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Quinta-feira, 10 de maio de 2018 I Série — Número 82
XIII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2017-2018)
REUNIÃOPLENÁRIADE9DEMAIODE 2018
Presidente: Ex.mo Sr. Jorge Lacão Costa
Secretários: Ex.mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Idália Maria Marques Salvador Serrão António Carlos Bivar Branco de Penha Monteiro Sandra Maria Pereira Pontedeira
S U M Á R I O
O Presidente (Jorge Lacão) declarou aberta a sessão às
15 horas e 5 minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa dos projetos de lei n.os
858 a 866/XIII (3.ª), da apreciação parlamentar n.º 64/XIII (3.ª) e dos projetos de resolução n.os 1567 a 1594/XIII (3.ª).
Ao abrigo da alínea b) do n.º 2 do artigo 224.º do Regimento, teve lugar o debate quinzenal com o Primeiro-Ministro (António Costa), que respondeu às perguntas formuladas pelos Deputados Fernando Negrão (PSD), Porfírio Silva e Fernando Rocha Andrade (PS), Catarina Martins (BE), Assunção Cristas (CDS-PP), Jerónimo de Sousa (PCP), Heloísa Apolónia (Os Verdes) e André Silva (PAN).
Entretanto, a Câmara saudou a presença, na tribuna do corpo diplomático, do Presidente da Comissão de Segurança Nacional e Assuntos Exteriores do Parlamento da República Islâmica do Irão, acompanhado de uma delegação.
Procedeu-se a um debate sobre o Dia da Europa, tendo feito intervenções, além da Secretária de Estado dos Assuntos Europeus (Ana Paula Zacarias), que abriu e encerrou o debate, os Deputados Rubina Berardo (PSD), Margarida Marques (PS), Isabel Pires (BE), Pedro Mota Soares (CDS-PP), Paula Santos (PCP) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).
A Presidente (Teresa Caeiro) encerrou a sessão eram 17 horas e 50 minutos.
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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.as e Srs. Deputados, vamos dar início à sessão.
Eram 15 horas e 5 minutos.
Peço aos Srs. Agentes da autoridade o favor de determinarem a abertura das galerias.
Peço também ao Sr. Secretário Deputado Duarte Pacheco o favor de fazer os competentes anúncios à
Câmara.
O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e
foram admitidas, várias iniciativas legislativas.
Refiro, em primeiro lugar, os projetos de lei n.os 858/XIII (3.ª) — Desmaterialização de dissertações, teses e
outros trabalhos para concessão de graus académicos (Os Verdes), que baixa à 8.ª Comissão, 859/XIII (3.ª) —
Estabelece a realização de uma campanha de sensibilização e de um novo período de entrega voluntária de
armas de fogo, com vista ao desarmamento da sociedade (Os Verdes), que baixa à 1.ª Comissão, 860/XIII (3.ª)
— Cria o Programa Extraordinário de Ingresso de Pessoas com Deficiência na Administração Pública
(PEIPDAP) (CDS-PP), 861/XIII (3.ª) — Estabelece a obrigatoriedade de contratação de 2% de trabalhadores/as
com diversidade funcional (BE), 862/XIII (3.ª) — Revoga a alteração do limite de idade da validade da carta de
condução dos motoristas das categorias D1, D1E, D, DE e CE, alterado pelo Decreto-Lei n.º 40/2016, de 29 de
julho (BE), 863/XIII (3.ª) — Revogação do Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis (AIMI) (PSD), que baixa
à 11.ª Comissão, 864/XIII (3.ª) — Alteração ao Código do Imposto sobre Pessoas Singulares para dedução de
encargos com imóveis de jovens até 30 anos com contratos de arrendamento (PSD), que baixa à 11.ª Comissão,
865/XIII (3.ª) — Regula a utilização de dispositivos digitais de uso pessoal e permite a fotografia digital nas
bibliotecas e arquivos públicos (PS) e 866/XIII (3.ª) — Alteração da taxa especial dos rendimentos prediais
(PSD), que baixa à 11.ª Comissão.
Deu também entrada na Mesa a apreciação parlamentar n.º 64/XIII (3.ª) — Decreto-Lei n.º 23/2018, de 10
de abril, que altera a forma de distribuição dos resultados líquidos dos jogos sociais explorados pela Santa Casa
da Misericórdia de Lisboa (PSD).
Refiro ainda a entrada na Mesa dos projetos de resolução n.os 1567/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que
utilize todos os mecanismos disponíveis para impedir a compra do Grupo Media Capital pela Altice (PCP), que
baixa à 6.ª Comissão, 1568/XIII (3.ª) — Suspensão da eficácia e reavaliação do Regulamento da Avaliação do
Mérito dos Militares das Forças Armadas (PCP), que baixa à 3.ª Comissão, 1569/XIII (3.ª) — Recomenda ao
Governo que tome as medidas necessárias para a urgente requalificação e reabilitação da Escola Básica e
Secundária de Rebordosa (CDS-PP), que baixa à 8.ª Comissão, 1570/XIII (3.ª) — Promoção do emprego público
para as pessoas com deficiência e medidas para acesso à formação profissional e emprego com direitos (PCP),
1571/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que proceda à realização de obras de reabilitação da Escola Básica
2,3 Frei Caetano Brandão, em Braga (CDS-PP), que baixa à 8.ª Comissão, 1572/XIII (3.ª) — Urgente
requalificação da Escola Secundária de Póvoa de Lanhoso (PCP), que baixa à 8.ª Comissão, 1573/XIII (3.ª) —
Requalificação e realização urgente de obras na Escola Secundária de Amares (PCP), que baixa à 8.ª Comissão,
1574/XIII (3.ª) — Requalificação e realização urgente de obras em escolas do Agrupamento de Escolas Santos
Simões, Guimarães (PCP), que baixa à 8.ª Comissão, 1575/XIII (3.ª) — Urgente requalificação da Escola
Secundária Padre Benjamim Salgado (PCP), que baixa à 8.ª Comissão, 1576/XIII (3.ª) — Urgente requalificação
da Escola Básica 2/3 Frei Caetano Brandão (PCP), que baixa à 8.ª Comissão, 1577/XIII (3.ª) — Recomenda ao
Governo que suspenda o procedimento de elaboração do Programa Especial do Parque Natural de Montesinho,
no sentido de envolver na sua discussão e ponderação as autarquias e entidades e agentes locais do território
em causa (CDS-PP), que baixa à 11.ª Comissão, 1578/XIII (3.ª) — Requalificação e realização urgente de obras
na Escola Secundária de Barcelinhos (PCP), que baixa à 8.ª Comissão, 1579/XIII (3.ª) — Recomenda ao
Governo que diligencie pela adoção de medidas que possibilitem uma maior eficiência dos procedimentos
inspetivos aos operadores económicos (PAN), 1580/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo a adoção de medidas
urgentes para reforço de meios e intervenção nas Maternidades Daniel de Matos e Bissaya Barreto (PCP), que
baixa à 9.ª Comissão, 1581/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo a adoção de medidas que contribuam para a
melhoria da empregabilidade de pessoas com deficiência (PAN), 1582/XIII (3.ª) — Transparência nos processos
de alienação ao Fundo Nacional de Reabilitação do Edificado de imóveis do Estado (CDS-PP), 1583/XIII (3.ª)
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— Recomenda ao Governo que, em articulação com a Câmara Municipal de Lisboa, proceda à reconversão e
reabilitação dos edifícios que integram a Colina de Santana, em Lisboa, para que possam ser utilizados para
habitação, num programa a criar, ou já existente, com vista ao arrendamento para fins habitacionais a preços
moderados, principalmente dirigido a jovens e famílias de classe média (CDS-PP), 1584/XIII (3.ª) — Recomenda
ao Governo que proceda ao levantamento do património imobiliário da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa,
no sentido de criar um programa com vista à reabilitação ou construção de imóveis para arrendamento para fins
habitacionais a preços moderados (CDS-PP), 1585/XIII (3.ª) — Dinamização da Comissão Nacional da
Habitação (PSD), que baixa à 11.ª Comissão, 1586/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que crie um seguro de
renda (PSD), 1587/XIII (3.ª) — Aperfeiçoamento do Balcão Nacional do Arrendamento (PSD), que baixa à 11.ª
Comissão, 1588/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que crie um subsídio para o arrendamento em situações
de fragilidade súbita (PSD), 1589/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que crie um subsídio para o arrendamento
para famílias numerosas e monoparentais (PSD), 1590/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que proceda à
dragagem de canais de navegação e ao reforço de cordões dunares na costa algarvia (PS), que baixa à 11.ª
Comissão, 1591/XIII (3.ª) — Programa de cooperação entre o Estado e as autarquias locais para o
aproveitamento do património imobiliário público com vista ao arrendamento (PSD), 1592/XIII (3.ª) — Reposição
do limite de idade para o exercício da profissão de motorista de veículos pesados e garantia de não penalização
no valor da pensão de reforma (Os Verdes), 1593/XIII (3.ª) — Acompanhamento da aplicação de quotas de
emprego para pessoas com deficiência (Os Verdes) e, finalmente, Sr. Presidente, 1594/XIII (3.ª) — Limitação e
adaptação do transporte de animais vivos (Os Verdes), que baixa à 7.ª Comissão.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Muito obrigado, Sr. Deputado Duarte Pacheco. O «finalmente» tem, de
facto, um sentido muito expressivo.
Srs. Deputados, como sabem, da nossa ordem do dia consta, em primeiro lugar, o debate quinzenal com o
Primeiro-Ministro e, de seguida, um debate sobre o Dia da Europa.
Cumprimentando o Sr. Primeiro-Ministro e demais membros do Governo, vamos, assim, proceder ao início
do debate quinzenal, desta feita ao abrigo da alínea b) do n.º 2 do artigo 224.º do Regimento.
Para formular perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão, do PSD.
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, apresento os meus cumprimentos ao Sr. Primeiro-Ministro
e aos Srs. Membros do Governo.
Sr. Primeiro-Ministro, começo por um tema que é incontornável e que, para além de ser incontornável, nos
preocupa a todos, que tem a ver com o Sr. Eng.º José Sócrates e que, na gíria da comunicação, é designado
por «caso Sócrates».
Tenho um conjunto de perguntas muito claras e muito objetivas, que, tenho a certeza, estão na cabeça e no
pensamento de um número significativo de portugueses, e vou passar a fazer-lhe essas perguntas, Sr. Primeiro-
Ministro.
Primeira: por que razão o Partido Socialista demorou mais de três anos a demarcar-se de José Sócrates e
do seu comportamento?
Vozes do PSD: — Muito bem!
Protestos de Deputados do PS.
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Segunda: porque é que, mesmo depois da acusação judicial a José
Sócrates, no final do ano passado, o Partido Socialista manteve sempre o mesmo discurso?
Terceira pergunta: qual a razão por que só agora, em maio de 2018, o Partido Socialista muda de estratégia
e de discurso?
Quarta pergunta: foi com medo de ser contaminado eleitoralmente pelo comportamento de José Sócrates e
Manuel Pinho?
Vozes do PSD: — Muito bem!
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Protestos de Deputados do PS.
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Quinta pergunta, Sr. Primeiro-Ministro: para o PS e para o senhor, em
concreto, o que é que é mais importante, os votos e as eleições ou os princípios e as convicções?
Aplausos do PSD.
Era bom, Dr. António Costa, que se deixasse de respostas evasivas ou pretextos formais e desse finalmente
uma explicação clara sobre o que se passa. Esperemos que seja hoje, esperemos que não vá continuar a
refugiar-se atrás de outros atores políticos.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Joana Lima (PS): — Ao que chegámos! Não têm nada para dizer!
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro (António Costa): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Negrão, sendo este um
debate com o Primeiro-Ministro, é óbvio que o que o Sr. Deputado estaria à espera que eu lhe dissesse era que
o Secretário-Geral do Partido Socialista não está aqui para responder e que o debate com o Partido Socialista
será noutra circunstância.
Aplausos do PS.
Mas, se eu lhe desse esta resposta, o Sr. Deputado imediatamente diria: «Aí está! Está a refugiar-se em
formalismos para fugir a responder àquilo que lhe estou a perguntar!»
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — E diria muito bem!
O Sr. António Costa Silva (PSD): — E está!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Portanto, não obstante a manifesta deslealdade parlamentar da sua pergunta,
eu vou responder.
Aplausos do PS.
Não vou responder, obviamente, nem como Secretário-Geral do Partido Socialista nem como Primeiro-
Ministro, vou responder como António Costa, na mesma qualidade em que na semana também falei sobre o
assunto.
E digo-lhe o seguinte: desde há muitos anos que tenho o mesmo entendimento sobre aquela que deve ser a
interpretação do princípio da separação e interdependência dos poderes.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Ah!…
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Tem dias!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Nesse entendimento, entendo que temos um sistema de justiça único no mundo,
que tem vantagens e inconvenientes, mas que tem uma enorme vantagem: assegura a todos os cidadãos que
nenhum de nós está acima da lei e que a investigação criminal é desempenhada com toda a independência.
A Sr.ª Rosa Maria Albernaz (PS): — Muito bem!
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O Sr. Primeiro-Ministro: — Há um outro princípio absolutamente fundamental, que é o da presunção da
inocência. Hoje em dia, o estatuto de arguido, que, como sabe, é um estatuto em benefício de quem é
investigado e para proteção dos direitos próprios de quem é investigado, é entendido como um juízo de pré-
culpabilidade na sociedade portuguesa. Sempre entendi também que nunca devemos trazer para o debate
público aquilo que deve ser discutido no local próprio, que é o tribunal.
É este o entendimento que tenho e que tive sempre e, por isso,…
Protestos de Deputados do PSD.
Por isso, relativamente ao caso do Eng.º José Sócrates que refere, desde a primeira hora disse que, não
obstante as relações de amizade, de camaradagem, entendia que o Partido Socialista se devia manter apartado
desse debate e devia confiar ao sistema judiciário a investigação e o exercício do direito de defesa a quem tem
direito de defesa.
Esta posição é a que tive desde o início e não mudei em nada a minha posição sobre essa matéria. Por isso,
na semana passada, quando fui interrogado sobre a questão, voltei a repetir o mesmo, não deixando esconder
aquilo que é óbvio hoje, ontem e desde o início: obviamente, se aqueles factos vierem a ser provados, isso
constitui uma desonra para a democracia, assim como, se os factos não vierem a ser provados, é a boa
demonstração de que o sistema de justiça funciona, o que é uma honra para a nossa democracia.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão.
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, a deslealdade não é do Parlamento,
a deslealdade é de V. Ex.ª para com os portugueses, porque não respondeu a uma única das perguntas que lhe
referi.
Aplausos do PSD.
Protestos do PS, batendo com as mãos nos tampos das bancadas.
Sr. Primeiro-Ministro, em 31 de dezembro de 2014, na visita que fez ao Sr. Eng.º José Sócrates na prisão, à
saída, o senhor disse: «Deixemos a justiça funcionar em todos os seus valores, queremos assegurar o princípio
da presunção da inocência».
A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Não saem disso! Não têm mais nada!
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — A semana passada e durante esta semana ouvimos altos dirigentes do
Partido Socialista dizerem e clamarem que estavam envergonhados com o que se passava,…
A Sr.ª Joana Lima (PS): — Tenham vergonha vocês!
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — E V. Ex.ª, Dr. António Costa, disse que se sentia desonrado,…
O Sr. Primeiro-Ministro: — Não!
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — … o que quer dizer que quem trouxe toda esta matéria para o plano
político não foi a oposição, foi o Governo, foi o Partido Socialista, foi V. Ex.ª!
Aplausos do PSD.
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Protestos do PS.
Sr. Primeiro-Ministro, mais uma pergunta sobre esta matéria, à qual responderá se assim o entender: as
confissões de vergonha e de desonra revelam o reconhecimento de que alguma coisa aconteceu, e alguma
coisa de grave aconteceu.
A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Ai, valha-me Deus! O que será?!
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — E, por isso, pergunto-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, se, afinal, a bancarrota foi
culpa da crise ou foi o resultado de nefastas decisões tomadas pelo Governo a que V. Ex.ª pertenceu, presidido
por José Sócrates?
Aplausos do PSD.
Protestos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Negrão, convido-o a ouvir as declarações
que prestei na semana passada sobre esta matéria. Eu não disse, em circunstância alguma, que esta ou aquela
acusação, este ou aquele facto, esta ou aquela pessoa me envergonhavam ou me desonravam. Eu disse aquilo
que qualquer um pode e deve dizer,…
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (Pedro Nuno Santos): — Até vocês!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … que é o seguinte: se aqueles factos vierem a ser provados no sistema de
justiça, isso constituiria uma desonra para a democracia,…
Aplausos do PS.
… como, da mesma forma, acrescentei que o sistema de justiça assenta no valor da independência da
investigação e da presunção da inocência e que, se não vierem a ser provados, isso demonstra o funcionamento
do sistema de justiça, o que é uma honra para a nossa democracia. Eu não me substituo a ninguém, e muito
menos ao sistema de justiça, no julgamento de quem quer que seja.
A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — E como V. Ex.ª sabe, por maioria de razão, por ter sido um ilustre magistrado,
mas também por ter sido já parte em processo-crime em outras condições,…
Aplausos do PS.
