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Quinta-feira, 30 de maio de 2013 I Série — Número 95

XII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2012-2013)

REUNIÃOPLENÁRIADE29DEMAIODE 2013

Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves

Secretários: Ex.mos

Srs. Maria Paula da Graça Cardoso Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz

S U M Á R I O

A Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 7

minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa das propostas de lei

n.os

148 e 149/XII (2.ª), dos projetos de lei n.os

418 a 422/XII (2.ª) e dos projetos de resolução n.

os 731 a 743/XII (2.ª).

Procedeu-se a um debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar do BE, sobre o guião para a «reforma do Estado» e o novo pacote de austeridade apresentado pelo Governo. Proferiram intervenções, na fase de abertura, o Deputado João Semedo (BE) (a) e o Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Paulo Portas), tendo usado da palavra, durante o debate, a diverso título, além daqueles oradores, os Deputados Duarte Pacheco (PSD), António Braga (PS), Hélder Amaral (CDS-PP), Bernardino Soares (PCP), Mariana Aiveca (BE), José Luís Ferreira (Os Verdes), Hugo Lopes Soares (PSD), Pedro Nuno Santos (PS), Nuno Magalhães (CDS-PP), Jorge Machado (PCP) e Cecília Honório (BE). A encerrar o debate, usaram da palavra o Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros e o Deputado Pedro Filipe Soares (BE).

Foram discutidos os projetos de resolução n.os

700/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo novo alargamento do prazo para o enquadramento dos agricultores no regime geral de IVA (PSD e CDS-PP) e 738/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a criação de um balcão para os pequenos agricultores afetados pelas novas normas de fiscalidade (BE). Intervieram os Deputados Afonso Oliveira (PSD), Abel

Baptista (CDS-PP), Pedro Filipe Soares (BE), Miguel Freitas (PS) e João Ramos (PCP).

Foi também discutido o projeto de resolução n.º 726/XII (2.ª) — Criação de um plano nacional para a prevenção de dengue (Os Verdes), tendo proferido intervenções os Deputados Heloísa Apolónia (Os Verdes), Ricardo Baptista Leite (PSD), Helena Pinto (BE), Paula Santos (PCP), Isabel Galriça Neto (CDS-PP) e Manuel Pizarro (PS).

Por último, foi apreciado o Decreto-Lei n.º 26/2013, de 19 de fevereiro, que procede à primeira alteração à Lei n.º 11/2011, de 26 de abril, que estabelece o regime jurídico de acesso e de permanência na atividade de inspeção técnica de veículos a motor e seus reboques e o regime de funcionamento dos centros de inspeção [apreciação parlamentar n.º 49/XII (2.ª) (PCP)], tendo intervindo, além do Secretário de Estado das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (Sérgio Monteiro), os Deputados João Ramos (PCP), Jorge Fão (PS), João Paulo Viegas (CDS-PP), Paulo Cavaleiro (PSD) e Ana Drago (BE). No final, a Mesa anunciou a apresentação dos projetos de resolução n.

os 744/XII (2.ª) (PCP) e 745/XII (2.ª) (Os Verdes),

solicitando a cessação de vigência daquele Decreto-Lei. O Presidente (Ferro Rodrigues) encerrou a sessão eram

18 horas e 15 minutos.

——

(a) Durante esta intervenção foram projetadas imagens.

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Sr.ª Secretária

de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade, que cumprimento, Srs. Jornalistas, Minhas Senhoras e

Meus Senhores, está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 7 minutos.

Os Srs. Agentes da autoridade podem abrir as galerias, por favor.

Antes de entrarmos no primeiro ponto da ordem do dia, que, como todos sabem, hoje consiste num debate

de urgência, requerido pelo Bloco de Esquerda, sobre o guião para a «reforma do Estado» e o novo pacote de

austeridade apresentado pelo Governo, peço à Sr. Secretária o favor de ler o expediente.

A Sr.ª Secretária (Maria Paula Cardoso): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e

foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: propostas de lei n.os

148/XII (2.ª) — Aprova o crédito

fiscal extraordinário ao investimento e 149/XII (2.ª) — Aumento do salário mínimo nacional (ALRAM); projetos

de lei n.os

418/XII (2.ª) — Quarta alteração à Lei n.º 91/95, de 2 de setembro, que estabelece o processo de

reconversão das áreas urbanas de génese ilegal, prorrogando o prazo de aplicação da lei (PCP), 419/XII (2.ª)

— Aprova o regime jurídico do financiamento colaborativo (PS), 420/XII (2.ª) — Alteração dos limites territoriais

entre as freguesias de Mombeja e de Ferreira do Alentejo e entre os municípios de Beja e de Ferreira do

Alentejo (PS), 421/XII (2.ª) — Alteração dos limites territoriais entre as freguesias de Beringel e Mombeja, do

município de Beja (PS) e 422/XII (2.ª) — Defende os serviços públicos e os postos de trabalho afetos à

atividade empresarial local e das participações locais (Primeira alteração à Lei n.º 50/2012, de 31 de agosto,

que aprova o regime jurídico da atividade empresarial local e das participações locais) (BE).

Deram, ainda, entrada na Mesa os seguintes projetos de resolução n.os

731/XII (2.ª) — Recomenda ao

Governo a continuidade do Serviço de Oncologia do Centro Hospitalar Barreiro/Montijo (PCP), 732/XII (2.ª) —

Recomenda ao Governo que mantenha e reforce a aposta e apoio à reabilitação urbana da Baixa do Porto e

honre os compromissos de natureza financeira assumidos com a Porto Vivo, SRU — Sociedade de

Reabilitação Urbana da Baixa Portuense, SA, relativos aos anos de 2010 e 2011, bem como contribua

ativamente para o preenchimento e estabilização dos corpos sociais até definição dos moldes futuros de

parceria entre a autarquia e a administração central (PSD), 733/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo o

estabelecimento de uma plataforma de complementaridade entre os hospitais do Barreiro, Almada e Setúbal

para a área da Oncologia (BE), 734/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo que desenvolva uma estratégia

concertada no sentido de que o Parque Nacional da Peneda-Gerês mantenha a sua integridade e possa

desempenhar uma função de servir a humanidade assegurando um espaço paisagístico em que o Homem e a

Natureza se integram harmoniosamente (PSD), 735/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a suspensão do

processo de privatização dos CTT — Correios de Portugal (PS), 736/XII (2.ª) — Estabelece a obrigatoriedade

de elaboração e apresentação de um relatório anual sobre emigração (PCP), 737/XII (2.ª) — Recomenda ao

Governo que assegure a qualidade da formação médica garantindo formação pós-graduada adequada a todos

os médicos (PS), 738/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a criação de um balcão para os pequenos

agricultores afetados pelas novas normas de fiscalidade (BE), 739/XII (2.ª) — Pela defesa dos CTT Correios

de Portugal, pela manutenção do seu carácter totalmente público e pela melhoria da qualidade do serviço

público postal (PCP), 740/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo que assegure as condições necessárias à

formação dos novos médicos (BE), 741/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a introdução do regime de «classe

5» em todas as vias portajadas (BE), 742/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo novas regras para simplificar a

burocracia das micro, pequenas e médias empresas (BE) e 743/XII (2.ª) — Reclama do Governo medidas que

gerem a eficácia do serviço de oncologia do Centro Hospitalar Barreiro/Montijo (Os Verdes).

A Sr.ª Presidente: — Vamos entrar agora no primeiro ponto da ordem do dia, que, como referi, consiste

num debate de urgência, requerido pelo Bloco de Esquerda, sobre o guião para a «reforma do Estado» e o

novo pacote de austeridade apresentado pelo Governo.

Sr.as

e Srs. Deputados, na forma deste debate, as primeiras intervenções são do Sr. Deputado João

Semedo, que representa o partido que teve a iniciativa, seguindo-se o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios

Estrangeiros, representando o Governo, e depois haverá uma primeira ronda de intervenções.

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Sendo assim, dou a palavra, para abrir o debate, ao Sr. Deputado João Semedo.

O Sr. João Semedo (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados e Sr.as

Deputadas: A reforma do Estado, a

par da sétima avaliação da troica, é a nova telenovela do Governo. Anunciada como o guião para as novas

medidas de austeridade, elas aí estão, mas do famoso guião atribuído a Paulo Portas ninguém, até hoje,

consegue pôr a vista em cima.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. João Semedo (BE): — Para destruir, aliás, Paulo Portas não precisa de guião, basta-lhe a ideologia

contra tudo o que é público.

O plano, tanto quanto se sabe, é simples: despedir dezenas de funcionários da Administração Pública,

cortar nas reformas e nas pensões e reduzir o Estado social ao mínimo.

Depois de ter inventado que a austeridade é expansionista, que o desemprego é uma oportunidade e que o

empobrecimento do País vai virar crescimento económico, o Governo aposta, agora, num novo ilusionismo: a

reforma do Estado.

Como já se tornou imagem de marca desta maioria, não há qualquer estudo sobre o impacto económico ou

social desta sangria, nem sequer a mais leve preocupação com o próprio Estado. Nada! É tudo feito a olho,

porque a única e exclusiva preocupação do PSD e do CDS é cortar na despesa pública, cortar para

compensar os colossais desvios orçamentais provocados pelas anteriores medidas de austeridade.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. João Semedo (BE): — Quando, mais uma vez, falhar tudo o que agora anunciam e prometem,

lançando mais de quatro dezenas de milhares de pessoas no desemprego, Passos Coelho, Vítor Gaspar e

Paulo Portas vão dizer-nos pela sexta, sétima ou oitava vez que foram apanhados de surpresa pelos efeitos

da sua própria política.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

O Sr. João Semedo (BE): — Este debate, Sr.as

e Srs. Deputados, é antigo de muitos anos. Gostaria de

lembrar o que dizia Pedro Passos Coelho em plena campanha eleitoral, precisamente há dois anos.

Dizia, então, Pedro Passos Coelho: «Nós calculámos e estimámos e eu posso garantir-vos: não será

necessário em Portugal cortar mais salários nem despedir gente para poder cumprir um programa de

saneamento financeiro». Eram estas, há dois anos, as promessas de Pedro Passos Coelho. Passaram dois

anos, as promessas foram todas furadas. Foram dois anos, Sr.as

e Srs. Deputados, a rasgar todas as

promessas.

Temos um Governo socialmente insensível, orçamentalmente delirante, financeiramente desastroso,

politicamente incapaz e constitucionalmente irresponsável.

Aplausos do BE.

Nada bate certo, a não ser o anunciado empobrecimento do País e dos portugueses.

Sr.as

e Srs. Deputados, diz-nos agora o Governo que tem de avançar para a destruição das funções sociais

do Estado, calcule-se, por uma razão e uma questão de equidade e justiça social.

O Governo pode não acertar numa coisa que diga ou que pense, mas a sua criatividade linguística não tem

qualquer limite: diminuem o subsídio de desemprego, o complemento social para os idosos, mas fazem-no,

calculem, Sr.as

e Srs. Deputados, em nome da justiça social. É preciso um enorme e ilimitado descaramento!

É falso que temos Estado a mais. É falso que foi a ineficiência e o despesismo do Estado que nos trouxe à

crise. É falso que se possa cortar no Estado sem que isso afete profundamente a vida das pessoas. Tudo isto

é falso!

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Aliás, Sr.as

e Srs. Deputados, os números que demonstram que tudo isto é falso são muito fáceis de

encontrar.

Ainda antes dos novos cortes e do despedimento previsto de 30 000 funcionários públicos, Portugal

consagra 10,4% da sua riqueza aos salários dos funcionários públicos, repito, 10,4%.

Em 2017, segundo o Documento de Estratégia Orçamental apresentado pelo Governo, está calculado que

o valor a pagar aos professores, aos polícias, aos juízes, aos médicos, aos enfermeiros, aos funcionários

públicos, não passará dos 8,6%.

O que o Governo não diz, porque sabe que isso destruiria toda a sua argumentação, é que estamos muito

abaixo da média da OCDE, que está nos 11%, e dos liberais Estados Unidos da América, que gastam mais do

que 11% do seu produto interno, ou a léguas dos 13% gastos pela França ou pela Inglaterra.

Num País como o nosso, onde o principal défice é o das qualificações, o que fez este Governo?

Colocou, pela primeira vez desde o 25 de Abril, o nosso País como o país que menos investe em

educação. A média da zona euro está nos 6,2% e Portugal, este ano, gastou 4,9%.

E o mesmo se pode dizer das despesas da saúde: são de 5,6%, este ano, contra uma média de 6,9% nos

países da OCDE e de 8,9% na «musa» deste Governo, a fonte de todas as inspirações, a Alemanha.

Não, Sr.as

e Srs. Deputados, não é o Estado que é gordo. O que é gordo é o apetite da direita e dos

mercados por todos os negócios que o desmantelamento do Estado lhes poderia dar de mão beijada.

Cortar nas despesas sociais, como quer o Governo, significa — não tenhamos nenhuma dúvida sobre isso

— novos impostos. Significará saúde mais cara e pior, educação apenas para quem a possa pagar e menos

apoio na velhice, nas idades mais avançadas.

Julgo que não será necessário dizer, mas quero dizê-lo com toda a convicção que as minhas palavras

possam ter: para este plano contam — não tenham qualquer dúvida — com a oposição do Bloco de Esquerda.

Aplausos do BE.

Durante a intervenção, foram projetadas Imagens, que podem ser vistas no final do DAR.

A Sr.ª Presidente: — Pelo Governo, tem agora a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios

Estrangeiros.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Paulo Portas): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs.

Deputados: Suponho, Sr. Deputado João Semedo, que a minha presença neste debate é o testemunho, para

além da obrigação, do interesse que coloco no tema de reformar o Estado e de procurar, nas circunstância

dificílimas que o País atravessa, ter um Estado mais eficiente.

Gostava de lhe dizer, relativamente à intervenção que fez, que o uso parcial das estatísticas não favorece a

verdade do debate,

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — … porque, como o Sr. Deputado sabe, a

estatística que mencionou não abrange a totalidade dos funcionários das administrações públicas

portuguesas, nem a questão central é a de um número. Reformar não é cortar, é tornar o Estado melhor.

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!

Risos do PCP e do BE.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — A questão central não é, portanto, aquela que

cita. Eu poderia dizer-lhe, com igual parcialidade, que se comparasse as horas de trabalho verificadas na

média da OCDE com aquelas que se verificam nas nossas administrações encontraria um défice que teria de

ser corrigido. Mas, repito, não farei uma utilização parcial das estatísticas como aquela que o Sr. Deputado

caiu na tentação de fazer.

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Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Ana Drago (BE): — É mentira!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Gostava também de lhe dizer que o Governo

já iniciou, depois da publicação do relatório da OCDE, há duas semanas a sua discussão interna relativamente

ao documento que deverá tornar público quanto a reformas que devam ser feitas no Estado, com o cuidado de

ter em atenção as circunstâncias que o País atravessa, a evolução da conjuntura externa, a necessidade de

fazer negociação social e a oportunidade, que não deve ser perdida, de reformas que são intergeracionais ou

que atravessam diversas legislaturas poderem merecer o consenso possível e, a meu ver, necessário dos

partidos do arco da governabilidade, e esse documento será apresentado no mês de junho.

Queria dizer-lhe também, Sr. Deputado João Semedo, que há uma parcela da sua intervenção que eu

percebo, conhecendo a coerência das suas posições, que não queira citar, mas que, em qualquer caso, é uma

circunstância do País e, nesse sentido, o próprio Bloco de Esquerda não lhe pode escapar, do ponto de vista

do debate político: é que o País não se encontra em circunstâncias externas normais ou correntes. O País,

desde 2011, encontra-se numa situação, que já defini muitas vezes nesta Câmara, de protetorado.

Protestos do Deputado do PS Carlos Zorrinho.

Uma parte da sua soberania financeira e orçamental foi perdida e só será recuperada quando termine de

forma positiva o calendário em que Fundo Monetário Internacional, Banco Central Europeu e Comissão

Europeia mantêm o acordo e o Memorando subscrito pelo Estado português, em 2011.

Nós não estamos a viver, Sr. Deputado João Semedo, circunstâncias normais. Uma parte do que disse

seria inteiramente discutível se estivéssemos a viver em circunstâncias normais. Sucede que o País ficou à

beira da bancarrota. Ficar à beira da bancarrota significa não ter dinheiro para pagar salários nem para pagar

pensões, que o Governo da época, com o conforto dos partidos da oposição da época, assinou um acordo

externo que nos vincula a obrigações e que o cumprimento dessas obrigações é condicionante de podermos

dispor das tranches financeiras para podermos viver, porque ainda não podemos viver independente ou

autonomamente.

É por isso, Sr. Deputado, que entre nós há uma diferença fundamental: o meu objetivo essencial é que uma

legislatura que começa com a troica em Portugal termine sem a troica em Portugal e com a recuperação da

nossa independência…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

… e que o País aprenda com os seus próprios erros e procure, do ponto de vista dos agregados essenciais

que nos levam a um défice ainda excessivo, encontrar administrações públicas que, por serem menos

pesadas, não signifiquem um Estado menos forte, por serem menos complicadas, permitam aos portugueses

ter um Estado menos burocrático e, por terem um custo inferior ao que tinham, permitam aos portugueses ter

uma carga fiscal inferior àquela que pagam.

São questões, para nós, determinantes.

Percebo que há, entre nós, uma divergência porque o Bloco de Esquerda tem a posição de «não falar com

eles», «não pagar»…

O Sr. João Semedo (BE): — Não é essa a posição do Bloco de Esquerda!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — … «não cumprir», só que, depois, não explica

como é que ficamos no euro.

O Sr. João Semedo (BE): — Não é verdade!

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O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Posso estar a exagerar e teremos ocasião de

confrontar as nossas posições, mas, objetivamente, «não falar com eles», «não cumprir» e, em alguns

momentos, «não pagar» considero — é a minha opinião — que uma estratégia com este teor levaria Portugal

não a um resgate, mas a dois, não a uma troica, mas a duas, não a uma dependência financeira, mas a duas.

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Isso seria pior para quem mais sofre.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Por isso, tendo a noção de que os programas

têm de se adaptar à realidade, como sempre afirmei, tendo a noção da deterioração das condições

económicas na Europa, que é evidente, tendo a noção das dificuldades do nosso mercado interno, aquilo que

acho essencial é que Portugal, que tem sido um País globalmente cumpridor e, por isso, já obteve um

faseamento do défice diferente e se prepara para obter níveis de reembolsos da dívida compagináveis com

aquilo que nós podemos pagar, mereça o respeito dos seus parceiros internacionais no sentido de nos

ajudarem a ultrapassar com sucesso um dos momentos mais difíceis da nossa História e nós sermos também

na Europa um caso bem-sucedido de um País que soube ultrapassar um memorando de entendimento e um

programa de ajustamento.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Como sabem, a modalidade deste debate inclui agora duas rondas.

O Sr. Deputado António Braga inscreveu-se para pedir esclarecimentos, mas tal não corresponde à prática

interpretativa do artigo 74.º do Regimento da Assembleia da República. Como, apesar de tudo, este artigo 74.º

deixa algumas dúvidas de interpretação, não deixo de o registar, seguimos a praxe e poderemos ver esta

questão mais à frente.

Na primeira ronda, temos já inscritos os Srs. Deputados Duarte Pacheco, do PSD, António Braga, do PS, e

Hélder Amaral, do CDS-PP.

Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr.

Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: Começo por saudar o Sr. Ministro pela forma serena como

introduziu o tema deste debate mostrando que ele deve ser feito longe de demagogias, longe da espuma do

momento, para que o debate possa ocorrer de uma forma mais profunda, o que, infelizmente, nem sempre tem

dominado a agenda política.

