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Quarta-feira, 9 de junho de 2021 I Série — Número 75
XIV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2020-2021)
REUNIÃOPLENÁRIADE8DEJUNHODE 2021
Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Secretárias: Ex.mas Sr.as Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Lina Maria Cardoso Lopes
S U M Á R I O
O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 3
minutos. Foi aprovado um parecer da Comissão de
Transparência e Estatuto dos Deputados relativo à renúncia do mandato de um Deputado do PAN e à respetiva
substituição. Deu-se conta da entrada na Mesa da Proposta de Lei n.º
101/XIV/2.ª, dos Projetos de Lei n.os 860 a 862/XIV/2.ª, das Apreciações Parlamentares n.os 49 e 50/XIV/2.ª, do Projeto de Deliberação n.º 14/XIV/2.ª e dos Projetos de Resolução
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n.os 1319 a 1329/XIV/2.ª Ao abrigo do artigo 74.º do Regimento, procedeu-se a
um debate de atualidade, requerido pelo PCP, sobre a preparação do novo ano letivo. Depois de a Deputada Ana Mesquita (PCP) e de o Ministro da Educação (Tiago Brandão Rodrigues) terem aberto o debate, usaram da palavra, a diverso título, além daqueles oradores e do Secretário de Estado Adjunto e da Educação (João Costa), os Deputados Porfírio Silva (PS), Firmino Marques (PSD), Alexandra Vieira (BE), Ana Rita Bessa (CDS-PP), Bebiana Cunha (PAN), Mariana Silva (PEV), André Ventura (CH), João Cotrim de Figueiredo (IL), Tiago Estevão Martins (PS), Cláudia André e António Cunha (PSD) e Alma Rivera (PCP). Encerraram o debate o Ministro da Educação e a Deputada Paula Santos (PCP).
Durante aquele debate, o Presidente saudou a eleição da Deputada Bebiana Cunha (PAN) para líder parlamentar do seu partido, bem como saudou a realização do congresso do PAN. De seguida, o Deputado André Ventura (CH) protestou por não ter sido igualmente felicitado aquando do congresso do Chega, tendo o Presidente endereçado felicidades pessoais a este Deputado.
Foi debatida, na generalidade, a Proposta de Lei n.º 92/XIV/2.ª (GOV) — Altera o Código de Processo Civil, as normas regulamentares do regime da propriedade
horizontal, o regime dos procedimentos para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior à alçada do tribunal de 1.ª Instância e o Código do Registo Predial. Intervieram, além do Secretário de Estado Adjunto e da Justiça (Mário Belo Morgado), os Deputados José Manuel Pureza (BE), Mónica Quintela (PSD), António Filipe (PCP), Telmo Correia (CDS-PP) e Joana Sá Pereira (PS).
Foram discutidos, em conjunto, na generalidade, a Proposta de Lei n.º 93/XIV/2.ª (GOV) — Altera procedimentos relacionados com a emissão, a entrega e a utilização do cartão de cidadão e o Projeto de Lei n.º 854/XIV/2.ª (PAN) — Concretiza o direito ao cartão de cidadão para as pessoas em situação de sem abrigo, procedendo à alteração da Lei n.º 7/2007, de 5 de fevereiro, e do Decreto-Lei n.º 135/99, de 22 de abril. Usaram da palavra, além da Ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública (Alexandra Leitão), os Deputados Bebiana Cunha (PAN), José Manuel Pureza (BE), Romualda Fernandes (PS), Telmo Correia (CDS-PP), António Filipe (PCP) e Márcia Passos (PSD).
Deu-se conta dos Deputados que estiveram presentes, por videoconferência, na reunião plenária.
O Presidente (Fernando Negrão) encerrou a sessão eram 18 horas e 24 minutos.
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O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas, Sr.as e Srs. Agentes da autoridade, vamos iniciar esta reunião plenária.
Eram 15 horas e 3 minutos.
Para minha perplexidade, há várias leituras que a Sr.ª Secretária terá de fazer agora. Digo-o entre aspas,
porque fui eu que assinei todas estas iniciativas.
Faça o favor, Sr.ª Secretária.
A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, a primeira leitura trata-se de um parecer da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados relativo à renúncia do Deputado André
Lourenço e Silva, do Grupo Parlamentar do PAN, eleito pelo círculo eleitoral de Lisboa, sendo substituído por
Nelson José Basílio Silva, do mesmo círculo eleitoral. Diz o parecer que «a renúncia do Deputado André
Lourenço e Silva cumpre os requisitos legais, sendo substituído por Nelson José Basílio Silva, a partir do dia 6
de junho de 2021, inclusive».
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos proceder à votação deste parecer.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do CH e das Deputadas não
inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira.
Faça favor de continuar com a segunda leitura, Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha.
A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, anuncio também que deram entrada na Mesa, e foram admitidos, a Proposta de Lei n.º 101/XIV/2.ª (ALRAA), que baixa à 1.ª Comissão; os
Projetos de Lei n.os 860/XIV/2.ª (PEV), que baixa à 14.ª Comissão, em conexão com a 1.ª Comissão,
861/XIV/2.ª (BE), que baixa à 8.ª Comissão, e 862/XIV/2.ª (IL); as Apreciações Parlamentares n.os 49/XIV/2.ª
(PCP e PEV) e 50/XIV/2.ª (PSD); e o Projeto de Deliberação n.º 14/XIV/2.ª (PAR).
Deram igualmente entrada na Mesa, e foram admitidos, os Projetos de Resolução n.os 1319/XIV/2.ª (PSD),
que baixa à 5.ª Comissão, 1320/XIV/2.ª (PSD), que baixa à 11.ª Comissão, em conexão com a 6.ª Comissão,
1321/XIV/2.ª (BE), que baixa à 11.ª Comissão, 1322/XIV/2.ª (BE), que baixa à 8.ª Comissão, 1323/XIV/2.ª
(BE), que baixa à 7.ª Comissão, 1324/XIV/2.ª (PAN), que baixa à 11.ª Comissão, em conexão com a 13.ª
Comissão, 1325/XIV/2.ª (PCP), que baixa à 8.ª Comissão, 1326/XIV/2.ª (PCP), que baixa à 6.ª Comissão,
1327/XIV/2.ª (PCP), que baixa à 6.ª Comissão, 1328/XIV/2.ª (PS), que baixa à 2.ª Comissão, e 1329/XIV/2.ª
(PS), que baixa à 12.ª Comissão.
Terminei, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Vamos, pois, entrar no primeiro ponto da ordem do dia. Ao abrigo do artigo 74.º do Regimento, temos agendado um debate de atualidade, requerido pelo PCP, sobre a preparação do novo ano
letivo.
Para abrir o debate, tem a palavra, pelo Grupo Parlamentar do PCP, a Sr.ª Deputada Ana Mesquita.
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: O PCP requereu o agendamento deste debate de atualidade sobre a preparação do novo ano letivo porque tem de ser agora, e
não apenas no primeiro dia de aulas, o momento para debater as alterações concretas que têm de ser feitas e
para apresentar soluções para os problemas que estão colocados a nível da recuperação das aprendizagens
dos alunos e da valorização da escola pública e de todos os seus trabalhadores.
Muitos dos problemas com que a escola pública está confrontada são anteriores à epidemia e há muito
deviam estar resolvidos. No entanto, há outros que decorrem do contexto epidémico e que necessitam,
igualmente, de respostas concretas. Há uma semana, o Governo anunciou o chamado «plano de recuperação
de aprendizagens», assentando a sua apresentação mais nos milhões acenados do que nas alterações
concretas do ponto de vista da organização do ano letivo. Na verdade, tratou-se sobretudo do enunciar de um
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conjunto de intenções pouco claras, nada detalhadas e limitadas no tempo, cuja aplicação atira apenas para
dois anos letivos. Importa que o Governo esclareça cabalmente que meios efetivamente vão estar ao serviço
das escolas para que exista a autonomia que permita o reforço dos apoios pedagógicos e sociais, a
contratação dos trabalhadores necessários, a diminuição do número de alunos por turma. Autonomia sem
meios é só um verbo de encher.
Neste contexto, o aumento de investimento que tem de ocorrer para recuperar atrasos, para combater o
abandono e o insucesso escolares, para valorizar os trabalhadores e a escola pública afigura-se bem superior
aos 140 milhões de euros, identificados no plano, para responder às necessidades identificadas pelas escolas
nos planos pedagógico-didático, organizacional e de recursos. É preciso diminuir o número de alunos por
turma; garantir a diferenciação pedagógica individual e por grupos de aprendizagem por ano de escolaridade;
assegurar o crédito horário para gestão, segundo a autonomia de cada agrupamento e de escola não
agrupada; mais crédito horário para diretores de turma, grupos de trabalho, ou outros; aumentar as parcerias e
as coadjuvações; acabar com as turmas de 1.º ciclo com mais do que um ano de escolaridade; diminuir a
carga horária letiva dos alunos; flexibilizar a organização das turmas, possibilitando o seu desdobramento;
reforçar as tutorias; criar equipas pedagógicas multidisciplinares que suportem os planos de escola de
recuperação das aprendizagens; garantir a formação adequada a todos os trabalhadores; reforçar os meios
destinados à escola inclusiva. Mais: é preciso garantir um reforço dos apoios da ação social escolar, uma
questão que não se descortina nos anúncios do Governo.
O PCP defende que é preciso ir muito mais longe do que o conjunto de generalidades anunciadas. Que
medidas concretas vai o Governo tomar para dar as respostas que se impõem? Quando chegam essas
medidas às escolas? Com que meios vão as escolas poder contar exatamente? Sr. Ministro, as escolas têm
de saber agora e não podem ficar até setembro sem saber com o que podem contar.
Do lado dos problemas anteriores à epidemia, estão os sucessivos atropelos aos direitos dos trabalhadores
ao longo de anos. Não há recuperação de aprendizagens possível se não existirem os auxiliares, os
administrativos, os técnicos especializados, os técnicos superiores, os professores e os educadores de que
cada escola necessita. Todos têm de ser valorizados nas funções que cada um desempenha. Por isso, é
inaceitável que continue a precariedade que atira milhares de trabalhadores de apoio educativo, não docentes,
para contratos a prazo, quando são necessidades permanentes das escolas ou que persistam 12 000
professores e educadores com vínculos precários, apesar de terem 10 ou mais anos de serviço. É
inconcebível que o rácio dos trabalhadores não docentes seja utilizado para contratação a termo e que não se
contratem os trabalhadores que, de facto, estão em falta só porque o rácio está preenchido. É preciso garantir
que os trabalhadores contratados com contratos COVID-19 são vinculados, porque eles fazem falta às
escolas.
É incompreensível que o Governo tarde na tomada de medidas para assegurar que às saídas por
aposentação correspondem as contratações de trabalhadores em número suficiente e com vínculo estável.
Quantos trabalhadores da escola pública, Sr. Ministro, vão passar à reforma até ao início do ano letivo? Vai
aposentar-se um elevadíssimo número de docentes até ao final da década, conforme indicam as estatísticas
da própria DGEEC (Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência). Faltam professores em vários
grupos de recrutamento e recorde-se o grave problema a que se assistiu, nomeadamente em janeiro do ano
passado e também no início deste ano até à altura do confinamento, de carência destes trabalhadores,
nomeadamente em Lisboa, em Setúbal e no Algarve. O Governo e o PS rejeitaram as propostas do PCP para
resolver esta questão. Mas, então, que medidas vão tomar para ultrapassar este problema?
Sr. Ministro, não basta o Governo vir sempre com a mesma lengalenga das medidas implementadas na
última Legislatura ou reapresentar medidas que já foram anunciadas na presente Legislatura. Sim, é preciso
cumprir as medidas positivas que decorrem do Orçamento do Estado e que decorrem da proposta e da
intervenção do PCP. Mas isso não chega, é preciso mais e o mais que é preciso tem de ser no sentido da
rutura com a política de direita e na afirmação de uma política patriótica e de esquerda. Para isso, nunca
faltou, nem nunca faltará, a proposta e a intervenção do PCP que, coerente, sucessiva e consequentemente,
tem lutado pela defesa da escola pública, democrática, universal, gratuita, inclusiva para todos, garantindo o
respeito pelos direitos dos alunos e também dos seus trabalhadores.
Aplausos do PCP e do PEV.
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O Sr. Presidente: — Neste período de abertura do debate, tem a palavra, pelo Governo, o Ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues.
O Sr. Ministro da Educação (Tiago Brandão Rodrigues): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quinze dias depois de convosco ter estado a debater a melhoria do estado dos profissionais da educação, agradeço
ao Parlamento e, nele, ao Partido Comunista Português mais esta oportunidade de vir ao vosso encontro para
medirmos o caminho já feito e apontarmos vias para um futuro próximo e, já agora, para poder provar que eu e
a minha equipa somos «patrióticos e de esquerda».
Risos do PS, do BE e do PCP.
Agora que todo o País procura caminhos para se recuperar da pandemia, agora que a urgência do imediato
permite que mesmo os ânimos políticos alimentados pela primeira página do dia vejam para além dela, este é
o momento para a discussão profunda sobre o próximo ano letivo, que o PCP invoca no seu requerimento
para esta audição, bem como, muito naturalmente, para todos os temas de política educativa que os Srs. e as
Sr.as Deputadas entendam, nesta tarde, invocar.
Todos sabemos bem como a situação epidemiológica do País veio tornar mais sensíveis os desafios que
são quase todos os desafios da educação, desde sempre. Mas se a pandemia evidenciou o que ainda temos,
como comunidade, a superar, também é certo que evidenciou a resiliência das comunidades educativas, a
essencialidade da educação para todos e para cada um dos nossos, vindo também a pôr em maior evidência
algo que quem com eles trabalha já conhecia: os imensos méritos dos nossos profissionais de educação,
artífices primeiros e fundamentais da resposta presente que a educação deu, e ainda dá, a mais de um ano de
ensino e de aprendizagem em circunstâncias antes absolutamente inimagináveis, e a forma ativa e
empenhada como, connosco, estão a construir um próximo ano letivo que será, ainda que não exatamente o
que todos desejamos que seja, um ano matricial na recuperação das aprendizagens e na resiliência do ensino.
Este será um ano de recuperação e de resiliência que dará melhor sequência à resistência das nossas
comunidades educativas e à retoma das aprendizagens presenciais que, mal foi possível, logo cumprimos.
«As últimas a fechar e as primeiras a abrir» — foi sempre o que dissemos sobre as nossas escolas e foi
exatamente o que, com todas elas, procurámos fazer.
É precisamente uma robusta preparação do próximo ano letivo que, com cada escola, temos vindo a
construir: uma robustez na resposta garantida pela conjuntura, pela estrutura e, acima de tudo, pelas pessoas.
A resposta pela conjuntura permite-nos, hoje, viver uma fase menos intensa da pandemia, na qual a vacinação
maioritária da população e, dentro dela, das comunidades educativas já não é uma aspiração longínqua, mas
antes uma realidade em constante progresso.
Ainda na semana passada, tivemos uma testagem complementar nos municípios com maior índice de
incidência, incluindo Lisboa, fazendo mais de 20 000 testes, com uma positividade que ronda os 0,2%, o que
prova o trabalho das nossas comunidades. Através da resposta pela estrutura educativa vemos, hoje, que está
mais dotada como há muito não estava.
Quando se comparam, nas estatísticas oficiais de educação, os anos letivos de 2014-2015 e de 2019-2020,
podemos constatar que houve um reforço de 8000 docentes que não acompanhou a redução de 100 000
alunos por fatores demográficos. O rácio de aluno por professor era, em 2009-2010, de 8,9, sendo, em 2020-
2021, no atual ano letivo, de 8,7. A resposta pelas pessoas, sejam as que ensinam, sejam as que aprendem,
com os recursos e as necessidades que são de cada um e que, por isso, diferem dos demais, em si, exige-nos
políticas que tratem estas pessoas, estas comunidades e estas escolas com a autonomia e a flexibilidade de
que estas mais precisam, tendo já sido dadas tantas provas de as merecerem cabalmente.
Ouvir, pensar, decidir, implementar e avaliar — estas são as fases da decisão política com as quais todos
concordaremos. O que decide, porém, a sua qualidade é o seu grau de participação, de envolvimento, de
auscultação e de acompanhamento. E, por isso, ouvimos peritos, representantes de diretores, de professores,
de alunos, conselhos pedagógicos, representantes de pais e encarregados de educação, autarcas e
associações setoriais da educação.
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Por querermos que a recuperação de aprendizagem, já em curso, seja ampliada no próximo ano letivo e,
de forma determinante, no seguinte, foi um elevado grau de parceria que procurámos no seu desenho e foi
esse mesmo grau que contemplámos na sua aplicação.
Confiámos nas escolas e, por nelas confiarmos, fizemos as escolhas que fizemos: escolhemos a
autonomia educativa, o cuidar da transição entre ciclos e o equilíbrio das diferentes componentes do bem-
estar dos nossos alunos. Criámos, com este plano participado, e criaremos, com a sua implementação
colaborativa, um espaço e tempo ampliados e fortalecidos para apoiar, com base na maior flexibilidade e
intensidade, os anos de escolaridade mais afetados pela pandemia.
Olhando para quem tem mais risco de ficar para trás, para deles cuidarmos mais, apostámos, também, na
capacitação das comunidades educativas e das escolas com recursos e meios que lhes permitam reforçar a
sua já notável capacidade de resposta, particularmente orientada para a melhoria das aprendizagens, para a
inclusão e para o envolvimento comunitário.
Apostámos no reforço de recursos humanos, no reforço de docentes para o alargamento do apoio tutorial
específico e no reforço de docentes através do crédito horário, destinado, prioritariamente, ao apoio do
primeiro ciclo e às transições de ciclo.
Apostámos, também, no reforço das equipas multidisciplinares de apoio à educação inclusiva e no reforço
dos técnicos alocados aos planos de desenvolvimento pessoal, social e comunitário.
Apostámos no reforço da formação através de produção de materiais didáticos de formação específica na
Matemática e do plano de apoio de formação de ação para as práticas de inclusão, não só para os docentes
mas também para os não docentes.
E trabalhámos e apostámos no apetrechamento e nas infraestruturas. Sr.as e Srs. Deputados, não falo de
obras e intervenções nas escolas, falo do reforço do orçamento das bibliotecas escolares, no alargamento e
no apetrechamento de um conjunto de laboratórios, da Rede de Clubes Ciência Viva na Escola, nas
instalações do Laboratório de Educação Digital e na instalação de centros de especialização tecnológica para
a efetiva modernização do ensino profissional.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir.
O Sr. Ministro da Educação: — Apostámos e reforçámos os recursos digitais para avaliar os alunos, os professores, as escolas e para gerir, em cada momento, os recursos extraordinários que alocámos. Isto para
quem precisa de uma educação e de cuidados e para quem precisa de aprender a ensinar, porque importa
avaliar as políticas públicas.
Não temos outro momento para dizer «presente!» aos que mais precisam de nós. É aqui o nosso tempo e
agora o nosso lugar. Repito, é aqui e agora que dizemos «presente!»: contem connosco, como nós contamos
com cada comunidade educativa, cada escola, cada aluno e cada professor, cada família e, obviamente, cada
partido e cada um dos Srs. Deputados.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para abrir a primeira ronda, tem a palavra o Sr. Deputado Porfírio Silva, do Grupo Parlamentar do PS.
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Falando do plano de recuperação de aprendizagens, cujas linhas mestras foram apresentadas pelo Governo, importa
identificar o que é essencial para conseguirmos que a experiência desmesurada da pandemia não fique como
cicatriz permanente nas vidas das crianças e jovens.
Ora, hoje, como ontem, o essencial é que ensinar é muito importante, mas aprender é que é decisivo. É por
isso que a educação, depois da pandemia, não há de ser uma resposta ao aluno médio da estatística, porque
esse aluno não se encontra em nenhuma escola deste País — não há um aluno igual a outro.
E, porque ensinar é importante mas aprender é que é decisivo, a educação, depois da pandemia, tem de
responder ao agravamento das desigualdades que se repercutem na escola e reforçar a pluralidade de vias
para aprender, porque alunos diferentes têm âncoras diversas às escolas — para uns, é a leitura e, para
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outros, é a abordagem experimental à ciência, a expressão artística, a aproximação ao mundo profissional ou
o desporto — e cada aluno pode construir todo um caminho de sucesso a partir da sua âncora.
O plano de recuperação de aprendizagens aposta nas ferramentas dessa diversidade: no reforço do apoio
à leitura e à escrita, nas estratégias para o Português língua não-materna, no apoio específico à recuperação
das aprendizagens em Matemática, em mais Clubes Ciência Viva na Escola, na educação estética e artística,
na inovação curricular no ensino profissional, associado aos centros de especialização tecnológica, em mais
desporto escolar inserido na comunidade.
E, porque ensinar é importante mas aprender é que é decisivo, importa entender que, em cada turma, há
diferentes potencialidades e diferentes dificuldades, requerendo abordagens em pequenos grupos ou até
individualizadas.
Para isso, reforçam-se as ferramentas de autonomia e flexibilidade das escolas, a gestão flexível das
turmas, das semanas, do calendário escolar e do currículo por ciclos de estudos, bem como a gestão da
distribuição de serviço para ter equipas educativas centradas no aluno, possibilitando a redução do número de
alunos por professor.
E, porque ninguém aprende num tubo de ensaio, importa sublinhar o programa para as competências
sociais e emocionais, reforçando o Apoio Tutorial Específico; o alargamento dos planos de desenvolvimento
pessoal, social e comunitário; o reforço das equipas de educação inclusiva e as estratégias para renovar a
articulação entre a escola e as famílias.
Srs. Deputados, neste plano, o que primeiro impressiona é a grandeza do investimento: 900 milhões de
euros! Trata-se de um investimento sem precedentes na educação, uma aceleração do que tem vindo a ser
feito nos últimos anos, em contraste notório com o último Governo PSD/CDS, que se desculpou com a troica
mas cortou na educação 1200 milhões de euros a mais do que estava previsto no Memorando de
Entendimento.
Aplausos do PS.
Protestos de Deputados do PSD.
Mas há outro investimento até mais significativo: o plano faz uma aposta renovada em confiança nas
escolas e nos professores, porque a educação não é um fato igual para todos.
