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Quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013 I Série — Número 53
XII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2012-2013)
REUNIÃOPLENÁRIADE13DEFEVEREIRODE 2013
Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves
Secretários: Ex.mos
Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz
S U M Á R I O
A Sr.ª Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas
e 5 minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa da interpelação n.º
9/XII (2.ª). Em declaração política, o Sr. Deputado Hélder Amaral
(CDS-PP) destacou a circunstância de Portugal ter regressado aos mercados, a descida dos juros da dívida no mercado secundário e a redução do défice da balança comercial e socorreu-se dos números para referir o impacto das greves na economia nacional. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Basílio Horta (PS), Ana Drago (BE), Bruno Dias (PCP) e Nuno Filipe Matias (PSD).
Ao abrigo do n.º 2 do artigo 76.º do Regimento, o Sr. Deputado Miguel Coelho (PS) insurgiu-se contra o Novo Regime do Arrendamento Urbano e propôs a sua revogação, tendo depois respondido a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Paulo Sá (PCP), António Prôa (PSD) — que também fez uma interpelação à Mesa —, Helena Pinto (BE) e Artur Rêgo (CDS-PP).
Deu-se conta da entrada na Mesa dos projetos de lei n.os
348 a 351/XII (2.ª), dos projetos de resolução n.
os 603, 604 e
606 a 614/XII (2.ª) e das propostas de lei n.os
128 e 129/XII (2.ª).
Foram debatidos, na generalidade, as propostas de lei n.
os 121/XII (2.ª) — Aprova a Lei das Finanças das Regiões
Autónomas e 122/XII (2.ª) — Estabelece o regime financeiro das autarquias locais e das entidades intermunicipais e o projeto de lei n.º 351/XII (2.ª) — Procede à sétima alteração da Lei das Finanças Locais, aprovada pela Lei n.º 2/2007, de 15 de janeiro, e altera o Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (BE). Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares (Miguel Relvas) e do Secretário de Estado do Orçamento (Luís Morais Sarmento), os Srs. Deputados Pedro Filipe Soares (BE), José Luís Ferreira (Os Verdes), Carlos Abreu Amorim (PSD), Paulo Sá (PCP), Mota Andrade (PS), Honório Novo (PCP), Jorge Paulo Oliveira (PSD), Helena Pinto (BE), António Leitão Amaro (PSD), João Gonçalves Pereira (CDS-PP), Carlos Santos Silva (PSD), António Filipe (PCP), Ricardo Rodrigues (PS) e João Pinho de Almeida (CDS-PP).
O Sr. Presidente (Guilherme Silva) encerrou a sessão eram 18 horas e 4 minutos.
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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, Srs. Jornalistas, está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 5 minutos.
Srs. Deputados, a Mesa aguarda a chegada do expediente, mas, entretanto, informo que a ordem do dia de
hoje engloba declarações políticas e a apreciação conjunta, na generalidade, das propostas de lei n.os
121/XII
(2.ª) — Aprova a lei das finanças das Regiões Autónomas e 122/XII (2.ª) — Estabelece o regime financeiro
das autarquias locais e das entidades intermunicipais e do projeto de lei n.º 351/XII (2.ª) — Procede à sétima
alteração da Lei das Finanças Locais, aprovada pela Lei n.º 2/2007, de 15 de janeiro, e altera o Código do
Imposto Municipal sobre Imóveis (BE).
Antes de mais, dou a palavra ao Sr. Secretário, Deputado Duarte Pacheco, para nos dar conta do
expediente que, entretanto, já chegou à Mesa.
O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, deu entrada na Mesa, e foi
admitida pela Sr.ª Presidente, a interpelação n.º 9/XII (2.ª) — Sobre funções sociais do Estado (Os Verdes), a
qual já está agendada.
A Sr.ª Presidente: — Peço, então, aos Srs. Deputados que ocupem os seus lugares para dar condições de
audição ao primeiro orador inscrito. É que há muito ruído na Sala e o primeiro orador perde sempre um pouco
com esse facto.
Pausa.
Srs. Deputados, creio que já temos condições para iniciar os nossos trabalhos, pelo que dou a palavra ao
Sr. Deputado Hélder Amaral, para uma declaração política em nome do CDS-PP.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: A realidade em que vivemos é
a de um País que acumulou um nível de endividamento público sem precedentes. É verdade que não
começou ontem, mas é neste tempo que somos obrigados a encontrar soluções.
A ação do Governo tem sido, nesse sentido, a de encontrar as melhores soluções, guiado por um
Memorando que nos impõe enormes sacríficos.
A resiliência dos portugueses e o espírito de compromisso do Governo conseguiram uma maior
compreensão dos mercados e a colaboração dos parceiros sociais.
Enquanto isto, a oposição confunde ou foge. Senão, vejamos.
Portugal recebeu seis avaliações positivas ao Programa de Ajustamento, tendo sido elogiado, por mais do
que uma vez, e por entidades externas, como exemplo a seguir por outros.
Estas avaliações merecem ainda mais destaque, tendo em conta o contexto existente na zona euro, numa
altura em que os nossos parceiros comerciais mais próximos estavam, e ainda estão, como nós, a atravessar
inúmeras dificuldades e a proceder a ajustamentos das suas economias.
Ainda assim, e perante dificuldades internas que encontram grande parte da sua origem em políticas
irresponsáveis do passado, e perante dificuldades externas atuais que estão fora do nosso controlo, Portugal
tem conseguido cumprir o compromisso que assumiu.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Perante as dificuldades, e ainda são muitas, não é solução ser um
contrapeso, ter um discurso desmotivador, quando existem portugueses que estão a passar por grandes
dificuldades, como o flagelo do desemprego, a quem deve ser dito, a bem da verdade, que o seu esforço não
está a ser inglório.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
É por isso que começo por destacar a descida acentuada dos juros da dívida no mercado secundário, após
o pico de janeiro de 2012. E é bom lembrar que esta tendência de descida dos juros da dívida portuguesa foi
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invertida ainda antes do anúncio feito em julho pelo Presidente do Banco Central Europeu, que disse, como
todos se lembrarão, que tudo iria fazer para salvar o euro.
E, já que estamos a falar na descida dos juros da dívida portuguesa, poderemos destacar outro facto:
Portugal conseguiu regressar aos mercados antes do previsto, colocando 2500 milhões de euros, a 5 anos, a
uma taxa de juro de 4,89%, tendo a procura ultrapassado os 12 000 milhões de euros, com 93% da emissão a
ser colocada junto de investidores estrangeiros. É, claramente, um sinal positivo.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — É indiscutível que o nosso País é hoje mais credível aos olhos de
todos, não só dos nossos principais parceiros comerciais como também dos nossos credores.
Importa realçar outro facto: a redução significativa do défice da balança comercial portuguesa, num
montante de 533,7 milhões de euros, tendo as exportações aumentado perto de 6%, em 2012.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — A realidade é que Portugal, de acordo com os últimos dados do
Eurostat, foi o quinto País, no total dos 27 da União Europeia, que mais exportou. É, claramente, um dado
positivo.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — A nossa economia é hoje mais competitiva e mais exportadora para os
mercados extracomunitários, o que demonstra a força e a resistência das nossas empresas: nos três primeiros
trimestres de 2012, as exportações de bens cresceram mais de 30% para Angola, mais de 150% para a China
e 35% para os Estados Unidos.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Há motivos para ter esperança no futuro.
A Comissão Europeia previu que o início da recuperação será este ano. A OCDE revelou dados que
preveem uma recuperação da conjuntura económica para os próximos meses. Pelo nono mês consecutivo, os
indicadores de dezembro registaram uma subida, fator que também se verifica numa comparação homóloga.
Segundo os indicadores divulgados, Portugal vai continuar a crescer nos próximos seis a nove meses. É
um dado que convém registar!
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Mas, se é de assinalar o esforço de muitos trabalhadores e
empresários, não podemos esquecer que esse esforço deve ser de todos, mesmo nas dificuldades e no
exercício de direitos fundamentais.
Não é aceitável que, enquanto um País trabalha e enfrenta muitas dificuldades, certo País parece querer
exercer direitos de uma forma que, pelo excesso, põe em causa os direitos e o esforço dos demais.
Alguns exemplos.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — O Ulrich!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Na CP, em cada 3 dias, 2 dias de paralisação total ou parcial; em 365
dias de 2012, 295 dias de greve, ou seja, 70 dias, num ano, sem paralisações.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Bem lembrado!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Podíamos dizer que nada disto custa ao erário público. Pois enganam-
se, Srs. Deputados, já que os custos destas paralisações são de 2,2 milhões de euros.
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O Sr. António Filipe (PCP): — E a luta continua!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E os swaps?! E os juros?! Quanto é que custam ao erário público?!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — A Metro de Lisboa perde mais de 800 000 €, em greves, num só ano.
Sr.ª Presidente, nenhum português de bom senso, de esquerda ou de direita, com ou sem partido político,
com ou sem swaps, apoiante ou não deste Governo, acha normal que empresas públicas deficitárias,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Deficitárias, porquê?
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — … que exigem um enorme esforço dos contribuintes, do dinheiro de
todos nós, ainda que no exercício de um direito, possam pôr em causa os direitos e o esforço de todos.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A política não é a opção entre o bem e o mal, mas entre o inaceitável e o preferível.
É neste contexto que devemos caminhar, com responsabilidade, enfrentando os desafios, que são muitos e
difíceis, no exercício de direitos fundamentais, mas também no respeito pelos direitos igualmente
fundamentais de todos!
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado Hélder Amaral, inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs.
Deputados Basílio Horta, do PS, Ana Drago, do BE, Bruno Dias, do PCP, e Nuno Matias, do PSD.
Não sei como pretende responder, Sr. Deputado…
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Dois a dois, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente: — Fica registado, Sr. Deputado.
Assim sendo, tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Basílio Horta.
O Sr. Basílio Horta (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Hélder Amaral, não sei se a parte politicamente
mais importante do seu discurso não foi a parte final, que poderíamos chamar, um pouco, antigreves, porque,
na parte económica, o Sr. Deputado esqueceu-se de aspetos fundamentais que devia reconhecer, se quer
fazer uma análise credível para os portugueses.
Falou na ida aos mercados antes do tempo. Bom, a ida aos mercados, se tal se pode chamar, com o BCE
a topar e a garantir toda a dívida e um conjunto de bancos a garantir a dívida, admitindo que seja uma boa
notícia — notícia, aliás, partilhada pela Espanha, pela Irlanda e pela Itália —, tem um problema, que é o de dar
conteúdo útil a essa notícia. E qual é o conteúdo útil que o senhor vê? Qual é a previsão de recessão para
2013? É de 1,9% — o dobro daquela que o Governo previa. E a Universidade Católica fala em 2,4%. Qual é a
dívida? Num mês, tem praticamente a dívida de todo o ano, ou seja, 125%. E o desemprego? Aproxima-se
dos 17%. Com que economia é que o Sr. Deputado Hélder Amaral conta para pagar a dívida? Com que
economia é que o Sr. Deputado conta para fazer face ao desemprego?
O Sr. Mota Andrade (PS): — Boa pergunta!
O Sr. Basílio Horta (PS): — Não tem economia para isso! E não tem economia, porque o senhor continua
a somar austeridade a austeridade.
O Banco Central Europeu tinha dois alicerces: um, era o monetarista, mas este está levantado, porque
invadiu a Europa com dinheiro; o outro é o da austeridade.
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Por isso, quando diz que vai aos mercados e se fia no BCE, pode ver a troica a sair pela porta, mas entra-
lhe o BCE pela janela, com PEC sucessivos. E o PEC 4, de entre os que aí vêm, talvez fosse o menos
gravoso para os portugueses. Esta é uma grande questão que se coloca.
O Sr. Deputado diz que fomos aos mercados e que a dívida tem uma taxa de juro baixa, mas taxa de juro
mais baixa e uma procura maior teve a Espanha, em plena crise. Portanto, não vá por aí, olhe para a
economia e para as empresas!
O Sr. Deputado fala nas exportações e quero lembrar-lhe o seguinte: o ano de 2012 acabou com 5,8%,
mas quanto é que tinham somado em 2011? E em 2010?
A Sr.ª Presidente: — Terminou o tempo de que dispunha, Sr. Deputado.
O Sr. Basílio Horta (PS): — Termino já, Sr.ª Presidente.
O que o Sr. Deputado não diz é que, em janeiro, as exportações relacionadas com dezembro desceram
18%. Isto deve preocupá-lo imenso! É que o esforço que foi feito anteriormente para exportar para fora da
Europa está a dar resultados, mas esgota-se, se não houver crédito, se não houver pré-financiamento, se não
houver financiamento, se não houver capitalização, se não houver uma série de requisitos que o Ministro da
Economia não para de anunciar, mas nenhum deles está concretizado.
O senhor pode dizer o que entender em relação aos mercados que, se a economia continuar neste
caminho, o senhor vai ter o descalabro político, económico e social do País. Não tenha dúvidas sobre isto!
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Hélder Amaral, devo dizer-lhe que a sua
intervenção foi muito preocupante. O Sr. Deputado tentou criar aqui uma narrativa que vai variando entre a
ficção e a pura falsidade.
Já que quis avançar com um conjunto de indicadores, tenho alguns números para si: 16,9%, a maior taxa
de desemprego da nossa história. São 923 000 trabalhadores desempregados e há quase mais 300 000
desempregados, desde que os senhores exercem funções governativas. Os factos da vossa política estão
exatamente aqui! O colapso do nosso tecido económico, o colapso da nossa capacidade de criar riqueza e
postos de trabalho, o colapso social que se agrava e que vai continuar a partir desta política de destruição da
economia é tudo obra vossa!
Sr. Deputado, isto não é uma incompetência do Governo, um efeito não intencional, não! Em todas as
medidas políticas de ataque ao rendimento dos trabalhadores, de ausência de qualquer atitude consistente de
auxílio às pequenas e médias empresas, a intenção do Governo é arrasar a economia, criar mais desemprego.
Aqui estão os resultados da sua política!
Mas, mais do que isso, Sr. Deputado, creio que temos de ter algum cuidado com o que se diz nesta
Câmara. O Sr. Deputado não pode ter o descaramento, repito, o descaramento de vir aqui fazer uma narrativa
cobarde sobre a luta dos trabalhadores contra uma política de destruição das suas condições de vida.
Note bem, Sr. Deputado: as dificuldades das exportações não podem ser assacadas à greve dos
estivadores. O que o senhor aqui fez foi ficção e falsidade. Sabe bem que a greve que foi feita foi às horas
extraordinárias, sabe bem que o cair das exportações no 4.º trimestre de 2012 se deve muito mais às políticas
de austeridade que estão a ser impostas na restante Europa do que a esta greve.
Não se atreva, repito, não se atreva a atirar os custos da sua política…
Protestos do CDS-PP.
… para quem tem a coragem de fazer a luta que bem custa a quem vive do seu salário para defender
condições dignas de trabalho. Não tenha esse descaramento!
Protestos do CDS-PP.
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A Sr.ª Presidente: — Terminou o tempo de que dispunha, Sr.ª Deputada Ana Drago.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Como não tenha o descaramento de dizer que são os trabalhadores do setor
público de transportes que têm a culpa das dificuldades do setor empresarial do Estado.
Sabe bem, ou devia saber, que 84% dos prejuízos do setor público dos transportes vêm dos juros da dívida
por ausência do pagamento compensatório do Estado.
A Sr.ª Presidente: — Terminou o tempo, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Portanto, Sr. Deputado, não há nada para os senhores se orgulharem neste
debate. Nada! A vossa política está a dar cabo do País, está a agravar o desemprego! Este número — 923
000 desempregados — é o «sucesso» da vossa política.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, quero cumprimentar o Sr. Deputado Basílio Horta, meu
caro amigo, e dizer-lhe que não posso estar totalmente de acordo com a intervenção que V. Ex.ª aqui fez.
É um facto indesmentível, confirmável, que, em 30 de janeiro de 2012, os juros eram 22,87% e que, em 30
de janeiro de 2013, eram de 5%.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Até um mau aluno em Matemática percebe que estamos no bom
caminho e que este é um dado positivo. Poderemos querer dizer: «bom, mas podia ser melhor.» Talvez! Mas,
ainda assim, é positivo.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Registo e concordo com todos os alertas que fez dos riscos e dos
perigos que enfrentamos, nomeadamente as exportações, e digo-lhe que o acompanhamos. Julgo que estará
de acordo comigo quando digo que tudo de bom que possa acontecer a Espanha pode ser bom para nós e
que tudo de mau que possa acontecer a Espanha, seguramente, terá efeitos na nossa vida interna.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Daí não escondermos nem ignorarmos que, de facto, o contexto
europeu e da zona euro é-nos totalmente adverso.
Ainda assim, eu não queria retirar nenhum mérito ao esforço dos trabalhadores e dos empresários, que
conseguiram, apesar destas dificuldades, encontrar outros mercados. E nesses está a correr bem. Teremos
que fazer mais e melhor. É verdade! Mas foi isso que quis realçar no meu discurso e foi para esse aspeto
positivo que quis chamar a atenção.
Mas, desculpe que lhe diga mais uma vez — e não esperava isso de V. Ex.ª —, começo a ter já alguma
saudade daquele Partido Socialista que residia nos resquícios do PEC 4, que era aquele Partido Socialista que
dizia que «quanto mais a luta aquece, mais força tem o PS», porque agora, quanto mais a luta aquece e mais
as dificuldades se apresentam, mais foge o PS e mais o PS está ausente.
O Sr. António Filipe (PCP): — É verdade!
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O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — E é, de facto, de um PS resiliente e forte que precisamos para nos
ajudar a vencer as dificuldades e os alertas de que aqui falou.
É um facto que o Banco de Portugal faz um alerta, mas di-lo claramente que será por dificuldades dos
mercados externos. Mas também repete e confirma outros dados, que nos dão um capital de esperança e um
capital de que, porventura, poderemos estar no bom caminho, e é isso que importa realçar.
Protestos do Deputado do PS João Galamba.
Sr.ª Deputada Ana Drago, não tenho, seguramente, nem o descaramento nem a arrogância de V. Ex.ª.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
É um facto que há coisas que não devem ser ditas aqui, no Parlamento, e, portanto, ficam com V. Ex.ª, eu
não as direi.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Porém, quero dizer-lhe que não escondo, não disfarço, não nego a
dificuldade de tantos e tantos trabalhadores e de tantas e tantas famílias que sofrem com o flagelo do
desemprego. Não é bom para as famílias, não é bom para as pessoas, não é bom para a economia
portuguesa, não é bom para ninguém. É o nosso principal drama.
Mas para isso é preciso encontrar soluções e a solução do Bloco de Esquerda, quando se procurou entre
os três maiores partidos, junto do Memorando e dos nossos parceiros, soluções para o problema, foi a
desistência em conversar com esses.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — E até hoje não foram capazes, não tiveram a decência de pedir
desculpa. Reconhecem o erro, mas não pedem desculpa.
Protestos do Deputado do BE Pedro Filipe Soares.
Diz muito do que preconiza o Bloco de Esquerda como soluções para o País!
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Deputada, se pensa que dá lições sobre trabalho a esta bancada,
enganou-se. Tenho 22 anos a trabalhar por conta de outrem. Conheço bem o mercado do trabalho, conheço
bem o flagelo do desemprego e conheço bem o sacrifício que é preciso fazer para manter empresas a laborar,
para manter empresas a criar riqueza e para manter empresas a criar emprego.
