financeiro e de fiscalização.
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São princípios que, encarados de forma geral, se afiguram ao CDS como razoáveis e prudentes.
É orientação do CDS, em matéria de empresas públicas, que elas correspondem, essencialmente, a dois tipos distintos: aquelas que se incumbem de serviços gerais da colectividade e que são, consequentemente, a expressão, sob a forma empresarial, de serviços públicos, e aquelas que são puras e simples empresas comerciais inseridas no mercado e que, em concorrência ou em mercado protegido por regulamentos, têm por real objectivo o lucro.
Defendemos que os princípios de gestão e as fórmulas de estrutura adoptadas devem adequar-se ao tipo de empresas a que se destinam.
Quer no que respeita à adequação ao regime do Código das Sociedades Comerciais e à organização da estrutura de administração aí prevista quer quanto à possibilidade de o Estado ter efectiva capacidade de promover orientações de gestão, entendemos que não faz sentido tratar da mesma forma entidades que são realmente diferentes.
Se atentarmos na definição que nos é dada pelo artigo 2.° do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, verificaremos que o sector empresarial do Estado abrange quer as empresas públicas propriamente ditas, nelas se incluindo também as entidades públicas empresariais, quer as empresas participadas, como descritas nos artigos 2.° e 6.° do mesmo diploma, ou seja, um vasto leque de entidades bem distintas.
Ora, atento o previsto no artigo 11.°, na versão que o Governo lhe pretende conferir, parece poder concluirse que as orientações de gestão se destinam a todas elas – e «todas» é um conceito muito amplo –, que parecem poder abranger desde a CP à Caixa de Geral de Depósitos, às administrações portuárias, e tantas e tantas outras múltiplas empresas públicas ou participadas pelo Estado português.
Isto não nos parece fazer grande sentido…
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — … e o que esperávamos, uma vez que o Governo pretende melhorar o regime jurídico das empresas que compõem o sector empresarial do Estado, era que soubesse fazer as distinções fundamentais e separasse claramente aquilo que, de facto, é completamente desigual e que, por isso mesmo, tem de ter tratamento diferente.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — Há um debate que deveria ser feito de forma profunda nesta Assembleia e que, desta forma, não se fará. De facto, até onde deve ir a competência para o Estado, através do Governo, interferir na gestão de certo tipo de empresas públicas? Vejamos uma qualquer empresa pública que exerce, em regime de concorrência, uma actividade no mercado. Fará sentido continuar a ter traços distintivos marcantes de regime face às suas congéneres privadas que vão muito para além do regime de remuneração dos membros dos seus órgãos sociais ou da garantia da prossecução de um conjunto de interesses colectivos que também lhe possam estar confiados? Obviamente, as empresas que, pelo contrário, são uma mera expressão empresarial de um serviço público e cujo objecto é, consequentemente, a prestação de serviços públicos de interesse geral, essas, sim, podem e devem manter, mesmo na submissão a orientações de gestão emanadas do Governo, traços distintivos específicos do seu regime jurídico.
Esta proposta de lei de autorização legislativa não faz essas distinções de forma clara nem promove esse debate, que nos parece de grande relevo, nem se propõe clarificar um regime jurídico que, já de si, é suficientemente delicado para poder ser submetido a confusões de regime e estatuto.
Não gostaria de concluir sem deixar uma palavra sobre a forma de administração destas empresas que vem prevista nesta proposta de lei.
Aparentemente, parece conformar-se com as alterações introduzidas, em Março do ano passado, ao Código das Sociedades Comerciais. Mas será mesmo necessário que empresas públicas, em que os conselhos de administração devem ser reduzidos ao mínimo, desde logo, numa óptica de controlo da despesa, passem a contemplar a existência de administradores executivos e também não executivos, estes em número superior ao daqueles, de comissões especializadas, de avaliação ou de auditoria e de outras sofisticações que o artigo 278.º do Código das Sociedades Comerciais permite mas não impõe? Por nós, parece abrir-se aqui mais uma porta para o aumento do despesismo público e da falta de responsabilização, aproveitando como pretexto a adequação ao Código das Sociedades Comerciais.
Além do mais, é a própria previsão do decreto-lei material que estabelece um mecanismo de redacção confusa, o que, só por si, já é um mau princípio. Porque não remeter simplesmente para o Código das Sociedades Comerciais, nas diversas formas que este já prevê para a estrutura organizativa da administração societária? Consideramos que o Governo perde aqui uma oportunidade, por um lado, de melhorar profundamente um regime em vigor e, por outro, de promover um debate que é necessário, dado o peso do sector empresarial do Estado na economia nacional.
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Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Telmo Correia): — Igualmente para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Leonor Coutinho.
A Sr.ª Leonor Coutinho (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Contrariamente ao costume quando se fala aqui da Administração Pública e da sua gestão sob a forma de sector administrativo, hoje é a gestão das empresas que está na ordem do dia. Aliás, no dia de hoje, tanto empresas públicas como privadas estão na ordem do dia.
Em 1999, quando o Estado português publicou o Decreto-Lei n.º 558/99 que agora se pretende alterar, a OCDE publicava os seus princípios sobre o governo das sociedades e a União Europeia publicava os princípios sobre o governo das sociedades.
São sempre recorrentes, nestes documentos, a importância da transparência, a importância da informação e as responsabilidades do órgão de administração, para além da salvaguarda dos direitos dos accionistas.
O Decreto-Lei n.º 558/99 apresentava, como preocupação essencial, «o acompanhamento das mais recentes orientações relativas ao enquadramento das empresas públicas no âmbito da União Europeia e, designadamente, a sua sujeição aos normativos do direito de concorrência e à configuração dos serviços de interesse público geral.
No entanto, o essencial do diploma visava garantir, com uma grande flexibilidade que era anunciada, a abrangência de todo um universo diversificado do sector empresarial do Estado no âmbito de uma lei enquadradora, uma vez que se reconhecia que apenas um número reduzido de empresas se encontrava sujeito ao Decreto-Lei n.º 260/76 e que a extensão do sector regulado só tinha paralelo na variedade de figuras jurídicas consagradas nos diferentes estatutos.
Foi, assim, consagrado o direito privado como direito aplicável a toda a actividade empresarial.
Previa-se desde logo, no preâmbulo da lei, a necessidade de outras alterações legislativas, designadamente a revisão do estatuto do gestor público, a tal que não foi feita nos últimos três anos e que agora está para promulgação.
Neste contexto, foi fundamental a extensão dos poderes do Tribunal de Contas ao universo empresarial do Estado, incluindo o novo sector das empresas regionais e locais, cuja lei-quadro tinha sido aprovada pela Assembleia da República, também em 1999.
Aliás, conforme é referido pelo Tribunal de Contas, o sector empresarial do Estado tem vindo a sofrer enormes alterações, abrangendo hoje um universo extremamente diversificado de empresas, tanto pela alteração dos sectores tradicionais, como resposta às normas de liberalização e concorrência, mas também por abranger agora sectores que, anteriormente, não tinham empresas públicas, como o ordenamento do território ou o ambiente, e por consagrar cada vez mais evoluções da gestão de sectores da administração do Estado, como é o caso dos hospitais — estávamos em 1999.
O conjunto de escândalos financeiros, de que o mais conhecido é a falência do gigante norte-americano na área da energia, Enron, a que se podem equiparar casos similares, tanto nos Estados Unidos, com a WorldCom, como na Europa, com a Parmalat ou a Vivendi, trouxeram para o domínio da opinião pública um debate que há muito se vinha fazendo nos meios académicos ou nos órgãos de regulação e supervisão: a falta de eficácia dos mecanismos de governo das sociedades e as falhas dos sistemas de auditoria e controlo, tanto nas empresas públicas como, e sobretudo, nas empresas privadas.
A necessidade de voltar a instituir a confiança nos mercados levou os Estados Unidos à lei normalmente designada por SOX (Lei Sarbanes-Oxley) e ao plano de acção da Comissão Europeia «Modernizar o direito das sociedades». Aliás, é na sequência desse plano que a nossa legislação tem vindo a ser alterada.
Nesse plano de acção são consagrados os princípios da responsabilidade dos administradores, que, anteriormente, não era consagrada do mesmo modo, é fixada a obrigação de declarações sobre o governo das sociedades, que se retoma neste diploma, é salientada a importância do papel dos administradores não executivos, que também consta deste diploma, e o controlo e divulgação das remunerações dos administradores, que igualmente é consagrado agora relativamente ao sector público.
Através do referido plano de acção, foram reforçadas as normas de transparência da informação e a prevenção e repressão de políticas irregulares das sociedades que, pelos vistos, também ocorrem nas empresas privadas. Aliás, é interessante verificar que, no diploma em apreço, vamos consagrar exactamente as mesmas regras.
Foi dada maior atenção às normas sobre a revisão oficial de contas e as sociedades de auditoria.
É neste contexto de reestruturação do governo das sociedades e de reforço das necessidades de controlo e transparência que se inserem as disposições que o Governo se propõe fixar para as empresas públicas e que pretendem atingir três tipos de objectivos.
Em primeiro lugar, assegurar a harmonia com as novas práticas de governo das sociedades.
Em segundo lugar, que sejam claramente definidas e acompanhadas as orientações de gestão fixadas pelo accionista Estado e que, portanto, sejam escritas e visíveis.
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Pretende-se, por último, assegurar o rigor na gestão dos recursos disponíveis e conter as despesas do Estado.
Assim, o Partido Socialista votará favoravelmente o pedido de autorização legislativa que agora é apresentado pelo Governo para legislar neste sector, relativamente ao qual todo o mundo está a legislar, tanto a nível público como privado.
Nesta matéria, o contributo do governo anterior não foi grande, mas é evidente que este Governo tomou em mãos a reforma de todo este sector.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Telmo Correia): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: O Governo apresentou a proposta de lei n.º 114/X, que visa solicitar autorização para introduzir alterações no regime jurídico do sector empresarial do Estado.
Segundo o Governo, as alterações propostas pretendem detalhar o articulado da legislação sobre o regime jurídico do sector empresarial do Estado face às debilidades encontradas durante o período de aplicação, harmonizando-o, portanto, com o novo estatuto do gestor público e com o novo Código das Sociedades Comerciais.
As alterações propostas visam, fundamentalmente, a definição de orientações de gestão, o aperfeiçoamento dos procedimentos e das obrigações de informação e a definição de novos modelos de organização empresarial.
Vou debruçar-me sobre três aspectos e fazer três observações.
Primeiro, quanto à definição das orientações de gestão — orientações estratégicas, gerais e específicas —, todas oriundas do Governo, parecem-nos adequadas se, porventura, vierem a dar eficácia ao sector empresarial do Estado e, particularmente, se este passar a funcionar ao serviço do interesse público. No entanto, há que dizer, Sr. Secretário de Estado, que temos algumas dúvidas de que o Governo assuma em pleno este objectivo central.
Segundo, concordamos também com as propostas de alteração às formas e aos períodos de apresentação de informação e controlo, por tornarem a informação disponibilizada mais clara, designadamente no que diz respeito às responsabilidades dos gestores públicos.
Terceiro, relativamente aos novos modelos propostos para a organização dos órgãos de governação das empresas públicas e participadas, a moda actualmente em uso nas sociedades anónimas parece imperar e fazer lei, sem que, nalguns casos, quanto a nós, existam justificações para tal.
