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Sexta-feira, 21 de Dezembro de 2007 I Série — Número 29
X LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2007-2008)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 20 DE DEZEMBRO DE 2007
Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama
Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Fernando Santos Pereira
SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 10 minutos.
Deu-se conta do relatório da Comissão de Defesa Nacional informando da caducidade do processo relativo à apreciação parlamentar n.º 50/X na sequência da discussão e votação ocorrida na especialidade.
Procedeu-se a um debate de actualidade, requerido pelo Grupo Parlamentar do PSD, sobre o regime jurídico das regiões de turismo. Intervieram, a diverso título, além do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva), os Srs. Deputados Mendes Bota (PSD), Hortense Martins (PS), Luís Fazenda (BE), José Soeiro (PCP), Telmo Correia (CDS-PP), Francisco Madeira Lopes (Os Verdes) e Melchior Moreira (PSD). A Câmara procedeu ainda ao debate temático sobre a Europa e o Conselho Europeu e à discussão e análise do Relatório de Acompanhamento do Programa Legislativo e de Trabalho da Comissão Europeia para 2008. Após a apresentação do relatório da Comissão de Assuntos Europeus pela Sr.ª Deputada Relatora Ana Catarina Mendonça (PS), usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Luís Amado), os Srs. Deputados Paulo Portas (CDS-PP), João Semedo (BE), Honório Novo (PCP), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Pedro Santana Lopes (PSD), Diogo Feio (CDS-PP), Mário Santos David (PSD), Agostinho Lopes (PCP), Vitalino Canas (PS) e Luís Montenegro (PSD).
No encerramento do debate, proferiram intervenções os Srs. Deputados Heloísa Apolónia (Os Verdes), Luís Fazenda (BE), Honório Novo (PCP), Nuno Magalhães (CDS-PP), Luís Pais Antunes (PSD), Jacinto Serrão (PS) e, por último, o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 10 minutos.
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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 10 minutos.
Srs. Deputados presentes à sessão:
Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto Marques Antunes
Alberto de Sousa Martins
Alcídia Maria Cruz Sousa de Oliveira Lopes
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Cardoso Duarte da Rocha Almeida Pereira
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Ceia da Silva
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
David Martins
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Elísio da Costa Amorim
Esmeralda Fátima Quitério Salero Ramires
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Fernando Manuel de Jesus
Fernando dos Santos Cabral
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Hugo Miguel Guerreiro Nunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jacinto Serrão de Freitas
Jaime José Matos da Gama
Joana Fernanda Ferreira Lima
Joaquim Ventura Leite
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Jovita de Fátima Romano Ladeira
João Barroso Soares
João Carlos Vieira Gaspar
João Cândido da Rocha Bernardo
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
Júlio Francisco Miranda Calha
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
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Lúcio Maia Ferreira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro
Manuel José Mártires Rodrigues
Manuel Luís Gomes Vaz
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Marcos Sá Rodrigues
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Eugénia Simões Santana Alho
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Irene Marques Veloso
Maria Isabel Coelho Santos
Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Júlia Gomes Henriques Caré
Maria Manuel Fernandes Francisco Oliveira
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento Diniz
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Marisa da Conceição Correia Macedo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson Madeira Baltazar
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paula Cristina Nobre de Deus
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato Luís Pereira Leal
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rita Manuela Mascarenhas Falcão dos Santos Miguel
Rita Susana da Silva Guimarães Neves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino da Costa
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes
Teresa Maria Neto Venda
Umberto Pereira Pacheco
Vasco Seixas Duarte Franco
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Vítor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Pinheiro Pereira
Partido Social Democrata (PSD):
Abílio André Brandão de Almeida Teixeira
Adão José Fonseca Silva
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Agostinho Correia Branquinho
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Zita Barbas Marvão Alves Gomes
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Joaquim Almeida Henriques
António Paulo Martins Pereira Coelho
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Emídio Guerreiro
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Santos Pereira
Fernando dos Santos Antunes
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hugo José Teixeira Velosa
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Virgílio Leite Almeida Costa
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José António Freire Antunes
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel de Matos Correia
José Mendes Bota
José Pedro Correia de Aguiar Branco
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
José de Almeida Cesário
João Bosco Soares Mota Amaral
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Miguel Pais Antunes
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Mário Henrique de Almeida Santos David
Mário Patinha Antão
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Paulo Miguel da Silva Santos
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Miguel de Santana Lopes
Pedro Quartin Graça Simão José
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos
Ricardo Jorge Olímpio Martins
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha
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Partido Popular (CDS-PP):
Abel Lima Baptista
António Carlos Bívar Branco de Penha Monteiro
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
José Hélder do Amaral
José Paulo Ferreira Areia de Carvalho
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Paulo Sacadura Cabral Portas
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro
Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Batista Mestre Soeiro
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Bloco de Esquerda (BE):
Ana Isabel Drago Lobato
António Augusto Jordão Chora
Francisco Anacleto Louçã
Helena Maria Moura Pinto
José Borges de Araújo de Moura Soeiro
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Mariana Rosa Aiveca Ferreira
Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Deputado não inscrito em grupo parlamentar:
Maria Luísa Raimundo Mesquita
O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, antes de mais, peço à Sr.ª Secretária que dê conta do expediente.
A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, deu entrada na Mesa o relatório da Comissão de Defesa Nacional informando da caducidade do processo relativo à apreciação parlamentar n.º 50/X [Decreto-Lei n.º 295/2007, de 22 de Agosto (Define o estatuto dos dirigentes associativos das associações de militares das Forças Armadas)] (CDS-PP), na sequência das discussão e votação ocorridas na especialidade.
É tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, o primeiro ponto da ordem de trabalhos de hoje é um debate de actualidade requerido pelo Grupo Parlamentar do PSD, ao abrigo do artigo 72.º do Regimento, sobre o regime jurídico das regiões de turismo.
Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Bota.
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O Sr. Mendes Bota (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Há quase dois anos, quando apresentou o PRACE, o Governo queria instituir cinco juntas regionais de turismo. Depois, passaram a ser 10 agências regionais de turismo. Pelo meio, recuperou a figura das cinco regiões de turismo e, finalmente, acabou a aprovar 10 áreas regionais de turismo. Mas o resultado final é um gigantesco equívoco, uma fraude política e uma tremenda confusão de imprevisíveis consequências.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Mendes Bota (PSD): — Ao anunciar a redução do número de entidades regionais de turismo de 19 para cinco, o Governo abusou da paciência e da inteligência dos portugueses, porque, de facto, criou 10 áreas e entidades regionais de turismo, todas com idêntico estatuto de autonomia administrativa, financeira e patrimonial, a que se podem acrescentar os estatutos especiais das Associações de Turismo de Lisboa e do Porto. Ou seja, são «10+2»!! Ao fim de tanto tempo de espera, o Governo não teve coragem de resistir ao corporativismo interno do partido que o suporta, colocando o protagonismo e a manutenção de pequenos feudos turísticos acima de uma estruturação racional do sector turístico.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Mendes Bota (PSD): — Ao invés dos objectivos a que se propôs, este mapa irá agravar a descontinuidade territorial até agora existente.
Pelas reacções que já se fizeram sentir, designadamente da Associação Nacional de Municípios Portugueses, muitos municípios não aceitarão integrar este modelo. O Centro vê-se extirpado do pólo de desenvolvimento turístico da Serra da Estrela, o Alentejo é amputado do Alqueva e do Litoral Alentejano, Lisboa não terá o Oeste de volta e o Norte ficará sem o Plano Director de Turismo do Douro.
Veremos, assim: os municípios de Aljezur e Vila do Bispo a deixar de integrar o Algarve, porque fazem parte do Litoral Alentejano; Penamacor a sair do Centro para integrar a Serra da Estrela; Baião e Resende a sair do Norte para fazer parte do Douro.
Como é possível que a referência territorial da divisão regional agora aprovada seja o Decreto-Lei n.º 46/89 já bastante alterado, aprovado numa altura em que ainda nem sequer existiam os municípios de Odivelas, da Trofa ou de Vizela? E onde arrumar os municípios que mudaram da NUTS II, na sequência da aprovação do Decreto-Lei n.º 204/2002?!… Maior confusão seria difícil de imaginar!! Recorde-se que, há nove anos, foi precisamente um mapa errado que «tramou» a regionalização. Hoje, nove anos depois, em matéria de regionalização turística, o erro repete-se, pelas mesmas más razões, e o responsável político é o mesmo: um Governo do Partido Socialista!
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Mendes Bota (PSD): — O espírito e a letra de todo o projecto de decreto-lei é altamente centralizador, colocando todas estas novas estruturas na mais absoluta dependência do Turismo de Portugal, IP e dos protocolos ou parcerias que este estiver disposto a conceder. O n.º 1 do artigo 4.º é claro ao definir que a missão das áreas regionais de turismo (ART’s) se insere «no quadro das orientações e directrizes da política de turismo definida pelo Governo». Isto é a governamentalização absoluta das ART, transformadas em meras direcções regionais do Ministério da Economia, chegando-se ao ponto de ser o Governo a designar o nome e o local da sede de cada uma delas…!
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Mendes Bota (PSD): — Ao invés de aumentar as atribuições e competências das actuais regiões de turismo, o Governo reduziu-as drasticamente a um mero papel de «colaboração», de «estudo», de «monitorização» e de «dinamização». O que lhes sobra é a «contratualização», mas… com quem?! Com o Turismo de Portugal, IP!! Como é possível que não exista uma única palavra sobre promoção turística ou sobre a articulação com as estruturas da promoção turística interna ou externa? O financiamento das ART, na prática, fica totalmente dependente da boa vontade operacional e orçamental do Governo. Serão entidades «eunucas», totalmente impotentes para gerar vida própria, transformadas em meras extensões do Turismo de Portugal, IP. E — pasme-se! —, ao invés de redistribuir pelas restantes ART cumpridoras dos objectivos orçamentados os montantes não utilizados por uma qualquer ART não cumpridora, o Governo propõe-se «abarbatá-los» para o Turismo de Portugal, IP, qual «glutão» insaciável!… Os municípios são autenticamente humilhados. Desde logo, a sua adesão às novas ART faz-se sob
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coacção: quem não entrar fica excluído do acesso aos fundos nacionais para a área do turismo! É um mau princípio e um mau começo! Depois, não ficou garantida nas assembleias gerais a paridade entre os municípios e os representantes do poder central e do sector privado — é um recuo em matéria de descentralização! Ao extinguir entidades que emanaram da vontade e do associativismo do poder local, à revelia da Assembleia da República, é muito possível que este decreto-lei esteja ferido de inconstitucionalidade, pelo que iremos apurar esta questão junto do Tribunal Constitucional.
Ao ter legislado sobre um texto substancialmente diferente daquele que foi remetido a parecer da Associação Nacional de Municípios Portugueses, da Associação Nacional de Regiões de Turismo (ANRET) ou da Confederação do Turismo Português (CTP), o Governo cometeu uma ilegalidade, pois só de má-fé se pode considerar ter cumprido a obrigação legal de obtenção do parecer daquelas entidades.
Este decreto-lei, tal como os anteriores projectos de decreto-lei que foram sendo conhecidos, padece de falta de rigor técnico-jurídico, sendo demasiado evidentes os «enxertos» de que foi sucessivamente alvo, provavelmente até ao último momento.
Resumindo e concluindo: o Governo teve todo o tempo do mundo para preparar uma solução consensual alargada — um ano e meio é «uma eternidade» no contexto de uma legislatura!… E fê-lo num secretismo injustificado; dialogou pouco e dialogou mal! Enganou os parceiros sociais e o grande público. O resultado é tecnicamente mau. Teve uma solução consensualmente alargada na mão e deixou-a fugir no último momento, privilegiando interesses particulares em detrimento do interesse nacional. Foi uma grande oportunidade perdida, de consequências desastrosas para o sector turístico em Portugal.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, gostaria de saber se há pedidos de esclarecimentos relativamente à intervenção do Sr. Deputado Mendes Bota.
Pausa.
Uma vez que não há, passamos ao debate, para o qual estão inscritos os Srs. Deputados Hortense Martins e Melchior Moreira.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Hortense Martins.
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo aprovou recentemente, em Conselho de Ministros, um diploma que prossegue as importantes reformas que estão a ser feitas na organização do Turismo em Portugal. Trata-se da aprovação do regime jurídico das áreas regionais de turismo, que reorganiza em 5 áreas regionais o turismo nacional.
Como se sabe, ao fim de longos anos e de muitas tentativas que nunca passaram de intenções, vemos agora que se avança na organização territorial, de acordo com o estipulado no PRACE e se procede à criação das entidades gestoras dos cinco pólos de desenvolvimento turísticos definidos no Plano Estratégico Nacional do Turismo (PENT).
Avança-se numa importante e decisiva reforma do sector turístico, nomeadamente na organização das entidades públicas regionais, e passa-se das actuais 19 regiões de turismo mais oito juntas, a que se acrescentam as zonas turísticas, para apenas cinco áreas regionais de turismo e cinco pólos definidos de acordo com o PENT.
Como se sabe, não era possível manter a actual situação de um País pulverizado de regiões de turismo e simultaneamente de um País que se demitia e fingia ignorar disparidades inexplicáveis, uma vez que permaneciam áreas do nosso território que nem sequer estavam abrangidas por qualquer região.
Tudo isto representava desperdício de recursos em estruturas que, por mais esforços que fizessem, não conseguiam, na sua maioria, ter massa crítica para desenvolver acções promocionais eficazes e eficientes.
Aplausos do PS.
O turismo não se compadece nem com «capelas», nem com «capelinhas», nem com delimitações territoriais!! É a lógica do produto que determina uma promoção eficaz, mas também tem de ter por base uma organização territorial lógica que favoreça o trabalho dos agentes económicos do sector.
E, Sr.as e Srs. Deputados, não podemos desejar que tudo seja deixado ao livre arbítrio da livre iniciativa associativa, pois já sabemos os resultados que isso tem produzido ao longo deste tempo.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Isso é centralismo!
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Existem vários concelhos, como Guimarães, Fundão, Ródão, Castelo Branco e Idanha… E, já agora, Sr. Deputado Mendes Bota, Penamacor está ainda dentro da região de turismo da Serra da Estrela!…
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Vozes do PS: — Bem lembrado!
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Desta forma, dá-se continuidade a várias alterações que estão já a produzir resultados. Pela primeira vez elaborou-se um plano a 15 anos! O PENT foi considerado um instrumento que todos reconhecem como útil e necessário, pois espelha as políticas públicas para os próximos anos e, desta forma, os agentes económicos podem melhor nortear a sua actividade. Define objectivos concretos, algo que, no passado, tínhamos dificuldades em descortinar. Relembramos o objectivo de pôr o turismo a representar 15% da riqueza nacional e 15% do emprego em 2015.
Aplausos do PS.
Ao nível europeu, representa 12% dos empregos e contribui com 10% para o PIB da União. O turismo ficou de forma expressa no Tratado de Lisboa.
Trata-se, portanto, de um sector estratégico que, neste momento, é tratado efectivamente como tal, face a um passado em que não se passava de meras palavras, não obstante até ter chegado a ter um Ministério.
Procedeu-se à reorganização das estruturas do Estado a nível do turismo, com a criação do Turismo de Portugal.
Foram feitas várias alterações ao nível do licenciamento, simplificando e responsabilizando os promotores, e o Orçamento do Estado deu incentivos ao turismo residencial.
A Lei dos Empreendimentos Turísticos está a ser revista, finalmente! Aliás, após muitas promessas de governos passados, nesta matéria, esta revisão só irá acontecer agora, uma década após terem-se iniciado as primeiras discussões. Esta já foi apelidada como a mais importante reforma legislativa do sector, e é-o efectivamente, porque vai de encontro às necessidades de desenvolvimento turístico, numa linha de desburocratização e simplificação que saudamos. Ainda hoje, associações como a Confederação do Turismo Português e a Associação de Hotéis de Portugal teceram elogios a esta reforma.
Vozes do PS: — Muito bem!
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Por tudo isto, podemos dizer que o turismo está no bom caminho — aliás, como denotam os números do sector para Portugal: as dormidas crescem mais 5,4%, os hóspedes crescem 7,4% e o tráfego aéreo regista um crescimento de cerca de 9%. Isto são resultados, Sr.as e Srs. Deputados!
Aplausos do PS.
As receitas totais crescem 11,3% e este foi um dos objectivos que se estipulou «crescer em número, mas também em receitas», para que este fosse um crescimento saudável. Portanto, assume particular relevância este crescimento de mais de 11%. E, quando verificamos os resultados regionais, vemos que todas as regiões apresentam crescimento de dormidas significativo neste período, e em termos homólogos: o Alentejo cresce 15,4%, o Norte 9,6%, o Centro 7,7%, Lisboa 6,0% e o Algarve 3,4%!!
Protestos do Deputado do PSD Mendes Bota.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Isso nada tem a ver!
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Já lá vamos, Sr. Deputado Mendes Bota.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, agradeço-lhe que conclua.
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Concluindo, Sr. Presidente, podemos verificar que, à direita, temos um vazio de propostas sobre este assunto — embora o PSD já tenha reconhecido o modelo das cinco áreas regionais —, à esquerda, o PCP propõe-se deixar tudo mais ou menos na mesma, mantendo a dependência total do Orçamento do Estado, além da completa desvalorização da obtenção de resultados.
Vozes do PS: — Bem lembrado!
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Esta reforma feita pelo Governo garante a cobertura de todo o território nacional, assegurando-se que estas estruturas regionais ainda têm competências e capacidades.
O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr.ª Deputada.
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A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Concluo já, Sr. Presidente, dizendo que, quanto às verbas, elas serão transferidas do Orçamento do Estado e serão estabelecidos critérios monotorizados pelo turismo.
Por tudo isto, Sr.as e Srs. Deputados, este é um momento muito importante para o turismo português, que é uma actividade económica de futuro e que, sem dúvida, terá cada vez maior peso no desenvolvimento sustentado de Portugal.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, na minha modesta opinião, este debate de actualidade é um absurdo.
É um absurdo, em primeiro lugar, porque esquece o tema principal no sector do turismo em Portugal que é o seu crescimento,…
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sabe porquê, Sr. Ministro?
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — É mérito do Sr. Ministro Santos Silva!
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — … é um momento único que o turismo português vive, com o crescimento das receitas, em 2007, acima dos 11% e com boas perspectivas de desenvolvimento para o sector! Em segundo lugar, é um absurdo porque se cita aqui um texto que os grupos parlamentares não podem conhecer: o texto aprovado em Conselho de Ministros, no passado dia 12 de Dezembro, e que está sujeito legalmente aos deveres de reserva, visto que está agora em processo de redacção final e envio para promulgação.
Discutamos, portanto, aquilo que pode ser discutido, que são os traços gerais da reforma relativa às regiões de turismo, às entidades gestoras das regiões de turismo, das áreas regionais de turismo, tal como foi apresentada publicamente e que configura a decisão estratégica fundamental do Governo.
Primeiro, é uma reforma necessária, há muito tempo adiada. Também aí se verifica uma importante diferença entre este Governo e os governos que o antecederam: nós não precisamos de ir para o show-off e de criar, até, ministérios do turismo…! Preferimos concretizar as coisas, realizar uma reforma que era urgente e que ninguém, antes de nós, tinha realizado!
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Então, explique a reforma, Sr. Ministro!
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Isto porque as 19 regiões de turismo e as oito juntas de turismo que existiam, até esta reforma, manifestamente não servem os objectivos de racionalidade e de eficiência, necessários para a política pública do turismo.
Em segundo lugar, esta reforma compagina dois objectivos essenciais e que são inteiramente compatíveis: o primeiro, o objectivo desenhado no programa de reestruturação da administração central do Estado e que é o objectivo de definir as NUTS II como território de referência para a organização territorial da administração.
