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Quinta-feira, 13 de Março de 2008 I Série — Número 58

X LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2007-2008)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 12 DE MARÇO DE 2008

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex.mos Srs. Maria Isabel Coelho Santos
Fernando Santos Pereira
Abel Lima Baptista
Artur Jorge da Silva Machado

SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 10 minutos.
Após leitura da acta da eleição dos Membros do Conselho Geral do Centro de Estudos Judiciários foram proclamados eleitos os candidatos propostos.
Deu-se conta da entrada na Mesa dos projectos de lei n.os 476 e 477/X, da proposta de resolução n.º 70/X e dos projectos de resolução n.os 284 e 285/X.
Foi aprovado o projecto de resolução n.º 285/X — Deslocação, de carácter particular, do Presidente da República a Moçambique (Presidente da AR).
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia (Os Verdes) trouxe à colação a contestação dos professores ao modelo de avaliação proposto pelo Ministério da Educação, a qual congregou milhares de docentes na marcha pela indignação. Depois, respondeu a pedidos de esclarecimento da Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça (PS).
Sobre o mesmo tema versou a declaração política da Sr.ª Deputada Ana Drago (BE), que respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Isabel Coutinho (PS), José Paulo Carvalho (CDS-PP) e Emídio Guerreiro (PSD).
Em declaração política, o Sr. Deputado Miguel Tiago (PCP) verberou também a política de ensino do Governo e, no fim, deu resposta aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados José Paulo Carvalho (CDS-PP), Emídio Guerreiro (PSD) e Manuel Mota (PS).
Igualmente em declaração política, a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro (CDS-PP) acusou o Governo de, na área da saúde, ter recuado em relação a posições assumidas anteriormente e de as ter corrigido de acordo com propostas que o seu partido tem vindo a apresentar e respondeu a pedidos de esclarecimento das Sr.as
Deputadas Maria Antónia Almeida Santos (PS) e Regina Ramos Bastos (PSD).
Ainda em declaração política, o Sr. Deputado Bravo Nico (PS) defendeu o modelo de avaliação de professores proposto pelo Ministério da Educação. No final, respondeu aos pedidos de esclarecimento colocados pelos Srs. Deputados João Oliveira (PCP), Ana Drago (BE), José Paulo Carvalho (CDS-PP), Emídio Guerreiro (PSD) e Heloísa Apolónia (Os Verdes) e deu explicações ao Sr. Deputado Bernardino Soares (PCP), que usou da palavra em defesa da consideração da sua bancada.
Procedeu-se à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 175/X — Procede à alteração do Estatuto dos Magistrados Judiciais e do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, em relação à qual se

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pronunciaram o Sr. Ministro da Justiça (Alberto Costa) e os Srs. Deputados Nuno Magalhães (CDS-PP), Helena Terra (PS), António Montalvão Machado (PSD), João Oliveira (PCP) e Helena Pinto (BE).
Foi também discutida, na generalidade, a proposta de lei n.º 181/X — Procede à segunda alteração ao Código do Imposto sobre Veículos, aprovado pela Lei n.º 22-A/2007, de 29 de Junho, introduzindo ajustamentos em matéria de condições de condução por outrem de veículos de pessoas com deficiência e de admissão temporária de veículos por trabalhadores transfronteiriços. Intervieram, além do Sr.
Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Carlos Baptista Lobo), os Srs. Deputados Patinha Antão (PSD), José Paulo Carvalho (CDS-PP), Honório Novo (PCP) e Hugo Nunes (PS).
Foi apreciado o Decreto-Lei n.º 20/2008, de 31 de Janeiro, que simplifica o regime do registo de veículos e procede à nona alteração ao Decreto-Lei n.º 54/75, de 12 de Fevereiro, à sétima alteração ao Regulamento do Registo de Automóveis, aprovado pelo Decreto n.º 55/75, de 12 de Fevereiro, à décima sexta alteração ao Regulamento Emolumentar dos Registos e do Notariado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 322-A/2001, de 14 de Dezembro, e à segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 178-A/2005, de 28 de Outubro [apreciações parlamentares n.os 66/X (PSD), 67/X (CDS-PP) e 68/X (PCP)], tendo feito intervenções, além do Sr. Secretário de Estado da Justiça (João Tiago Silveira), os Srs. Deputados Luís Rodrigues (PSD), Diogo Feio (CDSPP), Agostinho Lopes (PCP), Helena Pinto (BE) e Ricardo Rodrigues (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 35 minutos.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto de Sousa Martins
Alcídia Maria Cruz Sousa de Oliveira Lopes
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Cardoso Duarte da Rocha Almeida Pereira
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Ceia da Silva
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
David Martins
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Elísio da Costa Amorim
Esmeralda Fátima Quitério Salero Ramires
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Fernando Manuel de Jesus
Fernando dos Santos Cabral
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Hugo Miguel Guerreiro Nunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jacinto Serrão de Freitas
Jaime José Matos da Gama
Joana Fernanda Ferreira Lima
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
Joaquim Ventura Leite
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Jovita de Fátima Romano Ladeira
João Carlos Vieira Gaspar
João Cândido da Rocha Bernardo
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
Júlio Francisco Miranda Calha
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro

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Lúcio Maia Ferreira
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel José Mártires Rodrigues
Manuel Luís Gomes Vaz
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Marcos Sá Rodrigues
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Eugénia Simões Santana Alho
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Irene Marques Veloso
Maria Isabel Coelho Santos
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Júlia Gomes Henriques Caré
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento Diniz
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Marisa da Conceição Correia Macedo
Marta Sofia Caetano Lopes Rebelo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson Madeira Baltazar
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paula Cristina Nobre de Deus
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato Luís Pereira Leal
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rita Manuela Mascarenhas Falcão dos Santos Miguel
Rita Susana da Silva Guimarães Neves
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino da Costa
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Umberto Pereira Pacheco
Vasco Seixas Duarte Franco
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Vítor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Pinheiro Pereira

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio André Brandão de Almeida Teixeira
Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho
Ana Zita Barbas Marvão Alves Gomes

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António Joaquim Almeida Henriques
António Paulo Martins Pereira Coelho
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Santos Pereira
Fernando dos Santos Antunes
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Virgílio Leite Almeida Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
José Manuel de Matos Correia
José Pedro Correia de Aguiar Branco
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
José de Almeida Cesário
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Miguel Pais Antunes
Luís Miguel Pereira de Almeida
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Olímpia do Nascimento Castro Candeias
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Mário Patinha Antão
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Miguel de Santana Lopes
Pedro Quartin Graça Simão José
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos
Ricardo Jorge Olímpio Martins
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha

Partido Popular (CDS-PP):
Abel Lima Baptista
António Carlos Bivar Branco de Penha Monteiro

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Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
José Helder do Amaral
José Paulo Ferreira Areia de Carvalho
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Batista Mestre Soeiro
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Miguel Tiago Crispim Rosado

Bloco de Esquerda (BE):
Ana Isabel Drago Lobato
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
Helena Maria Moura Pinto
José Borges de Araújo de Moura Soeiro
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Mariana Rosa Aiveca Ferreira

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
José Miguel Pacheco Gonçalves

Deputado não inscrito em grupo parlamentar:
Maria Luísa Raimundo Mesquita

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Secretária, para dar conta do expediente.

A Sr.ª Secretária (Isabel Santos): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a acta da eleição para o Conselho Geral do Centro de Estudos Judiciários é do seguinte teor:

«Aos sete dias do mês de Março de dois mil e oito, procedeu-se à eleição para o Conselho Geral do Centro de Estudos Judiciários.
O resultado obtido foi o seguinte: Votantes — 172 Votos «sim» — 143 Votos brancos — 27 Votos nulos — 2 Nos termos legais aplicáveis e face ao resultado obtido, declaram-se eleitos para o Conselho Geral do Centro de Estudos Judiciários os seguintes candidatos: Efectivos: Vitalino José Ferreira Prova Canas (PS)

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José Manuel Pereira da Costa (PSD) Suplente: António Ribeiro Gameiro (PS) Para constar se lavrou a presente acta que vai ser devidamente assinada.» Deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: proposta de resolução n.º 70/X — Aprova o Tratado entre o Reino de Espanha, a República Francesa, a República Italiana, o Reino dos Países Baixos e a República Portuguesa, visando a criação da Força de Gendarmerie Europeia (EUROGENDFOR), assinado em Velsen, na Holanda, a 18 de Outubro de 2007, que baixou à 2.ª Comissão; projectos de lei n.os 476/X — Regime de comparticipação de opióides (CDS-PP), que baixou à 10.ª Comissão, e 477/X — Elevação da vila de Samora Correia a cidade (PSD), que baixou à 7.ª Comissão; projectos de resolução n.os 284/X — Suspensão da avaliação do desempenho do pessoal docente e alteração dos mecanismos de avaliação (CDS-PP) e 285/X — Deslocação, de carácter particular, do Presidente da República a Moçambique (Presidente da AR).

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos votar o projecto de resolução n.º 285/X.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência da Deputada N insc. Luísa Mesquita.

Passamos às declarações políticas.
Para o efeito, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: No passado Sábado, ocorreu em Lisboa a maior manifestação de sempre de um único sector, o dos professores: 100 000 na rua, a mostrar a sua indignação ao Governo! Os professores, no histórico dia 8 de Março, aplicaram um modelo de avaliação de políticas e chumbaram o Governo. Curioso que o Governo não queira aceitar esse modelo de avaliação e continue a afirmar que ficou indiferente à voz dos 100 000 que corporizaram a marcha pela indignação.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, estes 100 000, por mais que se diga o contrário, não deixaram indiferente ninguém: nem o membro mais arrogante dum Governo conseguiria ignorar esta força humana de indignação.
O Governo, que se quer fazer avaliar apenas nas urnas, que quer reduzir a participação do povo ao voto, foi obrigado a ver e a ouvir.
É certo que o Governo tentou que a manifestação não tivesse sucesso, mas os professores deram, convicta, absoluta e veementemente, a resposta necessária.
Que outra leitura pode ter, Srs. Deputados, a visita que agentes da PSP fizeram, em véspera da manifestação, a várias escolas do País (como Ourém, Porto, Matosinhos, Santarém)? Que outra leitura pode ter que não a da tentativa de intimidação, de desmobilização dos professores para a participação na manifestação? Cabe lá na cabeça de alguém que estivessem a contar os manifestantes para lhes poder garantir segurança (seria uma contagem altamente deficitária, então!)? Cabe lá na cabeça de alguém que os agentes da PSP se tivessem lembrado, por sua própria criação, de tomar aquela iniciativa? Então, não «está na cara» que receberam ordens? De quem? Quem ordenou o quê a quem? Isto é tanto mais intolerável quanto já houve outras situações idênticas, aquando de outras grandes manifestações contra o Governo, e o Ministro da Administração Interna parece que não aprendeu a lição e mantém a abertura suficiente para que estes actos de atentado à democracia se repitam.
Com os erros já cometidos, de controlo de manifestantes e de aderentes a greves por parte de forças de segurança, não é tolerável que o Ministro da Administração Interna não tenha informado as forças de segurança deste país que esse erro, esse atentado aos mais básicos valores democráticos e de liberdade, não poderia, jamais, voltar a repetir-se. Mas repetiu-se, Srs. Deputados, e este Parlamento não pode ficar indiferente a isso!

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Mas os professores não se deixaram intimidar! Aliás, estes actos persecutórios, de tão abomináveis que são, são mais uma alavanca para a indignação.
E o que não deixa de ser curioso, neste quadro, são as declarações desconcertadas do Sr. Ministro Augusto Santos Silva que, exactamente no dia anterior ao da marcha em Lisboa, numa reacção a um grupo de manifestantes em Chaves, concentrados à porta da sede do PS, considerou — veja-se bem! — essa manifestação como um acto intimidatório e antidemocrático…! Mas disse mais: disse que a liberdade, no País, se deve a ele e a mais três pessoas do seu partido. Que visão tão curta, de tão interesseira, a do Sr.
Ministro!... Prova-se, assim, a visão tão curta deste Governo. O Governo que governa contra as pessoas, que ofende a sua dignidade! Não foi, por isso, com grande surpresa que tomámos conhecimento de que muitas pessoas que nunca, nunca tinham participado numa manifestação, lá estiveram no dia 8; de que pessoas que estiveram pela primeira vez numa acção de contestação no pós-25 de Abril, lá estiveram no dia 8; de que pessoas que não participavam em manifestações há décadas, lá estiveram no dia 8; e de que pessoas que, de uma forma ou de outra, estão sempre presentes quando se trata de reclamar de impor o bem-estar colectivo, lá estiveram, mais uma vez, no dia 8! Professores sindicalizados, não sindicalizados, do norte ao sul, do interior ao litoral, do jovem professor ao professor reformado, professores de todas as áreas políticas, lá estiveram no dia 8! Professores do PS, aqueles que, à partida, estariam pré-disponíveis para aceitar as políticas do Governo do seu partido, lá estiveram no dia 8, de tão intoleráveis que são as políticas educativas do PS! Se o Governo se recusa a perceber esta força de contestação, vai por mau caminho.
O Governo bateu no fundo da educação, foi atingido o limite, os professores foram vergastados sucessivamente na sua idoneidade, desde declarações da Ministra, remetendo a culpa dos números do insucesso escolar para os professores e para as escolas, até à aprovação do Estatuto da Carreira Docente e à concretização do modelo de avaliação que é agora proposto.
Srs. Deputados, em nenhum país da Europa temos um sistema de avaliação como este que o Governo quer impor. Nos outros países, o sistema de avaliação de professores visa resolver problemas, visa corrigir o que não é cumprido, o que está errado.
Ao contrário, o sistema de avaliação proposto em Portugal visa, pura e simplesmente, impedir a progressão na carreira dos professores e visa levar os docentes a, artificialmente, elevarem as notas dos alunos, para que os números sejam bem mais bonitos mas a realidade inalterada.
O Primeiro-Ministro, quando era Deputado, falava constantemente da diferença entre o país legal e o país real; agora, está ele a contribuir para o país dos números, contraposto ao país real! Sr. Presidente, Srs. Deputados: A manifestação de Outubro, com 200 000 pessoas, a manifestação de Março, com 100 000 professores, entre outras, são sinais inequívocos: o Governo governa contra o povo e o povo reclama outra governação!! Que saia a Ministra, porque ela está mais do que descredibilizada, mas que, simultaneamente, se alterem as políticas educativas e se construam as bases da educação com professores, pais, funcionários e alunos. É a esta exigência que Os Verdes já juntaram, há muito, a sua voz.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, como deve saber, o Estado de direito tem regras e as regras não são apenas proclamações.
Para nós, Partido Socialista, os direitos, as liberdades e garantias estão acima de tudo em termos da defesa do Estado de direito democrático e, sobretudo, de uma democracia que se quer livre e participada por todos.

Vozes do PS: — Muito bem!

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A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Por isso, Sr.ª Deputada, quero dizer-lhe que o Partido Socialista é totalmente contra ingerências abusivas, despropositadas, de qualquer agente da PSP em termos de qualquer perseguição àqueles que têm o direito, livre, constitucional e democrático, de se manifestar.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Assim, Sr.ª Deputada, o Partido Socialista será intransigente nessa luta e na salvaguarda dos princípios éticos do Estado de direito democrático.
Sr.ª Deputada, creio que, propositadamente, não o quis dizer na sua intervenção, mas, sabe, no dia em que foi noticiada a visita de vários agentes da PSP a algumas escolas do País, o Sr. Ministro da Administração Interna, de imediato, mandou instaurar um inquérito,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Claro, claro! Já da outra vez também houve um inquérito…!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — … para que não restem dúvidas de que não houve qualquer ingerência do Governo e também porque actos destes têm de ser recriminados.
Por isso, Sr.ª Deputada, pergunto-lhe se está ao lado do PS, a aguardar os resultados do inquérito e também quanto a haver consequências sobre o que são violações, graves e grosseiras, de direitos, liberdades e garantias.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça, muito obrigada pela questão que me colocou.
Devo dizer, já no início, que, neste momento, eu própria, provavelmente à semelhança da grande maioria dos portugueses, quero tudo menos estar ao lado do PS em tantas matérias, como, por exemplo, a da educação. Mas, Sr.ª Deputada, o seu pedido de esclarecimento não versou sobre a questão da educação e, sim, sobre a dos direitos, liberdades e garantias.
Assim, só tenho pena que a Sr.ª Deputada não se tenha pronunciado sobre as vergonhosas declarações do seu camarada de partido, Sr. Ministro Augusto Santos Silva, relativamente à manifestação de Chaves, que apelidou de antidemocrática e atentatória da liberdade, e sobre o mais que disse acerca da responsabilidade de várias pessoas em relação ao 25 de Abril e à liberdade em Portugal.
Sr.ª Deputada, nem quanto a esta matéria da intervenção dos agentes da PSP, apesar do que a senhora acabou de dizer, estamos plenamente de acordo. Sabe porquê? É porque não é a primeira vez que isto acontece, como bem se recordará!! Aliás, com o Governo do Partido Socialista, tem vindo, sucessivamente, a acontecer isto mesmo, designadamente quando estão iminentes grandes greves e grandes manifestações,…

Vozes do PCP: — Bem lembrado!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … ou seja, grandes acções de contestação e de protesto contra o Governo. Coincidente, não é, Sr.ª Deputada? E o que acontece? Em cada uma dessas ocasiões, abre-se um inquérito que nunca apura responsabilidades sobre quem ordenou o quê a quem.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Não é verdade!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Significa isto que não acredito que um agente da PSP entenda que, por haver uma manifestação em Lisboa, há-de ir ao Porto, a Ourém, a Santarém e por aí fora, no sentido de saber quantas pessoas de uma determinada escola vão à manifestação, a fim de lhes garantir segurança

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— isto não cabe na cabeça de ninguém! Portanto, é evidente que aquele agente da PSP recebeu uma ordem no sentido de a cumprir naqueles termos. Ora, quem é que deu tal ordem e quem é que a pré-ordenou a quem é o que é preciso ver.
Face ao facto de isto já ser «cromo repetido», o que já deveria ter acontecido era o Sr. Ministro da Administração Interna ter orientado bem as nossas forças de segurança para que cenários destes não pudessem voltar a acontecer.

O Sr. Alberto Martins (PS): — E foi o que fez!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Não, Sr. Deputado Alberto Martins, não foi o que fez! Tanto não o fez que isto voltou a acontecer. Portanto, é essa prevenção que tem de ser levada a efeito.
Não há forma de intimidar gente que se sente tão recalcada, tão envergonhada pelas políticas de educação e outras que este Governo anda a implementar, claramente envergonhando e não dignificando o povo português e aqueles que trabalham.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A manifestação de professores, no último Sábado, foi histórica.
Os 100 000 docentes vindos de todo o País percorreram as ruas de Lisboa e fizeram ouvir as suas múltiplas críticas, as suas reivindicações, as suas razões em matéria de política educativa.
Não pode haver enganos nem meias palavras: quase dois terços de uma classe profissional mobilizou-se para contestar nas ruas uma política; esta é uma forte, uma inequívoca moção de censura à política educativa seguida nos últimos anos pelo governo do Partido Socialista! Esta mobilização já teve efeitos: deu a conhecer ao País o descontentamento e as razões dos docentes da escola pública.
Esta mobilização já teve outros efeitos: ontem, o Ministério da Educação chamou os jornalistas, após uma reunião com os sindicatos dos professores, e anunciou que vai permitir «soluções flexíveis» no âmbito da avaliação de desempenho dos docentes, um dos mais polémicos e desastrados processos políticos lançado pelos actuais responsáveis governamentais da educação.
O Deputado e porta-voz do Partido Socialista, Dr. Vitalino Canas, já veio dizer que não vale entrar numa «esquizofrenia dos recuos», que quem tivesse ouvido a Ministra da Educação, na semana passada, com atenção já teria compreendido esta ideia de «flexibilidade».
Não interessa verdadeiramente o nome deste movimento para a retaguarda iniciado pelo Ministério da Educação; interessa, sim, perceber o que ele significa em termos de correcção de uma política até aqui seguida e se há ou não capacidade de lançar uma outra política, essa, sim, capaz de responder, de facto, aos problemas, às insuficiências e aos desafios que se colocam ao sistema educativo português.
A situação de crispação das últimas semanas — é preciso lembrar — foi criada pelo Ministério da Educação, pela sua actuação impositiva, autoritária e desastrada.
Quando, hoje, o Ministério da Educação veio admitir soluções flexíveis e, portanto, que haja escolas com processos diferentes, não pode deixar que subsista qualquer dúvida ou ambiguidade. Este não é um jogo de adivinhas.
Em primeiro lugar, o Ministério da Educação tem de esclarecer o que acontece à avaliação dos professores contratados, dos professores em condições de progressão na carreira ou em condições de conversão de nomeação provisória em definitiva. É porque o Estatuto da Carreira Docente define que a avaliação de desempenho é «obrigatoriamente considerada» para estes efeitos. Portanto, segundo a lei criada por este Ministério, ninguém vai progredir na carreira ou vai ver renovado o seu contrato sem esta avaliação.
O que vai, portanto, agora acontecer? Haverá professores nestas condições que vão ser sujeitos a avaliação, com implicações para o seu futuro, e outros para os quais isto não acontece? Ou vai o Ministério da Educação suspender a aplicação desta parte do Estatuto da Carreira Docente?