Trata-se, portanto, de uma organização por vezes desajustada e complexa face ao tipo e à dimensão das empresas. Existem empresas totalmente públicas, bem como participadas, que não são grandes empresas e em que a aplicação concreta deste modelo porventura poderá ser geradora de empolamento orgânico, de multiplicação de cargos e encargos — e o Sr. Secretário de Estado não comentou esta questão — e, de alguma forma, entrar até em contradição com aquilo que são os objectivos apresentados pelo Governo na sua proposta de lei.
Devo dizer-lhe, Sr. Secretário de Estado, que a sua resposta quanto aos administradores não executivos é, no mínimo, estranha. É que, pelos vistos, para V. Ex.ª é perfeitamente legítimo e inquestionável copiar tudo o que é do sector privado para o público, tudo o que é do sector privado é obrigatoriamente bom para o sector público.
Não é assim, Sr. Secretário de Estado! E, por mais que o senhor se esforce, ninguém entende porque é que os administradores não executivos devem ter a competência para elaborar relatórios sobre a actividade dos administradores executivos. A não ser que o objectivo seja criar conflitos internos, artificiais muitas vezes, na gestão da própria empresa pública.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, a definição de objectivos e orientações, a obrigação de avaliar o respectivo cumprimento e a informação e acompanhamento da gestão de empresas públicas e participadas pode, portanto, quanto a nós, introduzir elementos positivos. Falta, porém, clarificar e precisar as obrigações que todos, Governo e empresas públicas e participadas, têm também para com o País e, designadamente, para com esta Assembleia.
Esta Casa não pode continuar arredada por argumentos formais, usados pelo Governo ou pelas próprias empresas, ou impedida de desempenhar cabalmente as suas competências constitucionais. E, porventura, seria também este o momento para precisar esta obrigação.
Sr. Secretário de Estado, foi esta a questão central que lhe coloquei e à qual o senhor se furtou a responder. É que, Sr. Secretário de Estado, ou assumimos claramente a obrigação de prestar informação a esta Casa sobre o funcionamento e o acompanhamento da gestão das empresas públicas participadas ou não vamos longe quanto ao desempenho das obrigações constitucionais desta Casa.
Finalmente, se os níveis de informação…
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O Sr. Presidente (Telmo Correia): — Sr. Deputado, o seu tempo já está esgotado.
O Orador: — Vou terminar, Sr. Presidente.
Como dizia, se os níveis de informação e acompanhamento forem superiores, se as condições para a avaliação do cumprimento das orientações forem as correctas, se a Assembleia da República puder conhecer melhor o desempenho deste sector vital, estarão a ganhar não as empresas públicas ou as empresas participadas, mas estará certamente a ganhar o sector empresarial do Estado e, com ele, o País.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Telmo Correia): — Também para uma intervenção, tem a palavra Sr. Deputado João Semedo.
O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda tem uma concordância genérica com as alterações que o Governo pretende introduzir no regime jurídico do sector empresarial do Estado, apesar de nos parecer que algumas delas poderão ser de difícil ou incerta execução e algumas outras traduzir-se em alguma ineficácia.
As nossas diferenças, aliás públicas e notórias, aquilo que nos separa do Governo tem, portanto, outra natureza, centra-se em torno de outras questões. Respeita à forma como olhamos para o sector empresarial do Estado e como vemos o seu papel, a sua composição, as empresas que o devem ou não integrar, os sectores que devem ou não incluir o sector público.
Discordamos também, em muito casos, das orientações definidas pelo Governo, que, na nossa opinião, não permitem o total aproveitamento do sector empresarial do Estado, enquanto alavanca do desenvolvimento social e económico, do crescimento da riqueza do País, do aumento dos postos de trabalho e do emprego e da satisfação de algumas necessidades dos cidadãos.
O combate à crise social e à estagnação económica passa também por um sector público mais forte, mais dinâmico e melhor orientado.
As propostas do Governo que hoje discutimos em nada modificam esta avaliação crítica que fazemos sobre a política imprimida ao sector público. Mas reconhecemos que podem ter reflexos positivos no funcionamento das empresas públicas e na correcção de algumas deformações e entorses, que saltam à vista na sua actividade e funcionamento.
Somos favoráveis à clarificação das relações entre o Governo e as empresas do sector empresarial do Estado, no que diz respeito à definição das orientações para a sua gestão.
Concordamos também com as medidas que sublinham os deveres de informação das empresas públicas perante quer a tutela quer a própria sociedade.
Vemos como positivo o reforço dos mecanismos de controlo, quer financeiro quer societário, nomeadamente a limitação do endividamento e o condicionamento das alterações de pactos sociais e do capital social das referidas empresas.
Admitimos como vantajosas as propostas apresentadas quanto à arquitectura dos órgãos de gestão das empresas públicas, embora seja necessário alertar para o risco de a transição de um modelo para o outro se poder traduzir na multiplicação desmesurada e desnecessária de lugares e cargos nas administrações das empresas públicas, sobretudo num país em que é grande o apetite e a voragem por estes lugares.
Por último, somos favoráveis à existência de um estatuto do gestor público que se aplique a todos os que administram empresas públicas, acabando com a multiplicidade de regimes e estatutos e com as diferenças, sem qualquer fundamento e que, muitas vezes, são social e até moralmente inaceitáveis.
O estatuto do gestor público é, portanto, uma peça, um instrumento de extrema importância. Por isso, não compreendemos e criticamos o Governo por não fazer acompanhar esta proposta de uma outra relativa a um novo estatuto do gestor público, há muito prometido e que constitui, aliás, um compromisso programático do Governo.
Discutir o regime das empresas públicas no desconhecimento do futuro estatuto dos seus gestores é a mesma coisa que jogar xadrez com metade das peças. Esta constitui a principal crítica do Bloco de Esquerda a este pedido de autorização legislativa.
Tanto mais que é certo e sabido que a aprovação do novo regime do sector empresarial do Estado vai provocar uma verdadeira dança e contradança de gestores públicos.
Neste contexto, adquire uma especial importância o que vier a ser consagrado no futuro estatuto do gestor público, sobretudo quanto a critérios de selecção, recrutamento e nomeação dos ditos gestores, matérias que o Governo retirou da proposta de lei agora em discussão, na perspectiva, certamente, de as fazer constar do estatuto do gestor público.
Como sabemos não faltam no sector empresarial do Estado casos de gestores que, estando mais preocupados com a gestão das suas expectativas pessoais do que com a gestão da empresa, ensombram e prejudicam o Estado e o interesse público.
Nomeações a pedido ou de favor, erros de casting, amiguismo, a filiação partidária como primeira alínea do curriculum profissional — há de tudo isto no sector público. É tempo de lhe pôr um ponto final.
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O estatuto do gestor público não será lixívia para todas as nódoas, mas pode certamente contribuir para eliminar algumas e evitar muitas outras. O Governo devia tê-lo trazido a esta discussão.
Por isso, Srs. Membros do Governo, para a próxima vez, e para fazermos este jogo, tragam todas as peças do xadrez.
Aplausos do BE.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente António Filipe.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças.
O Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças: — Sr. Presidente, gostaria de fazer três observações muito breves, procurando também, de certo modo, responder a alguns comentários feitos.
A separação entre o regime das empresas públicas e o estatuto do gestor público não é o Governo que a faz, mas a própria Constituição. Já foi assim em 1976 e em 1982 — não estamos, pois, a lidar com nada de novo.
Por outro lado, as medidas aprovadas e que constam do novo estatuto do gestor público, o qual está pendente de promulgação, foram amplamente anunciadas e difundidas, desde logo no dia em que foram aprovadas em Conselho de Ministros. Portanto, permitam-me que rejeite totalmente a acusação de que há aqui peças escondidas.
Gostaria de referir uma outra questão a propósito de uma observação feita pelo Sr. Deputado Honório Novo sobre a prestação de informação. Permita-me discordar da sua opinião, Sr. Deputado, pois o Governo não só responde como, mais, vai disponibilizar no site da Internet da Direcção-Geral do Tesouro informação detalhada sobre cada uma das empresas públicas — isto, de acordo com a resolução do Conselho de Ministros aprovada em matéria de boas práticas e transparência das empresas públicas. Portanto, como referi, teremos total transparência e ampla informação sobre esta matéria relativamente às empresas.
A Sr.ª Deputada Rosário Águas falou de medidas insuficientes, mas, curiosamente, não apontou as que faltam. Ora, gostaríamos de ter ouvido quais são as propostas e sugestões do PSD relativamente a esta matéria.
Por outro lado, parece que a Sr.ª Deputada Rosário Águas não leu a proposta de lei que aqui foi apresentada. É que aquilo que referiu sobre as comissões de auditoria não corresponde ao que está na lei. As comissões de auditoria têm autonomia regimental para estipular o seu modo de organização e funcionamento.
Mais, a Sr.ª Deputada disse que estamos a querer afastar as auditorias externas. Ora, o artigo 18.º-E da proposta de lei diz precisamente que compete à comissão de auditoria escolher auditores externos independentes. Portanto, está cá; parece é que a Sr.ª Deputada não leu.
Uma última nota que quero deixar, na sequência de uma observação que também não nos pareceu correcta por parte da bancada parlamentar do PSD, tem a ver com os resultados negativos das empresas públicas. Pois bem, basta olhar para os números: o ano de 2004 foi o pior ano em termos de resultados financeiros das empresas públicas. Se olharmos para o nível de autonomia financeira e solvabilidade das empresas públicas, 2004 foi o ano pior, inclusivamente inferior ao ano de 2001. Ora, em 2005, superámos os níveis que tinham sido alcançados em 2001.
O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — Só falta dizer que foi o seu Governo que fez isso!
O Orador: — E, em termos de resultados operacionais, gostaria de dizer o seguinte: em 2005, os resultados operacionais, após subsídios, foram positivos em cerca de 210 milhões de euros; e, mesmo antes dos subsídios, houve, claramente, uma melhoria dos resultados operacionais face aos exercícios anteriores, em especial face ao exercício de 2004.
Em síntese, Sr.as e Srs. Deputados, a conclusão é esta: o esforço de consolidação e saneamento financeiro que o Governo está a fazer ao nível do sector público administrativo não se cinge ao sector público administrativo, abrange também o sector público empresarial.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem de terminar, Sr. Secretário de Estado.
O Orador: — Portanto, agora já não se faz o que antes se fazia, que era, se me permitem a expressão, «varrer para debaixo do tapete», porque o esforço e as exigências que são feitas são-no nos dois subsectores, ou seja, no sector das empresas e ao nível da Administração Pública.
Aplausos do PS.
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O Sr. Presidente (António Filipe): — Não havendo mais inscrições, está concluído o debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 114/X.
Passamos à discussão do Decreto-Lei n.º 15/2007, de 19 de Janeiro de 2007 — Sétima alteração do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de Abril, e altera o regime jurídico da formação contínua de professores, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 249/92, de 9 de Novembro [apreciação parlamentar n.º 39/X (PCP)].