O que eu quis realçar, no meu discurso, foram aspetos positivos, sem esconder nenhum dos riscos,
nenhum dos aspetos negativos e dos perigos que teremos que enfrentar.
Fica à disposição de V. Ex.ª o seguinte: querem estar do lado da solução, querem ajudar, ou querem estar
do lado daqueles que obrigam, como acontece no seu partido, a negar uma realidade e a proibir que consiga
perceber o óbvio?
Protestos do BE.
A Sr.ª Deputada fez aqui um exercício de quem não consegue perceber o óbvio, mas nisso não a posso
ajudar.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
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A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Hélder Amaral, mesmo com uma pose de
Estado e com um tom de voz sereno, é possível, nesta Sala e lá fora, mover os insultos mais soezes a quem
trabalha e V. Ex.ª, na sua intervenção, mais uma vez, foi a demonstração disso.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — No dia em que o País ficou a saber que o desemprego atinge números nunca
vistos em Portugal, quando somos confrontados com estatísticas oficiais, repito, oficiais, de 16,9%; quando
sabemos que, se incluirmos os chamados «inativos disponíveis» e o «subemprego visível», o desemprego, em
termos reais e em sentido lato, atinge, seguramente, perto de 1,5 milhões de portugueses; quando sabemos
que, em Portugal, 4 em cada 10 jovens trabalhadores estão no desemprego, o Sr. Deputado, em nome do
CDS, veio à Assembleia fazer uma festa e falar de exportações. E nem aí acertou, Sr. Deputado!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — O que é espantoso é que, se o Sr. Deputado tivesse aprofundado um pouco
mais a leitura, para além das parangonas que lhe ofereceram, teria chegado à conclusão de que, de acordo
com o próprio Banco de Portugal, que será insuspeito de ser um órgão do PCP, se refere o abrandamento
notório, face ao aumento médio de 5,7%, no período de 2011-2012 e que a desaceleração em 2013 traduz um
forte abrandamento da atividade nas economias da área do euro, que representam cerca de dois terços dos
mercados de destino das exportações portuguesas.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Os senhores, com a vossa política, estão a matar o País à fome, estão a
asfixiar o consumo e a procura internas de uma forma nunca vista desde a década de 50, uma época que
será, provavelmente, de saudosa memória para alguns dos aqui presentes,…
O Sr. Honório Novo (PCP): — É verdade!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — … mas, para nós, não!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Bem lembrado!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Ora, mesmo nas exportações, que era o que restava, era o único motor que se
salvava deste «avião decrépito» em que os senhores estão a pôr a economia nacional, aquilo que verificamos
é que, mesmo ao nível da formação bruta de capital fixo e do investimento empresarial, há uma redução, há
uma queda acumulada de quase 36%, no período de 2009-2013.
Os senhores estão a matar a economia e nem as exportações se safam! E como é que o Sr. Deputado
resolve o problema em termos políticos? Vem dizer mal dos grevistas, vem dizer que a culpa disto tudo é dos
trabalhadores que fazem greve.
Veja bem, Sr. Deputado: em 2012, com o roubo dos subsídios de férias e de Natal, cada trabalhador dos
setores que aqui veio insultar viu a sua remuneração anual reduzida dois meses de salários. E, agora, os
senhores preparam-se para roubar, num ano, o equivalente a mais um mês de salário, em cima daqueles dois
meses, em subsídios de refeição, deslocações, trabalho suplementar e noturno.
Vozes do PCP: — Exatamente!
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
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O Sr. Bruno Dias (PCP): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.
Ora, com este ataque sem precedentes a quem trabalha o Sr. Deputado considera que a solução é «comer
e calar»?! É ir dando o que lhes pedem até dizerem que não chega?!
O ataque indigno, desonesto, insultuoso e provocador que aqui fez alguma vez permite silenciar a situação
de encargos financeiros e perdas especulativas, com os swaps com os CDS (Credit Default Swap), que
atingem centenas de milhões de euros, milhares de milhões de euros, que comparam com 68 milhões de
despesas com pessoal?!
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, termino dizendo o seguinte: aquilo que os senhores estão a
tentar omitir é que o roubo a quem trabalha só agrava os problemas do País. E os trabalhadores em luta, num
dia, defendem melhor o interesse nacional do que alguma vez os senhores em todas as vossas vidas!
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Filipe Matias.
O Sr. Nuno Filipe Matias (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Dirijo um cumprimento
especial ao Deputado Hélder Amaral pelo tema pertinente e relevante que nos trouxe a debate.
Penso que seria imprescindível que a oposição, neste Plenário, começasse por se perguntar a si mesma
quando é que começou a crise económica em Portugal, quais foram as causas, que tipo de problemas
enfrentamos, mas, sobretudo, que responsabilidades, nalguns casos, partilhamos e que temos de resolver e
encontrar solução. Isto porque é pouco sério ouvirmos um Partido Socialista — que, percebemos, anda
desesperado a procurar a unidade interna — fazer um discurso para fora para tentar iludir os portugueses de
problemas que a economia já tinha antes de junho de 2011, de uma taxa de desemprego que nos preocupa,
mas que tinha uma trajetória ascendente desde 2008.
Ora, numa altura em que temos de acabar o processo de consolidação, em que temos de concluir um
processo de ajustamento, em que temos de dotar a economia de mais instrumentos para resistir, para inovar,
para exportar, para crescer, para com isso criar emprego, seria fundamental que a oposição, a começar no
Partido Socialista, estivesse disponível para fazer a reflexão e não apenas a limitar-se, com slogans partidários
e políticos, a unir-se à mera contestação. E digo que seria fundamental porque aparecem os primeiros sinais
positivos, aparecem os primeiros resultados que mostram que, no final, o esforço para cada um dos
portugueses vai valer a pena,…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Só se for para os sem-abrigo do Ulrich!
O Sr. Nuno Filipe Matias (PSD): — … que as empresas nacionais, no final, saberão ser mais capazes de
encontrar novos mercados, de criar mais valor, de construir mais iniciativa.
O Sr. João Oliveira (PCP): — O País desmorona-se e vocês repetem a mesma conversa!
O Sr. Nuno Filipe Matias (PSD): — Seria fundamental, isso sim, que, neste esforço sério de debate, a
oposição não se entretivesse com slogans e faits divers e se juntasse à maioria e ao Governo para, num
esforço, encontrar melhores soluções, dar razão aos esforços que estão a ser pedidos a cada um dos
portugueses. Com uma certeza: a de que não é esta maioria nem é o Governo que impõem ao Banco de
Portugal a perspetiva de confiança e de esperança este quando assume que a segunda parte de 2013 será de
recuperação, será um semestre onde se poderá criar mais emprego, onde poderá haver novas oportunidades.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Foram três minutos e meio de frases feitas!
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O Sr. Nuno Filipe Matias (PSD): — Deste modo, mostraremos que a economia portuguesa não entrou, de
forma alguma, numa espiral recessiva, como alguns procuram, de forma teimosa, dizer para a opinião pública,
mas está, isso sim, a encontrar um paradigma de desenvolvimento diferente, mais saudável, mais sustentável,
e a assegurar que cada cidadão e cada empresa, no fim, pode perceber que todo o esforço valeu a pena. É
algo que, infelizmente, para a oposição não tem o mínimo significado, porque o que importa não são os bons
resultados que começam a aparecer,…
Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.
… é a tentativa de, amanhã, ter mais uma linha de crítica para, com isso, tentar procurar criar alguma
cortina na opinião pública, para procurar demonstrar uma realidade…
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Nuno Filipe Matias (PSD): — … que, felizmente, cada um de nós — e termino, Sr.ª Presidente —
estamos a sentir, em nome de um futuro que queremos que seja diferente. Diferente pensando nas pessoas,
nas empresas e procurando deixar respirar a sociedade,…
Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.
… sociedade essa, que, infelizmente, o Partido Socialista não nos deixou célere, saudável e capaz de
vencer.
Protestos do PS.
Mas esta maioria, este Governo e, sobretudo, cada português não vão deixar que a crise que nos deixaram
em junho de 2011 e que já cá estava continue no futuro.
É para isso que cá continuamos, para sermos parte da solução e não, como, infelizmente, a oposição é,
mera parte da contestação.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, começo por agradecer as perguntas dos Srs.
Deputados Bruno Dias e Nuno Matias.
Sr. Deputado Bruno Dias, V. Ex.ª, apesar do tom de Estado e a voz serena, que lhe reconheço e aprecio,
disse coisas com as quais não concordo.
Gostava de lhe fazer uma pergunta, Sr. Deputado: 295 dias de paralisação em 365, apenas 70 dias de
trabalho — acha normal? É inaceitável, Sr. Deputado! É inaceitável!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — É mentira!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso é mentira!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sabe V. Ex.ª os efeitos destas greves na produção do País, no conjunto
de serviços que ficam paralisados, no conjunto de pessoas que querem chegar aos seus postos de trabalho,
que querem trabalhar, que querem contribuir para o esforço nacional e não conseguem? Tem V. Ex.ª noção
das dificuldades que isso levanta?
O Sr. Deputado falou-me nos dados do Banco de Portugal.
Sr. Deputado, tal como costuma fazer, peço-lhe, já agora, um pouco de atenção.
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Protestos do PCP.
Falei-lhe, por exemplo, no Eurostat, que considera Portugal o quinto País onde as exportações mais
cresceram. Acha isso anormal? Acha que não se deve registar esse facto? Acha que isso não é positivo?
Segundo o relatório da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO), o Estado reduziu em um terço a
dívida, o atraso no pagamento aos fornecedores. Acha, ou não, fundamental este esforço do Estado para
injetar dinheiro na economia, para pagar ordenados e para continuar a produzir? É, ou não é, um dado
positivo?
VV. Ex.as
estão do outro lado, do lado do quanto pior melhor — mobilização para que o País pare,
mobilização para que as dificuldades cresçam; eu estou do lado das soluções, de puxar para cima o clima
económico e a confiança. Sabe porquê, Sr. Deputado? Porque quanto mais confiança houver, quanto melhor
for o clima económico, mais investimentos haverá, mais trabalho haverá, mais crescimento económico haverá,
mais depressa retiramos o Estado da tutela externa. Se assim não for, isso, sim, é que é, para mim,
inaceitável, Sr. Deputado.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Deputado Nuno Matias, há na oposição quem diabolize o
Memorando e a ação do Governo, como se fosse ela a causa da crise, esquecendo-se que só temos
Memorando e troica porque nos deixaram em crise; se não houvesse crise, não tínhamos nem uma coisa nem
outra!
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Ora bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Se, de um lado, podemos acusar, com intermitências, é certo, o maior
partido da oposição de às vezes querer parecer um partido como o Bloco de Esquerda ou o Partido Comunista
Português, ainda assim, vamos denotando alguns laivos de serenidade, de querer acertar com o caminho,
mudando, ou não, os documentos de estratégia — não me parece que seja importante ou fundamental; o
importante é o seu conteúdo —, havendo aí, portanto, alguns sinais de esperança. O mesmo não poderei dizer
das bancadas mais à esquerda do Hemiciclo.
É confrangedor que, perante evidências, que qualquer relatório indica, como o efeito da greve dos portos
nos dados das exportações…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Que aldrabice!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — … ou as suas consequências financeiras em empresas públicas, já
deficitárias e em graves dificuldades financeiras, perante o esforço dos trabalhadores e dos sindicatos dessas
empresas para terem empresas saudáveis e, com isso, melhor emprego e melhor remunerados, tenhamos o
Bloco de Esquerda e o Partido Comunista Português a fazerem um discurso de quem não quer perceber a
realidade, a manterem um discurso que sabem que a sociedade já não aceita.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Governam como governam, e a culpa é de quem faz greve!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — O problema do País não é tão-pouco a melhor ou a pior governação, o
problema do País é ter pessoas que apenas trabalham 70 dias em 365. Esse é, de facto, um grande problema,
Sr. Deputado.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Vozes do PCP: — Mentiroso!
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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, pedia-lhes um pouco mais de contenção no debate, sobretudo nos
extradebate.
A próxima intervenção, do Sr. Deputado Miguel Coelho, será proferida ao abrigo do artigo 76.º, n.º 2, do
Regimento, o que significa que será feita por direito próprio do Deputado e não será contabilizada nos tempos
do respetivo grupo parlamentar, neste caso o PS.
Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Miguel Coelho.
O Sr. Miguel Coelho (PS): — Sr.ª Presidente da Assembleia da República, Sr.as
e Srs. Deputados: Utilizo o
n.º 2 do artigo 76.º do Regimento da Assembleia da República para recolocar a questão relacionada com a lei
do arrendamento urbano aprovada há cerca de um ano, por iniciativa do Governo do PSD e do CDS-PP.
Tal como sustentei na declaração de voto que então produzi, esta lei, pelos resultados já conhecidos, não
só não veio contribuir para a resolução da questão inicial que se propôs resolver — a dinamização do mercado
de arrendamento — como veio, igualmente, criar uma insustentável situação de alarme social, com particular
incidência junto das pessoas mais desfavorecidas, dos pobres, idosos, aposentados e outros setores com
escassos rendimentos.
Trata-se de uma lei que, partindo de uma falácia e de duas mentiras base, constrói uma narrativa contra
todas aquelas pessoas que têm contratos de arrendamento anteriores a 1990, configurando mesmo um ajuste
de contas pessoal com as mesmas!
Vejamos a falácia: afirmaram os seus promotores que a lei tinha como objetivo liberalizar o mercado de
arrendamento e as condições para a renegociação dos contratos de arrendamento. Nada mais falso. Como já
sabemos, hoje em dia o mercado já é livre: alugam-se as casas pelos preços estabelecidos pelos proprietários
e pelo tempo por estes proposto, não estando essas rendas condicionadas a qualquer tipo de constrangimento
e podendo o senhorio, terminado o contrato, renegociar ou rescindir o contrato, restando apenas ao inquilino
procurar uma outra habitação.
De facto, esta lei é apenas um enorme e injusto ajuste de contas com aquelas pessoas que têm contratos
de arrendamento anteriores a 1990, injusto e injustificado!
Mas vejamos, de seguida, as mentiras sobre as quais tem assentado a narrativa da sua defesa.
A primeira delas refere que, com esta lei, se combaterá a escassez de fogos colocados no mercado de
arrendamento.
Uma análise aos resultados dos Censos 2011 permite, desde logo, concluir que estes contratos anteriores
a 1990 têm vindo a diminuir. Constata-se, igualmente, que 47% dos contratos de arrendamento são mesmo
posteriores a 2005 e que existiam, em 2011, mais de 110 000 habitações vagas para arrendar. Os mesmos
Censos também indicam que, para além destas 110 000 habitações para arrendar, existem mais cerca de 500
000 habitações que estão desocupadas sem que os seus proprietários revelem algum tipo de interesse em
colocá-las no mercado de arrendamento.
Sendo assim, o Governo, se pretende dinamizar o mercado de arrendamento — o que entendo necessário
—, devia, em primeiro lugar, ter legislado para que se criassem as condições para que estes fogos fossem
colocados no mercado.
Como é possível, com estes dados, sustentar-se que o problema da dinamização do arrendamento se
insere no âmbito dos contratos anteriores a 1990? É que, Sr.as
e Srs. Deputados, se estes 110 000 fogos
fossem agora colocados no mercado de arrendamento, sê-lo-iam em regime de renda livre, sem nenhum
constrangimento.
A segunda mentira tem sido construída a partir da afirmação de que as rendas estão congeladas e
apresentam valores muito baixos.
Sobre este argumento, importa igualmente esclarecer que, é certo, ainda se verificam situações de rendas
baixas face ao valor do mercado. Por essa razão, em 2006, foi aprovado o Novo Regime do Arrendamento
Urbano, que introduziu fatores de correção, possibilitando a atualização dos valores das rendas até 4% sobre
o valor do património, tendo em conta o estado de conservação dos imóveis e o investimento feito pelos
inquilinos na manutenção dos mesmos. Tratou-se de uma solução equilibrada e que, contrariamente ao
afirmado por Governo e senhorios, contribuiu para a atualização das rendas mais antigas, conforme se pode
constatar pelos dados dos Censos 2011.
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Assim, segundo estes Censos, verificamos que 70% das rendas têm já valores iguais ou superiores a 100 €
e que 55% são iguais ou superiores a 200 €. É certo que, em algumas situações, o valor da renda poderá ser
ainda significativamente baixo, mas é igualmente verdade que, em regra, as rendas já não são tão
miserabilistas como alguns querem fazer crer.
Importa também realçar as sérias consequências para a reabilitação urbana que esta nova lei introduziu ao
ignorar o fator conservação/reabilitação como fator de cálculo para o apuramento das novas rendas a
negociar. Como pode o Governo sustentar que a sua lei favorece a reabilitação urbana se elimina
precisamente a cláusula legal que incentivava os proprietários a reabilitarem os seus fogos como condição
para poderem tirar maior provento no seu arrendamento?
Como se vê, toda a componente argumentativa justificadora desta lei parte de pressupostos que não são
verdadeiros e os seus resultados também não atingem o objetivo inicial pretendido.
Desde que esta lei foi aprovada e até ao presente, aumentaram os impostos de um modo muito
significativo para a população em geral, com particular incidência nas condições de vida dos cidadãos de
menores rendimentos, pensionistas e reformados. A este autêntico confisco fiscal há que juntar o aumento
com os custos da eletricidade, do gás e da água, a par do aumento aplicado às despesas com a saúde. De
repente, estes cidadãos mais desprotegidos não só viram as suas condições de sobrevivência agravarem-se
como se confrontam com a possibilidade de perderem o teto onde moram.
A esmagadora maioria dos inquilinos com contratos anteriores a 1990 são pessoas idosas, aposentadas e
com escassos rendimentos. O Estado não pode ignorar esta situação num momento em que, como já referi, o
rendimento disponível das famílias está a ser reduzido através de todas estas medidas de austeridade.
Aplausos do PS.
Os aumentos das rendas preconizados para as famílias de rendimentos baixos, que se traduzem numa
taxa de esforço de 25% em relação ao seu rendimento bruto, podem significar uma diminuição incomportável
do rendimento disponível, fazendo a diferença entre conseguir sobreviver, entre conseguir e não conseguir
pagar uma renda, entre ter um teto ou transformar-se num sem-abrigo.
As consequências desta lei não são só perniciosas para os idosos com mais de 65 anos, para as pessoas
portadoras de deficiência e para aqueles que tenham um rendimento inferior a cinco rendimentos mínimos
anuais. É verdade que, para estes, o Governo encontrou a originalidade de lhes estabelecer uma «pena
suspensa» de cinco anos, findo os quais ou paga a renda na sua totalidade ou vai para a rua.
Dizem que estas pessoas estarão protegidas pela segurança social e que não serão despejadas. Quem
pode acreditar num Governo cuja primeira missão é mesmo destruir o Estado social?
Aplausos do PS.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Esta lei não é só perigosa para este tipo de pessoas, é igualmente
perigosa para aquelas famílias que, embora aufiram de um rendimento superior aos cinco rendimentos
mínimos, se situam num patamar de rendimentos médios entre os 1500 € e os 2500 €. A possibilidade de o
proprietário poder fixar unilateralmente o valor da renda em 6,7% sobre o valor atualizado do património
originará aumentos bruscos e significativos das rendas, pondo em causa a viabilidade financeira dessas
famílias, atirando-as para a pobreza.
