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II Série — Número 4
Sábado, 20 de Outubro de 1984
DIÁRIO
da Assembleia da República
III LEGISLATURA
2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1984-1965)
SUMÁRIO
ACTA DA REUNIÃO DA COMISSÃO DE ECONOMIA, FINANÇAS E PLANO DE 19 DE OUTUBRO DE 1984
O Sr. Presidente (João Salgueiro):—Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunido desta Comissão.
Eram ¡0 horas e 35 minutos.
O Sr. Presidente:— De acordo com o que foi estabelecido — e, aliás, este já foi o método que utilizámos aquando da aprovação da Lei do Orçamento do Estado para 1984— os Srs. Deputados terão oportunidade de obter aqui esclarecimentos adicionais por parte dos responsáveis pelos diferentes departamentos ministeriais.
Em última análise, deveria ser possível finalizarmos com a recolha de esclarecimentos sobre os problemas financeiros, mas a ausência do Sr. Ministro das Finanças e do Plano, na próxima semana, em virtude da sua deslocação ao Luxemburgo, torna conveniente que comecemos por esta matéria mais geral, sem prejuízo, no entanto, de a ela voltarmos no final com o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, que, desde o início, se mostrou disponível para um acompanhamento mais directo.
Não sei se o Sr. Secretário de Estado do Orçamento quer começar por fazer alguma intervenção.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Alípio
Dias):—Sim, se me permite, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente:—Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começaria por pedir desculpa pelo meu atraso, mas acontece que tive necessidade de passar no meu gabinete ainda de manhã, o que me obrigou, de facto, a estes 30 minutos de atraso.
O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): — Desde que não tenha descoberto mais nenhum «buraco»f...
Risos.
O Orador: — Não. vou é ver se tapo mais um... Risos.
Por outro lado, gostaria de apresentar as desculpas do Sr. Ministro das Finanças e do Plano por não poder estar aqui presente no início dos trabalhos, facto que se deve a razões de Estado, isto é, a reuniões a que não pode faltar. No entanto, deve passar ainda hoje de manhã aqui por esta Sala.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, uma vez que «: discussão na generalidade em Plenário se centrou, principalmente, em questões estritamente do foro financeiro, penso que poderíamos entrar já nos pedidos de esclarecimento.
Também estava agendada para esta manhã a discussão dos aspectos articulados com o Ministério da Administração Interna, mas penso que talvez pudéssemos, nesta primeira parte, centrar o debate c os pedidos de esclarecimento sobre as questões directamente ligadas ao Ministério das Finanças, sem prejuízo de, como disse, no final da análise dos diferentes departamentos ministeriais, onde os pedidos de alterações orçamentais foram maiores, voltarmos a rellcctir sobre o equilíbrio geral.
A Mesa espera, pois, inscrições dos Srs. Deputados que queiram usar da palavra.
Pausa.
Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Hasse Ferreira.
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O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): — Sr. Secretário de Estado do Orçamento, penso que há aspectos neste orçamento suplementar que ainda não foram completamente esclarecidos — pelo menos na minha opinião — e é precisamente sobre um desses aspectos, cuja análise em Plenário não me pareceu, apesar de tudo, suficientemente aprofundada — talvez por dificuldades de condições—, que solicito mais alguns esclarecimentos complementares.
Não tive oportunidade de estar presente na reunião da passada segunda-feira, por motivos relacionados com a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos. Liberdades e Carantias.
De qualquer forma, sei que no próprio dia do debate em Plenário apareceu num vespertino desta capital, concretamente o Diário -Popular —que é um jornal que até não costuma publicar notícias falsas —, ? afirmação de que, segundo informação do próprio Banco de Portugal, há muito tempo que este tinha informado a Secretaria de Estado do Orçamento sobre a impossibilidade de transferir para o Orçamento dc Estado as verbas que, efectivamente, depois não foi possível transferir.
Ora, como sabe, essa verba altera radicalmente o montante global que está em jogo no défice suplementar que é apresentado.
Assim, dada a importância desta contradição, embora a fonte do Banco de Portugal não venha, efectivamente, identificada — mas também não vi até agora nenhum desmentido—, gostaria que, do ponto de vista do rigor da nossa própria análise, o Sr. Secretário de Estado clarificasse um pouco mais este aspecto, ou seja, quando é que o Banco de Portugal terá previsto que poderia transferir essa verba e de que forma o terá feito — por documentos, verbalmente ou por outra forma qualquer— e quando terá dito o contrário, isto é, que não poderia transferir aquele montante.
Por agora apenas quero pedir este esclarecimento, embora tenha outras questões a colocar. Porém, e até para não mc dispersar, penso que seria melhor colocá-las ao Sr. Ministro das Finanças e ao Sr. Ministro da Indústria —que não sei se aparecerá nesta ronda —, uma vez que dizem respeito aos montantes das verbas para as empresas públicas. Outros esclarecimentos gostaria de pedir ao Sr. Secretário de Estado dos Transportes ou ao Sr. Ministro do Equipamento Social sobre o m,ontante das indemnizações compensatórias.
Neste momento é, de facto, este aspecto do relacionamento entre o Banco de Portugal e o Governo que gostaria de ver esclarecido.
Aliás, até penso que ouvi — mas, provavelmente, terei ouvido mal — o Sr. Ministro de Estado Almeida Santos dizer que o Governo não manda no Banco de Portugal. Não percebi exactamente o alcance desta afirmação e. além disso, o Governo, felizmente, também não manda no Diário Popular, apesar de ser um jornal da capital que é controlado pelo Estado.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): — Parece limitar-se à Televisão.
Risos.
O Orador: — De qualquer forma, penso que este assunto é suficientemente importante para justificar
um maior esclarecimento, pois, em meu entender, as impressões trocadas em Plenário não chegaram ao fundo da questão. Creio que esta notícia, publicada no dia 17 dc Outubro num jornal —que, pelo que conheço, não costuma publicar notícias que não sejam verídicas —, é suficientemente grave e, portanto, a sua não transmissão não tem fundamento.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
Antes, porém, gostaria de responder a uma questão levantada aqui pelo Sr. Deputado Hasse Ferreira.
Estava previsto o Sr. Ministro da Indústria vir à reunião desta Comissão na próxima terça-feira. Só que parece que há um Conselho de Ministros nesse dia e, portanto, estamos a tentar confirmar as presenças dos membros do Governo ainda a tempo de os Srs. Deputados serem informados.
Tem V. Ex.3 a palavra, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: <—
Sr. Deputado Hasse Ferreira, gostaria de esclarecer que, normalmente e por via de regra, as relações entre o Banco de Portugal e o Governo se estabelecem através do Gabinete do Sr. Ministro das Finanças e do Plano e, naturalmente, o Sr. Secretário de Estado do Tesouro.
Neste caso concreto, o que realmente posso recapitular e esclarecer a V. Ex.a é do que segue: o orçamento do Banco de Portugal para 1984, na sua demonstração de resultados provisionais, tem custos e proveitos. E nos proveitos, e a título de proveitos excepcionais, está lá prevista uma verba, grosso modo, da ordem dos 38 milhões de contos que, no entendimento do Banco de Portugal, resultaria da venda dc ouro. São os chamados lucros excepcionais que resultariam da venda de ouro.
Como já foi esclarecido pelo Sr. Ministro das Finanças e do Plano, durante o primeiro trimestre deste ano vendeu-se uma pequena quantidade de ouro. Mas à medida que o exercício foi decorrendo e que o ano financeiro foi evoluindo, constatou-se que não seria, porventura, necessário —ou pelo menos estritamente necessário — vender ouro ao longo do ano para fazer face ao financiamento da balança de transacções correntes.
A questão foi muito controvertida e acontece que o Banco de Portugal, a propósito do Orçamento para 1985, foi adiando a entrega da conta provisional para esse ano.
Ora, o que é um facto é que a decisão formal e definitiva da não alienação de ouro foi tomada, salvo o erro, só em 15 ou 16 de Outubro — não sei ao certo o dia, mas sei que fez na segunda-feira passada 8 dias. Foi, portanto, posteriormente a isso que, formalmente e oficialmente, o Banco de Portugal comunicou ao Governo —concretamente ao Sr. Ministro das Finanças e do Plano— que os seus resultados, por força da não alienação de ouro, não chegavam a atingir os montantes que estavam previstos, isto é, os tais 45 milhões de contos, e que, por essa via, não poderia fazer a entrega, a título de rendimentos de propriedade, dessa importância.
O Sr. Presidente: — Dado o método informal dc esclarecimento dos problemas que tínhamos adoptado
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e embora haja outros Srs. Deputados que pediram a palavra, vou dar de novo a palavra ao Sr. Deputado rlasse Ferreira, que a pediu, porque penso tratar-se ainda da mesma questão.
Antes, porém, quero informar os Srs. Deputados que o Sr. Ministro das Finanças e do Plano que há momentos chegou estará presente durante pouco tempo i.ma vez que tem outros compromissos ao fim da manhã. Está aqui, pois, por uma atenção com a Comissão.
Peço, assim, aos Srs. Deputados que queiram colocar questões ao Sr. Ministro o façam agora, embora, em lelação a todas as questões, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento esteja aqui, em representação do Ministério das Finanças, para esclarecer.
Tem V. Ex.° a palavra, Sr. Deputado Hasse Ferreira.
O Sr. Hasse Ferreira (UEDS):—Sr. Secretário de Estado, muito rapidamente quero abordar um aspecto que gostaria de ver esclarecido.
Segundo entendi, a decisão de não vender ouro, neste caso — e, provavelmente, noutros —, é sempre tomada pelo Banco de Portugal sem qualquer intervenção do Ministério das Finanças ou da Secretaria de Estado do Tesouro, na medida em que V. Ex.° diz que o Banco de Portugal comunicou ao Ministério das Finanças que não o vendia. Tenho, pois, a impressão de que não houve uma intervenção do Ministério das Finanças.
Por outro lado, as estimativas de diversos institutos de previsão indicavam que iria haver determinadas flutuações no preço do ouro ao longo deste ano. Ora, o que, aparentemente, surge é que o Banco de Portugal e o Ministério das Finanças não dispunham dessas estimativas. Ê que, de facto, houve previsões económicas quanto à evolução da venda de ouro.
Será que houve algum facto excepcional que tenha feito variar de tal forma a cotação do ouro que fizesse com que uma decisão tomada num sentido fosse alterada?
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —
Sr. Deputado Hasse Ferreira, esta questão tem de ser entendida do ponto de vista global.
A venda de ouro destinava-se, fundamentalmente, a financiar a balança de transacções correntes. Portanto, o Governo foi seguindo atentamente. Porque, repare, Sr. Deputado, a cotação podia não ser boa, mas se o Governo —ou melhor, o País— estivessem em dificuldades para financiar a sua balança de transacções correntes, provavelmente poderia ter que vender curo mesmo a uma cotação baixa. Outra hipótese que se poderia pôr era a de o Governo não ter necessidade de vender ouro para financiar a balança de transacções correntes, mas a cotação daquele ser de tal maneira elevada que valesse a pena vender ouro para estabilizar a dívida pública.
Portanto, há várias alternativas que se poderiam pôr e essas alternativas é que foram sendo sopesadas ao longo do ano.
Como lhe disse, a decisão final —que, naturalmente, foi tomada em articulação com o Governo — de não vender outro teve lugar na semana que se
iniciou fez na segunda-feira passada 8 dias, e foi na quinta-feira imediatamente a seguir que, formalmente e oficialmente, foi anunciada a decisão. Mas resultou, obviamente, de conversações e ponderação das diversas hipóteses.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Pinheiro Henriques.
O Sr. Pinheiro Henriques (MDP/CDE):—Sr. Secretário de Estado do Orçamento, apesar do debate jà travado na generalidade, penso que faltam alguns esclarecimentos em relação às verbas que aqui são alteradas, os quais situo em dois planos: primeiro, uma explicação para a dimensão dos desvios que se verificam nas verbas e, segundo, um esclarecimento em relação ao imprevisto.
Julgo que estes desvios são, por vezes, suficientemente significativos para justificar que se esclareça porque é que eles aconteceram e o que é que falhou.
Cito, por exemplo, o caso dos 2 milhões de contos atribuídos a pensões e reformas, cuja justificação não me parece suficientemente aceitável. Diz-se que é justificável pelo aumento de 14 % com que foram beneficiadas as pensões de aposentação.
Ora, a pergunta que, em relação a este exemplo — e gostaria de alargar o esclarecimento também em relação às outras verbas—, levanto é a seguinte: então não se previa qualquer aumento de pensões e reformas? Ou que aumento é que se previa?
O Sr. Presidente:—Tem V. Ex.° a palavra, para responder, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Sr. Deputado Pinheiro Henriques, se bem entendi V. Ex.a quer um esclarecimento, particularmente, em relação ao problema das pensões e reformas.
Quanto a esta questão, há um conjunto de causas e é natural que na explicação que foi dada, de uma forma, talvez, sintética, não estejam enumeradas todas as causas que suscitaram este reforço em matéria de pensões e reformas.
