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Sexta-feira, 3 de março de 2023 I Série — Número 96

XV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2022-2023)

REUNIÃOPLENÁRIADE2DEMARÇODE 2023

Presidente: Ex.mo Sr. Augusto Ernesto Santos Silva

Secretários: Ex.mos Srs. Palmira Maciel Fernandes da Costa Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Lina Maria Cardoso Lopes Diogo Feijóo Leão Campos Rodrigues

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 4

minutos. Procedeu-se à discussão, na generalidade, da Proposta

de Lei n.º 59/XV/1.ª (GOV) — Transpõe as Diretivas (UE) 2022/211 e (UE) 2022/228, relativas a matéria de proteção de dados pessoais, tendo intervindo no debate, a diverso título, além do Secretário de Estado Adjunto e da Justiça (Jorge Alves Costa), os Deputados Pedro Filipe

Soares (BE), Alma Rivera (PCP), Rui Paulo Sousa (CH), Patrícia Gilvaz (IL), Paula Cardoso (PSD), Inês de Sousa Real (PAN), Rui Tavares (L), Pedro Delgado Alves (PS) e Rodrigo Saraiva (IL).

Foram apreciados em conjunto, na generalidade, os Projetos de Lei n.os 285/XV/1.ª (IL) — Elimina a contribuição para o audiovisual, baixando a fatura da eletricidade dos portugueses e 39/XV/1.ª (CH) — Altera a lei que aprova o

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modelo de financiamento do serviço público de radiodifusão e de televisão no sentido de alterar as condições de cobrança da contribuição audiovisual. Usaram da palavra os Deputados João Cotrim Figueiredo (IL), Jorge Galveias (CH), Fernanda Velez (PSD), Mariana Mortágua (BE), Inês de Sousa Real (PAN), Rui Tavares (L), Sara Velez (PS) e Paula Santos (PCP).

Procedeu-se à apreciação conjunta, na generalidade, dos Projetos de Lei n.os 376/XV/1.ª (PCP) — Altera o Estatuto do Serviço Nacional de Saúde (primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 52/2022, de 4 de agosto), 146/XV/1.ª (BE) — Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, 584/XV/1.ª (PAN) — Garante a disponibilização de consultas de psicologia e de nutrição nos agrupamentos de centros de saúde, alterando o Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, e 591/XV/1.ª (CH) — Procede a alterações ao Estatuto do Serviço Nacional de Saúde a fim de permitir e assegurar a equidade no direito à saúde dos cidadãos. Intervieram no debate, a diverso título, os Deputados João Dias (PCP), Catarina Martins (BE), Inês de Sousa Real (PAN), Irene Costa (PS), André Ventura (CH), Joana Cordeiro (IL), Rui Cristina (PSD), Rui Tavares (L), João Cotrim Figueiredo (IL), Luís Soares (PS), Pedro dos Santos Frazão (CH) e Guilherme Almeida (PSD).

Foram discutidos, na generalidade, os Projetos de Lei n.os 458/XV/1.ª (BE) — Altera o Regulamento das Custas

Processuais (alteração ao Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro, que aprova o Regulamento das Custas Processuais), 486/XV/1.ª (CH) — Altera o Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26/02, no sentido de isentar de custas os funcionários públicos, em processo penal por ofensa sofrida no exercício das suas funções, ou por causa delas, 578/XV/1.ª (PCP) — Cria a unidade de missão para a revisão do regime das custas judiciais e 579/XV/1.ª (L) — Altera o Regulamento das Custas Processuais, isentando todos os trabalhadores e seus familiares, em matérias de direito do trabalho, do pagamento das custas processuais, independentemente do modo como se fazem representar em juízo e do rendimento anual auferido, e 586/XV/1.ª (PAN) — Garante o acesso ao direito e aos tribunais, procedendo à alteração do Regulamento das Custas Processuais e ao Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro. Proferiram intervenções os Deputados Pedro Filipe Soares (BE), Bruno Nunes (CH), Alma Rivera (PCP), Rui Tavares (L), Inês de Sousa Real (PAN), Mónica Quintela (PSD), Patrícia Gilvaz (IL) e Paulo Araújo Correia (PS).

Deu-se conta da entrada na Mesa dos Projetos de Lei n.os 599, 602 e 604 a 606/XV/1.ª e dos Projetos de Resolução n.os 471, 511 a 516 e 518/XV/1.ª

A Presidente (Edite Estrela) encerrou a sessão eram 18 horas e 18 minutos.

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O Sr. Presidente: — Sr.as Deputadas, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, temos quórum e todos

os grupos parlamentares devidamente representados, pelo que está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 4 minutos.

Peço aos Srs. Agentes da autoridade o favor de abrirem as galerias ao público.

Hoje não temos expediente, de forma que podemos entrar já na ordem do dia.

Pausa.

Peço aos Srs. Deputados que se vão acomodando, para podermos iniciar os nossos trabalhos.

O primeiro ponto da ordem do dia consiste na apreciação, na generalidade, da Proposta de Lei

n.º 59/XV/1.ª (GOV) — Transpõe as Diretivas (UE) 2022/211 e (UE) 2022/228 relativas a matéria de proteção

de dados pessoais.

Para apresentar a proposta de lei, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Justiça, Jorge

Alves Costa. Faça favor.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Justiça (Jorge Alves Costa): — Sr. Presidente, Sr.as e

Srs. Deputados: A aprovação pela União Europeia do pacote de proteção de dados, que inclui a Diretiva

(UE) 2016/680, relativa à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados

pessoais pelas autoridades competentes, para efeitos de prevenção, investigação, deteção, repressão de

infrações penais ou execução de sanções penais, e à livre circulação desses dados, levou a Comissão

Europeia a reexaminar atos jurídicos anteriormente adotados que incluem disposições que regulam o

tratamento de dados pessoais por autoridades competentes.

Tal reexame visou avaliar a necessidade de harmonizar esses atos jurídicos da União com a diretiva que

citei e apresentar, se fosse caso disso, propostas legislativas necessárias à alteração de tais atos, de modo a

assegurar uma abordagem coerente da proteção de dados.

Assim, identificaram-se carecedoras de alteração a decisão-quadro relativa às equipas de investigação

conjuntas e a diretiva sobre a decisão europeia de investigação em matéria penal. O âmago destes dois

instrumentos é o tratamento, o intercâmbio e a subsequente utilização de informações pertinentes para fins de

cooperação judiciária internacional em matéria penal.

Assim, por razões de coerência e de eficácia em matéria de proteção de dados, o tratamento de tais

elementos nesses dois instrumentos também deve cumprir o disposto na Diretiva (UE) 2016/680.

Com efeito, deve, por exemplo, ser possível que os dados pessoais contidos nas informações

legitimamente obtidas por uma equipa de investigação conjunta sejam tratados para fins diferentes daqueles

para os quais a equipa foi criada, como sucede, por exemplo, no caso de procedimentos penais subsequentes,

de procedimentos administrativos ou civis, ou, ainda, na hipótese de escrutínio parlamentar conexo, o que

acontece em alguns Estados-Membros.

Todavia, em qualquer das hipóteses mencionadas, a utilização dos dados deve ocorrer de acordo com as

condições estabelecidas na Diretiva (UE) 2016/680, desde logo observando os termos do direito da União e

cumprindo, nomeadamente, os princípios da necessidade e da proporcionalidade, atenta a finalidade da

causa.

Foi neste contexto que a Decisão-Quadro 2002/465/JAI, do Conselho, 2002, que cria as equipas conjuntas

de investigação, e a Diretiva (UE) 2014/41, que cria a decisão europeia de investigação, foram alteradas em

conformidade com o novo pacote de proteção de dados, no que diz respeito, exclusivamente, à harmonização

com as regras da União em matéria de proteção de dados.

Deste modo, impõe-se agora ajustar o direito interno à nova regulação da União, o que o Governo promove

através da presente proposta de lei.

Assim, atentando no articulado proposto, a nova redação introduzida com o novo n.º 9, aditado ao artigo

145.º-A da Lei n.º 144/99, de 31 de agosto, a lei sobre cooperação judiciária, vem garantir, em linha com a

Diretiva (UE) 2002/211, que as informações legitimamente obtidas por membros de equipas de investigação

conjuntas durante o exercício da sua atividade — concretamente, informações que não sejam acessíveis por

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outra forma às autoridades competentes dos Estados que os destacaram e que possam ser utilizadas,

mediante autorização prévia do Ministério da Justiça, para efeito de deteção, investigação e instauração de

procedimento judicial por outras infrações; informações em que esteja em causa o evitar de ameaça grave e

imediata à segurança pública, caso seja posteriormente instaurado procedimento penal; ou, ainda,

informações para outros efeitos, desde que exista acordo dos Estados que criaram a equipa —, sempre que

tais informações incluam dados pessoais, só podem ser tratadas nos termos da Diretiva (UE) 2016/680.

É essa a garantia que passa a constar do quadro de direito interno neste específico domínio.

Propõe-se também a revogação do n.º 2 do artigo 8.º da Lei n.º 88/2017, que transpõe para o ordenamento

interno a diretiva sobre as decisões europeias de investigação, transpondo, deste modo, para a ordem jurídica

interna a Diretiva (UE) 2022/228.

Ora, efetivamente, e como o quadro legal da União mudou e o n.º 1 do artigo 8.º da Lei n.º 88/2017 já

reflete instrumentos relevantes da União, em concreto a diretiva mater, a Diretiva (UE) 2016/680, entende-se

ser adequado revogar o n.º 2 daquele artigo.

Nestes termos, a proposta de lei do Governo reúne, em nosso entendimento, as condições necessárias

para que o Estado português cumpra o prazo de transposição destas diretivas, fixado, respetivamente, em 11

e 14 de março deste ano, 2023, datas estas já muito próximas, apelando-se a esta Assembleia que adote

procedimentos adequados à aprovação urgente desta proposta de lei.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos convictos de que encontrarão, em discussão na

especialidade, as melhores soluções face ao agora proposto e tendo em conta, nomeadamente, pareceres já

emitidos por entidades consultadas por esta Assembleia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: —Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, um Sr. Deputado, a quem vou dar a

palavra, tendo em conta que o Sr. Secretário de Estado tem, no fim, 2 minutos e pode aproveitar para

responder.

Tem, então, a palavra, para formular um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, do

Bloco de Esquerda.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — A Mesa é testemunha de que eu, ainda antes da intervenção do

Sr. Secretário de Estado, já tinha pretendido esclarecer alguns dos aspetos desta proposta de lei, e daí o meu

pedido. Não foi nenhuma artimanha para tentar passar à frente das intervenções.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Às vezes fazem! São prós em artimanhas!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Secretário de Estado, há uma matéria que, na explicação até

bastante profunda, do ponto de vista técnico, que deu, na apresentação da iniciativa, não está explicada e

para a qual a Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD) chamou a atenção e que é a seguinte: a

inclusão de um novo n.º 10 ao artigo 145.º-A.

Diz a Comissão Nacional de Proteção de Dados que esse aditamento não decorre da transposição de

nenhuma diretiva, que não consegue alcançar — e nós também não — o objetivo proposto, porque, inclusive,

faz remissões para leis que já estão revogadas.

Desse ponto de vista, sendo esta uma proposta de lei até bastante curta, bastante enxuta, em que se

adicionou um novo número neste artigo, sem percebermos qual o seu alcance e qual o seu objetivo, creio que

era importante que o Sr. Secretário de Estado pudesse dar essa informação a esta Câmara, e daí o meu

pedido inicial de esclarecimento para poder ter essa informação.

Não tendo o Sr. Secretário de Estado tempo para responder agora e fazendo-o no final, permita-me, então,

algumas considerações sobre o conteúdo da proposta de lei.

Esta iniciativa responde, genericamente, à necessidade de salvaguardar a partilha de dados e garantir que

há uma coerência em toda a estrutura europeia de salvaguarda de dados pessoais, faz a transposição desses

preceitos para a lei portuguesa, e nada temos contra isso. Teoricamente, parece-nos que dá maior

coordenação e maior consistência desse ponto de vista, mas há um problema que, creio, é mais profundo do

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que isso, e que é o seguinte: todo o direito da União e toda a relação dentro da União advém de um

pressuposto que, muitas das vezes, não está a colocar-se, que é o pressuposto de que o Estado de direito é

respeitado igualmente em todos os Estados, e nós temos dúvidas sobre isso.

Dou-lhe o exemplo concreto da Hungria. Sabemos que, acolá, a extrema-direita gosta muito de bater

palmas à Hungria,…

O Sr. Pedro Pinto (CH): — E bem! À Venezuela é que não batemos!

O Sr. Pedro Pinto (CH): — À Coreia do Norte não! À Coreia bates tu!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — … mas esse é um dos Estados que não cumpre os preceitos

fundamentais de respeito por liberdades e por salvaguarda dos direitos fundamentais dos cidadãos.

Sabemos que há aqui — e espero que confirme, pelo menos, estas nossas presunções — algumas

salvaguardas na partilha de dados, porque dependem sempre da autorização do Ministério da Justiça, e isso é

importante, mas, depois, às vezes, não sabemos onde é que elas poderão acabar, quais são os dados e como

é que eles podem ser usados.

Dirá o Sr. Secretário de Estado que isso é em processo de investigação criminal, por isso, de alguém que é

suspeito de um crime que está a ser investigado. Mas já temos outros exemplos na história, em que, às vezes,

há crimes que são desculpas para perseguir pessoas, por se querer condenar o exercício dos seus direitos

cívicos e, desse ponto de vista, aqui, é essa a preocupação.

Gostava que, se o Sr. Secretário de Estado pudesse abordar isso na sua intervenção final, o fizesse.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para intervir no debate, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, tem a palavra a

Sr.ª Deputada Alma Rivera.

A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Incidiremos também nalguns aspetos

que foram aqui abordados. A iniciativa legislativa que o Governo submete à Assembleia da República visa dar

cumprimento à obrigatoriedade de transpor para a ordem jurídica interna a Diretiva (UE) 2022/228, do

Parlamento Europeu e do Conselho, e a Diretiva (UE) 2022/211, do Parlamento Europeu e do Conselho,

ambas de 16 de fevereiro de 2022, no que diz respeito à sua harmonização em matéria de proteção de dados

pessoais, alterando a lei de cooperação judiciária internacional em matéria penal, aprovada pela Lei

n.º 144/1999, e pela Lei n.º 88/2017, que aprovou o regime jurídico de emissão, transmissão, reconhecimento

e execução de decisões europeias de investigação em matéria penal.

A este propósito, não podemos deixar de salientar algumas questões, que terá, por força das

circunstâncias, oportunidade de esclarecer no final deste debate.

Chamamos, por isso, a atenção para o parecer da Comissão Nacional de Proteção de Dados, sobretudo no

que se refere ao aditamento de um novo n.º 10 ao artigo 145.º-A da Lei n.º 144/99.

Sendo esta disposição aquela que prevê que ao tratamento, segurança, conservação, acesso e proteção

de dados pessoais tratados no âmbito da presente lei é aplicável a Lei n.º 34/2009, bem como a Lei

n.º 58/2019, a CNPD salienta que esta nova disposição legal não decorre da Diretiva (UE) 2022/211, que se

transpõe, nem se entende qual é o objetivo.

Acrescenta ainda que, em primeiro lugar, ao tratamento de dados pessoais que decorre da Lei n.º 144/99 é

aplicável, desde logo, a Lei n.º 59/2019, que transpõe a Diretiva LED, precisamente por se tratar do domínio

da cooperação policial e cooperação judiciária em matéria penal.

E diz ainda que, por outro lado, a remissão que é feita para a Lei n.º 58/2019, que dá execução ao

Regulamento (UE) 2016/679, não se afigura adequada, por os tratamentos de dados aqui em causa estarem

excluídos do seu âmbito de aplicação, por força do n.º 1 do artigo 2.º, que, por sua vez, remete para as

exclusões que são feitas no RGPD (Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados), pelo artigo 2.º, sendo

especialmente relevante a exclusão que se faz quanto aos tratamentos de dados efetuados por autoridades

competentes para efeitos de prevenção, investigação, deteção e repressão de infrações penais.

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É ainda sublinhada a desnecessidade de remissão para a Lei n.º 34/2009, uma vez que, tal como a Lei

n.º 59/2019, integra o ordenamento jurídico nacional e, por isso, é aplicável, sendo que a própria Lei

n.º 59/2019 elenca, no seu artigo 68.º, as situações em que a aplicação da Lei n.º 34/2009 se dá no contexto

específico do processo penal.

Perante isto — e não conseguindo perceber também por que motivo vai o Governo mais longe do que

aquilo que a própria diretiva implica —, o PCP entende ser necessário não só mais esclarecimentos, mas

também maior ponderação e correção, em sede de especialidade, de alguns erros de remissão, de pormenor,

que são apontados.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para intervir no debate, tem agora a palavra o Sr. Deputado Rui Paulo Sousa, do

Chega.

O Sr. Rui Paulo Sousa (CH): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A

proteção de dados pessoais é, na atualidade, uma das principais preocupações relativamente ao rasto de

dados que deixamos quando usamos a internet, vulgarmente apelidado de «pegada digital», e que revela

muitos milhões de dados.

O que esses dados revelam sobre nós, sobre as nossas vidas, quem pode ter acesso a eles e os riscos

inerentes à sua divulgação são preocupações que temos e que não podemos descurar.

É, por isso, importante mitigar estes riscos de divulgação de dados sem o consentimento dos próprios e,

também, garantir juridicamente o direito ao esquecimento, tal como o Chega propõe no seu projeto de revisão

constitucional.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!

O Sr. Rui Paulo Sousa (CH): — Este direito implica que cada um possa solicitar que dados e referências

relativos a si próprio sejam apagados, mesmo da internet. Isso ganha especial relevância numa sociedade

cada vez mais digital e dependente de novas tecnologias.

Se é verdade que os avanços tecnológicos têm benefícios, como o de permitir encurtar distâncias, por

exemplo, também é verdade que permitem novas formas de abuso e a disseminação quase instantânea de

informação por milhares de pessoas.

Novos tempos trazem novos desafios, tomando muitas vezes a forma de violência, pelo que é também

exigido ao legislador que saiba responder às novas problemáticas na sociedade. No entanto, tem de haver um

equilíbrio com a necessidade de proteção de outros direitos fundamentais.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Bem lembrado!

O Sr. Rui Paulo Sousa (CH): — Veja-se o recente caso de Tancos, que levou agora o tribunal a anular

parte do acórdão em primeira instância, por causa da utilização de prova baseada nos metadados. Isso poderá

levar, eventualmente, a absolvições.

É importante que se legisle o quanto antes, para que casos destes não voltem a verificar-se, sendo

necessário conjugar o direito à segurança com o direito à reserva da intimidade da vida privada e sigilo das

comunicações.

Aplausos do CH.

Protestos da Deputada do PSD Paula Cardoso.

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Querem safar os amigos!

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O Sr. Rui Paulo Sousa (CH): — Também não podemos ter uma manta de retalhos jurídica como a que

temos nesta matéria. E não é concebível que empresas de telecomunicações possam preservar os metadados

para cobrar aos seus clientes, mas que esse acesso seja vedado às autoridades judiciárias para efeitos de

investigação de crimes graves, muitas vezes em situações de vida ou de morte.

Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: As duas diretivas que esta proposta de

lei pretende transpor aprovam o regime jurídico da cooperação judiciária internacional em matéria penal e o

regime jurídico da emissão, transmissão, reconhecimento e execução de decisões europeias de investigação

em matéria penal, visando introduzir alterações pontuais em atos jurídicos da União Europeia adotados

anteriormente.

A alteração proposta pelo Governo consiste em determinar que informações legitimamente obtidas pelos

membros das equipas de investigação conjuntas sejam tratadas nos termos da Diretiva (UE) 2016/680, e em

prever que, ao tratamento, segurança, conservação, acesso e proteção dos dados pessoais, seja aplicável a

lei que estabelece o regime jurídico aplicável ao tratamento de dados referentes ao sistema judicial, devendo

ambas as diretivas ser transpostas até 11 e 14 de março, o que muito dificilmente acontecerá.

Ora, o controlo do RGPD foi confiado à Comissão Nacional de Proteção de Dados, que se pronunciou

sobre a proposta de lei em apreço e transmitiu algumas perplexidades sobre a forma como o Governo

procedeu à transposição das Diretivas (UE) 2022/211 e (UE) 2022/218. Entre outras considerações, a

Comissão Nacional de Proteção de Dados indica que a própria redação da norma é incorreta, de um ponto de

vista terminológico, pelos motivos aí explicados.

Em segundo lugar, a Comissão Nacional de Proteção de Dados alerta para o facto de haver referência à

anterior lei de proteção de dados pessoais, atualmente revogada, e para alguma confusão conceptual que

conviria esclarecer.

Julgamos que, em sede de especialidade, e com o auxílio dos pareceres do Conselho Superior da

Magistratura, do Conselho Superior do Ministério Público e da Ordem dos Advogados, que, certamente,

chegarão em breve, estas dificuldades poderão ser superadas e a lei aprovada.

Aplausos do CH.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, é sempre um gosto ter pessoas a assistir aos nossos

trabalhos nas galerias, e a todas saúdo. Mas permitam-me um especial destaque a um grupo de estudantes

do Panamá que estudam no Instituto Politécnico de Leiria e que se encontram a assistir aos nossos trabalhos,

visto que, com eles, estão representantes da Embaixada do Panamá em Lisboa, que saúdo, e visto que se

trata de uma atividade desenvolvida pelo nosso Grupo Parlamentar de Amizade com o Panamá. Bienvenidos.

Aplausos gerais, tendo Deputados do CH aplaudido de pé.

Passo agora a palavra à Sr.ª Deputada Patrícia Gilvaz, da Iniciativa Liberal.

A Sr.ª Patrícia Gilvaz (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta proposta de lei do Governo, de

acordo com a sua exposição de motivos, está relacionada com os dados pessoais que são obtidos pelas

equipas de investigação criminal.

Infelizmente, em Portugal, estes dados, certamente, não serão metadados, fruto da inércia dos três

Governos sucessivos do Partido Socialista, que não foram capazes de, em oito anos de governação, resolver

este problema.

Aliás, estamos todos recordados que a anterior Ministra da Justiça afirmou, ainda em 2015, apenas um ano

depois da decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia, que a Lei n.º 32/2008 estava absolutamente

conforme,…

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Bem lembrado!

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A Sr.ª Patrícia Gilvaz (IL): — … a mesma lei que foi declarada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional

e que agentes da sociedade civil já tinham denunciado, pelo menos desde 2017, mas que o Governo, como é

seu hábito, decidiu ignorar. Pior do que ignorar e pior do que desconhecer foi saber e nada fazer.

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Muito bem!

A Sr.ª Patrícia Gilvaz (IL): — Como a Iniciativa Liberal denunciou no início desta Legislatura, em 2021,

durante a presidência de Portugal no Conselho da União Europeia, este Governo coordenou trabalhos em

Bruxelas sobre esta matéria, mas nada fez em Portugal.

O Governo do Partido Socialista já conhecia plenamente a jurisprudência europeia sobre esta matéria e,

por isso, já sabia — ou devia saber — que a lei portuguesa violava quer o direito europeu, quer os direitos

fundamentais, dos cidadãos portugueses. Mas, enquanto presidia à União Europeia, com vaidade e

despesismo, em eventos com que este Governo envergonhou o nosso País, em Portugal o que é que fez o

Governo do Partido Socialista para resolver a situação dos metadados? Zero!

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Bola!