Percebe-se a felicidade dos senhorios com esta porta que agora lhes foi aberta: não só não têm de garantir
a reabilitação do fogo para poderem aumentar a renda como lhes foi oferecida de bandeja uma rentabilidade
muito superior às demais aplicações financeiras de baixo risco.
Foram, assim, criadas as condições para que se instalasse um significativo alarme social para a
implementação desta lei.
Em fevereiro do ano passado, o Ministro da Economia do Governo espanhol disse que «mais duro do que
perder o emprego é perder a habitação». Concordo com ele. Por isso, tenho a honra de ser o primeiro
subscritor de um projeto de resolução do meu partido que propõe uma moratória sobre os despejos das
pessoas que, tendo sido sempre cumpridoras, o deixaram de ser por ficarem desempregadas.
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Mas, Sr.as
e Srs. Deputados, esta lei não tem emenda nem possibilidade de ser remendada. São tantas as
trapalhadas com que foi elaborada, são tantos os alçapões que contém que não é possível melhorá-la, como
aparece agora pretender o PSD, porventura preocupado com a proximidade das eleições autárquicas.
É sempre positivo ver um partido, que até hoje sempre recusou aceitar qualquer alteração à lei que visasse
atenuar o sofrimento dos mais desprotegidos e que, pela voz de um dos seus representantes, aconselhava os
inquilinos mais desprotegidos a redimensionarem o seu orçamento e a procurarem outra casa, vir agora propor
algumas das medidas que há alguns meses tinha chumbado.
Esta lei não tem, de facto, ponta por onde se pegue e o que é necessário é mesmo revogá-la. Deve ser
esse o caminho!
Tenha o Governo e os partidos da maioria a coragem de revogar esta lei que, estou certo, trabalharemos
todos em conjunto para fazer uma nova lei do arrendamento urbano que seja equilibrada, justa e adequada
aos tempos modernos.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Estão inscritos, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Paulo Sá, do PCP,
António Prôa, do PSD, Helena Pinto, do BE, e Artur Rêgo, do CDS-PP, a quem o Sr. Deputado Miguel Coelho
vai responder individualmente.
Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá.
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Miguel Coelho, queria
cumprimentá-lo, em primeiro lugar, por trazer aqui este tema, de tanta importância.
O PCP, desde o primeiro momento, alertou para as consequências dramáticas desta lei, a qual logo desde
o início, apelidamos de «lei dos despejos».
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Alertámos, na altura, que iria produzir aumentos brutais das rendas,
incomportáveis para a maioria dos inquilinos, principalmente daqueles com contratos de arrendamento
anteriores a 1990, os mais idosos.
Alertámos também para que esta lei iria levar ao despejo sumário de milhares e milhares de inquilinos,
também eles mais idosos. E, na altura, anotámos, Sr. Deputado Miguel Coelho, que o PS, juntamente com o
PSD e com o CDS, tinha subscrito o pacto de agressão, que defendia e estabelecia que a lei do arrendamento
devia ser revista no sentido de permitir despejos mais rápidos, céleres e eficazes.
Vozes do PCP: — Exatamente!
O Sr. Paulo Sá (PCP): — O PS tem também responsabilidades porque assinou esse pacto de agressão e
abriu caminho a esta lei.
Mas, Sr. Deputado, quando confrontados com a situação dramática em que estão, neste momento,
centenas ou milhares de inquilinos, a receber cartas dos seus senhorios propondo aumentos de rendas
incomportáveis para os seus rendimentos, principalmente numa situação de agravamento das condições
económicas e sociais, verificamos que muitos inquilinos não têm objetivamente condições para pagar estas
rendas. Qual é a resposta do Governo? Nenhuma!
A Ministra e o seu Governo vêm, desde que apresentaram esta lei na Assembleia da República, falando
numa resposta social. Falaram disso quando apresentaram a lei aqui, na Assembleia; falaram disso na
discussão na generalidade; falaram disso na discussão na especialidade; falaram disso quando a lei foi
aprovada e entrou em vigor, mas, até ao momento, não houve qualquer resposta social, e a que existia na
anterior lei, que era um subsídio de renda em algumas situações, foi revogada por este Governo. Portanto,
não há qualquer resposta social, como também não há qualquer processo negocial nesta lei.
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Com o aumento do valor patrimonial tributário dos edifícios, que foi e está ainda a ser revisto até 31 de
março, este valor ficou tão elevado que basta o senhorio propor uma renda equivalente a 1/15 disso para que
não haja qualquer processo negocial e o inquilino tenha de aceitar este valor ou, então, abandonar a sua casa.
Esta lei, Sr. Deputado, como afirmamos desde o primeiro momento, é uma lei com consequências sociais
dramáticas, é uma lei desumana, que revela uma grande insensibilidade social e põe em causa o direito à
habitação. Desde o primeiro momento, dissemos que esta lei não devia ver a luz do dia e, agora, que deve ser
revogada.
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.
Não se resolve com qualquer com remendos, Sr. Deputado Miguel Coelho. O senhor acabou de dizer, da
tribuna, que esta lei não tem emenda; se esta lei não tem emenda o único caminho é o da revogação.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. Paulo Sá (PCP): — O PCP apresentou na semana passada, na quinta-feira, um projeto de lei para
revogar esta lei, cujo agendamento potestativo terá lugar no dia 27 de fevereiro, onde iremos discutir a
revogação da lei dos despejos.
Sr. Deputado Miguel Coelho, tendo dito que esta lei não tem emenda, tendo criticado, da tribuna, esta lei,
como é que o PS, no dia 27 de fevereiro, vai votar o projeto de lei que o PCP apresentou com a revogação da
lei das rendas?
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Coelho.
O Sr. Miguel Coelho (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Paulo Sá, muito obrigado pela questão que
colocou e começo por lhe responder pelo fim da sua pergunta.
Como o Sr. Deputado viu, utilizei o meu tempo regimental para me responsabilizar só a mim.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Oh!
O Sr. Miguel Coelho (PS): — Mas há uma coisa que o PS tem e que o seu partido não tem, que é a
liberdade de voto para os Deputados, e pode crer que votarei a favor do vosso projeto de resolução.
Aplausos de Deputados do PS.
Pode crer que votarei a favor do vosso e de qualquer projeto de resolução que vise a revogação desta lei.
Protestos do PCP.
Mas há outra coisa que lhe quero dizer, Sr. Deputado. De facto, estamos do mesmo lado da barricada
neste combate. Não é só o PCP que tem denunciado esta lei, eu tenho denunciado esta lei, o PS tem-se
oposto a esta lei, desde o início. Mas é a altura do PCP acabar com o estereótipo em relação ao pacto de
agressão, porque se os senhores não tivessem chumbado o PEC 4 não estávamos agora, aqui, nesta
situação.
Aplausos do PS.
Risos do PCP.
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A Sr.ª Presidente: — Para uma pergunta, pelo PSD, tem a palavra o Sr. Deputado António Prôa.
O Sr. António Prôa (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Miguel Coelho, começava por lhe dar nota —
aliás, já ontem tive oportunidade de o fazer — de que o projeto de resolução que o senhor apresenta em nome
do Partido Socialista, é uma «mão cheia de nada», porque é vago, é inconsequente, é menos abrangente do
que aquilo que já está consagrado na lei do arrendamento em vigor.
É menos abrangente porque só prevê a proteção até 2015. Na lei, essa proteção está prevista sem tempo
definido. É, por isso, um passo atrás na proteção das pessoas relativamente ao que a lei já hoje consagra.
Vozes do PSD: — Um tiro no pé!
O Sr. António Prôa (PSD): — Mas tanto eu como o País esperávamos que um Partido Socialista
responsável viesse aqui hoje contrariar o alarme social que tem procurado instalar na sociedade, justamente
àquelas pessoas mais frágeis e que merecem todo o respeito e toda a atenção.
Manda a verdade dizer, Sr. Deputado, que esta lei consagra, de modo equilibrado, um conjunto de
salvaguardas precisamente para as pessoas em situação mais vulnerável, para as pessoas mais idosas, para
as pessoas com carência económica, para as pessoas com deficiência e, em geral, nos contratos antigos;
precisamente porque se pretende diminuir o choque, poderia haver, para todas elas, um limite para a
possibilidade de aumento de renda.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. António Prôa (PSD): — Esta é, por isso, Sr. Deputado, uma lei genericamente equilibrada.
Claro que é possível fazer mais e melhor, claro que o podemos fazer, e ainda ontem a maioria teve a
oportunidade, em audição com a Sr.ª Ministra, de apontar um conjunto de questões que podem e devem ser
melhoradas.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. António Prôa (PSD): — Mas também tivemos imediatamente a resposta afirmativa da Sr.ª Ministra,
indo ao encontro daquelas que foram preocupações levantadas e anunciando um conjunto de medidas que
corrigem algumas falhas que, entretanto, foram detetadas.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. António Prôa (PSD): — Estamos, por isso, confortáveis no sentido de que este Governo vai reforçar
os cuidados na aplicação desta lei, uma lei que, como disse, reputamos de equilibrada, mas uma lei que,
sobretudo, vai contornar os problemas de uma outra lei que foi inconsequente e incapaz, da autoria do Partido
Socialista, de 2006, que nada mudou, ou da reabilitação urbana, de 2009, que nada fez.
Estamos em crer que, com esta lei, podemos finalmente ter a funcionar, como se pretende, um mercado de
arrendamento dinâmico e a reabilitação urbana, tão importante para as nossas cidades, coisa que o Partido
Socialista não foi capaz de fazer.
Aplausos do PSD.
Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente António Filipe.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Coelho.
O Sr. Miguel Coelho (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Prôa, muito obrigado pela sua questão.
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O Sr. Deputado está espantado por eu referir o alarme social. Vou dizer-lhe porquê, Sr. Deputado: o Sr.
Marques da Silva, que mora em Benfica, pagava 67 € e recebeu agora uma carta a exigir-lhe 444 €; a Sr.ª
Maria Antónia Santos, de São João de Deus, pagava 150 € e agora recebeu uma carta a exigir-lhe 615 €…
Protestos do PSD.
Tenho aqui outros casos que posso referir, agora sem citar nomes: uma senhora, que pagava 74 €,
recebeu agora uma carta a pedir-lhe 150 €. Para uma renda de 98 €, agora é-lhe pedido 326 €; uma renda de
70 € passa para 350 €. Como é que não quer que haja alarme social, Sr. Deputado?!
Aplausos do PS.
Ainda hoje saíram dados do INE onde se diz que há mais 200 000 desempregados. Como é que quer que
estas pessoas consigam pagar a renda, apesar de terem sido cumpridoras até aqui?
É evidente que esta lei não tem emenda, esta lei não tem remendo, esta lei merece ser revogada e,
pessoalmente, votarei a favor de qualquer revogação desta lei.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Pessoalmente?! Isso não serve para nada!
O Sr. Miguel Coelho (PS): — Mas há uma coisa que lhe quero dizer: é lamentável que só agora, a três ou
quatro meses das eleições autárquicas, o PSD se comece a preocupar com as consequências desta lei das
rendas.
Vozes do CDS-PP: — O PS já está em campanha!
O Sr. Miguel Coelho (PS): — Isto é que é lamentável, Sr.as
e Srs. Deputados! Só perante a proximidade
das eleições autárquicas é que se preocupam com isto! Assim como é lamentável que o porta-voz do PSD,
sobre estas questões, tenha dito precisamente há um ano: «Quem não puder, que procure casa, que mude de
casa». Isso é que é lamentável!
De qualquer modo, ainda bem que se aproximam de nós e ainda hei de ver os senhores a pedir a
revogação desta lei.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — O Sr. Deputado António Prôa pediu a palavra para que efeito?
O Sr. António Prôa (PSD): — Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. António Prôa (PSD): — Sr. Presidente, por seu intermédio, queria solicitar ao Sr. Deputado, em
razão da gravidade das afirmações que faz e do clima de alarme social que estas declarações promovem, que
nos faculte a informação que o Sr. Deputado, por alguma razão, não nos quis facultar. Em concreto, Sr.
Presidente, refiro-me à aplicação das cláusulas de salvaguarda, porque os exemplos referidos na carta não
significam um aumento de renda. Isto é enganar as pessoas.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, já está a extravasar a figura de interpelação à Mesa.
O Sr. António Prôa (PSD): — Falta a informação que nos permita, de modo sério, averiguar se estas
informações alarmistas são verdadeiras e fundadas ou não.
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Aplausos do PSD, do CDS-PP e do Deputado do PS Basílio Horta.
O Sr. Presidente (António Filipe): — O Sr. Deputado Miguel Coelho facultará a informação que entender e,
se pretende usar da palavra…
O Sr. Miguel Coelho (PS): — Sr. Presidente, como o Sr. Deputado António Prôa usou a figura da
interpelação, só usando a mesma figura.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Peço-lhe que seja muito breve, Sr. Deputado.
O Sr. Miguel Coelho (PS): — Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Deputado António Prôa, como é que não quer que haja alarme social se as pessoas estão a receber
estas cartas? É verdade! É que isso provoca alarme social.
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, também não está a fazer uma interpelação à Mesa.
Peço que terminemos aqui este incidente. O Sr. Deputado, depois, terá a possibilidade de usar da palavra.
O Sr. Miguel Coelho (PS): — Sr. Presidente, facultarei à Mesa toda a documentação que tenho, se
necessário, mas há uma coisa que também quero dizer, em jeito de interpelação: é que a primeira interpelação
também não foi uma interpelação, Sr. Presidente, mas uma pergunta direta que me foi dirigida.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, também tive a oportunidade de dizer isso.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Coelho, em primeiro lugar, quero saudá-
lo pela sua intervenção e pelo tema que trouxe a este Plenário.
Quero também, Sr. Deputado, congratular-me com a sua conclusão de que esta lei tem de ser revogada.
Congratulo-me com essa opinião porque penso também que é necessário alargar na sociedade portuguesa,
cada vez mais, o sentimento e a decisão de que esta lei só tem um destino, o da revogação,…
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — …e quantos mais formos a defender isso, melhor, Sr. Deputado!
Sr. Deputado, permita-me algumas observações sobre esta lei, começando pelas cláusulas de
salvaguarda, porque o Sr. António Prôa falou aqui em «mãos cheias de nada». É que também há as outras
mãos, «as mãos cheias de coisa nenhuma», que, no fundo, foi aquilo que a Sr.ª Ministra ontem trouxe, em
sede de Comissão.
Cláusulas de salvaguarda, Srs. Deputados? As cláusulas de salvaguarda são cinco anos para a população
mais idosa deste País, e só quero dizer que se os idosos não são despejados aos 75 anos, são-no aos 80
anos e se não forem aos 80, serão aos 85.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Exatamente!
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Cláusulas de salvaguarda para quem não tem hipótese de pagar a renda de
casa? É um deferimento da segurança social de cinco meses! Ao fim desse tempo, acabaram-se as cláusulas
de salvaguarda.
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O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É mentira!
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Ou os Srs. Deputados não têm consciência da gravíssima crise social em que
vivemos ou, então, não podem chamar a isto cláusulas de salvaguarda.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Para além do mais, Srs. Deputados, foi a própria Ministra Assunção Cristas
que ontem aqui, na Comissão, reconheceu que não existe política social nem resposta social para esta
matéria.
É a própria Ministra que diz: «vamos fazer, tenham calma que ela lá chegará». Não existe! Aquilo que a
Ministra Assunção Cristas ontem disse na Comissão é que é um grave problema, que não é só de alarme
social mas de pânico social,…
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Isso não é verdade!
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — …junto de uma população mais vulnerável, a que responde com uma
comissão de monitorização — uma comissão de monitorização, Srs. Deputados! — e nem sequer sabe definir
objetivos e prazos.
Mas, mais — e esta é a questão a que gostaria que o Sr. Deputado respondesse —, é a própria Ministra
Assunção Cristas que reconhece que existem senhorios sem escrúpulos.
Vozes do CDS-PP: — É verdade! E também há inquilinos incumpridores!
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Existem senhorios sem escrúpulos porque a lei está mal feita, porque a lei
não é equilibrada e põe todo o poder do lado do senhorio.
Protestos do CDS-PP.
E sabemos perfeitamente que há muitos inquilinos que já aceitaram rendas que não estão conforme a lei
nem são suportáveis.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Vou concluir, Sr. Presidente.
A pergunta que se impõe é esta: qual é a resposta do Governo e dos Deputados da maioria aos senhorios
sem escrúpulos? Quem é que ganha?
Sr. Deputado Miguel Coelho, diga lá: quem é que vai ganhar? São os senhorios sem escrúpulos ou há
alguma medida para ir ao encontro das necessidades dos inquilinos pobres?
Aplausos do BE.
Protestos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Coelho.
O Sr. Miguel Coelho (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Pinto, até posso responder já à sua
última pergunta, dizendo-lhe o seguinte: quem vai ganhar são esses senhorios sem escrúpulos e são os
fundos imobiliários que já se estão a constituir para aproveitarem ao máximo as oportunidades que esta nova
lei das rendas cria.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!
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O Sr. Miguel Coelho (PS): — As pessoas atingidas por esta lei são uma população idosa, que já quase
não tem ninguém que a defenda, não tem sindicatos poderosos nem associações com força e com visibilidade
para a defender.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Tem a lei!
O Sr. Miguel Coelho (PS): — São pessoas que, muitas vezes, sofrem de alguma iliteracia.
E veja-se o que diz esta lei: uma vez recebida a carta, se o inquilino não responder dentro dos prazos, o
seu contrato transforma-se automaticamente num novo contrato de arrendamento. Esta lei tem este alçapão. É
por isso que não há cláusulas de salvaguarda, contrariamente ao que referiu aqui o Sr. Deputado António
Prôa, que salvem estas pessoas — não há nenhuma! São fictícias estas cláusulas de salvaguarda!
O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Isso não é verdade!
O Sr. Miguel Coelho (PS): — Diria até que são cínicas, nessa matéria, porque esta lei foi feita apenas para
fazer um ajuste de contas com estas pessoas.
Entende-se — vá-se lá saber porquê… — que não há mercado de arrendamento porque as pessoas que
têm contratos anteriores a 1990 têm as rendas congeladas. Não é verdade! Não é verdade que isso esteja a
acontecer, nem é verdade que as rendas, hoje, sejam assim tão baixas, embora reconheça que há situações
em que ainda são muito baixas, assim como não é verdade que o Novo Regime do Arrendamento Urbano, de
2006, não tenha funcionado, tal como os resultados do Censos 2011 o demonstraram.
O que se passa aqui é que esta lei se inseriu na campanha de implementação neste País de uma
economia neoliberal onde só os mais aptos estão em condições de sobreviver, enquanto os idosos, os
pensionistas, os reformados e os desempregados, caídos nesta situação, passam a ser dispensáveis para
esta maioria.
É por isso que, há cerca de um ano, um responsável do PSD dizia: «Pois quem não puder pagar a casa,
procure outra casa!» Isto esclarece tudo!
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Quem disse isso? Quem foi?!
O Sr. Miguel Coelho (PS): — Sr. Deputado, até tenho aqui o recorte de jornal! Quer que lhe distribua?
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Diga quem foi!
O Sr. Miguel Coelho (PS): — Vou entregar na Mesa para que esta o faça distribuir.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Rêgo.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Coelho, noto que a intervenção que
fez foi a título individual e não em nome do Partido Socialista,…
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — … o que me leva a concluir que, se calhar, o Sr. Deputado já entrou em
campanha eleitoral para as eleições autárquicas.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
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O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — É que o próprio Partido Socialista não só não sentiu necessidade de fazer
declarações políticas sobre esta matéria como sentiu que a lei em vigor não servia e apresentou um projeto de
lei que foi trazido aqui à discussão para a elaboração de uma nova lei. Esta foi a posição do Partido Socialista.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Isso é que é sério!