Desde logo porque, como já tive ocasião de explicar na passada segunda-feira na reunião não pública da Comissão de Economia, Finanças e Plano, a dotação provisional foi estimada antes de fazermos o acerto final em matéria de aumentos de vencimentos da função pública.
Portanto, há que ter presente que a dotação provisional não estava, de facto, totalmente habilitada para fazer face, porventura, aos acréscimos salariais que se vieram a concretizar.
Quando falo em acréscimos salariais, faço-o lato sensu, porque há depois o problema das diuturnidades e dos subsídios de refeição que foram substancialmente aumentados — mais até do que o previsto.
Portanto, há aqui um conjunto de razões que explicam este facto.
Para além disso, foi também feito um esforço no sentido da aceleração da atribuição das pensões, quer na área das pensões de aposentação, quer na área das pensões de sobrevivência. Designadamente, em matéria de pensões de sobrevivência, o processo foi bastante encurtado, uma vez que, por força de um diploma de 1983, foi estabelecido uma pensão pro visória. Quer dizer, já não se torna necessário aguar-
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dar felizmente, toda a tramitação do processo para que seja fixada e atribuída a pensão de sobrevivência. Começa-se, de imediato, a pagar uma pensão provisória e a partir daí o processo decorre nos seus termos normais até se fixar a pensão definitiva.
Ora, são também situações e razões deste tipo que explicam o reforço agora proposto a esta Câmara em matéria de pensões e reformas.
Por um lado, a aceleração introduzida na atribuição de pensões. Certamente que os Srs. Deputados se recordam que, justamente, uma das críticas que foi feita ao Governo na parte final, de 1983 é que se estava a arrastar demasiado o processo de atribuição das pensões, o que era um facto. Esse processo foi acelerado, mas também teve a sua contrapartida que veio a ter implicações financeiras mais volumosas do que as que os serviços, porventura, inicialmente teriam previsto.
Por outro lado, houve que ter em conta o problema das pensões de sobrevivência.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado
Magalhães Mota.
O Sr. Magalhães Mota (ASD1): — Eu tinha também algumas questões para colocar e começaria pela dos 45 milhões dc contos.
Creio que as explicações do Sr. Secretário de Estado conduzem a um controle bastante apertado da situação, uma vez que era preciso ponderar várias variáveis de grande flutuação ao longo do tempo. Tinha que se ter em atenção as cotações do ouro, d comportamento da balança de transacções correntes c tudo isto deveria ser, portanto, uma situação acompanhada no dia-a-dia, tanto mais que se contava com uma receita de 45 milhões de contos para realizar despesas já previstas no Orçamento. Todos estes factos tornam mais estranho que esta decisão tenha surgido subitamente, já que o ouro não é património do próprio Estado depositado no Banco de Portugal.
Portanto, o que gostaria de saber é se a consequência jurídica desta situação não é a de que os lucrus resultantes das eventuais vendas do ouro são um resultado directo para o próprio Estado, e não um lucro do Banco de Portugal transferível depois para o Estado.
Como se verifica, as situações são completamente diferentes e traduzem-se em intervenções também de tipo completamente diferente.
Para além desta primeira inetrrogação. põe-se-me uma segunda. Numa situação complicada, como vimos, quais são os instrumentos de que o Ministério das Finanças dispõe para acompanhamento da situação da balança dc transacções correntes? Quer dizer, o Ministério precisou de uma informação do Banco de Portugal, não confiando nos seus próprios elementos, que certamente terá, para só no dia 8 ou 9 de Outubro tomar a decisão no sentido de não se vender ouro porque a balança de transacções correntes teve um comportamento melhor do que aquele que era esperado? O Ministério desconfiava do êxito da sua própria política e dos resultados obtidos? Não tinha segurança absoluta sobre esses resultados?
Depois disto, o Banco de Portugal tinha lá o ouro. Pelos vistos, o Ministério tinha-lhe dado instruções (ão genéricas que poderiam permitir que o Banco de Portugal, em qualquer momento, de acordo com as
circunstâncias, conforme ele próprio — e não o Governo— achasse oportuno, conveniente e útil, vendesse o ouro. Ou então, a não ser assim, o Ministério, porque dava instruções e indicações para a venda, sabia exactamente que o ouro não tinha sido vendido nem o ia ser. Uma das duas situações complica a explicação dada pelo Sr. Secretário de Estado do Orçamento. Isto porque se o Ministério dava instruções é porque conhecia a situação. Se o Banco de Portugal não tinha autonomia de decisão, o Ministério tinha obrigação de conhecer exactamente, há muito tempo, que não ia obter aquela receita. Pelo menos tinha obrigação de saber. E sabia, inclusivamente, que se no dia 15 ou 16 de Outubro tem dado ordem de venda de ouro para permitir esse lucro extraordinário de 45 milhões de contos, isso produziria alterações profundas na nossa própria situação e até no próprio valor das reservas de ouro do Banco de Portugal.
Seria o Banco de Portugal que dirigia toda esta operação? Mas nesse caso como é que se percebe que o Ministério não nos tivesse informado, a tempo e horas, das vendas sucessivas que o Banco de Portugal ia efectuando e que só no tal dia 15 ou 16 de Outubro se tenha dado conta, de repente, que as vendas que o Ministério presumia feitas, afinal não se tinham efectuado?
Isto é, pelo menos, estranho em matéria de relacionamento entre o Ministério das Finanças e o Banco de Portugal numa situação ainda por cima complexa e creio que justificaria algum esclarecimento complementar.
Gostaria depois de, numa segunda questão, conhecer quais foram as repercussões no Orçamento de 1984 e em orçamentos futuros de um protocolo celebrado com o Governo Regional da Madeira, que não passou pela Assembleia da República, mas que se traduz na transferência, no tempo e dilatadamente, da satisfação de compromissos do Governo Regional da Madeira.
O Sr. Presidente: — Antes de dar a palavra ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento para responder ao Sr. Deputado Magalhães Mota, queria dizer o seguinte: temos, segundo penso, muitas questões para esclarecer e ia pedir aos Srs. Deputados um esforço para não estarmos a levantar questões onde o esclarecimento já esteja atingido. O júri somos nós próprios, não estamos a convencer ninguém e julgo, portanto, que quando estivermos esclarecidos não vale a pena estarmos a querer aprofundar mais uma matéria que já esteja suficientemente clarificada.
Queria pedir, por outro lado, aos Srs. Deputados que queiram colocar questões directamente ao Sr. Ministro que o fizesse agora, porque ele terá que sair. Desta forma ele poderá dar, num prazo curto, resposta às questões que lhe forem postas.
Em relação às perguntas que o Sr. Deputado Magalhães Mota pôs o método era outro, pelo que o esclarecimento vai ser concluído ainda pelo método antigo.
Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —
Sr. Deputado, vou tentar recapitular como é que surge a transferência a títulos de rendimentos dc propriedade do Banco de Portugal para o Orçamento do Estado.
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O Banco de Portugal fez o seu orçamento e nele existe a conta de resultados provisionais.
Nessa conta temos custos e proveitos orgânicos e inorgânicos. E é deste conjunto de realidades que surge o resultado do Banco de Portugal e que surge a transferência a títulos de rendimentos de propriedade. Isto é transparente e consta do orçamento do Banco de Portugal.
Ao longo do ano, há uma articulação e contactos com certa regularidade, como é evidente, entre o Sr. Ministro e o Banco de Portugal e, eventualmente, outros secretários de Estado, ê na sequência destes contactos que se começa a resolver se se deve ou não vender ouro. Como já tive ocasião de dizer, Sr. Deputado, podíamos não ter necessidade de vender ouro do ponto de vista de financiar a balança de transacções correntes e, todavia, a cotação de ouro no mercado internacional ser de tal modo elevada que justificasse perfeitamente a sua venda. Não há aqui nenhum fetiche, isto é, julgo que o Governo não está agarrado à ideia de que o ouro é uma coisa perfeitamente inalienável e que tem que estar ao canto da gaveta. ê de facto uma das reservas que o País tem e que deve ser utilizada na prossecução dos objectivos que pretende alcançar com a política económica que está desenhada.
Ê, pois, ao longo do ano, do balancear destas questões, que a decisão acaba por ser tomada. Não é efectivamente necessário do ponto de vista da balança vender ouro; e a cotação deste, pelo menos neste momento e naquilo que é previsível até ao final do ano, não aconselha a que se venda ouro por outras razões que não sejam aquelas que são estritamente necessárias ao financiamento da balança. Mas como estas não são necessárias, vamos pôr de parte a venda de ouro.
Ê desta maneira, Sr. Deputado, que a questão surge e se põe e ou aceitamos esta realidade ou não a aceitamos, e é impossível, quanto a isto, ciar mais explicações do que aquelas que já foram dadas, ê que ela traduz a realidade dos factos e a partir daí, Sr. Deputado, os factos são sagrados e os comentários são livres, havendo as interpretações que cada um quiser fazer.
Mas esta é de facto a realidade e foi esta a tramitação.
No que respeita à Madeira, julgo que não há que falar cm protocolos secretos. Havia dificuldades do Governo Regional da Madeira em satisfazer o serviço da dívida que se vencia em 1984 e, portanto, o que o Governo Regional fez foi um protocolo com os bancos que o apoiaram, no sentido de diferir no tempo o reembolso dos juros e das amortizações que, porventura, tivessem lugar.
julgo que não há mais nada, Sr. Deputado, porque de facto é apenas isto.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI):—E isso não tem nenhuma repercussão no Orçamento do Estado?
O Orador: — Não.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): — ê estranho!
O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): — Houve intervenção do Governo junto dos bancos para eles aceitarem essa reestruturação da dívida?
O Orador: — Julgo que não, uma vez que se trata de matéria do Governo Regional.
Sr. Deputado Magalhães Mota, esse acordo poderia ter de facto repercussões no Orçamento do Estado se efectivamente uma parte desses financiamentos feitos ao Governo Regional tivesse o aval da República e se o Governo da República fosse chamado a honrar o aval que deu.
Nessa altura, teria obviamente repercussões no Orçamento do Estado.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, como já referi não vale a pena estarmos a repisar muito as matérias, tendo cada um que fazer o juízo que entender depois dos esclarecimentos, porque o que se vai aproveitar depois desse repisar não é, se calhar, quase nada.
Inscreveram-se para formular perguntas ao Sr. Ministro os Srs. Deputados Hasse Ferreira, Octávio Teixeira, Carlos Carvalhas, Bagão Félix e Mário Adegas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira.
O Sr. Hasse Ferreira (UEDS):—O problema que queria colocar relaciona-se com um aspecto sobre o qual não fiquei completamente esclarecido durante o debate inicial no Plenário.
Em função dos compromissos com o FMI e das cartas de intenção enviadas pelo Sr. Ministro e pelo Governador do Banco de Portugal, era aparentemente um objectivo essencial a contenção do défice orçamental. No entanto, e relacionado com esta operação que estávamos a analisar, aparece no quadro a dada altura como menos importante, pelo menos na aparência, este défice orçamental, que se deixa aumentar significativamente.
O que é que terá havido para além das cartas enviadas ao FMI que permita efectivamente esta situação? Houve algum acordo, contacto ou opção do Governo de fazer frente às injunções do FMI, que permita passar-se, tranquilamente, de um extremo rigor ou mesmo de uma excessiva preocupação de poder conter o défice orçamental, na discussão que aqui tivemos há um ano, para este alargar um pouco descontrolado que se verifica nesta fase?
Gostaria de saber o que se passa, porque a análise das cartas de intenções não parece suficiente. Haverá, obviamente, outros elementos que justificaram esta mudança de atitude do Governo em relação ao aumento deste défice orçamental.
Se o Sr. Ministro pudesse produzir mais alguns esclarecimentos, para além daqueles que já deu no Plenário, agradecia.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): —Aproveitava para colocar uma ou duas questões ao Sr. Ministro, embora depois com o Sr. Secretário de Estado tenhamos possivelmente que regressar a pontos que vou agora referir.
A primeira questão relaciona-se ainda com o problema dos 45 milhões de contos. Mas já explico a razão por que a levanto agora.
Não vou discutir neste momento a explicação que tem sido dada, mas o Sr. Secretário de Estado avançou que estavam previstos, em lermos de lucros excepcionais do Banco de Portugal, pela venda de ouro, cerca
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de 37 a 38 milhões de contos. O que é certo é que nessa perspectiva foram contados 45 milhões. E a taí questão que temos referido. Há assim outros problemas e não vale a pena estarmos a tentar passar por cima deles porque são importantes, do nosso ponto de vista.
A questão que coloco não se relaciona exclusivamente com os 45 milhões de contos e com o Banco de Portugal. Ela é mais global, e prende-se com o facto de saber por que é que ainda não foram tomadas medidas — é que isto não é uma situação de momento, porque já vem de há longo tempo.
