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Quinta-feira, 28 de Junho de 2007 I Série — Número 99
X LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2006-2007)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 27 DE JUNHO DE 2007
Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama
Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 15 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de lei n.º 388/X e da apreciação parlamentar n.º 47/X.
O Sr. Primeiro-Ministro (José Sócrates) apresentou ao Parlamento o programa da Presidência portuguesa da União Europeia, após o que deu resposta a perguntas colocadas pelos Srs. Deputados Luís Marques Mendes (PSD), Manuel Maria Carrilho (PS), Paulo Portas (CDS-PP), Francisco Louçã (BE), Jerónimo de Sousa (PCP) — que, antes, protestou pelo facto de, na concessão da palavra, a Mesa não ter seguido a ordem da representatividade parlamentar, o que mereceu uma explicação do Sr. Presidente, contestada posteriormente pelo Sr. Deputado Bernardino Soares (PCP) — e Álvaro Saraiva (Os Verdes). Fizeram, ainda, intervenções os Srs. Deputados Luís Marques Mendes (PSD), Paulo Portas (CDS-PP), Francisco Louçã (BE), Agostinho Lopes (PCP) e Vitalino Canas (PS).
A encerrar o debate, intervieram, além do Sr. PrimeiroMinistro, os Srs. Deputados Francisco Madeira Lopes (O Verdes), Luís Fazenda (BE), Nuno Magalhães (CDS-PP), Honório Novo (PCP), Mário David (PSD) e Alberto Martins (PS).
Por último, a Câmara apreciou o Relatório da Comissão de Assuntos Europeus sobre a Estratégia Política Anual da Comissão Europeia para 2008, sobre o qual se pronunciaram, além do Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Luís Amado), os Srs. Deputados Armando França (PS), Maria Ofélia Moleiro (PSD), Nuno Magalhães (CDS-PP) e Honório Novo (PCP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 35 minutos.
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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 15 minutos.
Srs. Deputados presentes à sessão:
Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Marques Antunes
Alberto de Sousa Martins
Alcídia Maria Cruz Sousa de Oliveira Lopes
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Maria Cardoso Duarte da Rocha Almeida Pereira
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Martins Seguro
António Ribeiro Gameiro
Armando França Rodrigues Alves
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
David Martins
Elísio da Costa Amorim
Esmeralda Fátima Quitério Salero Ramires
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Fernando Manuel de Jesus
Fernando dos Santos Cabral
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Hugo Miguel Guerreiro Nunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jacinto Serrão de Freitas
Jaime José Matos da Gama
Joana Fernanda Ferreira Lima
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
Joaquim Ventura Leite
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
Jovita de Fátima Romano Ladeira
João Carlos Vieira Gaspar
João Cândido da Rocha Bernardo
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
Júlio Francisco Miranda Calha
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel Alegre de Melo Duarte
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Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel José Mártires Rodrigues
Manuel Luís Gomes Vaz
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Marcos Sá Rodrigues
Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Irene Marques Veloso
Maria Isabel Coelho Santos
Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Júlia Gomes Henriques Caré
Maria Manuel Fernandes Francisco Oliveira
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento Diniz
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson Madeira Baltazar
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paula Cristina Nobre de Deus
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato José Diniz Gonçalves
Renato Luís Pereira Leal
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rita Manuela Mascarenhas Falcão dos Santos Miguel
Rita Susana da Silva Guimarães Neves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino da Costa
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes
Teresa Maria Neto Venda
Umberto Pereira Pacheco
Vasco Seixas Duarte Franco
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Vítor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Pinheiro Pereira
Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Zita Barbas Marvão Alves Gomes
António Alfredo Delgado da Silva Preto
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António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Joaquim Almeida Henriques
António Paulo Martins Pereira Coelho
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Santos Pereira
Fernando dos Santos Antunes
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel de Matos Correia
José Pedro Correia de Aguiar Branco
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
José de Almeida Cesário
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Miguel Pereira de Almeida
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Mário Henrique de Almeida Santos David
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Paulo Miguel da Silva Santos
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Miguel de Santana Lopes
Pedro Quartin Graça Simão José
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos
Ricardo Jorge Olímpio Martins
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Vasco Manuel Henriques Cunha
Zita Maria de Seabra Roseiro
Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Batista Mestre Soeiro
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Miguel Tiago Crispim Rosado
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Partido Popular (CDS-PP):
Abel Lima Baptista
António Carlos Bívar Branco de Penha Monteiro
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
José Hélder do Amaral
José Paulo Ferreira Areia de Carvalho
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Paulo Sacadura Cabral Portas
Bloco de Esquerda (BE):
Alda Maria Gonçalves Pereira Macedo
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
Helena Maria Moura Pinto
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca Ferreira
Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes
Álvaro José de Oliveira Saraiva
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai proceder à leitura do expediente.
A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: o projecto de lei n.º 388/X — Sistema Eleitoral para a Assembleia da República (PSD), que baixou à 1.ª Comissão, e a apreciação parlamentar n.º 47/X — Decreto-Lei n.º 200/2007, de 22 de Maio, que «Estabelece o regime do primeiro concurso de acesso para lugares da categoria de professor titular da carreira dos educadores de infância e dos professores dos ensinos básico e secundário» (PCP).
É tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, o primeiro ponto da nossa ordem do dia de hoje é um debate com o Sr. Primeiro-Ministro sobre a apresentação do programa da Presidência portuguesa da União Europeia, na sequência do último Conselho Europeu.
Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro (José Sócrates): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É já a partir do próximo domingo que Portugal assume a Presidência da União Europeia. Esta é, portanto, a ocasião para Portugal reafirmar aquele que é o seu compromisso firme com o projecto de construção europeia.
Sabemos bem que os interesses de Portugal se jogam na construção da Europa. Pertenço, tal como muitos de nós, à geração de políticos e de cidadãos que já nasceu com o projecto europeu e que continua a considerá-lo como um dos projectos mais importantes, mais generosos e mais críticos não apenas para a Europa, mas também para o mundo. Quero, por isso, assumir aqui e neste momento a ideia-força que orienta a Presidência portuguesa da União Europeia: construir uma Europa mais forte para um mundo melhor!
Aplausos do PS.
Queremos uma Europa que vença os impasses que têm estado a encurtar os seus passos. Uma Europa que seja capaz de enfrentar os desafios globais e que aproveite também as oportunidades destes tempos de mudança. Uma Europa que saiba construir novas pontes de diálogo e que seja uma voz mais presente e mais decisiva num mundo que precisa de estabilidade, de justiça e de desenvolvimento.
A Presidência portuguesa articula-se, por isso, em torno de três eixos fundamentais: o primeiro é a reforma dos Tratados; o segundo é uma agenda de modernização das economias e das sociedades europeias; e o terceiro é o reforço do papel da Europa no mundo.
O principal desafio consiste, evidentemente, em retomar o processo de reforma dos Tratados. O acordo
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alcançado no último Conselho Europeu traduziu-se num mandato claro e preciso, como sempre Portugal considerou absolutamente necessário.
Por isso, decidi convocar a Conferência Intergovernamental, que terá o seu início no próximo dia 23 de Julho, à margem do Conselho de Ministros dos Negócios Estrangeiros da União. O nosso objectivo é absolutamente claro: não perder a dinâmica do acordo alcançado em Bruxelas e queremos aprovar, o mais depressa possível, um novo tratado para a União Europeia.
Aplausos do PS.
O mandato adoptado pelo Conselho Europeu introduz uma mudança muito relevante: a natureza do tratado que será objecto de negociação mudou. Com efeito, abandonou-se a perspectiva de adoptar um tratado constitucional e retoma-se agora a tradição das emendas aos Tratados já existentes. O novo tratado será, pois, mais um tratado internacional, sem natureza constitucional e sem pretender substituir em bloco os dois Tratados que já estão em vigor.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!
O Orador: — Por outro lado, o mandato permite preservar o equilíbrio institucional anteriormente acordado, alterando apenas a data da entrada em vigor da denominada dupla ponderação dos votos no Conselho (que fica protelada para 2014, com um período de transição até 2017). A este equilíbrio acresce ainda um reforço das condições de aplicação do denominado «compromisso de Ioannina», de modo a melhor salvaguardar a posição de minorias expressivas nas votações no Conselho de Ministros Europeu.
Nos termos do mandato que nos foi conferido, é também abolida a estrutura de pilares da União Europeia, consagrando-se uma personalidade jurídica única, naquilo que é uma simplificação assinalável para os tratados europeus.
Sem embargo desta personalidade jurídica única, persistem processos de decisão próprios em matéria de política externa e de segurança comum; recupera-se, integralmente, o mecanismo da cooperação estruturada em matéria de defesa e confia-se ao alto representante da União para a política externa e de segurança (já não Ministro dos Negócios Estrangeiros) a condição de vice-presidente da Comissão Europeia e a responsabilidade de presidir ao Conselho de Ministros das relações exteriores.
No plano da cidadania europeia, o mandato adoptado preserva o reconhecimento do valor jurídico da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, com a excepção que é conhecida e que diz respeito à sua aplicação jurisdicional no Reino Unido. E não é demais salientar que adoptar uma declaração de direitos fundamentais com tal valor jurídico e que coloca em pé de igualdade os direitos civis e políticos, por um lado, e os direitos económicos, sociais e culturais, por outro, corresponde não apenas a um reforço da base da cidadania europeia mas também à afirmação dos nossos valores civilizacionais, comuns à identidade de todos os europeus.
Mas desejo salientar uma inovação importante deste mandato: o reforço do papel dos parlamentos nacionais no controlo do respeito pelo princípio da subsidiariedade por parte das instituições europeias.
Trata-se de um mecanismo de natureza preventiva que prevê que, quando metade dos parlamentos nacionais suscitarem objecções a uma iniciativa da Comissão com fundamento na violação do princípio da subsidiariedade, tal obrigará o Conselho e o Parlamento Europeu a expressamente deliberarem sobre a manutenção dessa proposta ou sobre a sua retirada. Os parlamentos nacionais sairão, portanto, reforçados no tratado que vamos preparar.
Aplausos do PS.
Srs. Deputados: Um mandato não é um tratado. Com este mandato a Europa escolheu o caminho, mas falta percorrê-lo. O que temos pela frente é um trabalho exigente, intenso e complexo. Cabe-nos acabar esta tarefa, o que é uma honra para Portugal. Mas não tenho ilusões: haverá sempre necessidade de negociação e de concertação — e devemos estar preparados para os problemas que podem surgir e que tantas vezes se manifestam apenas na recta final dos processos negociais. Mas partimos com confiança. Estamos preparados para conduzir os trabalhos da conferência intergovernamental, de modo a obter um novo tratado para a Europa, à altura destes novos tempos que hoje vivemos.
Mas, Srs. Deputados, gostaria também de vos dizer que a reforma dos Tratados é apenas uma parte, embora uma parte importante, da nossa tarefa. A Europa precisa de investir mais numa agenda de modernização. A Estratégia de Lisboa estará, portanto, de novo no centro das nossas preocupações. O que vamos fazer é contribuir activamente para um novo ciclo da Agenda de Lisboa, que será aprovado na Primavera de 2008, durante a Presidência eslovena. Mas prepararemos esse novo ciclo mantendo o equilíbrio entre as três componentes daquela Agenda: entre o pilar económico, o pilar social e o pilar ambiental.
Sempre foi assim a Estratégia de Lisboa e assim deve continuar a ser! Por outro lado, lançaremos o debate sobre um plano de acção tecnológico em matéria de energia, com especial destaque para a eficiência energética, e sublinharemos o papel dos biocombustíveis, muito em
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especial no quadro da relação que pretendemos aprofundar entre a União Europeia e o Brasil. Do mesmo modo, prosseguiremos a preparação da posição da União na conferência destinada a debater o quadro de referência na era pós-Quioto.
Colocaremos ainda na agenda europeia o tema da escassez de água e das situações de seca e relançaremos o debate para a construção das bases para uma efectiva política marítima à escala europeia.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!
O Orador: — Srs. Deputados, também pretendemos dar à dimensão social da Estratégia de Lisboa a relevância e a visibilidade que ela merece. Este ano passam 10 anos sobre o lançamento da Estratégia Europeia do Emprego. É, portanto, tempo de promover o debate sobre as melhores formas de coordenação das políticas de emprego, tendo em vista potenciar a criação de postos de trabalho que sejam sustentáveis no actual quadro de competição global. Esta linha de acção da Presidência portuguesa será estreitamente articulada com a qualificação dos recursos humanos, com a conciliação do trabalho com a vida familiar, com a luta contra a pobreza e, ainda, com o debate sobre a denominada flexigurança, que está na agenda europeia. Este debate deverá nortear-se pela procura de soluções integradas e equilibradas, buscando tradução prática em princípios gerais e comuns a nível europeu, mas que tenham em conta a diversidade das realidades sociais nos diferentes Estados-membros da União.
O reforço da cooperação policial e judiciária na luta contra o terrorismo e a criminalidade organizada estará também dentro das nossas tarefas. Mas as exigências de segurança não podem desvirtuar a natureza aberta e tolerante das nossas sociedades. Foi Portugal que propôs, e foi uma empresa portuguesa que concebeu, a solução tecnológica denominada SIS-one4all, para que os novos Estados-membros possam aderir plenamente ao Espaço Schengen e para que as fronteiras com esses países possam desaparecer no final da Presidência portuguesa, cumprindo, desta forma, um dos maiores anseios europeus, que é a livre circulação das pessoas no espaço da União.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O actual momento internacional impõe especiais responsabilidades à União Europeia. A Europa precisa de ter um protagonismo mais activo na cena internacional.
Neste segundo semestre de 2007 convergem decisões inadiáveis sobre questões delicadas da agenda global — futuro do Kosovo, dossier nuclear do Irão, crise humanitária no Darfur — e convivem com um conjunto de cimeiras bilaterais particularmente relevantes: Índia, China, Rússia e Ucrânia. O relacionamento com os Estados Unidos deve ser também objecto de acompanhamento empenhado, no quadro da relevância estratégica da relação transatlântica para a Europa.
Mas há três iniciativas no domínio da política externa europeia em que a Presidência portuguesa quer deixar a sua marca. São elas a cimeira com o Brasil, as conferências euro-mediterrânicas e a cimeira com África.
Por opção portuguesa, a nossa Presidência começará com uma nova cimeira da União: a cimeira entre a Europa e o Brasil. Esta será, seguramente, uma marca muito impressiva que deixaremos na política externa da União e que dará coerência ao relacionamento da Europa com as potências económicas emergentes.
Aplausos do PS.
A Europa já tem cimeiras anuais com a China, com a Índia e com a Rússia. Passará, a partir de agora, a partir da Presidência portuguesa, a ter cimeiras também com o Brasil. E com esta iniciativa, Portugal dá o seu contributo específico para enriquecer a política externa europeia, promovendo um relacionamento formal e institucional mutuamente benéfico para o Brasil e para a Europa.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!
O Orador: — Srs. Deputados, as Conferências Euromed, por seu turno, inserem-se na prioridade que decidimos atribuir à cooperação com o Sul, no quadro do Processo de Barcelona e da Nova Política de Vizinhança, e sublinham também o valor que atribuímos ao relançamento de um debate político de fundo com os nossos parceiros da orla Sul do Mediterrâneo, em particular nos domínios do desenvolvimento e nos domínios das migrações.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!
O Orador: — Finalmente, Srs. Deputados, quero sublinhar aquela que será uma iniciativa maior da nossa Presidência: Portugal propõe-se realizar em Dezembro a segunda cimeira entre a União Europeia e a África. Há sete anos, há sete longos anos que a Europa não tem um diálogo institucional estruturado com
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África — o que é uma lacuna absolutamente incompreensível na política externa europeia. Se há um país que não se pode resignar a esta situação e que tudo fará para a ultrapassar, esse país é Portugal.
Aplausos do PS.
Recordo, Srs. Deputados, que Portugal já esteve na base da primeira e da última cimeira com África, no Cairo, em 2000, e queremos estar, de novo, na base de uma nova parceria estratégica entre a Europa e África, tendo em vista os objectivos do desenvolvimento sustentável, da paz, do combate às doenças endémicas e de uma gestão equilibrada e mutuamente vantajosa dos fluxos migratórios.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Temos perfeita consciência de que assumimos a Presidência num momento delicado da conjuntura internacional e que estamos perante impasses e bloqueamentos que há demasiado tempo persistem na Europa. Esta Presidência vai exigir da nossa parte rigor, profissionalismo e disciplina. As presidências, por si sós, não resolvem todos os problemas, mas podem fazer a diferença. E podem fazer essa diferença se assumirem objectivos claros, humildade na forma de os prosseguir e vontade de enfrentar os problemas, promovendo os indispensáveis consensos entre todos os Estados-membros para fazer avançar o projecto europeu.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!
O Orador: — Essa é a nossa firme intenção. Manteremos um relacionamento permanente com o Parlamento Europeu e contamos com a colaboração estreita da Comissão e, em especial, do seu Presidente, Durão Barroso. Poderemos contar, também, com o apoio do Alto Representante para a Política Externa, Javier Solana. E não duvido da vontade e do empenhamento de todos os nossos parceiros europeus.
Confio, sobretudo, na qualidade e no profissionalismo da nossa diplomacia e de todos os técnicos que, aos diversos níveis, assumirão as responsabilidades da Presidência. E, sobretudo, sei que posso contar com o apoio dos portugueses, para quem o projecto europeu, a ideia da Europa, sempre representou um objectivo político maior para o nosso país, assente num largo consenso nacional.
Aplausos do PS, de pé.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está já constituída um primeira ronda de perguntas, com três Deputados inscritos, e uma segunda, com quatro Deputados.
O primeiro orador inscrito é o Sr. Deputado Luís Marques Mendes. Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, é a terceira vez que Portugal vai exercer a Presidência da União Europeia. As duas anteriores Presidências correram bem. É importante que o mesmo suceda desta vez: é importante para a Europa, para aprofundar o projecto europeu, e é importante para Portugal, para que reforce o seu prestígio na Europa e no mundo.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Estamos de acordo que este é um momento de relevante interesse nacional. A Europa é um traço de união entre os portugueses. Por isso mesmo, o Governo sabe que pode contar com o PSD para que Portugal faça uma boa presidência: uma presidência digna, eficaz e com resultados. É o que os portugueses e os europeus esperam de nós!
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — Quero dizer também, nesta ocasião, Sr. Primeiro-Ministro, que o programa apresentado merece o nosso acordo. É importante a prioridade conferida à aprovação final do tratado. É importante o conjunto de cimeiras que a Presidência vai levar a cabo. Destaco, aqui, de uma forma muito especial, a cimeira da União Europeia com o Brasil e a com África. São sinais importantes, tal como as conferências Euromediterrânicas, de abertura da Europa ao mundo, e abertura com a marca do universalismo português.
É importante também, em terceiro lugar, o conjunto de iniciativas no domínio económico e da competitividade da União Europeia. Sublinho, aqui, a importância de dossiers como o da energia, o das alterações climáticas, o da revisão do mercado interno e o do relançamento, como referiu, da Estratégia de Lisboa, cujo propósito é muito positivo e cujos resultados estão ainda muito longe das expectativas esperadas. Mas esta agenda parece-nos importante, sobretudo porque a Europa tem de se preocupar, no futuro, cada vez menos com a sua organização e o seu funcionamento e cada vez mais em ter uma agenda que vá de encontro às reais preocupações dos europeus,…
Vozes do PSD: — Muito bem!
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O Orador: — … a preocupação com o crescimento económico, o emprego e a solidariedade. É isto que nos pode dar uma Europa mais coesa e competitiva. É isto que pode ajudar a construir uma verdadeira Europa dos cidadãos.
Aplausos do PSD.
Daí também a importância do acordo alcançado, no passado fim-de-semana, no Conselho Europeu.
Pode não ter sido o acordo ideal, mas foi um acordo importante e o acordo necessário para a Europa vencer a crise em que estava mergulhada e ultrapassar o impasse institucional.
Esse acordo, do nosso ponto de vista, é de saudar. Os princípios fundamentais que tínhamos definido para este acordo estão consagrados: o princípio da igualdade entre os Estados e a recusa do directório; o princípio da coesão económica e social; o reforço do papel dos parlamentos nacionais; o equilíbrio relativo entre os Estados em termos de ponderação de votos, que tinha sido adquirido na anterior negociação; a carta dos direitos fundamentais; e a simplificação do processo decisório dentro da União Europeia. São apenas alguns de vários outros pontos que estão contemplados e por isso consideramos que é um acordo importante e positivo para o futuro da União Europeia.
É certo que ainda não temos tratado, mas não é menos verdade que já toda a gente conhece o conteúdo que esse tratado vai ter. E esse conteúdo, no essencial, representa 80% a 90% do que já estava previsto no anterior Tratado Constitucional. Ou seja, não é um acordo minimalista e ainda bem — ainda bem para a Europa e ainda bem para Portugal!
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — O que nos leva, por isso mesmo, Sr. Primeiro-Ministro, a uma última questão, que é a do modo de ratificação do futuro tratado: a questão do referendo.