Sr. Ministro, este é um debate realmente sério e importante para a sociedade portuguesa…

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Pois é!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — … mas, infelizmente, é aqui proposto pelo partido que não quer nenhuma

reforma do Estado…

O Sr. João Semedo (BE): — Fantástico! Já estragou tudo!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — … pela força política que posso intitular de Os conservadores do

regime,…

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

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O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — … aquela força política conservadora que quer manter tudo tal como

está, em que qualquer reforma…

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — É verdade!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — … qualquer coisa que mexa é, pura e simplesmente, oposição.

Aplausos do PSD e CDS-PP.

Sr. Deputado João Semedo, quando falamos da reforma do Estado, temos de pensar na reforma do Estado

em sentido lato e não só nos números que aqui nos trouxe,…

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Claro!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — … ou seja, na administração central, na administração local, na

administração regional, no setor empresarial do Estado, porque tudo isto é financiado pelos impostos dos

portugueses.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

Protestos do Deputado do PCP Jorge Machado.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — É esta a reflexão que tem de ser feita, porque todos sentimos que já

estamos no momento em que não é possível agravar a carga fiscal em Portugal.

Sr. Ministro, a reforma do Estado é importante por três razões.

Em primeiro lugar, para garantir a sua sustentabilidade. Temos, definitivamente, que adequar as despesas

e as receitas. Precisamos de nos libertar dos credores, precisamos de nos libertar da garantia da dívida. Só

um Orçamento sustentável é que permite, precisamente, a sustentabilidade do Estado social, que muitos

dizem defender mas que depois esquecem a forma de o financiar.

O Sr. Pedro Lynce (PSD): — Muito bem!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Segunda razão: para aumentar a eficiência do Estado. É necessário,

naturalmente, adequar o Estado à realidade. O Estado do século XXI não é o Estado do século XX. Há

inovação, há modernização, há evolução. Qualquer empresa sabe que, se mantiver a sua estrutura

organizativa como tinha há 100 anos, ela tende a morrer. Nós não queremos que o Estado morra, queremos

que o Estado sobreviva, que o Estado seja ágil, que o Estado se adeque à realidade.

A reforma do Estado é, portanto, fundamental, de modo a que o Estado seja mais ágil, possa ser mais

amigo da economia, possa ser mais amigo de todos aqueles que lá trabalham.

O Sr. Pedro Lynce (PSD): — Muito bem!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Terceira razão: para apoiar e reforçar a competitividade da nossa

economia. É que o Estado não existe só para se alimentar, o Estado existe para auxiliar a economia

portuguesa, para auxiliar a sociedade portuguesa.

Daí que seja fundamental diminuir a burocracia, tornar a nossa economia mais competitiva, a justiça deve

ser mais célere, devem ser mais ágeis os processos de licenciamento, o mercado de arrendamento, o

mercado laboral. Isto significa reformar o Estado para que a competitividade da economia possa ser maior,

para que haja maior capacidade de atrair investimento, para que possa ser criado emprego.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

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O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Esta reforma já tem vindo a ser

feita em algumas áreas. Podemos identificá-las: na justiça, na sustentabilidade da segurança social, no

mercado laboral, no setor da concorrência. E tem vindo a ser feita, mas vai ser sistematizada, muito em breve,

num documento que vai ser fundamental para o caminho que queremos prosseguir.

Mas esta reforma tem vindo a ser feita num momento de grandes dificuldades, porventura nas piores

condições possíveis. Porquê? Porque o País está, efetivamente, sob protetorado, com exigências financeiras

externas muito apertadas, mas também porque a economia europeia e a economia portuguesa vivem um

momento de grande recessão.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Mas reformar é algo de essencial e está previsto quer no Tratado

Orçamental quer na Lei de Enquadramento Orçamental, o que nos obriga a todos e, especialmente, àqueles

que lhe deram o voto favorável, nomeadamente os partidos da maioria e o Partido Socialista. E aí devemos

dizer que este debate deve ocorrer de uma forma ampla com a sociedade, com todos os parceiros sociais,

com todos os partidos políticos e, nomeadamente, não se devem imiscuir os partidos do arco da governação.

E aqui faço um apelo concreto ao Partido Socialista.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Do arco da desgovernação!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Esta reforma deve ocorrer fora de qualquer agenda ideológica, fora de

populismos e de demagogias, fora de imobilismos. O PS deve estar disponível para este debate para

estabelecer as pontes que forem necessárias para que os portugueses compreendam a estabilidade das

reformas que vamos todos empreender.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Srs. Deputado, só isto é coerente com o voto favorável que os senhores

deram quer à Lei de Enquadramento Orçamental quer ao Tratado Orçamental.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Bem lembrado!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Assim, Sr.ª Presidente, termino, fazendo um apelo ao Sr. Ministro para

que o Governo mantenha a abertura negocial com os parceiro sociais e com os partidos políticos, para que o

Governo mantenha o combate permanente, na esfera europeia, na defesa dos interesses nacionais, para que

o Governo mantenha a persistência reformista que tem demonstrado para que seja construído um futuro

diferente e melhor para Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é do PS.

Sr. Deputado António Braga, faça favor.

O Sr. António Braga (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Estamos hoje

com este debate, por iniciativa do Bloco de Esquerda, centrados outra vez na ideia de introduzir reformas no

Estado.

Há um conceito prévio a que o Governo aderiu que não acompanhamos: não há, Sr. Ministro, «a» reforma

do Estado; há reformas nos diferentes serviços do Estado, se quiser, para não invadir a sua ideologia ou a

ideologia do Governo, que tem um défice relativamente ao olhar com que põe sobre o Estado social as suas

ideias e as suas iniciativas.

Mas, Sr. Ministro, queria dizer-lhe que o Partido Socialista, em novembro do ano passado, apresentou, no

contexto da Assembleia da República, uma proposta, proposta, essa, que foi recusada pela maioria. E o que

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dizia a proposta, Sr. Ministro? Dizia que devíamos constituir no seio da Assembleia da República as condições

para debater a modernização do Estado. Um Estado mais forte — era o título —, mais amigo das pessoas e

das empresas.

Sr. Ministro, nessa proposta o Partido Socialista propunha um conjunto de critérios para organização desta

modalidade, de discussão, de reflexão e, quiçá, iniciativa legislativa, entre as quais ouvir universidades,

promover estudos de técnicos e especialistas em diferentes áreas, e propunha um calendário. Esse calendário

terminava justamente daqui a dois ou três dias, em inícios de junho.

Sr. Ministro, diante disso, o que é que o Governo nos disse? Disse-nos o seguinte: o Governo tem de ter

pronta a sua reforma até fevereiro de 2013.

O Sr. Mota Andrade (PS): — Bem lembrado!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Não é verdade!

O Sr. António Braga (PS): — Vou recordar o que foi dito: «O Governo não deixará de assumir as suas

responsabilidades. Não deixará, entre o sexto e o sétimo exames regulares, de apresentar um menu

discriminado do que corresponde à sua visão do que é uma reforma mais profunda do Estado.»

E disse mais o Sr. Primeiro-Ministro na altura, com uma tentativa de fazer humor, dirigindo-se ao

Secretário-Geral do meu partido, António José Seguro: «O Governo está cá para cumprir as suas

responsabilidades, não pense que pode escapar às suas.»

Pois bem, Sr. Ministro, se o Governo tivesse dado assentimento a esta metodologia, estávamos agora a

terminar o trabalho da reforma do Estado.

Aplausos do PS.

Sr. Ministro, nós não concordámos com a proposta do Governo e com a modalidade que quis impor à

Assembleia da República pela razão que vou indicar. E nem preciso de usar palavras minhas, vou citar o seu

colega de Governo, o Sr. Ministro das Finanças, que disse, com toda a clareza: na sequência da quinta

revisão, ficou assente que entre a sexta e a sétima avaliação iríamos discriminar um conjunto de medidas

concretas de cortes permanentes de despesa pública de 4000 milhões de euros. Não é possível fazê-lo sem

rever as funções do Estado.

Portanto, como vê, Sr. Ministro, a posição do PS foi sempre muito clara e, ao contrário do que tentaram

sempre dizer, construtiva na ideia de abordar uma reforma que pudesse chamar-se de reforma. Porque cortar

não é reformar e amputar é pior ainda do que cortar. Aquilo a que o Governo nos quis condicionar foi levar a

que o PS participasse numa farsa de reforma do Estado, ou dos serviços do Estado, que apenas tinha por

objetivo cortar, cortar, cortar!

Aplausos do PS.

Todos sabemos que o Sr. Ministro é hoje aqui o representante do Governo, por isso tem de me ouvir. O Sr.

Ministro Vítor Gaspar disse, uma outra vez — usavam ainda a expressão «refundação», agora parece que

esqueceram a ideia da refundação, mas não discutimos sequer a hermenêutica associada a isso, porque

levar-nos-ia longe… —, que a refundação do Estado, para permitir um corte de 4000 milhões de euros na

despesa, terá de ficar fechada até 25 de fevereiro do próximo ano.

Por isso, Sr. Ministro, aqui está, mais do que plausível, o recorte claro, clarinho como água, de que se há

aqui alguma questão por resolver isso é culpa exclusiva do Governo, que não foi capaz de compreender a

natureza deste debate, a sua implicação e consequências e trazer para o debate outros partidos que não

apenas os partidos da maioria absoluta.

Aplausos do PS.

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Já agora, Sr. Ministro, gostaria de lhe colocar uma questão. A Sr.ª Presidente referiu que, no contexto do

debate, as perguntas não são diretas mas, evidentemente, um Deputado quando fala pergunta ou afirma,

porque esse é o seu direito.

Sr. Ministro, qual é, afinal, o modelo de Estado social que o Governo nos propõe ou quer defender?

O Sr. Mota Andrade (PS): — Boa pergunta!

O Sr. António Braga (PS): — É que nós conhecemos as propostas de cortes — milhões ali, milhões

acolá… —, mas são baseadas em quê? Sabe por que é que lhe pergunto isto, Sr. Ministro? Porque estou

muito preocupado e, se o Sr. Ministro tiver atenção ao que disse o Sr. Schäuble ontem, salvo erro, em Paris,

não deixará de me acompanhar na preocupação. Ele diz que a Europa tem Estado social a mais, fala até em

percentagem, em cerca de 50%.

Queria, então, perguntar-lhe, Sr. Ministro: em que continente, em que país, em que sítio do mundo há um

Estado social que seja a vossa referência para aplicar em Portugal?

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é do CDS-PP.

Tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Secretária de Estado, Sr. Ministro dos Negócios

Estrangeiros, Srs. Deputados: Assistimos aqui hoje a um debate em que Bloco de Esquerda pede o debate,

anuncia o debate mas, no essencial, não quer fazer reforma nenhuma, quer que tudo fique como está.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Mas assistimos a uma coisa pior. Assistimos à bancada do Partido

Socialista dizer: nós queremos o debate! Mas queremos o debate segundo as nossas condições e nos nossos

tempos.

O Sr. António Braga (PS): — Já estava feito!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — É estranho, porque a única oportunidade em que estive presente na

Conferência de Líderes foi exatamente na altura em que aceitámos as condições do Partido Socialista para

fazer o debate.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente! Todas!

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Não é verdade!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — E o que é que faz o Partido Socialista? Diz: «Bom, agora já não

queremos fazer o debate!»

Portanto, importa saber se verdadeiramente querem ou não fazer este debate. Esta é a questão.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Srs. Deputados, importa saber se queremos ou não inverter o caminho

que nos levou à beira do abismo de forma irresponsável. Esta é a questão que importa saber.

Estamos hoje num cenário de extremas dificuldade. Podíamos ter feito isso no passado em condições

económicas mais favoráveis. Não foi essa a opção dos Governos, mas devemos fazê-lo agora, e vamos ter de

o fazer em condições ainda mais difíceis, em condições de compromissos assumidos pelo Estado português,

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bem como por outros Estados europeus — é o «two-pack», é o «six-pack», é o tratado orçamental. É algo que

veio para ficar; não é algo que esteja agora, é algo com que vamos ser confrontados hoje e no futuro.

Importa, portanto, que esse debate seja feito com largo consenso, com estabilidade para que fique para o

futuro. Por isso, Sr. Deputado, não importa e não lhe fica bem nenhuma estratégia de debate político ou de

retórica política nesta matéria.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — É preciso perceber que reformar não é cortar, não é destruir. Nada

disso.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Fale das medidas. Quais são as medidas?

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Reformar é tornar o Estado eficiente, é tornar o Estado eficaz, é tornar

o Estado sustentável. É isso o que o Governo se propõe fazer, e têm sido nesse sentido as propostas da

maioria.

Portanto, há que dar eficácia e sustentabilidade ao Estado. Já ouvi aqui dizer, da parte de todas as

bancadas, que não há crescimento económico sem contas públicas saudáveis. Mas o inverso é igualmente

verdade e, portanto, se não temos isso, há que olhar para os dois pilares de forma contínua e complementar.

Por isso, Sr. Ministro, gostava de saber se estamos ou não, em relação às reformas que já foram feitas, a

dar condições para o Estado ser mais eficaz, mais amigo das empresas que investem, mais amigo dos

investidores, mais amigo dos trabalhadores.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — É esse o sentido das reformas das leis laborais, é esse o sentido do

combate à muralha de aço que se chama burocracia, é esse o combate que se faz de cada vez que, numa

reforma setorial, procuramos dar eficácia. É o Estado a tratar o contribuinte como qualquer empresa deve

tratar o seu cliente, é o Estado a respeitar o cliente, é o Estado a respeitar, no fundo, os direitos constitucionais

e o serviço que tem de prestar à sociedade e às empresas.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Portanto, Sr. Ministro, pergunto se estas propostas que já fizemos,

quanto ao crédito fiscal, quanto a uma reforma que tem de ser feita com um consenso possível mas que só

pode ser estável dando segurança jurídica e eficácia, a reforma do IRC, tornam ou não o Estado competitivo

para quem investe e para quem quer investir? Tornam ou não o Estado competitivo para quem quer trabalhar?

O IVA de caixa,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Até agora não existe! Foi prometido em setembro de 2011 e já lá vão

quase dois anos!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — … que tantas bancadas deste Parlamento pediam, solicitavam mas que

sempre se recusaram a debater, é uma reforma abrangente a todos os setores.

Portanto, Sr. Ministro, gostava de dizer que é esse o caminho que queremos fazer. Não é destruir o Estado,

não é cortar a todo o custo, é pura e simplesmente criar condições para que, no futuro, situações como a que

vivemos hoje não se voltem a repetir, seja qual for o Governo.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é do PCP.

Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O

Governo está em mais um capítulo da sua ofensiva contra os serviços públicos e os trabalhadores da

Administração Pública baseado nas mentiras habituais. Ou seja, que se vai atacar o Estado, as suas

«gorduras» e os privilégios dos trabalhadores da Administração Pública, quando depois o que acontece é que

tanto se atacam os direitos dos trabalhadores da Administração Pública como se atacam os direitos dos

trabalhadores do setor privado; que não se vai despedir ninguém quando, afinal, o que estamos a ver é que

tudo empurra para o despedimento, mesmo sob o eufemismo de uma rescisão por mútuo acordo, sendo que a

outra hipótese é um despedimento puro e simples; que não havia, no caso do CDS, taxa sobre as reformas

quando agora, afinal, já está escrita.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Não há, não!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E ainda estamos para saber se vai ou não haver, na taxa ou por outra

maneira qualquer, retroatividade nas medidas que o Governo quer aplicar em relação às pensões e reformas.

Mas, na verdade, há uma grande operação de propaganda em curso. O Governo diz agora: «Vamos

aumentar o horário de trabalho aos trabalhadores da Administração Pública, mas é para os serviços

funcionarem mais tempo!»

Então, mas não estamos a ver, por todo o País, serviços a serem encerrados?

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não estamos a ver balcões das Finanças e da Segurança Social,

centros de saúde e extensões e outras repartições públicas a desaparecerem das nossas vilas, cidades e

freguesias? A reduzirem os seus horários? A terem condições precárias de funcionamento porque não são

substituídos os funcionários que se aposentam? Não estamos a ver isso? Vêm agora falar-nos de aumento do

horário dos serviços públicos… É mentira.

O Sr. António Filipe (PCP): — Muito bem!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É um «biombo» para esconder o aumento do horário sem aumento do

salário.

Mas o que é que o Governo quer, afinal, com a questão do Estado mínimo, porque é isto que pretende? O

Governo quer, por um lado, pôr fim a essa importantíssima função de redistribuição da riqueza que têm os

serviços públicos. É que como os serviços públicos são financiados com os impostos e os impostos devem

incidir mais sobre aqueles que têm mais riqueza e menos sobre aqueles que têm menos rendimento, então

isso significa que esse dinheiro é posto ao serviço de toda a comunidade — que a saúde é para todos, e é

justo que seja para todos; que a educação é para todos; que os serviços sociais devem abranger toda a

população.

O Governo, com esta política de Estado mínimo,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Não sabe o que é o Estado mínimo!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — … quer abrir mercado para o setor privado — é isso que está a fazer,

por exemplo, na saúde quando se encerram unidades públicas, abrindo-se um campo para que o setor privado

estabeleça os seus negócios —, quer desproteger a população, quer desregular setores importantíssimos da

vida nacional, que ficarão entregues aos sabores do mercado, independentemente de os direitos não estarem

garantidos.

E agora até o Ministro das Finanças, que até aqui sempre nos disse que o mercado interno não

interessava, o que interessava eram as exportações, como as exportações não vão crescer o que seria

desejável porque, evidentemente, os mercados para os quais exportamos não estão com essa procura, já veio

dizer-nos esta manhã: «Não, não! Afinal, agora o que nos vai salvar é o mercado interno!» Mas nada de

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aumentar salários, nada de aumentar reformas e pensões; pelo contrário, cortá-las e, ao mesmo tempo,

despedir funcionários públicos, despedir mais trabalhadores da Administração Pública.

Nós temos alternativa. Este caminho é que não é a alternativa. Nem a troica que fica cá para aplicar a

política da troica quando esta se for embora tem alternativa para o País.

E é engraçado que o Sr. Ministro tenha dito que a alternativa é o segundo resgate, quando naquela sua

famosa intervenção de domingo disse que havia quem estivesse já a preparar o segundo resgate (penso que

foram quase estas as suas palavras). Gostava muito de saber quem é esse «quem» que anda a preparar o

segundo resgate. Será o Governo? Estamos em crer que sim, porque, da forma como as coisas estão

encaminhadas, o que os senhores estão a preparar é criação de um novo programa, com mais imposições aos

portugueses e mais entrega de riqueza nacional aos grupos económicos e às potências estrangeiras.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é do Bloco de Esquerda.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr.ª Secretária de Estado: O Sr. Ministro é o

responsável pelo guião da «reforma do Estado» e por isso mesmo está hoje aqui para responder sobre essa

matéria. Mas o Sr. Ministro disse-nos, em fevereiro, que esse guião estava por dias de ser apresentado. Hoje,

veio aqui dizer-nos que por dias está.

A primeira pergunta é esta: o que tem andado o Governo a fazer? Por que não apresenta o guião, Sr.

Ministro Paulo Portas?

Mas a verdade é que já mandou uma carta à troica dizendo que vai cortar 4800 milhões.

O Sr. Ministro também já se pronunciou sobre determinado corte e já fez o anúncio ao País dizendo que

deste valor, dos 4800 milhões, não aceitaria 400 milhões, ou seja, o valor da «TSU dos pensionistas» com o

qual o Sr. Ministro se diz politicamente incompatível. O Governo anunciou também que tem condições para

evitar esta medida.

Ora, o que a OCDE nos vem dizer hoje mesmo é que não há folga nenhuma. E diz mais: que a derrapagem

do défice é tal que a flexibilização anunciada não chega sequer para tapar o buraco que está a ser criado com

a vossa política de austeridade.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Ministro, não é difícil concluir que por este caminho não há folga que

aguente nem nenhuma promessa que seja cumprida. O cumprimento das suas promessas eleitorais, Sr.