Quando neva em Trás-os-Montes, não se fecham escolas no Algarve. As escolas terão uma caixa de
ferramentas e terão de escolher as mais apropriadas aos seus alunos e só poderemos ter sucesso nesse
caminho confiando nos profissionais de educação, no seu profissionalismo e dedicação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, o plano de recuperação de aprendizagens é tão
realista como ambicioso, por uma razão: porque é robusto. Mas o sucesso do País em concretizá-lo vai
depender do contributo de todos — do processo de auscultação alargada que vai continuar e de uma
capacidade de concertação que tem de ser permanentemente exercida, bem como da sua monitorização e
contínua avaliação.
E, porque o País precisa dessa mobilização, não é boa ideia menosprezar aquilo que temos vindo a fazer
nestes anos. A coordenadora do BE reagiu apressadamente ao plano, dizendo que os 3000 professores que já
tinham sido anunciados no início do ano letivo não chegaram às escolas, revelando, assim, falta de rigor. É
que são 3000 professores em ETI (equivalentes a tempo integral), para tutorias e crédito horário, que
reforçaram a atribuição inicial de docentes às escolas antes do início do ano, em agosto, mais cedo do que
alguma vez tinha acontecido.
Aplausos do PS.
Protestos da Deputada do BE Catarina Martins.
Quando a coordenadora do Bloco de Esquerda pergunta «como é que se pode pedir às escolas para
organizarem tudo isto em três meses?», mostra que não percebeu algo essencial: não estamos a começar do
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zero! As escolas não vão começar agora a preparar-se, estiveram a responder, desde o primeiro dia, com as
ferramentas que temos consolidado nos últimos anos e que não foram inventadas agora.
Não está tudo feito, é preciso continuar, mas não é boa ideia menosprezar aquilo que temos vindo a fazer
nestes anos. A viagem é longa, mas o rumo é claro: sucesso, inclusão e cidadania para todos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Firmino Marques, do Grupo Parlamentar do PSD.
O Sr. Firmino Marques (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.ª e Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP trouxe a debate o tema da preparação do ano letivo, com o
objetivo de marcar posição quanto às negociações com o Governo para viabilizar a aprovação do Orçamento
do Estado para 2022. Vem dizer ao Governo como quer o anel de noivado!
Na sua intervenção inicial, o PCP fez a exposição do seu caderno de encargos em matéria laboral dos
professores: contagem de tempo de serviço, progressão na carreira, avaliação do desempenho docente, mais
e mais recursos humanos, além da questão que tenta sempre fazer passar, que é a de menos exames e
avaliações externas dos alunos.
Une-nos o reconhecimento da importância das questões em discussão, separam-nos as visões e as
opções em matéria educativa.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Vai daí?
O Sr. Firmino Marques (PSD): — O PSD gostaria de centrar a questão noutro prisma: a resiliência social e económica deve ser alcançada através de investimento bem concebido e bem orientado na educação.
O Sr. João Moura (PSD): — Muito bem!
O Sr. Firmino Marques (PSD): — Os retornos do investimento em educação traduzem-se em benefícios económicos, sociais e individuais, incluem melhores competências, empregabilidade, aumento da
produtividade e ganhos mais elevados.
Entre os não económicos, os benefícios associados à educação são melhor saúde, taxas de criminalidade
mais baixas e níveis mais elevados de confiança, tolerância e envolvimento cívico e político. O retorno social
mais relevante está associado a um maior crescimento do PIB (produto interno bruto), melhor difusão e
adoção de tecnologias, maior capacidade de inovação, finanças públicas estáveis e mais e melhor coesão
social.
Os países europeus, que são dotados de melhor educação, tanto em termos de meios, em quantidade e
qualidade, têm evidenciado uma capacidade de recuperação mais rápida dos choques económicos, resultando
disso mesmo uma melhor resiliência económica.
Baixos níveis de educação estão claramente associados à pobreza e, considerando que esta atinge um
elevado número de portugueses, a educação constitui, por isso, um dos principais desafios ao
desenvolvimento do nosso País. A frase «não deixar ninguém para trás» não pode apenas ser um mantra que
nos embala a todos. A pobreza é mais incidente entre quem tem escolaridade mais baixa e está associada a
processos de reprodução intergeracional que urge suster.
Continuamos a insistir na necessidade da implementação de um sistema de monitorização e de avaliação
das aprendizagens que permitam a comparação temporal e espacial dos resultados e que permitam a
correção das políticas públicas em tempo útil, em benefício dos seus destinatários. Exige-se uma intervenção
mais fina, mais orientada e centrada na qualidade.
Enquanto País, fizemos progressos assinaláveis: reduzimos o abandono escolar em cerca de 1,3 pontos
percentuais ao ano nos últimos 25 anos, tendo passado de uma taxa de abandono de 41,4% para 8,9%. Mas,
ao chegarmos a este ponto, a nossa meta tem de ser muito mais incisiva e exige aceleração na sua
concretização.
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O País está estagnado e o Governo com a sua ação, ou falta dela, enguiça o designado «elevador social».
É preciso resgatar aqueles que estão lá atrás para que todos possamos andar para a frente, sem comprometer
a qualidade das aprendizagens, nem as oportunidades futuras de cada aluno.
É preciso garantir a todos os alunos as mesmas oportunidades de sucesso educativo ao longo de todo o
percurso escolar, recorrendo à ação social escolar e ao princípio da equidade como orientador dos critérios de
apoio.
Que a todos, mas a todos, sem exceção, seja garantido o acesso ao conhecimento e ao curriculum que
deverá ser comum, incentivando a flexibilidade pedagógica e não a curricular.
Esta não é uma questão do próximo ano letivo, esta é uma questão deste ano letivo, do próximo e dos
seguintes.
Neste pressuposto, pergunto: o que está a ser feito para garantir que o elevador social que a escola deve
representar volte a funcionar? O que está a ser pensado para que o sistema educativo volte a atrair os
profissionais mais competentes? Como vai o Governo devolver a dignidade ao exercício da profissão de
educador e de professor? Como vai rejuvenescer a classe docente com a falta de atratividade da carreira
docente e dos cursos de formação inicial de professores? A estas questões o Governo responde
invariavelmente com o silêncio que lhe é característico, colocando em causa o futuro do nosso edifício
educativo.
Sr. Presidente, para concluir, sabemos do desafio de assegurar que todas as crianças e jovens possam
compensar a aprendizagem perdida a longo prazo, que não se esgotará apenas no ano letivo de 2021/2022, e
para o qual não podemos ambicionar nada menos do que apoios de alta qualidade, focados nos alunos, nos
professores e nas escolas, recuperando, assim, o papel de cada um e o papel de todos.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — É a vez do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda. Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alexandra Vieira.
A Sr.ª Alexandra Vieira (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo apresentou no Dia da Criança, resumidamente, um plano de recuperação para a
educação, o qual assentou num documento que ainda é desconhecido, que chega tarde, no final do ano letivo,
e que deixou muitas questões sem resposta, configurando uma forma de desrespeito pelas comunidades
educativas.
A intervenção do PS, já neste debate, ao atacar as propostas do Bloco de Esquerda, só pretende ajudar o
Governo a esconder a falta de uma resposta essencial. Se o que se prevê é a contratação de 3300
professores, este ano, isso significa manter a atual situação, pois são professores temporários e que têm o seu
contrato a terminar já no final deste ano letivo. Portanto, trata-se de renovar o contrato dos 3300 professores
que foram contratados no ano passado, e não aumentar.
Mais uma vez, e voltando ao plano, parece que ficou aquém do necessário. É um plano feito de intenções
genéricas e, em alguns aspetos, mal direcionadas, quando deveria corresponder ao momento excecional em
que vivemos. Era necessário dar uma resposta concreta, objetiva e real aos problemas com que as escolas se
deparam há anos, os quais a pandemia veio tornar visíveis e que não serão resolvidos com este plano.
Esta seria a ocasião para olhar de frente os problemas estruturais das escolas que são anteriores, mas já
lá iremos.
A pandemia afetou de forma inegável não só as aprendizagens como também o desenvolvimento pessoal e
social de todas as crianças e jovens. Agravaram-se os problemas de saúde mental de toda a comunidade
educativa e aumentaram todas as desigualdades.
O reforço da escola pública é, pois, urgente. Há vários anos que se faz notar a falta de investimento na
escola pública. As fragilidades que daí resultam tornaram-se ainda mais evidentes. O que é que se exigia? Um
investimento robusto na educação, um investimento que faça a diferença nas vidas das crianças e dos jovens
afetados pela pandemia.
No entanto, o Governo não se mostra disponível para fazer esse investimento. Dos cerca de 900 milhões
de euros anunciados, apenas 140 milhões são destinados ao investimento em recursos humanos no próximo
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ano letivo. A maior parte do investimento, 670 milhões, vai para equipamentos e infraestruturas, que sabemos
ser necessário, pois o equipamento encontra-se em estado crítico. Mas esse apetrechamento já estava em
curso e não sabemos que parte já estava prevista nos 599 milhões já anunciados.
Vamos ao ponto concreto dos problemas estruturais, sendo que irei enunciar dois.
O primeiro, e porque é impossível negar a sua existência, é a falta de professores no momento atual e que
se vai agravar nos próximos anos. O Governo acha que o plano de recuperação está desligado da solução dos
problemas crónicos da escola pública? Todos os anos faltam professores em várias disciplinas porque o
Governo não quer pagar o que é devido aos professores deslocados nem ser justo com quem aceita horários
incompletos. O Sr. Ministro acha mesmo que 3300 professores são suficientes? Tal não chega a três
professores por agrupamento, e é o mesmo número do ano passado. Foi suficiente? Parece-nos que não. Em
que condições foram contratados estes professores? Por um ano e quase sempre em horários incompletos!
Como vê, não é uma solução para o problema estrutural e tem a agravante de não se saber se o crédito
horário vai mesmo existir e como vai ser concretizado. Neste âmbito, o Bloco de Esquerda não tem dúvidas
em considerar que este plano é insuficiente na resolução deste problema.
Uma outra dimensão a destacar é a questão da autonomia. O Sr. Ministro usa tanto a palavra «autonomia»
que lhe gasta o sentido, mas, ainda assim, temos de lhe perguntar o seguinte: vai ser possível que os diretores
completem os horários incompletos com as horas de tutoria, sem que tenham de pedir autorização à tutela?
Vai ser possível, pelo menos, a alteração da fórmula de cálculo, que penaliza as escolas com o corpo docente
mais envelhecido? Vai ser possível diminuir o número de alunos por turma, de acordo com as necessidades
de cada agrupamento? Vai ser possível contratar professores e técnicos à medida das necessidades de cada
escola ou de cada agrupamento de escolas?
Não basta dizer que se confia nas escolas e dizer que têm toda a autonomia. É preciso verter essa boa
intenção em medidas concretas e em direção a uma gestão democrática das escolas, sempre adiada e sem
explicação plausível.
Sr. Ministro, a autonomia das escolas não pode ser um chavão, nem uma forma de o Governo afastar as
responsabilidades. Precisamos de um ensino mais adaptado a cada comunidade educativa e mais
personalizado, o que não se faz sem um reforço substancial e duradouro de recursos humanos — mais
professores, técnicos especializados, assistentes técnicos, assistentes operacionais. Sr. Ministro, os 140
milhões chegam para isto?
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Mesquita, do Grupo Parlamentar do PCP.
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro, de facto, os nossos receios confirmaram-se: a um conjunto de preocupações e de questões concretas, o Governo respondeu
novamente com um conjunto de generalidades e de medidas não detalhadas para resolver os problemas. E
isto não serve, Sr. Ministro! Isto não serve! É preciso dar respostas para que, efetivamente, não haja um
conjunto de intenções pouco claras, nada detalhadas e limitadas no tempo, conforme tivemos oportunidade de
referir no início do debate.
Portanto, o PCP pergunta novamente: que meios vão estar efetivamente ao serviço das escolas para que
exista uma autonomia que se possa dizer efetiva e que permita o reforço dos apoios pedagógicos e sociais, a
contratação dos trabalhadores necessários, a diminuição do número de alunos por turma?
Sr. Ministro, como é possível que se ache que os 15,5% de verbas, identificados neste plano de
recuperação de aprendizagens, vão chegar para dar resposta às necessidades nos planos pedagógico-
didático, organizacional e de recursos? É que são 140 milhões para dois anos letivos, quando andamos com
uma falta de trabalhadores na escola pública e com um problema gravíssimo de precariedade! Não é com
migalhas…
O Sr. Carlos Pereira (PS): — Migalhas?!
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A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — … que se vai resolver este problema, Sr. Ministro! É preciso, efetivamente, tomar medidas concretas.
Outras perguntas que lhe deixámos com grande preocupação: onde fica a ação social escolar no meio
disto tudo? Que reforço da ação social escolar vai ocorrer? Que apoios às famílias? Que apoios aos alunos?
Que apoios e meios para a educação inclusiva?
Mais ainda, Sr. Ministro: há uma preocupação que nós temos tido, que é relativa à precariedade.
Continuamos a dizer que não é aceitável que o rácio dos trabalhadores não docentes seja utilizado para
contratações a termo e que não se contratem os trabalhadores que estão em falta dizendo às escolas que não
podem ser contratados porque o rácio está preenchido. Mas se são necessários, Sr. Ministro, têm de ser
contratados. Porque é que isto não está a ser alterado? Porque não está a haver esta autorização?
Mas, novamente, Sr. Ministro, estamos a falar de um número enorme de saídas por aposentação. Esta é
uma questão muito concreta e nós fizemo-la: quantos trabalhadores da escola pública vão passar à
aposentação até ao início do ano letivo? Quantos vão ser contratados para suprir as aposentações e com que
vínculos? Não interessa contratar com vínculos a prazo para aquelas que são necessidades permanentes, é
preciso contratar e respeitar os direitos dos trabalhadores.
Depois, Sr. Ministro, faltam professores em vários grupos de recrutamento.
A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — É verdade!
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Como é possível? É uma situação que se arrasta e que já foi debatida, várias vezes, na Assembleia da República. O PCP já questionou inúmeras vezes o Governo sobre que
medidas ia tomar em relação a este assunto, mas não houve uma palavra sobre isto.
Como se vai recuperar aprendizagens se não há professores? Como, Sr. Ministro? E que medidas vai o
Governo tomar, então, para que até ao início do ano letivo se consiga resolver esta questão? E mais: não
pode ser limitado ao início do ano letivo, porque esta é uma questão de fundo e precisa de respostas de fundo.
E quais são elas, Sr. Ministro?
Além disso, gostávamos de saber se na preparação do próximo ano letivo também vai haver uma
preocupação em ouvir os alunos, porque nos parece que é preciso ouvi-los e identificar com eles os problemas
sobre as condições psicológicas, afetivas e de aprendizagem, no sentido de retomar a normalidade e de
recuperar as aprendizagens.
Por fim, termino com uma pergunta. Tendo em conta que se mantém um problema de fundo que impede
que haja a resolução de tantas questões que nós hoje estamos a debater, que é o bloqueio negocial com os
sindicatos, pergunto: para quando, Sr. Ministro, o fim do bloqueio negocial?
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — É a vez do Grupo Parlamentar do CDS-PP. Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa.
A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado: Encaminhando-nos para o fim da COVID, se correr tudo bem com a vacinação e com a imunidade de grupo,
diria que o assunto da recuperação das aprendizagens é talvez dos mais importantes que temos pela frente, a
par da recuperação da economia.
Por isso, tenho alguma dificuldade em perceber porque é que, uma semana depois de este plano ter sido
apresentado numa escola, o Parlamento não tem ainda acesso ao documento robusto para podermos ter uma
discussão que seja realmente informada e realmente transparente. Temos acesso a um vídeo sobre a
proteção na escola e a um PowerPoint, mas se, de facto, queremos ter uma posição concertada na construção
daquilo que é para mim, para o CDS, uma das linhas principais de recuperação deste País, deveríamos
começar exatamente por aí, por ter acesso à informação, para a discussão não ser assimétrica e, enfim, mal
informada, para não haver equívocos, para não haver erros. Esta é a primeira nota que gostava de deixar.
Em relação ao que é público e a que tive acesso, exatamente nesta atitude de procura e porque reconheço
a importância de alguns temas para pontes de entendimento, gostava de começar por elencar aqueles com
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que eu — lendo os três eixos de ação de uma espécie de um press release a que tive acesso — e o CDS
estamos de acordo. Há realmente algumas coisas em que estamos de acordo e que são bons pontos de
partida.
Por exemplo, a aposta na leitura e na escrita no 1.º ciclo. Sabemos que é importante — até já sabemos
desde o estudo que ganhou o Prémio Maria de Lourdes Pintasilgo de 2017 — e que aqui reside o início do
insucesso escolar, portanto é importante apostar nestas competências.
Sobre o incremento da gestão flexível de turmas, há muito tempo que temos vindo a falar sobre isso, até
por contraposição à tal política patriótica e de esquerda de que o Sr. Ministro diz que faz parte, uma vez que
essa política pretende a redução do número de alunos por turma.
Permitir que um aluno que reprove a uma ou a mais disciplinas transite de ano e possa frequentar essa
disciplina que vem do ano anterior — sim, estamos de acordo.
Quanto ao desenvolvimento de indicadores e instrumentos destinados à monitorização do plano para
promover informação transparente — sim, estamos de acordo.
Estamos de acordo, mas muitas destas ideias só vão ter impacto a médio ou a longo prazo e, de facto,
para terem esse efeito a longo prazo, deviam estar a começar a ser trabalhadas se não hoje ontem já. E isso
preocupa-me, porque o que não vejo neste plano — e aí, sim, sinto uma lacuna significativa — são as medidas
de urgência, as medidas de emergência.
Quantos alunos dos estudos de diagnóstico, do trabalho nas escolas, estão sinalizados para se saber o
que já têm para trás? Quais as suas dificuldades e em que disciplinas? Se não souber isso, não sei quantos
professores e, sobretudo, que professores é que preciso de contratar para dar apoio.
Quantos alunos regrediram em termos de comportamento, de motivação, de absentismo? Que trabalho de
mediação é preciso fazer já para que eles retomem o ano no início de setembro? Porque é que não há um
trabalho no verão para estes alunos que estão sinalizados como sendo de maior risco? Porque é que não há
um trabalho no início do ano letivo, ainda antes de começarem as aulas em setembro, para que eles possam
começar as aulas não para trás, mas, pelo menos, com as dificuldades reduzidas?
O Sr. Presidente: — Tem de terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Termino, sim, Sr. Presidente, dizendo que me parece que este é um plano de investimento, mas não é um plano de recuperação e de emergência. Pergunto: onde está a
emergência, para os senhores, na realização deste plano?
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Bebiana Cunha, a quem aproveito para desejar as maiores felicidades, sucessos, êxitos e sorte nesta nova função que vai exercer aqui, no Parlamento, como
líder do Grupo Parlamentar do PAN. Ao mesmo tempo, felicito o PAN pelo seu congresso e respetivos
resultados.
Tem a palavra, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Sr. Presidente, agradeço-lhe duplamente, não só por me passar a palavra mas pelas saudações e felicitações que me endereça a mim em particular e também ao PAN. Cá estaremos
para fazer o nosso trabalho.
Sr. Presidente, Sr. Ministro e respetiva equipa, Sr.as e Srs. Deputados: Começaria por saudar o PCP pelo
agendamento deste tema e por saudar as comunidades educativas, evidentemente, pelo trabalho que têm
desenvolvido de forma árdua e competente, o que parece ser consensual nesta Casa.
Temos dito ao Sr. Ministro, sempre que nos temos encontrado, que esta é, claramente, uma oportunidade
única para reforçar as políticas públicas de educação, para fazer reestruturações fundamentais no caminho
seguido.
Perante o plano que, de forma ainda incipiente, iremos discutir — esperamos que ele possa ser discutido a
posteriori, de forma mais aprofundada —, gostaríamos de trazer duas reflexões. Estamos ainda perante um
plano bastante vago que, por um lado, parece não cair na tentação do «penso fácil», de procurar respostas
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externalizadas, e parece querer fazer um caminho de reforço das respostas internas das comunidades
educativas, de dignificação dos profissionais da educação. Inclusivamente, parece trazer um caminho no
sentido de levar os planos nacionais — o das artes, o da leitura, entre tantos outros —, as competências team,
para os objetivos primordiais deste plano de recuperação.
Porém, para podermos assumir que não se trata, efetivamente, de um plano tão vago, é fundamental haver
compromissos do Sr. Ministro e respostas muito concretas. Desde logo, é dito no plano que ele assenta em
três pilares: sucesso, inclusão e cidadania. Na perspetiva do PAN, faltam-lhe dois pilares, que são o da
inovação e o do bem-estar.
Insistimos com o Sr. Ministro para que houvesse uma ampla auscultação das comunidades educativas e,
porque, na última vez que nos encontrámos, o Sr. Ministro já elencou várias entidades que foram ouvidas,
interessa-nos perceber quem foi, efetivamente, ouvido da parte dos estudantes, das nossas crianças e jovens,
bem como saber se vão ser ouvidos no planeamento do próximo ano letivo, como tem recomendado o CNE
(Conselho Nacional de Educação).
Uma segunda questão, ainda nesta fase inicial, é a de que a autonomia curricular se reveste de um
instrumento valioso, mas ele só será efetivo se houver uma autonomia que não seja sinónimo de decisões
sem rede da tutela. Na revisão dos conteúdos programáticos ao nível das aprendizagens essenciais, sabemos
bem que os nossos professores já fazem esta revisão horizontal e vertical dos currículos, mas eles continuam
a apelar, ao Ministério da Educação, por uma rede de suporte com vista a que essa revisão dos conteúdos
essenciais seja validada e tenha este suporte do Ministério.
Aplausos do PAN.
O Sr. Presidente: — Mais uma vez, muitas felicidades, Sr.ª Deputada. Tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Silva, de Os Verdes.
A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Saúdo o Grupo Parlamentar do PCP por trazer a debate um tema tão importante como o da
preparação do próximo ano letivo, um tema tão atual quanto, fruto da epidemia e de opções erróneas do
Governo, centenas de milhares de estudantes tiveram dois anos letivos postos em causa.