A Sr.ª Patrícia Gilvaz (IL): — E se hoje estamos mergulhados num caos jurídico, em que temos um

sistema judicial que não pode utilizar meios de prova essenciais para a realização de justiça, em que temos

uma verdadeira crise no nosso Estado de direito — não, não utilizo esta expressão de ânimo leve, Srs.

Deputados e Srs. Membros do Governo —, isto deve-se à inércia dos sucessivos Governos do Partido

Socialista, que não servem os portugueses e que tudo o que vão conseguir fazer é deixá-los bem pior do

estavam em 2015, quando vieram para o Governo.

Aplausos da IL.

O Sr. Presidente: — Para intervir, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Paula Cardoso.

A Sr.ª Paula Cardoso (PSD): — Ex.mo Sr. Presidente, Ex.mo Sr. Secretário de Estado: A liberdade, a

segurança e a justiça, direitos fundamentais do cidadão, devem ser eficazmente garantidos. Portanto, exigem

aos Estados-Membros da União Europeia uma eficaz cooperação entre as suas forças policiais, autoridades

aduaneiras e outras, a que comummente chamamos «equipas de investigação criminal».

Portanto, tratamos aqui de uma abordagem coerente e eficaz, no âmbito da proteção de dados pessoais,

que inclui os que são obtidos por estas equipas de investigação criminal conjuntas.

Estas diretivas vêm, no fundo, dizer que os dados pessoais obtidos legitimamente por uma equipa de

investigação podem ser utilizados para uma finalidade diversa ou diferente daquela para a qual foram

recolhidos, obedecendo a determinadas circunstâncias. Estas circunstâncias são as que vêm elencadas e que

dizem que é possível, desde que o responsável pelo tratamento esteja autorizado a tratá-los nos termos do

Direito da União Europeia e que o tratamento seja ajustado e proporcionado à sua finalidade.

Este é, no fundo, o objetivo da proposta de lei do Governo, ou seja, fazê-lo por duas formas: intervindo na

lei de cooperação judiciária internacional em matéria penal, que é a Lei n.º 144/99, de 31 de agosto, aditando

novos números que tratam das equipas de cooperação criminal conjuntas, e intervindo na Lei n.º 88/2017, de

21 de agosto, que aprova o regime jurídico da emissão, transmissão, reconhecimento e execução das

decisões europeias de investigação em matéria penal, revogando, o n.º 2 do artigo 8.º, que hoje determina que

o acesso a dados pessoais pelas autoridades competentes para os efeitos de prevenção, investigação,

deteção ou repressão penais ou execução de sanções penais é restrito, apenas tendo acesso aqueles que

forem devidamente autorizados.

Nada a opor quanto à necessidade de adequar e harmonizar a nossa legislação às diretivas que aqui estão

em causa. O único aspeto crítico que poderá ser apontado é o facto de a Lei n.º 34/2009, de 14 de julho, que

estabelece o regime jurídico aplicável ao tratamento de dados referentes ao sistema judicial, para o qual

remete o n.º 10 do artigo 145.º-A da Lei n.º 144/99, estar, grosso modo, desajustado do RGPD.

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E, para colmatar este desfasamento, o Governo não se limita a remeter o tratamento, segurança,

conservação, acesso e proteção para essa lei, mas também para a lei que assegura a execução na ordem

jurídica nacional do RGPD.

Fica, de algum modo, claro que o Governo sentiu necessidade de fazer esta cosmética para colmatar um

atraso na revisão da lei de dados do sistema judicial, que lhe é claramente imputável.

Aplausos do PSD.

Escusado será lembrar a necessidade urgente de adaptar esta Lei n.º 34/2009, que estabelece o regime

aplicável ao tratamento de dados, ao sistema do regime geral do RGPD.

Na anterior Legislatura, a Ministra da Justiça, Dr.ª Francisca Van Dunem, disse que o Governo iria retomar

a sua proposta de alteração do regime jurídico aplicável ao tratamento de dados referentes ao sistema judicial,

mas a verdade é que não o fez. E essa proposta, que viu a luz aqui na XIII Legislatura, que era a Proposta de

Lei n.º 126/XIII/3.ª (GOV), que alterava o regime jurídico aplicável ao tratamento de dados referentes ao

sistema judicial, foi vetada a 26 de julho de 2019, pelo Sr. Presidente da República, tendo acabado por

caducar com o termo da Legislatura.

Mas, já nessa proposta, o próprio Governo alegava e propunha-se introduzir um conjunto de garantias para

assegurar o elevado nível de proteção de dados pessoais no âmbito do sistema judiciário, onde se afigurava

necessária uma particular preocupação com a circulação da informação no contexto da tramitação dos

processos em várias instâncias e por diferentes entidades.

Estas garantias são especialmente adequadas à necessidade de assegurar a ausência de qualquer tipo de

interferência ou aproveitamento indevido no exercício de funções dos tribunais e do Ministério Público. E

acrescentava que era preciso tornar mais claro o papel de cada entidade, distinguindo-se as responsabilidades

que lhe incumbem no que concerne à proteção de dados pessoais recolhidos e tratados no âmbito dos

processos judiciais. E é aqui, neste papel claro que tem de caber a cada entidade, que está a desadequação

entre a lei e o RGPD.

Quem trata os dados? Sabemos que na lei não está claro sequer que os magistrados podem ser os

responsáveis pelo tratamento deste tipo de dados e, portanto, estas diretivas trarão sempre consigo a

necessidade de se fazer a revisão da lei dos dados do sistema judiciário.

Rematava, ainda, referindo que esta alteração deveria permitir distinguir melhor o papel de cada uma

destas entidades, que é fundamental para podermos ter uma lei de dados pessoais perfeitamente clara.

Estas necessidades estavam, há muito, identificadas, o Governo conhecia-as há muito, pelo que se impõe

questionar o Governo, Sr. Secretário de Estado, sobre quando irá retomar esta matéria, de forma a adaptar a

Lei n.º 34/2009 ao RGPD.

O PSD entende que esta proposta carece de correções e afinações em sede de especialidade, tendo em

conta, nomeadamente, sugestões que foram dadas e fragilidades que foram apontadas pelo parecer da

Comissão Nacional da Proteção de Dados, mas, em sede de especialidade, está disponível para fazer as

melhorias que se entenderem necessárias.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para intervir no debate, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, do PAN.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:

Esta matéria, ao mexer na legislação que possa ter a ver com a proteção de dados, exige a maior prudência e

cautela.

Por um lado, tem de ter em conta as ponderações difíceis entre a privacidade, mas por outro, também, a

segurança e persecução da justiça. Aliás, basta ver os casos recentes — não só de matéria segurança

nacional, como é o caso de Tancos, ou os casos que têm gerado alarme social, com o risco de pôr em causa

processos de investigação de crimes de pedofilia — para perceber que há dois interesses em demanda e em

conflito, que têm de ser, necessariamente, harmonizados.

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A proposta do Governo parece-nos que, numa certa dimensão, não tem essa prudência que se exige nesta

matéria. Se, por um lado, vai bem a proposta quando clarifica as disposições da diretiva LED, perde o pé

quanto ao n.º 10 do artigo 145.º-A, que não transpõe nenhuma diretiva, tem uma remissão legislativa

desadequada e usa ainda terminologias erradas e que nem sequer se afiguram necessárias.

Por isso, nesta fase, o PAN não acompanhará favoravelmente esta iniciativa, mas estamos disponíveis

para dar os nossos contributos na especialidade. Esperamos que, da parte do Governo e do PS, haja também

disponibilidade para corrigir esta matéria, no âmbito da especialidade, nomeadamente no que diz respeito aos

n.os 9 e 10.º do artigo 145.º-A.

O Sr. Presidente: — Para intervir no debate, em nome do Livre, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Tavares.

O Sr. Bruno Nunes (CH): — Para quê? O que é que ele percebe disso?

O Sr. Rui Tavares (L): — Sr. Presidente, boa tarde a todas e a todos: Esta proposta de lei do Governo que

discutimos hoje não aparece desgarrada, faz parte de um caminho que a União Europeia tem feito há muito

tempo. Começa com a entrada em vigor da Carta de Direitos Fundamentais e do seu artigo 16.º, que leva,

depois, ao Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados e à Diretiva (UE) 2016/680, que o acompanhou.

Agora, trata-se de atualizar, ao nível dos procedimentos, também do ponto de vista de investigação criminal

e da cooperação policial, toda a bitola, a fasquia que se tornou mais elevada e que pôs a Europa, de certa

forma, num lugar de ponta, no que diz respeito ao tratamento de dados no mundo.

Para já, sinalizo estarmos a discutir a transposição de uma diretiva ainda no prazo, o que, creio, é a

primeira vez nesta Legislatura, mas, como outros representantes de partidos aqui presentes, questiono-me

sobre a necessidade de acrescentar à diretiva a remissão que é feita para a lei nacional, no n.º 10 do artigo

145.º-A. Esperamos ouvir esses esclarecimentos, que são importantes para a formação da opinião do Livre.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, em nome do Grupo Parlamentar do PS, o Sr. Deputado Pedro

Delgado Alves.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Secretários de Estado: A

matéria que nos traz, hoje, à Câmara é mais uma peça na tarefa difícil de aprimoramento da galáxia de

legislação sobre dados pessoais.

De facto, a transformação das últimas décadas, em especial a última, tem tido um impacto significativo no

plano da União Europeia. Quer a entrada em vigor do Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados, quer as

diretivas e consequente legislação nacional emitida nesse âmbito, revelam-se de importância cada vez maior

no quadro do que é a vida em sociedade e a utilização e os riscos associados à partilha e ao tratamento de

dados pessoais.

Mas — queria começar por aí —, apesar de tudo, este não é um debate sobre toda esta galáxia; é um

debate específico, sobre uma constelação nesta galáxia, sobre um aspeto particular desta galáxia.

Não podia começar, precisamente por isso, sem saudar o Bloco de Esquerda, o Partido Comunista

Português, o PSD, o PAN e o Livre por terem discutido o que estamos a discutir: esta transposição de diretiva

e esta matéria.

Efetivamente, é faltar ao respeito à Câmara — e aqui dirijo-me muito diretamente à Sr.ª Deputada Patrícia

Gilvaz — aproveitar o agendamento sobre uma determinada matéria para fazer populismo penal sobre outra.

Aplausos do PS.

Protestos da Deputada da IL Patrícia Gilvaz.

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Fala de ti, não fales dos outros!

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O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Verdade seja dita, há, inegavelmente, um problema com a legislação

de metadados. É um problema que assiste à República Portuguesa, ao Reino de Espanha, à República

Italiana, à República Federal da Alemanha.

Todos os Estados-Membros da União Europeia, nesse tema de metadados, têm precisamente o mesmo

problema, que é a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia. Todos estes Estados — enfim, não

cito, necessariamente, aqueles que já tiveram decisões desfavoráveis, mas vários destes já tiveram decisões

desfavoráveis sobre a sua legislação, que procurou, no plano interno, acautelar a forma como a investigação

criminal acede a metadados — se deparam, precisamente, com o mesmo problema que tem a República

Portuguesa.

E a República Portuguesa tinha, efetivamente, legislação que, de uma determinada leitura da

jurisprudência europeia, era tida por válida e conforme, mas recentes decisões, quer no plano europeu quer no

plano interno, vieram dizer o contrário.

O dilema que esta Câmara enfrenta já há alguns meses, desde que a decisão foi conhecida, desde que foi

necessário retomar o tema, tem sido sobre como é que vamos conseguir superar aquilo que mais nenhum dos

outros 26 Estados-Membros conseguiu, até ao momento, superar.

É uma tarefa difícil, juridicamente complexa e, por isso, devíamos evitar fazer demagogia penal sobre o

tema, como a Iniciativa Liberal e o Chega hoje, infelizmente, fizeram, nesta sessão plenária.

Protestos da IL.

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Já cá faltava!

O Sr. Bruno Nunes (CH): — Tinha de falar do Chega!

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Há bocadinho esqueci-me, peço imensa desculpa, Srs. Deputados,

de referir que o Chega faz populismo penal, mas acho que todos sabemos que faz. Não lhes falta esse

elemento.

Aplausos do PS.

De facto, fizeram, porque esta transposição comporta matérias importantes. Por exemplo, dou, com toda a

facilidade, a mão à palmatória e reconheço as justas críticas que o Partido Social Democrata apontou, no que

respeita ao atraso na transposição ou na atualização da matéria sobre outra adaptação, neste caso da Lei

n.º 34/2009, a esta matéria.

Houve um veto do Sr. Presidente da República em 2019, quando se aprovou o pacote que aprovava, não

só a lei de execução do RGPD, como a lei sobre a investigação criminal. Ficou a faltar aquele que regula os

dados do sistema judicial, que o Sr. Presidente vetou. Infelizmente, a Legislatura seguinte, que foi a da

pandemia, não permitiu iniciar e concluir estes trabalhos. Mas é uma peça em falta.

E faço, precisamente, a mesma interpretação que a Sr.ª Deputada Paula Cardoso. Por essa razão — e

talvez seja isso que se deva explicar à CNPD, se quisermos — é que, por cautela, o Governo refere, na

proposta, o RGPD, não obstante este tratar de outra matéria. Mas o que se procura acautelar, da interpretação

que fazemos, é que os princípios que ali estão vertidos devem, também, ter lugar na aplicação até que esta

matéria seja clarificada.

Não vou citar a máxima latina «o que abunda não é nocivo» — digo-o em português —, ou seja, pôr esta

cautela adicional na lei é matéria que podemos discutir na especialidade, mas eu conservaria, para já, até

fazermos essa superação, sendo que, como já foi dito, há muitos temas que podem ser aprimorados no

trabalho de especialidade. Mais uma vez, uma pequena precisão: a referência desatualizada que temos na Lei

n.º 88/2017 não é introduzida por este diploma, ela subsiste no n.º 3 da norma que é alterada, porque essa,

sim, ainda refere a legislação de proteção de dados anterior. Mais uma matéria que podemos, e devemos,

corrigir em sede de especialidade.

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Este grupo parlamentar tem toda a disponibilidade, e esperamos que todas as forças políticas, e não

apenas as que já o fizeram hoje, também acompanhem esse trabalho de especialidade que temos

oportunidade de fazer.

É um diploma que não é especialmente complexo, é curto e de rápida resolução. O desafio que já temos

nos metadados é bem mais complicado e deve, também, procurar mobilizar a Câmara toda, mas com o

conhecimento, não só da complexidade técnica, mas daquilo que, efetivamente, está a ser tratado em cada

momento, em cada debate.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção no debate, em nome da Iniciativa Liberal, tem a palavra o

Sr. Deputado Rodrigo Saraiva.

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Sr. Presidente, Caro Deputado Pedro Delgado Alves, o seu conceito de

liberdade política, às vezes, parece-me um pouco estranho.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — É verdade! Olha, ouve!

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Era o que mais faltava ser o Grupo Parlamentar do Partido Socialista a

definir o guião da Iniciativa Liberal nos debates parlamentares. Era o que mais faltava!

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Era só o que faltava! Ele gosta, ele gosta.

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Eu sei que lhe dói ouvir algumas coisas que temos para dizer, mas era o

que mais faltava…

O Sr. Pedro Pinto (CH): — É a vida! É a vida!

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Eu sei que o Sr. Deputado gosta muito da técnica jurídica, mas nós

queremos vir aqui falar de política, e a técnica deixamo-la para a especialidade. Aqui, em primeira instância,

está a política.

Eu sei que o estado em que o Partido Socialista deixou a justiça e a investigação criminal é mau e que isso

lhe custa, mas estamos aqui para falar de política, que é do que queremos falar.

Aplausos da IL.

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Querem safar os amigos! É para safar o Sócrates!

O Sr. Presidente: — Entretanto, inscreveu-se, para aproveitar os 3 segundos que lhe restam, o

Sr. Deputado Pedro Delgado Alves. Vai exercer esse direito com grande economia de recursos. Faça favor.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, em primeiro lugar, a Iniciativa Liberal é livre de dizer o

que entender e criticar como entender, tal como esta bancada também é livre de apontar o populismo penal

quando o identifica.

Aplausos do PS.

Portanto, todos gozando, ao máximo, a sua liberdade.

Neste debate, e esse é o erro em que incorre o Sr. Deputado Rodrigo Saraiva, há uma dimensão política

que não se divorcia da dimensão técnica. Não podemos fazer o debate sobre uma transposição de diretivas,

que mobiliza centenas de milhares de páginas de doutrina e jurisprudência, e fazer de conta que não há uma

questão jurídica e falar de outro assunto.

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — O assunto é o mesmo!

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O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — É isso que critico e é essa crítica que volto a reiterar: falharam à

chamada neste debate, não falando do tema em discussão.

Aplausos do PS.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Isto não é o Largo do Rato nem a SIC (Sociedade Independente de

Comunicação)! Isto é a Assembleia da República!

O Sr. Presidente: — No período de encerramento do debate, assim seja permitido,…

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Era só o que faltava! Isto não é a Venezuela!

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Isto não é a Coreia do Norte!

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Tem a mania. Já na comissão é a mesma coisa!

O Sr. Presidente: — … tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Justiça, Jorge Alves Costa,

que vai fazer o favor de se levantar muito devagarinho, para os ânimos voltarem ao normal.

Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Justiça: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O tema

decidendo hoje era saber em que ponto é que Portugal deveria cumprir — e não é uma questão de ser bom

aluno — uma obrigação para com a legislação europeia.

Temos a Diretiva (UE) 2016/680, que é, de alguma forma, um upgrade relativamente à questão da proteção

de dados. Respondendo ao Sr. Deputado Filipe Soares, exatamente pelo facto de nem todos os Estados

terem o mesmo padrão de proteção de dados é que se impõe que a diretiva, ao nível da União Europeia, seja

transposta para todos os direitos internos de cada Estado-Membro. É isso que nos garante o nível mínimo

para podermos conviver ao nível das investigações criminais.

As equipas conjuntas de investigação e a decisão europeia de investigação não são de hoje, já têm muitos

anos. Há, agora, este acréscimo, relativamente ao robustecimento dos direitos dos cidadãos envolvidos

nessas investigações — arguidos, testemunhas, vítimas —, que veem o seu estatuto como cidadãos, digamos

que, aumentado relativamente à proteção de dados.

Acho que Portugal é um bom exemplo relativamente à questão da proteção de dados: temos um quadro

jurídico-constitucional robusto sobre esta matéria; temos uma Comissão Nacional de Proteção de Dados

independente; temos encarregados de proteção de dados, e estamos a falar apenas da investigação criminal,

na Polícia Judiciária, no Conselho Superior da Magistratura, no Conselho Superior do Ministério Público.

Portanto, temos uma estrutura e um mecanismo de controle muito eficientes.

Relativamente a questões muito concretas que foram colocadas e, sobretudo, no que tem a ver com o

aditamento do n.º 10 ao artigo 145.º-A, reconheço desde já que se trata de uma proposta — e por isso é que é

uma proposta — que esta Assembleia irá avaliar para, depois, discutir em especialidade, como acabei de dizer

na minha intervenção inicial. São as Sr.as e os Srs. Deputados que têm a palavra final relativamente àquilo que

ficará na futura lei, se esta Assembleia assim a aprovar.

O n.º 10 pode, eventualmente, ser um excesso de zelo, reconhecemos, porque já vimos também o parecer

da Comissão Nacional de Proteção de Dados, que tem quatro grandes pontos: concorda, discorda, concorda

com propostas de alterações. Portanto, não podemos apenas limitar a nossa visão sob um aspeto desse

parecer e dizer que o n.º 10 pode, eventualmente, não ser necessário. Com certeza que, em termos de

discussão na especialidade, se encontrarão as melhores soluções para esta proposta.

Esta proposta impõe-se, porque é necessária para robustecer o estatuto de todos quanto estão envolvidos

nas investigações criminais, mas, como o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves disse, num mundo restrito, tem a

ver com a cooperação judiciária em termos internacionais.

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O Sr. Presidente: — Tem de terminar, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Justiça: — Portanto, não estamos a falar de tudo. Estamos a

falar deste aspeto, porque a cooperação judiciária internacional, no fundo, é um novo tipo de processo penal

europeu e, muitas vezes, não há uma identidade de estatutos processuais para todos os arguidos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, despedimo-nos dos membros do Governo e passamos ao segundo

ponto da nossa ordem do dia, em que apreciaremos, em conjunto, na generalidade, os Projetos de Lei

n.os 285/XV/1.ª (IL) — Elimina a contribuição para o audiovisual, baixando a fatura da eletricidade dos

portugueses e 39/XV/1.ª (CH) — Altera a lei que aprova o modelo de financiamento do serviço público de

radiodifusão e de televisão no sentido de alterar as condições de cobrança da contribuição audiovisual.

Para apresentar o projeto de lei da Iniciativa Liberal, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim Figueiredo.

O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A contribuição audiovisual é

uma aberração. Já era uma aberração, mas neste contexto de contas de eletricidade altíssimas que os

portugueses têm de defrontar todos os meses é ainda mais aberrante, especialmente quando o Governo acha

que os mais carenciados precisam de uma redução de IVA (imposto sobre o valor acrescentado) que lhes vale

1 € por mês e os igualmente carenciados continuam a ter de pagar 3 € por mês de uma contribuição

audiovisual que já ninguém sabe muito bem para que é que é gasta.

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Muito bem!

O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Mas a aberração já vinha de antes, porque esta CAV (Contribuição

Audiovisual) é tudo menos uma taxa e chamar-lhe de contribuição é apenas uma forma eufemística de não lhe

chamar imposto. Só que não é um imposto qualquer; é o imposto mais regressivo que Portugal tem, porque

não é sequer uma taxa única, é um valor único. É um imposto regressivo que significa que, quanto menos uma

pessoa ganha, mais alta é a taxa deste imposto, desta contribuição.

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Muito bem!

O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Depois, a CAV é aberrante do ponto de vista da lógica económica,

porque é a principal fonte de receita da RTP (Rádio e Televisão de Portugal) e varia muito pouco ao longo dos

anos. Seja qual for a audiência, a RTP recebe o mesmo. Seja qual for o projeto de custos ou de gastos da

RTP, ela recebe o mesmo. Por isso, não espanta que a RTP2 tenha uma quota de menos de 1 % nas

emissões ditas hertzianas, ou que a RTP3 tenha uma quota inferior a 1 % nas emissões que são transmitidas

por cabo.

Portanto, não há qualquer incentivo. Quando se desliga a fonte de receita de qualquer outro objetivo, não

há incentivo a fazer melhor, não há incentivo a gastar menos e não há qualquer incentivo a inovar.

Estamos em 2023, Srs. Deputados, já não há só a televisão hertziana, não há só televisão por cabo. Há

serviços de streaming, há sites de vídeo, há aplicações de vídeo, há mil e uma maneiras de as pessoas

ocuparem o seu tempo quando querem consumir televisão.

Estamos todos a concorrer pelo mesmo tempo de visionamento das pessoas e pelo mesmo mercado

publicitário. E não deixa de ser irónico que os principais opositores da abolição da contribuição audiovisual

sejam os partidos de esquerda, cada vez mais presos ao passado, e as televisões privadas, que veem na

abolição da contribuição audiovisual um prenúncio daquilo que a RTP deveria fazer, que era concorrer

livremente no mercado.

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Muito bem!

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O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Portanto, fica aqui demonstrado que a IL defende os contribuintes,

não defende mais impostos; defende a concorrência, não defende duopólios de televisões privadas, que estão

protegidos da concorrência.

A contribuição audiovisual deve acabar!

Aplausos da IL.

O Sr. Presidente: — Para intervir no debate, apresentando o projeto de lei do Chega, tem a palavra o

Sr. Deputado Jorge Galveias.

