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Sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022 I Série — Número 34

XIV LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2021-2022)

COMISSÃO PERMANENTE

REUNIÃODE24DEFEVEREIRODE 2022

Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Secretários: Ex.mos Srs. Diogo Feijóo Leão Campos Rodrigues Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a reunião às 15 horas e 6

minutos. De seguida, o Presidente informou a Câmara de que

endereçou uma mensagem ao seu homólogo ucraniano condenando veementemente a agressão militar russa e expressando solidariedade para com o povo da Ucrânia.

Deu-se conta da alteração das datas das deslocações do Presidente da República ao Dubai, a Moçambique, a Reiquiavique e a Haia.

Ao abrigo da alínea b) do n.º 2 do artigo 224.º do Regimento, procedeu-se a um debate, com a participação do Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, sobre o conflito na fronteira entre a Rússia e a Ucrânia, tendo usado

da palavra, além do Ministro (Augusto Santos Silva), os Deputados Rui Rio (PSD), Pedro Filipe Soares (BE), João Oliveira (PCP), Telmo Correia (CDS-PP), Inês de Sousa Real (PAN), Mariana Silva (PEV), André Ventura (CH), João Cotrim de Figueiredo (IL) e Luís Capoulas Santos e Ana Catarina Mendonça Mendes (PS).

Foi aprovado o n.º 33 do Diário, respeitante à 3.ª Sessão Legislativa da XIV Legislatura.

Foi aprovado um parecer da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados, autorizando o levantamento da imunidade parlamentar a um Deputado do PS.

O Presidente encerrou a reunião eram 16 horas e 58 minutos.

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O Sr. Presidente: — Boa tarde, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas, Sr.as e Srs. Agentes de autoridade.

Vamos dar início a esta reunião da Comissão Permanente da Assembleia da República.

Eram 15 horas e 6 minutos.

Antes de iniciarmos o debate desta tarde e de dar a palavra ao Sr. Ministro de Estado e dos Negócios

Estrangeiros, gostaria de informar a Câmara de que, esta manhã, enderecei ao meu homólogo ucraniano uma

mensagem em que lhe transmiti a mais veemente condenação da agressão militar russa — o maior ataque à

paz e à estabilidade na Europa, em décadas! — à Ucrânia, que é um Estado soberano, livre e independente,

expressando a mais calorosa e profunda solidariedade com o povo ucraniano por parte do Parlamento, que eu

represento.

Recordo que este debate foi agendado ontem na Conferência de Líderes, em face da tensão que se vivia na

fronteira entre a Rússia e a Ucrânia e das preocupações que a situação a todos suscitava, preocupações que

se materializaram, esta madrugada, contrariando todas as declarações de intenção, com plena má-fé, e

defraudando todos os esforços diplomáticos que vinham sendo encetados.

Ainda antes de passar a palavra ao Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, o Sr. Secretário da

Mesa tem vários anúncios para fazer à Câmara, pelo que lhe vou dar de imediato a palavra.

O Sr. Secretário (Diogo Leão): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a Casa Civil do Sr. Presidente da República enviou as seguintes informações: a deslocação de Sua Excelência o Presidente da República ao

Dubai, inicialmente prevista para os dias 12 a 15 de janeiro de 2022, foi adiada para 4 a 7 de março; a deslocação

de Sua Excelência o Presidente da República a Moçambique, inicialmente prevista para os dias 20 a 23 de

janeiro de 2022, foi adiada para 16 a 23 de março; a deslocação de Sua Excelência o Presidente da República

a Reiquiavique foi adiada sine die e a deslocação de Sua Excelência o Presidente da República a Haia foi

alterada para os dias 21 e 22 de fevereiro.

É tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, passamos ao primeiro ponto da nossa ordem do dia que consiste no debate, com a participação do Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, cuja

presença agradeço, sobre o conflito entre a Rússia e a Ucrânia que começou por ser na fronteira, mas que,

neste momento, já é um conflito dentro da Ucrânia.

Para abrir o debate, tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Augusto Santos Silva): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Agradeço à Assembleia da República a oportunidade deste debate importantíssimo sobre a

maior crise de segurança por que a Europa passa desde o fim da II Guerra Mundial.

Permitam-me que as minhas primeiras palavras sejam de lamento e de consternação pelas vidas que já

foram perdidas, em virtude desta agressão militar da Rússia à Ucrânia. Neste momento, temos já a lamentar

dezenas e dezenas de vítimas, pessoas que perderam a vida ingloriamente e perderam a vida porque as mais

básicas regras do direito internacional e da Carta das Nações Unidas foram, e estão a ser, ostensivamente

violadas pela Federação Russa.

A segunda palavra é de condenação inequívoca sem «se» nem «talvez», sem qualquer espécie de

modulação, uma condenação inequívoca do ato de agressão militar, armada, da Rússia a um Estado soberano

e independente, a Ucrânia.

Esta ação de agressão tem de ser bem caracterizada. É uma invasão militar, com intuitos de ocupação militar,

de um Estado soberano, a Ucrânia, por parte de outro Estado, a Federação Russa.

Essa invasão militar configura uma violação ostensiva, como disse, da Carta das Nações Unidas, da

arquitetura da segurança europeia, laboriosamente construída desde, pelo menos, os anos 70 do século

passado e também dos próprios acordos de Minsk que a Federação Russa subscreveu.

É um ato de agressão praticado com uma duplicidade que raras vezes se viu com esta intensidade na cena

internacional nas últimas décadas. É um ato de agressão que, como bem caracterizou o Secretário-Geral das

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Nações Unidas, é intolerável, inaceitável para a comunidade internacional. Por isso mesmo, devemos, talvez,

iniciar este debate repercutindo as palavras do Secretário-Geral das Nações Unidas, apelando, diria mais,

exigindo à Rússia, mais uma vez, em nome da humanidade, que faça recuar as suas tropas para o seu próprio

território e que cesse este ato de agressão à Ucrânia.

Devemos, também, exprimir a solidariedade e o apoio às autoridades e ao povo ucraniano. Fê-lo o Sr.

Presidente da Assembleia da República; neste momento, o Sr. Presidente da República recebe, em nome de

todos nós, quero crer, a Sr.ª Embaixadora da Ucrânia em Portugal; fi-lo eu, em nome do Governo e também em

nome do País, na última segunda-feira, ao Ministro dos Negócios Estrangeiros da Ucrânia. Essa solidariedade

e esse apoio estende-se também às dezenas de milhares de cidadãos ucranianos que vivem em Portugal e às

centenas de cidadãos luso-ucranianos que vivem na Ucrânia.

É, portanto, uma solidariedade com todo o povo ucraniano, com particular enfâse dirigida aos ucranianos

que vivem em Portugal e que são mais de 28 000, que estão excelentemente bem integrados na sociedade

portuguesa e que não mereciam passar e ver passar as suas famílias, os seus parentes, os seus amigos, os

seus compatriotas pela barbárie que lhes está a ser infligida.

O ponto em que estamos é o de uma situação dinâmica que temos de acompanhar ao minuto, mas é um

ponto em que uma reação firme da comunidade internacional é absolutamente necessária no plano político, no

plano económico e, também, no plano da segurança e da defesa.

No plano político, trata-se de uma reação de indignação, de revolta da comunidade internacional verbalizada

pelo Secretário-Geral das Nações Unidas, mas também por diferentes organizações, coligações e plataformas

internacionais de concertação e de cooperação.

Aqueles que defendem o direito internacional, aqueles que defendem a Carta das Nações Unidas, aqueles

que defendem o sagrado direito de um Estado e de um povo à sua própria soberania e à integridade do seu

território, todos esses devem condenar, sem qualquer hesitação, o que está a acontecer, hoje, na Ucrânia, que

é uma invasão militar da Rússia.

A reação deve fazer-se também no plano económico e financeiro, que é um plano em que a União Europeia

tem um particular e compreensível protagonismo. Decidimos e aplicámos um primeiro pacote de sanções em

reação à decisão da Rússia de reconhecer a suposta independência de alegadas repúblicas populares no leste

da Ucrânia, isto é, de reconhecer regiões separatistas da Ucrânia. Aprovámos um pacote de sanções em reação

a essa decisão da Federação Russa e também em reação à aprovação, por parte do Parlamento russo, da

autorização para o uso de força militar no estrangeiro por parte das autoridades russas.

Esse pacote de sanções foi dirigido a indivíduos e a entidades, foi dirigido à interdição de produtos oriundos

das regiões separatistas e foi também dirigido à interdição de movimentos de financiamento do Estado russo e,

em particular, do banco central russo a partir do sistema económico e financeiro europeu. Estas sanções foram

devidamente concertadas com os nossos parceiros e aliados, nomeadamente, com os Estados Unidos, o Reino

Unido, o Canadá, o Japão, a Austrália e várias outras nações que se têm juntado a nós.

Hoje o Conselho Europeu dará orientações claras para um novo pacote de sanções, ainda mais duro, ainda

mais forte, ainda com mais impacto no plano económico e financeiro e já está marcado para amanhã, em

Bruxelas, um Conselho de Ministros dos Negócios Estrangeiros para formalizar a respetiva aprovação.

No plano da segurança e da defesa, em que a nossa estrutura de defesa é a NATO (North Atlantic Treaty

Organization), que é uma aliança defensiva, puramente defensiva, mas que tem capacidades de dissuasão que

são fortes e necessárias, porque são a primeira barreira para impedir agressões ao nosso território, ao longo da

manhã de hoje, o Conselho do Atlântico Norte deu autorização ao comando da NATO para reforçar as nossas

capacidades de dissuasão, em particular no flanco leste da Aliança.

Portanto, estas reações da Europa, do Atlântico Norte, da comunidade internacional, no plano político, no

plano económico e no plano da segurança e da defesa são uma resposta clara a esta agressão da Rússia e,

evidentemente, evoluirão à medida que a situação no terreno evoluir.

Finalmente uma nota de natureza consular: à data de ontem, ainda tínhamos 202 cidadãos portugueses,

residindo, vivendo ou estando temporariamente na Ucrânia; 160 deles luso-ucranianos, tão portugueses como

os demais, mas, evidentemente, sendo luso-ucranianos estando na sua pátria e não no estrangeiro quando

estão na Ucrânia. Mobilizámos hoje os nossos meios, que havíamos reforçado nas semanas anteriores, para

apoiar os portugueses e os luso-ucranianos que desejem ou tenham de sair da Ucrânia por via terrestre visto

que o espaço aéreo está fechado. Essa operação encontra-se em curso.

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Assim, dissemos hoje, em particular através das palavras do nosso Primeiro-Ministro, que Portugal está

inteiramente disponível não só para acolher estes, mas para acolher todos os amigos, familiares, vizinhos,

conhecidos da comunidade ucraniana que vive em Portugal e todos aqueles ucranianos que esta bárbara

agressão russa obrigue a deslocar-se temporariamente para fora do seu país.

Portugal é e vai ser também a sua casa de acolhimento.