Ainda dentro desta rubrica de participação nos lucros das empresas públicas, no caso concreto das instituições de crédito, gostaria de ter uma informação do Sr. Ministro sobre os 52 milhões de contos — parte do Banco de Portugal e parte de outras instituições monetárias — que estavam previstos. O que queria saber é se se mantém da parte das outras instituições monetárias a previsão, neste momento, de receber tudo.
Para terminar, uma outra questão.
já aqui foi visto, na sessão anterior, com o Sr. Secretário de Estado, o problema da existência de indícios claros, na execução orçamental, de desvios, nalguns casos relativamente acentuados, nos diversos impostos, isso não foi desconfirmado até agora, antes pelo contrário. Confirmam-no os elementos que temos até junho? O Governo tê-los-á já até Setembro?
A explicação que o Sr. Secretário de Estado deu foi a de que eles se anularão mais ou menos no conjunto, pelo que não valerá a pena fazer alterações.
A questão que coloco ao Sr. Ministro é política e atinente à Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado.
Pergunto ao Sr. Ministro se mantém também essa opinião do Sr. Secretário de Estado, no sentido de que não valerá a pena fazer as correcções necessárias nestas alterações, uma vez que elas no conjunto se andarão.
O que penso é que politicamente — não estamos aqui a analisar as questões apenas em termos técnicos— não é a mesma coisa que os aumentos de receitas dêem um certo tipo de impostos e as diminuições de receitas dêem um outro.
Eram estas as três questões que deixava para já ao Sr. Ministro.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): — Sr. Ministro, já tivemos ocasião de dizer no Plenário, e com alguma solenidade, que nos parece de uma grande irresponsabilidade tentar explicar o défice de 45 milhões de contos com o argumento da venda ou não venda de ouro.
Ora, as palavras têm um significado. Todas as pessoas que aqui estão conhecem bem a situação e os resultados do sistema bancário, e parece-nos que isto seria suficiente para se tirar uma conclusão. Se quisermos discutir neste terreno talvez a situação seja muito complicada.
Posto isto, e esperando que as palavras tenham sido compreendidas no seu verdadeiro sentido, a questão que queria colocar era a seguinte: o Sr. Ministro não teria tido conhecimento de uma versão ajustada, que já existisse, do orçamento do Banco
de Portugal, em Setembro, em que já não se previa vender ouro?
A segunda questão era a seguinte: mesmo tomando como boas as explicações do Sr. Secretário de Estado do Orçamento, de que o Banco de Portugal pensaria vender ouro no valor de 38 milhões de contos, verifica-se que para 45 milhões ainda faltam 7 milhões. Por que é que não foram buscar estes 7 milhões ao Banco de Portugal?
Agora, relacionando isto com o que disse há pouco — creio que para bom entendedor isso chega —, afirmo que, mesmo que se tivesse vendido o ouro, o défice seria de 36 milhões de contos. Portanto, há outras causas.
Isto, para dizer que deveríamos situar esta questão noutros planos.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Adegas.
O Sr. Mário Adegas (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O sentido das perguntas que pretendo formular ao Sr. Ministro vai no desejo de melhorarmos o controle da execução orçamental. O resto são realidades que o País tem de enfrentar e apesar de as podermos sempre discutir com profundidade, creio que talvez não consigamos obter alguma resposta.
O controle da execução orçamental é um problema que não tem nada a ver só com este Governo, mas sim com o nosso país. A meu ver, nesta área estamos muito longe de uma posição satisfatória, e é por isso que estou convencido de que é preciso não criarmos ilusões a esse respeito.
Foi positivo —e afirmei isso no Plenário— o trabalho realizado pela Secretaria de Estado do Orçamento, designadamente em ter mapas mensais para o meihor acompanhamento da realização de receitas e da efectivação de despesas. Creio, pois, que isso é positivo, mas ninguém levará a mal que diga que o considero muito insuficiente, porque estou convencido que também é preciso mudar a mentalidade da análise desses mapas.
Ora, se isso fosse feito, ou seja, se houvesse uma apreciação de gestão financeira global, o que não tem nada a ver com o desempenho de funções políticas, mas com a própria máquina e com a intervenção política, naturalmente que se teria rido mais atenção nas verbas grandes que lá estavam — e essa era a minha dúvida, o ano passado, quando manifestei algumas reservas na intervenção que fiz, na generalidade, no debate do Orçamento.
Desta forma, eu teria uma cábula no Orçamento e, por exemplo, nesta verba dos 45 milhões ou do equivalente no rendimento de propriedade teria, pelo menos, 3 ou 4 asteriscos, talvez até de cor, porque esta era aquela receita com que contava, mas que não desejava que se verificasse por aquela via. Isso é como se uma empresa ou um indivíduo tivesse um programa financeiro para o ano ou tivesse uma receita de um seguro de vida de um familiar — pre-vendo-se que esse seguro de vida ia ser recebido—, mas que era prudente que não contasse muito com essa receita ou que a ponderasse nas despesas que efectuava, porque até desejava que ela não se verificasse, ou seja, que o familiar não morresse.
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ê por isso que, até talvez com alguma originalidade, eu continue a referir que o problema da venda do ouro tem sido mal posto no Parlamento. Foi bom para a economia portuguesa, para a política cambial e para a política financeira que não se vendesse o ouro no tai valor de 45 milhões de contos.
O que está mal foi ter considerado essa receita e não a ter acompanhado depois, face à vulnerabilidade que ela tinha. E essa receita tinha uma vulnerabilidade tão grande que até se desejava que se não verificasse — portanto, ainda bem que não se verificou. Para não perdermos aqui muito tempo quanto a este assunto, creio que ele poderia ser mais escalpelizado numa reunião de trabalho.
A mentalidade do controle da execução orçamental é inexistente — como infelizmente é a predominante —, ou começa a ensaiar os primeiros passos de uma mentalidade burocrática que diz que olha os mapas, mas que olha os mapas de coisas pequenas e não de coisas grandes. Se, por exemplo, este ano se introduzirem no Orçamento verbas de rendimento de propriedade e, depois, se de 15 em 15 dias não se for verificando se as perspectivas e o nível ali incluído se mantém, penso que estamos a fazer gestão burocrática e não gestão orçamental moderna — é apenas disso que me estou a ocupar.
Um esforço que compreendi perfeitamente da parte do Sr. Ministro foi o de que, tanto quanto possível, não se continuasse a admitir ou não se admitisse, à partida, porque é sempre um mau vício de execução orçamental, as grandes dotações de capital para as empresas públicas. Creio, pois, que essa atitude de tentar travar essa situação foi positiva. Aliás, também acho positivo que haja desvio, porque se à partida ele é logo consagrado como encargo, a probabilidade de execução em Portugal é dramática e realiza-se caso seja ou não necessário. É, pois, bom que não escamoteemos esta realidade!
Portanto, o desvio dos reforços de dotação para as empresas públicas é, pois, uma realidade. A minha insatisfação é por julgar que ele é intercalar e parcial e que. infelizmente, não significa a totalidade da realidade. Por outro lado, ele significa factos consumados porque se quisermos interpretar a realidade, se formos ver as dívidas das empresas públicas ao sistema bancário, que têm que ser regularizadas, verificamos que não são 23 milhões de contos — podem ser 60, 70, 80, 100 milhões de contos, etc.
Em relação ao controle orçamental, gostaria que o Sr. Ministro me dissesse que medidas é que pensa que o País e a máquina administrativa têm possibilidades de lhe dar. E isto, porque quem necessita mais deste apoio é o Sr. Ministro para que a execução orçamental ganhe, porque estamos muito longe de qualquer grau que nos console, mesmo qe os mapas saiam no mês adequado—não posso deixar dc manifestar a minha insatisfação em relação a isso.
O ano passado houve um pedido dos Açores e da Madeira — talvez um pouco por habituação, um pouco porque as necessidades também o marcavam — solicitando uma dotação que vinha sendo praticada em anos anteriores e, em respeito e obediência a não haver desvio maior de défice, que neste caso era de cerca de um milhão de contos, o Sr. Ministro mostrou uma certa intransigência que alguns de nós, embora tivéssemos argumentado em sentido contrário, achávamos
razoável, dado o objectivo final que se obtinha, que era o de não deixar subir o défice. Mas, já que o défice não podia ser aquele, o pedido dos Açores e da Madeira deve ser repensado.
Tem que haver um escalonamento inevitável nas bonificações que o Estado não pagou. O Estado deve, talvez, uma centena de milhares de contos de bonificações: poupanças de créditos, poupança à habitação, habitação, etc. Tudo isso para fins grandiosos, mas a realidade é que não estão pagas.
Sabe-se dos esforços sérios que tem havido por parte do Ministério para escalonar este esquema, para que ele seja pago quando for adequado e de forma adequada. Costaria de assinalar que este esforço é positivo, porque os gestores públicos de certas instituições como seja a Caixa Geral, o Crédito Predial, etc, serão julgados pela não rentabilidade das mesmas, mas não se farão as contas de algumas das razões que conduzam a tal.
Ora, este problema tem-se agravado muito ultimamente porque se julgou que os montantes relativos às bonificações eram à volta de 1 milhão ou 2 de contos — porém, só agora se vai ver quanto é ao certo.
Contudo, o que me preocupa é outra coisa que gostaria de perguntar muito directamente ao Sr. Ministro. As bonificações para a habitação estão por pagar, há escalonamentos possíveis, está-se a estudar teenxa-mente e com seriedade o problema. Entretanto criou-se um Instituto Nacional de Habitação e o passado fica ali arrumado, isto é, não se arrumam as contas e, entretanto, esse instituto entra logo com uma dotação orçamental de alguns milhões de contos. Em meu entender, não havia possibilidade nem de dar 100 contos para essa modalidade porque o País não pode. Não é que a habitação não precise ou que esse esforço não deva ser feito. Só que, a meu ver, não se devem alimentar situações irrealistas, porque quem se oferece para fazer as bonificações não as poderá pagar.
Outro problema que queria deixar à reflexão do Sr. Ministro é o seguinte: sempre houve no nosso país muitas empreitadas e obras públicas que, por razões várias, vão arrancando e depois o escalonamento dos pagamentos vai-se fazendo. Só que é preciso pôr alguma disciplina neste campo porque as verbas hoje começam a ser muito perigosas. As verbas e os empréstimos intercalares concedidos a empreiteiros, que têm atrasos gravíssimos de pagamento, pode passar a ser incontrolável como uma bola de neve!
Não sei se alguém tem números reais acerca disso. Duvido que os tenha! Porém, o que não deixa dc ser verdade é que não se devem lançar obras quando depois não há perspectivas de as pagar. Também se pode esconder o. pagamento dizendo aos empreiteiros que debitem em 1985, 1986, etc. Contudo, a dívida está feita e o orçamento não é desonesto mas é irreal, porque faltam muitas verbas. Com efeito, isso pode conduzir a um certo desregramento, sobretudo quando há anos de eleições, em que o Ministro das Finanças será chamado à responsabilidade para o desagradável do défice e do desequilíbrio, mas, entretanto, quem fez a despesa foi capaz de ter tido um bom apoio do País, porque, entretanto, as coisas se fizeram.
Gostaria de fazer um reparo em relação ao facto de o Sr. Secretário de Estado do Orçamento ter dito que o escalonamento da dívida da Madeira não prejudicava o Orçamento. Não prejudica directamente o
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Orçamento, mas prejudicou o sistema bancário, porque dos créditos que concedeu verifica-se que esses créditos não voltam à banca quando devem voltar, e o escalonamento poderia não ser aquilo que em termos de gestão bancária era o que se desejava.
O Governo ao ter avançado tanto nesta matéria pode tê-lo feito por um sentido político positivo. Con^ tudo, em termos financeiros haverá repercussão futura no Orçamento, disso ninguém tenha ilusões, pois, directa ou indirectamente, mais tarde ou mais cedo, a factura há-de chegar. E a factura dos empréstimos à' Madeira e do escalonamento da dívida há-de ter repercussão ou neste Orçamento ou noutro futuro.
O Sr. Presidente: — Gostaria de pedir aos Srs. Deputados que nas perguntas que pretendessem formular tentassem ser um pouco mais sintéticos. Trata-se de matérias que lodos nós conhecemos muito bem e, portanto, basta só invocá-las para se compreender o que é que se quer dizer.
Tem a palavra o Sr. Deputado Bagão Félix.
O Sr. Bagão Félix (CDS): — Sr. Ministro, gostaria de lhe colocar uma questão que, aliás, tem que ver um pouco com a maneira como o Governo, aquando do debate na generalidade, procurou discutir a questão do défice orçamental.
Nesta matéria há três questões fundamentais, que são: a causa do défice, a constatação do défice e o modo de cobertura do défice. Ora, o Governo procurou — e isto até porque tinha o outro lado, que é chamado o lado patriótico da questão, que é o facto de não ter vendido o ouro — situar c sectorizar esta questão nos efeitos e não nas causas, isto é, no modo de cobertura do défice. Portanto, discutiu-se o problema do ouro.