O Sr. Primeiro-Ministro: — …ninguém tem direito a julgar ninguém a não ser o magistrado, de acordo com
o processo próprio que é o processo penal.
O Sr. Pedro Alves (PSD): — Isso devia ter dito há anos!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Portanto, da minha parte, e creio que da parte das demais pessoas que se
sentam na bancada do Partido Socialista, não houve qualquer mudança quanto à posição sobre esta matéria.
Aplausos do PS.
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Quanto à crise das dívidas soberanas, um fenómeno que, como sabe, não se esgotou em Portugal mas que
atingiu vários outros países, o meu entendimento hoje é o mesmo de então: é uma crise que tem uma raiz
sistémica na construção defeituosa da zona euro, que expôs de uma forma desnecessária países que estavam
em situação particularmente grave na sequência de decisões erráticas que a União Europeia tinha adotado em
2009, para fazer face à Grande Depressão de 2008.
E já agora, Sr. Deputado, só para sua tranquilidade, apesar de tudo, eu tinha saído do Governo em 2007 e
já não fazia parte desse Governo.
Vozes do PSD: — Ah!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas não foi por isso que deixei de ser apoiante desse Governo, que apoiei até
ao último dia de exercício das suas funções.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem novamente a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão.
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, para reiterar que não foi o PSD que
trouxe para a ribalta a discussão do caso José Sócrates.
Risos do PS.
O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Saiu de costas a fingir que não entrou!
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Nunca dissemos uma palavra antes de ouvirmos os responsáveis políticos
máximos do Partido Socialista dizer que estavam envergonhados com aquilo que aconteceu. E, portanto,
estamos legitimados para discutir politicamente este caso.
Aplausos do PSD.
E mais, Sr. Primeiro-Ministro — eu diria mesmo, se me permite, Dr. António Costa —, e mais: não é a primeira
vez que o Partido Socialista traz isto para a cena pública. Num debate, em dezembro de 2014, António José
Seguro acusou-o de ser apoiado por um partido invisível, que mistura negócios e política. Portanto, esta não foi
a primeira vez, isto já tem tempo.
Protestos do PS.
O problema é um problema grave, a sociedade sente este problema, precisa de respostas às suas perguntas
e o Sr. Primeiro-Ministro não respondeu a uma única pergunta das que lhe foram formuladas.
Aplausos do PSD.
Sr. Primeiro-Ministro, mudemos de tema, para o qual esperemos que tenhamos resposta.
Protestos do PS.
Eu gostava de poder continuar, mas temos outros temas, eventualmente tão graves como este, como é o
caso dos incêndios.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Não respondeu! Não respondeu a nenhuma pergunta!
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O Sr. Fernando Negrão (PSD): — A propósito da eventualidade, que ninguém deseja, de se repetir aquilo
que aconteceu em junho e em outubro do ano passado, Sr. Primeiro-Ministro, das tragédias que ocorreram
naquela altura, o Sr. Presidente da República disse ontem que não se recandidatará ao cargo se tal vier a
acontecer, ao contrário de V. Ex.ª — e isso é revelador —,…
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — …que disse imediatamente que não se demite se tal situação se repetir.
Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, peço que esclareça os portugueses se esta sua posição decorre do facto de
achar que o seu Governo não teve qualquer responsabilidade nos incêndios do ano passado, e, ainda, se
voltarem a acontecer tragédias semelhantes, se o Sr. Primeiro-Ministro continuará a negar as suas
responsabilidades.
Aplausos do PSD.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Esta sessão de trabalhos do PSD anda muito por baixo!
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro, para responder.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Negrão, digo-lhe a si o que já tive ocasião
de dizer: assumo sempre as minhas responsabilidades e a responsabilidade de um governante, quando há um
problema, não é demitir-se mas resolvê-lo. É isso que farei.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem ainda a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão.
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Mas, Sr. Primeiro-Ministro, a questão não é essa, não é o aparecimento
do problema, é a incompetência que está por detrás do problema. É a incompetência e a irresponsabilidade que
leva a que o problema apareça!
Aplausos do PSD.
Esse é que é o problema, Sr. Primeiro-Ministro, e por isso ainda há pouco lhe falava em princípios e em
convicções.
Sr. Primeiro-Ministro, estamos a poucas semanas do início da época dos incêndios florestais. Mais uma vez,
o seu Governo, em vez de dar sinais de tranquilidade aos portugueses, os sinais que têm surgido são sinais de
incompetência e de um acumular de casos e de erros…
Vozes do PS: — Oh!
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — … que só nos podem deixar preocupados.
Vou dar-lhe alguns exemplos, Sr. Primeiro-Ministro.
Os meios aéreos necessários ainda não estão garantidos. Ainda hoje um jornal titulava que desde 2006 —
altura em que o senhor era Ministro da Administração Interna — que Portugal não tem, em maio, tão poucos
aviões para combater incêndios.
A auditoria da Proteção Civil ao incêndio de Pedrógão Grande revelou falhas graves, respostas tardias e
desorganização, para além de o relatório ter estado escondido durante seis meses, sem ninguém saber onde
estava, e não ter sido divulgado publicamente.
Os agricultores, empresários e industriais afetados pelo incêndio de 2017 continuam à espera de ajudas do
Estado.
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No passado dia 1 de maio, o Grupo de Intervenção de Proteção e Socorro (GIPS) colocado no Sardoal não
pode ajudar no combate ao incêndio por não ter disponível um helicóptero e um carro todo o terreno.
Nesta segunda-feira, demitiu-se o Comandante Operacional Nacional da Proteção Civil, apenas cinco meses
após ter tomado posse.
Além disso, Sr. Primeiro-Ministro, soubemos também hoje que o Grupo de Intervenção de Proteção e Socorro
ainda não tem luvas, fatos, telemóveis, computadores, nem camas para poderem descansar.
Sr. Primeiro-Ministro, perante estes sinais reveladores de quem nada aprendeu com o passado, pergunto-
lhe se temos hoje, dia 9 de maio, um dispositivo de combate aos fogos devidamente apetrechado e pronto a
entrar em ação para o combate de tragédias que possam vir a ocorrer?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Negrão, como sabe, no dia 21 de outubro
do ano passado, o Conselho de Ministros aprovou uma resolução que deu integral execução às recomendações
da Comissão Técnica Independente, criada nesta Assembleia da República. Desde então, temos vindo a
desenvolver e a executar a par e passo as decisões tomadas. Uma dessas decisões passa, designadamente,
por um reforço significativo do Grupo de Intervenção de Proteção e Socorro, que tinha sido criado precisamente
em 2006.
Neste momento, o que estamos a discutir é a duplicação da capacidade de intervenção desse Grupo, que
tem vindo a ser formado e que vai ser equipado, em ritmo acelerado, porque levantar uma força desta dimensão,
que não foi reforçada durante 10 anos e que está agora a ser reforçada nestes meses, é um trabalho em tempo
record que estamos a executar.
Portanto, iremos continuar, a par e passo, a cumprir as resoluções, a cumprir a Diretiva Operacional Nacional,
para que o dispositivo esteja nas melhores condições possíveis por forma a enfrentar a ameaça quando ela se
concretizar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem novamente a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão.
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, não posso deixar de lhe dizer que
essa é a resposta padrão que tem dado a todas as nossas perguntas sobre incêndios.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Mas não resolve o problema!
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — E os problemas amontoam-se, os problemas renovam-se e nós não
vemos nenhuma capacidade política nem operacional para resolver estes problemas. Ontem foi penoso ouvir o
Sr. Ministro da Administração Interna, na Comissão, a responder às perguntas dos Srs. Deputados. Foi penoso
porque não respondeu a uma única pergunta!
Vozes do PSD: — Exatamente!
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Foi como agora!
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Foi penoso porque não teve uma resposta concreta para dar aos
portugueses, explicando-lhes o que se está a passar e como está o Governo preparado para resolver os
problemas dos portugueses.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Esgotou o seu tempo, Sr. Deputado.
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O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Primeiro-Ministro, nós não fazemos estas perguntas porque estamos
preocupados com a nossa posição política.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Não, não!…
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Não, Sr. Primeiro-Ministro! Nós estamos preocupados com os
portugueses, nós queremos ajudar, Sr. Primeiro-Ministro! E a pergunta que aqui lhe deixo, para terminar a minha
intervenção,…
Risos do Primeiro-Ministro.
Ah! Está a achar muita graça! Não sei a quê, não é? Esse seu sorriso é revelador também!
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua.
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — A pergunta que aqui fica — e termino, Sr. Presidente —, é a seguinte:
nós queremos ajudar. Diga-nos, Sr. Primeiro-Ministro, como é que podemos ajudar?
Aplausos do PSD.
Protestos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra, para responder, o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Negrão, permita-me que lhe diga, com
toda a franqueza,…
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Franqueza?! Isso é para rir!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … que os dois temas que escolheu para este debate dizem tudo sobre o estado
do PSD e sobre qual é a verdadeira postura do PSD no debate político em Portugal.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD, batendo com as mãos nos tampos das bancadas.
Mas não farei o favor de o acompanhar nem no tom nem na emoção. Manter-me-ei, simplesmente, sereno,
determinado, tal como está o Governo a cumprir a sua obrigação, como estivemos, ao longo deste inverno,
incansáveis a mobilizar o País para a grande tarefa da limpeza dos matos, como estamos a fazer, num esforço
enorme para criar os meios e reforçar as condições para executar o relatório de uma comissão técnica
independente, criada, em boa hora, nesta Assembleia, por iniciativa do PSD, e aprovado por unanimidade. Já
agora, que o PSD não liga nenhuma às suas recomendações, ao menos que haja alguém, o Governo, que
respeite a opinião técnica avalizada da Comissão criada pela Assembleia da República. Nós estaremos serenos
e determinados, sem agitação e sem gesticular.
Boa tarde, Sr. Deputado.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — O Sr. Deputado Fernando Negrão está a pedir a palavra para que efeito?
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O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, sei que esta não é uma figura regimental, mas é só para
dizer ao Sr. Primeiro-Ministro…
Protestos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado Fernando Negrão, peço-lhe só um momento.
Ó Sr. Deputado, compreenda,…
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Eu compreendo.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — … tem experiência parlamentar suficiente, que só posso dar-lhe a palavra
se invocar a figura regimental para o efeito.
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, a figura regimental… Só pretendo acenar ao Sr. Primeiro-
Ministro e dizer-lhe: boa tarde, Sr. Primeiro-Ministro.
Protestos do PS.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Obrigado!
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.as e Srs. Deputados, não dei a palavra a mais ninguém.
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Triste figura, Sr. Deputado!… Não deveria ter-lhe dado a palavra, Sr.
Presidente!
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço a vossa atenção, Srs. Deputados.
Quero aproveitar para informar a Câmara de que se encontra na tribuna do corpo diplomático uma delegação
parlamentar da República Islâmica do Irão, presidida pelo Presidente da Comissão de Segurança Nacional e
Assuntos Exteriores do respetivo Parlamento, a quem saúdo.
Aplausos, de pé, do PSD, do PS, do BE, do CDS-PP, do PCP, de Os Verdes e do PAN.
Passamos agora ao Grupo Parlamentar do PS, mas, antes, peço à Câmara que ajude a criar condições para
que o debate possa prosseguir.
Tem a palavra o Sr. Deputado Porfírio Silva.
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o Grupo Parlamentar do PS não vem aqui
para um debate partidário, que faz noutras sedes, vem aqui para um debate parlamentar sobre as missões do
Governo e do Parlamento.
Se outros não entendem as suas responsabilidades nesta Casa, nós não os seguimos nessa deriva.
Aplausos do PS.
Sr. Primeiro-Ministro, o Governo tem agido de forma estratégica para que a ciência, a tecnologia, a inovação
e o ensino superior, na sua ligação sistémica, façam do conhecimento um instrumento decisivo de
desenvolvimento económico e de coesão social e territorial.
Um dos aspetos cruciais desta estratégia é o combate à precariedade laboral no ensino superior e na ciência,
com o diploma do emprego científico, com o chamado «regime transitório do ensino politécnico» e com o
PREVPAP (Programa de Regularização Extraordinária dos Vínculos Precários na Administração Pública), que,
também aqui, se aplica aos trabalhadores que, cumulativamente, satisfaçam necessidades permanentes e não
tenham um vínculo adequado, sem nunca contornar as regras estatutárias das carreiras, já que o PREVPAP foi
concebido precisamente para valorizar as carreiras.
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Para mudar uma lógica entranhada que concebe erradamente a precariedade como uma facilidade de
gestão, o Governo promove um combate estrutural à precariedade, designadamente com a revisão do regime
jurídico de graus e diplomas, que faz depender a acreditação de ciclos de estudos da valorização e do
desenvolvimento sustentado das carreiras.
Contudo, Sr. Primeiro-Ministro, a verdadeira promoção do emprego científico é a criação de mais emprego
científico. O programa Estímulo ao Emprego Científico é isso que está a fazer, com várias linhas de ação, com
concursos para candidaturas individuais para planos de emprego científico nas instituições, reforço e criação de
unidades de I&D, projetos de I&D, reforçando, todas estas modalidades, o emprego científico, com a meta das
5000 contratações de investigadores doutorados até ao final da Legislatura.
Mas a criação sustentada de emprego científico passa pela modernização da economia, através da inovação
e da ciência. O ano de 2016 foi um ano de viragem: a despesa em I&D, que tinha vindo a diminuir desde 2010,
voltou a aumentar, e aí retomámos a convergência; aumentou o peso dos investigadores na população ativa,
sendo que a contratação aumentou mais no privado do que no público, e podemos perguntar: porquê? Porque
o investimento público puxou pelo investimento privado, porque as políticas públicas contam, porque este
Governo voltou a apostar no reforço e na diversificação das instituições, no enraizamento territorial do
conhecimento, ligando ensino superior, investigação e atividades sociais e económicas promotoras de coesão.
A Sr.ª Susana Amador (PS): — Muito bem!
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Por exemplo, com o Programa de Modernização e Valorização dos Institutos
Politécnicos, mas também com o programa INTERFACE, de que destaco aqui o vetor laboratórios colaborativos,
estando seis já criados em áreas tão diferentes como as culturas de montanha, a vinha e os vinhos portugueses,
a transformação digital da indústria, a gestão integrada da floresta e do fogo, o Atlântico, as tecnologias e os
produtos verdes do oceano.
Claro que há muito caminho para andar e persistem grandes desafios. Por exemplo, para o País alcançar o
objetivo do investimento global em I&D de 3% do PIB até 2030, precisamos de aumentar a parte do investimento
global no investimento nacional em I&D até dois terços. Isso passa pelo prosseguimento das estratégias de
criação de interfaces entre instituições diferentes e também, por exemplo, para enfrentar a aceleração das
mutações provocadas pela novas formas de automação, pelo digital, pela inteligência artificial e pelo uso
económico de grandes volumes de dados, precisamos de desenvolver muito o investimento social na educação
avançada de adultos, no retorno, sempre que necessário, à escola e ao ensino superior, para que a
transformação dos empregos não redunde em desemprego nem em exclusão.
Sr. Primeiro-Ministro, assim, a pergunta que lhe faço é a seguinte: estando em curso os trabalhos
preparatórios para o próximo quadro financeiro plurianual da União Europeia, e porque as melhores fases da
nossa pertença europeia se encontram nos momentos de convergência entre os interesses nacionais e os
interesses comuns, em que medida podemos esperar que a nossa estratégia para pôr o conhecimento ao serviço
da inovação social encontra, no quadro europeu, um ecossistema favorável aos objetivos nacionais, e como
entende agir o Governo com esse objetivo?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Porfírio Silva, a estratégia de desenvolvimento que
temos apresentado ao País tem a inovação como motor do desenvolvimento.
A inovação exige um investimento continuado em toda a fileira do conhecimento. Começa, necessariamente,
com a universalização do pré-escolar a todas as crianças com três anos e tem de concluir-se com todos os
mecanismos de transferência do conhecimento para o tecido empresarial. É toda esta fileira que temos de
trabalhar e não há melhor forma de transferir conhecimento para o tecido empresarial que não seja o reforço do
emprego qualificado. Por isso, mais e melhor emprego é indissociável desta estratégia.
O emprego científico é, obviamente, essencial, porque sem investimento em ciência, sem aplicação do
conhecimento científico, não é possível extrair os benefícios desse conhecimento.
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O País acumulou, ao longo de anos, práticas desadequadas de substituir contratações, que não eram
permitidas ou que não tinham quadro onde fossem possíveis, pelas mais diferentes soluções de precariedade
e, inclusive, o recurso a bolsas, que deveriam ser de estudo, como forma de financiar verdadeiros contratos de
trabalho.
Ora, hoje, temos simultaneamente três instrumentos a funcionar: em primeiro lugar, o concurso para
candidaturas individuais, no âmbito da FCT (Fundação para a Ciência e a Tecnologia), que encerrou já no
passado dia 16 de fevereiro e que recebeu mais de 4000 candidaturas para as 500 vagas que estão abertas;
em segundo lugar, o concurso institucional para mais 400 projetos de investigação, que encerrou em 22 de
março; e, em terceiro lugar, um mecanismo de contratação, que as instituições poderão abrir até agosto de
2018, relativo à abertura dos concursos necessários para a contratação de pessoas que, exercendo atividades
como bolseiros, exercem, efetivamente, atividades de trabalho subordinadas.