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O PCP traz hoje à Assembleia da República a discussão de um dos mais gravosos diplomas que este Governo do Partido Socialista já fez aprovar na área da educação. Não só pelo conteúdo que comporta, mas também pelo processo que sofreu a sua discussão com os sindicatos, o Decreto-Lei n.º 15/2007 tem a marca de um Governo que definiu como objectivo estratégico a destruição da escola pública e apontou os funcionários públicos, neste caso os professores, como alvo a abater.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Orador — Registamos, com agrado, que os professores e os seus sindicatos continuam empenhados na discussão, como bem demonstra a significativa delegação que hoje se encontra nas galerias a assistir a esta sessão.
O Governo começou por apresentar o primeiro documento para discussão em Junho de 2006, em cima das férias escolares, numa tentativa de fugir à contestação e de silenciar os docentes.
Aliás, registamos hoje, mais uma vez, a fuga da Sr.ª Ministra, que tenta disfarçar o incómodo destas medidas, mas que não conseguiu disfarçar a gravidade das propostas que apresentou e que viriam a determinar que, pela primeira vez em Portugal, todas as estruturas sindicais de professores convergissem na rejeição desta revisão, deixando o Governo completamente isolado.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Bem lembrado!
O Orador: — Apesar dessa contestação e da apresentação de alternativas e de contrapropostas, o Governo tomou a opção de impor as suas soluções na revisão do Estatuto da Carreira Docente.
E esta opção do Governo já era clara em Junho de 2006, quando a Sr.ª Ministra da Educação assinou o Despacho n.º 13599, que determinava às escolas a aplicação de algumas regras que se encontravam então em discussão.
Infelizmente, este mau prenúncio concretizou-se, e o que temos hoje no Decreto-Lei n.º 15/2007 confirma as preocupações que então manifestámos.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Orador: — A revisão do Estatuto da Carreira Docente, concretizada por este diploma, tem na sua base a ideia errada de que os responsáveis pelos problemas do nosso sistema educativo são os professores, como se os sucessivos Governos fossem meros espectadores da realidade e não fossem eles os principais responsáveis pela situação criada.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — Fica ainda claro que para a estratégia de destruição do sistema educativo que o Governo vai desenvolvendo é fundamental a desmoralização dos docentes, a limitação do acesso à profissão, a criação de divisões entre estes trabalhadores e a sua sujeição à mesma degradação que se vai impondo a todos os funcionários públicos. Aliás, não deixa de ser sintomática das intenções do Governo a «limpeza» feita às referências ao direito de negociação colectiva neste diploma.
Vejamos os aspectos mais negativos e gravosos, mantidos pelo Governo, da proposta inicial até à redacção final do Decreto-Lei.
Por um lado, institui-se uma prova para dificultar o acesso à profissão, criam-se categorias hierarquizadas numa carreira que era única e estabelecem-se constrangimentos administrativos de acesso ao topo da carreira para a esmagadora maioria dos docentes.
O Governo fixa critérios inaceitáveis de avaliação dos docentes como as taxas de abandono escolar, os resultados académicos dos alunos ou a apreciação da actividade lectiva pelos encarregados de educação, ao mesmo tempo que impõe a existência de quotas na atribuição das classificações mais elevadas do processo de avaliação, o que por si só é a negação do discurso do mérito tantas vezes repetido.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
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O Orador: — Por outro lado, agravam-se as condições de precaridade dos vínculos laborais, estabelece-se o aumento efectivo do horário de trabalho e introduzem-se factores de instabilidade que se estendem aos docentes dos quadros, ameaçados que estão, com a aplicação das regras relativas à mobilidade e aos supranumerários.
A realidade a que conduz esta revisão do Estatuto da Carreira Docente é a da profunda desmoralização dos docentes, agravando as condições de degradação de todo o sistema educativo. A realidade que temos nas escolas é precisamente o contrário dos discursos que sucessivamente ouvimos da bancada do PS e do Governo e que hoje talvez venhamos a ouvir novamente.
Os objectivos de defesa da escola pública, de apostar na qualificação dos portugueses, de criar melhores condições de ensino/aprendizagem ou de combater o abandono e o insucesso escolares não se fazem com a demagogia, com a degradação da condição profissional dos docentes ou com o ataque às suas organizações sindicais.
Com a noção de que este não é o Estatuto da Carreira Docente que cumpre aqueles objectivos, o PCP apresentará propostas concretas de alteração ao Decreto-Lei n.º 15/2007. As propostas que apresentaremos centrar-se-ão nos aspectos que consideramos mais negativos — e já referimos — de todo o diploma no sentido de evitar o que consideramos ser uma inaceitável descaracterização das funções docentes e um ataque aos seus direitos e à escola pública.
Pela sua própria natureza e pelo papel que assume, o PCP exige mudanças. É por lutarmos diariamente pela transformação desta sociedade que todos os dias exigimos e contribuímos para a concretização de mudanças no sentido do progresso e da justiça social.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Orador: — Não aceitamos, no entanto, que a mudança seja transformada num bem em si mesmo sem que sejam tidas em conta as consequências que acarreta.
A mudança que o Governo impôs, com esta revisão do Estatuto da Carreira Docente, é uma mudança de retrocesso e de atraso e terá, por isso, a frontal oposição do PCP.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Educação.
O Sr. Secretário de Estado da Educação (Valter Lemos): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A aprovação do novo Estatuto da Carreira Docente constitui um passo muito importante na melhoria da qualidade da escola pública em Portugal por três razões fundamentais.
Em primeiro lugar, institui mecanismos de avaliação rigorosa e objectiva do trabalho docente com consequências no reconhecimento do mérito dos melhores professores e na valorização das práticas profissionais, reforçando o compromisso dos professores com a escola, por um lado, e com os seus alunos por outro.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Em segundo lugar, estrutura a carreira docente em duas categorias, contribuindo para uma melhor organização e funcionamento das escolas, atribuindo funções de coordenação e responsabilidade aos professores titulares, cumprindo, assim, o princípio elementar da gestão de carreiras qualificadas: a mais experiência corresponde mais remuneração e mais responsabilidades.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — E mais competitividade também!
O Orador: — Em terceiro lugar, introduz melhorias nos mecanismos de recrutamento para a função docente com a criação de um exame de ingresso e de um período probatório, completando a maior exigência formativa estabelecida no novo regime de formação inicial de professores, mas melhorando, correspondentemente, as condições remuneratórias do início de carreira.
Apesar da sua importância, ainda assim, o novo Estatuto da Carreira Docente, constitui apenas um dos instrumentos de gestão do sistema educativo cuja revisão está em curso.
Este processo teve início com a alteração às regras dos concursos, tendo em vista conferir maior estabilidade aos professores e às escolas na gestão dos seus mais importantes recursos e reforçando o vínculo, como já disse, dos professores com as escolas e com os seus alunos.
Prosseguiu com a revisão da formação inicial de professores adaptando-a às novas regras introduzidas pelo Processo de Bolonha, reforçando quer a componente científica, quer a componente prática profissional da
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formação e generalizando estes princípios e procedimentos à formação de todos os professores, de todos os níveis, graus e áreas de ensino.
Finalmente, e para fechar este círculo, está em curso o processo de revisão do regime de autonomia e gestão das escolas, visando incrementar essa autonomia e melhorar as condições de liderança e de administração das mesmas escolas.
Srs. Deputados, este novo Estatuto é, pois, um passo decisivo nesta estratégia e, para além do seu papel na gestão das escolas e dos processos escolares, contribuirá decisivamente para a melhoria da imagem e relevância profissionais dos professores e a revitalização da imagem da escola na sociedade portuguesa, designadamente da escola pública.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Secretário de Estado, inscreveram-se quatro Srs. Deputados para formularem pedidos de esclarecimento.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Educação, vou pegar na nota dominante da sua curta intervenção,…
O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): — Curta, mas eficiente!
O Orador: — … que, mais uma vez, tem que ver com o reforço do discurso da melhoria da qualidade.
E vou centrar-me em três aspectos, que o Sr. Secretário de Estado acabou de referir, precisamente para demonstrar aquilo que acabei de dizer há pouco da tribuna, isto é, que este discurso do Governo não passa de afirmações demagógicas que não têm, depois, concretização nas medidas aprovadas e na realidade.
Começo pelo primeiro aspecto que o Sr. Secretário de Estado referiu: a melhoria da qualidade, para implementação de mecanismos de avaliação que premeiem o mérito — o famigerado discurso do mérito! Sr.
Secretário de Estado, pergunto-lhe se estes mecanismos de avaliação que premeiam o mérito são aqueles que estabelecem quotas para as classificações mais elevadas da avaliação, tal como previsto no artigo 46.º.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Boa pergunta!
O Orador: — Pergunto-lhe se são os mesmos mecanismos de avaliação que prevêem a avaliação dos docentes com base no abandono escolar, como se os docentes fossem os responsáveis pelo abandono escolar dos alunos, portanto, como se isso tivesse de influenciar a sua avaliação.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É uma vergonha!
O Orador: — Sr. Secretário de Estado, fica, pois, bem demonstrado que as suas afirmações de que estes mecanismos contribuem para a melhoria da qualidade não passam de afirmações demagógicas.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Orador: — Por outro lado, Sr. Secretário de Estado, em relação à questão dos professores titulares e da referência que fez sobre se a uma maior experiência não deveria corresponder esta melhoria que os senhores encontram na categoria dos professores titulares, faço-lhe um reparo: é que o senhor esqueceu-se de referir que o acesso a esta categoria de professor titular não só implica mais experiência, mas implica também mais vagas, porque o estabelecimento do limite de um terço nas vagas de acesso a esta categoria é uma limitação inadmissível à progressão dos docentes na carreira.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — Por fim, Sr. Secretário de Estado, quanto à melhoria das condições remuneratórias, se isto não fosse tão grave eu diria que dava para rir, porque a melhoria das condições remuneratórias não se garante impedindo a progressão dos docentes na carreira, Sr. Secretário de Estado.
Aliás, a melhoria das condições remuneratórias é uma consequência directa da progressão na carreira, que os senhores tentam impedir de forma administrativa, nomeadamente com a questão, que já referi, de um terço das vagas.
Portanto, Sr. Secretário de Estado, como vê, tem aqui inúmeras demonstrações da realidade concreta das vossas propostas, que não correspondem ao vosso discurso. É, pois, por isso que têm de ser responsabilizados pelos gravíssimos efeitos que estas medidas vão ter no sistema educativo português.
Aplausos do PCP.
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O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Duarte.
O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Educação, mais do que um pedido de esclarecimento, gostaria de lhe lançar um desafio. Quando estamos no exercício de cargos públicos deveremos ter a noção da realidade que nos envolve e, portanto, independentemente do mérito que os autores desta proposta lhe reconheçam, é obrigação dos responsáveis governamentais perceber o enquadramento em que esta proposta surge.
De facto, esta proposta de novo Estatuto da Carreira Docente tem sido causa de perturbação nas nossas escolas, tem sido causa de desmotivação dos nossos professores e, consequentemente, tem sido causa de prejuízo na qualidade do ensino das nossas crianças e dos nossos jovens.
Portanto, independentemente do mérito que os autores lhe reconheçam, este enquadramento deve ser tido em conta.
O que o PSD traz hoje, a este debate, é uma proposta muito concreta de desafio ao Governo para que seja sensível ao enquadramento, à realidade que envolve esta questão. Apresentamos, por isso, um conjunto de propostas de alteração muito concretas e muito claras.
