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Quinta-feira, 13 de março de 2014 I Série — Número 59

XII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2013-2014)

REUNIÃOPLENÁRIADE12DEMARÇODE 2014

Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves

Secretários: Ex.mos

Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz

S U M Á R I O

A Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 10

minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa dos projetos de lei n.

os

525 e 527 a 532/XII (3.ª) e do projeto de resolução n.º 977/XII (3.ª).

Foi aprovado um parecer da Comissão para a Ética, a Cidadania e a Comunicação, relativo à retoma de mandato de um Deputado do PSD.

Em declaração política, a Deputada Mariana Mortágua (BE) acusou o Governo de fazer do pagamento da dívida e do controlo do défice o objetivo central da sua governação para justificar os cortes e defendeu a necessidade de uma reestruturação da dívida. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Deputados Cecília Meireles (CDS-PP) e Miguel Tiago (PCP).

Em declaração política, o Deputado Luís Menezes (PSD) considerou que, passados três anos de governação, o País está melhor preparado para os desafios do futuro, desafiou todos os partidos a pensar naquilo que é melhor para o País após a saída da troica e apelou para consensos alargados entre as forças políticas. Deu, depois, resposta a pedidos de esclarecimento dos Deputados Pedro Nuno

Santos (PS), Pedro Filipe Soares (BE), João Oliveira (PCP) e Hélder Amaral (CDS-PP).

Em declaração política, o Deputado João Soares (PS) condenou as políticas europeias e nacionais que conduzem ao empobrecimento e falou acerca da necessidade de novas políticas que permitam um desenvolvimento sustentável do País. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados António Filipe (PCP), Mónica Ferro (PSD) e José Ribeiro e Castro (CDS-PP).

Em declaração política, o Deputado Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP) deu conta de algumas conclusões saídas do Congresso do Partido Popular Europeu, realizado em Dublin, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Carlos Costa Neves (PSD), Paula Baptista (PCP), Mariana Mortágua (BE) e Ana Catarina Mendonça (PS).

Em declaração política, o Deputado Paulo Sá (PCP), a propósito de um manifesto apresentado por individualidades nacionais apelando à renegociação da dívida do País, recordou que o seu partido havia apresentado propostas no mesmo sentido e chamou a atenção para as consequências de uma não renegociação, tendo de seguida respondido a

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pedidos de esclarecimento da Deputada Mariana Mortágua (BE).

Foi apreciada a petição n.º 253/XII (2.ª) — Apresentada pela ACAP (Associação Automóvel de Portugal), solicitando à Assembleia da República intervenção legislativa com vista a repor o sistema de incentivos ao abate de veículos em fim de vida, tendo-se pronunciado os Deputados Sandra Cardoso (PS), João Paulo Viegas (CDS-PP), Mariana Mortágua (BE), Bruno Dias (PCP) e Nuno Serra (PSD).

Foi ainda apreciada a petição n.º 289/XII (3.ª) — Apresentada pela Deco (Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor), solicitando à Assembleia da República a adoção de medidas legislativas que limitem a cobrança de comissões ou outros encargos de manutenção de contas à ordem e que promovam a transparência da sua publicitação e atualização, conjuntamente com os projetos de lei n.

os 527/XII (3.ª) — Proíbe a cobrança, pelas

instituições de crédito, de comissões, despesas ou outros encargos pela manutenção de contas de depósito à ordem (PCP), 529/XII (3.ª) — Assegura o acesso dos cidadãos aos serviços mínimos bancários gratuitos e limita a cobrança de despesas de manutenção de conta por parte das instituições de crédito (altera o Decreto-Lei n.º 27-C/2000, de 10 de março, e o Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de dezembro) (BE), e 532/XII (3.ª) — Cobrança de comissões e outros encargos pelas instituições de crédito e sociedades financeiras devidas pela prestação de serviços aos consumidores (PS). Proferiram intervenções os Deputados Paulo Sá (PCP), Pedro Filipe Soares (BE), Fernando Serrasqueiro (PS), Carlos Santos Silva (PSD) e Cecília Meireles (CDS-PP).

O Presidente (Guilherme Silva) encerrou a sessão eram 17 horas e 54 minutos.

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, Srs. Jornalistas, está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 10 minutos.

Podem ser abertas as galerias.

Pedia aos Srs. Deputados o favor de tomarem os vossos lugares.

Antes de iniciarmos o primeiro ponto da ordem do dia de hoje, que consiste em declarações políticas, vou

dar a palavra ao Sr. Secretário, Deputado Duarte Pacheco, para fazer o favor de ler o expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e

foram admitidos pela Sr.ª Presidente, os projetos de lei n.os

525/XII (3.ª) — Repõe a taxa do IVA na

eletricidade nos 6% (BE), que baixa à 5.ª Comissão, 527/XII (3.ª) — Proíbe a cobrança, pelas instituições de

crédito, de comissões, despesas ou outros encargos pela manutenção de contas de depósito à ordem (PCP),

528/XII (3.ª) — Alteração à Lei dos Baldios (altera a Lei n.º 68/93, de 4 de setembro, com redação da Lei n.º

89/97, de 30 de junho, que estabelece a lei dos baldios, altera o Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado

pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de julho, e efetua a nona alteração ao Regulamento das Custas Processuais,

aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro) (PSD e CDS-PP), que baixa à 11.ª Comissão, em

conexão com as 1.ª e 5.ª Comissões, 529/XII (3.ª) — Assegura o acesso dos cidadãos aos serviços mínimos

bancários gratuitos e limita a cobrança de despesas de manutenção de conta por parte das instituições de

crédito (altera o Decreto-Lei n.º 27-C/2000, de 10 de Março, e o Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro)

(BE), que baixa à 5.ª Comissão, 530/XII (3.ª) — Lei que define os princípios que regem a cobertura jornalística

das eleições e referendos nacionais (PSD e CDS-PP), 531/XII (3.ª) — Altera a Lei Geral Tributária para que o

Estado não inviabilize sistematicamente os planos especiais de recuperação de empresas (PS), que baixa à

5.ª Comissão, e 532/XII (3.ª) — Cobrança de comissões e outros encargos pelas instituições de crédito e

sociedades financeiras devidas pela prestação de serviços aos consumidores (PS); e o projeto de resolução

n.º 977/XII (3.ª) — Pelo respeito, pelas normas e princípios do direito internacional com o fim da parceria entre

a EPAL e a empresa israelita MEKOROT (PCP).

Sr.ª Presidente, há ainda um parecer da Comissão para a Ética, a Cidadania e a Comunicação que deve

ser votado de imediato.

O relatório e parecer da Comissão para a Ética, a Cidadania e a Comunicação refere-se à retoma do

mandato, nos termos do artigo 7.º do Estatuto dos Deputados, do Sr. Deputado Luís Vales (PSD), círculo

eleitoral do Porto, cessando a Sr.ª Deputada Paula Gonçalves, com efeitos a partir de 12 de março de 2014,

inclusive.

O parecer é no sentido de que a retoma do mandato do Deputado em causa é de admitir, uma vez que se

encontram verificados os requisitos legais.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, está em apreciação o parecer.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Sendo assim, retoma o mandato o Sr. Deputado Luís Vales, ao qual dou as boas-vindas de regresso ao

Parlamento.

Srs. Deputados, as declarações políticas de hoje vão ser proferidas pelos Srs. Deputados Mariana

Mortágua, do BE, Luís Menezes, do PSD, João Soares, do PS, Filipe Lobo d’Ávila, do CDS-PP, e Paulo Sá, do

PCP.

Como ainda há um certo ruído no Hemiciclo, vou aguardar um pouco para que o primeiro orador tenha

condições de ser ouvido.

Pausa.

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Srs. Deputados, vamos começar com as declarações políticas, pertencendo a primeira ao Bloco de

Esquerda.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as

Deputadas, Srs. Deputados: A dívida pública

portuguesa representa já 130% de toda a riqueza produzida no País e leva todos os anos 8000 milhões de

euros só em juros. É mais do que o Estado investe em todos os níveis de educação e de investigação.

Este Governo tomou posse fazendo do pagamento da dívida e do controlo do défice o objetivo central da

sua governação. Foi sempre em nome deste pagamento que Passos Coelho foi justificando o corte nas

pensões, o corte nos salários, o aumento de 30% em todos os impostos, a degradação do serviço público, do

serviço de educação, de saúde, os aumentos dos transportes ou da eletricidade.

Três anos depois, o que é que aconteceu? Para trabalhadores, desempregos e pensionistas, os

rendimentos nunca pararam de descer; já a dívida, essa, nunca parou de aumentar.

Onde o Memorando garantia que a dívida estaria nos 114% do PIB no final de 2013, hoje estamos nos

130%. O Governo que fez do pagamento da dívida a sua bandeira foi aquele que mais aumentou a dívida

pública em Portugal.

Mas esta semana, com uma candura desarmante, o Presidente da República veio explicar o plano da

direita para controlar a dívida. O plano apresenta, no entanto, três pequenas falhas — é irrealista, é

irresponsável e é impossível.

Aplausos do BE.

É irrealista, porque defende para 30 anos consecutivos aquilo que não foi conseguido num único ano. É

irresponsável, porque impõe o empobrecimento de todo o País em nome de uma meta que sabe ser

impraticável. E é impossível, porque nunca nenhum país do mundo, nem os Estados Unidos, nem a

Alemanha, conseguiu atingir as metas defendidas por Cavaco Silva e por este Governo.

Pese embora toda a retórica inflamada de Paulo Portas, o plano da direita para pagar a dívida é mais do

mesmo, mas mais forte. O Presidente da República usou os números que o Governo tenta esconder.

Diz-nos Cavaco Silva que durante 30 anos, e todos os anos, Portugal terá de ter, no mínimo, taxas de

crescimento do PIB de 3% e saldos primários de 4%.

Em 40 anos de democracia, Portugal nunca conseguiu atingir estes valores num único ano, quanto mais

em 30. Pior: nunca nenhum país do mundo o fez. Mesmo os países mais ricos, como a Alemanha, só

atingiram estas metas durante dois anos nos últimos 17.

Sejamos claros: o que nos propõem é continuar este nível de austeridade por três décadas e, com mais

cortes e sem investimento, atingir níveis de crescimento e de excedentes orçamentais que nenhuma das

economias mais ricas do planeta conseguiu. Isto só tem um nome, Srs. Deputados: chama-se má-fé.

A pergunta que se impõe é esta: se o Governo sabe que estas metas são inviáveis, por que é que insiste

num plano suicidário? E a resposta também está à vista: a sustentabilidade da dívida sempre foi a menor das

preocupações da direita. Assim tem sido e assim continuará a ser na pós-troica. A dívida é o pretexto para

impor a austeridade que corta salários e retira direitos a quem trabalha ou a quem trabalhou.

Aplausos do BE.

A transferência de rendimentos do trabalho para o capital é o único elemento que está a ser ajustado na

economia portuguesa.

Sr.as

e Srs. Deputados: Não há nada mais irrealista do que dizer que um país cada vez mais pobre,

acorrentado aos humores de Bruxelas e do FMI durante os próximos 30 anos, terá condições para pagar a

dívida e, sobretudo, terá condições para oferecer a quem cá vive um futuro melhor.

Mas é exatamente este plano — irrealista, irresponsável e impossível — que dá corpo ao tratado

orçamental. O que este tratado defende é que, independentemente de quem seja eleito, o dogma desta

austeridade continuará a ser aplicado. Não é por acaso que Cavaco Silva fala em consensos até 2035, quando

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até lá Portugal vai ver, pelo menos, seis ciclos eleitorais diferentes. Muda o Governo, mas apenas na certeza

de que continua o mesmo programa e o mesmo consenso, que é o programa da troica.

Medimos bem as palavras, Sr.as

e Srs. Deputados: este tratado e estes consensos a 30 anos afrontam os

princípios elementares da democracia, afrontam o princípio de um povo poder decidir livremente sobre o seu

futuro e sobre o rumo do país onde vive.

Vejamos do que falamos.

Segundo as regras do tratado, Portugal terá de reduzir a dívida a uma velocidade que, só no primeiro ano,

equivale a 10 000 milhões de euros, e isto sem contar com os juros. É mais do que todo o orçamento anual

para o Serviço Nacional de Saúde.

Se, com o atual nível de austeridade, a dívida tem subido, e muito, a pergunta a que os representantes do

tratado orçamental têm de responder não podia ser mais simples: que nível de devastação social é que

pretendem impor para, sem reestruturar a dívida, abater 10 000 milhões de euros em apenas um ano?

Sr.as

e Srs. Deputados, há um consenso crescente na sociedade portuguesa: a dívida pública e, sobretudo,

as medidas de austeridade impostas em nome do seu pagamento são hoje o maior obstáculo ao crescimento

económico português.

A rejeição do tratado orçamental e uma reestruturação responsável da dívida, que inclua a alteração dos

seus juros e o prolongamento do seu prazo, o abatimento de uma parte destes valores, são as condições

mínimas para ter políticas de crescimento e de emprego.

O que os portugueses esperam de cada uma e de cada um de nós é muito claro: os portugueses esperam

saber se o País continua preso a uma austeridade masoquista, que hipoteca o futuro durante décadas, ou se,

pelo contrário, temos a coragem, a determinação e a responsabilidade de afrontar os interesses financeiros e

de defender os direitos dos cidadãos.

A escolha do Bloco é muito clara: entre a banca e as pessoas, escolhemos as pessoas.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Cecília Meireles, do

CDS-PP, e Miguel Tiago, do PCP, tendo a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua informado a Mesa que pretende

responder a um Deputado de cada vez.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, trouxe-nos aqui o

que tem sido, porventura, o tema, não diria do dia, mas dos últimos anos, da política portuguesa mais

importante que temos discutido.

Desde as versões mais radicais do simples «Não pagamos!», passando pelas versões mais moderadas do

«Pagamos, mas só pagamos metade!» até às versões mais mitigadas, como as do PS, do «À segunda não

pagamos, à terça pagamos metade e à quarta queremos cumprir e fazer tudo e o seu contrário ao mesmo

tempo!»,…

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Pois é!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — … dentro destas várias versões, há algumas questões que, creio,

vale a pena pôr. E, permita-me que lhe diga, a Sr.ª Deputada, de uma forma que eu diria algo maniqueísta,

perguntou quem é que está com as pessoas e quem é que está com os bancos. Com as pessoas estamos

todos, Srs. Deputados!

Vozes do CDS-PP: — Exatamente!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Ninguém diria!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — S.ª Deputada Mariana Mortágua, gostava de lhe fazer a seguinte

pergunta: se um dos Srs. Deputados tiver uma dívida ao banco e eu lhe disser: «Ó Sr. Deputado, meu caro

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amigo, eu vou ao banco, vou negociar um prazo melhor, vou negociar mais tempo para pagar a sua dívida,

vou negociar uma taxa de juro melhor» e se uma outra pessoa lhe disser: «Não, é muito simples: deixe-se ficar

em casa, pura e simplesmente, não faça transferência e deixe de pagar», quem é que a Sr.ª Deputada acha

que está do lado dele? É quem vai negociar com o banco! E quem é que acha que está contra? É quem diz,

pura e simplesmente, «Não pagamos!».

Portanto, para visões maniqueístas do mundo, também lhe podia dizer que o que está aqui em causa é,

simplesmente, a escolha entre o cumprimento e o calote.

Porém, acho que a questão é um bocadinho menos maniqueísta e menos simples do que isto. É uma

questão um pouco mais profunda.

Há, pois, algumas perguntas que vale a pena serem colocadas para percebermos se o caminho do puro e

simples incumprimento é o caminho do oásis que estão a tentar descrever, porque não me parece que seja.

O caminho que tem sido trilhado e que está a começar a dar resultados, esse caminho, devo dizer-lhe,

também não foi trilhado em nome do pagamento da dívida mas, sim, em nome da nossa absoluta

incapacidade de nos conseguirmos financiar, ou seja, de nos conseguirmos endividar mais e mais e ao ritmo a

que o tínhamos feito.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Pagamento da dívida!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Não tem nada a ver com o pagamento da dívida, tem a ver com a

falta de pessoas dispostas a emprestar-nos mais dinheiro ao mesmo ritmo a que nos vínhamos endividando

por causa, de certeza, de alguma coisa que estaria no passado,…

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Por causa da dívida!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — … não de alguma coisa que viria no futuro.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Essa está boa!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Pergunto: partindo do princípio de que Portugal regressa aos

mercados em maio, que tipo de taxas de juro acha que teremos, se anunciarmos uma reestruturação? Acha

possível, acha viável que regressemos aos mercados? Acha que teremos capacidade de o fazer? Já não lhe

vou lembrar, pois tenho a certeza de que conhece, as palavras da Professora Teodora Cardoso, mas

perguntava-lhe se acha que é um caminho viável que um país que se vai financiar diga, pura e simplesmente,

«Emprestem-me mais dinheiro, mas já não vou pagar aquilo que devo». Pergunto-lhe, portanto, se lhe parece

um caminho viável.

Em segundo lugar, a médio e a longo prazos até posso perceber a defesa da reestruturação, ou da

renegociação, ou do que lhe queira chamar, mas é uma coisa que já todos percebemos é que é unilateral.

O Sr. João Galamba (PS): — É unilateral porquê?!

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.

Pergunto como é possível defender isso e não defender que no dia a seguir vamos ter défice zero. Sr.ª

Deputada Mariana Mortágua, como é que se pode defender que não iremos pagar aquilo que devemos e

vamos, ainda assim, continuar a endividar-nos no futuro?

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Essa é que é a grande pergunta a que os senhores não respondem.

Como é que nós, fazendo uma reestruturação, não vamos ter ainda mais austeridade do que a que temos

agora, por absoluta incapacidade de nos financiarmos?

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Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Pedia aos Srs. Deputados para respeitarem os tempos regimentais.

Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, tem a palavra para responder.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Meireles, confesso que até vejo

alguma ironia, para não dizer… A Sr.ª Deputada consegue olhar para o Bloco de Esquerda e acusar-nos da

política do «Não pagamos!» sem se rir…

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Consigo!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — … sem olhar para dentro e perceber que suporta um Governo que mais

vezes implementou a política do «Não pagamos!»? «Não pagamos salários!», «Não pagamos pensões!»,

«Não pagamos Serviço Nacional de Saúde!», «Não pagamos Estado social!».

Aplausos do BE.

A política do «Não pagamos!», Sr.ª Deputada, é a política deste Governo: não paga nada daquilo que deve

aos trabalhadores, aos cidadãos, aos pensionistas, a quem precisa de serviços públicos.

Sr.ª Deputada Cecília Meireles, a política do «Não pagamos!», do Governo, está a criar um País mais

pobre. O País, hoje, está muito mais pobre do que estava há três anos. E está a criar um País mais pobre sem

resolver o problema da dívida. A dívida, hoje, está muito maior do que estava há três anos.

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Exatamente!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Portanto, deparamo-nos com um problema crucial: a austeridade não

paga a dívida, porque a austeridade cria pobreza e uma casa mais pobre não paga melhor as suas dívidas.

Este é o problema e, portanto, temos duas conclusões a tirar desta nossa análise.

A primeira é que não tem nada a ver com o pagamento da dívida. A escolha do Governo não é pagar a

dívida, é usar a dívida como chantagem para não pagar os salários e para não pagar as pensões. Essa é a

escolha do Governo.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — É inacreditável! Só faltava ouvir isto!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Por outro lado, os senhores sabem que nós sabemos que os senhores

sabem que não vão pagar a dívida, porque ela não é pagável. Aliás, Manuela Ferreira Leite já percebeu isso;

Bagão Félix, também. Há várias figuras que, diria, muito distantes ideologicamente do Bloco de Esquerda, mas

que já perceberam isso: a dívida não é pagável!

Portanto, uma opção responsável, defesa do interesse nacional, das pessoas que estão desempregadas,

que querem trabalhar, que querem ter uma reforma, é, sim, reestruturar a dívida. Reestruturar a dívida é a

resposta responsável e alternativa ao radicalismo de um Governo que não conseguiu mais nada a não ser

empobrecer o País e aumentar a dívida.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, foi a 5 de abril de 2011

que, pela primeira vez, se falou em Portugal de renegociação da dívida, aliás, na altura apresentado como a

alternativa precisamente ao rumo prosseguido pelo PS, PSD e CDS quando assinaram o pacto de agressão

junto do FMI, Banco Central Europeu e União Europeia. Isso foi apresentado pela voz do Secretário-Geral do

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PCP, que, aliás, durante algum tempo, caminhou sozinho ao defender a renegociação da dívida nos seus

prazos, montantes e juros como a solução para a situação em que o País se encontrava, como alternativa ao

pacto que foi lançado sobre os portugueses, de autêntico empobrecimento e, como, aliás, referiu, de

redistribuição da riqueza e reconfiguração do Estado — mais concentração no capital, rendas, lucros e juros;

menos remuneração do trabalho e um Estado cada vez mais ao serviço daqueles que menos impostos pagam

e cada vez mais contra aqueles que mais impostos pagam.

A questão da renegociação da dívida é hoje, como já o era em 2011, crucial e o PCP trouxe a debate esta

questão quando ainda muitos notáveis a ela não se associavam e quando até alguns brandiam e agitavam os

preconceitos contra os comunistas por falarem de renegociação da dívida. Aliás, alguns desses que agora

compreenderam que a trajetória não é sustentável e que Portugal está claramente no caminho da rutura,

rutura perante os portugueses e os compromissos constitucionais para com os portugueses e, mesmo, rutura

no que toca à sustentabilidade da dívida. Cada vez mais se torna evidente que a dívida está num rumo de

insustentabilidade.

A questão que se coloca neste momento é esta: Portugal continuará a sangrar 21 milhões de euros por dia,

como disse, 8000 milhões de euros por ano, em juros da dívida, de pura agiotagem, sem amortizar na dívida,

e fará os caprichos dos especuladores ou resgatará a soberania e a democracia, salvaguardará os direitos dos

portugueses, dos trabalhadores e renegociará os termos da dívida?

Mas, Sr.ª Deputada, coloca-se também aqui uma outra questão. Falou muito da renegociação da dívida,

mas é importante aprofundar também os termos em que o BE fala da reestruturação da dívida, principalmente

neste contexto em que surge um manifesto de outras pessoas que se juntam a esta necessidade e aos apelos

para a reestruturação da dívida. Algumas dessas considerações passam ao lado das componentes ilegítimas

da dívida, que não serão pequenas; passam ao lado da questão fundamental dos constrangimentos europeus

e até confiam numa eventual mutualização ou em soluções europeias, como se o capitalismo tratasse dos

seus próprios males.

Para nós, PCP, é também importante clarificar estas questões fundamentais para assegurar que o País

paga a dívida, expurgada das suas componentes ilegítimas mas de acordo com as suas capacidades reais,

porque o contrário é, de facto, o caminho do incumprimento. Do incumprimento para os portugueses e também

do incumprimento do pagamento da dívida. O que gostaria de lhe perguntar é se também o Bloco de Esquerda

encara a questão nestes termos.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para responder, a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Miguel Tiago, o tema da renegociação ou

reestruturação da dívida é um tema difícil. O Bloco de Esquerda já apresentou várias propostas a esta

Assembleia da República, com soluções específicas de reestruturação, aliás, votadas favoravelmente também

pelo próprio PCP.

Sabemos e reconhecemos que há uma parte da dívida que não é legítima: os submarinos são disso um

bom exemplo, as PPP, a especulação financeira, o BPN… Tudo isto são fluxos e criaram dívida que não é

legítimo que seja paga, e isto tem de ficar claro.

Mas também é importante perceber, neste momento crucial que o País atravessa, que ganhamos em gerar

consensos alargados sobre esta matéria. Ganhamos em juntar forças sobre esta matéria para enfrentar um

Governo que, ele sim, está cada vez mais isolado, é cada vez mais dogmático na sua posição. E, assumimos,

o caminho é difícil e é por ser difícil que precisamos de todas e de todos aqueles que quiserem juntar-se. O

contrário desta posição seria permanecer na posição facilitista dos partidos da direita e do próprio Governo,

que é a posição de quem fecha os olhos e segue em frente, na esperança de que alguma coisa mude no

futuro. É a posição de não enfrentar os problemas, de «empurrar com a barriga» e deixar que quem vier a

seguir resolva o problema da dívida pública. Essa não é solução para o País, não trará um País melhor no

futuro, não resolverá os problemas concretos da economia e das pessoas.

Gostaria apenas de deixar aqui uma nota aos silêncios desta Sala, nomeadamente ao desafio que foi feito

relativamente ao tratado orçamental, em particular também ao PS, que assinou o tratado orçamental, e de

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dizer como é que se cortam 10 000 milhões, exigidos pelo tratado orçamental, sem aumentar a devastação

social, sem criar exatamente a mesma destruição social que já sabemos que a austeridade cria.

Por isso, o apelo que fazemos é de posições claras, de consensos claros, em nome de um País melhor, de

uma economia mais saudável e isso, não tenhamos nenhuma dúvida, só se consegue enfrentando o problema

de frente. E enfrentar o problema de frente é admitir que a dívida não é pagável, tem de ser reestruturada, o

consenso está a gerar-se, é cada vez maior e isolados nesta matéria estão os partidos da direita e está o

Governo.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Concluiu-se aqui a declaração política do Bloco de Esquerda.

A próxima declaração política é do PSD.

Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Menezes.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Numa altura em que estamos a

cerca de dois meses de terminar o Programa de Ajustamento Económico e Financeiro, é relevante termos a

capacidade para, de forma serena, olharmos para o País que recebemos em junho de 2011 e para aquele que

sairá do Programa de Ajustamento em maio de 2014.

Foram três anos de enormes sacrifícios para todos. Não houve setor da sociedade que não tivesse sido

atingido pela onda de choque que se levantou com a quase bancarrota do País no primeiro semestre de 2011.

Como disse desta tribuna há cerca de duas semanas o Deputado socialista Carlos Zorrinho, o Programa

inicial foi mal desenhado. Tive oportunidade de o dizer na altura ao Deputado Carlos Zorrinho, e repito: tem

toda a razão.

O Programa inicial partia de metas de défice orçamental falsas; previa uma maturidade média para o

pagamento dos empréstimos de apenas sete anos e um custo médio para essa dívida de cerca de 5%.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Bem lembrado!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Apesar desse Programa de Ajustamento mal desenhado pelo anterior

Governo, o atual Governo, com credibilidade e com os sacrifícios de todo um País por trás, conseguiu aquilo

que muitos achavam impossível. Conseguimos estabilizar as finanças públicas, estabilizámos o sistema

financeiro…

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — É uma «estabilidade»!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — … e, chegados a este ponto, conseguimos atingir um nível de taxas de juro

abaixo dos 4,5%, que nos permite olhar para o nosso regresso aos mercados sem a necessidade de nenhum

segundo resgate e com capacidade para escolhermos a melhor modalidade de regresso aos mercados, no

tempo adequado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Muitos disseram que seria impossível. Muitos disseram que fossem quais fossem os sacrifícios, seria

impossível evitar um segundo resgate. O facto é só um: estavam errados!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Os arautos da desgraça estavam errados. Os que previram uma espiral

recessiva estavam errados, não têm razão.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Como é possível dizer isto?!

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O Sr. Luís Menezes (PSD): — Mas é justo que se pergunte: o que é que aconteceu entretanto ao País? O

País está melhor ou está pior?

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Está pior!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Vamos a factos.

A taxa de desemprego está mais alta que no início do Programa de Ajustamento, mas teve a maior queda

homóloga nos últimos 12 meses: 2,3%, de 17,6 para 15,3% de janeiro de 2013 para janeiro de 2014.

A produção industrial do País aumentou em 2013, contra um decréscimo de 6%, em 2012.

As taxas de juro estão hoje em 4,4%, quando no momento do Programa de Ajustamento Económico e

Financeiro, em maio de 2011, estavam acima dos 9%.

Não se criavam tantas empresas em Portugal desde 2009 como aquelas que foram criadas em 2013.

Foram feitas reformas em todas as áreas — da economia, da justiça, da saúde, da educação — e que

estavam por fazer há décadas.

O PIB cresceu três trimestres consecutivos, o País saiu da recessão técnica, com todas as entidades

estrangeiras e nacionais a preverem um crescimento acima de 1% para 2014.

As nossas exportações continuam a fazer, todos os dias, o impossível possível, com crescimentos

sustentados, assentes na criatividade, na capacidade e no engenho das nossas empresas e dos seus

trabalhadores.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Temos, hoje, sem dúvida, um País melhor do que tínhamos em

maio de 2011. Temos, hoje, um País melhor preparado para os desafios do futuro.

Mas não devemos ter rodeios na análise da realidade que nos envolve. O País está melhor, mas, de facto,

as pessoas, os portugueses ainda não sentiram essas melhorias no seu dia a dia. Os ciclos económicos não

coincidem, para o bem e para o mal, com os ciclos de bem-estar.

Da mesma forma que quando o País se afundou às mãos de um Governo socialista os portugueses não

sentiram a sua vida a piorar à medida que a situação do País piorava, agora que o País começa a melhorar

também não é possível reverter, de forma imediata, para os portugueses essas melhorias no seu dia a dia. E

não vale a pena estar aqui com falsas demagogias e querer dizer o contrário.

Mas esse é o desafio que deixo a todos os partidos que constituem esta Câmara, isto é, que olhemos para

o pós-troica, que tenhamos a capacidade de deixar a conflitualidade de lado e que tenhamos a coragem de

pensar naquilo que é melhor para o País, que não pensemos nos nossos resultados eleitorais, mas, antes, nos

resultados que o País e os portugueses podem ter dos consensos essenciais para um futuro de prosperidade

e de crescimento sustentado.

E temos todos a responsabilidade, num ano em que comemoramos 40 anos de liberdade, de pôr os nossos

interesses pessoais de lado, de pôr os nossos interesses partidários de lado e de tentar lutar contra a

demagogia que grassa por todo o lado no nosso País.

Não há democracia sem partidos, mas também não há democracia quando as pessoas não acreditam nos

partidos que têm ao seu dispor.

Temos a responsabilidade de mostrar ao País que a política e os políticos são capazes de se entender e de

encontrar os consensos que o futuro pós-troica exige. Temos a responsabilidade de mostrar ao País que os

partidos são capazes de ceder no acessório para se concentrarem na sua missão principal: servir aqueles que

os elegem para governar.

É isso que este Governo e esta maioria têm tentado fazer todos os dias, desde junho de 2011. É isto que,

tenho a certeza, todos os partidos nesta Câmara pretendem fazer na sua atividade diária.

Mas tenhamos a capacidade e a coragem de mostrar, por ações concretas, que este período de provação,

que começará a terminar com a saída da troica em maio de 2014, será também um período de consensos

alargados e imprescindíveis. Consensos que permitam devolver a esperança, o crescimento e a prosperidade

a um povo que tanto lutou para as poder ter de volta a partir de maio de 2014.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. João Galamba (PS): — Devia ser o Miguel Frasquilho a fazer a intervenção!

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O Sr. José Magalhães (PS): — Onde está o Miguel Frasquilho?!

A Sr.ª Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Pedro Nuno Santos,

do PS, Pedro Filipe Soares, do BE, João Oliveira, do PCP, e Hélder Amaral, do CDS-PP.

O Sr. Deputado Luís Menezes já informou a Mesa que responderá a cada conjunto de dois Srs. Deputados.

Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Nuno Santos.

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Luís Menezes, a sua intervenção, a

somar à intervenção de ontem do Primeiro-Ministro, em reação ao manifesto assinado por 70 personalidades,

revela, mais uma vez, o que já sabíamos: o PSD e, já agora, também o CDS continuam isolados.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Isolados como?!

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Continuam a pedir e a apregoar a necessidade de um consenso, mas a

verdade é que aquilo que pedem, nomeadamente ao PS, é que o PS abdique da defesa daquilo que tem

assumido para subscrever o vosso programa, um programa que fracassou, um programa que é combatido

pelo Partido Socialista.

Isso, obviamente, nunca seria consenso; seria, sim, a capitulação de um partido que, acreditando num

determinado programa, teria de abdicar do seu para assumir o vosso.

Na realidade, não há isolamento maior do PSD e do CDS quando nós assistimos, talvez pela primeira vez

desde o 25 de Abril, a uma coligação tão ampla, da esquerda à direita, relativamente à necessidade de

renegociarmos a dívida pública portuguesa. Nunca vimos nenhuma iniciativa que juntasse da esquerda ao

PSD e ao CDS, líderes do PSD, dois ex-Ministros das Finanças do PSD e do CDS, Adriano Moreira e Freitas

do Amaral, fundadores do CDS, o Presidente da CIP, o Presidente da CCP, professores universitários,

constitucionalistas. Queriam uma coligação? Pois ela está aqui!

Aplausos do PS.

Mas é uma coligação que rejeita aquela que os senhores querem. É uma coligação em torno de um

programa que permita ao País reduzir, de forma substancial, a austeridade.

Os senhores não querem renegociar a dívida pública porque a querem toda. E querem-na toda para

continuar a justificar a austeridade que impõem ao País.

Aplausos do PS.

E não vale a pena continuarem com o «número» de empurrar para os outros o facto de não quererem

honrar as responsabilidades. O PSD e o CDS reestruturam todos os dias o compromisso do Estado português:

reestruturam os compromissos do Estado português com os funcionários públicos e reestruturam os

compromissos do Estado português com os pensionistas. E, de forma unilateral, não negociada, os únicos

que, até agora, não pagaram, em Portugal, foram os senhores.

Aplausos do PS.

Os senhores não se sentaram para negociar, reestruturaram esses compromissos de forma unilateral.

Ora, não é isso que o País quer. O País quer renegociar a dívida para termos melhores condições para

diminuir a austeridade imposta ao Estado português.

Neste momento, PSD e CDS estão isolados, pois se querem verdadeiramente um consenso, um consenso

nacional, façam favor de «tirar a cabeça da areia» e de assumir a realidade,…

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

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O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — … de deixar de ser irrealistas e de assumir a necessidade de

reestruturarmos, de renegociarmos a nossa dívida…

Protestos do Deputado do PSD Hugo Lopes Soares.

… e de travarmos a austeridade em Portugal.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Peço aos Srs. Deputados que respeitem o tempo regimental de intervenção.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Luís Menezes, devo dizer-lhe o seguinte:

o País estranhou, julgou que uma frase do líder parlamentar do PSD tinha sido um deslize. Dizia ele que o

País está melhor, as pessoas é que estão pior — como se quisesse dizer que, se o País não tivesse pessoas,

até já estávamos bem.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Que absurdo! Demagogia!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Pois, mas é para as pessoas que devemos governar.

E aquela que parecia ser uma asneira, uma frase mal dita, num debate mais acalorado, afinal, não é uma

asneira, é uma narrativa, é uma posição política — e, por isso, vale a pena ser discutida.

Assim, quando o Sr. Deputado repetiu hoje aqui a mesma ideia, quase a mesma frase que tinha sido dita

anteriormente, digo-lhe que é verdade que as pessoas estão pior. E estão pior por causa das políticas deste

Governo, estão pior porque viram os seus salários cortados, estão pior porque viram as suas pensões

cortadas, estão pior porque estão no desemprego ou porque tiveram de emigrar, estão pior porque este

Governo governou como tem governado até aqui.

Mas não bate certo a ideia que tenta passar de que, afinal, as pessoas estão pior, mas o País, se não

tivesse pessoas, até estava melhor. Não, Sr. Deputado! O País também está pior — e a responsabilidade é

deste Governo.