Em sede de Comissão de Educação, Os Verdes deram o seguinte exemplo: a não se alterarem as regras,
um estudante que, no ano letivo de 2019/2020, tenha entrado no 10.º ano, no próximo ano letivo terá de fazer
um exame de acesso ao ensino superior, mesmo que durante dois anos tenha tido apenas meia dúzia de
meses de aulas. O Sr. Ministro da Educação respondeu que isso acontecia com todos os estudantes. Sim, é
verdade, e esse é que é o drama!
De repente, o Governo encontrou a solução e, para brilhar, no Dia Mundial da Criança, tirou um plano da
cartola com o pomposo nome de Plano 21|23 Escola+, Plano de Recuperação das Aprendizagens e a avultada
soma de 900 milhões de euros. Na verdade, nem o floreado da apresentação nem os milhões prometidos são
compatíveis com o plano apresentado.
Da leitura possível são-nos suscitadas algumas questões. Em quanto tempo se vai concretizar este plano,
na sua totalidade?
O Governo fala da apresentação de um plano de autonomia curricular, com recomendações para o
acompanhamento de cada aluno. Vai estar pronto no início do ano letivo?
Lemos sobre turmas dinâmicas, mas serão elas possíveis quando o Ministério da Educação recusa diminuir
o número de alunos por turma, até em tempo de pandemia, quando é recomendada a limitação de pessoas
em espaços fechados?
Refere-se a constituição de equipas educativas. Quando vão ser contratados trabalhadores para as
constituir? Vão estar em funções já em setembro? E com que vínculo? Vai o Governo estimular os
trabalhadores a empenharem-se com os alunos ou vai dizer-lhes que por seis meses estão ali e, depois, logo
se verá onde estarão ou se estarão?
Anunciam-se ações específicas de formação para pessoal docente e não-docente. Quando se vai fazer
esta formação? Todo o pessoal estará preparado no primeiro período ou irão começar a receber formação em
setembro e os alunos irão aguardar que os profissionais estejam capazes de aplicar os planos?
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Sim, Sr. Ministro, estas são apenas algumas das perguntas que se colocam nesta fase em que ainda é
possível trabalhá-las, mas, na verdade, o que é absolutamente necessário é que o Governo esclareça, para
que não seja apenas mais um anúncio.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.
O Sr. André Ventura (CH): — Começo por me dirigir a si, Sr. Presidente, que felicitou o PAN pelo seu congresso, mas, aparentemente, esqueceu-se de felicitar o Chega também pelo seu congresso, pelo que tem,
hoje, a oportunidade de o fazer, se entender que todos os partidos nesta Assembleia são iguais e merecem da
sua parte a mesma atenção e o mesmo empenho.
Protestos do Deputado do BE Jorge Costa.
O Chega, que eu saiba, é um partido do Parlamento e teve o seu congresso, tal como o PAN também teve.
Penso que merecem os dois a mesma saudação.
Srs. Deputados, Sr. Ministro, disse que os rankings que avaliam as escolas são injustos, mas são rankings
criados com os seus indicadores e são rankings criados pelos indicadores que o próprio Governo definiu. Ora,
quando vem a esta Casa dizer que a vergonhosa situação das escolas públicas é a causa dos rankings está a
assumir o seu próprio falhanço.
Aproveito para lhe perguntar se é, ou não, verdade que, até setembro, vamos ter todos os computadores
finalmente distribuídos, como o senhor tinha prometido no final de 2020, por todas as escolas, sejam elas
públicas ou privadas. É que, Sr. Ministro, já basta de pagarmos 4600 €, com comemorações do 25 de Abril, a
destacados militantes socialistas e não haver dinheiro para pagar computadores às escolas nem para pagar
aos nossos professores e assistentes de educação. Era nisso que um Governo socialista deveria pensar no
dia em que anuncia que alguém vai ganhar 4600 € por mês e não tem dinheiro para distribuir computadores às
escolas públicas, que continuam a definhar em qualidade sempre sob a sua tutela.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, o congresso do Chega foi no dia 28 de maio…
O Sr. André Ventura (CH): — E o Sr. Presidente não disse nada sobre isso!
O Sr. Presidente: — Já passou uma semana e o próprio Sr. Deputado não o referiu. É evidente que lhe desejo todas as felicidades pessoais.
O Sr. André Ventura (CH): — Pessoais!
O Sr. Presidente: — Não havendo mais nada a dizer sobre isto, tem a palavra Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo. Também teve um congresso, Sr. Deputado?
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Se for preciso, faço um congresso, Sr. Presidente.
Risos.
O Sr. Presidente: — É verdade, é verdade. Não quero estar a fazer comparações,…
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — É melhor não!
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O Sr. Presidente: — … porque não posso nem devo, mas nem a Iniciativa Liberal nem o Chega mudaram as caras de quem os representa no Parlamento, e quem representa hoje o PAN no Parlamento é uma Sr.ª
Deputada que não é exatamente a mesma que o representava antes.
O Sr. André Ventura (CH): — Não é a mesma?!
O Sr. Presidente: — Também era difícil partidos que têm um único representante conseguirem mudar de representante.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, eu só quero dirigir-me ao Sr. Ministro da Educação.
O Sr. Presidente: — Peço que me compreendam também a mim.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Fica já a informação de que a nossa convenção será em dezembro.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado e parabéns, Sr. Deputado. Bom trabalho e felicidades pessoais também para si.
Faça favor, Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Muito obrigado, Sr. Presidente, e na sequência do próximo congresso do PS retribuo também.
Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Para quem ache que o
tema dos atrasos de aprendizagem é uma questão de somenos, convém lembrar dois dados. O IAVE (Instituto
de Avaliação Educativa) afirma que, em consequência do encerramento das escolas, mais de metade dos
alunos do 6.º e 9.º anos não atingem os mínimos de conhecimentos elementares. Quanto aos impactos de
longo prazo, vários estudos apontam para que muitos milhares de euros de rendimento vão ser perdidos ao
longo da vida destes alunos e vários milhares de milhões de euros vão ser perdidos pelas economias onde
eles estão.
Perante esta autêntica emergência nacional, o Sr. Ministro apresentou, no passado dia 1, um plano de
recuperação de aprendizagens. Na verdade, eram uns slides com pouco detalhe e, por isso, requeremos
acesso à versão integral do plano.
O Sr. Ministro da Educação: — Outra vez?
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Hoje de manhã, o que chegou foi um texto em que metade é para fazer elogios ao PS, porque para o PS a propaganda vem sempre primeiro, e depois há uma resma de
intenções, jargão tecnocrático e medidas sem conteúdo prático. Não há discriminação de verbas, não há
calendário de execução e não há maneira de avaliar se foram cumpridos os objetivos, que, em boa verdade,
também não são definidos em lado nenhum.
Portanto, por esclarecer ficam as dúvidas e as ansiedades dos pais e alunos que, em matéria de
recuperação de aprendizagens e visto que o Sr. Ministro diz que o plano vai custar 900 milhões de euros nos
próximos dois anos, gostavam que esclarecesse o seguinte: este valor já inclui os 125 milhões de euros
anunciados, em junho, com tanta pompa?
Destes 900 milhões, mais de dois terços são para infraestruturas. Qual é a lógica de misturar despesas
estruturais com a resposta conjuntural ao grave problema do atraso nas aprendizagens? Quanto desta
despesa estrutural já estava prevista e, se assim for, porque é que a apresenta outra vez? É só para enganar
os distraídos?
O Sr. Presidente: — Tem de terminar, Sr. Deputado.
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O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Estou quase a acabar, Sr. Presidente. Quanto do investimento de 630 milhões de euros em infraestruturas tem impacto direto na recuperação das
aprendizagens? Este investimento vai ser de menos de 300 € por aluno, o que é abaixo de todos os países
com os quais gostaríamos de nos comparar, e é um décimo do que vai gastar a Holanda, por exemplo.
Não vou fazer perguntas sobre quantos alunos, quantas escolas, por que motivo não estão previstos
programas de verão ou por que motivo não é dado ênfase aos programas de tutorias.
O Sr. Presidente: — Tem mesmo de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Vou concluir, Sr. Presidente. A três meses do início do ano letivo, é imperdoável que nada disto se saiba, que nada disto esteja
planeado e que já se tenha desistido do verão. Isto é o futuro da nossa juventude a ser hipotecado pela
inação, quando não pela incompetência, do seu Ministério.
O Sr. Presidente: — Mais uma vez, muito obrigado, muitos parabéns e felicidades.
Risos do CDS-PP, do CH e do IL.
Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues.
O Sr. Ministro da Educação: — Sr. Presidente, eu não tive congresso, mas fiz anos esta semana.
Aplausos do PS.
Tendo feito anos esta semana, o que eu esperava era uma felicitação, não por parte do Sr. Presidente mas
por parte desta Câmara.
Respondendo aos Srs. Deputados, dirijo-me primeiro ao Grupo Parlamentar do PPD/PSD e gostava de
registar a evolução positiva do pensamento do PSD em matéria de educação. Felicito-me por o Sr. Deputado
Firmino Marques, Presidente da Comissão de Educação, mostrar que longe parecem ir os tempos da
segregação vocacional precoce da fixação no afunilamento curricular e da formatação do processo ensino-
aprendizagem para exames.
Sr. Presidente da Comissão, é tão importante que falem de igualdade de oportunidades e de elevador
social. Bem-vindos ao bom caminho na discussão da educação. Congratulo-me que, com o seu bom senso,
com o seu conhecimento, nomeadamente no terreno, traga o que verdadeiramente importa porque, em abono
da verdade, esse bom caminho foi perdido durante muito tempo pelo Grupo Parlamentar do PPD/PSD.
Relativamente às questões trazidas pelo Grupo Parlamentar do PCP, queria recordar — porque assim o
fizemos, também, na nota preliminar que enviámos aos Srs. Deputados, para todos os grupos parlamentares,
incluindo para o Grupo Parlamentar do CDS-PP — que este plano de recuperação de aprendizagens foi
aprovado há semana e meia, na generalidade, no Conselho de Ministros, foi apresentado e, antes disso,
tivemos um conjunto de auscultações.
Foi perguntado por vários Srs. Deputados quem é que, afinal, tínhamos ouvido. Foi gente tão insuspeita
como Alexandre Homem Cristo. Gente tão insuspeita como David Justino. Conhecem?! Ouvimo-lo também,
porque, não é só aparentemente, é mesmo um perito da educação e ex-Ministro. Joaquim Azevedo,
conhecem? Também foi ouvido.
Obviamente, ouvimos um conjunto de outros peritos. Tivemos um grupo de trabalho e ouvimos um conjunto
de representantes de associações do setor. Foi também importante ouvir organizações sindicais, Sr.ª
Deputada, que representam os trabalhadores, nomeadamente os trabalhadores docentes.
Por outro lado, ouvimos alunos. A Sr.ª Deputada perguntava «quando é que vamos ouvir os alunos?»
Ouvimos um grupo de alunos de várias regiões do País, indicados pelos CFAE (centros de formação de
associações de escolas), ouvimos um grupo de alunos auscultados através da UNICEF (United Nations
International Children’s Emergency Fund) e tivemos uma reunião com os seus representantes, ouvimos
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também um grupo de alunos auscultados através da ComParte e ouvimos alunos presidentes de associações
de estudantes.
Foi esse o caminho que fizemos e é esse o caminho que estamos agora a fazer, porque, depois da
aprovação na generalidade, depois de conhecido o plano, estaríamos hoje a ouvir, por exemplo, todos os
diretores de agrupamento ou de escolas não agrupadas, e não estamos, porque estamos aqui, com os Srs.
Deputados. Mas vamos ouvir os diretores, vamos ouvir o Conselho das Escolas, vamos ouvir o Conselho
Nacional de Educação entre esta e a próxima semana, vamos poder ouvir todos esses representantes para ter
a aprovação final deste plano, depois de ouvidas as escolas. Portanto, também já temos essa concretização.
A Sr.ª Deputada do PCP dizia que vimos aqui apresentar generalidades. Não são generalidades! E tanto
não são generalidades que a Sr.ª Deputada tem um conjunto de receios que acabaram por se confirmar única
e simplesmente por uma razão: porque a Sr.ª Deputada já tinha dito, antes de apresentarmos este plano, que
tinha esses receios. Depois, falámos do rumo, falámos das medidas e a Sr.ª Deputada vem dizer que não as
conhece, mas elenca, praticamente ipsis verbis, tudo aquilo que tínhamos dito.
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Não, não!
O Sr. Ministro da Educação: — Por isso, é importante dizer que é normal que o PCP, neste momento, desconfie do rumo, por muito que o rumo coincida com aquilo que tínhamos referido, porque o PCP já tinha
dito que ia desconfiar do rumo.
Relativamente aos meios, e porque a Sr.ª Deputada também trouxe aqui as questões da ação social
escolar, é preciso dizer que a ação social escolar, desde 2015, aumentou 25%. Só no último Orçamento do
Estado aumentou 10,1%, 23 milhões de euros. É importante dizer que temos de ir mais longe, e é verdade que
são precisos mais recursos, por isso, trazemos mais recursos. O que não pode acontecer é dizermos que são
900 milhões de euros e, aparentemente, ficarmos todos zangados, porque, afinal, são mais 900 milhões de
euros para infraestruturas, como se as infraestruturas e o apetrechamento de que falámos não fossem
absolutamente essenciais para serem estruturais, Sr. Deputados. É que novos laboratórios digitais, novos
clubes de ciência viva na escola, novos laboratórios para o ensino profissional são, obviamente, muito, muito
fundamentais.
Sr.ª Deputada, tenho de lhe dizer que 900 milhões de euros não são rosas, com certeza, mas também não
são migalhas, são, certamente, pães com muita qualidade que as nossas escolas irão utilizar.
Relativamente ao que o CDS-PP acabou por nos dizer, que desconfia do trabalho nas nossas escolas,
porque, basicamente, vem dizer que a recuperação ainda se vai fazer. Sr.ª Deputada, o trabalho ainda não
está feito, mas está em curso.
A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Ah!
O Sr. Ministro da Educação: — De cada vez que falamos com um diretor, de cada vez que falamos com um professor, eles dizem-nos, de forma absolutamente clara, que esse trabalho está a ser feito, e está a ser
feito desde o primeiro dia em que fecharam. Estão a recuperar aprendizagens, estão a trabalhar, efetivamente,
para a recuperação e a consolidação das aprendizagens. Mas precisamos de fazer mais, sabemos que isso é
importante e concordamos consigo, Sr.ª Deputada. Concordamos na partilha, concordamos na transparência e
por isso a promovemos. E, também por isso, temos um conjunto de indicadores, para termos mais dados, para
termos melhor monitorização, para entendermos como é que podemos ver a eficiência e a eficácia de todas as
nossas medidas.
Pensava eu que o que enviámos não chegava ao Grupo Parlamentar do CDS, mas pergunte, porque nós
respondemos. Terá oportunidade de ver, através do processo legislativo, que as escolas também irão
conhecer todo o plano e, obviamente, cada uma das medidas terá um conjunto de informação complementar
que chegará às escolas, que nós também queremos que chegue.
A Sr.ª Deputada Mariana Silva, do PEV, diz-nos e realça que o plano tem um nome. Os planos,
habitualmente, têm um nome, Sr.ª Deputada, mas não nos fiquemos pelo nome nem nos fiquemos pelos
símbolos. Sabemos que, necessariamente, os símbolos representam alguma coisa. Uma pequena flor é
sempre uma flor, e é importante, e o PEV sempre se mostrou com essa grande flor…
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A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Não é para mim que está a falar!
O Sr. Ministro da Educação: — Desculpe, quero referir-me à Sr.ª Deputada Bebiana Cunha, do PAN. Queria agradecer ao PAN por, sendo exigente, saber olhar e ver a aposta humanista feita neste plano e
como foi importante, em nome da urgência, não abdicar da inclusão e da cidadania. Obviamente que os outros
princípios e os outros pilares que a Sr.ª Deputada acaba por elencar estão também no plano e fazem parte do
trabalho que cada uma das equipas pedagógicas está a fazer nas escolas.
O Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, do Iniciativa Liberal, diz-nos que quer conhecer o plano e que
fez um requerimento nesse sentido. Teremos oportunidade de lhe responder, mas traz-nos aqui uma dúvida,
que é a de saber se os 125 milhões de euros são os mesmos que apresentámos. Os 125 milhões de euros
estão neste ano nas escolas, com os técnicos especializados, com os psicólogos, com os moderadores, com
os professores. Os 900 milhões de euros são para o futuro. Os 125 milhões de euros foram gastos, por
exemplo, em tutorias, no reforço do crédito horário.
É preciso clarificar isto, porque houve quem colocasse essa questão, quem perguntasse onde é que
estavam esses professores. Quem conhece as escolas, quem conhece as dinâmicas das escolas sabe que,
no ano passado, nos normativos, mudámos a assignação de crédito horário que corresponde a cada uma das
turmas TEIP (territórios educativos de intervenção prioritária) e não TEIP e, por isso, na indicação de
componente letiva, logo em julho, os Srs. Diretores, as equipas de direção tiveram oportunidade de pedir
esses recursos. No dia 14 de agosto, quando a contratação inicial foi anunciada, esses professores estavam
assignados a cada uma das escolas e, no dia 1 de setembro, estavam lá.
A Sr.ª Coordenadora do Bloco de Esquerda fez perguntas sobre essa matéria. A Sr.ª Deputada conhece
bem as escolas e sabe que esses professores estão lá desde o início do ano letivo, não havendo nenhuma
dúvida relativamente a isso.
Quanto aos técnicos especializados, quero dizer que foi dada autorização às escolas, e as escolas fizeram
a contratação, podendo agora, também, fazer a renovação. E há um conjunto de escolas, quase 200 escolas
ou agrupamentos, que vão também poder ter técnicos especializados, uma vez que não tiveram no ano
passado, já que não recorreram a este instrumento.
A terminar, quero dizer ao Sr. Deputado do Chega que rankings nós não fazemos, é na porta ao lado.
Indicadores temos, e convidamo-lo a que os analise, que os estude e que faça alguma coisa para entender,
verdadeiramente, o que é a escola.
Vir para aqui com sound bites, todos sabemos fazer, mas o Sr. Deputado parece saber melhor do que
todos nós. E não brinque com o 25 de Abril!
O Sr. André Ventura (CH): — É dinheiro nosso!
O Sr. Ministro da Educação: — Não brinque com o 25 de Abril, porque o 25 de Abril é demasiado sério, toda esta Câmara sabe o que significa e os portugueses também.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, não o felicitei por nenhum congresso, porque ainda me lembro, embora tenha sido há 25 anos, que, quando se está no Governo, está-se em congresso permanente. E cinco anos e
meio como Ministro é um resultado já muito apreciável. Muitos parabéns e muitas felicidades!
Passamos à segunda ronda do debate.
Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Tiago Estevão Martins, do Grupo Parlamentar do PS.
O Sr. Tiago Estevão Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Nas semanas que antecederam a apresentação deste plano, o Plano de Recuperação de Aprendizagens,
ouvimos diversas reivindicações da sociedade civil. E durante esse período foram pedidos recursos
adequados, que haja dinheiro para que o plano tenha meios; autonomia para as escolas, para que se possa
adequar a resposta ao meio em que a escola se insere; o envolvimento das famílias; a promoção do bem-estar
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psicológico; que haja mecanismos de avaliação, para que possamos aferir o impacto das medidas. Tudo isto
num debate que, aliás, tem sido muito rico e muito alargado.
Em boa verdade, este é um debate que tem mobilizado a sociedade, porque é uma preocupação
fundamental o futuro dos nossos alunos. E aquilo que podemos dizer hoje, já com conhecimento deste plano,
é que o Governo soube interpretar as preocupações expressas no debate que foi sendo feito, um debate que,
diga-se, o Governo procurou promover desde sempre. O Governo procurou promover este debate porque
assumiu desde sempre, como fundamental, a preocupação com o impacto da pandemia nos nossos alunos.
Sabemos que a perda de dias de aulas, mas também das aprendizagens, é uma questão global, embora
com graus de intensidade diferentes, sabemos que, embora Portugal se situe na metade inferior da média da
OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico) do número de dias de aulas
perdidos, isso em nada nos pode descansar e, de facto, sempre foi nosso entendimento que nada substitui o
professor nem a sala de aula, como, aliás, bem tem sido dito e como o Governo cedo percebeu.
Os resultados que temos, à data, são duros, mas é essa a responsabilidade de quem está comprometido
com o combate às desigualdades. Por isso mesmo, o plano que, hoje, aqui discutimos é um plano feito a
muitas mãos, porque é de muitas mãos, de diversidade que é feita a escola, precisamente porque o Governo
entendeu, e bem, que para o desenho deste plano era necessário ouvir. Para concretizar este plano, o
Governo decidiu dialogar e promoveu auscultações a alunos, professores, diretores, peritos, psicólogos, ONG
(organizações não governamentais), representantes dos vários setores da educação, antigos ministros da
educação. Mas este plano também é fruto de um grupo de trabalho criado para o efeito, constituído por
especialistas com perfis muito diferentes.
Sabemos que o plano é ambicioso — ninguém, aqui, o negou —, mas é ambicioso porque a tarefa é de
grande monta. São 900 milhões de euros para dar corpo a uma abordagem pedagógica, estruturada e
consistente, dinheiro sem o qual não seria possível criar o contexto nem as condições para o esforço que
temos pela frente.
Mas é importante que se diga, porque é verdade, que reduzir este plano apenas aos meios, ao dinheiro, diz
muito pouco sobre aquilo que estamos aqui a discutir. Há quem faça de todas as discussões uma discussão
sobre o número de professores, sobre o número de assistentes operacionais, sobre quantas obras estão feitas
ou serão feitas, sobre quantos computadores estão em causa, mas esta discussão é muito mais do que isso.
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Muito bem!
O Sr. Tiago Estevão Martins (PS): — Esta discussão é muito mais do que isso, porque o plano também é muito mais do que isso. O plano apresenta uma visão clara do reforço da autonomia das escolas, na gestão
mais autónoma do calendário, na gestão mais flexível das turmas, e o muito dinheiro vem, também, a par de
muitas medidas pedagógicas propostas, como a própria estruturação do plano demonstra.
