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Quinta-feira, 25 de janeiro de 2018 I Série — Número 39
XIII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2017-2018)
REUNIÃOPLENÁRIADE24DEJANEIRODE 2018
Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Secretários: Ex.mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Idália Maria Marques Salvador Serrão Sandra Maria Pereira Pontedeira
S U M Á R I O
O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 9
minutos. Deu-se conta da apresentação dos projetos de lei n.os 736
a 741/XIII (3.ª) e dos projetos de resolução n.os 1247 a 1263/XIII (3.ª).
Ao abrigo do artigo 72.º do Regimento, procedeu-se a um debate de atualidade, requerido pelo BE, sobre «a dramática situação na fábrica TGI-Gramax, antiga Triumph International, e a salvaguarda dos salários e direitos das trabalhadoras». Abriu o debate a Deputada Catarina Martins (BE), tendo-se seguido no uso da palavra os Deputados Emídio Guerreiro (PSD), Ricardo Leão (PS), Hélder Amaral (CDS-PP), Rita Rato (PCP), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Isabel Pires (BE) e o Secretário de Estado Adjunto e do Comércio (Paulo Alexandre Ferreira).
Em declaração política, a Deputada Isabel Galriça Neto (CDS-PP) apontou diversos problemas com que se debate a área da saúde, que atribuiu a políticas erradas prosseguidas pelo Governo. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Moisés Ferreira (BE), António Sales (PS), Miguel Santos (PSD) e Carla Cruz (PCP).
Em declaração política, a Deputada Diana Ferreira (PCP), a propósito da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, lembrou a obrigação de o Estado tomar medidas concretas para responder às muitas necessidades, dificuldades e problemas sentidos pelas pessoas com deficiência e pelas suas famílias, tendo, no fim, respondido a pedidos de esclarecimento dos Deputados Jorge Falcato Simões (BE), Maria da Luz Rosinha (PS), Filipe Anacoreta Correia (CDS-PP) e Sandra Pereira (PSD).
Em declaração política, a Deputada Margarida Mano (PSD) falou do valor que se cria a partir do conhecimento e do que isso significa para a economia e para as gerações futuras e criticou a ausência de uma ação governativa orientada para a sua valorização. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Luís Monteiro (BE), Porfírio Silva (PS), Ana Rita Bessa (CDS-PP) e Ana Mesquita (PCP).
Em declaração política, o Deputado Pedro Coimbra (PS) deu conta dos temas abordados nas Jornadas Parlamentares do seu partido, que tiveram lugar nos passados dias 22 e 23, tendo-se referido à deslocação que, nesse âmbito, o seu
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Grupo Parlamentar fez aos distritos de Coimbra, Leiria e Viseu, atingidos pelos incêndios em 2017. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Deputados Pedro Soares (BE), Paula Santos (PCP) e Berta Cabral (PSD).
Ao abrigo do n.º 2 do artigo 76.º do Regimento, o Deputado Álvaro Batista (PSD), a propósito das assimetrias regionais, do despovoamento e do envelhecimento que afetam largas faixas do território nacional, deu o seu testemunho sobre a realidade que se vive no distrito de Castelo Branco, pelo qual foi eleito, tendo acusado o Governo de o votar ao abandono. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Deputados Hortense Martins (PS), Pedro Soares (BE) e Paula Santos (PCP).
Foi discutida a petição n.º 315/XIII (2.ª) — Solicitam a
prorrogação do prazo para entrega da declaração de Modelo 22 do IRC (Maria Filomena Martins de Oliveira Grimalde Simões e outros) juntamente com o projeto de resolução n.º 1259/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo a rápida conclusão do processo de revisão do calendário fiscal, reorganizando os prazos de entrega das diferentes declarações tributárias e definindo condições adequadas de disponibilização das aplicações de preenchimento e submissão dessas declarações (PCP). Proferiram intervenções os Deputados Paulo Sá (PCP), Paulino Ascenção (BE), Margarida Balseiro Lopes (PSD), Cecília Meireles (CDS-PP) e Ricardo Leão (PS).
O Presidente (Jorge Lacão) encerrou a sessão eram 18 horas e 27 minutos.
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O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas, vamos dar
início aos nossos trabalhos.
Eram 15 horas e 9 minutos.
Peço aos Srs. Agentes da autoridade o favor de abrirem as portas das galerias.
Antes de iniciarmos a ordem do dia de hoje, peço ao Sr. Secretário Deputado Duarte Pacheco o favor de
proceder à leitura do expediente.
O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e
foram admitidas, várias iniciativas legislativas.
Refiro, em primeiro lugar, os projetos de lei n.os 736/XIII (3.ª) — Reforça a proteção jurídico-penal da
intimidade da vida privada na internet (PS), 737/XIII (3.ª) — Aumenta a transparência fiscal dos combustíveis
por via de uma informação mais detalhada aos consumidores (CDS-PP), que baixa à 5.ª Comissão, 738/XIII
(3.ª) — Altera o Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, e o Decreto-Lei n.º
91/2009, de 9 de Abril, introduzindo alterações ao regime da adoção e adaptando o regime de proteção na
parentalidade à procriação medicamente assistida (PAN), 739/XIII (3.ª) — Procede à alteração do Código do
Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, e do Decreto-Lei n.º 91/2009, de 9 de Abril,
reforçando o regime de proteção na parentalidade (PAN), 740/XIII (3.ª) — Proteção da parentalidade nas
situações de adoção e de recurso à procriação medicamente assistida por casais de pessoas do mesmo sexo
(PS) e 741/XIII (3.ª) — Procede à 15.ª alteração à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprova o Código do
Trabalho, estabelece a dispensa para assistência a filho em substituição da dispensa para amamentação ou
aleitação (CDS-PP).
Dram ainda entrada na Mesa os projetos de resolução n.os 1247/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que
crie, disponibilize e mantenha atualizado um portal eletrónico onde seja divulgada informação relacionada com
as respostas criadas na sequência dos incêndios florestais de 2017 (PCP), que baixa à 7.ª Comissão, 1248/XIII
(3.ª) — Pela eliminação das dificuldades de circulação entre os concelhos da Chamusca e da Golegã através
da ponte João Joaquim Isidro dos Reis (PCP), que baixa à 6.ª Comissão, 1249/XIII (3.ª) — Aquisição de A
Anunciação, de Álvaro Pires de Évora (PSD), que baixa à 12.ª Comissão, 1250/XIII (3.ª) — Recomenda ao
Governo o desenvolvimento de ações tendentes à defesa e valorização da zona húmida das Alagoas Brancas
(PSD), que baixa à 11.ª Comissão, 1251/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo a requalificação da EN124 situada
nos concelhos de Silves e Portimão (BE), que baixa à 6.ª Comissão, 1252/XIII (3.ª) — Reforço dos meios de
apoio aos cidadãos portugueses que regressem ao País (PCP), 1253/XIII (3.ª) — Pela valorização e reforço dos
meios humanos, financeiros e técnicos do Banco Português de Germoplasma Vegetal (PCP) e 1254/XIII (3.ª) —
Recomenda ao Governo que compile e disponibilize, no portal eletrónico do Governo, toda a produção legislativa
referente aos incêndios florestais de 2017 e sensibilize as autarquias para veicularem a informação aos cidadãos
nos seus territórios (CDS-PP), que baixa à 7.ª Comissão.
Deram igualmente entrada os projetos de resolução n.os 1255/XIII (3.ª) — Reabertura do serviço básico de
urgências no Hospital Nossa Senhora da Ajuda, em Espinho (Os Verdes), 1256/XIII (3.ª) — Recomenda ao
Governo a criação de um programa extraordinário de apoio aos portugueses e lusodescendentes que, por força
das circunstâncias sociais, económicas e políticas no estrangeiro, regressem ao território nacional (CDS-PP),
1257/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo a reabertura da urgência básica do Hospital de Nossa Senhora da
Ajuda, em Espinho (BE), 1258/XIII (3.ª) — Pela manutenção das «ilhas» do Porto como resposta habitacional e
com taxas de esforço reduzidas (BE), que baixa à 11.ª Comissão, 1259/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo a
rápida conclusão do processo de revisão do calendário fiscal, reorganizando os prazos de entrega das diferentes
declarações tributárias e definindo condições adequadas de disponibilização das aplicações de preenchimento
e submissão dessas declarações (PCP), 1260/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que promova medidas de
prevenção e combate ao cyberbullying e ao cibercrime, nomeadamente a criação de grupos de trabalho de
avaliação da resposta penal a estes fenómenos e de avaliação dos diplomas legais e regulamentares vigentes
em matéria de saúde mental (CDS-PP), 1261/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que elabore um estudo sobre
as repercussões da reabertura do serviço ferroviário na Linha de Cintura do Porto (PS), que baixa à 6.ª
Comissão, 1262/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo a criação de um serviço de atendimento permanente no
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Hospital Nossa Senhora da Ajuda, em Espinho (PSD) e 1263/XIII (3.ª) — Recomenda o estabelecimento da
Zona Especial de Proteção do Centro Histórico do Porto, conforme o determinado na Lei nº 107/2001 (BE), que
baixa à 12.ª Comissão.
É tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Obrigado, Sr. Secretário Duarte Pacheco.
Vamos entrar na nossa ordem do dia, cujo primeiro ponto consta de um debate de atualidade, requerido pelo
BE, ao abrigo do 72.º do Regimento da Assembleia da República, sobre «a dramática situação na fábrica TGI-
Gramax, antiga Triumph International, e a salvaguarda dos salários e direitos das trabalhadoras».
Para abrir o debate, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª CatarinaMartins (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Estou
aqui para vos contar a história de uma fraude.
Uma multinacional com marca conhecida, a marca de lingerie Triumph, e com uma importante quota de
mercado na Europa e em Portugal, decidiu deslocalizar a sua produção e encerrar a fábrica que tinha em
Portugal há mais de 50 anos.
A Triumph sabia que este processo teria custos: com quase 500 trabalhadoras que dedicaram a sua vida à
fábrica, teria de pagar indemnizações a quem tem mais de 20 e 30 anos de trabalho. Com benefícios fiscais e
outros apoios públicos que recebeu ao longo dos anos, a deslocalização da Triumph levantaria ainda problemas
de incumprimento de legislação europeia e a fuga de uma unidade com tamanho custo social implicaria pesadas
consequências na imagem da Triumph.
Que fez, então, a multinacional? Antecipou um ano a deslocalização, passando a fábrica a um fundo de
capital de risco chamado Gramax Capital, que faz negócio a comprar e vender empresas industriais europeias,
muitas vezes liquidando-as — veja-se o seu cadastro de insolvências.
Antes da venda, a própria Triumph fez encomendas à fábrica garantindo um ano de produção da Gramax.
A operação incluiu um número — com a presença do Ministro da Economia e tudo! —, celebrando o novo
investimento e apresentando a desgraça como conquista. Mas a desgraça tinha data marcada, pois a
deslocalização foi consumada e a produção arrancou noutras paragens. A Triumph cessou encomendas e a
fábrica de Sacavém parou.
A nova empresa nunca foi um novo investimento, mas apenas um biombo. É aí que quem dedica a vida à
fábrica vê o chão fugir-lhe debaixo dos pés e o País vê mais uma fábrica fechada, outra vez uma unidade que
recebeu apoio público ao longo dos anos, mais perda de capacidade produtiva, mais um crime social — 500
pessoas no desemprego.
Só para a Triumph pode correr tudo bem: livra-se de responder sobre regras europeias — tecnicamente, não
foi a Triumph que encerrou a fábrica desde que recebeu apoios públicos; e livra-se também de custos de imagem
— a indignação pública atingirá o nome de uma empresa desconhecida, protegendo a imagem comercial da
Triumph.
Acresce que a responsabilidade pelas indemnizações a pagar recai também na Gramax. Abandonados por
uma multinacional sólida, os direitos dos trabalhadores ficam nas mãos de quem só soube descapitalizar a
empresa.
Sr. Presidente, esta é também a história de uma luta.
Completam-se hoje 20 dias e 500 horas de vigília cumpridas pelas trabalhadoras à porta da antiga Triumph,
em Sacavém: dia e noite, com chuva e frio, sem arredar pé, para impedir que a Gramax, insolvente, lhes roube
ainda o património — roupa e máquinas — da fábrica que ajudaram a construir com décadas de trabalho.
Aplausos do BE.
Estas trabalhadoras guardam as portas da fábrica porque sabem que se um dia as portas se fecharem
definitivamente este património da fábrica é a garantia de uma mínima compensação, sempre menor do que a
garantida por lei.
A todas estas mulheres — às trabalhadoras que agora se encontram nas galerias do Parlamento e às que
estão à porta da fábrica — quero prestar, em nome do Bloco de Esquerda, uma merecida homenagem.
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Aplausos do BE.
A luta destas trabalhadoras e trabalhadores não precisou de afetos presidenciais, visitas de governantes ou
expressões de caridade para conquistar o seu lugar. Muito nos dizem essas ausências sobre quem não
apareceu.
O Sr. JoséManuelPureza (BE): — Muito bem!
A Sr.ª CatarinaMartins (BE): — Mas o caso da Triumph é nacional, porque não é um caso isolado e porque
é um exemplo de tenacidade de quem à empresa só deu a sua força e o seu melhor. Essa é já uma vitória das
mulheres e homens da Triumph, porque derrubaram o biombo da Gramax e desmascararam a fraude. A sua
luta é a da dignidade do País e o Bloco de Esquerda não é daquele País que prefere olhar para outro lado.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, a indústria em Portugal perdeu, na última
década, quatro em cada 10 trabalhadores. Além disso, perdeu capacidade produtiva, aumentou a dependência
das importações e agravou-se a balança de pagamentos do País. Vezes demais em insolvências mal explicadas
e pior geridas. Vezes demais com trabalhadores à porta das empresas para tentar garantir o que é seu por
direito. Vezes demais condenando operárias e operários especializados ao desemprego de longa duração e à
pobreza.
Temos, portanto, responsabilidades e três urgências que nos interpelam.
Em primeiro lugar, precisamos de uma política de investimento que salvaguarde a capacidade produtiva
instalada no País e que trave esta sangria. Portugal pode e deve ter uma política industrial e assumir
responsabilidades públicas.
Em segundo lugar, precisamos de combater a fraude e a impunidade para impedir mais insolvências, que
são, na verdade, um assalto aos trabalhadores e ao País. É tempo de rever a legislação para impedir as
insolvências fraudulentas, priorizando o que conta: postos de trabalho, direitos dos trabalhadores, proteção da
capacidade produtiva, forte penalização do abuso.
Finalmente, precisamos de uma resposta concreta para o caso dos trabalhadores e das trabalhadoras da
Triumph, que estão sem salário desde novembro e, nalguns casos, abrange toda a família que trabalhava na
Triumph. Devemos-lhes apoio imediato, garantia de que os seus créditos são integralmente pagos e uma
solução para o dia seguinte.
Se à justiça se pede justiça, ao Governo exige-se que garanta a proteção dos trabalhadores durante o
processo de insolvência e que intervenha para defender a capacidade produtiva e permitir que a fábrica reabra.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª CatarinaMartins (BE): — Estou mesmo a concluir, Sr. Presidente.
Se tudo falhar e não existir solução que impeça o encerramento da Triumph, o Governo deve reconhecer a
necessidade de uma resposta social, de formação e de emprego para estas 463 pessoas.
As trabalhadoras da Triumph estão há 20 dias à porta da empresa e protegem-se umas às outras em
solidariedade. A sua luta é um exemplo de dignidade. Que se lhes faça justiça não é apenas uma urgência, é
uma exigência da democracia.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a Mesa não regista inscrições para este debate de atualidade. Espero
que os grupos parlamentares inscrevam rapidamente os seus Deputados, pois, caso contrário, teremos de
passar ao ponto seguinte da ordem do dia.
Pausa.
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Srs. Deputados, ainda estou para perceber qual é o interesse de quererem intervir antes ou depois de
determinado grupo parlamentar.
Haverá um momento em que se passará das afirmações às consequências.
Pausa.
Entretanto, a Mesa registou uma inscrição.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Emídio Guerreiro, do PSD, a quem agradeço por ser o
primeiro a intervir.
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as Deputadas e Srs.
Deputados: As minhas primeiras palavras são de solidariedade para com as trabalhadoras que, neste momento,
com as suas famílias, vivem momentos de muita angústia e de muita incerteza.
O Bloco de Esquerda agendou para hoje este debate de atualidade e pensava eu que este seria um momento
de viragem neste tipo de debates, que seria um momento em que o Bloco de Esquerda deixasse esta duplicidade
política que o carateriza — já é tempo, Sr.ª Deputada Catarina Martins, de o BE assumir as suas
responsabilidades: o tempo em que à segunda, quarta e sexta estão com o Governo e em que nos outros dias
da semana estão na oposição.
Aplausos do PSD.
Protestos do BE.
Sejamos claros: este Governo, a quem cabe resolver os problemas do País, só está em funções porque
dispõe de apoio parlamentar nesta Assembleia da República, apoio esse que é protagonizado por vários
partidos, incluindo o Bloco de Esquerda. Se assim é, esperávamos que, finalmente, o Bloco de Esquerda
assumisse as suas responsabilidades e trouxesse aqui uma solução.
Protestos do BE.
Não necessitam de reunir com os seus ministros à porta da fábrica, porque fazem-no, semanalmente, em
gabinetes. É aí que devem, de facto, procurar resolver esses problemas e deixarem-se de, de uma vez por
todas, terem este papel de duplicidade, híbrido, que não dignifica o debate político e muito menos o Parlamento.
Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, não são os vossos protestos que vão resolver os problemas daquelas
pessoas, …
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — São os vossos?!
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — … não são os vossos gritos que vão resolver os problemas daquelas
pessoas; são, de facto, as ações. Por isso, é necessário mudarmos a página e passarmos a um outro tempo,
em que os partidos que suportam e viabilizam o Governo tragam e concretizem soluções. Só assim será possível
terminarmos com este clima híbrido, em que num dia fazem uma coisa e noutro dia o seu contrário.
Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: E o que tem feito o Governo nesta matéria? Quando tudo
corre bem, até se atropelam, quer os líderes dos partidos que suportam o Governo, quer os diferentes secretários
de Estado e ministros. É um corrupio a ver quem consegue dizer aos portugueses «foi graças a mim que isto
está a acontecer».
Aplausos do PSD.
Mas, quando as coisas correm mal, quando as coisas não correm como se deseja, desaparecem todos, não
se vê ninguém a dar a cara, não se vê ninguém a assumir as responsabilidades. Isto é o que temos visto.
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É isso que acontece neste caso em particular. Decorreu um ano, um ano em que todos vimos mais uma ação
de propaganda, em que o Sr. Ministro da Economia se passeou na Gramax, em que disse ao País que a situação
estava resolvida e que até havia mais investimento e que se iria criar mais emprego.
Ora, é tempo de nós, oposição, perguntarmos ao Governo e aos partidos que o apoiam o que é que correu
mal, o que é que falhou, o que é que, em pouco mais de 12 meses, fez com que, de facto, chegássemos a esta
situação. Por isso, neste momento precisávamos de perceber o que é que correu mal e apurar
responsabilidades.
É também muito importante que tenhamos em mente isto: governar é difícil, é decidir, e se é preciso coragem
para decidir também é preciso coragem para assumir a responsabilidade das decisões. E aqui as decisões não
são solteiras, aqui as decisões são coletivas e são tomadas pelo Governo e suportadas, neste Parlamento, pelo
Bloco de Esquerda, pelo PCP, por Os Verdes e pelo PS.
Protestos do PS.
A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — O que é que o PSD quer?!
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Por isso, o desafio que vos é lançado aqui, hoje, é no sentido de que se
deixem desta duplicidade, que assumam as vossas responsabilidades e, sobretudo, que façam e falem menos.
Aplausos do PSD e de Deputados do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, pelo Grupo Parlamentar do PS, o Sr. Deputado
Ricardo Leão.
O Sr. Ricardo Leão (PS): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Comércio, Sr. Secretário
de Estado dos Assuntos Parlamentares, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Permitam-me que, em nome do
Grupo Parlamentar do PS, cumprimente igualmente todos os trabalhadores da Têxtil Gramax presentes nas
galerias.
Vozes do BE: — Triumph!
O Sr. Ricardo Leão (PS): — Da antiga Triumph.
Em primeiro lugar, em nome do Grupo Parlamentar do PS, quero agradecer ao Bloco de Esquerda o facto
de ter trazido ao debate da atualidade este tema pela importância do mesmo, pelas consequências que está a
ter, mas também pela preocupação que a todos nos traz.
A fábrica da marca alemã Triumph iniciou a sua produção, no concelho de Loures, na década de 60, tornando-
se uma das maiores entidades empregadoras deste concelho.
Foi sendo do conhecimento público que, há alguns anos, a Triumph vinha a manifestar a intenção de
abandonar a produção no nosso País através desta unidade em Sacavém, anunciando o propósito de
concretizar a venda da empresa ou, em último recurso, de proceder ao seu encerramento.
Depois de um período para o qual se temeu o pior, no segundo semestre de 2016 foi anunciada a sua venda
ao grupo Têxtil Gramax Internacional (TGI), sendo que, em janeiro de 2017, após uma visita à empresa do Sr.
Ministro da Economia, foi anunciada a manutenção desta unidade bem como a manutenção dos postos de
trabalho e a implementação de um novo plano de investimentos que previa a diversificação na produção e a
exportação para novos mercados.