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Em segundo lugar, o Ministério da Educação tem de esclarecer se a ameaça de processo disciplinar e a cessação das funções de coordenador continua, como até aqui, a pender sobre a cabeça dos professores em caso de considerarem que não há condições para prosseguir o processo de avaliação, porque é isto que está escrito no decreto regulamentar sobre a avaliação e tem sido esta, aliás, a chantagem do Ministério sobre os professores e sobre as decisões das escolas.
Em terceiro lugar, o Ministério não pode andar a «brincar às escondidas». Quando os professores saíram à rua não exigiram apenas o adiamento do processo de avaliação de desempenho. Não! Os professores quiseram e disseram-no: é preciso eliminar as fraquezas, os erros, as ambiguidades e as injustiças que este desenho de modelo de avaliação comporta em si.
É o modelo — e não apenas os tempos de aplicação — que não serve. É o modelo que é errado e pernicioso.
Nesta apreciação crítica, os professores não estiveram, aliás, sozinhos — várias personalidades, investigadores e especialistas têm vindo a mostrar o erro que iremos cometer se aplicarmos este modelo.
O Ministério não deve e não pode persistir no erro quando, aliás, já o reconheceu. Não pode fingir que a avaliação prossegue, que não «é suspensa» nestes próximos meses só para que a Ministra possa manter a face. Este não é um jogo de que «parece que é, mas não é».
O Ministério não pode pensar em retomar este exacto modelo, em Setembro, sem nada alterar nos inúmeros erros que já lhe foram apontados por tantas pessoas de diversas origens profissionais ou quadrantes políticos. Este não é um jogo de que «parece que há uma avaliação, mas não há».
Escolher, hoje, uma política séria de qualificação da escola e da educação é começar a fazer um amplo debate com os actores e com o País com base em comparações internacionais que nos permitam fazer escolhas informadas em matéria de avaliação de desempenho das escolas e é, portanto, expurgar o Estatuto da Carreira Docente deste modelo absolutamente kafkiano.
A resposta séria às questões colocadas pelos docentes e pela opinião pública em matéria política educativa tem de se centrar no essencial: saber quais as políticas e os instrumentos que podemos dar às escolas de modo a qualificar as respostas do sistema educativo aos seus velhos problemas e às suas novas exigências.
Para isso, o debate e as escolhas políticas devem centrar-se sobre a vida das escolas, apurar quais os instrumentos de que dispõem os professores para responder às necessidades educativas dos alunos, saber como trabalham e valorizar a capacidade de preparar a sua actividade lectiva, de acompanhar de forma personalizada o percurso e a aprendizagem dos seus alunos.
É esse o caminho que o Bloco de Esquerda quer percorrer. Lançámos, esta semana, um inquérito aos professores da escola pública — queremos conhecer exactamente quais são as suas condições para o exercício da docência, queremos saber quantos alunos acompanham, quantos níveis escolares leccionam, qual a distribuição das horas de trabalho lectivo e não lectivo. Vamos percebendo, pelas respostas que já temos, que são muitos os professores que têm mais de 120, 150, 160 alunos, que preparam aulas para múltiplos níveis de escolaridade e que estão atolados em trabalho burocrático.
Nestas condições, falar de acompanhamento personalizado dos alunos ou de respostas individualizadas e contextualizadas ou é enganar o País ou é falar de um sonho distante. Mas é aqui que está a capacidade de responder ao abandono e ao insucesso escolares. É esse o caminho que a saída à rua de tantos e tantos milhares de professores nos aponta e nos exige. É essa a vossa e a nossa responsabilidade, que desde já assumimos.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se três Srs. Deputados para pedir esclarecimentos.
Tem a palavra, em primeiro lugar, a Sr.ª Deputada Isabel Coutinho.

A Sr.ª Isabel Coutinho (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Drago, gostaria de colocar-lhe algumas questões que dizem directamente respeito à intervenção que acabou de proferir.
Em primeiro lugar, quero dar-lhe uma novidade — se é que ainda não sabe: é que não há recuo da Ministra da Educação nem do Governo no que diz respeito à aplicação da avaliação do desempenho dos professores.

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Em segundo lugar, gostaria de dizer-lhe que a avaliação de desempenho dos professores é para continuar e vai ser aplicada — não tenha a menor dúvida!

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Haja arrogância!

A Sr.ª Isabel Coutinho (PS): — As tais soluções flexíveis de que fala já estão presentes quer no documento quer também em circular que já foi para as escolas — e posso dar-lhe a data — no dia 26 de Fevereiro, muito antes da manifestação. Portanto, só não vê quem não quer ou quem quer fazer chicana política, aproveitando os professores.

Aplausos do PS.

Gostaria de dizer-lhe também, acerca das acusações de «autismo» da Ministra da Educação, que este Ministério já reuniu com os sindicatos 107 vezes! Registe bem: 107 vezes!

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Não parece nada!

A Sr.ª Isabel Coutinho (PS): — Tem um órgão mediador, que se chama conselho de escolas, que faz a ponte entre as escolas e o Ministério e que este ouve constantemente, acolhendo as suas sugestões, para um melhor funcionamento das escolas, o qual está, hoje, reunido para acertar alguns pontos.
Quero dizer-lhe também que este é o primeiro Ministério da Educação que reúne directamente com os conselhos executivos das escolas para ouvir o que nelas se passa.

Aplausos do PS.

Já que apela tanto a várias questões relativas a documentos que já estão feitos, qual é o vosso modelo de avaliação, quais são as vossas sugestões? Não basta apenas sublinhar os títulos da comunicação social e vir para aqui debitá-los. É preciso apresentar propostas concretas nos órgãos próprios.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Coutinho, há, hoje, duas teorias no Partido Socialista sobre este movimento de «flique-flaque à retaguarda» que tem sido elaborado nos últimos tempos pelo Ministério da Educação. Vejo que a Sr.ª Deputada partilha da teoria do Deputado Vitalino Canas, que é a de que o recuo já vem de longe, ou seja, ainda antes da manifestação, já o Ministério tinha recuado…

Protestos do PS.

Ainda bem! Os senhores não compreendem o fundamental. O problema não são os tempos, o problema não é fazer parar, agora, este modelo de avaliação que toda a gente compreende que é errado e, em Setembro, voltar a pegar nele, com todos os erros apontados, e, pura e simplesmente, nada fazer! Ou seja, com todos os erros de um modelo absolutamente kafkiano, em que nada de minimamente comparável existe em qualquer país europeu, pretendem agora os senhores dizer: «Esperem lá, agora fingimos que há uma avaliação, mas em Setembro mantemos isto exactamente com os mesmos erros».

Protestos do PS.

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Oiçam quem esteve na rua! Respeitem quem saiu das suas escolas, militantes, votantes do Partido Socialista, para dizer ao Partido Socialista: «Isto não pode continuar nestes termos». Mas, acima de tudo, os senhores têm uma responsabilidade e, por isso, não podem andar a «brincar às escondidas». No artigo 41.º do Estatuto da Carreira Docente diz-se que a avaliação do desempenho é obrigatoriamente considerada para progressão e acesso na carreira e para renovação de contrato. O que é que vai acontecer? Se há uma escola que faz avaliação, ela tem implicações para o futuro do professor, mas se há uma escola que não faz avaliação, o que é que acontece? Os senhores vão ou não manter a ameaça de promover processos disciplinares aos professores em relação aos quais for entendido que não estão reunidas as condições para avançar com o processo de avaliação, porque é isso que está no decreto regulamentar? A legislação é vossa, por isso, os senhores têm de responder!

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Paulo Carvalho.

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Drago, escutei a sua intervenção e gostava de lhe formular algumas perguntas e de tecer algumas considerações.
A verdade é que, quando o Partido Socialista fala sobre esta matéria, nunca sabemos muito bem de que é que está a falar: se está a falar daquilo que a Sr.ª Ministra disse há um mês, se daquilo que disse há 15 dias, se das «entradas de valente leão» do Sr. Secretário de Estado que diz: «É para fazer tal e qual como está», ou do Secretário de Estado que tem «saídas de sendeiro» e que vem agora dizer que isto, afinal, é com flexibilidade… O Partido Socialista, de facto, não deixa de surpreender-nos! Quando o desemprego sobe, diz que «está estável»; quando o Ministério da Educação recua, no fundo, é para fazer tal e qual «já tinham dito há três semanas»... Quando se trata de flexibilidade, umas vezes é flexibilidade de manhã, mas à tarde é para fazer exactamente como está… De facto, Srs. Deputados, a primeira coisa que vos digo é: organizem-se!! O que é que se passa relativamente à avaliação do desempenho? Não haja dúvida de que há um mérito que não pode ser retirado à Sr.ª Ministra da Educação, que conseguiu um fenómeno notável, que foi o de unir uma classe. Independentemente de ideologias, de partidos, conseguiu pôr os professores todos unidos contra o Ministério da Educação. É um mérito, não haja dúvida. Pena é ser tudo contra ela.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Até as fotografias o provam, há registos fotográficos!

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Porque se fosse a favor, não era mau de todo.
Quanto à avaliação do desempenho, preocupam-nos essencialmente duas coisas: por um lado, a própria substância da avaliação do desempenho, as soluções erradas; e, por outro, a forma como foi apresentada, que não foi explicada — e uma reforma deste tipo tem de ser, primeiro, bem explicada para, depois, ser bem percebida.
Concluo perguntando à Sr.ª Deputada se lhe parece razoável que, independentemente de estar errado — consideramos que o está —, um sistema de avaliação do desempenho entre em vigor a meio de um ano lectivo.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Paulo Carvalho, agradeço as questões que colocou e devo dizer que esta Ministra da Educação conseguiu uma coisa absolutamente extraordinária, que foi aquilo que o Partido Socialista tentou fazer há 12 anos, em 1995, quando anunciou a «paixão pela educação». A «paixão pela educação» chegou ao País e o País agita-se e, portanto, todos os docentes saíram à rua em defesa da escola pública, mas — azar dos azares — contra a política que tem vindo a ser lançada pelo Governo do Partido Socialista!

Vozes do BE: — Muito bem!

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A Sr.ª Ana Drago (BE): — O Sr. Deputado colocou aquela que considero ser a questão central. Estamos neste «jogo de adivinhas»: o Governo recuou ontem quando o Secretário de Estado chamou os jornalistas e as estações de televisão ao Ministério da Educação para anunciar, cremos, «qualquer coisa», foi «qualquer coisa» que terá acontecido na reunião com o sindicato dos professores, que já tinha acontecido antes, que já vinha de há dois meses… Mas a questão que verdadeiramente fica hoje em dúvida é esta: em que ano lectivo se inicia o processo de avaliação de desempenho?

Vozes do PS: — Já se iniciou!

A Sr.ª Ana Drago (BE): — É a meio deste ano lectivo? É no próximo ano lectivo? E o que é que acontece se agora se sucedem diferentes processos no sistema educativo? O que é que acontece às pessoas que são agora avaliadas? Quais são os efeitos dessa avaliação? Penso que o fundamental é não nos enredarmos nesta cartilha de interpretações que o Partido Socialista quer lançar e devemos, isso sim e acima de tudo, discutir o modelo. Este modelo serve a escola pública, em Portugal? Serve para qualificar a resposta do sistema educativo? Não serve!

O Sr. Mota Andrade (PS): — Qual é o vosso?

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Esta é hoje a conclusão de imensos investigadores, de pessoas oriundas dos mais diferentes quadrantes políticos, e é com isso que o Ministério da Educação tem de continuar a ser confrontado.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Emídio Guerreiro.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Drago, ouvi com bastante atenção a sua intervenção e penso que, no sábado passado, todo o País percebeu claramente que algo está muito mau, muito errado nas opções políticas que a Sr.ª Ministra da Educação tem vindo a tomar. Algo está muito, muito errado, porque na rua não vimos militantes do partido A ou do partido B; vimos, sim, uma classe profissional que, do Minho ao Algarve, se juntou na Praça Marquês de Pombal e que, independentemente da distância e das convicções políticas, decidiu, num sábado, vir dizer ao País, à Sr.ª Ministra «não!» E fê-lo não por uma questão de birra mas pelo que está em causa. E o que está em causa, na nossa opinião, deve ser visto em dois níveis: desde logo, na forma como o processo de avaliação foi introduzido nas escolas. E gostaria que a Sr.ª Deputada dissesse se concorda com esta forma, em que alguns despachos do Sr. Secretário de Estado anulam outros; em que há prazos que não podem ser cumpridos; em que se remetem competências a um conselho científico que não existe; em que há recomendações que esse conselho científico, que não existe, devia ter produzido antes para terem eficácia nas escolas… Isto é aquilo a que tenho chamado insistentemente, cara a cara com a Sr.ª Ministra da Educação, grandes actos de «incompetência pura», pois é disso que se trata.
Um segundo nível, o do conteúdo, é o que, a meu ver, devemos discutir cada vez mais: trata-se do modelo de avaliação e de saber se este tipo de avaliação, em que um colega avalia o outro, é o mais eficaz para o sistema.

Protestos do PS.

Parece-me que não e gostava de saber a sua opinião.
É porque este não é o sistema utilizado nos países que deviam servir-nos de referência. Ou seja, o professor deve ou não estar na escola com a grande missão de ensinar, sem qualquer outra preocupação, de ensinar mais e melhor? É esta a questão que lhe coloco, Sr.ª Deputada.

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Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Emídio Guerreiro, agradeço-lhe as questões que me coloca.
Creio que todo este processo tem sido absolutamente desastroso e gerido de uma forma absolutamente incompreensível. Creio que o País já percebeu que o modelo de avaliação de desempenho dos professores não serve para responder aos problemas reais do sistema educativo: o abandono e o insucesso. Ele foi criado como uma forma de punir, de criar um «culpado» das dificuldades do sistema educativo, pelo que não serve para qualificar aquilo que é a nossa resposta.
Agora, o que não podemos permitir é que este jogo que o Ministério da Educação criou nos últimos dias nos impeça de nos focarmos naquilo que é fundamental: o modelo é errado, a forma como as notas dos alunos contam para a avaliação dos professores, por muito que o Partido Socialista vá abanando a cabeça, não pode ser mantida, não pode ser retomada no próximo ano lectivo. Assim como não podemos ter situações como aquela em que um professor de Educação Física vai avaliar um professor de educação especial, que é o que está a acontecer hoje…! Todos compreendem que este é um modelo errado.
Se o Partido Socialista está de boa fé e quer, de facto, levar a cabo um processo sério de avaliação de desempenho dos professores, então, tem de voltar à estaca zero, tem de voltar a discutir todo este processo com os actores, com as forças políticas e sociais e com as organizações representativas do sector da educação, e tem de permitir a comparação com outras experiências internacionais. Isto para que a avaliação dos professores seja um processo sério, que permita, de facto, responder aos problemas do sistema educativo, em Portugal.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os professores estão em luta, em defesa da sua dignidade e do seu papel social, mas também em defesa da educação enquanto instrumento nacional para o desenvolvimento. A forma despudorada e agressiva como os membros do Governo têm reagido aos protestos é o sinal inequívoco de uma erosão e de um desgaste políticos cada vez mais evidentes. As visitas da polícia às escolas, a identificação de manifestantes e dirigentes e o clima de perseguição por todo o País que o Governo estimula não escondem o descontentamento e a revolta de todos.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Eram mais de 100 000, certamente. No dia 8 de Março, professores de todo o País trouxeram às ruas de Lisboa a força de uma unidade impressionante em torno da defesa da sua dignidade. E saudamos todos esses que, de longe e de perto, vieram e, com particular entusiasmo, as professoras que assinalaram o Dia da Mulher em luta pelos seus direitos. Mas defendendo essa dignidade, esses professores, esses largos milhares de homens e mulheres que dedicam a sua vida a construir o «saber» e o «saber fazer» deste país, defendem também a escola pública, enquanto instrumento de todos nós, do povo português e do Estado, essencial para a garantia da nossa soberania intelectual, económica e produtiva e para a própria democracia. A luta dos professores corporizou, naquele dia 8 de Março, a luta nacional contra o ataque à escola pública, tal como o fez nas duas semanas que antecederam esse dia e o fará nas seguintes.
Os resultados de um ataque cerrado à escola pública saltam à vista. O Governo, ao invés de promover o bom funcionamento da escola, é o próprio factor da instabilidade: seja o Estatuto da Carreira Docente e todas as suas consequências, como a da avaliação de professores que urge suspender, como propõe o projecto de resolução do PCP; seja a introdução de novos factores de entropia social, que visam pôr um fim político à vigência da Lei de Bases do Sistema Educativo e à Constituição da República Portuguesa, como o anunciado

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fim da gestão democrática dos estabelecimentos de ensino; seja ainda a forma absolutamente insensível como o Ministério da Educação tem diariamente imposto aos docentes regras instáveis, insensatas, delirantes e inexplicáveis; ou sejam mesmo as ditas reformas do ensino especial e do ensino artístico especializado, que visam acantonar um e elitizar e privatizar o outro, tudo aponta para uma incapacidade gritante por parte deste Governo para lidar com a educação pública e com os seus agentes e actores.
A reboque de justificações tão demagógicas quanto falsas, o Governo tenta, na realidade, pôr um fim à escola pública enquanto pilar da República Portuguesa e da democracia e enquanto instrumento para o desenvolvimento nacional. A reboque desta política, por sua vez, vem a degradação da qualidade do ensino que, aliada a um desinvestimento claro nas condições materiais e humanas do sistema educativo, provoca o seu definhamento lento, mas inexorável, sob a batuta da orientação das políticas de direita que o Governo vem seguindo.
Se o País pode hoje ainda afirmar que dispõe de um sistema educativo capaz, deve-o, em grande parte, à perseverança e ao empenho dos professores que, muitas vezes em condições absolutamente inacreditáveis e sem o devido reconhecimento, dão o seu melhor para fazer a escola pública funcionar! Deve-o à democratização do ensino, fruto da Revolução de Abril, e à luta permanente das populações, professores, pais e estudantes, em defesa da escola pública! Deve-o às comunidades locais que valorizam as suas escolas e à gestão democrática que, mesmo num quadro de insuficiente autonomia, tem possibilitado no interior de cada escola a procura e a implementação das melhores soluções para os diversos problemas! Não o deve a quem, dos gabinetes dos Ministérios, dita regras, distantes das escolas, desajustadas e inadequadas, nem a este nem mesmo aos anteriores governos, que, não fosse a resistência e a luta dos professores e estudantes ao longo dos tempos, há muito teriam posto um fim à gestão democrática, à escola inclusiva, ao ensino para todos e ao próprio edifício da escola pública, como bem temos visto através dos sucessivos arremessos políticos contra a Lei de Bases do Sistema Educativo.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Essa é que é essa!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Para o Governo, o protesto era apenas uma fantasia sindical. Para o Governo, a maior parte dos professores nem sabia tão-pouco por que protesta. A resposta foi dada: a maior parte dos professores deste país manifestou a sua indignação numa marcha histórica e inegavelmente consciente. Só quem despreza e desdenha o próprio sistema educativo público pode partir do princípio de que ele é feito por ignorantes ou por professores inconscientes.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — O Governo tem de retroceder. Mais de 100 000 professores nas ruas exigem agora humildade democrática e a abertura de um verdadeiro processo de negociação. A arrogância e o autoritarismo não são instrumentos políticos, são sinais de fraqueza política e debilidade democrática. O dia 8 de Março, os dias que o precederam e as lutas que o seguirão não permitem a continuação desta postura.
Ouvir as escolas, abrir o diálogo, trabalhar para a dignificação e valorização social dos professores, como elementos centrais do processo de ensino/aprendizagem, é a tarefa que se exige ao Governo. Não basta mudar o tom; é preciso mudar a política e recuar no ataque dirigido aos professores, iniciado por este Governo, desde logo, com o Estatuto da Carreira Docente! É neste sentido que o PCP interpela no próximo dia 18 o Governo sobre as questões da educação e foi também neste sentido que apresentou o seu projecto de resolução para a suspensão do processo de avaliação e o projecto de lei para a gestão democrática dos estabelecimentos de ensino.

Vozes do PCP: — Bem lembrado!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Os resultados da política de direita e de afronta aos direitos dos portugueses estão à vista. Não estão sozinhos os professores e, afinal de contas, quem o está é o Ministério da Educação, que se isola neste rumo de arrogância, prepotência e autoritarismo. A escola pública não é do Governo, não é do Ministério da Educação e muito menos é coutada de interesses privados. É de todos nós, cidadãos

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portugueses. E sempre as comunidades educativas se empenharão na sua dignificação e defesa, porque sabem, como nós, o valor desses pilares do desenvolvimento que são o conhecimento e o saber.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, dois Srs. Deputados, o primeiro dos quais é o Sr. Deputado José Paulo Carvalho, a quem dou a palavra.

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Tiago, não é a primeira vez que hoje se fala de educação nesta Sala e, pelos vistos, não será a última.
De qualquer modo, quero colocar-lhe uma questão e fazer algumas considerações.
A primeira consideração tem a ver com o seguinte: como já aqui referi da última vez que falámos sobre isto, o CDS não tem nesta matéria da educação uma perspectiva de classe. De facto, não olhamos para a educação nessa perspectiva mas, sim, na perspectiva de sistema.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Mas a verdade é que o Ministério da Educação decidiu escolher uma classe para ser o objecto dos seus ataques. Escolheu a classe dos professores, apresentou-a como uma espécie de classe de privilegiados e decidiu atacar em todas as frentes. Ora, é evidente que, dessa maneira, é o próprio Ministério da Educação que está a atacar todo o sistema.
É porque, Srs. Deputados do Partido Socialista, é impossível fazer seja o que for de útil na educação quando todos os professores consideram que a Sr.ª Ministra da Educação é a sua principal adversária…

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — … e quando a Sr.ª Ministra da Educação se dá ao desplante de dizer «perdi os professores, mas ganhei o País». Isto é absolutamente inadmissível porque o que se está a perder é a educação, em Portugal.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — O Partido Socialista e o Governo vêm aqui com uma espécie de tenaz de sucesso: quanto ao estatuto do aluno, não há faltas injustificadas, não há alunos que reprovem e, portanto, acabou-se com o abandono escolar; quanto à avaliação de desempenho dos professores, pôs-se as próprias notas dadas pelos professores a condicionar a sua avaliação de desempenho. Está aqui feita a tenaz do sucesso: assim, não há abandono escolar e haverá, pelo menos, melhoria de notas.
Mas a qualidade do sistema tem vindo a degradar-se todos os anos e isso é absolutamente inadmissível! Por isso, pergunto-lhe, Sr. Deputado — e o CDS entregou um projecto de resolução sobre esta matéria da avaliação de desempenho —, se acha ou não que o sistema tem de ser desburocratizado, se acha ou não razoável que na avaliação de desempenho sejam tidas em conta as notas dadas pelo próprio professor avaliado.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Paulo Carvalho, agradeço-lhe as questões colocadas.
Pela nossa parte, falaremos aqui de educação as vezes que forem necessárias e persistentemente o temos feito tendo em conta a intervenção desastrosa deste Governo nesta área, preocupação, aliás, partilhada por outras bancadas.