Olhemos, por exemplo, para o investimento, que recuou 20 pontos percentuais com esta governação.

Olhemos para o défice, no qual o Governo continua a não ter mão, nunca acertou, e, mesmo em 2013, vai ter

um valor acima daquele que era inicialmente previsto. E olhemos para a dívida, que era aquilo que o Governo

tinha prometido que iria resolver, mas que está quase nos 130% e não tem parado de aumentar.

Então, a pergunta é: o que fez este Governo? Onde é que o País está melhor? E a resposta é: não está!

Está pior porque quem vive cá está pior, está pior porque, relativamente a contas, as contas públicas também

estão piores.

Mas tentou o Sr. Deputado, e a sua bancada, ainda há pouco, fugir ao debate, porque questionado, na

declaração política feita pelo Bloco de Esquerda, sobre a reestruturação da dívida, não quis responder. Aceito

que, no debate parlamentar, não tenha querido responder ao Bloco de Esquerda. Mas, então, responda, por

exemplo, a Manuela Ferreira Leite, responda a Bagão Félix, responda àqueles que, do seu lado da política,

dizem que esta dívida não é pagável, que o País está pior e que o caminho que o Governo quer seguir porá o

País ainda pior do que está.

Responda, Sr. Deputado! A frontalidade necessária é dizer que, realmente, o único caminho que o País

tem de seguir para ficar melhor é romper com a dívida, romper com a finança e com a banca, para pôr as

pessoas melhor — e isso chama-se «reestruturar a dívida».

Desafio-o, muito diretamente, a ter a coragem de dizer a palavra «reestruturar», reestruturar a dívida. Essa

é que era a palavra sábia que devia ter apresentado aqui, ao Parlamento.

Aplausos do BE.

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, há um certo ruído, bastante alto, na Sala. Peço aos Srs. Deputados

o favor de falaram mais baixo.

Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Menezes para responder.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados Pedro Nuno Santos e Pedro Filipe Soares,

antes de mais, queria agradecer as vossas questões.

Tenho pena que, nem um, nem outro, tenha ouvido a minha declaração política.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Ouvimos até bem demais!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — É que o facto é só um: este Governo recebeu um Programa de Assistência

Económica e Financeira que tinha uma maturidade média de sete anos e taxas de juro próximas dos 5%. E o

que temos atualmente é um Programa de Assistência Económica e Financeira…

O Sr. Hugo Filipe Soares (PSD): — A terminar!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — … com uma maturidade de cerca de 20 anos, em termos médios, e com

uma taxa de juro próxima de 3%. Qual é a parte desta equação que os senhores não querem entender?

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Nós trabalhámos ao serviço do País, porque ganhámos credibilidade. Qual

é a parte que os senhores não querem entender?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Acho inenarrável ouvir o Sr. Deputado Pedro Nuno Santos vir aqui dizer que os únicos que não querem

pagar aquilo que devem são este Governo e esta maioria!

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Não é «não querem», é não pagaram!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr. Deputado, por lisura parlamentar, não vou citá-lo — podia, mas não vou

fazê-lo. Mas os factos são concretos: este Governo fez uma renegociação com os credores das maturidades,

fez uma renegociação com os credores das taxas de juro de um programa que os senhores negociaram mal.

Agora, se os senhores têm vergonha daquilo que negociaram, têm toda a razão para ter vergonha disso.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do Deputado do PS Pedro Nuno Santos.

O Sr. Deputado Pedro Nuno Santos e o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares falaram da questão do manifesto

assinado por 70 personalidades do nosso País. Respeito imenso o manifesto e respeito imenso as

personalidades em causa. Mas tenho o direito de ter uma opinião totalmente contrária. Tal como a tem, aliás, o

Professor Silva Lopes, que, em fevereiro de 2014 (há um mês), dizia que «não é esta a altura de estarmos a

fazer uma reestruturação que iria fazer com que a nossa situação fosse ainda pior do que já é» ou, ainda, a

Dr.ª Teodora Cardoso que acaba de declarar que «esta é a pior altura possível para falar da reestruturação da

dívida».

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Por isso, há opiniões contra e há opiniões a favor. Agora, os senhores só

utilizam o nome de algumas pessoas quando vos dá jeito.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos da Deputada do BE Mariana Mortágua.

Mas a manifestação que queria aqui deixar era, tão simplesmente, esta: o timing deste manifesto é, a todos

os títulos, inapropriado. É que é inacreditável que, no dia em que estamos com as taxas de juro…

Protestos do Deputado do PS João Galamba.

Sr. Deputado João Galamba, sei que, hoje, não foi o Sr. Deputado que falou, mas vai ter de me ouvir com

alguma paciência.

A questão, Srs. Deputados, é só uma: o manifesto aparece a dois meses de sairmos do Programa de

Ajustamento, o manifesto aparece no dia em que baixámos as taxas de juro abaixo de 4,5%.

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Daqui a dois meses, já subscrevem?

O Sr. Luís Menezes (PSD): — E se tenho todo o respeito pelas pessoas que assinaram este manifesto,

também não me esqueço que o manifesto é assinado por pessoas que deviam ter outra responsabilidade e

outro sentido de Estado e pensarem sobre os timings em que apresentam estas propostas e lembrá-los que

foram os responsáveis por muita da situação que hoje estamos a viver.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Muitos foram ministros das Finanças e muitos foram ministros das Obras Públicas. O ministério de João

Cravinho, em particular, deixou milhares de milhões de euros para esta juventude e para as gerações

vindouras pagarem e agora vem falar em reestruturar a dívida que ele nos deixou?!

Como disse hoje o jornalista José Gomes Ferreira, e bem, esta é uma carta que vem de uma geração

errada.

Tenham vergonha!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — O próximo pedido de esclarecimento é do PCP.

Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Luís Menezes, na declaração política que fez

da tribuna falou de Portugal como se fosse a terra do leite e do mel.

Sr. Deputado Luís Menezes, não é esse o País que os senhores deixam quando saírem do Governo. O

País que os senhores deixam pode ser retratado num exemplo muito simples, que é o exemplo de doentes

que nos hospitais, em vez de fraldas, são tratados com toalhas e sacos do lixo, porque os senhores cortaram o

financiamento dos hospitais. As pessoas hoje são tratadas nos hospitais do Serviço Nacional de Saúde como

se estivéssemos num país em guerra. É este o vosso Governo! O Governo das fraldas com toalhas e sacos do

lixo nos hospitais, Sr. Deputado Luís Menezes!

Neste pedido de esclarecimento, gostaria de concentrar-me em duas frases que o Sr. Deputado disse da

tribuna. Disse que o País está hoje melhor do que estava em maio de 2011 e, relacionada com esta, disse

que, apesar disso, os portugueses não sentiram ainda que o País está melhor.

A minha primeira pergunta é para saber que País é esse. Que País é esse de que o Sr. Deputado fala que

está melhor e que não tem pessoas? É que nós temos uma resposta a dar-lhe, Sr. Deputado, porque nós

sabemos qual é esse País que está melhor, esse País que não tem pessoas e que está melhor. É o País das

SGPS que, em 2012, amealharam 1045 milhões de benefícios fiscais que o Governo concedeu, mas que

escondeu das contas gerais do Estado.

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Vozes do PCP: — Exatamente!

O Sr. João Oliveira (PCP): — É o País dos grandes grupos económicos em que só no ano passado os três

maiores grupos amassaram mais 2000 milhões de euros. Isto num País onde foram roubados salários e

pensões, porque não havia dinheiro.

É o País da banca e dos especuladores internacionais que, apesar de estarmos num País onde foram

roubados salários e pensões, arrecadaram no ano passado mais de 7000 milhões de euros de juros da dívida.

É esse o País que está melhor e de que os senhores falam. O País dos grandes interesses económicos, o

País dos grandes grupos económicos e dos interesses financeiros, porque para todos os outros, Sr. Deputado

Luís Menezes, para aqueles que todos os dias se levantam de manhã e saem das suas casas para construir

este País, para todos esses, o País está muito pior!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — E está muito pior do que estava em maio de 2011, Sr. Deputado. Está muito

pior porque as pessoas trabalham mais e recebem menos salário;…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!

O Sr. João Oliveira (PCP): — … porque as pessoas pagam preços mais caros pela energia, pelos

transportes, pelos bens essenciais, mas roubaram-lhes a pensão, porque as pessoas têm hoje mais

dificuldades, mas cortaram-lhe o subsídio de desemprego, cortaram o rendimento social de inserção, cortaram

o abono de família. E depois ouvem o Governo falar de boca cheia dos incentivos à natalidade.

Para todos esses, Sr. Deputado Luís Menezes, para os portugueses de carne e osso falta futuro e sobra

mês depois do salário ou da pensão. Para esses, obviamente que o País não pode estar melhor!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Concluo com uma pergunta muito simples, Sr. Deputado. Que futuro é que

os senhores têm para dar aos portugueses? Olhe para estas galerias que hoje estão cheias de jovens e

responda a estes jovens que futuro é que os senhores têm para lhes dar. É o mesmo futuro daqueles jovens

que nos últimos três anos tiveram de sair do País onde queriam ficar, porque os senhores lhes negam aqui o

futuro, porque lhes negam o emprego, porque lhes negam o acesso à universidade, porque lhes negam o

direito a um salário justo quando começam a trabalhar? Que futuro é este que os senhores, agora com a

cobertura do Presidente da República, pretendem tornar definitivo?

Diz o Presidente da República que é até 2035. Srs. Deputados, se os senhores tiverem espaço para isso,

não será só até 2035, porque nós sabemos bem que querem tornar definitivos todos os cortes que até agora

eram provisórios.

Porém, conte com uma coisa: o povo português, que lá fora vos ouve quando fazem estes discursos de

fanfarronice, sabe bem que os senhores não têm futuro neste País como governo, porque os senhores não

têm condições para responder aos problemas do País. Só a rutura com esta política, só a rutura com o pacto

da troica, a renegociação da dívida e a devolução dos salários e direitos é que é uma perspetiva de futuro para

o País.

Mas isso passa sabe porquê, Sr. Deputado Luís Menezes?

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Por derrotar o Governo. Conte connosco para esse trabalho! Cá estaremos

para que este Governo seja derrotado e para que os portugueses recuperem a sua vida no futuro!

Aplausos do PCP.

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, estas intervenções têm beneficiado de um razoável alargamento de

tempo para garantir a equidade, mas a Mesa terá mais cuidado para a próxima, logo na primeira intervenção,

caso contrário o debate alarga-se demais.

O próximo pedido de esclarecimentos é do CDS-PP.

Tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Luís Menezes, como é óbvio, gostaria de

felicitá-lo pela intervenção que aqui trouxe, até porque, ouvindo a última intervenção do Partido Comunista

Português, quer pelo momento quer pelo tom, deixa claro a necessária afirmação da revolta que a oposição

mais à esquerda tem do sucesso ou dos bons resultados que os portugueses e a democracia têm conseguido.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — É cá um sucesso!…

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — E vem dos mesmos que sempre lutaram contra as liberdades e a

iniciativa privada e que estão exatamente no sítio onde sempre estiveram.

Protestos do PCP.

Sr. Deputado, gostaria de lhe dizer que, da nossa parte, fica claro que pagar a dívida não é uma

brincadeira de crianças. é algo para homens sérios e de palavra.

Posto isso, queria dizer-lhe que são impressionantes os dados que aqui trouxe, que não são da sua autoria

mas de organismos internacionais e por isso confirmáveis para quem tenha dúvidas. De acordo com esses

dados, a economia cresceu 1,7% face ao último trimestre de 2012. Portanto, estamos hoje muito melhor do

que estávamos em maio de 2011. Estamos hoje a ter, obviamente, desagravamento do investimento.

Disse o Sr. Deputado, e bem, com uma honestidade que eu gostava aqui de realçar, que os sinais são

ténues e que os portugueses ainda não sentiram sinais positivos. No entanto, há uma coisa que os

portugueses já sentiram e que eu gostaria que o Sr. Deputado confirmasse.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Veja lá o que vai dizer!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — O simples cenário de esperança, o simples cenário de confiança faz

com que cada português, que, porventura, hoje, está sozinho, porventura só tem o Governo a dizer isto, sinta

um sinal de confiança e assim está mais disponível para sofrer, está mais disponível para fazer sacrifícios,

está mais disponível para agarrar esta pequena janela de oportunidade.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sim, as pessoas emigram muito mais felizes!…

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — No fundo, o que é que o País sente? Que tinha uma doença

gravíssima, foi-lhe diagnosticada uma doença gravíssima, receitado um medicamento horrível, que sabe mal,

e que está apenas a uma dose para chegar ao fim do tratamento. E o que é que diz a família? «Desiste! Deixa

de tomar! Não vale a pena!»

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Tendo em conta que se trata de cianeto, veja lá!…

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — É por isso que eu gostava de lhe perguntar, Sr. Deputado, se este é o

momento de desistirmos, se este é o momento de atirarmos a toalha ao chão ou se este é o momento de, com

as necessárias cautelas e serenidade, dizer que o caminho que fizemos até agora foi um caminho

importantíssimo, um caminho elogiado por todos, um caminho que devemos continuar a trilhar.

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Para isso, devemos contar com o Partido Socialista. Bem sei que o Partido Socialista disse ontem:

«Estamos disponíveis para o consenso, mas não estamos disponíveis para cortes na saúde e na educação!»

Ora, não há frase mais eleitoralista do que esta, não há frase mais demagógica do que esta. Afinal de contas,

estão disponíveis para que consenso?!

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — É o consenso de Ferreira Leite e de Adriano Moreira!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Façamos, então, uma discussão e assentemos que não se corta na

saúde e na educação. Mas sentem-se à mesa e aceitem conversar com o Governo para enfrentar e apoiar os

portugueses.

Sr. Deputado, gostaria de perguntar-lhe que valor é que dá a esta necessidade de encontrarmos um

consenso no sentido de manter um rumo para pagarmos a dívida que for possível pagar, mas, acima de tudo,

para voltarmos a ter acesso ao financiamento para ser possível, isso sim, ajudar quem precisa e dotar a

economia portuguesa dos meios e dos mecanismos para podermos convergir com o resto da Europa. Foi isso

que nos propusemos no início do mandato e é isso que estamos a conseguir, é desse objetivo que estamos

cada vez mais perto.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Menezes.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados Hélder Amaral e João Oliveira, começo por

agradecer as questões que me colocaram.

Sr. Deputado João Oliveira, quanto à sua afirmação «quando esta maioria sair do Governo», quero dizer-

lhe que esta maioria há de sair do Governo quando os portugueses decidirem que ela saia do Governo. Não é

por os senhores dizerem que ela vai sair que sai.

Já agora, quero dizer-lhe que, em relação ao exemplo que deu — e que realmente é lamentável que

tivesse ocorrido —, o que também é lamentável é todas as semanas ouvirmos os senhores falar da questão

das fraldas nos hospitais. É uma vergonha. É o grau zero da política! Os senhores repetem isso dia após dia.

Protestos do PCP.

Sabe porquê? Porque não têm mais nenhum argumento para apresentar ao País.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Queria que escondêssemos? Nós não estamos cá para esconder!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — É uma tristeza, é uma pobreza a política feita desta maneira.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Se faltam coisas em hospitais, deve suprir-se a falta imediatamente.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Vai daí…!

O Sr. Luís Menezes (PSD): — E foi o que aconteceu, de facto. Mas os senhores, todas as semanas, não

arranjam outro assunto para falar.

Repito, é lamentável, é baixa política e é tudo o que os portugueses não querem ver nesta Câmara. É por

isso que os portugueses começam a estar fartos dos políticos e dos partidos.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Tristeza é termos chegado a este ponto! Os portugueses estão fartos é

desta maioria e deste Governo!

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O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr. Deputado Hélder Amaral, tenho pena que só o Sr. Deputado se tenha

dado ao trabalho de ouvir algumas coisas que eu disse da tribuna.

Primeiro, limitei-me a constatar factos. Segundo, fui muito frontal na análise que fiz, e repito o que disse: o

País está a melhorar e os números provam-no, mas isso ainda não se tem traduzido no dia a dia dos

portugueses. Da mesma forma que o País caminhava para um precipício liderado por um governo socialista,

os portugueses não foram sentindo isso no seu dia a dia. Infelizmente, as melhorias só virão com alguma

caminhada que ainda temos de fazer.

Mas isto é ser frontal, isto é ser verdadeiro e é isto que as pessoas querem ouvir de nós. Não é a

fanfarronice política do PS, ainda por cima vinda de quem vem, a dizer que quem não anda a pagar o que

deve é este Governo e esta maioria.

Olhe, Sr. Deputado Pedro Nuno Santos, podia ficar aqui a perder muito tempo. O Sr. Deputado tem agora

no Dr. Diogo Freitas do Amaral, na Dr.ª Manuela Ferreira grandes referências. Ainda bem para si! Espero que

não seja só pelo manifesto. Espero que seja para tudo. Para estas bancadas são referências para muito mais

do que isso que o senhor está a falar.

No entanto, é pena que não tenha dito que o Dr. Silva Lopes, que assinou esse manifesto, nas vossas

jornadas, há menos de um mês, disse que esta é a pior altura possível para reestruturar a dívida.

É pena que não tenha dito que a Dr.ª Teodora Cardoso, que tantas vezes, quando critica o Governo, os

senhores utilizam para atacar o Governo e a maioria, disse que esta reestruturação vem na pior altura possível

para a fazer. Desta vez, já não é uma referência para VV. Ex.as

.

Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Termino dizendo uma frase muito lapidar — e digo-a para os jovens que

nos veem, como disse o Deputado João Oliveira, e para as pessoas que nos ouvem: fazer a dívida, fazer as

estradas, fazer as obras e deixar para os outros pagar é muito fácil, mas no fim do dia aparece sempre o

cobrador com a fatura.

