I SÉRIE — NÚMERO 51
4
que possam existir, é importante que essas compras conjuntas existam e sejam constituídas ao longo dos
próximos meses para assegurar as reservas necessárias para o inverno de 2024 e os seguintes.
Em segundo lugar, é necessário que possamos desconectar definitivamente o preço do gás do preço da
eletricidade. Há uma proposta da Comissão Europeia que aponta, desde já, para a generalização ao mercado
europeu daquilo que temos designado como «Mecanismo Ibérico». Este, como mecanismo transitório, tem
permitido que o preço da eletricidade deixe de ser fixado pelo preço da produção com base no gás e, portanto,
tem permitido, mesmo num ano de seca tão grave como a que vivemos, que o preço médio seja 18% inferior ao
que seria se o Mecanismo Ibérico não estivesse a funcionar.
Por outro lado, e de forma a limitar a volatilidade dos preços, a Comissão Europeia propõe também que seja
alterado o referencial internacional da fixação do preço do gás, deixando de seguir o mercado TTF (title transfer
facility), fixado na Holanda, e passando a ter uma banda de variação dinâmica, como a antiga «serpente»
monetária funcionava, na Europa. Isto permitiria fixar quer um máximo quer um mínimo de variação dos preços,
de forma a eliminar o fator volatilidade.
Estes três elementos são relevantes. Agora, há duas respostas de fundo que são essenciais.
Em primeiro lugar, tendo em conta que o Mecanismo Ibérico é bom, mas enquanto solução transitória, é
necessário rever definitivamente o mecanismo de fixação do preço da eletricidade, pondo fim ao mecanismo
marginalista, que hoje já não tem qualquer justificação, nada justificando, portanto, continuar a financiar as fontes
de produção inframarginais pelo custo da fonte de produção mais elevada. Essa deve ser uma medida de fundo
e é importante que a Europa a possa adotar.
Em segundo lugar, nenhuma destas medidas será eficaz sem que tenhamos um verdadeiro mercado
europeu, e não haverá mercado europeu enquanto não houver uma verdadeira interconexão entre todos os
Estados. Isto é particularmente relevante para países como Portugal e Espanha, cujo nível de interconexão, seja
elétrica, seja de gás, é francamente limitado no conjunto do mercado europeu, pelo que teremos toda a
vantagem em participar num mercado mais vasto, e, por outro lado, o conjunto da Europa tem toda a vantagem
em poder contar quer com as energias renováveis produzidas na Península Ibérica, quer com a capacidade
desta de distribuir para o resto da Europa outras fontes de energia importadas de mercados terceiros.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — O segundo ponto fundamental da ordem de trabalhos tem a ver com a resposta à situação económica que estamos a viver. Aqui, é fundamental que a Europa aprenda de como geriu as duas
últimas grandes crises que enfrentou: a crise financeira, há cerca de 10 anos, e a crise mais recente, com a
COVID. Numa, a Europa entendeu que cada país devia resolver, por si, o seu problema, de acordo com as
regras da austeridade, mas, na COVID, compreendemos, e bem, que, para uma crise comum, só funciona uma
resposta comum e respondeu-se com base na solidariedade.
Não vale a pena comparar os resultados. Os primeiros foram dramáticos, do ponto de vista económico e
social, e os segundos permitiram, do ponto de vista sanitário, responder à crise e, do ponto de vista económico
e social, ter uma recuperação a seguir à situação mais forte da pandemia.
Aplausos do PS.
Devemos seguir as boas práticas e recusar as más práticas e, portanto, devemos ter, como fizemos na
COVID, um mecanismo que permita responder a esta crise económica que estamos a viver. Espero, aliás, que
a União Europeia perceba que as crises não são permanentes, mas são recorrentes. Por isso, devemos ter um
mecanismo permanente de resposta às crises e não estar a criar para cada crise um mecanismo transitório. O
SURE (temporary support to mitigate unemployment risks in an emergency) provou muitíssimo bem na crise da
COVID e devia ser mesmo o modelo de um mecanismo permanente de resposta às crises, embora aquilo que
financia devesse ser não o layoff, mas algo a que verdadeiramente deveríamos chamar «layon», ou seja, pagar
para que as empresas mantenham a laboração, apesar do brutal aumento dos custos energéticos que estão a
suportar, sendo que as empresas têm de ser apoiadas para que isso possa resultar.
Obviamente, não podemos ignorar as dificuldades em obter um consenso à escala europeia para que haja
uma nova emissão de dívida por parte da Comissão Europeia nem as limitações constitucionais que alguns