Eu próprio, ainda hoje, tive oportunidade de contactar e reunir pessoalmente com várias instituições
científicas, assim como tenho mantido contacto com vários Srs. Reitores, tendo em vista dinamizar a aplicação
deste projeto. Este processo corre em paralelo com o mecanismo geral que existe na administração
relativamente ao PREVPAP, e que também se aplica ao tecido universitário.
É, por isso, essencial também aqui combater a precariedade, porque quanto mais estabilidade tivermos
melhor qualidade teremos na investigação e na sua aplicação ao serviço de uma estratégia de inovação como
motor de desenvolvimento da nossa economia e da nossa sociedade.
Essa é a estratégia que temos vindo a desenvolver. Como aqui recordou, temos uma meta clara, que é criar
5000 postos de emprego científico até ao final da Legislatura, e é nesse objetivo que temos vindo a trabalhar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem agora a palavra o Sr. Deputado Fernando Rocha Andrade, do Grupo
Parlamentar do PS.
O Sr. Fernando Rocha Andrade (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro,
conhecemos, na semana passada, a proposta da Comissão Europeia relativamente ao envelope financeiro
global para o quadro financeiro plurianual.
Numa primeira leitura, parece que essa posição coloca, de certa maneira, os interesses portugueses numa
situação difícil, porque, se me permite, vou compará-la com a posição preliminar defendida pelo Governo
português.
Defendia o Governo português a manutenção dos fundos em matéria de coesão e de agricultura, o reforço
num conjunto de programas de gestão centralizada, que correspondem a prioridades como as migrações ou a
defesa, e defendia ainda o Governo português — associando-se, aliás, a propostas do Parlamento Europeu —
, de forma consequente, uma vez que o que estava a defender era um aumento do volume financeiro global dos
fundos, o aumento dos recursos à disposição da União Europeia, nomeadamente sob a forma de recursos
próprios tributários.
Tratava-se, em vários casos, de medidas que se justificariam por si próprias enquanto tributações que são
necessárias por reforçarem a equidade fiscal no espaço da União Europeia, como é, por exemplo, o caso da
tributação das plataformas digitais, em que uma tributação europeia substituiria a inexistente tributação dessa
enorme criação de riqueza ao nível nacional.
O que nos é dado na proposta inicial da Comissão é que o nível global do financiamento disponível para o
quadro financeiro plurianual mantém-se, mais ou menos, em termos nominais, havendo, efetivamente, o tal
reforço dos programas de gestão centralizada, mas, uma vez que a Comissão não deu desenvolvimentos às
propostas de recursos próprios tributários, perdendo, assim, uma oportunidade de reforçar a justiça fiscal na
União, o que acontece é que aquele aumento dos programas de gestão centralizada é realizado à custa da
diminuição significativa tanto dos fundos destinados à coesão quanto dos fundos destinados à agricultura.
Sr. Primeiro-Ministro, uma vez que me parece que a Comissão teve falta de ambição e de sentido de
oportunidade para contribuir para uma maior justiça fiscal e maiores recursos ao nível da comunidade, pergunto:
qual será agora a orientação que o Governo português vai seguir na negociação, por forma a que seja ainda
possível salvaguardar os interesses de Portugal nessa matéria?
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Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Rocha Andrade, a negociação do
próximo quadro financeiro plurianual, a par da reforma da união económica e monetária, são duas questões
centrais para Portugal no quadro da União Europeia. E o quadro financeiro plurianual é mesmo a questão central
para o desenvolvimento do País nos próximos anos, tendo em conta a elevada dependência que tem, ao nível
da sua capacidade de investimento, dos fundos estruturais.
O que podemos dizer sobre o que é conhecido da proposta da Comissão é que é um mau ponto de partida.
Todos sabíamos que o desenho do próximo quadro financeiro plurianual seria difícil: por um lado, a saída do
Reino Unido privava a União Europeia de um importante contribuinte; por outro lado, sabíamos que havia novas
prioridades assumidas pela União Europeia e que careciam de financiamentos. O desafio da gestão dos fluxos
migratórios e da integração dos migrantes, o reforço das medidas de combate ao terrorismo e a necessidade de
investirmos na inovação e no conhecimento como condição essencial para gerirmos o futuro da sociedade digital
eram novas dimensões que exigiam necessariamente a alocação de novas fontes de financiamento.
Perante isto, era necessário haver maior ambição e, por isso, dissemos, desde o princípio, que para dar
resposta a estas novas realidades não podiam servir como válvula de ajustamento nem a política de coesão
nem a política agrícola comum.
A política agrícola comum e a política de coesão fazem parte da identidade da União Europeia e ambas
provaram bem. E o pior que uma instituição pode fazer é abandonar o que já provou bem para vir financiar o
que de novo deseja fazer.
Ora, nós desejamos que a União Europeia faça o que tem a fazer de novo, mas que não sacrifique nada do
que tem feito bem até agora. E isso exige duas coisas: por um lado, um aumento das contribuições nacionais,
e daí Portugal ter assumido prontamente a disponibilidade para aumentar a sua contribuição nacional para a
União Europeia, sendo que o Comissário Oettinger propôs inicialmente um aumento de 1,2% e o Parlamento
Europeu propôs um aumento de 1,3%, mas todos devíamos assumir o compromisso de contribuir mais para
termos uma melhor União Europeia; por outro lado, o reforço dos recursos próprios da União através das
tributações de um conjunto de atividades que são dificilmente tributáveis a nível nacional. As plataformas digitais
são o melhor exemplo disso, mas, seguramente, as transações financeiras também são um exemplo que não
devemos nem podemos ignorar, assim como a tributação das atividades particularmente poluentes e que são
contrárias ao objetivo mobilizador que a Europa assumiu, de descarbonização do conjunto da sociedade e de
cumprimento dos objetivos do Acordo de Paris.
Ora, o que verificamos na proposta da Comissão é que, em vez de apostar num reforço do orçamento
comunitário, propõe manter tudo como estava, com a diferença de reforçar, e bem, o investimento em ciência e
de criar um mecanismo interessante de apoio às reformas — Portugal, aliás, propôs e tem defendido esse
mecanismo —, de modo a que se resolvam problemas estruturais e se favoreça a convergência dos Estados-
membros, o que implica um corte muito significativo na política agrícola comum e um corte ainda mais
significativo na política de coesão.
Não são conhecidos ainda os quadros nacionais. Sabemos que a proposta global aponta para um corte de
5% na despesa com a política agrícola e de 10% na despesa com a política de coesão. Seja qual for a situação
— e há quem tenha suspeitas de que os cortes relativamente a Portugal serão superiores aos da média —,
consideramos esta proposta um mau ponto de partida, pelo que não a poderemos aceitar.
Portanto, a posição com que partimos é, como sempre, construtiva e de acordo com os objetivos que
definimos: não aos cortes na política de coesão; não aos cortes na política agrícola, sobretudo aos cortes no
segundo pilar da política agrícola; reforçar o investimento na investigação e inovação; reforçar a capacidade de
integração dos migrantes nas sociedades europeias; ter uma gestão ativa dos fluxos migratórios,
designadamente por via dos programas de apoio ao desenvolvimento do continente africano; e investir no
combate ao terrorismo, que é uma ameaça global que impende sobre todos nós.
Do que esta Europa precisa é de ter um orçamento à medida da sua ambição. Do que os europeus
verdadeiramente não gostam é de que a Europa lhes continue a prometer mais do que aquilo que, efetivamente,
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depois, é capaz de cumprir. Isso é que desilude os europeus, isso é que gera o populismo, isso é que gera o
antieuropeísmo.
Se queremos uma Europa forte, temos de ter um orçamento à medida da Europa forte que desejamos e que
todos precisamos que seja.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para formular perguntas, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins,
do Bloco de Esquerda.
A Sr.ª CatarinaMartins (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, os médicos estão em greve; este mês
começou com uma outra greve, a dos assistentes operacionais, e está marcada para o final de maio a greve
dos técnicos superiores de diagnóstico e terapêutica. Em março, foram os enfermeiros a fazer greve.
O que todos estes trabalhadores querem, tal como os utentes, é defender o Serviço Nacional de Saúde. E o
Ministro da Saúde já veio reconhecer que as reivindicações são justas, mas diz que não há recursos. Ora, não
é verdade. Temos 800 milhões de euros que estão a ser usados para ir além da meta do défice que já estava
acordada. Portanto, existem recursos, o que é necessário é que o Ministro decida se quer ser Mário Centeno ou
Ministro da Saúde e que o Governo decida se quer ser parte da solução ou do problema, porque os trabalhadores
da saúde são, seguramente, a parte fundamental da solução.
Aplausos do BE.
Sr. Primeiro-Ministro, refiro-me agora à prevenção de incêndios, porque julgo que é fundamental que
tratemos este tema com alguma seriedade.
Não podemos repetir a tragédia de 2017 no verão de 2018. No entanto, há problemas na preparação: o
Comandante Operacional Nacional demitiu-se e os meios aéreos e logísticos estão atrasados.
Não ignoramos que haja quem aposte na chantagem como forma de negócio e sabemos que as mesmas
empresas de meios aéreos que operam em Portugal já foram investigadas em Espanha e que há mais interesses
contraditórios que se movem neste mundo. Cabe ao Governo denunciar e atuar. E julgo que é importante para
o País ter hoje uma palavra de tranquilidade, da parte do Primeiro-Ministro, sobre aquilo com que conta.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, comecemos pelo fim.
Como sabe, uma das decisões fundamentais levada a cabo foi a de acabar com esse conceito de «época de
incêndios». Portanto, o que estamos a fazer neste momento é a antecipar o que nos anos anteriores foi previsto
acontecer mais tarde.
Neste momento, do conjunto do dispositivo que foi definido para este ano — e é superior àquele de que
dispusemos nos anos anteriores —, creio que só relativamente a oito meios aéreos é que ainda não está
identificada a possibilidade de contratação. Quanto a todos os outros, estão contratados, aliás, a generalidade
deles já está em solo nacional, e aguardam o visto do Tribunal de Contas para poderem operar.
Mas gostaria de chamar a atenção para o facto de que a própria lei prevê que, em caso de necessidade, os
meios aéreos possam atuar mesmo sem o visto prévio do Tribunal de Contas, se for essencial a sua intervenção.
Ou seja, se hoje houver um incêndio onde esses meios aéreos tenham de atuar, a lei prevê que, legalmente,
eles possam atuar mesmo sem terem o visto prévio do Tribunal de Contas. O essencial era que eles estivessem
cá, porque se não estivessem não podiam atuar. Portanto, estamos em condições de atuar, se for necessário.
Sr.ª Deputada, o País ainda não deu conta, porque só dá conta quando as televisões vão ao terreno, mas
sabe quantos incêndios é que foram apagados no último fim de semana? Foram apagados 222 incêndios.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Não foi, com certeza, com meios aéreos, porque esses não podem voar!
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O Sr. Primeiro-Ministro: — Portanto, o sistema existe e está a responder.
Perguntarão: «O Tribunal de Contas vai dar o visto?». Não me posso antecipar à decisão do Tribunal de
Contas, mas o que sabemos é que rompemos o cerco que existia relativamente às dificuldades de contratação
e foi possível ir a Itália buscar 20 meios aéreos que não tínhamos conseguido encontrar nos concursos que
abrimos, de forma a podermos dispor dos meios necessários para gerir o dispositivo de acordo com o que está
previsto.
Sr.ª Deputada, relativamente à primeira questão que colocou, acho que não vale a pena dramatizar a
existência de greves, porque elas fazem parte da essência da democracia. Nenhum de nós acha que a greve
não faz parte da essência da democracia.
É evidente que temos bem consciência da necessidade de, simultaneamente, ir fazendo o que é necessário
fazer, reforçando os meios do Serviço Nacional de Saúde e melhorando as condições de todos os que trabalham
no Estado. Ora, ao longo destes dois anos e meio, temos vindo a fazer ambas as coisas, pois eliminámos os
cortes salariais, eliminámos a sobretaxa, repusemos o horário das 35 horas, repusemos os feriados que tinham
sido cortados e repusemos, este ano, as progressões nas carreiras. Portanto, temos vindo a reestabelecer no
Estado a normalidade, bem como os direitos dos trabalhadores do setor público.
Além disso, também temos vindo a reforçar o número de pessoas que trabalham no Serviço Nacional de
Saúde. Hoje, há mais 8000 pessoas a trabalhar no Serviço Nacional de Saúde do que havia no início desta
Legislatura. A Sr.ª Deputada pode dizer-me que ainda não são suficientes e é claro que não, aliás, por isso,
iremos continuar a fazer esse reforço.
Como já foi esclarecido, não temos uma folga de 800 milhões de euros, o que temos são menos 800 milhões
de euros no défice deste ano. A folga que temos deve-se à boa gestão orçamental, que fez com que pagássemos
menos juros e devêssemos menos dinheiro, o que é uma boa notícia, e com essa folga de 74 milhões de euros,
que foi o que estimámos ter poupado em juros, vamos aumentar o reforço de verbas.
O Programa de Estabilidade prevê, aliás, um aumento de 350 milhões de euros com as despesas de pessoal
nos próximos anos. Claro que não são 350 milhões de euros só para o Serviço Nacional de Saúde, porque há
também carências na escola pública, há carências nas forças de segurança, há carências nos serviços da
segurança social, há carências nas Lojas do Cidadão, há carências em múltiplos serviços públicos.
Por isso, aquilo que temos de fazer é, obviamente, balancear esses 350 milhões de euros entre as diferentes
necessidades de contratação de pessoal e a legítima expectativa de cada um dos atuais funcionários públicos
ver melhorado o seu rendimento. É com esse balanceamento que vamos investir em pessoal 350 milhões de
euros nos próximos anos. Iremos fazê-lo e, com certeza, no próximo Orçamento do Estado teremos opções
concretas para decidir sobre essa matéria.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem, novamente, a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª CatarinaMartins (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, cada investimento urgente que se
atrasa no SNS é dinheiro desperdiçado numa contratualização a um privado para fazer o serviço que o SNS
devia fazer. Cada investimento que se atrasa nos serviços públicos traduz-se no aumento do nosso défice social.
E lembro-o de que temos 2,4 milhões de pessoas, em Portugal, a viver abaixo da linha da pobreza.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
A Sr.ª CatarinaMartins (BE): — Mas, Sr. Primeiro-Ministro, queria trazer-lhe um outro tema: sigilo bancário.
As propostas para alterar o sigilo bancário são tão antigas neste Parlamento como a chegada do Bloco de
Esquerda à Assembleia da República e foram sendo chumbadas por diversas maiorias. Aliás, só o PCP foi
constante na votação favorável ao levantamento do sigilo bancário em 2005, 2006 e 2009, só para referir anos
em que coube ao PS impedir esta mudança.
Também é verdade que houve avanços que facilitaram à administração fiscal o acesso à informação, e nós
reconhecemos esses avanços, mas o problema mantém-se: depende sempre da suspeita e não pode ser usado
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o levantamento do sigilo bancário para detetar fugas ao fisco. Ou seja, em Portugal, quem combate a fraude e
a corrupção está a trabalhar às escuras.
No início desta Legislatura, o Governo fez um decreto-lei que permitia o acesso do fisco às contas bancárias
com maiores saldos, mas esse diploma foi vetado pelo Presidente da República, por causa da instabilidade
financeira e económica que se vivia na altura — acho que todos concordaremos que vivemos agora um momento
bastante diferente. Mesmo o Presidente da República, que vetou esse decreto-lei, está agora a pedir um maior
combate à corrupção e ao crime económico.
Ora, sabemos que não há nenhum combate à corrupção, ao crime económico e à evasão fiscal sem seguir
o rasto do dinheiro.
Portanto, a pergunta que tenho para lhe fazer vai no sentido de saber se o Governo vai permanecer calado
sobre o sigilo bancário, em nome do Presidente, até mesmo quando o Presidente está a exigir mudanças.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro, para responder.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, em primeiro lugar, não é verdade que a
Assembleia da República tenha chumbado todas as iniciativas.
Todas as propostas que eu fiz, como Ministro da Justiça, em 1999, 2000, 2001 e 2002 foram aprovadas.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — As do Bloco, não!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Por exemplo, o Sr. Deputado Filipe Neto Brandão propôs um alargamento para
que o próprio Ministério Público pudesse quebrar, por sua iniciativa, o sigilo bancário e essa proposta foi
aprovada.
Já nesta Legislatura foram aprovadas novas medidas de redução do sigilo bancário…
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — As do Bloco de Esquerda foram todas rejeitadas, como sabe!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Pode ser que as do Bloco tenham tido menos sorte, mas as que eu tenho
proposto têm tido melhor sorte.