Confesso que foi com espanto que, no final do ano passado, quer o Grupo Parlamentar do PS, mas também
eu próprio enquanto Presidente da Assembleia Municipal de Loures, fomos tendo conhecimento pelos
trabalhadores que, por decisão da Têxtil Gramax Internacional, estavam trabalhadores em casa por não existir
fluxo de trabalho, alegando não ter carteira de clientes para fazer face aos custos existentes, apresentando,
inclusivamente, um plano de reestruturação. Plano este que, rapidamente, se transformou, muito recentemente,
num processo de insolvência que, para além do impacto para o País, tem um impacto extremamente nefasto
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para o concelho de Loures, onde reside grande parte dos seus trabalhadores, representando esta unidade um
dos seus principais empregadores.
O Grupo Parlamentar do PS, quer por informações dos trabalhadores, quer pela resposta do Governo à
pergunta regimental que imediatamente fez, teve conhecimento da gravidade da situação, dos salários em
atraso, da ausência do pagamento do subsídio de Natal, mas também do acompanhamento e preocupação que
o atual Governo está a ter com esta matéria.
Um dos principais desafios de Portugal para a próxima década reside no desenvolvimento e na modernização
das empresas e da atividade económica em geral. Sem um robusto crescimento económico, melhoria da
produtividade e aumento da competitividade externa, nenhum dos problemas nacionais pode ser resolvido de
forma sustentável.
Por isso, apostar no desempenho da economia e das empresas, na criação de emprego e na qualificação
dos nossos trabalhadores e no capital humano em geral tem sido um imperativo do atual Governo.
Os resultados são hoje visíveis, com o crescimento da nossa economia e a redução da taxa de desemprego
a níveis de há 10 anos.
Este Governo, e o Sr. Ministro da Economia em particular, têm-se pautado por uma política de proximidade
e de acompanhamento constante ao tecido empresarial no nosso País.
Nesse sentido, gostaria de enaltecer a postura do atual Governo, que, sem muito alarido, de forma discreta,
tem trabalhado sobre esta matéria, por um lado, com as visitas da ACT (Autoridade para as Condições do
Trabalho) e do IEFP (Instituto do Emprego e Formação Profissional), bem como com os esforços da segurança
social para que, num curto prazo de tempo, os trabalhadores venham a receber aquilo a que têm direito de forma
rápida e eficaz, nomeadamente o processamento extraordinário para pagamento das prestações devidas,
matéria esta de extrema urgência pela realidade em que muitas famílias já se encontram e, por outro lado, o
esforço do Governo no encontrar de uma solução de investimento procurando investidores que permitam aos
trabalhadores terem a sua dignidade e direitos garantidos.
Por fim, queria dizer que o Grupo Parlamentar do PS, mais uma vez, demonstra a sua extrema preocupação
e solidariedade com a situação difícil dos quase 500 trabalhadores e suas famílias, que se encontram em vigília,
dia e noite, à porta da empresa, unicamente para lutar pelos seus direitos, vigília que eu próprio constatei numa
noite em que ali me desloquei. Nesse sentido, quero aproveitar para enaltecer a solidariedade da parte de muitas
associações para com os trabalhadores que lá estão, tais como escuteiros, Câmara Municipal e juntas de
freguesia envolventes àquela fábrica.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado.
O Sr. Ricardo Leão (PS): — Termino já, Sr. Presidente.
Esperamos, igualmente, que, com a recente nomeação de uma administradora judicial e o respetivo processo
especial de revitalização e com o empenhamento de todos, os direitos dos trabalhadores possam ser satisfeitos
de forma rápida.
Termino, com a certeza e a garantia do empenhamento total do Grupo Parlamentar do PS na resolução desta
situação.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, em nome do Grupo Parlamentar do CDS-PP, o
Sr. Deputado Hélder Amaral.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Queria, como é óbvio,
em nome do CDS, começar por cumprimentar as trabalhadoras presentes nas galerias e dizer que temos várias
formas de abordar este problema.
Este problema tem várias causas, porventura várias soluções, mas uma coisa sabemos: os únicos que não
têm culpa e que cumpriram bem o seu papel são os trabalhadores da Triumph.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
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O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Dito isto, queria dizer que o Bloco fez bem em trazer aqui este debate,
mas é bom dizer ao Bloco que, lamentavelmente, o Governo que V. Ex.ª, Sr.ª Deputada Catarina Martins, apoia
não tem Ministro da Economia. E era bom que a Sr.ª Deputada começasse por explicar porque é que não tem
Ministro da Economia. Digo isto porque o primeiro Ministro que, sobre esta matéria, disse qualquer coisa foi o
Ministro do Trabalho. Até agora, ainda não ouvimos o Sr. Ministro da Economia fazer uma intervenção como
aquela que é exigível ao Ministro da tutela.
É evidente que sabemos o que disse o Ministro Caldeira Cabral: disse que se congratulava com a
sobrevivência da antiga fábrica e que tudo correria bem. E a primeira pergunta que fazemos é a seguinte: em
que é que se baseava o Ministro da Economia para garantir ao País e aos trabalhadores que tudo estava bem
e que tudo correria bem?
A outra pergunta que fazemos é no sentido de sabermos porque é que o Bloco de Esquerda se limita a fazer
perguntas escritas sobre a situação da empresa e porque é que, nas reuniões que tem com o Governo, não vai
mais longe e não pergunta diretamente qual é a solução que tem para esta empresa.
Portanto, o Bloco de Esquerda, sim, assobia para o lado, sim, faz de conta que não vê e, no fundo, vem aqui
fazer aquele papel que faz bem, que é o de dizer «estou no Governo, mas gostamos de fazer de conta que
estamos na oposição».
Isso é curto, porque o Sr. Ministro diz «não nos resignamos, haveremos de encontrar soluções, nós temos
soluções».
Pergunto: quais são as soluções? Qual é a solução? Quais são os compromissos assumidos por esta
empresa que não está a cumprir? Do que o País precisa é de um Governo que assuma compromissos e que
obrigue ao seu cumprimento, de um Governo que penalize quem não cumpre!
O CDS apoia, obviamente, o tecido empresarial, mas não aquele que não cumpre compromissos, não aquele
que não cumpre com as regras. Nós estamos do lado das regras.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sejamos claros: se a ideia é, como tenho visto acontecer muitas vezes
no Parlamento, de atacar a estabilidade das leis laborais, de diabolizar o investimento, de diabolizar os
investidores, de não criar um clima favorável ao investimento, depois não podemos achar estranho que
circunstâncias destas aconteçam. Elas são ainda mais graves quando, sabendo disso, o Governo não cria
condições para antecipar problemas, para obrigar ao cumprimento das regras. E isso não aconteceu.
O Sr. Ministro esteve na Comissão de Economia e o que disse foi: «Nós estaremos do lado dos trabalhadores
a garantir que tudo lhes corra bem». Por isso, repito a pergunta: como, quando e em que circunstâncias? É isso
que queremos saber. E hoje, em nome das trabalhadoras, em nome da confiança no investimento, em nome do
emprego e do País, não podemos sair daqui sem ter respostas do Governo sobre o porquê de estas situações
continuarem a acontecer, sobre quais eram as garantias que o Ministro tinha de que estava tudo a correr bem e
quais as soluções para os trabalhadores e como é que resolvemos este problema. É que, se não, Sr.ª Deputada,
estaremos aqui apenas a fazer declarações vãs, que podem, eventualmente, preencher um qualquer telejornal,
e o problema das trabalhadoras, amanhã, continuará a ser o mesmo.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Rita Rato, do Grupo Parlamentar
do PCP.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Neste processo, o mais importante são as
trabalhadoras. Neste processo, o mais importante são, e têm de ser, as trabalhadoras e os seus direitos, porque
as trabalhadoras nada mais têm do que a sua força de trabalho, e é por isso que este não é um problema de
Sacavém, não é um problema de Loures, não é um problema do distrito de Lisboa, é um problema do País. A
defesa do emprego com direitos e a defesa do aparelho produtivo são uma estratégia de desenvolvimento para
o País e exigem o envolvimento do Governo.
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Aplausos do PCP.
Não é aceitável, Srs. Deputados, que esta empresa, após ter sido vendida à Gramax, tenha sido visitada pelo
Ministro da Economia, tenha sido vendida como um bom exemplo de sucesso de investimento estrangeiro e
que, até agora, estas trabalhadoras não tenham tido, por parte do Ministério da Economia, uma resposta eficaz
no âmbito deste processo. Este é um processo fraudulento! A história da ex-Triumph, atual Gramax, é a história
do desmantelamento premeditado de uma empresa e do ataque aos direitos dos trabalhadores.
A empresa agiu de má fé com estes trabalhadores. Estas trabalhadoras foram literalmente abandonadas pela
empresa. Os administradores desta empresa, que há pouco mais de um ano eram bons exemplos de sucesso,
são aqueles que se recusam a dar a cara a estas trabalhadoras, são aqueles que, na calada da noite, tentam
roubar equipamentos da empresa, que são a última garantia do cumprimento e do pagamento dos direitos e dos
créditos destes trabalhadores.
Por isso mesmo, os trabalhadores nada mais têm senão a sua luta, a sua força, a solidariedade do movimento
sindical, a solidariedade da população, das autarquias e daqueles que sabem que a razão está do lado dos
trabalhadores.
Aplausos do PCP.
Estas trabalhadoras foram aquelas que, durante anos, algumas mais de 40 anos, costuraram lucros à ex-
Triumph, «amassaram» os lucros desta empresa. E esta empresa, numa estratégia de desrespeito pelos direitos
destas pessoas, tentou desresponsabilizar-se em relação à sua situação. Primeiro, teve o descaramento de lhes
chamar um «fardo». O que a ex-Triumph, atual Gramax, chamou a estas trabalhadoras foi um «fardo» e o que
desenvolveu, de facto, foi um processo fraudulento de insolvência. O que esteve em cima da mesa, desde o
início, foi uma tentativa de um processo de reestruturação, mas, como não havia cabimento para o executar,
avançaram com um processo de insolvência.
Esta situação é da maior gravidade e o Governo tem de assumir todas as responsabilidades na fiscalização
desta situação e no cumprimento dos direitos dos trabalhadores.
Esta era a última unidade de produção na Europa! Esta empresa chegou a ter 1100 trabalhadores! Quando
foi vendida tinha 600 e, neste momento, tem cerca de 470 trabalhadores.
Não é aceitável, Srs. Deputados, que as trabalhadoras tenham de estar, há praticamente 20 dias, à porta da
empresa para impedir a retirada de material. Não é aceitável!
Não é aceitável que todos aqueles que se dizem defensores dos afetos tenham faltado a estas trabalhadoras,
que aqueles que se mostraram sempre disponíveis para atender a publicações de sucesso e a investimentos de
sucesso tenham faltado a estas trabalhadoras.
Por isso, nós entendemos que é muito importante tomar medidas, e ainda há tempo para o fazer. Temos
dúvidas, Srs. Deputados, de que seja já possível assumir a insolvência como um ponto final. Temos dúvidas
sobre isso! A unidade de produção faz falta a algumas trabalhadoras, porque muitas ainda são muito novas para
se reformarem — há trabalhadoras que ainda não têm 40 anos —, e também é necessário garantir a defesa da
produção nacional para o desenvolvimento do País.
Foi aprovada, por unanimidade, uma proposta do PCP para garantir uma resposta a esta empresa. Foi
aprovada aqui, por todos, mas a verdade é que têm faltado soluções.
É urgente garantir os direitos de proteção social no imediato, quer no acesso ao Fundo de Garantia Salarial,
quer no acesso ao subsídio de desemprego. É necessário e urgente garantir o pagamento de todos os créditos
em dívida, mas é urgente trabalhar em soluções para garantir os postos de trabalho e a continuidade da
produção, pela vida destas trabalhadoras, mas também pelo País.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, também para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Heloísa
Apolónia, em nome do Partido Ecologista «Os Verdes».
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A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado dos Assuntos
Parlamentares e Adjunto e do Comércio, Sr.as e Srs. Deputados: Uma nota prévia, decorrente da intervenção do
CDS-PP. Não venho aqui para lhe dar conselhos, como é evidente, Sr. Deputado Hélder Amaral, mas para dar
a opinião de Os Verdes. E Os Verdes entendem que, se o CDS e o PSD continuam a encontrar causas que, de
facto, não constituem a verdadeira essência dos problemas, então não conseguem encontrar as soluções
adequadas.
Quero lembrar-lhe, Sr. Deputado Hélder Amaral, que foi com a vossa legislação laboral que este problema
aconteceu e foi com a vossa legislação laboral que muitas empresas encerraram portas neste País.
Aplausos do PCP.
Vozes do CDS-PP: — Oh!…
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Portanto, Sr. Deputado Hélder Amaral, acha que o problema das empresas é uma
legislação laboral que facilita os despedimentos, tornando-os baratinhos para as entidades patronais?! Acha que
o problema das empresas é uma legislação laboral que está toda do lado das entidades patronais, Sr.
Deputado?! Não! Esse é o problema da economia do País, esse é o problema dos trabalhadores, e daí a
necessidade de regularizar e equilibrar forças para dignificar o trabalho no País.
O problema, Sr. Deputado, é que muitas empresas, como já aqui foi referido, recebem muito dinheiro e
benefícios públicos, usam e abusam, não são minimamente fiscalizadas e, depois, vão-se embora a seu bel-
prazer, sem ligar a absolutamente nada. Isto não é digno de um país desenvolvido, mas esta é a vossa
economia, a da lei da selva!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — A nossa?!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sim, a vossa, que os senhores também construíram!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — A Sr.ª Deputada é que está no Governo!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Bom, Sr.as e Srs. Deputados, já aqui foi contada a história, mas
quero reforçar algumas questões, designadamente deixar uma palavra enormíssima de solidariedade para com
os trabalhadores da ex-Triumph, que até já tive oportunidade de dar pessoalmente, no local da vigília, em frente
da empresa, onde, de forma absolutamente heroica, aqueles trabalhadores, fundamentalmente mulheres,
estiveram 20 dias seguidos, noite e dia, ininterruptamente, incansavelmente, a lutar pelos seus direitos e a
garantir que o material não sairia, de forma totalmente fraudulenta, daquela empresa. Mas é preciso reforçar
essa palavra de solidariedade, porque estamos a falar de trabalhadores especializados, que procuraram sempre
zelar pelo cumprimento dos compromissos da empresa e pelas encomendas existentes.
A verdade é que a Gramax, que entretanto comprou a ex-Triumph, anunciou no início de 2017 que iria investir
mais de 1 milhão de euros para modernizar a unidade têxtil de Sacavém. E, Srs. Membros do Governo, o Sr.
Ministro da Economia, na altura, garantiu como certa àquelas trabalhadoras a estabilidade daquela empresa.
O tempo decorreu e o que se verificou foi a verdade que veio ao de cima no final de 2017: a empresa procurou
retomar o plano de reestruturação que visava o despedimento de 150 trabalhadores, mas, no final de dezembro,
esses trabalhadores foram confrontados com a decisão da empresa de avançar com um processo de
insolvência.
Entretanto, às trabalhadoras que fizeram esta vigília heroica, como aqui referimos, demonstrando como é
importante lutar e não arredar pé, faltava-lhes cinco dias de pagamento do mês de novembro, faltava-lhes o
pagamento do mês de dezembro, faltava-lhes o pagamento de todo o subsídio de Natal, faltou-lhes o pagamento
do mês de janeiro, e as suas contas não esperam para ser pagas. Esse é o grande problema com que estas
trabalhadoras se confrontam.
A empresa deixou de servir refeições, não tinham, sequer, refeição para tomar. Foi a Câmara Municipal que
lhes deu a mão nesse domínio, como outras associações que também já aqui foram referidas. E, de facto, essa
solidariedade é imperiosa. Estamos a falar de 463 trabalhadores, de 463 pessoas que estão agregadas em
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famílias que precisam de sustento e, portanto, estamos a falar, de facto, de vidas das pessoas, de subsistência
das pessoas, estamos a falar, efetivamente, de coisas muito sérias.
É por isso, Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Comércio, que hoje se impõem respostas neste Plenário,
respostas que Os Verdes já solicitaram ao Governo, em termos de pergunta escrita, mas que ainda não
obtivemos. E impõe-se, fundamentalmente, que o Governo afirme hoje que mecanismos e garantias dá,
efetivamente, para a proteção destes 463 trabalhadores. A essas respostas o Governo não pode fugir! Pode
contar história,…
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … pode dizer o que fez, pode até, eventualmente, dizer o que não
fez, que também lhe ficaria bem, mas, Sr. Secretário de Estado, tem de dizer que direitos estão assegurados a
estes trabalhadores!
Aplausos do PCP.
Protestos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Isabel Pires, em
representação do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.
A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas:
Com este debate, percebemos que aquilo que incomoda a direita neste Parlamento, afinal, não é apenas não
estarem no Governo, é não terem capacidade e não conseguirem fazer oposição. Percebe-se que onde está a
exigência, naquilo que importa à vida das pessoas, é à esquerda e não nos partidos à direita. E as trabalhadoras
perceberam-no!
Aplausos do BE.
Relativamente às intervenções que PSD e CDS aqui fizeram, especialmente a do Sr. Deputado Emídio
Guerreiro, que nem usou os 5 minutos a que tinha direito, tenho de dizer que denotaram uma total falta de
respeito pelas trabalhadoras que aqui estiveram e pelas trabalhadoras que estão na fábrica, e vão continuar à
porta da fábrica, até a solução estar encontrada. E foi uma falta de respeito que o PSD e o CDS aqui tiveram,
porque aproveitaram para fazer politiquice com a vida das pessoas e nem uma palavra disseram sobre as
soluções que é necessário encontrar para este problema.
Aplausos do BE.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Mas também sabemos que quando os direitos dos trabalhadores e das trabalhadoras estiveram em causa,
como sucedeu na PT, nos CTT e, agora, na Triumph, e também noutras empresas, o PSD e o CDS nunca
tiveram nada a dizer, como continuam a não ter nada a dizer, e sempre viraram as costas às soluções
apresentadas. Relembro apenas, por exemplo, que, no caso do Fundo de Garantia Salarial e da necessidade
de aumentar o seu teto, o PSD votou contra a proposta do Bloco de Esquerda.
Vozes do BE: — Bem lembrado!
A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Assim se vê aquilo que o PSD e o CDS querem para os trabalhadores: não
querem saber dos trabalhadores do nosso País!
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Portanto, fica gravado, com este debate — e as trabalhadoras ficaram com essa ideia (não que tivessem
uma ideia diferente ou que esperassem mais do PSD e do CDS) —, que, quando se trata de dignidade e de
responder aos trabalhadores e às trabalhadoras da direita nada podem esperar, e assim vai continuar.
Também por isso, a solução governativa e parlamentar tem de ser exigente e aqui estamos para reclamar
essa exigência, porque o PSD e o CDS, em matéria laboral, não têm história, Srs. Deputados, têm cadastro,
com aquilo que fizeram ao nosso País.
Aplausos do BE.
Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Comércio, gostaria de colocar algumas questões sobre aquelas que
são as possibilidades de resolução e o que está em causa para estas trabalhadoras, nomeadamente no que se
refere ao problema da insolvência. Já aqui foi referido que, possivelmente, estamos perante um caso de
insolvência fraudulenta. Demasiadas vezes vimos acontecer este tipo de situações, mas não podemos permitir
que empresas viáveis utilizem mecanismos que passam por vender empresas ou fábricas a especialistas, como
a Gramax — especialistas em insolvências —, para, por um lado, lavarem a sua cara do ponto de vista comercial,
e, por outro, provocarem o desemprego e a desestruturação de milhares de famílias e também dos concelhos
que precisam destes importantes centros de produção para o País.
Portanto, sem uma clarificação da legislação sobre as matérias referidas, podemos estar a perder a
oportunidade de travar, no futuro, fraudes que se espalham pelo País e que trazem, por arrasto, desemprego,
perda de direitos e problemas sociais graves para quem trabalha, para as suas famílias e para o País.
Consideramos que quem foge às suas responsabilidades não pode ficar impune. É isso que está em causa e o
que se pretende clarificar com este debate.
Portanto, a pergunta que lhe deixava era no sentido de saber se serão precisas mais Triumph e mais
trabalhadoras à mercê de fraudes para agir no que toca à legislação relativamente a insolvências.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para uma intervenção, em nome do Governo, o Sr. Secretário de
Estado Adjunto e do Comércio, Paulo Alexandre Ferreira.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Comércio (Paulo Alexandre Ferreira): — Sr. Presidente, Sr.as e
Srs. Deputados: A minha primeira palavra é de solidariedade para com as trabalhadoras e os trabalhadores que
ainda há pouco estiveram estavam presentes nas galerias, dando nota de que não só o Governo partilha das
angústias e preocupações sentidas por eles, como também, e desde o início, está empenhado, na linha da
frente, em promover condições para a manutenção dos postos de trabalho das trabalhadoras e dos
trabalhadores da antiga Triumph e em salvaguardar sempre o cumprimento dos seus direitos.…
Aplausos do PS.
É importante recordar, uma vez mais, o histórico deste processo. Logo após ter tomado posse, o Governo foi
confrontado com uma apregoada inevitabilidade de encerramento desta unidade empresarial, em resultado de
uma decisão tomada pela Triumph International, à altura detentora da Triumph portuguesa. Como não nos
conformámos com essa apregoada inevitabilidade, mobilizámos a administração da Triumph International, os
diferentes organismos da Administração Pública e, naturalmente, as trabalhadoras e os trabalhadores, na
procura conjunta de uma solução que tornasse evitável o encerramento da unidade, com a perda total dos postos
de trabalho que isso significaria, contando também, e tendo em conta a sua importância local, com o
envolvimento quer da Câmara Municipal de Loures quer da Junta de Freguesia de Sacavém.
Neste percurso de procura de uma solução, começámos por explorar, junto do setor têxtil nacional,
alternativas que permitissem a viabilização laboral da fábrica, trazendo para Portugal o seu centro de decisão.