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Está a ver, Sr. Deputado? Isto é sério!
Entrando, agora, na questão de facto, relativamente àquelas cartas que o Sr. Deputado aqui mencionou e
que diziam que as pessoas tinham uma renda tal e receberam uma carta do senhorio a aumentar-lhes a renda
para 600 €, 500 € ou 200 €, melhor teria feito o Sr. Deputado, se realmente está preocupado com elas, se lhes
tivesse respondido e dito: «Os senhores têm de ver se o valor da renda que vos é proposto pelo senhorio
ultrapassa os 6,5% do VPT, os senhores têm de ver se o valor da renda que lhes é proposto pelo senhorio
ultrapassa mais do que 25% do rendimento anual bruto do vosso agregado familiar,…
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Ora bem! Claro! Isso é que era fazer o seu trabalho!
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — … porque, se assim for, os senhores, nos termos da lei, têm a
possibilidade de, dentro do prazo legal, responder ao senhorio e dizer ‘eu contraproponho uma renda de
tanto’».
É isto que está na lei e são estas as proteções e as defesas dos inquilinos.
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Já sabemos que isso não chega!
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — E é este o papel que, quem está genuinamente preocupado com as
dificuldades das pessoas, deve desempenhar. Todos nós temos essa obrigação.
Digo-lhe mais, Sr. Deputado: para as pessoas idosas e de menores rendimentos e para as pessoas
desempregadas, das quais também aqui foi falado, estão previstos na lei mecanismos de proteção. As
pessoas não podem ser despejadas se estiverem desempregadas,…
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Durante cinco meses!
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — … as pessoas com mais de 65 anos não podem ser despejadas…
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Durante cinco meses!
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — … e a renda não pode ultrapassar 10% do rendimento das pessoas que
aufiram 500 € ou menos.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É o que está na lei!
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Por cinco anos!
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Srs. Deputados, sejamos sérios!
Acho interessante que os senhores, quando intervêm, o façam aos berros, a causar alarme social, e que,
quando eu intervenho, a tentar esclarecer e explicar às pessoas quais são os direitos delas, os senhores
berrem igualmente, porque não convém que se ouça, convém é causar alarme social.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
Protestos do BE.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Sr. Deputado Miguel Coelho,…
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O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Irei concluir, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Miguel Coelho, lamento, por um lado, o papel que o Sr. Deputado veio aqui fazer e fico
contente e satisfeito, por outro, por o Partido Socialista, que assinou o Memorando da troica e apresentou um
projeto de lei reconhecendo a necessidade de uma lei nova, não vir fazer esse papel e não ir atrás do Sr.
Deputado Miguel Coelho.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Coelho.
O Sr. Miguel Coelho (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Artur Rêgo, com toda a cordialidade e simpatia
que tenho por si (e sei que é mútua), devo dizer-lhe que, se estou a fazer campanha eleitoral, então, já o faço
há muitos anos.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Isso é verdade!
O Sr. Miguel Coelho (PS): — Sabe porquê, Sr. Deputado? É que, quando ainda era Primeiro-Ministro o Dr.
Santana Lopes e ele quis mexer na lei das rendas, já eu estava no terreno a combater a possibilidade de ele
mexer na lei do arrendamento, no sentido em que os senhores, agora, o fizeram. Por isso, tenho alguma
credibilidade junto das associações de moradores que, na altura, ficaram preocupados com esta problemática.
Portanto, estou apenas a ser coerente comigo próprio. E sou tão coerente que quando, em 2006, o meu
partido estava no governo e fez a lei que esteve em vigor até os senhores a revogarem, mesmo assim, tive
dúvidas sobre ela e por isso mesmo não a votei conforme o meu grupo parlamentar na altura o fez.
Portanto, nesta matéria, se estou em campanha eleitoral, estou-o há muitos anos, mas tenho orgulho na
coerência que tenho sobre isto.
É que há algo sobre o que não tenho quaisquer dúvidas: os partidos, para alcançarem o poder, muitas
vezes, querem representar todos os setores da sociedade, e acho isso natural. Mas há momentos em que é
preciso optar. E entre os desprotegidos e as pessoas que estão mais protegidas, estarei sempre ao lado dos
mais desprotegidos. Digo-lhe isto com toda a sinceridade.
O seu papel, se calhar, é estar ao lado dos mais fortes. Também respeito isso, mas não é o meu papel e
não o farei.
Outra coisa que lhe quero dizer é o seguinte: o Governo fez esta trapalhada com a lei e, agora, quer que
sejamos todos nós a «esclarecer» as coisas mal feitas que o Governo fez.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — É uma lei da Assembleia da República!
O Sr. Miguel Coelho (PS): — Ainda ontem, a Sr.ª Ministra disse que era preciso explicar a lei. Mas como é
que se fez uma lei desta dimensão, uma lei que vai mexer com aquilo que há de mais sagrado para as
pessoas, que é o seu direito à habitação, e não se disse, primeiro, quais eram os objetivos? E, agora, pede-se
ajuda a tudo e a todos, dizendo «por favor, expliquem a lei, que ela não é assim tão má!».
Não, Srs. Deputados, a lei é má, independentemente das boas intenções da Sr.ª Ministra — e acredito que
as tenha. Mas a lei é má, porque é um ataque sem quartel às pessoas mais desfavorecidas e aos idosos, que,
contrariamente ao que foi aqui dito, não estão protegidos.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É mentira!
O Sr. Miguel Coelho (PS): — Têm uma «pena suspensa» por cinco anos! Ao fim de cinco anos, ou estão
em condições de pagar a renda ou, então, têm de ir para a rua, porque o contrato é atualizado.
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O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Seja sério!
O Sr. Miguel Coelho (PS): — E quando me fala em subsídio de renda, pergunto: onde é que ele está?
Pergunto ainda: é por toda a vida? É só 25% de subsídio de renda? Isto é, um idoso cuja renda, que
atualmente é de 70 €, é aumentada para 500 €, quanto é que vai ter de subsídio de renda? Será de 430 €?
Acha que o Estado vai fazer isso?
Sr. Deputado, isto é um mar de incertezas, é um mar de injustiças que caiem sobre os idosos!
Mais grave é que os senhores também estão a atacar outras pessoas, uma determinada classe média que,
agora, consegue sobreviver mas que, por causa da vossa austeridade, uma austeridade cega, uma
austeridade ideológica, está a ser lançada para a miséria.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Miguel Coelho (PS): — Hoje em dia, nas freguesias, muitos autarcas são contactados por pessoas,
profissionais liberais, engenheiros e advogados, que dizem «fiquei desempregado, peço ajuda para me darem
comida, peço ajuda para me pagarem a renda». Tudo isto causado por esta vossa política cega!
Os senhores, se têm alguma consciência social, deviam revogar esta lei e regressar ao aumento máximo
de 4% do valor do locado. Isto é que era correto, Sr. Deputado.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Miguel Coelho (PS): — Por fim, quero dizer-lhe que registei, ontem, a preocupação do CDS-PP,
com, apesar de tudo, alguma sensibilidade — …
Vozes do CDS-PP: — Temos muita sensibilidade!
O Sr. Miguel Coelho (PS): — … bem sei que é eleitoral autárquica —, que começou a ser manifestada
pelo PSD, no sentido de corrigir algumas das imperfeições desta lei, como dizem. Mas não são imperfeições.
Toda esta lei é, de facto, um autêntico aborto, Sr. Deputado.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, antes de passarmos ao segundo ponto da nossa
ordem de trabalhos, o Sr. Secretário vai anunciar à Câmara expediente que deu entrada na Mesa.
O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e
foram admitidas, várias iniciativas legislativas, algumas das quais já serão alvo de discussão esta tarde, a
saber: projetos de lei n.os
348/XII (2.ª) — Revoga a Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, que procede à revisão do
regime jurídico do arrendamento urbano, e suspende a atualização da renda dos diversos tipos de
arrendamento, prevista na Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, na sua versão originária, bem como a correção
extraordinária das rendas previstas na Lei n.º 46/85, de 20 de setembro (PCP), que baixa à 11.ª Comissão,
349/XII (2.ª) — Prorrogação do prazo para a obtenção do reconhecimento da propriedade privada sobre
parcelas de leitos ou margens das águas do mar ou de quaisquer águas navegáveis ou flutuáveis (Primeira
alteração à Lei n.º 54/2005, de 15 de novembro, que estabelece a titularidade dos recursos hídricos) (PS), que
baixa à 11.ª Comissão, 350/XII (2.ª) — Cria condições para a melhoria do financiamento às empresas no
âmbito da ajuda aos bancos por parte do Estado (BE), que baixa à 5.ª Comissão, e 351/XII (2.ª) — Procede à
sétima alteração da Lei das Finanças Locais, aprovada pela Lei n.º 2/2007, de 15 de janeiro, e altera o Código
do Imposto Municipal sobre Imóveis (BE), que baixa à 11.ª Comissão.
Deram também entrada, e foram admitidos, os projetos de resolução n.os
603/XII (2.ª) — Recomenda o
prolongamento de horário da USF Physis, em Vizela, até às 22 horas de 2.ª a 6.ª feira e a reabertura aos
sábados, domingos e feriados (PCP), que baixa à 9.ª Comissão, 604/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a
criação de uma rede de cinema digital e o estabelecimento de parcerias com as autarquias locais e os
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exibidores cinematográficos para a promoção e recuperação de recintos de cinema (PS), que baixa à 8.ª
Comissão, 606/XII (2.ª) — As novas regras da faturação e a comunicação dos elementos das faturas emitidas
(PCP), que baixa à 5.ª Comissão, 607/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo um conjunto de ações versando a
ocupação e reconhecimento da propriedade privada no domínio público hídrico (PS), que baixa à 11.ª
Comissão, 608/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a tomada de medidas para o relançamento do sector da
construção civil (PS), que baixa à 6.ª Comissão, 609/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo que promova a
rápida finalização da obra do Alqueva e garanta o seu desenvolvimento futuro (PS), que baixa à 7.ª Comissão,
610/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a isenção de pagamento de taxas moderadoras no Serviço Nacional
de Saúde para as pessoas portadoras de doenças crónicas e de doenças raras (BE), que baixa à 9.ª
Comissão, 611/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo medidas de valorização da arte xávega (BE), que baixa à
7.ª Comissão, 612/XII (2.ª) — Por uma política pública de crédito para o relançamento da economia (BE), que
baixa à 6.ª Comissão, 613/XII (2.ª) — Cria condições para a dinamização do financiamento à economia no
âmbito da ajuda pública aos bancos (BE), que baixa à 5.ª Comissão, e 614/XII (2.ª) — Combater o tráfico de
seres humanos (Os Verdes), que baixa à 1.ª Comissão.
Finalmente, deram entrada na Mesa, tendo sido admitidas, as propostas de lei n.os
128/XII (2.ª) —
Estabelece o regime a que deve obedecer a implementação e utilização de sistemas de transportes
inteligentes, transpondo a Diretiva 2010/40/UE, de 7 de julho, que estabelece um quadro para a
implementação de sistemas de transporte inteligentes no transporte rodoviário, inclusive nas interfaces com
outros modos de transporte, que baixa à 6.ª Comissão, e 129/XII (2.ª) — Autoriza o Governo a rever o Regime
Jurídico dos Organismos de Investimento Coletivo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 252/2003, de 17 de outubro,
que baixa à 5.ª Comissão.
É tudo, Sr. Presidente.
Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Guilherme Silva.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, tendo o Sr. Secretário da Mesa anunciado o expediente e findas que
estão as declarações políticas, há um certo barulho de fundo na Sala que peço que seja reduzido para
podermos prosseguir.
Vamos passar à discussão, na generalidade, das propostas de lei n.os
121/XII (2.ª) — Aprova a Lei das
Finanças das Regiões Autónomas e 122/XII (2.ª) — Estabelece o regime financeiro das autarquias locais e
das entidades intermunicipais e do projeto de lei n.º 351/XII (2.ª) — Procede à sétima alteração da Lei das
Finanças Locais, aprovada pela Lei n.º 2/2007, de 15 de janeiro, e altera o Código do Imposto Municipal sobre
Imóveis (BE).
Estas propostas de lei vão ser discutidas em conjunto, o que não é muito usual. Deveria ter havido,
eventualmente, um agendamento separado, mas foi assim que a Conferência de Líderes decidiu.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Deveria, sim!
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Muito bem!
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para apresentar as propostas de lei, tem a palavra o Sr. Ministro
Adjunto e dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares (Miguel Relvas): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs.
Deputados: As sérias restrições financeiras que enfrentamos obrigam todos os portugueses a conter despesas
e a evitar desperdícios. Por maioria de razão, estes são deveres imperiosos do Estado, a todos os níveis.
A recuperação da economia, que constitui o nosso maior desígnio estratégico nestes tempos de
emergência nacional, só se tornará possível num quadro de consolidação das finanças públicas. Este é um
esforço coletivo do qual ninguém se deve excluir. Pelo contrário, as dificuldades do momento presente exigem
um esforço solidário de todos, à escala nacional, à escala regional e à escala local.
Neste contexto, o Governo apresenta hoje à Assembleia da República as leis das finanças locais e das
finanças regionais.
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Uma das principais preocupações que estiveram na base das propostas agora em discussão consiste em
prever os princípios de natureza orçamental que têm vindo a ser introduzidos na Lei de Enquadramento
Orçamental, de forma a dar coerência e consistência a este conjunto de normativos.
Assim, prevêem-se os princípios de equilíbrio orçamental, da anualidade e plurianualidade, da unidade e
universalidade, da não consignação e do quadro plurianual e compatibilizam-se os universos de entidades que
estão abrangidas por estas leis.
A reformulação destas leis teve como objetivo acolher o previsto no Pacto Orçamental da União Europeia.
De facto, nas propostas apresentadas reforça-se a responsabilidade das regiões e dos municípios pelas
obrigações assumidas.
Nas presentes propostas de lei redefinem-se os níveis de transferências a efetuar pelo Estado, quer para
as regiões autónomas, quer para os municípios, de acordo com as necessidades de consolidação orçamental
do Estado, em particular, e das administrações públicas, em geral, de forma a distribuir esse esforço nacional
por todos os níveis.
Introduzem-se regras sobre o saldo orçamental, para garantir que as administrações regionais e locais
gerem os excedentes necessários ao serviço da dívida.
Redefinem-se os limites aos níveis globais de endividamento, tendo em consideração a relação com a
capacidade de pagamento.
Também ao nível do controlo orçamental se preveem mecanismos de deteção precoce de desvios e de
procedimentos de correção desses desvios.
No entanto, em situações de desequilíbrio económico e financeiro, quer das regiões autónomas, quer dos
municípios, estabelecem-se nas respetivas leis das finanças soluções inovadoras onde se preveem programas
específicos que poderão derrogar a aplicação das regras estabelecidas.
Neste aspeto assume clara importância a constituição do Fundo de Apoio Municipal. Este será um
instrumento na assistência aos municípios em dificuldades financeiras.
Este Fundo constituirá um mecanismo de solidariedade intermunicipal que permita acorrer às dificuldades
emergentes e disseminar as melhores práticas em termos de gestão orçamental e financeira dos municípios.
Não se trata aqui, ao contrário do que alguns poderão alegar, de beneficiar o infrator.
Ao contribuir para o Fundo, cada município verá o seu investimento remunerado e estará a contribuir para a
criação de uma garantia sistémica da qual todos beneficiam.
Se um município tiver de recorrer ao Fundo, a Lei das Finanças Locais prevê um mecanismo específico de
acompanhamento técnico e financeiro para esse município, mas respeitando sempre o princípio da autonomia
consagrado na Constituição da República.
Por fim, reforçam-se as competências atribuídas ao Conselho de Acompanhamento das Políticas
Financeiras, no caso da Lei das Finanças Regionais, e cria-se o Conselho de Coordenação Financeira, no
caso da Lei das Finanças Locais, como fóruns de troca de informação entre a administração central e a
administração regional ou a administração local.
O Governo está plenamente convencido de que estas propostas de lei cumprem os objetivos que estiveram
na sua génese, contribuindo para a robustez financeira das regiões e autarquias através de uma melhoria da
gestão orçamental.
No entanto, o Governo também crê que estas leis merecem o consenso mais alargado possível nesta
Assembleia e tudo fará para que, uma vez aprovadas, tenham efetiva aplicação prática.
Nesse sentido, encaramos de forma positiva todos os contributos que melhorem a redação e a substância
destas leis e que fortaleçam e alarguem esse consenso.
Sr. Presidente, Sr.
as e Srs. Deputados: O Governo valoriza a missão desempenhada pelos órgãos regionais
e autárquicos na oferta de serviços públicos de qualidade e proximidade aos cidadãos, sempre na primeira
linha de apoio a populações carenciadas e à coesão territorial.
Nos tempos difíceis que vivemos, este apoio torna-se indispensável e merece ser publicamente enaltecido.
O Governo valoriza o intermunicipalismo como forma privilegiada de desenvolvimento regional. A existência
de fronteiras administrativas municipais não deve limitar a visão da prestação do serviço público. A
possibilidade de ganhos de escala através da cooperação entre municípios é fortemente incentivada pelo
Governo através dos instrumentos legislativos que definem um novo modelo de funcionamento e um novo
modelo de financiamento agora submetidos à consideração da Assembleia da República.
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Por isso, quero dizer de uma forma muito clara que o poder central, o poder regional e o poder local são
peças complementares, essenciais na melhoria da qualidade de vida dos portugueses, na criação de
condições para o investimento, no aproveitamento racional dos recursos nacionais e na modernização do
País.
Solidariedade não é, para nós, um princípio vago ou uma palavra vã. Nunca deixaremos de tomar as
decisões que se impõem nem rejeitaremos as soluções em que acreditamos para ceder o passo ao ritmo, às
pressões e às prioridades político-partidárias de outros.
A nossa prioridade é Portugal e os portugueses. Temos os nossos prazos, temos o nosso rumo, temos as
nossas metas, e seremos, creiam, de uma persistência inabalável no cumprimento da agenda reformista que
foi sufragada pelos eleitores.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — O Sr. Ministro tem sete pedidos de esclarecimentos.
Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs.
Deputados, em primeiro lugar, quero registar estranheza pelo facto de o Governo propor um debate conjunto
de matérias que são efetivamente diferentes, o que acontece pela primeira vez na Assembleia da República.
Já agora, quero dizer também que, na Conferência de Líderes que agendou este debate, o Bloco de
Esquerda deixou bem claro que não queria que juntassem estes dois temas. Está vista a estratégia do
Governo: juntar para baralhar e, com isso, confundir as pessoas.
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Muito bem!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Mas faremos o debate nestes moldes porque a maioria assim o impôs,
não sendo essa a nossa vontade, dada a importância que os temas têm nos diversos patamares.
Indo diretamente às questões e olhando para as propostas de lei que estão em cima da mesa,
conseguimos perceber que o denominador comum destas duas propostas de lei é o sufoco: o sufoco das
pessoas, face às restrições que terão no espaço de maior proximidade com o Estado; o sufoco das regiões
autónomas, com a redução das transferências do Estado, e o sufoco das autarquias, com mais restrições nas
transferências que são feitas por parte do Estado.
