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9 | I Série - Número: 073 | 20 de Abril de 2007

O Orador: — Apresentamos hoje um projecto de lei que contempla a punição da desconformidade entre o que se ganha e o que manifestamente excede esse rendimento em termos de modo de vida ou de património, relativamente a determinada pessoa, mas com base num ponto que é fundamental, para que não aconteça a inversão do ónus da prova: é a qualificação e a tipificação deste crime como um crime de perigo abstracto. Isto é, a própria situação do enriquecimento injustificado cria um sentimento de perigosidade na sociedade que deve ser tutelado pela lei criminal. Portanto, não é preciso que haja um dano, não é preciso que se especifique a existência de um dano, como acontece nos crimes de resultado ou nos próprios crimes de perigo concreto.
Mas já estou a entrar na discussão técnico-jurídica que, penso, é fastidiosa.
De qualquer forma, Sr. Deputado António Filipe, repito, é bom saber da vossa disponibilidade para se encontrar uma solução. Sentimo-nos bem acompanhados pelo PCP, porque não é a filiação partidária que nos interessa aqui,…

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!

O Orador: — … nem os partidos em si, mas, sim, a vontade de colaborar no sentido de termos um quadro legislativo completo para o combate à corrupção no nosso país.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apreciamos hoje o projecto-lei do PSD que se intitula «Crime de enriquecimento ilícito».
O PSD, tal como nós socialistas, sempre disse que discordava da inversão do ónus da prova porque se viola deste modo o princípio constitucional da presunção de inocência imposto pelo artigo 32.º da Constituição.
Assim o disse o Sr. Deputado Fernando Negrão em debate sobre o tema da corrupção que realizámos nesta Assembleia.
Porém, o PSD resolveu «descobrir a pólvora»: inventou um novo tipo de crime, o de enriquecimento ilícito, mas que, no seu dizer, não implica a inversão do ónus da prova.
Vejamos, então, o que diz a nota justificativa do projecto de lei PSD.
Por um lado, citando a Convenção das Nações Unidas contra a corrupção, no seu artigo 20.º, afirma que é o suspeito arguido que tem de justificar razoavelmente o incremento significativo do património.
Este facto mais não é do que a inversão do ónus da prova. Ou seja, a nota justificativa do vosso projecto de lei contém em si a própria inversão do ónus da prova.
Por outro lado, mais à frente, a nota justificativa também diz que respeita o princípio constitucional da presunção de inocência, atribuindo em exclusivo à acusação a prova dos respectivos elementos do crime.
Face a esta contradição da nota justificativa, que serve precisamente para explicar aquilo que se vai julgar, fica o intérprete com muitas dúvidas.
Mas, então, o próprio texto legal dá-nos esse esclarecimento? Vejamos.
Ora, como acabamos de ver, a nota justificativa tanto invoca como legitima a inversão do ónus da prova e, por isso, a ofensa ao princípio da presunção de inocência, contra a nossa Constituição, como já dissemos, como, mais à frente, afirma que compete à acusação a prova dos elementos do tipo.
Já que da nota justificativa não se entende qual a intenção do proponente, vejamos, então, o que diz o n.º 1 do projecto de lei: «O funcionário que adquirir um património ou um modo de vida que sejam manifestamente desproporcionais ao seu rendimento e que não resultem de outro meio de aquisição lícito, com perigo de aquele património ou modo de vida provir de vantagens obtidas pela prática de crimes cometidos no exercício de funções públicas, é punível com pena de prisão até 5 anos».
Comecemos pelo princípio.
Começa o Partido Social Democrata por um conceito aberto. O que significa património ou modo de vida que sejam manifestamente desproporcionais ao seu rendimento? Desde já, afirmamos que esta não é uma questão primordial, mas deixa ao aplicador da lei penal a dificuldade de integrar no concreto o conceito do que é isso de desproporcional, o que, como sabemos, contém sempre o perigo de interpretações subjectivas e muito relativas, que, na prática, poderão conduzir a injustiças relativas difíceis de ultrapassar. Mas, como já disse, esta não é a questão fundamental, pois outros conceitos abertos existem na legislação penal que a jurisprudência se encarregou de integrar e de definir.
O problema mais difícil de ultrapassar, e na nossa opinião verdadeiramente inconstitucional, é o inciso que a seguir se transcreve, que viola o principio da presunção de inocência, valor constitucional dos Estados de direito e que, em nossa opinião, não é ultrapassável: «e que não resultem de outro meio de aquisição lícito». Ao afirmar-se que não resultem de outro meio licito significa que compete ao arguido provar a origem lícita, uma vez que o acusador pode não saber e, confrontado com a

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