Por um lado, privilegiamos — diria mesmo, reforçamos — os princípios da exigência, da avaliação e da promoção do mérito que o Governo, do ponto de vista retórico, também afirma. Estamos ao lado do Governo na sua retórica.
Por outro lado, temos uma proposta muito concreta no sentido de acabar, em primeiro lugar, com a distinção entre professores titulares e, diria, professores «de segunda». Isso não faz qualquer sentido, é absolutamente injustificado! Os professores, todos eles, estão na escola para ensinar, e se alguns não estão lá para ensinar, chame-lhes o que quiser mas não lhes chame professores, por razões óbvias.
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Em segundo lugar, acabe-se com a progressão por critérios meramente administrativos e governamentalizados. Creio que ambos queremos acabar com as progressões automáticas e queremos promover as progressões por mérito — estamos de acordo. Contudo, o que os senhores propõem não são progressões por mérito mas, sim, progressões baseadas em critérios administrativos, em quotas fixadas anualmente pelo Governo, quotas governamentalizadas ano a ano. Isto não é promover o mérito, Sr.
Secretário de Estado! A nossa proposta é muito clara: não só mantém como até reforça os princípios da exigência, da avaliação dos professores e da promoção do mérito para, assim, valorizarmos os melhores professores e melhorarmos o ensino. Estamos ao vosso lado e até reforçamos esta ideia do Governo.
Só que, por outro lado, não podemos estar ao lado deste ataque despudorado aos professores e à classe docente que o Governo tem encetado, nem podemos estar ao lado do Governo na distinção da carreira em duas categorias, o que é absolutamente injustificado.
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Muito bem!
O Orador: — E, principalmente, não podemos, de maneira alguma, camuflar uma suposta progressão por mérito através de critérios meramente administrativos cujas razões, sejam financeiras ou outras, serão sempre governamentalizadas, ano a ano.
Com isto não se prestigia a carreira docente, nem se trata com respeito os professores, nem se promove o mérito, nem se melhora o nosso ensino.
Este ponto divide-nos, mas penso que o Governo e o Partido Socialista têm hoje uma oportunidade de dar um sinal claro aos nossos agentes educativos, nomeadamente aos professores, de que a predisposição que têm não é a do controlo de uma qualquer despesa, de um qualquer défice mas, sim, a de apostar na qualificação dos portugueses.
Este, sim, é um grande desígnio nacional.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, ainda esta semana ouvimos o Sr.
Primeiro-Ministro, mais uma vez, dentro do discurso populista que tem marcado alguma da retórica em torno das corporações, dos privilégios, dizer que escolhe o interesse nacional. Os professores e os sindicatos foramse habituando a ser tratados desta forma, a ser humilhados desta maneira.
Falemos, então, Sr. Secretário de Estado, do interesse nacional, da emergência nacional.
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Efectivamente, a sua obrigação é explicar em que é que este Estatuto de carreira serve aquele que é um problema de emergência nacional, o insucesso escolar; a sua obrigação é explicar que este Estatuto deveria assentar na confiança perante os actores fundamentais, os professores, na motivação, na criação de desafios e na valorização do seu papel fundamental. Esta era a sua obrigação! O Sr. Secretário de Estado falou aqui de avaliação. Mas qual é o rigor desta avaliação quando os senhores instituem não duas categorias hierarquizadas mas duas carreiras? Efectivamente, quem está nos últimos escalões ainda pode «esperar sentado», chegar ao fim, mas quem está a meio da carreira não tem esperança! Não fale em rigor de avaliação quando o senhor e o seu Governo estabelecem claramente uma distinção entre dar aulas e ocupar cargos, explicando ao País que o essencial da profissão docente não é dar boas aulas e apresentar bons resultados.
A Sr.ª Alda Macedo (BE): — Muito bem!
A Oradora: — Explique ainda de que rigor de avaliação quer falar quando cabe ao Ministério, administrativamente, escolher os que são bons ou muito bons? Que critério, que rigor é este, Sr. Secretário de Estado?
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Nenhum!
A Oradora: — Explique, finalmente, por que é que está a sujeitar os professores com 20 e 30 anos de carreira a uma apreciação curricular que assenta em seis anos da sua carreira? Que número é este? Dá-lhe jeito, Sr. Secretário de Estado?!
A Sr.ª Alda Macedo (BE): — Muito bem!
A Oradora: — Uma outra questão muito pertinente é a de que somos um País pequeno e vamos ter três estatutos de carreira.
Por exemplo, sabemos que no caso dos Açores este Estatuto não terá os entraves que o Governo propõe relativamente ao acesso a professores titulares.
O Sr. Luís Fagundes Duarte (PS): — Têm outros!
A Oradora: — Nos Açores não é este o horizonte. É razão para perguntar-lhe se temos dois Partidos Socialistas!? Esta é uma demonstração, Sr. Secretário de Estado, do desnorte e da arbitrariedade dos senhores nestas propostas e nesta matéria.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, vou colocar-lhe apenas duas questões muito directas e muito concretas.
Nesta matéria, acompanho V. Ex.ª no que diz respeito à questão da exigência e do rigor. Aliás, penso que nenhum outro membro deste Parlamento, nem mesmo os sindicatos, nem — muito menos — os professores o deixam de acompanhar neste ponto. E vou começar por falar sobre isso mesmo, sobre exigência e rigor.
Sr. Secretário de Estado, há uns meses atrás, na altura da discussão do Estatuto da Carreira Docente, foi afirmado que uma das questões que mais preocupa o Ministério é a que se prende com as faltas dos professores, e falou-se em 6 milhões de horários lectivos de faltas.
Muito objectivamente, gostava que o Sr. Secretário de Estado me respondesse a estas duas questões: qual é o valor total dos horários existentes no País? E, destes tais 6 milhões de horários, quais as horas que representam cada um dos tipos de faltas ou de licenças dos próprios professores?
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — São estas as duas questões gostaria de ver respondidas pelo Sr. Secretário de Estado.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Educação.
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O Sr. Secretário de Estado da Educação: — Sr. Presidente, relativamente à primeira questão, sobre o problema da estruturação da carreira docente em duas categorias, gostaria de dizer aos Srs. Deputados que não conheço nenhuma carreira qualificada que tenha uma só categoria,…
O Sr. Pedro Duarte (PSD): — A dos professores! Sempre foi assim!
O Orador: — … nem na Administração Pública nem em nenhum outro sector. As carreiras com apenas uma categoria são carreiras com menor qualificação.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Não, não são!
O Orador: — A defesa de uma carreira só com uma categoria significa algo simples: significa querer dar um estatuto de menor qualificação à carreira docente.
Aplausos do PS.
Relativamente às questões das progressões, do reforço da exigência e ao problema das quotas, questões que foram colocadas pelo Srs. Deputado Pedro Duarte e, também, pelo Sr. Deputado João Oliveira… E, já agora, aproveitava para dizer à Sr. Deputada Cecília Honório que não cabe ao Ministério da Educação dizer quais são os bons e os muito bons; cabe aos professores, porque são eles que vão avaliar os outros professores.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Não! Cabe aos senhores!
O Orador: — Cabe ao Ministério da Educação, como cabe a qualquer estrutura,…
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Secretário de Estado, essa é a anedota do dia!
O Orador: — Estou a responder às perguntas que me fizeram, Sr. Deputado.
Cabe ao Ministério da Educação, como cabe a qualquer estrutura, instituir mecanismos de diferenciação que permitam a avaliação dos professores pelos outros professores, de forma a distinguir o mérito, de forma a distinguir aqueles que podem ser considerados os melhores no desempenho da sua profissão em relação aos outros. É isto que cabe ao Ministério da Educação e é assim que se estabelecem as quotas em Portugal ou em qualquer parte do mundo, como o Sr. Deputado sabe.
É um princípio de diferenciação.
O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): — Muito bem!
O Orador: — O estabelecimento das relações do Estatuto da Carreira Docente com os resultados escolares é absolutamente fundamental e a motivação dos professores, de que tanto falaram a Sr.ª Deputada Cecília Honório e o Sr. Deputado João Oliveira, não se faz com base num mero princípio do facilitismo ou das «palmadinhas nas costas».
Aplausos do PS.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Não sabe o que há-de responder!
O Orador: — Faz-se, sim, Sr.ª Deputada Cecília Honório, colocando exigências objectivas que possam ser avaliadas e referenciadas pelos professores relativamente ao seu próprio trabalho. É assim que se estabelece o princípio que está em causa.
Sr. Deputado Abel Baptista, o que nos preocupa não são as faltas dos professores.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — É penalizar!
O Orador: — O que nos preocupa são as consequências dessa situação e o facto de os alunos ficarem sem aulas. Isso é que nos preocupa! Por isso, as medidas que o Ministério instituiu têm exactamente a ver com o princípio da garantia de que os alunos estão nas escolas e de que têm o direito à aprendizagem. É da responsabilidade da escola pública, mas também da escola privada, enfim, da escola em geral, assegurar que os alunos estão na escola e é cumprido o seu direito à aprendizagem. Ou seja, o dever de que as aulas lhes são dadas e de que os alunos participam em todas as actividades de aprendizagem que estão previstas. Esta é a nossa preocupação.
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As medidas que o Governo tomou para resolver esta questão têm exactamente que ver com a garantia aos alunos de que vão ter as actividades de aprendizagem a que têm direito.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Vê-se…!
O Orador: — É este o problema central e é isto que nos preocupa.
Srs. Deputados, é assim que se melhoram os resultados. Melhoram-se os resultados garantindo aos alunos acesso à aprendizagem que estava previsto que tivessem.
Todos estamos de acordo sobre a aprendizagem que deve ser feita pelos alunos. O problema é que temos a obrigação de garantir, no dia-a-dia e no terreno, que isso aconteça todos os dias nas escolas.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Mas estamos a falar sobre as carreiras ou sobre as faltas?!
O Orador: — Não tenho a mínima dúvida de que essa é uma preocupação dos professores. Não será, eventualmente, uma preocupação de outros, mas é, certamente, uma preocupação dos professores. É por isso que eles estão preocupados em assegurar que os alunos passem a ter todas as actividades previstas para, assim, melhoramos os resultados escolares.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Emídio Guerreiro.
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de deixar uma primeira nota para dizer que se compreende a dificuldade e as insuficiências das respostas do Sr. Secretário de Estado pela simples razão de que não é a Sr.ª Ministra que está aqui presente e, pasme-se, também não é o Secretário de Estado que ao longo de meses teve de liderar, dentro da equipa ministerial, este processo.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Bem lembrado!
O Orador: — Por isso temos de compreender a ausência de clareza das respostas.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta do Governo de Estatuto de Carreira Docente que hoje apreciamos é claramente uma má solução. Não pretende dignificar a carreira dos docentes, não valoriza socialmente a função de docência, não valoriza o mérito nem o desempenho de cada professor. É uma solução meramente economicista.
Ao longo do processo de negociação tornou-se claro para todos que o Governo nunca quis ouvir os parceiros. Nunca quis ouvir os professores e os seus representantes.