E, portanto, criam-se, assim, cinco áreas regionais de turismo cuja cartografia coincide com a das NUTS II, com a das regiões.
O segundo objectivo é o objectivo inscrito no Plano Estratégico Nacional do Turismo, aprovado pelo Governo no princípio deste ano, depois de um amplo processo de participação pública; é um plano que define cinco pólos de desenvolvimento turístico em Portugal, a saber: o Douro, a Serra da Estrela, o Oeste, o Alqueva e o Litoral Alentejano.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — É uma espécie de «5+5»!
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Nenhum destes objectivos foi contrariado; qualquer destes objectivos mereceu amplo consenso social e político, quer o objectivo de reorganização segundo as NUTS II quer o objectivo da criação de cinco novos pólos de desenvolvimento turístico em Portugal. E, portanto, seria um absurdo que aqueles que não contestam qualquer destes objectivos viessem a contestar o par que eles os dois formam.
Aplausos do PS.
Esta reforma garantirá a coerência e a flexibilidade porque a organização, o regime jurídico das regiões de turismo é instrumental para o objectivo essencial da política de turismo, que é o desenvolvimento deste sector essencial, em Portugal, que cresce, hoje, bem acima do crescimento dos restantes sectores da economia.
Termino com uma outra referência: o quadro geral, já conhecido, mostra que esta é uma reforma que
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descentraliza (por exemplo, termina a actual tutela governamental sobre as regiões de turismo); é uma reforma que melhora o nível de sustentabilidade das entidades gestoras, porque incentiva ao seu auto-financiamento, promove o envolvimento dos agentes privados e garante plena autonomia administrativa e financeira às entidades gestoras das áreas regionais.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — A Mesa regista vários pedidos de esclarecimentos, sendo o primeiro o do Sr. Deputado Luís Fazenda, a quem dou a palavra.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, ouvi-o aqui valorizar e sublinhar as cinco regiões, as NUTS II. Mas, na verdade, não é disso que se trata; essa era uma aproximação de pontos de vista que ia fazendo o seu caminho.
O que temos é «5+5+2» — até parece uma fórmula futebolística, mal adaptada; o que temos é que, para além das cinco regiões, há cinco «pólos de desenvolvimento» e mais dois, com as grandes áreas metropolitanas.
Na verdade, aquilo que era uma simplificação contribuiu para uma heterogeneidade e para uma multiplicação de mais do dobro das regiões para as respectivas marcas. Esta é que é a questão!! E isso parecia fazer o seu caminho até um determinado momento, era até a opinião do Ministério da Economia…! Foi algo que foi sempre consensualizado, não totalmente, mas parcialmente, nesse percurso e, depois, sofreu um golpe de teatro em Conselho de Ministros!! Do que nós precisávamos, hoje, era de tentar apurar e perceber aqui quais as motivações do Governo para ter alterado esse percurso em relação à fixação das regiões de turismo. Quais as razões? Por que é que todo esse mapa foi completamente reformulado? Segunda questão: por que é que as autarquias são, na realidade, totalmente afastadas deste processo e das suas competências futuras? Será que a miniaturização das regiões de turismo — que é o «mal» para o qual alerta o Governo — impediria a capacidade, a dinâmica económica, a promoção das regiões, os incentivos? Pelo contrário!! Nós cremos que a capacidade associativa e, em particular, o papel das autarquias locais ajudariam!! Na verdade, aquele «12.º jogador» que aparece é o Governo, centralizando… E há um outro critério que nos traz uma enorme apreensão: é o facto de os apoios financeiros a estabelecer terem em conta valores, como, por exemplo, o número de camas de cada região, etc., o que pode vir a prejudicar, inclusivamente, a fruição de áreas turísticas que são património mundial da Humanidade — o caso do Douro e por aí… —, se esse é um critério dogmático, se é um critério fixista, se é um critério principal naquilo que venham a ser as afectações às futuras regiões de turismo…! Portanto, há aqui algumas coisas a explicar, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: por que é que de cinco passamos a 12? Faz um discurso a falar das cinco regiões, das NUTS II, e o resultado não são as NUTS II, é outra coisa qualquer!?… Não explica por que é que o movimento associativo e as autarquias são liminarmente afastados e não explica quais os critérios de afectação de verbas que podem ajudar ao desenvolvimento turístico! Estarmos, hoje, aqui, a fazer a avaliação…
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, pode concluir.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — … da política de turismo do Governo, ou daquilo que possa ser o saldo económico do País, é manifestamente deslocado. Nós estamos a querer tratar num debate — não é num «não-debate» — um decreto a sair…, mas que não é um «não-decreto»…
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, para um pedido de esclarecimento são só dois minutos.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — … é a intenção política do Governo! Ora, é isso que nós esperamos: uma resposta cabal e completa!!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Soeiro.
O Sr. José Soeiro (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr. Secretário de Estado, vou fazer cinco perguntas precisas e concisas.
A primeira: é verdadeira ou falsa a afirmação da Associação Nacional de Municípios Portugueses e da Associação Nacional das Regiões de Turismo de que foram ouvidas sobre um projecto de decreto-lei diferente do que foi presente e aprovado em Conselho de Ministros? Segunda pergunta: é ou não verdade que a versão das cinco regiões de turismo, correspondendo às cinco NUTS II, mereceram a concordância das estruturas representativas do sector, da Associação Nacional de
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Municípios Portugueses, que a Associação Nacional das Regiões de Turismo (ANRET) apenas propôs que Lisboa e Porto fossem consideradas autonomamente e que a proposta das cinco regiões foi aprovada em reunião com o Secretário de Estado e levada a Conselho de Ministros? Terceira pergunta: é ou não verdade que o Governo anunciou ao sector e ao País que iria reduzir para cinco as actuais 19 regiões de turismo,…
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — São «5+5+2»!
O Sr. José Soeiro (PCP): — … de forma a dar-lhes coerência e dimensão e correspondência com as cinco NUTS II? Quarta pergunta: é ou não verdade que o artigo 3.º do anteprojecto do decreto-lei, aprovado em Conselho de Ministros, consagra 10 regiões de turismo, eufemisticamente chamadas, agora, de «entidades regionais de turismo»? Quinta e última pergunta: é ou não verdade que a região do Alentejo já estava organizada à escala de NUTS II? Sendo assim, como explica a sua divisão em três regiões e qual a coerência e correspondência com a organização do território?
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, agradeço as perguntas e responderei também sinteticamente.
Primeira questão:…
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — É verdadeira!
Risos do PSD.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — … um governo coloca a consulta um projecto, mas isso não significa que esse projecto seja a decisão final do governo, senão não haveria consulta.
Protestos do PCP.
Risos do PSD.
Em segundo lugar, a reorganização passa pela criação de cinco áreas regionais de turismo cujo mapa coincide com o mapa das NUTS II.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Mas isso já não é preciso pôr à consulta!?…
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Terceira resposta: os cinco pólos de desenvolvimento turístico identificados no PENT terão entidades gestoras próprias.
Os Srs. Deputados terão oportunidade de perceber, quando virem o decreto, como é que se compaginam uma e outra coisa: a organização das áreas regionais e as entidades gestoras desses pólos de desenvolvimento turístico, identificados no PENT.
A quarta resposta: ambas estas medidas têm amplo consenso receptor…
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Ai têm?!
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — … quer a seguir as NUTS II como critério de organização regional quer a valorizar cinco pólos de desenvolvimento turístico.
Quinta e última resposta: é absolutamente absurdo evocar aqui o exemplo das associações de turismo de Lisboa e do Porto — que podem contratualizar com o Governo para certos fins e para financiamento de certas actividades — e que em nada têm a ver com as áreas regionais, a não ser que Lisboa e Porto pertencem, uma, à área regional de Lisboa e Vale do Tejo e, outra, à área regional do Norte…!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, a palavra ao Sr. Deputado Telmo Correia.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Quero, em primeiro lugar, cumprimentar o Partido Social-Democrata por
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trazer este tema à discussão. É um tema importante, da maior relevância e raras vezes esta Câmara discute o turismo, que representa mais de 10% da economia portuguesa.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — É verdade!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Em segundo lugar, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, agora especialista na matéria —…
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Também…!
Risos do PSD.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … além de especialista em La Fontaine e Esopo, chegou agora ao turismo —, quero dizer-lhe que este processo e este diploma têm um erro de forma e de conteúdo.
Em relação à forma, o processo é lamentável e quebra aquilo que sempre foi a consensualidade que procurámos manter em relação ao sector do turismo. O Governo, em 12 de Dezembro, anunciou, peremptoriamente: «vão acabar as 19 regiões de turismo e vamos ter 5 regiões de turismo». O resultado final é o de que não temos 5 mas 12 regiões de turismo,…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exactamente!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … ou seja, o Governo não cumpriu a sua palavra.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Porquê?! É preciso é saber porquê!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — De caminho, não ouviu nem respeitou as regiões de turismo, ignorou a posição dos municípios, a quem deu outro documento a consultar, e, mais do que tudo isso, ignorou completamente e de forma inaceitável a nossa opinião, a opinião da Assembleia da República, onde até já estava iniciado um processo legislativo sobre esta matéria, por parte do Grupo Parlamentar do PCP.
Aplausos do CDS-PP.
Esta é a questão de forma! Em relação à questão do conteúdo, podemos apontar cinco erros fundamentais, a ser verdade existir o tal diploma secreto de que alguns têm conhecimento mas que o Sr. Ministro não quer revelar. A ser verdade, padece de cinco erros fundamentais, o primeiro dos quais é o de governamentalizar. É porque o exercício de competências passa a depender do Instituto de Turismo e só do Instituto de Turismo!!
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — É a total governamentalização!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Totalmente! Tudo depende do poder central! É até o poder central que vai dizer qual é a sede e o nome da futura região de turismo…!
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — É falso!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — O segundo erro é o de que procurou melhorar a tal versão inicial, procurou responder a reclamações, mas continua a não corresponder à realidade. Três exemplos concretos neste segundo erro: primeiro, que eu saiba, ninguém pediu uma região de turismo do Alqueva — é um bocadinho como o anúncio ao Porto Ferreira, não sabemos quem o pediu… —, mas o Alqueva passa a ser uma área regional de turismo.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Foi o Roquette que pediu!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — O Alqueva tem qualquer coisa como 25 522 dormidas por ano e Leiria/Fátima tem qualquer coisa como 1 165 203 dormidas por ano, mas Leiria/Fátima deixa de ser região de turismo!! Por que é que Alqueva é região e por que é que Leiria/Fátima deixa de ser região?!
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — A não ser por motivos religiosos, não compreendo! Segundo exemplo: o Alentejo, que teve um processo de aglutinação voluntária, coordenada e organizada
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— como aqui foi dito, e bem, pelo Sr. Deputado José Soeiro —, passa a ser dividido, desnecessariamente, de forma artificial, em três regiões.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — A única boa notícia para o Alentejo é a de que, no novo mapa, o Alentejo entrou pelo Algarve adentro e parte da costa algarvia passou a ser Alentejo. Esta é a única boa notícia para o Alentejo, não há mais uma!
Protestos do Ministro dos Assuntos Parlamentares.
Vamos ver se é ou não assim, quando o diploma aparecer, vamos ver!! Terceiro exemplo: o Minho, que devia ser agrupado entre as duas regiões existentes no Minho, também desaparece, o que, pura e simplesmente, não faz sentido! Por outro lado, o Governo não tem qualquer critério lógico nesta matéria. Podia ter um critério lógico, que era o das cinco regiões — era um critério discutível, mas era um critério! —, podia defender aquilo que tínhamos defendido, que era a livre associação ao nível das NUTS III e o agrupamento ao nível das NUTS II — era outro critério. O que é que os senhores fizeram? Foram fazendo critérios e «fatos» à medida dos interesses socialistas.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E de outros interesses!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Ou seja, começaram pelas cinco, depois, como tiveram protestos, arranjaram mais cinco para contentar os descontentes e, no fim, o Dr. António Costa e o turismo de Lisboa não podiam ficar de fora, pelo que arranjaram mais duas, que são as regiões de turismo de Lisboa e do Porto.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — É o «5+5+2»!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — É um «fato» completamente feito à medida, sem qualquer correspondência com a realidade.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Uma vergonha!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Outro erro fundamental: a ser como parece que é, os senhores defendem, como critério fundamental, as NUTS II e, segundo o diploma, são as NUTS II com base nos Decretos-Lei n.os 46/99 e 217/99. Ora, ou estou completamente equivocado,…
O Sr. Nuno Antão (PS): — Já é normal!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … e o Governo terá ocasião de me esclarecer, ou estes diplomas foram revogados pelo Decreto-Lei n.º 244/2002,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É verdade!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … ou seja, as NUTS já não são aquelas que o Governo apresenta neste mesmo diploma. E, se as NUTS já não são as mesmas, os senhores estão a legislar sobre um território que já não existe e onde existem até municípios que não existiam naquela altura, como, por exemplo, os de Odivelas e Vizela. Isto já não é um erro de gestão política, isto já não é só uma trapalhada, isto, se assim é, é uma demonstração de pura incompetência! É porque os senhores não podem incluir num diploma NUTS que não existem!! Por outro lado, os senhores extinguem entidades que têm criação municipal — e aqui suscita-se, de facto, uma questão de inconstitucionalidade —, como é o caso das juntas de turismo, deixando a Assembleia da República de fora dessa matéria. E aqui, sim, repito, coloca-se, seriamente, um problema de inconstitucionalidade.
Quero dizer que, em toda esta intenção, há um argumento válido que compreendemos, que é o da redução de custos e contenção. Nada nos garante que assim seja porque, como é evidente, o que muitos municípios vão fazer com esta lei é criar, precisamente, agências municipais de turismo, aumentando os custos e não diminuindo.
Mas, se querem reduzir custos, dou-vos um exemplo concreto: o Governo lançou recentemente a nova campanha de Portugal — não vamos discutir marketing, porque não somos especialistas —…
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O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Telmo Correia, tem de se auto-limitar voluntariamente!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Como estava a referir, o Governo lançou, recentemente, a nova campanha de Portugal como sendo a West Coast of Europe. Ora, se os senhores querem reduzir custos, por que é que esta publicidade, relativamente à qual todo o dinheiro gasto no mercado externo não chega e é insuficiente, está afixada pelas nossas cidades e, designadamente, por que é que temos cartazes espalhados pela cidade de Lisboa, gastando dinheiro daquele que deveria servir para a promoção externa?!
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Se é para conter custos, por que é que não contêm, efectivamente, os custos?! Não sei se o Ministro Manuel Pinho também é «West» e é por isso que está desaparecido, mas espero que haja apreciação parlamentar deste diploma e espero que o Ministro Manuel Pinho venha a esta Câmara debatê-lo e melhorá-lo, porque tem de ser melhorado!
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Soeiro.
O Sr. José Soeiro (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Tenho aqui um documento que foi a Conselho de Ministros, conforme aqui refere, no dia 11 de Dezembro de 2007,…
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sim! E então?!…
O Sr. José Soeiro (PCP): — … e o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares teve, enfim, a amabilidade de nos dizer uma coisa de que já desconfiávamos mas que, agora, foi confirmada. E o que é que o Sr. Ministro confirmou? Confirmou que, quando o Governo manda para esta Casa diplomas sobre os quais diz ter ouvido a Associação Nacional de Municípios ou qualquer outra entidade, isso é questionável.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Pois, é falso!
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — É questionável porquê?
O Sr. José Soeiro (PCP): — Por uma razão muito simples: o Sr. Ministro diz que o Governo manda um diploma à Associação Nacional de Municípios, ela pronuncia-se sobre o diploma mas depois o Governo arroga-se o direito de fazer outro diploma, que não esse, e não ouvir a Associação Nacional de Municípios sobre o último. Foi isto que o Sr. Ministro aqui disse!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Sr. José Soeiro (PCP): — Naturalmente, e talvez por isso, aquelas duas Associações vieram a público dizer que não podem confiar neste Governo, porque, quando são solicitadas a dar pareceres, não sabem sobre o que estão, de facto, a pronunciar-se.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Não se pode confiar neste Governo! Ninguém pode!
O Sr. José Soeiro (PCP): — Isto é grave, Sr. Ministro! É grave, sobretudo quando se trata de matéria que é da competência das autarquias. Os senhores estão, efectivamente, a querer governamentalizar comissões municipais de turismo, juntas de turismo, quando, na verdade, não têm competência para isso. Estão a violar a própria Constituição, Sr. Ministro, e o Sr. Ministro tem a obrigação de a conhecer!! O facto de o Governo ter uma maioria absoluta que vem aqui bater palmas não chega!! É preciso um bocadinho mais! É preciso ter razão, é preciso justificar e fundamentar bem aquilo que aqui nos traz!! E a proposta que aqui está…
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Qual?
O Sr. José Soeiro (PCP): — A proposta que temos na mesa é uma proposta em que o Governo, efectivamente,…
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Mas qual proposta?!
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O Sr. José Soeiro (PCP): — … mostra não ser sério politicamente quando anda a discutir cinco regiões com o sector, com o País, com as autarquias e nesta Casa e, depois, nos traz aqui uma farsa de «5+5+2», em face do artigo 3.º
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Tem de explicar porquê!
O Sr. José Soeiro (PCP): — Já lhe perguntei, Sr. Ministro: o que é que diz o artigo 3.º do projecto?! Diganos quais são as diferenças entre as cinco regiões das NUTS II e as cinco agora chamadas «áreas regionais de turismo», os chamados pólos do PENT?! Quais são as diferenças, em competências, em atribuições, em financiamento e em gestão? Zero, Sr. Ministro!! Zero, zero, zero!!
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Tem de ler o decreto-lei!
O Sr. José Soeiro (PCP): — É isto que temos de discutir aqui, porque este diploma está claramente virado…
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Qual diploma?!
O Sr. José Soeiro (PCP): — … para retirar às regiões de turismo o «lombo», o «lombinho» — o Litoral Alentejano, o Alqueva, o Oeste, o Douro, a Serra da Estrela…! E para quê, Sr. Ministro?! Para corresponder aos interesses dos PIN e dos PIN+,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Sr. José Soeiro (PCP): — … que o Sr. Ministro Manuel Pinho tem andado a anunciar por todo o País e que, na verdade, escondem muitos casos de verdadeiros negócios imobiliários…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Sr. José Soeiro (PCP): — … que nada têm a ver com o turismo. Esta é que é a realidade e é a isto que os senhores não querem responder! É por isso que não têm a ousadia nem a coragem de trazer a esta Casa uma proposta de lei que permita a intervenção dos diferentes grupos parlamentares na construção de uma verdadeira lei-quadro das regiões de turismo, que era aquilo que se pretendia, que financie não como disse aqui a Sr.ª Deputada Hortense Martins — e o projecto de lei do PCP é claro! — mas com 0,5% das receitas do turismo, que, num ano como este, representavam 35 milhões de euros para as regiões de turismo e não apenas 20 milhões, como o Orçamento do Estado consagra!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Sr. José Soeiro (PCP): — Portanto, isto depende do turismo, porque é para o turismo que as regiões de turismo trabalham.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Sr. José Soeiro (PCP): — O que está sobre a mesa é transformar as regiões de turismo em «paus mandados» do patrão tão poderoso Instituto do Turismo de Portugal, tão governamentalizado que quase é caso para perguntarmos: perante um Instituto de Turismo tão poderoso, para quê haver, então, mais alguém no Governo responsável por estas áreas?!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Sr. José Soeiro (PCP): — Não faz sentido, Sr. Ministro! E o Sr. Ministro é um bom «bombeiro» — nós reconhecemo-lo! —, mas este não é um problema de incêndios! É um problema de política de turismo, que nada tem a ver com indicadores de turismo mas, sim, com instituições, com respostas institucionais. E os senhores, nesta matéria, não estão a responder àquilo de que o sector do turismo e o País precisam!!