A este respeito, quero deixar claro que considero que não há assuntos tabu na política, em Portugal, e que todos os temas devem ser livremente debatidos, porque cada um interpreta o interesse nacional.
Agora que já há um conteúdo para o Tratado, agora que já se conhece o que vai ser o conteúdo do Tratado, não há razão alguma para não se ter uma orientação política relativamente à questão do referendo. A nossa orientação é clara: entendemos que, na altura própria, deve ser realizado um referendo, que os portugueses devem ser consultados.
Este referendo foi prometido em 2002, foi prometido novamente em 2005, até já teve data marcada, até já originou uma revisão extraordinária da Constituição.
Mais ainda: há nove anos, esta Câmara, com os votos conjugados do seu partido, do meu próprio e do CDS-PP, deliberou fazer um referendo sobre o Tratado de Amesterdão, esse, sim, um Tratado pequeno e minimalista.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — É verdade!
O Orador: — Perante todo este «histórico» e todos estes compromissos, acho que nenhum português compreenderia que não fosse dada oportunidade aos portugueses de se pronunciarem.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Por isso mesmo, quero fazer-lhe uma única pergunta, é mesmo a única que coloco.
Será que o Sr. Primeiro-Ministro assumiu, perante os seus colegas europeus, algum compromisso de não realizar o referendo em Portugal? É uma pergunta simples e directa para uma resposta «sim» ou «não».
A terminar, quero dizer-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, e anunciar aos portugueses, que, na altura própria, formalizaremos a nossa própria proposta com vista à realização de um referendo europeu em Portugal, para honrar os compromissos assumidos perante os cidadãos.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — Cumprir a palavra não é uma questão de somenos, é uma questão política essencial.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Mas fá-lo-emos, acima de tudo, em homenagem à Europa dos cidadãos.
A Europa dos cidadãos faz-se com a participação dos cidadãos, não nas suas costas ou à sua revelia.
Há que não termos medo da vontade popular, nós que somos europeístas convictos e que queremos reforçar a opção europeia de Portugal. É uma questão de cidadania e de responsabilidade!
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Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Maria Carrilho.
O Sr. Manuel Maria Carrilho (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, quero felicitar o Sr. Primeiro-Ministro pelo programa apresentado.
É um programa claro, competente, com ambição, mas é também um programa realista. É um programa que aprendeu com as dificuldades dos últimos dois anos, isto é, que compreendeu a necessidade de um realismo que tenha em conta que a União a 27 não é a União a 25 nem a União a 15 e que compreendeu, também, que é hoje fundamental que se conecte mais estreitamente a União Europeia com duas das suas dimensões fundamentais, a da sua opinião pública e a da sua História.
História que, de resto, esteve bem presente ao longo do Conselho Europeu da semana passada, a lembrar que muitos dos nossos problemas de hoje decorrem não, como tantas vezes se pensa, da excessiva lentidão mas da extrema velocidade a que foram dados alguns passos da construção europeia.
Só tendo isto presente se poderá contrariar o sentimento expresso por Milan Kundera quando diz que «europeu é aquele que tem a nostalgia da Europa» para passar a ser, como gostaríamos, aquele que tem esperança na Europa.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — O programa apresentado está à altura das respostas que é preciso dar ao impasse que a União Europeia tem vivido.
Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, antes de pedir-lhe que esclareça dois pontos deste programa, não posso deixar de lamentar o gesto de avestruz do líder do PSD, infelizmente acompanhado por outros líderes, que tem pretendido reduzir — e, mais uma vez, fê-lo aqui, hoje — todo o programa da Presidência portuguesa da União à questão do tratado e, depois, como se isto não bastasse, reduzir todo o trabalho de elaboração do tratado à questão do referendo.
Aplausos do PS.
É uma dupla distorção que é grave porque desvaloriza — atrever-me-ia a dizer que quase estropia — o sentido e o alcance da missão portuguesa no próximo semestre.
É, de facto, um gesto de avestruz porque «mete a cabeça na areia» para não ver o que é importante. E o que é importante é a difícil e laboriosa elaboração do tratado.
Neste ponto, a discrição, como todos sabemos, a margem de manobra de um presidente em exercício é sempre uma condição de êxito das suas diligências.
É porque, Sr. Deputado Marques Mendes, há um «antes» e um «depois»; é porque há um princípio, um meio e um fim; é porque há fases… É todo este trajecto, é todo este caminho que é preciso fazer com segurança e resultados, lembrando, como dizia há meses, no nosso Parlamento, um pensador arguto, Daniel Innerarity, que a política é uma actividade cujas consequências têm maior alcance do que as suas previsões.
A questão da ratificação do futuro tratado pôr-se-á a seu tempo e, naturalmente, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista será fiel aos seus compromissos.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Ahhh…!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Vamos ver! Essa fica registada!
O Orador: — Resolva, pois, o Sr. Deputado Marques Mendes a algazarra referendária e antireferendária que vai no seu partido que o PS está tão seguro e atento aos timings como está solidário com o esforço e o talento diplomáticos que estes próximos meses exigem do Presidente em exercício do Conselho Europeu.
Quanto às questões que queria colocar-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, têm a ver com o acelerado processo de globalização que hoje vivemos e com algumas possibilidades de intervenção da União nesse mesmo processo.
Como sabemos, a globalização política vem do pós-guerra do século passado, com instituições que há muito reclamam profundas reformas, e a globalização económica acelera desde os anos 80, exigindo cada vez mais uma regulação também global, na qual a palavra da Europa pode ser decisiva.
Há ainda uma terceira globalização, a que já se tem chamado «o terceiro pilar» da globalização, que tem a ver com a História e com a diversidade dos povos, pilar este que, se queremos um crescimento com paz,
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tem de ser cada vez mais incentivado.
É porque, no mundo de hoje, a diminuição das distâncias físicas, graças às tecnologias da comunicação, tem tornado maiores quase todas as outras distâncias, nomeadamente as culturais e civilizacionais.
Neste quadro, a primeira questão que queria colocar-lhe é a de saber se, e de que modo, as previstas cimeiras com o Brasil e com África, que abrem e fecham a nossa Presidência, assumem este triplo desafio que se põe à Europa e que Portugal, com as raízes mundiais que a História nos proporcionou, pode talvez compreender melhor que os outros.
Para terminar, Sr. Primeiro-Ministro, a segunda questão que lhe deixo prende-se com a Estratégia de Lisboa, estratégia que, neste momento, faz também a sua «conversão realista».
Qual a lição a tirar destes sete anos e quais os objectivos nucleares do novo ciclo que o Sr. PrimeiroMinistro aqui esboçou? Será ele capaz de integrar o relançamento de projectos tão vitais para a Europa como o do chamado «MIT europeu» ou o do sistema europeu de navegação por satélite, o projecto Galileu? Sr. Primeiro-Ministro, são estas as nossas primeiras questões que aqui lhe deixamos, com os votos de uma boa, uma eficaz, Presidência da União Europeia.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — — Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados: Deixarei para a intervenção de fundo a grelha de análise e a leitura do CDS sobre o mandato que a Presidência portuguesa vai receber. No entanto, não queria deixar de afirmar desde já alguns princípios.
Em primeiro lugar, ainda bem que a União Europeia ultrapassou uma fase de impasse institucional e começou a tentar resolvê-lo, de forma produtiva e produtora de resultados.
A fortuna dos calendários atribui à Presidência portuguesa um mandato com possibilidades de sucesso para realizar uma Conferência Intergovernamental e desenvolver um projecto de tratado, seja de reforma seja de funcionamento, certamente menos ambicioso e mais consensual do que o Tratado Constitucional.
Não há qualquer mesquinhez que possa assaltar esta bancada por esse mandato acontecer no Governo de V. Ex.ª Pela nossa parte, não suspendemos a oposição, não permitiremos que os problemas dos portugueses e do País sejam ignorados ou esquecidos, mas também não suspendemos o sentido de Estado.
Sabemos que, se Portugal conseguir finalizar a redacção do tratado durante a sua Presidência, o que implica paciência, determinação, flexibilidade, isso prestigia Portugal e ligará o nosso país a um importante Tratado da União Europeia.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — Tendo-lhe dito isto, Sr. Primeiro-Ministro, gostava de acrescentar que, como diz, é certo que ainda não temos um tratado, temos um mandato, mas que esse argumento também implica uma responsabilidade para si.
É que também não mostraria especial competência um governo que, tendo um mandato, falhasse o seu desenvolvimento no que às atribuições da Presidência concerne.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — A este título, e sem substituir a intervenção de fundo, queria fazer-lhe cinco perguntas.
Em primeiro lugar, qual é, do seu ponto de vista, o potencial de desenvolvimento, na representação e no relacionamento com as organizações internacionais, da atribuição de personalidade jurídica própria à União Europeia? Até onde é que esse princípio poderá conduzir a União, nomeadamente em termos da representação nas organizações internacionais? Em segundo lugar, não deve ocultar-se que o alargamento da base populacional da União significa, para vários países entre os quais Portugal, uma diminuição do seu peso relativo, do ponto de vista da ponderação de voto. Não deve ocultar-se nem deve prometer-se contrariar, de forma impossível, essa circunstância.
O que queria perguntar-lhe é como é que o Sr. Primeiro-Ministro tenciona compensar, em termos dos meios diplomáticos, do apoio aos Negócios Estrangeiros, do apoio à nossa diplomacia, essa objectiva, embora relativa, diminuição do nosso peso, do ponto de vista do uso do voto.
Em terceiro lugar, queria fazer uma pergunta ao Sr. Primeiro-Ministro sobre uma questão, por mais que a considere pouco pertinente e abstracta ou deslocada — e imagino que não queira nenhum problema suplementar —, mas há questões de princípio que devem ser colocadas, sobretudo quando se estranha o modo como esta matéria foi desenvolvida.
Pode o Sr. Primeiro-Ministro invocar-me uma razão intelectualmente honesta para que não se refiram as raízes culturais e civilizacionais da Europa, adquirida que está há muito tempo — e ainda bem —, na gene-
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ralidade dos países, embora não em todos por razões específicas, a separação dos Estados e das Igrejas?
Aplausos do CDS-PP.
Em quarto lugar, queria solicitar ao Sr. Primeiro-Ministro uma explicação sobre o itinerário que o princípio da livre concorrência acabou por ter no Conselho Europeu e nas negociações do último andar do edifício, itinerário da livre concorrência esse que, em princípio, faz parte do «ADN» da União Europeia.
Gostaria que o Sr. Primeiro-Ministro pudesse explicar à Câmara qual o lugar, a dimensão e o conteúdo que aquele princípio terá no mandato que recebeu.
Por fim, Sr. Primeiro-Ministro, uma questão sobre cuja análise, provavelmente, até poderemos concordar mas sobre cujo resultado discordaremos: a questão da Turquia.
V. Ex.ª, na sua intervenção, citou momentos e factos ponderosos da vida internacional, entre os quais a questão do Kosovo e a do relacionamento com a Turquia.
Ainda ontem, foram abertos dois de três dossiers — e, significativamente, não o terceiro — desta nova fase de negociação com a Turquia.
Sr. Primeiro-Ministro, acho que, nesta matéria, se deve falar claro: a Turquia é um país amigo num mundo perigoso, é um Estado aliado numa região instável! Mas, Sr. Primeiro-Ministro, a Turquia só é um Estado laico porque tem tutela militar. Se, um dia, deixar de ter tutela militar, é evidente o risco de deixar de ser um Estado laico.
Basta esta equação para perceber que a Turquia, num prazo largo, não é elegível como membro de pleno direito da União Europeia. E basta esta equação, não preciso de citar outras de carácter demográfico ou geográfico! Portanto, a pergunta que lhe faço, Sr. Primeiro-Ministro, é se não é melhor a União Europeia ter uma posição frontal nesta matéria, não prometendo o que não pode dar, em vez de prosseguir, de forma assaz equívoca, uma gestão de expectativas em que, um dia, o problema já não é termos a Turquia dentro ou fora, mas termos a Turquia dentro ou contra — e isso é que não podemos ter com certeza.
Eram estas as cinco questões que queria deixar-lhe.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para responder a esta primeira ronda de perguntas, tem a palavra o Sr. PrimeiroMinistro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente e Srs. Deputados, quero, em primeiro lugar, registar o acordo das bancadas, que até agora se pronunciaram, com a agenda e o programa da Presidência portuguesa.
Isso parece-me ser da maior importância para o sucesso da Presidência e para as condições políticas com que a vamos exercer.
Mas, se me permitem, quero sublinhar um ponto: este é um programa ambicioso. E essa ambição resulta do trabalho intenso que fizemos, no último ano, na preparação deste programa — não vem de agora, mas de há um ano!
Aplausos do PS.
Lembro-me bem de, há alguns meses, quando eu falava da cimeira com o Brasil, ouvir muita gente dizer que talvez fosse extemporâneo e arriscado falarmos já nessa cimeira, sem termos certezas quanto às condições para a realizar. E quanto à cimeira com África, quando tanta gente nos avisava: «atenção aos problemas diplomáticos conhecidos, talvez seja bom não atribuir prioridade a isso»… E recordo-me bem daqueles que me chamavam a atenção para as dificuldades que iríamos ter com o tratado quando decidimos, ainda antes deste ano, conjuntamente com a Presidência alemã, colocar a questão da Constituição, do Tratado Constitucional e da reforma dos Tratados como o primeiro objectivo para as três Presidências de acordo com o programa conjunto.
Esse foi talvez o momento decisivo, quando Angela Merkel anunciou que a prioridade para a sua presidência, tal como para a Presidência portuguesa, seria terminar com este impasse, seria não aceitar mais a reflexão e passar à acção. Aí, sim, foi arriscado, porque ninguém sabia se havia, ou não, ambiente político para aprovar o mandato e, depois, para fazer o tratado.
Esta agenda portuguesa resulta da coragem que tivemos, nessa altura, para definir a luta pela reforma dos Tratados, quando a devíamos fazer e não depois.
Portanto, aqueles que acham que isto resulta de uma «fortuna dos calendários» não se enganem: isto resulta das decisões que tomámos, em conjunto, com a Presidência alemã e com a Presidência eslovena, assumindo, com coragem, que a Europa não podia fingir que não tinha um problema e assumindo que esse problema devia ser enfrentado e ultrapassado, porque o projecto europeu dependia dessa resolução!!
Vozes do PS: — Muito bem!
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O Orador: — Em segundo lugar, Srs. Deputados, quero que também fique claro o meu desacordo com uma certa desvalorização do trabalho que há entre passar de um mandato para um tratado. Desculpem, mas isso não me parece nada razoável. Toda a gente sabe das dificuldades que há em passar desse mandato para o tratado, toda a gente sabe que é mesmo nos momentos finais que as capacidades de negociação e de concertação são mais importantes.
Em terceiro lugar, quero responder ao Sr. Deputado Marques Mendes. E a minha resposta resume-se a uma palavra: não! Não, não me entendi com qualquer líder europeu sobre a ratificação do tratado, porque o meu primeiro entendimento é com o Parlamento e com os portugueses — e nunca faria isso!
Aplausos do PS.
Quero também recordar ao Sr. Deputado que nem eu me entendi com os líderes europeus nem eles se entenderam comigo, ou com os seus próprios povos e parlamentos!! Não conheço um líder europeu que tenha assumido, sem conhecer o texto, que vai fazer um referendo sobre aquilo que não conhece.
Aplausos do PS.
A não ser um único país que, por obrigação constitucional, tem de fazer um referendo: a Irlanda.
Ao contrário, conheço vários líderes políticos que, nesta negociação, foram a muitos detalhes justamente para evitar novos referendos. Mas esse é um problema deles, não é um problema dos outros, nem é um problema português.
Gostaria de discutir politicamente esta questão da ratificação porque não podemos passar por cima dela como se nada fosse. E ao Sr. Deputado Marques Mendes quero dizer, talvez, o óbvio: ainda não existe tratado! Naturalmente, conhecemos os pressupostos políticos em que vai assentar o tratado, mas não há um texto do tratado — e não há um texto pela simples razão de que o trabalho não está concluído! Ora, pretender pôr a ratificação antes do trabalho que exige a feitura desse texto, desculpe-me, Sr. Deputado, mas parece-me ser uma operação política que não tem a mínima justificação.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Parece-lhe!…
O Orador: — O que se intui da sua exposição e das suas posições é que o Sr. Deputado quer fazer um referendo seja lá sobre o que for. O Sr. Deputado quer é fazer um referendo!…
Protestos do PSD.
E querer fazer um referendo sem saber o que se vai referendar parece-me ser uma posição política, no mínimo, bizarra e extraordinária, para não dizer absurda. É porque o primeiro ponto que devemos considerar quando decidimos fazer um referendo é saber exactamente o que vamos perguntar ao povo português.
Ora, ainda não o sabemos pela simples razão de que não há tratado.
Por outro lado, Sr. Deputado, a propósito de política externa e de política europeia, o que o País pede e o que se exige é a construção do consenso, é um apelo ao mais severo sentido de Estado. E, estando Portugal a três dias do início da sua Presidência, esta é a pior altura para algum partido tentar obter algum ganho de causa com alguma manobra de antecipação de uma questão que naturalmente não se põe agora, pôr-se-á depois.
Mas todos os portugueses perceberam o que está aqui em causa… Para ser sincero, acho que o Sr. Deputado Marques Mendes está à procura não de uma base para o consenso, mas exactamente do único ponto em que pode querer ter um conflito.
Aplausos do PS.
Sr. Deputado, quero deixar as coisas bem claras: o Governo português dirá qual é a sua posição depois de ter o texto, aí sim. Não agora, porque isso enfraqueceria a nossa posição e corresponderia a colocar uma questão política que é para depois de haver um tratado e não para agora.
Só sabemos que o futuro tratado não vai ser um tratado constitucional, mas não sabemos qual vai ser o tratado.
Esta é a posição do Governo: pronunciar-nos-emos quando existir um texto do tratado! Sr. Deputado Marques Mendes e Sr. Deputado Paulo Portas, nós não queremos tréguas políticas, o que queremos é responsabilidade.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Não queremos que a democracia fique entre parêntesis durante seis meses; queremos
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debater as questões internas — temos, aliás, o maior interesse nisso.
O apelo que fazemos, naturalmente, é para que haja, quanto às matérias europeias e de política externa, a procura de um consenso e não a procura de um motivo para divergir…, que, em alguns casos, até será a procura de uma razão para existir politicamente!
Aplausos do PS.
Vou terminar, mas há um ponto que quero deixar claro: eu não tenho medo dos referendos, já fiz muitos referendos — nuns perdi e noutros ganhei. Mas acho que os referendos devem existir no exacto momento em que sabemos o que vamos referendar.
Só que há um argumento a favor do referendo que não me convence (e quero deixar essa minha posição bem clara): a ideia de que devemos ter um referendo sobre o futuro tratado, qualquer que ele seja, apenas porque nunca tivemos um referendo sobre a Europa. Acho esse argumento muito criticável, por duas razões:…
O Sr. Honório Novo (PCP): — Quem é que usa esse argumento?
O Orador: — … primeira, porque esse argumento pressupõe que se pode fazer um referendo com efeitos retroactivos — ou seja, fazemos agora um referendo sobre a matéria que Portugal decidiu já há muitos anos — e, segunda (o que é pior, e aí, sim, temos uma grande divergência, Sr. Deputado!), porque esse argumento põe em causa a legitimidade das ratificações que Portugal fez sobre a questão europeia — e não aceito isso!!
Aplausos do PS.
O Sr. Fernando Rosas (BE): — E com muita razão!
O Orador: — Este Parlamento ratificou os Tratados com a Europa, há uma maioria dos portugueses que suporta o projecto europeu e eu não estou de acordo com qualquer iniciativa política que, para obter ganhos partidários, tenha como consequência pôr em causa essa legitimidade que o Parlamento livremente aprovou.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos dar início à segunda ronda de perguntas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, quis a circunstância, pelos vistos, que, até agora, o Sr. Primeiro-Ministro ouvisse somente o «arco da obediência». Creio, no entanto, que no debate que hoje temos é indispensável que se discutam as dificuldades que a Europa vive.
O Sr. Primeiro-Ministro terá uma cimeira social no Outono — aliás, não se lhe referiu — e a Comissão Europeia divulgou hoje o seu relatório sobre a flexigurança. A flexigurança, Sr. Primeiro-Ministro, é a «Constituição não escrita» da Europa, é a voz dos liberais que detestam a liberdade e detestam a responsabilidade social.
É por isso que temos de nos perguntar, em Portugal, onde europeus sentem dificuldades como outros europeus, tendo nós o maior crescimento da taxa de desemprego da Europa, se precisamos de liberdade de despedimento, ou se, sendo nós o segundo país com trabalho mais precário na Europa, precisamos de liberdade de despedir.