Aplausos do PS, do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro. Vamos agora entrar no debate, pelo que, para intervir e fazer perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado Rui

Rio, do Grupo Parlamentar do PSD.

O Sr. Rui Rio (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Sr.as e Srs. Deputados, hoje é um dos dias mais negros da história recente da Europa. Entre a paz e a guerra, a Rússia

escolheu a guerra. Esta madrugada, as forças russas invadiram a Ucrânia, um país livre e soberano.

O PSD condena veementemente a flagrante e grosseira violação do direito internacional pela Rússia e

expressa a sua total solidariedade para com o Estado e para com o povo ucraniano e, em primeira linha, para

com todos os portugueses residentes na Ucrânia.

A Ucrânia é um país soberano. A Rússia negou e ameaçou essa soberania a um nível sem precedentes,

cercando durante meses o Estado ucraniano, com milhares de soldados russos e em total violação de todos os

tratados internacionais.

Todos os esforços diplomáticos efetuados insistentemente por europeus e americanos foram apenas usados

por Vladimir Putin para uma mera encenação. O mundo todo constatou isso mesmo e também constatou que,

nesta crise, a questão do alargamento da NATO esteve sempre no centro das discussões.

É um facto que sempre que o Governo ucraniano tentou uma aproximação à União Europeia e à NATO, no

sentido da consolidação democrática e do desenvolvimento económico, a Rússia ameaçou a Ucrânia. Foi assim

em 2004, foi assim em 2014 e é de novo agora, com consequências imprevisíveis.

À Rússia de Putin incomoda a democracia, a autonomia, o Estado de direito, os direitos humanos, os direitos

das minorias, a economia de mercado, a globalização imbuída de valores ocidentais. Incomoda-a a linguagem

ocidental dos valores e princípios humanistas, que são totalmente incompatíveis com toda e qualquer visão

imperialista.

O PSD condenou, desde logo, a decisão da Rússia de reconhecer a independência das autoproclamadas

repúblicas populares de Donetsk e de Lugansk, porque se trata de uma violação do direito internacional, dos

acordos de Minsk e do princípio do respeito pela integridade territorial dos Estados. Nenhuma ordem

internacional pode subsistir quando os Estados se sentem livres para colocar em causa a soberania de outros

Estados e para alterar as suas fronteiras pela força.

Nós sempre defendemos a diplomacia e a solução pacífica dos conflitos. A Rússia é o contrário: preteriu a

solução diplomática e o Presidente Putin é o responsável por trazer a guerra de volta ao continente europeu.

O PSD defende uma coordenação ativa entre a União Europeia, o Reino Unido e os Estados Unidos da

América para a adoção de um pesado pacote de sanções à Rússia. Isto porque este é um ato de agressão sem

precedentes e porque o alvo dos russos não é apenas Donbass, nem tão-somente a Ucrânia. O alvo é também

a estabilidade da Europa e de toda a ordem internacional.

Por isso, Portugal tem de estar disponível para fazer esse caminho conjunto. Não estarmos prontos para

contribuir com a nossa parte, no plano militar, económico ou diplomático, seria estarmos a ignorar o perigo de

termos um futuro bem mais sombrio para a Europa, em particular, e para a humanidade, em geral.

É, pois, nosso entendimento que, sem tibiezas, a União Europeia deve estar pronta a enviar à Rússia um

sinal muito forte de que este ataque é inaceitável e, por conseguinte, terá de ter um preço económico e político

exemplar e dissuasor de novas aventuras imperialistas e antidemocráticas.

Esta é uma situação gravíssima relativamente à segurança na Europa, a mais grave dos últimos tempos,

pelo que Portugal deve assumir integralmente os seus compromissos e a sua responsabilidade como membro

fundador da NATO e defensor da paz e dos valores democráticos. A ameaça à soberania ucraniana e à sua

integridade territorial deve ser condenada por todos os países que partilham os valores da paz e da democracia.

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Neste sentido, a afirmação destes valores, bem como a total disponibilidade de Portugal para colaborar com

os seus aliados no seio da União Europeia e da Aliança Atlântica devem ser inequívocas, demonstrando o seu

apoio e solidariedade para com o povo ucraniano.

Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Sr.as e Srs. Deputados, mais uma vez,

no centro da Europa, mulheres, homens e crianças inocentes temem pelas suas vidas. A razão de tal

barbaridade é o imperialismo russo e o seu total divórcio dos valores e princípios que, a todos, nos devem unir

e que são valores e princípios essenciais para a construção de um mundo mais livre, mais justo, mais

desenvolvido e mais respeitador dos direitos humanos.

A Rússia de Putin é o contrário disso tudo.

Nós, portugueses, europeus e cidadãos do mundo, temos de ser soldados no combate por tudo aquilo em

que acreditamos e que tanto nos custou alcançar.

Nestas horas sombrias, temos de estar ativos e solidários com o povo ucraniano e com todos aqueles que,

no quadro de toda a comunidade internacional, condenam a guerra e defendem a paz, a concórdia, o

desenvolvimento e a solidariedade internacional.

É este o lado em que o PSD está. É o lado em que o PSD sempre esteve.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, começo por agradecer a intervenção do Sr. Deputado Rui Rio, bem como a disponibilidade permanente que o seu partido

tem manifestado ao longo desta crise, que já leva várias semanas, e sempre que o Governo entendeu necessário

proceder a consultas sobre questões nas quais todos beneficiamos de um consenso político muito forte, muito

duradouro, muito estabilizado e muito genuíno em Portugal.

Agradeço também as referências que fez às diligências diplomáticas levadas a cabo aos mais diferentes

níveis. Permita-me um comentário sobre isto: ninguém disse ao Presidente Putin que não estava disponível para

ouvir e para o ouvir sobre o que ele entendia, ou entenderá, serem preocupações de segurança ou dos

interesses nacionais do seu país.

O Presidente Biden, a Presidente Ursula von der Leyen, o Presidente Charles Michel, todos nós fomos

dizendo à parte russa que estávamos disponíveis para considerar os dois temas principais que parecia que a

parte russa colocava em cima da mesa: em primeiro lugar, as suas preocupações de natureza geopolítica sobre

a segurança e o nível de militarização da sua vizinhança próxima; e, em segundo lugar, as questões relativas à

chamada indivisibilidade da segurança, ou seja, à necessidade que temos de considerar reciprocamente as

preocupações de segurança que exprimimos.

A única coisa que nós dissemos é que havia, e há, uma arquitetura de segurança europeia — construída,

aliás, com a União Soviética e depois com a Rússia, desde a Conferência de Helsínquia, nos anos 70 do século

passado — e que era, no quadro dessa arquitetura, em particular no quadro da Organização para a Segurança

e Cooperação na Europa, que essas questões se deviam colocar.

Quanto à relação entre a NATO e a Rússia, desde os anos 90, desde o chamado ato fundador, a NATO e a

Rússia têm uma estrutura comum, uma plataforma comum para considerarem conjuntamente quaisquer

questões de segurança e defesa que queiram colocar uma à outra. É o Conselho NATO-Rússia. Portanto, nós

tínhamos, e continuamos a ter, toda a disponibilidade para examinar reciprocamente as nossas preocupações

de segurança.

O que não aceitamos é que qualquer Estado, seja ele qual for, se arrogue o poder de veto sobre um Estado

terceiro. O que não aceitamos é que, no século XXI, ainda se queira conceber as relações entre as nações não

na base do direito internacional, laboriosamente construído desde o fim da II Guerra Mundial, mas na base de

obsoletas, arcaicas e ilegítimas esferas de influência.

Por conseguinte, temos toda a disponibilidade para considerar as questões de segurança reciprocamente,

mas nenhuma disponibilidade para aceitar a chantagem, para aceitar a intimidação, para aceitar a ameaça ou

para aceitar os poderes de veto.

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Aplausos do PS.

Tentámos tudo! Tentámos esgotar todas as vias político-diplomáticas — do diálogo, da interlocução, da

interação, da tentativa de compreender reciprocamente os pontos de vista e os interesses —, e o que se verifica

é que, ao longo destas semanas, o que obtivemos da Rússia não foi mais do que duplicidade.

Os exercícios militares conjuntos com a Bielorrússia iam terminar no domingo passado. Chegou domingo

passado, prosseguiram.

A Rússia anunciou várias vezes, ao longo da semana passada, que estava a reduzir as suas forças militares

estacionadas junto da fronteira, a leste e a norte da Ucrânia, mas, na prática, estava a aumentá-las.

O Presidente russo comprometeu-se com o Presidente em exercício do Conselho da União Europeia a

trabalhar para o cessar-fogo um dia antes de cometer o ato ilegal, ilegítimo e incendiário de reconhecer as

repúblicas-fantoches de Lugansk e Donetsk.

Portanto, o que obtivemos da Rússia foi a duplicidade e à duplicidade a Rússia adicionou a agressão. É isso

que está hoje em curso: uma agressão, um ato armado de agressão ilegal, ilegítima e imoral, de acordo com

qualquer princípio de direito, de moral ou de ética no relacionamento entre Estados.

Por isso é que dizemos, hoje — toda a comunidade internacional e, em particular, as Nações Unidas —, que

é preciso que a Rússia cesse de imediato este ato de agressão para que a via política possa ser reposta.

No entanto, a via política só pode ser reposta se a Rússia compreender que os Estados são soberanos, que

a soberania dos Estados é inviolável e que a integridade territorial dos Estados é inviolável.

Portugal assume os seus compromissos e assume-os em todas as esferas ou círculos em que participa,

desde logo, no conjunto das Nações Unidas, depois, no conjunto da União Europeia e, seguidamente, no

conjunto da nossa estrutura de defesa coletiva que é a NATO. Portanto, em cada uma destas plataformas, em

cada um destes níveis ou planos, nós participamos sempre da mesma maneira, contribuindo para a concertação,

para a defesa do direito internacional e para a prossecução da paz e de soluções pacíficas para os problemas.

Os 50 milhões de ucranianos têm direito a escolher o seu destino. Os 50 milhões de ucranianos têm direito

a decidir, eles próprios, quais são as alianças que querem e quais são os objetivos que querem prosseguir. E

as centenas de milhões de europeus, que compreendem tanto portugueses como russos, têm direito também a

viver em paz e em estabilidade. É disso que se trata.

Como o Ministro e o Presidente ucraniano não têm cessado de recordar nestes dias e nestas horas, nós não

estamos perante apenas, ou sobretudo, uma crise de relacionamento entre a Rússia e a Ucrânia ou entre a

Ucrânia e a Rússia, nós estamos perante a mais grave crise de segurança por que a Europa passou, e está a

passar, desde o fim da II Guerra Mundial.

Assim, nós todos, europeus, nós todos, democratas, nós todos, amantes da paz, nós todos, os que queremos

que as Nações Unidas nos representem, que os conflitos se resolvam de forma pacífica e que a proibição da

agressão armada — que é fundadora da ordem internacional e da Carta das Nações Unidas — seja respeitada,

todos temos de dizer hoje: «Presentes!». Sim, hoje, somos todos ucranianos!