Ministro Paulo Portas, é incompatível com a política deste Governo.

Por isso, responda-nos se o senhor também é um Ministro «a prazo», se a sua palavra será para cumprir

no Orçamento do Estado de 2014 ou se já tem guia de marcha para partir em outubro.

O Sr. Ministro diz que só tem uma palavra, mas toda a gente sabe que, quando toca a cortar nas pensões e

nas reformas, o Ministro Paulo Portas e o CDS têm duas palavras, duas linhas, Sr. Ministro: da linha vermelha

da TSU, passamos à via verde para a pobreza, que representa o corte dos 4800 milhões de euros nas funções

sociais do Estado, do qual 1 milhão é para pensões de reforma.

Por isso, perguntamos: que palavra tem este Governo? Que palavra tem o Sr. Ministro para com os

reformados da Caixa Geral de Aposentações, a quem vai cortar 10% nas pensões? Que palavra tem o

Governo, que quer alterar retroativamente o contrato que fez com estes trabalhadores? Que palavra tem o

Governo para com os pensionistas da Caixa Geral de Aposentações que ganham 485 €, ao qual o Sr. Ministro

está de acordo em cortar 2,5% para desconto para a ADSE? Que palavra tem o Governo, que faz dos

reformados o principal alvo da austeridade? Perguntamos: onde está Paulo Portas, defensor dos

pensionistas?

Aplausos do BE.

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A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é de Os Verdes.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro de Estado, Sr.ª Secretária de

Estado: Já percebemos há muito que este Governo está decidido a acabar com o Estado social e que a isso

chama «reforma do Estado».

Também já percebemos que este Governo não sabe fazer mais nada que não seja impor austeridade e que

o faz em nome da reforma do Estado. São cortes nos salários, cortes nas prestações sociais e nas reformas

— nos seus reformados, Sr. Ministro! —, cortes nos direitos das pessoas, cortes nas políticas sociais, mais

impostos e menos serviços públicos… E continua sem resolver nenhum dos nossos problemas.

A situação, aliás, agrava-se ainda mais cada vez que o Governo impõe novos pacotes de austeridade. É

mais desemprego, mais pobreza, mais exclusão social, mais défice, mais dívida pública e mais recessão.

Ainda hoje, ficámos a conhecer as previsões da OCDE, que apontam, de forma muito clara, para uma

recessão mais profunda ainda este ano e que para o ano a nossa economia irá crescer muito menos do que

aquilo que o Governo esperava.

E, de facto, esses dados não nos surpreendem. O que nos surpreende é a cegueira do Ministro das

Finanças, que se aprontou de imediato a afirmar que, mesmo com estas previsões, o cenário macroeconómico

do Orçamento retificativo será exatamente o que consta do Documento de Estratégia Orçamental.

Portanto, tudo continua na mesma, tudo continua como dantes e continuamos a seguir as orientações

apagadas do iluminado Ministro das Finanças!

Mas o pior é que o Governo insiste nos sacrifícios e prepara-se agora para atacar de novo o seu alvo

preferido, que são os funcionários públicos.

Seria bom agora dizer que, quando o Governo fala de propostas de rescisão por mútuo acordo, não se

trata de despedir, que não estamos perante despedimentos. Nós temos de dizer que o Governo está a faltar à

verdade, o Governo não está a dizer a verdade, porque, de facto, o que o Governo se prepara para fazer são

despedimentos em larga escala no sector público.

Se dúvidas houvesse a este respeito, bastaria atender a um pequeno detalhe: é que o Governo avança

com esta medida e até já sabe quantos funcionários públicos estão dispostos a rescindir por mútuo acordo,

mesmo sem lhes ter perguntado nada. Isto é fantástico! O Governo até adivinha quantos funcionários públicos

aceitam a rescisão. De facto, uma previsão destas só mesmo vinda do mestre das previsões, que é o nosso

Ministro das Finanças!

O Governo fala de mobilidade especial, mas do que se trata é de uma verdadeira via verde para o

despedimento. Em vez de falar de mobilidade especial, seria melhor que o Governo falasse de despedimento

especial, porque o Governo quer despedir à margem da lei.

Aliás, este Governo tem muita dificuldade em conviver dentro do quadro constitucionalmente estabelecido.

Este Governo não convive bem com a nossa Constituição. Basta ver que ainda não foi capaz de nos

apresentar um único Orçamento do Estado que se contivesse dentro das normas constitucionais. Em dois

Orçamentos do Estado, o Governo violou a Constituição em ambos. Agora, foi a lei das comunidades

intermunicipais, que o Tribunal considerou inconstitucional. Mesmo assim, o Governo insiste em voltar a fazê-

lo, neste pacote de austeridade sobre os trabalhadores da Administração Pública.

Sr. Ministro de Estado, às vezes, fica a ideia de que o Governo não tem a noção de que temos uma

Constituição, à qual o Governo também está sujeito.

Para terminar, a pergunta que tenho para lhe fazer, Sr. Ministro, é sobre os seus reformados, os

reformados que foram objeto de toda a atenção do CDS-PP durante a campanha eleitoral e que já foram muito

castigados por este Governo, do qual o Sr. Ministro faz parte.

Sr. Ministro, num dia temos taxas nas reformas, no outro dia já não temos, afinal, consta do escrito…

Preto no branco: Sr. Ministro, vamos ter taxas nas reformas ou não?

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!

A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é do Governo.

Tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.

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O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados:

Começaria pela intervenção do Sr. Deputado Duarte Pacheco para lhe agradecer, desde já, o facto de lembrar

que várias reformas estruturais importantes para a competitividade do País puderam ser feitas em clima de

acordo social, coisa que considero singularizadora da situação portuguesa. Foi muito importante a reforma das

leis laborais, foi importante a reforma da lei da concorrência, foi importante a reforma da lei do arrendamento,

foram importantes reformas na área da justiça económica, porque o mundo não para.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Exatamente!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — O investimento é a fonte do crescimento: ou

temos condições favoráveis para atrair investimento ou os investidores vão procurar outros países e outras

paragens, e isso significa perder riqueza para Portugal e perder a oportunidade de ter postos de trabalho em

Portugal.

Queria também sublinhar a importância que atribuiu à medida do crédito fiscal ao investimento, que

constitui, na verdade, uma redução espetacular do imposto a pagar para quem invista agora, aqui e agora, em

Portugal, o que pode ser relevante para as empresas que estão a decidir se fazem investimentos este ano ou

no próximo, convidando-as a investir este ano, ou para as empresas internacionais que têm de optar, no radar

dos seus investimentos, entre Portugal e outro país, convidando-as a investir em Portugal.

Vozes do PSD: — Muito bem!

Protestos do PS.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Mas quero sublinhar, por concordância, que

só há uma maneira de o crédito fiscal ao investimento e a reforma do IRC funcionarem a favor da economia: é

a sua estabilidade.

Considero que, para lá de todas as diferenças, mesmo sabendo que estamos em ano eleitoral, para lá de

toda a crispação — e o País merecia mais acordo —, uma reforma como a do IRC, que nasce de uma equipa

de fiscalistas, possa ser estavelmente negociada entre os partidos do arco da governabilidade. É essencial

que um investidor saiba, quando decide fazer um investimento em Portugal, que aquela reforma que o convida

a pôr o seu dinheiro cá e a criar postos de trabalho cá, não fica em causa, seja qual for o resultado eleitoral.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Portanto, quero sublinhar e apelar para que,

em matéria de IRC, haja capacidade de entendimento entre as forças políticas do chamado «arco da

governabilidade» no nosso País.

Queria dizer ao Sr. Deputado António Braga, que saúdo, naturalmente, tal como a todos, que, como verá

na intervenção final, eu tenho usado especificamente a expressão «reformas do Estado» e «no Estado» e que

a querela que procurou colocar relativamente ao momento em que um documento aberto é proposto para

debate ao País teria sido bastante mais simplificada caso não se tivesse verificado aquela querela que,

presumo, ainda esteja por resolver — mas não quero meter-me na vida do próprio Parlamento! —, que é a de

ter sido proposta uma comissão para a reforma da despesa,…

O Sr. António Braga (PS): — Reforma da despesa é convosco!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Isso é!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — … e o primeiro partido da oposição, que é

partido do arco da governabilidade e que aspira, naturalmente, a poder governar, ter entendido que não devia

participar.

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Protestos do PS.

Reformar não é cortar. Evidentemente que para reformar e revisitar certas funções do Estado é preciso

fazer opções pragmáticas — e já direi alguma coisa sobre isso —,…

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Diga! Diga!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — … sobre quem as deve fazer, em nome de

quem, com que serviço e com que garantia de qualidade, mas teria sido tudo, provavelmente, mais simples

nessa matéria.

Gostaria ainda de dizer ao Sr. Deputado António Braga o seguinte: quando o Partido Socialista se

aproximou de uma questão concreta — lembro-me que até estavam em jornadas parlamentares — sobre o

que fazer com a contribuição na ADSE (estamos a falar de uma contribuição que é voluntária, as pessoas

podem optar pelo Serviço Nacional de Saúde), no que é que isso deu, se bem se lembram? Numa divisão

dentro do Partido Socialista.

O Sr. António Braga (PS): — Não é verdade!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Deputado António Braga, deixe-me só

dizer-lhe isto,…

O Sr. António Braga (PS): — Não é verdade! É falso!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — … não está a interpretar-me bem. É que é

normal que haja diferenças de opinião sobre este assunto.

O Sr. António Braga (PS): — Não é!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — É normal! Não veja isto como um pecado.

Saber se, não sendo a ADSE sustentável, devia acabar-se com a ADSE — proposta de uma eminente figura

socialista — ou procurar aumentar ligeiramente a contribuição para garantir o mesmo perímetro de serviços é

uma opção, pode haver diferenças de opinião, incluindo nos partidos maiores.

O Sr. António Braga (PS): — A nossa não é uma nem outra!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Quero apenas chamar a atenção de que as

reformas sobre os serviços do Estado implicam opções de responsabilidade, não se resumem a um discurso

político e, quando somos confrontados com o que fazer nesta matéria, acho que uma das razões que leva o

Partido Socialista a querer estar longe de qualquer reforma no Estado ou para o Estado é não querer tomar

opções.

O Sr. António Braga (PS): — Mas está aqui! Nós fizemos propostas!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Mas um dia, se confirmarem a vossa ambição

de voltar a governar o País, têm de tomar opções, e era bom que as pessoas as conhecessem.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Queria dizer ao Sr. Deputado António Braga que o modelo que partilho em matéria de Estado social é o

que a Constituição prevê e é o que é tributário do modelo social europeu do qual nos devemos orgulhar e que,

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por razões de competitividade internacional, por razões de envelhecimento demográfico e por razões de

rarefação do crescimento económico, tem de ser reformado para ser preservado, para ser salvaguardado.

Ninguém contará, certamente, com este Governo para ultrapassar o modelo social europeu como fonte de

legitimação de uma política e de uma prática social.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Ao Sr. Deputado Hélder Amaral, quero também dar-lhe razão relativamente à questão do IRC e do crédito

fiscal ao investimento. E quero chamar a atenção para a seguinte expressão que utilizou: «Uma Administração

que seja capaz de tratar o cidadão como cliente» (não como vítima, não como cobaia, não como alguém que

tem de esperar que uma certa forma de ser Administração resolva). De facto, o cidadão é, muitas vezes, um

cliente do Estado, porque o paga através dos seus impostos. É precisamente essa a diferença. É que o

cidadão não tem de ter uma servidão relativamente à burocracia; o cidadão paga com os seus impostos um

Estado que pode ser mais eficiente. E nós não devemos desistir de procurar que ele seja mais eficiente,

nomeadamente para promover o investimento e a criação de emprego, em Portugal. Essa deve ser a

orientação essencial da desburocratização.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Diria ao Sr. Deputado Bernardino Soares que, mesmo que ele não queira, as rescisões por mútuo acordo

são exatamente isso: por mútuo acordo! E se houver desacordo de uma parte, não há mútuo acordo e não há

rescisão.

Protestos do PCP.

Não queira transformar as coisas naquilo que não são.

A segunda matéria a que se referiu explicitamente foi à chamada «TSU das pensões». Conhece a minha

posição: sou politicamente incompatível com essa medida. Há um mês, ela era uma obrigação para o Estado

português; hoje, é uma mera opção e temos o compromisso de a evitar. O que interessa aos pensionistas da

CGA e da segurança social é que ela seja evitada. E acho que o vamos conseguir.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E, não estando eu aqui na qualidade de líder partidário, há de reconhecer, pelo menos no que a mim diz

respeito, que já estive ligado, quer com o Partido Socialista, ao maior aumento de sempre dos reformados do

setor rural,….

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Nós também votámos isso!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — … quer no Ministério da Defesa, à criação da

pensão dos antigos combatentes, quer no Governo anterior de que fiz parte e que era de coligação, ao

programa de convergência das pensões mais baixas, quer neste Governo de que faço parte, ao

descongelamento das pensões mínimas, das pensões sociais e das pensões rurais, as mais baixas,

abrangendo 1 milhão de pessoas, pensões essas que tinham sido congeladas pelo Governo anterior.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Não é, portanto, uma qualquer lembrança ocasional; é uma medida de humanismo e de humanidade

relativamente a quem, em Portugal, é mais pobre e mais vulnerável.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Cortou as reformas!

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O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr.ª Deputada Mariana Aiveca, já lhe dei a

resposta relativamente à questão das pensões. Em relação à ADSE, queria chamar a sua atenção para que o

sistema não é obrigatório. E não lhe há de parecer, com certeza, uma diminuição o acesso ao Serviço

Nacional de Saúde, ou, então, não faz sentido o seu discurso relativamente ao Serviço Nacional de Saúde.

Portanto, se há um sistema que é específico e que tem uma cobertura superior, é natural que também

tenha uma forma de financiamento superior, sendo voluntária, ou não, a adesão a essa forma de

financiamento.

Mas, em qualquer caso, queria chamar a atenção para que nós consideramos — é uma divergência que

temos — que é necessário Portugal distinguir-se no plano externo como um País que é globalmente

cumpridor, ou seja, que ganha confiança, um País que não conseguia financiar-se autonomamente e que

precisa de voltar a conseguir financiar-se autonomamente, um País que, ainda assim, não descura, nem pode

descurar, as condições de coesão social e de acordo político mínimo para darmos de nós próprios a melhor

reputação e a melhor credibilidade junto dos nossos parceiros internacionais, o que tem um sentido essencial

que serve a todos: é que cumprir o Memorando significa que, em junho de 2014, aqueles que hoje têm um

poder de decisão, por causa da nossa dívida e por causa do nosso défice sobre assuntos que são nossos,

deixam de o ter e Portugal recupera a sua autonomia.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E quem é que está a preparar o segundo resgate?!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr.ª Presidente, creio que já me excedi no

tempo e agradeço a sua benevolência.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Eu também agradeço, Sr. Ministro, porque aqui quase sempre se excedem e nunca

ninguém agradeceu.

Risos do PSD e do CDS-PP.

Antes de passarmos à segunda ronda, há um pedido de palavra por parte do Sr. Deputado Carlos Zorrinho.

É para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — É para interpelar a Mesa na estrita interpretação da condução dos

trabalhos, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Sr.ª Presidente, foi feita aqui uma declaração muito importante para o

futuro de Portugal. O Sr. Ministro disse que não faria uma reforma do modelo social que não respeitasse a

Constituição.

A Sr.ª Presidente: — Isso não é sobre a condução dos trabalhos, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — O meu pedido é que esta intervenção fosse rapidamente transcrita, enviada

ao Sr. Ministro das Finanças, para efeitos da próxima negociação com a troica.

Aplausos do PS.

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A Sr.ª Presidente: — Fica registado, Sr. Deputado, sabendo-se que as interpelações, aqui, são todas

objeto de um tratamento hábil por parte dos oradores.

Passamos, então, à segunda ronda. A próxima intervenção é do PSD.

Tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Soares.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros,

Sr.ª Secretária de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados: Confesso que no início deste debate acreditava ainda que

fosse possível fazermos hoje, aqui, a discussão que o País, lá fora, espera que esta Câmara faça, a

verdadeira discussão sobre a reforma do Estado.

Achava eu que o Bloco de Esquerda vinha aqui, hoje, discutir propostas concretas para tornarmos o nosso

Estado mais sustentável.

Julgava eu que o Partido Comunista Português vinha aqui, hoje, acabar, de vez, com uma confusão que

parece querer fazer lavrar na cabeça dos portugueses, a de que reformar o Estado nada tem a ver com um

ataque às prestações sociais.

Pensava eu que, hoje, pela primeira vez, o Partido Socialista iria trazer propostas concretas para a reforma

do Estado. No entanto, o Partido Socialista veio aqui, hoje, «fazer um número» que julgo inacreditável. Veio

dizer-se disponível para discutir a reforma do Estado, mas hoje ainda estamos todos à espera que indiquem os

seus Deputados que constituem a comissão eventual que, nesta Câmara, foi proposta para fazer essa mesma

discussão.

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Ficou hoje claro para todos os portugueses que o Governo e os

partidos da maioria querem encontrar soluções, querem encontrar propostas concretas para o futuro, para que

o País possa ser sustentável. É que a reforma do Estado não é o debate de uma geração, não é o debate da

minha geração, não é o debate da geração anterior, não é o debate das gerações que hão de vir, é o debate

de todas as gerações.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Mas qual reforma? Diga! Isto não é reforma nenhuma!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Que País queremos construir? Que País queremos deixar aos

nossos filhos? Que País queremos que garanta que aqueles que mais precisam, os idosos, os jovens e as

crianças, possam ter sempre a proteção do Estado social?

Essa é que é a discussão sobre a reforma do Estado. E é essa discussão que nem o Bloco de Esquerda,

nem o Partido Comunista Português, nem o Partido Socialista querem fazer.

Mas este é um debate que a todos deve convocar. Deve convocar, designadamente, os partidos do arco da

governação, a saber, o Partido Socialista.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Do arco da governação?!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Ouvi agora esta interpelação à Mesa do líder parlamentar do Partido

Socialista, pedindo para distribuir uma declaração absolutamente verdadeira do Ministro de Estado e dos

Negócios Estrangeiros, que diz que queremos reformar o Estado no estrito cumprimento da Constituição da

República Portuguesa.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Esta é verdadeira, não é como aquela que vocês distribuíam!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Diz o Deputado Carlos Zorrinho: entreguem essa declaração ao

Ministro das Finanças, porque ele é que negociou com a troica. Mas quem é que negociou o Memorando

original? Não foi o Partido Socialista que negociou o Memorando com a troica?!

Julgo que essa declaração deve ter um efeito boomerang e ser distribuída ao Partido Socialista.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Temos de reformar o Estado sem demagogias, sem preconceitos ideológicos, mas também sem tabus

eleitoralistas. Queremos, ou não, uma segurança social sustentável? Queremos, ou não, discutir a melhor

forma de potenciar a nossa Administração Pública?

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Diga quais são as medidas! Diga!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Queremos, ou não, uma escola pública de qualidade e um Serviço

Nacional de Saúde de excelência, mas sustentável?

Sr.ª Presidente, espero que nas intervenções que se seguem não se perca a oportunidade…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Esta já se perdeu!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — … de os partidos que ainda irão intervir neste debate darem um

verdadeiro contributo para a reforma do Estado.

Termino, dizendo o seguinte: na verdade, incompatíveis com a austeridade, somos todos. É por isso que

queremos reformar o Estado, para aliviar os sacrifícios dos portugueses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Estão ainda inscritos, para intervir, os Srs. Deputados Pedro Nuno Santos, do PS,

Nuno Magalhães, do CDS-PP, Jorge Machado, do PCP, Cecília Honório, do BE, José Luís Ferreira, de Os

Verdes, e, finalmente, o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.

Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Nuno Santos.

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr.as

e Srs. Deputados: Ainda bem que é o

Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros que vem a este debate. Tem aqui, hoje, no Parlamento, a

oportunidade de clarificar definitivamente a sua posição sobre as pensões e, nomeadamente, de explicar ao

País por que é que é contra a «TSU dos pensionistas» mas aceita o corte retroativo nas pensões para a Caixa

Geral de Aposentações (CGA).

Aplausos do PS.

Qual é hoje a diferença, para si, entre um reformado do setor público e um reformado do setor privado?

Qual é, para si, a diferença entre uma reforma de 650 € de um reformado do setor público e uma reforma de

650 € de um reformado do setor privado?

Aplausos do PS.

Explique aqui por que é que aceita cortes de 740 milhões de euros nas pensões do setor público mas não

quer um corte de 400 milhões de euros no resto das pensões.

Explique qual é para si a diferença entre uns e outros reformados.

O Sr. Ministro e a maioria defendem um corte de 4000 milhões de euros no Estado. Chamam a esse corte

«reforma do Estado» e dizem que essa reforma é essencial para termos um Estado mais ágil e mais eficiente.

Deixemo-nos de conversa! O que os senhores querem é cortar nas pensões, cortar nos salários e despedir

trabalhadores do setor público, e não um Estado mais ágil, nem um Estado mais eficiente.

Os senhores defendem uma pseudorreforma do Estado, porque é a única alternativa ao aumento de

impostos. Só que para os cidadãos que vão sofrer as consequências deste corte de 4000 milhões de euros é

exatamente a mesma coisa. Cortar salários é aumentar impostos para esses trabalhadores. Cortar pensões é

aumentar impostos para esses pensionistas. Cortar no subsídio de desemprego, cortar no subsídio de doença,

aumentar os custos no acesso à saúde, tudo isso é outra forma de aumentar os impostos. É falso que seja

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uma alternativa aos impostos, até porque não vão sequer baixar nenhum dos impostos que aumentaram até

agora.

Aplausos do PS.

Os senhores conduzem o País como se estivessem a conduzir um automóvel em excesso de velocidade,

numa estrada. Vão a 200 km/hora, batem noutros automóveis, vão para a berma, atropelam milhares de

cidadãos, o carro está a sair… e negoceiam com a troica o regresso à estrada. Só que, quando negoceiam

com a troica o regresso à estrada, é para rapidamente voltarem a acelerar, voltarem aos 200 km/hora. Têm um

País inteiro a pedir «vão mais devagar, pensem, parem!». Mas não, depois de regressar à estrada, voltam a

acelerar, voltam a bater nos automóveis, voltam a ir para a berma, a atropelar pessoas! E, mais uma vez,

negoceiam o regresso à estrada, para voltar a fazer o mesmo. Continuam sem aprender e continua o País

inteiro a sofrer.

Prometem uma reforma do Estado para ajustar a despesa à capacidade de produzir da economia. Mas, de

cada vez que fazem um corte na despesa do Estado, diminuem a capacidade de produzir da economia.

Esta é uma corrida para o fundo. De ajustamento na despesa em ajustamento na despesa, vão mingando a

capacidade da economia portuguesa produzir. É uma receita falhada. Com dois anos de fracasso, continuam a

revelar que não conseguem retirar as consequências do fracasso da vossa política.

Não é reforma do Estado! É corte na despesa, é mais austeridade, é menos qualidade de vida para os

portugueses, designadamente para todos os trabalhadores do setor público e do setor privado.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr.ª e Sr. Secretários de Estado, Sr.as

e

Srs. Deputados: Caminhamos para o final de um debate sobre a reforma do Estado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Pensei que era do Governo!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Bem sei que ainda faltam duas intervenções, mas confesso não ter

grande esperança que venham a alterar significativamente o que tenho para vos dizer e, por isso, em nome do

CDS, gostaria de tirar duas ou três conclusões.

Primeira: Sr. Ministro, parece-nos que, do que foi dito e, sobretudo, do que não foi dito por todos os

partidos da oposição — e já todos falaram —, este debate sobre a reforma do Estado é um debate no qual

todos dizem querer participar, mas, quando chamados a fazê-lo e a propor alternativas, todos parecem querer

faltar.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — A começar pelo Governo…!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Não quero fazer juízos de intenção nem de valor, não quero dizer

que isso tem a ver com as eleições autárquicas que se aproximam, porque acho, Sr. Ministro, que, apesar

dessa ausência da oposição em relação à reforma — não houve sequer uma leve aparência de proposta —,

podemos e devemos aproveitar este debate para esclarecer a opinião pública em relação a alguns mitos.

O primeiro mito é o de que reformar o Estado social é destruí-lo; pelo contrário, é mantê-lo, e é mantê-lo

por aquelas famílias políticas — o socialismo democrático, a social-democracia e a democracia cristã — que,

na Europa, durante décadas e, curiosamente, na altura, com o protesto e a oposição daqueles que hoje se

pretendem apropriar dele, conseguiram construí-lo. É um mito que importa desfazer e, sobretudo, um embuste

que importa denunciar.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

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Sr. Ministro, devo ainda dizer que reformar o Estado não é criar um Estado mínimo, é criar um Estado

adequado, proporcional e eficaz nas circunstâncias nacionais e internacionais que neste momento

atravessamos e de acordo com as necessidades dos cidadãos.

Terceiro mito: reformar o Estado não é manter por si só um Estado forte, é criar um Estado que seja capaz

de ser eficaz e o rigor orçamental, como aqui foi dito, e bem, não é uma opção política ou, sequer, um estado

de espírito provisório, mas, sim, uma obrigação a que Portugal está vinculado por força de documentos

nacionais e internacionais que assinou. E não estou a falar do Memorando do Entendimento, estou a falar do

Tratado de Lisboa, do tratado orçamental ou da Lei de Enquadramento Orçamental. Por isso, Sr. Ministro, é

bom relembrá-lo a todos os partidos, em especial ao maior partido da oposição, àquele que foi, e certamente

será, alternativa do ponto de vista governativo.

Até 2014, data do fim do estado de protetorado a que fomos e somos obrigados a viver, Portugal não é,

pelo menos do ponto de vista orçamental, um País livre, terá uma liberdade condicionada — para não dizer

que ela foi suspensa — e todos nós, mais do que não seja em nome do Estado em que estamos, e

independentemente de quem nos trouxe aqui e porquê, temos, para com as gerações futuras e atuais, a

obrigação de apresentar alternativas, de sermos construtivos, de procurar o que nos une, na concórdia política

e social mínima, para que possamos, em 2014, recuperando a nossa liberdade orçamental, voltar a ser um

País dono do seu destino. E as novas alternativas, as novas propostas poderiam sair daqui. Mas, até aqui, aos

costumes disse-se rigorosamente nada, a não ser uma comissão a que o Sr. Deputado Carlos Zorrinho está

neste momento a fazer referência mas que, manifestamente, dela não quis fazer parte.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é do PCP.

Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, o Sr. Ministro, tal como as bancadas do

PSD e do CDS-PP, fala da reforma do Estado mas foge das medidas concretas da dita reforma do Estado,

que estão em cima da mesa, como o «diabo foge da cruz», o que, para um partido democrata cristão, tem que

se lhe diga! Foge destas medidas porque este pacote de medidas anunciado é terrorismo social, não é

reforma absolutamente nenhuma.

Vamos às medidas que estão em cima da mesa: os aumentos dos descontos da ADSE para os

trabalhadores e reformados, que são um novo corte nos salários e nas reformas — fale lá do «cisma grisalho»

a propósito desta medida —, e o aumento do horário de trabalho dos trabalhadores da Administração Pública,

impondo 40 horas como o limite mínimo, e não máximo, como no setor privado.

Mais uma vez, em vez de caminhar no bom sentido, no de melhorar as condições de trabalho de todos, o

Governo opta por mais exploração e mais despedimentos. É o ataque aos reformados, a todos os reformados,

com o aumento da idade real da reforma, a dita convergência da Caixa Geral de Aposentações e a segurança

social e a taxa de sustentabilidade, que são novos cortes nos reformados;…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — … é a mobilidade especial, a dita requalificação e, agora, com os seus 12

meses de duração, o subsídio de desemprego e a indemnização, torna-se claro que não se trata de um

sistema de qualificação mas, sim, de um mecanismo para o despedimento sem justa causa de milhares de

trabalhadores da Administração Pública.

Por fim, a dita reforma de que tanto falam é nada mais, nada menos do que um programa de rescisões

ditas amigáveis, o maior despedimento coletivo da nossa história: são 30 000 trabalhadores despedidos num

objetivo global de 50 000 saídas de trabalhadores da Administração Pública. Isto num cenário em que já temos

menos trabalhadores do que a média da OCDE.

Mais: este programa de rescisões, Sr. Ministro, que visa despedir 30 000 trabalhadores da Administração

Pública, é criado por portaria. É habitual nos debates parlamentares dizer-se que não se cria emprego por

decreto, mas a verdade é que o Governo prepara-se para criar desemprego por portaria!

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Aplausos do PCP.

Sr. Ministro, Srs. Deputados, isto não é reforma do Estado, não é eficácia dos serviços, é destruição de

serviços públicos, que foram uma conquista de Abril e que fazem falta a muitos e muitos portugueses.

Mais, e para terminar, Sr.ª Presidente: vieram a debate parlamentar duas mistificações e duas mentiras.

A primeira foi a de que gastamos demais com a Administração Pública e não conseguimos suportar estes

custos. É mentira! A OCDE afirma que as despesas com pessoal são de 11% do PIB. Ora, a Dinamarca gasta

18% e França gasta 13% do PIB. Gastamos menos do que Espanha, a Grécia ou a Irlanda. Gastamos 6,8%

do nosso PIB em saúde, enquanto França gasta 8% e a Alemanha 7% do seu PIB.

Dizem que não conseguimos suportar a proteção social no nosso País. Gastamos 36,7% da despesa,

quando a média da União Europeia é de 40% e a Alemanha gasta 43% da despesa em proteção social.

Segunda mentira: dizem que, para além de gastarmos mais do que é suposto, não temos dinheiro para os

serviços públicos. É mentira! Sr. Ministro, não temos é 12 000 milhões de euros para entregar de «mão

beijada» à banca, não temos é 7000 milhões de euros para os juros agiotas do FMI, não temos é 3000 milhões

de euros para dar em swaps, não temos dinheiro para continuar a dar benefícios fiscais aos grandes grupos

económicos, não temos dinheiro para pagar as PPP multimilionárias que são dadas aos grandes grupos

económicos? Para isto é que não há dinheiro! Os portugueses pagam os seus impostos para ter saúde,

educação, justiça e proteção social. Não pagam os seus impostos para dar à banca e aos grandes grupos

económicos!

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é do Bloco de Esquerda.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr.ª Secretária de Estado, Sr.as

e Srs.

Deputados: Sr. Ministro, permita-me que cite palavras suas, proferidas da bancada do CDS, adaptadas aos

dias que vivemos: «Dois anos depois, Portugal tem o maior endividamento de sempre, a maior carga fiscal de

sempre, o maior desemprego de sempre. Portugal é um País em que a esperança é cada vez mais rara (…),

com um governo que se relaciona com realidade em contactos curtos e intermitentes.»

Disse ainda o Sr. Ministro que «Portugal é hoje o campeão das falências, do desemprego, da injustiça

social» e, hoje, da falta de investimento. Por este andar, Sr. Ministro, o senhor ficará para a história como o

campeão da destruição do Estado social!

Aliás, os portugueses sabem que qualquer semelhança entre aquilo que disse antes das eleições e o que

faz depois das eleições é mera coincidência.

O Sr. Ministro enganou os professores, de quem esteve ao lado em toda a campanha eleitoral: foram

milhares foram para o desemprego.

Os pobres estão hoje cada vez mais pobres, com cortes sucessivos nas prestações sociais e esta caça

humilhante ao rendimento social de inserção (RSI).

O Sr. Ministro mentiu aos pensionistas e aos reformados, a todos aumentou os impostos e os cortes nas

pensões foram mais de 10% para a Caixa Geral de Aposentações e vamos ver como ficará a sua palavra de

honra relativamente à TSU dos pensionistas.

O Sr. Ministro enganou os contribuintes com mais impostos todos os dias, enganou os doentes, com

menos acesso ao Serviço Nacional de Saúde e enganou todas as famílias, a quem prometeu um visto familiar

por cada medida deste Governo.

Alguém devia dizer: «Tenha um gesto de humildade e saia, Sr. Ministro.» Mas, à falta de tamanha

humildade, ao menos tenha a humidade de explicar a este Parlamento com que medidas concretas vai fazer

os cortes que este Governo apresentou à troica e que constituem um compromisso: 325 milhões de euros para

cortar na educação, nos próximos 2 anos; 299 milhões de euros na segurança social; 127 milhões de euros na

saúde. Deixemo-nos de «falinhas mansas». Com que políticas concretas vai este Governo fazer todos estes

cortes brutais com os quais está comprometido perante a troica?

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Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é de Os Verdes.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Já há pouco referi as

dificuldades deste Governo em conviver com a nossa Constituição. O Governo move-se mal e convive com

visível desconforto no quadro constitucional e também com as soluções sociais do Estado que decorrem

dessa Constituição. Isto é visível sempre que o Governo anuncia medidas. Foi visível no Orçamento do Estado

para 2012, foi visível no Orçamento do Estado para 2013, é visível agora na lei das comunidades

intramunicipais e nas alterações à legislação laboral, sobre as quais o Tribunal Constitucional ainda não se

pronunciou mas cujo resultado se adivinha. É agora visível nesta nova ofensiva contra os funcionários

públicos, com cortes que o Governo pretende que venham a ter natureza permanente e que também são de

duvidosa constitucionalidade.

Nesta matéria, há uma agravante: é que o Governo pretende fazê-lo através de uma portaria, com o

propósito claro de fugir ao debate e de excluir a Assembleia da República dessa discussão, fazendo-o, assim,

em silêncio.

Para além da forma, interessa também olhar para o conteúdo, porque o Governo parece que não conhece

limites quando se trata de impor sacrifícios às pessoas que trabalham e, agora, no caso concreto, aos

trabalhadores da Administração Pública: menos dinheiro durante as baixas por doença, mais 5 horas de

trabalho por semana, redução de férias e de direitos laborais, aumento da idade da reforma e mais

despedimentos.

Sr. Ministro, por este caminho, onde é que isto vai parar?! Onde é que termina este pesadelo?!

Mais, Sr. Ministro: sendo o desemprego o maior problema com que hoje nos defrontamos, e que aliás este

Governo transformou num verdadeiro pesadelo social, seria oportuno que nos explicasse, com a clareza que

lhe é característica, qual é o contributo destas medidas para combater o desemprego.

Explique-nos, Sr. Ministro, de que forma é que o aumento da idade da reforma contribui para combater o

desemprego. De que forma é que o aumento do horário de trabalho para os funcionários públicos contribui

para combater o desemprego? De que forma é que este verdadeiro despedimento coletivo, que é, aliás, o

maior despedimento coletivo de que há memória, contribui para combater o desemprego?

Sr. Ministro de Estado, creio que seria importante que nos explicasse como é que estas medidas encaixam

na estratégia do Governo no que diz respeito ao combate ao desemprego, que o Governo diz estar a fazer.

Seria importante que os portugueses entendessem, porque ninguém compreende, como é que o Governo

combate o desemprego despedindo. Explique-nos, Sr. Ministro, porque não estamos a ver como é que se

combate o desemprego despedindo.

A Sr.ª Presidente: — Segue-se a intervenção do Governo, através do Sr. Ministro de Estado e dos

Negócios Estrangeiros.

O Governo solicita que o tempo desta intervenção se some ao da seguinte, que é a primeira do

encerramento, sendo que este procedimento já tem precedente.

Não havendo objeções, daria a palavra, então, ao Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros,

conjugando os dois momentos de intervenção.

Faça favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr.ª Presidente, muito obrigado pela

possibilidade que me dá.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Antes de passar diretamente à intervenção final, não queria deixar

de dizer ao Sr. Deputado Bernardino Soares, porque ficou por dizer, que considero que a política que leva a

um segundo resgate, a um segundo pacote financeiro e a um segundo calendário da troica é exatamente a

oposta daquela que acho que, dentro das circunstâncias, é a melhor, ou seja, um só pacote financeiro, um só

calendário, troica até ao fim de junho de 2014, um só resgate.

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E quem está a prepara o segundo resgate?

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Quem defende, nomeadamente, a política do

«não cumprimos e não pagamos», que conduz inexoravelmente ao segundo resgate, como sabe.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Queria dizer ao Sr. Deputado José Luís Ferreira, de Os Verdes, que suponho que já me terá ouvido referir

que os programas de ajustamento devem ter adaptação à realidade, que os esforços devem ser realistas e as

metas devem ser atingíveis, e ter-me-á ouvido dizer também que considerava que era difícil atingir, e dependia

muito de uma conjuntura externa que fosse mais favorável em vez de desfavorável, o estabelecido para 2014.

Por isso, acho que o Governo faz bem em abrir a possibilidade de flexibilizar, em negociação com os

credores, essa meta; assim sendo, só posso declarar que me preocupa a projeção que a OCDE faz, como é

evidente.

Queria dizer ao Sr. Deputado Pedro Nuno Santos, não tentando usar o mesmo acelerador nem as mesmas

regras de trânsito que utilizou na sua intervenção, o seguinte: cada um tem a força que o povo lhe dá. No meu

caso, deram-me 12% dos votos e eu procuro, em parceria…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Em mútuo acordo!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — … com o PSD, com quem tenho uma

coligação, defender 3,5 milhões de pessoas de uma taxa que é injusta e que tem um impacto económico

errado.

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Ah, o senhor é que é o travão!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Os senhores tinham 40% dos votos e usaram

esses 40% para congelar pensões de 249 €.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Que demagogia!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Veja lá a diferença: com 40% dos votos, que

o povo vos deu, congelaram pensões de 189 €, de 226 € e de 246 €!

Tenham, então, um bocadinho mais de consideração por quem, com muito menos votos e atuando em

parceria, numa coligação,…

Vozes do PCP: — Azar do PSD!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — … procura defender as pensões de 3,5

milhões de pessoas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — É só demagogia!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Queria dizer à Sr.ª Deputada Cecília Honório

que se esqueceu, porventura, de um facto absolutamente essencial: é que o meu primeiro compromisso

eleitoral foi «cumprir os acordos com os parceiros internacionais para devolver ao meu País a liberdade e a

independência que foi perdida no dia em que começou o protetorado.»

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Isto está escrito, foi dito e a Sr.ª Deputada esqueceu-se, por acaso, de o mencionar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Reconhece que assinou o acordo de capitulação.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — O que vos pode maçar é que, um dia, o povo,

comparando o que cada um consegue e o que cada um faz, continue a fazer as escolhas e os senhores

continuem no lugar em que o povo vos tem colocado.

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — O senhor é o Miguel Vasconcelos!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — E isso tem porventura a ver, mas esse é um

outro debate, com o facto de o Bloco de Esquerda nunca aceitar partilhar responsabilidades. Ora, só se

governa um País aceitando partilhar responsabilidades.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. João Semedo (BE): — Ora essa! Ora essa!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — E esse é que é o problema de fundo!

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Queria começar por esclarecer o que é que, do nosso ponto de

vista, devem ser e o que não devem ser reformas do Estado e no Estado.