Precisa, Sr. Primeiro-Ministro, de liberdade de despedir o meio milhão de homens e mulheres que estão desempregados? Precisam de liberdade de despedir os 800 000 precários e precárias que temos em Portugal, ou as centenas de milhares de jovens que só podem ter trabalho temporário? A nossa resposta, Sr. Primeiro-Ministro — e, porventura, divergimos —, é que não, é que é «menos Europa e pior Europa» se este critério da flexigurança vier a ser aplicado.
Acontece, no entanto, que esta ideia do mercado contra as pessoas é uma matriz da anterior Constituição e transfere-se para as regras que instituem o tratado cujo mandato o seu Governo deve levar a conclusão.
Hoje mesmo — veja, em Portugal! —, o relatório da Comissão do Livro Branco vem-nos dizer que é preciso menos férias, menos subsídios, menos salários, mais horário e mais despedimentos. O seu Governo, Sr. Primeiro-Ministro, consegue a «proeza», aplicando antes de tempo o conceito da flexigurança, de fazer já pior do que fizeram Bagão Félix, o PSD e o CDS-PP, quando estiveram no governo.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!
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O Orador: — E, por isso, a minha pergunta, Sr. Primeiro-Ministro, é a seguinte: o que é que tenciona defender, em nome do seu Governo quando reunir a Cimeira Social, no próximo Outono, para fazer avançar a noção da flexigurança?
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr. Presidente, em primeiro lugar, quero fazer o seguinte reparo: já estou aqui há muitos anos para conhecer quando é que um Presidente da Assembleia da República o é ou deixa de ser e passa a ser um dirigente partidário, uma emanação da maioria. É um reparo que registamos e queremos manifestar o nosso profundo desacordo com uma decisão arbitrária do Sr. Presidente da Assembleia da República. Tenha paciência…, não gosta desta representação do PCP, mas é a que existe!! Nesse sentido, queremos manifestar, com profunda indignação, esta novidade que imprimiu aqui a este debate, não respeitando a ordem natural que deveria ter acontecido.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, não posso admitir o que está a dizer e vou já dar um esclarecimento, em nome da Mesa.
O que ficou decidido, em Conferência de Líderes, sobre este debate foi quanto ao seu formato, quanto à abertura pelo Primeiro-Ministro, quanto aos períodos de encerramento. Quanto a perguntas e a intervenções no debate, o que ficou decidido foi que se respeitaria a ordem de inscrições.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não, não, Sr. Presidente!
O Sr. Presidente: — E a Mesa executou e deu cumprimento a isso que ficou decidido. Nada foi deliberado em contrário: nem o líder parlamentar do PCP, na Conferência de Líderes, suscitou qualquer questão relacionada com esse ponto, nem, oportunamente, procedeu a qualquer inscrição junto da Mesa. Foi a própria Mesa que, neste debate, se dirigiu ao líder do PCP para recolher a inscrição dos Deputados do PCP, que, aliás, como sabe, será, agora, o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, depois um Deputado do Partido Ecologista «Os Verdes», da CDU, e depois o Sr. Deputado Honório Novo.
Portanto, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, a Mesa é imparcial, a Mesa é estrita e rigorosa e o que V.
Ex.ª disse não tem o menor cabimento e é energicamente repudiado pela Mesa da Assembleia da República e pelo seu Presidente.
Tem a palavra.
A Sr.ª Rosa Maria Albernaz (PS): — Muito bem, Sr. Presidente!
O Orador: — Sr. Presidente, independentemente, de um esclarecimento posterior da minha bancada e do Presidente do Grupo Parlamentar do PCP, continuo a manter aquilo que disse.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, mau dia e mau momento para vir falar de consensos quando o seu Governo anuncia uma declaração de guerra social aos trabalhadores, ao seu direito à segurança no emprego, ao horário de trabalho, à organização do tempo de trabalho, à justa retribuição do trabalho extraordinário.
No que aqui nos traz, já deu uma resposta antecipada: com outro nome ou sem nome, vai arrancar com a flexigurança à portuguesa, como manda e quem manda na União Europeia.
Mas, situando-nos no terreno para onde quero conduzir este debate, é conhecida a nossa opinião sobre o que deviam ser alguns dos objectivos da Presidência portuguesa do Conselho da União Europeia.
Na verdade, nós pensávamos que este era um momento oportuno e teria o nosso consenso para o Governo tudo fazer para introduzir na agenda política europeia temas relevantes para o nosso futuro colectivo. Era o momento oportuno, por exemplo, para questionar as orientações que conformam o Pacto de Estabilidade com os seus rígidos critérios, que sufocam o desenvolvimento dos países de economias mais débeis; para questionar as prerrogativas concedidas ao Banco Central Europeu e que conduziram não apenas a um euro sobrevalorizado mas a uma sistemática subida das taxas de juro, com consequências nefastas para as famílias e para a economia; ou para questionar, e propor, reformas de fundo em relação à política agrícola comum e à política comum de pescas, que estão a levar à ruína as explorações agrícolas familiares, os pescadores e, até, armadores.
Tudo indica — e o seu discurso confirmou-o — que a Presidência portuguesa está praticamente hipotecada à concretização, a todo o custo, do já recusado Tratado Constitucional pelos votos dos povos francês e holandês e que agora, inaceitavelmente, se pretende retomar no essencial com a nova designação de tratado reformador.
Pelo que temos visto e ouvido, o importante e o decisivo para assegurar o sucesso da Presidência por-
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tuguesa é a aprovação do novo tratado, seja ele qual for, mesmo que seja um tratado à medida dos interesses do directório das grandes potências ou, mesmo, que seja um tratado no qual Portugal perde novas e substanciais fatias de soberania e capacidade de intervenção e decisão no seio das instituições comunitárias.
De facto, para essa Europa foi-se endereçando aos dirigentes de cada país — à Alemanha, à França, à Polónia, à Grã-Bretanha — o seu quinhão no recente acordo. E aqui, como diz o nosso povo em gíria popular, «europeu, europeu, mas venha cá o meu»!… E Portugal que ganha? Não ganha nada, Sr. Primeiro-Ministro! Portugal perde! E, mesmo no plano institucional que colocou esta discussão, Portugal perde um comissário permanente com direito a voto na Comissão Europeia; Portugal perde Deputados no Parlamento Europeu, passando de 24 para 22 já em 2009 e com a possibilidade de perder mais no futuro; Portugal perde na ponderação de votos no Conselho face às grandes potências da União Europeia, mesmo que as regras só entrem em vigor em 2017.
A luta dos povos travou no imediato o avanço rápido e em força em direcção a uma Europa federalista, neoliberal e militarista, mas é uma evidência que o caminho prossegue com novos passos.
Fruto dessa luta e das contradições deixou-se cair as referências de natureza constitucional ao novo tratado, mas com muita clareza expressa-o o Secretário-Geral da central do grande patronato europeu, o Sr.
Philippe de Buck, quando afirma «tudo o que as empresas europeias apontavam na lista de compras…», à Sr.ª Merkel, naturalmente, «… está hoje no 'carrinho'». Fala quem sabe!… Ou seja, o projecto neoliberal continua! São palavras que desfazem as ilusões sobre este projecto europeu ao serviço de quem está. Nós consideramos inaceitável qualquer avanço para um novo tratado sem que haja uma consulta ao povo português em referendo vinculativo.
Tem dito o Sr. Primeiro-Ministro — e reafirmou-o aqui hoje — que só depois de se conhecer o tratado se define a forma de ratificação, para não prejudicar a posição portuguesa. Grande contradição, Sr. PrimeiroMinistro! Então, V. Ex.ª e o seu Governo receberam, ou não, um mandato claro e preciso acerca do conteúdo do novo tratado? Se recebeu esse mandato claro e preciso, como já o confirmou, o que é que há de novo a negociar que impeça que confirme, desde já, que a ratificação seja feita por referendo? E desde quando, Sr. Primeiro-Ministro, uma negociação pode suspender a democracia e o necessário debate, não apenas em relação à ratificação mas também em relação ao seu próprio conteúdo? Ou será, Sr. PrimeiroMinistro, que não é tanto por isso mas pelo facto de, no Conselho Europeu, se ter concertado já, para evitar que a ratificação seja feita pelos povos, como transparece das suas próprias evasivas, das opiniões dos partidários do Sr. Presidente da Comissão Europeia ou das orientações que sopram de Belém?!… O Grupo Parlamentar do PS acaba aqui de anunciar que vai manter o seu compromisso. Quer metê-lo no «congelador»; oxalá o Governo não o meta no lixo! Veremos! De qualquer forma, quero dizer-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, que mais cedo ou mais tarde o povo português há-de exigir pronunciar-se, mesmo que o senhor não goste, nem queira.
Aplausos do PCP e de Os Verdes.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Saraiva.
O Sr. Álvaro Saraiva (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Depois do «não» da França e da Holanda ao Tratado Constitucional, as instituições europeias começaram a procurar encontrar a forma de anular aqueles «nãos».
Primeiro, mesmo sabendo que o Tratado Constitucional requeria unanimidade, começaram a desvalorizar aqueles «nãos», dizendo que os 18 países tinham dito «sim», depois perceberam que este argumento era totalmente inadmissível e começaram a falar num tratado simplificado em relação ao qual se faria de conta que era uma coisa mínima. O objectivo era claramente maquilhar o tratado, colocar-lhe uma capa diferente e encontrar uma estratégia para não dar a mínima hipótese de voltar a haver «nãos» a este tratado. Por isso, não querem nem ouvir falar de referendos.
Esta é a democracia que vivem as instituições europeias! Com efeito, não é o nome do tratado que importa, podem até chamar-lhe tratado de revisão, mas é ou não verdade, Sr. Primeiro-Ministro, que a figura do Ministro dos Negócios Estrangeiros se mantém com o nome de alto representante? É ou não verdade que se mantém alargado o âmbito de transferências dos Estados para a União Europeia? É ou não verdade que há uma diminuição da composição da Comissão? É ou não verdade que o sistema de decisão vai beneficiar largamente os grandes Estados? O Sr. Primeiro-Ministro não quer nem ouvir falar do referendo, mas importa que assuma, aqui, se mantém o que está escrito no Programa do Governo, e cito: «O Governo entende que é necessário reforçar a legitimação democrática do processo de construção europeia, pelo que defende que a aprovação e ratificação do Tratado deva ser precedida de referendo popular (…)». Vai responder que tudo depende do texto do tratado, mas não é isso que diz o Programa do Governo. Mas, então, que texto, na óptica do Sr. PrimeiroMinistro, mereceria um referendo? E que texto não mereceria esse tal referendo? Deixe isso hoje aqui claro, Sr. Primeiro-Ministro.
Ainda uma outra questão: um país que se traduz num mau exemplo europeu no que concerne ao cami-
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nho prosseguido para combater as alterações climáticas e que está bem distante de conseguir atingir as suas metas de Quioto vai estabelecer como prioridade da Presidência na União Europeia esse tema, o que Os Verdes consideram muito importante. O Sr. Primeiro-Ministro tem anunciado algumas medidas internas tendentes a esse cumprimento, claramente insuficientes para o conseguir. Pergunto: neste momento, já consegue quantificar que metas se vão conseguir atingir com as medidas anunciadas, designadamente no sector energético? Que exemplo, afinal, vai Portugal constituir ao nível europeu no que se refere ao cumprimento dos objectivos do acordo de partilha?
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Muito bem!
O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Honório Novo desistiu de fazer a sua pergunta.
Para responder ao conjunto de perguntas que lhe foram formuladas, tem a palavra o Sr. PrimeiroMinistro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, quero responder muito sinteticamente, porque disponho de pouco tempo, não só a todas as perguntas que me fizeram agora mas também às que me fizeram há pouco e que eu não respondi.
Em primeiro lugar, a atribuição da personalidade jurídica à União Europeia é, no meu ponto de vista, um passo em frente na capacidade da União Europeia para ter uma melhor política externa e uma voz mais activa no mundo.
Em segundo lugar, a ponderação de votos para Portugal é exactamente aquela que está no Tratado Constitucional, que, como se lembram, foi negociada, e apoiada pelo Partido Socialista, por anteriores governos.
Quanto à matéria que diz respeito às tradições culturais e históricas europeias, ela constará do tratado, porque o primeiro parágrafo do preâmbulo do antigo Tratado Constitucional será retomado.
Quanto à livre concorrência, esta foi muito debatida neste Conselho Europeu e eu estou de acordo com a alteração, porque entendo que a livre concorrência é um instrumento e não o objectivo da União. O objectivo da União deve ser o do crescimento e emprego e a livre concorrência é apenas um instrumento. Fico, portanto, satisfeito com o resultado do último Conselho Europeu, que colocou a concorrência no lugar a que ela tem direito e não nos objectivos da União.
Finalmente, quanto à Turquia, quero deixar muito claro o seguinte: o dever da União Europeia é o de conduzir negociações leais com a Turquia, no estrito cumprimento daquilo que devem ser os critérios de Copenhaga para a adesão à União Europeia. Se esses critérios forem cumpridos, deve entrar; se não forem cumpridos, não deve entrar. É a isto que se chama uma posição de lealdade negocial.
Sr. Deputado Francisco Louçã, ouvi-o mil vezes dizer que era preciso um debate sobre a Europa e a primeira vez que temos um debate sobre a Europa a única coisa que o Sr. Deputado é capaz de fazer é uma tirada demagógica!
O Sr. Fernando Rosas (BE): — É que não é preciso este debate mas outro! Este é mau!
O Orador: — Começa assim o Sr. Deputado: «Não interessa o programa, as reformas dos tratados, o mandato, a política externa…, nada disso. A flexigurança é a verdadeira Constituição da Europa!». Sim, senhor, que grande contributo que o Sr. Deputado deu ao debate europeu!!…Que profundidade de análise, Sr. Deputado!!…
Aplausos do PS.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Olhe o desprezo pelo desemprego!
O Orador: — Esse é um grande contributo para o debate europeu!!… O Sr. Deputado tem imensos preconceitos. Porque, sabe, a flexigurança foi aceite discutir não apenas pelas associações empresariais mas, também, pelas associações sindicais.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Por quais?!
O Orador: — Por quais? Pela Confederação Europeia de Sindicatos. Eles estão interessados em discutir… Claro está que, nesse capítulo, a CGTP está isolada — mas estão também isolados os senhores!
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Não, não!
O Orador: — Porque eles querem discutir…
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Protestos do PCP e do BE.
Srs. Deputados, oiçam!… Também vos ouvi com atenção e peço o mesmo silêncio que eu guardo quando os senhores falam.
O que nós queremos discutir são questões que têm a ver com a adaptabilidade, com a flexibilidade, que é muito importante para a competitividade e para a manutenção do emprego; o que queremos discutir são matérias como a aprendizagem ao longo da vida, as políticas activas de emprego. Isso é que, para nós, é a flexigurança! E devem ser definidos apenas objectivos, ideias-guia, ideias-beta, e não modelos «pronto-avestir» para cada país! Tal dependerá, naturalmente, da situação social de cada país.
Por outro lado, quero recordar, tanto à bancada do Bloco de Esquerda como à bancada do Partido Comunista, que no programa conjunto das três Presidências está escrito com clareza: reforçar o modelo social europeu.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Conversa!…
O Orador: — Ouviram bem, Srs. Deputados? Reforçar o modelo social europeu e assegurar a sustentabilidade das políticas sociais.
Referi várias vezes que queremos dar mais visibilidade à dimensão social da Estratégia de Lisboa.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Estranha forma essa! Despedindo…
O Orador: — Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, confundir isto com uma declaração de guerra aos trabalhadores é apenas um slogan,…
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Não é, não!
O Orador: —… e um slogan gasto! Há 30 anos que o dizem.
Sr. Deputado, tal como referi, eu sou da geração europeia. Nasci em 1957, quando se iniciou a aventura da Europa, e vim para o Parlamento um ano depois da assinatura da adesão de Portugal à Comunidade Europeia.
Eu sou da geração Europa,…
O Sr. António Filipe (PCP): — E nós somos da geração do 25 de Abril!
O Orador: — … sou um político europeu. E por ser um político europeu é que eu sempre soube que, para o Partido Comunista, Portugal perdia sempre na Europa.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Quais foram os ganhos?!
O Orador: — O Sr. Deputado diz agora: «Portugal perde na Europa». Mas isso é o que o Sr. Deputado diz desde o início! E aí, Sr. Deputado, temos irremediavelmente posições diferentes: eu acho que os interesses portugueses se defendem melhor na Europa e o Sr. Deputado sempre achou, e continua a achar, que Portugal perde. Não, Sr. Deputado! Portugal valoriza-se na Europa e seria um erro estratégico (que pagaríamos caro) se não tivéssemos construído este consenso nem tivéssemos aderido à Europa.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Só «chavões»!
O Orador: — Finalmente, há um aspecto de que não o ouvi falar. Qual é a sua posição sobre o tratado? Esqueceu-se de referir este pequeno pormenor, o de saber se estão de acordo,…
O Sr. Honório Novo (PCP): — Esta não é a bancada do PS!
O Orador: — … se não estão de acordo…
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — As perguntas são nossas!
O Orador: — Sim, Sr. Deputado. Mas nos 3 primeiros minutos também poderia ter dito «nós achamos bem este tratado, estamos concordantes» ou, então, «nós achamos mal». Mas dispensaram-se de o dizer!
Protestos do PCP.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Agora já há tratado?!
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O Orador: — Acalmem-se! Um momento!
O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Primeiro-Ministro.
O Orador: — Srs. Deputados, peço a mesma cordialidade que tenho convosco quando vos oiço. Também não gosto, mas oiço em silêncio e educadamente.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Então, há pouco não havia tratado e agora já há?!
O Orador: — O Sr. Deputado Honório Novo faz sempre estas cenas de se pôr aos gritos no Parlamento, pensando ele que isso ajuda a sua argumentação! A gritaria nunca ajuda, Sr. Deputado!
O Sr. Honório Novo (PCP): — E a aldrabice também não!
O Orador: — Eu disse apenas que nem os Srs. Deputados do PCP nem os Srs. Deputados do BE conseguiram dizer qual é a posição de cada um sobre o tratado.
Vozes do PCP e do BE: — Qual tratado?!…
O Orador: — Mas eu sei. Os senhores vão dizer: «Nós queremos uma outra Europa».
O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Primeiro-Ministro.
O Orador: — Há 30 anos que dizem o mesmo!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, esta interpelação versa justamente o assunto suscitado pelo meu camarada Jerónimo de Sousa.
Em primeiro lugar, não só não ficou decidido o método de inscrição na Conferência de Líderes como expressamente perguntei, apesar de os pedidos de esclarecimento serem formulados em formato diferente do previsto para o debate mensal, se se mantinha a ordem dos líderes partidários na intervenção.
Em segundo lugar, não foi a Mesa que contactou esta bancada para se informar sobre os oradores que iriam intervir, fui eu que liguei para a Mesa a inscrevê-los, e fi-lo com a tranquilidade de quem estava consciente de que o figurino seria o habitual.
Em terceiro lugar, durante dois anos e meio, seguimos aqui um determinado figurino de intervenção dos líderes partidários (que tem um significado político) e, de repente, sem que tal tenha ficado decidido em Conferência de Líderes — antes pelo contrário, na minha perspectiva —, hoje temos um figurino completamente diferente, que tem também, como é evidente, um significado político.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Bernardino Soares, não vamos insistir muito sobre este assunto. A Mesa retirou uma conclusão clara sobre o que foi decidido na Conferência de Líderes, que foi o que aplicámos.
A ordem dos oradores apenas foi referida em relação ao período de encerramento, o que quer dizer que, em relação ao restante debate, o que ficou decidido foi respeitar a ordem de inscrições. Nesse sentido, a Mesa dirigiu-se, através da Sr.ª Deputada Secretária, a V. Ex.ª para receber a inscrição de oradores por parte do PCP, o que foi feito.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Eu é que liguei!
O Sr. Presidente: — Na próxima ocasião, a propósito de matérias congéneres, V. Ex.ª terá de estar mais atento na Conferência de Líderes.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ó Sr. Presidente!…
O Sr. Presidente: — O Grupo Parlamentar do PCP também terá de ter presente na Mesa o seu membro, que hoje, uma vez mais, está ausente.
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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, o Secretário da Mesa indicado pelo PCP está em missão externa da Assembleia da República, no âmbito de uma delegação parlamentar.
Vozes do PCP: — Era escusado! É inacreditável!…
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos passar ao período das intervenções.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — É melhor, é!!…
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Mendes.
O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Queria abordar, nesta intervenção, aqueles que consideramos ser os desafios essenciais para a Europa nos próximos anos. Contudo, não posso deixar de, em primeiro lugar, fazer alguns apontamentos e comentários em relação à resposta que o Sr. Primeiro-Ministro me deu há instantes, no que toca à questão do referendo.
O primeiro ponto é o seguinte: o PSD saúda e apoia o acordo que foi alcançado no último Conselho Europeu. O PSD saúda e apoiará o Governo nos esforços para que Portugal desempenhe uma boa Presidência. Esta é matéria de consenso nacional e é um traço de união entre os portugueses.