Deparámo-nos, contudo, com dificuldades resultantes da dimensão elevada desta unidade industrial e do pouco
tempo que existia para reconverter uma unidade empresarial cuja produção, como já foi aqui dito, era
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exclusivamente destinada a um só cliente, a Triumph International, numa fábrica que tivesse capacidade para
desenvolver, no espaço de um ano, uma carteira diversificada de clientes e de mercados.
Neste contexto, a administração da Triumph International, à época, informou o Governo de que tinha aceitado
a proposta apresentada pelo investidor Gramax. Iniciou-se, assim, um período de transição da fábrica, em que
a Triumph International garantiria a manutenção de um conjunto de trabalhos, durante um determinado período
de tempo, período de tempo esse que deveria permitir à Gramax constituir uma equipa comercial capaz de
captar um volume de encomendas necessário para assegurar a sustentabilidade comercial e financeira desta
unidade produtiva.
Dada a sua importância na economia e emprego local, o Governo acompanhou este processo em estreita
articulação, uma vez mais, com a Câmara Municipal de Loures, com quem se partilhou, desde o primeiro
momento, a vontade de encontrar uma solução permanente, que permitisse salvaguardar o emprego e a
capacidade produtiva instalada.
A solução encontrada pela Triumph International era exigente, nomeadamente ao nível do processo de
transição, que obrigaria, como já referi, a criar uma carteira de clientes para uma empresa que, até aí, tinha
sempre funcionado num contexto de cliente único.
Sr.as e Srs. Deputados, chegados aqui, é inegável que este processo não obteve o sucesso desejado por
todos, nem reflete o empenho colocado, desde o primeiro momento, pelo Governo, pela Câmara Municipal de
Loures, pela Junta de Freguesia de Sacavém e, sobretudo, pelas trabalhadoras e trabalhadores da empresa.
Da parte do Governo, deixamos a garantia de que continuamos empenhados e a desenvolver trabalho nas
diferentes dimensões que o processo apresenta. Primeiro, continuamos a desenvolver esforços na promoção
nacional e internacional das competências dos trabalhadores, visando contribuir para a manutenção desta
capacidade no setor têxtil da região de Lisboa, nomeadamente do concelho de Loures. Segundo, está-se a
atuar, através de um importante trabalho de proximidade no local, junto das trabalhadoras e dos trabalhadores,
mobilizando equipas da Autoridade para as Condições do Trabalho, do Instituto do Emprego e Formação
Profissional, do Instituto da Segurança Social, I.P., com o objetivo de garantir — e este é um compromisso que
o Governo aqui assume, porque, de facto, ele já está no terreno — que os direitos dos trabalhadores estão a
ser, e serão, salvaguardados.
No âmbito das iniciativas que temos vindo a desenvolver, o Sr. Ministro da Economia irá receber
representantes dos trabalhadores no início da próxima semana. Continuamos, assim, a trabalhar para que não
existam inevitáveis e para que estas mulheres e estes homens possam continuar o trabalho que construíram
nas últimas décadas, com a produção nacional, as exportações, a manutenção do emprego e a sustentabilidade
social no concelho de Loures a dever poder continuar a beneficiar também do seu contributo para o excelente
momento económico que Portugal se encontra hoje a viver.
Há, hoje, um clima favorável ao crescimento, há, hoje, um clima favorável ao investimento empresarial e há,
hoje, confiança em Portugal. Isso deve-se à ação deste Governo e de quem o suporta.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Hélder Amaral.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, gostava
de dizer que o Bloco faz uma interpretação curiosa: requer primeiro o agendamento de um debate de atualidade,
abdica da sua intervenção política e depois acusa o CDS de fazer politiquice.
Protestos do BE.
Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, agradeço a convicção e até a frontalidade com que faz as suas intervenções.
Pela minha parte, com toda a simpatia, até gosto. Mas use essa mesma frontalidade e essa mesma convicção
para falar com a bancada do Partido Socialista e com o Governo.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
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Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — É que quem está a falhar às trabalhadoras, quem está a falhar à empresa,
é o seu Governo, é o Governo do Bloco de Esquerda, é o Governo do Partido Ecologista «Os Verdes», é o
Governo do Partido Socialista.
Se os senhores vêm aqui acusar que há uma fraude, cabe ao Governo impedir que essa fraude se concretize!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — O senhor ainda não conseguiu compreender!
O Sr. João Oliveira (PCP): — É um caso de insucesso escolar!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Não deite culpas ao Governo anterior, porque isto é da responsabilidade
do Governo que os senhores apoiam, dos orçamentos que os senhores aprovam, das políticas que os senhores
aqui apoiam e que permitem este tipo de fraudes.
Srs. Deputados, de uma vez por todas, e para terminar, a geringonça, que até gera alguma simpatia em
alguns setores, embora não nestas bancadas, tem de servir para alguma coisa no futuro, não pode ser só para
o regresso ao passado. Se é só para o regresso ao passado, é pouco, é curto e os trabalhadores não o merecem!
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Afinal, é surdo!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Emídio Guerreiro.
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Deixo uma nota final neste debate,
importante, ficando gravada, de facto, esta verdadeira fraude política que hoje temos aqui,…
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Fraude foi a sua intervenção!
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — … que é o facto de, sistematicamente, fazerem de conta que não o são.
Como tive oportunidade de dizer, uns dias são oposição, outros dias são Governo!
Ficamos também esclarecidos sobre o facto de o Governo estar preocupado e acompanhar a situação, mas
soluções, aquilo que os senhores deviam estar aqui a apresentar para sossegar as pessoas, uma vez que são
Governo,…
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Então, e o PSD?!
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — … repito, uma vez que são Governo,…
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — O PSD nem uma solução apresentou! Zero!
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Soluções, que os senhores deviam aqui apresentar, uma vez que
governam, uma vez que viabilizam este Governo, não há!
Aplausos do PSD.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Comércio: — Já dissemos qual é a solução!
O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Rita Rato.
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A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados, infelizmente, a história
do País está marcada por exemplos deste tipo: foi a Bombardier, foi a Valadares, foi a Opel da Azambuja, é
agora esta empresa.
É preciso, de facto, que exista vontade política para acompanhar estas situações. Não é possível apresentar
casos de investimento como casos de sucesso e não garantir o acompanhamento das situações.
Os trabalhadores perceberam o que ia acontecer e, por isso, é fundamental garantir que o Governo
acompanhe estas situações, sob pena de estarmos perante processos de deslocalizações e de encerramentos
de empresas com base em insolvências fraudulentas, porque é disso que se trata.
A ex-Triumph encontrou na Gramax uma forma de fugir aos direitos dos trabalhadores e de garantir a sua
situação. É urgente a proteção imediata destas pessoas no acesso ao fundo de garantia salarial e ao subsídio
de desemprego e é urgente garantir a manutenção dos postos de trabalho e a defesa do aparelho produtivo do
País. Não há desenvolvimento sem aparelho produtivo e o Governo tem de ter uma palavra firme relativamente
a estas empresas, que agem de forma abutre no nosso País.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Tem ainda a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Isabel Pires.
A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas:
Este caso das trabalhadoras da Triumph é importante para assegurar os seus direitos, mas esta luta é também
importante para mostrar que ainda vivemos num País muito desigual, em que a maioria dos trabalhadores que
estão em situações semelhantes não tem sequer acesso aos mínimos garantidos por lei. Esta é a questão que
deve ser também trazida a debate e que deve ter resposta a nível de políticas públicas.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE) — Muito bem!
A Sr.ª Isabel Pires (BE): — O nosso papel, enquanto Deputados da Assembleia da República, é o de
fazermos propostas no sentido de irmos além do que são os mínimos garantidos aos trabalhadores. E já
percebemos de onde é que as propostas vêm — do PSD e do CDS-PP nunca vieram propostas para os
trabalhadores.
Protestos do CDS-PP.
Portanto, as propostas que ficam são: é preciso garantir e cumprir os direitos que estão na legislação e
aumentar a proteção dos trabalhadores; é preciso não desistir de encontrar investidor para manter os postos de
trabalho; ao nível da vida daquelas trabalhadoras é preciso também olhar para a questão do fundo de garantia
salarial e rever os tetos, que são muito baixos, para muitas das indemnizações que aquelas trabalhadoras
mereceriam; e são precisos apoios públicos para a reconversão laboral.
O Sr. Presidente: — Tem de terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Vou terminar, Sr. Presidente, dizendo às trabalhadoras, que ainda estão e se
vão manter à porta da fábrica da Triumph, que o nosso papel e o nosso dever são os de não as abandonarmos.
Já sabemos que existem dois partidos nesta Assembleia da República que se demitiram de ser partidos, de
aprovar soluções ou, sequer, de apoiar soluções, mas da parte do Bloco de Esquerda as trabalhadoras não
serão abandonadas e triunfarão na sua luta!
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Passamos ao segundo ponto da ordem do dia, que consiste em declarações políticas.
Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto.
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A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A saúde está na ordem do
dia, com problemas graves que se acumulam, uma realidade muito preocupante para os portugueses e não uma
perceção, como há semanas aqui sugeria o Sr. Primeiro-Ministro.
Para o CDS, refletir sobre esta realidade e buscar soluções não é nem um exercício demagógico, nem
populista, é antes um imperativo que decorre da forma como fazemos política, centrados nas pessoas, nos
melhores resultados, ouvindo especialistas e sem preconceitos ideológicos.
Aplausos do CDS-PP.
Não acordámos hoje para esta temática, não fomos despertados por títulos de jornais ou por soundbites, há
mais de dois anos que vimos chamando a atenção para matérias de fundo nesta área e avisámos que, se se
prosseguissem políticas erradas e não se buscassem alguns consensos, teríamos maus resultados. Tínhamos
razão, infelizmente com claro prejuízo para os portugueses.
Vamos, então, à realidade.
Relativamente a listas de espera para consultas, para a realização de exames complementares de
diagnóstico e para cirurgias com tempos inaceitáveis, não estivemos a assobiar para o lado. Desde o início de
2016 questionámos o Governo 13 vezes — sim, 13 vezes! — sobre esta matéria.
O certo é que, entre respostas evasivas e promessas incumpridas, chegámos àquilo de que, ontem, todo o
País se deu conta: mais de metade dos hospitais a não cumprirem com os tempos recomendados, com números
ainda mais graves em algumas especialidades, como a oftalmologia ou a urologia.
São números inaceitáveis, que revelam má qualidade das respostas e falta de empenho deste Governo em
resolver situações que prejudicam claramente o bem-estar dos portugueses, que vão sendo deixados para trás.
Para este Governo, na área da saúde têm-se acumulado promessas bondosas, que tardam ou falham em serem
cumpridas, e valorizam-se défices e dívida pública, à custa de não se valorizar devidamente a relevância da
qualidade dos serviços públicos, nomeadamente na saúde.
Sabemos os problemas que se arrastam nas urgências e nos internamentos hospitalares, da necessidade
imperiosa de adequar serviços e profissionais de saúde para a realidade do envelhecimento e das múltiplas
doenças crónicas.
O que viu e vê este País, mesmo tendo tido menor atividade gripal do que em anos anteriores? Vê mais
internamentos em piores condições, macas acumuladas, tempos de espera inaceitáveis, médicos, enfermeiros,
terapeutas e outros profissionais de saúde exaustos e em número insuficiente. Vê ausência de planeamento,
atraso inaceitável no acionar de planos de contingência e de respostas em tempo útil.
Para quando? Sim, para quando, mais uma vez perguntamos, a contratação dos mais de 700 médicos
especialistas que há meses aguardam a sua colocação no Serviço Nacional de Saúde, nos tais concursos que,
há meses, estão «para daqui a dias»?
A tutela não está a cumprir com a legislação, que foi cumprida até 2016.
Que dizer das horas em dívida aos enfermeiros que se acumulam nos bancos de horas, que não foram pagas
até ao final de 2017, como era devido, porque não existe cabimento orçamental? Não! Os profissionais de saúde
também não são uma prioridade para este Governo.
Sobre as dívidas e pagamentos em atraso que se acumulam, que interferem e prejudicam a prestação de
cuidados, como também há muito vimos alertando, o que se passa? Bem pode o Sr. Ministro vir a esta Câmara
ou à comissão anunciar injeções de capital nos hospitais, porque, quando, como ainda hoje, vemos no portal
Transparência — SNS montantes de dívida na ordem dos mais de 300 milhões de euros apenas para o Centro
Hospitalar de Lisboa Norte temos razões para manter a preocupação.
Aplausos do CDS-PP.
Se formos falar de reformas do SNS, teremos certamente muitos grupos de trabalho, alguns até
descoordenados e sem a necessária visão integrada dos problemas que discutem, teremos alguns avanços,
que saudamos, nas áreas dos cuidados paliativos, mas temos, lamentavelmente, uma reforma hospitalar tímida
e uma reforma dos cuidados de saúde primários que está parada. Sobre ela muito temos questionado, ouvindo
até, o que é grave, falsas declarações do Sr. Primeiro-Ministro em relação a esta matéria. A realidade — e, mais
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uma vez, é de factos que falamos — evidencia que 2017 foi o pior ano da reforma dos cuidados de saúde
primários no nosso País.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Bem lembrado!
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Este é o cenário que conhecemos, com promessas incumpridas,
com respostas que tardam para os mais vulneráveis, listas de espera agravadas, profissionais em número
insuficiente, exaustos e descontentes, dívidas acumuladas.
Esta é a realidade da saúde em Portugal e que muito nos preocupa. É um cenário que demonstra falta de
prioridade para a saúde por parte deste Governo, que nem em percentagem, face ao PIB e a anos anteriores,
lhe conferiu a devida relevância e que tem manifestamente prejudicado os portugueses.
Não bastará, por parte dos partidos que têm aprovado ativamente as políticas governativas e viabilizado os
seus orçamentos, um exercício de contorcionismo, simulação e ambiguidade, ora criticando ora dando
condições, para que tudo se mantenha na mesma, pois os portugueses não estão iludidos e sabem quem hoje
é conivente com este estado de coisas.
Seguramente que há lugar para apresentar propostas…
Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Jorge Lacão.
O Sr. Presidente: — Atingiu o teu tempo, Sr.ª Deputada. Faça favor de concluir.
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Seguramente que há lugar para apresentar propostas e é isso que faremos hoje à noite e também nas nossas
jornadas parlamentares na próxima semana, porque conferimos à saúde a melhor e a maior das prioridades.
A este Governo pedimos respostas, porque, de facto, é de respostas concretas que esperamos e de que
carecem os portugueses, que, todos os dias, esperam e desesperam por melhores cuidados de saúde e em
tempo útil.
O CDS continuará a atribuir relevância a esta matéria e disso não abdicaremos.
Obrigada pela tolerância, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto, a Mesa registou a inscrição de quatro
Srs. Deputados para pedidos de esclarecimento. Como pretende responder, Sr.ª Deputada?
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Responderei a grupos de dois, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sendo assim, tem a palavra o Sr. Deputado Moisés Ferreira.
O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto, a temática da saúde é,
obviamente, muito importante. Aliás, é por causa disso que o Bloco de Esquerda tem apresentado tantas
propostas nesta área e tem criticado, sempre que é necessário, o Governo e o Partido Socialista.
Mas não podemos deixar de reparar que a Sr.ª Deputada disse da tribuna que há dois anos que o CDS-PP
tem alertado para os problemas na saúde. Talvez esse seja um dos problemas, ou seja, o facto de só há dois
anos ter despertado para os problemas no Serviço Nacional de Saúde.
Como parece que só a partir de agora é que a Sr.ª Deputada Assunção Cristas, que foi membro do Governo
PSD/CDS-PP, despertou para estes problemas, fez uma visita ao hospital de Portalegre e impressionou-se com
a falta de profissionais.
Sr.ª Deputada, o que fez quando esteve no Governo? Quantos profissionais expulsou do Serviço Nacional
de Saúde?
Repare, até se admirou porque os profissionais trabalham horas a mais! Mas não foi o CDS-PP que aumentou
o horário de trabalho e que, ainda hoje, está contra as 35 horas aplicadas aos profissionais da saúde?!
Protestos do CDS-PP.
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Bom, há muita incoerência sobre este assunto.
Mas há uma coisa que temos de dizer, há realmente um assunto sobre o Serviço Nacional de Saúde em que
o CDS-PP tem toda a coerência: o CDS-PP é contra o Serviço Nacional de Saúde; votou contra a sua criação;
esteve ao lado da revisão da lei de bases proposta por um governo de Cavaco Silva, em 1990, uma revisão que
introduziu, por exemplo, as taxas moderadoras e que diz que o Estado deve apoiar o desenvolvimento do setor
privado — veja-se!
Portanto, percebe-se bem o que o CDS-PP quer fazer quando discute saúde e quando diz que hoje vai
organizar uma conferência. Essa conferência, Sr.ª Deputada, terá presente, como um dos conferencistas, um
quadro do Hospital da Luz, Filipe Costa.
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — É um jurista!
O Sr. Moisés Ferreira (BE): — É apresentado como um quadro do Hospital da Luz e que está a estudar o
novo modelo de financiamento para a saúde.
Sr.ª Deputada, que modelo de financiamento é este que tanto agrada aos quadros do Hospital da Luz e aos
privados?
Protestos do CDS-PP.
É aquele modelo de financiamento que o CDS-PP ainda hoje de manhã, na Comissão de Saúde, esteve a
defender, o do favorecimento das parcerias público-privadas, o do favorecimento dos privados? É a tal alteração
que promoveu à Lei da Base da Saúde em 1990, que é o financiamento dos privados?
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado, tem de terminar.
O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Termino, Sr. Presidente.
É esse o novo modelo de financiamento, o de abrir as portas para os privados, continuando a reduzir o
Serviço Nacional de Saúde, como a Sr.ª Deputada e o seu partido fizeram quando estiveram no Governo?
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem agora a palavra o Sr. Deputado António Sales.
O Sr. António Sales (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto, bem-vinda ao debate sobre
sustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde.
Vozes do CDS-PP: — Oh!…
O Sr. António Sales (PS): — Sr.ª Deputada, como se pode ver neste Gráfico 1da evolução da despesa total
do SNS, esta é a expressão paradigmática da redução drástica de financiamento do Governo PSD/CDS, entre
2011 e 2015, e é também a inversão de uma curva, em 2015, bem expressiva daquilo que este Governo tem
feito em questão de financiamento do Serviço Nacional de Saúde.
Aplausos do PS.
No início da Legislatura, Sr.ª Deputada, em novembro de 2015, a herança deixada era francamente
problemática com múltiplas situações de crise operacional ao nível do acesso, do investimento e do
financiamento, em consequência de políticas de estrangulamento e de austeridade, materializadas em forte
redução orçamental.
Assistimos a uma redução drástica do investimento, ao encerramento de serviços, à limitação ou ao
adiamento de inovação terapêutica,…
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A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Cortes cegos!
O Sr. António Sales (PS): — … ao congelamento de admissões de profissionais, a um aumento do número
de cidadãos sem médico de família,…
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Assistimos a um aumento da dívida!
O Sr. António Sales (PS): — … à redução de remunerações de profissionais, à imposição do aumento do
horário de trabalho, sem contrapartidas, a um agravamento de taxas moderadoras e ao agravamento da situação
dos transportes de utentes do Serviço Nacional de Saúde.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. António Sales (PS): — Perante este quadro adverso, o atual Governo reforçou verbas dedicadas à
saúde e permitiu a aceleração de processos de autorização de inovação terapêutica, a admissão de mais 7000
profissionais, a reposição de horários de trabalho, o descongelamento de carreiras, o aumento do número de
cidadãos com médico de família.
A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Custa a reconhecer!
O Sr. António Sales (PS): — Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto, não reconhece que estamos hoje muito
diferentes do que estávamos em novembro de 2015?
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Na dívida, sim!
O Sr. António Sales (PS): — Sr.as e Srs. Deputados, o Partido Socialista e o Governo não estão satisfeitos,
querem mais! Querem compromissos para reafirmar o Serviço Nacional de Saúde,…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. António Sales (PS): — … para promover a renovação, a modernização e a descentralização e para
adaptar uma nova política de recursos humanos.
Deixo-lhe, por isso, uma questão, Sr.ª Deputada: quais são as suas propostas? Não ouvimos propostas
nenhumas! Estamos à espera.
Para além disso, está o CDS disponível para um acordo de base consensual, suprapartidário, sobre uma
nova adequação de enquadramento em saúde, expressa numa nova lei de bases da saúde, que vá ao encontro
de uma nova realidade de transição demográfica…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado, tem de concluir.
O Sr. António Sales (PS): — Termino já, Sr. Presidente.
Como eu estava a dizer, está o CDS disponível para um acordo de base consensual que vá ao encontro de
uma nova realidade de transição demográfica, aplicando fórmulas de financiamento com base nos resultados e
em mecanismos que permitam estabilizar as linhas de despesa em saúde?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto para responder.
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Sr. Presidente, começo por agradecer as perguntas dos Srs.
Deputados Moisés Ferreira e António Sales e por dizer que, de facto, é surpreendente que os senhores, cada
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vez que vimos falar de questões de política, tragam uma cortina de fumo para a ocultação de problemas que
todos os portugueses conhecem. Os senhores estão, de facto, numa posição constrangedora para explicar aos
milhares de portugueses, que hoje estão a viver problemas nas urgências, que isto é uma coisa que nada tem
a ver convosco.
Sr. Deputado Moisés Ferreira, é extraordinário que venha criticar e que a seguir viabilize todas as políticas,…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — E o Orçamento!
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — … inclusivamente o Orçamento, e, desta forma, não é mais do que
conivente com aquilo que está a acontecer. Isto porque estes problemas são com o vosso Governo — repito,
com o Governo que apoiam — e carecem de soluções. Os portugueses, por muito que possam, com certeza,
privilegiar reflexões e propostas, esperam respostas deste Governo, que é governo há dois anos, Sr. Deputado
— repito, há dois anos!