Reformar o Estado é, essencialmente, servir melhor o cidadão. A ideia de que qualquer mudança no

Estado é inaceitável significaria o impasse de um País bloqueado em dois sistemas diferentes: uma

administração intocável, assente essencialmente em direitos, e uma sociedade que financia essa

administração e não tem alternativa a cumprir os seus deveres.

O princípio de equidade ou de uma maior equidade entre todos os cidadãos, trabalhem no setor público ou

no setor privado, é, por isso, justo.

Reformar o Estado passa, evidentemente, por revisitar com cuidado as funções do Estado e tratar

diferentemente funções que são diferentes.

É evidente que as funções de soberania não são delegáveis, mas isso não quer dizer que as políticas de

defesa, de segurança, de justiça ou diplomacia devam ter, no Portugal do século XXI, e observando apenas o

interesse geral, a mesma ordem de prioridade e a mesma dimensão que tinham no século passado.

É ainda evidente que, em circunstâncias económicas recessivas e visando acelerar um horizonte de

crescimento, as funções de fomento económico ganham outro alcance. A isso não será independente, por

exemplo, a missão do banco público quanto ao financiamento da economia, as lições aprendidas quanto à

eficiência e à transparência na aplicação dos fundos comunitários ou o progresso que temos de fazer em

inovação e qualificação nas empresas e nas escolas.

Por fim, é nítido que as funções sociais do Estado marcam um aferidor do humanismo e inspiram uma

ambição de desenvolvimento. São, aliás, tributárias de um legado político, o modelo social europeu, que

precisa de ser reformado exatamente porque precisa de ser protegido e salvaguardado.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Outra coisa já bem diferente é que, nas suas

políticas sociais, o Estado reserve para si, em todas as formas e em todos os momentos, tanto a função

financiadora como a função prestadora.

O Estado será sempre o protagonista essencial das políticas sociais, mas não é o único ator social, em

Portugal, nem é o único protagonista que sabe e pode fazer política social com qualidade e proximidade.

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Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — O exercício de reformar o Estado, ao

contrário do que, por vezes, tem sido dito, não deve ter uma natureza ideológica, deve, sim, ter uma natureza

pragmática.

Administrações menos dispendiosas no custo, menos burocráticas no funcionamento e menos conflituantes

na decisão não se confundem com um Estado mínimo, nem com um Estado de mínimos, mas podem e devem

confundir-se com um Estado melhor e com melhores práticas.

Aliás, no próprio núcleo duro do Estado social, os elementos que temos de saber enfrentar e resolver não

são tipicamente de esquerda nem de direita. São factos da economia e da sociedade, entre os quais a

rarefação do crescimento económico ou o acentuar do declínio demográfico no Portugal da última década, o

que tem evidentemente consequências sobre a sustentabilidade das políticas sociais.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Evitar a rutura do contrato social, conseguir

uma relação equilibrada entre os que contribuem agora para o sistema e os que contribuíram antes e manter

níveis com ambição de proteção e ação social, levando em devida conta os mais fracos e os mais pobres

numa sociedade que não consegue enriquecer mas está a envelhecer, não é um manifesto partidário, é um

desafio nacional,…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — … que implica estudos de altíssima

complexidade técnica, que não se resume a uma simplificação política; fazê-lo é um dever social e não uma

redução social e fazê-lo com ponderação é um projeto que pode unir e que não deve segregar.

Não escapa a nenhum observador que reformar o Estado é um exercício que tem de respeitar um conjunto

de limites e obrigações.

Como é próprio de um Estado de direito, é necessário que as reformas sejam produzidas dentro do marco

constitucional. Tudo o mais seria deletério e, aliás, contraproducente na exata medida em que a Lei

Fundamental de um País não pode ser um exclusivo de uma parcela apenas da sua sociedade política.

De igual modo, Portugal tem constrangimentos financeiros que decorrem da sua situação de protetorado a

que nos levou a ameaça de bancarrota em 2011.

Esses constrangimentos — tomara eu poder dizer o contrário! — ainda não terminaram. Acresce que,

como nesta Câmara salientou, e bem, o Presidente da República no discurso do 25 de Abril, o nosso País

terá, ainda, no futuro, não apenas constrangimentos mas obrigações do ponto de vista do Tratado de Lisboa,

do Tratado Orçamental e das várias iniciativas em que se estriba o chamado governo económico europeu.

Nestas circunstâncias, em que estamos num protetorado que só termina em junho de 2014 (e cada dia que

nos deixe mais perto do fim do protetorado é um dia em que ficamos mais perto da reaquisição da nossa

independência) e com obrigações de responsabilidade financeira como contrapartida da solidariedade

europeia, repito, nestas condições, com um protetorado que ainda não acabou e obrigações de

responsabilidade financeira que serão permanentes no quadro europeu, é imperativo procurar exaustivamente

as condições de negociação política para as reformas que são necessárias e é imperativo explorar todas as

condições de negociação social que estejam ao dispor de um Estado que não pode deixar de se modernizar.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Quer isto dizer que a reforma do Estado

implica uma atitude aberta. O documento deverá ser negociável e melhorável, o que implica um método

específico, e procurar um acordo político e social, porventura não em relação a tudo mas em relação àquilo

que é mais estruturante para o futuro do País.

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Nesse plano, não quero aqui deixar de anunciar três questões que me parecem fundamentais para um

debate ordenado e produtivo.

Primeiro, uma despesa pública mais contida deve significar a possibilidade de uma carga fiscal mais

moderada.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Exatamente!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — É este, parece-me, o sentido útil, em primeiro

lugar, da reforma.

Terá de haver um momento em que a estabilização orçamental que vamos conseguindo permita uma

reversão da carga fiscal, que é, obviamente, uma dificuldade para o crescimento económico.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Se a recessão torna as coisas mais difíceis,

as próprias condicionantes da dívida aconselham a consensualizar, enquanto é tempo, o destino dos frutos do

crescimento para que, quando chegar um ciclo de crescimento, nos possamos entender sobre aquilo que pode

beneficiar a redução da nossa dívida e aquilo que pode beneficiar a redução da carga fiscal.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Saber quais são as prioridades da política

fiscal nessa área é uma discussão muito relevante e que, a meu ver, não deve ter faltas.

Em segundo lugar, administrações menos pesadas devem dar lugar a processos menos burocráticos. Não

é imaginável que uma administração com uma organização deficiente dos recursos humanos não possa

aproveitar a sua reestruturação inteligente para simplificar os processos, diminuir os procedimentos, rever os

sistemas e acelerar a capacidade de resposta que é dada ao público.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

É absolutamente necessário que a reforma lance as bases de um programa integral e integrado de

simplificação virada prioritariamente para as empresas e para o investimento.

Reduzir o número de procedimentos, reduzir a quantidade de departamentos que têm de se pronunciar,

evitar a mais que frequente contradição de vontades entre administrações, obrigar a respostas obrigatórias,

tempestivas, por parte da administração à família, ao cidadão, à empresa e ao investidor é a melhor ajuda que

um Estado menos pesado pode dar a uma economia mais forte.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Em abono do consenso, chamem-lhe, se quiserem, Simplex 2 — isso a mim não me causa nenhum

problema!

Risos do PSD.

Em terceiro lugar, um Estado mais atento ao cidadão, às famílias e às empresas pode e deve utilizar

instrumentos de política em que mantém a tutela de uma função mas não é, necessariamente, o seu executor.

Esta possibilidade é aberta quando esse mesmo Estado guarda para si funções de financiamento e de

supervisão, que são categóricas, mas admite utilizar mais exaustivamente os instrumentos de políticas

públicas como a contratualização e a concessão.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Muito bem!

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O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Os ganhos de gestão podem ser importantes

e só se deve contratualizar ou conceder quando há poupanças efetivas, porque se não isso seria fazer

ideologia e não ser pragmático.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Agora, quando há poupanças efetivas,

porque se concessiona ou porque se contratualiza, é preciso que o Estado seja forte na garantia da qualidade

do serviço prestado.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — A devolução de iniciativa à sociedade civil já

é praticada em várias áreas das políticas públicas. Seja na solidariedade, seja na educação, seja na saúde,

seja na agricultura, quanta contratualização faz o crescimento diário do nosso país, entre o Estado, a iniciativa

social, a iniciativa das associações e a iniciativa privada.

Não é preciso ter aqui, repito mais uma vez, nenhum fantasma ideológico. É ser pragmático, ver o que é

que outros podem fazer melhor, a um custo menos exagerado e com maior proximidade e garantir as

condições de transparência, supervisão e de qualidade do serviço.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — São estas três questões que, desde o início,

me parecem essenciais e que devem estar abertas à discussão de todos. Um Estado com um custo menos

pesado deve permitir uma carga fiscal mais moderada. Um Estado com menos peso, do ponto de vista

funcional, deve ser um Estado menos burocrático e mais simples para o cidadão. Um Estado que não quer

fazer tudo ao mesmo tempo e que tem a humildade de perceber que há quem possa fazer igualmente bem ou

melhor até do que ele, do ponto de vista do serviço à comunidade, deve estar aberto à contratualização e

reservar para si as funções inspetivas, as funções de supervisão e as funções de regulação e fiscalização da

qualidade do serviço.

É um caminho que, evidentemente, não é simples de fazer mas é, porventura, aquele que melhor serve às

gerações vindouras e essa é, certamente, a nossa primeira missão.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Agradeço ao Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, que, com esta

intervenção, preencheu a primeira fase do encerramento do debate.

Para preencher a segunda fase do encerramento, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, do

BE.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: O

debate desta tarde, proposto pelo Bloco de Esquerda, visava discutir as ideias que o Governo tinha anunciado

já em setembro do ano passado.

Em setembro do ano passado, o Governo dizia que queria criar um guião para a reforma do Estado. Em

fevereiro deste ano, o Governo dizia-nos que estava por dias esse guião e que o seu autor seria o Ministro

Paulo Portas, responsável desse pensamento, dessa reflexão e dessa materialização das propostas.

Chegados a finais de maio, o que nos diz o Governo é que já enviou à troica aquilo que quer cortar, porque

só quer mesmo cortar, mas as propostas, as medidas em concreto continuam a estar escondidas no gabinete

do Sr. Ministro Paulo Portas, continuam a estar à margem do conhecimento do País.

No decorrer deste debate, compreendemos também que este é um Governo que não vive bem consigo

próprio. O Governo chega, de manhã, ao pé do espelho e diz que não gosta do que vê.

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Disse o Sr. Ministro Paulo Portas, na abertura do debate, que o Bloco de Esquerda não fala, o Bloco de

Esquerda não cumpre e o Bloco de Esquerda não quer pagar. Pergunto se o Ministro Paulo Portas não estará

a falar deste Governo, porque quem não paga os salários e as pensões de quem trabalha e de quem

trabalhou, os direitos das pessoas, é este Governo. Quem não cumpre com as promessas eleitorais, com as

próprias metas orçamentais que já prometeu e continua a prometer, é este Governo. E quem não fala, como

se viu neste debate, é este Governo, que, perguntado sobre o guião de cortes que já sabe que vai fazer — já

colocou metas que dizem quanto vai cortar —, continua a esconder deste Parlamento, dos Deputados, que

devem fiscalizar o Governo, e do País aquilo que quer fazer.

Mas há hoje uma novidade. A novidade que o Governo nos traz, pela voz do Ministro Paulo Portas, é que,

afinal, vai corrigir aquilo que não cumpriu, ainda recentemente. Falo da Constituição.

Parece que hoje terá sido descoberta uma edição da Constituição, algures nos gabinetes do Governo, e

agora os Srs. Ministros vão levá-la para a mesinha de cabeceira. Esperemos é que não durmam no quarto ao

lado ou que não adormeçam logo após a abertura da primeira página. Já estamos a ver que, provavelmente,

vão continuar a não chegar ao princípio da confiança, ao princípio da igualdade e ao respeito pelo Estado de

direito, aquele que cumpre o direito dos seus trabalhadores, aquele que cumpre o direito dos seus

pensionistas, aquele que cumpre, com direito, os direitos dos seus cidadãos.

Aplausos do BE.

Quando este Governo nos fala de Constituição, creio que o País treme, porque se há coisa que este

Governo não conhece — vejamos ainda a decisão de ontem — é o que diz a Constituição.

Este Governo não tem uma visão, aquela que está na Constituição, de para que é que serve o Estado.

Vejamos o que foram as intervenções da maioria neste debate: do lado do CDS, nem uma palavra sobre

educação, nem uma palavra sobre saúde, e quanto ao PSD foi preciso deixar passar o tempo das duas

intervenções para ouvirmos uma referência fugaz, sem nada de concreto, sobre o tema.

Ora, este é o estado da reflexão da maioria! Percebemos bem, no final da intervenção do Sr. Ministro de

Estado, o que está em cima da mesa: cortar! Cortar naquilo que é de todos para dar ao monopólio de alguns;

cortar na despesa pública, com aquilo que nos faz falta, para continuar com o regabofe daquilo que sabemos

que são as rendas abusivas.

O Sr. Ministro disse ao que vinha. Dizia ele que precisamos de um Estado menos pesado para termos uma

economia mais forte. Ora, com este Governo, estamos como nunca, com um Estado que nunca foi tão leve

mas com uma economia que nunca foi tão má, e era hoje que a economia precisava de mais Estado, de mais

investimento público.

Vejamos quais foram os dados que saíram da OCDE, que nos dizem exatamente isso. É a política de

austeridade que está a destruir o País e são os cortes que este Governo está a fazer nos direitos das pessoas

que estão a levar a economia para o buraco.

O Sr. Ministro foi incapaz de responder às promessas eleitorais, à palavra que o Governo tem dado e,

agora, na prática, não respondeu ao guião mas respondeu ao debate ideológico.

Percebemos agora, na última intervenção do Sr. Ministro, que as escolhas não são técnicas, não são

económicas, nada têm a ver com a situação do País a não ser na utilização das contas públicas e da

destruição que o Governo está a fazer sobre elas para justificar cortes naquilo que a direita, ideologicamente,

sempre quis fazer: abrir aos privados, ainda mais, o espaço da educação, ter copagamentos na saúde e

despedir, despedir e despedir.

Vejamos o que isto deu no Estado social, qual é o resultado destas escolhas, e vejamos os custos que têm

na saúde as parcerias público-privadas, que foram criadas pela direita e que a direita agora nos diz que quer

manter.

Vejamos o resultado dos despedimentos na educação — mas não só na educação! —, que esses, sim, é

que estão a criar um Estado menos eficaz, porque estão a paralisar o Estado e estão a hipotecar o futuro das

próximas gerações, porque estão a destruir a escola pública.

Vejamos quais são as escolhas da direita na saúde, com o aumento do preço dos medicamentos, com o

aumento do preço dos copagamentos e com as escolhas de uma saúde mais cara para que cada vez menos

pessoas tenham acesso à saúde.

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Falar em humanismo quando hoje ficámos a saber que o resultado destas políticas é mais destruição do

País, mais desemprego, menos Estado, menos direitos, menos saúde, menos educação, é hipocrisia tamanha

desta democracia cristã que se perdeu na senda do liberalismo da política que tem levado por diante.

Termino, Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados, dizendo o seguinte: os

portugueses sabem, os cidadãos sabem que cortar nos direitos dos trabalhadores da função pública é cortar

nos direitos de todos os trabalhadores. Cortar nas pensões de quem trabalhou uma vida inteira é cortar em

quem recebe hoje e em quem vai receber no futuro. Cortar nos serviços públicos de educação, na saúde, na

segurança social, é destruir o que existe hoje para garantir que amanhã não há mais esses serviços públicos

para quem precisar deles.

Esta é a escolha do Governo que vai levantar os trabalhadores da Administração Pública, vai levantar

todas e todos — trabalhadores, reformados, cidadãos deste País — que não aceitam ser as cobaias destas

escolhas políticas, porque percebemos bem que as escolhas ideológicas da direita são a destruição do País.

Este «austericídio», a destruição de um país pela austeridade, não é o programa do futuro do País, é o

programa que quer tirar futuro ao País. E é por isso que a greve geral que se avizinha é o espaço da luta, o

espaço das escolhas e da demonstração que há alternativas a este Governo e há alternativas a esta política.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, terminámos o debate de urgência. Cumprimento os Srs. Membros

do Governo, desejando a ambos bom trabalho.

Srs. Deputados, passamos agora à apreciação conjunta dos projetos de resolução n.os

700/XII (2.ª) —

Recomenda ao Governo novo alargamento do prazo para o enquadramento dos agricultores no regime geral

de IVA (PSD e CDS-PP) e 738/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a criação de um balcão para os pequenos

agricultores afetados pelas novas normas de fiscalidade (BE).

Para intervir neste debate, estão já inscritos os Srs. Deputados Afonso Oliveira, do PSD, Abel Baptista, do

CDS-PP, e Pedro Filipe Soares, do BE.

Para apresentar o projeto do PSD e do CDS-PP, tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Oliveira.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O projeto de resolução,

apresentado pelos Grupos Parlamentares do PSD e do CDS-PP, recomenda ao Governo um novo

alargamento do prazo para o enquadramento do setor agrícola no regime geral do IVA.

Para que não persistam dúvidas sobre as novas obrigações fiscais para o setor agrícola, importa relembrar

alguns factos muito relevantes.

O Tribunal de Justiça, no Acórdão de 8 de março de 2012, declarou que o Governo português mantinha um

regime especial para os produtores agrícolas e não cumpria a Diretiva 2006/112/CE.

Já em 2008, e pela primeira vez, Portugal tinha sido notificado porque o regime português era incompatível

com as disposições do regime agrícola previsto na diretiva do IVA.

A União Europeia sustentava ainda, e cito: «o regime português em causa constitui uma violação do

princípio da generalidade do IVA». Portugal contestou a interpretação da União Europeia mas o Tribunal de

Justiça deu razão à Comissão Europeia.

Isto são factos. Perante estes factos incontornáveis e indiscutíveis, o Governo aplicou a legislação

portuguesa, o que foi obrigado a fazer no quadro do direito comunitário. Mas, mesmo neste enquadramento,

todos estamos de acordo que estas alterações legislativas vieram provocar problemas aos pequenos

agricultores: obrigaram a alterar procedimentos, introduziram burocracia e preocupação e, sem dúvida, no

mínimo, exigem tempo para a adaptação a esta nova realidade.

É também oportuno referir que votámos recentemente o projeto de resolução, apresentado pelo Partido

Socialista, que faz uma recomendação ao Governo para a necessidade de uma ampla campanha de

divulgação junto dos agricultores, alertando-os para as novas obrigações fiscais e contributivas. Este trabalho

está a fazer-se em grande articulação com as confederações do setor.

O Grupo Parlamentar do PSD votou favoravelmente algumas das recomendações desse projeto de

resolução, porque consideramos que correspondem às necessidades reais dos agricultores e coincidem com o

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trabalho que o Governo tem vindo a desenvolver, mas que importa intensificar. Portanto, nesta matéria

estamos de acordo.

Assim e tal como referimos no projeto de resolução agora apresentado, a preocupação dos Grupos

Parlamentares do PSD e do CDS-PP centra-se, de forma especial, nos pequenos agricultores que

desenvolvem uma agricultura de cariz familiar, com dificuldades de acesso a sistemas de informação, e

importa que o Governo lhes conceda mais tempo, um tempo razoável, para que lhes seja possível cumprir as

suas obrigações fiscais. É este o objetivo deste projeto de resolução, que todos os partidos representados

nesta Assembleia têm obrigação de acompanhar. Estamos a falar do alargamento do prazo e, portanto, nesta

matéria, penso que não haverá dificuldade em todos o acompanharem.

O projeto de resolução do Bloco de Esquerda revela também preocupação com esta matéria, mas introduz

um acréscimo de estruturas, um acréscimo de custos, uma alteração de procedimentos, que competem à

organização, ao Ministério da Agricultura, não nos competem a nós. Pensamos que, nos termos em que isto

está proposto, não nos compete a nós fazê-lo aqui, neste quadro.