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A perspectiva dos professores, neste momento, e aquilo que foi trazido à rua coincide com a defesa da escola pública. Não há aqui uma perspectiva acantonada à visão dos professores. Ela coincide, de facto, com a defesa da escola pública, porque só com a dignificação e a valorização social do professor é possível reforçar a capacidade da escola pública.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — É impensável atacar os direitos dos professores, debilitar a sua capacidade, enfraquecer a sua posição social e, ao mesmo tempo, esperar a melhoria da qualidade da escola pública.
Reforço esta nota: o Governo está a diminuir e a degradar a qualidade da escola pública, o que se reflecte diariamente naquilo que os alunos dela conseguem retirar.
Quanto à questão da avaliação propriamente dita, o Sr. Deputado sabe que o PCP apresentou também um projecto de resolução que propõe a abertura de um período de debate em torno desta matéria e a suspensão deste processo, como o Governo o preconiza. Porquê? Porque para nós não está só em causa o conjunto de regras burocráticas e as questões técnicas deste sistema de avaliação. O que está em causa para nós é a própria matriz política que a ele preside.
Entendemos que a avaliação dos professores, como qualquer avaliação no sistema público, deve servir antes de mais para conhecer as falhas e agir sobre elas, para conhecer as debilidades e corrigi-las, para conhecer as insuficiências e suprimi-las.
Ora, não é esta a perspectiva do Governo. A perspectiva do Governo é criar um sistema de avaliação punitivo, que tem como único objectivo limitar a progressão na carreira por parte dos professores. Mas com esse tipo de avaliação, independentemente das normas burocráticas que a rejam, o Governo não poderá nunca contar com o acordo do PCP.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Emídio Guerreiro.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Tiago, penso que a viragem do ano de 2007 para 2008 no Ministério da Educação foi uma viragem muito má. Se as coisas não estavam a correr bem desde há muito tempo, nestes últimos meses têm vindo de mal para pior.
O frenesim legislativo, com a consequente legislação que tem sido produzida, tem criado o que considero ser uma grande entropia nas escolas. Por isso, uma das primeiras questões que gostaria de lhe colocar é a seguinte: com regulamentos internos adaptados a uma realidade anterior e tendo em conta o Estatuto do Aluno aprovado recentemente, como é que é possível os profissionais, por mais briosos que sejam (e ainda que os dias tivessem mais do que 24 horas…!), serem capazes de adaptar toda a regulamentação interna da escola a este processo frenético de legislação, com diplomas a serem publicados uns atrás dos outros e a alterar os anteriores?

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito bem!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Gostaria de perceber se o PCP também está de acordo com o PSD nesta matéria, ou seja, se concorda que entupindo as escolas e os professores com despachos atrás de despachos e com normativos atrás de normativos é impossível qualquer organização poder dar resposta a tudo isto.
Depois, há um aspecto que também referido pelo Sr. Deputado José Paulo Carvalho e que também tem um tempo… A frase da Sr.ª Ministra, quando disse «Perdi os professores, ganhei as famílias» era no tempo em que, nas sondagens, nos estudos de opinião, a Sr.ª Ministra da Educação, fruto do seu início de mandato, aparecia como sendo a mais popular das Ministras.
Ora, esse tempo, Srs. Deputados, já lá vai há muito! Há mais de um ano que a Sr.ª Ministra disputa o último lugar em todos esses estudos. O último lugar agora é dela exclusivamente, mas durante muitos meses foi disputado, «ombro a ombro», «taco a taco», com o Sr. Ministro da Saúde Correia de Campos. A um deles já

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sabemos o que aconteceu, mas a esta, infelizmente, não percebemos por que é que ainda não houve uma alteração nem nos rostos nem na política. De facto, a situação nas escolas está cada vez pior! A pergunta final que lhe deixo é esta, Sr. Deputado: no meio desta entropia toda, como é que é possível ambicionar que os resultados melhorem e que o serviço público de educação seja mais eficaz, dando mais e melhores conhecimentos aos alunos. É porque, na verdade, isto é que deveria preocupar o Ministério da Educação.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Emídio Guerreiro, há uma diferença entre a interpretação que o PCP faz e aquela que faz o PSD sobre o que se passa actualmente na área da educação.
Obviamente que compreendemos que o PSD, partilhando da visão estratégica deste Governo, não está de acordo com o método, não está de acordo com a forma, não está de acordo com a velocidade, mas no essencial não discorda. Portanto, não remetemos o que se está a passar no Ministério da Educação para o plano da incompetência. Tudo o que se passa actualmente faz parte de uma estratégia de desarticulação e destabilização da escola pública.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — A via que foi escolhida foi a do ataque aos professores. Repito: o ataque aos professores foi a via que este Governo escolheu para atacar a escola pública, como, aliás, fez noutros sectores. Obviamente que desarticular e desmantelar os direitos dos trabalhadores é o primeiro passo para pôr fim ao próprio sector.
Portanto, a incompetência deste Governo será em fazer aquilo que os próprios senhores do PSD também gostariam de fazer, mas de forma mais pacífica. Por isso, talvez tenha razão na incompetência.
A própria forma como a legislação é produzida, as portarias, despachos, os decretos-leis, que chegam às escolas em catadupa, uns contradizendo os outros, avisos nas páginas da internet sem cobertura legal, obviamente que tudo isto não são mais do formas que o Governo vai inventando para ir destabilizando cada vez mais a escola pública e a capacidade de os professores fazerem o que lhe compete e o que querem fazer.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sobre a questão da popularidade da Sr.ª Ministra e as sondagens, gostaria de dizer que não medimos o sucesso político das medidas pelas sondagens, nem tampouco nos deixamos enganar nessas diversões que a comunicação social, por vezes com a ajuda dos governos, vai promovendo.
Quando a escola pública tiver melhores condições, mais capacidades materiais e humanas, quando os professores estiverem motivados, quando o insucesso escolar e o abandono forem realidades do passado, aí, sim, poderemos avaliar a popularidade das políticas. Mas, de facto, pouco nos importam as diversões das sondagens!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Mota.

O Sr. Manuel Mota (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Tiago, a minha primeira nota vai para uma questão recorrente nesta Assembleia, para todo um mundo de diferenças entre o Partido Socialista e o Partido Comunista Português.
Entendemos que a resposta da escola pública neste momento não é suficiente para os desafios do País.
Entendemos, e bem, aliás, como a maior parte da comunidade educativa, que é preciso encontrar respostas.

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Demos as primeiras respostas, desde logo, com o prolongamento de horário, com o inglês, com a música, com a estabilidade do corpo docente colocado por três anos, com o aumento dos cursos profissionais, nomeadamente no ensino secundário, que permitiram que mais de 30 000 alunos estejam hoje no sistema educativo, com a formação de professores. É este tipo de opções, como a reorganização da rede do 1.º Ciclo, que em nosso entender valoriza a escola pública, ao contrário de uma retórica e de uma demagogia que esperam que, mantendo tudo na mesma, Portugal consiga resolver os desafios da modernidade.

Aplausos do PS.

Protestos do PCP e de Os Verdes.

Há respostas que os políticos têm de dar perante o País. Como é que podemos manter as taxas de abandono e de insucesso escolar…

Protestos do PCP e de Os Verdes.

Compreendo o vosso nervosismo.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Olha quem fala!

O Sr. Manuel Mota (PS): — Mas compreendam que, do ponto de vista do debate, só com argumentos é que se pode chegar a algumas conclusões, portanto, façam o favor de ouvir, porque a democracia está também no saber ouvir.

Protestos do PCP.

Dizia eu que só com medidas concretas é que se pode melhorar esta situação. Mas o PCP, perante os problemas do País e perante estas matérias fundamentais, tem sempre a mesma resposta, que é parar os processos, suspender…

O Sr. António Filipe (PCP): — Essa agora!

O Sr. Manuel Mota (PS): — Para o PCP a resposta é parar os processos, é suspender, é não reformar. No fundo, quem não tem a responsabilidade de governar, quem não tem a responsabilidade de responder perante o País dá sempre a mesma resposta: parar e suspender.
A pergunta muito concreta que quero fazer ao Sr. Deputado Miguel Tiago é a seguinte: qual é o vosso modelo de avaliação e quais são as respostas que dão à necessidade de um modelo educativo em Portugal?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Mota, se a democracia também é saber ouvir, comece por dar essa sugestão à Sr.ª Ministra da Educação, que tem sérias dificuldades, até mesmo nesta Casa, em ouvir aquilo que os Deputados lhe vão dizendo.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Exactamente!

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O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sobre as actividades de enriquecimento curricular e todas essas «maravilhas» que nos apresentou, sugiro-lhe que vá às escolas verificar como funcionam no terreno.
Sugiro-lhe que leia a Lei de Bases do Sistema Educativo e lá identifique que todas essas vertentes de ensino deviam ser incluídas nos currículos. Ora, os Srs. Deputados e este Governo tiraram-nas dos currículos.
Não cumpriram a sua missão, que é implementar a lei. Pelo contrário, retiraram dos currículos a formação integral dos indivíduos através destas actividades nas escolas.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Não leiam só os «comandos» do Ministério!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Quanto a manter tudo na mesma, Sr. Deputado, realmente, é preciso ignorar tudo o que se passa e não ter conhecimento do conjunto de propostas que o PCP apresentou na área da educação para se poder dizer uma coisa dessa natureza.
Dou-lhe a seguinte nota, de que certamente não tem conhecimento: o PCP apresentou um projecto de lei para a gestão democrática das escolas em que, inclusivamente, coloca as questões da avaliação.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exactamente!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Se o Sr. Deputado está contra a gestão democrática dos estabelecimentos de ensino, se o Sr. Deputado está contra os órgãos colegiais, se o Sr. Deputado está contra um conselho pedagógico de carácter cada vez mais pedagógico e científico, então assuma essas suas divergências com as tendências da escola pública portuguesa, mas não diga que é o PCP que quer manter tudo na mesma, porque é o PCP que, sistematicamente tem vindo a criticar o que os senhores e o PSD, com ou sem o CDS, vão fazendo na área da educação.

Protestos do CDS-PP.

À retórica parlamentar de que o Sr. Deputado nos acusa, nós opomos a prática dialéctica que produz as propostas que o PCP aqui vai trazendo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Ao fim de três anos de Governo socialista constatamos que este só acerta quando recua e corrige.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Esta realidade é bem visível na área da saúde. Vejam-se apenas três exemplos.
Primeiro: em Novembro 2006 é divulgada na imprensa a versão 1 do mapa de requalificação das urgências feita com critérios estritamente técnicos e aritméticos. Segue-se contestação por parte das populações e autarquias preteridas.
Em Fevereiro 2007 é divulgada a versão 2 do mapa de serviços de urgência, denominada «versão final».
Curiosamente, alguns serviços de urgência básica previstos na versão 1, e devidamente justificados, passam ao estatuto de «serviços a encerrar», como foi o caso de Peniche. Nova contestação e confronto com as evidências.
A «versão final» deixava de ser final, remetendo-se a versão mesmo final para Julho de 2007…

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Era a chamada «finalíssima»!

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A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — E abre-se a via de negociações bilaterais entre o Ministério da Saúde e as autarquias.
Sucede-se a contestação. Face à realidade social das populações mais isoladas e vulneráveis, o Ministério acaba por recuar e corrigir algumas das situações que teriam gerado tremendas injustiças e desamparo. Vejase o caso dos concelhos de S. Pedro do Sul, Vouzela e Oliveira de Frades, cuja população veria o serviço de urgências reduzido a um alargamento do horário de funcionamento em Oliveira de Frades. A proposta acabou por ser corrigida.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Está desactualizada, Sr.ª Deputada!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Pressões no seio do PS elevam o tom da discórdia, nomeadamente com ameaças de criação de um novo partido.
A versão aparentemente (repito, aparentemente) finalíssima foi publicada em Março de 2008, exactamente quando o PS comemora três anos de Governo e uma substituição do Ministro da Saúde. Mas ainda falta o mais importante: falta qualquer compromisso quanto ao calendário para o cumprimento da requalificação das urgências.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Em segundo lugar, a vacina contra o cancro do colo do útero foi proposta três vezes pelo CDS na Assembleia da República.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Três vezes propusemos a sua integração no Plano Nacional de Vacinação ou, pelo menos, uma comparticipação que tornasse esta vacina acessível a todos os bolsos, evitando uma intolerável discriminação social. Três vezes a sua inclusão foi rejeitada, com os argumentos incongruentes e absurdos de que a sua eficácia ainda estaria por comprovar. Isto, no momento em que a Organização Mundial de Saúde já recomendava a sua aplicação e a esmagadora maioria dos países de referência da União Europeia já tinha acatado essa recomendação.
Uma semana, apenas uma semana depois da última recusa do Partido Socialista em incluir esta vacina no Plano Nacional de Vacinação, veio o Primeiro-Ministro anunciar, exactamente, a inclusão da vacina contra o cancro do colo do útero no Plano Nacional de Vacinação…

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Arrependeu-se!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — … já no início de 2008. Estamos em Março de 2008 e o site oficial do Ministério da Saúde refere, expressamente, que o Plano Nacional de Vacinação, em vigor desde Janeiro de 2008, inclui esta vacina para raparigas com 13 anos. Porém, qualquer jovem que pretenda vacinar-se agora verá rejeitado o seu pedido no centro de saúde, pois só se prevê que a sua distribuição ocorra em Setembro — quase no final de 2008.
Em todo o caso, o Governo recuou, corrigiu e acertou.
Em terceiro lugar, os cuidados paliativos são uma resposta activa aos problemas e aos efeitos da doença prolongada, incurável e progressiva. Tenta-se prevenir e atenuar o sofrimento que estas doenças provocam e proporcionar a máxima qualidade de vida possível a estes doentes e às suas famílias. Trata-se, portanto, de uma questão de humanismo perante o sofrimento,…

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — … de dignidade do ser humano até ao final da sua vida e de ética social para garantir o bem-estar de cada pessoa, sobretudo das mais vulneráveis.

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Aplausos do CDS-PP.

Em suma, trata-se de uma questão de civilização e de interesse público.
Os cuidados paliativos são interdisciplinares, mas um dos seus aspectos estruturais é a prevenção do sofrimento causado pelos sintomas, nomeadamente a dor física. Para aliviar as dores intensas e garantir uma qualidade de vida mínima a estes doentes, é fundamental administrar analgésicos muito potentes, denominados analgésicos opióides.
Ora, ao contrário do que acontece na maioria dos países civilizados, que dispensam estes medicamentos a título gratuito, Portugal mantém um regime de comparticipação destes medicamentos, que têm, Sr.as e Srs. Deputados, um valor médio de 4 € por unidade, de apenas 37%, correspondendo ao escalão C.

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Uma vergonha!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — A insensibilidade que isto traduz é intolerável.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Nesse sentido, o CDS apresentou um projecto de lei para que estes analgésicos sejam comparticipados pelo escalão máximo na venda em ambulatório. Ontem, a Ministra da Saúde veio anunciar que o Governo tomará esta medida.
O Governo, mais uma vez, recuou e corrigiu.

Aplausos do CDS-PP.

Mas a injustiça não fica por aqui. Hoje mesmo, entregámos uma pergunta ao Governo para que esclareça por que razão alguns hospitais do Serviço Nacional de Saúde não dispensam estes medicamentos em ambulatório. Disto são exemplo unidades de referência, como o IPO de Lisboa e o Hospital de Santo António, no Porto.
Em quarto lugar, o CDS tem vindo a insistir numa medida de política do medicamento com evidentes vantagens para a população e para o Estado: a dispensa generalizada de medicamentos em unidose nas farmácias de oficina, o que, aliás, já acontece nas farmácias hospitalares. Nesse caso, o Estado só comparticipa os remédios necessários e o doente só paga os comprimidos necessários para a sua cura, evitando-se, assim, um desperdício gigantesco, que pesa cada vez mais no Orçamento do Estado e no orçamento das famílias. Uma vez mais, o PS tem recusado esta proposta, invocando argumentos atentatórios ao mais elementar bom senso.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Diz-se agora que, no final de 2008, se iniciará, a título experimental, e numa só farmácia, em hospital, a dispensa de medicamentos em unidose. Ora, esta farmácia ainda está por criar.
Existem em Portugal cerca de 3000 farmácias, Sr.as e Srs. Deputados, mas o PS entende que só uma deve iniciar esta medida.

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Uma vergonha!

O Sr. Presidente: — Faça favor de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Estamos certos de que, mais cedo ou mais tarde, recuarão, corrigirão…

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!

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A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — … e acabarão, mais uma vez, por dar razão ao CDS.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — A Mesa registou a inscrição de duas Sr.as Deputadas para formular pedidos de esclarecimento.
Tem a palavra, em primeiro lugar, a Sr.ª Deputada Maria Antónia Almeida Santos.

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Caeiro, ontem, o seu registo, no âmbito da Comissão de Saúde, com a presença do Governo, foi outro. De facto, ouvi-a com muito mais agrado ontem do que hoje, pois, pelo menos, havia coerência nas suas palavras.
Hoje, a Sr.ª Deputada começa por dizer que «mais uma vez, o Partido Socialista vai dar razão ao CDS». Ó Sr.ª Deputada, «presunção e água benta, cada um toma a que quer»!

Aplausos do PS.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Também aconteceu com as forças de segurança! Diziam na altura que éramos demagógicos!

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Mas, Sr.ª Deputada, vamos ao essencial.
A Sr.ª Deputada, ontem, felicitou o Governo, e bem, visto que fez uma oposição responsável e credível, quanto ao anúncio da medida de extrema importância de atribuir um regime de comparticipação de 95% para os medicamentos opiáceos.
Mas, Sr.ª Deputada, já em 2003-2004 a Associação Portuguesa para o Estudo da Dor tinha proposto ao Governo a criação de um regime de comparticipação.

O Sr. Jorge Almeida (PS): — Pois é!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Ah! Isso já não é demagogia?!

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — O que estava o CDS a fazer nessa altura?! Ainda que mal pergunte, não estava no Governo?! É que, no caso da vacina do HPV (Vírus do Papiloma Humano), quando o CDS estava no Governo, não havia, de facto, vacina no mercado, mas, no caso do uso dos medicamentos opiáceos para tratar as formas graves da dor oncológica e não oncológica, que nós saibamos, nos últimos 10 anos não ocorreu nenhuma alteração ou evolução significativa nos planos científico e tecnológico. Portanto, explique que não tivesse havido decisão, Sr.ª Deputada! De facto, são estas contradições e esta falta de coerência que, sinceramente, não ouvi ontem nas palavras da Sr.ª Deputada, mas que ouço hoje, aqui, no Plenário.
Outra questão: a Sr.ª Deputada compara dados que não são comparáveis.

O Sr. Presidente: — Faça favor de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Comparou, mais uma vez, um estudo com uma decisão política, quando uma coisa é um estudo indicativo, outra coisa é uma decisão política, no que diz respeito à rede das urgências.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.

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A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria Antónia Almeida Santos, não se trata de presunção, mas de factos! A Sr.ª Deputada estava aqui presente quando, pela primeira vez, o Partido Ecologista «Os Verdes» e, depois, o CDS-PP apresentaram a proposta para inclusão da vacina contra o cancro do colo do útero no Plano Nacional de Vacinação e os senhores a recusaram, para, uma semana depois, vir o Primeiro-Ministro anunciá-la. É verdade ou é mentira?! É presunção? Não é presunção!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Relativamente ao mapa, Sr.ª Deputada, penso que compete ao Governo ter algum bom senso a governar. É que não pode apresentar sucessivos mapas à imprensa, sendo cada um deles considerado a versão final, para, depois, recuar, corrigir e acertar.
Além disso, Sr.ª Deputada, de que serve ter um mapa com apostilhas, se não há qualquer tipo de calendarização para a sua execução?!

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Relativamente aos opióides, Sr.ª Deputada, os senhores estão no Governo há três anos e, curiosamente — isto não é presunção! —, só uma semana depois de o CDS ter apresentado o projecto de lei para uma maior comparticipação é que os senhores se lembraram.

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — É curioso!

Protestos do PS.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — A Sr.ª Deputada pergunta o que fizemos em 2003-2004. A Sr.ª Deputada está a esquecer-se de que, nos últimos 15 anos, os senhores estiveram no Governo mais de 10 anos!

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — E dou-lhe alguns exemplos das políticas de saúde que foram desenvolvidas pelo Governo de coligação PSD/CDS-PP.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Quaisquer 30 segundos chegam!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Desde logo, o programa inicial de saúde oral para crianças não foi criado pelos senhores, Sr.ª Deputada, fomos nós que o criámos! O SIGIC, o programa especial para recuperação das listas de espera em cirurgia, não foi inventado pelos senhores, pois não?! Quanto aos genéricos, quem é que instituiu um sistema para alargamento da distribuição dos medicamentos genéricos no mercado, que, na altura, era incipiente?! Não foram os senhores, fomos nós!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Pois é!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Fomos nós que conseguimos atingir um patamar razoável.
Os hospitais SA, que os senhores, por uma questão ideológica, se apressaram a converter em EPE,…

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Exactamente!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — … também são do nosso tempo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Grande coisa!

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A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Mas não me vou alongar, Sr.ª Deputada. A questão que se coloca é esta: os senhores estão há três anos no Governo e continuam a invocar questões do passado para as medidas que não tomam e para as políticas que não assumem.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Regina Ramos Bastos.

A Sr.ª Regina Ramos Bastos (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Caeiro, começo por felicitála pela declaração política que fez a respeito da audição da Sr.ª Ministra da Saúde, ontem à tarde, na Comissão de Saúde, e por lhe dizer que ouvimos a Sr.ª Ministra, muito serenamente e com um tom muito diferente do do seu antecessor, falar da requalificação das urgências, da vacina contra o cancro do colo do útero, dos opiáceos para os cuidados paliativos, do acesso aos medicamentos, dos genéricos e de tudo o mais. Mas, Sr.ª Deputada, também ouvimos a Sr.ª Ministra da Saúde dar os números sobre as listas de espera para consultas de especialidade e para cirurgia. E disse-nos, com muita serenidade, que há 474 000 portugueses à espera de uma primeira consulta ou de consultas hospitalares de especialidade e 208 000 portugueses e portuguesas à espera de uma cirurgia.
Ora, o que a Sr.ª Ministra nos veio anunciar, relativamente a este estado catastrófico das listas de espera, foi uma coisa muito simples e inconsequente: o Governo e o seu Ministério estão a pensar constituir um grupo de trabalho que avalie a situação das listas de espera para cirurgia e para consulta, para, depois, propor medidas de combate a esta situação calamitosa. Enfim, ao fim de três anos, o Governo socialista limita-se a anunciar que, para este estado de coisas verdadeiramente terrível para os portugueses, que lhes cria sofrimento, ansiedade e angústia, se limita, realmente, a fazer essa avaliação.
A Sr.ª Ministra, ao substituir o tempestuoso ex-Ministro Correia de Campos, veio com a missão de serenar os ânimos, adiar ou evitar decisões e estar nesta apatia política até 2009.
O que gostaria de perguntar à Sr.ª Deputada é o seguinte: considera aceitável que, ao fim de três anos de governação socialista, a Sr.ª Ministra da Saúde se resigne…

O Sr. Presidente: — Faça favor de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Regina Ramos Bastos (PSD): — Concluo já, Sr. Presidente.
Como estava a dizer, Sr.ª Deputada, considera aceitável que, ao fim de três anos de governação socialista, a Sr.ª Ministra da Saúde se resigne a constituir um grupo de trabalho para resolver a questão dos milhares de portugueses que esperam por uma cirurgia e por uma consulta?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Regina Ramos Bastos, antes de mais, agradeço a questão que me colocou.
Sr.ª Deputada, porventura um dos aspectos mais terceiro-mundistas de Portugal e da saúde são as listas de espera para primeira consulta. Estima-se — aliás, isso foi dito ontem pela Ministra da Saúde — que 400 000 portugueses estão à espera de uma primeira consulta de especialidade. Isto é terceiro-mundista! Não há outra forma de o apelidar! Aliás, isto mesmo foi reconhecido, com transparência, pela Sr.ª Ministra.
Mas a Sr.ª Ministra também disse que havia sido criado um grupo de trabalho cujo relatório se aguardava para as próximas semanas. Agora ficamos nós a aguardar por aquilo que a Sr.ª Ministra aguarda, no sentido de sabermos o que é que, ao fim de três anos, se vai, finalmente, fazer para encurtar estas listas de espera de anos para determinadas especialidades.