A questão que pretendo colocar ao Sr. Ministro não tem tanto a ver com o ouro, que considero ser uma solução pouco ortodoxa c talvez pouco adequada, porque as reservas são património do País c não propriamente património do Estado. Com ouro ou sem ouro, com lucros de amoedação e produtos de venda de metal, com outras subtilezas do Fundo de Garantia de Riscos Cambiais —cm anos anteriores também houve subtilezas deste tipo, não ignoro isso e não quero desprezar esse facto—, isso só mostra que a realidade nos é cada vez mais desfavorável em termos do crescimento automático, vegetativo, da despesa pública. E um dos factores fortíssimos no aumento das despesas públicas é a questão do funcionalismo.
Apesar de todos os esforços em termos de legislação, quer por parte deste Governo, como de governos anteriores, verificamos que o número de funcionários públicos, em lermos líquidos, vai crescendo automaticamente.
Há pouco o Sr. Secretário dc Estado do Orçamento deu uma explicação ao Sr. Deputado Pinheiro Henriques sobre a questão do aumento das pensões e reformas dos funcionários. Disse que era de 14 %, tendo este valor implícita outra explicação que não explicitou claramente e que se refere ao aumento do universo físico dos aposentados da função pública. Quer dizer que este aumento do funcionalismo público é líquido. Portanto, o número de funcionários que aumenta é maior do que aquele que se aposenta, porque é o resultado líquido da operação de funcionários que são aposentados.
Ainda há pouco tempo saiu uma lista no Diário da República relativamente à Direcção-Geral de Recursos Humanos do Ministério da Agricultura que admitiu mais 140 funcionários.
Sr. Ministro, nestes últimos 12 meses qual foi o acréscimo efectivo do número de funcionários públicos? E quais foram as principais áreas em que tal se verificou?
Que medidas efectivas, e não apenas de teor legislativo e mais ou menos de intenção pia, se procuraram tomar para que esta questão, que mais tarde ou mais cedo terá que ser encarada, se possa resolver?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.
O Sr. José Vitorino (PSD): — Sr. Ministro, não vou invocar questões de ordem geral em termos do sistema económico ou financeiro. .Porém, gostaria de colocar algumas questões que creio serem evidentes.
Para além dos motivos ou das causas de que resultaram estes aumentos, designadamente em relação às empresas públicas, este acréscimo agora verificado resulta de uma má avaliação da situação feita no momento em que se elaborou o Orçamento do Estado? Resultou de uma incorrecta informação dos conselhos de gerência das entidades bancárias? Neste momento há outras dívidas camufladas que poderão surgir, designadamente, no próximo Orçamento ou ainda poderão continuar sem uma clarificação devida? Se há, em quanto se estimam? E se resultou de uma má avaliação ou incorrecta informação, de quem é a responsabilidade?
Em relação às rubricas de diversos ministérios, designadamente o da Educação — e neste caso obras extraordinárias devidas ao novo ano lectivo é aceitável que se façam, embora possamos dizer que deveriam ter sido previstas—, da Segurança Social, da Saúde e mesmo do Ministério dos Negócios Estrangeiros, todos sabemos que a estrutura dos orçamentos dos Ministérios, quer do seu conjunto quer dos departamentos, todas elas, estão suficientemente subdivididas c compartimentadas para ser perfeitamente possível fazer uma previsão das despesas para o ano seguinte.
Se houve falência da previsão, de quem foi e de quem é a responsabilidade?
Houve gastos descontrolados? É que não basta dizer que se aumentou tanto com as pensões ou com a actualização da moeda ou com outros factores, porque isso são elementos claramente possíveis de prever.
Ponho esta questão para já não invocar o aspecto de se ter feito um Orçamento que, à partida, se sabia ser irrealista. Nem sequer quero colocar o problema desse modo.
Portanto, tem de haver aqui uma responsabilidade. De quem c? Não digo que seja do Sr. Ministro das Finanças — já o deixei claro. Aliás, penso que o problema não tem estado a ser devidamente colocado, porque há muitas e muitas coisas que, pelo meu modo de pensar, não têm nada a ver com o Ministro das Finanças — embora lhe compita a coordenação e controle—, mas com o Governo no seu conjunto. E é preciso esclarecer este assunto.
A outra questão que lhe queria colocar é a seguinte: há uma estrutura de Orçamentos do Estado para os próximos anos, em termos de 2, 3, 4 ou 5 anos
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de vista? Isto prende-se com a questão levantada pelo Sr. Deputado Mário Adegas, em relação às obras públioas, pois é fundamental saber até que ponto é possível cobrir e continuar as obras para se acabar com o triste espectáculo verificado hoje em dia, que é o de haver lances de estrada aqui, itinerários de estrada ali, noutro sítio mais uma obra que se começou e que pára no ano seguinte e, entretanto, avança-se com 20 000 ou 30 000 contos para se dizer que a obra não parou, quando na realidade não está a avançar.
Há uma estrutura, pelo menos, para os próximos 2, 3, 4, 5 anos de vista, Sr. Ministro? Julgo que isto é fundamental, até pela crise que o País atravessa e pela recuperação que pretendemos que se faça.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro
das Finanças e do Plano.
O Sr. Ministro das Finanças e do Plano (Ernâni Lopes):—Tentarei abordar os vários pontos focados pelos Srs. Deputados.
A pergunta que o Sr. Deputado Hasse Ferreira me colocou, respeitante à articulação da nossa política com as regras que tínhamos estabelecido com o Fundo Monetário Internacional, foi no essencial respondida, ao que suponho, a propósito de uma pergunta que me foi feita no Plenário, ou pelo Sr. Deputado ou por outro seu colega.
Mas gostaria agora de a desenvolver um pouco mais. Desde logo queria pedir ao Sr. Deputado Hasse Ferreira que aceitasse uma sugestão da minha parte, no sentido de não se pôr o problema nos termos em que o Sr. Deputado o colocou na parte final da sua intervenção, ao dizer «na passagem do extremo rigor para um alargar quase descontrolado». Compreendo que há aqui uma forma literária mas que talvez não corresponda à realidade...
O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): — Desculpe, mas isso foi uma gentileza da minha parte.
O Orador: — Com certeza, compreendo perfeitamente a sua gentileza, mas isso leva-me a realçar que, de facto, não me parece que com a gentileza, em particular ou sem ela, isso corresponda a qualquer coisa próxima da realidade.
De qualquer modo, julgo que há na sua análise um ponto de partida que não corresponde à realidade e, em particular, não corresponde à outra hipótese que suscitou de corresponder a alguma mudança de atitude do Governo. Corresponde, isso sim, a necessidades que houver que enfrentar e corrigir.
Voltando agora ao ponto central da sua questão, gostava de lhe salientar que quer o aumento em termos de PIDDAC quer o aumento em termos de empresas públicas foi especificamente concertado com a missão do Fundo Monetário Internacional que esteve em Portugal.
Portanto, essa decisão político-económica foi tomada e acertada com o Fundo Monetário. O que na altura não foi acertado com o Fundo Monetário foi o aumento das receitas a título de rendimentos da propriedade, resultante de lucros extraordinários provenientes de venda de ouro.
Mas também é facto ...
O Sr. Hasse Ferreira (UEDS):— Diminuição de receitas, nesse caso, Sr. Ministro.
O Orador: — Tem razão, Sr. Deputado, é a diminuição de receitas.
O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): — Se fosse aumentar! ...
O Orador: —- Aí cstaríamqs certamente num debate muito interessante. Então, sim, estaríamos provavelmente num debate do maior interesse neste momento, que era um défice pequenino e com outras coisas. Suponho que talvez não fosse um debate do interesse, parlamentar como tema de discussão, mas do interesse, porventura, da economia portuguesa.
Esse elemento —como estava a dizer há pouco — não foi objecto de discussão específica nessa altura, mas o que é, certamente, objecto de convergência entre o Fundo Monetário Internacional e as autoridades monetárias portuguesas é o facto de o País necessitar não só de salvaguardar mas também de incrementar o seu nível de reservas. Consequentemente, uma operação desse tipo, que teria sido uma operação interessante em termos orçamentais, mas extremamente negativa em termos de situação de reservas do País, porque, como sabem, esse ouro estava dado em garantia e não foi vendido, já que foi possível pagar, há mais de 1 ano, os empréstimos que duravam desde há muitos meses atrás, nalguns casos — não em todos os casos —, pois isso dependia da época dos vencimentos. O que se passou, portanto, foi que Portugal foi capaz de o fazer, por ter recursos em divisas para pagar empréstimos que estavam caucionados.
Portanto, quanto à compatibilidade com as negociações com o FMI ela põe-se nestes termos, c julgo que estão relativamente salvaguardadas, em termos das negociações. Isso só resultou, como lhe disse, do facto de as nossas reservas não terem que ser afectadas em termos de necessidade de venda de ouro.
O Sr. Deputado Octávio Teixeira e o Sr. Deputado Carlos Carvalhas também suscitaram temas relacionados com esta matéria. Relativamente às perguntas colocadas, a primeira das quais sobre que tipo dc medidas se estão a prever em termos da gestão das participações a título de rendimentos da propriedade do conjunto do Banco de Portugal, devo dizer-lhe que, naturalmente, estamos a acompanhar — como também o Sr. Deputado Octávio Teixeira— essa evolução e, como é evidente, temos também uma versão já revista dos resultados do Banco de Portugal.
A este propósito, queria deixar aqui uma nota que julgo importante os Srs. Deputados terem presente: é que o tipo de relação entre o Ministério das Finanças e o Banco de Portugal é, por definição, uma relação permanente; não é uma relação que tenha lugar uma vez por ano ou de 3 em 3 meses. É, pois, por definição, uma relação em termos permanentes.
Existe também um outro aspecto que é importante: havia — e há — documentos formais que concretizam situações que se vão formando. O que acontece cm termos desta diminuição das receitas, resultante de um facto objectivo, ou seja, da não verificação dc lucros extraordinários pela venda de uma parte de ouro, é que foi concretizado numa altura que corresponde àquela situação em que, ao longo de um ano, há uma
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base material para concretizar e formalizar essa situa ção e, de facto, não me parece que seja uma altura excessivamente tardia.
Como já tive oportunidade de dizer, se a proposta de alteração à Lei do Orçamento tivesse sido apresentada, por exemplo, em Novembro ou nos finais de Outubro, nem sequer se teria posto toda esta necessidade de apresentar uma alteração à proposta.
Portanto, julgo que há aqui um certo empolamento de um problema de datas que me parece um pouco excessivo. Mas também não vou pronunciar-me sobre isso.
Perguntou-me ainda, em concreto, se quanto à participação das instituições de crédito se mantém a intenção de receber tudo das outras instituições monetárias. Temos tido uma política que julgamos útil e correcta, no sentido de reforçar as situações em matéria de capital do sistema bancário, designadamente dos bancos comerciais, razão pela qual o Ministério das Finanças está a ponderar uma possibilidade de, ainda este ano, não se fazer com que haja a entrada para o Ministério das Finanças dos resultados apurados nos bancos comerciais.
julgamos ser uma medida que reforça as condições dc capital da banca comercial e que constitui um elemento útil para o funcionamento, nas condições óptimas, do conjunto do sistema bancário.
Dada a dimensão da instituição e a sua natureza especial, contamos que no caso da Caixa Geral de Depósitos, haja a transferência para o Estado de rendimentos da propriedade.
Depois, o Sr. Deputado referiu, em termos políticos, uma matéria de desvios nos diversos impostos e as correcções necessárias aos impostos. Dir-lhe-ei, Sr. Deputado Octávio Teixeira, que isso às vezes acontece. E extremamente raro mas estamos de acordo: acontece, ...
Risos.
... são circunstâncias do destino.
julgo que tem razão, mas numa perspectiva que não é a que estamos a discutir aqui, Portanto, dir-lhe-ei que tem enviesadamente razão; no problema que estamos a discutir da alteração ao Orçamento de 1984, não tem qualquer razão; na perspectiva da política geral a médio prazo e do cômputo geral de evolução do papel do sistema fiscal no conjunto da economia, então tem alguma razão. É nesse ponto que o acompanho.
Passaria agora ao primeiro ponto: não tem razão em matéria de revisão da Lei do Orçamento de 1984, porque alterações desse tipo não se fazem no final do ano, não se faz.cm de uma forma inopinada, não se fazem para corrigir situações que tenham existido.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Dá-me licença,
Sr. Ministro?
O Orador: — Faça favor. Sr. Deputado.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Ministro, muito rapidamente e só para nos entendermos queria dizer-lhe que não se trata de uma questão de alterar üixas. incidências, etc. Não se trata disso, mas da alteração do Orçamento —as receitas já vão ser ou já esião cobradas —, isto é, da alteração formal do Orçamento.
O Orador: — Sr. Deputado, tem alguma alternativa de não fazer a correcção formal das receitas previstas quando, de facto, existem previsões nesse sentido?