Aplausos do PCP e de alguns Deputados do PSD.
O Sr. Presidente: — Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.
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O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O debate de actualidade de hoje reveste-se da maior importância para o futuro do turismo no nosso país.
Reconhecidamente um dos sectores económicos mais importantes de Portugal, o turismo apresenta, ao mesmo tempo, virtualidades de desenvolvimento e criação de riqueza e de afirmação local e regional e riscos para o desenvolvimento ambientalmente sustentável, em harmonia com a natureza, respeitando o meio natural, os recursos naturais, os habitats e a qualidade de vida das populações.
Importa, por isso, encarar o sector do turismo como um sector em que as potencialidades são muitas, mas os perigos não são menos. Por isso, é fundamental que a aposta que se faz no turismo seja uma aposta de qualidade mas com sustentabilidade ambiental, económica e social.
Para tanto, Os Verdes não têm dúvidas de que é fundamental, antes de mais, que se respeitem os instrumentos de ordenamento territorial, que se respeitem os valores, recursos e património existentes no território e que se encontrem formas de o valorizar, sem o deixar degradar ou comprometer a curto, médio ou longo prazos.
Nesse processo, é inevitável reconhecer o papel que o poder local tem tido desde sempre e deve continuar a ter, balizado, naturalmente, por um quadro legal que imponha o respeito pela sustentabilidade do desenvolvimento, pelo direito das gerações futuras a usufruírem pelo menos da mesma riqueza e potencialidades de que as gerações actuais dispõem, sendo tarefa de todos assegurar que não se cometam erros nas opções de investimento que conduzam a perdas irreversíveis de habitats, de paisagens, de recursos hídricos, de solos e florestas e de biodiversidade, as quais comprometerão a qualidade de vida e a nossa sobrevivência futura, em nome de um lucro imediatista e de promessas, muitas vezes propositadamente inflacionadas, irrealistas e falaciosas, de criação de postos de trabalho, de aumento de riqueza e de combate à desertificação.
Porém, este Governo encetou, na área do turismo, um processo verdadeiramente desastroso e altamente preocupante a pretexto de querer acabar com entraves burocráticos, de querer reformar tudo e mais alguma coisa, de querer simplificar, de querer acelerar processos de licenciamento e aprovação de regimes de excepção.
Para colocar o ambiente a render, mesmo que esse rendimento leve à sua destruição, este Governo, não contente com a criação do regime dos PIN e PIN+, quer agora acabar com as actuais regiões de turismo e fazê-las substituir por um mapa absolutamente estranho a qualquer lógica de racionalidade regional, de ordenamento territorial ou de respeito pela realidade existente no terreno e pelas autarquias locais e estruturas actualmente existentes, com responsabilidades na promoção e desenvolvimento do turismo em cada região.
Após ter andado a vender ao País e aos parceiros do sector a ideia das cinco grandes regiões de turismo coincidentes com as actuais NUTS II, pedindo pareceres à Associação Nacional de Municípios Portugueses e à Associação Nacional das Regiões de Turismo, vem o Governo, depois, trocar-lhes as voltas, apresentando um modelo que, além dessas cinco áreas regionais de turismo, acrescenta ainda as dos pólos de desenvolvimento turístico do Plano Estratégico Nacional do Turismo, que — vejam bem a «coincidência»…! — incidem precisamente nas áreas onde vamos encontrar os PIN+, entre as quais o Alqueva, o Litoral Alentejano e a Serra da Estrela, criando, assim, como uma costureirinha de corte e costura, uma «manta de retalhos», ao gosto de certos e determinados fregueses, titulares de interesses económicos privados,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem! É tudo «à medida»!
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — … na mira do lucro fácil, da depredação do território e do ambiente e da especulação imobiliária.
Tudo isto é feito ao arrepio de quem tem tido, ao longo dos anos, a responsabilidade de promover o turismo nas suas regiões: os municípios, livre e voluntariamente associados, de forma autónoma, e agora reduzidos à indigna condição de instrumentos da vontade do poder central, em mais um ataque ao poder local, já aqui hoje designado como «capelas» e «capelinhas».
Não está em causa a necessidade de rever o regime actualmente em vigor, …
Protestos do Ministro dos Assuntos Parlamentares.
… reconhecendo que as diferentes regiões de turismo apresentavam resultados diferentes, umas com mais sucesso do que outras, para o que concorria, sem dúvida, a disparidade no financiamento e a pouca transparência nesta matéria, designadamente no que toca à distribuição do IVA do turismo. Mas esta reforma não se podia fazer assim, expropriando as regiões de turismo das atribuições e das competências, governamentalizando, centralizando e não descentralizando, sem resolver aparentemente a falta de transparência nos critérios do financiamento e fugindo à discussão na Assembleia da República através da utilização da forma de decreto-lei, que, aliás, levanta sérias dúvidas de constitucionalidade.
De resto, o Governo prossegue em toda esta matéria um caminho de ziguezagues, e não só na Assembleia
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da República, onde, nos últimos tempos, sempre que a questão é levantada, só sabe «atirar» com os números das estatísticas do crescimento do turismo, recusando-se a discutir em concreto esta questão. E mais uma vez o faz, Sr. Ministro, não querendo trazer, através de proposta de lei, a discussão deste diploma à Assembleia da República, para além dos ziguezagues que tem tido em termos da negociação com os parceiros e da falta em manter compromissos.
Disse o Governo, em 21 de Julho de 2006: «a reforma das regiões de turismo terá o modelo que resultar das recomendações do grupo de trabalho». Desse grupo de trabalho faziam parte os representantes das regiões de turismo e das associações nacionais de municípios. Ora, basta ver, Sr. Ministro, o que estes parceiros têm vindo a dizer nos últimos dias à comunicação social para se perceber que esses compromissos não foram respeitados pelo Governo.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Melchior Moreira.
O Sr. Melchior Moreira (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Antes de iniciar a minha intervenção queria registar dois factos, o silêncio e a incomodidade do Grupo Parlamentar do PS e do Governo em relação a esta matéria.
Vozes do PS: — Oh!…
O Sr. Melchior Moreira (PSD): — A Sr.ª Deputada do Partido Socialista veio aqui falar de tudo menos do diploma. E quando esperávamos ouvir o Sr. Secretário de Estado sobre esta matéria ouvimos falar o Sr.
Ministro dos Assuntos Parlamentares — registe-se.
Aplausos do PSD.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Todos conhecemos a importância que o turismo assume para o desenvolvimento económico do País e todos reconhecemos o contributo que as regiões de turismo têm dado, ao longo dos anos, para a promoção do turismo nacional. Infelizmente, também é de todos conhecido o atribulado, para não dizer atabalhoado, processo de reestruturação das regiões de turismo que o Governo do PS está a desenvolver.
Começou por fingir que discutia e que aceitava a participação activa dos seus parceiros naturais e acabou impondo um modelo centralista e governamentalizador. E é perante este cenário de total autismo por parte do Governo na gestão desta matéria e no seu relacionamento com o sector, com as autarquias e com esta Assembleia, que é aprovado, em Conselho de Ministros, o diploma que estabelece as novas áreas regionais de turismo, demonstrando, para além da falta de diálogo, uma total ausência de visão estratégica para o desenvolvimento e promoção das regiões de turismo de Portugal.
Numa primeira abordagem, julgou-se que a aprovação corresponderia ao comunicado do Conselho de Ministros, sendo cinco o número de regiões, de acordo com aquilo que tinha sido proposto e analisado em discussão pública. Porém, deparamo-nos com um diploma que prevê, para além das cinco áreas regionais de turismo, cinco pólos de turismo e ainda a possibilidade de contratualizar com outras duas áreas metropolitanas.
Este novo mapa representa uma cedência em toda a linha e é um recuo face à última versão do projecto de decreto-lei que foi levado a parecer da Associação Nacional dos Municípios Portugueses (ANMP), da Associação Nacional das Regiões de Turismo (ANRET) e da Confederação do Turismo Português (CTP). Se, por um lado, compreendemos e concordamos com a convergência das regiões de turismo com as NUTS II, por outro lado, desconhecemos os critérios do Governo para a escolha dos cinco pólos de turismo que, na prática, funcionarão como cinco regiões de turismo.
Neste sentido, o PSD gostaria de entender qual o critério que presidiu a esta escolha e a não outra. Porquê esse recuo?
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — O Governo não explicou!
O Sr. Melchior Moreira (PSD): — O Governo gosta muito de falar de criação de massa crítica. Mas onde está a massa crítica dos actuais pólos de desenvolvimento turístico? Em áreas, em camas ou em dormidas? Pode falar-se de potencial futuro mas não se pode falar de massa crítica!
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Muito bem!
O Sr. Melchior Moreira (PSD): — Não percebemos também qual é a intenção do Governo ao estipular, no artigo 5.º do diploma aprovado, que a designação de cada uma das entidades regionais de turismo, bem como a localização da respectiva sede, seja definida por despacho de membro do governo. Relembro que aquando
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da discussão pública da última versão da reforma das regiões de turismos, que instituía as cinco regiões, o Governo defendia que a sua localização e designação seriam fixadas pela própria região.
Além disso, não podemos esquecer-nos de que as regiões de turismo devem ter uma muito significativa participação de entidades públicas e privadas com interesse no desenvolvimento turístico da respectiva região.
Neste sentido, é muito grave que seja o Governo a fixar unilateralmente a designação das novas regiões de turismo sem que os municípios interessados possam sequer propor ou sugerir os nomes que melhor podem servir as respectivas regiões.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Um Governo que não ouve, nem quer ouvir, o sector nem o poder local e as populações através dele representadas demonstra não compreender o verdadeiro sentido da democracia.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Muito bem!
O Sr. Melchior Moreira (PSD): — Não aceita lições de ninguém, não ouve os autarcas nem os respectivos sectores e decide tudo sozinho, como se a realidade pudesse ser moldada a seu bel-prazer. Não entendemos, por isso, esta mudança súbita de posição por parte do Governo, deixando toda a gente surpreendida, mesmo os socialistas, a não ser que o objectivo seja o de governamentalizar o sector do turismo, como, de resto, tem sido hábito deste Executivo.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — É, é!
O Sr. Melchior Moreira (PSD): — Gostávamos ainda de ver esclarecida a eventual dispersão estatutária entre as associações regionais de turismo (ART) que o actual modelo vai criar. Poderão as ART ficar de fora das decisões sobre a qualificação e o ordenamento do território ou mesmo sobre os recursos humanos? Existe todo um universo de novas atribuições que deviam, desde já, ficar contempladas ao nível da informação turística, da auditoria, do licenciamento, do apoio ao investimento, da classificação turística, da estatística, da monitorização e até da comercialização da sinalética turística. E tudo isto, meus caros amigos, o Governo deixou no vazio ou passou ao lado.
A composição das comissões instaladoras é outro exemplo de indefinição. Quem é que define o «representante das entidades privadas»? Quais entidades? As associações empresariais de nível nacional ou regional? É o Governo quem as define? E como cumprir a obrigatoriedade mínima de cinco membros? Esta questão não é inocente nem de somenos, pois compete às comissões instaladoras a preparação dos projectos de estatutos. Vinque-se bem: às comissões instaladoras compete apenas preparar, e não aprovar, os estatutos. Estes são, por natureza, prévios à própria constituição das assembleias gerais e a sua aprovação compete ao Governo. Mais centralismo do que isto não seria possível.
O PSD considera um erro capital a extinção imediata das regiões de turismo, logo à data da publicação deste diploma. Este facto deveria ocorrer à data da tomada de posse dos novos órgãos eleitos das novas entidades criadas, para evitar vazios de actividade.
Por outro lado, entendemos que o sector privado deve aumentar a sua participação à custa da representação da administração central, o que também não acontece.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir.
O Sr. Melchior Moreira (PSD): — Concluo já, Sr. Presidente.
Verifica-se, assim, que o principal objectivo do Governo em agilizar e dinamizar o sector do turismo português não foi cumprido. Com a entrada em vigor do novo diploma, a burocracia e as dificuldades de concertação agravar-se-ão. O novo modelo da reforma irá criar uma sobreposição em determinadas áreas que consideramos o elemento estabilizador na promoção de cada uma delas, criando uma concorrência mútua pouco benéfica para ambos.
Por fim, e para que fique claro, o PSD defende a necessidade de uma verdadeira reforma para as regiões de turismo, valorizando o papel crucial que o sector desempenha na economia nacional, constituindo-se como um dos motores de desenvolvimento social, económico e ambiental, a nível regional e nacional.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: O Governo escuda-se, segundo as suas próprias palavras, no facto de o documento estar sob reserva do Conselho de Ministros para aqui discordar e não comentar as avaliações que as oposições fazem acerca desse decreto. É uma falsa questão, porquanto não impediria o debate político acerca das opções.
Ficámos sem saber a posição acerca dos critérios de financiamento às regiões de turismo, o que é que
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diferencia as entidades gestoras das regiões de turismo, essa «ourivesaria» complicada que deu à costa no Conselho de Ministros e que aqui ninguém entende. Ficámos todos sem perceber isto, e, portanto, aquilo que podemos interpretar é que, entendendo bem o que vai acontecer, tivemos aqui um diálogo de surdos, numa ocasião soberana para propor ao Governo, se assim é e atento o dever de esclarecimento à Câmara, o anuncio hoje, aqui, da vinda do Sr. Ministro Manuel Pinho ao Parlamento para apresentar o decreto e a proposta.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Não vem!
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Seria o saldo natural deste debate. E se o Governo o não fizer,…
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Isso é um sonho, o Ministro vir cá!
O Sr. Luís Fazenda (BE): — … na verdade, está a fugir ao debate, e tem muita coisa para esconder sobre este decreto-lei.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero deixar algumas brevíssimas notas finais neste debate.
Primeira, percebe-se cada vez mais por que o PSD quis fazer este debate caricato,…
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Não explicou!
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — … no qual critica um documento que não conhece, só assim se explicando o rol de erros que aqui desfilou: resulta do embaraço do PSD e do CDS-PP,…
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Do vosso embaraço!
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — … que não conseguiram pôr ordem num mapa de 19 regiões de turismo e oito juntas de turismo e agora levam a mal que, finalmente, alguém esteja a pôr ordem no sector.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Agora são 12!
O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Concluo já, Sr. Presidente. Estou certo de que V. Ex.ª terá comigo a mesma benevolência que teve com os grupos parlamentares.
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, tem mesmo de concluir.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Concluo de imediato, Sr. Presidente.
Segunda nota: ao contrário do que julga o PCP, o turismo, para o Governo, é uma área essencial para investimento e para emprego.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Não parece!
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Por isso queremos valorizar o turismo.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está concluído o debate de actualidade, requerido pelo PSD, sobre o regime jurídico das regiões de turismo.
Passamos ao segundo ponto da nossa ordem do dia, que consiste no debate temático sobre a Europa e o Conselho Europeu, com a discussão e análise do Relatório de Acompanhamento do Programa Legislativo e de Trabalho da Comissão Europeia para 2008.
Em relação a este ponto foi elaborado um relatório pela Comissão de Assuntos Europeus. A abertura do debate será feita pela sua apresentação.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Relatora Ana Catarina Mendonça. Se o entender, pode subir à tribuna, mas é sempre apreciação livre do orador a gradação do seu posicionamento.
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A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Sr. Presidente, prefiro falar da bancada. Estava apenas à espera que acalmasse o ruído.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Mendes Bota, já terminou a discussão sobre as regiões de turismo. Se pudesse contribuir para gerar um silêncio nessa zona seria magnífico.
Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A apresentação do Relatório sobre o Programa Legislativo e de Trabalho da Comissão Europeia para 2008 decorre dos instrumentos normativos, desde logo do protocolo sobre o papel dos parlamentos nacionais no Tratado de Amesterdão, da Constituição da República Portuguesa e, obviamente, da Lei n.º 43/2006, de 25 de Agosto, que confere à Assembleia da República poderes de acompanhamento no processo da construção da União Europeia. Decorre, aliás, deste último diploma a exigência de acompanhamento e apreciação, precisamente, do Programa Legislativo e de Trabalho da Comissão Europeia.
Com a apresentação deste Relatório, Sr. Presidente e Srs. Deputados, cumpre-se o desígnio de maior aproximação dos parlamentos nacionais ao processo de construção europeia e, por consequência, de maior aproximação aos nossos cidadãos.
É, pois, neste quadro normativo e neste contexto que queria destacar o papel da Comissão de Assuntos Europeus, desde logo, por ter remetido a todas as comissões parlamentares o Programa Legislativo e de Trabalho da Comissão Europeia para emissão de parecer das comissões sobre uma proposta que a própria Comissão de Assuntos Europeus apresenta em relação à distribuição das várias iniciativas legislativas e não legislativas da Comissão Europeia e, também, sobre as propostas consideradas prioritárias pela Comissão Europeia, obviamente para entendimento das prioridades das comissões especializadas do Parlamento.
A este propósito, Sr. Presidente, queria salientar que, neste procedimento, das doze comissões especializadas às quais foram pedidos pareceres, nove pronunciaram-se. Há, aliás, um aumento significativo do empenho das comissões especializadas, um trabalho mais profícuo e de maior qualidade do nosso Parlamento nesta matéria, isto é, no acompanhamento das iniciativas, quer legislativas quer não legislativas, da Comissão Europeia, o que revela uma forte participação.
Da análise dos pareceres e das iniciativas estratégicas consideradas globalmente pelas várias comissões, devem destacar-se como prioridades as seguintes: o pacote migração, a Estratégia de Lisboa, o pacote Legislar Melhor, a Estratégia Comum União Europeia-África, o multilinguismo como um desafio da sociedade europeia, o pacote transportes verdes e energia.
Como iniciativas prioritárias que as comissões parlamentares se propõem acompanhar e escrutinar ao longo do ano de 2008, destaco apenas algumas, pois as mesmas podem ser lidas, no seu conjunto, nas páginas 8 a 12 do Relatório que apresentei a este Parlamento: a estratégia plurianual para o estabelecimento de um espaço de liberdade, segurança e justiça; o livro verde sobre migração e ensino; o reforço dos Estadosmembros em matéria de dádiva e transplante de órgãos a ocorrer com uma directiva; a proposta legislativa sobre o reforço da Eurojust; a comunicação sobre a União Europeia, África e China: rumo ao diálogo e à cooperação trilateral sobre a paz, a estabilidade e o desenvolvimento sustentável em África;… Sr. Presidente, bem sei que o tema pode ser exaustivo, mas é impossível intervir com tanto ruído no Plenário. Peço desculpa, mas não consigo! Lamento.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, verdadeiros Deputados são aqueles que avançam rompendo esse ruído de fundo. E acabam sempre tendo êxito oratório!
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Tem razão, Sr. Presidente. Talvez não seja verdadeira Deputada, mas tento! Continuando o rol das prioridades estratégicas de acompanhamento e de escrutínio definido pelas comissões parlamentares, destaco ainda: o pacote dos transportes marítimos; a revisão orçamental; o livro verde sobre a coesão territorial europeia; o plano de acção para um consumo e uma produção sustentáveis; a proposta sobre a revisão da política agrícola comum; a recomendação da Comissão sobre a inclusão activa; a comunicação da Comissão sobre o compromisso renovado em relação à justiça social na Europa e, por fim, a proposta de directiva relativa às condições de entrada e residência de trabalhadores sazonais.
Estas as prioridades que o Parlamento português destacou.
A Comissão de Assuntos Europeus promoveu igualmente uma audição pública sobre o Programa Legislativo agora em análise, cujas conclusões não podem ser todas enunciadas neste Plenário, evidentemente. Destaco, por isso, de entre todas elas, a necessidade de continuarmos a aprofundar a metodologia de trabalho de articulação entre Assembleia da República, Governo, Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas e Comissão Europeia. A Assembleia da República tem obtido uma boa resposta quanto à emissão de todos estes pareceres.