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Em todo o caso, Sr.ª Deputada Maria Antónia Almeida Santos, é evidente que é de felicitar a medida da Sr.ª Ministra. É evidente que só podemos congratular-nos com o cumprimento de uma iniciativa que nós próprios tomámos há uma semana atrás. É evidente que sim!

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Vê a presunção?!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Contudo, o que é estranho é que os senhores só a tomem nesta altura.
Mas houve alguns aspectos da intervenção da Sr.ª Ministra que ficaram por esclarecer.
A Sr.ª Ministra começou a intervenção dizendo o seguinte: «Fui nomeada para devolver a confiança aos profissionais e aos portugueses». Mas ficámos sem saber quando é que os portugueses perderam essa confiança. Terá sido nos três primeiros anos deste Governo?

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exactamente!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Terá sido antes?

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Foi antes, com certeza!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Ficámos sem saber por que é que a Ministra foi nomeada para devolver essa confiança.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Foi à primeira!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Pois. Não foi à primeira, mas à segunda ou, talvez, à terceira.
Além do mais, houve alguns aspectos bizarros. Os Secretários de Estado, que também estiveram presentes, demoraram bastante tempo a enaltecer os resultados do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM): a melhoria dos serviços, a qualidade, o profissionalismo e a modernização desta rede.
Ora, se houve um aumento tão grande da qualidade, se houve, como disse o Secretário de Estado Francisco Ramos, um aumento das saídas em 21%, o que fica por esclarecer é por que razão demitiram o presidente do INEM, responsável por esta modernização e requalificação.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Por fim, coloco outra questão: por que é que não são capazes de assumir o compromisso de aumentar o número de viaturas de transporte de doentes e de emergência médica? Quanto a isso, apesar de instados várias vezes, nada souberam dizer.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Sr. Presidente, solicito a V. Ex.ª que me informe se deu entrada na Mesa o projecto anunciado pelo CDS-PP.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, é para dar o esclarecimento sob a forma de contra-interpelação?

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, quero também fazer uma interpelação à Mesa.

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O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, depois de a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro ter apresentado publicamente este projecto na passada quinta-feira, ele deu entrada na Mesa, como aliás foi anunciado no início desta sessão.

Aplausos do CDS-PP.

Se a Sr.ª Deputada tivesse estado atenta, com certeza teria ouvido esse anúncio.
E, Sr.ª Deputada, já agora, aproveito para dizer que estamos há três anos à espera que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresente o que quer que seja nesta área.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, em representação do Grupo Parlamentar do PS, tem a palavra o Sr. Deputado Bravo Nico.

O Sr. Bravo Nico (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Vou colocar seis questões e dar seis respostas sobre o modelo de avaliação de professores.
Primeira questão essencial: queremos um sistema e um modelo de avaliação de professores que não é exigente, que não reconhece o mérito, que não valoriza a actividade lectiva, que não é rigoroso, que não é transparente, que não dignifica a classe docente, que não é equivalente a mais nenhum modelo de avaliação de qualquer outra profissão qualificada e que não promove o desenvolvimento da carreira dos professores? Ou queremos um modelo e um sistema de avaliação de professores que seja exigente, rigoroso e transparente, que incentive um desenvolvimento de qualidade na carreira de cada professor, que dignifique a classe docente, que promova os resultados escolares, que valorize a escola pública e que redignifique o sistema público de educação? Só há duas respostas: ou queremos um modelo que dignifique ou queremos um modelo que não dignifique.
O PS escolheu: queremos um modelo que dignifique a escola pública.

Aplausos do PS.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Isso é que é orgulho!

O Sr. Bravo Nico (PS): — Segunda questão: se queremos este modelo de avaliação, quando deveremos implementá-lo? Temos três alternativas.
Primeira alternativa: nunca; concordamos com ele, mas nunca o implementaremos.
Segunda alternativa: com certeza, concordamos com o modelo de avaliação de desempenho dos professores, mas ainda não é altura de implementá-lo, porque não há tempo, as pessoas não têm experiência, as escolas não estão preparadas, não há condições para implementá-lo. Talvez no próximo ano, mas só experimentalmente. Talvez daqui a dois anos. Talvez em 2013 esteja perfeitamente implementado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Essa é para o António Vitorino!

O Sr. Bravo Nico (PS): — Terceira alternativa: implementar agora, de acordo com o que está estabelecido no Decreto Regulamentar n.º 2/2008, de maneira que esteja concluído o procedimento de avaliação no final do ano lectivo de 2008/2009.
A primeira e a segunda alternativas só são uma coisa: nunca fazer nada! A terceira alternativa é a única que implementa um modelo de avaliação rigoroso e transparente. Foi essa que o PS escolheu, é o que as escolas estão a fazer, é o que nós defendemos.

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Aplausos do PS.

Vozes do CDS-PP: — Escolheu a pior!

O Sr. Bravo Nico (PS): — Terceira questão: o que é que este modelo de avaliação avalia nos professores? Avalia três conjuntos de objectivos.
Primeira dimensão da avaliação: os objectivos que constam do plano de actividades das escolas, os objectivos que constam dos projectos educativos das escolas e os objectivos que são decididos pelos próprios professores, que são avaliados nos projectos curriculares de turma que eles próprios elaboram.
Segunda dimensão da avaliação: os indicadores das escolas, a assiduidade, a participação nos projectos das escolas, a orientação educativa, o apoio aos alunos, o contacto com as famílias, a relação com a comunidade.
Terceira dimensão da avaliação: os objectivos que o próprio professor estabelece para si próprio, de acordo com as circunstâncias da sua escola, com as circunstâncias das suas turmas, com as características dos seus alunos e de acordo com o projecto curricular das suas turmas. Tudo objectivos da escola naquela circunstância, naquele território, com aqueles professores, com aqueles alunos! É isto que queremos. É isto que está a ser feito.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Bravo Nico (PS): — Quarta questão: como é colocado em prática o modelo de avaliação dos professores? Como é que isto é feito?

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Diga lá como é!

O Sr. Bravo Nico (PS): — Através de instrumentos que são elaborados e aprovados pelos conselhos pedagógicos das escolas. São as escolas, no exercício da sua autonomia pedagógica, que determinam os instrumentos que serão utilizados para proceder à avaliação do desempenho dos seus próprios professores.
Por outras palavras, para quem não entende,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Para quem não entende?!…

O Sr. Bravo Nico (PS): — … são os professores que determinam o procedimento de avaliação de si próprios na sua própria escola.

Aplausos do PS.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Somos todos burros!

O Sr. Bravo Nico (PS): — Quinta questão: quem avalia os professores? É muito fácil, Srs. Deputados: como em qualquer profissão qualificada, são os pares que avaliam. É assim em todas as profissões qualificadas e não havia razão nenhuma para que não fosse assim na profissão de professor, uma das mais qualificadas do nosso país! Aplausos do PS.

Sexta e última pergunta: na prática, como é que está ser implementado o sistema de avaliação de desempenho dos professores?

O Sr. João Oliveira (PCP): — É melhor nem falar nisso!

O Sr. Bravo Nico (PS): — Exactamente como está estabelecido no Decreto Regulamentar n.º 2/2008.

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Iniciou-se este ano lectivo e concluir-se-á no final do próximo ano lectivo.
Estão a ser seguidos os procedimentos de acompanhamento previstos através do Conselho Científico para a Avaliação de Desempenho de Professores; através do Conselho das Escolas, parceiros activos na construção das melhores soluções; através das direcções regionais de educação, que estão no terreno a apoiar os professores, os conselhos executivos e os conselhos pedagógicos; através dos serviços do Ministério da Educação, que estão a dar todo o apoio; através das associações profissionais que fazem parte Conselho Científico para a Avaliação de Desempenho de Professores; através das faculdades, das universidades, dos especialistas.
Só quem não está a ajudar a construir e a concretizar um bom procedimento de avaliação é a oposição, que não quer que se implemente qualquer sistema de avaliação!

Aplausos do PS.

Para terminar, Sr. Presidente, refiro o seguinte: trata-se de um processo dinâmico, que será implementado com todo o cuidado e com todo o rigor; que será ajustado onde for necessário; que será simplificado onde for necessário e onde se verifique que a simplificação melhora a qualidade; e que está a ser acompanhado por todos aqueles que querem dar um contributo muito forte para a qualificação dos professores e para a dignificação de uma classe que, repito, é uma das mais importantes para o desenvolvimento do País, para a redignificação dos serviços públicos de Portugal e para a construção de uma escola pública – que penso que todos gostaríamos que um dia existisse no nosso país – que preste um serviço público de qualidade e que seja um instrumento de desenvolvimento económico, humano e social. É isto que está em causa. É isto que está a ser feito, por muito que custe a muitas das pessoas que estão aqui.

Aplausos do PS.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso é no «país da Alice»!

O Sr. Presidente: — Há vários oradores inscritos para pedirem esclarecimentos.
O primeiro é o Sr. Deputado João Oliveira, a quem dou a palavra.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bravo Nico, o senhor é uma espécie de «tropa de choque» do Partido Socialista, que é chamada ao combate para justificar o injustificável. Costuma brindarnos com respostas de «bugalhos» sobre «alhos»: quando lhe perguntamos sobre avaliação, responde-nos com as refeições escolares; quando lhe perguntamos sobre actividades extra-curriculares, responde-nos com a reorganização da rede escolar.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Tem que estar com mais atenção!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Hoje resolveu intervir sobre a avaliação e optou por um esquema de cátedra: fez perguntas e deu respostas. Aliás, essa é uma típica atitude de monólogo do Partido Socialista e deste Governo, que não ouvem nem querem responder.

Vozes do PCP: — Muito bem!

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Vocês fazem bem isso!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Ainda assim, vou introduzir algumas «peças» na «engrenagem» dessas perguntas e dessas respostas que o Sr. Deputado aqui introduziu.

Protestos da Deputada do PS Helena Terra.

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Começo por perguntar-lhe o seguinte: o Sr. Deputado tem ou não consciência que, antes das últimas alterações ao Estatuto da Carreira Docente, estava em vigor um outro, aprovado em 1990, do qual decorria um modelo de avaliação?! Já existia um modelo de avaliação! E quem esteve no Governo, desde 1990 até hoje, foram os senhores, o PSD e o CDS! Portanto, se hoje reconhecem que o modelo anterior não serve é um bom acto de contrição! Mas importa que oiçam os destinatários do modelo de avaliação, ou seja, a comunidade educativa, para não repetirem os erros que cometeram ao longo desses anos todos!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Deputado, é errada a ideia que procura passar, de que estamos numa situação pacífica, de que este modelo de avaliação é pacífico, serve a todos e é inexplicavelmente contestado, porque é um modelo que tem sido contestado por todos, como, aliás, sucede com a política educativa! Ao contrário do que dizia a Sr.ª Ministra da Educação, a contestação não é só dos sindicatos, nem do PCP.
Foram mais de 100 000 os professores que se manifestaram em Lisboa contra esta política educativa.
Portanto, Sr. Deputado, importava que retirassem daí as devidas consequências: é que este não é um modelo que dignifica os professores, é um modelo que os persegue;…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — … este não um modelo que permite a melhoria do funcionamento da escola pública, é um modelo que a prejudica.
Se tivessem ouvido, hoje, os representantes dos conselhos directivos do distrito de Coimbra, teriam percebido que as escolas não têm condições para aplicar este modelo de avaliação, porque ele foi feito para perseguir os docentes e para dificultar a vida às escolas!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Neste quadro, Sr. Deputado, a questão que lhe coloco é esta: se tudo é tão pacífico, se este modelo é tão consensual, estão ou não dispostos a discutir, com toda a comunidade educativa, as aparentes 1001 vantagens que este modelo tem?! O que o PCP propõe é o diálogo, nesta Assembleia e em todo o País, com todos os destinatários do modelo de avaliação e das políticas educativas! Está, pois, ou não o Partido Socialista disposto, de uma vez por todas, a dialogar com toda a comunidade educativa e com todos os partidos políticos?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Bravo Nico.

O Sr. Bravo Nico (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, devo confessar, com toda a sinceridade, e apesar de toda a estima que tenho por V. Ex.ª, que defraudou as minhas expectativas.
Pensava que o PCP diria aqui que não concordava com a proposta que está em cima da mesa de sistema de avaliação de desempenho de professores, mas que tinha alternativas.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Aprovem o projecto de resolução!

O Sr. Bravo Nico (PS): — Pensava que diria: «Não concordamos com esses prazos, mas temos outros; não concordamos com esses instrumentos, mas temos outros;…»

Protestos do PCP.

«… não concordamos que seja feita pelos pares, mas temos uma alternativa».

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Mas, Sr. Deputado, o PCP disse zero!

Aplausos do PS.

Protestos do PCP e de Os Verdes.

Aliás, o PCP já nos habitou, há muito tempo, a esse vazio de conteúdo.
Permita-me ainda, Sr. Deputado, que lhe diga que fica muito mal ao Partido Comunista Português referir-se à manifestação de professores que ocorreu no passado Sábado da forma como o faz.
Nós ouvimos os professores, escutamos com atenção o que é dito pelos professores, respeitamos a liberdade de os professores se manifestarem e de exprimirem as suas opiniões livre e democraticamente.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Também era melhor!…

O Sr. Bravo Nico (PS) — O que não fazemos, Sr. Deputado, é capturar, apropriar-nos e utilizar de forma politicamente incorrecta a genuína expressão que os professores expressaram, livre e democraticamente aceite, no passado sábado. Isso não se faz!

Aplausos do PS.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Tenha vergonha!

O Sr. Bravo Nico (PS) — Aliás, orgulhamo-nos muito desta nossa postura de diálogo, de abertura.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso tem de ter correspondência na prática!

O Sr. Bravo Nico (PS) — E temos muita pena que V. Ex.ª e os seus colegas de partido não tenham tido iguais preocupações às aqui manifestadas quanto aos constrangimentos à manifestação de professores quando militantes do PS, na sua sede nacional, foram objecto dos mesmos constrangimentos. Os senhores nunca o referiram!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Bernardino Soares pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Para defesa da consideração da bancada, Sr. Presidente.

Vozes do PS: — Oh!…

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bravo Nico, não vou referir-me à matéria da política educativa, que aqui tem estado amplamente em debate, mas não posso deixar que se procure converter em verdade uma mentira sistematicamente repetida.

Vozes do PCP: — Exactamente!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — O PCP sempre repudiou, e repudiará, formas de intervenção e de protesto político que se dirijam aos partidos políticos.
Se o Sr. Deputado quiser consultar a nota que o PCP fez sair no próprio dia das infelizes declarações do Sr. Ministro Augusto Santos Silva, poderá ler que o PCP considera inaceitável estes eventos e que, no quadro dos direitos constitucionais, «temos a concepção de que os protestos devem ser dirigidos ao poder político e

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às associações patronais e não a instalações ou actividades partidárias». Se o Sr. Deputado o quiser comprovar, pode fazer esta consulta na Internet, nos órgãos de comunicação social.
Não aceitamos que continuem a repetir essa mentira nem que continuem a dizer que temos falta de respeito pelas realizações partidárias.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não temos essa falta de respeito e chega de repetir essa mentira!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Bravo Nico.

O Sr. Bravo Nico (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, ouvi com atenção o que referiu, mas não ouvi uma palavra fundamental: «repudiar».

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Então não disse?! É surdo?

Vozes do PS: — Não, não!

O Sr. Bravo Nico (PS): — Agradecia que V. Ex.ª aqui referisse que repudia os acontecimentos que tiveram lugar à porta da sede nacional do Partido Socialista, que foram inaceitáveis, como disse,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ah!… Afinal referi!

O Sr. Bravo Nico (PS): — … mas não disse que os repudiava! Volto a repetir que nós não nos apropriamos, não capturamos, não tornamos nossas aquelas expressões genuínas, expressas livre e democraticamente, de professores no passado sábado, dia 8 de Março. Essa expressão não é nossa, não é vossa, é apenas dos professores! E os senhores não devem apropriar-se daquilo que não é vosso.

Aplausos do PS.

Vozes do PCP: — Tenha vergonha!

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bravo Nico, queria agradecer-lhe o facto de ter tido a simpatia de trazer aqui um pequeno resumo de um manual de instruções sobre o processo de avaliação de desempenho dos professores, que foi publicado no Ministério da Educação há alguns dias atrás.

Protestos do PS.

Portanto, para os mais desatentos e para os iniciados, aqui vem a defesa política do processo de avaliação de desempenho dos professores. Porém, Sr. Deputado, fica uma dúvida: estará o Sr. Deputado fora de tempo, depois das últimas tomadas de posição do Ministério da Educação, ou o Sr. Deputado pretende vir, na prática, corrigir o que possa ter sido não um recuo mas uma marcha-atrás do Ministério da Educação no processo de avaliação de desempenho de docentes? Esta é a primeira questão que lhe coloco, mas, se me permite, tenho mais três a colocar.
Primeira questão: o Sr. Deputado considera que o Dr. António Vitorino, os sindicatos dos professores, o Conselho das Escolas e os 100 000 docentes que estiveram na rua são todos reaccionários, são avessos à

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mudança, não querem um processo de avaliação de desempenho, estão a ser manipulados, não sabem ler instruções? Julgo que o Sr. Deputado deveria esclarecer-nos sobre estas questões.
Segunda questão (que não vem no manual): o que é que acontece aos professores contratados nas escolas que decidirem não fazer, até ao final deste ano lectivo, o processo de avaliação de desempenho? Têm ou não os seus contratos renovados?

O Sr. João Oliveira (PCP): — Havia uma ameaça!

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Última questão, Sr. Deputado: vi que tem um papel com um número e gostava de perguntar-lhe se foi esse o resultado da sua avaliação de desempenho, ou se é esse o resultado da avaliação que os portugueses fazem da política educativa do Governo socialista, isto é, zero!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Bravo Nico.

O Sr. Bravo Nico (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Drago, muito obrigado pelas questões que me colocou, que me permitirão, certamente, esclarecê-la um pouco melhor.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Sim, bem precisa de ser esclarecida!

O Sr. Bravo Nico (PS): — Quando diz que utilizei um «pequeno manual» para aqui ilustrar o que é o sistema de avaliação de desempenho dos professores, é verdade! Esse «manual» (que a senhora não conhece) chama-se Decreto Regulamentar n.º 2/2008, de 10 de Janeiro.

Aplausos do PS.

Vozes do BE: — Não, não!

O Sr. Bravo Nico (PS): — É verdade! Segunda resposta: todos registámos aqui, surpreendidos, que a Sr.ª Deputada qualifica todas as pessoas que manifestaram, livre e democraticamente, a sua opinião no sábado (e nos dias anteriores e posteriores) como reaccionários. A palavra é sua!

Protestos do BE.

Foi a Sr.ª Deputada que a utilizou, não fomos nós! Essa palavra não é nossa. Aliás, tivemos o cuidado de referir que os respeitamos, que os escutamos. Temos um histórico que diz que possuimos nos genes essa expressão democrática e genuína de nos manifestarmos livremente. O PS convive muito bem com isso!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Desde que a polícia faça o controlo e vá às escolas!…

O Sr. Bravo Nico (PS): — Já os partidos à esquerda têm muita dificuldade em conviver com o diálogo e com a diferença.
Relativamente aos professores que são objecto de avaliação — os professores contratados e os que irão transitar de escalão este ano —, Sr.ª Deputada, para se esclarecer, basta ir ler o tal «manual» que referiu, o Decreto Regulamentar n.º 2/2008, porque está lá tudo explicado,…

A Sr.ª Helena Terra (PS): — É verdade!

O Sr. Bravo Nico (PS): — … no artigo que diz respeito ao período de avaliação dos professores contratados (artigo 28.º).

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Paulo Carvalho.

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bravo Nico, V. Ex.ª começou por dizer — aliás, muito ao seu estilo, diga-se em abono da verdade — que ia fazer uma intervenção com seis perguntas e seis respostas. A verdade, Sr. Deputado, é que para fazer aquelas perguntas e dar aquelas respostas mais valia não ter dito nada!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — De facto, chegámos ao fim com uma mão cheia de nada.

Vozes do BE: — É verdade!

Vozes do PCP: — Zero!

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Zero! Sabe porquê? O Sr. Deputado não prestou um único esclarecimento relevante sobre esta matéria.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — É verdade!

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Refugiou-se, como é seu timbre, em cláusulas gerais — na transparência, no rigor. Tudo aquilo que, depois, não concretizou!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Nem se sabe, exactamente, em que é que o sistema de que falou é transparente. Dê um exemplo de transparência! Podia ter dito! Ou diga-nos onde está um exemplo do rigor deste sistema! É um desafio que lhe lanço.
Também gostava de dizer-lhe que, vá lá!, ao fim de todo este tempo, parece que o Partido Socialista e o Governo começaram a ouvir qualquer coisa… A Sr.ª Deputada Isabel Coutinho disse que foram precisas 107 reuniões entre o Ministério da Educação e os sindicatos. Pelos vistos, as 106 primeiras não serviram para nada!

Protestos do PS.

É preciso ter ouvido duro! A 107.ª reunião, vá lá!, fez com que se abrisse uma «pequena janela» de oportunidade para o bom senso.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito pequena!

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Vamos ver se a «porta» não se fecha antes do tempo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP) — O PS está a querer fechá-la!

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Afinal, do que é que o Sr. Deputado aqui veio falar? Veio falar de um Conselho Científico que ainda não funcionou? É disso que veio falar, do que está no Decreto Regulamentar, desse Conselho Científico que ainda não existe? Veio falar dos parâmetros que esse Conselho

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Científico deveria ter aprovado e que ainda não aprovou?! Ou será que já aprovou os parâmetros, Sr. Deputados? Já que falou de tanto rigor, diga-nos se estão aprovados os parâmetros!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Zero!