Se este é o denominador comum, no caso das autarquias ele existe porque se insiste numa política errada,
dado que as receitas são conseguidas com base na política do betão e com uma programação muto
extemporânea e desgarrada da realidade, que é a da previsão das receitas do IMI.
Também é claro o que vai acontecer com as receitas do IMI, que são a grande base de receitas que o
Governo prevê para as autarquias: mais sufoco para as famílias, para, depois, ser também mais sufoco para
as autarquias, com o Estado central, o Governo, a tentar «lavar as mãos» das suas responsabilidades.
No que toca às regiões autónomas, é o Governo a querer ser a troica para com as regiões autónomas.
Esconde e esquece que há custos de insularidade reais, que os habitantes das regiões autónomas dos Açores
e da Madeira têm um salário mais baixo do que a média nacional e têm custos de bens essenciais mais altos
do que a média nacional. O que o Governo quer fazer é cortar com a solidariedade. Por isso, aprendeu a lição
com a troica: quer cortar com a solidariedade para entregar a fatura às pessoas.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Isto não aceitamos, e gostava até de perceber — e esta é a pergunta
que coloco para terminar — por que é que este Governo, tão crítico do governo anterior, sobre as regiões
autónomas, afinal, o que faz é ressuscitar as propostas de Teixeira dos Santos e de José Sócrates.
Afinal, onde fica a coerência do Governo e desta maioria que, na oposição, dizia que não queria estas
propostas, que não queria esta forma de fazer política?
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Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva). — O Sr. Ministro informou que responderia no fim dos pedidos de
esclarecimento.
Para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares, tem a palavra o Sr.
Deputado José Luís Ferreira.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos
Parlamentares, com a nova Lei das Finanças Locais, o Governo quer retirar ao poder local 400 milhões de
euros de receitas que, historicamente, foram sempre receitas municipais, colocando em causa a autonomia
financeira dos municípios.
É, portanto, na nossa perspetiva, uma proposta gravíssima e inaceitável para as autarquias locais.
A proposta configura sérias e graves restrições e violações da autonomia local, no seguimento, aliás, do
que tem feito o Governo no Orçamento do Estado, na lei dos compromissos. A este propósito, não deixa de
ser estranho que o Governo, não cumprindo a Lei das Finanças Locais — porque não cumpre — exija o
cumprimento da lei dos compromisso aos municípios. Isto é a política franciscana no seu pleno: «Olha para o
que eu digo e não olhes para o que eu faço!»
Sucede que os municípios têm vindo a fazer aquilo que a administração central não faz. Os municípios têm
vindo a desenvolver um trabalho que o Governo tem vindo a recusar fazer, os municípios têm vindo a
desenvolver um trabalho notório nas áreas em que o Governo insiste em se desresponsabilizar
completamente.
Sr. Ministro, um dos eixos que dá suporte à proposta do Governo assenta na presunção, mas creio que é
uma presunção mais que ilidível, é uma presunção pouco fiável, ou, melhor, é um palpite, porque assenta num
putativo aumento generalizado da receita do IMI em consequência da reavaliação geral dos prédios urbanos,
que ainda está a decorrer, como o Sr. Ministro sabe.
A Autoridade Tributária estima um aumento do IMI de 780 milhões de euros mas a Associação Nacional de
Municípios Portugueses também fez estudos e concluiu que o acréscimo será inferior a 300 milhões de euros.
Ora, esta disparidade de valores leva-nos a questionar se não seria mais sensato esperar pela conclusão
da reavaliação geral dos prédios urbanos e só depois discutir o regime financeiro das autarquias locais.
Sr. Ministro, se este regime financeiro assenta na reavaliação dos prédios urbanos e se esta reavaliação
não está ainda concluída, não lhe parece que estamos a «pôr a carroça à frente dos bois»?
Sobre a criação do fundo municipal, refere-se que este fundo se destina a financiar municípios, tendo em
vista a reprogramação da dívida e a consolidação dos passivos financeiros. Mas como é que o Governo
pretende financiar este fundo? Da forma mais fácil, ou seja, o Governo quer colocar os municípios no seu
conjunto a financiar os municípios em situação de resgate. O Estado sacode a água do capote, faz aqui mais
uma retirada estratégica, o Governo volta as costas às suas responsabilidades e coloca os municípios que
adotaram medidas rigorosas de gestão a financiar os municípios que não implementaram essas práticas de
gestão. Ora, isto é delirante, porque o Governo acaba por penalizar os municípios que adotam as medidas
mais rigorosas.
Sr. Ministro, considera que esta medida é um estímulo para que os municípios adotem formas de gestão
rigorosas? Explique-nos como.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos
Abreu Amorim.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sr. Presidente, antes de iniciar o meu pedido de esclarecimento,
gostaria apenas de dizer ao líder parlamentar do Bloco de Esquerda que a Conferência de Líderes nada impôs
em relação à grelha do presente debate. A Conferência de Líderes decidiu como é costume e como faz
relativamente a qualquer outra matéria.
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Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, permitam-me que dirija um cumprimento especial à Sr.ª Secretária
de Estado da Administração Local e da Reforma Administrativa, uma vez que é a primeira vez que se encontra
em funções neste Plenário.
A presente proposta de Lei das Finanças Locais consubstancia-se numa lógica de rigor e de firmeza
legislativa e de limpidez nos fins e nos métodos que devem assinalar toda a atividade das autarquias locais no
novo ciclo que se iniciará após as eleições locais deste ano.
Esta proposta de lei deve diferenciar-se da lei ainda em vigor, designadamente mostrando pujança
suficiente para resistir aos choques orçamentais, isto é, evitando a desagradável revogação dos seus efeitos
mal surja um novo Orçamento do Estado, convertendo aquele que deveria ser um instrumento essencial da
política autárquica num resto de quase nada acompanhado de coisa nenhuma, sempre ao sabor das variações
circunstanciais dos orçamentos do Estado.
Se este diploma vier a ser capaz de se sedimentar no ordenamento jurídico, superando as alterações das
meras conjunturas orçamentais, este Governo e esta maioria já terão obtido uma enorme vitória para o poder
local democrático português.
Neste primeiro pedido de esclarecimento, o Grupo Parlamentar do PSD gostaria de sublinhar alguns dos
importantes acrescentos da proposta, nomeadamente: o facto de as freguesias terem uma participação na
receita do IMI sobre prédios urbanos…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E o corte de 20%?!
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — … e ainda a alteração que remete para as freguesias
essencialmente não urbanas a totalidade da receita do IMI sobre prédios rústicos.
Estamos perante o início da emancipação financeira das freguesias, que foi, recordemos, condição
necessária da realização da reforma de reorganização territorial das freguesias.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E o corte de 20%?
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Também em matéria das entidades intermunicipais, realça-se a
criação de um mecanismo específico de financiamento premiando a contribuição de cada uma dessas
entidades para o desenvolvimento regional com base no índice sintético de desenvolvimento regional com que
o INE concertará os resultados nas áreas da competitividade, da coesão e da qualidade ambiental.
Por último, Sr. Ministro e Srs. Secretários de Estado, o Grupo Parlamentar do PSD aproveita este debate
para sublinhar a intenção de, em sede de especialidade, elucidar, de modo inequívoco, a figura do gestor
prevista no n.º 1 do artigo 74.º da proposta de lei.
Bem sabemos que não estava no plano legislativo deste Governo o desígnio de criar uma figura que se
confrontasse com a dos órgãos municipais, cuja legitimidade resulta de eleições democráticas e que estão
especialmente enlaçadas no revestimento constitucional do princípio da autonomia local.
Mas, precisamente para evitar eventuais equívocos ou as costumeiras más vontades, o Grupo Parlamentar
do PSD pede o devido esclarecimento ao Sr. Ministro. Esta figura do gestor terá como desígnio funcional o
mero acompanhamento do cumprimento do contrato de assistência financeira e do programa de ajustamento
sem poder de iniciativa ou de veto, porque é neste sentido que o Grupo Parlamentar do PSD irá densificar
juridicamente a referida figura.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo
Sá.
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro a proposta do Governo sobre as finanças locais,
como, aliás, todas as anteriores leis de finanças locais, mexe profundamente com a vida das pessoas.
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A ser aprovada, esta proposta de lei, conduziria ao agravamento do saque fiscal e tarifário, reduziria
drasticamente a capacidade de prestação de serviços públicos por parte das autarquias locais e levaria ao
abandono de vastos territórios, condenando-os ao atraso e ao subdesenvolvimento.
Esta proposta do Governo não aparece isolada, insere-se numa política — a política da troica —, que visa
reduzir o papel do Estado e as suas funções sociais, alienar serviços públicos, entregando-os aos grandes
interesses privados, onerar as populações, espoliando-as dos seus direitos e rendimentos.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Esta proposta do Governo é mais uma peça da política de empobrecimento dos
portugueses.
O Sr. Ministro veio aqui justificar ou tentar justificar esta Lei das Finanças Locais com a necessidade da
consolidação das contas públicas. É uma completa falsidade, Sr. Ministro! Diga lá, Sr. Ministro, qual é a
percentagem da dívida dos municípios na dívida pública do Estado. É de 3%, não é verdade? Diga lá, Sr.
Ministro, qual é o peso da administração local no défice orçamental. É absolutamente marginal, não é verdade,
Sr. Ministro?
O Sr. Ministro e o Governo sabem perfeitamente que as autarquias locais não são responsáveis pela
situação financeira em que se encontra o País, mas tentam deliberadamente intoxicar a opinião pública contra
as autarquias locais para abrir caminho a mais um ataque ao poder local.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Um ataque que, a ser consumado, terá sérias consequências na vida das
pessoas.
Sr. Ministro, a Associação Nacional de Municípios Portugueses já emitiu um parecer sobre a proposta de
Lei das Finanças Locais.
Utilizo as palavras da Associação: «É uma proposta inaceitável, arrasadora para o futuro do poder local,
que afeta a capacidade de gestão e a autonomia locais, repercutindo-se de forma gravíssima na vida dos
municípios com consequências desastrosas para as populações».
Diz ainda a Associação que «é uma proposta que privará os municípios de condições mínimas para
minorar os efeitos da grave crise que se abate sobre os cidadãos e sobre as famílias» — por culpa deste
Governo e da troica, dizemos nós.
O que é que o Sr. Ministro tem a dizer sobre este parecer da Associação, que representa os 308
municípios do País? Vai ignorá-lo e, contra tudo e contra todos, vai tentar impor esta execrável Lei das
Finanças Locais?
A Associação Nacional de Municípios Portugueses desafiou o Governo a tornar públicos os estudos e
ensaios efetuados relativos à aplicação desta proposta de lei aos 308 municípios.
Sr. Ministro, vai aceitar este desafio? Vai divulgar estes estudos ou vai, pelo contrário, sonegá-los,
tentando, mais uma vez, vender gato por lebre?
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Mota
Andrade.
O Sr. Mota Andrade (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, sejamos claros: não são as autarquias que são
as responsáveis pelo défice público.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — São vocês!
O Sr. Mota Andrade (PS): — O Sr. Ministro disse há pouco que era necessário poupar e corrigir as contas
públicas.
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Estamos inteiramente de acordo, mas tem de ser dito de forma muito clara que não são as autarquias que
são responsáveis pela derrapagem que existiu em 2012 no défice público. Em 2012, as autarquias tiveram um
saldo positivo de cerca de 600 milhões de euros, contribuindo, assim, para a diminuição do défice das contas
públicas.
Sr. Ministro, na proposta que hoje nos é presente, sobre a compensação de cortes de muitos milhões de
euros de transferências do poder central para a administração local, o Governo responde dizendo que há uma
compensação desses cortes com o aumento do IMI.
Ora bem, é para nós fundamental que nos sejam fornecidos os modelos de simulação, município a
município, em que o Governo se apoiou para tomar esta decisão.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Mota Andrade (PS): — Todos sabemos que o aumento do IMI vai causar enormes problemas à
economia local, porque é dinheiro que sai dos contribuintes, das pessoas, que vivem nos diferentes
municípios. E há municípios com grandes debilidades, nomeadamente os municípios do interior.
Aplausos do PS.
Portanto, esse modelo, essa simulação terá de nos ser facultada.
Mas queria ainda colocar-lhe uma outra pergunta, Sr. Ministro.
A maioria decidiu concretizar aquilo a que chamou uma reorganização administrativa do território e uma
das razões que invocou foi a de «dar escala» e mais meios para as freguesias poderem responder ao anseio
das pessoas.
Ora, o que constatamos é que houve um corte significativo, de cerca de 20%, nas receitas das freguesias,
de cerca de 40 milhões de euros.
Explique-me, Sr. Ministro, a contradição entre os argumentos apresentados e este corte que é feito nas
finanças das freguesias.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Honório
Novo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, o senhor não traz aqui uma proposta de lei de
finanças regionais; o senhor traz aqui aquilo que pode ser considerado um verdadeiro plágio, um plágio da Lei
n.º 1/2007, um plágio da lei apresentada aqui por José Sócrates e Teixeira dos Santos e aprovada contra a
vontade do PSD, do CDS, do PCP, do BE e de Os Verdes.
Naturalmente que o senhor acrescentou-lhe uns pozinhos, uns pozinhos decorrentes do novo tratado
orçamental, em primeira linha, e uns pozinhos decorrentes da aprovação e da subscrição pelos três partidos
que subscreveram o chamado Memorando da troica, em segunda linha.
Aliás, é por isso que temos uma norma que altera as condições de fixação das taxas do IRS e do IVA,
limitando-as a 20% nas regiões autónomas em vez dos 30% das leis anteriores, mas esse é um aspeto que
está no Memorando da troica e é da responsabilidade do PS, do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Ministro, vou dar-lhe três exemplos daquilo que é um verdadeiro plágio
em termos financeiros da lei Sócrates.
Primeiro exemplo: as garantias do Estado e as possibilidades de o Estado assumir responsabilidades por
obrigações das regiões autónomas.
Havia uma disposição na lei de 2010 e o senhor elimina-a e passa a adotar a Lei n.º 1/2007, isto é, proíbe
essa assunção de responsabilidades.
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Segundo exemplo: a evolução de transferências orçamentais para as regiões autónomas.
Em 2010, fixava-se um valor mínimo para a evolução dessas transferências, ou, melhor, no limite dizia-se
que seria igual à transferência do ano anterior. O que é que os senhores fazem? Adotam a solução de 2007,
do Governo Sócrates, solução essa que, inclusivamente, admite que as transferências possam evoluir
negativamente de ano para ano.
Terceiro exemplo: o valor das transferências ao abrigo do Fundo de Coesão.
Os senhores recuperam, parcela por parcela, sem tirar nem pôr, tudo o que o Governo Sócrates, em 2007,
impôs às regiões autónomas. Tudo!
Portanto, a pergunta é esta, Sr. Ministro: por que é que o Governo PSD/CDS plagia o Governo Sócrates?
Por que é que este Governo despreza completamente e espezinha a vontade da maioria do PSD e do CDS
que, em conjunto com o PCP, com o Bloco de Esquerda e com Os Verdes, aprovaram a Lei n.º 1/2010? Por
que é que o senhor não recupera essa lei? A não ser — e eu só ponho uma hipótese e não sei se quer
responder a ela — que o senhor esteja apostado em que Alberto João jardim se demita, como fez em 2007, e
provoque novas eleições antecipadas. É isso que o senhor quer?
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge
Paulo Oliveira.
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, o PSD sempre defendeu,
defende e continuará a defender o aperfeiçoamento contínuo das autonomias, não porque temamos ou
receemos qualquer desagregação do País, mas porque entendemos que esta é a melhor forma de enfrentar
as dificuldades da insularidade.
Mas o PSD também sempre defendeu e continuará a defender que o Estado deve honrar os seus
compromissos, independentemente do Governo que assumiu esses compromissos, em nome de Portugal.
Ora, a materialização destas duas posições políticas, de forma isolada ou conjugada, motivam a colocação
ao Sr. Ministro de três questões muito simples em torno da lei das finanças regionais.
Primeira pergunta: a redução do diferencial fiscal entre as regiões autónomas e o continente, nos exatos
termos em que está prevista na proposta de lei — uma das inovações introduzidas, como é, naturalmente, do
vosso conhecimento —, é ou não a tradução prática do que consta do Programa de Assistência Económica e
Financeira a Portugal, na sua versão inicial?
Segunda questão: está o Governo disponível para dialogar sobre eventuais alterações à sua proposta,
sempre que as mesmas não contendam com disposições constantes do Memorando de Entendimento?
Para finalizar, uma terceira questão, Sr. Ministro: entende o Governo que a defesa das autonomias deveria
plasmar, ao nível da lei das finanças regionais, uma diferenciação entre a Região Autónoma dos Açores e a
Região Autónoma da Madeira, como defende o Secretário-Geral do Partido Socialista, António José Seguro?
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, em conjunto, aos pedidos de esclarecimento que
lhe foram colocados, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, há uma
questão prévia que quero deixar e que responde a todas as questões que foram colocadas: a vontade do
Governo, objetivamente, é a de que esta Lei das Finanças Locais (e a lei das finanças regionais, mas a Lei
das Finanças Locais em particular) não seja uma lei para ser aprovada e para o Orçamento vir suspender,
como tem acontecido, ano após ano, Orçamento após Orçamento. Apresentámos uma Lei das Finanças
Locais adequada à realidade.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — À realidade não!
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O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Ao Orçamento!
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — Segunda questão: estamos abertos, e já o
dissemos, a sugestões, a propostas que permitam valorizar e enriquecer ambas as propostas de lei. Isto,
respondendo, desde já, a uma questão colocada por um dos Deputados da maioria. Naturalmente que
estamos abertos, até porque — e já o disse — o gestor tem uma função de acompanhamento, na Lei das
Finanças Locais, e não uma função de fiscalização de todo o processo. Esta função de fiscalização vai
competir, naturalmente, ao futuro fundo de apoio e, portanto, esta é uma proposta que virá dos partidos da
maioria e que o Governo acolherá, com a consciência de que valoriza este modelo.
Sr. Deputado Pedro Mota Soares,…
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Esse é o seu colega de Governo!
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — Peço desculpa, Sr. Deputado Pedro Filipe
Soares, mas também não lhe ficaria mal ser Pedro Mota Soares. Significava que teria uma sensibilidade social
mais acentuada do que aquela que tem.
Aplausos do PSD.
Protestos do BE.
Deixe-me dizer-lhe, Sr. Deputado, que não há nenhum sufoco. Esta é a última peça para que todo o
modelo de construção do poder local, em Portugal, esteja preparado para os desafios que vai ter pela frente
nas próximas décadas.
Este ano, o poder local foi capaz de diminuir a dívida e foi capaz de ter um superavit — há pouco foi aqui
referido como sendo de 500 milhões, mas não, foi um superavit de execução de 740 milhões —, sem que isso
tenha posto em causa a qualidade do serviço público prestado pelo poder local. O que se passou a ter foi
maior eficiência, maior responsabilização na gestão da coisa pública.
Portanto, há aqui um princípio de assumir responsabilidades por parte do poder local.
Há pouco, foi-me colocada uma questão no sentido de saber se era justo que os municípios contribuíssem
para um fundo. Devo dizer o seguinte: o que perguntarão os alemães ou os finlandeses, no contexto da União
Europeia? Claro que sim, isso será remunerado! Os municípios contribuirão para esse fundo, até porque,
como sabe, no Memorando de Entendimento a receita que provinha da avaliação do IMI já era uma receita
que deveria ser destinada à administração central.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Belo exemplo!…
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — Quem é que assinou? Não fui eu, foi o
Governo do Partido Socialista.