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Apresentaram-se então, nessa audição, propostas constantes do Programa Legislativo e do Trabalho da Comissão Europeia para 2008, apresentado em Outubro passado. E da articulação com o escrito e exposto neste Relatório, neste programa de trabalho, e a própria audição, queria destacar que a Comissão Europeia traça, como objectivos estratégicos para 2008, a prosperidade, solidariedade, segurança e liberdade e o reforço do papel da Europa no mundo.
Para concretizar estes objectivos, a Comissão Europeia entende como suas prioridades: a luta contra as alterações climáticas; a promoção da energia sustentável, segura e competitiva; a prossecução da Estratégia de Lisboa renovada para o crescimento e o emprego; a gestão dos fluxos migratórios para a Europa; a revisão da política agrícola comum e a política europeia de vizinhança.
O ano de 2008, Sr. Presidente e Srs. Deputados, será ainda marcado pela ratificação do Tratado de Lisboa; pela adesão ao euro de Malta e Chipre já a 1 de Janeiro; pela concretização das medidas promovidas pela Estratégia de Lisboa, designadamente a energia sustentável, as alterações climáticas e os objectivos ambientais; pela concretização do Programa de Haia para a criação do Espaço de Liberdade, Segurança e Justiça da União Europeia a 27 e, ainda, pela consolidação de uma nova geração de programas financeiros.
A tudo isto acrescem, como áreas estratégicas, uma administração mais moderna, eficaz, responsável e transparente, o desenvolvimento de uma sociedade de conhecimento, a revisão do mercado único, a análise da realidade social, designadamente nas suas tendências sociodemográficas, o acesso dos cidadãos aos direitos e às oportunidades e, por último, o instrumento de controlo da qualidade das iniciativas legislativas e não legislativas pelo Parlamento.
O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Termino já, Sr. Presidente.
A ideia subjacente no Programa Legislativo e de Trabalho da Comissão Europeia é a de trabalhar para servir os europeus, os seus cidadãos.
Sr. Presidente, termino, com a seguinte nota: o novo Tratado de Lisboa reforça o papel dos parlamentos nacionais e o Parlamento português não pode demitir-se desse papel, tendo, aliás, já desenvolvido, nesta matéria, um trabalho de qualidade que deve ser ressaltado neste debate.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Luís Amado): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: É com particular satisfação que compareço hoje, na Assembleia da República, para participar neste debate que marca o final da Presidência portuguesa.
Satisfação, naturalmente, pelo facto de ter a convicção de que o prestígio de Portugal sai fortalecido deste exercício; satisfação porque, ao longo destes seis meses, demos passos significativos num conjunto de áreas importantes que resultaram no efectivo fortalecimento do projecto europeu, desde logo ao conseguirmos pôr um ponto final no impasse institucional que se vinha arrastando há vários anos.
Agora, munidos do sólido mandato alcançado sob a Presidência alemã, realizámos, em apenas três meses, uma Conferência Intergovernamental que culminou na adopção de um novo tratado, o Tratado de Lisboa, assinado nos Jerónimos no passado dia 13.
Por outro lado, concretizámos o alargamento do Espaço Schengen, realização que só foi possível graças à proposta portuguesa, conhecida por «SISone4all». Esta solução viabilizou a integração dos novos Estadosmembros no actual Sistema de Informação Schengen dentro do prazo inicialmente previsto.
Consolidámos, assim, a livre circulação de pessoas, uma das pedras basilares do projecto Europeu e, amanhã mesmo, o Primeiro-Ministro, acompanhado de alguns ministros, estará nas fronteiras deste novo espaço de livre circulação alargado que consolidámos.
Demos um novo alento à Estratégia de Lisboa, contribuindo, em estreita articulação com a futura Presidência eslovena, para a preparação de um novo ciclo dessa estratégia, confirmando-se que a Agenda de Lisboa continua a ser o enquadramento adequado para a resposta da Europa aos seus desafios.
Em todas as áreas sectoriais conseguimos concretizar avanços, contribuindo ora com pequenos, ora com grandes passos.
Destacaria, desde logo, a adopção de uma decisão integrada sobre o Programa Galileu, que inclui o seu financiamento, governação e contratação pública. Também obtivemos um acordo para a criação de um instituto europeu de inovação e tecnologia, conduzimos o debate em torno dos princípios comuns da flexissegurança e, na área das telecomunicações da Sociedade de Informação, após 20 anos de negociações complexas, a Presidência portuguesa alcançou um acordo sobre a directiva de serviços postais que permitirá uma liberalização total dos serviços postais da União, a partir de 31 de Dezembro de 2010.
No ambiente, destacaria o contributo da União Europeia para a Conferência de Bali e o lançamento das bases para uma política marítima europeia integrada.
Ontem mesmo, em matéria de agricultura, conseguimos ainda acordar a reforma do sector do vinho,
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essencial para um sector confrontado com a redução de consumo e com a concorrência. Na mesma área, alcançaram-se acordos políticos sobre a reestruturação do sector do açúcar e a alteração do quadro legal para o financiamento da política agrícola comum.
Reforçámos o Espaço de Liberdade, Segurança e Justiça, muito em particular nas áreas das migrações, onde era evidente a necessidade de actuação, pondo o enfoque na convergência entre migrações e desenvolvimento e estimulando o debate sobre a imigração legal.
Proclamámos em Estrasburgo, a 12 de Dezembro, a Carta dos Direitos Fundamentais e acordámos na instauração de um Dia Europeu contra a Pena de Morte, a celebrar em 10 de Outubro. Em Nova Iorque, na 3.ª Comissão da Assembleia Geral das Nações Unidas, co-patrocinámos e empenhámo-nos, em nome da União Europeia, na aprovação de uma resolução sobre uma moratória contra a pena de morte. A votação desta resolução representa, justamente e a todos os títulos, um marco num esforço colectivo e cada vez mais universal para pôr termo à pena capital.
No capítulo do alargamento, mantivemo-nos fiéis aos nossos compromissos, dando continuidade e fazendo avançar os processos de negociação de adesão da Croácia e da Turquia à União Europeia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Temos a convicção de ter contribuído para que a Europa tenha adquirido, ao longo do último semestre, uma maior confiança para assumir as suas responsabilidades no quadro institucional. Como tive aqui ocasião de frisar, a pressão para a resolução da questão institucional provinha não apenas da própria União mas resultava também da expectativa com que a comunidade internacional aguardava um maior compromisso da Europa na resolução de situações de tensão e conflito, como aquelas que enfrentamos.
Num tempo em que os Estados se vêem confrontados com os limites das suas capacidades individuais de acção, a União Europeia e os seus mecanismos colectivos, agora substancialmente reforçados pelo Tratado de Lisboa, emergem com clareza como resposta às novas dinâmicas do sistema internacional.
Foi nossa preocupação valorizar o potencial europeu, aproveitando os recursos à disposição da União nas mais diversas áreas, lançando um debate, que começa a dar frutos, sobre a identificação dos interesses comuns europeus enquanto base e fundamento de uma política externa para a União, política externa essa que, não se substituindo às políticas externas nacionais, saiba reflectir os pontos de convergência e de encontro de todos os Estados-membros.
Uma tal abordagem vem permitindo uma melhor coordenação da nossa acção ao nível global no tratamento das temáticas próprias da agenda da globalização — das alterações climáticas à segurança energética, da defesa dos direitos humanos às questões do multilateralismo e das questões da segurança às questões do desarmamento ou da não proliferação. Permite ainda a definição, num novo patamar de integração, da visão europeia do relacionamento transatlântico, da situação nos Balcãs Ocidentais e das suas perspectivas de futuro, da estabilização das relações com o mundo árabe e da singular importância do espaço partilhado do Mediterrâneo, do aprofundamento dos laços com África e, de um modo mais geral, com as demais regiões do mundo.
Este contributo da Presidência portuguesa, como disse, reforçado pelo Tratado de Lisboa, serviu de matriz para a nossa acção no plano concreto. Desde logo, nos Balcãs Ocidentais, a União assumiu o protagonismo que lhe cabia e desempenhou um papel de liderança para reforçar a estabilidade na região. Transmiti pessoalmente essa mensagem a todos os governos e a todos assegurei que o futuro dos Balcãs Ocidentais está na União Europeia.
Nessa perspectiva e em colaboração com a Comissão, conseguimos estreitar mais os laços com toda a região, assinando acordos de associação e de cooperação com o Montenegro, com a Bósnia Herzegovina e com a Sérvia; empenhámo-nos no acompanhamento do processo negocial sobre o futuro do Kosovo, assegurando o envolvimento da União através da nomeação de um representante dos 27 Estados-membros na troika, facilitadora das negociações entre Belgrado e Pristina, e no Conselho Europeu ficou clara a disponibilidade da União para pôr em prática a solução que venha a definir o futuro estatuto do Kosovo, nomeadamente por meio de uma missão da política europeia de segurança e defesa e da contribuição de um gabinete civil internacional, integrado na presença internacional.
Tal como nos propusemos, dedicámos particular importância ao Mediterrâneo, tanto em termos políticos como económicos, enfatizando a sua relevância estratégica para a União. Realizámos seis reuniões com os nossos parceiros do flanco sul, na área dos negócios estrangeiros, no quadro das migrações e nas áreas sectoriais do ECOFIN do comércio, dos transportes e da energia.
No Médio Oriente, a Presidência portuguesa empenhou-se no reforço do papel da União Europeia no processo de paz, quer no conflito israelo-árabe, quer nas vertentes libanesa e síria. Contribuímos para assegurar condições conducentes ao diálogo bilateral entre a liderança israelita e palestina, reagindo com equilíbrio e contenção aos desenvolvimentos quotidianos, apoiando o trabalho do novo representante do quarteto para o Médio Oriente, Tony Blair, e a iniciativa americana que conduziu à decisiva Conferência de Indianápolis; organizámos e acolhemos, para esse efeito, duas reuniões do quarteto, uma em Lisboa e outra em Paris, com o Comité de Seguimento da Liga Árabe, e participámos amplamente na recente Conferência de Doadores de Paris, na qual a União Europeia acabaria por ser o maior contribuinte.
Colmatámos uma grave lacuna no relacionamento da União com os principais actores à escala global,
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promovendo a realização da primeira Cimeira com o Brasil, na qual foi estabelecida uma parceria estratégica entre as partes. Garantimos, por isso, que o Brasil se associasse nessa parceria estratégica à realização de cimeiras que a União já tem com os outros Estados com essa dimensão, designadamente a Rússia, a China e a Índia.
Sete anos após a Cimeira do Cairo, voltamos a reunir em Lisboa a Europa e a África, definindo uma estratégia conjunta, em prática até 2010, que enquadra o nosso relacionamento futuro através de oito parcerias prioritárias.
Destaco ainda o estabelecimento de uma parceria com Cabo Verde, a primeira entre a União Europeia e um país ACP.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Presidência portuguesa do Conselho da União constituiu um desafio a todos os títulos e também em termos de logística. Realizámos em Portugal 140 reuniões, das quais 20 a nível ministerial ou de chefes de Estado; foram acreditados cerca de 16 500 delegados de Estados-membros da União Europeia e de países terceiros; e foram solicitadas acreditações de 8000 jornalistas, que fizeram a cobertura dos principais eventos do semestre. O portal da Presidência registou 820 000 visitantes.
Este esforço não seria possível sem o forte empenho da Administração Pública portuguesa e, por isso, permitam-me aqui, para concluir, uma palavra especial de reconhecimento e apreço a todos os que colaboraram directamente com esta Presidência, naturalmente sobre a liderança do Primeiro-Ministro e do Governo.
Não posso deixar de ter uma palavra muito especial de reconhecimento do esforço feito nos municípios e nas regiões autónomas onde muitos destes eventos se realizaram com o forte empenho das administrações locais e regionais, dos vários sectores da Administração e dos vários responsáveis do Governo, que conseguiram, em negociações difíceis por vezes, resultados surpreendentes.
Uma palavra muito particular de apreço ao esforço da diplomacia portuguesa no seu conjunto, designadamente da representação permanente em Bruxelas, no sentido de garantir o sucesso dos objectivos que nos propúnhamos alcançar.
Uma palavra natural de apreço pelo trabalho inexcedível dos dois Secretários de Estado que me acompanharam permanentemente nestas tarefas, o Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Europeus e o Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação.
E também uma palavra final de apreço para esta Assembleia. Nesta Assembleia, independentemente da diferença de posições e de prospectivas, que sempre pude testemunhar, encontrámos, ao longo destes seis meses, o permanente apoio necessário para que a responsabilidade e a ambição a que esta Presidência se propunha fosse alcançada. Agradeço, por isso, aos Srs. Deputados, designadamente aos Deputados das Comissões de Assuntos Europeus e de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas, e, em particular, ao Sr. Presidente da Assembleia da República todo o apoio que sempre sentimos para que este objectivo do Governo tivesse uma realização bem sucedida.
Muito obrigado a todos.
Aplausos do PS, do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, vários Srs. Deputados. O Sr. Ministro responderá a grupos de dois.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, quero começar por lhe dizer que, quando as coisas correm bem, isso deve ser sublinhado. A Presidência portuguesa prestigiou Portugal e o Sr. Ministro foi elevadamente responsável pela forma como as coisas correram. Pela minha parte, sempre disse que teríamos sentido de responsabilidade quanto ao exercício da Presidência, e tivemos, e que isso não diminuiria a nossa oposição. Posso, pois, felicitá-lo sem correr o risco de alguém pensar que o CDS foi menos oposição por Portugal ter a Presidência.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Ministro, quero fazer-lhe duas perguntas.
A primeira é relativa a factos da vida internacional que foram acontecendo durante a Presidência, é relativa ao Kosovo.
Sr. Ministro, escapa-me porque é que a comunidade internacional insiste em facilitar a criação de Estados inviáveis, que põem em causa o princípio da estabilidade das fronteiras; que representam mais uma forma de humilhação em relação à Sérvia, que a Europa precisa de aproximar e, um dia, integrar; que desafiam a relação entre a União Europeia e a Rússia; e que constituem um precedente grave, que não saberemos quantas vezes será utilizado.
Escapa-me porque é que tudo isto acontece e, por isso, gostaria de lhe perguntar qual é a sua opinião e a sua visão sobre o provável processo de reconhecimento unilateral da independência do Kosovo, porque nós estamos preocupados com esse facto.
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Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Em segundo lugar, quero fazer-lhe uma outra pergunta, esta de natureza interna. Saber se em Portugal haverá ratificação do Tratado de Lisboa por via parlamentar ou referendária é uma decisão das instituições portuguesas, mas terá havido um político francês que terá declarado a um jornal português que a existência de referendo em Portugal constituía «uma traição». Perguntei-me: traição a quem? O Prof. Adriano Moreira disse aqui, há dias, na Assembleia que a modéstia é uma qualidade das pessoas, mas a humildade não é uma virtude dos Estados. A nós parece-nos estranho que uma declaração destas possa ser feita sem um reparo por parte do Governo português,…
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — … porque é competência de nenhum político francês saber se em Portugal há ou não referendo.
Aplausos do CDS-PP.
Em alusão a este ponto, gostava também de obter da sua parte a confirmação de que não há nenhum compromisso dos governos que subscreveram o Tratado de Lisboa — a nosso ver, em boa hora — que não seja com o próprio Tratado, ou seja, que não existe qualquer compromisso oculto relativamente ao seu modo de ratificação.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.
O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, o Primeiro-Ministro do Governo português tem alimentado em torno da questão da ratificação do Tratado de Lisboa um tabu. Podemos hoje dizer que é, de certa forma, um tabu «com o rabo de fora», na exacta medida em que todos já percebemos que o Governo, o Partido Socialista e também o PSD não querem qualquer referendo, aliás, fogem do referendo «como o diabo foge da cruz».
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!
O Sr. João Semedo (BE): — Mas, seja como for, nesta ginástica, neste contorcionismo, do discurso político do Governo sobre esta matéria, o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros teve uma virtude, que quero sublinhar: é que foi bastante mais claro e explícito quando afirmou numa entrevista – e gostaria de o recordar – que «Os tratados internacionais não têm de ser referendados, é para isso que existem os parlamentos».
Gostaria de lhe perguntar — permita-me que o faça — se o Sr. Ministro, quando foi convidado para este Governo, quando tomou posse e até, numa outra oportunidade, quando mudou de pasta, conhecia o Programa do Governo,…
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Muito bem!
O Sr. João Semedo (BE): — … porque esse Programa consagra explicitamente a realização de um refendo para ratificar o tratado europeu.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Bem lembrado!
O Sr. João Semedo (BE): — Gostava que me respondesse a essa pergunta, que, presumo, tem uma resposta afirmativa, e, nesse contexto de uma eventual resposta afirmativa, saber como é que se sente perante uma tão exuberante «cambalhota» e mudança de opinião.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Muito bem!
O Sr. João Semedo (BE): — É que essa «cambalhota» tem que ter uma explicação e tem que ter uma razão; até diria, se me permite a expressão, tem de ter uma razão razoável. Será que, de facto, há um pacto entre os governos europeus para se abrigarem, para se afastarem, para se eximirem de um referendo ao tratado europeu? E, se há esse pacto, pergunto-lhe como é que um Governo se permite trocar um compromisso assumido com o seu País, com os portugueses, com o seu eleitorado, por um pacto assinado nos gabinetes das chancelarias europeias entre governos e parceiros europeus.
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Sr. Ministro, gostaria que me respondesse a estas perguntas.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, registo as palavras simpáticas do Sr. Deputado Paulo Portas como registo a omissão de qualquer referência ao trabalho da Presidência portuguesa por parte do Sr. Deputado João Semedo.
Em relação às questões em concreto, o Sr. Deputado Paulo Portas não está mais preocupado do que eu, seguramente, com o desenvolvimento de todo o processo de estabilização dos Balcãs Ocidentais, porque é a região no seu conjunto que está em causa quando se pensa na solução do problema concreto do Kosovo. E, hoje, é indissociável a abordagem de uma solução para o estatuto final do Kosovo sem enquadrar, necessariamente, essa opção na perspectiva estratégica para toda a região dos Balcãs Ocidentais.
Temos, aqui, um problema europeu e é nesta perspectiva que a Presidência portuguesa sempre assumiu, desde a primeira hora, esse problema. Chegámos ao ponto a que chegámos, do meu ponto de vista, porque houve um défice enorme da presença europeia no acompanhamento deste processo.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Estou completamente de acordo!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Como sabe, desde os Acordos de Dayton, no final da década de 90, o processo foi assumido por um formato de mecanismo de acompanhamento internacional em que quatro países europeus integravam o chamado Grupo de Contacto, e esses quatro países europeus de alguma forma desenvolveram uma lógica de directório na condução deste processo. A ausência de debate político interno no Conselho relativamente a um problema de tal gravidade e de tal sensibilidade para a paz e para a estabilidade na região dos Balcãs Ocidentais e para a paz e para a estabilidade da Europa, do meu ponto de vista, era justamente uma das situações mais críticas com que nos confrontávamos e com que nos confrontamos ainda hoje.
Por isso, se verificar, a preocupação da Presidência portuguesa desde o mês de Junho, mês final da Presidência alemã, foi justamente a de orientar o Conselho para uma perspectiva de trabalho em conjunto: uma perspectiva de abordagem do interesse estratégico comum, independentemente da abordagem em função de interesses estratégicos específicos que diferentes Estados têm perante esse problema.
O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Portugal tem uma distância em relação a esse problema, que não tem, por exemplo, a Espanha, por razões óbvias.