O Sr. Jorge Galveias (CH): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostaria de, em

nome do Chega, agradecer à RTP, ao seu Conselho de Administração e, em especial, ao seu Presidente,

Nicolau Santos, a forma calorosa e atenciosa com que recebeu no dia de ontem a visita do grupo de

Deputados, assessores e serviços da Comissão de Cultura, Comunicação, Juventude e Desporto.

Para muitos, terá sido a primeira vez que entraram numa estação de televisão. Para mim, foi o revisitar

uma casa e reencontrar velhos amigos com quem trabalhei.

A visita de ontem permite-me reafirmar, com convicção, que Portugal precisa da RTP, e o Chega defende a

RTP. Acreditamos na importância do serviço público de rádio e de televisão, mas exigimos, obviamente, um

serviço de qualidade, independente, imparcial e sustentável.

O Sr. Bruno Nunes (CH): — Muito bem!

O Sr. Jorge Galveias (CH): — Como partido conservador que somos, protegemos o liberalismo económico

dos devaneios ultraliberais que roçam a libertinagem económica que alguns defendem.

Aplausos do CH.

Bem sabemos que a Iniciativa Liberal se move segundo os fetiches e dogmas dos cifrões e do lucro, sendo,

para a IL, estes valores superiores à pessoa.

O Chega dirá sempre «não» a qualquer tentativa de gentrificação vinda da direita canhota ou da esquerda

sinistra.

A Sr.ª Rita Matias (CH): — Muito bem!

O Sr. Jorge Galveias (CH): — Por outro lado, a Iniciativa Liberal foca-se única e exclusivamente nos

nichos que passam pelas zonas mais in, mais cool e da moda dos grandes centros urbanos, onde não há

linhas que separem o Bloco de Esquerda da Iniciativa Liberal nem Mortágua de Rui Rocha.

Já o Chega olha para Portugal como um todo. Defende o interior e o mundo rural e não esquece a

importância que tem a RTP para a coesão territorial, sendo que é o seu serviço público que assegura áreas de

informação, em termos regionais e locais, que nenhum órgão assegura, bem como a ligação aos 5 milhões de

portugueses espalhados pelos quatro cantos do mundo, não esquecendo a ligação à lusofonia.

Aplausos do CH.

Meus senhores, isto é justiça social, algo que o partido Iniciativa Liberal não conhece.

A proposta que o Chega hoje aqui traz é uma proposta liberal — não se assustem! Passo a explicar:

queremos efetivamente aliviar as faturas de eletricidade dos portugueses — pois, como decerto sabem, é

através dos fornecedores de eletricidade que a contribuição audiovisual é atualmente cobrada — e propomos

que passem a ser os fornecedores dos pacotes de serviços de comunicações eletrónicas a cobrá-la.

Assim, por um lado, aliviamos os contribuintes. Por outro lado, quem decide, ou não, adquirir serviços de

comunicações eletrónicas pode, ou não, estar sujeito a essa taxa, tendo em conta as isenções presentes e

que também pretendemos alargar.

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O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!

O Sr. Jorge Galveias (CH): — Acabar, pura e simplesmente, com a CAV, neste momento, é destruir e

matar a RTP e o seu serviço público, e é também um ataque à democracia.

Defendemos um serviço público de rádio e de televisão que ofereça conteúdos programáticos dignos da

nossa história, dignos da nossa quase milenar Nação. Defendemos uma RTP livre de interesses obscuros e

de pressões e que não se subjugue às sinistras agendas globalistas.

Aplausos do CH.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Fernanda Velez, do Grupo Parlamentar do

PSD.

A Sr.ª Fernanda Velez (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Iniciativa Liberal pretende, com o

projeto de lei ora em discussão, eliminar a contribuição para o audiovisual da fatura da eletricidade, revogando

a Lei n.º 30/2003, de 22 de agosto, diploma que aprova o atual modelo de financiamento da RTP.

Por sua vez, o Chega apresenta um projeto de lei que visa alterar as condições de cobrança da CAV

estabelecidas na mesma lei.

Propõe, designadamente, que a contribuição deixe de ser cobrada pelas empresas comercializadoras ou

distribuidoras de eletricidade, para passar a ser cobrada através das empresas fornecedoras de pacotes de

serviços de comunicações eletrónicas.

Propõe ainda que os consumidores que beneficiam da redução do valor da contribuição fiquem isentos do

seu pagamento. Parece-nos haver, aqui, falta de coerência política, porquanto o facto de se alterar a cobrança

da CAV, em fatura de identidade diversa, mantém inalteradas algumas das desconformidades invocadas.

No que respeita à Iniciativa Liberal, as duas principais razões invocadas para estabelecer um novo modelo

de financiamento do serviço público de radiodifusão e de televisão, eliminando a CAV, assentam em: primeiro,

na eliminação de uma taxa que sobrecarrega as famílias em tempo de crise, o que se traduziria numa

poupança de cerca de 35 € por ano; segundo, porque a Iniciativa Liberal entende que os serviços de

radiodifusão e de televisão não devem ser financiados por fundos públicos, dado que isso contribui para uma

distorção de mercado, favorecendo a empresa pública face às restantes de natureza privada.

Assim, defendem que as empresas do setor público e do setor privado devem ser financiadas

exclusivamente pelas receitas comerciais dos respetivos serviços e não por qualquer contribuição ou taxa a

fazer recair sobre os contribuintes.

Ora, este entendimento da Iniciativa Liberal não tem em conta um conceito fundamental, que consiste no

reconhecimento da necessidade de um serviço público de radiodifusão e de televisão que contribua para a

formação cultural e cívica dos portugueses e para a construção de uma sociedade livre, pluralista e

democrática.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados, em Portugal, como em muitos países da Europa, é um imperativo do

Estado assegurar a existência e o funcionamento de um serviço público de radiodifusão e de televisão,

devendo, para isso, garantir os meios necessários, suficientes e apropriados à sua prestação.

Para além das receitas próprias geradas pela RTP, a principal fonte de financiamento do serviço público de

radiodifusão e de televisão, assenta na CAV, cobrada mensalmente na fatura de energia elétrica num

montante de 2,85 € mais IVA.

A contribuição para o audiovisual representa, assim, uma parcela significativa das receitas do operador de

serviço público, indispensável para a prossecução das missões investidas pela Lei da Televisão e dos

Serviços Audiovisuais a Pedido e pelo Contrato de Concessão do Serviço Público de Rádio e de Televisão,

assinado com o Estado português.

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Relembro que este modelo não é exclusivo de Portugal. Na Alemanha, por exemplo, o serviço público de

radiodifusão e de televisão tem como fonte de financiamento o pagamento, pelos cidadãos, de uma taxa de

18,36 € mensais por cada residência de um agregado familiar. No Reino Unido, o visionamento ou gravação

de programas emitidos pela BBC (British Broadcasting Corporation), em qualquer canal ou formato, está

sujeito ao pagamento de uma licença por cada residência familiar, no valor de 159 €.

Aqui chegados, importa referir que o PSD considera importante defender a existência de um serviço público

de radiodifusão e de televisão em Portugal.

Sr. Presidente, Srs. Deputados, podemos questionar se o atual modelo é, ou não, o melhor modelo de

financiamento, podemos suscitar um debate no sentido de procurar uma forma mais adequada de

financiamento do serviço público de radiodifusão e de televisão, podemos e devemos colocar a questão de

saber se a RTP — entidade beneficiária deste financiamento — assegura uma gestão prudente e adequada,

um desempenho equilibrado do serviço público de televisão, respeitando o princípio da correta utilização de

recursos públicos provenientes do contributo de todos os portugueses.

Para essa reflexão e respetiva discussão, o PSD está e estará sempre disponível, mas não à custa da

abolição do serviço público de radiodifusão e de televisão, enquanto instrumento poderoso e essencial para a

construção de uma sociedade mais informada, mais culta, mais democrática e orientada para a preservação

de valores fundamentais, como sejam a defesa da identidade nacional, da língua portuguesa, da tolerância e

do pluralismo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, do Grupo Parlamentar do

Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A IL gosta tanto da liberdade e

da democracia que está disposta a sacrificar ambas ao mercado. Essa contradição é muito visível,

nomeadamente nesta proposta que nos apresenta.

A maior parte das democracias com que nos comparamos têm serviços públicos de televisão,…

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É verdade!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — … com formas de financiamento autónomo, sejam elas na conta da luz

ou de outra forma, porque se entende que a televisão pública é uma forma de garantia de pluralismo e de

acesso à informação em todo o território.

É assim que a RTP (Rádio e Televisão de Portugal) tem obrigações de serviço público que mais nenhum

canal televisivo tem, obrigações essas que pretendem cumprir critérios de coesão social e critérios de coesão

territorial. Por exemplo, a RTP tem regras mais restritas para garantir a língua gestual portuguesa; a RTP tem

de garantir a RTP Internacional; a RTP tem de garantir uma cobertura noticiosa das várias localidades em

Portugal, algo que o mercado não cobre, porque não é rentável.

Protestos do CH.

O Sr. Deputado Cotrim de Figueiredo até falava sobre o anacronismo da RTP, sobre o facto de ser um

modelo do passado que já não tem ligação às gerações futuras, às novas formas de comunicação. Há uma

única plataforma de streaming em Portugal que é totalmente gratuita e que tem conteúdos nacionais e

internacionais: chama-se RTP Play.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Bem lembrado!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — É a única que garante o acesso de todos a novos conteúdos,…

Protestos do CH.

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… com uma vantagem: é que a RTP, ao produzir conteúdos, está a ajudar a economia local, está a ajudar

a produção nacional de conteúdos, coisa que mais nenhuma plataforma faz.

Mas a questão é a de saber como é que se financia a RTP, que assegura a democracia, a liberdade, a

pluralidade, a economia e a produção nacionais, desde logo porque não é muito desejável que a RTP, sendo

uma televisão pública, dependa inteiramente do Orçamento do Estado, que vai mudando ao sabor de cada

Governo. É bom que tenha uma forma de financiamento autónomo.

Protestos do CH.

Há um segundo problema: a RTP tem custos acrescidos porque cumpre um serviço público, mas não pode

competir com os privados nas receitas de publicidade.

Protestos da IL.

Portanto, não pode ter a mesma receita de publicidade — está impedida legalmente — que têm os

privados. Até é desejável que não o tenha, não só porque isso implica outras condições no mercado, mas

também porque se quer que a televisão pública seja um garante de independência face a poderes económicos

e face ao Governo, em cada momento.

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Não és independente quando estás na SIC?!

O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — A premissa está errada!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — O que é que aconteceria com o fim da CAV?! Era o fim da RTP. O fim

da CAV era o fim da RTP. Essa, certamente, Sr. Deputado, é uma proposta que não podemos acompanhar.

Defendemos o serviço público autónomo, livre, que acrescente à democracia, em vez de nos vermos

sempre reféns das lógicas de mercado.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para intervir no debate, em nome do PAN, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de

Sousa Real.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A RTP é uma empresa pública

que inclui estações de rádio e de televisão, sendo que, todos os dias, em todo o mundo, disponibiliza

conteúdos e serviços a milhões de pessoas — algo que, claramente, a Iniciativa Liberal, ao trazer-nos esta

proposta, acaba por ignorar.

A importância deste meio de comunicação social é indiscutível, seja pela difusão da cultura, da informação,

como também pelo próprio contributo do sentimento de união para todos os portugueses que se encontram

dispersos pela diáspora.

Nesse sentido, parece-nos que é fundamental que se assegure não só a manutenção deste serviço

público, como também, evidentemente, a não ingerência governamental.

Nessa medida, estamos de acordo, mas não pelo caminho que a Iniciativa Liberal nos traz. É que, de facto,

ao estar a eliminar de forma taxativa a contribuição para o audiovisual — coisa diferente da proposta de

isenção que o Chega nos traz —, há um não acautelar de alguns dos princípios basilares da democracia, que

são os da liberdade de imprensa, da idoneidade das instituições e, também, do acesso à informação.

Por outro lado, não nos podemos esquecer de que o serviço disponibilizado pela RTP deve também

acompanhar a evolução da nossa sociedade — cujo dinheiro não deve ser utilizado, por exemplo, para apoiar

e divulgar montarias e atividades afins — e deve seguir o mesmo caminho que já seguiu com a tauromaquia: o

de eliminar este tipo de atividades da sua programação.

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O Sr. Pedro Pinto (CH): — Já mandas na televisão?! Isso é ditadura!

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Mas, no que diz respeito, efetivamente, ao serviço essencial da RTP,

o PAN reconhece a importância deste serviço público e estará sempre ao lado da sua manutenção.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Isso é que é ditadura! É ditadura!

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — O PAN reconhece, acima de tudo, a importância do acesso à

informação por parte dos milhares de concidadãos portugueses que estão no estrangeiro e para os quais este

elemento é fundamental.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, no debate, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Tavares, do

Livre.

O Sr. Rui Tavares (L): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Iniciativa Liberal fez um discurso em

que disse, por exemplo, que a CAV é regressiva, mas não propõe torná-la menos regressiva; propõe eliminá-

la.

A Iniciativa Liberal costuma — e bem —, no debate público, comparar muito Portugal com os seus

parceiros europeus, mas, desta vez, esqueceu-se de o fazer e de dizer que, na Alemanha, se paga sete vezes

mais e que, no Reino Unido, se paga dez vezes mais. E bem, porque a BBC e as emissoras públicas da

República Federal Alemã desempenham um papel público, como a RTP também desempenha, nas suas

múltiplas valências e em múltiplos momentos. Quando há uma crise, quando há uma pandemia, quando há a

necessidade de ter a telescola, a RTP está lá.

Neste Parlamento, a apresentação desta proposta tem, pelo menos, um mérito: clarifica aquilo que

poderíamos, enfim, chamar «algum simplismo» da Iniciativa Liberal.

A Iniciativa Liberal é pluralista — e bem —, mas esquece-se de ser pluralista no seu pluralismo. Explico-

me: podemos ter muita escolha, mas, se toda a escolha que temos — seja em champôs, ou em sopas, ou em

emissoras de televisão — for sempre guiada pelo mesmo critério, essa escolha é falsa, porque não temos

pluralismo dentro do pluralismo.

Protestos do CH.

É por isso que é importante que, na oferta que temos de televisão, haja oferta comercial, haja oferta

pública, haja oferta não lucrativa, e que aumentemos — e não diminuamos — o tipo de critérios que temos,

para que não sejamos só uma sociedade pluralista, mas uma sociedade em que haja critérios múltiplos nesse

pluralismo que oferecemos às pessoas.

Aplausos do PS.

Protestos do CH.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, renovo o que já disse: a única consequência que os Srs. Deputados

que tentam impedir um Deputado de falar têm é que o Deputado passa a ter o tempo disponível para

completar o seu argumento.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Isso já ele tem!

O Sr. Presidente: — E no dia em que for preciso ter meia-hora para isso, eu dar-lhe-ei a meia-hora,…

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Pode dar à vontade!

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O Sr. Presidente: — … porque qualquer das Sr.as e Srs. Deputados aqui tem o direito de se fazer ouvir e

de expender os seus argumentos.

Já agora, convinha que não tentassem a mesma técnica que o Presidente da Assembleia da República,

porque isso é mesmo de mais.

Aplausos do PS, do L e de Deputados do PCP.

Vozes do CH: — Ah!

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, para intervir no debate, a Sr.ª Deputada Sara Velez, do Partido

Socialista.

A Sr.ª Sara Velez (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos duas iniciativas legislativas,

uma da IL e outra do Chega, ambas acerca do financiamento da RTP.

O projeto de lei apresentado pelo partido Iniciativa Liberal, no contexto da atual crise dos preços de

energia, apresenta um novo modelo de financiamento do serviço público de televisão, eliminando a

contribuição para o audiovisual e pretendendo reduzir, desta forma, a fatura de eletricidade das famílias.

A iniciativa apresentada pelo Chega tem por objetivo proceder à alteração das condições de cobrança

desta contribuição, deixando a mesma de ser cobrada pelas empresas comercializadoras de energia para

passar a ser cobrada através de empresas fornecedoras de telecomunicações e internet.

Tanto uma iniciativa como a outra, embora com fundamentos bem diferentes, pretendem introduzir

alterações à forma como a RTP se financia. Uma delas faz capitular por completo o financiamento público,

com a motivação — que está expressa no epigrafado do título, aparentemente cheia de virtuosismo — de

fazer baixar a fatura de eletricidade dos portugueses, mas o seu objetivo fundamental, aliás, declarado, é o de

que a RTP passe a ser financiada exclusivamente por receitas oriundas de publicidade comercial. Esta visão

implica, na prática, o fim de qualquer serviço público de rádio e de televisão.

A Sr.ª SusanaAmador (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Sara Velez (PS): — Efetivamente, para gerar receitas comerciais, a orientação estratégica e a

respetiva planificação da atividade das operadoras — quer de rádio, quer de televisão — seria

necessariamente comercial e não de natureza de serviço público, impedindo, desta forma, o cumprimento da

obrigação constitucional, que recai sobre o Estado português, de assegurar a existência e o funcionamento de

um serviço público de televisão.

Importa também referir que o presente projeto de lei não prevê qualquer mecanismo contingente para o

caso da prestação de serviço público, caso a RTP não obtenha as receitas comerciais suficientes. Tal

implicaria fazer perigar o adequado funcionamento do serviço público de rádio e de televisão no

desenvolvimento da sua atividade enquanto ferramenta e plataforma global de comunicação de referência,

como é a RTP.

A outra iniciativa, do partido Chega, prevê a alteração do modelo de cobrança da própria contribuição,

passando-a das companhias comercializadoras de eletricidade para os operadores de telecomunicação.

Esta nova configuração pode também — como o próprio parecer da ERC (Entidade Reguladora para a

Comunicação Social) faz à iniciativa, de forma muito explícita — fazer perigar o valor recolhido, pondo em

causa o cumprimento das obrigações que decorrem do contrato, uma vez que uma parcela significativa destas

receitas provém, como todos sabemos, da própria CAV.

Convém ainda acrescentar que o momento em que discutimos estas duas iniciativas é precisamente o

momento em que o Governo, no quadro das suas competências, promove — como todos sabemos — a

revisão do contrato de concessão.

O Governo nomeou recentemente a comissão encarregue de produzir o livro branco sobre o tema, e todos

os interlocutores com quem temos falado elogiam o trabalho que está a ser feito, que pretende, depois,

produzir a melhor solução — baseada em toda a informação, conhecimento e melhores práticas disponíveis —

para termos um novo contrato que permita à RTP continuar a fornecer a melhor resposta de serviços públicos.

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Discutir o modelo de financiamento numa altura em que se revê o contrato de concessão não nos parece

de todo adequado, por esta alteração que produzirá também, previsivelmente, efeitos no seu modelo de

financiamento.

Sr.as e Srs. Deputados, para concluir, temos afirmado muitas vezes, desta bancada, que somos

intransigentes…

O Sr. Filipe Melo (CH): — Já sabemos!

A Sr.ª Sara Velez (PS): — … defensores do serviço público de rádio e de televisão.

A RTP assegura um conjunto bastante diversificado de programação de qualidade, em horário nobre,

privilegiando as produções em língua portuguesa, apoiando o cinema e a ficção nacionais, promovendo a

divulgação institucional de indiscutível utilidade pública e ajudando também a promover as produções

independentes.

A RTP, mesmo em períodos difíceis — como foi o período da pandemia —, foi fundamental para ajudar a

produção e ficção nacionais e os artistas portugueses. Rapidamente se organizou para levar, através da

televisão e das plataformas digitais, o Estudo em Casa a todos os alunos, que, em consequência dos

sucessivos confinamentos, ficaram sem aulas. Assumiu mesmo um papel fundamental na divulgação de

informação de prevenção a toda a população a respeito da pandemia, e está a fazê-lo, igualmente, sem

distorções, no que respeita à cobertura da guerra na Ucrânia.

A RTP é também a estação de televisão que promove programas fundamentais para aumentar a qualidade

da democracia, acompanhando discussões públicas sobre os mais diversificados temas. Como nos recordava,

ainda ontem, o seu diretor de informação, na visita que a Comissão de Cultura, Comunicação, Juventude e

Desporto realizou à RTP — na qual, infelizmente, não pudemos contar com a companhia do Grupo

Parlamentar da Iniciativa Liberal —,…

A Sr.ª SusanaAmador (PS): — Muito bem!

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): —Tiveram saudades?!

A Sr.ª Sara Velez (PS): — … a RTP é também o canal de televisão que produz programas como o

Parlamento ou o Eurodeputados, contribuindo, desta forma, também para o «aumento da qualidade da nossa

democracia» — mais uma citação do Sr. Presidente do Conselho de Administração da RTP, em audiência

recente na Assembleia.

Os serviços privados também o poderiam ter feito, é verdade. Poder, podiam, mas, efetivamente, não o

fizeram; e se o fizessem, Srs. Deputados, não seria a mesma coisa.

Como temos vindo a reiterar — e eu vou repetir de novo —, um serviço de rádio e de televisão que

assegure direitos à informação, à educação, à formação cultural e cívica, à cultura, a uma programação de

qualidade e a uma informação verdadeiramente independente e plural, que não seja dependente das regras

comerciais de publicidade ditadas por audiências ou outros critérios reúne os requisitos essenciais para termos

um serviço público de televisão. Sabemos que isso é garantido essencialmente através da contribuição para o

audiovisual.

Deste lado, estaremos sempre na defesa destes princípios, na defesa do serviço público de televisão, pela

democracia, pela pluralidade e também pela cultura portuguesa, não só em Portugal, como em toda a nossa

diáspora, com todos os Portugueses pelo Mundo, programa de referência da nossa RTP.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para intervir, tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos, do PCP.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Iniciativa Liberal traz a debate uma

proposta em que justifica a eliminação da contribuição audiovisual com o objetivo de reduzir a fatura da

eletricidade.

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Ainda ontem foram tornados públicos os lucros da EDP (Energias de Portugal): em 2022, obteve 679

milhões de euros de lucro.

Se, verdadeiramente, a intenção da Iniciativa Liberal fosse a de reduzir a fatura de eletricidade, então,

porque é que não intervém nas margens de lucro das empresas energéticas,…

O Sr. João Dias (PCP): — Exatamente! Muito bem!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — … daqueles que estão a ganhar com os sacrifícios das famílias, com os

sacrifícios dos trabalhadores e da população?

Estão a ganhar e não é pouco. Há aí muito espaço para reduzir o preço da eletricidade.

A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Ah, pois!

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Então e baixar os impostos?!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Para a IL, o que nunca baixa são os lucros; lucros, como já referi, obtidos à

custa dos salários, das pensões, dos reformados e dos trabalhadores.

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Não baixam é os impostos!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Mesmo que não houvesse contribuição audiovisual, a fatura da eletricidade

iria continuar a aumentar.

Veja-se bem o exemplo dos combustíveis: reduziu-se o ISP (imposto sobre os produtos petrolíferos e

energéticos), mas isso não teve uma tradução proporcional na redução dos preços dos combustíveis.

O Sr. João Dias (PCP): — Pois! Como é óbvio!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Aliás, houve até semanas em que houve redução do ISP e os combustíveis

ainda aumentaram. E o que é que aconteceu? Essa redução foi absorvida pelas margens das petrolíferas. Na

altura, alertámos para o problema.

Por isso, acabar com a contribuição audiovisual não significa reduzir a fatura da eletricidade, o que significa

é que esse é o montante que será transferido para as empresas energéticas.

O Sr. João Dias (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Tal qual!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Para aumentar os lucros da EDP, a Iniciativa Liberal está disponível para

acabar com a RTP.