O Sr. Deputado Mota Andrade, quando aqui colocou essa questão, esqueceu-se, mas nós retirámos esse
princípio, pois conseguimos negociar com a troica que as verbas decorrentes da avaliação do IMI deveriam ser
destinadas à administração local, com o objetivo de diminuir a dívida e contribuir, assim, para a diminuição do
défice. Ou seja, aquilo que estava negociado no Memorando de Entendimento como sendo uma verba para a
administração central, conseguimos que se mantivesse dentro da administração local…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Beneficiar a banca!
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — Não, beneficiar a banca, Sr. Deputado…
Vamos ver se o Sr. Deputado será presidente de câmara, pois terá oportunidade de responder ao seu colega
Paulo Sá e de lhe dizer que esta lei não é «execrável», que, aliás, é um termo político desadequado. Se tiver
sucesso na sua candidatura, terá oportunidade de lhe demonstrar…
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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Demonstro-lhe a si!
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — … que esta lei é o perfeito instrumento para
um autarca que quer gerir o seu município com eficiência, com seriedade e com qualidade.
Sr. Deputado José Luís Ferreira, vamos ver se nos entendemos: esta lei é muito clara, as freguesias saem
reforçadas. E digo o mesmo ao Sr. Deputado Mota Andrade. É que as freguesias passam a ter o IVA, passam
a ter o IMI, passam a ter acesso à receita de IMI dos prédios rústicos e passam também a ter 1% da verba
total dos prédios urbanos. Considera que isto é pouco? Não lhe parece que é uma alteração? Não lhe parece
que é uma valorização das freguesias? Não lhe parece que é um novo instrumento?
Deixe-me, aliás, dizer-lhe que, ainda ontem, tive oportunidade de, conjuntamente com a Sr.ª Secretária de
Estado, receber a ANAFRE e uma das questões que me foi colocada foi esta: «Sr. Ministro, agora que o
debate vai para o Parlamento, espero que o Governo defenda estas verbas para as freguesias. Não permita
que partidos centralistas, que são, enfim,…»
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — PS e PSD!
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — «… aqueles que têm as freguesias no
discurso, mas que, na prática, têm os hábitos que sabemos…» É que sabemos que muitas das câmaras que
são geridas pelo Partido Socialista e pelo Partido Comunista não descentralizam para as freguesias.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Falso!
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — Gostam das freguesias no discurso, mas não
gostam na prática! Essa é uma grande diferença!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Tem de estudar mais, Sr. Ministro, senão corre o risco de errar no que diz!
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — Em relação às questões colocadas pelo Sr.
Deputado Carlos Abreu Amorim, já tive oportunidade de responder que o Governo está aberto a boas
propostas, a propostas construtivas, quer venham da maioria, quer venham da oposição, o que nem sempre é
possível.
Sr. Deputado Paulo Sá, já tive oportunidade de dizer que isto não é um saque fiscal. Vejo que o Sr.
Deputado defende o IMT, mas temos de nos entender! E o Sr. Deputado Mota Andrade, pelo que vejo,
também defende o IMT — «o imposto mais estúpido do mundo», como disse, à época, um Primeiro-Ministro
socialista, o Eng.º António Guterres.
A verdade é que nós, com a compensação que os municípios vão ter, resultante da avaliação do IMI,
extinguimos o IMT em 2016.
Sr. Deputado Mota Andrade, sabe a estima pessoal que tenho por si. Pois a minha discordância é
proporcional à estima pessoal que tenho por si. Deixe-me dizer-lhe que o que é espantoso é que o Sr.
Deputado estava aí, nessa bancada, a aplaudir, quando o Governo do seu partido assinou o Memorando de
Entendimento, onde se encontravam premissas que alterámos agora, em relação à Lei das Finanças Locais e
à Lei das Finanças das Regiões Autónomas, como já tive oportunidade de dizer. Para quem é que ia o IMI? A
receita resultante da avaliação do IMI ia para a administração central. Nós dissemos: «Não, vai para um fundo
municipal remunerado, que vai permitir que o poder local possa responder a situações delicadas que já hoje
encontramos e que continuaremos a encontrar no futuro».
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Deputado Honório Novo, quem acolhe as
propostas do Eng.º José Sócrates não somos nós, como tem sido bem visível, deixe isso para outros. Não
somos nós que as acolhemos.
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O Sr. Honório Novo (PCP): — São vocês, são!
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — Se o Sr. Presidente permitir, quero pedir ao
Sr. Secretário de Estado do Orçamento que responda a duas questões sobre a lei das finanças regionais.
Se ainda houver tempo, agradeço.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Não me parece que haja inconveniente, mas não sei.
Se as pessoas que fizeram as perguntas entenderem que podem ser esclarecidas…
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Luís Morais Sarmento): — Sr. Presidente, Srs. Deputados,
relativamente às questões colocadas pelo Sr. Deputado Honório Novo, quanto às garantias de Estado, quero
referir que o princípio que queremos afirmar na lei é o que está previsto no pacto orçamental e também na
proposta de lei, entregue a esta Assembleia da República, relativa à lei de enquadramento orçamental, isto é,
que cada entidade é responsável pelas suas obrigações e que, nos casos previstos na lei, o Estado pode, de
facto, substituir-se. Não sei se poderá ser dito de outra forma, mas o Governo, como o Sr. Ministro já aqui
referiu, está aberto a alterações ao texto da lei, para que o mesmo possa ser melhorado.
Os princípios que queremos afirmar relativamente a esta matéria são o da responsabilidade de cada um
dos níveis da administração e também o de que, nos casos previstos na lei, mas apenas nesses casos, essa
responsabilidade possa ser partilhada com o Estado.
Relativamente à questão das transferências, é verdade que esta lei torna as transferências compatíveis
com a situação atual do País. Nem podia ser de outra forma, porque não podemos prometer transferências
que não podemos efetuar. Portanto, temos de compatibilizar as transferências com a necessidade de
consolidação orçamental do conjunto das administrações públicas, como, aliás, também já foi referido pelo Sr.
Ministro na sua intervenção.
Quanto à questão do diferencial fiscal, é uma questão que está prevista no Memorando de Entendimento, e
julgo que desde o início do Memorando. É algo que decorre da assinatura do Memorando e, portanto, não
podemos iludir esta questão.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para apresentar o projeto de lei do Bloco de Esquerda, tem, agora,
a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: Antes de
mais, Sr. Ministro Miguel Relvas, permita-me só uma pequena observação. Mais uma vez, o Sr. Ministro
apresenta uma proposta de lei na área do poder local e consegue atingir a unanimidade, Sr. Ministro, só que é
a unanimidade nas críticas e na sua liminar rejeição.
O Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares: — Não se preocupe!
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Isto começa a ser uma proeza na área do poder local, Sr. Ministro!
Vozes do BE: — Muito bem!
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Mas, Sr.as
e Srs. Deputados, o Bloco de Esquerda quer contribuir para este
debate e, por isso, apresentámos um projeto de lei em que propomos, muito sinteticamente, a criação de um
fundo de incentivo ao desenvolvimento sustentável, ao contrário do fundo intermunicipal, e exclusivamente
intermunicipal, apresentado pelo Governo, onde avançamos novos critérios para a atual fórmula de
distribuição territorial da derrama e a introdução da progressividade fiscal nas regras de participação fixa dos
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municípios no IRS. Pensamos que é um caminho completamente diferente daquele que o Governo apresenta
na sua proposta de lei e que merecia ser debatido em profundidade por esta Assembleia da República.
Mas, a propósito disso, e antes de terminar, penso que, nas próximas intervenções, o Governo terá
oportunidade de esclarecer todas as bancadas sobre o mistério do IMI, pois o Sr. Ministro não respondeu. Há
aqui um mistério, ao nível do IMI: o Governo diz que o corte de todas as transferências para as autarquias é
baseado no aumento do IMI, mas ninguém percebe como é que esse aumento vai surgir. Se têm projeções,
Sr. Ministro, mostre-as à Assembleia, porque isso diverge, e muito, daquilo que já sabemos, da parte da
Associação Nacional de Municípios Portugueses. Ou vamos sair daqui com o tabu do IMI por esclarecer, Sr.
Ministro?
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Leitão
Amaro.
O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo:
Discutimos hoje mais uma peça na profunda e estrutural reforma da administração local portuguesa.
Este Governo e este Ministro já apresentaram a reorganização administrativa territorial autárquica, a lei de
racionalização das empresas municipais, a lei de diminuição dos dirigentes autárquicos, a lei dos
compromissos, o programa de apoio à economia local, a lei de atribuições e competências das autarquias e,
agora, hoje, esta última peça, que é a proposta de Lei das Finanças Locais. Trata-se de uma reforma profunda
pela qual o Sr. Ministro e o seu Governo estão de parabéns, pela coragem, pela ambição e pela visão.
Se há área da governação onde reformas são feitas com visão, com profundidade e com coragem, a do
poder local é uma, e o Sr. Ministro está de parabéns.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Mas, porque esta é uma reforma com visão, já está a produzir
resultados: as autarquias portuguesas continuam a prestar os seus serviços, continuam a prestá-los com
qualidade, e os resultados na poupança financeira já se sentem.
Risos de Deputados do PS.
No ano de 2012, houve um superavit de cerca de 300 milhões de euros — poupança dos contribuintes,
poupança para os contribuintes, causada pelas propostas e pelas leis do Governo, mas também por um
esforço muito meritório dos autarcas portugueses, que muitos teimam em não querer ver, que muitos não
querem reconhecer, mas os portugueses sabem-no e reconhecem essa poupança.
Hoje, temos essa última peça, a que vai trazer essa reorganização estrutural no plano financeiro. Esta é
uma reforma para os tempos em que vivemos, para a realidade que temos, e essa realidade exige-nos uma
reforma que tem quatro marcas fundamentais.
Primeira marca, imprescindível: rigor, equilíbrio e transparência nas contas públicas, coisa que alguns não
querem e não conhecem. Mas esta é a marca do Governo.
Segunda marca: menos dependência das autarquias de receitas relativamente ao imobiliário. E essa
menos dependência vem acompanhada, como o Sr. Ministro disse, de um corte nos impostos. Estranhamos
os partidos da oposição, que não gostam de impostos nas palavras, mas aqui querem ser contra a abolição do
IMT. Não compreendemos!
Terceira marca: um fortalecimento da proximidade, um fortalecimento das freguesias, através do reforço
financeiro. Os senhores, que criticaram, o que dizem agora? Fortalecemos os meios financeiros das
freguesias, mas também fortalecemos a colaboração intermunicipal, porque a escala é importante. Se todos
dizemos isso, porque não estamos de acordo com este fortalecimento financeiro das entidades
intermunicipais?
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Finalmente, porque o desenvolvimento económico é importante, esta reforma cria um mecanismo
financeiro que incentiva à colaboração das autarquias e as premeia quando conseguem, quando têm um
resultado de aumento do desenvolvimento na sua área de influência.
Portanto, é uma reforma que traz rigor nas contas públicas, aumenta e fortalece a proximidade, promove a
colaboração entre municípios e promove, incentiva e premeia o desenvolvimento económico.
São várias as mudanças, também essas importantíssimas, que trazem mais transparência, por revelação,
designadamente das contas: a existência de um auditor externo; as obrigações de revelação da parte do IRS
na liquidação de imposto dos contribuintes; as obrigações de envolver todas as entidades participadas no
perímetro de consolidação; um mecanismo mais sério, mais forte, de controlo daqueles casos de desequilíbrio.
Porque, sim, precisamos de cuidar daqueles casos, dos maus casos (que não são a maioria, mas que são
alguns) de desequilíbrio nas contas municipais. E esta lei resolve o que a anterior não resolvia, com
mecanismos muito mais sérios e rigorosos.
Em suma, com esta lei, os portugueses poderão confiar ainda mais nas autarquias e na sua gestão
financeira. Os autarcas portugueses já são heróis do serviço público e esta lei, que sem dúvida é exigente, vai
tornar esse heroísmo ainda mais claro.
Com esta lei, ficará ainda mais claro, mais transparente e mais seguro que as autarquias são agentes
essenciais do serviço público e que desenvolverão, todas elas e cada vez mais, o seu papel no máximo
respeito pelos recursos públicos que os portugueses lhes confiaram.
Sr. Ministro, está de parabéns por mais este esforço reformista.
No Parlamento, apreciaremos e melhoraremos esta lei.
Convidamos todos os grupos parlamentares a juntarem-se a nós, ao Governo, neste esforço reformista, de
rigor nas contas públicas, de aposta na proximidade, de aposta na colaboração municipal.
Sr. Presidente, Sr.as
Deputadas e Srs. Deputados: Onde é que ficam VV. Ex.as
no intuito de reformar o
País? Onde ficam VV. Ex.as
no intuito de melhorar o poder local?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mota Andrade,
do PS.
O Sr. Mota Andrade (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: O Sr.
Ministro não respondeu às minhas perguntas, desde logo não disse se vai facultar à Assembleia da República
os modelos de simulação, município a município, em que se baseou para atribuir e para anunciar
determinados valores de IMI.
Mais: não disse se nos vai facultar o relatório da Autoridade Tributária sobre esta matéria. Ora, isso, para
nós, é fundamental, em nome da transparência.
O Sr. Ministro também não respondeu à questão de as freguesias perderem 40 milhões de euros, 20% em
relação ao passado. Isto também são factos.
Deixe que lhe diga que a proposta que hoje aqui apreciamos em nada contribui para reduzir ou apaziguar o
clima de instabilidade e de latente conflito social com que os portugueses se veem confrontados diariamente.
Mais uma vez, o Governo elaborou uma proposta de lei sem ouvir ninguém.
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Muito bem!
O Sr. Mota Andrade (PS): — Muito menos procurou encontrar, junto dos autarcas espalhados pelo País ou
junto das suas associações representativas, o necessário consenso, tão profundamente invocado no dito
documento Verde.
Em conjunto, encontraria, seguramente, outras soluções, que não as que estão hoje aqui para o poder
local. E essa reforma do poder local, que o PS sempre considerou necessária — quero aqui sublinhar que o
Secretário-Geral do PS, em julho de 2011, disse que estava disponível para fazer esta reforma —, não foi
dotada de instrumentos para responderem aos novos desafios que são precisos e que estão colocados, hoje,
às autarquias. Não, esta tem sido uma reforma solta e feita à la carte.
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Aliás, Sr. Ministro, sobre a reforma, lembro aqui a presença do Sr. Presidente da Associação Nacional de
Municípios Portugueses, pessoa insuspeita, como militante do seu partido, que na última reunião da Comissão
de Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local disse, preto no branco, que toda esta reforma — como
sempre o Partido Socialista disse — devia ter começado por uma nova lei eleitoral autárquica.
Aplausos do PS.
Nova lei eleitoral autárquica essa que, dado os senhores não se entenderem com o CDS, não se
entenderem na maioria, nem sequer equacionam.
Mas deixe-me dizer o seguinte, Sr. Ministro: esta surdez incompreensível da maioria, confrontada com as
consequências decorrentes de uma reforma feita a régua e esquadro contra o poder local e contra a sua
autonomia, tem consequências.
Esta lei de financiamento do poder local, como nos é apresentada, constitui mais um erro, um erro que será
suportado, em primeiras linhas, pelos eleitos, mas que terá efeitos implacáveis para cada um dos portugueses
que se verão privados de poderem aceder a apoios que têm sido assegurados pelos municípios e pelas
freguesias, tantas vezes colmatando a ausência do Estado.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Mota Andrade (PS): — Esta situação aumentou, aliás, significativamente, fruto da atual situação que
o País vive.
Sr. Ministro, queremos uma verdadeira reforma do poder local. Essa reforma, como já vimos, não vai
passar de uma reforma pífia. Mas o Partido Socialista tem sentido de Estado e de responsabilidade. Por isso,
na sede própria, em Comissão, em sede de especialidade, iremos apresentar propostas sérias para que esta
lei — que é uma má lei, desde já aqui o afirmo — possa ser melhorada.
Oxalá a maioria tenha também sentido de Estado e aceite essa melhoria das propostas, para bem do poder
local e dos portugueses.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João
Gonçalves Pereira, do CDS-PP.
O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro e demais membros do Governo,
Sr.as
e Srs. Deputados: A minha primeira palavra vai para o Partido Socialista. Confesso que é com grande
espanto que a última Lei das Finanças Locais, que foi feita por um governante do Partido Socialista, o Dr.
António Costa, não mereça aqui, nesta Câmara, um único elogio por parte dessa bancada.
Calculo que no tal «documento de Coimbra» do Partido Socialista se tem de defender um anterior
governante, o Dr. António Costa, que se esqueceu de fazer referência a ele próprio.
Risos de Deputados do CDS-PP.
O Governo traz aqui hoje um novo regime financeiro das autarquias locais. Este novo regime surge no
quadro do ponto 3.14 do Memorando, assinado pelo Partido Socialista — muitas vezes (é bom recordar) o
Partido Socialista esquece-se de que assinou esse mesmo Memorando.
Este novo regime das autarquias locais foi também enquadrado na proposta de Programa do Governo.
Esta proposta de lei surge no quadro de um conjunto de novos diplomas do Governo: a lei dos compromissos
e pagamentos em atraso, o novo programa de apoio à economia local, a reforma administrativa do território, a
reforma do setor empresarial local, que irá levar à extinção de múltiplas empresas municipais, a extinção dos
governos civis, a proposta de lei de atribuições e competências, que está neste momento em discussão na
especialidade aqui na Assembleia da República, e agora a nova Lei das Finanças Locais.
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Esta nova Lei das Finanças Locais é uma lei de rigor, de exigência e de transparência. E tem dois grandes
objetivos: a sustentabilidade económica e financeira das autarquias e a exigência de governar com
responsabilidade.
O Governo apresenta aqui um novo modelo de gestão de financiamento e de transferência de recursos, um
modelo que exige controlo e gestão orçamental, um modelo que reforça os mecanismos de recuperação
financeira e um modelo que reitera o compromisso de cumprir os défices e as dívidas da administração local.
Estamos perante uma lei que regula o endividamento das autarquias locais e que regula a repartição de
recursos públicos entre o Estado e essas mesmas autarquias locais. Esta não é uma lei contra os municípios.
O País tem hoje bons exemplos de governação autárquica. Permitam-me que cite aqui o caso da Câmara
Municipal de Ponte de Lima.
Risos do PS e do PCP.
Esse é um excelente exemplo de uma boa gestão autárquica. Se todos os municípios do País fossem
governados como Ponte de Lima não estaríamos, seguramente, a fazer a maior parte das reformas que
estamos a fazer.
Sr.as
e Srs. Deputados, o tempo de fazer rotundas, o tempo de fazer estradas, de construir piscinas,
pavilhões ou fontanários não pode continuar. Estas obras de grande volume financeiro e de utilidade duvidosa
transferem um ónus insuportável para as futuras gerações. Isto não pode continuar.
Não se trata, aqui e apenas, de satisfazer compromissos internacionais. Trata-se de redefinir um novo
modelo de governação local. Esta é uma reforma que não visa interesses partidários, é uma reforma que não
visa interesses de esta ou daquela autarquia, visa apenas, e tão-só, melhorar o serviço das populações.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Santos
Silva, do PSD.