Dir-lhe-ei, por isso, muito concretamente, que a minha preocupação no essencial, neste momento, é a de contribuir para uma posição comum da União Europeia sobre esta matéria, independentemente da opção que venha a ser a que a maioria do Conselho, hoje, já definiu. A convergência no sentido da plataforma comum para uma posição que permita à União Europeia ser um factor de estabilidade na região é absolutamente determinante. Foi nessa perspectiva que trabalhámos e é nessa perspectiva que continuaremos a trabalhar.
A partir do dia 1 de Janeiro, terei oportunidade de lhe responder em concreto sobre essa questão.
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, tem de concluir já, porque esgotou o tempo de que dispunha.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sobre a ratificação, se o Sr. Presidente me permitir responder descontando 1 minuto nas respostas seguintes…
O Sr. Presidente: — Não pode, porque o tempo já está supernegativo, a menos que conte com o crédito do Grupo Parlamentar do PS. E, se o PS fosse generoso desde já, permitia ao Sr. Ministro completar esta ronda de respostas.
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Sr. Presidente, damos 3 minutos.
O Sr. Presidente: — Mas tem de ser uma transferência palpável.
Risos.
A Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça é muito avarenta, tem de dar mais tempo ao Sr. Ministro.
Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, faça favor de continuar, mas tem que ser rápido.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Peço a palavra, Sr. Presidente.
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O Sr. Presidente: — Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, intervém para interromper o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros?
Risos.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa sobre a condução dos trabalhos.
O Sr. Presidente: — Faça favor.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, dado o número de perguntas, estou certo de que a maioria não deixará o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros sem tempo para responder.
Risos.
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, é uma interpelação muito política, mas, efectivamente, tem é que se dirigir ao Grupo Parlamentar do PS para fazer uma transferência de tempo. O resto são palavras generosas.
Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, queira concluir a sua resposta.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, respondo muito rapidamente, já que esta questão exige uma resposta da parte do Governo.
Sobre as declarações do Deputado Lamassoure, é óbvio que elas não têm qualquer sentido do ponto de vista da realidade. Não há, nem houve, qualquer acordo. O que é preciso perceber é que a questão da forma de ratificação não deixou de ser enquadrada em todo o processo de negociação do novo Tratado, como é sabido. O processo de ratificação esteve sempre presente, designadamente nos processos desenvolvidos pelos Governos da Holanda e da França, que tinham sido confrontados com processos de ratificação, por via referendária, e que tiveram o resultado que tiveram.
Por isso, a forma de ratificação esteve sempre na cabeça de todos os negociadores e a questão da ratificação em condições que permitam a entrada em vigor do Tratado em 2009 está presente na mente de todos os responsáveis políticos. Mas não há nada mais do que uma leitura subjectiva do que foi o processo negocial. Não há, objectivamente, qualquer compromisso assumido por nenhum governo em relação a qualquer forma de ratificação. Foi isso que sempre dissemos e é isso que aqui fica hoje, de novo, dito.
No princípio do próximo ano, tal como o Sr. Primeiro-Ministro tem dito, o Governo exprimirá a sua posição sobre a forma de ratificação que entende adoptar, salvaguardada qualquer reserva relativamente à existência de qualquer compromisso, que não existiu, nem poderia existir, sobre esta matéria entre os diferentes governos que acompanharam o processo de negociação da forma do Tratado.
O Sr. Presidente: — Há pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro, mas, para que ele possa responder, tem de ter tempo. O Sr. Ministro já tem 2 minutos, mas esclareço que cada Deputado tem 2 minutos para pedir esclarecimentos e o Governo tem 3 minutos para responder a cada grupo de dois.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, para mais uma interpelação à Mesa sobre a condução dos trabalhos?
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, a minha única preocupação é a de que o Governo não deixe sem resposta as questões que são colocadas.
Portanto, peço a V. Ex.ª que desconte no tempo final do Governo, que é de 8 minutos, os 4 minutos necessários para o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros poder responder aos dois blocos de pedidos de esclarecimento que faltam. Se V. Ex.ª vir que isto é possível, peço, em nome do Governo, essa facilidade.
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, a questão central nestes debates é que o Governo tem de gerir o seu tempo de acordo com a sua inteligência, mas também de acordo com o Regimento. Se o Sr. Ministro, que é um rigoroso cumpridor do Regimento, assim proceder, será um excelente colega do Governo ao transmitir
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essas instruções aos seus colegas.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, talvez para facilitar, ainda temos mais uma pergunta, pelo que podemos conceder ao Governo 1 minuto do nosso tempo para obtermos resposta à nossa pergunta.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — À nossa pergunta!
Risos do PCP e do BE.
O Sr. Presidente: — Assim sendo, será transferido 1 minuto do tempo do CDS-PP.
Estão agora inscritos quatro Srs. Deputados para pedir esclarecimentos. O Governo transmitirá à Mesa como quer responder, se dois a dois se aos quatro em conjunto, consoante o tempo que tem disponível.
Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, o que entendo é que devemos começar a falar claro sobre esta questão do processo de ratificação do Tratado.
Bem se sabe, Sr. Ministro, que, em Espanha, o Governo vai dizer o seguinte: «Este Tratado é igual ao anterior. Já ratificámos o Tratado Constitucional e não temos necessidade de ratificar este».
Também já sabemos que, em França ou na Holanda, os Governos vão dizer exactamente o contrário dos seus confrades espanhóis. Vão, certamente, dizer: «Este Tratado é muito diferente do anterior, não tem nada a ver com o Tratado Constitucional, esse foi rejeitado em referendo, mas, como este é minimalista, podemos ratificá-lo no Parlamento».
Sr. Ministro, estes três Governos (França e Holanda, de um lado, e Espanha, do outro) dirão exactamente o contrário uns dos outros para concluírem exactamente a mesma coisa,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Sr. Honório Novo (PCP): — … isto é, para fugirem à ratificação por referendo, para se furtarem a ouvir a opinião dos cidadãos em nome dos quais o Tratado foi pretensamente construído.
Sr. Ministro, quero chamar a sua atenção para o facto de que este tipo de cinismo político vai, um dia, condenar a União Europeia, esta construção europeia, pode ficar tranquilo e certo disto. Mas este tipo de cinismo e de discurso cínico não é aceitável em Portugal, não é aceitável que seja usado da mesma forma pelo Governo, em Portugal.
Sr. Ministro, em Julho, o Primeiro-Ministro disse, nesta Casa, que não falava sobre o processo de ratificação, porque na altura não existia nenhum tratado! Pois, agora, há Tratado, Sr. Ministro! Há Tratado aprovado desde Outubro, há Tratado assinado desde o dia 13 de Dezembro e, portanto, é chegado o momento de o Governo cumprir e honrar também este compromisso! Já não é apenas o compromisso eleitoral, já não é só o compromisso do Programa do Governo, é também este compromisso assumido aqui! Não é aceitável que o Sr. Ministro venha, em representação do Governo, dizer aqui, em nome de uma pretensa estratégia partidária ou governamental, em nome de uma pretensa estratégia mediática da agenda de propaganda — desculpe-me o termo — do Primeiro-Ministro, que só anuncia o processo de ratificação em Janeiro, depois das festas de fim de ano!
O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Gostaríamos de ouvir uma resposta objectiva agora, na Casa onde ela deve ser dada!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, nós, Os Verdes, também entendemos que neste debate temos de ficar a saber mais qualquer coisa do que aquilo que nos tem sido dito. E uma das coisas que é preciso entender é por que razão é que por esta Europa fora todos os Estados andam a «fugir a sete pés» do referendo. O que nós pretendemos saber é se isto será fruto do acaso ou se haverá, de facto, um compromisso implícito relativamente à ratificação e entrada em vigor deste Tratado.
Talvez para isso valha a pena fazer um pouco de história resumida, porque o tempo é escasso, em relação
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a esta matéria.
O Tratado Constitucional foi rejeitado pelo «não», em referendo, da França e da Holanda. Entretanto, as elites europeias negociaram um pretenso novo tratado, que é praticamente igual ao Tratado Constitucional, mudaram o nome, mas cuidaram de ter a certeza de que este Tratado não poderia mais ser rejeitado e teria de entrar em vigor. Então, a manobra envolve-se no processo de ratificação por via parlamentar e não por via de referendo. Por isso, temos a Europa em peso a «fugir a sete pés» da via do referendo.
Bom, alteram-se as regras para que o resultado querido pelas elites europeias, independentemente daquilo que os povos da Europa querem, tenha sucesso. Isto, Sr. Ministro, é que é a Europa democrática?! Isto, Sr.
Ministro, é que é a Europa próxima dos cidadãos?! Talvez valha a pena relembrar também aquilo que se tem passado em Portugal. O Programa do Governo é claríssimo relativamente à questão do referendo ao Tratado Europeu, com o argumento de uma maior democratização da Europa e, também, de que nunca em Portugal os portugueses se pronunciaram sobre o processo de construção europeia. Portanto, o Programa do Governo, como referi, é claro.
Entretanto, o Governo veio dizer que, imediatamente a seguir à assinatura do Tratado, esclareceria a forma de ratificação, pondo, inclusivamente, em causa aquilo que está no seu próprio Programa do Governo. Foi assinado o Tratado e o Governo vem agora dizer que, afinal, já não é a seguir à assinatura do Tratado que esclarece a forma de ratificação mas, sim, quando findar a Presidência portuguesa e, portanto, em Janeiro o Governo dirá aquilo que tem a dizer.
Entretanto, surgem declarações públicas de Lamassoure a dizer que, se o Governo português fizer o referendo, é um traidor. Sr. Ministro, já garantiu que não há qualquer acordo expresso entre as elites europeias relativamente à forma de ratificação do Tratado. Mas, então, esta afirmação será um grande incidente diplomático? Ou não será? O que é que resultará de uma afirmação desta natureza? Os portugueses, no nosso país, se chamam — e passe a expressão — mentiroso ao Sr. Primeiro-Ministro, lá vêm os processos disciplinares,…
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Quando?!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … lá se levantam todos os braços e todas as cabeças em relação às insinuações extremamente preocupantes quanto a essas afirmações.
O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Se alguém, de fora, chama traidor ao Primeiro-Ministro, o que é que resulta daqui, Sr. Ministro?
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, vou agora tentar gerir mais inteligentemente o tempo de que disponho.
Primeiro, em relação à questão colocada pelo Sr. Deputado João Semedo, a minha posição é de princípio.
Foi isso que viu na minha entrevista? Tenho direito a ter posições de princípio em relação aos processos de ratificação de tratados internacionais. Exprimi-a, mantenho-a, não tem nada que ver com a mudança de opinião em relação à questão em concreto. Há uma promessa eleitoral, sabemo-lo, mas não tem nada que ver com a teorização que fiz sobre a minha posição em relação aos processos de ratificação de tratados internacionais.
Sr. Deputado Honório Novo, gostava de ter uma resposta hoje. Não tem! Terá uma resposta no princípio do ano, como o Primeiro-Ministro disse!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Isso não é sério!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Somos nós que temos o direito de estabelecer as orientações e definir as prioridades do ponto de vista do anúncio.
Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.
Dissemos sempre que, enquanto tivéssemos a responsabilidade da Presidência, não teríamos necessidade de embarcar nesse debate…
O Sr. Honório Novo (PCP): — Foi dito aqui que, depois de haver Tratado, teríamos uma decisão!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Deputado, não seja tão ansioso! Faltam 10 dias! Estamos na quadra natalícia! Porquê tanta ansiedade? Espere uma semana! Vai ter tempo de saber
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qual é a posição do Governo!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Queria saber antes do Natal! A democracia não se compadece com os períodos natalícios!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Quanto à questão colocada pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, quero dizer-lhe o seguinte: o Sr. Lamassoure não é um membro do Governo, é um Deputado do Parlamento Europeu e, como sabe, os Deputados têm o direito de expressão livre, que nenhum governo toma devidamente a sério em todas as suas consequências do ponto de vista, sobretudo, das responsabilidades políticas. Se assim fosse, imagine o que seria se os governos tivessem de estar a responder a, muitas vezes, atoardas!?
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Então, não é grave!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Srs. Deputados, neste caso concreto, foi uma atoarda de um Deputado, que não tem qualquer fundamento. Há um compromisso? Há! Há um compromisso de todos os membros do governo europeus de ter o Tratado ratificado até ao final do ano de 2008. Esse é o único compromisso que o Governo português assumiu.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Nós não acreditamos na história da Carochinha!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Santana Lopes.
O Sr. Pedro Santana Lopes (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, pensava colocar-lhe questões que implicavam que tivesse mais tempo para responder, nomeadamente qual o balanço que faz, nesta altura, sobre o processo de adesão da Turquia e, também, as implicações do Tratado no relacionamento entre as presidências futuras da Comissão e do Conselho.
Mas hoje tinha pensado, sobretudo, fazer algumas considerações sobre o papel do Presidente da Comissão Europeia. Tivemos já ocasião de fazê-lo em relação ao Governo, ao Sr. Primeiro-Ministro, à acção do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, dos Srs. Secretários de Estado e da diplomacia portuguesa.
Queria pôr-lhe uma questão que julgo ser de fácil resposta e que é gosto e dever do nosso partido colocar, ou seja, a honra, que compreenderá que sintamos, por, em relação ao anterior líder do partido a que pertenço, José Manuel Durão Barroso — e até numa altura em que se evocam reacções à sua indigitação para a Presidência da Comissão Europeia, independentemente dos juízos sobre essa altura histórica —, ver reconhecido o seu papel de Presidente da Comissão por todos estes resultados que foram alcançados.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Pedro Santana Lopes (PSD): — A nós orgulha-nos esse contributo, o papel que Durão Barroso desempenhou. Sentimos, também, orgulho, como portugueses, do papel que o Governo conseguiu desempenhar e dos resultados que alcançou, mas permita-nos que sublinhemos hoje o trabalho deste socialdemocrata no momento em que estamos a chegar ao fim da Presidência e em que é a última oportunidade que temos no Parlamento para fazermos esse balanço.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Pedro Santana Lopes (PSD): — Sentimos orgulho pelo Governo, mas um particular orgulho pelo Presidente da Comissão Europeia.
Não nos levará a mal e renovamos as felicitações, Sr. Ministro.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, começo por felicitá-lo pelo modo como decorreu a Presidência portuguesa da União Europeia, felicitar também, em especial, o Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Europeus pelo trabalho rigoroso que desempenhou…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
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O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — … e, evidentemente, salientar um dos aspectos essenciais desta Presidência, que é o Tratado de Lisboa.
O CDS, em relação ao Tratado de Lisboa, tomou uma posição clara sobre as duas questões que, neste momento, estão em cima da mesa: por um lado, a questão substancial; por outro lado, a questão de natureza formal e acessória, mas não menos importante, que é o modo de ratificação.
A nossa posição é de «sim, sim». Temos o «sim» em relação ao referendo por respeito às promessas eleitorais feitas, desde logo, pelos partidos que compõem o arco europeu nesta Assembleia da República — PS, PSD e CDS; temos a posição «sim» em relação ao referendo por respeito à Assembleia da República, que já aqui aprovou perguntas de referendo, bem como uma revisão constitucional para possibilitar precisamente este referendo; e temos a posição «sim» porque consideramos que existem transferências de soberania, independentemente da posição que os portugueses sobre elas tenham.
Por isso mesmo, apresentamos uma pergunta simples em relação a esta matéria e que posso transmitirlhe. A pergunta é: concorda com a aprovação do Tratado de Lisboa? Foi uma pergunta testada juridicamente, é uma pergunta possível à luz da nossa Constituição. Sobre esta matéria, o Sr. Ministro assumiu uma posição clara ao dizer que os tratados internacionais não têm que ser referendados e que é para isso que existem os parlamentos.
Gostaria de saber, Sr. Ministro, se se sente confortável com a possibilidade de o Governo de Portugal propor a aprovação de um referendo em relação a esta matéria.
Gostaria, também, de lhe colocar perguntas de natureza substancial sobre a actualidade da União Europeia. Foi criado um grupo de reflexão, sabemos também, que, na sequência desse mesmo grupo de reflexão, temos dois dossiers em relação aos quais a Turquia pôde avançar quanto ao seu processo de adesão. Ministro, gostaria de saber é se considera que a entrada da Turquia põe, ou não, em causa a governabilidade da União Europeia ou se tem algum efeito em relação a essa mesma governabilidade.
São duas questões simples e claras em relação às quais gostaria que o Sr. Ministro respondesse.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Santana Lopes, em relação às considerações que teceu, gostaria apenas de referir que uma das razões — estou perfeitamente à vontade para dizê-lo — para o sucesso desta Presidência é, em grande parte, resultante de um forte apoio das várias instituições europeias à Presidência portuguesa em todo o processo que decorreu durante estes seis meses e, sem dúvida, que a Comissão e, em particular, o Presidente da Comissão tiveram um papel importante nesse apoio.
O Sr. Primeiro-Ministro tem-se referido sistematicamente à excelente cooperação que sempre sentiu da Comissão no seu conjunto, dos vários comissários europeus com quem tivemos de trabalhar e em particular, naturalmente, do Presidente da Comissão. A responsabilidade para o bem e para o mal de uma presidência é do país que a dirige, do governo que a determina, dos objectivos que define, da ambição e do risco que assume, mas, sem dúvida, sem o forte envolvimento das instituições — da Comissão e do Parlamento Europeu, cada vez mais —, é difícil conseguir as realizações que, apesar de tudo, nos diferentes sectores fomos conseguindo e, como temos dito, o Presidente da Comissão, desde a primeira hora, teve uma palavra permanente de apoio, de estímulo e de acompanhamento dos trabalhos da Presidência. É também essa a sua responsabilidade, independentemente de reconhecermos que a circunstância de ser português não podia deixar de o inibir no sentido de não apoiar ainda mais a Presidência do seu país.
Em relação às questões que o Sr. Deputado Diogo Feio colocou, primeiro, quanto ao referendo, já disse que a minha posição de princípio é essa, não vou escondê-la, mas isso não quer dizer que não haja situações de excepção. Não tenho qualquer problema em submeter à apreciação, dada uma determinada circunstância, um determinado tratado. Não há uma rigidez, uma ortodoxia inflexível nessa minha posição. A minha posição de princípio é essa, repito, mas penso que é má prática, gera insegurança do ponto de vista político nas relações internacionais estar a submeter permanentemente tratados internacionais à ratificação pela via do referendo. Esta é a minha posição de princípio, mas, se o Governo vier a tomar a decisão de proceder à ratificação por referendo, não tenho qualquer problema em submeter-me a essa disciplina. Tenho uma posição de princípio, que é a que defini.
Em relação ao grupo de reflexão e à entrada da Turquia na União Europeia, temos de ter em consideração que as circunstâncias mudaram muito desde que discutimos e lançámos o debate para o Tratado Constitucional e as circunstâncias estratégicas e políticas da Europa e do sistema internacional no momento que vivemos. Essas considerações, do meu ponto de vista, não devem ser desprezadas quando temos que olhar para o calendário e para a forma de ratificação, mas, independentemente disso, relativamente à Turquia não tenho qualquer dúvida de que não podemos elaborar estaticamente na apreciação do impacto da Turquia num processo de adesão. Porque é um processo muito dinâmico, a sua integração, se se vier a verificar, efectivar-se-á bastante mais para a frente e a dinâmica da União Europeia, eventualmente no contexto da
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implementação de um novo tratado, determinará regras completamente diferentes.
Do meu ponto de vista, seria pouco objectiva qualquer referência que pretendesse fazer neste momento à pergunta concreta que me colocou sobre a governabilidade da União nesse sentido.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Vamos passar ao período de intervenções.
Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Santos David.
O Sr. Mário Santos David (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Neste debate semestral que ocorre no fim da Presidência portuguesa, cumpre-nos deixar uma palavra de congratulação ao Governo pela forma eficaz e pragmática como a exerceu, prestigiando o nosso país. Já fora assim em 1992 com Cavaco Silva e em 2000 com António Guterres.