Para a Ministra e a sua equipa a questão era simples. Era preciso poupar dinheiro e para o fazer gizaram uma táctica bastante simples: dois anos a diminuir o papel e a função do professor, dois anos a responsabilizá-los do estado da educação, dois anos a chamar-lhes preguiçosos e faltosos, generalizando de uma forma perigosa os maus exemplos, dois anos a acenar aos pais, dois anos a desvalorizar a contestação e, no final de tudo isto, em tempo recorde, a aprovar um novo estatuto que divide os professores em duas categorias e que recorre a truques administrativos para fixar e determinar a progressão da carreira.
O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Desta actuação deliberada do Governo, não resultaram nem ganhos para as escolas nem ganhos para os alunos! O sucesso educativo passa por termos docentes empenhados e motivados. Não basta dizer-se que a escola deve estar centrada nos alunos, deixando passar a ideia de que este desígnio é incompatível com estar do lado dos professores! Depois de dois anos de guerra permanente, o Governo, de forma autista,…
A Sr.ª Helena Terra (PS): — Outra vez o autismo?!
O Orador: — … aprova um novo estatuto que, ao invés de tranquilizar a escola, vem incendiar de novo a situação.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É disto que estamos a tratar. De uma proposta que é má, que é autista e que não promove o mérito, que não motiva e que não dignifica nem a autoridade do professor nem a função social da docência.
Dizem o Governo e parte do Partido Socialista que o novo estatuto pretende promover o mérito e a avaliação de desempenho. Dizem que a poupança não é o fim último da proposta.
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O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): — É verdade!
O Orador: — Nada mais falso e nada mais contraditório.
E como é ridículo ouvirmos o Sr. Primeiro-Ministro afirmar que os militares não chegam todos a generais ou afirmar que os portugueses não entendem que não haja avaliação para os professores! No mínimo, é preciso não ter memória do seu próprio passado. Aliás, esta amnésia estende-se a muitos dos actuais membros do Governo e a grande parte dos Deputados da maioria…! O Estatuto que o Governo pretende substituir previa mecanismos de avaliação bem rigorosos. Todos nos recordamos de quão difícil era ascender ao 8.º escalão. A prova era difícil, o júri externo era rigoroso e era necessário possuir requisitos mínimos para se poder candidatar à prova. Em 1998, o Governo, do qual o Eng.
Sócrates fazia parte, acabou com esta avaliação. Substituiu o rigor da avaliação externa por uma autoavaliação a ser analisada pelo conselho executivo das escolas.
Srs. Deputados, o que esteve em causa, então, não foi o rigor, não foi premiar o mérito, não foi criar um sistema de avaliação mais justo. O que motivou este facilitismo tipicamente socialista foi a procura dos votos dos professores nas eleições de 1999, onde o Partido Socialista procurava a maioria absoluta!
A Sr.ª Isabel Jorge (PS): — E agora, anda à procura de votos para quê?!
O Orador: — Ora, o resultado desta tentativa de conquistar votos a todos os custos foi claro, Srs. Deputados. É que em menos de 10 anos, aplicando as regras socialistas, cerca de 40% dos professores estão nos escalões de topo! Em 1998, ao Eng. Sócrates e ao Partido Socialista não interessava uma cultura de rigor na avaliação de desempenho. Nem sequer se comparava a carreira docente com a carreira do exército! Sr.as e Srs. Deputados do Partido Socialista, nessa altura — e permitam-me que vos recorde — o que vos interessava era conquistar votos…! É por essa razão que torna-se difícil acreditar que os mesmos protagonistas queiram agora privilegiar o mérito e o rigor! É por isso que fica mal ao Eng. Sócrates invocar o exército e a necessidade de criar um modelo de avaliação, quando ele participou directamente na extinção da avaliação que existia. Não parece nem é politicamente sério! Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Temos assim que o PS de hoje quer remediar o erro que o PS de ontem criou.
O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Muito bem!
O Orador: — E uma vez mais optou mal. As opções que faz neste Estatuto são tão erradas como as alterações que, em 1998, introduziu no anterior Estatuto.
Dividir a carreira em duas, criando professores de primeira e de segunda pode ajudar a resolver o problema financeiro, mas não premeia nem o mérito nem impõe uma cultura de rigor na avaliação de desempenho.
O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Na verdade, ao prever que anualmente serão definidas administrativamente, por despacho conjunto do Ministério da Educação e do Ministério das Finanças, as quotas quer para as vagas de professor titular quer para as notas qualitativas a atribuir no processo de avaliação, o Governo mata o processo de avaliação de desempenho! Arrasa por completo a justiça que um processo de avaliação de desempenho deve conter.
Para que haja justiça é fundamental que, à partida, no início da carreira, todos os docentes possam aspirar a chegar ao topo. Não apenas por tempo de serviço mas cumprindo patamares de exigência que privilegiem o mérito e a competência.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — É fundamental para a motivação e para o empenho dos professores que assim seja. Os bons devem poder chegar ao topo. Os maus devem ser penalizados.
O que não faz sentido é que seja o Governo a determinar anualmente quantos excelentes pode haver em cada escola e depois, ainda, quantos destes excelentes podem progredir na carreira.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD vem para este debate com o propósito, muito claro, de contribuir construtivamente para atenuar o clima de perturbação nas nossas escolas, o sentimento de desprestígio dos professores e o ambiente de desqualificação do nosso ensino.
Fazemo-lo apresentando uma proposta muito concreta. A questão é muito simples: o Governo afirma os princípios da exigência, da avaliação e de promoção do mérito, mas fica-se pelas palavras... O PSD afirma
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esses mesmos princípios, sem qualquer diferença, mas não se fica pelas palavras. Concretiza esses princípios. É esta a grande diferença.
A Sr.ª Sónia Sanfona (PS): — Vê-se!
O Orador: — O PSD propõe que se apliquem, de facto, os princípios da exigência, da avaliação e da promoção do mérito nas carreiras dos professores. O Governo, se não aprovar as propostas do PSD, limitarse-á a ceder a critérios administrativos que desmobilizam os nossos professores, prejudicando, assim, a qualidade do ensino.
Se o Governo e o Partido Socialista pretendem resolver mais do que um problema financeiro, se o Governo e o Partido Socialista pretendem um Estatuto que valorize o rigor, o mérito e a avaliação de desempenho, se o Governo e o Partido Socialista querem um Estatuto que valorize a função da docência e que mobilize e motive os professores, têm uma excelente oportunidade de emendarem os erros que cometeram ao longo deste processo.
As nossas propostas de alteração ao Estatuto da Carreira Docente vão nesse sentido: queremos uma só carreira, com escalões bem definidos e com processos de avaliação que privilegiam a exigência e o mérito.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Propomos a existência de instrumentos de avaliação rigorosos, com o recurso a avaliadores externos, e uma só carreira, à partida ao dispor de todos, mas onde apenas os melhores chegarão ao topo.
Sem quotas e sem artifícios administrativos, apostando tudo nos patamares de exigência definidos para cada escalão, que aumentam conforme a carreira avança. Propomos, ainda, júris de avaliação externa nos escalões de topo.
Exigência, mérito, competência e avaliação são estes os quatro eixos que entendemos serem determinantes para a progressão da carreira. Sem expedientes burocráticos e de forma rigorosa, mas transparente.
Se o objectivo do Governo é, ao contrário do que aconteceu em 1998, o de privilegiar o rigor e a avaliação, tem nas nossas propostas o caminho para uma carreira docente que se pretende rigorosa e exigente, mas justa e livre de truques administrativos. Saibam ter a humildade democrática de reconhecer que não tomaram as melhores opções e acolham as propostas que podem repor o rigor, a motivação e a paz nas escolas.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Daqui a dois anos este Governo será confrontado com uma das maiores responsabilidades que o País lhe impõe, a do combate e resolução do grave problema que é o insucesso escolar. O Governo vai ter de responder às estatísticas que revelam o insucesso em quase todos os níveis de ensino, particularmente no 3.º ciclo e no ensino secundário, e as contas que o País lhe vai pedir passarão por saber em que é que este Estatuto resolveu esse insucesso, um dos mais graves problemas nacionais, como já disse. Em que é que este Estatuto criou motivação, lançou desafios aos profissionais, valorizou o seu papel e contribuiu para resolver um problema de emergência nacional? É por isto que os senhores vão responder daqui a muito pouco tempo.
O Governo não oferece motivação, confiança, oportunidades ou valorização da profissão porque a sua esperança é, claramente, a de que os professores se esmaguem mutuamente, por forma a que os senhores tenham menos trabalho. Estão enganados. Estão profundamente enganados! Este Governo foi confrontado com as maiores manifestações de descontentamento destes profissionais e os professores têm dois anos para mostrar que os senhores estão enganados que eles sabem o que é essencial na sua profissão.
O Sr. Secretário de Estado deu aqui algumas respostas muito «coxas» e, sem o querer ofender, direi que «meteu os pés pelas mãos». Não sabe justificar, por exemplo, a opção pelas duas categorias hierarquizadas e não tem para esta escolha outra explicação que não seja a do estrangulamento da progressão profissional.
Não tem! O senhor poderá dizer que foi a Inglaterra buscar uns «cheirinhos» de duas carreiras, mas sabe perfeitamente que esse modelo foi ultrapassado e, portanto, não tem outra justificação que não seja a dos cortes. De facto, este Estatuto não é outra coisa senão uma manta de retalhos feita de cima para baixo, para que as contas, no fim, batam certo.
Mas há contas que não nos deixam, sequer, perceber onde é que querem chegar. Os senhores têm um «buraquinho numa agulha» e vão fechá-lo. É impossível compreender por que é que, por exemplo, sugerem uma pontuação para os professores que estão no 10.º escalão e depois descobrem que, afinal, ela não se ajusta à realidade e que não há pessoas que possam cumprir aquele critério. Os senhores, afinal, nem contas sabem fazer.
Por outro lado, não podem justificar um aspecto que é abusivo e claramente inconstitucional. Como é que explicam ao País que os professores e as professoras sejam penalizados por darem faltas justificadas, faltas
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dadas por motivo de saúde ou ao abrigo do direito à maternidade e à paternidade? Como é que justificam este atropelo à Constituição? Estão dispostos a tudo para guilhotinar esta profissão e não têm explicações para o que fazem. Os senhores não sabem, de facto, fazer contas e não sabem qual é o vosso horizonte.
Efectivamente, a vossa prioridade é a de criar instabilidade e desafiar aquele que deveria ser o vosso maior compromisso: a qualidade da escola pública. Na verdade, o Governo devia ter por objectivo a criação de confiança nos professores e a valorização destes profissionais, porque têm um papel fundamental para o futuro deste país!
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr. Secretário de Estado da Educação, Sr.as e Srs. Deputados: O diploma aqui em apreciação tem, para o CDS, uma importância extrema na estruturação da sociedade portuguesa. Esta não é uma questão apenas do âmbito da educação, pois ultrapassa em muito esse meio. Consideramos que a educação é a base de uma sociedade e a principal agenda para o desenvolvimento da mesma. Os educadores e professores são os agentes fundamentais da educação escolar. São eles que irão ensinar e formar as nossas crianças, os adultos de amanhã. Esta classe deve, portanto, ser olhada de um modo especial que socialmente a valorize.
O Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário reafirma a importância que esta classe tem para o bom funcionamento de um Estado onde a educação deve ser uma prioridade. Os professores foram, no passado, uma classe amplamente respeitada e surgiam no topo das profissões mais confiáveis. No entanto, o passar dos tempos e as políticas erradas no que concerne ao papel destes profissionais na área da educação vieram deteriorar esta imagem perante os portugueses. A retirada da autoridade dos professores perante os alunos foi propositada e levada a cabo por aqueles que confundem autoridade com autoritarismo, levando a escola para um caminho que um país moderno não pode ter.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — A exigência e o rigor foram totalmente substituídos por uma pedagogia sem exigência. É necessário, contudo, conjugar estes dois elementos, pedagogia e exigência, e a verdade é que não é possível termos um ensino exigente sem a respectiva valorização dos docentes, da sua competência e da sua autoridade. Ora, o Governo não foi capaz de levar a cabo esta valorização na recente negociação para o novo Estatuto da Carreira Docente.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — A negociação deste Estatuto mais parecia o jogo do «gato e do rato». Era marcada uma ronda negocial com os parceiros sociais e o Ministério apresentava um documento. Na segunda reunião, já era outra a versão do documento, sem que os parceiros sociais a conhecessem, algo que sucedeu mais do que uma vez. Como tal, os parceiros sociais analisavam documentos já não considerados pela tutela. Com esta atitude negocial, o Ministério desprestigiava os educadores e professores.
As declarações dos responsáveis do Ministério da Educação foram sempre no sentido de colocar a sociedade contra os professores. Muitos foram, apesar de tudo, os contributos dos agentes da educação para este novo Estatuto. Cremos que a sua grande maioria foi mesmo num sentido construtivo e de mais-valia para o resultado final.
Para além disso, algumas formas de luta dos docentes foram por nós apoiadas, pois estava em causa toda a sua reputação, toda a reputação de uma classe que prezamos e vemos como elemento fundamental para a prosperidade do País.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — A Sr.ª Ministra da Educação, que deveria ser a primeira pessoa a querer construir uma base sólida de entendimento, foi, neste caso, um elemento de desestabilização de todo o processo. Muitas das suas palavras foram no sentido de atingir a reputação dos professores,…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Bem lembrado!
O Orador: — … criando, assim, uma desconfiança de muitos pais para com os professores dos seus filhos, dando a entender aos alunos que o elo mais fraco seria o professor e criando na sociedade a ideia de que todo o mal que há na educação se deve ao professor.
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Da nossa parte, constatamos que os erros, em muitos casos graves, cometidos na educação pública nacional se devem à definição de más políticas e de maus programas e não a maus professores. Aliás, se não fosse a determinação, a responsabilidade, a competência e, em muitos casos, o sacrifício dos professores, os resultados seriam bem piores. Para o CDS, os professores são, como já referimos, o principal agente do sistema educativo. Por isso, não pretendemos perder os professores em desfavor da sociedade, mas, sim, mantê-los nesta causa.
Com a aprovação das normas constantes do Decreto-Lei n.º 15/2007, de 19 de Janeiro, criou-se uma grande frustração e desmotivação na classe docente, caminho que não é, em nossa opinião, aquele de que a educação pública precisa. É por isso que esperamos que o Partido Socialista aceite discutir em sede de especialidade alterações ao actual Estatuto da Carreira Docente. Com esse gesto, o Partido Socialista não dará um sinal de recuo mas, antes, que quer dar a devida importância à educação como factor de desenvolvimento, começando exactamente pela estabilidade, pela motivação e pela valorização daqueles que todos os dias tutelam e trabalham o sistema educativo e o progresso dos alunos deste país.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Diga lá o que pensa!
O Orador: — Embora não concordemos com todas as propostas aqui apresentadas pelo PCP, não vai ser o CDS a inviabilizar a discussão, em sede da Comissão de Educação, Ciência e Cultura, das propostas apresentada para que nessa sede possa haver uma franca discussão e todos possamos aperfeiçoar o diploma em apreço no sentido de melhorar a educação no nosso país.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luiz Fagundes Duarte.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Vai falar dos Açores!
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Vai falar do Estatuto dos Açores!
O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A contra-informação militante tem tentado fazer passar a ideia de que o Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário — vulgarmente conhecido por Estatuto da Carreira Docente — seria a encarnação do mal que um governo perverso teria resolvido engendrar contra os professores deste país.
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Eu não diria melhor! Pode ficar por aí!
O Orador: — E o Partido Comunista Português, que muito contente se assume como o braço parlamentar deste tipo de contra-informação, achou por bem requerer a apreciação parlamentar do novo Estatuto.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Aliás, é um direito!
O Orador: — Imbuído do seu novo espírito de fiel seguidor do PCP em matéria de educação,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Antes fosse!…
O Orador: — … o PSD anunciou ontem que entregaria hoje, nesta Câmara — como, de resto, não o fez —
, uma proposta de alteração ao mesmo Estatuto, naturalmente convencido de que com esta iniciativa irá conseguir, à boleia do PCP e das suas manifestações,…
Aplausos do PS.
… aquilo que foi incapaz de concretizar durante os anos em que foi governo: definir, regulamentar e dignificar a carreira dos professores dos ensinos básico e secundário e dos educadores de infância. O Grupo Parlamentar do Partido Socialista tem todo o gosto em vir a campo e participar nesta apreciação parlamentar, assumindo, no entanto, como ponto de partida, que a política de educação em Portugal não é, nem pode ser, uma questão sindical.
Vozes do PS: — Exactamente!
O Orador: — Até porque esta apreciação terá o mérito de permitir ao Governo tornar mais claras as suas intenções em matéria de melhoria e aperfeiçoamento da escola pública e explicar ao País, por meio desta
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Câmara, quais são os princípios políticos determinantes deste diploma, no que diz respeito à formação, à função e à promoção do professor e quais as medidas estruturantes que estão a ser adoptadas. E vou citar apenas algumas.
Organizar e valorizar o trabalho dos professores, visando a dignificação da escola pública e a melhoria dos resultados escolares dos alunos, reforçando o trabalho para a promoção do sucesso, a prevenção do abandono escolar precoce e a qualidade das aprendizagens.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Bonito! Mas não existe!
O Orador: — Diferenciar os professores, introduzindo procedimentos que permitem reconhecer o mérito e valorizar o exercício da actividade lectiva: o desempenho em sala de aula, a preparação das aulas, o acompanhamento dos alunos e os resultados escolares obtidos.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Nós lemos o preâmbulo!
O Orador: — Valorizar a qualificação dos docentes, bonificando aqueles que promovem a sua valorização profissional e científica, obtendo, por exemplo, os graus de mestre ou de doutor.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Vamos ao concreto!
O Orador: — Assegurar que sejam os professores mais competentes, mais experientes e com vencimentos mais elevados a assumir funções de maior responsabilidade e exigência na escola, designadamente a supervisão e a coordenação pedagógicas, e a gestão.
Obrigar a que o ingresso na carreira docente dependa da posse de uma habilitação profissional adequada ao grupo de recrutamento a que se concorre, da aprovação em prova de avaliação de conhecimentos e competências e de uma boa avaliação de desempenho — como, de resto, acontece no acesso a qualquer profissão exigente.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Orador: — Finalmente, estabelecer a carreira de professor em categorias hierarquizadas, de acordo com um princípio de organização comum às carreiras mais qualificadas da Administração Pública, tal como já acontece nas carreiras docentes de diferentes países europeus e, entre nós, nas carreiras do ensino superior.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Estratificação!
O Orador: — Dificilmente alguém que pense a sério sobre a educação poderá apresentar objecções de fundo, que não sejam construtivas, a estes princípios e medidas, a não ser que pretenda enviesar, como tem sido apanágio de alguma oposição de memória mais leve e de consciência mais pesada, pela diversão ou pela irresponsabilidade.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — No entanto, as cabeças bem-pensantes do PCP entendem que medidas como estas constituem «mecanismos que são limitações directas aos direitos dos trabalhadores em causa, que são retrocessos sociais e económicos claros e indisfarçados»,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Orador: — … preferindo, em contrapartida, a situação vigente até 1998, quando se procedeu à última revisão do Estatuto da Carreira Docente, ou no máximo a que vigora actualmente, em que a progressão dos professores se processa, prioritariamente, pela passagem das horas, ao arrepio das qualificações pessoais e profissionais e do mérito de cada um…
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Por vossa responsabilidade e por vossa acção!
O Orador: — … e, em muitas situações, fora das escolas e das salas de aula, como se de funcionários administrativos se tratasse.
Vozes do PS: — Muito bem!
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O Orador: — Por sua vez, o PSD vem agora insurgir-se contra a «divisão entre os professores titulares e os professores de segunda» — como se em encarnações passadas não tivesse defendido uma carreira docente hierarquizada, baseada na avaliação do mérito individual de cada docente — numa postura simplista e redutora que entende a progressão dos professores na carreira como um mal a evitar, advogando assim o triunfo da mediocridade que foi, de resto, a marca mais significativa das políticas que tentou desenvolver enquanto teve responsabilidades governativas: falou muito, e nada fez..
Aplausos do PS.
E agora, fiel a essa estratégia da inércia, o PSD continua a falar, e não deixa fazer.
Vozes do PS: — Exactamente!
O Orador: — No entanto, Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr. Secretário de Estado da Educação, ela move-se. Ela, a política educativa.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Move-se, para trás!
O Orador: — Move-se contra os apóstolos do sindicalismo cego aos interesses da escola pública e dos alunos, porque defensor do igualitarismo que premeia o rebanho e castiga o brio profissional e a competência dos professores e educadores enquanto indivíduos. Nesta matéria, a política educativa que está a ser defendida e lançada vai produzindo os seus efeitos.
Move-se a favor da promoção da qualidade e da dignificação da actividade profissional dos professores e educadores.
E move-se, obviamente, contra aqueles que, com medo da mudança — e explorando, com intuitos de ganhos mediáticos e partidários, as compreensíveis perturbações que uma mudança de paradigma nunca deixa de produzir na sociedade a que se aplica, ainda que temporariamente —, nos vêm tentar dizer que para melhor já basta assim.
Com este Governo, e com as medidas que ele vai tomando, a escola pública, a pouco e pouco, vai adquirindo um conjunto de instrumentos políticos e de gestão que irão, sem dúvida, alterar profundamente, e estamos convencidos de que para melhor, o quadro da educação no nosso país.
Ficamos agora à espera dos diplomas já anunciados pelo Governo, e reafirmados agora pelo Sr. Secretário de Estado, que regulamentarão, nas diversas especialidades, o novo Estatuto que as oposições tão agudamente contestam. Já conhecemos, mesmo, o texto do diploma que regulamentará o primeiro concurso para professor titular e que também já vai sendo objecto da campanha de intoxicação, provocada por leituras enviesadas, de que tem vindo a ser objecto o decreto-lei hoje em apreciação.
Protestos do PCP.
Por exemplo, as oposições parlamentares controladas pelo sindicalismo mais retrógrado, que não quer perder o controlo que até há bem pouco tempo detinha sobre a educação em Portugal —…
Aplausos do PS.
O Sr. João Oliveira (PCP): — É preciso estar muito incomodado!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Está de cabeça perdida!
