O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 7

II Série — 2.° Suplemento ao número 1 Quarta-feira, 18 de Outubro de 1978

DIARIO

da Assembleia da República

I LEGISLATURA 3.A SESSÃO LEGISLATIVA (1978 - 1979)

SUMÁRIO

Inquérito parlamentar:

Requerimento do Grupo Parlamentar do PS pedindo a nomeação de uma comissão parlamentar eventual de inquérito a acusações formuladas por alguns órgãos de comunicação social ao Deputado António Macedo.

Ex.mo Sr. Presidente da Assembleia da República:

O Grupo Parlamentar do Partido Socialista vem, ao abrigo do disposto no artigo 183.°, n.° 2, alínea e), da Constituição e demais legislação aplicável, requerer se proceda a inquérito parlamentar, nos termos e com os fundamentos seguintes:

1 — O jornal estatizado O Comércio do Porto publicou no seu número de 24 de Setembro último um artigo de Fernando Barradas intitulado «... E a veneranda figura foi a Angola!», onde se afirma que António Cândido Miranda de Macedo ou só António Macedo, presidente do Partido Socialista e Deputado a esta Assembleia pelo círculo do Porto, serviu de intermediário num negócio de café de milhões de contos entre «os milionários do café» e o Presidente da República Popular de Angola, Agostinho Neto.

2— Lê-se, com efeito, no citado artigo publicado no jornal estatizado O Comércio do Porto, de 24 de Setembro último, o seguinte (veja documento n.° 1):

Um negócio de milhões de contos

No dia 28 de Agosto de 1977, acompanhado por dois industriais ligados ao café, que inclusivamente lhe pagaram o bilhete de ida e volta de avião, chegou a Luanda um importante elemento do Partido Socialista.

Conforme na altura afirmou numa entrevista à Radiodifusão Portuguesa um seu correligionário político que na altura, se encontrava igualmente em Angola, o velho democrata e lutador antifascista deslocou-se àquele país «por razões

de natureza particular». De facto, a veneranda figura do Partido Socialista foi a Angola servir de intermediário en-

tre os milionários do café e Agostinho Neto, num negócio de milhões de contos, sublinhe-se: milhões de contos.

3 — Ressalta do próprio contexto do artigo que o visado por tais acusações infamantes é o Deputado socialista António Macedo. Mas, para maior certeza, dias depois o semanário Tempo, no seu número de 28 de Setembro último, depois de se referir a António Macedo como «o venerando presidente do PS», assevera que «um matutino portuense» o acusa de responsável por chorudo negócio de café, cujos custos são suportados pelos portugueses ... (veja documento n.° 2).

4 — Outros órgãos de comunicação social se fizeram eco das acusações infamantes do jornal estatizado O Comércio do Porto ao Deputado António Macedo, como a Rádio Renascença e o semanário Expresso, este no seu número de 30 de Setembro último (veja documento n.° 3).

5 — Lendo-se, com atenção, tais notícias e comentários, resulta que o Deputado António Macedo é neles acusado de ter servido de intermediário num negócio chorudo de café efectuado entre industriais portugueses e o Presidente da República Popular de Angola, Agostinho Neto, no valor de milhões de contos, do qual auferiu proventos em seu benefício próprio e com prejuízo do povo português, valendo-se para isso do seu passado antifascista e das suas relações pessoais de amizade com o Presidente Agostinho Neto.

6 — Tais afirmações infamantes provocaram escândalo público, dada a repercussão que tiveram.

7 — Tais imputações infamantes foram negadas e desmentidas pelo visado, como se colhe, entre outros factos, das cartas que dirigiu ao jornal estatizado O Comércio do Porto e aos semanários Expresso e Tempo (veja documentos n.os 4 a 6).

8 — Ora, tais afirmações infamantes não podem ficar na penumbra da dúvida e do boato, pois se trata de matéria de interesse público relevante para o exercício das atribuições da Assembleia da República (artigo 1.° da Lei n.° 43/77, de 18 de Junho).

9— Com efeito, fere o prestígio e a dignidade da Assembleia da República afirmar-se publicamente que um seu Deputado se encontra envolvido em tráfico ilícito de café, para seu benefício e em pre-

Página 8

2-(8)

II SÉRIE — NÚMERO 1

juízo do povo português, valendo-se para isso da sua projecção política, do seu passado antifascista e das suas relações pessoais de amizade com o Chefe de um Estado estrangeiro.

10 — Por outro lado, como ainda num dos seus recentes discursos o recordou o Sr. Presidente da República, a colaboração amiga com os países africanos de expressão portuguesa constitui um dos pilares da politica externa portuguesa.

11 — Por isso, se tais afirmações infamantes forem destituídas de fundamento — como são —, elas representarão não só um atentado à honra alheia e uma manobra política reprovável, como também uma ofensa aos interesses do Estado Português. Tal facto será duplamente grave quando oriundo de um jornal estatizado como é O Comércio do Porto, pois que parece ser suposto dever um jornal estatizado não ofender os interesses do Estado a que pertence.

12— Em face do exposto, apresenta-se o seguinte

Projecto de resolução

A Assembleia da República resolve, ao abrigo do disposto nos artigos 1.° e 2.° da Lei n.° 43/ 77, de 18 de Junho, e demais legislação aplicável, constituir uma comissão eventual de inquérito com o objectivo de averiguar da veracidade das acusações infamantes acima precisadas (nomeadamente nos n.os 2 a 5 supra) formuladas pelo jornal estatizado O Comércio do Porto e os demais órgãos de comunicação social atrás referidos (Rádio Renascença, Tempo e Expresso) contra o Deputado António Cândido Miranda de Macedo, ou só António Macedo.

Para tanto, requer a V. Ex.ª se digne mandar publicar o presente requerimento, nos termos e para os efeitos do artigo 220.° do Regimento.

Junta seis documentos.

Lisboa, 17 de Outubro de 1978. —Pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista: António Macedo — Francisco Salgado Zenha — Carlos Lage.

DOCUMENTO N.° 1

De facto, é verdade. O público anda a ser roubado no preço do café — acabou por confessar, custosamente, o dono de uma das principais firmas que, no Porto, comercializam café.

Estou num elegante gabinete alcatifado, numa empresa que se dedica à venda de café. Vou directo ao assunto:

Sei que, tenho provas de que, quero saber como, tem de me explicar porquê e justificar os quantos.

Quando as verdades se dizem com determinação, em voz alta, sem hesitar e sem reticências, as pessoas, que, acima de tudo, nem sonham que as sabemos e que as vamos dizer, não têm coragem para as negar, para as contestar, para. as desmentir.

Adoptam-se atitudes de criança apanhada a ir ao frasco dos doces e, com um suspiro forte, após um breve momento de hesitação acaba-se por confessar.

A consciência, por vezes, é mais forte do que a falta de escrúpulos. E a confissão torna-se um alívio...

Então, a tranquilidade só se consegue depois do saco despejado. E, realmente, nalguns casos o saco estava, está, bem cheio.

Mas não se esqueça —diz-me o industrial de café—, eu não lhe contei nada. Por isso, se escrever alguma coisa no jornal, eu nego tudo o que sejam referências à minha pessoa ...

E assim, esbarrando com o medo, fui lentamente recolhendo os elementos que, mais uma vez, me permitem afirmar que, neste momento, o negócio do café está assente na chantagem e na corrupção. Na ilegalidade.

Um negócio de milhões de contos

No dia 28 de Agosto de 1977, acompanhado por dois industriais ligados ao café que, inclusivamente, lhe pagaram o bilhete de ida e volta de avião, chegou a Luanda um importante elemento do Partido Socialista.

Conforme na altura afirmou numa entrevista à Radiodifusão Portuguesa um seu correligionário político, que, na altura, se encontrava igualmente em Angola, o velho democrata e lutador antifascista deslocou-se àquele país por razões de natureza particular.

De facto, a veneranda figura do Partido Socialista foi a Angola servir de intermediário entre os milionários do café e Agostinho Neto, num negócio de milhões de contos. Sublinhe-se, milhões de contos.

Refira-se, como informação, para que cada um pense o que quiser, que entre a ilustre personagem socialista e os homens do café só foram estabelecidos contactos para este negócio. Ou seja, nenhum laço de amizade, conhecimento comercial ou até mesmo afinidades políticas existiam entre um e outros.

Como diria o poeta, foi verem-se e amarem-se...

Para o «namoro» entre o político e os industriais serviu de «correio» um comerciante estabelecido com uma loja de miudezas na Rua de Fernandes Tomás.

Os avisos do anjo da guarda

Por cá, entretanto, e como consequência da contingentação às importações, começou a faltar o café.

A maioria dos industriais do sector principiou a deitar as mãos à cabeça. Sem café, as suas empresas teriam de fechar.

Começou então a chantagem...

Devido a jogadas de anticipação que, nalguns casos, só podem ter sido consequência de avisos feitos por pessoas bem metidas nos meandros do Governo, o café passou a estar exclusivamente nas mãos de dois ou três industriais.

Efectivamente, e basta referir o caso das importações de 1977, o sector assistiu a autênticos golpes de teatro que só podiam ter sido ensaiados nos gabinetes governamentais. Por exemplo:

Para 1977, foi fixado um limite máximo de importação de café no valor de 800 000 contos. Este limite foi fixado por portaria publicada no dia 27 de Fevereiro desse ano. Pois nesse mesmo dia, imagine-se, o limite estabelecido já estava ultrapassado em cerca de 1 500 000 contos ...

Realmente, o caso é muito estranho. Embora, e lá está o que referi no primeiro artigo desta série, esteja tudo perfeitamente legal. Assim, e curiosamente, dois industriais «iluminados» pelo anjo-da-

Página 9

18 DE OUTUBRO DE 1978

2-(9)

-guarda, fizeram, sozinhos, em enos de dois meses, quase o triplo das importações que estavam destinadas a todo o sector para o ano inteiro...

Entretanto, aos outros industriais passaram a ser sistematicamente negados os boletins de importação.

Mas, sobre este caso, quem poderá dar boas informações são as Dr.as Rita Balbina Colher e Alda de Carvalho, chefes de serviço, e Dr. Boavida, chefe de licenciamento e registo prévio do Ministério do Comércio Externo, e, sobretudo, o Dr. António Celeste, do Partido Socialista e Secretário de Estado nessa data ...

Acrescente-se ainda que, por várias vezes, as quantias, em dólares, constantes nos boletins de importação tiveram um valor superior ao custo real do produto, possibilitando assim a compra de muitas mais toneladas de café do que as autorizadas ou, se se quiser igualmente aventar esta hipótese, possibilitando uma fuga de divisas ...

Possuidores da quase totalidade do produto, em Portugal, toda a comercialização do café passou a ser feita segundo as exigências e condições de preço impostas pelos amigos do anjo-da-guarda ...

(De O Comércio do Porto, de 24 de Setembro de 1978.)

DOCUMENTO N.° 2

António Macedo, o venerando presidente do PS que tanta polémica tem suscitado, centralizou mais uma vez as atenções gerais. No sábado, ao lado de Rego, Curto e Laje, foi «vedeta» num comício socialista em S. Mamede de Infesta, ao qual acorreram algumas dezenas de pessoas: invocou «manobras e campanhas» orquestradas contra o seu partido como causador do desgaste da imagem do PS, por elas responsabilizando jornais que classifica como reaccionários, alguns partidos e até, «esferas altas do Poder».

Neste contexto incluiu, mesmo, Ramalho Eanes, não se coibindo de dizer que o Presidente acaba de «dar algumas alfinetadas ao PS, sem a coragem de o fazer directamente»...

Paralelamente, um matutino portuense acusava António Macedo de responsável por chorudo negócio de café, cujos custos são suportados pelos Portugueses ...

(Do Tempo, de 28 de Setembro de 1978.)

DOCUMENTO N.° 3

O negócio do café desce ao banco da imprensa com o seu anjo-da-guarda

«Café: negócios amargos.» Já lá vão mais de oito dias desde que O Comércio do Porto começou a escalpelizar o negócio do café, mundo que, pelos vistos, se tem prestado a manobras mais que duvidosas com frequentes insinuações aqui e além na imprensa.

Começou O Comércio do Porto a série «Café: negócios amargos» em 22 deste mês em reportagens assinadas por Fernando Barradas e sobre as quais, que nós saibamos, caiu o maior dos silêncios, mesmo nos

meios de comunicação social, excepção feita à Rádio

Renascença, embora o tema se centre no mundo da

corrupção, cancro primeiro das democracias. Cancro ainda maior se a corrupção conseguir os favores de personalidades com cartão de antifascistas. Pior ainda e melhor para os negócios se esse cartão vier do antigo regime em virtude de actos públicos que atraíram as atenções gerais de modo a constituírem espécie de carimbo. (Está tudo em Jacinto Benavente, o grande comediógrafo espanhol dos princípios do século, morto nos alvores do franquismo, na sua peça Os Interesses Criados.) Carimbo que actuará com tanta mais eficiência quanto maior for o posto no aparelho de Estado do seu detentor.

Quando se consegue interessar um tal cidadão, ele próprio será levado pela dinâmica do negócio que urge proteger e pelo escândalo que provocaria a sua revelação a interessar outros e outros. O negociante hábil sabe disto e sabe que o medo do escândalo guarda a vinha e o vinhateiro e pode levar mesmo a produzir legislação que legitime, face ao direito positivo vigente, actuação nada consentânea com a convivência civil em que devem assentar as relações sociais. É este o tema da comédia de Jacinto Benavente que recordámos, ao ler as reportagens de O Comércio do Porto, que nelas se pode enquadrar se tudo corresponder à verdade. E porque o tema é dos mais importantes que a imprensa portuguesa tratou ou aflorou nestes últimos dias, não quis o Expresso deixar de o pôr em relevo, ao mesmo tempo que chama a atenção dos seus leitores para a obra do célebre comediógrafo espanhol e a atenção das companhias de teatro.

O Comércio do Porto não foi, porém, ao fundo da questão.

Ao seu repórter, segundo ele próprio confessa, foram oferecidas «notas de conto» (não diz quantas) para abandonar o inquérito. Entretanto, sabemos que o jornal portuense tenciona ir mais além, depois de um período de pausa, e que um tímido inquérito está a caminho. Não ao jornal, mas ao negócio do café.

Apresentamos a seguir uma parte do texto publicado no passado domingo, respeitando, inclusive, os subtítulos.

Um negócio de milhões de contos

«No dia 28 de Agosto de 1977, acompanhado por dois industriais ligados ao café que inclusivamente lhe pagaram o bilhete de ida e volta de avião, chegou a Luanda um importante elemento do Partido Socialista.

Conforme na altura afirmou numa entrevista à Radiodifusão Portuguesa um seu correligionário político que, na altura, se encontrava igualmente em Angola, o velho democrata e lutador antifascista deslocou-se àquele país por razões de natureza particular.

De facto a veneranda figura do Partido Socialista foi a Angola servir de intermediário entre os milionários do café e Agostinho Neto, num negócio de milhões de contos. Sublinhe-se: milhões de contos.

Refira-se, como informação, para que cada um pense o que quiser, que entre a ilustre personagem socialista e os homens do café só foram estabelecidos contactos para este negócio. Ou seja, nenhum laço de amizade, conhecimento comercial ou até mesmo afinidades políticas existiam entre um e outros.

Como diria o poeta, foi verem-se e amarem-se ...

Para o «namoro» entre o político e os industriais serviu de «correio» um comerciante estabelecido com uma loja de miudezas na Rua de Fernandes Tomás.

Página 10

2-(10)

II SÉRIE — NÚMERO 1

Os avisos do anjo-da-guarda

Por cá, entretanto, e como consequência da contingentação às importações, começou a faltar b café.

A maioria dos industriais do sector principiou a deitar as mãos à cabeça. Sem café, as suas empresas teriam de fechar.

Começou então a chantagem ...

Devido a jogadas de antecipação que, em alguns casos só podem ter sido consequência de avisos feitos por pessoas bem metidas nos meandros do Governo, o café passou a estar quase exclusivamente nas mãos de dois ou três industriais.

Efectivamente, e basta referir o caso das importações de 1977, o sector assistiu a autênticos golpes de teatro que só podiam ter sido ensaiados nos gabinetes governamentais. Por exemplo:

Para 1977, foi fixado um limite máximo de importação de café no valor de 800 000 contos. Este limite foi fixado por portaria publicada no dia 27 de Fevereiro desse ano. Pois nesse mesmo dia, imagine-se, o limite estabelecido já estava ultrapassado em cerca de 1 500 000 contos.

Realmente, o caso é muito estranho. Embora, e lá está o que referi no primeiro artigo desta série, esteja tudo perfeitamente legal. Assim e curiosamente, dois industriais «iluminados» pelo anjo-da-guarda, fizeram sozinhos, em menos de dois meses, quase o triplo das importações que estavam destinadas a todo o sector para o ano inteiro ...

Entretanto, aos outros industriais passaram a ser sistematicamente negados os boletins de importação.

Mas sobre este caso quem poderá dar boas informações sãos as Dr.as Rita Balbina Colher e Alda de Carvalho, chefes de serviço, o Dr. Boavida, chefe de licenciamento e registo prévio do Ministério do Comércio Externo, e, sobretudo, o Sr. Dr. António Celeste, do Partido Socialista e Secretário de Estado nessa data ...

Acrescente-se ainda que, por várias vezes, as quantias, em dólares, constantes nos boletins de importação tiveram um valor superior ao custo real do produto, possibilitando assim a compra de muitas mais toneladas de café do que as autorizadas ou, se se quiser igualmente aventar essa hipótese, possibilitando uma fuga de divisas...

Possuidores da quase totalidade do produto, em Portugal, toda a comercialização do café passou a ser feita segundo as exigências e condições de preço impostas pelos amigos do anjo-da-guarda ...

(De O Comércio do Porto, de 24 de Setembro de 1978.)

A culpa é do Governo

Para O Comércio do Porto a culpa é do Governo, acusação que é feita nos seguintes termos:

E eis-nos chegados ao momento de fazer a pergunta principal desta reportagem que, há seis dias, temos vindo a publicar: Quem é o grande responsável por esta situação?

Quem é o culpado pela existência de homens de fatos cinzentos, quem permite que se criem ocasiões de corrupção, quem provoca a fraude, quem torna fácil a ilegalidade?

Não há a mínima dúvida sequer: o culpado é o Governo!

Ao impor a limitação à importação de produtos de consumo, seja o café, o bacalhau, o açúcar, as bananas ou outra coisa qualquer, o Governo está, automaticamente, a dar origem aos circuitos de importação e comercialização clandestinos.

Só o facto de não haver livre importação de café é que permitiu o aparecimento de alguns aventureiros que, golpe a golpe, passaram a ter o exclusivo do produto. Logo, a fornecê-lo aos outros industriais impondo condições na venda e preços que, por sua vez, se reflectiram na bolsa do consumidor.

No dia em que cada industrial for livre de importar o produto necessário às suas carências de produção e venda, deixam indistintamente de existir especuladores, circuitos de candonga, passando a haver não só abundância no abastecimento como a salutar concorrência, que quase sempre resulta a favor do público.

Neste caso concreto do café, foi o Governo o responsável pelas centenas de milhares de contos que, a dezenas de escudos por quilograma, pagámos a mais pelo produto.

Muito poucos serão, como já dissemos, os comerciantes que têm a sua escrita limpa de vigários. A maior parte deles, certamente, alinhou a custo na ilegalidade. Mas, como já expliquei, não tinham segunda alternativa: ou viciavam a escrita e escolhiam o caminho da fraude, ou tinham de fechar a porta, lançando no desemprego centenas de trabalhadores.

Claro que «os por fora» exigidos por baixo da mesa, fomos nós que os pagámos ... Mas, mesmo assim, sei que alguns comerciantes só acederam a participar na vigarice porque estavam, como se costuma dizer, «com a corda ao pescoço».

Até porque, veja-se, os comerciantes, apesar de, para pagar a chantagem, levarem o café mais caro ao consumidor, não tiveram com esse aumento, qualquer tipo de lucro extra. Simplificando, diremos que os comerciantes foram obrigados a ir-nos ao bolso para dar a outros.

(Do Expresso, de 30 de Setembro de 1978.)

DOCUMENTO N.° 4 Lisboa, 10 de Outubro de 1978.

Ex.mo Sr. Director de O Comércio do Porto:

Só muito tardiamente, e em circunstâncias que não interessa referir, tomei conhecimento de uma série de artigos, sob o título «Café: negócios amargos», da autoria do Sr. Fernando Barradas.

No terceiro da série, com a rubrica «Um negócio de milhões de contos», publicado em O Comércio do Porto, de 24 de Setembro, alude-se à ida a Luanda de «um importante elemento do Partido Socialista», «velho democrata e lutador antifascista», concretizando-se que a «veneranda figura do Partido Socialista foi a Angola servir de intermediário entre os milionários do café e Agostinho Neto, num negócio de milhões de contos. Sublinhe-se: milhões de contos».

Pelas referências que ficam apontadas, e sabido — o que sempre foi claro e público — que sou amigo

Página 11

18 DE OUTUBRO DE 1978

2-(11)

pessoal de Agostinho Neto (que me honra com a sua estima) e que por três vezes estive em Angola (em missões de amizade ou de carácter político-partidário), logo houve, ao que me informam, santas almas a propalar que a «coisa» era comigo — e para me atingir...

Ora, o escrito do Sr. Fernando Barradas nem sequer tem o mérito da novidade. É a repetição, o decalque, de outras insinuações malévolas — indirectas, ambíguas, sofisticadas...— já por mim categoricamente desmentidas e tratadas como calúnias que são.

Claro que a reincidência, neste momento, leva a admitir que se insere na campanha movida contra o Partido Socialista e alguns dos seus elementos mais destacados e representativos, como, aliás, já foi salientado.

Mas isso é uma outra história que um dia será contada.

Por agora, e face ao que fica ponderado, proponho-me prestar dois breves e decisivos esclarecimentos:

Um, de ordem geral — ao garantir que, durante 1977 (ano visado no texto do Sr. Fernando Barradas), se não importou de Angola um grama ou um grão de café ...

Em Portugal não entrou, nessa época e vindo de Angola, ao menos o café necessário para uma chávena ou «bica» ...

Outro esclarecimento, de ordem pessoal — ao afirmar peremptoriamente que nunca recebi nem receberei um único centavo (sublinhe-se: um único centavo), a qualquer título, por qualquer modo, por qualquer negócio — de café ou do que queiram inventar.

...Mas, afinal, quem fez, como fez, quando se fez o tal negócio de café de Angola de milhões de contos?

Sublinhe-se: de milhões de contos!

Por outro lado, guarda-se silêncio sobre determinantes e resultados das minhas viagens a Luanda: o êxito dos contactos levados a cabo para o estabelecimento de relações diplomáticas, a nível de embaixada; a aceitação, em princípio, do descongelamento ou «desconfisco» de certos bens e valores de muitos dos nossos compatriotas, ainda fixados ou já ausentes de Angola; o repatriamento de angolanos e até o regresso de «retornados», segundo regras a definir e a concertar; a libertação de algumas dezenas de portugueses presos nas cadeias de Luanda, por razões políticas e outras, etc.

Sr. Director: entrego nas mãos de V. Ex.ª este «desforço», que mais é um acto de legítima defesa da honra e do bom nome de quem nada teme, porque nada deve — certo de que lhe será dado publicidade, nos termos e condições que são meu direito.

Apresento a V. Ex.ª os meus cumprimentos.

António Macedo

DOCUMENTO N.° 5

Lisboa, 11 de Outubro de 1978.

Ex.mo Sr. Director do Expresso:

No Expresso-Revista, de 30 de Setembro, e sob o título «O negócio de café desce ao banco da imprensa com o seu anjo-da-guarda» (a ocupar, para maior realce, quase toda a largura das pp. 18 e 19-R), foi transcrito, reproduzido (por fotogravura) e largamente comentado um texto da autoria do jornalista Fernando Barradas, que o jornal O Comércio do Porto publicara na sua edição do dia 24.

Afora o mais que decorre do carácter e propósitos da vinculação do Expresso à matéria desse texto — com as incidências e implicações que agora e aqui me abstenho de apreciar—, julgo de meu direito remeter a V. Ex.°, para efeitos de publicação, no próximo número do seu semanário, uma fotocópia da carta que enderecei ao director de O Comércio do Porto, acerca da notícia que serviu de base e suporte ao escrito do Expresso— e que, repito, a transcreveu, reproduziu e comentou, dando-lhe, deste modo, maior divulgação e projecção pública.

Agadecido, apresento a V. Ex.ª os meus cumprimentos.

António Macedo

DOCUMENTO N.° 6

Porto, 16 de Outubro de 1978.

Ex.mo Sr. Nuno Rocha, do jornal o Tempo:

Na galeria «Pessoas», de o Tempo, de 28 de Setembro, com chamamento do público leitor para a rubrica «António Macedo», informa-se que «um matutino portuense (leia-se O Comércio do Porto) acusava António Macedo de responsável por chorudo negócio de café, cujos custos são suportados pelos Portugueses».

Posto que no dito matutino não tivesse sido feita a menor referência ao meu nome (nem sequer ao cargo de presidente do Partido Socialista), como também se não escrevesse que eu fora «responsável por chorudo negócio de café, cujos custos são suportados pelos Portugueses», entendeu o Tempo, para os fins que teve por convenientes, redigir pelo modo como o fez a notícia inserta na sua galeria.

Para além da reserva que faço de reagir contra a distorção, o carácter e propósitos do texto publicado em o Tempo, é de meu direito remeter a V. Ex.ª, para efeitos de publicação no próximo número do seu semanário, uma fotocópia da carta que enderecei ao director de O Comércio do Porto acerca da notícia de que o Tempo se fez eco, com o realce e caracterização a que alude.

Apresento a V. Ex.ª os meus cumprimentos.

António Macedo

Página 12

PREÇO DESTE NÚMERO 3$00

IMPRENSA NACIONAL CASA DA MOEDA

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×