Houve quem deixasse a dívida para pagar. Podem ter a certeza de que este Governo e de que esta maioria

vão cumprir aquilo com que se comprometeram com os portugueses: vão pagar a sua dívida e mandar a troica

daqui para fora! Quem a trouxe foi o Partido Socialista, mas quem a vai mandar embora é esta maioria!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Conclui-se aqui a declaração política do PSD.

A próxima declaração política é do PS.

Tem a palavra o Sr. Deputado João Soares.

O Sr. João Soares (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A situação que estamos a viver é

extremamente dura e difícil, talvez a mais dura e difícil desde há 40 anos, para Portugal e para a Europa, para

a União Europeia a que pertencemos.

O ideal europeu e o projeto de construção de uma Europa de paz e unida nasceu da destruição

devastadora e do holocausto em que os regimes totalitários, principalmente a Alemanha nazi, deixaram a

Europa em 1945.

Há que não o esquecer. Nunca! Foi nesse fremente dramático que nasceram os ideais europeus de paz,

unidade e solidariedade crescente de que se fizeram os últimos decénios do século passado e o primeiro

deste século, na Europa.

Os progressos, as melhorias materiais e no plano dos direitos humanos fundamentais foram assinaláveis

ao longo desse período, e Portugal deu o seu contributo, há 40 anos, com o início do fim das ditaduras que

restavam na Europa Ocidental.

Vivemos, então, anos de crescente bem-estar na Europa. Hoje estamos muito longe dessa realidade.

Que Europa é esta, insensível aos milhões e milhões de desempregados, vítimas de políticas onde o

pseudocrescimento económico apenas é sentido por uma pequena minoria?

Que Europa é esta, mercantilista e masoquista, que permite aos bancos o financiamento a taxas de juro

irrisórias e obriga os seus Estados membros a pagarem juros elevados, juros esses que provocam mais

desemprego, põem em risco o Estado social e empobrecem a classe média e os trabalhadores?

Que Europa é esta que defende uma austeridade punitiva e cruel, que endeusa os mercados financeiros?

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Que Europa é esta que deixa morrer à sua porta, todos os dias, dezenas de emigrantes, recusando

friamente o auxílio de que tanto necessitam?

Que Europa é esta que negoceia com ditaduras em troca de petróleo e gás, ignorando violações

constantes e grosseiras dos mais básicos direitos fundamentais?

Que Europa é esta que vê crescer, impotente e indolente, o conflito na Ucrânia sem iniciativas concretas de

política externa?

Que Europa é esta onde a burocracia tomou conta do discurso e do espaço de decisão?

É uma Europa que se deixou arrastar para o marasmo, para o liberalismo económico sem limites e sem lei,

um liberalismo de casino, um liberalismo desumano e decadente que está a provocar o declínio da União

Europeia.

Aplausos do PS.

O PS defendeu sempre, bate-se e bater-se-á pelo regresso a uma Europa solidária, uma Europa mais

unida, sobretudo ao nível político, e onde a política tenha novamente a primazia sobre a finança especulativa.

Mas a burocracia de Bruxelas, tão bem representada pela Comissão Europeia e pelo seu Presidente,

permanece adormecida e insensível ao que se passa dentro e fora das fronteiras da União.

Há quem diga, agora, pretender consensos artificiais, feitos em provetas mais do que quebradas. Este não

é o tempo para esses jogos florentinos. É o tempo que antecede importantes eleições europeias em que vão

confrontar-se pelo menos duas visões opostas da Europa e do seu futuro.

É preciso ter consciência de que existe um perigo cada vez mais real de um ressurgimento em força da

extrema-direita radical, xenófoba e racista. Um pouco por toda a Europa surgem partidos radicais que

defendem o fim de uma Europa unida e solidária. E o que fazem a maioria dos governos nacionais e a

Comissão Europeia? Nada! «Assobiam para o ar», ignoram estes perigos e continuam a defender a

austeridade sobre a austeridade. Os radicais agradecem e alimentam-se do descontentamento da classe

média, cada vez mais sacrificada e empobrecida, cavalgam as crescentes ondas de pobreza e de miséria e

culpam o outro, o estrangeiro, o imigrante.

É contra essa decadência, é contra esta apagada e vil tristeza que devemos lutar. É contra este estado de

coisas que nós, socialistas do PS, temos lutado e vamos continuar a lutar de forma cada vez mais firme.

A economia portuguesa inicia o ano de 2014 com um ligeiro crescimento do produto, assente no

comportamento positivo das exportações e numa assinalável descida dos juros das obrigações soberanas.

O andamento destas duas variáveis está intimamente ligado à conjunção feliz de um enquadramento

menos recessivo das economias de destino das nossas exportações, a par de um esforço titânico dos nossos

empresários para encontrarem novos eixos de destino para os produtos fabricados em Portugal. Empresários

que do Estado viram poucos ou nenhuns incentivos estruturantes e que continuaram confrontados com uma

persistente burocracia, com dificuldades crescentes de acesso ao crédito bancário e com um governo que

persiste numa política de contração do investimento público.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. João Soares (PS): — A evolução em baixa das taxa de juro da dívida soberana é um facto comum a

todas as economias mediterrânicas da União Europeia, sem exceção, não sendo — e é preciso dizê-lo com

toda a clareza — um mérito do Governo português, apesar de toda a intoxicação propagandística do Governo,

de uma forma despudorada.

Aplausos do PS.

Este comportamento das taxas de juro decorre simplesmente do facto de o Banco Central Europeu, com o

seu atual Presidente Mario Draghi, ter enviado uma clara mensagem aos especuladores de que defenderia, a

qualquer custo, o euro e ter contrariado as manobras de ataque aos juros das dívidas soberanas dos países

membros mais frágeis, Portugal incluído.

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A este facto positivo também não foi estranha a avultada injeção de recursos que o BCE fez — aliás, como

a liderança do Partido Socialista vinha reclamando deste há muito — nos bancos mais frágeis, incluindo quase

todos os bancos portugueses, mas que, infelizmente, não serviu as necessidades de crédito dos agentes

produtivos da nossa economia.

Em todas as restantes variáveis macroeconómicas relevantes (e isso já foi sublinhado aqui nalgumas das

intervenções que me antecederam), nível de desemprego, défice público e montante da dívida pública,

consumo privado e investimento, o retrato que fica dos últimos três anos é de um falhanço quase absoluto,

sendo que esta situação decorre de uma política ultraliberal fundamentalista e — perdoem-me a expressão —

tonta, que procurou ir muito mais longe do que os objetivos expressos no Memorando da troica.

O FMI e a Comissão Europeia já fizeram o mea culpa, e registámo-lo. O anterior Ministro das Finanças,

hoje assumidamente só ao serviço do FMI, também. Mas o Governo português, autista, persiste em afogar o

País na política económica suicida que continua a ter a austeridade como única medida.

A nossa proposta em Portugal e na Europa, é de clara alternativa e de quebra do atual paradigma.

Queremos uma política de descida seletiva dos impostos que favoreça a poupanças das famílias e, no caso

das empresas, a atividade exportadora.

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. João Soares (PS): — Peço só mais um segundo, Sr.ª Presidente.

Como eu dizia, queremos uma política de descida seletiva dos impostos que favoreça as poupanças das

famílias e, no caso das empresas, a atividade exportadora, o investimento e, sobretudo, a criação de emprego.

Em resumo, tem de medir-se o êxito ou o falhanço da política económica pela sua capacidade efetiva de

reduzir desemprego e criar riqueza equilibradamente distribuída, e não pela acomodação medrosa às

vontades e quimeras dos ditos mercados financeiros.

Para nós, socialistas do PS, a política deste Governo falhou e é preciso outra, totalmente diferente. Um

novo rumo que terá já em maio um importante passo nas eleições europeias.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados António Filipe, do

PCP, e Mónica Ferro, do PSD.

O Sr. Deputado acaba de informar a Mesa de que responde em conjunto.

Entretanto, acaba de se inscrever o Sr. Deputado José Ribeiro e Castro, no limite do tempo, mas, com

certeza, admitiremos a sua inscrição.

Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado António Filipe.-

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Soares, estava a ouvi-lo a interrogar

sobre que Europa é esta — a Europa que, nas suas próprias palavras, nos condena a uma austeridade que

está a ter consequências sociais e económicas dramáticas e a conduzir a enormes tragédias sociais — e

estava a pensar: se eu ou algum camarada da minha bancada, há uns tempos, chegássemos àquela tribuna e

interrogássemos sobre que Europa é esta, o que é o Sr. Deputado não diria de nós. Diria: «Lá estão eles, os

antieuropeístas, os que não gostam da Europa, os que são contra a Europa». Podemos dizer que, em certa

medida, estamos vingados. Os senhores já reconhecem, ou seja, começam a reconhecer as consequências

que este processo de integração europeia tem tido para Portugal.

O Sr. Deputado pergunta muito bem quando diz «que Europa é esta?». Simplesmente, esta Europa é

aquela que os senhores, os partidos socialistas e os partidos do Partido Popular Europeu, aqui representado

pelo PSD e pelo CDS, construíram,…

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — … que endeusaram e vituperavam todos aqueles que tivessem uma

interrogação que fosse acerca dos caminhos que esta Europa estava a seguir.

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É bom que reconheçam agora, ainda que tardiamente, olhando para nós: «Os senhores, afinal, tinham

razão quando alertavam para as consequências a que este processo de construção europeia poderia

conduzir».

Efetivamente, os senhores não podem pôr-se de fora deste processo. Diria que seria bom que os partidos

socialistas, inclusivamente o Partido Socialista, em Portugal, fizessem o que dizem e não fizessem o que

fazem quando têm a possibilidade de fazer, quando estão no Governo.

Lembro-me, há uns tempos, das grandes esperanças que os senhores depositavam na vitória do François

Hollande, que diziam que ia mudar completamente a face da Europa e as políticas europeias. Não mudou

absolutamente nada, nem na Europa, nem em França, e, Sr. Deputado, em França, se mudou, foi para pior,

infelizmente!

Depois, tinham esperança na eleição alemã, no sentido em que, finalmente, a Sr.ª Merkel iria — permita-

se-me a expressão — ser posta na ordem e as coisas iam mudar de rumo. Não mudaram! Está o SPD no

governo com a Sr.ª Merkel. O que é que mudou na política da Alemanha em relação à Europa? Não mudou

rigorosamente nada, Sr. Deputado!

Portanto, quando o Sr. Deputado diz que há duas visões opostas sobre a Europa, há sim, Sr. Deputado,

mas a oposição não é entre os partidos socialistas e sociais-democratas e os partidos do Partido Popular

Europeu.

As duas visões que há sobre a Europa são daqueles que, como nós, entendem que devemos estar na

Europa para defender os interesses de Portugal, do povo português e dos países economicamente mais

frágeis da Europa, e daqueles que querem estar na Europa para fazer discursos muito piedosos a dizer que é

preciso mudar muitas coisas, que o caminho que a Europa tem vindo a seguir é um caminho mau, mas,

depois, na prática, absolvem as causas que conduziram a essa situação.

Termino com uma questão muito concreta, Sr. Deputado. O Partido Socialista aceitou o tratado orçamental

nesta Assembleia e sabe as consequências que daí decorrem. Pergunto se os Srs. Deputados não acham que

ao aceitarem este tratado orçamental, que condena à austeridade os povos da Europa, designadamente o

povo português, não estão, no fundo, a dar razão à conceção exposta pelo Sr. Presidente da República,

Aníbal Cavaco Silva, quando diz que estamos condenados a pelo menos mais 20 anos de austeridade.

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. António Filipe (PCP):— Termino de imediato, Sr.ª Presidente.

O Sr. Deputado não acha que, ao aceitar o tratado orçamental, como aceitou, o Partido Socialista está a

aceitar a condenação do povo português a uma brutal austeridade para as próximas duas décadas e meia?

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mónica Ferro, pelo PSD.

Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Mónica Ferro (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Soares, creio que acabámos de assistir

ao lançamento da campanha do PS para as eleições europeias. Um PS que acredita que a União Europeia é

uma comunidade de segurança, um PS que acredita que é uma zona de prosperidade, um PS que acredita

numa zona de bem-estar, ou um PS que é profundamente antieuropeu, um PS que recusa, que renega todo o

contributo que deram, desde Mário Soares a António Guterres e a José Sócrates, e todo o empenho que

tiveram na construção deste modelo europeu que nós temos em vigor, um PS que não é do PSE (Partido

Socialista Europeu), que não está ao lado do Hollande, que não está ao lado do governo de coligação da Sr.ª

Merkel. Portanto, que PS é este?

De facto, ouvindo a sua exposição, Sr. Deputado, ficamos com a impressão de que a primeira medida que

o PS vai propor no próprio Parlamento Europeu é a do desmantelamento de todo o processo de construção

europeia. Achámos que íamos ter em vós um aliado forte para a construção de uma união bancária credível,

que permitisse fazer face a alguns problemas que o euro tem encontrado, mas, afinal, não. Afinal,

encontramos, em simultâneo com a denúncia de um radicalismo, um apelo à radicalização.

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Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Mónica Ferro (PSD): — Afinal, encontramos em vós, em vez de uma voz de alternativa, uma voz

que apenas sabe apontar o dedo.

O Sr. Deputado falou mais de 10 minutos mas gastou muito pouco tempo da sua intervenção a fazer uma

meia dúzia de promessas demasiadamente vagas, na nossa opinião, para quem quer ser uma alternativa,

porque é disso que estamos a tratar.

Se, afinal, este é o manifesto eleitoral do PS às próximas eleições europeias, gostava de saber o que é que

vos distingue de outros partidos, gostava de saber o que é subscrito pelo vosso colega Francisco Assis, que é

o vosso cabeça de lista.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Mónica Ferro (PSD): — Também gostava de saber se isto interpreta fielmente o sentir desta

bancada do Partido Socialista. É que os portugueses que vão votar no dia 25 de maio precisam de saber que

PS é que vão eleger.

Portanto, Sr. Deputado, a minha pergunta final é só esta: o manifesto eleitoral do PS é «vamos sair da

Europa»? O manifesto eleitoral do PS é «não queremos Europa»? Esta pergunta é fundamental, Sr. Deputado.

Aplausos do PSD.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sair do euro!

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Ribeiro e Castro.

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. as

e Srs. Deputados, Sr. Deputado João

Soares, começo por cumprimentá-lo pela intervenção que aqui nos trouxe.

Diria que a bancada do CDS, porventura, convergiria com muitas das perguntas e muitas das

perplexidades face às dificuldades com que o projeto europeu hoje se confronta.

De facto, é possível perguntarmos «que Europa é esta». Porém, a questão não tem a ver tanto com as

perguntas que fazemos, mas com as respostas que cada um de nós dá. Temos algumas respostas, mas

gostávamos de conhecer quais são as respostas do Partido Socialista relativamente a estas perguntas.

O Sr. Deputado evocou riscos que existem hoje sobre a segurança europeia e, quanto à crise da Ucrânia, é

uma interpelação fortíssima.

Por isso, gostava de saber quais são as respostas do PS à questão da Crimeia, quais são as respostas do

PS às eleições de 25 de maio, não as europeias, mas as presidenciais na Ucrânia, que são decisivas para a

transição democrática neste país e para o respeito que todos os atores, a começar pela Rússia, têm de ter

pela transição democrática na Ucrânia. Gostava de saber qual é o vigor dos socialistas europeus e do PS

português nesta matéria.

Mas vamos às questões mais internas. O Sr. Deputado falou da austeridade punitiva e cruel e pergunto-lhe

se distingue esta retórica de uma exigência de rigor orçamental, ou seja, rigor e equilíbrio orçamental.

Sabemos que a moeda do euro foi construída com alguns erros, mas houve exigências que careciam de

ser cumpridas, nomeadamente os limites de 3% do PIB de défice público e de 60% do PIB na dívida pública. O

Sr. Deputado reconhece ou não que o desrespeito continuado destes limites contribuiu de uma forma decisiva

para a crise em que estamos? Concorda ou não que os tratados são para cumprir?

Por exemplo, o Sr. Deputado e a sua bancada endossaram, neste Parlamento, o tratado orçamental. O Sr.

Deputado e o PS querem ou não cumprir o tratado orçamental?

Pergunto isto porque, há dias, um jovem dirigente do Partido Socialista, João Torres, líder da JS, apareceu

a defender que o tratado orçamental impede uma política de esquerda.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — É verdade!

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O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — O PS quer rebentar com o tratado orçamental? É isso que lhe

queremos perguntar, ou seja, se é essa a segurança que dá aos portugueses e aos seus parceiros europeus.

Em matéria de política socialista europeia, pergunto: o que é que devemos tomar por bom? É Hollande

antes das eleições ou é Hollande de hoje? Qual é que devemos seguir? É Martin Schulz, livre, como

Presidente do Parlamento Europeu, ou é Martin Schulz da grande coligação da Alemanha e que segue

políticas comuns de equilíbrio orçamental e de rigor financeiro? O que é que devemos seguir?

Por último, as eleições são em maio e o Sr. Deputado terminou a sua intervenção com um novo milagre. Já

está revelado o terceiro segredo de Fátima e nós estamos à beira de descobrir o primeiro segredo de Assis. Já

não é a 13 de maio, mas é a 25 de maio.

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — O Sr. Deputado prometeu aqui uma descida seletiva dos

impostos, como ponto do seu programa. Também somos a favor de uma descida dos impostos, mas por rigor

financeiro e orçamental, por redução da despesa pública, pela reforma do Estado, por equilíbrio das finanças

públicas. Ora, queria perguntar-lhe como é que o PS consegue uma descida seletiva dos impostos sem rigor

orçamental e sem equilíbrio financeiro. Como é que consegue esse milagre? Era esta a pergunta que lhe

queria fazer.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Soares.