Na saúde, as respostas já eram para ontem! A que é que temos assistido?
Quero lembrar também o Sr. Deputado António Sales de que há dois anos fomos os primeiros nesta Câmara
a responder ao repto do Sr. Presidente da República sobre um pacto para a saúde. O que vai nas outras
bancadas? Um silêncio confrangedor! Repito, silêncio confrangedor!
Aplausos do CDS-PP.
Protestos do Deputado do PS António Sales.
O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Votaram contra a nossa proposta de aumento do investimento!
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Portanto, há dois anos, não foi agora, que o CDS, não estando no
Governo, está…
Aliás, numa altura em que anunciaram que tinha acabado a austeridade, que havia possibilidades de se
modificar tudo, de responder ao descontentamento dos profissionais, o que é que vemos? Não iludam a
realidade! Não conseguem iludir a realidade! Ficam mal na fotografia, Srs. Deputados! Ficam mal na fotografia,
porque o Governo é vosso e as soluções…
Reparem: há contributos que vêm do CDS, o que é que acontece? Os senhores chumbam-nos! Os senhores
chumbam as propostas que são feitas.
O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Quais?!
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Portanto, é irónico, no mínimo.
Sr. Deputado, não tenho nenhum problema em dizer, e é com muito orgulho que o digo, que trabalho na Luz
Saúde, sim, e nada disso belisca a minha honestidade e a minha verticalidade. Desafio-o a demonstrar o
contrário. Mas quero dizer-lhe que nós não temos o padecimento que o senhor tem, nós não pecamos por
preconceito ideológico. Não temos nenhum preconceito ideológico…
Protestos do PS, do BE e do PCP.
O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Não?!
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Não, não temos! Sabe o que nos preocupa? Sabe o que nos
diferencia, Sr. Deputado?
Protestos do Deputado do BE Moisés Ferreira.
Oiça, Sr. Deputado, até ao fim. Sabe o que nos diferencia? Nós preocupamo-nos com as pessoas e com os
resultados; os senhores põem o preconceito ideológico à frente das pessoas e dos resultados.
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Aplausos do CDS-PP.
Já agora queria dizer-lhe que o que disse é, até, uma descortesia para com membros do Governo que o
senhor apoia e que hoje vão estar no painel. O senhor não leu tudo! De facto, tem uma visão desfocada.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Atingiu o seu tempo, Sr.ª Deputada. Faça favor de concluir.
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Portanto, quero dizer-lhe que estão mais pessoas no painel da nossa conferência, nenhuma delas
relacionadas com o CDS, e que será com muito gosto, porque não pecamos, de facto, por esse preconceito
ideológico, que, se quiser, está desde já convidado para estar presente e, assim, dar os seus contributos.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Santos.
O Sr. Miguel Santos (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto, o ponto de situação da
saúde em Portugal e, sobretudo, do SNS é o seguinte: falta de resposta nas urgências; descontrolo financeiro e
duplicação nos atrasos de pagamento; cativações, como instrumento de cortes orçamentais, de forma
encapotada; hospitais à míngua e sem recursos; tempos médios de resposta garantida nas cirurgias
ultrapassados; consultas com listas de espera de anos, dois e quatro anos; investimento ao nível mais baixo de
sempre; conflitualidade crescente no setor; e o menor orçamento da saúde, em percentagem do PIB, desde
2010.
Sr.ª Deputada, nos últimos dois anos foram introduzidos graves desequilíbrios no Serviço Nacional de Saúde
e no sistema de saúde e o resultado está à vista: há uma ausência completa de reformas. De resto, a resposta
do Governo e da maioria para a ausência de reformas é: à reforma dos cuidados de saúde primários, grupo de
trabalho; à reforma hospitalar, grupo de trabalho; à deslocalização do Infarmed para o Porto, grupo de trabalho;
ao modelo de aplicação das taxas moderadoras, grupo de trabalho; à estratégia para a eliminação do VIH/Sida,
grupo de trabalho; ao enquadramento dos médicos dentistas no SNS, grupo de trabalho; à criação de uma
maternidade nova em Coimbra, grupo de trabalho; à avaliação externa das políticas de saúde, Srs. Deputados,
grupo de trabalho; ao hospital central da Madeira, grupo de trabalho; ao desenvolvimento das unidades de
cuidados na comunidade, grupo de trabalho; à reestruturação dos CODU (Centro de Orientação de Doentes
Urgentes) do INEM, uma medida completamente executiva, grupo de trabalho;…
Protestos do Deputado do PS António Sales.
… à reforma da saúde pública nacional, grupo de trabalho;…
Risos.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — É caso para dizer: «falam, falam e eu não os vejo a fazer nada»!
O Sr. Miguel Santos (PSD): — … à luta contra a fraude no SNS, grupo de trabalho; à alteração do período
normal para as 35 horas, grupo de trabalho.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado, atingiu o seu tempo.
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Grupo de trabalho!
Risos.
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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Faça favor de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Miguel Santos (PSD): — Vou terminar Sr. Presidente.
Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto, neste momento, existe uma pronúncia dos ideólogos da esquerda sobre
o quê? As taxas moderadoras! Ainda esta manhã ouvimos o Sr. Ministro afirmar que não mexe nas taxas
moderadoras, elas existem para moderar os consumos. O problema é a resposta dos cuidados de saúde
primários, de resto, há mais de 60% dos portugueses isentos.
Sr.ª Deputada, é sobre esta avaliação que eu peço a sua pronúncia e a pronúncia do CDS.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra, para um pedido de esclarecimento, a Sr.ª Deputada Carla
Cruz.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Sr. Presidente, a Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto, dali de cima, da tribuna,
disse que o CDS tinha uma força. Eu gostava de começar por dizer que o CDS, na anterior Legislatura, decidiu
entrar no Governo e utilizar a força que tinha para destruir o Serviço Nacional de Saúde. Agora, o PCP, não
estando no Governo,…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Ai não está?!
Vozes do CDS-PP: — Ah!…
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — … com a força que tem, apresenta propostas concretas para resolver os
problemas do Serviço Nacional de Saúde, problemas agravados pela atuação do PSD e do CDS-PP no anterior
Governo.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Muito bem!
Protestos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto, enquanto a força que o CDS tinha no anterior
Governo aumentou exponencialmente as taxas moderadoras, o PCP, sem estar no Governo, já contribuiu para
que elas baixassem.
Aplausos do PCP.
Protestos da Deputada do CDS-PP Assunção Cristas.
Enquanto o CDS utilizou a força que tinha, no anterior Governo, para dificultar o acesso dos doentes ao SNS,
encerrando serviços de proximidade, o PCP tem contribuído, apresentando propostas, para a reabertura
daqueles serviços, que o CDS e o PSD encerraram.
Enquanto o CDS, com a força que tinha, impediu que muitos utentes tivessem acesso a medicamentos, o
PCP, com a força que tem, não estando no Governo, tem possibilitado que os doentes acedam aos
medicamentos.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Essa é boa!
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — A Sr.ª Deputada disse que há poucos profissionais no Serviço Nacional de
Saúde. Sr.ª Deputada, com a força que tinha, na altura do Governo PSD/CDS-PP,…
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — O que interessa é agora! É agora!
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A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — … fez com que saíssem, extemporaneamente, profissionais do Serviço Nacional
de Saúde. É verdade que esses profissionais fazem hoje falta, mas isso aconteceu por causa da política do
PSD/CDS-PP que os obrigou a sair porque cortou salários, aumentou o horário de trabalho e diminuiu o número
de profissionais nas equipas.
Protestos de Deputados do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Concluo, Sr. Presidente.
O PCP, com a força que tem e sem estar no Governo, apresentou propostas concretas, que estão hoje no
Orçamento do Estado, e é preciso que se lhes dê, de facto, concretização, pois melhoram a resposta pública e
beneficiam o Serviço Nacional de Saúde.
A pergunta concreta que lhe deixo, Sr.ª Deputada, é: está o CDS disponível para acompanhar aquelas que
são as propostas que o PCP inscreveu no Orçamento do Estado, tais como valorização e reforço dos cuidados
de saúde primários, investimento nos hospitais, contratação de médicos e substituição de trabalhadores com
vínculo através do recurso a empresas de trabalho temporário?
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.ª Deputada, tem mesmo de concluir.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Concluo, Sr. Presidente.
Está, de facto, o CDS disposto e disponível a apoiar esta política?
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra, para responder, a Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto.
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Sr. Presidente, agradeço as questões e comentários dos Srs.
Deputados Miguel Santos e Carla Cruz.
Sr.ª Deputada Carla Cruz, de facto, não resisto a dizer, aliás, como eu disse, daquela tribuna, que os
senhores vão repetindo um mantra de que não é convosco, mas, de facto, são os senhores que viabilizam esta
ação governativa.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Claro!
A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Aprovam o Orçamento!
Protestos do PCP.
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Todo este ruído que fazem, para o resultado ser o de manter estas
políticas, ser o de manter aquilo que nós descrevemos e que os portugueses conhecem, que são factos, e é de
factos que estamos a falar, esta vossa inconsequência e ambiguidade é o que os portugueses não entendem.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente!
O Sr. António Sales (PS): — Os factos são estes, que estão neste gráfico da evolução da despesa total do
SNS.
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Não entendem esta ideia de que à segunda, quarta e sexta querem
apoiar o Governo e de que à terça, quinta e sábado dizem que estas políticas levam a maus resultados. Em que
ficamos, afinal?!
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Protestos do PCP.
Insisto, o Governo é este, e é este Governo que há dois anos e tal não toma decisões, o que, aliás, foi muito
bem ilustrado pelo Sr. Deputado Miguel Santos, depois do que eu disse ali, naquela tribuna, ao dizer que a forma
de governar deste Governo é, de facto, fazer grupos de trabalho!
Protestos do PS e do PCP.
É, de facto, uma inovação, mas não vai ao encontro das necessidades dos portugueses. Mais: quando nos
tinham anunciado que acabou a austeridade, o que vemos, em termos de investimento para a saúde?
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Vemos o investimento nos hospitais.
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Subiu o investimento, face ao PIB? O PIB até aumentou, mas — é
interessante! — não temos aumento no investimento, não passámos dos 5,4%. Relativamente a anos anteriores,
a despesa total com a saúde não aumentou!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Diminuiu!
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Onde estamos, então, em termos de prioridade política, que nem
na percentagem do PIB é refletida?
O que eu queria, aqui, dizer é que é falso que nós estejamos contra o Serviço Nacional de Saúde — é de
uma falácia tremenda! —, é falso que não tenhamos apresentado propostas de consenso, como já aqui disse.
E, no que concerne, Sr.ª Deputada, às taxas moderadoras, convirá dizer, para não fazer demagogia e como
dizem todos aqueles que estudam o sistema de saúde, que não são as taxas moderadoras que inviabilizam o
acesso dos portugueses aos cuidados de saúde.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — São, sim!
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Mais, a senhora, que gosta tanto de ir revisitar o passado para
justificar erros do presente e daqueles que agora têm de tomar decisões, teria de ver que foi precisamente no
anterior Governo, por proposta do Governo, que foi feito o maior alargamento da isenção de taxas.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Sabe porquê? Por causa de uma política de empobrecimento, que levou à
pobreza milhares e milhares de portugueses!
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Sr.ª Deputada, não se exalte.
Portanto, em abono da honestidade intelectual, teria de dizer que as taxas moderadoras não financiam mais
do que 1% a 2% do Serviço Nacional de Saúde e não são, seguramente, elas o cerne desta discussão. Mais,
não são a justificação para os problemas que este Governo está a deixar crescer e que não está a resolver para
os portugueses.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem de concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Portanto, temos, de facto, ineficiência dos serviços públicos, temos um Governo mais preocupado com o
défice e com a dívida, à custa da degradação do Serviço Nacional de Saúde, e temos partidos que o apoiam e
que não fazem mais do que proclamar, mas não buscam soluções.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Não é verdade!
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A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — O CDS tem-nas buscado e tem-nas apresentado.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.ª Deputada, tem mesmo de concluir.
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — A Sr.ª Deputada Carla Cruz está, também, convidada para estar
presente, logo, na nossa conferência.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Diana
Ferreira.
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: É inadiável a tomada de medidas concretas
para responder às muitas necessidades, dificuldades e problemas sentidos pelas pessoas com deficiência e
pelas suas famílias.
O artigo 71.º da nossa Constituição determina que as pessoas com deficiência gozam plenamente dos
direitos constitucionalmente consagrados, devendo o Estado «(…) realizar uma política nacional de prevenção
e de tratamento, reabilitação e integração (…)» das pessoas com deficiência e de apoio às suas famílias, bem
como assumir «(…) o encargo da efetiva realização dos seus direitos (…)» e apoiar organizações das pessoas
com deficiência. Neste artigo, por si só, cabem os direitos fundamentais das pessoas com deficiência e a
responsabilidade do Estado na efetivação dos mesmos.
Existe, também, a lei antidiscriminação, que previne e proíbe a discriminação, «(…) direta ou indireta, em
razão da deficiência, sob todas as suas formas (…)», e que sanciona «(…) a prática de atos que se traduzam
na violação de quaisquer direitos fundamentais, ou na recusa ou condicionamento do exercício de quaisquer
direitos económicos, sociais, culturais ou outros».
Portugal subscreveu e ratificou a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Sendo um dos
Estados Partes, tal obriga o Estado e vincula todos os governos a tomarem medidas que garantam o
cumprimento dos direitos e liberdades fundamentais. Nos 50 artigos da Convenção estão definidas
responsabilidades dos Estados Partes, em matérias como emprego, educação, saúde, proteção social,
habitação, mobilidade, acesso à justiça, acesso à cultura, acesso ao desporto, acesso ao lazer, participação na
vida social e política. Estão ainda definidas responsabilidades específicas quanto aos direitos das mulheres e
das crianças com deficiência.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estes e outros diplomas jurídicos são fundamentais, mas tão fundamental
quanto o que está escrito no papel é a existência de políticas e de medidas concretas que traduzam para a vida
de todos os dias o que é suportado no papel há largos anos.
Todos os dias são negados direitos fundamentais às pessoas com deficiência. Quando se perpetuam as
dificuldades no acesso ao emprego com direitos — tanto no setor público como no privado —, quando a
formação profissional das pessoas com deficiência está aquém do necessário e possível para que esta
corresponda à aquisição de conhecimentos, capacidades e competências para a inclusão na vida ativa, quando
se vão eternizando situações de pobreza e de exclusão social e quando a proteção social é manifestamente
insuficiente são negados direitos fundamentais.
Quando faltam meios humanos, materiais e pedagógicos na escola pública para o devido acompanhamento
e efetiva inclusão das crianças e jovens com necessidades educativas especiais, quando persistem dificuldades
no acesso a centros de saúde, a cuidados hospitalares, a produtos de apoio, a terapias essenciais ao
acompanhamento, a medicamentos e à reabilitação, quando perduram graves problemas de mobilidade — seja
nas barreiras arquitetónicas, que impedem a circulação nos espaços, na via pública e no acesso a edifícios
públicos, seja no acesso a transportes públicos e coletivos, com casos de escandalosa discriminação —,
quando, 20 anos depois da consagração da língua gestual portuguesa na Constituição, perduram obstáculos
comunicacionais, como a falta de intérpretes de língua gestual nos serviços públicos ou a necessidade de
melhores condições de acessibilidade televisiva para as pessoas surdas, limitando e impedindo o acesso a
serviços públicos e à informação, ou quando não estão garantidas condições de igualdade no acesso à cultura,
ao desporto, ao lazer, à participação na vida social e política são negados direitos fundamentais.
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Quando não são devidamente valorizados os profissionais que trabalham nesta área são negados direitos
fundamentais, tanto aos profissionais como às pessoas com deficiência.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A dignidade na vida das pessoas com deficiência é inseparável do
cumprimento destes direitos.
O PCP tem intervindo, por diversas vezes, com propostas concretas. Fomos o primeiro partido a intervir sobre
a vida independente, aqui, na Assembleia da República.
Apresentámos propostas para a valorização da formação profissional das pessoas com deficiência,
entendendo que importa garantir o seu acesso a todo o tipo e a todos os níveis das ações de formação
profissional disponíveis, sendo este um relevante princípio que poderá garantir a igualdade de direitos e de
oportunidades, nomeadamente à inclusão na vida ativa.
Apresentámos propostas para a eliminação das barreiras arquitetónicas, para um caminho de equiparação
dos atletas paralímpicos aos olímpicos, para a criação de uma bolsa de intérpretes de língua gestual para os
serviços públicos e de valorização da língua gestual portuguesa.
Interviemos sobre a necessidade de se garantirem melhores condições de acesso à prestação social para a
inclusão.
Defendemos e apresentámos propostas sobre o atestado multiusos e a necessidade da sua gratuitidade e o
reforço de meios humanos, materiais e pedagógicos no âmbito da educação especial.
Apresentámos propostas para melhor proteção social dos trabalhadores sinistrados do trabalho.
Intervenção que continuaremos a fazer e que continuaremos a assumir, apresentando soluções e apontando
caminhos para que seja cumprido o tanto que está consagrado em muitos documentos, sabendo que a
participação ativa das pessoas com deficiência, das suas famílias e das suas organizações representativas é
imprescindível para novas conquistas.
A melhoria das suas condições de vida e o cumprimento dos seus direitos exigem medidas transversais e
articuladas. Exigem que o Estado não se demita das suas responsabilidades — consagradas na Constituição,
previstas em lei e plasmadas na Convenção, que foi subscrita e ratificada pelo Estado português e que, por isso
mesmo, vincula todos os governos a agirem para o seu cumprimento.
O PCP cá estará, como sempre tem estado, para que se construa não um caminho de assistencialismo, que
representa um profundo retrocesso social, mas, sim, um caminho de progresso, um caminho de justiça social,
que é inseparável da concretização de uma vida digna, de uma vida autónoma e independente, direito inalienável
de todos e de cada um.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — A Mesa regista a inscrição de quatro Srs. Deputados para pedidos de
esclarecimento.
Como deseja responder, Sr.ª Deputada?
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Dois a dois, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sendo assim, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Falcato.
O Sr. Jorge Falcato Simões (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Diana Ferreira, consideramos que há e
houve alguns efetivos avanços nas políticas na área da deficiência. No entanto, também consideramos que há
atitudes contraditórias nestas políticas, que decorrem do facto de não existir uma estratégia para a deficiência
que, por acaso, o Comité de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência instou o Governo português a
apresentar até abril do ano passado. Já passaram nove meses e continuamos sem uma estratégia para a
deficiência.
Penso que na sua intervenção ficou clara a falta que faz esta estratégia para articular todas as intervenções
necessárias nas diversas áreas em que é preciso intervir.
A demonstração desta falta de estratégia está no facto de, na atribuição da prestação social para a inclusão,
estar a ser exigido que sejam interpostos processos de interdição aos destinatários desta prestação. Pessoas
com deficiência intelectual ou multideficiência grave, a quem recusam abrir conta bancária, vão sendo
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empurradas para uma situação de inabilitação, de interdição, numa altura em que estamos num processo de
revisão do Código Civil exatamente para alterar o sistema de interdição, que é completamente contrário ao que
está previsto na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, nomeadamente nos artigos 12.º e
28.º. Estamos a praticar uma violação da Convenção.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Falcato Simões (BE): — Vou terminar, Sr. Presidente.
O que quero saber é qual é a posição do Partido Comunista Português face a esta clara violação dos direitos
das pessoas com deficiência e à necessidade de existência de uma estratégia para a deficiência.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria da Luz Rosinha para pedir
esclarecimentos.
A Sr.ª Maria da Luz Rosinha (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, muito boa tarde a todos e a
todas.
Saúdo, desde logo, o tema escolhido pelo PCP para a declaração política de hoje, através da Sr.ª Deputada
Diana Ferreira, a deficiência, que, para o Partido Socialista, é uma preocupação de todos os dias. E não é uma
simples preocupação, é, antes, uma preocupação traduzida em muitas ações, em muitas decisões que têm
melhorado a vida de milhares de pessoas portadoras de deficiência ou incapacidade. E porque, na realidade,
há quem pareça não ter memória para todo o trabalho feito, eu gostaria de lembrar, desde logo, algumas das
decisões que, efetivamente, se traduziram na tal melhoria.
Aumentou-se a bonificação para portadores de deficiência no abono de família; aumentou-se o subsídio para
assistência à terceira pessoa; aumentou-se a dedução específica, em sede de IRS, para agregados com
ascendentes ou descendentes com deficiência; criou-se o Balcão de Inclusão; criou-se a prestação social de
inclusão, que tem três objetivos fundamentais, desde logo, melhorar a proteção social para as pessoas com
deficiência ou incapacidade, promover o combate à pobreza destas mesmas pessoas e constituir-se como um
incentivo à participação laboral e à autonomização.
O Partido Socialista tem dito, sucessivamente, que a tarefa não está terminada e que não estará enquanto
houver uma única pessoa com deficiência ou incapacidade que não esteja incluída na sociedade.
Vozes do PS: — Muito bem!
A Sr.ª Maria da Luz Rosinha (PS): — Nesse sentido, Sr.ª Deputada, quero ainda lembrar-lhe que neste
momento — e recordo, até, o que o Sr. Deputado Jorge Falcato acabou de referir, a Convenção sobre os Direitos
das Pessoas com Deficiência — se está a trabalhar no Mecanismo da Monitorização dos Direitos das Pessoas
com Deficiência, no âmbito dessa mesma Convenção.
Acredito, este é um processo que envolve todas as forças políticas com assento na Assembleia da República
e, por isso, é também um compromisso de todos nós para todos os dias.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Diana Ferreira.