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Sr. Deputado, de que prazos veio falar-nos? Dos que estão no decreto regulamentar ou daqueles que constam de um despacho «órfão»,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Não assinado e sem tema!

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — … em relação ao qual ninguém assume a paternidade, que remete, afinal, para as escolas? E não diga que o CDS não apresentou propostas, porque já apresentámos um projecto de resolução.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Sr. Presidente, termino com a seguinte pergunta: se considera que este sistema de avaliação é assim tão claro, tão evidente, tão rigoroso e tão transparente, então faça-nos o favor de explicar (seguramente, a Câmara dá-lhe todo o tempo necessário) em que consiste a avaliação de desempenho e como funciona,…

O Sr. Bravo Nico (PS): — Outra vez?!

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — … porque, com tanta confusão, ainda ninguém percebeu!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Bravo Nico.

O Sr. Bravo Nico (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Paulo Carvalho, certamente por falta de tempo, desconhece que, de facto, o Conselho Científico para a Avaliação de Professores já existe e está a trabalhar, a acompanhar a concretização do procedimento de avaliação de desempenho dos professores.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Desde?…

O Sr. Bravo Nico (PS): — Mais: ao referir que desconhece a existência do Conselho Científico para a Avaliação de Professores, uma vez mais V. Ex.ª indica que a elaboração do seu pensamento carece de uma sustentação óbvia, porque o senhor não conhece a realidade!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Não é possível!

O Sr. Bravo Nico (PS): — O senhor não sabe que, por exemplo, os professores Arsélio Martins, Jorge Mira, José Alves, Maria João Leitão,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Já reuniram?

O Sr. Bravo Nico (PS): — … Mário José Silva, Ludgero Leote, etc., etc., são pessoas que já estão a trabalhar hoje no acompanhamento da concretização do sistema de avaliação de desempenho. E isso é muito grave, Sr. Deputado, porque o senhor fala do que não conhece, de uma realidade que não existe, que é diferente da que conhece.

O Sr. José Junqueiro (PS) — Muito bem!

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O Sr. Bravo Nico (PS): — A terminar, Sr. Deputado, devo dizer que conheço uma proposta do CDS, a que hoje deu entrada na Assembleia da República. E sabe qual é a tradução dessa proposta? É parar, parar tudo! O Sr. Luís Fazenda (BE): — Exactamente!

O Sr. Bravo Nico (PS): — Parar o processo de avaliação.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Parar a confusão!

O Sr. Bravo Nico (PS): — Essa é exactamente a mesma resposta que VV. Ex.as deram quando se fez a reorganização do 1.º ciclo do ensino básico; quando se avançou com a requalificação do ensino secundário; quando se fez o enriquecimento curricular; quando se introduziram as aulas de inglês; quando surgiu o programa Novas Oportunidades. Por VV. Ex.as
, parava tudo! Só que não parou, está tudo em marcha. E estas coisas estão a ser feitas, sabe por quem, Sr. Deputado? Pelas escolas, pelos professores e pelos técnicos do Ministério da Educação.
Este é um trabalho que está a dar resultados. Só para que V. Ex.ª tenha um parâmetro de comparação, se me permite utilizar o número de 100 000 professores que estiveram na rua no passado sábado, diria que corresponde a um quarto do número de cidadãos portugueses que entraram na escola desde que o PS começou a governar, que são — para que tenha uma ideia — 400 000!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Emídio Guerreiro.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bravo Nico, ouvimos aqui uma das várias correntes do PS que, hoje em dia, falam sobre educação.

Protestos do PS.

E percebemos que o Deputado Bravo Nico é o porta-voz da corrente que domina na «5 de Outubro». É a corrente oficial da Ministra da Educação — não é bem oficial nem do Governo nem do Partido Socialista, mas é da Ministra da Educação! Mais, na forma como se expressou, o Sr. Deputado reflecte o que tem sido o Ministério a Educação: trouxe seis perguntas e seis respostas. Ou seja, não é preciso mais perguntas, está tudo respondido!… E também foi claro na forma como terminou a intervenção: «É assim, e é para quem quer!». Só faltou dizer: «Porque nós é que mandamos, nós é que somos o dono da chave e a porta está fechada».
Em suma, foi a expressão da arrogância e da prepotência que têm caracterizado estes três anos do Ministério da Educação.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — Estão muito satisfeitos!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Deputado, dignificar os professores com esse discurso, com esta Ministra?! Só se for uma anedota! Que eu saiba, os 100 000 professores que saíram à rua não foram fazer uma manifestação de júbilo, para gritar: «Sr.ª Ministra, a senhora é a melhor do mundo!» Não, Sr. Deputado! Nem foram dizer: «Ó Bravo Nico, meu herói!»

Risos do PSD, do CDS-PP, do PCP, do BE e de Os Verdes.

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Não, Sr. Deputado. E sabe porquê? Foram dizer, sim, que andam a ser achincalhados há três anos, que a política não os dignifica,…

Vozes do PSD: — É verdade!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — … que este Governo não tem dignificado a carreira!

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — O Sr. Deputado falou de transparência e de rigor?! Onde, Sr. Deputado?! No estatuto do aluno, onde não há faltas?! No fim dos exames?! No facilitismo para as pessoas obterem resultados no final do ano?! Não! Isto é tudo menos transparente e rigoroso.
O Sr. Deputado devia explicar melhor a questão da avaliação de desempenho dos professores. E não vale a pena fazer de conta que o resto da Europa não existe, porque existe, e com quem nós devíamos aprender.
O Governo devia, pois, estar a aproveitar este tempo para perceber porque é que desenvolveu um modelo de avaliação que nenhum dos nossos parceiros europeus tem, sobretudo aqueles que nos deviam servir de referência.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — A pergunta que lhe deixo é, pois, a seguinte: porque é que os senhores não seguem as melhores práticas? Sr. Deputado — e com isto termino —, não se trata de recuar ou de não recuar ou de medir o passo, se foi na semana passada ou ontem; trata-se, sim, de voltar a colocar bom senso na política educativa,…

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — … bom senso nas escolas, porque, infelizmente, o senhor e esta Ministra da Educação, de quem o senhor é porta-voz, têm sido incapazes de colocar o bom senso nas escolas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Bravo Nico.

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Será que vai falar na avaliação de desempenho?!

O Sr. Bravo Nico (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Emídio Guerreiro, também necessitava de alguma clarificação no sentido de saber qual foi a corrente do seu partido que representou na sua intervenção,…

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Só há uma!

O Sr. Bravo Nico (PS): — … se a corrente do Presidente da Câmara Municipal do Porto, Dr. Rui Rio, se a corrente oficial da liderança do PSD, se a corrente da liderança da bancada do PSD ou se, eventualmente, uma putativa corrente da sua própria liderança ao PSD. Temos de saber!

Aplausos do PS.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Fale de educação!

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O Sr. Bravo Nico (PS): — Quando V. Ex.ª refere a incapacidade aparente do nosso Governo em dialogar com as pessoas, permita-me que lhe refira algo, de forma séria, para que esta conversa não seja, de facto, achincalhante, porque estamos a falar de uma coisa muito séria.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Até aqui esteve a brincar! Isso é uma verdade!

O Sr. Bravo Nico (PS): — Foi este Governo que criou o Conselho das Escolas, que permite que as políticas educativas sejam dialogadas e concertadas com as escolas, onde, de facto, estão os professores.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Bem lembrado!

Protestos do PCP.

O Sr. Bravo Nico (PS): — Foi este Governo, Sr. Deputado, que dialogou com as empresas, com as associações profissionais, com as associações sindicais e com as autarquias para criar o programa Novas Oportunidades e que dialogou fortemente com as autarquias para reordenar a rede do 1.º ciclo do ensino básico,…

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Exactamente!

O Sr. Bravo Nico (PS): — … para criar refeições quentes nas escolas…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Cá estão as refeições!

O Sr. Bravo Nico (PS): — … e para construir centros escolares.
É este Governo, que os senhores acusam de não dialogar, que dialoga! Hoje está a acontecer diálogo! Mais de 100 reuniões foram feitas a propósito da avaliação dos professores. Quem acusa este Governo de não dialogar, depois de todas estas evidências, é alguém que sofre de esquizofrenia. É de esquizofrenia política que VV. Ex.as sofrem!

Aplausos do PS.

Por último, Sr. Deputado, não diga aquilo que eu, de facto, não disse. Eu repudio essas palavras.

O Sr. Patinha Antão (PSD): — Quem repudiou foi o PCP!

O Sr. Bravo Nico (PS): — Aquilo que referi na tribuna, e que vou repetir, para que fique esclarecido,…

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Explique lá o processo!

O Sr. Bravo Nico (PS): — … foi que este processo de avaliação é um processo dinâmico,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Já pôs 100 000 na rua!

O Sr. Bravo Nico (PS): — … que vai ser concretizado com todo o acompanhamento, para que possa ser aperfeiçoado e melhorado a todo o momento, para que possamos cumprir o nosso objectivo, concretizando um sistema de avaliação de professores, com rigor, com transparência e com objectividade, que seja aplicado agora, que seja bem aplicado e que tenha, para essa aplicação, o concurso de todos aqueles que querem contribuir para isso.
E se, neste exercício de parceria e de contribuição para aplicação de um bom sistema de avaliação, tivermos o contributo dos partidos da oposição ele é bem-vindo, mas, até hoje, não tivemos nada;…

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O Sr. João Oliveira (PCP): — Apresentámos muitas propostas sobre o Estatuto da Carreira Docente que vocês chumbaram!

O Sr. Bravo Nico (PS): — … se conseguirmos ter aqui o contributo das associações profissionais, ele é bem-vindo; e se, a esta ampla parceria, quiserem juntar os próprios sindicatos dos professores, como está a acontecer, eles também são bem-vindos, pois têm um papel importante em todo este processo, que queremos valorizar.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. Bravo Nico (PS): — Nós queremos, de facto, concretizar um modelo de avaliação de professores justo, rigoroso, transparente, que dignifique a classe docente e a escola pública e que preste um bom serviço aos portugueses e a Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bravo Nico, é inacreditável como consegue fazer uma declaração política sobre educação sem referir algo sobre a marcha que teve lugar no sábado, que levou nada mais nada menos do que dois terços dos professores à rua para contestarem a política educativa deste Governo.
Vou fazer-lhe uma pergunta, de uma forma algo simplificada, que acho que é uma pergunta que se impõe neste momento, porque, de facto, as pessoas e nós próprios precisamos de perceber: se, de acordo com o discurso do PS, da Ministra, da bancada parlamentar do PS,…

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Uma parte da bancada!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … do Governo, etc., este sistema de avaliação é tão bom, tão bom, tão bom, tão perfeito, tão perfeito, tão perfeito, então, como é que ninguém consegue perceber e reconhecer a sua bondade? Então, está tudo doido e só o Governo e a bancada do PS é que estão, de facto, no caminho certo e alertados para a verdade das verdades?! Vamos lá ver: os senhores insistem numa mentira, que não vale a pena transportar para a verdade, porque, pura e simplesmente, não é verdade, que é o facto de ninguém querer a avaliação dos professores. Não é assim! Queremos uma avaliação de professores, mas não aquela que os senhores propõem.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Então qual é?!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Porque aquela que os senhores propõem não é uma verdadeira avaliação de professores. Porquê? Porque ela não tem como objectivo a dignificação da carreira, nem resolver problemas do sistema de ensino, nem aferir deficiências para as corrigir. Tem, fundamentalmente, dois objectivos, que é estagnar carreiras, fazer com que os professores não evoluam nas carreiras, e artificializar o sucesso escolar, para os senhores apresentarem bons números a Bruxelas, mantendo a realidade do insucesso em Portugal.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Não é verdade!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — E isso é verdadeiramente inadmissível! É evidente que os professores, que lidam todos os dias com esta dura realidade, têm de se indignar face aos verdadeiros objectivos do vosso sistema de avaliação.
Depois, o Sr. Deputado diz que dialogam, dialogam, dialogam. Mas os professores acusam-vos exactamente do contrário, dizem que não os ouvem.

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Sr. Deputado, o meu grupo parlamentar tem dois Deputados e fomos «inundados» — não tem outro nome — de mails e de cartas de escolas e de professores relativamente à incapacidade…

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, peço-lhe que conclua.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … de os conselhos executivos praticarem o sistema de avaliação que os senhores lhes querem impingir. Os senhores também receberam! Que respostas lhes deram? Que diálogo, afinal, andam os senhores a manter, que não é absolutamente nada, absolutamente nada?

O Sr. Patinha Antão (PSD): — Zero!

Vozes do PCP: — Zero!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — É isso mesmo! Zero! Sr. Presidente e Srs. Deputados, termino mesmo fazendo uma pergunta concreta: o Sr. Deputado Bravo Nico acha isto tudo normal? O Sr. Deputado acha normal este isolamento do Partido Socialista? O Sr. Deputado quer andar «orgulhosamente só»?

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Bravo Nico.

O Sr. Bravo Nico (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, o sistema público de educação em Portugal é uma questão muito séria, que merece de todos nós a maior responsabilidade política, porque estamos a falar de uma das principais câmaras magmáticas de um Portugal que queremos que seja desenvolvido, que tenha pessoas qualificadas, que tenha um modelo de desenvolvimento económico baseado no conhecimento e que seja um País em que todos os portugueses se orgulhem de uma escola pública que seja instrumento de igualdade de oportunidades e de desenvolvimento económico, social e humano. E, neste exercício de reflexão e de construção política em torno de um sistema público de educação com qualidade, temos, de facto, de assumir grande responsabilidade.
Ora, no momento em que se debate um dos elementos mais estruturantes de um serviço público de qualidade, que é a avaliação desse serviço público na perspectiva de garantir, de facto, que os portugueses são servidos em condições de igualdade de oportunidades, com qualidade, com rigor e com objectividade, não é aceitável que muitos dos partidos da oposição aproveitem este elemento fundamental da construção do nosso país para o utilizarem para o jogo político-partidário, para a chicana político-partidária e para aquilo que não interessa neste momento nem às escolas nem aos professores.

Aplausos do PS.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — «Palavras leva-as o vento»!

O Sr. Bravo Nico (PS): — Nós queremos um sistema de avaliação rigoroso, transparente, objectivo, que seja equivalente ao das restantes profissões qualificadas e que promova o desenvolvimento da carreira dos professores.

O Sr. António Filipe (PCP): — Não é este! É outro!

O Sr. Bravo Nico (PS): — Queremos que este sistema seja aplicado agora, porque já esperámos demasiados anos sem o ter.
É reconhecido por todos que o actual sistema de avaliação é injusto e ineficaz, não é transparente e não contribuiu para os resultados que Portugal hoje, de facto, não se orgulha de ter.

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Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.

Mas queremos avançar com toda a cautela, acompanhando e monitorizando a aplicação do sistema de avaliação e tendo ao nosso lado aqueles que são, de facto, os verdadeiros parceiros da escola pública — os professores, os pais, as associações profissionais, os sindicatos, que têm um papel fundamental, e também todos aqueles que vêem na escola pública um instrumento da sua promoção social e pessoal.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua.

O Sr. Bravo Nico (PS): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Queremos que os professores sejam avaliados pelos pares, porque é assim nas restantes profissões qualificadas. E não tinha sentido que não fosse assim com os professores, porque isso seria desqualificar os professores e nós não aceitamos isso.
Por último, queremos que este sistema seja implementado com o acompanhamento que está previsto no decreto regulamentar, com todas as medidas que o melhorem e simplifiquem, as quais estamos perfeitamente abertos para incorporar, no sentido de que ele se aplique, se aplique bem e possa contribuir para o desenvolvimento do nosso sistema educativo e para que os portugueses se possam orgulhar cada vez mais de uma escola pública que está cada vez mais forte e mais ao serviço de Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados terminámos o período de declarações políticas.
Vamos, agora, passar à apreciação, na generalidade, da proposta de lei n.º 175/X — Procede à alteração do Estatuto dos Magistrados Judiciais e do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais.
Para apresentar o diploma, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça (Alberto Costa): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A iniciativa legislativa que hoje apresentamos a esta Assembleia visa três objectivos.
Em primeiro lugar, visa aproximar a realidade do Supremo Tribunal de Justiça do seu conceito constitucional, pondo termo a uma situação de prolongado défice de realização da Constituição.
Em segundo lugar, visa introduzir, no acesso aos tribunais superiores, um factor de «legitimação pelo procedimento», passando de um processo interno baseado em inspecções e antiguidade para um outro com lugar para júris com elementos externos, publicidade e transparência.
Em terceiro lugar, visa melhorar as condições de intervenção, no âmbito do Conselho Superior da Magistratura, dos membros eleitos pela Assembleia da República, obviando a desequilíbrios hoje identificados no funcionamento daquele órgão.
A Constituição consagra o conceito de um Supremo Tribunal de Justiça não como um tribunal de carreira para profissionais da judicatura mas, sim, como um tribunal com juízes, com magistrados do Ministério Público e com outros juristas de mérito — professores de direito, advogados e outros. Essa diversidade e essa abertura à comunidade jurídica global integram o perfil constitucional do Supremo Tribunal de Justiça.
É impressivo que, desde o início da vigência desta opção constitucional, se tenha verificado uma verdadeira neutralização, por via legislativa, dos efeitos práticos desta escolha.
Os lugares que os constituintes esperavam que fossem preenchidos por juristas de mérito exteriores à magistratura foram também eles preenchidos por magistrados nas décadas que vão decorridas. Em centenas de provimentos, registaram-se apenas duas excepções.
Estamos perante uma amputação deformadora do alcance da opção constitucional, a que pretendemos pôr termo.
Poderíamos ter ido mais longe na proposta, elevando para um terço ou um quarto, como parecia defensável, o número de lugares a preencher por juristas de mérito exteriores à magistratura, mas pareceunos mais importante estabelecer um consenso alargado, que desse força e estabilidade a esta inovação institucional e não pudesse ser apresentado como agressivo em relação a expectativas dignas de consideração.

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Assim, optámos por propor que quatro quintos dos lugares no Supremo Tribunal de Justiça fossem preenchidos por candidatos provenientes da magistratura, como se encontra previsto, e o quinto restante fosse obrigatoriamente preenchido por candidatos provenientes do exterior da magistratura, diferentemente do que hoje acontece.
O segundo objectivo que prosseguimos é o de incorporar um elemento de publicidade e de transparência no processo de avaliação curricular no acesso aos tribunais superiores e também o de promover um maior enraizamento e possibilidade de escrutínio no âmbito da comunidade jurídica.
Não se elimina nem se desconsidera o actual instrumentário de inspecções e classificações. Ele é acrescentado de uma defesa pública do curriculum dos candidatos perante um júri em que, sem prejuízo dos poderes constitucionalmente atribuídos ao Conselho Superior da Magistratura, há uma representação mais abrangente da comunidade jurídica.
Sustentar publicamente um curriculum como momento de um processo de acesso a um tribunal superior é uma mais-valia numa sociedade aberta.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Ministro da Justiça: — A legitimação decorrente do princípio democrático, através da nomeação pelos conselhos, com a sua específica composição, ganha em ser reforçada por uma «legitimação através do procedimento», sobretudo através das dimensões da publicidade e da transparência.
Com a intervenção de um júri parcialmente exterior aos conselhos visa-se permitir a articulação de uma lógica de avaliação interna com uma perspectiva de avaliação externa.
Estes objectivos são prosseguidos com obediência às normas e princípios constitucionais referentes à nomeação e promoção dos juízes, nomeadamente os que asseguram o papel central do Conselho Superior da Magistratura e, em medida análoga, do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais. Isso porque lhes está assegurada uma sólida reserva de competência; porque lhes cabe elaborar, numa primeira fase, a ordenação dos candidatos; porque os seus membros, togados e não togados, fazem parte dos júris previstos; e porque lhes pertence a última palavra na elaboração da lista definitiva de candidatos. Daí que tenhamos mesmo afinado fórmulas inicialmente encaradas para assegurar a plena conformidade ao quadro constitucional.
Sr.as e Srs. Deputados: A composição do Conselho Superior da Magistratura tem assegurado, simultaneamente, a compatibilidade com o princípio democrático e com o princípio da participação, mas quanto às condições de participação, no desempenho efectivo das suas funções, dos membros eleitos pela Assembleia da República tem-se verificado uma assimetria, que não traduz da melhor forma o conceito constitucional do órgão e que, pelo contrário, o afecta.
Daí ter-se criado, nesta Assembleia, aquando da discussão da Lei Orgânica do Conselho Superior da Magistratura, um consenso alargado em torno da necessidade de valorização do papel dos membros eleitos pela Assembleia. Diversos grupos parlamentares ou apresentaram iniciativas ou exprimiram então apoio a soluções como as que, no âmbito de um entendimento partilhado, aqui trazemos hoje.
Para nós, o essencial é conferir mais equilíbrio à situação actualmente existente, criando melhores condições para a intervenção dos membros eleitos que permitam valorizar o seu papel, em sintonia com a estrutura e critério desse órgão constitucional. Nesta linha, manifestamos disponibilidade para aperfeiçoamentos, na especialidade, que salvaguardem esse critério.
Não se trata de «ilegitimar» o modo e o estilo até agora seguidos. Com mais publicidade, mais transparência, procedimentos mais abertos, mais escrutínio, mais ajustamento aos padrões constitucionais, trata-se de reforçar a legitimação e de cumprir o que consta do nosso próprio compromisso: valorizar a diversidade, o mérito e a transparência no acesso aos tribunais superiores.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Muito bem!

O Sr. Ministro da Justiça: — Este não é um momento de ruptura mas, sim, um momento de incremento constitucional e democrático. Assim, um quinto dos juízes do Supremo Tribunal de Justiça passará a ser obrigatoriamente preenchido por juristas de mérito não provenientes da magistratura; o acesso aos tribunais

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superiores passa a incluir um acto público — a defesa dos currículos dos candidatos perante júris que integram também elementos da comunidade jurídica exteriores aos conselhos; e criam-se condições para o reforço do papel dos membros do Conselho Superior da Magistratura designados por esta Assembleia, mais em linha com o critério constitucional reflectido na composição desse órgão.
As opções que constam desta iniciativa encontram-se acolhidas, como sabem, no acordo políticoparlamentar para a reforma da justiça, mas estamos convictos de que este passo, que é marcante, ganha em ser dado com alargado consenso democrático.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Muito bem!