Ao mesmo tempo — este é o segundo ponto —, o PSD tem convicções e coerência no que se refere à questão do referendo. Não abdicamos das nossas convicções nem da nossa coerência. E, acima de tudo, não estamos disponíveis para fazer tábua rasa dos compromissos que todos assumimos perante os portugueses.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — O único argumento invocado para dizer que não é tempo de definir uma orientação política sobre esta matéria é o de que ainda não há tratado. Pois não. Não há tratado. Mas já toda a gente sabe o conteúdo que o tratado vai ter!
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Se não se soubesse o conteúdo, não tinha havido acordo em Bruxelas; se não se soubesse o conteúdo, não tinha havido mandato claro e preciso para a Presidência da União Europeia. Esta é que é a questão.
Não vale a pena «tapar o sol com a peneira». Toda a gente, em Portugal, que se interessa por estas matérias sabe qual é o conteúdo que o tratado vai ter, conhece os termos do acordo. Mais: alguns, destacados e proeminentes figuras da política em Portugal, até já fizeram contabilidade, chamando a atenção de que 80% ou 90% do conteúdo do novo tratado vem de trás, isto é, do Tratado Constitucional. Ou seja, estão já reunidas todas as condições não para aprovar em concreto o referendo mas para assumir uma orientação política e um compromisso político. Disto não há dúvidas de espécie alguma!
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — Também não vale a pena o Sr. Primeiro-Ministro dizer que, com esta matéria, se está a introduzir uma divergência na questão europeia. Não. Não é verdade.
Em relação à substância das matérias europeias, estamos de acordo e queremos fazer, novamente, desta matéria um traço de união entre os portugueses. Mas, numa questão de política interna, numa questão de soberania nacional, numa questão que é de credibilidade política, não somos nós que estamos a introduzir divergência. Quem está a divergir deste consenso em relação ao referendo é o Governo e o partido que o apoia, porque prometeram este referendo em 2002, quando ainda não havia tratado, prometeram-no em 2005, voltaram a prometê-lo depois das eleições e, pelos vistos, agora têm dúvidas ou tencionam não honrar os compromissos assumidos perante os portugueses.
Vozes do PSD: — Exactamente!
O Orador: — Isto é que é divergir! Isto não é um exercício de credibilidade!
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Há um aspecto que quero sublinhar no final deste ponto: contem connosco para tudo o que reforce a imagem de Portugal, o consenso nacional em torno da Presidência e das questões europeias. Para nós, ao contrário de outras bancadas, elas são mesmo importantes e essenciais. Mas, atenção, atribuímos uma enorme importância à credibilidade política — honrar os compromissos, cumprir as promessas eleitorais.
Sei que, neste Governo, não se dá qualquer importância a uma questão tão simples como a de prometer aos eleitores uma coisa e, depois, cumprir. Não contem connosco para isso. Esta é uma matéria séria, é uma das razões por que estamos na vida política.
Aplausos do PSD.
Resolvida esta questão, gostaria de referir que a Europa tem de enfrentar os seus mais importantes desafios, dos quais sublinho três de dimensão estratégica: a questão da competitividade da economia europeia no contexto da globalização; a questão do modelo social europeu; e a questão das relações externas e de segurança da União Europeia. É da capacidade de responder a estas questões estratégicas que resultará o futuro da União Europeia no século XXI.
Em primeiro lugar, a questão da economia. Nos últimos anos, a economia europeia tem dado mostras de algum fôlego, sobretudo tendo em atenção os bons desempenhos de alguns Estados-membros como a Alemanha, a Espanha e os países do centro e leste europeu. Infelizmente, não é o caso de Portugal, cuja economia continua a divergir da média europeia.
Apesar destes sinais, a economia europeia não está ainda plenamente preparada para garantir a sua competitividade à escala global. A Europa carece de levar até ao fim o mercado único, nomeadamente na área da energia e dos serviços financeiros. Com o mercado interno de 1992, a União Europeia atingiu a escala de que precisava; agora, é tempo de introduzir flexibilidade, de modo a agilizar a economia europeia face às economias concorrentes.
Este aspecto é especialmente importante para as pequenas e médias empresas. Elas precisam de flexibilidade, de menos encargos administrativos e de menos barreiras burocráticas. As pequenas e médias empresas dispensam bem excessos regulatórios que as inferiorizam no confronto competitivo. As pequenas e médias empresas têm sido, em Portugal e na Europa, o parente pobre do processo de integração europeia e nós não podemos continuar nesta linha de orientação.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!
O Orador: — A União Europeia precisa, também, de uma renovada Estratégia de Lisboa. Não nos iludamos. Até ao momento, os resultados são decepcionantes: houve demasiada retórica, pouca acção e escassos resultados. Ou conseguimos estar na vanguarda do conhecimento e da inovação ou perderemos o desafio da competição global, e a factura a pagar é o empobrecimento.
Também não podemos descurar a obrigação de garantir que o nosso desenvolvimento se processe de forma ambientalmente sustentada. É muito positivo que a União Europeia esteja a assumir um papel liderante no que diz respeito à agenda global do ambiente. As propostas que a Comissão Europeia tem sobre a mesa são muito válidas, muito pertinentes e muito oportunas.
Todavia, há dois aspectos fundamentais que têm de ser garantidos: por um lado, assegurar a coerência e a solidariedade na implementação das medidas por parte dos 27 Estados-membros; por outro lado, mobilizar os grandes parceiros, como os EUA e os denominados países BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China), para a mesma orientação essencial. Se isto não suceder — e é importante que seja dado um impulso já nos próximos seis meses —, a União Europeia pagará uma pesada factura ambiental e ocorrerão graves distorções concorrenciais.
O segundo grande desafio prende-se com o sistema social europeu. Também aqui a Europa não pode fugir à sua responsabilidade. É preciso ter coragem para debater e para agir. Este sistema social que tanto distinguiu a Europa durante anos face ao mundo está em crise, desde logo por força do envelhecimento da população e das baixas taxas de natalidade. É uma crise que tem de ser enfrentada, e o crescimento da economia é absolutamente essencial.
Torna-se necessário definir um equilíbrio entre flexibilidade de mercados e protecção social, ajustando-o à realidade competitiva dos dias de hoje. Não queremos nem uma protecção social economicamente destruidora nem progresso económico à custa da degradação social.
Aplausos do PSD.
A verdade é esta: a Europa, que tantas e tantas vezes esteve na fronteira do conhecimento, do desenvolvimento do respeito pelos direitos do homem, esta Europa a que pertencemos, deve encontrar dentro de si mesma as soluções que permitam aos europeus estarem, simultaneamente, na vanguarda do progresso e do bem-estar social. Numa palavra, também aqui precisamos de uma Europa rica, tal como os europeus merecem uma Europa justa e solidária. A competitividade não se pode fazer à custa da solidariedade.
O terceiro desafio estratégico tem a ver com a política externa e de segurança da União Europeia. Seja-
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mos também aqui claros e directos: o impacto internacional da Europa está muito aquém daquilo que seria esperado. De uma Europa com história, com desenvolvimento cultural e social, com peso económico, com recursos disponíveis, com grande experiência na paz e na estabilidade; desta Europa esperar-se-ia muito mais.
No fundo, a Europa ainda continua à procura do seu papel de entidade política no mundo. Todavia, a afirmação da União Europeia no mundo enquanto entidade económica e política, portadora de valores fundamentais e universais é não só desejável como absolutamente necessária para poder ser um factor de equilíbrio e de estabilidade nas relações internacionais.
A Europa deve dotar-se de uma política externa comum que seja firme, consistente e coerente.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — Sem uma política externa capaz e uma política de defesa adequada, a Europa será sempre um «anão político» e, com o tempo, uma irrelevância económica.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — Claro que esta tarefa não é fácil, mas é essencial ir ultrapassando as peculiaridades de cada Estado e fazer com que a Europa fale a uma só voz.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — Só dessa forma podemos enfrentar os riscos próximos que corremos.
Será preciso lembrar o que se passa no Kosovo, em pleno seio da Europa? E a Palestina? E o Líbano? E a proliferação nuclear? E o terrorismo? Srs. Deputados, é uma ilusão pensar que estes são problemas dos outros. Não! São problemas nossos, estão próximos de nós e requerem intervenção dos europeus.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — No capítulo da defesa, temos de reforçar os laços euro-atlânticos, mas não podemos continuar indefinidamente apenas a contar com os Estados Unidos da América para a nossa protecção. Temos de reforçar os nossos próprios meios de segurança e de defesa. É certo que têm sido dados passos positivos nesse sentido, mas não parecem ainda serem suficientes. Uma Europa mais unida e mais forte será um importantíssimo factor de paz e de estabilidade no mundo.
Só respondendo a estes desafios, que considero estratégicos, a Europa poderá ter uma agenda política a sério. Uma agenda política que não se preocupe tanto com as questões da sua organização e do seu funcionamento mas que vá ao encontro das reais aspirações e preocupações dos europeus, ou seja, a competitividade, o crescimento e o emprego. Só que responder a estes desafios requer também duas questões políticas, prévias e essenciais: debate político e vontade política.
O debate político nesta matéria é essencial. Só ele pode esclarecer os europeus. Só cidadãos esclarecidos podem verdadeiramente estar mobilizados para as dificuldades que enfrentam. É importante, por exemplo, este debate que aqui hoje está a ser feito sobre a Presidência portuguesa da União Europeia, mas o Parlamento podia ter dado um bom exemplo se, na semana passada, tivesse feito, antes do Conselho Europeu, que era capital, um debate sobre a orientação que Portugal levava para esse Conselho Europeu.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — Pedimos esse debate mas, infelizmente, ele não foi realizado.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Exactamente!
O Orador: — Não é assim, sem debate político, que se concentram as atenções dos portugueses e dos europeus no projecto de construção da Europa.
Srs. Deputados, acabou o tempo de um projecto europeu baseado apenas na vontade dos Estados e dos Governos que os representam. Este é um sinal dos novos tempos que estamos a viver. Acabou o tempo de decidir sem a participação e a responsabilização dos cidadãos. Ou temos uma Europa dos cidadãos em que eles verdadeiramente participem ou a Europa, a prazo, perde a sua identidade.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Finalmente, a vontade política é o motor indispensável da acção. Sem vontade política, nada se faz e nada se consegue e, sobretudo, a vontade dos dirigentes europeus. Cabe-lhes, acima de
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tudo, pensar nas próximas gerações, sem egoísmos que não fazem sentido, sem novos proteccionismos que não têm qualquer razão de ser.
O que os europeus desejam é claro: uma Europa alargada e aprofundada, um espaço de paz e de prosperidade, uma Europa que seja referência de coesão e de solidariedade, uma Europa virada ao mundo e não virada para dentro de si, uma Europa aberta ao mundo e não uma Europa fortaleza, uma Europa na vanguarda do conhecimento e do desenvolvimento à escala mundial.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — E Portugal tem aqui um desafio fundamental.
A Europa é mesmo o nosso espaço vital. Somos europeus pela geografia, mas também pela convicção.
Acreditamos nas virtualidades deste grande projecto. Queremos estar sempre na linha da frente e no centro da decisão política, no núcleo duro onde se tomam as decisões dentro da Europa, nunca na margem ou na periferia.
Daí também a importância da Presidência portuguesa da União Europeia. É na Europa e é com a Europa que podemos construir um Portugal maior.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: O CDS faz parte do arco europeu e tem sobre a evolução da União Europeia uma posição realista, ajustada às necessidades e às possibilidades de Portugal.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — Por sermos europeístas, não poderia deixar de nos inquietar o impasse que, no plano institucional, a Europa viveu. Esse impasse prejudicava — e ainda prejudica — a Europa enquanto ideia e as suas economias como realidade. Naturalmente, quem mais tinha a perder com o impasse é quem mais atrasado está (não por acaso, Portugal é um dos países com atraso). O impasse não era bom para ninguém; era especialmente prejudicial para os Estados que, como Portugal, precisam de progredir mais e depressa.
Por sermos realistas, temos também ideias claras sobre as vantagens e sobre os limites do processo europeu. A história da Europa, não raro trágica, é uma história de nações. Esse facto não é descontável por utopias que o ignorem. Por sua vez, a economia internacional é o que é: uma economia global e competitiva. Este dado aconselha a que Portugal não escolha o isolamento nem repita a autarcia: os nossos interesses defendem-se melhor numa organização forte e partilhada.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Acresce outro dado que a alguns pertinentemente incomoda mas a nós não: os novos países da Europa a 27 livraram-se do século totalitário com o auxílio das potências do mundo livre. Não sendo apagável essa memória, é natural o paradoxo desta nova Europa: geograficamente, é mais continental do que nunca; estrategicamente, é mais atlântica do que outrora.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Como ainda não se conhece outro sistema de defesa das nossas liberdades que não seja a coligação euro-atlântica, os valores e também o pragmatismo aconselham a que a Europa perceba duas coisas: não ganhamos nada em negligenciar a aliança com os Estados Unidos da América, que são um Estado e não uma Presidência; temos muito a perder se não encontrarmos uma relação estável com a Rússia, assente na negociação e não no conflito.
Sendo estas as condicionantes, o nosso ponto de partida era este: a Europa não podia prolongar a sua «anemia» institucional; o Tratado Constitucional ficou «ferido na asa» por dois referendos e não era ressuscitável; o modelo de convivência a 27 teria de ser menos ambicioso e mais praticável, aconselhando-se uma moderação que produzisse resultados e não novas utopias que fermentassem velhas clivagens.
O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — Acreditamos que foi esta visão pragmática que prevaleceu no Conselho Europeu, conseguindo-se, o que vai a benefício da jurisprudência das cautelas, que ninguém ficasse de fora. Negociar um
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tratado a 26 seria ingrato para a Presidência portuguesa. É certo que, durante a barganha das negociações, houve argumentos chocantes e ameaças infelizes. Mas todos acabaram por compreender que a União tem um pacto não escrito: a obrigação do compromisso, mesmo que seja o compromisso de chegar a um compromisso.
Aplausos do CDS-PP.
Em certo sentido, o sucedido em Bruxelas recorda a prudente observação de Winston Churchill quando obteve, com génio e com coragem, uma das suas primeiras vitórias intercalares: «isto não é o princípio do fim; é apenas o fim do princípio».
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Sr. Primeiro Ministro, fiéis a estas ideias — moderação e realismo — tiramos algumas conclusões sobre as condições de exercício da Presidência portuguesa.
Primeiro: é bom que a Europa encontre uma solução e ultrapasse o impasse.
Segundo: é útil que a fortuna dos calendários, sem desvalorizar o nosso trabalho, tenha colocado na Presidência portuguesa uma conferência intergovernamental com possibilidades de sucesso.
Terceiro: o que temos é um mandato, ainda não é um tratado. Desejamos que esse mandato se converta em tratado, o que implica vontade, paciência e competência. Se puder haver um tratado razoável a que Portugal fique ligado, isso prestigia Portugal Quarto: por uma qualquer misteriosa razão, associa-se uma Presidência a um desfalecimento das oposições. Era o que mais faltava! Só para referir factos desta semana, não conte com o nosso silêncio quando esta «governação por relatórios» anuncia mais taxas moderadoras mais altas, a ver se quem é pobre aceita e se o País se distrai; ou menos benefícios fiscais sem a contrapartida de um IRS mais simples e com taxas baixas,…
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — … a ver se o contribuinte não dá conta e a opinião pública amolece; ou revisões laborais que outrora tanto criticaram quando se tratava de flexibilizar e que agora parecem querer converter em ataques ao salário.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — Sr. Primeiro-Ministro: aqui não se suspende a oposição; por maioria da razão, também não se suspende o sentido de Estado.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — Conte com a nossa oposição em tudo o que prejudica os portugueses; não faltará o nosso patriotismo em tudo o que prestigie Portugal.
Aplausos do CDS-PP.
Sr. Presidente, sobre o mandato e as suas circunstâncias, também quero aqui alinhavar considerações que constituem a nossa grelha de análise quanto ao seu desenvolvimento.
Primeiro: não ficámos tristes com o abandono da utopia constitucional. Apesar de sermos muito críticos com a Constituição da República Portuguesa, ainda somos dos que acham que a Constituição é uma prerrogativa nacional. Vezes sem conta alertámos para a jactância de chamar Constituição ao que não era, e o tempo deu-nos razão.
Segundo: cantamos o hino e vemos a bandeira das estrelas com naturalidade. Mas nunca achámos que substituíssem a bandeira e o hino de Portugal. Por isso, não nos atormenta — pelo contrário, tranquilizanos — o abandono da pretensão, formal é certo, do Estado europeu; Portugal é uma nação antiga e bem sabemos que a política dos símbolos não é meramente simbólica.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Terceiro: parece-nos um exercício de mero bom senso deixar de lado, ou em anexo, a querela da prevalência dos direitos. Salvo melhor opinião, é um pouco tarde para colocar essa questão.
Todos sabemos as implicações de ser país membro e como se recebe o acervo da União na ordem interna.
Quarto: não nos desilude a ausência da Carta dos Direitos Fundamentais no documento facial; já nos
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inquietaria a sua irrelevância. E de todo o modo, persiste uma dúvida: estando a separação dos Estados e das Igrejas, em grande medida, adquirida, estabelecida e regulada, em nome de que honestidade intelectual — de resto, uma honestidade intelectual laica — se teme uma referência preambular às raízes da Europa, que são, obviamente, judaico-cristãs?
Vozes do CDS-PP:— Muito bem!
O Orador: — Quinto: também nos parece ajuizado que as palavras correspondam aos factos — é preferível o Alto Representante ao alegado Ministro dos Negócios Estrangeiros. No carácter jurídico e institucionalmente novo da União, não há um governo que substitua os governos nacionais e, por isso, é preferível não haver um ministro, não vá alguém achar que esse ministro substitui os ministros dos negócios estrangeiros de cada país. Alguma indefinição nesta matéria — e a necessidade de compatibilizar o maior desempenho externo da União — é um exemplo do reforçado interesse da conferência intergovernamental que vai começar.
Sexto: apoiamos com firmeza o reforço da União Europeia em matérias como o combate ao terrorismo e à imigração ilegal. Na primeira questão, porque não há condescendência possível com a utilização da violência e a fanatização da religião. Na segunda matéria, porque a Europa deve fazer o possível para travar decisões, como a que foi tomada pelo Presidente Zapatero, de regularização unilateral, que provocam «efeitos de chamada», fomentam o tráfico de pessoas e têm iniludíveis consequências nos países membros do mesmo espaço.
Aplausos do CDS-PP.
Sétimo: apoiamos uma visão da Europa que privilegie a competitividade, incentive a ciência e a tecnologia, defenda a concorrência, apoie as empresas, proteja a propriedade, assuma o desafio das alterações climáticas e tenha solidariedade energética. Se a Europa não for tudo isto, pouco sentido terá ou fará.
Oitavo: não nos ocorre nenhuma boa razão para que uma certa inércia burocrática continue a encaminhar a União Europeia para factos consumados que têm riscos e gestão de expectativas erradas que têm consequências. Será a Europa a sofrer as consequências de qualquer nova fractura nos Balcãs. A Europa devia meditar nas consequências que pode ter uma precipitação no Kosovo. Está por provar que a comunidade internacional deva especializar-se na criação de Estados inviáveis; está por provar que seja do interesse europeu novos ressentimentos com a Sérvia e com a Rússia; está, aliás, por provar a vantagem de institucionalizar no coração dos Balcãs um novo outro Estado islâmico.
Igualmente séria e profunda é a questão da Turquia. Como disse há pouco, é um país amigo num mundo perigoso, é um Estado aliado numa região instável. Tanto basta para que a Europa dê à Turquia um estatuto especialíssimo. Mas entendamo-nos: a Europa não deve prometer à Turquia aquilo que não lhe pode dar.
O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Orador: — É preferível dizer claramente a prosseguir equivocadamente.
É, ainda, importante o reforço da preocupação estratégica com o Mediterrâneo e o incentivo a uma estratégia do mar, tal como a possibilidade de um sistema de alerta dos parlamentos nacionais relativamente às políticas comunitárias.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, tentarei terminar rapidamente.
O nosso guião é este. Não quero deixar de terminar sem duas referências curtas.
Em primeiro lugar, não escapa a nenhum observador atento que foram dois líderes de centro-direita, ambos do Partido Popular Europeu, que estiveram na base deste passo em frente. Refiro-me à Chanceler Merkel e ao Presidente Sarkozy. Não ficaria bem deixar de fazer esta menção sem deslustrar, aliás, todos os demais, incluindo o Primeiro-Ministro inglês, que hoje cessa funções.
Em segundo lugar, quanto à questão da ratificação, há-de haver referendo se o conteúdo do futuro tratado implicar significativas transferências de soberania. Como não é matéria de dogma, o referendo já não será tão necessário se essas transferências não se revelarem significativas.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — O passado ilustra o futuro: Maastricht devia ter sido sujeito a referendo: criou a moeda.