Sr.ª Deputada, não vou comentar em público, porque nunca o faço, as conversas entre o Governo e o
Presidente da República, mas quando entender que há condições políticas para retomar a legislação, que foi
oportunamente vetada pelo Sr. Presidente da República, o Governo retomará, naturalmente, a iniciativa
legislativa, porque, da nossa parte, não mudámos de opinião sobre a importância dessa medida.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra, Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, oportuno é alterar a lei do sigilo
bancário.
Lembro que o veto do Sr. Presidente da República não abrangeu alterações no âmbito do acordo com os
Estados Unidos e com a União Europeia, que, aliás, mecanicamente, PSD e CDS aceitaram. Ou seja, hoje, os
bancos portugueses dão informação aos norte-americanos e a outros países europeus de contas acima de 50
000 euros que sejam de cidadãos europeus em Portugal, mas não dão informação ao fisco português sobre
essas contas quando elas são de portugueses.
Parece aberrante, mas, na verdade, hoje, o fisco só recebe informação sobre contas de portugueses quando
essas contas estão em bancos estrangeiros e não tem acesso à mesma informação quando se trata de contas
de portugueses em Portugal.
Este tratamento discriminatório viola a Constituição da República Portuguesa, e, claro, os sacrossantos
tratados europeus, e não tem nenhum sentido, porque, objetivamente, impede o combate à evasão fiscal.
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Segundo estudos internacionais, Portugal perde, a cada ano, os impostos devidos por 20 000 a 30 000
milhões de euros de rendimento. Com justiça fiscal, faríamos um País muito mais justo e muito diferente.
É esse o desafio que quero deixar aqui hoje, pois, para o Bloco de Esquerda, não devemos aguardar mais.
Assim, no dia 17 de maio, realizar-se-á um agendamento potestativo do Grupo Parlamentar do Bloco de
Esquerda sobre sigilo bancário e, desde já, convidamos todos os partidos a agendarem também as suas
propostas sobre esta matéria e o Governo a acompanhar este processo.
O Bloco de Esquerda propõe alterações ao sigilo bancário para permitir ao fisco conhecer os depósitos acima
de 50 000 euros, de modo a evitar a fuga ao fisco e a termos, assim, circunstâncias de igualdade entre cidadãos
estrangeiros e cidadãos nacionais com contas dentro e fora do País.
Sobre quem nada deve, o Estado ficará a saber o mesmo que hoje já sabe pela declaração de IRS. Só tem
razão para temer esta alteração quem vive de dinheiro sujo ou da fuga ao fisco em grande escala.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — O segundo objetivo da nossa alteração é permitir aos contribuintes
conhecerem os grandes perigos financeiros a que possam estar expostos.
Queremos com esta alteração que o Banco de Portugal possa e deva divulgar os relatórios anuais sobre os
maiores devedores da banca que estão em incumprimento.
O Parlamento está, neste momento, a debater requerimentos sobre essa matéria mas, como todos sabemos,
porque temo-lo requerido a cada comissão de inquérito, estes pedidos batem no muro do sigilo bancário.
Portanto, é preciso mexer na lei, e que seja para se saber tudo.
O PSD apela a que sejam conhecidos os maiores devedores da Caixa Geral de Depósitos. Quando está em
causa dinheiro público, temos de saber quem incumpriu.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — De acordo! Mas há dinheiro público só na Caixa Geral de Depósitos? Não!
A Caixa recebeu 2800 milhões de euros; para o BPN foram mais de 5000 milhões de euros de dinheiro público,
e a conta continua a aumentar. Então, o PSD não quer conhecer os maiores incumpridores do BPN? Daquele
banco que tinha o conselho de administração igual a um conselho de ministros do PSD?!…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe o favor de concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Com a mesma tolerância dada aos outros partidos, concluirei, Sr.
Presidente.
E do BES, que está tão envolvido no escândalo Sócrates mas teve gente em todos os Governos nos últimos
25 anos?! Já foram 5000 milhões de euros e ainda será mais. Não queremos conhecer? E do BANIF, o banco
protegido do Governo Regional da Madeira?! E do BCP e do BPI, que tiveram empréstimos de 4500 milhões de
euros públicos, no mesmo momento em que se cortavam o subsídio de desemprego e o abono de família?! Não
queremos conhecer?
Sejamos consequentes: tenhamos a coragem de mexer…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem mesmo de concluir, Sr.ª Deputada, com tolerância e tolerância.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Com certeza, Sr. Presidente.
Tenhamos a coragem de mexer nos segredos que só protegem quem não deve ser protegido e façamo-lo
com dois objetivos: combater a evasão fiscal e proteger as contas públicas.
Uma última nota em cinco segundos: Sr. Primeiro-Ministro, Donald Trump decidiu retirar os Estados Unidos
do acordo nuclear com o Irão. Foi um erro, é perigoso, e Portugal não deve ficar indiferente.
Aplausos do BE.
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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, sobre a decisão dos Estados
Unidos relativa ao acordo com o Irão já tomámos posição pública, condenando essa decisão e sublinhando o
perigo que ela constitui, porque é um retrocesso para as garantias de paz no mundo.
Sobre a bondade do decreto-lei do Governo, que foi vetado pelo Sr. Presidente da República, agradeço-lhe
os elogios, mas, como compreenderá, não precisa de me convencer da bondade do decreto-lei do Governo.
Estávamos convencidos e continuamos convencidos da bondade do decreto-lei que o Governo apresentou e
aquilo em que posso confiar é que a Sr.ª Deputada e o Bloco de Esquerda também ajudem a convencer o Sr.
Presidente da República da bondade da iniciativa legislativa do Governo e de que há condições políticas para
ela poder ser adotada.
Ficaremos todos, seguramente, satisfeitos com um largo consenso sobre essa matéria.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Assunção Cristas, do CDS-PP.
A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, há três meses, o CDS
apresentou um pacote legislativo nesta Casa muito focado na área da justiça, em particular da justiça cível, da
justiça administrativa, da justiça fiscal e da justiça comercial, aquela que, no fundo, toca mais diariamente na
vida das pessoas e das empresas.
Perguntei, na altura, qual seria o posicionamento do Partido Socialista, não obtive resposta, mas continuamos
a aguardar propostas que venham, eventualmente, de todos os partidos.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Também temos propostas entradas há dois anos, como, por exemplo,
a da regulamentação do lobby, na Comissão Eventual para o Reforço da Transparência no Exercício de Funções
Públicas, e continuamos à espera de que lhes possa ser dado um impulso mais célere nessa Comissão.
Mas, para tudo isto e para aquilo que podemos fazer, temos um enquadramento fundamental, que é a
Constituição da República Portuguesa. Ora, para mexer mais aprofundadamente na área da justiça teremos,
necessariamente, de mexer na Constituição. E a minha pergunta é a seguinte: o Partido Socialista está
disponível para embarcar neste desafio?
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra, Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Assunção Cristas, as perguntas ao Partido
Socialista deverão ser dirigidas, como costumo explicar, à bancada do Partido Socialista.
Se há matéria sobre a qual nenhum Governo se deve pronunciar é mesmo a da revisão constitucional, porque
é mesmo a única lei desta Assembleia onde não podemos ter, sequer, iniciativa ou participação a qualquer nível.
Portanto, utilizando a sua palavra, não podemos «embarcar» em qualquer revisão, porque a Constituição
priva o Governo de intervir nessa matéria.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Assunção Cristas.
A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, nós já estamos muito
habituados a que o Sr. Primeiro-Ministro goste de vestir e despir várias peles e de dizer que está aqui como
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Primeiro-Ministro e não como Secretário-Geral do Partido Socialista e que não tem qualquer interligação com o
Grupo Parlamentar do Partido Socialista.
Nós já sabemos disso, mas há um limite para esse posicionamento. De resto, o Sr. Primeiro-Ministro, nesta
Casa, hoje, já ultrapassou esse mesmo limite,…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — É verdade!
A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — … quando disse que ia tomar uma posição não enquanto Primeiro-
Ministro mas como…
O Sr. Primeiro-Ministro: — António Costa!
A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — … António Costa.
Mas, seguindo o seu raciocínio, aí, nessa bancada, não está António Costa, está o Primeiro-Ministro de
Portugal!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente!
A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Portanto, a pergunta que lhe vou fazer, Sr. Primeiro-Ministro, é
precisamente dirigida ao Primeiro-Ministro de Portugal.
Assim, depois do que ouvimos nos últimos tempos sobre o posicionamento do Partido Socialista, depois de
termos visto que houve surpresa do lado de vários dirigentes do Partido Socialista — aliás, ministros do seu
Governo — em relação ao que se passou num anterior Governo de que o senhor, no início, fez parte, mas teve
colegas que fizeram parte durante bastante mais tempo,…
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Até ao fim!
A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — … e percebemos que houve surpresa, porque ninguém viu nada,
ninguém ouviu nada, ninguém se apercebeu de nada, dou isso de barato e não me compete a mim duvidar,
compete-me, sim, perguntar-lhe, enquanto Primeiro-Ministro, o seguinte: se isso foi assim e se é assim, o que é
que o Sr. Primeiro-Ministro está a fazer internamente, no seu Governo? Considera ou não necessário ter um
escrutínio interno, ter mecanismos de fiscalização ou de prevenção, para que aquilo que se passou com o seu
Governo socialista do passado, onde foi n.º 2, não aconteça também agora?!
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra, Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, desconheço que, relativamente a qualquer
membro do atual Governo, exista qualquer situação como a que alegadamente ocorreu relativamente a
membros de um outro Governo de que também fiz parte.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem, novamente, a palavra a Sr.ª Deputada Assunção Cristas.
A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, a pergunta não era essa mas,
sim, a seguinte: considera necessário e acha importante levar a cabo um maior escrutínio e uma maior
fiscalização da ação do Governo, para prevenir que situações que, aparentemente, passaram despercebidas a
todas as pessoas que estavam nesse Governo voltem a acontecer?
Aplausos do CDS-PP.
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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra, Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, francamente, se tiver alguma sugestão concreta,
estou disponível para a ouvir de bom grado.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Como Primeiro-Ministro ou como António Costa?!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Creio que a situação que tem sido descrita na comunicação social, envolvendo
um antigo Ministro da Economia, deixou toda a gente surpresa, como a Sr.ª Deputada teria ficado igualmente
surpresa se houvesse essa notícia sobre alguns dos seus antigos colegas de Governo.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Mas não há!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Agora, presumo que a Sr.ª Deputada desconhecesse quais eram as fontes de
rendimento dos seus diferentes colegas de Governo. É assim!…
Se a Sr.ª Deputada tem alguma forma específica de escrutínio… Não sei o que quer dizer com isso, mas se
tem alguma sugestão estou disponível para a estudar, porque acho que é essencial reforçar sempre, e sempre,
a transparência, o escrutínio público e a confiança.
Contudo, não posso ter uma suspeição geral sobre todos os seres humanos por existir uma situação onde,
alegadamente, há um incumprimento que é, no mínimo, eticamente censurável.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem, novamente, a palavra a Sr.ª Deputada Assunção Cristas.
A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, devo dizer que me causa
alguma estranheza que, pelo menos em relação ao Ministério da Economia, não seja feito um escrutínio e uma
auditoria interna muito profundos, para se perceber o que aconteceu então, quando, de resto, um atual Ministro
deste Governo era, na altura, assessor daquele mesmo gabinete.
Protestos do PS.
Em todo o caso, espero que o Sr. Primeiro-Ministro tenha atenção redobrada e todos os alertas bem
presentes, porque nem me passa pela cabeça que, enquanto Primeiro-Ministro, possa subscrever aquilo que já
aqui disse, hoje mesmo, que foi o seguinte: se a justiça tiver uma conclusão no caso José Sócrates, é uma
desonra para a democracia — eu acho que é uma desonra para o Partido Socialista —, mas, se tiver outra,
afinal, é porque funcionou bem.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Sr. Primeiro-Ministro, mudando de assunto e deixando estes alertas,
no dia 15 de março, perguntei-lhe, aqui, quantos meios aéreos é que estavam disponíveis e preparados para os
fogos…
Protestos do Deputado do PS Filipe Neto Brandão.
… e o Sr. Primeiro-Ministro respondeu-me que eram 55 meios aéreos, mais do que os que tinham existido
no ano passado e mais do que os que sempre existiram.
Perguntei-lhe também quando é que esses meios aéreos estavam garantidos. Dando sequência à sua linha
de que acabou a «época de incêndios», e bem, e de que, portanto, todo o ano temos de estar de prevenção,
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respondeu-me que esses meios estavam garantidos para todo o ano. A minha pergunta é esta: o que é que me
diz hoje, quando percebemos que, afinal, ainda não estão garantidos?!
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra, para responder, o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, se houve alguma ilegalidade praticada no
Ministério da Economia, em qualquer Governo que seja, as nossas autoridades judiciárias são, seguramente,
competentes para procederem a essa investigação. A não ser que V. Ex.ª entenda que tenho maior habilidade,
maior capacidade ou maior competência para fazer investigação criminal do que a Sr.ª Procuradora-Geral da
República, o Ministério Público e a Polícia Judiciária. Se assim o entender, agradeço-lhe o elogio mas,
sinceramente, na minha leitura da Constituição, considero-me impedido de proceder a investigação criminal.
Aplausos do PS.
Também estou seguro de que, se algo de muito grave tivesse acontecido, quem entretanto foi Ministro da
Economia, designadamente no seu Governo, não deixaria de o ter detetado e comunicado às autoridades
competentes para o fim conveniente.
O Sr. José Miguel Medeiros (PS): — Bem lembrado!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Eu, pelo menos, sempre que fui Ministro e detetei alguma ilegalidade, ou tive
dúvidas de legalidade, fiz sempre o mesmo: comuniquei sempre ao Ministério Público ou à direção da Polícia
Judiciária. Está aqui, aliás, um antigo Diretor Nacional da Polícia Judiciária que o pode testemunhar, visto que
tive oportunidade de, em mão, lhe entregar factos que constituíam grave suspeita da prática de crimes sobre
serviços na minha dependência.
Aplausos do PS.
Portanto, como não tenho tendência para presumir que os outros não são, pelo menos, tão sérios como eu,
não tenho a menor dúvida de que, se tivesse detetado algum comportamento ilegal, quem exerceu funções de
Ministro da Economia nos últimos anos não deixaria de ter feito aquilo que, obviamente, se impunha fazer, que
era denunciar esse facto às autoridades.
Quanto aos meios aéreos, já tive oportunidade de responder, há pouco, à Sr. Deputada Catarina Martins e,
nos últimos 10 minutos, nenhum facto novo surgiu…
Risos do PS.
… que me permita acrescentar algo novo ao que já tinha respondido anteriormente à Sr.ª Deputada Catarina
Martins.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem, ainda, a palavra a Sr.ª Deputada Assunção Cristas.
A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, se bem me recordo, quem
sucedeu a Manuel Pinho foi Vieira da Silva. Além disso, neste momento, com a informação que existe, e que
era desconhecida pelo menos da generalidade, acharia natural que o senhor, enquanto Primeiro-Ministro,
pedisse uma sindicância, uma auditoria interna a todos os atos e a todos os contratos praticados na altura do
Ministro Manuel Pinho.
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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Sr. Primeiro-Ministro, em relação aos meios aéreos, o que lhe posso
dizer é que, de facto, é inexplicável como é que o Sr. Primeiro-Ministro, há pouco mais de um mês, dizia que
seriam 55 os meios aéreos que estariam disponíveis a tempo inteiro. É que, afinal, vamos ver a Diretiva
Operacional, que manda que estejam 20, mas, na verdade, não estão 20 e apenas 3 estão totalmente legais.
Os outros estão lá e, numa emergência, podem ser acionados, porque ultrapassam o visto do Tribunal de
Contas, mas não sabemos o que se passa em relação a todos os outros meios. O que percebemos é que há,
mais uma vez, uma grande barafunda: não se cumprem prazos, não se organizam os trabalhos atempadamente,
sai o Comandante Operacional e é o quinto que agora, na vigência do seu Governo, está em funções. Relembro
que, no passado, isto correu muitíssimo mal e, portanto, a minha pergunta vai no sentido de saber se o Sr.
Primeiro-Ministro consegue manter que, na verdade, o seu Governo não está a falhar nesta área.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra, para responder, o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, creio que a Sr.ª Deputada terá lido o mesmo que
li nos jornais e, portanto, saberá o mesmo que eu sei, ou seja, que está aberta uma investigação criminal.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — O senhor saberá mais!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Como a Sr.ª Deputada sabe, além do mais até como doutora em Direito, numa
sindicância, o Governo solicita ao Procurador-Geral da República ou, neste caso, à Procuradora-Geral da
República a designação de um magistrado do Ministério Público para determinar o apuramento de factos.
Ora, se o Ministério Público, não no âmbito administrativo, que é o da sindicância, mas no âmbito criminal,
onde os instrumentos de investigação são muito mais intrusivos e permitem um maior aprofundamento do
conhecimento, já tem uma investigação aberta, que sentido faz ir agora pedir uma sindicância ao Ministério
Público, para o Ministério Público fazer, em sede administrativa, o que já está a fazer em sede criminal?! Ou a
Sr.ª Deputada não confia no Ministério Público?! Olhe, eu confio no Ministério Público!
Aplausos do PS.