O Sr. João Soares (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, agradeço as questões que me foram dirigidas

pelas várias bancadas. Obviamente que, no limitado tempo que tenho, não terei condições para responder a

todas, mas vou tentar e vou responder pela ordem inversa das questões me foram colocadas. Começaria,

então, por responder ao Sr. Deputado Ribeiro e Castro.

Em matéria de Ucrânia, como, aliás, no que diz respeito à cooperação internacional com os países que

saíram da antiga União Soviética, o Partido Socialista tem tido uma posição que é clara desde sempre.

Eu e o Sr. Deputado Adão e Silva estaremos a chefiar uma equipa da Organização para a Segurança e

Cooperação na Europa que vai fiscalizar as eleições presidenciais a que o Sr. Deputado Ribeiro e Castro se

referiu. Devo dizer-lhe que, há uns anos, também chefiei a missão internacional, constituída por mais de 150

parlamentares de 30 países, que observou as eleições que tiveram lugar na Ucrânia. Neste quadro, temos

procurado, com as limitações que são normais neste contexto internacional, para além de tudo mais, defender

também os interesses portugueses. E Portugal tem alguns interesses a defender, nomeadamente interesses

económicos, pois os portugueses começam a estar mais presentes na Ucrânia, e há ainda a vasta

comunidade ucraniana que está em Portugal.

Sr. Deputado Ribeiro e Castro, gostava de lhe dizer que estamos de acordo em relação ao tratado

orçamental. É um tratado e, em princípio, deve ser respeitado. Mas, como todos os tratados, se as

circunstâncias se modificarem, pode, eventualmente, ser considerada a hipótese de derrogar este ou aquele

aspeto.

De qualquer forma, o entendimento da generalidade dos comentadores da área económica é o de que o

tratado orçamental não impõe nenhuma espécie de limitações ao desenvolvimento da economia portuguesa,

bem pelo contrário. Queremos contas públicas equilibradas mas queremos que cresça a produção de riqueza

no nosso País — esse é que é o nosso objetivo central.

Ao contrário do que sempre temos defendido, e daquilo que fizemos quando tivemos responsabilidades de

poder, a coligação que está no poder, que o Sr. Deputado Ribeiro e Castro apoia, é que, pelo contrário, o que

tem feito é impedir a criação da riqueza, fomentar o desemprego e agravar a dívida portuguesa. Devo dizer-

lhe, aliás — é reconhecido por toda a gente —, que o Governo que mais equilibrou as contas públicas em

termos de défice e mesmo em termos de dívida foi o último Governo do Partido Socialista, até ao inicio da

crise internacional de 2009,…

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O Sr. Miguel Santos (PSD): — Ah!

O Sr. João Soares (PS): — … que, aliás, a bancada do PSD começou por negar.

É bom termos memória, mesmo de factos relativamente recentes. Quando o último Governo do Partido

Socialista estava no poder, os senhores diziam que não havia crise internacional e era a incapacidade do

Governo do Partido Socialista para gerir os interesses do País, mas agora passam a vida a chamar a atenção

para a crise internacional. Não temos e nunca tivemos essa postura maniqueísta. Continuamos a acreditar

numa Europa de progresso e de solidariedade, não obstante as imensas dificuldades.

Ao contrário do que acontece com praticamente todas as outras bancadas, e isto também se dirige ao

nosso colega e meu amigo António Filipe, fomos fundadores, tivemos um papel importante na Constituição

Portuguesa de 1976, bem como tivemos um papel absolutamente decisivo na adesão à Europa, uma Europa

que se caracterizava por ser uma Europa de desenvolvimento sustentado e de solidariedade.

O Sr. Deputado António Filipe, que é um homem que conhece a história e que tem, aliás, obras

interessantes, recém-publicadas, sobre matérias históricas sabe muito bem que as coisas se modificam.

Obviamente que a Alemanha de Willy Brandt não é a Alemanha da Sr.ª Merkel. Não lhe vou dizer que, por ter

sido educada na Alemanha de Leste, provavelmente, seja pior que Willy Brandt, até porque Willy Brandt teve

uma política de abertura a Leste particularmente interessante e deu um contributo reconhecido por todos para

aquilo que foram os grandes anos em que vivemos, mas a História modifica-se.

Como disse há pouco, em resposta ao Sr. Deputado Ribeiro e Castro, devo dizer que conheço bem os

novos países que saíram da antiga União Soviética, como alguns dos nossos colegas que aqui estão, e, nessa

matéria, as coisas modificaram-se, e modificaram-se muito, muito, muito!

Quando falamos de economia de casino…

O Sr. Alberto Martins (PS): — Não se esqueça de responder à Sr.ª Deputada Mónica Ferro.

O Sr. João Soares (PS): — O meu líder de bancada está a chamar-me à atenção, como deve, para a

necessidade de responder à Sr.ª Deputada Mónica Ferro. Vou responder à Sr.ª Deputada Mónica Ferro com a

maior das simpatias e o maior dos gostos.

Risos.

Acreditamos profundamente nessa ideia de Europa e estamos profundamente apostados.

Mais: escolhemos um dos melhores dirigentes do Partido Socialista para chefiar a nossa candidatura ao

Parlamento europeu. Saúdo com a mais fraterna e sincera das admirações o meu querido amigo e camarada

Francisco Assis, que é o grande líder da lista que o Partido Socialista apresenta para estas eleições e que vai

obter para Portugal — não é para o PS, é para o interesse de Portugal — uma vitória que será o primeiro sinal

da mudança e do novo rumo que se impõe em Portugal, na defesa dos ideais europeus.

Aplausos do PS.

Esse é que é o nosso programa. Foi sempre o nosso programa, com todos aqueles de que falou e ainda

mais alguns de que se esquecem sempre pelo caminho e que foram também muito importantes na construção

do progresso no quadro europeu.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, tem sido uma tarde em que todos têm excedido o tempo

desmesuradamente. Aliás, todos não. A Sr.ª Deputada Mónica Ferro está a dizer que não e tem razão. A Sr.ª

Deputada respeitou o tempo, mas foi a única.

Queria pedir aos Srs. Deputados para não compararmos as próximas intervenções com as anteriores,

senão arrastar-se-á uma equidade insuportável em termos de tempo.

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Pedia, pois, que tivessem em conta do tempo de que dispõem, uma vez que a Mesa nem sempre o pode

fazer, porque também trata de outras coisas, e que, em autorregulação, tomassem conta dos limites do tempo.

Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Lobo d'Ávila.

O Sr. Filipe Lobo d'Ávila (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Nos passados dias 6 e 7

de março realizou-se, em Dublin, o Congresso do Partido Popular Europeu, um Congresso que reuniu mais de

800 congressistas, mais de 70 partidos do centro-direita de 39 países, entre os quais o CDS e o PSD.

Foi um momento de grande pluralismo ideológico da maior família política da Europa e que extravasou

mesmo as fronteiras da União Europeia, fazendo pontes com Estados associados e Estados vizinhos.

Foi um Congresso marcado por um debate aberto sobre o manifesto eleitoral para 25 de maio, palco de

uma disputa democrática com diferentes candidaturas para a presidência da Comissão Europeia. Falamos de

um manifesto legitimado que traçou as prioridades desta campanha e os grandes desafios da União Europeia

nos próximos anos: o combate ao desemprego, a solidariedade entre os Estados-membros, a consolidação do

modelo social europeu, a luta contra a imigração ilegal.

Foi um Congresso com a particularidade de apontar, à partida, três candidatos com origens geográficas e

políticas diferentes: Michel Barnier, de um grande Estado fundador, a França; Jean Claude Juncker, de um

pequeno Estado fundador, o Luxemburgo; e Valdis Dombrovskis, de um pequeno Estado do grande

alargamento a leste, a Letónia. Isto a provar bem a abertura e descentralização dos perfis políticos no PPE.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O CDS desde o primeiro dia manifestou um sinal inequívoco de

simpatia e empatia com a candidatura de Jean Claude Juncker, confirmado pelo Congresso como o candidato

do Partido Popular Europeu a Presidente da Comissão Europeia.

Uma vitória que prova duas coisas: que no Partido Popular Europeu não há indicações a dedo, não há

candidatos definidos à partida, os votos contam-se nas urnas, e que as opções de escolha são transparentes,

sendo que os congressistas privilegiaram um candidato com um perfil de experiência institucional, negociador,

promotor de compromissos, conhecedor profundo dos alicerces da moeda única e dos pilares precisos para se

chegar a uma união económica sustentável e para preservar, reformando, o modelo social europeu, de que os

europeus se devem poder orgulhar.

O CDS apoiou o Sr. Jean Claude Juncker por razões muito simples de explicar: primeiro, o Sr. Juncker é

um político, não é um tecnocrata, e as questões com que a Europa se debate têm que merecer um olhar

político, uma avaliação política e não são apenas um encargo tecnocrata.

Segundo, o Sr. Juncker é um democrata-cristão de razão e coração e a Europa precisa da sensibilidade

social e cristã quando se debate com um problema muito sério de competitividade e desemprego.

Terceiro, o Sr. Juncker é um político naturalmente aceite, apoiado no Sul, no Centro e no Norte da Europa

e isso é essencial para remover os preconceitos morais perigosos que as crises das dívidas soberanas

geraram no nosso continente.

Quarto — ou talvez mesmo em primeiro lugar —, o Sr. Juncker é amigo de Portugal, é amigo dos

portugueses e conhece muito bem os portugueses, porque 20% da população do Luxemburgo é portuguesa.

Se ele for, como nós desejamos e procuraremos que seja, Presidente da Comissão Europeia, será sempre um

homem sensível a Portugal e aos portugueses.

Quinto, o Sr. Juncker foi primeiro-ministro durante 18 anos, todos em coligação, ora com os socialistas ora

com os liberais. Uma prova, Sr.as

e Srs. Deputados, que a estabilidade exigida às reformas estruturais foi

sempre um bem acautelado pela sua liderança e que as pontes com outros partidos — importa recordar nesta

sede — podem e devem ser executadas em nome do interesse nacional.

Negociador nato, capaz de fazer compromissos entre interesses divergentes, experiente na política

europeia como nenhum outro, dará à Comissão esse preciso papel, mais do que nunca necessário: o de uma

instituição garante do diálogo entre pequenos, médios e grandes Estados; o de uma instituição depositária do

método comunitário como mecanismo fundacional da unidade europeia; o de uma instituição motora do

combate às prioridades desta União Europeia, focada no crescimento e emprego, na solidariedade dos

Estados-membros e na concretização, tão rápida quanto possível, da união bancária.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Não é justo que uma empresa portuguesa que apresente melhor

performance que uma empresa alemã, quando quer aceder ao crédito, beneficie de uma taxa de juro mais

desvantajosa em razão do seu território ou da sua nacionalidade.

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Nesse âmbito, do rumo económico e financeiro europeu, Jean Claude Juncker tem sido um dos grandes

defensores da união bancária, por perceber como ela é crucial para contornar esta crise e conjugar três

importantes peças: a força e credibilidade do sistema bancário; a garantia de regras comuns no acesso das

empresas ao crédito; a capitalização da economia para gerar empregos.

Só acabando com sistemas bancários de primeira e de segunda podemos caminhar para soluções

comunitárias mais rápidas e efetivas no combate à crise e entrar definitivamente no caminho do crescimento

económico, num caminho de futuro que é, e não pode deixar de ser, um caminho de esperança, numa Europa

onde não há virtuosos nem pecadores, numa Europa onde não há os bons do Norte e os maus do Sul, numa

Europa que se quer com experiência, com solidariedade, com futuro, uma Europa que seja motor de

esperança para os europeus e para os portugueses.

Aplausos do CDS-PP.

Entretanto assumiu a presidência o Vice-Presidente Guilherme Silva.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila, inscreveram-se quatro Srs.

Deputados para pedir esclarecimentos. O Sr. Deputado, entretanto, informará a Mesa como pretende

responder.

Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Costa Neves.

O Sr. Carlos Costa Neves (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila, mais do que

cumprimentá-lo pela sua intervenção, peço-lhe autorização para me associar à sua declaração política pela

oportunidade e pelo conteúdo.

A oportunidade da sua intervenção não se deve só ao facto de nos aproximarmos das eleições europeias,

deve-se também a ser este o momento para defender os princípios, os valores e o ideal da construção

europeia.

Voltar à essência do projeto da União Europeia, algo que depois de 1989 e da queda do Muro de Berlim

parecia obsoleto, parecia fazer parte do armazém de velharias, eis que, agora, se torna tão importante quando

somos confrontados com situações como a que estamos a viver na Ucrânia.

A sua declaração tem também oportunidade porque o Partido Socialista, que habitualmente esteve na área

do projeto da construção europeia, está hoje sem norte.

Quanto ao que, há pouco, disse o Sr. Deputado João Soares, não assinalei apenas aquilo que ouvi;

assinalei sobretudo o que não ouvi, ou seja, assinalei o descrédito em relação ao projeto, em relação aos

ideais, em relação aos valores e até em relação às eleições, pelo facto de nunca ter pronunciado o nome do

candidato do Partido Socialista europeu à presidência da Comissão nas próximas eleições europeias.

Aplausos de Deputados do PSD.

Curioso que Martin Schulz tenha estado fora do discurso do Sr. Deputado João Soares. Curioso! Curioso

mas sintomático. Sintomático desta situação, sintomático deste incómodo, sintomático de que, neste

momento, está completamente desalinhado, quer dos seus camaradas do partido socialista europeu, quer dos

outros países europeus, mesmo dos que têm governos socialistas, quer das propostas desse mesmo grupo

socialista.

Em terceiro lugar, foi uma intervenção oportuna, porque temos um grande desafio de consolidação em

relação à União Económica e Monetária e em relação ao euro.

Por isso, associo-me à intervenção do Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila, terminando com uma questão, que

é a seguinte: passadas as eleições e estando nós a apoiar também quer o candidato a Presidente da

Comissão Jean-Claude Juncker quer o manifesto eleitoral, apresentado no último Congresso do PPE em que

tive o gosto de participar, entende o Sr. Deputado que a força agregadora que é necessária nesta próxima

fase do projeto é simbolizada por Jean-Claude Juncker e pelo seu projeto?

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — O Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila informou a Mesa que pretende

responder a conjunto de dois pedidos de esclarecimento e, sendo assim, dou desde já a palavra à Sr.ª

Deputada Paula Baptista.

A Sr.ª Paula Baptista (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila, o senhor veio aqui trazer-

nos o Congresso do Partido Popular Europeu, mas aquilo que os portugueses gostavam de saber,

independentemente de quem são os candidatos para o Parlamento Europeu, são medidas e propostas

concretas…

O Sr. António Filipe (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Paula Baptista (PCP): — … para uma Europa que se defronta com grandes problemas sociais, pelo

que impõe-se que seja feito aqui o esclarecimento dessas medidas e dessas propostas concretas numa

Europa com tantos problemas.

As perguntas que os portugueses poderiam levantar e que penso ser justo colocarem-se aqui são as

seguintes: como é que se desenvolve o País nesta Europa com um QREN com menos dinheiro? Como é que

se desenvolve Portugal nesta Europa com condicionantes macroeconómicas e com uma PAC (política agrícola

comum) que não salvaguarda os interesses da produção nacional nem da sua soberania? Como é que se

desenvolve este País nesta Europa com o resgate da troica, com medidas que acentuaram o desemprego, a

flexibilidade laboral, os baixos salários e os sucessivos cortes nas pensões, reformas e salários? Como é que

se desenvolve este País com o resgate da troica e com as medidas concretas de cortes na saúde e na

educação?

O Sr. António Filipe (PCP): — Bem perguntado!

A Sr.ª Paula Baptista (PCP): — Estas políticas levadas a cabo pela Europa e levadas a cabo por este

Governo do PSD/CDS-PP são uma opção ideológica de submissão do poder político ao poder económico.

Sr. Deputado, deixo-lhe aqui uma pergunta muito concreta: como é que pretende convencer o povo

português que tudo vai melhorar quando se mantêm fiéis às mesmas políticas que nos conduziram à situação

política e económica de pobreza, de exclusão social, de desemprego e emigração do povo português?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila.

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, queria agradecer as perguntas

que foram colocadas.

Começando pelo Sr. Deputado Carlos Costa Neves, agradeço a sua intervenção e as considerações que

teceu. De facto, não precisamos de identificar os nomes dos que são os nossos cabeças de lista para provar a

união da Aliança Portugal, aliança que PSD e CDS apresentarão nas próximas eleições ao Parlamento

Europeu, ao contrário de outros que, pelos vistos, têm de identificar os seus cabeças de lista.

Sr. Deputado, do ponto de vista do CDS, não temos quaisquer dúvidas quanto ao projeto europeu e

sabemos bem onde estamos. Entre aqueles que querem mais Europa, aqueles que querem a desintegração

da União Europeia, aqueles que querem o fim do euro, aqueles que querem o fim da Europa que temos hoje,

nós sabemos bem onde estamos: estamos entre aqueles — e estamos juntos nesse caminho e nesse projeto

— que querem uma Europa solidária, uma Europa que consiga ter uma maior participação de todos os

europeus e, sobretudo, queremos ter uma Europa de compromissos, de diálogo, sem virtuosos nem

pecadores, como tive oportunidade de dizer.

Por isso, Sr. Deputado, concordo inteiramente com o que aqui veio dizer e acrescento algo a propósito

daquele que será, aparentemente, o candidato do PS europeu a Presidente da Comissão Europeia.

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De facto, não deixa de ser extraordinário que os socialistas portugueses digam que a Alemanha precisa de

mudar a perspetiva que tem sobre Portugal, sobre o Governo de Portugal e sobre os portugueses e, depois,

queiram apoiar para Presidente da Comissão Europeia aquele que na própria Alemanha tem feito o caminho

que tem feito, com a Chanceler Merkel. Não deixa, pois, de ser extraordinário que essa seja também a posição

dos socialistas portugueses e a posição dos socialistas europeus.