Nice nem tanto. A Constituição, até pelo seu nome, justificava-o; veremos o que nos reserva este tratado de funcionamento. Como não sou dotado de presciência, mais não me ocorre neste momento dizer.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Por fim, e com isto termino, Sr. Presidente, a especificidade de Portugal. Apoiamos sem
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reservas o protagonismo da Presidência de Portugal nas Cimeiras União Europeia-Brasil e União EuropeiaÁfrica. Ambas constituem um activo de Portugal enquanto história e enquanto memória. Ambas podem constituir oportunidades de futuro. É evidente o nosso interesse em ambas. Saibamos ser, na Europa, o que conseguirmos ser para além dela.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Nas vésperas de se iniciar a Presidência portuguesa, o Primeiro-Ministro quis vir ao Parlamento apresentar o seu Programa. O essencial do Programa é, aliás, bem conhecido e ficou claro no debate até agora: é o mandato para concluir o novo tratado reformador da União e é a promoção publicitária de um novo conceito constituinte, a flexigurança.
Com estas duas orientações, a União precipita-se para mudanças fundamentais. Qualquer delas põe em xeque a confiança das cidadãs e dos cidadãos europeus.
Dirão os eurocratas que assim a Europa se está a mexer, e é verdade! De facto, durante dois anos, os governos queixaram-se dos europeus. Afinal de contas, os cidadãos informados de um dos grandes países fundadores tinham rejeitado o Tratado Constitucional em referendo, não compreendendo, não podiam compreender, não queriam compreender que só a vitória do «sim» seria permitida pela aliança dos grandes governos.
A partir de então, instalou-se, portanto, o impasse. Com um humor soturno, que não quero deixar de sublinhar, o Vice-Presidente do Parlamento Europeu explicou por que não se fez nada durante dois anos.
Diz ele, e cito: «chamamos período de reflexão àqueles momentos em que ninguém sabe exactamente o que fazer». Assim foi: durante os últimos dois anos, as lideranças dos governos europeus não souberam o que fazer e por isso fizeram que reflectiam. Mas, durante este período, fazendo que reflectiam, a vida seguiu o seu curso.
Durante dois anos, a Europa perdeu voz nas questões internacionais, continuou a desagregar os seus serviços sociais e, assim, enfraqueceu a democracia. Ora, era isto precisamente que queriam os principais estrategas dos governos europeus.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!
O Orador: — Diz-se, muitas vezes, que a Europa não tem liderança, ou que as suas lideranças não têm projecto nem projecção. Mas nada pode ocultar a responsabilidade directa dessas lideranças em escolhas coerentes e em decisões escolhidas: a Europa não tem voz nas questões internacionais porque é assim que os seus dirigentes vêem o seu lugar no mundo.
A União, até hoje, não teve uma única palavra oficial sobre os voos clandestinos da CIA e sobre as prisões secretas em território da União Europeia.
Vozes do BE: — Muito bem!
O Orador: — A questão mais essencial do direito à justiça — não se pode pensar noutra mais importante — foi assim trocada pelo fingimento diplomático.
A Europa deixou de ter uma palavra sobre a guerra e a paz. Aliás, perversamente, do quarteto da Cimeira das Lajes, o último sobrevivente será Durão Barroso — Aznar foi corrido, Blair já se foi embora e Bush terminará o mandato em vergonha. Barroso, pelo contrário, ambiciona mais um mandato. A guerra, essa, prossegue com o seu cortejo de barbárie, mergulhando o Iraque na guerra civil, reforçando o papel regional do Irão e promovendo o fanatismo wahaabita da Arábia Saudita. Muitos dos criminosos de guerra, os que tiveram o poder de mandar fazer a guerra suja em nome da mentira, nunca serão julgados, e até talvez sejam condecorados.
Por isso lhe lembro, Sr. Primeiro-Ministro, que um bom tratado reformador deveria começar por estabelecer o contributo da Europa para a paz, retirando as tropas coloniais do Iraque e do Afeganistão.
Portugal tem soldados cuja missão é arriscar as suas vidas pela defesa do governo dos principais narcotraficantes do Afeganistão, e nós queremos que esses soldados voltem para casa.
Aplausos do BE.
Sr. Presidente, durante estes dois anos, a Europa perdeu também em coesão e tornou-se mais desigual.
Este foi o resultado da trituração do princípio da solidariedade social, em particular com a justificação, tantas vezes repetidas nesta Câmara, do Pacto de Estabilidade. Os sistemas públicos de segurança social, de saúde e de educação foram restringidos, espartilhados, corrompidos. O resultado é «menos Europa».
A flexigurança e a liberdade de despedir é «menos Europa», o fim das contratações colectivas e o fim do
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princípio da responsabilidade colectiva é «menos Europa».
Sr. Presidente, esses princípios de uma Europa sem direitos estão todos no guião do tratado reformador.
Aliás, estamos aqui a viver um fingimento, no qual a bancada do Bloco de Esquerda não quer colaborar.
Finge-se que o tratado vai ser escrito desbravando ideias novas, quando já está praticamente concluído em todas as suas linhas fundamentais e a Conferência Intergovernamental limitar-se-á ao trabalho de procurar precisões jurídicas.
Os mais cínicos — porque os há! — dirão mesmo que o tratado reformador não mexe em quase nada: António Vitorino escrevia ontem que se salvou 80% do Tratado Constitucional. Quase tudo, menos o símbolo, menos o nome, que acabam continuando. Afinal, saiu a bandeira, mas ela vai decorar todas as cerimónias e edifícios; continua a ouvir-se o hino, mas já não é hino; o Ministro dos Negócios Estrangeiros passou a Alto Representante e não se fala de Constituição, desde que as regras ademocráticas que impedem a repartição dos poderes estejam blindadas da opinião pública.
Vozes do BE: — Muito bem!
O Orador: — Fica o Presidente e fica a personalidade jurídica da União, mesmo que tratados futuros possam reduzir as suas competências. Fica o Banco Central, definindo uma política monetária que exclui a Europa da decisão; fica a regra de votação do directório agora postergada para 2017.
O que são, então, os 20% que faltam? Falta a Carta dos Direitos Sociais, que fica fora do tratado. Já ouço a indignação: «Não, a Carta está lá!». Pois não é que ela emerge, triunfante, através de uma referência na pág. 25 e ainda na 17.ª, 18.ª, 19.ª e até — que generosidade! — na 20.ª nota de rodapé do Anexo 1 do mandato da próxima CIG, garantindo o seu valor legal?! Infelizmente, o rendilhado jurídico desta inserção da Carta é uma demonstração do recuo da ideia de Europa. A Carta, em si, já recusava europeizar os direitos consagrados nas Constituições de cada país e, por isso, substituía direitos importantes por votos piedosos e rasgadamente marcados pela ideologia liberal.
Abdicava, por exemplo, do «direito ao trabalho», que responsabiliza cada um e todos, trocando-o por um generosíssimo «direito a procurar trabalho», o direito de constituir um mercado liberal sem responsabilidade social. Assim era a Carta, mas a Carta estava na Constituição.
Agora, a Carta está fora do tratado. Não podia haver compromisso mais comprometido, Sr.as e Srs. Deputados: a Carta não pode estar no tratado. Pior ainda — e essa é a mudança mais importante no texto legal a que o Sr. Primeiro-Ministro não se quis referir: o âmbito de aplicação da Carta passa a ser delimitado pelos poderes próprios da União e pelo que esteja definido no restante dos tratados. Ou seja, a interpretação das normas depende sempre e só da jurisprudência do Tribunal, deixa de ter aplicação directa, predominando uma visão restritiva que anula todo o valor declarativo dos direitos gerais.
O Reino Unido, em consequência, exclui-se da Carta – e da jurisprudência do Tribunal – e só aceita preceitos que estejam explicitados na sua lei nacional.
Ora vejamos, então, como se resume este imbróglio: o Reino Unido sai da Carta, mas a própria Europa desgradua a Carta por uma declaração inconsequente e inaplicável, que só é vinculativa porque é declarativa e só declara o que não vincula.
Assim se pode medir, Sr.as e Srs. Deputados, o que são os 80% e o que vale o resto: fica no tratado, minuciosamente delimitado pela lista de emendas e adendas do Conselho de Bruxelas, tudo o que estabelece a instituição, o poder, o banco, o mercado. Nada do que define direitos sociais, igualdade, democracia e participação.
Vozes do BE: — Muito bem!
O Orador: — É por isso que os governos querem, numa corrida contra o tempo, terminar o tratado reformador num par de meses à nossa frente, ratificá-lo no ano seguinte, sempre antes das eleições de 2009.
A conspiração da ratificação instantânea alimenta-se, assim, de um dogma: recusar a todo o custo o referendo. Discutir o tratado, em caso algum. Consultar os europeus, nunca. Deixá-los decidir, nem pensar.
Referendo, jamais!
Vozes do PCP: — «Jamais!»
O Orador: — Basta ouvir os conspiradores anti-referendários. Diz Sérgio Sousa Pinto, do PS: «O referendo só é legítimo para questões menores». Acrescenta Matos Correia, do PSD: «Passamos bem sem os referendos». «Logo se vê», diz o CDS, na esperança de que não se veja nada. O Presidente Cavaco Silva, seguindo Durão Barroso, vai no mesmo sentido e o Primeiro-Ministro repete e repetirá que só depois de escrito o tratado, então, é que vai verificar se é coerente com a sua promessa anterior de, pela primeira vez, levar os portugueses à decisão europeia.
Está assim a nascer uma nova doutrina, Sr.as e Srs. Deputados, que não é sofisticada e, aliás, resume-
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se em poucas palavras.
O novo tratado é muito importante. Deve ser ratificado por Portugal? Deve! Mas deve ser referendado? Não deve! Porquê? Porque é pouco importante.
O novo tratado vai ser concluído pela Presidência portuguesa. Grande orgulho! Devemos apoiá-lo todo? Devemos! Porquê? Porque é muito importante! Mas devemos aprová-lo todos? Nem pensar, não devemos.
Porquê? Porque é pouco importante.
Esta é a nova doutrina sobre o tratado.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Muito bem!
O Orador: — É uma doutrina provinciana, senão mesmo pacóvia: o povo português não deverá votar porque Sarkozy ou Gordon Brown poderiam levar a mal.
Mais simples seria, Sr. Primeiro-Ministro, dizer à Europa que respeitamos as regras de cada país mas que, em Portugal, temos um compromisso de decidir em referendo os objectivos da União. Nós somos europeus que não desprezamos a Europa e, por isso, temos de viver em democracia.
Assim, concluo, Sr. Primeiro-Ministro, respondendo à pergunta que nos fez, indicando o que é para o Bloco de Esquerda um tratado aceitável para referendar e que votaríamos.
É, em primeiro lugar, um tratado estabelece o objectivo da União para uma política internacional activa de paz, na prevenção de conflitos, na sustentabilidade ambiental planetária e direitos sociais universais.
Esse tratado teria a nossa aprovação.
Em segundo lugar, um tratado que estabelece o funcionamento da União, com a convergência das políticas sociais orientadas para o que é preciso: serviços comuns, transportes, telecomunicações e investigação científica. Esse tratado teria a nossa aprovação.
Em terceiro lugar, um tratado que condicione a política do Banco Central Europeu à criação de emprego.
Esse tratado terá a nossa aprovação.
Em quarto lugar, um tratado que rejeita o directório e assenta na cooperação entre iguais para aquilo que é comum e prioritário na Europa. Esse tratado tem a nossa aprovação.
Mas o tratado da flexigurança e do desemprego, do directório e do autoritarismo, esse tratado que se recusa ao voto da democracia tem a nossa oposição total.
Não podemos, Sr. Primeiro-Ministro, perder mais seis meses. Precisamos de mais Europa, mais solidária e mais democrática. Para isso, aqui, temos que traçar uma linha: um tratado que diminua a Europa não pode passar.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, em vésperas do início da 3.ª Presidência da União Europeia, anuncia-se um filme conhecido: o Governo português feito notário, por vezes simples mordomo, das grandes potências europeias. Foi assim em 1992, com a primeira grande reforma da política agrícola comum (PAC), que iniciou o seu desmantelamento; foi assim em 2000, com a agenda neoliberal da Estratégia de Lisboa e a consolidação do Euro; e é assim, no presente, com o encargo de redacção de um tratado reformador para a União Europeia.
O tratado de revisão, agora encomendado à Presidência portuguesa, mantém o núcleo duro — uns falam em 80%, outros em 90% — do, pelos vistos, «mal morto» tratado dito constitucional ou Constituição europeia, o que significa avanços relativamente à situação actual no federalismo e militarismo e a conservação da sua imagem de marca neoliberal.
Houve quem comentasse as alterações conhecidas e projectadas para o tratado reformador afirmando que do Tratado Constitucional se manteve «o essencial para permitir o funcionamento mais eficiente e mais democrático da União Europeia alargada». Porém, esqueceu-se de referir que era a eficiência que procuravam as grandes potências europeias.
Era sabido, perante o processo de alargamento e depois de criarem a ideia da inelutável alteração do figurino institucional da União Europeia em vigor, que os grandes países europeus (bem acolitados pelas organizações do grande patronato, através da mesa-redonda ERT/BusinessEurope – veja-se a recente visita do patrão dos patrões Ernest-Antoine Seillière a José Sócrates) iriam procurar impor uma redistribuição dos poderes nos órgãos da União que lhes assegurasse, no âmbito de uma União a 27, a continuação do comando das políticas da União Europeia.
O ensaio do novo tratado dito reformador, desenhado no projecto do mandato da CIG, na base da dita Constituição, abdica formalmente de uma conceptualização constitucional, mas consagra e consolida a natureza federal presente no percurso da União desde o Tratado de Roma e constitucionaliza, de facto, o directório das grandes potências, através da prevalência na lógica decisória do peso da população sobre a igualdade de Estados soberanos.
Mas então não há recuos ou melhorias nas formulações e conteúdos face à dita Constituição europeia?
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É seguramente um exagero denominar assim as alterações propostas. «Mais as vozes do que as nozes»! Houve o abandono formal dos conceitos de «Constituição» e «constitucional». Reformulou-se o artigo imperativo da norma que estabelecia o primado do direito comunitário sobre o nacional — a norma que levou PSD e PS, na Revisão Constitucional de 2004, «mais papistas que o papa», a um intempestivo aditamento de novo número ao artigo 8.º da Constituição da República para acolher o que era ainda um mero projecto! O Ministro dos Negócios Estrangeiros foi baptizado de «Alto Representante da União», e houve mais algumas, poucas, mudanças.
Fruto da luta dos povos e também das contradições internas, os estados-maiores políticos da União Europeia viram-se obrigados a maquilhar/recauchutar o dito Tratado Constitucional, expressa e explicitamente para fugirem a uma ratificação por referendo. No fundo, concretizando o que dizia Romano Prodi, na sua recente visita a Portugal: «Pode haver um problema de designação formal, mas não de substância (…), podemos chamar-lhe constituição ou tratado. Isso não importa», pelo que apelou, em coerência, ao «trabalho criativo» do Governo PS. Se não foi o Governo português que o fez, alguém o «criou» por ele! Ou, no fundo, respondendo também à pergunta n.º 3 da Chanceler alemã, Presidente em exercício da UE: «utilização de terminologia diferente, sem todavia modificar a substância jurídica» da dita Constituição.
Não deixa de ser extraordinário que quem passa a vida a dar lições de democracia a outros povos e países assuma assim, com arrogância e desfaçatez, um descarado desrespeito pela vontade democraticamente expressa pelos povos francês e holandês. Como escrevia um conhecido comentador, «os referendos são perigosos»! E, assim, ultrapassada a fase da repetição de referendos (Dinamarca e Tratado Maastricht, Irlanda e Tratado de Nice) e até acertar a vontade do povo eleitor com a vontade dos órgãos comunitários, ensaia-se uma nova saída. Por exemplo, um mini-tratado, como foi imediatamente sugerido após os «não» da França e da Holanda, e agora se projecta «susceptível de ser ratificado unicamente pelos parlamentos nacionais, sem recurso a referendos». E, assim, se aperfeiçoa, segundo alguns, o funcionamento democrático da União Europeia! Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Presidência portuguesa da União Europeia seria uma ocasião óptima para uma reflexão séria dos órgãos comunitários sobre a brutal contradição entre alguns dos seus objectivos, há muito afixados em diversos e sucessivos tratados, e as consequências das suas principais orientações e políticas.
Poder-se-ia partir de outros exemplos, mas, sendo a Presidência do Governo português durante os próximos seis meses, seria extremamente interessante e importante para o País e para a Europa confrontar as causas dos nossos graves problemas económicos e sociais – a excepção são os sucessos da especulação bolsista e os obscenos lucros e taxas de lucro dos grupos económicos e financeiros – e essas orientações e políticas comunitárias.
Sendo que há culpas, bem conhecidas, das políticas internas de direita de sucessivos governos do PS e do PSD/CDS-PP, das quais se destaca o apoio e cumplicidade com aquelas mesmas políticas e orientações, como se explica que, apesar do objectivo da coesão económica e social que a União Europeia diz perseguir e promover, Portugal se mantenha persistentemente, há cinco anos, em rota de divergência de crescimento económico e tudo indicia que assim vai permanecer nos próximos anos?! E, naturalmente, interrogamo-nos se tal situação nada tem a ver com o Pacto de Estabilidade, com as políticas do Banco Central Europeu, com a PAC e a política comum de pescas, com as orientações do mais estrito neoliberalismo, de liberalização de mercados públicos e privatizações de empresas e de serviços públicos (Bolkestein), com as políticas comerciais na Organização Mundial de Comércio e nas associações bilaterais, com o desmantelamento em curso do «modelo social europeu», de que faz parte o golpe de morte da flexissegurança, de que o Sr. Primeiro-Ministro não quer ouvir falar.
Mas que modelo social europeu será este de fala o Sr. Primeiro-Ministro em que a liberdade de despedimento será lei e o direito ao trabalho estável e de qualidade será postergado, um objectivo que vai sendo classificado de absurdo ou utópico, fora da modernidade neoliberal que nos querem impor?! Esta reflexão deveria estar no centro do Programa da Presidência portuguesa. Um programa, certamente, não fechado sobre Portugal mas, sim, um programa que, a partir do concreto nacional, suportasse o necessário empenhamento do Estado português na mudança de rumo da União Europeia, por uma Europa de cooperação entre Estados soberanos e iguais em direitos, de progresso social e de paz, o que nunca acontecerá com um tratado como o que agora se anuncia.
Um sublinhado final: o PCP considera completamente inaceitável que se avance para a ratificação de um tratado como o referido sem que haja referendos juridicamente vinculativos, inclusive em Portugal. E não apenas para o cumprimento do Programa Eleitoral do PS, que nenhuma maquilhagem do tratado poderá evitar, mas pela necessidade absoluta de que o povo português se pronuncie clara e explicitamente sobre um processo em que se joga o seu futuro colectivo, como País soberano e independente.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Saraiva.
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O Sr. Álvaro Saraiva (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: As bases do tratado de revisão continuam a assumir, no essencial, o que já estava no Tratado Constitucional.
Esta proposta reforça o poder dos grandes países a partir de 2014, retirando capacidade de influência a países como Portugal ao nível dos processos de decisão. Este tratado mantêm na sua essência a lógica de um modelo económico neoliberal, tendo como base o Pacto de Estabilidade, ao mesmo tempo que ataca os direitos sociais, a segurança social e os serviços públicos.
O que é substancial mantêm-se na íntegra, como seja o reforço de competências da União Europeia em detrimento das competências nacionais. Podemos concluir que apenas se rebaptizou como revisão do tratado para manter toda a mesma lógica.
Convém relembrar que o Tratado Constitucional foi chumbado com o «não» da França e da Holanda. As instituições da União Europeia nunca se conformaram com este resultado.
Confrontados com esta situação, a lógica da discussão passou a ser: como fazer e qual o truque para que os que disseram «não» digam «sim»? Argumentaram que, como 18 países tinha dito «sim», o tratado deveria avançar.
Mas, durante o avança e não avança, perceberam que isso era insustentável de tão antidemocrático e que acentuaria ainda mais o divórcio entre os povos dos Estados-membros e as instituições europeias.
Perante esta situação, os mais interessados nunca desistiram do Tratado Constitucional e, caminhando aos ziguezagues, começaram a reinventar a forma de, mantendo o texto, dar nova capa ao tratado para o fazer passar por coisa diferente.
Aliás, como alguém dizia no sábado, «perdeu-se muito tempo por pouca coisa».
Mas, agora, a preocupação é fazer com que os que não se pronunciaram não tenham oportunidade de dizer «não» e os que disseram «não» não voltem a repetir a ousadia.
Em conclusão, está tudo encaminhado para que os vários países preparem com muita artimanha a fuga ao referendo europeu. E Portugal não foge à regra. Seguindo a posição do Presidente da República, o Governo e o Sr. Primeiro-Ministro vieram logo a correr dizer que era uma boa ideia, que estavam de acordo com as palavras do Presidente da República.