Sr.as e Srs. Deputados, em bom rigor, este plano apresenta-nos três eixos. O primeiro é sobre o que se
quer fazer com as aprendizagens, o segundo é sobre os meios para que tal seja possível e o terceiro é sobre
como podemos avaliar e acompanhar os resultados das políticas implementadas. Contudo, quem acompanhar
este debate, quem tenha ouvido o debate até aqui fica com a ideia de que um plano destes é apenas uma lista
de compras. Mas, Sr. Ministro, como vimos, aliás, neste debate, sabemos que, nesta Casa, estas discussões
assumem sempre a mesma dinâmica, a mesma sequência, o mesmo argumentário. Há sempre quem peça
estabilidade, mas peça mudanças todos os meses; há sempre quem peça mais autonomia para as escolas,
mas passe o tempo a pedir mais regras e orientações;…
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Muito bem!
O Sr. Tiago Estevão Martins (PS): — … há quem diga que nada é sua responsabilidade, mas não hesite em intervir em matérias da competência exclusiva do Governo, como, aliás, bem aconteceu, recentemente,
com o futuro regime de recrutamento de docentes; há quem diga que as medidas estão atrasadas, mesmo que
cumpram com o calendário definido; e há quem aja como se começássemos sempre do zero, dizendo que
nada foi feito, mesmo que os dados e a realidade o desmintam.
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Sr.as e Srs. Deputados: A educação está longe de ser o caos que insistentemente tentam fazer passar e
muito menos funciona em piloto automático, para que se possa dizer, quando as coisas correm bem, que
acontecem independentemente do Ministro.
Sabemos que, em educação, nunca está tudo feito, por isso aqui estamos para continuar o caminho.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cláudia André, do Grupo Parlamentar do PSD.
A Sr.ª Cláudia André (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, julgo que a pergunta do dia de hoje é: onde está o plano? E, pelo que ouvi até agora, parece-me que ainda não há
plano. Temos, realmente, ouvido muitas entidades, temos, realmente, ouvido muitas opiniões, mas resultaram
num PowerPoint.
O Grupo Parlamentar do PSD, até à data, só conhece um PowerPoint, que é um conjunto de ideias vagas,
de frases feitas e de fórmulas mais do que gastas, iguaizinhas às de outros documentos, que podiam
perfeitamente encaixar nos anos de 2016, 2018 ou 2019.
Um PowerPoint, como costumo dizer ou como dizia aos meus queridos alunos, tem sempre de ter por
detrás um estudo, um trabalho de investigação consolidado e científico, porque ele serve apenas para
identificar uma mensagem simples. E, realmente, foi uma mensagem simples que o Ministro da Educação quis
passar há sete dias: um PowerPoint que anuncia 900 milhões de euros e que, a seguir, coloca uma série de
conteúdos, mas ninguém consegue perceber muito bem onde é que estão os milhões e onde é que vão ser
gastos. Uma coisa é certa: na última página, percebemos que 670 milhões são para equipamentos. E estes
equipamentos deviam ter chegado ao longo do mandato do Sr. Ministro da Educação, que é longo, porque
nunca foi tão longo nenhum outro mandato de outro ministro da educação desde o 25 de Abril, ou até antes.
Portanto, estes equipamentos, desde que o Sr. Ministro «reina» neste Ministério da Educação, já deviam
ter chegado em setembro de 2020, conforme anunciado, e já deviam ter chegado em janeiro de 2021, quando
os alunos estiveram confinados. Mas não, os equipamentos vão chegar agora e tiram, dos 900 milhões de
euros, 770 milhões para equipamentos e apetrechamentos. Ou seja, para o apoio nas escolas, efetivamente,
sobram pouco mais de 240 milhões de euros, e estes 240 milhões de euros significam, então, 143 € por aluno.
Este estudo diz-nos que, simplesmente para pessoal de apoio aos alunos, temos 140 € por aluno, para o
próximo ano letivo.
O que é mais interessante é que o estudo da Universidade Nova que saiu em março diz-nos que, só para
tutores de Português e de Matemática, teriam sido precisos 240 milhões de euros, o que significa, no mínimo,
422 € por aluno.
Por isso, Sr. Ministro, que ainda não conseguiu fazer um diagnóstico de todos os anos de escolaridade,
que ainda não sabe que perdas houve, ao contrário do que diz, e que está muito preocupado com as perdas
dos alunos, mas ainda não conseguiu aferir estas perdas, tenho algo para lhe perguntar: porquê, Sr. Ministro?
Por que razão não consegue ter um plano eficaz, um diagnóstico real? E por que razão ainda o vem anunciar
para a comunicação social sete dias antes de ter um plano que nos diga exatamente, com exaustão, tudo
aquilo que concluiu, depois da audição de tão nobres figuras, que o são, não tenho a menor dúvida?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Ainda no tempo do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado António Cunha.
O Sr. António Cunha (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Quanto ao Plano 21|23 Escola+, não deixa de ser jocoso o anúncio das medidas e dos recursos. Do nosso ponto de
vista, não passa de um plano de consolidação de promessas não cumpridas, de propostas e números
requentados para enganar os mais incautos.
O seu PowerPoint não quantifica recursos, tanto humanos, como materiais, e nem sequer os calendariza.
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Anunciam-se 900 milhões de euros. Pergunto: para serem gastos onde? Com que alunos? Em que espécie
de autonomia? Em que prioridades? Para um ou dois anos letivos? Não sabemos.
Sabemos que, no Eixo 1, «Ensinar e Aprender», os senhores anunciam, do meu ponto de vista bem, 37
ações específicas e 18 recomendações para as escolas concretizarem. Mas, no Eixo 2, «Apoiar as
Comunidades Educativas», onde é preciso investir os euros, os senhores anunciam tão-somente nove ações
específicas e zero recomendações. Zero! Porquê?!
Das ações, há uma, «reforço de docentes», que é apenas a continuidade do reforço do crédito horário
deste ano letivo, que sabemos que foi insuficiente.
Há outra, requentada, a «escola digital», já anunciada no PRR (Plano de Recuperação e Resiliência) e 15
meses depois da aprovação do Plano de Ação para a Transição Digital.
Proclamam o reforço de docentes, mas eles já existem, por se tratar de um acréscimo correspondente à
vinculação obrigatória que o Governo tem de fazer dos professores da norma-travão. Com plano ou não,
seriam vinculados, por isso este anúncio cheira a mofo e é ressesso.
Congratulamo-nos com a anunciada descentralização e reforço da autonomia das escolas, sobre as quais
falou com alguma genica. Mas foi o seu Governo que travou, em 2015, o programa Aproximar Educação, e,
por isso, perdemos seis anos no processo de descentralização de competências.
Mas, neste plano, não há orientações claras e concretas sobre o reforço dessa autonomia. Vai colocá-las
no despacho de organização do ano letivo? De que forma? Robusta? Com suborçamentação?
Não se ouve, deste Governo, uma palavra sobre a promoção da atratividade e da valorização da carreira
de docente, nem uma palavra sobre a formação inicial, de forma a compensar o elevado número de
aposentações nos próximos anos.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.
O Sr. António Cunha (PSD): — Termino já, Sr. Presidente. Este é o Governo que deixou de executar 7 mil milhões de euros, dos quais 1250 milhões não foram
usados para apoios sociais, que deixou 17 000 alunos sem acesso remoto às aulas, que deixou para trás
cerca de 80 000 alunos com necessidades educativas especiais e que deixou 350 000 alunos, apoiados pela
ação social escolar, praticamente abandonados.
O Sr. Presidente: — Tem mesmo de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. António Cunha (PSD): — Também é estranho o silêncio do Governo perante as feridas que têm vindo a público sobre situações graves de insegurança e de violência em contexto escolar.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Alexandra Vieira, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.
A Sr.ª Alexandra Vieira (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A crise económica afeta os alunos e as suas famílias. Um estudo encomendado pelo Governo levantou o problema do impacto da carência
económica e da precariedade habitacional nas aprendizagens.
Feito o estudo, que consequências se tiram? Que parte desse investimento na educação vai para o reforço
da ação social escolar?
Sobre as aprendizagens não realizadas, o Bloco de Esquerda faz três constatações, sendo a primeira a de
que as escolas implementaram, no ano passado, um plano de recuperação. Portanto, parece que, nesta
proposta, não existe nada de novo.
Em segundo lugar, no momento excecional que vivemos, concordando que há aprendizagens que podem
estar comprometidas, não se vislumbra nenhuma intenção de rever normativos em vigor que transformam o
currículo numa manta de retalhos, desde logo as metas de aprendizagem e os exames nacionais, que
continuam em vigor, paralelamente ao Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória e ao Decreto-Lei
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n.º 55/2018, relativo à autonomia e flexibilidade curriculares. Uns e outros são antagónicos e geram profundas
tensões.
Em terceiro lugar, referem-se os laboratórios de aprendizagem. O Sr. Ministro importa-se de definir o que
são? Inserem-se no objetivo estratégico de diversificar as estratégias de ensino? São mais recursos digitais?
Mais equipamentos?
Sr. Ministro, devo dizer que há formas mais económicas e eficazes de recuperar aprendizagens. A fórmula
é simples: visitas de estudo, sair dos muros da escola, conhecendo o meio e a comunidade em que se
inserem os alunos, os museus e os monumentos, os parques, as bibliotecas, as zonas protegidas, as ruas da
cidade ou da vila, ou conhecendo outras cidades, em interdisciplinaridade com quase todas as disciplinas e
concretizando, direta ou indiretamente, as aprendizagens não realizadas.
Sem dúvida que o primeiro ciclo tem de ser alvo de uma atenção muito cuidada, mas não podemos exigir
às crianças que despendam horas extra na recuperação. Há outras estratégias. A pedagogia e a didática
indicam-nas e os professores conhecem-nas. Saberá o Sr. Ministro que a brincar também se aprende? Ora, o
lúdico e o tempo para brincar livremente nunca foram tão escassos como o são neste momento.
A recuperação da aprendizagem já está a ocorrer, mas, para que seja eficaz, é muito importante diminuir o
número de alunos por turma e garantir que não haja turmas mistas, para que sejam permitidas, por essa
razão, turmas com menos alunos, pelo menos no primeiro ciclo.
Quanto às recomendações para a melhoria das aprendizagens dos alunos em Matemática, dado que já
existe um Plano da Matemática, que já tem 280 páginas, em resultado de um estudo encomendado pelo
próprio Ministério da Educação, qual é a sua pertinência? O que é que este plano acrescenta às
recomendações para a melhoria das aprendizagens em Matemática?
Deixamos, desde já, um alerta: se um aluno tem, repetidamente, insucesso a uma disciplina, o problema é
dele ou é da disciplina? Por que razão é que, tal como foi apresentado, tem de ser o aluno a frequentar a
disciplina no ano anterior? Além da dificuldade organizacional que isso trará às escolas, é pouco pedagógico,
para não dizer psicologicamente desaconselhável.
O investimento em equipamento e infraestruturas é necessário e urgente. O Bloco de Esquerda há muito
que o defende. Porém, esta necessidade não devia esconder uma outra, igualmente urgente, senão mesmo
até mais: a falta gritante de investimento em recursos humanos, que continua a ser, no nosso entender, a
parte mais frágil deste plano, assim como de todo o sistema educativo, para a qual não se vislumbra nenhuma
medida concreta e estrutural no sentido da sua resolução.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Alma Rivera, do Grupo Parlamentar do PCP.
A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação e restantes Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Se já eram insuficientes os meios humanos — temos vindo a falar sobre isso
hoje, e é consensual, o que motivou, aliás, o início de um caminho de redução do número de alunos por turma,
ainda que claramente insuficiente, arrastado e demorado por parte do Governo —, agora, tendo em conta os
últimos dois anos, é demasiado urgente que esse caminho seja retomado e aprofundado.
Por ser um direito dos alunos serem acompanhados de forma próxima e dedicada ao seu processo de
aprendizagem e por ser preciso dar condições aos professores para poderem cumprir o seu papel
indispensável, o Governo tem de assumir compromissos.
A COVID-19 evidenciou da pior maneira como a interação professor-aluno é fulcral. Com tanto que ficou
para trás, com essa profunda cicatriz, não se pode insistir numa fórmula de megaturmas, que já era má antes,
quanto mais agora!
É evidente que, ter turmas mais pequenas, reduzir o número de alunos por turma, tem de ser uma
prioridade nesta fase. Para isso, são precisos professores. Isso é incontornável. São precisos mais
professores, professores valorizados, tratados condignamente. É preciso vincular os que estão e, para isso,
eliminar os requisitos, por exemplo da norma-travão, que impedem essa vinculação e condenam milhares de
professores e de educadores à precariedade.
Mas são precisos mais professores para turmas com menos alunos, e alunos com mais acompanhamento.
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Ainda relativamente aos professores, num contexto em que precisamos tanto destes profissionais e da sua
motivação, vai o Governo corrigir a injustiça de não considerar os horários completos e incompletos na
mobilidade interna? Vai pôr fim à injustiça que afasta os professores dos horários incompletos do acesso às
prestações sociais? Estas são perguntas muito concretas.
Não há recuperação de aprendizagens, não há minoração dos efeitos da COVID-19 se não se assumirem
investimentos e prioridades, e a escola é uma delas.
Não está em causa aquilo que se passa estritamente na sala de aula; é preciso, como irá ser preciso, um
reforço a nível dos auxiliares de ação educativa, dos administrativos e dos técnicos especializados.
Com um desafio como o que temos pela frente, não podemos ter uma escola pública a funcionar com os
mínimos. Isto quer dizer que é preciso contratar os funcionários que estão em falta, sim.
O Governo vai, ou não, avançar em relação a isto, concretamente? O que será feito com os trabalhadores
não docentes contratados com contrato COVID-19? Vão ser integrados? Estão a desempenhar necessidades
permanentes, não estão? É evidente. Então, o que vamos fazer relativamente à sua modalidade de
contratação?
Relativamente aos técnicos especializados, como, por exemplo, os psicólogos, tão essenciais nos tempos
que vivemos, se a DGAE (Direção-Geral da Administração Escolar) não tem autorizado o mecanismo de seis
meses, argumentando que a entidade empregadora é o mesmo organismo da Administração Pública, como
pensam garantir a continuidade do trabalho e a estabilização destes técnicos especializados?
Ouvir este debate faz-nos pensar. Quando os alunos não conseguirem acompanhar e progredir na matéria,
e o professor não conseguir ter tempo para lhe dedicar exclusivamente, quando faltar o terapeuta, todo o
trabalho feito é posto em causa. Quando os alunos estiverem com quadros depressivos e ansiosos
exponenciais e não houver o psicólogo, não é a lírica do ministro nem as citações do Partido Socialista que
vão valer a estes alunos. Portanto, são precisos meios.
É isso que temos vindo a dizer e é com isso que queremos que o Sr. Ministro se comprometa,
concretamente.
O Sr. Ministro gaba-se de um aumento de 20%, desde 2015, na ação social escolar, entre outros números
que nos vai citando. Muito bem, mas, em 2020, abateu-se uma pandemia no mundo e no nosso País também.
Isso criou novas necessidades, e para uma situação excecional são precisas medidas excecionais.
Parece que o Governo não quer ouvir isto, só que vai ter a prova das consequências da sua falta de
investimentos mais à frente, e estas vão ser muito mais palpáveis e muito mais graves do que o défice.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — É a vez do Grupo Parlamentar do CDS-PP. Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa para uma intervenção.
A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nesta ronda, gostava de falar, então, sobre o Orçamento, sobre os tais 900 milhões de euros anunciados, porque, mais uma vez, precisava de mais
informação para perceber exatamente de que é que estamos a falar.
Há pouco tempo, quando se discutiu o PRR, foi apresentado um conjunto de medidas em grande parte
sobrepostas às que são apresentadas agora, e ainda bem. É sinal de consistência, com certeza. Mas,
infelizmente, os agregados não coincidem, portanto a comparação torna-se complicada.
Senão, vejamos: no PRR, havia, para investimento na área digital, uma verba de 599 milhões de euros,
com um calendário de execução até 2025, dizendo-se que estava previsto que muitas das metas seriam
concluídas em 2026. Agora, para dois anos letivos, aparece um plano de 900 milhões de euros, que é suposto
estar completo em 2023.
Outro bom exemplo é a produção de recursos educativos digitais, que, no PRR, está calendarizada para o
último trimestre de 2025 — segundo o plano que, a esse sim, tive acesso —, mas, agora, diz que vão ser
feitos até 2023.
Gostava que ficássemos esclarecidos sobre os vários documentos que nos são apresentados, porque, de
facto, volto a dizer, para um assunto tão importante, era bom que tivéssemos informação clara. Não sei de
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quem é, quem a gere, se é intencional ou não, mas, neste momento, sei que não consigo avaliar exatamente o
que é que vai ser investido e como.
É explícito que, destes 900 milhões de euros, 670 milhões são o chamado investimento de capital. Convém
não somar laranjas com maçãs. Investimento de capital é aquele que fazemos em infraestruturas — routers,
wi-fi, os computadores de setembro de 2020, isso tudo é investimento de capital. E, depois, há investimento
operacional, que são 43,5 milhões de euros para formação de professores, verba que também estava prevista,
de alguma maneira, no PRR; 47,3 milhões de euros para os recursos digitais, os tais que no PRR aparecem
para 2025; e, depois, 140 milhões de euros para recursos humanos em dois anos.
Já aqui foi perguntado pelo PCP e pelo Bloco, e eu faço a pergunta talvez com um olhar um pouco
diferente: estes recursos humanos são contratados diretamente pelas escolas, como o Sr. Secretário de
Estado já aventou como hipótese numa entrevista ao Público? São contratados dois anos e depois ficam
vinculados ou já não serão necessários, porque foram para tutorias específicas e avaliar-se-á, no final desse
período, se são ou não necessários para continuar?
A questão é que, do investimento operacional, dos 335 milhões de euros — os tais 125 milhões que vêm
deste ano, mais os 215 milhões que aparecem agora, excluindo o investimento de capital —, não sabemos
dizer se isto é muito ou se é pouco, porque não sabemos, exatamente, como é que eles vão ser aplicados, se
vão ser aplicados na recuperação propriamente dita, que era o seu objetivo, ou se vão ser aplicados a fazer
aquilo que o Governo não fez noutros anos, como por exemplo 50 salas de pré-escolar, ou semestralizar anos,
coisas que já vinham de trás.
Portanto, o que quero saber — e a pergunta é muito clara — é o seguinte: com o que é que o Sr. Ministro
se compromete em 2023? É como a nossa economia, trazê-la de volta a 2019, e os nossos alunos vão estar
nos níveis de 2019? Ou vai levá-los mais à frente e desenvolver para o nível em que eles deviam estar, de
facto, em 2023, com um crescimento em termos de sucesso educativo?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Bebiana Cunha, do Grupo Parlamentar do PAN.
A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro, gostaríamos de insistir numa pergunta que já lhe deixámos na primeira ronda e que se prende com a revisão dos conteúdos
programáticos. Gostaríamos de saber se o Ministério da Educação vai estar na retaguarda desta revisão às
aprendizagens, no caminho que deve ser feito ao nível do foco nas aprendizagens essenciais, ou se vai
esconder-se no chapéu da autonomia das escolas.
O Sr. Ministro, na sua intervenção, referiu, precisamente, que um dos pilares é a inclusão, o que,
evidentemente, já aqui saudámos, mas a inclusão precisa de sair do papel. Por isso, a esse nível, gostaria de
lhe deixar aqui uma série de questões, até porque, como é referido no documento — e bem —, as pessoas
mais afetadas por esta crise socioeconómica são, evidentemente, as pessoas mais vulneráveis, mais
fragilizadas e, portanto, relativamente a estas pessoas, há uma série de questões que têm de ser acauteladas
no que diz respeito ao início do próximo ano letivo.
Uma das questões prende-se com o facto de percebermos se o Ministério da Educação vai antecipar os
problemas de transporte destas crianças socioeconomicamente mais vulneráveis e que se repetem, por
razões administrativas e razões financeiras, todos os anos letivos.
Um dos aspetos que também é referido neste documento prende-se com a gestão flexível das turmas,
visando aqui atribuir às escolas a possibilidade de diminuir o número de alunos por turma. O que gostaríamos
de saber é como, efetivamente, vai o Ministério da Educação garantir esta gestão flexível das turmas, como é
que vai garantir este apoio às escolas.
Quando, no documento, se fala de generalização da orientação escolar e profissional, queremos saber o
que é que isso significa, se falamos de uma industrialização da orientação escolar e profissional ou se falamos
numa especialização, de mais meios, mais recursos e pessoas que possam intervir o mais cedo possível, pois
todos sabemos a importância de a orientação escolar e profissional ser feita numa perspetiva longitudinal.
E porque falamos de intervenção longitudinal e falamos de inclusão, não poderia aqui deixar de referir que,
por exemplo, uma criança surda, de dois anos, neste momento não pode frequentar a educação bilingue de
crianças surdas para poder iniciar a aprendizagem da língua gestual portuguesa. Ou seja, neste momento, as
crianças surdas não podem ser apoiadas pela intervenção precoce, porque os profissionais não dominam a
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língua gestual e não sabem comunicar com elas. E o que aqui, evidentemente, temos de refletir é que estas
famílias precisam de esperar até aos três anos de idade das suas crianças para poderem ter acesso ao início
da aprendizagem desta língua e, evidentemente, ninguém pode esperar que o seu filho ou filha complete três
anos de idade para começar a comunicar com ele. Portanto, este é um dos aspetos que queremos saber se
vai ficar resolvido, a par da necessária bolsa de intérpretes de língua gestual que os pais e as mães surdos
precisam para conseguir acompanhar os seus educandos no seu percurso escolar.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Silva, de Os Verdes.
A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O debate sobre a preparação do novo ano letivo tem de ser feito de respostas a velhos problemas, mas também de elementos
e abordagens novas.
Confrontados com as limitações das suas famílias e com as insuficiências das escolas, que por vezes
conseguem pouco mais do que «olhar pelas crianças», muitos estudos apontam para o crescimento de
dificuldades motoras por parte de crianças e jovens.