Por outro lado, aliás, como a Iniciativa Liberal já diversas vezes disse, a sua intenção é destruir, de facto, a

RTP, o serviço público de rádio e televisão. Mas a RTP não se resume à RTP 1, também engloba a RTP 2, a

RTP 3, a RTP Memória,…

O Sr. Filipe Melo (CH): — Ah, essa é do PCP, a da memória!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — … a RTP Açores, a RTP Madeira, a RTP Internacional, a Antena 1, a

Antena 2, a Antena 3, a RTP Play e a rádio Zig Zag, com conteúdos dirigidos especificamente para a infância

e para as crianças.

Além de o serviço público de rádio e televisão ser fundamental para a nossa liberdade e democracia, é

também um elemento essencial para a promoção da nossa cultura, da nossa língua, para a coesão territorial,

para a ligação das comunidades portuguesas ao nosso território, com conteúdos concretos, dirigidos a

diversas áreas de interesse e a diversas camadas da nossa população.

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No plano da educação, também há conteúdos específicos que são produzidos. Todos nos recordamos de

que, na altura da pandemia, foi a RTP que fez a transmissão das aulas.

Vozes do PCP: — Muito bem!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Podemos, no entanto, dizer que está tudo bem? Não, não está tudo bem,

mas a solução não passa nem pela privatização, nem pelo desmantelamento da RTP.

As opções de sucessivos governos criaram inúmeros constrangimentos na RTP, como, por exemplo, o fim

das indemnizações compensatórias, que limitaram, em muito, o desenvolvimento de projetos e a produção de

conteúdos diversificados.

A solução passa pelo financiamento público, através do Orçamento do Estado. Passa, também, pelo

investimento na modernização e inovação da RTP. Passa pela valorização dos seus trabalhadores, garantindo

vínculos laborais estáveis, garantido carreiras e remunerações dignas. Esta não é uma questão de mercado.

A Constituição da República Portuguesa determina que o Estado assegura a existência e o funcionamento

de um serviço público de rádio e televisão. É, pois, uma competência do Governo, cabendo ao mesmo garantir

as condições e os meios para assegurar o serviço público de rádio e televisão — a RTP — no nosso País.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem, novamente, a palavra o Sr. Deputado Jorge Galveias, do Grupo Parlamentar do

Chega.

O Sr. Jorge Galveias (CH): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Paula Santos, esqueceu-se de falar na RTP

África!

O Sr. Bruno Nunes (CH): — É racismo!

O Sr. Jorge Galveias (CH): — Cuidado com isso, que pode ser considerado racismo, mas esperemos que

não.

Aplausos do CH.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — É a única coisa que tem para dizer?!

O Sr. Jorge Galveias (CH): — Sr.ª Deputada Fernanda Velez, agradeço a opinião de V. Ex.ª, mas tenho a

referir que, neste momento, estamos a aguardar que seja terminado o Livro Branco do Serviço Público de

Rádio e de Televisão, que nos irá ajudar a discutir as formas de financiamento da RTP. Consideramos que a

publicidade será uma das formas de financiamento da RTP, mas estamos a aguardar, precisamente, que saia

o Livro Branco.

Por outro lado, o facto de o Chega defender a RTP como empresa pública não significa que sejamos a

favor de um Estado social. No entanto, consideramos que a RTP é, de facto, a única forma, a única estação de

televisão que, sendo pública, nos pode levar aos quatro cantos do mundo.

Aplausos do CH.

O Sr. Presidente: — Para encerrar o debate, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, da

Iniciativa Liberal.

O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, este debate, na altura de o encerrar, bem se pode

dizer que precisava de mais um bocadinho de tempo, porque, hoje, estamos aqui sozinhos a defender um

novo modelo de financiamento para o serviço público de televisão, como, em tempos, já estivemos.

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Protestos da Deputada do PCP Paula Santos.

Ó Sr.ª Deputada, se me permitir dizer aquilo que eu acho — e não o que a Sr.ª Deputada acha que eu acho

—, talvez seja preferível!

Aplausos da IL.

Já em tempos estivemos sozinhos a defender uma determinada posição em relação à TAP (Transportes

Aéreos Portugueses) e, hoje, muita gente está connosco. Tenho a certeza de que muita gente estará

connosco na defesa de um novo modelo de financiamento para a TAP.

Comentou-se, aqui, muita coisa que nós não dissemos e, também, algumas coisas que, de facto, mostram

que é preciso muito debate sobre a matéria: nunca defendemos que se acabasse com a RTP, nunca

defendemos que se acabasse com o serviço público da RTP, mas defendemos que se acabasse com a

contribuição para o audiovisual.

Protestos do PCP.

Ao pretender acabar com a contribuição para o audiovisual, o que eu quis dizer, na tribuna, foi que queria

estabelecer uma nova forma de financiamento que fosse mais relacionada com os reais objetivos de serviço

público, de forma a torná-la bastante mais bem-sucedida.

Depois, há coisas que são ditas que merecem resposta. A Sr.ª Deputada do PSD, Fernanda Velez, diz-nos

que queremos acabar com a CAV, porque é uma forma de favorecer a televisão pública. Não, eu até acho que

é uma forma de favorecer a televisão privada, porque, ao isolar e tirar a televisão pública do mercado

publicitário, quem ganha são as televisões privadas, e temos um duopólio de televisões privadas que — esse,

sim! — fere o «pluralismo do pluralismo».

A Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, do Bloco de Esquerda, quer-nos convencer de que a introdução da

linguagem gestual, a cobertura territorial e uma maior contribuição para conteúdos locais —…

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Entre outras coisas…

O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — … e já lá vamos, aos conteúdos locais — valem 200 milhões de

euros por ano.

Mesmo que essa conta funcionasse, lembro a Sr.ª Deputada de que o que é gasto, pela RTP, em

conteúdos locais, em comparação com o que é gasto pelas televisões privadas e pelas próprias plataformas

de streaming, é uma gota de água. A televisão pública não gasta mais do que essas plataformas.

Quanto à inovação tecnológica ou à RTP Play, saúdo o aparecimento da RTP Play, mas qual é a audiência

da RTP Play? Quantos visionamentos tem?

Protestos da Deputada do BE Mariana Mortágua.

Eu digo-lhe, Sr.ª Deputada: ninguém sabe, ninguém sabe, porque isso não conta absolutamente para nada

num futuro mais ou menos risonho da RTP.

Depois, diz-nos que seria um perigo a RTP deixar de depender da contribuição para o audiovisual e passar

a depender do Orçamento, porque isso retiraria a independência da RTP. No entanto, relembro à

Sr.ª Deputada que a Lusa — a agência noticiosa — depende do Orçamento. A Sr.ª Deputada está a querer

dizer que também temos de tratar desse assunto, porque a independência da Lusa está em perigo?

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Vai estando…

O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — O Sr. Deputado Rui Tavares, do Livre, diz-nos que fazemos muito

bem em fazer comparações internacionais. Fazemos muito bem e fazemo-las bem, porque, ao citar o estudo

da European Broadcasting Union, que, se bem se recorda, é uma associação de televisões públicas,

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esqueceu-se de dizer que somos dos países que menos cobram, mas que somos apenas um país entre os 13

países que cobram e que, na União Europeia, há 15 países que não cobram.

Depois, o tal «pluralismo do pluralismo», que é uma expressão interessante, mas, como tantas expressões

interessantes do Sr. Deputado, significa muito pouco. No caso da RTP, o que é o pluralismo? O futebol que

passa na RTP é melhor do que o futebol dos outros? O entretenimento que passa na RTP é mais

entretenimento do que o dos outros? E os concursos que passam na RTP?

Nesse caso, Sr. Deputado, vamos ver qual é o orçamento de produção da RTP para estes conteúdos de

que acabei de falar e, também, para aqueles que foram aqui mencionados como sendo muito importantes,

como se não houvesse conteúdos informativos de divulgação cultural nos outros canais, com muito mais

audiência. Isto, porque as coisas que passam na RTP, sem audiência, não interessam e, sobretudo, não

devem ser suportadas pelos portugueses, de uma forma geral.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Ah, não?! É a audiência que conta?!

O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Depois, esta coisa bafienta de que só o que passa na RTP é que é

visto por todo o mundo, como se em todo o mundo as pessoas estivessem agarradas a televisões para ver

conteúdos televisivos, é uma coisa completamente do século passado.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — É só Big Brother!

O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Depois, para culminar, queria dizer que, na intervenção do

Sr. Deputado Jorge Galveias, do Chega, das coisas mais bafientas que ouvi aqui, no Parlamento, nos últimos

tempos, foi que acha que no interior só se vê RTP, não se vê mais nada, como se os outros canais privados,

inclusive a RTP 3, não estivessem também disponíveis na TDT (televisão digital terrestre).

Por outro lado, também quer alargar as isenções, introduzindo ainda mais Estado nesta questão, sendo o

contribuinte a pagar, uma vez mais, e diz que este tipo de iniciativas, da Iniciativa Liberal, são um ataque à

democracia. Ó Sr. Deputado, ataque à democracia, vindo do Chega, seria quase uma piada.

Protestos do CH.

A Sr.ª Rita Matias (CH): — Estás forte, hoje!

O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Relembro que, há 9 meses — tomem nota! —, o Sr. Deputado

Diogo Pacheco de Amorim…

Protestos do CH.

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Hoje, está a engrossar a voz!

O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Recordam-se o que é que o Sr. Deputado Diogo Pacheco de

Amorim disse, nesta Câmara, sobre a contribuição para o audiovisual?

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Tenha juízo, Sr. Deputado, tenha juízo!

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de terminar.

O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Há 9 meses — esta é a minha parte da RTP Memória,

Sr. Presidente —, o Sr. Deputado Diogo Pacheco de Amorim dizia, nesta Casa, que a contribuição para o

audiovisual era uma forma de pôr a EDP a fazer de «cobrador do fraque» das contribuições do audiovisual e

que a verdadeira intenção era acabar com a CAV, mas não era já, porque estava a massacrar os já

massacrados portugueses com as faturas da eletricidade.

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Protestos do CH.

Portanto, este tipo de incoerência a que o Chega já nos habituou, isso, sim, é o verdadeiro ataque à

democracia!

Aplausos da IL.

Protestos do CH.

O Sr. Presidente: — Vamos agora passar ao ponto 3 da ordem do dia, com a apreciação conjunta, na

generalidade, os Projetos de Lei n.os 376/XV/1.ª (PCP) — Altera o Estatuto do Serviço Nacional de Saúde

(primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 52/2022, de 4 de agosto), 146/XV/1.ª (BE) — Estatuto do Serviço

Nacional de Saúde, 584/XV/1.ª (PAN) — Garante a disponibilização de consultas de psicologia e de nutrição

nos agrupamentos de centros de saúde, alterando o Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, e

591/XV/1.ª (CH) — Procede a alterações ao Estatuto do Serviço Nacional de Saúde a fim de permitir e

assegurar a equidade no direito à saúde dos cidadãos.

Logo que haja condições, o Sr. Deputado João Dias pode começar a subir vagarosamente as escadas e a

usar a sua melhor voz alentejana, para se fazer ouvir.

Protestos do CH.

Espere meio minuto mais.

Pausa.

Muito bem, pode agora começar, Sr. Deputado.

O Sr. João Dias (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apesar de todos os problemas e contrariedades

a que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) está sujeito — e são muitos, não o escondemos! —, é notável a sua

capacidade de resistir e responder aos problemas de saúde da população, uma capacidade de atender e

cuidar que só é possível graças à forte ligação à população, mas graças também, e muito, ao empenho e

dedicação dos seus profissionais de saúde, que daqui saudamos.

O SNS, essa conquista da Revolução de Abril, que, estando inscrita na nossa Constituição, pertence,

acima de tudo, ao povo português, torna ainda mais relevante que o Estatuto do SNS seja um elemento que o

defenda dos ataques de que tem sido alvo, desde a sua criação, e que resolva os seus principais problemas:

que ponha o direito à saúde em primeiro lugar, que rompa com os interesses daqueles que querem fazer da

doença e da saúde um negócio, ou seja, um estatuto que responda e corresponda às necessidades da

população, cujas carências no financiamento, na planificação e na gestão só beneficiam os grupos privados,

que aproveitam para fazer da doença uma fonte de lucro.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!

O Sr. João Dias (PCP): — O novo Estatuto do SNS não veio responder às exigências de recuperação do

Serviço Nacional de Saúde, antes, pelo contrário, é mesmo um retrocesso, face à aprovação da nova Lei de

Bases da Saúde.

A prova disso é que, hoje, quando deveríamos estar a falar da abertura de mais serviços no SNS, na

verdade, do que se fala, é do seu encerramento.

Quando, hoje, se deveria tranquilizar a população com a garantia dos serviços de saúde necessários em

todos os níveis e especialidades, reforçando os seus meios humanos e físicos, bem como a sua capacidade

de resposta, o que se vê é a falta de investimento, é o garrote do Ministério das Finanças e uma preocupante

e crescente transferência de dinheiros públicos, valências e serviços para os grupos económicos privados.

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Nesse sentido, o Grupo Parlamentar do PCP vem propor a alteração ao novo Estatuto do SNS que,

publicado pelo Governo, não corresponde, de forma cabal, ao estatuto que o PCP entende dever existir.

Não se trata de apresentar um Estatuto do SNS que o PCP entende ser necessário. Procuramos, isso, sim,

corrigir as suas orientações mais negativas. Queremos, assim, introduzir as principais medidas que

respondam aos problemas que o SNS enfrenta atualmente. Propomos retirar a abertura para a entrega de

mais serviços ao setor privado, seja nos cuidados de saúde primários ou nos hospitais, retomando,

inclusivamente, as formulações estabelecidas na Lei de Bases da Saúde, que prevê o caráter supletivo e

temporário do recurso aos privados.

Entendemos, ainda, que os prestadores privados não devem integrar o SNS, devendo ser excluída a

possibilidade de concessão de serviços hospitalares, bem como a gestão privada de unidades públicas.

Elimina-se, igualmente, a possibilidade de entrega de unidades de saúde familiar (USF) a entidades

externas ao SNS, previstas no modelo C, tão desejado pelo PSD, pela Iniciativa Liberal e pelo Chega.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Essa é que é essa!

O Sr. João Dias (PCP): — No plano da arquitetura institucional, rejeitamos a criação de uma nova direção

executiva, optando-se pelo reforço das competências da atual ACSS (Administração Central do Sistema de

Saúde), que passa a ser a administração central do Serviço Nacional de Saúde, e não do sistema de saúde,

como ardilosamente foi designada.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!

O Sr. João Dias (PCP): — Clarificamos a permanência das administrações regionais de saúde, as ARS,

cuja manutenção se tornou dúbia com o estatuto aprovado pelo Governo, por se entender, da nossa parte, ser

necessária a existência de um patamar regional desconcentrado, para o qual não há, neste momento,

qualquer alternativa.

O PCP, com este projeto de lei, altera o Estatuto do SNS, porque entende que, com o novo estatuto do

Governo, se mantém a desvalorização dos trabalhadores da saúde, o que constitui um fator de desmobilização

e abandono do SNS que importa inverter. Também perpetua e consolida a regra do contrato individual de

trabalho e o regime do Código do Trabalho, com o que isso significa de desvalorização das carreiras e de

vinculação à Administração Pública, a que acresce a indisponibilidade que o Governo tem manifestado para

melhorar as remunerações dos profissionais da saúde.

Incluiu, no novo estatuto, um regime de dedicação plena que, na verdade, ninguém conhece e, do pouco

que se sabe, distingue-se totalmente do anterior regime de dedicação exclusiva — aliás, igualmente

interrompido pelo Governo PS — e traduzir-se-á na manutenção da acumulação de funções no privado e no

aumento da carga horária. Mantém a possibilidade de prática ilimitada de horas extraordinárias, sem cuidar

dos direitos dos trabalhadores da saúde, nem sequer das condições de qualidade e segurança no exercício

das suas funções.

Sr. Presidente, Srs. Deputados, do que precisamos é de um estatuto que abra a porta a mais médicos,

mais enfermeiros, assistentes técnicos e operacionais, mais psicólogos, farmacêuticos, técnicos de

diagnóstico e terapêutica, terapeutas, dentistas, nutricionistas e tantas outras profissões, para garantir um

trabalho que é cada vez mais multidisciplinar e de equipa.

Precisamos, lutamos, acima de tudo, pelo SNS dos cuidados de saúde primários, com mais médicos e

enfermeiros de família e todos os profissionais indispensáveis ao acompanhamento de todos os que deles

precisam.

Enfim, precisamos de um SNS que valorize e respeite os profissionais e crie condições para a sua fixação.

Isto tem custos? Claro que sim, mas custará sempre menos do que entregar serviços de saúde a grupos

privados. Isso, sim, é muito mais caro para a saúde dos portugueses.

Aplausos do PCP.

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — E em Loures? Como é que está a correr em Loures?

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O Sr. Presidente: — Para apresentar a iniciativa do Bloco de Esquerda, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Ontem, demitiram-se 11 chefias no

hospital de Loures; hoje, ao final da tarde, uma comissão de utentes fará um protesto contra o encerramento

de urgências.

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Oiçam a vossa amiga!…

O Sr. Luís Soares (PS): — Queremos ouvir!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Acontece em Loures e acontece um pouco por todo o País, mas o

Ministro da Saúde veio dizer-nos que tinha a solução: fiquemos tranquilos, não há encerramentos, o que há é

reorganização.

É talvez um pouco difícil, ainda assim, que a população de Loures perceba porque é que quando chega a

uma urgência que está encerrada, afinal, ela não está encerrada, está reorganizada e abre noutro sítio. E,

portanto, o que o Sr. Ministro da Saúde diz às pessoas de Loures é que está tudo bem, só que a urgência

pediátrica que queriam em Loures, afinal, funciona em Lisboa.

Dirá o mesmo, aliás, à população do Barreiro ou do Montijo: «Está tudo bem, não houve encerramentos, há

uma reorganização.» E as pessoas do Barreiro ou do Montijo lá terão uma porta fechada, que não é um

encerramento, e virão a Lisboa para ter acesso às urgências.

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Ouçam a vossa amiga!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Não fosse trágico e isto parecia um sketch do Ricardo Araújo Pereira: «As

urgências não estão encerradas, estão reorganizadas; abrem a porta, não abrem; estão reorganizadas noutro

concelho, noutro sítio qualquer».

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Falou bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — São as urgências de pediatria, são as urgências de obstetrícia, são cada

vez mais serviços.

No dia 8 de março, o Ministro da Saúde estará no Parlamento, a pedido do Bloco de Esquerda, e depois de

tantos adiamentos, e só posso esperar que, no dia 8 de março, Dia Internacional da Mulher, o Ministro da

Saúde venha dizer que há urgências e não que os encerramentos, afinal, são reorganizações, porque isso

vale muito pouco a quem procura o seu hospital.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Mas se os utentes não encontram o seu hospital é preciso dizer que os

trabalhadores da saúde também não encontram nenhuma resposta. Esta tarde, enquanto estávamos aqui

neste Plenário, terminou uma reunião com a FNAM, a Federação Nacional de Médicos, dizendo que «não

percebe o que é que o Ministro Manuel Pizarro quer». E diz a Presidente da FNAM: «Não percebemos o que é

que o Ministro pretende, não há nenhum avanço negocial e, portanto, vai manter-se a greve dos médicos no

dia 8 e no dia 9 de março.»

Até agora, tudo o que o Governo faz sobre o Serviço Nacional de Saúde é empurrar com a barriga —

empurrar com a barriga —, e à medida que vai empurrando o problema com a barriga, o problema fica maior,

cada vez maior! E no centro deste problema está a falta de profissionais no Serviço Nacional de Saúde, a falta

de condições para que os trabalhadores possam fixar-se no Serviço Nacional de Saúde, o que, aliás, o Bloco

de Esquerda diz há anos. E, ano após ano, o Governo fará mais uma promessa, atirará mais um número de

milhões e mais um número de contratações que não correspondem em nada à realidade do Serviço Nacional

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de Saúde. Haverá um dia em que o PS perceba que o País não se governa com anúncios, o País governa-se

com soluções e o Serviço Nacional de Saúde precisa de gente a trabalhar no SNS.

Nunca aconteceu, no tempo da nossa democracia, o que está a acontecer agora: serviços estão a ser

encerrados, não por falta de utentes, mas por falta de profissionais. Isto é um retrocesso como não há

memória!

O projeto do Bloco de Esquerda para o Estatuto do SNS aborda muitas matérias, mas agora quero falar

mesmo da fixação de profissionais, porque esse é o maior problema que temos. E quero ler-vos uma carta,

uma carta de 2018, que foi escrita por alguém a quem o Serviço Nacional de Saúde dizia muito, e foi escrita

dirigindo-se a médicos: «Como todos sabemos» — e estou a citar — «… os meus amigos, como profissionais,

e eu, como utente, o nosso Serviço Nacional de Saúde atravessa um tempo de grandes dificuldades que, se

não forem atalhadas rapidamente, podem levar ao seu colapso.» Continua a carta, mais adiante: «… Sem

carreiras, que pressupõem a entrada por concurso, a formação permanente, a progressão por mérito, um

vencimento adequado, não há Serviço Nacional de Saúde digno deste nome.»

Esta carta foi escrita em 2018, por António Arnaut, e nestes cinco anos, como nos anos anteriores, o

Governo prometeu e quebrou todas, todas as suas promessas.

Na proposta de estatuto do Bloco de Esquerda, que hoje aqui apresento e que irá a votos, queria destacar

aquelas medidas que têm precisamente a ver com isto: a existência de carreiras, de vencimentos dignos, de

capacidade de formação permanente dos médicos e dos trabalhadores do SNS, porque é disso que eles

precisam para ficarem no Serviço Nacional de Saúde. É precisamente essa a ideia, a de que todos os

trabalhadores do SNS hão de ter direito a uma carreira. E ninguém diga que é carreira dizer a um enfermeiro

que tem de trabalhar 100 anos ou a um médico 80 para chegar ao topo da carreira! Isto não é carreira, isto é

gozar com quem trabalha! Carreira é, sim, o direito a fazer-se investigação — a investigação que é a formação

permanente a que os profissionais de saúde têm direito — e é ter condições para trabalhar, com chefias que

possam reconhecer, porque podem ir a concurso ou ser eleitas e ter concursos e programas, e não chefias por

nomeação que ninguém percebe.

É essa a saúde de que o SNS precisa e é por ela que lutamos todos os dias.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para apresentar a iniciativa do PAN, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa

Real.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Numa altura em que somos

confrontados com um grave retrocesso no acesso ao SNS e com o encerramento de urgências hospitalares,

em particular de pediatria e pedopsiquiatria, mais do que nunca é urgente não só falar em saúde, mas dar

respostas ao que o SNS precisa. E esta frase, nomeadamente a necessidade do «mais vale prevenir do que

remediar», ganha especial relevância quando falamos da saúde, pois é evidente que poderíamos prevenir

inúmeras doenças e poupar imensos recursos ao Serviço Nacional de Saúde se apostássemos na priorização

da saúde preventiva, ao invés de escolhermos reiteradamente a medicação aposteriori.

Neste domínio, o Governo tem deixado muito trabalho para trás. Estima-se que um terço das mortes

resultantes de hábitos alimentares inadequados, obesidade ou diabetes seria evitável e sabemos que quase

metade dos adultos portugueses reportaram que os seus níveis de stress pioraram com o início da crise

sanitária. Mas, seja no âmbito do apoio a nível da saúde mental, seja na disponibilização de consultas de

nutrição, aquilo que temos visto é, reiteradamente, uma ausência de recursos humanos e de falta de apoio,

inclusive ao nível da ação social, também nas nossas universidades.

Esta epidemia global que nos atingiu e a falta de recursos humanos associados têm levado ao declínio da

capacidade de resposta do SNS. Em Portugal, optamos por reverter o ditado em matéria de saúde, preferindo

remediar sem prevenir, ao invés de prevenir para não remediar.

Por isso, trazemos hoje a debate um projeto de lei que pretende reverter o paradigma atual. E,

contrariamente ao que uma certa direita liberal nos quer fazer acreditar, não é subfinanciando o Serviço

Nacional de Saúde ou deixando-o entregue às pretensões desreguladas dos privados que os cuidados de

saúde irão melhorar em Portugal, muito pelo contrário. Até porque, recordo, durante a pandemia, nos serviços

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de urgência, tivemos cidadãos a desmaiar à espera do atendimento, precisamente no privado, e quem lhes

valeu foi o Serviço Nacional de Saúde.

Mais: é por isso que propomos também que os cidadãos tenham acesso a consultas de psicologia e de

nutrição nos agrupamentos e centros de saúde, de forma a garantir que todos, sem exceção, têm acesso a

estes serviços de saúde que consideramos essenciais, sem serem prejudicados caso não tenham fundos

monetários para o fazer.

Sr.as e Srs. Deputados, hoje assistimos a um debate completo, com propostas de diversas bancadas, sobre

os problemas do Estatuto do SNS. Foram levantadas questões pertinentes e não nos podemos esquecer do

que aqui nos traz. Acreditamos todos, com as nossas diferenças e ideologias, na luta por um melhor SNS para

todas e para todos.

Por isso mesmo, esperamos que acompanhem a proposta do PAN, porque cuidar da nossa saúde também

tem de começar pela prevenção.

O Sr. Presidente: — Para intervir no debate, em nome do Grupo Parlamentar do PS, tem a palavra a

Sr.ª Deputada Irene Costa.

A Sr.ª Irene Costa (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Todos corroboramos a ideia de que a

criação do SNS foi um extraordinário avanço civilizacional, Sr. Deputado João Dias.

Há 43 anos que ter cuidados de saúde deixou de depender do rendimento de cada um e a doença deixou

de ser uma punição financeira sobre aqueles que são economicamente mais vulneráveis.

A Sr.ª Maria Antónia de Almeida Santos (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Irene Costa (PS): — É este caminho que percorremos há 43 anos e é este caminho que o Partido

Socialista continua e quer melhorar, o caminho de garantir a todos os portugueses cuidados de saúde

eficientes, acessíveis e de qualidade, todos os dias, a todas as horas.

É neste sentido que surge o novo Estatuto do SNS. Ele surge pela necessidade de se adaptar às novas

realidades, de atender aos novos desafios e de continuar a dar respostas efetivas a todos os portugueses,

todos os dias e a todas as horas. Um estatuto adequado à nova Lei de Bases da Saúde, que vem clarificar o

papel e a relação entre os vários atores do sistema de saúde. E, Sr. Deputado, não há qualquer confusão

entre competências atribuídas às diversas estruturas de saúde, designadamente à ACSS, aos SPMS

(Serviços Partilhados do Ministério da Saúde), ao Ministério da Saúde ou à Direção Executiva. Há, sim, uma

estratégia política bem definida, concreta e que é muito simples de entender.

Este novo estatuto surge para promover a autonomia das instituições, numa política de descentralização e

proximidade, com ganhos na autonomia e reforço de lideranças. Surge para definir estratégias, no sentido de

garantir uma maior motivação aos profissionais, no respeito pela sua valorização e justa retribuição,

encontrando-se em negociações o tema da dedicação plena.

Este estatuto surge com o objetivo de reorganizar e rentabilizar o funcionamento dos serviços, acentuando-

se a ideia do funcionamento em rede, em articulação, numa otimização de recursos, eficiência e acréscimo de

valor. Veja-se, a título de exemplo, a nível dos serviços de obstetrícia, a implementação do plano Nascer em

Segurança no SNS, um plano que envolveu diversos serviços, envolveu muitos profissionais e foi aprovado

quando todos os intervenientes estiveram de acordo. Um plano que surge com o objetivo de garantir um

acesso efetivo, de induzir mais segurança e de garantir uma resposta eficiente e que, até à data,

Sr. Deputado, funciona sem falhas.

Este novo Estatuto do SNS apresenta-se como um instrumento de planeamento estratégico que segue

uma orientação política clara e objetiva. No sentido de resolver os principais problemas do SNS, pretende

implementar medidas estruturais que, naturalmente, não serão do agrado de todos e que, por isso mesmo,

podem gerar contestação. Mas, Sr. Deputado, é preciso tempo, tempo para que possam ser apresentados

resultados, tempo para que se possam tirar conclusões. Apenas com seis meses de trabalho, com a criação e

dedicação da Direção Executiva, que é a maior revolução do ponto de vista da gestão do SNS, com o maior

investimento de saúde dos últimos anos, com a tendência do aumento do número de profissionais e com o

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reconhecimento de que é necessária uma intervenção firme a nível da saúde, resta-me perguntar ao

Sr. Deputado se será este o tempo de o Partido Comunista propor alterações ao Estatuto do SNS.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do Grupo Parlamentar do

Chega, para fazer um pedido de esclarecimento à Sr.ª Deputada Irene Costa.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Irene Costa, falar neste debate de um projeto

que tem como objetivo um SNS sem falhas, que este Governo terá apresentado, é, pelo menos, caricato ao

dia em que estamos.

Como sabem, ainda ontem foi anunciado o encerramento das urgências do hospital de Loures, que hoje

está a reencaminhar as crianças para outros hospitais de Lisboa.

Foi isto que os senhores conseguiram com o vosso Estatuto do SNS. Foi isto que os senhores

conseguiram com as vossas mudanças no SNS! Não há fim de semana em que um hospital funcione

integralmente, com as suas várias valências, e agora, aqui mesmo, ao nosso lado, em vários municípios,

urgências encerram, que é precisamente o contrário do que o seu Ministro tinha dito que ia fazer.

Portanto, gostava de saber qual é a sua opinião sobre isto, sobre o Ministro que garantiu que não haveria

encerramentos, que haveria continuidade dos serviços, que haveria a permanência do funcionamento do SNS

e que agora está a encerrar urgências pediátricas.

Era a isto que o PS, aqui, se não fosse uma mera extensão do Governo, devia responder. É que até agora,

Sr.ª Deputada, o famoso Estatuto do SNS, a famosa lógica do SNS, só deu para uma coisa: deu para

assessorias de milhares de euros do novo CEO (chief executive officer) da saúde.

Aplausos do CH.

Foi só isso que deu até agora. Não deu mais nada! Até agora, ainda ninguém percebeu porque é que

temos um novo CEO na saúde, o que é que ele está a melhorar e para que é que precisa de assessores a

360 € por dia.

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Exatamente!

O Sr. André Ventura (CH): — Era isso que devíamos tentar perceber. E a Sr.ª Deputada vir aqui falar do

Estatuto do SNS, do programa que o Governo está a executar e do SNS sem falhas, no dia de hoje, em que

tudo está a falhar, Sr.ª Deputada, é, pelo menos, não conhecer a realidade ou, em relação ao Grupo

Parlamentar do Partido Socialista, uma grande falta de vergonha.

Aplausos do CH.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Irene Costa.

A Sr.ª Irene Costa (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado André Ventura, penso que não ouviu com atenção

aquilo que foi dito. O que se propôs, a nível do Estatuto do SNS, foi uma reorganização dos serviços.

A Sr.ª Maria Antónia de Almeida Santos (PS): — E é o que está a acontecer!

A Sr.ª Irene Costa (PS): — Os serviços não vão fechar, vão ser reorganizados; há apenas um fecho

noturno, repito, noturno e com resposta noutras instituições.

Aplausos do PS.

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O Sr. Bruno Nunes (CH): — Vá a Loures ver o que está a acontecer!

A Sr.ª Irene Costa (PS): — Muito me espanta o Sr. Deputado André Ventura vir com estas questões

quando o vosso partido votou contra o Orçamento do Estado, em que se previa uma verba avultada dedicada

à saúde.

Aplausos do PS.

Protestos do CH.

O Sr. Presidente: — Ia dar a palavra, novamente, ao Sr. Deputado André Ventura, para apresentar a

iniciativa do Chega, mas, antes, Sr. Deputado, e peço desculpa, tenho de fazer só um esclarecimento.

Houve aqui um problema de comunicação. Na prática, veio a perceber-se que a Sr.ª Deputada Irene Costa

estava a formular um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado João Dias.

Entretanto, o Sr. Deputado André Ventura pensava que a Sr.ª Deputada Irene Costa estava a fazer uma

intervenção.

A Mesa, por um momento, não pensava nada.

Risos.

Mas tudo pode ser corrigido.

Se o Sr. Deputado João Dias entende que se sentiu interpelado pela Sr.ª Deputada Irene Costa e deseja

responder ao pedido de esclarecimento, fará esse favor e, depois, o Sr. Deputado André Ventura apresentará

a iniciativa do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, se me permite…

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, é para fazer uma interpelação à Mesa?

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, é apenas para dizer que o Chega dispensa a apresentação

do projeto, fará uma intervenção própria, apresentando o projeto, rebatendo, assim, ao Sr. Deputado João

Dias, para ele responder imediatamente à Sr.ª Deputada.

Pareceu-me, honestamente, que a Sr.ª Deputada Irene Costa estava a fazer uma intervenção e peço

desculpa pelo lapso.

O Sr. Presidente: — Obrigado, Sr. Deputado.

Então, com esta condução participativa dos trabalhos, tem a palavra o Sr. Deputado João Dias.

O Sr. João Dias (PCP): — Sr. Presidente, obrigado por esta oportunidade de ainda poder responder à

interpelação que me foi feita.

Sr.ª Deputada, quero dizer-lhe que se houve coisa que não faltou foi tempo que o PCP deu ao PS. Aliás, só

com muita paciência revolucionária é que conseguimos tolerar todas aquelas dificuldades que tiveram para

poder melhorar o Serviço Nacional de Saúde.

Aplausos do PCP.

Risos do CH, da IL e de Deputados do PSD.

Resta-nos lembrar os ganhos e as conquistas que a população teve com a iniciativa do PCP.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Mas quais?!

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O Sr. João Dias (PCP): — Desde logo, o fim das taxas moderadoras, Sr.ª Deputada, que não foi da

totalidade, porque o PS ainda resistiu a terminar com as taxas moderadoras nas urgências. Mas também

houve, para os profissionais de saúde, o descongelamento das carreiras, nomeadamente a passagem das 40

horas para as 35 horas semanais. Tudo isso com muita resistência, e o PS, com os pés a rojo, não queria!

Risos.

Nós, felizmente, conseguimos, tivemos essa resistência.

Mas também queria dizer à direita, nomeadamente ao Grupo Parlamentar do Chega, que o que os

senhores querem sabemos nós muito bem.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Essa é que é essa!

Protestos do CH.

O Sr. João Dias (PCP): — Não vos chegam já os mais de 6000 milhões de euros que vão diretamente do

orçamento do Serviço Nacional de Saúde para o privado?! Ainda querem mais? Sabemos muito bem o que os

senhores querem!

Aplausos do PCP.

Protestos do CH e contraprotestos do PCP.

O Sr. Presidente: — Agora é altura, talvez, de ouvir uma voz serena e nada melhor do que a Sr.ª Deputada

Joana Cordeiro, da Iniciativa Liberal, para o efeito.

Risos.

A Sr.ª Joana Cordeiro (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos novamente a discutir o

Estatuto do SNS, um mês depois da última discussão. Mas, Srs. Deputados, nunca é demais, porque nunca é

demais dizer que este novo estatuto mais não faz do que mudar a posição dos dados, porque o jogo continua

o mesmo. Isto, porque, como se tem visto, as políticas do Governo e do Partido Socialista não trazem

mudanças. Continuamos a assistir à degradação do SNS e pouco ou nada se faz.

Já o Bloco de Esquerda e o PCP, justiça vos seja feita, com estes projetos de lei, de facto, apresentam

mudanças. Acontece é que a esmagadora maioria delas são diametralmente opostas àquilo que a Iniciativa

Liberal defende para o SNS e para todo o sistema de saúde.

Sim, Srs. Deputados, há mais vida para além do SNS. Existe todo um sistema nacional de saúde que os

senhores ignoram e desprezam, mas sem o qual mais de 3200 milhões de pessoas não teria acesso a

cuidados. E, neste número, estou só a incluir as pessoas que têm seguros privados de saúde. Estas pessoas,

como é evidente, não teriam acesso à saúde, porque o SNS, sozinho, não teria capacidade de resposta para

as acolher.

Srs. Deputados, ao contrário do Bloco de Esquerda e do PCP, a Iniciativa Liberal considera que a

articulação entre os vários setores deve funcionar em rede e numa real complementaridade, porque os setores

privado e social não devem existir apenas para suprir deficiências do setor público. Isto não só não se vê no

novo Estatuto do SNS, que apenas prevê, de uma forma vaga, a articulação entre os vários setores, como

muito menos se vê nos projetos de lei do Bloco de Esquerda e do PCP, que, como é habitual, centralizam tudo

no Estado.

Reforço que a Iniciativa Liberal defende um sistema de saúde onde não predomine esta gestão estatista,

que, obviamente, como todos temos assistido, só tem gerado ineficiências, listas de espera, serviços

encerrados, má gestão de recursos e nenhuma autonomia dos gestores.

O novo Estatuto do SNS não altera este cenário e estes projetos de lei da esquerda ainda o pioram. Vou

dar um exemplo: estes projetos acabam com as PPP (parcerias público-privadas) e, Sr.ª Deputada Catarina

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Martins, é preciso ter muita lata, desculpe-me a expressão, para ter ido ali acima, à tribuna, falar da situação

atual do hospital de Loures, quando o Bloco de Esquerda, ao defender o fim das PPP, foi um dos partidos

responsáveis pela situação que se passa hoje no hospital de Loures.

Aplausos da IL.

O que os Srs. Deputados do Bloco de Esquerda e do PCP querem é só mais Estado, mais Estado, mais

Estado. A Iniciativa Liberal defende uma mudança de paradigma, de uma saúde centrada no Estado e no

prestador para uma saúde centrada nos melhores resultados para os doentes e em mais liberdade de escolha

para as pessoas.

Esta mudança também não se encontra no projeto de lei do Chega, que apenas propõe o reforço dos

profissionais de saúde em zonas geográficas carenciadas, o fim da direção executiva do SNS, o que é menos

mau,…

Protestos do CH.

… mas propõe a reposição das competências das ARS, o que é um erro. É preciso mais!

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Começaste tão bem e agora estás a estragar tudo!

A Sr.ª Joana Cordeiro (IL): — Sobre o projeto de lei do PAN, apenas digo que é obviamente importante

que todas as pessoas tenham acesso a cuidados de saúde mental e de nutrição, no âmbito dos cuidados

primários, mas é importante lembrar que esse acesso pode perfeitamente ser contratualizado com o setor

privado e com o setor social, com profissionais liberais.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a Iniciativa Liberal quer um sistema de saúde que funcione, mais

próximo das pessoas, com mais incentivos para os melhores resultados, com concorrência entre setores e que

mantenha sempre a proteção de quem precisa. Estes requisitos obrigam, necessariamente, a uma

reconfiguração profunda do modelo que existe, pois não se alcançam melhores resultados, neste momento,

com melhorias incrementais, mudanças cosméticas ou remendos. Assim, nada serve alterar este Estatuto do

SNS sem primeiro reformular todo o modelo de saúde que temos em Portugal.

Aplausos da IL.

Entretanto, assumiu a presidência a Vice-Presidente Edite Estrela.

A Sr.ª Presidente: — Boa tarde, Sr.as e Srs. Deputados.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Cristina, do Grupo Parlamentar do PSD.

O Sr. Rui Cristina (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Parlamento discute hoje quatro

iniciativas que se propõem alterar o Estatuto do Serviço Nacional de Saúde em vigor, que foi aprovado há seis

meses pelo Decreto-Lei n.º 52/2022.

Percebemos que o PCP, o Bloco de Esquerda e o PAN recorram a esta forma de contornar a sua limitação,

que é a de não terem Deputados suficientes para requererem a apreciação parlamentar do decreto-lei em

questão. Já o projeto de lei do Chega é menos compreensível, na medida em que esse partido já requereu

oportunamente a apreciação parlamentar do Estatuto do SNS, sendo essa a sede onde cabe discutir neste

momento quaisquer alterações a esse diploma.

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Essa é a desculpa que vocês dão para não apresentarem nada,

é falarem mal dos outros!

O Sr. Rui Cristina (PSD): — Dito isto, deixam muito a desejar as propostas hoje em discussão.

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As do PCP e do Bloco de Esquerda repetem a habitual cassete estatista que está na génese da extrema-

esquerda: mais Estado, só Estado, separação radical entre as funções públicas e privadas, manutenção das

obsoletas e burocráticas administrações regionais de saúde, fim da gestão empresarial dos hospitais públicos

e a sua integração no setor público administrativo.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — E isso é uma grafonola!

O Sr. Rui Cristina (PSD): — Se estas propostas forem aprovadas, irão provocar uma ainda mais rápida e

avassaladora degradação do SNS, cada vez mais abandonado pelos seus profissionais mais capacitados e

cada vez mais reduzido a um serviço de saúde mínimo.

Aplausos do PSD.

Quanto ao projeto do PAN, se é sempre meritório propor-se mais consultas de psicologia e nutrição no

SNS, essa proposta não deixa de saber a poucochinho quando está em causa a vigência do Estatuto do SNS.

Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, o PSD não se revê no Estatuto do SNS do Partido Socialista e muito

menos no atual estado de degradação do SNS, que tem mais de 1,5 milhões de portugueses sem médico de

família; um SNS com centenas de milhares de doentes que estão meses, e mesmo anos, à espera de uma

consulta e de uma cirurgia; um SNS onde os serviços de urgência hospitalares estão em rotura e são

obrigados a fechar portas a crianças e grávidas; um SNS onde muitos hospitais vivem os piores momentos da

sua história, de que é exemplo o Hospital Beatriz Ângelo, que, há um ano, era uma bem-sucedida parceria

público-privada e, agora, com a gestão pública, os doentes queixam-se dos tempos de espera mais longos e

da degradação dos serviços.

Aplausos do PSD.

A demissão em bloco dos 11 chefes das equipas de urgências do hospital de Loures é bem um sinal de

alarme de que algo vai muito mal no SNS, acima de tudo devido à falta de médicos e ao baixo investimento.

Por isso, nós, Partido Social Democrata, apresentamos, em sede própria, isto é, no âmbito da apreciação

parlamentar, diversas propostas de melhoria do atual Estatuto do SNS, as quais ainda não foram votadas, mas

sê-lo-ão este mês.

Risos do Deputado do CH Pedro dos Santos Frazão.

Propomos o aumento da cobertura de médicos de família pelo recurso a médicos dos setores social e

privado; propomos a previsão da possibilidade de retribuição dos profissionais de saúde em função do seu

desempenho clínico e dos ganhos de saúde; propomos…

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Promessas, promessas!…

O Sr. Rui Cristina (PSD): — … o financiamento dos estabelecimentos e serviços do SNS através de

mecanismos de contratualização plurianual de objetivos; propomos que o SNS possa contratualizar com os

setores social e privado ou grupos profissionais a realização de prestações de saúde, desde que sejam

vantajosas para o Estado e para as pessoas; propomos a passagem das USF para modelo B, bem como a

regulamentação das USF de modelo C; propomos a dinamização de sistemas locais de saúde; e propomos,

finalmente, a extinção das administrações regionais de saúde.

Aplausos do PSD.

Veremos ainda este mês se o PS diaboliza estas nossas propostas para salvar o SNS ou se prefere

continuar o único responsável pelo colapso para que caminham os serviços públicos de saúde.

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O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Mas quais propostas?!

O Sr. Rui Cristina (PSD): — Lembro que ainda ontem o Presidente da Câmara Municipal de Loures, um

socialista, afirmou que os resultados da atividade assistencial do hospital de Loures eram satisfatórios com a

gestão anterior e agora estão muito aquém do desejado. E até o próprio antigo ministro socialista Campos

Fernandes acusa o Governo do PS de ser ideológico, ao ter acabado com as PPP no Hospital Beatriz Ângelo,

em Loures.

O PSD continuará, como sempre, na defesa intransigente das pessoas, do Serviço Nacional de Saúde,

recusando a demagogia dos partidos da extrema-esquerda e a irresponsabilidade do Governo do PS.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Maria Antónia de Almeida Santos (PS): — Quais são as alternativas do PSD propriamente ditas?

Não percebi!

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura,

do Grupo Parlamentar do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente: Assistimos, agora, a um belo momento aqui no Parlamento

em que a Iniciativa Liberal diz que «é preciso mais, temos de fazer mais, isto que o Chega aqui traz não

chega, a extrema-esquerda também não chega, é preciso mais!». E o Sr. Deputado Rui Cristina vai até mais

longe e diz: «Nós propomos isto, aquilo e aqueloutro, e onde é que o PS está quando chegar o determinado

momento?» E eis que chegamos ao dia do debate e olhamos para o sistema a ver se encontramos as

propostas da Iniciativa Liberal e do PSD e não há propostas da Iniciativa Liberal e do PSD.

Vozes do CH: — Não há, não há!

O Sr. André Ventura (CH): — As propostas não estão aqui hoje! Portanto, vamos propor, vamos fazer,

vamos pensar, mas, quando chega o dia do debate, vão à tribuna dizer que vão propor mas não propõem

nada!

O Sr. Rui Cristina (PSD): — É em sede própria!

O Sr. André Ventura (CH): — Não, Srs. Deputados, nós, ao contrário de vocês, arriscamos e trazemos

propostas. É assim que é em democracia: arriscamos e trazemos!

Aplausos do CH.

O Sr. Deputado João Dias disse: «Sabemos bem o que querem!» Sabemos bem? Não, Sr. Deputado, nós

é que sabemos bem o que é que vocês querem. Querem ser os apêndices de segunda do Partido Socialista e,

como não conseguem, tentam fazer uns números para os vossos distritos.

A Sr.ª Maria Antónia de Almeida Santos (PS): — Acha?!

O Sr. André Ventura (CH): — O Sr. Deputado, que veio aqui hoje dizer o que disse, sabe que em Beja, no

hospital de Beja, ainda no ano passado, em vários momentos do ano, o próprio serviço de urgência pediátrica

esteve encerrado? O que é que tem a dizer sobre isso?

O Sr. João Dias (PCP): — Nem sabe onde é que ele fica!

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O Sr. André Ventura (CH): — Sabe o que ainda ontem aconteceu em Évora? Évora diz-lhe alguma coisa,

Sr. Deputado? Sabe quem é que tem responsabilidades em Évora, Sr. Deputado? Ainda ontem, morreu um

utente que ficou sem atendimento.

«Sabe bem o que é que nós queremos»?! Olhe, há uma coisa que nós não queremos: é aprovar seis

orçamentos socialistas que destruíram a saúde. É isso que nós não queremos.

Aplausos do CH.

Protestos do PCP.

Estou a ouvir dizer que só aprovaram quatro! Ah, só aprovaram quatro!…

Nem queremos, como os senhores quiseram, o fim das PPP em alguns hospitais, que, agora, estão a

pagar cara essa vossa escolha, porque essa nem sequer era a escolha do Partido Socialista. Foram vocês

que impuseram essa escolha ao Partido Socialista.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Exatamente!

O Sr. André Ventura (CH): — Sabem que mais, Srs. Deputados? Nem sequer é só o Partido Socialista o

responsável pela destruição do que está a acontecer na saúde em Beja, em Évora, em Vila Franca e em

Braga. Os senhores são os principais responsáveis da destruição da saúde em Portugal. Os principais!

Aplausos do CH.

E esta é a diferença: há a extrema-esquerda que quer destruir a saúde; há a direita que fala, mas não faz;

e há a outra que está aqui a propor e a dar a cara!

Aplausos do CH.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Tavares, do

Livre.

Pausa.

Vejo que o Sr. Deputado Luís Soares se preparava para intervir, mas não é o Sr. Deputado ainda, é o

Sr. Deputado Rui Tavares, do Livre. Hoje está tudo muito distraído e divertido.

Risos.

Tem a palavra, Sr. Deputado Rui Tavares.

O Sr. Rui Tavares (L): — Sr.ª Presidente: Estava um bocado espantado com a versão do «agora é que é»

de um partido que diz que os outros não apresentam propostas, mas já falou três vezes e também não

apresentou uma única proposta.

Protestos do CH.

Mas adiante, adiante, adiante que o tempo é pouco.

Protestos do CH.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Srs. Deputados do Chega, façam favor de criar condições para que

orador possa falar.

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Os senhores, parece, têm assim uma reação especial em relação ao Sr. Deputado Rui Tavares.

Protestos do CH.

Não ouço bem.

O Sr. André Ventura (CH): — Se não ouve bem, não pode ser Presidente!

O Sr. Pedro Pinto (CH): — E os outros? Somos só nós?!

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Pois, não se consegue ouvir porque os senhores fazem tanto barulho

que não se consegue ouvir.

Sr. Deputado Rui Tavares, tem a palavra.

O Sr. Rui Tavares (L): — Sr.ª Presidente, adiante que o tempo é pouco e os desafios do SNS são bem

grandes.

Um estudo lançado esta segunda-feira pela Universidade Nova, pelos Professores Pedro Pita Barros e

Eduardo Costa, diz-nos que vai haver uma vaga de 5000 aposentações no SNS até 2030 e que mesmo os

aumentos de profissionais que tem havido nos últimos anos não servem para reforçar o SNS, servem para

manter, e mal, o nível de serviço.

Além disso, temos o problema não só das remunerações e de novas contratações mas também da fixação

do tempo de serviço, porque os profissionais de saúde têm filhos e filhas, querem equilibrar o trabalho com a

sua vida familiar e está a ser insustentável manter o SNS assim.

Há, portanto, muito para reinventar. É preciso acabar com a suborçamentação crónica do SNS, é preciso,

como diz o projeto do PAN, estender o SNS a novas valências, nutricionismo, saúde mental, é preciso, como

diz o projeto do Bloco, garantir que as unidades de saúde familiar se mantêm no seu espírito inicial e, portanto,

serviço público, e é preciso reforçar o SNS, como diz o projeto do PCP, que nos convoca a este debate.

Merecem estes projetos passar a uma discussão na especialidade, porque todo o tempo é pouco para,

nesta década, termos um SNS que garanta o serviço de qualidade que presta aos portugueses, que tem

prestado e de que os portugueses precisam.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim

Figueiredo, do Grupo Parlamentar da Iniciativa Liberal.

O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, para os espectadores que

estão nas galerias e para os espectadores que estão a ver-nos na televisão e que só chegaram agora, vou

fazer um breve resumo deste debate: o Estatuto do SNS foi publicado a 4 de agosto, um mês depois foi

nomeado um novo ministro e 15 dias depois foi nomeado o diretor executivo do SNS.

O que é que tivemos nos cinco meses em que foi nomeado o diretor executivo? Tivemos a óbvia confusão

de competências que toda a gente, a começar por nós, avisou que ia haver. Quando se perguntava sobre a

dificuldade de acesso à IVG (interrupção voluntária da gravidez), ou sobre o plano de encerramento de

maternidades, ou sobre a solução para as demissões em bloco nos serviços de urgência pediátrica, e outros,

em vários hospitais, o ministro e o diretor executivo tinham ou conhecimento diferente ou opiniões diferentes.

O que não tivemos nestes cinco meses foi, certamente, melhorias no SNS.

A história do Estatuto continua. Ele já foi objeto de uma apreciação parlamentar e agora volta aqui a debate

com quatro — nada menos que quatro — propostas de alteração. É uma vida rica a deste Estatuto, mas, do

nosso ponto de vista, é vã, porque fazer remendos numa coisa que não tem cura não vai adiantar

absolutamente nada.

Aliás, a este propósito, não posso deixar de dizer que duas das propostas que aqui hoje se discutem, uma

do Bloco de Esquerda e outra do PCP, pretendem acabar com qualquer hipótese de se fazer PPP para

sempre, ou seja, não é só não fazer novas PPP, como estava no memorando da geringonça.

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O Sr. João Dias (PCP): — Exatamente! Claramente!

O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Desafio os senhores do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista

a encontrarem um utente, um autarca, uma pessoa que observe as realidades antes e depois das PPP e que

venha dizer que as PPP não deviam voltar.

Aplausos da IL.

Ficou claro, mais uma vez, que este problema da saúde em Portugal não vai lá com remendos, não vai lá

com festinhas ao Estatuto do SNS sem uma reforma estrutural.

Convido os Srs. Deputados a acompanharem-me numa reflexão e a dizerem-me se concordam com esta

forma de olhar para o problema. Em Portugal, há três tipos de utentes dos cuidados de saúde. Há os que não

têm alternativa e vão ao SNS — e esses estão genericamente infelizes com tudo, com o acesso, com o tempo

de espera, com o cuidado e atendimento. Há os que têm seguros de saúde, das empresas ou privados — e

esses estão um bocadinho menos infelizes, mas não gostam da cobertura territorial ou da cobertura de

patologia ou das exigências de condições pré-existentes. E há os utentes da ADSE, que não têm tantas

dificuldades de cobertura, nem de condições pré-existentes, mas têm uns aumentos de preços, volta e meia,

assim meio injustificados.

Ninguém está completamente feliz. Mas vamos imaginar que pegamos nestes três grupos de pessoas e

que conseguimos que nenhum tenha as razões de queixa que tem hoje: o acesso passa a ser universal, sem

depender de pré-condições, sem aumento de preços bruscos, com atendimento célere e de qualidade do

ponto de vista da terapia.

O Sr. Luís Soares (PS): — Isso é na Roménia?!

O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Esta vai ser a proposta de lei de bases da saúde que a Iniciativa

Liberal vai propor neste Parlamento. Sim, Srs. Deputados do Chega, nós não andamos atrás dos

agendamentos dos outros, nós faremos o nosso agendamento quando estivermos prontos.

Protestos do CH.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Vou concluir com esta fantástica frase que inventei hoje de manhã,

Sr.ª Presidente: a esquerda gosta muito de dizer que nós defendemos os privados da saúde, e a esquerda

está quase certa — nós defendemos os que são privados de cuidados de saúde como deve ser!

Aplausos da IL.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Agora, sim, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Luís

Soares, do Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. Luís Soares (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Distam do dia de hoje cerca de oito

meses após a aprovação do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde. Convirá relembrar que a aprovação

desse instrumento foi precedida de uma longa discussão pública, em que os partidos puderam participar, e

que foi também precedida de um longo debate e aprovação da Lei de Bases da Saúde, que, desde a sua

primeira aprovação na década de 90, apenas teve uma grande reforma, precisamente a reforma de há oito

meses.

Por isso, Sr.as e Srs. Deputados, permitam-me concluir a ideia, antes mesmo de começar, de que o debate

desta tarde, como ficou visto, não foi convocado para escrutinar o Governo ou para ajudar a melhorar o

Serviço Nacional de Saúde.

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O Sr. Filipe Melo (CH): — Não está cá o Governo!

O Sr. Luís Soares (PS): — Pelo contrário, o debate foi convocado para adensar o discurso simplista de

alguns, que dizem que se vive o caos no SNS, que o Governo e o PS demonstram cegueira ideológica, ora

contra, ora a favor dos privados, consoante a crítica nos chega da direita ou da esquerda, amplificando e

alimentando algum circuito noticioso.

Aplausos do PS.

Ora, Sr.as e Srs. Deputados, é claro que há problemas, não os ignoramos. Aliás, continuaremos, hoje, a

falar deles, mas continuaremos, sobretudo, a agir para os resolver.

Agora, sejamos claros: generalizar a ideia de que o Serviço Nacional de Saúde não funciona, que o que se

vive é um caos, não é só um exagero, é algo que os portugueses sabem que não corresponde à realidade.

Não confundamos a árvore com a floresta. Diariamente, são cerca de 150 000 profissionais, médicos,

enfermeiros, técnicos superiores, assistentes técnicos, assistentes operacionais, que asseguram a prestação

de cuidados de saúde em Portugal. Há milhares de atos médicos, consultas, exames, rastreios, episódios de

urgências que, diariamente, são praticados nos estabelecimentos públicos de saúde e que representam, sem

custos para os cidadãos, 70 % dos cuidados de saúde prestados em Portugal.

A Sr.ª Maria Antónia de Almeida Santos (PS): — Muito bem!

O Sr. Luís Soares (PS): — Há desafios? Claro que há desafios. Desafios que, aliás, não são exclusivos do

nosso sistema de saúde português, do SNS, porque os problemas que vivemos em Portugal são problemas

que encontramos na generalidade dos sistemas de saúde europeus como os conhecemos.

Basta olhar para o que se passa no sistema de saúde inglês, ou na pressão que se verifica nas urgências

em França, ou na escassez de recursos do sistema alemão. É nesses problemas comuns que estamos

concentrados e em que não estamos apenas hoje concentrados, Sr.as e Srs. Deputados. Não acordámos para

eles hoje.

Senão, vejamos: os últimos sete anos foram um exemplo da valorização do capital humano. A esquerda

não se deve arrepender, deve orgulhar-se do que fizemos em conjunto — a reposição das 35 horas, a

reposição dos cortes dos salários, a reposição e valorização do pagamento das horas extraordinárias, os

aumentos salariais, a regulação das profissões de saúde.

Aplausos do PS.

O investimento no SNS, Sr.as e Srs. Deputados, mais do que duplicou. A despesa corrente aumentou 60 %.

O Serviço Nacional de Saúde contratou mais de 25 000 trabalhadores, Sr.as e Srs. Deputados. Não nos

devemos arrepender disso.

Contudo, não ignoramos os problemas. Sabemos que temos profissionais cansados, que o recurso

excessivo às horas extraordinárias tem de ser revisto, que o recurso excessivo à adaptação de serviços tem

de ser revisto. Ouvimos, aliás, recentemente o testemunho emocionado de uma médica explicando que as

profissões de saúde são cada vez menos atrativas. Mas também explicou que tal não se prende apenas com

as questões remuneratórias, que a exigência do ponto de vista da conciliação com a vida familiar, com a

dureza do trabalho noturno, do trabalho por turnos, da rigidez na relação com o Estado cria dificuldades aos

profissionais.

Respondemos com confiança, respondemos com o que estamos a fazer, com o Estatuto do Serviço

Nacional de Saúde, com um instrumento de dedicação plena que permitirá valorizar quem quer vestir

plenamente a camisola do SNS, de forma voluntária, de forma progressiva, envolvendo os profissionais e os

seus representantes.

Aplausos do PS.

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Um segundo problema é o da organização e planeamento. E, mais uma vez, respondemos com o Estatuto.

Sim, o Estatuto aprovado há apenas oito meses. Uma nova orgânica, um novo diretor executivo, responsável

pela execução de políticas em saúde, um Estatuto que dá mais autonomia às organizações na contratação de

recursos humanos, na gestão quotidiana, mas, sobretudo, uma orgânica que privilegia a integração e

articulação de todos os níveis de cuidado, participada por agentes locais e por cidadãos.

O terceiro problema é o do aumento da despesa pública. É verdade, a despesa pública em saúde, Sr.as e

Srs. Deputados, tem de continuar a aumentar. É certo que fizemos um caminho de 1 % do PIB (produto

interno bruto) em 1970, antes da criação do SNS, para 10 % do produto interno bruto que se prevê de

investimentos, aproximando-nos da União Europeia. Fizemo-lo com o PS, continuaremos a fazê-lo com o PS.

Mas é também certo que hoje vivemos mais tempo, que vivemos com mais carga de doença, que vivemos

com novas doenças crónicas que exigem terapêutica, tecnologia e mais investimento.

Concluindo, Sr.as e Srs. Deputados, todas estas dimensões, as dimensões destes problemas são

complexas e ajudam-nos a compreender que o momento em que vivemos, como referi, não se compadece

com um discurso à esquerda, não toda, e sobretudo à direita, simplista, do caos, da cegueira ideológica, da

amplificação das notícias dos jornais ou das aberturas de noticiários.

Como explicou recentemente o novo diretor executivo, urgem transformações, transformações rápidas que

deem segurança, confiança aos cidadãos, para assegurar, sobretudo, a articulação entre as estruturas

assistenciais, para planear a 10 anos as necessidades de recursos humanos, para olhar para as carreiras da

saúde na perspetiva da nova geração de profissionais.

Mas passaram oito meses, Sr.as e Srs. Deputados. O novo Estatuto do Serviço Nacional de Saúde foi

aprovado há escassos oito meses e dá-nos os instrumentos necessários. Por isso, Sr.as e Srs. Deputados,

deixem-nos trabalhar.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Rui Cristina,

a quem dou a palavra.

O Sr. Rui Cristina (PSD): — Muito obrigado, Sr.ª Presidente.

Acabei de ouvir a intervenção do Sr. Deputado Luís Soares, que disse que houve um grande investimento

no SNS. Então, vamos lá fazer contas, Sr. Deputado: de 2016 a 2022, tirando o ano 2021, que foi um ano de

covid-19, sabe qual foi a taxa de execução a nível de investimento deste Governo? Foi de 50 %, Sr. Deputado!

Foi de 50 %!

Há sempre grandes parangonas e grandes anúncios por parte do Sr. Primeiro-Ministro e do Sr. Ministro da

Saúde a dizerem que este vai ser o maior investimento de sempre, como aconteceu em 2022, que eram 509

milhões de euros, se não estou em erro. Sabe qual foi a taxa de execução em 2022? Foi de 45 %! Esta é a

verdadeira realidade daquilo que o Partido Socialista está sempre a apregoar.

Aplausos do PSD.

O Chega disse, há pouco, através do Sr. Deputado André Ventura, que o PSD não tem propostas. Tem

propostas, sim senhora, e foram apresentadas na Comissão da Saúde — aliás, entendo a gafe do

Sr. Deputado, já que não faz parte da mesma.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Soares.

O Sr. Luís Soares (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, fico extremamente satisfeito que o PSD

use a intervenção do PS para responder ao Chega. Nós nos vossos arrufos não nos metemos.

Aplausos do PS.

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Vozes do PSD e do CH: — Oh!…

O Sr. Luís Soares (PS): — Quanto à questão de fundo, Sr.as e Srs. Deputados, o PSD tem toda a

legitimidade para neste ou noutros debates intervir com um contributo sério para aquilo que entende que é o

melhor caminho para o Serviço Nacional de Saúde, mas há, se me permitem, um conselho que vos deixo:

antes de pensarem no futuro, devem fazer um ato de contrição quanto àquele que foi o vosso contributo no

passado. Saldo? Os profissionais de saúde, os cidadãos portugueses conhecem-no bem.

Nessa medida, Sr. Deputado Rui Cristina, creio que ninguém quer recordar…

O Sr. Rui Cristina (PSD): — A vossa taxa de execução de 40 %!

O Sr. Luís Soares (PS): — … o período entre 2011 e 2015, em que os cortes nos salários, os cortes nas

horas extraordinárias, os cortes no investimento do Serviço Nacional de Saúde foram o timbre e a marca que

nos traz até hoje a imagem do PSD.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Frazão, do

Grupo Parlamentar do Chega.

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Sr.ª Presidente. Srs. Deputados: Ouvimos com muita atenção, na

nossa bancada, as intervenções do Sr. Deputado João Dias, do PCP, e da Sr.ª Deputada Catarina Martins, do

BE, que fizeram um diagnóstico sobre o SNS, esquecendo que apoiaram durante vários anos a Sr.ª Ministra

Marta Temido, que ouvia a Internacional quando estava nervosa e que foi a responsável pela aprovação, com

a vossa anuência, deste novo Estatuto do SNS.

Aliás, também com a vossa anuência foi apresentada esta grande figura do CEO da saúde. Mas este

Estatuto do SNS e o CEO da saúde são como um autocarro desgovernado que bate contra o muro da

realidade. Sabe porquê, Sr. Deputado? Nós andamos no terreno e eu quero dizer-lhe que hoje estive numa

manifestação de agricultores — a quem envio um grande abraço — e eles próprios sabem aquilo que se está

a passar em Portugal.

Vejam o que eles dizem na rua: «Não queremos ser a Venezuela.» É isto! E é isto que as vossas propostas

de alteração querem ser, ou seja, são propostas estatizantes, que querem agrupar toda a saúde nas mãos do

Estado, o qual, sabemos muito bem, é um mau gestor e vai trazer problemas, aliás, já está a trazer problemas

à saúde.

A frase que vimos hoje na grande faixa usada na manifestação era a seguinte: «Contra a incompetência

que nos governa!» De facto, a incompetência que nos governa também se expressa neste novo CEO da

saúde, porque este novo CEO da saúde, que ganha 11 000 €/mês e gasta 10 milhões de euros por ano no seu

gabinete, a única coisa que faz é encerrar serviços.

A Sr.ª Maria Antónia de Almeida Santos (PS): — O que é que já encerrou?

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Sim, Srs. Deputados, encerrar serviços.

Nós tivemos na Comissão de Saúde o Sr. Presidente do Sindicato Independente dos Médicos a dizer-nos

que reorganizar é apenas um eufemismo para encerrar.

A Sr.ª Maria Antónia de Almeida Santos (PS): — Mas o que é que já encerrou?

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Portanto, foi isto que foi dito. Srs. Deputados, sejam verdadeiros.

Vejamos bem com casos concretos o estado a que isto chegou: depois de uma geringonça de seis anos,

de uma maioria absoluta e de dois ministros da saúde, ontem, 11 médicos, chefes de serviço, demitiram-se.

Estas notícias até já nem abrem os telejornais de tão corriqueiras que são.

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O hospital em causa, que já foi uma EPE (entidade pública empresarial) diz, pela voz dos seus próprios

médicos, que outrora era um hospital modelo e revolucionário na abordagem de gestão de doentes e que

agora vive os piores momentos da sua história.

Esta é apenas a ponta do iceberg de uma situação que existe por todo o País, já que no Hospital de Dona

Estefânia, o hospital de fim de linha para crianças, estão fechados os serviços de pedopsiquiatria. E vejam

bem: a intenção destes serviços é controlar as crianças com medicamentos ou até mesmo pela força, até

existirem pedopsiquiatras disponíveis.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Uma vergonha!

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — No hospital de Évora, morreu um homem com 82 anos nas

urgências, que já tinha sido triado. Morreu sem ninguém perceber. Quando foram tentar mudá-lo da maca para

a cadeira é que perceberam que estava morto. Isto foi feito à frente de outros pacientes que estavam à espera,

uma espera de 24 horas nas urgências.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Uma vergonha!

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — No Algarve, um médico do INEM (Instituto Nacional de

Emergência Médica) teve de transportar um doente cardíaco no seu próprio carro, conduzido pela mulher,

porque não existiam ambulâncias disponíveis.

Em Setúbal, um pai viu a filha morrer nos seus braços, depois de uma hora e meia à espera de uma

ambulância e nove telefonemas para o INEM, onde lhe mentiram dizendo que a ambulância já estava a

caminho e foi por isso que ele não se meteu no próprio carro e foi para o hospital.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

Enquanto vemos esta incompetência de norte a sul do País, a Comissão de Saúde deste Parlamento, por

causa dos Deputados do PS, demora mais de seis meses para aprovar uma visita parlamentar ao Algarve e

agenda mais de meia dúzia de audiências por causa do acesso ao aborto.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Muito obrigada, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

Isto são experimentalismos na saúde, com muita prosápia e risota do Sr. Ministro, mas o que se passa

neste País é grave demais para continuar.

Aplausos do CH.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme

Almeida, do Grupo Parlamentar do PSD.

O Sr. Guilherme Almeida (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os projetos de lei que estão

em discussão e que visam alterar o atual Estatuto do Serviço Nacional de Saúde constituem uma oportunidade

perdida.

A verdade é que este Estatuto evidencia a incapacidade do Governo em suster a degradação do SNS e

aumentar a capacidade de resposta e a atratividade do serviço público de saúde.

Por parte dos partidos de extrema-esquerda, mais uma vez, ouvimos um bafiento estatismo que tão maus

resultados têm dado ao nosso País.

O mais recente exemplo da degradação que se vive no SNS é no hospital de Loures, onde o serviço de

urgência pediátrica passou a fechar à noite e durante os fins de semana por falta de médicos de pediatr ia e

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onde os chefes de serviço de urgência se demitiram em bloco por falta de condições mínimas para prestar

cuidados de saúde de qualidade.

O que disseram estes profissionais e os utentes deveria merecer uma atenta reflexão deste Parlamento.

O atual modelo do SNS sofre de falta de médicos de família, de falta de especialistas, tendo equipas

médicas a trabalhar no limite há demasiado tempo, carreiras pouco atrativas, pouco investimento em formação

e deficientes condições de trabalho.

O SNS precisa de uma nova visão reformista em que o preconceito ideológico dê lugar à qualidade de

serviço, à eficiência de gestão, à autonomia na contratação, à valorização das carreiras, ao reconhecimento

dos profissionais e, acima de tudo, aos direitos e aos interesses dos utentes do serviço de saúde.

Aplausos do PSD.

O PSD entende e defende o sistema de saúde como um sistema aberto, onde o prestador público, sendo o

pilar do sistema, deve coabitar com outros prestadores privados e sociais, sem qualquer reserva ideológica,

que não seja a busca da eficiência, a melhoria da qualidade e a garantia do acesso equitativo e universal.

As propostas que o Grupo Parlamentar do PSD apresentou no âmbito da apreciação parlamentar do

Decreto-Lei n.º 52/2022, de 4 de agosto, vão nesse sentido e abrem o caminho a essa ambição reformista

social-democrata. Veremos com atenção como serão votadas pela atual maioria socialista. O tempo urge e o

SNS não pode esperar muito mais.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina

Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Quando se fala do SNS era bom que

falássemos dos problemas e das soluções.

Vejam bem: não há nada mais parecido com uma urgência encerrada de um hospital com gestão pública

do que uma urgência encerrada de uma PPP. E Loures encerrou como PPP, como encerra agora, porque não

tem médicos.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É verdade!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Da mesma forma, não vale a pena dizer que isto das carreiras até foi

muito bom, porque até estão em vigor as 35 horas. Os médicos não tiveram antes as 35 horas, nem têm agora

as 35 horas. Eu não sei se os Deputados do Partido Socialista deram conta, mas falar das 35 horas para os

médicos é absurdo! O contrato de trabalho dos médicos nunca foi de 35 horas, nem antes nem depois,

portanto também não é esse o problema.

O problema é que os salários são vergonhosamente baixos. O problema é que não há condições de

trabalho. O problema é que nas negociações, agora, o Governo tudo o que propõem é baixar o preço das

horas extraordinárias e ainda quer pôr médicos mais velhos obrigados a fazer urgências, o que quer dizer que

vai haver mais médicos a sair do Serviço Nacional de Saúde.

Há uma história que serve para todos os serviços públicos, e o Partido Socialista é um retrato dessa

história política desastrosa das democracias europeias: põe-se um serviço público a funcionar mal, para que a

população não confie e diz-se que a única solução é privatizar. Privatiza-se e fica pior para todo o País. É isso

que o Partido Socialista está a fazer com o SNS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Digo-lhe uma coisa, Sr. Deputado Luís Soares, e com isto concluo: ter

acabado a sua intervenção com um cavaquista «deixem-nos trabalhar» é ilustrador desta posição.

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Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para encerrar este debate, tem a palavra o Sr. Deputado João Dias.

O Sr. João Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Este debate, que mais não fosse, serviu para

deixar bem claras as posições que cada um de nós tem relativamente ao Serviço Nacional de Saúde e vem

confirmar a orientação política do PS quando afirma o seu orgulho neste Estatuto do Serviço Nacional de

Saúde mas não resolve os problemas do SNS.

Apesar de chorarem lágrimas de crocodilo em relação ao SNS, a verdade é que, de todo o elenco de

propostas que aqui trazem, ao observarmos e avaliarmos o seu alcance e os seus efeitos, claramente, vemos

que a sua opção é pelo fim do Serviço Nacional de Saúde tal como o concebemos.

Os Srs. Deputados do Chega dizem constantemente que o PCP esteve do lado do PS durante seis anos.

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — É mentira?!

O Sr. João Dias (PCP): — Srs. Deputados, foram quatro anos de troica, dos quais os senhores têm

saudades. E é a esse tempo que os senhores querem voltar, pois nessa altura militavam no PSD e no CDS.

Os senhores têm saudades desse tempo.

Protestos do CH.

Pois tenho a certeza absoluta de que a população portuguesa não tem saudades nenhumas desses

tempos, Srs. Deputados.

Aquilo que se passa no Hospital Beatriz Ângelo, de facto, é bastante preocupante. É inadmissível que,

hoje, a falta de investimento, que é recusada àquele hospital e a tantas outras estruturas públicas, conduza a

estas dificuldades com que estão confrontados.

De facto, a carência de profissionais de saúde é mais sentida numas estruturas do que noutras, numas

especialidades do que noutras.

Mas será justo comparar a gestão de PPP com gestão pública? Não é justo, porque estamos a comparar

coisas completamente diferentes.

Protestos dos Deputados do PS Luís Soares e Maria Antónia de Almeida Santos.

Estamos a falar de uma gestão pública com completa falta de autonomia, que não pode contratar os

profissionais de saúde de que precisa.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Exatamente!

O Sr. João Dias (PCP): — Estamos a falar, Srs. Deputados, de dificuldades que são criadas. Vejam bem:

aquando da gestão privada do Grupo Luz Saúde, que a tinha e não a quis — e bem que o Governo a quis

entregar —, os anestesistas foram embora. Sabem quantos anestesistas temos hoje no Hospital Beatriz

Ângelo, em Loures? Quinze! Sabem quantos fazem falta? Trinta! Assim podemos ver as dificuldades que

existem.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Ora bem!

Vozes do PSD: — Porque é que saíram?

O Sr. João Dias (PCP): — Querem comparar aquilo que é incomparável?

As PPP limitam-se a cumprir o que têm nos contratos. Quando os doentes têm situações complexas que

não estão nos contratos, sabem o que é que fazem?

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A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Mandam-nos embora!

O Sr. João Dias (PCP): — O Sr. Deputado João Cotrim Figueiredo disse que não temos exemplos, mas o

que mais há neste País são exemplos.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. João Dias (PCP): — Concluo, Sr.ª Presidente.

O que mais há são exemplos de utentes que, estando nessas situações complexas, foram enviados para

outros hospitais. Foi o que aconteceu em Braga, em Vila Franca e também no Hospital Beatriz Ângelo, em

Loures.

Aplausos do PCP.

Protestos do CH e contraprotestos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Srs. Deputados, façam o favor de guardar silêncio.

Vamos passar ao ponto 4 da ordem do dia, que consta do debate, na generalidade, dos Projetos de Lei

n.os 458/XV/1.ª (BE) — Altera o Regulamento das Custas Processuais (alteração ao Decreto-Lei n.º 34/2008,

de 26 de fevereiro, que aprova o Regulamento das Custas Processuais), 486/XV/1.ª (CH) — Altera o

Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro, no sentido

de isentar de custas os funcionários públicos, em processo penal por ofensa sofrida no exercício das suas

funções, ou por causa delas, 578/XV/1.ª (PCP) — Cria a unidade de missão para a revisão do regime das

custas judiciais, 579/XV/1.ª (L) — Altera o Regulamento das Custas Processuais, isentando todos os

trabalhadores e seus familiares, em matérias de direito do trabalho, do pagamento das custas processuais,

independentemente do modo como se fazem representar em juízo e do rendimento anual auferido, e

586/XV/1.ª (PAN) — Garante o acesso ao direito e aos tribunais, procedendo à alteração do Regulamento das

Custas Processuais e ao Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro.

Para apresentar o projeto de lei do Bloco de Esquerda, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O acesso à justiça deveria ser

universal e não ter barreiras económicas, mas não é isso que acontece no nosso País. O atual Regulamento

das Custas Processuais é uma barreira clara e inequívoca no acesso à justiça.

Sabemos que, se fizéssemos o que já fizemos no passado — tentar mudar de forma aprofundada e

estrutural o Regulamento das Custas Processuais —, o Partido Socialista diria logo «não pode ser, não pode

ser, porque precisamos deste dinheiro para a justiça funcionar». Então, para fugir dessa acusação e desse

passadismo que o Partido Socialista diz permanentemente que não pode ser mas deixa andar, trazemos

alguns dos mais absurdos critérios que atualmente existem neste Regulamento das Custas Processuais e cuja

correção, para além de trazer melhor acesso à justiça, não teria quase nenhum encargo para o Estado.

Atualmente, alguém que participe numa ação num tribunal tem de pagar uma taxa de justiça, mas pode

ficar dispensado de o fazer em alguns casos. Chama-se dispensa do pagamento prévio de taxa de justiça. No

final desse processo, é referido quem é responsável por esse pagamento e, regra geral, é a parte vencedora

que tem, primeiro, de pagar as taxas de justiça, para depois pedir o ressarcimento desse pagamento à parte

que foi vencida.

Faz isto algum sentido? Não faz sentido absolutamente nenhum. Esta incoerência legislativa mostra-se em

alguns casos concretos da vida das pessoas. Porque é que ela existe? Porque se parte do pressuposto que,

também na justiça, deve haver o pagamento do utilizador-pagador, o tal «impulso processual»: quem inicia um

processo deve ser obrigado a pagar por esse encargo que a justiça tem.

Não vou referir sequer o que significa aplicar o impulso do utilizador-pagador ao modelo de justiça, quando

a justiça é um dos bens essenciais do Estado de direito.

Mas esta incoerência legislativa mostra que, por exemplo, nos casos dos processos-crime que foram

deduzidos contra um arguido de um pedido cível — logo, não é sequer o próprio que desencadeia esse

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impulso processual —, este pode contestar o processo, pode ganhá-lo e, no entanto, é o responsável pelo

pagamento porque ganhou esse processo.

Pode, depois, ir correr atrás do prejuízo e dizer «atenção, mas o vencido deve-me este pagamento». No

entanto, a verdade é que já pagou uma primeira vez e pode vir a ter ainda mais custos, para ser ressarcido,

muitas vezes podendo nem sequer ser ressarcido. Faz isto algum sentido? Não faz sentido absolutamente

nenhum. É a realidade que atualmente existe.

O mesmo se passa com os processos de jurisdição de menores ou outros processos sobre o estado das

pessoas, como, por exemplo, os divórcios sem consentimento do outro cônjuge, em que há diretas

dificuldades acrescidas em processos que já de si são complexos. Faz sentido? Não faz.

E é por isso que vemos com bons olhos, por exemplo, o parecer da Ordem dos Advogados sobre esta

matéria, que diz algo tão simples como isto: «Entendemos que a alteração preconizada afigura-se acertada e

justa. Com efeito, o atual regime em vigor cria um injustificado encargo para a parte que, tendo ganho de

causa e, como tal, não sendo responsável pelo pagamento de custas, se veja obrigada a ter de, primeiro,

suportar o pagamento da taxa de justiça para, posteriormente, ter que solicitar o seu reembolso a título de

custas de parte.»

Mais uma vez, o absurdo da realidade deve ser mudado e creio que agora o argumento de dizer que isto

custa ao Estado já não faz sentido, e esse não pode ser sacado pelo Partido Socialista, que terá de inventar

novos argumentos para chumbar algo que é absolutamente banal e exigido atualmente nos tribunais

portugueses.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para apresentar o projeto de lei do Chega, tem a palavra o

Sr. Deputado Bruno Nunes.

O Sr. Bruno Nunes (CH): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quando entramos nesta Sala, mesmo

aqui do nosso lado direito, temos a estátua Justiça. E aquilo de que hoje vimos aqui falar é de uma das coisas

que mais nos preocupa desde a génese do partido Chega: a justiça e, tantas vezes, a injustiça, mas, acima de

tudo, a reforma no sistema judicial que é preciso, de uma vez por todas, pensar.

Hoje estamos aqui falar das taxas. Nos últimos dias temos falado na progressão de várias carreiras ligadas

à justiça. Outros dias falamos do sistema prisional. Continuamos a tentar resolver a retalho aquilo que tem sido

uma consequência de dezenas de anos de socialismo — não fosse o socialismo o princípio do Estado social

de tentar juntar todos e de fazer justiça de forma equitativa para todos. Mas não é o que vai acontecendo.

Estamos numa altura em que o PRR determina que a modernização e a digitalização deveriam ser grandes

apostas, e nesta reforma administrativa está incluída a justiça. A justiça que dita que, ainda hoje, qualquer

advogado que queira consultar um processo ou tê-lo para si tem de se deslocar ao tribunal, consultar dezenas

e dezenas de apensos e, se quiser levar o processo para o trabalhar, tem de o digitalizar. A modernização e a

digitalização administrativa ainda não chegaram aos tribunais, deixando que a justiça não seja feita de uma

forma justa.

Hoje em dia, temos uma justiça essencialmente cara, em que as pessoas, para poderem recorrer à justiça

— e nisto concordamos com alguns dos projetos de lei que estão hoje em debate —, são obrigadas a pagar e

ficam limitadas, tantas vezes, no seu acesso à justiça por falta de dinheiro.

Há outros que são obrigados, inicialmente, a pagar o processo e que veem ficar pendente o regresso desse

dinheiro: chegará eventualmente, no final. É quase como fazer uma conta poupança reforma, com a lentidão

que a justiça tem em Portugal, e deixar na mão do Estado tudo o que são as custas.

Quanto à nossa proposta, o Chega vem propor, essencialmente, que sejam isentadas as custas aos

funcionários públicos ou outros que estejam a exercer as funções de interesse público no processo penal por

ofensa sofrida no exercício das suas funções ou por causa delas.

Ou seja, entendemos que é verdade que, hoje em dia, o Ministério Público, em caso de ofensa, pode fazer

ou intentar uma ação. Mas, quando chegamos ao direito de regresso dos direitos patrimoniais, o Ministério

Público, ou o Estado, já não defende: não defende os polícias, não defende os professores, não defende os

trabalhadores da Autoridade Tributária, não defende os enfermeiros, não defende os médicos. Fica, assim, a

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ação de direitos patrimoniais a cargo do próprio ofendido, que poderá ou não ter disponibilidade financeira

para avançar com dinheiro para uma ação.

Esta poderia ser uma justiça justa e certa para todos, mas nós sabemos que o sistema judicial não é assim,

e este pequeno passo que o Chega pretende dar é essencialmente para resolver uma injustiça para todos

aqueles que defendem a Administração Pública, mas que, acima de tudo, defendem o Estado e a Nação.

Quando olhamos à volta, percebemos que esta justiça está de tal forma organizada que não serão apenas

estes pequenos passos que propomos que vão resolver este problema. Precisamos de uma reforma séria e

apelamos, nomeadamente, aos partidos da direita para perceberem que temos muito pouco tempo para nos

organizarmos, para constituir um Governo de direita e fazer uma reforma séria na justiça em Portugal.

Caso contrário, como está, a única coisa que nos vão dar são as notícias de hoje, em que José Sócrates

diz que as falhas do Governo paralisam o seu próprio julgamento, a «Operação Marquês», em que José

Sócrates refere o seu «Simplex» na justiça — aquelas palavras que vocês tanto gostam —, mas diz que o

Estado é diretamente responsável pelos últimos 9 dos 10 anos de atraso.

O que temos é uma justiça parada: tribunais completamente sobrelotados, funcionários sem progressão na

carreira e todos aqueles que trabalham em prol da Nação a ter de pagar custas judiciais se eventualmente

forem agredidos ou ofendidos no exercício da sua função, sobre a qual não estamos de acordo.

Apresentamos este projeto por acreditarmos que são precisos dar pequenos passos para a reforma na

justiça. A partir daqui, temos, de facto, de trabalhar em conjunto, e toda a direita tem de perceber de uma vez

por todas que não podemos continuar com uma visão da justiça como temos atualmente em Portugal.

Aplausos do CH.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para apresentar o projeto de lei do PCP, tem a palavra a

Sr.ª Deputada Alma Rivera.

A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Estamos a pouco mais de um mês de

comemorar mais um aniversário da Revolução de Abril, um momento que transformou Portugal, em que se

abriu caminho à liberdade e se construiu o edificado de direitos que ficaram plasmados na Constituição da

República Portuguesa.

Quando dizemos — e o PCP tem dito — que o que falta a este País não é destruir ou adulterar o seu

património constitucional, mas sim cumprir os comandos constitucionais e aprofundá-los, temos, em matéria

de justiça, demonstração disso mesmo.

Diz o n.º 1 do 20.º artigo da Constituição o seguinte: «A todos é assegurado o acesso ao direito e aos

tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser

denegada por insuficiência de meios económicos.»

Esta é uma disposição fundamental numa democracia, num Estado de direito digno desse nome, e precisa

de ser levada à prática e não contrariada, como foi feito por PS e PSD ao longo de décadas. Precisa de ser

verdade na vida de toda e qualquer pessoa neste País, quer tenham um salário baixo, como a generalidade da

população tem, quer tenham rendimentos mais elevados. Mas também para todos aqueles que, não sendo

suficientemente carenciados para ter acesso ao apoio judiciário — e é preciso ser praticamente indigente para

o ter —, deixam de defender os seus interesses, porque não se podem dar ao luxo de iniciar um processo.

A maioria da população não tem meios económicos para suportar os custos e a demora de um processo

judicial. Mas se a todos não é garantido o acesso à justiça, então não há uma verdadeira realização da justiça.

É verdade que existem duas justiças: uma para cidadãos ou empresas com elevados recursos económicos e

outra para o comum cidadão, que vive do seu trabalho e que tantas vezes deixa de fazer valer os seus

interesses e direitos simplesmente porque não tem dinheiro.

Se juntarmos a morosidade do funcionamento dos tribunais, a ainda reduzida dimensão dos Julgados de

Paz, o escassíssimo alcance social destes mecanismos de apoio judiciário, os custos com os honorários de

advogados, e o que aqui discutimos, o elevado valor das custas a suportar pelo recurso aos tribunais, é fácil

perceber que não há justiça para todos.

Esta é uma justiça de classe. E uma justiça de classe que, ao não ser célere, ao não ser acessível, ao não

ser igual para todos, como ninguém pode negar, não o é, não é justiça.

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Do incomportável custo do acesso aos tribunais até à falta de meios humanos e tecnológicos para o

combate à alta criminalidade, passando pelas precárias condições do parque judiciário prisional, até à carência

de recursos humanos em todas as áreas ou pela situação socioprofissional indigna dos diversos operadores

judiciários, tudo isto existe, tudo isto é triste, tudo isto faz parte de uma justiça a dois tempos.

O que propomos é urgente, ou seja, que a Assembleia dê o tão necessário impulso para a revisão legal das

custas judiciais, com a criação de uma unidade de missão que, dada a complexidade e implicações da

matéria, esteja habilitada para se debruçar sobre o assunto nos próximos seis meses.

Esta proposta que aqui trazemos é absolutamente fundamental para que se avance para uma justiça

realizada, que só o pode ser pela garantia do acesso de todos ao direito e aos tribunais. Não é tolerável um

País em que a justiça só é acessível a quem a pode pagar.

É preciso dar efetivo cumprimento ao direito constitucional de todos os cidadãos de acesso ao direito e à

tutela jurisdicional. A justiça é uma trave-mestra do Estado de direito democrático. É mesmo! E afastá-la da

vida das pessoas, enfraquecendo o Estado de direito democrático, põe em perigo a própria democracia.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para apresentar o projeto de lei do Livre, tem a palavra o Sr. Deputado

Rui Tavares.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Tem 2 minutos, bem, 3 minutos.

O Sr. Rui Tavares (L): — Sr.ª Presidente: O acesso ao direito e aos tribunais são direitos com consagração

constitucional porque, como se costuma dizer, sem justiça não há Estado de direito democrático.

No entanto, como todos sabemos, o acesso aos tribunais está condicionado pelos custos associados à

justiça. Isto é especialmente grave quando se apresentam grandes diferenciais de poder naqueles que podem

ser queixosos em processos em tribunais.

Em particular, lembremos o que acontece no direito laboral. É uma das fontes de litigância mais comum, a

mais das vezes motivada por razões que fragilizam o direito dos trabalhadores. O atual Regulamento das

Custas Processuais, isenta de taxa de justiça, trabalhadores e familiares que sejam representados pelo

Ministério Público e pelos serviços jurídicos dos sindicatos, desde que sejam gratuitos. Portanto, exclui desta

isenção a representação por advogado, ainda que seja pro bono, e também por um representante oficioso.

O Provedor de Justiça, em 2010, já recomendou ao Governo que alargasse a isenção a esta possibilidade

de representação, mas nunca teve resposta. Por outra via, o Regulamento das Custas Processuais assume a

presunção de insuficiência económica dos trabalhadores que aufiram um rendimento anual até 20 400 €. E é

assim desde 2008, sem atualização.

Isto, evidentemente, desconsidera a evolução das circunstâncias económicas da sociedade, de resto

premiada por uma pandemia que trouxe novas conflitualidades — sociedades que encerram, trabalhadores

que vão para casa e nunca mais são chamados, teletrabalho — que aumentaram significativamente a

conflitualidade e a litigiosidade de âmbito laboral, como, aliás, costuma ser com todas as crises económicas.

Defende-se, neste projeto do Livre, que a isenção da taxa de justiça nas ações intentadas por conta de

matérias laborais não esteja associada a rendimento, mesmo porque o grosso da conflitualidade não é

protagonizada por trabalhadores que sejam financeiramente mais abastados.

Entende-se que esta medida não exponencia a litigância, não só porque ninguém recorre a tribunal

levianamente, como porque o Regulamento das Custas Processuais responsabiliza os trabalhadores, ainda

que isentos, pelo pagamento dos encargos a que deram origem ao processo, caso sejam totalmente vencidos

na ação.

Uma das funções da lei é interpor-se entre os mais fracos e os mais fortes, e isso é muito claro no direito

do trabalho. Mas de pouco adianta estarmos do lado dos mais fracos na lei se não lhes dermos a possibilidade

de fazerem valer os seus direitos na justiça.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para apresentar o projeto de lei do PAN, tem a palavra a

Sr.ª Deputada Inês Sousa Real.

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A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Temos em Portugal três

justiças.

Uma primeira justiça para os ricos, para aqueles a quem o acesso à justiça não é um problema, para quem

tem possibilidade de pagar custas judiciais, honorários a advogados, recursos, tudo o que for necessário,

inclusive para fazer arrastar processos até à prescrição para se isentarem de qualquer responsabilidade,

mesmo quando lesaram o Estado ou diferentes particulares.

Uma segunda justiça para os muito pobres, para aqueles que, infelizmente, preenchem os apertados

requisitos do apoio judiciário, tendo em conta o valor máximo do rendimento do agregado familiar, necessário

para ficar isento de custas judiciais e de honorários dos advogados.

E, por último, temos uma justiça para os demais, para a classe média, considerada demasiado rica para

aceder ao apoio judiciário, mas demasiado pobre para acarretar com custas judiciais e honorários de

advogados, e para quem o acesso à justiça não é, muitas vezes, uma opção real.

Falamos de trabalhadores, de pais, de vítimas de crimes, de cidadãos que entendem que lhes está a ser

cobrada indevidamente uma dívida, de cidadãos a quem lhes é devido algum crédito, pequenos empresários,

entre tantas outras situações. Não pode ser negada justiça a todas estas pessoas, em todas estas situações,

porque a justiça não é um bem de luxo, é um direito, e um direito fundamental previsto na nossa Constituição.

Também não deve a mesma servir, por exemplo, para o Estado pôr ao serviço dos privados, para que PPP

rodoviárias possam cobrar as taxas, mas negar, depois, o acesso adequado aos cidadãos.

Desta forma, o PAN propõe, com esta iniciativa que hoje apresenta, uma garantia efetiva do acesso ao

direito e aos tribunais por todos os cidadãos. Por um lado, garantindo o acesso à justiça com a limitação, por

portaria, do valor a que poderão ascender as custas judiciais, impedindo custas proibitivas que impeçam os

cidadãos de recorrer aos tribunais. Por outro lado, pretende-se acautelar a isenção de todos os trabalhadores,

em matéria de direito do trabalho e em matéria de acidentes de trabalho e de doenças profissionais,

independentemente da forma como sejam representados, em que não se exclua quem é representado por

mandatário judicial, tal como está previsto atualmente e que põe em causa o próprio princípio da igualdade.

Por fim, esta iniciativa pretende compensar as isenções e limitações propostas, onerando aqueles que

litigam de má-fé, aqueles que sabem de antemão que litigam com deslealdade, prejudicando o próprio sistema

judiciário e o acesso dos demais.

Uma justiça acessível a todos é um imperativo de um Estado de direito democrático e que podemos,

através destas iniciativas, finalmente alcançar.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Ninguém bate palmas à Inês!

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mónica

Quintela, do Grupo Parlamentar do PSD.

A Sr.ª Mónica Quintela (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Debatemos hoje várias

iniciativas legislativas sobre as custas judiciais, sendo que todas as consideram exorbitantemente elevadas. E

efetivamente são, Sr.as e Srs. Deputados.

A Constituição da República Portuguesa, no seu artigo 20.º, garante o acesso à justiça e aos tribunais e

dispõe expressamente que ninguém pode ficar privado de recorrer à justiça por razões de insuficiência

económica.

Mas a Constituição não está a ser cumprida. Há muitos cidadãos e empresas que não têm possibilidades

económicas para recorrer aos tribunais quando os seus direitos são violados.

Atendendo ao plasmado na nossa Lei Fundamental, podíamos pensar que essa insuficiência económica

não releva e que o recurso à justiça está garantido. Só que não, Sr.as e Srs. Deputados!

Desde logo porque, a par de custas processuais elevadíssimas, temos também um mais que deficiente

sistema de acesso ao direito e aos tribunais que coarta a possibilidade de abranger qualquer cidadão que

ultrapasse o limiar da indigência.

Quem pretender intentar uma ação para defesa dos seus legítimos direitos tem de ter recursos económicos

folgados que lhes permita pagar a taxa de justiça inicial, que é variável em função do valor da ação. A isto

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acrescem todos os demais encargos, como por exemplo os pagamentos para a realização de perícias, que

são caríssimas, ou os pedidos de esclarecimentos e comparências dos senhores peritos em audiência de

discussão e julgamento, que também são pagos e dispendiosos.

Basta ver, por exemplo, a nota de pagamento de encargos de uma perícia médico-legal ao Instituto

Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses ou de uma perícia informática ao Laboratório de Polícia

Científica da Polícia Judiciária.

No final do processo, pode ter ainda que pagar o remanescente na parte do decaimento da ação, se for o

caso. Quanto mais elevado for o valor da ação, mais elevadas são as custas, sem qualquer limite ou

ponderação, numa lógica cega e discricionária.

E quem é demandado, e não for abastado, passa uma autêntica tormenta porque, se não for praticamente

indigente e o seu agregado familiar também, não lhe é concedido apoio judiciário, apesar de não poder deixar

de contestar a ação sob pena de ser logo condenado no pedido.

O valor das custas processuais consubstancia uma autêntica denegação de justiça e cria um fosso entre

quem tem e quem não tem possibilidades económicas, o que não se pode tolerar.

Aplausos do PSD.

Trata-se de permitir o acesso aos alicerces do Estado de direito democrático: a realização da justiça e a

paz social.

Urge alterar os montantes e as tabelas das custas judiciais, adequando-as à realidade de um País com

uma taxa de pobreza severamente assustadora e que vive com dificuldades extremas, que se repercutem

inclusivamente ao nível da alimentação, com muitas famílias a não ter dinheiro para dar de comer aos seus

filhos.

Urge, também, reformular o sistema de acesso ao direito de forma a permitir que o cidadão comum possa

dele beneficiar, inclusivamente na modalidade de isenção de pagamento de taxas de justiça e demais

encargos de processo e de patrocínio forense.

Recordo que, em finais de 2016, a então Ministra da Justiça, Dr.ª Francisca Van Dunem, prometeu rever a

lei de acesso ao direito e aos tribunais, mas só mesmo no final da XIII Legislatura é que o Governo apresentou

uma proposta, não tendo havido tempo para o processo legislativo.

A proposta era tão má e recebeu tantas críticas dos profissionais do foro que não viu mais a luz do dia, não

obstante a então Sr.ª Ministra da Justiça reconhecer a necessidade de alterar o valor das custas judiciais e de

prometer fazê-lo, bem como de rever o sistema de acesso ao direito. Até hoje, nada!

Recordo que, em sede do último Orçamento do Estado, o PSD apresentou as propostas 624-C e 631-C,

respetivamente para a redução das custas e para a revisão do acesso ao direito, as quais foram chumbadas

pelo Partido Socialista.

Este histórico, Sr.as e Srs. Deputados, não augura nada de bom relativamente às intenções do Governo

para resolver uma entropia grave, que afeta milhares de cidadãos e empresas.

No que concerne às iniciativas hoje em discussão, procurando introduzir algumas alterações no

regulamento das custas processuais e até a criação de uma unidade de missão para refletir sobre a revisão

das custas, reconhecemos a bondade das mesmas e a intenção de melhorar o sistema. Mas muitas são

redundantes, até já constam no texto da lei — como por exemplo a do Chega —, e não resolvem a

exorbitância das custas, a impossibilidade de se aceder ao sistema de acesso ao direito pelas empresas e

cidadãos carenciados e a perceção de que há uma justiça para ricos e outra para pobres. Esta perceção, Sr.as

e Srs. Deputados, corrói a democracia.

A revisão global do Regulamento das Custas Processuais e do sistema de acesso ao direito é urgente e a

Sr.ª Ministra da Justiça já disse, em recente audição regimental, que não ia baixar as custas.

De resto, sobre custas, o que consta no Programa do Governo é que serão devolvidas aos cidadãos que

desistirem dos processos pendentes em tribunal, como forma de combater a morosidade e os atrasos dos

tribunais.

Maior desfaçatez e imobilismo é difícil de imaginar!

Aplausos do PSD.

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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Patrícia Gilvaz,

do Grupo Parlamentar da Iniciativa Liberal.

A Sr.ª PatríciaGilvaz (IL): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Estado continua a falhar naquela

que é uma das suas funções mais básicas — falha, por isso, no acesso à justiça.

Não podemos deixar de assinalar que o mesmo PS que quer dar habitação acessível aos portugueses é o

mesmo PS que não consegue sequer garantir um sistema judicial acessível e funcional para todos.

Atualmente, este sistema judicial está condicionado a uma grande parte da população, por um conjunto de

fatores, todos eles de responsabilidade dos Executivos que nos governaram nas últimas décadas.

As elevadas custas judiciais, que todos reconhecem como sendo desproporcionais e desadequadas ao

nosso País, aliadas à incapacidade de produzir riqueza e dar melhores rendimentos aos portugueses, condena

a população a recorrer a um sistema de acesso ao direito e aos tribunais que deixa de fora até a classe média-

baixa. Ou seja, deixa de fora grande parte da população portuguesa.

A Sr.ª Ministra da Justiça bem que pode anunciar a digitalização dos requerimentos de apoio judiciário, mas

o computador continuará a negar apoio judiciário mesmo a quem se encontra, efetivamente, com dificuldades

financeiras. Este é um desrespeito por aqueles que são os direitos fundamentais de acesso ao direito e à

tutela jurisdicional efetiva.

O Governo não pode afirmar que existe uma liberdade no acesso ao direito e aos tribunais, quando esta se

encontra condicionada pelos baixos recursos financeiros dos portugueses.

A isto o Governo não dá resposta, ou porque não consegue, ou porque não quer. Este é um problema que

necessita de abordagem séria por parte do Governo, que tem obrigação de ouvir quer a sociedade civil quer a

judiciária, e perceber quais são as mudanças orçamentais que precisam de ser feitas, aplicá-las de uma forma

global, numa revisão do Regulamento das Custas Processuais, e na restante legislação de apoio judiciário.

Dito isto, não vemos que uma grande parte destas propostas em análise sejam uma verdadeira solução.

São propostas que não concretizam conceitos, que não atentam nem privilegiam a capacidade económica ou

financeira, mas, sim, a profissão ou a classe profissional.

Srs. Deputados, o acesso à justiça é um direito que deve existir de forma equitativa para todos os

portugueses. De outra forma será uma denegação da justiça ou a justiça de alguns ou para alguns.

O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Muito bem!

A Sr.ª Patrícia Gilvaz (IL): — A Iniciativa Liberal trabalhará e contribuirá sempre para uma resposta que vá

ao encontro de uma justiça que se adeque a 2023 e ao contexto económico em que nos encontramos e

também uma justiça que sirva todos, isto é, que não seja discriminatória em razão do estrato social ou da

situação profissional, e que sirva e proteja especialmente os mais vulneráveis.

Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, agora não me vai dizer que isto é populismo judicial. Eu digo-lhe o que

é populismo judicial. É, por exemplo, dizer que me estou a borrifar, para não dizer palavras piores, para o

segredo de justiça, como aconteceu com uma figura do Partido Socialista, que, por acaso, ascendeu a

segunda figura do Estado.

Vozes da IL: — Bem lembrado!

A Sr.ª Patrícia Gilvaz (IL): — E se populismo é expor a incompetência do Governo socialista, nós vivemos

muito bem com isso e vamos continuar a fazê-lo.

Aplausos da IL.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Araújo

Correia, do Grupo Parlamentar do PS.

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O Sr. Paulo Araújo Correia (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começaria por dizer que,

quando está na oposição, o PSD incorpora uma figura simpática, que é a do Pai Natal; uma espécie de Pai

Natal com um saco cheio de medidas fáceis e de prendas para distribuir a todos os portugueses.

Isso, em si, não teria problema nenhum. O problema é que, quando o PSD é chamado a exercer funções

governativas, já incorpora a figura do Grinch, que tudo faz para arruinar o Natal aos portugueses.

Protestos da Deputada do PSDJoana Barata Lopes.

Esta dicotomia entre o PSD na oposição e o PSD no Governo é já sobejamente conhecida pelos

portugueses, Sr. Deputada. É por isso que, em sucessivas eleições, vocês não têm sido merecedores da

confiança dos portugueses, ao contrário do Partido Socialista.

Aplausos do PS.

Quero também referir a qualidade da proposta aqui apresentada pelo partido Chega. Infelizmente, o

Sr. Deputado Bruno Nunes já não está presente, certamente terá tido afazeres muito importantes,…

A Sr.ª Rita Matias (CH): — Olhe para trás!

O Sr. Paulo Araújo Correia (PS): — … mas o que queria referir é que a qualidade da proposta é

inversamente proporcional aos decibéis que o partido Chega aqui usa para apresentar as suas propostas.

Protestos do Deputado do CH Pedro dos Santos Frazão.

E não sou eu quem o diz. Sr. Deputado, não se exalte que não sou eu quem o diz; quem o diz é o parecer

do Conselho Superior da Magistratura, que refere, de forma clara, que as vossas propostas são redundantes,

uma vez que propõem isenções que já existem no Regulamento das Custas Processuais.

Aplausos do PS.

Sr.as e Srs. Deputados, as iniciativas hoje em debate dizem respeito a uma das dimensões mais

estruturantes e relevantes da construção do nosso Estado de direito democrático: a garantia do acesso aos

tribunais.

A verdade é que, como já foi dito, esta garantia merece proteção constitucional, estando consagrada no

n.º 1 do artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, que estabelece, de forma muito clara, que não

pode ser denegada a justiça a nenhum cidadão por insuficiência económica. Este é um princípio constitucional

que, acho, nos mobiliza a todos e que merece uma ampla concordância desta Câmara, como se viu das

intervenções que me antecederam.

No entanto, esta garantia constitucional não pode, na nossa ótica, desvincular-se em absoluto da realidade

económica do País.

Protestos da Deputada do CH Rita Matias.

Para que tenhamos noção, só entre 2015 e 2022, o Ministério da Justiça gastou aproximadamente 1000

milhões de euros em apoio judiciário e em casos relacionados, no cumprimento desta obrigação constitucional

de assegurar às pessoas economicamente mais fragilizadas o acesso à justiça.

A Sr.ª Rita Matias (CH): — Só têm 26 Deputados na bancada, quando são 120! Uma vergonha!

O Sr. Paulo Araújo Correia (PS): — Dir-me-ão que o Governo está apenas a cumprir uma obrigação

constitucional. Mas também me parece ser avisado não desprezar o grau de comprometimento do Governo da

República com esta matéria.

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Por isso, a bem de um debate sério, é necessário dizer que também é constitucionalmente admissível —

aliás, como tem entendido abundante jurisprudência do Tribunal Constitucional — o estabelecimento da

exigência de uma contrapartida pela prestação de serviços de administração da justiça, desde que com isso

não se comprometa o acesso à justiça pelo cidadão de rendimentos médios, ao mesmo tempo que se garante

que aqueles que são economicamente mais vulneráveis continuam a encontrar no Estado formas de apoio

para fazer valer os seus direitos.

Este é, como dizia, o entendimento jurisprudencial firme do Tribunal Constitucional, que é doutrinalmente

acompanhado por constitucionalistas de referência, como o são Gomes Canotilho ou Vital Moreira.

Efetivamente, a gratuitidade da justiça poderia encerrar o efeito pernicioso de facilitar a judicialização de

bagatelas e assim dificultar a pronta intervenção dos tribunais em processos urgentes.

Feito este enquadramento, parece-nos existir igualmente um alargado consenso nesta Casa de que é,

efetivamente, necessário rever o Regulamento das Custas Processuais.

Contudo, já não nos parece avisado que essa intervenção e revisão possam ser feitas de forma

desgarrada, com propostas avulsas e com propostas redundantes, como resulta do proposto pelo partido

Chega, devendo, sim, obedecer a uma visão integrada, global, participada por todos os operadores judiciários.

A verdade é que, ao contrário do que disse o PSD, foi já anunciado publicamente pela Sr.ª Ministra da

Justiça que se está a ultimar a revisão do Regulamento das Custas Judiciais, fazendo exatamente uma análise

global, integrada, participada, que permitirá também analisar as propostas que aqui foram apresentadas —

pelo menos, as que são viáveis, que são as que propõem soluções válidas.

Certamente que, nesse debate, depois de ter sido submetido à Assembleia da República, estaremos em

condições de rever a questão das custas processuais de uma forma que, efetivamente, leva em conta as

legítimas aspirações dos portugueses.

Assim, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista exorta o Governo da República a que possa imprimir a

celeridade necessária à conclusão deste processo.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alma Rivera, do

Grupo Parlamentar do PCP.

A Sr.ª Rita Matias (CH): — Cada vez que apontar o dedo, olhe para a sua bancada. Estão só 26

Deputados na bancada, quando são 120! Falta de noção!…

A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Sr.ª Presidente, quando tiver condições para começar a falar, fá-lo-ei.

Entretanto, não vou gastar tempo a falar por cima de ninguém.

Pausa.

Muito obrigada.

Bom, o problema, Srs. Deputados — em particular, Sr. Deputado do Partido Socialista Paulo Araújo Correia

—, é que, se há coisa que caracteriza os diversos Ministros da Justiça é essa atitude de constante prometer,

assegurar, anunciar que se está a ultimar estatutos profissionais, custas judiciais,… Enfim, há sempre um

conjunto de aspetos que estão sempre quase, quase, quase a ficarem prontos.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Bem lembrado!

A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — O facto é que não temos visto resultados dessa atuação e, portanto, tendo

em conta a complexidade daquilo que se trata, entendemos que a Assembleia da República pode, e deve,

tomar uma atitude, de forma integrada.

Se a Assembleia da República entende — como julgo que ficou patente — que o acesso à justiça é uma

prioridade, tal como a democraticidade desse acesso, então avancemos, a partir da Assembleia da República,

com a criação desta unidade de missão, com diversos intervenientes que são habilitados para tal, para que

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estes possam fazer as recomendações e as propostas concretas a esse nível e contribuir também, se a Sr.ª

Ministra da Justiça o estiver a fazer, para rever o regime das custas judiciais.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para encerrar este debate, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe

Soares, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, creio que a primeira conclusão deste

debate é a de que ninguém conseguiu negar, por um lado, que há uma barreira económica no regime atual

das custas processuais, que se torna intransponível para muitas pessoas no acesso à justiça, e que isso é um

entrave à plena execução do Estado de direito.

A segunda coisa que foi unânime é que a proposta que o Bloco de Esquerda traz — até porque já foi

vigente no passado — é da mais elementar sensatez. Isto porque não faz sentido o que atualmente existe, que

é o Estado imputar a cidadãos a cobrança de custas judiciais que são pagas ao Estado. Não. É o Estado que

deve ter essa obrigação.

Por isso, ao ouvir o Sr. Deputado Paulo Araújo Correia, que não negou nenhuma destas vertentes —

pareceu-me até que acompanhou as preocupações —, creio que depois esbarram numa realidade recorrente

no Partido Socialista, que começa a ser também a realidade desta Ministra da Justiça. É que, estudos, grupos

de trabalho, intenções, há em barda no Governo. Não faltam! O problema é a execução!

Ora, a cada dia que passa, numa matéria tão fundamental como a da justiça, há mais negação de acesso à

justiça.

Neste caso particular — do exemplo que dei, que a Ordem dos Advogados também deu e que já foi aqui

referido por outros Deputados —, há incompreensão em relação ao facto de cidadãos, que não têm sequer a

ver com o processo que lhes foi movido, acabarem por ganhar o processo, mas, mesmo assim, têm de pagar.

Essa é uma incompreensão que é absurda, porque não faz sentido.

Depois há outros problemas — particularmente em casos de divórcio —, como o da tutela de crianças, em

que esta realidade não é só uma questão económica, mas uma complexidade social que o Estado impõe a

processos que normalmente já são difíceis.

Cada dia que passa em que continuamos com esta situação é mais um dia em que estamos a prejudicar a

vida das pessoas.

Ora, creio que esta é daquelas matérias tão simples, tão simples, tão simples, que não poderia ficar em

causa, em nome de uma revisão futura, que será sempre estrutural e que, ou deixará tudo na mesma, ou

então estará a atirar as suas alterações para as calendas.

É por isso que proponho ao Partido Socialista que, sendo esta uma matéria tão pontual, não fiquemos à

espera da Sr.ª Ministra da Justiça, do Ministério da Justiça, não fiquemos à espera dos tempos da justiça, mas

que façamos nós a justiça para garantir que as pessoas não são lesadas pelas nossas escolhas.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.as e Srs. Deputados, chegámos, assim, ao final da nossa ordem do

dia.

Tem, agora, a palavra a Sr.ª Secretária Palmira Maciel, para nos dar algumas informações.

A Sr.ª Secretária (Palmira Maciel): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e

foram admitidas, várias iniciativas legislativas.

Em primeiro lugar, refiro os Projetos de Lei n.os 599/XV/1.ª (PAN), que baixa à 1.ª Comissão,

602/XV/1.ª (PCP), que baixa à 13.ª Comissão, em conexão com as 1.ª e 3.ª Comissões, 604/XV/1.ª (PCP), que

baixa à 13.ª Comissão, 605/XV/1.ª (CH), que baixa à 6.ª Comissão, em conexão com a 5.ª Comissão, e

606/XV/1.ª (CH), que baixa à 6.ª Comissão.

Refiro, de seguida, os Projetos de Resolução n.os 471/XV/1.ª (PAN), que baixa à 1.ª Comissão,

511/XV/1.ª (PS), 512/XV/1.ª (PCP), que baixa à 12.ª Comissão, 513/XV/1.ª (PCP), que baixa à 10.ª Comissão,

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514/XV/1.ª (L), que baixa à 9.ª Comissão, 515/XV/1.ª (PS), 516/XV/1.ª (PAN), que baixa à 7.ª Comissão, e

518/XV/1.ª (PAR).

É tudo, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Muito obrigada, Sr.ª Secretária.

Posto isto, anuncio que a reunião plenária de amanhã começa às 10 horas, com a seguinte ordem do dia.

Do primeiro ponto consta a discussão conjunta das seguintes iniciativas legislativas:

Projeto de Lei n.º 516/XV/1.ª (PS) — Segunda alteração à Lei n.º 66-A/2007, de 11 de dezembro, que

define as competências, modo de organização e funcionamento do Conselho das Comunidades Portuguesas;

Projeto de Resolução n.º 162/XV/1.ª (PS) — Recomenda ao Governo que valorize a participação cidadã

nos procedimentos eleitorais, revendo os valores das compensações pela participação nas assembleias de

voto;

Projeto de resolução n.º 394/XV/1.ª (PS) — Determina a preparação da codificação da legislação eleitoral;

Projeto de resolução n.º 426/XV/1.ª (PS) — Recomenda ao Governo que realize uma experiência de voto

eletrónico presencial em mobilidade nos círculos eleitorais das comunidades;

Petição n.º 30/XV/1.ª (Luís Humberto Pacheco Ferreira Teixeira) — Por uma maior conversão dos votos em

mandatos;

Projeto de Lei n.º 377/XV/1.ª (PSD) — Procede à segunda alteração da Lei n.º 66-A/2007, de 11 de

dezembro, que define as competências, modo de organização e funcionamento do Conselho das

Comunidades Portuguesas;

Projeto de Lei n.º 398/XV/1.ª (PAN) — Estabelece o regime jurídico aplicável ao esclarecimento cívico e ao

direito de antena no âmbito das eleições para Presidente da República, Assembleia da República, Assembleia

Legislativa Regional dos Açores, Assembleia Legislativa Regional da Madeira, Parlamento Europeu e órgãos

das autarquias locais, bem como no âmbito dos referendos nacionais, regionais e locais;

Projeto de Lei n.º 517/XV/1.ª (PAN) — Altera a Lei Eleitoral para a Assembleia da República, reduzindo

para 10 o número de círculos eleitorais e criando um círculo eleitoral da emigração e um círculo nacional de

compensação;

Projeto de Lei n.º 518/XV/1.ª (PAN) — Altera diversos diplomas, alargando o direito de voto antecipado no

âmbito das eleições para os órgãos das autarquias locais e melhorando o processo eleitoral nos círculos da

emigração no âmbito das eleições para a Assembleia da República;

Projeto de Lei n.º 560/XV/1.ª (PSD) — Consagra a possibilidade de opção pelo voto por correspondência,

em alternativa ao voto presencial, aos eleitores residentes no estrangeiro nas eleições presidenciais e nas

eleições europeias, procedendo à vigésima terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 319-A/76, de 3 de maio, que

regulamenta a eleição do Presidente da República, à sexta alteração à Lei n.º 14/87, de 29 de abril, que

aprova a lei eleitoral para o Parlamento Europeu, e à sétima alteração ao regime jurídico do recenseamento

eleitoral, aprovado pela Lei n.º 13/99, de 22 de março, e assegura a implementação, nas próximas eleições

europeias, de um projeto-piloto não vinculativo de voto eletrónico não presencial destinado aos eleitores

residentes no estrangeiro;

Projeto de Lei n.º 577/XV/1.ª (PCP) — Alarga as competências e reforça o apoio ao funcionamento do

Conselho das Comunidades Portuguesas (segunda alteração à Lei n.º 66-A/2007, de 11 de dezembro);

Projeto de Lei n.º 581/XV/1.ª (L) — Revê as leis eleitorais, alargando o leque de inelegibilidades para a

Assembleia da República; consagrando um círculo nacional de compensação; alargando o período de

campanha eleitoral e o voto por correspondência às eleições para a Presidência da República e estabelecendo

regras relacionadas com os debates televisivos, a remoção da propaganda eleitoral e a possibilidade de

missões internacionais de observadores;

Projeto de Lei n.º 582/XV/1.ª (L) — Consagra um prazo para remoção da propaganda eleitoral e determina

que a sua violação constitui contraordenação, alterando a Lei n.º 97/88, de 17 de agosto, na sua redação

atual;

Projeto de Lei n.º 583/XV/1.ª (L) — Cria uma comissão nacional para debates eleitorais e altera a lei da

cobertura eleitoral;

Projeto de Lei n.º 587/XV/1.ª (PAN) — Reforça as competências do Conselho das Comunidades

Portuguesas e os direitos dos respetivos conselheiros, alterando a Lei n.º 66-A/2007, de 11 de dezembro;

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Projeto de Lei n.º 589/XV/1.ª (CH) — Altera a Lei n.º 66-A/2007, de 11 de dezembro, que define as

competências, modo de organização e funcionamento do Conselho das Comunidades Portuguesas.

O segundo ponto trata da apreciação do Projeto de Resolução n.º 466/XV/1.ª (PSD) — Recomenda ao

Governo que, no âmbito do processo de descentralização, avalie a vulnerabilidade sísmica dos edifícios e

equipamentos do Estado a transferir para os municípios e comunidades intermunicipais, juntamente com, na

generalidade, os Projetos de Lei n.os 580/XV/1.ª (L) — Indicador de risco em caso de sismo, 585/XV/1.ª (PAN)

— Institui um sistema nacional de cobertura do risco de fenómenos sísmicos e de desastres naturais e cria o

fundo sísmico e para desastres naturais e 590/XV/1.ª (CH) — Altera a legislação com o objetivo de reforçar a

segurança das construções contra os sismos.

Do terceiro ponto consta a discussão do Projeto de Resolução n.º 469/XV/1.ª (CH) — Constituição de uma

comissão parlamentar eventual para apurar e prevenir interferência política abusiva no sistema bancário

português.

O quarto ponto trata da discussão do Projeto de Lei n.º 558/XV/1.ª (PS) — Estabelece a composição,

organização, funcionamento e estatuto do Conselho para a Ação Climática.

Por fim, do quinto e último ponto constam as votações regimentais.

Chegámos ao fim da nossa sessão.

Muito boa tarde a todos e a todas e até amanhã.

Muito obrigada.

Eram 18 horas e 18 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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