Esta posição começa a generalizar-se, batalhando no argumento de que já não estamos perante um Tratado Constitucional mas, sim, perante uma mera revisão do Tratado de Roma e, agora, do de Nice e, portanto, não vale a pena perguntar aos cidadãos europeus se estão ou não de acordo. Mas vão mais longe e argumentam que, antes de conhecer com rigor o texto, não é correcto falar em referendo.
Podem não conhecer o texto na totalidade, mas, Sr. Primeiro-Ministro, então o que fizeram durante aquela maratona negocial de 15 horas?! De certeza que não estiveram a jogar poker; de certeza que estiveram a traçar as linhas mestras para a revisão do tratado.
A questão fundamental, Sr.as e Srs. Deputados, é que existe um compromisso do Partido Socialista em relação ao referendo que nada tem a ver se a revisão é grande e profunda ou se é pequena e limitada, tem a ver com a necessária legitimação.
Aliás, o ex-Deputado do Partido Socialista Guilherme de Oliveira Martins dizia, em 24 de Junho de 2004, «(…) quero dizer, muito brevemente, que é a democracia europeia que está em causa e, como a democracia é sempre exigente, temos muito trabalho para realizar (…) e relativamente ao que está em causa, o Partido Socialista toma uma posição muito clara: é o partido dos dois sim, sim ao referendo, sim ao Tratado Constitucional.» Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Neste debate não podíamos deixar passar outras matérias preocupantes e que são reveladoras das politicas da União Europeia e do Governo.
A flexissegurança é um conceito muito falado mas que não é mais do que um termo utilizado para ocultar os verdadeiros objectivos das políticas neoliberais, o da liberalização dos despedimentos individuais e o da redução das pensões. Por trás de um conceito que se quer fazer passar por inovador encontra-se um instrumento que nos remeterá ao séc. XIX, no que diz respeito ao enfraquecimento da posição do trabalhador e à concentração do poder absoluto nas mãos do empregador.
Outra das matérias que Os Verdes querem abordar é a Estratégia de Lisboa, que nasceu na última Presidência portuguesa, em 2000. De acordo com as linhas orientadoras — linhas de que sempre desconfiámos —, a Europa devia ser, em 2010, o espaço mais competitivo do mundo, com uma forte aposta na ciência e na investigação e com uma economia capaz de produzir um crescimento sustentado, empregos para garantir a coesão social, crescimento económico e desenvolvimento.
Mas, infelizmente, tudo aconteceu ao contrário, o que temos é mais desemprego, flexibilização do horário de trabalho e do tempo de reforma, congelamento dos salários reais, liberalização dos serviços e o continuado desmantelamento da administração pública.
O que pretendemos da Presidência portuguesa é que coloque de lado o Pacto de Estabilidade e avance com uma proposta de um pacto social e de crescimento que lance a semente para uma verdadeira política social, que trave o desemprego e que apresente políticas de valorização do trabalho e de defesa dos trabalhadores.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Por último, as questões energéticas. Sobre esta matéria houve muita festa, muitas conferências e muito boas intenções, mas, depois, quando analisamos a realidade,
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constatamos que muito pouco foi feito e que, de Conselho para Conselho, se vão adiando os problemas e em todos as conclusões sempre a mesma escrita: «o Conselho incentiva na busca de respostas urgentes; o Conselho aguarda com expectativa»… Em matéria do cumprimento do Protocolo de Quioto, tudo indica que não vamos cumprir as metas traçadas. Aliás, os números disponíveis apontam para aí, ou seja, até 2010, Portugal tinha como objectivo uma meta de mais 27% em relação a 1990 e, neste momento, já estamos perto dos 50%; a União Europeia tinha de reduzir 8% até 2010, em relação a 1990, e nos dias de hoje os números que existem é que vamos chegar a 2010 apenas com uma redução de 0,6% . É um escândalo! Apesar de o Governo ter vindo a anunciar algumas medidas internas, continuamos a assistir a uma falta de investimento eficaz em torno das energias renováveis e, por conseguinte, a um cada vez maior afastamento do cumprimento do Protocolo de Quioto.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Aquilo que podemos concluir é que cada vez mais os cidadãos se encontram afastados da União Europeia e que as políticas postas em prática são cada vez mais contra os cidadãos e não a favor deles.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vitalino Canas.
O Sr. Vitalino Canas (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de começar por uma nota à margem deste debate.
Embora isso não tenha directamente que ver com o tema do debate de hoje — o Programa para a Presidência portuguesa —, quero assinalar um facto que diz respeito à Europa: Tony Blair deixa hoje o lugar de Primeiro-Ministro do Reino Unido, assumindo Gordon Brown esse cargo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Ainda bem!
O Orador: — Tony Blair foi talvez o líder britânico que, nas últimas décadas, teve um discurso mais positivo e mais construtivo sobre a União Europeia no contexto do seu país e das suas condições específicas.
Só esse facto já seria suficiente para o evocar aqui, uma vez que a União Europeia necessita, certamente, de um Reino Unido de corpo inteiro na Europa.
Mas Blair foi também um líder com sucesso — diz o observador exterior, naturalmente sem querer intrometer-me nos assuntos internos britânicos — no que toca ao objectivo de tornar o seu país mais forte e foi um dos líderes europeus, temos de o reconhecer, que maior influência e protagonismo assumiu nos assuntos mundiais do pós-guerra.
Daí poder extrair-se uma lição, que quero assinalar e é aqui que quero chegar: nada impede que um líder político possa ter, simultaneamente, um contributo positivo para o fortalecimento da Europa, ao mesmo tempo que trabalha para o fortalecimento do seu país e para o acréscimo de influência nos assuntos globais.
Sr. Primeiro-Ministro, o resultado do Conselho Europeu de Bruxelas, de 21 e 22 de Junho, foi, segura e certamente, e, por isso, devemos felicitar essa Presidência, um sucesso da Presidência alemã, mas também foi um sucesso da Presidência portuguesa ainda antes de começar, porque o Governo português conseguiu o mandato claro e preciso que pediu para poder conduzir a Conferência Intergovernamental. Mas essa é apenas uma percentagem mínima do sucesso que nos é exigido. Muito trabalho teremos ainda todos pela frente, pelo que as euforias são, seguramente, proibidas.
Houve um sucesso inegável, não obstante o debate a que se começa agora a assistir, promovido por aqueles que querem descobrir aspectos negativos nesse acordo que se conseguiu no Conselho Europeu do fim-de-semana passado, aqueles que falam do regresso dos «soberanismos», da Europa das Nações, da Europa a duas ou mais velocidades, em suma, aqueles que falam do regresso dos egoísmos nacionais.
Esse é o debate errado. Porque, na verdade, o equilíbrio conseguido é um equilíbrio muito positivo. É um acordo a 27 – sublinho, a 27 e não a 26, a 25 ou a 20 – que verdadeiramente representa não um retrocesso mas o regresso ao futuro do projecto da União Europeia. Não obstante as cláusulas de opting out ou o adiamento da entrada em vigor dos mecanismos de votação, o acordo é um acordo muito satisfatório para a Europa.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!
O Orador: — O Sr. Primeiro-Ministro falou, há pouco, de um programa ambicioso, e é disso que a Europa necessita: de ambição e de liderança. Ambição, liderança e optimismo são as receitas para os nossos problemas.
É desse modo que poderemos, finalmente, afirmar-nos como um parceiro global, com peso político equivalente ao peso económico de que a Europa já dispõe.
É desse modo que poderemos assumir uma atitude de liderança na resolução de problemas que estão
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não apenas nas nossas traseiras mas, verdadeiramente, na nossa porta da frente. Problemas como os do Kosovo, os dos Balcãs Ocidentais, do Líbano ou do Médio Oriente carecem de uma Europa forte e afirmativa.
É desse modo que combateremos o terrorismo.
É desse modo que encontraremos uma solução para os fluxos migratórios, que nos preocupam, provenientes da orla sul do Mediterrâneo.
É desse modo que enfrentaremos a insegurança energética, É assim que assumiremos uma liderança, essencial neste momento, no combate às causas das alterações climáticas.
É assim que damos esperança a quem quer aderir — e há muitos que ainda o querem fazer — à União Europeia.
No Conselho Europeu de 21 e 22 de Junho demos todos um passo importante nesse sentido. Estamos confiantes de que a Presidência portuguesa será mais um passo significativo do projecto da União Europeia.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos passar ao período de encerramento. Cada grupo parlamentar disporá de 3 minutos e o Sr. Primeiro-Ministro de 6 minutos.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: No encerramento deste debate sobre a Presidência portuguesa da União Europeia, Os Verdes começam por lamentar a forma como o debate decorreu.
Ao longo dos cerca de 35 minutos em que o Sr. Primeiro-Ministro usou da palavra pouco se discutiu as questões que interessam a Portugal e aos portugueses. Não se falou nos verdadeiros problemas da Europa; do afastamento dos cidadãos das instituições europeias; do agravamento da situação social, designadamente em Portugal; dos 20% mais ricos, que estão que estão dada vez mais ricos, e dos 20% mais pobres, que estão cada vez mais pobres: do problema do emprego; dos atrasos a nível da redução de emissões de gases com efeito estufa, em que Portugal é campeão e em que a própria Europa também apresenta dificuldades em cumprir Quioto em 2012; das medidas concretas de que necessitaríamos para responder já a este problema, necessariamente associado ao da dependência energética e á ineficiência dos consumos, e do generalizado atraso em que nos encontramos nesta matéria — europeus e portugueses —, atraso esse que serve, naturalmente, os interesses dos defensores do nuclear, que encontram o que querem precisamente no programa desta Presidência.
Aliás, é dito claramente que, no que respeita à energia nuclear, ficará concluído o processo de consulta que facilitará a escolha dos instrumentos que poderão contribuir de forma mais eficaz para a segurança nuclear e para a gestão segura dos resíduos, como se houvesse ao alcance da capacidade tecnológica humana alguma gestão totalmente segura de resíduos nesta matéria… Mas também não se falou da necessidade de apostar nos transportes colectivos como medida fundamental para reduzir os gases de efeito estufa e combater as alterações climáticas.
Por outro lado, pouco se falou de como a Agenda de Lisboa, o Pacto de Estabilidade e Crescimento ou a flexissegurança servem uma agenda neoliberal da Europa, de enfraquecimento interno desta mesma Europa, do desemprego, da precarização laboral e do ataque aos direitos sociais, apesar dos bonitos discursos que são feitos em torno do reforço da coesão social.
De facto, a agenda deste Governo tem tabus e preconceitos. Gosta de tomar como certas e boas para os portugueses coisas como o Pacto de Estabilidade e Crescimento ou como a Agenda de Lisboa, quando o balanço que deles fazemos é o enfraquecimento do tecido social, o aumento das desigualdades e a submissão dos objectivos ambientais às pressões do poder económico, que só investe em função do lucro que pode obter.
O Sr. Primeiro-Ministro recusa-se a discutir questões de fundo, não respondendo, aliás, de resto, a nenhuma das questões que Os Verdes aqui levantaram no debate, refugiando-se, arrogantemente, num discurso consigo próprio ou com a direita, com a qual partilha valores e caminhos semelhantes.
A questão do tratado é elucidativa em relação a esta postura. Depois de ter assumido no seu Programa de Governo a realização de um referendo, a consulta aos portugueses, em nome de princípios de democratização, o Sr. Primeiro-Ministro vem aqui dizer que não conhece nenhum líder político que tenha assumido fazer um referendo antes de conhecer o conteúdo do tratado. Depois lá se lembrou da Irlanda, que vai ser obrigado a fazer esse referendo. Ora, eu lembro-lhe outro, Sr. Primeiro-Ministro: o líder português também assumiu esse compromisso perante os portugueses, e seria bom que dele não fugisse.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Bem lembrado!
O Orador: — Finalmente, Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Deputados, no reforço da demo-
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cratização da construção europeia, seria fundamental que os Parlamentos nacionais, de facto, não estivessem afastados. Infelizmente, há dados muito concretos que nos levam a crer que pode nem sempre existir essa intenção. Aliás, a Presidência portuguesa da União Europeia e a Presidência do Parlamento Europeu organizaram uma deslocação de representantes de todos os grupos do Parlamento Europeu a Portugal com o objectivo de debater a Presidência portuguesa. Estes representantes do Parlamento Europeu têm um programa, segundo o qual vão falar com diversas entidades; contudo, deixam completamente de fora o Parlamento português. Irão falar com o Governo e com o Presidente da República, mas, apesar de virem ao edifício da Assembleia da República, não irão falar com os grupos parlamentares, nem em sede de uma simples comissão.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Este programa e esta agenda que a Presidência portuguesa aqui nos traz não é, certamente, a agenda da construção de uma Europa mais justa e mais fraterna e, por isso mesmo, pode contar com a oposição clara e firme do Partido Ecologista «Os Verdes».
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: O Sr. Primeiro-Ministro disse aqui, num momento curioso do nosso debate, que nenhum líder de governo europeu lhe havia pedido para se pronunciar acerca do modo de ratificação do tratado dito «reformador». Nem era preciso! Com a verdade nos engana, se me permite! A verdade é que todo o trabalho de elaboração da saída do impasse institucional e do defunto Tratado Constitucional foi feito ao fio e à medida de tentar evitar referendos em todo o lado. Esperou por uma nova situação política em França, enfim, tudo foi feito de modo a que não se recorra a referendo em qualquer Estado-membro, exceptuando aquele que tem a obrigatoriedade constitucional de a ele recorrer, que é a República da Irlanda.
Portanto, não valia a pena falar daquilo que era a matéria-prima, o método de todo o processo negocial.
As chancelarias na Europa não falaram de outra coisa senão de um percurso que evitasse o veredicto popular. Não era preciso combinar, não era preciso nenhuma aliança tácita ou secreta entre os líderes dos governos europeus, porque esse era o propósito, esse era o objectivo: ver se não havia mais nenhum «referendo negativo», como se dizia, o que já de si é uma expressão não neutral em relação ao desfecho dos referendos na França e na Holanda.
Quando olhamos para a imprensa britânica dos últimos dias, vemos que pode haver algum calafrio. É que, em todos os quadrantes, Gordon Brown está a ser pressionado para que haja um referendo na GrãBretanha, para que haja um referendo no Reino Unido.
Portanto, o que vier a sair da CIG está ainda periclitante em função da Grã-Bretanha e podemos divisar uma situação crítica, no futuro, mais ou menos congénere daquela que sucedeu com os chamados «referendos negativos».
Por isso é que o Sr. Primeiro-Ministro não se quer comprometer com o referendo. O Sr. PrimeiroMinistro não se quer comprometer com o referendo porque receia que o Presidente em exercício da União Europeia seja descrito pelos líderes de outros governos europeus do seguinte modo: «Ora vejam bem, numa altura em que nós queremos ver se conseguimos ratificar isto, aqui, nos nossos Estados-membros, vem o Presidente em exercício falar de referendos lá na terra dele. Não pode ser!».
Ora bem, é este sentido, a que o Sr. Primeiro-Ministro chamará política de Estado e política de Estado na Europa, que nós contestamos, porque, independentemente do modo de ratificação nos outros Estadosmembros, a posição de Portugal é a posição de Portugal, os compromissos assumidos em Portugal são os compromissos assumidos em Portugal, não são contaminados nem contaminantes de outras posições na União Europeia.
Essa tentativa de ganhar estatura europeia parece-me um défice democrático, Sr. Primeiro-Ministro, um jogo de sombras chinesas, não tem a responsabilidade política do Chefe do Governo de Portugal no exercício da Presidência da União Europeia.
O Sr. Primeiro-Ministro perguntou aqui: «Qual é a vossa posição acerca do Tratado?». É negativa, Sr.
Primeiro-Ministro! É negativa!
O Sr. Primeiro-Ministro: — São contra a Europa!
O Orador: — Se já tínhamos um mau tratado, passámos a ter um pior tratado! Mas mais: não perca a sua perspectiva, porque ela é interessantíssima do ponto de vista do comportamento dos socialistas na Europa. Os socialistas vêm de capitulação em capitulação! Os socialistas procuraram fazer crer que a deriva liberal do Tratado Constitucional seria mais ou menos contrabalançada e equilibrada com a Carta dos Direitos Fundamentais. Pois bem, a Carta dos Direitos Fundamentais, diga-se o que se disser, lá foi para a gaveta e ficámos apenas com a deriva liberal e com o «atrelado» europeu nas questões de política externa
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e de política de defesa, aliás, bem confusas e muito pouco propícias a uma política de paz e a uma política de uma outra afirmação e protagonismo da União Europeia no concerto mundial.
O Sr. Presidente: — Faça favor de concluir, Sr. Deputado.
O Orador: — Quando o Sr. Primeiro-Ministro nos diz aqui «A minha Presidência, a Presidência de Portugal vai ser marcada, claramente, pela conclusão do tratado reformador mas também pela agenda social».
Sr. Primeiro-Ministro, lamento dizer-lhe que essa agenda social só por piada pode ser a protecção dos direitos sociais, só por piada pode ser o reforço do modelo social! Só por piada! Da mesma forma que a Agenda de Lisboa nunca teve componente social e não foi mais do que um mercado — e, hoje, por toda a Europa, é considerada a agenda da destruição dos serviços públicos —, a Presidência portuguesa ficará marcada pela agenda social da flexigurança, que é a destruição de direitos sociais dos trabalhadores.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs.
Membros do Governo: Deste debate, o CDS sublinha cinco factos e retira cinco conclusões.
Primeiro facto: com moderação, pragmatismo e realismo, foi possível ultrapassar o impasse em que se encontrava a União Europeia. Ainda bem! Primeira conclusão: o CDS tinha razão em apelar a uma solução de consenso e não a uma solução de utopia, que a ninguém aproveitava e apenas prejudicava os europeus e a situação económica existente na Europa.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — Segundo facto: a natureza do mandato para o futuro tratado não é a mesma, quer no seu conteúdo, quer na sua forma, do mandato para o Tratado Constitucional Europeu. Era de esperar! Segunda conclusão: o CDS, ao contrário de outros, tinha razão em aguardar com serenidade e responsabilidade antes de se pronunciar sobre a forma de ratificação. No referendo trata-se de uma consulta popular sobre uma questão concreta, pelo que não vale a pena falar da questão concreta sem conhecer, concretamente, o seu conteúdo.
Terceiro facto: da Cimeira resultou um reforço dos poderes dos Parlamentos nacionais no controlo do respeito do princípio da subsidiariedade pelos órgãos comunitários.
Terceira conclusão: o CDS tinha razão quando defendeu um reforço do controlo parlamentar, de forma a combater a Europa de uma união, de um só directório. Ainda bem que foi possível evitá-la! Quarto facto: o Sr. Primeiro-Ministro, hoje, veio aqui apresentar-nos as prioridades da Presidência europeia mas não gastou um único dos seus 30 minutos a falar sobre a política europeia do mar. Ora, para o CDS, Portugal tem uma vocação especial atlantista, um passado universalista e deve ver no mar um desafio e uma oportunidade, tanto mais que, ao nível europeu, três quartos da fronteira da União Europeia são costa marítima.
O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — Ora, neste amplo debate e em vésperas de a Comissão Europeia apresentar, publicamente, as conclusões do Livro Verde, não ouvimos uma única palavra do Governo.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Está aqui!
O Orador: — Quarta conclusão: o CDS tem razão em fazer desta política uma prioridade e o Sr. Primeiro-Ministro vai bem se sublinhar esta mesma prioridade na intervenção de encerramento deste debate.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Quinto facto: o Governo e o Primeiro-Ministro nada disseram sobre política comum de imigração. E, Sr. Primeiro-Ministro, tenho aqui tudo o que disse sobre política comum de imigração.
Na sequência da Cimeira Europa-África, disse: «Trata-se de uma lacuna que cumpre resolver, de forma a uma regulação duplamente vantajosa dos fluxos migratórios». Foi a única coisa que disse relativamente à política comum de imigração! Parece-nos pouco! Para nós, tanto a nível europeu como a nível nacional, é uma prioridade e, por isso, retiramos uma quin-
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ta conclusão: o CDS tem razão quando exige que o Governo faça da imigração, lá como cá, uma prioridade, no sentido de adoptarmos uma política comum que seja, de facto, coesa e aplicável a todos os países, sem qualquer tipo de distinção.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O CDS, patrioticamente, deseja uma Presidência portuguesa da União Europeia profissional e competente, deste e de qualquer outro governo. Saudamos, por isso, a saída do impasse, a moderação e o pragmatismo nas soluções que foi possível alcançar e o reforço dos Parlamentos nacionais. Preocupa-nos a falta de referência do Governo à prioridade da política europeia do mar e a uma política comum de imigração. Nisto, como em tudo resto, aliás, seremos oposição firme mas leal, combativa mas, certamente, com apurado sentido de Estado.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: Para além de lamentáveis e inéditos incidentes, este debate mostrou o que poderia ser mas, infelizmente, não será a Presidência portuguesa da União Europeia. Podia ser a Presidência em que as taxas de juro parassem de subir, em que o Banco Central Europeu passasse a servir os interesses da coesão, passasse a influenciar e a motivar positivamente o crescimento económico e o emprego, em vez de prosseguir orientações de «financeirização» da economia e de contenção obsessiva e única da inflação.