O que é que o Sr. Deputado quer fazer, se tem indicadores, como a Secretaria de Estado do Orçamento tem, de que há evolução entre o previsto e o realizado em matéria de cobrança de impostos? Qual é a razão para que isso não seja traduzido na revisão de uma Lei do Orçamento?
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Essa é que não consta.
O Orador: — Pois, mas o que se passa é que são alterações que se compensam entre si e que dão, basicamente, o mesmo tipo de resultados. Nem são necessários — e é esse ponto em que o Sr. Deputado não tem razão—, em 1984, porque não é no final do ano que se vão estar a fazer alterações. O que realmente interessa — e é neste ponto que estou de acordo consigo, pois creio que esse elemento de preocupação que o Sr. Deputado Octávio Teixeira suscita é um elemento de preocupação também de todos os portugueses — é que Portugal terá de rever e melhorar sensivelmente — e o Governo está a desencadear o processo para o fazer— o conjunto do sistema fiscal. Esse é que é o problema.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): —E o outro?
O Orador: — Pois, mas em relação ao outro, peço imensa desculpa mas não o acompanho, pura e simplesmente. Julgo que o Sr. Deputado não tem qualquer razão, pois o problema que suscita está correcto mas não cabe nesta discussão.
O Sr. Deputado Carlos Carvalhas referiu a situação em termos do conjunto dos resultados do sistema bancário. Sobre este ponto, já tive oportunidade de dar uma indicação de resposta: pensamos que é uma boa orientação, num momento em que se faz a abertura do sistema bancário à iniciativa privada, dar condições de bom funcionamento e dar condições de solidez reforçada e dc solidez rebustecida ao sistema bancário. Julgamos também que se justifica que haja uma orientação no sentido de acompanhar o conjunto das instituições, quer através do Banco Central, quer através do Ministério das Finanças. Ê isso que temos feito e é também nesse sentido que adoptámos uma posição de responsabilidade permanente em matéria de gestão da economia e do sistema bancário em particular onde, como sabe. temos acompanhado e melhorado as próprias condições de exploração do conjunto do sistema bancário. E isso que o Governo tem feito, em articulação não só com o Banco de Portugal mas também com os vários presidentes das várias instituições de crédito do sector público, em reuniões regulares que temos tido e que têm dado, julgo eu, bons resultados.
O Sr. Deputado Mário Adegas referiu vários pontos, alguns dos quais o Sr. Secretário do Orçamento me pediu para tratar, razão pela qual abordarei fundamentalmente dois ou três.
Antes de o Sr. Secretário de Estado tocar no problema, devo dizer-lhe que acompanho algumas das referências que o Sr. Deputado fez em matéria dc controle de gestão orçamental.
Isto não é qualquer blague: quando tenho uma blague ou um pequeno assomo de humor ou de ironia
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em geral não sou compreendido. Ê uma pena, e o melhor é não ter a tendência para fazer humor. Não tomem isto como sentido de humor, mas o certo é que, se tenho uma ironia ou uma sílaba de humor, em geral resulta uma coisa confusa, não para mim mas para os meus interlocutores, sobretudo quando são um grande conjunto e se esse conjunto está segmentado em várias componentes há pelo menos uma que não percebe. Portanto, acho melhor não fazer de blague, Sr. Deputado.
Mas o certo é que, infelizmente, ao longo de 1983 não dispúnhamos, nem o Sr. Secretário de Estado do Orçamento nem eu próprio —e julgo que os nossos serviços também não — daquele mínimo dos mínimos, que era ter, ao menos, uma indicação, com alguma segurança em termos de tempo, do que é que se tinha passado em matéria de cobrança de impostos no mês anterior. Nem isso tínhamos! E presumo que não éramos só nós que não tínhamos; os nossos antecessores, evidentemente, também não tinham. Apesar disso, conseguimos, com muito esforço —e isto, Sr. Deputado Bagão Félix, vem muito a propósito da questão que pôs e a que já lá vamos—, pôr a funcionar uma pequena máquina, que pude apresentar na discussão do Orçamento para 1984, para acompanhar um núcleo de acompanhamento de despesas. E tencionamos dar mais passos nesse sentido.
Isto tem muito a ver com a questão que o Sr. Deputado Bagão Félix colocou e com o facto de nós termos simultaneamente funcionalismo a mais e funcionalismo a menos em termos de qualidade, de estrutura de qualidade e da sua qualificação. Mas, enfim, são problemas a que mais tarde nos referiremos.
Portanto, gostaria de dizer, sem qualquer elemento de blague — repito, e peço toda a atenção para não ser mal compreendido— que em 1983 nem isso tínhamos, e que agora, apesar de tudo, temos.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento pediu-me para tratar desta matéria e parece-me que é uma boa solução. Também direi que vamos avançar um pouco mais dentro daquilo que é possível nessa matéria. Tenho aqui a indicação feita pelo Sr. Deputado Mário Adegas de que as regiões autónomas têm um problema em matéria de dotação. Trata-se de um problema que teremos que estudar cuidadosamente.
Depois, entramos em dois pontos fundamentais que o Sr. Deputado referiu.
O primeiro é o aspecto das bonificações que estão por pagar. Temos uma pequena dotação orçamental da ordem, salvo erro, de 8 milhões de contos ou à volta disso, para pagamento de bonificações que não assumimos. É um ponto de extrema gravidade em termos do comportamento do Estado, que, tradicionalmente, há anos c anos que não cumpre obrigações que tem de pagamento de bonificações que se vão atrasando e que têm característica, imposta pela aritmética —e que não tem nada a ver com decisões de orientação gerai, nem tem nada a ver com desejos políticos—, que se traduz no simples facto de os números se somarem uns aos outros; o juro composto, a. soma dos juros com o capital, a soma dos juros com os juros e a soma das dívidas com as dívidas terem um' comportamento simpático que se chama comportamento exponencial. Ora, a acumulação de bonificações, embora não cresça tanto, cresce muito porque se acumulam, em cada ano, as antigas c as que surgem nesse ano. E o nosso país tem reais problemas em matéria de bonificações.
Julgo que quando o Sr. Deputado Mário Adegas põe a tónica entre a necessidade de assegurar as responsabilidades financeiras em comparação com a necessidade — como o Sr. Deputado disse— de criar situações, de tomar iniciativas, de fazer novos projectos, etc, aí, no essencial, pensamos que no caso que citou especificamente de um desses organismos, ele deve funcionar sobre si próprio, sem apoio do exterior. Noutro caso, noutro sentido, esse organismo não faria sentido. Ê um problema que, como o Sr. Deputado Mário Adegas sabe, das duas uma: ou esse organismo é para funcionar sem recurso a contribuições adicionais, ou então está viciado desde o seu princípio. E para não estar viciado desde o seu início, tudo se reconduz à correcta gestão financeira das iniciativas que ele tomar. Ê aí que o problema deve ser posto.
O Sr. Deputado Bagão Félix sublinhou um aspecto muitíssimo importante, usando um qualificativo que eu não conhecia mas que — devo dizer-lhe — vou adoptar porque o acho correcto, quando falou da «realidade do conhecimento automático». Esse, enfim, não me parece particularmente interessante, mas o outro — «vegetativo» — sim. A expressão «crescimento vegetativo das despesas públicas» parece-me uma imagem que tem uma certa aderência à realidade e que me faz lembrar o problema da flor do pântano, que é o dia da véspera em que o pântano fica morto e que, como sabe, foi um problema interessante de todo o período da nossa formação intelectual quando se punha isso em termos da hecatombe.
Bom, espero que não estejamos já na antevéspera desse dia,, do dia que está a meio, mas o Sr. Deputado tem toda a razão, toda. Focou apenas um dos aspectos, podia até ter focado mais, pois eu próprio tive oportunidade de me referir a outros, salvo erro, ainda ontem, portanto não é com grande distância.
Com este prolegómeno não tento corresponder ao seu prolegómeno, mas iria agora responder à questão que me põe de qual é o acréscimo efectivo, nos últimos meses, em matéria de funcionários públicos. Neste momento, não tenho aqui o número exacto até porque pedi esses elementos à Secretaria de Estado da Administração Pública, mas temos um acompanhamento mais de ordem ou pontual ou genérico. O número que lhe podia dar, depois de conferenciar rapidamente, no momento em que o Sr. Deputado estava a fazer a sua pergunta, com o Sr. Secretário de Estado do Orçamento sobre essa matéria, é da ordem de um aumento de 5000 pessoas em matéria de funcionários públicos.
O Sr. Bagão Félix (CDS): — O Sr. Ministro dá-me licença?
O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Bagão Félix (CDS): — Esse número é um aumento líquido na medida em que há também aposentados que vão saindo. Ou será um aumento bruto?
O Orador: — A ideia que temos, nesta matéria, é a de que interessa aprofundar essa questão e não dar uma resposta apenas para cumprir o rito de resposta imediata. Julgo que, dentro em breve, devemos ter essa informação e o Sr. Secretário de Estado do Orçamento lha poderá dar. Tenho uma opinião de princípio sobre o que devia ser, mas se o Sr. Deputado estiver de
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acordo não avançava nesta questão pois prefiro que não seja dado apenas aquilo que é a interpretação deste número.
O Sr. Deputado José Vitorino suscita 4 problemas, tanto quanto pude ver: um, relativo a empresas públicas; outro, de segurança social, saúde, educação e gastos descontrolados; outro, o mal de um orçamento que, à partida, é irrealista e, finalmente, uma perspectiva de 2 a 4 anos.
O Sr. Secretário de Estado do Planeamento dará — é por isso que está presente nesta Comissão Especializada — informações detalhadas quanto ao problema das empresas públicas que, como sabe. têm a ver com aquela Secretaria de Estado.
Em todo o caso, antes de o Sr. Secretário de Estado i do Planeamento usar da palavra para responder a esta questão, julgo que é útil termos uma noção de ordem mais geral, se quiser, sobre esse problema das empresas públicas.
Suponho que muitos de nós não se sentirão directa ou indirectamente responsáveis pela existência de um sector público em Portugal, no sentido de um sector empresarial público de produção que teve uma génese específica. A génese das empresas públicas em Portugal está muito longe de ser uma génese programada em função dos interesses da economia, programada em função da evolução a médio e a longo prazo dos sectores, programada em termos de assegurar que a passagem de uma empresa, com origem privada, para o sector público era a expressão de uma decisão de fundo de política económica de gestão a longo prazo. A génese, como sabem, não tem exactamente este tipo de perfil. O seu perfil é outro.
Por outro lado — e isto é uma aspecto que convém salientar — muitas das empresas públicas existentes, porque são aquelas empresas naqueles sectores, teriam sempre dificuldades. E não têm dificuldades por serem ou não serem públicas— é um aspecto que julgo fundamental termos presente porque temos a tendência excessiva de olhar para as empresas públicas com uma abordagem emocional e. realmente, julgo que abordagens emocionais não são necessariamente as melhores abordagens em termos de gestão de economia no seu conjunto.
As realidades do processo histórico português são o que são neste momento, lulgo que temos muito a corrigir e julgo também que seria uma má orientação e um mau caminho tentar resolver num ápice de tempo, ou seja. em meses, l, 2 ou até 3 anos, situações que só para se degradarem — o que é sempre mais rápido — demoraram mais de uma década. Atenção!, só para se degradarem, porque, como sabem, o processo de degradação geral é mais rápido do que o processo de estruturação.
Antes de entrarmos, com o Sr. Secretário do Planeamento, na matéria concreta dos 23,5 milhões de contos, Sr. Deputado |osé Vitorino, ainda quero referir mais um elemento adicional, ainda temos que ter presente um outro aspecto. A economia portuguesa não está, de modo nenhum, isolada neste tipo de problemas. Independentemente de todos os aspectos que já referi, designadamente no que respeita à génese da situação actual, o facto é que os problemas cm matéria de sectores básicos industriais, na economia europeia, afectam hoje praticamente todos os países. Não há um país europeu que esteja neste momento em condições de ter
sectores tradicionais —velhos, por assim dizer— da indústria, que foram os sectores motores nos anos 50 e 60.
E aqui todos nós temos este ónus. Olhando à volta da Comissão verifica-se que a esmagadora maioria dos presentes, tal qual como eu e o Sr. Presidente, tem um ónus. Ê que a nossa formação intelectual e os nossos períodos de formação de atitude perante o funcionamento da economia e das suas componentes fundamentais são dos anos 50, princípios ou meados de 60. E esses anos, de facto, têm muito pouco a ver com a segunda metade dos anos 80 e pouco ou nada a ver com os anos 90. Até mais: têm pouco a ver também com a transição dos princípios dos anos 70. E isto também tem de ser visto. Ê que há aqui muitas empresas e sobretudo fileiras industriais que, pura e simplesmente, qualquer que seja a sua natureza, estão no final da sua capacidade de rentabilidade, que temos de gerir tão bem quanto possível.