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: — Para intervir e fazer perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, do Bloco de Esquerda.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, a invasão da Ucrânia pela Rússia é inaceitável. O Bloco de Esquerda condena, sem reservas, o

ataque que está em curso e a ocupação do território de um país soberano.

Não há imperialismos bons e imperialismos maus. São todos perigosos para os povos e, por isso, rejeitamos

a ação militar russa. Lamentamos todas as vidas perdidas e estamos solidários com todas as pessoas que

deixam as suas casas para trás e fogem da guerra.

Assim, em primeiro lugar, deve existir um cessar-fogo imediato e a retirada das forças russas do território

ucraniano. A insistência da Rússia na via militar tem de ser punida com sanções fortes que afetem diretamente

a oligarquia russa e a elite do país.

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Esta é a primeira pergunta que lhe faço: o Governo português acompanha essa intenção? De que forma o

fará? Quais os reforços de sanções que estarão em cima da mesa, para decisão, nas próximas horas?

A segunda pergunta é especificamente sobre a ação do Governo português e as suas próprias decisões

soberanas. Sabendo que os vistos gold foram e são uma das formas de os oligarcas russos fugirem às suas

obrigações e de poderem também fugir às sanções, o Governo português não considera necessário suspender

de imediato a atribuição de mais vistos e retirar aqueles que já foram atribuídos?

Por outro lado, que fará o Governo português para garantir que a elite russa é penalizada, também nos seus

interesses económicos em Portugal, e que não fica sem responsabilidades por tudo aquilo que está a fazer?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Muito obrigado, Sr. Presidente. Agradeço as questões colocadas pelo Sr. Deputado Pedro Filipe Soares e registo a condenação, sem

reservas, que faz do ato de agressão da Rússia. É muito importante que essa condenação se faça e que seja o

mais generalizada possível neste Parlamento, que representa o País na sua diversidade.

Também acompanho a exigência de um cessar-fogo imediato, que, neste caso específico, significa um

cessar-fogo por parte dos russos, porque eles são os atacantes, já que o fogo disparado pelos ucranianos, hoje,

foi um fogo em legítima defesa, em defesa do seu país e do seu território.

Em relação às sanções, teremos certamente orientações claras do Conselho Europeu, que reúne hoje à noite

em Bruxelas, presencialmente — o Primeiro-Ministro está, neste momento, a deslocar-se para esse Conselho

—, e essas orientações serão depois vertidas e aprovadas na reunião dos Ministros dos Negócios Estrangeiros,

que já está marcada para amanhã, às 15 horas, também em Bruxelas.

Essas orientações vão no sentido que o Sr. Deputado indicou, isto é, de continuar a sancionar as pessoas

russas, singulares ou coletivas, diretamente associadas a estas decisões, portanto, às decisões do

reconhecimento, à decisão da agressão e às decisões conexas. Essas pessoas, individuais ou coletivas, são

sancionadas na lógica das sanções europeias, isto é, os seus ativos financeiros na Europa são congelados e a

sua liberdade de movimentos na Europa é coartada.

Acrescenta-se a isso sanções económicas sobre a economia russa, dirigidas especificamente, num primeiro

pacote, à interdição de importação de produtos oriundos das duas regiões separatistas, sendo que, muito

provavelmente, hoje, o seu âmbito será alargado.

Finalmente, acrescentam-se as sanções poderosas, aquelas que dizem respeito ou que vão diretamente ao

coração do poder russo, interditando o financiamento, a partir da União Europeia, do Estado russo,

designadamente através da compra de obrigações, impedindo o acesso da Rússia aos mercados de capitais e

de dívida da Europa e também interditando movimentos com o banco central russo, para além de movimentos

de bancos russos.

Por isso mesmo, não tendo Portugal — e bem, do meu ponto de vista! — um regime nacional de sanções,

mas executando, aplicando o regime internacional e europeu de sanções, qualquer cidadão russo que resida

em Portugal a qualquer título, com qualquer tipo de autorização, sendo também, ou não sendo, cidadão

português, que faça parte da lista dos sancionados, está sujeito à limitação de movimentos em Portugal e ao

congelamento dos seus ativos financeiros.

Portanto, no caso específico das pessoas, qualquer que seja o tipo de autorização de que sejam titulares, se

estão na lista dos sancionados, são sancionados em Portugal, como em qualquer outro Estado da União

Europeia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, através do Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, registo que, sobre a suspensão de processos em curso para a obtenção de vistos gold ou da cidadania portuguesa, o Sr. Ministro se refugiou na lei geral e

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não condenou esse processo em particular, que é um processo relevante, porque muitos destes oligarcas têm

interesses, direta ou indiretamente, através desse direito de cidadania, em Portugal.

Por isso, esperamos que a sanção seja passível de alcançar todos os seus pertences, mas também a sua

cidadania, neste contexto, e que o Governo tenha essa coragem.

Protestos da Deputada do PS Constança Urbano de Sousa.

Sabemos que a escalada militar tem acontecido dos dois lados da fronteira da Ucrânia e até nos diversos

lados nacionais das fronteiras da Ucrânia, porque tem havido também uma crescente colocação de tropas da

NATO nos países vizinhos da Rússia e da Ucrânia. Da mesma forma, como foi referido, tem havido um aumento

das forças russas nas fronteiras com a União Europeia.

Desse ponto de vista, consideramos que ambas as ações são injustificáveis e que estão na origem do

problema que hoje está a ser enfrentado. E é por isso que nós percebemos e aceitamos o reforço das sanções

económicas, a perseguição a esta elite de oligarcas russos, mas não compreendemos a escalada da via militar.

O que o reforço da NATO, nestes últimos anos, em todos os países vizinhos da Rússia, tem alcançado é

uma legitimação do discurso de Putin e não o contrário. É esta ideia de que a militarização trará consigo uma

dissuasão que tem alimentado a escalada da agressão e que, por outro lado, tem ajudado a que a retórica

nacionalista de Putin tenha também benefícios internos, que é algo que ele está a procurar neste momento.

Por isso, desse ponto de vista, registo que ninguém defendeu uma intervenção militar da NATO na Ucrânia

— isso é bom. No entanto, achamos que é errado considerar que o reforço da NATO, antes das sanções

económicas, ou mesmo face a sanções económicas, que não têm a força que deveriam ter, é também uma via

errada. Como disse há pouco, mais presença da NATO não dissuade, apenas escala o conflito.

É por isso que a Europa deve rejeitar, com todas as suas forças, uma nova guerra alargada no seu território,

seja ela permanente, seja ela uma ameaça constante nas suas fronteiras. Desse ponto de vista, a mobilização

militar que está em curso do lado da NATO não ajuda a soluções, antes poderá agravar alguns dos problemas.

O que pergunto ao Sr. Ministro é o que fará o Governo português sobre isto: vai alimentar a escalada militar,

com o envio de tropas para as fronteiras da Ucrânia ou vai apelar ao retorno da via diplomática?

O envio de militares portugueses é uma escolha errada e com a qual o Bloco de Esquerda não irá pactuar.

Alimentar o militarismo é insistir na desestabilização daquela região e criar mais problemas à União Europeia.

Por isso, repito a pergunta: o que fará o Governo português sobre esta matéria?

Para o Sr. Ministro poder responder de seguida, no tempo que lhe resta, faço um outro conjunto de perguntas,

que tem que ver com o respeito pelo direito internacional humanitário. Notamos que o Governo português — o

Sr. Ministro ainda o repetiu há pouco — demonstrou a abertura para acolher em Portugal todos os ucranianos,

nas suas palavras: «vizinhos, amigos, familiares daqueles que já têm a sua vida estabelecida em Portugal». É

um passo positivo, que registamos, mas ainda é insuficiente.

Nessa perspetiva, responder aos milhares, dezenas de milhares, porventura, centenas de milhares, se não

milhões, de pessoas, que vão sofrer com esta guerra, é responder a cada um e a cada uma delas, não apenas

aos que têm amigos, familiares, vizinhos que vivem em território nacional.

Gostava de ter do Governo português a disponibilidade de mostrar que hoje fará parte daquela Europa que

não repetirá os erros que ainda há meses estava a cometer, deixando tantos refugiados sem o apoio necessário.

Gostaria de saber se Portugal, nesta matéria, também tomará a liderança, garantindo a todas as ucranianas e

a todos os ucranianos que precisem do nosso País para viver, para fugir à guerra, uma saída que lhe possamos

dar. Era importante que tivéssemos esse compromisso, também aqui, hoje.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, muito obrigado pelas suas questões e, se me permite, começo pela última, pela nossa convergência,

antes de ir às nossas divergências.

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Quando me referi à nossa disponibilidade para acolher os amigos, os familiares, os vizinhos da grande,

respeitada e bem integrada comunidade ucraniana residente em Portugal, não estava a definir um limite, estava

a dar um exemplo. Isto porque todos nós sabemos que quanto melhores e mais intensas são as ligações com a

comunidade já existente, melhor e mais fácil é a integração.

Portugal cumprirá, como sempre tem cumprido, as obrigações da lei internacional humanitária e a nossa

prática fala por nós. Estamos agora a chegar aos 800 refugiados afegãos acolhidos por Portugal e continuamos

disponíveis e a fazer parte do grupo de Estados-Membros da União Europeia que diz sempre «presente»,

quando se trata de proceder ao acolhimento e à recolocação de refugiados.

Contudo, há três divergências entre nós que não vale a pena esconder. Uma diz respeito ao seguinte:

pareceu-me que o Sr. Deputado quer estabelecer sempre uma relação simétrica em que há um imperialismo,

mas há também outro imperialismo. «Se quero criticar o imperialismo russo (…) — são os seus termos —, (…)

tenho de, ao mesmo tempo, criticar o imperialismo do outro lado».

Eu não acho que haja esta simetria. Acho que há mesmo uma potência agressora que viola flagrantemente

os seus próprios acordos, os acordos que ela própria subscreveu, e a lei internacional, e que há uma aliança

defensiva que, sim, está também a fortalecer a sua capacidade de defesa e de dissuasão. Portanto, não há

simetria, a culpa não é de todos. A culpa, a responsabilidade, a violação têm um nome e têm um rosto. Esse

nome é o de Vladimir Putin e o rosto é o dele.

Depois, há também uma divergência, que é a de o Sr. Deputado entender que a via diplomática só pode ser

seguida se renunciarmos à nossa própria capacidade e ao nosso próprio direito de nos defendermos,

dissuadindo os outros de nos atacar, mas eu creio que as duas coisas são igualmente necessárias. E por isso

mesmo é que, sim, estamos a reforçar a nossa capacidade de dissuasão, porque é ela que permite a Putin

pensar mil vezes antes de se atrever a fazer um gesto e a tomar uma ação que, se não fosse essa capacidade

de dissuasão, não teríamos a certeza de que ele não tomasse.