O Sr. Carlos Santos Silva (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares,
Sr.ª e Sr. Secretários de Estado, Sr.as
e Srs. Deputados: A autonomia regional é, hoje, um tema central do
sistema político e da nossa vivência coletiva. É uma questão absolutamente preponderante nas sociedades
contemporâneas.
Recordo que a autonomia regional é uma das mais vibrantes e sólidas conquistas da nossa democracia.
Sr.as
e Srs. Deputados, é verdade que a autonomia regional é uma realidade política, um mecanismo
concreto e uma instituição consagrada pela Lei Fundamental. Não é menos verdade que, numa sociedade
democrática, a dignidade e a realização pessoal da comunidade, da autarquia, da região e do Estado-nação
são valores reais e de crescente atualidade.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Carlos Santos Silva (PSD): — É necessário que se perceba, de uma vez por todas, que a
autonomia regional não é uma matéria que diga exclusivamente respeito aos Açores e à Madeira, mas sim a
todos os cidadãos e a todo o País.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Carlos Santos Silva (PSD): — É bom que se perceba, de uma vez por todas, que a questão da
autonomia, mesmo nos Açores e na Madeira, não se resume às estruturas do governo regional ou do
parlamento regional, mas continua, até, junto dos cidadãos, dos municípios, das instituições e das empresas.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Para «rapar» o dinheiro às autarquias!
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O Sr. Carlos Santos Silva (PSD): — A autonomia regional é uma mais-valia para o nosso País, e é, sem
dúvida, uma vantagem em relação a diversas soluções que foram encontradas pelos nossos parceiros
europeus para situações que configuram alguma semelhança. Diria, mesmo, que a autonomia regional é um
dos principais instrumentos da coesão social e territorial de que dispõe a República Portuguesa.
Este património histórico não é propriedade de ninguém mas, sim, o reflexo de um amplo consenso
nacional. Foi assim no passado, queremos que assim seja no futuro.
Sr.as
e Srs. Deputados, decorre da autonomia regional e dos estatutos político-administrativos a existência
de mecanismos que regulam as matérias financeiras das regiões. É nesse contexto que a proposta de lei de
finanças regionais se reveste de uma elevada importância no panorama da atual política económico-financeira
do País.
Esta lei decorre, desde logo, do compromisso assumido pelo Governo do Partido Socialista no âmbito do
Programa de Assistência Económica e Financeira a Portugal. Já nesse momento, o Estado português lavrou o
compromisso de retificar a lei das finanças regionais até finais de 2012 para, em articulação com a lei de
enquadramento orçamental, adaptar à arquitetura jurídica interna as regras e procedimentos orçamentais
constantes do Tratado da União Europeia. Naturalmente que o atual Governo se comprometeu a honrar a
palavra que foi dada pelo anterior executivo e que vincula o Estado português.
Sr.as
e Srs. Deputados, é com base neste enquadramento de respeito pelos acordos feitos com a troica,
num contexto de grande exigência, que o esforço na consolidação orçamental tem sido, e deve ser, pedido a
todos e partilhado por todos, incluindo os diversos níveis da administração pública central, regional e local.
Ora, é isso que, antes de mais, está hoje em debate.
Trata-se de aprovar uma lei que permita criar condições sustentáveis de estabilidade orçamental e que
assente numa autonomia que seja, ela própria, responsável por um esforço que é nacional.
Devo salientar que aspetos centrais da autonomia continuam vertidos no diploma quanto a matérias que se
relacionam com as receitas regionais, nomeadamente o princípio de que as receitas cobradas na região são
receitas da região.
Com vista a reforçar o princípio da estabilidade orçamental, procedem-se a alterações significativas em
matéria de dívida.
É muito importante esta atualização da lei, na medida em que a mesma reflete não só a realidade em que
se processa atualmente o financiamento das regiões autónomas mas também o quadro em que hoje se
assumem os compromissos orçamentais de Portugal no seio da União Europeia. Neste contexto, o Governo
consagrou na lei a regra de que o endividamento público regional tem de se orientar precisamente pelos
mesmos princípios estratégicos a que está sujeito o endividamento do Estado.
Sr.as
e Srs. Deputados, esta lei é também um contributo para a devolução às finanças públicas de duas
características fundamentais que importa preservar e cultivar: a credibilidade e o rigor.
A credibilização e responsabilização da autonomia financeira das regiões autónomas é um vetor essencial
para o sucesso da própria credibilização do Estado português. Esta lei mais não faz do que colocar as regiões
autónomas como entidades participantes do esforço que o Estado tem vindo a pedir a todos os portugueses.
A autonomia regional pode, e deve, ser defendida, e esta lei, não tenhamos dúvidas, não viola, antes
reforça, o núcleo essencial da autonomia, porque vem dar substância a essa mesma autonomia.
Sr.as
e Srs. Deputados, por tudo o que expus, fica patente que vivemos novos tempos, uma realidade
macroeconómica difícil e não desejada. São estas especiais circunstâncias que deveriam impedir quaisquer
tentativas de paralelismo com os tempos vivenciados em 2007 ou 2010,…
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Muito bem!
O Sr. Carlos Santos Silva (PSD): — … datas de apresentação da lei de finanças regionais em vigor e a
sua posterior alteração, que levaram à evolução do PSD nesta matéria.
Apelamos a todas as forças políticas, e muito em especial ao Partido Socialista, para que o seu sentido de
Estado e a defesa dos interesses da República, neste contexto tao penalizador para a vida de todos os
portugueses, se sobreponham a todas e quaisquer considerações de ordem partidária.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: É muito
sintomático que, neste debate, o Governo e a maioria tenham pretendido amalgamar as matérias das finanças
locais e das finanças das regiões autónomas. São questões institucionalmente distintas, mas para o Governo
é tudo o mesmo.
Trata-se de impor o centralismo como política do Estado, trata-se de esmagar a autonomia financeira das
autarquias locais e das regiões autónomas.
É tudo muito claro: de um lado estão o Governo e a troica, do outro lado estão as regiões, as autarquias e
as populações;…
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. António Filipe (PCP): — … de um lado está a recessão forçada e o objetivo de redução do défice
custe o que custar, do outro lado estão os objetivos de desenvolvimento equilibrado do País e as
preocupações com o bem-estar social; de um lado estão a troica e o Governo, do outro lado estão o povo e o
País.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. António Filipe (PCP): — A proposta de lei das finanças locais assume, sem mais, o propósito da
total liquidação da autonomia financeira das autarquias locais. É uma proposta contra as populações, contra o
poder local, de negação do direito ao desenvolvimento local, amarrada aos objetivos do pacto de agressão da
troica de empobrecimento do País e de ruína dos portugueses, em total desprezo para com as necessidades
do povo e do seu direito ao bem-estar, de abandono e de condenação de vastos territórios e regiões do País
ao atraso e ao subdesenvolvimento, dirigida ao duplo objetivo de impor a asfixia financeira e de
institucionalizar uma ilegítima ingerência na autonomia local por via de uma efetiva tutela de mérito e
integrativa.
É cinicamente apresentada como destinada a acabar com a dependência do imobiliário mas consagra, de
facto, como réstia de sobrevivência, uma arquitetura financeira que terá no imobiliário a principal fonte de
receita.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É evidente!
O Sr. António Filipe (PCP): — É concebida para prolongar à força, no plano local, o saco fiscal e tarifário e
a redução abrupta da prestação e serviços e funções públicas, integrando um volume de transferências que
corresponderá a um corte de um quarto do seu montante, mais de 500 milhões de euros, e à sua fixação em
valor inferior ao de 2007, assumindo arbitrariamente o princípio de que a lei tem o valor que a cada momento
os governos entenderem e que é para ser cumprido, ou não, segundo esse entendimento.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — Articulada com outros instrumentos de liquidação do poder local (proposta
de lei de atribuições e competências, liquidação de freguesias, lei dos compromissos, Orçamento do Estado e
leis de execução orçamental, legislação sobre pessoal dirigente e setor empresarial local), a proposta de lei
das finanças locais constitui mais um passo qualitativo nesse percurso.
Em termos financeiros, a proposta reduz drasticamente a participação dos municípios e das freguesias na
partilha de recursos públicos e, ao afetar o acréscimo da cobrança do IMI decidido pelo Governo no processo
de reavaliação predial (que constitui um saque fiscal ainda de consequências imprevisíveis) não para os
municípios (nem sequer consignadamente para consolidação orçamental, como até agora já abusivamente
estava previsto) mas, sim, para criar um fundo de apoio de resgate dos municípios em insolvência, o Governo
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não só atira os municípios para a falência como põe os que ainda não estão falidos a pagar o resgate dos que
já faliram.
No plano das finanças das regiões autónomas, o que o Governo PSD/CDS propõe é o regresso à lei das
finanças regionais de 2007, do Governo Sócrates, cuja aprovação levou à demissão do Governo Regional da
Madeira e à convocação de eleições antecipadas nessa região,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Bem lembrado!
O Sr. António Filipe (PCP): — … e a revogação da lei das finanças regionais de 2010, que obteve um
amplo consenso nesta Assembleia, com a ativa participação dos partidos da atual maioria.
Estamos a assistir agora a um debate paradoxal: o PSD e o CDS a proporem uma lei igual à que tanto
criticaram e o PS a criticar o regresso à lei que em 2007 propôs e fez aprovar.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É espantoso!
O Sr. António Filipe (PCP): — A proposta do Governo sobre finanças regionais é parte integrante da
política de saque fiscal, de empobrecimento das populações, de comprometimento do direito ao
desenvolvimento e progresso regionais e de ataque à democracia.
Inscrita no pacto de agressão assinado em junho de 2011, e na linha do que o Governo do PS/Sócrates já
havia ensaiado com a lei de 2007, esta proposta de lei visa dar um novo e mais acentuado passo na redução
do volume de transferências para as regiões autónomas, nos mecanismos de ingerência e na limitação da
autonomia regional.
A Lei Orgânica n.º 1/2010, de 29 de março, atualmente em vigor, corrigiu em matérias significativas o que
de mais grave havia sido consagrado na Lei Orgânica n.º 1/2007, de 19 de fevereiro, tendo por isso contado
com o voto favorável do PCP.
Esta proposta de lei será um grande passo atrás nas relações entre o Estado e as regiões autónomas; um
grande passo atrás nas obrigações e princípios decorrentes do respeito pela autonomia regional; uma
grosseira violação dos estatutos político-administrativos; e um grande passo atrás no que dispõe sobre as
transferências financeiras, respetivos montantes e componentes de cálculo, e nas disposições em matéria
fiscal.
Termino, Sr. Presidente, dizendo que o PCP se opõe frontalmente a estas propostas de lei e que
empenhar-se-á, na especialidade, para que os seus aspetos mais negativos venham a ser alterados.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo
Rodrigues.
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.as
e Sr. Secretários de Estado, Sr.as
e
Srs. Deputados: Um primeiro esclarecimento é devido.
Sr. Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares, coube-lhe a si, como governante, a apresentação de
duas iniciativas legislativas da sua responsabilidade: uma diz respeito às finanças regionais; a outra diz
respeito às autarquias locais. Por força da orgânica do seu Governo, o senhor é o Ministro que tutela as
autarquias mas, quer queira quer não, não é o Ministro que tutela as autonomias, porque não o há neste
Governo, nunca houve em nenhum, nem nós o admitiremos!
Aplausos do PS.
Esse equívoco tem de ficar claro. Portanto, o senhor, de facto, é o Ministro que tutela as autarquias — daí
ter uma Secretária de Estado da Administração Local e Reforma Administrativa —, mas que o equívoco que
referi não se transforme numa realidade substancial. O facto de trazer a debate uma proposta de lei das
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finanças locais e uma proposta de lei das finanças das regiões autónomas é propício a essa confusão, mas
nós queríamos distinguir os planos, o que penso ser extensivo a todas as bancadas.
Vamos, então, ao que interessa, que é, na lei das finanças regionais — e o Sr. Secretário de Estado do
Orçamento está aqui presente —, o relacionamento financeiro entre as regiões autónomas e a República.
Antes de mais, devo dizer, com toda a clareza, que há sempre uma outra via. Não é a via do Partido
Comunista, que, como vimos, queria que continuasse o aval do Estado para obrigações da região, ou seja, as
regiões que façam dívidas que o Estado paga ou o Estado avaliza.
Vozes do PCP: — Não, não!
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Foi o que disse o Sr. Deputado Honório Novo, ou seja, que o Estado
devia sempre avalizar as dívidas da região. Mas não é isso que nós queremos.
Há sempre uma terceira via, uma via que deve ser de rigor, de credibilidade, de transparência e de
informação.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Haja seriedade!
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Por isso, é preciso dar às regiões autónomas o mesmo tratamento que
o País tem.
Se temos um compromisso internacional que diz que o nosso défice público não deve ser superior a 60%
do PIB, concordamos que estamos integrados num País que tem esse compromisso internacional. Se diz que
o défice deve ser inferior a 3%, o dos Açores, no ano passado, foi de 0,8% e o défice público foi de 18% do
PIB.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Da dívida pública!
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Da dívida pública, claro que sim! Agora aceito a correção.
Gostaria de dizer, com toda a clareza, que a proposta que aqui apresentam relativamente às finanças
regionais não merece o acordo das regiões autónomas. Os quatro pareceres, das assembleias legislativas e
dos governos regionais, são no sentido de não concordar com a iniciativa legislativa do Governo.
Há questões que são estruturais e que eu gostaria de realçar. Uma delas tem a ver com o relacionamento
financeiro.
Nesta proposta, o Governo diz que pretende reter 5% do IRS cobrado na região e dá-lo diretamente às
autarquias sediadas na região. Sr. Ministro, não vimos aqui exigir que dê aos Açores ou à Madeira 105% do
IRS, aquilo que vimos exigir com toda a determinação e clareza é que os 100%, sendo receita gerada na
região, são receita própria das regiões. E, sendo receita própria das regiões autónomas, compete a cada uma
das regiões autónomas saber o que faz com o seu orçamento. Não compete à República gerir os orçamentos
regionais.
Aplausos do PS.
Repito, Sr. Ministro, para que ouça bem, uma vez que o Sr. Secretário de Estado já deve ter percebido: não
exigimos 105% de IRS, nós queremos aquilo que é próprio das regiões autónomas, que são receitas próprias
— está na Constituição e nos estatutos político-administrativos. Portanto, 100% do IRS gerado nas regiões
autónomas é receita das regiões autónomas, pelo que os senhores não têm o direito de reter 5% para atribuir
a quem quer que seja. Esse mau precedente deve ser retirado da lei das finanças regionais porque os
senhores não devem ter, e nem têm, essa competência.
Sr. Ministro e Sr. Secretário de Estado, há, naturalmente, abertura do Partido Socialista para encontrarmos
as soluções mais adequadas. O Governo encontrará no Partido Socialista o mesmo partido responsável, quer
em 2007, quer em 2010, quer em 2013.
Somos favoráveis à máxima transparência no relacionamento financeiro entre as regiões e a República,
mas, Sr. Secretário de Estado, uma comissão de acompanhamento que tenha um número de presenças da
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República superior ao das regiões dá a ideia de uma certa tutela sobre as regiões, equívoco esse que também
pode ser dissipado. As comissões de acompanhamento do relacionamento financeiro devem ser paritárias, ou
seja, devem ser constituídas com o mesmo número de membros das Regiões Autónomas da Madeira e dos
Açores e da República. Parece-me ser adequado este princípio.
De resto, Sr. Secretário de Estado, devo dizer que o seu Ministério tem tido um trabalho aturado no sentido
de encontrar as melhores soluções. Nós compreendemos a conjuntura difícil que o País atravessa e, com toda
a sinceridade, também a compreendemos para as regiões autónomas. Todos temos de estar disponíveis para
fazer um esforço de solidariedade para ultrapassarmos estas questões. Todavia, há questões que são
estruturais e que constituem afrontamentos ao estatuto político-administrativo e à Constituição — e outras há
que têm a ver mais com a conjuntura.
Talvez seja adequado encontrar nesta iniciativa legislativa outras ideias, outras reformulações que, não nos
desviando dos princípios fundamentais que enformam e enquadram a conjuntura difícil que estamos a viver,
nos permitam fixar alternativas que justifiquem um bom relacionamento entre as regiões autónomas e a
República.
Era a primeira vez que as duas regiões autónomas estariam contra uma lei das finanças regionais. Esse
não deve ser o objetivo. Devemos trabalhar para encontrar as melhores soluções e o Sr. Secretário de Estado
encontrará no Partido Socialista o interlocutor necessário para as encontrar.
Uma nota final para dizer ao Sr. Deputado Carlos Santos Silva: bem-vindo à discussão das questões da
autonomia regional! É um bom interlocutor para as questões da autonomia regional, ficamos à espera das
propostas que possa apresentar-nos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe
Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs.
Deputados: O Sr. Ministro Miguel Relvas, na polivalência que lhe é reconhecida, veio hoje dar uma «perninha»
sobre as finanças locais e, também, as regionais, mas ficou «fora de pé» quando apresentou, como proposta
sua, a mesma proposta de lei de finanças regionais que, quando estava na oposição, disse que não queria
aceitar. Aliás, até é estranho que, no âmbito do espaço que apoia o Governo, os Deputados que não
aceitavam, em 2007, estas mesmas propostas agora estejam calados e digam que são as únicas necessárias
porque a troica assim as via. Ora, ainda não havia troica em 2007 e estas propostas já existiam!
Resgatadas, ressuscitadas aquelas que eram as políticas de Sócrates e de Teixeira dos Santos, parece
que as responsabilidades do Partido Socialista foram lavadas, limpas na atualidade e reapresentadas por
parte da maioria. Ora, engana-se a maioria, porque fica «fora de pé» naquela que é a visão do País.
A maioria olha para o País e não percebe que tem regiões autónomas, não percebe que tem autonomias e
que elas existem porque há necessidades específicas e tem de existir respeito pelas populações.
Os custos de insularidade são claros.
Por exemplo, na Região Autónoma dos Açores, os salários são, em média, inferiores em 89 € aos do
continente; a taxa de inflação é sempre, nos Açores e na Madeira, em média, 2% acima da do continente; e os
custos dos bens essenciais também se situam acima dos praticados no continente.
Esta realidade fez com que, na nossa construção do País, percebêssemos que deveria existir solidariedade
para com essas regiões e, por isso, criámos uma lei das finanças regionais, que estava agora a ser aplicada,
que corrigiu os erros de Sócrates e de Teixeira dos Santos e que reconhecia essa especificidade e essa
necessidade de solidariedade.
Vozes do BE: — Muito bem!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Mas o Governo dinamita tudo isto: o Governo dá o dito por não dito! O
PSD e o CDS esqueceram as suas propostas, esqueceram aquelas que foram as suas palavras e que agora
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são letra de lei e atiram para cima da troica, afinal, a sua própria responsabilidade, numa visão do País que
afronta as autonomias!
Vozes do BE: — É verdade!
Protestos do PSD.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Ora, esta responsabilidade é vossa, não é da troica e deve ser
assumida como tal aqui!
É uma escolha política que, pela nossa parte, criticamos, porque a ideia que está subjacente às políticas
das finanças do Governo é a de salve-se quem puder, a de cada um por si! A Madeira? Os Açores? Que
arranjem receitas próprias, não há aqui solidariedade! Ah, os salários são mais baixos lá? Temos pena,
desenrasquem-se! Os custos dos bens essenciais são mais altos lá? Temos pena, desenrasquem-se!