Este problema, repito, não é só um problema português. Connosco agrava-se um pouco, mas isso é por outras razões. Este problema existe hoje em todas as economias razoavelmente desenvolvidas de todo o mundo, em particular na Europa.
Portanto, temos que ter a noção de uma certa frieza e de não darmos um conteúdo excessivamente emotivo ao problema da gestão da situação das empresas públicas e tentar, de facto, resolvê-lo.
O Sr. José Vitorino (PSD): — Dá-me licença, Sr. Ministro?
O Orador: — Faça favor.
O Sr. José Vitorino (PSD): — Logo no princípio, eu disse que não apontava questões de ordem estrutural ligadas ao sistema económico-financeiro em geral. Não pus o problema de fundo em termos de bondade ou ruindade das empresas públicas — tenho ideias sobre isso, poderíamo-lo ter discutido, mas não foi essa a questão — e não referi também se o Estado devia ou não pagar os subsídios. Interessava era saber, em termos estáticos, digamos assim, o que está e como vai ser a previsão para termos uma noção exacta da situação.
O Orador: — Bom, para lhe dizer o que está, onde é que está o realismo, e, dentro do realismo, onde é que está a capacidade, também, porque o realismo supõe a disponibilidade, o Sr. Secretário de Estado do Planeamento tem todos os elementos para fornecer.
Quanto ao segundo aspecto que referiu, ou seja, se houve gastos descontrolados ou situações claramente possíveis de prever em matéria de segurança social, de saúde e do Ministério dos Negócios Estrangeiros, julgo que, em matéria de algumas destas áreas, certamente houve necessidade de reforços orçamentais, como aliás consta da própria proposta de alteração à Lei do Orçamento do Estado e, portanto, não há necessidade de lhe dizer aquilo que já consta, porque houve, de facto, necessidade de reforçar os orçamentos desses Ministérios. Naturalmente que essas situações inicialmente não estavam previstas, mas vieram a acontecer ao longo do ano. Pensamos que há toda a vantagem em acompanhar com o máximo de cuidado e segurança as evoluções nestas matérias, em hora, como sabe, nós tenhamos necessidade de intensificar —e aí retomo a posição do Sr. Deputado Mário Adegas — o conjunto
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da gestão orçamental e não apenas o de um ou outro dos Ministérios.
Nós julgamos que há necessidade de fazer o conjunto da gestão orçamental de modo a não haver aquilo que referiu de situações de derrapagem em alguns sítios. |ulgo que há vantagem em seguir nesse caminho.
Depois referiu-se — suponho que não é uma pergunta específica, mas tomei nota— a. um Orçamento que à partida é irrealista. Creio que o Sr. Deputado José Vitorino não está numa situação em que lhe seja impossível conceber o Orçamento. Como sabe, independentemente da variação no capítulo das receitas, com alguns arranjos dentro do Orçamento de 1984, teríamos tido possibilidade de um agravamento muito moderado do défice e pôr o volume do défice do Orçamento no valor próximo dos 7,2 %, o que seria realmente um exercício de gestão orçamental, julgo eu, não totalmente despiciendo.
Ora bem, o facto, em termos de não se ter feito esse exercício com um défice da ordem dos 7,2 %, resulta de circunstâncias que são praticamente alheias à gestão orçamental em si própria. Julgo que isto lhe dá uma ideia de que o Orçamento não é, à partida, irrealista.
A última pergunta é aquela que tem maior importância, julgo eu, do ponto de vista do futuro da gestão da economia portuguesa.
Quando pergunta se há uma estrutura do Orçamento para os próximos anos, dir-lhe-ei que há estudos nesse sentido, mas não há uma estrutura elaborada que possa permitir dar-lhe uma resposta neste momento.
Sr. Presidente, creio que do ponto de vista das respostas do lado do Ministério ainda haveria a acrescentar as do Sr. Secretário de Estado do Orçamento, mas deixo-as para outra altura.
O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro tem outros compromissos e precisava de sair. Suponho que alguns dos Srs. Deputados gostariam de aprofundar mais esta matéria, mas, como fica o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, talvez pudéssemos passar desta concepção geral para a parte mais precisa.
Uma vez que o Sr. Ministro citou antecessores na pasta, gostava só de referir dois ou três pontos que me parecem ser importantes porque permitem um maior esclarecimento.
Em primeiro lugar queria confirmar aquilo que o Sr. Ministro diz —e uma vez que avançámos já em fazer uma distinção clara entre o que é o controle da despesa orçamental e o que é o seu conhecimento e o seu registo, tenho a impressão que todos neste momento estamos esclarecidos que pode haver um resvalar do défice orçamental sem haver desconhecimento, o que é evidente—, ou seja, que realmente estava em curso no Ministério das Finanças um trabalho que já vinha de trás, que o Dr. Alípio Dias, suponho, tinha ajudado a lançar, para uma informatização do acompanhamento das receitas e despesas. Já havia alguns frutos, mas estávamos longe de ter um resultado tão satisfatório quanto é preciso.
Em relação a outras questões o Sr. Deputado Almerindo Marques também tinha pedido a palavra, mas acho que não vamos agora entrar num debate porque seria penoso para o Sr. Ministro prolongar uma sessão não tendo ele possibilidade de estar presente.
Assim, se concordassem, continuaríamos os trabalhos, apesar da saída do Sr. Ministro, e talvez propusesse o seguinte ponto de ordem: uma vez que está presente o
Sr. Secretário de Estado da Administração Interna e que o Sr. Secretário de Estado do Orçamento vai estar connosco, provavelmente em todas as sessões, se concordassem, faríamos uma alteração à ordem dos trabalhos para iniciar dentro de instantes a análise dos problemas de articulação com o Ministério da Administração Interna, no sentido de evitar que o Sr. Secretário de Estado tivesse de deslocar-se outra vez a esta comissão, sem prejuízo de o Sr. Secretário de Estado do Orçamento dar os esclarecimentos que estão em curso neste momento.
Neste momento assumiu a presidência o Sr. Vice-■Presidente Almerindo Marques.
O Sr. Presidente:— Srs. Deputados, dando seguimento ao que estava esboçado, dou a palavra ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento para fazer os complementos da intervenção do Sr. Ministro, e depois passaríamos para a área da Administração Interna, uma vez que está presente o Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Pinheiro Henriques (MDP/CDE): — Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: — Faça favor.
O Sr. Pinheiro Henriques (MDP/CDE): — Gostaria de perguntar se isso significa que a votação da matéria respeitante ao Ministério das Finanças passa para a parte final. Penso que essa alteração se justifica na medida em que se começou por abordar a matéria referente ao Ministério das Finanças dada a impossibilidade de o Sr. Ministro das Finanças acompanhar a parte final. No entanto, como suponho que não existe essa impossibilidade da parte do Sr. Secretário de Estado do Orçamento, penso que se justifica procc-der-se agora à correcção, chamemos-lhes assim, desta análise.
O Sr. Presidente: — Suponho, mesmo, que as votações do Ministério das Finanças serão normalmente as últimas. Por conseguinte, com a alteração da agenda não se prejudica o debate.
Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Alípio Dias): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de retornar ao tema do controle orçamental.
O Sr. Ministro das Finanças e o Sr. Dr. João Salgueiro já avançaram algumas explicações nesta matéria, mas julgo que ela é importante de mais para passar em claro sem uma explicação adicional.
Tenho para mim que a intervenção do Sr. Deputado Mário Adegas, quer ontem no Plenário da Assembleia da República, quer hoje de manhã, se filia, naturalmente — o que é perfeitamente compreensível—, no conhecimento que o Sr. Deputado tem do Ministério das Finanças do tempo que foi Secretário de Estado do Tesouro, nos primeiros 8 meses de 1981.
De facto, alguma coisa se mudou daí para cá, Sr. Deputado. Inclusivamente, mudou o Director-Geral da Contabilidade Pública, porque era necessário que as coisas caminhassem mais rapidamente. Só por desconhecimento do trabalho feito é que admito a sua intervenção.
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Seria estultícia da nossa parte ficarmos satisfeitos em ter os mapas da execução orçamental no dia 9 de cada mês. Não é disso que se trata, Sr. Deputado. O que se trata é que esse mapa que se tem no dia 9 de cada mês nos dá uma visão imediata e a partir daí, no núcleo de acompanhamento de execução orçamental, há uma pessoa responsável por cada orçamento. Portanto, nós temos o mapa, não no dia 9, mas 15 ou 20 dias depois, consoante a natureza dos Ministérios, e temos depois uma análise escalpelizada de tudo o que se passou durante a execução orçamental. Gostaria que ficasse claro que não se trata de ter um mapa, mas sim de ter uma informação actualizada e escalpelizada dos diferentes orçamentos. Este é um ponto que eu gostaria de marcar.
E o que se diz da despesa diz-se da receita. Sabemos quanto é que foi arrecadado por cada distrito e por cada imposto e estamos a caminhar para ter esta informação até a nível de repartição de finanças, porque estamos interessados, inclusivamente, em fazer uma gestão dos recursos humanos, dos responsáveis, designadamente na área das direcções de finanças.
Temos interesse em saber porque é que corre bem ou mal aquele imposto, porque se atrasa, porque cresce mais em Leiria e não cresce em Aveiro ou Coimbra, o que se passa, o que aconteceu, se foi dada ou não alguma isenção. Começamos a ter essa possibilidade e espero que a partir do final deste próximo ano o grau de informação que temos, a possibilidade que temos e a minúcia que temos, seja bastante melhor.
Mas isto, como sabe, não é fácil e é preciso preparar pessoal, arranjar equipamento e articular tesourarias com a contabilidade pública. Tudo isto leva o seu tempo e julgo que o Sr. Deputado conhece particularmente bem o Ministério. Mas gostava de lhe dar conta que, desde que saiu do Ministério, em Agosto ou Setembro de 1981, algumas coisas mudaram e julgo que para melhor.
Outro ponto que referiu na sua exposição foi o problema das dívidas dos empreiteiros e julgo que também apontou o problema das empresas públicas. Mas como vejo o Sr. Deputado muito interessado e empenhado em ajudar o Governo na execução orçamental julgo que, na sua dupla qualidade de deputado e de presidente de um banco nacionalizado, poderia dar —o Sr. Deputado como presidente, assim como os outros gestores da banca— uma ajuda notável nesta matéria. Gostaria somente que quando surgissem os pedidos de financiamento dos empreiteiros a título de adiantamento, ou das empresas públicas, para projectos de investimento tivessem cuidado no sentido de que antes de tomar posição sobre a operação de crédito silicitassem se está efectivamente incluído no PIDDAC ou no PISEE. Resolvíamos assim o problema, Sr. Deputado; é tão simples como isto. Só pergunto porque é que ainda o não fizeram. Eu já disse a alguns colegas. Porque é que vocês não fazem isto? Queixam-se do Governo mas não tomam as medidas, não ajudam o Governo. Podiam ter uma oportunidade muito grande de ajudar o Governo, com brilho e até para inlustrarem a sua função de estudo, que mostraram quando apuraram uma operação que, de facto ...
O Sr. Magalhães Mota (ASDI):—Dá-me licença?
O Orador; — Faça favor.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI):—Queria só co:o-car-lhe uma questão: por acaso, em Conselho de Ministros, o Sr. Secretário de Estado ou o Sr. Ministro das Finanças já puseram essa mesma questão aos seus colegas de Governo, que lançam obras sem elas estarem incluídas no PIDDAC ou no PISEE?
O Orador: — Com certeza. Pela minha perte não me tenho cansado de o dizer. Mas basta ler o artigo 18.° da Lei de Enquadramento para concluir que não á possível, de facto, que isso aconteça.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): — Mas acontece.
O Orador: — Sr. Deputado, então, depois, o Tribunal de Contas terá de se encarregar de ver porque é que isso acontece. Lá estará o Tribunal de Contas para, em tempo oportuno, julgar as contas.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): — Não é em lempc oportuno, como sabe, Sr. Secretário de Estado.
O Orador: — Sr. Deputado, de facto o Triburta! efe Contas terá de se pronunciar sobre isso.
Mas, enfim, independentemente disso, julgo ou.; poderá haver, de uma forma muito sincera e muito autêntica, um contributo muito forte das instituições de crédito nacionalizadas no sentido de ajudarem a evitar situações deste tipo. Basta só que tenham este cuidado: se está no PIDDAC provem que está nc PIDDAC, se está no PISEE provem que está no PISEE, e tudo o mais se resolverá.
Volto ainda ao problema do crédito da Madeira e as implicações que pode ter no Orçamento do Estado.
É indiscutível que tem implicações no Orçamento do Estado, Sr. Deputado, mas julgo que aí —e desculpe-me a forma muito sincera como falo— a faca e o queijo estão na mão dos gestores bancários: basta que não aceitem o reescalonamento da dívida e exijam que o Governo da República cumpra o seu dever. Nós não aceitámos o reescalonamento da dívida; portanto, se a Madeira não pode pagar o Estado avalista que cumpra. É tão simples como isso, Sr. Deputado. Mas se os senhores aceitaram não me parece muito correcto que venham agora levantar a questão e venham queixar-se aqui que aceitaram esta situação. Quer dizer, aceita-se ou não se aceita, e se não se aceita pede-se ao avalista que honre os seus compromissos.