Comecemos por recordar a institucionalização das Cimeiras UE-Brasil, há muito sugeridas por Durão Barroso e sobre as quais outras presidências, até agora, não tinham sido sensíveis ao seu inegável interesse.
É óbvio que não fazia qualquer sentido que o Brasil fosse o único dos países BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China) com o qual a União não tinha encontros regulares ao mais alto nível. O erro foi, finalmente, corrigido!
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Mário Santos David (PSD): — A Cimeira União Europeia-África permitiu abrir um novo espaço de diálogo e parceria entre os dois continentes. Assim se passe agora das palavras aos actos concretos. Mas reiteramos que teríamos preferido uma Cimeira com todos os Chefes de Estado e de Governo da União Europeia (e não apenas os representantes de 22 dos 27 Estados-membros) e a que tivessem faltado alguns líderes africanos. A União Europeia não pode ser hipócrita na aplicação das suas próprias decisões: proibir a entrada em seu território de um indivíduo e depois convidá-lo para conferências internacionais que ela própria leva a efeito, não é sério! É pena não se ter aproveitado para organizar, em paralelo, outros eventos que valorizassem a posição de Portugal junto dos países lusófonos que tivemos o prazer de acolher.
O Sr. Pedro Santana Lopes (PSD): — Muito bem!
O Sr. Mário Santos David (PSD): — A partir de amanhã, teremos o início das celebrações da adesão de novos parceiros ao espaço de livre circulação de Schengen — mais um sinal da sua progressiva e normal integração plena no projecto Europeu. Não esquecemos também que, no preciso momento em que termina a Presidência portuguesa, mais dois Estados, Chipre e Malta, aderem à moeda comum, o euro.
Mas o ano de 2007 e, muito principalmente, a Presidência portuguesa ficam obviamente marcados pela aprovação do Tratado de Lisboa, assinado na semana passada. O mandato conferido na conclusão da Presidência alemã era extremamente concreto e preciso, mas a diplomacia portuguesa soube limar os últimos detalhes, dotando a União Europeia de um instrumento que lhe permitirá um processo de decisão mais eficaz e transparente.
É certo que, para não perturbar as mentes mais sensíveis, suprimiram-se todas as referências que pudessem sugerir que estamos num processo de construção de um «super-Estado federal»: da Ode à Alegria à bandeira azul com as 12 estrelas douradas, do lema «Unida na diversidade» ao dia europeu a 9 de Maio, tudo desapareceu! Como se estes símbolos precisassem de estar inscritos em algum tratado para se afirmarem e perdurarem no nosso imaginário colectivo como símbolos visíveis do projecto da União Europeia.
Muito nos regozijamos pelo facto de Portugal ser um dos 16 Estados que subscreveram a Declaração dos Estados-membros n.º 52 anexa ao Tratado, reafirmando que estes, juntamente com o euro, são os símbolos do vínculo comum dos cidadãos à União Europeia e dos laços que os ligam a esta.
Para conseguir esta nova imagem, prescindiu-se de um texto, porventura longo mas coerente e compreensível para todos, e substituímo-lo por um novo articulado hermético e complexo que altera, acrescenta, revoga, deslocaliza ou repristina os actuais tratados, apenas inteligível para os especialistas, seja por vocação ou por obrigação profissional. O Tratado, dito simplificado, virou a confusão do costume. Não é nem melhor nem pior que os anteriores: é igual! Esqueceu-se dos seus principais destinatários: os cidadãos! E, estando prevista uma versão consolidada, não se entende por que não foi essa a subscrita nos Jerónimos.
E pasme-se: tão célere a responder às solicitações exteriores, o Governo esqueceu-se, como vem sendo hábito, dos portugueses. A versão consolidada em português ainda não existe. A francesa, por exemplo, está já disponível na Internet desde o dia 28 de Novembro.
Daí ser fundamental explicar o que muda com o novo Tratado, e no PSD entendemos oportuno utilizar também esta oportunidade para o fazer, embora de forma obrigatoriamente sucinta.
O Tratado de Lisboa é imprescindível já que era necessário a União Europeia conjugar alargamento com aprofundamento. E fê-lo de uma forma justa e equilibrada, melhorando a legitimidade, transparência, eficácia, democraticidade e coerência do processo decisório.
Começamos por valorizar o princípio de igualdade entre todos os Estados-membros, bem como o
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reconhecimento explícito da dupla natureza da União Europeia, uma união de Estados e de cidadãos em plano de igualdade. Mantendo o respeito pela identidade nacional, a cidadania europeia torna-se complementar desta, não a substituindo.
Sai bastante ampliado o papel dos Parlamentos nacionais, que passam a ter uma intervenção fundamental no processo de decisão ao poderem accionar o mecanismo de alerta precoce sempre que considerem estarem a ser violados os princípios de subsidiariedade e da proporcionalidade. Uma palavra de apreço ao Presidente da Comissão Europeia por, desde o início do seu mandato, ter voluntariamente imposto este procedimento, mesmo sem ainda ter a obrigação de o fazer. O Parlamento Europeu é também valorizado, ao alargar-se amplamente o campo de aplicação da co-decisão.
A nova regra de votação no Conselho passará a ser, a partir de 2014 (ou 2017), por maioria qualificada, que obedecerá aos requisitos de uma dupla maioria de 55% dos Estados-membros (com um mínimo de quatro) e representando 65% da população. Note-se, no entanto, que o voto por unanimidade continua a ser necessário nas áreas da fiscalidade, recursos próprios, quadros financeiros plurianuais, segurança social, política externa e defesa.
O novo Tratado reforça o princípio da coesão económica, social e territorial, já que sem solidariedade a própria União Europeia não faz sentido; enfatiza o estatuto das regiões ultraperiféricas, reconhecendo a sua especificidade; atribui personalidade jurídica única à União, o que reforça o seu poder de negociação na cena internacional; torna mais coerente a acção externa da União nos vectores políticos, humanitários ou económicos; e cria uma cláusula de solidariedade entre os Estados-membros em caso de ataque terrorista ou catástrofe natural.
A Carta dos Direitos Fundamentais assume força jurídica vinculativa. Os seus 54 artigos reflectem os valores da dignidade, liberdade, igualdade, solidariedade, cidadania e justiça por que nos regemos. Confirma os direitos económicos e sociais, o direito à propriedade, os direitos dos trabalhadores e dos parceiros sociais, da segurança social. Mas também consagra os chamados direitos da terceira geração, da bioética, da protecção de dados e da boa governança. A União Europeia deve orgulhar-se de ter o primeiro documento à escala internacional juridicamente vinculativo que congrega, num único texto submetido ao mesmo mecanismo de controlo jurisdicional, os direitos políticos, cívicos, económicos e sociais. Valores, esses, que queremos promover à escala mundial.
O modelo social europeu é amplamente reflectido em todo o Tratado de Lisboa. A política social passa a competência partilhada, o pleno emprego e o progresso social fazem parte dos objectivos da União, o Tratado contem uma cláusula social que obriga a que as questões sociais sejam sempre tidas em conta, horizontalmente, quando da definição e aplicação de todas as políticas. O Tratado reconhece, ainda, os serviços públicos enquanto instrumentos de coesão social e regional.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O ano de 2008 abre uma nova etapa na construção da União Europeia. Assistimos neste semestre a uma manifestação colectiva inequívoca dos 27 Estados-membros de prosseguir este aliciante projecto. Um processo que se quer dinâmico, não estático, que tem de ser gradual e participado para ser bem compreendido, aceite e apoiado pelos cidadãos.
Dotemos, pois, a União dos novos instrumentos de que necessita para concretizar estes objectivos e esperemos que o Governo tenha a coragem de assumir as reformas necessárias para que Portugal retome o caminho da convergência de que tanto necessitamos!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.
O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Desde o virar do século que a construção de uma Europa cada vez mais liberal avança a todo o vapor, permanentemente anunciada como a única forma de resolver o recorrente «impasse institucional» em que, garantem-nos, a Europa terá mergulhado.
Foi assim em Nice. Foi assim com o defunto Tratado Constitucional. É assim que os seus defensores têm defendido a entrada em vigor do tratado reformador ou de Lisboa, dois novos nomes para um texto antigo e já conhecido desde o Tratado Constitucional.
A assinatura deste documento foi o momento central da Presidência portuguesa, mas arrisca-se a cavar ainda mais fundo o alheamento e a crise de confiança com que os europeus olham para este processo de constituição europeia e para as políticas emanadas de Bruxelas. Depois do chumbo do Tratado Constitucional, lá temos o mesmo conteúdo, redigido de forma esdrúxula, a servir de pretexto para evitar nova consulta popular. Tudo foi feito para que os europeus não estragassem outra vez a festa, como aconteceu há dois anos com a França e a Holanda.
Nos últimos tempos, crescem as vozes no Partido Socialista que defendem a legitimidade da ratificação parlamentar e a representatividade deste Parlamento. Mas não nos enganemos! Representar o povo não é o mesmo que nos substituirmos à livre expressão da sua vontade. Esta não é uma questão entre duas formas de legitimação política sobre as quais se tenha de estabelecer uma hierarquia de valores. É uma questão entre
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a seriedade e o valor do compromisso na vida política. Todos os partidos que hoje se encontram aqui, nesta Câmara, defenderam no seu programa eleitoral a ratificação popular. Não nos esquecemos também que foi este mesmo Parlamento que aprovou uma revisão constitucional, precisamente para permitir referendar o tratado europeu.
Sr.as e Srs. Deputados, recordemos o que está escrito no programa do Partido Socialista: «O Partido Socialista entende que é necessário reforçar a legitimação democrática do processo de construção europeia, pelo que defende que a aprovação e a ratificação do Tratado deva ser precedida de referendo popular».
Ouviram bem: «reforçar a legitimação».
Sr.as e Srs. Deputados, o Kosovo é, por estes dias, um bom exemplo — talvez o melhor exemplo — da diferença que vai entre a proclamação de uma Europa a uma só voz, de uma voz europeia independente e autónoma, e a realidade da política externa da União Europeia. É aqui que melhor se percebem os limites da tão famosa Política Externa e de Segurança Comum, sobretudo sempre que os Estados Unidos entram neste jogo. A independência não será certamente reconhecida na ONU mas Washington não vai esperar sequer 24 horas. E vários governos europeus seguirão e imitarão a Casa Branca. Consumar-se-á um novo facto político na Europa e para Bruxelas vai apenas sobrar a pesada factura dos acontecimentos.
Em termos práticos, nesta matéria, a Presidência portuguesa conseguiu apenas transferir o problema para «o senhor que se segue».
Sr.as e Srs. Deputados: A crise da Europa não é institucional, é política.
A construção europeia tem sido feita contra a própria ideia da Europa. É uma Europa do «menos»: menos protecção social, menos emprego, menos serviços públicos, menos poder de decisão para os cidadãos.
Nós, Bloco de Esquerda, somos europeístas por convicção e é exactamente por isso que estamos contra este Tratado. Acreditamos que, para resolver a crise europeia, só mesmo mais Europa. Uma Europa que tenha políticas transnacionais para a criação de emprego, de protecção social, de transportes públicos ou de defesa do ambiente. É isso que nos separa.
Temos a ambição de uma Europa maior, não uma Europa liberal como esta, que tem sacrificado os direitos sociais da maioria dos europeus ao critério único do lucro máximo para um mínimo de cidadãos.
A Presidência portuguesa decorreu como previsto, de acordo com a encomenda alemã — o Tratado foi assinado e o referendo enterrado. O resto reduziu-se ao festim mediático e às luzes de sucessivas cimeiras.
Quando os europeus não podem discutir a Europa, os governos saem-se sempre com as presidências.
Sr.as e Srs. Deputados, o Primeiro-Ministro assumiu um compromisso perante os portugueses: fazer um referendo. Agora, parece estar disposto a rasgá-lo e a substituí-lo por um outro, assinado com os seus parceiros europeus.
Caso o Partido Socialista abdique da sua palavra e o Governo rejeite o referendo, o Bloco de Esquerda reafirma que apresentará uma moção de censura que condene esta violação grosseira do Programa e dos compromissos do Governo. É o valor da confiança e a seriedade política que estão em causa e que confrontam a consciência de todos e de cada um de nós.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A terceira Presidência portuguesa da União Europeia está marcada, muito negativamente, pela assinatura de um Tratado, gravoso para o País e para a Europa.
Um Tratado que consolida o federalismo sob o domínio e comando das grandes potências, o neoliberalismo nas orientações económicas e sociais e o militarismo atrelado à NATO e ao imperialismo norteamericano.
Um Tratado que impõe novas mutilações da soberania nacional, como sucede com o registo da «conservação dos recursos biológicos do mar, no âmbito da Política Comum de Pescas como competência exclusiva da União» (alínea d) do artigo 3.º do Título I do Tratado).
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Ora aí está!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Um Tratado que significa uma perda acrescida de capacidade institucional nos órgãos da União Europeia — perda de dois Deputados, de um Comissário permanente, de peso nas votações no Conselho Europeu.
Um Tratado que o estardalhaço mediático das «cimeiras», para desviar atenções de problemas internos e tentar passar a imagem de êxitos externos e reconhecimento internacional, não esconde a inaceitável cedência, por parte do Governo PS/Sócrates, aos interesses das grandes potências e grupos económicos.
Assim se ofendeu gravemente o n.º 1 do artigo 7.º da Constituição da República Portuguesa, que afirma que Portugal se rege, nas relações internacionais, pelos «princípios de independência nacional» e da «igualdade entre os Estados».
Mas é notável que sendo o Tratado, para os seus autores e defensores, uma obra-prima cheia de
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virtualidades para a felicidade dos povos europeus, estes não possam agora participar em consulta referendária prévia à sua ratificação porque… podem dizer «não»! Notável deveras! Sr. Presidente, Srs. Deputados: É um Tratado tão bom, tão bom, que os portugueses e outros cidadãos europeus nem o podem compreender, nem pronunciar-se sobre ele! Notável!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É um escândalo!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Notável também a convergência e confluência das posições do grande capital nacional (Belmiro, Carrapatoso e outros) e europeu, através da sua Confederação, por uma rápida ratificação do Tratado, à margem dos povos. Como notável é, também, o seu apoio à aprovação, pelo Conselho Europeu de 14 de Dezembro, da flexigurança.
Afirma o Negócios Europeus que a flexigurança restaurará uma «relação positiva entre competitividade e protecção social». Nesta época natalícia é, sem dúvida, um lindo eufemismo para usar em vez de «despedimento sem justa causa e precariedade».
Para o Governo português da Presidência, o facto de tais princípios de flexigurança violarem o artigo 53.º (segurança no emprego) da Constituição da República Portuguesa, aliás bloqueado na sua revisão pelo artigo 288.º (limites materiais da revisão), não importa.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Isso não lhes interessa!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Até faz jeito para enquadrar a nova vaga de ataque aos direitos dos trabalhadores que o Governo José Sócrates tem em curso, com as suas propostas de alteração ao Código do Trabalho. Assim, o PS sempre pode dizer que essas alterações são para cumprir uma imposição da União Europeia! Mas o Governo português queria prolongar e explorar, tanto quanto fosse possível, os êxitos do grande capital e das grandes potências, na sua liderança da União. E, ontem, tivemos a «cereja no bolo»: a reforma da OCM (Organização Comum de Mercado) do Vinho.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Aliás, já aqui referida hoje pelo Sr. Ministro!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Outro grande êxito da Presidência: mais 6 milhões de euros para liquidar a pequena e a média vitivinicultura portuguesa.
Se ainda houvesse qualquer dúvida sobre quem manda na União Europeia, esta reforma do sector vitivinícola esclarece em definitivo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A competitividade no centro da reforma — expliquem-nos como vai o País competir com quem faz duas vindimas por ano.
Arrancam a vinha agora — expulsando os pequenos vitivinicultores e as regiões ditas não competitivas — para, amanhã, 2015/2018, liberalizar completamente o plantio.
Com as consequências que se adivinham: deslocalização das produções previamente liquidadas e espoliação dos mesmos de sempre, os pequenos produtores, do valor económico acumulado dos direitos de plantação. Provavelmente, pagar agora para arrancar a vinha cuja plantação, há um ano ou dois, foi subsidiada; Alargar o campo de manobra legal para o grande «martelanço» de massas hidro-alcoólicas, europeias e de países-terceiros, a que vão permitir chamar legalmente «vinho» e, acrescente-se, engarrafar com direito a indicação de casta e ano de vindima; A passagem, do Conselho Europeu para a Comissão da competência de aprovação de novas práticas enológicas. E, cúmulo dos cúmulos, neste exercício comunitário de coerência enológica, a ajuda à utilização de mostos na correcção do álcool vai acabar em quatro anos; a correcção até quatro graus, por recurso ao açúcar de beterraba, eterniza-se. Mas podia lá acabar uma prática que a França e a Alemanha defendem!…
O Sr. Honório Novo (PCP): — Exactamente!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Não admira, assim, que, com esta política, com este Ministro da Agricultura e com este Governo, os agricultores portugueses tenham visto, em 2006, cair o rendimento real por activo de 5,8%. Queda que é a terceira maior de uma União Europeia onde, em 20 países, o rendimento agrícola subiu, onde a média foi uma alta de 4,7% (certamente um dos resultados económicos de que o Governo se gaba).
O Sr. Honório Novo (PCP): — É a Presidência Portuguesa no seu melhor!
O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.
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O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PCP, reafirmando a sua frontal oposição ao Tratado, pronuncia-se pela realização de um referendo que dê a oportunidade ao povo português de se pronunciar antes da sua ratificação e após um largo e aprofundado debate nacional.
O Sr. Presidente: — Conclua, por favor, Sr. Deputado.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
O PCP apela aos portugueses para que intervenham e se manifestem sobre um processo em que se joga o seu futuro colectivo como País soberano e independente.
Apelamos para que tornem uma exigência nacional a luta por uma Europa de cooperação entre Estados soberanos e iguais em direitos, de progresso social e de paz.
Aplausos do PCP e de Os Verdes.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vitalino Canas.
O Sr. Vitalino Canas (PS): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A palavra que mais se tem ouvido e lido sobre a Presidência portuguesa da União Europeia no 2.º semestre de 2007 é a palavra «sucesso».
Não o sucesso mais ou menos duvidoso, mais ou menos protocolar, mais ou menos simpático, que se invoca em qualquer discurso oficial numa qualquer celebração, mas sim o sucesso verdadeiro, o sucesso inteiro, reconhecido por todos os observadores objectivos e neutrais.
Deixem-me dizer-vos que fiquei algo surpreendido por ter verificado, perante a intervenção que fez, que o Sr. Deputado Mário David não se revê neste observadores objectivos e neutrais.
Às vezes, é bom medir o nosso sucesso pelos olhos dos outros. E o que os outros pensam sobre o desempenho da Presidência portuguesa é motivo de orgulho para todos os portugueses. Portugal esteve à altura das suas responsabilidades e foi muito mais longe do que as expectativas.
Esta foi uma Presidência de risco. Mas de risco assumido.
Na definição do seu programa, a Presidência portuguesa do Conselho, personificada pelo PrimeiroMinistro, José Sócrates e pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros, Luís Amado, com a sua equipa, de que é justo destacar os Secretários de Estado dos Assuntos Europeus e dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação, decidiu correr riscos.
Havia incerteza em relação ao Tratado? Decidiu-se assumir a superação desse problema como a máxima prioridade da Presidência.
As relações com África estavam num ponto quase zero e sem grandes expectativas? Decidiu-se apostar tudo na realização do que muitos diziam impossível, uma cimeira euro-africana que relançasse o processo de diálogo entre os dois continentes.
Havia problemas com a Rússia? Nunca se tinha conseguido institucionalizar um diálogo regular União Europeia/Brasil? Havia dossiers complicados para fechar? A Presidência não se escondeu e trabalhou para que, em todos os domínios, houvesse progresso ou resultados, sem se remeter à fácil opção de esperar que os seis meses passassem, tranquila e rapidamente.
A Presidência poderia, por conseguinte, ter corrido tremendamente mal. Mas correu tremendamente bem! E porque soube correr riscos, o facto de ter corrido tremendamente bem merece relevo reforçado.
A coragem de correr riscos é algo vital no mundo de hoje e vital para a Europa.
Nos últimos anos, colou-se à Europa e aos seus líderes uma certa imagem de hesitação, de indecisão, de receio ou de paroquialismo, derivada muitas vezes da excessiva defesa dos interesses nacionais. Esta imagem não contribuiu nem para a confiança no projecto europeu, nem para o sentimento de pertença a um espaço coeso, nem para a auto-estima dos cidadãos europeus. Estes, confrontados com as dinâmicas de outras zonas do mundo, começaram a colocar em dúvida a sua própria capacidade de enfrentar e de vencer os desafios da globalização.
Ora, a missão dos líderes europeus é mostrar que a Europa está à altura dos seus desafios, é combater o desânimo e a descrença. E, para isso, têm de mostrar coragem, liderança, capacidade de risco, ousadia, grandeza. Tudo isso a Europa mostrou, sob a liderança portuguesa e, para sermos inteiramente justos, também sob a liderança alemã que a antecedeu.
Sr. Presidente, um dos êxitos da Presidência portuguesa foi, certamente, a assinatura do Tratado de Lisboa, que põe termo a um longo período de impasse.
O Tratado de Lisboa aparece despido de todas as referências federalistas ou federalizantes, algumas simplesmente simbólicas, que se podiam imputar ao Tratado Constitucional. Nessa medida, é um Tratado diferente, imbuído de um espírito diferente, porventura mais racional e até mais adaptado ao sentimento comum dos povos e das nações europeias.
Contra o Tratado de Lisboa estarão alguns, mas em minoria. Estarão aqueles que consideram que o Tratado de Lisboa vai diminuir a soberania dos Estados-membros da União Europeia. A esses podem fazer-se algumas perguntas. Por exemplo, esta: numa época de globalização, ainda existem verdadeiramente Estados
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soberanos no sentido tradicional? Ou esta: é possível afirmar que os Estados europeus, que não são membros da União Europeia, são mais soberanos que os Estados que estão na União Europeia? A Suíça, a Noruega e outros são mais capazes de fazer valer, soberanamente, os seus interesses nacionais do que Portugal, a Itália, o Reino Unido, ou outros Estados-membros? Esses, que se preocupam com as pretensas perdas de soberania de Portugal, respondam: haveria alguma forma de Portugal ser mais soberano, ter mais influência mundial, ter maior capacidade de garantir o seu próprio destino que não através da participação no aprofundamento da União Europeia? A verdade é que a União Europeia, no contexto actual, em vez de significar perda de soberania para os seus Estados-membros representa uma forma de eles poderem afirmar melhor, ainda que conjuntamente, a sua soberania ao nível internacional.
A soberania de Portugal fora da União Europeia valeria muito pouco. A soberania de Portugal dentro do espaço da União Europeia e a partir da União Europeia, ou com base na União Europeia, perante os outros parceiros internacionais, vale mais. Vale tanto mais quanto a União Europeia se fortalecer e ganhar influência.
Uma União Europeia que seja um gigante económico, mas que não passe de um anão político, sem influência e credibilidade perante os outros parceiros globais, é uma União Europeia que deixa cada um dos seus Estados-membros reduzidos à sua pequenez perante gigantes reais ou emergentes como os Estados Unidos da América, a China, a Índia, o Brasil, a Indonésia e outros.
O Tratado de Lisboa, na medida em que cria uma União Europeia mais coesa, mais democrática e transparente, mas também mais ágil nas suas decisões e mais capaz de falar com uma voz única no plano externo, traduz-se, consequentemente, num saldo positivo de soberania e de influência dos Estados-membros da União Europeia e não num saldo negativo, com perda de soberania.
Além dos «soberanistas», haverá outros opositores. Haverá aqueles que se opõem ao Tratado de Lisboa porque o seu modelo de referência não é o modelo da Europa democrática e social. E não faltarão aqueles que se oporão ao Tratado de Lisboa e procurarão destruí-lo simplesmente por um prosaico motivo de vingança. Esses são os que, íntima ou declaradamente, entendem que a queda do Muro de Berlim foi uma injustiça ou até uma desgraça. E mesmo que tenham vergonha em admitir que assim pensam, no fundo consideram que essa desgraça e essa injustiça só podem ser reparadas com a queda e a desgraça da Europa.
Mas os cidadãos europeus e os seus representantes perceberão o progresso que o Tratado de Lisboa representa para a Europa. Registarão os ganhos em transparência, eficácia e democracia que ele traz. Tratase de um progresso, inclusive no que respeita à participação dos Parlamentos nacionais no aprofundamento e no acompanhamento da União e na fiscalização dos seus órgãos.
Estamos bem conscientes do progresso que o Tratado de Lisboa representa, mas também não ignoramos os desafios que nos esperam. Um dos mais urgentes é o da criação de condições para o bom entendimento do Tratado de Lisboa.
Por isso, é exigido aos Governos, aos Parlamentos, aos Deputados, às instituições europeias e aos meios académicos um trabalho de rápida realização de uma versão consolidada e de descodificação do Tratado, descodificação esta que permita explicar, de forma simples, as implicações deste mesmo Tratado.
Não adianta limitar-nos a reiterar os aspectos positivos, que sempre soarão mais ou menos abstractos e pouco apreensíveis para o cidadão comum.
Mas os desafios não ficam por aqui. Destaco outro igualmente relevante: a operacionalização das novas soluções institucionais com o inerente reajustamento dos arranjos e estruturas já existentes.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Seria extremamente redutor cingir o sucesso da Presidência portuguesa ao Tratado que leva o nome de Lisboa. Devo lembrar a Cimeira com o Brasil, em Julho, e a Cimeira com África.
Poderíamos mencionar outros dossiers: o da flexissegurança, o projecto Galileu, o plano tecnológico da energia e muitos mais em diversas áreas.
Há que sublinhar duas constatações importantes.
Primeira: Portugal soube ter o talento de obter a unanimidade para posições que, ao mesmo tempo que servem o interesse da Europa, acautelam e promovem interesses estratégicos de Portugal, como é o caso do reforço das dimensões atlântica, mediterrânica e africana da política externa europeia.
Segunda: Portugal mostrou que não sabe apenas valorizar e pôr ao serviço da Europa as relações de proximidade que tem com África, com o Brasil ou com a China. Mesmo naqueles casos em que não há tal proximidade, em que não há relações tradicionais estreitas, em que os interesses estratégicos nacionais não apontam nesse sentido, como por exemplo acontece com a Rússia, é possível contribuir para centrar a atitude da Europa num tom mais construtivo.
Sr. Presidente, não quero terminar sem deixar de sublinhar que é motivo de orgulho o facto de esta Presidência ter ocorrido no momento em que a Comissão é liderada por um português, o Dr. José Manuel Durão Barroso, que daqui saúdo pelo modo como também contribuiu para o sucesso dessa mesma Presidência.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito bem!
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O Sr. Vitalino Canas (PS): — Como também será motivo de orgulho o facto de algumas decisões agora tomadas estarem fadadas para perdurar e serem projectadas durante algumas décadas. Enquanto isso suceder será também o nome de Portugal que se estará a projectar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Em nome do Grupo Parlamentar do PS, e antes de passarmos à fase de encerramento do debate, gostaria de reafirmar a nossa opção acerca da ratificação do Tratado de Lisboa.
Como sabem, o Partido Social Democrata defende que essa ratificação ocorra pela via parlamentar.
Fazemo-lo porque essa é uma fórmula indiscutivelmente legítima. Fazemo-lo porque não somos indiferentes à evolução da Europa nos últimos três anos, tantos quantos decorreram da assinatura, em Outubro de 2004, do Tratado de Roma. Fazemo-lo também porque não é possível continuarmos a conviver com um desfasamento claro entre os instrumentos vigentes de organização da Europa perspectivada para 15 Estados-membros quando, hoje, já somos 27, com novas exigências e novos desafios.
Fazemo-lo também porque queremos ser parte da construção de uma Europa de paz, com prosperidade e com as suas instituições a prosseguirem o seu trabalho com mais eficácia e com mais eficiência.
Por isso, e para concluir, queremos reafirmar, sem tibiezas, por uma questão de responsabilidade política, por uma convicção de assim interpretarmos melhor o interesse nacional, que o PSD, vocacionado para as questões europeias e para a construção desta Europa, decidiu, nos seus órgãos máximos, que a via parlamentar é a que se adequa melhor aos desafios e ao futuro próximo da União Europeia.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Vamos passar ao período de encerramento do debate.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Creio que os portugueses percebem bem que quanto mais afastados estiverem os centros de decisão mais desligados estão dos problemas concretos e das necessidades reais dos cidadãos e dos povos. Quanto mais aproximado estiver o centro de decisão mais atenderá às necessidades e aos problemas reais desses povos.
A cooperação entre Estados poderia ser delineada com essa aproximação de poder, não tinha de ser necessariamente ligada ao afastamento dos centros de decisão dos cidadãos.
Os portugueses já conhecem muito bem alguns resultados concretos deste caminho, designadamente através do Pacto de Estabilidade e Crescimento — talvez assim não soe muito, mas quando se fala dos 3% de défice já soa alguma coisa… — ou da Política Agrícola Comum e das suas consequências para países como Portugal, ao verem o estado actual da nossa agricultura ou do tão falado instrumento da flexigurança, que já não regula propriamente as questões do emprego e o seu fomento, mas promove o desemprego e regula-o.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, na nossa perspectiva, é profundamente preocupante o caminho que está a ser seguido — e damos estes exemplos que os portugueses já vão conhecendo muito bem.
É preocupante a forma como este Tratado agora assinado vem transferir mais competências para a União Europeia, justamente numa lógica de perda de soberania dos Estados-membros. Veja-se aquilo que acontece relativamente aos recursos marinhos, em que nem sequer se tem em conta a possibilidade da competência partilhada no seio da União Europeia, mas da competência exclusiva, ou seja, através do reforço das maiorias qualificadas a nível da política de segurança interna, imigração, direito de asilo, etc.
Os Srs. Deputados referem, depois, a importância do reforço dos parlamentos nacionais neste quadro.
Mas, no fim, esse reforço reduz-se ao poder de ser informado, ao poder de opinar sobre processos de decisão na União Europeia.
Importa também salientar que este Tratado consagra e reforça o poder isolado dos grandes Estados da União Europeia, o que é visível através da distribuição de votos do Conselho, através do fim das presidências rotativas, através do fim do princípio de que todos os Estados têm um comissário com direito de voto permanente na Comissão Europeia… Srs. Deputados, se este não é o caminho para a Europa dos grandes, digam-nos, por favor, qual é! É neste quadro, e com todas estas implicações, que Os Verdes consideram fundamental dar a conhecer aos portugueses o que eles não conhecem, que é justamente o conteúdo deste Tratado, porque anda aí muito boa gente a pintar de cor-de-rosa, e de outras cores, este Tratado, procurando até, de alguma forma, escamotear o seu verdadeiro conteúdo e o caminho que nele se encerra. Por isso, é importante abrir um debate sério, frontal, esclarecedor e que envolva os portugueses relativamente ao conteúdo deste Tratado.
Consideramos que o referendo, para além de tudo o mais, tem também a grande vantagem de pôr os portugueses a debater, a conhecer, a ser esclarecidos sobre o que está em causa neste Tratado.
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Lamentamos que o Governo continue a esconder à Assembleia da República as suas verdadeiras intenções relativamente à forma de ratificação do Tratado. Entendemos — e queremos reforçar — que o Programa do Governo é claro relativamente à exigência do referendo. Queremos relembrar que houve uma revisão constitucional, aprovada por unanimidade, para permitir a realização desse referendo e consideramos que a sua não realização seria uma profunda ofensa e um profundo desrespeito aos portugueses nesta matéria.
Aplausos de Os Verdes.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A seu tempo e nas condições precisas, o Bloco de Esquerda irá avaliar o Roteiro de Bali, o acordo da flexigurança, as várias cimeiras externas que foram organizadas durante o período da Presidência portuguesa (em especial, a Cimeira União Europeia-África) e as concepções que presidem às parcerias e a outros aspectos das relações externas da União, bem como outros aspectos que se traduzirão em futuras medidas da União Europeia, sendo questão assente e incontrovertida que o Tratado de Lisboa é, para todos os efeitos, o ponto alto da Presidência portuguesa.
Um Tratado de conteúdo liberal, que rejeitamos totalmente, mas que marca e simboliza, para o bem e para o mal, a Presidência portuguesa. Um Tratado que reunirá os seus adeptos confessos e outros, neste país e, para além do nosso país, no conjunto dos países da União Europeia.
Cá estaremos para o debate dos conteúdos de tudo isso, incluindo do Tratado.
A questão que se coloca é a da ratificação do Tratado de Lisboa e, por isso, essa questão marcou toda a discussão. Ora, com o devido respeito, gostaria de dizer o seguinte: o cidadão Luís Amado tem evidentemente todo o direito a posições de princípio sobre o que quer que seja. Mas o Ministro Luís Amado deveria ter-nos dito se está de acordo com o que, acerca da ratificação do Tratado, diz o Programa do Governo, do seu Governo, do Governo do qual é, neste momento, Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros e do qual era, na altura em que esse Programa do Governo foi apresentado neste Parlamento, Ministro da Defesa Nacional.
Em suma, gostaria de saber se o Ministro Luís Amado está ou não de acordo com o Programa do Governo.
Quanto à posição do cidadão Luís Amado, tenho o maior gosto em ouvi-la, tenho o maior respeito intelectual por tentar percebê-la, mas ela não importa ao Plenário do Parlamento. O que importa ao Plenário do Parlamento saber é a posição do Ministro Luís Amado.
E creio que é um sofisma total dizermos «participámos num processo negocial na União Europeia, não há qualquer acordo oculto, cada um fez a leitura subjectiva do processo onde se encontrava e todos virão a tirar as conclusões acerca do processo de ratificação». Se isso não embota a nossa inteligência crítica, compreendemos todos que houve uma posição de partida do conjunto dos Estados-membros e que essa posição de partida foi trabalhada pela diplomacia dos vários Estados. É que eles não se encontraram, no mesmo sítio e à mesma hora, caminhando na mesma direcção, não sabendo ao que iam. Isso é que creio ser um embuste para a inteligência crítica de qualquer cidadão, para uma racionalidade mínima deste processo.
Portanto, não é meramente uma questão de quebra da palavra dada que antecipamos aqui como debate; é algo mais do que isso. É sobre a forma de legitimação política: que tipo de Europa é esta, que tipo de tratados são estes que, depois, não podem merecer o escrutínio dos povos e, em primeiro lugar, do povo português? Se o Primeiro-Ministro, que, como cidadão, tem seguramente uma opinião muito diferente do cidadão Luís Amado, escolheu vincar bem a opção deste Governo por um referendo no seu discurso de posse como Primeiro-Ministro, não percebemos por que é que o Governo vai manter até aos primeiros dias de Janeiro esta posição de encobrimento de uma decisão, qualquer que ela seja.
A responsabilidade da Presidência? Bom, mas a responsabilidade da Presidência está já, neste momento, na passagem do testemunho. A calma da quadra natalícia, que, com alguma jocosidade, hoje aqui nos invocou? A propósito de quê? Creio, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, que a questão é muito séria, do ponto de vista da democracia, de qualquer ideia de democracia europeia que venhamos a ter e, sobretudo, da democracia portuguesa e da relação de respeito que deve haver entre os governos, os parlamentos, os partidos que têm maiorias absolutas e os compromissos com o eleitorado.
É certo que o PSD já antecipa o caminho. O PSD prometeu ao eleitorado um referendo e mudou de opinião, o que prometeu ao eleitorado já não conta.
O Partido Socialista apressa-se a seguir o caminho indicado pelo PSD.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.
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Ministro dos Negócios Estrangeiros: Sr. Ministro, depois da sua não-resposta sobre a questão do referendo, quase apetecia fazermos aqui… Sabe o quê? Desejarmos a todos um bom Natal e um bom Ano Novo, irmos todos para casa e voltarmos em Janeiro, para ouvirmos finalmente a sua resposta. Não pode ser. Enfim, é a vida… De maneira que vamos, mesmo assim, intervir no período de encerramento deste debate.
Sr. Presidente, quem, durante estes seis meses, ouviu o discurso oficial, ou certo discurso oficioso — vindo de um bloco central que nem sequer ensaia qualquer sinal de desavença —, quase seria tentado a concluir que discordar das estratégias da Presidência portuguesa ou apontar a dedo as soluções por ela propostas constituiria uma espécie de crime de traição à Pátria, com o qual se estaria a denegrir este País.
Esta atitude pacóvia e provinciana reflecte muito bem uma posição subserviente — quando não servil —, que muito deste discurso esconde por trás da auto-satisfação, da arrogância e de uma falsa defesa dos interesses de Portugal e dos portugueses.
Vem tudo isto a propósito do balanço da Presidência Portuguesa da União Europeia — a última, caso o tão elogiado Tratado Reformador venha a ser ratificado — e em jeito de remate deste debate.
Para o PCP, Portugal pouco ou nada tem, de facto, a festejar com esta Presidência. Nada tem a festejar com o Tratado Reformador, já aprovado e assinado, mas cuja ratificação por via referendária, ouvindo os cidadãos em nome dos quais é anunciado, se impõe por imperativos políticos e éticos.
O Sr. António Filipe (PCP): — Muito bem!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Um Tratado que reforça o poder do directório dos países mais ricos e remete à (quase) insignificância política o papel e a influência de Portugal e de outros Estados médios e pequenos. Um Tratado através do qual se diminui o número de Deputados portugueses, que elimina a presença permanente de um português na Comissão Europeia e que cria a figura (quase) sinistra do Presidente do Conselho Europeu — em boa verdade, do Presidente do Conselho de Administração dos interesses dos Estados dominantes.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Muito bem!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Por que raio haveríamos nós de festejar um Tratado cada vez mais federalista, cada vez mais apostado na criação de um bloco de dominação estratégica — e mesmo militar — do mundo, para que arrasta o nosso país, mesmo que ao arrepio da Constituição da República? Mas não é só o Tratado que nos afasta deste balanço oficial tão «cor-de-rosa»! Portugal não pode festejar que a sua Presidência tenha acolhido os princípios da flexigurança, a liberalização dos despedimentos, o reforço institucional para a desregulamentação das relações de trabalho, no fundo, a criação de melhores condições para cortar direitos tão duramente conquistadas pelos trabalhadores e pelos povos, ao longo de muitas dezenas de anos.
Como pode Portugal festejar as decisões ontem apadrinhadas pela Presidência portuguesa sobre as alterações no sector vitivinícola? Como podemos aceitar que nos acenem com mais milhões para «comprar» o nosso silêncio e nos queiram impor, hoje, o arranque da vinha cuja plantação pretendem liberalizar daqui a alguns anos?
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Como podemos festejar que um país de marinheiros e pescadores, com a maior zona económica exclusiva (ZEE) da União Europeia, aceite, ainda por cima sob a Presidência portuguesa, alienar os instrumentos que lhe permitiam gerir não só os recursos piscícolas mas igualmente os recursos marinhos? Por fim, e para abordar todos os temas que José Sócrates tem usado como «troféus de caça» (passe a expressão), importa referir as cimeiras. A utilidade das cimeiras não se pode resumir ao anúncio de boas ideias contra bloqueamentos interessados ou interesseiros. A utilidade das cimeiras é medida, sobretudo pelo seu conteúdo e pelos seus resultados. Quando concluímos que não houve qualquer anulação da dívida externa dos países pobres e que o famoso objectivo de 0,7% do PIB na ajuda pública ao desenvolvimento continuam a ser figuras de retórica, percebemos melhor o que significam as novas parcerias económicas para manter e reforçar uma reiterada vontade de ingerência neo-colonial.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Uma última palavra. Durante estes seis meses, lemos e ouvimos milhares de páginas de textos produzidos pela Presidência portuguesa sobre os mais diversos temas.