Finalmente, sobre a questão das capacidades de defesa, quero dizer que defendermo-nos, termos

capacidade de defesa, termos capacidade de dissuasão, é muito diferente de sermos militaristas…

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — …é apenas assumirmos a responsabilidade de proteger o nosso próprio povo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Passamos ao Grupo Parlamentar do PCP. Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira para intervir e fazer perguntas.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro, as nossas primeiras palavras são para expressar profunda preocupação com os desenvolvimentos da escalada de confrontação

política, económica e militar, e com os sérios riscos que essa confrontação comporta.

A guerra é o maior perigo que a humanidade enfrenta e a Europa tem uma das mais dolorosas experiências

do que a guerra pode significar. A guerra não é solução, seja para que problema for, e é preciso fazer todos os

esforços para a evitar.

Por isso, consideramos que a situação que se vive no Leste Europeu exige de Portugal e do Governo

português uma intervenção que contrarie essa escalada de confrontação política, económica e militar, que

contribua para o desanuviamento da situação e para uma solução negociada que garanta a paz, desde logo,

recusando envolver militares portugueses em operações que contrariam esses objetivos.

É hoje evidente que a situação que se vive na Ucrânia não é um problema entre russos e ucranianos, nem

apenas uma disputa por território ou demarcação de fronteiras.

O problema é mais profundo, mais amplo e ultrapassa em muito o Leste Europeu. O problema de fundo, que

enquadra a situação que se vive na Ucrânia, é o mesmo problema que já vimos acontecer na Jugoslávia, no

Iraque, no Afeganistão, na Líbia ou na Síria. É o problema da utilização do cerco, da confrontação e da guerra

para impor pela força relações económicas geradoras de maiores injustiças e desigualdades ou a apropriação

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de recursos naturais e energéticos. É o problema de se invocar ou de se esquecer o direito internacional em

função da conveniência de circunstância.

É o problema da utilização da NATO como instrumento desses objetivos e é o problema da subordinação da

União Europeia à política belicista dos Estados Unidos da América e da NATO.

Vale a pena perguntar a quem serve, afinal, uma guerra na Europa. Não serve aos ucranianos nem aos

russos e tampouco serve aos restantes povos europeus, mas serve ao Governo dos Estados Unidos da América

e ao seu complexo industrial militar.

Quer para desviar atenções de problemas internos, quer para assegurar a venda de armamento em larga

escala, quer ainda pelo aproveitamento económico de uma guerra a milhares de quilómetros das suas próprias

fronteiras, o Governo dos Estados Unidos e o complexo industrial militar norte-americano são os verdadeiros

interessados numa nova guerra na Europa e estarão certamente dispostos a sacrificar até ao último ucraniano

ou europeu para a promover.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Meu Deus!

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — É inacreditável!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Por outro lado, registamos o recente discurso de Putin, com afirmações que incorporam conceções próprias da Rússia czarista e que criticam decisões que, no quadro da União Soviética,

resolveram a questão das nacionalidades, reconhecendo os direitos dos povos e garantindo a paz por mais de

70 anos.

Sendo hoje a Rússia um país capitalista, o seu posicionamento é determinado, no essencial, pelos interesses

das suas elites e dos detentores dos grupos económicos e, apesar de os orçamentos militares dos países da

NATO serem dez vezes superiores ao da Rússia, não é expectável que a Rússia, cujo povo conheceu, na

história, colossais agressões, venha a considerar aceitável que o inimigo esteja acampado nas suas fronteiras

ou lhe faça um cerco militar por via de um ainda maior alargamento da NATO.

Tal como não é expectável que a Rússia aceite que o mesmo resultado seja alcançado por via da ação do

regime xenófobo e belicista instaurado na Ucrânia na sequência do golpe de Estado de 2014, que envolveu

inclusivamente o recurso a forças nazi-fascistas e que nunca, até hoje, cumpriu os acordos de Minsk.

O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — Quem é que não cumpriu os acordos?!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Foi este o caminho que foi seguido para trazer o mundo até aqui, e é este o caminho que o PCP condena em toda a sua extensão.

O PCP considera que os esforços devem ser feitos no sentido de assegurar a paz.

No quadro em que o conflito na Ucrânia está hoje colocado, a solução de paz só pode ser alcançada travando

a escalada de confrontação política, económica e militar da NATO, dos Estados Unidos da América e da União

Europeia com a Rússia e contando com o contributo da Rússia para uma solução política e pacífica negociada.

O PCP defende esta posição com a coerência de quem sempre recusou a guerra e defendeu a paz como

solução para os conflitos internacionais.

Defendemos esses princípios quando estavam em causa as guerras da Jugoslávia, do Iraque, do

Afeganistão, da Líbia ou da Síria. Voltamos a defendê-los hoje, exatamente com a mesma convicção.

Aplausos do PCP e do PEV.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Muito mau!

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, devo dizer que estou de acordo com os princípios com que organizou a primeira parte da sua intervenção,

designadamente, e julgo ter tomado boa nota, com a sua denúncia daqueles que violam o direito internacional

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e daqueles que usam o cerco, a confrontação e a guerra para imporem relações políticas e económicas entre

Estados ou povos. Estou também de acordo com a sua denúncia da escalada de confrontação.

Por isso, não consigo perceber como é que o Sr. Deputado não aplica esses princípios à situação presente.

É que a escalada de confrontação existe desde há vários meses, porque há um país, que se chama Federação

Russa, que tem acumulado militares, equipamento militar, armas e unidades de combate na vizinhança imediata

de um outro país chamado Ucrânia.

Vozes do PSD: — Claro!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — É isso que a Rússia tem feito, até chegar a mais de 200 000 militares estacionados do lado russo da fronteira com a Ucrânia. E é essa escalada que a

Rússia prosseguiu quando, em conúbio com o regime de Lukashenko, inventou uns exercícios militares

conjuntos, mobilizando mais de 30 000 militares russos para a Bielorússia, a poucos quilómetros da fronteira

norte da Ucrânia.

Foi essa escalada que prosseguiu também no plano político e no plano do discurso político e que culminou

na alegação delirante de que a Ucrânia não era uma coisa realmente diferente da Rússia ou que a Ucrânia não

tinha direito à sua própria identidade e à sua própria soberania.

Portanto, sim, Sr. Deputado, nós devemos ser contra a escalada militar, devemos ser contra aqueles que

usam «o cerco, a concentração e a guerra» — palavras suas — para impor relações políticas e económicas.

Impor relações políticas e económicas é o que o Presidente Putin diz que quer fazer, porque ele acha que a

Ucrânia não sobrevive historicamente sem a Rússia.

Porém, em vez de tentar convencer disso os ucranianos e esperar por que os ucranianos fiquem convencidos

ou digam o que pensam acerca dessa conceção extraordinária do Presidente Putin, em vez disso, em vez de

usar a persuasão, o convencimento, a influência, o que é que ele usa? Sim, Sr. Deputado, usa o cerco, a

confrontação e, desde ontem à noite, usa a guerra.

Acho extraordinário que o Sr. Deputado consiga ter gastado até agora julgo que mais de 5 minutos do seu

tempo sem dizer aquilo que resultaria como consequência límpida, cristalina e óbvia dos princípios que diz

defender e sem denunciar aqui, publicamente, o ato de agressão praticado pela Rússia contra a Ucrânia.

Ainda tem 13 segundos para o fazer, se quiser.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado João Oliveira, poderá usar ainda da palavra durante alguns segundos.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, o senhor pede-nos que condenemos apenas uma circunstância, mas nós fizemos mais do que isso. Condenámos todo o caminho que nos trouxe até aqui e

condenamos todas as ações que contribuam para o mesmo objetivo.

A escalada de confrontação política, económica e militar não é um ato, nem uma circunstância isolados. É a

extensão, durante 30 anos, das fronteiras da NATO até às fronteiras com a Rússia. É o reforço de meios e

contingentes militares em países limítrofes da Rússia. E é, inclusivamente, o apoio militar à Ucrânia e a

concentração de militares em zonas como a zona de demarcação que, pelos acordos de Minsk, não deveria ter

a presença destas forças militares.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Vou concluir, Sr. Presidente. Temos agora, numa perspetiva de resposta a esta situação, sanções e o recrudescimento da concentração

desses meios militares, na esperança de quê?

O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.

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O Sr. João Oliveira (PCP): — De que, com a escalada, se ponha fim ao problema? Não, Sr. Ministro, é preciso condenar tudo aquilo que contribua para um desfecho violento deste conflito, que já é violento nesta

altura.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado João Oliveira, tem mesmo de terminar.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Concluo, Sr. Presidente. E isso só se alcança defendendo a paz e soluções que sejam condicentes com a defesa da paz e não com

a promoção da guerra.

Aplausos do PCP e do PEV.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, o Sr. Deputado sabe que essa técnica de querer condenar tudo ao mesmo tempo é o melhor disfarce para se

recusar ou ter medo de condenar especificamente alguma coisa.

Aplausos do PS.

Mas queria gastar este minuto de que disponho com um outro princípio que o Sr. Deputado enuncia e com o

qual não posso estar mais em desacordo.

O Sr. Deputado diz que a Rússia não pode aceitar um cerco militar nas suas fronteiras. De onde deduzo que

o Sr. Deputado, que imagina que a pertença de um país à NATO seja um cerco militar à Rússia, estivesse

disponível para aceitar que o Presidente Putin tomasse medidas semelhantes às que está a tomar agora, em

relação aos Estados bálticos, que são Estados vizinhos da Rússia e são membros da NATO, ou talvez em

relação à Polónia, que também é um Estado membro da NATO e vizinho da Rússia.

Não, Sr. Deputado, sejam os Estados Unidos da América, seja o Reino Unido, seja Portugal, seja a Rússia,

ninguém tem esse poder de veto numa ordem internacional baseada em regras. Tinha no século XIX, na teoria

do concerto europeu, tinha em parte do século XX, na teoria das esferas de influência, tinha durante a Guerra

Fria, em que o mundo parecia dividido entre duas superpotências que, ao mesmo tempo, se amparavam e se

digladiavam.

Mas não tem lugar no mundo que nós queremos e que o Sr. Deputado diz querer, que é o mundo baseado

no direito internacional, em regras que valem para todos.

Depois, o que é que o Sr. Deputado entende por extensão das fronteiras da NATO? Quer dizer que o Sr.

Deputado quer negar aos húngaros o direito de escolherem a sua aliança defensiva? Quer negar aos polacos o

direito de escolherem a sua aliança defensiva? Então, quem escolhe? E se é a Rússia que escolhe, porque é

que o Sr. Deputado não lhe chama imperialismo?

Aplausos do PS, do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para intervir e fazer perguntas pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP, o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado, Sr. Ministro, não devemos ignorar a tripla excecionalidade em que este debate ocorre, ou seja, a excecionalidade do

Parlamento, após as eleições, dentro dela, a excecionalidade do meu próprio grupo parlamentar — assumimos

as nossas responsabilidades — e a excecionalidade por estarmos perante uma situação de guerra, uma situação

que não conhecíamos na Europa desde há muitos anos.