O Sr. Presidente:— Se me dão licença, e sem prejuízo da intervenção do Sr. Deputado Mário Adegas, pediria que outros Srs. Deputados só se inscrevessem para este tema da primeira parte dos esclarecimentos, porque, como há pouco pedi, pretendia passar depois às questões do Ministério da Administração Interna. Pedia-lhes, portanto, que as inscrições fossem só para este tema.
Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Adegas.
O Sr. Mário Adegas (PSD): — Por razões de autodisciplina, vou referir aqui, com muita firmeza, que as palavras do Sr. Secretário de Estado do Orçamento são tão inadequadas e tão despropositadas que não as devo comentar. Em todo o caso, poderei fazê-lo noutra reunião de trabalho.
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Entretanto, não posso deixar de chamar a atenção para algumas imprecisões que foram avançadas, dizendo, desde já, quais são: eu não disse —pelo contrário, disse o oposto do que o Sr. Secretário de Estado concluiu — que não tinha sido feito um esforço no sentido do controle do acompanhamento, com mapas, etc, etc. Mais: eu signifiquei o meu apreço por saber que o esforço existia nessa matéria. E o que concluí — a gravação poderá provar — foi que considerava ainda insatisfatório o que tinha sido obtido, ou seja, que os esforços feitos responderiam a uma natureza de dívidas de menor porte (de despesas, de receitas, etc). Não é um problema de mapas; o problema é que estou contra os mapas e não estou satisfeito como cidadão e como deputado, e não pelo tempo em que estive no Ministério, em que, realmente, a insatisfação foi muito grande. Mas não tenho medo de referir que sei o que se passa no Ministério das Finanças e, se não tenho a vaidade de dizer que sei melhor do que as pessoas que lá estão, direi que talvez conheça tão bem como as pessoas que lá estão, porque, muitas vezes, não é o domínio do corredor que faz o domínio ou o conhecimento de como é que as coisas se processam.
Portanto, o que eu referia é que o controle orçamental, em Portugal, precisa de uma gestão. Eu, como cidadão e como deputado, que tenho de votar, estou insatisfeito. Que o Sr. Secretário de Estado não esteja tão insatisfeito como eu é um problema dele e não meu. Isto quanto à gestão global.
E o meu exemplo era este: é que da forma como cu entendo o controle orçamental — provavelmente de forma isolada, mas lá chegaremos e o tempo o confirmará — penso que o núcleo que existe para o controlar teria verificado, teria telefonado, teria falado com o Sr. Vice-Governador Vítor Constâncio, com o Sr. Vice-Governador Rui Vilar, por exemplo, e teria dito se se previa que uma verba tão significativa para o valor global do Orçamento continuava na expectativa de ser confirmada, em resultado das várias orientações, que até considero positivas, e não com a chegada de um ofício burocrático —e mantenho que é burocrático—, num dia qualquer, mesmo que seja depois de ter vindo do Orçamento, porque vejo que é inteiramente insensível o tipo de argumentos que se avançam de que este tipo de controle orçamental — e como cidadão e deputado tenho inteira liberdade de o dizer — é insatisfatório porque tem um pendor burocrático e, teimosamente, se mantém nesse nível.
Foi aqui também referido o facto — e, como disse há pouco, não me queria alongar muito— do crédito dos gestores bancários da Madeira.
Ê que o facto de eu acumular as funções e não o ordenado — acumulo-as porque a Assembleia o permite, a lei permite— também me dá muita independência, não apenas por causa dos lugares que ocupo, mas faço-o sempre de forma tão independente que nenhum sinal de implicação — como às vezes se refere, querendo-se tapar a boca, porque a pessoa está num lado ou noutro— não terá resultado positivo. O Sr. Secretário de Estado tinha dito, momentos atrás, que isso não tinha efeito no Orçamento e eu disse: «ê verdade que não tem de forma directa, tem de forma indirecta.» Foi a única coisa que quis referir.
Que o sistema bancário —e agora o desabafo — deveria ter intervindo, isso sim, porque os créditos, provavelmente, não seriam concedidos. Mas só quem tem estado fora do País ou quer ignorar as realidades
é que ainda se permite afirmar que algum crédito bancário da banca nacionalizada, quer para governos autónomos, quer para empresas públicas ou para apoio a acções do Governo, deixa liberdade de decisão aos gestores ou aos presidentes, uma liberdade plena. Isso é hipocrisia global, pois não corresponde ao que se passa no País.
Finalmente, o que queria referir e deixar aqui bem claro é isto: reafirmo que os esforços da Secretaria de Estado do Orçamento, nesta matéria, são enormes. Aplaudo-os, mas isso não impede que possa, num ou noutro caso, mostrar alguma insatisfação. E mostro-a para melhorar, para colaborar, porque é assim que entro na política e ninguém fará com que eu mude de posição.
Quanto a outros pormenores, refiro que, efectivamente, o Governo não sente um grande desconforto com este desvio. Pois que fique a saber que, como deputado da maioria, como antigo dirigente partidário, como antigo responsável no Ministério das Finanças, sinto um profundo desconforto, porque se trata de um desconforto, e não são as justificações técnicas que respondem a tudo.
Sei como é que se faz o controle, sei que é difícil, mas sei que ele é insatisfatório. Aliás, fica aqui provado que não há elementos.
Quanto, ainda, a outras questões, nós teremos, provavelmente — até porque, agora, não quero ser maçador—, oportunidade de as aflorar.
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente foão Salgueiro.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —
Sr. Deputado Mário Adegas, queria agradecer as palavras que acaba de dizer e queria associar-me consigo.
Nós não estamos ainda satisfeitos com o tipo de controle que existe; aí estou de acordo consigo: temos de ir mais longe. Eu próprio dizia há pouco que o nosso objectivo era ir mais longe, quer na área da receita, quer na área da despesa. Portanto, pode crer que estamos inteiramente de acordo consigo nessa preocupação. E agradeço, de facto, que me tenha dado oportunidade de esclarecer aquilo que já foi feito e aquilo que pensamos dever ser feito no Governo.
Por último, só lhe queria dizer é que, em matéria de relações com o Banco de Portugal, houve, dc facto, contactos, quer do Sr. Ministro, quer de mim próprio, que fiz alguns telefonemas sobre isso.
Mas o problema não foi esse: foi que a decisão final de não se vender ouro é que foi tomada, de facto, naquela altura. Contactos houve, a decisão final é que foi tomada já nessa altura.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, tenho a impressão de que, se concordassem, nós iríamos, talvez, fazer aqui uma mudança de agulha: o Sr. Secretário de Estado do Planeamento teria oportunidade de. como agora confirmei, a propósito da análise dos sectores, designadamente daqueles onde há empresas públicas, avançar, se for necessário, nalgum esclarecimento mais aprofundado, sem o fazer agora de uma forma genérica.
Por outro lado, poderíamos talvez aproveitar, conforme estava inicialmente previsto, para vermos aspee-
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tos da articulação com o Ministério da Administração Interna, se os Srs. Deputados quiserem alguns esclarecimentos.
Evidentemente que há várias questões aqui abordadas hoje que precisam, como os Srs. Deputados referiram, de alguns esclarecimentos, mas fá-lo-emos em sessões seguintes.
Portanto, passaríamos agora a ver os aspectos de esclarecimento que os Srs. Deputados entenderem úteis em relação à articulação da revisão orçamental com os problemas do Ministério da Administração Interna.
Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): —O Ministério da Administração Interna aparece a dois títulos na proposta governamental: em primeiro lugar, aparece uma verba de 180 000 contos nas Comissões de Coordenação Regional para implementação de investimentos intermunicipais —e seria útil conhecermos quais, qual o grau de prioridade que lhes foi atribuído e as necessidades deste reforço—, mas aparece também, segundo as palavras introdutórias do debate do Sr. Ministro, a propósito da dotação provisional, visto que o Sr. Ministro das Finanças esclareceu que o reforço proposto para a dotação provisional se destina a satisfazer carências de várias ordens no Ministério da Administração Interna, entre outros.
Ora, a minha primeira questão é, pois, a seguinte: quais são as carências de vária ordem verificadas no Ministério da Administração Interna e qual a parte da dotação provisional que vai para esse Ministério? O Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado disseram ainda que seria possível calcular, nesta data, já com certo rigor, aquilo que poderia ser atribuído a todos os Ministérios e que a dotação provisional poderia ter, assim, um carácter rigorosamente provisional.
Eram, pois, estes os dois esclarecimentos que pretendia.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Planeamento.
O Sr. Secretário de Estado do Planeamento (Mário
de Sousa):—Sr. Presidente, Srs. Deputados: Responderia à pergunta do Sr. Deputado Magalhães Mota, relativa aos investimentos intermunicipais. Quanto à dotação provisional, se o permitissem, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento prestaria esclarecimentos, dos quais, com certeza, eu não disponho de informação tão detalhada.
Quanto aos investimentos intermunicipais, talvez que a designação que acompanha a proposta de lei não seja feliz. Fala em implementação de empreendimentos intermunicipais, e o que realmente se passa é que esta verba se destina, única e exclusivamente, a fazer face a encargos com revisões de preços e altas de praça de empreendimentos intermunicipais que já estão em curso.
O diploma que regulamenta o regime dos investimentos intermunicipais é o Decreto-Lei n.° 118/82, de 19 de Abril, no qual se contempla, expressamente, que haverá lugar a revisões de preços e altas de praça, quando, evidentemente, haja razões para isso, e que esses encargos serão satisfeitos no ano seguinte àquele a que respeitarem.
Portanto, no início do ano não havia possibilidade de quantificar quais os encargos com essas revisões de
preços e altas de praça, e por essa razão, durante o primeiro semestre deste ano, foram-se colhendo informações. As câmaras municipais que têm obras em curso foram dando conhecimento às Comissões de Coordenação Regional de quais os encargos nesta matéria de revisões de preços e altas de praça. Chegou-se à conclusão de qual era o montante e pretende-se agora fazer face a essas despesas que já foram suportadas pelas câmaras municipais.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI):— Em primeiro lugar, uma vez que se trata de revisão de preços em relação a obras já efectuadas, e, tal como vem aqui colocada, essa possibilidade não estava à mercê dos deputados de saberem exactamente o que era — eu pelo menos não consegui saber — gostaria de saber se o Sr. Secretário de Estado me pode dar uma ideia de qual é, percentualmente, o valor dessas revisões de preços em relação aos custos totais das obras efectuadas em investimentos intermunicipais.
Em segundo lugar gostaria de saber quais são os instrumentos de controle de que o Ministério dispõe para controlar a execução e o cumprimento dos prazos contratualmente fixados para as realizações das obras e quais as razões que motivam o seu arrastamento em vários investimentos, provocando, depois, excessivo peso por revisões de preços.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Planeamento.
O Sr. Secretário de Estado do Planeamento: —
Sr. Deputado, creio que a verba não é excessiva, atendendo ao valor global com os encargos fixos dos diversos empreendimentos. Efectivamente, no ano em curso houve 2 milhões de contos para encargps fixos em empreendimentos intermunicipais; a percentagem será, pois, de cerca de 10 %.
A verdade é que a percentagem real é maior. Em matéria de controle, houve a publicação, em Abril último, de um despacho conjunto do Sr. Secretário de Estado do Orçamento e meu que suscitou a necessidade de se proceder a reprogramações financeiras de ebras que não estavam a ter o ritmo que constava da programação financeira inicialmente contemplada.
O diploma em questão, o decreto-lei que institui o sistema de empreendimentos intermunicipais, não prevê qualquer sanção para atrasos consideráveis nas obras. Normalmente os donos das obras são as câmaras municipais que atravessam, em alguns casos, dificuldades financeiras e, portanto, não podem dar o ritmo que seria desejável a essas mesmas obras.
Estamos a preparar legislação, nos termos das finanças locais, imposta pela respectiva lei, com vista a rever o sistema de empreendimentos intermunicipais, no sentido de estabelecer sanções ou penas para aqueles casos em que o atraso da obra sc deva a causas imputáveis ao dono da obra, realmente incomportáveis e que seja contraditório com a necessidade de utilizar, bem e rapidamente, os dinheiros públicos.
Não sei se satisfiz inteiramente as dúvidas de V. Ex.a
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.
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O Sr. Magalhães Mota (ASDI): — Eu penso que sim, Sr. Secretário de Estado. Há, no entanto, um ponto que gostaria de mencionar: estou convencido de que no ano passado, na verba dos 2 milhões de contos, já estavam incluídas as revisões de preços.
O Sr. Secretário de Estado do Planeamento: —
Não estavam, não, Sr. Deputado.
O Sr. Presidente:—Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —
O Sr. Deputado Magalhães Mota colocou uma questão a que eu talvez possa responder, e que era, no tocante à Administração Interna, a de saber que verbas se pensam reforçar.