A Sr.ª Deputada Paula Baptista falou de opções ideológicas. Sr.ª Deputada, quanto a opções ideológicas,

estamos absolutamente conversados, porque sabemos bem qual é a posição do PCP sobre a União Europeia,

sobre o euro e temos também perfeita consciência — e era bom que os senhores também tivessem —

daquelas que seriam as consequências da saída de Portugal da União Europeia e da desintegração do euro.

A Sr.ª Paula Baptista (PCP): — Fale lá das medidas concretas!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Perguntou a Sr.ª Deputada, como é que se desenvolve um País

que foi deixado à beira da bancarrota. Sr.ª Deputada, com muito esforço, como tem sido feito. Com

credibilidade, recuperando a credibilidade de Portugal e, sobretudo, não cometendo os erros do passado.

É assim que se desenvolve o País e é assim que se desenvolve Portugal para o futuro, para as próximas

gerações.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana

Mortágua.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila, tivemos aqui uma

declaração do CDS de apoio a um candidato com uns argumentos um pouco estranhos. Falou da língua, disse

que vem do Luxemburgo, onde há muitos portugueses. Bom, devo dizer-lhe que Durão Barroso também fala

português e veja só onde é que isto nos trouxe!… Portanto, não nos parece que a língua ou a proveniência do

candidato seja necessariamente um grande argumento.

O que é importante, sim, é a escolha política, saber qual é a posição política do candidato que apoiamos.

Aquilo que o Sr. Deputado veio apresentar é a substituição de um yes man da Alemanha da Sr.ª Merkel por

outro yes man da Alemanha da Sr.ª Merkel. A mesma política!

Portanto, Sr. Deputado, sabendo que não é a língua nem a origem que determinam as políticas e o que é

necessário é uma alternativa política, digo-lhe que a nossa alternativa fala grego, vem de um país que sofreu e

conhece bem a situação dos portugueses, sabe o que é ser de um país periférico que sofreu com o modelo de

construção europeia, sabe o que é ver um povo desesperado pela austeridade imposta por uma Europa que

há muito tempo que pôs a solidariedade e a democracia no bolso, chama-se Alexis Tsipras e é um candidato

que, de facto, significa e protagoniza uma alternativa política.

E, Sr. Deputado, fico até perplexa, porque tive muitos debates com outros Deputados, também do CDS, e

lembro-me de os ouvir dizer: «Bom, nós até queríamos aliviar a austeridade mas a Europa não deixa. Nós até

gostávamos que isto não fosse assim, mas há regras da Europa que impõem que assim seja. Nós não

queríamos bem assim, mas os senhores da Europa são maus, o Banco Central não nos ajuda…».

Muitas e muitas vezes ouvi Deputados do CDS acusarem a Europa de ter as políticas erradas e, portanto,

fico perplexa quando vejo aqui uma declaração de apoio a um candidato que mais não faz do que repetir as

mesmas políticas num novo ciclo, isto é, são exatamente os mesmos problemas, as mesmas políticas, só que

mais fortes, mais graves.

Para terminar, gostaria ainda de dizer que há hoje um consenso fora dos dogmas radicais deste Governo e

desta elite que domina a Europa. Há, de facto, um consenso generalizado que ultrapassa muito as fronteiras

da Europa. A Comissão Europeia não soube lidar com a crise, impôs austeridade quando o que era necessário

era aliviar a austeridade e criar emprego, a Europa é hoje menos democrática, crescem conflitos por toda a

Europa que maltratou os seus cidadãos.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr.ª Deputada, queira terminar.

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A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Ora, aquilo que o Sr. Deputado aqui nos traz não é uma alternativa a

isso, é exatamente confirmar esta política, confirmar esta Europa que é, sim, a pior Europa possível.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana

Catarina Mendonça.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Filipe Lobo d’ Ávila, queria saudar a

sua intervenção porque ela tem em tudo uma caricatura. O Sr. Deputado consegue subir à tribuna para falar

da Europa, falar de eleições europeias, falar do projeto europeu, falar até do seu candidato e do candidato da

sua família política à Comissão Europeia sem nunca referir o nome do seu cabeça de lista ao Parlamento

Europeu.

Vozes do PS: — Ah, pois é!

Vozes do PSD: — Então não referiu?

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — É, aliás, sintomático que o tenha ignorado, porque aquilo que os

senhores, com esta proximidade das eleições europeias, estão a tentar é que o povo esqueça que, nos últimos

10 anos, a Europa e a Comissão Europeia foram lideradas pela família política do PPE (Partido Popular

Europeu), que é verdade que nos últimos anos a Europa perdeu toda a sua capacidade de responder a esta

crise, que é verdade que as pessoas estão hoje pior na Europa, e em particular em Portugal, do que estavam

há dois anos atrás. Sr. Deputado, do Congresso do PPE, que respostas é que saíram para combater a crise?

Que resposta pode surgir para a Europa do futuro?

Perante esta crise, aquilo que tem acontecido ao longo dos últimos anos são respostas paliativas que não

conseguiram consolidar uma Europa enquanto projeto de solidariedade e enquanto projeto de coesão social.

Sr. Deputado, para o PS, o projeto da Europa não é aquele que existe hoje em dia, é um projeto de

solidariedade e de coesão social que o PPE conseguiu «matar» ao longo dos últimos tempos. Ora, a resposta

que o PPE nos traz é mais do mesmo, ou seja, é mais austeridade, são mais cortes, é mais empobrecimento

deste projeto europeu.

Por isso, quando estamos a falar de projeto de solidariedade na Europa não confunda essa solidariedade

com aquilo que está hoje espelhado na Europa, que é uma Europa dividida entre o Norte e o Sul, é uma

Europa dividida entre os mais ricos e os mais pobres, entre aqueles que foram pecadores e os que são

melhores. Isso não serve um projeto europeu e muito menos serve para dar resposta às graves

consequências da crise que hoje vivemos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Lobo d’ Ávila.

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Sr. Presidente, começo por agradecer os pedidos de

esclarecimento das Sr.as

Deputadas Mariana Mortágua e Ana Catarina Mendonça.

Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça, a senhora falou em caricatura e eu, de facto, até percebo a sua

intervenção. Na verdade, a Sr.ª Deputada critica-me por não falar no cabeça de lista Paulo Rangel, mas não

há qualquer questão quanto a isso.

Vozes do PS: — Mas não falou!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Sobre a Aliança Portugal já respondi ao Deputado que me

questionou anteriormente.

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Porém, não deixa de ser curioso que a Sr.ª Deputada, ao fazer esta crítica, tenha dificuldades, também, em

referir-se àquele que aparentemente é o candidato à Comissão Europeia pelo Partido Socialista Europeu.

Chama-se Martin Schulz e, aparentemente, é alguém que é responsável por aquilo que é a governação alemã,

pois é um dos responsáveis de um partido parceiro de coligação da chanceler Merkel. Seguramente que a Sr.ª

Deputada sabe do que estamos a falar…

Protestos do PS.

Sr. Presidente, se eu puder concluir… Há ali uma certa agitação compreensível…

Sr.ª Deputada, não deixa de ser curiosa a ausência de qualquer referência ao vosso candidato e, por isso,

a única coisa que lhe posso dizer é que se alguém considera que Martin Schulz fará aquilo que os socialistas

portugueses querem contra os socialistas alemães ou mesmo contra aquilo que é a política estabelecida com

o apoio do governo alemão, está muito enganado. Assim, quero dizer-lhe que talvez a principal caricatura seja

essa, e fica aqui bem evidente.

Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, julgo que as nossas opções são absolutamente claras e legítimas. A

alternativa grega é a sua, é uma alternativa como outra qualquer; em democracia é assim mesmo e é bom que

assim seja.

A única coisa que lhe posso dizer, Sr.ª Deputada, é que, do nosso ponto de vista, o candidato do PPE à

presidência da Comissão Europeia tem experiência, é um candidato que é conhecido pelo diálogo, é um

candidato que conhece Portugal, que lida e lidou com os portugueses durante muitos anos, e isso, para nós, é

tudo menos irrelevante.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo

Sá.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Há três anos, no dia 5 de abril de 2011, o

PCP propôs a renegociação da dívida pública.

Vozes do PS: — Ah!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — «Caiu o Carmo e a Trindade»! De diversos quadrantes — do PS, do PSD e do

CDS — levantou-se um coro de protestos. A proposta de PCP era irresponsável e irrealista — diziam — e

conduziria ao afundamento da economia e ao empobrecimento dos portugueses. O que era preciso, diziam

essas vozes, era assinar o Memorando da troica, um programa que o PCP identificou, desde o primeiro

momento, como um programa de agressão contra o povo português e de submissão aos interesses do grande

capital nacional e estrangeiro.

Passados três anos, aparecem personalidades de diversos quadrantes políticos, da direita è esquerda —

algumas delas com responsabilidades por três anos de pacto de agressão —, a defender que a dívida pública

é insustentável, que não pode ser paga e que o único caminho é renegociação de uma parte dessa dívida,

tratando apenas da dívida detida pelo BCE e pela troica.

Caso contrário, de acordo com estas personalidades, o cenário para o futuro apresenta-se negro:

definhamento da economia, degradação dos serviços públicos, maior precariedade laboral, mais emigração,

principalmente de jovens, dificuldades acrescidas para as micro e pequenas empresas.

Todos estes alertas, sobre as consequências da não renegociação da dívida, foram lançados pelo PCP há

três anos. Foi preciso que a vida dos portugueses tivesse sido arruinada pela aplicação do pacto de agressão,

foi preciso que a economia atravessasse o mais longo período de recessão da história da nossa democracia,

foi preciso que a dívida tivesse disparado para quase 130% do PIB para que certos setores da nossa

sociedade se convencessem, talvez a contragosto, da justeza das propostas do PCP.

Perante uma tomada de consciência, cada vez mais geral, de que o único caminho que serve os interesses

nacionais é o da renegociação da dívida, vem o Governo, pela voz do Primeiro-Ministro, reafirmar a sua opção

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de continuar a garantir que aqueles que especularam com a dívida pública portuguesa receberão, até ao

último cêntimo, o produto da sua agiotagem.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Os leilões de recompra de dívida pública e as emissões de obrigações do

tesouro, apresentadas pelo Governo como um grande sucesso da sua política, não resolvem o problema da

dívida pública como o Governo pretende fazer crer. Apenas aumentam os encargos com o serviço da dívida,

ao mesmo tempo que garantem a continuação da satisfação dos interesses dos credores.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Se há três anos a proposta do PCP de renegociação da dívida tivesse sido

acolhida, Portugal não tinha chegado ao ponto a que chegou.

Para não beliscar os interesses dos credores, para lhes garantir mais de 7000 milhões de euros por ano em

juros, o Governo cortou salários e pensões, reduziu ou mesmo eliminou prestações sociais, atacou as funções

do Estado, em particular as funções sociais, impôs um inqualificável saque fiscal aos rendimentos do trabalho,

lançou centenas de milhares de portugueses no desemprego e empurrou outros tantos para a emigração,

levou inúmeras micro e pequenas empresas à falência. Enfim, esmagou o País e o povo com a sua política de

empobrecimento.

Ao mesmo tempo as maiores fortunas do País cresceram, foram concedidos benefícios fiscais às grandes

empresas no valor de milhares de milhões de euros e até prescreveram as contraordenações aplicadas a um

certo banqueiro, evitando-lhe o pagamento de um milhão de euros em coimas.

É conhecida a intenção do Governo e dos partidos que o suportam de prolongar a política de

empobrecimento para além do fim do programa da troica, tendo contado nesse desiderato com a preciosa

colaboração do PS, que com eles aprovou um conjunto de instrumentos, como o tratado orçamental, que

visam condicionar e limitar a capacidade dos portugueses optarem e decidirem sobre o seu futuro coletivo,

condenando-os ao retrocesso social e económico.

Usando como pretexto a redução da dívida até ao patamar imposto pela União Europeia, o horizonte

temporal desta política até já foi definido, com a prestimosa colaboração do Presidente da República. 2035 é a

data que Cavaco Silva e todos os defensores da política de empobrecimento gostariam que os portugueses

inscrevessem no seu calendário.

Mas a política da troica — com ou sem a troica —, subordinada ao pagamento de uma dívida impagável,

não é uma inevitabilidade. Há uma alternativa! A renegociação da dívida, libertando Portugal das amarras da

especulação.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Muito bem!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Reafirmamos a necessidade de renegociar a dívida pública, nos seus prazos,

juros e montantes, assumindo um serviço da dívida, indexado às exportações, compatível com o crescimento

económico e com a criação de emprego. Uma renegociação da dívida que diminua a dependência externa,

afetando recursos à recuperação do aparelho produtivo para substituir as importações por produção nacional e

reforçar a capacidade exportadora do País; uma renegociação da dívida que permita melhorar os salários,

pensões e reformas e, em geral, elevar o nível de vida dos trabalhadores e do povo português e uma

renegociação da dívida determinada pelos interesses nacionais e não pelos interesses dos credores, que,

contrariamente ao que aconteceu na Grécia, não traga atrás de si novos sacrifícios para o povo e novas

investidas no saque dos recursos nacionais.

O caminho da renegociação da dívida proposto pelo PCP não está isento de dificuldades e

constrangimentos, mas é aquele que melhor defende o interesse nacional, libertando o País e o povo

português dos programas de austeridade feitos à medida dos interesses da especulação financeira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

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O Sr. Paulo Sá (PCP): — Longe de constituir uma medida isolada, a renegociação da dívida pública

proposta pelo PCP é a opção por um caminho que tem na valorização do trabalho e na promoção do emprego,

na defesa da produção nacional, na diminuição da dependência externa, no equilíbrio sustentado das contas

públicas, na ação convergente com outros países, na diversificação das fontes de financiamento, uma opção

de rutura e mudança, uma opção que exige a urgente demissão do Governo e fim das suas políticas de

desastre nacional.

Aplausos do PCP

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana

Mortágua.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Sá, penso que, cada vez mais,

somos confrontados com a necessidade, e sobretudo com a responsabilidade, de reestruturar esta dívida.

Se ela tivesse sido reestruturada mais cedo, a verdade é que não teríamos chegado aqui e não teríamos

este nível de destruição do País, da economia e das condições de vida.

A pergunta que devemos fazer é no sentido de saber por que é que ela não foi reestruturada mais cedo. E

há duas razões essenciais para isso, a primeira das quais é a de que, se ela tivesse sido reestruturada mais

cedo, pouparia décadas de rendas que saem diretamente daquilo que é tirado aos trabalhadores e aos

pensionistas para os bancos e os mercados financeiros, e pouparia de facto, porque os mercados financeiros

deixariam de receber todo esse dinheiro, que é uma transferência direta dos salários para as suas contas.

Mas, por outro lado, e sobretudo, a verdade é que se a dívida pública tivesse sido reestruturada mais cedo,

o Governo e a direita perderiam uma importante arma de chantagem, aquilo que tudo permite, a «arma» que

permite e justifica todos os abusos. Esta é a verdadeira ou uma importante razão pela qual a dívida não foi

reestruturada mais cedo, nem vai ser reestruturada.

Pela nossa parte, sabemos que a dívida não deve ser paga, em larga medida porque há uma parte dela

que é ilegítima, resulta de contratos que foram assinados ilegitimamente, como o das PPP, o dos submarinos,

o do dinheiro do BPN, e há outra parte que não é pagável, com os pressupostos que estão inscritos no tratado

orçamental assinado pelos partidos da maioria e pelo PS, como o Governo se propõe pagar. É que esses

pressupostos não são realistas! Nenhum país conseguiu os anos sucessivos de crescimento económico ou de

excedentes primários que estão assumidos, quando se diz que a dívida é pagável. E o Governo sabe-o! Sabe

bem que não consegue pagar a dívida e, por isso, tem duas estratégias: ignora o futuro, vai empurrando com a

barriga, não quer falar sobre o assunto, nunca admite quais são os pressupostos que estão na base do

compromisso que assumiu e, por outro lado, no curto prazo, faz tudo para empurrar o problema para a frente.

Aliás, chegou até ao ponto de ir pedir dinheiro emprestado, a 5,5%, aos mercados, para recomprar dívida que

custava 3%. Isto é um ambiente de desespero! Estão com medo do que aí vem, sabem que não conseguem

pagar a dívida nem ir aos mercados nas mesmas condições.

Portanto, Sr. Deputado, termino, perguntando-lhe se concorda ou não que a reestruturação da dívida é

uma medida de responsabilidade, urgente, necessária e que se tornou numa questão de interesse nacional.

Existe um consenso nacional em torno desta questão, porque ela é, de facto, condição essencial para que o

País possa sair da crise e retomar um padrão de crescimento económico e também de criação de emprego.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, obviamente que entendemos

que a renegociação da dívida é o único caminho que serve os interesses do País e tem de ser feita. Aliás, há

três anos que defendemos este caminho, pois, em 5 de abril de 2011, propusemos a renegociação da dívida e

alertámos para os problemas que a não renegociação iria trazer. E, na realidade, esses problemas vieram

todos a verificar-se, ou seja, o País afundou-se, a economia afundou-se e os portugueses empobreceram.

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Contrariamente àquilo que os subscritores do pacto de agressão diziam, a assinatura desse pacto de

agressão não visava garantir o pagamento de salários e pensões, visava, pelo contrário, garantir que aquelas

pessoas que tinham especulado contra a dívida soberana portuguesa recebessem até ao último cêntimo o

produto da sua agiotagem.