Durante os períodos mais restritos de confinamento, os recreios foram impedidos aos alunos. Para o futuro,
a escola terá atividades para puxar os alunos para o recreio? As aulas de Educação Física vão ser
asseguradas desde as mais tenras idades? Há condições estruturais? Há professores em número suficiente?
Mais desporto, mais rua. Está o Governo disponível para esta dimensão?
Sr. Ministro, por proposta de Os Verdes, no Orçamento do Estado para 2021 foi aprovado o estudo e
substituição dos sistemas energéticos das escolas por outros mais sustentáveis. Como está a aplicação desta
medida?
Há milhares de alunos que passam frio no inverno e não conseguem suportar o calor no verão, mesmo que
as escolas gastem o mesmo ou mais do que poderiam gastar pelo facto de os sistemas serem obsoletos. E
também aqui o Governo tem os meios para responder a esta necessidade, só não fará se não quiser.
Para além da pandemia, há uma doença crónica, que é a do desleixo de sucessivos Governos em relação
à escola pública. Quanto é que tem previsto gastar para recuperar as escolas que estão degradadas, que
colocam em causa as condições de trabalho para os profissionais e, principalmente, as condições de
aprendizagem?
Todos os dias nos continuam a chegar queixas de alunos, professores e encarregados de educação e
ainda há muito por fazer — é esta a conclusão que se pode tirar.
Por último, Os Verdes consideram que este é o tempo de se promoverem mudanças. Os cidadãos devem
compreender a importância da preservação da natureza e a educação ambiental deve dar uma contribuição
nesse sentido.
Poucas são as instituições de ensino que conseguem ter espaços de experimentação ambiental. E poucas
são as que proporcionam oportunidades de contacto direto e regular com a natureza aos seus alunos, prática
que contribuiria para uma melhor cidadania ambiental. Além disso, são escassas as abordagens curriculares
das matérias ambientais e de desenvolvimento sustentável, que deveriam ser áreas-âncora dos currículos,
tendo em conta que a sobrevivência da humanidade, do planeta e dos seus ecossistemas dependem da
profunda compreensão de uma nova relação dos seres humanos com a natureza.
Um dos desígnios da literacia ambiental é não apenas o desenvolvimento de atitudes e comportamentos
individuais responsáveis, mas também que a sociedade tenha cidadãos capazes de participar coletivamente,
no sentido de estudar, compreender, sugerir, denunciar, alertar e reivindicar políticas adequadas à
preservação do meio ambiente e ao progresso, rumo ao desenvolvimento sustentável.
A questão é saber se o Governo está disponível para este trabalho.
Aplausos da Deputada do PCP Alma Rivera.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.
O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro, não me respondeu a duas questões, que volto a sublinhar.
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Primeiro, em relação aos computadores, esperemos que não aconteça o mesmo que aconteceu no ano
passado, que só em 31 de dezembro encomendaram computadores que tinham prometido em março.
Portanto, a questão é muito simples: vamos ou não ter computadores este ano, quando a pandemia voltar —
esperemos que não — a agravar-se?
Sobre o insucesso escolar, voltou a não dizer nada hoje. Recordo-lhe que, nos últimos dados que
conhecemos — já que gosta tanto de dados —, apenas 44,16% dos alunos concluíram o secundário com
sucesso. É uma vergonha para o seu Ministério, foi você que o disse também. O que é que vai fazer no
próximo ano para impedir que isso aconteça?
Dos vários agrupamentos escolares que foram analisados, 376 tinham pelo menos um aluno com um
chumbo analisado e revelado. O que é que vai fazer em relação a isso, já que tem 900 milhões de euros para
gastar?
Finalmente, Sr. Ministro, não podia deixar de lhe responder ao seguinte: não estou a brincar com o 25 de
Abril, Sr. Ministro, estou a brincar com aqueles que, num momento de pandemia, em que muitas famílias veem
os seus rendimentos emagrecidos ou aniquilados, num momento em que muitas empresas têm de fechar e
muitos estabelecimentos têm de falir, o Governo deite cá para fora uma resolução, num dia escondido e numa
noite escondida, a criar três órgãos, com motoristas, apoios técnicos, 12 pessoas, e com alguém a ganhar
4600 € por mês — 4600 € por mês! — para uma celebração que vai durar um dia. Explique isso aos
portugueses que estão lá fora, que é isso que eles querem saber!
Em vez de andar com brincadeiras do 25 de Abril e de cravos ao peito…
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir.
O Sr. André Ventura (CH): — Vou já terminar, Sr. Presidente. Em vez de andar com brincadeiras do 25 de Abril e de cravos ao peito, desafio-o a explicar isto. Explique
como é que alguém vai ganhar 4600 € por mês, durante cinco anos, para uma celebração de um dia sobre o
25 de Abril! Explique lá isso! Boa sorte, e cá estaremos para ver o que é que os portugueses acham da sua
explicação!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, pelo Governo, o Sr. Ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues.
O Sr. Ministro da Educação: — Sr. Presidente, passo a responder aos vários Srs. Deputados que colocaram questões.
O Grupo Parlamentar do PPD/PSD traz aqui o PowerPoint que utilizei para apresentar este plano. O Grupo
Parlamentar do PPD/PSD recebeu, como os outros grupos parlamentares, um documento que quisemos fazer
chegar aos grupos parlamentares; é igual ao documento que está a ser enviado a todos aqueles que estamos
a auscultar.
Não sei se a Sr.ª Deputada Cláudia André conhece esse documento, devia conhecer. Se não o conhece, é
uma pena. Esse PowerPoint, diz a Sr.ª Deputada, poderia ser um qualquer plano que aconteceu em 2016 ou
em 2018. Acredito que sim, caso tivéssemos tido uma pandemia — muitos deles vão ao encontro também das
nossas políticas públicas.
O que lhe posso dizer, Sr.ª Deputada, é que este plano nunca poderia ter aparecido entre 2011 e 2015,
porque está tão longe, tão longe, daquilo que era a aposta na educação do Governo do seu partido.
Aplausos do PS.
Porque não fala em segregação precoce, porque acaba por trazer para a primeira linha o ensino
profissional, porque entende, verdadeiramente, onde é que a inclusão deve estar, porque fala na Estratégia
Nacional de Educação para a Cidadania — veja lá, Sr.ª Deputada!
Protestos da Deputada do PSD Cláudia André.
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Mas a Sr.ª Deputada, com estes anos de escola e com este tempo enquanto Deputada, já diz palavras
como «diagnóstico», disse que é importante aferir — imagine-se só! Sr.ª Deputada, ainda bem que é
importante aferir, e estamos a fazê-lo.
Sabemos que, dificilmente — tenho a certeza —, num plano desta natureza, se o PPD/PSD fosse Governo,
se falaria sobre cidadania, nada se falaria sobre inclusão.
Protestos do PSD.
A Sr.ª Deputada falou dos seus queridos alunos. Tenho pena que, aparentemente, também não dissesse,
como diz e acredita, aos seus queridos alunos que a crítica democrática — porque é importante que o seja —,
sendo legítima e absolutamente necessária, mais ainda nesta Câmara, convém também que seja honesta, Sr.ª
Deputada, e de preferência informada e não apenas uma conta de dividir falsa e falseadora.
A Sr.ª Deputada traz aqui um conjunto de elementos e, aparentemente, não tem o histórico, por exemplo,
do nosso orçamento.
Sr.ª Deputada — porque o nosso programa orçamental é público e muito conhecido —, em 2015, o
programa orçamental da educação, que não foi da nossa responsabilidade, tinha 5643 milhões de euros.
Neste momento, em 2021, temos mais 1374 milhões de euros, mais 25%, Sr.ª Deputada. No fundo,
ultrapassámos os 7000 milhões de euros e ultrapassámos todos os exercícios orçamentais desde 2011.
Protestos da Deputada do PSD Cláudia André.
Sr.ª Deputada, penso que os seus alunos ficariam tristes, certamente, com esta memória seletiva da sua
professora. E tenho a certeza de que é muito querida desses alunos. Mas acredito também, Sr.ª Deputada,
que depois de o seu colega ter tentado explicar que os 900 milhões eram igual a zero, há aí uma confusão e
uma falta de concertação nesse bailado e nessa encenação, e era importante que tivesse algum raccord.
Sr.ª Deputada, parafraseando o seu colega Sr. Deputado António Cunha, é bastante jocosa a forma como
acaba por apresentar aqui as questões relacionadas com o plano de recuperação de aprendizagens.
Protestos do PSD.
Relativamente às questões que nos traz o PCP, queria dizer, Sr.ª Deputada Alma Rivera, que este plano é
mesmo excecional. É pela excecionalidade dos tempos que vivemos que temos um plano desta natureza.
A rede pública de educação e ensino — a Sr.ª Deputada sabe, e eu já o disse na minha primeira
intervenção — vinculou, desde 2016, 9000 docentes aos quais se irão somar 2400 no presente ano letivo.
Se é verdade que o Grupo Parlamentar do PPD/PSD confundiu os novos recursos humanos com o que é a
norma-travão, norma que, aliás, combateu, que era de cinco anos, e que, em conjunto com a esquerda
parlamentar, conseguimos passar para três anos em qualquer grupo de recrutamento. É preciso dizê-lo e
saudar a nossa esquerda.
É preciso também dizer que, neste mesmo período — e a Sr.ª Deputada parece ter-se esquecido —,
demos autorização para contratar 12 000 assistentes operacionais, assistentes técnicos, técnicos
especializados, a maioria dos quais já se encontra nas nossas escolas, porque foi dada agora autorização
para 5000, como sabe, muitos dos quais também já estão nas nossas escolas.
É igualmente preciso dizer, Sr.ª Deputada, que temos de continuar a trabalhar para que, efetivamente,
possamos ter este conjunto de medidas, com estes recursos humanos suplementares que temos tido.
O conjunto de medidas deste plano tem por base um conjunto de políticas públicas que temos discutido
com o PCP. Fizemo-lo durante muito tempo também com o Bloco de Esquerda e temo-lo feito, num processo
muito colaborativo, com o Partido Ecologista «Os Verdes» e o PAN, que também tem sido um ouvinte atento e
um partícipe atento das políticas educativas.
E porque a Sr.ª Deputada perguntava, é preciso dizer que este plano abrange, porque tem de abranger, um
conjunto de medidas de curto, de médio e de longo prazo e, relativamente a isso, é assim que tem de ser.
A Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa questionava sobre os recursos humanos. Os recursos humanos serão
contratados pela escola. Os docentes serão contratados pelas escolas, uma vez que serão dados créditos
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horários. Por outro lado, todos os outros, como os que são, por exemplo, técnicos especializados, serão
contratados através das escolas, com os instrumentos que existem, que são suficientemente céleres. Uma
certeza: os recursos docentes estarão disponíveis antes do início do ano letivo, uma vez que as escolas os
pedem em julho, tal qual fizeram no ano passado.
O PAN fala da importância da educação inclusiva, e sobre isto eu queria dizer algo muito claro. Neste
plano, duplicámos os recursos humanos alocados para as equipas coordenadoras. Temos mais técnicos
especializados, temos mais inclusão, temos mais formação e, quanto aos referenciais curriculares, também
são claras as orientações curriculares para a educação pré-escolar, o perfil dos alunos, as aprendizagens
essenciais e a estratégia nacional da educação para a cidadania.
Sobre este último ponto, queria também chamar a atenção do PEV para o seguinte: é verdade que temos
de ter melhorias infraestruturais e é por isso que fizemos mais de 1000 intervenções desde 2015, nas nossas
escolas. Quando as Sr.as Deputadas do PAN e do PEV nos falam da importância da cidadania, falando no
ambiente e em todas estas questões, quero lembrar que lançámos recentemente o Prémio Gandhi de
Educação para a Cidadania, que neste ano incidirá sobre o bem-estar animal e que agradecia que pudessem
ver, e, por outro lado, o Compromisso Verde da Juventude, que foi lançado neste ano e se traduz num
compromisso dos jovens com o futuro que incide sobre a sustentabilidade ambiental, sobre a ação climática,
dando voz à juventude para concretizar esta mudança que queremos, neste tempo.
Com a sua permissão, Sr. Presidente, passo a palavra ao Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação.
O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação, tem a palavra.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação (João Costa): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, queria apenas clarificar uma dimensão que penso que perpassou neste debate sem que tenha
havido uma visão clara do que está em causa quando falamos de autonomia. É preciso, de facto, ver o que
tem sido o caminho da autonomia das escolas na gestão curricular nos últimos anos.
Há mais de 10 anos, tivemos uma primeira geração de contratos de autonomia. Salvo erro, em 2014,
tivemos uma segunda geração de contratos de autonomia, que foram feitos, como se sabe, muito rapidamente
e numa perspetiva de autonomia que era a chamada «autonomia com alíneas», em que a escola tem
autonomia, mas: alínea a), não pode fazer isto; alínea b), não pode fazer aquilo; alínea c), não pode fazer
aqueloutro… Tínhamos uma fórmula de crédito horário incompreensível, em que o Governo da altura dizia
«uma hora para isto», «meia hora para aquilo», «duas horas para aqueloutro» e «só tem crédito horário em
função dos resultados dos exames», porque o crédito horário não era para trabalhar, era um prémio, em vez
de ser uma ferramenta de trabalho.
Ora, o que fizemos, em 2015/2016, foi tratar a fórmula de crédito horário como um lugar de autonomia de
decisão das escolas para a promoção de medidas de acordo com a sua intenção, com a sua opção curricular
e pedagógica.
Em segundo lugar, começámos com o Programa Nacional de Promoção de Sucesso Escolar, a convidar as
escolas a definirem as suas próprias medidas curriculares de apoio. Isso foi feito no mesmo ano em que
fizemos o Projeto-Piloto de Inovação Pedagógica.
Um ano depois, estávamos a pilotar o projeto de autonomia e flexibilidade curricular, que verteu para lei,
em 2018, que alargou às escolas do ensino público uma prerrogativa que só existia para o privado, que é ter
25% de gestão livre do seu currículo.
No ano seguinte, em 2019, aprovámos a portaria dos planos de inovação, que alargam para todas as
escolas, mediante a apresentação de um plano, a possibilidade de terem medidas mais livres e mais
inovadoras de gestão curricular. O que estamos a fazer agora é a dizer que não precisam de recorrer a essa
portaria para aplicar muitas medidas de eficácia demonstrada. Neste sentido, agradeço ao Sr. Deputado
António Cunha por ter sido o primeiro que aqui disse que, só em medidas curriculares, temos 37 ações
específicas. Portanto, não é um plano de generalidades, é um plano de medidas que já são desenvolvidas
pelas escolas.
Mais, para cada uma delas, para cada medida de política educativa, basta consultar tudo o que tem vindo a
ser disponibilizado. Temos relatórios de acompanhamento, indicadores de eficácia, indicadores de eficiência.
É isso que queremos aprofundar durante este plano.
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O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação: — Vou concluir, Sr. Presidente, dizendo que não estamos a falar de generalidades, estamos a falar de uma confiança reforçada nas escolas, com meios para
que possam acontecer e com provas dadas através de experiências autorizadas aqui e ali e que agora
generalizamos a todas as escolas.
É isto que queremos. Um sistema mais livre, mais capaz de encontrar soluções, porque, ao contrário do
que aqui perpassa, as escolas são capazes, e por isso merecem esta confiança do Ministério da Educação.
Aplausos do PS.
O Sr. André Ventura (CH): — E sobre o 25 de Abril?
O Sr. Presidente: — Passamos à fase de encerramento do debate. Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues.
O Sr. Ministro da Educação: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado André Ventura, relativamente ao 25 de Abril, esta Casa sabe bem o que significa o 25 de Abril, sempre. E é uma vergonha um
Deputado único não saber ler uma única estatística. Isso, sim, é uma vergonha.
Gostava de entender qual foi o contributo solidário que o senhor ou o seu partido apresentaram para as
pessoas que sofrem e com quem tanto enche a boca nesta Câmara. O que lhe posso dizer, Sr. Deputado, é
que há uma diferença grande entre este palco e os palcos onde o Sr. Deputado grita tantas vezes «vergonha».
Os portugueses sabem bem qual é essa diferença.
Relativamente a este plano, o que queria dizer aos Srs. Deputados é que o que vimos aqui fazer é prestar
contas. Temo-lo feito ao longo destes anos, e é importante poder também auscultar a Assembleia da
República.
Sabemos que viremos aqui, em breve, para a audição regimental. Felizmente, viremos também, de forma
excecional, para falar sobre este plano, a requerimento do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, a quem
gostava de agradecer. Esta próxima semana será para cimentar e densificar ainda, se cabe, este plano, com
as audições que teremos. Ouviremos os diretores, ouviremos aqueles que representam os professores,
ouviremos necessariamente todos aqueles que fazem parte, como atores educativos, do diálogo constante
com o Ministério da Educação — o Conselho Nacional de Educação, o Conselho das Escolas e outros
representantes, como, por exemplo, os representantes dos pais e encarregados de educação.
É para nós importante poder solidificar essa auscultação e que todos os processos onde esta equipa está
envolvida possam acontecer assim, auscultando, por muito que isso dê trabalho, por muito que,
aparentemente, seja complexo poder abrir a todas as comunidades educativas, como fizemos, através dos
CFAE, a todos os concelhos pedagógicos de todos os agrupamentos e de escolas não agrupadas, para que
nos chegasse a informação.
Aparentemente, dá trabalho falar com os nossos alunos, mas quisemo-lo fazer. Aparentemente, dá trabalho
falar com peritos, em particular com aqueles que são conotados com outras frentes políticas que não aquelas
que apoiam este Governo, mas quisemo-lo fazer e foi altamente proveitoso e frutuoso.
Por isso, continuaremos a fazer assim e continuaremos agora com a apresentação deste plano, que foi
feito e continuará a ser feito com as comunidades educativas a dar novos elementos para que, através de
recursos humanos, façamos este apetrechamento que é fundamental.
Não podemos dizer reiteradamente que temos a escola do passado, a escola do século XIX, que
aparentemente a nossa escola não se moderniza e que, no momento em que temos mais recursos do que
aqueles que conseguimos erguer durante os últimos seis Orçamentos do Estado, parece uma desgraça
apresentarmos um plano de 900 milhões de euros. É uma verba que significa mais formação, é uma verba que
significa mais recursos educativos, é uma verba que significa mais apetrechamento infraestrutural e é uma
verba que, acima de tudo, representa mais recursos humanos para as nossas escolas.
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Por isso, queria agradecer à Assembleia da República por termos tido a oportunidade de vir aqui
apresentar e discutir este plano. É importante que a sociedade o faça e é importante também dizer — e isto
não é só uma impressão, é um convencimento que tenho — que as escolas estão bem mais apaziguadas e
que entenderam bem melhor o plano do que alguma parte deste Hemiciclo, que tantas e tantas vezes quis
criar ruído, mas não procurou entender verdadeiramente aquilo que foi apresentado no Dia Mundial da
Criança.
As escolas, na sua sapiência, no seu entendimento, mas também na sua autonomia, conseguiram entender
aquilo que estava a acontecer naquele dia, aquilo que foi auscultado com anterioridade e a forma como a
tutela foi respondendo às ansiedades, a todas as necessidades e, acima de tudo, às grandes aspirações que
têm as nossas escolas para continuarem — volto a dizer — a trabalhar com os nossos alunos para que
verdadeiramente esse trabalho seja feito em cada agrupamento de cada um dos nossos municípios, em cada
escola não agrupada, em cada uma das turmas e, acima de tudo, com cada uma das nossas crianças,
independentemente da sua condição de partida. Isto é algo que também nunca nos podemos esquecer. Há
menos de 20 anos tínhamos 45% de abandono escolar. Hoje temos, nos números do primeiro trimestre de
2021, 6,5%. Tanto se falou de rankings, tanto olhámos para os rankings, mas nunca nos podemos esquecer
que, em 2002, esses 45% nunca chegavam a fazer exames, pelo que a performance cega desses mesmos
rankings de cada uma das nossas escolas acabavam por demonstrar só uma parte das nossas comunidades
educativas.
Felizmente, muitos desses jovens agora não abandonam, muitos jovens dessas famílias estão na escola
até à conclusão da escolaridade obrigatória. Por isso, a escola pública está de parabéns por continuar a fazer
aquilo que lhe compete: integrar todos, formar todos e educar cada um dos nossos alunos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Também para encerrar o debate, tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Paula Santos, do Grupo Parlamentar do PCP.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Queria, em primeiro lugar, dirigir uma palavra de saudação a toda a comunidade educativa que, durante estes últimos
tempos, tempos difíceis, fez um esforço enorme para dirigir e assegurar o melhor da escola pública para os
estudantes — os professores, os técnicos especializados, os auxiliares de ação educativa, administrativos, os
pais e, naturalmente, os estudantes.
Este tempo de epidemia que vivemos mostrou também a importância da escola pública para combater as
desigualdades e para assegurar o direito à educação para todos.
Aplausos do PCP.
Em boa hora, o Grupo Parlamentar do PCP marcou o debate sobre a preparação do próximo ano letivo.
Identificámos os problemas com que a escola pública se confronta e apresentámos soluções para a sua
resolução.
Neste debate, suscitámos diversas questões que ficaram sem resposta. Perante problemas concretos que
afetam a escola pública, os seus trabalhadores e os estudantes, o Governo não toma as medidas necessárias
para que o próximo ano letivo se inicie em total normalidade.
Constrói uma narrativa que mais não passa de palavras vãs sem qualquer correspondência com a
realidade.
Durante o debate, ficámos a saber que, afinal, não há plano de recuperação de aprendizagens! Se o plano
ainda não está concluído, qual foi a intenção do Governo para o anunciar dado que ainda não existe?
Isto só vem confirmar a avaliação que o PCP fez no debate, ou seja, que, para o Governo fazer que faz,
aquilo que foi apresentado não passa de anúncios generalistas.
As escolas não precisam de anúncios generalistas, precisam de saber agora com o que contam. Não vai
ser em setembro, quando as aulas estiverem a iniciar, que será o tempo de preparar as estratégias para a
recuperação das aprendizagens.