O Sr. Ministro da Justiça: — Pela nossa parte, faremos o necessário para o promover. Daí a nossa atenção e abertura a contributos na discussão na especialidade, em direcção a todas as bancadas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A presente proposta de lei altera o Estatuto dos Magistrados Judiciais e o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, modificando os regimes do acesso aos tribunais superiores, da composição do Conselho Permanente do Conselho Superior da Magistratura e do estatuto dos vogais com assento naquele Conselho (julgo ter sintetizado as principais propostas).
Quanto ao acesso aos tribunais superiores, faz depender a abertura de concurso para juiz da relação de uma deliberação do Conselho Superior da Magistratura e da existência da necessidade de provimento de vagas, num concurso que é, aliás, objecto de uma profunda densificação, subdividindo-se em duas fases.
Nos tribunais da relação prevê-se a constituição de um júri que deverá efectuar a avaliação curricular e emitir parecer sobre a prestação de cada candidato, regras, aliás, que são também retomadas, com ligeiras alterações, no que respeita à nomeação de juízes do Supremo Tribunal de Justiça, do Supremo Tribunal Administrativo e do Tribunal Central Administrativo.
No que concerne à composição do Conselho Permanente do Conselho Superior da Magistratura e ao estatuto dos respectivos vogais, estabelece-se a regra do exercício de funções em regime de tempo integral, ainda que os vogais membros do Conselho Permanente que exerçam estas funções neste tipo de regime passem a auferir vencimento correspondente ao do vogal magistrado de categoria mais elevada, propondo-se, assim, o fim da distinção entre os que exercem cargos públicos e os demais.
Estas alterações, constantes, aliás, do «defunto» pacto da justiça celebrado entre o PS e o PSD, merecemnos algumas dúvidas, que carecem de discussão e de melhor explicação em sede de especialidade.
A justiça, em geral, e a justiça administrativa e fiscal, em particular, a nosso ver, careciam de outra reforma que não esta.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — De uma reforma profunda que a torne mais justa porque mais célere e mais equitativa porque respeitadora dos direitos dos cidadãos.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — O CDS tem, aliás, vindo a denunciar os constantes bloqueios, pendências e demoras nas decisões destes tribunais que, não obstante o esforço dos Srs. Magistrados, reiteradamente, atingem as empresas, prejudicam o investimento, retardam o crescimento económico e, por vezes, impedem que decisões arbitrárias da Direcção-Geral de Contribuições e Impostos, que violam os mais elementares direitos dos cidadãos e das empresas, sejam atempadamente revogadas.

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O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Ao longo destes meses, e só para citar alguns exemplos, denunciámos penhoras ilegais, vendas judiciais ilegais de imóveis e a aplicação retroactiva de procedimentos por parte da Administração Pública, para não falar de outros comportamentos manifestamente abusivos.
Convido até o Sr. Ministro — com certeza que já o fez —, mas sobretudo os Srs. Deputados da maioria, a visitarem o que é hoje a realidade dos tribunais administrativos, para verem as condições de trabalho de que os Srs. Juízes usufruem para tamanha tarefa que lhes é colocada.
E, por isso mesmo, à semelhança do que alguns operadores judiciários disseram nas audições realizadas na 1.ª Comissão, manifestamos algumas dúvidas quanto à presente proposta de lei.
Desde logo, sobre o modelo de acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, pois entendemos que a composição do júri quase que o torna num júri interno. Melhor dito, é um júri externo que funciona, na prática, como um júri interno.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Para não dizer que esta composição não corresponde ao que foi acordado e transcrito no pacto para a justiça. Mas a isso já vamos ter de nos habituar…

Vozes do CDS-PP: — Bem lembrado!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Por outro lado, a defesa do currículo no que toca ao acesso às relações pode criar algumas dificuldades, pois, para além de induzir os magistrados para um aumento dos pedidos de licença para formação, que geraria ainda mais pendências, não se vislumbra como essa avaliação poderá ser feita. E apetece até perguntar como será esta mensurável numa carreira tão específica como esta.
Será pelo facto de um Sr. Juiz ter sido presidente do Conselho de Jurisdição da Federação Portuguesa de Futebol? Ou por ter sido director-geral de um qualquer serviço da Administração Pública? Não se percebe, e pode, de facto, dar azo a discricionariedades indesejáveis.
Somos favoráveis — que fique claro — a tudo que vise premiar o mérito, mas duvidamos que esta solução tenha legitimidade legal, até constitucional e certamente não terá política.
Por outro lado, se quem gradua para o acesso ao Supremo é um órgão de que fazem parte o presidente desse mesmo órgão e vogais juízes, e se entram também pessoas oriundas da magistratura do Ministério Público, não se vislumbra a razão por que não está prevista a presença de um membro desta magistratura na composição daquele órgão.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro da Justiça: Em suma, o CDS está, como sempre esteve, aliás, disponível para participar numa verdadeira reforma da justiça, sobretudo nesta área concreta, mas esta proposta de lei, se correcções não forem realizadas em sede de especialidade, à semelhança de outras, permito-me dizer, é o espelho do que tem sido a política do Governo nesta área — titubeante, temerária e, sobretudo, ineficaz.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Terra para uma intervenção.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta que hoje discutimos nesta Câmara é da iniciativa do Governo e, de algum tempo a esta parte, tem sido objecto de análise e reflexão por parte dos Deputados, mormente daqueles que compõem a 1.ª Comissão.
As matérias aí previstas foram igualmente objecto do acordo político-parlamentar para a reforma da justiça celebrado entre o PS e o PSD, e aí tratadas, aliás, com bastante detalhe.
Foram também objecto de várias audições — à Associação Sindical dos Juízes Portugueses; ao Conselho Superior da Magistratura; ao Conselho Superior do Ministério Público; ao Sr. Ministro da Justiça; ao Sr.
Bastonário da Ordem dos Advogados; e ao Sindicato dos Magistrados do Ministério Público.

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Mas, obviando esta minha introdução, cumpre nesta sede fazer uma pequena análise das alterações mais significativas que esta proposta de lei introduz.
No Programa do XVII Governo Constitucional podemos observar que estão previstas soluções que conduzem no sentido de uma maior publicidade e transparência no processo de acesso aos tribunais superiores, propondo-se que a progressão nas carreiras dos Srs. Magistrados tenha por base a qualificação, o mérito e a transparência na evolução profissional, nomeadamente no acesso aos tribunais superiores.
Esta iniciativa visa alterar o Estatuto dos Magistrados Judiciais e o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais; contudo, as alterações propostas versam primordialmente sobre três aspectos fundamentais: o acesso aos tribunais superiores; a composição do Conselho Permanente do Conselho Superior da Magistratura; e o estatuto dos vogais com assento neste Conselho.
Quanto ao acesso aos tribunais superiores, neste âmbito a proposta que ora discutimos vai no sentido de fazer depender a abertura de concurso para juiz da relação de deliberação do Conselho Superior da Magistratura e da necessidade de provimento de vagas, concurso que, aliás, é objecto de uma profunda densificação, propondo-se a sua divisão em duas fases: a primeira, em que o Conselho Superior da Magistratura «define o número de concorrentes que irão ser admitidos a concurso», e a segunda, na qual se leva a cabo a avaliação curricular dos candidatos.
Vou agora referir-me à composição do Conselho Permanente do Conselho Superior da Magistratura.
No que concerne a composição do Conselho Permanente, a proposta de lei n.º 175/X introduz como regra, para os vogais do Conselho Superior da Magistratura que pertençam ao Conselho Permanente, o exercício de funções em regime de tempo integral, a menos que a tal renunciem.
Por outro lado, esta iniciativa aponta ainda para que os «vogais membros do Conselho Permanente que exerçam funções em regime de tempo integral aufiram vencimento correspondente ao do vogal magistrado de categoria mais elevada», propondo o fim da distinção entre os que exercem cargos públicos e os demais.
Quanto ao estatuto dos vogais, no sentido de criar melhores condições de intervenção para os membros do Conselho Superior da Magistratura eleitos pela Assembleia da República, prevê-se que os vogais que integrem o respectivo Conselho Permanente desempenhem as suas funções em regime de tempo integral e que a sua designação passe a efectuar-se pelo período correspondente à duração do respectivo mandato. Em idêntico sentido, procedeu-se à alteração da composição do Conselho Permanente do Conselho Superior da Magistratura através do aumento, neste órgão, do número de vogais designados pela Assembleia da República.
A necessidade de apresentar soluções que melhorem o Estatuto dos Magistrados Judiciais há muito que era sentida. O Estatuto dos Magistrados Judiciais actualmente em vigor foi aprovado pela Lei n.º 21/85, de 30 de Julho, ou seja, há cerca de 23 anos. É, portanto, fácil perceber que a proposta de lei que hoje discutimos vem ao encontro de uma necessidade fundamental: a adequação da lei à realidade, que, objecto de mutação ao longo das duas últimas décadas, é hoje bem diferente do que era então.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Montalvão Machado.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Quase um ano depois do previsto (sim, quase um ano depois), o Governo do Partido Socialista apresenta à Assembleia da República a proposta de lei que visa alterar o Estatuto dos Magistrados Judiciais e o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais.
A proposta tem sido amplamente criticada por alguns sectores dos chamados «operadores judiciários» e tem sido apoiada por outros. E isso é próprio e até natural.
Mas, desde já, se deve anunciar: os representantes dos portugueses nesta Casa devem manter uma postura completamente incólume a desejos exclusivamente corporativistas, mas devem também ser contra soluções incoerentes que, apenas por serem novas, podem não justificar-se ou até mesmo piorar o actual estado da justiça, já tanto em crise.
A única coisa que move o Partido Social Democrata, nesta questão, é legislar bem, ajudar a legislar bem, tendo sempre em consideração, no caso, que «(…) a Justiça, em bom rigor, vale o que os juízes valem…» e

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que «… é bem mais importante a verdadeira qualidade dos juízes do que propriamente as leis que eles aplicam.» Por isso é que muito importante, é mesmo muito importante, alterarmos o Estatuto dos Magistrados Judiciais e o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais.
Assim, a proposta de lei trata de duas ou três questões importantes, já aqui abordadas.
Primeira, o acesso aos tribunais superiores.
Relativamente ao acesso aos tribunais da relação e ao Supremo Tribunal de Justiça, prevê-se uma fase do concurso, onde é suposto que o candidato defenda publicamente o seu currículo. Ou seja, será concretizado aquilo que o PSD propôs, com transparência e muito sentido de responsabilidade, uma verdadeira apreciação pública do currículo do candidato a juiz de um tribunal superior. E isto, para nós, é verdadeiramente relevante.
Sabe-se que os juízes devem, sobretudo, julgar. Claro! Mas isso não deve ser impeditivo da sua valorização constante, permanente e quotidiana, da sua investigação científica e jurídica, do desenvolvimento da sua categoria humana, como homens e mulheres e como juízes e todos, todos os profissionais de qualquer actividade, só não têm tempo para isso se não quiserem.
Não serão, pois, Sr. Presidente e Srs. Deputados, apenas os juízes e os seus conselhos superiores a conhecerem os currículos daqueles que, ao mais alto nível, exercerão a muitíssimo nobre função jurisdicional, serão todos, seremos todos nós, afinal, que conheceremos esses dados, o que também é fundamental — porque não dizê-lo? — num verdadeiro Estado de direito democrático.
De facto, Srs. Deputados, a justiça é como o juiz: não pode ser só séria, tem de parecê-lo todos os dias e em todos os momentos…

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — … e é justamente por isso que o acesso aos tribunais superiores se deve fazer de forma absolutamente límpida, transparente, eficaz e responsável.
Nisso muitos de nós estamos, pois, de acordo.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Já não tanto, porventura, quanto à composição do júri de avaliação desses currículos. Será necessário acompanhar, com todo o cuidado, a evolução do processo legislativo, no âmbito da discussão e votação na especialidade, pois que, pelo menos, é duvidoso que o número proposto dos elementos do júri seja o mais adequado.
Mas, verdadeiramente, o mais importante não é isso. O que verdadeiramente importa é que, para o acesso aos tribunais da relação, se explique, se especifique, se densifiquem, afinal, quais os critérios a adoptar na avaliação curricular dos candidatos (como não se fez neste caso e como se fez, estranhamente, para o acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, aos tribunais administrativos e fiscais e ao Supremo Tribunal Administrativo).
Remeter para depois, remeter para o além, como é costume do Governo quando algo se complica, empurrando aquilo que, politicamente, não dá jeito porque se complica, é desprestigiante para a própria função legislativa e pode ser, até, pernicioso.
Segunda questão relevante: a que diz respeito aos juristas de mérito que, numa proporção de um quinto, hão-de preencher o Supremo Tribunal de Justiça.
O desejável era, de facto, que um quinto dos lugares de juízes conselheiros fosse obrigatoriamente, como V. Ex.ª disse, preenchido por juristas de reconhecido mérito não pertencentes às magistraturas, não podendo esses lugares ser preenchidos por magistrados.
Apesar desse objectivo, com os medos e as hesitações habituais, a proposta de lei não altera uma vírgula, uma única vírgula, ao que a actual lei dispõe sobre a matéria e que deu tão nefastos resultados. Foi a realidade que o demonstrou. Foi a história que o demonstrou. Mas, face a esses resultados nefastos, que fazer ou propor? Nada, ou melhor, propor o mesmo para tudo ficar, afinal, na mesma.

Vozes do PSD: — Muito bem!

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O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — É por isso que se esta proposta for aceite sem mais, se as vagas para juristas de reconhecido mérito não forem preenchidas, de futuro, como agora afinal, três em cada quatro serão atribuídas a juízes da relação e uma em cada quatro será atribuída a procuradores-gerais adjuntos, ou seja, ficará tudo na mesma.
É por isso que, se esta proposta for aceite sem mais, se as vagas para juízes de reconhecido mérito não forem preenchidas, de futuro — como agora, afinal —, três em cada quatro delas serão atribuídas a juízes da relação e uma em cada quatro será atribuída aos procuradores-gerais adjuntos. Ou seja, e numa palavra, ficará tudo na mesma.
Porém, é estranho (é mesmo muito estranho) que, para o acesso ao Supremo Tribunal Administrativo, a proposta de lei tome isso em consideração, estipulando que as vagas são necessariamente — necessariamente, repito — ocupadas de acordo com as quotas indicadas, não podendo, nunca, serem as mesmas preenchidas por candidatos de outras alíneas.
Ora, o Governo esqueceu-se de legislar de igual forma para o Supremo Tribunal de Justiça, ou não? E, se se esqueceu, foi voluntária ou involuntariamente? É também isso que, na especialidade, tem que ser debatido, tem que ser esclarecido e, sobretudo, tem que ser resolvido.
Terceira e última questão: a composição e o estatuto do Conselho Permanente do Conselho Superior da Magistratura O Partido Social Democrata apresentou há muito tempo, há mesmo muito tempo, o projecto de lei n.º 243/X, preconizando que os vogais que fossem membros do Conselho Permanente desempenhassem as suas funções em tempo integral, que auferissem vencimento correspondente ao do vogal magistrado da categoria mais alta, que fosse elevado de dois para quatro o número de vogais do Conselho Permanente designados pela Assembleia da República e que a designação dos vogais membros do Conselho Permanente se fizesse por período igual ao da duração do respectivo mandato.
Quando se aprovou, neste Parlamento, a Lei de Organização e Funcionamento do Conselho Superior da Magistratura, tais propostas do PSD não foram consideradas. São-no agora (são-no agora, reconheça-se), apesar de subsistirem algumas diferenças que urge, também, esclarecer em sede de especialidade.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Um advogado que todos conhecemos escreveu que «os tribunais são, na verdade, o último sustentáculo da legalidade…» e que «… a livre convicção dos julgadores é o último reduto da liberdade».
Ajudemos, pois, a que a causa da justiça melhore, beneficiando substancialmente, o que, hoje, nos é proposto pelo Governo.
Ao fazê-lo, cumpriremos tão simplesmente um dever que é nosso.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo traz à discussão desta Assembleia uma proposta de lei que visa alterar o regime de acesso aos tribunais superiores e a composição e estatuto dos membros do Conselho Permanente do Conselho Superior da Magistratura.
Como decorre da própria Exposição de motivos, o Governo estabelece dois objectivos centrais: a criação de condições que garantam o preenchimento de um quinto dos lugares do Supremo Tribunal de Justiça por juristas de mérito e a melhoria das condições de intervenção para os membros do Conselho Superior da Magistratura eleitos pela Assembleia da República.
As soluções propostas pelo Governo não só estão desajustadas dos objectivos propostos como constituem factores de preocupação pelas consequências que delas podem decorrer. Aliás, na sustentação das suas propostas, o Governo parece pretender ignorar a realidade e a prática até hoje existentes, o que só poderá contribuir para o desfasamento das soluções que agora se propõem face às exigências do funcionamento destes órgãos do sistema judicial.

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Quanto ao acesso aos tribunais superiores, as preocupações do Governo centram-se na necessidade de discussão pública do currículo do candidato perante um júri cuja composição fica agora definida na lei.
Relativamente aos critérios a que deve estar sujeita a graduação dos candidatos, a proposta do Governo consiste em aplicar aos tribunais da Relação, ao Tribunal Central Administrativo e ao Supremo Tribunal Administrativo as regras já hoje definidas para o acesso ao Supremo Tribunal de Justiça.
Tendo o Governo definido como objectivo central o preenchimento de um quinto dos lugares do Supremo Tribunal de Justiça por juristas de mérito, não deixa de ser curioso que a única alteração proposta seja a fixação da composição do júri que procede à avaliação curricular do candidato. O que o Governo parece querer dizer com esta solução é que não houve até hoje mais juristas de mérito nomeados juízes do Supremo Tribunal de Justiça porque o júri constituído para o concurso não integrava obrigatoriamente um representante do Conselho Superior do Ministério Público, um advogado e um professor catedrático de Direito.
Fingindo desconhecer que até hoje houve apenas quatro candidatos na quota de juristas de mérito e que dois deles foram nomeados, o Governo foge das verdadeiras causas que estão na origem desta situação — mais relacionadas com os requisitos exigidos e o estatuto remuneratório correspondente — e refugia-se no argumento fácil do corporativismo, que tudo parece justificar.
Mas mais graves são as alterações propostas ao Conselho Permanente do Conselho Superior da Magistratura, uma vez que as propostas do Governo incidem na composição daquele Conselho e no regime dos seus membros.
Por um lado, aumenta-se de dois para quatro o número de vogais do Conselho Superior da Magistratura eleitos pela Assembleia da República com assento no Conselho Permanente.
Por outro lado, altera-se a regra da fixação do regime de tempo integral. Se até hoje era o Plenário do Conselho Superior da Magistratura que decidia quais dos seus membros estariam sujeitos ao regime de tempo integral, com as propostas do Governo só os membros do Conselho Permanente estão sujeitos ao regime de tempo integral, podendo, no entanto, a ele renunciar.
O Governo justifica estas alterações com a necessidade de criar melhores condições de intervenção para os membros do Conselho Superior da Magistratura eleitos pela Assembleia da República. Na verdade, o que o Governo faz é introduzir um novo factor de politização do Conselho Superior da Magistratura e criar novas dificuldades ao seu funcionamento.
Ao ignorar deliberadamente que até hoje nenhum dos membros do Conselho Superior da Magistratura eleitos pela Assembleia da República ou designados pelo Presidente da República exerceu o seu mandato em regime de tempo integral e ao prever a possibilidade de os membros do Conselho Permanente renunciarem a tal regime, o Governo limita as já difíceis condições de funcionamento deste Conselho.
Se os membros do Conselho Superior da Magistratura eleitos pela Assembleia da República e os designados pelo Presidente da República mantiverem a sua indisponibilidade para o desempenho de funções em regime de tempo integral, este Conselho contará com menor disponibilidade dos seus membros. Se se dispuserem a exercer as suas funções em regime de tempo integral, estarão os membros nomeados pelos órgãos políticos em maioria face aos membros eleitos pelos juízes.
Em suma, as alterações propostas pelo Governo não só não contribuirão para a resolução dos problemas identificados na Exposição de motivos como introduzirão novos factores de perturbação no funcionamento do sistema judicial.
Se tivermos em conta, por exemplo, as funções que o Conselho Superior da Magistratura pode ser chamado a desempenhar no quadro da nova organização judiciária que este Governo tem em preparação, ficam bem à vista as consequências extremamente negativas que estas alterações podem acarretar, nomeadamente no que respeita à garantia da independência dos juízes e à separação do poder político face ao poder judicial.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

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A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: O Governo apresentou uma proposta de lei à Assembleia da República que visa alterar três aspectos do Estatuto dos Magistrados Judiciais.
O Estatuto dos Magistrados Judiciais é uma peça jurídica de fundamental importância para a estrutura do Estado de direito.
Nas audições realizadas a propósito deste diploma, ficou claro que, da parte dos principais agentes judiciais envolvidos, se esperava uma revisão mais profunda deste Estatuto, tendo em conta que ele vigora há mais de 20 anos e que, como em quase todas as áreas da sociedade — aliás, penso mesmo que em todas —, se procederam entretanto a significativas alterações sociais, que têm que ter reflexo na administração da justiça.
Entre os aspectos que poderiam ser revistos estão, por exemplo, a questão complexa do exercício do poder disciplinar, a qual se relaciona de perto com as inspecções judiciais e os respectivos critérios, bem como a questão das avaliações. No entanto, o Governo parece ter optado por uma revisão apenas parcelar, restrita a apenas alguns aspectos bastante concretos.
Optou o Governo, enquadrado no «pacto de justiça» que estabeleceu com o PSD apenas tocar três aspectos: acesso aos tribunais superiores; composição do Conselho Permanente do Conselho Superior da Magistratura; e estatuto dos seus vogais.
A primeira questão será: porquê mexer em três pontos e não uma avaliação completa ao Estatuto? Bom, mas ficamos a saber que o pacto — o tal pacto! — «tem dias»: num dia existe, no dia seguinte já está posto em causa, apenas deu para propor três alterações. Embora quase seja obrigada a concluir que o pacto também não funcionou para estas três matérias concretas, como ficou evidente pela intervenção do Sr. Deputado António Montalvão Machado… Como é sabido, o Bloco de Esquerda considera que este pacto não trouxe nada de bom à justiça: afunila as soluções entre dois partidos, acorda nos corredores as soluções e ainda por cima não ouve os alertas e as sugestões dos diferentes agentes na área da justiça.
Debater o Estatuto dos Magistrados Judiciais é falar do Estado de direito, é falar da independência dos tribunais, é falar dos perigos que poderão advir se existir controlo por parte do poder político.
Por outro lado, compreendemos e apoiamos o caminho que vá no sentido de uma maior abertura dos tribunais e dos juízes à sociedade, aos problemas do dia-a-dia, que permita evoluir e alterar tudo aquilo que entrave a celeridade da justiça, que impeça o acesso dos cidadãos e das cidadãs — aliás, a peça-chave em tudo.
O sistema de justiça só cumprirá o seu papel se todos os cidadãos e cidadãs forem tratados em igualdade de circunstâncias perante o tribunal. É este o grande desafio! Apoiamos todas as medidas que vão no sentido da transparência no acesso aos tribunais superiores e pensamos que, neste aspecto, a proposta de lei podia ir mais longe, nomeadamente naquilo que diz respeito ao papel dos júris e à definição de critérios. Somos, sem dúvida, favoráveis à abertura dos júris a personalidade não juízes, que podem contribuir para a tão desejável abertura do sistema de justiça.
Em relação aos concursos para os tribunais superiores, salientamos a discussão do currículo do candidato.
Esta discussão permitirá avaliar, espera-se, outras actividades que enriqueçam o candidato na sua qualidade de juiz. Nestes critérios, podem constar, por exemplo, a participação em acções de formação ou a docência, entre outros. No entanto, há que assegurar também que os magistrados possam fazer esse enriquecimento curricular, tendo em conta, obviamente, as necessidades de serviço dos tribunais.
Da mesma forma, salientamos que, para os tribunais administrativos e fiscais, se estabeleça uma série de critérios concretos para a graduação dos candidatos — seguindo as considerações já acima apontadas para os magistrados judiciais.
Por isso, Sr. Ministro e Sr. Secretário de Estado, não se entende que, no caso dos concursos para os tribunais judiciais, não exista referência aos critérios concretos para a avaliação curricular. Porquê esta diferença? Um outro aspecto que parece apontar para uma vontade de maior abertura do sistema judicial é o aumento de vogais designados pela Assembleia da República para o Conselho Permanente. Esperemos que esta medida — e gostaríamos de o reafirmar — seja aproveitada de forma positiva e não no sentido do controlo político da justiça.