Quanto aos meios aéreos, Sr.ª Deputada, é bom não truncarmos as palavras. Acabámos com o conceito de
«época de incêndios» mas, apesar de tudo, o ano não é todo igual. Em dezembro tende a haver mais frio do
que em agosto, em agosto tende a chover menos do que em janeiro e, por isso, o dispositivo, passando a ter
elementos permanentes, não tem, obviamente, os mesmos elementos nos 365 dias do ano. Há de concordar
que seria uma péssima gestão do dinheiro público termos, durante 365 dias, o mesmo dispositivo de meios
aéreos de combate aos incêndios, sendo que, objetivamente, mesmo com todos os riscos de alterações
climáticas, é normal prever que há épocas do ano em que o risco é francamente maior do que em outras épocas
do ano.
Por isso, a Diretiva Operacional Nacional, que está publicada e que V. Ex.ª, certamente, conhece, define
também o calendário do empenho progressivo dos meios e do desempenho progressivo dos meios, ao longo do
ciclo anual, como é normal que venha a acontecer, e irá acontecer.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem, ainda, a palavra a Sr.ª Deputada Assunção Cristas.
A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, ainda bem que confia no
Ministério Público, mas isso não é muito consistente com as tomadas de posição do seu Governo: meses antes
de terminar o mandato da Procuradora-Geral da República dizem que, porventura, a irão substituir.
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Aplausos do CDS-PP.
Protestos do PS.
Não é propriamente um sinal de grande confiança no Ministério Público nem de estabilidade para o exercício
do mandato. De resto, quando coloco estas questões, coloco-as do ponto de vista da política e da ética,…
Protestos do PS.
… que é outra responsabilidade, ao lado da responsabilidade judicial.
Creio que um Primeiro-Ministro, pelo menos é assim que interpreto as funções,…
Risos do PS.
… deve poder fazer mais do que aquilo que está no Código Penal para prevenir comportamentos impróprios,
mesmo que, porventura, não sancionados criminalmente, por parte dos membros do Governo.
Sobre a questão dos fogos, já percebemos que, de facto, os anúncios são uma coisa, a realidade é outra.
O CDS, antecipadamente, trouxe esta matéria ao Parlamento e continuaremos a acompanhá-la com muita
atenção, no desejo de que não se repitam as tragédias do ano passado,…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — … mas com uma enorme preocupação.
Outra matéria que continua a preocupar-nos, Sr. Primeiro-Ministro, e não é só a nós, é a da saúde.
Já não tenho muito tempo para lhe colocar questões em detalhe, mas faço-lhe uma pergunta muito simples:
vai continuar a permitir este garrote do Ministério das Finanças à área da saúde ou vai mudar a sua orientação?
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.ª Deputada, tem de terminar.
A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Duas perguntas finais, uma relativa ao aeroporto de Lisboa: Sr.
Primeiro-Ministro,…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem de ser muito rápida, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Sr. Primeiro-Ministro, há mais de um ano, nesta Casa, respondeu-me que era preciso esperarmos até ao
final do ano para termos o resultado do estudo ambiental. Ora, já passou o final do ano, já estamos quase a
meio de outro ano e, aparentemente, estará aí o estudo ambiental. Mas houve uma pergunta que o PAN fez
aqui, num dos últimos debates quinzenais,…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.ª Deputada, tem mesmo de concluir.
A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Sr. Presidente, vou terminar.
Como estava a dizer, o PAN fez aqui uma pergunta, num dos últimos debates quinzenais, que foi a de saber
se haverá ou não avaliação ambiental estratégica, e isto não é irrelevante. Sr. Primeiro-Ministro, vai ou não vai
haver? Já sabe ou ainda não sabe responder a esta pergunta?
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Com a mesma equidade, da parte da Mesa, tem a palavra, para
responder, o Sr. Primeiro-Ministro.
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O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, a resposta é muito breve.
Sr.ª Deputada Assunção Cristas, como já tive oportunidade de responder ao Sr. Deputado André Silva,…
A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Não sabe responder!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … se for legalmente necessária, será feita, se não for legalmente necessária,
não será feita.
Fico muito satisfeito que tenha confiança no Ministério Público e, portanto, faça como eu, aguarde, serena e
pacientemente, que alguma investigação do Ministério Público chegue ao fim e que se apure a verdade dos
factos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para formular as suas perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo
de Sousa, do PCP.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, permita-me que insista na questão
da situação no Serviço Nacional de Saúde.
Perante uma campanha contra o SNS, que não para de crescer, o Governo continua a não querer resolver
os problemas que se prolongam no tempo, como é o caso dos problemas dos profissionais que trabalham no
serviço público de saúde. Dizer a estes trabalhadores que têm razão mas que não se pode resolver tudo de uma
vez só não chega. Sim, reconhecemos que há avanços, mas há uma década que estes trabalhadores esperam
pela valorização dos seus salários e dos seus direitos. Esperam os trabalhadores e esperam os utentes, que
são confrontados, todos os dias, com novas dificuldades.
É a estes profissionais — médicos, enfermeiros, técnicos superiores de saúde e assistentes técnicos
operacionais — que se deve o facto de o Serviço Nacional de Saúde ainda dar hoje a resposta de qualidade
que dá, apesar de todos os atropelos a que tem sido sujeito.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr. Primeiro-Ministro, os profissionais de saúde e os utentes merecem,
da sua parte, uma resposta mais avançada.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr. Primeiro-Ministro, por todo o País, milhares e milhares de
trabalhadores portugueses celebraram o 1.º de Maio, saindo à rua, ao apelo da CGTP (Confederação Geral dos
Trabalhadores Portugueses), numa grande e expressiva manifestação da sua força reivindicativa, em defesa
dos seus direitos, pela valorização dos seus salários, pela redução do horário de trabalho. Foi uma magnífica
jornada de exigência de solução de importantes e sentidos problemas que são transversais ao mundo do
trabalho e que exigem resposta da parte do Governo e, também, da Assembleia da República.
Desde logo, a exigência de um aumento geral dos salários e, igualmente, do salário mínimo nacional para
650 €, a partir de 2019, exigência que o PCP acompanha. É uma exigência mais do que justa, tendo em conta
a desequilibrada evolução da distribuição do rendimento nacional e o modelo económico assente nos baixos
salários, que urge ultrapassar.
Enquanto os salários reais subiam umas décimas em cada um dos últimos anos, a riqueza dos 25 mais ricos
de Portugal crescia, em 2016 e 2017, 26,9%. Só as empresas do PSI 20 tiveram, em 2017, uma subida média
de lucros de 12%, em relação a 2016, realidade que não está desligada, também, da grave ofensiva
desencadeada nos últimos anos contra as leis laborais.
Também é tempo de ter outra consideração e resposta à justa exigência da redução do horário de trabalho
para as 35 horas, neste tempo marcado por novos avanços científicos e tecnológicos, avanços, estes, que não
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podem ser apenas instrumento de acumulação de lucros mas uma oportunidade e uma possibilidade de
melhorar as condições de vida e de trabalho, particularmente, de reduzir a penosidade do trabalho, alargando o
direito ao descanso, à presença na família, ao lazer e à cultura.
Como vamos dar resposta a estes problemas, Sr. Primeiro-Ministro?
O Sr. Primeiro-Ministro já admitiu que não há economia sustentável que se funde em salários baixos. Então,
não basta constatar e afirmar, são necessárias, de facto, medidas concretas, para além das outras questões,
designadamente, dos horários de trabalho.
Diga-nos, Sr. Primeiro-Ministro, quando é que passamos das palavras aos atos.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra, para responder, o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, temos de olhar para a
realidade. E qual é a realidade?
Em 2016, em 2017 e em 2018, o salário mínimo nacional subiu 15%. Só nos últimos dois anos o conjunto
dos salários acima do salário mínimo nacional subiu 4%. Ou seja, ao longo dos últimos anos, os atos têm
traduzido as palavras. Houve uma melhoria do rendimento efetivo dos trabalhadores, tanto daqueles que
recebem o salário mínimo nacional, como dos outros que já têm um salário acima do salário mínimo nacional.
Também acelerámos o descongelamento da contratação coletiva, de forma a criar melhores condições para
o diálogo e a sustentar uma melhoria do processo salarial. Isso aconteceu no setor privado, mas acontece
também no setor público.
No setor público, eliminámos os cortes nos vencimentos e em vários dos elementos complementares,
repusemos o horário das 35 horas semanais e os feriados que tinham sido cortados.
Dirá: «Há avanços…». E dir-lhe-ei que haver avanços é muito importante, porque nos últimos anos a questão
não era a de não haver avanços, mas a de haver recuos. Nós não ficámos a marcar passo, avançámos! E temos
vindo a avançar passando das palavras aos atos.
É assim também no Serviço Nacional de Saúde que hoje tem, relativamente ao início desta Legislatura, mais
3600 médicos e cerca de mais 3000 enfermeiros do que tinha. O número de técnicos de diagnóstico aumentou
4% ao longo destes anos. E isso traduziu-se efetivamente numa melhoria das prestações de saúde para os
portugueses.
Temos hoje mais 300 000 consultas hospitalares, mais 19 000 intervenções cirúrgicas e mais 200 000
tratamentos nas urgências do que tínhamos em 2015, o que significa que tem havido avanços que têm sido
suportados por um investimento importante. Em 2016, em 2017 e em 2018, houve um aumento de 700 milhões
de euros, repito, 700 milhões de euros anuais na saúde.
Não foi por acaso que a saúde foi o setor excecionado das cativações e não é por acaso que o decreto-lei
de execução orçamental, que brevemente entrará em vigor, agiliza o mecanismo de execução da despesa no
âmbito da saúde e, em particular, das unidades hospitalares.
Estamos a desenvolver um programa importante de investimento em 113 unidades de cuidados de saúde
primários, além do investimento de 500 milhões de euros em várias unidades hospitalares, não incluindo aqui o
lançamento das novas unidades hospitalares como o hospital central do Alentejo, o hospital do Seixal, o hospital
oriental de Lisboa, o estudo sobre o hospital do Funchal e outras intervenções que temos em curso.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Em curso, não, no papel!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Por isso, porque Roma e Pavia não se fizeram num dia, também não é em dois
anos e meio que se estanca a sede acumulada ao longo de uma década. O que é importante é termos condições
para dar continuidade a este caminho que, como diz, tem sido feito de avanços e que não pode voltar a marcar
passo e muito menos pode voltar a ter recuos.
Temos de continuar a avançar, e é isso que iremos continuar a fazer.
Aplausos do PS.
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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, a conclusão deveria ser óbvia: se
as medidas que estão a ser tomadas não resolvem os problemas, há que continuar a procurar resolvê-los com
outras medidas, com outro financiamento,…
O Sr. Primeiro-Ministro: — É isso, claro!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — … respondendo às aspirações de quem trabalha nesse setor.
Aplausos do PCP.
Por último, Sr. Primeiro-Ministro, o problema da corrupção continua a surgir ciclicamente no espaço público
e sempre associado às relações da despudorada promiscuidade e submissão do poder político ao poder
económico, às ligações de quadros e dirigentes em grandes empresas e grupos económicos com
responsabilidades governativas em sucessivos governos, às opções de privatização, com decisões tomadas em
processos pouco transparentes, num quadro de fortes suspeitas de corrupção e tráfico de influências.
O caso das rendas da energia que envolve hoje o ex-ministro Manuel Pinho é o mais recente a acrescentar
a um longo rol. PT, CTT, SIRESP, ANA-Aeroportos de Portugal, banca, submarinos são exemplos de
privatizações, de concessões, de PPP (parcerias público-privadas) que se enquadram em processos de
favorecimento de grandes interesses económicos de contornos nebulosos com graves consequências para o
País.
Esta realidade mereceu a forte e contínua denúncia do PCP ao longo dos anos, mas também o combate com
propostas concretas não apenas para reverter e recuperar para o setor público os setores básicos, estratégicos
da economia nacional, devolvendo ao País o que é seu, mas também para contrariar as práticas de submissão,
corrupção e conluios com os grupos económicos.
As propostas defendidas pelo PCP foram rejeitadas com a convergência entre PS, PSD e CDS, fragilizando
o combate à corrupção, não apenas no setor energético, mas em todos os setores onde os escândalos das
privatizações foram acompanhados de suspeitas que alguns só agora descobriram, sacudindo
responsabilidades próprias em todo o processo de evolução.
É inquestionável a necessidade de uma apurada e célere investigação aos casos como o de Manuel Pinho,
mas é preciso mais. É preciso uma avaliação mais abrangente que aborde o conjunto de ligações entre os
sucessivos Governos e as principais empresas e grupos económicos. Foi com esse objetivo que propusemos o
alargamento da comissão de inquérito para que pudesse escrutinar todas as situações.
Este tem sido o nosso combate de sempre. Combate que integra outras propostas apresentadas, algumas
das quais em discussão, nomeadamente: combate ao enriquecimento injustificado; combate aos offshore;
combate à fuga de capitais e à criminalidade económica e financeira; reforço da cooperação judiciária
internacional; reforço dos meios de fiscalização e inspeção do Estado; reforço de mecanismos que impedem os
membros do Governo de transitar para os conselhos de administração dos grupos económicos; controlo
apertado de registo de interesses e da situação de incompatibilidades.
Sim, Sr. Primeiro-Ministro, considero que, aos anos que aqui ando, gente séria há em todos os partidos, mas
a verdade é que esta promiscuidade acaba por situar o problema e estar na raiz dos problemas em termos de
corrupção.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe o favor de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — É nesse sentido que gostaríamos de saber qual é a disponibilidade do
Governo para que se avance em matéria de combate à corrupção, à criminalidade económica e financeira. Que
atitude vai o Governo tomar perante as propostas apresentadas para que se faça este caminho?
Aplausos do PCP.
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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro para responder.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, a disponibilidade do Governo
para reforçar os meios de combate à corrupção é total.
Devo dizer que tive oportunidade de, recentemente, rever o conjunto da legislação e de verificar, até com
algum orgulho, que os grandes instrumentos de definição do tipo de crime de corrupção, de alargamento dos
instrumentos de investigação criminal à corrupção e o combate ao branqueamento de capitais e ao tráfico de
influências resultaram das iniciativas que apresentei, então, como Ministro da Justiça, complementadas com um
projeto de lei do PCP, creio que da autoria da Sr.ª Deputada Odete Santos, sobre o branqueamento de capitais.
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Em 2001!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Portanto, se a Assembleia da República entender que há novos mecanismos a
introduzir, por mim só tenho a aplaudir, porque é necessário continuar a reforçar os instrumentos de combate à
corrupção.
O combate à corrupção é um desafio sistémico que abrange governos, autarquias locais, administrações
regionais, ou seja, que abrange qualquer setor público. É um fenómeno que mina a confiança dos cidadãos na
democracia, distorce a concorrência e é uma ameaça efetivamente às liberdades.
Portanto, todo o instrumento existente que seja eficaz para prevenir e combater a corrupção pode e deve ser
mobilizado. Deixar-lhe-ei, depois, Sr. Deputado, uma cópia de um discurso que fiz em setembro de 2001, na
apresentação desse pacote legislativo, onde poderá ver que não é aqui, seguramente, que haverá qualquer
distinção no nosso ponto de vista sobre o que é necessário fazer e sobre a prioridade que deve ser dada ao
combate à corrupção.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — E o momento de dar a palavra, para formular perguntas, à Sr.ª Deputada
Heloísa Apolónia.
Faça favor.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, deixo umas breves palavras
para um assunto maior que já aqui foi referido hoje várias vezes e que se prende com a matéria da corrupção.
De facto, Sr. Primeiro-Ministro, a corrupção mina a confiança dos cidadãos e prejudica-os. Prejudica-nos,
como sociedade, esta absoluta promiscuidade entre empresas e governantes a que os cidadãos têm assistido
quer no ato de governação, quer no ato de pós-governação. É uma matéria à qual, de facto, temos de dar uma
outra atenção.
Quero deixar aqui claro que Os Verdes estão absolutamente disponíveis para contribuir para este debate e
para o reforço dos mecanismos do combate à corrupção.
Sr. Primeiro-Ministro, depois da tragédia que ocorreu no verão passado, a expectativa evidente do País é a
de que se reforcem os meios e as condições para que nada daquilo volte a acontecer. Ou seja, a expectativa é
a de que tudo se deve fazer para prevenir tragédias e para gerar as condições necessárias para ter capacidade
de combate a incêndios.
No entanto, Sr. Primeiro-Ministro, o senhor pode pôr uma imensidão de homens e mulheres no terreno, mas,
se não lhes der condições para atuarem, designadamente os equipamentos, os meios, enfim, e todas as
condições necessárias de intervenção, é evidente que isso não vai valer de nada.
É por isso que o País deve estar preocupado relativamente a estas notícias que têm vindo a público, no
sentido de garantir que há determinadas forças e equipas, como o GIPS (Grupo de Intervenção de Proteção e
Socorro), que não estão devidamente apetrechadas, designadamente com equipamentos de proteção individual
e outros meios, como viaturas, de transporte e de combate, para poderem proceder às ações que todos lhes
estamos a pedir.