Ora, a política do «desenrasquem-se» mina a solidariedade que deveria existir.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Queira fazer o favor de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Termino já, Sr. Presidente.
E o mesmo se passa na Lei das Finanças Locais.
Diz-nos o Governo: nós vamos ao bolso dos portugueses porque vamos aumentar de forma brutal o IMI. E
faz-nos uma projeção em que esse aumento brutal será muito para além do que é aceitável e do que consta
da própria proposta do Governo. E acrescenta: nós vamos ao bolso dos portugueses, bem fundo no bolso dos
portugueses, para depois dar dinheiro às autarquias.
Ora, ficam os portugueses sem dinheiro e também as autarquias. Quem é que paga no meio disto tudo?
Pagam novamente as pessoas, porque ficam em causa o Estado social e a coesão territorial e regional. Mas
esse é o legado deste Governo e é o legado do Sr. Ministro, que é, afinal, tão polivalente mas com um só fito:
cortar. Cortar onde é essencial!
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís
Ferreira.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, também recebi a ANAFRE, a 29 de
janeiro, e o que a ANAFRE me disse foi que está contra a proposta de lei, porque com esta proposta o
Governo retira 20% das receitas às freguesias.
A ANAFRE revê-se na posição da Associação Nacional de Municípios Portugueses. E o Sr. Ministro
certamente conhecerá a posição desta Associação que, em conclusão, diz o seguinte: a Associação Nacional
de Municípios Portugueses rejeita o projeto de diploma em apreço, emitindo parecer desfavorável. Portanto,
não sei que ANAFRE o Sr. Ministro recebeu!
Seja como for, a verdade é que o Governo, com este negócio e de forma unilateral, se prepara para retirar
ao poder local 400 milhões de euros, o que trará consequências desastrosas para as populações e configura
também sérias violações da autonomia local.
Esta proposta prevê que a lei do Orçamento do Estado possa determinar transferências do Orçamento do
Estado de montante inferior ao que resultaria da aplicação de Lei das Finanças Locais, a qual, aliás, o
Governo nunca cumpriu; atribui isenções relativamente aos impostos que constituem receita municipal,
nomeadamente para os imóveis do Estado; consagra benefícios e isenções fiscais, sem que a compensação
aos municípios seja feita de forma automática; e impõe uma redução substancial do montante do Fundo de
Equilíbrio Financeiro.
Ora, na nossa perspetiva, isto é, a todos os títulos, inadmissível, sobretudo se tivermos em conta que os
municípios são, em muitos casos, o verdadeiro «ministério da solidariedade» do nosso País.
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Trata-se, portanto, de uma proposta inaceitável à luz dos princípios da autonomia financeira dos
municípios. E, para além disso, é ainda um monumental erro de gestão, porque com apenas 8,9% de receitas
do Estado os municípios são responsáveis por cerca de 36% do investimento público do País.
É ainda uma opção errada do ponto de vista político, porque esta proposta vai agravar ainda mais os
problemas existentes em cada concelho do País e obrigará as câmaras municipais a diminuírem
substancialmente os apoios às instituições, nomeadamente às instituições de natureza social, área em que,
como se sabe, o Governo se tem vindo a desresponsabilizar a passos largos.
Em conclusão, e para terminar, Os Verdes entendem que esta proposta do Governo é mais uma «facada»
na autonomia do poder local e terá consequências muito negativas para as populações, sobretudo numa altura
em que o Governo «está de saída» em tudo o que seja responder às necessidades das pessoas.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de
Almeida.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as
e Srs. Deputados: A lei das finanças regionais é, naturalmente — e terá que ser sempre —, uma lei de
concretização da autonomia e não pode ser um instrumento de centralismo. Não pode, por isso, ser uma lei
que sirva para controlar as regiões autónomas, seja qual for o Governo que esteja na República ou em cada
uma dessas regiões.
O princípio fundamental da lei das finanças regionais é o da solidariedade. É também em nome dessa
solidariedade que é normal que, numa altura em que todo o País atravessa dificuldades, as regiões
autónomas contribuam para a recuperação, a nível nacional, de um equilíbrio financeiro que permita a todos,
incluindo às regiões autónomas, ultrapassar a dificuldade que neste momento vivemos.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Obviamente, não poderemos ignorar exemplos de má gestão
que levam a que as regiões não sejam iguais na sua situação financeira e que, naturalmente, as opções que
cada um dos governos regionais possa tomar tenham consequências diferentes para o povo de uma e de
outra região autónoma.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Mas, em nome da mesma autonomia que enunciámos, cabe
ao povo de cada uma dessas regiões julgar os governos e a sua ação.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Entendemos que o debate de uma lei das finanças regionais
deve ser feito em nome do consenso. Por isso, não é bom que seja aprovada e que represente apenas a
posição do Governo da República, posição essa que seja a oposta à de ambos os governos regionais e à da
maioria de ambos os parlamentos de cada uma das regiões. E esse é o desafio essencial do trabalho a
desenvolver, em sede de especialidade: construir uma solução que, no final, permita ter um consenso mais
alargado do que aquele que existe no seu início.
Já vimos, hoje, que a disponibilidade do Governo da República para isso é total. Aliás, um porta-voz talvez
inesperado — o Sr. Vice-Presidente do Governo Regional dos Açores — veio dizer que numa matéria técnica,
difícil, mas essencial, que tem a ver com o IVA, se chegou a consenso entre o Governo da República e o
Governo da Região Autónoma dos Açores.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
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O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Pois é esse exemplo que tem de ser seguido e continuado
para aprofundarmos a lei, na especialidade. Designadamente, temos de debater matérias de
constitucionalidade no que respeita à cobrança de impostos, que são relevantes e não podem ser ignoradas,
ou matérias como a da transferência no âmbito do Fundo de Coesão — não podemos deixar de fazer essa
discussão, de ir a fundo na mesma e de procurar a melhor solução.
Há outras matérias que, podendo ser esclarecidas em sede de especialidade, devem ser esclarecidas
desde já, e uma delas é a do diferencial fiscal. Por que é que vai ser reduzido o diferencial fiscal permitido às
regiões autónomas?
Por exemplo, nos Açores, o diferencial fiscal permitido vai reduzir de 30% para 20%. Agora, o Governo
Regional do Açores é contra, mas convém lembrar que em 1998 e em 1999, quando esse diferencial fiscal foi
introduzido, o Partido Socialista, no parlamento regional, votou contra!
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Ainda nos lembramos que o Partido Socialista, à época, era
contra a introdução da diferenciação fiscal nos Açores, mas agora vem manifestar a sua preocupação.
Contudo, penso que há uma voz que deixará o Partido Socialista descansado, que anunciou — e já direi
quem — que «será apenas alterado o limite máximo de diferenciação de IRS, de IRC e de IVA na região, o
qual passará a ser de 20%, quando agora está fixado num máximo de 30%. Esta medida…» — frisou — «…
terá um impacto reduzido em termos de número de contribuintes de IRS».
Quem o disse foi Carlos César, no dia 4 de maio de 2011, quando veio a Lisboa reunir com José Sócrates
e saber, afinal de contas, com o que José Sócrates se tinha comprometido no Memorando de Entendimento.
Srs. Deputados do Partido Socialista, estejam descansados, pois quem propôs foi José Sócrates e Carlos
César disse que isso não tem impacto absolutamente nenhum!
Vozes do PSD: — Bem lembrado!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Portanto, os Srs. Deputados do Partido Socialista podem ficar
absolutamente descansados! Mas também convém ter a noção de que, na Região Autónoma da Madeira, se
os madeirenses não vão poder beneficiar desse diferencial fiscal é porque a Madeira está sujeita a um
programa de apoio financeiro específico que impede, neste momento, que haja qualquer diferenciação positiva
para os madeirenses, fruto do que foi a gestão financeira da Região Autónoma da Madeira.
Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.
Srs. Deputados, esta é uma discussão viva, interessante e deverá permitir a melhor solução em nome da
autonomia. Mas não devemos esquecer que o consenso é tão desejável quanto atingível nessa mesma
discussão.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Criticam o homem mas, afinal, aproveitam tudo o que ele diz!
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavras o Sr. Deputado Carlos Abreu
Amorim.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: À guisa de conclusão deste
debate, designadamente sobre a proposta de lei das finanças locais, sou forçado a salientar, uma vez mais,
alguma pobreza na lógica das propostas e das ideias com que a oposição nos brindou hoje, neste debate.
Na verdade, em praticamente tudo o que diz respeito à reforma do poder local, a oposição, desde a
extrema-esquerda radical até ao maior partido da oposição, com especiais responsabilidades autárquicas, não
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tem feito propostas, tem-se barricado numa lógica do contra e não tem estado à altura dos seus pergaminhos,
na lógica da liberdade local.
Por exemplo, não ouvi o Partido Socialista falar no alargamento do perímetro da consolidação das contas
dos municípios. A partir do momento em que esta lei entrar em vigor, todas as entidades que estão na periferia
do município estarão obrigadas à mesma lógica de prestação de contas. Isso é uma novidade e é
extremamente positivo!
Não ouvi o Partido Socialista falar na criação de um mecanismo concreto de saneamento financeiro dos
municípios que estão em péssima situação financeira, e isso devia ser realçado e, se calhar, também
aplaudido.
Para terminar, Sr. Presidente, gostaria de lembrar o seguinte: o Partido Socialista, há dias, elaborou um
documento — interno, mas com grande retumbância mediática nacional — que ficou conhecido por
«Documento de Coimbra», uma espécie de Tratado de Tordesilhas entre as duas grandes fações que se
digladiam dentro do Partido Socialista. E uma das primeiras conclusões desse Documento de Coimbra é
exatamente a ideia de que a atual direção do PS e a sua direção parlamentar deveriam fazer a defesa
denodada das soluções preconizadas pelo Governo anterior, o Governo de José Sócrates.
Pois é pena que o Documento de Coimbra tenha sido já violado aqui, hoje, porque grande parte dessas
soluções — e isso foi dito aqui por um Deputado da extrema-esquerda radical — já estava prevista na
proposta de lei anterior, feita pelo Governo anterior e que, agora, com o constrangimento do Memorando
assinado com a troica, nós também fomos obrigados a repristinar.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — E é uma pena que o Partido Socialista não tenha estado à altura
dos seus pergaminhos e não tenha defendido aquilo que, no Documento de Coimbra, também plasmou.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos do PCP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra, por 37 segundos, o Sr.
Deputado Mota Andrade.
O Sr. Mota Andrade (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.as
e Srs. Deputados: É, de facto, pena que leis
tão importantes, e que, para perdurarem no tempo, deviam ser objeto de uma maioria qualificada, sejam
tratadas desta forma.
Lamento imenso a última intervenção, a intervenção do Deputado Carlos Abreu Amorim. Quero, aliás, dizer
ao Deputado Carlos Abreu Amorim, que falou em municípios que estão com grandes dificuldades financeiras,
que a sua candidatura, já anunciada, é precisamente a um município que tem enormes dificuldades
financeiras…
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Isso é mentira!
O Sr. Mota Andrade (PS): — … e que não é governado pelo Partido Socialista.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Agora, é a zanga das comadres!
O Sr. Mota Andrade (PS): — Quero também, desde já, frisar que o PS não aceita a figura, que consta da
lei, do gestor de acompanhamento. É que essa é uma clara violação da autonomia do poder local, consagrada
na Constituição da República.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É verdade!
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O Sr. Mota Andrade (PS): — Não é aceitável que as populações escolham os seus governantes locais e
que, depois, estes tenham de ficar subordinados a alguém que não tem qualquer legitimidade democrática. É
uma tutela política que consideramos inadmissível.
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Muito bem!
O Sr. Mota Andrade (PS): — Também não concordamos que, relativamente aos benefícios fiscais,
nomeadamente àqueles que dão receita às autarquias, a sua concessão ou não concessão fique dependente
apenas do poder central, numa atitude completamente discriminatória em relação ao governo das autarquias
locais.
Por último, Sr. Presidente, gostaria de dizer que está a encerrar-se mais um capítulo da chamada «reforma
do poder local».
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Mota Andrade (PS): — Termino já, Sr. Presidente.
Como referi, esta é uma reforma que nasceu mal e que foi fruto de uma grande trapalhada. E, como, em
tempos, o Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim também reconheceu, volto aqui a lembrar que, na última reunião
do poder local, o Presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses deu razão ao Partido
Socialista e à abertura que o Partido Socialista demonstrou na altura, no sentido de que tudo deveria ter
começado por uma revisão da lei eleitoral autárquica. Ora, foi por não terem ouvido o Partido Socialista que
caímos nesta monumental trapalhada, que é esta chamada «reforma da administração local».
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — O Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim pediu a palavra para que
efeito?
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Para exercer o direito de defesa da honra.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sr. Presidente, o Sr. Deputado Mota Andrade manifestou uma
enorme preocupação pela minha candidatura à presidência do município de Vila Nova de Gaia. Quero informar
o Sr. Presidente, o Sr. Deputado Mota Andrade e os restantes Deputados que essa preocupação pode ter
razão de ser, mas o Sr. Deputado Mota Andrade pode estar ciente de que nunca usarei o meu cargo nesta
Assembleia para falar de outras candidaturas ou de outros cargos políticos.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para dar explicações, querendo, tem a palavra o Sr. Deputado Mota
Andrade.
O Sr. Mota Andrade (PS): — Sr. Presidente, como bem se viu, não ofendi a honra de ninguém, muito
menos a do Sr. Deputado e meu amigo Carlos Abreu Amorim.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Assim, ainda é mais fácil dar explicações.
O Sr. Mota Andrade (PS): — A esse propósito, Sr. Presidente, houve aqui um pequeno incidente: é que a
defesa da honra deveria ter sido exercida no final do debate, como V. Ex.ª sabe.
Mas, já que o Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim se sentiu tão afrontado pela minha intervenção, devo
dizer que o Sr. Deputado acabou de confessar que, de facto, tem um combate muito difícil pela frente, porque
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vai candidatar-se a uma autarquia que tem grandes dificuldades em termos de tesouraria, o que não é culpa
do Partido Socialista.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Santos
Silva.
O Sr. Carlos Santos Silva (PSD): — Sr. Presidente, muito rapidamente, gostaria de dizer ao Sr. Deputado
Ricardo Rodrigues, que simpaticamente me dirigiu algumas palavras relativamente à minha presença neste
debate, que é com todo o gosto e prazer que defendo o meu partido neste debate da lei das finanças
regionais. Até porque a questão autonómica, a questão das regiões faz parte do todo nacional e nós, enquanto
Deputados nacionais, devemos estar disponíveis para qualquer discussão em torno destas matérias.
Quero também saudar o Governo pela abertura que mostrou aqui, hoje, para, em sede de especialidade,
podermos melhorar esta mesma lei.
Para terminar, e porque foi lançado o repto relativamente à mudança de posição por parte do PSD, dir-vos-
ei, Deputados Pedro Filipe Soares e Honório Novo, que não é uma mudança, é uma evolução. É que não foi o
PSD que mudou; infelizmente, foi a realidade dura do País que mudou, e os senhores não perceberam.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do
Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Gostaria de
aproveitar o pouco tempo que me resta para referir quatro aspetos.
O primeiro é para reafirmar a disponibilidade do Governo para discutir todos os aspetos referentes à Lei
das Finanças das Regiões Autónomas e à Lei das Finanças Locais, no sentido de melhorá-las e obter o
máximo consenso possível nestas duas leis que são estruturais para as finanças públicas.
O segundo é para referir, relativamente à questão do IRS — e julgo que não terei percebido totalmente
aquilo que foi referido pelo Sr. Deputado do PS —, que a posição do Governo é aquela que já foi estabelecida
em documentos passados. O que se passa, Sr. Deputado, é que, se 100% da receita for receita do Governo
regional e acrescermos a isso 5% para as autarquias das regiões, isso significaria que teríamos 105% da
receita nas regiões. Portanto, presumo que não percebi exatamente o que o Sr. Deputado quis transmitir, mas
estaremos disponíveis para discutir esse aspeto, em sede de especialidade.
Em terceiro lugar, ainda relativamente à lei de finanças regionais, gostaria de referir que a comissão de
acompanhamento é, de facto, paritária. Há quatro representantes das regiões e quatro representantes da
administração central. O que está previsto é exatamente isso.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Mais o Ministro! Logo, não é paritária!
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — A única coisa adicional que é referida é o facto de ser
presidida por um representante do Ministério das Finanças.
Finalmente, quero referir um aspeto já aqui esclarecido, mas que gostaria de frisar novamente,
relativamente ao gestor do fundo de apoio municipal. Obviamente, trata-se de um gestor do contrato e não de
um gestor que substitua o poder político na autarquia. Trata-se, aqui, de um gestor do contrato, à semelhança
do gestor do contrato que temos relativamente ao nosso acompanhamento com a troica.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É um Moedas em cada autarquia!
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O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Este gestor não substitui esta Assembleia, não substitui o
Governo, não substitui quaisquer desses poderes. Portanto, não creio que haja aí qualquer
inconstitucionalidade.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado Mota Andrade, devo dar-lhe uma pequena explicação.
De harmonia com o artigo 84.º, n.os
3 e 4 do Regimento, a Mesa pode dar imediatamente a palavra para a
defesa da honra não apenas a um qualquer Deputado, mas reforçadamente quando se trata de membro da
direção do Grupo Parlamentar.
Portanto, a palavra foi concedida nos termos regimentais.
O Sr. Mota Andrade (PS): — Sr. Presidente, aceito a explicação, mas penso que ela se aplica, sim,
quando se trata da defesa da honra da bancada e não da defesa da honra do Deputado.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Não, não, as duas situações estão previstas. Caberá à Mesa avaliar
da oportunidade ou não da concessão da palavra. Mas podia ter acontecido que eu me tivesse enganado, é
humano.
Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, está concluído o debate, na generalidade, das propostas de
lei n.os
121/XII (2.ª) e 122/XII (2.ª) e do projeto de lei n.º 351/XII (2.ª).
Nada mais havendo a discutir, estão igualmente concluídos os nossos trabalhos de hoje.
A próxima reunião plenária realiza-se amanhã, às 15 horas, com a seguinte ordem do dia: declarações
políticas; discussão conjunta dos projetos de resolução n.os
592/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo medidas
dirigidas ao setor da construção civil e imobiliário, em particular nas Comunidades Intermunicipais do Cávado
e do Ave (PSD) e 608/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a tomada de medidas para o relançamento do setor
da construção civil (PS); apreciação, em conjunto, dos projetos de resolução n.os
414/XII (1.ª) — Recomenda
ao Governo o estabelecimento de isenção das taxas moderadoras para os cidadãos portadores de fibrose
quística (PS) e 610/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a isenção de pagamento de taxas moderadoras no
Serviço Nacional de Saúde para as pessoas portadoras de doenças crónicas e de doenças raras (BE); debate
conjunto dos projetos de resolução n.os
369/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo a elaboração de um plano
estratégico para a zona de influência do Empreendimento de Fins Múltiplos de Alqueva e um conjunto de
outras medidas tendentes ao correto aproveitamento do mesmo (PCP) e 609/XII (2.ª) — Recomenda ao
Governo que promova a rápida finalização da obra do Alqueva e garanta o seu desenvolvimento futuro (PS); e
apreciação da petição n.º 134/XII (1.ª) — Apresentada por Manuel António Dias Pinheiro e outros,
manifestando-se à Assembleia da República contra o mega-agrupamento entre escolas de Rebordosa e Vilela.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 4 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.