A Presidência portuguesa poderia também ser, mas não é nem será, uma Presidência em que se prestasse atenção especial às condições específicas com que se debatem os países menos desenvolvidos ou mais periféricos da União. Poderia ser a Presidência que colocasse na ordem do dia a necessidade de alterar o Pacto, para permitir maiores níveis de investimento de qualidade e condições reforçadas de recuperação dos atrasos dos países menos desenvolvidos.
O Governo português mostrou aqui que não quer que a União Europeia mude de paradigma, altere as suas políticas para favorecer os povos e promover a coesão.
As preocupações do Governo são outras: no fundamental e no essencial, são as de servir, como aluno fiel e bem comportado, o roteiro para um novo tratado, dito ou não constitucional ou, agora, renovador, servindo de tabelião para dar corpo às pretensões do directório de potências dessa mesma União. São opções políticas, opções más, opções que prejudicam Portugal, que prejudicam os portugueses, mas que também prejudicam os europeus. São, por isso, opções que vão continuar a merecer, da parte do PCP, antes, durante e depois da Presidência portuguesa, a mesma firme oposição e a mesma clara denúncia.
Sejamos claros e frontais: o melhor serviço que podemos prestar a Portugal é continuar a lutar pelo que julgamos ser melhor para os portugueses e para a Europa e que o Governo deixa, intencionalmente, fora da agenda e da discussão europeia durante a sua Presidência.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — Uma última palavra, em jeito de conclusão, quanto ao referendo sobre o futuro tratado.
Relativamente a isto, Sr. Primeiro-Ministro, aconselho-o a ler o artigo 295.º da Constituição e o seu sentido político,…
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Vale a pena!
O Orador: — … mas, por favor, não «assobie para o ar», não faça de conta que não sabe, pois já todos o sabemos, que o próximo tratado levará tudo o que estava no outro projecto menos algumas migalhas.
Pode bem o Sr. Primeiro-Ministro dizer o que quiser, mas, se Portugal não realizar o referendo, o senhor estará não só a faltar a mais um compromisso eleitoral — e a isto até já estamos bem habituados — como também a dar mostras de um desprezo profundo e de uma falta de respeito clara pela opinião do povo português.
O Sr. António Filipe (PCP): — Muito bem!
O Orador: — Sejamos claros, Sr. Primeiro-Ministro: o que o leva a fugir do referendo como o diabo da cruz não é o haver ou não haver, desde já, formalmente, um tratado, mas, antes, os seus compromissos, bem transcritos no El País, de 24 de Junho, pela voz do Primeiro-Ministro espanhol, e que passo a reproduzir: «Evitar os referendos é um objectivo declarado dos governos europeus que impulsionaram esta reforma, convencidos de que um novo ‘Não’ ampliaria a crise até limites insuportáveis e poria em sério risco o futuro da integração europeia».
Vozes do PCP: — Ora aí está!
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O Orador: — É por isto, Sr. Primeiro-Ministro, por tudo isto que os senhores mostram um pavor de morte perante o voto popular sobre o tratado europeu. Isto é uma verdadeira conspiração política e um golpe político contra os povos e as nações da União!
Protestos do PS.
Um golpe, Sr. Primeiro-Ministro, que parece já ter tradução política com a anunciada — há poucos minutos — intenção do Ministro dos Negócios Estrangeiros holandês de não fazer um referendo porque as alterações de Bruxelas respondem às questões suscitadas pelos holandeses quando chumbaram o projecto.
O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Orador: — Vou terminar, Sr. Presidente.
Esta é a interpretação do «não» holandês feita por alguém que não quer o referendo.
Estamos, portanto, Sr. Primeiro-Ministro, perante uma enorme fraude política em que, pelos vistos, e se dela não se demarcar suficientemente, parece também empenhado, quando não assume aqui, e hoje, compromissos claros quanto ao referendo sobre o tratado em Portugal, quando ele existir, no fim do ano.
Aplausos do PCP e de Os Verdes.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Santos David.
O Sr. Mário Santos David (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Antes de iniciar a minha intervenção, quero fazer um breve comentário sobre uma informação de grande importância política.
Como acaba de ser referido, o governo holandês acaba de anunciar a forma como tenciona ratificar o futuro tratado. Isto significa que considera que já há conteúdo suficiente para decidir e que não é preciso esperar pelo fim da Conferência Intergovernamental.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — É verdade! Eles já sabem, só o senhor é que não sabe!
O Orador: — Ou seja, Sr. Primeiro-Ministro, o governo holandês acaba de deitar por terra o seu argumento de que ainda não é tempo de decidir sobre o «sim» ou «não» ao referendo. Pelos vistos, para a Holanda, o conteúdo do tratado está definido. É verdade, todos sabemos que é verdade,…
O Sr. Honório Novo (PCP): — Mais depressa se apanha um mentiroso do que um coxo!
O Orador: — … ele está aqui, o Sr. Primeiro-Ministro conhece-o, tal como nós.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — Mas pode o Governo contar com o apoio empenhado e construtivo do PSD, interna e internacionalmente, para o sucesso da próxima Presidência da União Europeia. A União respira um novo sentimento de esperança e de confiança e a Presidência portuguesa vai iniciar-se com o seu ponto principal de preocupação política praticamente resolvido. Digo-o, Sr. Primeiro-Ministro, sem qualquer intenção de minimizar a importância de vermos aprovado no próximo semestre o novo tratado, o tratado reformador.
O Governo anunciou, e bem, aos nossos parceiros comunitários que só avançaria para a convocação de uma conferência intergovernamental desde que a Presidência alemã lhe transmitisse um mandato claro e preciso.
Esteve também acertado quando insistiu na necessidade de esse mandato ser subscrito pela unanimidade dos 27 Estados-membros para que não houvesse surpresas no caminho. Todos estes objectivos foram atingidos. O deslumbramento foi tanto que o Sr. Primeiro-Ministro se permitiu, desde logo, antecipar a conclusão da CIG para o Conselho Europeu de Outubro, em Lisboa. E tinha razão para estar deslumbrado: os seus pedidos foram de tal modo satisfeitos que, para sermos intelectualmente honestos, pediu um mandato e deram-lhe um tratado quase prontinho. Nunca um mandato foi tão detalhado. Todos os anteriores continham as ideias, os conceitos, os objectivos a atingir; agora dispomos já da própria redacção da quase totalidade do articulado.
No Anexo I das conclusões do último Conselho Europeu remete-se por 34 vezes para o texto já acordado na CIG de 2004. São 34 vezes em que se indica que se transcrevem integralmente dezenas de artigos do Tratado Constitucional contendo tudo o que é fundamental.
Não podendo mencionar todas as áreas, refiro apenas o peso relativo de cada Estado em termos de votos de cada um no Conselho e em termos de Eurodeputados, a regra da dupla maioria, as áreas às quais
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se alarga o campo de aplicação da co-decisão, as 51 novas áreas em que se transfere a soberania ao passar a sua aprovação da unanimidade para a maioria qualificada. E, quando há inovações, o mandato explicita a redacção dos novos artigos, declarações e protocolos. Se não me enganei, fá-lo 36 vezes, referindo expressamente que «o objectivo do presente Anexo é esclarecer a formulação exacta, sempre que necessário, e clarificar a posição de certas disposições».
80 a 90% do Tratado Constitucional foi recuperado, foi repristinado tudo o que era essencial para um funcionamento mais legítimo, eficaz, transparente e coerente da União Europeia. Era um tratado em que podíamos rever-nos e, por isso, agora que conhecemos o conteúdo final do próximo tratado — que fique bem claro — ele merece o nosso apoio.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Termino, Sr. Presidente.
Não sendo o tema do momento, mas merecendo também a atenção da comunicação social, não podemos deixar de referir a futura forma de ratificação, já que desde sábado passado, como acabamos de verificar, não colhe a ideia de que temos de aguardar pelo fim da CIG para conhecer o tratado. Com o devido respeito, a verdadeira CIG foi na sexta-feira. E se todos os partidos estavam de acordo sobre referendar o Tratado Constitucional, como e porquê mudar de opinião? Por nós, PSD, prometemos e queremos cumprir.
É uma questão de credibilidade e de seriedade política.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.
O Orador: — Concluirei imediatamente, Sr. Presidente.
E não receamos o resultado dessa consulta popular, em que vamos empenhar-nos com convicção.
Nos corredores de Bruxelas vai-se sussurrando que devia encorajar-se todos os Estados-membros a evitar a realização de referendos. Nada mais errado.
Para europeístas convictos como somos, seria muito mau sinal que os chefes de Estado e de governo quisessem imiscuir-se na forma como cada Estado deve ou não deve ratificar o tratado. Seria uma ingerência inaceitável, um atropelo ao princípio da subsidiariedade. A construção europeia já sofreu muito no passado por atropelos deste tipo.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Não contem com o PSD para ir por aí, mas contem connosco para honrar compromissos e para ajudar a reforçar o consenso europeu em Portugal, porque isso é importante para a Europa, para os portugueses e para Portugal.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins, para uma intervenção final no debate.
O Sr. Alberto Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Caros Colegas: A História de Portugal mudou nos últimos 33 anos de forma muito significativa, havendo duas opções colectivas que mudaram a vida pública, o rumo do país e até as nossas instituições — o 25 de Abril, com a fundação da democracia, em 1974, e a opção pela Europa em 1985.
Os padrões de desenvolvimento, a abertura dos mercados, da economia, da vida portuguesa ao espaço europeu e até das instituições foram alterações significativas da nossa vida colectiva. Por isso, podemos dizer que a identidade europeia é já um traço da nossa identidade pública e comunitária.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!
O Orador: — Assim, não podemos deixar de saudar aquilo que aconteceu no Conselho Europeu de Bruxelas em Junho, uma vez que há basicamente o regresso ao espírito reformista na Europa e, sobretudo, o fim de um bloqueio institucional que estava a fazer com que a Europa se mantivesse parada, sem movimento e sem ser capaz de dar os passos essenciais para o desenvolvimento do nosso espaço económico, do nosso espaço social, do nosso espaço político e para o relacionamento planetário que se exige.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!
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O Orador: — Era — e é! —, por isso, importante que este debate fosse hoje centrado naquilo que aqui nos traz, que é sobretudo o programa da Presidência portuguesa. E nesse programa da Presidência portuguesa, desde logo, podemos ter dois pontos de partida: um deles é o grande consenso europeu que existe na sociedade portuguesa. Há um arco da construção europeia na sociedade portuguesa, mas também não podemos esquecer-nos — e isso é visível sobretudo nos partidos à nossa esquerda — de que há opções contra a Constituição europeia, contra a União Europeia, e que existiram sempre. Isto é, há uma esquerda que é anti-União Europeia. É sobretudo a esquerda do subsídio, da reserva mental, não é a esquerda da partilha política, a esquerda comunitária, a esquerda dos Estados.
Aplausos do PS.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É a esquerda do referendo!
O Orador: — Sobre isso estamos conversados! A União Europeia não passa por aqui no seu desenvolvimento, no seu movimento, no seu carácter social. Sabemos isso, e sabemo-lo pela História.
Por isso, aquilo que temos de fazer quanto ao programa da Presidência portuguesa é centrarmo-nos naquilo que é essencial nesse programa. E o que é? O tratado europeu. Naturalmente, é um instrumento decisivo para a união livre de Estados soberanos que está a construir-se na Europa. O aprofundamento do tratado e o seu rigorismo jurídico não são uma pura questão semântica.
Como já foi dito pelo Sr. Primeiro-Ministro, um mandato é um mandato, um tratado é um tratado!! Há passos a percorrer cuja exigência sabemos o que significa. E sabemos o que significa o tratado para o futuro da Europa: é mais um patamar no desenvolvimento da Europa. E desenvolvimento da Europa para quê? E aqui está também um traço da Presidência portuguesa, como foi afirmado: para garantir o modelo social europeu, para garantir a Europa social, para garantir a Europa da competitividade, a Europa do emprego, a Europa da inovação tecnológica.
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Está à vista!
O Orador: — Porque sozinhos não vamos lá! Sozinhos tivemos o Goulag, não tivemos uma Europa desenvolvida!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.
O Orador: — E temos de ter presente o papel da Europa no Mundo como instrumento de paz.
Por isso, concluindo, diria que há duas ideias fundamentais: a ideia de uma política de defesa e a ideia de uma política externa comum. Saliento, felicitando o Governo por isso, as grandes apostas nas cimeiras Europa/Brasil e União Europeia/África. São instrumentos decisivos para o futuro da Europa, da África, da América Latina, da América em geral e para o futuro planetário.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para a sua intervenção de encerramento, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro, José Sócrates.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Deixem-me começar por dizer que o propósito de todos aqueles que estão empenhados na Presidência portuguesa é servir a Europa. Sabemos bem a importância que tem para Portugal o projecto europeu e sabemos bem a importância que têm para o Mundo o desenvolvimento e o aprofundamento do projecto europeu.
E nada mais importante para a confiança na economia europeia, para a confiança na sociedade europeia e para a confiança na Europa por parte de quem espera mais de nós no mundo do que resolvermos a crise institucional em que temos sido mergulhados nos últimos dois anos. É por isso que a prioridade ao tratado é absolutamente essencial; é por isso que os trabalhos desenvolvidos nos últimos oito meses para que fosse possível chegar a um acordo no último Conselho e para que seja possível transformar esse mandato num tratado são absolutamente críticos para a Europa; e é por isso que assumo com orgulho esta primeira prioridade em resolver o impasse institucional, porque, quando aprovarmos o tratado a Europa, ficará mais forte, sairá da crise e terá uma presença no mundo à altura dos nossos anseios e daquilo que esperamos que seja a Europa para defender os valores europeus.
Aplausos do PS.
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Mas atenção: somos uma União, não somos uma aliança!! Nesta União Europeia todos os países são necessários, todos são imprescindíveis, e é por isso que os acordos têm de ser a 27! Ninguém duvida que eu preferisse o tratado anterior. Eu preferia o Tratado Constitucional, gosto do Tratado Constitucional, gosto da ideia da Constituição europeia, gosto dos símbolos e gosto mais do texto anterior, mas, naturalmente, estive do lado daqueles que querem ver a Europa avançar, daqueles que querem fazer um compromisso, porque sei que a única forma de fazer a Europa avançar é com base nesse compromisso. Foi por isso que Portugal esteve do lado do compromisso.
Aqueles que sempre estiveram contra o Tratado Constitucional, naturalmente, também estão contra este tratado! Como os compreendo…! Até prevejo que grande parte desta animosidade se deve ao facto de, pela primeira vez nos últimos dois anos e meio, haver uma possibilidade de lhe retirarmos o argumento da «crise da Europa»…!
Aplausos do PS.
Sei que muitos políticos não ficarão satisfeitos porque já não podem falar da «crise da Europa»!… Srs. Deputados, quero também referir-me ao conteúdo do tratado.
Já foi aqui dito várias vezes, e insinuado, que agora é muito fácil, que passar do mandato para o tratado é muito fácil!… Alguns até disseram que já sabem, que já conhecem o texto, que já conhecem o conteúdo.
Quero, naturalmente, convidar os partidos que acham que conhecem o texto…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — O António Vitorino!
O Orador: — … a fazerem o favor de não se esquecerem de o mandar ao Governo, pois isso pouparnos-ia imenso trabalho. E se algum gabinete de estudos tem por aí um texto do tratado, por favor, por razões nacionais, poupem-nos esse trabalho, mandem-no ao Governo que o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros ficará contentíssimo por ter essa contribuição.
Aplausos do PS.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Telefone para a Holanda que lá sabem!
O Orador: — E reparem como neste debate a propósito da ratificação, que forças políticas querem transformar na questão principal — não interessa nada quanto ao tratado, o que interessa é a forma de ratificar — já começou a falar-se… O Sr. Deputado Mário Santos David trouxe aqui uma informação de «última hora» na esperança de ganhar o debate, claro está. Disse ele que o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros da Holanda anunciou a forma como aquele país vai ratificar o tratado — e isso é «a prova» de que já conhece o texto…! Vou ler as declarações do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros holandês. Diz o seguinte (e passo a ler o telex da Lusa): «O Ministro dos Negócios Estrangeiros holandês admitiu hoje que o novo tratado possa não ser referendado». Há uma diferença entre admitir hoje e dizer que não vai ser referendado.
Risos do PCP e do BE.
Se os Srs. Deputados me dão licença, penso que esses risos escarninhos não trazem qualquer argumento ao debate. Eu também vos ouvi em silêncio e confesso que muitas vezes não gosto do que dizem.
Portanto, igual respeito peço às vossas bancadas.
Diz ainda o telex da Lusa o seguinte: «Na Holanda, o texto deverá ser analisado pelo Conselho de Estado, que se pronunciará sobre a existência de elementos constitucionais, cabendo depois ao Parlamento decidir se haverá ou não referendo.» Isto foi dito pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros, que, mais à frente, diz: «Esperamos…» — oiçam bem, Srs. Deputados! — «… as propostas portuguesas com interesse.» E, destas declarações, conclui o PSD e o Sr. Deputado Mário David: o Ministro disse que não vai haver referendo. Os Srs. Deputados consideram isto honesto, neste final de debate?
Vozes do PS: — Não!
O Orador: — Com sinceridade, não considero isto honesto!! E o Sr. Deputado Mário David prestou uma péssima informação ao Parlamento.
Aplausos do PS.
Ainda quanto ao referendo, quero dizer que não tenho medo dos referendos. Penso que o instrumento do referendo deve ser muitas vezes usado. No entanto, o que não aceito é que alguém diga que um tratado internacional só tem legitimidade se for por referendo,…
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Vozes do PSD, do PCP e do BE: — Ninguém disse isso!
O Orador: — … porque isso é ser contra a democracia parlamentar e é um ataque à democracia representativa a propósito de derivas, essas sim, da democracia popular.
Aplausos do PS.
Uma coisa é aceitarmos as diferentes formas de ratificação, pode ser parlamentar ou pode ser referendária. O que não aceito, porém, é classificar como antidemocrática uma ratificação parlamentar.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Não aceito e considero essa ideia perigosa, contra o Parlamento e contra a democracia representativa.
É claro, depois desta conversa, vem a luta dos povos… Ohhh…! A luta dos povos!!… No passaran!! Nessa história da luta dos povos nunca vejo referir aqueles que, na Europa, votaram «sim»! Não…, esses não interessam, nada!! Só interessam aqueles que votaram «não»; esses é que fizeram uma luta! Os outros, aqueles países onde houve referendo — como aqui ao lado, em Espanha, em que 75% dos espanhóis votaram a favor — não contam!… O que conta são aqueles que votaram «não». É isto que as duas bancadas à esquerda do Hemiciclo chamam a luta dos povos e a que dizem no passaran!! Considero isso um declínio na conversa e no debate político!
Aplausos do PS.
Finalmente, quero dizer que esta é uma agenda ambiciosa: resolver o problema institucional; ter uma agenda de modernização para a Europa; darmos, de novo, o nosso contributo para que seja possível um novo ciclo da Agenda de Lisboa, para dar um ritmo às reformas da Europa e para que a economia europeia se possa afirmar na económica global.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Primeiro-Ministro.
O Orador: — Vou já terminar, Sr. Presidente.
Mas também não aceito que aquilo que são contributos portugueses para melhorar a política externa ao nível europeu seja considerado aqui, no Parlamento, como se não fosse nada de importante para Portugal.
Então, não é importante para Portugal dar um contributo na política externa para que se possa fazer a cimeira com o Brasil?!… Isso não resulta de uma ideia do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros?! Não lutámos oito meses para convencer os parceiros europeus de que se justificava uma cimeira com o Brasil?! É porque já existe uma cimeira com a América Latina e era importante convencer os europeus de que tínhamos de pôr o Brasil ao mesmo nível da Rússia, da China e da Índia, para dar coerência à nossa política com os BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China). Consideram que essa distinção do Brasil no conjunto da América Latina é ou não importante estrategicamente para Portugal? E por que é que não se sublinha isso como algo que Portugal atingiu, como um contributo da sensibilidade portuguesa para a política externa europeia?!…
Aplausos do PS.
E por que é que se considera que a cimeira com África é um objectivo menor, que não interessa nada à vida dos portugueses?!…
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Primeiro-Ministro.
O Orador: — O facto de Portugal, que tem um especial interesse estratégico com África, quando era difícil, há mais de oito meses, ter posto a questão em cima da mesa e ter dito que era preciso fazer essa cimeira, que é importante para os europeus e para os africanos, não é absolutamente decisivo?! E depois, «virar os olhos» da Europa para o Sul, convencer os europeus de que a agenda da política externa não é apenas o Leste mas que há também um problema estratégico a Sul, a relação do mundo islâmico com o mundo ocidental, isso não vale nada? Passa-se por cima disso como se fossem apenas questões burocráticas… — «eles lá tratarão disso»?… Não!! Tudo isto resulta de decisões e de propostas portuguesas! É esta a nossa agenda: uma agenda interna — tratado, Agenda de Lisboa, reformas —, mas também uma agenda internacional ao serviço de uma Europa mais forte, porque uma Europa mais forte é a melhor garantia da valorização da cultura europeia, dos valores europeus, mas também a melhor contribuição que podemos dar para um Mundo melhor.