O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.
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O Sr. Honório Novo (PCP): — Não nos recordamos de ter lido ou ouvido qualquer referência à coesão social e à convergência económica.
A verdade é, assim, incontornável: a coesão económica e social, a progressiva aproximação aos níveis mais elevados de vida foram completamente varridos do discurso europeu, também por via da Presidência Portuguesa da União Europeia.
É triste e lamentável! Mas bem significativo e revelador dos interesses que a chamada «esquerda modernaça» continua a servir!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Terminada a Presidência portuguesa, cumpre fazer um balanço, que, para o CDS, é, como já foi aqui dito, positivo — e, ao dizê-lo, acompanho o que foi referido pelos meus antecessores, nomeadamente pelo presidente do meu partido.
Mas importa também recordar o que foi dito, no início dessa mesma Presidência. Permitam-me que recorde o que o CDS disse num debate com o Sr. Primeiro-Ministro, que marcava justamente o início dessa Presidência: «O CDS deseja que Portugal tenha uma Presidência profissional e competente, que permita a assinatura do Tratado de Lisboa. Seremos neste período uma oposição firme, mas leal, pois sabemos separar as questões europeias com oposição interna».
Ora, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, no CDS, a palavra tem o seu valor.
Por isso mesmo, praticamente concluída a Presidência, afirmamos com clareza e para que não fiquem dúvidas: a Presidência portuguesa foi profissional e competente, permitiu ultrapassar o impasse institucional europeu que afectava o seu funcionamento, a sua economia e a afirmação do seu papel no mundo. Por isso, não deixamos de felicitar o Governo, bem como — e nunca é demais recordar — a excelência da diplomacia portuguesa.
Aplausos do CDS-PP.
Mas também, Sr. Presidente, neste período, o CDS soube denunciar os sucessivos erros internos que este mesmo Governo tem vindo a cometer em áreas — e só para citar alguns exemplos — como a fiscalidade, a segurança ou a educação.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Em suma, cumprimos a palavra: na oposição, somos firmes, mas leais! A nosso ver, desta Presidência resulta como positivo o Tratado de Lisboa, que assegura, como disse, um mínimo de equilíbrio entre países, contra uma lógica de directório que rejeitamos.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — As cimeiras com os denominados países BRIC, esperamos, irão marcar uma nova posição da Europa no mundo, nomeadamente a nível económico, mas não só! Ou o reforço, como já foi aqui dito, do papel dos parlamentos nacionais.
Não queremos deixar de mostrar também a nossa preocupação em relação a alguns temas. Foram sendo dados uns passos ténues na política de imigração, nomeadamente ao nível da Cimeira União Europeia/África — que não deixou de ser relevante mas que não permitiu os passos que esperaríamos, que desejaríamos e, mais, de que necessitaríamos —, e também ao nível da política europeia do mar.
Preocupa-nos ainda o facto de existir alguma dificuldade de relação entre o futuro presidente do Conselho Europeu e o Presidente da Comissão, mas são questões que temos esperança que venham a ser apresentadas.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Em conclusão, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, durante este período o CDS fez o seu papel e cumpriu a sua palavra — oxalá todos pudessem fazer o mesmo.
Aplausos do CDS-PP.
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O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Pais Antunes.
O Sr. Luís Pais Antunes (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, cabe-me, em nome do PSD, proferir algumas palavras no encerramento deste debate, e gostaria de começar por sublinhar que, infelizmente, este debate não trouxe surpresas. Com algumas honrosas excepções — e uma delas foi certamente a intervenção do Sr. Deputado Mário David —, pouco se falou sobre a Europa, pouco se falou sobre o Conselho Europeu e muito pouco, para não dizer nada, se falou sobre um dos temas da agenda, o Relatório de Acompanhamento do Programa Legislativo e de Trabalho da Comissão Europeia para 2008.
Falou-se, sobretudo, da Presidência portuguesa e do seu sucesso, que gostaria de sublinhar mais uma vez, na linha do que os Deputados do PSD que me antecederam já fizeram. Estiveram bem as autoridades portuguesas, esteve bem o Governo português. Esta Presidência correu bem, como, aliás (cabe sublinhar), correram as anteriores. Estão de parabéns também as instituições europeias e a Comissão Europeia, em particular.
Mas, atenção, penso que não devemos cair no erro de nos precipitarmos, fazendo balanços excessivamente optimistas e extemporâneos sobre os resultados desta Presidência. O futuro dir-nos-á qual o verdadeiro sucesso desta Presidência, e o passado já nos deu um número suficiente de lições para percebermos que «nem sempre aquilo que parece é» — e, infelizmente, a Europa e a história da União Europeia têm sido disso férteis exemplos.
Gostaria também de dizer que, independentemente da decisão — porque é disso que se trata! —, que o Governo e a maioria que o apoia tomarão e anunciarão ao País dentro de 10 dias (isto segundo o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros aqui nos anunciou), a Europa está confrontada com um desafio que é certamente o mais importante e o maior que se lhe coloca e que é o de um real e verdadeiro défice de discussão. Esse desafio coloca-se à Europa, em geral, e ao nosso país, em particular.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Pais Antunes (PSD): — É necessário realizar um amplo e grande debate, que envolva não apenas os agentes políticos, não apenas o Governo, a Assembleia da República, mas também os agentes económicos e, sobretudo, a sociedade civil.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Pais Antunes (PSD): — Sem conseguirmos fazer esse debate, a discussão da via ou da forma de ratificação é perfeitamente espúria. O que está aqui em causa não é saber como se ratifica ou como se vota; o que está aqui em causa é levar os europeus e os portugueses, em particular, a discutir a Europa, a discutir a justeza das suas políticas e das opções e dos caminhos que estamos a seguir.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Pais Antunes (PSD): — Neste aspecto, o PSD será firme, e proporá todas as medidas necessárias com vista a levar a cabo essa discussão.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Pais Antunes (PSD): — Gostaria ainda de sublinhar que, se é verdade que durante todo este período da Presidência portuguesa, que se determinará dentro de alguns dias, houve da parte do PSD, em particular, uma postura de Estado e um respeito pelo papel institucional que o Governo desempenhou, isso não significa que o PSD esteja de acordo com tudo e com todos os passos que foram dados pelo Governo português. E, apesar de não querermos misturar neste debate questões de política interna, não posso deixar de manifestar aqui o desejo de que o Governo — muito ocupado que tem estado, e bem, com a Presidência portuguesa — regresse, permitam-me a expressão, «à terra», a partir do dia 1 de Janeiro, e que a partir dessa data esteja mais atento à realidade dos portugueses e dos problemas dos portugueses…
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Pais Antunes (PSD): — … e, sobretudo, às implicações que as reformas recentemente decididas no âmbito da União Europeia nos colocam e que nos obrigam a desenvolver os máximos esforços para as ultrapassar.
É este o voto que aqui gostaria de deixar, junto com os votos também de um Bom Natal para o Governo e para os Deputados da maioria.
Aplausos do PSD.
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O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jacinto Serrão.
O Sr. Jacinto Serrão (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Neste debate de encerramento, é possível fazer um pequeno resumo daquilo que aconteceu, ao longo do debate.
Tal como era esperável, nós pudemos verificar dois tipos de registo bem claros nesta Casa: o registo do Partido Socialista (e do Governo), que procurou centrar todo o seu discurso nas questões essenciais, inerentes ao tema agora em debate e, consequentemente, procurou esclarecer a opinião pública sobre o tema que estamos a discutir neste momento; e o registo da oposição, que procurou, claramente, ignorar os êxitos da Presidência portuguesa, colocando questões meramente laterais,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Claro, o referendo é à lateralidade…!
O Sr. Jacinto Serrão (PS): — … lateralidades, pura e simplesmente, Srs. Deputados,…
O Sr. Honório Novo (PCP): — A gestão dos recursos do mar na sua terra também é uma «lateralidade»…!
O Sr. Jacinto Serrão (PS): — … e com um objectivo muito claro: o objectivo foi o de confundir a opinião pública…
Protestos do PCP.
Srs. Deputados, posso concluir? Dizia eu que o objectivo foi o de confundir a opinião pública e de diminuir o êxito ou, melhor, os grandes êxitos da Presidência portuguesa no Conselho.
Agarraram-se à questão da ratificação do Tratado, mas, Srs. Deputados, nós temos muito tempo para fazer esse debate, para discutir sobre esses assuntos.
Não se precipitem, há muito tempo para fazer esse debate! Aliás, seria bom recordar as vozes dos partidos da oposição e o seu próprio tom, que, ao longo do tempo de toda a Presidência portuguesa, muitas vozes que procuraram criticar — algumas delas num tom verdadeiramente agoirento — a ambiciosa agenda com que o Governo português se abalançou para esta Presidência,…
O Sr. Afonso Candal (PS): — É verdade!
O Sr. Jacinto Serrão (PS): — … agenda essa que se materializou em todos os seus pontos. Pois bem, Srs. Deputados da oposição, perante os evidentes resultados, é altura de «enfiarem a viola no saco».
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Que classe!…
Vozes do CDS-PP: — Estava isto a correr tão bem!…
O Sr. Jacinto Serrão (PS): — Sr.as e Srs. Deputados, pouco se falou do Programa Legislativo e do Trabalho da Comissão Europeia para 2008…
Protestos do PSD, do CDS-PP, do PCP, do BE e de Os Verdes.
Sr. Presidente, se me é permitido concluir…! Do Programa Legislativo e do Trabalho da Comissão Europeia para 2008, pouco se falou neste debate. E vale a pena recordar que grande parte das iniciativas da Comissão Europeia para o ano 2008 advém do trabalho produzido pela Presidência portuguesa durante estes seis meses. Portanto, Sr.as e Srs. Deputados, Portugal continuará a estar presente, no ano 2008 e noutros anos, no processo de trabalhos da União Europeia, mesmo findo o mandato da sua Presidência, agora, no mês de Dezembro.
Também importa realçar alguns aspectos mas, pelos vistos, não tenho tempo para realçar esses aspectos das iniciativas da Comissão Europeia para 2008, pelo que me fico pela melhoria da qualidade legislativa. Nós estamos no Parlamento, que é o melhor lugar, o lugar por excelência para fazer esse trabalho, ou seja, acompanhar esta iniciativa da União Europeia, de maneira a podermos melhorar a produção legislativa no espaço europeu.
É evidente que, para além da desejada cooperação entre todos os Deputados e todas as comissões especializadas, também é necessário recordar que os Parlamentos Regionais da Madeira e dos Açores também têm aqui um papel importante nestes trabalhos.
Por isso mesmo é que nós, Parlamento nacional — e tivemos a oportunidade de ouvir o Sr. Presidente da
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Assembleia numa reunião em que estavam presentes os representantes dos Parlamentos nacionais —, vamos fazer com que os Parlamentos regionais sejam ouvidos com muito mais regularidade sobre as iniciativas da União Europeia. E é assim, Sr.as e Srs. Deputados, que se valoriza, de uma forma séria e honesta, o processo de construção das autonomias da Madeira e dos Açores.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para a intervenção de encerramento do debate, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Vai dizer agora que vão realizar o referendo!
Risos.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Queria…, Sr. Deputado, mas tem de esperar mais uns dias! Tem de esperar pelo Ano Novo! O Ano Novo traz novas ideias!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — E a nova ideia não é a do Programa do Governo!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Algumas notas finais, no encerramento deste debate: nada de novo!! Sabemos que a Câmara expressa um consenso que tem sustentado a política externa do País e, em particular, a política europeia, ao longo dos últimos anos. Este consenso mantém-se, como se pôde verificar aqui, pelas várias intervenções.
A esquerda à esquerda do Partido Socialista…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — A esquerda! Diga!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — … nada aprendeu, nada de novo durante estes anos! É, aliás, absolutamente ridículo! Creio que qualquer cidadão português que tivesse oportunidade de ouvir este debate não deixaria de ficar chocado com as intervenções que quer o Partido Comunista, quer o Bloco de Esquerda, quer Os Verdes aqui fizeram hoje, porque são absolutamente incapazes de reconhecer um pequeno aspecto positivo que tenha decorrido de um trabalho desenvolvido, com rigor e profissionalismo, durante seis meses, não digo pelo Governo mas por milhares e milhares de portugueses de diferentes partidos — alguns deles são comunistas! —,…
Aplausos do PS.
Protestos do PCP.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Não vá por aí, Sr. Ministro! Isso é populismo do mais baixo! E o Sr. Ministro sabe bem que esta bancada não faz isso!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — … que puseram nesse trabalho a imagem do País e procuraram, justamente por isso, honrar o prestígio de Portugal.
Creio que a esquerda se mantém acantonada num beco da História, incapaz de perceber o que se está a passar à sua volta e, por isso mesmo, por ser incapaz de perceber o que se passa à sua volta, se vai acantonando cada vez mais no seu reduto nacionalista, de valores contraditórios.
Foi absolutamente patético ver, na assembleia do Parlamento Europeu, na passada semana, uma esquerda envergonhada e incapaz de reagir, quando percebeu que estava a fazer o jogo da extrema-direita mais nacionalista, mais xenófoba.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Seja sério, Sr. Ministro!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Eles escondiam as camisolas, envergonhados justamente pelo facto de ficarem associados a uma das pateadas mais vergonhosas que o Parlamento conheceu.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — É falso!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso não foi a esquerda!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — É esta contradição, este beco da História em
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que os senhores se colocaram que os impede de compreenderem o mundo e, justamente, de acompanharem o projecto europeu.
Aplausos do PS.
O Governo tem a consciência tranquila. Nós temos a consciência do dever cumprido; temos a consciência de que o fizemos procurando enquadrar todos aqueles que devem prestigiar a imagem do País na frente externa. O País é hoje respeitado na frente externa, porque tem uma base de consenso político-partidário que todos os agentes responsáveis neste País têm sabido preservar, ao longo de três décadas de vida democrática.
Eu, enquanto Ministro dos Negócios Estrangeiros, tudo tenho feito no sentido de garantir que a coesão de um bloco que sustenta a credibilidade da política externa do País se mantenha firme,…
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — … designadamente quando estão em causa os profundos interesses do nosso País. E é por isto que, com muita honra, chego ao final deste debate reconhecendo quem nos elogia e quem nos ataca. Nada de novo! Seria preocupante se eu visse que o elogio vinha de quem sempre nos criticou, de quem sempre orientou a sua acção pelo desgaste da política externa do Partido Socialista,…
Protestos do PCP e de Os Verdes.
… e seria absolutamente chocante para mim, ter hoje mesmo, da parte do Partido Comunista Português ou do Bloco de Esquerda, o apoio que, a meu ver, seria, no mínimo, legítimo, reconhecendo a acção que foi desenvolvida ao longo destes últimos meses.
A Sr.ª Isabel Jorge (PS): — Eles nada reconhecem, nada!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Gostava ainda de deixar uma nota final.
Temos a consciência de que os desafios com que estamos confrontados do ponto de vista nacional são enormes, e não apenas num Estado com a dimensão de Portugal. O que temos verificado, ao longo dos últimos anos, é que as grandes potências europeias reconhecem hoje que não é possível fazer face aos enormes problemas, aos complexos e difíceis problemas que temos pela frente se não formos capazes de manter bem vivo o projecto europeu. E é esse o desafio que temos pela frente.
Foi no aprofundamento, no desenvolvimento desse projecto que a Presidência portuguesa fez fica pé ao longo dos últimos meses, com ambição, com sentido de risco mas com bom senso. Essas são qualidades de liderança que soubemos transmitir ao projecto europeu.
A liderança do Primeiro-Ministro foi absolutamente incontornável. Sem a sua capacidade de liderança e de risco não tínhamos dado à Europa a imagem de que esta podia sair do beco em que estava no timing em que decidimos, não podíamos avançar em projectos que estavam bloqueados há muito tempo. Fizemo-lo precisamente porque houve ambição e risco, associado ao bom senso que tem mantido, naturalmente, toda a acção externa dos diferentes governos que têm presidido aos destinos do nosso país.
E é com esse mesmo espírito que aqui estamos para entrar numa nova fase da nossa relação com o projecto europeu, certos de que prestigiámos o País na Europa e na relação da Europa com o mundo. Nas regiões do Mediterrâneo, na América Latina, no mundo árabe islâmico, em África, nós hoje temos, no fim desta Presidência, um País mais respeitado, mais credibilizado e com uma imagem diferente da que tinham há um ano.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Temos essa convicção! Temos a convicção de que o «reboque» do projecto europeu tocou não apenas nos europeus mas em todos os povos que olham para a Europa e a vêem como um factor de estabilidade fundamental para a paz e a estabilidade no sistema internacional num dos momentos de crise mais grave que este conhece desde a II Guerra Mundial.
E são estes factores, que, aliás, alguns Deputados já aqui referiram, designadamente o Sr. Deputado do PSD, que devem ser ponderados quando se faz a avaliação das opções políticas que vamos ter de assumir no futuro mais imediato.
O mundo está a mudar muito radical e vertiginosamente. Não olhemos para o mundo com os parâmetros de análise da realidade que tínhamos depois do fim da Guerra Fria. Depois do 11 de Setembro toda a realidade internacional está numa dinâmica de enorme volatilidade e é preciso que o projecto europeu se adapte rapidamente às circunstâncias novas com que nos confrontamos.
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É absolutamente indispensável que cada Estado que faz hoje parte do projecto europeu perceba, como tem percebido no dia-a-dia, ao longo dos últimos anos, que não há forma hoje de fazer face aos grandes problemas com que o sistema internacional, a Europa e cada Estado se confrontam se não nos associarmos em plataformas multilaterais. E, felizmente, estamos associados a uma dessas plataformas, a uma das plataformas que tem sabido desenvolver uma acção política e estratégica de maior estabilidade no sistema internacional, que é justamente o projecto europeu. O seu aprofundamento e desenvolvimento são um desafio enorme para países como o nosso.
Temos hoje o orgulho, no fim desta Presidência, de ter dado um contributo muito importante para a clarificação desse projecto, para o seu desenvolvimento e para o seu aprofundamento para uma Europa mais forte, como dissemos, num mundo melhor.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, está concluído o nosso debate sobre o último Conselho Europeu.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, peço desculpa por me ter esquecido de desejar a todos os Srs. Deputados — e, naturalmente, também aos Srs. Deputados do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista, objecto da minha crítica — os votos de um Bom Natal e um Bom Ano, com boas notícias no início do ano para todos vós.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, estão concluídos os nossos debates sobre a Presidência portuguesa da União Europeia, o último Conselho Europeu e o Programa Legislativo e de Trabalho da Comissão Europeia para 2008.
A próxima sessão plenária realizar-se-á amanhã, às 10 horas, tendo como ordem do dia um debate com o Ministro da Defesa Nacional, ao abrigo do artigo 225.º do Regimento, no final do qual haverá lugar a votações.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 10 minutos.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
António José Martins Seguro
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Partido Social Democrata (PSD):
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
José Manuel Pereira da Costa
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Miguel Pereira de Almeida
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Zita Maria de Seabra Roseiro
Partido Comunista Português (PCP):
José Honório Faria Gonçalves Novo
Miguel Tiago Crispim Rosado
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Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:
Partido Socialista (PS):
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Partido Social Democrata (PSD):
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Partido Socialista (PS):
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
Marta Sofia Caetano Lopes Rebelo Gonçalves
Partido Social Democrata (PSD):
Domingos Duarte Lima
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