Finalmente, consideramos que as palavras da Sr.ª Ministra da Agricultura estão corretas, quando afirma

que há necessidade de simplificar o mais possível os processos fiscais para os pequenos agricultores.

Estamos de acordo com estas palavras, acompanhamos esta afirmação; aliás, é um trabalho que tem vindo a

ser desenvolvido também em ligação com as estruturas do setor, porque é fundamental e é isto que os

agricultores esperam do Ministério da Agricultura e do Governo. Esperam que haja, o mais possível, um

processo de simplificação.

Nesta fase, aquilo que é possível é o que estamos aqui a fazer, que é alargar este prazo, num processo

difícil, para dar mais tempo aos pequenos agricultores.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Ferro Rodrigues.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Mais do que apresentar o projeto

de resolução, visto que o meu colega Afonso Oliveira, do PSD, já o fez, quero referir o porquê deste projeto.

Primeiro, estamos obrigados a cumprir regras comunitárias às quais nos vinculámos, por tratados

internacionais, aquando da adesão de Portugal à União Europeia e, por isso, temos de nos conformar com

algumas decisões tomadas pelas instâncias comunitárias. Porém, não devemos deixar de analisar e verificar

qual é a realidade portuguesa, qual é a situação concreta, em cada momento, em que se dá a aplicação de

regras comunitárias, visto que os próprios tratados, nalgumas circunstâncias, o permitem e preveem.

Estamos a falar, neste caso concreto, de uma recomendação ao Governo, de alargamento do prazo para

que se cumpra uma decisão comunitária — a do enquadramento dos agricultores no regime geral do IVA. Mas

não nos referimos a todos os agricultores, estamos a falar de uma quantidade de pequenos agricultores, em

que alguns deles se dedicam a uma agricultura familiar e de autoconsumo, na qual apenas se justifica a venda

de alguns produtos que não são necessários para o autoconsumo, mas que contribuem, de alguma forma,

para uma pequena economia doméstica, nalguns casos, em situações muito precárias e, noutros, até de ajuda

na alimentação de outros pequenos consumidores, de vizinhos de proximidade.

Trata-se de uma forma de agricultura que a própria União Europeia vem incentivando e a cuja

concretização vem dando apoio, não só por questões agrícolas e alimentares, mas também por questões de

ordenamento do território, de valorização de pequenos espaços rurais que não devem ser abandonados.

Portanto, há aqui algum sentido no que deve ser feito relativamente ao enquadramento dos agricultores no

regime geral do IVA, procurando, sobretudo, encontrar soluções para manter estes agricultores em atividade,

para manter o acesso destas famílias à agricultura e às terras, de que, na maior parte dos casos, até são

proprietárias, podendo esta pequena agricultura, esta agricultura de subsistência e familiar beneficiar de apoio,

tal como se prevê na nova política agrícola comum 2014-2020.

Há, pois, que tentar delimitar este regime e as situações, de forma a que possam ser enquadráveis e

registáveis, que é o que também se pretende. Aliás, é isto que, no dizer da Sr.ª Ministra, está a ser feito, e nós

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acreditamos e confiamos que este trabalho pode vir a ser feito, com a simplificação das regras não só fiscais

mas também comunitárias, no que diz respeito a estes pequenos agricultores. Isto, para permitir que possam

ter uma atividade, que possam ter viabilidade.

Enquanto essa pequena agricultura se mantiver, estamos também a contribuir, em termos ambientais, para

o enquadramento daquilo que é o «esverdeamento» da agricultura, o greening que está previsto no próximo

Quadro Comunitário de Apoio, no âmbito agrícola.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para apresentar o projeto de resolução do Bloco de Esquerda, tem

a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda traz a

debate um projeto de resolução, aliás, na sequência do pensamento que temos expressado e das propostas

que temos feito sobre esta matéria, que visa responder, de forma material e no terreno, às dificuldades que a

política fiscal deste Governo tem colocado aos pequenos agricultores.

Este problema do IVA sobre os agricultores é, em primeiro lugar, um problema de uma enorme injustiça,

porque alguém que tem uma pequena exploração, que até utiliza a agricultura para subsistência e, depois,

pretende vender o excesso da sua subsistência, é agora obrigado, por obra e graça deste Governo, a fazer

uma declaração fiscal sobre a matéria, a ter de iniciar atividade e, no fundo, a um conjunto de complicações,

como o recurso a contabilistas, etc., que até lhe podem ficar mais caras e representar mais do que o retorno, o

pecúlio que tira dessa pequena venda.

Ora, o que estranhamos, nesta matéria, é que o PSD e o CDS, que, há cerca de três semanas, chumbaram

uma proposta do Bloco que visava trazer uma moratória a este processo, dando mais tempo aos agricultores,

para que tivessem a capacidade de se adaptar, de perceber o que muda, no fundo, para minorar as ações

deste Governo, venham, agora, dizer que querem um alargamento do prazo, um novo alargamento do prazo.

Chegam tarde, esperemos que não cheguem a más horas, mas isto só demonstra que o Governo e a maioria

estão confrontados com a incapacidade de responder, no terreno, às dificuldades que eles próprios criaram.

Pergunta o Sr. Deputado se me parece bem este projeto de resolução e a resposta é muito simples: face à

realidade, este é o mal menor, mas não é a escolha ideal, como bem sabe e como, estranhamente, não ouvi

por parte do PSD e do CDS, que, defendendo os agricultores, na prática, com as suas políticas, estão a criar

grandes dificuldades à sua atividade e, particularmente, neste caso concreto, aos pequenos agricultores,

porque é destes que estamos a falar, e não dos grandes agricultores.

Ora, o que o Bloco de Esquerda aqui apresenta, cumprindo com aquelas que são as suas propostas nesta

matéria, como disse há pouco, é um projeto que, no nosso entender, não traz prejuízo, do ponto de vista de

mais gastos para o Estado, já que se trata do aproveitamento de infraestruturas regionais do Ministério da

Agricultura.

O que se propõe é que, nessas infraestruturas, com as competências que existem no terreno, no fundo,

haja capacidade para responder aos agricultores, para ter um balcão de aconselhamento, de ajuda, de auxílio.

É que todos percebemos que uma parte do problema que está em cima da mesa é a complicação do

processo, para uma população que, na sua grande maioria, é envelhecida. Tendo uma política de

proximidade, ajudando a ultrapassar os problemas, com estes balcões de proximidade, acessíveis às pessoas,

estamos a desenvolver um caminho na construção de soluções e a responder aos agricultores, protegendo

aqueles que estão, agora, a ser atacados pela política do Governo.

Esperávamos que o PSD e o CDS mostrassem a sensibilidade que, na comissão e em debate, têm dito

possuir em relação a este problema e que, por isso, acompanhassem este projeto de resolução, porque creio

que entendem da sua justiça e da necessidade que existe na sua aplicação.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel

Freitas.

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O Sr. Miguel Freitas (PS): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Esta proposta que o PSD e o CDS

nos trazem, para alargamento do prazo de inscrição dos agricultores no regime geral do IVA, merece-nos duas

leituras. A primeira é a de que se trata do reconhecimento, por parte da maioria, da falta de preparação com

que o Governo avançou com este regime para os agricultores em Portugal.

Mas uma segunda leitura também pode ser feita. É que, ao trazer esta discussão ao Parlamento, há o

reconhecimento, por parte da maioria, de que é necessária uma decisão da Assembleia da República para

dirimir um conflito interno do Governo, entre o Ministério da Agricultura e o Ministério das Finanças.

Vozes do PSD: — Que exagero!

O Sr. Miguel Freitas (PS): — Aliás, quem ouviu hoje o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros

neste Parlamento, percebe que existem dois governos dentro deste Governo. A implementação do regime

fiscal em Portugal para os pequenos agricultores é um bom exemplo do desentendimento e do conflito latente

entre as duas partes deste Governo.

Mas, depois destas duas leituras sobre esta iniciativa, quero dizer que consideramos útil o alargamento do

prazo — sabemos que já houve um adiamento desse prazo, mas, pelos vistos, o Governo e a maioria

reconhecem que não foi suficiente —,…

Vozes do PSD: — Ah!

O Sr. Miguel Freitas (PS): — … desde que não seja, exclusivamente, para empurrar o problema para a

frente, desde que sirva para resolver problemas concretos. É que, quando a maioria foi confrontada, nesta

Assembleia da República, com uma proposta concreta para a simplificação do regime declarativo, em matéria

de IVA, a maioria chumbou-a, quando se tratava de resolver um problema concreto, a maioria chumbou.

Mas este regime fiscal não tem apenas impacto em matéria de IVA, também tem impacto em matéria de

IRS e de contribuição para a segurança social.

Aquilo que verificamos é que estes agricultores que, agora, se vão coletar vão ser discriminados,

relativamente a outros titulares de rendimentos, nomeadamente aos titulares de rendimentos que, no âmbito

do Código do IVA, estão na categoria A e H, isto é, obtêm rendimentos de trabalho e de pensões, mas estão

isentos da apresentação da declaração de IRS até 4104 €. Ora, isto não acontece com os agricultores que

estão na categoria B e que são, portanto, discriminados.

Finalmente, importa também resolver o problema da contribuição para a segurança social.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. Miguel Freitas (PS): — É que os agricultores, ao fazerem esta inscrição, estão, acima de tudo, a

reiniciar a sua atividade e a ser reconhecidos como trabalhadores independentes. Ora bem, ao serem

reconhecidos como trabalhadores independentes,…

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Miguel Freitas (PS): — … têm de pagar uma contribuição desde o primeiro mês em que se

inscrevem e, portanto, estão também a ser penalizados.

Insisto e repito, para terminar, no seguinte: se for para resolver o problema, estamos de acordo com o

adiamento deste prazo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Ramos.

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O Sr. João Ramos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os pequenos e médios agricultores foram

brindados, por este Governo, através do Orçamento do Estado para 2013, com alterações na fiscalidade.

Alterações que obrigam à inscrição nas finanças de agricultores que pretendam vender uns molhos de salsa

ou uma dúzia de ovos. Até podem estar isentos de pagamentos, mas a inscrição nas finanças obriga à entrega

periódica da declaração de IVA, o que obriga a contabilidade minimamente organizada, logo, a custos

acrescidos. Mas também há obrigatoriedade de passar faturas de prestação de pequenos serviços ou pela

venda de produtos cujo preço só é conhecido muito depois do momento da entrega e da faturação.

Esta opção, de aumentar a receita fiscal através dos pequenos e médios produtores, obriga-nos a uma

interrogação: o Governo já esgotou as possibilidades de obter receita fiscal a partir das grandes empresas que

se dedicam à agricultura e ao agronegócio, que recebem milhões de fundos comunitários e exportam produtos

a granel que, depois, são vendidos como se fossem de outros países? Será que as grandes empresas do

agronegócio pagam, em Portugal, todos os impostos que deveriam pagar? Será que a grande distribuição

alimentar paga, em Portugal, os impostos devidos?!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Boa pergunta!

O Sr. João Ramos (PCP): — Será justo agravar a fiscalidade de quem vende uns molhos de hortaliças na

feira, enquanto grandes multinacionais, com atividade na agricultura e na distribuição alimentar, com milhões

de lucros, passam ao lado desta ânsia de aumento de receita?! Claro que não!

Este é um Governo que elimina os mais pequenos para deixar espaço a que os grandes cresçam ainda

mais. Não será por acaso que algumas casas exportadoras de vinho do Porto, algumas cooperativas e até

uma empresa compradora de banana da Madeira estão a informar os produtores que só lhes recebem as

produções se estiverem coletados nas finanças. Afinal, estas grandes empresas comportam-se como agentes

das finanças e aliadas ao serviço do Governo e da troica, que tão amigos têm sido do agronegócio

especulativo e da transferência de tributação para fora do País, enquanto contribuem para arruinar a pequena

agricultura familiar e a pequena e média agroindústria nacional.

Esta alteração da fiscalidade para pequenos e médios agricultores acaba por ser a única medida até agora

conhecida direcionada à agricultura familiar. Infelizmente, é muito esclarecedora quanto às verdadeiras

intenções deste Governo PSD/CDS para com a agricultura familiar e os pequenos e médios agricultores. Não

têm, contudo, coragem de assumir a sua opção de classe e responsabilizam o Tribunal de Justiça da União

Europeia por estas alterações.

Se a proibição de regime de isenção é uma imposição do tribunal europeu com a qual ao Governo

português não concorda, então que o diga e que intervenha politicamente. Mas, da parte do Governo, não

ouvimos essa discordância, nem conhecemos qualquer intervenção junto da estrutura da União Europeia no

sentido de alterar as regras que impedem a existência da isenção.

O projeto de resolução que a maioria apresenta não corresponde às necessidades dos pequenos e médios

agricultores. Essas foram expressas no projeto de resolução do PCP, que solicitava a suspensão de todo o

processo, já rejeitado pela maioria do PSD e do CDS, com a abstenção do PS.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Faça favor de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. João Ramos (PCP): — Termino já, Sr. Presidente.

O PCP não pode inviabilizar uma proposta que prolonga o prazo de aplicação das medidas, mas não

podemos deixar de denunciar os malabarismos políticos para tentar passar uma imagem de preocupação com

os pequenos e médios agricultores — que não têm. Apresentam, agora, um projeto que, em termos práticos,

visa o mesmo que outro apresentado pelo Bloco de Esquerda e que chumbaram há 15 dias.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. João Ramos (PCP): — Em suma, apresentam uma recomendação ao Governo quando este já

assumiu que iria alargar os prazos.

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Para «limpar a cara» vale todo o tipo de malabarismos políticos, exceto resolver definitivamente o

problema. Os pequenos e médios agricultores saberão perceber a diferença entre os que contribuem para a

resolução dos problemas e aqueles que, estando na origem dos mesmos, querem fingir que os resolvem.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Srs. Deputados, está assim concluído o debate sobre os projetos

de resolução n.os

700/XII (2.ª) e 738/XII (2.ª).

Passamos ao terceiro ponto da ordem do dia, que consiste na apreciação do projeto de resolução n.º

726/XII (2.ª) — Criação de um plano nacional para a prevenção de dengue (Os Verdes).

Para apresentar o projeto de resolução, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Os Verdes apresentam,

hoje, um projeto para que este Parlamento recomende ao Governo a criação de um plano nacional de

prevenção de dengue.

Quero, desde já, chamar atenção das Sr.as

e dos Srs. Deputados para o facto de este plano cuja criação

propomos ser relativo à dengue, em concreto. Quero dizer que não se trata de questões de vigilância ou,

exclusivamente, de reação à infeção — e relativamente à prevenção não se trata apenas de avaliar. Julgo que

este esclarecimento é importante para eventuais intervenções que se seguirão e às quais terei oportunidade

de reagir.

Sr.as

e Srs. Deputados, a dengue é uma doença tropical, que passou, contudo, a ser profundamente

conhecida e familiar para nós desde outubro de 2012, quando foram identificados mais de 2000 casos na

Região Autónoma da Madeira. O mosquito responsável pela infeção tinha sido detetado na Madeira desde

2005, mas a doença revela-se, em 2012, de forma assustadora.

A dengue é transmitida aos seres humanos por via de um mosquito — vetor transmissor — que tem de

estar infetado com o vírus. O mosquito é portador do vírus e transmite-o às pessoas e as pessoas infetadas

com o vírus também o transmitem ao mosquito. Tudo através de uma picada.

Sabendo que a erradicação do mosquito, que é extraordinariamente resistente, é uma tarefa praticamente

impossível, conclui-se então que é fundamental controlar a população de mosquitos, quer por via de processos

químicos controlados quer por via da dificultação da reprodução do mosquito, que se dá muitas vezes nas

águas estagnadas ou em coisas tão simples como no prato de um vaso colocado junto a uma janela ou a uma

porta de uma casa.

Também é uma medida fundamental para a prevenção informar as pessoas, designadamente sobre a

forma de se poderem prevenir da picada e como encontrar ajuda médica.

Sr.as

e Srs. Deputados, a ação de controlo tem de ser continuada, se for intermitente não dá resultados, e a

ação de sensibilização e formação da população é fundamental para travar surtos de febre de dengue. É ainda

essencial que não cometamos o erro de circunscrever esta questão à Madeira onde o mosquito já existe, pois

de Angola vieram pessoas infetadas — desde fevereiro, mais 60.

O mosquito está na Madeira pronto a picar e poderá chegar ao continente com facilidade (não é uma

ilusão), quer por via do transporte de mercadorias, designadamente de plantas, a curto prazo, quer por via das

alterações climáticas, a médio prazo — esta é, aliás, uma questão que está bastante estudada e para o qual o

País já está alertado.

Sr. Presidente, julgamos que é fundamental que o País aja rapidamente, de uma forma global e eficaz, por

via da criação de um plano de prevenção da dengue.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo

Baptista Leite, do PSD.

O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados: O Partido

Ecologista «Os Verdes» traz-nos hoje um projeto de resolução que recomenda ao Governo a criação de um

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plano nacional para a prevenção de dengue, como foi aqui dito, na sequência da identificação de casos de

infeção por este vírus na Região Autónoma da Madeira.

Reconhecemos o voluntarismo e acreditamos até na boa-fé de Os Verdes ao apresentarem este projeto de

resolução.

Porém, a verdade é que, certamente por lapso ou por desconhecimento, Os Verdes apresentam hoje um

projeto de recomenda a criação de um plano que basicamente já está em funcionamento desde dezembro

2012, por despacho ministerial, e que tem apresentado resultados concretos com reconhecido mérito pelos

especialistas do setor.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — O Governo criou mesmo uma plataforma de especialistas em

entomologia médica e saúde pública, que tem como missão a prevenção e o controlo de doenças humanas de

transmissão vetorial, entre as quais se inclui a dengue, e esta estratégia tem tido sucesso.

Mas vamos aos factos.

Para contextualizar, e reforçando o que a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia referiu, recordo que a infeção da

dengue se transmite através da picada dos mosquitos do género Aedes infetados com o vírus. Importa

também realçar que não ocorre transmissão de pessoa para pessoa. Transmite-se, pois, exclusivamente

através da picada do mosquito. E estes vetores, ou seja, os mosquitos, estão presentes em extensas áreas do

globo, particularmente nas regiões tropicais e subtropicais.

Como foi aqui recordado, a presença do mosquito foi detetada na Região Autónoma da Madeira, em 2005,

tendo sido implementadas medidas de controlo entomológicas, incluindo a prevenção da exportação do vetor.

Importa deixar claro que em Portugal continental não foram, até à data, detetados mosquitos daquele género.

O surto de dengue na Madeira teve início a 3 de outubro de 2012, tendo havido, até à data, 444 casos

confirmados. Da totalidade destes casos, apenas três ocorreram desde fevereiro passado e os dois últimos

casos confirmados foram comprovadamente importados de Angola. Para ser mais claro, 97% dos casos de

dengue na Região Autónoma da Madeira ocorreram até ao final do ano de 2012.

Percebe-se facilmente com estes dados que a estratégia do Ministério da Saúde e do Governo Regional da

Madeira conseguiu o controlo epidemiológico deste difícil desafio de saúde pública.

Mais: a plataforma de especialistas criada pelo Governo prossegue a sua missão, através da vigilância, da

prevenção e da implementação de estratégias que garantem uma ação de acordo com o estado do

conhecimento e sempre de forma transparente, podendo a população acompanhar a sua atividade através da

Internet, num site específico criado pela Direção-Geral da Saúde.

Para terminar, e perante estes factos, procurando realçar algo de positivo que possa sair deste debate,

revemos na posição de Os Verdes um apoio inequívoco às decisões e ações desenvolvidas neste campo pelo

Ministério da Saúde.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Peço-lhe o favor de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — Concluo já, Sr. Presidente.