A dívida, Sr.ª Deputada, é claramente insustentável. Aliás, o Governo, depois de 20 000 milhões de euros

de medidas de austeridade, que esmagaram os portugueses e a economia nacional, apresenta um saldo

primário perto dos 0% e estima que, em 2014, será de 0,3%. Estudos diversos mostram que, para que a dívida

fosse sustentável, para que pudesse ser paga nos próximos 20 anos, o saldo primário teria de ser superior, em

média, a 3,5%. Agora, imagine-se o que significa um saldo primário de 3,5%! Representa um empobrecimento

de Portugal inimaginável! Depois da austeridade que tivemos nos últimos anos, que esmagou e empobreceu o

País, alcançando o Governo um saldo primário perto dos 0%, imagine-se o que significaria, nos próximos 20

anos, impor saldos primários da ordem dos 3,5%, que é o valor apresentado nos estudos! É um futuro de

empobrecimento que aqueles que defendem a manutenção da atual situação e rejeitam a negociação da

dívida estão a propor aos portugueses. É um futuro, uma geração de empobrecimento inimaginável, para

garantir sempre que aqueles que especularam contra a dívida pública portuguesa possam receber até ao

último cêntimo o produto da sua agiotagem.

Por isso, há três anos, defendemos, e continuamos a defender, que o único caminho possível para o País,

o único caminho que serve os interesses nacionais é a renegociação da dívida.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, vamos passar ao segundo ponto da nossa ordem

de trabalhos, que consta da apreciação da petição n.º 253/XII (2.ª) — Apresentada pela ACAP (Associação

Automóvel de Portugal), solicitando à Assembleia da República intervenção legislativa com vista a repor o

sistema de incentivos ao abate de veículos em fim de vida.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sandra Cardoso.

A Sr.ª Sandra Cardoso (PS): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Antes de mais, cumprimento os

Srs. Peticionários.

Estamos hoje a tratar de uma petição cujo objetivo é solicitar a promoção de uma iniciativa legislativa com

vista a repor o sistema de incentivos ao abate de veículos em fim de vida.

Este regime de incentivos foi criado, em Portugal, pelo Decreto-Lei n.º 292-A/2000 e, na entrega para abate

de um veículo ligeiro em fim de vida, conferia uma redução no imposto sobre veículos, aquando da compra de

um veículo novo.

A sua vigência foi sucessivamente prorrogada até 31 de dezembro de 2010, bem como os montantes de

incentivo envolvidos. Nesse ano, o valor do incentivo era de 750 € por veículo para abate com mais de 10

anos e de 1000 € por veículo para abate com mais de 15 anos, estando os veículos integrados nesse regime

sujeitos ao cumprimento de um conjunto de requisitos.

Em 2011, o último ano de vigência, o regime foi aplicado apenas aos veículos elétricos.

Ao solicitar a reposição do sistema de incentivos, os peticionários apresentam um conjunto de elementos

empíricos e de argumentos, realçando que este tipo de incentivos, que vigora noutros países da União

Europeia, com pequenas diferenças em relação ao que foi adotado em Portugal, contribui para reduzir a

sinistralidade. Realçam ainda que possui um objetivo ambiental, traduzido na redução das emissões de CO2 e

do consumo de combustível e que contribui para a dinamização do mercado automóvel, minimizando os

efeitos da crise no setor, agravada em 2009.

Estimam que a reposição deste regime de incentivos permite um aumento de vendas na ordem dos 15 000

veículos, o que permitiria ao Estado, segundo os mesmos, beneficiar de uma receita fiscal líquida de 50

milhões e de um impacto positivo no emprego do setor, que só em 2012 terá perdido cerca de 21 000

trabalhadores.

O Partido Socialista reconhece os problemas que afetam o setor automóvel, traduzidos no encerramento

de empresas e na perda de milhares de postos de trabalho, que são claramente agravados pelas medidas de

austeridade impostas pela maioria. Nesse sentido, relembramos que, em 2013, foi aprovada a Resolução da

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Assembleia da República n.º 128/2013, de 7 de agosto, que recomenda ao Governo o estudo e a adoção de

medidas urgentes de apoio e sustentabilidade do setor automóvel nacional. No seu ponto 3, recomenda, mais

especificamente, que se estude a criação de um programa de incentivos ao abate dos carros em fim de vida e

a autossustentabilidade dessa medida por via das receitas fiscais geradas.

Sobre esta matéria, consideramos válidos os elementos empíricos e os argumentos aduzidos pelos

peticionários, aos quais o Partido Socialista é sensível, mas consideramos igualmente que neste momento

qualquer proposta/medida deverá ser pensada e avaliada no contexto da realidade atual, no contexto de crise

que o País atravessa, devendo essa avaliação incidir fundamentalmente sobre os reais impactos na economia

e nas finanças públicas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João

Paulo Viegas.

O Sr. João Paulo Viegas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Gostaria de começar por

saudar a Associação Automóvel de Portugal e os mais de 6300 peticionários por esta iniciativa.

O debate de hoje, que incide sobre uma petição atinente às dificuldades a que têm estado sujeitos os

empresários do setor automóvel, é um debate que não é novo para nós e sobre o qual temos estado muito

atentos. A nossa atenção tem-se debruçado sobre o assunto de várias formas, tendo nós sido motivados por

várias e diferentes dimensões do problema. Aliás, falar de melhoria da frota automóvel nacional é falar de mais

segurança rodoviária e de mais respeito pelo meio ambiente.

A capacidade de recuperação do setor é, assim, exatamente proporcional a uma melhoria dos resultados

no combate à sinistralidade rodoviária e no combate às emissões de CO2.

Os argumentos esgrimidos pelos peticionários vão exatamente ao encontro desta ideia. É por isso mesmo

que também nós somos sensíveis a esta problemática.

Como sabem, o nosso grupo parlamentar, em conjunto com o Grupo Parlamentar do PSD, apresentou a

esta Assembleia o projeto de resolução n.º 781/XII (2.ª), de 25 de junho de 2013. Este documento manifesta a

preocupação que temos sentido, indo muito além do que aqui solicitam os peticionários. Quem peticionou fez

essencialmente referência à recuperação da medida de incentivo ao abate, que tem, como já percebemos,

muitas vantagens para o setor e para o combate a outras dificuldades, já no que diz respeito ao nosso projeto

de resolução há identificação de mais medidas que podem ser positivas para o setor automóvel.

Há uma realidade que, contudo, não foi referida de forma direta no nosso documento e que passa pelo

combate à concorrência desleal. A concorrência em causa não se verifica apenas na prestação de uma

atividade legal ou ilegal, mas também no que respeita às regras a respeitar. Não podemos permitir que

existam regras desiguais entre todos os que praticam atos comerciais no setor. É por isso que se torna

necessário apostar na uniformização da legislação referente às exigências ambientais.

É importante que todos possamos contribuir para que o setor automóvel melhore. Seguir as

recomendações do nosso projeto de resolução, por forma a fazermos crescer a economia, é um passo

importante para uma área que representa uma grande fatia do PIB português.

Contudo, e ainda no que respeita ao contributo para a melhoria do setor, importa referir que foi criado, no

âmbito da Comissão de Economia, o Grupo de Trabalho Setor Automóvel, que pretende fazer uma análise

mais abrangente dos novos desafios.

Os automóveis em Portugal, no que à produção diz respeito, têm uma enorme responsabilidade nas

exportações. Por isso, falar em novos desafios é necessariamente promover também a produção industrial. E

não nos podemos esquecer de que, estando nós num domínio de exportações para a zona euro, o aumento

da produção pode acontecer na medida em que melhorar o próprio mercado europeu e também na medida em

que se melhorem as condições do mercado português.

Contamos, desta forma, e recuperando as ideias que temos para o setor, ajudar todos os peticionários e o

setor automóvel.

Aplausos do CDS-PP.

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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Ainda para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Mariana Mortágua.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, quero cumprimentar os

peticionários e dizer que reconhecemos que o setor automóvel foi muito afetado pela crise, pelas medidas de

austeridade, pelas medidas que comprimiram a procura interna e empobreceram os trabalhadores.

Reconhecemos também que este programa de incentivo ao abate teve impactos importantes, em termos

de sustentabilidade ambiental, pois tratou-se de um regime fiscal que permitiu não só reduzir as emissões de

dióxido de carbono, mas até, e também, o desenvolvimento de novas tecnologias que foram, entretanto,

incorporadas na própria indústria automóvel. Permitiu, ainda, reduzir a sinistralidade e contribuir para mais

segurança nas estradas e permitiu também que um setor importante da economia pudesse florescer e criar

mais empregos. Portanto, reconhecemos e valorizamos os progressos e a importância deste tipo de regimes

fiscais.

Sabemos que estes programas foram terminados, descontinuados, sem um estudo ou argumento mais

desenvolvido, puramente por questões orçamentais.

Pela nossa parte, rejeitamos uma política que coloca todas as outras matérias sob a ditadura das questões

orçamentais, sem ter em consideração os seus impactos no ambiente, no emprego e na economia.

Por isso, quero aqui dizer que o argumento orçamental não pode nem deve ser o único argumento a

valorizar numa democracia e numa economia e que acompanhamos todas as medidas que possam contribuir

para aumentar a sustentabilidade ambiental.

Há espaço para que essas medidas sejam implementadas, há espaço e necessidade de criar mais

medidas adequadas à economia, que passam pela promoção dos transportes públicos, mas também pela

existência de regimes fiscais que criem um incentivo a outro tipo de meios de transporte, como os meios de

transporte elétricos, mas também há espaço e também é necessário criar medidas para apoiar estes setores

industriais, estes setores produtivos, que têm sofrido com a crise económica e a compressão da procura

interna. E isto passa, necessariamente, por aumentar salários, por dar e devolver poder de compra às

populações.

Portanto, da parte do Bloco de Esquerda, reconhecemos, valorizamos e acompanhamos todas as medidas

que possam ir nesse sentido.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Começo por expressar uma palavra de

saudação às 6318 pessoas que subscreveram esta petição dirigida à Assembleia da República, bem como à

ACAP que, há cerca de um ano, promoveu esta iniciativa.

Na apreciação que agora fazemos em Plenário desta petição, temos a obrigação de não nos ficarmos por

uma abordagem teórica, abstrata, genérica sobre a bondade ou o interesse de o País, um dia talvez, quem

sabe, ver ser reposto o sistema de incentivo ao abate de veículos em fim de vida.

É caso para dizer que a Assembleia da República está agora a discutir esta petição em Plenário, mas em

boa verdade já respondeu à petição, poucos meses depois de ela ter sido apresentada, com a resolução que

foi aqui aprovada, por unanimidade, como já foi referido, com a contribuição de vários grupos parlamentares,

para o que o PCP contribuiu ativamente com as suas propostas, de forma a que o texto final fosse aprovado

por unanimidade.

Temos a consciência de que este setor — não só na comercialização, mas também na reparação, na

indústria, nas suas várias vertentes e componentes — precisa de uma abordagem e de uma política integrada,

coerente, que tenha em conta a realidade concreta e que não se deixe esmagar por abordagens mais ou

menos genéricas que ouvimos de vez em quando, como já sucedeu neste debate.

Srs. Deputados, vamos ver o que é que acontece quando houver poder de compra, porque há de haver,

pois outra política terá de ser adotada para haver poder de compra, para que as pessoas possam deixar de ter

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o seu poder de compra esmagado e para que o comércio automóvel, designadamente, possa ter de novo os

números, os indicadores e a realidade que apresentava até há cerca de três/quatro anos.

Nessa altura, venham os Srs. Deputados falar de importações e de balança comercial… É que aquilo que

os senhores apresentam orgulhosamente ao País, no que respeita à balança comercial e ao corte nas

importações, resulta não da substituição de importações por produção nacional mas, sim, da substituição de

importações por restrições ao consumo, à compra, à aquisição e à reparação! Nós temos um parque

automóvel envelhecido, fruto dessa política que estão a levar a cabo, pelo que é preciso um conjunto de

medidas, entre as quais medidas de política fiscal, em que necessariamente se enquadra esta matéria dos

incentivos ao abate de veículos em fim de vida.

E aquilo que se acrescenta — a própria resolução da Assembleia o faz — são outras vertentes dessa

política fiscal, incluindo, por exemplo, o imposto único de circulação e — uma outra questão que é

fundamental, considerando a sociedade que temos — o imposto sobre veículos, relativo à aquisição dos

veículos, designadamente no que diz respeito aos segmentos de gama mais baixa, que são mais acessíveis e

a que a população acaba por recorrer em maior número, nomeadamente aos segmentos A e B —veículos de

menor cilindrada e de mais baixo preço.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Não podemos ignorar a forma como esta medida de incentivo ao abate será estudada e levada a cabo. É

necessário trabalhar de uma forma sensata para garantir a justiça, a justiça fiscal, relativamente a esta

medida.

Mas a questão base, fundamental, é o poder de compra dos portugueses e a capacidade de investimento

das empresas, para que não estejamos a falar de incentivo ao abate quando não há dinheiro para comprar

viaturas nem tão-pouco para as reparar.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Serra.

O Sr. Nuno Serra (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Começo por deixar um cumprimento

especial à ACAP e aos cerca de 6300 cidadãos que subscreveram esta petição, que tem como pretensão

promover uma iniciativa legislativa com vista repor o sistema de incentivos ao abate de veículos em fim de

vida.

Os objetivos deste programa de incentivos, que esteve em vigor até 2010, eram, para além de potenciar o

mercado de vendas de automóveis em Portugal, os de minimizar os efeitos da crise sentida no setor, que se

iniciou em 2003. Mas teve também um contributo significativo na redução dos elevados níveis de sinistralidade

rodoviária, das emissões de CO2 e do consumo de combustível.

Este problema, para além de já ter sido amplamente discutido em vários fóruns, e também na Assembleia,

é um assunto de consideração atual, que foi alvo de um projeto de resolução apresentado pelo PSD, em junho

de 2013.

Esse projeto de resolução manifestava a preocupação dos partidos da maioria no que diz respeito à

adoção de medidas de apoio ao setor automóvel nacional. Uma preocupação substanciada com a queda de

40% do mercado, em 2012, o pior resultado dos últimos 27 anos, e que também explicou uma grande perda

de impostos, por exemplo do imposto sobre veículos.

Esse projeto de resolução recomendava, em primeiro lugar, para além de muitas outras medidas, que se

estudasse a criação de um programa de incentivo ao abate de carros em fim de vida e a autossustentabilidade

dessas medidas, por via das receitas fiscais geradas a partir desse programa.

Já ouvimos o Governo sobre esta causa, matéria para a qual mostrou uma grande sensibilidade. Sabemos

também, como já aqui foi referido, que a ação governativa no espaço orçamental está muito limitada enquanto

estivermos sob o programa de resgate, especificamente no que diz respeito aos incentivos fiscais, que é o que

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está aqui em causa. Portanto, as restrições que nos são impostas no Memorando de Entendimento

condicionam grandemente esta atuação.

O PSD considera que este assunto é de grande importância para a sustentabilidade do setor automóvel,

pelo que deve ser visto com a maior atenção por parte do Governo, e mantém completamente as

recomendações apresentadas em junho passado, não só a respeitante a esta medida mas todas as outras

incluídas no projeto de resolução, que têm como objetivo dinamizar o setor automóvel e melhorar a economia

portuguesa.

Aplausos do PSD e CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr.as

e Srs. Deputados, concluído este debate, vamos passar ao

último ponto da nossa ordem de trabalhos, que consta da apreciação da petição n.º 289/XII (3.ª) —

Apresentada pela Deco (Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor), solicitando à Assembleia da

República a adoção de medidas legislativas que limitem a cobrança de comissões ou outros encargos de

manutenção de contas à ordem e que promovam a transparência da sua publicitação e atualização,

conjuntamente com os projetos de lei n.os

527/XII (3.ª) — Proíbe a cobrança, pelas instituições de crédito, de

comissões, despesas ou outros encargos pela manutenção de contas de depósito à ordem (PCP), 529/XII (3.ª)

— Assegura o acesso dos cidadãos aos serviços mínimos bancários gratuitos e limita a cobrança de despesas

de manutenção de conta por parte das instituições de crédito (altera o Decreto-Lei n.º 27-C/2000, de 10 de

março, e o Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de dezembro (BE) e 532/XII (3.ª) — Cobrança de comissões e outros

encargos pelas instituições de crédito e sociedades financeiras devidas pela prestação de serviços aos

consumidores (PS).

Para apresentar o projeto de lei do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Começo por saudar os mais de 80 000

subscritores da petição promovida pela DECO, que vêm solicitar a criação de legislação que proíba a

cobrança de comissões pela manutenção de contas à ordem.

É exatamente esse o objetivo do projeto de lei que o PCP traz hoje, aqui, a discussão: proibir que as

instituições de crédito cobrem aos seus clientes comissões pela manutenção das contas de depósitos à ordem

e pelas operações simples associadas a essas contas, como, por exemplo, consultas de saldos e movimentos,

depósitos e levantamentos ou pagamentos de bens e serviços, quer estas operações sejam realizadas nos

balcões da instituição de crédito, quer nas caixas automáticas ou através da Internet.

É esta a solução que se impõe perante uma atitude cada vez mais predatória da banca. Passámos de uma

situação, num passado não muito longínquo, em que as contas à ordem eram remuneradas, para uma

situação em que os bancos se apoderam de parte do dinheiro depositado pelos seus clientes.

De acordo com o Banco de Portugal, em 2013, as comissões foram, em média, de 50 € para contas com

um saldo médio de 250 €.

Acresce ainda que os cidadãos com menores rendimentos são os mais penalizados já que quanto menor é

o saldo médio anual da conta maior é o valor das comissões cobradas.

Chega-se, inclusivamente, ao ponto de a banca cobrar despesas de manutenção de contas à ordem de

trabalhadores que passaram à condição de desempregados por estas contas deixarem de estar associadas a

um salário.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Hoje em dia é cada vez mais difícil a um cidadão passar sem uma conta à

ordem, situação que a banca explora abusivamente, cobrando comissões cada vez maiores.