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente, agradeço aos Srs. Deputados Jorge Falcato e Maria da Luz
Rosinha as questões que colocaram e gostaria, desde já, afirmar que foi feito, efetivamente, ao longo de vários
anos, um caminho em que se foram conseguindo alcançar direitos para as pessoas com deficiência, um caminho
que também não está desligado daquela que foi a luta destas pessoas, das suas famílias e das suas
organizações representativas.
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Pese embora esse caminho, que foi feito ao longo de vários anos, e também avanços que foram conseguidos
nos últimos anos, designadamente no reforço da proteção social — especialmente depois de anos, em que
durante o Governo PSD/CDS se cortou brutalmente nas proteções sociais —, o que é facto é que esses avanços
e esse caminho estão ainda muito longe de responder às necessidades e aos problemas sentidos todos os dias
pelas pessoas com deficiência.
O reforço que existe na proteção social é insuficiente para responder a um conjunto de necessidades que
persistem todos os dias na vida das pessoas com deficiência e, naturalmente, o que importa garantir, o caminho
que importa fazer é o que aprofunde essa proteção social mas que não esteja desligado da garantia de outros
direitos fundamentais, como é o direito ao emprego, designadamente no que se refere a uma intervenção direta
no setor público mas também a tomada de medidas que garantam o emprego no setor privado.
Relativamente à prestação social para a inclusão — e o PCP teve uma intervenção concreta que alargou o
alcance desta prestação —, o que sempre dissemos é que esta prestação social em nenhum momento poderia
significar menos proteção social ou menos condições e direitos para as pessoas com deficiência. Por isso,
entendemos que não pode haver nenhum elemento, nem qualquer obstáculo, que esteja a servir de impedimento
no acesso à prestação social para a inclusão. Esta prestação está prevista num diploma que já está emitido e
que tem um conjunto de critérios de acesso, critérios esses que, por insistência do PCP, foram alargados,
abarcando mais pessoas com deficiência na atribuição dessa prestação social, uma intervenção que fizemos
durante a discussão do Orçamento do Estado para 2018. Naturalmente, entendemos que não pode haver
nenhum motivo, nem pode haver instrumentos que impeçam o acesso das pessoas com deficiência à prestação
social para a inclusão.
Queria ainda reforçar a necessidade de uma intervenção que garanta, além do direito ao emprego, o direito
à educação e à saúde, aliás, constitucionalmente consagrados, pois o cumprimento desses direitos é também
condição para a melhoria das condições de vida das pessoas com deficiência.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Filipe
Anacoreta Correia.
O Sr. Filipe Anacoreta Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Diana Ferreira, antes de mais,
quero felicitar a si, e ao Grupo Parlamentar do PCP, por trazer este assunto à ordem do dia. A última vez que
no Plenário estivemos com um dossier importante sobre a matéria das políticas para a deficiência foi, como
sabe, por iniciativa do CDS, e algumas delas estavam prontas a ser votadas no final do ano passado,
nomeadamente medidas ligadas às licenças laborais e também aos apoios, à bonificação para deficientes das
Forças Armadas, medidas que o PCP votou favoravelmente na generalidade, mas, no final do ano passado,
suspendemos a votação para as remeter para este ano. Esperamos que o PCP mantenha a posição que teve
aquando da votação na generalidade, para que possamos, finalmente este ano, avançar com essa matéria.
Queria dizer-lhe, Sr.ª Deputada, que considero que o agendamento desta matéria é da maior importância.
Como sabe, na semana passada tivemos a apresentação na Assembleia da República do relatório do
Mecanismo previsto pela Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que citou, e que é, sem
dúvida nenhuma, um instrumento incontornável e da maior importância para que possamos trabalhar na
continuidade sobre a fiscalização do cumprimento do Estado português num conjunto de matérias que elencou.
Sr.ª Deputada, creio que nós, aqui, na Assembleia da República, temos de ter a capacidade de assumir a
responsabilidade e de dizer que chegou o momento de, finalmente, dotar esse Mecanismo de dotações,
designadamente orçamentais, financeiras, que sejam adequadas ao seu funcionamento. Esta matéria tem sido
repetida. Como sabe, o Sr. Deputado Jorge Falcato é membro do Mecanismo e também por essa via trouxe à
nossa discussão essa possibilidade, e creio que é agora a altura.
O CDS espera que, em vez de estarmos sempre a invocar para os outros, consigamos realmente
implementar esta medida e o façamos com a maior urgência e com a dotação orçamental que, efetivamente, é
exigida e necessária.
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Sr. Presidente, vou terminar, dizendo apenas que é importante que superemos a questão partidária e a
discussão partidária. Sabemos que o PCP inscreveu no Orçamento do Estado tudo o que considerou essencial.
Tudo o que foi essencial para a sua votação foi inscrito no Orçamento do Estado…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.
O Sr. Filipe Anacoreta Correia (CDS-PP): — … e o resto não foi.
Portanto, se não foi, temos nós, agora, de tentar ir além das lacunas e lutar aqui, na Assembleia da República,
para ultrapassar as barreiras àquilo que se impõe para as pessoas com deficiência.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sandra
Pereira.
A Sr.ª Sandra Pereira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a Convenção das Nações Unidas
sobre o Direito das Pessoas com Deficiência, que foi adotada em 2006 e ratificada pelo Estado português
exatamente em 2009, impõe-nos o dever coletivo, enquanto sociedade, de garantir às pessoas com deficiência
ou incapacidade a plena fruição de todos os direitos, tal qual os demais cidadãos. E o PSD, devo aqui reafirmar,
temo-lo dito várias vezes, está absolutamente empenhado na construção dessa sociedade.
Por isso, quero saudar o Partido Comunista Português por ter trazido esta matéria a debate e quero, uma
vez mais, reiterar que, para o Partido Social Democrata, estas questões constituem sempre uma reserva de
unidade e estamos absolutamente empenhados em encontrar consensos de forma a dar respostas a estas
pessoas que delas necessitam. Esse é o nosso objetivo.
A Sr.ª Maria das Mercês Soares (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Sandra Pereira (PSD): — A Sr.ª Deputada Diana Ferreira falou, e muito bem, de alguns progressos
nesta área, que o PSD também tem registado, mas há um longo caminho a percorrer de que não nos podemos
esquecer. E foi a Sr.ª Deputada que disse que o reforço da proteção social é ainda insuficiente para responder
às inúmeras necessidades destas pessoas.
O Partido Comunista Português não se pode escudar, porque agora também é Governo e tem a obrigação
de responder por isso, por tudo aquilo que falta fazer. Por isso, pergunto-lhe, Sr.ª Deputada, relativamente à
qualificação e valorização profissional das pessoas com deficiência, se não considera que há um longo caminho
a percorrer e se não considera que esta é que é a alavanca e o motor de ação da verdadeira integração das
pessoas com deficiência.
Faço-lhe a pergunta porque o PCP — bom, hoje é quarta-feira, normalmente o PCP só é do Governo à sexta-
feira e hoje está aqui a fazer o papel que é do Governo —…
Protestos dos Deputados do PCP Carla Cruz e Paulo Sá.
… responde perante o País como um partido que é do Governo, e tem de responder também pelo que ainda
não foi feito no âmbito da lei das acessibilidades e no âmbito das quotas de emprego público para as pessoas
com deficiência.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Sandra Pereira (PSD): — Portanto, Sr.ª Deputada, o Partido Comunista Português também tem
responsabilidades e também responde perante o País pelo que não foi feito.
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Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Diana Ferreira.
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente, agradeço também as questões da Sr.ª Deputada Sandra
Pereira e do Sr. Deputado Filipe Anacoreta Correia e gostaria de começar por dizer que estas palavras de
preocupação, que foram enumeradas nestas duas intervenções, contrastam com a ação concreta do PSD e o
CDS quando estiveram no governo.
Isto porque os senhores, quando estiveram no governo, o que fizeram, efetivamente, foi cortar nas prestações
sociais, foi cortar na educação especial, limitando e impedindo, até, o acesso de crianças e jovens com
necessidades educativas especiais a uma plena educação inclusiva. O que os senhores fizeram foi encerrar
serviços públicos, o que, naturalmente, prejudicando os trabalhadores e a população em geral, prejudicou de
forma mais agravada grupos sociais especialmente fragilizados, como é o caso das pessoas com deficiência.
Esta foi a vossa ação, é uma ação que fala por si sobre a vossa preocupação com as pessoas com deficiência,
porque foi efetivamente isto que fizeram, quando estiveram no governo.
O PCP, não estando no Governo, já conseguiu apresentar um conjunto muito significativo de propostas que
vão, exatamente, num caminho de progresso e de justiça social. Aliás, gostaria de relembrar que o PCP, tendo
sido o primeiro partido a apresentar, nesta Casa, uma proposta para um projeto-piloto de vida independente, viu
esse projeto rejeitado exatamente pelo PSD e pelo CDS.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Isso é que demonstra muito bem a preocupação que o PSD e o CDS têm
com a garantia de uma vida autónoma e independente para as pessoas com deficiência.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — As boas palavras, Sr.ª Deputada, não podem esconder os atos que
praticaram quando estiveram no governo, nem os ataques que fizeram aos direitos das pessoas com deficiência.
Aplausos do PCP.
Protestos das Deputadas do PSD Maria das Mercês Soares e Sandra Pereira.
Sr.ª Deputada, não estando no Governo, o PCP apresentou propostas sobre a valorização da formação
profissional das pessoas com deficiência, apresentou propostas em que dizia que era necessário avaliar a
formação profissional das pessoas com deficiência e construir respostas para que essa formação profissional,
efetivamente, desse origem a um caminho de integração na vida ativa das pessoas com deficiência, de maneira
a garantir aquele que é um direito fundamental na vida de cada um e também na vida das pessoas com
deficiência, que é o direito ao emprego, ao emprego com direitos.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sabemos que este há de ser um conceito estranho para os senhores, porque
o que fizeram, quando estiveram no governo, durante quatro anos, foi exatamente atropelar direitos laborais.
A Sr.ª Maria das Mercês Soares (PSD): — Os senhores são uns santos!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Pode crer! Se enganássemos as pessoas como os senhores enganaram…!
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A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Mas fizemos mais, Sr.ª Deputada, consagrámos em Orçamento do Estado
propostas para a eliminação das barreiras arquitetónicas. Consagrámos também em Orçamento do Estado
propostas para a equiparação dos atletas paralímpicos aos atletas olímpicos.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Também conseguimos intervir, como já disse, para garantir melhores
condições no acesso à prestação social para a inclusão. Interviemos sobre a gratuitidade do atestado multiusos,
Sr.ª Deputada, para que, efetivamente, todas as pessoas a ele possam ter acesso, e propusemos também que
todos os documentos legais que existem neste momento possam ser considerados para atestar a incapacidade
das pessoas com deficiência.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Propusemos a isenção de custas para os sinistrados do trabalho, Sr.ª
Deputada.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Termino, Sr. Presidente.
O património de intervenção institucional do PCP e também o património de intervenção ativa e de luta que
o PCP tem nesta matéria falam por si e dizem exatamente de que lado é que estamos: estamos do lado da
defesa dos direitos fundamentais das pessoas com deficiência.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida
Mano.
A Sr.ª Margarida Mano (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O conhecimento é a base do
desenvolvimento moderno.
Criar valor a partir do conhecimento significa melhores condições de vida para a população atual e para as
gerações futuras. Criar valor a partir do conhecimento significa acrescentar competitividade à economia. Criar
valor a partir do conhecimento significa desenvolvimento para Portugal, significa também saber responder a
desafios societais globais, conforme nos refere o relatório European Innovation Scoreboard 2017, que passo a
citar: «Em tempos de profunda transformação tecnológica e societal, a competitividade da economia europeia e
o bem-estar dos cidadãos europeus depende — mais do que nunca — da capacidade da indústria de
desenvolver e comercializar com sucesso soluções inovadoras». Este relatório serve de alerta: na Europa, o
crescimento da inovação é apático e Portugal, País de inovação moderada, está abaixo da média europeia. Este
é o contexto e esta é a situação de partida que urge alterar.
O Partido Social Democrata apresentou, oportunamente, seis iniciativas legislativas relativas ao
conhecimento e à criação de valor e está a realizar, neste momento, em diferentes distritos do País, um roteiro
por instituições de ensino superior, instituições de interface, outras entidades públicas e empresas. Há, no
ecossistema da inovação nacional, exemplos que nos devem deixar orgulhosos do caminho percorrido,
exemplos de processos colaborativos extraordinários, de cocriação entre a academia e o setor empresarial, que
trazem para Portugal investimento, emprego qualificado, conhecimento e riqueza, exemplos que nos fazem
acreditar no caminho que sempre temos defendido.
De resto, o roteiro tem reforçado a relevância, o mérito e a necessidade das propostas apresentas pelo PSD,
no que toca à valorização do conhecimento, e encontramos eco relativamente ao que propusemos sobre
propriedade industrial, emprego de doutorados, carreira docente e aproximação entre academia e economia. O
reduzido número de doutorados no setor privado ou a insuficiente relevância dada à propriedade industrial são
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sinais de que as empresas ainda não têm a capacidade de valorização do investimento e do desenvolvimento
que o futuro requer, mas são também desafios para os quais as lideranças do sistema científico estão despertas.
Infelizmente, o contacto direto com os atores do desenvolvimento revela, e confirma também, a ausência de
uma ação governativa orientada para o sucesso da valorização do conhecimento; revela a preocupação com o
desinvestimento no ensino superior e na ciência, sendo que, em 2016, a despesa total desceu 1,3%, com quebra
nas despesas de capital e funcionamento, o que põe em causa a investigação de ponta; revela que, apesar das
sucessivas e sempre adiadas garantias, o Governo continua sem disponibilizar às instituições de ensino superior
as verbas relativas a 2017, não tendo cumprido, nesse ano, um contrato assinado em 2016 pelo Ministro da
Ciência, na presença do Ministro das Finanças e do Primeiro-Ministro; revela que a FCT, a Fundação para a
Ciência e a Tecnologia, também ainda não transferiu as verbas de emprego científico para as instituições, não
as contratualizou, impossibilitando, em muitos casos, a concretização da abertura de concursos.
Mas esse contacto com os atores do desenvolvimento revela também que, ao nível do planeamento e das
regiões, nos deparamos com os problemas decorrentes da política de excessivo centralismo na gestão de fundos
que tem caraterizado este Governo, com uma completa descoordenação entre tutelas, como no caso do
mapeamento das infraestruturas científicas e tecnológicas, e incompetência na política de gestão, que
determinam que, relativamente ao atual quadro comunitário, e mais de dois anos volvidos, as CCDR (comissões
de coordenação e desenvolvimento regional) tenham gastado na ciência zero, ou valores próximos de zero.
Esse contacto revela também, na economia, uma preocupante não adesão do discurso do Governo à
realidade, concretizada, por exemplo, no anúncio de apoios não sentidos no terreno pelas empresas e entidades
de interface. O Programa INTERFACE, do Governo, não chegou ao terreno e, em demasiadas situações,
ouvimos das lideranças científicas e tecnológicas que esse Programa exclui as suas organizações por razões
incompreensíveis ou, pelo menos, não explicitadas.
Esta é a realidade, estes são os factos que não podem ser negados. O Partido Social Democrata não se
acomoda e sabe que, para assegurar o desenvolvimento do País, é absolutamente essencial cimentar a nossa
posição em matérias científicas, tecnológicas e de justiça social, esta última obtida através de grandes
conquistas, muitas já neste século. As grandes transformações que advêm da evolução do conhecimento são
um desafio incontornável e representam uma oportunidade para países como Portugal, que têm talentos e
competências que são reconhecidos a nível internacional.
Ao colocar na agenda parlamentar a valorização do conhecimento, o PSD luta por um modelo de
desenvolvimento que, acarinhando o Made in Portugal, ambiciona o invented in Portugal, um modelo de
desenvolvimento que, incentivando o fazer em Portugal, quer que Portugal seja visto como um país inteligente
no mundo.
É da responsabilidade do Governo assegurar que Portugal está preparado e, para isso, não basta dizer que
vai mobilizar, que vai criar sinergias ou lançar programas, é preciso assegurar que em Portugal se continuará a
fazer investigação de ponta, é preciso assegurar que as experiências boas que os portugueses conseguiram
alcançar, mesmo em tempos difíceis, se multiplicarão.
O Partido Social Democrata considera que o Governo não pode desperdiçar o momento. É preciso olhar para
este ciclo de uma forma integrada e, sobretudo, tem de se promover a valorização económica do conhecimento,
objetivo para o qual é essencial saber e querer chamar empresas e empresários, como principais dinamizadores
do tecido económico e da produção de riqueza.
Portugal tem de assumir, relativamente à valorização do conhecimento, uma visão que assegure o futuro
geracional através de claras e sustentáveis vantagens de impacto social, económico e de melhoria de vida das
pessoas.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Esgotou o seu tempo, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Margarida Mano (PSD): — Termino, Sr. Presidente, dizendo que Portugal pode contar com o PSD
para construir o futuro, pena é que não esteja a poder contar com este Governo.
Aplausos do PSD.
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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.ª Deputada, a Mesa regista a inscrição de quatro Srs. Deputados para
pedir esclarecimentos.
Como deseja responder?
A Sr.ª Margarida Mano (PSD): — Dois a dois, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Luís Monteiro.
O Sr. Luís Monteiro (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Margarida Mano, antes de mais, quero
congratular a bancada parlamentar do PSD por ter trazido o tema da ciência e da relação da produção científica
e da tecnologia com o mundo empresarial, porque abre um debate importante sobre o papel da academia na
sociedade.
Mas foi justamente ao abrigo desta narrativa empresarialista, que assiste à proposta da direita, que, há
poucos meses, o PSD deu entrada no Parlamento de dois projetos de lei que alteram os estatutos da carreira
docente universitária e do politécnico. Na verdade, com essas propostas, o PSD não faz mais do que pressionar
os docentes do ensino superior a trabalhar de borla nas empresas, tudo isto com a justificação de que era preciso
aproximar a produção científica e tecnológica do mundo empresarial e industrial. Essas propostas não passam
de um insulto aos profissionais e é até curioso que o PSD, tão defensor da concertação social, não tenha
conseguido formular uma proposta que encontrasse acolhimento das organizações representativas dos
trabalhadores.
Mais: não são só os sindicatos que rejeitam estas propostas de alteração ao estatuto da carreira docente. O
próprio CNE, Conselho Nacional de Educação, através dos seus pareceres, diz o mesmo em relação a cada
uma das propostas, e passo a citar: «(…) esta proposta de alteração não deve ser acolhida». Ora, esses
pareceres foram aprovados no Conselho Nacional de Educação, com os votos favoráveis — pasme-se! — dos
conselheiros indicados pelo PSD. Ou seja, é o próprio PSD que, no Conselho Nacional de Educação, admite
que a sua produção legislativa no Parlamento fica muito aquém das expectativas.
Sr.ª Deputada Margarida Mano, para a sua bancada, na verdade, tudo é empresariável: o direito ao
conhecimento é um mercado, o direito ao trabalho é um mercado — e, de preferência, um mercado que deve
ser explorado —, em geral, a universidade é, para o PSD, uma empresa e uma fábrica de precários e de
trabalhadores que devem trabalhar à borla nas empresas.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Monteiro (BE): — O Bloco rejeita essa visão, o Conselho Nacional de Educação rejeita essa
visão.
O PSD mantém as suas propostas e tenciona abrir uma guerra com docentes e investigadores?
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra o Sr. Deputado Porfírio Silva para pedir esclarecimentos.
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Margarida Mano, valorizar o conhecimento? Claro!
A qualificação dos portugueses, a educação em todos os níveis de ensino, a ciência e o conhecimento são
questões em que o Partido Socialista também está empenhado. Sendo questões que não pulsam ao ritmo dos
anos letivos, nem sequer dos próprios anos, mas ao ritmo das gerações, põem uma questão específica no que
diz respeito à relação entre maioria e minoria, e queria deixá-lo claro.
Estamos confortáveis nesta maioria parlamentar, e estamos confortáveis porque este Governo e esta maioria
da esquerda plural têm feito bem ao País, têm feito progredir o País e, portanto, como tem sido dito, não estamos
à procura de outros parceiros. Não obstante, nestas matérias estruturais, estruturantes, queremos ter a
possibilidade de construir convergências produtivas também com os partidos da oposição e, portanto, em
matéria de conhecimento, estamos disponíveis para esse trabalho.
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Mas, Sr.ª Deputada, o PSD vir falar de incompetência em matéria de gestão de fundos comunitários só pode
ser uma tentativa de esconjurar a pegada desastrosa que deixaram nessa matéria.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Ainda nesta manhã, na Comissão de Economia, tivemos oportunidade, acerca
de outra matéria educativa, de explicitar as responsabilidades do PSD e também do CDS nesta matéria. Mas
em matéria de valorização do conhecimento, os senhores tiraram do escopo dos fundos comunitários, por
exemplo, o emprego científico, o que tem problematizado, tornado muito mais difícil uma série de ações,…
O Sr. Carlos César (PS): — Muito bem!
O Sr. Porfírio Silva (PS): — … que podiam ser mais facilmente e melhor financiadas do que são, por vossa
responsabilidade.
Sr.ª Deputada, o Sr. Deputado Luís Monteiro já mencionou aqui o parecer que o Conselho Nacional de
Educação deu, quase por unanimidade, sobre as vossas propostas, a última vez que vieram aqui falar. Lembro-
me bem daquilo que disse sobre as vossas propostas, mas, Sr.ª Deputada, o Conselho Nacional de Educação
conseguiu ser ainda mais demolidor para com as vossas propostas do que nós aqui tínhamos sido.