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Esta proposta de lei — e com isto terminarei, Sr. Presidente — é mais uma peça na reforma da justiça que o Governo tem trazido a esta Assembleia da República, mas, diria, vem um pouco «às prestações» — agora uma, depois outra… — e não deve ser vista fora do global de todas as propostas de lei que o Governo quer apresentar nesta área.
Por isso, Sr. Ministro da Justiça, esta não é uma proposta de ruptura, pode ter a certeza, mas também não é uma proposta de consenso. Esperemos que não seja um acto falhado.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O nosso objectivo era triplo — primeiro, consagrar a defesa pública dos curricula para o acesso aos tribunais superiores; segundo, garantir a obrigatoriedade do preenchimento de um quinto dos lugares do Supremo Tribunal de Justiça por candidatos não provenientes da magistratura; e, terceiro, dotar de condições de intervenção os representantes desta Assembleia que integram o Conselho Superior da Magistratura.
Congratulamo-nos com os resultados desta discussão.
Existe um largo suporte parlamentar para que a defesa pública dos curricula se processe no âmbito do actual acesso aos tribunais superiores, algo que não existiu nas últimas décadas e que representará um ganho em matéria de transparência, de publicidade, de enraizamento na comunidade e de escrutínio pela comunidade jurídica e pela comunidade em geral.
Em relação ao segundo objectivo, torna-se também evidente que existe um largo suporte para que se realize o conceito constitucional de um supremo tribunal que, além de juízes e magistrados do Ministério Público, tem juristas de outra proveniência. Queria reafirmar aqui que a nossa intenção, independentemente do que for preciso esclarecer na especialidade, é a de assegurar que esse propósito constitucional passe a ter tradução na realidade.
Por último, em relação ao Conselho Superior da Magistratura e ao seu Conselho Permanente, queria também registar uma larguíssima convergência e até lembrar ao Sr. Deputado Nuno Magalhães que, quando esta matéria aqui foi discutida a 12 de Abril do ano passado, V. Ex.ª definiu uma posição de claro apoio a esta solução com estes contornos. Assim, exortava-o a não se deixar impressionar com o facto de estas medidas terem originariamente nascido no âmbito de um acordo político-parlamentar para a justiça…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Com certeza!

O Sr. Ministro da Justiça: — … e a aderir a uma solução que foi tão nítida a suscitar o seu entusiasmo na sessão e na intervenção que aqui fez no dia 12 de Abril de 2007.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Bem lembrado!

O Sr. Ministro da Justiça: — Creio, portanto, Sr.as e Srs. Deputados, que com os necessários aperfeiçoamentos na especialidade, para os quais estamos inteiramente abertos, podemos considerar a sessão de hoje um passo no sentido de uma maior concretização dos objectivos e dos valores constitucionais.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, passamos à apreciação, na generalidade, da proposta de lei n.º 181/X — Procede à segunda alteração ao Código do Imposto sobre Veículos, aprovado pela Lei n.º 22A/2007, de 29 de Junho, introduzindo ajustamentos em matéria de condições de condução por outrem de veículos de pessoas com deficiência e de admissão temporária de veículos por trabalhadores transfronteiriços.
Para apresentar o diploma, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

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O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Carlos Baptista Lobo): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: É com especial honra que me dirijo pela primeira vez à Assembleia e por isso os meus cumprimentos.
O Programa do XVII Governo Constitucional assumiu a requalificação e a salvaguarda do património ambiental para as gerações futuras como uma das suas grandes orientações estratégicas, prevendo o seu desenvolvimento, designadamente através da reforma do anterior imposto automóvel.
Este compromisso foi cumprido com inegável sucesso, tendo sido fixadas metas ambiciosas e de vanguarda em relação aos restantes países da União Europeia no que respeita à integração na base tributável do novo imposto de uma componente formada pelas emissões de dióxido de carbono. A título de exemplo, saliente-se que, hoje em dia, essa componente ambiental corresponde a 60% do encargo fiscal.
O outro princípio orientador da reforma da tributação automóvel — que visava a deslocação de parte da carga fiscal do momento da aquisição para a fase da circulação — também se encontra rigorosamente cumprido.
Assim, a partir de 1 de Julho de 2007, o novo imposto sobre veículos representou, desde logo, um desagravamento de cerca de 10% da carga fiscal (tendo como contrapartida o imposto de circulação), sendo que, no Orçamento do Estado para 2008, o Governo realizou de imediato mais uma etapa, desagravando o imposto sobre veículos (ISV), em média, mais de 10%, tornando consequentemente a aquisição dos veículos pelos cidadãos e pelas empresas menos onerosa.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A estes objectivos o Governo associou um outro de carácter mais formal, mas não menos relevante — rever, consolidar, racionalizar e codificar toda a imensidão de legislação vigente no âmbito da tributação automóvel, visando dotar esta área fiscal de maior clareza e coerência, harmonizando os princípios, técnicas e conceitos de que se servem as figuras tributárias dos novos impostos sobre veículos e único de circulação.
A concretização de uma reforma tão profunda e compreensiva dificilmente pode ser assumida como um trabalho inacabado e muito menos perfeito, importando, humildemente, corrigir e melhorar aspectos que, pela sua relevância e impacto, o justifiquem.
É este o fundamento da proposta de lei que aqui, hoje, se discute.
Trata-se, no essencial, de introduzir dois ajustamentos ao Código do Imposto sobre Veículos, que — embora pontuais — assumem relevância e urgência inquestionável.
Em primeiro lugar, pretende o Governo corrigir uma situação que se detectou constituir um obstáculo relevante e desproporcionado à mobilidade de pessoas com deficiência, no que respeita à possibilidade de condução por outrem desses veículos.
Com efeito, o actual regime de condução por outrem de veículos que beneficiem da isenção aplicável às pessoas com deficiência, como foi demonstrado recentemente pelo próprio Provedor de Justiça, encerra alguma desproporcionalidade ao impedir que esses veículos possam ser conduzidos — alternativamente — quer pelos ascendentes e descendentes em primeiro grau da pessoa com deficiência quer por um terceiro, familiar ou não, designadamente nos casos em que aqueles estejam temporariamente impedidos.
Assim, neste âmbito, importa aperfeiçoar a norma em causa, minorando eventuais constrangimentos às estruturas familiares de apoio que podem auxiliar, do modo que considerem mais conveniente, a pessoa com deficiência, em especial aquelas que com ela vivam em economia comum.
Um outro ajustamento diz respeito à admissão temporária de veículos com matrícula estrangeira, designadamente espanhola, na forma de tráfego transfronteiriço. Reconhecem-se as vantagens na existência destes corredores permanentes de circulação que permitam a mobilidade das pessoas, bem como na criação de condições adequadas de circulação e mobilidade num contexto de exercício de uma actividade profissional, sendo um factor importante do desenvolvimento económico e social das áreas fronteiriças.
Em concreto, pretende-se permitir aos trabalhadores transfronteiriços residentes em Espanha e que trabalhem em Portugal a admissão em território nacional de veículos com matrícula definitiva de outro Estadomembro em condições menos restritivas. A admissão passa a ser autorizada aos trabalhadores transfronteiriços que residam em Espanha e se deslocam regularmente para território nacional, com a finalidade de exercer uma actividade profissional em Portugal, independentemente da distância quilométrica a que se encontra o local de trabalho.
São, portanto, estas as duas alterações que propomos. São ajustamentos de pormenor.

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Patinha Antão.

O Sr. Patinha Antão (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: Em primeiro lugar, sendo a sua primeira intervenção, os nossos votos de bom sucesso nestes trabalhos parlamentares. Gostamos de o ver cá.
Queríamos também sublinhar algo que é estranho, mas que revelamos positivamente. O Sr. Secretário de Estado disse que abordava este tema com uma nota de humildade. Oxalá esse seu exemplo frutifique nessa bancada, porque o normal é termos um registo exactamente contrário! Quanto à matéria que o Sr. Secretário de Estado aqui nos traz, vou ser muito rápido a colocar os problemas.
Efectivamente, trata-se de melhorias marginais, mas importantes.
Damos o nosso acordo à melhoria pontual no que diz respeito às condições de condução por outrem de veículos de pessoas com deficiência.
Relativamente à outra matéria, que é a razão de ser desta alteração legislativa, Sr. Secretário de Estado, o Governo merece uma crítica. O Governo criou, com o novo imposto automóvel, um problema que não existia.
Como o Sr. Secretário de Estado muito bem sabe, entre 2000 e 2007, vigorava para os veículos com matrícula espanhola e outras pertencentes a trabalhadores fronteiriços, neste caso espanhóis, que trabalhassem em Portugal e residissem em Espanha, a legislação que existe em Espanha.
O seu Governo, em Junho de 2007, ao alterar o imposto, numa lógica burocrática e de perseguição destes cidadãos, criou uma situação completamente ridícula. Tomou consciência deste problema, mas, quando fez a primeira alteração, em Dezembro, esqueceu-se. O Sr. Ministro, na Cimeira de Braga, reconheceu-o publicamente e disse: «Cometemos um erro. Para a semana vamos resolver.» A Cimeira foi no dia 19 de Janeiro e estamos em Março… Sr. Secretário de Estado, resolveu, mas mal, permita-me que lhe diga. O vício burocrático que ainda anima o Ministério das Finanças, oxalá possa corrigir! Quanto à alteração que nos propõe, queríamos dizer que devia eliminar a parte final em que obriga o agregado familiar destes cidadãos a demonstrar que não tem residência em Portugal. Esse vício burocrático — e é esse o contributo que queríamos dar para resolvermos, de vez, este problema — devia eliminá-lo da legislação. Sr. Secretário de Estado, se o fizer, copia a legislação de Espanha e o Sr. Primeiro-Ministro pode dizer, como disse em Braga, ao seu grande amigo Zapatero — e saudamos o Primeiro-Ministro de Espanha! —, que os cidadãos espanhóis são tratados em Portugal como os cidadãos portugueses em Espanha.
É muito importante que exista este clima, Sr. Secretário de Estado, porque, de acordo com a evidência da imprensa, trabalham connosco cerca de 14 000 espanhóis, dos quais 3000 trabalham no Serviço Nacional de Saúde — foram aliciados, e bem, pelo nosso governo. Como é possível que estas pessoas continuem a ser objecto de uma actuação da Guarda como se fossem criminosos, com apreensão de veículos e um tratamento completamente ilógico? Sr. Secretário de Estado, uma última sugestão: para que o Sr. Ministro possa honrar esse seu compromisso — e, como sabe, esta matéria pode ser retroactiva —, faça favor de dar instruções para que as multas e apreensões feitas a partir do momento em que o diploma foi alterado, em Junho de 2007, sejam imediatamente objecto de eliminação para que os cidadãos espanhóis que trabalham connosco possam dizer: «Afinal, Portugal tem um Governo normal. Tem um Governo que procede como na União Europeia, tem um Governo que nos trata como nós tratamos os portugueses que todos os dias passam a fronteira e trabalham em Espanha».
Sr. Secretário de Estado, é isto que lhe deixamos, saudando-o uma vez mais.
Se me permite, se a sua nota de humildade consentir responder de forma a ver o bom senso destas nossas alterações, nós consideramos que esta sua primeira intervenção é muito positiva.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Paulo Carvalho.

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.
Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, começo também por saudar V. Ex.ª, Sr. Secretário de Estado, na sua primeira intervenção na Assembleia da República e desejar-lhe não só as maiores felicidades mas também, muito sinceramente, que continue neste registo — que, aliás, foi uma lufada de ar fresco —…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exactamente!

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — … de humildade democrática e de bom senso.

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Ah!

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Ainda bem que a Sr.ª Deputada Maria Antónia Almeida Santos sentiu o toque! É bom sinal.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exactamente!

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Não se deixe influenciar pelas más companhias, Sr. Secretário de Estado!

Risos do CDS-PP.

Quanto à matéria que aqui trouxe e que foi exposta de forma até bastante abrangente por V. Ex.ª, concordamos objectivamente com a razão de ser das alterações propostas. Provavelmente, já se podia ter aproveitado outra ocasião, porque não é a primeira vez que é alterado este Código. No entanto, mais vale tarde que nunca! Era uma solução necessária quer num caso quer no outro. Estou a referir-me aos dois artigos que vão ser alterados, quer aquele que diz respeito aos trabalhadores espanhóis quer em matéria de condições de condução por outrem de veículos de pessoas com deficiência.
Parece-nos razoável que se passe a considerar esta expressão «regularmente», porque é mais abrangente e, nesse sentido, mais adequada aos cidadãos espanhóis que aqui trabalham e que não vão todos os dias para o seu país, mas que permanecem cá alguns dias. Parece-me perfeitamente aceitável que aqueles pretendam continuar com o automóvel de matrícula espanhola.
Porém, temos algumas dúvidas.
A primeira é sobre a própria disposição, e pode ser que o Sr. Secretário de Estado, se lhe for concedido tempo, nos explique. A norma do artigo 2.º prevê efeitos retroactivos, pelo que se nos levantam algumas dúvidas sobre a constitucionalidade ou legalidade de uma disposição que tem efeitos retroactivos. A norma do artigo 2.º faz retroagir o efeito desta alteração à data de 1 de Julho de 2007, para todos os efeitos.
Por outro lado, a solução que se apresenta, sendo boa, é uma solução anti-Simplex,…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exactamente!

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — … porque é muito formalista, bastante burocratizada, como, aliás, o Sr. Deputado Patinha Antão já aqui referiu. Há que salvaguardar algum rigor. Estamos de acordo em que não haja situações de abuso, mas parece-nos que há um exagero burocrático. Gostávamos de saber se há abertura da parte do Governo para simplificar o procedimento.
Quanto ao artigo 57.º proposto, parece-nos perfeitamente razoável. Limitar apenas a uma pessoa seria um pouco absurdo e, portanto, há aqui uma relação instrumental de utilização de condução da viatura para serviço do cidadão que dela beneficia. Nesse sentido, parece-nos perfeitamente razoável esta alteração.

Aplausos do CDS-PP.

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O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: Em pouco mais de seis meses o novo Código do Imposto sobre Veículos sofre já a segunda alteração, o que não abona muito a favor da qualidade da legislação adoptada em Julho do ano passado. Enfim, a relativa pouca estabilidade da legislação aprovada mostra que, tal como dissemos na altura, teria sido melhor ponderar algumas das soluções então adoptadas. Isto não significa, Sr. Secretário de Estado, que não estejamos perfeitamente abertos às alterações que melhorem a situação e o enquadramento legal.
Gostava de lhe dizer, uma vez que não era o titular do cargo na altura, que, pelo menos, parte da primeira alteração não mereceu, de todo, o nosso acolhimento nem melhorou a situação. Deu voz a um interesse corporativo, interno, limitado, ainda por cima representando um interesse do próprio Estado e, como tal, mereceu a nossa oposição na altura.
Não é o caso, diga-se, das alterações que agora são propostas, que, em tese, merecem a nossa concordância.
No caso da isenção aplicável aos veículos de pessoas com deficiência, trata-se de permitir que esses veículos possam ser conduzidos não só por familiares em primeiro grau directo da pessoa com deficiência mas também por duas terceiras pessoas, desde que essas pessoas sejam devidamente identificadas e desde que — e isto é um elemento essencial — a condução seja feita sempre e apenas com a pessoa com deficiência a ser obrigatoriamente um dos ocupantes do veículo.
A outra alteração que a proposta apresenta tem a ver com os veículos de matrícula espanhola pertencentes a trabalhadores residindo em Espanha, mas a desempenhar a sua actividade profissional em Portugal. Com esta alteração, os espanhóis podem passar a deslocar-se entre a respectiva residência e os locais de trabalho em Portugal sem que os agentes da PSP ou da GNR verifiquem, como até agora impunha o Código, se o local de trabalho estava a mais ou a menos de 60 km da fronteira.
Esta alteração impedirá, portanto, que, caso o trabalhador espanhol tenha o seu local de trabalho a 61 km ou mais, o seu veículo seja apreendido pela autoridade respectiva. Parece-nos, portanto, que esta é uma solução justa e adequada.
Só que, Sr. Secretário de Estado, como em tudo na vida, há sempre um «mas», e esta última alteração tem um «mas», um grande «mas». Nada, na proposta de lei, permite concluir que esta norma legal, a ser aprovada, tem como garantia uma aplicação idêntica aos trabalhadores portugueses que se desloquem para um local de trabalho em Espanha. Há que introduzir uma norma legal que permita uma efectiva circulação de trabalhadores nas suas viaturas nacionais, quer seja em Portugal quer seja em Espanha. Esta norma alterada tem de ser obrigatoriamente objecto de reciprocidade.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Este facto não está, na nossa opinião, formalmente garantido — sublinho, não está plena e formalmente garantido — e é ao Governo que compete garantir formalmente a existência desta reciprocidade. O Governo terá de o fazer ainda hoje, se houver oportunidade, mas não oral e, sim, formalmente, ou, no máximo, durante a aprovação na especialidade. Desta garantia, que permitirá assegurar a equidade rigorosa no tratamento de trabalhadores espanhóis e portugueses — recordo que há 14 000 espanhóis a trabalhar em Portugal, mas há muito mais de 50 000 portugueses a trabalhar em Espanha —, vai depender a nossa posição final global sobre as modificações desta proposta de lei.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Nunes.

O Sr. Hugo Nunes (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, aproveito para saudar o Sr. Secretário de Estado e desejar também as maiores felicidades na participação dos nossos trabalhos.

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Com a apresentação da proposta de lei n.º 181/X, visa-se a segunda alteração do Código do Imposto sobre Veículos. O Sr. Deputado Honório Novo ainda há pouco referiu-o, e bem, mas esqueceu-se de referir que a primeira alteração ficou, desde logo, prometida e garantida pela aprovação do próprio Código por parte dos pressupostos que estavam nele contidos.
Esta segunda alteração é um aperfeiçoamento, mas é um aperfeiçoamento que incide em duas vertentes muito específicas da aplicação do Código do Imposto sobre Veículos: a condução de veículos de pessoas com deficiência e a circulação de veículos de matrícula espanhola utilizados por trabalhadores transfronteiriços que sejam residentes em Espanha.
A primeira vertente, a vertente relacionada com os veículos que sejam propriedade de pessoas com deficiência, é uma alteração que pretende apenas permitir que, para além dos ascendentes ou descendentes em primeiro grau, essas viaturas possam ser conduzidas por duas pessoas que não tenham esse tipo de relação com o proprietário, desde que este seja um dos ocupantes.
A segunda vertente é também um aperfeiçoamento à primeira alteração, no sentido de possibilitar que trabalhadores transfronteiriços residentes em Espanha possam circular, no seu trajecto de casa para o local de trabalho, sem estarem limitados pelo raio de 60 km, o que nos parece de perfeita justiça até porque vem restabelecer uma eventual situação de discriminação.
Neste debate na generalidade, gostava de deixar, desde já, claro que, com a humildade que caracteriza a nossa atitude e a nossa postura de sempre nos debates no Parlamento,…

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Por amor de Deus!

O Sr. Hugo Nunes (PS): — … teremos toda a disponibilidade para no debate, na especialidade, aprofundar a discussão e garantir que a questão da reciprocidade fica devidamente prevista.

Aplausos do PS.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Espero que essa ideia de humildade frutifique!

O Sr. Presidente: — Concluída a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 181/X, passamos à apreciação do Decreto-Lei n.º 20/2008, de 31 de Janeiro, que simplifica o regime do registo de veículos e procede à nona alteração ao Decreto-Lei n.º 54/75, de 12 de Fevereiro, à sétima alteração ao Regulamento do Registo de Automóveis, aprovado pelo Decreto n.º 55/75, de 12 de Fevereiro, à décima sexta alteração ao Regulamento Emolumentar dos Registos e do Notariado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 322-A/2001, de 14 de Dezembro, e à segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 178-A/2005, de 28 de Outubro [apreciações parlamentares n.os 66/X (PSD), 67/X (CDS-PP) e 68/X (PCP)].
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Rodrigues.

O Sr. Luís Rodrigues (PSD): — Sr. Presidente Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr. Secretário de Estado da Justiça, Sr.as e Srs. Deputados: O novo regime da tributação automóvel, aliado à alteração do registo automóvel, veio criar situações de uma injustiça profunda que reclamam ser urgentemente corrigidas.
Todos sabemos que o registo automóvel não se encontra devidamente actualizado, dele constando proprietários que há muito não o são.
Todavia, e incompreensivelmente, o Governo limita essa possibilidade aos casos de propriedade de veículos adquirida antes de 31 de Outubro de 2005.
O estabelecimento injustificado e arbitrário desta data limite cria uma situação de ilegítima desigualdade, pondo em causa o respeito pelo princípio basilar da igualdade dos cidadãos perante a lei.
Por isso, o regime transitório deveria ser aplicado aos veículos adquiridos até à data da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 20/2008, ou seja, até 31 de Janeiro deste ano.