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Sobre o calendário e a concretização das medidas, nada foi clarificado. Para que as escolas possam, com
autonomia, encontrar as estratégias mais adequadas à realidade concreta e às necessidades específicas de
cada estudante, para recuperar atrasos e combater o insucesso e o abandono escolares, precisam de estar
dotadas dos meios humanos e materiais necessários.
Dos 900 milhões que o Sr. Ministro referiu hoje diversas vezes, no âmbito deste plano de recuperação de
aprendizagens, somente 140 milhões são dirigidos aos trabalhadores, o que é um motivo de preocupação,
quando o reforço do número de trabalhadores é uma prioridade.
Quanto aos demais investimentos que referiu neste debate, esperamos que não passem, uma vez mais, de
um compromisso sem concretização, como os computadores que ainda estão por chegar.
A redução do número de alunos por turma permite o acompanhamento pedagógico adequado dos
estudantes pelos professores, essencial para a recuperação dos atrasos e para a existência de condições de
aprendizagem. Mas sobre isto não há qualquer referência.
Para que, no próximo ano letivo, não haja falta de auxiliares de ação educativa, de administrativos nem de
técnicos especializados e para que todas as turmas tenham os professores em todas as disciplinas, é preciso,
desde já, tomar medidas nesse sentido. É preciso contratar os auxiliares de ação educativa e administrativos
necessários, integrá-los numa carreira com vínculo público, pondo fim à precariedade e à inaceitável
contratação a horas.
É preciso reforçar a contratação de professores, vinculá-los e combater a precariedade que afeta milhares
destes profissionais, muitos com 10 ou mais anos de serviço. É preciso adotar medidas para combater a falta
de professores, como o PCP propõe, nomeadamente através do reforço do crédito horário, de acordo com as
necessidades sinalizadas pelas escolas, da possibilidade de as escolas completarem horários e da atribuição
de complemento de alojamento e deslocação.
É igualmente preciso contratar os técnicos especializados necessários e integrá-los também numa carreira,
combatendo a precariedade que os afeta.
Garantir o direito à educação e a igualdade no acesso e sucesso escolar a todos os estudantes passa pelo
reforço do investimento efetivo na escola inclusiva, pelo reforço da ação social escolar, pelo avanço na
gratuitidade de material didático na sequência da gratuitidade dos manuais escolares, pela constituição de
equipas multidisciplinares, pelo investimento no parque escolar, nomeadamente na construção e
requalificação de escolas, na construção de pavilhões desportivos, nas escolas que ainda não dispõem deste
equipamento, na modernização de equipamentos e no apetrechamento com material escolar e didático.
O Governo não só não responde cabalmente aos problemas que persistem na escola pública, como
pretende transferi-los para as autarquias. O processo de transferência de competências na área da educação
para as autarquias, além de configurar uma desresponsabilização do Governo, não garante o direito universal
e constitucional à educação, deixando-se, assim, de ter uma política de educação para passar a ter 278
políticas de educação, condicionadas à capacidade financeira de cada uma das autarquias.
Mas, como estava a dizer, além de configurar uma desresponsabilização, constitui um verdadeiro processo
de transferência de encargos para as autarquias, sem estarem asseguradas as condições e os meios para o
exercício dessas competências.
Sr. Ministro, deixe-me que lhe diga, ser patriótico e de esquerda não é uma questão de discurso, é uma
questão de prática. Porém, registamos que, neste debate, o Sr. Ministro reconhece que é a política patriótica e
de esquerda que o PCP defende que tem as soluções para a valorização da escola pública e para a
valorização dos seus trabalhadores.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Chegámos, assim, ao fim do nosso primeiro ponto da ordem do dia. Passamos ao ponto seguinte, que consiste na discussão, na generalidade, da Proposta de Lei n.º
92/XIV/2.ª (GOV) — Altera o Código de Processo Civil, as normas regulamentares do regime da propriedade
horizontal, o regime dos procedimentos para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos
de valor não superior à alçada do tribunal de 1.ª Instância e o Código do Registo Predial.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Justiça.
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O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Justiça (Mário Belo Morgado): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Uma justiça ágil e eficiente é um pilar fundamental da vida em comunidade. Regula tensões e
conflitos sociais, garante a defesa dos direitos, liberdades e garantias, contribui para criar valor e reduzir
desigualdades e é um catalisador de inovação, transformação e desenvolvimento.
Deste modo, a eficácia da justiça assume uma dimensão de valor e princípio estruturante do Estado de
direito, considerando mesmo o Tribunal Constitucional que a exigência de celeridade processual integra o
núcleo dos interesses protegidos pela Constituição.
Até à atual crise pandémica, o sistema judicial apresentava níveis de produtividade bem positivos, em
resultado de toda uma série de reformas que têm sido implementadas. Mas, hoje, temos uma grande pressão
sobre os tribunais que têm funcionado, nos últimos 15 meses, a um ritmo bastante inferior ao normal devido às
medidas sanitárias adotadas e à suspensão excecional dos prazos judiciais.
Entretanto, o número de processos entrados vai continuar a aumentar, em especial nas áreas que
apresentam maiores conexões com as consequências económicas e sociais da pandemia. Se nada fizermos,
voltaremos a ter pendências acumuladas.
Para que a justiça esteja à altura dos desafios e das necessidades, temos de continuar a apostar, com
determinação acrescida, no único caminho possível: racionalização e modernização organizativa,
procedimentos simplificados, mais liderança e melhor gestão.
O aprofundamento do processo de transformação digital é um eixo fundamental desta estratégia, mas os
imperativos de mudança não se esgotam aqui, pois a eficácia da justiça também se joga noutros planos
estruturantes, como é o caso, sobretudo, das leis de processo.
Identificados os principais fatores de bloqueio e morosidade mais gritantes, com a proposta de lei que aqui
apresentamos visa-se agilizar a tramitação, eliminar atos redundantes, inúteis ou sem valor acrescentado,
suprimir intervenções não essenciais e clarificar alguns pontos geradores de dúvidas e controvérsias
jurisprudenciais que estão na base de muitos recursos para os tribunais superiores. Ao mesmo tempo, tivemos
a preocupação de não comprimir garantias processuais respeitando todos os princípios fundamentais da
ordem jurídica.
Do conjunto desta proposta de lei, que também altera algumas normas do Código do Registo Predial, do
regime da propriedade horizontal e do regime anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98, destacaria as seguintes
medidas: agiliza-se o regime da prova pericial nas situações em que o juiz, após os articulados, possa
conhecer do mérito da causa ou deva apreciar exceções dilatórias; limita-se a obrigação de realizar audiência
prévia aos casos em que as partes não tenham tido oportunidade de se pronunciar sobre tais questões. Assim
se evitam diligências não essenciais e deslocações aos tribunais que devem limitar-se ao necessário, em
especial numa conjuntura pandémica.
No entanto, quanto a este ponto, será conveniente clarificar que o juiz poderá sempre convocar esta
diligência se o entender necessário ou conveniente.
Estende-se ainda a possibilidade de dispensa de audiência prévia quando a sua finalidade seja apenas a
programação de audiência final e, para evitar o injustificado arrastamento do processo, não poderá ter lugar
mais do que uma vez. Pela mesma razão, limita-se a tentativa de conciliação, impedindo-se, nomeadamente,
que possa ser suspensa ou realizar-se mais do que uma vez.
Consagra-se o limite de três testemunhas por cada facto, sem prejuízo de poderem ser inquiridas mais se o
juiz o entender necessário, sendo certo que a generalidade dos sistemas jurídicos dá ao juiz a possibilidade de
dispensar provas quanto aos factos já suficientemente esclarecidos.
É estimulada e alargada a possibilidade de as testemunhas prestarem depoimento por escrito,
nomeadamente em caso de acordo das partes. É um modelo muito utilizado noutros sistemas,
designadamente em França, com reconhecidas vantagens ao nível da celeridade, mas que, entre nós, tem tido
utilização muito residual.
Nos casos de menor complexidade, a sentença poderá ser sumariamente fundamentada e ditada para a
ata. Quanto aos recursos, entre outros aspetos, clarificam-se os ónus do recorrente que impugna a decisão de
facto e reconhece-se ao juiz relator a faculdade de decidir liminarmente essa impugnação, se o recorrente não
identificar de forma convincente o erro na apreciação da prova.
É ainda conferida ao juiz relator a faculdade de decidir sumariamente o recurso se for manifestamente
infundado ou quando a questão já tenha sido julgada de modo uniforme e reiterado.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, apresentamo-nos nesta Assembleia com fortes convicções mas sem
dogmatismos, com o maior respeito por diferentes pontos de vista e com uma atitude de abertura e de
flexibilidade relativamente a todos os contributos que possam aperfeiçoar um diploma tão importante para o
País.
A qualidade da justiça é uma tarefa de todos nós, responsáveis políticos, administração judiciária,
profissionais do foro, universidades e comunidade em geral. Trata-se de uma tarefa que não é fácil e a que
todos nos convoca, pois, a mudança sempre depara com os antigos quadros conceptuais, aqueles que, em
última instância, se visa mudar.
No contexto do esforço coletivo que temos a responsabilidade de desenvolver, confio que um salutar e
aprofundado debate democrático não deixará de se traduzir nos necessários consensos.
Aplausos do PS.
Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Fernando Negrão.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Pureza, do Bloco de Esquerda.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Secretários de Estado, a pandemia tem as costas largas e serve para justificar muita coisa, mas, para justificar uma reforma de fundo
do processo civil, parece-me, de facto, qualquer coisa de excessivo.
Do que estamos a tratar é de uma proposta, que é isso mesmo, de uma reforma de fundo do processo civil,
com uma dimensão assinalável. Mas dizer que tudo isto tem a ver com a escassez de resposta e com as
dificuldades resultantes da pandemia, com toda a franqueza, parece-me que é uma justificação sem grande
credibilidade.
Por isso mesmo é que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista aparece a tentar, enfim, resolver um
problema, a tentar corrigir este passo em falso fazendo com que a proposta baixe à comissão sem votação. É
a forma que encontrou para evitar uma situação, realmente, embaraçosa.
A orientação geral deste diploma é claramente, como, aliás, o Sr. Secretário de Estado teve ocasião de
dizer agora mesmo, a de suprimir procedimentos e momentos de intervenção das partes que o Sr. Secretário
de Estado classificou como supérfluas — o adjetivo não foi exatamente este, mas era à volta disto.
Pretende-se esta supressão de formas de participação das partes no processo civil que, por definição, é
um processo de partes. Portanto, isso tem de ser avaliado com grande cautela, com grande prudência e esse
deve ser o nosso objetivo.
A justificação dada pelo Governo, como ainda agora fez o Sr. Secretário de Estado, é a de que se pretende
combater expedientes dilatórios. Sem dúvida, precisamos de o fazer, não temos a menor das reservas
relativamente a isso, salvo uma, que é a que nos faz estar aqui com atenção redobrada perante esta iniciativa:
é que, às vezes, suprimindo expedientes dilatórios, introduzem-se fatores de injustiça no processo e isso
temos de evitar.
Vou dar três exemplos breves resultantes da proposta de lei. Primeiro, em relação às alterações que são
feitas ao regime da prova pericial, quero sublinhar que esta preferência que o Governo manifesta pela
verificação não judicial qualificada introduz, do nosso ponto de vista, pelo menos, um risco muito assinalável
de desigualdade entre as partes. Vejam-se aquelas pessoas que têm maior fragilidade económica e que não
têm, mesmo com o mecanismo de apoio judiciário, a capacidade de pagar a um especialista para ser o
avalista, de alguma forma, o certificador do seu argumento.
A este primeiro aspeto acresce, aliás, outra questão, que é justamente a de introduzir as entidades de
utilidade pública como elementos importantes, com riscos bastante fortes de não isenção.
Segundo, em relação à tentativa de conciliação, devemos combater as tentativas de conciliação dilatórias,
certamente, mas o problema é que ao restringir a fase de audiência prévia não só se vai matar a oralidade,
como vai afetar, na prática, a tentativa de conciliação.
O terceiro exemplo, entre muitos outros, é justamente o da prolação oral das sentenças para as chamadas
«ações de baixa densidade». A baixa densidade, para o Governo, é seguramente a mais alta das intensidades
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para uma imensa quantidade de pessoas que não podem ter ações a não ser de baixa intensidade, para os
critérios do Governo. Portanto, o dever de fundamentação e de inteligibilidade das sentenças é, nestes casos,
o de mais alta intensidade, o de mais alta densidade.
Sr. Secretário de Estado, para terminar, creio que 4 minutos para avaliar esta proposta é manifestamente
pouco e, por isso mesmo, fez bem o Grupo Parlamentar do Partido Socialista em fazer baixar esta proposta à
comissão sem votação, porque isso permitirá um trabalho aturado. Cá estaremos para esse efeito.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Mónica Quintela, do PSD.
A Sr.ª Mónica Quintela (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Sorrateiramente, no meio do barulho dos diplomas relativos ao combate à corrupção, eis que chega uma
proposta do Governo para alterar vários diplomas legais entre os quais, de forma profunda, o Código de
Processo Civil, que é a trave-mestra do nosso ordenamento jurídico.
Consta da exposição de motivos apresentada que as alterações se destinam a recuperar a redução da
atividade dos tribunais provocada pelas restrições inerentes à COVID-19. Compulsada a proposta de lei,
constata-se que os motivos invocados pelo Governo não têm tradução no texto apresentado. Tal ressalta logo
da norma sobre a aplicação da lei no tempo, que dispõe, expressamente, que o regime ora proposto só se
aplica aos processos iniciados a partir da data da sua entrada em vigor e não aos processos pendentes. Logo,
não se destina a recuperar pendências nem sequer a um regime transitório. Como disse o Sr. Deputado José
Manuel Pureza — para não repetir, direi de outra forma — a COVID-19 serve para tudo, é um saco sem fundo.
Esta proposta tem estampada a derrota do Governo no combate aos atrasos dos tribunais de forma leal e
justa para os cidadãos, enveredando por soluções aventureiras, repristinando normas do anterior Código de
Processo Civil, importando práticas de outros sistemas jurídicos, misturando tudo num cocktail explosivo de
êxito mais do que duvidoso, o que não se compadece com a necessidade de certeza e de segurança jurídica.
Recordo que o atual Código de Processo Civil entrou em vigor a 1 de setembro de 2013 e é da autoria do
Governo do PSD, que criou uma comissão de trabalho para levar a cabo a reforma do processo civil,
debatendo em profundidade as entropias do sistema. Esta reforma introduziu novas regras de gestão e de
tramitação processual, como seja a obrigatoriedade de audiência prévia, com vista à identificação do objeto de
litígio e a anunciação dos temas da prova, eliminando a base instrutória. Quer isto dizer que os temas da
prova, pedra angular do processo, têm como finalidade permitir que a discussão do litígio decorra de forma
ampla, com vista a abarcar toda a matéria com interesse para a decisão da causa.
É, pois, com preocupação que o PSD vê algumas das propostas apresentadas que não só desvirtuam a
atual estrutura processual civil, como também constituem inovações perigosas importadas do common law
norte-americano e que não têm cabimento na nossa praxis jurídica. Veja-se, a este propósito, a estulta
proposta de admissão de depoimento testemunhal por escrito, perante um notário e sem o acordo das partes,
o que só podemos apelidar de «autêntica aberração» ou de «profundo desconhecimento» do que é um
julgamento. É bom de ver que um depoimento prestado dessa forma, sem observância do contraditório e sem
a imediação ou a oralidade, em nada contribui para a celeridade processual e as partes não prescindirão do
seu depoimento presencial em audiência de discussão e julgamento.
Causa também preocupação a proposta de prolação oral de sentenças, de que o Sr. Secretário de Estado
aqui falou, com remissão direta para os articulados, sendo óbvio que tal prática não permite que o tribunal
analise, como se impõe, criteriosamente as provas produzidas em julgamento com vista à aplicação do direito
aos factos. Como cereja em cima do bolo, passe a ironia, propõe-se a redução do prazo de recurso da matéria
de facto e, então, passamos a ter sentenças orais sem fundamentação e, concomitantemente, a restrição do
direito ao recurso.
Também mal se compreende a limitação do número de testemunhas produzidas por cada facto. Sr.
Secretário de Estado, como sabe, já não há factos mas, sim, temas de prova, que são compostas pelo
alegado nos articulados. Entre outras propostas que causam muita apreensão, atente-se também na alteração
aos regimes da prova pericial, limitando-a, e no regime do maior acompanhado que favorece o erro numa
matéria em que não é possível que haja erro.
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Não podemos esquecer que o processo civil é um processo de partes, que é a vida das pessoas que,
diariamente, é decidida nos tribunais e que, seja de menor ou de maior montante, não pode ser decidida de
qualquer maneira, bem pelo contrário. A responsabilidade é do legislador, é de todos nós. Há que não o
esquecer.
Neste pressuposto e tratando-se de um diploma estruturante da nossa ordem jurídica, o PSD está
disponível para trabalhar, com a seriedade e o respeito que os cidadãos merecem, as alterações que
melhorem o atual Código, limando as arestas que a prática judiciária mostrou, mas sem embarcar em soluções
simplistas, de pseudolimpezas de atrasos processuais à custa da vida dos cidadãos, com decisões
erráticas,…
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Mónica Quintela (PSD): — … em cumprimento do mandato que nos foi conferido pelos portugueses e cujas responsabilidades não alijamos.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe, do PCP.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado e Srs. Deputados: Diria que é difícil fazer este debate nos 4 minutos de que dispomos pela seguinte razão: se quiséssemos dizer algo de
aprofundado relativamente ao conteúdo desta proposta de lei certamente que os 4 minutos não chegariam. No
estado em que temos este debate e em que é necessário, efetivamente, travá-lo porque está ainda agora a
começar, diria que os 4 minutos sobram.
Risos do Deputado do BE José Manuel Pureza.
Evidentemente que a justiça deve ser célere. Obviamente o valor da celeridade é importante e todos o
reconhecemos, enfim à exceção das partes em litígio que também estejam interessadas em que a justiça não
seja célere, mas esta já é outra questão. É um objetivo do Estado de direito que a justiça tenha celeridade.
As reformas legislativas, sobretudo quando são profundas, convém que também não sejam adiadas, mas
convém que não haja uma excessiva celeridade que leve a que haja reformas mal ponderadas que, depois,
levam àquilo a que estamos habituados, ou seja, a sucessivas reformas que vão procurando emendar erros
cometidos ainda há pouco tempo.
Quando olhamos para o Código de Processo Civil, vemos que temos tido reformas muito frequentes e um
emendar a mão muito frequente. De facto, não se diga que o que motiva esta proposta de lei é a pandemia,
porque, na verdade, não é. Já estamos a ver que, enfim, a pandemia agora serve para tudo.
Mas o que está aqui proposto, estando este diploma aprovado, tendo sido feita toda a sua tramitação, no
âmbito desta Assembleia da República e fora dela, sendo promulgado e publicado, é que entre em vigor,
segundo o Governo propõe, 30 dias depois da sua publicação. Este diploma é para aplicar aos processos que
deem entrada nos tribunais depois da sua entrada em vigor. Bom, então a pandemia, esperamos nós, já vem
lá muito para trás, ou seja, esperamos nós que, no momento em que esta lei possa entrar em vigor, a
pandemia seja já uma má recordação do passado.
Portanto, estamos confrontados com uma reforma profunda, de cinco dezenas de artigos, do Código de
Processo Civil. Obviamente, não rejeitamos que deva ser discutida, pois, evidentemente, há uma proposta
profunda que merece a atenção desta Assembleia, mas sem se limitar a assinar de cruz o que o Governo
proponha. Aliás, a demonstração disto é que hoje mesmo, no momento em que iniciávamos este debate, foi-
nos enviado um contributo da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, com 65 páginas, no qual se faz
uma apreciação muito detalhada desta iniciativa legislativa. Aliás, tínhamos já recebido da Ordem dos
Advogados também uma contribuição significativa, com objeções, algumas razoáveis, outras com as quais
mais ou menos concordaremos.
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O que importa referir é que não rejeitamos, da nossa parte, a bondade de alterações ao processo civil que
possam contribuir para melhorar a celeridade processual mas que não ponham em causa direitos processais,
porque, evidentemente, as normas do processo civil não foram inventadas do nada e têm uma justificação.
Quando as quisermos alterar temos de ter presente quer a justificação da sua existência, quer a justificação
quer a bondade da sua alteração. Não rejeitamos isso de maneira nenhuma!
Estamos disponíveis para esse trabalho, que deve ser feito com a devida ponderação, portanto ouvindo os
vários agentes judiciários, as várias entidades que devam pronunciar-se sobre esta matéria. Podemos dizer
que este processo legislativo está no seu início, fará a sua tramitação e daremos a nossa contribuição para
que possa chegar-se a algum lado e melhorar, de facto, o funcionamento da justiça. É essa a nossa
disposição, mas quer parecer-nos que esta Assembleia não pode prescindir de um debate aprofundado que,
até agora, ainda não houve oportunidade de ter lugar.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr. Deputado Telmo Correia, do CDS-PP, tem a palavra.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Sr. Deputado António Filipe, se em 4 minutos não é fácil, em 3 fica mais difícil ainda, mas vou tentar dizer
qualquer coisa sobre esta matéria.
Sr. Secretário de Estado, registo uma concordância de todas as bancadas que falaram até agora quanto ao
conteúdo da reforma, mas não quanto ao método. Efetivamente, isto não é método de discutir uma reforma
deste tipo, ou seja, com uma grelha diminuta, no final da sessão legislativa e à boleia ou a pretexto da
pandemia. Esta é uma reforma que não tem, forçosamente, que ver com a pandemia ou que não tem mesmo
nada que ver com a pandemia.
É uma reforma vasta, como aqui foi dito, pois são alterados perto de 50 artigos do Código de Processo
Civil. Não é, também como diz, e bem — a Ordem dos Advogados, a contrarreforma em relação a 2013 — não
é isso que está em causa —, mas é uma alteração significativa. Basta ver que, enfim, são restringidas a
obrigatoriedade de audiência prévia, de conciliação, é introduzida, como nos disse, a limitação do número de
testemunhas por facto e, um pouco ao contrário, diria eu, da lógica de reforma são, ao mesmo tempo,
reintroduzidas a réplica, no caso de exceções, ou mesmo a tréplica. Portanto, há também aqui normas que
vêm um pouco em sentido contrário da lógica global da reforma. No entanto, como aqui foi dito, é uma matéria
que merece discussão aprofundada.