Francamente! Nós estamos dispostos a acolher, a discutir, a procurar convergências, mas é preciso vir com
propostas estruturadas, é preciso vir com propostas pensadas, é preciso vir com propostas que não sejam meros
anúncios, que não sejam apenas propostas desgarradas.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Concluo, Sr. Presidente.
Sr.ª Deputada, até porque está a ser concluída e vai ser apresentada proximamente a avaliação da OCDE a
estes sistemas que têm a ver com a valorização do conhecimento, a minha pergunta é muito simples: o PSD vai
continuar a apresentar apenas propostas desgarradas e pontuais que mereçam a rejeição de todos os
intervenientes, de todos os atores, de todos os agentes, como aconteceu na última vez que aqui vieram, ou vão
tentar alguma abordagem mais construtiva e mais abrangente?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Mano.
A Sr.ª Margarida Mano (PSD): — Sr. Presidente, começo por agradecer aos Srs. Deputados Luís Monteiro
e Porfírio Silva a dinâmica acesa que colocaram nas suas intervenções e que me permitirá, seguramente, afirmar
aquilo que o PSD pensa sobre estas matérias.
De facto, Sr. Deputado Luís Monteiro, não temos uma visão de uma sociedade empresarialista, como não
temos uma visão de uma sociedade estatizada.
O Sr. Luís Monteiro (BE): — Não têm nenhuma visão. Ponto! Eu registo!
A Sr.ª Margarida Mano (PSD): — Temos uma visão de uma sociedade real, onde existem empresas, onde
existe Estado, onde existem vários desafios societais e onde a democracia faz leituras. E a nossa leitura é a de
que instituições de ensino superior, instituições de interface, todo o sistema científico, o mercado e a
sociedade,…
O Sr. Luís Monteiro (BE): — Devem trabalhar à borla!
A Sr.ª Margarida Mano (PSD): — … também nos seus anseios de justiça social, são fundamentais, o que
significa que não há um triple helix, há um quadruple helix, e nós estamos aqui para ajudar.
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O Sr. Luís Monteiro (BE): — Devem trabalhar à borla!
A Sr.ª Margarida Mano (PSD): — Sr. Deputado, não há trabalho à borla, há trabalho pago naturalmente, há
uma missão — e aqui fazia a ponte com o que o Sr. Deputado Porfírio Silva disse — das instituições de ensino
superior, que é tripla: é uma missão de ensino, é uma missão de investigação e é uma missão de transferência
de conhecimento, de valorização, o que quisermos chamar-lhe. E nessa tripla missão é claro para o PSD — e
disso o PSD não vai abdicar, encontrando eco, ao contrário daquilo que dizem, em muitas instituições e em
muitos atores do sistema — que, hoje, um docente pode ter um perfil diferenciado em função das três missões,
naturalmente contratualizado com o Estado.
O Sr. Luís Monteiro (BE): — O perfil era trabalhar à borla!
A Sr.ª Margarida Mano (PSD): — Relativamente à gestão dos fundos comunitários, uma vez que o referiu,
gostava de dizer que é muito curioso que digam isso. Normalmente, olham para 2015 e para antes de 2015 —
esquecem o contexto e olham só para as medidas —, mas não há exemplo mais caricato do que se diz e do
que se faz do que a gestão dos fundos comunitários com este Governo. O Governo fala em descentralização,
mas, do ponto de vista de gestão de fundos comunitários, centralizou tudo! Por exemplo, um aviso de um
programa operacional regional, que antes era decidido pelo respetivo presidente da CCDR (comissão de
coordenação e desenvolvimento regional), hoje tem de ir a uma comissão interministerial coordenadora, o que
demora meses.
Portanto, nós olhamos para o presente e para o futuro, não olhamos para o passado, mas, se olharmos para
o passado, olhamos para os últimos dois anos.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Rita
Bessa, do CDS-PP.
A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, começo por saudar o PSD por ter trazido este tema a
debate — aliás, numa boa tradição, já trouxe este tema a debate por diversas vezes.
A transferência de conhecimento e a sua transformação em valor pressupõe que antes disso haja
investimento na produção de conhecimento, seja produção em ciência fundamental, seja em ciência aplicada.
Apesar de o Governo do PS definir-se como o grande promotor da ciência — e também aqui ter virado a
página —, verificamos que a FCT, que é o principal instrumento de financiamento público da ciência, executou
em 2016 menos verbas do que na página anterior, em 2015, e tememos bem que em 2017 a situação seja
idêntica, ou ainda pior.
Portanto, há vários efeitos que decorrem desta falta de investimento em ciência, apesar de ser propagado o
contrário.
Gostaria de me situar concretamente num, que diz respeito aos investigadores FCT. Como sabem, são
investigadores de excelência, reconhecidos internacionalmente, mas cujos contratos estão a acabar — alguns
já acabaram e outros vão acabar no 1.º trimestre — pela única razão de que o Governo não criou condições
para a sua continuação do trabalho em Portugal. Portanto, estes melhores investigadores portugueses não têm
perspetivas de se manterem cá, não têm lugares, não têm carreira e não têm verbas para executar os seus
projetos.
Daqui decorre uma pergunta que gostaria de dirigir à Sr.ª Deputada Margarida Mano: considera que, nestes
termos e com estes exemplos, a política do Governo estabelece as condições básicas, as condições mínimas
para a garantia da inovação e para esta transferência de conhecimento? Considera que o PS oferece alguma
credibilidade para que se apresente como o grande promotor da ciência em Portugal?
Aplausos do CDS-PP.
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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana
Mesquita, do PCP.
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Margarida Mano, a
propósito da discussão que o PSD trouxe hoje, as expressões «sociedade do conhecimento» ou «criação de
valor a partir do conhecimento» são muitas vezes usadas com o propósito da promoção de uma área de negócio
muito apetecível aos grupos privados, que põem em causa muitas vezes ou servem-se do interesse público
geral, perdendo recursos nacionais.
A verdade é que nesta discussão é preciso relembrar aquilo que foi a opção política do Governo PSD/CDS,
porque o paradigma que esse Governo tentou impor foi sempre o de subordinar a produção científica e
tecnológica ao mercado privado, proporcionando a chamada «transferência do conhecimento» ao mercado
privado, disponibilizando a investigação e desenvolvimento nacional aos grupos económicos e financeiros para
que potenciassem os seus lucros à custa do Sistema Científico e Tecnológico Nacional, bem como do
investimento público. Esta foi a prática política que puseram em cima da mesa. Até porque, conforme a Sr.ª
Deputada Margarida Mano já reconheceu, o esforço privado nesta matéria é residual — e, acrescentamos, foi
sempre residual, porque era tão mais fácil aproveitar os recursos públicos, havendo quem lhes pudesse prestar
a mão nesse sentido.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Aliás, a visão que fazia parte inseparável do caminho de destruição das
funções sociais do Estado e de concentração de meios públicos nos privados, ao arrepio das necessidades de
desenvolvimento do País, foi exatamente o caminho apontado pelo PSD no Governo e agora também nos
projetos que trouxe à discussão e que novamente aqui retoma.
O que o PCP propõe é uma política alternativa que assente no incremento do investimento público e privado
e uma viragem na política de formação, investigação e desenvolvimento tecnológico. Defendemos que é preciso
partir das capacidades e do potencial científico e técnico existentes, articular as diversas dimensões do
conhecimento, da investigação, do desenvolvimento, da inovação com a indústria e as demais necessidades do
País.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Mas, quando falamos de valorização do conhecimento e articulação com o setor produtivo, temos de
perguntar, então, porque é que o PSD agora está tão aparentemente preocupado, porque quando o PCP, na
passada Legislatura, propôs medidas para o desenvolvimento, por exemplo, de parcerias com as micro,
pequenas e médias empresas ou da constituição de um fundo para a inovação tecnológica empresarial —
espante-se! — o PSD votou contra, e, já agora, o CDS também.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Mano.
A Sr.ª Margarida Mano (PSD): — Sr. Presidente, começo por agradecer às Deputadas Ana Rita Bessa e
Ana Mesquita as questões que colocaram.
Tentaria começar — aliás, as perguntas tocam-se no que diz respeito à investigação — por uma questão que
nos parece absolutamente central. Na nossa perspetiva, houve um tempo em que as instituições de ensino
superior podiam estar na sua torre de marfim, podiam ser financiadas por um Estado que não era propriamente
um Estado democrático.
Esse tempo acabou, porque hoje a criação de riqueza é essencial. Não há criação de riqueza nem criação
de valor sem conhecimento, não há conhecimento sem investigação de ponta e a investigação de ponta é muito
cara. Conhecemos muitas experiências onde ela é feita essencialmente por privados e onde o Estado não
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acompanha. Aquilo que pensamos é que Portugal tem condições únicas, porque tem um sistema público de
investigação competitivo, e que, até pelo próprio mecanismo de avaliação dos docentes, concorre
internacionalmente. Portanto, o Estado tem obrigação de regular, de investir e de orientar no sentido do serviço
público.
Por isso mesmo é que estranhamos que o Governo atual se demita desse papel, reduzindo o investimento
em ciência, reduzindo, nomeadamente… Aliás, no roteiro que estamos a realizar, ouvi mais do que uma vez,
ouvi duas vezes alguém dizer que a FCT é um mero instrumento administrativo, não é uma fundação, não tem
estratégia científica, não tem independência. Nós não podemos estar mais de acordo.
Uma das bandeiras do Governo foi o emprego científico, que teve, do ponto de vista do Partido Social
Democrata, a manifestação e o apoio correspondente: votámos contra algumas coisas que nos pareciam
inadmissíveis e votámos a favor outras. Portanto, o emprego científico é uma bandeira importante, mas o
emprego científico não é estratégia para a investigação, não é estratégia para Portugal.
Esta questão é, para nós, essencial. É preciso haver emprego, mas é preciso haver emprego científico não
hoje mas daqui a 5 anos e daqui a 10 anos e, pela forma como o Governo está a atuar, parece-nos que isso não
vai acontecer a muito curto prazo.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro
Coimbra, do PS.
O Sr. Pedro Coimbra (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Partido Socialista realizou nos dias
22 e 23 as suas Jornadas Parlamentares no distrito de Coimbra sobre o tema «Proximidade, Transparência e
Descentralização», tema relevante no contexto político atual.
No primeiro dia, segunda-feira, deslocámo-nos a concelhos dos distritos de Coimbra, de Leiria e de Viseu,
que foram atingidos pela calamidade dos incêndios de 2017.
Tivemos a oportunidade de voltar a constatar, uma vez mais, a violência com que foram ceifadas vidas
humanas, destruídas casas, arrasadas empresas, incineradas propriedades agrícolas e florestais e queimadas
memórias.
Foi uma jornada de trabalho dedicada a ouvir, sobretudo ouvir quem foi mais atingido, mas também ouvimos
autarcas e associações. Ouvir para decidir em conformidade, ajudando a resolver problemas.
Desde o incêndio de outubro último, passaram apenas três escassos meses. Em três meses é impossível
fazer tudo, mas muito já foi feito.
Temos a noção clara de que a responsabilidade de reabilitar e de dar esperança se impõe. Levámos a efeito
estas visitas na defesa intransigente das populações, das empresas e do território.
Nestas Jornadas Parlamentares, quisemos, igualmente, assinalar a solidariedade do povo português, bem
como prestar a nossa homenagem às vítimas e às suas famílias.
Como disse atrás, temos a consciência de que há muito a fazer e, provavelmente, também alguma coisa a
corrigir, mas ficámos igualmente com orgulho ao verificar o muito que já foi feito: milhares de atendimentos de
proximidade, resolvendo os problemas das pessoas nos espaços Cidadão Móvel; apoios a famílias com carência
económica, em casos de primeira necessidade; diligências múltiplas de preparação e adequação das
infraestruturas públicas nas áreas afetadas; mais de 5 milhões de euros de compensações, já pagas, relativas
a 27 das vítimas mortais; cerca de 300 casas já reabilitadas, envolvendo investimentos que rondam os 2,5
milhões de euros; perto de 27 milhões de euros atribuídos a empresas, tendo em vista o restabelecimento da
atividade económica; 204 candidaturas já apresentadas por entidades empregadoras e 5,1 milhões de euros já
aprovados de apoios financeiros à manutenção de mais de 1800 postos de trabalho; quase 9000 pessoas em
formação profissional e 1600 desempregados encaminhados para medidas ativas de emprego; cerca de 600
000 € entregues para aquisição de alimentos para animais, desde os destinados ao gado aos destinados a
colmeias; cerca de 46 milhões de euros já atribuídos a agricultores para cobrir prejuízos enormes.
Podemos afirmar com certeza absoluta que está a decorrer no País um gigantesco processo de recuperação.
Estou certo de que daqui resultará mais coesão social, mais desenvolvimento e mais competitividade.
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Um mau contributo para tudo isto será, sim, fazer dos incêndios uma arma de arremesso político, sem
respeito por quem sofre, causando bloqueios, ruídos de fundo e dificuldades que, certamente, não nos trarão
nada de positivo.
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Muito bem!
O Sr. Pedro Coimbra (PS): — O reforço dos mecanismos de apoio por que pugnamos e a necessidade
urgente de intervir com eficiência e diligência na aplicação dos meios, na certeza de que estamos no caminho
certo para alcançar melhores resultados, são uma evidência que constatámos.
Se é verdade que queremos rapidamente ultrapassar as atuais dificuldades, também é razoável ter
expectativas, pelas reformas em curso, de que calamidades desta natureza não se repitam com a frequência a
que assistimos nos últimos meses, muito menos com as dimensões alcançadas.
Para isso, um Estado próximo e eficiente é fundamental. Foi sempre isso que o Partido Socialista defendeu
e é isso que defende na sua própria matriz identitária.
Sr.as e Srs. Deputados, nestas Jornadas Parlamentares fizemos ainda um debate rico, aberto e plural —
como, aliás, é hábito no Partido Socialista — sobre transparência na vida pública portuguesa, um tema que foi
sempre priorizado pelo Partido Socialista. Recordo que foi por iniciativa do Partido Socialista que, em 2016, foi
criada a Comissão Eventual para o Reforço da Transparência no Exercício de Funções Públicas.
Sr.as e Srs. Deputados, foi também nas Jornadas Parlamentares do Partido Socialista destes dois últimos
dias que debatemos um outro tema para nós muito relevante, que é a descentralização.
A reforma da descentralização é, inequivocamente, um aspeto fundamental da reforma do Estado. A
Associação Nacional de Municípios Portugueses já a assinalou como absolutamente prioritária.
O Governo tem sido muito claro e a descentralização está inscrita no seu Programa. Cabe agora aos
restantes partidos políticos acompanharem o Partido Socialista nesta reforma, a bem dos portugueses e a bem
de Portugal.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Termino, dizendo que temos orgulho na governação do Partido
Socialista. O crescimento económico é uma realidade concreta. Também os portugueses assim o reconhecem,
como é sabido, tal como muitos dos nossos parceiros internacionais.
Vive-se um clima de paz social.
Sabemos que o caminho ainda é longo e estreito, mas queremos continuar a cumpri-lo, dando o nosso
melhor.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado Pedro Coimbra, inscreveram-se para pedir esclarecimentos
três Srs. Deputados. Peço-lhe para informar a Mesa sobre a forma como pretende responder.
O Sr. Pedro Coimbra (PS): — Respondo em conjunto, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr.
Deputado Pedro Soares, do Bloco de Esquerda.
O Sr. Pedro Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Pedro Coimbra, em
primeiro lugar, queria saudar o Partido Socialista pela realização das suas Jornadas Parlamentares.
Acompanhámos as Jornadas através da imprensa e ouvimos com atenção a sua intervenção, em que nos
relata o que se passou, e gostávamos de fazer duas ou três considerações sobre esta matéria.
Certamente que as Jornadas Parlamentares do Partido Socialista não foram apenas de constatação,
certamente que projetaram a ação do Partido Socialista para o futuro, e isso é o que mais nos importa, porque
referir tudo o que já foi feito em termos de infraestruturas, de indemnizações às famílias das vítimas no que diz
respeito aos incêndios rurais é positivo, é importante, tendo em conta que tanto as economias locais como as
pessoas, as famílias esperam que assim seja e com a maior urgência. No entanto, Sr. Deputado Pedro Coimbra,
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é fundamental que percebamos que nestes incêndios rurais houve causas, houve razões, e essas é que importa
atacar.
Por isso, gostaria de perguntar ao Sr. Deputado se estão perspetivadas medidas concretas relativamente
àquilo que, do nosso ponto de vista, é fundamental, nomeadamente em relação ao ataque às causas estruturais
deste tipo de problemas, à criação e regulamentação das unidades de gestão florestal, à definição dos benefícios
fiscais e dos apoios do Estado à criação de novas formas de organização do minifúndio florestal, à limpeza das
florestas, à definição da construção da rede primária. Que medidas concretas, nomeadamente de entre as que
estão no debate político e na agenda, pensa o Partido Socialista levar a cabo?
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe para terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Soares (BE): — Termino já, Sr. Presidente.
Em relação à descentralização, falou de consensos e disse esperar consensos na Assembleia da República,
mas devo dizer, Sr. Deputado, que, relativamente a esta matéria, temos ainda uma grande distância até
chegarmos a esses consensos.
Não está definido o que pensa o Partido Socialista quanto ao processo de regionalização e no que diz respeito
ao assegurar a universalidade dos direitos do Estado social no processo de descentralização, nomeadamente
na educação e na saúde, como também não está definido o que pensa relativamente à proposta de lei das
finanças locais, às alterações fundamentais, para que possamos pronunciar-nos sobre o processo de
descentralização, e finalmente, sobre medidas para que se consiga, efetivamente, mais autonomia financeira
para as freguesias, de modo a que possam, elas próprias, adquirir e assumir maiores competências num
processo de descentralização.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada
Paula Santos, do PCP.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Pedro Coimbra, gostaria
também de cumprimentar o Partido Socialista pela realização das suas Jornadas Parlamentares e de referir dois
aspetos que focou na intervenção.
O primeiro diz respeito à situação dos incêndios que devastaram o nosso País no ano 2017 e aos necessários
apoios aos atingidos e às vítimas destes mesmos incêndios, bem como à necessidade de reconstruir e garantir
a recuperação do potencial produtivo destas regiões.
Mas o que constatamos é que, de facto, a realidade é um pouco mais difícil do que a que o Sr. Deputado
aqui trouxe, porque se verifica um tratamento desigual. No terreno, há agricultores que fizeram investimentos e
receberam apoios e há quem não saiba exatamente a que se destinam esses mesmos apoios.
Queria referir uma questão muito concreta. O Grupo Parlamentar do PCP trouxe à Assembleia da República
um projeto de lei, que foi votado e é hoje uma lei, para apoio às vítimas dos incêndios que deflagraram em junho
do ano passado. Propusemos que essa lei fosse alargada a todos os concelhos do nosso País que sofreram
com os incêndios no ano passado. Esta proposta do Partido Comunista Português não foi aprovada, mas
consideramos que ela é fundamental e que daria a resposta que hoje não está a ser garantida aos cidadãos.
Por isso, apelo mais uma vez à necessidade de um tratamento igual para as situações dos incêndios.
O segundo aspeto é sobre a descentralização.
Em primeiro lugar, se queremos descentralizar, se queremos proximidade, uma primeira proposta que aqui
deixo, e que temos vindo a colocar há muito tempo, é que se reponham as freguesias que foram extintas pelo
anterior Governo, uma proposta que já trouxemos a votação à Assembleia da República e que o Partido
Socialista também rejeitou. O que se propõe é que se reponham as freguesias onde seja essa a vontade das
populações. Inclusivamente, na situação dos incêndios, vimos a importância da proximidade dos eleitos das
freguesias no apoio às populações.
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Em segundo lugar, quando se fala de descentralização, da parte do Partido Socialista está excluída uma
questão fundamental e que consta da nossa Constituição, que é a criação das regiões administrativas. Essa é
uma questão fundamental para o desenvolvimento do nosso País e para a descentralização.
Em terceiro lugar, e para terminar, pergunto: se o objetivo é transferir competências e descentralizar, quais
são as condições que o Governo propõe para o seu exercício pelas autarquias? É que tudo o que conhecemos
das propostas do Governo deixa-nos bastantes preocupações. Já solicitámos ao Governo — e foi aprovado na
11.ª Comissão da Assembleia da República — os elementos sobre os impactos concretos de cada uma das
medidas, mas não os conhecemos, ainda não chegou esta informação.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Vou concluir, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Contou com a distração da Mesa.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Vou mesmo concluir, Sr. Presidente, referindo só uma questão: se não estão
garantidos os meios, se estamos a falar de um conjunto de áreas em que hoje há inúmeros problemas pelo
País,…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.ª Deputada, colabore!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — … não se trata de uma transferência de competências, mas, sim, de uma
transferência de encargos e do odioso, daquilo que o Governo quer desresponsabilizar-se e que é da sua
competência, como são as matérias fundamentais da educação e da saúde.
Agradeço, Sr. Presidente, a sua tolerância.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — A minha distração, queria a Sr.ª Deputada dizer!
Tem agora a palavra, sem precedente relativamente ao tempo, a Sr.ª Deputada Berta Cabral, também para
pedir esclarecimentos.
A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — Sr. Presidente, espero ter alguma tolerância da sua parte, apesar desta sua
observação inicial.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, quero começar por saudar o PS pela realização das suas Jornadas
Parlamentares e também pelos temas escolhidos para o debate.
O Sr. Deputado Pedro Coimbra trouxe vários temas, mas gostaria de fazer algumas considerações e duas
notas prévias sobre a questão da descentralização.
A primeira nota é que o PSD tem estado, nesta matéria, sempre na linha da frente, considera que se trata de
uma reforma importantíssima do Estado, um desígnio nacional e, neste sentido — quero aqui afirmá-lo —, tem
provas dadas quer na presente Legislatura, quer na passada.