Dito isto, quero começar por sublinhar, Sr. Ministro, aquelas que são, em minha opinião, as duas

convergências fundamentais. A primeira é a convergência de quem considera que um país amigo, um país

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soberano e um país livre foi atacado e vítima de uma agressão. E isso tem toda a relevância, toda a importância

e obriga-nos, a todos, em nossa opinião, a ser solidários com a Ucrânia e o seu povo.

Só não vê isto quem achar que a União Soviética não acabou ou quem achar que a Rússia ainda é soviética,

e quem achava, ainda nesse contexto, há poucas horas, que a invasão era uma ficção. Portanto, quem deixar

esse pensamento alternativo, percebe que a nossa obrigação é a de ser solidários com a Ucrânia.

A segunda convergência, Sr. Ministro, tem que ver com o facto de também o CDS achar que esta não é uma

matéria para debate partidário ou para algum tipo de partidarite no País. Perante uma situação de guerra, uma

situação de confronto, devemos estar juntos, próximos uns dos outros e de quem assume as responsabilidades

em nome de Portugal. Esse é o nosso entendimento.

Sublinhadas as convergências, quero deixar duas ou três questões sobre esta matéria. Em primeiro lugar,

Sr. Ministro, na sua leitura — e porque, de facto, o Sr. Putin e o seu regime são bastante elusivos em relação

ao que fazem —, qual é o objetivo final desta ação? Até onde irá o regime de Putin? Até à anexação total, à

divisão da Ucrânia, à instalação de um regime-fantoche? Tem ou não uma leitura sobre isso? E qual é, ainda

neste contexto, o espaço para o diálogo e a diplomacia? Obviamente, penso na diplomacia até na perspetiva de

um cessar-fogo que deve ser exigido e que seria muito importante.

Por outro lado, Sr. Ministro, apoiando aquilo que disse e apoiando o endurecimento de sanções económicas

que, designadamente, a União Europeia venha a determinar, quero perguntar-lhe se, de alguma forma, não

exagerámos na sua possível eficácia, porque muitos responsáveis europeus, ainda há pouco tempo, diziam que,

com estas sanções, o Sr. Putin talvez recuasse, talvez não declarasse guerra.

Bom, as sanções económicas não parecem ter sido eficazes e, em nossa opinião, poderão levar a alterações

profundas no próprio quadro europeu — e questiono-o quanto a isto, Sr. Ministro —, designadamente em

matérias como a da energia, em que os nossos próprios objetivos, e estou a pensar, por exemplo, na

descarbonização, poderão ser postos em causa, numa situação que vai ser forçosamente de crise.

Sr. Ministro, ouvimos aqui aquela ideia dos apaziguadores — já existiam no tempo da Guerra Fria e, pelos

vistos, também existem agora — de que o melhor é não fazer nada porque, não fazendo nada, talvez o Sr. Putin

se acalme. Sobre isso, vem sempre à minha memória a célebre frase de Winston Churchill: «O apaziguador é

aquele que alimenta o crocodilo, na esperança de ser o último a ser devorado.» É evidente que o apaziguamento,

por si só, não resolverá o problema.

O Sr. Ministro falou da revisão da arquitetura da segurança europeia. É evidente que essa revisão terá de

ser feita, mas, em todo este processo, também me preocupa que até agora a Europa não tenha falado sempre

a uma só voz. Vimos vários intervenientes, vários diálogos entre diferentes participantes, quase um concurso de

protagonistas europeus, deixando apagado o papel do Sr. Borrell, que deveria ser, de facto, a voz una da União

Europeia nesta matéria. Pergunto: não teremos precisamente de reforçar, no contexto europeu, esse pilar e

essa afirmação europeia, porque estamos a viver momentos completamente diferentes?

No meio deste contexto e destas preocupações, existem, em minha opinião, sinais positivos, como, por

exemplo, a preocupação da Administração norte-americana com a Europa, uma vez que voltou a perceber que

a Europa é central; a proximidade do Reino Unido à União Europeia, que não víamos, seguramente, desde o

Brexit; a centralidade da NATO; e a posição da Turquia.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe para concluir.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Termino, Sr. Presidente, dirigindo uma última palavra ao Sr. Ministro: acho da maior importância aquilo que disse em relação aos refugiados.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem mesmo de terminar.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Neste momento, de facto, somos todos ucranianos. E Portugal deve dar, mais uma vez, um extraordinário exemplo de humanismo na receção e na integração desse povo, naquela que

será uma das maiores crises de refugiados na Europa e no mundo.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.

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O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, agradeço as questões colocadas pelo Sr. Deputado Telmo Correia.

Relativamente à questão sobre qual é nossa leitura do que parece ser o objetivo final das ações

empreendidas pelo Presidente Putin e pelo regime russo, Sr. Deputado, é muito difícil responder a essa

pergunta, dada a duplicidade de que esse regime tem dado provas.

Poderia parecer que o objetivo final da Rússia era o de impedir uma integração — agora, a curto ou a médio

prazo — da Ucrânia na NATO, mas, se esse era o objetivo, não valia a pena formulá-lo, porque a integração da

Ucrânia na NATO não é uma questão da nossa agenda de hoje. Como o Sr. Deputado sabe melhor que ninguém,

o processo de integração na NATO é muito moroso em várias etapas e exige reformas profundas, não apenas

no sistema de segurança, mas também no sistema institucional, porque a NATO é uma aliança de democracias

dos países candidatos.

Poder-se-ia pensar que o objetivo do regime russo seria o de aplicar à região de Donetsk e Lugansk a mesma

receita, vamos dizer assim, usada na Abecásia ou na Ossétia do Sul, e, portanto, criar ali um enclave que

fornecesse uma suposta proteção geopolítica e geoestratégica para a Rússia. Ora, se assim fosse, não se

compreenderia que a declaração de reconhecimento da independência fosse feita em relação à integralidade

do Donbass e não aos 30% de território ocupado pelos separatistas. Mesmo que o objetivo se quedasse no

controlo de uma espécie de protetorado sobre essa região do Donbass, isso não explicaria os termos

absolutamente inacreditáveis em que é feita a declaração de guerra por parte da Rússia, que aquilo que faz,

verdadeiramente, é, primeiro, negar o direito da Ucrânia à existência e, segundo, ameaçar todo o mundo com

medidas, e cito, «que nunca antes foram conhecidas na História».

Portanto, podemos dizer duas coisas muito importantes. Em primeiro lugar, qualquer que seja o objetivo,

daqueles que elenquei, prosseguido pelas autoridades russas, ele é ilegítimo, ele é ilegal e ele é condenável.

Em segundo lugar, temos de estar preparados para todos os cenários. Lamento dizê-lo, mas não posso dizer

outra coisa: hoje, temos de trabalhar com todos os cenários em cima da mesa, porque o que acontece é que a

ação de Putin não excede apenas as suas palavras, a ação de Putin, em cada momento, está a exceder o

máximo que nós prevíamos como possível nessa mesma ação.

O Sr. Deputado perguntou ainda se não exagerámos na crença da eficácia das sanções. Eu diria que não,

no pilar económico. Insisto, temos de trabalhar ao mesmo tempo em dois pilares: no pilar da nossa própria

defesa, que passa pela nossa própria capacidade de dissuasão; e no pilar das sanções económicas e financeiras

propriamente ditas. Estas são verdadeiramente as alternativas à via militar para a imposição à Rússia dos custos

em que merece incorrer por causa das ações de agressão que pratica.

Se o Sr. Deputado Rui Rio me permite, citá-lo-ia nesta ocasião, porque o ouvi dizer, e bem, que, se as

sanções podem causar-nos dificuldades adicionais, vale a pena passar, circunstancialmente, por essas

dificuldades para garantirmos o nosso objetivo essencial, que é a nossa própria paz e a nossa própria segurança.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, como, daqui a pouco, vamos ter algumas, poucas, votações, informo que temos quórum, estando 33 Deputados presentes.

Tem a palavra, para formular perguntas, a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, do PAN.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, em pleno século XXI, não deveria ser necessário relembrarmos

as palavras de Martin Luther King, que nos disse, um dia, que a injustiça em qualquer lugar é uma ameaça à

justiça em todo o lugar. Mas, hoje, ao ouvir o PCP dizer que esta guerra é apenas uma mera circunstância, de

facto, torna-se necessário relembrar que estamos perante um feito atroz, o qual deve ser forte e claramente

repudiado por todos aqueles que se assumem no espetro democrático do nosso País.

Protestos do Deputado do PCP Bruno Dias.

Hoje, é um dia de pesar para a história europeia e para a paz internacional. Hoje, é um dia de pesar para a

democracia.

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Por isso, o partido Pessoas – Animais – Natureza condena, de forma veemente, os atos hostis e bélicos da

Rússia para com o povo ucraniano, relativamente ao qual manifesta, em contrapartida, a mais profunda

solidariedade e a vontade de que a via diplomática não esteja totalmente inviabilizada e que, em breve, possam

ser retiradas todas as forças militares do território ucraniano.

Aliás, numa altura em que todos, sem exceção, deveríamos estar mobilizados para a retoma económica e

social do ponto de vista global e para o combate às alterações climáticas, a Rússia optou pela guerra ao invés

de optar pela paz, negando, assim, uma política externa promotora dos direitos humanos e da própria

democracia.

O PAN, sendo um partido pacifista e defensor da diplomacia, reafirma, de forma clara, a sua preocupação

com o agudizar do conflito da Rússia com a Ucrânia, conflito que — não podemos deixar de lembrar — já causou

nos últimos anos a morte de, pelo menos, 14 mil pessoas. Não esquecemos também o genocídio do povo

ucraniano levado a cabo pelo Governo soviético, que tirou a vida a milhões de pessoas e que ficou conhecido

como Holodomor, ou seja, a morte pela fome.

O PAN, sendo um partido defensor do direito internacional, não pode deixar de condenar esta postura

belicista da Rússia de Putin. Esta postura representa um ataque à integridade territorial da Ucrânia, uma

flagrante violação dos acordos de Minsk, e que está a trazer uma guerra e a desestabilização para o seio do

continente europeu, com consequências económicas imprevisíveis, mas também representa uma clara violação

dos direitos humanos.

Nesse sentido, não podemos deixar de saudar o Governo por ter assumido que o nosso País estará de

braços abertos para acolher todos os cidadãos ucranianos e não apenas os familiares e amigos, como já aqui

foi esclarecido, que precisem de refúgio no nosso País. Hoje, somos todos ucranianos. Aliás, a guerra que a

Rússia iniciou não foi apenas à Ucrânia, foi a todo e qualquer povo que se encontre no espetro democrático e

que possa ousar fazer-lhe frente. A gravidade desta postura exige, por isso, ação imediata, mas também união

da comunidade internacional.

Sr. Ministro, há três questões que gostaríamos de ver esclarecidas por parte do nosso Governo. Embora

existam convergências e tenha toda a nossa solidariedade para o restabelecimento da paz e a participação de

Portugal no acordo internacional, há questões sobre as quais temos de agir de forma célere.

Não ficou clara, Sr. Ministro, a questão relativa ao congelamento dos bens dos oligarcas russos e à própria

proibição de as pessoas e entidades da União Europeia disponibilizarem fundos, direta ou indiretamente, aos

mesmos. Que medidas vão ser adotadas e quando?

O mesmo se pode dizer em relação aos vistos gold. Portugal tem acolhido de braços abertos os rublos dos

oligarcas russos que rodeiam Putin — neste caso, é uma autêntica via verde para a nacionalidade dada a

Abramovich —, pelo que é importante percebermos se vai, ou não, haver uma revisão deste modelo e dos vistos

que já foram atribuídos.

Uma questão que hoje ainda não foi aqui falada tem que ver com a ratificação do Tratado de Proibição de

Armas Nucleares, que, neste momento, ganha uma importância redobrada.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Estou mesmo a concluir, Sr. Presidente. Falamos de um acordo em que os países aderentes aceitam a proibição do uso, desenvolvimento, produção,

teste, armazenamento e transferência de armas nucleares. Na União Europeia, a Irlanda, a Áustria e Malta já

aderiram. Portugal não só não aderiu, como é o único país de língua oficial portuguesa que não o fez.

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, tem de concluir.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Por isso, gostaríamos de saber para quando, Sr. Ministro, a adesão a este Tratado.

Termino reiterando o nosso compromisso para com a paz e a nossa solidariedade para com o povo

ucraniano.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.

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O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, agradeço as suas palavras e as suas questões, às quais passo a responder diretamente.

Quanto ao congelamento dos bens de oligarcas russos em Portugal, insisto, Sr.ª Deputada: aquelas

personalidades russas ou luso-russas que estejam em Portugal e façam parte da lista de personalidades

sancionadas pela União Europeia, segundo as nossas regras e com os nossos fundamentos jurídicos, têm os

seus ativos financeiros congelados e deixam de ter liberdade de movimentos em Portugal ou no espaço europeu.

Somos um Estado de direito e, portanto, não basta dizer que «fulano é oligarca» ou que «não gosto de sicrano»

para lhes congelar os bens ou para lhes interditar movimentos. Há uma lista — já vai em mais de 500 pessoas

individuais ou coletivas russas — que é aplicada em Portugal, como é aplicada em qualquer outro país da União

Europeia.

Sr.ª Deputada, isso também se aplica independentemente do título de autorização de residência que as

pessoas tenham em Portugal, seja autorização de residência para investimento — o tal visto gold —, seja

autorização de residência para outros fins, de investimento, de trabalho, de lazer, etc. Essas regras aplicam-se

independentemente das circunstâncias em que as pessoas se encontrem no que diz respeito à titulação da sua

residência em Portugal. Insisto no seguinte, porque é um erro que se faz sistematicamente, certamente de forma

involuntária: as autorizações de residência para investimento não são atribuições de direitos de cidadania em

Portugal, muito menos vias verdes de nacionalidade.

Quanto à sua terceira questão — aquela em que temos uma divergência, mas acredito que a Sr.ª Deputada

compreenderá bem — sobre a adesão de Portugal ao Tratado de Proibição de Armas Nucleares, a minha

resposta é muito simples: enquanto eu for Ministro dos Negócios Estrangeiros… Porquê? Porque não podemos

ser hipócritas. Portugal faz parte de uma aliança, a NATO, que é uma aliança com capacidade nuclear. Portanto,

não vale a pena fingirmos que não fazemos parte dela.

Os países europeus que citou, que são nossos parceiros na União Europeia, como a Áustria ou Malta, são

países subscritores do Tratado de Proibição de Armas Nucleares, mas não são países membros da NATO.

A NATO é uma aliança nuclear. E porque é que a NATO é uma aliança nuclear? Sr.ª Deputada, não há

melhor dia para compreender a sua razão de ser do que o de hoje. Imagine o que seria o dia de hoje se a NATO

não tivesse uma capacidade de dissuasão nuclear.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para formular perguntas, a Sr.ª Deputada Mariana Silva, do Grupo Parlamentar de Os Verdes.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, paz, sim, guerra, não. Nada justifica a guerra e a perda de vidas humanas.

Os Verdes condenam a ação da Rússia, esta madrugada, contra os territórios da Ucrânia e contra o povo da

Ucrânia. A escalada de agressão e violência não pode ser a resposta e deve ser totalmente condenada.

Os Verdes declaram a sua solidariedade para com a população da Ucrânia, que vê a sua vida ameaçada e

destruída.

Apelamos à Rússia para travar, no imediato, os bombardeamentos e a intervenção militar nos territórios da

Ucrânia.

Consideramos, por outro lado, que a reação de Portugal e da União Europeia não pode ser militar, o que

constituiria um risco agravado de uma escalada sem precedentes.

Mas não podemos branquear o papel da NATO e a desestabilização da região. A NATO tem demonstrado,

desde que foi criada, que, ao invés de promover a paz e a democracia, evitar conflitos ou assegurar a sua

resolução pacífica — que são o pretexto para a sua criação e manutenção —, é promotora da guerra e da

indústria militar, servindo os princípios expansionistas e imperialistas dos Estados Unidos da América,

promovendo conflitos numa lógica de guerra interminável.

Lembremos 2014: um golpe de Estado na Ucrânia, apoiado pelos Estados Unidos, pela NATO e pela União

Europeia, depôs o Presidente ucraniano legitimamente eleito e colocou no seu lugar alguém que servisse os

interesses de expansão da NATO.

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Talvez alguns se sintam confortáveis com este Governo de índole fascista, que tem continuamente atacado

as regiões de Donbass, que declaram a sua independência, violando sistematicamente os acordos de Minsk,

assim como a população russa da Ucrânia.

Desde a derrota e retirada das tropas dos Estados Unidos do Afeganistão, as atenções canalizaram-se para

outros quadrantes.

A Ucrânia é um palco apetecível para prolongar uma política de desestabilização geral, justificar

investimentos da indústria militar e continuar a pressionar o velho inimigo, a Rússia.

Os Estados Unidos têm dezenas de milhares de militares na Europa, armam as tropas ucranianas «até aos

dentes», expandem as bases militares da NATO na região, instalam mísseis com capacidade nuclear na

Roménia e na Polónia.

Acompanhamos, assim, a posição assumida pelo Partido Verde dos Estados Unidos, que apela à

Administração norte-americana para que pare o envio de milhões de dólares de armamento sofisticado para a

Ucrânia e reduza o contingente militar na região.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Portugal e o Governo português não podem alinhar com as políticas

belicistas e expansionistas da NATO e dos Estados Unidos.

A questão que coloco, Sr. Ministro, é a seguinte: como é que a sua ação de promoção do belicismo e da

guerra se compagina com a Constituição da República Portuguesa, que nos obriga exatamente ao contrário? É

urgente que Portugal dê cumprimento à Constituição, que reavalie o seu papel na Aliança Atlântica e defenda a

dissolução da NATO como bloco político-militar.

Portugal deve aderir ao Tratado de Proibição de Armas Nucleares.

Por último, reafirmamos a nossa génese ecologista e pacifista.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Estou mesmo a terminar, Sr. Presidente. A resolução dos conflitos só pode ser trabalhada num único cenário, o do diálogo, pelo que apelamos a que

todas as partes enveredem por um caminho de promoção da paz e da procura de soluções diplomáticas para a

crise na região.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, mais uma vez, permita-me começar por manifestar o meu acordo, não em relação às suas palavras iniciais, mas, sim, às suas

palavras finais, embora as suas palavras iniciais me motivem uma grande apreciação. Mas o acordo doutrinário

é com as suas palavras finais.

Devemos praticar o diálogo, e não soluções militares, para encontrar soluções políticas duradouras. São,

aliás, as soluções políticas, e não as soluções militares, que são duradouras. Como os militares estão sempre

a explicar-nos, a ação militar, quando é necessária, é uma espécie de compra de tempo para que as soluções

políticas possam ser encontradas e possam ser postas em prática.

Mais uma vez, convido-a a examinar a situação presente à luz desse princípio, o de que devemos privilegiar

o diálogo e dizer não ao belicismo, ao militarismo e à opção pela imposição à força armada.

O que é que há de belicista na proposta da União Europeia, que chegou a ser, e é, inclusivamente, a proposta

de rever sistemicamente a arquitetura de segurança da Europa com a Rússia? Foi isso que o chanceler Scholz

foi dizer a Moscovo. Foi isso que o Presidente Macron, em nosso nome, porque é o Presidente do Conselho da

União Europeia, foi dizer a Moscovo. O que é que tem de belicista essa proposta de nos sentarmos à mesa com

os russos para examinar as questões que queiram colocar sobre dimensões que, eventualmente, considerem

obsoletas ou sobre a necessidade de revisão da arquitetura da segurança europeia? Em que é que essa

proposta é uma ação militar? Em que é que essa proposta é uma intimidação ou uma ameaça à Rússia? Onde

é que esteve aqui a ameaça da Ucrânia à Rússia? Em que é que os 50 milhões de ucranianos são uma ameaça

à Rússia? O que é que fez a Ucrânia? Militarizou-se? Deslocou maciçamente unidades de combate para a

fronteira com a Rússia? A Ucrânia negou a existência da Rússia ou o direito da Rússia à existência?

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Portanto, Sr.ª Deputada, não basta dizer que somos pela paz e contra a guerra, quando alguém está a fazer

a guerra. É preciso, por isso — visto que somos pela paz e contra a guerra —, denunciar a guerra que as

pessoas fazem e não tentar essa espécie de equivalência, em que, como todos têm culpa, os culpados são

desculpados.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para dirigir perguntas ao Sr. Ministro, o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, queria começar por dizer que o Chega condena, sem reservas, sem meias-palavras, a invasão da Federação Russa ao território ucraniano que hoje ocorreu.

Aliás, apesar de todas as divergências que temos, enquanto partidos ou enquanto políticos, o Chega

concorda que Portugal, depois do ato que hoje ocorreu, deve fazer todos os esforços do ponto de vista militar e

do ponto de vista da aplicação de sanções económicas, políticas e diplomáticas não só à Rússia como aos seus

principais dirigentes.

Na verdade, parece um pouco surpreendente que haja, neste Parlamento, quem consiga falar da dissolução

da NATO e de se acabar com armas nucleares na União Europeia no dia em que um país da Europa é atacado

por uma potência nuclear. Parece brincadeira, mas não é. Há quem defenda — foi dito aqui, no Parlamento

português, no dia em que um país nuclear nos ataca, porque é atacar toda a Europa e o seu coração — que

não devíamos ter armas nucleares. Seria muito bonito defendermo-nos com poemas, com palavras e com rosas

na mão, mas não é assim que os russos entendem, nem é assim que o regime de Vladimir Putin entende. Por

isso, sim, estamos de acordo, temos de fazer um esforço nesse sentido.

Sr. Ministro, é ou não verdade que andámos distraídos durante muito tempo, enquanto a China duplicava o

seu orçamento militar e a Rússia anexava a Crimeia e provocava repúblicas-fantoche, ficando para trás o

orçamento europeu e o pilar da defesa europeia?

Também queria que respondesse a uma questão que interessa à esmagadora maioria dos portugueses. Há

poucas horas, o preço do gás natural subiu 35%, o preço da energia bateu hoje um novo recorde e muitos dos

portugueses que estão a ver-nos querem saber se, no país onde existem mais taxas sobre a energia e sobre o

gás, o Governo vai fazer alguma coisa para que, durante os próximos meses, os portugueses não tenham de

decidir entre estar com o aquecimento em casa e pôr comida na mesa.

A par da questão internacional que a todos nos une em grande maioria neste Parlamento, essa é uma

questão que hoje a maioria dos portugueses gostava de ver respondida.

Repito: o que vai fazer o Governo em relação a uma escalada do preço da energia, que se prevê não venha

a ficar tão reduzido nos próximos meses? Essa, sim, é uma questão que, em pleno inverno, interessa a todos

os portugueses.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr. Deputado André Ventura, em relação à questão que coloca, como sabe, Portugal fez em devido tempo o que devia fazer para se tornar

menos dependente de combustíveis fósseis. Já hoje, mais de metade da eletricidade que consumimos provém

de fontes renováveis de energia e somos dos países europeus menos dependentes da Federação Russa em

matéria de gás e petróleo.

Se me permite acrescentar um ponto, queria só chamar-lhe a atenção para o seguinte: é também a autocracia

que leva à guerra. É também a ideia de que o estrangeiro é um inimigo ou um potencial inimigo e a ideia de que

há povos, quaisquer que eles sejam, aos quais se pode recusar o direito à existência, bem como o desamor às

instituições liberais, o desamor às instituições democráticas,…

O Sr. Luís Capoulas Santos (PS): — Muito bem!

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O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — … o não querer ouvir as pessoas e não querer respeitar as escolhas das pessoas, que leva à guerra, leva ao belicismo, leva ao militarismo.

Aplausos do PS.

Creio que aí, também, há uma lição que esta Assembleia e nós todos devemos ter em conta.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para formular perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, do Iniciativa Liberal.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, desta vez, ouvimos palavras duras de condenação da intolerável invasão da Ucrânia pela Rússia

da parte do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, da parte da Comissão Europeia, da parte de outros

responsáveis políticos. Mas são apenas palavras, e a defesa da liberdade e dos direitos humanos não pode ser

só retórica, porque as palavras não impediram que Putin tivesse feito gato-sapato dos apelos à diplomacia e à

paz.

As palavras não refrearam as ambições imperialistas nem impediram a Rússia de continuar a estacionar

tropas na fronteira ucraniana, numa clara manobra de intimidação; não impediram a Rússia de ter preparado

exercícios militares massivos nas fronteiras com a Ucrânia e a Bielorrússia, desse ditador-fantoche Lukashenko;

não impediram a Rússia de ter reconhecido a independência das províncias de Lugansk e Donetsk, em clara

violação do direito internacional e da soberania ucraniana; e, finalmente, nesta madrugada, não impediram a

Rússia de invadir a Ucrânia e atacar vários pontos do território ucraniano, incluindo a própria capital, Kiev,

bombardeando o subúrbio de Brovary e o Aeroporto de Gostomel, provocando já dezenas de mortos.

Putin não vai ficar por aqui e é evidente para todos que não serão as palavras que o pararão. É tempo, aliás,

é mais do que tempo, de passar das palavras à ação.

Primeiro, na parte humanitária, deve ser prestado todo o apoio aos portugueses na Ucrânia e todo o apoio

aos ucranianos residentes em Portugal, aos seus familiares na Ucrânia e a todos os que necessitem de ajuda

ou refúgio. Saudamos a posição do Governo português hoje, aqui, assumida, que só peca por não ter sido

tomada há mais de uma semana, quando o Iniciativa Liberal a isso o exortou publicamente.

Segundo, devem ser apoiadas as decisões de sanções drásticas que o Conselho Europeu e o próprio G7

(Grupo dos Sete) irão tomar hoje, mesmo que tal tenha custos económicos para Portugal. A defesa da liberdade

e dos direitos humanos, já disse, não pode ser só retórica.

Finalmente, deve responder-se à letra à ameaça inaceitável de Putin de retaliar, e cito, «de forma nunca

vista», qualquer interferência nas suas intenções imperialistas.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe para concluir.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Vou concluir, Sr. Presidente. É essencial reforçar a dissuasão militar, incluindo a participação de Portugal na força de reação rápida da

NATO e, desta vez a tempo, aumentar a ameaça de retaliação a qualquer intenção agressiva em relação à

Polónia ou à Roménia e, sobretudo, aos nossos parceiros da União Europeia Estónia, Letónia e Lituânia,

especialmente vulneráveis às ambições da Rússia no corredor de Kaliningrado.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem mesmo de terminar.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, vou terminar com uma última palavra para os entusiastas das cercas sanitárias, porque o apoio desavergonhado do PCP a esta agressão serve para nos

lembrar a todos que os inimigos das liberdades estão presentes nos vários extremos deste Parlamento e, se

não denunciarmos isto, qualquer dia estamos a discutir aqui uma situação bem mais grave em Taiwan.

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O Sr. Bruno Dias (PCP): — Mentiroso!

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Cotrim de Figueiredo, também estou de acordo com V. Ex.ª quando diz que não basta ficar pelas palavras e que é preciso

agir. Mas, em todos os exemplos que deu, eu vi e vejo a ação da União Europeia.

Agimos aquando da anexação da Crimeia, aliás, fizemos sanções, essas também bastante poderosas,

incluindo sobre as nossas próprias economias; agimos aquando da guerra híbrida no Donbass; estamos a agir

agora, como tínhamos agido antes, aquando da guerra da invasão da Geórgia, e assim sucessivamente.

A questão, talvez, esteja na forma da ação. Pareceu-me ouvir ao Sr. Deputado a tese de que deveríamos

seguir o processo «dente por dente», ou seja, se Putin escala militarmente, também devemos escalar

militarmente.

A dissuasão não é bem isso. A dissuasão é termos e mostrarmos as nossas próprias capacidades de defesa,

mas mantermo-nos no registo de defesa que é nosso. Não somos agressivos, não somos ofensivos, não

privilegiamos a via militar sobre a via política. Também na nossa reação seguimos estes princípios.

Julgo que esses princípios são os mais adequados.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para terminar o debate, haverá duas intervenções da parte do Grupo Parlamentar do PS.

Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Capoulas Santos para formular uma pergunta.

O Sr. Luís Capoulas Santos (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, este debate, que está prestes a terminar, sobre uma crise que

representa a maior ameaça à paz mundial a que assistimos desde o pós-guerra, como já foi dito, confirmou que

existe um amplo consenso na sociedade portuguesa e nas suas instituições políticas relativamente à

condenação, sem qualquer contemplação, das autoridades russas pela sua exclusiva responsabilidade no

presente conflito.

Não há nenhum argumento histórico, recente ou remoto, que possa justificar o uso da força para alterar

fronteiras internacionalmente reconhecidas e pôr em causa a integridade territorial e a soberania de um país

independente.

Está em risco o direito internacional, a segurança europeia e a própria paz mundial, porque os esforços

diplomáticos a todos os níveis, por mais quixotescos que possam parecer neste momento, têm de ser

prosseguidos, sem desfalecimento, de forma a reduzir a tensão e a minimizar tanto quanto possível as

consequências económicas e sociais, de dimensão imprevisível.

Gostaria, por isso, de aplaudir a forma como as instituições europeias — em particular, com a formação do

Conselho de que o Sr. Ministro faz parte — têm vindo a reagir à situação criada pela Rússia, isto é, com firmeza,

mas com prudência e com o gradualismo que as circunstâncias exigem.

A unidade dos 27 até agora demonstrada, que é sempre tão difícil de alcançar, mesmo em matérias

relevantes, e a boa articulação da União Europeia com os nossos aliados extracomunitários, além de confirmar

a gravidade da situação, são um sinal de responsabilidade e de afirmação do projeto europeu, o que nos dá

confiança para o futuro.

No preciso momento em que começamos a vislumbrar a vitória sobre a maior pandemia do último século,

em que a generalidade dos indicadores económicos nos dá sinais positivos de recuperação e em que todos os

esforços à escala global deveriam estar concentrados no maior desafio que se coloca à humanidade, o das

alterações climáticas, do que a Europa e o mundo menos necessitam é da abertura de um confronto de grandes

proporções, que só pode provocar retrocesso civilizacional e um inútil e incomensurável sofrimento humano.

Até há poucas horas, tinha várias questões concretas para lhe colocar sobre os vários cenários que poderiam

ocorrer, para tentar encontrar uma solução para o problema ucraniano. Contudo, os últimos acontecimentos

revelam que estamos perante um perigoso afloramento de um desígnio mais vasto da liderança russa que põe

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em causa a nossa arquitetura de segurança e a própria União Europeia, o que me leva apenas a reiterar o apoio

do Grupo Parlamentar do Partido Socialista ao povo ucraniano e à ação do Governo, designadamente na frente

europeia, incentivando a que prossiga a postura construtiva, prudente e responsável que constitui a marca de

Portugal no Conselho da União Europeia e nas instâncias internacionais em que participa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Capoulas Santos, de facto, há uma característica absolutamente essencial no comportamento europeu até agora, que é a

unidade. A unidade, em primeiro lugar, entre os 27 e a rapidez da resposta conjunta dos 27, e, também, a

convergência com os nossos aliados mais próximos, desde logo os Estados Unidos, o Reino Unido e o Canadá.

Essa unidade faz a nossa força, porque um dos objetivos — e não foram objetivos inconfessados —

confessados explicitamente pelo Presidente Putin tinha sido o da desunião da Europa, o da divisão da Europa.

E por isso é que tem sido tão importante este trabalho de concertação feito a diferentes níveis, desde os chefes

de Estado e de Governo aos representantes permanentes nas instituições europeias, porque isso dá uma força

e uma eficácia à ação europeia que a mesma não teria se a unidade não existisse ou pudesse ser posta em

dúvida.

Depois, a prudência. Estamos a falar de circunstâncias muito perigosas e em relação às quais qualquer erro

de cálculo pode produzir efeitos indesejáveis absolutamente devastadores. Portanto, por muito que, por vezes,

nos custe, é preciso preservar a cabeça fria, é preciso preservar a racionalidade, é preciso ser cauteloso e

prudente.

Desse ponto de vista, permita-me, Sr. Deputado, que aproveite esta ocasião para salientar e saudar a

contenção impressionante de que a Ucrânia tem dado provas. O sangue-frio, a capacidade de resistência, a

capacidade de agir racionalmente e a contenção que as autoridades ucranianas têm mostrado até agora são

algumas das razões que explicam por que merecem tanto o nosso apoio, a nossa solidariedade e a nossa

presença próxima.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, ainda pelo Grupo Parlamentar do PS, a Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendes.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, ontem, na Conferência de Líderes, quando marcámos este debate, não queríamos acreditar que hoje pudéssemos ter

acordado numa Europa diferente e, atrevo-me mesmo a dizer, num mundo diferente.

Por isso, a primeira palavra deste Grupo Parlamentar, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, é de forte

condenação, sem nenhuma tibieza, àquilo que aconteceu esta madrugada: uma invasão militar, uma agressão

militar da Rússia à Ucrânia que não queríamos imaginar que fosse possível, depois de meses e meses a tentar

a via diplomática. Esta madrugada ficará para a história como um dia negro, uma página negra.

O Grupo Parlamentar do Partido Socialista quer dirigir-se aos milhões de ucranianos. Quem viu, hoje, as

imagens de homens e mulheres, velhos e novos, crianças a fugir à guerra, que não tem qualquer razão para

existir, não pode deixar de dar uma palavra de solidariedade e de profunda — repito, profunda — gratidão pela

forma nobre como têm resistido às agressões silenciosas ao longo dos anos.

Aplausos do PS.

Acordámos, Sr.as e Srs. Deputados, com a guerra de volta ao teatro europeu, numa ação militar, como já se

disse ao longo da tarde, gravíssima, ilegal, sem precedentes na Europa desde a II Guerra Mundial. Este era o

nosso espaço de paz, de estabilidade, de segurança e que está, neste momento, profundamente ameaçado.

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Este ato de agressão militar contra um país soberano é de tal gravidade que viola as mais elementares regras

do direito internacional e da Carta das Nações Unidas, sendo, também, um evidente ataque aos direitos

humanos e à liberdade do povo ucraniano, um atentado aos princípios da ordem e da paz mundial. É mesmo

um ataque à democracia e a todos os democratas!

Aplausos do PS.

Este ato de agressão militar, planeado e deliberado, bem como o reconhecimento da chamada

«independência das regiões separatistas», são claras violações da integridade territorial e da soberania da

Ucrânia, à qual manifestamos, mais uma vez, a nossa solidariedade.

O Sr. Ministro disse há pouco, e nós estamos de acordo, que, hoje, somos todos ucranianos, porque, hoje,

estamos todos a defender a liberdade e a democracia.

Hoje, sabemos que o alvo de Putin vai muito mais além das fronteiras ucranianas. Sabemos que o alvo é,

como já há tantos anos, a paz, a estabilidade e a segurança na Europa. É a democracia e a liberdade que Putin

não vê como aliadas, mas como ameaças ao seu poder autocrático e ao seu sonho do regresso ao império

russo ou soviético.

Como democratas, afirmamos todos que é intolerável o que aconteceu esta noite e o que está a acontecer.

Como defensores do direito internacional, temos mesmo de dizer que, sim, há culpados, sim, há um rosto desse

culpado, e esse culpado chama-se Vladimir Putin.

Perante estes acontecimentos trágicos que, repito, resultam das manobras políticas internas de consolidação

de poder e de uma visão ultrapassada de áreas estratégicas de influência, que não podem ter lugar num mundo

que se quer aberto, de diálogo e de cooperação, não podemos perder de vista os principais afetados por este

ato de agressão.

Juntamos, por isso, a voz deste Grupo Parlamentar à voz do Governo e à voz de todos quantos não só

pedem uma condenação desta agressão, como exigem a retirada urgente das tropas russas da Ucrânia.

Juntamos a nossa voz a todos os que esperam ainda que seja possível uma solução diplomática de dissuasão

do caminho que a Rússia de Putin teima em escolher.

Hoje, mais do que ontem, é fundamental a união de todos os aliados — não esqueçamos, de todos os aliados

— na condenação inequívoca destes acontecimentos e na aplicação de sanções, como o Sr. Ministro disse,

fortes e muito fortes, perante o que está a acontecer.

As Nações Unidas, a União Europeia, a NATO, todos condenaram veementemente a decisão e, felizmente,

este Parlamento também o está a fazer. É fundamental que esta união se mantenha e também é fulcral o reforço

da segurança do flanco leste da NATO e do seu poder de dissuasão, reforço para o qual Portugal tem o dever

de contribuir.

É esta união e esta resposta coordenada que tem de prevalecer, a bem dos ucranianos, a bem da

democracia, a bem dos princípios da ordem internacional.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro, não coloco nenhuma questão. Quero, em primeiro lugar,

saudar o Governo português por, mais uma vez, continuarmos a ser um País humanista, um País que integra,

um País que recebe e receberá todos quantos fogem desta guerra e deste ato bárbaro. Quero, em segundo

lugar, saudar a decisão do Governo português de pedir às nossas embaixadas que passem os vistos sem

reservas àqueles que procuram a paz, a liberdade e a democracia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, agradeço as palavras da Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendes. Permita-me, pois, dois comentários, ou dois desenvolvimentos, sendo que o

primeiro para ser totalmente claro sobre o que é condenável e inaceitável nesta situação.

A Rússia tem todo o direito de exprimir a sua divergência sobre a existência da Aliança Atlântica, tem todo o

direito de exprimir a sua divergência sobre a composição da Aliança Atlântica e tem todo o direito de exprimir a

sua divergência sobre as missões e os objetivos da Aliança Atlântica.

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A Rússia tem todo o direito de fazer uma leitura das suas condições de segurança, de acordo com a qual

essas condições de segurança têm uma forte dimensão territorial e geográfica. Entendemos que é uma leitura

obsoleta, mas reconhecemos à Rússia o direito de ter essa leitura.

Mais: a Rússia tem todo o direito de pôr em cima da mesa, nas relações internacionais, sejam bilaterais,

sejam multilaterais, o que entende deverem ser os seus interesses nacionais, os seus interesses estratégicos,

as suas preocupações de segurança. A Rússia tem todo o direito de salientar, nos documentos estruturantes da

arquitetura de segurança da União Europeia, mais este princípio do que aquele, mais esta frase do que

aqueloutra.

Portanto, quando a Rússia diz «nós valorizamos, sobretudo, o princípio da indivisibilidade da segurança»,

nós dizemos que nenhuma decisão em matéria de segurança de uns deve fazer-se sem ter em atenção decisões

equivalentes de outros e também dizemos «examinemos esses problemas», porque todos esses problemas

podem ser examinados.

Nós temos diferenças de inserção geopolítica, diferenças de interesses, diferenças de História, diferenças

de conceções e de visões do mundo. Não é aí que está o problema, o problema está em que, pelo menos a

partir de 1945, com a fundação das Nações Unidas, a Carta das Nações Unidas e a Declaração Universal dos

Direitos Humanos — documentos subscritos pela Rússia —, passámos a considerar o mundo das relações

internacionais não como um mundo de combate permanente dos fortes contra os fortes e da opressão

permanente dos fracos pelos fortes, mas como um mundo organizado em regras sobre as quais estamos de

acordo e na base das quais dirimimos pacífica, política e diplomaticamente os diferendos que tenhamos.

Ora, esse mundo de regras é incompatível com atos de ameaça, com atos de intimidação e muito menos é

compatível com atos de agressão, com o querer resolver as questões negando ao interlocutor o direito à

existência, com o querer resolver ou fazer valer os nossos interesses negando aos interesses contrários

qualquer espécie de dignidade e, muito menos, com o querer resolver os nossos problemas à lei da bala. E é a

lei da bala que está hoje a imperar por responsabilidade da Rússia, que está há várias horas a agredir e a invadir

militarmente a Ucrânia.

Já era grave o facto de a Rússia ter rasgado os acordos de Minsk que ela própria subscreveu e pôr em causa

a soberania e a integridade territorial da Ucrânia, inventando, primeiro, aquelas repúblicas-fantoche e fingindo,

agora, que estava a reconhecer juridicamente a sua independência. Já isso era grave e já isso mereceu a

resposta pronta e firme da nossa parte.

Desde a madrugada de hoje que a Rússia franqueou mais uma linha vermelha, mais um limiar, estando em

plena agressão militar contra um Estado soberano e a causar a maior crise de segurança da Europa. Este é um

primeiro comentário.

Mas nós temos lições a tirar, porque as questões da segurança não podem ser dissociadas das questões

económicas. A nossa capacidade de defender a paz e a segurança das nossas populações não pode ser

dissociada da nossa própria resiliência em matéria das infraestruturas de que necessita o nosso

desenvolvimento e da qualidade da nossa democracia. As dependências económicas que se toleram

transformam-se, tarde ou cedo, em dependências políticas e até em dependências estratégicas.

Por isso é que o Primeiro-Ministro de Portugal dirá, mais uma vez, como tem dito ao longo dos últimos seis

anos e como antes dele o disse o Primeiro-Ministro Passos Coelho, que a Europa não pode contornar mais a

questão da excessiva dependência em que se encontra face à Rússia em matéria de energia, pois isso dá uma

alavanca à Rússia e uma debilidade à Europa que só contribuem para um desequilíbrio estratégico e político.

É muito importante reagir agora, mas também é muito importante tratar da diversificação das fontes de

abastecimento de energia na Europa, das interligações que devem percorrer, organizar e estruturar o mercado

europeu de energia em todo o território europeu, porque é assim que nos tornamos menos dependentes. Quando

nos tornamos menos dependentes, tornamo-nos mais independentes e, portanto, mais autónomos e mais

soberanos.

Uma coisa nós sabemos: não é apenas a segurança da Europa, é a estabilidade do mundo que precisa de

uma Europa forte, de uma Europa independente e de uma Europa soberana.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.

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Chegámos, assim, ao final do primeiro ponto da nossa ordem do dia.

Havendo quórum — encontram-se registados 34 Srs. Deputados —, estamos em condições de passar ao

segundo ponto, as votações.

Srs. Deputados, está em aprovação o n.º 33 do Diário, respeitante à reunião da Comissão Permanente

realizada no dia 10 de fevereiro de 2022.

Pausa.

Não havendo objeções, considera-se aprovado.

Peço, agora, ao Sr. Secretário Diogo Leão que proceda à leitura de um parecer da Comissão de

Transparência e Estatuto dos Deputados.

O Sr. Secretário (Diogo Leão): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, a solicitação do Tribunal Judicial da Comarca de Évora, Juízo de Instrução Criminal de Évora — Juiz 2, Inquérito 49/21.0GTEVR, a Comissão de

Transparência e Estatuto dos Deputados decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o levantamento da

imunidade parlamentar do Deputado Eduardo Cabrita (PS) no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, está em apreciação o parecer.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Sr.as e Srs. Deputados, chegámos ao fim dos nossos trabalhos de hoje. Boa tarde a todos.

Está encerrada a reunião.

Eram 16 horas e 58 minutos.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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