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Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, pergunto o que é que se passa efetivamente em relação aos meios aéreos,
aos equipamentos de proteção individual e às viaturas de transporte e combate para que, de facto, não estejam
ainda no terreno — relativamente aos meios aéreos o Sr. Primeiro-Ministro já disse alguma coisa. O Tribunal de
Contas, por exemplo, está a demorar mais tempo do que é normal demorar? O Governo atrasou-se? Porque é
que, neste momento, não temos as condições efetivas no terreno?
Sr. Presidente, coloco já as minhas questões todas seguidas, na medida em que o tempo está a correr
depressa.
Outra questão que gostava de colocar tem a ver com o seguinte: o Governo não está a conseguir pacificar
os setores da saúde e da educação. Não está, Sr. Primeiro-Ministro, e isso vê-se, designadamente, por aquela
que tem sido a resposta dos profissionais na área da saúde.
Também já foram referidas as inúmeras greves que têm acontecido e o Sr. Primeiro-Ministro diz: «Ninguém
põe em causa o direito à greve». Evidentemente que não, mas o Governo tem de fazer uma leitura das greves
e parece-nos que está a fazer a leitura errada. Não se trata apenas de garantir o direito à greve, mas de fazer a
leitura daquilo que se quer dizer com as greves, que são uma forma de luta radical.
Então, Sr. Primeiro-Ministro, aquilo que Os Verdes constatam é que o Governo não está a conseguir pacificar
os profissionais da saúde e da educação, por exemplo.
Relativamente à educação, como é que é possível o Governo partir para uma negociação com os sindicatos
que a Assembleia da República ordenou…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe para concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Como eu estava a perguntar, relativamente à educação, como é que é possível o Governo partir para uma
negociação com os sindicados, que a Assembleia da República ordenou através do Orçamento do Estado para
2018 e também da Resolução n.º 1/2018, da autoria de Os Verdes, dizendo: «Não vamos contabilizar, para
efeitos de progressão na carreira, os nove anos que perderam, vamos contabilizar só dois e, se não estiverem
dispostos a isso, não há negociação para ninguém»!
Como é que o Governo, que está obrigado por lei a ouvir os sindicatos, representantes dos professores,
relativamente à abertura de concursos, lança cá para fora um aviso de abertura de concurso extraordinário,
externo, e não lhes dá cavaco, sequer?
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.ª Deputada, tem mesmo de concluir.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — É evidente que os sindicatos se sentem postos de parte
relativamente a esta matéria.
Mesmo, mesmo para terminar, quero dizer, Sr. Primeiro-Ministro, que, sobre a avaliação ambiental
estratégica para o aeroporto do Montijo, ela não deve ser feita só se for legalmente exigida. O Governo também
tem vontade política.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.ª Deputada, há limites para a tolerância. Tem mesmo de concluir.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — E, ou tem vontade política de estudar o máximo possível para que
se consiga compreender o mínimo pormenor e conhecer o mais possível os impactos daquele projeto, ou, então,
o Governo pode ter muito a perder. Quanto mais contestado é um projeto, mais estudos e consultas públicas
devem ser feitos.
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra para responder.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, creio que o Sr. Ministro da
Administração Interna já teve ontem oportunidade de, longamente, informar a Assembleia da República sobre o
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ponto de situação relativamente à contratação de meios aéreos, à aquisição de viaturas, enfim, à aquisição dos
equipamentos.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Esteve durante 5 horas para não dizer nada!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Chamo a atenção de que o que estamos a discutir é algo absolutamente
extraordinário: uma força que foi criada em 2006 com 500 ou 600 elementos — na altura, até com menos, com
trezentos e poucos elementos — e que, ao longo destes anos, pouco cresceu duplicou os seus elementos em
muito poucos meses. Este é um esforço absolutamente extraordinário, que só a Guarda Nacional Republicana
poderia conceber, com a sua capacidade de mobilização e de organização e com o esforço financeiro
extraordinário que estamos a fazer.
Chamo a atenção que quando, em 2005, a Espanha decidiu levantar uma força especial de natureza militar
de combate aos incêndios levou quase sete anos a constituí-la. A primeira fase do GIPS foi constituída em seis
meses e esta segunda fase está a ser constituída em menos tempo.
Portanto, o que a Sr.ª Deputada diz ser atraso eu diria que são, porventura, as dificuldades de uma ambição
excessiva que foi colocada relativamente a ter tudo pronto no próximo dia 15 e o que estamos agora a discutir
é se será a 15, a 20, no final do mês ou em meados do próximo mês de junho. Portanto, o esforço que está a
ser feito é enorme.
Mas, Sr.ª Deputada, devo dizer-lhe que até fico surpreendido que Os Verdes ponham o enfoque da questão
nos elementos de combate, porque acho que a grande conclusão, a mais importante e que ninguém pode
ignorar, que consta, aliás, da relação da Comissão Técnica Independente, é que o grande investimento que tem
de ser feito é a montante, é na prevenção: na reforma estrutural da floresta, na limpeza da floresta.
Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.
Sr.ª Deputada, sejamos claros: se não fizermos esse trabalho — e é aí que temos estado a concentrar os
nossos esforços —, os meios serão sempre insuficientes perante as necessidades. Até podemos ter o dobro
dos elementos do GIPS, podemos ter o dobro dos bombeiros voluntários, podemos ter o dobro dos meios
aéreos, mas se as condições no terreno não forem alteradas os meios serão sempre insuficientes.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — E nós já alertámos para isso!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Ora bem, Sr.ª Deputada, eu não queria insultá-la, mas era mesmo isso. Eu
estava nesta desagradável posição a dizer aquilo que pressupunha que fossem Os Verdes a dizer ao Governo.
Portanto, é essa a nossa prioridade.
Mas nós não ignoramos que a prevenção não é tudo e que é necessário termos meios e robustecê-los.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Ah, vá lá!…
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Deputada, foi por isso que decidimos reforçar o GIPS, que criámos há 10
anos foi criado e que, durante estes anos, não foi reforçado; foi por isso que assinámos mais 79 equipas de
intervenção permanente dos bombeiros voluntários; foi por isso que estamos a abrir concurso para admissão de
mais 200 elementos para reforçar os guardas florestais, para reforçar os vigilantes da natureza, para reforçar o
CNAF (Corpo Nacional de Agentes Florestais), para reforçar todos os meios de vigilância.
Foi por isso que, já na semana passada, entraram em funcionamento os mecanismos de vigilância através
das torres de vigia.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe que conclua, Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Vou já concluir, Sr. Presidente.
Este esforço enorme que está a ser feito é precisamente porque todos temos razões para estar preocupados.
E depois de tudo isto estar concluído, mesmo quando os homens estiverem todos formados, equipados, com as
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luvas, com todos os equipamentos, mesmo depois de todos os meios aéreos estarem disponíveis, eu continuarei
preocupado. E todos temos boas razões para continuarmos preocupados, porque a ameaça climática é imensa,
o estado da floresta é o que é, o nível da limpeza é o que é e, portanto, seguramente que temos todos razões
para continuarmos preocupados.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Queira concluir, Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Por mim, garanto-lhe que continuarei preocupado, durante todo o ano, com esta
matéria.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem agora a palavra o Sr. Deputado André Silva, do PAN, para formular
perguntas.
O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, no ano passado, em julho, como sabe, o
Parlamento aprovou um pacote de alterações legislativas conhecido como reforma da floresta.
Uma das alterações aprovadas, proposta pelo PAN, visa a implementação de um sistema de alerta às
populações em caso de emergência ou catástrofe, via sms e através dos meios de comunicação social. Ou seja,
quando eu, o Sr. Primeiro-Ministro ou outro cidadão nos encontramos numa região afetada por incêndios ou
terramotos, por exemplo, recebemos um aviso da proteção civil com instruções de como devemos agir para
garantirmos a nossa segurança. Esta medida é fundamental para prevenir tragédias como as que aconteceram
nas estradas nacionais junto a Pedrogão Grande.
Assim, Sr. Primeiro-Ministro, gostaríamos de saber quando entrará em funcionamento este sistema de alerta.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro para responder.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, no próximo dia 1 de junho, entrará em vigor esse
sistema de alerta, em que as operadoras enviarão, por sms, uma mensagem preventiva de alerta.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem, de novo, a palavra o Sr. Deputado André Silva.
O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, outra proposta do PAN, que foi aprovada
aquando do pacote da reforma da floresta foi a obrigatoriedade de, no site do ICNF (Instituto da Conservação
da Natureza e das Florestas), constar uma lista dos municípios que não dispõem de um plano municipal de
defesa da floresta contra incêndios.
Ora, segundo a lista publicada no site do ICNF, no passado dia 4 de maio, há cinco dias, constata-se que
existem muitos municípios que continuam sem ter o Plano de Defesa da Floresta Contra Incêndios — é o caso
de Pedrógão Grande — e muitos outros que estão totalmente desatualizados há vários anos, como são os de
Castanheira de Pera, Condeixa, Arganil ou Tondela.
Não é compreensível que concelhos que viveram as tragédias do último ano não tenham ainda um plano ou
um plano atualizado, e é muito claro que estes municípios não querem nem estão preparados para fazer a
devida prevenção dos incêndios e, consequentemente, a proteção das comunidades.
Gostaria de saber, Sr. Primeiro-Ministro, se o Governo está a acompanhar estas situações nos municípios e
se está ou irá a tomar medidas para suprir estas falhas destes municípios, que originarão problemas que serão
de todos nós.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra, Sr. Primeiro-Ministro, para responder.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, não tenho nada a acrescentar ao que o Sr.
Deputado disse. Se há algum município que incumpre a lei, deve cumpri-la. É isso.
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Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Deputados, está assim concluído o debate quinzenal.
Creio que nos podemos despedir do Sr. Primeiro-Ministro e demais membros do Governo.
Pausa.
Srs. Deputados, vamos passar ao ponto dois da ordem do dia, que consta do debate sobre o Dia da Europa.
Para iniciar o debate, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Europeus, Ana Paula Zacarias.
Faça favor, Sr.ª Secretária de Estado.
A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Europeus (Ana Paula Zacarias): — Sr. Presidente, Sr.as
Deputadas e Srs. Deputados: Em 2012, realizou-se um festival de poesia em Berlim, em que se decidiu fazer
um poema em cadeia. Ou seja, o poeta tomava a última frase que o anterior poeta tinha feito, tendo de fazer um
poema sobre a Europa.
Em 2012, cada poeta começou a escrever palavras duras de crise, sofrimento, desemprego, ceticismo,
tristeza.
Hoje, esse poema seria seguramente diferente. Hoje, dia em que celebramos a Europa, o balanço que
fazemos é bem mais positivo para a Europa e para Portugal.
Para a Europa, 2017, que parecia ser o ano de todos os perigos, foi também o ano de todas as esperanças.
A instabilidade na situação internacional teve o efeito de contribuir para aumentar o sentimento de urgência da
unidade europeia. Em simultâneo, a crise mundial foi deixando para trás os efeitos mais duros da crise: o
crescimento económico aumentou, o desemprego diminuiu, melhorou a sensação de prosperidade e de
otimismo.
Há um ano, a União Europeia assinalou os 60 anos do Tratado de Roma. Num espírito de unidade, os líderes
comprometeram-se a defender os valores da liberdade, da democracia, do Estado de direito, da dignidade
humana, da igualdade e da solidariedade e, ao mesmo tempo, vincularam-se num esforço de ação conjunta em
desígnios estratégicos fundamentais: crescimento e emprego, dimensão social responsável, segurança dos
cidadãos, reforma das políticas de migração, projeção de uma Europa forte, coesa e capaz de moldar a
globalização.
É assim que nestes dois planos, o dos valores e o dos resultados e da ação concreta, o projeto europeu joga
o seu futuro.
O Portugal que se apresentou em 2017 às instituições europeias e aos Estados-membros foi, seguramente
também, um país bem diferente do do passado. Sem dúvida o nosso perfil na União Europeia conheceu uma
evolução assinalável: de um país sob um programa de assistência económica e financeira, Portugal passou a
caso de sucesso, atingindo os seus objetivos de política económica interna sem colocar em causa o
cumprimento das regras europeias.
A presidência do Eurogrupo representa para Portugal o reconhecimento da validade das suas opções, mas
também a possibilidade de o País ter um papel mais ativo no debate sobre o aprofundamento da união
económica e monetária e sobre o futuro da Europa.
De facto, num contexto em que as ameaças à integridade da União Europeia aparecem sob as mais variadas
formas, como o Brexit ou a ascensão dos populismos, dos nacionalismos ou do euroceticismo, as credenciais
europeístas de Portugal dão-nos um lugar de destaque entre os nossos pares.
A Europa é uma opção fundamental de Portugal, transversal à nossa sociedade. E vale a pena sublinhar aqui
os dados do Eurobarómetro, que nos confirmam que 81% dos portugueses sentem-se europeus — acima dos
70% da média europeia. Pela nossa História, pelo nosso perfil associado a uma maior capacidade de
intervenção, proporcionada pelos resultados económicos e financeiros, temos o dever de continuar a contribuir
para encontrar soluções e facilitar acordos nos complexos dossiers que estão em cima da mesa das
negociações.
Afinal, a União Europeia é a arte do compromisso. E o compromisso só é possível se houver diálogo, troca
de opiniões e argumentos. Temos de fazer esse diálogo, tendo em conta os medos e as expectativas de todos,
mesmo aqueles que parecem irracionais, exagerados ou irrelevantes. Precisamos de nos ouvir uns aos outros
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e em toda a União Europeia, evitando estereótipos e compreendendo as razões que diferem os comportamentos
uns de outros.
É neste contexto que teve lugar o arranque, no passado dia 20 de abril, dos Encontros com os Cidadãos.
Iniciativas similares serão levadas a cabo em todos os Estados-membros da União Europeia, estando prevista
a apresentação dos seus resultados ao Conselho Europeu de dezembro de 2019.
Coordenada pelo Governo, em parceria com a Comissão Europeia através da sua representação em Lisboa,
esta iniciativa prevê a realização de uma dezena de Encontros com os Cidadãos, em diversos formatos, em
diversas regiões do País, abrangendo as áreas mais importantes da Agenda Europeia. E é precisamente neste
quadro que o Governo e a Assembleia da República, através da Secretaria de Estado dos Assuntos Europeus
e da Comissão de Assuntos Europeus, à qual deixo uma saudação especial, organizarão, em breve, um evento
com jovens aqui, nesta Casa, para debater o futuro da Europa. E a Europa do futuro será a Europa dos cidadãos,
ou não será.
Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: A Europa que queremos é a Europa que protege, uma
Europa que cumpre o que promete, uma Europa que concretiza.
Este debate com os cidadãos impõe-se exatamente por este motivo: porque estamos frente a desafios muito
profundos.
A Comissão Europeia acaba de apresentar a proposta de quadro financeiro plurianual para o período 2021-
2027, cuja negociação nos irá ocupar durante os próximos meses. Este quadro constitui a oportunidade de
traduzir em atos as declarações políticas sobre o futuro da Europa. Sem financiamento suficiente, não
poderemos implementar a ambição que queremos.
Por isso, e pese embora os aspetos positivos deste quadro financeiro no que se refere à ciência e à tecnologia
e no que se refere aos programas relativos às reformas o Governo considera que este fica aquém do que a
Europa necessita.
Consideramos também que a política de coesão e a política agrícola comum, duas políticas estruturantes da
União Europeia, não podem ser as únicas variáveis de ajustamento para permitir o financiamento destas
importantes novas políticas.
O aprofundamento da UEM (União Económica e Monetária) continua a ser prioritário para encontrar
mecanismos de defesa nas próximas crises. A negociação do Brexit, o dossier digital, o dossier da mobilidade,
o dossier das migrações, da segurança e defesa exigem todo o nosso empenho e o maior consenso alargado
possível daqui até às eleições europeias de maio de 2019.
Espero que, a 28 mãos, consigamos construir uma nova narrativa europeia, bem-sucedida e positiva, que
responda às expectativas dos cidadãos. Deles é o futuro da Europa.
Aplausos do PS.
Entretanto, assumiu a presidência a Vice-Presidente Teresa Caeiro.
A Sr.ª Presidente: — Vamos, agora, passar ao período de debate. As intervenções serão feitas pela ordem
constante da grelha atribuída a este debate sobre o Dia da Europa.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Rubina Berardo, do PSD.
A Sr.ª Rubina Berardo (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Europeus, Sr.
Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Srs. Deputados, Sr.as Deputadas: Celebramos hoje o Dia da
Europa. Se se perguntasse: «o que é a Europa?», seguramente que este Hemiciclo apresentaria não só sete
descrições diferentes, uma por cada partido representado, como também, talvez, 230 versões da Europa, que
cada um de nós realiza e ambiciona.
Reformulo, então, a pergunta: quem é a Europa?
Na mitologia, Europa era uma jovem fenícia, que encantou Zeus à primeira vista, pela sua beleza e graça.
Zeus transforma-se em touro para se aproximar da jovem.
Europa, seduzida pela candura do touro, primeiro afagou-o, depois sentou-se-lhe no dorso. Sem demoras, o
touro disparou de imediato a voar por cima do oceano e revelou a sua verdadeira identidade divina à Europa.
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Este, Srs. Deputados, é o mito do rapto ou da sedução da Europa, que levou a que o nosso continente
ganhasse o seu nome. E há muitas formas hoje de interpretar esse mito. Mas há uma em que estaremos
certamente todos de acordo: a importância, para o futuro de Portugal, do próximo quadro financeiro plurianual
da União.
Srs. Deputados, o PSD acompanha a necessidade de responder pró-ativamente aos novos desafios que se
colocam à União. Também não somos imunes à restrição orçamental que representa a saída do Reino Unido.
Contudo, neste primeiro esboço da Comissão, retiram-se verbas dos Estados — e das regiões! — mais
pobres da União para realocar essas verbas às novas áreas que mais beneficiam os Estados-membros mais
ricos.
O PSD já o afirmou: estamos ao lado dos interesses de Portugal e não aceitamos cortes na política de coesão
e na política agrícola comum.
O Comissário para o Orçamento reagiu às críticas sobre a proposta de Orçamento da Comissão, dizendo:
«As críticas significam que estou certo». Não, Sr. Comissário Oettinger, não está certo! É a negação do princípio
elementar da União: a solidariedade entre os povos e entre os Estados.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Rubina Berardo (PSD): — Ouvimos, hoje, o Sr. Primeiro-Ministro de Portugal «verter lágrimas de
crocodilo» sobre estes cortes. Mas convém ter memória — e o PSD vai ajudar o Governo socialista a relembrar-
se do que fez.
No Governo anterior, Portugal foi precursor na dinamização do grupo Amigos da Coesão, que unia os 15
principais beneficiários desta política.
Na sua ânsia cega de fazer tábua rasa também neste domínio, o atual Governo esqueceu e ignorou os
Amigos da Coesão. E, agora, Srs. Deputados, vemos a consequência: a Comissão Europeia sacrifica — em
primeiro lugar! — logo a política de coesão.
O Sr. Primeiro-Ministro já não se encontra no Plenário, mas a Sr.ª Secretária de Estado terá, talvez,
oportunidade de explicar ao País por que razão o Governo socialista se esqueceu desta colaboração dos Amigos
da Coesão.
A Sr.ª Margarida Marques (PS): — Não é verdade!
A Sr.ª Rubina Berardo (PSD): — Mas, para o PSD, a Europa é muito mais do que a soma de todos os fundos
comunitários! É um fator identitário, político e cultural. Bem ao contrário daqueles que, neste Parlamento, apoiam
o Governo e rejeitam a integração, rejeitam o euro e rejeitam a NATO, mas que, curiosamente, nunca rejeitam
os fundos comunitários e os apoios da União.
Portugal e os portugueses merecem — e nós exigimos! — um Governo que seja ambicioso na política
europeia, que não exprima timidez ou vergonha, ao abordar a integração europeia neste Parlamento.
Vejamos a desconcertante demora do Governo na adesão à cooperação estruturada permanente (CEP) no
domínio da segurança e da defesa, por exemplo.
Srs. Deputados, no meio de todas as derivas populistas na Europa, existem, resistem e persistem europeístas
que conseguem demonstrar que os cidadãos não estão inevitavelmente condenados a escolher essas derivas.
E temos vários exemplos: o resultado das eleições presidenciais austríacas em 2016; a resposta de Angela
Merkel à crise migratória; a vitória de Emmanuel Macron, precisamente com um discurso e propostas pró-
europeias.
Para terminar, gostava de relembrar que a Europa enfrentou, desde os seus primeiros dias, tensões que
testaram a nossa resiliência e a nossa capacidade de transformação, tal e qual Europa, a jovem fenícia do nosso
mito fundador.
Por vezes, Srs. Deputados, as verdades sonantes também vêm do exterior. John Kerry afirmou, há dias: «A
Europa precisa de acreditar em si própria». É assim que abraçamos a Europa: com sedução e contra as
tentativas de rapto da nossa Europa.
Viva Portugal! E viva a Europa!
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Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem, agora, a palavra, pelo Grupo Parlamentar
do Partido Socialista, a Sr.ª Deputada Margarida Marques.
A Sr.ª Margarida Marques (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Europeus, Sr.
Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Comemora-se hoje o Dia
da Europa.
Comemorar o Dia da Europa é lembrar o passado. O que a União Europeia fez, desde a sua fundação, pela
paz, pela democracia, pelo bem-estar dos europeus, pelos direitos e pela proteção social, pela ciência ou pela
inovação.
Comemorar o Dia da Europa é lembrar os pais fundadores: Adenauer, Henri Spaak, Spinelli, De Gasperi,
Jean Monnet, Robert Schuman. É lembrar Delors.
Mas comemorar o Dia da Europa é olhar os desafios que têm a ver com o futuro da Europa. E não estranharão
que, destes, me debruce sobre o futuro quado financeiro plurianual — afinal, a Comissão Europeia apresentou-
nos, há exatamente uma semana, a sua proposta —, porque o quadro financeiro plurianual tem a ver com a
União Europeia que queremos, não tem a ver apenas com o envelope financeiro a que cada país, o nosso País,
tem direito ou de que virá a beneficiar.
É positivo que a Comissão Europeia assuma a necessidade de promover a inovação e se coloque numa
posição competitiva em matéria de tecnologia, na defesa do planeta e do clima, na promoção do investimento.
É positivo que a Comissão Europeia dê centralidade à proteção dos europeus e dos que residem na União
Europeia. A proteção, em todas as suas dimensões, está na primeira ambição dos europeus relativamente à
União Europeia.
É positivo que a Comissão Europeia seja intransigente na defesa dos valores europeus, a começar pelo
Estado de direito, ameaçado em alguns países que integram a União Europeia.
É positivo que a Comissão Europeia proponha um esboço de Orçamento para a zona euro. Reduzido, sem
dúvida, mas é um primeiro passo, e um princípio tão rejeitado por muitos países, nos últimos anos.
Mas a proposta da Comissão Europeia é pouco ambiciosa, sem dúvida. O Parlamento Europeu tinha dado
abertura para uma proposta de Orçamento mais ambiciosa.
Desta vez, temos um fator de perturbação adicional: a saída do Reino Unido da União Europeia. Mas na
negociação 2007-2013 tínhamos o alargamento: mais países beneficiários e, ainda por cima, objetivo 1, tal como
Portugal.
A Comissão Europeia procura evidenciar que o Orçamento aumentou. Mas não aumentou, ou aumentou
muito pouco. O quadro financeiro, agora proposto, passou, por exemplo, a integrar o FED (Fundo Europeu de
Desenvolvimento), que não estava integrado nos quadros financeiros anteriores.
Mas não é só o pouco esforço pedido aos países que nos preocupa, porque, finalmente, são todos
beneficiários.
Preocupa-nos que a Comissão Europeia não tenha proposto acabar definitivamente com os rebates — e são
vários — que surgiram na sequência da declaração da Sr.ª Tatcher «I want my money back» (quero o meu
dinheiro de volta), contrariando, também aqui, a recomendação do Parlamento Europeu.
Preocupa-nos a falta de ambição da Comissão Europeia no que diz respeito à mobilização de recursos
próprios, também aqui muito aquém das recomendações do Parlamento Europeu.
Preocupa-nos que a Comissão Europeia não tenha valorizado o social e a solidariedade, que fazem parte da
coesão dos territórios.
Preocupa-nos que a Comissão Europeia tenha decidido, na sua proposta, reduzir as verbas da coesão, em
vez de se ter colocado numa posição exigente de propor uma nova geração de políticas de coesão. Sim, porque,
hoje, o campo de aplicação das políticas de coesão tem novos desafios. As regiões de coesão têm de tornar-se
ou afirmar-se como regiões competitivas, que incorporem tecnologia e inovação, que atraiam pessoas,
competências, investimento, empresas. Não são mais «as regiões pobres» da União Europeia.
Aplausos do PS.
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Preocupa-nos que tenha decidido reduzir as verbas da PAC (política agrícola comum).
Esta proposta coloca grandes desafios a Portugal na negociação. A valorização das políticas de gestão
centralizada, em detrimento das políticas de gestão partilhada, requer de Portugal uma atitude exigente e
intransigente na negociação dos respetivos regulamentos.
E isto não é uma questão burocrática, é uma questão com um enorme alcance político. Quem lida com fundos
estruturais sabe bem do que estou a falar.
O equilíbrio geográfico no acesso a estas políticas e programas de gestão centralizada e aos respetivos
recursos tem de assegurar que todos os países a eles acedam em condições de igualdade. Não se pode, em
circunstância alguma, permitir à partida que, por exemplo, as grandes universidades, centros de investigação
ou operadores de satélites do centro da Europa estejam numa posição privilegiada. Portugal tem interesses com
potencial de crescimento em todos estes domínios e as instituições portuguesas têm de estar exatamente nas
mesmas condições que os operadores holandeses, franceses ou alemães.
Exigência aos operadores portugueses? Sem dúvida, mas as regras terão de promover o equilíbrio
geográfico.
Resumindo, Portugal está confrontado com três grandes desafios nesta negociação, a saber: chegar a um
quadro financeiro plurianual (QFP) para a União Europeia que permita responder às ambições da União
Europeia e dos cidadãos europeus; chegar a um envelope financeiro nacional justo no quadro europeu; e chegar
a normativos para a gestão dos fundos e dos instrumentos financeiros que assegurem um acesso equilibrado
de Portugal a todos as políticas e programas de gestão centralizada.
Só assim estará assegurada uma participação equitativa e igualitária de todos os Estados-membros no
processo de construção europeia.
Aplausos do PS.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Este Plenário fervilha de emoção e de entusiasmo! Nunca se tinha registado
um debate parlamentar assim!
Risos.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires, a quem apelo que
faça um melhor cumprimento do tempo do que a Sr.ª Deputada que a antecedeu, embora haja a tolerância
devida. Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Secretária de Estado, Sr. Secretário de Estado, Sr.as
Deputadas e Srs. Deputados: A União Europeia é hoje bem diferente das promessas que há 68 anos foram
feitas aos povos europeus, bem longe dessas juras de solidariedade eterna. O brutal programa da troica em
Portugal, especificamente, mostrou bem ao nosso povo o quão cruel pode ser este projeto de União Europeia.
No entanto, todos os anos neste dia se celebram essas promessas, ignorando-se a dura realidade.
O problema de momentos como este, Sr.ª Secretária de Estado, é que facilmente se cai na armadilha de
discursos utópicos sobre solidariedade e liberdade, sobre a união entre povos, que não passam de mera
propaganda. É uma armadilha apenas para quem deixa de olhar para a realidade de todos os dias.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Olhemos para o orçamento europeu que está a ser discutido e ficará claro que
a suposta solidariedade deu lugar aos cortes na coesão. Olhemos para os objetivos económicos e perceberemos
que a suposta União Europeia da prosperidade económica deu lugar à União Europeia da austeridade. Olhemos
para os direitos dos povos e veremos como a União os quer submissos ao pagamento de dívidas impagáveis e
à obsessão dos défices, deixando para trás o investimento público e a defesa dos serviços públicos.
Onde estão as propostas de paz quando a União Europeia, sempre submissa à beligerante NATO, se perde
num complexo puzzle de relações diplomáticas e reforça o seu orçamento para a guerra e para a militarização,
concretizado na Cooperação Estruturada Permanente?
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Onde está a União Europeia dos direitos, vergada à realpolitik, quando os próprios governantes europeus
atacam os seus povos com atropelos à liberdade de imprensa ou aos direitos fundamentais?
A suposta União Europeia da liberdade deu lugar a coisas tão inaceitáveis como aos acordos com regimes
ditatoriais, como a Turquia, ou a um silêncio ensurdecedor sobre o que se passa na Catalunha, na Hungria ou
na Polónia.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, para este debate basta
de ingenuidade sobre um projeto que é cada vez mais opressor! Não devemos permitir que esta data passe sem
que haja uma reflexão séria sobre que projeto europeu existe e que consequências tem ele para as populações
que diz representar.
Vamos então a algumas perguntas que gostávamos que o Governo respondesse. Aceitará Portugal que o
próximo orçamento europeu seja um ataque à política de coesão e à política agrícola comum, desviando dinheiro
dessas verbas diretamente para programas militaristas? Aceitará Portugal que o projeto europeu seja o da
Europa-fortaleza, fechada sobre si mesma, militarizada, que dá prioridade às armas e a esta indústria e não aos
direitos humanos? Aceitará Portugal que a política humanitária europeia se continue a traduzir em pagamentos
ao regime ditatorial da Turquia para servir de muro na crise dos refugiados?
É este o choque de realidade que o novo quadro financeiro plurianual apresenta: rejeitar a convergência,
aprofundar a divergência e atropelar por completo a solidariedade.
Hoje não devemos celebrar em vão nem de continuar com a proclamação de intenções vazias ou de vir falar
em fábulas e histórias mitológicas, Srs. Deputados. O que devemos é ter a responsabilidade de perceber o que
se passa de mal e ter a coragem de mudar — mas mudar radicalmente! — em nome de um projeto de união
entre povos, de facto, e não em nome de um projeto que esmaga os povos por um capricho de poucos que
querem governar em nome do interesse de alguns.
Sabemos que, neste debate, PS, PSD e CDS estão juntos num projeto europeu que esquece os povos, que
implementa a austeridade e que militariza o nosso território, e para isso não contarão com o Bloco de Esquerda.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Muitíssimo obrigada, Sr.ª Deputada, redimiu a Sr.ª Deputada Margarida
Marques em termos de tempos, obviamente.
Tem agora a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Só mesmo em termos de
tempos!
Risos.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Comemoramos hoje o Dia da Europa com tudo o que isso representa
e, ainda assim, não são poucos aqueles que perguntam se teremos, de facto, motivos para o assinalar. É por
isso que, 68 anos depois, não podemos esquecer nem devemos negligenciar a razão principal da integração
europeia, a convivência pacífica entre Estados, a construção de um projeto social, político e económico, e esta
perspetiva é indispensável para contrariarmos análises que são meramente conjunturais ou pontuais.
Alcançámos muito nestes 68 anos. A Europa é um espaço de paz, de segurança, de justiça, de inclusão
social, um espaço de bem-estar que é ímpar no mundo. Apesar de algumas contrariedades mais recentes, a
Europa continua a ser o continente da liberdade e das liberdades, da livre iniciativa, da livre-circulação, do
respeito pelos direitos únicos e inalienáveis que são constantes à nossa natureza humana. Por mais de 70 anos,
a Europa continua a ser o garante da paz, o garante da autossuficiência alimentar de quase 500 milhões de
pessoas e, também, o garante das liberdades políticas e sociais a muitos povos que as viram negadas pelas
duas piores formas de totalitarismo que o mundo conheceu.
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No Dia da Europa, vale a pena recordar os princípios fundadores e os progressos que realizámos em mais
de seis décadas, numa altura em que muitos dos nossos cidadãos olham para a Europa mais como um fardo
do que como uma oportunidade.
Basta ser lúcido ou estar atento para perceber que a Europa que temos hoje é uma Europa que não está
institucionalmente preparada para responder às inúmeras crises que se sucedem, ano após ano, e que não está
preparada para responder às fissuras que se estão a abrir no projeto de integração europeia, da crise das dívidas
soberanas à crise dos refugiados, do terrorismo ao Brexit, passando pelo recrudescimento de movimentos
nacionalistas, populistas, xenófobos e antieuropeus que ascendem à direita e à esquerda e que não são
questões meramente triviais.
Nesse sentido, temos de elogiar e de perceber que — no último ano já o demonstrámos —, enquanto
europeus, temos a capacidade de ultrapassar dificuldades e penso que a prova provada disso foi a
institucionalização da Cooperação Estruturada Permanente num espaço de pouco mais de dois anos.
Dito isto, também temos de perceber que a Europa continua asfixiada pelo imobilismo na adoção de decisões
que a própria União tomou mas que, depois, não consegue cumprir de forma célere e próxima dos cidadãos.
Um exemplo flagrante disso é a conclusão da União Económica e Monetária (UEM), cuja incompletude continua
a afetar países como Portugal, que mais do que nunca necessita do regresso da confiança no sistema bancário
para poder reforçar o financiamento da nossa economia.
O CDS não hesita em assumir o seu europeísmo, mas o nosso é um europeísmo com um padrão de
exigência, fundado em valores como o da solidariedade.
Exigência para podermos progredir na integração europeia sem nunca esquecer a mais-valia dos princípios
da subsidiariedade e da proporcionalidade. Para onde quer que caminhemos, teremos sempre, com muita
transparência, de assegurar a legitimidade das decisões, mas também garantir sempre o respeito pela soberania
dos Estados e dos povos.
Exigência para avançarmos de forma sustentada por esta via e para assegurarmos o equilíbrio entre as
decisões, mas exigência também para garantirmos que, por exemplo, as estruturas da governação económica
da União, que ainda estão por concluir, possam ser feitas o mais rapidamente possível. E a verdade é que,
desde 2014, temos vindo, ano após ano, Conselho Europeu após Conselho Europeu, relatório após relatório, a
adiar o que é inadiável e tão importante para Portugal como, por exemplo, a conclusão da UEM.