Sabemos assim que podemos contar com o apoio do Partido Ecologista «Os Verdes» nesta interminável

tarefa de combate às doenças humanas de transmissão vetorial, incluído a dengue, porque só assim faz

sentido: sempre juntos na defesa pela saúde dos cidadãos portugueses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto,

do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Este tema de debate que o Partido

Ecologista «Os Verdes» traz hoje a Plenário é importante.

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Todos nós, de uma forma ou de outra, sobretudo desde o final do ano passado, ficámos a saber que o

mosquito responsável pela dengue já foi responsável, no passado, por vastas epidemias na Europa. E, caso o

mosquito seja reintroduzido, terá, segundo os especialistas — e penso que esta é uma constatação do

conhecimento científico —, todas as condições para se implantar largamente no Sul da Europa. Este facto

deve trazer-nos preocupação e, sobretudo, alguma postura proativa na prevenção.

É um facto que a dengue chegou à Madeira, foram confirmados vários casos, como, aliás, o Sr. Deputado

acabou de reportar, pelo que escuso de estar a repetir.

Quando esta situação se verificou na Madeira, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda questionou o

Governo sobre as várias medidas adotadas e alertou para a necessidade de se colocar em marcha um

conjunto de medidas preventivas, referindo que, para além das medidas necessárias para o acompanhamento

e tratamento das pessoas infetadas, era também necessário um conjunto de medidas no sentido de possibilitar

a contenção do mosquito, também evitando que se alastrasse a outras zonas geográficas.

Nessa altura, o Governo até respondeu (por acaso, contrariamente a outras situações sobre as quais

colocámos questões ao Ministério da Saúde), e detalhadamente, indicando as medidas que estavam a ser

implementadas.

A prevenção tem — e, do nosso ponto de vista, deve continuar a ter, pois não se pode dizer que o

problema está resolvido, bem pelo contrário — caráter prioritário e estruturante em todas estas questões.

Penso, por isso, que as campanhas de informação à população devem manter-se, até porque é necessário

dizer como é que as pessoas se protegem do mosquito, que é uma das formas mais eficazes para o conter.

No caso da Madeira em particular, inclusivamente a medida que foi tomada de distribuição gratuita do

repelente não deve ser abandonada, porque é necessário que os governos o disponibilizem às populações

pobres — embora tenha sido o Governo da República a disponibilizá-lo, pois o Governo Regional da Madeira

só teve a ver com a gestão do processo.

Neste sentido, Sr.as

e Srs. Deputados, nada temos a opor a que se melhore o sistema que já existe.

Também não vou dizer que não está nada feito, porque está — não temos problemas em dizê-lo.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Ah, bom!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — E, sobretudo, é necessário garantir a monitorização.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Peço-lhe o favor de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Vou terminar com a seguinte frase, Sr. Presidente: é necessária uma

monitorização que permita o controlo da implementação, a avaliação dos efeitos das medidas tomadas, para

que seja possível corrigir, quando tal for necessário. Se para tanto for preciso um plano, por que não, Sr.

Deputado?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula

Santos, do PCP.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria, em primeiro lugar, saudar a

iniciativa do Partido Ecologista «Os Verdes» por trazer esta questão à Assembleia da República e por nos

colocar este desafio — e vou referi-lo desta forma —, de podermos abordar aqui a problemática da dengue,

que já tem afetado pessoas no nosso território.

Na nossa opinião, é importante que possam ser tomadas medidas concretas em relação a esta doença

específica.

Desde já, queria dizer que estamos de acordo com o projeto que Os Verdes aqui nos trazem, porque é

importante que, nesta matéria, haja um plano nacional que incorpore as várias matérias em relação a esta

questão, como a prevenção, a informação, a consciencialização, mas também as questões referentes à

monitorização e à avaliação do próprio plano. Trata-se de um plano especificamente sobre esta doença,

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porque ela tem afetado pessoas na Região Autónoma da Madeira — como os Srs. Deputados já aqui

referiram, também há conhecimento de casos em território continental.

Consideramos, por isso, que se trata de um problema do País e é a nível nacional que ele deve tratado.

Sabe-se que o mosquito responsável por esta doença existe na Madeira desde 2005, muito embora os

primeiros casos tenham surgido em outubro de 2012. Além disso, não podemos ficar indiferentes ao risco de

aparecimento de surtos de febre de dengue em Portugal. Esta não é uma questão virtual, é uma questão real

e que deve merecer, por parte das entidades públicas responsáveis por esta matéria, a maior atenção, e não

me refiro só à vigilância mas a uma atuação concreta que permita evitar e combater esta doença.

Como também é do conhecimento público, esta doença é transmitida por mosquitos que são característicos

das regiões tropicais e subtropicais do mundo, mas que têm uma grande capacidade de adaptação — as

águas estagnadas, por exemplo, são um bom meio para a propagação e a reprodução destes mesmos

mosquitos.

Como ainda não existe uma vacina para esta doença, a prevenção tem aqui um papel central: a adoção de

atitudes e comportamentos, coletivos e individuais, é fundamental para travar a propagação da doença.

Como já referi, a generalização da informação, a sensibilização das pessoas para a necessidade de cada

uma delas tomar medidas ativas constitui um elemento central. Por exemplo, a informação e a formação

devem ser muito amplas, incluindo mesmo as crianças, para que possam, desde início, apreender novos

hábitos que permitam dar combate a esta doença e que permitam mesmo a sua erradicação.

Este deve ser, de facto, o objetivo central das entidades responsáveis, da Direcção-Geral de Saúde e do

Ministério da Saúde, a bem da saúde pública dos portugueses.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Peço-lhe o favor de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Termino já, Sr. Presidente.

Pelas razões expostas, reiteramos o nosso acordo a esta proposta. De facto, a febre de dengue merece

uma atenção especial e é neste sentido que estamos de acordo com esta proposta.

O plano deve trazer as linhas orientadoras para travar esta doença.

Esperemos que a prevenção da doença saia do papel e que o plano seja efetivamente implementado,

porque em muitas situações do nosso País existe um conjunto de planos que não saem do papel. Esperamos,

pois, que sobre esta matéria em concreto seja diferente.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Galriça

Neto, do CDS-PP.

A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Como já aqui foi dito,

estamos a debater um projeto de resolução de Os Verdes para a criação de um plano nacional para a

prevenção de dengue.

Trata-se, de facto, de um assunto relacionado com a saúde pública, que é relevante e abrange uma

questão que interessa a toda a população. Há alguns aspetos que já foram focados, mas que queremos, de

alguma forma, ressaltar para enquadrar este debate.

Trata-se de uma infeção provocada por um vírus, em que um mosquito vai ser o vetor para propagar a

doença aos humanos. É uma doença em relação à qual não há nem vacina nem tratamento específico e para

a qual são fundamentais as medidas para proteger contra a picada e para erradicar o dito mosquito.

O Sr. João Serpa Oliva (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Neste contexto, é fundamental que haja um papel central para as

medidas de informação.

No nosso País, tomou um especial relevo esta temática por causa do surto detetado na Madeira, desde

outubro de 2012, embora, como também já foi dito, existissem casos conhecidos anteriormente. Felizmente,

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no caso da Madeira, não se verificaram casos mortais, o que convém relevar, tendo este surto já sido

considerado controlado, desde março de 2013.

Queria sublinhar que o site da Direcção-Geral da Saúde, que dispõe de informações regulares e

atualizadas, na informação 19 de maio, refere que, dos mais de 2000 casos, já aqui referidos como prováveis,

apenas em 440 se confirmou laboratorialmente existir a infeção. E importa ressaltar, até face a dados

utilizados no debate, que não há identificação do dito subtipo do mosquito responsável por esta infeção no

continente.

Dito isto, importa dizer que temos uma situação, em termos de saúde pública, plenamente controlada.

Convém, obviamente, manter medidas de vigilância, mas de forma integrada e de modo a garantir o controlo

da infeção, respostas adequadas e um nível de informação que possa permitir o alerta quanto à necessidade

de proteção individual.

Já foi mencionada a criação, por despacho de dezembro de 2012, de uma plataforma de especialistas em

entomologia médica e saúde pública, que, de entre as várias funções que tem, faz menção de introduzir

estratégias integradas — não apenas em relação a este tipo de infeção, mas em relação a outras que podem

existir, como já se verificou recentemente na Europa —; faz menção à função de preparar planos de ação e de

contingência; e faz menção a um conjunto de medidas que visa garantir que esta situação se mantém

controlada, como está agora.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Termino já, Sr. Presidente.

Esta plataforma está constituída, tem reunido e, portanto, está preparada para dar resposta às

necessidades. Estranhamente, o projeto de Os Verdes ignora esta criação e esta plataforma, que é, aliás,

responsável, em colaboração com a Direcção-Geral de Saúde, por produção de informação muito relevante,

tais como normas de orientação clínica e distribuição de folhetos à população.

Para concluir, saudando esta preocupação com uma matéria que é relevante em termos de saúde pública,

temos de dizer que, de facto, não vemos necessidade de desenvolver mais um plano setorial, isolado,

desgarrado de estratégias mais alargadas. Portanto, não há lugar para a aprovar um plano que, ao fim e ao

cabo, já está no terreno, não devendo haver lugar também — e queria relevar isto — para alarmismos,

garantindo à população que a situação está plenamente controlada.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel

Pizarro, do PS.

O Sr. Manuel Pizarro (PS): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Julgo que este debate que o Partido

Ecologista «Os Verdes» aqui induz, com este projeto de resolução, é útil, desde logo porque a questão da

emergência, no hemisfério norte — no nosso caso, para já, na Região Autónoma da Madeira, embora o risco

também exista para o continente —, das chamadas «doenças tropicais» é um risco que está absolutamente

identificado. Está identificado em função das alterações climáticas e isso justifica que a questão da saúde tem

de estar presente em todas as políticas e que seria muito útil que o País retornasse à agenda do combate às

alterações climáticas, que foi completamente abandonada nos últimos dois anos,…

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Muito bem!

O Sr. Manuel Pizarro (PS): — … em função dos preconceitos da atual maioria de direita contra as

energias renováveis e a política que foi desenvolvida pelo nosso Governo para combater a pegada de

carbono, …

Vozes do PS: — Bem lembrado!

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O Sr. Manuel Pizarro (PS): — … mas também pelas questões que dizem respeito à globalização e,

naturalmente, à maior facilidade de deslocação internacional, que torna mais simples a deslocação dos

agentes da doença e dos seus vetores, como é o caso deste mosquito que está identificado na Região

Autónoma da Madeira, já há alguns anos.

Em segundo lugar, devo reafirmar a nossa confiança no sistema nacional de saúde pública, que funciona

de forma cientificamente adequada e que é uma garantia de tranquilidade para os portugueses.

Isto não quer dizer que, neste caso, em concreto, a resposta não tenha pecado por um pouco tardia. A

verdade é que o sistema só foi ativado quando já havia suspeita de diagnóstico de alguns milhares de casos

de dengue na Madeira, com grave risco para a saúde das populações e para o impacto desta notícia nos

circuitos internacionais, sabendo nós como o turismo é absolutamente essencial para a economia da Madeira.

Enfim, mais vale tarde que nunca, e a verdade é que o sistema foi instituído e está em pleno funcionamento

e, desse ponto de vista, julgo que podemos transmitir aos cidadãos portugueses uma mensagem de

tranquilidade.

Isto não torna inútil o projeto de resolução de Os Verdes, do nosso ponto de vista. A verdade é que

consideramos útil a ideia da existência de um plano organizado, que possa ser monitorizado não apenas pela

tutela, como é a lógica que está implícita na plataforma criada em dezembro (e à qual alguns Srs. Deputados

já se referiram), mas também debatido e tornado visível na opinião pública, e que possa também ser

acompanhado pelos Deputados, de acordo com a sua missão de fiscalização da ação do Governo e, mais

vasta ainda, a sua missão de proteção da saúde dos portugueses.

Portanto, desse ponto de vista, acompanhamos o projeto de resolução de Os Verdes, pois não

consideramos que o mesmo colida com a existência da plataforma. A plataforma deve ter a sua atividade

assente num plano nacional de combate à dengue, que deve ser adequadamente monitorizado e

acompanhado pelo conjunto das entidades portuguesas e pelo Parlamento, também.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa

Apolónia, de Os Verdes.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Em dezembro, por

despacho, foi criada uma plataforma circunscrita à área da saúde.

Vejam bem, Sr.as

e Srs. Deputados: Os Verdes não propuseram, não recomendam ao Governo como se

fará o plano, porque esta plataforma pode ser usada. Mas fazer um plano de prevenção da dengue tem de ser

algo mais abrangente, tem de incluir gente da educação, gente responsável por aeroportos e por portos.

Protestos do Deputado do PSD Ricardo Baptista Leite.

O Sr. Deputado do PSD diz que o projeto de resolução de Os Verdes prevê algo que já existe. Então, vou

solicitar que me envie, hoje ainda, se possível, o plano nacional de prevenção de dengue que existe hoje, em

Portugal.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Termino já, Sr. Presidente.

Sr.as

e Srs. Deputados, fazer um plano de prevenção não é criar alarmismo, é justamente prevenir! Mas, já

agora, em setembro ou outubro, talvez tenhamos oportunidade de voltarmos a falar sobre o que

eventualmente poderá reacontecer na Madeira, justamente porque poderes públicos não atuaram em

conformidade com aquilo que deveriam fazer.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Srs. Deputados, está assim concluído o debate do projeto de

resolução 726/XII (2.ª).

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Passamos ao quarto e último ponto, que consiste na apreciação do Decreto-Lei n.º 26/2013, de 19 de

fevereiro, que procede à primeira alteração à Lei n.º 11/2011, de 26 de abril, que estabelece o regime jurídico

de acesso e de permanência na atividade de inspeção técnica de veículos a motor e seus reboques e o regime

de funcionamento dos centros de inspeção [apreciação parlamentar n.º 49/XII (2.ª) (PCP)].

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Ramos, do PCP.

O Sr. João Ramos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Decreto-Lei n.º

26/2013 vem alterar a Lei n.º 11/2011, surgida a partir de um longo processo de discussão e que, no final,

obteve o consenso entre os partidos da maioria — PSD e CDS — e o PS.

Estamos no âmbito da legislação reguladora do setor da inspeção de veículos e dos respetivos centros de

inspeção.

Estamos, agora, perante uma situação em que o PCP, que alertou para os riscos e consequências

decorrentes da opção política de intensificar a liberalização do setor, promovendo a concentração e não

garantindo uma rede de centros dispersos pelo País, se vê forçado, através desta apreciação parlamentar, a

denunciar esta decisão do Governo de alterar, a meio do jogo, as regras definidas pela própria maioria.

Para além de intensificar o processo de liberalização, este projeto de lei que altera a lei da Assembleia da

República apresenta como grave a suspensão de um processo de concurso para a abertura de novos centros

de inspeção de veículos. Para este concurso, muitos pequenos e médios empresários prepararam, tiveram

custos na preparação dos processos e, agora, veem o processo suspenso, sem qualquer explicação.

Isto, Srs. Deputados, «cheira a esturro», é quase um «rabo escondido, com o gato de fora»!

Depois de ter iniciado um processo de atribuição de licenças para a abertura de novos centros de inspeção

e depois de conhecer as candidaturas e aqueles que estão em melhores e em piores situações para acederem

às licenças, o Governo suspende o processo. Será que o Governo não ficou agradado com os candidatos

melhor posicionados para acederem às licenças? Há muito que explicar neste processo!

O decreto-lei que hoje apreciamos não resolve, pelo contrário, agrava o problema criado pelas últimas

alterações legislativas, ao permitir mais centros nas áreas mais densamente povoadas ao sabor dos

interesses do mercado — cria pressão para a degradação da qualidade do serviço, face à pressão para atrair

clientes; promove a degradação da rentabilidade das pequenas empresas, proprietárias de centros de

inspeção, face aos grupos económicos que gerem redes desses mesmos centros.

A estes aspetos negativos soma-se ainda um outro: fazer depender a abertura de novos centros de

inspeção das regras de mercado determinará que o interior do País pouco povoado continuará carente destes

centros. E assim, sem uma cobertura adequada no território nacional, o interior do País continuará privado de

um serviço público e obrigatório de proximidade, uma desadequação com implicações na vida das populações

e das empresas, que são obrigadas a deslocações de centenas de quilómetros para acederem a este serviço.

Estamos em crer que os Deputados que se envolveram intensamente na preparação da Lei n.º 11/2011

estão desconfortados com esta sobreposição do órgão de Governo sobre o órgão deliberativo. Se assim for,

não aceitarão esta ingerência e terão, através da aprovação da suspensão de vigência proposta pelo PCP, a

oportunidade de mostrar ao Governo que deve respeito à Assembleia da República.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Fão, do

PS.

O Sr. Jorge Fão (PS): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Apreciamos hoje o decreto-lei que

introduziu alterações no regime de exercício de atividade e permanência dos centros de inspeção automóvel,

por iniciativa do Partido Comunista.

Ainda temos presente a história recente da definição de um regime jurídico de exercício de atividade neste

setor, que culminou, em 2011, com a aprovação desse mesmo regime: em 2010, o Governo da

responsabilidade do Partido Socialista constatou que havia 161 concelhos neste País que não tinham o

serviço de centros de inspeção automóvel; Portugal tinha sido condenado, em 2009, pelo Tribunal de Justiça

europeu por não garantir a liberdade de acesso ao exercício desta atividade e a liberdade de exercício de

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atividade económica neste setor, e pretendia responder a esta condenação; era necessário ainda alargar a

cobertura territorial com este tipo de serviços e promover a criação de novos centros, em particular

introduzindo um novo conceito, o conceito concursal concessionário, que alterava completamente a filosofia

anterior no que diz respeito à abertura de novos centros, tendo sempre presente a necessidade de elevar o

grau de exigência da qualidade dos veículos, promotores, dessa forma, de maior segurança rodoviária nas

estradas portuguesas.

Foi com estes objetivos que, em 2010, o Governo de então aprovou o chamado novo regime jurídico do

exercício da atividade neste setor. Depois, provavelmente porque na altura imperava a onda do «bota-

abaixismo», uma coligação perfeitamente imprevista entre o PSD, o CDS, ajudados pelo Bloco de Esquerda e

pelo Partido Comunista, em julho, logo a seguir à aprovação do decreto-lei, que tinha ocorrido em abril, numa

apreciação parlamentar, originou pura e simplesmente a revogação deste enquadramento legal.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Estavam habituados a aprovar tudo o que queriam!

O Sr. Jorge Fão (PS): — Logo de seguida, portanto, houve a necessidade de voltar tudo à estaca zero, de

recuperar a legislação que era já de 1999 e de estagnar completamente o processo, iniciando-se um novo

processo legislativo para a criação de um novo regime jurídico. Isso veio a culminar, em 2011, com a

aprovação de uma nova lei, a contento do PSD, do CDS, do Bloco de Esquerda e com o apoio do Partido

Comunista, para um novo regime, que se dizia estabilizado, duradouro e que, seguramente, perduraria nos

tempos.

O certo é que, volvido pouco mais de um ano, o atual Governo, da responsabilidade do CDS e do PSD,

sentiu necessidade de fazer a alteração, através do decreto-lei que hoje apreciamos, da legislação que estava

em vigor.

No essencial — importa falar do presente —, o que faz este decreto-lei? Altera o artigo 2.º, que já tinha

estado na base da discordância do Partido Socialista porque mantém um regime de classificação do território

que não consideramos ser o adequado, com a questão dos concelhos limítrofes; cria condições para que se

aumente o número de centros mas ficando essencialmente concentrados nas Áreas Metropolitanas de Lisboa

e do Porto, o resto do território não é contemplado nesta matéria; para além disto, agrava a situação no que

diz respeito à sustentabilidade das empresas, porque aumenta significativamente a taxa que têm de pagar por

este tipo de serviços.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Sr. Deputado, tem de terminar.