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Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, concluído este debate sobre a apresentação do programa da Presidência portuguesa da União Europeia, vamos passar ao segundo ponto da ordem do dia que consta da apreciação do Relatório da Comissão de Assuntos Europeus sobre a Estratégia Política Anual da Comissão Europeia para 2008.
Tem a palavra o Sr. Deputado Armando França.
O Sr. Armando França (PS): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, devo assinalar que o relatório e o parecer que hoje apreciamos foram elaborados a partir de um documento atempadamente enviado à Assembleia da República pela Comissão Europeia e depois de ter sido ouvida, na Comissão, a Chefe da Representação Permanente da Comissão Europeia em Portugal.
Recebemos e recolhemos, por isso, toda a informação necessária para que o nosso trabalho parlamentar pudesse ser conveniente e eficazmente feito.
Em segundo lugar, assinalamos que esta estratégia política anual para 2008 é ambiciosa pelas prioridades e pelas acções elencadas, nomeadamente pela proposta de revisão do Orçamento da União, pela proposta de revisão do mercado único, pela proposta de balanço da situação social na União Europeia, pelas propostas relativas às alterações climáticas, pela Estratégia de Lisboa e pelas medidas propostas para enfrentar a complexa e difícil situação das migrações.
A Comissão Europeia apresentou a sua estratégia em coerência com os objectivos estratégicos que definiu para o seu mandato e na convicção de que eles permitirão responder ao desafio da globalização e preparar os europeus para o futuro.
Todavia, a nosso ver e apesar do ânimo e da confiança que partilhamos, quod erat demonstrandum, isto é, a dinâmica, se não mesmo a aceleração das mudanças, em áreas decisivas como a economia, o social, a investigação e o ambiente, é tal que as respostas estratégicas que a Comissão preparou e apresentou há três anos deixam dúvidas em alguns espíritos sobre se serão as mais adequadas e as melhores. Isto apesar do razoável comportamento da economia europeia e de importantes dossiers terem sido ultrapassados com sucesso, como foram os da Directiva de Serviços, das Perspectivas Financeiras e, agora, do acordo sobre o mandato para o tratado constitucional.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Entendemos que, perante o vasto conjunto de acções e de medidas elencadas, devemos congratular-nos, em primeiro lugar, com um conjunto de medidas para legislar melhor e, em segundo lugar, com o facto de a Comissão ter considerado crucial a tarefa da comunicação com os cidadãos e de se ter comprometido com várias medidas para aumentar e melhorar a comunicação com os cidadãos da União Europeia.
Gostaríamos de deixar uma palavra final ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, nos meses que antecederam este momento, aliás, como acabou de ser dito pelo Sr. Primeiro-Ministro, a sua equipa, a nossa diplomacia, todos os funcionários, têm trabalhado com grande afã, grande entusiasmo, grande empenho e grande qualidade. Isso reflecte-se, justamente, no conjunto de propostas que acabamos de ouvir apresentar para a Presidência portuguesa.
Estamos certos de que isso mesmo também vai reflectir-se no trabalho que Portugal vai desempenhar na cooperação com a Comissão Europeia e as instituições europeias em termos desta Estratégia Política para 2008, proposta pela Comissão.
Manifestamos-lhe a solidariedade do Grupo Parlamentar do Partido Socialista para com o Governo e a confiança de que 2008, sendo um ano importante, será decisivo para os destinos e o futuro da União Europeia.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Ofélia Moleiro.
A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados: Se dúvidas houvesse sobre a importância do reforço do papel do Parlamento nas questões europeias teriam sido dissipadas nesta tarde que dedicámos à Europa e, em particular, à Presidência portuguesa.
Compete à Comissão de Assuntos Europeus apreciar a Estratégia Política Anual da Comissão Europeia para 2008 que respeita a um período particularmente difícil e conturbado, mas, ainda assim, extremamente desafiante.
E o maior desafio é, sem dúvida, a elaboração do tratado reformador ou, como eu própria gostaria que se chamasse, tratado de Lisboa.
Mas, ainda para enfrentar e resolver, há os problemas do financiamento, dos recentes alargamentos, dos futuros alargamentos, da defesa e da segurança, tal como os das novas fronteiras da União Europeia e a questão da Turquia.
A Comissão Europeia traçou quatro objectivos estratégicos: prosperidade; solidariedade; segurança e
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liberdade; e reforço do papel da Europa no Mundo.
Para alcançar tais objectivos, a Comissão estabeleceu prioridades transversais: o combate às alterações climáticas; a energia sustentável; a renovação da Estratégia de Lisboa, agora centrada no crescimento e no emprego; a gestão dos fluxos migratórios para a União Europeia.
No reforço do papel da Europa no mundo propõe-se, entre outras acções, continuar as negociações com a Croácia e com a Turquia, a definição do estatuto do Kosovo, o novo acordo com a Rússia e negociações com a Arménia, o Azerbeijão, a Geórgia e a Moldávia, entre outros.
A Delegação Parlamentar que, há poucos dias, esteve na Bulgária e na Roménia ficou bem ciente e foi bem alertada para o facto de que estes dois países se assumem verdadeiramente como a nova «porta» da Europa para a Rússia e para outros países. Estes dois países estão preocupados e esperam da União Europeia uma política de defesa e segurança que proteja estas fronteiras que, sendo deles, são, hoje, as nossas, em particular no que diz respeito aos conflitos «congelados» na região do Mar Negro.
Mas estes mesmos países também estão especialmente preocupados com a sua excessiva dependência da Rússia no domínio das energias. Por isso, viram-se para nós, União Europeia, para energias renováveis, por forma a alterarem a sua situação actual.
A Comissão Europeia tem de conseguir alcançar os objectivos de prosperidade, crescimento, emprego, bem necessários nesta hora de globalização em que somos confrontados com a Índia, a China e outros países que, para além dos respectivos produtos, têm também um fortíssimo nível de conhecimento intelectual e tecnológico.
Para além disso, a Europa precisa de saber legislar melhor. Esta é uma intenção que também está plasmada na Estratégia Política da Comissão Europeia e que é absolutamente essencial.
A Europa precisa de legislar de forma mais simplificada e de enquadrar os cidadãos e as empresas comunitárias, reduzindo os custos da burocracia europeia. Não podemos deixar que as burocracias nacionais sejam substituídas pela burocracia europeia, porventura mais complexa e mais cara.
Por fim, a União precisa de melhorar a comunicação, precisa de comunicar com os cidadãos, do Atlântico ao Mediterrâneo, do Mar Báltico ao Mar Negro, em todas as áreas.
Alcançar os objectivos estratégicos só é possível se os mesmos forem assumidos como seus por todos e por cada um dos 27 Estados-membros e, dentro de cada um destes, por todos os cidadãos e actores sociais e económicos.
Os cidadãos não podem sentir-se excluídos. O tratado renovador (ou tratado de Lisboa) será a base que permitirá esta Estratégia, mas é importante que ninguém seja excluído e que, sobretudo, os cidadãos se sintam parte da «Europa das decisões». E isso faz-se pronunciando-se em referendo.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O presente Relatório referente à Estratégia Política Anual da Comissão Europeia para 2008, discutida no Parlamento Europeu no passado mês de Fevereiro, enquadra-se num período de grandes e decisivos desafios para a União Europeia.
A Comissão Europeia apresentou a sua Estratégia coerentemente com os objectivos definidos para o seu mandato, isto é, prosperidade, solidariedade, segurança e liberdade e o reforço do papel da Europa no mundo, na convicção de que eles permitirão responder ao desafio da globalização e preparar os europeus para o futuro.
Destacamos três prioridades transversais eleitas para o ano de 2008, que, de entre várias, consideramos importantes: a luta contra as alterações climáticas; a Estratégia de Lisboa renovada para o crescimento e o emprego; e as migrações.
Quanto à primeira, este Relatório inclui medidas para a criação de uma rede europeia de gás e de electricidade, medidas para promover a eficiência energética e a energia sustentável, a revisão do sistema de reservas petrolíferas da União Europeia para reforçar a solidariedade entre os Estados-membros no domínio energético, medidas para dar seguimento ao Plano Estratégico Europeu para as Tecnologias Energéticas e ainda disposições destinadas a fazer cumprir as regras da concorrência e do mercado interno no sector da energia.
Do mesmo modo, a Comissão Europeia compromete-se a diligenciar (o que nos parece positivo), a nível mundial, no sentido de reduzir as emissões de CO
2 para além de 2012, isto é, para além de Quioto.
No que diz respeito à Estratégia de Lisboa, a Comissão Europeia aponta-a como um programa destinado a promover a prosperidade, a qualificação ambiental, a inserção social, numa lógica coerente de parcerias entre os Estados-membros e no respeito pelas especificidades e pelo estádio de desenvolvimento de cada país. Esta separação é, aliás, essencial para tratar igual o que é igual e desigualmente aquilo que é desigual, tratando-se de um princípio do mais elementar direito.
Por isso, o ano de 2008 será o ano em que se verificarão os primeiros resultados da aplicação da Estratégia, no que diz respeito às políticas de coesão e de desenvolvimento rural.
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Finalmente, quanto à gestão dos fluxos migratórios para a União Europeia, a Comissão Europeia apresentará, segundo se propõe, duas propostas legislativas sobre a migração de mão-de-obra, que abordarão as condições de entrada e residência dos trabalhadores sazonais e dos estagiários remunerados no espaço da União Europeia. Trata-se de dois grupos muitas vezes esquecidos, quer pelos órgãos comunitários, quer, reconheça-se, pelos governos, quer pelos parlamentos nacionais, mas que, cada vez mais, até tendo em atenção e adaptando-se às novas formas laborais, ganham uma importância que, de forma alguma, podemos olvidar.
Por isso mesmo, parece-nos que estas duas medidas, a juntar a outras (das quais destacamos, por exemplo, a aplicação do chamado SIS II, a gestão externa das fronteiras da União Europeia e ainda a criação de uma base de dados centralizada de impressões digitais), são medidas essenciais, nesta área.
Desejamos, assim, que o ano de 2008 bem como a Presidência portuguesa constituam mais um momento de aprofundamento destas políticas (e de outras que, por falta de tempo, não referi), sendo nesse quadro que iremos trabalhar.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Quero deixar duas ou três notas apenas sobre a Estratégia Política Anual da Comissão Europeia para 2008.
É verdade que o programa da Comissão constitui um documento de continuidade, sem inovar, nem procurar encontrar novos caminhos ou políticas para responder aos desafios do desenvolvimento e da coesão económica e social.
É verdade também que, embora de forma implícita, o Relatório assinala este tom conformista com que a Comissão desenvolve o seu programa para 2008. Só que, em vez de procurar apontar soluções alternativas, o Relatório, a nosso ver, limita-se a atribuir as razões para este impasse à «falta de lideranças europeias» e à «não aprovação do (chamado) Tratado Constitucional».
Não podemos estar mais em desacordo com esta perspectiva.
Bastava, por exemplo, levar a sério os resultados de um recente inquérito realizado em Portugal para percebermos que à União Europeia não são precisos «dons sebastiões» para resolver os problemas que os cidadãos consideram prioritários. E, como é óbvio, avançar com políticas que satisfaçam as preocupações expressas sobre a coesão, o emprego e a educação não depende — em nada — de qualquer alteração que reforce os mecanismos de um directório de Estados que passará a decidir também em nome do nosso país.
Um segundo aspecto vale a pena assinalar: dos recursos financeiros afectos às prioridades políticas da Comissão só 4% — repito, só 4%! — se destinam à componente solidariedade, sendo que quase 50% visam as relações externas e cerca de 30% as questões de segurança. Só o enunciar expresso destes números mostra bem o não-valor que assumem as questões relativas à coesão e à solidariedade para a Comissão e o seu programa político.
Nenhuma das conclusões do Relatório aborda, de uma forma clara e frontal, este tema, que, quanto a nós, é essencial, como também deixam fundamentalmente de lado a questão dos recursos humanos e das contratações de novo pessoal para as instituições europeias. É porque, dos novos funcionários cuja contratação está prevista, e se descontarmos os 250 a integrar por força de novas adesões, serão quase 650 — repito, 650! — as novas contratações previstas para as instituições europeias. Numa altura em que, em Portugal, o despedimento de funcionários públicos está na ordem do dia pela mão deste Governo, verificamos que a burocracia, em Bruxelas, continua a crescer sem controlo e aparentemente sem objectivos ou retorno útil em políticas (porque se os tivesse até se justificava) ou serviços públicos e universais concretos (porque se assim fosse talvez se justificasse).
Protestos do Deputado do PS Armando França.
Ó Sr. Deputado Armando França, eu disse 250 funcionários a integrar em função do alargamento, além disso 650 novas contratações previstas para as instituições europeias. Foi isso que eu disse.
Tudo isto e outros aspectos nos afastam da estratégia política da Comissão e, igualmente, do fundamental das conclusões do relatório parlamentar. No entanto, não quero deixar de cumprimentar o Relator, Sr. Deputado Armando França, pela sua elaboração.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Luís Amado): — Sr. Presidente, Srs. Deputa-
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dos, uma primeira observação para louvar a possibilidade de o Parlamento, no âmbito da lei de acompanhamento do processo de construção europeia, passar a dedicar mais algum tempo da sua actividade ao acompanhamento destas questões.
Neste quadro, se insere a apreciação que é feita nos termos da lei do documento de estratégia anual da Comissão, neste caso o documento para 2008. É um bom princípio e é bom que o papel dos parlamentos nacionais seja reforçado nessa perspectiva de acompanhamento do trabalho da Comissão, como das outras instituições europeias, não apenas do Conselho mas também do Parlamento.
É preciso ter em consideração, desde logo, que este relatório não tem, ainda, em conta conclusões importantes quer do Conselho Europeu da Primavera quer do Conselho Europeu do passado fim-desemana — e há conclusões que vão ter alguma repercussão na preparação dos trabalhos da Comissão para 2008.
Assim, muito sucintamente, gostaria de salientar alguns aspectos que, do nosso ponto de vista, marcarão seguramente a agenda europeia durante 2008, independentemente dos trabalhos da Comissão, mas que o relatório da Comissão, desde logo, antecipa e prevê com particular ênfase.
Em primeiro lugar, acerca do trabalho de consolidação da União em matéria do alargamento, seja no âmbito da área Schengen seja no âmbito da área euro, são decisões importantes e algumas já foram tomadas. Em relação ao euro, no passado Conselho foi tomada a decisão de Malta e Chipre aderirem à zona euro a partir de 1 de Janeiro de 2008 e a Eslováquia a partir de 1 de Janeiro de 2009. Contribui-se, assim, também, por essa via, para o reforço do espaço de construção da união económica e monetária.
Também numa perspectiva muito cara aos cidadãos e muito directamente envolvendo os interesses dos cidadãos dos países respectivos, o alargamento da área Schengen a que Portugal tem dedicado particular atenção. Como é sabido, foi por iniciativa política do Governo português e com uma solução técnica encontrada por uma empresa portuguesa, que foi possível antecipar em três anos, no mínimo, a entrada em Schengen dos países do alargamento mais recente.
Não é demais valorizar esse papel que, oportunamente, foi assumido pelo Ministério da Administração Interna e que encontrou a solução adequada do ponto de vista técnico, também por iniciativa do Ministério da Administração Interna e com a colaboração de uma empresa portuguesa: o «SIS-one4all», antecipando as soluções técnicas inovadoras que o sistema de segunda geração projectará para 2009. Esse será também um contributo importante que daremos ao reforço e à coesão da participação dos cidadãos europeus no projecto europeu.
Um segundo aspecto que gostaria de sublinhar e que é muito evidente neste relatório prende-se com as regras de reexame do orçamento que a Comissão pretende discutir.
Parece-nos de todo em todo oportuno que este debate seja feito — nós próprios ao nível do Conselho, em inúmeras ocasiões, temo-nos deparado com situações de profundo desfasamento entre os objectivos e os princípios políticos que valorizamos das políticas e os recursos que lhes estão afectos. Não há uma coerência em alguns aspectos das políticas que vincule objectivos, prioridades e recursos financeiros.
Por isso, este trabalho de reexame do orçamento parece-me oportuno e penso que o Conselho deve estar disponível para o fazer. Recentemente no último Conselho, por sinal, esta questão foi reaberta e temos todo o interesse em acompanhar a Comissão neste debate durante os próximos meses, tendo em vista a elaboração do relatório para o próximo ano (2008).
Quanto à importância e ao destaque que são dados à Estratégia de Lisboa, não é absolutamente clara a observação do Deputado Honório Novo de que não há qualquer referência à problemática do emprego e às questões sociais, uma vez que a Estratégia de Lisboa passou conceptualmente a ser o «chapéu» onde as dimensões económica, ambiental e social são tratadas. Portanto, a visão integrada do desenvolvimento da Estratégia de Lisboa inclui necessariamente as componentes sociais que referiu.
Uma nota ainda sobre a importância dada à abordagem global das migrações. Como é sabido, essa é uma das preocupações que o Governo português tem afirmado permanentemente: a necessidade de não reduzir a política necessariamente convergente entre as políticas dos diferentes Estados para a União Europeia em matéria de migrações a uma dimensão puramente securitária. É preciso ter em consideração, sem dúvida, os aspectos integradores dessas políticas e os aspectos de relacionamento externo que a União tem de assumir para dar mais eficácia e coerência a essa acção política.
Por isso mesmo, e fazendo um reparo a propósito da intervenção que foi feita, há pouco, pelo Sr. Deputado do CDS, o programa de prioridades tem um capítulo muito significativo relativamente às questões das migrações.
Por último, em relação à área externa, este relatório não deixa de consagrar uma prioridade e uma preocupação muito particulares que a Comissão assumirá relativamente à questão do alargamento, quer na perspectiva do desenvolvimento da política europeia de vizinhança quer da estabilização dos Balcãs. Esta é uma das preocupações que vamos ter ao longo já do segundo semestre da Presidência portuguesa e, seguramente, mais ainda ao longo do ano de 2008, isto é, como desenvolver uma acção estratégica para a região dos Balcãs ocidentais, em que o quadro de expectativas de alargamento criado em toda a região tem de ser bem definido, no sentido de contribuir para a pacificação da região na sequência de decisões muito importantes que teremos de tomar nos próximos meses relativamente ao estatuto definitivo para o Kosovo.
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Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, estão assim concluídos os nossos trabalhos de hoje.
A próxima sessão plenária realizar-se-á amanhã, quinta-feira, às 15 horas. Haverá um período de antes da ordem do dia com declarações políticas e eventual tratamento de assuntos de interesse político relevante, a que se seguirá o período da ordem do dia, de que constará a apreciação das proposta de lei n.os 148/X — Aprova o regime jurídico das instituições de ensino superior e 140/X — Primeira alteração à Lei n.º 30/2002, de 20 de Dezembro, aprovando o Estatuto do Aluno do Ensino Básico e Secundário.
Serão ainda apreciadas as petições n.os 149/X (1.ª) — Apresentada pelo Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local, solicitando que a Assembleia da República adopte medidas no sentido de proceder à regulamentação das compensações pela prestação de trabalho em condições de risco, penosidade e insalubridade no âmbito do exercício de funções nos serviços e organismos da administração local, prevista no artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 53-A/98, de 11 de Março, e 204/X (2.ª) — Apresentada por António Manuel Soares Rodrigues e outros, sobre o pedido de alteração da delimitação entre os municípios de Vale de Cambra e de Oliveira de Azeméis, no lugar e Baralhas.
Haverá ainda votações às 18 horas.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 35 minutos.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Partido Socialista (PS):
António José Ceia da Silva
João Barroso Soares
Partido Social Democrata (PSD):
Carlos Jorge Martins Pereira
Emídio Guerreiro
Joaquim Virgílio Leite Almeida Costa
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Jorge José Varanda Pereira
José Eduardo Rego Mendes Martins
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Pedro Augusto Cunha Pinto
Sérgio André da Costa Vieira
Partido Comunista Português (PCP):
Francisco José de Almeida Lopes
Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:
Partido Socialista (PS):
António Ramos Preto
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Partido Social Democrata (PSD):
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
João Bosco Soares Mota Amaral
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
José António Freire Antunes
José Mendes Bota
Mário Patinha Antão
Partido Comunista Português (PCP):
Artur Jorge da Silva Machado
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Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Partido Socialista (PS):
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
José Eduardo Vera Cruz Jardim
Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Partido Social Democrata (PSD):
Domingos Duarte Lima
Fernando Mimoso Negrão
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Pereira da Costa
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Miguel Pais Antunes
Partido Popular (CDS-PP):
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro
DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL