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Quinta-feira, 29 de abril de 2021 I Série — Número 60

XIV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2020-2021)

REUNIÃOPLENÁRIADE28DEABRILDE 2021

Presidente: Ex.mo Sr. António Filipe Gaião Rodrigues

Secretários: Ex.mos Srs. Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco

S U M Á R I O

O Presidente (António Filipe) declarou aberta a sessão

às 15 horas e 2 minutos. Foi aprovado um parecer da Comissão de

Transparência e Estatuto dos Deputados relativo à suspensão do mandato de um Deputado do BE e à respetiva substituição.

Deu-se conta da apresentação dos Projetos de Lei n.os 806, 808 e 810/XIV/2.ª e dos Projetos de Resolução n.os 1217 a 1229/XIV/2.ª.

O Presidente em exercício procedeu à leitura da mensagem do Presidente da República sobre a devolução, sem promulgação, do Decreto da Assembleia da República

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n.º 128/XIV — Permite o recurso a técnicas de procriação medicamente assistida através da inseminação com sémen após a morte do dador, nos casos de projetos parentais expressamente consentidos, alterando a Lei n.º 32/2006, de 26 de julho (procriação medicamente assistida).

Foi apreciado o Relatório sobre a Aplicação da Declaração do Estado de Emergência no período de 17 a 31 de março de 2021. Usaram da palavra o Ministro da Administração Interna (Eduardo Cabrita), os Deputados João Cotrim de Figueiredo (IL), André Ventura (CH), Mariana Silva (PEV), Bebiana Cunha (PAN), Ana Rita Bessa (CDS-PP), João Oliveira (PCP), Moisés Ferreira (BE), António Cunha (PSD) e André Pinotes Batista (PS) e, a encerrar o debate, a Ministra da Saúde (Marta Temido).

Ao abrigo da alínea b) do n.º 2 do artigo 224.º do Regimento, procedeu-se a um debate com a Ministra de Estado e da Presidência (Mariana Vieira da Silva), tendo a Ministra, o Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros (André Moz Caldas) e as Secretárias de Estado para a Cidadania e a Igualdade (Rosa Monteiro) e para a

Integração e as Migrações (Cláudia Pereira) dado resposta às perguntas formuladas pelos Deputados Fernando Negrão, Lina Lopes e Rui Cristina (PSD), Beatriz Gomes Dias e Fabíola Cardoso (BE), Alma Rivera (PCP), Telmo Correia (CDS-PP), Inês de Sousa Real (PAN), Mariana Silva (PEV), André Ventura (CH), João Cotrim de Figueiredo (IL), Elza Pais e Susana Amador (PS), Diana Santos (BE), Bruno Aragão, Telma Guerreiro e Romualda Fernandes (PS), Artur Soveral Andrade e Carla Borges (PSD), Ana Rita Bessa (CDS-PP) e Bebiana Cunha (PAN).

Foi anunciada a entrada na Mesa dos Projetos de Lei n.os 811 e 812/XIV/2.ª e do Projeto de Resolução n.º 1230/XIV/2.ª.

Deu-se conta dos Deputados que estiveram presentes, por videoconferência, nesta sessão bem como na sessão solene comemorativa do 25 de Abril.

O Presidente (António Filipe) encerrou a sessão eram 19 horas e 6 minutos.

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O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, vamos dar início à sessão.

Eram 15 horas e 2 minutos.

Peço aos Srs. Agentes da autoridade que abram as portas das galerias, por favor.

Vamos começar por anunciar um parecer da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados, que

terá de ser votado.

A Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha vai dar conta do parecer.

A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o parecer da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados refere-se à suspensão do mandato do Deputado do

Bloco de Esquerda Pedro Filipe Soares (círculo eleitoral de Lisboa), nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo

4.º, da alínea b) do n.º 2 do artigo 5.º e do n.º 1 do artigo 9.º do Estatuto dos Deputados, e à sua substituição

por Fabian Filipe Figueiredo, pelo período de 26 de abril a 11 de junho de 2021, inclusive.

A Comissão proferiu parecer no sentido de que a suspensão do Deputado Pedro Filipe Soares cumpre os

requisitos legais.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, está em apreciação o parecer.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência das Deputadas não inscritas

Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira.

A Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha vai agora ler o expediente que, entretanto, deu entrada na Mesa.

A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, deram entrada na Mesa, e foram admitidos pelo Sr. Presidente, os Projetos de Lei n.os 806/XIV/2.ª (PEV), que baixa à 10.ª Comissão, 808/XIV/2.ª (PS),

que baixa à 10.ª Comissão, e 810/XIV/2.ª (PSD), que baixa à 1.ª Comissão.

Deram também entrada na Mesa, e foram admitidos, os Projetos de Resolução n.os 1217/XIV/2.ª (PSD),

que baixa à 5.ª Comissão, em conexão com a 6.ª e a 10.ª Comissões, 1218/XIV/2.ª (Deputada não inscrita

Cristina Rodrigues), que baixa à 3.ª Comissão, 1219/XIV/2.ª (BE), que baixa à 9.ª Comissão, 1220/XIV/2.ª

(PAN), que baixa à 12.ª Comissão, 1221/XIV/2.ª (PCP), que baixa à 3.ª Comissão, 1222/XIV/2.ª (PSD), que

baixa à 10.ª Comissão, 1223/XIV/2.ª (CDS-PP), que baixa à 6.ª Comissão, 1224/XIV/2.ª (PAN), que baixa à

12.ª Comissão, 1225/XIV/2.ª (PS), que baixa à 11.ª Comissão em conexão com a 7.ª Comissão, 1226/XIV/2.ª

(PS), que baixa à 6.ª Comissão, 1227/XIV/2.ª (BE), que baixa à 1.ª Comissão, 1228/XIV/2.ª (PAN), que baixa à

10.ª Comissão, e 1229/XIV/2.ª (BE), que baixa à 8.ª Comissão.

É tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, vou passar a ler a mensagem recebida de Sua Ex.ª o Presidente da República relativa à devolução, sem promulgação, do Decreto da Assembleia da República n.º

128/XIV — Permite o recurso a técnicas de procriação medicamente assistida através da inseminação com

sémen após a morte do dador, nos casos de projetos parentais expressamente consentidos, alterando a Lei

n.º 32/2006, de 26 de julho (procriação medicamente assistida):

«Ex.mo Sr. Presidente da Assembleia da República

Dirijo-me a V. Ex.ª, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 136.º da Constituição, transmitindo a presente

mensagem à Assembleia da República sobre o Decreto n.º 128/XIV, que permite o recurso a técnicas de

procriação medicamente assistida através da inseminação com sémen após a morte do dador, nos casos de

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projetos parentais expressamente consentidos, alterando a Lei n.º 32/2006, de 26 de julho (procriação

medicamente assistida), nos termos seguintes:

1 — O Decreto em apreciação permite o recurso a técnicas de procriação medicamente assistida através

da inseminação com sémen após a morte do dador, nos casos de projetos parentais expressamente

consentidos, alterando a Lei n.º 32/2006, de 26 de julho (procriação medicamente assistida).

2 — Procede-se, deste modo, ao alargamento da inseminação post mortem, até agora permitida apenas

com transferência de embrião do casal progenitor.

3 — A questão da inseminação post mortem suscita, no entanto, questões no plano do direito sucessório

que o Decreto não prevê, uma vez que não é acompanhada da revisão, nem assegurada a sua articulação

com as disposições aplicáveis em sede do Código Civil, o que pode gerar incerteza jurídica, indesejável em

matéria tão sensível. É o caso de o dador querer, expressamente, manter o regime do Código Civil, em

detrimento do consagrado no presente diploma, no quadro do superior interesse da criança — a criança

concetura ou nascitura, mas também outras crianças já nascidas do mesmo progenitor.

4 — Acresce que o Decreto estabelece uma norma transitória que determina que a possibilidade de

inseminação post mortem com sémen do marido ou do unido de facto é aplicável aos casos em que, antes da

entrada em vigor da lei, se verificou a existência de um projeto parental claramente consentido e estabelecido,

sem que, para garantia da segurança jurídica, se assegure que foi livre, esclarecido, de forma expressa e por

escrito, sem violação das disposições legais atualmente em vigor, e que o apuramento da existência desse

projeto parental claramente consentido e estabelecido inclui a vontade inequívoca de abranger os seus efeitos

sucessórios.

Deste modo, devolvo, sem promulgação, o Decreto da Assembleia da República n.º 128/XIV, para que a

Assembleia da República possa ponderar as soluções ali consagradas, nos domínios acima especificados,

designadamente à luz do princípio da segurança jurídica e no contexto sistemático das demais normas

relevantes do ordenamento jurídico nacional em matéria sucessória.

Marcelo Rebelo de Sousa»

Srs. Deputados, lida esta mensagem, a questão será reapreciada nos termos previstos na Constituição,

pelo que aguardar-se-á o decurso do tempo necessário e uma eventual iniciativa com vista à confirmação ou à

alteração deste diploma.

Vamos passar ao segundo ponto da nossa ordem de trabalhos, que consiste na apresentação e discussão

do relatório sobre a aplicação da declaração do estado de emergência no período de 17 a 31 de março de

2021.

Para proceder à apresentação deste relatório, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna,

Eduardo Cabrita.

O Sr. Ministro da Administração Interna (Eduardo Cabrita): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este relatório corresponde ao décimo terceiro período de estado de emergência que foi declarado pela

Assembleia da República, sob proposta do Sr. Presidente da República, desde março de 2020. E corresponde

ao vigésimo relatório que, num quadro de transparência, quer de períodos de estado de emergência, quer de

aplicação das regras da Lei de Bases da Proteção Civil, no quadro de situações de calamidade, contingência

ou de alerta, o Governo apresenta à Assembleia da República.

Olhando para este relatório, diria que a principal conclusão que dele devemos extrair é a de que estavam

certos o Presidente da República e a Assembleia da República ao declararem este conjunto de medidas, ao

abrigo do estado de emergência, e o Governo ao executá-las.

Os resultados atingidos nesta quinzena, que corresponde ao início do processo de desconfinamento e ao

período da Páscoa, provam que as medidas eram adequadas e que os portugueses foram exemplares na

forma como adequaram a sua resposta a esta exigência.

Aplausos do PS.

Da minha experiência do último ano de debate convosco, permitam-me que diga que o que melhor prova

que o Governo fez o que devia fazer é o resultado apresentado neste relatório e o de que não estarei aqui, a

seguir, a participar num debate sobre um eventual próximo período de estado de emergência.

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Durante o período a que se refere este relatório, a vacinação teve um crescimento muito significativo,

alargando-se de forma decisiva ao grupo acima dos 80 anos e com o primeiro período de vacinação massiva

de professores do pré-escolar e do 1.º ciclo de ensino básico. Durante este período, foi possível o retorno das

atividades letivas presenciais nas creches, no pré-escolar e no 1.º ciclo do ensino básico.

Neste período também houve uma redução muito significativa de casos, de cerca de um máximo de 600

casos diários para uma média abaixo de 400; houve uma redução significativa de óbitos, que, mesmo assim,

não podemos deixar de lamentar, mas que passaram de mais de duas dezenas, no início do período, para

dois ou três óbitos nos últimos dias; houve uma redução de 35% de internados; houve uma redução de 24%

dos casos ativos; mas, e talvez mais importante que tudo, em duas semanas apenas, houve uma redução de

38% do número de internados em cuidados intensivos, aqueles que determinam uma maior pressão sobre o

Serviço Nacional de Saúde.

As forças de segurança, as câmaras e as autarquias locais, as estruturas de apoio social, mas, sobretudo,

os cidadãos, estiveram conjugados neste grande esforço que permitiu iniciar a libertação da sociedade

portuguesa, permitiu dar espaço de intervenção ao Serviço Nacional de Saúde para curar os doentes e

também para retomar, gradualmente, a resposta em que os portugueses confiam.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Vamos agora passar às intervenções dos Srs. Deputados, por ordem crescente de representatividade.

Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, do Iniciativa Liberal.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Este minuto liberal é hoje particularmente feliz, porque estamos a dois dias de sair de cinco meses e

meio de estado de emergência. Não acabou a pandemia, há muito para fazer, mas o muito que há a fazer

pode agora ser baseado no que as pessoas livre e responsavelmente escolham fazer por si e pelos outros e

não nas imposições de um Estado omnipotente e omnipresente. Dar oportunidade a que sejam as pessoas e

não o Estado a decidir o essencial da sua vida coletiva é a essência do liberalismo.

É altura de discutir que sentido faz manter medidas como a obrigatoriedade do teletrabalho, cuja

reapreciação parlamentar já solicitámos, a limitação arbitrária e sem lógica de horários de comércio, cafés e

restaurantes, a obrigatoriedade de uso de máscaras em espaços públicos amplos ou a proibição de certas

atividades lúdicas e de lazer, em especial aquelas que estão basicamente encerradas há mais de um ano,

como os eventos, os bares e as discotecas.

Alguns verão nesta discussão um tema essencialmente jurídico sobre a extensão dos poderes que a

legislação da proteção civil ou da saúde possam conferir. A Iniciativa Liberal vê nesta discussão uma

oportunidade de discutir de que forma é que Portugal irá iniciar a recuperação social e económica que é da

maior urgência.

E para que os portugueses possam assumir o seu papel central nesta recuperação, o Estado tem de se

focar em fazer o que lhe compete, sem hesitações ou complexos ideológicos. É possível acelerar a

vacinação? É — basta recorrer a todos os que estão habilitados a vacinar. É possível alargar os testes para

retomar a vida normal em segurança? É — basta continuar a cooperação entre laboratórios públicos e

privados que tão bons resultados tem produzido.

Depois de amanhã, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, acaba o estado de emergência e começa a

hora de Portugal cuidar do seu futuro.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Administração Interna, o tom que imprimiu ao seu discurso, hoje, nesta Assembleia, ao dizer «eu tive razão, o Governo teve razão, tivemos todos razão» e a

falta de entusiasmo com que o Partido Socialista bateu palmas no final, quase se esquecendo de o fazer,

mostram bem o contrário, ou seja, que não teve razão, afundou o País e não cuidou de quem tinha de cuidar.

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Diga-nos, Sr. Ministro, quantos polícias já foram vacinados, até hoje! Ao fim de três meses, continuamos à

espera de saber quantos polícias já foram vacinados. É que, como sempre, o sindicato diz uma coisa e o Sr.

Ministro diz outra!

E quantos bombeiros já foram vacinados? Também neste caso, como é habitual, eles dizem uma coisa e o

Sr. Ministro diz outra!

Mas já que veio aqui falar de racionalidade — e, agora que vai terminar o estado de emergência, não

teremos aqui o Sr. Ministro de 15 em 15 dias para o dizer —, explique-nos lá qual é o racional de fechar

restaurantes às 13 horas. Explique-o ao País, aos que fecharam, aos que faliram, aos que desapareceram!

Diga-nos qual é o caso, na Europa, em que os restaurantes abrem às 8 horas da manhã e fecham às 13

horas! Indique-nos um caso em que isso aconteça, Sr. Ministro!

E vou terminar com outra questão. O Sr. Ministro, no ano passado, antes de entrar em vigor o primeiro

estado de emergência, quando aqui veio respondeu-me o seguinte: «Não se vê necessidade de fechar

fronteiras, isso é o que a extrema-direita quereria». Ora, Sr. Ministro, acabou o estado de emergência, passou

a pandemia e foi o Sr. Ministro que não reabriu as fronteiras com Espanha!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Vou terminar, Sr. Presidente. Explique-nos lá se vamos, como sempre, ficar de joelhos à porta dos espanhóis, se são eles que vão

decidir quando reabrem as fronteiras ou se teremos um pingo de dignidade e dizemos que somos nós, e não

eles, a decidir quando é que abrimos as fronteiras com Espanha.

É que já chega, já basta de estarmos sempre de joelhos perante o país vizinho! Convinha que o Sr.

Ministro desse um sinal nesse sentido.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Silva, do PEV.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O relatório que hoje analisamos e discutimos diz respeito à quinzena de 17 a 31 de março, período em que se

iniciou o processo de desconfinamento por fases.

Na primeira fase, algumas atividades económicas reabriram e recomeçaram os seus negócios.

No que diz respeito a este relatório, uma vez mais dizemos que o mais importante é o que o mesmo não

diz. E o que o relatório não diz é quantos negócios, particularmente micro e pequenos negócios, não reabriram

e não diz por que razão não reabriram essas fontes de rendimento de milhares de famílias.

O debate do relatório sobre a aplicação da declaração do estado de emergência não pode ser um ritual

vazio de sentido. Os senhores, que propuseram o estado de emergência e defenderam a sua renovação por

15 vezes, devem dar-lhe sentido e conteúdo.

Mas nós respondemos à pergunta anterior: muitos desses pequenos negócios não reabriram, porque os

apoios, tantas vezes anunciados, não lhes chegaram, à força de dar prioridade ao défice das contas públicas.

Muitos nem sequer conseguiram furar as barreiras que foram impostas, com burocracias inultrapassáveis.

É esse o balanço que também é preciso fazer nestes relatórios.

O que este relatório não nos diz é quantos trabalhadores ficaram sem emprego neste período e quais as

razões, e quantos deles têm de ser reintegrados, porque esses despedimentos são ilegais. É que a epidemia

não pode justificar tudo. É que nem tudo é culpa da epidemia.

Este relatório devia trazer-nos a informação sobre a atividade da ACT (Autoridade para as Condições do

Trabalho) para impedir abusos e aproveitamentos.

O problema é o que este relatório não diz, e isso já o dissemos diversas vezes. Não diz que o acesso aos

cuidados de saúde primários continua a ser, em algumas partes do País, uma verdadeira aventura.

As pessoas cumprem as regras de segurança que lhes foram impostas, e não se dirigem aos centros de

saúde presencialmente para se proteger e proteger os outros, mas os telefones continuam a não ser

atendidos. Continua a ser difícil entrar em contacto com os médicos de família, marcar uma consulta e, desta

forma, continua a ser difícil perder o medo de aceder aos serviços de saúde.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este relatório, não obstante a preocupação que perpassa por largos

setores da sociedade portuguesa, continua a não nos informar sobre o que se está a fazer na área da saúde

mental, apesar de os membros do Governo repetirem exaustivamente que há verbas para o reforço da saúde

mental. Mas o que se está a fazer agora, no presente? É que, por muitos anúncios que o Governo faça, isso

de nada valerá, se não se iniciar já um processo urgente de avaliação e monitorização sobre as incidências

dos problemas de saúde mental e de intervenção precoce, designadamente nas escolas, para o que é preciso,

porém, dotá-las dos meios humanos e técnicos necessários.

Sr. Presidente e Srs. Deputados, já falta pouco. Esperamos nós que os dois relatórios que faltam nos

tragam as respostas às perguntas colocadas.

Aplausos do Deputado do PCP João Oliveira.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Bebiana Cunha, do PAN.

A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Este relatório e o momento que vivemos fazem-nos perspetivar, na proximidade, tempos melhores não só com

aquilo que são os dados que conhecemos, mas também evidentemente com o fim do estado de emergência.

É verdade que os passos têm de ser conscientes e também é verdade que o Governo tem de apoiar mais

aqueles concelhos que se encontram em piores situações, nomeadamente naquilo que aos dados

epidemiológicos diz respeito.

Em relação às políticas de saúde, não pode passar-se o que, neste momento, se está a passar, com

pedidos de devolução do pagamento de horas extraordinárias aos profissionais de saúde pública e a iminência

da dispensa de profissionais que foram integrados neste contexto, mas que também já eram necessários, fruto

daquelas que eram as necessidades estruturais. É isto o que nos dizem não só os profissionais, mas também

as administrações hospitalares. Veja-se, por exemplo, o caso dos enfermeiros nos hospitais de Braga ou do

Tâmega e Sousa, que estarão na iminência de ser dispensados.

Mas também é tempo de o Governo devolver às escolas o merecido reconhecimento. É tempo de o

Ministério dialogar com as entidades representativas e de caminhar a sério para as políticas de inclusão, num

momento em que, por exemplo, os encarregados de educação surdos continuam a não ver assegurada a sua

participação no acompanhamento dos seus educandos, através, por exemplo, do que poderia ser a

implementação de uma proposta aprovada ao PAN em 2020, de uma bolsa de intérpretes em língua gestual

portuguesa (LGP).

Este é o tempo em que, nas escolas, menos conteúdo será mais e melhor.

Deste relatório concluímos também que este é o momento para apoiar os trabalhadores independentes, as

famílias e a recuperação das empresas, sem esquecer, obviamente, a definição de objetivos ambientais

sérios, mas que não sirvam de bode expiatório, como acontece na Petrogal, em Matosinhos.

Também a cultura precisa de passar a ter a devida importância nas políticas do Governo, pois também

precisamos dela para viver. Evidentemente, referimo-nos à cultura que produz conhecimento e bem-estar e

não a atividades que alguns querem continuar a chamar de «cultura», mas que, na verdade, promovem a

violência, a tortura e o sofrimento, impróprios de uma sociedade moderna e civilizada, atividades estas que,

como já se viu no passado, nem as regras da DGS (Direção-Geral da Saúde) souberam cumprir.

A nível laboral, é também um momento para proceder à regulamentação do teletrabalho, equilibrando e

«desdensificando» aquilo que é o quadro legal.

Para concluir, quero apenas dizer, Sr.as e Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, que, volvido um

ano, possa o Governo retirar todas as aprendizagens da forma como esta crise nasceu, através de políticas

que permitem a invasão e a depredação de ecossistemas e o declínio da biodiversidade, e possa, então,

promover políticas públicas, de acordo com aquelas que são as necessidades sociais e ambientais do século

XXI.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa.

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A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Analisamos mais um relatório sobre a aplicação da declaração do estado de emergência e caminhamos para o

final destas análises, com o que, julgo, todos ficamos satisfeitos, a vários títulos.

Do ponto de vista do que consta do relatório, volto a insistir no tema da testagem, de que já falei há 15 dias.

Mantemos a preocupação, porque o nível de testes PCR não cresce, mantendo-se relativamente idêntico ao

do tempo do confinamento. Já os varrimentos com testes de antigénio são os principais responsáveis pelos

valores globais mais elevados de testagem.

Quanto ao documento sobre a estratégia de testagem, que se esperaria que tivesse surgido antes do

desconfinamento ou, pelo menos, no «Dia D» do desconfinamento, dia 15 de março, surgiu só na semana

passada, no dia 21 de abril, para ser operacionalizado daí para a frente, já com um mês de desconfinamento

em marcha. Enfim…

Também do ponto de vista do que consta do relatório sobre a economia, diz-nos que há uma ligeira

aceleração económica, o que não podia deixar de ser, pois as portas reabriram-se em algumas atividades.

Mas não se fazem quaisquer avaliações ou considerações sobre os números do desemprego, o layoff ou

sobre as portas que, de facto, acabaram por não se voltar a abrir.

Na cultura, como já aqui foi dito, mantém-se um padrão curioso, de reportar quantos seguidores têm no

Facebook ou no Instagram os teatros nacionais, o que é interessante. Mas o que realmente valia a pena

saber, que é se os apoios estão a chegar às estruturas, tal como foi anunciado, sobre isso não há nenhuma

palavra.

Neste relatório, gostava de me fixar na vacinação, com uma pergunta muito específica para a Sr.ª Ministra

da Saúde, que tem a ver com o seguinte: neste último período de março e, sobretudo, na última semana, o

relatório regista um pico de vacinação, que obviamente tem a ver com a vacinação dos professores — salvo

erro, 265 000 inoculações, que é o número mais alto registado. Também nesta altura foi anunciado que se

esperaria que, em velocidade de cruzeiro, em abril, se chegasse perto das 100 000 inoculações por dia, para o

que seriam necessários 5200 profissionais de saúde, de vários tipos, os quais seriam requisitados ou, de

alguma forma, desviados dos cuidados de saúde primários.

Nessa mesma altura, ou um bocadinho antes, a Sr.ª Ministra emitiu a Portaria n.º 54/2021, de 10 de março,

que cria incentivos adicionais para a recuperação da atividade presencial nos cuidados de saúde primários.

A minha pergunta é a seguinte: como é que a Sr.ª Ministra compatibiliza as duas coisas? É que, por um

lado, quer recuperar a atividade assistencial que ficou para trás com um determinado conjunto de recursos,

mas, por outro, desvia esses recursos para o processo de vacinação. Ora, a mim parece-me muito pouco

compatível fazer as duas coisas ao mesmo tempo. E ainda hoje, na Comissão de Saúde, o Dr. Roque da

Cunha, do Sindicato Independente dos Médicos (SIM), dizia que o que está a acontecer é que as escalas, nos

cuidados de saúde primários, para estas outras atividades impedem essa recuperação.

Assim sendo, Sr.ª Ministra, pergunto-lhe, muito concretamente, o seguinte: não seria possível, como até já

foi anunciado, recorrer complementarmente, por exemplo, às farmácias ou aos privados, para estes também

ajudarem neste processo de vacinação, de modo a não desviar esses recursos dos cuidados de saúde

primários?

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira, do PCP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O relatório que estamos a discutir é o relatório que coincide com muitos dos aspetos que já anteriormente tinham

sido identificados e, particularmente, com a absoluta necessidade de considerar uma espinha dorsal de

resposta aos problemas colocados pela epidemia e aos problemas económicos e sociais que dela decorrem,

resposta essa que assenta em quatro aspetos que identificamos como absolutamente fundamentais — a

vacinação, a testagem, o rastreio e os apoios sociais.

Particularmente, os aspetos relacionados com a saúde — a vacinação, a testagem e o rastreio — são

absolutamente essenciais, não apenas como resposta ao designado «desconfinamento», mas, sobretudo,

como linha de resposta de fundo ao problema da epidemia, para evitar novos confinamentos e novas

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situações de aplicação de medidas restritivas mais gravosas, como aquelas que foram aplicadas desde o

início do ano.

A vacinação é, hoje, reconhecida universalmente como a grande resposta de fundo ao problema da

epidemia, pelo que tem, de facto, de ser colocada no topo das prioridades, assegurando não só o

cumprimento dos objetivos que estão definidos no plano de vacinação, mas também que, por essa via,

Portugal pode enfrentar, pelo menos com menos preocupação, aquilo que pode vir a ser o desenvolvimento da

epidemia perante os riscos que ela naturalmente continuará a comportar e que dificilmente podem ser

anulados.

E é absolutamente essencial que o reforço da estrutura de saúde pública e a capacidade de garantir o

rastreio e a testagem, em função do rastreio que é feito, sejam elementos em que possamos confiar para que,

no futuro, não surjam novas situações de descontrolo das infeções e dos contágios perante novas variantes

que possam comportar novamente esses riscos. Estas matérias relacionadas com o rastreio e a testagem são

cruciais para que, no futuro, essa resposta possa ser encarada com confiança.

Por fim, Srs. Ministros e Sr. Secretário de Estado, refiro as matérias relacionadas com os apoios sociais.

Os impactos e os prejuízos económicos para milhares e milhares de trabalhadores, para milhares e milhares

de pequenas e médias empresas que viram a sua atividade posta em causa, encerrada ou limitada, são hoje

um problema de fundo da situação nacional que tem de ser considerado em toda a sua extensão e com os

apoios sociais que são necessários para dar resposta à agudização dos problemas da pobreza, da exclusão

social e do desespero que, na vida de muitos portugueses, se foi instalando, perante estas dificuldades

económicas com que fomos confrontados. E é absolutamente essencial que estas medidas de apoio social

sejam consideradas em toda a sua extensão e para dar a resposta às dificuldades que estão, neste momento

já presentes, mas também àquelas que podem vir a agudizar-se nos próximos meses.

E queria, Sr.ª Ministra e Srs. Secretários de Estado, chamar a atenção para um problema que continua a

ser — já foi há um ano — um problema dramático da nossa vida nacional, que é o aproveitamento da

epidemia como pretexto para impor mais exploração, mais ataques aos direitos dos trabalhadores.

Multiplicam-se, hoje, os processos de despedimento coletivo que, a pretexto da epidemia, vão encontrando

campo aberto para se poder instalar com a fragilização das relações laborais, com a fragilização da situação

dos trabalhadores, com esse objetivo de agravamento da exploração e do empobrecimento.

O aproveitamento da epidemia como pretexto para pôr em causa os direitos dos trabalhadores, para pôr

em causa o emprego não pode ser admitido, e o Estado e o Governo têm de assumir esta como uma das

matérias que tem de ter um combate decisivo, não apenas por via da ação inspetiva da ACT…

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Concluo, Sr. Presidente. Como dizia, esta matéria tem de ter um combate decisivo, não apenas por via da ação inspetiva da ACT,

para fazer cumprir os direitos dos trabalhadores, mas também com uma resposta firme, que tem de se exigir

ao Governo, recusando esta perspetiva, particularmente dos despedimentos coletivos como expressão desse

aproveitamento da crise pelas grandes empresas.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para uma intervenção, pelo Bloco de Esquerda, o Sr. Deputado Moisés Ferreira.

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Não obstante este debate ser sobre o Relatório sobre a Aplicação da Declaração do Estado de Emergência no

período de 17 a 31 de março de 2021, provavelmente o mais relevante nesta discussão é o facto de não existir

o debate a seguir, é o facto de não debatermos a renovação do estado de emergência.

A verdade é que, depois de um período muito difícil, em janeiro, do qual nos lembramos certamente, e

depois de um confinamento muito duro e muito prolongado, a população em Portugal e os profissionais de

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saúde, em especial os do SNS (Serviço Nacional de Saúde), conseguiram controlar a pandemia e mantê-la,

hoje, neste momento em que falamos, dentro de níveis controláveis.

Mas o fim do estado de emergência não é, obviamente, nem pode ser, o fim das respostas públicas e o fim

das políticas públicas sobre a pandemia e sobre as várias consequências da pandemia. E creio que

deveremos fazer várias constatações.

A primeira constatação é a de que a vacinação e a testagem de grande escala funcionam, como ainda

ontem comprovou quem assistiu à chamada reunião do Infarmed — Autoridade Nacional do Medicamento e

Produtos de Saúde. A vacinação até tem um efeito protetor superior àquele que inicialmente se esperava e,

efetivamente, o reforço da testagem permite-nos andar à frente do vírus e permite-nos antecipar a formação

de surtos e, portanto, quebrar logo cadeias de transmissão e não permitir que existam novos surtos no País.

Por isso, aquilo que se espera é que o Governo tenha uma voz forte — aliás, como temos defendido — na

Europa, para combater qualquer guerra comercial entre farmacêuticas que prejudiquem a produção, que

estrangulem a distribuição de vacinas para os vários países, porque só assim é que vamos conseguir mesmo

reforçar a vacinação.

O Sr. Jorge Costa (BE): — Muito bem!

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Também se espera que o aumento de testagem que se verificou, porque as universidades e o secundário passaram novamente a regime presencial, não seja apenas um epifenómeno

para responder à abertura das universidades e do secundário e que se mantenha a testagem nos níveis que

se registaram nos dias 19, 20, 21 e 22 de abril. Como se espera, também, que se aproveite este momento de

relativa acalmia, de menor pressão da COVID-19 e das suas consequências no SNS, para fazer a

recuperação do SNS. Isso é, obviamente, a recuperação da atividade que foi suspensa, mas uma recuperação

que é até mais abrangente, porque é preciso reforçar e robustecer o Serviço Nacional de Saúde.

Isso não se fará despedindo enfermeiros, como está a acontecer em Penafiel; isso não se fará tornando

2000 profissionais descartáveis, como aqueles que estão em risco de ir para a rua, porque os seus contratos

precários estão para acabar; isso não se fará com o subsídio de risco que não chega a ninguém; e não se fará

com uma obstinação do Governo de não negociar carreiras e melhorias de condições de trabalho dos

trabalhadores do Serviço Nacional de Saúde.

Isso far-se-á, exatamente, fazendo o oposto, ou seja, contratando todos os profissionais que há para

contratar…

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Termino, Sr. Presidente. Isso far-se-á contratando todos os profissionais que há para contratar e melhorando as suas condições de

trabalho. É esse o grande desafio, neste momento, para reforçar o Serviço Nacional de Saúde e para

recuperar toda a atividade do SNS.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem, agora, a palavra, para uma intervenção, pelo PSD, o Sr. Deputado António Cunha.

O Sr. António Cunha (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos, de novo, a apreciar um relatório sobre o estado de emergência referente a um período que ficou

marcado pela decisão de levantar gradualmente as medidas de confinamento.

Aparentemente, as várias fases de desconfinamento foram definidas por critérios associados ao risco de

transmissibilidade e do nível de incidência da disponibilidade do Serviço Nacional de Saúde e da capacidade

de testagem e de rastreio que também tem claudicado, infelizmente, nos timings e nos objetivos.

Sublinhamos, em contraponto, que no período em discussão os portugueses se pautaram, uma vez mais,

pelo respeito do dever cívico de recolhimento e dos outros deveres gerais que lhes foram impostos.

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Vozes do PSD: — Bem dito!

O Sr. António Cunha (PSD): — O País está, manifesta e legitimamente, cansado de tanta exigência e de um planeamento com resultados práticos duvidosos e, em alguns casos, desastrosos. Um período marcado

pela retoma de atividades comerciais e serviços, entre as quais as escolas em regime presencial. Mas também

aqui o Governo andou mal e com os passos trocados. Os alunos, bem como o pessoal docente e não docente,

regressaram a 15 de março, mas a prometida testagem, que se anunciou como massiva, iniciou-se quase 15

dias depois, facto que comprometeu, desde logo, a segurança sanitária dos estabelecimentos de ensino e os

expôs ao risco de propagação de novas cadeias de transmissão.

Apesar de estarem incluídos na primeira fase de vacinação, estavam vacinados até 31 de março menos de

metade dos efetivos dos elementos das forças de segurança. Quantos estão hoje, Sr. Ministro?

Também os bombeiros, ao contrário do que apregoou o Sr. Ministro da Administração Interna, estão longe

da conclusão do processo de vacinação. São os factos que desmentem o Governo. Mas quantos estão, hoje,

vacinados, Sr. Ministro?

A incerteza e a indefinição quanto ao futuro, especialmente na economia, no apoio aos mais

desfavorecidos, aos jovens, aos mais vulneráveis, continuam a ser a sina do País e a pecha deste Governo.

Para o PSD, este grave problema de saúde pública não pode ignorar a brutal crise económica e social em que

a pandemia nos fez mergulhar.

Apesar da estabilização das condições sanitárias, não podemos esquecer que continua a haver falhas

graves nos internamentos, nas consultas e nas cirurgias do SNS e que, infelizmente, permaneceremos

impotentes perante a morte até atingirmos a imunidade de grupo. Agora, em vez de estado de emergência,

devemos estar todos em estado de alerta.

Importa, por isso, que o Governo não anuncie, mas também faça; que, inevitavelmente, concretize os

apoios sociais às famílias e que promova a proteção do nosso tecido empresarial, verdadeiramente

fundamental para a recuperação social e económica do País.

A pandemia é uma batalha, e uma batalha só se vence quando verdadeiramente formos capazes de nos

anteciparmos aos ataques do inimigo e, neste caso, por maioria de razão, pelo facto de termos pela frente um

inimigo invisível e ainda pouco conhecido. Mas o Governo, que devia ter sido capaz de nos colocar à frente do

vírus, lamentavelmente andou sempre atrás do prejuízo.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem, agora, a palavra, para uma intervenção, pelo PS, o Sr. Deputado André Pinotes Batista.

O Sr. André Pinotes Batista (PS): — Sr. Presidente, queria, na sua pessoa, saudar o Sr. Ministro da Administração Interna, a Sr.ª Ministra da Saúde e o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

Iniciaríamos esta nossa intervenção deixando uma palavra a todos aqueles que tiveram perdas durante

este período, a todos aqueles que atrasaram os seus percursos de vida e a todos aqueles a quem a pandemia

trouxe sofrimento.

Encontramo-nos, neste órgão, para debater o décimo terceiro relatório de 15 estados de emergência, num

período em que, é bom recordar, muitos alertaram que iríamos falhar. E, Sr. Ministro, olhos nos olhos, digo-lhe

que ao dizerem «iríamos falhar» não era o Sr. Ministro que ia falhar, era que Portugal iria falhar.

Hoje, sabemos que Portugal não falhou neste combate e que os portugueses também não falharam neste

combate.

Aplausos do PS.

Durante este período, protegemos a saúde, protegemos os rendimentos e tudo fizemos para proteger a

dignidade dos nossos cidadãos. Mas, três dias depois de celebrarmos «o dia inicial, inteiro e limpo», três dias

depois da celebração do 25 de Abril, Dia da Liberdade, também não podia deixar passar a oportunidade para

registar que os adversários do regime, aqueles que se sentam nas cadeiras de acicatar o medo, que fazem

com que estas cadeiras em vez de serem cadeiras de solução sejam cadeiras de acicatar medo, cadeiras-

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palco, cadeiras para aparecerem, cadeiras para agitarem, cadeiras para assustarem, falharam. São vampiros

da nossa liberdade. Mas, no momento em que tentaram erigir torres entre a saúde e a economia, o Grupo

Parlamentar do Partido Socialista, a Assembleia da República, no seu todo, o Governo, o Sr. Primeiro-Ministro,

o Sr. Presidente da República souberam ser elementos de coesão entre os nossos cidadãos.

Pode ter havido dias melhores ou piores do ponto de vista do sound bite, mas com certeza que para aquilo

que é o garante da estabilidade do funcionamento de um país, para aquilo que é a salvaguarda da saúde, para

aquilo que é o garante de um projeto de sociedade, ganhámos todos os dias, porque se cada medida teve a

sua dose de dor, toda ela foi tomada com conhecimento, toda ela foi tomada com ponderação, toda ela foi

tomada para evitar um caos pandémico.

Mas, enfim, não podemos esperar dos inimigos da democracia que a defendam.

Neste momento, olhando para VV. Ex.as, queria reiterar que, no fim — e ainda estamos muito longe do fim

—, e fazendo também um apelo à serenidade das pessoas, ao cumprimento das regras e a que vejam neste

desconfinamento a celebração do seu próprio contributo individual e não um momento de abertura absoluta,

sem consciência ou sem responsabilidade, será também a democracia quem vai triunfar. E os portugueses

saberão também que é a democracia que os protege e que é o Estado que os acolhe nos momentos de

dureza. Mas não o faz por favor, fá-lo por obrigação. É essa a nossa visão.

Gostaria de finalizar, dizendo que se os portugueses foram parceiros nesta demanda, não queremos voltar

ao velho normal. Queremos rasgar novos horizontes, queremos, aliás, aproveitar, de todas estas dificuldades,

de todas estas tormentas, um caminho novo para rasgar horizontes, porque é essa a massa de que são feitos

os portugueses, é isso que diz a nossa história. E, no fim, com responsabilidade, sem receios e sem nos

deixarmos levar por aqueles que nos querem convidar para o medo, vamos adaptar-nos e vamos superar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para encerrar este debate, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Saúde, Marta Temido.

A Sr.ª Ministra da Saúde (Marta Temido): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Disse-nos o Sr. Deputado do Iniciativa Liberal que é hora de Portugal cuidar do seu futuro. Pois, aqui chegados, é importante

dizer que só há futuro porque aqui chegámos. E chegámos aqui porque os indivíduos tiveram a capacidade de

se unir e de se rever no Estado, que é formado por todos eles. E o Estado teve capacidade de ser responsável

por todos os indivíduos, porque é essa a sua função: proteger os mais frágeis e os que mais dele necessitam.

Aplausos do PS.

Foi por isso que conseguimos, ao longo deste período, encontrar, concretamente no Serviço Nacional de

Saúde, um serviço de saúde mais robusto, que respondeu melhor às necessidades assistenciais dos

portugueses.

E para quem nos diz que precisamos de continuar a reforçar os recursos humanos do Serviço Nacional de

Saúde, gostaria de lembrar que na anterior Legislatura fizemo-lo em 15 425 profissionais, e não havia uma

pandemia.

Gostaria de lembrar que, no ano passado, no ano de 2020, fizemo-lo, em 9193 profissionais. Foram 9193

profissionais! E neste ano, só neste ano, nos meses que levamos desde o início do ano, já o fizemos em 3619

profissionais.

Aplausos do PS.

São números impressionantes. São números que não dependem de nós, dependem dos portugueses, das

escolhas que eles fizeram, das escolhas em serviços públicos e das escolhas em serviços públicos de saúde,

que não servem por si só, servem para servir as portuguesas e os portugueses. Servem para continuar a

trabalhar em várias linhas de cuidados, obviamente na vacinação — neste momento, a esperança que a todos

nos move —, mas também nas áreas habituais de prestação de cuidados.

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E foi com estes homens e estas mulheres que o Serviço Nacional de Saúde realizou, em março de 2021,

comparando com março de 2020, mais 19% de consultas médicas em cuidados de saúde primários.

Portanto, para quem nos diz que a atividade assistencial precisa de ser reforçada, nós dizemos que, sim,

precisa de ser reforçada. Precisa de ser recuperada? Sim, precisa de ser recuperada. Mas os homens e as

mulheres que são profissionais de saúde já o estão a fazer, e têm-no feito em cada dia, sempre com a

preocupação de não deixar ninguém para trás, nem quem precisa de consultas médicas nem quem precisa de

consultas de enfermagem, nem quem precisa de rastreios, nem quem precisa de vacinação.

Portanto, é com este Serviço Nacional de Saúde, que tanto sofreu nos últimos meses, tal como sofreu a

maioria do nosso povo, que vamos continuar a contar.

Vamos também contar com a continuação da recuperação na área da saúde mental. E se nos perguntarem

o que temos estado a fazer nessa área, respondemos que temos estado discretamente a trabalhar,

designadamente com a criação de equipas comunitárias de saúde mental na área da infância e da

adolescência, como aconteceu no primeiro trimestre deste ano, em plena pandemia.

Mas, olhando para tudo aquilo que o futuro nos traz — porque é grande, e nós não vamos desistir dele —,

não acreditamos que o planeamento de resultados duvidosos e desastrosos seja a cara e o rosto com que

hoje, aqui, nos apresentamos. Apresentamo-nos conscientes dos muitos desafios que temos pela frente, das

muitas dificuldades que temos para vencer, mas também, de cara lavada, de rosto sereno, a dizer que vamos

continuar, porque esse é que é o caminho.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Muito obrigado, Sr.ª Ministra. Srs. Deputados, terminámos, assim, este segundo ponto da ordem de trabalhos.

Vamos dar início ao terceiro ponto, que consiste num debate, ao abrigo da alínea b) do n.º 2 do artigo 224.º

do Regimento, com a Ministra de Estado e da Presidência, Mariana Vieira da Silva.

Como os Srs. Deputados sabem, regimentalmente, este debate segue uma ordem pré-estabelecida, em

que os partidos intervirão de acordo com a grelha de tempos distribuída, a que se seguirá, de imediato, a

resposta do respetivo membro do Governo.

Para abrir o debate, em nome do Governo, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência (Mariana Vieira da Silva): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O último ano ficou marcado pela maior crise de saúde pública que o País e o mundo enfrentaram

nos últimos 100 anos. Vivemos uma crise sem precedentes, que obrigou a medidas, também elas, sem

precedentes. Ao contrário do que alguns diziam há um ano, é hoje unânime que a crise que vivemos, como,

aliás, todas as crises, tem impactos muito diferenciados: em função do estado de saúde de cada um, em

função da situação económica de cada um, em função das desigualdades estruturais da nossa sociedade.

Por isso, temos de ter uma atenção redobrada para com os que estão em circunstâncias mais frágeis.

Cabe-nos agir para minimizar as consequências da crise. Desde logo, na proteção das vítimas de violência

doméstica, cuja vulnerabilidade foi agravada no âmbito das restrições que atravessámos. Foi nossa prioridade

proceder, de imediato, ao reforço de meios e de mecanismos de proteção das vítimas para garantir que,

mesmo em confinamento, lhes era e é prestado o apoio necessário.

Desde março de 2020, alargámos e diversificámos os canais de atendimento, criámos novas respostas de

acolhimento de emergência e promovemos a difusão de várias campanhas de sensibilização.

Também ao nível do emprego e da situação económica, as mulheres são dos grupos mais afetados pela

atual crise. As mulheres são maioritárias nas profissões que estiveram na linha da frente, como estão,

também, em maioria no trabalho não pago, assim como nos setores mais afetados pela pandemia.

Para desenhar políticas públicas que permitam colmatar e combater estes efeitos, a produção de

conhecimento e dados sobre estes impactos é e tem sido um fator fundamental. Para responder a estas

desigualdades, o PRR (Plano de Recuperação e Resiliência), entregue na Comissão Europeia, inclui medidas

de promoção da igualdade entre mulheres e homens, que vão desde as novas respostas sociais, que

permitem melhor conciliação entre a vida pessoal, profissional e familiar, até às medidas de apoio ao emprego,

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que majoram o apoio no sexo representado e a medidas que garantam um equilíbrio de género no que

respeita à formação nas áreas digitais.

Como sempre, assinalámos que a emergência da pandemia não eliminou a urgência das políticas que

tínhamos em curso. Assim, concretizámos a larga maioria das ações da resolução do Conselho de Ministros

que aprovámos para o combate à violência doméstica, com destaque para o Plano Anual de Ação de

Formação Contínua, cujas formações se iniciam no princípio das próximas semanas.

No domínio da representação equilibrada, Portugal mereceu destaque no Índice de Igualdade de Género,

em 2020, como o país que registou o maior progresso desde 2010.

Em resultado das alterações legais promovidas neste Parlamento, a percentagem de mulheres dirigentes

superiores na Administração Pública subiu de 32 para 42%, de 2015 para 2020, e o peso das mulheres nos

órgãos dirigentes nas empresas cotadas subiu de 12%, em 2017, para 26%, em 2020.

Em ano de eleições autárquicas, é de desejar que estes dados sejam uma inspiração para que os partidos

possam, evidentemente, cumprir, mas até ir além de uma lei da paridade, que é hoje mais exigente.

Ainda no âmbito do combate às desigualdades, e dando cumprimento à resolução deste Parlamento, o

Governo colocou em consulta pública, no passado dia 9 de abril, a proposta daquele que é o primeiro Plano

Nacional de Combate ao Racismo e à Discriminação.

Esta estratégia vem dar resposta à necessidade, há muito sentida, de conjugar o repúdio da discriminação

formal com o desenvolvimento de um programa de combate às desigualdades estruturais e de promoção da

mobilidade social.

Na nossa versão final, o plano terá as suas medidas associadas a metas próprias e a calendários de

desenvolvimento. O objetivo é que este seja um verdadeiro instrumento de transformação coletiva e de reforço

da coesão social.

O combate à discriminação e o reforço da coesão social são, também, os objetivos do Programa Escolhas,

iniciativa que promove a inclusão social de crianças e jovens de contextos mais vulneráveis. No dia 14 de abril,

lançámos a oitava geração deste Programa, com mais de 100 projetos em 68 concelhos, envolvendo quase 30

000 participantes.

Ainda no domínio da integração, permitam-me que destaque a criação de uma nova plataforma para a

renovação automática de autorização de residência, que permitiu renovar 108 000 títulos. Foi alterado o

modelo de atribuição do Número de Identificação da Segurança Social, o NISS na Hora, que já permitiu a

atribuição de mais 172 000 novos números e desde o início do ano passado até hoje, mais 77 000 cidadãos

estrangeiros passaram a ter número de utente do SNS.

A pandemia veio reforçar a necessidade de garantirmos uma resposta pública aos cidadãos estrangeiros

que vivem no nosso País e que são, apesar da pandemia, mais 12% do que em 2019 e mais 70% do que em

2015.

Logo em março, foi determinado que os cidadãos estrangeiros com pedidos pendentes junto do SEF

(Serviço de Estrangeiros e Fronteiras), veriam a sua situação regularizada temporariamente. Estes efeitos

foram alargados, em novembro, a todos quantos manifestaram essa intenção até ao dia 15 de outubro e serão

brevemente alargados através de um novo despacho.

Para garantirmos que ninguém fica para trás no âmbito da vacinação à COVID-19, foi criada uma

plataforma online que permite o registo de cidadãos estrangeiros ainda sem número de utente. Fruto de um

amplo trabalho de divulgação, já 11 000 cidadãos se registaram nesta plataforma.

Nestes primeiros meses do ano, a atividade desta área governativa e de todo o Governo fica naturalmente

marcada pela Presidência portuguesa do Conselho da União Europeia, que assume como uma das

prioridades principais o reforço do pilar social, num contexto de recuperação económica e social e da dupla

transição climática e digital.

Assumindo a agenda da igualdade um papel central para o modelo social europeu, foram definidas três

prioridades.

Em primeiro lugar, garantir que a implementação do Pilar Europeu dos Direitos Sociais atende à perspetiva

de género; em segundo lugar, assinalar, como, aliás, fizemos no passado dia 6 de abril, os 10 anos da

Convenção de Istambul com uma Conferência de Alto Nível; e, em terceiro lugar, a avaliação do impacto

socioeconómico da COVID-19 na igualdade de género, cujo objetivo é a apresentação de uma proposta de

conclusões do Conselho. Como base para o fundamento destas conclusões, foi solicitado ao Instituto Europeu

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para a Igualdade de Género a produção de um estudo com alguns dados preliminares, que já foram tornados

públicos.

A Presidência portuguesa está também empenhada em desbloquear, no Conselho, a diretiva relativa ao

equilíbrio entre mulheres e homens nos conselhos de administração.

Aplausos do PS.

Queria ainda destacar, pelo enorme desafio que representa e pela sua importância para um melhor

conhecimento do País, a realização do Censos 2021, a maior operação realizada pelo Instituto Nacional de

Estatística em cada década. Os inquéritos à população arrancaram no dia 19 de abril e até ao dia de hoje mais

de 6 milhões de portugueses já submeteram as suas respostas.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, os temas que hoje aqui abordei, pela sua transversalidade, cruzam-

se de forma muito marcada com dois dos desafios estratégicos identificados pelo Governo no início da

Legislatura, desafios que são hoje ainda mais atuais do que no momento em que o Governo os definiu e que

têm marcado a ação do Governo, tanto na resposta urgente à crise pandémica, como na ação estrutural de

recuperação e resiliência.

Bem sabemos como estes desafios têm diversos fatores. Quando o Governo, por exemplo, reduz o preço

dos passes sociais, aumenta o salário mínimo ou aumenta as pensões, não está apenas — e já seria muito —

a combater as desigualdades sociais, está também a combater as desigualdades de género.

Quando o Governo reforça os apoios sociais, combate a precariedade ou cria melhores condições para a

integração de migrantes, não está apenas a desenvolver as suas políticas setoriais, que aqui hoje apresenta,

está também a criar condições para uma evolução mais favorável da nossa demografia.

Hoje, como no início da Legislatura, o Governo responde de forma decidida aos desafios que em cada

conjuntura se colocam, sem nunca deixar de ter presentes os desafios estruturais, em nome de um País mais

justo e coeso, que entregue às futuras gerações um País mais sustentável.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Vamos passar aos pedidos de esclarecimento à Sr. ª Ministra. Para o efeito, em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão, do PSD.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Muito obrigado, Sr. Presidente. Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência, que cumprimento, começo por lhe colocar uma pergunta muito

concreta, que tem a ver com o Instituto Nacional de Estatística, que tinha uma empresa americana a

assessorá-lo para fazer a recolha e o tratamento de dados. Entretanto, com a intervenção da Comissão

Nacional de Proteção de Dados, esta empresa foi afastada. E foi afastada por uma razão: porque estava

previsto, quando foi contratualizada, a transferência de dados dessa empresa para os Estados Unidos da

América e para países terceiros.

Sr.ª Ministra, pergunto-lhe se tinha conhecimento disto. Se não tinha, qual a razão e, tendo conhecimento

disto, porque contratualizou essa empresa.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr.ª Ministra, passo a um tema que, na minha opinião, é central e que raramente está na agenda política: o das crianças.

Eu diria que a parte mais vulnerável da população portuguesa são, de facto, as crianças.

O Sr. Adão Silva (PSD): — É verdade!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Há quem diga mesmo que é a epidemia escondida. É esta a situação das crianças em Portugal.

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Logo no início da pandemia, o Secretário-Geral das Nações Unidas, o Eng.º António Guterres — que é

muito citado quando politicamente isso é importante, mas depois não leem o que diz, e convém ler —, disse o

seguinte: «Numa altura em que a recessão mundial acelera, poderá haver centenas de milhares de mortes

suplementares de crianças». E acrescentou: «O confinamento e a recessão mundial alimentam as tensões nas

famílias e as crianças são, por sua vez, vítimas e testemunhas de violência e de abusos».

Foi esta a preocupação manifestada pelo Sr. Eng.º António Guterres, Secretário-Geral das Nações Unidas.

A UNICEF (United Nations International Children’s Emergency Fund), preocupada também com o

problema, alerta para o perigo desta crise sanitária, que transforma uma crise global dos direitos das crianças

e diz que os países devem atuar, de imediato, com uma agenda global coordenada.

Pergunto-lhe, Sr.ª Ministra: estas recomendações foram ouvidas pelo Governo? Foram, com certeza. E

pergunto o que fez o Governo na sequência das recomendações feitas pelo Secretário-Geral das Nações

Unidas e pela UNICEF.

A nível interno, a APAV (Associação Portuguesa de Apoio à Vítima) ajudou quase 1600 crianças vítimas de

violência sexual nos últimos cinco anos. Desde 2016 que os números aumentam todos os anos, num

crescimento que já vai em cerca de 122%.

Só no âmbito do Projeto CARE, a Rede CARE (Rede de Apoio Especializado a Crianças e Jovens Vítimas

de Violência Sexual), em 2016, apoiou 195 crianças, em 2017, apoiou 251 crianças, em 2018, apoiou 304

crianças, em 2019, apoiou 417 crianças e, em 2020, apoiou 432 crianças. Foi um aumento global, como disse,

de 122%. O Governo conhece estes números, Sr.ª Ministra? O que faz com eles?

Sr.ª Ministra, não precisando de ir mais longe, Espanha acaba de aprovar, com largo consenso — apenas o

voto contra do partido de extrema-direita —, a nova lei de proteção integral da infância e da adolescência

contra a violência. É já hoje considerada uma lei pioneira e tem, resumidamente, estas características:

prevenção de todo o tipo de violência contra menores, repito, de todo o tipo de violência; criação de um registo

especial deste tipo de delitos, uma vez que as estatísticas são manifestamente insuficientes; poupar as

vítimas, uma vez que só prestam declarações durante o inquérito e apenas excecionalmente vão a julgamento;

formação especial para quem atende as vítimas; prolongamento dos prazos de prescrição dos delitos contra

menores; endurecimento das condições de cumprimento das penas.

Sr.ª Ministra, este é um grande desafio. Este é o desafio que temos para apoiar as crianças discriminadas

pela violência doméstica e por outro tipo de violência. Sr.ª Ministra, aceita este desafio?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder a estas questões, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Negrão, agradeço as perguntas que me dirigiu.

Vou começar pela primeira, para lhe dizer que o Instituto Nacional de Estatística (INE), como sabe, está a

desenvolver os Censos e, na sequência das notícias das últimas horas, questionei o Instituto Nacional de

Estatística, que me informou que foi colocado perante um conjunto de questões, primeiro, na internet e,

depois, por perguntas da CMTV (Correio da Manhã TV).

As operações tecnológicas de segurança da informação na recolha de dados no site de 2021 foram

auditadas pelo Gabinete Nacional de Segurança e o INE mantém e afirma que a sua abordagem respeita os

requisitos de segurança, constitui a melhor opção para o sucesso da operação e a plataforma dos Censos

2021 é segura.

Depois das notícias e dos contactos da Comissão Nacional de Proteção de Dados, que suscitou dúvidas

relativamente ao enquadramento jurídico da subscrição destes serviços, o INE decidiu suspender totalmente a

subscrição desses serviços, para que não subsistam quaisquer dúvidas. Continua a garantir a segurança dos

Censos, mas, neste momento, perante as dúvidas, resolveu suspender.

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Então, e agora?!

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A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — O resultado desta ação não irá afetar a segurança do site dos Censos, continuando a ser assegurada a total proteção de dados pessoais, e a forma de resposta pela

população também não será afetada, poderá, no máximo, ter alguma lentidão adicional.

Esta foi a informação que, nas últimas horas, o INE me prestou. Estarei, a partir de agora, obviamente,

sempre disponível para responder a quaisquer questões que me coloquem.

O segundo tema que o Sr. Deputado traz, sobre a proteção das crianças, é um tema muito relevante.

Apenas uma parte dessa política é da minha responsabilidade mas não deixarei de lhe responder porque,

efetivamente, e foi sempre uma preocupação do Governo, perante uma crise desta dimensão, é necessário

garantir a proteção das crianças.

Foi por isso que organizámos, em torno das escolas, uma rede social de proteção que garantiu,

praticamente, só para ter uma ideia, 20% das refeições habituais, quando a escola está a funcionar, neste

período mais crítico. E, por exemplo, neste segundo confinamento, garantimos sempre que as comissões de

proteção de crianças e jovens estavam a funcionar de forma ininterrupta, precisamente porque considerámos

que, no primeiro confinamento, esse funcionamento fez falta.

Queria ainda dizer-lhe que, quando aqui aprovámos uma estratégia para o combate à violência doméstica,

incluímos o desenvolvimento de ações específicas, dirigidas, por um lado, à prevenção primária e secundária,

mas também garantindo que todos os profissionais que atuavam no âmbito da violência doméstica tinham

orientações, e orientações coerentes entre si, porque esse era um dos temas identificado na área das crianças

e dos jovens. O guia está pronto, foi lançado em 2020 e faz parte da formação integrada a todos os agentes

que trabalham na área da violência doméstica e na resposta em programas de prevenção primária e de apoio

às crianças.

Prevê-se também o acompanhamento de projetos de prevenção e de intervenção junto dos grupos mais

vulneráveis e, como anunciámos há poucos dias, lançámos também um concurso para apoio psicológico às

crianças e aos jovens, precisamente, no âmbito da rede nacional de apoio à violência doméstica.

Sr. Deputado, a UNICEF, em 2019, disse que Portugal era um dos países com políticas que melhor

respondiam às necessidades das crianças. Podemos confiar nesta indicação da UNICEF e também podemos

olhar para os dados: a pobreza nas crianças diminuiu, o abandono escolar precoce diminuiu. Temos sempre

procurado responder às crianças e aos jovens como sendo eles, sabemos todos, aqueles a quem temos de

garantir que as desigualdades não se reproduzem. É isso que temos feito e, obviamente, estarei sempre

disponível para o continuar a fazer.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — O PSD continua a dispor de tempo, pelo que tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Lina Lopes.

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência, tenho três questões para lhe colocar: a primeira é sobre o Plano de Recuperação e Resiliência, a segunda é sobre a Lei n.º

60/2018 e a terceira é sobre uma diretiva europeia COM 2021.

Sr.ª Ministra, em Portugal, apenas 0,2% das jovens portuguesas pensam trabalhar em TIC (tecnologias de

informação e comunicação). No entanto, as remunerações nesta área são bastante elevadas, em comparação

com outras profissões. Devemos perguntar-nos qual a razão de as jovens fugirem de uma ocupação tão bem

remunerada. Provavelmente, afastam-se das TIC por se verem confrontadas com estereótipos de género nas

escolhas pessoais e por anteverem um ambiente de trabalho ocupado e chefiado quase exclusivamente por

homens.

Sr.ª Ministra, a única forma de ultrapassar este défice é organizar a formação com um contingente

significativo de jovens mulheres nesta área, o qual, depois de incorporado no mercado de trabalho, terá um

efeito multiplicador e gerará uma distribuição diferente das ocupações laborais.

Foi o que disse, recentemente, o Prof. Tribolet, com base numa experiência que realizou, na conferência

«A Economia Digital e as Mulheres», organizada pela Subcomissão para a Igualdade e Não Discriminação,

onde a Sr.ª Ministra esteve presente.

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Sr.ª Ministra, sabemos que existem, no PRR, apoios que podem ser dirigidos para este tipo de iniciativas.

Por isso, pergunto: os apoios do PRR foram analisados tendo em conta o seu impacto de género? De acordo

com o artigo 16.º do Orçamento do Estado, existe uma desagregação, por sexo, desses apoios?

A minha segunda questão é sobre a Lei n.º 60/2018, que visa a promoção da igualdade remuneratória

entre mulheres e homens e que entrou em vigor em 2018. Quantas entidades empregadoras já foram

notificadas? Quantas contraordenações graves foram aplicadas às entidades com práticas discriminatórias nas

remunerações das mulheres? Por que razão é que a desigualdade salarial persiste e resiste?

Pergunto também, Sr.ª Ministra, se já avaliou esta lei, porque ela já entrou em vigor e até agora não temos

nenhuma avaliação ou, então, se temos, gostávamos de saber qual foi o resultado.

Por fim, quanto à diretiva COM 2021, Sr.ª Ministra, a desigualdade salarial, como sabemos, persiste e

resiste. Estando a Sr.ª Ministra e o Governo na Presidência do Conselho Europeu, por que razão não fazer um

regulamento e não uma diretiva? Era muito importante pensarmos nesta situação e, também, em fazer mais

pela igualdade. Isto porque aquilo que vimos acontecer, recentemente, a uma mulher, mulher essa que é

Presidente da Comissão Europeia, não pode continuar.

Neste momento, a Oradora exibiu fotografias da reunião da Presidente da Comissão Europeia com o

Presidente da Turquia e o Presidente do Conselho Europeu, em Ancara.

Por isso, Sr.ª Ministra, para terminar, queria apenas saber se podemos dar um passo em frente para

combater a desigualdade salarial.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência, para responder.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, muito obrigada pelas suas questões, que são questões sobre as quais temos vindo a falar recorrentemente, mas não queria deixar de lhe

responder.

Como sabe, a questão da igualdade perante a revolução tecnológica que aí vem tem-nos preocupado

desde a primeira hora. Já existia um projeto lançado, o Projeto Engenheiras por um dia, e o Governo viu, no

Plano de Recuperação e Resiliência, um instrumento para reforçar a nossa atuação nessa matéria, e foi

precisamente isso que fizemos.

Se percorrer todas as medidas do Plano de Recuperação e Resiliência, tanto nas respostas sociais, como

nas políticas de habitação, nas políticas relacionadas com o SNS, enfim, em muitas políticas, encontra essa

perspetiva de género pela qual a Sr.ª Deputada me costuma perguntar.

É evidente que, sendo um dos temas do Plano de Recuperação e Resiliência essa preparação da nossa

sociedade para a sociedade digital, aquilo que fizemos foi proceder a uma integração da perspetiva de género

no plano, como disse, e desenhar programas, na área digital, que garantissem sempre, nos diferentes tipos

que existem, um compromisso com a igualdade de género. Significa isto que, por exemplo, as instituições de

ensino superior, quando se candidatarem ao pacote de financiamento que lá consta para o desenvolvimento

das áreas das ciências, tecnologias e matemáticas, devem incluir o seu plano de igualdade no programa a que

se candidatam. E significa também que, na área da formação digital — e o programa será conhecido dentro de

dias —, temos metas de formação para homens e para mulheres, para procurar suprir a dificuldade que a Sr.ª

Deputada identifica, que é uma dificuldade muito séria. Se deixarmos que agora se cristalizem diferenças entre

homens e mulheres na capacidade de ocupar os postos de trabalho que serão criados na área digital,

estamos, simplesmente, a definir que os problemas de igualdade salarial, que já hoje temos, crescem,

reproduzem-se, aumentam para as próximas gerações.

Perguntou-me também sobre a lei da igualdade salarial. Como sabe, aquilo que estava previsto era que,

num primeiro momento, faríamos sair o balanço geral e setorial, o que aconteceu, e vai sair já neste mês de

junho a sua terceira edição.

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No ano passado, era suposto ter saído o balanço por empresa, profissão e nível de qualificação — a

pergunta que a Sr.ª Deputada me fez —, mas todos sabemos a pressão a que as empresas estiveram

sujeitas. Houve, por isso, um adiamento do relatório que serve para este efeito, e para muitos outros, mas em

junho deste ano sairá o primeiro balanço por empresa, profissão e nível de qualificação para as empresas. A

partir daí, a ACT notificará as empresas para que apresentem o plano de divulgação e as empresas terão 12

meses para o fazer. O prazo que a ACT tem para proceder a esta notificação vai até ao dia 31 de julho deste

ano.

Queria também dizer-lhe que esta lei será avaliada pela CITE (Comissão para a Igualdade no Trabalho e

no Emprego), segundo creio, ao longo deste ano de 2021.

Relativamente à dimensão europeia que a Sr.ª Deputada me suscitou, as presidências portuguesas são,

como diz o Sr. Primeiro-Ministro, uma espécie de prova de estafetas. Nós recebemos um conjunto de dossiers,

melhoramos esses dossiers para deixar para o próximo e introduzimos as nossas prioridades nessa

presidência. É isso que temos procurado fazer, como disse na tribuna, e daí a importância de desbloquear

uma das diretivas fundamentais nesta matéria, que é a diretiva sobre as mulheres nos conselhos de

administração.

Procurámos centrar-nos na resposta a esta «doença» porque entendemos que era uma prioridade, uma

vez que, como mostram os dados do estudo que Portugal, enquanto Presidência portuguesa, encomendou,

tem efeitos muito significativos nas horas trabalhadas, nos salários, na divisão do trabalho em casa entre

homens e mulheres. E procurámos garantir que saíamos deste ano, na Europa como em Portugal, com

condições para desenvolver políticas para superar estas diferenças. Foi essa a nossa prioridade, temos

sempre de defender prioridades, mas estamos a prosseguir o trabalho na diretiva da igualdade de tratamento,

na diretiva da igualdade salarial e na diretiva das mulheres nos conselhos de administração.

Aplausos do PS.

Entretanto, assumiu a presidência o Presidente, Eduardo Ferro Rodrigues.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Cristina, do Grupo Parlamentar do PSD.

O Sr. Rui Cristina (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência, como sabemos, a Sr.ª Ministra tem a coordenação da gestão dos fluxos migratórios e a integração dos imigrantes na sociedade

portuguesa, ainda que seja da competência do Sr. Ministro da Administração Interna a questão dos

desembarques de imigrantes ilegais na costa algarvia.

Este é um tema nacional de grande impacto, numa região em que o fator segurança é uma mais-valia de

extrema importância para a indústria turística.

Relembro que o Sr. Ministro da Administração Interna disse, aqui mesmo, que Portugal «não deve cair no

ridículo, ao considerar que existe uma rede de migração ilegal para o Algarve».

O Governo tentou ignorar a realidade, mas os últimos relatórios de segurança interna indicam que Portugal

se mantém sob pressão migratória como destino, e pressão migratória indireta. É que, depois da consolidação

das rotas dos imigrantes, vem a criminalidade altamente organizada. Por isso, é necessário reforçar os meios

de fiscalização de forma eficaz, para que a costa algarvia não fique vulnerável a fenómenos de migração

ilegal.

Primeiro, era um problema ridículo e inexistente. Depois de sete desembarques no Algarve, já se justificava

haver conversações e um eventual acordo de migração legal com Marrocos. Em outubro, o titular da pasta da

Administração Interna remeteu as negociações para o período da Presidência portuguesa da União Europeia.

Mais: nem sequer sabemos o que pretende fazer o Governo português. Não sabemos se pretende acolher,

integrar ou expulsar os imigrantes que entraram ilegalmente no nosso País e se tem condições para o fazer.

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Boa pergunta!

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O Sr. Rui Cristina (PSD): — As questões que lhe coloco, Sr.ª Ministra, são as de saber quais as medidas que o Governo vai tomar para prevenir os desembarques dos imigrantes que ocorrem no Algarve e se o

Governo vai proceder ao reforço dos meios de fiscalização da costa algarvia.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência, Mariana Vieira da Silva, a quem saúdo.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, saúdo-o também. Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Cristina, sendo este um debate setorial, a questão que me colocou não é

da minha área, como, aliás, o Sr. Deputado referiu, em vários momentos.

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — É Ministra de Estado!

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Segundo a divisão de trabalho que o Governo tem, do nosso lado estão as políticas de integração e, sobre essas, obviamente, respondo. Mas não queria deixar de

lhe responder.

Desde dezembro de 2019, chegaram sete barcos com migrantes à costa algarvia. Obviamente, no contexto

das migrações na Europa, este não é um problema de grande significado. É um problema de menor

significado, comparando com muitos países.

Aquilo que lhe queria dizer é que Portugal está a concluir com Marrocos um acordo bilateral de mobilidade

de trabalhadores, porque aquilo que procuramos — e fomos o primeiro País a apresentar o seu plano de ação

no âmbito do Pacto Global das Migrações — é fomentar as migrações legais e garantir a integração dos

migrantes.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para colocar questões, pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, a Sr.ª Deputada Beatriz Gomes Dias.

A Sr.ª Beatriz Gomes Dias (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr.as Secretárias de Estado, Srs. Secretários de Estado, quero começar por colocar umas questões relativas à igualdade de género.

Sabemos, e a Sr.ª Ministra disse-o na sua intervenção inicial, que os efeitos da pandemia foram graves e

afetaram desproporcionalmente as mulheres. Os dados do Instituto Europeu para a Igualdade de Género, que

analisou os impactos da pandemia do coronavírus na igualdade de género, apontam para perdas massivas de

emprego, principalmente no caso dos empregos maioritariamente femininos, como, por exemplo, aqueles que

dizem respeito a cuidados, a serviços domésticos, a indústrias têxteis, ao turismo, à restauração, aos serviços.

Todos esses empregos tiveram perdas massivas. As mulheres, que são maioritárias nesses empregos, têm

40% de perdas de trabalho e, também, uma diminuição do salário.

A recuperação não aconteceu para as mulheres da mesma forma que aconteceu para os homens. Os

dados demonstram que os trabalhadores do sexo masculino recuperaram mais o trabalho do que as

trabalhadoras, sendo as trabalhadoras mais penalizadas, tendo recuperado menos o trabalho.

Um terceiro eixo é o do aumento da violência doméstica e da violência de género contra as mulheres.

Gostava de perguntar à Sr.ª Ministra quais são os dados que tem relativamente a esta matéria. Sabemos que

os dados foram colhidos em 2020 e que também terão sido colhidos no primeiro trimestre de 2021.

Gostávamos de saber também quais são os dados relativos ao desemprego, principalmente ao

desemprego das mulheres, e às perdas de rendimentos.

Há bocado, na resposta à Deputada do PSD, disse que o Governo estava a preparar um conjunto de

políticas para responder a esta perda massiva que afetou principalmente as mulheres. Também gostava de

perguntar quais são as políticas que o Governo está a ponderar implementar.

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Outro assunto tem a ver com a lei sobre a igualdade salarial. Saiu, há poucos dias, uma diretiva europeia

para a igualdade salarial e, embora Portugal esteja alinhado com as normas da diretiva, persistem

desigualdades salariais de género significativas em Portugal.

A lei da igualdade salarial definia, no seu artigo 10.º, uma avaliação desta disparidade salarial, para a

promoção da igualdade, ou seja, para saber onde estamos, como estamos e como vamos alcançar essa

igualdade. Até agora, não recebemos qualquer informação. Esta primeira avaliação devia ter acontecido até

agosto de 2020, por isso, pedimos informações relativas a essa avaliação.

Sobre as dificuldades de conciliação da vida profissional com a vida familiar, os dados também apontam

para um efeito maior nas mulheres em teletrabalho. Foram mais as profissões desempenhadas por mulheres

que adotaram o teletrabalho e isso teve um efeito bastante acentuado na conciliação da vida profissional com

a vida familiar.

Os dados também demonstram que, quando as mulheres estão em teletrabalho, são mais interrompidas

pelos filhos do que os homens em teletrabalho. Isto tem efeitos na concentração e, depois, também na

progressão na carreira e no desempenho. Tem um efeito, portanto, na sua vida profissional, para além do

aumento das tarefas domésticas, das tarefas de cuidados, que ficaram sobre os ombros das mulheres.

Também se verificou um aumento do trabalho não pago e gostava de perguntar quais são os dados que

têm sobre esta matéria e que medidas estão a implementar.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, a Sr.ª Ministra Mariana Vieira da Silva.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Beatriz Gomes Dias, muito obrigada pelas questões que me colocou.

Queria começar por dizer que, mesmo quando os dados são difíceis, mesmo quando os dados são graves,

parece-me que precisamos sempre de olhar para o caminho que temos feito. O caminho que temos feito,

nesta matéria, é positivo e não queria deixar de realçá-lo.

Desde 2010 até 2020, Portugal, como disse há pouco, subiu 13 lugares naquele índice de igualdade e, no

que diz respeito à disparidade salarial, também vimos uma descida significativa, de 17,9% para 14,4%. Sei

que esta diferença é na mesma muito significativa e ainda mais chocante quando vemos que é precisamente

nas profissões mais qualificadas que esta diferença é maior. Mas não queria deixar de assinalar que temos

feito um caminho, que é ajudado pela lei que aqui foi aprovada, e que passará a haver um conjunto de dados

importantíssimos para a ação: dados diferenciados por empresa, dados diferenciados por profissão e dados

diferenciados por escolarização.

A partir de junho deste ano, as empresas receberão esses dados e deverão desenvolver, caso tenham

diferenças, os seus planos para a correção dessa desigualdade salarial.

Tal como aconteceu com outras leis, como a da representação equilibrada, creio que podemos estar

confiantes na eficácia desta lei. Tanto assim é que esta é uma lei que vai à frente, digamos assim, da diretiva

europeia que a Sr.ª Deputada citou.

Desde o primeiro dia que dissemos que os impactos nesta crise seriam diferentes para as mulheres e para

os homens. Desde março que temos esses dados publicados e podemos olhar para as diferenças e verificar

onde é que elas são mais significativas.

O estudo europeu que a Sr.ª Deputada citou mostra-nos que, em Portugal, houve essa perda de emprego

maior para as mulheres. Acima de tudo, no momento do verão e da recuperação de emprego, a recuperação

foi menos forte para as mulheres. Houve um impacto muito significativo nas horas trabalhadas e, portanto, nos

salários.

Julgo que o nosso objetivo é, de facto, o de desenvolver estas políticas, não só no plano europeu, mas

também no plano nacional. Por isso é que, no PRR, por exemplo, nas medidas de contratação, encontrará

apoios majorados à contratação das mulheres nestes setores.

Logo neste segundo confinamento, fizemos a alteração de majorar os apoios, por exemplo, sempre que se

garantisse a alternância entre mulheres e homens no apoio à família. Essa alteração teve um período de

tempo muito reduzido de aplicação, mas, em qualquer caso, essa majoração acabou por abranger, em março,

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1640 pessoas. Felizmente, as escolas puderam reabrir, porque é esse o elemento fundamental da igualdade,

mas teríamos, com isto, um instrumento de correção de algumas dessas situações.

É evidente que muitas das medidas que tomámos, em sede de Orçamento Suplementar e, depois, em sede

de Orçamento do Estado, são medidas que, porque a crise atinge mais as mulheres, protegem mais as

mulheres. Por exemplo, pagar o layoff a 100%, tendo sido as mulheres a maioria das pessoas em layoff,

garante que estamos a ajudar mais as mulheres, e a mesma coisa face às medidas de apoio aos

trabalhadores informais, ao prolongamento do subsídio social de desemprego e do RSI (rendimento social de

inserção).

Todas essas medidas corrigiram uma injustiça que a crise económica criou. Temos outras para tomar,

certamente, e cá estamos para o fazer.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para colocar questões, a Sr.ª Deputada Fabíola Cardoso, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Fabíola Cardoso (BE): — Sr. Presidente, cumprimento todas as pessoas que, com o seu trabalho, permitiram a realização deste debate, em especial a Sr. ª Ministra de Estado e da Presidência e a sua equipa.

Pretendo colocar algumas questões sobre temas LGBTI (lésbicas, gays, bissexuais, transgénero e

intersexuais) que preocupam o Bloco de Esquerda e que têm estado praticamente ausentes da política deste

Governo, tanto na resposta à pandemia, como nas estratégias delineadas para a recuperação económica

necessária, e também na sua intervenção inicial de hoje.

Apesar do slogan do Censos 2021, que diz «contamos todos, contamos com todos», as pessoas LGBTI

são completamente invisíveis aos olhos daquela que é referida como a «maior operação estatística nacional».

Continuaremos a ignorar a percentagem de lésbicas ou de pessoas trans no País, por exemplo.

Sr.ª Ministra, sem dados credíveis não é possível delinear políticas públicas sólidas nestas áreas. Apesar

dos avanços legislativos, a recusa sistemática em recolher informação sobre esta matéria, bem como sobre as

minorias étnico-raciais, impede o conhecimento das discriminações e dificulta o seu combate. A sua

invisibilidade no Censos é, também, uma forma de perpetuar essas discriminações.

Assim, pergunto se está o seu ministério, em articulação com o Instituto Nacional de Estatística, disposto a

colmatar esta falha de dados de informação estatística, como e quando.

Apesar das declarações do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, que disse, em resposta ao Bloco de

Esquerda, que combater a discriminação contra as pessoas LGBTI seria «uma das tarefas e uma das

prioridades da Presidência portuguesa do Conselho da União Europeia», apesar das declarações da Sr.ª

Secretária de Estado dos Assuntos Europeus, que defendeu, no Parlamento Europeu, que não deve haver

lugar para a homofobia onde quer que seja, na Europa, a bandeira do arco-íris tem ficado no armário da

Presidência portuguesa do Conselho da União Europeia.

Não considera, Sr.ª Ministra, esta situação profundamente embaraçosa para o nosso País e

completamente inaceitável? O que podemos esperar dos dois meses de Presidência portuguesa que ainda

faltam?

Para terminar, apesar da Resolução da Assembleia da República n.º 69/2020, aprovada aqui, que

recomenda ao Governo o apoio de emergência às associações e coletivos LGBTI no âmbito da crise

pandémica que atravessamos, apesar da Estratégia Nacional para a Igualdade e a Não Discriminação, que

está em vigor, não são conhecidas medidas que respondam a estes normativos legais.

Que medidas estão previstas, Sr.ª Ministra, para o acompanhamento desta área de intervenção política

pelo seu Governo?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência, Mariana Vieira da Silva.

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A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Fabíola Cardoso, muito obrigada pelas suas questões.

Vou começar pela dimensão europeia: não me revejo — já na semana passada disse isso à Sr.ª Deputada

— na descrição que faz da Presidência portuguesa, talvez por ter havido já muitos momentos da Presidência

portuguesa em que discuti estes temas. O que é certo é que não me revejo.

Conforme lhe expliquei, foi tema no Conselho EPSCO (Emprego, Política Social, Saúde e Consumidores)

do passado dia 15 de março. Houve um debate sobre a orientação nesta matéria. Há um debate, que é

realizado online — mas não creio que isso seja desmerecimento face aos temas, são mesmo as condições em

que estamos a trabalhar nesta presidência —, precisamente sobre a estratégia europeia da igualdade LGBTIQ

(lésbicas, gays, bissexuais, transgénero, intersexuais e queer) 2020-2025, e na Cimeira Social uma das

sessões é precisamente sobre as diferentes políticas de combate à discriminação, incluindo as medidas de

combate à discriminação das pessoas LGBTIQ. Portanto, não me revejo nas críticas que faz e é só isso que

queria repetir. É parte do nosso trabalho, é parte da nossa reflexão, é um tema que é divisivo, como a Sr.ª

Deputada sabe, mas é um tema que faz parte da nossa Presidência.

Relativamente à resposta às pessoas LGBTI, temos procurado, nas várias áreas em que trabalhamos,

manter sempre um contacto regular com as principais associações deste setor. A Direção-Geral da Saúde

emitiu orientações específicas quando fomos confrontados, por exemplo, com o acesso das pessoas trans ao

acompanhamento clínico que estavam a ter e que foi interrompido no período mais crítico da pandemia, a que

procurámos responder no âmbito da parceria com a Associação Nacional de Farmácias. Criámos o canal de

comunicação direto e privilegiado com as associações para identificar sempre os problemas que existiam.

Temos procurado reforçar as respostas especializadas para as pessoas LGBTI e vítimas de violência e temos

procurado cumprir a resolução da Assembleia da República que a Sr.ª Deputada aqui citou.

Temos uma dotação de 1,7 milhões de euros no Portugal 2020, para esta área e temos procurado

disponibilizar o financiamento para projetos nesta matéria. Esse é um caminho que já vinha de trás e que

também existiu no combate à pandemia.

Em articulação com o Ministério da Saúde, temos realizado o reporte das situações que foram sinalizadas

pelas organizações LGBTI para respeitar e para dar valor à estratégia de saúde para as pessoas LGBTI.

Portanto, temos procurado responder a nível local, em articulação com as associações, aos problemas que

se vão colocando.

Sobre os Censos, como já lhe disse na semana passada, durante o período em que este inquérito esteve

em discussão pública essa questão nunca surgiu. Poderemos debater se poderia fazer sentido, mas a verdade

é que ela não surgiu em contexto nenhum na discussão pública que existiu em 2019 sobre estes Censos.

Como sabe, esta é uma matéria da competência do INE, mas eu, pessoalmente, tenho dúvidas de que

essa questão acrescentasse algo no contexto do recenseamento. Mas essa é uma discussão que poderíamos

ter feito, como fizemos outras, caso tivesse surgido como tema político nesse momento, sendo que podíamos

tê-la discutido politicamente. Não foi discutido, ninguém levantou essa questão e os Censos estão agora a

decorrer.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Alma Rivera do Grupo Parlamentar do PCP.

A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Sr. Presidente, cumprimento a Sr.ª Ministra, as Sr.as Secretárias de Estado e o Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Como sabem, ao longo de muitos anos, nesta Assembleia, a

imigração foi tratada como caso de polícia.

Na primeira metade dos anos 90 do século XX, as obras públicas em curso fizeram chegar ao nosso País

milhares de imigrantes à procura de trabalho. As políticas restritivas de imigração postas em prática na União

Europeia, na sequência da entrada em vigor dos Acordos de Schengen e da respetiva convenção de

aplicação, colocaram muitos desses milhares numa situação de ilegalidade. Muitos desses cidadãos

imigrantes, que correspondiam às reais necessidades do nosso País, foram forçados a uma situação de

ilegalidade, explorados por muitos dos patrões que se recusavam a colaborar na sua legalização para

beneficiar da fragilidade em que se encontravam.

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A política das portas fechadas à imigração era justificada com slogans sem sentido, como o de que

Portugal não podia ser um País de portas escancaradas, como se alguma vez o tivesse sido, ou o de que não

podíamos acolher tanta gente, como se os imigrantes, em vez de trabalhar, viessem viver à nossa custa. Cedo

se demonstrou, porém, a evidência de que a imigração não é um mal e que só algumas mentes malformadas

a podem considerar como tal.

Toda a história da humanidade é uma história de migrações. Portugal é um País de imigrantes e de

emigrantes. É um País que deve tratar os seus imigrantes com a mesma humanidade com que quer que os

outros países tratem os nossos emigrantes. A imigração é um bem. O mal é a situação de ilegalidade a que

muitos imigrantes são condenados.

A insustentabilidade de uma política de imigração de portas fechadas, que não é mais do que uma política

de olhos fechados à realidade de que os fluxos migratórios não são regulados pelas leis do direito mas da

sociologia, levou a que, na falta de uma legislação coerente de acolhimento e inserção, tenham sido adotados

mecanismos precários de regularização, como as regularizações extraordinárias, as autorizações de

permanência, os mecanismos excecionais de regularização, baseados na discricionariedade das orientações

transmitidas ao SEF.

O PCP sempre considerou que a imigração não é um caso de polícia. Casos de polícia são as redes de

tráfico de mão-de-obra ilegal e quem delas beneficia. As suas vítimas, que são os imigrantes que procuram

desesperadamente uma vida digna, devem ser libertadas dessas amarras e ter direito ao trabalho com direitos

e salários justos.

Não podemos ignorar a situação dos trabalhadores que, vindos de diversas partes do mundo, trabalham

em explorações agrícolas no sul do País, vivem em condições miseráveis de habitabilidade e numa situação

de total marginalidade social.

O Sr. Jorge Costa (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Apurar a situação em que estes trabalhadores se encontram, saber da legalidade das concretas condições de trabalho a que são submetidos, nomeadamente em matéria de

salários, horários de trabalho e demais direitos laborais, e cuidar da sua integração social são imperativos a

que o Estado português não se pode furtar.

A integração dos imigrantes exige uma política justa e realista de concessão de autorizações de residência

que não deixe ficar na ilegalidade quem vive e trabalha no nosso País.

Não é aceitável que o Estado português receba impostos e descontos de trabalhadores imigrantes, mas

depois os mantenha em situação ilegal. Há que garantir que ninguém que viva em Portugal seja privado do

seu direito à prestação de cuidados de saúde, do direito à educação e ensino dos seus filhos ou do direito a

adquirir uma habitação digna. Mas, para que esses e outros direitos sociais sejam amplamente reconhecidos,

é preciso uma política de vistos e de autorizações de residência que seja um fator de integração e não de

exclusão social.

Não ignoramos que, aquando da declaração do estado de emergência, o Governo determinou que os

cidadãos estrangeiros que tenham formulado pedidos tendo em vista a sua regularização em território nacional

passem a ter a sua permanência em Portugal considerada regularizada, tendo determinado também o

alargamento da validade dos documentos que expirariam aquando do estado de emergência para que os

cidadãos estrangeiros não perdessem os seus direitos, designadamente os direitos sociais. Estas são medidas

que, naturalmente, saudamos. Contudo, este esforço de integração não deve limitar-se ao estado de

emergência nem à pandemia.

O regresso à normalidade, que esperamos seja tão breve quanto possível, não deve significar o regresso

ao velho normal de ilegalidade. É preciso que o Governo dê concretização aos propósitos inscritos nas

Grandes Opções do Plano em 2020, de criar um visto para procura de trabalho antes da entrada em Portugal,

e é preciso que a resolução dos problemas administrativos que afetam a situação de muitos imigrantes, e que

não podem ser resolvidos por meios exclusivamente eletrónicos, tenham uma resposta atempada.

É sabido que a depauperação dos serviços públicos em matéria de recursos humanos é um problema

transversal. Reflete-se na segurança social, na saúde, na educação, na justiça ou na segurança e impede

muitos cidadãos de resolver, em tempo razoável, muitos problemas que dependem de decisões da

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Administração Pública. Sucede que, em matéria de estrangeiros, este problema é muito sensível, dado que a

falta de resposta por parte dos serviços pode implicar a manutenção de situações indesejáveis de ilegalidade

de cidadãos em território nacional. Que respostas tenciona, então, o Governo dar nestas matérias?

Aplausos de Deputados do BE.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Alma Rivera, muito obrigada pelas suas questões.

Quero destacar, em primeiro lugar, que me revejo totalmente na dimensão em que a Sr.ª Deputada

destacou a forma como devemos olhar para as migrações. Por isso, o Governo saúda o facto de os últimos

anos terem sido anos de saldo migratório positivo, dado que não só temos invertido ciclos de emigração como

termos reforçado ciclos de imigração. Como disse há pouco, é um sinal disso que, mesmo em pandemia,

continuem a crescer o número de imigrantes, face ao ano homólogo. Isto não é o resultado de um País que

tenha uma política de portas fechadas, pelo contrário. Portanto, queria dizer-lhe isso.

Como a Sr.ª Deputada referiu, procurámos, nessa dimensão de emergência, resolver muitos dos problemas

que estavam identificados, através do tal despacho que conferiu acesso às diferentes formas de proteção

social àqueles que tinham pedidos pendentes, mas também continuando a trabalhar, porque, como a Sr.ª

Deputada sabe, muito deste trabalho é um trabalho de proximidade, rua a rua, terra a terra, de modo a poder

garantir que as pessoas têm acesso. Por isso é que não só contam, do nosso ponto de vista, os números das

pessoas que tiveram acesso geral e abstrato, digamos assim, a esta resposta, mas também as pessoas que,

entretanto, passaram a ter número de segurança social, o que, como sabe, era um dos problemas que às

vezes criava círculos viciosos de acesso à regularização.

Além disso, quero destacar, como tenho sempre destacado nas nossas audições, o grande resultado que é

termos mais 77 000 pessoas com número de utente do SNS, sendo esse acesso ao SNS uma forma máxima,

se quiser, de integração na nossa sociedade, no nosso País.

Quero dizer-lhe também que as políticas gerais, transversais, que temos implementado são políticas que

protegem os imigrantes. Isso mesmo é válido quando olhamos para as discrepâncias que existem nas

remunerações entre os cidadãos nacionais e os trabalhadores estrangeiros, em que, em 2011, a distância era

de 9,4 pontos percentuais e neste momento é de 2,6 pontos percentuais. Tudo isso é resultado das políticas

de integração e das políticas de melhoria dos rendimentos que aqui temos discutido.

É verdade que nem tudo se deve fechar na resposta de emergência. Por isso mesmo, o Governo, em

agosto de 2019, tinha aprovado o seu plano nacional de implementação do pacto global para as migrações.

Muitas destas políticas que resolvemos transitoriamente, pela urgência da pandemia, são políticas que

estavam assumidas. Hoje, quem renova as suas autorizações de residência, lá tem o número do SNS. Ou

seja, há uma dimensão de resposta de emergência e há uma dimensão estrutural que fica para além da

pandemia. Esperamos poder garanti-la em diferentes esferas.

Como há pouco disse, na minha intervenção, a renovação automática de autorização de residência

permitiu uma renovação a 108 000 títulos de forma automática. Já falei também das 172 000 pessoas que

passaram a ter número de segurança social e, no âmbito da restruturação do SEF que está a ser feita, o

atendimento de todas estas renovações passará a ser feito nos mesmos espaços em que cada um de nós

trata da sua documentação. A nossa expectativa é a de que essa proximidade também permita resolver uma

parte dos problemas que a Sr.ª Deputada identificou.

Nesta matéria temos sempre desafios novos. Temos imigrantes a chegar de países cada vez mais diversos

e isso traduz-se num desafio acrescido para as nossas políticas de integração. Daí a importância que damos

ao ensino do português como língua não materna e as transformações que fizemos nas políticas de português

como língua de acolhimento, que esperamos possam chegar a mais gente porque alterámos várias regras que

dificultavam o acesso à língua.

Não quero ainda deixar de assinalar que durante todo o tempo em que as escolas estiveram fechadas, da

mesma maneira que na televisão pública houve aulas de várias disciplinas, também lá esteve, sempre, o

Português Língua não Materna, porque não nos esquecemos nunca das questões da integração.

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia, pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Secretário de Estado, Sr.ª Ministra, em primeiro lugar, gostaria de cumprimentá-la e agradecer os esclarecimentos que nos foi dando.

No entanto, quero dizer, obviamente com o devido respeito por V. Ex.ª e pela função que ocupa, que,

eventualmente, não escolheríamos como área de inquirição prioritária aquela que é a sua, o que não a

desvaloriza em nada mas traduz um bocadinho aquilo que temos visto ao longo deste período de debate em

que a Sr.ª Ministra, muitas vezes, teve necessidade de responder com «Essa não é exatamente a minha área.

Isso não sou eu, exatamente, que tenho essa tutela», o que significa que aquilo que os grupos parlamentares

mais quereriam saber não é aquilo que a Sr.ª Ministra mais nos pode trazer.

Incorrendo também nesse risco, Sr.ª Ministra, quero colocar uma primeira questão sobre uma área que é

obviamente da sua tutela, ainda que não totalmente. Trata-se da questão que se liga com a igualdade de

género, com os direitos de todos, em particular das mulheres, que são as principais vítimas de violência

doméstica, e, como já lhe foi perguntado também hoje, um bocadinho da questão dos menores. Desde já,

coloco duas perguntas nessa matéria.

Primeiro, Sr.ª Ministra, tem ou não a perceção de que os relatórios que nos chegam — e a minha análise

desses relatórios é feita muito na lógica da 1.ª Comissão, mas também numa lógica de administração interna

— nos dizem que, neste período de pandemia, os números teriam até diminuído, o que é, obviamente, motivo

de reflexão e de preocupação.

Ou seja, Sr.ª Ministra, no fundo, não temos cifras negras muito superiores ao que seria normal, porque, de

alguma forma, se as pessoas ficaram fechadas atrás da porta, por assim dizer, também este tipo de crime

pode ter ficado fechado atrás da porta e, portanto, podemos estar, realmente, numa situação bastante mais

preocupante da que os números e as estatísticas nos dão.

Por outro lado, ainda em relação à questão da violência doméstica e, sobretudo, no que diz respeito aos

menores, o Parlamento tem em agenda uma proposta de lei sobre esta matéria — se não estou em erro é a

28/XIV/1.ª —, uma petição e iniciativas dos vários partidos. E o CDS dará também o seu contributo para

aprofundarmos o assunto e protegermos melhor os menores deste tipo de situações. Ou seja, há a ideia de

que um menor pode ser exposto a violência direta, e isso é violência sobre menores, evidentemente, mas de

que a própria exposição a um contexto de violência doméstica, ainda que não diretamente sobre o menor, é,

em si mesma, uma forma de violência, e obviamente que teremos de atentar a isso no futuro e o CDS porá

todo o seu empenhamento nisso.

O que lhe pergunto, Sr.ª Ministra, é se nos seus planos, na sua ação, na formação, na identificação dos

agentes, na formação pedagógica, na preparação dos agentes e das pessoas que terão de lidar com isso, se

essa realidade está ou não contemplada, de que forma — uma vez que estamos ainda em processo legislativo

— e qual a sua preocupação e ponderação em relação a esta matéria.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência Mariana Vieira da Silva.

Sr.ª Ministra, faça favor.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, como vê é muito possível fazer perguntas importantíssimas para o País e todas elas nas minhas áreas. Portanto, se as perguntas são

sobre áreas que não são as minhas, acho que o devo dizer. Procurei responder a todas elas, mesmo não

sendo das minhas áreas, mas é muito fácil fazer perguntas sobre as minhas áreas, que não são assim tão

poucas — pelo menos é o que a minha agenda diz.

Aplausos do PS.

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Risos do BE.

As preocupações que o Sr. Deputado aqui referiu a propósito da violência doméstica são preocupações

que tivemos desde a primeira hora. No início do primeiro confinamento, na declaração do primeiro estado de

emergência, desde a primeira hora, preocupámo-nos com esta ideia de que as vítimas de violência doméstica

poderiam estar confinadas com o seu agressor, e isso é, obviamente, um cenário de terror individual e de

enorme preocupação coletiva.

Foi por isso que procurámos diversificar todos os canais possíveis de resposta — parafraseando um velho

anúncio, «se não pode telefonar, mande uma mensagem escrita» —, criando respostas por e-mail,

diversificando, por exemplo, as visitas das forças de segurança aos casos de possível reincidência que

conhecíamos e num contacto permanente com a rede de apoio no âmbito da violência doméstica.

Estou perante aquela situação em que, quando os números da violência doméstica são piores, é

gravíssimo, e quando são melhores, são cifras negras. Percebo a pergunta, porque corresponde exatamente à

minha preocupação, mas o que lhe posso dizer é que os números são, de facto, melhores e isso não decorre

de nenhuma desaceleração da nossa capacidade de acompanhamento. Pelo contrário, o nosso atendimento

aumentou em 2020 face a 2019, tivemos mais capacidade de resposta do que em 2019 e, portanto, eu não

diria, pelos números que tenho, que a baixa no número das queixas e das mortes, que são, ainda assim,

números horríveis, decorra desse confinamento. Obviamente, não o poderei garantir, mas o que lhe posso

dizer é que os nossos números de atendimento contribuem para a minha convicção de que foi a nossa melhor

resposta, foi a permanente presença de campanhas que fizemos na comunicação social durante este ano que

deu uma melhor capacidade de resposta.

Sobre as propostas que estão na Assembleia, naturalmente, este é o momento para que a Assembleia se

pronuncie sobre a lei. O momento do Governo já passou. Nós estamos preparados para dar uma resposta

muito forte à dimensão das crianças e jovens.

Como já respondi há pouco ao PSD, na resolução do Conselho de Ministro que aprovámos e nas medidas

que tomámos, essa foi uma dimensão fundamental, bem como o é também no novo programa de formação

que iniciámos, que é um programa que, tal como na altura a equipa que avaliou aquele momento crítico de

violência doméstica nos recomendou, tem áreas de formação transversais a todos os setores, para que quem

atende, quem faz a queixa, quem ajuda possa ter elementos fundamentais de formação comum, porque era

nessas brechas que tínhamos alguns problemas.

Como eu disse há pouco, criámos uma rede de respostas de apoio psicológico, precisamente para reforçar

o apoio psicológico e psicoterapêutico a crianças e jovens vítimas de violência doméstica. Como sabem, no

entendimento do Governo elas já eram vítimas de violência doméstica e nunca nos opusemos a que a lei o

viesse vincar ou clarificar mais, e teremos, por força deste anúncio, num protocolo com a Ordem dos

Psicólogos Portugueses, as respostas em todo o território nacional.

Portanto, na produção de guias que todos os agentes conheçam, na formação e nestas respostas às

crianças, julgamos que estamos a responder aos principais desafios que temos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Ainda está no uso da palavra o Sr. Deputado Telmo Correia. Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, enfim, não desvalorizo, de maneira nenhuma, as suas áreas. O que lhe disse foi só que, do ponto de vista da oposição, até pela sua

transversalidade, elas poderiam não ser uma prioridade, mas até um motivo de descanso para si, e não o

contrário. A oposição, obviamente, não pretende outra coisa senão ir aos pontos mais polémicos, por assim

dizer. Portanto, sei bem — um saber de experiências feito, ainda que limitado — que a agenda de qualquer

membro do Governo é extremamente exigente e uma agenda de muito trabalho. Não tenho a menor dúvida

sobre isso, não é isso que está em causa e agradeço-lhe as suas respostas.

Em relação a uma outra questão, de que também já falou hoje, a imigração ilegal, o seu colega da

Administração Interna foi, de facto, muito infeliz quando respondeu a uma pergunta minha dizendo que achava

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ridícula a existência de uma nova rota. Comprovou-se que essa rota existe, ou pode existir, que ela é

relevante, e a sua primeira resposta que deu há pouco ao meu colega do PSD é interessante. Trata-se

exatamente daquilo que lhe queria perguntar e vou manter a pergunta, apesar da sua resposta. Ou seja, a

resposta a esse tipo de situações, à imigração ilegal, é a imigração legal, como é evidente, e é por aí que

devemos ir.

A resposta à situação do Norte de África, e em particular de Marrocos — sendo que muitos desses

imigrantes poderão não vir diretamente de Marrocos —, é, por um lado, obviamente, a parceria em termos de

ajuda e desenvolvimento e, por outro, os acordos de imigração legal.

Fico satisfeito que esses acordos estejam a ser negociados e o que lhe pergunto, Sr.ª Ministra — e, mais

uma vez, estamos a falar de uma área transversal, também poderia fazer a pergunta ao seu colega dos

Negócios Estrangeiros —, é qual o exato ponto de situação destes acordos, ou seja, se nos poderia dizer mais

alguma coisa sobre o seu conteúdo e se são, ou não, só com Marrocos.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência, Mariana Vieira da Silva.

Sr.ª Ministra, faça favor.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, a sua questão, em concreto, é se podemos dizer que há, ou não, uma rota de imigração ilegal. Era isso que estava

em causa.

O que lhe posso dizer é que a existência dessa rota está sob investigação e temos de procurar ter as

respostas possíveis.

Sobre os acordos, posso dizer-lhe que, neste momento, encontram-se em fase de negociação acordos com

vista à organização e fluxos de mobilidade laboral com Marrocos, Moldávia e Índia, e a criação, como sabe, de

um espaço de mobilidade na CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa).

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real. Sr.ª Deputada, faça favor.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Membros do Governo aqui presentes: Nesta primeira ronda, e para facilitar, adianto, desde já, à Sr.ª Ministra que tenho três perguntas

muito concretas para lhe colocar.

Começo pelas matérias da igualdade de género.

A Sr.ª Ministra concluiu a sua intervenção inicial falando em sustentabilidade, mas no que respeita à

igualdade de género a situação é manifestamente insustentável. E os dados falam por si, Sr.ª Ministra.

Apesar do trabalho que tem sido feito, sabemos, todos e todas, que a crise provocada pela COVID-19 tem

deixado as mulheres para trás e as estatísticas dão nota disso mesmo: há um muro que tem sido erguido no

fosso que separa homens e mulheres e não o estamos a conseguir derrubar.

Senão, vejamos: em cada 100 crianças que tiveram de ficar em isolamento profilático, 84 ficaram ao

cuidado da mãe.

Os apoios sociais que surgiram durante a suspensão das atividades letivas foram, na sua larga maioria,

requeridos pelas mulheres. Aliás, as mulheres foram, também, a maioria dos profissionais essenciais que

estiveram na linha da frente do combate à crise.

Uma vez mais, também foram as mulheres quem mais perdeu o seu rendimento. Enquanto que um homem

perdeu 5,4% do seu rendimento, uma mulher perdeu 8,1%. E são também as mulheres o grupo mais

vulnerável à pobreza e exclusão social.

Ouvimos, muito recentemente, a Sr.ª Ministra falar, numa entrevista, das preocupações que tem

relativamente à igualdade de género, preocupações que secundamos, mas o que precisamos hoje de saber,

Sr.ª Ministra, é, das palavras à ação, da preocupação às políticas públicas, o que, efetivamente, vai ser feito

para garantir que estamos a combater a pobreza de forma estrutural.

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Falou-nos no layoff, mas temos de ir mais longe em matéria de igualdade, como a salarial, a começar pela

transparência dos salários praticados nas empresas ou na Administração Pública.

Temos de garantir, também, o acesso à habitação, à habitação digna e não apenas precária,

evidentemente, quando continuamos a ter barracas no nosso País que não são erradicadas.

Salário igual, uma maior conciliação entre vida profissional e vida privada, mas que isto não signifique que

são sistematicamente as mulheres a ser empurradas para a vida privada, ficando a cuidar dos filhos, o que

passa, por exemplo, por revisitar as licenças para o gozo do exercício da maternidade e parentalidade, como

consta de uma proposta do PAN que já deu entrada na Assembleia da República.

Sr.ª Ministra, vamos ter, em breve, um plano de recuperação e resiliência que terá de ser articulado com os

diferentes instrumentos do País e o que lhe pergunto é se nos consegue garantir que este plano vai estar

perfeitamente alinhado com o impacto da concretização das medidas de igualdade de género, se vai

assegurar que os cidadãos e a sociedade civil podem, em tempo real, perceber o impacto de género deste

programa aliado às grandes opções para o País.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência Mariana Vieira da Silva.

Sr.ª Ministra, faça favor.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, a primeira condição para que possamos corrigir as desigualdades que esta pandemia criou é conhecermos todos os dados

relativamente a todas as prestações e apoios criados, o que, no fundo, permite, e muito bem, que a Sr.

Deputada esteja aqui a destacar essas desigualdades, tendo destacado precisamente as duas medidas em

que elas são maiores. Esta é, precisamente, a primeira condição para que as possamos corrigir.

O que temos feito, desde logo em janeiro, quando as escolas estavam fechadas, quando alterámos o

subsídio de apoio à família, foi procurar majorá-lo sempre que fosse dividido o apoio. Há pouco já pude dizer

os números, que são apenas de março e, portanto, são números reduzidos, mas, no fundo, criámos a política

para produzir maior igualdade nesse indicador.

A Sr.ª Deputada diz que não é só no layoff e eu também acho que não é só no layoff. Mas também lhe

quero dizer que não foi só no layoff. Quando se definiu, como se definiu neste Parlamento, um conjunto de

políticas de resposta às pessoas que têm uma relação mais informal com a nossa economia, são as mulheres

que estão a ser protegidas. São maioritariamente as mulheres que estão a ser protegidas.

Quando pagamos o layoff a 100%, são as mulheres que estão a ser protegidas; quando aumentamos o

salário mínimo ou o RSI, são, maioritariamente, as mulheres que estão a ser protegidas, tal como quando

baixamos o preço dos passes sociais também são as mulheres que estão a ser mais protegidas.

Aplausos do PS.

Relativamente à lei da igualdade salarial, aprovada neste Parlamento, já há pouco respondi. Na primeira

fase tivemos dados gerais e setoriais e teremos, no mês de junho, os dados empresa a empresa, que

permitirão corrigir as desigualdades. Esses dados serão conhecidos das empresas, naturalmente, e também

da ACT, que dirá que a empresa tem um mês para responder com o seu plano de correção dessas

desigualdades.

Foi essa a lei que foi aprovada. Parece-me uma boa lei, que vai produzir os seus resultados, e entramos

agora no momento mais importante, se quiser.

Fez-me um conjunto de perguntas sobre o PRR. Já há pouco respondi sobre isso mas tenho muito gosto

em responder de novo sobre esta matéria porque o nosso Programa de Recuperação e Resiliência define, de

facto, políticas que procuram corrigir as desigualdades, em particular as desigualdades de género.

Essas políticas estão identificadas ao longo do Programa — era uma exigência da Comissão Europeia que,

obviamente, Portugal cumpriu —, tendo medidas nas diferentes áreas. Por exemplo, na componente à

habitação, que a Sr.ª Deputada referiu, a Bolsa Nacional de Alojamento Urgente vem permitir responder não

apenas à violência doméstica, mas também aos processos de autonomização nesta matéria. Na parte do

SNS, o robustecimento dos cuidados de saúde primários, centrados nas pessoas e na proximidade, são

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fundamentais na identificação das situações de risco para a violência doméstica, estando essa prioridade

referida. Na componente das qualificações, também existem as medidas que, há pouco, já referi, de

majoração nos apoios à contratação e na formação nas áreas digitais.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — A Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real ainda dispõe de tempo e pretende utilizá-lo. Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, agradeço até porque o tempo escasseia. Sr.ª Ministra, queria dizer, muito telegraficamente, ainda dentro da matéria da igualdade e em relação à

comunidade, que ouvimos os esclarecimentos que prestou ao Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda. No

entanto, ficámos sem perceber que investimento vai ser feito, em concreto, nas respostas de habitação,

nomeadamente de emergência. Falou em 1,7 milhões de euros. De onde provém este dinheiro? Onde vai ser

investido? Fazer depender única e exclusivamente a igualdade, por exemplo, dos jogos da Santa Casa, é o

mesmo que dizer que continuamos numa lógica de fortuna ou azar. A igualdade não se compadece com isso!

Hoje, não posso deixar de lhe pôr uma última questão, Sr.ª Ministra. Ouvimos o PSD e o CDS a falar da

questão dos migrantes, mas ninguém falou das mais de 130 pessoas que, na semana passada, morreram em

pleno mar Mediterrâneo. Portugal também tem de ter uma palavra a dizer sobre isto e não pode ficar em

silêncio sobre este flagelo humano que bate à porta das nossas fronteiras.

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, tem de concluir.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Portanto, não podemos falar apenas de prevenção, temos de falar de ação. Sr.ª Ministra, gostaria de saber, por isso, o que Portugal vai fazer, no âmbito da Presidência do

Conselho da União Europeia, em relação a isto.

Muito obrigada pela tolerância, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência, Mariana Vieira da Silva.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, as políticas de habitação são financiadas através do Programa de Recuperação e Resiliência. Este valor para trabalhar a matéria da

habitação é um valor de que o País já não dispunha desde a década de 1990.

Quanto à questão dos refugiados, como sabe, Portugal participa no esforço de solidariedade e é um dos

países que mais se tem manifestado disponível para acolher adultos e menores neste contexto. Julgo que isto

é reconhecido por todos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para fazer perguntas, a Sr.ª Deputada Mariana Silva, de Os Verdes.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Ministra, ainda no caminho de estabilizar a propagação da doença e ainda focados nos apoios que são

necessários prestar, no desconfinamento que entrará na sua última fase na próxima semana, não podemos

deixar de dizer que as consequências desta pandemia, que ainda está entre nós, estão longe de ser avaliadas.

Não sabemos quais as consequências económicas, sociais e, sobretudo, de saúde, no geral, e de saúde

mental, em particular, que poderão afetar desde os mais jovens aos mais idosos, mas também não sabemos

as consequências do aumento da violência doméstica neste tempo de pandemia, em que as vítimas foram

obrigadas a conviver com os abusadores, com os criminosos. Há até estudos que indicam que um terço das

vítimas o terá sido pela primeira vez nestes períodos de confinamento.

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Por outro lado, as mulheres representam uma grande parte dos trabalhadores que estiveram naquela que

se escolheu chamar de «linha da frente», não só como profissionais de saúde, mas também como

trabalhadoras de lares, auxiliares de limpeza nas escolas, nos hospitais, nas estruturas de apoio aos idosos e

no apoio ao domicílio.

Também são mulheres as que mais trabalham nos serviços essenciais, como nas caixas de supermercado,

em empresas e indústrias que não fecharam e que, por isso, sofriam a pressão diária de serem portadoras da

doença e de a levar para casa, para os familiares idosos e crianças. E não podemos deixar de relembrar que

estas trabalhadoras, na maioria mulheres, lidaram com centenas de pessoas por dia e ficaram de fora do

plano de vacinação, quando era indispensável estarem protegidas.

Uma vez que até foram para estas trabalhadoras e para estes trabalhadores as imensas palmas e os

agradecimentos tão pomposos de valorização do seu papel, que permitiu a todos ter acesso a produtos

alimentares durante o primeiro confinamento, vai-se a ver e uma boa parte destas trabalhadoras recebem

apenas o salário mínimo nacional ou pouco mais, levando para casa, ao final do mês, quantias que mal

chegam para pagar a renda, as despesas fixas, como a eletricidade, o gás, a água, a educação dos filhos.

Foram elas que corajosamente saíram de casa, mesmo quando nada sabíamos sobre o que estávamos a

viver.

Por isso, o que gostaríamos de perguntar, Sr.ª Ministra, é se, depois desta experiência e de todas os

elementos de desigualdade com que fomos confrontados, e que não foram surpresa para ninguém, o Governo

vai tomar medidas para um significativo aumento das retribuições destas trabalhadoras, porque elas

mantiveram-se nos seus postos de trabalho diariamente. São também elas que constituem o grosso da coluna

dos muitos milhares de portugueses que empobrecem a trabalhar!

Principalmente porque a chave para a resolução de uma boa parte dos problemas de violência doméstica

também será, exatamente, quebrar dependências, nomeadamente económicas, dos abusadores — a

pandemia agravou claramente as questões de violência doméstica de que muitas mulheres foram vítimas, pela

primeira vez, durante o confinamento —, o problema da violência ainda requer, infelizmente, um conjunto

considerável de medidas a adotar, adaptar e a colocar em prática. Sr.ª Ministra, estão a ser reforçados os

serviços públicos de apoio a estas vítimas? Está a ser feita formação aos funcionários dos serviços públicos?

Disse que esta será feita nas próximas semanas, mas espero que não seja por culpa desta pandemia, porque

a necessidade de os profissionais da segurança pública atenderem e garantirem a segurança destas vítimas

estava claramente identificada.

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, muito obrigado.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, estou mesmo a terminar. Por último, sabemos que as mulheres são as maiores vítimas da violência doméstica e, até, durante o

namoro,…

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, tem mesmo de terminar.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — … mas é ainda preciso incentivar a denúncia no masculino. Homens e jovens não podem continuar a ser discriminados, ridicularizados ou abandonados quando admitem que são

vítimas de violência doméstica.

Aplausos de Deputados do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência, Mariana Vieira da Silva.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, não nego — nunca o fiz e também não seria hoje o primeiro dia que o faria — que esta crise tenha impactos diferenciados em homens e

mulheres. Aliás, tenho trazido este tema permanentemente à Assembleia da República.

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Para definir políticas públicas também temos de saber quais são as que resultam e as que não resultam,

por isso também vale a pena olhar para o caminho que fizemos nos últimos anos — e digo propositadamente

«fizemos», na primeira pessoa do plural. A verdade é que quando olhamos para a percentagem de população

em risco de pobreza, vemos que, em 2015, nas mulheres, era de 27% e, agora, é de 22%; quando olhamos

para a taxa de desemprego das mulheres, vemos que era de 13%, em 2015, e que, agora, é de 7,3%; quando

olhamos para o emprego precário, vemos que também reduziu significativamente, de 3% para 1,7%, segundo

dados do INE durante este período.

Ou seja, sabemos quais são as políticas que promovem maior igualdade entre homens e mulheres e são

as políticas que estamos a desenvolver, desde 2015. É evidente que uma crise tem um impacto brutal e

significativo, mas é com as políticas que já criámos e com o seu desenvolvimento que vamos continuar a

reduzir a pobreza entre as mulheres, a reduzir as desigualdades salariais, a reduzir a precariedade laboral.

Por isso, como já aqui citei hoje longamente, tanto as medidas de emergência que criámos, como as

medidas que incluímos no Programa de Recuperação e Resiliência permitem responder a essas

desigualdades, majorando apoios no sexo representado nas profissões, garantindo que, na formação e nas

áreas digitais, há promoção da igualdade e que, no grande esforço que o País vai fazer na formação das áreas

da ciência, da tecnologia, matemática e afins, existe também esse contributo das políticas de igualdade para

esta correção.

Relativamente à resposta sobre as questões da violência doméstica, no plano que desenvolvemos a partir

de 2019, procurámos desenvolver formação para todas as áreas que respondem a esta questão, desde o

âmbito da Rede Nacional de Apoio às Vítimas de Violência Doméstica, às polícias e à área da justiça. A ideia

era construirmos um plano anual de formação, que está hoje publicado, e o nosso objetivo é formar 13 000

pessoas neste pacote de financiamento que agora aprovámos. O INA (Direção-Geral da Qualificação dos

Trabalhadores em Funções Públicas) estava a terminar a constituição das turmas e, portanto, as próximas

semanas irão mesmo ser neste sentido.

Foi preciso fazer algo que não existia e nós procurámos fazê-lo: um plano comum que tem, obviamente,

diferenças entre os setores, mas que tem um tronco comum para responder a esta matéria. Uma das críticas

feita ao País era relativa ao facto de as formações aos diferentes agentes não ter cruzamento entre si, de não

se articularem na resposta. É isso que aqui procuramos promover e a formação já está financiada e vai iniciar-

se.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para formular perguntas, o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, cumprimento a Sr.ª Ministra e os Membros do Governo. Sr.ª Ministra, queria fazer-lhe uma pergunta à qual ainda não deu resposta nas várias intervenções que

foram feitas e, hoje, dificilmente, não poderá deixar de a dar. Vai ou não manter o ativista Mamadou Ba no

Grupo de Trabalho para a Prevenção e o Combate ao Racismo? Não vou fazer-lhe mais nenhuma pergunta

para que possamos saber todos, hoje, finalmente, se vai mantê-lo ou não. Alguém que chamou «bosta» aos

nossos polícias, que disse que queria matar os homens brancos,…

Risos da Deputada do BE Fabíola Cardoso.

Não se ria, Sr.ª Deputada! Um dia pode ser a si também!

Merecemos uma resposta da Ministra de Estado a dizer se vai manter um elemento destes, um ativo tóxico

destes num grupo de trabalho do seu Ministério, debaixo da sua tutela.

A Sr.ª Fabíola Cardoso (BE): — Ativo tóxico? Boa expressão!

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência.

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A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, não deve ter-me feito essa pergunta nenhuma vez, porque, nesta Legislatura, é a segunda vez que me faz perguntas e a primeira desde

que esse grupo de trabalho existe. Portanto, é certamente a primeira vez que me pergunta, pois, em sessões

em que eu tenha estado, o Sr. Deputado, até agora, só esteve uma vez.

O Governo decidiu constituir um grupo de trabalho para apoiar o desenvolvimento do Plano Nacional de

Combate ao Racismo e à Discriminação. Esse grupo de trabalho tem peritos de instituições universitárias e

tem representantes das organizações da sociedade civil. Mamadou Ba é um representante de uma

organização que combate, há décadas, o racismo em Portugal e está no grupo de trabalho para dar o seu

contributo, que, aliás, já foi entregue ao Governo.

Aplausos do PS e da Deputada do BE Fabíola Cardoso.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado André Ventura, ainda dispõe de 49 segundos. Tem a palavra.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, ficámos a saber que a Ministra não fica incomodada com declarações do género «bosta de polícias que temos». Ficamos muito contentes por saber isso!

O Governo vai dar 15 milhões de euros para o combate ao racismo, aliás, por uma proposta aprovada no

Parlamento, em que iria comprar-se espaço de publicidade… Sr.ª Ministra, não me olhe com essa cara! Foi

aprovado no Parlamento pelo seu partido! São 15 milhões de euros para o combate ao racismo!

Gostava de perguntar-lhe quanto é que vamos gastar. No momento em que o País não tem dinheiro para

apoiar trabalhadores independentes, para apoiar funcionários públicos, para apoiar desempregados, para

apoiar pensionistas, quanto é que vamos gastar em campanhas contra o racismo? É da mais elementar justiça

que o País saiba quanto é que vamos gastar com isto! Gostava que a Sr.ª Ministra soubesse finalmente

responder, para não estarmos só a ver peças televisivas questionando se são 15 milhões, 15 mil milhões, 30

milhões ou 20 milhões! A Sr.ª Ministra viu, porque eu também vi e passou num canal em horário, aliás,

bastante nobre.

Finalmente, gostava de perguntar-lhe o seguinte: anda uma grande confusão sobre a comparticipação dos

medicamentos aos requerentes de asilo. Mas a confusão é política, porque a legal eu já sei. Aos exilados e

refugiados, o Estado paga 100% dos medicamentos, isto é, dá uma comparticipação de 100%.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já excedeu o seu tempo.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, vou terminar. Como é que explica ao País que haja idosos que não conseguem pagar os medicamentos? Como é que

explica que haja tantos trabalhadores que pagam impostos e não conseguem pagar medicamentos e que as

pessoas que vêm por asilo e como refugiados tenham 100% de comparticipação?

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir.

O Sr. André Ventura (CH): — Quero perguntar-lhe se concorda com isto e como é que um Estado de bem pode viver com isto.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, não tenho grande esperança de que o Sr. Deputado vá compreender a resposta ou aceitá-la, porque já sei que, depois, vai cortar vídeos e

só importa a sua pergunta e nunca as respostas que obtém.

Aplausos do PS.

Os 15 milhões que o Sr. Deputado sistematicamente refere incluem-se num pacote de medidas para todo o

Governo responder a divulgação relacionada com o tema da COVID-19. Este pacote permitiu, por exemplo,

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divulgar o anúncio que ajuda as vítimas de violência doméstica a saber o que fazer, a quem queixar-se, o que

devem organizar quando apresentam uma queixa, tendo estado presente de forma visível em muitos jornais.

Como já tive oportunidade de dizer a várias Sr.as e Sr. Deputados, creio que foi isso que nos permitiu

responder de forma eficaz à violência doméstica.

Podemos dizer, como o Sr. Deputado muitas vezes diz, que não há racismo. Todos sabemos que existe! O

que acontece é que uns escolhem combatê-lo e outros não lhe dão voz.

Vozes do PS: — Exatamente!

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — É isso que o Sr. Deputado está a fazer quando diz que os refugiados ou os requerentes de asilo não pagam medicamentos e as outras pessoas pagam.

O Sr. André Ventura (CH): — Não sou eu, é a lei!

O Sr. Presidente: — Sr.ª Ministra, tem de concluir.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Vou já terminar, Sr. Presidente. Portugal tem uma política de apoio a um conjunto de pessoas que chegam ao nosso País sem nada, como

tem uma política de apoio às pessoas mais pobres, que também não pagam medicamentos. É disso que

estamos a falar quando falamos de igualdade.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para formular perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ª Ministra, há uma série de questões que queria colocar-lhe, mas que já foram abordadas, nomeadamente quanto à sua

preocupação com a violência doméstica em tempo de pandemia. Vamos ver até onde chegam os resultados

das medidas que o Governo pôs em prática.

Ficámos a saber que há abertura do Governo para acompanhar os que, no Parlamento, propuseram a

tipificação do crime de exposição de menores a violência doméstica. Só não percebo por que motivo é que,

em maio do ano passado, o PS — penso que ainda há uma certa coordenação entre o PS e o Governo —

votou contra a proposta da Iniciativa Liberal.

Entretanto, como há perguntas que não ficaram respondidas, queria saber qual o ponto de situação e que

balanço faz a Sr.ª Ministra da introdução de duas novas valências no sistema de informação, nomeadamente a

Linha SMS 3060 e a linha de e-mail, para a apresentação de queixas no âmbito da violência doméstica.

Ainda no domínio da igualdade de género, a 20 de abril, 43 dos 54 membros do Conselho Económico e

Social da ONU (Organização das Nações Unidas) — Portugal é um desses membros — votaram a favor da

integração do Irão na Comissão sobre o Estatuto das Mulheres, que é um dos mais importantes organismos

internacionais para a proteção da igualdade de género.

Queria saber, Sr.ª Ministra, se me pode dizer se Portugal votou a favor da integração do Irão nessa

Comissão.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, muito obrigada pelas suas questões.

Também espero para ver se as medidas que tomámos têm, até ao fim desta crise, eficácia no combate à

violência doméstica. Não tenho dúvida de que se trata de um trabalho continuado, que continuamos

permanentemente a fazer.

Com estes diferentes reforços da nossa capacidade de atendimento, — tanto nas linhas telefónicas, como

nos e-mails e nos SMS — recebemos, desde 19 de março de 2020, através destes três canais, 1941 pedidos

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de ajuda, o que significa, tal como há pouco disse ao Sr. Deputado Telmo Correia, um aumento face à média

de atendimentos de 2019. Em média, em alguns meses, nos mais difíceis, verificou-se um registo de mais 11

000, 13 000, atendimentos.

Sr. Deputado, relativamente à última questão que colocou, não sei responder-lhe. Se conseguir obter

informação durante o debate, não deixarei de o informar.

A avaliação que fazemos destas respostas à violência doméstica é a que referi, sabendo que é um trabalho

continuado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, por 9 segundos, o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, será o suficiente. Sr.ª Ministra, refiro-me agora à cibersegurança. Em outubro de 2020, a Sr.ª Ministra disse que,

relativamente à rede 5G, os fornecedores iam ser sujeitos a processos de certificação e de avaliação, pelo que

quero saber se isso aconteceu e quais foram os resultados.

O Gabinete Nacional de Segurança produziu um relatório, que é secreto — não sei o que lá diz —, mas, ao

que parece, é referido que há nas redes 5G graves riscos de cibersegurança para Portugal, não se referindo a

que países. Sabemos, por notícias que, entretanto, vieram a público, que a China e a Rússia são dois dos

países mais citados em relação aos problemas de cibersegurança estatal.

Assim, queria saber se podia adiantar se, relativamente ao relatório que recebeu, a China e a Rússia são,

efetivamente, dois dos países citados com risco para Portugal.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, o processo de introdução da rede 5G em Portugal seguiu a recomendação europeia.

Como sabe, a União Europeia produziu um conjunto de respostas, a toolbox, e o que o grupo de trabalho

fez foi desenhar as medidas que teriam de existir em Portugal para lhes corresponder.

No que respeita a essas medidas, é simples: há um decreto-lei que o Governo aprovou e que está em

consulta pública neste momento, mas, fundamentalmente, é na Lei das Comunicações Eletrónicas que é dada

a maior parte das respostas a estes temas da cibersegurança, é lá que estão incluídas as medidas que a

toolbox europeia recomenda que cada país tenha. Foi isso que Portugal fez e cabe agora ao Parlamento dar a

sua aprovação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para formular perguntas, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elza Pais, do PS.

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Ministra, ao longo deste último ano, o País percebeu a importância da aposta que sempre fizemos na igualdade. Foi

uma aposta em políticas fortes, estruturadas e robustas, que funcionaram como um amortecedor essencial

para aguentarmos esta crise pandémica e olharmos, hoje, com esperança para o futuro, retomando o caminho

de progresso que vínhamos fazendo desde 2015.

É importante relembrar, nesta agenda de progresso, algumas batalhas que travámos nestes últimos seis

anos e a recuperação que temos vindo a fazer das desigualdades estruturais.

Aprovámos, nesta Casa, leis civilizacionais pela dignidade da pessoa e contra o sofrimento humano; leis

que garantem, hoje, igual dignidade legal à hétero e à homoparentalidade; leis que garantem o acesso de

todas as mulheres à procriação medicamente assistida; leis que garantem o direito à autodeterminação e à

identidade de género; e impedimos os retrocessos relativamente à IVG (interrupção voluntária da gravidez).

Aprovámos, ainda, leis de representação equilibrada de género, que quebram o teto de vidro que impede

as mulheres de chegarem aos lugares de topo na decisão económica e política, onde realmente se decide,

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com resultados de implementação muito positivos, como iremos ver, acelerando, deste modo, as mudanças

que poderiam levar mais de 100 anos a acontecer, como é reconhecido pela Organização Internacional do

Trabalho e pela Organização das Nações Unidas.

Introduzimos, em sede de Orçamento, orçamentos com perspetiva de género, aprovámos a lei da

prevenção e combate à discriminação racial, em 2017, e temos agora o plano nacional contra o racismo para

reforçar esse combate.

Além disso, temos, hoje, uma Rede Nacional de Apoio a Vítimas de Violência Doméstica bem estruturada,

com mecanismos de reforço e proteção das vítimas — de jovens e crianças, de mulheres idosas, de pessoas

LGBTI —, rede esta que na crise apoiou e atendeu mais de 80 000 pessoas. Também são realizadas diversas

campanhas anuais de prevenção sobre violência doméstica, mutilação genital feminina, violência no namoro,

etc., etc., etc.

Temos, também, um plano de formação para milhares de pessoas, como a Sr.ª Ministra já disse, com uma

dotação de 6,5 milhões de euros.

Na semana passada, aprovámos a integração de organizações não governamentais — uma conquista

importante — na Lei-Quadro do Estatuto de Utilidade Pública, pela qual sempre nos batemos. Este esforço e

este trabalho foram reconhecidos, aliás, pelo Instituto Europeu para a Igualdade de Género, que refere

Portugal como um dos seis países europeus com equilíbrio de género no Parlamento, o que muito nos

orgulha.

Portanto, durante a pandemia, não deixámos congelar a defesa dos direitos humanos, pelos quais sempre

continuámos a lutar.

Num curto espaço de tempo, foram postas em prática várias medidas e apoios sociais e económicos

extraordinários às pessoas e às famílias, num esforço coletivo de mobilização de recursos, que chegaram a

mais de 200 000 pessoas.

A Estratégia Nacional para a Igualdade e a não Discriminação 2018-2030 «Portugal + Igual» foi reforçada

para proteger as pessoas mais vulneráveis. Provou-se, portanto, que o Estado social e as políticas de

igualdade são sempre importantes e ainda o são mais em momentos de crise.

Temos agora o PRR, um plano de oportunidades únicas, um instrumento decisivo, como diria Giddens,

para recuperar da crise e corrigir esses tais desequilíbrios estruturais, desde logo através de medidas positivas

que estão a ser previstas, nomeadamente no acesso à habitação digna — 26 000 famílias irão ter esse

acesso, sendo sinalizadas as vítimas de violência doméstica e também as famílias monoparentais; através de

majorações para projetos de empreendedorismo feminino; através do acesso ao digital com equilíbrio de

género, pois há um desequilíbrio brutal que já existia antes da pandemia e que se espera que agora com o

PRR se corrija.

A igualdade é, por isso, central para uma recuperação justa e inteligente da crise.

Portugal, neste momento, lidera os destinos da União Europeia.

Pergunto-lhe o seguinte, Sr.ª Ministra: Como é que a Presidência portuguesa do Conselho da União

Europeia vai assegurar que a recuperação só se faz com igualdade de oportunidades e com igualdade de

género para que ninguém fique para trás? Como vai impedir retrocessos europeus nesta matéria?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, muito obrigada pelas suas questões.

Como disse há pouco, mesmo nestes momentos difíceis, precisamos de olhar para as políticas que

desenhámos e, ao longo deste tempo alargado, reconhecer o seu sucesso. Acho que este é um elemento

fundamental para podermos continuar sempre a desenhar políticas melhores.

Já aqui hoje foram referidos vários elementos importantes, nomeadamente a melhoria de Portugal no

ranking da igualdade de género, o salto que demos na área da representação equilibrada, tanto nos

organismos públicos como nos conselhos de administração, e as melhorias que temos tido nas questões das

disparidades salariais. Mais: quando olhamos para a última década, verificamos que a percentagem de

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homens que gozava da licença parental facultativa era de 52% e passou para 72% e a percentagem dos que

gozava da licença partilhada era de 10% e passou para 42%.

Sabermos que as políticas têm estes resultados é da maior importância quando, perante uma crise, temos

de desenhar novas políticas.

No Plano de Recuperação e Resiliência, procurámos que as diferentes dimensões em que sabemos que é

preciso responder às desigualdades entre homens e mulheres encontrassem o seu espaço, por exemplo na

área da saúde e na área social, o que pretende contribuir, como sempre contribuiu, para a conciliação entre a

vida pessoal, familiar e profissional; procurámos ter respostas novas que adiem a institucionalização dos mais

velhos em lares, dando respostas de proximidade que possam ser partilhadas entre as famílias e os serviços

públicos; procurámos ter respostas na habitação, como já referiu a Sr.ª Deputada, para responder às

carências das famílias monoparentais; procurámos ter uma resposta organizada em matéria de violência

doméstica; e procurámos, no momento em que queremos que a transição verde e a transição digital sejam

justas e possam promover a igualdade, ter medidas que corrijam as desigualdades preexistentes nas matérias

relativas às qualificações e à formação profissional na área digital mas não só.

Quando olhamos para os dados do PISA (Programa Internacional de Avaliação dos Alunos), vemos que

entre as raparigas que são melhores alunas só uma minoria é que pretende seguir as áreas das ciências e das

tecnologias, estando os rapazes em maioria nessas áreas e em minoria nas áreas dos apoios sociais.

Sabemos que estas desigualdades vêm da construção de estereótipos nos quais todos participamos — as

famílias, os órgãos de comunicação social, as escolas, a sociedade como um todo — e, por isso, a resposta

também terá de ser da sociedade como um todo e aquilo que procuramos é dar visibilidade a essas

desigualdades e encontrar políticas públicas para corrigi-las.

Mas não nos iludamos: a resposta a esta construção da ideia de que uns têm mais jeito para umas coisas e

outros têm mais jeito para outras não será conseguida por nenhum Governo, por nenhum Parlamento. É uma

resposta que envolve toda a sociedade.

No que respeita às dimensões que referiu em matéria europeia, julgo que o contributo que Portugal

procurou dar neste semestre às políticas da igualdade foi no sentido de conseguir construir um consenso, que

a nível europeu nem sempre é fácil. Esta crise teve impactos desiguais para homens e mulheres e haverá

respostas para corrigir essa desigualdade.

Essa foi a grande prioridade que decidimos escolher, procurando informação junto do Instituto Europeu

para a Igualdade de Género. No próximo Conselho Europeu, procuraremos responder com esse consenso em

torno dos impactos e com um compromisso em torno das medidas que temos de desenvolver.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para fazer perguntas, também pelo Grupo Parlamentar do PS, tem a palavra a Sr.ª Deputada Susana Amador.

A Sr.ª Susana Amador (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Ministra, ao longo deste debate e nos últimos meses, temos vindo a constatar aquilo que sabíamos e que já

estava estudado, ou seja, que a crise pandémica está longe de ser simétrica também do ponto de vista do

género. Foram as mulheres as mais atingidas, como revelaram estudos do FMI (Fundo Monetário

Internacional), da OIT (Organização Internacional do Trabalho) e da Comissão Europeia.

Em Portugal, igualmente, esta crise não foi neutra em termos de género e as mulheres foram afetadas em

termos económicos e sociais, aprofundando-se as desigualdades no que diz respeito à partilha do tempo,

designadamente do tempo de trabalho não pago. E lembremo-nos do perfil dos beneficiários do apoio

extraordinário à família, em que mais de 80% são mulheres. Sublinhe-se, por isso, o quanto foi importante o

Orçamento do Estado ter reforçado o abono de família e alargado a gratuitidade das creches num esforço para

aumentar o rendimento disponível das famílias, mas também para permitir uma melhor conciliação entre a vida

profissional e familiar dos pais.

De forma transversal, ao longo destes meses, foram criadas medidas de manutenção do emprego, de

apoio à contratação e de apoio às famílias e empresas, bem como de apoio a públicos mais vulneráveis, com

impacto particular nas mulheres, de que são exemplos o layoff simplificado, o apoio extraordinário à retoma

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progressiva de atividade e o subsídio por assistência a filho ou a neto em isolamento profilático. Mais de 3,4

mil milhões de apoios foram pagos, impactando mais de 2,8 milhões de pessoas que foram abrangidas por

estes apoios sociais.

É também por isso que os instrumentos legislativos criados em anos recentes, de governação socialista e

com o apoio deste grupo parlamentar — instrumentos como a lei da promoção da igualdade salarial e as leis

da representação equilibrada de homens e mulheres em cargos de decisão, quer na Administração Pública,

como a Sr.ª Ministra referiu, que passou de 32% para 42% de mulheres em cargos dirigentes, quer nos órgãos

do setor empresarial e das empresas cotadas em bolsa, onde a participação das mulheres também aumentou,

passando de 12% para 26% em 2020 —, foram determinantes para um país mais igual, logo, para um país

mais democrático e têm esta marca de água do Partido Socialista.

Foi igualmente determinante o Programa 3 em Linha, que visa promover um maior equilíbrio e conciliação

da vida profissional, pessoal e familiar como condição primeira da igualdade entre homens e mulheres e para

uma cidadania plena, bem como a lógica que a Sr.ª Ministra referiu da partilha das licenças de parentalidade.

Ao longo do tempo, tem vindo a aumentar a proporção de homens que gozam essa licença facultativa, que

aumentou de 45% para 68%, e as licenças partilhadas aumentaram de 9% para quase 40%.

São avanços evidentes que permitem mais justiça e que consagram e aprofundam a igualdade, tal como

está previsto no artigo 9.º da nossa Constituição. Por isso, o esforço que tem sido feito em campanhas para

promover a igualdade, na CIG (Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género), ou para alargar a

consciência da discriminação e dos direitos e reforçar mecanismos de proteção — por exemplo, na CITE, que

tem hoje poderes reforçados — são tão necessários.

Sr.ª Ministra, saudamos ainda o facto de, em articulação com a Estratégia para a Inovação e Modernização

do Estado e da Administração Pública, ser prosseguida a formação de trabalhadores em matéria de igualdade

e não discriminação, também na área da conciliação, e a criação de mecanismos que garantam que o

teletrabalho não agudiza as assimetrias sociais de género preexistentes.

É, assim, nuclear que sejamos capazes de prevenir que se reproduzam no futuro os focos de desigualdade

existentes e que irrompam novos focos na economia digital e nas profissões de acesso a este tipo de

atividades, ou seja, naquilo que se designa como «o futuro do mundo do trabalho». Nessa perspetiva,

questionava-a, Sr.ª Ministra, sobre a relevância do Livro Verde do Futuro do Trabalho na dimensão da

igualdade, que o mesmo patenteia e que está agora na concertação social.

Por seu turno, a versão final do PRR, que Portugal entregou ontem — aliás, Portugal foi o primeiro Estado-

Membro a entregar esse documento —, promove uma nova geração de equipamentos e de respostas para a

primeira infância, idosos e deficientes, inclui medidas de promoção da igualdade remuneratória e de promoção

da representação equilibrada nos cargos de direção, mas também combate os estereótipos, designadamente

nas TIC, que limitam as escolhas formativas das raparigas e das mulheres e enformam desigualdades futuras

que queremos inverter e travar.

Esta recuperação responsiva ao género e esta atuação sobre fatores estruturantes da desigualdade fazem,

Sr.ª Ministra, com que este plano seja, efetivamente, um instrumento de oportunidades únicas para que

ninguém fique para trás, tal como nos interpela a Agenda 2030 das Nações Unidas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência, Mariana Vieira da Silva.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, muito obrigada pelas questões que me colocou.

O caminho que vínhamos fazendo na recuperação de inúmeros indicadores de igualdade entre homens e

mulheres, o qual já referi, teve esta interrupção por uma crise que, como todas as crises, afeta sempre mais

aqueles que já eram mais vulneráveis. Ora, os mais vulneráveis junto do mercado de trabalho são as mulheres

e, por isso, nas dimensões da precariedade, nas dimensões dos baixos salários, em todas estas dimensões

vemos as mulheres ser mais afetadas do que os homens.

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Este tipo de medidas, que já aqui referi — quer as medidas que já aprovámos, como a do pagamento do

layoff a 100%, quer os vários apoios sociais que a Sr.ª Deputada mencionou —, respondem a esta

emergência, mas não são apenas essas as medidas que temos de tomar. Temos de tomar medidas que

permitam projetar para o futuro, nas crianças, nas jovens raparigas e nas jovens mulheres, a capacidade de

poderem viver num contexto de igualdade salarial.

É evidente que estas questões da igualdade salarial têm uma dimensão, também já referida, de

transparência salarial, de, por exemplo, as pessoas poderem saber qual é o salário quando se candidatam a

um posto de trabalho e de esse conhecimento ser prévio para que, depois, não se possam construir injustiças.

Ou seja, instrumentos para que a ACT possa intervir quando existam desigualdades. Todos esses

instrumentos, que a lei prevê e que estão em implementação, enfrentam um tipo de desigualdade salarial que

não é, propriamente, a do «trabalho igual, salário igual», mas antes a de nem todos terem acesso ao trabalho

igual.

É também sobre estas dificuldades de acesso a esse trabalho igual que temos de agir. Vemos diariamente

publicadas nos jornais as áreas que irão ter mais empregos e que serão mais bem pagas no futuro e as áreas

que irão perder empregos. É evidente que há uma dimensão disto que se pode, ou não, verificar, mas

sabemos que, numa sociedade mais digital, quem tenha essas competências digitais estará mais bem

colocado no mercado de trabalho.

Já desde há três anos que temos um programa junto das escolas secundárias com empresas das áreas

das tecnologias e com muitas engenheiras deste País, no sentido de explicarem o que é isso de ser

engenheira e de motivar as raparigas para esse tipo de carreiras, mas precisamos de mais medidas. Por isso,

no início da Legislatura, no contrato que assinámos com as instituições de ensino superior, estava lá essa

preocupação, a de todas as instituições de ensino superior terem medidas de combate a este tipo de

segregação profissional.

Também por isso, os instrumentos financeiros que o PRR tem nessa matéria procuram responder a esta

realidade. Por um lado, exigindo que cada um destes programas tenha uma perspetiva de género e se

proponha corrigir esta desigualdade e, por outro lado, tendo majorações nas medidas de apoio ao emprego

quando estivermos a falar de emprego do sexo sub-representado nestas áreas, sendo que no caso das

tecnologias é o das mulheres.

Como disse a Sr.ª Deputada, na desigualdade de género há dimensões de resposta imediata e dimensões

de resposta estrutural. Este Parlamento, ao longo da última Legislatura, aprovou um pacote legislativo muito

sólido que tem os instrumentos legais para podermos continuar este caminho. Falta agora concretizá-lo no dia

a dia, ter as políticas públicas que o implementem e ter, nas escolas, nas famílias e nas instituições de ensino

superior, as respostas para construir a igualdade nesta área.

Aplausos do PS.

Entretanto, reassumiu a presidência o Vice-Presidente António Filipe.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos dar início à segunda ronda de perguntas neste debate. O primeiro partido a interpelar a Sr.ª Ministra será o Bloco de Esquerda. Para esse efeito, tem a palavra a

Sr.ª Deputada Beatriz Gomes Dias.

A Sr.ª Beatriz Gomes Dias (BE): — Sr. Presidente, nesta segunda ronda vou começar por fazer uma pergunta relacionada com o Inquérito às Condições, Origens e Trajetórias da População Residente, que será

conduzido pelo Instituto Nacional de Estatística. Este inquérito surgiu da reivindicação do movimento social e

também do Bloco de Esquerda para que a recolha de dados étnico-raciais fosse incluída nos Censos 2021.

Tendo sido rejeitada esta opção, a qual era, em nossa opinião, a mais correta, o Governo avançou com este

inquérito e o orçamento necessário para a sua consecução está inscrito no Orçamento de 2021.

Contudo, as informações mais recentes, que resultam de uma entrevista que o Presidente do INE deu ao

Expresso, revelam que só no final deste ano, ou seja, no quarto trimestre, é que irá ser implementado um

estudo-piloto para poder aferir o modelo, a amostra e a metodologia a serem adotados neste inquérito, sendo

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que o Presidente do INE não se compromete com a realização do inquérito propriamente dito no próximo ano,

em 2022.

Tendo em conta que esta discussão começou em 2019, e estando em consulta pública, até 10 de maio, o

Plano Nacional de Combate ao Racismo e à Discriminação, pergunto-lhe, Sr.ª Ministra, quando vamos ter os

resultados deste inquérito. Não considera que era fundamental ter esta informação para poder ter políticas

públicas robustas que, efetivamente, corrigissem as desigualdades que resultam da discriminação étnico-

racial?

A este ritmo, com a lentidão com que este processo tem sido conduzido, ficamos apreensivos relativamente

à informação que irá estar disponível para apoiar a implementação deste plano, que é fundamental para a

correção de desigualdades, mas, também, para conhecer a real composição do nosso País. Essa informação

ainda não temos, essa fotografia falta-nos e é urgente completar esse quadro.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, muito obrigada pela sua questão. Como sabe, além de estar no Orçamento deste ano, nestes termos exatos de realização do piloto,

essa medida também faz parte do Plano Nacional de Combate ao Racismo e à Discriminação. O Governo

entende que é prioritário termos mais conhecimento nesta matéria e, por isso, está no plano de ação do INE.

Acontece, porém, como creio que sempre dissemos, que o ano de 2021 é muito atípico para as atividades

normais do Instituto Nacional de Estatística. É o ano da realização dos Censos e este ano isso é ainda mais

difícil. Realizar um recenseamento populacional e habitacional em plena pandemia traz desafios muito novos e

tem exigido muito esforço de todos os que trabalham no INE, pelo que gosto sempre de lhes agradecer.

O Inquérito às Condições, Origens e Trajetórias da População Residente é novo, precisa de ser testado e é

sempre assim com todos. Aliás, também houve um teste aos Censos, pois é o que faz com que seja possível

ter um inquérito melhor. Sr.ª Deputada, não lhe sei responder quanto a 2022, mas prometo que, da próxima

vez que aqui vier, trarei uma resposta sobre o momento concreto em que teremos a versão final. Porém,

parece-me importantíssimo que possamos passar ao teste-piloto, que nos vai trazer já algumas informações.

Além do piloto a esse inquérito, temos ainda o modo regular do inquérito ao emprego, de 2021, que é

precisamente dedicado ao tema «situação dos migrantes e seus descendentes no mercado de trabalho». É

um inquérito realizado por amostra, de oito em oito anos, e também ele nos trará informação muito relevante

nesta matéria. A recolha de dados iniciou-se em janeiro de 2021, decorre até 2022 e teremos dados sobre

este inquérito em março de 2022.

Creio que, brevemente, teremos muito mais informação do que a que temos hoje e concordo com a Sr.ª

Deputada quando diz que essa informação é da maior relevância para a definição de políticas públicas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para fazer perguntas, tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Diana Santos, a quem saúdo por esta sua primeira intervenção nesta Assembleia. Receba as nossas saudações,

Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Diana Santos (BE): — Muito obrigada, Sr. Presidente. Sr.ª Ministra, numa altura em que estamos prestes a implementar o Plano de Recuperação e Resiliência e

em que, finalmente, vai sair a estratégia para a deficiência, onde é também urgente desenhar novas políticas,

faço questão de trazer para este debate a importância de um combate mais assertivo e eficaz contra a

discriminação das pessoas com deficiência — um dos grupos sectoriais mais prejudicados estruturalmente

com esta pandemia.

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Tal discriminação é transversal a um dos grupos mais oprimidos da sociedade e assume, também, duplas e

triplas dimensões, quando se combinam fundamentos interseccionais como o género, a etnia, a religião e a

orientação sexual.

Não nos parece de todo o mais apropriado esta discussão estar confinada a uma secretaria de Estado,

quando estamos perante discriminações transversais que carecem de efetivas políticas de igualdade e é

nessa convergência que devem ser assumidas, não fazendo sentido acantonar respostas. É com isso que nos

pauta a Convenção para os Direitos das Pessoas com Deficiência e é isso que se espera de Estados

democráticos em 2021.

Estamos a falar de questões tão transversais como a violência e crimes de ódio contra pessoas com

deficiência, que também se agravaram com a pandemia. Todos sabemos que acontecem, mas estão

completamente ocultos no nosso País. É urgente acabar com esta invisibilidade, que deve ser denunciada e,

nas ocorrências, devem ser punidos exemplarmente os culpados. Bem sabemos que não acontece porque

não existem estruturas e respostas no terreno adequadas e generalizadas que permitam acolher estas vítimas

em segurança, com conforto e dignidade. É urgente pensar numa resposta.

Estamos também a falar da Lei n.º 4/2019, que estabelece o sistema de quotas de emprego para pessoas

com deficiência, com um grau de incapacidade igual ou superior a 60%, que está a ser bastante útil, mas que,

não havendo mecanismo de monitorização, não protege nenhuma pessoa com deficiência de concursos

falaciosos e deturpados que abrem vagas mínimas de cada vez, por forma a não terem quotas a cumprir.

Estamos a falar da questão do acesso aos transportes públicos. Se nos focarmos na região da Grande

Lisboa, excecionalmente, ainda existem alguns transportes públicos acessíveis a pessoas com mobilidade

reduzida, no entanto, qualquer cidadão que adquira o seu passe não tem qualquer desconto e as

possibilidades de deslocação são muito resumidas porque a oferta é bastante escassa.

As empresas podem continuar a registar neste momento veículos e frotas que sejam inacessíveis,

independentemente do ano de fabrico dos próprios equipamentos, sejam eles urbanos ou de longo curso, e as

pessoas com deficiência continuam a ser prejudicadas no seu tempo e no seu livre arbítrio ao terem de

obedecer a marcação antecipada para, por exemplo, a circulação em comboios ou a confirmação de utilização

de elevadores, de estações ferroviárias, etc.

A Lei n.º 46/2006, que, idilicamente, proibiria e puniria a discriminação em relação à deficiência e risco

agravado de saúde, não está a ter impacto. Há dados, por exemplo, do INR (Instituto Nacional para a

Reabilitação), de 2019, que dão conta de um total de 1076 queixas apresentadas ao abrigo dessa lei. E,

dessas, apenas uma queixa culminou com a aplicação de coima, sendo considerada um processo de

contraordenação. Mais de 93 queixas foram arquivadas por falta de prova.

Pergunto: tendo em conta que estes dados são tão dissuasores para as pessoas com deficiência e que

elas não estão a acreditar no cumprimento desta lei, o que é que o Governo pondera fazer? Tem algum

planeamento para motivar as pessoas a conseguirem, concretamente, sentir-se protegidas?

Por fim, queria deixar uma referência aos Censos 2021. É de reforçar positivamente o enquadramento no

modelo social da deficiência e das questões levantadas, para aferir as diferentes limitações ou dificuldades

físicas e cognitivas dos cidadãos com deficiência. Este facto permite não ser excludente de pessoas que,

pelos mais variados motivos, não tenham a sua deficiência validada e quantificada em atestado multiúsos. Isso

é muito benéfico. É de lamentar, no entanto, que todas as perguntas que pretendem aferir esta condição

peçam aos cidadãos e às cidadãs que se refiram, facultativamente, aos seus problemas de saúde,

evidenciando, novamente, o modelo médico ainda tão enraizado na nossa cultura. Nem todas as pessoas com

deficiência padecem de problemas de saúde associados e, por isso, acreditamos que esta situação deveria

ser revista.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para responder, a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, queria saudá-la porque é a primeira vez que tenho a oportunidade de responder a perguntas colocadas por si.

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Algumas das perguntas que a Sr.ª Deputada colocou não são da minha área. Vou procurar, ainda assim,

responder a uma parte das suas questões, que são, de facto, relacionadas com um dos temas que nos

preocupa, que é o cruzamento da interseccionalidade das desigualdades.

Em primeiro lugar, queria dizer que temos duas respostas, na área da deficiência doméstica,

especializadas nesta matéria, sendo que uma é na área das pessoas com deficiências físicas e outra é na

área da saúde mental. E temos, no pacote de formação na área de violência doméstica, a que já fiz várias

vezes referência, um módulo especificamente dirigido a este tipo de violência para que todos os que trabalham

na rede nacional de combate à violência doméstica e todos os que trabalham nesta área possam ter formação

específica nesta matéria. Esse é sempre um elemento fundamental da melhoria da nossa capacidade de

resposta.

Em segundo lugar, queria dizer-lhe que, como sabe, o Plano de Recuperação e Resiliência, na dimensão

das vulnerabilidades sociais, também tem previstas duas medidas na área da deficiência. Uma diz respeito às

respostas e aos equipamentos sociais — tem prevista uma melhoria da nossa capacidade de resposta do

ponto de vista do território e de alguma especialização — e a outra diz respeito às acessibilidades, em que

está prevista uma verba significativa.

Finalmente, queria dizer-lhe que, precisamente para responder às discriminações múltiplas e à

interseccionalidade que a Sr.ª Deputada referiu, temos neste momento um concurso aberto para um livro

branco sobre esse tema, para procurarmos interligar as diferentes respostas na área da igualdade e das

discriminações, uma vez que precisam, verdadeiramente, dessa interligação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Vamos passar às perguntas do Partido Socialista. Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Aragão.

O Sr. Bruno Aragão (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, permitam-me que recupere para Plenário, pela importância que nos parece que tem, um dos assuntos que aflorámos na

última audição regimental da Sr.ª Ministra.

As fundações, públicas ou privadas, desempenham uma missão própria que, por isso mesmo,

reconhecemos numa lei-quadro específica. Essa missão, pela sua natureza social e pelo seu compromisso

com a comunidade, alicerça-se na assunção coletiva de um estatuto especial que devemos aperfeiçoar.

Do registo nacional de fundações, que entrou em vigor em 1 de janeiro de 2020, constam mais de 800

fundações, algumas das quais com estatuto de utilidade pública.

Da cultura à investigação, da educação ao desporto, do apoio humanitário à assistência a vítimas, o

trabalho destas fundações é essencial na perspetiva comunitária e solidária que temos da sociedade e,

sobretudo, como resultado da visão filantrópica dos seus fundadores ou instituidores.

O atual regime tem vindo a ser melhorado ao longo dos anos, reforçando sempre a perceção pública da

natureza destas instituições. Mas é conhecida a intenção do Governo de reforçar os poderes de fiscalização

das fundações privadas, aproximando-os ao regime que já existe para as fundações públicas.

A atual lei já prevê três formas possíveis de extinção de fundações em três circunstâncias específicas. No

entanto, não existem mecanismos que permitam uma fiscalização efetiva dessas circunstâncias, nem

mecanismos que permitam perceber se existem efetivamente motivos para intervir, por exemplo, declarando o

seu fim. Na prática, há um quadro legal que prevê essas situações, mas, depois, há lacunas que não

permitem, de facto, a sua efetivação.

A minha questão, Sr.ª Ministra, é muito concreta: como é que o Governo pretende assegurar um exercício

efetivo dos poderes de fiscalização sobre estas fundações respeitando a sua autonomia enquanto pessoas

coletivas de direito privado?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para responder ao Sr. Deputado, o Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, André Caldas.

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O Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros (André Moz Caldas): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Bruno Aragão, em primeiro lugar, gostaria de saudá-lo pelo

interesse continuado nestas matérias.

O Programa do XXII Governo valoriza precisamente essa dimensão filantrópica e os fins sociais deste tipo

de entidades, e isso implica que implementemos políticas públicas para combater um certo estigma que

acabou por se abater sobre algumas entidades deste tipo.

Portanto, além de uma certa flexibilização das suas ferramentas de gestão, parece fundamental clarificar o

regime de fiscalização, muito em particular o regime de fiscalização pela entidade competente para o

reconhecimento daquelas fundações que se hajam desviado dos fins para que foram reconhecidas.

Tal permitirá credibilizar todo o setor fundacional e valorizará o seu trabalho, associando-se a uma outra

iniciativa que este Parlamento já aprovou na semana passada, a Lei-Quadro do Estatuto de Utilidade Pública,

que permitiu uma fortíssima consolidação legislativa, uma forte simplificação administrativa dos processos de

atribuição desse estatuto, mas também uma credibilização intertemporal do regime, dotando a entidade

competente para essa atribuição dos mecanismos de que necessita para verificar se, ao longo do tempo, estas

entidades mantêm os requisitos para os quais originariamente viram o seu estatuto de utilidade pública

reconhecido.

Isto representa um pacote de iniciativas que permitirá solidificar a perceção pública sobre a importância

destas entidades e, com isso, afastar todas as nuvens negras que, no passado, ensombraram a sua atuação,

permitindo, de uma forma definitiva, valorizar a sua importância social, que muitas vezes é complementar ao

próprio Estado na sua ação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para formular perguntas, a Sr.ª Deputada Telma Guerreiro.

A Sr.ª Telma Guerreiro (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, cumprimento a Sr.ª Ministra e a sua equipa.

Começo por mencionar três factos. Primeiro facto: Portugal tem das melhores políticas de integração de

migrantes — deve-se a Governos socialistas. Segundo facto: Portugal está entre os países com melhores

medidas de proteção aos migrantes durante a pandemia — deve-se a este Governo socialista. Terceiro facto:

estas políticas e as oportunidades de emprego trazem ao distrito de Beja muitos migrantes.

Depois dos factos, as perguntas.

Nesta pandemia foi possível democratizar o acesso à saúde para todos os migrantes, independentemente

da fase de regularização em que se encontram. Pergunto: esta medida veio para ficar?

Sendo a vacinação à COVID-19 considerada um meio de proteção da comunidade, peço que nos

esclareça: como irá funcionar a vacinação para os migrantes sem número de utente?

Tem ficado claro, desde que foi decretado que Odemira regredia no desconfinamento, deixando para trás,

injustamente, toda uma comunidade e economia local, que a equação está errada. A população migrante

flutuante conta para o numerador da equação, mas tem de passar a contar, também, para o denominador da

mesma equação. Está o Governo disponível para a ajustar?

Assinalo, também, que Aljezur já tem incidência de casos vindos de Odemira, pois o vírus não conhece as

regiões administrativas. Nesta fase, em que apesar de ainda estarmos no túnel, já vemos uma luz ao fundo do

mesmo, não fará sentido juntar à equação-base de todos os concelhos o esforço comum e o seu contexto,

considerando assim como indicadores o índice de testagem, a imunização, a carga no SNS e a densidade

populacional? Por tudo isto, não fará sentido que as próximas medidas sejam mais proporcionais a cada

contexto, a cada território?

Sr.ª Ministra, sei que poderá estar a pensar: «A Sr.ª Deputada traz um conjunto de questões que não são

para mim.» Mas são, Sr.ª Ministra, porque aquilo de que lhe falo, e que muito nos preocupa, é a

vulnerabilidade das relações — das relações entre territórios, das relações entre setores económicos, das

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relações entre os locais e os migrantes. Não podemos colocar em causa todo o trabalho das entidades locais,

das autarquias e do Governo em prol da integração e da inclusão.

É este trabalho que faz com que os búlgaros, os ucranianos, os indianos, os nepaleses passem a ser a

Gergana, o Volodimir, o Harpreet Singh, a Shova Gurung, a Efson, que é das melhores amigas da minha filha

Olívia.

Aquilo de que lhe falo, Sr.ª Ministra, é da necessária defesa, sem intransigências, dos direitos humanos, da

democracia e do Estado de direito, para os quais o Governo socialista e este Grupo Parlamentar não precisam

de pedir meças, mas precisam de continuar numa posição de defesa desses direitos, daqueles de que

também a Sr.ª Ministra comunga.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para responder, a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, muito obrigada pela sua questão, que é, obviamente, da minha responsabilidade responder, por muitos motivos, desde logo porque

tutelo, neste Governo, a área transversal das desigualdades, porque tenho a pasta da integração e das

migrações e também porque, desde que sou Ministra, tenho procurado apoiar o concelho de Odemira. Aliás,

não posso deixar de elogiar, neste momento mais difícil, todo o trabalho que lá é feito.

Recomendo a todas as Sr.as e Srs. Deputados que possam visitar a Escola de São Teotónio que o façam e

vejam a resposta que lá se dá, que é do melhor que tenho visto no que diz respeito a políticas de integração

neste País.

A resposta que temos procurado dar na área da saúde a todas as pessoas que vivem em Portugal,

independentemente do ponto de situação da sua regularização, tem em Odemira um exemplo extremo. Se não

tivéssemos garantido, com aquele despacho, que todos tinham acesso a um número de utente e a uma

resposta de saúde, tudo seria mais difícil. Se não tivéssemos garantido nesta Assembleia, quando foi

aprovada a Lei de Bases da Saúde, que esses apoios eram para todos e que a redução das taxas

moderadoras era para todos, independentemente da sua situação de regularização, estaríamos a responder a

esta pandemia em situações muito mais difíceis do que estamos.

A Sr.ª Deputada faz-me perguntas a propósito dos indicadores que foram selecionados. Temos de

compreender que estamos a utilizar indicadores para a definição das nossas medidas, que são indicadores

que semanalmente o País reporta ao Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças. Portanto, há

aqui um equilíbrio nos indicadores usados oficialmente e naqueles que são usados para a nossa tomada de

decisão, ainda que, como sabe, na resolução do Conselho de Ministros também esteja previsto que seja tido

em conta o número de testes, a positividade dos testes e a capacidade de resposta do SNS.

Como a Sr.ª Deputada disse, a situação de Odemira é hoje melhor do que era há uma semana. Vemos

uma situação decrescente do número de casos, o que também tem a ver com uma resposta focada que temos

procurado dar, com o reforço das equipas de saúde, das equipas da ACT, das equipas da segurança social e

das equipas do Alto Comissariado para as Migrações, procurando apoiar naquilo que é mais importante, para

lá das fórmulas e dos indicadores, e garantindo que cada um que está doente não tem contacto com mais

ninguém e pode fazer o seu isolamento em situação digna, em situação de ter acesso à alimentação e aos

apoios sociais.

É isso que, numa lógica de proximidade e com equipas constituídas para o efeito, estamos a procurar fazer

e que continuaremos a fazer, com o inexcedível apoio da Câmara Municipal de Odemira.

Vou, agora, dar-lhe uma resposta muito rápida a uma das questões que colocou. Ao mesmo tempo que

estes despachos permitiram o acesso ao SNS, também estamos a executar as decisões que constam do

Plano Estratégico para as Migrações, isto é, de garantir que todos têm número de utente e que ele faz parte

das autorizações de residência. Por isso, se há uma dimensão de urgência, também há uma dimensão de

resposta estrutural, que é para manter e para aprofundar.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Romualda Fernandes.

A Sr.ª Romualda Fernandes (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, a questão que aqui trago, Sr.ª Ministra, prende-se com o Plano

Nacional de Combate ao Racismo e à Discriminação para o período de 2021-2025, recentemente colocado em

consulta pública, até 10 de maio, o que, desde já, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista saúda, tratando-

se de uma medida do Programa do Governo com vista a concretizar o direito à igualdade e à não

discriminação, um alicerce da democracia portuguesa, constitucionalmente consagrado.

Este plano reflete a determinação do Governo na valorização plena da diversidade que integra a sociedade

portuguesa e que a enriquece e em combater o racismo, a discriminação racial, a xenofobia e a intolerância

associada a estes fenómenos, em linha com o Novo Plano de Ação da União Europeia contra o Racismo

2020-2025.

É uma estratégia nacional assente numa visão de comunidade que procura a inclusão, que rejeita a

exclusão social, que é transversal, intersectorial e interseccional, e que, embora com ênfase na prevenção e

no combate ao racismo e à discriminação, não descura também o combate a todas as formas de

desigualdades e a todas as situações de exclusão social, em linha com políticas de promoção da inclusão

social, de crianças e jovens de contextos socioeconómicos mais vulneráveis, no âmbito do Programa

Escolhas, em vigor desde 2001 e criado também por um Governo do Partido Socialista.

Só desta forma se consegue unir todas as vítimas da exclusão para, juntos, lutarmos contra o populismo,

os nacionalismos fechados e agressivos, que estimulam ódios e ressentimentos.

Saúdo ainda a auscultação da sociedade civil e atores relevantes, através do Grupo de Trabalho para a

Prevenção e o Combate ao Racismo e à Discriminação, durante a fase de preparação deste plano.

Pergunto-lhe, Sr.ª Ministra, se entre as diferentes áreas de intervenção que o plano preconiza há alguma

ou algumas que considere mais prioritárias e que possam alavancar as outras.

Por fim, pergunto-lhe se é expectável a aplicação deste plano ainda durante este ano.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade.

A Sr.ª Secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade (Rosa Monteiro): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Romualda Fernandes, relativamente ao processo de elaboração e produção deste documento,

agora em consulta pública, devo referir que já temos, ao dia de hoje, 40 contributos na plataforma

ConsultaLEX, o que muito nos agrada, pois o que queremos é um plano muito participado e discutido de forma

ampla. Como sabemos, esse documento resultou também de um processo muito participado, a partir de um

grupo de trabalho que trabalhou intensivamente desde novembro até à data de um primeiro relatório

preliminar. Contou também com a contribuição de um conjunto de áreas governativas centrais neste combate

que é também multidimensional.

Portanto, a nossa perspetiva é a de que ele seja aprovado ainda durante a nossa Presidência da União

Europeia, o que seria também simbólico.

Respondendo à sua segunda questão, devo dizer que há medidas que são de arranque imediato e,

portanto, serão tomadas ainda durante 2021.

As áreas fundamentais foram identificadas como 10 áreas, nomeadamente a governação, a informação e o

conhecimento. E aqui temos, como alicerce fundamental de uma transformação que é necessária no combate

à discriminação ético-racial e ao racismo, a formação e a capacitação de profissionais e também a produção,

hoje aqui já tão sublinhada, de informação, de conhecimento e de dados, como mecanismo fundamental para

a produção de políticas mais eficazes neste domínio.

Diria que a área da educação é também, ela mesma, estruturante em termos não só de conteúdos, mas

também do combate a fenómenos de segregação entre escolas e, dentro das próprias escolas, a dimensão do

ensino superior, respeitando sempre a autonomia das instituições do ensino superior, a dimensão do

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trabalho/emprego, onde existe ainda um conjunto de barreiras à igualdade neste domínio, e a dimensão

estruturante da habitação, que beneficiará grandemente deste verdadeiro pacote transformador, já aqui hoje

mencionado pela Sr.ª Ministra e previsto no Plano de Recuperação e Resiliência.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — O PS ainda dispõe de 24 segundos, mas presumo que já não pretenda utilizá-los.

Assim sendo, tem a palavra, pelo PSD, o Sr. Deputado Artur Soveral Andrade.

O Sr. Artur Soveral Andrade (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Na passada semana, Sr.ª Ministra, o PSD interpelou V. Ex.ª

sobre uma questão que quer manter na agenda, porque lhe atribui grande relevância, que é a dramática

questão demográfica, facto de que todos devemos estar recordados.

Mais um exemplo para acrescentar aos que demos na semana passada e que ilustra bem a gravidade da

situação tem a ver com a densidade populacional à escala municipal. As variações são, de facto, brutais: há

municípios com 13 habitantes por km2 e outros com 950 habitantes por km2, sendo que, ao nível das

freguesias, as diferenças ainda são maiores.

Sobre a situação presente já tratámos na semana passada, pelo que, para hoje, trago aqui algumas notas

sobre se, quanto ao futuro, podemos estar otimistas, ou se, pelo contrário, devemos estar bastante

preocupados.

De acordo com previsões respeitáveis, o País perderá, até 2050, pelo menos, 7% da população residente.

Quanto aos jovens, a perda será de 20% e a população com menos de 65 anos de idade diminuirá

aproximadamente 10%. Quanto às pessoas com mais de 90 anos, felizmente o aumento será de quase 200%

(creio que a percentagem será, salvo erro, de 186%).

Assim, com base no que dissemos na semana passada sobre o presente e o que acrescentamos hoje

sobre o futuro, o PSD, em complemento às questões que já colocou anteriormente, acrescenta mais algumas.

Em primeiro lugar, o que é que o Governo vai fazer para atenuar as diferenças entre as regiões, que a Sr.ª

Ministra, na semana passada, reconheceu existirem?

Em segundo lugar, pergunto: o Governo tem previstas ações para o interior, de maneira a que também o

interior possa beneficiar de eventuais saldos migratórios, de modo a atenuar assimetrias de povoamento?

Em terceiro lugar, o Governo reconhece que o nosso desequilíbrio demográfico contribui para acentuar as

desigualdades sociais? Esta pergunta é quase retórica, pois com certeza é afirmativa.

Em quarto lugar, o Governo, no âmbito do que estamos aqui a tratar, atribui alguma relevância aos

portugueses que estão a residir no estrangeiro? Estamos a falar de mais de 2,5 milhões de pessoas, pelo que

me parece que este fator também deve ser tido em conta.

Em quinto lugar, o Governo tem alguma avaliação, neste momento, sobre o impacto que a pandemia pode

ter no agravamento destas circunstâncias?

Em sexto lugar, quais são as medidas concretas que o Governo vai adotar para romper com este

definhamento populacional?

Finalmente, partindo do princípio de que essas medidas vão existir, qual é a calendarização das mesmas e

quais os resultados que o Governo prevê atingir?

Sr.ª Ministra, tenho por V. Ex.ª genuína estima, pelo que o que vou dizer a seguir é com todo o respeito.

Quando, há pouco, respondia ao Deputado Telmo Correia, fazendo referência a um anúncio, lembrei-me —

V. Ex.ª não se lembra, pois, felizmente, ainda é muito jovem — de um anúncio icónico, da Regisconta. A voz

era do, apelidado de Very Nice, Fernando Girão, e naquele anúncio a Regisconta era «aquela máquina».

Acontece que todos queriam ser, segundo a Regisconta, «homens Regisconta», e a Regisconta teve um fim

infeliz.

Ora, como é óbvio, isto nada tem a ver com V. Ex.ª — é o meu estilo, espero que não leve a mal. O que

queremos dizer com isto é que, oxalá os anúncios que venha a fazer não tenham o desfecho que teve a

Regisconta.

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Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Artur Soveral Andrade, agradeço as suas questões.

Estando nós em ano de recenseamento, teremos dados, ainda neste ano, que nos darão um retrato mais

fiel do que o País é hoje nas dimensões de coesão territorial e nas questões demográficas relacionadas com

os territórios.

Sabemos que não virão boas notícias no sentido de que todos reconhecemos que temos um problema

demográfico e que temos um problema demográfico que acentua as desigualdades territoriais.

Na semana passada, quando me colocaram este conjunto de questões a propósito de demografia, respondi

o mesmo que lhe vou responder a si e, depois, desenvolverei as questões concretas.

Nós temos procurado, desde 2015, desenhar políticas públicas que promovam uma resposta efetiva ao

desafio demográfico. Que políticas são essas? São políticas de reforço dos rendimentos, são políticas de

reforço dos apoios sociais, são políticas de reforço da nossa capacidade de acolhimento de migrantes, são

políticas que pretendem, no fundo, que se viva melhor em Portugal, porque essa é sempre a melhor condição

para que possamos enfrentar os desafios demográficos.

É por isso que, nos períodos de crise, temos sempre mais severas situações demográficas do que temos

fora dos períodos de crise. E os números que na altura dei, e que agora vou repetir, mostram que temos tido

algum sucesso nessas políticas, porque temos um saldo migratório positivo desde 2017, coisa que já não

acontecia há muitos anos, porque há uma ligeira melhoria nos indicadores de fecundidade, ou seja, as

pessoas estão, hoje, mais próximas de ter os filhos que desejam ter, que é aquilo que nos cabe garantir. E

acreditamos que é combatendo a precariedade, que é tendo respostas no domínio da habitação, que é

reforçando os apoios sociais, que é reforçando a capacidade de resposta nas creches e no ensino pré-escolar

que podemos responder ao desafio demográfico.

Foi nesse sentido que tomámos muitas medidas ao longo destes anos: aumentando o abono de família até

aos 6 anos; aumentando a dedução por número de filhos, corrigindo aquele tempo em que as deduções

variavam conforme a riqueza dos pais; promovendo as renovações automáticas das autorizações de

residência; respondendo no plano dos cuidados continuados; respondendo com mais investimento nos

equipamentos sociais e com a gratuitidade das creches nos 1.º e 2.º escalões.

No plano das medidas relacionadas com o território, temos desenvolvido múltiplas medidas de apoio para

que as pessoas possam escolher viver no interior.

Ainda ontem — acho que foi ontem —, foi notícia, por exemplo, um conjunto de centros que possam

possibilitar o trabalho à distância, em teletrabalho, para que mais pessoas possam viver no interior, mesmo

fazendo o seu trabalho à distância.

Temos um programa de apoio à criação de emprego no interior, chamado +COESO Emprego, que dá

apoios muito significativos a essa localização. E respondemos procurando atrair para o País investimentos

significativos — o que ainda nesta semana fizemos, por exemplo, em Sines — que possam permitir que todas

as regiões do País sejam capazes de atrair populações. É assim que temos feito.

Todos sabemos que a resposta ao desafio demográfico é mais do que uma maratona, está muito para lá de

uma maratona. E o Governo entende que este desafio tem resposta na área das políticas de natalidade, mas

também tem uma resposta muito significativa na área das políticas das migrações. E Odemira — olhando para

a Sr.ª Deputada Telma Guerreiro — é um exemplo de um crescimento populacional por via das migrações.

Também traz desafios. Cá estamos para lhes responder.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Carla Borges.

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A Sr.ª Carla Borges (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr.ª Ministra, permita-me que lhe apresente um cenário, que já vinha de antes da pandemia, mas que a pandemia agravou,

baseado no acompanhamento que fazemos no terreno junto das várias entidades intervenientes em matéria

de violência doméstica.

Infelizmente, como todos sabemos, a violência doméstica é brutalmente silenciosa, o que impede não só a

identificação como também uma atuação musculada desde o seu início. E, por vezes, antes dos sinais de

violência doméstica, outros sobressaem, como é o caso de quadros depressivos ou, no caso das crianças, de

défice de aprendizagem ou de comportamentos de risco sinalizados em contexto escolar pelas equipas de

intervenção precoce ou então pelas Comissões de Proteção de Crianças e Jovens.

Em qualquer dos casos, ocorre a criação de um processo individual, por cada entidade, respeitante à

situação diagnosticada. Mas, como sabemos, a violência doméstica é, frequentemente, um ato contínuo, onde

a saúde mental das vítimas se deteriora de dia para dia, dando origem a patologias mentais graves. As vítimas

passam a ser acompanhadas pelas unidades de saúde mental ou de pedopsiquiatria e outras entidades

passam a estar envolvidas.

Mas, um dia, a violência doméstica ganha voz e a situação é sinalizada. E na defesa e salvaguarda das

vítimas, outras instituições são chamadas a intervir, juntando-se às anteriores, como é o caso da GNR

(Guarda Nacional Republicana), do Ministério Público ou de instituições de apoio à vítima, cada uma delas

fazendo o acompanhamento no domínio da sua tutela.

Mas, por vezes, a situação agrava-se ainda mais. As vítimas são obrigadas a sair de casa e são acolhidas

numa casa-abrigo, deixando tudo para trás, ou seja, família, trabalho, escola, amigos. As suas vidas são

interrompidas.

Por força destas circunstâncias, para trás ficam também, por vezes, as instituições que, até à altura, as

acompanhavam, como também os seus processos individuais, o que por vezes também se verifica quando as

vítimas têm de sair da casa onde inicialmente foram acolhidas, deslocando-se para outra casa, bem mais

longe.

Neste contexto de enorme vulnerabilidade, o conhecimento do historial clínico ou educativo das vítimas

assume um papel determinante para o sucesso da intervenção, o que nem sempre acontece. E surge a

pergunta: porquê?

Certamente que não é por falta de empenho e espírito de missão de todos os profissionais envolvidos, cuja

dedicação e sentido de missão no acompanhamento das vítimas de violência doméstica e na proteção das

crianças e jovens em risco registamos de forma sublinhada.

A questão que se coloca é outra, é sobre a urgente necessidade de agilizar procedimentos e respostas a

um nível interministerial, possibilitando uma intervenção intersectorial, devendo haver uma clara orientação

sobre esta matéria, salvaguardando a imperiosa necessidade da proteção das vítimas no que diz respeito à

sua identidade ou outros dados pessoais, sem beliscar o código ético e deontológico dos vários profissionais,

promovendo-se o devido acompanhamento e conhecimento do historial e percurso das vítimas nas suas mais

variadas vertentes, principalmente no domínio da saúde mental e da educação, de forma a garantir uma

intervenção eficaz.

Não obstante aquilo a que a Sr.ª Ministra fez referência, por várias vezes, nesta Assembleia, acerca do

plano de formação, permita-me que diga, Sr.ª Ministra, que aquilo de que falamos vai muito para além disto,

no domínio do relacionamento interministerial que é necessário.

Por isso, Sr.ª Ministra, tendo em conta não só as competências do seu Ministério nesta matéria, mas

também a sua função, enquanto Ministra do Estado e da Presidência, e a sua missão de coordenar e

acompanhar a execução de medidas de caráter interministerial, perante a necessidade, evidenciada por todos

os atores, de que existem elementos que, pela sua natureza, necessitam ser do conhecimento dos técnicos

que acompanham as vítimas, de forma a garantir o sucesso das intervenções, e perante o facto de a

circulação dessas informações não fluir entre as várias instituições, pergunto-lhe, Sr.ª Ministra: quais as

medidas que entende serem necessárias implementar, de forma a corrigir e a ultrapassar estas entropias do

sistema?

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para responder, a Sr.ª Secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade.

A Sr.ª Secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, de facto não temos feito outra coisa que não seja aperfeiçoar o sistema e evitar, precisamente, as lacunas existentes

na relação entre as várias partes que integram este sistema.

Aliás, são já fruto disso um conjunto de novos instrumentos, desde o Manual de Atuação Funcional a

adotar pelos OPC (Órgãos de Polícia Criminal) nas 72 horas subsequentes à apresentação de denúncia por

maus-tratos cometidos em contexto de violência doméstica, que foi produzido de uma forma articulada,

integrando vários Ministérios, a própria PGR (Procuradoria-Geral da República), e que está aí para a formação

que vamos avançar já neste mês.

Também no domínio de um conjunto de instrumentos, e porque referiu a questão das crianças e da

intervenção necessária no domínio das crianças, lançámos um guia para profissionais que intervêm com

crianças e jovens vítimas de violência, que foi, também ele, produzido com a participação de todos estes

Ministérios e também da PGR.

E estão a ser produzidas as orientações específicas agora para todos os setores que intervêm neste

domínio, reforçando também uma intervenção que não existia e que consideramos necessária, com a

constituição destas respostas de apoio psicoterapêutico especializado para as crianças que estão na nossa

rede.

A partir do momento em que aconteceu a pandemia, desde março do ano passado, passámos a fazer

reuniões regulares com todas as estruturas — todas as estruturas! — que são 244, porque conseguimos

ampliar a cobertura nacional de respostas de atendimento. E, neste momento, temos 95% do território

continental coberto de respostas especializadas, que trabalham em redes locais.

Apostámos também na estratégia de territorialização de respostas, com que nos comprometemos através

de protocolos de territorialização, que juntam várias áreas setoriais e também vários parceiros locais, desde as

forças de segurança às equipas das associações e das ONG (organizações não governamentais),

especializadas na intervenção em violência doméstica. Esse é o trabalho que estamos a fazer.

Mais, estamos a reforçar a capacidade de gestão da própria rede, o que é um passo decisivo, com a

criação de um sistema de gestão da informação de toda a rede. Criámos uma plataforma de gestão de vagas,

que não existia, passou a existir em outubro. E só a existência desta plataforma de gestão de vagas reduz o

tempo de procura e melhora — melhora! — a atuação e o desempenho e facilita o trabalho das muitas equipas

que, durante a pandemia, se mantiveram de portas abertas, a acompanhar e a acolher as vítimas de violência

doméstica.

É isso que estamos a fazer e que continuaremos a fazer.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Alma Rivera.

A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, os riscos e retrocessos na igualdade que resultam da COVID-19 não são por acaso. Já fizemos, várias vezes, debates sobre isso mesmo. Desde logo,

as mulheres são a esmagadora maioria das trabalhadoras na linha da frente na saúde, nos cuidados em geral

e também representam muitos dos serviços e do comércio essencial, que nunca pararam, por exemplo.

Depois, porque sendo mais atingidas pela precariedade, por vínculos frágeis e não correspondentes às

funções exercidas, por situações de trabalho informal, pelos salários mais baixos, por horários desregulados,

entre outras situações, são mais facilmente descartáveis. E foram dispensadas, despedidas.

O confinamento e o teletrabalho, que recaíram também mais sobre elas, fizeram com que existisse uma

sobreposição de papéis. As mulheres tiveram de trabalhar, de cuidar, de acompanhar a escola dos filhos, de

fazer as tarefas domésticas, o que contribuiu para um retrocesso na partilha equilibrada dessas tarefas e no

caminho histórico de libertação da mulher.

Mas há ainda um outro fator que nos preocupa muito e que já hoje aqui foi referido. É que, por todos estes

motivos e mais alguns, a vulnerabilidade das mulheres a situações de violência aumenta dramaticamente — o

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aumento de tensões no seio familiar que o confinamento e a situação económica significaram para as vítimas

de violência doméstica significa estarem confinadas com os agressores. E sendo também mais difícil o pedido

de ajuda, a degradação da situação económica e social funciona como um preventivo adicional à rutura.

Sobre a violência doméstica já aqui se descreveu um pouco da situação e se falou de alguns dos

instrumentos utilizados, mas há questões em que gostaríamos de insistir, não por teimosia, mas porque são

mesmo cruciais para se ter uma boa resposta neste âmbito.

Como também já tivemos oportunidade de dizer, em 2020 o PCP fez aprovar no Orçamento do Estado um

balanço da situação, uma fotografia: para além de mais formação dos diversos intervenientes, ficou definido

que seria feito um levantamento de necessidades na esfera pública a nível de meios humanos em cada um

dos diversos serviços para que se percebesse como é que está a situação: como está a situação nos centros

de saúde e hospitais; como estão as equipas de prevenção da violência em adultos, quais as dificuldades com

que se confrontam e quantas estão operacionais; se têm profissionais dedicados exclusivamente a esta frente.

E nas escolas e nas universidades o que falta? A educação sexual, parte essencial da prevenção da

violência no namoro, por exemplo, que entraves encontra?

E nas forças de segurança? Existem 144 salas de atendimento e apoio às vítimas e 641 efetivos

preparados para estas situações. É este o retrato atualizado da situação? É preciso mais para haver trabalho

direcionado? Que balanço se pode, então, fazer?

Mesmo relativamente ao Ministério Público, aos tribunais ou à segurança social, quantas equipas

multidisciplinares de apoio nos tribunais existem, de facto, na rede? Que respostas faltam e que profissionais

estão em falta nessas diferentes respostas?

Era isso que era preciso saber e que o PCP considerou fundamental, continuando a insistir para que se

cumpra. É preciso perceber, em concreto, no terreno, como podemos melhorar a nossa resposta.

Como sabemos, os serviços públicos foram depauperados ao longo de anos, sendo essencial que agora se

cubram essas insuficiências.

Queria dizer ainda que a igualdade não é um desígnio abstrato nem pode ser apenas simbólico, estar no

campo da representação simbólica, tem de ser literal, tem de se começar pela base e verificar-se em cada

vida, em cada trabalho, em cada casa. E sempre que falham os apoios sociais, sempre que falham os direitos,

sempre que se falha no acesso à educação, à saúde e à saúde sexual e reprodutiva, sempre que se falha na

concretização de condições dignas de acesso à cultura, por exemplo, estamos a correr riscos de graves

retrocessos.

Por isso mesmo, não podemos esquecer que continua a haver desrespeito pelos direitos de maternidade,

pelo salário igual para trabalho igual, pela objetiva necessidade de regulação dos horários. E isso só é assim

porque existe uma total impunidade e a ACT não tem, objetivamente, dado resposta às necessidades. Há

atropelos tremendos todos os dias, à vista de todos e à vista do Governo, e não há consequências.

Milhares de mulheres estão a sentir entraves reais, com consequências diretas na igualdade, mas quanto a

isso não existe intervenção e mantêm-se os abusos e as arbitrariedades. Para mais, é a própria Administração

Pública que mantém trabalhadoras na precariedade, como acontece em cantinas do Estado e em setores

como a limpeza ao serviço das instituições públicas, tal como está a estimular o regresso a casa de

funcionárias públicas, com o teletrabalho.

No mesmo sentido e porque a igualdade só é efetiva se corresponder a concretas condições para o bem-

estar e igualdade de oportunidades, o que só se consegue com o desenvolvimento e o combate à pobreza e à

exploração, quero deixar ainda uma consideração sobre o Plano Nacional de Combate ao Racismo e à

Discriminação 2021-2025, que aponta diversos aspetos fundamentais no emprego, na habitação, no acesso à

saúde e à ação social e no desporto.

Aborda-se a habitação, muito bem, sendo uma dimensão imprescindível, mas falta um compromisso

concreto, como também já tivemos oportunidade de falar. Nessa, como noutras matérias, falta esse

compromisso e nesta frente resta saber se vamos ter habitação pública de qualidade, sem lógicas de

segregação, como, quanto e quando. Deixamos essa questão.

Da mesma forma, pretende-se atingir o respeito pelos direitos laborais de todos, mas não é com códigos de

conduta e com ferramentas que isto lá vai. Não é por explicar às empresas de trabalho temporário que a

exploração é má que isso vai deixar de ser uma prática, quando é, precisamente, o seu ramo de atividade.

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O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Por isso, importa lembrar que, para quem é vítima de racismo e de discriminação, não é grande alento um plano de 21 páginas se esse plano não significar um encarar de causas

profundas da discriminação, intervindo nelas — depois, não é fazer só a identificação, é encontrar solução

para os problemas diários das pessoas.

Por isso, questionamos que compromissos assume o Governo para com todos aqueles que precisam de

respostas nas suas vidas.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, queria agradecer-lhe, uma vez mais, as questões que me coloca e, como noutras conversas que temos tido, queria distinguir dois planos.

O primeiro plano é o de não reconhecer o diagnóstico que faz sobre a falta de reforço da capacidade de

resposta do setor público. Temos respondido, reforçando, ao longo dos últimos anos, os profissionais em

várias áreas: os profissionais de saúde são hoje mais 10 000 do que eram no ano passado; na ACT, como a

Sr.ª Deputada sabe, temos hoje 421 inspetores, estando em processo o aumento do quadro para 495; os

trabalhadores das escolas aumentaram, de acordo com aquilo que estava acordado no Orçamento do Estado.

Também na dimensão da resposta de que aqui tratámos tem havido um reforço, por exemplo, no recrutamento

de psicólogos, para o apoio psicológico, ou de mediadores, para os gabinetes de apoio à vítima.

Como sabe, neste momento, temos em curso uma avaliação nacional do apoio à vítima de que resultará

um quadro mais claro sobre os recursos e as respostas que existem e, a partir daqui, também poderemos

trabalhar na sua melhoria.

Esse acompanhamento pretende, precisamente, aperfeiçoar o funcionamento desta rede, o que está a ser

feito com o Ministério do Trabalho, uma vez que muitas destas respostas têm dupla tutela e o nosso objetivo é

o de poder melhorar a capacidade de resposta numa rede que — não queria deixar de relembrar — tem

crescido muito significativamente, passando, de 2015 até agora, a abranger mais 88 concelhos, tendo desde

2015 mais respostas e mais vagas também.

Quanto ao segundo plano, o de combate ao racismo e à discriminação — do qual já falei aqui, mas queria

referi-lo novamente —, o nosso objetivo foi o de desenhar um conjunto de medidas políticas que permitissem

uma discussão pública alargada sobre o caminho que devemos seguir nesta matéria, se é aquele, se é outro

ou se precisa de correções.

Naturalmente, quando o Governo aprovar o plano na sua forma final, este terá as suas metas concretas e

um calendário específico para cada uma das medidas. Esse trabalho só se faz quando conhecemos todas as

medidas que estão em causa para dizer que compromissos podemos assumir, em que calendário, quando.

Como disse a Sr.ª Secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade, esperamos que até ao fim deste

primeiro semestre o plano traga metas concretas para cada uma das medidas que viermos a definir.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Vamos passar agora ao CDS-PP. Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, era exatamente sobre o Plano Nacional de Combate ao Racismo e à Discriminação que gostaria

de falar hoje. E, antes de haver mal-entendidos, gostava que partíssemos de um princípio comum, que é o da

igualdade como corolário da dignidade da pessoa humana, portanto, de rejeição da discriminação em razão de

ascendência, sexo, raça, território de origem, religião, convicções políticas, ideologias, instrução, condição

económica, condição social ou orientação sexual, tudo aquilo que diz a nossa Constituição, tudo aquilo que diz

o artigo 2.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Este é um ponto de partida.

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Também é um ponto de partida estes princípios não terem ainda tradução plena na realidade, nem do

mundo nem do nosso País. Mas também estamos a ter esta discussão sobre caminhos e soluções num tempo

muito concreto, num tempo social, num tempo político e num tempo até orgânico muito concreto, impulsionado

pelas redes sociais.

É muito fácil, neste tempo concreto, que este discurso se polarize em extremismos, em políticas

identitárias, sejam de esquerda, sejam de direita, e gostaria de dizer também que é um ponto de partida a

rejeição de qualquer uma dessas polarizações e que me coloco, neste debate, num espaço de moderação,

que tem necessariamente de existir sob pena de partirmos mais do que aquilo que somos capazes de

construir ou de fazer progredir.

Portanto, coloco-me neste espaço, como não podia deixar de ser, como democrata-cristã, à procura de vias

de impulso para os mais vulneráveis, os mais esquecidos, os menorizados, e foi com este olhar que analisei o

plano que aqui está em consulta pública.

Dito isto, porque é importante fazer estes preâmbulos para que não haja mesmo mal-entendidos nas

conversas que estamos a ter, temo bem não compreender algumas propostas; em relação a outras, penso que

estão na fronteira ou têm alguns riscos a que vale a pena estarmos atentos.

Há algumas propostas que não compreendo por razões muito simples: por exemplo, na área da saúde,

porque me parecem generalistas e podiam estar neste plano — como, de resto, estão no Programa de

Governo — afetas a qualquer pessoa, no que diz respeito ao acesso aos cuidados de saúde primários, aos

cuidados integrados, à ação social escolar para todas as crianças que dela precisem.

Onde é que vejo riscos que me preocupam, por exemplo, na cultura? Como disponho de pouco tempo, vou

ter de escolher algumas medidas, mas isto merecia uma conversa mais alargada.

Dizia eu, relativamente à cultura, por exemplo, quando dizem «para valorizar os diplomas legislativos que

regulam o investimento do Estado no desenvolvimento das artes, no combate ao racismo e à xenofobia», qual

é o perigo que vejo aqui? É o risco de poder incentivar situações extremas absurdas, no meu entendimento —

posso estar errada —, como aquelas que aconteceram, por exemplo, em Inglaterra, no caso do museu de

Jane Austen, bastante noticiado cá em Portugal, em que os promotores entenderam criar um espaço

expositivo para mostrar que, apesar de Jane Austen ser abolicionista, contra a escravatura, portanto, ainda

assim tinha hábitos que estavam diretamente relacionados com o imperialismo, como, por exemplo, o

consumo de chá. Não quero ver este género de excessos a acontecer em Portugal, estimulados por

financiamentos públicos.

No ensino superior, a medida emblemática tem a ver com o contingente especial para alunos das escolas

TEIP (Programa Territórios Educativos de Intervenção Prioritária).

Gostava que se começasse a olhar bem para as escolas TEIP porque, se verificarmos, estas escolas, no

seu global, estão, de facto, a cumprir o seu papel, prometido no início, quer do ponto de vista dos resultados a

que chegam, quer do ponto de vista dos meios que têm e até dos graus de liberdade que têm.

Se olharmos para o último relatório de avaliação de 2018, vemos que o insucesso escolar nestas escolas é

maior nos anos finais do que nos iniciais. Ou seja, ao longo do percurso escolar acentua-se o insucesso

escolar destes alunos. Se calhar, valia a pena começarmos por um investimento aqui, ou por um olhar

diferente sobre estas escolas. Oferecer a estes alunos uma via de acesso ao ensino superior tem de ser feito

com cautela e é importante a escolha das palavras. Parece-me bem o contingente, mas rejeitaria quotas, por

exemplo, e critérios de mérito e não uma via verde de acesso.

E é muito importante que, a seguir, haja trabalho nas universidades para acompanhar estes alunos e que

não seja apenas um emblema, o de combate à discriminação, para depois nada ser feito para garantir que não

foi um logro, porque simplesmente os colocámos lá.

Para terminar, Sr. Presidente, com a sua tolerância, poderia falar também na educação. Preocupa-me

muito aquilo que aqui é dito sobre a imagem e a alteração dos currículos, na linha de um revisionismo histórico

potencial, para o qual o Sr. Presidente da República bem alertou aqui, no seu discurso do 25 de Abril e com o

qual não posso estar mais de acordo.

Portanto, diria: ação, sim, mas com cautelas, num espaço de moderação, na consistência dos valores e

distanciando-se de revisionismos históricos, fracionamentos identitários que nos subtraem e que, por isso,

mais nos desumanizam.

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O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência, tem a palavra para responder.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, agradeço a introdução que fez, mas espero que saiba que, no meu entender, não era necessária.

É evidente que a elaboração deste plano obriga a um conjunto de cautelas, porque a última coisa que o

Governo quer é que ele se transforme num aumentar da discriminação. Foi por isso que o desenhámos tal

como está, realçando bem quais são os seus princípios transversais, e é também por isso que procuramos

que a sua discussão pública seja o mais alargada possível, para que possamos recolher todos os contributos,

porque me parece ser a única maneira de ser bem sucedido e apropriado pelos portugueses.

Nunca vão ser todos, mas, quanto a mim, com as prioridades que estabelecemos, temos condições de

conseguir que uma maioria dos portugueses se reveja neste plano, que reconheça os problemas que ele

identifica e, concordando mais com umas e menos com outras, também com a generalidade das suas medidas

de ação.

É verdade que há aqui muitas medidas que poderiam estar em qualquer outro plano. Mais: há aqui

medidas que estão noutros planos e esse é um dos objetivos que o Governo teve e que está explicitado nos

ditos quatro princípios transversais. Pretendemos que este plano constitua parte de uma intervenção integrada

de combate às desigualdades, porque essas discriminações são formas extremas de desigualdades.

Por isso, há medidas que a Sr.ª Deputada aqui referiu que fazem parte da Estratégia Nacional de Combate

à Pobreza, fazem parte do Programa de Recuperação e Resiliência e fazem parte do 1.º Direito — Programa

de Apoio ao Acesso à Habitação.

Foi precisamente com esse espírito que construímos o programa e é por isso que me parece que algumas

das preocupações que a Sr.ª Deputada aqui transmitiu, embora sejam preocupações naturais que tenhamos,

não são riscos efetivos na concretização deste plano.

Este plano obedece a esta lógica de querermos combater todas as formas de discriminação, todas as

formas de desigualdade, incluindo aquelas que decorrem de determinados preconceitos relacionados com a

raça ou com a etnia.

É por isso mesmo que procuramos recuperar instrumentos de política que — concordo com a Sr.ª

Deputada — precisam de ser melhorados e, aliás, o investimento nesses programas também faz parte, por

exemplo, do Programa de Recuperação e Resiliência.

Aquilo que é certo é que, ao fim destes anos, temos identificado territórios, conhecemos as suas

características e sabemos que não temos sido capazes, em muitos casos — mesmo nos casos de pleno

sucesso escolar —, que as pessoas possam dar outro passo. É isso que aqui procuramos. Temos trabalhado

com o ensino superior e temos reações muito positivas do Conselho de Reitores e do Conselho Coordenador

dos Institutos Superiores Politécnicos.

Este contingente reproduz outros contingentes que já existem e, portanto, temos condições para fazer

aquilo que julgo que se pede num Plano de Combate ao Racismo e à Discriminação: garantir oportunidades às

pessoas e garantir que a mobilidade social possa acontecer. É isso que procuramos com as medidas que aqui

temos e se em alguma redação pudermos minorar riscos, cá estaremos para o fazer.

Aquilo que aqui temos são políticas de redução das desigualdades, de combate à discriminação, de

possibilidade de cada um se sentir bem no país que escolheu para viver. É isto que procuramos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Vamos agora passar ao PAN. Tem a palavra a Sr.ª Deputada Bebiana Cunha.

A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Sr. Presidente, cumprimento a Sr.ª Ministra e a sua equipa e gostaria de partir, desde já, para uma primeira pergunta.

A Sr.ª Ministra já hoje aqui falou muito de imigrantes e gostaria de saber qual a resposta da Sr.ª Ministra

àquilo que foi uma denúncia pública feita pela associação SOLIM — Solidariedade Imigrante, no passado dia

11 de abril, relativamente àquelas que são as condições de trabalho de muitos dos imigrantes, quer em Beja,

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quer em Ferreira do Alentejo, naquilo que é a agricultura intensiva, nomeadamente nos olivais e nos

amendoais.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado para a Integração e as Migrações, Cláudia Pereira.

A Sr.ª Secretária de Estado para a Integração e as Migrações (Cláudia Pereira): — Sr. Presidente, muito obrigada pela sua questão, Sr.ª Deputada, que incide sobre uma das nossas principais preocupações.

O nosso esforço tem sido sempre o de integrar nas medidas existentes do Governo as preocupações dos

imigrantes. Neste sentido, de facto, a maior parte da população que trabalha na agricultura é população

imigrante e, como disse, e a associação SOLIM tem vindo também a mostrá-lo, há medidas que precisam de

ser melhoradas.

Melhorámos bastante os cursos de língua portuguesa, com o Português Língua de Acolhimento, que irá

começar muito em breve. Abrimos um aviso de 2,2 milhões de euros. Entre as várias medidas há uma

bastante importante: é que a poderão frequentar os imigrantes que têm autorização de residência, bem como

aqueles que começaram já o processo e ainda não a têm ou os que têm o número de segurança social.

Portanto, assim poderemos abrir o leque de escolhas destes imigrantes e dar-lhes redes.

Em segundo lugar, estamos a trabalhar numa abordagem de proximidade com os municípios, entre os

quais Beja, mas também outros municípios no Alentejo e em todo o País, exatamente para haver um maior

envolvimento, bem como com as empresas, para a melhoria das condições.

Em terceiro lugar, os centros locais de apoio ao imigrante do Alto Comissariado para as Migrações são 116

no País, em Beja e também noutros locais, e têm feito um trabalho muito significativo a nível local.

Por exemplo, há centros locais de apoio ao imigrante que vão com os próprios imigrantes que não têm

transporte às delegações regionais, informam-nos sobre as questões da habitação, vão com eles arrendar a

casa. É uma abordagem no local bastante importante.

Quero ainda referir que, com os Srs. Autarcas, em especial com o de Beja, temos trabalhado na estratégia

local de habitação, que poderá melhorar muito tanto a nível de aquisição de habitação como de arrendamento

seguro de habitação para os imigrantes.

Por último, o próprio Alto Comissariado para as Migrações irá descentralizar os seus serviços para Beja e

assim ter uma abordagem mais eficaz com os imigrantes.

Muito obrigada por ter trazido esta questão, Sr.ª Deputada.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr.ª Deputada Bebiana Cunha, queira prosseguir.

A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, tenho uma segunda questão, que está no âmbito das suas competências ao nível da promoção da cidadania e da participação dos cidadãos e das

cidadãs e que se prende com um assunto que tem a ver indiretamente consigo, não sem antes o termos

levado à Sr.ª Ministra da Administração Pública e ao Sr. Ministro da Educação.

Passo a contextualizar. Em 2018, o Governo lançou o Orçamento Participativo, ao qual vários cidadãos e

cidadãs se apresentaram mediante o regulamento que estava definido. Outros cidadãos e cidadãs

participaram também por via do voto, mas sabemos que, volvidos três anos, ainda há projetos vencedores

sem resposta do Governo e sem estarem implementados, incumprindo as expectativas em relação a este

processo de participação.

Um desses projetos vencedores é precisamente o Portugal sem Touradas. Assim, gostaria de

contextualizar dizendo que, inicialmente, a Sr.ª Ministra da Administração Pública nos deu nota de que passou

este projeto para a Educação e que, por sua vez, o Sr. Ministro da Educação disse que não iria cumpri-lo

porque não estava nos seus planos. Voltando a questionar a Sr.ª Ministra da Administração Pública,

soubemos então que colocará a execução deste projeto num outro ministério, através de uma pessoa que

ainda não foi oficialmente nomeada, que é a Sr.ª Provedora dos Animais.

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Portanto, gostaríamos de perguntar à Sr.ª Ministra se considera que esta é uma forma de lidar com os

processos de participação dos cidadãos e cidadãs, porque, efetivamente, estes ainda estão sem resposta, e

se considera que eles vão ver a luz do dia durante esta Legislatura.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, com toda a franqueza, esse tema não é mesmo da minha área de intervenção. Sei pouco mais do que a Sr.ª Deputada sobre esta matéria

neste momento. O que sei é que quando fazemos projetos experimentais, como o Orçamento Participativo era,

temos de tirar conclusões quando há coisas que precisam de ser melhoradas.

Sei que a Sr.ª Ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública está a fazer isso mesmo.

Quando temos um projeto, temos de pensar, desde logo, qual é a entidade que o vai desenvolver e nem

sempre isso é evidente. Nuns casos é, mas, quando não é, nem sempre é fácil. As melhorias estão em curso

e, quanto ao resto, acho que a Sr.ª Deputada tem as respostas.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Ainda dispõe de tempo, pelo que tem a palavra para prosseguir, Sr.ª Deputada Bebiana Cunha.

A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, uma terceira questão para terminar. Já aqui muito se falou hoje de violência doméstica, que, evidentemente, é um flagelo da nossa sociedade

que precisa de políticas multifatoriais. Reconhecemos que há caminho feito, mas há ainda muito por fazer e

um dos aspetos que falta, que hoje não foi sequer falado e que o PAN tem procurado trazer a debate, prende-

se com o facto de as nossas casas-abrigo de vítimas de violência doméstica não estarem ainda preparadas

para acolher os animais de companhia das vítimas.

Em 2020, obtivemos uma resposta do Governo dando nota de que estava a ser feito o levantamento

exaustivo para perceber quantas casas-abrigo, na rede que existe em Portugal, estavam preparadas para

receber também os animais das vítimas. Em 2021, vimos inserido no Orçamento do Estado a proposta de

adaptação de todas as casas-abrigo para que as vítimas não se vejam forçadas a atrasar a sua saída porque

não podem levar o animal, colocando-se ainda mais em risco, não podendo deste modo ser apoiadas

emocionalmente por esses animais.

Portanto, gostaríamos de saber qual é o ponto da situação, Sr.ª Ministra.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade.

A Sr.ª Secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, de facto, esse é um compromisso presente na Lei do Orçamento do Estado.

A Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género tem estado precisamente a proceder a um

levantamento e análise, junto das várias estruturas, quanto à complexidade que envolverá esta dimensão e

prática de acompanhamento, desde logo, as questões do transporte dos animais, porque temos um sistema

montado para o transporte de vítimas. Uma vítima que é vítima num concelho vai para um outro concelho e,

portanto, há um conjunto de dimensões de logística que são muito complexas, de segurança e de

confidencialidade.

Portanto, isso está em estudo, é um trabalho que envolve necessariamente as equipas que estão no

terreno na gestão destas estruturas e destes processos.

De qualquer forma, e como terá certamente conhecimento, já antecipámos essa situação introduzindo nas

fichas, nos modelos únicos que as estruturas também passam a preencher, a questão da presença de animais

e, inclusivamente, de situações de agressores que, como sabemos, também agridem os animais de

companhia das vítimas como forma de pressão e terrorismo psicológico.

Portanto, vamos desenhar esse projeto dentro das complexidades que referi.

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Passamos agora ao PEV, pelo que dou a palavra à Sr.ª Deputada Mariana Silva.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, dizem-nos as estatísticas que tivemos menos 1908 nascimentos em 2020 do que em 2019.

Não é um facto novo, mas este ano acentuou-se, o que é compreensível face às expectativas muito

negativas quanto ao futuro criadas por uma pandemia que assolou o País e que levou cada um a reponderar

as suas decisões.

Como já afirmei, esse é um problema mais profundo e que vem de trás. Os problemas económicos e

sociais são decisivos no momento em que se tomam opções sobre projetos e sonhos de vida, e quando se

pensa nos filhos, pensa-se no seu percurso de vida.

Compreenda, por isso, que comece pelo fim do ciclo, designadamente pelo acesso, em igualdade, ao

ensino superior. Também neste caso, Sr.ª Ministra, a maioria dos estudantes do ensino superior são mulheres.

Aproveito para saudar as centenas de estudantes que se manifestaram hoje à porta desta Assembleia,

reclamando isso mesmo: um futuro com garantias, um futuro com oportunidades, um futuro de igualdade.

A questão central é a que lhe colocámos na primeira pergunta. A questão das condições de cada um para

decidir ter filhos. Ter um filho é uma decisão cada vez mais ponderada. É preciso, desde logo, garantir

emprego estável e com condições. Aqueles que vivem pendurados em sucessivos contratos precários ou

trabalham sem contrato, sempre com a espada do desemprego sobre a cabeça, têm condições para assumir

essa responsabilidade?

Para além da questão do aumento do salário mínimo nacional, é necessário garantir que os salários, na

sua generalidade, aumentem e que as reformas aumentem, para ajudar no crescimento da economia e dar

confiança aos jovens.

Mas há ainda a urgência de dar outras respostas, desde logo, ao nível de uma rede pública de creches, já

que são as mulheres que se confrontam, em primeiro lugar, com a ausência de um sítio seguro e com

qualidade para deixar as crianças e ir trabalhar; também ao nível do reforço do abono de família, com a sua

universalização, para fazer face às despesas crescentes; e ainda ao nível dos cuidados de saúde em pediatria

e outros. É indispensável que os pais saibam que têm mais do que os cuidados básicos, nomeadamente com

o acompanhamento em oftalmologia ou em medicina dentária.

Mas há que dar resposta também ao nível das estruturas públicas para apoio aos mais idosos, aliviando as

famílias de encargos muitas vezes insuportáveis.

Se se tomarem estas medidas, temos confiança de que ficam garantidas as condições para nascerem mais

crianças, para se renovarem as gerações e garantir o desenvolvimento do País. Será assim, Sr.ª Ministra?

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, as tarefas e as medidas de política pública necessárias para responder a esse objetivo comum, que é não procurar a solução para o

desafio demográfico numa qualquer imagem do passado, mas garantir que cada pessoa pode escolher ter os

filhos que quer ter, passa por muitas das medidas que a Sr.ª Deputada aqui elencou e muitas das medidas

que têm sido concretizadas ao longo dos últimos anos.

Na verdade, temos hoje um abono de família reforçado para as crianças mais jovens, cujos encargos

pesavam mais sobre o orçamento dos seus pais; temos hoje creches gratuitas para as crianças dos dois

primeiros escalões; temos hoje um aumento das bolsas de ação social escolar no ensino superior que é

superior ao aumento da propina e que vê aumentada a dimensão de habitação e de alojamento estudantil face

ao que tínhamos; temos hoje um conjunto de medidas previstas no Programa de Recuperação e Resiliência,

na área da habitação, que vão desde a habitação acessível, para que os jovens possam constituir as suas

famílias mais cedo do que atualmente fazem, e também no campo do alojamento estudantil temos um

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programa para reforçar muito significativamente o número de camas disponíveis para os jovens estudantes do

ensino superior no nosso País.

Como referiu o salário mínimo, saberá também que, antes da pandemia, quando apresentámos os

objetivos do Governo para a evolução do salário mínimo, eles foram apresentados num pacote mais amplo de

aumento dos rendimentos e de aumento dos salários e não apenas do salário mínimo, conscientes que

estamos de que, para as novas gerações, a possibilidade de se autonomizarem das casas dos seus pais para

as suas próprias casas, o combate à precariedade e salários justos são o elemento fundamental para que

possam ter os seus filhos mais cedo, porque muitas vezes essa é a única forma de poderem ter os filhos que

querem ter.

Estas medidas, como tenho dito ao longo da tarde de hoje, mostram resultados positivos. Quando olhamos,

por exemplo, para a taxa de pobreza, mesmo das famílias monoparentais, das famílias com filhos, que é

sempre um ponto sensível dos nossos indicadores de pobreza, vemos que, desde 2015, esses indicadores

melhoraram. Isto significa que sabemos quais são as políticas que resultam.

Creio que todos queremos alcançar esse objetivo e, mesmo com uma pandemia, que interrompeu este

percurso, sabemos como é que temos de fazer para recuperar esse caminho.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Terminamos, assim, este debate setorial. Agradeço à Sr.ª Ministra, às Sr.as Secretárias de Estado e ao Sr. Secretário de Estado esta tarde, que já vai longa.

Srs. Deputados, peço que não saiam ainda, porque o Sr. Secretário Diogo Leão tem uns anúncios para

fazer.

Sr. Secretário, faça o favor de dar conta do expediente.

O Sr. Secretário (Diogo Leão): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, anúncio à Câmara que deram entrada na Mesa, e foram admitidos pelo Sr. Presidente, os Projetos de Lei n.os 811/XIV/2.ª (PAN) e 812/XIV/2.ª (PSD),

que baixam à 10.ª Comissão, e o Projeto de Resolução n.º 1230/XIV/2.ª (PAR).

Quanto à relação dos Srs. Deputados presentes por videoconferência na Sessão Solene Comemorativa do

25 de Abril, comunico que estiveram presentes os Srs. Deputados do Partido Socialista João Azevedo Castro,

eleito pelo círculo eleitoral dos Açores, Carlos Pereira, Marta Freitas e Olavo Câmara, eleitos pelo círculo

eleitoral da Madeira, Paulo Pisco, eleito pelo círculo eleitoral da Europa, e Paulo Porto, eleito pelo círculo

eleitoral de fora da Europa.

Estiveram igualmente presentes os Srs. Deputados do Partido Social Democrata Ilídia Quadrado, eleita

pelo círculo eleitoral dos Açores, Sara Madruga da Costa e Sérgio Marques, eleitos pelo círculo eleitoral da

Madeira, e José Cesário, eleito pelo círculo eleitoral de fora da Europa.

Sr. Presidente, na sessão plenária de hoje estiveram presentes, por videoconferência, os Srs. Deputados

do Partido Social Democrata Sérgio Marques, eleito pelo círculo eleitoral da Madeira, e José Cesário, eleito

pelo círculo eleitoral de fora da Europa, e o Sr. Deputado do Partido Socialista Ivan Gonçalves, eleito pelo

círculo eleitoral de Setúbal.

É tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Muito obrigado, Sr. Secretário. Lembro que a nossa sessão plenária de amanhã, às 15 horas, tem como primeiro ponto da ordem do dia a

apresentação e discussão do Programa de Estabilidade, que será acompanhado pela apreciação dos Projetos

de Resolução n.os 1111/XIV/2.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo que envie o PRR na sua versão final ao

Parlamento para discussão, 1217/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que complemente o Programa de

Estabilidade com um programa de investimentos e um programa de medidas sociais, 1221/XIV/2.ª (PCP) —

Pelo direito soberano de Portugal decidir do seu futuro: combater o vírus e o seu aproveitamento, assegurar o

desenvolvimento do País e 1223/XIV/2.ª (CDS-PP) — Por uma visão estratégica para o País orientada para as

pessoas e as empresas: recuperar a economia e o emprego e responder à emergência social.

Do segundo ponto da ordem do dia consta a apreciação da Proposta de Lei n.º 86/XIV/2.ª (GOV) — Aprova

a Lei das Grandes Opções para 2021-2025.

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No final, haverá votações regimentais.

Estamos, então, a terminar os nossos trabalhos por hoje.

Muito boa tarde a todas e a todos.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 6 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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