O Sr. Jorge Fão (PS): — Portanto, sem ter tido diálogo com o setor — o setor chamou-nos a atenção para

o efeito —, o Governo produziu estas alterações, com as quais claramente o Partido Socialista não está de

acordo.

Por conseguinte, parece-nos que deve ser considerada a oportunidade desta apreciação parlamentar,

porque o decreto-lei nada de novo trouxe e não melhorou o sistema. Antes pelo contrário, levantou um

conjunto de dificuldades na atual situação que as empresas já vivem.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo

Viegas, do CDS-PP.

O Sr. João Paulo Viegas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados:

A segurança rodoviária é uma prioridade das políticas europeias e mundiais. Na Europa, assinou-se

recentemente o compromisso «estradas seguras», com o objetivo de reduzir para metade o número de vítimas

até 2020.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Muito bem!

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44

O Sr. João Paulo Viegas (CDS-PP): — O verdadeiro objetivo da discussão de hoje tem de ser, acima de

tudo, o de salvaguardar que os veículos nacionais circulam em segurança.

Para que se possam concretizar estes aspetos, o CDS entende que há três princípios básicos que têm que

ser respeitados na inspeção automóvel: respeito por um serviço acessível ao cidadão, ou seja, um serviço que

promova uma distribuição geográfica dos centros de inspeção que não obrigue os cidadãos a mudarem a sua

rotina para respeitar as regras; não pode, por parte das autoridades fiscalizadoras, existir qualquer cedência

no que respeita à fiscalização da segurança dos veículos; e os próprios centros de inspeção têm de ser

submetidos a rigorosos testes de qualidade do seu serviço.

Tudo para que seja possível ao Estado, através do Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres

(IMTT), garantir que a circulação em ambiente rodoviário é efetivamente realizada apenas por veículos

capacitados para o fazer.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Exatamente!

O Sr. João Paulo Viegas (CDS-PP): — Por outro lado, há que analisar os termos estabelecidos pela lei

para a criação de novos centros de inspeção. Na ótica do CDS, e considerando que estamos a falar de uma

atividade que salvaguarda a segurança pública, entendemos que deve ser dada liberdade ao mercado,…

O Sr. Jorge Fão (PS): — Ai é?! Agora é liberdade de mercado?…

O Sr. João Paulo Viegas (CDS-PP): — … mas sempre de forma a respeitar a sustentabilidade de uma

atividade necessária para todos. Há, assim, que encontrar um ponto de equilíbrio entre a abertura do mercado

e o respeito pela qualidade do serviço — é, aliás, por isto mesmo que no setor não há concorrência ao nível do

preço.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Ora!

O Sr. João Paulo Viegas (CDS-PP): — A Lei n.º 11/2011, de 26 de abril, quando aqui surgiu e foi discutida

tinha por objetivo, como muito bem referiu o Deputado Jorge Fão, clarificar as novas regras para acesso à

atividade de criação de centros de inspeção automóvel. Creio que o objetivo foi conseguido com a alteração

feita pelo Decreto-Lei n.º 26/2013, de 19 de fevereiro.

As alterações que agora foram introduzidas são as seguintes: os critérios populacionais em menos 2500

eleitores; as distâncias mínimas entre centros de inspeção nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto; a

obrigatoriedade de local específico para a inspeção de veículos de duas e três rodas e de quadriciclos; a

tramitação processual das candidaturas passa a ser feita por via eletrónica; clarifica-se a questão dos pontos

de distância entre centros, nomeadamente no que respeita ao ponto concreto de onde se contabiliza a

distância entre centros; há novos prazos, garantias e valores da contrapartida financeira; passa a ser possível

uma atualização anual das tarifas, mas que é adequada à taxa de inflação medida pelo índice de preços do

consumidor total; e as responsabilidades passam para o lado do proprietário em vez de estarem do lado do

utilizador.

Contudo, importa lembrar que a iniciativa legislativa que levou à abertura de novos centros de inspeção, e

que agora foi alterada, aconteceu porque Portugal estava em incumprimento relativamente a uma deliberação

do Tribunal de Justiça da União Europeia. Essa deliberação tinha condenado o nosso País por não cumprir o

princípio básico da livre concorrência e da livre iniciativa.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. João Paulo Viegas (CDS-PP): — Concluo já, Sr. Presidente.

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Posto isto, parece ao CDS que o mais importante é garantir que são salvaguardadas a qualidade dos

serviços, a proximidade aos cidadãos e a saúde das empresas que prestam um serviço de vital importância

para a segurança pública.

Para além do mais, dado que este processo já vai longo e está certamente a manter as dificuldades

encontradas pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, bem como pela Comissão Europeia, a vida dos

cidadãos…

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Tem de concluir. Muito obrigado, Sr. Deputado.

O Sr. João Paulo Viegas (CDS-PP): — Muito obrigado, Sr. Presidente.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — A Mesa não regista, neste momento, quaisquer inscrições, nem de

Srs. Deputados nem de membros do Governo.

A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade (Teresa Morais): — Sr.

Presidente, peço-lhe que inscreva, para intervir, o Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas, Transportes e

Comunicações, por favor.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Assim sendo, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Obras

Públicas, Transportes e Comunicações para uma intervenção.

O Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (Sérgio Monteiro): — Sr.

Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Como já foi dito, na discussão relativa à apreciação parlamentar, o

procedimento concursal não se suspendeu, anulou-se. O processo concursal anterior está terminado, foi

anulado e, portanto, não há aqui nenhuma decisão que esteja adiada no tempo ou que crie alguma incerteza

relativamente às candidaturas anteriores — o processo simplesmente foi anulado.

O procedimento anterior anulou-se por um motivo que me parece óbvio: tendo nós aprovado um decreto-lei

em 2012 — o Decreto-Lei n.º 144/2012, de 11 de julho —, que, como muito bem foi dito, conformou para a

nossa ordem jurídica a transposição de uma diretiva relativamente à qual Portugal já estava em

incumprimento, e tendo o procedimento anterior sido lançado com requisitos de natureza técnica diferentes

daqueles que estavam agora neste decreto-lei, parecia estranho tomar a decisão quanto a um concurso que

não tinha tido em consideração as matérias que, depois, foram transpostas para o ordenamento jurídico

através desse mesmo diploma.

Não só esse decreto-lei trouxe dados novos, requisitos novos e obrigações novas, como também a Portaria

n.º 221/2012, de 20 de julho, definiu novos requisitos técnicos aplicáveis aos centros de inspeção.

Portanto, o somatório destas duas obrigações, que se tornaram obrigações a partir do momento em que os

diplomas foram conhecidos, levou a que fizesse sentido, em nome dessa coerência, que o procedimento

anterior fosse anulado e que se facilitasse o acesso a todos aqueles que, tendo apresentado candidatura no

procedimento anterior, quisessem ajustar as suas candidaturas aos novos requisitos.

Recordo que o Governo foi sensível a algumas das preocupações apresentadas, quer por candidatos ao

procedimento anterior quer por associações do setor, e ilibou-os do pagamento da taxa de inscrição neste

segundo procedimento, em nome da não oneração daqueles que tinham já feito algum trabalho no

procedimento anterior. Portanto, em nome da igualdade de oportunidades e da não oneração de quem fez

essa apresentação, tomámos esta decisão.

Temos agora, neste novo procedimento, um elevado número de candidaturas, o que mostra duas coisas:

em primeiro lugar, que a sustentabilidade do setor não está em causa, nem com o número de centros, que em

teoria aumenta relativamente à lei de 2011, sendo mais 21 face aos 85 inicialmente previsto (portanto, o

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aumento não é significativo); em segundo lugar, que o ajustamento das taxas sobre o volume de negócios,

que passam de 5% para um regime progressivo até 15%, num setor que está regulado do ponto de vista do

preço e que, portanto, tem um volume de negócios estável, contribui para a consolidação orçamental, para que

os contribuintes não sejam chamados também a fazer essa consolidação. Portanto, temos mais um setor a

contribuir, por uma percentagem maior, para essa consolidação orçamental.

Parece-me justo, parece-me territorialmente mais equilibrado o regime, e as regras, que definimos neste

decreto-lei, sendo que não vamos de todo ao arrepio daquilo que os grupos parlamentares que hoje suportam

a maioria defenderam relativamente à lei de 2011. Estamos a ir completamente em linha com isso,

aprofundando as matérias que, do nosso ponto de vista, deviam ser aprofundadas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo

Cavaleiro, do PSD.

O Sr. Paulo Cavaleiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Esta

apreciação parlamentar demonstra um problema de base do PCP com o setor privado e com o mercado —

alguma desconfiança a que já nos têm vindo a habituar, uma desconfiança generalizada —, quando sabemos

que existem exemplos positivos em que todos ganhamos com a abertura do mercado.

Neste contexto, a alteração da Lei n.º 11/2011, de 26 de abril, que aprovou o regime de acesso e de

permanência na atividade de inspeção técnica de veículos de motor e de seus reboques e o regime de

funcionamento dos centros de inspeção, pretendeu dar um passo em frente rumo à harmonia preconizada

pelas instâncias europeias, em linha com as boas práticas que vêm sendo adotadas nestes países.

Este decreto-lei surge numa tentativa de aumentar a concorrência no mercado deste setor, como já referiu

o Sr. Secretário de Estado, pela quantidade de concorrentes ao novo concurso.

Sabemos que a Comissão Europeia se prepara para deferir um leque alargado de normas à escala da

União por via das quais se aprofunda o controlo técnico e periódico dos veículos, se estende no âmbito da

aplicação das novas categorias de veículos e se aumenta a frequência dos controlos. Neste quadro, não

podemos deixar de revelar que o nosso País, em comparação, por exemplo, com a Europa a 27, está já

norteado desta tendência, que conduz a um aumento dos índices de segurança nas estradas, desencadeando

muitos efeitos positivos em termos económicos.

Este caminho permitirá a Portugal aumentar as suas normas de segurança e melhorar a qualidade dos

controlos, contribuindo de forma muito relevante para a criação de novos postos de trabalho sustentáveis

neste domínio, é nossa convicção.

Esta nova legislação veio também alargar o universo de veículos sujeitos a inspeção, designadamente

motociclos, triciclos e quadriciclos com cilindrada superior a 250 cm3, bem como reboques e semirreboques.

Portanto, são aumentados os veículos que passam a ser abrangidos.

Há também uma lógica de cimentar e de ajustamento da contrapartida financeira a suportar pelas

sociedades gestoras dos centros de inspeção em prol do Estado, garantindo, assim, um reforço do regulador e

do IMTT a fim de conferir músculo ao relevante papel que irá assumir neste novo quadro.

Em resumo, nesta matéria vamos ter mais cobertura da rede e vamos ter mais proximidade; o concurso

que entretanto foi anulado permitiu que todos partissem para o novo concurso no mesmo ponto de partida; e

vamos ter mais fiscalização, mais concorrência e mais controlo na instalação dos novos centros.

Nós não somos como os partidos mais à esquerda, não desconfiamos regularmente do mercado.

Risos do PCP.

Acreditamos que com um mercado bem regulado podemos ter melhores soluções, em que todos os

cidadãos podem ganhar.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Ana

Drago, do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Muito rapidamente, quero dizer que não

vou seguir a linha autoproclamatória do Sr. Deputado Paulo Cavaleiro,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — No mínimo!

A Sr.ª Ana Drago (BE): — … porque considero que contribui pouco para a discussão que aqui estamos a

ter e que é bastante importante para a segurança dos portugueses. E queria aproveitar esta ocasião para

saudar a iniciativa do PCP, com esta apreciação parlamentar.

Nos últimos anos da história, que já aqui foi narrada pelos diferentes Deputados, todo este processo tem

tido uma vida relativamente atribulada…

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É verdade!

A Sr.ª Ana Drago (BE): — … e temos percebido que a bancada do PSD tem uma volatilidade neste

domínio que ora segue numa direção, ora segue noutra. Não se pode falar de aprofundamento, trata-se de

anular o percurso que tinha feito na oposição e agora, pura e simplesmente, o Governo parece querer seguir

noutra direção.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É verdade!

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr.as

e Srs. Deputados, aquilo que até agora as bancadas da maioria e o Sr.

Secretário de Estado — enfim, sempre «preocupado» com os contribuintes!? — ainda não falaram foi na

questão do acesso e da acessibilidade territorial destes mesmos centros e da forma como isso é fundamental

para assegurar a todos os cidadãos, independentemente do sítio onde vivem e onde têm o seu carro, o acesso

a um centro destes e, portanto, não faz uma alteração profunda no seu quadro de vida, porque o acesso é a

questão determinante na área da segurança.

Percebemos que o Governo tem um único argumento, que é o que o mercado não sustenta pura e

simplesmente não é socialmente útil ou importante, e nós temos uma outra argumentação, a de que é, de

facto, importante assegurar acessibilidade e, portanto, cobertura territorial.

O que nos foi dito sobre o concurso para o futuro não nos sossega, pelo contrário, inquieta-nos, pelo que

entendemos que, nesta matéria, devemos ter bastante cuidado com a forma como o Governo, pura e

simplesmente, entende o que é liberalizar. O Governo entende que liberalizar é assegurar a segurança,

assegurar um serviço e a sua acessibilidade para todos os possuidores de veículo automóvel.

Nesse sentido, iremos acompanhar o PCP que, creio, vai apresentar um requerimento para cessação de

vigência do Decreto-Lei. Entendemos que era útil que esta Assembleia se dedicasse a um trabalho profundo

no que toca ao assegurar da acessibilidade por parte de todos os cidadãos. Esse é o nosso trabalho e não

apenas o de assegurar se o mercado quer ou não. Esse é o papel do Sr. Secretário de Estado, em vidas

passadas e em vidas futuras!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Ramos.

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O Sr. João Ramos (PCP): — Sr. Presidente, a posição do PCP relativamente a esta matéria, aos vários

processos legislativos que decorreram, foi determinada pelo processo de liberalização do setor, que não

garantia, na nossa perspetiva, de forma nenhuma, a acessibilidade do serviço.

Estamos perante um serviço público, obrigatório, de proximidade, um serviço que, como já foi aqui dito,

deve dar garantias de segurança rodoviária, deve ser de proximidade, acessível e viável financeiramente.

Para que tal aconteça, o que se pretende? A existência de uma rede de centros criados ao sabor das leis

do mercado, em que os centros concorrem entre si para atrair mais clientes, em que há centros de pequenos

empresários a par de centros de grandes redes de grupos económicos e o que determina a abertura de novos

centros é a rentabilidade, sabendo nós as implicações que isso tem para quem pretenda abrir um centro numa

grande zona demográfica ou no interior do País, onde continuam a escassear e onde muitas populações e

muitas empresas têm de fazer centenas de quilómetros para poder recorrer a este serviço obrigatório e

público, que deveria ser.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado

das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

O Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Ainda assim, surpreendo-me. Mas nos 50 segundos que restam à Sr.ª Deputada Ana

Drago, talvez ainda possa acenar com a bandeira da segurança!

Hoje, veio só com a acessibilidade. Menos mal. Já evoluímos no debate. Tipicamente, o medo é com a

segurança, com a qualidade do serviço, e nada disso está em causa.

Faço três perguntas e dou duas respostas, dando o meu contributo para este debate.

A Sr.ª Deputada diz: «Bom, do ponto de vista de valorização dos serviços do Estado, devemos pugnar por

essa valorização». Sr.ª Deputada, nós confiamos nos reguladores para verificar se os centros de inspeção…

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Sr. Secretário de Estado, tem muito pouco tempo para tanta

pergunta e tanta resposta. Tem de ser mais sintético.

Risos do PS e do PCP.

Faça favor.

O Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Serei, com certeza,

Sr. Presidente.

Com mais 20 segundos, direi o seguinte: confiamos nos reguladores e no serviço que eles prestam, porque

são entidades que representam o Estado; aumentamos a acessibilidade dos cidadãos ao serviço pelo facto de

termos hoje mais centros do que aqueles que estavam previstos na nova lei; e, por fim, aumentamos o

contributo dos privados para a sustentabilidade das contas públicas, através de uma maior percentagem para

o Orçamento.

Com estas três respostas, Sr.ª Deputada, diria que estamos conversados.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António Braga (PS): — E quem é que paga?!

O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Não há mais Srs. Deputados inscritos. Estamos a chegar ao final

dos nossos trabalhos.

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49

Entretanto, informo que deram entrada na Mesa os projetos de resolução n.os

744/XII (2.ª) (PCP) e 745/XII

(2.ª) (Os Verdes), visando a cessação de vigência do Decreto-Lei n.º 26/2013, de 19 de fevereiro, que procede

à primeira alteração à Lei n.º 11/2011, de 26 de abril, que estabelece o regime jurídico de acesso e de

permanência na atividade de inspeção técnica de veículos a motor e seus reboques e o regime de

funcionamento dos centros de inspeção [apreciação parlamentar n.º 49/XII (2.ª) (PCP)], que serão votados na

reunião plenária da próxima sexta-feira.

A próxima reunião plenária realizar-se-á amanhã, quinta-feira, dia 30, com início às 15 horas e a seguinte

ordem do dia: primeiro ponto, declarações políticas; segundo ponto, apreciação do projeto de resolução n.º

661/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo que os relatórios das inspeções às autarquias voltem a ser de acesso

público (BE); terceiro ponto, discussão conjunta dos projetos de resolução n.os

477/XII (2.ª) — Recomenda a

criação de condições para que os portugueses com uma formação académica ou profissional especializada

não tenham de emigrar e para que possam regressar aqueles que abandonaram o País (PS) e 736/XII (2.ª) —

Estabelece a obrigatoriedade de elaboração e apresentação de um relatório anual sobre emigração (PCP).

O ponto quatro da nossa ordem de trabalhos consiste na discussão conjunta da petição n.º 179/XII (2.ª) —

Apresentada por Cristina Maria Ramalho Balonas dos Santos e outros, solicitando à Assembleia da República

intervenção no sentido de assegurar a continuação da prestação de cuidados oncológicos pelo Centro

Hospitalar Barreiro/Montijo, e dos projetos de resolução n.os

731/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a

continuidade do Serviço de Oncologia do Centro Hospitalar Barreiro/Montijo (PCP), 733/XII (2.ª) —

Recomenda ao Governo o estabelecimento de uma plataforma de complementaridade entre os hospitais do

Barreiro, Almada e Setúbal para a área da Oncologia (BE) e 743/XII (2.ª) — Reclama do Governo medidas que

gerem a eficácia do serviço de oncologia do Centro Hospitalar Barreiro/Montijo (Os Verdes).

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 15 minutos.

Imagens projetadas pelo Deputado do BE João Semedo no decurso da intervenção que proferiu na

abertura do debate de urgência.

Imagens — voltar

O Estado é gordo, como diz o Governo?

0

5

10

15

2019,5%

15,2%13,3%

12,1%11,2% 11%

10,4%

8,6%

Despesa com funcionários públicos (% do PIB)

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50

O Estado é gordo, como diz o Governo?

0 2 4 6 8

Portugal

Zona Euro

4,9%

6,2%

Gastos com educação (% do PIB)

Portugal

Zona Euro

O Estado é gordo, como diz o Governo?

0,0%

2,0%

4,0%

6,0%

8,0%

10,0%

PortugalOCDE

DinamarcaInglaterra

Alemanha

5,6%6,9%

9,4%

8,0%8,9%

Gastos em saúde (% do PIB)

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‘Consolidação orçamental’ 2011-2012

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5

10

15

20

25

Austeridade Consolidação Empobrecimento

23,8

6,6

17,2

Milh

are

s d

e m

ilhõ

es

de

eu

ros

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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