Além de exigência falamos também de solidariedade. Temos, com a aprovação do próximo quadro
comunitário, o quadro financeiro plurianual, um enorme teste à solidariedade dos Estados-membros. Ou a
Europa é um espaço de coesão e de solidariedade ou deixa de ser Europa. A redução de fundos da coesão ou
da agricultura leva a um aumento da desigualdade entre países e regiões e isso é um rombo no valor da
solidariedade que nós, nesta bancada, não podemos aceitar.
Também uma suposta perda de fundos que tenha a ver com uma alteração dos critérios, para além do critério
do PIB (produto interno bruto) per capita, é algo que para nós seria absolutamente inaceitável. Era muito
importante que o Governo também aqui dissesse quais os esforços que está a fazer no panorama nacional e
internacional para garantir que os fundos da coesão e os fundos da agricultura não são reduzidos para Portugal,
porque isso seria a pior forma de assinalarmos este Dia da Europa.
Aplausos do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Vamos prosseguir com o debate e tem agora a palavra a Sr.ª Deputada
Paula Santos.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: No dia
em que se assinala a vitória sobre as forças nazi-fascistas na II Grande Guerra, convertido significativamente
em Dia da Europa, saudamos a luta dos povos na defesa dos seus direitos, do direito ao desenvolvimento, ao
progresso e à paz, na defesa do direito de cada povo de decidir o rumo para o seu país. Queremos neste dia
saudar a luta dos povos do continente europeu que contribuíram para avanços civilizacionais e que foram
protagonistas de revoluções emancipadoras, cujo legado ainda hoje assume uma enorme atualidade.
Aplausos do PCP.
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O momento em que vivemos é de profunda e arrastada crise na e da União Europeia. Crise essa que é
indissociável da natureza capitalista do processo de integração e que, simultaneamente, torna evidente a sua
natureza de classe. Uma crise que resulta de opções políticas que conduziram à exploração e ao
empobrecimento generalizado dos povos dos Estados-membros que integram a União Europeia.
Prometeram direitos, coesão, solidariedade, prosperidade, progresso e paz, mas o que a União Europeia
trouxe foi desemprego, precariedade, pobreza, desigualdades, exclusão, guerra.
Para Portugal, a integração na União Europeia, na União Económica e Monetária, no mercado único, tiveram
como consequências a destruição do aparelho produtivo, a destruição de postos de trabalho, o ataque aos
direitos de trabalho e aos direitos sociais, a retirada de soberania, maior dependência e retrocesso económico
e social.
Dada a ausência e a incapacidade de resposta da União Europeia para solucionar os problemas com que os
povos estão confrontados, apresentam-nos agora como solução para o futuro a insistência na mesma opção
política responsável pela situação a que se chegou, numa espécie de «salto em frente» no sentido do
aprofundamento dos pilares que norteiam a União Europeia, o federalismo, o neoliberalismo e o militarismo,
procurando iludir a superação dos problemas.
Surgem, por parte da União Europeia, perspetivas de retirada de maiores parcelas de soberania aos Estados-
membros através do aprofundamento da concentração de poder económico e político, da criação do fundo
monetário europeu, de um orçamento europeu e até de um ministro da economia e das finanças europeu,
maquilhado com o pilar europeu dos direitos sociais, para legitimar a continuação da política de exploração e de
empobrecimento sob a forma das ditas reformas estruturais.
Simultaneamente, prossegue o aprofundamento do militarismo e da política intervencionista, de ingerência e
de agressão da União Europeia, com a crescente cooperação com a NATO, a criação da cooperação estruturada
permanente e o objetivo de reforçar o orçamento na área da defesa e da segurança. A preparação do próximo
quadro financeiro plurianual vai ao encontro desta perspetiva, reforçando as despesas na área da defesa,
visando uma corrida ao armamento à custa da coesão e da política agrícola comum, opção que merece a nossa
veemente rejeição.
São as opções políticas da União Europeia, por exemplo, na forma como tem vindo a tratar a questão das
migrações, assente na repressão e na expulsão ao invés de assegurar direitos fundamentais, que, a par da
intensificação da exploração e do crescimento da pobreza, criam o caldo propício ao crescimento de forças de
extrema-direita, uma situação preocupante, indissociável das orientações subjacentes ao processo de
integração capitalista.
É igualmente preocupante a opção de perseguição de quem ousa defender os direitos dos trabalhadores e
dos povos, sejam partidos comunistas ou organizações sindicais, tal como a criminalização da luta por melhores
condições de vida. Esta realidade parece não incomodar a União Europeia, que propagandeia, mas não pratica,
os valores da democracia e da liberdade e convive bem com o cerceamento de direitos, liberdades e garantias.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Não falta quem propositadamente fale de Europa e União Europeia como se
estivéssemos a referir a mesma coisa, ou quem fale na necessidade de salvar a Europa, quando o objetivo é
salvar o processo de integração capitalista da União Europeia para continuar a beneficiar o grande capital e os
grupos monopolistas à custa da exploração dos trabalhadores.
Afirmamos hoje que a melhor forma de construir uma Europa dos trabalhadores e dos povos, uma Europa
que defenda e respeite os direitos do trabalho e os direitos sociais, uma Europa verdadeiramente de cooperação
e de solidariedade, uma Europa assente nas relações económicas mutuamente vantajosas, uma Europa de
progresso e de paz, não passa pela subjugação dos interesses nacionais aos condicionalismos e imposições da
União Europeia mas, sim, pela rutura com a União Europeia e com tudo aquilo que representa, pela afirmação
da soberania, pelo direito ao desenvolvimento económico e social, respeitando os direitos dos trabalhadores e
garantindo os direitos sociais, pela redistribuição da riqueza, pela cooperação, pela solidariedade e pela paz.
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Aplausos do PCP e de Os Verdes.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, de Os Verdes, para
uma intervenção.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Europeus
e Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: O Sr. Primeiro-Ministro, há pouco, no anterior debate,
referiu que, se quisermos uma Europa forte, temos de ter um orçamento à medida. Acho que isto já é sonhar
mesmo muito, porque uma Europa forte nunca passaria por uma União Europeia que tem como prioridade
prosseguir não aqueles que são os interesses dos povos mas, sim, os interesses das elites europeias.
Quando a União Europeia se divorciou dos povos, evidentemente, autoenfraqueceu-se, porque sem esse
apoio fundamental, vital para se alimentar, é impossível continuar. É para os povos que os governantes devem
dirigir todas as suas ações. Ora, uma Europa que, ao invés de promover coesão e solidariedade entre os seus
Estados-membros, aquilo que fez foi criar um maior fosso, inclusivamente entre as dinâmicas económicas e
sociais desses Estados-membros, é uma Europa que falhou, como é evidente.
Nós, ao nível alimentar, por exemplo, quando integrámos a então CEE (Comunidade Económica Europeia),
dependíamos do exterior em cerca de 25% daquilo que consumíamos; hoje, dependemos brutalmente mais e,
se calhar, os números até estão mesmo praticamente invertidos: dependemos quase mais de 70% daquilo que
consumimos ao nível alimentar. Portanto, isto também tem muito a ver com a consequência direta, por exemplo,
daquela que foi a política agrícola comum, que serviu interesses como os da França mas esqueceu interesses
como os de Portugal. E, aqui, o que é que fez? Liquidou a nossa atividade produtiva! Nós recebemos fundos
comunitários para não produzir, para ter as nossas terras inativas.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Bem lembrado!
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Isto é uma União Europeia que falha redondamente! E agora o que
é que a União Europeia vem propor, através de um novo orçamento? Enfraqueça-se a política de coesão e
enfraqueça-se a política agrícola comum!
Isto é para perceber que, de facto, aqui não há solução possível. Uma Europa que emergisse de uma lógica
de solidariedade entre países não tem nada ver com isto. Isto é a Europa das elites, não é a Europa dos povos,
e, portanto, naturalmente, tem o seu falhanço marcado, que é justamente aquilo que tem acontecido.
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, fica assim concluído o período de
debate. Vamos entrar no período de encerramento, para o que tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado dos
Assuntos Europeus, dispondo de 7 minutos.
A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Europeus: — Sr.ª Presidente, agradeço aos Srs. Deputados e
às Sr.as Deputadas.
Isto é a Europa. O que aqui aconteceu, agora, foi o debate sobre a Europa, e este debate sobre a Europa
tem espaço para poesia e para mitologia, inclusive, porque isso faz parte da identidade europeia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Mas também tem espaço para o realismo!
A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Europeus: — E tem espaço para o realismo, sim, Sr.ª Deputada.
Tem toda a razão!
Tem espaço para olhar para a Europa que queremos construir e para a Europa que Portugal defenderá, e
que defenderá com muito orgulho, sem vergonhas e sem demoras, em todas as instâncias onde tiver de intervir.
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E temo-lo feito, temo-lo feito através da presença do Sr. Primeiro-Ministro, desde a primeira hora, nas instâncias
europeias, no Parlamento Europeu, explicando o que queremos e que Europa queremos, e temo-lo feito junto
de todos os países da União Europeia com que temos mantido relações e encontros bilaterais a todos os níveis
para encontrar o caminho certo, o caminho da Europa que queremos, o caminho para a Europa que Portugal
acha que deve ser a Europa.
Então, não pensem que não vamos trabalhar ou que não estamos a trabalhar. O grupo dos Amigos da
Coesão é um grupo que se constituirá, provavelmente, a partir do momento em que sair o nosso regulamento
sobre a política de coesão, no dia 29 de maio, porque a política de coesão é, desta vez — e este é mais um
elemento de toda a complexidade desta negociação —, um elemento que vai ter alianças muito variáveis em
níveis geográficos. O que aparecer vai ser benéfico para uns países, menos benéfico para outros, mesmo em
termos da política de coesão, e vamos ter de encontrar essas alianças em geometrias variáveis, o que assim
iremos fazer.
Quanto aos outros aspetos do orçamento, queria agradecer à Sr.ª Deputada Margarida Marques por ter
sublinhado os aspetos positivos que este orçamento nos traz, os quais não podemos esquecer. Estes aspetos
são fundamentais porque tratam do crescimento da ciência, da inovação, da proteção do emprego, da proteção
social e trazem, sobretudo, este esboço de linha orçamental, que vem com um programa de apoio às reformas
e com um fundo para o investimento e para a estruturação, num momento em que haja novas crises sistémicas
na Europa.
O aspeto social, a política social europeia, é central, e temos de lhe dar a atenção devida. Este orçamento,
assim, traz aspetos extremamente positivos, mas traz também preocupações, obviamente, as quais foram aqui
elencadas.
Uma dessas preocupações é a política agrícola comum, e é interessante que quem ache que a política
agrícola comum acabe por ser uma coisa negativa para o País depois, afinal, queira a política agrícola comum.
Temos de a defender de acordo com os nossos interesses, com a maneira como ela pode ser útil para o nosso
País, e assim faremos, porque se trata sobretudo de trabalhar a questão do desenvolvimento rural. É o pilar do
desenvolvimento rural que é particularmente importante para Portugal.
Quanto às políticas de coesão, elas têm de se modernizar, têm de ser abertas também a novas políticas.
Desde o início dissemos que as questões das migrações, por exemplo, da integração dos migrantes, devem ser
um aspeto importante dentro da política de coesão. Estamos dispostos a aceitar isso, mas, então, não pode
haver menos dinheiro para a política de coesão. A política de coesão pode ser mais abrangente, mas não pode
ter um financiamento menor, e por isso, seguramente, nos bateremos.
Quanto à União Económica e Monetária, continuaremos a defender a melhoria da sua resiliência aos choques
económicos através da conclusão da União Bancária, da criação da União dos Mercados de Capitais e dessa
capacidade orçamental que acrescente estabilidade e favoreça o investimento na zona euro. Nesse sentido,
vemos positivamente estas propostas apresentadas pela Comissão relativas ao apoio às reformas estruturais e
ao fundo de estabilização do investimento.
Iremos também trabalhar noutra área que aqui foi referida: esta ideia de que temos de estar com os cidadãos.
Efetivamente, a União Europeia não pode ser uma União Europeia de elites, tem de chegar ao cidadão, tem de
estar com o cidadão, tem de ouvir o cidadão. Este é um aspeto fundamental, porque é daí que nascem estes
populismos, que nascem os ataques ao Estado de direito, e o Estado de direito é e tem de continuar a ser um
pilar fundamental da União Europeia. Isso é inegável, e por isso iremos também trabalhar nesta área.
As eleições europeias de maio de 2019 estão aí à porta e temos pela frente um calendário muito exigente
este ano. Trabalharemos com afinco na defesa dos interesses nacionais para alcançar um resultado que seja
bom para Portugal mas que seja também bom para a Europa, porque é disso que se trata, que seja igualmente
um resultado bom para a Europa, porque a Europa tem de ser essa Europa que protege, essa Europa que
concretiza, essa Europa que dá aos cidadãos a resposta às suas expetativas. Por isso, este 9 de maio é um dia
de celebração mas deve ser também um dia de mobilização.
Até ao final do ciclo institucional da União Europeia, temos muito a fazer para demonstrar aos cidadãos o
valor acrescentado da nossa União, o valor acrescentado para Portugal, o valor dessa entidade que, como aqui
foi dito, nos trouxe 68 anos de paz — e, às vezes, esquecemo-nos do quão importante isso é, esquecemo-nos
de quão frágil a paz é. A Sr.ª Deputada Paula Santos falou do momento da vitória, e este momento da vitória
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tem de ter uma reflexão muito grande em todos nós, sobretudo nos mais jovens, que não sabem que essa paz
é tão frágil assim.
Iremos redobrar o nosso trabalho nos dossiês legislativos que ainda estão em curso, negociar o quadro
económico-financeiro plurianual e reconquistar a confiança dos cidadãos.
O ano de 2019 será um ano de mudança para a Europa: pela primeira vez, deixaremos de ter o Reino Unido
connosco, um Estado-membro que abandona o projeto. Todos lamentamos essa decisão, todos a respeitamos,
mas esperamos que o Reino Unido possa continuar a ser um parceiro estratégico e próximo da União Europeia
neste seu caminho, que terá de ser composto por esse triângulo virtuoso de cidadãos, Estados-membros e
instituições europeias.
Há 68 anos, a Declaração Schuman tinha por objetivo a construção de um futuro que acabasse de vez com
as tragédias fratricidas na Europa. A União Europeia é, por isso, inestimável e insubstituível. Contribuir para a
sua preservação, para o seu aperfeiçoamento, de forma pragmática mas não despida de idealismos, não
despida de valores, é o convite que todos estamos obrigados a aceitar. Contamos convosco, contamos com
debates como este, contamos com a vossa ajuda para que possamos apresentar um resultado à altura deste
repto no próximo Dia da Europa, 9 de maio de 2019, em Sibiu, na Roménia.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, concluído o debate sobre o Dia da Europa, chegamos
ao fim dos nossos trabalhos da reunião plenária de hoje. Despeço-me da Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos
Europeus e do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.
Resta-me apenas informar a Câmara da nossa ordem de trabalhos da sessão de amanhã, que começará às
15 horas e que consiste na discussão conjunta dos projetos de resolução n.os 1476/XIII (3.ª) — Recomenda ao
Governo que proceda à alteração do sistema de fundos de reserva dos edifícios em vigor, garantindo a sua
efetiva existência e utilização devida, através de uma fiscalização a ser realizada pelos municípios, promovendo
a existência do financiamento necessário para a conservação dos edifícios (CDS-PP), 1477/XIII (3.ª) —
Recomenda ao Governo a adoção de medidas para a proteção e promoção do arrendamento, nomeadamente
as medidas necessárias para a criação do regime jurídico do seguro de renda (CDS-PP), do projeto de lei n.º
821/XIII (3.ª) — Cria um incentivo ao arrendamento habitacional, reduzindo a taxa de tributação autónoma, em
sede de IRS, dos rendimentos prediais, resultantes de contratos de arrendamento para habitação, procedendo
à alteração do Código do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, aprovado pelo Decreto-Lei n.º
442-A/88, de 30 de novembro (CDS-PP), na generalidade, dos projetos de resolução n.os 1582/XIII (3.ª) —
Transparência nos processos de alienação ao fundo nacional de reabilitação do edificado de imóveis do Estado
(CDS-PP), 1583/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo, em articulação com a Câmara Municipal de Lisboa, que
proceda à reconversão e reabilitação dos edifícios que integram a Colina de Santana, em Lisboa, para que
possam ser utilizados para habitação, num programa a criar, ou já existente, com vista ao arrendamento para
fins habitacionais a preços moderados, principalmente dirigido a jovens e famílias de classe média (CDS-PP),
1584/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que proceda ao levantamento do Património Imobiliário da Santa
Casa da Misericórdia de Lisboa, no sentido de criar um programa com vista à reabilitação ou construção de
imóveis para arrendamento para fins habitacionais a preços moderados (CDS-PP), 1586/XIII (3.ª) — Recomenda
ao Governo que crie um seguro de renda (PSD), 1588/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que crie um subsídio
para o arrendamento em situações de fragilidade súbita (PSD) e 1591/XIII (3.ª) — Programa de cooperação
entre o Estado e as autarquias locais para o aproveitamento do património imobiliário público com vista ao
arrendamento (PSD).
No final do debate, haverá eventual votação das iniciativas discutidas.
Está encerrada a sessão.
Eram 17 horas e 50 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.