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É um verdadeiro despautério a justificação pública dada pelo Sr. Secretário de Estado da Justiça sobre o estabelecimento da data limite, ao afirmar que se tinha de encontrar uma data e que esta foi definida para evitar eventuais fraudes.
Infere-se, assim, que se um cidadão vendeu o seu automóvel antes de 31 de Outubro de 2005, o Governo considera que o fez de uma forma transparente; se o vendeu um dia depois dessa data, e o comprador não o registou, o Governo levanta suspeições sobre esse processo. É perfeitamente absurdo! Ainda no regime transitório, o PSD também vem propor que o registo realizado pelo vendedor seja gratuito, pois ele não é responsável pelo incumprimento do comprado, nem pela incapacidade do Estado. Neste caso, o vendedor está apenas a prestar um serviço que cabia ao Estado.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este novo regime persiste no erro de não dar legitimidade para registar a venda de um veículo aos cidadãos e às empresas que não têm como actividade o comércio automóvel.
O PSD entende que esta é a altura para resolver de vez um dos maiores problemas do registo automóvel, criando um novo mecanismo alternativo.
Considero fundamental aprovar esta medida, permitindo que os vendedores possam também eles registar a venda, pois está em causa a prevenção de problemas futuros.
Sr. Presidente, quero saudar também o Automóvel Clube de Portugal (ACP) pela petição entregue a V. Ex.ª no passado dia 25 de Fevereiro, pois esta apresenta legitimamente as mesmas preocupações que a apreciação parlamentar do PSD e que esta pretende resolver.
Até ao momento, apesar de alertado, o Governo não teve a coragem de assumir publicamente que o Decreto-Lei n.º 20/2008 apresenta grandes lacunas e não resolve a trapalhada instalada no registo automóvel neste momento.
Estranhamente, ou talvez não!, após a iniciativa parlamentar do PSD, e no mesmo dia em que o ACP apresentou a sua petição, o Ministério das Finanças emitiu um comunicado de imprensa com o único objectivo de tentar ganhar tempo e acalmar a revolta dos cidadãos que estavam na iminência de serem obrigados a pagar impostos sobre veículos que já não eram seus.
Com a aproximação do dia de hoje, em que se iriam discutir estas apreciações parlamentares, o Governo emitiu mais um comunicado — governa por comunicados! —, a 6 de Março, desta vez do Conselho de Ministros, em que afirma que aprovou um novo decreto-lei relativo ao abate de veículos. É o Simplex a funcionar: quanto mais legislação avulsa melhor! Por incapacidade do próprio Estado, e do que se conhece do diploma, é possível abaterem-se veículos que existem e circulam, levando também ao não pagamento do imposto único de circulação que é devido.
A trapalhada legislativa do Governo transmite a desorientação e a confusão aos serviços de finanças e aos serviços da antiga DGV, não lhes permitindo responder e resolver muitos dos problemas colocados neste âmbito pelos cidadãos.
Sr. Presidente, além do ACP, aqui referido, quero também agradecer a colaboração da ACAP (Associação Automóvel de Portugal) na análise da nossa proposta.
Com o alargamento do regime transitório até à data da entrada em vigor deste diploma, 31 de Janeiro, e com o alargamento da legitimidade do registo ao vendedor, independentemente da sua actividade económica ou profissional, o PSD pretende, com esta apreciação parlamentar, criar uma lei mais justa para os cidadãos e para as empresas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Em relação ao Decreto-Lei n.º 20/2008, o CDS apresenta propostas alternativas que baixarão à comissão e que, por isso, merecerão uma discussão mais aprofundada nesta Câmara.
Não podemos deixar de começar esta intervenção sem uma palavra muito especial para o Sr. Presidente do Automóvel Clube de Portugal, que está nas galerias a assistir a este debate, com quem tivemos reuniões no sentido de fazermos propostas que auxiliem o Governo a ultrapassar a difícil situação em que deixou os

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contribuintes portugueses, as autoridades fiscais e as autoridades policiais. É esse, pura e simplesmente, o nosso objectivo.

Aplausos do CDS-PP.

Começo pelos contribuintes, como é evidente.
Os contribuintes portugueses, os cidadãos portugueses, de acordo com uma legislação que foi aprovada e que aqui está em discussão, hoje, vêem-se perante a possibilidade de pagar um imposto por um veículo que já não é propriedade sua.
Esta é, claramente, uma situação de injustiça fiscal e não há comunicado do Ministério das Finanças que a ultrapasse — o comunicado emitido pelo Ministério das Finanças no sentido de se conseguir ultrapassar esta situação refere a possibilidade de pagamentos de juros e de execuções de natureza fiscal.
A solução encontrada, de pedido de apreensão de viaturas, resolve muito pouco. Ainda antes de vigorar o actual regime, aqueles pedidos já totalizavam 64 000. Desde aí, têm-se sucedido os pedidos de apreensão, junto da Direcção-Geral de Viação.
Poderíamos vir a ter uma situação em que as forças policiais, mesmo com os novos concursos de admissão de pessoal, quase nada mais fariam senão andar pelas estradas e auto-estradas do nosso país à procura de automóveis. Não me parece uma boa solução! De igual modo, não me pareceria uma boa solução a hipótese de as autoridades de natureza fiscal constantemente terem de lançar processos de execução fiscal em relação a contribuintes que não pagam imposto sobre um veículo que já não é seu, o que até é um dos mais elementares princípios de justiça.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Por isso mesmo, apresentamos as propostas que esperamos que o Grupo Parlamentar do PS possa acolher. São propostas pela positiva, para resolver um problema, diria, uma confusão que foi criada.
É que este decreto-lei, que aparece no âmbito da simplificação, do Simplex, programa que vemos com muita simpatia e que tem trazido medidas bem importantes até na área da justiça, neste caso, devido a duas falhas, uma, em relação ao regime transitório e, outra, em relação ao pedido de registo dos automóveis, acaba por trazer o contrário do seu objectivo, isto é, uma grande confusão.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, valorizando a simplificação que este decreto-lei introduz, não podemos deixar de fazer algumas referências relativamente a aspectos que aqui já foram considerados.
Esta questão leva-nos a perguntar ao Governo que associações ligadas ao sector — associações de comércio de automóveis mas também o Automóvel Clube de Portugal e associações de consumidores — foram ouvidas quanto à redacção deste decreto-lei e mesmo da Portaria n.º 99/2008, porque uma boa audição do Governo a estas estruturas certamente teria evitado esta apreciação parlamentar que estamos, hoje, a realizar.
As questões em apreciação e as correcções a fazer do Decreto-Lei são as que já foram referidas. No n.º 1 do artigo 6.º, emendar a data para 31 de Janeiro de 2008. No artigo 2.º, respeitante ao 25.º, estabelecer a possibilidade de não apenas as entidades previstas nas alíneas c) e d) registarem a venda desde que para isso façam prova suficiente e, relativamente ao artigo 4.º, consideramos que o Governo deveria fazer alguma operação de simplificação e esclarecimento quanto ao n.º 1 do artigo 25.º, que tem riscos de evidente confusão que a simples leitura tornará evidente.
Gostaria, no entanto, de aproveitar esta apreciação parlamentar para dar algumas notas a propósito da Portaria n.º 99/2008, sublinhando que o Governo, no anúncio público da Portaria, atropelou claramente o artigo 46.º da Constituição da República, acerca da liberdade de associação.

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Na alínea d) do artigo 18.º da Portaria, o Governo estabeleceu uma intervenção das associações representativas dos comerciantes de veículos mas, depois, afastou dessa intervenção uma associação e fez pior, apresentando a Portaria na sede de outra associação, havendo pelo menos três no sector.
Ora, como é sabido, não podem as autoridades públicas impor um acto de associação, de adesão ou de permanência numa associação, quer essa imposição seja directa quer decorra indirectamente de sujeição de certo direito ou vantagem ao acto de associação.
Dir-me-á o Sr. Secretário de Estado que o problema concreto da associação discriminada está resolvido.
Ainda bem que o Governo o fez rapidamente, evitando mais prejuízos para essa estrutura associativa. Mas a questão não fica resolvida em termos de redacção da Portaria porque nesta se fixa associações legítimas, reconhecidas pelo Governo, que tenham o estatuto de utilidade pública – alínea d), artigo 18.º. Ora, pergunto ao Sr. Secretário de Estado desde quando é que a Constituição da República permite ao Governo diferenciar as associações representativas pelo facto de terem ou não estatuto de utilidade pública? Isto seria condicionar, de facto, a liberdade de associação prevista na Constituição da República ao arbítrio dos governos, atribuindo ou não tal estatuto. Portanto, julgo que esta Portaria precisa também de ser alterada e o Governo deverá fazê-lo.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Existem hoje mais de um milhão e meio de veículos automóveis cujo registo de propriedade não corresponde ao seu proprietário actual.
A entrada em vigor do imposto único de circulação, que passa a tributar o proprietário do veículo e não a sua circulação, levou a que pessoas que tenham vendido o seu automóvel sem que o registo de propriedade fosse alterado começassem a receber as notificações de pagamento do imposto sobre veículos que já não lhes pertencem. Esta é uma situação de tributação fiscal injusta e indevida, que precisa de ser resolvida. Para isso é preciso colocar em ordem o registo automóvel nacional, agilizando os processos em causa.
Com o Decreto-Lei n.º 20/2008, o Governo deu um passo neste sentido. Mas parece que, ao insistir em não reconhecer as suas debilidades, dá vários passos para trás. Primeiro simplifica mas, depois, burocratiza e complica a vida dos cidadãos e contribuintes.
O Decreto-Lei estabelece uma disposição transitória para o ano de 2008 que permite aos vendedores particulares registar os automóveis vendidos até 31 de Outubro de 2005, bastando uma simples declaração aos serviços das conservatórias que depois notificam «a parte não requerente» do negócio. Mas não se percebe a razão pela qual se promove uma situação de desigualdade entre quem vendeu o carro antes e depois dessa data, afectando cerca de 400 000 viaturas. Por que razão uma pessoa que vendeu o seu carro a 1 de Novembro de 2005 não pode beneficiar da mesma simplificação administrativa? O objectivo de clarificação do registo automóvel e tributação fiscal não se mantém?! O lógico seria aplicar este regime transitório até à data de publicação do Decreto-Lei, como, aliás, alertou, e bem, o Automóvel Clube de Portugal na petição que entregou nesta Assembleia.
Mas, em vez disso, o Governo complica! Passou a estabelecer que o antigo proprietário já não tem de pagar o imposto se pedir às autoridades para apreenderem os documentos desse carro. Até ao final de Janeiro eram mais de 64 000 os carros declarados para apreensão. Depois estabeleceu que, se ao final de 6 meses os veículos não forem apreendidos, as matrículas são canceladas. Passará a ser esta uma das prioridades de actuação da PSP? Vigiar as matrículas em circulação? Era só o que faltava! Outra medida muito simples para combater os registos automóveis virtuais e a ocorrência futura de situações de injustiça fiscal na tributação automóvel seria permitir que os vendedores particulares pudessem registar a venda do veículo, quer a particulares quer a profissionais do sector. Até ao momento recai sobre o comprador o ónus de fazer os novos registos. Facilitar a vida aos cidadãos e agilizar os processos administrativos passa por partilhar essa responsabilidade com quem vende, até porque com o novo imposto poderá gerar-se uma situação de conflito de interesses entre vendedor e comprador que importa acautelar.
Estas são duas pequenas modificações ao regime do registo automóvel que seriam, elas sim, medidas Simplex. Mas outra medida para facilitar a vida aos cidadãos seria permitir-lhes o pagamento antecipado do imposto único de circulação, prevenindo situações em que o contribuinte quer efectuar o pagamento mas não

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tem possibilidades de o fazer no mês em que tem de o fazer obrigatoriamente. Em tempos de Simplex, não se justificam estas medidas.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Estão em debate três pedidos de apreciação parlamentar, apresentados por vários grupos parlamentares, relativos ao Decreto-Lei n.º 20/2008, de 31 de Janeiro.
Começo pela proposta de alteração, apresentada pelo CDS, do artigo 25.º, onde julgo haver uma gralha.
De facto, propõe o CDS que da alínea b) do n.º 1 do artigo 25.º passe a constar o seguinte: «Requerimento subscrito apenas pelo vendedor que seja pessoa singular, confirmado pelo vendedor».
Ora bem, a segurança jurídica aconselharia, no mínimo, a que o CDS revisse esta sua posição, na medida em que o vendedor confirmar por si próprio um registo automóvel não seria adequado. Se é para ser confirmado pelo comprador, que é o que propõe o PSD, esse é o regime que vigora — antes do Simplex, depois do Simplex, como os senhores quiserem… —, que é o seguinte: quem compra um veículo e o vende, se o requerimento tiver a assinatura do comprador e do vendedor, pode registá-lo. Portanto, não percebo qual é a dificuldade,…

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Não é isso!

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — … não percebo o que é que os senhores querem reapreciar.
Verifico, então, que os senhores têm um problema de timing — em relação a vendas de veículos ocorridas antes de 2005, até 2008 e depois de 2008.
Como os senhores sabem, este Decreto-Lei propõe um regime muito simplificado e também uma redução substantiva dos emolumentos e das taxas se o registo for feito pela Internet, ou seja, passa de 50 € para 10 €, sensivelmente. Portanto, não era possível dizer que, a todo o tempo, se podia fazer esse registo, ou pelo menos essa redução, pois, assim, estaríamos a beneficiar um determinado conjunto de pessoas que antecipadamente sabia que ia haver uma redução das taxas.
Portanto, há aqui uma questão de segurança jurídica, uma questão de segurança razoável para todos os intervenientes.
De qualquer maneira, não vemos que esse seja um problema grave e julgamos que, naturalmente, o Governo, em algumas áreas, poderá fazer algumas correcções.
Quanto ao problema das associações, suscitado pelo PCP, não o percebi bem. Não sei se o PCP defende algumas das associações que não ficou prevista, mas o princípio parece-me claro. Em relação às associações que têm idoneidade e que merecem, por requisitos objectivos, ter um acesso mais fácil e mais rápido à Internet, consideramos que elas devem proceder a esses registos. As outras devem fazer um protocolo para que a situação fique razoavelmente conforme com a lei.
Por tudo isso, parece-me que não há razão nos vossos pedidos de apreciação parlamentar. Contudo, mantemos a nossa disponibilidade para, em diálogo, conseguirmos fazer alguns aperfeiçoamentos da lei, embora não vejamos razão substantiva para que as vossas questões obtenham merecimento.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado da Justiça (João Tiago Silveira): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o Decreto-Lei n.º 20/2008, de 31 de Janeiro, simplificou o regime do registo automóvel para os cidadãos e para as empresas e atacou de frente problemas que precisavam de ser resolvidos.

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É conhecido um destes problemas: há muitos veículos que não estão registados em nome do real proprietário e esta era uma situação que precisava de ser resolvida, era uma herança de há décadas que ninguém tentou resolver, até agora.

Aplausos da Deputada do PS Maria Antónia Almeida Santos.

Este Decreto-Lei criou mecanismos para actualizar o registo automóvel, criou meios para o registo ser mais simples, mais fiável, mais seguro. Criou defesas para os cidadãos, para o cidadão ter a garantia de que o veículo está registado em nome de quem realmente é o proprietário.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Muito bem!

O Sr. Secretário de Estado da Justiça: — Em primeiro lugar, passou a existir uma certidão electrónica do registo automóvel, um instrumento poderoso para conhecer, de forma actualizada, a informação do registo automóvel.
Em segundo lugar, passou a ser possível promover registos através da Internet. Pergunto: o PCP, o PSD ou o CDS alguma vez se lembraram de actualizar a base de dados do registo automóvel com o auxílio da Internet? E respondo: não, nunca se lembraram!

Protestos da Deputada do BE Helena Pinto.

Em terceiro lugar, criámos um regime para a regularização dos registos desactualizados.
Durante o ano de 2008, as pessoas podem declarar a quem venderam o veículo e a conservatória notificará essa pessoa para realizar o registo em seu nome. Criou-se uma arma que as pessoas não tinham, e com uma forte redução de preços. E pergunto: o PC, o PSD ou o CDS alguma vez criaram algum incentivo à regularização de registos? Não, nunca! E podiam tê-lo feito, através de um projecto de lei.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — O PC? Deve ser o personnal computer!

O Sr. Secretário de Estado da Justiça: — Em quarto lugar, o pedido de registos passou a poder ser solicitado pelo vendedor quando revenda veículos de forma profissional. Os profissionais do sector, quando a sua idoneidade esteja comprovada (o que exige requisitos apertados), passaram a poder tratar das formalidades do registo. Desoneraram-se, assim, os cidadãos e as empresas e garantiu-se que os registos são mesmo feitos e ficam mesmo actualizados. O PCP, o PSD ou o CDS lembraram-se de desonerar os cidadãos e as empresas com uma medida como esta? Nunca! E sabiam que isto era uma herança de há décadas.

O Sr. Luís Rodrigues (PSD): — Sr. Secretário de Estado, responda às perguntas!

O Sr. Secretário de Estado da Justiça: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O regime de simplificação do registo automóvel é um regime para acautelar o futuro e resolver problemas do passado.
Visa evitar que o registo automóvel torne a estar desactualizado e contribui para o actualizar. Temos a certeza de ter criado um regime perfeito? Não, não temos! Mas temos duas certezas, não certezas ao sabor do mediatismo e do oportunismo político, não quando entrou efectivamente em funcionamento, há pouco mais de um mês, este regime, não quando muitos portugueses só agora começaram a beneficiar dos mecanismos que lhes foram oferecidos.
Aliás, a este propósito, gostaria de dar uma boa notícia a esta Câmara e aos cidadãos. Já durante o mês de Abril, será disponibilizada às pessoas a possibilidade de realizarem a apreensão de veículo pela Internet.
Mais um medida que nunca teve um contributo do PCP, do PSD ou do CDS! Temos ainda outra certeza: a certeza de que este regime dá instrumentos para resolver os problemas das pessoas. Problemas que o PCP, o PSD ou o CDS nunca tiveram a coragem de resolver. Mas isso nós também já sabemos: quando verdadeiramente é preciso resolver os problemas do País, não é com o PSD que eles são

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resolvidos, é com o PS e com os governos PS, porque o PSD, hoje em dia, é mesmo ao sabor da espuma dos dias.

O Sr. Luís Rodrigues (PSD): — Por que é que não responde às questões, Sr. Secretário de Estado?

O Sr. Secretário de Estado da Justiça: — Mas cá estaremos nós para acautelar os direitos das pessoas e garantir que elas têm defesas para actualizar o registo automóvel.

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Rodrigues (PSD): — Não esclareceu absolutamente nada, Sr. Secretário de Estado!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Esta é uma peça histórica de retórica! Fica para os anais deste Parlamento!

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apenas dois comentários, de forma relativamente rápida, o primeiro dos quais sobre a intervenção do Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, onde assinalamos a vontade de dialogar sobre esta matéria.
É evidente que há uma gralha em relação ao «vendedor», Sr. Deputado, porque não pode ser a mesma pessoa a confirmar. E o Sr. Deputado, aliás, compreendeu logo essa gralha em relação ao vendedor. Mas, com certeza, em relação a esta matéria, também sabem distinguir aquilo que é uma declaração conjunta daquilo que é uma declaração apenas de um sujeito que pode ser confirmada por outro. É uma questão jurídica…

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Confirmada por um e por outro!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — … mas, com certeza, o Sr. Deputado não tem qualquer problema em compreender como se consegue fazer uma mera declaração de venda. É simples e, se calhar, bom para o diálogo que podemos ter no futuro.
Em relação às declarações do Sr. Secretário de Estado aqui, nesta Câmara, não podemos deixar de salientar que, quanto àquelas que eram as propostas substanciais dos três partidos aqui presentes, nada disse.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Para além do mais, e vou concluir, Sr. Presidente, o Sr. Secretário de Estado decidiu recorrer à utilização do discurso do passado, fazendo, aliás, uma grande maldade ao Sr. Eng.º António Guterres, ao Sr. Dr. António Costa e ao Sr. Dr. Augusto Santos Silva, que pertenceram a governos que, em relação a esta matéria, nada fizeram, como o Sr. Secretário de Estado, com certeza, sabe.

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — É verdade! Vale a pena lembrar!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Mas, Sr. Secretário de Estado, aquilo que é essencial, ao fazer, é fazer bem, e fazer bem em relação às pessoas, que são essenciais, e à justiça na sociedade, isto é, a justiça em relação aos contribuintes, a justiça em relação às forças policiais – que não se podem transformar em polícias de apreensão, como é evidente, até porque, na sua actividade, têm outras preocupações que são essenciais – e justiça em relação àqueles que trabalham nos impostos e que não se podem ver «encharcados» de situações de obrigação de pagamento de juros ou de execuções fiscais.

Aplausos do CDS-PP.

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Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, concluímos a discussão destas apreciações parlamentares.
Em relação às apreciações parlamentares n.os 66/X e 67/X foram apresentadas propostas de alteração, as quais baixam à 1.ª Comissão, mas a apreciação parlamentar n.º 68/X caduca, uma vez que não se registou a apresentação de qualquer proposta.
A nossa próxima sessão plenária realizar-se-á amanhã, às 15 horas, dela constando declarações políticas, bem como a discussão, na generalidade, dos projectos de lei n.os 454/X — Determina o registo de movimentos transfronteiriços de capitais (BE) e 451/X — Introduz alterações à Lei Geral Tributária em sede de garantias dos contribuintes (CDS-PP) e, ainda, a apreciação da petição n.º 84/IX (2.ª) — Apresentada pelo Movimento para a Oncologia Pediátrica Integrada, solicitando que a Assembleia da República adopte medidas legislativas para inclusão da valência de oncologia pediátrica no futuro Centro Materno-Infantil do Norte. Haverá ainda lugar a votações, às 18 horas.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 35 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Socialista (PS):
Alberto Marques Antunes
António Ribeiro Gameiro
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego

Partido Social Democrata (PSD):
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
José Eduardo Rego Mendes Martins
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas

Partido Popular (CDS-PP):
Paulo Sacadura Cabral Portas

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Socialista (PS):
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes

Partido Social Democrata (PSD):
João Bosco Soares Mota Amaral
José Mendes Bota

Partido Popular (CDS-PP):
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

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Partido Socialista (PS):
João Barroso Soares
Manuel Alegre de Melo Duarte
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Maria Manuel Fernandes Francisco Oliveira
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz

Partido Social Democrata (PSD):
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Carlos Jorge Martins Pereira
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Jorge José Varanda Pereira
José António Freire Antunes
Mário Henrique de Almeida Santos David
Paulo Miguel da Silva Santos
Zita Maria de Seabra Roseiro

Bloco de Esquerda (BE):
João Pedro Furtado da Cunha Semedo

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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