O Orador: — … como se a educação fosse uma questão sindical —, já andam para aí a dizer que, perante os concursos para professor titular, tal como são regulamentados pelo projecto de decreto-lei actualmente em fase de negociação e de discussão pública, ficariam prejudicados os profissionais que gozem de licença de maternidade ou de paternidade, que se ausentem do serviço para assistência a filhos menores, ou por doença, ou para prestação de provas profissionais, ou para o exercício do direito à greve.
Vozes do PS: — Exactamente!
O Orador: — É o estilo demagógico e trauliteiro de quem não hesita em explorar dúvidas e sentimentos de receio, habilmente manipulados junto dos cidadãos por especialistas da contra-informação que, em vez de darem o seu contributo para resolver essas dúvidas e esses receios, os utilizam como arma de arremesso contra o Governo.
Aplausos do PS.
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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Olha quem fala!
O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Está a delirar!
O Orador: — E aqui, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares e Sr. Secretário de Estado da Educação, gostaria que o Governo deixasse um sinal bem claro, hoje e nesta Câmara, de que o disposto no artigo 103.º do Estatuto da Carreira Docente — o Decreto-Lei agora em apreciação — ficará inequivocamente plasmado nos decretos-lei regulamentadores do Estatuto, de modo a que as oposições não venham para a rua dizer, dando voltas à verdade, que direitos fundamentais como a maternidade e a paternidade, a assistência a filhos menores, ou as ausências por doença, para prestação de provas profissionais, ou para o exercício do direito à greve não serão, em caso algum, obstáculo à progressão na carreira.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Resta-me agradecer ao Partido Comunista Português a oportunidade que a todos nos deu de, uma vez mais, se discutir nesta Câmara assuntos do maior relevo na vida social do nosso país…
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Vai fazer uma pirueta, está mesmo a ver-se!
O Orador: — … e pela oportunidade que deu ao Governo para vir aqui explicar as boas políticas que está a desenvolver em matéria de política de educação, contribuindo assim para que os cidadãos entendam, de uma vez por todas, quem é que está do lado do progresso e quem, como o PCP e o seu recém-aliado PSD, prefere que em educação nada mude, nada se transforme, e tudo se perca.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Através da apreciação parlamentar n.º 39/X, da iniciativa do PCP, é-nos dada a oportunidade de analisar o Decreto-Lei n.º 15/2007, publicado em 19 de Janeiro último, que, muito mais do que introduzir alterações ao Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário, vulgarmente conhecido por Estatuto da Carreira Docente, em boa verdade destrói por completo o anterior Estatuto, rasga-o e à sua lógica e aos seus princípios e fá-lo substituir por um novo Estatuto, com novas regras, eivado de um novo paradigma, como diz o Sr. Deputado Fagundes Duarte, relativamente à função docente não superior.
Este novo paradigma, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é um paradigma no qual os professores não são vistos como os actores fundamentais do funcionamento do sistema educativo, que é preciso respeitar e valorizar — e a quem se devem reconhecer dignos direitos laborais, dar as melhores condições de trabalho, em nome de uma melhor educação para Portugal —, mas que apenas são vistos, pela parte da tutela, como um mal, infelizmente, necessário e por enquanto indispensável, com um poder e uma liberdade de acção e de pensamento que interessa a todo o custo vigiar, a quem se pretende restringir ao máximo os direitos, como forma de os controlar, asfixiar e reduzir ao mínimo a sua capacidade de actuação e intervenção.
Com efeito, esta reforma, que de 135 artigos apenas deixa 19 incólumes, vem criar duas categorias profissionais na carreira docente — a de professor e a de professor titular —, hierarquicamente divididas por um fosso, que, para a maioria esmagadora dos docentes, constituirá uma barreira intransponível, em que cabe aos do topo, sob dependência de directa de inspectores e do director, a responsabilidade de fiscalizar os restantes, de determinar o perfil dos docentes que a escola contratará, de examinar os que entram na profissão, de os avaliar e de decidir quem progride e poderá aceder ao clube exclusivo, com reflexos extremamente negativos no são funcionamento das escolas e da actividade pedagógica.
As restrições que cria condicionam de forma inadmissível e retroactiva a progressão na carreira e o acesso ao topo da mesma, o que faz com a criação de duas categorias hierarquizadas, com a dotação de lugares das categorias, através de um esquema de quotas na avaliação, limitando a um terço do total aqueles que poderão aceder à categoria de titular, com a não contagem do tempo de serviço, com o aumento da duração média da carreira de 26 anos para 30 anos (já sem falar naqueles professores que vão trabalhar 45 anos e mais com as alterações ao regime da aposentação).
Professores e educadores que leccionavam há um número considerável de anos, numa carreira, em relação à qual fizeram um importante investimento, pessoal e profissional, de tempo, de vida, com dedicação, esforço e muito sacrifício, suportando as sucessivas afrontas de muitos governos e ministros, vêem agora as suas legítimas expectativas de progressão nessa carreira «irem por água abaixo», serem completamente
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frustradas e espezinhadas com total indiferença e desprezo, como quem usa, abusa e deita fora os professores como se fossem descartáveis.
A urgência, a fúria e a cegueira do Governo foi de tal ordem que, em seis meses de negociações praticamente inexistentes com os sindicatos, num calendário estabelecido unilateralmente pelo Governo, este se limitou a cumprir no mínimo aquilo a que a lei o obrigava, não tendo recuado em nada do que era fundamental, demonstrando ainda uma postura de surdez, de arrogância e de soberba indignas, distinguindose claramente do anterior processo negocial da reforma de 1998, para, aliás, fazer algo que não representava uma necessidade ou prioridade premente para o nosso sistema público de educação.
Pela primeira vez, nenhuma organização representativa dos direitos dos docentes apoiou uma reforma implementada pelo Governo, tendo-se unido num amplo consenso, numa ampla plataforma que, de uma forma séria, empenhada, profundamente crítica e reivindicativa, demonstrou a sua justa razão, isolando por completo a Sr.ª Ministra da Educação.
Na defesa desta reforma, o Governo e o Partido Socialista gastaram o latim a falar do mérito, da vergonha que era os professores progredirem automaticamente — como se isso fosse verdade, como se, ao acumular de anos de serviço, não acrescesse já a obrigatoriedade de realizar e obter aproveitamento nas acções de formação contínua, não acrescesse já mecanismos de avaliação em prática nas escolas —, que era preciso avaliar — como se os professores temessem ser avaliados, desde que essa avaliação seja justa, isenta e adequada —, encheram os ouvidos dos portugueses com mentiras, caluniando os professores e arrastando para a lama a dignidade da função docente, acusando professores e educadores de serem responsáveis pelo insucesso escolar, fazendo, não vista grossa, mas assumindo a mais negra cegueira, a daqueles que não querem genuinamente ver, e procurar, entre as muitas causas do insucesso, do abandono, as de natureza socioeconómica, a falta de condições do parque escolar, as insuficiências da rede do pré-escolar, a falta de material e de equipamentos, a falta de pessoal, de professores, de professores de apoio, essencialmente a falta de vontade de mudar que tem ocupado a cadeira do Ministério da Educação nas últimas décadas, assumindo, de uma vez por todas, a educação como uma prioridade, como o investimento mais precioso que podemos realizar.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Muito bem!
O Orador: — Face aquele discurso de desvalorização da função docente, da necessidade de erigir o mérito em único critério, da exigência de avaliação que o Governo prosseguiu, qual foi o seu caminho? Se entendiam que a avaliação existente não funcionava bem e necessitava de ser aperfeiçoada, podiam têlo feito; se entendiam que a formação contínua era mal ministrada, não contribuía para os objectivos pretendidos e era mal avaliada ou, porventura, insuficiente, podiam tê-la tornado mais exigente e, acima de tudo, de melhor qualidade. Os professores agradeciam, pois são os primeiros interessados, em conjunto com os alunos, em melhorar a sua prática e em evoluir no sentido de aperfeiçoar o seu desempenho científico e pedagógico.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Exactamente!
O Orador: — Mas não foi isso que fizeram, simplesmente porque não era isso que os preocupava verdadeiramente.
O que os preocupava e o que os preocupa não é a qualidade do ensino e da escola pública, que está intrinsecamente ligada à estabilidade e valorização da função docente e dependente das condições que os fazedores de ensino — os educadores e professores — encontram dentro do espaço escolar; não é o reforço da escola democrática e com autonomia do ponto de vista do projecto educativo que melhor responda ao universo discente em causa; não é dotar as escolas de capacidade financeira adequada; não é garantir uma forma de colocação de docentes justa e transparente, através de um concurso nacional, público e democraticamente controlável.
O que os preocupava e o que os preocupa é, apenas e tão-somente, cortar na despesa da educação, seja encerrando escolas, seja não dotando os quadros dos docentes necessários, seja recusando à esmagadora maioria dos docentes o acesso aos últimos lugares da carreira, independentemente até do mérito, que tanto apregoaram, ou dos princípios da justiça e da igualdade, já que professores com a mesma capacidade, com a mesma avaliação e com o mesmo mérito relativo não terão a mesma oportunidade, dependendo da escola e dos resultados da avaliação externa da mesma ou dos critérios administrativamente fixados pelo Governo.
O que os preocupa, verdadeiramente, é enxovalhar os professores, para tentar destruir a sua real capacidade interventiva e reivindicativa nas políticas de educação e na sociedade. E, pior de tudo, o que estão a promover é a degradação da escola pública de qualidade e democrática.
Esta não é, Sr. Presidente e Srs. Deputados, uma cruzada do Ministério da Educação apenas contra os professores e, supostamente, a favor dos alunos, dos pais ou do sucesso educativo. Esta é, verdadeiramente, de entre todas as vilanias deste Governo, a mais clara e grave afronta ao direito à educação, perpetrada através do mais baixo ataque à classe docente.
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Por tudo isto, entendem Os Verdes que é fundamental e imperioso, neste processo de apreciação, a Assembleia da República assumir as suas responsabilidades constitucionais e corrigir o Decreto-Lei n.º 15/2007.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Nesta altura do debate, talvez possamos registar que ele confirma duas coisas fundamentais: primeiro, a prioridade dada pelo PCP a esta apreciação parlamentar, a este tema da revisão do Estatuto da Carreira Docente, sobretudo pela repercussão que este diploma pode assumir; segundo, o isolamento do Governo, do Partido Socialista e do seu grupo parlamentar nesta Assembleia da República. Este facto poderia nada ter de interessante se não fosse também acompanhado pelo completo isolamento do Partido Socialista na comunidade educativa…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Orador: — … no que respeita à avaliação desta revisão do Estatuto da Carreira Docente. É isto que é preocupante, porque traduz uma opção que o Governo assume.
O Governo assume esta revisão do Estatuto da Carreira Docente como uma opção de alterar este diploma contra tudo e contra todos. Não o faz por desatenção, por falta de alternativas ou por falta de contrapropostas; fá-lo consciente de que é contra tudo e contra todos e que será, certamente, com grave prejuízo para o sistema educativo português.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Orador: — Por outro lado, importa registar que não houve da parte do Governo e do Partido Socialista um único argumento que demonstrasse a bondade das soluções que são aqui apresentadas ou que tentasse contrariar as acusações e as previsões que aqui foram feitas relativamente às consequências destas medidas.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Orador: — Aquilo a que assistimos foi à utilização de uma série de desculpas e à criação de figuras como a do numerus clausus do mérito na avaliação ou do numerus clausus da progressão na carreira.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Orador: — Importa registar também que o PCP não fica refém da imposição do Governo. O Governo pode tentar impor as medidas que quiser, pode não querer negociar com os sindicatos e impor a sua vontade, pode, inclusivamente, sugerir novas reedições da «lei da rolha» nesta Assembleia da República, mas o PCP não fica refém dessas imposições e, por isso, trouxemos à discussão na Assembleia da República esta alteração ao Estatuto da Carreira Docente e entregámos propostas de alteração.