Tenho dificuldade em dizer-lhe, quanto a verbas exactas, porque, efectivamente, não está ainda decidido, mas posso anunciar-lhe as finalidades. Penso que isso já poderá, de algum modo, ainda que parcialmente, dar satisfação ao solicitado.
Fundamentalmente, há reforços de verbas, quer na área da PSP, quer na da GNR, para gasolinas, combustíveis; na área do Serviço Nacional de Bombeiros, também há reforço de verba para ambulâncias, ligada à mesma rubrica de combustíveis; há alguns reforços de verbas para as assembleias distritais e, eventualmente — ainda não está decidida, mas, enfim, está pedida e estaríamos a equacioná-la—, para instalações, quer da PSP, quer da GNR, que têm, de facto, alguns aquartelamentos em péssimas condições.
O Sr. Presidente: — Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Fernandes.
O Sr. Manuel Fernandes (PCP): —Sr. Secretário de Estado do Planeamento, uma das questões que eu tinha a colocar enquadra-se nas respostas que deu ao Sr. Deputado Magalhães Mota, por conseguinte não se torna necessário melhor esclarecimento.
De qualquer forma, pretendia levantar uma questão, que, aliás, coloquei no Plenário e à qual não recebi qualquer resposta.
Trata-se de solicitar uma explicação de como é que o Ministério da Administração Interna, no âmbito desta alteração orçamental, enquadra a despesa que teve neste momento, assumindo os compromissos com as autarquias, no âmbito do financiamento dos transportes escolares e da acção social escolar, no que diz respeito ao último trimestre deste ano. Foi uma verba de 775 000 contos que, através da Caixa Geral de Depósitos, foi distribuída aos municípios.
Não tenho conhecimento de autorização para qualquer empréstimo entre o Ministério da Administração Interna e a Caixa Geral de Depósitos. Não encontrei nesta alteração orçamental qualquer verba que dê cobertura a esta despesa e fica-se-me esta dúvida: como é que o Ministério da Administração Interna encontrou esta saída? Solicitava-lhe, pois, esse esclarecimento.
O Sr. Presidente: — Para responder ao pedido de esclarecimento que lhe foi formulado, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Planeamento.
O Sr. Secretário de Estado do Planeamento: —
Sr. Deputado Manuel Fernandes, realmente quando foi
solicitada ao Ministério da Administração Interna a sua presença para aqui prestar esclarecimentos aos Srs. Deputados a propósito da proposta de lei da revisão orçamental, preocupei-me, sobretudo, em colher informação e preparar aquele ponto em que há uma referência expressa ao Ministério da Administração Interna. Lamentavelmente, não estou nas melhores condições para poder esclarecer o Sr. Deputado relativamente à verba para transportes escolares, uma vez que não estava prevista na proposta de lei. Poderia, eventualmente, prestar-lhe esses esclarecimentos se essa matéria tivesse corrido pela minha Secretaria de Estado específica, mas o problema foi tratado sobretudo entre a Secretaria de Estado da Administração Autárquica, e penso que entre a Secretaria de Estado do Tesouro, pelo menos com o Ministério das Finanças.
Não me arrisco a dar-lhe informações pormenorizadas, porque embora, enfim, vá tendo um conhecimento um pouco fluido do que se passa nessa matéria, não gostaria de arriscar aqui uma informação errada, pelo que peço imensa desculpa. Poderei recolher junto do Ministério informações mais precisas, que depois transmitirei, ou alguém do Ministério aqui se deslocará para dar resposta ao Sr. Deputado.
O Sr. Presidente: —Tem a palavra o Sr. Deputado
Manuel Fernandes.
O Sr. Manuel Fernandes (PCP):—Sr. Secretário de Estado do Planeamento, a questão que eu lhe coloco foi suscitada em Plenário — o Sr. Secretário de Estado de facto não estava presente, mas o Sr. Secretário de Estado que representa neste momento o Ministério das Finanças estava. Não foi feita qualquer referência pelo Sr. Ministro das Finanças a esta pergunta concreta que eu coloquei. Pensei que seria suscitada na intervenção que então foi anunciada e que seria feita pelo Sr. Secretário de Estado da Educação, mas que depois não se concretizou, tendo eu ficado com esta dúvida.
Já que o Sr. Secretário de Estado, pelas razões que expôs, não se encontra neste momento em condições de me poder dar a resposta, pergunto-lhe, concretamente, se o Ministério das Finanças, perante esta situação, tem conhecimento desta operação e se está em condições de me poder dar a resposta que solicitei.
O Sr. Presidente:— Para responder a este pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —
Sr. Deputado Manuel Fernandes, embora não tenha, de facto, um conhecimento pormenorizado, posso talvez dar uma ideia daquilo que sei.
Aquilo que se passou foi o seguinte: havia uma necessidade de as câmaras municipais contrairem um empréstimo junto da Caixa Geral de Depósitos para poderem avançar com alguns fundos para esta finalidade.
Como era uma tramitação bastante difícil —tinha de vir à Assembleia— e demorada, julgo que houve um acerto, uma combinação entre o Sr. Secretário de Estado da Administração Autárquica e o Sr. Secretário de Estado do Tesouro no sentido de que houvesse um adiantamento de fundos do Tesouro à Caixa Geral de Depósitos, enquanto, até ao final do ano, se procederia às formalidades necessárias para que, efectivamente,
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II SÉRIE — NÚMERO 4
a Caixa Geral pudesse ser reembolsada, pudesse formalizar o empréstimo e nessa altura reembolsar o Tesouro.
É esta a explicação que lhe posso dar neste momento.
O Sr. Presidente: —Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Fernandes.
O Sr. Manuel Fernandes (PCP): — Então aguarda-se que as câmaras municipais contraiam esse empréstimo com a Caixa Geral de Depósitos para, então, tapar esta situação que se encontra neste momento a aguardar essa démarche.
Por conseguinte, são as câmaras municipais que vão cobrir esta verba de 775 000 contos ou, pelo contrário, como foi anunciado pelo próprio Ministério da Administração Interna, é o aparelho central que o vai fazer como compromisso em relação a este último trimestre? Fazia parte de diplomas que foram publicados?
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —
Sr. Deputado, julgo que, depois dai verba que vier a ser fixada para as autarquias locais para o próximo ano, haverá uma certa compensação, haverá que acrescentar, de algum modo, à verba das câmaras municipais, exactamente para as compensar deste encargo adicional.
Julgo que é isso que, de facto, está previsto, mas, sinceramente, não tenho o pormenor.
As câmaras podem contrair empréstimos e recorrer a fontes para os pagar. Dentro dos limites da lei não vejo que haja algum inconveniente nisso.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Secretário de Estado, da forma como está a apresentar a questão, nós, em termos da Comissão, não podemos estar a admitir que se contraiam encargos agora e que se diga que este ano não se pagarão mas sim no orçamento seguinte.
Isto passa-se indirectamente. Agora são as câmaras que contraem os empréstimos, mas depois o Estado, no próximo ano, no orçamento, vai dar esse dinheiro.
O Sr. Presidente: — Sugeria, uma vez que os Srs. Deputados já formularam as perguntas e o Sr. Secretário de Estado já deu um princípio de esclarecimento, a menos que haja um elemento novo, fosse concedida a palavra ao Sr. Deputado Abreu Lima.
O Sr. Abreu Lima (CDS):—Sr. Secretário de Estado, tenho a impressão —pelo menos foi o que se passou quando se discutiu o Orçamento Geral do Estado no fim do ano findo— que na verba de 52 milhões e meio de contos atribuídos às autarquias estava enquadrada uma verba de 950 000 contos. Pelo menos foi o que a Sr.a Secretária de Estado da Administração Autárquica disse, ou seja, que na verba de 52 milhões e meio de contos atribuída às câmaras estava prevista e incluída uma verba de 950 000 contos para fazer face, no último trimestre deste ano, aos transportes e à acção social escolar.
Portanto, penso que deverá ser essa a razão por que isto não está previsto neste orçamento suplementar.
Isto foi o que foi afirmado. Se não tivesse sido transferida para as câmaras a obrigatoriedade de assegurar
os transportes escolares e uma parte da acção social escolar, no último trimestre a verba não seria de 52 milhões e meio de contos mas isto deduzido de 950 000 contos. Isto foi o que se afirmou no Plenário quando foi discutido o Orçamento Geral do Estado.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Almerindo Marques.
O Sr. Almerindo Marques (PS):—Sr. Secretário de Estado, o meu pedido de esclarecimento é breve e destina-se a formalizar melhor um outro que já foi feito.
Eu gostaria de saber, discriminadamente, quais os investimentos intermunicipais que estão previstos nesta verba relativa ao Ministério da Administração Interna.
Gostaria, por conseguinte, que nos fosse facultadai, formalmente, a relação dos investimentos intermunicipais e, se possível, eventualmente, com a justificação da necessidade de serem introduzidos num momento em que implicam reforço orçamental.
O Sr. Presidente: — Para responder ao pedido de esclarecimento que lhe foi formulado, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Planeamento.
O Sr. Secretário de Estado do Planeamento: —
Sr. Deputado Almerindo Marques, naturalmente que satisfarei, com todo o gosto, a solicitação de V. Ex.a
Nesta ocasião não tenho os elementos suficientes para os fornecer de imediato porque, como expliquei há pouco, as revisões de preços, altas de praça e encargos seriam superiores àqueles que são referidos. Simplesmente, através de um despacho conjunto que foi publicado em Abril, foi possível fazer reprogramações financeiras e há dinheiro que foi transferido para as Comissões de Coordenação Regional destinado a encargos fixos que nós sabemos já que não serão gastos este ano e que parte dessa verba será aproveitada para cobrir o montante global de revisões de preços e altas de praça que seria da ordem dos 340 000 contos, salvo erro. No entanto, só serão necessários 180 000 porque conseguiu-se poupar a restante diferença em termos de reprogramação financeira.
É perfeitamente possível fazer uma discriminação obra a obra, câmara municipal a câmara municipal, através desta rubrica de revisões de preços e altas de praça, de quanto é que cada uma delas irá receber. Eu farei chegar esses elementos à Comissão o mais depressa possível.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado. Isso é um ponto que tem já sido abordado em outras ocasiões, por alguns Srs. Deputados e portanto ficaria esclarecido.
Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, uso novamente da palavra porque julgo que há um aspecto que não está ainda esclarecido, levantado pelo Sr. Deputado do CDS e de que julgo todos nos recordamos.
Havia no Orçamento do ano anterior, na dotação do Ministério da Educação a transferir para as autarquias, uma verba que já estava incluída nos tais mais de 50 milhões de contos que foram transfe-
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20 DE OUTUBRO DE 1984
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ridos para as autarquias e que — tenho ideia —, seria entre os 900 e os 950 000 contos.
Para melhor compreendermos esta questão, necessitávamos saber — e isto até pelas informações que têm vindo a público, porque não há informação directa do Ministério para a Assembleia— se estes 755 000 contos pertencem a essa verba que se situa entre os 900 e os 950 000 contos.
Julgo que não, porque a informação que havia...
(Devido a deficiência técnica não foram registadas algumas palavras da intervenção do Sr. Deputado Octávio Teixeira.)
...é essencial sabermos em que condições é atribuída esta verba para vermos isto em termos orçamentais.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Planeamento.
O Sr. Secretário de Estado do Planeamento: —
Srs. Deputados, com a reserva reforçada de que esta matéria não diz directamente respeito ao meu pelouro, pelo que poderão tomar o que vou dizer como uma informação a título pessoal, repito que irei diligenciar junto do Sr. Ministro para que alguém, devidamente mandatado para o efeito, possa informar detalhadamente os Srs. Deputados.
Gostaria de ajudar a esclarecer o ponto levantado pelo Sr. Deputado Abreu Lima. Efectivamente ...
(Devido a deficiências técnicas é impossível reproduzir o resto da intervenção do Sr. Secretário de Estado, e o encerramento da reunião pelo Sr. Presidente às 12 horas e 55 minutos.)
Estiveram presentes os seguintes membros da Comissão:
João Maurício Fernandes Salgueiro. Almerindo da Silva Marques. Octávio Augusto Teixeira. Américo Albino da Silva Salteiro. António Domingues de Azevedo. Edmundo Pedro.
Maria da Conceição Fausta Quintas. Maria Luísa Modas Daniel. António dos Santos Meira. Cecília Pita Catarino. Guido Orlando Freitas Rodrigues. José Adriano Gago Vitorino. Manuel Portugal da Fonseca. Mário Martins Adegas. Adérito Soares Campos. Joaquim Miranda da Silva. Francisco Manuel Costa Fernandes. Carlos Alberto Gomes Carvalhas. António Bagão Félix. João Gomes de Abreu Lima. Manuel Tomás Rodrigues Queiró. José Pinheiro Henriques. Joel Eduardo Hasse Ferreira. Joaquim Magalhães Mota.
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