A segunda nota é que, nos últimos meses, desde as autárquicas, o PS e principalmente o Governo têm feito
uma narrativa no sentido de passar a ideia de que a descentralização não avança ou está atrasada por
indefinição do PSD. Nada mais falso! Nada mais falso, porque o Governo se atrasou — como bem se recordam
— na apresentação da proposta de lei de bases da descentralização.
O Governo está atrasado na apresentação da proposta de lei de finanças locais e está atrasadíssimo na
entrega à Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território, Descentralização, Poder Local e Habitação dos
estudos e trabalhos preparatórios solicitados há mais de seis meses pelo PSD e, como agora mesmo foi referido
pela Sr.ª Deputada do PCP, também requeridos pelo PCP.
Feitas estas notas prévias que considero importantíssimas, quero dizer que o PSD está neste processo como
sempre esteve: com o mesmo rumo e com a mesma determinação.
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O Sr. Carlos César (PS): — Isso é péssimo!
A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — Sempre defendemos a descentralização, acreditamos nas virtualidades de um
poder de proximidade, sabemos que os municípios podem exercer novas competências com mais eficácia e
mais eficiência, mas também sabemos que só poderão fazê-lo com mais recursos quer financeiros, quer
materiais.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe o favor de concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — É para isso que aqui estamos, para defender os municípios, que são o elo
mais fraco deste processo. Cabe ao Parlamento ser o garante de uma descentralização que não seja
desresponsabilização do Governo, que bem gosta de atirar para cima dos outros as suas responsabilidades.
Protestos do PS.
Agora mesmo, os municípios estão a contestar uma lei do Governo que passa para os municípios…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.ª Deputada, tem de concluir.
A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — … a responsabilidade de limpar as matas, lei com a qual os municípios não
concordam.
Protestos do PS.
Nós não podemos…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — A Sr.ª Deputada ouviu a Mesa?
A Sr.ª BertaCabral (PSD) — Peço desculpa, Sr. Presidente, mas gostaria de ter a mesma tolerância que
tiveram os meus antecedentes, ainda para mais porque o PS está a entrar em diálogo.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.ª Deputada, queira colaborar com a orientação dos trabalhos.
A Sr.ª BertaCabral (PSD) — Sr. Deputado Pedro Coimbra, pergunto se considera ou não que a lei das
finanças locais é um documento essencial, uma peça fundamental neste processo de descentralização.
Já agora, como está tão bem informado,…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — A Sr.ª Deputada quer fazer o favor de colaborar para a boa orientação
dos trabalhos?
A Sr.ª BertaCabral (PSD) — … pergunto também para quando a entrega neste Parlamento.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Coimbra.
O Sr. PedroCoimbra (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, começaria por agradecer ao Sr.
Deputado Pedro Soares e às Sr.as Deputadas Paula Santos e Berta Cabral as questões que nos colocaram,
tentando eu responder a todas as questões em conjunto.
Queria, desde já, sublinhar e salientar que, infelizmente, conheço bem a realidade dos incêndios e vivi bem
de perto a calamidade dos incêndios de 15 e de 16 de outubro. Portanto, sou testemunha próxima das
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dificuldades, sou testemunha do cenário terrível que viveram as populações e sou testemunha do cenário de
destruição que todo o território afetado sofreu naqueles dois dias.
Sou também o primeiro a reconhecer que não é possível resolver, de um momento para o outro, um problema
que foi criado e agravado durante décadas, com o abandono do território e com o despovoamento de parte do
interior de Portugal.
Aliás, importa recordar que foi durante o último Governo de direita, liderado pelo PSD e com o CDS a integrá-
lo, que se viveu a maior taxa de emigração, a maior taxa de despovoamento do interior desde a década de 60,
quando uma geração inteira de portugueses emigrou.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. PedroCoimbra (PS): — Foram esses jovens que as senhoras e os senhores empurraram para fora
do País que deixaram muito boa parte do território ao abandono e descuidado como hoje o encontramos,
infelizmente.
Por isso, Sr. Deputado Pedro Soares e Sr.ª Deputada Paula Santos, estamos, naturalmente, empenhados e
dedicados em encontrar soluções. Temos tido um espírito reformista e temos tido um espírito para encontrar
soluções para os problemas com que nos temos deparado.
Também há que reconhecer que, por cada problema que identificamos e resolvemos, deparamo-nos com
um problema novo e diferente daquele que conhecíamos.
Todos nós, legisladores, não conseguimos ainda ter a imaginação e a flexibilidade para encontrar de uma só
vez uma solução para todos os problemas com que nos deparamos no território e junto das nossas populações.
É com esse espírito que queremos continuar, isto é, de forma empenhada e dedicada, apoiando aqueles que
mais necessitam neste momento, mas também reestruturando e lançando reformas que, estamos certos,
perdurarão no tempo para que possamos criar um melhor território, mais coeso e mais justo.
Sobre a descentralização, queria afirmar que confio nas autarquias e confio nos autarcas portugueses. Penso
que este é um passo muito decisivo, muito importante, muito estruturante, na reforma do Estado português e é,
com certeza, uma reforma que nos trará mais coesão, mais eficiência, mais eficácia na gestão dos recursos
públicos.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. PedroCoimbra (PS): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Estranho muito que a Sr.ª Deputada Berta Cabral não esteja a acompanhar as posições da Associação
Nacional de Municípios Portugueses…
O Sr. JorgePauloOliveira (PSD): — Está, está!
O Sr. PedroCoimbra (PS): — … e esteja perfeitamente alheada da posição dos autarcas portugueses na
defesa desta reforma. Aliás, também estranho que V. Ex.ª tenha aqui afirmado o que afirmou, não manifestando
de forma clara e evidente um apoio a esta reforma do Governo do Partido Socialista,…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado, tem de concluir.
O Sr. PedroCoimbra (PS): — … a bem dos portugueses e também das autarquias de todo o País.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.as e Srs. Deputados, estamos, agora, em condições de passar para
uma intervenção, ao abrigo do n.º 2 do artigo 76.º do Regimento.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Batista, do PSD.
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O Sr. ÁlvaroBatista (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Hoje, pretendo falar das assimetrias
regionais, do despovoamento e do envelhecimento que afetam largas faixas do território nacional. Hoje, quero
aqui deixar testemunho da realidade crua e dura que se continua a viver no meu círculo eleitoral. Hoje, quero
falar no abandono a que este Governo votou o distrito de Castelo Branco.
As projeções do INE (Instituto Nacional de Estatística) esperam que, num cenário mediano, entre 2012 e
2060, o índice de envelhecimento aumente em Portugal de 131 para 307 idosos por cada 100 jovens e toda a
gente acha que este cenário, a suceder, será seguramente catastrófico para toda a estrutura social.
Foi também o INE que veio reportar que o índice de envelhecimento estava a aumentar, que tinha aumentado
em 95% dos municípios portugueses entre 2011 e 2016, com decréscimo em apenas 15 dos 308 concelhos.
O agravamento do índice de envelhecimento naquele período atingiu principalmente municípios das sub-
regiões do Interior Norte e Centro — Beiras e Serra da Estrela, Beira Baixa e Médio Tejo —, com destaque para
os concelhos de Vila de Rei, Oleiros e Penamacor, do distrito de Castelo Branco, que registaram um aumento
em mais de 100 idosos por 100 jovens.
Salientou, ainda, o INE a circunstância de o índice de envelhecimento ser mais elevado nos territórios rurais
do que nos territórios urbanos, verificando-se o franco acentuar deste tipo assimetria nos distritos de Castelo
Branco, sub-região da Beira Baixa e nas Terras de Trás-os-Montes.
Esta disparidade entre regiões rurais e urbanas revelava-se particularmente intensa na sub-região da Beira
Baixa, 682 idosos para 125 jovens, e nas Beiras e Serra da Estrela, 423 idosos para 100 jovens.
No meu círculo eleitoral, o concelho que apresenta o pior índice é o de Vila Velha de Ródão, com uns
absolutamente impressionantes 803 idosos por cada 100 jovens.
Sr.as e Srs. Deputados, Vila Velha de Ródão, concelho do distrito de Castelo Branco, tinha, em 1940, perto
de 10 000 residentes, tendo vindo a perder consecutivamente população desde essa altura. Em 2015, havia ali
apenas 3304 habitantes.
Sr.as e Srs. Deputados, o que se pode fazer num concelho com 3304 habitantes, uma curva demográfica a
descer consecutivamente há quase 80 anos, e 803,9 idosos por cada 100 jovens?
Acontece que o fenómeno da redução da população atinge não só este município mas todo o distrito no seu
conjunto, não existindo um único concelho que tenha conseguido manter o número de habitantes que tinha em
1940.
Penamacor perdeu 71% da população, Vila de Rei perdeu 63%, Proença-a-Nova tem agora menos 58% das
pessoas e o campeão é Idanha-a-Nova, que tem hoje menos 74% das pessoas que tinha na década de 40.
No que se refere à economia, todos os concelhos do distrito de Castelo Branco apresentam um poder de
compra per capita inferior à média nacional, sendo que Idanha-a-Nova e Proença-a-Nova não chegam a 70% e
Sertã e Belmonte apenas conseguem chegar aos 75%. Já Penamacor tem o poder de compra mais baixo: 60%
da média nacional.
Srs. Deputados, o poder de compra per capita em Lisboa é 258% mais elevado do que o de Penamacor e,
no Porto, é 183% mais elevado do que o de Penamacor.
Refiro um pequeno exemplo que diz muito: na semana passada, um dos temas dos jornais locais era a luta
de uma freguesia contra o encerramento da única caixa Multibanco que existe num raio de muitos quilómetros.
Depois de ter fechado praticamente tudo no interior, agora chegou a altura de encerrarem coisas que as
populações urbanas têm como certas.
Srs. Deputados, pensem no que é viver sem transportes públicos decentes, sem caixas Multibanco, sem as
agências da Caixa Geral de Depósitos, que estão a fechar, sem médico de família e o que é viver longe dos
filhos que partiram e dos netos que vêm cada vez menos.
Soluções este Governo não tem, mas os problemas estão lá, não há como ignorá-los.
Estando o preço da interioridade a ser cobrado às regiões há muitas dezenas de anos, hoje já é todo o País
que está a pagá-lo. Vejam-se os incêndios deste outono, que chegaram praticamente às praias, depois de terem
queimado uma área formidável do Pinhal de Leiria, a seguir a terem queimado uma área formidável do interior
abandonado.
Se nada se fizer de concreto, só pode piorar. É lamentável que não existam reais medidas de discriminação
positiva para os territórios de baixa densidade.
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Enquanto o Governo PSD/CDS procurava salvar o País da bancarrota em que foi colocado pelo Governo de
José Sócrates, o PS lavava as mãos como Pilatos e prometia à boca cheia, no distrito de Castelo Branco, que,
quando voltasse a ser governo, iria de imediato acabar com as portagens na A23.
A questão é esta: o PS ou o Governo das esquerdas cumpriram? Não cumpriram! Aliás, primeiro aumentaram
as portagens para depois fazerem a pantomina de as baixar. Afinal, ficar tudo igual.
Enquanto o anterior Governo do PSD renegociava os contratos das parcerias público-privadas rodoviárias,
tendo conseguido poupanças de quase 3000 milhões de euros — números da UTAO (Unidade Técnica de Apoio
Orçamental), uma entidade independente —, pergunto o que é que andava a fazer o PS. Andava a lavar as
mãos como Pilatos e a prometer que acabava com as portagens. E o que fez o PS desde que chegou ao
Governo? Mantém as portagens, assobia para o lado e lava as mãos como Pilatos.
Srs. Deputados, a pergunta que se impõe é esta: para o ano que vem, na campanha das legislativas, o PS
vai voltar a prometer acabar com as portagens no distrito de Castelo Branco? E estão à espera que as pessoas
acreditem?
Vamos lá agora falar de estradas.
No distrito de Castelo Branco e no que se refere às estradas, há dois eixos viários essenciais para o
desenvolvimento de toda a região: o IC6, entre Coimbra e a Covilhã, e o IC31, que deverá ligar a A23, na zona
de Castelo Branco, a Termas de Monfortinho, aquela que passará a ser a via mais curta entre Lisboa e Madrid.
Também na campanha eleitoral, o PS prometeu concretizar estas duas obras, mas, passada mais de metade
da Legislatura, é claro, neste momento, que estas promessas também caíram em cesto roto.
Sr.as e Srs. Deputados, todas as promessas feitas pelo PS durante a campanha eleitoral caíram em cesto
roto!
A pergunta que se impõe é esta: para o ano que vem, na campanha das legislativas, vão voltar a prometer
concluir o IC6 e o IC31 no distrito de Castelo Branco? E estão à espera que as pessoas acreditem?
Sr.as e Srs. Deputados, o Instituto Politécnico de Castelo Branco teve, em 2015, com o anterior Governo, um
orçamento superior a 24 milhões de euros e, com este Governo, teve 20 milhões em 2017, ou seja, menos 4
milhões.
Srs. Deputados, «quem ama é quem cuida» e o PSD, com a troica do PS às costas, cuidava mais.
A Universidade da Beira Interior (UBI) recebeu por aluno, em 2017, 3500 €, menos do que qualquer outra no
País, a Universidade do Algarve recebeu mais 1000 € por aluno e a Universidade de Évora recebeu mais 1500
€ por aluno. Porquê? Porque é que o atual Governo não gosta do distrito de Castelo Branco? Porque é que a
maioria insiste em penalizar este pedaço de interior e os que ainda lá moram? Os alunos das outras
universidades precisam de mais dinheiro do que os da UBI? Porquê? Tem de ser explicado.
Em todo o interior não há um centro de medicina nuclear, sendo a Cova da Beira a região do País que fica
mais longe de um hospital com este serviço.
Os doentes da Covilhã e do Fundão que fazem atualmente quimioterapia — e são perto de 100 — têm de ir
fazer os seus tratamentos a Coimbra, com um martírio de três horas de viagem para cada lado. Não é humano
obrigar um doente a fazer três horas de viagem depois de ter feito quimioterapia, mas é a política deste Governo.
O PSD sempre se preocupou com os problemas da interioridade, tendo apresentado, no início da Legislatura,
um projeto de lei que visa a criação de um estatuto dos territórios de baixa densidade, uma lei-quadro para
começar a promover a coesão territorial de forma efetiva.
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Apoiado!
O Sr. ÁlvaroBatista (PSD): — Depois da troica, era tempo de fazer. E o que fizeram as esquerdas?
Amuaram, porque a ideia não foi deles.
Num dia à noite, escreveram num papel umas quantas medidas desgarradas para fazer de conta que faziam
sem fazer coisa nenhuma. Anunciaram-nas aos quatro ventos e descansaram.
Srs. Deputados, convenhamos que algumas medidas deste Governo para o interior não passam de
caricaturas. Fazer exercícios militares no interior? Levar a Vila Velha de Ródão ou a Belmonte uma ópera ou
uma peça do Teatro D. Maria não vai rejuvenescer a população nem criar oportunidades para os jovens.
Recentemente, o Governo teve, inclusive, o descaramento de vir dizer que estava quase tudo feito nas suas
medidas para a interioridade.
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Srs. Deputados, no interior quase nada mudou e o que mudou, mudou para pior.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Faça favor de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Álvaro Batista (PSD): — Termino já, Sr. Presidente.
Enquanto o Governo anda a passear, o interior continua a esmorecer, a perder população e a envelhecer.
Ainda mora gente em Oleiros, na Sertã, em Vila de Rei, em Proença, na Covilhã e em Castelo Branco, gente
que também são portugueses, que têm de ter os mesmos direitos e oportunidades.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado, inscreveram-se três Srs. Deputados para pedir
esclarecimentos.
Para o efeito, tem a palavra a Sr.ª Deputada Hortense Martins, do PS.
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, de facto, Sr. Deputado
Álvaro Batista, no início da sua intervenção, fiquei agradada pelo tom da mesma, porque ouvir, pela primeira
vez, um Deputado eleito pelo PSD falar do interior e, aparentemente, da defesa do interior até poderia ser algo
positivo. Só que rapidamente o Sr. Deputado desfez tudo o que de positivo a sua intervenção poderia ter.
Aplausos do PS.
Sr. Deputado, é preciso, sim, descaramento, como disse. É preciso descaramento e, além disso, estar
desmemoriado, porque dizer que as assimetrias, o despovoamento e o abandono do interior se devem a um
Governo com dois anos é ignorar completamente o que passou e o que foi feito pelo Governo do PSD e do CDS,
o seu Governo, o Governo que o senhor apoiava, que, esse sim, empobreceu o País, empobreceu o interior e
as pessoas tiveram de emigrar novamente, como o meu pai emigrou na década de 60. Isso, sim, fica na pele de
toda a gente, e as pessoas que me estão a ouvir sabem do que estou a falar.
Aplausos do PS.
Protestos do Deputado do PSD Jorge Paulo Oliveira.
Também lhe quero dizer que não há só aspetos negativos. Infelizmente, há aspetos negativos, mas há
também muitos aspetos positivos, e isso o senhor não diz. Parece que há uns concelhos do PSD e os outros do
PS com realidades diferentes, mas não é assim. O PS lidera a maior parte das autarquias e essas autarquias
mas também as outras lutam contra essas adversidades. Porém, têm um Governo que deixa marca a favor do
interior.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Vou concluir, Sr. Presidente.
E essa marca pode constatar-se no Orçamento do Estado deste ano. A saber: o investimento na Linha da
Beira Baixa; o investimento nas áreas protegidas; sim, a promessa de continuar o caminho da baixa de preço
de portagens; o investimento na educação, que os senhores pararam, como pararam o investimento na
remodelação de escolas.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.ª Deputada, deve mesmo concluir.
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Concluo, Sr. Presidente, dizendo que tudo o que de bom foi feito no interior
tem a marca do Partido Socialista. Infelizmente, quando os senhores chegam ao Governo, desfazem tudo,
acabam com tudo e o retrocesso volta a acontecer.
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Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Soares,
do Bloco de Esquerda.
O Sr. Pedro Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, Sr. Deputado Álvaro Batista,
queria saudá-lo por trazer ao Parlamento o debate sobre a interioridade, os processos de extrema perda
demográfica, de desertificação dos territórios do interior e, uma questão fundamental, a equidade territorial. A
equidade territorial tem sido um dos grandes problemas da nossa democracia — de facto, trata-se de um
problema de democracia —, o dar condições iguais às populações que vivem no interior e àquelas que vivem
no litoral, as que vivem nos territórios rurais e as que vivem nos territórios urbanos.
Sr. Deputado, não posso deixar de lhe colocar uma questão, com toda a franqueza e transparência. Gostava
de lhe perguntar onde é que esteve nos quatro anos em que houve uma maioria PSD/CDS, que nada contribuiu
para que as assimetrias territoriais no nosso País fossem diminuídas. Sabemos, pelo contrário, que todas elas
se agravaram, que os territórios do interior continuaram a perder músculo demográfico, continuaram a perder
músculo económico, que cada vez mais — e isso é grave — a interioridade chega perto do litoral, ou seja, cada
vez mais há territórios em que os critérios demográficos, os critérios económicos, os critérios de perda de
condições de vida têm vindo a diminuir gravemente.
Sr.as e Srs. Deputados, isso tem a ver, em primeiro lugar, com uma questão fundamental. É necessário
garantir condições de vida, condições de acesso aos serviços, às populações do interior e todos sabemos o
papel que a maioria PSD/CDS teve em relação a essa matéria: encerramento de tribunais; encerramento de
centros de saúde; eliminação de freguesias…
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Não é verdade!
O Sr. Pedro Soares (BE): — Srs. Deputados, é objetivamente verdade.
E mais: como o Sr. Deputado disse, e bem, cada vez mais há envelhecimento nos territórios do interior —
aliás, é um problema demográfico de todo o País, mas com particular incidência no interior — e também
sabemos o papel que a maioria PSD/CDS teve, por exemplo, com o corte das pensões,…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Soares (BE): — … que acabou por afetar gravemente as populações do interior, também por
essa via.
Protestos do PSD.
Sr. Deputado, queria concluir dizendo apenas que o que é necessário no interior é criar emprego, é criar
condições de vida para essas populações, é criar acesso à rede de serviços públicos, fundamentais para que
haja qualidade de vida nessas populações, e esse é um desígnio fundamental.
Para isso, é necessário dar capacidade de decisão política a essas populações,…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado…
O Sr. Pedro Soares (BE): — … por isso, é necessário que haja uma descentralização a sério também nos
nossos territórios.
Não basta dizer que queremos melhores estradas, porque, Sr. Deputado, se ficarmos só pelas estradas o
que vai acontecer é que isso vai ajudar a drenar cada vez mais populações do interior para o litoral, e não é isso
que queremos. Nós queremos melhores condições de vida, Sr. Deputado.
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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado, queira fazer o favor de colaborar com a Mesa.
O Sr. Pedro Soares (BE): — Terminei, Sr. Presidente.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos,
do PCP.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Álvaro Batista, as assimetrias regionais, que
são uma realidade no nosso País e que se agravaram, têm responsáveis.
Os responsáveis são o PS, o PSD e o CDS que, ao longo de décadas, optaram por políticas que conduziram
à destruição do aparelho produtivo, que conduziram à destruição de emprego, que conduziram ao encerramento
de serviços públicos e que levaram, efetivamente, ao abandono do interior por milhares e milhares de pessoas,
porque não encontravam aí solução para a sua vida, fruto destas políticas que foram sendo implementadas.
Aliás, o Sr. Deputado, à semelhança do PSD e do CDS, nos últimos tempos, tem procurado fazer um exercício
de branqueamento daquelas que são as suas responsabilidades.