Queria apenas lembrar ao Sr. Secretário de Estado que, em 2018, e muito pré-pandemia, por assim dizer,
o CDS, respondendo, de resto, a um apelo que existia até do Sr. Presidente da República para uma reforma
da justiça, apresentou aqui um conjunto relativamente vasto de medidas e de iniciativas, entre as quais, Sr.
Secretário de Estado — pasme-se! —, constavam a possibilidade de sentenças imediatas e orais, os
depoimentos escritos, evitando a deslocação de testemunhas, a eliminação da figura dos depoimentos de
parte, podendo ser ouvidas na lógica da prova testemunhal, o reforço dos juízes na audiência prévia, a
alteração das regras de citação, a eliminação da regra que permite adiamentos de audiência com junção de
novos documentos.
Sr. Secretário de Estado, curiosamente, estas nossas propostas de 2018 ficaram, passe a expressão, a
aboborar, depois da baixa à comissão sem votação, para, no final, serem chumbadas, precisamente pelo
Partido Socialista que, agora, vem, juntamente com V. Ex.ª enquanto Secretário de Estado, apresentar-nos
algumas destas ideias.
Dito isto, no entanto, não somos vingativos, nem seguimos nenhum processo de retaliação. Portanto, não é
pelo facto de as nossas propostas pré-pandemia não terem tido acolhimento e por o Partido Socialista e o
Governo terem acordado, com a pandemia, para a necessidade de algumas dessas propostas, que agora
seremos contra estas. Não será por retaliação ou por as nossas não terem sido aprovadas e dar-lhes-emos,
obviamente, a devida atenção.
Como disse, há propostas que, de resto, eram coincidentes com as nossas e, portanto, concordaremos
com elas. Com outras, não concordaremos, mas, em sede de especialidade, lá estaremos, para fazer uma
reforma que vale a pena, até porque a celeridade é, de facto, um objetivo fundamental do nosso sistema de
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justiça. Não podemos passar a vida a queixar-nos da falta de celeridade e, depois, não querer discutir as
normas quando aqui são trazidas, obviamente com a cautela que foi referida e com a qual estou de acordo.
Queremos discutir, quando são trazidas, normas que procuram ajudar a essa celeridade.
O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Joana Sá Pereira, do PS, para uma intervenção.
A Sr.ª Joana Sá Pereira (PS): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Os cidadãos compreendem cada vez com mais clareza que a justiça, para ser boa, tem de ser uma justiça célere.
Por isso mesmo, o sistema deve continuar a esforçar-se no sentido de introduzir melhorias para aprofundar
essa mesma celeridade.
Acreditamos que este é mesmo o momento de acautelar os próximos tempos e é, sobretudo, o momento
de evitarmos andar para trás nos bons indicadores de recuperação das pendências processuais e de uma
trajetória que tem aumentado a confiança dos cidadãos no sistema de justiça.
Temos alguma dificuldade em perceber o discurso do PSD nesta matéria: às segunda, quartas e sextas,
parece queixar-se do tempo que os processos demoram em tribunal e pede, aliás, urgência na implementação
de algumas reformas, mas, depois, às terças e às quintas, perante propostas que visam agilizar os processos,
sem pôr em causa a segurança e a confiança no sistema, o PSD indigna-se, ferozmente.
Protestos da Deputada do PSD Mónica Quintela.
Julgo que o PSD tem mesmo de encontrar um rumo nesta matéria, Sr.ª Deputada, porque é muito claro o
propósito do Governo nesta matéria. Por um lado, agilizar e, por outro, clarificar, para tornar a administração
da justiça mais célere e mais próxima dos cidadãos. Sublinhamos a oportunidade desta proposta de lei e a
disponibilidade do Governo assinalada pelo Sr. Secretário de Estado para melhorar esta versão. Aliás,
corresponderemos a essa disponibilidade também com contributos para que a podermos aprofundar.
Esta iniciativa, como já foi dito, pretende alterar quatro diplomas estruturais do nosso ordenamento jurídico,
dos quais se destaca o nosso Código de Processo Civil, com alterações pontuais em algumas matérias.
Destacaremos três para que, de facto, se perceba a importância desta proposta.
Em primeiro lugar, no que respeita ao regime da prova pericial, propõem-se, por um lado, o alargamento de
forma clara do leque das entidades competentes para as realizar, designadamente, universidades, que, aliás,
já as fazem no processo de forma célere e credível, nomeadamente através do reconhecimento de letra e
assinatura — portanto, já existe —, e, por outro lado, também reservar-se a perícia colegial apenas para os
casos em que a especial complexidade do processo e o conhecimento de matérias distintas o justificar,
evitando, assim, naturalmente, o entorpecimento injustificado do processo que temos vindo a verificar.
Por outro lado, no plano internacional, são reconhecidas as vantagens de celeridade processual no recurso
ao depoimento por escrito e ao depoimento previamente produzido no escritório de um dos advogados, que,
aliás, já está previsto no nosso Código de Processo Civil, nos artigos 517.º e 518.º
Também aqui não há nenhuma novidade, Sr.ª Deputada Mónica Quintela, nem nenhum drama.
A Sr.ª Mónica Quintela (PSD): — Há drama, há!
A Sr.ª JoanaSá Pereira (PS): — Aquilo que se pretende é apenas incentivar o recurso a este meio de produção de prova, reduzindo as custas para metade, sempre que a totalidade das testemunhas arroladas
pelas partes seja inquerida até ao despacho que marque a audiência final.
O que se altera, ainda que pontualmente, no regime do depoimento por escrito — aliás, em consonância
com aquilo que já existe no Decreto-Lei n.º 269/98 — é a possibilidade da sua utilização sem necessidade de
autorização do juiz. Isto parece-nos muitíssimo importante e permite-se ainda, nesta proposta, Sr.ª Deputada,
que este depoimento passe a ser, como disse, feito na presença do notário, e mais, que o juiz, oficiosamente
ou a requerimento das partes, possa determinar a sua renovação presencialmente. Portanto, esta salvaguarda
também nos parece da maior importância.
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O último ponto que queremos destacar nesta matéria tem que ver, de facto, com o princípio, que foi
instituído em 2013, da obrigatoriedade de realização de audiências prévias, que, no nosso entendimento, se
tem revelado desproporcional, injustificada, em muitos casos. Por isso, acompanhamos a oportuna restrição à
obrigatoriedade da sua realização e também acompanhamos a adequada extensão da possibilidade da
dispensa da audiência prévia pelo juiz, quando apenas existe para programar a audiência final.
Atrevo-me a dizer que não há tragédia, nem drama. Aquilo que há é um propósito muito claro de agilizar e
simplificar os processos e reforçar, sobretudo, a confiança dos cidadãos numa justiça melhor e mais rápida. E
mais, se queremos, de facto, reduzir as desigualdades no acesso à justiça, temos de ter leis sem
complexidades e sem alçapões.
Estou convencida, para terminar, Sr. Presidente, de que todos os contributos que os grupos parlamentares
apresentarão em sede de especialidade enriquecerão, sem dúvida, este diploma. Estamos disponíveis para
aprofundar esta discussão, com o detalhe técnico ou jurídico que esta matéria exige, e, por isso, já solicitámos
a baixa à comissão, sem votação, deste diploma, para que, de facto, o Parlamento consiga dar mais um passo
na construção de uma justiça eficiente, uma pretensão legítima de todos os cidadãos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Para o encerramento deste debate, tem de novo a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Justiça, Mário Belo Morgado.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Justiça: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Por limitações de tempo, é difícil abordar todas as questões suscitadas. Mas no decurso do processo legislativo
será certamente possível acomodar muitas sugestões e contributos dos diferentes grupos parlamentares,
como é próprio do debate democrático e construtivo.
Não se ilude a existência de uma certa tensão entre a exigência de um processo judicial sem demoras
injustificadas e outros valores. A qualidade da justiça joga-se em diferentes eixos problemáticos, que se
cruzam e que se impõe harmonizar.
Sem comprimir garantias e no respeito de todos os grandes princípios da ordem jurídica, visamos uma
justiça mais eficaz, capaz de promover uma efetiva igualdade de armas, acessível e merecedora da confiança
dos cidadãos.
Mas sejamos claros: reformar significa mudar, em maior ou menor medida, o paradigma existente, fazendo-
o evoluir no plano da organização e da forma, numa lógica de contínua adaptação do modelo de
funcionamento das instituições às necessidades da vida e a um mundo cada vez mais dinâmico e vertiginoso.
Quando realmente chega a hora de fazer reformas, esquece-se, com frequência, que as verdadeiras
mudanças nunca são insípidas, inodoras e incolores.
Ontem mesmo, o novo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça enfatizou um antigo e pacífico
diagnóstico. Dizia ele: «A nossa Justiça tem ainda um forte pendor burocrático e garantístico, com impacto
direto nos níveis de eficiência e nos tempos de decisão, sendo matizada por uma prática forense em que
predomina a indiferenciação entre o inútil e o essencial, o que, para além do mais, vem desaguando em
despachos ou sentenças cuja leitura se transforma num difícil exercício».
Na verdade, sem conceder nos princípios fundamentais, o grande desafio que teremos de ganhar é o da
renovação da nossa cultura judiciária, trabalhando continuamente na construção de um paradigma de
modernidade, centrado em objetivos e resultados e enformado por uma estratégia de simplificação e de
eliminação de formalismos e atos inúteis.
Temos todas as condições para o conseguir e para alcançar os desejáveis consensos alargados.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Terminado este debate, passamos agora ao terceiro ponto da nossa ordem de trabalho, com a discussão conjunta, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 93/XIV/2.ª (GOV)
— Altera procedimentos relacionados com a emissão, a entrega e a utilização do cartão do cidadão e do
Projeto de Lei n.º 854/XIV/2.ª (PAN) — Concretiza o direito ao cartão de cidadão para as pessoas em situação
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de sem abrigo, procedendo à alteração da Lei n.º 7/2007, de 5 de fevereiro, e do Decreto-Lei n.º 135/99, de 22
de abril.
Começarei por dar a palavra, para a apresentação da proposta de lei, do Governo, à Sr.ª Ministra da
Modernização do Estado e da Administração Pública, Alexandra Leitão.
A Sr.ª Ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública (Alexandra Leitão): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A qualidade e a eficiência dos serviços públicos são hoje indissociáveis do
seu nível de digitalização.
Em Portugal, a Administração Pública tem liderado o processo de transição digital, funcionando como um
acelerador desta transformação na economia e na sociedade e desenvolvendo respostas cada vez mais
centradas nas necessidades dos cidadãos e das empresas.
O lançamento do cartão de cidadão, há 14 anos, foi um dos maiores exemplos deste pioneirismo dos
serviços do Estado, tendo juntado num só cartão a informação que estava dispersa por vários documentos e
associando uma série de novos atributos ao documento de identificação que foram decisivos para a adesão
das pessoas aos serviços públicos online.
No cumprimento do seu Programa, o Governo vem agora propor várias alterações legislativas aos
procedimentos relacionados com a emissão, a entrega e a utilização do cartão do cidadão, que vão permitir
simplificar e agilizar as interações com os órgãos e entidades da Administração Pública.
Nesse sentido, a presente proposta de lei prevê que a morada deixe de constar fisicamente do circuito
integrado do cartão, para que possa ser alterada sem necessidade de o cidadão possuir um leitor do cartão,
dando assim cumprimento à medida do programa Simplex Morada sempre atualizada, desenvolvida em
articulação com a área governativa da Justiça.
Contribuindo para a materialização do princípio do only-once, que visa evitar que cidadãos e empresas
sejam obrigados a apresentar a mesma informação ao Estado várias vezes, esta proposta de lei prevê que o
titular do cartão de cidadão possa autorizar a qualquer momento — e não apenas quando são recolhidos os
dados biométricos — a partilha e reutilização desses mesmos dados.
A presente proposta de lei prevê, ainda, a generalização da possibilidade da entrega do cartão de cidadão
por via postal, na morada do seu titular, e a diversificação dos balcões de levantamento, prevendo que os
postos e secções consulares possam funcionar também como serviços de entrega.
Cria-se ainda o quadro legal que permite a ativação do cartão de cidadão com recurso a biometria,
eliminando a necessidade de entrega presencial do cartão de cidadão para ativar esses certificados, mediante
a utilização de mecanismos seguros e conformes com as disposições previstas nos regulamentos europeus. O
procedimento do cartão de cidadão fica, assim, totalmente desmaterializado do princípio ao fim.
Outra alteração proposta vai permitir que um cidadão sem endereço postal físico possa indicar a morada de
uma entidade — por exemplo, uma autarquia, os serviços da segurança social ou uma associação da
sociedade civil — para que o seu cartão de cidadão seja emitido. Esta é uma medida de enorme importância
para as pessoas que vivem na rua ou em situações precárias em alojamentos de transição.
A proposta de lei propõe-se ainda alargar o campo de aplicação do Sistema de Certificação de Atributos
Profissionais (SCAP), de modo a promover a sua disseminação e escalar os seus benefícios na utilização de
serviços digitais, públicos e privados.
Em suma, o que o Governo propõe é um conjunto de soluções para simplificar a vida dos cidadãos e tornar
os serviços do Estado mais eficientes. Ao todo, estima-se que, somando os vários impactos destas alterações
— deslocações e tempo despendido com o atendimento presencial —, será possível obter uma poupança total
de 287 057 dias/ano. São cerca de sete milhões de horas que os cidadãos deixam de despender nos vários
serviços, que passam a poder ser feitos online e de forma simplificada, sem contar com a libertação de horas
de trabalho nos serviços, que podem ser aplicadas no atendimento daqueles que não podem, ou não querem,
prescindir do atendimento presencial, ou em tarefas especializadas e de maior valor acrescentado para as
organizações.
Importa ainda sublinhar que em nenhum momento do processo de simplificação do acesso aos serviços
públicos e da agilização da relação com o Estado foi descurada a segurança documental e o reforço da cadeia
de identidade, assim como a inclusão das pessoas com menor literacia digital, seja através da abertura de
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Espaços Cidadão, seja da multiplicação de formas de apoio na utilização das tecnologias — como é o caso
das videochamadas, recentemente implementadas no portal ePortugal.
Sr.as e Srs. Deputados, acredito que este seja um passo seguro no sentido da transformação digital da
Administração Púbica e mais um avanço importante para um País mais moderno, mais competitivo e mais
inclusivo.
Fico à vossa disposição.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Bebiana Cunha, do PAN.
A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de saudar, de uma forma geral, a iniciativa do Governo, mas não podemos, neste âmbito, deixar de dizer que, de facto, em 2021, ainda
vigoram obstáculos a uma pessoa que se encontre em situação de sem abrigo, quer no acesso ao cartão de
cidadão, quer no acesso ao atestado de insuficiência económica, isto por variadíssimos motivos, o mais óbvio
porque não pode indicar uma morada correspondente ao local de residência habitual.
Já o tínhamos sinalizado em 2019 e, portanto, hoje, voltamos a insistir com propostas para o garante dos
direitos das pessoas em situação de sem abrigo, desta feita acompanhados, e bem, pelo Governo, que, quase
dois anos depois, acolhe as propostas do PAN; mas procuramos ir um pouco mais além das propostas que o
Governo nos traz nesta matéria para resolver aspetos fundamentais na vida das pessoas que se encontram
em situação de sem abrigo ou sem teto.
Em 2021, um cidadão ou cidadã em situação de sem abrigo só pode pedir um certificado da sua situação
económica se tiver a benevolência dos serviços da junta de freguesia onde faz o pedido, mas este atestado de
insuficiência económica, inacreditavelmente, tem, em muitas juntas de freguesia, um custo, um preço, o que é
completamente incompreensível, pelo que é necessário garantir a gratuitidade deste certificado de
insuficiência económica.
Sem um atestado de residência ou uma certidão de situação económica, uma pessoa em situação de sem
abrigo não pode, como bem sabemos, aceder a um conjunto de apoios sociais, tais como o próprio rendimento
social de inserção.
Sem um cartão de cidadão, estes cidadãos e cidadãs não só não são detentores de plenos direitos, como,
pior, a falta de resposta do Estado coloca-os em incumprimento dos seus deveres.
Garantir, sem obstáculos, o acesso ao cartão de cidadão às pessoas em situação de sem abrigo é apenas
cumprir as estratégias nacionais.
Já tínhamos trazido esta recomendação em 2019. Na altura, não foi acompanhada. Esperamos que desta
vez possa haver uma postura diferente porque não se trata, aqui, de dar vitórias ao PAN mas de assegurar os
mais básicos direitos destas pessoas que se encontram em situação de extrema vulnerabilidade.
Portanto, partindo desta proposta de lei, queremos garantir que a morada de uma pessoa em situação de
sem abrigo ou sem teto possa ser um endereço de um apartado, possa ser um número de telefone ou
endereço de correio eletrónico. E isto é crucial porque são as organizações não governamentais, que atuam
de forma bastante próxima das pessoas em situação de sem abrigo, que nos alertam para isto mesmo, e
estamos a falar de práticas que já são aplicadas noutros países.
Como, aliás, afirmou a Comunidade Vida e Paz, esta proposta suprime um atentado aos direitos humanos
e resolve um fator de constrangimento no acesso às medidas de proteção social.
Trazemos também aqui a questão do comprovativo do atestado de insuficiência económica, que possa ser
alcançado através do testemunho de um técnico social, onde a pessoa pernoita, acabando com todo o tipo de
burocracias que põem em causa direitos fundamentais. E sabemos bem que estamos a falar de pessoas em
situações altamente vulneráveis, que não têm condições para que os obstáculos burocráticos não lhe limitem
estes acessos a algo tão fundamental e basilar dos direitos humanos, o acesso a um cartão que permite a
identificação das pessoas para acederem a apoios sociais fundamentais para a sua sobrevivência.
Muito obrigada, Sr. Presidente, pela sua tolerância.
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O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem agora a palavra o Sr. Deputado José Manuel Pureza, do Bloco de Esquerda.
Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta proposta de simplificação do procedimento ou de alguns procedimentos relativos ao cartão de cidadão só pode merecer, da nossa parte,
apoio. Cremos que se trata de um conjunto de passos que se justificam, que simplificam a vida das pessoas e
sem riscos maiores, pelo menos numa primeira leitura, de lesão de bens jurídicos essenciais.
Queríamos, todavia, colocar duas anotações, uma delas convergente com aquilo que acabou de ser dito
pela Sr.ª Deputada Bebiana Cunha, e que é, basicamente, o seguinte: com a revogação incluída no diploma
proposto pelo Governo da obrigatoriedade de inclusão da morada no circuito integrado do cartão de cidadão,
fica de uma vez por todas — assim o entendemos e assim desejamos — eliminado qualquer tipo de
justificação para não se atribuir um cartão de cidadão, não só às pessoas sem abrigo, como às pessoas que
integram comunidades nómadas, a quem tem sido negada a possibilidade de terem um cartão de cidadão
justamente com esta motivação de não ser possível declarar a respetiva morada.
Portanto, acompanhamos perfeitamente esta proposta, desde que ela signifique a possibilidade de,
finalmente, ser feita justiça básica a estas pessoas, que é terem um cartão de cidadão, sem o qual não podem
aceder a um conjunto de benefícios de que devem ser titulares.
Sem querer puxar de galões que não fazem qualquer sentido, lembro apenas que a Assembleia da
República aprovou, recentemente, uma resolução justamente sobre esta matéria, que mereceu os votos de
todas as forças políticas à exceção do Chega, e sobre isso não farei nenhum comentário. Não é necessário.
A segunda anotação que queria fazer é que há aqui uma questão de fundo: qual é a capacidade de
resposta que o Instituto dos Registos e do Notariado (IRN) tem para uma execução devida do objetivo último
da proposta do Governo, que é satisfazer a fluidez do procedimento de aquisição do cartão de cidadão?
Sabemos que, à data, são cerca de 200 000 — mais coisa, menos coisa — os cartões de cidadão que
estão por entregar. Isto contrasta completamente com o movimento negativo, no que diz respeito aos recursos
humanos do Instituto dos Registos e do Notariado. Os números não são do Bloco de Esquerda, mas do
próprio Instituto e são, aliás, do Governo, como um todo, no Orçamento do Estado para 2012, em que
estimava uma quebra de cerca de 20% dos trabalhadores do IRN, designadamente conservadores e oficiais
de registo.
Podemos perfeitamente apoiar mudanças de natureza tecnológica, mas temos a noção de que se essa
mudança não for acompanhada de uma dotação dos meios humanos necessários para pô-la a render, então,
ela fica sem efeito. O glamour da modernidade tecnológica não esconde a necessidade real, quotidiana, de
meios para dar resposta.
Portanto, o desafio que esta proposta de lei faz ao Governo é para garantir a sua efetiva exequibilidade,
dotando o IRN dos meios humanos em falta e que não são poucos. De acordo com números do próprio IRN,
cifram-se em défices oficiais de registo e de conservadores que vão para além das 1000 pessoas. Ora,
evidentemente, podemos fazer aqui curto-circuitos tecnológicos, mas não há circuito-tecnológico que seja
capaz de substituir a falta de pessoas.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Romualda Fernandes, do PS.
Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Romualda Fernandes (PS): — Sr. Presidente, cumprimento a Sr.ª Ministra, Sr.as e Srs. Deputados: Portugal tem vindo, nos últimos anos, a operar uma notável transformação digital no funcionamento do Estado,
com vista a afirmar-se como um País moderno e ágil na prestação de serviços essenciais.
O País tem vindo a incorporar a simplificação e inovação no ADN (ácido desoxirribonucleico) da sua
Administração Pública, o que lhe tem trazido reconhecimento internacional, como o Prémio de Serviço Público
das Nações Unidas de 2020.
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A relação com a tecnologia tem vindo a intensificar-se e o recurso aos serviços digitais teve um
crescimento exponencial neste período longo de confinamento. Só em Portugal, o portal dos serviços públicos
gerido pela Agência para a Modernização Administrativa acumulou mais de 19 mil visitantes e o número de
cidadãos com chave móvel digital multiplicou-se, ascendendo a 2700 milhões.
Esses serviços públicos são expressões dessa busca incessante de servir melhor os cidadãos, agilizando a
relação com o Estado, sem descurar a garantia documental e o reforço da cadeia de identidade. As alterações
que visam simplificar procedimentos e facilitar interações dos cidadãos com a Administração Pública tornam-
se mais eficientes e que louvamos.
Dessas alterações, ainda teremos a referir os serviços territorialmente competentes da segurança social,
de associações ou de entidades da sociedade civil sem fins lucrativos, que se revestem da máxima
importância para responder a um imperativo ético indeclinável, conferindo às pessoas em situação de sem
abrigo um reconhecimento da sua identidade. Saudamos as referências que já foram feitas e que a Sr.ª
Ministra nos apresentou nesse sentido.
Por outro lado, a concretização da medida do Simplex Morada sempre atualizada, que a Sr.ª Ministra
também já referiu e que visa simplificar os procedimentos de alteração da morada no cartão de cidadão e a
possibilidade da sua entrega, por via postal, na morada do seu titular, prevendo-se igualmente que os
certificados associados de autenticação e assinatura possam ser ativados à distância, mediante a utilização de
mecanismos seguros, na esteira dos regulamentos comunitários do Parlamento Europeu e do Conselho,
relativos à identificação eletrónica e aos serviços de confiança para as transações eletrónicas no mercado
interno.
Salientamos ainda a preocupação com a harmonização da exigência da recolha dos dados biométricos
para a emissão de documentos de modo a que possam ser reutilizados, dispensando os cidadãos de uma
dupla recolha e de um trabalho duplicado para os serviços.
A lei é ainda atualizada, designadamente, no que se refere à identificação dos serviços responsáveis pela
emissão, à possibilidade de apresentação do pedido por via eletrónica e à atualização da previsão do
requerimento quando o titular seja cidadão maior acompanhado, por força da vigência superveniente do
regime jurídico do maior acompanhado.
Com esta iniciativa, vamos ao cerne da preocupação vertida na Resolução da Assembleia da República n.º
130/2021, apresentada pelo Bloco de Esquerda, que recomendava ao Governo que tome medidas para dotar
as pessoas de comunidades nómadas de uma morada que lhes possibilite a obtenção de cartão de cidadão,
bem como de um projeto, apresentado pelo PAN, que visa concretizar o direito ao cartão de cidadão para as
pessoas em situação de sem abrigo, para que possam também ter a sua identificação de morada.
Com efeito, os cidadãos sem endereço postal físico terão agora diversas possibilidades de escolha de
morada ao seu alcance, tal como identificado no artigo 13.º, amplificando-se assim os direitos de cidadania e
atribuição de identidade desses cidadãos.
O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr.ª Deputada, chamo a sua atenção para o tempo.
A Sr.ª Romualda Fernandes (PS): — Estou a terminar, Sr. Presidente. As soluções simplificadoras da vida dos cidadãos e das empresas, que geram impactos positivos e
poupanças no seu tempo, merecem a nossa adesão, pelo que estamos certos que obteremos o consenso
necessário para a aprovação desta proposta, introduzindo as benfeitorias que se afigurem necessárias, sendo
certo que esta iniciativa já mereceu apreciação positiva das entidades consultadas, a ANMP (Associação
Nacional de Municípios Portugueses) e a Ordem dos Advogados.
Sr. Presidente, muito obrigada pela tolerância.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia, do CDS-PP. Faça favor, Sr. Deputado.
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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado: Em primeiro lugar, quero salientar que esta proposta — como aqui foi já referido, de resto — não tem um caráter polémico
especial ou algum apreço de dúvida maior, por assim dizer.
De resto, como aqui nos foi explicado, corresponde a um conjunto de matérias que vão desde a
harmonização de dados biométricos à retirada da morada do leque de informações, nos termos e nas
circunstâncias explicadas pela Sr.ª Ministra, à entrega do cartão por via postal ou sem identificação física na
informação sobre a morada. Portanto, são matérias que correspondem a uma atualização e que geram, à
semelhança do que aqui foi dito, um consenso, penso que amplo, na Câmara.
Obviamente, algumas dúvidas são levantadas. A Sr.ª Deputada Romualda Fernandes dizia, agora mesmo,
que tinha o parecer positivo da Associação Nacional de Municípios Portugueses e da Ordem dos Advogados,
no entanto, a Associação de Municípios presente levanta algumas dúvidas que fazem sentido e que devem ser
ponderadas.
Uma das dúvidas que levanta, por exemplo, é a de que algumas destas matérias são remetidas para
regulamentação por portaria. Não são matérias irrelevantes e, neste contexto, mesmo neste amplo consenso,
carecem de atenção e de avaliação. É o caso do novo sistema biométrico, é o caso dos termos e condições de
utilização do novo sistema de certificação de atributos profissionais e são os casos em que é preciso
apresentar, por via eletrónica, os pedidos de cartão de cidadão. Todas estas matérias ficam — e isto é, de
alguma forma, uma crítica — remetidas para portaria e isso não é irrelevante.
A Ordem dos Advogados já levanta uma outra questão, que é a da segunda via e das garantias
relativamente a essa segunda via e à possibilidade de obtenção da mesma.
Isto em relação ao diploma na sua amplitude, por assim dizer.
Em relação à questão concreta, seja dos sem-abrigo, seja das comunidades nómadas, queria dizer que,
por princípio, pelo menos da nossa parte, não existe nenhuma objeção. Obviamente, esses portugueses são
cidadãos como todos os outros e, portanto, devem ter esse acesso.
No entanto, e referindo-me ao projeto do PAN, convém ser rigoroso e dizer que, hoje em dia, com as
alterações legislativas que tivemos, já não há, propriamente, um impedimento de acesso aos direitos
fundamentais, sejam eles de obtenção de apoios, laborais ou outros, ou mesmo de saúde. Não é uma situação
de completa ausência, por assim dizer, de cidadania. No entanto, não estamos contra a ideia e pensamos
também que é preciso saber muito bem como vamos envolver os municípios, sejam as câmaras municipais,
sejam as freguesias, nesta matéria. Ou seja, é preciso saber como vamos coligir esses dados e ser eficazes
desse ponto de vista.
O projeto do PAN é um bocadinho mais alargado e vai a outras possibilidades além da autárquica, porque
vai aos números de telemóvel, ou outros. No entanto, a proposta que o Governo nos traz parece-nos, desse
ponto de vista, razoável e não será por nós que ela não será apreciada e analisada em sede de especialidade,
ainda que algumas destas questões que aqui referimos tenham de ser, obviamente, vistas e ponderadas,
porque, apesar de tudo, o diploma é melhorável ou, pelo menos, «detalhável» em alguns aspetos relevantes.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe, do PCP.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Estamos perante uma proposta de lei que visa aperfeiçoar os mecanismos tecnológicos relativos ao cartão de
cidadão com o objetivo de facilitar a vida aos cidadãos, o que nos parece um objetivo meritório, mas há dois
aspetos para os quais gostaríamos de chamar a atenção. Em primeiro lugar, a tecnologia não dispensa as
pessoas e isso já foi dito, há pouco, pelo Sr. Deputado José Manuel Pureza.
Sabemos que o Instituto dos Registos e do Notariado tem um défice muito considerável de recursos
humanos e sabemos das dificuldades por que os cidadãos têm passado para a obtenção de cartões de
cidadão e para a renovação dos respetivos cartões. Enfim, não sei se todos nós já passámos por isso, mas
grande parte de nós já teve de perder duas manhãs ou duas tardes para tratar do cartão de cidadão, a
primeira vez para fazer o respetivo pedido e a segunda para fazer o seu levantamento. Muita gente passou por
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isso e, portanto, aquilo que permita evitar transtornos para a vida dos cidadãos relativamente à emissão dos
cartões de cidadão é positivo, mas implica que, da parte do Instituto dos Registos e do Notariado, os recursos
humanos sejam capazes de responder às exigências e também de apoiar as pessoas.
Se introduzirmos mecanismos de sofisticação tecnológica, mas, depois, não apoiarmos as pessoas a usá-
los, estaremos a aumentar as desigualdades e a criar uma elite de pessoas aptas a utilizar todos os
mecanismos tecnológicos existentes, enquanto um grande número de pessoas, por não se sentirem
habilitadas a usar esses organismos, ficarão excluídas da possibilidade da sua utilização.
Hoje já teremos um problema assim, pois, embora muitos cidadãos tenham cartão de cidadão, aqueles cuja
idade não faz com que tenham bilhete de identidade vitalício — naturalmente, ainda existem pessoas nessa
situação —, entre os titulares do cartão de cidadão, a grande maioria, porventura, não utiliza a chave móvel
digital porque não sabe exatamente para o que serve, porque não sabe como se ativa ou porque não foi
elucidada sobre as possibilidades da sua utilização.
Portanto, importa cuidar também das condições que damos às pessoas para poderem utilizar os meios
tecnológicos que pomos à sua disposição.
Depois, há o problema dos cidadãos sem-abrigo, que tanto consta na proposta de lei do Governo como na
iniciativa do PAN. O Sr. Deputado Telmo Correia referiu, e é verdade, que a Associação Nacional de
Municípios Portugueses criticou o facto de não termos ideia de como o Governo pretende regulamentar esta
matéria, havendo várias soluções possíveis. Elas ficam dependentes de regulamentação e, obviamente, as
autarquias devem saber as linhas com que se cosem, mas até agora ninguém sabe.
Do nosso ponto de vista, das várias soluções propostas, quer-nos parecer que a primeira linha de apoio a
esses cidadãos deveriam ser os serviços da segurança social. Ou seja, obviamente que a solução para os
problemas dos sem-abrigo é eles deixarem de o ser, mas enquanto tivermos cidadãos sem-abrigo há, de
facto, um problema a resolver e quer-nos parecer que a primeira linha de resolução deveria passar pelos
serviços da segurança social. No plano autárquico, vemos com mais facilidade que possa passar pela câmara
municipal do que pelas juntas de freguesia, porque o cidadão sem-abrigo, designadamente em meios urbanos,
dificilmente se fixará numa freguesia. Um sem-abrigo de Lisboa ou do Porto, provavelmente, não estará
apenas numa única freguesia, procurando encontrar abrigo onde puder. Portanto, creio que é mais facilmente
localizável um ponto de apoio a nível municipal do que propriamente a nível de freguesia, porque teremos
dificuldade em delimitar qual ela será exatamente.
Assim, se a opção for pelas autarquias, do nosso ponto de vista, será mais curial que seja pela câmara
municipal, mas quer-nos parecer que a primeira linha de apoio a estes cidadãos, até pelas atribuições do
respetivo serviço, será a segurança social. Naturalmente, esta é uma questão que o Governo deverá
regulamentar, pelo que é interessante sabermos qual é a reflexão do Governo sobre esta matéria.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Márcia Passos, do PSD, para uma intervenção.
A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos um pouquinho preocupados por duas razões. Por algumas das soluções apresentadas
na proposta de lei do Governo e na iniciativa do PAN, por um lado, e por esta acalmia das Sr.as e Srs.
Deputados, por outro, porque parece que está tudo bem nos registos e notariado, mas não está. É que,
efetivamente, não está nada bem.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Bem lembrado!
A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — Um cidadão que, nos dias de hoje, pretenda renovar o seu cartão de cidadão encontra tudo menos facilidades. As lojas do cidadão permanecem inexplicavelmente encerradas;
quem tenta fazer o agendamento por telefone não consegue porque do outro lado ninguém atende; quem
reside, por exemplo, em alguns concelhos do interior do País não consegue agendar via internet porque não
existe rede, a não ser, com alguma sorte, junto ao rio, em algumas localidades.
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Se residir, por exemplo, no distrito do Porto, hoje, pode conseguir agendar a renovação do seu cartão de
cidadão para setembro ou dezembro deste ano, ficando entre quatro a seis meses de espera para renovar o
cartão de cidadão, mas se tiver urgência pode optar por se deslocar a Penedono, no distrito de Viseu. É
verdade, Srs. Deputados, há conservatórias do Registo Civil do distrito do Porto a sugerirem aos cidadãos que
façam mais de 170 km para renovarem o seu cartão de cidadão. É este o estado dos pedidos de emissão ou
de renovação dos cartões dos cartões de cidadão, já para não falar dos muitos cartões de cidadão que
supostamente já estão emitidos mas que, inexplicavelmente, estão com meses de atraso nas entregas aos
seus titulares.
É este o reflexo da falta de investimento deste Governo num setor que é fundamental para a sociedade e
que, sob diversas perspetivas — civil, predial, comercial —, conferem segurança jurídica aos cidadãos, aos
negócios, ao comércio e ao investimento. Um setor estruturante em que o Estado não permite a renovação do
quadro de pessoal há mais de 20 anos, uma realidade à qual o Governo responde com programas que
costuma apelidar de «Simplex», mas que, muitas vezes, não são mais do que meios de ocultar as reais
necessidades.
É isto que faz esta proposta de lei que, podendo ter um ou outro aspeto positivo na tentativa de
simplificação de procedimentos, como por exemplo na recolha dos dados biométricos e na possibilidade da
sua reutilização, esconde as enormes fragilidades e carências governativas.
A situação é mais grave, Srs. Deputados, quando percebemos que o Governo continua a querer fugir do
problema dos cidadãos chamados «sem-abrigo». Pelo que assistimos neste Plenário, parece que isto é
normal, parece que estamos a aceitar esta normalidade da existência de pessoas sem-abrigo no nosso País.
Repare-se que o Governo prefere chamá-los de cidadãos nacionais sem postal físico. O que é isto? O que é
um cidadão nacional sem endereço postal físico ou, como prefere o PAN, um cidadão nacional sem local
correspondente à respetiva residência habitual?
Srs. Deputados, estamos, obviamente, a falar das pessoas em situação de sem-abrigo e não podemos
fazer de conta que não vemos. Em vez de resolver o problema social e humano destas pessoas, vem dizer-se
que elas podem indicar a morada da junta de freguesia ou da câmara municipal.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Qual é a alternativa?
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Qual?!
A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — A situação é tão caricata que não dizem em que junta de freguesia ou câmara municipal, pois não o podem dizer. Não há área de residência sequer. Ou, então, a morada da
segurança social, ou ainda, como adianta o PAN, o endereço de um apartado ou, imagine-se, um número de
telefone, um endereço de e-mail!
Srs. Deputados, o PAN quer que as pessoas em situação de sem-abrigo indiquem a morada de um
apartado, que tem custos?! De um número de telefone? De um endereço de e-mail? Mas as pessoas sem-
abrigo andam de iPad pela rua?!
Risos de Deputados do PSD.
Um endereço de e-mail, Srs. Deputados? O que é isto, Srs. Deputados? O que é isto?!
Em novembro de 2019, o PAN apresentou um projeto de resolução com a mesma justificação de motivos,
mas com soluções manifestamente diferentes e essas nós aprovamos.
O assunto é problemático, Srs. Deputados, merece a reflexão de todos, mas merece soluções concretas,
viáveis e que resolvam a vida das pessoas, nomeadamente daquelas que estão em situação de sem-abrigo.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — Outra situação com a qual não podemos pactuar é com a emissão de atestados, que o PAN vem propor, com base em declarações de pessoas recenseadas numa junta de
freguesia.
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Desculpe que lhe diga, Sr.ª Deputada, mas o PAN não deve conhecer a realidade dos autarcas deste País.
Os autarcas são responsáveis e não podem emitir atestados, nem emitem — não temos autarcas que possam
fazer isto! —, com base em declarações de cidadãos. Para emitir um atestado de residência, ou seja lá do que
for, o presidente da junta de freguesia tem de conhecer,…
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Claro!
A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — … tem de ir ao local, porque senão não pode atestar. Era só o que faltava que fosse diferente!
Para terminar, Sr. Presidente, o PSD irá à discussão na especialidade com vontade de encontrar soluções,
deixando claro, desde já, que não aprovará normas que tentem esconder os reais problemas do País.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Para o encerramento deste debate, uma vez que não há mais inscrições, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública, Alexandra
Leitão.
A Sr.ª Ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Queria, antes de mais, começar por dizer que a tecnologia é algo que tem de estar ao serviço,
pois é um instrumento de inclusão. E é um instrumento de inclusão quer quando apoiamos as pessoas com
menos literacia digital para usarem os serviços online, quer quando usamos a tecnologia — sim, Sr.ª
Deputada, usamos a tecnologia! — para integrar no sistema as pessoas que vão vivendo à margem dele, seja
por que circunstâncias da sua vida.
Portanto, aquilo a que a proposta de lei está totalmente aberta, é isso que pretendemos fazer, é a que a
tecnologia seja usada para incluir, e para incluir aqueles que usam os serviços online e aqueles que estão
excluídos, em função de circunstâncias próprias da sua vida.
Queria também dizer que ouviremos, naturalmente, a Associação Nacional de Municípios Portugueses
aquando da elaboração da portaria que irá densificar as normas do diploma que se referem às autarquias e
temos toda a confiança de que, com as autarquias, encontraremos soluções para recensear estas pessoas e
para lhes dar a plena cidadania que, até agora, de certa forma, lhes tem sido dificultada.
Esse trabalho vai ser feito, naturalmente, em parceria com a Associação Nacional de Municípios, sem
prejuízo do trabalho, também de detalhe ou densificação, que esta Assembleia faça na especialidade.
Gostaria, ainda, de dizer que não é verdade que as lojas do cidadão estejam encerradas. As lojas do
cidadão, até porque são espaços físicos, em regra, grandes, com um grande aglomerado de pessoas,
estiveram encerradas em determinados períodos da pandemia e, entretanto, já abriram, para atendimento por
marcação. Mas queria dar aqui alguns números, porque a melhor coisa é dar alguns números.
A Loja do Cidadão das Laranjeiras fazia, no seu tempo normal, 5000 atendimentos por dia, o que significa
que, quando uma loja como esta está fechada um, dois ou três meses, por força daquilo que sabemos, é fácil
de perceber o que é preciso correr para conseguir a recuperação.
E, por isso, dou-vos mais uns números: entre 19 de abril e 31 de maio, sendo que, no plano de
desconfinamento, as lojas do cidadão reabriram em 19 de abril, o número de atendimentos nas lojas do
cidadão chegou quase a 300 000, sendo que, em 2020, período em que, como sabem, também tivemos dois
momentos de confinamento, as lojas do cidadão fizeram 3 milhões de atendimentos, e estamos a falar de
atendimentos presenciais.
Mas dou ainda um outro número, que é o seguinte: entre setembro de 2020 e maio de 2021, foram
entregues, presencialmente, 2,4 milhões de cartões de cidadão, foram entregues, pelos CTT, quase 500 000 e
foram entregues, nos espaços cidadão — soluções mais pequenas, naturalmente, das freguesias —, cerca de
20 000.
Portanto, o que temos aqui, bem ao contrário, é a recuperação de uma situação difícil, porque corremos
atrás de um problema que foi provocado por um encerramento motivado por aquilo que sabemos, ou seja, pela
necessidade de confinamento. Estes são os números de uma recuperação, em que, sim, a tecnologia, em que,
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sim, a transição digital nos ajudam muito. Para quê? Para que possamos agilizar e apoiar as pessoas para
usar o digital e, dessa forma, deixar o presencial para quem não pode ou não quer usar o digital. Este é o
nosso propósito e todas as melhorias que a proposta de lei possa receber, da parte dos Srs. Deputados, nesta
linha, são, por isso, bem-vindas.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Srs. Deputados, damos por terminado o ponto três da nossa ordem de trabalhos.
O ponto quatro, sem tempos para debate, diz respeito às Propostas de Resolução n.os 21/XIV/2.ª (GOV) —
Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e a República Helénica sobre Cooperação em matéria de
Defesa, assinado em Lisboa, em 12 de outubro de 2020, 22/XIV/2.ª (GOV) — Aprova o Acordo entre a
República Portuguesa e a Organização Europeia de Direito Público para o Estabelecimento de um Escritório
Regional em Portugal, assinado em Atenas, em 16 de outubro de 2020, 23/XIV/2.ª (GOV) — Aprova o Acordo
entre a República Portuguesa e a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, assinado em Lisboa, em 18
de dezembro de 2020, que revê o Acordo referente ao Estabelecimento da Sede da Comunidade em Portugal,
assinado em Lisboa, em 3 de julho de 1998, e 24/XIV/2.ª (GOV) — Aprova o Acordo em Matéria de Proteção
dos Investimentos entre a União Europeia e os seus Estados-Membros, por um lado, e a República de
Singapura, por outro, feito em Bruxelas, em 19 de outubro de 2018.
Chegámos, assim, ao fim da nossa ordem de trabalhos de hoje.
A próxima sessão plenária realizar-se-á amanhã, às 15 horas.
O primeiro ponto da ordem do dia, requerido pelo Bloco de Esquerda, destina-se à apreciação do Projeto
de Lei n.º 859/XIV/2.ª (BE) — Legaliza a canábis para uso pessoal, conjuntamente com o Projeto de Lei n.º
862/XIV/2.ª (IL) — Estabelece a legalização da canábis.
Consta, do ponto dois, sem tempos para debate, o Projeto de Lei n.º 863/XIV/2.ª (PS) — Renova a
imposição transitória da obrigatoriedade do uso de máscara em espaços públicos, prorrogando, pela terceira
vez, a vigência da Lei n.º 62-A/2020, de 27 de outubro.
No final do debate, iremos proceder às votações regimentais.
Antes de encerrar a sessão, vou dar a palavra ao Sr. Deputado Secretário, para nos dar conta dos Srs.
Deputados que estiveram presentes por videoconferência.
Faça favor, Sr. Secretário.
O Sr. Secretário (Nelson Peralta): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, anuncio que a Sr.ª Deputada Sara Madruga da Costa, do Grupo Parlamentar do PSD, eleita pelo círculo eleitoral da Madeira, o Sr.
Deputado Carlos Alberto Gonçalves, também do PSD, eleito pelo círculo eleitoral da Europa, e o Sr. Deputado
Pedro Sousa, do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, estiveram presentes nesta sessão plenária por
videoconferência.
O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr.as e Srs. Deputados, damos por terminados os nossos trabalhos de hoje.
Um resto de boa tarde e uma boa noite.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 24 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.