Os dados disponibilizados pela Associação Portuguesa de Bancos indicam que, para os quatro maiores

bancos privados portugueses, os rendimentos de serviços e comissões atingem já valores entre 25% e 33%

do produto bancário. O dinheiro depositado nos bancos por particulares ou por empresas não pertence aos

bancos; é dinheiro que lhes é entregue temporariamente, permitindo que os bancos desenvolvam o seu

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negócio principal — conceder crédito a particulares e a empresas. Assim, é ilegítimo que os bancos se

apropriem dos depósitos dos seus clientes, por via das comissões.

Para finalizar, expresso a convicção do PCP de que a proibição de cobrança de comissões pela

manutenção de contas à ordem, nos termos propostos no nosso projeto de lei, deverá ser complementada

pela intervenção do Governo junto do banco público — a Caixa Geral de Depósitos — no sentido de limitar a

cobrança de comissões sobre outros serviços bancários.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para apresentar o projeto de lei do Bloco de Esquerda, tem a

palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, queria deixar

uma saudação devida aos peticionários, particularmente à DECO, por ter promovido esta petição e por ter

lançado, com a força com o que o conseguiu fazer, este debate na sociedade.

É certo que não é a primeira vez que a Assembleia discute esta matéria, mas creio que hoje os «holofotes»

do País estão virados para a Assembleia pedindo responsabilidade aos Deputados para acabarem com o

abuso a que hoje se assiste em matéria de comissões bancárias relacionadas com contas à ordem.

De facto, como a DECO lembra na sua petição, estas contas, até há bem poucos anos, eram remuneradas.

E percebe-se exatamente porquê: porque quem coloca o dinheiro numa conta à ordem disponibiliza a

possibilidade de a banca ter o seu negócio e de, também através desse dinheiro, fornecer investimento,

capacidade de crédito, no fundo dinamizar esse dinheiro na economia.

Ora, a banca, que reconhecia que utilizava o dinheiro dos depósitos para o seu negócio, remunerava as

pessoas. É certo que com uma taxa de juro baixa; é certo que muitas das vezes as pessoas nem sequer

percebiam muito bem os cálculos, mas em todo o caso este é um episódio do passado, porque hoje em dia a

realidade é bem diferente. Há poucos anos, recebíamos por ter uma conta à ordem, agora não só pagamos

como pagamos cada vez mais!

A DECO fez as contas, e bem, e concluiu que, desde o início da crise financeira, o custo de manutenção de

uma conta à ordem teve um aumento de 41%. E nós perguntamos: há algum serviço que seja prestado? A

verdade é que não!

Portanto, é curiosa a primeira afirmação do Banco de Portugal, quando diz que só devem ser pagos os

serviços que as entidades bancárias prestam. Ora, não há nenhum serviço que esteja a ser prestado na

manutenção de uma conta à ordem. Por isso, qual é o motivo para nós pagarmos? Apenas e só o abuso da

parte da banca.

O primeiro alerta que fica, pois, em cima da Mesa é o de que não devemos pagar pela manutenção das

contas bancárias, porque elas não representam nenhum serviço!

Mas, se juntarmos a esta reflexão o resultado de estudos feitos pela Comissão Europeia, percebemos que

nenhuma das taxas cobradas, quer por consultas de saldos, quer por transferências, quer pelo home banking

(o acesso às contas através da Internet), deveria ser paga, porque ou não tem valor de custo ou tem um valor

irrisório!

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Portanto, é esse o conteúdo que o Bloco de Esquerda traz a debate: o

bom senso no combate ao abuso e a defesa das pessoas contra o abuso da banca!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para apresentar o projeto de lei do Partido Socialista, tem a palavra

o Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro.

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O Sr. Fernando Serrasqueiro (PS): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A petição que a DECO hoje

nos traz, e cuja iniciativa saúdo, faz-nos revisitar a questão das comissões bancárias mais uma vez. E

suponho que não ficaremos por aqui.

Hoje, estamos a tratar da matéria das comissões, que são um serviço acessório à atividade principal da

banca. Não estamos a intervir ao nível do produto principal mas, sim, ao nível, se quiserem, da encomenda ou

do embrulho. E é por isso que não colhe a crítica, que já antecipo, de que o mercado deve funcionar, porque

não estamos a interferir com o produto essencial, que é o produto bancário.

Não podemos é, por outro meio, no que respeita àquilo que é a atividade acessória, permitir que não haja

quaisquer regras para o seu exercício e o seu condicionamento. E é por isso que no nosso projeto queremos

reforçar a competência do Banco de Portugal para poder ter condições de zelar pelo cumprimento de um

conjunto de princípios que eu aqui gostaria de sublinhar. O primeiro desses princípios é o de que as

comissões estejam condicionadas ao custo que suportem. Com isto, quero dizer que deve haver

proporcionalidade e que hoje ninguém consegue entender que, para uma mesma comissão bancária,

tenhamos, entre diferentes instituições, um leque de valores de um para cinco ou de um para seis.

Ora, isto só significa que não há uma adequação ao custo; é um produto fixado artificialmente, é um preço

que ninguém entende e é preciso ter regras para condicioná-lo.

Não podemos aceitar que esse leque seja tão alargado, nem que haja sobreposições nas comissões, sem

que se faça nem se promova a normalização do nome das comissões, para que os clientes possam saber se

há alternativas noutro banco, porque a panóplia de nomes e de comissões é tanta que rivaliza com uma lista

telefónica.

Srs. Deputados, esta matéria tem de ser atacada pela via de dar maior competência ao Banco de Portugal

e não pode ficar como agora — temos um bom exemplo — em que, ao vir aconselhar, recebeu logo a resposta

da Associação Portuguesa de Bancos a dizer «não vamos cumprir». Ora, isto não é resposta a um problema.

Se o problema existe, temos de atacá-lo reforçando as competências do Banco de Portugal, não fixando

preços. O nosso projeto não é esse, é propor um conjunto de princípios pelos quais o Banco de Portugal tem

de zelar na fixação das comissões.

Por isso, a nossa posição visa, em primeiro lugar, atacar o problema globalmente para depois atacar dois

novos problemas: serviços mínimos bancários que devem ser alargados e tornados obrigatórios.

Srs. Deputados, deveríamos também avançar para uma fatura detalhada, só das comissões bancárias,

porque se eu misturar comissões bancárias com o meu controlo de depósitos e levantamentos isso significa

não haver transparência neste tipo de faturação.

Nesse sentido, propomos nova legislação para o Banco de Portugal, serviços mínimos alargados e uma

faturação detalhada para as comissões bancárias.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Silva.

O Sr. Carlos Santos Silva (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Este debate sobre as

comissões de manutenção de conta, nomeadamente sobre depósitos à ordem, é extremamente atual,

pertinente e merece uma reflexão aprofundada.

A existência de uma petição subscrita por dezenas de milhares de portugueses deve ser entendida como

um sinal político que o legislador deve levar em linha de conta. Simultaneamente, exige de todos nós um

debate claro e profundo sobre a problemática em si, mas igualmente um forte realismo acerca dos efeitos da

linha de rumo que venhamos a adotar.

De acordo com as informações prestadas pela DECO (Associação para a Defesa do Consumidor), verifica-

se inapropriadamente um conjunto de situações que, a serem verdade e provadas, merecem uma resposta

concludente por parte da autoridade de supervisão, o Banco de Portugal.

Não podemos aceitar situações como as descritas pela DECO, nomeadamente: a falta de prestação de

informações relativas às comissões associadas à conta de depósito à ordem e os pressupostos da sua

aplicação.

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Não podemos aceitar os valores exigidos a título de comissões de manutenção de conta, sem a

compreensão clara da formulação do seu preço, associado ainda à velha questão em que é questionado se a

manutenção de uma conta corresponde, ou não, a um serviço prestado pelos bancos. E, como tal, pergunta-se

se essa despesa é considerada legítima, ou não, por parte dos bancos.

Mas, por outro lado, em contraditório, e com o intuito de clarificar este debate, não posso deixar de referir

os comentários do Banco de Portugal relativos à petição da DECO.

O Banco de Portugal afirma desconhecer os dados de base da análise da DECO. Na sua análise, o Banco

de Portugal refere que a evolução das taxas cobradas entre 2008 e 2013 representa um acréscimo de 18% e

não de 40%, como a análise da DECO indica.

Neste sentido, importa o cabal esclarecimento desta questão, sob pena de existir um processo legislativo

que não assenta em bases empíricas irrefutáveis, com a consequente produção de consequências que podem

colocar em causa a credibilidade do nosso sistema financeiro e os próprios interesses dos depositantes.

Para terminar Sr. Presidente, devo saudar a petição da DECO, que teve o mérito de provocar o debate

público acerca deste tema, inclusive a pronúncia e o reconhecimento por parte do Banco de Portugal quanto a

boas práticas a adotar pelos bancos quanto à matéria em discussão na última segunda-feira.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.a Deputada Cecília

Meireles.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, queria

cumprimentar a DECO por esta iniciativa. Aliás, esta não é a primeira nem a segunda iniciativa deste género,

tendo o CDS nalgumas vezes concordado e noutras vezes discordado. E em relação a algumas manifestou

dúvidas ou abertura, mas, em todo o caso, este é um verdadeiro serviço público e deve ser saudado como tal.

Não é por acaso que a petição angariou um número tão elevado de assinaturas, mas porque corresponde a

um problema real que as pessoas sentem.

Creio não ser esta a última vez que discutimos quer os problemas relacionados com as comissões

bancárias e outros serviços bancários quer os relacionados com petições da DECO sobre questões fiscais.

Passando ao assunto desta petição, não é a primeira vez que o discutimos aqui no Parlamento. E a

publicação desta notícia motivou uma pergunta do CDS ao Banco de Portugal feita em julho de 2013. Essa

pergunta versava basicamente sobre dois temas: o primeiro, o de saber se o Banco de Portugal confirmava os

dados da DECO que apontavam para um aumento de cerca de 40% nas comissões bancárias desde 2007; o

segundo, o de saber como devia ser feita a intervenção nesta matéria.

O Banco de Portugal respondeu, dando dados que, sendo diferentes, são igualmente preocupantes, ou

seja, pronunciou-se não desde 2007, mas desde 2008. Disse o Banco de Portugal que, em 2008, para uma

conta bancária com saldo médio de 250 € haveria taxas de 40.46 € e que em 2013 elas teriam aumentado

para quase 50 €; depois, no final de 2013, já tinham diminuído para 47,64 €. Ou seja, é um crescimento na

casa dos 20% que não deixa de ser preocupante e de motivar ação.

Aliás, não por acaso, na resposta a esta pergunta, o próprio Banco de Portugal considera que deve haver

uma atuação e informa — isso foi dito quer na resposta à pergunta, quer na altura em que o Banco de Portugal

compareceu na Assembleia da República e foi questionado especificamente sobre esta matéria.

Diz o Banco de Portugal que é preciso atuar e que está a fazer uma reflexão profunda. Naturalmente, não

estamos apenas a falar de comissões de depósitos à ordem, mas de muitas outras comissões, por muitos

outros serviços ou por virtuais serviços prestados pelo banco, tendo-se gerado uma grande confusão, o que,

naturalmente, motivou abusos. De facto, o Banco de Portugal agiu.

Existem estas boas práticas que foram recomendadas já para este ano, eu diria mesmo para esta semana,

havendo três, que são as três fundamentais, que — gostava de deixar isto claro — nos parece terem de ser

efetivas, havendo abertura da parte do CDS para as tornar efetivas, seja por via legislativa ou outra.

Primeira recomendação do Banco de Portugal: os serviços de conta à ordem devem incluir a

disponibilização de instrumentos de movimentação dos depósitos pela sua essencialidade.

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O Sr. Paulo Sá (PCP): — Não vai dizer nada sobre a nossa proposta?

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Assim sendo, recomenda que a comissão de manutenção da conta

de depósito à ordem englobe a anuidade do cartão de débito e a realização, no mínimo, de três levantamentos

mensais ao balcão.

Segunda recomendação: que esta comissão seja cobrada em função da manutenção da conta e não do

saldo médio da conta. Ou seja, que haja um preço para esta comissão que não varie, ao contrário do que

acontece atualmente, que é em função do saldo da conta.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr.a Deputada.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Terminarei, Sr. Presidente.

Finalmente, disse o Banco de Portugal que estas recomendações entrem em vigor depressa.

O Sr. João Oliveira (PCP): — E sobre os projetos apresentados não se vai pronunciar?

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Por último, e muito importante, quero dizer que é quase impossível

para aqueles que são os utentes e os consumidores perceberem quais são as comissões que vão pagar e

escolherem uma conta em função disso, porque, de facto, os nomes são às centenas. Esta recomendação do

Banco de Portugal é também urgente…

O Sr. João Oliveira (PCP): — E sobre o projeto apresentado pelo PCP não vai pronunciar-se?

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — O projeto do PCP não defende isto, fala de coisa diferente.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Está enganada!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, por favor, não entrem em diálogo, até porque a Sr.a

Deputada Cecília Meireles já não dispõe de tempo.

Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Termino, mesmo, Sr. Presidente, dizendo que é também urgente, do

ponto de vista da transparência e da uniformização de nomes, que sejam tomadas medidas.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado

Paulo Sá.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Exatamente na semana em que a Assembleia da

República ia discutir a proibição da cobrança de comissões pela manutenção de contas de depósito à ordem,

o Banco de Portugal veio fazer um conjunto de sugestões à banca sobre estas comissões.

Protestos da Deputada do CDS-PP Cecília Meireles.

Mas as sugestões do Banco de Portugal são isso mesmo, Srs. Deputados da maioria, são sugestões que

as instituições financeiras podem, ou não, acatar e, por isso, as sugestões do Banco de Portugal não resolvem

o problema. O que resolve o problema é a proposta do PCP e é por isso que deve ser transformada em lei.

Neste debate, ficamos sem saber o que é que o PSD e o CDS pretendem fazer relativamente a esta

questão, isto é, se estão disponíveis para proibirem a cobrança de comissões pelas contas de depósito à

ordem.

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E a pergunta natural que se faz é se vão utilizar estas sugestões do Banco de Portugal como pretexto para

rejeitarem as propostas do PCP e para deixarem que a banca continue a esbulhar os seus clientes.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Srs. Deputados da maioria, não temos dúvidas de que estamos do lado dos

cidadãos, defendendo os seus interesses.

Srs. Deputados da maioria, do PSD e do CDS, entre a banca e os cidadãos, quem é que escolhem?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado

Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: De facto, este debate fica marcado

pela tentativa de se utilizar o Banco de Portugal como um escudo da ausência de posição da direita. Esta é

que é a matéria que está em cima da mesa.

Há um «elefante», há um abuso por parte da banca, e ou nós agimos, como todos percebemos, do ponto

de vista legal, através de lei, ou todos já compreendemos que o próprio Banco de Portugal serve para tentar

fazer com que tudo fique na mesma. E é isso que não podemos aceitar.

Há um abuso por parte da banca? Há. Este abuso torna ainda mais desigual a relação entre clientes

bancários? Torna, porque paga mais quem menos pode! E quando há um abuso, quando há aumento da

desigualdade, o que é que fazemos? Escondemo-nos atrás do Banco de Portugal?! Sr.as

e Srs. Deputados da

maioria, espero que não seja essa a vossa posição.

O projeto apresentado pelo Bloco de Esquerda defende uma posição sensata: a possibilidade de alargar o

âmbito dos serviços mínimos bancários para serviços novos, como as transferências, os pagamentos de

serviços, principalmente a existência do home banking, através da Internet. Mas também podem ter a certeza

de o nosso projeto apontar para uma solução legislativa que acaba com o abuso do pagamento das comissões

pela manutenção de contas à ordem. Esta é a única escolha que está em cima da mesa: acabar com o abuso

ou fazer de conta que ele não existe para continuar a mantê-lo.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado

Carlos Silva.

O Sr. Carlos Santos Silva (PSD): — Sr. Presidente, desde já atalho, respondendo ao Sr. Deputado Paulo

Sá, para lhe dizer que, neste caso, o PSD está exatamente do lado dos cidadãos e dos consumidores.

Protestos do PCP e do BE.

Nessa perspetiva, peço meças aos Srs. Deputados da esquerda mais radical, porque desta maioria nasceu

o apoio às famílias sobre-endividadas.

Protestos do PCP e do BE.

Desta maioria nasceu também a possibilidade de as famílias levantarem o produto dos seus PPR para

pagamento das suas habitações e de verem impedida a alteração de spread em situações pontuais, como, por

exemplo, nos casos de divórcio.

Protestos do PCP e do BE.

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13 DE MARÇO DE 2014

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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, por favor, deixem ouvir o orador.

O Sr. Carlos Santos Silva (PSD): — Srs. Deputados, estamos exatamente, como sempre estivemos, do

lado dos portugueses!

Desse ponto de vista, quero dizer-lhe ainda, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, porque citou, e bem, a

questão dos serviços mínimos bancários, que tocou no ponto essencial: é que todos os portugueses, mesmo

os mais necessitados, têm a possibilidade de gastarem zero com as suas contas bancárias, usufruindo dos

serviços mínimos bancários, sobre o que esta Assembleia da República, e muito bem, legislou, tendo obrigado

a banca a dar alternativas aos portugueses para as suas contas à ordem.

Nessas circunstâncias, estamos, mais uma vez, do lado dos portugueses!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, a Mesa não regista mais inscrições para este

debate, pelo que chegamos ao fim dos nossos trabalhos de hoje.

A próxima reunião plenária terá lugar amanhã, quinta-feira, pelas 15 horas, sendo a ordem do dia

preenchida com a interpelação n.º 14/XII (3.ª) — Sobre a grave situação económica e social do País e a

política alternativa para a solução dos problemas nacionais (PCP).

Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 54 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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