Durante os quatro anos em que o seu Governo esteve a governar — de 2011 a 2015 —, pergunto-lhe o que
fez esse seu Governo para manter na região escolas e centros de saúde, o que fez para eliminar as portagens
na A23, o que fez para evitar encerramento dos serviços públicos, o que fez para ir mais longe nas
acessibilidades, nomeadamente a construção do IC6. Sr. Deputado, não só não fez nada, como agravou ainda
mais a situação das populações que vivem nestas localidades e nesta região.
O Sr. Deputado, o seu partido, bem como os partidos políticos da Assembleia da República, votaram, há dois
meses, uma proposta do PCP para a eliminação das portagens nas ex-SCUT e, pasme-se, o PS e o PSD
votaram contra. A proposta podia ter sido aprovada e hoje já não haver portagens nas ex-SCUT, mas, por causa
do PS e do PSD, continuam a ser cobradas e a criar inúmeras dificuldades às populações e às empresas daquela
região.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.ª Deputada, terminou o seu tempo.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Sr. Deputado, sobre o IC6, deixe-me que lhe diga o seguinte: foi o seu Governo que considerou que essa via
não era prioritária, quando o PCP, durante anos e anos e anos, tem vindo a propor a sua construção.
Sr. Presidente, para terminar, queria dizer o seguinte: o Sr. Deputado disse que fechou praticamente tudo no
interior. Pois é, mas o seu partido foi o que fechou mais, quando, ao extinguir as freguesias no nosso País,
fechou as juntas de freguesia.
Protestos do Deputado PSD Jorge Paulo Oliveira.
Sr. Presidente, de facto, não são medidas avulsas que contribuem para o desenvolvimento regional e para
combater o despovoamento e a desertificação.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Faça favor de concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — É preciso, efetivamente, uma política que rompa com as vossas opções de
direita, de desinvestimento que só levaram à degradação das condições de vida e à desertificação daquela
região do País.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Batista.
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O Sr. Álvaro Batista (PSD): — Sr. Presidente, antes de mais, queria agradecer as perguntas feitas pela Sr.ª
Deputada Hortense Martins, do Sr. Deputado Pedro Soares e da Sr.ª Deputada Paula Santos porque me
permitem esclarecer um conjunto de questões.
À Sr.ª Deputada Hortense Martins devo dizer que compreendo o seu incómodo. É que, depois de a senhora
ter andado a prometer, por escrito, às populações do distrito de Castelo Branco que, se fosse Governo, iria fazer
tudo e mais alguma coisa e de, depois, não ter conseguido fazer nada, é evidente que tem de se desligar da
realidade, e é claramente aquilo que acontece a V. Ex.ª.
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Muito bem!
Protestos da Deputada do PS Hortense Martins.
O Sr. Álvaro Batista (PSD): — Sr.ª Deputada, a senhora prometeu tudo e mais alguma coisa no distrito de
Castelo Branco e o Partido Socialista, o seu Partido Socialista, até agora, não fez nada.
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Ganhou as eleições!
O Sr. Álvaro Batista (PSD): — Por muito que a senhora venha aqui dizer o contrário, as pessoas que lá
estão, quem continua a morar naquele distrito sabe que o Partido Socialista tem sido uma fraude completa.
Aplausos do PSD.
Ao Sr. Deputado Pedro Soares queria dizer que tem uma memória seletiva absolutamente extraordinária.
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Olha quem fala!
O Sr. Álvaro Batista (PSD): — Então, e o que fechou durante o Governo do Sr. Primeiro-Ministro José
Sócrates, seu parceiro de coligação?
O Sr. Pedro Soares (BE): — Não fomos parceiros de coligação do Sócrates!
O Sr. Álvaro Batista (PSD): — Já agora, diga-me: com o seu Governo, com este Governo das esquerdas
coligadas, o que é que, até agora, abriu no interior?
Aplausos do PSD.
É que notícias dos jornais dizem o contrário. Olhe: fecharam agências da Caixa Geral de Depósitos; estão a
fechar postos de correio por todo o País. São exemplos concretos.
Protestos do PS e do BE.
Estão até a fechar as caixas Multibanco.
Continuação de protestos do PS e do BE.
Srs. Deputados, os senhores podem fazer de conta que estes problemas não existem, mas eles existem e
os problemas que o anterior Governo resolveu foram deixados por um Governo da esquerda.
Aos senhores da esquerda que aqui estão a clamar como se não tivessem nenhum problema com aquilo que
está a acontecer, queria dizer o seguinte: se o interior fosse importante para o Partido Comunista, os senhores
teriam incluído o interior no Programa do Governo, que assinaram com o Partido Socialista.
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A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Não fomos nós que rejeitámos as propostas, foram os senhores.
O Sr. Álvaro Batista (PSD): — Isto porque os senhores não assinavam uma coisa com o Partido Socialista
e deixavam o interior para depois, e, depois, não vinham aqui fazer pantominas que, sabem, o próprio Partido
Socialista não aceita. Se os senhores se preocupassem com o interior, teriam colocado o interior como vossa
primeira prioridade.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — O senhor é que votou contra, não foi o PCP.
O Sr. Álvaro Batista (PSD): — Portanto, é altura de os senhores decidirem. Vão continuar a fazer de conta
ou vão, finalmente, arranjar algo de concreto para o interior?
Protestos da Deputada do PS Hortense Martins.
A carta foi posta em cima da mesa pelo PSD e chama-se: estatuto dos territórios de baixa densidade.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Álvaro Batista (PSD): — Termino já, Sr. Presidente.
Trata-se de uma lei de bases para o interior.
A esquerda quer ou não que haja uma lei-quadro para o interior ou quer continuar a fazer de conta, sem fazer
nada?
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Deputados, vamos passar ao ponto três da nossa agenda, que
consta da apreciação da petição n.º 315/XIII (2.ª) — Solicitam a prorrogação do prazo para entrega da
declaração de Modelo 22 do IRC (Maria Filomena Martins de Oliveira Grimalde Simões, e outros) juntamente
com o projeto de resolução n.º 1259/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo a rápida conclusão do processo de
revisão do calendário fiscal, reorganizando os prazos de entrega das diferentes declarações tributárias e
definindo condições adequadas de disponibilização das aplicações de preenchimento e submissão dessas
declarações (PCP).
Para apresentar o projeto de resolução do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá.
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por cumprimentar, em nome do Grupo
Parlamentar do Partido Comunista Português, os mais de 4000 subscritores da petição hoje em discussão, que
solicitam a prorrogação do prazo para entrega da declaração do Modelo 22 do IRC até 30 de junho de 2017.
Embora, por motivos óbvios, este pedido já não possa ser atendido, as preocupações subjacentes à petição
mantêm toda a atualidade, já que o prazo para entrega do Modelo 22 do IRC não foi apenas um problema em
2017, é, na realidade, um problema recorrente que, na opinião do PCP, urge resolver, no âmbito de uma
reorganização global do calendário fiscal.
É, aliás, nesse sentido que o PCP traz hoje a debate um projeto de resolução que recomenda ao Governo a
rápida conclusão do processo de revisão do calendário fiscal.
As preocupações e a intervenção do PCP sobre esta matéria não surgiram agora, de repente. Na realidade,
há muitos anos que o PCP vem defendendo a necessidade de reorganizar o calendário fiscal, adequando-o às
necessidades dos contribuintes, em geral, e dos contabilistas certificados, em particular.
Com o anterior Governo, do PSD e do CDS, deparámo-nos com uma total indiferença relativamente a este
problema. Não vale a pena estes partidos virem agora chorar lágrimas de crocodilo, mostrando-se muito
preocupados com os problemas dos contabilistas certificados e até, como fez o CDS no Orçamento do Estado,
apresentar propostas avulsas para dar resposta a alguns desses problemas. Quando estavam no Governo
puderam atuar, mas não o quiseram fazer, pelo que nada do que digam agora consegue branquear essa opção.
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Há dois anos, quando o atual Governo tomou posse, questionámo-lo sobre a disponibilidade para uma
reorganização dos prazos de entrega das diferentes declarações fiscais. Nessa altura, o Governo não
reconheceu a existência de problemas com o calendário fiscal e, consequentemente, não manifestou
disponibilidade para a sua revisão.
Não desistindo de contribuir para a resolução do problema, o PCP foi insistindo nesse assunto e, em meados
de 2017, fruto dessa insistência, o Governo mostrou-se disponível para, finalmente, rever o calendário fiscal,
solicitando informação à Autoridade Tributária, para começar esse processo, e convidando a Ordem dos
Contabilistas Certificados a apresentar uma proposta de reorganização do calendário fiscal.
Entretanto, o PCP teve conhecimento de que a Ordem dos Contabilistas Certificados, tal como outros
profissionais de contabilidade, apresentou propostas nesse sentido.
Assim, com a intervenção decisiva do PCP, deu-se início a um processo de revisão do calendário fiscal. É
este processo que deve, agora, ser concluído com celeridade e é essa proposta que o PCP traz hoje a debate,
ao recomendar ao Governo a rápida conclusão do processo de revisão do calendário fiscal, reorganizando os
prazos de entrega das diferentes declarações tributárias e definindo condições adequadas de disponibilização
das aplicações de preenchimento e submissão dessas declarações, com o objetivo de ultrapassar os problemas
recorrentes, identificados por organizações e associações de profissionais de contabilidade.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulino Ascenção,
do Bloco de Esquerda.
O Sr. Paulino Ascenção (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo por saudar os contabilistas
certificados, em particular os subscritores desta petição, e saúdo também o projeto de resolução do PCP.
O calendário das obrigações fiscais é apertado, estas não estão distribuídas de forma uniforme ao longo do
ano. Os contabilistas têm apresentado várias propostas, quer através da sua Ordem profissional, quer através
de outras associações, no sentido de resolver o problema com uma arrumação mais homogénea. O Bloco de
Esquerda tem acompanhado essas preocupações, mas as propostas têm encontrado resistência por parte da
administração tributária.
Este problema torna-se muito mais complicado sempre que há atrasos na disponibilização das ferramentas
informáticas necessárias para o cumprimento das obrigações declarativas. A consequência é o encurtamento e
a sobreposição dos prazos de entrega das declarações dos diferentes impostos, o que conduz ao
congestionamento do Portal das Finanças.
Os contabilistas têm de ajustar-se a essas dificuldades, procurando os horários em que o Portal das Finanças
responde em melhores condições, ou seja, horários que não são horários normais de trabalho, à noite ou ao fim
de semana. Todo este conjunto de situações origina cansaço, stress, erros nas declarações e, portanto, mais
trabalho.
Trata-se de uma situação recorrente com as declarações anuais, em que a disponibilização das ferramentas
não acontece com a antecedência necessária para a planificação do trabalho dos contabilistas, de modo a que
estes organizem as suas vidas. Os contabilistas são gente, têm vida própria, têm família, têm filhos, têm direito
a férias, não podem ter a sua vida em suspenso a aguardar a libertação das ferramentas fora de tempo por parte
da administração tributária, não podem ser obrigados a ajustar-se a todos os atrasos.
Em particular no que se refere à informação empresarial simplificada (IES), que não tem implicações no
apuramento ou na entrega de impostos ao Estado, não há motivo para que o seu calendário não seja ajustado
quando há atrasos. É uma declaração meramente estatística e, apesar de ostentar no seu nome o termo
«simplificada», tem sido alterada todos os anos e adicionados novos conteúdos e anexos, ou seja, pode ser
tudo menos simplificada.
As alterações legislativas que determinam a adaptação das ferramentas informáticas para proceder à entrega
das declarações de impostos acontecem com a aprovação do Orçamento do Estado, isto é, com mais de um
ano de antecedência face ao momento em que essas declarações têm de ser entregues. Não se compreende,
portanto, que as ferramentas informáticas não sejam disponibilizadas mais atempadamente.
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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Paulino Ascenção (BE): — A concluir, Sr. Presidente, direi que há uma regra que consideramos
fundamental e que tem de ser respeitada: se há um atraso na libertação da ferramenta informática, tem de ser
atualizado o prazo para o cumprimento da obrigação correspondente, respeitando sempre um intervalo mínimo
de tempo obrigatório entre esses dois momentos para que os contabilistas possam organizar o seu trabalho.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra, também para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Margarida
Balseiro Lopes, do PSD.
A Sr.ª Margarida Balseiro Lopes (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo, naturalmente, por
saudar a iniciativa dos peticionários que hoje aqui debatemos, que é, de resto, um tema muito importante para
os contribuintes e para os contabilistas.
Com efeito, através da petição n.º 315/XIII (2.ª), os mais de 4000 peticionários vêm solicitar a prorrogação
do prazo de entrega da declaração modelo 22 do IRC. E fazem-no fundamentalmente porque são por demais
evidentes os atrasos na sua disponibilização atempada no Portal das Finanças. É, de resto, um problema que
acontece não apenas com esta declaração, mas também com outras obrigações declarativas, como é o caso
da IES.
Defendem, e bem, os peticionários que tal facto tem ocorrido de forma recorrente ao longo de vários anos,
prejudicando desta forma a atividade dos contabilistas, condicionando o cumprimento legal das referidas
obrigações declarativas dos contribuintes.
O resultado tem sido prejudicial para quem apenas quer ajudar e contribuir para o cumprimento rigoroso das
obrigações declarativas. O trabalho é realizado sob pressão, num curto espaço de tempo, propiciando a
ocorrência de erros e até de situações de incumprimento.
Pretendem, por isso, e bem, os peticionários que exista um prazo limite para a Autoridade Tributária
disponibilizar os formulários das declarações fiscais, dando assim mais tempo para o cumprimento das
obrigações declarativas, nomeadamente da IES e da declaração modelo 22.
Apesar de o Governo admitir uma diferente conjugação dos prazos das obrigações declarativas relativas a
vários impostos, por terem sido desenhados isoladamente pelo legislador e poderem apresentar incongruências
e, por isso, poderem ser suscetíveis de melhoria, na realidade pouco ou nada foi feito.
E não basta o convite à Ordem para que apresente uma proposta de reorganização do calendário fiscal. Já
passou demasiado tempo sem que nada fosse feito.
Da mesma forma nos parece inconsequente o pedido feito pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais
à Autoridade Tributária para identificar os momentos de sobrecarga do sistema, resultantes da sobreposição
dos termos dos prazos de mais do que uma obrigação declarativa. São públicos e evidentes os períodos de
sobrecarga e até de colapso do Portal das Finanças. Remeter para o apuramento daquilo que já se conhece é
apenas um sinal de quem não quer decidir nem fazer.
Por tudo isto, é tempo de o Governo avançar com um novo calendário fiscal que tenha em consideração as
reivindicações dos peticionários, a bem da estabilidade, da previsibilidade e da tranquilidade dos contribuintes.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Ainda para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília
Meireles, do CDS-PP.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Naturalmente, começo por
saudar os peticionários, que vêm alertar para um problema que estamos a discutir agora, infelizmente, quando
a questão já foi ultrapassada, mas, como se trata de uma questão recorrente e que se repetiu várias vezes ao
longo dos anos, continua a ser muito atual, porque é natural que se venha a repetir novamente no futuro. E qual
é o problema? O problema é que, ao longo do ano, os contribuintes e os profissionais contabilistas, que
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trabalham para os contribuintes, têm de cumprir determinadas obrigações fiscais, designadamente obrigações
fiscais declarativas, e têm de o fazer, como é óbvio, no Portal das Finanças. Ora, o que é que acontece? O que
acontece é que, em muitos casos, os formulários para se cumprirem essas obrigações, para os contabilistas e
contribuintes preencherem, são disponibilizados muito tarde. Isto significa que, por exemplo, quando o prazo
para o cumprimento de uma obrigação termina em 31 de maio, e seria suposto que houvesse cinco meses para
que se pudesse proceder ao preenchimento do formulário, se o formulário é disponibilizado apenas 15 dias
antes, o prazo é muito encurtado e, portanto, torna-se completamente impossível cumprir a obrigação,
nomeadamente por um profissional que, às vezes, tem centenas de declarações para carregar.
O CDS, de facto, no Orçamento do Estado para 2017, apresentou já uma proposta de agilização do
calendário fiscal, no sentido de que houvesse pelo menos uma semana por mês em que os profissionais de
contabilidade não tivessem um prazo a terminar, mas essa proposta foi chumbada pela união das esquerdas
que suporta o Governo.
Desta vez, este ano, fizemos uma proposta bastante mais minimalista, no sentido de que, com 120 dias de
antecedência face ao termo do prazo em que o contribuinte e os contabilistas têm de cumprir a obrigação, o
formulário tenha de estar disponibilizado no Portal das Finanças; se isto não acontecer, então, por cada dia de
atraso da administração tributária, prorroga-se automaticamente o prazo. Isto, para deixarmos de ter, todos os
anos, esta discussão sobre a prorrogação do prazo.
Os Srs. Deputados dir-me-ão que o problema dos prazos e da prorrogação dos prazos e dos atrasos da
administração tributária não começou com este Governo. Não começou, de facto, com este Governo, como
também não começou com o anterior, é crónico, porque, infelizmente, nalguns casos, o desrespeito com que a
administração trata os contribuintes e os profissionais é crónico. Porém, isso não é desculpa para nada
fazermos; pelo contrário, torna até mais obrigatório que, rapidamente, façamos alguma coisa.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Portanto, pela nossa parte, aquilo que o CDS fará é apresentar um
projeto de lei, transformando a proposta que já apresentámos, estabelecendo, de uma vez para sempre, um
prazo…
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Ora!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — … e uma prorrogação automática, no caso de o fisco não cumprir.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe para concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Com certeza, Sr. Presidente.
Em relação ao projeto do PCP, no sentido de recomendarmos ao Governo que reveja o calendário fiscal, Sr.
Deputado Paulo Sá, mal não faz, mas tenho dúvidas de que um Governo que já disse que o ia fazer, e que o ia
fazer a partir de 1 de janeiro de 2018, sendo que, até agora, ainda não vimos nada, vá fazer alguma coisa por
causa de uma recomendação da Assembleia. Francamente, acho que mal não faz, mas também não vai fazer
bem nenhum, tanto mais que, relembro, o sistema fiscal é matéria de reserva relativa de competência da
Assembleia da República e, portanto, uma atuação do Governo sobre esta matéria terá de passar pela
Assembleia da República. Se calhar, Srs. Deputados, era mais prático fazermos nós, em vez de recomendarmos
ao Governo que o faça.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Leão, do
PS.
O Sr. Ricardo Leão (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero, em primeiro lugar, cumprimentar
e saudar os mais de 4000 peticionários, em particular a sua primeira subscritora, a Dr.ª Maria Filomena Simões,
aqui presente.
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I SÉRIE — NÚMERO 39
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Estamos perante uma petição que solicita a prorrogação do prazo para entrega da declaração modelo 22 do
IRC. O Grupo Parlamentar do PS, quer através das audiências que tem feito, quer pelas sugestões enviadas
pelas associações, pela Ordem ou mesmo por grupos de contabilistas certificados, que legitimamente nos fazem
chegar as suas opiniões, reconhece que este problema, que já existe há muitos anos e que nunca foi resolvido
— durante quatro anos e meio do anterior Governo do PSD e do CDS nada se fez, como aqui foi referido e
confirmado —, reside essencialmente na não disponibilização atempada dos formulários eletrónicos e das
aplicações por parte da Autoridade Tributária e Aduaneira, o que, naturalmente, tem gerado um desequilíbrio na
relação Estado/contribuinte.
Nesse sentido, os contabilistas certificados têm vindo a manifestar-se sobre o atraso com que a Autoridade
Tributária tem disponibilizado as aplicações de submissão das declarações eletrónicas modelo 22 e da própria
IES, muitas vezes em cima dos prazos de entrega definidos por lei, implicando que os mais de 70 000
contabilistas certificados tenham muito pouco tempo para entregar essas declarações, originando stress e
ansiedade, com possíveis erros originados por esse facto, recaindo, nesta situação, consequências criminais e
financeiras para os próprios.
Assim sendo, quer pelas respostas dadas às questões elaboradas pelo PS, quer pelo exposto no projeto de
resolução do PCP, o qual aproveito também para saudar, o Governo assume a sua disponibilidade para se
avaliarem os atuais prazos definidos isoladamente e as eventuais incongruências no Código, bem como
trabalhar com a Ordem dos Contabilistas Certificados e a própria AT (Autoridade Tributária e Aduaneira) para
se apresentar uma resposta de reorganização do calendário fiscal, com vista à sua aplicação a partir de 1 de
janeiro de 2018, na sequência, aliás, de reunião já havida entre o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e
a própria bastonária da Ordem, na passada semana.
Por isso, aproveito para, em nome do Grupo Parlamentar do PS, mostrar a nossa disponibilidade e abertura
para, no futuro, se abordarem outras matérias com a Ordem dos Contabilistas Certificados e também com outras
organizações representativas e com os próprios contabilistas certificados, que, legitimamente, têm colocado
questões sobre a renovação do Portal das Finanças, as férias fiscais, a simplificação do calendário fiscal, o justo
impedimento para os contabilistas certificados, ou, até mesmo, a relação existente com a própria Autoridade
Tributária e Aduaneira, sempre no sentido do equilíbrio da relação Estado/contribuinte, no normal cumprimento
das obrigações fiscais, por parte dos sujeitos passivos, em prol da valorização da profissão dos contabilistas
certificados, uma profissão de utilidade pública.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.as e Srs. Deputados, chegamos, assim, ao final dos nossos trabalhos.
Cumpre-me anunciar que a próxima reunião plenária terá lugar amanhã, às 15 horas, constando da respetiva
ordem do dia a interpelação ao Governo n.º 16/XIII (PS), sobre o tema «Portugal 2030».
Está, assim, encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 27 minutos.
Gráfico 1 — voltar
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25 DE JANEIRO DE 2018
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Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.