O que está em causa nas propostas apresentadas é, por um lado, garantir a existência de uma carreira única, que não estratifique os professores e que não crie divisões nos professores feitas administrativamente e justificadas de forma administrativa,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Orador: — … e, por outro, garantir as condições para que os docentes não sejam perseguidos pelos mecanismos da avaliação mas, antes, encontrem nesses mesmos mecanismos um estímulo a obterem melhores classificações.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Orador: — Os mecanismos de avaliação que estão previstos nesta revisão do Estatuto da Carreira Docente perseguem os docentes e não lhe criam estímulos à melhoria da qualidade do seu trabalho.
Aplausos do PCP.
Apresentamos também propostas no sentido de garantir a estabilidade e a dignidade dos vínculos dos docentes, impedindo, por exemplo, a diminuição dos quadros de escola e empurrando estes docentes para
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novos esquemas de mobilidade, em que a Administração decide por si qual a escola onde o docente pode ficar.
Prevemos, ainda, a eliminação de novos obstáculos no acesso à profissão, nomeadamente pela previsão da prova de acesso, com a qual estamos em completo desacordo, porque entendemos que não é uma forma de dignificar o acesso à profissão.
Por último, apresentamos propostas que garantem a progressão na carreira, com base na experiência, no empenho e na qualidade do trabalho dos docentes, eliminando a quota que o Governo estabelece para aqueles que podem progredir plenamente na carreira.
Termino esta minha segunda intervenção referindo apenas um elemento fundamental para a análise das propostas do PCP: ao contrário do Governo, estas propostas que o PCP apresenta resultam de uma opinião que formámos com estreita ligação à opinião e à análise daqueles que todos os dias fazem o sistema educativo.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Orador: — Não é uma opinião que nos «caia do céu» ou que achemos que é a verdade absoluta. É uma opinião que discutimos colectivamente, em que tivemos em conta as opiniões, a sensibilidade e a análise feita por quem, todos os dias, faz o sistema educativo, e que queremos também trazer à Assembleia da República com a exacta noção de que são propostas que contribuem para a melhoria da qualidade e do desenvolvimento do sistema de ensino.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Também para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr.
Secretário de Estado da Educação.
O Sr. Secretário de Estado da Educação: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero deixar aqui três notas.
A primeira é para, uma vez mais, responder à Sr.ª Deputada Cecília Honório e aos restantes Deputados sobre a questão dos resultados escolares. O Governo inscreveu, pela primeira vez, no centro das políticas educativas, a melhoria dos resultados escolares e não tem qualquer problema em discutir essa questão.
Mais, Sr.ª Deputada: gostaria de dizer que, pela primeira vez nos últimos 20 anos, este ano o número de alunos no sistema educativo cresceu 24 000, todos eles «roubados» ao abandono escolar. Pela primeira vez, conseguiu-se um resultado objectivo na melhoria dos resultados escolares.
Aplausos do PS.
O Governo, nessa matéria, tem muito orgulho em situar no centro da política educativa a questão dos resultados escolares.
Uma segunda nota, sobre a questão da maternidade e da paternidade, para dizer, objectivamente — e gostaria de esclarecer isto de uma vez por todas —, que em caso algum, em circunstância alguma, uma mãe ou um pai terá prejuízo no que respeita às questões da assiduidade, etc., etc.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — E na doença?!
O Orador: — A finalizar gostaria de dizer que o Governo não altera o Estatuto da Carreira Docente contra tudo e contra todos; altera-o a favor dos professores,…
Protestos do PCP.
… designadamente daqueles que são bons profissionais, que são a maioria, a favor dos alunos e dos seus resultados e a favor das escolas e das famílias portuguesas.
Aplausos do PS.
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, sei que disponho de, apenas, 3 segundos, mas serei muito breve.
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O Sr. Presidente (António Filipe): — Se o Sr. Deputado conseguir fazer a intervenção em 3 segundos, faça favor.
Faça favor.
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: É apenas e só para constatar e lamentar que o Governo trate as propostas positivas que o Partido Social Democrata trouxe hoje a este debate da mesma forma autista, arrogante e insensível com que trata os professores e o nosso sistema de ensino.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem, ainda, a palavra, para uma intervenção o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
Vozes do PCP e do BE: — Ohh!…
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de intervir para finalizar este debate.
A mudança do Estatuto da Carreira Docente é, do ponto de vista do Governo, uma das reformas principais, é uma das reformas emblemáticas do Programa e da acção deste Governo e é uma reforma que está concluída. O Decreto-Lei está publicado e estamos agora na fase da sua regulamentação e da sua aplicação.
O Governo pretende quatro objectivos com esta reforma, e eles aplicam-se aqui como se aplicarão em muitas outras revisões de carreiras profissionais.
Primeiro objectivo: equidade no acesso, e daí a prova de acesso. Exigência e equidade no acesso.
Segundo objectivo: avaliação do desempenho, com consequências do ponto de vista da progressão na carreira. Não haverá qualquer progressão automática mas, sim, progressões por mérito, resultantes de avaliações com consequências.
Terceiro objectivo: não mais haverá carreiras planas, indiferenciadas, em que todos valem da mesma maneira e a única maneira de progredir é envelhecer. Recusamo-nos a aceitar isto…
Aplausos do PS
… e daí a proposta de, pelo menos, duas categorias, com uma categoria com claras responsabilidades de coordenação, de enquadramento e de direcção.
Quarto objectivo: valorização do trabalho nas escolas. Valorização dos resultados escolares, dos resultados dos alunos nas escolas; valorização da assiduidade; valorização da assunção de responsabilidades nas escolas, em particular pelo exercício de cargos de direcção e coordenação; valorização da formação.
São estes quatro objectivos que o Estatuto da Carreira Docente, revisto por este Governo, trouxe e são eles que guiarão também o Governo em muitas outras revisões de carreiras profissionais na Administração Pública.
Este debate é muito instrutivo também sobre a atitude dos diferentes partidos.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Lá vem a análise do pensador político!
O Orador: — O Partido Comunista Português não quer prova de acesso, não quer equidade no acesso.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Não sabe o que o PCP quer!
O Orador: — O Partido Comunista Português sabe muito bem que a forma de acesso, hoje, não é equitativa e que penaliza os candidatos formados nas universidades e nos institutos politécnicos públicos.
Porém, vive bem com essa iniquidade; nós não vivemos.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Não alinhamos é nas vossos posições!
O Orador: — Em segundo lugar, o PCP não quer quotas, não quer categorias, não quer avaliação com consequências. O PCP não quer que os resultados escolares dos alunos contem como critério de avaliação de desempenho dos professores nem quer que a opinião dos pais conte na avaliação das escolas. Isso define bem o que é a concepção do PCP!
Aplausos do PS.
O Bloco de Esquerda vai atrás. O Bloco de Esquerda tem essa forma, que supõe moderna, do medo de existir, que é o medo de dirigir e o medo de distinguir segundo o mérito.
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Protestos do BE.
Agora, o que é interessante é que o CDS procure fugir, procure escapar, entre os «pingos da chuva».
Conseguiu gastar aqui 6 minutos sem dizer uma única palavra sobre o conteúdo do Estatuto. Mas o CDS não pode escapar a definir-se. O CDS ou quer ir a reboque do Partido Comunista Português ou tem de se definir…!
Protestos do CDS-PP.
O PSD definiu-se ao dizer três coisas.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Disse muito mais!
O Orador: — Primeira, que não queria perturbações. O PSD não quer perturbações. O PSD não quer que a acção de um Governo perturbe. O PSD quer a tranquilidade do marasmo. Se uma reforma perturba, o PSD é contra essa reforma. Quando faz as moções de estratégia, o PSD diz que quer rever as carreiras profissionais, como quer rever a rede de urgências. Mas se alguém revê, se alguém perturba, o PSD fica contra!
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
Que atitude de um partido que, supostamente, é um partido de governo…! Depois, o PSD não quer, especificamente, duas coisas para os professores do ensino básico e secundário.
O PSD não quer categorias. No entanto, o PSD nunca propôs aqui que se acabasse com as categorias no ensino superior, nem em todas as carreiras da função pública que as têm. Mas o PSD não quer que haja categorias distintas na carreira dos professores! Que credibilidade…!
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem de terminar, Sr. Ministro.
O Orador: — Estou a terminar, Sr. Presidente.
E o PSD não quer quotas. Contudo, fez aprovar aqui, na anterior Legislatura, um diploma sobre a avaliação do desempenho dos funcionários públicos com quotas! Mas para professores não as quer.
Protestos do PSD e do PCP.
E porque é que o PSD quer categorias para todos os funcionários públicos menos para os professores? Porque é que o PSD quer quotas na avaliação de todos os funcionários públicos menos dos professores? Por causa da perturbação. Porque o PSD tem medo de qualquer «contestaçãozinha» que exista.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Ministro, tem mesmo que concluir!
O Orador: — Ora, Srs. Deputados, quem tem medo pode comprar um cão, mas governar não consegue!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, deram entrada na Mesa propostas, em número considerável, apresentadas pelo PCP e pelo PSD, pelo que o Decreto-Lei que acabámos de apreciar e as respectivas propostas baixam à Comissão de Educação, Ciência e Cultura para aí serem discutidas na especialidade.
Srs. Deputados, a próxima reunião plenária realiza-se quarta-feira, dia 7 de Março, às 15 horas, e terá como ordem do dia a interpelação n.º 11/X, sobre política para o desenvolvimento rural e agricultura, apresentada por Os Verdes.
Está encerrada a sessão.
Eram 13 horas e 20 minutos.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Partido Socialista (PS)
Elísio da Costa Amorim
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Fernando Manuel de Jesus
Glória Maria da Silva Araújo
Hugo Miguel Guerreiro Nunes
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
José Eduardo Vera Cruz Jardim
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel Luís Gomes Vaz
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rita Susana da Silva Guimarães Neves
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Partido Social Democrata (PSD)
António Paulo Martins Pereira Coelho
António Ribeiro Cristóvão
Emídio Guerreiro
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Sérgio André da Costa Vieira
Partido Comunista Português (PCP)
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
Maria Odete dos Santos
Partido Popular (CDS-PP)
Abel Lima Baptista
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:
Partido Socialista (PS)
António Ribeiro Gameiro
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Partido Social Democrata (PSD)
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Partido Socialista (PS)
Alberto Marques Antunes
Alcídia Maria Cruz Sousa de Oliveira Lopes
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento Diniz
Umberto Pereira Pacheco
Vítor Manuel Pinheiro Pereira
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Partido Social Democrata (PSD)
Agostinho Correia Branquinho
Carlos António Páscoa Gonçalves
José de Almeida Cesário
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Partido Comunista Português (PCP)
Miguel Tiago Crispim Rosado
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL