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II SÉRIE — NÚMERO 77

PROPOSTA DE LEI N.° 94/11 PRATICAS INDIVIDUAIS RESTRITIVAS DA CONCORRÊNCIA

1 — O Governo apresenta esta proposta de lei animado pelo propósito de contribuir para se dotar quanto antes o ordenamento jurídico português com os meios legais de defesa da concorrência, bem como de prevenção e repressão das práticas restritivas. Seria redundante qualquer tentativa de enaltecimento das virtualidades da concorrência no contexto de uma sociedade aberta e estimulada pela competitividade. Dela se espera permanente tensão na procura do progresso técnico, na racionalização dos sistemas de produção e distribuição e, por via disso, a maximização dos resultados com a maior economia de custos. Dela esperam os consumidores que a oferta dos produtos e serviços se processe em termos de progressiva melhoria qualitativa, sem estrangulamentos e sem estar sujeita às pressões no sentido da alta dos preços. Dela espera ainda o poder democrático o revigoramento do próprio mercado, a sua transparência e funcionamento liberto dos abusos e distorsões dos operadores sem escrúpulos dispostos a aproveitar todas as oportunidades de lucro fácil, desleal e imoral. Como espera, outrossim, o encurtamento das distâncias em relação aos sistemas jurí-dico-económicos dos países da Europa em cujas organizações comunitárias esperamos integrar-nos.

2 — Não ignora o Governo as dificuldades que minam toda a acção consequente deste domínio. Nem desconhece, aliás, as conclusões dos estudiosos da criminalidade económica em geral, dominadas por um não disfarçado desencanto no que toca à viabilidade de uma luta eficaz contra a chamada delinquência de colarinhos brancos, categoria que cobre também as práticas restritivas da concorrência. Ê assim, consabidamente, tanto nos países de economia de mercado como nos de economia estatizada e planificada. Se são diferentes, pela natureza das coisas, as manifestações da criminalidade económica, não deixa de ser comum a preocupação com ps seus custos e a sua rebeldia em relação aos instrumentos clássicos de prevenção e repressão.

Sabe-se, aliás, que todas estas dificuldades se agravam no campo específico das práticas restritivas da concorrência. Por ser menos sensível e emotivo o impacte dos seus custos sobre as respectivas vítimas, afinal de contas, a comunidade de consumidores; por serem menos visíveis as próprias condutas que as corporizam; por ser menos evidente o seu carácter de práticas proibidas e ilíticas. É o que a literatura da especialidade dos países com mais aturada experiência neste domínio — v. g. os autores franceses — confirma de forma particularmente impressiva.

Apesar de tudo, entende o Governo ser necessário enfrentar este desafio. Que mais não se ganhe, sempre se contribuirá para avivar a consciência colectiva dos custos sociais destas práticas, da sua reprovabilidade e intolerabilidade moral. E sempre se poderá, por esta via, abrir o caminho a formas mais eficazes de luta e prevenção.

3 — Ao elaborar a sua proposta de lei, o Governo esteve atento à lição do direito comparado. Concretamente, ponderou com particular cuidado a experiência legislativa da França, Alemanha Federal e Espanha. À influência destes textos legais, bem como dos comen-

tários entretanto suscitados nas respectivas doutrinas, ficaram a dever-se muitas das soluções adiantadas nesta proposta de lei.

Apesar de tudo, acredita o Governo ter concluído por um projecto com identidade própria e com a originalidade suficiente para merecer uma ponderação autónoma. Um projecto que cura igualmente reivindicar uma certa coerência política e doutrinal, ê o que importa explicitar, sumariando alguns dos seus traços mais salientes.

4 — Optou-se por submeter o ilícito em matéria de concorrência ao regime geral (substantivo e processual) das contra-ordenações. Seguiu-se, quanto a isto, o paradigma da lei alemã (Kartellgesetz) de 1957. E isto por duas razões: em primeiro lugar, porque se reputa este regime particularmente indicado à natureza específica deste ilícito; em segundo lugar, porque se acredita que esta solução pode ter o mérito de contribuir para a progressiva dinamização prática da lei das contra-ordenações, até agora latente como mera lei quadro.

São conhecidas as vicissitudes sofridas por esta lei, que se prendem com a dificuldade da conversão brusca e global das contravenções em contra-ordenações, dificuldades que relevam sobretudo da necessidade de encontrar as autoridades competentes para a aplicação das coimas. Nestes termos, e a ser verdade, como se afigura, que a instauração definitiva do regime das contra-ordenações é, no nosso país, inevitável a prazo relativamente curto, tudo haverá a ganhar se tal se fizer de forma gradual. E nada mais indicado para começar do que um domínio tão circunscrito e específico como o do ilícito em matéria de concorrência.

5 — São três as categorias de práticas consideradas restritivas da concorrência, proibidas como contra-ordenações e, como tais, sancionadas com coima: as práticas concertadas, os abusos de posição dominante e as práticas individuais (imposição de preços mínimos, imposição de condições discriminatórias relativamente a transacções comparáveis e recusa de venda). A aplicação das sanções compete em primeira linha ao Conselho da Concorrência, a criar no Ministério da Agricultura, Comércio e Pescas, com recurso para os tribunais comuns, nos termos do regime geral das contra-ordenações instaurado pelo Decreto-Leí n.° 232/79, de 24 de Julho.

6 — Nestes termos, o Governo, utilizando o poder conferido pelo n.° 1 do artigo 170.° da Constituição da República, apresenta à Assembleia da República, com pedido de prioridade e urgência, a seguinte proposta de lei:

Capítulo 1

Das regras de concorrência

Secção i.a Generalidades

ARTIGO 1*

O presente diploma tem por objecto a defesa da concorrência no mercado nacional, a fim de salvaguardar os interesses dos consumidores, assegurar a transparência dos mercados e favorecer a realização dos objectivos gerais de desenvolvimento económico e social.